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Textos Básicos Filosofia e Ciências Humanas Introdução à Filosofia Paul o Ghiral dell i Jr. Manole Para os que gostam da filosofia viva TEXTOS BÁSICOS Filosofia e Ciências Humanas INTRODUÇÃO À FILOSOFIA Paulo Ghiraldelli Jr. Manole Prefácio Há uma historieta que conta que um francês, um inglês e um alemão foram encarregados de um estudo sobre o camelo. Então, o francês foi ao zoológico, entrevistou o guarda, jogou comida para o camelo, cutucou o animal com seu guarda-chuva e, chegando em casa, mandou para seu jornal um artigo curto mas repleto de afirmações picantes e espirituosas sobre o camelo. O inglês foi até o Oriente, instalou-se confortavelmente no deserto com inúmeros instrumentos de pesquisa e, depois de três anos, trouxe um livro grosso, cheio de fatos documentais sobre o camelo que, embora não tivesse nenhuma conclusão ou ordem, era um volume de grande valor documental. O alemão, com desprezo pela frivolidade do francês e pela falta de concatenação de conceitos do inglês, não foi a lugar algum. Ficou no seu escritório e passou a redigir uma obra, prevista para 12 volumes, com o título: A ideia de camelo deduzida da concepção do Eu. O que está acima foi publicado em vários lugares. Hoje em dia, mais um personagem poderia ser colocado na historieta: o norte-americano. Se solicitado a dissertar sobre o camelo ele não faria XII INTRODUÇÃO À FILOSOFIA nenhuma das coisas acima apontadas; ele simplesmente pararia e perguntaria: “o que ganhamos sabendo algo mais sobre o camelo?” Há os que julgam que a mais autêntica maneira de filosofar é a do alemão. Mas a filosofia, atualmente, parece estar querendo se fixar em uma posição mais ativa. Antes dos filósofos saírem por aí procurando saber coisas, eles estão tendentes a perguntar sobre o quanto há de vantagem em saber tais coisas ou não. O espírito deste livro é o espírito da atualidade. Trata-se de uma introdução à filosofia que é, na verdade, um tipo de curso introdutório de filosofia que, antes de tudo, partiu de uma pergunta básica: o que é vantajoso saber em filosofia, atualmente, para podermos conversar, ler e fazer mais e melhor, enfim, tentarmos pegar uma via mais produtiva para construirmos um mundo mais feliz? Paulo Ghiraldelli Jr. setembro de 2002 3 S crates e os sofistas Os chamados “filósofos pré-socráticos” discutem questões de ordem cosmológica (teoria do cosmo, do mundo) e ontológica (teoria do ser). Sócrates e os sofistas ampliam a conversação da filosofia para o campo da ética, da moral e da política, uma vez que propõem questões novas — perguntas a respeito do homem. Os “pré-socráticos” cosmológicos falam sobre a physis (que, como foi dito, grosseiramente pode-se traduzir por “natureza”), o princípio criador responsável pela geração de todas as coisas. Os pré-socráticos que fundam a ontologia discursam sobre o “ser”, na medida em que deslocam a discussão filosófica para o campo da linguagem e da lógica. Os sofistas, diferentemente, discorrem sobre tais assuntos mas, em geral, preferem falar aos gregos sobre a “arte do bem viver”, ou do “saber viver”, que inclui a arte de argumentar, ou de saber argumentar — a retórica. Quanto à arte de saber viver, Trasímaco, por exemplo, a respeito do campo social, insiste que as disputas morais não são relevantes, exceto quando podem ser vistas como lutas pelo poder. Quanto à retórica, Górgias, por exemplo, escreve que: 1) “nada há”; 2) “se houvesse algo, ninguém poderia sabê-lo”; e 3) “se alguém soubesse, não poderia comunicá-lo”. Esse tipo de doutrina incomoda Sócrates e Platão. Eles a tomam como frases que desviam os indivíduos de um caminho produtivo. Para eles, não são frases em favor do objeto da filosofia, como este se instaura na investigação dos pré-socráticos. Por influência de Platão, portanto, a história da filosofia consagra o termo “sofisma” e o verbo “sofismar” como palavras relacionadas com o trabalho da argumentação vazia. Todavia, é engano tomar os sofistas como simplesmente “professores ambulantes” e “falsos filósofos”. Protágoras (490-422 a.C.) cria uma situação que até hoje representa um problema sério em filosofia ao dizer que “o homem é a medida de todas as coisas”. Esta frase simples incomoda muitos filósofos e talvez hoje, mais do que em todos os vinte e cinco séculos passados, ela seja a pedra no sapato de todos os que se imaginam alinhados à Filosofia, com a inicial em maiúscula – trata-se do problema que alguns filósofos denominam de “subjetivismo” e “relativismo”. Isto é, se as coisas são mensuradas mediante uma régua que é o homem, então elas não têm um padrão de medida de si mesmas, mas a medida do homem – isto implicaria um relativismo que iria contra o próprio espírito da Filosofia, disseram e dizem vários bons pensadores. Sócrates e Platão, cada um ao seu modo, se indispõem contra esse tipo de relativismo. Sócrates, em especial, cria um modo particular de investigação que, por um lado, se é o da conversação, como o dos sofistas, por outro, não raro, é esclarecedoramente decepcionante, uma vez que não traz ao final uma resposta definitiva. Sócrates, por si mesmo, não discute se tal forma de agir consiste em um método de filosofia. Posteriormente, historiadores da filosofia chamariam tal método de elenkhos – um modo de argumentar que implica a possibilidade da refutação, levando o inquirido a tomar ciência de que ele não sabia o que pensava saber. O próprio Sócrates define-se como aquele que nada sabe. Sócrates não tem nenhum livro ou aforismos. A seu respeito sabe-se o que é dito por seus discípulos e, em especial, por Platão. Sua vida é a da peregrinação por Atenas, junto com seus discípulos ou sozinho, interrogando as pessoas. Sócrates filosofa por meio de perguntas abrangentes, do tipo “O que é a coragem?”, “O que é a amizade?”, “O que é o amor?” etc., e muitos dizem que seu método é a “maiêutica”, um modo de, ao questionar os outros, tirar deles a resposta correta – uma forma de “parir” as ideias. Sendo a mãe de Sócrates parteira, a “maiêutica” aparece em vários manuais de filosofia definida em analogia ao trabalho de parto; ou seja, Sócrates é aquele que faz vir à luz a verdade dos conceitos. Por conta disso, outros manuais de história da filosofia dizem que Sócrates é o autêntico praticante da “análise conceitual”. Todavia, é sempre oportuno enfatizar que Sócrates não arranca nada de muito concreto de ninguém, muito menos traz à luz uma definição qualquer para explicitar um conceito. Ao contrário, nos diálogos de Platão, não raro ele mais deixa as pessoas em dúvida sobre possuir ou não um conhecimento em matéria de moral (entendendo próximo ao estado em que ele próprio se encontrava) do que qualquer outra coisa. Não se quer dizer com isso que Sócrates não mostre uma moral, sua própria determinação de acreditar no que toma como certo para si mesmo. Não, suas crenças o guiam e Sócrates é sincero para com elas. Mas, segundo a própria doutrina socrática, ter crenças sólidas não necessariamente leva alguém a poder dizer que possui um saber sobre a moral, isto é, conceitos e, então, definições positivas e generalizáveis – um conhecimento verdadeiro em ética (a teoria da moral). O método de Sócrates, o elenkhos, é utilizado da seguinte forma. Sócrates pergunta, por exemplo, o que é uma determinada qualidade moral – a virtude ou a justiça etc. Incita seu interlocutor a dar uma definição da qualidade moral em questão. Em geral, era-lhe fornecida uma série de exemplos. Ou seja, o interlocutor mais dizia do corajoso ou do justo do que da coragem ou da justiça. Sócrates, então, rejeita os exemplos, explicando que não são definições, mas casos particulares. Quando o interlocutor consegue chegar a algo que se aproxima de uma definição, Sócrates aplica-lhe un teste mostrando que tal definição contrasta com uma série de outros enunciados que o próprio interlocutor referiu e que lhe são caros. Ou se fica com os primeiros ou se fica com a segunda. Em qual, de fato, o interlocutor acredita? Qual pode se sustentar? Toma-se Aristóteles para dizer que o elenkhos se divide em ironia e maiêutica. A refutação seria a ironia, e depois, no final da argumentação, o interlocutor seria levado a concluir pela verdade. Os intérpretes mais atuais de Sócrates preferem deixar de lado a ideia de ironia e, principalmente, de maiêutica, tomando o elenkhos como método de refutação e Sócrates como quem leva a sério a ideia de que o mais sábio é aquele que “sabe que nada sabe”. O que Sócrates pretende é mostrar que os atenienses caem em contradições. Ele também não tem uma resposta para o que pergunta, e então ambos, Sócrates e o interlocutor, devem admitir que o que sabem sobre o perguntado é tão-somente uma coisa: nada sabem. Isso leva a uma situação que, em grego, recebe o nome de aporia, ou seja, uma situação difícil, um ponto que parece não poder ser ultrapassado, um problema sem solução – o que corresponde, no plano do indivíduo, a um estado de perplexidade. A maneira de Sócrates filosofar não agrada aos poderosos. Os que têm poder político, mesmo em uma democracia, muito raramente apreciam uma argumentação que os leva, no final, a admitir que estão caindo em contradições. Assim, aproveitando-se das diferenças de valores entre as cidades de Esparta e Atenas, alguns atenienses tramam contra Sócrates, acusando-o de defender valores de Esparta, falsas doutrinas, ofensa aos deuses, corrupção da juventude e coisas do gênero. Sócrates vai a julgamento e sua condenação se dá por votação, 280 a 220. A sentença não soa bem à opinião pública, uma vez que Sócrates é um cidadão eminente, e então as autoridades atenienses relaxam a sua guarda de modo que ele possa fugir da prisão. Mas Sócrates insiste com seus discípulos que sua fuga não contesta os juízes, mas sim as leis da cidade – a ligação umbilical que os gregos possuem com a polis está na base de um dos principais motivos para que Sócrates se mantenha obediente. Assim, cumpre sua pena, a de tomar veneno e esperar a morte, que ocorre em meio aos seus discípulos; importante lembrar que Sócrates permanece conversando e ensinando até os seus últimos momentos.
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Textos Básicos Filosofia e Ciências Humanas Introdução à Filosofia Paul o Ghiral dell i Jr. Manole Para os que gostam da filosofia viva TEXTOS BÁSICOS Filosofia e Ciências Humanas INTRODUÇÃO À FILOSOFIA Paulo Ghiraldelli Jr. Manole Prefácio Há uma historieta que conta que um francês, um inglês e um alemão foram encarregados de um estudo sobre o camelo. Então, o francês foi ao zoológico, entrevistou o guarda, jogou comida para o camelo, cutucou o animal com seu guarda-chuva e, chegando em casa, mandou para seu jornal um artigo curto mas repleto de afirmações picantes e espirituosas sobre o camelo. O inglês foi até o Oriente, instalou-se confortavelmente no deserto com inúmeros instrumentos de pesquisa e, depois de três anos, trouxe um livro grosso, cheio de fatos documentais sobre o camelo que, embora não tivesse nenhuma conclusão ou ordem, era um volume de grande valor documental. O alemão, com desprezo pela frivolidade do francês e pela falta de concatenação de conceitos do inglês, não foi a lugar algum. Ficou no seu escritório e passou a redigir uma obra, prevista para 12 volumes, com o título: A ideia de camelo deduzida da concepção do Eu. O que está acima foi publicado em vários lugares. Hoje em dia, mais um personagem poderia ser colocado na historieta: o norte-americano. Se solicitado a dissertar sobre o camelo ele não faria XII INTRODUÇÃO À FILOSOFIA nenhuma das coisas acima apontadas; ele simplesmente pararia e perguntaria: “o que ganhamos sabendo algo mais sobre o camelo?” Há os que julgam que a mais autêntica maneira de filosofar é a do alemão. Mas a filosofia, atualmente, parece estar querendo se fixar em uma posição mais ativa. Antes dos filósofos saírem por aí procurando saber coisas, eles estão tendentes a perguntar sobre o quanto há de vantagem em saber tais coisas ou não. O espírito deste livro é o espírito da atualidade. Trata-se de uma introdução à filosofia que é, na verdade, um tipo de curso introdutório de filosofia que, antes de tudo, partiu de uma pergunta básica: o que é vantajoso saber em filosofia, atualmente, para podermos conversar, ler e fazer mais e melhor, enfim, tentarmos pegar uma via mais produtiva para construirmos um mundo mais feliz? Paulo Ghiraldelli Jr. setembro de 2002 3 S crates e os sofistas Os chamados “filósofos pré-socráticos” discutem questões de ordem cosmológica (teoria do cosmo, do mundo) e ontológica (teoria do ser). Sócrates e os sofistas ampliam a conversação da filosofia para o campo da ética, da moral e da política, uma vez que propõem questões novas — perguntas a respeito do homem. Os “pré-socráticos” cosmológicos falam sobre a physis (que, como foi dito, grosseiramente pode-se traduzir por “natureza”), o princípio criador responsável pela geração de todas as coisas. Os pré-socráticos que fundam a ontologia discursam sobre o “ser”, na medida em que deslocam a discussão filosófica para o campo da linguagem e da lógica. Os sofistas, diferentemente, discorrem sobre tais assuntos mas, em geral, preferem falar aos gregos sobre a “arte do bem viver”, ou do “saber viver”, que inclui a arte de argumentar, ou de saber argumentar — a retórica. Quanto à arte de saber viver, Trasímaco, por exemplo, a respeito do campo social, insiste que as disputas morais não são relevantes, exceto quando podem ser vistas como lutas pelo poder. Quanto à retórica, Górgias, por exemplo, escreve que: 1) “nada há”; 2) “se houvesse algo, ninguém poderia sabê-lo”; e 3) “se alguém soubesse, não poderia comunicá-lo”. Esse tipo de doutrina incomoda Sócrates e Platão. Eles a tomam como frases que desviam os indivíduos de um caminho produtivo. Para eles, não são frases em favor do objeto da filosofia, como este se instaura na investigação dos pré-socráticos. Por influência de Platão, portanto, a história da filosofia consagra o termo “sofisma” e o verbo “sofismar” como palavras relacionadas com o trabalho da argumentação vazia. Todavia, é engano tomar os sofistas como simplesmente “professores ambulantes” e “falsos filósofos”. Protágoras (490-422 a.C.) cria uma situação que até hoje representa um problema sério em filosofia ao dizer que “o homem é a medida de todas as coisas”. Esta frase simples incomoda muitos filósofos e talvez hoje, mais do que em todos os vinte e cinco séculos passados, ela seja a pedra no sapato de todos os que se imaginam alinhados à Filosofia, com a inicial em maiúscula – trata-se do problema que alguns filósofos denominam de “subjetivismo” e “relativismo”. Isto é, se as coisas são mensuradas mediante uma régua que é o homem, então elas não têm um padrão de medida de si mesmas, mas a medida do homem – isto implicaria um relativismo que iria contra o próprio espírito da Filosofia, disseram e dizem vários bons pensadores. Sócrates e Platão, cada um ao seu modo, se indispõem contra esse tipo de relativismo. Sócrates, em especial, cria um modo particular de investigação que, por um lado, se é o da conversação, como o dos sofistas, por outro, não raro, é esclarecedoramente decepcionante, uma vez que não traz ao final uma resposta definitiva. Sócrates, por si mesmo, não discute se tal forma de agir consiste em um método de filosofia. Posteriormente, historiadores da filosofia chamariam tal método de elenkhos – um modo de argumentar que implica a possibilidade da refutação, levando o inquirido a tomar ciência de que ele não sabia o que pensava saber. O próprio Sócrates define-se como aquele que nada sabe. Sócrates não tem nenhum livro ou aforismos. A seu respeito sabe-se o que é dito por seus discípulos e, em especial, por Platão. Sua vida é a da peregrinação por Atenas, junto com seus discípulos ou sozinho, interrogando as pessoas. Sócrates filosofa por meio de perguntas abrangentes, do tipo “O que é a coragem?”, “O que é a amizade?”, “O que é o amor?” etc., e muitos dizem que seu método é a “maiêutica”, um modo de, ao questionar os outros, tirar deles a resposta correta – uma forma de “parir” as ideias. Sendo a mãe de Sócrates parteira, a “maiêutica” aparece em vários manuais de filosofia definida em analogia ao trabalho de parto; ou seja, Sócrates é aquele que faz vir à luz a verdade dos conceitos. Por conta disso, outros manuais de história da filosofia dizem que Sócrates é o autêntico praticante da “análise conceitual”. Todavia, é sempre oportuno enfatizar que Sócrates não arranca nada de muito concreto de ninguém, muito menos traz à luz uma definição qualquer para explicitar um conceito. Ao contrário, nos diálogos de Platão, não raro ele mais deixa as pessoas em dúvida sobre possuir ou não um conhecimento em matéria de moral (entendendo próximo ao estado em que ele próprio se encontrava) do que qualquer outra coisa. Não se quer dizer com isso que Sócrates não mostre uma moral, sua própria determinação de acreditar no que toma como certo para si mesmo. Não, suas crenças o guiam e Sócrates é sincero para com elas. Mas, segundo a própria doutrina socrática, ter crenças sólidas não necessariamente leva alguém a poder dizer que possui um saber sobre a moral, isto é, conceitos e, então, definições positivas e generalizáveis – um conhecimento verdadeiro em ética (a teoria da moral). O método de Sócrates, o elenkhos, é utilizado da seguinte forma. Sócrates pergunta, por exemplo, o que é uma determinada qualidade moral – a virtude ou a justiça etc. Incita seu interlocutor a dar uma definição da qualidade moral em questão. Em geral, era-lhe fornecida uma série de exemplos. Ou seja, o interlocutor mais dizia do corajoso ou do justo do que da coragem ou da justiça. Sócrates, então, rejeita os exemplos, explicando que não são definições, mas casos particulares. Quando o interlocutor consegue chegar a algo que se aproxima de uma definição, Sócrates aplica-lhe un teste mostrando que tal definição contrasta com uma série de outros enunciados que o próprio interlocutor referiu e que lhe são caros. Ou se fica com os primeiros ou se fica com a segunda. Em qual, de fato, o interlocutor acredita? Qual pode se sustentar? Toma-se Aristóteles para dizer que o elenkhos se divide em ironia e maiêutica. A refutação seria a ironia, e depois, no final da argumentação, o interlocutor seria levado a concluir pela verdade. Os intérpretes mais atuais de Sócrates preferem deixar de lado a ideia de ironia e, principalmente, de maiêutica, tomando o elenkhos como método de refutação e Sócrates como quem leva a sério a ideia de que o mais sábio é aquele que “sabe que nada sabe”. O que Sócrates pretende é mostrar que os atenienses caem em contradições. Ele também não tem uma resposta para o que pergunta, e então ambos, Sócrates e o interlocutor, devem admitir que o que sabem sobre o perguntado é tão-somente uma coisa: nada sabem. Isso leva a uma situação que, em grego, recebe o nome de aporia, ou seja, uma situação difícil, um ponto que parece não poder ser ultrapassado, um problema sem solução – o que corresponde, no plano do indivíduo, a um estado de perplexidade. A maneira de Sócrates filosofar não agrada aos poderosos. Os que têm poder político, mesmo em uma democracia, muito raramente apreciam uma argumentação que os leva, no final, a admitir que estão caindo em contradições. Assim, aproveitando-se das diferenças de valores entre as cidades de Esparta e Atenas, alguns atenienses tramam contra Sócrates, acusando-o de defender valores de Esparta, falsas doutrinas, ofensa aos deuses, corrupção da juventude e coisas do gênero. Sócrates vai a julgamento e sua condenação se dá por votação, 280 a 220. A sentença não soa bem à opinião pública, uma vez que Sócrates é um cidadão eminente, e então as autoridades atenienses relaxam a sua guarda de modo que ele possa fugir da prisão. Mas Sócrates insiste com seus discípulos que sua fuga não contesta os juízes, mas sim as leis da cidade – a ligação umbilical que os gregos possuem com a polis está na base de um dos principais motivos para que Sócrates se mantenha obediente. Assim, cumpre sua pena, a de tomar veneno e esperar a morte, que ocorre em meio aos seus discípulos; importante lembrar que Sócrates permanece conversando e ensinando até os seus últimos momentos.