Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Não há nada mais simples.
Tem só duas datas—a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra coisa todos os dias são meus.

Sou fácil de definir.
Vi como um danado.
Amei as coisas sem sentimentalidade nenhuma.
Nunca tive um desejo que não pudesse realizar, porque nunca ceguei.
Mesmo ouvir nunca foi para mim senão um acompanhamento de ver.
Compreendi que as coisas são reais e todas diferentes umas das outras;
Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento.
Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.

Um dia deu-me o sono como a qualquer criança.
Fechei os olhos e dormi.
Além disso, fui o único poeta da Natureza.

"Poemas Inconjuntos". In Poemas de Alberto Caeiro
8-11-1915

1. Analise a atitude do sujeito poético face ao pensamento.

1.1. Explique a alternativa de que dispõe para conhecer a realidade.

1.2. Mostre como o recurso às formas do verbo "compreender" (vv.10-12) sugere uma atitude diferente da enunciada nas suas afirmações.

2. Comente a aproximação do "eu" a uma "criança" (v.13).

3. Interprete o verso "Entre uma e outra cousa todos os dias são meus." (v.4) enquanto síntese da "biografia" do sujeito poético.

4. Estabeleça uma comparação entre as características formais da poesia de Alberto Caeiro e a de Pessoa ortônimo.

Question

Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Não há nada mais simples.
Tem só duas datas—a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra coisa todos os dias são meus.

Sou fácil de definir.
Vi como um danado.
Amei as coisas sem sentimentalidade nenhuma.
Nunca tive um desejo que não pudesse realizar, porque nunca ceguei.
Mesmo ouvir nunca foi para mim senão um acompanhamento de ver.
Compreendi que as coisas são reais e todas diferentes umas das outras;
Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento.
Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.

Um dia deu-me o sono como a qualquer criança.
Fechei os olhos e dormi.
Além disso, fui o único poeta da Natureza.

"Poemas Inconjuntos". In Poemas de Alberto Caeiro
8-11-1915

1. Analise a atitude do sujeito poético face ao pensamento.

1.1. Explique a alternativa de que dispõe para conhecer a realidade.

1.2. Mostre como o recurso às formas do verbo "compreender" (vv.10-12) sugere uma atitude diferente da enunciada nas suas afirmações.

2. Comente a aproximação do "eu" a uma "criança" (v.13).

3. Interprete o verso "Entre uma e outra cousa todos os dias são meus." (v.4) enquanto síntese da "biografia" do sujeito poético.

4. Estabeleça uma comparação entre as características formais da poesia de Alberto Caeiro e a de Pessoa ortônimo.

Accepted Answer

1. A atitude do sujeito poético face ao pensamento é de rejeição. Ele valoriza a experiência sensorial direta e desconfia do pensamento como meio de compreender a realidade, pois acredita que o pensamento tende a igualar as coisas, enquanto os sentidos captam suas diferenças.

1.1. A alternativa de que dispõe para conhecer a realidade é através dos sentidos. O sujeito poético afirma que compreendeu as coisas com os olhos, valorizando a percepção sensorial em detrimento do pensamento.

1.2. O uso das formas do verbo "compreender" sugere uma atitude de aceitação da realidade tal como ela é percebida pelos sentidos. Ao afirmar que compreendeu com os olhos e não com o pensamento, o sujeito poético destaca a diferença entre a percepção sensorial direta e a interpretação mental que pode distorcer a realidade.

2. A aproximação do "eu" a uma "criança" sugere inocência e pureza na forma de perceber o mundo. Assim como uma criança, o sujeito poético vê o mundo de forma direta e sem preconceitos, valorizando a simplicidade e a autenticidade.

3. O verso "Entre uma e outra cousa todos os dias são meus" sintetiza a biografia do sujeito poético ao enfatizar a vivência presente e imediata. Ele vive intensamente cada dia, sem se preocupar com passado ou futuro, valorizando a experiência diária como sua verdadeira história.

4. Comparando as características formais da poesia de Alberto Caeiro e de Pessoa ortônimo, nota-se que Caeiro utiliza uma linguagem simples e direta, focada na descrição sensorial e na experiência imediata. Já Pessoa ortônimo tende a explorar mais a complexidade emocional e filosófica, com uma linguagem mais elaborada e introspectiva.

Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia...

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