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Psicologia ·
Psicanálise
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Sigmund Freud TRÊS ENSAIOS SOBRE A TEORIA DA SEXUALIDADE 1905 NOTA DO EDITOR INGLÊS DREI ABHANDLUNGEN ZUR SEXUAL THEORIE a EDIÇÕES ALEMÃS 1905 Leipzig e Viena Deuticke ii 83 págs 1910 2a Ed Leipzig e Viena Deuticke iii 87 págs Com acréscimos 1915 3a Ed Leipzig e Viena Deuticke vi 101 págs Com acréscimos 1920 4a Ed Leipzig e Viena Deuticke viii l04 págs Com acréscimos 1922 5a Ed Leipzig e Viena Deuticke viii l04 págs Sem alterações 1924 GS 5 3119 Com acréscimos 1925 6a Ed Leipzig e Viena Deuticke 120 págs G S 5 1942 GW 5 29145 Sem alterações 1972 SA 5 pp 37145 Vorwort zur vierten Auflage 1920 Int Z Psychoanal 6 p 247 1920 Leipzig e Viena Deuticke pp viiviii 1922 Leipzig e Viena Deuticke pp viiviii 1924 GS 5 pág 5 1925 Leipzig e Viena Deuticke p 5 1942 GW 5 pp 312 1972 SA 5 pp 456 b TRADUÇÕES EM INGLÊS Three Contributions to the Sexual Theory 1910 Nova York Journal of Nerv and Ment Dis Publ Co Série de Monografias no 7 x 91 págs Trad de AA Brill Introd de JJ Putnam Three Contributions to the Theory of Sexc 1916 2a Ed da de 1910 acima xi 117 págs Com acréscimos 1918 3a Ed xii 117 págs 1930 4a Ed xiv l04 págs Revisada 1938 Basic Writings 553629 Reedição da ed de 1930 acima Three Essays on the Theory of Sexuality 1949 Londres Imago Publishing Co 133 págs Trad de James Strachey A presente tradução inglesa é uma versão corrigida e ampliada da que se publicou em 1949 Os Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade juntamente com A Interpretação dos Sonhos figuram sem dúvida como as contribuições mais significativas e originais de Freud para o conhecimento humano Não obstante na forma em que costumamos ler esses ensaios é difícil avaliar a natureza exata de seu impacto quando da primeira publicação É que no decorrer de edições sucessivas num período de vinte anos eles foram submetidos por seu autor a mais modificações e acréscimos do que qualquer outro de seus escritos salvo talvez pela própria Interpretação dos Sonhos Esta edição difere num importante 1 aspecto de todas as que a antecederam seja em alemão ou em inglês Embora se baseie na sexta edição alemã de 1925 última a ser publicada durante a vida de Freud ela indica com as respectivas datas todas as alterações substanciais introduzidas na obra desde sua primeira edição Em todos os pontos em que se suprimiu ou modificou grandemente o material nas edições posteriores o trecho omitido ou a versão anterior são fornecidos em notas de rodapé Isso permitirá ao leitor ter uma noção mais clara de como eram estes ensaios em sua forma original Provavelmente causará surpresa por exemplo saber que a íntegra das seções sobre as teorias sexuais infantis e sobre a organização prégenital da libido ambas no segundo ensaio só foi acrescentada em 1915 dez anos após a primeira edição do livro Esse mesmo ano trouxe também o acréscimo da seção sobre a teoria da libido no terceiro ensaio Menos surpreendente é que os avanços da bioquímica tenham tornado necessário em 1920 reescrever o parágrafo sobre as bases químicas da sexualidade Nesse ponto a rigor a surpresa funciona mais no sentido inverso pois a versão original desse parágrafo aqui impressa numa nota mostra a notável antevisão de Freud nesse aspecto e revela quão pouco se fez necessário alterar suas concepções ver em 1 Entretanto a despeito dos acréscimos consideráveis feitos ao livro após sua publicação original sua essência já estava presente em 1905 sendo mesmo possível rastrearlhe as origens até datas ainda mais remotas A história completa do interesse de Freud pelo assunto pode agora graças à publicação da correspondência com Fliess 1950a ser pormenorizadamente acompanhada mas bastanos aqui indicar seus contornos gerais As observações clínicas da importância dos fatores sexuais na causação da neurose de angústia e da neurastenia inicialmente e das psiconeuroses mais tarde foram o que levou Freud pela primeira vez a uma investigação geral do tema da sexualidade Suas primeiras abordagens durante o início da década de 1890 partiram dos pontos de vista da fisiologia e da química Por exemplo encontrase uma hipótese neurofisiológica sobre os processos de excitação e descarga sexuais na Seção III de seu primeiro artigo sobre a neurose de angústia 1895b um notável diagrama ilustrando essa hipótese aparece no Rascunho G das cartas a Fliess aproximadamente na mesma época mas já fora mencionado um ano antes no Rascunho D A insistência de Freud nas bases químicas da sexualidade remonta pelo menos a essa época mas há também uma alusão ao tema no Rascunho D provavelmente datado da primavera de 1894 Nesse caso Freud acreditava dever muito às sugestões de Fliess como fica demonstrado entre outros pontos em suas associações ao famoso sonho da injeção de Irma no verão de 1895 A Interpretação dos Sonhos Capítulo II Era também a Fliess que devia algumas sugestões sobre o tema correlato da bissexualidade ver em 1 que Freud mencionou numa carta de 6 de dezembro de 1896 Carta 52 e que mais tarde veio a considerar como um fator decisivo ver em 1 embora sua opinião final sobre a atuação desse fator o tenha colocado em desacordo com Fliess É nessa mesma carta de fins de 1896 Freud l950a Carta 52 que encontramos a primeira referência às zonas erógenas passíveis de estimulação na infância porém mais tarde sufocadas e a seus vínculos com as perversões No início do mesmo ano Rascunho K de 1o de janeiro de 1896 e aqui podemos ver indícios de uma abordagem mais psicológica surge também uma discussão sobre as forças recalcadoras o asco a vergonha e a moral Contudo embora tantos elementos da teoria de Freud sobre a sexualidade já estivessem em sua mente por volta de 1896 sua pedra angular ainda estava por ser descoberta Desde os primórdios tinha havido uma suspeita de que os fatores casuais da histeria remontavam à infância há uma alusão a esse fato nos parágrafos iniciais da Comunicação Preliminar de Breuer e Freud de 1893 Por volta de 1895 ver por exemplo a Parte II do Projeto impressa como um apêndice à correspondência com Fliess Freud dispunha de uma explicação completa da histeria com base nos efeitos traumáticos da sedução sexual na primeira infância Durante todos esses anos anteriores a 1897 porém a sexualidade infantil era encarada como nada além de um fator latente passível de vir à luz com resultados desastrosos somente pela intervenção de um adulto É verdade que se poderia supor uma aparente exceção a isso a partir do contraste traçado por Freud entre a causação da histeria e a da neurose obsessiva a primeira afirmava ele remontava a experiências sexuais passivas na infância ao passo que a segunda se originaria em experiências ativas Mas Freud deixa muito claro em seu segundo ensaio sobre As Neuropsicoses de Defesa 1896b onde essa distinção é traçada que as experiências ativas subjacentes 2 à neurose obsessiva são invariavelmente precedidas por experiências passivas donde mais uma vez a mobilização da sexualidade infantil se deveria em última análise à interferência externa Foi somente no verão de 1897 que Freud se viu forçado a abandonar sua teoria da sedução Anunciou esse acontecimento em sua carta a Fliess de 21 de setembro Carta 69 e sua descoberta quase simultânea do complexo de Édipo feita em sua autoanálise Cartas 70 e 71 de 3 e 15 de outubro levou inevitavelmente ao reconhecimento de que as moções sexuais atuavam normalmente nas crianças de mais tenra idade sem nenhuma necessidade de estimulação externa Com essa descoberta a teoria sexual de Freud estava realmente completa Levou alguns anos porém para que ele acatasse por inteiro sua própria descoberta Num trecho do ensaio sobre A Sexualidade na Etiologia das Neuroses 1898a por exemplo ele se pronuncia ora a favor ora contra ela De um lado afirma que as crianças são capazes de todas as funções sexuais psíquicas e de muitas das somáticas e que é errôneo supor que sua vida sexual só comece na puberdade De outro lado entretanto declara que a organização e a evolução da espécie humana buscam evitar qualquer atividade sexual considerável na infância que as forças motoras sexuais dos seres humanos devem ser armazenadas e somente liberadas na puberdade e que isso explica por que as experiências sexuais infantis estão fadadas a ser patogênicas O importante prossegue ele são os efeitos posteriores produzidos por tais experiências na maturidade graças ao desenvolvimento do aparelho sexual somático e psíquico ocorrido no entretempo Até mesmo na primeira edição de A Interpretação dos Sonhos 1900a vêse um trecho curioso ao final do Capítulo III ver em 1 onde Freud comenta que temos em alta conta a felicidade da infância por ser ela ainda inocente de desejos sexuais Uma nota corretiva foi acrescentada a esse trecho em 1911 por sugestão de Jung segundo afirma Ernest Jones Isso foi sem dúvida um remanescente de um rascunho inicial do livro pois em outros trechos por exemplo na discussão do complexo de Édipo no Capítulo V ele escreve de maneira perfeitamente inequívoca sobre a existência de desejos sexuais mesmo nas crianças normais E é evidente que ao redigir seu caso clínico de Dora no início de 1901 já estavam firmemente estabelecidas as linhas principais de sua teoria da sexualidade Ver em 1 Ainda assim porém Freud não tinha pressa em publicar seus resultados Concluída e prestes a ser lançada A Interpretação dos Sonhos em 11 de outubro de 1899 Carta 121 escreveu ele a Fliess É possível que uma teoria da sexualidade seja a sucessora imediata do livro dos sonhos E decorridos três meses em 26 de janeiro de 1900 Carta 128 Estou colhendo material para a teoria sexual e esperando que alguma centelha inflame o material já acumulado Mas a centelha demoraria muito a surgir Salvo pelo pequeno ensaio Sobre os Sonhos e pela Psicopatologia da Vida Cotidiana ambos lançados antes do outono de 1901 Freud nada publicou de importante nos cinco anos que se seguiram E então repentinamente em 1905 lançou três obras fundamentais seu livro sobre O Chiste os Três Ensaios e o caso clínico de Dora É certo que este último fora escrito em sua maior parte quatro anos antes ver a partir de 1 sendo publicado em outubro e novembro de 1905 As outras duas obras foram lançadas quase simultaneamente alguns meses antes embora se ignorem as datas exatas ver uma discussão mais extensa a esse respeito no Prefácio do Editor ao livro sobre o chiste 1905c em 1 Nas edições alemãs as seções só aparecem numeradas no primeiro ensaio e mesmo neste a rigor antes de 1924 só eram numeradas até a metade do texto Para facilitar as referências estendemos aqui a numeração das seções ao segundo e terceiro ensaios PREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃO O autor que não se deixa enganar sobre as lacunas e obscuridades deste pequeno escrito ainda assim resistiu à tentação de incorporarlhe os resultados das investigações dos últimos cinco anos por não querer destruir seu caráter de documento unitário Por isso reproduz o texto original com alterações mínimas e se contenta em acrescentar algumas notas de rodapé que se distinguem das antigas por levarem um asterisco Ademais é seu fervoroso desejo que este livro envelheça rapidamente obtida uma aceitação universal para o que outrora trouxe de novo e substituídas as imperfeições que contém por teses mais corretas 3 Viena dezembro de 1909 PREFÁCIO À TERCEIRA EDIÇÃO Depois de observar por um decênio a recepção e os efeitos deste livro cabeme dotar esta terceira edição de algumas observações prévias destinadas a corrigir malentendidos e expectativas irrealizáveis em relação a ele É preciso frisar acima de tudo que a exposição aqui encontrada parte inteiramente da experiência médica cotidiana à qual os resultados da investigação psicanalítica pretendem trazer aprofundamento e relevância científica Os Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade não podem conter nada além daquilo que a psicanálise precisa supor ou permite confirmar Excluise portanto a possibilidade de que algum dia se ampliem a ponto de constituir uma teoria sexual e é compreensível que não tomem posição acerca de muitos problemas importantes da vida sexual Mas nem por isso se deve acreditar que tais capítulos omitidos desse grande tema sejam desconhecidos do autor ou que este os tenha desprezado por considerálos secundários A subordinação deste escrito às experiências psicanalíticas que levaram a sua redação mostrase ainda não apenas na escolha do material como também em sua ordenação Ao longo de todo ele observase uma certa seqüência de instâncias dáse prioridade aos fatores acidentaisdeixamse em segundo plano os fatores disposicionais e o desenvolvimento ontogenético é considerado antes do filogenético É que o acidental desempenha na análise o papel preponderante sendo esta dominada por ele quase por completo o disposicional só vem à luz por trás dele como algo despertado pelo vivenciar mas cuja apreciação ultrapassa amplamente o campo de trabalho da psicanálise Uma proporção semelhante domina a relação entre a ontogênese e a filogênese A ontogênese pode ser vista como uma repetição da filogênese na medida em que esta não seja modificada por uma vivência mais recente A predisposição filogenética fazse notar por trás do processo ontogenético No fundo porém a predisposição é justamente o precipitado de uma vivência prévia da espécie à qual se vem agregar a experiência mais nova do indivíduo como soma dos fatores acidentais Junto a sua total dependência da investigação psicanalítica devo destacar como característica desse meu trabalho sua deliberada dependência da investigação biológica Evitei cuidadosamente introduzir expectativas científicas provenientes da biologia sexual geral ou da biologia das espécies animais em particular no estudo da função sexual do ser humano que nos é possibilitado pela técnica da psicanálise A rigor meu objetivo foi sondar o quanto se pode apurar sobre a biologia da vida sexual humana com os meios acessíveis à investigação psicológica erame lícito assinalar os pontos de contato e concordância resultantes dessa investigação mas não havia por que me desconcertar com o fato de o método psicanalítico em muitos pontos importantes levar a opiniões e resultados consideravelmente diversos dos de base meramente biológica Introduzi nesta terceira edição um número abundante de inserções mas renunciei a identificálas como na edição anterior mediante algum sinal particular O trabalho científico em nosso campo teve seu progresso lentificado nos últimos tempos mas era indispensável uma certa complementação deste escrito caso se pretendesse mantêlo em contato com a literatura psicanalítica mais recente Viena outubro de 1914 PREFÁCIO À QUARTA EDIÇÃO Dissipadas as correntes da guerra podese verificar com satisfação que o interesse pela psicanálise permanece ileso no mundo em geral Mas nem todas as partes da doutrina tiveram o mesmo destino As colocações e constatações puramente psicológicas da psicanálise sobre o inconsciente o recalcamento o conflito que leva à doença o lucro extraído da doença os mecanismos da formação de sintomas etc gozam de crescente reconhecimento e são consideradas até mesmo por aqueles que em princípio as contestam Mas a parte da doutrina que faz fronteira com a biologia cujas bases são 4 fornecidas neste pequeno escrito continua a enfrentar um dissenso indiminuto e as próprias pessoas que por algum tempo se ocuparam intensamente da psicanálise foram movidas a abandonála para abraçar novas concepções destinadas a restringir mais uma vez o papel do fator sexual na vida anímica normal e patológica Ainda assim não posso decidirme pela suposição de que essa parte da doutrina psicanalítica possa afastarse muito mais que as outras da realidade apurada A memória e o reexame constantemente reiterado dizemme que ela brotou de uma observação igualmente esmerada e isenta de expectativas ademais o esclarecimento dessa dissociação percebida no reconhecimento público não apresenta nenhuma dificuldade Em primeiro lugar os primórdios aqui descritos da vida sexual humana só podem ser confirmados por investigadores que tenham paciência e habilidade técnica suficientes para reconduzir a análise até os primeiros anos da infância do paciente É freqüente ademais não haver possibilidade disso porquanto a prática médica exige que se despache com mais rapidez aparentemente o caso patológico Salvo pelos médicos que exercem a psicanálise entretanto ninguém pode ter acesso algum a esse campo nem qualquer possibilidade de formar por si um juízo que não seja influenciado por suas próprias aversões e preconceitos Soubessem os homens aprender através da observação direta das crianças estes três ensaios poderiam não ter sido escritos Mas convém lembrar ainda que parte do conteúdo deste escrito a saber sua insistência na importância da vida sexual para todas as realizações humanas e a ampliação aqui ensaiada do conceito de sexualidade tem constituído desde sempre o mais forte motivo para a resistência que se opõe à psicanálise No afã de encontrar tópicos grandiloqüentes chegouse até a falar no pansexualismo da psicanálise e a fazer a esta a absurda censura de que ela explicaria tudo a partir da sexualidade Só é possível assombrarse com isso quando se esquece quão confuso e distraído se pode ficar em decorrência dos fatores afetivos Já faz um bom tempo que o filósofo Arthur Schopenhauer mostrou aos homens em que medida seus feitos e interesses são determinados por aspirações sexuais o sentido corriqueiro da expressão e parece incrível que todo um mundo de leitores tenha conseguido banir de sua mente de maneira tão completa uma advertência tão impressionante E quanto à ampliação do conceito de sexualidade que a análise das crianças e dos chamados perversos tornou necessária todos aqueles que desde seu ponto de vista superior olham desdenhosamente para a psicanálise deveriam lembrarse de quanto essa sexualidade ampliada da psicanálise se aproxima do Eros do divino Platão Cf Nachmansohn 1915 Viena maio de 1920 5 AS ABERRAÇÕES SEXUAIS O fato da existência de necessidades sexuais no homem e no animal expressase na biologia pelo pressuposto de uma pulsão sexual Seguese nisso a analogia com a pulsão de nutrição a fome Falta à linguagem vulgar no caso da pulsão sexual uma designação equivalente à palavra fome a ciência valese para isso de libido A opinião popular faz para si representações bem definidas da natureza e das características dessa pulsão sexual Ela estaria ausente na infância farseia sentir na época e em conexão com o processo de maturação da puberdade seria exteriorizada nas manifestações de atração irresistível que um sexo exerce sobre o outro e seu objetivo seria a união sexual ou pelo menos os atos que levassem nessa direção Mas temos plena razão para ver nesses dados uma imagem muito infiel da realidade olhandoos mais de perto constatase que estão repletos de erros imprecisões e conclusões apressadas Introduzamos aqui dois termos chamemos de objeto sexual a pessoa de quem provém a atração sexual e de alvo sexual a ação para a qual a pulsão impele Assim fazendo a observação cientificamente esquadrinhada mostrará um grande número de desvios em ambos o objeto sexual e o alvo sexual e a relação destes com a suposta norma exige uma investigação minuciosa 1 DESVIOS COM RESPEITO AO OBJETO SEXUAL A teoria popular sobre a pulsão sexual tem seu mais belo equivalente na fábula poética da divisão do ser humano em duas metades homem e mulher que aspiram a unirse de novo no amor Por isso causa grande surpresa tomar conhecimento de que há homens cujo objeto sexual não é a mulher mas o homem e mulheres para quem não o homem e sim a mulher representa o objeto sexual Dizse dessas pessoas que são de sexo contrário ou melhor invertidas e chamase o fato de inversão O número de tais pessoas é bastante considerável embora haja dificuldades em apurálo com precisão A A INVERSÃO COMPORTAMENTO DOS INVERTIDOS As pessoas em questão comportamse de maneira muito diversificada em vários aspectos a Podem ser invertidos absolutos ou seja seu objeto sexual só pode ser do mesmo sexo enquanto o sexo oposto nunca é para eles objeto de anseio sexual mas antes os deixa frios ou até lhes desperta aversão sexual Quando se trata de homens essa aversão os incapacita de praticarem o ato sexual normal ou então não extraem dessa prática nenhum gozo b Podem ser invertidos anfígenos hermafroditas sexuais ou seja seu objeto sexual tanto pode pertencer ao mesmo sexo quanto ao outro falta à inversão portanto o caráter de exclusividade c Podem ser invertidos ocasionais ou seja em certas condições externas dentre as quais destacamse a inacessibilidade do objeto sexual normal e a imitação elas podem tomar como objeto sexual uma pessoa do mesmo sexo e encontrar satisfação no ato sexual com ela Os invertidos mostram ainda um comportamento variado no juízo que fazem da peculiaridade de sua pulsão sexual Alguns aceitam a inversão como algo natural tal como os normais aceitam a orientação de sua libido e defendem energicamente sua igualdade de direitos com os normais Outros porém rebelamse contra o fato de sua inversão e a sentem como uma compulsão patológica Outras variações concernem às relações temporais O traço da inversão pode vir de longa data no indivíduo até onde sua memória consegue alcançar ou só se ter feito notar em determinada época antes ou depois da puberdade Esse caráter pode conservarse por toda a vida ou ser temporariamente suspenso ou ainda constituir um episódio no caminho para o desenvolvimento normal e pode até exteriorizarse pela primeira vez em época posterior da vida após um longo período de atividade sexual normal Observouse também uma oscilação periódica entre o objeto sexual normal e o invertido 6 Particularmente interessantes são os casos em que a libido se altera no sentido da inversão depois de se ter uma experiência penosa com o objeto sexual normal Em geral essas diferentes séries de variações coexistem independentemente umas das outras Em sua forma mais extrema talvez se possa supor regularmente que a inversão existiu desde época muito prematura e que a pessoa se sente em consonância com sua peculiaridade Muitos autores se recusariam a reunir num só conjunto os casos aqui enumerados e prefeririam frisar as diferenças em vez das semelhanças entre esses grupos o que se prende a sua maneira favorita de encarar a inversão No entanto por mais legítimas que sejam essas distinções é impossível desconhecer que todos os graus intermediários são abundantemente encontrados de modo que o estabelecimento de séries como que se impõe por si só CONCEPÇÃO DA INVERSÃO A primeira apreciação da inversão consistiu em concebêla como um sinal inato de degeneração nervosa e estava em consonância com o fato de os observadores médicos terem deparado com ela pela primeira vez em doentes nervosos ou pessoas que davam a impressão de sêlo Essa caracterização contém dois elementos que devem ser apreciados separadamente o caráter inato e a degeneração DEGENERAÇÃO A degeneração está exposta às objeções que se levantam em geral contra o uso indiscriminado dessa palavra Tornouse costume imputar à degeneração todos os tipos de manifestação patológica que não sejam de origem diretamente traumática ou infecciosa A classificação dos degenerados feita por Magnan faz com que nem mesmo a mais primorosa conformação geral da função nervosa fique excluída da aplicabilidade do conceito de degeneração Nessas circunstâncias podese indagar que benefício e que novo conteúdo possui em geral o juízo degeneração Parece mais oportuno falar em degeneração apenas quando 1 houver uma conjugação de muitos desvios graves em relação à norma 2 a capacidade de funcionamento e de sobrevivência parecer em geral gravemente prejudicada Vários fatores permitem ver que os invertidos não são degenerados nesse sentido legítimo da palavra 1 Encontrase a inversão em pessoas que não exibem nenhum outro desvio grave da norma 2 Do mesmo modo encontramola em pessoas cuja eficiência não está prejudicada e que inclusive se destacam por um desenvolvimento intelectual e uma cultura ética particularmente elevados 3 Se abstrairmos os pacientes encontrados em nossa experiência médica e procurarmos abarcar um horizonte mais amplo depararemos em duas direções com fatos que impedem que se conceba a inversão como um sinal de degeneração a É preciso considerar que nos povos antigos no auge de sua cultura a inversão era um fenômeno freqüente quase que uma instituição dotada de importantes funções b Ela é extremamente difundida em muitos povos selvagens e primitivos ao passo que o conceito de degeneração costuma restringirse à civilização elevada cf I Bloch e mesmo entre os povos civilizados da Europa o clima e a raça exercem a mais poderosa influência sobre a disseminação e o juízo que se faz da inversão CARÁTER INATO Como é compreensível o caráter inato só é alegado no tocante à primeira e mais extrema classe dos invertidos e na verdade com base na asseveração dessas pessoas de que em nenhum momento de sua vida mostrouse a elas outra orientação de sua pulsão sexual Já a existência das duas outras classes especialmente da terceira os invertidos ocasionais dificilmente se compatibiliza com a concepção de 7 um caráter inato Por isso os que sustentam essa opinião tendem a separar o grupo dos invertidos absolutos de todos os demais o que tem como conseqüência a renúncia a uma concepção universalmente válida da inversão Assim a inversão teria um caráter inato numa série de casos enquanto noutros poderia terse originado de outra maneira O oposto disso é a concepção alternativa de que a inversão é um caráter adquirido da pulsão sexual Ela se apóia nas seguintes considerações 1 Na vida de muitos invertidos mesmo absolutos podese demonstrar a influência de uma impressão sexual prematura cuja conseqüência duradoura é representada pela inclinação homossexual 2 Na vida de muitos outros é possível indicar as influências externas favorecedoras e inibidoras que levaram em época mais prematura ou mais tardia à fixação da inversão relacionamentos exclusivos com o mesmo sexo companheirismo na guerra detenção em presídios os riscos da relação heterossexual celibato fraqueza sexual etc 3 A inversão pode ser eliminada pela sugestão hipnótica o que seria assombroso numa característica inata Dentro dessa perspectiva podese até contestar a própria existência de uma inversão inata É possível objetar cf Havelock Ellis 1915 que um exame mais rigoroso dos casos reivindicados em prol da inversão inata provavelmente também traria à luz uma vivência da primeira infância que foi determinante para a orientação da libido Essa vivência simplesmente não se teria preservado na memória consciente da pessoa mas seria possível trazêla de volta à lembrança mediante a influência apropriada Segundo esses autores a inversão só poderia ser qualificada como uma variação freqüente da pulsão sexual passível de ser determinada por uma quantidade de circunstâncias externas de vida Mas a aparente certeza assim adquirida chega ao fim através da observação contrária de que muitas pessoas ficam sujeitas às mesmas influências sexuais inclusive na meninice sedução masturbação mútua sem por isso se tornarem invertidas ou assim continuarem permanentemente Somos portanto impelidos à suposição de que a alternativa inatoadquirido é incompleta ou então não abarca todas as situações presentes na inversão EXPLICAÇÃO DA INVERSÃO Nem a hipótese de que a inversão é inata nem tampouco a conjectura alternativa de que é adquirida explicam sua natureza No primeiro caso é preciso dizer o que há nela de inato para que não se concorde com a explicação rudimentar de que a pessoa traz consigo em caráter inato o vínculo da pulsão sexual com determinado objeto sexual No outro caso cabe perguntar se as múltiplas influências acidentais bastariam para explicar a aquisição da inversão sem necessidade de que algo no indivíduo fosse ao encontro delas A negação deste último fator segundo nossas colocações anteriores é inadmissível O RECURSO À BISSEXUALIDADE Desde Lydston 1889 Kiernan 1888 e Chevalier 1893 temse recorrido para esclarecer a possibilidade de uma inversão sexual a uma série de idéias que contém uma nova contradição das opiniões populares Estas admitem que o ser humano ou é homem ou é mulher A ciência porém conhece casos em que os caracteres sexuais parecem confusos e é portanto difícil determinar o sexo antes de mais nada no campo anatômico A genitália dessas pessoas combina caracteres masculinos e femininos hermafroditismo Em casos raros os dois tipos de aparelho sexual coexistem plenamente desenvolvidos hermafroditismo verdadeiro porém com muito mais freqüência achamse ambos atrofiados Mas a importância dessas anormalidades está em que elas facilitam de maneira inesperada a compreensão da formação normal É que certo grau de hermafroditismo anatômico constitui a norma em nenhum indivíduo masculino ou feminino de conformação normal faltam vestígios do aparelho do 8 sexo oposto que persistiram sem nenhuma função como órgãos rudimentares ou que se modificaram para tomar a seu encargo outras funções A concepção resultante desses fatos anatômicos conhecidos de longa data é a de uma predisposição originariamente bissexual que no curso do desenvolvimento vaise transformando em monossexualidade com resíduos ínfimos do sexo atrofiado Era sugestivo transpor essa concepção para o campo psíquico e explicar a inversão em todas as suas variedades como a expressão de um hermafroditismo psíquico E para resolver a questão restaria apenas constatar uma coincidência regular da inversão com os sinais anímicos e somáticos do hermafroditismo Só que essa expectativa não se realizou Não é possível imaginar relações tão estreitas entre o suposto hibridismo psíquico e o hibridismo anatômico comprovável O que amiúde se constata nos invertidos é uma redução generalizada da pulsão sexual cf Havelock Ellis 1915 e uma ligeira atrofia anatômica dos órgãos Amiúde mas de modo algum regularmente ou mesmo predominantemente Portanto cabe reconhecer que a inversão e o hermafroditismo somático são no conjunto independentes entre si Temse ainda atribuído grande importância aos chamados caracteres sexuais secundários e terciários e a sua freqüente presença acentuada nos invertidos cf Havelock Ellis 1915 Também nisso há muito de acerto mas não se deve esquecer que em geral os caracteres sexuais secundários e terciários de um sexo aparecem com muitíssima freqüência no outro são portanto indícios de hermafroditismo mas nem por isso revelase uma mudança do objeto sexual no sentido da inversão O hermafroditismo psíquico ganharia corpo se com a inversão do objeto sexual houvesse em paralelo ao menos uma mudança das demais qualidades anímicas pulsões e traços de caráter para a variante típica do sexo oposto Mas só se pode esperar tal inversão do caráter com alguma regularidade nas mulheres invertidas pois nos homens a mais plena virilidade anímica é compatível com a inversão A persistir na colocação de um hermafroditismo psíquico é preciso acrescentar que suas manifestações nos diversos campos permitem identificar apenas um ínfimo condicionamento recíproco O mesmo se aplica aliás ao hibridismo somático segundo Halban 1903 também as atrofias de órgãos específicos e os caracteres sexuais secundários aparecem com bastante independência uns dos outros A doutrina da bissexualidade foi exprimida em sua mais crua forma por um portavoz dos invertidos masculinos um cérebro feminino num corpo masculino Entretanto ignoramos quais seriam as características de um cérebro feminino A substituição do problema psicológico pelo anatômico é tão inútil quanto injustificada A tentativa de explicação de KrafftEbing parece concebida de maneira mais exata que a de Ulrichs embora em essência não difira dela segundo KrafftEbing 1895 5 a disposição bissexual dota o indivíduo tanto de centros cerebrais masculinos e femininos quanto de órgãos sexuais somáticos Esses centros começam a desenvolverse na época da puberdade na maioria das vezes sob a influência das glândulas sexuais que independem deles na disposição originária Mas a esses centros masculinos e femininos aplicase o mesmo que dissemos sobre os cérebros masculinos e femininos e a propósito nem sequer sabemos se cabe presumir para as funções sexuais áreas cerebrais delimitadas centros como as que supomos por exemplo para a fala Ainda assim duas idéias permanecem de pé após essas discussões de algum modo há uma disposição bissexual implicada na inversão embora não saibamos em que consiste essa disposição além da formação anatômica e lidase também com perturbações que afetam a pulsão sexual em seu desenvolvimento OBJETO SEXUAL DOS INVERTIDOS A teoria do hermafroditismo psíquico pressupõe que o objeto sexual dos invertidos seja o oposto do normal O homem invertido sucumbiria como a mulher ao encanto proveniente dos atributos masculinos do corpo e da alma sentirseia como uma mulher e buscaria o homem 9 No entanto por melhor que isso se aplique a toda uma série de invertidos ainda está longe de revelar uma característica universal da inversão Não há dúvida alguma de que uma grande parcela dos invertidos masculinos preserva o caráter psíquico da virilidade traz relativamente poucos caracteres secundários do sexo oposto e com efeito busca em seu objeto sexual traços psíquicos femininos Não fosse assim seria incompreensível o fato de a prostituição masculina que hoje como na Antigüidade se oferece aos invertidos copiar as mulheres em todas as exteriorizações da indumentária e do porte tal imitação de outro modo ofenderia necessariamente o ideal dos invertidos Nos gregos entre os quais os homens mais viris figuravam entre os invertidos está claro que o que inflamava o amor do homem não era o caráter masculino do efebo mas sua semelhança física com a mulher bem como seus atributos anímicos femininos a timidez o recato e a necessidade de ensinamentos e assistência Mal se tornava homem o efebo deixava de ser um objeto sexual para o homem e talvez ele próprio se transformasse num amante de efebos Nesses casos portanto como em muitos outros o objeto sexual não é do mesmo sexo mas uma conjugação dos caracteres de ambos os sexos como que um compromisso entre uma moção que anseia pelo homem e outra que anseia pela mulher com a condição imprescindível da masculinidade do corpo da genitália é por assim dizer o reflexo especular da própria natureza bissexual A situação é menos ambígua nas mulheres entre as quais as invertidas ativas exibem com particular freqüência os caracteres somáticos e anímicos do homem e anseiam pela feminilidade em seu objeto sexual muito embora também nesse caso um conhecimento mais estreito pudesse revelar uma variedade maior ALVO SEXUAL DOS INVERTIDOS O fato importante a ser retido é que de modo algum se pode chamar de uniforme a meta sexual dos invertidos Nos homens a relação sexual per anum não coincide em absoluto com a inversão a masturbação é com igual freqüência seu alvo exclusivo e as restrições ao alvo sexual a ponto de ele ser um mero extravasamento da emoção são aqui ainda mais comuns do que no amor heterossexual Também entre as mulheres invertidas são múltiplos os alvos sexuais parecendo privilegiado entre elas o contato com a mucosa bucal CONCLUSÃO É verdade que nos vemos impossibilitados de esclarecer satisfatoriamente a origem da inversão a partir do material apresentado até agora mas podemos notar que nesta indagação chegamos a um conhecimento que talvez se revele mais importante para nós do que a solução da tarefa acima Chamou nos a atenção que imaginávamos como demasiadamente íntima a ligação entre a pulsão sexual e o objeto sexual A experiência obtida nos casos considerados anormais nos ensina que neles há entre a pulsão sexual e o objeto sexual apenas uma solda que corríamos o risco de não ver em conseqüência da uniformidade do quadro normal em que a pulsão parece trazer consigo o objeto Assim somos instruídos a afrouxar o vínculo que existe em nossos pensamentos entre a pulsão e o objeto É provável que de início a pulsão sexual seja independente de seu objeto e tampouco deve ela sua origem aos encantos deste B ANIMAIS E PESSOAS SEXUALMENTE IMATURAS COMO OBJETOS SEXUAIS Enquanto as pessoas cujos objetos sexuais não pertencem ao sexo normalmente apropriado ou seja os invertidos afiguramse ao observador como uma coletânea de indivíduos talvez bastante válidos em outros aspectos os casos em que se escolhem pessoas sexualmente imaturas crianças como objetos sexuais são desde logo encarados como aberrações esporádicas Só excepcionalmente as crianças são objetos sexuais exclusivos em geral passam a desempenhar esse papel quando um indivíduo covarde ou impotente prestase a usálas como substituto ou quando uma pulsão urgente impreterível não pode apropriarse no momento de nenhum objeto mais adequado Ainda assim é esclarecedor sobre a 10 natureza da pulsão sexual o fato de ela admitir tão ampla variação e tamanho rebaixamento de seu objeto coisa que a fome muito mais energicamente agarrada a seu objeto só permitiria nos casos mais extremos Uma observação similar é válida quanto à relação sexual com animais que não é nada rara sobretudo entre os camponeses e onde a atração sexual parece ultrapassar a barreira da espécie Por motivos estéticos de bom grado se atribuiriam estas e outras aberrações graves da pulsão sexual à loucura mas isso não é possível A experiência ensina que não se observam entre os loucos quaisquer perturbações da pulsão sexual diferentes das encontradas entre os sadios bem como em raças e classes inteiras Assim com a mais insólita freqüência encontrase o abuso sexual contra as crianças entre os professores e as pessoas que cuidam de crianças simplesmente porque a eles se oferece a melhor oportunidade para isso Os loucos apenas exibem tal aberração em grau intensificado ou então o que é particularmente significativo elevado a uma prática exclusiva e substituindo a satisfação sexual normal Essa curiosíssima relação entre as variações sexuais e a escala que vai da saúde à perturbação mental dá o que pensar Eu opinaria que este fato ainda por esclarecer seria uma indicação de que as moções da vida sexual mesmo normalmente encontramse entre as menos dominadas pelas atividades anímicas superiores Segundo minha experiência quem é mentalmente anormal em algum outro aspecto seja em termos sociais ou éticos habitualmente também o é em sua vida sexual Mas muitos são os anormais na vida sexual que em todos os outros pontos correspondem à média e que passaram pessoalmente pelo desenvolvimento cultural humano cujo ponto mais fraco continua a ser a sexualidade Ora como resultado mais genérico dessas discussões extrairíamos o entendimento de que numa grande quantidade de condições e num número surpreendentemente elevado de indivíduos a índole e o valor do objeto sexual passam para segundo plano O essencial e constante na pulsão sexual é alguma outra coisa 2 DESVIOS COM RESPEITO AO ALVO SEXUAL Considerase como alvo sexual normal a união dos genitais no ato designado como coito que leva à descarga da tensão sexual e à extinção temporária da pulsão sexual uma satisfação análoga à saciação da fome Todavia mesmo no processo sexual mais normal reconhecemse os rudimentos daquilo que se desenvolvido levaria às aberrações descritas como perversões É que certas relações intermediárias com o objeto sexual a caminho do coito tais como apalpálo e contemplálo são reconhecidas como alvos sexuais preliminares Essas atividades de um lado trazem prazer em si mesmas e de outro intensificam a excitação que deve perdurar até que se alcance o alvo sexual definitivo Além disso a um desses contatos o das mucosas labiais das duas pessoas o beijo atribuiuse em muitos povos dentre eles os mais altamente civilizados um elevado valor sexual apesar de as partes do corpo nele implicadas não pertencerem ao aparelho sexual mas constituírem a entrada do tubo digestivo Aí estão portanto fatores que permitem ligar as perversões à vida sexual normal e que também são aplicáveis à classificação delas As perversões são ou a transgressões anatômicas quanto às regiões do corpo destinadas à união sexual ou b demoras nas relações intermediárias com o objeto sexual que normalmente seriam atravessadas com rapidez a caminho do alvo sexual final A TRANSGRESSÕES ANATÔMICAS SUPERVALORIZAÇÃO DO OBJETO SEXUAL Somente em raríssimos casos a valorização psíquica com que é aquinhoado o objeto sexual enquanto alvo desejado da pulsão sexual restringese a sua genitália ela se propaga antes por todo o seu corpo e tende a abranger todas as sensações provenientes do objeto sexual A mesma supervalorização irradiase pelo campo psíquico e se manifesta como uma cegueira lógica enfraquecimento do juízo perante as realizações anímicas e as perfeições do objeto sexual e também 11 como uma submissão crédula aos juízos dele provenientes Assim é que a credulidade do amor passa a ser uma fonte importante se não a fonte originária da autoridade Ora é essa supervalorização sexual que não suporta bem a restrição do alvo sexual à união dos órgãos genitais propriamente ditos e que contribui para elevar as atividades ligadas a outras partes do corpo à condição de alvos sexuais A importância desse fator da supervalorização sexual pode ser estudada em melhores condições no homem cuja vida amorosa é a única a terse tornado acessível à investigação enquanto a da mulher em parte por causa da atrofia cultural em parte por sua discrição e insinceridade convencionais permanece envolta numa obscuridade ainda impenetrável USO SEXUAL DA MUCOSA DOS LÁBIOS E DA BOCA O uso da boca como órgão sexual é considerado como perversão quando os lábios língua de uma pessoa entram em contato com a genitália de outra mas não quando ambas colocam em contato a mucosa labial Nesta exceção reside o ponto de ligação com o normal Quem por considerálas perversões detesta as outras práticas certamente usuais desde os primórdios da humanidade cede nisso a um claro sentimento de asco que o resguarda de aceitar tal alvo sexual Mas os limites desse asco são muitas vezes puramente convencionais aquele que beija com ardor os lábios de uma bela jovem talvez usasse com asco a escova de dentes dela embora não tenha nenhuma razão para supor que sua própria cavidade bucal seja mais limpa que a da moça Chama a atenção aqui o fator do asco que estorva a supervalorização libidinosa do objeto sexual mas que por sua vez pode ser vencido pela libido Poder seia ver no asco uma das forças que levaram à restrição do alvo sexual Em geral estas se detêm ante a genitália Mas não há dúvida alguma de que também os genitais do sexo oposto em si mesmos podem constituir objetos de asco e de que esse comportamento é uma das características de todos os histéricos sobretudo as mulheres A força da pulsão sexual gosta de se exercer na dominação desse asco Ver a partir de 1 USO SEXUAL DO ORIFÍCIO ANAL No que concerne ao ânus reconhecese com clareza ainda maior do que nos casos anteriores que é a repugnância que apõe nesse alvo sexual o selo da perversão Mas que eu não seja acusado de partidarismo por observar que a fundamentação desse asco no fato de tal parte do corpo servir à excreção e entrar em contato com o asqueroso em si os excrementos não é muito mais convincente do que a razão fornecida pelas moças histéricas para explicar seu asco ante o órgão genital masculino que ele serve à micção O papel sexual da mucosa do ânus de modo algum se restringe à relação sexual entre homens nem tampouco a predileção por ela é característica da sensibilidade dos invertidos Parece ao contrário que o paedicatio do homem deve seu papel à analogia com o ato praticado com a mulher ao passo que a masturbação recíproca é o alvo sexual mais facilmente encontrado na relação sexual dos invertidos SIGNIFICAÇÃO DE OUTRAS PARTES DO CORPO A propagação do interesse sexual para outras partes do corpo com todas as suas variações em princípio nada nos oferece de novo nada acrescenta ao conhecimento da pulsão sexual que nisso não faz senão proclamar sua intenção de se apoderar do objeto sexual em todos os sentidos Mas ao lado da supervalorização sexual apresentase nas transgressões anatômicas um segundo fator que é alheio ao conhecimento popular Certos lugares do corpo como as mucosas bucal e anal que aparecem repetidamente nessas práticas como que reivindicam ser considerados e tratados eles mesmos como genitais Veremos mais adiante que essa reivindicação se justifica pelo desenvolvimento da pulsão sexual e que é atendida na sintomatologia de certos estados patológicos SUBSTITUIÇÃO IMPRÓPRIA DO OBJETO SEXUAL FETICHISMO 12 Uma impressão muito peculiar resulta dos casos em que o objeto sexual normal é substituído por outro que guarda certa relação com ele mas que é totalmente impróprio para servir ao alvo sexual normal Do ponto de vista da classificação por certo teríamos feito melhor em mencionar esse grupo sumamente interessante de aberrações da pulsão sexual já entre os desvios com respeito ao objeto sexual mas o adiamos até tomar conhecimento do fator da supervalorização sexual da qual dependem esses fenômenos ligados ao abandono do alvo sexual O substituto do objeto sexual geralmente é uma parte do corpo os pés os cabelos muito pouco apropriada para fins sexuais ou então um objeto inanimado que mantém uma relação demonstrável com a pessoa a quem substitui de preferência com a sexualidade dela um artigo de vestuário uma peça íntima Comparouse esse substituto não injustificadamente com o fetiche em que o selvagem vê seu deus incorporado A transição para os casos de fetichismo com renúncia ao alvo sexual seja este normal ou perverso constituise dos casos em que se exige do objeto sexual uma condição fetichista para que o alvo sexual seja alcançado determinada cor dos cabelos certas roupas ou mesmo defeitos físicos Nenhuma outra variação da pulsão sexual nas raias do patológico merece tanto o nosso interesse quanto essa dada a singularidade dos fenômenos a que dá lugar Um certo rebaixamento da aspiração ao alvo sexual normal fraqueza de execução no aparelho sexual parece ser prérequisito disso em todos os casos O ponto de ligação com o normal é proporcionado pela supervalorização psicologicamente necessária do objeto sexual que se propaga inevitavelmente por tudo o que está associativamente ligado ao objeto Por isso certo grau desse fetichismo costuma ser próprio do amor normal sobretudo nos estágios de enamoramento em que o alvo sexual normal é inatingível ou sua satisfação parece impedida Schaff mir ein Halstuch von ihrer Brust Ein Strumpfband meiner Liebeslust O caso só se torna patológico quando o anseio pelo fetiche se fixa indo além da condição mencionada e se coloca no lugar do alvo sexual normal e ainda quando o fetiche se desprende de determinada pessoa e se torna o único objeto sexual São essas as condições gerais para que meras variações da pulsão sexual se transformem em aberrações patológicas Na escolha do fetiche manifestase como Binet 1888 foi o primeiro a sustentar e como depois se comprovou abundantemente a influência persistente de uma impressão sexual recebida na maioria das vezes na primeira infância o que se pode comparar com a proverbial persistência do primeiro amor on revient toujours à ses premiers amours Essa derivação é particularmente clara nos casos em que há apenas um condicionamento fetichista do objeto sexual Voltaremos a deparar em outro ponto ver em 1 com a significação das impressões sexuais precoces Em outros casos o que leva à substituição do objeto pelo fetiche é uma conexão simbólica de pensamentos que na maioria das vezes não é consciente para a pessoa Os trajetos dessas conexões nem sempre podem ser indicados com certeza o pé por exemplo é um antiquíssimo símbolo sexual que já aparece no mito e as peles decerto devem seu papel de fetiche à associação com os pêlos do mons Veneris Não obstante nem mesmo esse simbolismo parece independer sempre das experiências sexuais da infância B FIXAÇÕES DE ALVOS SEXUAIS PROVISÓRIOS SURGIMENTO DE NOVAS INTENÇÕES Todas as condições externas e internas que dificultam ou adiam a consecução do alvo sexual normal impotência preço elevado do objeto sexual riscos do ato sexual reforçam como é compreensível a tendência a demorarse nos atos preliminares e a formar a partir deles novos alvos sexuais que podem tomar o lugar dos normais Um exame mais atento sempre mostra que esses novos propósitos mesmo os que se afiguram mais estranhos já se esboçam no processo sexual normal 13 O TOCAR E O OLHAR Uma certa dose de uso do tato ao menos para os seres humanos é indispensável para que se atinja o alvo sexual normal Sabese também universalmente que fonte de prazer por um lado e que afluxo de excitação renovada por outro são proporcionados pelas sensações de contato com a pele do objeto sexual Portanto demorarse no tocar desde que o ato sexual seja levado adiante dificilmente pode contar entre as perversões O mesmo se dá com o ver que em última análise deriva do tocar A impressão visual continua a ser o caminho mais freqüente pelo qual se desperta a excitação libidinosa e é com a transitabilidade desse caminho se é que esse tipo de consideração teleológica é permissível que conta a seleção natural ao fazer com que o objeto sexual se desenvolva em termos de beleza A progressiva ocultação do corpo advinda com a civilização mantém desperta a curiosidade sexual que ambiciona completar o objeto sexual através da revelação das partes ocultas mas que pode ser desviada sublimada para a arte caso se consiga afastar o interesse dos genitais e voltálo para a forma do corpo como um todo A demora nesse alvo sexual intermediário do olhar carregado de sexo surge em certa medida na maioria das pessoas normais e de fato lhes dá a possibilidade de orientarem uma parcela de sua libido para alvos artísticos mais elevados Por outro lado o prazer de ver escopofilia transformase em perversão a quando se restringe exclusivamente à genitália b quando se liga à superação do asco o voyeur espectador das funções excretórias ou c quando suplanta o alvo sexual normal em vez de ser preparatório a ele Este último é marcantemente o caso dos exibicionistas que se posso deduzilo após diversas análises exibem seus genitais para conseguir ver em contrapartida a genitália do outro Na perversão que aspira a olhar e ser olhado distinguese um traço curiosíssimo do qual nos ocuparemos ainda mais intensamente na aberração a ser examinada a seguir ou seja nela o alvo sexual apresentase numa configuração dupla nas formas ativa e passiva A força que se opõe ao prazer de ver mas pode eventualmente ser superada por ele como vimos antes no caso do asco é a vergonha SADISMO E MASOQUISMO A inclinação a infligir dor ao objeto sexual bem como sua contrapartida que são as mais freqüentes e significativas de todas as perversões foram denominadas por KrafftEbing em formas ativa e passiva de sadismo e masoquismo passivo Outros autores p ex SchrenckNotzing 1899 preferem a designação mais estrita de algolagnia que destaca o prazer na dor a crueldade enquanto os termos escolhidos por KrafftEbing colocam em primeiro plano o prazer em qualquer forma de humilhação ou sujeição No tocante à algolagnia ativa o sadismo suas raízes são fáceis de apontar nas pessoas normais A sexualidade da maioria dos varões exibe uma mescla de agressão de inclinação a subjugar cuja importância biológica talvez resida na necessidade de vencer a resistência do objeto sexual de outra maneira que não mediante o ato de cortejar Assim o sadismo corresponderia a um componente agressivo autonomizado e exagerado da pulsão sexual movido por deslocamento para o lugar preponderante O conceito de sadismo oscila na linguagem corriqueira desde uma atitude meramente ativa ou mesmo violenta para com o objeto sexual até uma satisfação exclusivamente condicionada pela sujeição e maustratos a ele infligidos Num sentido estrito somente este último caso extremo merece o nome de perversão De maneira similar a designação de masoquismo abrange todas as atitudes passivas perante a vida sexual e o objeto sexual a mais extrema das quais parece ser o condicionamento da satisfação ao padecimento de dor física ou anímica advinda do objeto sexual O masoquismo enquanto perversão parece distanciarse mais do alvo sexual normal do que sua contrapartida em primeiro lugar podese pôr em dúvida se ele aparece alguma vez como fenômeno primário ou se pelo contrário surge 14 regularmente do sadismo mediante uma transformação É freqüente poderse reconhecer que o masoquismo não é outra coisa senão uma continuação do sadismo que se volta contra a própria pessoa que com isso assume para começar o lugar do objeto sexual A análise clínica dos casos extremos de perversão masoquista mostra a colaboração de uma ampla série de fatores como o complexo de castração e a consciência de culpa no exagero e fixação da atitude sexual passiva originária A dor que com isso é superada alinhase com o asco e a vergonha que se opunham à libido como resistência O sadismo e o masoquismo ocupam entre as perversões um lugar especial já que o contraste entre atividade e passividade que jaz em sua base pertence às características universais da vida sexual Que a crueldade e a pulsão sexual estão intimamente correlacionadas énos ensinado acima de qualquer dúvida pela história da civilização humana mas no esclarecimento dessa correlação não se foi além de acentuar o fator agressivo da libido Segundo alguns autores essa agressão mesclada à pulsão sexual é na realidade um resíduo de desejos canibalísticos e portanto uma coparticipação do aparelho de dominação que atende à satisfação de outra grande necessidade ontogeneticamente mais antiga Afirmouse também que toda dor contém em si mesma a possibilidade de uma sensação prazerosa Contentamonos aqui em afirmar que o esclarecimento dessa perversão de modo algum tem sido satisfatório e que possivelmente diversas aspirações anímicas nela se combinam para produzir um efeito único A particularidade mais notável dessa perversão reside porém em que suas formas ativa e passiva costumam encontrarse juntas numa mesma pessoa Quem sente prazer em provocar dor no outro na relação sexual é também capaz de gozar como prazer de qualquer dor que possa extrair das relações sexuais O sádico é sempre e ao mesmo tempo um masoquista ainda que o aspecto ativo ou passivo da perversão possa terse desenvolvido nele com maior intensidade e represente sua atividade sexual predominante Assim vemos que algumas das inclinações à perversão apresentamse regularmente como pares de opostos o que em conjunto com um material a ser posteriormente apresentado pode reivindicar uma elevada significação teórica É ainda evidente que a existência do par de opostos sadismomasoquismo não é dedutível em termos imediatistas da mescla de agressão Ao contrário ficaríamos tentados a relacionar a presença simultânea desses opostos com a oposição entre masculino e feminino que se combina na bissexualidade oposição que amiúde é substituída na psicanálise pelo contraste entre ativo e passivo 3 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AS PERVERSÕES VARIAÇÃO E DOENÇA É natural que os médicos que inicialmente estudaram as perversões em exemplos bem marcados e em condições especiais tenhamse inclinado a adjudicarlhes o caráter de um sinal de degeneração ou doença tal como havia ocorrido com a inversão Não obstante é ainda mais fácil descartar tal opinião no presente caso A experiência cotidiana mostrou que a maioria dessas transgressões no mínimo as menos graves dentre elas são um componente que raramente falta na vida sexual das pessoas sadias e que é por elas julgado como qualquer outra intimidade Quando as circunstâncias são favoráveis também as pessoas normais podem substituir durante um bom tempo o alvo sexual normal por uma dessas perversões ou arranjarlhe um lugar ao lado dele Em nenhuma pessoa sadia falta algum acréscimo ao alvo sexual normal que se possa chamar de perverso e essa universalidade basta por si só para mostrar quão imprópria é a utilização reprobatória da palavra perversão Justamente no campo da vida sexual é que se tropeça com dificuldades peculiares e realmente insolúveis no momento quando se quer traçar uma fronteira nítida entre o que é mera variação dentro da amplitude do fisiológico e o que constitui sintomas patológicos Ainda assim em muitas dessas perversões a qualidade do novo alvo sexual é de tal ordem que requer uma apreciação especial Algumas delas afastamse tanto do normal em seu conteúdo que não 15 podemos deixar de declarálas patológicas sobretudo nos casos em que a pulsão sexual realiza obras assombrosas lamber excrementos abusar de cadáveres na superação das resistências vergonha asco horror ou dor Nem mesmo nesses casos porém podese ter uma expectativa certeira de que em seus autores se revelem regularmente pessoas com outras anormalidades graves ou doentes mentais Tampouco nesses casos podese passar por cima do fato de que pessoas cuja conduta é normal em outros aspectos colocamse como doentes apenas no campo da vida sexual sob o domínio da mais irrefreável de todas as pulsões Por outro lado a anormalidade manifesta nas outras relações da vida costuma mostrar invariavelmente um fundo de conduta sexual anormal Na maioria dos casos podemos encontrar o caráter patológico da perversão não no conteúdo do novo alvo sexual mas em sua relação com a normalidade Quando a perversão não se apresenta ao lado do alvo e do objeto sexuais normais nos casos em que a situação é propícia a promovêla e há circunstâncias desfavoráveis impedindo a normalidade mas antes suplanta e substitui o normal em todas as circunstâncias ou seja quando há nela as características de exclusividade e fixação então nos vemos autorizados na maioria das vezes a julgála como um sintoma patológico A PARTICIPAÇÃO DO ANÍMICO NAS PERVERSÕES Talvez justamente nas perversões mais abjetas é que devamos reconhecer a mais abundante participação psíquica na transformação da pulsão sexual Eis aí a obra de um trabalho anímico ao qual não se pode negar a despeito de seu resultado atroz o valor de uma idealização da pulsão A onipotência do amor talvez nunca se mostre com maior intensidade do que nessas aberrações O mais nobre e o mais vil por toda parte da sexualidade aparecem na mais íntima dependência mútua vom Himmel durch die Welt zur Hölle DUAS CONCLUSÕES Do estudo das perversões resultounos a visão de que a pulsão sexual tem de lutar contra certas forças anímicas que funcionam como resistências destacandose entre elas com máxima clareza a vergonha e o asco É lícito conjecturar que essas forças contribuam para circunscrever a pulsão dentro dos limites considerados normais e que caso se desenvolvam precocemente no indivíduo antes que a pulsão sexual alcance a plenitude de sua força sem dúvida serão elas que irão apontar o rumo de seu desenvolvimento Observamos ainda que algumas das perversões investigadas só se tornam compreensíveis mediante a convergência de diversos motivos Se elas admitem uma análise uma decomposição então devem ser de natureza composta Com isso podemos ter um indício de que talvez a própria pulsão sexual não seja uma coisa simples mas reúna componentes que voltam a separarse nas perversões A clínica nos alertaria portanto para a existência de fusões que perderiam sua expressão como tais na conduta normal uniforme 4 A PULSÃO SEXUAL NOS NEURÓTICOS A PSICANÁLISE Uma importante contribuição para o conhecimento da pulsão sexual em pessoas que ao menos se aproximam do normal é extraída de uma fonte acessível apenas por determinado caminho Existe apenas um meio de obter informações exaustivas e sem erro sobre a vida sexual dos chamados psiconeuróticos os que sofrem de histeria neurose obsessiva da erroneamente chamada neurastenia e certamente também de dementia praecox e paranóia submetêlos à investigação psicanalítica da qual se serve o procedimento terapêutico introduzido por Josef Breuer e eu em 1893 e então chamado de catártico Devo primeiramente esclarecer repetindo o que já disse em outras publicações que essas psiconeuroses até onde chegam minhas experiências baseiamse em forças pulsionais de cunho sexual 16 Não quero dizer com isso apenas que a energia da pulsão sexual faz uma contribuição para as forças que sustentam os fenômenos patológicos os sintomas e sim asseverar expressamente que essa contribuição é a única fonte energética constante da neurose e a mais importante de todas de tal sorte que a vida sexual das pessoas em pauta expressase de maneira exclusiva ou predominante ou apenas parcial nesses sintomas Como exprimi em outro lugar 1905e Posfácio ver em 1 os sintomas são a atividade sexual dos doentes A prova dessa afirmação deriva do número crescente de psicanálises de histéricos e outros neuróticos que venho realizando há vinte e cinco anos e sobre cujos resultados já prestei contas minuciosamente em outras publicações como ainda continuarei a fazer A psicanálise elimina os sintomas dos histéricos partindo da premissa de que tais sintomas são um substituto uma transcrição por assim dizer de uma série de processos desejos e aspirações investidos de afeto aos quais mediante um processo psíquico especial o recalcamento negase a descarga através de uma atividade psíquica passível de consciência Assim essas formações de pensamento que foram retidas num estado de inconsciência aspiram a uma expressão apropriada a seu valor afetivo a uma descarga e no caso da histeria encontramna mediante o processo de conversão em fenômenos somáticos justamente os sintomas histéricos Pela retransformação sistemática com a ajuda de uma técnica especial dos sintomas em representações investidas de afeto já agora conscientizadas ficase em condições de averiguar com a máxima precisão a natureza e a origem dessas formações psíquicas antes inconscientes RESULTADOS DA PSICANÁLISE Verificouse por esse caminho que os sintomas representam um substituto de aspirações que extraem sua força da fonte da pulsão sexual Harmonizase plenamente com isso o que sabemos sobre o caráter dos histéricos aqui tomados por modelo de todos os psiconeuróticos antes de seu adoecimento bem como sobre as ocasiões que precipitam a doença O caráter histérico permite identificar um grau de recalcamento sexual que ultrapassa a medida normal uma intensificação da resistência à pulsão sexual que já ficamos conhecendo como vergonha asco e moralidade e uma fuga como que instintiva a qualquer ocupação do intelecto com o problema do sexo que tem como conseqüência nos casos mais acentuados a manutenção de uma completa ignorância sexual mesmo depois de alcançado o período de maturidade sexual Esse traço de caráter tão essencial na histeria não raro escapa à observação casual ficando encoberto pelo segundo fator constitucional da histeria ou seja o desenvolvimento desmedido da pulsão sexual somente a análise psicológica sabe desvendálo em todas as oportunidades e solucionar a enigmática contradição da histeria registrando a presença desse par de opostos uma necessidade sexual desmedida e uma excessiva renúncia ao sexual O ensejo para o adoecimento apresentase à pessoa de disposição histérica quando em conseqüência de sua própria maturação progressiva ou das circunstâncias externas de sua vida as exigências reais do sexo tornamse algo sério para ela Entre a premência da pulsão e o antagonismo da renúncia ao sexual situase a saída para a doença que não soluciona o conflito mas procura escapar a ele pela transformação das aspirações libidinosas em sintomas Não passa de exceção aparente o fato de uma pessoa histérica um homem por exemplo adoecer por causa de uma emoção banal de um conflito que não gire em torno de um interesse sexual Nesses casos a psicanálise consegue demonstrar regularmente que a doença foi possibilitada pelo componente sexual do conflito que privou os processos anímicos de uma execução normal NEUROSE E PERVERSÃO Boa parte da oposição contra estas minhas teses se esclarece pelo fato de que a sexualidade da qual derivo os sintomas psiconeuróticos é considerada coincidente com a pulsão sexual normal Só que a psicanálise ensina ainda mais Ela mostra que de modo algum os sintomas surgem apenas à custa da chamada pulsão sexual normal pelo menos não de maneira exclusiva ou predominante mas que representam a expressão convertida de pulsões que seriam designadas de perversas no sentido mais 17 lato se pudessem expressarse diretamente sem desvio pela consciência em propósitos da fantasia e em ações Portanto os sintomas se formam em parte às expensas da sexualidade anormal a neurose é por assim dizer o negativo da perversão A pulsão sexual dos psiconeuróticos permite discernir todas as aberrações que estudamos como variações da vida sexual normal e como manifestações da patológica a Na vida anímica de todos os neuróticos sem exceção encontramse moções de inversão de fixação da libido em pessoas do mesmo sexo Sem uma discussão a fundo é impossível apreciar adequadamente a importância desse fator para a configuração do quadro patológico só posso asseverar que a tendência inconsciente para a inversão nunca está ausente e em particular presta os maiores serviços ao esclarecimento da histeria masculina b No inconsciente dos psiconeuróticos é possível demonstrar como formadoras do sintoma todas as tendências à transgressão anatômica encontrandose entre elas com particular freqüência e intensidade as que reivindicam para as mucosas da boca e do ânus o papel dos genitais c Um papel muito destacado entre os formadores de sintomas das psiconeuroses é desempenhado pelas pulsões parciais que na maioria das vezes aparecem como pares de opostos e das quais já tomamos conhecimento como portadoras de novos alvos sexuais a pulsão do prazer de ver e do exibicionismo e a pulsão de crueldade em suas formas ativa e passiva A contribuição desta última é indispensável à compreensão da natureza sofrida dos sintomas e domina quase invariavelmente uma parte da conduta social do doente É também por intermédio dessa ligação da libido com a crueldade que se dá a transformação do amor em ódio das moções afetuosas em moções hostis que é característica de um grande número de casos de neurose e até ao que parece da paranóia em geral O interesse por esses resultados aumenta ainda mais a partir de certas particularidades dos fatos a Sempre que se descobre no inconsciente uma pulsão desse tipo passível de ser pareada com um oposto em geral podese demonstrar que este último também é eficaz Toda perversão ativa portanto é acompanhada por sua contrapartida passiva quem é exibicionista no inconsciente é também ao mesmo tempo voyeur quem sofre as conseqüências das moções sádicas recalcadas encontra outro reforço para seu sintoma nas fontes da tendência masoquista O completo acordo com a conduta nas perversões positivas correspondentes decerto é muito digno de nota embora nos quadros patológicos uma ou outra das inclinações opostas desempenhe o papel preponderante b Nos casos mais patentes de psiconeurose é raro encontrar desenvolvida apenas uma dessas pulsões perversas na maioria das vezes encontramos um grande número delas e em geral vestígios de todas Mas a intensidade de cada pulsão isolada é independente do desenvolvimento das outras Também nesse aspecto o estudo das perversões positivas proporciona uma contrapartida exata 5 PULSÕES PARCIAIS E ZONAS ERÓGENAS Se juntarmos o que a investigação das perversões positivas e negativas nos permitiu averiguar parecerá plausível reconduzilas a uma série de pulsões parciais que no entanto não são primárias já que permitem uma decomposição ulterior Por pulsão podemos entender a princípio apenas o representante psíquico de uma fonte endossomática de estimulação que flui continuamente para diferenciála do estímulo que é produzido por excitações isoladas vindas de fora Pulsão portanto é um dos conceitos da delimitação entre o anímico e o físico A hipótese mais simples e mais indicada sobre a natureza da pulsão seria que em si mesma ela não possui qualidade alguma devendo apenas ser considerada como uma medida da exigência de trabalho feita à vida anímica O que distingue as pulsões entre si e as dota de propriedades específicas é sua relação com suas fontes somáticas e seus alvos A fonte da pulsão é um processo excitatório num órgão e seu alvo imediato consiste na supressão desse estímulo orgânico Outra hipótese provisória de que não podemos furtarnos na teoria das pulsões afirma que os órgãos do corpo fornecem dois tipos de excitação baseados em diferenças de natureza química A uma 18 dessas classes de excitação designamos como a que é especificamente sexual e referimonos ao órgão em causa como a zona erógena da pulsão parcial que parte dele Nas inclinações perversas que reivindicam para a cavidade bucal e para o orifício anal um sentido sexual o papel das zonas erógenas é imediatamente perceptível Elas se comportam em todos os aspectos como uma parte do aparelho sexual Na histeria esses lugares do corpo e os tratos de mucosa que partem deles transformamse na sede de novas sensações e de alterações da inervação e mesmo de processos comparáveis à ereção tal como os próprios órgãos genitais diante das excitações dos processos sexuais normais O sentido das zonas erógenas como aparelhos acessórios e substitutos da genitália evidenciase com maior clareza dentre as psiconeuroses na histeria mas isso não implica que ele deva ser menos valorizado nas outras formas de doença Nestas neurose obsessiva paranóia ele é apenas menos reconhecível pois a formação dos sintomas se dá em regiões do aparelho anímico mais afastadas dos centros específicos que dominam o corpo Na neurose obsessiva o que mais se destaca é a significação dos impulsos que criam novos alvos sexuais e parecem independentes das zonas erógenas Não obstante na escopofilia e no exibicionismo o olho corresponde a uma zona erógena no caso da dor e da crueldade como componentes da pulsão sexual é a pele que assume esse mesmo papel a pele que em determinadas partes do corpo diferenciouse nos órgãos sensoriais e se transmudou em mucosa sendo assim a zona erógena πατ εξοχην por excelência 6 ESCLARECIMENTOS SOBRE A APARENTE PREPONDERÂNCIA DA SEXUALIDADE PERVERSA NAS PSICONEUROSES A discussão precedente talvez tenha colocado sob um prisma falso a sexualidade dos psiconeuróticos Talvez tenha criado a aparência de que em virtude de sua predisposição os psiconeuróticos aproximamse estreitamente dos perversos em sua conduta sexual e se distanciam dos normais na mesma medida É bem possível de fato que a disposição constitucional desses doentes contenha além de um grau desmedido de recalcamento sexual e de uma intensidade hiperpotente da pulsão sexual uma tendência incomum à perversão no sentido mais lato Ainda assim a investigação de casos mais brandos mostra que esta última suposição não é necessariamente indispensável ou que pelo menos ao formar um juízo sobre esses efeitos patológicos é preciso descontar a atuação de um outro fator Na maioria dos psiconeuróticos a doença só aparece depois da puberdade a partir das solicitações da vida sexual normal É contra esta que se orienta de modo preponderante o recalcamento Ou então a doença se instaura mais tardiamente quando a libido fica privada de satisfação pelas vias normais Em ambos os casos a libido se comporta como uma corrente cujo leito principal foi bloqueado ela inunda então as vias colaterais que até ali talvez tivessem permanecido vazias Assim também o que parece ser uma enorme tendência à perversão apesar de negativa nos psiconeuróticos pode estar colateralmente condicionado e em todo caso deve ser colateralmente intensificado O fato é que se tem de alinhar o recalcamento sexual enquanto fator interno com os fatores externos que como a restrição da liberdade a inacessibilidade do objeto sexual normal os riscos do ato sexual normal etc permitem que surjam perversões em indivíduos que de outro modo talvez permanecessem normais Nesse aspecto os diversos casos de neurose podem portarse de maneira diferente num prepondera a força inata da tendência à perversão noutro o aumento colateral dessa mesma tendência por ser a libido desviada do alvo e do objeto sexuais normais Seria errôneo presumir uma oposição onde existe de fato uma relação de cooperação A neurose sempre produz seus efeitos máximos quando a constituição e a vivência cooperam no mesmo sentido Uma constituição marcante talvez possa prescindir do apoio de impressões provenientes da vida e um grande abalo na vida talvez provoque a neurose até mesmo numa constituição corriqueira Aliás essa visão da importância etiológica do inato e do acidentalmente vivenciado é igualmente válida em outros campos Entretanto caso se prefira a hipótese de que uma tendência particularmente marcante para as perversões é uma das peculiaridades da constituição psiconeurótica abrese a perspectiva de se poder distinguir uma multiplicidade dessas constituições segundo a preponderância inata desta ou daquela 19 zona erógena desta ou daquela pulsão parcial Como acontece com tantas outras coisas nesse campo ainda não se investigou se há uma relação especial entre a disposição perversa e a escolha da forma específica da doença 7 INDICAÇÃO DO INFANTILISMO DA SEXUALIDADE Ao demonstrar as moções perversas enquanto formadoras de sintomas nas psiconeuroses aumentamos extraordinariamente o número de seres humanos que poderiam ser considerados perversos Não é só que os próprios neuróticos constituam uma classe muito numerosa há também que levar em conta que séries descendentes e ininterruptas ligam a neurose em todas as suas configurações à saúde por isso Moebius pôde dizer com boas justificativas que todos somos um pouco histéricos Assim a extraordinária difusão das perversões forçanos a supor que tampouco a predisposição às perversões é uma particularidade rara mas deve antes fazer parte da constituição que passa por normal É discutível como vimos que as perversões remontem a condições inatas ou resultem como supôs Binet quanto ao fetichismo ver em 1 de experiências ao acaso Agora se nos oferece a conclusão de que há sem dúvida algo inato na base das perversões mas esse algo é inato em todos os seres humanos embora enquanto disposição possa variar de intensidade e ser acentuado pelas influências da vida Tratase pois das raízes inatas da pulsão sexual dadas pela constituição as quais numa série de casos as perversões convertemse nas verdadeiras portadoras da atividade sexual perversa outras vezes passam por uma supressão recalcamento insuficiente de tal sorte que podem atrair indiretamente para si na qualidade de sintomas patológicos parte da energia sexual e que permitem nos casos mais favoráveis situados entre os dois extremos mediante uma restrição eficaz e outras elaborações a origem da chamada vida sexual normal Mas devemos dizer ainda que essa suposta constituição que exibe os germes de todas as perversões só é demonstrável na criança mesmo que nela todas as pulsões só possam emergir com intensidade moderada Vislumbramos assim a fórmula de que os neuróticos preservaram o estado infantil de sua sexualidade ou foram retransportados para ele Desse modo nosso interesse voltase para a vida sexual da criança e procederemos ao estudo do jogo de influências que domina o processo de desenvolvimento da sexualidade infantil até seu desfecho na perversão na neurose ou na vida sexual normal 20 A SEXUALIDADE INFANTIL O DESCASO PARA COM O INFANTIL Faz parte da opinião popular sobre a pulsão sexual que ela está ausente na infância e só desperta no período da vida designado da puberdade Mas esse não é apenas um erro qualquer e sim um equívoco de graves conseqüências pois é o principal culpado de nossa ignorância de hoje sobre as condições básicas da vida sexual Um estudo aprofundado das manifestações sexuais da infância provavelmente nos revelaria os traços essenciais da pulsão sexual desvendaria sua evolução e nos permitiria ver como se compõe a partir de diversas fontes É digno de nota que os autores que se ocuparam do esclarecimento das propriedades e reações do indivíduo adulto tenham prestado muito mais atenção à fase préhistórica representada pela vida dos antepassados ou seja atribuído uma influência muito maior à hereditariedade do que à outra fase pré histórica àquela que se dá na existência individual da pessoa a saber a infância É que como se pode supor a influência desse período da vida seria mais fácil de compreender e teria direito a ser considerada antes da influência da hereditariedade É certo que na literatura sobre o assunto encontramos notas ocasionais acerca da atividade sexual precoce em crianças pequenas sobre ereções masturbação e até mesmo atividades semelhantes ao coito Mas elas são sempre citadas apenas como processos excepcionais curiosidades ou exemplos assustadores de depravação precoce Nenhum autor ao que eu saiba reconheceu com clareza a normatividade da pulsão sexual na infância e nos escritos já numerosos sobre o desenvolvimento infantil o capítulo sobre o Desenvolvimento Sexual costuma ser omitido AMNÉSIA INFANTIL A razão dessa estranha negligência pode ser buscada em parte nas considerações convencionais que os autores respeitam em conseqüência de sua própria criação e em parte num fenômeno psíquico que até agora escapou a qualquer explicação Refirome à singular amnésia que na maioria das pessoas mas não em todas encobre os primeiros anos da infância até os seis ou oito anos de idade Até o momento não nos ocorreu ficar surpresos ante o fato dessa amnésia e no entanto teríamos boas razões para isso De fato somos informados de que durante esses anos dos quais só preservamos na memória algumas lembranças incompreensíveis e fragmentadas reagíamos com vivacidade frente às impressões sabíamos expressar dor e alegria de maneira humana mostrávamos amor ciúme e outras paixões que então nos agitavam violentamente e até formulávamos frases que eram registradas pelos adultos como uma boa prova de discernimento e de uma capacidade incipiente de julgamento E de tudo isso quando adultos nada sabemos por nós mesmos Por que terá nossa memória ficado tão para trás em relação a nossas outras atividades anímicas Ora temos razões para crer que em nenhuma outra época da vida a capacidade de recepção e reprodução é maior do que justamente nos anos da infância Por outro lado devemos supor ou podemos convencernos disso mediante a investigação psicológica de outrem que as mesmas impressões por nós esquecidas deixaram ainda assim os mais profundos rastros em nossa vida anímica e se tornaram determinantes para todo o nosso desenvolvimento posterior Não há como falar portanto em nenhum declínio real das impressões infantis mas sim numa amnésia semelhante à que observamos nos neuróticos em relação às vivências posteriores e cuja essência consiste num mero impedimento da consciência recalcamento Mas quais são as forças que efetuam esse recalcamento das impressões infantis Quem solucionasse esse enigma teria também esclarecido a amnésia histérica Todavia não queremos deixar de destacar que a existência da amnésia infantil fornece um novo ponto de comparação entre o estado anímico da criança e o dos psiconeuróticos Já deparamos com outro desses pontos ver em 1 quando se impôs a nós a fórmula de que a sexualidade dos psiconeuróticos preserva o estado infantil ou é reconduzida a ele E se a própria amnésia infantil também tiver de ser relacionada com as moções sexuais da infância 21 Aliás ligar a amnésia infantil à histérica é mais do que um mero jogo de palavras A amnésia histérica que está a serviço do recalcamento só é explicável pela circunstância de que o indivíduo já possui um acervo de traços anêmicos que deixaram de estar à disposição da consciência e que agora através de uma ligação associativa apoderamse daquilo sobre o que atuam as forças repulsoras do recalcamento Podese dizer que sem a amnésia infantil não haveria amnésia histérica Cf Freud l950a Carta 84 de 10 de março de 1898 Creio pois que a amnésia infantil que converte a infância de cada um numa espécie de época préhistórica e oculta dele os primórdios de sua própria vida sexual carrega a culpa por não se dar valor ao período infantil no desenvolvimento da vida sexual Um observador isolado não pode preencher as lacunas assim geradas em nosso conhecimento Já em 1896 frisei a significação da infância para a origem de certos fenômenos importantes que dependem da vida sexual e desde então nunca deixei de trazer para primeiro plano o fator infantil na sexualidade 1 O PERÍODO DE LATÊNCIA SEXUAL DA INFÂNCIA E SUAS RUPTURAS As constatações extraordinariamente amiudadas de moções sexuais pretensamente excepcionais e anormativas na infância bem como a revelação das lembranças infantis do neurótico até então inconscientes talvez permitam traçar o seguinte quadro das condutas sexuais da infância Parece certo que o recémnascido traz consigo germes de moções sexuais que continuam a se desenvolver por algum tempo mas depois sofrem uma supressão progressiva a qual por sua vez pode ser rompida por avanços regulares do desenvolvimento sexual ou suspensa pelas peculiaridades individuais Nada se sabe ao certo sobre a regularidade e a periodicidade desse curso oscilante de desenvolvimento Parece no entanto que a vida sexual da criança costuma expressarse numa forma acessível à observação por volta dos três ou quatro anos de idade AS INIBIÇÕES SEXUAIS Durante esse período de latência total ou apenas parcial erigemse as forças anímicas que mais tarde surgirão como entraves no caminho da pulsão sexual e estreitarão seu curso à maneira de diques o asco o sentimento de vergonha as exigências dos ideais estéticos e morais Nas crianças civilizadas temse a impressão de que a construção desses diques é obra da educação e certamente a educação tem muito a ver com isso Na realidade porém esse desenvolvimento é organicamente condicionado e fixado pela hereditariedade podendo produzirse no momento oportuno sem nenhuma ajuda da educação Esta fica inteiramente dentro do âmbito que lhe compete ao limitarse a seguir o que foi organicamente prefixado e imprimilo de maneira um pouco mais polida e profunda FORMAÇÃO REATIVA E SUBLIMAÇÃO Com que meios se erigem essas construções tão importantes para a cultura e normalidade posteriores da pessoa Provavelmente às expensas das próprias moções sexuais infantis cujo afluxo não cessa nem mesmo durante esse período de latência mas cuja energia na totalidade ou em sua maior parte é desviada do uso sexual e voltada para outros fins Os historiadores da cultura parecem unânimes em supor que mediante esse desvio das forças pulsionais sexuais das metas sexuais e por sua orientação para novas metas num processo que merece o nome de sublimação adquiremse poderosos componentes para todas as realizações culturais Acrescentaríamos portanto que o mesmo processo entra em jogo no desenvolvimento de cada indivíduo e situaríamos seu início no período de latência sexual da infância Também sobre o mecanismo desse processo de sublimação podese arriscar uma conjectura As moções sexuais desses anos da infância seriam por um lado inutilizáveis já que estão diferidas as funções reprodutoras o que constitui o traço principal do período de latência e por outro seriam perversas em si ou seja partiriam de zonas erógenas e se sustentariam em pulsões que dada a direção do desenvolvimento do indivíduo só poderiam provocar sensações desprazerosas Por conseguinte elas 22 despertam forças anímicas contrárias moções reativas que para uma supressão eficaz desse desprazer erigem os diques psíquicos já mencionados asco vergonha e moral RUPTURAS DO PERÍODO DE LATÊNCIA Sem nos iludirmos quanto à natureza hipotética e quanto à clareza insuficiente de nossos conhecimentos acerca dos processos do período infantil de latência ou adiamento voltemos à realidade para indicar que esse emprego da sexualidade infantil representa um ideal educativo do qual o desenvolvimento de cada um quase sempre se afasta em algum ponto amiúde em grau considerável Vez por outra irrompe um fragmento de manifestação sexual que se furtou à sublimação ou preservase alguma atividade sexual ao longo de todo o período de latência até a irrupção acentuada da pulsão sexual na puberdade Na medida em que prestam alguma atenção à sexualidade infantil os educadores portamse como se compartilhassem nossas opiniões sobre a construção das forças defensivas morais à custa da sexualidade e como se soubessem que a atividade sexual torna a criança ineducável pois perseguem como vícios todas as suas manifestações sexuais mesmo que não possam fazer muita coisa contra elas Nós porém temos todos os motivos para voltar nosso interesse para esses fenômenos temidos pela educação pois deles esperamos o esclarecimento da configuração originária da pulsão sexual 2 AS MANIFESTAÇÕES DA SEXUALIDADE INFANTIL O CHUCHAR Por motivos que se deduzirão posteriormente tomaremos como modelo das manifestações sexuais infantis o chuchar sugar com deleite ao qual o pediatra húngaro Lindner 1879 dedicou um excelente estudo O chuchar Ludeln ou Lutschen que já aparece no lactente e pode continuar até a maturidade ou persistir por toda a vida consiste na repetição rítmica de um contato de sucção com a boca os lábios do qual está excluído qualquer propósito de nutrição Uma parte dos próprios lábios a língua ou qualquer outro ponto da pele que esteja ao alcance até mesmo o dedão do pé são tomados como objeto sobre o qual se exerce essa sucção Uma pulsão preênsil surgida ao mesmo tempo pode manifestarse através de puxadas rítmicas simultâneas do lóbulo da orelha e apoderarse de uma parte de outra pessoa em geral a orelha para o mesmo fim O sugar com deleite aliase a uma absorção completa da atenção e leva ao adormecimento ou mesmo a uma reação motora numa espécie de orgasmo Não raro combinase com a fricção de alguma parte sensível do corpo como os seios ou a genitália externa Por esse caminho muitas crianças passam do chuchar para a masturbação O próprio Lindner reconheceu a natureza sexual dessa ação e a destacou de maneira irrestrita Na meninice o chuchar é freqüentemente equiparado aos outros maus costumes sexuais da criança De numerosos pediatras e neurologistas temse erguido um protesto muito enérgico contra essa concepção parcialmente baseado sem dúvida na confusão entre sexual e genital Esse protesto levanta uma questão difícil e irrecusável por qual característica genérica podemos reconhecer as manifestações sexuais da criança Pareceme que a concatenação de fenômenos que pudemos discernir através da investigação psicanalítica nos autoriza a ver no chuchar uma manifestação sexual e a estudar justamente nele os traços essenciais da atividade sexual infantil AUTOEROTlSMO Temos a obrigação de fazer um exame aprofundado desse exemplo Como traço mais destacado dessa prática sexual salientemos que a pulsão não está dirigida para outra pessoa satisfazse no próprio corpo é autoerótica para dizêlo com a feliz denominação introduzida por Havelock Ellis 1910 Está claro além disso que o ato da criança que chucha é determinado pela busca de um prazer já vivenciado e agora relembrado No caso mais simples portanto a satisfação é encontrada mediante a 23 sucção rítmica de alguma parte da pele ou da mucosa É fácil adivinhar também em que ocasiões a criança teve as primeiras experiências desse prazer que agora se esforça por renovar A primeira e mais vital das atividades da criança mamar no seio materno ou em seus substitutos há de têla familiarizado com esse prazer Diríamos que os lábios da criança comportaramse como uma zona erógena e a estimulação pelo fluxo cálido de leite foi sem dúvida a origem da sensação prazerosa A princípio a satisfação da zona erógena deve terse associado com a necessidade de alimento A atividade sexual apóiase primeiramente numa das funções que servem à preservação da vida e só depois tornase independente delas Quem já viu uma criança saciada recuar do peito e cair no sono com as faces coradas e um sorriso beatífico há de dizer a si mesmo que essa imagem persiste também como norma da expressão da satisfação sexual em épocas posteriores da vida A necessidade de repetir a satisfação sexual dissociase então da necessidade de absorção de alimento uma separação que se torna inevitável quando aparecem os dentes e o alimento já não é exclusivamente ingerido por sucção mas é também mastigado A criança não se serve de um objeto externo para sugar mas prefere uma parte de sua própria pele porque isso lhe é mais cômodo porque a torna independente do mundo externo que ela ainda não consegue dominar e porque desse modo ela se proporciona como que uma segunda zona erógena se bem que de nível inferior A inferioridade dessa segunda região a levará mais tarde a buscar em outra pessoa a parte correspondente os lábios Pena eu não poder beijar a mim mesmo dirseia subjazer a isso Nem todas as crianças praticam esse chuchar É de se supor que cheguem a fazêlo aquelas em quem a significação erógena da zona labial for constitucionalmente reforçada Persistindo essa significação tais crianças uma vez adultas serão ávidas apreciadoras do beijo tenderão a beijos perversos ou se forem homens terão um poderoso motivo para beber e fumar Caso sobrevenha o recalcamento porém sentirão nojo da comida e produzirão vômitos histéricos Por força da dupla finalidade da zona labial o recalcamento se estende à pulsão de nutrição Muitas de minhas pacientes com distúrbios alimentares globus hystericus constricção na garganta e vômitos foram na infância firmes adeptas do chuchar No chuchar ou sugar com deleite já podemos observar as três características essenciais de uma manifestação sexual infantil Esta nasce apoiandose numa das funções somáticas vitais ainda não conhece nenhum objeto sexual sendo autoerótica e seu alvo sexual achase sob o domínio de uma zona erógena Antecipemos que essas características são válidas também para a maioria das outras atividades das pulsões sexuais infantis 3 O ALVO SEXUAL DA SEXUALIDADE INFANTIL CARACTERÍSTICAS DAS ZONAS ERÓGENAS Do exemplo do chuchar podemos ainda deduzir várias coisas para a caracterização do que é uma zona erógena Tratase de uma parte da pele ou da mucosa em que certos tipos de estimulação provocam uma sensação prazerosa de determinada qualidade Não há dúvida de que os estímulos produtores de prazer estão ligados a condições especiais que desconhecemos Entre elas o caráter rítmico deve desempenhar algum papel impondose aqui a analogia com as cócegas Menos seguro parece é se o caráter da sensação prazerosa provocada pelo estímulo pode ser designado de particular particularidade esta em que estaria contido justamente o fator sexual Em matéria de prazer e desprazer a psicologia ainda tateia tanto no escuro que as hipóteses mais prudentes são as mais recomendáveis Mais adiante talvez deparemos com razões que pareçam sustentar a idéia de uma qualidade particular da sensação prazerosa A propriedade erógena pode ligarse de maneira mais marcante a certas partes do corpo Existem zonas erógenas predestinadas como mostra o exemplo do chuchar Mas esse exemplo ensina também que qualquer outro ponto da pele ou da mucosa pode tomar a seu encargo as funções de uma zona erógena devendo portanto ter certa aptidão para isso Assim a qualidade do estímulo mais do que a natureza das partes do corpo é que tem a ver com a produção da sensação prazerosa A criança chuchadora perscruta seu corpo para sugar alguma parte dele que depois por hábito tornase a 24 preferida quando tropeça casualmente numa das partes predestinadas os mamilos a genitália esta decerto retém a preferência Uma capacidade de deslocamento inteiramente análoga reaparece na sintomatologia da histeria Nessa neurose o recalcamento afeta sobretudo as zonas genitais propriamente ditas e estas transmitem sua excitabilidade a outras zonas erógenas de outro modo relegadas na vida adulta que então se comportam exatamente como genitais Além disso porém tal como ocorre no chuchar qualquer outra parte do corpo pode ser provida da excitabilidade da genitália e alçada à condição de zona erógena As zonas erógenas e histerógenas exibem as mesmas características O ALVO SEXUAL INFANTIL O alvo sexual da pulsão infantil consiste em provocar a satisfação mediante a estimulação apropriada da zona erógena que de algum modo foi escolhida Essa satisfação deve ter sido vivenciada antes para que reste daí uma necessidade de repetila e é lícito esperarmos que a natureza tenha tomado medidas seguras para que essa vivência não fique entregue ao acaso Já tomamos conhecimento do que é que promove a satisfação dessa finalidade no caso da zona labial é a ligação simultânea dessa parte do corpo com a alimentação Ainda depararemos com outros dispositivos semelhantes como fontes da sexualidade O estado de necessidade de repetir uma satisfação transparece de duas maneiras por um sentimento peculiar de tensão que tem antes o caráter de desprazer e por uma sensação de prurido ou estimulação centralmente condicionada e projetada para a zona erógena periférica Por isso podese também formular o alvo sexual de outra maneira ele viria substituir a sensação de estimulação projetada na zona erógena pelo estímulo externo que a abolisse ao provocar a sensação de satisfação Esse estímulo externo consiste na maioria das vezes numa manipulação análoga ao sugar Está em perfeito acordo com nossos conhecimentos fisiológicos que a necessidade possa também ser evocada perifericamente através de uma modificação real na zona erógena Só é um tanto estranho que para ser abolido um estímulo pareça exigir a colocação de um segundo no mesmo lugar 4 AS MANlFESTAÇÕES SEXUAIS MASTURBATÓRIAS Só pode alegrarnos sumamente descobrir que uma vez compreendida a pulsão vinda de uma única zona erógena não temos muito mais coisas importantes a aprender sobre a atividade sexual das crianças As diferenças mais significativas dizem respeito às providências necessárias à satisfação que no caso da zona labial consistiam no sugar e que terão de ser substituídas por outras ações musculares conforme a posição e a natureza das outras zonas ATIVIDADE DA ZONA ANAL Tal como a zona dos lábios a zona anal está apta por sua posição a mediar um apoio da sexualidade em outras funções corporais É de se presumir que a importância erógena dessa parte do corpo seja originariamente muito grande lnteiramonos pela psicanálise não sem certo assombro das transmutações por que normalmente passam as excitações sexuais dela provenientes e da freqüência com que essa zona conserva durante toda a vida uma parcela considerável de excitabilidade genital Os distúrbios intestinais tão freqüentes na infância providenciam para que não faltem a essa zona excitações intensas Os catarros intestinais na mais tenra idade deixam a criança nervosa como se costuma dizer no adoecimento neurótico posterior eles têm uma influência determinante na manifestação somática da neurose e colocam à disposição dela toda a soma das perturbações intestinais Considerandose a significação erógena da zona rectal que se preserva ao menos em sua transmutação tampouco podemos rir da influência das hemorróidas às quais a medicina antiga atribuía tanta importância no esclarecimento dos estados neuróticos As crianças que tiram proveito da estimulabilidade erógena da zona anal denunciamse por reterem as fezes até que sua acumulação provoca violentas contrações musculares e na passagem pelo ânus pode exercer uma estimulação intensa na mucosa Com isso hão de produzirse sensações de volúpia ao lado das sensações dolorosas Um dos melhores presságios de excentricidade e nervosismo 25 posteriores é a recusa obstinada do bebê a esvaziar o intestino ao ser posto no troninho ou seja quando isso é desejado pela pessoa que cuida dele ficando essa função reservada para quando aprouver a ele próprio Naturalmente não é que lhe interesse sujar a cama ele está apenas providenciando para que não lhe escape o dividendo de prazer que vem junto com a defecação Mais uma vez os educadores têm razão ao chamarem de perversas schlimm as crianças que retardam essas funções O conteúdo intestinal que enquanto corpo estimulador comportase frente a uma área de mucosa sexualmente sensível como precursor de outro órgão destinado a entrar em ação depois da fase da infância tem ainda para o lactante outros importantes sentidos É obviamente tratado como parte de seu próprio corpo representando o primeiro presente ao desfazerse dele a criaturinha pode exprimir sua docilidade perante o meio que a cerca e ao recusálo sua obstinação Do sentido de presente esse conteúdo passa mais tarde ao de bebê que segundo uma das teorias sexuais infantis ver em 1 é adquirido pela comida e nasce pelo intestino A retenção da massa fecal a princípio intencionalmente praticada para tirar proveito da estimulação como que masturbatória da zona anal ou para ser empregada na relação com as pessoas que cuidam da criança é aliás uma das raízes da constipação tão freqüente nos neuropatas Além disso o sentido pleno da zona anal espelhase no fato de se encontrarem muito poucos neuróticos que não tenham seus rituais escatológicos especiais suas cerimônias e coisas similares por eles cuidadosamente mantidos em segredo A estimulação masturbatória efetiva da zona anal com a ajuda do dedo provocada por uma comichão centralmente determinada ou perifericamente mantida não é nada rara nas crianças mais velhas ATIVIDADE DA ZONA GENITAL Entre as zonas erógenas do corpo infantil encontrase uma que decerto não desempenha o papel principal nem pode ser a portadora das moções sexuais mais antigas mas que está destinada a grandes coisas no futuro Nas crianças tanto de sexo masculino quanto feminino está ligada à micção glande clitóris e nas primeiras achase dentro de uma bolsa de mucosa de modo que não pode faltarlhe a estimulação por secreções que aticem precocemente a excitação sexual As atividades sexuais dessa zona erógena que faz parte dos órgãos sexuais propriamente ditos são sem dúvida o começo da futura vida sexual normal Por sua posição anatômica pelas secreções em que estão banhadas pela lavagem e fricção advindas dos cuidados com o corpo e por certas excitações acidentais como as migrações de vermes intestinais nas meninas é inevitável que a sensação prazerosa que essas partes do corpo são capazes de produzir se faça notar à criança já na fase de amamentação despertando uma necessidade de repetila Considerada a soma dos dispositivos existentes e ponderando que as providências para manter a limpeza mal podem atuar de modo diferente da sujeira custa evitar a conclusão de que é através do onanismo do lactante do qual praticamente nenhum indivíduo escapa que se estabelece a futura primazia dessa zona erógena na atividade sexual A ação que elimina o estímulo e provoca a satisfação consiste num contato por fricção manual ou numa pressão decerto preparada nos moldes de um reflexo exercida com a mão ou unindo as coxas Este último método é de longe o mais freqüente nas meninas Nos meninos a preferência pela mão já indica a importante contribuição que a pulsão de dominação está destinada a fazer para a atividade sexual masculina A bem da clareza convém eu indicar que é preciso distinguir três fases da masturbação infantil A primeira é própria do período de lactância a segunda pertence à breve florescência da atividade sexual por volta do quarto ano de vida e somente a terceira corresponde ao onanismo da puberdade amiúde o único a ser levado em conta A SEGUNDA FASE DA MASTURBAÇÃO INFANTIL 26 O onanismo do lactante parece desaparecer após um curto prazo mas seu prosseguimento ininterrupto até a puberdade pode constituir o primeiro grande desvio do desenvolvimento a que se aspira para os seres humanos inseridos na cultura Em algum momento da infância posterior ao período de amamentação comumente antes do quarto ano a pulsão sexual dessa zona genital costuma redespertar e novamente durar algum tempo até ser detida por uma nova supressão ou prosseguir ininterruptamente As circunstâncias possíveis são muito variadas e só é viável apreciálas mediante uma análise mais rigorosa dos casos individuais Mas todos os detalhes dessa segunda fase de atividade sexual infantil deixam atrás de si as mais profundas marcas inconscientes na memória da pessoa determinam o desenvolvimento de seu caráter caso ela permaneça sadia e a sintomatologia de sua neurose caso venha a adoecer depois da puberdade Nesta última eventualidade constatamos que esse período sexual foi esquecido e que as lembranças conscientes que o testemunham foram deslocadas já afirmei que eu também vincularia a amnésia infantil normal com essa atividade sexual infantil Através da investigação psicanalítica é possível tornar consciente o esquecido e desse modo eliminar uma compulsão que provém do material psíquico inconsciente O RETORNO DA MASTURBAÇÃO DA LACTÂNCIA A excitação sexual do período de lactância retorna nos anos infantis já indicados seja como um estímulo de prurido centralmente condicionado que exorta a uma satisfação masturbatória seja como um processo da natureza de uma polução que em analogia com as poluções da maturidade chega à satisfação sem a ajuda de ação alguma Este último caso é o mais freqüente nas meninas e na segunda metade da infância não é inteiramente compreensível em termos do que o condiciona e muitas vezes embora não regularmente parece ter como premissa um período anterior de onanismo ativo A sintomatologia dessas manifestações sexuais é escassa o que dá sinal do aparelho sexual ainda não desenvolvido é na maioria das vezes o aparelho urinário que funciona por assim dizer como tutor dele A maioria dos chamados distúrbios vesicais dessa época são perturbações sexuais a enurese noturna quando não representa um ataque epilético corresponde a uma polução Para o reaparecimento da atividade sexual são decisivas as causas internas e as contingências externas ambas as quais podem ser inferidas nos casos de doença neurótica a partir da forma dos sintomas sendo descobertas com certeza através da investigação psicanalítica Sobre as causas internas falaremos mais adiante as contingências fortuitas externas ganham nesse período uma importância grande e duradoura Em primeiro plano situase a influência da sedução que trata a criança prematuramente como um objeto sexual e que em circunstâncias que causam forte impressão ensinaa a conhecer a satisfação das zonas genitais uma satisfação que ela fica quase sempre obrigada a renovar pelo onanismo Tal influência pode provir de adultos ou de outras crianças não me é possível admitir que em meu ensaio sobre A Etiologia da Histeria 1896c eu tenha superestimado sua freqüência ou sua importância embora eu ainda não soubesse na época que os indivíduos que permanecem normais podem ter tido na infância as mesmas experiências e por isso tenha dado maior valor à sedução do que aos fatores da constituição e do desenvolvimento sexuais É evidente que a sedução não é necessária para despertar a vida sexual da criança podendo esse despertar surgir também espontaneamente de causas internas DISPOSIÇÃO PERVERSA POLIMORFA É instrutivo que a criança sob a influência da sedução possa tornarse perversa polimorfa e ser induzida a todas as transgressões possíveis Isso mostra que traz em sua disposição a aptidão para elas por isso sua execução encontra pouca resistência já que conforme a idade da criança os diques anímicos contra os excessos sexuais a vergonha o asco e a moral ainda não foram erigidos ou estão em processo de construção Nesse aspecto a criança não se comporta de maneira diversa da mulher inculta média em quem se conserva a mesma disposição perversa polimorfa Em condições usuais ela pode permanecer sexualmente normal mas guiada por um sedutor habilidoso terá gosto em todas as perversões e as reterá em sua atividade sexual Essa mesma disposição polimorfa e portanto infantil é 27 também explorada pelas prostitutas no exercício de sua profissão e no imenso número de mulheres prostituídas ou em quem se deve supor uma aptidão para a prostituição embora tenham escapado ao exercício dela é impossível não reconhecer nessa tendência uniforme a toda sorte de perversões algo que é universalmente humano e originário PULSÕES PARCIAIS De resto a influência da sedução não ajuda a revelar as circunstâncias iniciais da pulsão sexual mas antes confunde nossa visão dela uma vez que apresenta prematuramente à criança um objeto sexual de que a princípio a pulsão sexual infantil não mostra nenhuma necessidade Contudo devemos admitir que também a vida sexual infantil apesar da dominação preponderante das zonas erógenas exibe componentes que desde o início envolvem outras pessoas como objetos sexuais Dessa natureza são as pulsões do prazer de olhar e de exibir bem como a de crueldade que aparecem com certa independência das zonas erógenas e só mais tarde entram em relações estreitas com a vida genital mas que já na infância se fazem notar como aspirações autônomas inicialmente separadas da atividade sexual erógena A criança pequena é antes de mais nada desprovida de vergonha e em certos períodos de seus primeiros anos mostra uma satisfação inequívoca no desnudamento do corpo com ênfase especial nas partes sexuais A contrapartida dessa inclinação tida como perversa a curiosidade de ver a genitália de outras pessoas provavelmente só se torna manifesta um pouco mais tarde na infância quando o obstáculo do sentimento de vergonha já atingiu certo desenvolvimento Sob a influência da sedução a perversão de ver pode alcançar grande importância na vida sexual da criança Entretanto minhas investigações da meninice tanto de pessoas sadias quanto de doentes neuróticos forçamme a concluir que a pulsão de ver pode surgir na criança como uma manifestação sexual espontânea As crianças pequenas cuja atenção foi atraída em algum momento para sua própria genitália geralmente pela masturbação costumam dar o passo adicional sem ajuda externa e desenvolver um vivo interesse pelos genitais de seus coleguinhas Dado que as oportunidades de satisfazer tal curiosidade em geral só se apresentam quando da satisfação das duas necessidades excrementícias tais crianças tornamse voyeurs zelosos espectadores da micção e da defecação de outrem Uma vez sobrevindo o recalcamento dessas inclinações a curiosidade de ver a genitália alheia seja do mesmo sexo ou do sexo oposto persiste como uma pressão torturante que em muitos casos de neurose fornece posteriormente a mais poderosa força impulsora para a formação do sintoma Com independência ainda maior das outras atividades sexuais vinculadas às zonas erógenas desenvolvese na criança o componente de crueldade da pulsão sexual A crueldade é perfeitamente natural no caráter infantil já que a trava que faz a pulsão de dominação deterse ante a dor do outro a capacidade de compadecerse tem um desenvolvimento relativamente tardio É sabido que ainda não se teve êxito na análise psicológica exaustiva dessa pulsão podemos supor que o impulso cruel provenha da pulsão de dominação e surja na vida sexual numa época em que os genitais ainda não assumiram seu papel posterior Assim ela domina uma fase da vida sexual que mais adiante descreveremos como organização prégenital As crianças que se distinguem por uma crueldade peculiar para com os animais e os companheiros despertam em geral justificadamente a suspeita de uma atividade sexual intensa e precoce advinda das zonas erógenas e mesmo no amadurecimento precoce e simultâneo de todas as pulsões sexuais a atividade sexual erógena parece ser primária A ausência da barreira da compaixão traz consigo o risco de que esse vínculo estabelecido na infância entre as pulsões cruéis e as erógenas tornese depois indissolúvel na vida Desde as Confissões de Jean Jacques Rousseau a estimulação dolorosa da pele das nádegas tem sido reconhecida por todos os educadores como uma das raízes erógenas da pulsão passiva de crueldade masoquismo Disso eles concluíram com acerto que o castigo corporal que quase sempre incide nessa parte do corpo deve ser evitado em todas as crianças cuja libido através das exigências posteriores da educação cultural possa ser forçada para vias colaterais 5 A INVESTIGAÇÃO SEXUAL INFANTIL 28 A PULSÃO DE SABER Ao mesmo tempo em que a vida sexual da criança chega a sua primeira florescência entre os três e os cinco anos também se inicia nela a atividade que se inscreve na pulsão de saber ou de investigar Essa pulsão não pode ser computada entre os componentes pulsionais elementares nem exclusivamente subordinada à sexualidade Sua atividade corresponde de um lado a uma forma sublimada de dominação e de outro trabalha com a energia escopofílica Suas relações com a vida sexual entretanto são particularmente significativas já que constatamos pela psicanálise que na criança a pulsão de saber é atraída de maneira insuspeitadamente precoce e inesperadamente intensa pelos problemas sexuais e talvez seja até despertada por eles O ENIGMA DA ESFINGE Não são interesses teóricos mas práticos que põem em marcha a atividade investigatória na criança A ameaça trazida para suas condições existenciais pela chegada conhecida ou suspeitada de um novo bebê assim como o medo de que esse acontecimento traga consigo a perda de cuidados e de amor tornam a criança pensativa e perspicaz O primeiro problema de que ela se ocupa em consonância com essa história do despertar da pulsão de saber não é a questão da diferença sexual e sim o enigma de onde vêm os bebês Numa distorção facilmente anulável esse é também o enigma proposto pela Esfinge de Tebas Ao contrário o fato de existirem dois sexos é inicialmente aceito pela criança sem nenhuma rebeldia ou hesitação Para o menino é natural presumir uma genitália igual à sua em todas as pessoas que ele conhece sendolhe impossível conjugar a falta dela com sua representação dessas outras pessoas COMPLEXO DE CASTRAÇÃO E INVEJA DO PÊNIS Essa convicção é energicamente sustentada pelos meninos obstinadamente defendida contra a tradição que logo resulta da observação e somente abandonada após sérias lutas internas o complexo de castração As formações substitutivas desse pênis perdido das mulheres desempenham um grande papel na forma assumida pelas diversas perversões A suposição de uma genitália idêntica masculina em todos os seres humanos é a primeira das notáveis e momentosas teorias sexuais infantis Tem pouca serventia para a criança que a ciência biológica dê razão a seu preconceito e tenha de reconhecer o clitóris feminino como um autêntico substituto do pênis Já a garotinha não incorre em semelhantes recusas ao avistar os genitais do menino com sua conformação diferente Está pronta a reconhecêlo de imediato e é tomada pela inveja do pênis que culmina no desejo de ser também um menino tão importante em suas conseqüências TEORIAS DO NASCIMENTO Muitas pessoas recordam com clareza a intensidade com que se interessaram no período pré púbere pela questão da proveniência dos bebês As soluções anatômicas então concebidas foram dos mais diversos tipos eles sairiam do seio ou se recortariam do ventre ou o umbigo se abriria para deixá los passar Fora da análise é muito raro haver lembranças de uma investigação correspondente nos primeiros anos da infância há muito ela sucumbiu ao recalcamento mas seus resultados são uniformes os filhos chegam quando se come determinada coisa como nos contos de fadas e nascem pelo intestino como na eliminação de fezes Essas teorias infantis fazem lembrar condições existentes no reino animal sobretudo a cloaca dos tipos de animais inferiores aos mamíferos A CONCEPÇÃO SÁDICA DA RELAÇÃO SEXUAL Quando as crianças em tão tenra idade assistem à relação sexual entre adultos o que é ensejado pela convicção dos mais velhos de que a criança pequena não pode entender nada de sexual elas não 29 podem deixar de conceber o ato sexual como uma espécie de sevícia ou subjugação ou seja de encará lo num sentido sádico A psicanálise também nos permite verificar que uma impressão dessa natureza na primeira infância contribui em muito para a predisposição a um deslocamento sádico posterior do alvo sexual Ademais as crianças se ocupam muito com o problema de saber em que consiste a relação sexual ou como dizem elas em que consiste ser casado e costumam buscar a solução do mistério em alguma atividade conjunta proporcionada pelas funções de micção ou defecação O FRACASSO TÍPICO DA INVESTIGAÇÃO SEXUAL INFANTIL Em geral podese dizer das teorias sexuais infantis que elas são reflexos da própria constituição sexual da criança e que apesar de seus erros grotescos testemunham uma maior compreensão dos processos sexuais do que se pretenderia de seus criadores As crianças também percebem as alterações provocadas na mãe pela gravidez e sabem interpretálas corretamente a fábula da cegonha é amiúde contada a uma platéia que a recebe com desconfiança profunda embora quase sempre silenciosa Mas como dois elementos permanecem desconhecidos na investigação sexual infantil a saber o papel do sêmen fecundante e a existência do orifício sexual feminino os mesmos pontos aliás em que a organização sexual infantil ainda está atrasada os esforços do pequeno investigador são geralmente infrutíferos e acabam numa renúncia que não raro deixa como seqüela um prejuízo permanente para a pulsão de saber A investigação sexual desses primeiros anos da infância é sempre feita na solidão significa um primeiro passo para a orientação autônoma no mundo e estabelece um intenso alheamento da criança frente às pessoas de seu meio que antes gozavam de sua total confiança 6 AS FASES DE DESENVOLVIMENTO DA ORGANIZAÇÃO SEXUAL Até agora destacamos como características da vida sexual infantil o fato de ela ser essencialmente autoerótica seu objeto encontrase no próprio corpo e de suas pulsões parciais serem inteiramente desvinculadas e independentes entre si em seus esforços pela obtenção de prazer O desfecho do desenvolvimento constitui a chamada vida sexual normal do adulto na qual a obtenção de prazer fica a serviço da função reprodutora e as pulsões parciais sob o primado de uma única zona erógena formam uma organização sólida para a consecução do alvo sexual num objeto sexual alheio ORGANIZAÇÕES PRÉGENITAIS O estudo das inibições e perturbações desse processo de desenvolvimento com a ajuda da psicanálise permitenos identificar os rudimentos e etapas preliminares de tal organização das pulsões parciais que ao mesmo tempo resultam numa espécie de regime sexual Essas fases da organização sexual são normalmente atravessadas sem dificuldade revelandose apenas por alguns indícios Somente nos casos patológicos é que são ativadas e se tornam passíveis de conhecimento pela observação grosseira Chamaremos prégenitais às organizações da vida sexual em que as zonas genitais ainda não assumiram seu papel preponderante Até aqui tomamos conhecimento de duas delas que dão a impressão de constituir recaídas em estados anteriores da vida animal A primeira dessas organizações sexuais prégenitais é a oral ou se preferirmos canibalesca Nela a atividade sexual ainda não se separou da nutrição nem tampouco se diferenciaram correntes opostas em seu interior O objeto de uma atividade é também o da outra e o alvo sexual consiste na incorporação do objeto modelo do que mais tarde irá desempenhar sob a forma da identificação um papel psíquico tão importante Como resíduo dessa hipotética fase de organização que nos foi imposta pela patologia podemos ver o chuchar no qual a atividade sexual desligada da atividade de alimentação renunciou ao objeto alheio em troca de um objeto situado no próprio corpo Uma segunda fase prégenital é a da organização sádicoanal Nela a divisão em opostos que perpassa a vida sexual já se constituiu mas eles ainda não podem ser chamados de masculino e feminino e sim ativo e passivo A atividade é produzida pela pulsão de dominação através da 30 musculatura do corpo e como órgão do alvo sexual passivo o que se faz valer é antes de mais nada a mucosa erógena do intestino mas há para essas duas aspirações opostas objetos que não coincidem Ao lado disso outras pulsões parciais atuam de maneira autoerótica Nessa fase portanto já é possível demonstrar a polaridade sexual e o objeto alheio faltando ainda a organização e a subordinação à função reprodutora AMBIVALÊNCIA Essa forma da organização sexual pode conservarse por toda a vida e atrair permanentemente para si uma boa parcela da atividade sexual O predomínio do sadismo e o papel de cloaca desempenhado pela zona anal conferemlhe um cunho singularmente arcaico Como característica adicional é próprio dela que os pares opostos de pulsões estejam desenvolvidos de maneira aproximadamente igual num estado de coisas descrito pela oportuna designação de ambivalência introduzida por Bleuler A hipótese das organizações prégenitais da vida sexual repousa na análise das neuroses e é difícil apreciála independentemente do conhecimento destas Podemos esperar que a continuidade dos esforços analíticos venha a fornecernos muito mais informações sobre a estrutura e o desenvolvimento da função sexual normal Para completar o quadro da vida sexual infantil é preciso acrescentar que com freqüência ou regularmente já na infância se efetua uma escolha objetal como a que mostramos ser característica da fase de desenvolvimento da puberdade ou seja o conjunto das aspirações sexuais orientase para uma única pessoa na qual elas pretendem alcançar seus objetivos Na infância portanto essa é a maior aproximação possível da forma definitiva assumida pela vida sexual depois da puberdade A diferença desta última reside apenas em que a concentração das pulsões parciais e sua subordinação ao primado da genitália não são conseguidas na infância ou só o são de maneira muito incompleta Assim o estabelecimento desse primado a serviço da reprodução é a última fase por que passa a organização sexual OS DOIS TEMPOS DA ESCOLHA OBJETAL Podese considerar como ocorrência típica que a escolha de objeto se efetue em dois tempos em duas ondas A primeira delas começa entre os dois e os cinco anos e retrocede ou é detida pelo período de latência caracterizase pela natureza infantil de seus alvos sexuais A segunda sobrevém com a puberdade e determina a configuração definitiva da vida sexual Mas a existência da bitemporalidade da escolha objetal que se reduz essencialmente ao efeito do período de latência é de suma importância para o desarranjo desse estado final Os resultados da escolha objetal infantil prolongamse pelas épocas posteriores ou se conservam como tal ou passam por uma renovação na época da puberdade Contudo revelamse inutilizáveis em conseqüência do recalcamento que se desenvolve entre as duas fases Seus alvos sexuais foram amenizados e agora representam o que se pode descrever como a corrente de ternura da vida sexual Somente a investigação psicanalítica pode demonstrar que por trás dessa ternura dessa veneração e respeito ocultamse as antigas aspirações sexuais agora imprestáveis das pulsões parciais infantis A escolha de objeto da época da puberdade tem de renunciar aos objetos infantis e recomeçar como uma corrente sensual A não confluência dessas duas correntes tem como conseqüência muitas vezes a impossibilidade de se alcançar um dos ideais da vida sexual a conjugação de todos os desejos num único objeto 7 AS FONTES DA SEXUALIDADE INFANTIL No esforço de rastrear as origens da pulsão sexual descobrimos até agora que a excitação sexual nasce a como a reprodução de uma satisfação vivenciada em relação a outros processos orgânicos b pela estimulação periférica apropriada das zonas erógenas e c como expressão de algumas pulsões que ainda não nos são inteiramente compreensíveis em sua origem como a pulsão de ver e a pulsão para 31 a crueldade A investigação psicanalítica que retrocede de uma época posterior para a infância e a observação contemporânea da criança conjugamse para nos apontar outras fontes que fluem regularmente para a excitação sexual A observação de crianças tem a desvantagem de trabalhar com dados facilmente passíveis de malentendidos e a psicanálise é dificultada pelo fato de só poder chegar a seus dados e conclusões depois de longos rodeios em cooperação entretanto os dois métodos obtêm um grau satisfatório de certeza de conhecimentos Pela investigação das zonas erógenas já descobrimos que essas regiões da pele meramente mostram uma intensificação especial de um tipo de estimulabilidade que em certo grau é próprio de toda a superfície cutânea Portanto não nos surpreenderá constatar que é possível atribuir efeitos erógenos muito claros a certos tipos de estimulação geral da pele Entre esses destacamos acima de tudo os estímulos térmicos o que talvez facilite nossa compreensão do efeito terapêutico dos banhos quentes EXCITAÇÕES MECÂNICAS Devemos ainda arrolar aqui a produção de excitação sexual pela agitação mecânica e ritmada do corpo na qual devemos distinguir três formas de atuação estimulatória no aparato sensorial dos nervos vestibulares na pele e nas áreas profundas músculos aparelho articular A existência das sensações prazerosas assim geradas vale enfatizar que é lícito empregarmos indistintamente numa vasta medida excitação sexual e satisfação cabendonos o dever de buscar mais adiante uma explicação para isso ver em 1 a existência dessas sensações prazerosas produzidas por certos tipos de agitação mecânica do corpo é confirmada pelo fato de as crianças gostarem tanto das brincadeiras de movimento passivo como serem balançadas e jogadas para o alto e de pedirem incessantemente que sejam repetidas Sabe se que é costumeiro usar o recurso de embalar as crianças inquietas para fazêlas adormecer O balanço das carruagens e mais tarde das viagens de trem exerce um efeito tão fascinante nas crianças mais velhas que pelo menos todos os meninos em algum momento da vida quiseram ser condutores de trem ou cocheiros quando crescessem Eles dedicam um intrigante interesse de extraordinária intensidade a tudo o que se relaciona com as ferrovias e na idade em que se ativa a fantasia pouco antes da puberdade fazem disso o núcleo de um simbolismo singularmente sexual É evidente que a compulsão a estabelecer tal vínculo entre as viagens ferroviárias e a sexualidade provém do caráter prazeroso das sensações de movimento Sobrevindo então o recalcamento que converte tantas das predileções infantis em seu oposto essas mesmas pessoas quando adolescentes ou adultas reagirão com náuseas aos balanços e sacolejos ficarão terrivelmente esgotadas pelas viagens de trem ou tenderão a sofrer ataques de angústia nas viagens protegendose da repetição dessa experiência dolorosa através de um pavor das ferrovias Alinhase aqui o fato ainda não compreendido de que a conjugação do susto com a agitação mecânica produz a grave neurose traumática histeriforme Podemos ao menos supor que essas influências que numa intensidade ínfima transformamse em fontes de excitação sexual provoquem em medida excessiva uma profunda desordem no mecanismo ou na química sexual ATIVIDADE MUSCULAR É sabido que a atividade muscular intensa é para a criança uma necessidade de cuja satisfação ela extrai um prazer extraordinário Se esse prazer tem algo a ver com a sexualidade se encerra em si mesmo uma satisfação sexual ou se pode converterse no ensejo de uma excitação sexual tudo isso é passível de considerações críticas que de fato podem também apontar contra a colocação contida nos parágrafos precedentes a saber que o prazer extraído das sensações de movimento passivo é de natureza sexual ou produz excitação sexual Mas o fato é que uma série de pessoas informa ter vivenciado os primeiros sinais de excitação em sua genitália no curso de brigas ou lutas com seus companheiros de brincadeiras situação na qual além do esforço muscular generalizado há ainda um estreito contato com a pele do oponente A tendência a travar lutas musculares com determinada pessoa bem como em épocas posteriores a inclinação às disputas verbais Provocase o que se ama são um bom sinal de que a escolha de objeto recaiu sobre essa pessoa Na promoção da excitação sexual através da atividade 32 muscular caberia reconhecer uma das raízes da pulsão sádica Em muitos indivíduos a vinculação infantil entre as lutas corporais e a excitação sexual é codeterminante da orientação privilegiada que assumirá mais tarde sua pulsão sexual PROCESSOS AFETIVOS Menores são as dúvidas a que ficam sujeitas as outras fontes de excitação sexual na criança É fácil demonstrar tanto pela observação contemporânea quanto pela investigação posterior que todos os processos afetivos mais intensos inclusive as excitações assustadoras propagamse para a sexualidade o que aliás pode contribuir para a compreensão do efeito patogênico de tais abalos anímicos Nos escolares o pavor de fazer uma prova ou a tensão diante de uma tarefa difícil de solucionar podem ser importantes não só para seu relacionamento com a escola mas também para a irrupção de manifestações sexuais na medida em que nessas circunstâncias é muito freqüente surgir uma sensação estimuladora que incita ao contato com a genitália ou ainda um processo da natureza de uma polução como todas as suas conseqüências desconcertantes O comportamento das crianças na escola que propõe aos professores um número bastante grande de enigmas merece em geral ser relacionado com o desabrochar de sua sexualidade O efeito sexualmente excitante de muitos afetos que em si são desprazerosos tais como a angústia o medo ou o horror conservase num grande número de seres humanos por toda a vida e sem dúvida explica por que tantas pessoas correm atrás da oportunidade de vivenciar tais sensações desde que haja apenas certas circunstâncias secundárias a pertença a um mundo imaginário à leitura ou ao teatro para atenuar a gravidade da sensação desprazerosa Presumindose que também as sensações de dor intensa provoquem o mesmo efeito erógeno sobretudo quando a dor é abrandada ou mantida a distância por alguma condição concomitante estaria nessa vinculação uma das principais raízes da pulsão sadomasoquista de cujas múltiplas complexidades vamos assim ganhando aos poucos algum discernimento TRABALHO INTELECTUAL Por fim é inequívoco que a concentração da atenção numa tarefa intelectual bem como o esforço intelectual em geral têm por conseqüência produzir em muitas pessoas tanto jovens quanto adultas uma excitação sexual concomitante o que por certo constitui a única base justificável para a tão duvidosa prática de derivar as perturbações nervosas do excesso de trabalho intelectual Correndo agora os olhos por essas provas e indícios fornecidos sobre as fontes da excitação sexual infantil e que não foram completos nem exaustivos podemos vislumbrar ou reconhecer os seguintes traços universais parece que as mais abundantes providências são tomadas para que o processo da excitação sexual cuja natureza decerto se tornou bastante enigmática para nós seja posto em andamento Cuidam disso antes de mais nada e de maneira mais ou menos direta as excitações das superfícies sensíveis a pele e os órgãos sensoriais e da maneira mais imediata a influência dos estímulos sobre certas áreas designadas como zonas erógenas O elemento decisivo nessas fontes de excitação sexual é sem dúvida a qualidade do estímulo embora o fator da intensidade no caso da dor não seja de todo indiferente Além disso porém existem no organismo dispositivos cuja conseqüência é fazer com que a excitação sexual surja como um efeito concomitante num grande número de processos internos tão logo a intensidade desses processos ultrapasse certos limites quantitativos O que chamamos de pulsões parciais da sexualidade deriva diretamente dessas fontes internas da excitação sexual ou então se compõe de contribuições vindas dessas fontes e das zonas erógenas É possível que nada de maior importância ocorra no organismo sem fornecer seus componentes para a excitação da pulsão sexual Não me parece possível no momento trazer maior clareza e segurança a essas proposições gerais e responsabilizo dois fatores por isso primeiro a novidade de todo o método de abordagem e segundo a circunstância de a natureza da excitação sexual sernos inteiramente desconhecida Ainda assim eu não gostaria de renunciar a duas observações que prometem abrirnos amplas perspectivas 33 AS DIFERENTES CONSTITUIÇÕES SEXUAIS a Assim como antes vimos ser possível ver em 1 e 2 basear uma multiplicidade de constituições sexuais inatas na formação diferenciada das zonas erógenas podemos agora experimentar a mesma coisa com a inclusão das fontes indiretas de excitação sexual Podemos presumir que essas fontes façam contribuições em todos os indivíduos mas não tenham em todas as pessoas a mesma intensidade e que na conformação privilegiada de cada fonte da excitação sexual situese outra contribuição para diferenciar as diversas constituições sexuais VIAS DE INFLUÊNCIA RECÍPROCA b Se abandonarmos a expressão figurada a que nos apegamos por tanto tempo ao falar em fontes da excitação sexual poderemos chegar à hipótese de que todas as vias de ligação que levam à sexualidade vindo de outras funções devem também ser percorríveis na direção inversa Por exemplo se o fato de a zona labial ser patrimônio comum de duas funções é a razão por que a ingestão de alimentos gera uma satisfação sexual esse mesmo fator nos permite compreender que haja distúrbios na nutrição quando as funções erógenas da zona comum são perturbadas E uma vez que sabemos que a concentração de atenção é capaz de provocar excitação sexual somos levados a supor que atuando pela mesma via só que em sentido inverso o estado de excitação sexual pode influenciar a disponibilidade de atenção dirigível a algo Boa parte da sintomatologia das neuroses que deduzo das perturbações nos processos sexuais expressase em perturbações de outras funções nãosexuais do corpo essa circunstância até agora incompreensível tornase menos enigmática quando se considera que representa apenas a contrapartida das influências sob as quais se dá a produção da excitação sexual Mas as mesmas vias pelas quais as perturbações sexuais se propagam para as outras funções do corpo devem também prestar na saúde um outro importante serviço Por elas se daria a atração das forças pulsionais da sexualidade para outros alvos nãosexuais ou seja a sublimação da sexualidade Mas devemos encerrar com a confissão de que é ainda muito pouco o que se conhece com certeza sobre essas vias que sem dúvida existem e provavelmente são percorríveis em ambas as direções 34 AS TRANSFORMAÇÕES DA PUBERDADE Com a chegada da puberdade introduzemse as mudanças que levam a vida sexual infantil a sua configuração normal definitiva Até esse momento a pulsão sexual era predominantemente autoerótica agora encontra o objeto sexual Até ali ela atuava partindo de pulsões e zonas erógenas distintas que independendo umas das outras buscavam um certo tipo de prazer como alvo sexual exclusivo Agora porém surge um novo alvo sexual para cuja consecução todas as pulsões parciais se conjugam enquanto as zonas erógenas subordinamse ao primado da zona genital Posto que o novo alvo sexual atribui aos dois sexos funções muito diferentes o desenvolvimento sexual de ambos passa agora a divergir muito O do homem é o mais conseqüente e também o mais facilmente acessível a nossa compreensão enquanto o da mulher representa até mesmo uma espécie de involução A normalidade da vida sexual só é assegurada pela exata convergência das duas correntes dirigidas ao objeto sexual e à meta sexual a de ternura e a sensual A primeira destas comporta em si o que resta da primitiva eflorescência infantil da sexualidade É como a travessia de um túnel perfurado desde ambas as extremidades O novo alvo sexual do homem consiste na descarga dos produtos sexuais o anterior a obtenção do prazer de modo algum lhe é estranho mas antes o mais alto grau de prazer se vincula a esse ato último do processo sexual A pulsão sexual colocase agora a serviço da função reprodutora tornase altruísta por assim dizer Para que essa transformação tenha êxito é preciso contar em seu processo com as disposições originárias e com todas as particularidades das pulsões Como em todas as outras ocasiões em que se devem realizar no organismo novas combinações e composições que levam a mecanismos complexos também aqui há uma oportunidade para perturbações patológicas caso essas reordenações não se realizem Todas as perturbações patológicas da vida sexual devem ser consideradas justificadamente como inibições do desenvolvimento 1 O PRIMADO DAS ZONAS GENITAIS E O PRÉPRAZER O ponto de partida e o alvo final do processo de desenvolvimento aqui descrito são claros a nossos olhos As transições intermediárias ainda nos são obscuras em muitos aspectos teremos de deixar subsistir nelas mais de um enigma Escolheuse o que mais se destaca nos processos da puberdade como o que constitui sua essência o crescimento manifesto da genitália externa que exibira durante o período de latência da infância uma relativa inibição Ao mesmo tempo o desenvolvimento dos genitais internos avançou o bastante para que eles possam descarregar produtos sexuais ou conforme o caso recebêlos para promover a formação de um novo ser vivo Assim ficou pronto um aparelho altamente complexo à espera do momento em que será utilizado Esse aparelho deve ser acionado por estímulos e a observação nos permite saber que os estímulos podem afetálos por três caminhos vindo do mundo externo mediante a excitação das zonas erógenas já conhecidas do interior do organismo por vias que ainda temos de explorar e da vida anímica que por sua vez é um repositório de impressões externas e um receptor de excitações internas Pelos três caminhos provocase o mesmo efeito ou seja um estado que se designa como excitação sexual e que se exprime por dois tipos de sinais anímicos e somáticos O indício anímico consiste num sentimento peculiar de tensão de caráter extremamente premente entre os múltiplos indícios corporais situase em primeiro lugar uma série de alterações nos genitais como o inequívoco sentido de serem disposições preliminares preparativos para o ato sexual a ereção do membro masculino e a umidificação da vagina TENSÃO SEXUAL O caráter de tensão da excitação sexual suscita um problema cuja solução é tão difícil quanto seria importante para a compreensão dos processos sexuais Apesar de todas as diferenças de opinião que reinam sobre esse ponto na psicologia devo insistir em que um sentimento de tensão tem de trazer em si 35 o caráter de desprazer Para mim o decisivo é que tal sentimento traz consigo uma pressão para alterar a situação psíquica impulsiona de uma maneira que é totalmente estranha à natureza do prazer sentido Mas se a tensão da excitação sexual for computada como um sentimento de desprazer esbarraremos no fato de que ela é inequivocamente experimentada como prazerosa Sempre que é produzida por processos sexuais a tensão fazse acompanhar pelo prazer até mesmo nas alterações preparatórias dos genitais evidenciase uma espécie de satisfação Como então relacionar essa tensão desprazerosa com esse sentimento de prazer Tudo o que se relaciona com o problema do prazer e do desprazer toca num dos pontos mais sensíveis da psicologia atual Procuraremos aprender o máximo possível a partir das condições do caso em pauta e evitar qualquer abordagem mais estreita do problema em sua totalidade Lancemos primeiramente um olhar para o modo como as zonas erógenas se encaixam na nova ordem Sobre elas recai um papel importante na introdução da excitação sexual O olho talvez o ponto mais afastado do objeto sexual é o que com mais freqüência pode ser estimulado na situação de cortejar um objeto pela qualidade peculiar cuja causa no objeto sexual costuma ser chamada de beleza Daí se chamarem atrativos os méritos do objeto sexual A essa estimulação já se liga por um lado um prazer e pelo outro ela tem como conseqüência um aumento da excitação sexual ou a produção dela caso ainda esteja faltando Se a isso vem somarse a excitação de outra zona erógena por exemplo a da mão que é tocada o efeito é o mesmo uma sensação de prazer de um lado que logo se intensifica pelo prazer proveniente das alterações preparatórias da genitália e de outro um aumento da tensão sexual que logo se converte no mais evidente desprazer quando não lhe é permitido o acesso a um prazer ulterior Talvez mais transparente ainda seja um outro caso por exemplo quando se estimula por contato numa pessoa não excitada sexualmente uma dada zona erógena digamos a pele do seio de uma mulher Esse contato logo provoca uma sensação prazerosa mas ao mesmo tempo prestase como nenhum outro para despertar uma excitação sexual que exige um aumento do prazer O problema está justamente em saber como é que o prazer vivenciado pode despertar a necessidade de um prazer ainda maior O MECANISMO DO PRÉPRAZER Ora o papel desempenhado nisso pelas zonas erógenas é claro O que vale para uma delas vale para todas Elas são todas usadas para proporcionar mediante sua estimulação apropriada um certo aumento do prazer este leva a um acréscimo de tensão que por sua vez tem de produzir a energia motora necessária para levar a cabo o ato sexual A penúltima etapa desse ato mais uma vez é a estimulação apropriada de uma zona erógena a própria zona genital na glande peniana pelo objeto mais adequado para isso a mucosa da vagina e do prazer gerado por essa excitação obtémse dessa vez por via reflexa a energia motora requerida para a expulsão das substâncias sexuais Esse último prazer é o de intensidade mais elevada e difere dos anteriores por seu mecanismo É inteiramente provocado pela descarga em sua totalidade é um prazer de satisfação e com ele se extingue temporariamente a tensão da libido Não me parece injustificável fixar através de uma denominação essa diferença de natureza entre o prazer advindo da excitação das zonas erógenas e o que é produzido pela expulsão das substâncias sexuais O primeiro pode ser convenientemente designado de préprazer em oposição ao prazer final ou prazer de satisfação da atividade sexual O préprazer portanto é o mesmo que já pudera ser produzido embora em menor escala pela pulsão sexual infantil o prazer final é novo e portanto provavelmente está ligado a condições que só surgem na puberdade A fórmula para a nova função das zonas erógenas tem assim o seguinte teor elas são empregadas para possibilitar por meio do préprazer delas extraído como na infância a produção do prazer maior da satisfação Pude recentemente elucidar outro exemplo retirado de uma esfera muito diferente do acontecer anímico em que se alcança igualmente um efeito maior de prazer através de uma sensação prazerosa insignificante que atua assim como um prêmio de incentivo Surgiu também ali a oportunidade de nos aprofundarmos mais na natureza do prazer 36 OS PERIGOS DO PRÉPRAZER A ligação do préprazer com a vida sexual infantil entretanto é corroborada pelo papel patogênico que pode competir a ele Do mecanismo em que está incluído o préprazer pode resultar evidentemente um perigo para a consecução do alvo sexual normal perigo este que surge quando em algum ponto dos processos sexuais preparatórios o préprazer se revela demasiadamente grande e pequena demais sua contribuição para a tensão Falta então a força pulsional para que o processo sexual seja levado adiante todo o caminho se encurta e a ação preparatória correspondente toma o lugar do alvo sexual normal A experiência nos ensina que a precondição dessa eventualidade perniciosa é que já na vida infantil a zona erógena em questão ou a pulsão parcial correspondente haja contribuído numa medida incomum para a obtenção de prazer Quando a isso vem ainda somarse fatores que promovem a fixação é fácil surgir em época posterior da vida uma compulsão que resiste à incorporação desse pré prazer específico num novo contexto É dessa natureza de fato o mecanismo de muitas perversões que consistem numa demora nos atos preparatórios do processo sexual O malogro da função do mecanismo sexual por culpa do préprazer é mais facilmente evitado quando já na vida infantil pronunciase igualmente o primado das zonas genitais As medidas para isso parecem realmente ser tomadas na segunda metade da infância dos oito anos até a puberdade Durante esses anos as zonas genitais já se comportam de maneira semelhante à da maturidade convertemse na sede de sensações de excitação e alterações preparatórias sempre que se sente algum prazer pela satisfação de outras zonas erógenas embora esse efeito continue desprovido de finalidade ou seja não contribua em nada para o prosseguimento do processo sexual Já na infância portanto junto ao prazer de satisfação surge uma certa dose de tensão sexual se bem que menos constante e menos profusa e agora podemos entender por que ao discutir as fontes da sexualidade foinos igualmente lícito dizer que o processo em questão provocava quer uma satisfação sexual quer uma excitação sexual Ver em 1 Observese que no percurso para o conhecimento começamos por fazer uma idéia muito exagerada da diferença entre a vida sexual infantil e a madura e agora fazemos uma emenda a isso Não só os desvios da vida sexual normal como também a configuração normal desta são determinados pelas manifestações infantis da sexualidade 2 O PROBLEMA DA EXCITAÇÃO SEXUAL Ficaramnos ainda inteiramente por esclarecer tanto a origem quanto a natureza da tensão sexual que surge simultaneamente com o prazer ao serem satisfeitas as zonas erógenas A suposição mais óbvia ou seja a de que essa tensão brota de algum modo do próprio prazer não só é muito improvável em si como fica também anulada ao considerarmos que no prazer máximo o que se vincula à descarga dos produtos sexuais não se produz tensão alguma porém ao contrário toda a tensão é abolida Assim prazer e tensão sexual só podem estar relacionados de maneira indireta O PAPEL DAS SUBSTÂNCIAS SEXUAIS À parte o fato de que normalmente só a descarga das substâncias sexuais põe fim à excitação sexual temos ainda outros pontos de referência para relacionar a tensão sexual com os produtos sexuais Numa vida de continência o aparelho sexual costuma livrarse das substâncias sexuais durante a noite a intervalos variáveis mas não desordenados com uma sensação de prazer e no curso da alucinação onírica de um ato sexual No tocante a esse processo a polução noturna é difícil evitar a concepção de que a tensão sexual que sabe descobrir o atalho alucinatório como substituto do ato em si é uma função da acumulação de sêmen nos reservatórios de produtos sexuais Depõem no mesmo sentido as experiências feitas sobre o caráter esgotável do mecanismo sexual Quando se esgota a reserva de sêmen não só a execução do ato sexual é impossível como também cessa a estimulabilidade das zonas erógenas cuja excitação já não é capaz de provocar nenhum prazer Assim nos inteiramos de passagem de que certa dose de tensão sexual é necessária até mesmo para a excitabilidade das zonas erógenas 37 Somos assim levados ao que se não estou equivocado é a hipótese bastante difundida de que a acumulação das substâncias sexuais cria e mantém a tensão sexual isso talvez se deva à pressão desses produtos nas paredes de seus receptáculos que atuariam como um estímulo num centro medular cujo estado seria percebido pelos centros superiores e geraria na consciência a conhecida sensação de tensão Se a excitação das zonas erógenas aumenta a tensão sexual isso só poderia acontecer pressupondose que elas tenham uma ligação anatômica prefigurada com esses centros elevem o tônus de excitação neles e sendo suficiente a tensão ponham em marcha o ato sexual ou sendo ela insuficiente estimulem a produção das substâncias sexuais Os pontos fracos dessa doutrina que vemos aceita por exemplo na exposição de KrafftEbing sobre os processos sexuais residem em que tendo sido criada para explicar a atividade sexual do homem adulto ela pouco leva em conta três situações cujo esclarecimento deveria igualmente proporcionar São elas as situações das crianças das mulheres e dos homens castrados Em nenhum desses três casos é possível falar numa acumulação de produtos sexuais no mesmo sentido que no homem o que dificulta uma aplicação uniforme desse esquema todavia cabe admitir desde logo que seria possível encontrar meios pelos quais também esses casos lhe ficariam subordinados De qualquer modo persiste a advertência de que não devemos imputar ao fator da acumulação de produtos sexuais realizações de que ele não parece capaz APRECIAÇÃO DOS ÓRGÃOS SEXUAIS INTERNOS As observações feitas em homens castrados parecem mostrar que a excitação sexual pode independer em grau considerável da produção de substâncias sexuais Ocasionalmente sua libido escapa ao prejuízo trazido pela operação de castração embora a regra seja a limitação de libido que aliás é o que motiva essa medida Além disso há muito se sabe que as doenças que eliminam a produção de células sexuais masculinas deixam intactas a libido e a potência do indivíduo agora estéril Portanto de modo algum é tão assombroso quanto o considera Rieger 1900 que a perda das glândulas sexuais masculinas na maturidade possa não ter maior influência no comportamento anímico do indivíduo É certo que a castração praticada em idade precoce antes da puberdade aproximase em seu efeito do objetivo de suprimir os caracteres sexuais embora aqui além da perda das glândulas sexuais em si também possa entrar em jogo uma inibição do desenvolvimento de outros fatores vinculada a essa perda TEORIA QUÍMICA As experiências feitas com a extirpação das gônadas testículos e ovários de animais bem como o correspondente reimplante desses órgãos em vertebrados do sexo oposto finalmente lançaram uma luz parcial sobre a origem da excitação sexual e com isso reduziram ainda mais a importância da eventual acumulação de produtos celulares sexuais Tornouse possível o experimento E Steinach de transformar um macho numa fêmea e inversamente uma fêmea num macho processo em que a conduta psicossexual dos animais se altera de acordo com os caracteres sexuais somáticos e ao mesmo tempo que eles Mas essa influência determinante do sexo não deve ser atribuída à participação das gônadas que produz as células sexuais específicas espermatozóides e óvulo mas sim a seu tecido intersticial que por isso tem sido destacado pelos autores como glândula da puberdade É muito possível que as investigações posteriores venham a revelar que essa glândula da puberdade tem normalmente uma disposição hermafrodita com o que ficaria anatomicamente fundamentada a doutrina da bissexualidade dos animais superiores e já é provável que essa glândula não seja o único órgão relacionado com a produção da excitação sexual e dos caracteres sexuais De qualquer modo essa nova descoberta biológica ajustase ao que já verificamos antes sobre o papel da glândula tireóide na sexualidade Assim estamos autorizados a supor que na porção intersticial das gônadas produzemse substâncias químicas especiais que absorvidas na corrente sangüínea carregam de tensão sexual determinadas partes do sistema nervoso central Já temos conhecimento a partir do caso das substâncias tóxicas introduzidas no corpo como algo estranho de tal transformação de um estímulo tóxico num estímulo que atua em 38 determinado órgão Quanto ao modo como a excitação sexual é gerada pela estimulação das zonas erógenas uma vez carregado o aparelho central e às interações surgidas no curso desses processos sexuais entre os efeitos dos estímulos puramente tóxicos e os dos fisiológicos isso ainda só pode ser tratado hipoteticamente e não constitui tarefa oportuna aqui Basta que nos atenhamos como o essencial nessa concepção dos processos sexuais à hipótese de que existem substâncias peculiares provenientes do metabolismo sexual Essa colocação aparentemente arbitrária apóiase num conhecimento pouco levado em conta porém digno da mais alta consideração As neuroses que só podem ser atribuídas a perturbações na vida sexual mostram a mais extrema semelhança clínica com os fenômenos de intoxicação e abstinência decorrentes do uso habitual de substâncias tóxicas produtoras de prazer alcalóides 3 A TEORIA DA LIBIDO Combinam bem com essas hipóteses sobre a base química da excitação sexual as noções de que nos valemos para procurar dominar as manifestações psíquicas da vida sexual Estabelecemos o conceito da libido como uma força quantitativamente variável que poderia medir os processos e transformações ocorrentes no âmbito da excitação sexual Diferenciamos essa libido no tocante a sua origem particular da energia que se supõe subjacente aos processos anímicos em geral e assim lhe conferimos também um caráter qualitativo Ao separar a energia libidinosa de outras formas de energia psíquica damos expressão à premissa de que os processos sexuais do organismo diferenciamse dos processos de nutrição por uma química especial A análise das perversões e das psiconeuroses levounos à compreensão de que essa excitação sexual é fornecida não só pelas chamadas partes sexuais mas por todos os órgãos do corpo Chegamos assim à representação Vorstellung de um quantum de libido a cujo substituto Vertretung psíquico damos o nome de libido do ego e cuja produção aumento ou diminuição distribuição e deslocamento devem fornecernos possibilidades de explicar os fenômenos psicossexuais observados Essa libido do ego no entanto só é convenientemente acessível ao estudo analítico depois de ter sido psiquicamente empregada para investir os objetos sexuais ou seja quando se converteu em libido do objeto Vemola então concentrarse nos objetos fixarse neles ou abandonálos passar de uns para outros e partindo dessas posições nortear no indivíduo a atividade sexual que leva à satisfação ou seja à extinção parcial e temporária da libido A psicanálise das chamadas neuroses de transferência histeria e neurose obsessiva nos proporciona uma clara visão disso Podemos ainda inteirarnos no tocante aos destinos da libido de que ela é retirada dos objetos mantémse em suspenso em estados particulares de tensão e por fim é trazida de volta para o interior do ego assim se reconvertendo em libido do ego Em contraste com a libido do objeto também chamamos a libido do ego de libido narcísica Do ponto de observação da psicanálise podemos contemplar como que por sobre uma fronteira cuja ultrapassagem não nos é permitida a movimentação da libido narcísica formando assim uma idéia da relação entre ela e a libido objetal A libido narcísica ou do ego parecenos ser o grande reservatório de onde partem as catexias de objeto e no qual elas voltam a ser recolhidas e a catexia libidinosa narcísica do ego se nos afigura como o estado originário realizado na primeira infância que é apenas encoberto pelas emissões posteriores de libido mas no fundo se conserva por trás delas Deveria ser tarefa de uma teoria da libido no campo dos distúrbios neuróticos e psicóticos expressar todos os fenômenos observados e os processos deduzidos em termos da economia libidinal É fácil inferir que nesse contexto cabe aos destinos da libido do ego a significação maior sobretudo quando se trata de explicar as perturbações psicóticas mais profundas A dificuldade reside então em que o veículo de nossas investigações a psicanálise só nos proporciona informações seguras por enquanto sobre as transformações da libido de objeto mas não consegue estabelecer uma distinção imediata entre a libido e as outras formas de energia que operam no ego Por isso de momento a continuação da teoria da libido só é possível pelo caminho da especulação Entretanto renunciase a tudo o que foi ganho até agora com a observação psicanalítica 39 quando a exemplo de CG Jung dissolvese o próprio conceito de libido ao equacionálo com a força pulsional psíquica em geral A distinção entre as moções pulsionais sexuais e as restantes e portanto a restrição do conceito de libido às primeiras encontra forte apoio na hipótese já discutida de uma química particular da função sexual 4 DIFERENCIAÇÃO ENTRE O HOMEM E A MULHER Sabese que somente com a puberdade se estabelece a separação nítida entre os caracteres masculinos e femininos num contraste que tem a partir daí uma influência mais decisiva do que qualquer outro sobre a configuração da vida humana É certo que já na infância se reconhecem bem as disposições masculinas e femininas o desenvolvimento das inibições da sexualidade vergonha nojo compaixão etc ocorre nas garotinhas mais cedo e com menor resistência do que nos meninos nelas em geral a tendência ao recalcamento sexual parece maior e quando se tornam visíveis as pulsões parciais da sexualidade elas preferem a forma passiva Mas a atividade autoerótica das zonas erógenas é idêntica em ambos os sexos e essa conformidade suprime na infância a possibilidade de uma diferenciação sexual como a que se estabelece depois da puberdade Com respeito às manifestações autoeróticas e masturbatórias da sexualidade poderseia formular a tese de que a sexualidade das meninas tem um caráter inteiramente masculino A rigor se soubéssemos dar aos conceitos de masculino e feminino um conteúdo mais preciso seria possível defender a alegação de que a libido é regular e normativamente de natureza masculina quer ocorra no homem ou na mulher e abstraindo seu objeto seja este homem ou mulher Desde que me familiarizei com a noção de bissexualidade passei a considerála como o fator decisivo e penso que sem levála em conta dificilmente se poderá chegar a uma compreensão das manifestações sexuais efetivamente no homem e na mulher ZONAS DOMINANTES NO HOMEM E NA MULHER Afora isso só tenho a acrescentar o seguinte nas meninas a zona erógena dominante situase no clitóris e é portanto homóloga à zona genital masculina a glande Tudo o que pude averiguar pela experiência sobre a masturbação nas meninas relacionouse com o clitóris e não com as partes da genitália externa que são posteriormente significativas para as funções sexuais Chego mesmo a duvidar de que a menina sob a influência da sedução possa ser levada a outra coisa que não a masturbação clitoridiana a ocorrência disso é totalmente excepcional As descargas espontâneas de excitação sexual tão corriqueiras justamente na menina pequena expressamse em contrações do clitóris e as freqüentes ereções deste órgão facultam à menina formular um juízo acertado mesmo sem nenhuma instrução sobre as manifestações sexuais do sexo oposto ela meramente transfere para os meninos as sensações de seus próprios processos sexuais Quando se quer compreender a transformação da menina em mulher é preciso acompanhar as vicissitudes posteriores dessa excitabilidade do clitóris A puberdade que no menino traz um avanço tão grande da libido distinguese na menina por uma nova onda de recalcamento que afeta justamente a sexualidade do clitóris O que assim sucumbe ao recalcamento é uma parcela de sexualidade masculina O reforço das inibições sexuais criado por esse recalcamento da puberdade na mulher fornece então um estímulo à libido do homem e obriga a um aumento de sua atividade com essa intensificação da libido aumenta também a supervalorização sexual que só aparece plenamente diante da mulher que recusa que renega sua sexualidade Quando enfim o ato sexual é permitido o próprio clitóris é excitado e compete a ele o papel de retransmitir essa excitação para as partes femininas vizinhas assim como as lascas de lenha resinosa podem ser aproveitadas para atear fogo a um pedaço de lenha mais dura Para que se efetue essa transferência é preciso amiúde um certo intervalo de tempo durante o qual a moça fica insensível Essa anestesia pode tornarse permanente quando a zona clitoridiana se recusa a abrir mão de sua excitabilidade o que é preparado justamente por sua atividade intensa na vida infantil Sabese que muitas vezes a anestesia da mulher é apenas aparente e localizada Elas ficam anestesiadas na vagina porém de modo algum são incapazes de excitação no clitóris ou mesmo em outras zonas A esses 40 determinantes erógenos da anestesia vêm então somarse os determinantes psíquicos igualmente condicionados pelo recalcamento Quando a mulher transfere a excitabilidade erógena do clitóris para a vagina ela muda a zona dominante para sua atividade sexual posterior ao passo que o homem conserva a dele desde a infância Nessa mudança da zona erógena dominante assim como na onda de recalcamento da puberdade que elimina por assim dizer a masculinidade infantil residem os principais determinantes da propensão das mulheres para a neurose especialmente a histeria Esses determinantes portanto estão intimamente relacionados com a natureza da feminilidade 5 O ENCONTRO DO OBJETO Durante os processos da puberdade firmase o primado das zonas genitais e no homem o ímpeto do membro agora capaz de ereção remete imperiosamente para o novo alvo sexual a penetração numa cavidade do corpo que excite sua zona genital Ao mesmo tempo consumase no lado psíquico o encontro do objeto para qual o caminho fora preparado desde a mais tenra infância Na época em que a mais primitiva satisfação sexual estava ainda vinculada à nutrição a pulsão sexual tinha um objeto fora do corpo próprio no seio materno Só mais tarde vem a perdêlo talvez justamente na época em que a criança consegue formar para si uma representação global da pessoa a quem pertence o órgão que lhe dispensava satisfação Em geral a pulsão sexual tornase autoerótica e só depois de superado o período de latência é que se restabelece a relação originária Não é sem boas razões que para a criança a amamentação no seio materno tomase modelar para todos os relacionamentos amorosos O encontro do objeto é na verdade um reencontro O OBJETO SEXUAL NA FASE DE AMAMENTAÇÃO Todavia desses primeiros e mais importantes de todos os vínculos sexuais resta mesmo depois que a atividade sexual se separa da nutrição uma parcela significativa que ajuda a preparar a escolha do objeto e dessa maneira restaurar a felicidade perdida Durante todo o período de latência a criança aprende a amar outras pessoas que a ajudam em seu desamparo e satisfazem suas necessidades e o faz segundo o modelo de sua relação de lactente com a ama e dando continuidade a ele Talvez se queira contestar a identificação do amor sexual com os sentimentos ternos e a estima da criança pelas pessoas que cuidam dela mas penso que uma investigação psicológica mais rigorosa permitirá estabelecer essa identidade acima de qualquer dúvida O trato da criança com a pessoa que a assiste é para ela uma fonte incessante de excitação e satisfação sexuais vindas das zonas erógenas ainda mais que essa pessoa usualmente a mãe contempla a criança com os sentimentos derivados de sua própria vida sexual ela a acaricia beija e embala e é perfeitamente claro que a trata como o substituto de um objeto sexual plenamente legítimo A mãe provavelmente se horrorizaria se lhe fosse esclarecido que com todas as suas expressões de ternura ela está despertando a pulsão sexual de seu filho e preparando a intensidade posterior desta Ela considera seu procedimento como um amor puro assexual já que evita cuidadosamente levar aos genitais da criança mais excitações do que as inevitáveis no cuidado com o corpo Mas a pulsão sexual como bem sabemos não é despertada apenas pela excitação da zona genital aquilo a que chamamos ternura um dia exercerá seus efeitos infalivelmente também sobre as zonas genitais Aliás se a mãe compreendesse melhor a suma importância das pulsões para a vida anímica como um todo para todas as realizações éticas e psíquicas ela se pouparia das autorecriminações mesmo depois desse esclarecimento Quando ensina seu filho a amar está apenas cumprindo sua tarefa afinal ele deve transformarse num ser humano capaz dotado de uma vigorosa necessidade sexual e que possa realizar em sua vida tudo aquilo a que os seres humanos são impelidos pela pulsão É verdade que o excesso de ternura por parte dos pais tornase pernicioso na medida em que acelera a maturidade sexual e também mimando a criança tornaa incapaz de renunciar temporariamente ao amor em épocas posteriores da vida ou de se contentar com menor dose dele Um dos melhores prenúncios de neurose posterior é quando a criança se mostra insaciável em sua demanda de ternura dos pais por outro lado são justamente os pais neuropáticos que em geral tendem a exibir uma ternura desmedida os que 41 mais contribuem com suas carícias para despertar a disposição da criança para o adoecimento neurótico Deduzse desse exemplo aliás que os pais neuróticos têm caminhos mais diretos que o da herança para transferir sua perturbação para seus filhos ANGÚSTIA INFANTIL As próprias crianças se comportam desde cedo como se sua afeição pelas pessoas que a assistem fosse da natureza do amor sexual A angústia das crianças não é originariamente nada além da expressão da falta que sentem da pessoa amada por isso elas se angustiam diante de qualquer estranho temem a escuridão porque nesta não vêem a pessoa amada e se deixam acalmar quando podem segurarlhe a mão na obscuridade Atribuir a todos os bichospapões da infância e a todas as histórias horripilantes contadas pelas babás a culpa por provocarem nervosismo na criança é superestimarlhes o efeito Só as crianças propensas ao estado de angústia é que acolhem essas histórias que em outras não causam nenhuma impressão e só tendem ao estado de angústia as crianças com uma pulsão sexual desmedida ou prematuramente desenvolvida ou que se tornou muito exigente em função dos mimos excessivos Nesse aspecto a criança portase como o adulto na medida em que transforma sua libido em angústia quando não pode satisfazêla e inversamente o adulto neurotizado pela libido insatisfeita comportase como uma criança em sua angústia começa a sentir medo tão logo fica sozinho ou seja sem uma pessoa de cujo amor se acredite seguro e a querer aplacar esse medo através das medidas mais pueris A BARREIRA DO INCESTO Quando a ternura dos pais pelo filho é bemsucedida em evitar que a pulsão seja prematuramente despertada nele ou seja antes que se dêem as condições somáticas da puberdade e despertada com tal força que a excitação anímica irrompa de maneira inconfundível no sistema genital essa ternura pode cumprir sua tarefa de orientar esse filho na maturidade em sua escolha do objeto sexual Sem dúvida o caminho mais curto para o filho seria escolher como objetos sexuais as mesmas pessoas a quem ama desde a infância com uma libido digamos amortecida Com o adiamento da maturação sexual entretanto ganhouse tempo para erigir junto a outros entraves à sexualidade a barreira do incesto para que assim se integrem os preceitos morais que excluem expressamente da escolha objetal na qualidade de parentes consangüíneos as pessoas amadas na infância O respeito a essa barreira é acima de tudo uma exigência cultural da sociedade esta tem de se defender da devastação pela família dos interesses que lhe são necessários para o estabelecimento de unidades sociais superiores e por isso em todos os indivíduos mas em especial nos adolescentes lança mão de todos os recursos para afrouxarlhes os laços com a família os únicos que eram decisivos na infância Mas é na esfera da representação que se consuma inicialmente a escolha do objeto e a vida sexual do jovem em processo de amadurecimento não dispõe de outro espaço que não o das fantasias ou seja o das representações não destinadas a concretizarse Nessas fantasias as inclinações infantis voltam a emergir em todos os seres humanos agora reforçadas pela premência somática e entre elas com freqüência uniforme e em primeiro lugar o impulso sexual da criança em direção aos pais quase sempre já diferenciado através da atração pelo sexo oposto a do filho pela mãe e a da filha pelo pai Contemporaneamente à subjugação e ao repúdio dessas fantasias claramente incestuosas consumase uma das realizações psíquicas mais significativas porém também mais dolorosas do período da puberdade o desligamento da autoridade dos pais unicamente através do qual se cria a oposição tão importante para o progresso da cultura entre a nova e a velha gerações Em cada uma das etapas do curso de desenvolvimento por que todos os indivíduos são obrigados a passar um certo número deles fica retido de modo que há pessoas que nunca superam a autoridade dos pais e não retiram deles sua ternura ou só o fazem de maneira muito incompleta Em sua maioria são moças que para a alegria dos pais persistem em seu amor infantil muito além da puberdade e é muito instrutivo constatar que é a essas moças que falta em seu posterior casamento a capacidade de dar ao marido o que é devido a ele Tornamse esposas frias e permanecem sexualmente anestesiadas Com isso se aprende que o amor 42 sexual e o que parece ser um amor nãosexual pelos pais alimentamse das mesmas fontes ou seja o segundo corresponde apenas a uma fixação infantil da libido Quanto mais perto se chega das perturbações mais profundas do desenvolvimento psicossexual mais se destaca de maneira inequívoca a importância da escolha objetal incestuosa Nos psiconeuróticos grande parte da atividade psicossexual destinada ao encontro do objeto ou a totalidade dela permanece no inconsciente em decorrência de seu repúdio da sexualidade Para as moças com uma necessidade exagerada de ternura e um horror igualmente desmedido às exigências reais da vida sexual tornase uma tentação irresistível por um lado realizar em sua vida o ideal do amor assexual e por outro ocultar sua libido por trás de uma ternura que possam expressar sem autorecriminações agarrandose por toda a vida a sua inclinação infantil renovada na puberdade para os pais ou irmãos A psicanálise mostra a essas pessoas sem esforço que elas estão enamoradas no sentido corriqueiro da palavra desses seus parentes consangüíneos uma vez que com a ajuda dos sintomas e outras manifestações da doença rastreialhes os pensamentos inconscientes e os traduz em pensamentos conscientes Também nos casos em que uma pessoa anteriormente sadia adoece após uma experiência amorosa infeliz podese descobrir com segurança que o mecanismo de seu adoecimento consiste numa reversão de sua libido para as pessoas preferidas na infância AS REPERCUSSÕES DA ESCOLHA OBJETAL INFANTIL Mesmo quem teve a felicidade de evitar a fixação incestuosa de sua libido não escapa inteiramente a sua influência Observase um eco muito claro dessa fase do desenvolvimento quando o primeiro enamoramento sério de um rapaz como é tão freqüente recai sobre uma mulher madura e o da moça sobre um homem mais velho e dotado de autoridade já que essas figuras lhes podem revivescer as imagens da mãe e do pai Talvez a escolha do objeto se dê em geral mediante um apoio mais livre nesses modelos O homem sobretudo busca a imagem mnêmica da mãe tal como essa imagem o dominou desde os primórdios da infância e está em perfeita harmonia com isso que a mãe ainda viva oponhase a essa reedição dela mesma e a trate com hostilidade Em vista dessa importância do relacionamento infantil com os pais para a escolha posterior do objeto sexual é fácil compreender que qualquer perturbação desse relacionamento terá as mais graves conseqüências para a vida sexual na maturidade também ao ciúme dos amantes nunca falta uma raiz infantil ou pelo menos um reforço infantil As desavenças entre os pais ou seu casamento infeliz condicionam a mais grave predisposição para o desenvolvimento sexual perturbado ou o adoecimento neurótico dos filhos A afeição infantil pelos pais é sem dúvida o mais importante embora não o único dos vestígios que reavivados na puberdade apontam o caminho para a escolha do objeto Outros rudimentos com essa mesma origem permitem ao homem sempre apoiado em sua infância desenvolver mais de uma orientação sexual e criar condições muito diversificadas para sua escolha objetal PREVENÇÃO DA INVERSÃO Uma das tarefas implícitas na escolha do objeto consiste em não se desencontrar do sexo oposto Isso como é sabido não se soluciona sem um certo tateamento Com freqüência as primeiras moções depois da puberdade se extraviam sem que haja nenhum dano permanente Dessoir 1894 assinalou acertadamente a regularidade que se deixa entrever nas amizades apaixonadas dos rapazes e moças adolescentes por outros do mesmo sexo A grande força que repele a inversão permanente do objeto sexual é sem dúvida a atração que os caracteres sexuais opostos exercem entre si no contexto desta discussão nada podemos dizer para esclarecêla Mas esse fator não basta por si só para excluir a inversão diversos outros fatores auxiliares vêm juntarse a ele Acima de tudo há o entrave autoritário da sociedade quando a inversão não é considerada um crime vêse que ela responde plenamente às inclinações sexuais de um número nada pequeno de indivíduos Podese ainda presumir no tocante ao homem que sua lembrança infantil de ternura da mãe e de outras pessoas do sexo feminino a quem ficava entregue quando criança contribui energicamente para nortear sua escolha para a mulher ao passo que a intimidação sexual precoce que experimentou por parte do pai e sua atitude competitiva com 43 relação a ele desviao de seu próprio sexo Mas ambos os fatores aplicamse também à menina cuja atividade sexual fica sob a guarda especial da mãe Daí resulta uma relação hostil com o mesmo sexo que influencia decisivamente a escolha do objeto no sentido considerado normal A educação dos meninos por pessoas do sexo masculino pelos escravos na antigüidade parece favorecer o homossexualismo a freqüência da inversão na aristocracia de hoje tornase um pouco mais inteligível diante de seu emprego de criados do sexo masculino bem como pelos maiores cuidados pessoais que a mãe dedica aos filhos Em muitos histéricos vêse que a ausência precoce de um dos pais por morte divórcio ou separação em função da qual o remanescente absorveu a totalidade do amor da criança foi o determinante do sexo da pessoa posteriormente escolhida como objeto sexual com isso possibilitando se a inversão permanente 44 RESUMO É chegado o momento de ensaiarmos um resumo Partimos das aberrações da pulsão sexual com respeito a seu objeto e seu alvo e deparamos com a questão de saber se elas provêm de uma disposição inata ou são adquiridas como resultado das influências da vida A resposta a essa pergunta nos veio da compreensão mediante a investigação psicanalítica das condições da pulsão sexual nos psiconeuróticos um grupo humano numeroso que não fica longe dos sadios Assim descobrimos que nessas pessoas a inclinação para todas as perversões é demonstrável na qualidade de forças inconscientes e se denuncia como formadora de sintomas e pudemos dizer que a neurose é como que o negativo das perversões Diante da ampla disseminação das tendências perversas agora reconhecidas fomos impelidos ao ponto de vista de que a disposição para as perversões é a disposição originária universal da pulsão sexual humana e de que a partir dela em conseqüência de modificações orgânicas e inibições psíquicas no decorrer da maturação desenvolvese o comportamento sexual normal Alimentamos a esperança de poder apontar na infância essa disposição originária entre as forças que restringem a orientação da pulsão sexual destacamos a vergonha o asco a compaixão e as construções sociais da moral e da autoridade Assim tivemos de ver em cada aberração fixa da vida sexual normal um fragmento de inibição do desenvolvimento e infantilismo Embora tenha sido necessário situar em primeiro plano a importância das variações da disposição originária tivemos de supor entre elas e as influências da vida uma relação de cooperação e não de antagonismo Por outro lado já que a disposição originária é necessariamente complexa pareceunos que a própria pulsão sexual seria algo composto de diversos fatores e que nas perversões como que se desfaria em seus componentes Com isso as perversões se revelaram de um lado como inibições do desenvolvimento normal e de outro como dissociações dele Essas duas concepções foram reunidas na hipótese de que a pulsão sexual do adulto nasce mediante a conjugação de diversas moções da vida infantil numa unidade numa aspiração com um alvo único Juntamos a isso o esclarecimento da preponderância das inclinações perversas nos psiconeuróticos na medida em que a reconhecemos como o enchimento colateral de canais secundários em função do bloqueio do leito principal da corrente sexual pelo recalcamento e passamos então ao exame da vida sexual na infância Pareceunos lamentável que se negasse a existência da pulsão sexual na infância e que as manifestações sexuais não raro observadas nas crianças fossem descritas como acontecimentos que fogem à regra Pareceunos ao contrário que a criança traz consigo ao mundo germes de atividade sexual e que já ao se alimentar goza de uma satisfação sexual que então busca reiteradamente proporcionarse através da conhecida atividade de chuchar Todavia a atividade sexual da criança não se desenvolve no mesmo passo que as demais funções mas sim após um breve período de florescência entre os dois e os cinco anos entra no chamado período de latência Neste a produção de excitação sexual de modo algum é suspensa mas continua e oferece uma provisão de energia que é empregada em sua maior parte para outras finalidades que não as sexuais ou seja de um lado para contribuir com os componentes sexuais para os sentimentos sociais e de outro através do relacionamento e da formação reativa para construir as barreiras posteriores contra a sexualidade Assim se construiriam na infância à custa de grande parte das moções sexuais perversas e com a ajuda da educação as forças destinadas a manter a pulsão sexual em certos rumos Outra parte das moções sexuais infantis escapa a esses empregos e consegue expressarse como atividade sexual Pudemos então verificar que a excitação sexual da criança provém de uma multiplicidade de fontes A satisfação surge acima de tudo mediante a excitação sensorial apropriada das chamadas zonas erógenas e provavelmente podem funcionar como tal qualquer ponto da pele e qualquer órgão dos sentidos provavelmente qualquer órgão embora existam certas zonas erógenas destacadas cuja excitação estaria assegurada desde o começo por certos dispositivos orgânicos Além disso a excitação sexual parece surgir como um subproduto por assim dizer de um grande número de processos que ocorrem no organismo tão logo eles alcançam certa intensidade e muito especialmente de todas as comoções mais fortes ainda que de natureza penosa As excitações de todas essas fontes ainda não estão conjugadas cada qual seguindo separadamente seu alvo que é meramente a obtenção de certo prazer Na infância portanto a pulsão sexual não está centrada e é a princípio desprovida de objeto ou seja autoerótica 45 Ainda durante a infância começa a fazerse notar a zona erógena da genitália seja porque como qualquer outra zona erógena ela produz satisfação mediante a estimulação sensorial apropriada seja porque de um modo não inteiramente inteligível havendo uma satisfação proveniente de outras fontes produzse ao mesmo tempo uma excitação sexual que mantém uma relação particular com a zona genital Temos de admitir com pesar que não se chegou a um esclarecimento suficiente das relações entre a satisfação sexual e a excitação sexual como também entre a atividade da zona genital e a das demais fontes da sexualidade Pelo estudo dos distúrbios neuróticos observamos que é possível identificar na vida sexual infantil desde seus primórdios os rudimentos de uma organização dos componentes sexuais da pulsão Numa primeira fase muito precoce o erotismo oral fica em primeiro plano uma segunda dessas organizações prégenitais caracterizase pela predominância do sadismo e do erotismo anal somente numa terceira fase desenvolvida na criança apenas até a primazia do falo é que a vida sexual passa a ser determinada pela contribuição das zonas genitais propriamente ditas Tivemos então de registrar como uma de nossas mais surpreendentes descobertas que essa eflorescência precoce da vida sexual infantil dos dois aos cinco anos também acarreta uma escolha objetal com toda a riqueza das realizações anímicas que isso implica de modo que a fase correspondente e ligada a ela apesar da falta de síntese entre os componentes pulsionais isolados e da incerteza do alvo sexual deve ser apreciada como uma importante precursora da posterior organização sexual definitiva A instauração bitemporal do desenvolvimento sexual nos seres humanos ou seja sua interrupção pelo período de latência pareceunos digna de uma atenção especial Ela se afigura como uma das condições da aptidão do homem para o desenvolvimento de uma cultura superior mas também de sua tendência à neurose Ao que saibamos nada de análogo é demonstrável entre os parentes animais do homem A origem dessa peculiaridade humana deveria ser buscada na protohistória da espécie Não pudemos dizer que medida de atividade sexual na infância poderia ainda ser descrita como normal como não perniciosa para o desenvolvimento ulterior O caráter dessas manifestações sexuais revelouse predominantemente masturbatório A experiência permitiunos ainda comprovar que as influências externas da sedução podem provocar rompimentos prematuros da latência e até a supressão dela e que nesse aspecto a pulsão sexual da criança comprova ser de fato perversopolimorfa comprovamos ainda que tal atividade sexual prematura prejudica a educabilidade da criança Apesar das lacunas em nossos conhecimentos da vida sexual infantil foinos então preciso fazer uma tentativa de estudar as transformações sobrevindas com a chegada da puberdade Destacamos duas delas como decisivas a subordinação de todas as outras fontes de excitação sexual ao primado das zonas genitais e o processo do encontro do objeto Ambos já estão prefigurados na vida infantil A primeira consumase pelo mecanismo de exploração do préprazer os atos sexuais outrora autônomos ligados ao prazer e à excitação convertemse em atos preparatórios do novo alvo sexual a descarga dos produtos sexuais cuja consecução acompanhada de enorme prazer põe termo à excitação sexual Nesse aspecto havíamos levado em conta a diferenciação dos seres sexuados em masculino e feminino e descobrimos que no tornarse mulher fazse necessário um novo recalcamento que suprime parte da masculinidade infantil e prepara a mulher para a troca da zona genital dominante Por fim descobrimos que a escolha objetal é guiada pelos indícios infantis renovados na puberdade da inclinação sexual da criança pelos pais e por outras pessoas que cuidam dela e que desviada dessas pessoas pela barreira do incesto erigida nesse meiotempo orientase para outras que se assemelhem a elas Cabe ainda acrescentar por último que durante o período de transição da puberdade os processos de desenvolvimento somático e psíquico prosseguem por algum tempo sem ligação entre si até que a irrupção de uma intensa moção anímica de amor levando à inervação dos genitais produz a unidade da função amorosa exigida pela normalidade FATORES QUE PERTURBAM O DESENVOLVIMENTO 46 Cada passo nesse longo percurso de desenvolvimento pode transformarse num ponto de fixação cada ponto de articulação nessa complexa montagem pode ensejar a dissociação da pulsão sexual como já discutimos em diversos exemplos Restanos ainda fornecer um panorama dos diversos fatores internos e externos que perturbam o desenvolvimento e indicar o lugar do mecanismo afetado pela perturbação proveniente deles É claro que os fatores mencionados numa mesma série podem não ter o mesmo valor e devemos estar preparados para encontrar dificuldades na devida avaliação de cada um deles CONSTITUIÇÃO E HEREDITARIEDADE Em primeiro lugar cabe mencionar aqui a diversidade inata da constituição sexual em que provavelmente recai o peso principal mas que como é compreensível só pode ser deduzida de suas manifestações posteriores e mesmo assim nem sempre com grande certeza Concebemos essa diversidade como uma preponderância desta ou daquela das múltiplas fontes de excitação sexual e cremos que tal diferença entre as disposições deve expressarse de alguma maneira no resultado final mesmo que este se mantenha dentro das fronteiras da normalidade Sem dúvida é concebível que haja também variações na disposição originária que levem necessariamente e sem a ajuda de outros fatores à configuração de uma vida sexual anormal Poderseia descrevêlos como degenerativos e considerá los como a expressão de uma deterioração hereditária Nesse contexto tenho um fato notável a relatar Em mais da metade dos casos de histeria neurose obsessiva etc que tive em tratamento psicoterapêutico pude demonstrar com certeza que o pai sofrera de sífilis antes do casamento quer se tratasse de tabes ou paralisia progressiva quer a doença luética fosse indicada de algum outro modo pela anamnese Quero observar expressamente que as crianças posteriormente neuróticas não traziam em si nenhum sinal físico de sífilis hereditária de modo que justamente sua constituição sexual anormal é que devia ser considerada como a última ramificação de sua herança sifilítica Embora eu esteja longe de afirmar que a descendência de pais sifilíticos é a condição etiológica invariável ou imprescindível da constituição neuropática não creio que a coincidência por mim observada seja acidental ou sem importância As condições hereditárias dos perversos positivos são menos conhecidas pois eles sabem furtarse à investigação Ainda assim há boas razões para supor que o que é válido para as neuroses também o seja para as perversões E que não raro se encontram numa mesma família a perversão e a psiconeurose distribuídas de tal modo entre os dois sexos que os membros masculinos ou um deles são perversos positivos enquanto os membros femininos em consonância com a tendência de seu sexo ao recalcamento são perversos negativos ou seja histéricos uma boa prova das relações essenciais por nós descobertas entre os dois distúrbios ELABORAÇÃO ULTERIOR Por outro lado não se pode defender o ponto de vista de que a conformação da vida sexual ficaria inequivocamente determinada com a instauração dos diversos componentes da constituição sexual Ao contrário o processo de determinação prossegue e surgem outras possibilidades conforme as vicissitudes por que passam as correntes tributárias das sexualidades provenientes das diversas fontes Obviamente é essa elaboração ulterior que decide em termos definitivos enquanto o que se poderia descrever como uma constituição idêntica pode levar a três desfechos diferentes 1 Quando todas as disposições se mantêm em sua proporção relativa considerada anormal e são reforçadas com o amadurecimento o desfecho só pode ser uma vida sexual perversa A análise dessas disposições constitucionais anormais ainda não foi devidamente empreendida mas já conhecemos casos facilmente explicáveis mediante tais hipóteses Os autores opinam por exemplo ver em 1 que toda uma série de perversões por fixação teria como precondição necessária uma debilidade inata da pulsão sexual Expressa nessa forma tal colocação me parece insustentável mas ela passa a fazer sentido quando se pensa numa debilidade constitucional de determinado fator da pulsão sexual qual seja a zona genital zona esta que assume posteriormente a função de conjugar num todo cada uma das atividades sexuais isoladas tendo por alvo a reprodução Quando a zona genital é fraca essa 47 conjugação exigida na puberdade está fadada a fracassar e o mais forte dentre os demais componentes da sexualidade impõe sua prática como uma perversão RECALCAMENTO 2 Produzse um desfecho diferente quando no curso do desenvolvimento alguns componentes que tinham força excessiva na disposição passam pelo processo de recalcamento sobre o qual devemos insistir em que não é equivalente a uma supressão Nesse caso as excitações correspondentes continuam a ser produzidas como antes mas são impedidas por um obstáculo psíquico de atingir seu alvo e empurradas para muitos outros caminhos até que se consigam expressar como sintomas O resultado pode aproximarse de uma vida sexual normal restrita na maioria das vezes mas complementada pela doença psiconeurótica São justamente esses os casos que se tornaram familiares para nós através da investigação psicanalítica dos neuróticos A vida sexual dessas pessoas começa como a dos perversos e toda uma parte de sua infância é ocupada por uma atividade sexual perversa que ocasionalmente se estende para além da maturidade Produzse então por causas internas em geral antes da puberdade mas vez por outra até mesmo depois dela uma reversão devida ao recalcamento e a partir daí a neurose toma o lugar da perversão sem que se extingam os antigos impulsos Isso faz lembrar o provérbio Junge Hure alte Betschwester só que nesse caso a juventude foi curta demais Essa substituição da perversão pela neurose na vida de uma mesma pessoa assim como a já mencionada distribuição da perversão e da neurose entre os diferentes membros de uma mesma família é coerente com a concepção de que a neurose é o negativo da perversão SUBLIMAÇÃO 3 O terceiro desfecho da disposição constitucional anormal é possibilitado pelo processo de sublimação no qual as excitações hiperintensas provenientes das diversas fontes da sexualidade encontram escoamento e emprego em outros campos de modo que de uma disposição em si perigosa resulta um aumento nada insignificante da eficiência psíquica Aí encontramos uma das fontes da atividade artística e conforme tal sublimação seja mais ou menos completa a análise caracterológica de pessoas altamente dotadas sobretudo as de disposição artística revela uma mescla em diferentes proporções de eficiência perversão e neurose Uma subvariedade da sublimação talvez seja a supressão por formação reativa que como descobrimos começa no período de latência da criança e nos casos favoráveis prossegue por toda a vida Aquilo a que chamamos caráter de um homem constróise numa boa medida a partir do material das excitações sexuais e se compõe de pulsões fixadas desde a infância de outras obtidas por sublimação e de construções destinadas ao refreamento eficaz de moções perversas reconhecidas como inutilizáveis Por conseguinte a disposição sexual universalmente perversa da infância pode ser considerada como a fonte de uma série de nossas virtudes na medida em que através da formação reativa impulsiona a criação delas EXPERIÊNCIAS ACIDENTAIS Comparadas às descargas sexuais às ondas de recalcamento e às sublimações sendo inteiramente desconhecidas para nós as condições internas destes dois últimos processos todas as outras influências parecem bem menos importantes Quem incluir os recalcamentos e sublimações na disposição constitucional e encarálos como manifestações vitais desta poderá afirmar justificadamente que a conformação final da vida sexual resulta acima de tudo da constituição inata Mas ninguém com algum discernimento contestará o fato de que em tal cooperação de fatores há também espaço para as influências modificadoras do que foi acidentalmente vivenciado na infância e depois Não é fácil avaliar a eficácia dos fatores constitucionais e acidentais em sua relação recíproca Na teoria sempre se tende a superestimar os primeiros a prática terapêutica destaca a importância dos últimos Mas em nenhum caso se deve esquecer que existe entre ambos uma relação de cooperação e não de exclusão O fator constitucional tem de aguardar experiências que o ponham em vigor o acidental precisa apoiarse na 48 constituição para ter efeito Na maioria dos casos podese imaginar o que se tem chamado de série complementar na qual as intensidades decrescentes de um fator são compensadas pelas intensidades crescentes de outro mas não há razão alguma para negar a existência de casos extremos nos dois limites da série Harmonizase ainda melhor com a investigação psicanalítica dar um lugar de destaque entre os fatores acidentais às experiências da primeira infância A série etiológica única decompõese então em duas que podem ser chamadas de disposicional e definitiva Na primeira a constituição e as vivências acidentais da infância interagem da mesma maneira que na segunda a disposição e as vivências traumáticas posteriores Todos os fatores nocivos ao desenvolvimento sexual externam seu efeito promovendo uma regressão um retorno a uma fase anterior do desenvolvimento Prossigamos agora em nossa tarefa de enumerar os fatores que verificamos serem influentes no desenvolvimento sexual quer representem forças eficazes ou meras manifestações delas PRECOCIDADE Um desses fatores é a precocidade sexual espontânea demonstrável com certeza pelo menos na etiologia das neuroses muito embora tal como outros fatores não seja por si só uma causa suficiente Manifestase na interrupção encurtamento ou encerramento do período infantil de latência c converte se em causa de perturbações por ocasionar manifestações sexuais que pelo estado incompleto das inibições sexuais de um lado e por ainda não estar desenvolvido o sistema genital de outro só podem trazer em si o caráter de perversões Essas tendências à perversão podem então permanecer como tais ou instaurado o recalcamento transformarse em forças propulsoras de sintomas neuróticos De qualquer modo a precocidade sexual dificulta o desejável domínio posterior da pulsão sexual pelas instâncias anímicas superiores e aumenta o caráter compulsivo que à parte isso os substitutos Vertretungen psíquicos da pulsão reivindicam para si A precocidade sexual amiúde corre paralela ao desenvolvimento intelectual prematuro e como tal é encontrada na história infantil dos indivíduos mais eminentes e capazes em tais condições não parece tornarse tão patogênica como quando surge isoladamente FATORES TEMPORAIS Da mesma forma exigem consideração outros fatores que ao lado da precocidade podem ser reunidos sob a designação de temporais A ordem em que são ativadas as diversas moções pulsionais bem como o lapso de tempo em que podem manifestarse antes de sucumbir a influência de uma nova moção pulsional emergente ou a algum recalcamento típico parecem filogeneticamente determinados Todavia tanto nessa seqüência temporal quanto nessa duração parece haver variações que devem exercer uma influência dominante no resultado final Não é indiferente que uma dada corrente emerja antes ou depois de sua corrente contraída pois o efeito de um recalcamento não pode ser desfeito cada desvio temporal na montagem dos componentes produz invariavelmente uma alteração no resultado Por outro lado as moções pulsionais que emergem com intensidade especial têm com freqüência um decurso assombrantemente rápido como por exemplo o vínculo heterossexual dos que depois se tornam homossexuais manifestos Não há justificativa para o medo de que as tendências estabelecidas com mais violência na infância dominem permanentemente o caráter adulto é igualmente esperável que elas venham a desaparecer cedendo lugar a seu oposto Gestrenge Herren regieren nicht lange Não estamos sequer em condições de fornecer indícios das causas dessas complicações temporais dos processos de desenvolvimento Abrese aqui o panorama de uma densa falange de problemas biológicos e talvez também históricos dos quais nem ao menos nos aproximamos o bastante para travar batalha com eles ADESIVIDADE A importância de todas as manifestações sexuais precoces é aumentada por um fator psíquico de origem desconhecida que por ora decerto só pode ser apresentado como uma hipótese psicológica 49 provisória Refirome à elevada adesividade Haftbarkeit ou fixabilidade dessas impressões da vida sexual que é preciso admitir para a complementação dos fatos nas pessoas que depois se tornarão neuróticas ou perversas já que as mesmas manifestações sexuais prematuras em outras pessoas não conseguem gravarse de maneira tão profunda a ponto de produzirem uma repetição convulsiva e poderem prescrever por toda a vida os caminhos da pulsão sexual Parte da explicação dessa adesividade talvez resida num outro fator psíquico que não podemos negligenciar na causação das neuroses a saber a preponderância que cabe na vida anímica aos traços mnêmicos em comparação com as impressões recentes Esse fator é obviamente dependente da formação intelectual e aumenta conforme a elevação da cultura pessoal Em contraste com isso o selvagem tem sido caracterizado como das unglückselige Kind des Augenblickes Em decorrência da relação inversa entre a cultura e o livre desenvolvimento da sexualidade cujas conseqüências podem ser seguidas muito de perto na conformação de nossa vida a importância do rumo tomado pela vida sexual da criança para a vida posterior é muito pequena nos níveis cultural ou social mais baixos e muito grande nos mais elevados FIXAÇÃO O terreno preparado pelos fatores psíquicos que acabamos de mencionar é favorável aos estímulos acidentalmente vivenciados da sexualidade infantil Estes últimos sobretudo a sedução por outras crianças ou por adultos fornecem o material que com a ajuda dos primeiros pode fixarse como um distúrbio permanente Boa parte dos desvios da vida sexual normal posteriormente observados tanto nos neuróticos quanto nos perversos é estabelecida desde o começo pelas impressões do período infantil supostamente desprovido de sexualidade De sua causação participam a complacência constitucional a precocidade a característica da adesividade elevada e a estimulação fortuita da pulsão sexual por influências estranhas Todavia a conclusão insatisfatória que emerge dessas investigações das perturbações da vida sexual provém de não sabermos sobre os processos biológicos que constituem a essência da sexualidade o bastante para formar com base em nossos conhecimentos isolados uma teoria suficiente para compreendermos tanto o normal quanto o patológico 50 APÊNDICE LISTA DOS ESCRITOS DE FREUD QUE VERSAM PREDOMINANTEMENTE OU EM GRANDE PARTE SOBRE A SEXUALIDADE Claro está que as referências à sexualidade são encontradas na grande maioria dos escritos de Freud A lista que se segue compreende aqueles que versam mais diretamente sobre o assunto A data indicada no início de cada item corresponde ao ano de publicação Os detalhes mais completos sobre cada obra serão encontrados na bibliografia ao final deste volume 1898a A Sexualidade na Etiologia das Neuroses 1905d Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade 1906a Minhas Teses sobre o Papel da Sexualidade na Etiologia das Neuroses 1907c O Esclarecimento Sexual da Criança 1908b Caráter e Erotismo Anal 1908c Sobre as Teorias Sexuais Infantis1908d Moral Sexual Civilizada e Doença Nervosa Moderna 1910a Cinco Lições de Psicanálise Conferência IV 1910c Uma Lembrança Infantil de Leonardo da Vinci Capítulo III 1910h Um Tipo Especial de Escolha de Objeto no Homem 1912d Sobre a Degradação mais Generalizada da Vida Amorosa 1912f Contribuições para um Debate sobre a Masturbação 1913I A Predisposição à Neurose Obsessiva 1913j O Interesse pela Psicanálise Parte II C 1913k Prefácio a Scatologic Rites of All Nations de Bourke 1914c Sobre o Narcisismo Introdução 191617 Conferências Introdutórias sobre Psicanálise Conferências XX XXI XXII e XXVI 1917c Sobre as Transformações da Pulsão particularmente o Erotismo Anal 1918a O Tabu da Virgindade 1919e Espancase uma Criança 1920a Sobre a Psicogênese de um Caso de Homossexualismo Feminino 1922b Alguns Mecanismos Neuróticos no Ciúme na Paranóia e no Homossexualismo Seção C 1923a Dois Verbetes de Enciclopédia 2 A Teoria da Libido 1923e A Organização Genital Infantil 1924c O Problema Econômico do Masoquismo 1924d O Naufrágio do Complexo de Édipo 1925j Algumas Conseqüências Psíquicas da Diferença Anatômica entre os Sexos 1927e Fetichismo 1931a Tipos Libidinais 193lb Sexualidade Feminina 1933a Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise Conferências XXXII e XXXIII 1940a 1938 Um Esboço de Psicanálise Capítulos III e VII 1940e 1938 A Cisão do Ego no Processo de Defesa 51 RESUMO FREUD Sigmund Três ensaios sobre a teoria da sexualidade 1905 AS ABERRAÇÕES SEXUAIS No momento inicial do texto Freud explica que a existência das necessidades sexuais no ser humano é tratada na biologia como pulsão sexual porém com analogias usando de parâmetro a fome Na opinião popular o desejo sexual não existe na infância e só se manifesta na maturação da puberdade Seu objetivo é puramente a união sexual mas Freud discute que essa seja a realidade sobre a pulsão sexual Ele chama de objeto sexual a pessoa de quem provém a atração sexual e de alvo sexual a ação para a qual a pulsão impele a partir dessas nomenclaturas ele busca explicar a relação destes e os seus desvios Ele fala sobre desvios com respeito ao objeto sexual se referindo aos homossexuais em vista que seus objetos de desejo são invertidos Em seguida Freud trata a respeito da inversão apontando os comportamentos dos invertidos a concepção de inversão apresentando que esta caracterização contém dois elementos que devem ser apreciados separadamente o caráter inato e a degeneração Freud fala sobre a bissexualidade a explicando como uma certa anomalia ou recurso natural uma predisposição originariamente bissexual que no curso do desenvolvimento Ele apresenta variados pontos de vista acerca desse tema citando outros autores que já discutiram sobre a bissexualidade sendo para ele também um mecanismo dos invertidos Acerca desse tema o autor conclui que existe uma forte ligação entre a pulsão sexual e o objeto sexual Acerca do próximo tópico se tratando de animais e pessoas sexualmente imaturas como objetos sexuais Freud toma como resultado da discussão acerca do tema o entendimento de que dentro de uma grande e quantidade de condições e num número surpreendentemente elevado de indivíduos a índole e o valor do objeto sexual passam para segundo plano ele também declara que O essencial e constante na pulsão sexual é alguma outra coisa Freud nos fala sobre os desvios com respeito ao alvo sexual transgressões anatômicas com supervalorização do objeto sexual por parte do sujeito o uso sexual da mucosa dos lábios e da boca pelo indivíduo o uso sexual do orifício anal a significação de outras partes do corpo Tópicos estes listados que nos remete ao que futuramente ele define como fases do desenvolvimento psicossexual Um pouco mais a frente no texto Freud disserta acerca da substituição imprópria do objeto sexual ou seja ele fala sobre o fetichismo tornando o texto mais imerso sobre o assunto entra em destaque as fixações de alvos sexuais provisórios ou seja o surgimento de novas intenções o tocar e o olhar o sadismo e o masoquismo As perversões eram marcadas como doenças muitas vezes porém Freud disserta em seu texto sobre as variações das perversões e que elas não necessariamente possuem origem patológicas As perversões podem ter objetos inanimados como parte da realização destas Freud determina que as perversões participam de modo abundante na transformação da pulsão sexual A pulsão sexual nos neuróticos se estabelece como um novo tópico da discussão onde Freud aponta o posicionamento psicanalítico e os resultados dessa abordagem dentro da temática destacando a relação entre a neurose e perversão discorrendo sobre suas hipóteses As pulsões parciais são investigadas durante o texto principalmente no foco das zonas erógenas e as situações que o indivíduo as explora aprofundando a relação dessas zonas com pacientes como os histéricos Não deixando esses tópicos vagos Freud esclarece a aparente preponderância da sexualidade perversa dentro dessas psiconeuroses nos introduzindo por fim ao próximo tema através das indicações do infantilismo da sexualidade A SEXUALIDADE INFANTIL Ao abordar esse tema Freud ressalta o descaso para com o infantil e a sexualidade existente nesse período buscando estabelecer sua hipótese sobre essa questão retratando a amnésia infantil e a sua relação com o sexual nos trazendo os períodos de latência sexual e suas rupturas assim como os processos de inibição sexual formação reativa e sublimação que ocorrem nesse período até as rupturas desse período As manifestações da sexualidade infantil são listadas e esclarecidas no texto sendo elas O chuchar e o autoerotismo Após isso Freud nos fala sobre o alvo da sexualidade infantil esclarecendo as características das zonas erógenas as manifestações masturbatórias atividade da zona anal e genital Estabelecendo as fases da masturbação infantil e esclarecendo como estas ocorrem O autor destaca também questões voltadas para a disposição perversa polimorfa pulsões parciais e a investigação sexual infantil partindo da pulsão natural da criança em saber apresentando teorias como o enigma da esfinge complexo de castração e inveja do pênis nas meninas e as teorias do nascimento criadas pelas crianças assim como a concepção sádica das relações sexuais Por fim esse capítulo do ensaio foca na discussão acerca das fonte da sexualidade infantil AS TRANSFORMAÇÕES DA PUBERDADE Esse capítulo do texto está voltada para a chegada da puberdade e as alterações que levam a vida sexual infantil à sua configuração definitiva Freud aborda nesse tópico o primado das zonas genitais e o conceito de préprazer apontando seus mecanismos perigos e questões voltadas para a tensão sexual Mais a frente ele engaja nos problemas acerca da excitação sexual o papel das substâncias sexuais do organismo apreciação dos órgãos sexuais internos apontando as teorias químicas sobre a sexualidade nesse contexto Freud nos introduz à teoria da libido estabelecendo a diferença e zonas dominantes no homem e na mulher antes de falar acerca do encontro do objeto sexual voltando a relacionar a necessidade desse objeto à fase da infância e a angústia infantil explicando a relação deste comportamento com a sexualidade Finalizando a discussão com a prevenção da inversão esclarecendo que o determinante do sexo da pessoa posteriormente escolhida como objeto sexual com isso possibilitandose a inversão permanente RESUMO Nesse tópico do ensaio Freud retorna a todo o conteúdo apresentado sintetizando os temas e discutindo sobre os fatores que perturbam o desenvolvimento constituição e hereditariedade discorre acerca da elaboração ulterior e destaca informações sobre tópicos que conhecemos ao se tratar de psicanálise como o recalcamento sublimação experiências acidentais precocidade fixação entre outros Freud conclui sua investigação determinando que as perturbações da vida sexual provêm de não sabermos sobre os processos biológicos que constituem a essência da sexualidade o bastante para formar com base em nossos conhecimentos isolados uma teoria suficiente para compreendermos tanto o normal quanto o patológico
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Sigmund Freud TRÊS ENSAIOS SOBRE A TEORIA DA SEXUALIDADE 1905 NOTA DO EDITOR INGLÊS DREI ABHANDLUNGEN ZUR SEXUAL THEORIE a EDIÇÕES ALEMÃS 1905 Leipzig e Viena Deuticke ii 83 págs 1910 2a Ed Leipzig e Viena Deuticke iii 87 págs Com acréscimos 1915 3a Ed Leipzig e Viena Deuticke vi 101 págs Com acréscimos 1920 4a Ed Leipzig e Viena Deuticke viii l04 págs Com acréscimos 1922 5a Ed Leipzig e Viena Deuticke viii l04 págs Sem alterações 1924 GS 5 3119 Com acréscimos 1925 6a Ed Leipzig e Viena Deuticke 120 págs G S 5 1942 GW 5 29145 Sem alterações 1972 SA 5 pp 37145 Vorwort zur vierten Auflage 1920 Int Z Psychoanal 6 p 247 1920 Leipzig e Viena Deuticke pp viiviii 1922 Leipzig e Viena Deuticke pp viiviii 1924 GS 5 pág 5 1925 Leipzig e Viena Deuticke p 5 1942 GW 5 pp 312 1972 SA 5 pp 456 b TRADUÇÕES EM INGLÊS Three Contributions to the Sexual Theory 1910 Nova York Journal of Nerv and Ment Dis Publ Co Série de Monografias no 7 x 91 págs Trad de AA Brill Introd de JJ Putnam Three Contributions to the Theory of Sexc 1916 2a Ed da de 1910 acima xi 117 págs Com acréscimos 1918 3a Ed xii 117 págs 1930 4a Ed xiv l04 págs Revisada 1938 Basic Writings 553629 Reedição da ed de 1930 acima Three Essays on the Theory of Sexuality 1949 Londres Imago Publishing Co 133 págs Trad de James Strachey A presente tradução inglesa é uma versão corrigida e ampliada da que se publicou em 1949 Os Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade juntamente com A Interpretação dos Sonhos figuram sem dúvida como as contribuições mais significativas e originais de Freud para o conhecimento humano Não obstante na forma em que costumamos ler esses ensaios é difícil avaliar a natureza exata de seu impacto quando da primeira publicação É que no decorrer de edições sucessivas num período de vinte anos eles foram submetidos por seu autor a mais modificações e acréscimos do que qualquer outro de seus escritos salvo talvez pela própria Interpretação dos Sonhos Esta edição difere num importante 1 aspecto de todas as que a antecederam seja em alemão ou em inglês Embora se baseie na sexta edição alemã de 1925 última a ser publicada durante a vida de Freud ela indica com as respectivas datas todas as alterações substanciais introduzidas na obra desde sua primeira edição Em todos os pontos em que se suprimiu ou modificou grandemente o material nas edições posteriores o trecho omitido ou a versão anterior são fornecidos em notas de rodapé Isso permitirá ao leitor ter uma noção mais clara de como eram estes ensaios em sua forma original Provavelmente causará surpresa por exemplo saber que a íntegra das seções sobre as teorias sexuais infantis e sobre a organização prégenital da libido ambas no segundo ensaio só foi acrescentada em 1915 dez anos após a primeira edição do livro Esse mesmo ano trouxe também o acréscimo da seção sobre a teoria da libido no terceiro ensaio Menos surpreendente é que os avanços da bioquímica tenham tornado necessário em 1920 reescrever o parágrafo sobre as bases químicas da sexualidade Nesse ponto a rigor a surpresa funciona mais no sentido inverso pois a versão original desse parágrafo aqui impressa numa nota mostra a notável antevisão de Freud nesse aspecto e revela quão pouco se fez necessário alterar suas concepções ver em 1 Entretanto a despeito dos acréscimos consideráveis feitos ao livro após sua publicação original sua essência já estava presente em 1905 sendo mesmo possível rastrearlhe as origens até datas ainda mais remotas A história completa do interesse de Freud pelo assunto pode agora graças à publicação da correspondência com Fliess 1950a ser pormenorizadamente acompanhada mas bastanos aqui indicar seus contornos gerais As observações clínicas da importância dos fatores sexuais na causação da neurose de angústia e da neurastenia inicialmente e das psiconeuroses mais tarde foram o que levou Freud pela primeira vez a uma investigação geral do tema da sexualidade Suas primeiras abordagens durante o início da década de 1890 partiram dos pontos de vista da fisiologia e da química Por exemplo encontrase uma hipótese neurofisiológica sobre os processos de excitação e descarga sexuais na Seção III de seu primeiro artigo sobre a neurose de angústia 1895b um notável diagrama ilustrando essa hipótese aparece no Rascunho G das cartas a Fliess aproximadamente na mesma época mas já fora mencionado um ano antes no Rascunho D A insistência de Freud nas bases químicas da sexualidade remonta pelo menos a essa época mas há também uma alusão ao tema no Rascunho D provavelmente datado da primavera de 1894 Nesse caso Freud acreditava dever muito às sugestões de Fliess como fica demonstrado entre outros pontos em suas associações ao famoso sonho da injeção de Irma no verão de 1895 A Interpretação dos Sonhos Capítulo II Era também a Fliess que devia algumas sugestões sobre o tema correlato da bissexualidade ver em 1 que Freud mencionou numa carta de 6 de dezembro de 1896 Carta 52 e que mais tarde veio a considerar como um fator decisivo ver em 1 embora sua opinião final sobre a atuação desse fator o tenha colocado em desacordo com Fliess É nessa mesma carta de fins de 1896 Freud l950a Carta 52 que encontramos a primeira referência às zonas erógenas passíveis de estimulação na infância porém mais tarde sufocadas e a seus vínculos com as perversões No início do mesmo ano Rascunho K de 1o de janeiro de 1896 e aqui podemos ver indícios de uma abordagem mais psicológica surge também uma discussão sobre as forças recalcadoras o asco a vergonha e a moral Contudo embora tantos elementos da teoria de Freud sobre a sexualidade já estivessem em sua mente por volta de 1896 sua pedra angular ainda estava por ser descoberta Desde os primórdios tinha havido uma suspeita de que os fatores casuais da histeria remontavam à infância há uma alusão a esse fato nos parágrafos iniciais da Comunicação Preliminar de Breuer e Freud de 1893 Por volta de 1895 ver por exemplo a Parte II do Projeto impressa como um apêndice à correspondência com Fliess Freud dispunha de uma explicação completa da histeria com base nos efeitos traumáticos da sedução sexual na primeira infância Durante todos esses anos anteriores a 1897 porém a sexualidade infantil era encarada como nada além de um fator latente passível de vir à luz com resultados desastrosos somente pela intervenção de um adulto É verdade que se poderia supor uma aparente exceção a isso a partir do contraste traçado por Freud entre a causação da histeria e a da neurose obsessiva a primeira afirmava ele remontava a experiências sexuais passivas na infância ao passo que a segunda se originaria em experiências ativas Mas Freud deixa muito claro em seu segundo ensaio sobre As Neuropsicoses de Defesa 1896b onde essa distinção é traçada que as experiências ativas subjacentes 2 à neurose obsessiva são invariavelmente precedidas por experiências passivas donde mais uma vez a mobilização da sexualidade infantil se deveria em última análise à interferência externa Foi somente no verão de 1897 que Freud se viu forçado a abandonar sua teoria da sedução Anunciou esse acontecimento em sua carta a Fliess de 21 de setembro Carta 69 e sua descoberta quase simultânea do complexo de Édipo feita em sua autoanálise Cartas 70 e 71 de 3 e 15 de outubro levou inevitavelmente ao reconhecimento de que as moções sexuais atuavam normalmente nas crianças de mais tenra idade sem nenhuma necessidade de estimulação externa Com essa descoberta a teoria sexual de Freud estava realmente completa Levou alguns anos porém para que ele acatasse por inteiro sua própria descoberta Num trecho do ensaio sobre A Sexualidade na Etiologia das Neuroses 1898a por exemplo ele se pronuncia ora a favor ora contra ela De um lado afirma que as crianças são capazes de todas as funções sexuais psíquicas e de muitas das somáticas e que é errôneo supor que sua vida sexual só comece na puberdade De outro lado entretanto declara que a organização e a evolução da espécie humana buscam evitar qualquer atividade sexual considerável na infância que as forças motoras sexuais dos seres humanos devem ser armazenadas e somente liberadas na puberdade e que isso explica por que as experiências sexuais infantis estão fadadas a ser patogênicas O importante prossegue ele são os efeitos posteriores produzidos por tais experiências na maturidade graças ao desenvolvimento do aparelho sexual somático e psíquico ocorrido no entretempo Até mesmo na primeira edição de A Interpretação dos Sonhos 1900a vêse um trecho curioso ao final do Capítulo III ver em 1 onde Freud comenta que temos em alta conta a felicidade da infância por ser ela ainda inocente de desejos sexuais Uma nota corretiva foi acrescentada a esse trecho em 1911 por sugestão de Jung segundo afirma Ernest Jones Isso foi sem dúvida um remanescente de um rascunho inicial do livro pois em outros trechos por exemplo na discussão do complexo de Édipo no Capítulo V ele escreve de maneira perfeitamente inequívoca sobre a existência de desejos sexuais mesmo nas crianças normais E é evidente que ao redigir seu caso clínico de Dora no início de 1901 já estavam firmemente estabelecidas as linhas principais de sua teoria da sexualidade Ver em 1 Ainda assim porém Freud não tinha pressa em publicar seus resultados Concluída e prestes a ser lançada A Interpretação dos Sonhos em 11 de outubro de 1899 Carta 121 escreveu ele a Fliess É possível que uma teoria da sexualidade seja a sucessora imediata do livro dos sonhos E decorridos três meses em 26 de janeiro de 1900 Carta 128 Estou colhendo material para a teoria sexual e esperando que alguma centelha inflame o material já acumulado Mas a centelha demoraria muito a surgir Salvo pelo pequeno ensaio Sobre os Sonhos e pela Psicopatologia da Vida Cotidiana ambos lançados antes do outono de 1901 Freud nada publicou de importante nos cinco anos que se seguiram E então repentinamente em 1905 lançou três obras fundamentais seu livro sobre O Chiste os Três Ensaios e o caso clínico de Dora É certo que este último fora escrito em sua maior parte quatro anos antes ver a partir de 1 sendo publicado em outubro e novembro de 1905 As outras duas obras foram lançadas quase simultaneamente alguns meses antes embora se ignorem as datas exatas ver uma discussão mais extensa a esse respeito no Prefácio do Editor ao livro sobre o chiste 1905c em 1 Nas edições alemãs as seções só aparecem numeradas no primeiro ensaio e mesmo neste a rigor antes de 1924 só eram numeradas até a metade do texto Para facilitar as referências estendemos aqui a numeração das seções ao segundo e terceiro ensaios PREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃO O autor que não se deixa enganar sobre as lacunas e obscuridades deste pequeno escrito ainda assim resistiu à tentação de incorporarlhe os resultados das investigações dos últimos cinco anos por não querer destruir seu caráter de documento unitário Por isso reproduz o texto original com alterações mínimas e se contenta em acrescentar algumas notas de rodapé que se distinguem das antigas por levarem um asterisco Ademais é seu fervoroso desejo que este livro envelheça rapidamente obtida uma aceitação universal para o que outrora trouxe de novo e substituídas as imperfeições que contém por teses mais corretas 3 Viena dezembro de 1909 PREFÁCIO À TERCEIRA EDIÇÃO Depois de observar por um decênio a recepção e os efeitos deste livro cabeme dotar esta terceira edição de algumas observações prévias destinadas a corrigir malentendidos e expectativas irrealizáveis em relação a ele É preciso frisar acima de tudo que a exposição aqui encontrada parte inteiramente da experiência médica cotidiana à qual os resultados da investigação psicanalítica pretendem trazer aprofundamento e relevância científica Os Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade não podem conter nada além daquilo que a psicanálise precisa supor ou permite confirmar Excluise portanto a possibilidade de que algum dia se ampliem a ponto de constituir uma teoria sexual e é compreensível que não tomem posição acerca de muitos problemas importantes da vida sexual Mas nem por isso se deve acreditar que tais capítulos omitidos desse grande tema sejam desconhecidos do autor ou que este os tenha desprezado por considerálos secundários A subordinação deste escrito às experiências psicanalíticas que levaram a sua redação mostrase ainda não apenas na escolha do material como também em sua ordenação Ao longo de todo ele observase uma certa seqüência de instâncias dáse prioridade aos fatores acidentaisdeixamse em segundo plano os fatores disposicionais e o desenvolvimento ontogenético é considerado antes do filogenético É que o acidental desempenha na análise o papel preponderante sendo esta dominada por ele quase por completo o disposicional só vem à luz por trás dele como algo despertado pelo vivenciar mas cuja apreciação ultrapassa amplamente o campo de trabalho da psicanálise Uma proporção semelhante domina a relação entre a ontogênese e a filogênese A ontogênese pode ser vista como uma repetição da filogênese na medida em que esta não seja modificada por uma vivência mais recente A predisposição filogenética fazse notar por trás do processo ontogenético No fundo porém a predisposição é justamente o precipitado de uma vivência prévia da espécie à qual se vem agregar a experiência mais nova do indivíduo como soma dos fatores acidentais Junto a sua total dependência da investigação psicanalítica devo destacar como característica desse meu trabalho sua deliberada dependência da investigação biológica Evitei cuidadosamente introduzir expectativas científicas provenientes da biologia sexual geral ou da biologia das espécies animais em particular no estudo da função sexual do ser humano que nos é possibilitado pela técnica da psicanálise A rigor meu objetivo foi sondar o quanto se pode apurar sobre a biologia da vida sexual humana com os meios acessíveis à investigação psicológica erame lícito assinalar os pontos de contato e concordância resultantes dessa investigação mas não havia por que me desconcertar com o fato de o método psicanalítico em muitos pontos importantes levar a opiniões e resultados consideravelmente diversos dos de base meramente biológica Introduzi nesta terceira edição um número abundante de inserções mas renunciei a identificálas como na edição anterior mediante algum sinal particular O trabalho científico em nosso campo teve seu progresso lentificado nos últimos tempos mas era indispensável uma certa complementação deste escrito caso se pretendesse mantêlo em contato com a literatura psicanalítica mais recente Viena outubro de 1914 PREFÁCIO À QUARTA EDIÇÃO Dissipadas as correntes da guerra podese verificar com satisfação que o interesse pela psicanálise permanece ileso no mundo em geral Mas nem todas as partes da doutrina tiveram o mesmo destino As colocações e constatações puramente psicológicas da psicanálise sobre o inconsciente o recalcamento o conflito que leva à doença o lucro extraído da doença os mecanismos da formação de sintomas etc gozam de crescente reconhecimento e são consideradas até mesmo por aqueles que em princípio as contestam Mas a parte da doutrina que faz fronteira com a biologia cujas bases são 4 fornecidas neste pequeno escrito continua a enfrentar um dissenso indiminuto e as próprias pessoas que por algum tempo se ocuparam intensamente da psicanálise foram movidas a abandonála para abraçar novas concepções destinadas a restringir mais uma vez o papel do fator sexual na vida anímica normal e patológica Ainda assim não posso decidirme pela suposição de que essa parte da doutrina psicanalítica possa afastarse muito mais que as outras da realidade apurada A memória e o reexame constantemente reiterado dizemme que ela brotou de uma observação igualmente esmerada e isenta de expectativas ademais o esclarecimento dessa dissociação percebida no reconhecimento público não apresenta nenhuma dificuldade Em primeiro lugar os primórdios aqui descritos da vida sexual humana só podem ser confirmados por investigadores que tenham paciência e habilidade técnica suficientes para reconduzir a análise até os primeiros anos da infância do paciente É freqüente ademais não haver possibilidade disso porquanto a prática médica exige que se despache com mais rapidez aparentemente o caso patológico Salvo pelos médicos que exercem a psicanálise entretanto ninguém pode ter acesso algum a esse campo nem qualquer possibilidade de formar por si um juízo que não seja influenciado por suas próprias aversões e preconceitos Soubessem os homens aprender através da observação direta das crianças estes três ensaios poderiam não ter sido escritos Mas convém lembrar ainda que parte do conteúdo deste escrito a saber sua insistência na importância da vida sexual para todas as realizações humanas e a ampliação aqui ensaiada do conceito de sexualidade tem constituído desde sempre o mais forte motivo para a resistência que se opõe à psicanálise No afã de encontrar tópicos grandiloqüentes chegouse até a falar no pansexualismo da psicanálise e a fazer a esta a absurda censura de que ela explicaria tudo a partir da sexualidade Só é possível assombrarse com isso quando se esquece quão confuso e distraído se pode ficar em decorrência dos fatores afetivos Já faz um bom tempo que o filósofo Arthur Schopenhauer mostrou aos homens em que medida seus feitos e interesses são determinados por aspirações sexuais o sentido corriqueiro da expressão e parece incrível que todo um mundo de leitores tenha conseguido banir de sua mente de maneira tão completa uma advertência tão impressionante E quanto à ampliação do conceito de sexualidade que a análise das crianças e dos chamados perversos tornou necessária todos aqueles que desde seu ponto de vista superior olham desdenhosamente para a psicanálise deveriam lembrarse de quanto essa sexualidade ampliada da psicanálise se aproxima do Eros do divino Platão Cf Nachmansohn 1915 Viena maio de 1920 5 AS ABERRAÇÕES SEXUAIS O fato da existência de necessidades sexuais no homem e no animal expressase na biologia pelo pressuposto de uma pulsão sexual Seguese nisso a analogia com a pulsão de nutrição a fome Falta à linguagem vulgar no caso da pulsão sexual uma designação equivalente à palavra fome a ciência valese para isso de libido A opinião popular faz para si representações bem definidas da natureza e das características dessa pulsão sexual Ela estaria ausente na infância farseia sentir na época e em conexão com o processo de maturação da puberdade seria exteriorizada nas manifestações de atração irresistível que um sexo exerce sobre o outro e seu objetivo seria a união sexual ou pelo menos os atos que levassem nessa direção Mas temos plena razão para ver nesses dados uma imagem muito infiel da realidade olhandoos mais de perto constatase que estão repletos de erros imprecisões e conclusões apressadas Introduzamos aqui dois termos chamemos de objeto sexual a pessoa de quem provém a atração sexual e de alvo sexual a ação para a qual a pulsão impele Assim fazendo a observação cientificamente esquadrinhada mostrará um grande número de desvios em ambos o objeto sexual e o alvo sexual e a relação destes com a suposta norma exige uma investigação minuciosa 1 DESVIOS COM RESPEITO AO OBJETO SEXUAL A teoria popular sobre a pulsão sexual tem seu mais belo equivalente na fábula poética da divisão do ser humano em duas metades homem e mulher que aspiram a unirse de novo no amor Por isso causa grande surpresa tomar conhecimento de que há homens cujo objeto sexual não é a mulher mas o homem e mulheres para quem não o homem e sim a mulher representa o objeto sexual Dizse dessas pessoas que são de sexo contrário ou melhor invertidas e chamase o fato de inversão O número de tais pessoas é bastante considerável embora haja dificuldades em apurálo com precisão A A INVERSÃO COMPORTAMENTO DOS INVERTIDOS As pessoas em questão comportamse de maneira muito diversificada em vários aspectos a Podem ser invertidos absolutos ou seja seu objeto sexual só pode ser do mesmo sexo enquanto o sexo oposto nunca é para eles objeto de anseio sexual mas antes os deixa frios ou até lhes desperta aversão sexual Quando se trata de homens essa aversão os incapacita de praticarem o ato sexual normal ou então não extraem dessa prática nenhum gozo b Podem ser invertidos anfígenos hermafroditas sexuais ou seja seu objeto sexual tanto pode pertencer ao mesmo sexo quanto ao outro falta à inversão portanto o caráter de exclusividade c Podem ser invertidos ocasionais ou seja em certas condições externas dentre as quais destacamse a inacessibilidade do objeto sexual normal e a imitação elas podem tomar como objeto sexual uma pessoa do mesmo sexo e encontrar satisfação no ato sexual com ela Os invertidos mostram ainda um comportamento variado no juízo que fazem da peculiaridade de sua pulsão sexual Alguns aceitam a inversão como algo natural tal como os normais aceitam a orientação de sua libido e defendem energicamente sua igualdade de direitos com os normais Outros porém rebelamse contra o fato de sua inversão e a sentem como uma compulsão patológica Outras variações concernem às relações temporais O traço da inversão pode vir de longa data no indivíduo até onde sua memória consegue alcançar ou só se ter feito notar em determinada época antes ou depois da puberdade Esse caráter pode conservarse por toda a vida ou ser temporariamente suspenso ou ainda constituir um episódio no caminho para o desenvolvimento normal e pode até exteriorizarse pela primeira vez em época posterior da vida após um longo período de atividade sexual normal Observouse também uma oscilação periódica entre o objeto sexual normal e o invertido 6 Particularmente interessantes são os casos em que a libido se altera no sentido da inversão depois de se ter uma experiência penosa com o objeto sexual normal Em geral essas diferentes séries de variações coexistem independentemente umas das outras Em sua forma mais extrema talvez se possa supor regularmente que a inversão existiu desde época muito prematura e que a pessoa se sente em consonância com sua peculiaridade Muitos autores se recusariam a reunir num só conjunto os casos aqui enumerados e prefeririam frisar as diferenças em vez das semelhanças entre esses grupos o que se prende a sua maneira favorita de encarar a inversão No entanto por mais legítimas que sejam essas distinções é impossível desconhecer que todos os graus intermediários são abundantemente encontrados de modo que o estabelecimento de séries como que se impõe por si só CONCEPÇÃO DA INVERSÃO A primeira apreciação da inversão consistiu em concebêla como um sinal inato de degeneração nervosa e estava em consonância com o fato de os observadores médicos terem deparado com ela pela primeira vez em doentes nervosos ou pessoas que davam a impressão de sêlo Essa caracterização contém dois elementos que devem ser apreciados separadamente o caráter inato e a degeneração DEGENERAÇÃO A degeneração está exposta às objeções que se levantam em geral contra o uso indiscriminado dessa palavra Tornouse costume imputar à degeneração todos os tipos de manifestação patológica que não sejam de origem diretamente traumática ou infecciosa A classificação dos degenerados feita por Magnan faz com que nem mesmo a mais primorosa conformação geral da função nervosa fique excluída da aplicabilidade do conceito de degeneração Nessas circunstâncias podese indagar que benefício e que novo conteúdo possui em geral o juízo degeneração Parece mais oportuno falar em degeneração apenas quando 1 houver uma conjugação de muitos desvios graves em relação à norma 2 a capacidade de funcionamento e de sobrevivência parecer em geral gravemente prejudicada Vários fatores permitem ver que os invertidos não são degenerados nesse sentido legítimo da palavra 1 Encontrase a inversão em pessoas que não exibem nenhum outro desvio grave da norma 2 Do mesmo modo encontramola em pessoas cuja eficiência não está prejudicada e que inclusive se destacam por um desenvolvimento intelectual e uma cultura ética particularmente elevados 3 Se abstrairmos os pacientes encontrados em nossa experiência médica e procurarmos abarcar um horizonte mais amplo depararemos em duas direções com fatos que impedem que se conceba a inversão como um sinal de degeneração a É preciso considerar que nos povos antigos no auge de sua cultura a inversão era um fenômeno freqüente quase que uma instituição dotada de importantes funções b Ela é extremamente difundida em muitos povos selvagens e primitivos ao passo que o conceito de degeneração costuma restringirse à civilização elevada cf I Bloch e mesmo entre os povos civilizados da Europa o clima e a raça exercem a mais poderosa influência sobre a disseminação e o juízo que se faz da inversão CARÁTER INATO Como é compreensível o caráter inato só é alegado no tocante à primeira e mais extrema classe dos invertidos e na verdade com base na asseveração dessas pessoas de que em nenhum momento de sua vida mostrouse a elas outra orientação de sua pulsão sexual Já a existência das duas outras classes especialmente da terceira os invertidos ocasionais dificilmente se compatibiliza com a concepção de 7 um caráter inato Por isso os que sustentam essa opinião tendem a separar o grupo dos invertidos absolutos de todos os demais o que tem como conseqüência a renúncia a uma concepção universalmente válida da inversão Assim a inversão teria um caráter inato numa série de casos enquanto noutros poderia terse originado de outra maneira O oposto disso é a concepção alternativa de que a inversão é um caráter adquirido da pulsão sexual Ela se apóia nas seguintes considerações 1 Na vida de muitos invertidos mesmo absolutos podese demonstrar a influência de uma impressão sexual prematura cuja conseqüência duradoura é representada pela inclinação homossexual 2 Na vida de muitos outros é possível indicar as influências externas favorecedoras e inibidoras que levaram em época mais prematura ou mais tardia à fixação da inversão relacionamentos exclusivos com o mesmo sexo companheirismo na guerra detenção em presídios os riscos da relação heterossexual celibato fraqueza sexual etc 3 A inversão pode ser eliminada pela sugestão hipnótica o que seria assombroso numa característica inata Dentro dessa perspectiva podese até contestar a própria existência de uma inversão inata É possível objetar cf Havelock Ellis 1915 que um exame mais rigoroso dos casos reivindicados em prol da inversão inata provavelmente também traria à luz uma vivência da primeira infância que foi determinante para a orientação da libido Essa vivência simplesmente não se teria preservado na memória consciente da pessoa mas seria possível trazêla de volta à lembrança mediante a influência apropriada Segundo esses autores a inversão só poderia ser qualificada como uma variação freqüente da pulsão sexual passível de ser determinada por uma quantidade de circunstâncias externas de vida Mas a aparente certeza assim adquirida chega ao fim através da observação contrária de que muitas pessoas ficam sujeitas às mesmas influências sexuais inclusive na meninice sedução masturbação mútua sem por isso se tornarem invertidas ou assim continuarem permanentemente Somos portanto impelidos à suposição de que a alternativa inatoadquirido é incompleta ou então não abarca todas as situações presentes na inversão EXPLICAÇÃO DA INVERSÃO Nem a hipótese de que a inversão é inata nem tampouco a conjectura alternativa de que é adquirida explicam sua natureza No primeiro caso é preciso dizer o que há nela de inato para que não se concorde com a explicação rudimentar de que a pessoa traz consigo em caráter inato o vínculo da pulsão sexual com determinado objeto sexual No outro caso cabe perguntar se as múltiplas influências acidentais bastariam para explicar a aquisição da inversão sem necessidade de que algo no indivíduo fosse ao encontro delas A negação deste último fator segundo nossas colocações anteriores é inadmissível O RECURSO À BISSEXUALIDADE Desde Lydston 1889 Kiernan 1888 e Chevalier 1893 temse recorrido para esclarecer a possibilidade de uma inversão sexual a uma série de idéias que contém uma nova contradição das opiniões populares Estas admitem que o ser humano ou é homem ou é mulher A ciência porém conhece casos em que os caracteres sexuais parecem confusos e é portanto difícil determinar o sexo antes de mais nada no campo anatômico A genitália dessas pessoas combina caracteres masculinos e femininos hermafroditismo Em casos raros os dois tipos de aparelho sexual coexistem plenamente desenvolvidos hermafroditismo verdadeiro porém com muito mais freqüência achamse ambos atrofiados Mas a importância dessas anormalidades está em que elas facilitam de maneira inesperada a compreensão da formação normal É que certo grau de hermafroditismo anatômico constitui a norma em nenhum indivíduo masculino ou feminino de conformação normal faltam vestígios do aparelho do 8 sexo oposto que persistiram sem nenhuma função como órgãos rudimentares ou que se modificaram para tomar a seu encargo outras funções A concepção resultante desses fatos anatômicos conhecidos de longa data é a de uma predisposição originariamente bissexual que no curso do desenvolvimento vaise transformando em monossexualidade com resíduos ínfimos do sexo atrofiado Era sugestivo transpor essa concepção para o campo psíquico e explicar a inversão em todas as suas variedades como a expressão de um hermafroditismo psíquico E para resolver a questão restaria apenas constatar uma coincidência regular da inversão com os sinais anímicos e somáticos do hermafroditismo Só que essa expectativa não se realizou Não é possível imaginar relações tão estreitas entre o suposto hibridismo psíquico e o hibridismo anatômico comprovável O que amiúde se constata nos invertidos é uma redução generalizada da pulsão sexual cf Havelock Ellis 1915 e uma ligeira atrofia anatômica dos órgãos Amiúde mas de modo algum regularmente ou mesmo predominantemente Portanto cabe reconhecer que a inversão e o hermafroditismo somático são no conjunto independentes entre si Temse ainda atribuído grande importância aos chamados caracteres sexuais secundários e terciários e a sua freqüente presença acentuada nos invertidos cf Havelock Ellis 1915 Também nisso há muito de acerto mas não se deve esquecer que em geral os caracteres sexuais secundários e terciários de um sexo aparecem com muitíssima freqüência no outro são portanto indícios de hermafroditismo mas nem por isso revelase uma mudança do objeto sexual no sentido da inversão O hermafroditismo psíquico ganharia corpo se com a inversão do objeto sexual houvesse em paralelo ao menos uma mudança das demais qualidades anímicas pulsões e traços de caráter para a variante típica do sexo oposto Mas só se pode esperar tal inversão do caráter com alguma regularidade nas mulheres invertidas pois nos homens a mais plena virilidade anímica é compatível com a inversão A persistir na colocação de um hermafroditismo psíquico é preciso acrescentar que suas manifestações nos diversos campos permitem identificar apenas um ínfimo condicionamento recíproco O mesmo se aplica aliás ao hibridismo somático segundo Halban 1903 também as atrofias de órgãos específicos e os caracteres sexuais secundários aparecem com bastante independência uns dos outros A doutrina da bissexualidade foi exprimida em sua mais crua forma por um portavoz dos invertidos masculinos um cérebro feminino num corpo masculino Entretanto ignoramos quais seriam as características de um cérebro feminino A substituição do problema psicológico pelo anatômico é tão inútil quanto injustificada A tentativa de explicação de KrafftEbing parece concebida de maneira mais exata que a de Ulrichs embora em essência não difira dela segundo KrafftEbing 1895 5 a disposição bissexual dota o indivíduo tanto de centros cerebrais masculinos e femininos quanto de órgãos sexuais somáticos Esses centros começam a desenvolverse na época da puberdade na maioria das vezes sob a influência das glândulas sexuais que independem deles na disposição originária Mas a esses centros masculinos e femininos aplicase o mesmo que dissemos sobre os cérebros masculinos e femininos e a propósito nem sequer sabemos se cabe presumir para as funções sexuais áreas cerebrais delimitadas centros como as que supomos por exemplo para a fala Ainda assim duas idéias permanecem de pé após essas discussões de algum modo há uma disposição bissexual implicada na inversão embora não saibamos em que consiste essa disposição além da formação anatômica e lidase também com perturbações que afetam a pulsão sexual em seu desenvolvimento OBJETO SEXUAL DOS INVERTIDOS A teoria do hermafroditismo psíquico pressupõe que o objeto sexual dos invertidos seja o oposto do normal O homem invertido sucumbiria como a mulher ao encanto proveniente dos atributos masculinos do corpo e da alma sentirseia como uma mulher e buscaria o homem 9 No entanto por melhor que isso se aplique a toda uma série de invertidos ainda está longe de revelar uma característica universal da inversão Não há dúvida alguma de que uma grande parcela dos invertidos masculinos preserva o caráter psíquico da virilidade traz relativamente poucos caracteres secundários do sexo oposto e com efeito busca em seu objeto sexual traços psíquicos femininos Não fosse assim seria incompreensível o fato de a prostituição masculina que hoje como na Antigüidade se oferece aos invertidos copiar as mulheres em todas as exteriorizações da indumentária e do porte tal imitação de outro modo ofenderia necessariamente o ideal dos invertidos Nos gregos entre os quais os homens mais viris figuravam entre os invertidos está claro que o que inflamava o amor do homem não era o caráter masculino do efebo mas sua semelhança física com a mulher bem como seus atributos anímicos femininos a timidez o recato e a necessidade de ensinamentos e assistência Mal se tornava homem o efebo deixava de ser um objeto sexual para o homem e talvez ele próprio se transformasse num amante de efebos Nesses casos portanto como em muitos outros o objeto sexual não é do mesmo sexo mas uma conjugação dos caracteres de ambos os sexos como que um compromisso entre uma moção que anseia pelo homem e outra que anseia pela mulher com a condição imprescindível da masculinidade do corpo da genitália é por assim dizer o reflexo especular da própria natureza bissexual A situação é menos ambígua nas mulheres entre as quais as invertidas ativas exibem com particular freqüência os caracteres somáticos e anímicos do homem e anseiam pela feminilidade em seu objeto sexual muito embora também nesse caso um conhecimento mais estreito pudesse revelar uma variedade maior ALVO SEXUAL DOS INVERTIDOS O fato importante a ser retido é que de modo algum se pode chamar de uniforme a meta sexual dos invertidos Nos homens a relação sexual per anum não coincide em absoluto com a inversão a masturbação é com igual freqüência seu alvo exclusivo e as restrições ao alvo sexual a ponto de ele ser um mero extravasamento da emoção são aqui ainda mais comuns do que no amor heterossexual Também entre as mulheres invertidas são múltiplos os alvos sexuais parecendo privilegiado entre elas o contato com a mucosa bucal CONCLUSÃO É verdade que nos vemos impossibilitados de esclarecer satisfatoriamente a origem da inversão a partir do material apresentado até agora mas podemos notar que nesta indagação chegamos a um conhecimento que talvez se revele mais importante para nós do que a solução da tarefa acima Chamou nos a atenção que imaginávamos como demasiadamente íntima a ligação entre a pulsão sexual e o objeto sexual A experiência obtida nos casos considerados anormais nos ensina que neles há entre a pulsão sexual e o objeto sexual apenas uma solda que corríamos o risco de não ver em conseqüência da uniformidade do quadro normal em que a pulsão parece trazer consigo o objeto Assim somos instruídos a afrouxar o vínculo que existe em nossos pensamentos entre a pulsão e o objeto É provável que de início a pulsão sexual seja independente de seu objeto e tampouco deve ela sua origem aos encantos deste B ANIMAIS E PESSOAS SEXUALMENTE IMATURAS COMO OBJETOS SEXUAIS Enquanto as pessoas cujos objetos sexuais não pertencem ao sexo normalmente apropriado ou seja os invertidos afiguramse ao observador como uma coletânea de indivíduos talvez bastante válidos em outros aspectos os casos em que se escolhem pessoas sexualmente imaturas crianças como objetos sexuais são desde logo encarados como aberrações esporádicas Só excepcionalmente as crianças são objetos sexuais exclusivos em geral passam a desempenhar esse papel quando um indivíduo covarde ou impotente prestase a usálas como substituto ou quando uma pulsão urgente impreterível não pode apropriarse no momento de nenhum objeto mais adequado Ainda assim é esclarecedor sobre a 10 natureza da pulsão sexual o fato de ela admitir tão ampla variação e tamanho rebaixamento de seu objeto coisa que a fome muito mais energicamente agarrada a seu objeto só permitiria nos casos mais extremos Uma observação similar é válida quanto à relação sexual com animais que não é nada rara sobretudo entre os camponeses e onde a atração sexual parece ultrapassar a barreira da espécie Por motivos estéticos de bom grado se atribuiriam estas e outras aberrações graves da pulsão sexual à loucura mas isso não é possível A experiência ensina que não se observam entre os loucos quaisquer perturbações da pulsão sexual diferentes das encontradas entre os sadios bem como em raças e classes inteiras Assim com a mais insólita freqüência encontrase o abuso sexual contra as crianças entre os professores e as pessoas que cuidam de crianças simplesmente porque a eles se oferece a melhor oportunidade para isso Os loucos apenas exibem tal aberração em grau intensificado ou então o que é particularmente significativo elevado a uma prática exclusiva e substituindo a satisfação sexual normal Essa curiosíssima relação entre as variações sexuais e a escala que vai da saúde à perturbação mental dá o que pensar Eu opinaria que este fato ainda por esclarecer seria uma indicação de que as moções da vida sexual mesmo normalmente encontramse entre as menos dominadas pelas atividades anímicas superiores Segundo minha experiência quem é mentalmente anormal em algum outro aspecto seja em termos sociais ou éticos habitualmente também o é em sua vida sexual Mas muitos são os anormais na vida sexual que em todos os outros pontos correspondem à média e que passaram pessoalmente pelo desenvolvimento cultural humano cujo ponto mais fraco continua a ser a sexualidade Ora como resultado mais genérico dessas discussões extrairíamos o entendimento de que numa grande quantidade de condições e num número surpreendentemente elevado de indivíduos a índole e o valor do objeto sexual passam para segundo plano O essencial e constante na pulsão sexual é alguma outra coisa 2 DESVIOS COM RESPEITO AO ALVO SEXUAL Considerase como alvo sexual normal a união dos genitais no ato designado como coito que leva à descarga da tensão sexual e à extinção temporária da pulsão sexual uma satisfação análoga à saciação da fome Todavia mesmo no processo sexual mais normal reconhecemse os rudimentos daquilo que se desenvolvido levaria às aberrações descritas como perversões É que certas relações intermediárias com o objeto sexual a caminho do coito tais como apalpálo e contemplálo são reconhecidas como alvos sexuais preliminares Essas atividades de um lado trazem prazer em si mesmas e de outro intensificam a excitação que deve perdurar até que se alcance o alvo sexual definitivo Além disso a um desses contatos o das mucosas labiais das duas pessoas o beijo atribuiuse em muitos povos dentre eles os mais altamente civilizados um elevado valor sexual apesar de as partes do corpo nele implicadas não pertencerem ao aparelho sexual mas constituírem a entrada do tubo digestivo Aí estão portanto fatores que permitem ligar as perversões à vida sexual normal e que também são aplicáveis à classificação delas As perversões são ou a transgressões anatômicas quanto às regiões do corpo destinadas à união sexual ou b demoras nas relações intermediárias com o objeto sexual que normalmente seriam atravessadas com rapidez a caminho do alvo sexual final A TRANSGRESSÕES ANATÔMICAS SUPERVALORIZAÇÃO DO OBJETO SEXUAL Somente em raríssimos casos a valorização psíquica com que é aquinhoado o objeto sexual enquanto alvo desejado da pulsão sexual restringese a sua genitália ela se propaga antes por todo o seu corpo e tende a abranger todas as sensações provenientes do objeto sexual A mesma supervalorização irradiase pelo campo psíquico e se manifesta como uma cegueira lógica enfraquecimento do juízo perante as realizações anímicas e as perfeições do objeto sexual e também 11 como uma submissão crédula aos juízos dele provenientes Assim é que a credulidade do amor passa a ser uma fonte importante se não a fonte originária da autoridade Ora é essa supervalorização sexual que não suporta bem a restrição do alvo sexual à união dos órgãos genitais propriamente ditos e que contribui para elevar as atividades ligadas a outras partes do corpo à condição de alvos sexuais A importância desse fator da supervalorização sexual pode ser estudada em melhores condições no homem cuja vida amorosa é a única a terse tornado acessível à investigação enquanto a da mulher em parte por causa da atrofia cultural em parte por sua discrição e insinceridade convencionais permanece envolta numa obscuridade ainda impenetrável USO SEXUAL DA MUCOSA DOS LÁBIOS E DA BOCA O uso da boca como órgão sexual é considerado como perversão quando os lábios língua de uma pessoa entram em contato com a genitália de outra mas não quando ambas colocam em contato a mucosa labial Nesta exceção reside o ponto de ligação com o normal Quem por considerálas perversões detesta as outras práticas certamente usuais desde os primórdios da humanidade cede nisso a um claro sentimento de asco que o resguarda de aceitar tal alvo sexual Mas os limites desse asco são muitas vezes puramente convencionais aquele que beija com ardor os lábios de uma bela jovem talvez usasse com asco a escova de dentes dela embora não tenha nenhuma razão para supor que sua própria cavidade bucal seja mais limpa que a da moça Chama a atenção aqui o fator do asco que estorva a supervalorização libidinosa do objeto sexual mas que por sua vez pode ser vencido pela libido Poder seia ver no asco uma das forças que levaram à restrição do alvo sexual Em geral estas se detêm ante a genitália Mas não há dúvida alguma de que também os genitais do sexo oposto em si mesmos podem constituir objetos de asco e de que esse comportamento é uma das características de todos os histéricos sobretudo as mulheres A força da pulsão sexual gosta de se exercer na dominação desse asco Ver a partir de 1 USO SEXUAL DO ORIFÍCIO ANAL No que concerne ao ânus reconhecese com clareza ainda maior do que nos casos anteriores que é a repugnância que apõe nesse alvo sexual o selo da perversão Mas que eu não seja acusado de partidarismo por observar que a fundamentação desse asco no fato de tal parte do corpo servir à excreção e entrar em contato com o asqueroso em si os excrementos não é muito mais convincente do que a razão fornecida pelas moças histéricas para explicar seu asco ante o órgão genital masculino que ele serve à micção O papel sexual da mucosa do ânus de modo algum se restringe à relação sexual entre homens nem tampouco a predileção por ela é característica da sensibilidade dos invertidos Parece ao contrário que o paedicatio do homem deve seu papel à analogia com o ato praticado com a mulher ao passo que a masturbação recíproca é o alvo sexual mais facilmente encontrado na relação sexual dos invertidos SIGNIFICAÇÃO DE OUTRAS PARTES DO CORPO A propagação do interesse sexual para outras partes do corpo com todas as suas variações em princípio nada nos oferece de novo nada acrescenta ao conhecimento da pulsão sexual que nisso não faz senão proclamar sua intenção de se apoderar do objeto sexual em todos os sentidos Mas ao lado da supervalorização sexual apresentase nas transgressões anatômicas um segundo fator que é alheio ao conhecimento popular Certos lugares do corpo como as mucosas bucal e anal que aparecem repetidamente nessas práticas como que reivindicam ser considerados e tratados eles mesmos como genitais Veremos mais adiante que essa reivindicação se justifica pelo desenvolvimento da pulsão sexual e que é atendida na sintomatologia de certos estados patológicos SUBSTITUIÇÃO IMPRÓPRIA DO OBJETO SEXUAL FETICHISMO 12 Uma impressão muito peculiar resulta dos casos em que o objeto sexual normal é substituído por outro que guarda certa relação com ele mas que é totalmente impróprio para servir ao alvo sexual normal Do ponto de vista da classificação por certo teríamos feito melhor em mencionar esse grupo sumamente interessante de aberrações da pulsão sexual já entre os desvios com respeito ao objeto sexual mas o adiamos até tomar conhecimento do fator da supervalorização sexual da qual dependem esses fenômenos ligados ao abandono do alvo sexual O substituto do objeto sexual geralmente é uma parte do corpo os pés os cabelos muito pouco apropriada para fins sexuais ou então um objeto inanimado que mantém uma relação demonstrável com a pessoa a quem substitui de preferência com a sexualidade dela um artigo de vestuário uma peça íntima Comparouse esse substituto não injustificadamente com o fetiche em que o selvagem vê seu deus incorporado A transição para os casos de fetichismo com renúncia ao alvo sexual seja este normal ou perverso constituise dos casos em que se exige do objeto sexual uma condição fetichista para que o alvo sexual seja alcançado determinada cor dos cabelos certas roupas ou mesmo defeitos físicos Nenhuma outra variação da pulsão sexual nas raias do patológico merece tanto o nosso interesse quanto essa dada a singularidade dos fenômenos a que dá lugar Um certo rebaixamento da aspiração ao alvo sexual normal fraqueza de execução no aparelho sexual parece ser prérequisito disso em todos os casos O ponto de ligação com o normal é proporcionado pela supervalorização psicologicamente necessária do objeto sexual que se propaga inevitavelmente por tudo o que está associativamente ligado ao objeto Por isso certo grau desse fetichismo costuma ser próprio do amor normal sobretudo nos estágios de enamoramento em que o alvo sexual normal é inatingível ou sua satisfação parece impedida Schaff mir ein Halstuch von ihrer Brust Ein Strumpfband meiner Liebeslust O caso só se torna patológico quando o anseio pelo fetiche se fixa indo além da condição mencionada e se coloca no lugar do alvo sexual normal e ainda quando o fetiche se desprende de determinada pessoa e se torna o único objeto sexual São essas as condições gerais para que meras variações da pulsão sexual se transformem em aberrações patológicas Na escolha do fetiche manifestase como Binet 1888 foi o primeiro a sustentar e como depois se comprovou abundantemente a influência persistente de uma impressão sexual recebida na maioria das vezes na primeira infância o que se pode comparar com a proverbial persistência do primeiro amor on revient toujours à ses premiers amours Essa derivação é particularmente clara nos casos em que há apenas um condicionamento fetichista do objeto sexual Voltaremos a deparar em outro ponto ver em 1 com a significação das impressões sexuais precoces Em outros casos o que leva à substituição do objeto pelo fetiche é uma conexão simbólica de pensamentos que na maioria das vezes não é consciente para a pessoa Os trajetos dessas conexões nem sempre podem ser indicados com certeza o pé por exemplo é um antiquíssimo símbolo sexual que já aparece no mito e as peles decerto devem seu papel de fetiche à associação com os pêlos do mons Veneris Não obstante nem mesmo esse simbolismo parece independer sempre das experiências sexuais da infância B FIXAÇÕES DE ALVOS SEXUAIS PROVISÓRIOS SURGIMENTO DE NOVAS INTENÇÕES Todas as condições externas e internas que dificultam ou adiam a consecução do alvo sexual normal impotência preço elevado do objeto sexual riscos do ato sexual reforçam como é compreensível a tendência a demorarse nos atos preliminares e a formar a partir deles novos alvos sexuais que podem tomar o lugar dos normais Um exame mais atento sempre mostra que esses novos propósitos mesmo os que se afiguram mais estranhos já se esboçam no processo sexual normal 13 O TOCAR E O OLHAR Uma certa dose de uso do tato ao menos para os seres humanos é indispensável para que se atinja o alvo sexual normal Sabese também universalmente que fonte de prazer por um lado e que afluxo de excitação renovada por outro são proporcionados pelas sensações de contato com a pele do objeto sexual Portanto demorarse no tocar desde que o ato sexual seja levado adiante dificilmente pode contar entre as perversões O mesmo se dá com o ver que em última análise deriva do tocar A impressão visual continua a ser o caminho mais freqüente pelo qual se desperta a excitação libidinosa e é com a transitabilidade desse caminho se é que esse tipo de consideração teleológica é permissível que conta a seleção natural ao fazer com que o objeto sexual se desenvolva em termos de beleza A progressiva ocultação do corpo advinda com a civilização mantém desperta a curiosidade sexual que ambiciona completar o objeto sexual através da revelação das partes ocultas mas que pode ser desviada sublimada para a arte caso se consiga afastar o interesse dos genitais e voltálo para a forma do corpo como um todo A demora nesse alvo sexual intermediário do olhar carregado de sexo surge em certa medida na maioria das pessoas normais e de fato lhes dá a possibilidade de orientarem uma parcela de sua libido para alvos artísticos mais elevados Por outro lado o prazer de ver escopofilia transformase em perversão a quando se restringe exclusivamente à genitália b quando se liga à superação do asco o voyeur espectador das funções excretórias ou c quando suplanta o alvo sexual normal em vez de ser preparatório a ele Este último é marcantemente o caso dos exibicionistas que se posso deduzilo após diversas análises exibem seus genitais para conseguir ver em contrapartida a genitália do outro Na perversão que aspira a olhar e ser olhado distinguese um traço curiosíssimo do qual nos ocuparemos ainda mais intensamente na aberração a ser examinada a seguir ou seja nela o alvo sexual apresentase numa configuração dupla nas formas ativa e passiva A força que se opõe ao prazer de ver mas pode eventualmente ser superada por ele como vimos antes no caso do asco é a vergonha SADISMO E MASOQUISMO A inclinação a infligir dor ao objeto sexual bem como sua contrapartida que são as mais freqüentes e significativas de todas as perversões foram denominadas por KrafftEbing em formas ativa e passiva de sadismo e masoquismo passivo Outros autores p ex SchrenckNotzing 1899 preferem a designação mais estrita de algolagnia que destaca o prazer na dor a crueldade enquanto os termos escolhidos por KrafftEbing colocam em primeiro plano o prazer em qualquer forma de humilhação ou sujeição No tocante à algolagnia ativa o sadismo suas raízes são fáceis de apontar nas pessoas normais A sexualidade da maioria dos varões exibe uma mescla de agressão de inclinação a subjugar cuja importância biológica talvez resida na necessidade de vencer a resistência do objeto sexual de outra maneira que não mediante o ato de cortejar Assim o sadismo corresponderia a um componente agressivo autonomizado e exagerado da pulsão sexual movido por deslocamento para o lugar preponderante O conceito de sadismo oscila na linguagem corriqueira desde uma atitude meramente ativa ou mesmo violenta para com o objeto sexual até uma satisfação exclusivamente condicionada pela sujeição e maustratos a ele infligidos Num sentido estrito somente este último caso extremo merece o nome de perversão De maneira similar a designação de masoquismo abrange todas as atitudes passivas perante a vida sexual e o objeto sexual a mais extrema das quais parece ser o condicionamento da satisfação ao padecimento de dor física ou anímica advinda do objeto sexual O masoquismo enquanto perversão parece distanciarse mais do alvo sexual normal do que sua contrapartida em primeiro lugar podese pôr em dúvida se ele aparece alguma vez como fenômeno primário ou se pelo contrário surge 14 regularmente do sadismo mediante uma transformação É freqüente poderse reconhecer que o masoquismo não é outra coisa senão uma continuação do sadismo que se volta contra a própria pessoa que com isso assume para começar o lugar do objeto sexual A análise clínica dos casos extremos de perversão masoquista mostra a colaboração de uma ampla série de fatores como o complexo de castração e a consciência de culpa no exagero e fixação da atitude sexual passiva originária A dor que com isso é superada alinhase com o asco e a vergonha que se opunham à libido como resistência O sadismo e o masoquismo ocupam entre as perversões um lugar especial já que o contraste entre atividade e passividade que jaz em sua base pertence às características universais da vida sexual Que a crueldade e a pulsão sexual estão intimamente correlacionadas énos ensinado acima de qualquer dúvida pela história da civilização humana mas no esclarecimento dessa correlação não se foi além de acentuar o fator agressivo da libido Segundo alguns autores essa agressão mesclada à pulsão sexual é na realidade um resíduo de desejos canibalísticos e portanto uma coparticipação do aparelho de dominação que atende à satisfação de outra grande necessidade ontogeneticamente mais antiga Afirmouse também que toda dor contém em si mesma a possibilidade de uma sensação prazerosa Contentamonos aqui em afirmar que o esclarecimento dessa perversão de modo algum tem sido satisfatório e que possivelmente diversas aspirações anímicas nela se combinam para produzir um efeito único A particularidade mais notável dessa perversão reside porém em que suas formas ativa e passiva costumam encontrarse juntas numa mesma pessoa Quem sente prazer em provocar dor no outro na relação sexual é também capaz de gozar como prazer de qualquer dor que possa extrair das relações sexuais O sádico é sempre e ao mesmo tempo um masoquista ainda que o aspecto ativo ou passivo da perversão possa terse desenvolvido nele com maior intensidade e represente sua atividade sexual predominante Assim vemos que algumas das inclinações à perversão apresentamse regularmente como pares de opostos o que em conjunto com um material a ser posteriormente apresentado pode reivindicar uma elevada significação teórica É ainda evidente que a existência do par de opostos sadismomasoquismo não é dedutível em termos imediatistas da mescla de agressão Ao contrário ficaríamos tentados a relacionar a presença simultânea desses opostos com a oposição entre masculino e feminino que se combina na bissexualidade oposição que amiúde é substituída na psicanálise pelo contraste entre ativo e passivo 3 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AS PERVERSÕES VARIAÇÃO E DOENÇA É natural que os médicos que inicialmente estudaram as perversões em exemplos bem marcados e em condições especiais tenhamse inclinado a adjudicarlhes o caráter de um sinal de degeneração ou doença tal como havia ocorrido com a inversão Não obstante é ainda mais fácil descartar tal opinião no presente caso A experiência cotidiana mostrou que a maioria dessas transgressões no mínimo as menos graves dentre elas são um componente que raramente falta na vida sexual das pessoas sadias e que é por elas julgado como qualquer outra intimidade Quando as circunstâncias são favoráveis também as pessoas normais podem substituir durante um bom tempo o alvo sexual normal por uma dessas perversões ou arranjarlhe um lugar ao lado dele Em nenhuma pessoa sadia falta algum acréscimo ao alvo sexual normal que se possa chamar de perverso e essa universalidade basta por si só para mostrar quão imprópria é a utilização reprobatória da palavra perversão Justamente no campo da vida sexual é que se tropeça com dificuldades peculiares e realmente insolúveis no momento quando se quer traçar uma fronteira nítida entre o que é mera variação dentro da amplitude do fisiológico e o que constitui sintomas patológicos Ainda assim em muitas dessas perversões a qualidade do novo alvo sexual é de tal ordem que requer uma apreciação especial Algumas delas afastamse tanto do normal em seu conteúdo que não 15 podemos deixar de declarálas patológicas sobretudo nos casos em que a pulsão sexual realiza obras assombrosas lamber excrementos abusar de cadáveres na superação das resistências vergonha asco horror ou dor Nem mesmo nesses casos porém podese ter uma expectativa certeira de que em seus autores se revelem regularmente pessoas com outras anormalidades graves ou doentes mentais Tampouco nesses casos podese passar por cima do fato de que pessoas cuja conduta é normal em outros aspectos colocamse como doentes apenas no campo da vida sexual sob o domínio da mais irrefreável de todas as pulsões Por outro lado a anormalidade manifesta nas outras relações da vida costuma mostrar invariavelmente um fundo de conduta sexual anormal Na maioria dos casos podemos encontrar o caráter patológico da perversão não no conteúdo do novo alvo sexual mas em sua relação com a normalidade Quando a perversão não se apresenta ao lado do alvo e do objeto sexuais normais nos casos em que a situação é propícia a promovêla e há circunstâncias desfavoráveis impedindo a normalidade mas antes suplanta e substitui o normal em todas as circunstâncias ou seja quando há nela as características de exclusividade e fixação então nos vemos autorizados na maioria das vezes a julgála como um sintoma patológico A PARTICIPAÇÃO DO ANÍMICO NAS PERVERSÕES Talvez justamente nas perversões mais abjetas é que devamos reconhecer a mais abundante participação psíquica na transformação da pulsão sexual Eis aí a obra de um trabalho anímico ao qual não se pode negar a despeito de seu resultado atroz o valor de uma idealização da pulsão A onipotência do amor talvez nunca se mostre com maior intensidade do que nessas aberrações O mais nobre e o mais vil por toda parte da sexualidade aparecem na mais íntima dependência mútua vom Himmel durch die Welt zur Hölle DUAS CONCLUSÕES Do estudo das perversões resultounos a visão de que a pulsão sexual tem de lutar contra certas forças anímicas que funcionam como resistências destacandose entre elas com máxima clareza a vergonha e o asco É lícito conjecturar que essas forças contribuam para circunscrever a pulsão dentro dos limites considerados normais e que caso se desenvolvam precocemente no indivíduo antes que a pulsão sexual alcance a plenitude de sua força sem dúvida serão elas que irão apontar o rumo de seu desenvolvimento Observamos ainda que algumas das perversões investigadas só se tornam compreensíveis mediante a convergência de diversos motivos Se elas admitem uma análise uma decomposição então devem ser de natureza composta Com isso podemos ter um indício de que talvez a própria pulsão sexual não seja uma coisa simples mas reúna componentes que voltam a separarse nas perversões A clínica nos alertaria portanto para a existência de fusões que perderiam sua expressão como tais na conduta normal uniforme 4 A PULSÃO SEXUAL NOS NEURÓTICOS A PSICANÁLISE Uma importante contribuição para o conhecimento da pulsão sexual em pessoas que ao menos se aproximam do normal é extraída de uma fonte acessível apenas por determinado caminho Existe apenas um meio de obter informações exaustivas e sem erro sobre a vida sexual dos chamados psiconeuróticos os que sofrem de histeria neurose obsessiva da erroneamente chamada neurastenia e certamente também de dementia praecox e paranóia submetêlos à investigação psicanalítica da qual se serve o procedimento terapêutico introduzido por Josef Breuer e eu em 1893 e então chamado de catártico Devo primeiramente esclarecer repetindo o que já disse em outras publicações que essas psiconeuroses até onde chegam minhas experiências baseiamse em forças pulsionais de cunho sexual 16 Não quero dizer com isso apenas que a energia da pulsão sexual faz uma contribuição para as forças que sustentam os fenômenos patológicos os sintomas e sim asseverar expressamente que essa contribuição é a única fonte energética constante da neurose e a mais importante de todas de tal sorte que a vida sexual das pessoas em pauta expressase de maneira exclusiva ou predominante ou apenas parcial nesses sintomas Como exprimi em outro lugar 1905e Posfácio ver em 1 os sintomas são a atividade sexual dos doentes A prova dessa afirmação deriva do número crescente de psicanálises de histéricos e outros neuróticos que venho realizando há vinte e cinco anos e sobre cujos resultados já prestei contas minuciosamente em outras publicações como ainda continuarei a fazer A psicanálise elimina os sintomas dos histéricos partindo da premissa de que tais sintomas são um substituto uma transcrição por assim dizer de uma série de processos desejos e aspirações investidos de afeto aos quais mediante um processo psíquico especial o recalcamento negase a descarga através de uma atividade psíquica passível de consciência Assim essas formações de pensamento que foram retidas num estado de inconsciência aspiram a uma expressão apropriada a seu valor afetivo a uma descarga e no caso da histeria encontramna mediante o processo de conversão em fenômenos somáticos justamente os sintomas histéricos Pela retransformação sistemática com a ajuda de uma técnica especial dos sintomas em representações investidas de afeto já agora conscientizadas ficase em condições de averiguar com a máxima precisão a natureza e a origem dessas formações psíquicas antes inconscientes RESULTADOS DA PSICANÁLISE Verificouse por esse caminho que os sintomas representam um substituto de aspirações que extraem sua força da fonte da pulsão sexual Harmonizase plenamente com isso o que sabemos sobre o caráter dos histéricos aqui tomados por modelo de todos os psiconeuróticos antes de seu adoecimento bem como sobre as ocasiões que precipitam a doença O caráter histérico permite identificar um grau de recalcamento sexual que ultrapassa a medida normal uma intensificação da resistência à pulsão sexual que já ficamos conhecendo como vergonha asco e moralidade e uma fuga como que instintiva a qualquer ocupação do intelecto com o problema do sexo que tem como conseqüência nos casos mais acentuados a manutenção de uma completa ignorância sexual mesmo depois de alcançado o período de maturidade sexual Esse traço de caráter tão essencial na histeria não raro escapa à observação casual ficando encoberto pelo segundo fator constitucional da histeria ou seja o desenvolvimento desmedido da pulsão sexual somente a análise psicológica sabe desvendálo em todas as oportunidades e solucionar a enigmática contradição da histeria registrando a presença desse par de opostos uma necessidade sexual desmedida e uma excessiva renúncia ao sexual O ensejo para o adoecimento apresentase à pessoa de disposição histérica quando em conseqüência de sua própria maturação progressiva ou das circunstâncias externas de sua vida as exigências reais do sexo tornamse algo sério para ela Entre a premência da pulsão e o antagonismo da renúncia ao sexual situase a saída para a doença que não soluciona o conflito mas procura escapar a ele pela transformação das aspirações libidinosas em sintomas Não passa de exceção aparente o fato de uma pessoa histérica um homem por exemplo adoecer por causa de uma emoção banal de um conflito que não gire em torno de um interesse sexual Nesses casos a psicanálise consegue demonstrar regularmente que a doença foi possibilitada pelo componente sexual do conflito que privou os processos anímicos de uma execução normal NEUROSE E PERVERSÃO Boa parte da oposição contra estas minhas teses se esclarece pelo fato de que a sexualidade da qual derivo os sintomas psiconeuróticos é considerada coincidente com a pulsão sexual normal Só que a psicanálise ensina ainda mais Ela mostra que de modo algum os sintomas surgem apenas à custa da chamada pulsão sexual normal pelo menos não de maneira exclusiva ou predominante mas que representam a expressão convertida de pulsões que seriam designadas de perversas no sentido mais 17 lato se pudessem expressarse diretamente sem desvio pela consciência em propósitos da fantasia e em ações Portanto os sintomas se formam em parte às expensas da sexualidade anormal a neurose é por assim dizer o negativo da perversão A pulsão sexual dos psiconeuróticos permite discernir todas as aberrações que estudamos como variações da vida sexual normal e como manifestações da patológica a Na vida anímica de todos os neuróticos sem exceção encontramse moções de inversão de fixação da libido em pessoas do mesmo sexo Sem uma discussão a fundo é impossível apreciar adequadamente a importância desse fator para a configuração do quadro patológico só posso asseverar que a tendência inconsciente para a inversão nunca está ausente e em particular presta os maiores serviços ao esclarecimento da histeria masculina b No inconsciente dos psiconeuróticos é possível demonstrar como formadoras do sintoma todas as tendências à transgressão anatômica encontrandose entre elas com particular freqüência e intensidade as que reivindicam para as mucosas da boca e do ânus o papel dos genitais c Um papel muito destacado entre os formadores de sintomas das psiconeuroses é desempenhado pelas pulsões parciais que na maioria das vezes aparecem como pares de opostos e das quais já tomamos conhecimento como portadoras de novos alvos sexuais a pulsão do prazer de ver e do exibicionismo e a pulsão de crueldade em suas formas ativa e passiva A contribuição desta última é indispensável à compreensão da natureza sofrida dos sintomas e domina quase invariavelmente uma parte da conduta social do doente É também por intermédio dessa ligação da libido com a crueldade que se dá a transformação do amor em ódio das moções afetuosas em moções hostis que é característica de um grande número de casos de neurose e até ao que parece da paranóia em geral O interesse por esses resultados aumenta ainda mais a partir de certas particularidades dos fatos a Sempre que se descobre no inconsciente uma pulsão desse tipo passível de ser pareada com um oposto em geral podese demonstrar que este último também é eficaz Toda perversão ativa portanto é acompanhada por sua contrapartida passiva quem é exibicionista no inconsciente é também ao mesmo tempo voyeur quem sofre as conseqüências das moções sádicas recalcadas encontra outro reforço para seu sintoma nas fontes da tendência masoquista O completo acordo com a conduta nas perversões positivas correspondentes decerto é muito digno de nota embora nos quadros patológicos uma ou outra das inclinações opostas desempenhe o papel preponderante b Nos casos mais patentes de psiconeurose é raro encontrar desenvolvida apenas uma dessas pulsões perversas na maioria das vezes encontramos um grande número delas e em geral vestígios de todas Mas a intensidade de cada pulsão isolada é independente do desenvolvimento das outras Também nesse aspecto o estudo das perversões positivas proporciona uma contrapartida exata 5 PULSÕES PARCIAIS E ZONAS ERÓGENAS Se juntarmos o que a investigação das perversões positivas e negativas nos permitiu averiguar parecerá plausível reconduzilas a uma série de pulsões parciais que no entanto não são primárias já que permitem uma decomposição ulterior Por pulsão podemos entender a princípio apenas o representante psíquico de uma fonte endossomática de estimulação que flui continuamente para diferenciála do estímulo que é produzido por excitações isoladas vindas de fora Pulsão portanto é um dos conceitos da delimitação entre o anímico e o físico A hipótese mais simples e mais indicada sobre a natureza da pulsão seria que em si mesma ela não possui qualidade alguma devendo apenas ser considerada como uma medida da exigência de trabalho feita à vida anímica O que distingue as pulsões entre si e as dota de propriedades específicas é sua relação com suas fontes somáticas e seus alvos A fonte da pulsão é um processo excitatório num órgão e seu alvo imediato consiste na supressão desse estímulo orgânico Outra hipótese provisória de que não podemos furtarnos na teoria das pulsões afirma que os órgãos do corpo fornecem dois tipos de excitação baseados em diferenças de natureza química A uma 18 dessas classes de excitação designamos como a que é especificamente sexual e referimonos ao órgão em causa como a zona erógena da pulsão parcial que parte dele Nas inclinações perversas que reivindicam para a cavidade bucal e para o orifício anal um sentido sexual o papel das zonas erógenas é imediatamente perceptível Elas se comportam em todos os aspectos como uma parte do aparelho sexual Na histeria esses lugares do corpo e os tratos de mucosa que partem deles transformamse na sede de novas sensações e de alterações da inervação e mesmo de processos comparáveis à ereção tal como os próprios órgãos genitais diante das excitações dos processos sexuais normais O sentido das zonas erógenas como aparelhos acessórios e substitutos da genitália evidenciase com maior clareza dentre as psiconeuroses na histeria mas isso não implica que ele deva ser menos valorizado nas outras formas de doença Nestas neurose obsessiva paranóia ele é apenas menos reconhecível pois a formação dos sintomas se dá em regiões do aparelho anímico mais afastadas dos centros específicos que dominam o corpo Na neurose obsessiva o que mais se destaca é a significação dos impulsos que criam novos alvos sexuais e parecem independentes das zonas erógenas Não obstante na escopofilia e no exibicionismo o olho corresponde a uma zona erógena no caso da dor e da crueldade como componentes da pulsão sexual é a pele que assume esse mesmo papel a pele que em determinadas partes do corpo diferenciouse nos órgãos sensoriais e se transmudou em mucosa sendo assim a zona erógena πατ εξοχην por excelência 6 ESCLARECIMENTOS SOBRE A APARENTE PREPONDERÂNCIA DA SEXUALIDADE PERVERSA NAS PSICONEUROSES A discussão precedente talvez tenha colocado sob um prisma falso a sexualidade dos psiconeuróticos Talvez tenha criado a aparência de que em virtude de sua predisposição os psiconeuróticos aproximamse estreitamente dos perversos em sua conduta sexual e se distanciam dos normais na mesma medida É bem possível de fato que a disposição constitucional desses doentes contenha além de um grau desmedido de recalcamento sexual e de uma intensidade hiperpotente da pulsão sexual uma tendência incomum à perversão no sentido mais lato Ainda assim a investigação de casos mais brandos mostra que esta última suposição não é necessariamente indispensável ou que pelo menos ao formar um juízo sobre esses efeitos patológicos é preciso descontar a atuação de um outro fator Na maioria dos psiconeuróticos a doença só aparece depois da puberdade a partir das solicitações da vida sexual normal É contra esta que se orienta de modo preponderante o recalcamento Ou então a doença se instaura mais tardiamente quando a libido fica privada de satisfação pelas vias normais Em ambos os casos a libido se comporta como uma corrente cujo leito principal foi bloqueado ela inunda então as vias colaterais que até ali talvez tivessem permanecido vazias Assim também o que parece ser uma enorme tendência à perversão apesar de negativa nos psiconeuróticos pode estar colateralmente condicionado e em todo caso deve ser colateralmente intensificado O fato é que se tem de alinhar o recalcamento sexual enquanto fator interno com os fatores externos que como a restrição da liberdade a inacessibilidade do objeto sexual normal os riscos do ato sexual normal etc permitem que surjam perversões em indivíduos que de outro modo talvez permanecessem normais Nesse aspecto os diversos casos de neurose podem portarse de maneira diferente num prepondera a força inata da tendência à perversão noutro o aumento colateral dessa mesma tendência por ser a libido desviada do alvo e do objeto sexuais normais Seria errôneo presumir uma oposição onde existe de fato uma relação de cooperação A neurose sempre produz seus efeitos máximos quando a constituição e a vivência cooperam no mesmo sentido Uma constituição marcante talvez possa prescindir do apoio de impressões provenientes da vida e um grande abalo na vida talvez provoque a neurose até mesmo numa constituição corriqueira Aliás essa visão da importância etiológica do inato e do acidentalmente vivenciado é igualmente válida em outros campos Entretanto caso se prefira a hipótese de que uma tendência particularmente marcante para as perversões é uma das peculiaridades da constituição psiconeurótica abrese a perspectiva de se poder distinguir uma multiplicidade dessas constituições segundo a preponderância inata desta ou daquela 19 zona erógena desta ou daquela pulsão parcial Como acontece com tantas outras coisas nesse campo ainda não se investigou se há uma relação especial entre a disposição perversa e a escolha da forma específica da doença 7 INDICAÇÃO DO INFANTILISMO DA SEXUALIDADE Ao demonstrar as moções perversas enquanto formadoras de sintomas nas psiconeuroses aumentamos extraordinariamente o número de seres humanos que poderiam ser considerados perversos Não é só que os próprios neuróticos constituam uma classe muito numerosa há também que levar em conta que séries descendentes e ininterruptas ligam a neurose em todas as suas configurações à saúde por isso Moebius pôde dizer com boas justificativas que todos somos um pouco histéricos Assim a extraordinária difusão das perversões forçanos a supor que tampouco a predisposição às perversões é uma particularidade rara mas deve antes fazer parte da constituição que passa por normal É discutível como vimos que as perversões remontem a condições inatas ou resultem como supôs Binet quanto ao fetichismo ver em 1 de experiências ao acaso Agora se nos oferece a conclusão de que há sem dúvida algo inato na base das perversões mas esse algo é inato em todos os seres humanos embora enquanto disposição possa variar de intensidade e ser acentuado pelas influências da vida Tratase pois das raízes inatas da pulsão sexual dadas pela constituição as quais numa série de casos as perversões convertemse nas verdadeiras portadoras da atividade sexual perversa outras vezes passam por uma supressão recalcamento insuficiente de tal sorte que podem atrair indiretamente para si na qualidade de sintomas patológicos parte da energia sexual e que permitem nos casos mais favoráveis situados entre os dois extremos mediante uma restrição eficaz e outras elaborações a origem da chamada vida sexual normal Mas devemos dizer ainda que essa suposta constituição que exibe os germes de todas as perversões só é demonstrável na criança mesmo que nela todas as pulsões só possam emergir com intensidade moderada Vislumbramos assim a fórmula de que os neuróticos preservaram o estado infantil de sua sexualidade ou foram retransportados para ele Desse modo nosso interesse voltase para a vida sexual da criança e procederemos ao estudo do jogo de influências que domina o processo de desenvolvimento da sexualidade infantil até seu desfecho na perversão na neurose ou na vida sexual normal 20 A SEXUALIDADE INFANTIL O DESCASO PARA COM O INFANTIL Faz parte da opinião popular sobre a pulsão sexual que ela está ausente na infância e só desperta no período da vida designado da puberdade Mas esse não é apenas um erro qualquer e sim um equívoco de graves conseqüências pois é o principal culpado de nossa ignorância de hoje sobre as condições básicas da vida sexual Um estudo aprofundado das manifestações sexuais da infância provavelmente nos revelaria os traços essenciais da pulsão sexual desvendaria sua evolução e nos permitiria ver como se compõe a partir de diversas fontes É digno de nota que os autores que se ocuparam do esclarecimento das propriedades e reações do indivíduo adulto tenham prestado muito mais atenção à fase préhistórica representada pela vida dos antepassados ou seja atribuído uma influência muito maior à hereditariedade do que à outra fase pré histórica àquela que se dá na existência individual da pessoa a saber a infância É que como se pode supor a influência desse período da vida seria mais fácil de compreender e teria direito a ser considerada antes da influência da hereditariedade É certo que na literatura sobre o assunto encontramos notas ocasionais acerca da atividade sexual precoce em crianças pequenas sobre ereções masturbação e até mesmo atividades semelhantes ao coito Mas elas são sempre citadas apenas como processos excepcionais curiosidades ou exemplos assustadores de depravação precoce Nenhum autor ao que eu saiba reconheceu com clareza a normatividade da pulsão sexual na infância e nos escritos já numerosos sobre o desenvolvimento infantil o capítulo sobre o Desenvolvimento Sexual costuma ser omitido AMNÉSIA INFANTIL A razão dessa estranha negligência pode ser buscada em parte nas considerações convencionais que os autores respeitam em conseqüência de sua própria criação e em parte num fenômeno psíquico que até agora escapou a qualquer explicação Refirome à singular amnésia que na maioria das pessoas mas não em todas encobre os primeiros anos da infância até os seis ou oito anos de idade Até o momento não nos ocorreu ficar surpresos ante o fato dessa amnésia e no entanto teríamos boas razões para isso De fato somos informados de que durante esses anos dos quais só preservamos na memória algumas lembranças incompreensíveis e fragmentadas reagíamos com vivacidade frente às impressões sabíamos expressar dor e alegria de maneira humana mostrávamos amor ciúme e outras paixões que então nos agitavam violentamente e até formulávamos frases que eram registradas pelos adultos como uma boa prova de discernimento e de uma capacidade incipiente de julgamento E de tudo isso quando adultos nada sabemos por nós mesmos Por que terá nossa memória ficado tão para trás em relação a nossas outras atividades anímicas Ora temos razões para crer que em nenhuma outra época da vida a capacidade de recepção e reprodução é maior do que justamente nos anos da infância Por outro lado devemos supor ou podemos convencernos disso mediante a investigação psicológica de outrem que as mesmas impressões por nós esquecidas deixaram ainda assim os mais profundos rastros em nossa vida anímica e se tornaram determinantes para todo o nosso desenvolvimento posterior Não há como falar portanto em nenhum declínio real das impressões infantis mas sim numa amnésia semelhante à que observamos nos neuróticos em relação às vivências posteriores e cuja essência consiste num mero impedimento da consciência recalcamento Mas quais são as forças que efetuam esse recalcamento das impressões infantis Quem solucionasse esse enigma teria também esclarecido a amnésia histérica Todavia não queremos deixar de destacar que a existência da amnésia infantil fornece um novo ponto de comparação entre o estado anímico da criança e o dos psiconeuróticos Já deparamos com outro desses pontos ver em 1 quando se impôs a nós a fórmula de que a sexualidade dos psiconeuróticos preserva o estado infantil ou é reconduzida a ele E se a própria amnésia infantil também tiver de ser relacionada com as moções sexuais da infância 21 Aliás ligar a amnésia infantil à histérica é mais do que um mero jogo de palavras A amnésia histérica que está a serviço do recalcamento só é explicável pela circunstância de que o indivíduo já possui um acervo de traços anêmicos que deixaram de estar à disposição da consciência e que agora através de uma ligação associativa apoderamse daquilo sobre o que atuam as forças repulsoras do recalcamento Podese dizer que sem a amnésia infantil não haveria amnésia histérica Cf Freud l950a Carta 84 de 10 de março de 1898 Creio pois que a amnésia infantil que converte a infância de cada um numa espécie de época préhistórica e oculta dele os primórdios de sua própria vida sexual carrega a culpa por não se dar valor ao período infantil no desenvolvimento da vida sexual Um observador isolado não pode preencher as lacunas assim geradas em nosso conhecimento Já em 1896 frisei a significação da infância para a origem de certos fenômenos importantes que dependem da vida sexual e desde então nunca deixei de trazer para primeiro plano o fator infantil na sexualidade 1 O PERÍODO DE LATÊNCIA SEXUAL DA INFÂNCIA E SUAS RUPTURAS As constatações extraordinariamente amiudadas de moções sexuais pretensamente excepcionais e anormativas na infância bem como a revelação das lembranças infantis do neurótico até então inconscientes talvez permitam traçar o seguinte quadro das condutas sexuais da infância Parece certo que o recémnascido traz consigo germes de moções sexuais que continuam a se desenvolver por algum tempo mas depois sofrem uma supressão progressiva a qual por sua vez pode ser rompida por avanços regulares do desenvolvimento sexual ou suspensa pelas peculiaridades individuais Nada se sabe ao certo sobre a regularidade e a periodicidade desse curso oscilante de desenvolvimento Parece no entanto que a vida sexual da criança costuma expressarse numa forma acessível à observação por volta dos três ou quatro anos de idade AS INIBIÇÕES SEXUAIS Durante esse período de latência total ou apenas parcial erigemse as forças anímicas que mais tarde surgirão como entraves no caminho da pulsão sexual e estreitarão seu curso à maneira de diques o asco o sentimento de vergonha as exigências dos ideais estéticos e morais Nas crianças civilizadas temse a impressão de que a construção desses diques é obra da educação e certamente a educação tem muito a ver com isso Na realidade porém esse desenvolvimento é organicamente condicionado e fixado pela hereditariedade podendo produzirse no momento oportuno sem nenhuma ajuda da educação Esta fica inteiramente dentro do âmbito que lhe compete ao limitarse a seguir o que foi organicamente prefixado e imprimilo de maneira um pouco mais polida e profunda FORMAÇÃO REATIVA E SUBLIMAÇÃO Com que meios se erigem essas construções tão importantes para a cultura e normalidade posteriores da pessoa Provavelmente às expensas das próprias moções sexuais infantis cujo afluxo não cessa nem mesmo durante esse período de latência mas cuja energia na totalidade ou em sua maior parte é desviada do uso sexual e voltada para outros fins Os historiadores da cultura parecem unânimes em supor que mediante esse desvio das forças pulsionais sexuais das metas sexuais e por sua orientação para novas metas num processo que merece o nome de sublimação adquiremse poderosos componentes para todas as realizações culturais Acrescentaríamos portanto que o mesmo processo entra em jogo no desenvolvimento de cada indivíduo e situaríamos seu início no período de latência sexual da infância Também sobre o mecanismo desse processo de sublimação podese arriscar uma conjectura As moções sexuais desses anos da infância seriam por um lado inutilizáveis já que estão diferidas as funções reprodutoras o que constitui o traço principal do período de latência e por outro seriam perversas em si ou seja partiriam de zonas erógenas e se sustentariam em pulsões que dada a direção do desenvolvimento do indivíduo só poderiam provocar sensações desprazerosas Por conseguinte elas 22 despertam forças anímicas contrárias moções reativas que para uma supressão eficaz desse desprazer erigem os diques psíquicos já mencionados asco vergonha e moral RUPTURAS DO PERÍODO DE LATÊNCIA Sem nos iludirmos quanto à natureza hipotética e quanto à clareza insuficiente de nossos conhecimentos acerca dos processos do período infantil de latência ou adiamento voltemos à realidade para indicar que esse emprego da sexualidade infantil representa um ideal educativo do qual o desenvolvimento de cada um quase sempre se afasta em algum ponto amiúde em grau considerável Vez por outra irrompe um fragmento de manifestação sexual que se furtou à sublimação ou preservase alguma atividade sexual ao longo de todo o período de latência até a irrupção acentuada da pulsão sexual na puberdade Na medida em que prestam alguma atenção à sexualidade infantil os educadores portamse como se compartilhassem nossas opiniões sobre a construção das forças defensivas morais à custa da sexualidade e como se soubessem que a atividade sexual torna a criança ineducável pois perseguem como vícios todas as suas manifestações sexuais mesmo que não possam fazer muita coisa contra elas Nós porém temos todos os motivos para voltar nosso interesse para esses fenômenos temidos pela educação pois deles esperamos o esclarecimento da configuração originária da pulsão sexual 2 AS MANIFESTAÇÕES DA SEXUALIDADE INFANTIL O CHUCHAR Por motivos que se deduzirão posteriormente tomaremos como modelo das manifestações sexuais infantis o chuchar sugar com deleite ao qual o pediatra húngaro Lindner 1879 dedicou um excelente estudo O chuchar Ludeln ou Lutschen que já aparece no lactente e pode continuar até a maturidade ou persistir por toda a vida consiste na repetição rítmica de um contato de sucção com a boca os lábios do qual está excluído qualquer propósito de nutrição Uma parte dos próprios lábios a língua ou qualquer outro ponto da pele que esteja ao alcance até mesmo o dedão do pé são tomados como objeto sobre o qual se exerce essa sucção Uma pulsão preênsil surgida ao mesmo tempo pode manifestarse através de puxadas rítmicas simultâneas do lóbulo da orelha e apoderarse de uma parte de outra pessoa em geral a orelha para o mesmo fim O sugar com deleite aliase a uma absorção completa da atenção e leva ao adormecimento ou mesmo a uma reação motora numa espécie de orgasmo Não raro combinase com a fricção de alguma parte sensível do corpo como os seios ou a genitália externa Por esse caminho muitas crianças passam do chuchar para a masturbação O próprio Lindner reconheceu a natureza sexual dessa ação e a destacou de maneira irrestrita Na meninice o chuchar é freqüentemente equiparado aos outros maus costumes sexuais da criança De numerosos pediatras e neurologistas temse erguido um protesto muito enérgico contra essa concepção parcialmente baseado sem dúvida na confusão entre sexual e genital Esse protesto levanta uma questão difícil e irrecusável por qual característica genérica podemos reconhecer as manifestações sexuais da criança Pareceme que a concatenação de fenômenos que pudemos discernir através da investigação psicanalítica nos autoriza a ver no chuchar uma manifestação sexual e a estudar justamente nele os traços essenciais da atividade sexual infantil AUTOEROTlSMO Temos a obrigação de fazer um exame aprofundado desse exemplo Como traço mais destacado dessa prática sexual salientemos que a pulsão não está dirigida para outra pessoa satisfazse no próprio corpo é autoerótica para dizêlo com a feliz denominação introduzida por Havelock Ellis 1910 Está claro além disso que o ato da criança que chucha é determinado pela busca de um prazer já vivenciado e agora relembrado No caso mais simples portanto a satisfação é encontrada mediante a 23 sucção rítmica de alguma parte da pele ou da mucosa É fácil adivinhar também em que ocasiões a criança teve as primeiras experiências desse prazer que agora se esforça por renovar A primeira e mais vital das atividades da criança mamar no seio materno ou em seus substitutos há de têla familiarizado com esse prazer Diríamos que os lábios da criança comportaramse como uma zona erógena e a estimulação pelo fluxo cálido de leite foi sem dúvida a origem da sensação prazerosa A princípio a satisfação da zona erógena deve terse associado com a necessidade de alimento A atividade sexual apóiase primeiramente numa das funções que servem à preservação da vida e só depois tornase independente delas Quem já viu uma criança saciada recuar do peito e cair no sono com as faces coradas e um sorriso beatífico há de dizer a si mesmo que essa imagem persiste também como norma da expressão da satisfação sexual em épocas posteriores da vida A necessidade de repetir a satisfação sexual dissociase então da necessidade de absorção de alimento uma separação que se torna inevitável quando aparecem os dentes e o alimento já não é exclusivamente ingerido por sucção mas é também mastigado A criança não se serve de um objeto externo para sugar mas prefere uma parte de sua própria pele porque isso lhe é mais cômodo porque a torna independente do mundo externo que ela ainda não consegue dominar e porque desse modo ela se proporciona como que uma segunda zona erógena se bem que de nível inferior A inferioridade dessa segunda região a levará mais tarde a buscar em outra pessoa a parte correspondente os lábios Pena eu não poder beijar a mim mesmo dirseia subjazer a isso Nem todas as crianças praticam esse chuchar É de se supor que cheguem a fazêlo aquelas em quem a significação erógena da zona labial for constitucionalmente reforçada Persistindo essa significação tais crianças uma vez adultas serão ávidas apreciadoras do beijo tenderão a beijos perversos ou se forem homens terão um poderoso motivo para beber e fumar Caso sobrevenha o recalcamento porém sentirão nojo da comida e produzirão vômitos histéricos Por força da dupla finalidade da zona labial o recalcamento se estende à pulsão de nutrição Muitas de minhas pacientes com distúrbios alimentares globus hystericus constricção na garganta e vômitos foram na infância firmes adeptas do chuchar No chuchar ou sugar com deleite já podemos observar as três características essenciais de uma manifestação sexual infantil Esta nasce apoiandose numa das funções somáticas vitais ainda não conhece nenhum objeto sexual sendo autoerótica e seu alvo sexual achase sob o domínio de uma zona erógena Antecipemos que essas características são válidas também para a maioria das outras atividades das pulsões sexuais infantis 3 O ALVO SEXUAL DA SEXUALIDADE INFANTIL CARACTERÍSTICAS DAS ZONAS ERÓGENAS Do exemplo do chuchar podemos ainda deduzir várias coisas para a caracterização do que é uma zona erógena Tratase de uma parte da pele ou da mucosa em que certos tipos de estimulação provocam uma sensação prazerosa de determinada qualidade Não há dúvida de que os estímulos produtores de prazer estão ligados a condições especiais que desconhecemos Entre elas o caráter rítmico deve desempenhar algum papel impondose aqui a analogia com as cócegas Menos seguro parece é se o caráter da sensação prazerosa provocada pelo estímulo pode ser designado de particular particularidade esta em que estaria contido justamente o fator sexual Em matéria de prazer e desprazer a psicologia ainda tateia tanto no escuro que as hipóteses mais prudentes são as mais recomendáveis Mais adiante talvez deparemos com razões que pareçam sustentar a idéia de uma qualidade particular da sensação prazerosa A propriedade erógena pode ligarse de maneira mais marcante a certas partes do corpo Existem zonas erógenas predestinadas como mostra o exemplo do chuchar Mas esse exemplo ensina também que qualquer outro ponto da pele ou da mucosa pode tomar a seu encargo as funções de uma zona erógena devendo portanto ter certa aptidão para isso Assim a qualidade do estímulo mais do que a natureza das partes do corpo é que tem a ver com a produção da sensação prazerosa A criança chuchadora perscruta seu corpo para sugar alguma parte dele que depois por hábito tornase a 24 preferida quando tropeça casualmente numa das partes predestinadas os mamilos a genitália esta decerto retém a preferência Uma capacidade de deslocamento inteiramente análoga reaparece na sintomatologia da histeria Nessa neurose o recalcamento afeta sobretudo as zonas genitais propriamente ditas e estas transmitem sua excitabilidade a outras zonas erógenas de outro modo relegadas na vida adulta que então se comportam exatamente como genitais Além disso porém tal como ocorre no chuchar qualquer outra parte do corpo pode ser provida da excitabilidade da genitália e alçada à condição de zona erógena As zonas erógenas e histerógenas exibem as mesmas características O ALVO SEXUAL INFANTIL O alvo sexual da pulsão infantil consiste em provocar a satisfação mediante a estimulação apropriada da zona erógena que de algum modo foi escolhida Essa satisfação deve ter sido vivenciada antes para que reste daí uma necessidade de repetila e é lícito esperarmos que a natureza tenha tomado medidas seguras para que essa vivência não fique entregue ao acaso Já tomamos conhecimento do que é que promove a satisfação dessa finalidade no caso da zona labial é a ligação simultânea dessa parte do corpo com a alimentação Ainda depararemos com outros dispositivos semelhantes como fontes da sexualidade O estado de necessidade de repetir uma satisfação transparece de duas maneiras por um sentimento peculiar de tensão que tem antes o caráter de desprazer e por uma sensação de prurido ou estimulação centralmente condicionada e projetada para a zona erógena periférica Por isso podese também formular o alvo sexual de outra maneira ele viria substituir a sensação de estimulação projetada na zona erógena pelo estímulo externo que a abolisse ao provocar a sensação de satisfação Esse estímulo externo consiste na maioria das vezes numa manipulação análoga ao sugar Está em perfeito acordo com nossos conhecimentos fisiológicos que a necessidade possa também ser evocada perifericamente através de uma modificação real na zona erógena Só é um tanto estranho que para ser abolido um estímulo pareça exigir a colocação de um segundo no mesmo lugar 4 AS MANlFESTAÇÕES SEXUAIS MASTURBATÓRIAS Só pode alegrarnos sumamente descobrir que uma vez compreendida a pulsão vinda de uma única zona erógena não temos muito mais coisas importantes a aprender sobre a atividade sexual das crianças As diferenças mais significativas dizem respeito às providências necessárias à satisfação que no caso da zona labial consistiam no sugar e que terão de ser substituídas por outras ações musculares conforme a posição e a natureza das outras zonas ATIVIDADE DA ZONA ANAL Tal como a zona dos lábios a zona anal está apta por sua posição a mediar um apoio da sexualidade em outras funções corporais É de se presumir que a importância erógena dessa parte do corpo seja originariamente muito grande lnteiramonos pela psicanálise não sem certo assombro das transmutações por que normalmente passam as excitações sexuais dela provenientes e da freqüência com que essa zona conserva durante toda a vida uma parcela considerável de excitabilidade genital Os distúrbios intestinais tão freqüentes na infância providenciam para que não faltem a essa zona excitações intensas Os catarros intestinais na mais tenra idade deixam a criança nervosa como se costuma dizer no adoecimento neurótico posterior eles têm uma influência determinante na manifestação somática da neurose e colocam à disposição dela toda a soma das perturbações intestinais Considerandose a significação erógena da zona rectal que se preserva ao menos em sua transmutação tampouco podemos rir da influência das hemorróidas às quais a medicina antiga atribuía tanta importância no esclarecimento dos estados neuróticos As crianças que tiram proveito da estimulabilidade erógena da zona anal denunciamse por reterem as fezes até que sua acumulação provoca violentas contrações musculares e na passagem pelo ânus pode exercer uma estimulação intensa na mucosa Com isso hão de produzirse sensações de volúpia ao lado das sensações dolorosas Um dos melhores presságios de excentricidade e nervosismo 25 posteriores é a recusa obstinada do bebê a esvaziar o intestino ao ser posto no troninho ou seja quando isso é desejado pela pessoa que cuida dele ficando essa função reservada para quando aprouver a ele próprio Naturalmente não é que lhe interesse sujar a cama ele está apenas providenciando para que não lhe escape o dividendo de prazer que vem junto com a defecação Mais uma vez os educadores têm razão ao chamarem de perversas schlimm as crianças que retardam essas funções O conteúdo intestinal que enquanto corpo estimulador comportase frente a uma área de mucosa sexualmente sensível como precursor de outro órgão destinado a entrar em ação depois da fase da infância tem ainda para o lactante outros importantes sentidos É obviamente tratado como parte de seu próprio corpo representando o primeiro presente ao desfazerse dele a criaturinha pode exprimir sua docilidade perante o meio que a cerca e ao recusálo sua obstinação Do sentido de presente esse conteúdo passa mais tarde ao de bebê que segundo uma das teorias sexuais infantis ver em 1 é adquirido pela comida e nasce pelo intestino A retenção da massa fecal a princípio intencionalmente praticada para tirar proveito da estimulação como que masturbatória da zona anal ou para ser empregada na relação com as pessoas que cuidam da criança é aliás uma das raízes da constipação tão freqüente nos neuropatas Além disso o sentido pleno da zona anal espelhase no fato de se encontrarem muito poucos neuróticos que não tenham seus rituais escatológicos especiais suas cerimônias e coisas similares por eles cuidadosamente mantidos em segredo A estimulação masturbatória efetiva da zona anal com a ajuda do dedo provocada por uma comichão centralmente determinada ou perifericamente mantida não é nada rara nas crianças mais velhas ATIVIDADE DA ZONA GENITAL Entre as zonas erógenas do corpo infantil encontrase uma que decerto não desempenha o papel principal nem pode ser a portadora das moções sexuais mais antigas mas que está destinada a grandes coisas no futuro Nas crianças tanto de sexo masculino quanto feminino está ligada à micção glande clitóris e nas primeiras achase dentro de uma bolsa de mucosa de modo que não pode faltarlhe a estimulação por secreções que aticem precocemente a excitação sexual As atividades sexuais dessa zona erógena que faz parte dos órgãos sexuais propriamente ditos são sem dúvida o começo da futura vida sexual normal Por sua posição anatômica pelas secreções em que estão banhadas pela lavagem e fricção advindas dos cuidados com o corpo e por certas excitações acidentais como as migrações de vermes intestinais nas meninas é inevitável que a sensação prazerosa que essas partes do corpo são capazes de produzir se faça notar à criança já na fase de amamentação despertando uma necessidade de repetila Considerada a soma dos dispositivos existentes e ponderando que as providências para manter a limpeza mal podem atuar de modo diferente da sujeira custa evitar a conclusão de que é através do onanismo do lactante do qual praticamente nenhum indivíduo escapa que se estabelece a futura primazia dessa zona erógena na atividade sexual A ação que elimina o estímulo e provoca a satisfação consiste num contato por fricção manual ou numa pressão decerto preparada nos moldes de um reflexo exercida com a mão ou unindo as coxas Este último método é de longe o mais freqüente nas meninas Nos meninos a preferência pela mão já indica a importante contribuição que a pulsão de dominação está destinada a fazer para a atividade sexual masculina A bem da clareza convém eu indicar que é preciso distinguir três fases da masturbação infantil A primeira é própria do período de lactância a segunda pertence à breve florescência da atividade sexual por volta do quarto ano de vida e somente a terceira corresponde ao onanismo da puberdade amiúde o único a ser levado em conta A SEGUNDA FASE DA MASTURBAÇÃO INFANTIL 26 O onanismo do lactante parece desaparecer após um curto prazo mas seu prosseguimento ininterrupto até a puberdade pode constituir o primeiro grande desvio do desenvolvimento a que se aspira para os seres humanos inseridos na cultura Em algum momento da infância posterior ao período de amamentação comumente antes do quarto ano a pulsão sexual dessa zona genital costuma redespertar e novamente durar algum tempo até ser detida por uma nova supressão ou prosseguir ininterruptamente As circunstâncias possíveis são muito variadas e só é viável apreciálas mediante uma análise mais rigorosa dos casos individuais Mas todos os detalhes dessa segunda fase de atividade sexual infantil deixam atrás de si as mais profundas marcas inconscientes na memória da pessoa determinam o desenvolvimento de seu caráter caso ela permaneça sadia e a sintomatologia de sua neurose caso venha a adoecer depois da puberdade Nesta última eventualidade constatamos que esse período sexual foi esquecido e que as lembranças conscientes que o testemunham foram deslocadas já afirmei que eu também vincularia a amnésia infantil normal com essa atividade sexual infantil Através da investigação psicanalítica é possível tornar consciente o esquecido e desse modo eliminar uma compulsão que provém do material psíquico inconsciente O RETORNO DA MASTURBAÇÃO DA LACTÂNCIA A excitação sexual do período de lactância retorna nos anos infantis já indicados seja como um estímulo de prurido centralmente condicionado que exorta a uma satisfação masturbatória seja como um processo da natureza de uma polução que em analogia com as poluções da maturidade chega à satisfação sem a ajuda de ação alguma Este último caso é o mais freqüente nas meninas e na segunda metade da infância não é inteiramente compreensível em termos do que o condiciona e muitas vezes embora não regularmente parece ter como premissa um período anterior de onanismo ativo A sintomatologia dessas manifestações sexuais é escassa o que dá sinal do aparelho sexual ainda não desenvolvido é na maioria das vezes o aparelho urinário que funciona por assim dizer como tutor dele A maioria dos chamados distúrbios vesicais dessa época são perturbações sexuais a enurese noturna quando não representa um ataque epilético corresponde a uma polução Para o reaparecimento da atividade sexual são decisivas as causas internas e as contingências externas ambas as quais podem ser inferidas nos casos de doença neurótica a partir da forma dos sintomas sendo descobertas com certeza através da investigação psicanalítica Sobre as causas internas falaremos mais adiante as contingências fortuitas externas ganham nesse período uma importância grande e duradoura Em primeiro plano situase a influência da sedução que trata a criança prematuramente como um objeto sexual e que em circunstâncias que causam forte impressão ensinaa a conhecer a satisfação das zonas genitais uma satisfação que ela fica quase sempre obrigada a renovar pelo onanismo Tal influência pode provir de adultos ou de outras crianças não me é possível admitir que em meu ensaio sobre A Etiologia da Histeria 1896c eu tenha superestimado sua freqüência ou sua importância embora eu ainda não soubesse na época que os indivíduos que permanecem normais podem ter tido na infância as mesmas experiências e por isso tenha dado maior valor à sedução do que aos fatores da constituição e do desenvolvimento sexuais É evidente que a sedução não é necessária para despertar a vida sexual da criança podendo esse despertar surgir também espontaneamente de causas internas DISPOSIÇÃO PERVERSA POLIMORFA É instrutivo que a criança sob a influência da sedução possa tornarse perversa polimorfa e ser induzida a todas as transgressões possíveis Isso mostra que traz em sua disposição a aptidão para elas por isso sua execução encontra pouca resistência já que conforme a idade da criança os diques anímicos contra os excessos sexuais a vergonha o asco e a moral ainda não foram erigidos ou estão em processo de construção Nesse aspecto a criança não se comporta de maneira diversa da mulher inculta média em quem se conserva a mesma disposição perversa polimorfa Em condições usuais ela pode permanecer sexualmente normal mas guiada por um sedutor habilidoso terá gosto em todas as perversões e as reterá em sua atividade sexual Essa mesma disposição polimorfa e portanto infantil é 27 também explorada pelas prostitutas no exercício de sua profissão e no imenso número de mulheres prostituídas ou em quem se deve supor uma aptidão para a prostituição embora tenham escapado ao exercício dela é impossível não reconhecer nessa tendência uniforme a toda sorte de perversões algo que é universalmente humano e originário PULSÕES PARCIAIS De resto a influência da sedução não ajuda a revelar as circunstâncias iniciais da pulsão sexual mas antes confunde nossa visão dela uma vez que apresenta prematuramente à criança um objeto sexual de que a princípio a pulsão sexual infantil não mostra nenhuma necessidade Contudo devemos admitir que também a vida sexual infantil apesar da dominação preponderante das zonas erógenas exibe componentes que desde o início envolvem outras pessoas como objetos sexuais Dessa natureza são as pulsões do prazer de olhar e de exibir bem como a de crueldade que aparecem com certa independência das zonas erógenas e só mais tarde entram em relações estreitas com a vida genital mas que já na infância se fazem notar como aspirações autônomas inicialmente separadas da atividade sexual erógena A criança pequena é antes de mais nada desprovida de vergonha e em certos períodos de seus primeiros anos mostra uma satisfação inequívoca no desnudamento do corpo com ênfase especial nas partes sexuais A contrapartida dessa inclinação tida como perversa a curiosidade de ver a genitália de outras pessoas provavelmente só se torna manifesta um pouco mais tarde na infância quando o obstáculo do sentimento de vergonha já atingiu certo desenvolvimento Sob a influência da sedução a perversão de ver pode alcançar grande importância na vida sexual da criança Entretanto minhas investigações da meninice tanto de pessoas sadias quanto de doentes neuróticos forçamme a concluir que a pulsão de ver pode surgir na criança como uma manifestação sexual espontânea As crianças pequenas cuja atenção foi atraída em algum momento para sua própria genitália geralmente pela masturbação costumam dar o passo adicional sem ajuda externa e desenvolver um vivo interesse pelos genitais de seus coleguinhas Dado que as oportunidades de satisfazer tal curiosidade em geral só se apresentam quando da satisfação das duas necessidades excrementícias tais crianças tornamse voyeurs zelosos espectadores da micção e da defecação de outrem Uma vez sobrevindo o recalcamento dessas inclinações a curiosidade de ver a genitália alheia seja do mesmo sexo ou do sexo oposto persiste como uma pressão torturante que em muitos casos de neurose fornece posteriormente a mais poderosa força impulsora para a formação do sintoma Com independência ainda maior das outras atividades sexuais vinculadas às zonas erógenas desenvolvese na criança o componente de crueldade da pulsão sexual A crueldade é perfeitamente natural no caráter infantil já que a trava que faz a pulsão de dominação deterse ante a dor do outro a capacidade de compadecerse tem um desenvolvimento relativamente tardio É sabido que ainda não se teve êxito na análise psicológica exaustiva dessa pulsão podemos supor que o impulso cruel provenha da pulsão de dominação e surja na vida sexual numa época em que os genitais ainda não assumiram seu papel posterior Assim ela domina uma fase da vida sexual que mais adiante descreveremos como organização prégenital As crianças que se distinguem por uma crueldade peculiar para com os animais e os companheiros despertam em geral justificadamente a suspeita de uma atividade sexual intensa e precoce advinda das zonas erógenas e mesmo no amadurecimento precoce e simultâneo de todas as pulsões sexuais a atividade sexual erógena parece ser primária A ausência da barreira da compaixão traz consigo o risco de que esse vínculo estabelecido na infância entre as pulsões cruéis e as erógenas tornese depois indissolúvel na vida Desde as Confissões de Jean Jacques Rousseau a estimulação dolorosa da pele das nádegas tem sido reconhecida por todos os educadores como uma das raízes erógenas da pulsão passiva de crueldade masoquismo Disso eles concluíram com acerto que o castigo corporal que quase sempre incide nessa parte do corpo deve ser evitado em todas as crianças cuja libido através das exigências posteriores da educação cultural possa ser forçada para vias colaterais 5 A INVESTIGAÇÃO SEXUAL INFANTIL 28 A PULSÃO DE SABER Ao mesmo tempo em que a vida sexual da criança chega a sua primeira florescência entre os três e os cinco anos também se inicia nela a atividade que se inscreve na pulsão de saber ou de investigar Essa pulsão não pode ser computada entre os componentes pulsionais elementares nem exclusivamente subordinada à sexualidade Sua atividade corresponde de um lado a uma forma sublimada de dominação e de outro trabalha com a energia escopofílica Suas relações com a vida sexual entretanto são particularmente significativas já que constatamos pela psicanálise que na criança a pulsão de saber é atraída de maneira insuspeitadamente precoce e inesperadamente intensa pelos problemas sexuais e talvez seja até despertada por eles O ENIGMA DA ESFINGE Não são interesses teóricos mas práticos que põem em marcha a atividade investigatória na criança A ameaça trazida para suas condições existenciais pela chegada conhecida ou suspeitada de um novo bebê assim como o medo de que esse acontecimento traga consigo a perda de cuidados e de amor tornam a criança pensativa e perspicaz O primeiro problema de que ela se ocupa em consonância com essa história do despertar da pulsão de saber não é a questão da diferença sexual e sim o enigma de onde vêm os bebês Numa distorção facilmente anulável esse é também o enigma proposto pela Esfinge de Tebas Ao contrário o fato de existirem dois sexos é inicialmente aceito pela criança sem nenhuma rebeldia ou hesitação Para o menino é natural presumir uma genitália igual à sua em todas as pessoas que ele conhece sendolhe impossível conjugar a falta dela com sua representação dessas outras pessoas COMPLEXO DE CASTRAÇÃO E INVEJA DO PÊNIS Essa convicção é energicamente sustentada pelos meninos obstinadamente defendida contra a tradição que logo resulta da observação e somente abandonada após sérias lutas internas o complexo de castração As formações substitutivas desse pênis perdido das mulheres desempenham um grande papel na forma assumida pelas diversas perversões A suposição de uma genitália idêntica masculina em todos os seres humanos é a primeira das notáveis e momentosas teorias sexuais infantis Tem pouca serventia para a criança que a ciência biológica dê razão a seu preconceito e tenha de reconhecer o clitóris feminino como um autêntico substituto do pênis Já a garotinha não incorre em semelhantes recusas ao avistar os genitais do menino com sua conformação diferente Está pronta a reconhecêlo de imediato e é tomada pela inveja do pênis que culmina no desejo de ser também um menino tão importante em suas conseqüências TEORIAS DO NASCIMENTO Muitas pessoas recordam com clareza a intensidade com que se interessaram no período pré púbere pela questão da proveniência dos bebês As soluções anatômicas então concebidas foram dos mais diversos tipos eles sairiam do seio ou se recortariam do ventre ou o umbigo se abriria para deixá los passar Fora da análise é muito raro haver lembranças de uma investigação correspondente nos primeiros anos da infância há muito ela sucumbiu ao recalcamento mas seus resultados são uniformes os filhos chegam quando se come determinada coisa como nos contos de fadas e nascem pelo intestino como na eliminação de fezes Essas teorias infantis fazem lembrar condições existentes no reino animal sobretudo a cloaca dos tipos de animais inferiores aos mamíferos A CONCEPÇÃO SÁDICA DA RELAÇÃO SEXUAL Quando as crianças em tão tenra idade assistem à relação sexual entre adultos o que é ensejado pela convicção dos mais velhos de que a criança pequena não pode entender nada de sexual elas não 29 podem deixar de conceber o ato sexual como uma espécie de sevícia ou subjugação ou seja de encará lo num sentido sádico A psicanálise também nos permite verificar que uma impressão dessa natureza na primeira infância contribui em muito para a predisposição a um deslocamento sádico posterior do alvo sexual Ademais as crianças se ocupam muito com o problema de saber em que consiste a relação sexual ou como dizem elas em que consiste ser casado e costumam buscar a solução do mistério em alguma atividade conjunta proporcionada pelas funções de micção ou defecação O FRACASSO TÍPICO DA INVESTIGAÇÃO SEXUAL INFANTIL Em geral podese dizer das teorias sexuais infantis que elas são reflexos da própria constituição sexual da criança e que apesar de seus erros grotescos testemunham uma maior compreensão dos processos sexuais do que se pretenderia de seus criadores As crianças também percebem as alterações provocadas na mãe pela gravidez e sabem interpretálas corretamente a fábula da cegonha é amiúde contada a uma platéia que a recebe com desconfiança profunda embora quase sempre silenciosa Mas como dois elementos permanecem desconhecidos na investigação sexual infantil a saber o papel do sêmen fecundante e a existência do orifício sexual feminino os mesmos pontos aliás em que a organização sexual infantil ainda está atrasada os esforços do pequeno investigador são geralmente infrutíferos e acabam numa renúncia que não raro deixa como seqüela um prejuízo permanente para a pulsão de saber A investigação sexual desses primeiros anos da infância é sempre feita na solidão significa um primeiro passo para a orientação autônoma no mundo e estabelece um intenso alheamento da criança frente às pessoas de seu meio que antes gozavam de sua total confiança 6 AS FASES DE DESENVOLVIMENTO DA ORGANIZAÇÃO SEXUAL Até agora destacamos como características da vida sexual infantil o fato de ela ser essencialmente autoerótica seu objeto encontrase no próprio corpo e de suas pulsões parciais serem inteiramente desvinculadas e independentes entre si em seus esforços pela obtenção de prazer O desfecho do desenvolvimento constitui a chamada vida sexual normal do adulto na qual a obtenção de prazer fica a serviço da função reprodutora e as pulsões parciais sob o primado de uma única zona erógena formam uma organização sólida para a consecução do alvo sexual num objeto sexual alheio ORGANIZAÇÕES PRÉGENITAIS O estudo das inibições e perturbações desse processo de desenvolvimento com a ajuda da psicanálise permitenos identificar os rudimentos e etapas preliminares de tal organização das pulsões parciais que ao mesmo tempo resultam numa espécie de regime sexual Essas fases da organização sexual são normalmente atravessadas sem dificuldade revelandose apenas por alguns indícios Somente nos casos patológicos é que são ativadas e se tornam passíveis de conhecimento pela observação grosseira Chamaremos prégenitais às organizações da vida sexual em que as zonas genitais ainda não assumiram seu papel preponderante Até aqui tomamos conhecimento de duas delas que dão a impressão de constituir recaídas em estados anteriores da vida animal A primeira dessas organizações sexuais prégenitais é a oral ou se preferirmos canibalesca Nela a atividade sexual ainda não se separou da nutrição nem tampouco se diferenciaram correntes opostas em seu interior O objeto de uma atividade é também o da outra e o alvo sexual consiste na incorporação do objeto modelo do que mais tarde irá desempenhar sob a forma da identificação um papel psíquico tão importante Como resíduo dessa hipotética fase de organização que nos foi imposta pela patologia podemos ver o chuchar no qual a atividade sexual desligada da atividade de alimentação renunciou ao objeto alheio em troca de um objeto situado no próprio corpo Uma segunda fase prégenital é a da organização sádicoanal Nela a divisão em opostos que perpassa a vida sexual já se constituiu mas eles ainda não podem ser chamados de masculino e feminino e sim ativo e passivo A atividade é produzida pela pulsão de dominação através da 30 musculatura do corpo e como órgão do alvo sexual passivo o que se faz valer é antes de mais nada a mucosa erógena do intestino mas há para essas duas aspirações opostas objetos que não coincidem Ao lado disso outras pulsões parciais atuam de maneira autoerótica Nessa fase portanto já é possível demonstrar a polaridade sexual e o objeto alheio faltando ainda a organização e a subordinação à função reprodutora AMBIVALÊNCIA Essa forma da organização sexual pode conservarse por toda a vida e atrair permanentemente para si uma boa parcela da atividade sexual O predomínio do sadismo e o papel de cloaca desempenhado pela zona anal conferemlhe um cunho singularmente arcaico Como característica adicional é próprio dela que os pares opostos de pulsões estejam desenvolvidos de maneira aproximadamente igual num estado de coisas descrito pela oportuna designação de ambivalência introduzida por Bleuler A hipótese das organizações prégenitais da vida sexual repousa na análise das neuroses e é difícil apreciála independentemente do conhecimento destas Podemos esperar que a continuidade dos esforços analíticos venha a fornecernos muito mais informações sobre a estrutura e o desenvolvimento da função sexual normal Para completar o quadro da vida sexual infantil é preciso acrescentar que com freqüência ou regularmente já na infância se efetua uma escolha objetal como a que mostramos ser característica da fase de desenvolvimento da puberdade ou seja o conjunto das aspirações sexuais orientase para uma única pessoa na qual elas pretendem alcançar seus objetivos Na infância portanto essa é a maior aproximação possível da forma definitiva assumida pela vida sexual depois da puberdade A diferença desta última reside apenas em que a concentração das pulsões parciais e sua subordinação ao primado da genitália não são conseguidas na infância ou só o são de maneira muito incompleta Assim o estabelecimento desse primado a serviço da reprodução é a última fase por que passa a organização sexual OS DOIS TEMPOS DA ESCOLHA OBJETAL Podese considerar como ocorrência típica que a escolha de objeto se efetue em dois tempos em duas ondas A primeira delas começa entre os dois e os cinco anos e retrocede ou é detida pelo período de latência caracterizase pela natureza infantil de seus alvos sexuais A segunda sobrevém com a puberdade e determina a configuração definitiva da vida sexual Mas a existência da bitemporalidade da escolha objetal que se reduz essencialmente ao efeito do período de latência é de suma importância para o desarranjo desse estado final Os resultados da escolha objetal infantil prolongamse pelas épocas posteriores ou se conservam como tal ou passam por uma renovação na época da puberdade Contudo revelamse inutilizáveis em conseqüência do recalcamento que se desenvolve entre as duas fases Seus alvos sexuais foram amenizados e agora representam o que se pode descrever como a corrente de ternura da vida sexual Somente a investigação psicanalítica pode demonstrar que por trás dessa ternura dessa veneração e respeito ocultamse as antigas aspirações sexuais agora imprestáveis das pulsões parciais infantis A escolha de objeto da época da puberdade tem de renunciar aos objetos infantis e recomeçar como uma corrente sensual A não confluência dessas duas correntes tem como conseqüência muitas vezes a impossibilidade de se alcançar um dos ideais da vida sexual a conjugação de todos os desejos num único objeto 7 AS FONTES DA SEXUALIDADE INFANTIL No esforço de rastrear as origens da pulsão sexual descobrimos até agora que a excitação sexual nasce a como a reprodução de uma satisfação vivenciada em relação a outros processos orgânicos b pela estimulação periférica apropriada das zonas erógenas e c como expressão de algumas pulsões que ainda não nos são inteiramente compreensíveis em sua origem como a pulsão de ver e a pulsão para 31 a crueldade A investigação psicanalítica que retrocede de uma época posterior para a infância e a observação contemporânea da criança conjugamse para nos apontar outras fontes que fluem regularmente para a excitação sexual A observação de crianças tem a desvantagem de trabalhar com dados facilmente passíveis de malentendidos e a psicanálise é dificultada pelo fato de só poder chegar a seus dados e conclusões depois de longos rodeios em cooperação entretanto os dois métodos obtêm um grau satisfatório de certeza de conhecimentos Pela investigação das zonas erógenas já descobrimos que essas regiões da pele meramente mostram uma intensificação especial de um tipo de estimulabilidade que em certo grau é próprio de toda a superfície cutânea Portanto não nos surpreenderá constatar que é possível atribuir efeitos erógenos muito claros a certos tipos de estimulação geral da pele Entre esses destacamos acima de tudo os estímulos térmicos o que talvez facilite nossa compreensão do efeito terapêutico dos banhos quentes EXCITAÇÕES MECÂNICAS Devemos ainda arrolar aqui a produção de excitação sexual pela agitação mecânica e ritmada do corpo na qual devemos distinguir três formas de atuação estimulatória no aparato sensorial dos nervos vestibulares na pele e nas áreas profundas músculos aparelho articular A existência das sensações prazerosas assim geradas vale enfatizar que é lícito empregarmos indistintamente numa vasta medida excitação sexual e satisfação cabendonos o dever de buscar mais adiante uma explicação para isso ver em 1 a existência dessas sensações prazerosas produzidas por certos tipos de agitação mecânica do corpo é confirmada pelo fato de as crianças gostarem tanto das brincadeiras de movimento passivo como serem balançadas e jogadas para o alto e de pedirem incessantemente que sejam repetidas Sabe se que é costumeiro usar o recurso de embalar as crianças inquietas para fazêlas adormecer O balanço das carruagens e mais tarde das viagens de trem exerce um efeito tão fascinante nas crianças mais velhas que pelo menos todos os meninos em algum momento da vida quiseram ser condutores de trem ou cocheiros quando crescessem Eles dedicam um intrigante interesse de extraordinária intensidade a tudo o que se relaciona com as ferrovias e na idade em que se ativa a fantasia pouco antes da puberdade fazem disso o núcleo de um simbolismo singularmente sexual É evidente que a compulsão a estabelecer tal vínculo entre as viagens ferroviárias e a sexualidade provém do caráter prazeroso das sensações de movimento Sobrevindo então o recalcamento que converte tantas das predileções infantis em seu oposto essas mesmas pessoas quando adolescentes ou adultas reagirão com náuseas aos balanços e sacolejos ficarão terrivelmente esgotadas pelas viagens de trem ou tenderão a sofrer ataques de angústia nas viagens protegendose da repetição dessa experiência dolorosa através de um pavor das ferrovias Alinhase aqui o fato ainda não compreendido de que a conjugação do susto com a agitação mecânica produz a grave neurose traumática histeriforme Podemos ao menos supor que essas influências que numa intensidade ínfima transformamse em fontes de excitação sexual provoquem em medida excessiva uma profunda desordem no mecanismo ou na química sexual ATIVIDADE MUSCULAR É sabido que a atividade muscular intensa é para a criança uma necessidade de cuja satisfação ela extrai um prazer extraordinário Se esse prazer tem algo a ver com a sexualidade se encerra em si mesmo uma satisfação sexual ou se pode converterse no ensejo de uma excitação sexual tudo isso é passível de considerações críticas que de fato podem também apontar contra a colocação contida nos parágrafos precedentes a saber que o prazer extraído das sensações de movimento passivo é de natureza sexual ou produz excitação sexual Mas o fato é que uma série de pessoas informa ter vivenciado os primeiros sinais de excitação em sua genitália no curso de brigas ou lutas com seus companheiros de brincadeiras situação na qual além do esforço muscular generalizado há ainda um estreito contato com a pele do oponente A tendência a travar lutas musculares com determinada pessoa bem como em épocas posteriores a inclinação às disputas verbais Provocase o que se ama são um bom sinal de que a escolha de objeto recaiu sobre essa pessoa Na promoção da excitação sexual através da atividade 32 muscular caberia reconhecer uma das raízes da pulsão sádica Em muitos indivíduos a vinculação infantil entre as lutas corporais e a excitação sexual é codeterminante da orientação privilegiada que assumirá mais tarde sua pulsão sexual PROCESSOS AFETIVOS Menores são as dúvidas a que ficam sujeitas as outras fontes de excitação sexual na criança É fácil demonstrar tanto pela observação contemporânea quanto pela investigação posterior que todos os processos afetivos mais intensos inclusive as excitações assustadoras propagamse para a sexualidade o que aliás pode contribuir para a compreensão do efeito patogênico de tais abalos anímicos Nos escolares o pavor de fazer uma prova ou a tensão diante de uma tarefa difícil de solucionar podem ser importantes não só para seu relacionamento com a escola mas também para a irrupção de manifestações sexuais na medida em que nessas circunstâncias é muito freqüente surgir uma sensação estimuladora que incita ao contato com a genitália ou ainda um processo da natureza de uma polução como todas as suas conseqüências desconcertantes O comportamento das crianças na escola que propõe aos professores um número bastante grande de enigmas merece em geral ser relacionado com o desabrochar de sua sexualidade O efeito sexualmente excitante de muitos afetos que em si são desprazerosos tais como a angústia o medo ou o horror conservase num grande número de seres humanos por toda a vida e sem dúvida explica por que tantas pessoas correm atrás da oportunidade de vivenciar tais sensações desde que haja apenas certas circunstâncias secundárias a pertença a um mundo imaginário à leitura ou ao teatro para atenuar a gravidade da sensação desprazerosa Presumindose que também as sensações de dor intensa provoquem o mesmo efeito erógeno sobretudo quando a dor é abrandada ou mantida a distância por alguma condição concomitante estaria nessa vinculação uma das principais raízes da pulsão sadomasoquista de cujas múltiplas complexidades vamos assim ganhando aos poucos algum discernimento TRABALHO INTELECTUAL Por fim é inequívoco que a concentração da atenção numa tarefa intelectual bem como o esforço intelectual em geral têm por conseqüência produzir em muitas pessoas tanto jovens quanto adultas uma excitação sexual concomitante o que por certo constitui a única base justificável para a tão duvidosa prática de derivar as perturbações nervosas do excesso de trabalho intelectual Correndo agora os olhos por essas provas e indícios fornecidos sobre as fontes da excitação sexual infantil e que não foram completos nem exaustivos podemos vislumbrar ou reconhecer os seguintes traços universais parece que as mais abundantes providências são tomadas para que o processo da excitação sexual cuja natureza decerto se tornou bastante enigmática para nós seja posto em andamento Cuidam disso antes de mais nada e de maneira mais ou menos direta as excitações das superfícies sensíveis a pele e os órgãos sensoriais e da maneira mais imediata a influência dos estímulos sobre certas áreas designadas como zonas erógenas O elemento decisivo nessas fontes de excitação sexual é sem dúvida a qualidade do estímulo embora o fator da intensidade no caso da dor não seja de todo indiferente Além disso porém existem no organismo dispositivos cuja conseqüência é fazer com que a excitação sexual surja como um efeito concomitante num grande número de processos internos tão logo a intensidade desses processos ultrapasse certos limites quantitativos O que chamamos de pulsões parciais da sexualidade deriva diretamente dessas fontes internas da excitação sexual ou então se compõe de contribuições vindas dessas fontes e das zonas erógenas É possível que nada de maior importância ocorra no organismo sem fornecer seus componentes para a excitação da pulsão sexual Não me parece possível no momento trazer maior clareza e segurança a essas proposições gerais e responsabilizo dois fatores por isso primeiro a novidade de todo o método de abordagem e segundo a circunstância de a natureza da excitação sexual sernos inteiramente desconhecida Ainda assim eu não gostaria de renunciar a duas observações que prometem abrirnos amplas perspectivas 33 AS DIFERENTES CONSTITUIÇÕES SEXUAIS a Assim como antes vimos ser possível ver em 1 e 2 basear uma multiplicidade de constituições sexuais inatas na formação diferenciada das zonas erógenas podemos agora experimentar a mesma coisa com a inclusão das fontes indiretas de excitação sexual Podemos presumir que essas fontes façam contribuições em todos os indivíduos mas não tenham em todas as pessoas a mesma intensidade e que na conformação privilegiada de cada fonte da excitação sexual situese outra contribuição para diferenciar as diversas constituições sexuais VIAS DE INFLUÊNCIA RECÍPROCA b Se abandonarmos a expressão figurada a que nos apegamos por tanto tempo ao falar em fontes da excitação sexual poderemos chegar à hipótese de que todas as vias de ligação que levam à sexualidade vindo de outras funções devem também ser percorríveis na direção inversa Por exemplo se o fato de a zona labial ser patrimônio comum de duas funções é a razão por que a ingestão de alimentos gera uma satisfação sexual esse mesmo fator nos permite compreender que haja distúrbios na nutrição quando as funções erógenas da zona comum são perturbadas E uma vez que sabemos que a concentração de atenção é capaz de provocar excitação sexual somos levados a supor que atuando pela mesma via só que em sentido inverso o estado de excitação sexual pode influenciar a disponibilidade de atenção dirigível a algo Boa parte da sintomatologia das neuroses que deduzo das perturbações nos processos sexuais expressase em perturbações de outras funções nãosexuais do corpo essa circunstância até agora incompreensível tornase menos enigmática quando se considera que representa apenas a contrapartida das influências sob as quais se dá a produção da excitação sexual Mas as mesmas vias pelas quais as perturbações sexuais se propagam para as outras funções do corpo devem também prestar na saúde um outro importante serviço Por elas se daria a atração das forças pulsionais da sexualidade para outros alvos nãosexuais ou seja a sublimação da sexualidade Mas devemos encerrar com a confissão de que é ainda muito pouco o que se conhece com certeza sobre essas vias que sem dúvida existem e provavelmente são percorríveis em ambas as direções 34 AS TRANSFORMAÇÕES DA PUBERDADE Com a chegada da puberdade introduzemse as mudanças que levam a vida sexual infantil a sua configuração normal definitiva Até esse momento a pulsão sexual era predominantemente autoerótica agora encontra o objeto sexual Até ali ela atuava partindo de pulsões e zonas erógenas distintas que independendo umas das outras buscavam um certo tipo de prazer como alvo sexual exclusivo Agora porém surge um novo alvo sexual para cuja consecução todas as pulsões parciais se conjugam enquanto as zonas erógenas subordinamse ao primado da zona genital Posto que o novo alvo sexual atribui aos dois sexos funções muito diferentes o desenvolvimento sexual de ambos passa agora a divergir muito O do homem é o mais conseqüente e também o mais facilmente acessível a nossa compreensão enquanto o da mulher representa até mesmo uma espécie de involução A normalidade da vida sexual só é assegurada pela exata convergência das duas correntes dirigidas ao objeto sexual e à meta sexual a de ternura e a sensual A primeira destas comporta em si o que resta da primitiva eflorescência infantil da sexualidade É como a travessia de um túnel perfurado desde ambas as extremidades O novo alvo sexual do homem consiste na descarga dos produtos sexuais o anterior a obtenção do prazer de modo algum lhe é estranho mas antes o mais alto grau de prazer se vincula a esse ato último do processo sexual A pulsão sexual colocase agora a serviço da função reprodutora tornase altruísta por assim dizer Para que essa transformação tenha êxito é preciso contar em seu processo com as disposições originárias e com todas as particularidades das pulsões Como em todas as outras ocasiões em que se devem realizar no organismo novas combinações e composições que levam a mecanismos complexos também aqui há uma oportunidade para perturbações patológicas caso essas reordenações não se realizem Todas as perturbações patológicas da vida sexual devem ser consideradas justificadamente como inibições do desenvolvimento 1 O PRIMADO DAS ZONAS GENITAIS E O PRÉPRAZER O ponto de partida e o alvo final do processo de desenvolvimento aqui descrito são claros a nossos olhos As transições intermediárias ainda nos são obscuras em muitos aspectos teremos de deixar subsistir nelas mais de um enigma Escolheuse o que mais se destaca nos processos da puberdade como o que constitui sua essência o crescimento manifesto da genitália externa que exibira durante o período de latência da infância uma relativa inibição Ao mesmo tempo o desenvolvimento dos genitais internos avançou o bastante para que eles possam descarregar produtos sexuais ou conforme o caso recebêlos para promover a formação de um novo ser vivo Assim ficou pronto um aparelho altamente complexo à espera do momento em que será utilizado Esse aparelho deve ser acionado por estímulos e a observação nos permite saber que os estímulos podem afetálos por três caminhos vindo do mundo externo mediante a excitação das zonas erógenas já conhecidas do interior do organismo por vias que ainda temos de explorar e da vida anímica que por sua vez é um repositório de impressões externas e um receptor de excitações internas Pelos três caminhos provocase o mesmo efeito ou seja um estado que se designa como excitação sexual e que se exprime por dois tipos de sinais anímicos e somáticos O indício anímico consiste num sentimento peculiar de tensão de caráter extremamente premente entre os múltiplos indícios corporais situase em primeiro lugar uma série de alterações nos genitais como o inequívoco sentido de serem disposições preliminares preparativos para o ato sexual a ereção do membro masculino e a umidificação da vagina TENSÃO SEXUAL O caráter de tensão da excitação sexual suscita um problema cuja solução é tão difícil quanto seria importante para a compreensão dos processos sexuais Apesar de todas as diferenças de opinião que reinam sobre esse ponto na psicologia devo insistir em que um sentimento de tensão tem de trazer em si 35 o caráter de desprazer Para mim o decisivo é que tal sentimento traz consigo uma pressão para alterar a situação psíquica impulsiona de uma maneira que é totalmente estranha à natureza do prazer sentido Mas se a tensão da excitação sexual for computada como um sentimento de desprazer esbarraremos no fato de que ela é inequivocamente experimentada como prazerosa Sempre que é produzida por processos sexuais a tensão fazse acompanhar pelo prazer até mesmo nas alterações preparatórias dos genitais evidenciase uma espécie de satisfação Como então relacionar essa tensão desprazerosa com esse sentimento de prazer Tudo o que se relaciona com o problema do prazer e do desprazer toca num dos pontos mais sensíveis da psicologia atual Procuraremos aprender o máximo possível a partir das condições do caso em pauta e evitar qualquer abordagem mais estreita do problema em sua totalidade Lancemos primeiramente um olhar para o modo como as zonas erógenas se encaixam na nova ordem Sobre elas recai um papel importante na introdução da excitação sexual O olho talvez o ponto mais afastado do objeto sexual é o que com mais freqüência pode ser estimulado na situação de cortejar um objeto pela qualidade peculiar cuja causa no objeto sexual costuma ser chamada de beleza Daí se chamarem atrativos os méritos do objeto sexual A essa estimulação já se liga por um lado um prazer e pelo outro ela tem como conseqüência um aumento da excitação sexual ou a produção dela caso ainda esteja faltando Se a isso vem somarse a excitação de outra zona erógena por exemplo a da mão que é tocada o efeito é o mesmo uma sensação de prazer de um lado que logo se intensifica pelo prazer proveniente das alterações preparatórias da genitália e de outro um aumento da tensão sexual que logo se converte no mais evidente desprazer quando não lhe é permitido o acesso a um prazer ulterior Talvez mais transparente ainda seja um outro caso por exemplo quando se estimula por contato numa pessoa não excitada sexualmente uma dada zona erógena digamos a pele do seio de uma mulher Esse contato logo provoca uma sensação prazerosa mas ao mesmo tempo prestase como nenhum outro para despertar uma excitação sexual que exige um aumento do prazer O problema está justamente em saber como é que o prazer vivenciado pode despertar a necessidade de um prazer ainda maior O MECANISMO DO PRÉPRAZER Ora o papel desempenhado nisso pelas zonas erógenas é claro O que vale para uma delas vale para todas Elas são todas usadas para proporcionar mediante sua estimulação apropriada um certo aumento do prazer este leva a um acréscimo de tensão que por sua vez tem de produzir a energia motora necessária para levar a cabo o ato sexual A penúltima etapa desse ato mais uma vez é a estimulação apropriada de uma zona erógena a própria zona genital na glande peniana pelo objeto mais adequado para isso a mucosa da vagina e do prazer gerado por essa excitação obtémse dessa vez por via reflexa a energia motora requerida para a expulsão das substâncias sexuais Esse último prazer é o de intensidade mais elevada e difere dos anteriores por seu mecanismo É inteiramente provocado pela descarga em sua totalidade é um prazer de satisfação e com ele se extingue temporariamente a tensão da libido Não me parece injustificável fixar através de uma denominação essa diferença de natureza entre o prazer advindo da excitação das zonas erógenas e o que é produzido pela expulsão das substâncias sexuais O primeiro pode ser convenientemente designado de préprazer em oposição ao prazer final ou prazer de satisfação da atividade sexual O préprazer portanto é o mesmo que já pudera ser produzido embora em menor escala pela pulsão sexual infantil o prazer final é novo e portanto provavelmente está ligado a condições que só surgem na puberdade A fórmula para a nova função das zonas erógenas tem assim o seguinte teor elas são empregadas para possibilitar por meio do préprazer delas extraído como na infância a produção do prazer maior da satisfação Pude recentemente elucidar outro exemplo retirado de uma esfera muito diferente do acontecer anímico em que se alcança igualmente um efeito maior de prazer através de uma sensação prazerosa insignificante que atua assim como um prêmio de incentivo Surgiu também ali a oportunidade de nos aprofundarmos mais na natureza do prazer 36 OS PERIGOS DO PRÉPRAZER A ligação do préprazer com a vida sexual infantil entretanto é corroborada pelo papel patogênico que pode competir a ele Do mecanismo em que está incluído o préprazer pode resultar evidentemente um perigo para a consecução do alvo sexual normal perigo este que surge quando em algum ponto dos processos sexuais preparatórios o préprazer se revela demasiadamente grande e pequena demais sua contribuição para a tensão Falta então a força pulsional para que o processo sexual seja levado adiante todo o caminho se encurta e a ação preparatória correspondente toma o lugar do alvo sexual normal A experiência nos ensina que a precondição dessa eventualidade perniciosa é que já na vida infantil a zona erógena em questão ou a pulsão parcial correspondente haja contribuído numa medida incomum para a obtenção de prazer Quando a isso vem ainda somarse fatores que promovem a fixação é fácil surgir em época posterior da vida uma compulsão que resiste à incorporação desse pré prazer específico num novo contexto É dessa natureza de fato o mecanismo de muitas perversões que consistem numa demora nos atos preparatórios do processo sexual O malogro da função do mecanismo sexual por culpa do préprazer é mais facilmente evitado quando já na vida infantil pronunciase igualmente o primado das zonas genitais As medidas para isso parecem realmente ser tomadas na segunda metade da infância dos oito anos até a puberdade Durante esses anos as zonas genitais já se comportam de maneira semelhante à da maturidade convertemse na sede de sensações de excitação e alterações preparatórias sempre que se sente algum prazer pela satisfação de outras zonas erógenas embora esse efeito continue desprovido de finalidade ou seja não contribua em nada para o prosseguimento do processo sexual Já na infância portanto junto ao prazer de satisfação surge uma certa dose de tensão sexual se bem que menos constante e menos profusa e agora podemos entender por que ao discutir as fontes da sexualidade foinos igualmente lícito dizer que o processo em questão provocava quer uma satisfação sexual quer uma excitação sexual Ver em 1 Observese que no percurso para o conhecimento começamos por fazer uma idéia muito exagerada da diferença entre a vida sexual infantil e a madura e agora fazemos uma emenda a isso Não só os desvios da vida sexual normal como também a configuração normal desta são determinados pelas manifestações infantis da sexualidade 2 O PROBLEMA DA EXCITAÇÃO SEXUAL Ficaramnos ainda inteiramente por esclarecer tanto a origem quanto a natureza da tensão sexual que surge simultaneamente com o prazer ao serem satisfeitas as zonas erógenas A suposição mais óbvia ou seja a de que essa tensão brota de algum modo do próprio prazer não só é muito improvável em si como fica também anulada ao considerarmos que no prazer máximo o que se vincula à descarga dos produtos sexuais não se produz tensão alguma porém ao contrário toda a tensão é abolida Assim prazer e tensão sexual só podem estar relacionados de maneira indireta O PAPEL DAS SUBSTÂNCIAS SEXUAIS À parte o fato de que normalmente só a descarga das substâncias sexuais põe fim à excitação sexual temos ainda outros pontos de referência para relacionar a tensão sexual com os produtos sexuais Numa vida de continência o aparelho sexual costuma livrarse das substâncias sexuais durante a noite a intervalos variáveis mas não desordenados com uma sensação de prazer e no curso da alucinação onírica de um ato sexual No tocante a esse processo a polução noturna é difícil evitar a concepção de que a tensão sexual que sabe descobrir o atalho alucinatório como substituto do ato em si é uma função da acumulação de sêmen nos reservatórios de produtos sexuais Depõem no mesmo sentido as experiências feitas sobre o caráter esgotável do mecanismo sexual Quando se esgota a reserva de sêmen não só a execução do ato sexual é impossível como também cessa a estimulabilidade das zonas erógenas cuja excitação já não é capaz de provocar nenhum prazer Assim nos inteiramos de passagem de que certa dose de tensão sexual é necessária até mesmo para a excitabilidade das zonas erógenas 37 Somos assim levados ao que se não estou equivocado é a hipótese bastante difundida de que a acumulação das substâncias sexuais cria e mantém a tensão sexual isso talvez se deva à pressão desses produtos nas paredes de seus receptáculos que atuariam como um estímulo num centro medular cujo estado seria percebido pelos centros superiores e geraria na consciência a conhecida sensação de tensão Se a excitação das zonas erógenas aumenta a tensão sexual isso só poderia acontecer pressupondose que elas tenham uma ligação anatômica prefigurada com esses centros elevem o tônus de excitação neles e sendo suficiente a tensão ponham em marcha o ato sexual ou sendo ela insuficiente estimulem a produção das substâncias sexuais Os pontos fracos dessa doutrina que vemos aceita por exemplo na exposição de KrafftEbing sobre os processos sexuais residem em que tendo sido criada para explicar a atividade sexual do homem adulto ela pouco leva em conta três situações cujo esclarecimento deveria igualmente proporcionar São elas as situações das crianças das mulheres e dos homens castrados Em nenhum desses três casos é possível falar numa acumulação de produtos sexuais no mesmo sentido que no homem o que dificulta uma aplicação uniforme desse esquema todavia cabe admitir desde logo que seria possível encontrar meios pelos quais também esses casos lhe ficariam subordinados De qualquer modo persiste a advertência de que não devemos imputar ao fator da acumulação de produtos sexuais realizações de que ele não parece capaz APRECIAÇÃO DOS ÓRGÃOS SEXUAIS INTERNOS As observações feitas em homens castrados parecem mostrar que a excitação sexual pode independer em grau considerável da produção de substâncias sexuais Ocasionalmente sua libido escapa ao prejuízo trazido pela operação de castração embora a regra seja a limitação de libido que aliás é o que motiva essa medida Além disso há muito se sabe que as doenças que eliminam a produção de células sexuais masculinas deixam intactas a libido e a potência do indivíduo agora estéril Portanto de modo algum é tão assombroso quanto o considera Rieger 1900 que a perda das glândulas sexuais masculinas na maturidade possa não ter maior influência no comportamento anímico do indivíduo É certo que a castração praticada em idade precoce antes da puberdade aproximase em seu efeito do objetivo de suprimir os caracteres sexuais embora aqui além da perda das glândulas sexuais em si também possa entrar em jogo uma inibição do desenvolvimento de outros fatores vinculada a essa perda TEORIA QUÍMICA As experiências feitas com a extirpação das gônadas testículos e ovários de animais bem como o correspondente reimplante desses órgãos em vertebrados do sexo oposto finalmente lançaram uma luz parcial sobre a origem da excitação sexual e com isso reduziram ainda mais a importância da eventual acumulação de produtos celulares sexuais Tornouse possível o experimento E Steinach de transformar um macho numa fêmea e inversamente uma fêmea num macho processo em que a conduta psicossexual dos animais se altera de acordo com os caracteres sexuais somáticos e ao mesmo tempo que eles Mas essa influência determinante do sexo não deve ser atribuída à participação das gônadas que produz as células sexuais específicas espermatozóides e óvulo mas sim a seu tecido intersticial que por isso tem sido destacado pelos autores como glândula da puberdade É muito possível que as investigações posteriores venham a revelar que essa glândula da puberdade tem normalmente uma disposição hermafrodita com o que ficaria anatomicamente fundamentada a doutrina da bissexualidade dos animais superiores e já é provável que essa glândula não seja o único órgão relacionado com a produção da excitação sexual e dos caracteres sexuais De qualquer modo essa nova descoberta biológica ajustase ao que já verificamos antes sobre o papel da glândula tireóide na sexualidade Assim estamos autorizados a supor que na porção intersticial das gônadas produzemse substâncias químicas especiais que absorvidas na corrente sangüínea carregam de tensão sexual determinadas partes do sistema nervoso central Já temos conhecimento a partir do caso das substâncias tóxicas introduzidas no corpo como algo estranho de tal transformação de um estímulo tóxico num estímulo que atua em 38 determinado órgão Quanto ao modo como a excitação sexual é gerada pela estimulação das zonas erógenas uma vez carregado o aparelho central e às interações surgidas no curso desses processos sexuais entre os efeitos dos estímulos puramente tóxicos e os dos fisiológicos isso ainda só pode ser tratado hipoteticamente e não constitui tarefa oportuna aqui Basta que nos atenhamos como o essencial nessa concepção dos processos sexuais à hipótese de que existem substâncias peculiares provenientes do metabolismo sexual Essa colocação aparentemente arbitrária apóiase num conhecimento pouco levado em conta porém digno da mais alta consideração As neuroses que só podem ser atribuídas a perturbações na vida sexual mostram a mais extrema semelhança clínica com os fenômenos de intoxicação e abstinência decorrentes do uso habitual de substâncias tóxicas produtoras de prazer alcalóides 3 A TEORIA DA LIBIDO Combinam bem com essas hipóteses sobre a base química da excitação sexual as noções de que nos valemos para procurar dominar as manifestações psíquicas da vida sexual Estabelecemos o conceito da libido como uma força quantitativamente variável que poderia medir os processos e transformações ocorrentes no âmbito da excitação sexual Diferenciamos essa libido no tocante a sua origem particular da energia que se supõe subjacente aos processos anímicos em geral e assim lhe conferimos também um caráter qualitativo Ao separar a energia libidinosa de outras formas de energia psíquica damos expressão à premissa de que os processos sexuais do organismo diferenciamse dos processos de nutrição por uma química especial A análise das perversões e das psiconeuroses levounos à compreensão de que essa excitação sexual é fornecida não só pelas chamadas partes sexuais mas por todos os órgãos do corpo Chegamos assim à representação Vorstellung de um quantum de libido a cujo substituto Vertretung psíquico damos o nome de libido do ego e cuja produção aumento ou diminuição distribuição e deslocamento devem fornecernos possibilidades de explicar os fenômenos psicossexuais observados Essa libido do ego no entanto só é convenientemente acessível ao estudo analítico depois de ter sido psiquicamente empregada para investir os objetos sexuais ou seja quando se converteu em libido do objeto Vemola então concentrarse nos objetos fixarse neles ou abandonálos passar de uns para outros e partindo dessas posições nortear no indivíduo a atividade sexual que leva à satisfação ou seja à extinção parcial e temporária da libido A psicanálise das chamadas neuroses de transferência histeria e neurose obsessiva nos proporciona uma clara visão disso Podemos ainda inteirarnos no tocante aos destinos da libido de que ela é retirada dos objetos mantémse em suspenso em estados particulares de tensão e por fim é trazida de volta para o interior do ego assim se reconvertendo em libido do ego Em contraste com a libido do objeto também chamamos a libido do ego de libido narcísica Do ponto de observação da psicanálise podemos contemplar como que por sobre uma fronteira cuja ultrapassagem não nos é permitida a movimentação da libido narcísica formando assim uma idéia da relação entre ela e a libido objetal A libido narcísica ou do ego parecenos ser o grande reservatório de onde partem as catexias de objeto e no qual elas voltam a ser recolhidas e a catexia libidinosa narcísica do ego se nos afigura como o estado originário realizado na primeira infância que é apenas encoberto pelas emissões posteriores de libido mas no fundo se conserva por trás delas Deveria ser tarefa de uma teoria da libido no campo dos distúrbios neuróticos e psicóticos expressar todos os fenômenos observados e os processos deduzidos em termos da economia libidinal É fácil inferir que nesse contexto cabe aos destinos da libido do ego a significação maior sobretudo quando se trata de explicar as perturbações psicóticas mais profundas A dificuldade reside então em que o veículo de nossas investigações a psicanálise só nos proporciona informações seguras por enquanto sobre as transformações da libido de objeto mas não consegue estabelecer uma distinção imediata entre a libido e as outras formas de energia que operam no ego Por isso de momento a continuação da teoria da libido só é possível pelo caminho da especulação Entretanto renunciase a tudo o que foi ganho até agora com a observação psicanalítica 39 quando a exemplo de CG Jung dissolvese o próprio conceito de libido ao equacionálo com a força pulsional psíquica em geral A distinção entre as moções pulsionais sexuais e as restantes e portanto a restrição do conceito de libido às primeiras encontra forte apoio na hipótese já discutida de uma química particular da função sexual 4 DIFERENCIAÇÃO ENTRE O HOMEM E A MULHER Sabese que somente com a puberdade se estabelece a separação nítida entre os caracteres masculinos e femininos num contraste que tem a partir daí uma influência mais decisiva do que qualquer outro sobre a configuração da vida humana É certo que já na infância se reconhecem bem as disposições masculinas e femininas o desenvolvimento das inibições da sexualidade vergonha nojo compaixão etc ocorre nas garotinhas mais cedo e com menor resistência do que nos meninos nelas em geral a tendência ao recalcamento sexual parece maior e quando se tornam visíveis as pulsões parciais da sexualidade elas preferem a forma passiva Mas a atividade autoerótica das zonas erógenas é idêntica em ambos os sexos e essa conformidade suprime na infância a possibilidade de uma diferenciação sexual como a que se estabelece depois da puberdade Com respeito às manifestações autoeróticas e masturbatórias da sexualidade poderseia formular a tese de que a sexualidade das meninas tem um caráter inteiramente masculino A rigor se soubéssemos dar aos conceitos de masculino e feminino um conteúdo mais preciso seria possível defender a alegação de que a libido é regular e normativamente de natureza masculina quer ocorra no homem ou na mulher e abstraindo seu objeto seja este homem ou mulher Desde que me familiarizei com a noção de bissexualidade passei a considerála como o fator decisivo e penso que sem levála em conta dificilmente se poderá chegar a uma compreensão das manifestações sexuais efetivamente no homem e na mulher ZONAS DOMINANTES NO HOMEM E NA MULHER Afora isso só tenho a acrescentar o seguinte nas meninas a zona erógena dominante situase no clitóris e é portanto homóloga à zona genital masculina a glande Tudo o que pude averiguar pela experiência sobre a masturbação nas meninas relacionouse com o clitóris e não com as partes da genitália externa que são posteriormente significativas para as funções sexuais Chego mesmo a duvidar de que a menina sob a influência da sedução possa ser levada a outra coisa que não a masturbação clitoridiana a ocorrência disso é totalmente excepcional As descargas espontâneas de excitação sexual tão corriqueiras justamente na menina pequena expressamse em contrações do clitóris e as freqüentes ereções deste órgão facultam à menina formular um juízo acertado mesmo sem nenhuma instrução sobre as manifestações sexuais do sexo oposto ela meramente transfere para os meninos as sensações de seus próprios processos sexuais Quando se quer compreender a transformação da menina em mulher é preciso acompanhar as vicissitudes posteriores dessa excitabilidade do clitóris A puberdade que no menino traz um avanço tão grande da libido distinguese na menina por uma nova onda de recalcamento que afeta justamente a sexualidade do clitóris O que assim sucumbe ao recalcamento é uma parcela de sexualidade masculina O reforço das inibições sexuais criado por esse recalcamento da puberdade na mulher fornece então um estímulo à libido do homem e obriga a um aumento de sua atividade com essa intensificação da libido aumenta também a supervalorização sexual que só aparece plenamente diante da mulher que recusa que renega sua sexualidade Quando enfim o ato sexual é permitido o próprio clitóris é excitado e compete a ele o papel de retransmitir essa excitação para as partes femininas vizinhas assim como as lascas de lenha resinosa podem ser aproveitadas para atear fogo a um pedaço de lenha mais dura Para que se efetue essa transferência é preciso amiúde um certo intervalo de tempo durante o qual a moça fica insensível Essa anestesia pode tornarse permanente quando a zona clitoridiana se recusa a abrir mão de sua excitabilidade o que é preparado justamente por sua atividade intensa na vida infantil Sabese que muitas vezes a anestesia da mulher é apenas aparente e localizada Elas ficam anestesiadas na vagina porém de modo algum são incapazes de excitação no clitóris ou mesmo em outras zonas A esses 40 determinantes erógenos da anestesia vêm então somarse os determinantes psíquicos igualmente condicionados pelo recalcamento Quando a mulher transfere a excitabilidade erógena do clitóris para a vagina ela muda a zona dominante para sua atividade sexual posterior ao passo que o homem conserva a dele desde a infância Nessa mudança da zona erógena dominante assim como na onda de recalcamento da puberdade que elimina por assim dizer a masculinidade infantil residem os principais determinantes da propensão das mulheres para a neurose especialmente a histeria Esses determinantes portanto estão intimamente relacionados com a natureza da feminilidade 5 O ENCONTRO DO OBJETO Durante os processos da puberdade firmase o primado das zonas genitais e no homem o ímpeto do membro agora capaz de ereção remete imperiosamente para o novo alvo sexual a penetração numa cavidade do corpo que excite sua zona genital Ao mesmo tempo consumase no lado psíquico o encontro do objeto para qual o caminho fora preparado desde a mais tenra infância Na época em que a mais primitiva satisfação sexual estava ainda vinculada à nutrição a pulsão sexual tinha um objeto fora do corpo próprio no seio materno Só mais tarde vem a perdêlo talvez justamente na época em que a criança consegue formar para si uma representação global da pessoa a quem pertence o órgão que lhe dispensava satisfação Em geral a pulsão sexual tornase autoerótica e só depois de superado o período de latência é que se restabelece a relação originária Não é sem boas razões que para a criança a amamentação no seio materno tomase modelar para todos os relacionamentos amorosos O encontro do objeto é na verdade um reencontro O OBJETO SEXUAL NA FASE DE AMAMENTAÇÃO Todavia desses primeiros e mais importantes de todos os vínculos sexuais resta mesmo depois que a atividade sexual se separa da nutrição uma parcela significativa que ajuda a preparar a escolha do objeto e dessa maneira restaurar a felicidade perdida Durante todo o período de latência a criança aprende a amar outras pessoas que a ajudam em seu desamparo e satisfazem suas necessidades e o faz segundo o modelo de sua relação de lactente com a ama e dando continuidade a ele Talvez se queira contestar a identificação do amor sexual com os sentimentos ternos e a estima da criança pelas pessoas que cuidam dela mas penso que uma investigação psicológica mais rigorosa permitirá estabelecer essa identidade acima de qualquer dúvida O trato da criança com a pessoa que a assiste é para ela uma fonte incessante de excitação e satisfação sexuais vindas das zonas erógenas ainda mais que essa pessoa usualmente a mãe contempla a criança com os sentimentos derivados de sua própria vida sexual ela a acaricia beija e embala e é perfeitamente claro que a trata como o substituto de um objeto sexual plenamente legítimo A mãe provavelmente se horrorizaria se lhe fosse esclarecido que com todas as suas expressões de ternura ela está despertando a pulsão sexual de seu filho e preparando a intensidade posterior desta Ela considera seu procedimento como um amor puro assexual já que evita cuidadosamente levar aos genitais da criança mais excitações do que as inevitáveis no cuidado com o corpo Mas a pulsão sexual como bem sabemos não é despertada apenas pela excitação da zona genital aquilo a que chamamos ternura um dia exercerá seus efeitos infalivelmente também sobre as zonas genitais Aliás se a mãe compreendesse melhor a suma importância das pulsões para a vida anímica como um todo para todas as realizações éticas e psíquicas ela se pouparia das autorecriminações mesmo depois desse esclarecimento Quando ensina seu filho a amar está apenas cumprindo sua tarefa afinal ele deve transformarse num ser humano capaz dotado de uma vigorosa necessidade sexual e que possa realizar em sua vida tudo aquilo a que os seres humanos são impelidos pela pulsão É verdade que o excesso de ternura por parte dos pais tornase pernicioso na medida em que acelera a maturidade sexual e também mimando a criança tornaa incapaz de renunciar temporariamente ao amor em épocas posteriores da vida ou de se contentar com menor dose dele Um dos melhores prenúncios de neurose posterior é quando a criança se mostra insaciável em sua demanda de ternura dos pais por outro lado são justamente os pais neuropáticos que em geral tendem a exibir uma ternura desmedida os que 41 mais contribuem com suas carícias para despertar a disposição da criança para o adoecimento neurótico Deduzse desse exemplo aliás que os pais neuróticos têm caminhos mais diretos que o da herança para transferir sua perturbação para seus filhos ANGÚSTIA INFANTIL As próprias crianças se comportam desde cedo como se sua afeição pelas pessoas que a assistem fosse da natureza do amor sexual A angústia das crianças não é originariamente nada além da expressão da falta que sentem da pessoa amada por isso elas se angustiam diante de qualquer estranho temem a escuridão porque nesta não vêem a pessoa amada e se deixam acalmar quando podem segurarlhe a mão na obscuridade Atribuir a todos os bichospapões da infância e a todas as histórias horripilantes contadas pelas babás a culpa por provocarem nervosismo na criança é superestimarlhes o efeito Só as crianças propensas ao estado de angústia é que acolhem essas histórias que em outras não causam nenhuma impressão e só tendem ao estado de angústia as crianças com uma pulsão sexual desmedida ou prematuramente desenvolvida ou que se tornou muito exigente em função dos mimos excessivos Nesse aspecto a criança portase como o adulto na medida em que transforma sua libido em angústia quando não pode satisfazêla e inversamente o adulto neurotizado pela libido insatisfeita comportase como uma criança em sua angústia começa a sentir medo tão logo fica sozinho ou seja sem uma pessoa de cujo amor se acredite seguro e a querer aplacar esse medo através das medidas mais pueris A BARREIRA DO INCESTO Quando a ternura dos pais pelo filho é bemsucedida em evitar que a pulsão seja prematuramente despertada nele ou seja antes que se dêem as condições somáticas da puberdade e despertada com tal força que a excitação anímica irrompa de maneira inconfundível no sistema genital essa ternura pode cumprir sua tarefa de orientar esse filho na maturidade em sua escolha do objeto sexual Sem dúvida o caminho mais curto para o filho seria escolher como objetos sexuais as mesmas pessoas a quem ama desde a infância com uma libido digamos amortecida Com o adiamento da maturação sexual entretanto ganhouse tempo para erigir junto a outros entraves à sexualidade a barreira do incesto para que assim se integrem os preceitos morais que excluem expressamente da escolha objetal na qualidade de parentes consangüíneos as pessoas amadas na infância O respeito a essa barreira é acima de tudo uma exigência cultural da sociedade esta tem de se defender da devastação pela família dos interesses que lhe são necessários para o estabelecimento de unidades sociais superiores e por isso em todos os indivíduos mas em especial nos adolescentes lança mão de todos os recursos para afrouxarlhes os laços com a família os únicos que eram decisivos na infância Mas é na esfera da representação que se consuma inicialmente a escolha do objeto e a vida sexual do jovem em processo de amadurecimento não dispõe de outro espaço que não o das fantasias ou seja o das representações não destinadas a concretizarse Nessas fantasias as inclinações infantis voltam a emergir em todos os seres humanos agora reforçadas pela premência somática e entre elas com freqüência uniforme e em primeiro lugar o impulso sexual da criança em direção aos pais quase sempre já diferenciado através da atração pelo sexo oposto a do filho pela mãe e a da filha pelo pai Contemporaneamente à subjugação e ao repúdio dessas fantasias claramente incestuosas consumase uma das realizações psíquicas mais significativas porém também mais dolorosas do período da puberdade o desligamento da autoridade dos pais unicamente através do qual se cria a oposição tão importante para o progresso da cultura entre a nova e a velha gerações Em cada uma das etapas do curso de desenvolvimento por que todos os indivíduos são obrigados a passar um certo número deles fica retido de modo que há pessoas que nunca superam a autoridade dos pais e não retiram deles sua ternura ou só o fazem de maneira muito incompleta Em sua maioria são moças que para a alegria dos pais persistem em seu amor infantil muito além da puberdade e é muito instrutivo constatar que é a essas moças que falta em seu posterior casamento a capacidade de dar ao marido o que é devido a ele Tornamse esposas frias e permanecem sexualmente anestesiadas Com isso se aprende que o amor 42 sexual e o que parece ser um amor nãosexual pelos pais alimentamse das mesmas fontes ou seja o segundo corresponde apenas a uma fixação infantil da libido Quanto mais perto se chega das perturbações mais profundas do desenvolvimento psicossexual mais se destaca de maneira inequívoca a importância da escolha objetal incestuosa Nos psiconeuróticos grande parte da atividade psicossexual destinada ao encontro do objeto ou a totalidade dela permanece no inconsciente em decorrência de seu repúdio da sexualidade Para as moças com uma necessidade exagerada de ternura e um horror igualmente desmedido às exigências reais da vida sexual tornase uma tentação irresistível por um lado realizar em sua vida o ideal do amor assexual e por outro ocultar sua libido por trás de uma ternura que possam expressar sem autorecriminações agarrandose por toda a vida a sua inclinação infantil renovada na puberdade para os pais ou irmãos A psicanálise mostra a essas pessoas sem esforço que elas estão enamoradas no sentido corriqueiro da palavra desses seus parentes consangüíneos uma vez que com a ajuda dos sintomas e outras manifestações da doença rastreialhes os pensamentos inconscientes e os traduz em pensamentos conscientes Também nos casos em que uma pessoa anteriormente sadia adoece após uma experiência amorosa infeliz podese descobrir com segurança que o mecanismo de seu adoecimento consiste numa reversão de sua libido para as pessoas preferidas na infância AS REPERCUSSÕES DA ESCOLHA OBJETAL INFANTIL Mesmo quem teve a felicidade de evitar a fixação incestuosa de sua libido não escapa inteiramente a sua influência Observase um eco muito claro dessa fase do desenvolvimento quando o primeiro enamoramento sério de um rapaz como é tão freqüente recai sobre uma mulher madura e o da moça sobre um homem mais velho e dotado de autoridade já que essas figuras lhes podem revivescer as imagens da mãe e do pai Talvez a escolha do objeto se dê em geral mediante um apoio mais livre nesses modelos O homem sobretudo busca a imagem mnêmica da mãe tal como essa imagem o dominou desde os primórdios da infância e está em perfeita harmonia com isso que a mãe ainda viva oponhase a essa reedição dela mesma e a trate com hostilidade Em vista dessa importância do relacionamento infantil com os pais para a escolha posterior do objeto sexual é fácil compreender que qualquer perturbação desse relacionamento terá as mais graves conseqüências para a vida sexual na maturidade também ao ciúme dos amantes nunca falta uma raiz infantil ou pelo menos um reforço infantil As desavenças entre os pais ou seu casamento infeliz condicionam a mais grave predisposição para o desenvolvimento sexual perturbado ou o adoecimento neurótico dos filhos A afeição infantil pelos pais é sem dúvida o mais importante embora não o único dos vestígios que reavivados na puberdade apontam o caminho para a escolha do objeto Outros rudimentos com essa mesma origem permitem ao homem sempre apoiado em sua infância desenvolver mais de uma orientação sexual e criar condições muito diversificadas para sua escolha objetal PREVENÇÃO DA INVERSÃO Uma das tarefas implícitas na escolha do objeto consiste em não se desencontrar do sexo oposto Isso como é sabido não se soluciona sem um certo tateamento Com freqüência as primeiras moções depois da puberdade se extraviam sem que haja nenhum dano permanente Dessoir 1894 assinalou acertadamente a regularidade que se deixa entrever nas amizades apaixonadas dos rapazes e moças adolescentes por outros do mesmo sexo A grande força que repele a inversão permanente do objeto sexual é sem dúvida a atração que os caracteres sexuais opostos exercem entre si no contexto desta discussão nada podemos dizer para esclarecêla Mas esse fator não basta por si só para excluir a inversão diversos outros fatores auxiliares vêm juntarse a ele Acima de tudo há o entrave autoritário da sociedade quando a inversão não é considerada um crime vêse que ela responde plenamente às inclinações sexuais de um número nada pequeno de indivíduos Podese ainda presumir no tocante ao homem que sua lembrança infantil de ternura da mãe e de outras pessoas do sexo feminino a quem ficava entregue quando criança contribui energicamente para nortear sua escolha para a mulher ao passo que a intimidação sexual precoce que experimentou por parte do pai e sua atitude competitiva com 43 relação a ele desviao de seu próprio sexo Mas ambos os fatores aplicamse também à menina cuja atividade sexual fica sob a guarda especial da mãe Daí resulta uma relação hostil com o mesmo sexo que influencia decisivamente a escolha do objeto no sentido considerado normal A educação dos meninos por pessoas do sexo masculino pelos escravos na antigüidade parece favorecer o homossexualismo a freqüência da inversão na aristocracia de hoje tornase um pouco mais inteligível diante de seu emprego de criados do sexo masculino bem como pelos maiores cuidados pessoais que a mãe dedica aos filhos Em muitos histéricos vêse que a ausência precoce de um dos pais por morte divórcio ou separação em função da qual o remanescente absorveu a totalidade do amor da criança foi o determinante do sexo da pessoa posteriormente escolhida como objeto sexual com isso possibilitando se a inversão permanente 44 RESUMO É chegado o momento de ensaiarmos um resumo Partimos das aberrações da pulsão sexual com respeito a seu objeto e seu alvo e deparamos com a questão de saber se elas provêm de uma disposição inata ou são adquiridas como resultado das influências da vida A resposta a essa pergunta nos veio da compreensão mediante a investigação psicanalítica das condições da pulsão sexual nos psiconeuróticos um grupo humano numeroso que não fica longe dos sadios Assim descobrimos que nessas pessoas a inclinação para todas as perversões é demonstrável na qualidade de forças inconscientes e se denuncia como formadora de sintomas e pudemos dizer que a neurose é como que o negativo das perversões Diante da ampla disseminação das tendências perversas agora reconhecidas fomos impelidos ao ponto de vista de que a disposição para as perversões é a disposição originária universal da pulsão sexual humana e de que a partir dela em conseqüência de modificações orgânicas e inibições psíquicas no decorrer da maturação desenvolvese o comportamento sexual normal Alimentamos a esperança de poder apontar na infância essa disposição originária entre as forças que restringem a orientação da pulsão sexual destacamos a vergonha o asco a compaixão e as construções sociais da moral e da autoridade Assim tivemos de ver em cada aberração fixa da vida sexual normal um fragmento de inibição do desenvolvimento e infantilismo Embora tenha sido necessário situar em primeiro plano a importância das variações da disposição originária tivemos de supor entre elas e as influências da vida uma relação de cooperação e não de antagonismo Por outro lado já que a disposição originária é necessariamente complexa pareceunos que a própria pulsão sexual seria algo composto de diversos fatores e que nas perversões como que se desfaria em seus componentes Com isso as perversões se revelaram de um lado como inibições do desenvolvimento normal e de outro como dissociações dele Essas duas concepções foram reunidas na hipótese de que a pulsão sexual do adulto nasce mediante a conjugação de diversas moções da vida infantil numa unidade numa aspiração com um alvo único Juntamos a isso o esclarecimento da preponderância das inclinações perversas nos psiconeuróticos na medida em que a reconhecemos como o enchimento colateral de canais secundários em função do bloqueio do leito principal da corrente sexual pelo recalcamento e passamos então ao exame da vida sexual na infância Pareceunos lamentável que se negasse a existência da pulsão sexual na infância e que as manifestações sexuais não raro observadas nas crianças fossem descritas como acontecimentos que fogem à regra Pareceunos ao contrário que a criança traz consigo ao mundo germes de atividade sexual e que já ao se alimentar goza de uma satisfação sexual que então busca reiteradamente proporcionarse através da conhecida atividade de chuchar Todavia a atividade sexual da criança não se desenvolve no mesmo passo que as demais funções mas sim após um breve período de florescência entre os dois e os cinco anos entra no chamado período de latência Neste a produção de excitação sexual de modo algum é suspensa mas continua e oferece uma provisão de energia que é empregada em sua maior parte para outras finalidades que não as sexuais ou seja de um lado para contribuir com os componentes sexuais para os sentimentos sociais e de outro através do relacionamento e da formação reativa para construir as barreiras posteriores contra a sexualidade Assim se construiriam na infância à custa de grande parte das moções sexuais perversas e com a ajuda da educação as forças destinadas a manter a pulsão sexual em certos rumos Outra parte das moções sexuais infantis escapa a esses empregos e consegue expressarse como atividade sexual Pudemos então verificar que a excitação sexual da criança provém de uma multiplicidade de fontes A satisfação surge acima de tudo mediante a excitação sensorial apropriada das chamadas zonas erógenas e provavelmente podem funcionar como tal qualquer ponto da pele e qualquer órgão dos sentidos provavelmente qualquer órgão embora existam certas zonas erógenas destacadas cuja excitação estaria assegurada desde o começo por certos dispositivos orgânicos Além disso a excitação sexual parece surgir como um subproduto por assim dizer de um grande número de processos que ocorrem no organismo tão logo eles alcançam certa intensidade e muito especialmente de todas as comoções mais fortes ainda que de natureza penosa As excitações de todas essas fontes ainda não estão conjugadas cada qual seguindo separadamente seu alvo que é meramente a obtenção de certo prazer Na infância portanto a pulsão sexual não está centrada e é a princípio desprovida de objeto ou seja autoerótica 45 Ainda durante a infância começa a fazerse notar a zona erógena da genitália seja porque como qualquer outra zona erógena ela produz satisfação mediante a estimulação sensorial apropriada seja porque de um modo não inteiramente inteligível havendo uma satisfação proveniente de outras fontes produzse ao mesmo tempo uma excitação sexual que mantém uma relação particular com a zona genital Temos de admitir com pesar que não se chegou a um esclarecimento suficiente das relações entre a satisfação sexual e a excitação sexual como também entre a atividade da zona genital e a das demais fontes da sexualidade Pelo estudo dos distúrbios neuróticos observamos que é possível identificar na vida sexual infantil desde seus primórdios os rudimentos de uma organização dos componentes sexuais da pulsão Numa primeira fase muito precoce o erotismo oral fica em primeiro plano uma segunda dessas organizações prégenitais caracterizase pela predominância do sadismo e do erotismo anal somente numa terceira fase desenvolvida na criança apenas até a primazia do falo é que a vida sexual passa a ser determinada pela contribuição das zonas genitais propriamente ditas Tivemos então de registrar como uma de nossas mais surpreendentes descobertas que essa eflorescência precoce da vida sexual infantil dos dois aos cinco anos também acarreta uma escolha objetal com toda a riqueza das realizações anímicas que isso implica de modo que a fase correspondente e ligada a ela apesar da falta de síntese entre os componentes pulsionais isolados e da incerteza do alvo sexual deve ser apreciada como uma importante precursora da posterior organização sexual definitiva A instauração bitemporal do desenvolvimento sexual nos seres humanos ou seja sua interrupção pelo período de latência pareceunos digna de uma atenção especial Ela se afigura como uma das condições da aptidão do homem para o desenvolvimento de uma cultura superior mas também de sua tendência à neurose Ao que saibamos nada de análogo é demonstrável entre os parentes animais do homem A origem dessa peculiaridade humana deveria ser buscada na protohistória da espécie Não pudemos dizer que medida de atividade sexual na infância poderia ainda ser descrita como normal como não perniciosa para o desenvolvimento ulterior O caráter dessas manifestações sexuais revelouse predominantemente masturbatório A experiência permitiunos ainda comprovar que as influências externas da sedução podem provocar rompimentos prematuros da latência e até a supressão dela e que nesse aspecto a pulsão sexual da criança comprova ser de fato perversopolimorfa comprovamos ainda que tal atividade sexual prematura prejudica a educabilidade da criança Apesar das lacunas em nossos conhecimentos da vida sexual infantil foinos então preciso fazer uma tentativa de estudar as transformações sobrevindas com a chegada da puberdade Destacamos duas delas como decisivas a subordinação de todas as outras fontes de excitação sexual ao primado das zonas genitais e o processo do encontro do objeto Ambos já estão prefigurados na vida infantil A primeira consumase pelo mecanismo de exploração do préprazer os atos sexuais outrora autônomos ligados ao prazer e à excitação convertemse em atos preparatórios do novo alvo sexual a descarga dos produtos sexuais cuja consecução acompanhada de enorme prazer põe termo à excitação sexual Nesse aspecto havíamos levado em conta a diferenciação dos seres sexuados em masculino e feminino e descobrimos que no tornarse mulher fazse necessário um novo recalcamento que suprime parte da masculinidade infantil e prepara a mulher para a troca da zona genital dominante Por fim descobrimos que a escolha objetal é guiada pelos indícios infantis renovados na puberdade da inclinação sexual da criança pelos pais e por outras pessoas que cuidam dela e que desviada dessas pessoas pela barreira do incesto erigida nesse meiotempo orientase para outras que se assemelhem a elas Cabe ainda acrescentar por último que durante o período de transição da puberdade os processos de desenvolvimento somático e psíquico prosseguem por algum tempo sem ligação entre si até que a irrupção de uma intensa moção anímica de amor levando à inervação dos genitais produz a unidade da função amorosa exigida pela normalidade FATORES QUE PERTURBAM O DESENVOLVIMENTO 46 Cada passo nesse longo percurso de desenvolvimento pode transformarse num ponto de fixação cada ponto de articulação nessa complexa montagem pode ensejar a dissociação da pulsão sexual como já discutimos em diversos exemplos Restanos ainda fornecer um panorama dos diversos fatores internos e externos que perturbam o desenvolvimento e indicar o lugar do mecanismo afetado pela perturbação proveniente deles É claro que os fatores mencionados numa mesma série podem não ter o mesmo valor e devemos estar preparados para encontrar dificuldades na devida avaliação de cada um deles CONSTITUIÇÃO E HEREDITARIEDADE Em primeiro lugar cabe mencionar aqui a diversidade inata da constituição sexual em que provavelmente recai o peso principal mas que como é compreensível só pode ser deduzida de suas manifestações posteriores e mesmo assim nem sempre com grande certeza Concebemos essa diversidade como uma preponderância desta ou daquela das múltiplas fontes de excitação sexual e cremos que tal diferença entre as disposições deve expressarse de alguma maneira no resultado final mesmo que este se mantenha dentro das fronteiras da normalidade Sem dúvida é concebível que haja também variações na disposição originária que levem necessariamente e sem a ajuda de outros fatores à configuração de uma vida sexual anormal Poderseia descrevêlos como degenerativos e considerá los como a expressão de uma deterioração hereditária Nesse contexto tenho um fato notável a relatar Em mais da metade dos casos de histeria neurose obsessiva etc que tive em tratamento psicoterapêutico pude demonstrar com certeza que o pai sofrera de sífilis antes do casamento quer se tratasse de tabes ou paralisia progressiva quer a doença luética fosse indicada de algum outro modo pela anamnese Quero observar expressamente que as crianças posteriormente neuróticas não traziam em si nenhum sinal físico de sífilis hereditária de modo que justamente sua constituição sexual anormal é que devia ser considerada como a última ramificação de sua herança sifilítica Embora eu esteja longe de afirmar que a descendência de pais sifilíticos é a condição etiológica invariável ou imprescindível da constituição neuropática não creio que a coincidência por mim observada seja acidental ou sem importância As condições hereditárias dos perversos positivos são menos conhecidas pois eles sabem furtarse à investigação Ainda assim há boas razões para supor que o que é válido para as neuroses também o seja para as perversões E que não raro se encontram numa mesma família a perversão e a psiconeurose distribuídas de tal modo entre os dois sexos que os membros masculinos ou um deles são perversos positivos enquanto os membros femininos em consonância com a tendência de seu sexo ao recalcamento são perversos negativos ou seja histéricos uma boa prova das relações essenciais por nós descobertas entre os dois distúrbios ELABORAÇÃO ULTERIOR Por outro lado não se pode defender o ponto de vista de que a conformação da vida sexual ficaria inequivocamente determinada com a instauração dos diversos componentes da constituição sexual Ao contrário o processo de determinação prossegue e surgem outras possibilidades conforme as vicissitudes por que passam as correntes tributárias das sexualidades provenientes das diversas fontes Obviamente é essa elaboração ulterior que decide em termos definitivos enquanto o que se poderia descrever como uma constituição idêntica pode levar a três desfechos diferentes 1 Quando todas as disposições se mantêm em sua proporção relativa considerada anormal e são reforçadas com o amadurecimento o desfecho só pode ser uma vida sexual perversa A análise dessas disposições constitucionais anormais ainda não foi devidamente empreendida mas já conhecemos casos facilmente explicáveis mediante tais hipóteses Os autores opinam por exemplo ver em 1 que toda uma série de perversões por fixação teria como precondição necessária uma debilidade inata da pulsão sexual Expressa nessa forma tal colocação me parece insustentável mas ela passa a fazer sentido quando se pensa numa debilidade constitucional de determinado fator da pulsão sexual qual seja a zona genital zona esta que assume posteriormente a função de conjugar num todo cada uma das atividades sexuais isoladas tendo por alvo a reprodução Quando a zona genital é fraca essa 47 conjugação exigida na puberdade está fadada a fracassar e o mais forte dentre os demais componentes da sexualidade impõe sua prática como uma perversão RECALCAMENTO 2 Produzse um desfecho diferente quando no curso do desenvolvimento alguns componentes que tinham força excessiva na disposição passam pelo processo de recalcamento sobre o qual devemos insistir em que não é equivalente a uma supressão Nesse caso as excitações correspondentes continuam a ser produzidas como antes mas são impedidas por um obstáculo psíquico de atingir seu alvo e empurradas para muitos outros caminhos até que se consigam expressar como sintomas O resultado pode aproximarse de uma vida sexual normal restrita na maioria das vezes mas complementada pela doença psiconeurótica São justamente esses os casos que se tornaram familiares para nós através da investigação psicanalítica dos neuróticos A vida sexual dessas pessoas começa como a dos perversos e toda uma parte de sua infância é ocupada por uma atividade sexual perversa que ocasionalmente se estende para além da maturidade Produzse então por causas internas em geral antes da puberdade mas vez por outra até mesmo depois dela uma reversão devida ao recalcamento e a partir daí a neurose toma o lugar da perversão sem que se extingam os antigos impulsos Isso faz lembrar o provérbio Junge Hure alte Betschwester só que nesse caso a juventude foi curta demais Essa substituição da perversão pela neurose na vida de uma mesma pessoa assim como a já mencionada distribuição da perversão e da neurose entre os diferentes membros de uma mesma família é coerente com a concepção de que a neurose é o negativo da perversão SUBLIMAÇÃO 3 O terceiro desfecho da disposição constitucional anormal é possibilitado pelo processo de sublimação no qual as excitações hiperintensas provenientes das diversas fontes da sexualidade encontram escoamento e emprego em outros campos de modo que de uma disposição em si perigosa resulta um aumento nada insignificante da eficiência psíquica Aí encontramos uma das fontes da atividade artística e conforme tal sublimação seja mais ou menos completa a análise caracterológica de pessoas altamente dotadas sobretudo as de disposição artística revela uma mescla em diferentes proporções de eficiência perversão e neurose Uma subvariedade da sublimação talvez seja a supressão por formação reativa que como descobrimos começa no período de latência da criança e nos casos favoráveis prossegue por toda a vida Aquilo a que chamamos caráter de um homem constróise numa boa medida a partir do material das excitações sexuais e se compõe de pulsões fixadas desde a infância de outras obtidas por sublimação e de construções destinadas ao refreamento eficaz de moções perversas reconhecidas como inutilizáveis Por conseguinte a disposição sexual universalmente perversa da infância pode ser considerada como a fonte de uma série de nossas virtudes na medida em que através da formação reativa impulsiona a criação delas EXPERIÊNCIAS ACIDENTAIS Comparadas às descargas sexuais às ondas de recalcamento e às sublimações sendo inteiramente desconhecidas para nós as condições internas destes dois últimos processos todas as outras influências parecem bem menos importantes Quem incluir os recalcamentos e sublimações na disposição constitucional e encarálos como manifestações vitais desta poderá afirmar justificadamente que a conformação final da vida sexual resulta acima de tudo da constituição inata Mas ninguém com algum discernimento contestará o fato de que em tal cooperação de fatores há também espaço para as influências modificadoras do que foi acidentalmente vivenciado na infância e depois Não é fácil avaliar a eficácia dos fatores constitucionais e acidentais em sua relação recíproca Na teoria sempre se tende a superestimar os primeiros a prática terapêutica destaca a importância dos últimos Mas em nenhum caso se deve esquecer que existe entre ambos uma relação de cooperação e não de exclusão O fator constitucional tem de aguardar experiências que o ponham em vigor o acidental precisa apoiarse na 48 constituição para ter efeito Na maioria dos casos podese imaginar o que se tem chamado de série complementar na qual as intensidades decrescentes de um fator são compensadas pelas intensidades crescentes de outro mas não há razão alguma para negar a existência de casos extremos nos dois limites da série Harmonizase ainda melhor com a investigação psicanalítica dar um lugar de destaque entre os fatores acidentais às experiências da primeira infância A série etiológica única decompõese então em duas que podem ser chamadas de disposicional e definitiva Na primeira a constituição e as vivências acidentais da infância interagem da mesma maneira que na segunda a disposição e as vivências traumáticas posteriores Todos os fatores nocivos ao desenvolvimento sexual externam seu efeito promovendo uma regressão um retorno a uma fase anterior do desenvolvimento Prossigamos agora em nossa tarefa de enumerar os fatores que verificamos serem influentes no desenvolvimento sexual quer representem forças eficazes ou meras manifestações delas PRECOCIDADE Um desses fatores é a precocidade sexual espontânea demonstrável com certeza pelo menos na etiologia das neuroses muito embora tal como outros fatores não seja por si só uma causa suficiente Manifestase na interrupção encurtamento ou encerramento do período infantil de latência c converte se em causa de perturbações por ocasionar manifestações sexuais que pelo estado incompleto das inibições sexuais de um lado e por ainda não estar desenvolvido o sistema genital de outro só podem trazer em si o caráter de perversões Essas tendências à perversão podem então permanecer como tais ou instaurado o recalcamento transformarse em forças propulsoras de sintomas neuróticos De qualquer modo a precocidade sexual dificulta o desejável domínio posterior da pulsão sexual pelas instâncias anímicas superiores e aumenta o caráter compulsivo que à parte isso os substitutos Vertretungen psíquicos da pulsão reivindicam para si A precocidade sexual amiúde corre paralela ao desenvolvimento intelectual prematuro e como tal é encontrada na história infantil dos indivíduos mais eminentes e capazes em tais condições não parece tornarse tão patogênica como quando surge isoladamente FATORES TEMPORAIS Da mesma forma exigem consideração outros fatores que ao lado da precocidade podem ser reunidos sob a designação de temporais A ordem em que são ativadas as diversas moções pulsionais bem como o lapso de tempo em que podem manifestarse antes de sucumbir a influência de uma nova moção pulsional emergente ou a algum recalcamento típico parecem filogeneticamente determinados Todavia tanto nessa seqüência temporal quanto nessa duração parece haver variações que devem exercer uma influência dominante no resultado final Não é indiferente que uma dada corrente emerja antes ou depois de sua corrente contraída pois o efeito de um recalcamento não pode ser desfeito cada desvio temporal na montagem dos componentes produz invariavelmente uma alteração no resultado Por outro lado as moções pulsionais que emergem com intensidade especial têm com freqüência um decurso assombrantemente rápido como por exemplo o vínculo heterossexual dos que depois se tornam homossexuais manifestos Não há justificativa para o medo de que as tendências estabelecidas com mais violência na infância dominem permanentemente o caráter adulto é igualmente esperável que elas venham a desaparecer cedendo lugar a seu oposto Gestrenge Herren regieren nicht lange Não estamos sequer em condições de fornecer indícios das causas dessas complicações temporais dos processos de desenvolvimento Abrese aqui o panorama de uma densa falange de problemas biológicos e talvez também históricos dos quais nem ao menos nos aproximamos o bastante para travar batalha com eles ADESIVIDADE A importância de todas as manifestações sexuais precoces é aumentada por um fator psíquico de origem desconhecida que por ora decerto só pode ser apresentado como uma hipótese psicológica 49 provisória Refirome à elevada adesividade Haftbarkeit ou fixabilidade dessas impressões da vida sexual que é preciso admitir para a complementação dos fatos nas pessoas que depois se tornarão neuróticas ou perversas já que as mesmas manifestações sexuais prematuras em outras pessoas não conseguem gravarse de maneira tão profunda a ponto de produzirem uma repetição convulsiva e poderem prescrever por toda a vida os caminhos da pulsão sexual Parte da explicação dessa adesividade talvez resida num outro fator psíquico que não podemos negligenciar na causação das neuroses a saber a preponderância que cabe na vida anímica aos traços mnêmicos em comparação com as impressões recentes Esse fator é obviamente dependente da formação intelectual e aumenta conforme a elevação da cultura pessoal Em contraste com isso o selvagem tem sido caracterizado como das unglückselige Kind des Augenblickes Em decorrência da relação inversa entre a cultura e o livre desenvolvimento da sexualidade cujas conseqüências podem ser seguidas muito de perto na conformação de nossa vida a importância do rumo tomado pela vida sexual da criança para a vida posterior é muito pequena nos níveis cultural ou social mais baixos e muito grande nos mais elevados FIXAÇÃO O terreno preparado pelos fatores psíquicos que acabamos de mencionar é favorável aos estímulos acidentalmente vivenciados da sexualidade infantil Estes últimos sobretudo a sedução por outras crianças ou por adultos fornecem o material que com a ajuda dos primeiros pode fixarse como um distúrbio permanente Boa parte dos desvios da vida sexual normal posteriormente observados tanto nos neuróticos quanto nos perversos é estabelecida desde o começo pelas impressões do período infantil supostamente desprovido de sexualidade De sua causação participam a complacência constitucional a precocidade a característica da adesividade elevada e a estimulação fortuita da pulsão sexual por influências estranhas Todavia a conclusão insatisfatória que emerge dessas investigações das perturbações da vida sexual provém de não sabermos sobre os processos biológicos que constituem a essência da sexualidade o bastante para formar com base em nossos conhecimentos isolados uma teoria suficiente para compreendermos tanto o normal quanto o patológico 50 APÊNDICE LISTA DOS ESCRITOS DE FREUD QUE VERSAM PREDOMINANTEMENTE OU EM GRANDE PARTE SOBRE A SEXUALIDADE Claro está que as referências à sexualidade são encontradas na grande maioria dos escritos de Freud A lista que se segue compreende aqueles que versam mais diretamente sobre o assunto A data indicada no início de cada item corresponde ao ano de publicação Os detalhes mais completos sobre cada obra serão encontrados na bibliografia ao final deste volume 1898a A Sexualidade na Etiologia das Neuroses 1905d Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade 1906a Minhas Teses sobre o Papel da Sexualidade na Etiologia das Neuroses 1907c O Esclarecimento Sexual da Criança 1908b Caráter e Erotismo Anal 1908c Sobre as Teorias Sexuais Infantis1908d Moral Sexual Civilizada e Doença Nervosa Moderna 1910a Cinco Lições de Psicanálise Conferência IV 1910c Uma Lembrança Infantil de Leonardo da Vinci Capítulo III 1910h Um Tipo Especial de Escolha de Objeto no Homem 1912d Sobre a Degradação mais Generalizada da Vida Amorosa 1912f Contribuições para um Debate sobre a Masturbação 1913I A Predisposição à Neurose Obsessiva 1913j O Interesse pela Psicanálise Parte II C 1913k Prefácio a Scatologic Rites of All Nations de Bourke 1914c Sobre o Narcisismo Introdução 191617 Conferências Introdutórias sobre Psicanálise Conferências XX XXI XXII e XXVI 1917c Sobre as Transformações da Pulsão particularmente o Erotismo Anal 1918a O Tabu da Virgindade 1919e Espancase uma Criança 1920a Sobre a Psicogênese de um Caso de Homossexualismo Feminino 1922b Alguns Mecanismos Neuróticos no Ciúme na Paranóia e no Homossexualismo Seção C 1923a Dois Verbetes de Enciclopédia 2 A Teoria da Libido 1923e A Organização Genital Infantil 1924c O Problema Econômico do Masoquismo 1924d O Naufrágio do Complexo de Édipo 1925j Algumas Conseqüências Psíquicas da Diferença Anatômica entre os Sexos 1927e Fetichismo 1931a Tipos Libidinais 193lb Sexualidade Feminina 1933a Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise Conferências XXXII e XXXIII 1940a 1938 Um Esboço de Psicanálise Capítulos III e VII 1940e 1938 A Cisão do Ego no Processo de Defesa 51 RESUMO FREUD Sigmund Três ensaios sobre a teoria da sexualidade 1905 AS ABERRAÇÕES SEXUAIS No momento inicial do texto Freud explica que a existência das necessidades sexuais no ser humano é tratada na biologia como pulsão sexual porém com analogias usando de parâmetro a fome Na opinião popular o desejo sexual não existe na infância e só se manifesta na maturação da puberdade Seu objetivo é puramente a união sexual mas Freud discute que essa seja a realidade sobre a pulsão sexual Ele chama de objeto sexual a pessoa de quem provém a atração sexual e de alvo sexual a ação para a qual a pulsão impele a partir dessas nomenclaturas ele busca explicar a relação destes e os seus desvios Ele fala sobre desvios com respeito ao objeto sexual se referindo aos homossexuais em vista que seus objetos de desejo são invertidos Em seguida Freud trata a respeito da inversão apontando os comportamentos dos invertidos a concepção de inversão apresentando que esta caracterização contém dois elementos que devem ser apreciados separadamente o caráter inato e a degeneração Freud fala sobre a bissexualidade a explicando como uma certa anomalia ou recurso natural uma predisposição originariamente bissexual que no curso do desenvolvimento Ele apresenta variados pontos de vista acerca desse tema citando outros autores que já discutiram sobre a bissexualidade sendo para ele também um mecanismo dos invertidos Acerca desse tema o autor conclui que existe uma forte ligação entre a pulsão sexual e o objeto sexual Acerca do próximo tópico se tratando de animais e pessoas sexualmente imaturas como objetos sexuais Freud toma como resultado da discussão acerca do tema o entendimento de que dentro de uma grande e quantidade de condições e num número surpreendentemente elevado de indivíduos a índole e o valor do objeto sexual passam para segundo plano ele também declara que O essencial e constante na pulsão sexual é alguma outra coisa Freud nos fala sobre os desvios com respeito ao alvo sexual transgressões anatômicas com supervalorização do objeto sexual por parte do sujeito o uso sexual da mucosa dos lábios e da boca pelo indivíduo o uso sexual do orifício anal a significação de outras partes do corpo Tópicos estes listados que nos remete ao que futuramente ele define como fases do desenvolvimento psicossexual Um pouco mais a frente no texto Freud disserta acerca da substituição imprópria do objeto sexual ou seja ele fala sobre o fetichismo tornando o texto mais imerso sobre o assunto entra em destaque as fixações de alvos sexuais provisórios ou seja o surgimento de novas intenções o tocar e o olhar o sadismo e o masoquismo As perversões eram marcadas como doenças muitas vezes porém Freud disserta em seu texto sobre as variações das perversões e que elas não necessariamente possuem origem patológicas As perversões podem ter objetos inanimados como parte da realização destas Freud determina que as perversões participam de modo abundante na transformação da pulsão sexual A pulsão sexual nos neuróticos se estabelece como um novo tópico da discussão onde Freud aponta o posicionamento psicanalítico e os resultados dessa abordagem dentro da temática destacando a relação entre a neurose e perversão discorrendo sobre suas hipóteses As pulsões parciais são investigadas durante o texto principalmente no foco das zonas erógenas e as situações que o indivíduo as explora aprofundando a relação dessas zonas com pacientes como os histéricos Não deixando esses tópicos vagos Freud esclarece a aparente preponderância da sexualidade perversa dentro dessas psiconeuroses nos introduzindo por fim ao próximo tema através das indicações do infantilismo da sexualidade A SEXUALIDADE INFANTIL Ao abordar esse tema Freud ressalta o descaso para com o infantil e a sexualidade existente nesse período buscando estabelecer sua hipótese sobre essa questão retratando a amnésia infantil e a sua relação com o sexual nos trazendo os períodos de latência sexual e suas rupturas assim como os processos de inibição sexual formação reativa e sublimação que ocorrem nesse período até as rupturas desse período As manifestações da sexualidade infantil são listadas e esclarecidas no texto sendo elas O chuchar e o autoerotismo Após isso Freud nos fala sobre o alvo da sexualidade infantil esclarecendo as características das zonas erógenas as manifestações masturbatórias atividade da zona anal e genital Estabelecendo as fases da masturbação infantil e esclarecendo como estas ocorrem O autor destaca também questões voltadas para a disposição perversa polimorfa pulsões parciais e a investigação sexual infantil partindo da pulsão natural da criança em saber apresentando teorias como o enigma da esfinge complexo de castração e inveja do pênis nas meninas e as teorias do nascimento criadas pelas crianças assim como a concepção sádica das relações sexuais Por fim esse capítulo do ensaio foca na discussão acerca das fonte da sexualidade infantil AS TRANSFORMAÇÕES DA PUBERDADE Esse capítulo do texto está voltada para a chegada da puberdade e as alterações que levam a vida sexual infantil à sua configuração definitiva Freud aborda nesse tópico o primado das zonas genitais e o conceito de préprazer apontando seus mecanismos perigos e questões voltadas para a tensão sexual Mais a frente ele engaja nos problemas acerca da excitação sexual o papel das substâncias sexuais do organismo apreciação dos órgãos sexuais internos apontando as teorias químicas sobre a sexualidade nesse contexto Freud nos introduz à teoria da libido estabelecendo a diferença e zonas dominantes no homem e na mulher antes de falar acerca do encontro do objeto sexual voltando a relacionar a necessidade desse objeto à fase da infância e a angústia infantil explicando a relação deste comportamento com a sexualidade Finalizando a discussão com a prevenção da inversão esclarecendo que o determinante do sexo da pessoa posteriormente escolhida como objeto sexual com isso possibilitandose a inversão permanente RESUMO Nesse tópico do ensaio Freud retorna a todo o conteúdo apresentado sintetizando os temas e discutindo sobre os fatores que perturbam o desenvolvimento constituição e hereditariedade discorre acerca da elaboração ulterior e destaca informações sobre tópicos que conhecemos ao se tratar de psicanálise como o recalcamento sublimação experiências acidentais precocidade fixação entre outros Freud conclui sua investigação determinando que as perturbações da vida sexual provêm de não sabermos sobre os processos biológicos que constituem a essência da sexualidade o bastante para formar com base em nossos conhecimentos isolados uma teoria suficiente para compreendermos tanto o normal quanto o patológico