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Unidade IV CONSTITUIÇÃO E PROCESSO Capítulo 1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO PROCESSUAL 11 DIREITO PROCESSUAL E DIREITO CONSTITUCIONAL Nas últimas décadas um generoso aporte para o aprimoramento do processo tem sido trazido pela colocação metodológica do denominado Direito Processual Constitucional que consiste na condensação metodológica e sistemática dos princípios constitucionais do processo Para Dinamarco uma leitura atenta das relações entre Direito Processual e Direito Constitucional revela dois sentidos em que elas se desenvolvem Em um primeiro sentido a relação ocorre da Constituição em direção ao processo há a tutela constitucional do próprio processo por meio de seus princípios inscritos na Constituição Federal No segundo sentido do processo em direção à Constituição está a jurisdição constitucional Segundo Nelson Nery Jr didaticamente é possível falar em Direito Processual Constitucional e Direito Constitucional Processual para nos referirmos a essa realidade Naturalmente o Direito Processual se compõe de um sistema uniforme que lhe dá homogeneidade de sorte a facilitar sua compreensão e aplicação para a solução das ameaças e lesões ao direito Mesmo que se reconheça essa unidade processual é comum dizer didaticamente que existe um Direito Constitucional Processual para significar o conjunto das normas de Direito Processual que se encontram na Constituição Federal ao lado de um Direito Processual Constitucional que seria a reunião dos princípios para o fim de regular a denominada jurisdição constitucional A ideia central que se encontra nessa relação entre Constituição e processo está na necessidade de preservar os valores do Estado Democrático de Direito e garantir o acesso à Justiça interpretando aplicando e também produzindo legislativamente o arcabouço normativo infraconstitucional a partir desses fundamentos valorativos como atestam a reforma do CPP de 2008 e o Livro I da Parte Geral do CPC de 2015 Para cumprir esses objetivos a Constituição regula o Direito Processual definindolhe os princípios básicos para que ele possa posteriormente atuar convenientemente os valores que ela própria contém e que por sua superioridade hierárquica projeta sobre todo o ordenamento jurídico Incluemse aqui além das garantias constitucionais das partes princípios constitucionais do processo os princípios constitucionais em matéria de organização judiciária e competência bem como as normas gerais referentes às denominadas funções essenciais à Justiça É a tutela constitucional do processo No que se refere ao conjunto de instrumentos processuais incluídos no próprio texto constitucional para fazer prevalecer os valores que o integram é importante salientar que seu objetivo é a criação de instrumentos adequados efetivos e céleres para o exercício da jurisdição visando a prevalência da Constituição em relação às demais normas estatais A garantia da supremacia da Constituição é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito Não basta apenas a declaração da intenção de agir de acordo com o Direito É necessário que se ofereçam instrumentos eficazes para que seja atingido esse objetivo afastando qualquer ameaça à democracia e aos direitos fundamentais É a jurisdição constitucional Incluemse na jurisdição constitucional a os mecanismos de controle da constitucionalidade das leis e atos normativos da Administração que visam impedir que eles prevaleçam em detrimento da ordem constitucional quando em conflito com ela e b os instrumentos da jurisdição constitucional das liberdades mediante os quais a Constituição busca dar efetividade a determinadas garantias e direitos nela contemplados para que não se transformem em mera promessa programática Relativamente aos instrumentos de controle em abstrato da constitucionalidade trouxe o texto constitucional de 1988 a ação direta de inconstitucionalidade que pode ser por omissão ou medida para tornar efetiva norma constitucional art 103 2º ou em tese de norma legal ou ato normativo art 103 3º Posteriormente a Emenda Constitucional nº 3 de 17 de março de 2003 criou a ação declaratória de constitucionalidade incorporada ao texto da lei maior e que se destina a declarar a constitucionalidade de lei ou ato normativo federal Em matéria de controle de constitucionalidade há ainda a arguição de descumprimento de preceito fundamental ADPF prevista no 1º do art 102 da Constituição Federal e regulamentada pela Lei nº 98821999 No âmbito da jurisdição constitucional das liberdades classicamente o constitucionalismo brasileiro tem trazido como instrumentos da jurisdição constitucional a o habeas corpus para garantir a liberdade de locomoção sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação desse direito por ilegalidade ou abuso de poder art 5º inc LXVIII b o mandado de segurança que possui a finalidade de proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data quando o responsável pelo abuso de poder ou ilegalidade por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público art 5º LXIX e c a ação popular destinada a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe à moralidade administrativa ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural art 5º inc LXXIII A carta constitucional de 1988 ao lado desses inovou criando ou modificando a o mandado de segurança coletivo com o objetivo de possibilitar a proteção de direitos de coletividades cujos integrantes se encontrem na mesma situação jurídica art 5º inc LXX b o mandado de injunção para as situações em que a ausência de norma regulamentadora torna inviável o exercício das prerrogativas inerentes à cidadania à nacionalidade e à soberania bem como os direitos e liberdades constitucionais art 5º inc LXI e c o habeas data para assegurar o conhecimento de informações sobre a pessoa do impetrante que constem de registros ou bancos de dados de entidades de caráter público ou governamentais art 5º inc LXXII Podese ainda dizer de forma ampla que o processo é o meio pelo qual são garantidos os valores individuais coletivos e difusos que a ordem constitucional vigente abarca É por meio dele que se garante concretamente a atuação da legislação ordinária e complementar em consonância com as opções axiológicas presentes no texto da lei maior É necessário que o processo seja adequado efetivo e célebre para o cumprimento desse papel e também se adeque às mudanças que venham a ocorrer no âmbito da própria ordem constitucional Nesse sentido devese sempre pensar com base nos direitos fundamentais buscando garantir os valores e bens constitucionalmente protegidos Em outro sentido a interpretação judicial tem sido apontada como instrumento de mutação na legislação sendo inclusive incluída entre os denominados processos informais de mudança da Constituição Não obstante as limitações existentes é jurídica e politicamente relevante esse papel desempenhado pelo processo como mecanismo de atualização legal e constitucional Na prática a Além disso a ação em sentido amplo inclui a ação em sentido estrito do autor e a defesa do réu a inafastabilidade de qualquer lesão ou ameaça a direito inclui necessariamente tanto os possíveis direitos do autor quanto os do réu Não seria possível garantir ao autor o acesso à atividade jurisdicional do Estado sem em contrapartida oferecer ao réu a mesma possibilidade Ainda em se tratando dos direitos de ação e de defesa a garantia da inafastabilidade do Poder Judiciário da qual deriva o direito à ação está incluída entre os direitos e garantias fundamentais individuais e coletivos Título II Capítulo I Esse aspecto demonstra ser ela hoje uma garantia ampla não cabendo mais a interpretação restritiva de cunho individualista O direito à ação decorrente da garantia de acesso à Justiça é reforçado constitucionalmente pelas normas inscritas nos incs XXXIV alínea a XXI e LIX do art 5 que dispõe respectivamente sobre o direito de petição aos poderes públicos substituição processual atribuída às entidades associativas e ação privada substitutiva da ação penal pública A garantia da inafastabilidade do Poder Judiciário tem em nível político um importante sentido fundamentando na ideia de separação dos poderes buscando garantir a defesa do indivíduo perante o estado Colocase nesse sentido como um freio ao possível arbítrio dos poderes do Estado uma garantia direta contra o arbítrio do Poder Legislativo e indireta contra o arbítrio do Poder Executivo e do próprio Poder Judiciário Em sentido oposto ela pode materializar a onipresença do Estado e a onipotência do Poder Judiciário tendo em vista que nenhum conflito poderá ser afastado de sua apreciação nem por meio da lei É fundamental para que isso não ocorra que o Estado respeite a autonomia da vontade das partes sempre que ela não atinja direitos fundamentais interesse público bem como unicamente restrinja direitos de terceiros Exemplo que pode ser apresentado é o reconhecimento do direito das partes em optar pela arbitragem mesmo que anteriormente ao conflito mediante contrato O mesmo se pode dizer da opção pela mediação Não é aceitável que o Estado pretenda regular e reger todas as esferas da vida social mesmo que por meio do Poder Judiciário A inafastabilidade é uma garantia dos cidadãos e não do Estado é um limite ao agir do Estado não ao agir dos indivíduos e coletividades A garantia do juiz natural busca assegurar portanto a legitimidade do órgão e da pessoa que o ocupa Em outras palavras esse princípio significa que o Estado não pode criar órgãos com função jurisdicional apenas para o julgamento de fatos ou pessoas específicos e que a jurisdição só pode ser exercida pelos órgãos competentes e seus legítimos ocupantes tendo por base para essa aferição as normas constitucionais O motivo político para o seu estabelecimento é a busca da criação de um instrumento efetivo de garantia contra o arbítrio Ela impede que os Poderes Legislativo e Executivo bem como os órgãos hierarquicamente superiores do Poder Judiciário criem órgãos jurisdicionais não previstos constitucionalmente ou subistituições de titulares dos órgãos existentes prática comum em regimes autoritários e totalitários principalmente como forma de perseguição política aos dissidentes do sistema Podese afirmar que a garantia do juiz natural busca assegurar a estabilidade dos órgãos jurisdicionais e a independência dentro dos limites constitucionais e legais e a imparcialidade dos juízes Especificamente no que se refere à independência e imparcialidade dos juízes além de assegurada pela garantia do juiz natural busca também ser assegurada por meio das garantias que lhes são atribuídas e vedacões que lhes são impostas constitucionalmente Aliás a independência e a imparcialidade dos juízes no exercício da atividade jurisdicional estão previstas expressamente na Declaração Universal dos Direitos do Homem em seu art X Todo homem tem direito em plena igualdade a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele É importante salientar que imparcialidade é diferente de neutralidade Significa a garantia da ausência de vínculos ou interesses no processo de relação pessoal do julgador com a outra parte e de seu interesse no objeto da demanda situações que geram o impedimento ou a suspeição do juiz para atuar no caso sub judice A neutralidade em contrapartida significa a inexistência de postura axiológica No passado a imparcialidade em sua forma extrema confundiase com o princípio dispositivo e com a ideologia do liberalismo clássico Nessa visão era confundida com neutralidade ao ponto de Montesquieu considerar o juiz como um ser inanimado a boca que pronuncia a lei Hoje há a consciência de que o Direito possui necessariamente componentes valorativos Dessa forma é impossível a atuação em casos concretos sem que haja por parte do juiz uma apreciação axiológica dos fatos e nele trazidos Essa situação não elide a existência de um processo de objetivação mas reconhece também a presença da subjetividade em especial no âmbito da atividade jurisdicional é essa a razão pela qual existem mecanismos de controle como o sistema recursal Ao lado disso a própria Constituição Federal estabelece em seus arts 1 e 3 ao fixar os fundamentos e objetivos do Estado brasileiro parâmetros valorativos ao exercício da atividade jurisdicional Também a legislação infraconstitucional o faz ao adotar a interpretação teleológica como regra a ser seguida conforme o art 5 da Lei de Introdução às normas de Direito Brasileiro que determina que o juiz na aplicação da lei deve atender aos fins sociais a que ela se destina e às exigências do bem comum A garantia de assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados está prevista no art 5 inc LXXIV do texto constitucional A Constituição Federal de 1988 inovou nessa questão ao estabelecer nesse dispositivo o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos Entendase no texto legal a expressão Estado como significando poder público abrangendo a União os EstadosMembros e os municípios Em primeiro lugar esse dispositivo constitucional se refere à assistência jurídica e não à assistência judiciária termo que vinha historicamente sendo utilizado pela legislação pátria A assistência jurídica é ampla enquanto a assistência judiciária é mais restrita limitada ao direito que está em discussão nas demandas junto ao Poder Judiciário A primeira inclui a par dessas a assistência extra e préjudicial e a assistência em processos administrativos entre outras possibilidades Podese afirmar que a assistência jurídica é uma espécie do gênero assistência jurídica Depreendese portanto que a modificação trazida pelo constituinte teve o objetivo de ampliar a assistência aos carentes dandolhes além daquela necessária para o ingresso em juízo também as assessorias preventiva e extrajudicial Nesse sentido manifestase José Carlos Barbosa Moreira A grande novidade trazida pela Carta de 1988 consiste em que para ambas as ordens de providências isenção de custas e defensoria técnica o campo de atuação já não se delimita em função do atributo judiciário mas passa a compreender tudo que seja jurídico A mudança do adjetivo qualificador da assistência reforçada pelo acréscimo do integral importa notável ampliação do universo que se quer cobrir Ao utilizar o adjetivo integral o legislador constituinte reforça a posição colocada anteriormente pois a assistência jurídica integral só pode ser entendida como aquela que propicie ao carente todos os instrumentos jurídicos necessários antes durante e após o processo judicial e mesmo preventivos e extrajudiciais consultorias assessorias e representação junto à Administração Pública quando o ingresso em juízo não for necessário O segundo adjetivo gratuita somado ao anterior integral que significar que aquele que não possuir recursos suficientes está isento de todas as despesas que se fizerem necessárias para o fazer Ambas possuem duplo direcionamento a estabelecem direitos fundamentais que podem ser exigidos por qualquer cidadão e b contêm uma ordem dirigida ao poder público para que garanta o direito à prestação jurisdicional em um prazo razoável e crie os meios necessários para que isso efetivamente ocorra É importante destacar que o direito à razoável duração do processo como norma definidora de direito e garantia fundamental tem aplicação imediata conforme determina o 1º do art 5º da Constituição Federal que possui o seguinte texto As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata Ou seja não há mais qualquer justificação jurídica para o desrespeito a esse direito fundamental Continuarão existindo entretanto os entraves sociais políticos econômicos culturais e processuais impondo limites à sua plena efetivação De qualquer modo resta uma questão fundamental a ser elucidada o que significa prazo razoável Em um primeiro momento cabe destacar que historicamente se tem trabalhado com duas hipóteses principais a tempo razoável é o tempo legal expressamente previsto na legislação processual ou b tempo razoável é o tempo médio efetivamente despendido no País para cada espécie concreta de processo A primeira dessas soluções apresenta a vantagem de se trabalhar com um critério objetivo mas tem contra si o fato de que em determinadas etapas processuais em especial aquelas relativas a atos do Poder Judiciário não existem prazos expressamente definidos A segunda traz um conteúdo de realidade mas a sua adoção implicaria a negação da garantia constitucional tendo em vista que a média de duração dos processos no Brasil encontrase hoje muito acima do legal e do que se pode considerar como razoável lendo essa expressão em seu sentido gramatical A Emenda Constitucional nº 452004 ao adotar na redação da alínea e do inc II do art 93 a necessidade do cumprimento dos prazos legais devendo o juiz quando não o fizer justificar o fato sob pena de ficar impedido de ser promovido por merecimento De outro a nova redação dada à alínea c desse mesmo dispositivo passa a se referir a critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição Nesse sentido se constituem em normas que se efetivamente consideradas pelos tribunais serão de fundamental importância para efetivar o direito constitucional à prestação jurisdicional em um prazo razoável Esses dois dispositivos tornam o cumprimento do prazo razoável por parte dos magistrados uma exigência para suas promoções De um lado o texto da alínea e do inc II do art 93 estabelece a necessidade do cumprimento dos prazos legais devendo o juiz quando não o fizer justificar o fato sob pena de ficar impedido de ser promovido por merecimento De outro a nova redação dada à alínea c desse mesmo dispositivo passa a se referir a critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição Nesse sentido se constituem em normas que efetivamente consideradas pelos tribunais serão de fundamental importância para efetivar o direito constitucional à prestação jurisdicional em um prazo razoável Mesmo definido o prazo razoável como o prazo legal é necessário ao se analisar em cada caso concreto se ele foi efetivamente respeitado considerar ao lado da complexidade do objeto com base na qual o próprio ordenamento jurídico já define no âmbito do Direito Processual procedimentos diferenciados dois outros aspectos a o comportamento e a atuação dos litigantes e seus advogados e b o comportamento e a atuação do órgão jurisdicional Quando a demora na prestação jurisdicional decorrer da tomada de medidas procrastinatórias por qualquer dos litigantes e seus procuradores deve o órgão jurisdicional competente tomar as medidas cabíveis inclusive com a aplicação das penas previstas e o encaminhamento de denúncia se for o caso ao Tribunal de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil OAB quando for perceptível a intenção do advogado adiar o término do processo Nessa situação haverá desrespeito à garantia da prestação jurisdicional em um prazo razoável nas situações em que o órgão jurisdicional não tomar as medidas cabíveis Quando a demora na prestação jurisdicional decorrer da forma de atuação do órgão jurisdicional não cumprindo os prazos legais de forma efetiva ou possuindo comportamento profissional ou ético incompatível com a função pública exercida ocorrerá o desrespeito à garantia da prestação jurisdicional em um prazo razoável devendo também ser tomadas as medidas cabíveis inclusive junto à respectiva corregedoria e se necessário junto ao Conselho Nacional de Justiça É necessário entretanto que se entenda que sempre que a demora ocorrer em razão da complexidade da demanda não se pode falar em desrespeito ao direito à prestação jurisdicional em um prazo razoável Essa demora para ferir a garantia constitucional deve decorrer de inércia ou omissão do órgão jurisdicional seja ela voluntária ou involuntária Ela é voluntária quando o órgão jurisdicional propositamente não cumpre os prazos estabelecidos inverte a ordem de julgamento dos processos beneficiando alguns litigantes e prejudicando outros não decide ou adia a tomada de decisões É involuntária quando decorre do excesso de trabalho da falta de material humano e de estrutura e de problemas contidos na própria legislação processual Quando a demora é voluntária a culpa é do Estado pois ele é o responsável direto pelos atos de seus agentes Quando a demora é involuntária também a culpa é do Estado que não pode alegar para o não cumprimento de seus deveres o fato de ser incompetente na gestão pública E em ambos os casos cabe ao cidadão que teve seu direito lesado pela demora na prestação jurisdicional o direito de acionar o Estado buscando ser indenizado pelas perdas e danos que lhe foram impostos Ao lado do inc LXXVIII do art 5º agora incluído no texto constitucional e das alterações introduzidas nas alíneas do inc II do art 93 outros dispositivos presentes na Emenda Constitucional nº 45 podem ser apontados como importantes para garantir o direito à prestação jurisdicional em um prazo razoável Nesse sentido o art 93 ganhou quatro novos incisos a saber XII atividade jurisdicional será interrompida sendo vedado férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau funcionando nos dias em que não houver expediente forense normal juízes em plantão permanente XIII o número de juízes na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva demanda judicial e à respectiva população XIV os servidores receberão delegação para a prática de atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório XV a distribuição de processos será imediata em todos os graus de jurisdição Essas normas contêm disposições que efetivamente implementadas terão grande repercussão na duração dos processos em especial a presente no inc XIII do art 93 que estabelece a necessidade de proporcionalidade entre o número de juízes a demanda e a população O art 107 recebeu dois novos parágrafos com os seguintes conteúdos 2º Os Tribunais Regionais Federais instalarão a justiça itinerante com a realização de audiências e demais funções da atividade jurisdicional nos limites territoriais da respectiva jurisdição servindose de equipamentos públicos e comunitários 3º Os Tribunais Regionais Federais poderão funcionar descentralizadamente constituindo Câmaras regionais a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo vinculate em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta nas esferas federal estadual e municipal bem como proceder à sua revisão ou cancelamento na forma estabelecida em lei A ampliação da abrangência do efeito vinculante no controle concentrado e a criação da súmula vinculante no controle difuso são importantes instrumentos da uniformização da interpretação constitucional sem a qual não há possibilidade de se falar em segurança jurídica nem em tratamento isonômico dos cidadãos brasileiros Visa expressamente eliminar a insegurança jurídica e a multiplicação de processos sobre questões idênticas Deve entretanto a edição de Súmula Vinculante ser resultado do processo de objetivação do direito via Debate Crítico Apreciativo DCA Seu conteúdo deve ser a corrobor 16 GARANTIAS DE ADEQUAÇÃO DOS PROCEDIMENTOS E PRESTAÇÃO JURISDICIONAL OBJETIVA E EFETIVA São denominadas garantias de adequação dos procedimentos e de efetividade na prestação jurisdicional na classificação adotada a devido processo legal voltado a garantir em especial que a demanda se desenvolva em cumprimentos das garantias e procedimentos definidos em lei b isonomia garantindo igualdade de tratamento às partes c publicidade dos atos processuais que funciona como garantia das partes de que terão acesso a todas as informações contidas no processo d contraditório garantindo o direito de exercer a defesa de ser informado e de participar de todos os atos processuais e ampla defesa garantindo a utilização de todos os meios e recursos necessários ao pleno exercício do direito de defesa f licitude das provas que busca garantir a não utilização de provas obtidas por meios ilícitos g fundamentação das decisões garantindo acesso às razões que levaram o juiz a tomar aquela decisão e não outra e h duplo grau de jurisdição impondo uma organização judiciária que inclua órgãos de primeiro e de segundo graus de jurisdição Resumindo é necessário que após garantir o ingresso em juízo o Estado também assegure que as partes serão tratadas isonomicamente terão direito a ter acesso às informações contidas no processo a contrapor seus pontos de vista e a utilizar todos os meios lícitos de defesa a conhecer os fundamentos das decisões e delas recorrerem Essas garantias minimizam a subjetividade do ato de aplicação do direito constituindo importantes ideias reguladoras próprias do processo de objetivação do direito por meio do processo 161 Devido processo legal A garantia do devido processo legal está prevista no art 5º inc LIV do texto constitucional ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal Essa garantia pode ser desdobrada em devido processo legal em sentido processual e devido processo legal em sentido material Em sua feição processual estabelece que devem ser asseguradas às partes todas as garantias processuais e que é necessária a observância das normas e da sistemática previamente estabelecidas para o processo Busca nesse sentido evitar o arbítrio do juiz por meio da devida obediência aos procedimentos previstos em lei e da correta formação da relação processual inclui assim as 1º Os Tribunais Regionais do Trabalho instalarão a justiça itinerante com a realização de audiências e demais funções de atividade jurisdicional nos limites territoriais da respectiva jurisdição servindose de equipamentos públicos e comunitários 2º Os Tribunais Regionais do Trabalho poderão funcionar descentralizadamente constituindo Câmaras regionais a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo No art 125 foram introduzidos no que interessa a essa matéria os seguintes novos parágrafos 6º O Tribunal de Justiça poderá funcionar descentralizadamente constituindo Câmaras regionais a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo 7º O Tribunal de Justiça instalará a justiça itinerante com a realização de audiências e demais funções da atividade jurisdicional nos limites territoriais da respectiva jurisdição servindose de equipamentos públicos e comunitários Essas novas disposições constitucionalizam mudanças importantes no âmbito da estrutura do Poder Judiciário permitindo a descentralização da segunda instância e criando a justiça itinerante Ambas as medidas podem propiciar uma maior racionalização na utilização do tempo agilizando a tramitação dos processos e efetivando o direito à prestação jurisdicional em um prazo razoável Finalmente cabe destacar a ampliação do efeito vinculante anteriormente atribuído apenas às decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal STF nas ações declaratórias de constitucionalidade e que agora também atinge as decisões proferidas nas ações diretas de inconstitucionalidade por meio da nova redação dada ao 2º do art 102 As decisões definitivas de mérito proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta nas esferas federal estadual e municipal Também a criação da súmula vinculante expressamente prevista no art 103A agora acrescido ao texto constitucional O Supremo Tribunal Federal poderá de ofício ou por provocação mediante decisão de dois terços dos seus membros após reiteradas decisões sobre matéria constitucional aprovar súmula que a partir de sua publicação na imprensa oficial terá efeito garantia somente podem ser estabelecidos mediante lei com base nas exigências expressamente constantes da Constituição Federal Não podem portanto ser determinados pelo Poder Judiciário Especificamente em relação à publicidade dos julgamentos segundo o art 93 inc IX ela pode ser restrita para as partes e seus advogados ou somente para esses nos casos previstos em lei desde que a preservação do direito à intimidade não prejudique o interesse público à informação Ou seja a regra geral é a publicidade de todos os atos processuais incluindo o julgamento podendo a lei limitála apenas com base na exigência da defesa da intimidade nos casos em que essa defesa não prejudique o interesse público à informação Nesse princípio o próprio texto constitucional já estabeleceu qual o bem maior a ser considerado quando da existência de conflito 164 Contraditório A garantia do contraditório está prevista no art 5º inc LV do texto constitucional ao lado da ampla defesa aos litigantes em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes O contraditório que a Constituição Federal insere no sistema jurídico não é entretanto um mandamento meramente formal de dar vistas às partes para manifestação a respeito de cada ato processual como numa conversa de portadores de necessidades especiais auditivas Tratase de um contraditório material substancial um compromisso de atenção para com aquilo que está sendo dito a fim de que a decisão ao final realmente seja a síntese daquilo que foi debatido e discutido durante todo o processo não podendo haver no processo civil por exemplo decisão a respeito de tema que não tenha sido debatido pelas partes CPC de 2015 art 10 ainda que se trate de matéria sobre a qual o juiz possa decidir de ofício Essa garantia dá ao processo uma estrutura dialética tendo em vista que garante a participação efetiva das partes Não é o exercício do contraditório no entanto uma imposição pelo menos em nível do Direito Processual Civil Ele dá aos litigantes como regra geral a ocasião e a possibilidade de intervir assim como o compromisso de serem efetivamente ouvidos São exceções as situações que envolvam direitos indisponíveis em que o titular do direito seja incapaz quando então a participação se torna compulsória seja pessoalmente ou por meio de representante ou curador No Direito Processual Penal a regra é oposta sendo o exercício do contraditório efetivo obrigatório tendo em vista ser a liberdade um direito indisponível e existir o impedimento legal de que qualquer pessoa seja condenada sem defesa São elementos do contraditório a informação e a reação Em razão disso impõemse a comunicação de todos os atos processuais às partes através da citação e das intimações e a bilateralidade das audiências Em suma se isto não pode ser efetivo pois prescinde a criação de oportunidades para que tanto o autor como o réu se manifestem Não admite exceções sendo nulos os processos no quais ele não seja garantido São consequências práticas em primeiro lugar a fixação dos limites subjetivos da coisa julgada e em segundo o fato de que a relação jurídica processual só se completa nos processos de jurisdição contenciosa após a citação válida Com relação à primeira dessas consequências classicamente vinhase entendendo que o princípio do contraditório impunha os efeitos da coisa julgada apenas às pessoas que efetivamente tivessem participado do processo Contemporaneamente diante do surgimento dos interesses e direitos individuais homogêneos coletivos e difusos a teoria jurídica e a legislação absorveram as denominadas coisas julgadas erga omnes e ultra partes Nessas os efeitos da sentença estendemse também a outros beneficiados que não participaram concretamente do processo Têm elas no entanto aplicação apenas em relação à parte beneficiada pela decisão não se aplicando nos casos em que o direito não é reconhecido 165 Ampla defesa A garantia da ampla defesa está prevista no art 5º inc LV do texto constitucional ao lado do contraditório aos litigantes em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes Embora tratada constitucionalmente junto com o contraditório com ele não se confunde Aquele se refere à garantia da possibilidade de efetiva participação no processo em nível da ação ou da defesa essa à amplitude do exercício dessa participação No texto da norma que prevê ambas as garantias há um trecho que se encontra na sua parte final após a vírgula e que pode inclusive ser lido como se referindo apenas à ampla defesa reforçando essa interpretação Nesse trecho a utilização do pronome ela feminino parece indicar claramente essa situação da previsão de duas diferentes garantias interligadas e complementares entre si em mesmo texto normativo Também é necessário salientar que a palavra defesa presente na norma constitucional não se confunde com o instituto fundamental do Direito Processual denominado defesa de que é titular o réu e que se contrapõe a outro instituto processual igualmente fundamental denominado ação pertencente ao autor O texto constitucional é claro ao estabelecer a ampla defesa como garantia dos litigantes A defesa a que se refere essa garantia constitucional inclui primeiramente o conjunto de provas que ambas as partes podem trazer ao processo ou requerer que sejam produzidas como no caso das perícias buscando convencer o julgador de que sua posição é a correta O direito às provas necessárias para a interposição do direito alegado ou questionado se encontra previsto na expressão meios a ela inerentes Ao lado das provas inclui também os recursos processuais das decisões proferidas sempre que uma das partes com elas não concordar O dispositivo constitucional após a expressão meios utiliza Nesse sentido conjuguese com a ideia de verdade formal e não com a de verdade real no sentido que essas expressões possuem no âmbito do direito Como toda garantia não é ela absoluta Há princípios jurídicos e éticos maiores a imporlhe limites em especial no processo penal contidos no princípio da proporcionalidade Há situações em que com base do princípio da proporcionalidade devese estabelecer uma ponderação entre os bens e valores envolvidos no ilícito que se busca provar e no ilícito praticado para a obtenção da prova definindo níveis de ilicitude eticamente aceitáveis na obtenção da prova perante a gravidade do ilícito a ser provado Devese ainda levar em consideração a qualidade dos valores em jogo fixandose quais devem ser privilegiados diante das opções axiológicas da sociedade e do respectivo estado Questão complexa no que se refere às provas obtidas por meios ilícitos diz respeito à inviolabilidade do sigilo da correspondência e das comunicações telefônicas prevista constitucionalmente no inc XII do art 5º é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas de dados e das comunicações telefônicas salvo no último caso por ordem judicial nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal Esse dispositivo constitucional estabelece que a quebra da inviolabilidade só pode ocorrer com relação aos dados e às comunicações telefônicas por meio de decisão judicial e com a finalidade específica de investigação criminal ou instrução processual penal O texto constitucional ao autorizar a quebra do sigilo restringiua com a utilização da expressão salvo no último caso Com isso exclui pelo menos em uma interpretação literal a possibilidade de quebra de sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas Em função desse dispositivo não há como se falar a princípio na possibilidade de obtenção de prova lícita por meio de quebra de sigilo com relação à correspondência e às comunicações telegráficas É importante salientar que não há nada de ilícito na gravação dos próprios diálogos inclusive quando efetivados por meio de telefone desde com instrumentos não proibidos tais como as secretárias eletrônicas e mesmo gravadores acoplados aos aparelhos como já é comum em vários celulares O que não são permitidas são a escuta e a gravação não autorizadas das conversas telefônicas de terceiros Entretanto mais complexa se torna a definição de lícito e do ilícito nessa matéria quando se trata das novas formas de comunicação eletrônica e virtual emails torpedos mensagens em aplicativos WhatsApp por exemplo recados em sites de relacionamento como o Facebook postagens em blogs e no Twitter conversas via Messenger Skype e similares O que é e o que não é inviolável nesse novo universo de comunicação Buscando identificar a melhor solução para essas e outras situações o que se pode dizer é que diante de situações nas quais ocorra a colisão entre o princípio da licitude das provas que visa resguardar o direito individual à intimidade e à vida privada e o direito à prova que visa garantir o pleno acesso à Justiça e o devido processo legal devese aplicar o princípio da proporcionalidade sendo que a precedência de um ou de outro dependerá sempre das especificidades do caso concreto 167 Fundamentação das decisões judiciais A garantia da obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais está contida no inc IX do art 93 do texto constitucional quando estabelece que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentadas todas as decisões sob pena de nulidade Podese ainda afirmar que essa garantia decorre também do princípio do devido processo legal O dever de motivação das decisões é garantia política contra a possibilidade de arbítrio por parte do Estadojuiz Em respeito a ela todo aquele que exercer a atividade jurisdicional é obrigado a dizer as razões de suas decisões fundamentandoas Vejase que o CPC de 2015 em seu art 489 em dispositivo que assim como o sistema de precedentes arts 926 e 927 do CPC de 2015 também merece ser aplicado a todo o direito processual busca aperfeiçoar o respeito e o sentido do art 93 IX da CF Para tanto o CPC de 2015 explica quais são as espécies de decisões eivadas de nulidade por não se considerarem fundamentadas Traduz em suma que é importante explicar com clareza por quais motivos a opinião do julgador é aquela é importante mais do que dizer ao vencedor o motivo de sua vitória explicar ao perdedor por quais motivos os seus argumentos não foram suficientes Tem haver uma síntese da comunicação processual decorrente de um contraditório efetivamente substancial A fundamentação deve incluir razões fáticas provas constantes do processo e jurídicas normas súmulas jurisprudência costume de cada resposta dada a cada pedido constante do processo Sem essa fundamentação a decisão é nula Além disso sem ela ficaria aquele a quem foi negada a proteção de direito pleiteado privado também de seu direito de recorrer de forma adequada à decisão proferida Todo recurso se constitui em um questionamento de uma decisão e a possibilidade de questionála pressupõe o conhecimento dos seus fundamentos O dever de fundamentação que inclui as razões de fato e de direito não pode ser meramente formal pois está destinado a permitir o controle sobre o exercício da função jurisdicional em dois níveis Em primeiro lugar ao controle da sociedade sobre as atividades jurisdicionais do Estado visando assegurar sua imparcialidade e legalidade Esse primeiro nível é de natureza fundamentalmente política Em segundo pelas partes por uma razão técnica que é o poder de recurso pelo qual se busca a reforma da decisão proferida Literalmente a expressão recursos O direito aos recursos necessários em sentido processual é indispensável para que as partes possam buscar a modificação de decisões proferidas em processos judiciais Sobre a possibilidade de recorrer das decisões jurisdicionais retirase da lição de Sérgio Gilberto Porto O sistema recursal hodierno portanto consagrou o princípio de que todas as decisões judiciais salvo as de mero expediente são recorríveis No sistema aparece assim o recurso como direito da parte cabendo a esta se sucumbente total ou parcialmente interpôlo Como se lê expressamente no texto constitucional os meios e recursos são inerentes à ampla defesa ou seja ligados estruturalmente a ela e dela inseparáveis Nesse sentido todos os meios indispensáveis para o adequado exercício do direito de defesa podem ser utilizados Normas que restringiam o direito probatório são constitucionalidade questionável Quanto aos recursos o que é indispensável é que haja a sua previsão de forma adequada e não de forma ilimitada Essa limitação decorre de outro princípio igualmente constitucional qual seja a definitividade das decisões judiciais 166 Licitude das provas A garantia da inadmissibilidade no processo de provas obtidas por meios ilícitos também denominada do princípio da licitude das provas está prevista no art 5º inc LVI do texto constitucional são inadmissíveis no processo as provas obtidas por meios ilícitos Essa garantia se coloca como limite à garantia da ampla defesa devendo ser lida como seu contraponto Se de um lado a Constituição Federal permite a ampla defesa visando com isso chegar ao correto conhecimento dos fatos do outro coloca um princípio ético segundo o qual não se busca esse conhecimento a qualquer preço Ao interesse de uma das partes sobrepõese a defesa da dignidade da integridade e da privacidade da outra O que se busca com o processo é a resolução de conflitos concretos de interesses pacificando com justiça Não é objetivo do processo a certeza ou a verdade Como será visto em capítulo posterior não há como saber de forma definitiva se chegamos ou não à ela O adequado conhecimento dos fatos é meio para que o juiz possa decidir atingindo os objetivos da jurisdição não um fim em si mesmo O que está colocado claramente na garantia da licitude das provas é o princípio ético de que os fins não justifcam os meios Essa garantia constitucional foi construída fundamentalmente na busca de coibir o arbítrio o abuso do poder e as torturas patrocinadas essas em muitas ocasiões pelas autoridades policiais A crítica que lhe é feita é que buscando reprimir conduta delituosa pode recusar ou negar a verdade como princípio processual No entanto em face da sua localização no texto constitucional é necessário salientar que essa é uma norma destinada em primeiro lugar ao julgador como um dever que lhe é imposto e que gera como consequência uma garantia para as partes e para a sociedade e um princípio orientador da elaboração e interpretação das normas processuais É desse dever constitucional que segundo parte da teoria processual decorre o princípio processual da livre motivação do juiz também denominado princípio da persuasão racional ou do livre convencimento Significa que o juiz tem liberdade de convencimento dentro dos limites colocados pela lei e pelo que indica a realidade formal dos autos do processo conjunto probatório Ou seja é livre convencimento diante do que é trazido ao processo e ao que consta da ordem jurídica nacional lida à luz da Constituição Federal Não significa portanto autorização para que o juiz decida como bem desejar de acordo com sua subjetividade Quanto à amplitude da fundamentação da sentença entendese que deve ser proporcional à importância do caso julgado No entanto colocase nessa posição pelo menos um problema como definir a importância de um caso É muito difícil talvez impossível aferila perante os elementos subjetivos que envolvem cada situação em concreto e as grandes diferenças sociais econômicas e culturais que separaram a população brasileira em mundos totalmente diversos É possível fazêlo entretanto se considerarmos os efeitos sociais da sentença o interesse público envolvido mas esse tipo de valoração não se adequa à grande massa de processos Buscando dar uma resposta mais direta ao problema da amplitude da fundamentação deve ela ser suficiente para que ambas as partes possam conhecer e compreender os motivos pelos quais a decisão foi dada naquele sentido Deve em especial demonstrar para a parte vencida os motivos pelos quais ela não possui o direito alegado Nesse sentido deve ser a sentença o momento de materialização do processo de objetivação desenvolvido naquele processo O duplo grau de jurisdição na teoria jurídica brasileira é entendido de pelo menos duas formas diferentes a como a necessária existência de uma primeira e de uma segunda instância de julgamento das demandas cabendo à segunda analisar os recursos apresentados relativamente às decisões da primeira e b como a necessária análise das decisões proferidas em primeiro grau por um segundo órgão jurisdicional Nesse segundo sentido não se confunde com o direito ao recurso Os autores que defendem a previsão constitucional do duplo grau de jurisdição o veem como um princípio implícito decorrente da estrutura adotada pelo Poder Judiciário que segundo o art 92 da Constituição Federal é formado em todas as justiças por juízos e tribunais Essa duplicidade juízos e tribunais implicaria a adoção de uma estrutura processual baseada no duplo grau Há também autores que defendem a tese de que o duplo grau de jurisdição está previsto constitucionalmente como garantia no dispositivo que trata do contraditório e da ampla defesa art 5º inc LV quando ele assegura os recursos inerentes à ampla defesa Outros veem esse princípio no plano internacional mais especificamente na Convenção Interamericana de Direitos Humanos da qual o Brasil é signatário Segundo ela Art 8 Garantias judiciais 1 2 Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presume sua inocência enquanto não se comprova legalmente sua culpa Durante o processo toda pessoa tem direito em plena igualdade às seguintes garantias mínimas h direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior Adotando o primeiro sentido entre os indicados que aproxima o duplo grau de jurisdição do direito ao recurso é possível ver nessa convenção internacional ratificada e integrada ao ordenamento jurídico brasileiro por meio do procedimento de internalização dos atos internacionais sua previsão legal mas não constitucional De outro lado há previsão infraconstitucional expressa do duplo grau de jurisdição especificamente no art 496 do CPC de 2015 Trata da situação da obrigatoriedade de análise pelo órgão de segundo grau das decisões proferidas em primeiro grau contra a Fazenda Pública Nesse dispositivo legal encontrase claramente o segundo dos sentidos atribuídos à expressão duplo grau de jurisdição Não está o duplo grau de jurisdição entretanto colocado de forma expressa em nenhum dispositivo da carta constitucional Em razão disso não é o duplo grau de jurisdição uma garantia absoluta até pelo fato de constituir um princípio norma que se concretiza na maior medida possível conforme as circunstâncias e não uma regra norma de tudo ou nada O princípio do duplo grau de jurisdição no sentido mais usual que lhe é atribuído estabelece o controle hierárquico da aplicação do direito pela atividade jurisdicional por meio dos órgãos de segundo grau e excepcionalmente dos órgãos de cúpula Isto ocorre normalmente quando é interposto recurso por uma das partes não satisfazendo com a decisão proferida e excepcionalmente em caso de reexame necessário ainda que não haja recurso nos casos previstos em lei qualidade da imutabilidade em seu sentido maior impedindo sua modificação em qualquer processo que envolva as mesmas partes e o mesmo objeto bem como por meio de lei Impõe dessa forma limites ao legislador ao juiz e às partes Salientese que apenas a sentença de mérito é suscetível de obter a autoridade da coisa julgada material Com efeito toda a sentença é sujeita à coisa julgada formal mas apenas tendo solucionado definitivamente a lide faz também coisa julgada material No tocante às decisões interlocutórias por sua vez o que se produz é mera preclusão o que as tornam imutáveis no processo em que foram proferidas A coisa julgada que se refere o texto constitucional é a material pois apenas ela impede a repositura da ação tendo em vista pressupor uma decisão de mérito da qual não caiba mais recurso Compreendese ser objetivo do processo por meio da decisão final de mérito tornar certo o direito das partes Esse escopo é intangível e não é atribuível à sentença de mérito da qual não caiba mais recurso a qualidade da imutabilidade Não havendo a segurança trazida pela coisa julgada tão logo proferida a decisão final a parte insatisfeita poderia dar início a outro processo como o mesmo objetivo daquele já encerrado Para Humberto Theodoro Júnior A Constituição Federal de 1998 ao contrário da Portuguesa não se preocupou em dispensar tratamento constitucional ao instituto da coisa julgada em si Muito menos quanto aos aspectos envolvendo a sua inconstitucionalidade Apenas alude a coisa julgada em seu art 5º XXXVI quando elenca entre as garantias fundamentais a de que estaria ela imune aos efeitos da lei nova Ou seja a lei não prejudicará o direito adquirido o ato jurídico perfeito e a coisa julgada Como se observa a preocupação do legislador constituinte foi apenas a de pôr a coisa julgada a salvo dos efeitos de lei nova que contempleasse regra diversa de normatização da relação jurídica objeto de decisão judicial não mais sujeita a recurso como uma garantia dos jurisdicionados Tratase pois de tema de direito intertemporal em que se consagra o princípio da irretroatividade da lei nova Daí que a noção de intangibilidade da coisa julgada no sistema jurídico brasileiro não tem sede constitucional mas resulta antes de norma contida no CPC pelo que de modo algum pode estar imune ao princípio da constitucionalidade hierarquicamente superior Segundo Cândido Rangel Dinamarco Na fórmula constitucional da garantia da coisa julgada está dito apenas que a lei não a prejudicará art 5º XXXVI mas é notório que o constituinte minus dixit quam voluit entende essa garantia uma amplitude maior do que as palavras nos fazem pensar Por força da coisa julgada não só o legislador carece de poderes para dar nova disciplina a uma situação concreta já definitivamente regada em sentença irrecorrível como também os juízes são proibidos de exercer a jurisdição outra vez sobre o caso e as partes já não dispõem do direito de ação ou de defesa como meio de voltar a veicular em juízo a matéria já decidida Com esses contornos a coisa julgada é mais que um instituto de direito processual Ela pertence ao direito constitucional segundo Liebman ou ao direito processual material para quem acata a existência desse plano bifronte do ordenamento jurídico Resolvese em uma situação de estabilidade definida pela lei instituída mediante o processo garantida constitucionalmente e destinada a proporcionar segurança e paz de espírito às pessoas Para Liebman a autoridade da coisa julgada não é o efeito da sentença mas uma qualidade um modo de ser e de manifestarse dos seus efeitos quaisquer que sejam vários e diversos consoante as diferentes categorias das sentenças Nesse sentido considerase que a coisa julgada não é apenas mais um dos possíveis efeitos das sentenças mas uma qualidade de que podem revestirse tais efeitos qual seja a imutabilidade Segundo ele De fato todos os efeitos possíveis da sentença podem de igual modo imaginarse pelo menos em sentido hipotético produzidos independentemente da autoridade da coisa julgada sem que por isso se lhe desnature a essência A coisa julgada é qualquer coisa mais que se ajunta para aumentarlhes a estabilidade e isso vale igualmente para todos os efeitos possíveis das sentenças Identificar a declaração produzida pela sentença com a coisa julgada significa portanto confundir o efeito com um elemento novo que o qualifica Acerca da impossibilidade de se considerar a coisa julgada como um efeito da sentença Liebman assevera que Hoje não se fala de coisa julgada senão para usar uma forma elíptica a fim de designar a autoridade da coisa julgada Ora essa expressão assaz abstrata não pode e não é de referirse a um efeito autônomo que possa estar de qualquer modo sozinho indica pelo contrário a força a maneira com que certos efeitos se produzem isto é uma qualidade ou modo de ser deles O mesmo se pode dizer das diversas palavras por que se procura explicar a fórmula legislativa tradicional imutabilidade definitividade intangibilidade incontestabilidade termos que exprimem todos eles uma propriedade uma qualidade particular um atributo do objeto a que se referem porque são por si sós expressões vazias privadas de conteúdo e de sentido Não fosse o instituto da coisa julgada a insatisfação dos homens perante uma sentença contrária a seus interesses provavelmente levaria à existência de demandas intermináveis nas quais os indefinidos recursos opostos pela parte vencida impossibilitariam a prolação de uma decisão final definitiva ou seja válida para ambos os litigantes razão pela qual a estabilidade das relações jurídicas controvertidas jamais seria alcançada e por conseguinte a pacificação social restaria extremamente prejudicada Se a sentença de mérito tem a finalidade de tornar certos os direitos e os deveres das partes no caso concreto podese dizer que tal objetivo não estaria perfeitamente assegurado se os interessados pudessem deflagrar logo após ação idêntica tendente a revogála ou modificála Daí a importância da coisa julgada que destinada a garantir a certeza e a segurança das relações jurídicas concretas caracterizase pela proibição imposta a todos os juízes de pronunciaremse novamente sobre situação jurídica substancial já definida por sentença não mais sujeita a recurso Assim atribuinte o caráter de definitividade às decisões de mérito não mais subordinadas a recursos resguarda a coisa julgada o direito constitucional à proteção jurisdicional efetiva Do exposto não é difícil identificar o fundamento político da coisa julgada posto que não é possível persistir na situação proposta indefinidamente de forma que sejam cabíveis tantos recursos quantos desejem as partes O fundamento político do instituto da coisa julgada reside no fato de que aquele que teve seu direito reconhecido deve ter garantida a segurança jurídica para o gozo dos bens decorrentes da decisão E isso implica a limitação da possibilidade de recurso atribuída aquele que não teve seu direito reconhecido É necessário em um determinado momento dar fim definitivamente à controvérsia Do ponto de vista jurídico adotase a teoria de Liebman para quem a coisa julgada não é um efeito da sentença mas sim uma qualidade que a ela se agrega tornandoa definitiva Acerca da distinção entre a eficácia de uma sentença e sua imutabilidade assim se manifesta o mestre italiano A eficácia da sentença deve lógica e praticamentes distinguirse da sua imutabilidade Aquela pode definirse genericamente como um comando que tenha o fim de declarar querer tenha o de constituir ou modificar ou determinar uma relação jurídica A sentença vale como comando pelo menos no sentido de que contém a formulação autoritiva duma vontade de conteúdo imperativo e basta isso para que se possa falar ao menos do ponto de vista formal do comando que nasce da sentença Esse comando na verdade ainda quando seja eficaz não só é suscetível de reforma por causa da pluralidade das instâncias e do sistema dos recursos sobre que está o processo construído mas está exposto ao risco de ser contraditado por outro comando pronunciado também por um órgão do Estado Assim a eficácia de uma sentença não pode por si só impedir o juiz investido também ele da plenitude dos poderes exercidos pelo juiz que prorrogou a sentença de reexaminar o caso decidido e julgálo de modo diferente Somente uma razão de utilidade política e social o que já foi lembrado intervém para evitar esta possibilidade tornando o comando imutável quando o processo tenha chegado à sua conclusão com a preclusão dos recursos contra a sentença nele pronunciada Nisso consiste pois a autoridade da coisa julgada que se pode definir com precisão como a imutabilidade do comando emergente de uma sentença Não se identifica ela simplesmente com a definitividade e intangibilidade do ato que pronuncia o comando é pelo contrário uma qualidade mais intensa e mais profunda que reveste o ato também em seu conteúdo e torna assim imutáveis além do ato em sua existência formal os efeitos quaisquer que sejam do próprio ato67 Nesse sentido temse que eficácia e autoridade da sentença não se confundem Com efeito toda sentença é dotada de eficácia razão pela qual ela só não produz efeitos antes do trânsito em julgado se e quando a lei outorgar efeito suspensivo ao recurso cabível interposto Tal eficácia contudo não se confunde com autoridade da coisa julgada a qual torna o comando imutável após o trânsito em julgado da decisão tendo em vista os motivos políticos acima expostos A garantia da coisa julgada traz uma série de consequências práticas tendo em vista que é a sentença final de mérito que estabelece o alcance e os limites da decisão É o que se denomina limites subjetivos e objetivos da coisa julgada Os primeiros referemse a pessoas quem atingidas pela decisão os segundos ao objeto o quê sobre os quais incidem seus efeitos No tocante aos limites objetivos têm eles origem no pedido e suas causas indicados pelo próprio autor na inicial É limitado por eles que o juiz profere regra geral a sua decisão declarando o direito de ambas as partes No entanto não é a sentença como um todo que é qualificada pela garantia da coisa julgada Ela qualifica apenas a decisão em si a norma concreta expedida pelo órgão jurisdicional e não relatório e a motivação Já com relação aos limites subjetivos são eles definidos regra geral pela participação efetiva no processo Só pode ser atingido pela coisa julgada quem foi parte tendo podido exercer as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa Não pode então a princípio a coisa julgada atingir terceiros Essa regra foi absoluta no Direito Processual por muito tempo Contemporaneamente no entanto sofre ela algumas restrições oriundas dos denominados coisas julgadas erga omnes68 e ultra partes69 previstas em algumas leis brasileiras criadas a partir da década de 1980 Nessas situações entendese que a decisão de mérito proferida em benefício de determinado sujeito de direito estendese também em favor de outros que pertencam à mesma classe categoria ou grupo ou se encontram na mesma situação jurídica ou de fato para beneficiálos tendo em vista tratarse de interesses e direitos difusos coletivos ou individuais homogêneos Contemporaneamente passouse também a discutir a possibilidade de flexibilização da coisa julgada O fato de a Constituição Federal ter protegido a coisa julgada70 não dá ao instituto contornos ilimitados nem o coloca à frente de todos os outros princípios constitucionais Assim como as outras garantias expressas na Lei Maior a coisa julgada deve ser interpretada de forma a preservar a integração de todo o sistema possibilitando ao Estado que propicie por meio da sua função jurisdicional a pacificação social mediante a realização da Justiça É nesse contexto que o instituto da coisa julgada deve ser compreendido por meio de uma perspectiva crítica dimensionandoo de acordo com sua finalidade e importância para a preservação da unidade do ordenamento jurídico A coisa julgada não é uma garantia absoluta prevalecendo sobre qualquer outra garantia até mesmo porque não existem princípios absolutos Há sentenças cujos efeitos são juridicamente impossíveis repelidos por razões de ordem constitucional Não são sentenças juridicamente inexistentes71 mas sentenças cujos efeitos jamais serão abarcados pela coisa julgada que é a qualidade que se agrega aos efeitos da sentença São em outras palavras sentenças inaptas para a geração de efeitos posto que contrárias às exigências fundamentais de ordem constitucional Não seria coerente aceitar que uma lei independentemente do tempo de entrada em vigor possa ser declarada inconstitucional e não se aplicasse o mesmo tratamento às sentenças judiciais Tornase evidente nessa argumentação a relevância da conceituação inicial do instituto da coisa julgada como um atributo dos efeitos da sentença na esteira do pensamento de Liebman não se confundindo entretanto com os próprios efeitos Frente ao exposto é importante destacar que parece não terminologicamente adequado falar em flexibilização da coisa julgada Na realidade não há essa flexibilização mas sim o reconhecimento de que determinadas sentenças não adquirem a qualidade de coisa julgada o que é diverso72 É necessário então identificar aqueles casos em que uma sentença concreta não é suscetível de obter sua autoridade haja vista a inaceitabilidade pela ordem jurídica vigente dos resultados práticos que ela produz É indispensável o reconhecimento de que de um lado a coisa julgada representa uma garantia de segurança às partes estabilizando relações controvertidas de outro tal estabilização não pode ocorrer à custa de outras garantias ou valores igualmente protegidos pela Constituição Federal Perante uma situação concreta em que isso tenha ocorrido com o objetivo de manutenção da harmonia do ordenamento constitucional farseá indispensável a interpretação e aplicação dos princípios constitucionais segundo o método da proporcionalidade buscando propiciar o efetivo acesso à Justiça não apenas em seu aspecto formal mas sim em sua plenitude material Segundo Francielli Stadtlober Borges a proposta de relativização da coisa julgada implica mudança de comportamento por parte do Poder Judiciário vindo ao encontro das teses segundo as quais não existem princípios absolutos razão pela qual a garantia constitucional da coisa julgada deve ser interpretada e aplicada de forma sistemática Por conseguinte possível afirmar que o caráter absoluto até então atribuído ao instituto da coisa julgada é um dogma que precisa ser superado para dar legitimidade ao sistema jurídicoprocessual o qual não pode ser tido como instrumento impotente incapaz de corrigir decisões teratológicas contrárias a toda a ordem jurídica vigente A segurança jurídica visada deve estar sempre em harmonia com a justiça das decisões de forma a evitar a eternização de injustiças flagrantes73 Da mesma forma que as outras garantias expressas na Lei Fundamental a coisa julgada deve ser interpretada de modo a melhor propiciar a integração de todo o ordenamento jurídico possibilitando ao Estado na sua função jurisdicional proporcionar a pacificação social mediante a realização da Justiça Tendo em vista a pluralidade de interesses consagrados pela Constituição Federal não raro diferentes princípios podem apontar soluções igualmente diversas para um mesmo problema razão pela qual é preciso realizar a adequação possível observandose os princípios da unidade da efetividade e da proporcionalidade Existem portanto sentenças cujos efeitos são juridicamente impossíveis eis que repelidos pela ordem constitucional e que portanto não são protegidos pela coisa julgada que é justamento a qualidade que se agrega aos efeitos da sentença Da inexistência de efeitos juridicamente possíveis decorre como consequência a não incidência da coisa julgada material sobre eles razão pela qual tais sentenças jamais estarão imunes a novo pronunciamento judicial Segundo Francielli Stadtlober Borges nesse contexto temse que sentenças juridicamente impossíveis podem ser desconstituídas a qualquer momento eis que apenas aparentemente acobertadas pela autoridade da coisa julgada sendo que o vício insanável de que padecem pode ser reconhecido até mesmo de ofício pelo juiz Inviável portanto o estabelecimento de prazos preclusivos para o manejo de ações de cunho rescisório contra as referidas decisões posto que essas como já foi dito jamais serão qualificadas pela coisa julgada74 De fato o instituto da coisa julgada não tem o condão de sanar o insanável tornar irremediável o que é simplesmente juridicamente impossível No sistema atual de controle da constitucionalidade dos atos do Poder Público não é possível aceitar o mito da imutabilidade de decisões manifestamente contrárias a valores sufragados pela ordem constitucional eis que o Poder Judiciário muito embora seja independente dos demais não detém a soberania estatal não podendo fazer prevalecer tais decisões em detrimento de toda a estrutura jurídica e política do Estado que é uno As hipóteses em que a coisa julgada não atinge os efeitos decorrentes das sentenças são excepcionais devendo ser analisadas com muita cautela sob pena de pôr em xeque a estabilidade social proveniente da sentença transitada em julgado É a coisa julgada uma garantia de ordem constitucional so podendo ter sua autoridade afastada quando em confronto com outro princípio constitucional que em determinada situação concreta deva ser preservado segundo critérios de ponderação dos princípios constitucionais Sendo assim percebese que o que se pretende com essa nova abordagem do instituto da coisa julgada não é propriamente sua relativização termo que vem ganhando força na É preciso adotar uma postura mais aberta e crítica no sentido de que não devo o juiz ao se deparar com situação concreta em que a sentença não esteja coberta pela coisa julgada esquivarse por detrás do formalismo excessivo impedindo a revisão de tal decisão É preciso tomar consciência de que o instituto da coisa julgada não é um fim em si mesmo devendo pois ser aplicado em consonância com os demais valores resguardados pela Constituição Federal DIREITO PROCESSUAL CONSTITUCIONAL GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO PROCESSUAL COISA JULGADA DINAMARCO Cândido R A instrumentalidade do processo 4 ed São Paulo Malheiros 1994 24 Idem ibidem p 2530 NERY JR Nelson Princípios do processo civil na Constituição Federal 6 ed São Paulo RT 2000 p 2021 Sobre a utilização das normas programáticas como mera forma retórica e simbólica de encobrir a dominação RODRIGUES Horácio Wanderlei O uso do discurso de proteção aos direitos humanos como veículo da domin és p 262 HADDOCk LOBO Eugênio Roberto Advocacia na Constituição de 88 Revista do Instituto dos Advogados Catarinenses Florianópolis ano IV n 4 p 26 nov 1992 Convenção Americana de Direitos Humanos Disponível em httpwwwcidhorgBasicosPortuguescConvencaoAmericanahtm Nesse sentido ANNONI Danielle Direitos humanos acesso à justiça no direito internacional Curitiba Jurá 2003 p 134 39 ALEXY Op cit 40 DWORKIN Ronald Uma questão de princípio São Paulo Martins Fontes 2009 41 GÜNTHER Klaus The sense of appropriateness Albany State University of New York Press 2003 42 SILVA L V A Op cit p 33 43 CAPPELLETTI Mauro GARTH Bryant Acesso à justiça Porto Alegre Fabris 1988 p 15 44 Daí a proteção de que cuida a título de exemplo o art 189 do CPC de 2015 ao estabelecer as normas excepcionais de segredo de justiça nos casos de exigência do próprio interesse público e nos feitos que se refiram a ações de direito de família tais como casamentos filiação separação dos cônjuges divórcio guarda dos filhos entre outros 45 A citação é a comunicação feita ao réu de que está sendo instaurado um processo abrindolhe o prazo para apresentar a contestação é denominada na CLT de notificação a intimação é o instrumento pelo qual se faz todas as demais comunicações às partes advogados e outras pessoas que venham a ser chamadas para praticar qualquer ato no processo 46 Idem a nota 45 47 Entendendose que o processo é composto da relação jurídica processual mais o procedimento verificase a ausência de sintonia da legislação com a teoria jurídica processual quando o CPC de 1973 define que o processo se inicia com o primeiro despacho do juiz ou com a distribuição 48 Sobre a coisa julgada ver o item 17 deste mesmo capítulo Sobre os conceitos de coisa julgada erga omnes e ultra partes ver as notas de rodapé 68 e 69 também deste mesmo capítulo 49 Sobre o direito à prova ver ARAGÃO Egas Dirceu Moniz de Direito à prova Revista de Processo São Paulo RT ano X n 39 p 98118 julset 1985 50 PORTO Sérgio Gilberto Coisa julgada civil Rio de Janeiro Aide 1996 p 5051 51 Sobre o problema da verdade na ciência e no processo ver o Capítulo 1 da Unidade V deste mesmo volume 52 Sobre a questão da verdade ver o Capítulo 1 da Unidade V neste mesmo volume 53 Convenção Americana de Direitos Humanos Disponível em httpwwwcidhorgBasicosPortuguescConvencaoAmericanahtm 54 Como regra o segundo grau de jurisdição só se efetiva quando houver a apresentação por uma das partes de recurso da decisão proferida Ou seja há a necessidade de nova provocação da atividade jurisdicional do estado agora com relação a um órgão de segundo grau Há entretanto situações excepcionais em que a lei estabelece que o duplo grau de jurisdição é obrigatório denominadoas de devolução oficial ou remessa necessária ou impropriamente de recurso de ofício São exemplos dessa situação a a remessa necessária dos autos ao Tribunal de Justiça quando da absolvição sumária do réu em crime de delito doloso contra a vida sem encaminhamento ao tribunal do júri e b a remessa necessária ao tribunal imediatamente superior dos autos dos processos em que haja condenação na Fazenda Pública nos termos do art 496 do CPC de 2015 55 Nessa situação não cabe julgar a demanda desconsiderando o pronunciamento proferido mas sim submeter à reanálise dos tribunais locais a decisão ou sentença recorrida Os órgãos aos quais compete julgar os recursos ocupam posição de revisão ou anulação não de mando Isto significa que exceto em caso de súmula vinculante CF art 103A e Lei nº 114712006 embora os tribunais possam alterar a decisão anteriormente proferida não podem impor aos órgãos de primeiro grau que estes passem a adotar suas posições 56 CPC de 2015 art 1012 57 CPC de 2015 art 520 58 Para a redação desta seção foi de grande valia a pesquisa de Francielli Stadtlober Borges A desmistificação do instituto da coisa julgada no processo civil moderno hipóteses de relativização da coisa julgada inconstitucional Florianópolis UFSC 2004 59 Também são previstos nesse mesmo texto constitucional o direito adquirido e o ato jurídico perfeito Não são eles no entanto decorrentes do processo e da atividade jurisdicional do Estado embora se constituem em limites ao exercício dessa e das demais atividades estatais São eles definidos respectivamente nos 1º e 2º do art 6º da LINDB Reputamse ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou e Consideramse adquiridos assim os direitos que o seu titular ou alguém por ele possa exercer como aqueles cujo começo do exercício tenha termo préfixo ou condição preestabelecida inalterável o arbítrio de outrem 60 Há as situações em que a legislação prevê a possibilidade de proposição de ação rescindida dentr de determinados prazos expressamente estabelecidos ou revisão criminal A ação rescindida está disciplinada no CPC de 2015 arts 966 e seguintes a revisão criminal no CPP de 1941 arts 621 e seguintes 61 THEODORO JÚNIOR Humberto FARIA Juliana Cordeiro de A coisa julgada inconstitucional e os instrumentos processuais para seu controle Revista dos Tribunais São Paulo ano 91 v 795 p 30 jan 2002 62 DINAMORO Cândido Rangel Relativizar a coisa julgada materal Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil São Paulo n 19 p 17 setout 2002 63 LIEBMAN Enrico Tullio Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa julgada 2 ed Rio de Janeiro Forense 1981 p 6 64 Idem ibidem p 1920 65 Idem ibidem p 5 66 CPC de 2015 art 503 67 LIEBMAN Op cit p 5154 68 Coisa julgada erga omnes é aquela que vale para qualquer pessoa do latim para com todos Está ela prevista nas Leis nº 73471985 Lei da Ação Civil Pública e nº 80781990 Código de Defesa do Consumidor para os direitos difusos e individuais homogêneos 69 Coisa julgada ultra partes é aquela que vale além dos limites subjetivos fixados no processo fora das partes Está ela prevista na Lei nº 80781990 Código de Defesa do Consumidor para os direitos coletivos mas limitada ao grupo categoria ou classe 70 Sobre este tema ver RODRIGUES Horácio Wanderlei e AGACCI Francielli Stadtlober Borges Sobre a relativização da coisa julgada seus limites e suas possibilidades Revista de Processo São Paulo RT ano 37 n 203 p 1538 jan 2012 71 Em sentido contrário entendendo que são sentenças juridicamente inexistentes WAMBIER Teres Arruda Alvim MEDINA José Miguel Garcia O dogma da coisa julgada hipóteses de relativização São Paulo RT 2003 72 Cf BORGES Op cit 73 Cf BORGES Op cit 74 Cf BORGES Op cit 75 RODRIGUES Horácio Wanderlei AGACCI Francielli Stadtlober Borges Sobre a regularização da coisa julgada seus limites e suas possibilidades Revista de Processo São Paulo RT ano 37 n 203 p 27 jan 2012 76 Em 2 de junho de 2011 o STF concedeu a um jovem o direito de voltar a pleitear de seu suposto pai a realização do exame de DNA depois que um primeiro processo de investigação de paternidade foi extinto na primeira instância sem a realização do exame A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário nº 363889 dando provimento ao recurso para afastar o óbice da coisa julgada a determinar o seguimento do processo de investigação de paternidade na Justiça de primeiro grau Foi também reconhecida a repercussão geral do tema mais restrita em sua abrangência aos casos específicos de investigação de paternidade em situação equivalente O relator do processo foi o Ministro José Antonio Dias Toffoli mas a decisão final ocorreu quando veio ao plenario o voto de vista do Ministro Luiz Fux que acompanhou o relator Utilizandose da ponderação de direitos cotejou diferentes princípios constitucionais em especial o da definitividade intangibilidade da coisa julgada e o da dignidade da pessoa humana no caso o direito de saber quem é seu pai No confronto entre ambos entendeu haver a precedência do segundo por constituirse em um dos princípios nucleares da Constituição de 1988 No julgamento foi também lembrado que o Pacto de San José da Costa Rica do qual o Brasil é signatário prevê o direito do ser humano a conhecer sua história e seus direitos Também foram lembrados o direito fundamental à informação genética o direito à identidade e o direito à verdade real o direito do filho de saber quem é seu pai E o princípio da dignidade da pessoa humana inclui todos eles Brasil STF Recurso Extraordinário nº 363889 77 O que ocorreu com o instituto da coisa julgada é um excelente exemplo para demonstrar o que será visto no Capítulo 1 da Unidade V deste volume sobre subjetividade e objetivação do direito Durante muito tempo a teoria corroborada sobre a coisa julgada mantevese praticamente inatacável Mas novos problemas trazidos ao Poder Judiciário levaram à construção de novas hipóteses explicativas E o que parecia um dogma imutável teve de ceder diante da refutação de parte de seus enunciados A mudança ocorrida no sentido atribuído classicamente à coisa julgada decorre de um intenso processo de DCA O resultado foi uma maior aproximação da verdade no âmbito do processo de objetivação do direito 78 BORGES Op cit