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J Pneumol 252 marabr de 1999 III A ética da pesquisa em seres humanos e a publicação de artigos científicos A ética da pesquisa em seres humanos e a publicação de artigos científicos TRAJANO SARDENBERG1 EDITORIAL O avanço da medicina rumo à determinação de novos tra tamentos clínicos e cirúrgicos e novos métodos de diagnósti cos envolve a experimentação em seres humanos A experi mentação em animais não humanos os modernos modelos matemáticos e estatísticos e o uso intensivo da informática não conseguiram excluir a fase final de experimentar em se res humanos O rigor científico refletido no rigoroso delineamento da pesquisa há que ser obedecido em qualquer tipo de experi mento Modelos matemáticos para determinação do número de amostra randomização uso de placebo washout du plocego tempo de seguimento e etc são aspectos rotinei ramente aplicados e avaliados nos experimentos em seres humanos O uso de seres humanos em experimentos científicos traz inegáveis benefícios para a sociedade No entanto há sem pre o conflito entre o indivíduo submetido à experimentação e a ciência1 A ciência não está isolada da sociedade e portanto sofre influências políticas econômicas ideológicas étnicas e etc Os experimentos conduzidos por médicos alemães durante o regime nazista em prisioneiros raciais políticos e militares é o maior exemplo do século XX em que a balança pendeu radicalmente para o interesse da sociedade em detrimento dos interesses do indivíduo Devemos sempre lembrar que o objetivo da pesquisa é melhorar a saúde e o bemestar dos pacientes e nunca cau sar danos ou submetêlos a graves riscos para obter esses objetivos2 Apesar da regulamentação institucional da pesquisa em seres humanos no ano de 1900 na antiga Prússia3 o pri meiro documento internacional sobre esse tema é o Código de Nuremberg4 editado pelo Tribunal de Nuremberg em 1947 no qual constam 10 itens com recomendações que os médicos devem seguir nos experimentos em seres humanos 1 Professor Assistente do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu UNESP Presidente da Co missão de Ética Médica da FMB UNESP Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da FMB UNESP Endereço para correspondência Trajano Sardenberg Departamen to de Cirurgia e Ortopedia Faculdade de Medicina de Botucatu UNESP 18618970 Botucatu SP Fax 014 8214615 email tsardenfmbunespbr O primeiro tópico explicita o consentimento voluntário dos sujeitos humanos é absolutamente necessário Em 1964 a Assembléia Médica Mundial aprovou a Decla ração de Helsinque cuja última edição foi aprovada na 48ª Assembléia Geral na República da África do Sul em 19965 Em nosso país em 1996 o Conselho Nacional de Saúde aprovou a Resolução 196966 que regulamenta a pesquisa em seres humanos no Brasil Referendada em vários docu mentos nacionais e internacionais inclusive a Declaração de Helsinque a Resolução 19696 incorporou vários conceitos da bioética e reafirmou o consentimento livre e esclarecido dos indivíduos para participarem de pesquisas científicas e a aprovação prévia dos protocolos por comitê independente Apesar de haver vários elos de ligação entre os aspectos científicos e os aspectos éticos da pesquisa clínica como por exemplo em estudos com número de amostra e randomiza ção inadequados haverá a participação de seres humanos em experimentos cujos resultados não terão validade científi ca os aspectos especificamente relacionados à ética da pes quisa em seres humanos são muitas vezes colocados em segundo plano durante o delineamento e execução do es tudo Alguns pesquisadores reconhecem a importância dos as pectos éticos na pesquisa porém manifestam preocupações com a institucionalização do estabelecimento de regras nes sa área argumentando que se trata de mais uma tentativa de controlar e reprimir os pesquisadores além de ser imposição do governo e que reprime a criatividade dos pesquisadores No entanto estas regulamentações não foram impostas por governos mas sim elaboradas principalmente por médicos pesquisadores para proteger os pacientes e garantir a quali dade das pesquisas2 A política editorial de parte de nossas revistas científicas reflete a primazia da técnica em relação à ética na pesquisa clínica Em estudo realizado por nós7 observamos que em 139 periódicos brasileiros aproximadamente 80 não fa zem qualquer referência a aspectos éticos nas suas instru ções aos autores O Jornal de Pneumologia solicita nas Ins truções Redatoriais que Sempre que pertinente declarar no texto que o trabalho foi aprovado pela Comissão de Ética do Hospital As orientações do Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas expressas nos Requisitos Uniformes para Manuscritos Submetidos a Revistas Biomédicas8 são con Sardenberg T IV J Pneumol 252 marabr de 1999 sideradas frágeis9 ao afirmarem explicitamente ao relatar experimentos com seres humanos indique se os procedi mentos foram realizados de acordo com os padrões éticos do comitê responsável por experimentação humana e com a Declaração de Helsinque de 1975 tal como revista em 1983 A publicação ou não de artigos considerados eticamente inadequados é polêmica antiga no meio científico editorial Um dos aspectos levantados seria que ao não publicar arti gos eticamente questionáveis estarseia criando a falsa im pressão de que estudos não éticos não estariam sendo reali zados A alternativa seria publicar em caráter excepcional o artigo não ético porém com relevância científica junto com editorial crítico10 Por outro lado ao ferir frontalmente um dos princípios da Declaração de Helsinque resultados de pesquisa realizadas em desacordo com os princípios da De claração não devem ser publicados essa postura encontra adversários importantes como por exemplo os editores do Journal of the American Medical Association9 e do Jour nal of Bone and Joint Surgery11 Beecher12 professor de Pesquisa em Anestesia na Escola Médica de Harvard expri me opinião de que artigos não éticos não devem ser publica dos o que seria fator desencorajante para a realização des ses experimentos e afirma ainda que a publicação de artigo não ético junto com editorial crítico teria que ser feito com excepcional habilidade para evitar o odor da hipocrisia O estabelecimento de orientações éticas precisas e claras acoplado à exigência de que os autores dos artigos infor mem os procedimentos éticos adotados no desenvolvimento da pesquisa principalmente a obtenção do consentimento esclarecido e a aprovação por comitê independente signifi caria que a revista científica privilegia os pesquisadores pre ocupados com a ciência e a ética9 A luz da ética iluminando o caminho da ciência é o ideal que devemos almejar ativamente Portanto a busca desse ideal deve ser realizada com a participação efetiva de todos os parceiros da ciência entre eles os pesquisadores agên cias financiadoras editores e leitores das revistas científicas As revistas científicas podem e devem colaborar nessa ta refa estabelecendo recomendações éticas mais amplas e detalhadas a serem seguidas pelos pesquisadores que pre tendam publicar os resultados de seus estudos Algumas sugestões práticas baseadas nas recomendações de Rennie e Yank9 e de Amdur e Biddle13 poderiam ser adotadas pelos editores 1 As orientações éticas contidas nas Instruções aos Au tores de revistas devem ser mais amplas e claras do que as observadas atualmente 2 As revistas devem citar explicitamente a Declaração de Helsinque e a Resolução 19696 do Conselho Nacional de Saúde como referências para orientação aos pesquisadores 3 As revistas devem publicar a Declaração de Helsinque preferencialmente versão em português da última edição o Conselho Federal de Medicina poderia patrocinar a tradução oficial desse documento internacional e a Resolução 196 96 do Conselho Nacional de Saúde 4 Os pesquisadores devem seguir durante a elaboração e execução de seus estudos clínicos a Declaração de Helsin que e a Resolução 19696 5 As revistas devem exigir que no texto dos artigos publi cados na parte de Métodos os autores informem sobre o consentimento esclarecido e a aprovação prévia do protoco lo por comitê de ética 6 Na análise dos artigos enviados para publicação os editores devem solicitar quando necessário informações adicionais sobre os aspectos éticos da pesquisa REFERÊNCIAS 1 Vieira S Hossne WS Um pouco de história In Experimentação com seres humanos 1ª ed São Paulo Editora Moderna 1987929 2 Sussman MD Ethical standards in the treatment of human subjects involved in clinical research editorial J Pediatr Orthop 199818701 702 3 Vollmann J Winau R Informed consent in human experimentation before the Nuremberg code BMJ 199631314451447 4 The Nuremberg Code 1947 BMJ 19963131448 5 World Medical Association Declaration of Helsinki JAMA 1997 277925926 6 Conselho Nacional de Saúde Ministério da Saúde Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos Resolução 196 1996 7 Sardenberg T Müller SS Pereira HR Oliveira RA Hossne WS Análise dos aspectos éticos da pesquisa em seres humanos contidos nas ins truções aos autores de 139 revistas científicas brasileiras Rev Assoc Med Bras 1999 no prelo 8 Internacional Committee of Medical Journals Editors Uniforms re queriments for manuscripts submitted to biomedical journals J Pneumol 199723XXVXXXIV 9 Rennie D Yank V Disclosure to the reader of institutional review board approval and informed consent editorial JAMA 1997277922923 10 Nilstun T Rastam J Ethics in orthopedic research editorial Acta Orthop Scand 199768205206 11 Einhorn TA Burstein AH Cowell HR Human experimentation edi torial J Bone Joint Surg Am 199779959960 12 Beecher HK Ethics and clinical research N Engl J Med 1966274 13541360 13 Amdur RJ Biddle C Institutional review board approval and publica tion of human research results JAMA 1997277909914 O desenvolvimento da medicina depende em grande medida da realização de experimentos em seres humanos Apesar dos esforços para desenvolver modelos substitutos essa fase é indispensável para validar novos tratamentos e diagnósticos Pinto 2020 Os benefícios que essa prática traz para a sociedade geram também um considerável conflito ético que existe entre os interesses de cada um dos sujeitos e os objetivos da ciência Castilho e Kalil 2005 Trajano Sardenberg no seu artigo assinala eventos do passado como os experimentos realizados durante o regime nazista que retratam dramaticamente a necessidade inadiável de proteger os direitos dos sujeitos das pesquisas e de respeitar a dignidade do homem Muniz 2018 Para assegurar essa proteção a ética em pesquisa na espécie humana foi internacionalmente regulamentada inicialmente através do Código de Nuremberg em 1947 e posteriormente pela Declaração de Helsinque em 1964 além das normativas nacionais como Resolução 19696 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil Esses documentos estabelecem alguns princípios fundamentais como o consentimento informado e a aprovação prévia dos protocolos pelos comitês independentes de ética Morais et al 2023 Contudo apesar da existência de normativas Sardenberg critica o descaso comumente encontrado com relação aos aspectos éticos nos estudos científicos que se traduz também pelo fato de cerca de 80 dos periódicos brasileiros não exigirem dos autores que esclareçam as questões éticas em suas submissões TavaresNeto e Azevêdo 2009 Ainda o autor discute a polêmica sobre a edição de artigos que trazem estudos eticamente duvidosos Enquanto alguns alegam que essas edições podem alertar a comunidade científica acerca de práticas inadequadas outros afirmam que a edição pode acidentalmente validar estudos que violam princípios éticos basilares De acordo com Muniz 2018 para superar esta situação Sardenberg sugere que as revistas científicas aprimorem suas diretrizes em relação aos requisitos éticos exigindo maior transparência sobre a obtenção do consentimento informado e sobre a aprovação pelos comitês de ética promovendo uma ciência que combine rigor técnico e responsabilidade ética Morais et al 2023 Soares e Corrêa 2010 O texto de Sardenberg portanto expõe a complexidade e as dificuldades da experimentação em humanos claramente indicando a procura de um equilíbrio adequado entre o progresso científico e a salvaguarda dos direitos individuais Ele diz que a ética não deverá ser vista como um obstáculo à criatividade ou à inovação mas é uma parte essencial para que haja qualidade e legitimidade na pesquisa em biomedicina Soares e Corrêa 2010 Com isso o autor convoca todos os envolvidos no processo científico a se unirem para lutar pela moral na ciência pessoal Morais et al 2023 O legado de Trajano Sardenberg é um valioso alerta à comunidade científica sobre a necessidade de um intenso controle da ética na pesquisa a fim de que possam ser evitados abusos conservada a credibilidade pública e garantidos os avanços médicos em conformidade com os valores basilares da dignidade e dignidade humana Morais et al 2023 REFERÊNCIAS DE CASTILHO Euclides Ayres KALIL Jorge Ethics and medical research principles guidelines and regulations Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical v 38 n 4 2005 DE MORAIS Beatriz Guerra et al FORMULAÇÃO DE UM CÓDIGO DE ÉTICA PARA UMA EMPRESA DO SETOR DA CONSTRUÇÃO CIVIL NO MUNICÍPIO DE FAINAGO RECIMA21Revista Científica MultidisciplinarISSN 26756218 v 4 n 12 p e4124569e4124569 2023 MUNIZ Monalisa Ética na avaliação psicológica velhas questões novas reflexões Psicologia Ciência e Profissão v 38 p 133146 2018 OLEVATE Izulpério Cardoso PINTO Marcus Vinicius De Mello ROCHA Lamara Laguardia Valente O uso dos seres humanos em pesquisa científica na área da saúde diretrizes e procedimentos éticos Enfermagem Brasil v 10 n 2 2011 SOARES Jaqueline Mendes CORREA Marilena Cordeiro Dias Villela Como pesquisar o perfil patentário de um fármaco o caso Efavirenz Química Nova v 33 p 12161219 2010 TAVARESNETO José AZEVÊDO Eliane S Ethics relevance in Brazilian medical journals Revista da Associação Médica Brasileira v 55 p 400404 2009 O desenvolvimento da medicina depende em grande medida da realização de experimentos em seres humanos Apesar dos esforços para desenvolver modelos substitutos essa fase é indispensável para validar novos tratamentos e diagnósticos Pinto 2020 Os benefícios que essa prática traz para a sociedade geram também um considerável conflito ético que existe entre os interesses de cada um dos sujeitos e os objetivos da ciência Castilho e Kalil 2005 Trajano Sardenberg no seu artigo assinala eventos do passado como os experimentos realizados durante o regime nazista que retratam dramaticamente a necessidade inadiável de proteger os direitos dos sujeitos das pesquisas e de respeitar a dignidade do homem Muniz 2018 Para assegurar essa proteção a ética em pesquisa na espécie humana foi internacionalmente regulamentada inicialmente através do Código de Nuremberg em 1947 e posteriormente pela Declaração de Helsinque em 1964 além das normativas nacionais como Resolução 19696 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil Esses documentos estabelecem alguns princípios fundamentais como o consentimento informado e a aprovação prévia dos protocolos pelos comitês independentes de ética Morais et al 2023 Contudo apesar da existência de normativas Sardenberg critica o descaso comumente encontrado com relação aos aspectos éticos nos estudos científicos que se traduz também pelo fato de cerca de 80 dos periódicos brasileiros não exigirem dos autores que esclareçam as questões éticas em suas submissões TavaresNeto e Azevêdo 2009 Ainda o autor discute a polêmica sobre a edição de artigos que trazem estudos eticamente duvidosos Enquanto alguns alegam que essas edições podem alertar a comunidade científica acerca de práticas inadequadas outros afirmam que a edição pode acidentalmente validar estudos que violam princípios éticos basilares De acordo com Muniz 2018 para superar esta situação Sardenberg sugere que as revistas científicas aprimorem suas diretrizes em relação aos requisitos éticos exigindo maior transparência sobre a obtenção do consentimento informado e sobre a aprovação pelos comitês de ética promovendo uma ciência que combine rigor técnico e responsabilidade ética Morais et al 2023 Soares e Corrêa 2010 O texto de Sardenberg portanto expõe a complexidade e as dificuldades da experimentação em humanos claramente indicando a procura de um equilíbrio adequado entre o progresso científico e a salvaguarda dos direitos individuais Ele diz que a ética não deverá ser vista como um obstáculo à criatividade ou à inovação mas é uma parte essencial para que haja qualidade e legitimidade na pesquisa em biomedicina Soares e Corrêa 2010 Com isso o autor convoca todos os envolvidos no processo científico a se unirem para lutar pela moral na ciência pessoal Morais et al 2023 O legado de Trajano Sardenberg é um valioso alerta à comunidade científica sobre a necessidade de um intenso controle da ética na pesquisa a fim de que possam ser evitados abusos conservada a credibilidade pública e garantidos os avanços médicos em conformidade com os valores basilares da dignidade e dignidade humana Morais et al 2023 REFERÊNCIAS DE CASTILHO Euclides Ayres KALIL Jorge Ethics and medical research principles guidelines and regulations Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical v 38 n 4 2005 DE MORAIS Beatriz Guerra et al FORMULAÇÃO DE UM CÓDIGO DE ÉTICA PARA UMA EMPRESA DO SETOR DA CONSTRUÇÃO CIVIL NO MUNICÍPIO DE FAINAGO RECIMA21Revista Científica MultidisciplinarISSN 26756218 v 4 n 12 p e4124569e4124569 2023 MUNIZ Monalisa Ética na avaliação psicológica velhas questões novas reflexões Psicologia Ciência e Profissão v 38 p 133146 2018 OLEVATE Izulpério Cardoso PINTO Marcus Vinicius De Mello ROCHA Lamara Laguardia Valente O uso dos seres humanos em pesquisa científica na área da saúde diretrizes e procedimentos éticos Enfermagem Brasil v 10 n 2 2011 SOARES Jaqueline Mendes CORREA Marilena Cordeiro Dias Villela Como pesquisar o perfil patentário de um fármaco o caso Efavirenz Química Nova v 33 p 12161219 2010 TAVARESNETO José AZEVÊDO Eliane S Ethics relevance in Brazilian medical journals Revista da Associação Médica Brasileira v 55 p 400404 2009
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J Pneumol 252 marabr de 1999 III A ética da pesquisa em seres humanos e a publicação de artigos científicos A ética da pesquisa em seres humanos e a publicação de artigos científicos TRAJANO SARDENBERG1 EDITORIAL O avanço da medicina rumo à determinação de novos tra tamentos clínicos e cirúrgicos e novos métodos de diagnósti cos envolve a experimentação em seres humanos A experi mentação em animais não humanos os modernos modelos matemáticos e estatísticos e o uso intensivo da informática não conseguiram excluir a fase final de experimentar em se res humanos O rigor científico refletido no rigoroso delineamento da pesquisa há que ser obedecido em qualquer tipo de experi mento Modelos matemáticos para determinação do número de amostra randomização uso de placebo washout du plocego tempo de seguimento e etc são aspectos rotinei ramente aplicados e avaliados nos experimentos em seres humanos O uso de seres humanos em experimentos científicos traz inegáveis benefícios para a sociedade No entanto há sem pre o conflito entre o indivíduo submetido à experimentação e a ciência1 A ciência não está isolada da sociedade e portanto sofre influências políticas econômicas ideológicas étnicas e etc Os experimentos conduzidos por médicos alemães durante o regime nazista em prisioneiros raciais políticos e militares é o maior exemplo do século XX em que a balança pendeu radicalmente para o interesse da sociedade em detrimento dos interesses do indivíduo Devemos sempre lembrar que o objetivo da pesquisa é melhorar a saúde e o bemestar dos pacientes e nunca cau sar danos ou submetêlos a graves riscos para obter esses objetivos2 Apesar da regulamentação institucional da pesquisa em seres humanos no ano de 1900 na antiga Prússia3 o pri meiro documento internacional sobre esse tema é o Código de Nuremberg4 editado pelo Tribunal de Nuremberg em 1947 no qual constam 10 itens com recomendações que os médicos devem seguir nos experimentos em seres humanos 1 Professor Assistente do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu UNESP Presidente da Co missão de Ética Médica da FMB UNESP Membro do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da FMB UNESP Endereço para correspondência Trajano Sardenberg Departamen to de Cirurgia e Ortopedia Faculdade de Medicina de Botucatu UNESP 18618970 Botucatu SP Fax 014 8214615 email tsardenfmbunespbr O primeiro tópico explicita o consentimento voluntário dos sujeitos humanos é absolutamente necessário Em 1964 a Assembléia Médica Mundial aprovou a Decla ração de Helsinque cuja última edição foi aprovada na 48ª Assembléia Geral na República da África do Sul em 19965 Em nosso país em 1996 o Conselho Nacional de Saúde aprovou a Resolução 196966 que regulamenta a pesquisa em seres humanos no Brasil Referendada em vários docu mentos nacionais e internacionais inclusive a Declaração de Helsinque a Resolução 19696 incorporou vários conceitos da bioética e reafirmou o consentimento livre e esclarecido dos indivíduos para participarem de pesquisas científicas e a aprovação prévia dos protocolos por comitê independente Apesar de haver vários elos de ligação entre os aspectos científicos e os aspectos éticos da pesquisa clínica como por exemplo em estudos com número de amostra e randomiza ção inadequados haverá a participação de seres humanos em experimentos cujos resultados não terão validade científi ca os aspectos especificamente relacionados à ética da pes quisa em seres humanos são muitas vezes colocados em segundo plano durante o delineamento e execução do es tudo Alguns pesquisadores reconhecem a importância dos as pectos éticos na pesquisa porém manifestam preocupações com a institucionalização do estabelecimento de regras nes sa área argumentando que se trata de mais uma tentativa de controlar e reprimir os pesquisadores além de ser imposição do governo e que reprime a criatividade dos pesquisadores No entanto estas regulamentações não foram impostas por governos mas sim elaboradas principalmente por médicos pesquisadores para proteger os pacientes e garantir a quali dade das pesquisas2 A política editorial de parte de nossas revistas científicas reflete a primazia da técnica em relação à ética na pesquisa clínica Em estudo realizado por nós7 observamos que em 139 periódicos brasileiros aproximadamente 80 não fa zem qualquer referência a aspectos éticos nas suas instru ções aos autores O Jornal de Pneumologia solicita nas Ins truções Redatoriais que Sempre que pertinente declarar no texto que o trabalho foi aprovado pela Comissão de Ética do Hospital As orientações do Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas expressas nos Requisitos Uniformes para Manuscritos Submetidos a Revistas Biomédicas8 são con Sardenberg T IV J Pneumol 252 marabr de 1999 sideradas frágeis9 ao afirmarem explicitamente ao relatar experimentos com seres humanos indique se os procedi mentos foram realizados de acordo com os padrões éticos do comitê responsável por experimentação humana e com a Declaração de Helsinque de 1975 tal como revista em 1983 A publicação ou não de artigos considerados eticamente inadequados é polêmica antiga no meio científico editorial Um dos aspectos levantados seria que ao não publicar arti gos eticamente questionáveis estarseia criando a falsa im pressão de que estudos não éticos não estariam sendo reali zados A alternativa seria publicar em caráter excepcional o artigo não ético porém com relevância científica junto com editorial crítico10 Por outro lado ao ferir frontalmente um dos princípios da Declaração de Helsinque resultados de pesquisa realizadas em desacordo com os princípios da De claração não devem ser publicados essa postura encontra adversários importantes como por exemplo os editores do Journal of the American Medical Association9 e do Jour nal of Bone and Joint Surgery11 Beecher12 professor de Pesquisa em Anestesia na Escola Médica de Harvard expri me opinião de que artigos não éticos não devem ser publica dos o que seria fator desencorajante para a realização des ses experimentos e afirma ainda que a publicação de artigo não ético junto com editorial crítico teria que ser feito com excepcional habilidade para evitar o odor da hipocrisia O estabelecimento de orientações éticas precisas e claras acoplado à exigência de que os autores dos artigos infor mem os procedimentos éticos adotados no desenvolvimento da pesquisa principalmente a obtenção do consentimento esclarecido e a aprovação por comitê independente signifi caria que a revista científica privilegia os pesquisadores pre ocupados com a ciência e a ética9 A luz da ética iluminando o caminho da ciência é o ideal que devemos almejar ativamente Portanto a busca desse ideal deve ser realizada com a participação efetiva de todos os parceiros da ciência entre eles os pesquisadores agên cias financiadoras editores e leitores das revistas científicas As revistas científicas podem e devem colaborar nessa ta refa estabelecendo recomendações éticas mais amplas e detalhadas a serem seguidas pelos pesquisadores que pre tendam publicar os resultados de seus estudos Algumas sugestões práticas baseadas nas recomendações de Rennie e Yank9 e de Amdur e Biddle13 poderiam ser adotadas pelos editores 1 As orientações éticas contidas nas Instruções aos Au tores de revistas devem ser mais amplas e claras do que as observadas atualmente 2 As revistas devem citar explicitamente a Declaração de Helsinque e a Resolução 19696 do Conselho Nacional de Saúde como referências para orientação aos pesquisadores 3 As revistas devem publicar a Declaração de Helsinque preferencialmente versão em português da última edição o Conselho Federal de Medicina poderia patrocinar a tradução oficial desse documento internacional e a Resolução 196 96 do Conselho Nacional de Saúde 4 Os pesquisadores devem seguir durante a elaboração e execução de seus estudos clínicos a Declaração de Helsin que e a Resolução 19696 5 As revistas devem exigir que no texto dos artigos publi cados na parte de Métodos os autores informem sobre o consentimento esclarecido e a aprovação prévia do protoco lo por comitê de ética 6 Na análise dos artigos enviados para publicação os editores devem solicitar quando necessário informações adicionais sobre os aspectos éticos da pesquisa REFERÊNCIAS 1 Vieira S Hossne WS Um pouco de história In Experimentação com seres humanos 1ª ed São Paulo Editora Moderna 1987929 2 Sussman MD Ethical standards in the treatment of human subjects involved in clinical research editorial J Pediatr Orthop 199818701 702 3 Vollmann J Winau R Informed consent in human experimentation before the Nuremberg code BMJ 199631314451447 4 The Nuremberg Code 1947 BMJ 19963131448 5 World Medical Association Declaration of Helsinki JAMA 1997 277925926 6 Conselho Nacional de Saúde Ministério da Saúde Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos Resolução 196 1996 7 Sardenberg T Müller SS Pereira HR Oliveira RA Hossne WS Análise dos aspectos éticos da pesquisa em seres humanos contidos nas ins truções aos autores de 139 revistas científicas brasileiras Rev Assoc Med Bras 1999 no prelo 8 Internacional Committee of Medical Journals Editors Uniforms re queriments for manuscripts submitted to biomedical journals J Pneumol 199723XXVXXXIV 9 Rennie D Yank V Disclosure to the reader of institutional review board approval and informed consent editorial JAMA 1997277922923 10 Nilstun T Rastam J Ethics in orthopedic research editorial Acta Orthop Scand 199768205206 11 Einhorn TA Burstein AH Cowell HR Human experimentation edi torial J Bone Joint Surg Am 199779959960 12 Beecher HK Ethics and clinical research N Engl J Med 1966274 13541360 13 Amdur RJ Biddle C Institutional review board approval and publica tion of human research results JAMA 1997277909914 O desenvolvimento da medicina depende em grande medida da realização de experimentos em seres humanos Apesar dos esforços para desenvolver modelos substitutos essa fase é indispensável para validar novos tratamentos e diagnósticos Pinto 2020 Os benefícios que essa prática traz para a sociedade geram também um considerável conflito ético que existe entre os interesses de cada um dos sujeitos e os objetivos da ciência Castilho e Kalil 2005 Trajano Sardenberg no seu artigo assinala eventos do passado como os experimentos realizados durante o regime nazista que retratam dramaticamente a necessidade inadiável de proteger os direitos dos sujeitos das pesquisas e de respeitar a dignidade do homem Muniz 2018 Para assegurar essa proteção a ética em pesquisa na espécie humana foi internacionalmente regulamentada inicialmente através do Código de Nuremberg em 1947 e posteriormente pela Declaração de Helsinque em 1964 além das normativas nacionais como Resolução 19696 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil Esses documentos estabelecem alguns princípios fundamentais como o consentimento informado e a aprovação prévia dos protocolos pelos comitês independentes de ética Morais et al 2023 Contudo apesar da existência de normativas Sardenberg critica o descaso comumente encontrado com relação aos aspectos éticos nos estudos científicos que se traduz também pelo fato de cerca de 80 dos periódicos brasileiros não exigirem dos autores que esclareçam as questões éticas em suas submissões TavaresNeto e Azevêdo 2009 Ainda o autor discute a polêmica sobre a edição de artigos que trazem estudos eticamente duvidosos Enquanto alguns alegam que essas edições podem alertar a comunidade científica acerca de práticas inadequadas outros afirmam que a edição pode acidentalmente validar estudos que violam princípios éticos basilares De acordo com Muniz 2018 para superar esta situação Sardenberg sugere que as revistas científicas aprimorem suas diretrizes em relação aos requisitos éticos exigindo maior transparência sobre a obtenção do consentimento informado e sobre a aprovação pelos comitês de ética promovendo uma ciência que combine rigor técnico e responsabilidade ética Morais et al 2023 Soares e Corrêa 2010 O texto de Sardenberg portanto expõe a complexidade e as dificuldades da experimentação em humanos claramente indicando a procura de um equilíbrio adequado entre o progresso científico e a salvaguarda dos direitos individuais Ele diz que a ética não deverá ser vista como um obstáculo à criatividade ou à inovação mas é uma parte essencial para que haja qualidade e legitimidade na pesquisa em biomedicina Soares e Corrêa 2010 Com isso o autor convoca todos os envolvidos no processo científico a se unirem para lutar pela moral na ciência pessoal Morais et al 2023 O legado de Trajano Sardenberg é um valioso alerta à comunidade científica sobre a necessidade de um intenso controle da ética na pesquisa a fim de que possam ser evitados abusos conservada a credibilidade pública e garantidos os avanços médicos em conformidade com os valores basilares da dignidade e dignidade humana Morais et al 2023 REFERÊNCIAS DE CASTILHO Euclides Ayres KALIL Jorge Ethics and medical research principles guidelines and regulations Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical v 38 n 4 2005 DE MORAIS Beatriz Guerra et al FORMULAÇÃO DE UM CÓDIGO DE ÉTICA PARA UMA EMPRESA DO SETOR DA CONSTRUÇÃO CIVIL NO MUNICÍPIO DE FAINAGO RECIMA21Revista Científica MultidisciplinarISSN 26756218 v 4 n 12 p e4124569e4124569 2023 MUNIZ Monalisa Ética na avaliação psicológica velhas questões novas reflexões Psicologia Ciência e Profissão v 38 p 133146 2018 OLEVATE Izulpério Cardoso PINTO Marcus Vinicius De Mello ROCHA Lamara Laguardia Valente O uso dos seres humanos em pesquisa científica na área da saúde diretrizes e procedimentos éticos Enfermagem Brasil v 10 n 2 2011 SOARES Jaqueline Mendes CORREA Marilena Cordeiro Dias Villela Como pesquisar o perfil patentário de um fármaco o caso Efavirenz Química Nova v 33 p 12161219 2010 TAVARESNETO José AZEVÊDO Eliane S Ethics relevance in Brazilian medical journals Revista da Associação Médica Brasileira v 55 p 400404 2009 O desenvolvimento da medicina depende em grande medida da realização de experimentos em seres humanos Apesar dos esforços para desenvolver modelos substitutos essa fase é indispensável para validar novos tratamentos e diagnósticos Pinto 2020 Os benefícios que essa prática traz para a sociedade geram também um considerável conflito ético que existe entre os interesses de cada um dos sujeitos e os objetivos da ciência Castilho e Kalil 2005 Trajano Sardenberg no seu artigo assinala eventos do passado como os experimentos realizados durante o regime nazista que retratam dramaticamente a necessidade inadiável de proteger os direitos dos sujeitos das pesquisas e de respeitar a dignidade do homem Muniz 2018 Para assegurar essa proteção a ética em pesquisa na espécie humana foi internacionalmente regulamentada inicialmente através do Código de Nuremberg em 1947 e posteriormente pela Declaração de Helsinque em 1964 além das normativas nacionais como Resolução 19696 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil Esses documentos estabelecem alguns princípios fundamentais como o consentimento informado e a aprovação prévia dos protocolos pelos comitês independentes de ética Morais et al 2023 Contudo apesar da existência de normativas Sardenberg critica o descaso comumente encontrado com relação aos aspectos éticos nos estudos científicos que se traduz também pelo fato de cerca de 80 dos periódicos brasileiros não exigirem dos autores que esclareçam as questões éticas em suas submissões TavaresNeto e Azevêdo 2009 Ainda o autor discute a polêmica sobre a edição de artigos que trazem estudos eticamente duvidosos Enquanto alguns alegam que essas edições podem alertar a comunidade científica acerca de práticas inadequadas outros afirmam que a edição pode acidentalmente validar estudos que violam princípios éticos basilares De acordo com Muniz 2018 para superar esta situação Sardenberg sugere que as revistas científicas aprimorem suas diretrizes em relação aos requisitos éticos exigindo maior transparência sobre a obtenção do consentimento informado e sobre a aprovação pelos comitês de ética promovendo uma ciência que combine rigor técnico e responsabilidade ética Morais et al 2023 Soares e Corrêa 2010 O texto de Sardenberg portanto expõe a complexidade e as dificuldades da experimentação em humanos claramente indicando a procura de um equilíbrio adequado entre o progresso científico e a salvaguarda dos direitos individuais Ele diz que a ética não deverá ser vista como um obstáculo à criatividade ou à inovação mas é uma parte essencial para que haja qualidade e legitimidade na pesquisa em biomedicina Soares e Corrêa 2010 Com isso o autor convoca todos os envolvidos no processo científico a se unirem para lutar pela moral na ciência pessoal Morais et al 2023 O legado de Trajano Sardenberg é um valioso alerta à comunidade científica sobre a necessidade de um intenso controle da ética na pesquisa a fim de que possam ser evitados abusos conservada a credibilidade pública e garantidos os avanços médicos em conformidade com os valores basilares da dignidade e dignidade humana Morais et al 2023 REFERÊNCIAS DE CASTILHO Euclides Ayres KALIL Jorge Ethics and medical research principles guidelines and regulations Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical v 38 n 4 2005 DE MORAIS Beatriz Guerra et al FORMULAÇÃO DE UM CÓDIGO DE ÉTICA PARA UMA EMPRESA DO SETOR DA CONSTRUÇÃO CIVIL NO MUNICÍPIO DE FAINAGO RECIMA21Revista Científica MultidisciplinarISSN 26756218 v 4 n 12 p e4124569e4124569 2023 MUNIZ Monalisa Ética na avaliação psicológica velhas questões novas reflexões Psicologia Ciência e Profissão v 38 p 133146 2018 OLEVATE Izulpério Cardoso PINTO Marcus Vinicius De Mello ROCHA Lamara Laguardia Valente O uso dos seres humanos em pesquisa científica na área da saúde diretrizes e procedimentos éticos Enfermagem Brasil v 10 n 2 2011 SOARES Jaqueline Mendes CORREA Marilena Cordeiro Dias Villela Como pesquisar o perfil patentário de um fármaco o caso Efavirenz Química Nova v 33 p 12161219 2010 TAVARESNETO José AZEVÊDO Eliane S Ethics relevance in Brazilian medical journals Revista da Associação Médica Brasileira v 55 p 400404 2009