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Engenharia Civil ·

Mecânica dos Solos 1

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Luis Antonio Bittar Venturi (organizador) GEOGRAFIA Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula EDITORA SARANDI Coleção Aplicando Técnicas de Pedologia 4 DÉBORAH DE OLIVEIRA Introdução, 84 Técnicas de campo em pedologia, 85 Descrição do solo no campo, 85 Transcrição da descrição morfológica do solo no campo, 96 Na sala de aula, 98 Considerações finais, 104 Referências de apoio, 105 Sobre o autor, 106 INTRODUÇÃO O solo é resultado da interação de vários processos pedogenéticos, como adições, perdas e transformações. Sua formação depende da combinação e da intensidade de cinco fatores de formação: material de origem, clima, relevo, organismos e tempo. Os fatores de formação do solo atuam conjuntamente, mas a manifestação desses fatores dá origem a uma infinidade de tipos de solo no globo. Os solos não estão distribuídos no globo de forma aleatória. Eles expressam a combinação dos fatores de formação e o grande par te deles localiza-se de acordo com a zonalidade climática global. Deste modo, na zona intertropical aparecem solos mais desenvolvidos, pois há mais calor e umidade. Já em zonas de clima frio e em zonas áridas ou cobertas com gelo há solos pouco desenvolvidos ou até ausência de solos (ver Figura 4.1). A Pedologia surgiu como ciência dos solos há pouco mais de 100 anos, com o russo Dokuchaev que, entre 1877 e 1878, estudou os solos da Rússia para fins de fertilidade. Ele foi o primeiro a perceber que o solo possuía camadas, que hoje chamamos de horizontes, e que regiões de climas semelhantes podem originar solos semelhantes. Atualmente, há técnicas bem definidas relacionadas a levantamentos de solos no campo. Essas técnicas são padronizadas pela Sociedade Brasileira de Ciência do Solo e encontram-se detalhadas em Santos et al. (2005); elas são muito utilizadas pelos pedólogos, que têm um papel importante para a ciência do solo. O pedólogo é responsável por realizar os levantamentos de solos, elaborar mapas e boletins descritivos. As etapas de seu trabalho seguem procedimentos de gabinete, campo e laboratório. No gabinete, o pedólogo seleciona mapas, cartas e fotografias aéreas da sua área de estudo, escolhe onde irá fazer levantamentos de campo e descreve a área de estudo quanto às suas características climáticas, geomorfológicas, geológicas, dentre outras, que irão auxiliar no entendimento dos solos e da paisagem em que os solos estão inseridos. Isso porque o pedólogo, enquanto geógrafo, vê o solo como um dos componentes da paisagem, que só pode ser compreendido como tal. Esta fase corresponde à etapa pré-campo. Figura 4.1. Distribuição do intemperismo no globo conforme zonalidade climática. Fonte: Büdel (1974). TÉCNICAS DE CAMPO EM PEDOLOGIA As técnicas de campo seguem critérios bem definidos para a descrição do solo no campo. Cabe ressaltar que o trabalho de campo e a descrição do perfil de solo são fundamentais para a Pedologia. Como o perfil do solo corresponde ao conjunto de horizontes ou camadas do solo mais ou menos paralelas à superfície do terreno e como cada horizonte possui características próprias, eles devem ser descritos um a um. As descrições de campo são baseadas principalmente nos sentidos de visão e tato. Isso significa que se deve observar atentamente o perfil, retirar amostras do solo e manuseá-las. Uma boa descrição de campo irá nortear as análises de laboratório a serem realizadas posteriormente. A escolha do local onde será descrita a morfologia do perfil do solo varia de acordo com a finalidade da descrição e sua utilização. Há várias finalidades para este tipo de estudo, como, por exemplo, mapeamento de solos, estudo de uso da terra, funcionamento hídrico, erosão, manejo e fertilidade, dentre outras. Materiais de campo Os materiais utilizados em campo são basicamente ferramentas como enxada, pá, faca, martelo, trena e trado, além de água para molhar as amostras de solo, caderneta de campo, caneta, lupa de bolso, sacos plásticos para coleta de amostras e uma tabela de cores específica para cor de solos (ver Figura 4.2). DESCRIÇÃO DO SOLO NO CAMPO Primeiramente, deve-se selecionar onde será realizada a descrição do solo. Normalmente, os solos são descritos em barrancos de estradas, por abertura de trincheiras e/ou por meio de tradagens. Em geral, aproveita-se os barrancos de estradas, o que está se tornando cada vez mais difícil, com a impermeabilização destes para a contenção de deslizamentos. Nesse caso, opta-se por tradagens ou abertura de trincheiras. Se a descrição for feita em um barranco de estrada, deve-se preparar o perfil para o início do trabalho. Com a enxada, limpa-se a parede do barranco a uma profundidade tal que se possa ver o solo “fresco” e a uma largura de aproximadamente um metro. A partir daí e utilizando uma faca, podemos começar a separar os diferentes horizontes, baseando-se principalmente na cor (ver Figura 4.3). A descrição da morfologia do solo segue a seguinte sequência: transição entre horizontes, cor, textura, estrutura, porosidade, consistência, além de outras características morfológicas nem sempre presentes em todos os solos, como: cerosidade, cimentação, nódulos e concreções minerais, presença de carbonatos, entre outros. Figura 4.2. Material usado para a descrição do solo no campo. De cima para baixo e da esquerda para a direita: pedocomparador, enxadeta e trado, borrifador de água, pá de jardineiro, martelo, etiqueta e saco plástico, faca, régua e material de descrição e coleta de solo no campo (SANTOS et al., 2005). Fonte: Lepsch (2002). capítulo 4 - técnicas de pedologia 85 Figura 4.3. Perfil de solo em barranco de estrada. Quando se descreve o solo através de tradagem, deve-se atentar para o fato de que só é possível descrever a cor, a textura e a consistência do solo molhado, pois as outras características morfológicas serão destruídas pelo trado. Espessura e transição entre horizontes A transição entre horizontes é identificada pela diferença de um horizonte em relação ao outro, principalmente quanto a cor, textura e estrutura. Ela é marcada no perfil com uma faca ou martelo através da observação visual e do tato, retirando-se amostras dos diferentes horizontes e comparando-as, até que seja possível a delimitação das transições. A transição é descrita quanto à forma e ao grau. As formas de transição são: plana, ondulada, irregular e descontínua (ver Figura 4.4). O grau corresponde à faixa de separação entre os horizontes, no caso: abrupta (com até 2,5 cm), clara (entre 2,5 cm a 7,5 cm), gradual (entre 7,5 cm a 12,5 cm) e difusa (com mais de 12,5 cm). Mede-se a espessura de cada horizonte com metro ou trena. Muitas vezes não é possível ver a transição do último horizonte do perfil, pois ele poderá estar muito profundo. Horizontes do solo Um perfil de solo completo e bem desenvolvido apresenta cinco horizontes: O, A, E, B e C, porém, nem todos os solos apresentam todos esses horizontes (ver Figura 4.5). Os horizontes apresentam uma grande variedade de tipos, que são diferenciados entre si de acordo com a classificação da Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, através de sufixos com letras minúsculas: - a – propriedades diaclas (vulcanoclásticas); - b – horizonte enterrado; - c – concreções ou nódulos endurecidos; - d – acentuada decomposição de matéria orgânica; - e – escurecimento externo dos agregados por matéria orgânica; 86 práticas de geografia f – presença de plintita; g – gleiização; h – acumulação iluvial de matéria orgânica; i – desenvolvimento incipiente do horizonte B; j – tiomorfismo (permanente ou temporariamente alagado – sulfídico); k – presença de carbonatos; m – extremamente cimentado; n – acumulação de sódio; o – matéria orgânica mal ou não decomposta; p – horizonte lavrado ou revolvido; q – acumulação de sílica; r – rocha branda ou saprolito; s – acumulação iluvial de Fe e Al com matéria orgânica; t – acumulação iluvial de argila; u – modificações antropogênicas; v – características vétricas; w – intenso intemperismo do horizonte B; x – cimentação aparente que se desfaz quando umedecido; y – acumulação de sulfato de cálcio; z – acumulação de sais mais solúveis que sulfato de cálcio. As cores do solo A descrição morfológica da cor do solo é facilitada pela sua visualização, pois é a característica que mais chama a atenção de quem a descreve e por ela pode-se inferir quanto à composição do solo (ver Figura 4.6). No caso de um solo escuro, pode-se inferir que ele possui matéria orgânica; um solo vermelho indica a presença de óxidos de ferro, como a hematita, e um solo amarelo indica a presença de goethita. Já um solo acinzentado pode ter presença de ferro reduzido, típico de locais mal drenados, como beiras de rios. As cores são descritas de acordo com a padronização mundial, o que facilita muito os estudos de pesquisadores de várias nacionalidades. Ela segue o sistema Munsell de cores e utiliza uma tabela denominada Munsell Soil Color Charts. A Tabela de Munsell ou Carta de Munsell, como é conhecida no Brasil, apresenta várias páginas destacáveis, que possuem três componentes: matiz, valor e croma (Figuras 4.7 e 4.8). O matiz corresponde à cor dominante, no caso, vermelho, amarelo, azul, verde e púrpura, cujos números variam nos seguintes intervalos: 2.5, 5, 7.5 e 10. Os matizes mais usados estão entre 0 R (de Red – vermelho), significando 100% (dessa cor); Y (de Yellow – amarelo), significando 100% e YR (de Yellow-Red – vermelho-amarelado), signifi- Figura 4.5. Horizontes principais do solo. Fonte: Lepsch (2002). 87 capítulo 4 - técnicas de pedologia Figura 4.6. Caixa denominada pedocomparador utilizada para melhor comparar as diferentes cores dos solos. Figura 4.7. Esquema de interpretação da Carta de Munsell. Fonte: Santos et al. (2005). Exemplo: Matiz 7,5YR Croma 7/6 Valor Figura 4.8. A Carta de Munsell. Cada página corresponde a um MATIZ Y/R R Y 5R INTENSIDADE DE COR VALOR 7 6 MAIS OXIDADO 7000A AMPLITUDE (MATIZ) CROMA 0/8 MAIS REDUZIDO 4000A 88 práticas de geografia cuando uma mistura de 50% de vermelho e 50% de amarelo. Nos solos brasileiros, as cores vermelhas, vermelho-amareladas e amareladas são as mais comuns. O valor refere-se à tonalidade da cor, que varia de preto a branco, na escala vertical. O croma diz respeito à pureza relativa ou à saturação da cor e varia de cores neutras e acinzentadas a aumentada na escala horizontal. A amostra de solo deve ter sua cor descrita preferencialmente no campo, sob a luz do Sol. As amostras devem ser descritas secas e úmidas. O torrão de solo deve ser quebrado para verificar se a cor da sua superfície corresponde à mesma cor do interior. Quando o solo apresenta mais de uma cor, é necessário descrever a cor da matriz e todas as cores de possíveis manchas. As manchas, ou mosqueados, devem ser descritas quanto: à quantidade: pouco (area < 2% da superfície do horizonte), comum (de 2 a 20% da superfície do horizonte) e abundante (> 20% da superfície do horizonte); à tamanho: pequeno (eixo maior < 5 mm), médio (eixo maior de 5 a 15 mm) e grande (eixo maior > 15 mm); à contraste de cores das manchas em relação à cor matriz: difuso (quando a cor das man- chas varia pouco em relação à cor matriz do solo, distinto (mosqueado facilmente visível) e proeminente (grande diferença entre o mosqueado e a cor matriz do solo). A denominação da cor, em inglês, na Carta de Munsell, tem sua tradução para o português publicada pela Sociedade Brasileira de Ciência do Solo (ver Tabela 4.1). A textura do solo A textura corresponde à distribuição das fra- ções granulométricas do solo. O solo apresenta três frações granulométricas quanto ao tamanho das partículas: areia (2,0 a 0,05 mm), siltle ( 0,05 a 0,002 mm) e argila (menor que 0,002 mm). É comum o solo apresentar frações granu- lométricas maiores, como cascalho (20 a 2,0 mm), porém estas frações são muito grandes para determinar a textura do solo no campo. No campo, é possível ver apenas as frações de areia e silte ou ambos no com o auxílio de lupas. A fração argila só é possível de ser vista com microscópio eletrônico de varredura (Figura 4.9). Figura 4.9. Particulas de argila caulinítica sob microscopio eletrônico. capítulo 4 - técnicas de pedologia 89 Tabela 4.1 - Correspondência em português das cores de Munsell Munsell Correspondente em Português Munsell Correspondente em Português Black Preto Light reddish brown Bruno-avermelhado-claro Bluish black Preto-azulado Light reddish gray Cinzento-avermelhado-claro Bluish gray Cinzento-azulado Light yellowish brown Bruno-amarelado-claro Brown Bruno Bluish gray Cinzento-azulado Brownish yellow Amarelo-brumado Olive Oliva Dark bluish gray Cinzento-azulado-escuro Olive brown Bruno-olivaceo Dark brown Bruno-escuro Olive gray Cinzento-olivaceo Dark gray Cinzento-escuro Olive yellow Amarelo-olivaceo Dark grayish brown Bruno-acinzentado-escuro Pale brown Bruno-claro-acinzentado Dark grayish green Verde-acinzentado-escuro Pale green Verde-claro-acinzentado Dark greenish gray Cinzento-esverdeado-escuro Pale olive Oliva-clara-acinzentada This olive brown This olive brown Pale red Vermelho-claro-acinzentado Weak red Fraco vermelho-claro Yellow Amarelo Olive yellow Amarelo olivaceo Yellow brown Bruno-amarelado Yellow orange Amarelo-laranja Yellow red Vermelho-amarelado Fonte: Santos et al. (2005). 90 práticas de geografia É preciso molhar a amostra e homogeneizá-la para sentir sua textura ao tato. Em seguida deve-se tentar fazer um cilindro de aproximadamente 6 a 7 cm de comprimento e 1 cm de diâmetro (ver Figuras 4.10 e 4.11). Se não for possível fazer um cilindro, a textura é arenosa. Se for possível fazer o cilindro e ele se desfizer, a textura é média (significa que não há fração predominante); ao continuar moldando um cilindro de 15 a 16 cm de comprimento, se ele rachar ao formar um círculo, a textura é argilosa e, se ele não rachar, a textura é muito argilosa. A proporção das frações só será determinada com precisão através de análise de laboratório, mas as inferências de campo são importantes, pois, ao esmagar uma amostra de solo entre o polegar e o indicador, percebe-se que a areia é a mais grosseira dentre as três amostras e é áspera ao tato, pois arranha entre os dedos. Muitas vezes pode-se até escutar o atrito entre os grãos de areia nos dedos. O silte é sedoso entre os dedos e tem a textura de um talco, porém é possível identificá-lo se houver uma quantidade elevada no solo, pois a amostra é plástica e facilmente moldável. Uma amostra pode ser classificada em arenosa, siltosa, argilosa ou, como raramente um horizonte de solo contem apenas uma fração, na combinação dessas texturas. No caso de uma amostra que apresente mais areia do que argila, denomina-se de arenosargilosa. Quando apresenta mais de silte do que argila será chamada de silteargilosa e assim por diante. Figura 4.10. Teste da textura no campo. Figura 4.11. Etapas para descrição da textura no campo: A) molhar a amostra; B) se não for possível fazer um cilindro de 6 a 7 cm, a textura é arenosa, mas se for possível fazer o cilindro e ele se desfizer, a textura é média; C) continuar moldando um cilindro de 15 a 16 cm de comprimento; D) se ele rachar ao formar um círculo, a textura é argilosa; E) se ele não rachar, a textura é muito argilosa. Fonte: Coche (1985), modificado. capítulo 4 – técnicas de pedologia 91