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CAPÍTULO II A QUESTÃO AMBIENTAL UMA VISÃO DE MUNDO a lógica ecológica é a negação pura e simples da lógica do capital não se pode salvar a terra dentro do quadro do capitalismo não se pode desenvolver o terceiro mundo segundo o modelo do capitalismo MARCUSE apud CATALÃO 1993 p52 Educadores como Tristão 1992 Dias 1993 Reigota 1994 Gutiérrez 1994 Viezzer Ovalles 1995 entendem que a concepção de Educação Ambiental transcende os aspectos ecológicos para orbitar na esfera políticoideológica conscientes da complexidade da questão ambiental Segundo esses e outros autores antes de ser uma crise ecológica a crise é civilizacional Nesse sentido não é a natureza que está em desarmonia mas sim a sociedade pósindustrial Tal constatação nos diz da urgência de priorizar as relações políticoeconômicas e socioculturais nas práticas pedagógicas ao invés da lógica simplista dos conteúdos educativos Conceções como eurocentrismo conceito utilitarista da natureza propriedade como um direito natural e também concepção individualista de comportamento de fragmentação da ciência e consequentemente do conhecimento escolar são heranças transmitidas pela educação formal alicerçadas pela filosofia liberalpragmática que caracterizou a cultura escolar nos últimos trezentos anos Para uma melhor compreensão dessa questão é necessário que se explique o conceito de natureza e o papel da cultura escolar trazidos pela modernidade 21 A CULTURA OCIDENTAL COMO NEGÇÃO DA NATUREZA Um dos pontos mais característicos do movimento ambientalista é a crítica à ciência moderna e à sua visão de mundo em que o conhecimento dela decorre e de se arrogar o direito de domar a natureza pretendendo dela ser independente O conceito de res extensa a que Descartes reduziu à natureza é segundo Santos 1999 isomórfico do conceito de terra nullius desenvolvido pelos juristas europeus para justificar a ocupação dos territórios do Novo Mundo É também por essa razão que a concepção dos povos ameríndios como homo naturalis traz consi go a desconteztualização de sua subjetividade Daí em diante a natureza só pode ter acesso à cidade por duas vias ambas ditadas por ela como o jardim botânico o zoológico e o museu etnográfico Nesse contexto foi crucial o papel do Estado por criar um regime jurídico de propriedade sendo essa uma das categorias básicas do liberalismo Esse regime legítimo simultaneamente o mesmo princípio e mantém incomunicáveis dois processos históricos simbióticos a exploração da natureza pelo homem e do homem pelo homem SANTOS 1999 p149 No primeiro caso essa concepção de natureza foi evoluindo com o capitalismo a ponto de ser considerada no século XXI como um recurso que deve ser preservado como quantidade escassa cujo consumo no processo produtivo deve ser racionalizado considerado portanto apenas como meio para a reprodução econômica Isso está absolutamente dado para os adeptos da racionalidade econômica os recursos não são vistos senão sob o ângulo de sua disponibilidade no mercado e de preço LEFF 1999 apud IRA 1995 p106 No segundo caso a hegemonia europeia influenciou previamente a consciência moderna na recusa no extermínio na negação do outro aonde foi o homem europeu encontrou a si mesmo e toda vez que encontrou a diversidade a exterminou e a reprimiu BALDUCCI 1991 p 43 Esses fatos propiciaram uma cisão entre a cultura hu mana e a natureza Isso é corroborado pela gênese etimológica da palavra cultura que é originária do verbo latino colere Cultura era o cultivo e o cuidado com as plantas com os animais e com tudo que se relacionava com a terra dá o termo agricultura Por extensão era usada para referirse ao cuidado com as crianças e com sua educação para o desenvolvimento de suas qualidades e faculdades naturais por isso puericultura O vocábulo se estendia aos deuses dai o termo culto Cultura escreve Hanna Arendt era o cuidado com a terra para tornála agradável aos homens era também o cuidado com os deuses os ancestrais e seus monumentos ligandose à memória e por ser o cuidado com a educação referiase ao culto do espírito CHAUI 1987 p11 rado do reino natural das causas necessárias e mecânicas a natureza tornase imóvel passiva materialidade dispersa exterioridade mecânica enquanto cultura se faz mobilidade atitude Assim é interessante salientar que para aprofundar a relação entre o reino da cultura humana e o reino da natureza episódios como a Revolução Francesa também contribuíram na perspectiva comportamental dos homens ocidentais inaugurando as bases filosóficas do liberalismo como o individualismo a propriedade privada e a liberdade tudo isso calcado no mercado Na modernidade instituiuse a educação escolar como espaço para a expansão da cultura Embora Condorcet 17601793 defendesse uma escola abrangente para todos os progressistas ao criticar a herança cultural impregnada na escola não a negavam mas admitiam desvios de classe social a séria valorização do conhecimento das ciências e da tradição como sustentáculo do progresso O liberalismo acabou hierarquizando o conteúdo da cultura Para alguns a cultura utilitarista e para outros a cultura geral alimentando a divisão de classes Não é de estranhar portanto que no século XXI ainda ocorra a dicotomia entre natura e cultura em especial na cultura acadêmica sobretudo em função dessas concepções que permeiam a história da educação escolar histórico é a cultura e seus mediadores eficazes são os professores Dessa forma esse paradigma inscrito historicament na educação escolar produz vários efeitos 22 PARADIGMA HISTÓRICOCULTURAL INSCRITO NA EDUCAÇÃO ESCOLAR Na esteira da educação proposta pela modernidade os conteúdos escolares são instrumentos de grande capacidade de subjetivação Dessa forma o conceito de natureza é reintroduzido na cultura escolar no sentido oposto à cultura e será veiculado pela própria educação Ainda hoje podemos observar essa concepção transmitida nos livros didáticos por exemplo Não devemos dormir com plantas no quarto Segundo Keim 1993 subjacente a essa concepção percebese uma clara intenção de colocar a natureza como algo ruim e ameaçador Os primeiros registros sobre esse assunto datam do início do século XIX época em que se desenvolvia a Revolução Industrial tornandose necessário romper as ligações campestre e agrária da população para facilitar a obtenção de matériaprima para as caldeiras e transformar os hábitos da população criando indivíduos que valorizassem os produtos industrializados mais que os artesanais Não é de se estranhar no entanto que nos dias atuais essas concepções estejam presentes na prática escolar Recentemente analisando títulos de livrostexto utilizados no ensino de Ciências Doxsey et al 1997 p 68 citando Wortman et al encontraram Frequentemente eles trazem explícita ou implicitamente padrões culturais que reforçam o mito do antropocentrismo como por exemplo reforçando o postulado de que as espécies animais e vegetais só existem em função do homem Títulos tais como Raízes e causas úteis ao homem Animais nocivos Águas necessárias à população a importância do solo para o homem permitem evidenciar a existência de uma ênfase utilitarista no estudo da Ciência Diante da necessidade de mudanças paradigmáticas sobre a concepção de natureza observamos o quanto é urgente um investimento maciço na formação inicial e continuada dos professores da educação básica em especial para os das séries iniciais do Ensino Fundamental pois esses últimos são por exigências estruturais e por natureza histórica profissionais interdisciplinares Pouco lhes é dado e muito lhes é exigido Esse vácuo é muito grande para garantir o alicerce da educação calcado em bases que reforçam essa concepção de homem e de natureza Isso pode comprometer sobremaneira a escolaridade subsequente resultando nas vergonhosas estatísticas por todos conhecidas A Lei de Diretrizes e Bases 939496 estabelece o prazo de dez anos para que esses profissionais obtenham nível superior de formação Isso será suficiente para dar conta dessa problemática Em 1989 Carvalho em sua tese de doutoramento verificou que 45 dos professores primários entrevistados nunca tinham ouvido falar em Educação Ambiental Essa concepção não é privilégio dos professores primários pois conforme identificou Reigota 1994 em um grupo de estudantes de PósGraduação há uma representação inicial entre professores do curso de Especialização denominada naturalista na qual o meio ambiente é considerado como sinônimo de natureza Cerca da metade daqueles professores apresenta o meio ambiente de maneira espacial ou seja ele corresponderia ao lugar onde os seres vivos habitam O outro subgrupo por sua vez concebe o meio ambiente como elemento circundante elementos bióticos e abióticos ao homem aqui entendido no seu aspecto biológico Em nossa concepção essa visão naturalista da questão ambiental retratada por esses alunos pósgraduandos reflete a visão parcial que em muito se deve à sua formação acadêmica que ratifica ao mesmo tempo em que produz essa visão unilateral de mundo Isso nos remete historicamente às bases filosóficas e às diretrizes legais da educação brasileira Encontramos no art 1 da Lei 402461 a seguinte afirmação A Edu cação Nacional inspirada nos princípios da liberdade e dos ideais de solidariedade humana tem por fim e o preparo do indivíduo e da sociedade para o domínio dos recursos científicos e tecnológicos que lhes permitem utilizar as possibilidades e vencer as dificuldades do meio Observando o lema e da referida Lei a ela é conferido um caráter extremamente utilitarista de natureza à luz do pragmatismo de Dewey Segundo Japiassú 1993 o pragmatismo é um princípio filosófico que valoriza a prática mais que a teoria e considera que devemos dar mais importância às consequências e efeitos de ação do que a seus princípios e pressupostos e valoriza a utilidade como principal critério da atividade humana Essa concepção de mundo está subjacente nos currículos ocorrendo o mesmo para as disciplinas e para a formação docente Ainda nessa linha de reflexão é interessante registrar que no início da República em uma das reformas educacionais pretendiase introduzir Ciências Naturais no ensino com vistas a romper com uma tradição humanista clássica predominantemente da época No entanto Ribeiro 1987 p 74 afirma que por vários motivos essa decisão foi alvo de críticas pelo fato de não ter respeitado o modelo pedagógico de Comte No que diz respeito à idade de introdução dos estudos científicos os próprios positivistas fizeram restrição à reforma Segundo a autora Comte não recomendava o ensino das ciências senão após os 14 anos Até então a criança deveria receber uma educação de caráter estético baseada na poesia na música no desenho e nas línguas Ref reforçando essas concepções é comum serem veiculadas pela mídia campanhas institucionais como a do desperdício de água luz elétrica ou de praias limpas Essas mensagens sob a ótica da cultura culpabilizam as pessoas caracterizandoas como consumidoras compulsivas e como potenciais depredadores do meio ambiente Em pese o que existe de verdadeiro em cada uma dessas óticas ambas padecem de uma cisão epistemológica A visão científica prendese a uma abordagem pragmática calcada na razão instrumental enquanto a visão cultural limitase a uma abordagem comportamental centrada no indivíduo Ambas indicam que se a população fosse devidamente esclarecida sobre as transformações que ocorrem na natureza a questão ambiental estaria resolvida Assim se o processo de informação fosse eficiente a resolução dos problemas ambientais seria consequência natural Por outro lado Sorrentino apud Sommer 1987 p48 assevera Estudos sobre problemas ambientais provam de maneira bastante clara que a falha não está na falta de informação ou no desconhecimento dos problemas mas na sensação de distância da ação individual e coletiva Os países latinoamericanos submetidos há séculos a regimes autoritários tiveram como consequência a produção de uma cultura política restritiva à participação Essa postura aliada ao despreparo à descrença e à falta de motivação para a participação na resolução de seus próprios problemas em relação à possibilidade de qualquer autoridade fazer algo que não seja em proveito pessoal e em prejuízo coletivo tem levado os indivíduos a atitudes cada vez mais individualistas e menos coletivas É de se observar no entanto que a realidade dos fatos tanto local como planetária é ameaçadora Quem são os maiores responsáveis em extensão e em abrangência tendo como consequência os danos ambientais e sociais Quais ações eou comportamentos carecem de ser implementados com possibilidades de reversão do atual quadro Gadotti 1998 assegura que toda educação pode ter uma orientação voltada para a formação da cidadania e para o desenvolvimento afirmando que essa última é condição sine qua non para o desenvolvimento auto sustentado de um país uma vez que a educação básica ou bem mais precioso e de maior valor para o desenvolvimento mais do que as riquezas naturais Nessa perspectiva cabenos a pergunta a que tipo de desenvolvimento está se referindo A custa de quais condições este se efetiva Quem paga o ônus Se no dicionário desenvolvimento é o ato ou efeito de desenvolver e desenvolver significa fazer crescer ou aumentar é preciso indagar a que interesse serviu esse desenvolvimento Como analisar seus efeitos contraditórios do mesmo cujo resultado é simultaneamente produtivo e predatório O conceito de desenvolvimento é complementar à ideia de cultura forjada no século XVIII como afirma Herculano 1992 p2324 Desenvolvimento é uma nova roupagem para a ideia de progresso que está presente no iluminismo etnocêntrico de Turgot e Condorcet no século XVIII e que foi adotado pelo Positivismo do século XIX Tal como o termo progresso e o termo evolução trazido da biologia a ideia predominante de desenvolvimento supõe uma trajetória a se percorrer uma mudança ordenada predeterminada universal segundo um mesmo e único processo civilizatório uma crença de que a sociedade devese mover em uma direção desejada e melhor O desenvolvimento capitalista supõe em resumo um processo linear de crescimento ascendente e infinito natural e resignadamente desigual a respeito do caráter predatório do processo civilizatório Ele denuncia a ideia de desenvolvimento como sendo um mito útil para mobilizar os povos da periferia a aceitar sacrifícios legitimar a destruição de suas culturas e justificar as formas de dependência Na Europa e nos Estados Unidos esse desenvolvimento industrial gerou uma produtividade e acúmulo sem precedentes outorgandolhes o título de países desenvolvidos enquanto os países de base agroexportadora desprovidos de ciência e de tecnologia ficaram reféns dos primeiros disponibilizando matériaprima e mãodeobra para a expansão de suas indústrias multinacionais e ampliação de seus mercados consumidores Nesse sentido observa Penteado 1994 p3132 Esta expansão industrial em escala mundial efetuada sem as devidas precauções legais referentes aos possíveis efeitos nocivos sociais acelera a ocorrência do lado perverso deste processo no campo social potencializase a oferta de mãodeobra maior que a capacidade de absorção no mercado de trabalho enquanto outra parcela amplia a exclusão Nessa perspectiva a preservação de direitos inalienáveis à própria vida como moradia alimentação e trabalho fica a cargo de iniciativas individuais O direito à educação embora presente nas leis se traduz em letra morta Embora essas necessidades nunca fossem consideradas no processo de desenvolvimento prevalente as consequências desse desenvolvimento se traduziram além dos efeitos sociais elencados na desqualificação do meio natural como a mudança climática causada pela depleção da camada de ozônio e do efeito estufa a contaminação das águas o avanço da desertificação e a diminuição da biodiversidade entre outros comprometendo a biosfera Isso tem alarmado boa parte dos habitantes do planeta e algumas autoridades governamentais Para alguns pesquisadores esse modelo de desenvolvimento que se reduz ao desenvolvimento econômico à produção de riqueza produz a pobreza Nesse sentido degradações sociais e humanas caminham juntas com a deterioração dos ecossistemas No século XVII já alertava o cacique Seattle citado por Pedersolli 1980 p50 somente quando for secado o último rio cortada a última árvore envenenado o último peixe aí o homem se dará conta de que não poderá comer dinheiro 23 AS PRIMEIRAS PREOCUPAÇÕES OFICIAIS COM A QUESTÃO AMBIENTAL A primeira preocupação oficial nesse sentido aconteceu em junho de 1972 quando ocorreu a Conferência Meio Ambiente e Desenvolvimento promovida pela Organização das Nações Unidas ONU em Estocolmo na Suécia com a participação de 113 países que resultou na declaração sobre o ambiente humano Esse encontro estabeleceu o Plano de Ação Mundial orientando os governos e em particular recomendando o desenvolvimento de um programa internacional de Educação Ambiental tendo em vista educar o cidadão comum para a compreensão dos mecanismos de sustentação da vida na terra para o manejo e para o controle do meio ambiente Vale ressaltar ainda que como encaminhamento prático resultou dessa Conferência a seguinte recomendação Que o secretáriogeral os organismos dos sistemas das Nações Unidas em particular de Organização Educacional Científica e Cultural das Nações Unidas UNESCO e as demais instituições interessadas após consultaremse e de comum acordo adotem as disposições necessárias a fim de estabelecerem um programa internacional de educação sobre o meio ambiente de enfoque interdisciplinar e com caráter escolar e extraescolar que abranja todos os níveis de ensino e se dirija ao público em geral especialmente ao cidadão que vive nas zonas rurais e urbanas ao jovem e ao adulto indistintamente com o objetivo de ensinarlhes medidas simples que dentro de suas possibilidades possam tomar para ordenar e controlar o meio ambiente ASSIS 1999 p59 de seu contexto sociocultural currículo obsoleto pouco investimento na formaçãocapacitação docente crianças e adolescentes decorando livros didáticos calçados em perguntas e respostas enfim o ato de aprender se encerrando na própria escola Então até que ponto se pode esperar de Educação Ambiental uma ação pedagógica relevante e diferenciada das demais Em 1992 por sua vez o Tratado de Educação Ambiental para as Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global produzido na jornada de Educação Ambiental durante o Fórum Internacional de ONGs Rio92 delimitou princípios básicos de educação para as sociedades sustentáveis e responsabilidades globais Declarou como fundamental o papel da Educação Ambiental para a promoção da ação socioambiental e da cidadania e expressou princípios mais descritivos do conteúdo e da metodologia da Educação Ambiental repensando a potencialidade de processos educacionais para estimular orientar e mobilizar a população para a mudança paradigmática 24 CONSCIÊNCIA AMBIENTAL UMA CONSTRUÇÃO NECESSÁRIA No século XX fatos como a destruição de Nagasaki e Hiroxima pelos EUA e o acirramento da eugenia na Alemanha são considerados pontos de partida para a constituição dos movimentos ambientalistas cujos fundamentos foram de caráter ético que são incorporados ao caráter conservacionista forjados no século XIX Para Crespo 1997 o ambientalismo se constituiu em um movimento de ideias de teses que opera num contexto mundial de globalização acelerada É um movimento que sofre várias influências culturais contribuindo portanto segundo a autora para a construção histórica de seus argumentos diversas clivagens ideológicas que o fragmentam em diferentes correntes As mais proeminentes são o ambientalismo pragmático ou de resultados e o ideológico ou ético O primeiro cunhado de ecologia de resultados está preocupado em frear o processo de depleção dos recursos naturais e criar dentro do sistema socioeconômico vigente mecanismos que compatibilizem o desenvolvimento econômico e o manejo sustentável dos recursos naturais São chamados de programas de tecnologias limpas regulação de usos e de direitos dos recursos No segundo chamado de ecologismo ético o princípio é o de questionar a própria relação homemnatureza historicamente situado e de desconstruir a sua racionalidade Seus defensores argumentam que não basta um abrangimento no processo de destruição A lógica do desenvolvimento indefinido consumismo exacerbado presente no primeiro mundo não pode ser generalizada Em Belgrado posteriormente em 1975 a UNESCO lançou o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Programa Internacional de Educação Ambiental PIEA No Brasil esse processo se refletiu em 1976 quando o Ministério da Educação e Cultura MEC e o Ministério do Interior MINTER firmaram um Protocolo de Intenções segundo o qual seriam incluídos temas ecológicos nos currículos de 1º e de 2º graus A UNESCO organizou em 1977 a 1ª Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental em Tbilisi Geórgia exURSS Nela definiramse objetivos recomendações e estratégias para o plano nacional e internacional Os participantes da Conferência de Tbilisi concluiram Ainda que seja óbvio que os aspectos biológicos constituem a base natural do meio humano as dimensões sócioculturais e econômicas e os valores éticos definem por sua vez as orientações e os instrumentos com os quais o homem poderá compreender e utilizar melhor os recursos da natureza com o objetivo de satisfazer suas necessidades ASSIS 1999 p59 A Educação Ambiental acompanha esse conceito amplo de meio ambiente e como princípio fundamental incorpora a interdisciplinaridade No entanto a Educação Ambiental praticada hoje nas redes escolares brasileiras enfrenta toda a problemática própria da educação e para todo o planeta Dados compilados por Sachs 1993 apud LEFF 1999 demonstram que os países desenvolvidos consomem da produção mundial 72 de leite 64 da carne 81 do papel e papelão 86 do alumínio 86 do cobre 80 de ferro e do aço 87 dos produtos químicos e 92 dos automóveis Podemos dizer que esse modelo de desenvolvimento é concentrador predatório segregado e excluente em que ¼ da população mundial consome 80 dos bens e mercadorias produzidos pelos trabalhadores da Terra Partindo do pressuposto de que o recurso é finito as mudanças só poderão ocorrer a partir de uma nova consciência uma nova subjetividade uma nova forma de agir e de sentir no comportamento e no consumo Nessa perspectiva o conceito utilizado é o de sociedade sustentável e não de desenvolvimento sustentável pelas ambiguidadesintencionalidades pelas quais o termo desenvolvimento é impregnado historicament vida e dos elos de solidariedade que existem em todas as espécies Nessa perspectiva segundo Morin 1997 p131 o meio é permanentemente membro constituído de todos os seres que nele se alimentam e portanto edecopendentes e esses seres só constroem sua existência sua autonomia sua originalidade na relação ecológica A independência do ser vivo exige uma dependência em relação ao meio Os seres vivos transformam o meio autoproduzindose alimentam e coproduzem seu ecossistema e ao mesmo tempo degradamno com suas poluições dejetos predações e depredações Nesse sentido o homem os outros animais e os vegetais coexistem coexistiram com o intuito de manter a vida no planeta Terra Isso é atestado nas seguintes palavras de Gramsci 1991 p39 devese conceber o homem como uma série de relações atuais processo no qual se a individualidade tem a máxima importância não é todavia o único elemento a ser considerado A humanidade que se reflete em cada individualidade é composta de diversos elementos 1 o indivíduo 2 os outros homens 3 a natureza animais e com os elementos integrantes da natureza Por outro lado essa complementaridade pode ser de domínio ou de interdependência Nessa perspectiva a individualidade dita pelo pensador está ligada a uma construção do sujeito ideológico construído historicamente na relação do homem colonizador sobre a natureza e sobre os demais homens cujas consequências estão presentes no planeta Terra Diante desses fatos no final do século XX houve necessidade de se construir uma consciência ambiental Essa por sua vez manifestase como uma angústia e uma necessidade de reintegração do homem à natureza A ecologia aparece como um elemento capaz de preencher o vazio que deixa a ciência moderna para ordenar o mundo Nesse contexto a questão ambiental emerge como uma crise de civilização caracterizada segundo Leef 1999 por três aspectos de fratura e de renovação que são a os limites do crescimento e a construção de um novo paradigma de produção sustentável b o fracionamento do conhecimento a emergência da teoria de sistemas e o pensamento da complexidade e c o questionamento da concentração do poder do Estado e do mercado e as reivindicações da cidadania por democracia por equidade por justiça por participação e por autonomia Esses pontos de ruptura questionam os paradigmas do conhecimento e do modelo organizacional da sociedade de moderna Eles apontam também a perspectiva da construção de uma outra racionalidade social sustentada por pilares calçados em significados culturais e ecológicos que prescindem de valores éticos de saberes plurais e de construções democráticas Nessa tarefa é que a educação se converte em um processo estratégico para a promoção de uma sociedade sustentável Nessa perspectiva a escola se constitui em um espaço com potencialidade estratégica capaz de articular diferentes saberes que podem ser difusos e até contraditórios sistematizando uma nova cultura Essa nova cultura é cunhada por Gutiérrez 1994 p41 como uma ecopedagogia³ ou pedagogia da sustentabilidade Diante disso é possível dizer que essa ecopedagogia remete a uma emergência de um ecoprofessor⁴ que precisa ser forjado antes de tudo como um cidadão planetário capaz de educar para a construção da cidadania planetária Educar para a cidadania planetária supôs o reconhecimento de uma comunidade civil planetária que deve ser tratada a partir da vida cotidiana Para Gutiérrez 1994 p42 educar para a cidadania planetária implica desenvolver capacidadehabilidades como 1 sentir intuir emocionar 2 imaginar inventar criar e recriar 3 relacionar e interconectarse autoorganizarse 4 informarse comunicarse expressarse 5 localizar processar e utilizar a imensa informação da aldeia global 6 buscar causas e prever consequências 7 criticar avaliar sistematizar e tomar decisões 8 pensar em totalidade holisticamente Esse ecoprofessor precisa ter a sensibilidade de que não se pode pensar uma cidadania planetária excluindo a dimensão social da ecologia Esse pensamento é corroborado por Boff 1996 p63 com a seguinte indagação o planeta é minha casa a Terra o meu endereço Como posso viver bem numa casa malarrumada malcheirosa poluída e doente O bemestar não pode ser só social tem que ser também sóciocósmico Nessa concepção o conceito de ecologia é impregnado de novo significado A etimologia da palavra ecologia é composta do prefixo grego que significa ecocasa e logiaestudo sendo portanto o estudo da casa da moradia O conceito de ecologia foi criado pelo biólogo alemão Ernst Haeckel 18431919 como um capítulo da Biologia para designar o estudo das inter e retrorelações dos seres vivos entre si e com seu meio ambiente Guattari 1986 amplia essa concepção de ecologia denominandoa ecosofia Ecosofia é uma palavra composta cuja etimologia do prefixo eco significa casa e o sufixo sophia significa saber sendo portanto muito diferente de logos que significa estudo Saber assume um sentido mais amplo para diferentes saberes igualmente amplo no sentido de que jamais se divide Constitui então um todo formado por partes atômicas que uma vez interdependentes se interagem sempre O conceito de ecosofia articula três ecologias a social a mental e a ambiental A ecologia social se refere às relações dos seres humanos entre si São relações geradas pela família com que partilhamos nosso microcotidiano até as relações estabelecidas entre nações e povos entre si passando inclusive por uma rede infinitaindeterminada de relações sociais que articulam a vida nos bairros aldeias e cidades nos movimentos e lutas sociais na cultura e no lazer de diferentes povos Nesse sentido expressam relações de classes dentre dominantes e dominadas entre homens e mulheres representantes e representados entre educadores e educandos entre adultos e crianças entre povos do Norte e do Sul entre nações ricas e pobres A ecologia social deverá trabalhar na reconstrução do modelo em todos os níveis do socius incluindo também nos estratos mais subjetivos vez que a ideologia dominante está inserida em nossa existência individual e coletiva A ecologia mental está relacionada com a constituição e os dejetos produzidos por essa civilização fomentados pela criação de uma demanda de necessidades cada vez maior de bens supérfluos Enquanto a ecologia natural referiase apenas à preservação da natureza a ecologia integral para além da ecosofia amplia para visão da Terra vista pelos astronautas na década de 60 referese à qualidade de vida ambiental e social Nesse sentido é preciso reavaliar essa forma de estar e se relacionar consigo mesmo com os outros e com as coisas plantados pela modernidade Novamente recorremos a Gramsci 1994 p12 quando ele declara que criticar a concepção de mundo signifie portanto criticar também toda a filosofia até hoje existente na medida em que ela deixou estratificações na filosofia popular Essa crítica pressupõe um conhecimento um desvelamento das ocultações consolidadas nesse modelo de vida e de consumo que o capitalismo nos impõe E preciso desmontar a hegemonia burguesa compreendêla por dentro para que uma outra seja construída a partir de uma lógica contrahegemônica humanizadora contrária portanto à da dominação e à da exploração Nessa perspectiva a ecosofia seria um importante componente ético na construção de um novo paradigma de uma nova lógica Em educação seria uma lógica ecopedagógica vista como um movimento pedagógico re volucionário com uma nova abordagem curricular Tais princípios estão assentados inclusive no Tratado de Educação Ambiental para as Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global Tratado das ONGs p194196 Nesse documento podemos destacar alguns eixos importantes a educação ambiental é individual e coletiva Tem o propósito de formar cidadãos com consciência local e planetária que respeitem a autodeterminação dos povos e a soberania das nações a educação ambiental deve envolver uma perspectiva holística enfocando a relação entre o ser humano a natureza e o universo de forma interdisciplinar Uma educação centrada na perspectiva holística busca construir um modelo de mundo sem fragmentações na busca da totalidade do ser humano Daí é preciso considerar que a visão holística se diferencia da visão mecanicista no que tange à abordagem das partes pois a abordagem holística não é nem analítica nem sintética Ela se caracteriza pelo uso simultâneo e conjunto ou da sinergia destes dois métodos enquanto a abordagem mecanicista é analítica CREMA 1991 apud GUIMARÃES 1996 p97 Nesse sentido até que ponto a educação pode contribuir para a qualidade de vida da cidade e do campo Como os currículos poderiam se constituir como instrumentos para uma sustentabilidade ambiental e social da subjetividade Ela se refere dessa forma às relações de cada ser consigo mesmo suas emoções e sensações corporais com o inconsciente com os mistérios da vida bem como sua espiritualidade Esses registros são construídos historicamente pela mídia eletrônica reinventando por meio da semiótica de subjetivação padrões culturais de comportamentos inclusive reforçando o consumismo Já a ecologia ambiental são as relações que os seres humanos estabelecem com a natureza Reflete os diferentes modos de como os grupos sociais se relacionam com a natureza seja de forma predatória ou sustentável Pode ser para satisfazer suas necessidades elementares como pode ser para apropriaçãotransformaçãoconsumodescarte Na civilização moderna essas ações definem equivocadamente o nível de desenvolvimento da sociedade A ecologia ambiental está portanto relacionada de maneira intrínseca com a subjetividade e com os aspectos social político e econômico Por outro lado todos os viventes dependem direta ou indiretamente do meio natural utilizandoo como fonte de recursos para sua própria sobrevivência como a água os vegetais o oxigênio os outros animais os minerais as rochas etc Ou como receptor dos dejetos Com o progresso tecnológico especialmente após a Revolução Industrial cresceu muito o consumo de recursos naturais