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Direito Constitucional

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O Laboratório Americano de Estudos Constitucionais Comparados - LAECC procura aprofundar as discussões temáticas comparativas entre os vários sistemas constitucionais americanos. O grupo desenvolve abordagens comparativas em 4 diferentes linhas, procurando cobrir todas as dimensões materiais do constitucionalismo e fomentar a pro dução científica nos diversos ramos do direito, sempre primando pela abordagem de abrangência interdisciplinar. E SCRITOS SOBRE JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL E DIREITOS FUNDAMENTAIS Apoio Alexandre Walmott Borges Hugo França Pacheco José Luiz de Moura Faleiros Júnior Moacir Henrique Júnior Ricardo Padovini Pleti Ferreira Concepção e coordenação Alexandre Walmott Borges Sérgio Augusto Lima Marinho Capa Equipe LAECC Projeto gráfico e diagramação Equipe LAECC Laboratório Americano de Estudos Constitucionais Comparados CNPJ/MF nº 33.097.820/0001-00 Rua Johen Carneiro, 377, Uberlândia – MG CEP 38.400-070 www.laecc.org.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) ________________________________________________________________________________ E74 2020 Escritos sobre jurisdição constitucional e direitos fundamentais / Alexandre Walmott Borges, Sérgio Augusto Lima Marinho (Coordenadores). Uber lândia: LAECC, 2020. 662 p. Obra coletiva. Inclui bibliografia. ISBN: 978-65-99099-27-4 1. Direito Público. 2. Direito Constitucional. 3. Jurisdição Constitucional. 4. Direitos Fundamentais. I. Borges, Alexandre Walmott. II. Marinho, Sérgio Augusto Lima. CDD: 340 / CDU: 342 ________________________________________________________________________________ Catalogação na fonte / Conselho Editorial Laboratório Americano de Estudos Constitucionais Comparados - LAECC http://laecc.org.br/conselho-editorial A DAILTON B ORGES DE O LIVEIRA Doutorando no Programa de Biocombustíveis do Instituto de Química da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Presidente/coordenador da Comissão Permanente de Sindicância e Inquérito da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. A LESSANDRA S ILVEIRA Doutora em Direito pela Universidade de Coimbra – UC. Professora da Universidade do Minho – Portugal. A LEXANDRE DE S Á A VELAR Doutor em História pela Universidade Federal Fluminense – UFF. Professor da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. A LEXANDRE W ALMOTT B ORGES Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC e em História pela Univer sidade Federal de Uberlândia – UFU. Professor da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. A LFREDO J OSÉ DOS S ANTOS Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Professor da Universidade Estadual Paulista - UNESP Campus Franca. A LMIR G ARCIA F ERNANDES Doutor em Direito Comercial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor do Centro Universitário do Planalto de Araxá – UNIARAXÁ. A NTONIO M ADRID P ÉREZ Doutor em Direito pela Universitat de Barcelona – UB. Professor da Universidade de Barcelona – UB. Professor do curso de Mestrado Interuniversitário organizado pelas universidades: Universidad Rey Juan Carlos, Universidad Carlos III de Madrid, Universitat Autònoma de Barcelona e Universi tat de Barcelona. B ERNARDO W ALMOTT B ORGES Doutor em Física pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Professor da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. B ORJA M UNTADAS F IGUERAS Doutor em Filosofía Contemporánea y Tradición Clásica pela Universitat de Barcelona – UB. Professor e investigador em Filosofía Moderna y Contemporánea na Universitat La Salle, Campus Barcelona, na Universitat de Barcelona – UB e Professor Convidado na Universidade Federal de Uberlândia – UFU. D ANIEL U STÁRROZ Doutor e Mestre em Direito Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Pro fessor Adjunto de Direito Civil na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. D IVA J ÚLIA S OUSA DA C UNHA S AFE C OELHO Pós-Doutora em Direito Constitucional Comparado pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU e Doutora em Ciudadania y Derechos Humanos pela Universidad de Barcelona – UB. Profes sora da Universidade Federal de Goiás – UFG. F ABIANA A NGÉLICA P INHEIRO C ÂMARA Doutora em História Social pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Mestre em Gestão Internacional e Desenvolvimento Econômico pela Universidade de Reading – Inglaterra. F RANCIELLE V IEIRA O LIVEIRA Doutoranda em Ciências Jurídicas Públicas no âmbito do Doutorado Europeu da Universidade do Minho – Portugal. F RANCISCO I LÍDIO F ERREIRA R OCHA Doutor em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Professor do Centro Universitário do Planalto de Araxá – UNIARAXÁ. G ONÇAL M AYOS S OLSONA Doutor e Mestre em História da Filosofia pela Universitat de Barcelona – UB. Professor Titular na Faculdade de Filosofia da Universitat de Barcelona – UB. I LTON N ORBERTO R OBL F ILHO Doutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná – UFPR. Professor Adjunto da Faculdade de Direito da UFPR e do Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP. Diretor da Aca demia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). J OSÉ C ARLOS R EMOTTI C ARBONELL Doutor em Direito pela Universitat Autònoma de Barcelona – UAB. Professor da Universitat Au tònoma de Barcelona – UAB. J OSÉ L UIZ DE M OURA F ALEIROS J ÚNIOR Mestre em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Professor de cursos preparató rios para a prática da advocacia. Advogado. L UCIANA O RANGES C EZARINO Pós-Doutora pelo Politécnico de Milão – POLIMI. Doutora pela Faculdade de Economia, Adminis tração e Contabilidade da Universidade de São Paulo – FEA/USP. Professora da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. M ILLA A LVES B AFFI Pós-Doutora em Microbiologia de Alimentos pela Universidad de Castilla La Mancha – UCLM. Doutora em Genética e Bioquímica pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Professora da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. M OACIR H ENRIQUE J ÚNIOR Doutor em Direito e Ciência Política e Mestre em Criminologia e Sociologia Jurídico-Penal pela Universidade de Barcelona – UB. Professor da Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG. P AULO C ÉSAR C ORRÊA B ORGES Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Sevilla – US. Doutor e Mestre em Direito pela Univer sidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP. Professor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP Campus Franca. P AULO R OBERTO DE A LMEIDA Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Professor da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. R ENATO C ÉSAR C ARDOSO Pós-Doutor em Filosofia pela Universitat de Barcelona – UB. Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Professor da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. R ICARDO P ADOVINI P LETI F ERREIRA Doutor e mestre em Direito Empresarial pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Professor da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. R ODRIGO V ITORINO S OUZA A LVES Doutoranto em Direito pela Universidade de Coimbra – UC. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Professor da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. S AULO P INTO C OELHO Pós-Doutor pela Universitat de Barcelona – UB. Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Professor da Universidade Federal de Goiás – UFG. T HIAGO P ALUMA Doutor em Direito Internacional pela Universidad de Valencia. Professor da Universidade Federal de Uberlândia. V IVIANE S ÉLLOS -K NOERR Pós-Doutora pela Universidade de Coimbra – UC. Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Professora do Centro Universitário Curitiba – UniCURITIBA. W ELLINGTON M IGLIARI Doutor e Mestre em Direito Internacional Público pela Faculdade de Direito, Universitat de Barce lona – UB. SOBRE OS AUTORES Coordenadores A LEXANDRE W ALMOTT B ORGES Professor da UFU, dos programas de pós-graduação em Direito e em Biocombustíveis. Professor visitante do programa de pós-graduação em Direito da UNESP.Doutor em Direito. Doutor em História. Pesquisador líder do LAECC. E-mail : walmott@laecc.org.br S ÉRGIO A UGUSTO L IMA M ARINHO Mestre em Direito Público pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universida de Federal de Uberlândia com pesquisa fomentada pela CAPES. Graduado em Direito pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade Federal de Uberlândia com pesquisa fomentada pela FAPEMIG. Professor Universitário. Advogado. E-mail : professorsergiomarinho@gmail.com Autores A LEX C ABELLO A YZAMA Abogado por la Universidad Mayor de San Simón (UMSS – Bolivia). Máster en Derecho por la Universidad Federal de Uberlândia (UFU - Brasil). Miembro del Grupo de Investi gación y Estudios en Derecho Internacional (GEPDI- UFU-CNPq) y Laboratorio Ameri cano de Estudios Constitucionales Comparados (LAECC- UFU-CNPq). A LEXANDRE W ALMOTT B ORGES Professor da UFU, dos programas de pós-graduação em Direito e em Biocombustíveis. Professor visitante do programa de pós-graduação em Direito da UNESP. Doutor em Direito. Doutor em História. Pesquisador líder do LAECC. E-mail : walmott@laecc.org.br A MANDA F IGUEIREDO DE A NDRADE Mestranda em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Graduada em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), onde foi bolsista FAPEMIG de iniciação científica. E-mail : amandafdeandrade@gmail.com. A NA F LÁVIA A LVES C ANUTO V ELOSO Doutora e Mestra em Direito pela Universidade de São Paulo (USP). Graduada em Direi to pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Advogada. Professora universitária. E-mail : anaflavia@ecaa.adv.br. A NA L UIZA S ILVA A GOSTINHO Pós-graduada em Direito Público. Bacharal em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia. Advogada. A RTHUR P INHEIRO B ASAN Doutorando em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), Mestre em Direito pela Faculdade de Direito Prof. Jacy de Assis, da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Pós-graduado em Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade Damásio (2014). Associado Titular do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilida de Civil - IBERC. Professor Adjunto na Universidade de Rio Verde (UNIRV). B RUNO M ARQUES R IBEIRO Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre e Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Especialista em Direito Civil pela Uni versidade Católica Dom Bosco (UCDB). Docente em cursos de graduação e pós graduação lato sensu . Advogado. D ANLER G ARCIA Mestre e bacharel em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), onde foi bolsista FAPEMIG. E DUARDO R ODRIGUES DOS S ANTOS Mestre em Direito Público pela UFU. Pós-graduado em Direito Constitucional. Professor de Direito Constitucional. Autor da Editora Juspodivm. Advogado, Parecerista e Consul tor Jurídico. F ABIANA A NGÉLICA P INHEIRO C ÂMARA Professora das Faculdades Inspirar, cursos de graduação em direito, administração e relações internacionais. Mestra em Economia Política. Doutora em História. F ÁBIO R OSA N ETO Bacharel em Direito pela Faculdade Pitágoras de Uberlândia/MG. Especialista em Direito Constitucional Aplicado com Capacitação para o Ensino no Magistério Superior pela Faculdade Damásio. Pós-graduado em Direito Previdenciário pela Faculdade Damásio. Conciliador da Justiça Federal de Uberlândia desde 2015. Mestrando em direito pela Universidade Federal de Uberlândia. G ABRIEL G OMES C ANÊDO V IEIRA DE M AGALHÃES Advogado. Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Uberlândia. Profes sor de Direito Constitucional e Processual Penal no Centro Universitário de Patos de Minas/UNIPAM. G ABRIELE L EDERMANN C ANTELI Graduanda em Direito na Universidade Federal de Uberlândia – UFU. G IUSEPPE C AMMILLERI F ALCO Mestrando em Direito pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista - “Júlio de Mesquita Fi lho” - UNESP campus de Franca/SP. I LTON N ORBERTO R OBL F ILHO Professor da UFPR e do IDP (Brasília). Pós-Doutor em Direito Constitucional pela PU CRS e Doutor em Direitos Humanos e Democracia pela UFPR. I SADORA P IMENTEL A LVES R OSA Graduanda em Direito pela Universidade de Uberaba – Uniube. J OSÉ E MÍLIO M EDAUAR O MMATI Mestre e Doutor em Direito Constitucional pela UFMG; Professor do Curso de Gradua ção em Direito da PUC Minas – Campus Serro; Professor do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade de Itaúna – MG. J OSÉ L UIZ DE M OURA F ALEIROS Desembergador Substituto no Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Especialista em Direito Penal e Processual Penal, e em Processo Civil. Possui MBA Executivo. Profes sor Universitário. J OSÉ L UIZ DE M OURA F ALEIROS J ÚNIOR Mestre em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Especialista em Di reito Processual Civil, Direito Civil e Empresarial, Direito Digital e Compliance . Membro do Instituto Avançado de Proteção de Dados – IAPD e do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade Civil – IBERC. Conselheiro Editorial do LAECC. Advogado. J ÚLIA P ALMEIRA M ACEDO Pós-graduada em Direito de Família e Sucessões, Mestra em Criminologia pela Université Catholique de Louvain, Advogada, Mediadora Judicial, Professora de Direito Penal e Direito Processual Penal, membro do Grupo de Pesquisa “Mães Livres”, Coordenadora do Projeto “Mulheres Mil: plantando liberdade para além das grades”, Coordenadora do Grupo de Estudo sobre Mulheres e Violências. L EONARDO DE A NDRADE A LBERTO Graduação em Direito em andamento pela Universidade do Estado de Minas Gerais, Unidade Frutal, Bolsistade iniciação científica Edital nº 01/2019 PAPq/UEMG, pesquisa dor do Laboratório Americano de EstudosConstitucionais Comparados (LAECC). E mail: leonardoaalberto@hotmail.com L ETÍCIA P EREIRA M OREIRA Graduada em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia. Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. L UIS C ARLOS Á LVAREZ Abogado, Magister en Derechos y Garantías fundamentales, UFU. L UIZ C ARLOS G OIABEIRA R OSA Mestre em Direito Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Doutor em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUCMinas). Pós doutor em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra. Professor de Direitos Fundamentais e Direito do Consumidor na Universidade Federal de Uberlândia (UFU). lgoiabeira@yahoo.com.br. M ADALENA G ONTIJO B. F ONSECA Mestranda em Direito pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade Federal de Uberlândia. Especialista em Direito Público pela Faculdade de Ipatin ga/Anamages. Gerente da 2ª Unidade do Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Uberlândia. E-mail: madalenagontijobfonseca@gmail.com M ARIA C AROLINA P AGANINI C ENTOFANTI C REMASCO DE P AIVA Procuradora do Município de Uberlândia/MG. Pós-graduada em Ciências Penais e em Processo Civil pela Universidade Anhanguera (UNIDERP). Graduada em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia. M OACIR H ENRIQUE J ÚNIOR Doutor em Direito e Ciência Política e Mestre em Criminologia e Sociologia Jurídico Penal, ambos pela Universitat de Barcelona, pesquisador do Laboratório Americano de Estudos Constitucionais Comparados (LAECC). Professor do Curso de Direito da Uni versidade do Estado de Minas Gerais, Unidade Frutal. E-mail:moacir.henrique@uemg.br P ABLO M ARTINS B ERNARDI C OELHO Doutor em História pela Universidade Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP/Franca. Professor Adjunto do curso de Direito da Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG – Unidade Frutal. R ENATA A LVARES G ASPAR Pós-Doutoranda do PPGD da Universidade Federal de Uberlância, com Bolsa PNP/CNPq. Doutora em Direito pela Universidade de Salamanca-Espaa (2008) e mestre em Estudios Latinoamericanos (menção Ciências Políticas/Direitos Humanos) pela mesma Universidade (2005). Ambos os títulos revalidados pela USP - Universidade de São Paulo. Consultora Jurídica para do MERCOSUL no Projeto Focem Base de dados Jurisprudencial (2008). R ODRIGO P ENA C OSTA E C OSTA Mestrando em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Advogado Públi- co do Município de Araguari/MG. R ODRIGO P EREIRA M OREIRA Professor de Direito da Universidade Estadual de Goiás (Campus Morrinhos) e do Insti tuto Luterano de Ensino Superior de Itumbiara. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia. Capítulo elaborado dentro do projeto de pesquisa “A função contramajoritária dos direitos fundamentais e a legitimidade das cláusulas pétreas” de senvolvido na UEG. R UAN E SPÍNDOLA F ERREIRA Mestre em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia. Advogado e professor uni versitário. S ÉRGIO A UGUSTO L IMA M ARINHO Mestre em Direito Público pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universida de Federal de Uberlândia com pesquisa fomentada pela CAPES. Graduado em Direito pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade Federal de Uberlândia com pesquisa fomentada pela FAPEMIG. Professor Universitário. Advogado. E-mail : professorsergiomarinho@gmail.com T HARUELSSY R ESENDE H ENRIQUES Mestranda em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). V ALÉRIA E MÍLIA DE A QUINO Mestranda em Direito pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade Federal de Uberlândia. Especialista em Advocacia Cível pela Escola Superior de Advoca cia da OAB/MG. Professora de Direito na UNIPAC. E-mail: valeriaemiliaa@gmail.com W ILCON L UCIANO A BREU Abogado por la Universidad Tecnológica de Santiango (UTESA), Rep. Dom.. Máster en Derecho por la Universidad Federal de Uberlândia (UFU), Brasil. Miembro de Laborato rio Americano de Estudios Constitucionales Comparados (LAECC-UFU). Aspirante a fiscalizador público nacional. lucianowilcon@gmail.com PRϾLOGO Para além da escolha de seus mandatários pelo voto direto e universal, qualquer democracia contemporânea se ampara em dois pilares funda mentais: o respeito às instituições democráticas, aí incluindo o Poder Judi ciário, e a estrita observância dos direitos fundamentais. No Brasil, passados mais de 30 anos da promulgação da Constituição da República de 1988, ainda se tem um grande déficit de efetividade do seu extenso rol de direitos fundamentais. Não obstante, é inegável o avanço do caminhar no sentido de garantir uma sociedade livre, justa e solidária, muitas vezes originadas (ou ao menos aperfeiçoadas) por meio da jurisdi ção constitucional. Muitas lutas históricas da sociedade se sagraram em incremento do pa tamar civilizatório brasileiro em julgamentos do Supremo Tribunal Fede ral, mas não foram ali iniciadas. Direitos de minorias étnicas (como indí genas e quilombolas), sujeitos LGBT, cotas raciais, pesquisas com células tronco embrionárias, liberdades de expressão e de imprensa, entre tantos outros, fazem parte de uma longa jornada de construção de direitos pela sociedade civil, que se levantou contra um modelo de sociedade hegemô nico, injusto e desigual. Não obstante, se é certo que a jurisdição constitucional é essencial para o fortalecimento da democracia brasileira e para o respeito e a garantia dos direitos fundamentais, não se pode ignorar que normalmente essa concre tização é permeada por discussões relativas a possíveis avanços do Poder Judiciário sobre espaços, a princípio, reservados aos Poderes Executivos e Legislativos, sobretudo quando se tangencia questões centrais da Política. A definição de pressupostos, conteúdo e limites da jurisdição constitucio nal não é nada singela, assim como a linha entre Política e Direito é bas tante tênue nas sociedades atuais (se é que se pode falar em tal linha em XV Prólogo uma Constituição extensa como é a brasileira). Daí se vê a importância da presente obra, que justamente se propõe a deslindar a Jurisdição Constitucional, seu papel, seus limites, sob a pers pectiva de casos históricos e do direito comparado. Repleta de temas de extrema relevância e caucada em reflexão jurídica profunda e crítica, a obra perpassa por tópicos como: controle de atos de governo; o papel da Corte Constitucional na defesa de direitos contramajoritários; direitos de sujeitos LGBT e criminalização da homofobia; execução provisória da pena após a decisão de 2ª instância; cárcere e controle social no capitalis mo incipiente; individualização da pena com enfoque nos crimes de tráfico de drogas; tutela de direitos fundamentais na pós-modernidade; educação enquanto forma de evitar violações a direitos das mulheres no meio ambi ente de trabalho; encarceramento feminino e a prisão domiciliar; combate à corrupção; Declaração de Direitos de Liberdade Econômica e sua aplica ção às relações de consumo; Estado Plurinacional da Bolívia e a reforma constitucional de 2009; diálogos institucionais e efeito backlash; direito à saúde e gestão municipal; justiça de transição; e constitucionalismo multi nível, transconstitucionalismo e interconstitucionalismo. Trata-se, assim, de arsenal gigantesco de temas candentes da atualida de, aqui tratados com profundidade e tenacidade. Todos os textos possu em um traço comum: a partir de pesquisa acadêmica de qualidade, contri buem para significativa reflexão acerca do Direito e os arranjos institucio nais frente a complexas questões sociais postas ao Poder Judiciário. Em suma, simbolizando a importância do papel da pesquisa, da ciência e do ensino acadêmico no país, mais do que uma obra memorável, trata-se de verdadeiro instrumento de defesa da Democracia. Brasília, julho de 2020. G USTAVO K ENNER A LCÂNTARA Mestre em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia. Professor na escola superior do MPU. Procurador da República. XVI APRESENTAÇÃO A presente obra coletiva tem por finalidade reforçar o compromisso de debater, pesquisar e refletir acerca da temática importantíssima da Jurisdi ção Constitucional e dos Direitos Fundamentais, sempre em voga, não raras vezes sob ataque. Na diversidade de temas explorados busca-se con tribuir para a efetivação dos Direitos Fundamentais, bem como para o exercício da Jurisdição Constitucional dentro das balizas do Estado Demo crático de Direito estabelecido pela Constituição Cidadã. A Jurisdição Constitucional é explorada pelos autores Sérgio Augusto Lima Marinho e Ana Flávia Canuto Veloso com o estudo dos limites à atuação da Corte Constitucional, especialmente quando há necessidade de se analisar atos de governo, e dos parâmetros para invalidação destes atos sem que isto represente uma usurpação de poder por parte do Judiciário. Os autores José Emílio Medauar Ommati e Rodrigo Pereira Moreira também exploram a temática da Jurisdição Constitucional discorrendo acerca da (in)existência das funções representativa e iluminista da Supre ma Corte brasileira destacadamente considerando-se a vocação contrama joritária dos direitos fundamentais. Nesta quadra, o autor Bruno Marques Ribeiro discute a função contra majoritária dos direitos fundamentais e a criminalização da LGBTfobia pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ação direta de inconsti tucionalidade por omissão nº 26 julgada em conjunto com o Mandado de Injunção nº 4733. O direito fundamental à identidade de gênero é explorado pelo autor Danler Garcia que destaca a atuação da Corte Constitucional na efetivação do referido direito no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.275 o qual possibilitou a retificação do prenome e do gênero de travestis e transexuais sem a substancialidade de cirurgia e laudo médico e XVII Apresentação psicológico. O papel contramajoritário dos direitos fundamentais também é traba lhado pelos autores Ruan Espíndola Ferreira e Sérgio Augusto Lima Mari nho os quais discorrem acerca da tensão entre o Direito e a Democracia à luz da análise do HC 126.292/SP no qual o Supremo Tribunal Federal de cidiu pela relativização do direito fundamental à presunção de inocência. Adiante, os autores Arthur Pinheiro Basan e Eduardo Rodrigues dos Santos analisam o papel das constituições de efetivação dos direitos e ga rantias fundamentais no contexto da pós-modernidade em especial diante da necessidade de proteção das minorias. O autor Fábio Rosa Neto destaca o papel construtivo da educação para o respeito aos direitos fundamentais como um mecanismo necessário de combate à violação dos direitos das mulheres no ambiente laboral. Na sequência, o autor José Luiz de Moura Faleiros apresenta uma relei tura do crime de tortura e dos “castigos” contra crianças e adolescentes sob as lentes do direito constitucional. O autor apresenta dados coletados dos tribunais pátrios para expor suas visões sobre os limites do direito dos pais sobre os seus filhos, notadamente quanto às correções impostas aos mesmose às repercussões dessas medidas sob a ótica criminal. Os direitos das mulheres também constituem temática trabalhada pelas autoras Júlia Palmeira Macedo e Ana Luiza Silva Agostinho que analisam o entendimento firmado pela Corte Constitucional no HC143.641/SP em relação à prisão cautelar de mulheres que ostentem a condição de gestan tes, puérperas ou mães de crianças com até doze anos de idade que estejam sob a responsabilidade delas, bem como a aplicação deste entendimento pelo Judiciário brasileiro. Também relacionado à temática do encarceramento, o trabalho da au tora Letícia Pereira Moreira apresenta uma reflexão acerca do direito fun damental à individualização da pena, especialmente em relação ao crime de tráfico de drogas, bem analisa a atuação da Suprema Corte brasileira XVIII Apresentação para afastar a aplicação do chamado direito penal do inimigo em relação a este crime. Realizando um interessante recorte o autor Rodrigo Pena Costa e Costa analisa como que o encarceramento foi utilizado como mecanismo de controle social pela classe burguesa ascendente do modelo capitalista, seu trabalho busca apresentar as origens e o desenvolvimento das práticas punitivas nas sociedades pré-capitalistas até o surgimento das prisões e a estreita relação entre elas e o mercado de trabalho. O autor Giuseppe Cammilleri Falco em seu texto alerta para a necessi dade de realizar um efetivo combate a corrupção, mas tendo em vista os cuidados necessários a fim de evitar que atividade jurisdicional produza consequências nefastas ao desenvolvimento da ordem econômica compre endida como direito fundamental. Os autores Luiz Carlos Goiabeira Rosa, Madalena Gontijo B. Fonseca e Valéria Emília de Aquino desenvolveram pesquisa analisando a recém promulgada Declaração de Direitos de Liberdade Econômica e sua aplica ção às relações de consumo, sobremaneira considerando o direito funda mental à proteção ao consumidor. O autor Alex Cabello Ayzama proporciona aos leitores uma análise da reforma constitucional boliviana realizada no ano de 2009 para além de um recorte histórico de mudança constitucional, mas também sintetizan do o modelo de Estado adotado e o papel do Tribunal Constitucional à luz dos direitos humanos e da supremacia constitucional. Os autores Isadora Pimentel Alves Rosa e Ruan Espíndola Ferreira dis cutem o efeito backlash, como uma reação de revanchismo contrária à uma decisão judicial a fim de afastar o entendimento nela fixado, efeito este que pode ser atribuída tanto à população quanto ao Poder Legislativo e Executivo o que pode caracterizá-lo como uma forma de diálogo institu cional. A autora Amanda Figueiredo de Andrade explora a temática do papel XIX Apresentação da gestão municipal na resolução das demandas de saúde considerando-se a repartição de competências constitucionalmente estabelecida, apontando para a necessidade de desenvolvimento de consensos e estratégias regio nais como instrumento à superação das adversidades verificadas no siste ma único de saúde e, via de consequência, à maior efetividade ao direito fundamental à saúde. A autora Maria Carolina Paganini Centofanti Cremasco de Paiva anali sa o direito fundamental à proteção de dados, sua positivação no ordena mento jurídico pátrio e o tratamento jurisprudencial a respeito do tema. Em seguida, os autores José Luiz de Moura Faleiros Júnior e Gabriele Ledermann Canteli exploram as potencialidades da rede blockchain para a efetivação do acesso à justiça, destacando como esta tecnologia disruptiva pode propiciar soluções a problemas dos modelos atuais, embora a testa gem e o aprimoramento regulatório sejam caminhos necessários para o atingimento desse desiderato. Inaugurando a sessão desta obra coletiva destinada aos ensaios, os au tores Alexandre Walmott Borges e Fabiana Angélica Pinheiro Câmara visi tam as formas de relações estabelecidas entre as Constituições em concor rência com outras fontes, bem como autoridades com a autoridade estatal nacional, destacando o significado de expressões como constitucionalismo multinível, transconstitucionalismo e interconstitucionalismo. Os autores Leonardo de Andrade Alberto e Moacir Henrique Júnior apresentam ensaio sobre as legislações latino-americanas de proteção de dados e apontando para a necessidade de sua caracterização como um direito fundamental a partir da possibilidade de aplicação do sistema mul tinível nos Estados Americanos. O autor Ilton Norberto Robl Filho , em seu escrito sobre Estado, Direito e Constituição, disserta acerca de dilemas contemporâneos importantes como o constitucionalismo abusivo e as democratura , o exercício adequa do do poder de legislar pelo Executivo, Legislativo e Judiciário e as defici- XX Apresentação ências nos mecanismos de accountability e nas interações dos órgãos de controle, bem como acerca do enfrentamento dessas questões. O direito fundamental de acesso à justiça é tema do trabalho realizado pelos autores Alexandre Walmott Borges e Renata Alvares Gaspar que aponta para o inequívoco na percepção do ferido direito fundamental co mo um mero direito de acesso à jurisdição, indicando que a compreensão adequada vai muito além a fim de que se verifique concretamente a reali zação do acesso à justiça. Portanto ao Estado incumbe não manter as por tas do judiciário abertas, como ademais oferecer e garantir legitimidade a outras vias de solução de disputa, garantindo-lhes. A temática dos direitos fundamentais sociais é explorada pelo autor Gabriel Gomes Canêdo Vieira de Magalhães que analisa os referidos direi tos à luz da cláusula de vedação do retrocesso, do mínimo existencial e da limitação fática à realização dos direitos eminentemente prestacionais, qual seja: a reserva do possível. Discorrendo acerca dos direitos humanos estabelecidos em tratados in ternacionais, o autor Wilcon Luciano Abreu analisa o direito ao asilo polí tico e sua posição de jusfundamentalidade como elemento limitador do poder discricionário do Estado. A autora Tharuelssy Resende Henriques tece considerações acerca da Justiça de Transição no Brasil a partir da análise da decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF 153 e da Corte Interamericana de Direito Hu manos no caso da "Guerrilha do Araguaia". O autor Luis Carlos Álvarez escreve sobre a Constituição Colombiana de 1991 e como esta Carta Constitucional realizou uma importante incor poração de direitos humanos como direitos fundamentais implementando importante avanços em prol dos direitos sociais e estabeleceu uma organi zação do Estado colombiano configurando-o como um Estado Democráti co. Por fim, Pablo Martins Bernardi Coelho realiza importante reflexão XXI Apresentação acerca do papel do Supremo Tribunal Federal apresentando como a gran de quantidade de recursos que chegam até o Supremo pode inviabili zar/enfraquecer sua atuação como efetiva Corte Constitucional. Uberlândia, julho de 2020. O S C OORDENADORES XXII SUMÁRIO S OBRE OS AUTORES ......................................................................................................IX P RϾLOGO ................................................................................................................... XV A PRESENTAÇÃO .......................................................................................................XVII S UMÁRIO ................................................................................................................ XXIII 1. J URISDIÇÃO CONSTITUCIONAL E O CONTROLE DE ATOS DE GOVERNO : UMA ANÁLISE DOS CASOS L ULA , M OREIRA F RANCO E A LEXANDRE R AMAGEM ............... 27 Sérgio Augusto Lima Marinho, Ana Flávia Alves Vanuto Veloso 2. E XISTEM AS FUNÇЀES REPRESENTATIVA E ILUMINISTA DO S UPREMO T RIBUNAL F EDERAL ?.....................................................................................................................71 José Emílio Medauar Ommati, Rodrigo Pereira Moreira 3. A TIVISMO JUDICIAL E A ATUAÇÃO DO S UPREMO T RIBUNAL F EDERAL NA CONCRETIZAÇÃO DOS DIREITOS DAS MINORIAS ......................................................111 Bruno Marques Ribeiro 4. T RANSEXUALIDADE E DIGNIDADE : CONSIDERAÇЀES ACERCA DO RECONHECIMENTO À IDENTIDADE TRANS NO B RASIL ............................................143 Danler Garcia 5. A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL SOB A ϾTICA DA FILOSOFIA POLÍTICA : DEBATENDO A TENSÃO ENTRE DIREITO E DEMOCRACIA À LUZ DA DECISÃO NO HABEAS CORPUS 126.292............................................................................................159 Ruan Espíndola Ferreira, Sérgio Augusto Lima Marinho XXIII Sumário 6. A CONDIÇÃO PϾS - MODERNA E A TUTELA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ............. ....................................................................................................................................191 Arthur Pinheiro Basan, Eduardo Rodrigues dos Santos 7. U MA RELEITURA DO CRIME DE TORTURA E DOS “ CASTIGOS ” PRATICADOS CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES À LUZ DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS .........................................................................................................223 José Luiz de Moura Faleiros 8. A EDUCAÇÃO DA POPULAÇÃO COMO FORMA DE COMBATE À VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DAS MULHERES NO AMBIENTE DE TRABALHO ..........................................247 Fábio Rosa Neto 9. E NCARCERAMENTO FEMININO NO B RASIL E APLICAÇÃO DA PRISÃO DOMICILIAR : DESAFIOS PARA A EFETIVAÇÃO DA DECISÃO DO STF NO HABEAS CORPUS N º 143.641/SP.................................................................................................................265 Júlia Palmeira Macedo, Ana Luiza Silva Agostinho 10. D OSIMETRIA DA PENA NO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS : DIREITO PENAL DO INIMIGO E JURISPRIDÊNCIA DO S UPREMO T RIBUNAL F EDERAL ..............................315 Letícia Pereira Moreira 11. C ÁRCERE E CONTROLE SOCIAL NO CAPITALISMO INCIPIENTE ................................ ....................................................................................................................................351 Rodrigo Pena Costa e Costa 12. A DIFERENÇA ENTRE O REMÉDIO E O VENENO É A DOSE : SOBRE OS IMPACTOS ECONϿMICOS DO COMBATE À CORRUPÇÃO .............................................................423 Giuseppe Cammilleri Falco 13. A APARENTE ANTINOMIA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL À PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR E A L EI 13.874/19...............................................................................449 Luiz Carlos Goiabeira Rosa, Madalena Gontijo B. Fonseca, Valéria Emília de Aquino XXIV Sumário 14. L A REFORMA CONSTITUCIONAL BOLIVIANA DE 2009: UN CORTO BALANCE SOBRE LOS PRINCIPALES CAMBIOS EN EL ESTADO PLURINACIONAL ........................477 Alex Cabello Ayzama 15. A S TEORIAS DOS DIÁLOGOS INSTITUCIONAIS E O EFEITO BACKLASH ....................................................................................................................................493 Isadora Pimentel Alves Rosa, Ruan Espíndola Ferreira 16. G ESTÃO MUNICIPAL EM SAÚDE : CONSIDERAÇЀES ACERCA DO DIÁLOGO INSTITUCIONAL DO S ISTEMA Ú NICO DE S AÚDE ......................................................507 Amanda Figueiredo de Andrade 17. O DIREITO FUNDAMENTAL À PROTEÇÃO DE DADOS : ABORDAGENS TEϾRICAS E PRÁTICAS ....................................................................................................................523 Maria Carolina Paganini Centofanti Cremasco de Paiva 18. A REDE BLOCKCHAIN E SUAS POTENCIALIDADES PARA A EFETIVAÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA ......................................................................................................537 José Luiz de Moura Faleiros Júnior, Gabriele Ledermann Canteli 19. A S PALAVRAS VIAJANTES : INTER , TRANS , MULTI . QUANTOS CONSTITUCIONALISMOS HÁ ? UM AGREGADO DE POSIÇЀES CLASSIFICATϾRIAS NA TEORIA CONSTITUCIONAL .........................................................................................557 Alexandre Walmott Borges, Fabiana Angélica Pinheiro Câmara 20. A APLICAÇÃO DO SISTEMA MULTINÍVEL COMO GARANTIDOR DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DIGITAIS ( PROTEÇÃO DE DADOS ) NOS ESTADOS AMERICANOS ....571 Leonardo de Andrade Alberto, Moacir Henrique Júnior 21. N OTAS SOBRE ESTADO , DIREITO E CONSTITUIÇÃO ................................................ ....................................................................................................................................585 Ilton Norberto Robl Filho XXV Sumário 22. A CESSO À JUSTIÇA : UM OLHAR CONTEMPORÂNEO SOBRE SEU SENTIDO E ALCANCE NO FAZER DA JUSTIÇA ...............................................................................599 Alexandre Walmott Borges, Renata Alvares Gaspar 23. D IREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS : CLÁUSULA DE VEDAÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL , MÍNIMO EXISTENCIAL E RESERVA DO POSSÍVEL .........................................607 Gabriel Gomes Canêdo Vieira de Magalhães 24. E L DERECHO A ASILO POLÍTICO FRENTE A LA DISCRECIONALIDAD DE ESTADO .... ....................................................................................................................................627 Wilcon Luciano Abreu 25. J USTIÇA DE TRANSIÇÃO NO B RASIL : ANÁLISE DA DECISÃO DO STF, NA ADPF 153, E DA C ORTE I NTERAMERICANA DE D IREITOS H UMANOS , NO CASO G OMES L UND E OUTROS (“G UERRILHA DO A RAGUAIA ”) VS . B RASIL E O PRINCÍPIO DA PREVALÊNCIA DOS DIREITOS HUMANOS ...................................................................635 Tharuelssy Resende Henriques 26. C OLOMBIA , UN ESTADO SOCIAL Y DEMOCRATICO DE DERECHO ....................................................................................................................................647 Luis Carlos Álvarez 27. O FUNCIONAMENTO DO S UPREMO T RIBUNAL F EDERAL : CORTE CONSTITUCIONAL OU RECURSAL ? ............................................................................655 Pablo Martins Bernardi Coelho XXVI EXISTEM AS FUNÇЀES REPRESENTATIVA E ILUMINISTA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL? 2 José Emílio Medauar Ommati Rodrigo Pereira Moreira 1. Introdução Luís Roberto Barroso, Ministro do Supremo Tribunal Federal, tem di fundido em seus textos doutrinários e em votos proferidos o reconheci mento das funções representativa e iluminista das Cortes Constitucionais. Este capítulo tece algumas considerações críticas e alerta para a incon gruência desses dois tipos de funções em uma democracia constitucional como a fundada pela Constituição de 1988. Em outras palavras, pretende mos demonstrar que o Judiciário em uma democracia constitucional ape nas pode agir em uma perspectiva contramajoritária, na garantia dos direi tos fundamentais de todos os cidadãos, podendo e devendo agir contra as maiorias ocasionais. Assim, a partir de duas concepções extremamente distintas, como a do positivismo garantista de Luigi Ferrajoli e a da teoria do direito como inte gridade de Ronald Dworkin, mostraremos os equívocos de o Judiciário brasileiro assumir as funções representativa e iluminista como quer o hoje 71 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira Ministro do STF Luís Roberto Barroso. Para o sucesso da presente empreitada, em um primeiro momento, apresentaremos os argumentos de Luís Roberto Barroso em sua defesa das funções iluminista e representativa dos tribunais constitucionais; após isso, mostraremos, com base nas concepções do garantismo de Luigi Ferrajoli e da teoria do direito como integridade de Ronald Dworkin, os equívocos da adoção das funções iluminista e representativa pelo Judiciário, analisando, inclusive, duas decisões do STF em que essas funções foram supostamente utilizadas. 2. As funções dos tribunais constitucionais na visão de Luís Roberto Barroso Um dos pontos de partida utilizado pelo autor para delinear as funções do Supremo Tribunal Federal é o advento do chamado pós-positivismo concebido como uma nova conexão entre o Direito e a Moral. Assim, exis te uma nova perspectiva jurídica sobre a justiça e a legitimidade democrá tica, a diferenciação entre regras e princípios, a valoração da interpretação jurídica e o desenvolvimento de uma teoria dos direitos fundamentais. 1 Ademais, percebe-se que os referenciais teóricos de Luís Roberto Barroso estão, em sua maioria, vinculados ao constitucionalismo dos Estados Uni dos da América que constitui o pano de fundo de orientação da pesquisa desenvolvida por ele. 2 A jurisdição constitucional se depara cotidianamente com os chamados casos difíceis, ou seja, casos que não possuem respostas prontas no sistema 1 BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria . Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, número especial, 2015, p. 23-50. 2 BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis dos tribunais constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 4, 2018, p. 2171-2228. 72 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? jurídico, devendo o intérprete construir o sentido da norma jurídica para resolver o problema concreto. A vagueza da linguagem, os desacordos morais razoáveis e a colisão de normas constitucionais são questões que levam ao surgimento de casos difíceis, devendo ser utilizada a técnica da ponderação para alcançar uma solução. 3 Sobre esse ponto, o autor ainda reafirma a distinção entre judicialização e ativismo judicial. A judicialização consiste no fato de que muitas ques tões políticas, sociais e morais são levadas ao Poder Judiciário para obter uma solução. O ativismo judicial é uma atitude de interpretar proativa mente a Constituição Federal, seja para atender efetivamente demandas sociais, seja para obter avanços que não seriam possíveis pelo Poder Legis lativo ou Executivo. 4 Continua afirmando que a Corte Constitucional não pode ser o único ou sequer o principal âmbito de debate sobre a interpretação da Constitui ção. Deve a jurisdição constitucional escutar “a voz das ruas”, os movi mentos sociais e demais canais de expressão da sociedade. 5 Não explica se “a voz das ruas” seria das minorias oprimidas ou das maiorias, embora em seu voto sobre a possibilidade de prisão pena após condenação em segun da instância, que será analisado, indique que o autor entende a possibili dade de ouvir as maiorias, mesmo quando essas pedem a relativização de direitos e garantias fundamentais. Adentrando nas funções desempenhadas pelas Cortes Constitucionais, 3 BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria . Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, número especial, 2015, p. 23-50. 4 BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis dos tribunais constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 4, 2018, p. 2171-2228. 5 BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis dos tribunais constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 4, 2018, p. 2171-2228. 73 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira Barroso explica que a jurisdição constitucional passou por transformações devido ao surgimento das constituições analíticas incluindo as possibilida des de: (i) a aplicação direta da Constituição a determinadas situações, com atri buição de sentido a determinada cláusula constitucional; (ii) a interpreta ção conforme a Constituição, técnica que importa a exclusão de determi nado sentido possível de uma norma, porque incompatível com a Consti tuição, e na afirmação de uma interpretação alternativa, esta sim em har monia com o texto constitucional; e (iii) a criação temporária de normas para sanar hipóteses conhecidas como de inconstitucionalidade por omis são, que ocorrem quando determinada norma constitucional depende de regulamentação por lei, mas o Legislativo queda inerte, deixando de editá la. 6 Nesse diapasão, o Supremo Tribunal Federal possui a função de atuar contramajoritariamente. Isso significa que a legitimidade democrática da jurisdição constitucional advém da proteção dos direitos fundamentais – que não podem ser violados por decisão da maioria –, e a tutela das regras do jogo democrático, abarcando a participação política de todos na demo cracia. As minorias que não conseguem representação no jogo democráti co não estão desamparadas e entregues ao arbítrio da maioria. Essa função deve ser exercida com parcimônia, pois atua quando estiverem em jogo direitos fundamentais e participação democrática, sendo que em outros casos deve prevalecer a conformação do legislador. 7 Além da função contramajoritária, Barroso também desenvolve um pa pel representativo das Cortes Constitucionais. Para ele existe uma crise 6 BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis dos tribunais constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 4, 2018, p. 2171-2228. 7 BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria . Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, número especial, 2015, p. 23-50. 74 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? política que impede o sistema representativo de exprimir de forma efetiva a vontade da maioria. No Brasil existe um desprezo da sociedade civil pela atividade política devido a revelação de disfunções no financiamento elei toral e das relações entre Executivo e Legislativo na atuação em cargos públicos para o próprio benefício. Por isso existiriam tribunais que se tor naram mais representativos dos anseios e demandas sociais do que os po deres democraticamente eleitos. 8 Afirma que a composição do Poder Judiciário é heterogênea, com pes soas de diferentes origens sociais e em razão dos juízes ingressarem na carreira por meio de concurso público. Já o Poder Legislativo seria mais difícil o acesso das diferentes origens sociais por exigir grandes recursos financeiros para a eleição. A composição do STF, mesmo sendo indicação do Presidente da República mediante aprovação do Senado Federal, não seria diferente na medida em que a maioria dos ministros vieram de car reiras jurídicas “cujo ingresso se faz por disputados concursos público”. 9 Esse argumento nos parece derivado do subjetivismo do autor, pois pesquisa de 2018, realizada pelo CNJ, apontou que 1,6% dos magistrados se declararam pretos, 16,5% pardos e apenas 11 indígenas em todo o terri tório nacional. Em relação ao gênero, as mulheres ocupam 38% da magis tratura. Quanto à classe social, a pesquisa aponta que “a maioria dos ma gistrados brasileiros tem origem nos estratos sociais mais altos, sendo que 51% deles têm o pai com ensino superior completo ou mais, e 42% com a mãe na mesma faixa de escolaridade. Quanto mais recente é o ingresso na carreira, maior é a proporção de magistrados com pais com ensino superi- 8 BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria . Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, número especial, 2015, p. 23-50. 9 BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria . Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, número especial, 2015, p. 23-50. 75 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira or completo ou mais.” 10 Além disso, outra pesquisa de 2013 do CNJ de monstrou que nos tribunais superiores apenas 8,9% são pardos ou pre tos. 11 Ademais, não explica o autor como que essa representatividade dos tri bunais é averiguada caso a caso. Se seria por meio de pesquisas de opinião, monitoramento de redes sociais ou apenas com o subjetivismo do julga dor. Também não elucida como que em determinadas decisões se ouve “a voz das ruas” e em outras isso não é levado em consideração pela Corte Constitucional. Um dos exemplos citados como atuação representativa do STF é a pos sibilidade da execução provisória da pena. Segundo o autor, essa decisão teve amplo apoio popular. 12 Mas se isso é utilizado como argumento para julgamento, e a universalidade do argumento é importante na teoria da argumentação jurídica, 13 essa perspectiva será utilizada sempre? Se a mai oria da população é contra a união estável homoafetiva então o STF deverá superar o precedente que reconheceu esse direito fundamental? 14 Por qual razão a reforma trabalhista teve diversos pontos julgados constitucionais, 10 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Perfil sociodemográfico dos magistrados brasileiros 2018 . Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp content/uploads/2019/09/a18da313c6fdcb6f364789672b64fcef_c94 8e694435a52768cbc00bda11979a3.pdf 11 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Pesquisa do CNJ: quantos juízes negros? Quantas mulheres? Disponível em: https://www.cnj.jus.br/pesquisa-do-cnj-quantos juizes-negros-quantas-mulheres/ 12 BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis dos tribunais constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 4, 2018, p. 2171-2228. 13 MacCORMICK, Neil. Rhetoric and the rule of law: a theory of legal reasoning. Ox ford: Oxford University Press, 2005. 14 REVISTA ÉPOCA. Ibope: 55% da população é contra a união civil gay. Disponível em: http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI252815-15228,00- IBOPE+DA+POPULACAO+E+CONTR A+UNIAO+CIVIL+GAY.html 76 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? mesmo diante da proibição do retrocesso em direitos sociais, se a maioria da população era contra? 15 Completando sua fundamentação da função representativa do Poder Judiciário, Barroso entende que: (i) a garantia de vitaliciedade permite que os juízes atuem de forma independente da política eleitoral; (ii) o judiciá rio só age mediante provocação; (iii) as decisões do Poder Judiciário de vem ser motivadas, por isso não poderá ser “um ato de pura vontade dis cricionária”. 16 Nesse ponto, é difícil vislumbrar como os argumentos elencados po dem contribuir com a função representativa. A vitaliciedade, por exemplo, existe para que os magistrados possam agir com independência e impar cialidade, mesmo quando tomarem decisões que são contrárias à maioria ou aos outros poderes. Seria, portanto, um elemento de exercício da fun ção contramajoritária. Por fim, o autor defende a existência de uma função iluminista das Cortes Constitucionais. Em suas palavras: Além do papel representativo, [..], supremas cortes desempenham, ocasi onalmente, um papel iluminista. Trata-se de uma competência perigosa, a ser exercida com grande parcimônia, pelo risco democrático que ela repre senta e para que cortes constitucionais não se transformem em instâncias hegemônicas. Ao longo da história, alguns avanços imprescindíveis tive ram de ser feitos, em nome da razão, contra o senso comum, as leis vigen tes e a vontade majoritária da sociedade. A abolição da escravidão ou a proteção de mulheres, negros, homossexuais, transgêneros e minorias reli giosas, por exemplo, nem sem pôde ser feita adequadamente pelos meca- 15 DATA FOLHA. Maioria Rejeita Reforma Trabalhista. Disponível em: http://datafolha.folha.uol.com.br/ opiniaopublica/2017/05/1880398-maioria-rejeita reforma-trabalhista.shtml 16 BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis dos tribunais constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 4, 2018, p. 2171-2228. 77 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira nismos tradicionais de canalização de reivindicações sociais. 17 Essa função iluminista indica que em determinados momentos a Corte Constitucional fica responsável por empurrar a história e conduzir o papel civilizatório. 18 Nos momentos em que a decisão vista como correta, justa e legítima não coincidir com a vontade da maioria ou do Congresso é preci so “acender luzes na escuridão, submeter a vontade à razão. 19 Sobre a função iluminista, é possível perceber que essa não vai além da função contramajoritária dos direitos fundamentais e da jurisdição consti tucional. Todos os exemplos citados pelo autor são atuações contramajori tárias em que o Poder Judiciário agiu para garantir efetividade aos direitos das minorias oprimidas pelas maiorias (mulheres, homossexuais, questão racial, etc.). Isso porque o conceito de minoria não está relacionado apenas a uma questão numérica, “mas deve levar em consideração a verificação da dis criminação ou invisibilidade histórica de um determinado grupo.” 20 A própria explicação que Barroso concede à função iluminista não destoa da proteção das minorias contra a vontade do congresso ou das maiorias, não desenvolvendo a sua definição além dessa concepção básica. Voltaremos a tratar desse tema na análise do julgado sobre a criminalização do aborto até o terceiro mês de gestação. 17 BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis dos tribunais constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 4, 2018, p. 2171-2228. 18 BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria . Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, número especial, 2015, p. 23-50. 19 BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis dos tribunais constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 4, 2018, p. 2171-2228. 20 CORBO, Wallace. Reflexões acerca da função contramajoritária do STF na proteção de direitos das minorias. Revista dos Tribunais Rio de Janeiro, vol. 5, p. 181-212, maio-jun., 2014. 78 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? 3. A função contramajoritária como única função da jurisdição constitucional Os direitos fundamentais são o fruto de um longo processo de evolução social e de complexificação da sociedade moderna e que permitiram a ma nutenção e o aumento dessa complexidade social. Nesse sentido, direitos fundamentais são aquisições evolutivas da sociedade moderna e, em uma perspectiva interna, possibilitam que os membros da comunidade possam se ver como autores e destinatários das normas que regulam suas vidas, garantindo que todos os seus membros sejam tratados com igual respeito e consideração. 21 Destarte, democracia e respeito aos direitos fundamentais se tornam indissociáveis, de modo que respeitar um implica necessariamente respei tar os outros; ou, ainda, existe uma relação de tensão constitutiva entre os direitos fundamentais e o Estado de Direito, aquilo que Habermas deno minará de relação de equiprimordialidade entre Estado de Direito e demo cracia. 22 Dessa maneira, esses direitos são os legitimadores do Estado de Direito por sistematizar o conteúdo axiológico objetivo da ordem demo crática em que os cidadãos prestam o seu consentimento e condicionam o seu dever de obediência ao Direito. 23 Os direitos fundamentais reúnem os valores mais relevantes para a co munidade política, e sob a perspectiva objetiva – entendidos como valores 21 OMMATI, José Emílio Medauar. Uma Teoria dos Direitos Fundamentais. 6 a edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. 22 Sobre isso, vide: OMMATI, José Emílio Medauar. Teoria da Constituição. 8 a edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019; HABERMAS, Jürgen. Facticidad y Validez: Sobre el Derecho y el Estado Democrático de Derecho en Términos de Teoría del Discur so. Madrid: Trotta, 1998. 23 LUÑO, Antonio Enrique Perez. Los derechos fundamentales. 6ª ed. Madrid: Tecnos, 1995, p. 20-21. 79 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira morais coletivos –, a sua defesa não diz respeito apenas ao Estado, pois engloba toda a sociedade. 24 É a ótica comunitária que permite entender os direitos fundamentais no seu aspecto objetivo, aquilo que Ronald Dworkin denominará de moralidade política da comunidade. 25 A competência negativa, como função jurídico-objetiva dos direitos fundamentais, significa o reflexo do direito subjetivo concedido pelo âmbi to de proteção. 26 O âmbito de liberdade concedido pelo direito fundamen tal ao indivíduo (pela perspectiva subjetiva) está, do ponto de vista objeti vo, sendo ao mesmo tempo retirado do Estado. 27 Em outras palavras, exis te uma limitação à margem de atuação do Estado que no uso das suas competências legislativas, administrativas e jurisdicionais não pode inter ferir injustificadamente naquilo que os direitos fundamentais protegem. 28 24 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. 2ª ed. Rio de Janei ro: Lumen Juris, 2010, p. 106-107. 25 Nesse sentido, vide: DWORKIN, Ronald. O Direito da Liberdade: A Leitura Moral da Constituição Norte-Americana. São Paulo: Martins Fontes, 2006; DWORKIN, Ronald. A Raposa e o Porco-Espinho: Justiça e Valor. São Paulo: Martins Fontes, 2014. 26 Nos dizeres de Ingo Sarlet: “[...] ao significado dos direitos fundamentais como direi tos subjetivos de defesa do indivíduo contra o Estado corresponde sua condição (como direito objetivo) de normas de competência negativa para os poderes públi cos, no sentido de que o status fundamental de liberdade e igualdade dos cidadãos se contra subtraído da esfera de competência dos órgãos estatais, contra os quais se en contra também protegido, demonstrando que também ao poder constitucionalmente reconhecido é, na verdade, juridicamente constituído e desde sua origem determina do e limitado, de tal sorte que o Estado somente exerce seu poder no âmbito do espa ço de ação que lhe é colocado à disposição” (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 145). 27 DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 118. 28 PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Direitos fundamentais. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 67. 80 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? Ao mesmo tempo, os direitos fundamentais se constituem, em uma democracia constitucional, como a própria condição de possibilidade da atuação dos poderes públicos. Nem sempre o Estado é o inimigo dos direi tos fundamentais: antes de tudo, ele deve ser seu principal promotor e protetor, aquilo que J.J.Gomes Canotilho certa vez denominou de um es tado constitucionalmente amigo dos direitos fundamentais. 29 Exatamente para garantir que não haja violação dos direitos fundamen tais por parte das maiorias eventuais que são representadas pelo Executivo e Legislativo, eleitos por essa maioria, que a democracia constitucional estabeleceu um contrapeso, o Judiciário, que, não sendo eleito, deve garan tir o igual respeito e consideração por todos, protegendo os direitos fun damentais não apenas das maiorias, mas fundamentalmente das minorias. Mais uma vez, Estado de Direito e democracia se interligam, garantindo que a própria democracia se realize como governo de todo o povo e não apenas das maiorias representadas pelos poderes políticos do Legislativo e do Judiciário. 30 Por isso que o Judiciário apenas pode exercer sua função contramajori tária de proteção dos direitos fundamentais. Essa defesa da função con tramajoritária do Judiciário e dos Tribunais Constitucionais em uma de mocracia constitucional é realizada tanto por teorias positivistas dos direi tos fundamentais, a exemplo do garantismo de Luigi Ferrajoli, quanto por teorias não positivistas ou antipositivistas, como a de Ronald Dworkin, que chegam a um ponto comum de necessidade de proteção dos direitos individuais frente à vontade da maioria. Nos próximos tópicos pretende-se demonstrar que mesmo com fundamentos diferentes os dois autores che gam a conclusões semelhantes. 29 CANOTILHO, J.J. Gomes. Estudos sobre Direitos Fundamentais. 2 a edição, Coim bra: Almedina, 2008. 30 OMMATI, José Emílio Medauar. Teoria da Constituição. 8 a edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. 81 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira 3.1. Direitos como Trunfos contra a Maioria e o Papel Contramajoritário do Judiciário Em seu primeiro trabalho de fôlego, intitulado Levando os Direitos a Sério, Ronald Dworkin pretendeu lançar um ataque frontal ao positivismo jurídico na perspectiva defendida por Herbert L.A. Hart. 31 De acordo com o autor norte-americano, o erro fundamental de Hart foi o de pensar o Direito apenas como um conjunto convencional de re gras estabelecidas por uma autoridade em um determinado momento do passado. Para Dworkin, por outro lado, o Direito é muito mais rico, cons tituindo-se também por princípios, muitas vezes não escritos, mas que funcionam como argumentos que exigem que uma decisão judicial seja tomada em um sentido e não em outro. Por isso que, para o autor norte americano, não seria correto falar em discricionariedade judicial, havendo uma única decisão correta para cada caso submetido a julgamento pelo Judiciário. 32 Os princípios, enquanto argumentos, podem se apresentar ora como argumentos de princípio em sentido estrito, ora como argumentos de polí tica. Resumidamente, argumentos de princípio são aqueles relacionados à igualdade, liberdade, ao devido processo ou a outra dimensão da morali dade; já os argumentos de política são aqueles que se relacionam com a melhoria do bem-estar da coletividade. É claro, como afirma Dworkin, que esses argumentos não são estanques ou separados, mas o próprio reconhe cimento de um argumento como sendo de princípio ou de política depen derá dos próprios argumentos utilizados pelos interessados. Dworkin exemplifica esse ponto com uma lei hipotética em que o legislador confere a um determinado ramo da economia uma isenção fiscal para gerar em- 31 DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. 32 DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. 82 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? prego ou fortalecer o consumo. Não existe um direito a uma isenção fiscal, mas quando o legislador transforma essa política em direito, passa-se a ter um direito. 33 Se os argumentos de política devem ser resolvidos e debatidos nas esfe ras políticas, é dizer, no Legislativo e no Executivo, porque foram eleitos para tanto, argumentos de princípio, vinculados aos direitos fundamentais dos cidadãos, devem ser protegidos e garantidos no espaço jurisdicional, já que os argumentos de princípio ou princípios em sentido estrito funcio nam como trunfos, coringas, contra políticas públicas. 34 E isso se dá, porque, de acordo com Dworkin, o Direito somente será válido se for, ao mesmo tempo, legítimo e a legitimidade do Direito se encontra na medida em que ele reflete a moralidade política da comunida de que se organiza em uma democracia constitucional. 35 Nessa perspectiva, a democracia constitucional passa a ser entendida como a melhor concepção de democracia, pois é a única que leva a sério a ideia de que é o próprio povo que se autogoverna, e não apenas a maioria. Para que isso possa se realizar, não apenas as maiorias devem ser detento ras de direitos, mas todo o povo, aí incluídas as minorias. 36 Se as maiorias já são protegidas pelo Legislativo e Executivo que, em princípio, falam em seu nome, as minorias precisam de uma instituição que as protejam, porque nem sempre a comunidade personificada, ou seja, 33 DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. 34 DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. No mesmo sentido: OMMATI, José Emílio Meduar. Uma Teoria dos Direitos Fun damentais. 6 a edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019; OMMATI, José Emílio Me dauar. Teoria da Constituição. 8 a edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. 35 DWORKIN, Ronald. O Direito da Liberdade: A Leitura Moral da Constituição Norte-Americana. São Paulo: Martins Fontes, 2006; DWORKIN, Ronald. A Raposa e o Porco-Espinho: Justiça e Valor. São Paulo: Martins Fontes, 2014. 36 DWORKIN, Ronald. A Virtude Soberana: A Teoria e a Prática da Igualdade. São Paulo: Martins Fontes, 2005. 83 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira o Estado, fala a seus cidadãos com uma única voz. Essa instituição proteto ra das minorias, por meio da defesa e realização dos direitos fundamentais, é o Judiciário e por isso que não pode ser eleito, para não ficar sob a pres são das maiorias. 37 Nesse sentido, em um caso concreto submetido ao Judiciário para jul gamento, se um argumento de princípio que se relaciona com um direito fundamental, entrar em conflito com um argumento de política, o Judiciá rio deve decidir com base no argumento de princípio, para a proteção do direito fundamental, mesmo que isso desagrade as maiorias. Por isso que os argumentos de princípio em uma democracia constitucional funcionam como trunfos contra as maiorias para a defesa das minorias e a salvaguarda e proteção da própria democracia e da Constituição. Portanto, em uma perspectiva de integridade constitucional, tal como trabalhada por Ronald Dworkin, não faz sentido falar em funções repre sentativa e iluminista do Judiciário e da jurisdição constitucional, como pretende o hoje Ministro Luís Roberto Barroso. 3.2. Direitos Fundamentais como a Lei do Mais Fraco A teoria garantista de Luigi Ferrajoli é uma teoria positivista do direi to. 38 Não um positivismo exegético, mas um positivismo crítico, pois de termina em toda aplicação normativa do intérprete deve-se analisar se existe compatibilidade entre a lei e a Constituição. 39 O positivismo crítico 37 DWORKIN, Ronald. A Virtude Soberana: A Teoria e a Prática da Igualdade. São Paulo: Martins Fontes, 2005. 38 FERRAJOLI, Luigi. Constitucionalismo principialista e constitucionalismo garantis ta. In: ______; STRECK, Lênio Luiz; TRINDADE, André Karam. Garantismo, her menêutica e (neo)constitucionalismo: um debate com Luigi Ferrajoli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. 39 FERRAJOLI, Luigi. Il paradigma garantista: filosofia e critica del diritto penale. 2ª ed. Napoli: Editoriale Scientfica, 2016, p. 152. 84 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? está ligado ao surgimento das constituições rígidas. 40 Em uma concepção geral, o garantismo significa os limites e vínculos impostos a todos os poderes, público ou privado, político ou econômico, em nível estatal ou internacional, por meio da lei e dos direitos fundamen tais. 41 Destarte, os direitos fundamentais consistem em limites e vínculos es tabelecidos pela Constituição Federal. São limites enquanto direitos indi viduais que impõe um dever de não lesão. São vínculos em relação aos direitos sociais que impõe uma obrigação de prestação material. 42 A jun ção das duas garantias forma o Estado Constitucional na medida em que une os direitos fundamentais do Estado Liberal e do Estado Social. 43 Sobre a fundamentação dos direitos fundamentais, Ferrajoli afirma que a justificação desses direitos não está neles mesmos, mas nos fins que estes buscam realizar ao serem tutelados pelo ordenamento jurídico, são, assim, uma técnica racionalmente idônea para garantir determinados critérios axiológicos sugeridos pela experiência histórica do constitucionalismo nacional e internacional. Essa relação entre meios e fins é a de racionalida de instrumental, ou seja, o nexo que liga os direitos fundamentais aos cri térios axiológicos. 44 Estes critérios são: (i) dignidade da pessoa humana; (ii) igualdade; (iii) paz; e (iv) tutela do mais fraco. 45 40 TRINDADE, André Karam. Positivismo e (neo)constitucionalismo: as teorias de Ferrajoli, Prieto Sanchís e García Amado. Revista do Mestrado em Direito da Uni versidade Católica de Brasília , vol. 10, n. 2, p. 406-430, jul.-dez., 2016. 41 FERRAJOLI, Luigi. Il paradigma garantista: filosofia e critica del diritto penale. 2ª ed. Napoli: Editoriale Scientfica, 2016, p. 6. 42 FERRAJOLI, Luigi. Principia iuris – teoria del diritto e della democrazia: 1. Teoria del diritto. Laterza: Roma-Bari, 2012, p. 773. 43 FERRAJOLI, Luigi. Principia iuris – teoria del diritto e della democrazia: 1. Teoria del diritto. Laterza: Roma-Bari, 2012, p. 775. 44 FERRAJOLI, Luigi. Los fundamentos de los derechos fundamentales . Madrid: Trot ta, 2001, p. 317. 45 Num primeiro momento Ferrajoli incluíra dentre os critérios a democracia substan- 85 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira O fundamento axiológico da dignidade da pessoa humana 46 é explicado por Ferrajoli com base na filosofia kantiana. Para Immanuel Kant, ou uma coisa tem um preço e pode ser substituída por um equivalente, ou possui uma dignidade, não admitindo nenhum tipo de equivalência. Dessa ma neira, o ser racional possui um fim em si mesmo e, portanto, dotado de dignidade, não podendo ser tratado como um meio para realização de outra vontade. 47 Nesse diapasão, os direitos fundamentais que garantem a dignidade da pessoa humana são: (i) todos os direitos de liberdade; 48 e (ii) todos os direitos sociais. 49 A igualdade jurídica indica que todos devem ser titulares das mesmas cial, todavia nos seus últimos escritos o mesmo retirou a democracia como critério axiológico e a alocou como critério de validade, colocando em seu lugar a dignidade da pessoa humana como um novo critério axiológico. 46 Ingo Sarlet retrata que na Alemanha, sobre a influência de Günther Düring, começou a defesa de um sistema de direitos fundamentais que não tivesse nenhum tipo de la cuna, haja vista a derivação destes direitos a partir do princípio fundamental da dig nidade da pessoa humana. Os direitos fundamentais seriam a concretização da dig nidade humana nos seus diversos aspectos. Todavia, esta teoria foi criticada por Kon rad Hesse observando que nem todos os direitos fundamentais possuem uma fun damentação direta na dignidade da pessoa humana. Por isso, entende-se hoje que o sistema de direitos fundamentais não é lógico-dedutivo, ou seja, fechado, mas um sistema aberto e flexível a novos conteúdos (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 70-72). 47 KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo: Discur so; Barcarolla, 2009, p. 239. 48 A autonomia para Kant é o fundamento da dignidade da pessoa humana ou de qual quer outro ser racional, ou seja, a ideia de autonomia precede à própria noção de dignidade e tem como significado a capacidade de todo ser racional de ser legislador universal e estar, simultaneamente, submetido à legislação por si criada (WEYNE, Bruno Cunha. O princípio da dignidade humana: reflexões a partir da filosofia de Kant. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 312) 49 FERRAJOLI, Luigi. Por uma teoria dos direitos e dos bens fundamentais . Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 105. 86 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? situações que a lei dispõe de forma universal. Isso implica em igualdade de direitos e igualdade de deveres. Os direitos fundamentais com fundamento axiológico na igualdade são aqueles que “garantindo as diferenças pessoais e reduzindo as desigualdades materiais, asseguram o (igual) valor ou a (igual) dignidade de todas as pessoas.” 50 O terceiro fundamento axiológico é o da paz, reconhecido desde 1948 pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. Inspirado na teoria de Thomas Hobbes, este critério indica que se deve proteger a vida para se garantir a paz, e deve-se superar a guerra para assegurar o direito à vida. Quanto maior proteção aos direitos de liberdade, à integridade pessoal e aos direitos sociais, mais sólida será a paz. 51 O último critério axiológico é o da tutela do mais fraco ou lei do mais fraco. Todos os direitos fundamentais se justificam na proteção das pesso as mais fracas frente aos mais fortes. Assim tem-se: (i) o direito à vida fren te ao mais forte fisicamente; (ii) os direitos de liberdade contra os mais fortes politicamente; e (iii) os direitos sociais contra os mais fortes econo micamente. 52 Isso faz com que os direitos fundamentais estejam ao abrigo frente à força do mercado e da política. 53 Toda a construção histórica dos direitos fundamentais está relacionada na luta do mais fraco contra o mais forte, muitas vezes com necessidade de derramamento de sangue. A Revolução Francesa representou a luta da burguesia contra o Estado absolutista e a conquista dos direitos individuais e liberais. A Revolução Industrial afirmou a necessidade de direitos fun- 50 FERRAJOLI, Luigi. Los fundamentos de los derechos fundamentales . Madrid: Trot ta, 2001, p. 329-333. 51 FERRAJOLI, Luigi. Los fundamentos de los derechos fundamentales . Madrid: Trot ta, 2001, p. 356. 52 FERRAJOLI, Luigi. Por uma teoria dos direitos e dos bens fundamentais . Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 106. 53 FERRAJOLI, Luigi. Los fundamentos de los derechos fundamentales . Madrid: Trot ta, 2001, p. 362. 87 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira damentais sociais para garantir uma efetiva igualdade entre patrão e em pregado, entre ricos e pobres. Na seara penal, Ferrajoli explica que no momento da prática do delito a parte mais fraca é a vítima (por isso a teoria do autor não é abolicionista, mas do direito penal mínimo), no momento do processo é o acusado e na execução penal é o condenado. Contudo, essa perspectiva de proteção do mais fraco também existe no direito de família, no direito público em ge ral, no direito internacional, 54 no direito do consumidor, na proteção da criança e do adolescente, na proteção do idoso etc. Nesse ponto, não se pode deixar de observar que os direitos fundamen tais realizam a passagem do Estado Legislativo de Direito para o Estado Constitucional de Direito. O primeiro utiliza o critério da legalidade como único e exclusivo para identificar um direito válido, observando apenas a legitimidade para fazer as leis. O segundo, por sua vez, entende que a vali dade do direito não depende apenas da forma em que a lei foi produzida, mas também do seu conteúdo que não pode violar os direitos fundamen tais que estão previstos nas constituições rígidas. Desse modo, a jurisdição pode sancionar como inválida uma lei que não observa os limites e víncu los estabelecidos pela Constituição em relação aos direitos fundamentais. 55 Isso também significa a passagem de uma concepção formal de demo cracia para uma perspectiva substancial de democracia. A primeira diz respeito à utilização dos direitos políticos (votar e ser votado) para a parti cipação da vontade popular na formação do governo. 56 A segunda busca a diminuição da arbitrariedade e do abuso estatal por meio do reconheci mento de direitos de liberdade e direitos sociais para o fortalecimento da 54 FERRAJOLI, Luigi. Dei diritti e delle garanzie. Bologna: Il Mulino, 2013, p. 45. 55 FERRAJOLI, Luigi. Pasado y futuro del Estado de derecho. In: CARBONELL, Miguel (org.). Neoconstitucionalismo(s). 4ª ed. Madrid: Trotta, 2009, p. 16-18. 56 COPETTI NETO, Alfredo. A democracia constitucional sob o olhar do garantismo. Florianópolis: Empório do Direito, 2016, p. 55-57. 88 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? democracia. 57 Nas palavras de Ferrajoli: La dimensione sostanziale della democrazia non é altro, infatti, che la sua dimensione garantista o costituzionale: consiste nelle garazie dei diritti fondamentali costituzionalmente stabilitti, cioè in quegli insiemi di limite e vincoli che disegnano quella che ho chiamato la sfera del no decidibile : di ciò che no può essere deciso, cioè la lesione dei dirtti di libertà, e di ciò che no può non essere deciso, cioè la soddisfazione dei diritti sociali. 58 Nesse diapasão, os direitos fundamentais funcionam como limites à democracia meramente política em que prevalece a vontade da maioria mesmo quando violadora de direitos básicos da minoria. Em uma demo cracia substancial não existe poder ilimitado. Aqui também reside a função contramajoritária dos direitos fundamentais. Esses direitos criam a chamada esfera do indecidível, ou seja, aquela es fera que a maioria não pode decidir sobre determinado assunto (no caso dos direitos individuais ou de defesa) ou não pode deixar de decidir (a exemplo dos direitos sociais). Os direitos fundamentais funcionam como garantias primárias de pres tação ou de não lesão, mas que uma vez violados chamam a necessidade de garantias secundárias consistentes no aparato jurisdicional para reparar ou sancionar tal violação. 59 Por isso a necessidade de a jurisdição constitucio- 57 COPETTI NETO, Alfredo. A democracia constitucional sob o olhar do garantismo. Florianópolis: Empório do Direito, 2016, p. 82-83. No mesmo sentido: FERRAJOLI, Luigi. Poderes selvagens: a crise da democracia italiana. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 17-19. 58 FERRAJOLI, Luigi. Dei diritti e delle garanzie. Bologna: Il Mulino, 2013, p. 127. Tradução livre: “De fato, a dimensão substancial da democracia não é outra senão a sua dimensão garantista ou constitucional: consiste nas garantias dos direitos fun damentais constitucionalmente estabelecidos, isto é, no conjunto de limites e víncu los que designam aquilo que eu chamei de esfera do não decidível: aquilo que não po de ser decidido, ou seja, a lesão aos direitos de liberdade, e o que não pode deixar de ser decidido, isto é, a satisfação dos direitos sociais.” 59 FERRAJOLI, Luigi. Principia iuris – teoria del diritto e della democrazia: 1. Teoria 89 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira nal ser contramajoritária, pois guardiã da Constituição e dos direitos fun damentais que atuam em favor da parte mais fraca, minoritária e vulnerá vel. 4. Análise de decisões ditas representativas e iluminitas 4.1. Execução Provisória da Pena: o Problema da Representatividade Como já foi observado, Barroso entende que as decisões que autoriza ram a execução provisória da pena após julgamento em segunda instância constituem exemplos do exercício da função representativa do Supremo Tribunal Federal. Assim, serão analisadas essas decisões a partir do voto do referido Ministro. A primeira decisão que teve participação do Ministro Barroso foi o ha beas corpus 126.292-SP. Nesse caso o paciente foi condenado à pena de 5 anos e 4 meses na primeira instância e interpôs recurso de apelação para o Tribunal de Justiça de São Paulo que negou provimento. Mesmo cabendo recurso especial e/ou extraordinário, o tribunal expediu imediatamente o mandado de prisão. 60 Inconformado o paciente impetrou habeas corpus para o Superior Tri bunal de Justiça que negou a liminar sob o fundamento que o instrumento processual correto seria o recurso especial. Diante disso foi impetrado novo habeas corpus no Supremo Tribunal Federal para discutir a execução provisória da pena, sob a relatoria do Min. Teori Zavascki. 61 Em seu voto, o Ministro Barroso defende que o trânsito em julgado não é requisito para a prisão, mas sim a ordem escrita e fundamentada de auto- del diritto. Laterza: Roma-Bari, 2012, p. 673. 60 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 126.292/SP . Relator: Min. Teoria Zavascki. DJe 07.02.2017. 61 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 126.292/SP . Relator: Min. Teoria Zavascki. DJe 07.02.2017. 90 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? ridade judiciária competente. Afirma também que a presunção de inocên cia é um princípio e, portanto, não é absoluta e sofre restrições por meio da técnica da ponderação. 62 Sobre a ponderação o autor explica que estão em colisão a presunção de inocência contra a efetividade da lei penal e bens jurídicos tutelados pela lei penal, a exemplos da vida, da segurança, da propriedade e da duração razoável do processo. Não elucida, contudo, a definição do âmbito de pro teção dos supostos direitos em conflito, se limitando a dizer que o núcleo essencial da presunção de inocência reside na “ideia de que a imposição ao réu de medidas restritivas de direitos deve ser excepcional e, por isso, deve haver elementos probatórios a justificar a necessidade, adequação e pro porcionalidade em sentido estrito da medida.” 63 Continua realizando a proporcionalidade, porém, mesmo citando Ro bert Alexy, o Ministro Barroso não segue a ordem de adequação, necessi dade e proporcionalidade em sentido estrito. De forma discricionária, vai direto para o último passo afirmando que a presunção de inocência vai perdendo peso argumentativo na medida que o processo avança. Para ele os recursos extraordinários não servem para reavaliar condenações, pois tutelam a higidez do ordenamento jurídico. 64 Conclui que o sacrifício imposto à presunção de inocência é pequeno em relação ao ganho da efetividade penal e credibilidade da justiça. Para o Ministro, a proporcionalidade também significa “vedação à proteção esta tal insuficiente” e que o entendimento de prisão pena após o trânsito em julgado garante proteção insatisfatória a bens jurídicos fundamentais. 65 62 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 126.292/SP . Relator: Min. Teoria Zavascki. DJe 07.02.2017. 63 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 126.292/SP . Relator: Min. Teoria Zavascki. DJe 07.02.2017. 64 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 126.292/SP . Relator: Min. Teoria Zavascki. DJe 07.02.2017. 65 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 126.292/SP . Relator: Min. Teoria Zavascki. 91 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira Nesse ponto, é possível observar que a proporcionalidade não foi utili zada de forma correta, mesmo que se adote a teoria de Alexy. Partindo da sua concepção de princípios como mandamentos de otimização, que po dem ser limitados mediante situações fáticas e jurídicas, Robert Alexy constrói uma forma de aplicação do critério da proporcionalidade por meio de três subcritérios: (i) adequação; (ii) necessidade; e (iii) proporcio nalidade em sentido estrito. Os dois primeiros se atêm às limitações fáticas e o último à limitação jurídica. Tal teoria recebe críticas por permitir um alto grau de subjetividade no momento de sua aplicação. A discricionariedade já está presente na pró pria “escolha” dos direitos fundamentais que entram em conflito. Como a teoria da ponderação só permite a restrição de um direito fundamental para a realização de outro direito fundamental, foi preciso encontrar na Constituição Federal um direito de mesma estirpe que pudesse conflitar com a presunção de inocência, mesmo ao custo de subverter a própria finalidade dos direitos individuais, que é funcionar como defesa do indiví duo contra o arbítrio estatal. Surgem, portanto, conflitos entre os direitos individuais que deveriam concorrer para proteger o indivíduo, mas que são utilizados no caso con creto para aumentar o poder punitivo do Estado - como se o Estado fosse titular dos direitos fundamentais e não o seu destinatário - a exemplo da efetividade do direito penal. A adequação, por sua vez, serve como uma análise negativa e com o ob jetivo de eliminar os meios que não são adequados para se atingir a finali dade almejada. Destarte, esse primeiro momento não determina quais os meios mais corretos, apenas indica quais são os adequados e os inadequa dos excluindo, desde já, estes últimos. 66 Talvez seja esse o critério que DJe 07.02.2017. 66 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 590. 92 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? permita uma menor discricionariedade, contudo não constitui um grande avanço para se chegar à conclusão; afinal, apenas irá excluir meios de res trição dos direitos fundamentais que não consigam de nenhuma maneira realizar o outro direito fundamental pretendido. A necessidade serve para determinar, dentre os meios tidos como ade quados, aquele que menos intervenha no âmbito de proteção de um direito fundamental. Isso significa que é preciso adotar o meio mais brando, evi tando sacrifícios desnecessários nas restrições aos direitos fundamentais. 67 Temos aqui outro problema na relativização da presunção de inocência e o recurso da discricionariedade para sua superação. Isso porque existe no direito brasileiro meio menos gravoso, autorizado pela Constituição e há muito utilizado para se garantir uma “efetividade do direito penal”: a utili zação das prisões cautelares, especialmente a prisão preventiva nos arts. 311 a 316 do Código de Processo Penal. É um meio menos gravoso, pois a sua utilização depende da conjugação dos requisitos estabelecidos pela legislação e não permite uma prisão automática enquanto se está pendente o trânsito em julgado da ação penal. A discricionariedade reside na desconsideração deste meio, mesmo que a análise neste ponto não seja jurídica e sim fática, como observa Alexy; ou seja, para entender que o caso não permite a restrição da presunção de inocência basta saber se existe ou não existe a possibilidade de prisão pre ventiva, que visa justamente a efetividade e a aplicação da lei penal no or denamento jurídico brasileiro. Sendo positiva a resposta, a limitação do direito fundamental não poderá ser realizada, pois esta não passou pelo teste da necessidade. A proporcionalidade em sentido estrito, a seu turno, indica que quanto maior for o grau de afetação de um direito fundamental, maior deverá ser a satisfação de um outro direito fundamental. Este último subcritério ainda 67 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 590-591. 93 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira pode ser dividido em três passos: (i) avaliação do grau de afetação de um direito fundamental; (ii) avaliação da satisfação do outro direito funda mental; (iii) observância se a afetação de um justifica a satisfação do ou tro. 68 Dessa maneira, na perspectiva jurídica do terceiro subcritério, é preciso levar em consideração os argumentos subjacentes ao conflito de direitos fundamentais para saber se a realização de um justifica a restrição do ou tro. No presente caso, contudo, não há necessidade de chegar na fase final da ponderação se não passou pelo requisito da necessidade. Retornando ao voto, 69 o Ministro ainda afirma que: (i) o art. 312 do CPP não proíbe a prisão pena, pois reforça a possibilidade de prisão antes do trânsito em julgado; 70 (ii) a prisão após condenação em segunda instân cia melhora a credibilidade do Poder Judiciário; (iii) os recursos extraordi nários podem ser usados como meios protelatórios; (iv) a demora na pri são deixa a sociedade incrédula na capacidade estatal de fazer cumprir a lei penal; (v) uma interpretação pragmática levaria a relativizar a presunção de inocência para garantir um equilíbrio e funcionalidade do sistema de justiça criminal, 71 diminuição da seletividade do sistema penal 72 e quebra do paradigma da impunidade. 73 Observa-se que o Ministro substituiu argumentos de princípio por ar gumentos de política, transformando-se em legislador, papel que não cabe 68 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 593-594. 69 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 126.292/SP . Relator: Min. Teoria Zavascki. DJe 07.02.2017. 70 Confundindo os conceitos de prisão pena e prisões cautelares. 71 Nesse argumento, ele retorna à necessidade de manter uma credibilidade do Poder Judiciário. 72 Explica que é preciso punir as pessoas com maior capacidade financeira. 73 Nesse ponto, explica que é necessário restaurar a confiança da sociedade na Justiça Criminal. 94 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? ao Judiciário que tem como função, como vimos com Dworkin e Ferrajoli, proteger as minorias contra as maiorias, principalmente nesse caso em que o texto constitucional coloca o estado de inocência como um verdadeiro direito fundamental e, portanto, como um argumento de princípio. Argu mentos tais como garantia de equilíbrio e funcionalidade do sistema de justiça criminal, diminuição da seletividade do sistema penal, quebra do paradigma da impunidade ou quejandos não são suficientes para afastar um direito fundamental que funciona como um trunfo, um coringa, con tra esses argumentos políticos. Nas ADCs 43 e 44, o Ministro Barroso deixa ainda mais clara a sua perspectiva representativa da jurisdição constitucional. Nessas ações de controle abstrato discutiu-se a declaração de constitucionalidade do art. 283 do CPP 74 cuja redação impede a prisão pena antes do trânsito em jul gado. Na medida cautelar, Barroso retoma o argumento da inefetividade do direito penal com exemplos dos casos de Pimenta Neves, Luís Estevão, Edmundo, Pedro Talvane, Dorothy Stang. Defende que a certeza da puni ção no direito penal é o fator de maior prevenção de criminalidade e que condicionar a prisão ao julgamento dos tribunais superiores gera um des prestígio dos tribunais do segundo grau de jurisdição. Ademais, além dos argumentos já delineados no HC 126.292-SP, o autor foca no baixo índice de provimento dos recursos extraordinários para justificar a possibilidade de relativização da presunção de inocência. 75 Embora não conste em seu voto escrito, o Ministro Barroso afirmou em entrevista, após o julgamento da medida cautelar, que o Supremo Tribunal Federal precisa corresponder aos sentimentos da sociedade e que a atuação 74 Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de prisão caute lar ou em virtude de condenação criminal transitada em julgado. 75 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MC nas ADCs 43 e 44. Relator: Min. Marco Aurélio. DJe 07.03.2018. 95 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira do STF apenas eventualmente é contramajoritária. 76 Algo semelhante àquilo que escreve doutrinariamente como a necessidade de “ouvir a voz das ruas”. 77 O acórdão do julgamento de mérito das ADCs 43 e 44 ainda não foi publicado. Não obstante, o voto escrito do Ministro Barroso já foi divulga do pela Revista Consultor Jurídico, 78 sendo utilizado como base para a análise. Nesse voto, o autor retoma os argumentos demonstrados no HC 126.292/SP e na Medida Cautelar das próprias ADCs. Acrescenta novos argumentos ao debate começando por explicar que o caso não demanda apenas atribuir uma interpretação abstrata ao texto, pois existe uma rela ção entre a realidade e o intérprete. Para ele: A realidade é parte da normatividade do Direito. Essa é uma constatação que se tornou dominante em todo o mundo. Os textos oferecem um ponto de partida para a interpretação e demarca as possibilidades de sentido da norma. Na terminologia tradicional, fornecem a moldura dentro da qual o intérprete poderá fazer escolhas legítimas. Não escolhas livres: dentro das possibilidades de sentido de uma norma, o intérprete deverá escolher a melhor. Não as de sua preferência pessoal, mas a que mais adequadamente realize os valores constitucionais e o interesse da sociedade. Observe-se que respeitar os direitos fundamentais com proporcionalidade faz parte do interesse da sociedade. Não são coisas antagônicas. 79 76 CONSULTOR JURÍDICO. Barroso afirma que STF precisa corresponder aos senti mentos da sociedade. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-abr 02/barroso-stf-responder-aos-sentimentos-sociedade 77 BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis dos tribunais constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 4, 2018, p. 2171-2228. 78 TADEU, Rover. Leia o voto do ministro Barroso sobre prisão após segunda instân cia. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019- out-24/leia-voto-ministro-barroso-prisao-segunda-instancia 79 TADEU, Rover. Leia o voto do ministro Barroso sobre prisão após segunda instân- 96 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? Embora nesse voto o Min. Barroso não cite expressamente Friedrich Müller, no HC 126.292/SP esta referência é expressa. 80 Por isso é conveni ente entender que a interpretação literal para Müller pode não ser o ponto de chegada, todavia constituí o limite de significado atribuído ao texto. Assim, uma concretização da norma não pode ocorrer contra os possíveis significados literais do texto (mesmo diante de uma polissemia), salvo “se o texto literal for comprovadamente equivocado ou passível de ser mal compreendido”, 81 ou seja, “decisões que passam claramente por cima do teor literal da Constituição não são admissíveis”. 82 Portanto, a relação entre realidade e intérprete não garante a possibili dade de subverter a literalidade do texto constitucional que funciona como limite no momento de concretização da norma. O argumento do Min. Barroso fica comprometido na medida em que não existe divergência so bre o conceito de trânsito em julgado. Um segundo ponto sustentado no voto, é que decisão no HC 126.292/SP fez diminuir o índice de encarceramento. Contudo, ele mesmo reconhece que isso pode ser uma consideração apressada sobre os núme ros de encarceramento e que suas interpretações são apenas possibilida des. 83 Assim, não se pode ver a diminuição do encarceramento como deriva do direto da mudança de entendimento do STF, pois nessa mesma época – cia. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019- out-24/leia-voto-ministro-barroso-prisao-segunda-instancia 80 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 126.292/SP . Relator: Min. Teoria Zavascki. DJe 07.02.2017. 81 MÜLLER, Friedrich. Teoria estruturante do direito. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 202-203. 82 MÜLLER, Friedrich. Metodologia do direito constitucional. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 74-75. 83 TADEU, Rover. Leia o voto do ministro Barroso sobre prisão após segunda instân cia. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019- out-24/leia-voto-ministro-barroso-prisao-segunda-instancia 97 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira a partir de 2015 – também foram implementadas as audiências de custódia que podem ser a causa da diminuição do encarceramento. No terceiro argumento, Barroso rebate a crítica de que os pobres que sofreriam mais com a prisão pena em segunda instância. Afirma que nos crimes de pobres a regra já é a prisão preventiva no curso do processo. 84 Questão já contestada pela Defensoria Pública da União. 85 Chegando na parte mais importante para a dita “função representativa” do STF, o Ministro explica que as críticas dirigidas ao seu posicionamento, especificamente aquelas que afirmam ser um populismo penal, não proce dem e que opinião pública ou clamor público são conceitos voláteis. Con tinua afirmando que: Não se pode perder de vista que numa democracia todo poder é represen tativo. Ninguém exerce poder em nome próprio ou no interesse próprio. Compilando a melhor teoria constitucional desenvolvida em todo o mun do, cabe assentar: a) o juiz não é um ser isolado do mundo, encastelado em uma torre de marfim, intérprete de textos abstratos e indiferente à vida lá fora. Juízes têm o dever de ter janelas para o mundo, ter olhos para a realidade e capa cidade de identificar o sentimento social, passando-o, naturalmente, pelo filtro da Constituição. [...] b) juízes constitucionais têm uma auto-compreensão acerca de sua missão institucional, de qual o seu papel na vida do país, de qual a melhor forma de realizar os valores constitucionais. Se violência, corrupção e impunida de são as mazelas do seu tempo – ao lado da desigualdade extrema, devo 84 TADEU, Rover. Leia o voto do ministro Barroso sobre prisão após segunda instân cia. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019- out-24/leia-voto-ministro-barroso-prisao-segunda-instancia 85 AMORIM, Felipe. Defensoria: prisão em segunda instância é mais rigorosa para o “andar de baixo”. Disponível em: https://www.bol.uol.com.br/noticias/2019/10/17/defensoria-prisao-em-2-instancia e-mais-rigorosa-para-andar-de-baixo.htm 98 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? acrescentar –, cabe ao juiz, sim, participar do esforço coletivo de enfrentar esses males; c) o Supremo Tribunal Federal é o intérprete final da Constituição, mas não é o dono dela nem tampouco seu intérprete único. A definição do sen tido e alcance da Constituição cabe à sociedade como um todo. Com as cautelas próprias, com os filtros adequados, não se deve ter a arrogância de se achar proprietário da Constituição, com o poder de excluir a cidadania do acesso a ela. 86 A primeira consideração a ser realizada é sobre a necessidade de o juiz ter “a capacidade de identificar o sentimento social”. Assim, ao mesmo tempo que classifica a opinião pública e clamor social como conceito volá teis, o Min. Barroso utiliza da expressão “sentimento social” que o juiz deveria alcançar no momento de aplicar a Constituição. Dessa maneira, voltamos às indagações feitas no tópico 2 deste capítu lo: Como ouvir a voz das ruas? O sentimento social será verificado por pesquisa de opinião? Pelo monitoramento das redes sociais? Ou pelo sub jetivismo do julgador? Essas perguntas não possuem respostas porque não existe uma função representativa majoritária que deve ser exercida pelo Supremo Tribunal Federal. A função da Corte Constitucional é atuar de forma contrajamari tária na proteção dos direitos e garantias fundamentais. É entender que os direitos fundamentais são os direitos dos mais fracos contra os mais fortes e a entidade estatal com todo o seu aparato policial, do Ministério Público e da Justiça Criminal constitui o lado mais forte da relação jurídica proces sual penal. Como já observado, no momento da prática do delito a parte mais fraca é a vítima, no momento do processo é o acusado e na fase de execução o 86 TADEU, Rover. Leia o voto do ministro Barroso sobre prisão após segunda instân cia. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019- out-24/leia-voto-ministro-barroso-prisao-segunda-instancia 99 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira condenado. 87 Subverter essa lógica é negar toda a historicidade de con quistas dos direitos e garantias fundamentais como direitos de defesa. Não adianta falar em eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas se ainda não resta fixada a ideia de que o principal destinatário das garantias é o Estado. Ademais, utilizar a tese de Häberle (Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituição) para exprimir uma necessidade de ouvir a sociedade ou a vontade da maioria é equivocada na medida que esse autor não nega a função precípua da jurisdição constitucional que é “zelar pelo texto consti tucional, inclusive se for necessário contra a vontade da maioria”. 88 Como demonstra Georges Abboud: O que Peter Häberle pretende a partir de sua sociedade aberta é inserir os valores pluralistas da sociedade democrática como elemento da constru ção da jurisprudência do Tribunal Constitucional, mediante o maior aces so do cidadão a essa esfera da justiça. 89 Dito isso, o STF precisa funcionar como caixa de ressonância para os direitos das minorias e facilitar o acesso destas à jurisdição constitucio nal, 90 caso contrário perderá a sua legitimidade democrática derivada da sua função contramajoritária. 87 FERRAJOLI, Luigi. Dei diritti e delle garanzie. Bologna: Il Mulino, 2013, p. 45. 88 ABBOUD, Georges. STF vs. Vontade da Maioria: As reflexões pelas quais a existência do STF somente se justifica se ele for contramajoritário. Revista dos Tribunais, vol. 921, p. 191 – 211, 2012. 89 ABBOUD, Georges. STF vs. Vontade da Maioria: As reflexões pelas quais a existência do STF somente se justifica se ele for contramajoritário. Revista dos Tribunais, vol. 921, p. 191 – 211, 2012. 90 Expressão cunhada por: NUNES, Daniel Capecchi. O STF como Caixa de Ressonân cia: as demandas por direitos de minorias e a dimensão objetiva da impermeabilidade constitucional. Revista da Procuradoria Geral do Município de João Pessoa, n. 6. p. 353-396, 2017-2018. 100 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? 4.2. Descriminalização do aborto: a questão iluminista Um exemplo de decisão iluminista do Supremo Tribunal Federal, apontada por Barroso, é o Habeas Corpus 124.306/RJ. O caso trata da des criminalização do aborto até o terceiro mês de gestação e de questões pro cessuais de habeas corpus e prisão preventiva. Para a finalidade deste capí tulo, abordar-se-á apenas a questão relativa à inconstitucionalidade do crime de aborto. 91 O voto do Min. Marco Aurélio ateve-se às questões processuais e não abordou a parte da descriminalização. Tal fundamentação iniciou-se com o voto do Min. Barroso ao explicar que a vida do feto é relevante, porém, a criminalização do aborto antes do terceiro mês de gestação viola direitos fundamentais da mulher. 92 O primeiro argumento utilizado é que os direitos fundamentais possu em uma função contramajoritária. Para ele: Característica essencial dos direitos fundamentais é que eles são oponíveis às maiorias políticas. Isso significa que eles funcionam como limite ao le gislador e até mesmo ao poder constituinte reformador (CF, art. 60, § 4º). Além disso, são eles dotados de aplicabilidade direta e imediata, o que legi tima a atuação da jurisdição constitucional para a sua proteção, tanto em caso de ação como de omissão legislativa. 93 Ademais, toca na questão da proporcionalidade como requisito para a limitação dos direitos fundamentais e os seus subcritérios de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, já explicados nos co- 91 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 92 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 93 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 101 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira mentários das decisões sobre a execução provisória da pena. 94 Continua dizendo que, independentemente da teoria adotada para o começo da vida do embrião, o fato é que ele não pode sobreviver fora do corpo da mulher. A criminalização do aborto, portanto, viola o direito fundamental à autonomia da mulher que tem o poder de decidir sobre o seu próprio corpo contra os interesses do Estado. O útero da mulher não está à serviço da sociedade. 95 Outro direito fundamental violado é a integridade física e psíquica. A primeira em razão das transformações e consequências da gestação para o corpo da mulher e a segunda porque ter um filho exige renúncia e dedica ção por toda a vida e não pode resultar de uma obrigação criada pelo direi to penal. 96 Para Barroso, os direitos sexuais e reprodutivos também são infringi dos, pois é direito da mulher decidir quando e como ter filhos. Além disso, o autor também lança mão de um argumento contramajoritário: A sexualidade feminina, ao lado dos direitos reprodutivos, atravessou mi lênios de opressão. O direito das mulheres a uma vida sexual ativa e praze rosa, como se reconhece à condição masculina, ainda é objeto de tabus, discriminações e preconceitos. Parte dessas disfunções é fundamentada historicamente no papel que a natureza reservou às mulheres no processo reprodutivo. Mas justamente porque à mulher cabe o ônus da gravidez, sua vontade e seus direitos devem ser protegidos com maior intensidade. 97 A igualdade de gênero também restaria violada na medida em que exis- 94 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 95 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 96 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 97 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 102 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? te uma histórica subjugação das mulheres em relação aos homens, uma injustiça que precisa ser neutralizada. Sendo que a criminalização do abor to prejudica essencialmente as mulheres mais pobres que não possuem acesso a clínicas e hospitais. 98 Dessa maneira, até esse momento é possível observar que a argumenta ção do voto não possui perspectiva iluminista. As questões ressaltadas dizem respeito à função contramajoritária dos direitos fundamentais das mulheres violados em razão da criminalização do aborto. Sob o olhar do garantismo estar-se-á diante da esfera do indecidível, ou seja, os âmbitos de proteção dos direitos fundamentais ressaltados estão ao abrigo de decisões estatais e das maiorias, não podendo o direito penal punir o aborto até o terceiro mês de gestação. A luta pela concretização dos direitos das mulheres representa a luta do mais fraco contra o mais forte. Também em uma perspectiva de integridade, tal como defendida por Dworkin, o aborto se coloca como um direito fundamental, na medida em que protege a liberdade da mulher e sua esfera íntima, chegando Dworkin a aproximar esse tipo de decisão a uma de natureza religiosa. Da mesma forma que as liberdades de religião e crença devem ser protegidas, também essa decisão extremamente íntima da mulher deve ser constitucionalmente protegida. 99 Para finalizar o seu voto, Barroso aplica o critério da proporcionalidade para solucionar o conflito entre a possibilidade do aborto e o direito à vida do feto. Nesse voto, o autor aplica a proporcionalidade tal qual delineada por Robert Alexy. Começando pela adequação, ele explica que a criminali- 98 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 99 DWORKIN, Ronald. Domínio da Vida: Aborto, Eutanásia e Liberdades Individuais. 2 a edição, São Paulo: Martins Fontes, 2009. No mesmo sentido, vide: OMMATI, José Emílio Medauar. Uma Teoria dos Direitos Fundamentais. 6 a edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. 103 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira zação do aborto é ineficaz para a proteção da vida do feto na medida em que: (i) as taxas de aborto nos países em que este é legalizado possuem semelhança com as taxas de aborto onde existe sua tipificação como delito penal; (ii) a criminalização afeta mais as mulheres que sofrem com com plicações de abortos clandestinos; (iii) em questões morais um posiciona mento religioso não pode levar à criminalização de quem pensa diferen te. 100 Em relação à necessidade, o Ministro afirma que existem outros ins trumentos que são menos gravosos e eficazes, como a descriminalização do aborto nos momentos iniciais da gestação após o cumprimento de re quisitos para sua realização, a criação de uma rede de apoio à grávida e sua família e de programas de planejamento familiar. 101 Sobre a proporcionalidade em sentido estrito, argumenta que a crimi nalização do aborto representa uma grave restrição aos direitos fundamen tais das mulheres sendo que proporciona um grau reduzido de eficácia na proteção à vida do feto. Por isso não há razão para o interesse estatal na tutela do embrião se sobrepor ao direito fundamental da mulher. A preva lência da vida do feto acontece apenas em estágio mais avançado de gestão quando o aborto deve ser criminalizado. 102 Talvez aqui a perspectiva iluminista se coloque na medida em que o Supremo Tribunal Federal pretendeu, com essa decisão, empurrar a histó ria para um futuro mais honrado, com a proteção dos direitos das mulhe res, já que o Parlamento brasileiro é bastante resistente à legalização do aborto em nosso país. Contudo, como já afirmamos nesse trabalho, qual a legitimidade de o 100 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 101 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 102 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306/RJ . Relator: Min. MARCO AURÉ LIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, DJe 17.03.2017. 104 Existem as funções representativa e ilumista do Supremo Tribunal Federal? Supremo Tribunal Federal em empurrar a história? Empurrar a história para onde? Esse debate não deveria ser feito pelas instâncias políticas com representatividade para tanto? E mais: pode uma Turma do Supremo Tri bunal Federal, portanto um órgão fracionário do Tribunal, tomar uma decisão tão complexa assim, quando a questão nem mesmo tinha sido colocada nos autos do procedimento? Afinal, não era isso que se discutia no procedimento. Embora concordemos com a decisão do STF quanto ao conteúdo, não podemos esquecer que o Direito não é apenas conteúdo, mas também forma e a forma na democracia se coloca também como um direito, como um mecanismo para evitar os abusos e as violações de direitos. 103 Nessa decisão, em nome de um iluminismo do STF, o próprio Tribunal acabou por esquecer os limites processuais de sua decisão, decidindo para muito além do que foi pedido e violando o sistema jurídico, exercitando um questionável maximalismo judicial. 104 5. Conclusão A partir dos argumentos apresentados é possível concluir que as teorias dos direitos fundamentais, positivista ou não positivista, determinam a necessidade de uma função contramajoritária da jurisdição constitucional. Essa função indica que as minorias, em um conceito amplo, devem ser protegidas contra as maiorias ocasionais que de forma arbitrária e antide mocrática pretendem restringir determinado direito fundamental. 103 Sobre a relação entre forma e conteúdo na democracia constitucional, vide: HABE RMAS, Jürgen. Facticidad y Validez: Sobre el Derecho y el Estado Democrático de Derecho en Términos de Teoría del Discurso. Madrid: Trotta, 1998. 104 A ideia de maximalismo judicial retiramos da obra de Cass Sunstein. Nesse sentido, veja: SUNSTEIN, Cass. A Constituição Parcial. Belo Horizonte: Del Rey, 2008; SUNSTEIN, Cass. One Case at a Time: Judicial Minimalism on the Supreme Court. Cambridge: Harvard University Press, 2001. 105 José Emílio Medauar Ommati · Rodrigo Pereira Moreira Por essa razão que não existem as funções representativa e iluminista do Supremo Tribunal Federal. A perspectiva representativa é incompatível com a função contramajoritária dos direitos e garantias fundamentais. A visão iluminista traz consigo apenas argumentos que já estão inclusos na função contramajoritária, como foi possível observar da análise dos temas julgados pela Corte Constitucional, acrescentando uma motivação preju dicial de maximalismo judicial. Referências ABBOUD, Georges. STF vs. Vontade da Maioria: As reflexões pelas quais a existência do STF somente se justifica se ele for contramajoritário. Revista dos Tribunais, vol. 921, p. 191 – 211, 2012. ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011. AMORIM, Felipe. Defensoria: prisão em segunda instância é mais rigorosa para o “an dar de baixo”. Disponível em: https://www.bol.uol.com.br/noticias/2019/10/17/defensoria-prisao-em-2-instancia e-mais-rigorosa-para-andar-de-baixo.htm . BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria . Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, número especial, 2015, p. 23-50. BARROSO, Luís Roberto. 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