Todo mundo aceita que ao homem
cabe pontuar a própria vida:
que viva em ponto de exclamação
(dizem: tem alma dionisíaca);
viva em ponto de interrogação
(foi filosofia, ora é poesia);
viva equilibrando-se entre vírgulas
e sem pontuação (na política):
o homem só não aceita do homem
que use a só pontuação fatal:
que use, na frase que ele vive
o inevitável ponto-final.
NETO, João C. M. Museu de Tudo e Depois. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988. p. 146.
Para além do cumprimento de regras das gramáticas normativas, a pontuação possibilita a ordenação de termos e enunciados para a geração de efeitos, geralmente estéticos, em textos. No poema acima, é estabelecida uma relação entre a vida e a pontuação, conforme pode ser observado no(s) verso(s)
A
“Todo mundo aceita que ao homem / cabe pontuar a própria vida”, em que “pontuar” pode ser entendido como “corromper”, assim como ocorre com a vírgula ao separar períodos.
B
“inevitável ponto-final”, que representa, de forma denotativa, o fim de frases e enunciados de obras que citam Dionísio como divindade mitológica.
C
“cabe pontuar a própria vida:”, onde os dois-pontos expressam a necessidade de evidenciar uma citação referente às pontuações e aos modos de viver.
D
“cabe pontuar a própria vida:”, onde os dois-pontos são utilizados para listar as comparações entre as pontuações e os modos de viver.
E
“que use, na frase que ele vive”, que deveria ser finalizado pelo ponto de exclamação, devido ao caráter imperativo do conselho.