No dia em que nasci, as pessoas da nossa aldeia tiveram pena de minha mãe, e ninguém deu os parabéns a meu pai. Vim ao mundo durante a madrugada, quando a última estrela se apaga. Nós, pachtuns, consideramos esse um sinal auspicioso. Meu pai não tinha dinheiro para me levar ao hospital ou para uma parteira; então uma vizinha ajudou minha mãe. O primeiro bebê de meus pais foi natimorto, mas eu vim ao mundo chorando e dando pontapés. Nasci menina num lugar onde rifles são disparados em comemoração a um filho, ao passo que as filhas são escondidas atrás de cortinas, sendo seu papel na vida apenas fazer comida e procriar.
Para a maioria dos pachtuns, o dia em que nasce uma menina é considerado sombrio. O primo de meu pai, Jehan Sher Khan Yousafzai, foi um dos poucos a nos visitar para celebrar meu nascimento e até mesmo nos deu uma boa soma em dinheiro. Levou uma grande árvore genealógica que remontava até meu trisavô, e que mostrava apenas as linhas de descendência masculina. Meu pai, Ziauddin, é diferente da maior parte dos homens pachtuns. Pegou a árvore e riscou uma linha a partir de seu nome, no formato de um pirulito. Ao fim da linha escreveu “Malala”. O primo riu, atônito. Meu pai não se importou. Disse que olhou nos meus olhos assim que nasci e se apaixonou. Comentou com as pessoas: “Sei que há algo diferente nessa criança.” Também pediu aos amigos para jogar frutas secas, doces e moedas em meu berço, algo reservado somente aos meninos.
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YOUSAFZAI, Malala. Eu sou Malala: a história da garota que defendeu o direito à educação e foi baleada pelo Talibã. Malala Yousafzai com Christina Lamb – 1ª ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2013, p. 21-22. Disponível em: https://www.companhiadasletras.com.br/trechos/15356.pdf. Acesso em 21 ago. 2023.
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Como a chegada de Malala ao mundo foi recebida pelas pessoas de sua aldeia?
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Qual foi o sinal auspicioso considerado pelos pachtuns quando Malala nasceu?