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Glauber
Era um homem comum, que vivia num lugar comum. Tudo que fazi...
Era um homem comum, que vivia num lugar comum. Tudo que fazia era comum. Todos os dias, quando saía do trabalho, entrava no bar, tomava uma bebida, olhava a vitrina onde se encontrava uma lagosta enorme, vermelha, com antenas cilíndricas e longas – isso virava o dicionário – e a lagosta se repetia na ordem comum. Saía do trabalho, entrava no bar, tomava uma piro, porque a vitrina nunca deixava de ser a lagosta e a lagosta é a bem comum. Este pedaço de coisas comuns eram mais comuns, embora sobressai-se no mar esse comum, mas não se inquietar-se.
— Era melhor no trabalho, quando saia, e no bar tomava sua bebida e olhava o crustáceo. "Crustáceo macruco, de antenas cilíndricas e longas e cuja carne é saborosa. Palinurus argus". Essa definição, que achava bela, vinha no dicionário. Então, agora quando saia do bar, gostava de dizer:
— Alô, crustáceo.
— Alô, respondia a lagosta, como das antenas cilíndricas e longas, fazia-lhe um aceno amigo. O homem ia embora para o seu comum, mas pensando muito nele novo interesse. A lagosta foi receptiva e isso era bom, muito bom.
Os dias iam-se repetindo no seu comum, e na saída, dizia para a lagosta:
— Quando saía do trabalho, no bar tomava a dose de bebida e, na saída, dizia para a lagosta:
— Alô, Palinurus argus. Qualquer dia come-la-ê. É uma forma de sair do meu comum. Não é sempre que se pode comer lagosta.
— Está certo, respondeu ela. Venha.
— O homem era o mesmo, porque sabia não só o comum da casa, cheguei àquela hora certa, aceitaria a comida, a mulher, os filhos. Sabia-se comum, que fazia comum.
— Ah, eu comeria, ou bar, a casa.
Ontem estava disposto a romper barreiras, a cortar amarras, sentia-se possuído por uma força diferente. Não voltaria para casa, ficaria no bar e pediria a lagosta e a comer sozinho.
— Alô, crustáceo.
— Vou come-la hoje.
— Venha, respondeu a lagosta.
Ficou como desarmado com tanta passividade. Já estimava um pouco e não queria destruí-la. Deixaria para outra vez. Voltou para casa, mas o desejo da lagosta começava a obscurecer a sua relação comum com as coisas comuns da casa, do trabalho, do tudo.
No dia seguinte o homem saiu de casa, foi para o trabalho, no bar pediu a bebida. Disposto se tinha levantado a coisa estava a essa hora. Em casa que se danasse. Comeria a lagosta. Sentiu-se no canto do bar e se sentiu feliz, sozinho. Comeria a lagosta inteira. Ela chegou, linda. Vermelha. As antenas faziam movimentos leves – antenas cilíndricas e longas – estavam na sua frente o crustáceo macruco — Palinurus argus — exatamente como no dicionário.
— Alô, filha. Eu disse que uma diaveria de come-la aqui estou.
— Aqui estou, repeti a lagosta.
O homem pegou o garfo, usou as mãos, pegou de novo o garfo, a faca, colher as mãos, tentava tirar pedaços da lagosta, não conseguia; as antenas não deixavam movimentar-se. Sentia picadas nos braços, no rosto, no pescoço. As antenas iam crescendo, cresciam, e já não mais o apertavam. De repente sentiu um pedaço de ombro cair sobre a mesa, o sangue escorrendo sobre a lagosta, que ia engolindo os braços, enquanto as antenas lhe permitiram reagi-la. Não podia ser assim dominado por um simples crustáceo. Lutaria até o fim. Mas não adiantava. O outro ombro já fora também destruído, o sangue se misturava à toalha, caía no chão fazendo uma enorme poça, não encherga bem a lagosta. Sentiu picadas terríveis nos olhos, e como os ombros e braços, estavam sendo degolidos pela lagosta.
— Meu Deus, meu Deus, gritou o homem, que ainda tinha um pequeno pedaço de boca.
— Meu Deus, meu Deus, imitou-o a lagosta comendo agora os órgãos. Comia com uma rapidez incrível. Só faltava o coração e o fígado. As antenas arrancaram os dois e elas engoliu instantaneamente. Então a gorda chegou, levou a lagosta para a vitrina, limpou a mesa, o chão, apagou o homem, levou-o para casa para melhor lavar a operação.
ARAÚJO, Maria Lysia Corrêa de. A roupa. In: JOSÉ, Elias (Org.) Seletcontes seletantes. São Paulo: FTD, 1991, v. 5, p. 48-51.
Era um homem comum, que vivia num lugar comum. Tudo que fazia era comum. Todos os dias, quando saía do trabalho, entrava no bar, tomava uma bebida, olhava a vitrina onde se encontrava uma lagosta enorme, vermelha, com antenas cilíndricas e longas – isso virava o dicionário – e a lagosta se repetia na ordem comum. Saía do trabalho, entrava no bar, tomava uma piro, porque a vitrina nunca deixava de ser a lagosta e a lagosta é a bem comum. Este pedaço de coisas comuns eram mais comuns, embora sobressai-se no mar esse comum, mas não se inquietar-se.
— Era melhor no trabalho, quando saia, e no bar tomava sua bebida e olhava o crustáceo. "Crustáceo macruco, de antenas cilíndricas e longas e cuja carne é saborosa. Palinurus argus". Essa definição, que achava bela, vinha no dicionário. Então, agora quando saia do bar, gostava de dizer:
— Alô, crustáceo.
— Alô, respondia a lagosta, como das antenas cilíndricas e longas, fazia-lhe um aceno amigo. O homem ia embora para o seu comum, mas pensando muito nele novo interesse. A lagosta foi receptiva e isso era bom, muito bom.
Os dias iam-se repetindo no seu comum, e na saída, dizia para a lagosta:
— Quando saía do trabalho, no bar tomava a dose de bebida e, na saída, dizia para a lagosta:
— Alô, Palinurus argus. Qualquer dia come-la-ê. É uma forma de sair do meu comum. Não é sempre que se pode comer lagosta.
— Está certo, respondeu ela. Venha.
— O homem era o mesmo, porque sabia não só o comum da casa, cheguei àquela hora certa, aceitaria a comida, a mulher, os filhos. Sabia-se comum, que fazia comum.
— Ah, eu comeria, ou bar, a casa.
Ontem estava disposto a romper barreiras, a cortar amarras, sentia-se possuído por uma força diferente. Não voltaria para casa, ficaria no bar e pediria a lagosta e a comer sozinho.
— Alô, crustáceo.
— Vou come-la hoje.
— Venha, respondeu a lagosta.
Ficou como desarmado com tanta passividade. Já estimava um pouco e não queria destruí-la. Deixaria para outra vez. Voltou para casa, mas o desejo da lagosta começava a obscurecer a sua relação comum com as coisas comuns da casa, do trabalho, do tudo.
No dia seguinte o homem saiu de casa, foi para o trabalho, no bar pediu a bebida. Disposto se tinha levantado a coisa estava a essa hora. Em casa que se danasse. Comeria a lagosta. Sentiu-se no canto do bar e se sentiu feliz, sozinho. Comeria a lagosta inteira. Ela chegou, linda. Vermelha. As antenas faziam movimentos leves – antenas cilíndricas e longas – estavam na sua frente o crustáceo macruco — Palinurus argus — exatamente como no dicionário.
— Alô, filha. Eu disse que uma diaveria de come-la aqui estou.
— Aqui estou, repeti a lagosta.
O homem pegou o garfo, usou as mãos, pegou de novo o garfo, a faca, colher as mãos, tentava tirar pedaços da lagosta, não conseguia; as antenas não deixavam movimentar-se. Sentia picadas nos braços, no rosto, no pescoço. As antenas iam crescendo, cresciam, e já não mais o apertavam. De repente sentiu um pedaço de ombro cair sobre a mesa, o sangue escorrendo sobre a lagosta, que ia engolindo os braços, enquanto as antenas lhe permitiram reagi-la. Não podia ser assim dominado por um simples crustáceo. Lutaria até o fim. Mas não adiantava. O outro ombro já fora também destruído, o sangue se misturava à toalha, caía no chão fazendo uma enorme poça, não encherga bem a lagosta. Sentiu picadas terríveis nos olhos, e como os ombros e braços, estavam sendo degolidos pela lagosta.
— Meu Deus, meu Deus, gritou o homem, que ainda tinha um pequeno pedaço de boca.
— Meu Deus, meu Deus, imitou-o a lagosta comendo agora os órgãos. Comia com uma rapidez incrível. Só faltava o coração e o fígado. As antenas arrancaram os dois e elas engoliu instantaneamente. Então a gorda chegou, levou a lagosta para a vitrina, limpou a mesa, o chão, apagou o homem, levou-o para casa para melhor lavar a operação.
ARAÚJO, Maria Lysia Corrêa de. A roupa. In: JOSÉ, Elias (Org.) Seletcontes seletantes. São Paulo: FTD, 1991, v. 5, p. 48-51.
Aguarde as respostas que iria fazer sobre esse texto