Duzentas gramas
Meu amigo Hélio, que é pai do Arthur e diz sonoramente trêss e déss (ao invés de, digamos, "trêis" e "dés"), fica indignado quando peço na padaria duzentas gramas de presunto - quando a forma correta, insiste ele, é "duzentos" gramas.
Sempre que acontece e estamos juntos acabamos discutindo uns dez minutos sobre modos diferentes de falar. Ele de praxe argumenta que as regras de pronúncia e ortografia, se existem, devem ser obedecidas - e que os mais cultos (como eu, um cara que traduz livros!) devem insistir na forma correta a fim de esclarecer e encaminhar gente menos iluminada, como supõe-se seja a moça que me vende na padaria o presunto e o queijo.
Eu sempre argumento que quando ele diz que só existe uma forma correta de falar está usurpando um termo de outro ramo, e tentando aplicar a ética à gramática: como se falar "corretamente" implicasse em algum grau de correção moral; como se dizer "duzentas" gramas fosse incorrer numa falha de caráter e dizer "duzentos" fosse prova de virtude e integridade.
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BRABO, Paulo. A bacia das almas, 15 mar. 2006.
Disponível em: https://tinyurl.com/ya6ta9cr. Acesso em: 10 out. 2019.
- "Meu amigo Hélio [...] fica indignado quando peço na padaria duzentas gramas de presunto - quando a forma correta, insiste ele, é 'duzentos' gramas."
Hélio aponta um desvio da norma-padrão na expressão "duzentas gramas" utilizada pelo autor em seu dia a dia. O problema identificado por Hélio deve se tornar exemplo de concordância nominal, pois
a) o numeral deveria concordar em gênero com o substantivo.
b) deveria haver concordância com o verbo que sucede o pedido.
c) o numeral deveria concordar em número com o substantivo.
d) deveria haver concordância com o verbo que está anteposto ao pedido.
- Caso se inserisse um adjetivo em "dizer 'duzentos' fosse prova de virtude e integridade", haveria diversas formas de redação. A única forma que desrespeita as regras de concordância está em:
a) prova de virtude e integridade absolutas
c) prova de absoluta virtude e integridade