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43 Metástase óssea revisão da literatura Bone metastases literature review 1 Médico Titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia Mestre em Ortopedia pela UFRJ Chefe do Serviço de Tumor do Hospital de Traumato OrtopediaINTO Médico da Seção de Tecido Ósseoconectivo HC IINCA 2 Médica Ortopedista Membro Associado da SBOT Especialista em Ortopedia Oncológica pelo INCAMS 3 Médico Titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia Médico da Seção de Tecido Ósseo conectivo HC IINCA Especialista em Ortopedia Oncológica pelo INCAMS Médico do serviço de tumor do HTOINTO 4 Médica Ortopedista Membro Associado da SBOT Membro Titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia Pediátrica 5 Chefe da Seção de Tecido Ósseo conectivo HC IINCA 6 Médico da Seção de Tecido Ósseo conectivo HC IINCA Mestre em cirurgia pela UFRJ Trabalho realizado no INCA Instituto Nacional de Câncer Endereço para correspondência Walter Meohas Av Ayrton Senna 1850 sala241 Barra da Tijuca Email wmeohasyahoocombr Walter Meohas1 Danielle Probstner2 Roberto André Torres Vasconcellos3 Ana Cristina de Sá Lopes4 José Francisco Neto Rezende5 Nelson Jabour Fiod6 Resumo Os autores sumarizam os aspectos históricos relevantes e os conceitos atuais sobre abordagem de pacientes com doença óssea metastática Eles mostram a importância da história clínica evolução e diagnóstico avaliando os estudos radiológicos cintilográficos e opções de tratamento A conclusão é que o manuseio da mestástase óssea deve levar em conta o prognóstico e a expectativa de vida Palavraschave Metástase Carcinoma Lesão óssea metastática Abstract The authors summarize the most relevant historical aspects and current concepts on approach of patient with bone metastatic disease They point out the importance of clinical issues and diagnostic evolution taking a look of radiologic and scintigrafic studies and treatment options The conclusion is that management of bone metastasis should be tailored to the patient overall prognosis and life expectancy Key words Metastasis Carcinoma Metastatic bone lesion Revisão de Literatura Metástase óssea Artigo submetido em 290604 aceito para publicação em 050105 Revista Brasileira de Cancerologia 2005 511 4347 44 Meohas W et al INTRODUÇÃO O termo metástases vem do Grego meta além stasis parar7 sendo originalmente empregado no contexto da Teoria Fisiológica Humoral vigente 400 500 anos AC segundo a qual o equilíbrio da homeostase corporal era dado pelo perfeito balanceamento entre os quatro humores orgânicos sangue bile amarela bile negra e fleuma Esta teoria fisiopatológica foi criada em analogia à Teoria dos Quatro Elementos sendo documentada por Hipócrates e posteriormente traduzida por Galeno no século 2 DC passando então à Escola Escolástica de Medicina da Idade Média1 2 Segundo a Teoria Fisiológica Humoral o organismo cozinhava o excesso ou o eliminava através dos dejetos orgânicos Caso o material não fosse completamente cozido ou eliminado era depositado apostasis ou mandado para outra parte do corpo metástases Acreditavase que o acúmulo de bile negra era responsável pelo surgimento dos tumores e que as metástases eram depósitos desta bile transportados para outra parte do organismo Estes conceitos influenciaram o meio científico até o século XIX quando importantes descobertas delinearam um novo panorama no campo da Oncologia12 As bases celulares do câncer foram reconhecidas nesta época com a demonstração do crescimento através da divisão celular por Raspail em 1826 pela descrição da estrutura celular como unidade básica da vida por Schwann e pela descoberta de Müller de que o crescimento tumoral assemelhavase ao do tecido normal1 O termo metástases com o contexto que conhecemos foi introduzido por Récamier 17741852 Entretanto cabe a Thiersch 18221895 e Waldeyer 18651921 a estrutura das bases da Teoria Mecanicista que ganhou espaço a partir do século XIX através da comprovação morfológica de êmbolos metastáticos de células epiteliais em vasos linfáticos e linfonodos De acordo com esta teoria plenamente aceita no final do século XIX as células tumorais seriam distribuídas via vasos sangüíneos e linfáticos formando colônias tumorais no local onde fossem depositadas1 Com a descoberta do microscópio tornouse possível relacionar o tumor primário com os implantes ósseos secundários inaugurando definitivamente o início da Teoria da Circulação Paget von Recklinghausen e Schmorl observaram que nem todos os ossos eram acometidos por implantes secundários com a mesma freqüência ficando claro que apenas o fluxo lentificado Revista Brasileira de Cancerologia 2005 511 4347 de sangue nos sinusóides da medula óssea e a pouca espessura da parede dos vasos não poderiam ser as únicas explicações para este fato12 Em 1889 Paget publica a Teoria do Solo e Semente onde conclui que a influência combinada das células tumorais com o meio na qual se encontram permitiriam o crescimento tumoral secundário após uma fase de latência de forma análoga às sementes cujo potencial desenvolve em solo fértil1 Em 1940 Batson comprova no meio científico a existência de uma quarta via de disseminação metastática somando o sistema venoso avalvular que se estende da base do crânio à pelve às outras três vias conhecidas sistemas Cava Porta e Pulmonar1 A metástase é portanto o resultado final de várias etapas interdependentes um processo multifacetado que inclui uma complexa interação entre o tumor e organismo hospedeiro uma seqüência de eventos que ainda hoje não foi completamente esclarecida3 Desde 1970 as pesquisas neste campo vêm sendo intensificadas sabendose atualmente da importância dos fatores quimiotáxicos e de crescimento no desenvolvimento da metástase óssea corroborando a teoria proposta por Paget em 18891 Este trabalho faz um apanhado sobre a abordagem da doença óssea metastática chamando atenção para suas particularidades tratamento e prognóstico independente do tumor primário ASPECTOS CLÍNICOS A doença óssea metastática é responsável por mais de 99 dos tumores malignos que acometem o osso e todo tumor maligno pode eventualmente produzir metástase1 Fisiologicamente a metástase é um processo ineficiente Sabese por exemplo que após injeção intravenosa experimental de células tumorais altamente metastáticas apenas 001 destas irão conseguir formar um foco tumoral3 A ineficiência deste processo se deve às várias etapas interdependentes que compõem a complexa cascata de eventos necessários ao estabelecimento do implante secundário3 O processo de disseminação metastática parece ser semelhante em todos os tipos de tumor e suas etapas relevantes são a oncogênese a angiogênese a existência de células tumorais com fenótipo invasivo e com maior velocidade de crescimento capacidade de sobrevivência à circulação sangüínea adesão da célula tumoral ao tecidoalvo extravasamento e crescimento celular na localização secundária angiogênese no foco metastático 45 Metástase óssea Revista Brasileira de Cancerologia 2005 511 4347 e bloqueio da resposta imune hospedeira3 As metástases para pulmão são mais comuns em sarcomas as metástases ósseas surgem com maior freqüência dos carcinomas de mama 49figura1 pulmão rim próstata e tireóide localizandose mais comumente nas vértebras arcos costais esqueleto axial 80 na pelve e no fêmur7 Muitas vezes a localização primária permanece desconhecida 3 chamando a atenção para a doença apenas o quadro metastático Os implantes secundários são extremamente raros distalmente em cotovelo e joelho 03 acometendo de forma preponderante mulheres acima da quarta década de vida78 Clinicamente a dor é o principal sintoma podendo ser acompanhada de aumento de volume local eou fratura patológica A lesão no entanto pode evoluir de forma assintomática e só se mostrar em vigência de fratura patológica ou do edema local muitas vezes confundido com trombose venosa9 A abordagem do paciente deve começar com o estadiamento clínico representado na classificação TNM da União Internacional Contra o Câncer UICC A metastáse óssea ou não é representada pela letra M M0 ausência e M1 presença10 O estadiamento clínico inclui testes laboratoriais como hemograma completo dosagem de eletrólitos ex sódio potássio cálcio fósforo magnésio dosagem de enzimas ex Fosfatase Alcalina Desidrogenase Lática Fosfatase Ácida dosagem de marcadores tumorais específicos ex Antígeno Carcinoembrionário Antígeno Prostático específico dosagem de Imunoglobulinas de proteínas específicas ex Bence Jones e dosagem hormonal exParatormônio3 Um criterioso estudo por imagem deve também Figura 1 metástase de tumor de mama carcinoma ductal infiltrante ser realizado iniciando com radiografia simples do local acometido procurando alterações como lesões líticas com padrão geográfico permeativo ou de roído de traça lesões osteoblásticas ou mistas É importante estar atento a possíveis reações periosteais ex espiculada laminada triângulo de Codman que por não serem freqüentes podem ser superestimadas simulando diagnóstico de tumor ósseo primário3 A Cintilografia Óssea complementa a avaliação mapeando todo o esqueleto e definindo se a lesão em questão é única ou múltipla O Tc99mMDP é o radiofármaco mais utilizado para esta finalidade O estudo por radionuclídeos foi introduzido para estadiamento por Sklaroff y Charkes em 19709 é um exame metabólico para lesões osteoblásticas com alguma repercussão por imagem fazendo diagnóstico de lesões ósseas com precocidade de até quatro meses em relação à radiografia simples7 A investigação por imagem deve seguir com estudo tomográfico local e à distância TC de tórax abdome e pelve e RNM com contraste de Gadolíneo da região acometida com a finalidade de melhor avaliar o comprometimento das partes moles ou compressão neurológica nas metástases de coluna Mais recentemente a Tomografia por Emissão de Pósitrons PET Scan vem sendo introduzida para rastreamento de metástase em alguns tipos de tumores direcionamento de biópsias e estudo diferencial entre recidiva tumoral em partes moles e fibrose O potencial clínico da PET ainda está sendo investigado para delinear claramente seu papel na abordagem do paciente oncológico4 A última etapa do estadiamento clínico das lesões ósseas metastáticas é a biópsia que pode ser feita de forma aberta cirurgicamente ou fechada por trocarte A biópsia óssea se faz necessária somente nos casos onde os exames de estadiamento não conseguiram definir a localização primária da lesão devendo sempre ser feita após a investigação por imagem para que o hematoma decorrente do trauma cirúrgico não altere o resultado da cintilografia tomografia ressonância magnética e radiografia simples TRATAMENTO LOCAL Os principais objetivos do tratamento local são alívio da dor manutenção ou restauração da função com descompressão neurológica e controle do crescimento tumoral local quando possível5 Para esta finalidade utilizase a radioterapia isolada e ou em conjunto com procedimentos cirúrgicos que devem levar em consideração o prognóstico do tumor 46 primário a expectativa de vida e o estado geral de saúde do paciente5 A radioterapia pode ser empregada com intenção paliativa a fim de suprimir o crescimento tumoral nas lesões metastáticas que não ameacem biomecanicamente a estrutura óssea isto porque induz um aumento da vascularização na periferia do tumor que enfraquece o osso adjacente a este aumentando o risco de fratura espontânea5As doses usadas no tratamento paliativo vão de 2000 a 4000 cGy em doses fracionadas800cGy nos dias 0721 ou 2000 em 7 dias ou 3000 em 2 semanas ou 4000 em 4 semanas a analgesia independe do fracionamento e sim da dose11 Nos pacientes sem condições de cirurgia a radioterapia é usada com objetivo antiálgico na tentativa de melhorar a qualidade de vida11 A radioterapia é ainda o principal método adjuvante no tratamento cirúrgico uma vez que promove o controle tumoral nas áreas com implantes pela manipulação na cirurgia mantendo a integridade estrutural e prevenindo novas fraturas ao longo do osso manuseado5 O tratamento cirúrgico pode ser empregado nas fraturas patológicas iminentes ou naquelas já estabelecidas A indicação para cirurgia é controversa variando de acordo com a experiência de cada centro especializado em oncologia5 São indicações cirúrgicas gerais de maior aceitação fratura em ossos que sustentam carga onde a expectativa de vida é maior ou igual a 1 mês fratura em ossos que não sustentam carga com expectativa de vida maior ou igual a 3 meses estado geral de saúde adequado para intervenção cirúrgica estoque ósseo remanescente que suporte implante ortopédico e se o procedimento traz benefícios para o paciente no sentido de permitir sua mobilização e facilitar seus cuidados gerais5 A maioria dos serviços utiliza ainda o escore desenvolvido por Mirels quadro 1 mesclado às próprias observações clínicas na polêmica indicação cirúrgica das fraturas patológicas iminentes6 Este escore para cirurgia deve ser acima de oito Com relação às indicações de tratamento cirúrgico para descompressão de elementos neurais e estabilização biomecânica da coluna vertebral a maioria dos autores concorda com intervenções nos seguintes casos 1 mielopatia 2 obstrução óssea do canal vertebral produzindo compressão tecal 3 instabilidade vertebral com dor mecânica renitente 4 fraturaluxação da coluna 5 radiculopatia com sintomas progressivos e incontroláveis 6 crescimento tumoral não responsivo à radioterapia 7 expansão direta de tumor de lesões primárias para a vértebra5 Analisandose com critério a peculiaridade de cada caso podese utilizar uma gama extensa de soluções ortopédicas desde a confecção sob medida de endopróteses diafisárias e articulares rígidas ou não placas parafusos até hastes intramedulares bloqueadas ou nãocolocadas a foco aberto ou fechado O cimento ósseo polimetil metacrilato vem sendo empregado com sucesso como método adjuvante para aumentar a estabilidade obtida com a fixação interna e para preenchimento de defeitos causados pela curetagem intra lesional do foco Em alguns serviços a crioterapia também é usada como método adjuvante no controle de lesões quimio e radio resistentes5 Nos tumores hipervascularizados angiografia e embolização podem ser utilizadas de forma neoadjuvante com o objetivo de reduzir o sangramento intra operatório Imobilizadores e amputação ainda têm espaço no tratamento local da doença óssea metastática O primeiro pode ser empregado quando a doença local é extensa e a performance status PS crítica isto é naqueles pacientes tidos como préterminais enquanto a amputação tem sua utilidade nos casos de complicações relacionadas ao tumor ou ao tratamento ex ulceração sangramento e lesões infectadas na dor intratável e na maioria dos casos de acrometástases5 figura 2 O prognóstico das lesões ósseas metastáticas está relacionado à resposta clínica à doença primária ao número de implantes no esqueleto e ao tipo Pontos Variáveis 1 2 3 Local Membros superiores Membros inferiores Região peritrocantérica Dor Leve Moderada Funcional Lesão Blástica Mista Lítica Tamanho 13 13 a 12 23 Quadro 1 Quadro 1 Quadro 1 Quadro 1 Quadro 1 Escore para indicação cirúrgica das fraturas patológicas iminentes Fonte Mirels 6 Meohas W et al Revista Brasileira de Cancerologia 2005 511 4347 47 Figura 2 Figura 2 Figura 2 Figura 2 Figura 2 acrometástase de tumor de pulmão carcinoma epidermóide histopatológico do tumor Certos tipos de tumor como o Carcinoma Renal Carcinoma de Mama e Mieloma Múltiplo tem maior capacidade de consolidação enquanto que neoplasias como Melanoma Carcinoma de Pulmão e Carcinoma Colo Retal raramente consolidam quando fraturados5 CONCLUSÃO As metástases para o tecido ósseo usualmente são oriundas de carcinomas que têm seu controle adequado quando o tratamento da lesão primária é eficaz A combinação apropriada de cirurgia terapia sistêmica e radioterapia promove o controle da dor e preserva a função nos pacientes com implante ósseo secundário A abordagem da doença óssea metastática é multidisciplinar e deve ser adequada ao contexto geral do paciente levando em consideração fatores relevantes como performance status PS sobrevida e os reais benefícios que o tratamento proposto pode trazer para aquele caso em particular O advento da Medicina de Cuidados Paliativos e da Clínica da Dor trouxe inestimáveis contribuições para a melhoria da qualidade de vida daqueles pacientes considerados fora de possibilidade de cura Neste panorama o cirurgião ortopédico tem papel fundamental no tratamento dos implantes secundários sendo importante que compreenda que a alteração local é parte da doença sistêmica e que portanto deve ser avaliada de forma abrangente visando a melhoria da qualidade de vida da população acometida pela doença óssea metastática REFERÊNCIAS 1 Diel IJ Kauffamann M Bastert G editors Metastatic bone diseases fundamental and clinical aspects Berlin Sringer Verlag 1994 p 111 2 Sim FH Frassica FJ editors Diagnosis and management of metastatic bone disease multidisciplinary approach New York Raven 1998 p 16 3 Brown HK Healey JH Metastatic cancer to bone In DeVita VT Jr Hellman S Rosenberg AS Principles and practice of oncology 6th ed Philadelphia Lippincott Raven 2001 chap 56 4 Bohuslavizki KH Early JF Brenner W Pet imaging of osteosarcoma J Nucl Med 20034093042 5 Healey JH Brown HK Complications of bone metastases Cancer 20008812294050 6 Mirele H Metastatic diseases in long bones a proposed scoring system for diagnosis impending pathologic fractures Clin Orthop 198924925664 7 Donato J Tumores ósseos In Metástase de carcinoma Rio de Janeiro Rocca 2001 p 2116 8 Câmera RLA Metastatic ossea come segno único de um carcinoma delle prostata Minerva Urol 197123159 9 Lichtenstein L Tumores ósseos In SJM Carcinoma metastático en el esqueleto Barcelona Tallerer Gráficos 1975 p 37087 10Instituto Nacional de Câncer Ministério da Saúde TNM classificação dos tumores malignos 5a ed Rio de Janeiro Brasil 1998 11 Tong D Gillick L Hendrickson FR Cancer 1982508939 Metástase óssea Revista Brasileira de Cancerologia 2005 511 4347
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43 Metástase óssea revisão da literatura Bone metastases literature review 1 Médico Titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia Mestre em Ortopedia pela UFRJ Chefe do Serviço de Tumor do Hospital de Traumato OrtopediaINTO Médico da Seção de Tecido Ósseoconectivo HC IINCA 2 Médica Ortopedista Membro Associado da SBOT Especialista em Ortopedia Oncológica pelo INCAMS 3 Médico Titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia Médico da Seção de Tecido Ósseo conectivo HC IINCA Especialista em Ortopedia Oncológica pelo INCAMS Médico do serviço de tumor do HTOINTO 4 Médica Ortopedista Membro Associado da SBOT Membro Titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia Pediátrica 5 Chefe da Seção de Tecido Ósseo conectivo HC IINCA 6 Médico da Seção de Tecido Ósseo conectivo HC IINCA Mestre em cirurgia pela UFRJ Trabalho realizado no INCA Instituto Nacional de Câncer Endereço para correspondência Walter Meohas Av Ayrton Senna 1850 sala241 Barra da Tijuca Email wmeohasyahoocombr Walter Meohas1 Danielle Probstner2 Roberto André Torres Vasconcellos3 Ana Cristina de Sá Lopes4 José Francisco Neto Rezende5 Nelson Jabour Fiod6 Resumo Os autores sumarizam os aspectos históricos relevantes e os conceitos atuais sobre abordagem de pacientes com doença óssea metastática Eles mostram a importância da história clínica evolução e diagnóstico avaliando os estudos radiológicos cintilográficos e opções de tratamento A conclusão é que o manuseio da mestástase óssea deve levar em conta o prognóstico e a expectativa de vida Palavraschave Metástase Carcinoma Lesão óssea metastática Abstract The authors summarize the most relevant historical aspects and current concepts on approach of patient with bone metastatic disease They point out the importance of clinical issues and diagnostic evolution taking a look of radiologic and scintigrafic studies and treatment options The conclusion is that management of bone metastasis should be tailored to the patient overall prognosis and life expectancy Key words Metastasis Carcinoma Metastatic bone lesion Revisão de Literatura Metástase óssea Artigo submetido em 290604 aceito para publicação em 050105 Revista Brasileira de Cancerologia 2005 511 4347 44 Meohas W et al INTRODUÇÃO O termo metástases vem do Grego meta além stasis parar7 sendo originalmente empregado no contexto da Teoria Fisiológica Humoral vigente 400 500 anos AC segundo a qual o equilíbrio da homeostase corporal era dado pelo perfeito balanceamento entre os quatro humores orgânicos sangue bile amarela bile negra e fleuma Esta teoria fisiopatológica foi criada em analogia à Teoria dos Quatro Elementos sendo documentada por Hipócrates e posteriormente traduzida por Galeno no século 2 DC passando então à Escola Escolástica de Medicina da Idade Média1 2 Segundo a Teoria Fisiológica Humoral o organismo cozinhava o excesso ou o eliminava através dos dejetos orgânicos Caso o material não fosse completamente cozido ou eliminado era depositado apostasis ou mandado para outra parte do corpo metástases Acreditavase que o acúmulo de bile negra era responsável pelo surgimento dos tumores e que as metástases eram depósitos desta bile transportados para outra parte do organismo Estes conceitos influenciaram o meio científico até o século XIX quando importantes descobertas delinearam um novo panorama no campo da Oncologia12 As bases celulares do câncer foram reconhecidas nesta época com a demonstração do crescimento através da divisão celular por Raspail em 1826 pela descrição da estrutura celular como unidade básica da vida por Schwann e pela descoberta de Müller de que o crescimento tumoral assemelhavase ao do tecido normal1 O termo metástases com o contexto que conhecemos foi introduzido por Récamier 17741852 Entretanto cabe a Thiersch 18221895 e Waldeyer 18651921 a estrutura das bases da Teoria Mecanicista que ganhou espaço a partir do século XIX através da comprovação morfológica de êmbolos metastáticos de células epiteliais em vasos linfáticos e linfonodos De acordo com esta teoria plenamente aceita no final do século XIX as células tumorais seriam distribuídas via vasos sangüíneos e linfáticos formando colônias tumorais no local onde fossem depositadas1 Com a descoberta do microscópio tornouse possível relacionar o tumor primário com os implantes ósseos secundários inaugurando definitivamente o início da Teoria da Circulação Paget von Recklinghausen e Schmorl observaram que nem todos os ossos eram acometidos por implantes secundários com a mesma freqüência ficando claro que apenas o fluxo lentificado Revista Brasileira de Cancerologia 2005 511 4347 de sangue nos sinusóides da medula óssea e a pouca espessura da parede dos vasos não poderiam ser as únicas explicações para este fato12 Em 1889 Paget publica a Teoria do Solo e Semente onde conclui que a influência combinada das células tumorais com o meio na qual se encontram permitiriam o crescimento tumoral secundário após uma fase de latência de forma análoga às sementes cujo potencial desenvolve em solo fértil1 Em 1940 Batson comprova no meio científico a existência de uma quarta via de disseminação metastática somando o sistema venoso avalvular que se estende da base do crânio à pelve às outras três vias conhecidas sistemas Cava Porta e Pulmonar1 A metástase é portanto o resultado final de várias etapas interdependentes um processo multifacetado que inclui uma complexa interação entre o tumor e organismo hospedeiro uma seqüência de eventos que ainda hoje não foi completamente esclarecida3 Desde 1970 as pesquisas neste campo vêm sendo intensificadas sabendose atualmente da importância dos fatores quimiotáxicos e de crescimento no desenvolvimento da metástase óssea corroborando a teoria proposta por Paget em 18891 Este trabalho faz um apanhado sobre a abordagem da doença óssea metastática chamando atenção para suas particularidades tratamento e prognóstico independente do tumor primário ASPECTOS CLÍNICOS A doença óssea metastática é responsável por mais de 99 dos tumores malignos que acometem o osso e todo tumor maligno pode eventualmente produzir metástase1 Fisiologicamente a metástase é um processo ineficiente Sabese por exemplo que após injeção intravenosa experimental de células tumorais altamente metastáticas apenas 001 destas irão conseguir formar um foco tumoral3 A ineficiência deste processo se deve às várias etapas interdependentes que compõem a complexa cascata de eventos necessários ao estabelecimento do implante secundário3 O processo de disseminação metastática parece ser semelhante em todos os tipos de tumor e suas etapas relevantes são a oncogênese a angiogênese a existência de células tumorais com fenótipo invasivo e com maior velocidade de crescimento capacidade de sobrevivência à circulação sangüínea adesão da célula tumoral ao tecidoalvo extravasamento e crescimento celular na localização secundária angiogênese no foco metastático 45 Metástase óssea Revista Brasileira de Cancerologia 2005 511 4347 e bloqueio da resposta imune hospedeira3 As metástases para pulmão são mais comuns em sarcomas as metástases ósseas surgem com maior freqüência dos carcinomas de mama 49figura1 pulmão rim próstata e tireóide localizandose mais comumente nas vértebras arcos costais esqueleto axial 80 na pelve e no fêmur7 Muitas vezes a localização primária permanece desconhecida 3 chamando a atenção para a doença apenas o quadro metastático Os implantes secundários são extremamente raros distalmente em cotovelo e joelho 03 acometendo de forma preponderante mulheres acima da quarta década de vida78 Clinicamente a dor é o principal sintoma podendo ser acompanhada de aumento de volume local eou fratura patológica A lesão no entanto pode evoluir de forma assintomática e só se mostrar em vigência de fratura patológica ou do edema local muitas vezes confundido com trombose venosa9 A abordagem do paciente deve começar com o estadiamento clínico representado na classificação TNM da União Internacional Contra o Câncer UICC A metastáse óssea ou não é representada pela letra M M0 ausência e M1 presença10 O estadiamento clínico inclui testes laboratoriais como hemograma completo dosagem de eletrólitos ex sódio potássio cálcio fósforo magnésio dosagem de enzimas ex Fosfatase Alcalina Desidrogenase Lática Fosfatase Ácida dosagem de marcadores tumorais específicos ex Antígeno Carcinoembrionário Antígeno Prostático específico dosagem de Imunoglobulinas de proteínas específicas ex Bence Jones e dosagem hormonal exParatormônio3 Um criterioso estudo por imagem deve também Figura 1 metástase de tumor de mama carcinoma ductal infiltrante ser realizado iniciando com radiografia simples do local acometido procurando alterações como lesões líticas com padrão geográfico permeativo ou de roído de traça lesões osteoblásticas ou mistas É importante estar atento a possíveis reações periosteais ex espiculada laminada triângulo de Codman que por não serem freqüentes podem ser superestimadas simulando diagnóstico de tumor ósseo primário3 A Cintilografia Óssea complementa a avaliação mapeando todo o esqueleto e definindo se a lesão em questão é única ou múltipla O Tc99mMDP é o radiofármaco mais utilizado para esta finalidade O estudo por radionuclídeos foi introduzido para estadiamento por Sklaroff y Charkes em 19709 é um exame metabólico para lesões osteoblásticas com alguma repercussão por imagem fazendo diagnóstico de lesões ósseas com precocidade de até quatro meses em relação à radiografia simples7 A investigação por imagem deve seguir com estudo tomográfico local e à distância TC de tórax abdome e pelve e RNM com contraste de Gadolíneo da região acometida com a finalidade de melhor avaliar o comprometimento das partes moles ou compressão neurológica nas metástases de coluna Mais recentemente a Tomografia por Emissão de Pósitrons PET Scan vem sendo introduzida para rastreamento de metástase em alguns tipos de tumores direcionamento de biópsias e estudo diferencial entre recidiva tumoral em partes moles e fibrose O potencial clínico da PET ainda está sendo investigado para delinear claramente seu papel na abordagem do paciente oncológico4 A última etapa do estadiamento clínico das lesões ósseas metastáticas é a biópsia que pode ser feita de forma aberta cirurgicamente ou fechada por trocarte A biópsia óssea se faz necessária somente nos casos onde os exames de estadiamento não conseguiram definir a localização primária da lesão devendo sempre ser feita após a investigação por imagem para que o hematoma decorrente do trauma cirúrgico não altere o resultado da cintilografia tomografia ressonância magnética e radiografia simples TRATAMENTO LOCAL Os principais objetivos do tratamento local são alívio da dor manutenção ou restauração da função com descompressão neurológica e controle do crescimento tumoral local quando possível5 Para esta finalidade utilizase a radioterapia isolada e ou em conjunto com procedimentos cirúrgicos que devem levar em consideração o prognóstico do tumor 46 primário a expectativa de vida e o estado geral de saúde do paciente5 A radioterapia pode ser empregada com intenção paliativa a fim de suprimir o crescimento tumoral nas lesões metastáticas que não ameacem biomecanicamente a estrutura óssea isto porque induz um aumento da vascularização na periferia do tumor que enfraquece o osso adjacente a este aumentando o risco de fratura espontânea5As doses usadas no tratamento paliativo vão de 2000 a 4000 cGy em doses fracionadas800cGy nos dias 0721 ou 2000 em 7 dias ou 3000 em 2 semanas ou 4000 em 4 semanas a analgesia independe do fracionamento e sim da dose11 Nos pacientes sem condições de cirurgia a radioterapia é usada com objetivo antiálgico na tentativa de melhorar a qualidade de vida11 A radioterapia é ainda o principal método adjuvante no tratamento cirúrgico uma vez que promove o controle tumoral nas áreas com implantes pela manipulação na cirurgia mantendo a integridade estrutural e prevenindo novas fraturas ao longo do osso manuseado5 O tratamento cirúrgico pode ser empregado nas fraturas patológicas iminentes ou naquelas já estabelecidas A indicação para cirurgia é controversa variando de acordo com a experiência de cada centro especializado em oncologia5 São indicações cirúrgicas gerais de maior aceitação fratura em ossos que sustentam carga onde a expectativa de vida é maior ou igual a 1 mês fratura em ossos que não sustentam carga com expectativa de vida maior ou igual a 3 meses estado geral de saúde adequado para intervenção cirúrgica estoque ósseo remanescente que suporte implante ortopédico e se o procedimento traz benefícios para o paciente no sentido de permitir sua mobilização e facilitar seus cuidados gerais5 A maioria dos serviços utiliza ainda o escore desenvolvido por Mirels quadro 1 mesclado às próprias observações clínicas na polêmica indicação cirúrgica das fraturas patológicas iminentes6 Este escore para cirurgia deve ser acima de oito Com relação às indicações de tratamento cirúrgico para descompressão de elementos neurais e estabilização biomecânica da coluna vertebral a maioria dos autores concorda com intervenções nos seguintes casos 1 mielopatia 2 obstrução óssea do canal vertebral produzindo compressão tecal 3 instabilidade vertebral com dor mecânica renitente 4 fraturaluxação da coluna 5 radiculopatia com sintomas progressivos e incontroláveis 6 crescimento tumoral não responsivo à radioterapia 7 expansão direta de tumor de lesões primárias para a vértebra5 Analisandose com critério a peculiaridade de cada caso podese utilizar uma gama extensa de soluções ortopédicas desde a confecção sob medida de endopróteses diafisárias e articulares rígidas ou não placas parafusos até hastes intramedulares bloqueadas ou nãocolocadas a foco aberto ou fechado O cimento ósseo polimetil metacrilato vem sendo empregado com sucesso como método adjuvante para aumentar a estabilidade obtida com a fixação interna e para preenchimento de defeitos causados pela curetagem intra lesional do foco Em alguns serviços a crioterapia também é usada como método adjuvante no controle de lesões quimio e radio resistentes5 Nos tumores hipervascularizados angiografia e embolização podem ser utilizadas de forma neoadjuvante com o objetivo de reduzir o sangramento intra operatório Imobilizadores e amputação ainda têm espaço no tratamento local da doença óssea metastática O primeiro pode ser empregado quando a doença local é extensa e a performance status PS crítica isto é naqueles pacientes tidos como préterminais enquanto a amputação tem sua utilidade nos casos de complicações relacionadas ao tumor ou ao tratamento ex ulceração sangramento e lesões infectadas na dor intratável e na maioria dos casos de acrometástases5 figura 2 O prognóstico das lesões ósseas metastáticas está relacionado à resposta clínica à doença primária ao número de implantes no esqueleto e ao tipo Pontos Variáveis 1 2 3 Local Membros superiores Membros inferiores Região peritrocantérica Dor Leve Moderada Funcional Lesão Blástica Mista Lítica Tamanho 13 13 a 12 23 Quadro 1 Quadro 1 Quadro 1 Quadro 1 Quadro 1 Escore para indicação cirúrgica das fraturas patológicas iminentes Fonte Mirels 6 Meohas W et al Revista Brasileira de Cancerologia 2005 511 4347 47 Figura 2 Figura 2 Figura 2 Figura 2 Figura 2 acrometástase de tumor de pulmão carcinoma epidermóide histopatológico do tumor Certos tipos de tumor como o Carcinoma Renal Carcinoma de Mama e Mieloma Múltiplo tem maior capacidade de consolidação enquanto que neoplasias como Melanoma Carcinoma de Pulmão e Carcinoma Colo Retal raramente consolidam quando fraturados5 CONCLUSÃO As metástases para o tecido ósseo usualmente são oriundas de carcinomas que têm seu controle adequado quando o tratamento da lesão primária é eficaz A combinação apropriada de cirurgia terapia sistêmica e radioterapia promove o controle da dor e preserva a função nos pacientes com implante ósseo secundário A abordagem da doença óssea metastática é multidisciplinar e deve ser adequada ao contexto geral do paciente levando em consideração fatores relevantes como performance status PS sobrevida e os reais benefícios que o tratamento proposto pode trazer para aquele caso em particular O advento da Medicina de Cuidados Paliativos e da Clínica da Dor trouxe inestimáveis contribuições para a melhoria da qualidade de vida daqueles pacientes considerados fora de possibilidade de cura Neste panorama o cirurgião ortopédico tem papel fundamental no tratamento dos implantes secundários sendo importante que compreenda que a alteração local é parte da doença sistêmica e que portanto deve ser avaliada de forma abrangente visando a melhoria da qualidade de vida da população acometida pela doença óssea metastática REFERÊNCIAS 1 Diel IJ Kauffamann M Bastert G editors Metastatic bone diseases fundamental and clinical aspects Berlin Sringer Verlag 1994 p 111 2 Sim FH Frassica FJ editors Diagnosis and management of metastatic bone disease multidisciplinary approach New 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