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TEORIAS DO CURRICULO Eliane de Godoi Teixeira Fernandes Fundamentos conceituais do currículo Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto você deve apresentar os seguintes aprendizados Identificar os conceitos e as dimensões que regulam o currículo Reconhecer os elementos e fenômenos da construção curricular Analisar os pressupostos nos quais se baseiam a organização curricular Introdução No âmbito macroeducacional o currículo se refere às diretrizes do Estado para o sistema educacional público e privado Essas diretrizes são organi zadas por meio de leis que procuram observar o que já foi realizado na educação brasileira e mundial para conciliar o passado com as expectati vas de formação para as novas gerações No âmbito microeducacional o currículo procura adaptar as diretrizes exigidas pela União pelos estados e municípios aos anseios da comunidade da qual faz parte Dessa forma o currículo se ocupa do futuro atuando no tempo presente com o co nhecimento que adquiriu no passado Neste capítulo você vai analisar as características os conceitos e dimen sões que compõem e regulam o currículo Diferente do documento curri culum vitae utilizado no campo de recrutamento e seleção com a trajetória educacional as experiências profissionais mais relevantes as habilidades e competências de cada candidato a determinado trabalho no campo edu cacional o currículo combina análise do passado e aspirações para o futuro 1 Currículo conceitos e origem De acordo com o glossário da Revista História Sociedade e Educação no Brasil da Faculdade de Educação da UNICAMP currículo foi con ceituado como documento norteador do processo de ensino e de apren dizagem ou plano estruturado de estudos pela primeira vez em 1633 no Oxford English Dictionary ZOTTI 2006 Entretanto foi apenas em 1918 com a publicação da obra The Curriculum de Frankin Bobbitt nos Estados Unidos que o currículo se firmou como campo de reflexão e de estudos ZOTTI 2006 Ao longo do tempo o termo currículo passou a designar diferentes etapas no processo de escolarização incluindo uma relação de matériasdisciplinas com seu corpo de conhecimento organizado numa sequência lógica com o respectivo tempo de cada uma grade ou matriz curricular ZOTTI 2006 documento online as diretrizes explicitadas nas leis federais estaduais e municipais que regulam a área educacional e até mesmo as relações interpes soais que acontecem na sala de aula e que não são previstas Veja na Figura 1 algumas possibilidades de conceituar currículo Figura 1 Possibilidades de conceituação de currículo Fonte Adaptada de Zotti 2006 Outra maneira de pensar o currículo é colocar tudo o que acontece na escola como parte integrante de sua estrutura assuntos aulas relacionamentos situações A complexidade do currículo está em relacionar todas essas esferas visto que quando apenas uma está em foco perdese a visão sistêmica do todo Assim currículo é uma série de ações de diferentes agentes O conceito de currículo é multifacetado e modificouse historicamente atendendo a realidades sociais distintas há tempos e espaços específicos e em consequência disso precisa ser compreendido no contexto social em que está inserido ZOTTI 2006 documento online Fundamentos conceituais do currículo 2 O pontochave para entender o currículo está na resposta a duas questões específicas Qual é a função específica da escola Quais habilidades e competências humanas poderão ser desenvolvidas a partir da escolarização O que ensinar a quem É consenso entre educadores e a população leiga que uma das funções pri mordiais da escola é formar o cidadão para a atuação social Entretanto qual é o tipo de atuação que se espera Esse questionamento deve seguir o mesmo caminho lógico da questão anteriormente apresentada sobre qual é a função da escola A partir da resposta a essas questões podemos escolher qual currículo será mais representativo para nossas expectativas Enquanto instituição que promove o aprendizado sobre o conhecimento humano acumulado com vistas ao desenvolvimento a escola tem por obrigação promover o acesso a certos conhecimentos que para a maioria das pessoas não são acessíveis em outro lugar que não a escola O conhecimento mais valioso é por conseguinte aquele que extrapola o senso comum ou seja o pensamento científico que capacita o ser humano a ver a sua realidade de maneira diferente e a agir de maneira a buscar uma maior qualidade de vida para si e para a comunidade Segundo Galian 2016b o conhecimento capacita o ser humano a olhar para o mundo de outro ponto de vista diferente daquele que já tem no seu dia a dia Portanto os conhecimentos oferecidos pela escola devem servir para que os estudantes possam estranhar o mundo cotidiano de maneira a se sentirem potentes para investigálo e agir sobre ele melhorandoo A escola deve ensinar que o mundo está como está porque foi organizado assim de maneira desigual e injusta mas que há outras possibilidades A naturalização do status quo social fixa a ideia de que o mundo é assim porque não é possível ser de outra forma 3 Fundamentos conceituais do currículo Entretanto não é possível ensinar todos os conhecimentos na escola seja pela falta de tempo de recursos ou até mesmo pelo pouco valor de determi nados assuntos para o desenvolvimento humano Assim sempre será preciso fazer uma seleção de conhecimentos uma escolha sobre o que vai compor o currículo escolar Galian 2016a ressalta que essa escolha não acontece pelo valor intrínseco do conhecimento mas pelos interesses que acompanham cada assunto Para determinado público podese escolher conhecimentos que tendem a limitar o horizonte de possibilidades dessas pessoas àquilo que elas já têm no dia a dia ou seja vão inserirse no trabalho mais próximo e viver no ambiente já conhecido Para outros podese escolher um currículo com um horizonte bem mais amplo de possibilidades o que acontece justamente porque não vivemos em uma sociedade justa e isso se reflete na problematização da escolha dos currículos para cada classe social GALIAN 2016a Determinados conhecimentos entram no currículo escolar depois de muita mobi lização social como no caso de leis que modificam a Lei de Diretrizes e Bases da Educação tornando obrigatório o ensino de determinados conteúdos que antes não eram contemplados É o caso da Lei nº 10639 de 2003 que torna obrigatório o estudo da História da África e dos Africanos a luta dos negros no Brasil a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social econômica e política pertinentes à História do Brasil BRASIL 2003 documento online e da Lei nº 11645 de 2008 que torna obrigatório o estudo da história e cultura afrobrasileira e indígena BRASIL 2008 Entretanto conseguir colocar na Lei de Diretrizes e Bases da Educação LDB 939496 a exigência para que esses assuntos apareçam no currículo de todas as escolas ainda não significa que eles de fato aparecerão no cotidiano escolar O movimento entre a entrada do currículo na legislação e a concretização na prática educacional passa pela adequação dos cursos de formação inicial e continuada de professor pela compreensão e quebra de preconceitos pela adequação do tempo e grade curricular e depois pela real prática na sala de aula Embora o caminho seja longo é de suma importância que esses assuntos constem na legislação pois sem isso não conseguirão entrar no material didático livros e apostilas e na sala de aula Fundamentos conceituais do currículo 4 As teorias críticas do currículo mostram que especialmente a escola ofere cida para aqueles menos favorecidos que não têm outra maneira ou outro local para adquirir esses conhecimentos tende a ser menos rica em conhecimentos ou a simplificar os assuntos de maneira regular Ora se a escola e o currículo mostrarem apenas o que os estudantes já conhecem em seu dia a dia ou tentarem construir um currículo que apenas os agrade pouca transformação cognitiva poderá ser adquirida e os estudantes sairão da escola com um repertório muito parecido com o que já tinham antes de entrar Enquanto isso outra camada da população tem acesso a um conhecimento diferenciado que permite que eles olhem o mundo de outra forma e possam agir de outra maneira É justamente essa dinâmica que faz com que cada indivíduo e sua classe social fique onde está permanecendo na posição em que se encontra A Lei de Diretrizes e Bases da Educação LDB 939496 traz explícito em seu Título II BRASIL 1996 documento online TÍTULO II Dos Princípios e Fins da Educação Nacional Art 2º A educação dever da família e do Estado inspirada nos prin cípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho Art 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios I igualdade de condições para o acesso e permanência na escola II liberdade de aprender ensinar pesquisar e divulgar a cultura o pensamento a arte e o saber III pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas IV respeito à liberdade e apreço à tolerância V coexistência de instituições públicas e privadas de ensino VI gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais VII valorização do profissional da educação escolar VIII gestão democrática do ensino público na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino IX garantia de padrão de qualidade X valorização da experiência extraescolar XI vinculação entre a educação escolar o trabalho e as práticas sociais XII consideração com a diversidade étnicoracial XIII garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida 5 Fundamentos conceituais do currículo A partir disso alguns questionamentos sobre o currículo podem ser feitos Como selecionar o que há de essencial em cada disciplina para que o estudante entenda esse mundo em que vive Como cada conteúdo poderá se articular aos princípios e fins da edu cação nacional presentes no texto da LDB O que é necessário para entender que o mundo é uma construção e está como está por uma convenção O que se deve fazer para mostrar que há outras possibilidades de or ganização social e capacitar os estudantes na promoção de mudanças necessárias 2 Fenômenos e elementos da construção curricular A educação é uma atividade intencional cujo objetivo é o desenvolvimento de determinadas habilidades e competências humanas que são apreciadas e necessárias para a vida em sociedade Você já pensou quais são os conhecimentos que auxiliam a escola a concretizar sua intenção segundo o Estado a gestão e os professores De acordo com Zotti 2006 os estudos sobre o currículo têm seu cerne na análise dos conflitos socioeconômicos advindos dos processos de industrialização e urbanização dos Estados Unidos e da Inglaterra Essas situações marcam a necessidade de escolarização em massa das camadas menos favorecidas da população para formar mão de obra especializada para as indústrias em ascensão nos séculos XVIII e XIX A mencionada obra de Bobbitt espelha o desejo de racionalização técnica e instrumental desejado pela economia ao propor um currículo metodicamente organizado medido controlado e avaliado No Brasil essa cultura curricular ficou conhecida como tecnicismo e se manteve nas décadas de 1960 e 1970 como uma renovação do pensamento escolanovista anterior Se percorrermos historicamente a teoria curricular podemos analisar o currículo escolar a partir de dois grandes eixos as concepções tradicionais ou conserva doras e as concepções críticas Com origem nos Estados Unidos tanto as visões conservadoras como as críticas influenciaram sobremaneira o campo no Brasil De plano de estudos o conceito evolui para a visão de currículo como a totalidade de experiências vivenciadas pela criança sob a orientação da escola levando em conta e valorizando os interesses do aluno Seus representantes Dewey e Kilpa trick contribuíram para o desenvolvimento das teorias progressivistas As teorias Fundamentos conceituais do currículo 6 progressivistas começaram a se delinear a partir do século XVIII e se constituíram como tentativa de buscar respostas aos problemas socioeconômicos advindos dos processos de urbanização e industrialização ocorridos nos Estados Unidos no final do século XIX e início do século XX ZOTTI 2006 documento online Ambas tradicionais a visão escolanovista e a tecnicista tinham o mesmo objetivo de adaptar a escola e o currículo à ordem capitalista com base nos princípios de ordem racionalidade e eficiência utilizando conceitos tanto em presarias quanto do campo da psicologia ZOTTI 2006 documento online Somente a partir da década de 1960 as análises sobre a relação entre escola e sociedade começaram a se desenvolver na Inglaterra e nos Estados Unidos gerando as teorias críticas do currículo A partir delas as relações entre o que se ensina e como se ensina e suas repercussões nas desigualdades sociais começaram a ser questionadas O currículo visto como uma lista de conteúdos neutros perdeu sua imparcialidade deixando transparecer que a escolha por determinados temas e métodos refletia na estratificação de classes econômicas e sociais Chamado de sociologia do currículo esse campo do saber têm como re presentantes mais conhecidos Michel Apple 2016 Henry Giroux 1997 Michael Young 2014 e Basil Bernstein 1996 que vão analisar o currículo como forma de imposição cultural e opressão de uma classe sobre outra a fim de manterse no poder No link a seguir você confere uma conferência na cidade de Bauru São Paulo em 2013 na qual o professor Saviani fala sobre o sistema de ensino no Brasil desde a colonização A linha histórica escolhida relaciona intencionalidade política e econômica com as mudanças propostas para a educação nacional httpsqrgopagelinkmDVNB Outra ressalva é que se antes a escola servia para a formação do clero e das classes abastadas que possuíam cultura clássica e comportamento comedido ao receber os novos alunos a expectativa da escola não se alterou Dessa forma os novos alunos que não tinham os mesmos conhecimentos culturais e atitudinais esperados começaram a fracassar na escola De acordo com Smolka 2003 a partir da década das décadas de 1970 e 1980 começam a ser publicadas pelo mundo todo pesquisas que tratam do 7 Fundamentos conceituais do currículo tema do fracasso escolar como as de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky 1984 na Argentina e no México Clay 197275 na Austrália Foucambert 1978 e Lentin 1979 na França Scribner e Cole 1981 na Libéria Read 1978 nos EUA Leite 1980 Cagliari 1989 e Capovilla 1997 no Brasil entre outros Esses estudos também exerceram forte impacto nos debates sobre o currículo pois modificaram a maneira como os processos de ensino e de aprendizagem se desenvolvem e destacaram suas variáveis mais importantes No Brasil o destaque às pesquisas de Emília Ferreiro e Ana Teberosky Psicogênese da língua escrita culminou na prescrição desses estudos como diretrizes em documentos oficiais nas ementas dos cursos de formação e capacitação docente bem como no método de alfabetização adotado nas escolas públicas brasileiras SMOLKA 2003 Outros estudiosos se dedicaram a pesquisar o currículo e a sociologia do currículo confirmando a relação estreita entre escola currículo e expectativas do sistema capitalista O conceito de currículo é multifacetado e modificouse historicamente atendendo a realidades sociais distintas há tempos e espaços específicos e em consequência disso precisa ser compreendido no contexto social em que está inserido ZOTTI 2006 documento online No link a seguir você confere um artigo de Guiomar Namo de Mello que trata das teorias do currículo especialmente no Brasil de maneira simples e objetiva httpsqrgopagelink3nCQU 3 Organização curricular O currículo está disseminado em várias dimensões do processo escolar En quanto documento formal é apenas parte do que podemos chamar de diretrizes Fundamentos conceituais do currículo 8 curriculares É um norteador que se refere a princípios e metas visto que se encontra fora da realidade concreta das escolas Entretanto é a partir desse conjunto de princípios que a realidade na sala de aula se concretiza Para ser utilizado na escola o currículo formal deverá e será transformado em livros didáticos e apostilas em interpretações e adaptações que a escola faz da sua realidade em práticas que os professores oferecerão em sala de aula diante das reais necessidades e expectativas de seus alunos Por isso o currículo precisa ser entendido como um documento adaptável flexível e elaborado por professores estudantes e governantes O ponto de destaque do documento formal está nas escolhas feitas para a escola brasileira e o plano formativo da população que explicita os conhe cimentos essenciais que deverão ser apresentados e ensinados para as novas gerações a fim de capacitálas para viver em sociedade Historicamente os professores não fazem parte da construção do currí culo apenas o recebem e devem seguilo executálo Assim podem pensar apenas em método não em conteúdo de modo que não há espaço e tempo para questionar por que se ensina o que se ensina Para favorecer a compreensão sobre a organização complexa que envolve o currículo vamos utilizar a classificação de Galian 2016b disposta na Figura 2 a seguir Figura 2 Currículo em processo Fonte Adaptada de Galian 2016a 9 Fundamentos conceituais do currículo Currículo prescrito formal é concebido muito antes de chegar ao nível estadual e municipal Historicamente os professores não fazem parte da construção desse currículo eles apenas o recebem e devem executálo No início os debates para elaboração da BNCC contaram com a participação docente mas após algum tempo essa possibilidade de participação foi cerceada Currículo planejado transformação das diretrizes legais em materiais para uso por professores e alunos como guias curriculares livros didáticos e apostilas Entretanto é comum que a hierarquia se inverta e que os livros didáticos passem a ser utilizados na escola como o currículo a ser seguido Outro ponto controverso é a existência de materiais diferenciados oferecidos pela mesma editora à rede pública e à rede privada de ensino Para baratear a produção do material para a esfera pública a mesma editora e os mesmos autores pode simplificar textos omitir figuras ou diminuir sua qualidade gráfica fazendo com que prevaleça a metodologia de memorização Currículo organizado referese à organização de tempos espaços e agrupamentos para efetivar o currículo planejado dentro da escola Mostra a hierarquia entre as disciplinas e os professores de acordo com a organização do currículo Historicamente por exemplo artes e educação física não têm o mesmo status que português e matemática Salas que agrupam alunos com maior dificuldade também tendem a marcar uma expectativa de aprendiza gem diferenciada em comparação aos agrupamentos de melhores alunos Currículo em ação encontro efetivo entre professoralunoconheci mento Nesse currículo o professor tem mais autonomia de ação pode escolher se vai usar todo o livro didático se vai inverter alguma ordem de apresentação se vai utilizar fontes diversificadas etc Currículo avaliado dimensão da avaliação na qual fica explícito para o aluno o que é ainda mais importante dentro de tudo o que foi apresentado durante determinado período Também demonstra para o professor e a gestão quais são os pontos de sucesso do currículo pre visto o que funcionou e o que não funcionou De uma maneira geral e problemática no Brasil esse último passo do caminho tem invertido o processo colocando a avaliação como fomentadora do currículo prescrito Isso é destacado pelas avaliações externas que acabam por ditar o que se deve ensinar e em qual ano escolar por exemplo Fundamentos conceituais do currículo 10 Acesse o link a seguir para conferir uma entrevista da professora Gláudia Galin sobre a formação do currículo para a BNCC para a Faculdade de Educação da USP httpsqrgopagelinkwqWx6 Em resumo a escolha do currículo sempre silenciará algumas vozes es pecialmente as dos que detêm menos poder Sempre haverá além disso vozes distorcidas pois determinados valores e culturas são tratados de maneira equivocada na escola pela própria dificuldade de formação profissional e quebra de paradigmas que permitam validar o que é muito diferente do padrão imposto pela sociedade atual exemplos clássicos dizem respeito a moral e religião Por outro lado outros assuntos são supervalorizados do ponto de vista acadêmico ou então por interesses políticos e econômicos O resultado da escolha do que fará parte do currículo é sempre tenso visto que o espaço é limitado Os grupos que ficam de fora vão lutar para serem incluídos e quem está incluído se fortalecerá para não perder o espaço já conquistado Outros já contemplados requererão maior espaço ou destaque Assim o currículo é algo que nunca estará finalizado pronto pelo contrário está em movimento seguindo os diversos interesses sociais políticos e econômicos que cercam a escola É o que Galian 2016b chama de equilíbrio instável um documento que precisará ser revisto criticado e sempre ampliado para ser adaptado às necessidades de formação humana de cada época Esse é um processo natural visto que as escolhas de hoje podem não ser mais imprescindíveis daqui a um ou cinco anos por exemplo aulas de latim moral e cívica datilografia entre outras A conversa sobre currículo e política envolve formação de identidade não é neutra Assim embora não seja o ideal fazer escolhas que eliminam outras possibilidades é essa a única maneira de elaborálo 11 Fundamentos conceituais do currículo APPLE M Ideologia e currículo Porto Alegre Artmed 2016 BERNSTEIN B A estruturação do discurso pedagógico Petrópolis Vozes 1996 BRASIL Lei n 10639 de 9 de janeiro de 2003 Altera a Lei no 9394 de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e dá outras providências Brasília 2003 Disponível em httpwww planaltogovbrccivil03leis2003l10639htm Acesso em 23 jan 2020 BRASIL Lei n 9394 de 20 de dezembro de 1996 Estabelece as diretrizes e bases da edu cação nacional Brasília 1996 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03 leisl9394htm Acesso em 23 jan 2020 BRASIL Lei n 11645 de 10 março de 2008 Altera a Lei no 9394 de 20 de dezembro de 1996 modificada pela Lei no 10639 de 9 de janeiro de 2003 que estabelece as dire trizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e Indígena Brasília 2008 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03Ato200720102008Lei L11645htm Acesso em 23 jan 2020 GALIAN C V A A seleção do conhecimento em documentos curriculares ciências natu rais e arte Revista Brasileira de Educação v 21 n 67 outdez 2016b Disponível em http wwwscielobrscielophppidS141324782016000400989scriptsciabstracttlngpt Acesso em 23 jan 2020 GALIAN C V A Currículo e conhecimento escolar na perspectiva da educação integral Cadernos Cenpec v 6 n 1 janjun 2016a Disponível em httpcadernoscenpecorg brcadernosindexphpcadernosarticleview347 Acesso em 23 jan 2020 GIROUX H Os professores como intelectuais rumo a uma nova pedagogia crítica da aprendizagem Porto Alegre Artes Médicas 1997 SMOLKA A L B A criança na fase inicial da escrita São Paulo Cortez 2003 YOUNG M F D Teoria do currículo o que é e por que é importante Cadernos de Pesquisa v 44 n 151 mar 2014 Disponível em httpwwwscielobrscielophpscriptsci abstractpidS010015742014000100010lngennrmisotlngpt Acesso em 23 jan 2020 ZOTTI S A Currículo In GLOSSÁRIO HISTEDBR São Paulo UNICAMP 2006 Disponível em httpwwwhistedbrfeunicampbrnavegandoglossarioverbccurriculohtm Acesso em 23 jan 2020 Fundamentos conceituais do currículo 12 Os links para sites da Web fornecidos neste capítulo foram todos testados e seu fun cionamento foi comprovado no momento da publicação do material No entanto a rede é extremamente dinâmica suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo Assim os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade precisão ou integralidade das informações referidas em tais links Leituras recomendadas BOBBITT J F O currículo Lisboa Didática 2004 CONFERÊNCIA Nacional de Educação Prof Dermeval Saviani S l s n 2013 1 vídeo 20 min Publicado pelo canal BauruPHC Disponível em httpswwwyoutubecomwatch vVFb5E38gUl4 Acesso em 23 jan 2020 MELLO G N Currículo da educação básica no Brasil concepções e políticas São Paulo S n 2014 Disponível em httpmovimentopelabaseorgbrwpcontentuploads201509 guiomarpesquisapdf Acesso em 23 jan 2020 PROFª Drª Cláudia Galian S l s n 2016 1 vídeo 8 min Publicado pelo canal Comu nicação e Mídia FEUSP Disponível em httpswwwyoutubecomwatchtimeconti nue1vHT7DZrLKsLQfeatureemblogo Acesso em 23 jan 2020 SACRISTAN J Gimeno Saberes e incertezas sobre o currículo O que significa o currículo da página 17 até 37 Disponível em httpsintegradaminhabibliotecacombrsearch qSaberes20e20Incertezas20do20currC3ADculoredirectOnClose Acesso em 30092021 13 Fundamentos conceituais do currículo
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TEORIAS DO CURRICULO Eliane de Godoi Teixeira Fernandes Fundamentos conceituais do currículo Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto você deve apresentar os seguintes aprendizados Identificar os conceitos e as dimensões que regulam o currículo Reconhecer os elementos e fenômenos da construção curricular Analisar os pressupostos nos quais se baseiam a organização curricular Introdução No âmbito macroeducacional o currículo se refere às diretrizes do Estado para o sistema educacional público e privado Essas diretrizes são organi zadas por meio de leis que procuram observar o que já foi realizado na educação brasileira e mundial para conciliar o passado com as expectati vas de formação para as novas gerações No âmbito microeducacional o currículo procura adaptar as diretrizes exigidas pela União pelos estados e municípios aos anseios da comunidade da qual faz parte Dessa forma o currículo se ocupa do futuro atuando no tempo presente com o co nhecimento que adquiriu no passado Neste capítulo você vai analisar as características os conceitos e dimen sões que compõem e regulam o currículo Diferente do documento curri culum vitae utilizado no campo de recrutamento e seleção com a trajetória educacional as experiências profissionais mais relevantes as habilidades e competências de cada candidato a determinado trabalho no campo edu cacional o currículo combina análise do passado e aspirações para o futuro 1 Currículo conceitos e origem De acordo com o glossário da Revista História Sociedade e Educação no Brasil da Faculdade de Educação da UNICAMP currículo foi con ceituado como documento norteador do processo de ensino e de apren dizagem ou plano estruturado de estudos pela primeira vez em 1633 no Oxford English Dictionary ZOTTI 2006 Entretanto foi apenas em 1918 com a publicação da obra The Curriculum de Frankin Bobbitt nos Estados Unidos que o currículo se firmou como campo de reflexão e de estudos ZOTTI 2006 Ao longo do tempo o termo currículo passou a designar diferentes etapas no processo de escolarização incluindo uma relação de matériasdisciplinas com seu corpo de conhecimento organizado numa sequência lógica com o respectivo tempo de cada uma grade ou matriz curricular ZOTTI 2006 documento online as diretrizes explicitadas nas leis federais estaduais e municipais que regulam a área educacional e até mesmo as relações interpes soais que acontecem na sala de aula e que não são previstas Veja na Figura 1 algumas possibilidades de conceituar currículo Figura 1 Possibilidades de conceituação de currículo Fonte Adaptada de Zotti 2006 Outra maneira de pensar o currículo é colocar tudo o que acontece na escola como parte integrante de sua estrutura assuntos aulas relacionamentos situações A complexidade do currículo está em relacionar todas essas esferas visto que quando apenas uma está em foco perdese a visão sistêmica do todo Assim currículo é uma série de ações de diferentes agentes O conceito de currículo é multifacetado e modificouse historicamente atendendo a realidades sociais distintas há tempos e espaços específicos e em consequência disso precisa ser compreendido no contexto social em que está inserido ZOTTI 2006 documento online Fundamentos conceituais do currículo 2 O pontochave para entender o currículo está na resposta a duas questões específicas Qual é a função específica da escola Quais habilidades e competências humanas poderão ser desenvolvidas a partir da escolarização O que ensinar a quem É consenso entre educadores e a população leiga que uma das funções pri mordiais da escola é formar o cidadão para a atuação social Entretanto qual é o tipo de atuação que se espera Esse questionamento deve seguir o mesmo caminho lógico da questão anteriormente apresentada sobre qual é a função da escola A partir da resposta a essas questões podemos escolher qual currículo será mais representativo para nossas expectativas Enquanto instituição que promove o aprendizado sobre o conhecimento humano acumulado com vistas ao desenvolvimento a escola tem por obrigação promover o acesso a certos conhecimentos que para a maioria das pessoas não são acessíveis em outro lugar que não a escola O conhecimento mais valioso é por conseguinte aquele que extrapola o senso comum ou seja o pensamento científico que capacita o ser humano a ver a sua realidade de maneira diferente e a agir de maneira a buscar uma maior qualidade de vida para si e para a comunidade Segundo Galian 2016b o conhecimento capacita o ser humano a olhar para o mundo de outro ponto de vista diferente daquele que já tem no seu dia a dia Portanto os conhecimentos oferecidos pela escola devem servir para que os estudantes possam estranhar o mundo cotidiano de maneira a se sentirem potentes para investigálo e agir sobre ele melhorandoo A escola deve ensinar que o mundo está como está porque foi organizado assim de maneira desigual e injusta mas que há outras possibilidades A naturalização do status quo social fixa a ideia de que o mundo é assim porque não é possível ser de outra forma 3 Fundamentos conceituais do currículo Entretanto não é possível ensinar todos os conhecimentos na escola seja pela falta de tempo de recursos ou até mesmo pelo pouco valor de determi nados assuntos para o desenvolvimento humano Assim sempre será preciso fazer uma seleção de conhecimentos uma escolha sobre o que vai compor o currículo escolar Galian 2016a ressalta que essa escolha não acontece pelo valor intrínseco do conhecimento mas pelos interesses que acompanham cada assunto Para determinado público podese escolher conhecimentos que tendem a limitar o horizonte de possibilidades dessas pessoas àquilo que elas já têm no dia a dia ou seja vão inserirse no trabalho mais próximo e viver no ambiente já conhecido Para outros podese escolher um currículo com um horizonte bem mais amplo de possibilidades o que acontece justamente porque não vivemos em uma sociedade justa e isso se reflete na problematização da escolha dos currículos para cada classe social GALIAN 2016a Determinados conhecimentos entram no currículo escolar depois de muita mobi lização social como no caso de leis que modificam a Lei de Diretrizes e Bases da Educação tornando obrigatório o ensino de determinados conteúdos que antes não eram contemplados É o caso da Lei nº 10639 de 2003 que torna obrigatório o estudo da História da África e dos Africanos a luta dos negros no Brasil a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social econômica e política pertinentes à História do Brasil BRASIL 2003 documento online e da Lei nº 11645 de 2008 que torna obrigatório o estudo da história e cultura afrobrasileira e indígena BRASIL 2008 Entretanto conseguir colocar na Lei de Diretrizes e Bases da Educação LDB 939496 a exigência para que esses assuntos apareçam no currículo de todas as escolas ainda não significa que eles de fato aparecerão no cotidiano escolar O movimento entre a entrada do currículo na legislação e a concretização na prática educacional passa pela adequação dos cursos de formação inicial e continuada de professor pela compreensão e quebra de preconceitos pela adequação do tempo e grade curricular e depois pela real prática na sala de aula Embora o caminho seja longo é de suma importância que esses assuntos constem na legislação pois sem isso não conseguirão entrar no material didático livros e apostilas e na sala de aula Fundamentos conceituais do currículo 4 As teorias críticas do currículo mostram que especialmente a escola ofere cida para aqueles menos favorecidos que não têm outra maneira ou outro local para adquirir esses conhecimentos tende a ser menos rica em conhecimentos ou a simplificar os assuntos de maneira regular Ora se a escola e o currículo mostrarem apenas o que os estudantes já conhecem em seu dia a dia ou tentarem construir um currículo que apenas os agrade pouca transformação cognitiva poderá ser adquirida e os estudantes sairão da escola com um repertório muito parecido com o que já tinham antes de entrar Enquanto isso outra camada da população tem acesso a um conhecimento diferenciado que permite que eles olhem o mundo de outra forma e possam agir de outra maneira É justamente essa dinâmica que faz com que cada indivíduo e sua classe social fique onde está permanecendo na posição em que se encontra A Lei de Diretrizes e Bases da Educação LDB 939496 traz explícito em seu Título II BRASIL 1996 documento online TÍTULO II Dos Princípios e Fins da Educação Nacional Art 2º A educação dever da família e do Estado inspirada nos prin cípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho Art 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios I igualdade de condições para o acesso e permanência na escola II liberdade de aprender ensinar pesquisar e divulgar a cultura o pensamento a arte e o saber III pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas IV respeito à liberdade e apreço à tolerância V coexistência de instituições públicas e privadas de ensino VI gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais VII valorização do profissional da educação escolar VIII gestão democrática do ensino público na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino IX garantia de padrão de qualidade X valorização da experiência extraescolar XI vinculação entre a educação escolar o trabalho e as práticas sociais XII consideração com a diversidade étnicoracial XIII garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida 5 Fundamentos conceituais do currículo A partir disso alguns questionamentos sobre o currículo podem ser feitos Como selecionar o que há de essencial em cada disciplina para que o estudante entenda esse mundo em que vive Como cada conteúdo poderá se articular aos princípios e fins da edu cação nacional presentes no texto da LDB O que é necessário para entender que o mundo é uma construção e está como está por uma convenção O que se deve fazer para mostrar que há outras possibilidades de or ganização social e capacitar os estudantes na promoção de mudanças necessárias 2 Fenômenos e elementos da construção curricular A educação é uma atividade intencional cujo objetivo é o desenvolvimento de determinadas habilidades e competências humanas que são apreciadas e necessárias para a vida em sociedade Você já pensou quais são os conhecimentos que auxiliam a escola a concretizar sua intenção segundo o Estado a gestão e os professores De acordo com Zotti 2006 os estudos sobre o currículo têm seu cerne na análise dos conflitos socioeconômicos advindos dos processos de industrialização e urbanização dos Estados Unidos e da Inglaterra Essas situações marcam a necessidade de escolarização em massa das camadas menos favorecidas da população para formar mão de obra especializada para as indústrias em ascensão nos séculos XVIII e XIX A mencionada obra de Bobbitt espelha o desejo de racionalização técnica e instrumental desejado pela economia ao propor um currículo metodicamente organizado medido controlado e avaliado No Brasil essa cultura curricular ficou conhecida como tecnicismo e se manteve nas décadas de 1960 e 1970 como uma renovação do pensamento escolanovista anterior Se percorrermos historicamente a teoria curricular podemos analisar o currículo escolar a partir de dois grandes eixos as concepções tradicionais ou conserva doras e as concepções críticas Com origem nos Estados Unidos tanto as visões conservadoras como as críticas influenciaram sobremaneira o campo no Brasil De plano de estudos o conceito evolui para a visão de currículo como a totalidade de experiências vivenciadas pela criança sob a orientação da escola levando em conta e valorizando os interesses do aluno Seus representantes Dewey e Kilpa trick contribuíram para o desenvolvimento das teorias progressivistas As teorias Fundamentos conceituais do currículo 6 progressivistas começaram a se delinear a partir do século XVIII e se constituíram como tentativa de buscar respostas aos problemas socioeconômicos advindos dos processos de urbanização e industrialização ocorridos nos Estados Unidos no final do século XIX e início do século XX ZOTTI 2006 documento online Ambas tradicionais a visão escolanovista e a tecnicista tinham o mesmo objetivo de adaptar a escola e o currículo à ordem capitalista com base nos princípios de ordem racionalidade e eficiência utilizando conceitos tanto em presarias quanto do campo da psicologia ZOTTI 2006 documento online Somente a partir da década de 1960 as análises sobre a relação entre escola e sociedade começaram a se desenvolver na Inglaterra e nos Estados Unidos gerando as teorias críticas do currículo A partir delas as relações entre o que se ensina e como se ensina e suas repercussões nas desigualdades sociais começaram a ser questionadas O currículo visto como uma lista de conteúdos neutros perdeu sua imparcialidade deixando transparecer que a escolha por determinados temas e métodos refletia na estratificação de classes econômicas e sociais Chamado de sociologia do currículo esse campo do saber têm como re presentantes mais conhecidos Michel Apple 2016 Henry Giroux 1997 Michael Young 2014 e Basil Bernstein 1996 que vão analisar o currículo como forma de imposição cultural e opressão de uma classe sobre outra a fim de manterse no poder No link a seguir você confere uma conferência na cidade de Bauru São Paulo em 2013 na qual o professor Saviani fala sobre o sistema de ensino no Brasil desde a colonização A linha histórica escolhida relaciona intencionalidade política e econômica com as mudanças propostas para a educação nacional httpsqrgopagelinkmDVNB Outra ressalva é que se antes a escola servia para a formação do clero e das classes abastadas que possuíam cultura clássica e comportamento comedido ao receber os novos alunos a expectativa da escola não se alterou Dessa forma os novos alunos que não tinham os mesmos conhecimentos culturais e atitudinais esperados começaram a fracassar na escola De acordo com Smolka 2003 a partir da década das décadas de 1970 e 1980 começam a ser publicadas pelo mundo todo pesquisas que tratam do 7 Fundamentos conceituais do currículo tema do fracasso escolar como as de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky 1984 na Argentina e no México Clay 197275 na Austrália Foucambert 1978 e Lentin 1979 na França Scribner e Cole 1981 na Libéria Read 1978 nos EUA Leite 1980 Cagliari 1989 e Capovilla 1997 no Brasil entre outros Esses estudos também exerceram forte impacto nos debates sobre o currículo pois modificaram a maneira como os processos de ensino e de aprendizagem se desenvolvem e destacaram suas variáveis mais importantes No Brasil o destaque às pesquisas de Emília Ferreiro e Ana Teberosky Psicogênese da língua escrita culminou na prescrição desses estudos como diretrizes em documentos oficiais nas ementas dos cursos de formação e capacitação docente bem como no método de alfabetização adotado nas escolas públicas brasileiras SMOLKA 2003 Outros estudiosos se dedicaram a pesquisar o currículo e a sociologia do currículo confirmando a relação estreita entre escola currículo e expectativas do sistema capitalista O conceito de currículo é multifacetado e modificouse historicamente atendendo a realidades sociais distintas há tempos e espaços específicos e em consequência disso precisa ser compreendido no contexto social em que está inserido ZOTTI 2006 documento online No link a seguir você confere um artigo de Guiomar Namo de Mello que trata das teorias do currículo especialmente no Brasil de maneira simples e objetiva httpsqrgopagelink3nCQU 3 Organização curricular O currículo está disseminado em várias dimensões do processo escolar En quanto documento formal é apenas parte do que podemos chamar de diretrizes Fundamentos conceituais do currículo 8 curriculares É um norteador que se refere a princípios e metas visto que se encontra fora da realidade concreta das escolas Entretanto é a partir desse conjunto de princípios que a realidade na sala de aula se concretiza Para ser utilizado na escola o currículo formal deverá e será transformado em livros didáticos e apostilas em interpretações e adaptações que a escola faz da sua realidade em práticas que os professores oferecerão em sala de aula diante das reais necessidades e expectativas de seus alunos Por isso o currículo precisa ser entendido como um documento adaptável flexível e elaborado por professores estudantes e governantes O ponto de destaque do documento formal está nas escolhas feitas para a escola brasileira e o plano formativo da população que explicita os conhe cimentos essenciais que deverão ser apresentados e ensinados para as novas gerações a fim de capacitálas para viver em sociedade Historicamente os professores não fazem parte da construção do currí culo apenas o recebem e devem seguilo executálo Assim podem pensar apenas em método não em conteúdo de modo que não há espaço e tempo para questionar por que se ensina o que se ensina Para favorecer a compreensão sobre a organização complexa que envolve o currículo vamos utilizar a classificação de Galian 2016b disposta na Figura 2 a seguir Figura 2 Currículo em processo Fonte Adaptada de Galian 2016a 9 Fundamentos conceituais do currículo Currículo prescrito formal é concebido muito antes de chegar ao nível estadual e municipal Historicamente os professores não fazem parte da construção desse currículo eles apenas o recebem e devem executálo No início os debates para elaboração da BNCC contaram com a participação docente mas após algum tempo essa possibilidade de participação foi cerceada Currículo planejado transformação das diretrizes legais em materiais para uso por professores e alunos como guias curriculares livros didáticos e apostilas Entretanto é comum que a hierarquia se inverta e que os livros didáticos passem a ser utilizados na escola como o currículo a ser seguido Outro ponto controverso é a existência de materiais diferenciados oferecidos pela mesma editora à rede pública e à rede privada de ensino Para baratear a produção do material para a esfera pública a mesma editora e os mesmos autores pode simplificar textos omitir figuras ou diminuir sua qualidade gráfica fazendo com que prevaleça a metodologia de memorização Currículo organizado referese à organização de tempos espaços e agrupamentos para efetivar o currículo planejado dentro da escola Mostra a hierarquia entre as disciplinas e os professores de acordo com a organização do currículo Historicamente por exemplo artes e educação física não têm o mesmo status que português e matemática Salas que agrupam alunos com maior dificuldade também tendem a marcar uma expectativa de aprendiza gem diferenciada em comparação aos agrupamentos de melhores alunos Currículo em ação encontro efetivo entre professoralunoconheci mento Nesse currículo o professor tem mais autonomia de ação pode escolher se vai usar todo o livro didático se vai inverter alguma ordem de apresentação se vai utilizar fontes diversificadas etc Currículo avaliado dimensão da avaliação na qual fica explícito para o aluno o que é ainda mais importante dentro de tudo o que foi apresentado durante determinado período Também demonstra para o professor e a gestão quais são os pontos de sucesso do currículo pre visto o que funcionou e o que não funcionou De uma maneira geral e problemática no Brasil esse último passo do caminho tem invertido o processo colocando a avaliação como fomentadora do currículo prescrito Isso é destacado pelas avaliações externas que acabam por ditar o que se deve ensinar e em qual ano escolar por exemplo Fundamentos conceituais do currículo 10 Acesse o link a seguir para conferir uma entrevista da professora Gláudia Galin sobre a formação do currículo para a BNCC para a Faculdade de Educação da USP httpsqrgopagelinkwqWx6 Em resumo a escolha do currículo sempre silenciará algumas vozes es pecialmente as dos que detêm menos poder Sempre haverá além disso vozes distorcidas pois determinados valores e culturas são tratados de maneira equivocada na escola pela própria dificuldade de formação profissional e quebra de paradigmas que permitam validar o que é muito diferente do padrão imposto pela sociedade atual exemplos clássicos dizem respeito a moral e religião Por outro lado outros assuntos são supervalorizados do ponto de vista acadêmico ou então por interesses políticos e econômicos O resultado da escolha do que fará parte do currículo é sempre tenso visto que o espaço é limitado Os grupos que ficam de fora vão lutar para serem incluídos e quem está incluído se fortalecerá para não perder o espaço já conquistado Outros já contemplados requererão maior espaço ou destaque Assim o currículo é algo que nunca estará finalizado pronto pelo contrário está em movimento seguindo os diversos interesses sociais políticos e econômicos que cercam a escola É o que Galian 2016b chama de equilíbrio instável um documento que precisará ser revisto criticado e sempre ampliado para ser adaptado às necessidades de formação humana de cada época Esse é um processo natural visto que as escolhas de hoje podem não ser mais imprescindíveis daqui a um ou cinco anos por exemplo aulas de latim moral e cívica datilografia entre outras A conversa sobre currículo e política envolve formação de identidade não é neutra Assim embora não seja o ideal fazer escolhas que eliminam outras possibilidades é essa a única maneira de elaborálo 11 Fundamentos conceituais do currículo APPLE M Ideologia e currículo Porto Alegre Artmed 2016 BERNSTEIN B A estruturação do discurso pedagógico Petrópolis Vozes 1996 BRASIL Lei n 10639 de 9 de janeiro de 2003 Altera a Lei no 9394 de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e dá outras providências Brasília 2003 Disponível em httpwww planaltogovbrccivil03leis2003l10639htm Acesso em 23 jan 2020 BRASIL Lei n 9394 de 20 de dezembro de 1996 Estabelece as diretrizes e bases da edu cação nacional Brasília 1996 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03 leisl9394htm Acesso em 23 jan 2020 BRASIL Lei n 11645 de 10 março de 2008 Altera a Lei no 9394 de 20 de dezembro de 1996 modificada pela Lei no 10639 de 9 de janeiro de 2003 que estabelece as dire trizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e Indígena Brasília 2008 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03Ato200720102008Lei L11645htm Acesso em 23 jan 2020 GALIAN C V A A seleção do conhecimento em documentos curriculares ciências natu rais e arte Revista Brasileira de Educação v 21 n 67 outdez 2016b Disponível em http wwwscielobrscielophppidS141324782016000400989scriptsciabstracttlngpt Acesso em 23 jan 2020 GALIAN C V A Currículo e conhecimento escolar na perspectiva da educação integral Cadernos Cenpec v 6 n 1 janjun 2016a Disponível em httpcadernoscenpecorg brcadernosindexphpcadernosarticleview347 Acesso em 23 jan 2020 GIROUX H Os professores como intelectuais rumo a uma nova pedagogia crítica da aprendizagem Porto Alegre Artes Médicas 1997 SMOLKA A L B A criança na fase inicial da escrita São Paulo Cortez 2003 YOUNG M F D Teoria do currículo o que é e por que é importante Cadernos de Pesquisa v 44 n 151 mar 2014 Disponível em httpwwwscielobrscielophpscriptsci abstractpidS010015742014000100010lngennrmisotlngpt Acesso em 23 jan 2020 ZOTTI S A Currículo In GLOSSÁRIO HISTEDBR São Paulo UNICAMP 2006 Disponível em httpwwwhistedbrfeunicampbrnavegandoglossarioverbccurriculohtm Acesso em 23 jan 2020 Fundamentos conceituais do currículo 12 Os links para sites da Web fornecidos neste capítulo foram todos testados e seu fun cionamento foi comprovado no momento da publicação do material No entanto a rede é extremamente dinâmica suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo Assim os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade precisão ou integralidade das informações referidas em tais links Leituras recomendadas BOBBITT J F O currículo Lisboa Didática 2004 CONFERÊNCIA Nacional de Educação Prof Dermeval Saviani S l s n 2013 1 vídeo 20 min Publicado pelo canal BauruPHC Disponível em httpswwwyoutubecomwatch vVFb5E38gUl4 Acesso em 23 jan 2020 MELLO G N Currículo da educação básica no Brasil concepções e políticas São Paulo S n 2014 Disponível em httpmovimentopelabaseorgbrwpcontentuploads201509 guiomarpesquisapdf Acesso em 23 jan 2020 PROFª Drª Cláudia Galian S l s n 2016 1 vídeo 8 min Publicado pelo canal Comu nicação e Mídia FEUSP Disponível em httpswwwyoutubecomwatchtimeconti nue1vHT7DZrLKsLQfeatureemblogo Acesso em 23 jan 2020 SACRISTAN J Gimeno Saberes e incertezas sobre o currículo O que significa o currículo da página 17 até 37 Disponível em httpsintegradaminhabibliotecacombrsearch qSaberes20e20Incertezas20do20currC3ADculoredirectOnClose Acesso em 30092021 13 Fundamentos conceituais do currículo