Texto de pré-visualização
Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 326 LEITURA CORDEL E FORMAÇÃO DE LEITORES EXPERIÊNCIAS EM UM CLUBE DE LEITURA ONLINE SILVA Jaqueline Avelino da1 SILVA Marcelo Medeiros da2 RESUMO Este artigo objetiva compreender de que forma as experiências de leitura de cordel em um clube online contribuíram para a formação leitora de estudantes de uma escola municipal localizada na zona rural de Monteiro Paraíba no período em que atuamos como bolsistas do Programa de Residência Pedagógica Para tanto além de notas de diário de campo valemonos de um questionário aplicado aos alunos que participaram do clube de leitura e à professora de Língua Portuguesa da turma e supervisora da intervenção Metodologicamente esta pesquisa consiste em um estudo de caso de cunho qualitativo e ancorase teoricamente nas discussões de Candido 2004 Marinho e Pinheiro 2012 e Medeiros e Pinheiro 2014 que nos serviram de suporte para pensarmos o lugar da Literatura e do cordel na formação de leitores bem como nos pressupostos de Cosson 2014 Luzia de Maria 2016 e Souza 2018 que por sua vez nos foram imprescindíveis na reflexão sobre os clubes de leitura A análise e os resultados obtidos nos permitiram identificar que o clube de leitura a seleção dos cordéis a linguagem deles e as temáticas trabalhadas contribuíram para que os discentes envolvidos vivenciassem a experiência do clube de forma ativa isto é lendo comentando compartilhando opiniões e se posicionando de forma crítica frente aos textos e com isso desejassem continuar presentes a cada encontro do clube PALAVRASCHAVE Literatura de Cordel clube de leitura formação de leitores ensino remoto READING CORDEL AND FORMATION OF READERS AN EXPERIENCE AT AN ONLINE CLUB ABSTRACT This paper aims to understand how cordel reading experiences at an online club contributed to the reading formation of students from a Town School placed at the countryside of 1 Graduada em Letras Língua Portuguesa pela Universidade Estadual da Paraíba CCHE Email jaquelineasilva262gmailcom 2 Professor doutor da Universidade Estadual da Paraíba CCHE Email marcelomedeirossilvayahoocombr Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 327 Monteiro city Paraíba at time we were scholarship of the Pedagogical Residence Program For this purpose besides the notes of a field diary we have relied on a questionary which was applied with the students who participated of the reading club and with their Portuguese Language Teacher who supervisioned our intervention Methodologically this research has a qualitative slant and it has been supported theorically on the discussions by Candido 2004 Marinho and Pinheiro 2012 and Medeiros and Pinheiro 2014 who supported us to think about the place of the Literature and the Cordel in the formation of readers as well as on the pressuposts by Cosson 2014 Luzia of Maria 2016 and Souza 2018 who were in their turn indispensable into the reflection about the reading clubs The analysis and the results has gotten allowed us to indentify that the reading club which was observed by us even in a short period of time it was a relevant action in the reading formation process of the students In this way the selection of cordels their language and the worked thematics contributed for the students has to lived the experience of the club in a active way in another words reading commenting sharing opinions and placing theirselves in critical way before the texts and with that for they to wish to continue presented every single gathering of the club KEYWORDS Cordel Literature reading club formation of readers remote teaching INTRODUÇÃO A leitura constitui uma das atividades mais essenciais à vida humana porque o ato de ler nos forma como sujeitos de uma sociedade Além disso essa prática nos transforma uma vez que amplia os nossos conhecimentos desenvolve a capacidade de criticidade e estimula a nossa imaginação criativa Por isso as ações de promoção à leitura são imprescindíveis à formação humana e encontram na escola a sua instância de fomento mais importante razão por que as práticas de leitura ocorridas no interior dessa instituição têm sido escopo de várias pesquisas Na esteira de tais trabalhos o presente artigo se volta para a descrição e a reflexão de ações didáticas realizadas em um subprojeto de Língua Portuguesa do Programa Residência Pedagógica da Universidade Estadual da Paraíba campus VI desenvolvido em MonteiroPB entre os anos de 2020 e 2021 em uma escola pública do referido município Tais ações estiveram voltadas para a promoção da leitura com alunos do ensino fundamental e tomaram a forma de um clube de leitura cujos encontros aconteciam semanalmente entre novembro de 2020 e agosto de 2021 e dos quais participaram dezesseis estudantes com idade entre 12 doze e 19 dezenove anos que cursavam o ensino fundamental II Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 328 Tendo em vista a impossibilidade de atividades presenciais por causa do contexto pandêmico vivido desde 2020 a criação de um clube de leitura online foi um espaço importante para a realização das intervenções didáticas mas sobretudo para a promoção de ações voltadas às atividades de leitura a partir de escolhas metodologias e objetivos distintos dos que comumente marcam as práticas de leitura no interior da sala de aula Assim ao refletirmos sobre o quanto o trabalho e o fomento às atividades de leitura no contexto das salas de aula pelo Brasil são em muitas situações deixados equivocadamente em um segundo plano priorizamos para que fossem a leitura e os textos literários em especial os cordéis o centro das nossas ações dentro do Programa de Residência Pedagógica no âmbito do qual se deu a experiência que iremos relatar mais à frente Pensando nessa priorização do trabalho com o texto a nossa primeira atitude foi o cuidado na seleção do que convinha ser lido ao longo do clube Assim era importante que as leituras realizadas de alguma forma levassem em consideração as experiências de vida e a realidade das pessoas envolvidas na ação Foi por este motivo que o cordel se tornou o gênero escolhido para compor o repertório de objetos de leitura de nossas ações didáticas uma vez que o gênero em questão nos possibilitaria uma proximidade com o universo de vivências dos alunos que participariam do clube de leitura tendo em vista que o cordel é uma manifestação cultural nordestina que em parte circula no município onde vivem os alunos e desfruta de certo prestígio dentre os bens símbolicos a que esses estudantes têm acesso Além disso a escolha por tal gênero deveuse também ao fato de que quando embasadas a partir da Literatura de cordel as atividades de leitura ampliam as possibilidades de ensino na medida em que proporcionam um ambiente favorável para o deleite e ao mesmo tempo para a criação e a construção de um imaginário a partir da leitura de folhetos de cordel já que nestes podemos encontrar uma variedade surpreendente de temas situações humanas tragédias comédias casos inusitados relatos históricos que podem ser escopo em sala de aula de situações diversas de leitura de encantamento o que certamente favorecerá aproximação entre texto e leitor O presente artigo está organizado da seguinte forma após esta introdução na seção 2 trazemos uma discussão teórica sobre as contribuições da literatura de cordel na formação de leitores e sobre os clubes de leitura como metodologia eficaz na formação de leitores de cordel A seção 3 está dividida em duas partes na primeira delas analisamos as respostas de um questionário que foi aplicado aos participantes do clube de leitura e que buscava compreender de acordo com a perspectiva dos discentes a importância das ações de leitura realizadas no Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 329 clube online na segunda parte tomando como base as notas dos diários de campo descrevemos as ações de leitura desenvolvidas em um dos encontros do clube Na seção 4 chegamos às considerações finais do artigo 1 Revisão da literatura 11 Cordel e leitura contribuição para a formação de leitores Considerando o histórico de acesso desigual à educação em nosso país não é de todo descabida a afirmação de que nos lugares mais recônditos onde o Estado não se pôde fazer presente plenamente garantindo acesso à educação de qualidade o cordel educou parte de nosso país Quando não educou no sentido formal do termo preencheu em muitos dos cidadãos brasileiros a necessidade de fantasia e de desejo como podemos perceber na leitura do poema Descoberta da Literatura de João Cabral de Melo Neto que ilustra a importância cultural do cordel em nosso país em especial na região Nordeste No diaadia do engenho toda a semana durante cochichavamme em segredo saiu um novo romance E da feira do domingo me traziam conspirantes para que os lesse e explicasse um romance de barbante Sentados na roda morta de um carro de boi sem jante ouviam o folheto guenzo a seu leitor semelhante com as peripécias de espanto preditas pelos feirantes Embora as coisas contadas e todo o mirabolante em nada ou pouco variassem nos crimes no amor nos lances e soassem como sabidas de outros folhetos migrantes a tensão era tão densa subia tão alarmante que o leitor que lia aquilo como puro altofalante e sem querer imantara todos ali circunstantes receava que confundissem o de perto com o distante o ali com o espaço mágico seu franzino com o gigante e que o acabassem tomando pelo autor imaginante ou tivesse que afrontar as brabezas do brigante E acabaria não fossem contar tudo à Casagrande na moita morta do engenho um filhoengenho perante cassacos do eito e de tudo se estava dando ao desplante de ler letra analfabeta de curumba no caçanje próprio dos cegos de feira muitas vezes meliantes Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 330 O poema acima retrata as memórias de uma experiência de leitura com a literatura de cordel O eulírico filho de dono do engenho possui o domínio da leitura e narra a experiência em que trabalhadores do engenho trazem da feira de domingo romances de barbantes folhetos de cordel e o pedem para ler e explicar as histórias a eles Assim sentados na roda morta de um carro de boi sem jante os trabalhadores do engenho vivenciam uma experiência em uma roda de leitura ouvem atentos as narrativas de cordel que se tornam nesse contexto decisivas em suas vidas visto que é no ouvir que estes trabalhadores se tornam leitores Dessa forma a plateia iletrada sentada naquela roda de carro de boi vivencia o prazer de participar de uma roda de leitura compartilhada onde o ato de ler é uma resposta a uma necessidade a de fabulação Nesse caso sendo fabulação a literatura de cordel assim como as demais formas de literatura acaba se configurando como um desejo de toda e qualquer cultura porque o contar e o ouvir histórias é algo que está intrinsecamente ligado ao ser humano O poema de João Cabral de Melo Neto atualiza pois na esteira do pensamento de Antonio Candido acerca da função social da literatura a ideia de ser esta um direito humano porque se configura como uma necessidade humana tendo em vista que ninguém pode passar vinte e quatro horas sem mergulhar no universo da ficção e da poesia CANDIDO 2004 p 175 e também porque a literatura é o meio para o qual projetamos nossos desejos sonhos raivas frustações É o ímã que atrai as nossas descargas emocionais Por isso é fator indispensável de humanização e sendo assim confirma no homem a sua humanidade inclusive porque atua em grande parte no subconsciente e no inconsciente CANDIDO 2004 p 175 Logo a literatura não é uma experiência inofensiva Ela atua na formação da personalidade sem corromper ou edificar visto que trazendo livremente em si o que chamamos o bem e o que chamamos o mal humaniza em sentido profundo porque faz viver CANDIDO 2004 p 176 Nesse sentido o eulírico do poema Descoberta da Literatura não é apenas compreendido como um eu que compartilha de forma biográfica uma situação em que lia romances de cordel para os trabalhadores mas o poema transmite ao leitor as memórias de um eu que reflete acerca de uma experiência literária em que a literatura de cordel como elemento cultural se instala em seu imaginário Dessa forma a palavra descoberta que dá nome ao poema não evoca apenas o conhecimento daquilo que outrora era tido como segredo e não podia chegar aos ouvidos da CasaGrande mas representa sobretudo uma experiência literária profunda e significativa tanto para o eulírico como para os trabalhadores que ouvem atentos as narrativas de cordel MARTINS 2018 Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 331 Assim tendo em vista a importância histórica do cordel na formação de muitos leitores sobretudo na região Nordeste considerando as experiências humanas que os folhetos de barbantes trazem esses são importantes para a formação humana dos sujeitos e por isso devem fazer parte dos materiais de leitura para as práticas que ocorrem no interior da escola uma vez que conforme afirma Gomes 2021 p 8 O trabalho com a leitura ligada a esse tipo de produção artística oferece mais oportunidade de observar e compreender o mundo à sua volta o que possibilita ao aluno um ganho maior de autonomia de outras possibilidades de aquisição do conhecimento Em consonância com essa afirmação Pereira 2015 lembra que No cordel os fatos narrados são acontecimentos presenciados ou conhecidos pelos escritores e pelo público Se outrora versavam geralmente sobre façanhas extraordinárias de vaqueiros de conversas entre animais histórias de valentões fazendeiros beatos cangaceiros matutos astuciosos enfim um conjunto de personagens que lembrava pessoas e práticas existentes no cotidiano da sociedade no sertão nordestino na atualidade não há limites para temas os mais diversos assuntos viram poesia na pena do poeta popular PEREIRA 2015 p 45 Nesse sentido observase que o cordel resgata em seus versos traços da cultura popular da oralidade e principalmente coloca em pauta temáticas que circulam no meio social dos alunos o que faz desse gênero um verdadeiro convite para o deleite em uma boa narrativa capaz de envolver toda a comunidade no processo de leitura e discussão de maneira análoga ao que é narrado por João Cabral de Melo Neto no poema que trouxemos no início desta seção e que mostra o quanto a literatura de cordel servia de alimento tanto para o sujeito letrado o filho das elites dos engenhos quanto para os trabalhadores do eito que sentiam necessidade de fantasia e de desejo e por isso valiamse da literatura de cordel para preencher tal necessidade Levandose em consideração que o percurso de formação de leitores se dá por meio de um processo paulatino de constantes e efetivas atividades de leitura e discussão de textos reiterar a necessidade da presença da Literatura de cordel no fomento de práticas de incentivo à leitura é acima de tudo valorizar a cultura nordestina é enxergar nesta literatura uma rica diversidade em abordagens e temas que quando associados a metodologias coerentes tornase uma importante ferramenta para provocar a emoção dos alunos e refinar a emoção estética deles Afinal um bom leitor não é aquele que simplesmente decodifica palavras de um texto mas sim aquele que é capaz de associar a leitura realizada com o mundo que está a sua volta Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 332 e com as suas próprias experiências de vida em um processo por meio do qual vai refinando suas emoções e aprimorando a sua consciência de ser e estar no mundo Assim reiterando a importância da escolarização do cordel tendo em vista o potencial formativo que esse gênero possui mas tendo também consciência de que essa escolarização não pode ocorrer de qualquer forma é que a partir de Marinho e Pinheiro 2012 resgatamos algumas sugestões de procedimentos que podem ser empregadas no trabalho com a Literatura de cordel em sala de aula e das quais nos valemos em alguns dos encontros do clube de leitura Para esses autores uma primeira atividade que pode ser realizada em sala de aula até porque ela atende bem a perspectiva de interdisciplinaridade tão em voga é discutir e trabalhar as ilustrações típicas dos folhetos que são as xilogravuras MARINHO E PINHEIRO 2012 p 131 Nesse caso o professor pode solicitar aos alunos que a partir da associação entre imagens que compõem a xilogravura e o título dos cordéis os alunos levantem suposições do que pode vir acontecer na narrativa Além disso podem ser pensadas atividades que adicionem outros elementos para serem abordados junto com a Literatura de cordel tais como a musicalização de estrofes o trabalho de escuta de canções que apresentem relação com o texto que será lido Afinal a musicalização de algumas estrofes ou mesmo o simples fato de iniciar a aula ouvindo uma música pode atrair os alunos visto que a sonorização pode trazer um sentimento a mais para a compreensão e fruição do texto tornando a atividade de leitura mais prazerosa Eis um fato que talvez seja instrumento de vivências agradáveis em sala de aula Cantar com toda a turma uma canção cantar em pequenos grupos sugerir que os próprios alunos criem música para as histórias é um começo de conversa MARINHO PINHEIRO 2012 p132 No entanto se a musicalização das estrofes não for uma realidade possível para a turma podem ser levadas músicas que se associem ao cordel trabalhado em sala para serem ouvidas antes da leitura do texto afinal a vertente da MPB bebeu e continua bebendo no fecundo poço do Cordel Compositores nordestinos souberam redimensionar ritmos criar uma música com face peculiar MARINHO PINHEIRO 2012 p 132 Desta forma ao estabelecer essa aproximação do educando com temas presentes na cultura popular e sobretudo por possibilitar diferentes formas de abordagens em sala a Literatura de cordel tornase uma rica fonte para o desenvolvimento de atividades de leitura e o aprimoramento do letramento literário dos alunos Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 333 12 Clube de leitura uma metodologia para a formação de leitores de cordel Para início de conversa gostaríamos de trazer a seguinte fala Professora por que aqui no clube do livro literatura é tão legal e na sala de aula é tão chata Esse questionamento está relatado no livro O clube do livro ser leitor que diferença faz de Luzia de Maria 2016 e nos faz refletir sobre quais procedimentos e metodologias tornam a leitura na perspectiva desta aluna uma atividade significativa quando realizada em um clube do livroleitura ao contrário das atitudes e posicionamentos que são tomadas em sala de aula para que esta mesma atividade se torne algo enfadonho e chato para os estudantes Para discorrer sobre o assunto parece indispensável sabermos como se configura e se caracteriza um clube de leitura para assim compreendermos o que existe por trás da oposição entre ler dentro e fora da sala de aula Segundo Cosson 2014 p 138 os clubes de leitura são uma forma de interação social por meio da qual as práticas de leitura ganham a especificidade e concentricidade dos gestos espaços e hábitos Esses espaços não são simplesmente os locais onde acontece a leitura de um livro ou texto literário tampouco se configuram como encontros para uma mera discussão de um determinado texto Pelo contrário os clubes de leitura são eventos de interlocução em que predominam a coletividade o compartilhamento de perspectivas e a interação social e para cujo funcionamento os seguintes elementos são essenciais leitores um grupo de pessoas entre dez e vinte cinco pessoas vários exemplares de livros ou seja cada participante deve ter um exemplar da obra a ser discutida e por fim um coordenador uma pessoa que deve moderar as reuniões além de estimular a participação e organizar as atividades do grupo COSSON 2014 p 153 De maneira geral um clube de leitura a depender do perfil objetivos e interesses dos participantes pode assumir abordagens distintas e não precisa ocorrer necessariamente de forma presencial Os espaços virtuais têm fomentado o surgimento de vários clubes para a discussão de uma miríade de temas autores e obras Sobre a importância pedagógica dos clubes de leitura no espaço virtual Cosson 2014 afirma Os clubes do livro online podem igualmente ser um instrumento didático de grande alcance entre os jovens Como uma atividade escolar eles ampliam o tempo destinado às discussões sobre a obra permitem que os alunos mais tímidos participem com mais facilidade oferecem um tempo maior para os Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 334 alunos lerem a contribuição dos colegas e se pronunciarem com maior organização do pensamento entre outros benefícios COSSON 2014 p 151 Assim por não exigirem o deslocamento físico forjar uma maior privacidade e de certa forma facilitar o contato entre sujeitos afins pelo mundo os clubes de leitura online tornamse uma importante opção para o compartilhamento de leituras SOUZA 2018 p 683 Sobre esse assunto Cosson 2014 p 154 salienta que os espaços de promoção à leitura como os clubes de leitura promovem a interação entre textos e leitores entre leitura e literatura entre o privado e o coletivo As leituras são portanto expostas e os sentidos dados ao mundo por meio delas são discutidos e reconstruídos Assim participar de um clube de leitura é compartilhar com um grupo de pessoas as interpretações impressões e percepções acerca de um texto e dos modos como somos afetados por esse texto Entretanto vale ressaltar que todo esse processo deve ser desenvolvido com o auxílio de um mediador que incentive os participantes a apresentarem as mais diversas opiniões sobre o que escolherem como objeto de leitura para o clube Por isso o primeiro acordo a ser estabelecido entre os membros de um clube de leitura e igualmente entre professores e alunos é este Assim como uma regra básica sem a qual nenhum clube de leitura ou espaço de aprendizado pode funcionar é que seja garantido a todos o seu direito à fala Mas isso implica que seja cobrado de todos o respeito ao colega o dever de silenciar e ouvir quando a fala pertence a outro seja ele o professor ou algum aluno LUZIA DE MARIA 2016 p 29 Neste sentido os clubes de leitura devem ser antes de qualquer coisa um espaço de respeito ao posicionamento e à opinião do outro afinal o diferencial desses clubes é justamente a forma como os textos são abordados a mediação e principalmente os espaços de fala concedidos aos seus integrantes Tudo concorre para que haja a cada encontro a promoção de interações de diálogos Desta forma os espaços de fomento à leitura do texto literário como os clubes ou os círculos de leitura presencial ou remotamente devem sempre ser incentivados de modo que alcancem o maior número possível de jovens para que estes possam ser paulatinamente inseridos em práticas de leitura que lhes sejam mais significativas e possam contribuir para a sua formação como cidadão e como ser humano no geral Por isso é importante que as ações de promoção à leitura e a manutenção de espaços de fomento à leitura existam efetivamente no interior da escola e sejam devidamente planejados Formar leitor exige tempo e planejamento Não se forma leitor da noite para o dia nem Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 335 tampouco de qualquer maneira Acreditamos que foi essa consciência acerca da responsabilidade política e pedagógica que envolve a formação de leitores e o cuidado no planejamento das nossas ações didáticas desde a seleção dos textos até a escolha dos procedimentos didáticos para a entrada do texto na sala de aula que garantiram o êxito do clube de leitura que coordenamos com estudantes do ensino fundamental Para corroborar essa nossa hipótese passamos a analisar o questionário aplicado com os integrantes do clube de leitura mas antes apresentaremos brevemente a metodologia e os procedimentos que nos guiaram na realização da experiência de que o presente texto constitui uma reflexão 2 Metodologia Como estudo de caso na esteira de André 2005 a pesquisa de que se origina o presente artigo é uma investigação sobre a formação de leitores na educação básica a partir da reflexão sobre a realização por meio da plataforma do Google Meet de um clube online em que de novembro de 2020 a agosto de 2021 foram lidos um conjunto de cordéis com alunos do ensino fundamental II de uma escola da rede pública de ensino do município de Monteiro PB onde atuávamos como bolsistas do subprojeto de Língua Portuguesa vinculado ao Programa de Residência Pedagógica do Centro de Ciências Humanas e Exatas CCHE campus VI da Universidade Estadual da Paraíba O nosso corpus constituiuse inicialmente das respostas dos integrantes a um questionário que foi aplicado a eles após o encerramento das atividades do clube de leitura Esse questionário foi produzido via formulário Google e era composto por um total de 15 quinze questionamentos abertos que objetivavam apurar a percepção dos alunos acerca de três momentos específicos as perguntas iniciais buscavam compreender como os alunos se enxergavam enquanto leitores e que leituras costumavam realizar antes de participarem do clube Em um segundo momento as perguntas se direcionavam a tentar compreender de que forma as atividades e as estratégias de leitura desenvolvidas no clube contribuíram para a formação leitora deles Por fim o terceiro bloco de perguntas buscava identificar como os alunos se avaliavam enquanto leitores após terem participado do clube de leitura Desta forma conseguimos contato com um total de 10 dez participantes os quais prontamente aceitaram responder ao questionário A maioria era do sexo feminino 8 oito e apenas 2 dois eram do sexo masculino Para preservar a identidade de nossos colaboradores durante a análise de suas respostas atribuímos a cada um deles um nome fictício que remete Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 336 aosàs protagonistas dos cordéis lidos ao longo do clube Assim mais adiante em nossa análise aparecerão Creuza e Evangelista do Romance do Pavão Misterioso Pedro Malazarte de As palhaçadas de Pedro Malazarte Calar Valdivino Esmeralda e Floriano de Cachorro dos Mortos Genival e Cesário de O filho de Evangelista do pavão Misterioso e por fim Frederica personagem de A sedutora Maldita Posteriormente tomamos como corpus também as notas em nosso diário reflexivo as quais nos permitiram descrever como se deu a realização dos encontros Entretanto no presente texto deternosemos apenas à descrição e reflexão de um único encontro não só para que se possa compreender como o clube de leitura funcionava mas também para ilustrar a metodologia e os procedimentos didáticos empregados em cada um deles Assim como precisamos operar por recorte optamos por descrever o encontro em que se leu o cordel Futebol no inferno de autoria do José Soares Tal escolha não foi aleatória mas levou em conta os dados do questionário segundo os quais esse foi o cordel que mais cativou os nossos colaboradores tendo em vista que o tema dele estava mais próximo de seus horizontes de expectativa já que a prática de futebol é uma das mais frequentes redes de sociabilidade na região onde moram os participantes do clube de leitura Vale ressaltar que o número de encontros do clube de leitura não corresponde entretanto ao de cordéis lidos visto que para a leitura de alguns textos como Cachorro dos Mortos de Leandro Gomes de Barros A Sedutora Maldita de Manuel d Almeida Filho A moça que mais sofreu na Paraíba do Norte de Antônio Américo Medeiros O mistério dos três anéis e o Morcego Humano ambos de autoria de Delarme Monteiro O massacre de Canudos de Varneci Santos do Nascimento e O Filho de Evangelista do Pavão Misterioso de Manoel Apolinário Pereira foi necessário destinar mais de um encontro tendo em vista que eram cordéis mais extensos cuja leitura não se encerrava em uma única tarde período em que nos reuníamos via plataforma do Google Meet Ainda assim o clube de leitura teve no total vinte e sete encontros nos quais os estudantes tiveram a oportunidade de conhecer dezoito importantes cordelistas e entraram em contato com vinte e um cordéis alguns dos quais considerados cânones de nossa literatura popular Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 337 3 Resultados 31 Leitores de Cordel em formação experiências em um Clube de Leitura online Nesta seção a partir da análise do questionário aplicado com os integrantes do clube de leitura procuramos 1 compreender as práticas e hábitos de leituras vivenciados pelos alunos antes desse projeto 2 identificar como foi a experiência de participar do clube e as impressões dos integrantes em relação aos cordéis lidos nos encontros e 3 refletir sobre o que eles acreditam ser semelhante ou discrepante do trabalho com a leitura na sala de aula em comparação com as atividades desenvolvidas no clube de leitura bem como 4 investigar de que forma a participação no clube e as leituras do gênero cordel realizadas contribuíram na vida dos integrantes enquanto leitores em formação Assim no que tange às práticas e hábitos de leitura vivenciados pelos alunos antes do Clube de Leitura em resposta ao questionamento sobre esse aspecto duas alunas apontaram gostar de poesiaversos e afirmaram ler com frequência Um aluno destacou já ter conhecimento do gênero cordel e que este tipo de texto fazia parte do seu repertório de leitura Outra aluna destacou ler notícias e textos disponíveis na internet e o restante dos entrevistados afirmou que suas leituras se restringiam a gibis contos e textos presentes nos livros didáticos da escola Entretanto quando pensamos a leitura desenvolvida somente a partir dos livros didáticos como é colocado por um dos alunos nos deparamos com uma situação grave visto que o livro didático sozinho não é suficiente para uma eficaz formação de leitores tendo em vista que muitas vezes oferece apenas fragmentos de textos literários e geralmente os aborda do ponto de vista gramatical BORDINI AGUIAR 1988 p 33 Dessa forma pelas colocações dos alunos é possível observar que as práticas de leituras desempenhadas por eles talvez não acontecessem com frequência nem tampouco parecem ser levadas a sério visto que as respostas apresentadas pelos discentes expressavam uma vaguidão o que nos leva a crer que estas leituras aconteciam esporadicamente e de forma aleatória seja por não terem acesso a livros de literatura seja por não haver alguém que mediasse o contato deles com esses gêneros Assim quando questionados com que frequência realizavam essas leituras os alunos pontuaram pouca assiduidade e relataram que quase nunca tiravam tempo para ler por deleite por prazer Um aluno pontuou que o hábito de leitura não era algo presente em sua vida e apenas lia quando precisava tirar alguma dúvida ou mesmo quando necessitava estudar para alguma prova Outro aluno destacou que passava semanas sem ao menos pegar em um livro em um texto e só realmente lia quando algum professor propunha a atividade Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 338 Já quando perguntados sobre o que fazia com que eles retornassem todas as quintas feiras para participarem dos encontros do Clube de Leitura observamos que as respostas dos alunos entrevistados apontam para um incentivo por parte da docente de Língua Portuguesa que os convidou a participar da atividade A aluna Creuza por exemplo destacou Fiquei sabendo pela professora de português que mim sic fez o convite de participar O que mim sic fez querer participar foi que gosto muito de lê sic e tive certeza q sic entrando nesse grupo só tinha a ganhar Se o convite da docente foi importante a curiosidade acerca do que era um clube de leitura e de como funcionaria também foi outro elemento motivador para atrair interessados como afirmam Frederica Evangelista e Pedro Malazartes Frederica Minha professora me falou a forma que funcionava como eles iam nos ensinar achei interessante e quis participar Evangelista Minha professora me comunicou e me influenciou a participar pois ela viu que seria algo bom pra mim eu tive curiosidade de saber como funcionava e acabei entrando Pedro Malazarte a professora de Português me chamou fiquei curioso e fui pra conhecer Já as respostas de Valdivino e Calar respectivamente Por que eu achava bem divertida as aulas etc e A professora quem sic me falou do clube fui a primeira vez e resolvi continuar participando por que achei legal expressam não só o motivo que os trouxe ao clube como também o que os fez continuarem participando dos encontros Ao serem convidados pela professora eles vão vivenciar as suas primeiras descobertas e experiências em um evento formativo como o que estávamos coordenando e a partir das percepções iniciais resolvem continuar fazendo parte da atividade Parece que já no encontro inicial os alunos percebem que as leituras coletivas desenvolvidas por nós poderiam ser uma forma de ampliarem seus horizontes culturais por meio do diálogo e do compartilhamento de ideias COSSON 2014 Posteriormente com intuito de realizarmos uma avaliação geral acerca dos aspectos que os alunos consideravam importantes nas atividades desenvolvidas no Clube de Leitura perguntamos o que eles destacavam como positivo nos encontros de que participaram Assim de maneira geral observamos que em suas respostas fizeram menção a três aspectos a as interações e participações durante os encontros b a organização e atuação dos residentes e c a escolha dos cordéis a serem lidos Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 339 Metade dos alunos considera como aspectos positivos do Clube de Leitura a interação e a participação dos integrantes Segundo eles os encontros se tornavam mais dinâmicos e contribuíam para que de certo modo eles ficassem desinibidos e perdessem a vergonha de ler em público Assim ainda que essa leitura fosse mediada pela tela de um computador ou celular uma vez que como já dissemos todos os encontros do Clube de Leitura ocorreram de modo remoto em virtude do contexto pandêmico ao contrário do espaço de sala de aula em que muitos relataram ter vergonha de ler no ambiente online do Clube de Leitura os alunos afirmaram se sentirem à vontade para ler comentar e interagir durante os encontros Dessa forma o espaço do Clube foi para eles um ambiente que proporcionou liberdade para que pudessem se expressar e partilhar suas respectivas opiniões Afinal o primeiro acordo a ser estabelecido entre os membros de um clube de leitura e igualmente entre professores e alunos é como o dissemos citando Luzia de Maria 2016 justamente o direito à fala e a ser ouvido Por lhes ter sido facultado esse direito é que os integrantes do Clube de Leitura ligavam seus microfones seja para emitirem alguma opinião acerca do que era lido eou perguntado seja para lerem algum trecho do cordel que era objeto de leitura do dia Três alunos afirmaram que para eles o aspecto positivo foi a execução de cada encontro do Clube ressaltando o trabalho desempenhado pelos residentes no planejamento e a atenção que eles concediam aos integrantes do Clube Creuza A interpretação dos residentes e dos professores que compõem o clube de leitura Frederica A forma como o pessoal organizava o encontro Cesário Professores muito bons divertidos alegres que nos motivava sic a ler fazendo com que voltássemos toda semana Em uma das respostas um entrevistado alega que o incentivo dos bolsistas era o que o fazia retornar toda semana Assim na função de mediadores conseguimos criar as condições para que os alunos pudessem acolher o texto e se sentissem participantes efetivos em cada encontro do clube Mais do que apresentar o cordel aos discentes os residentes construíram estratégias de compreensão para que os estudantes fossem capazes de agir diante do texto comentando e compartilhando as suas impressões de leitura de maneira crítica mas também sensível frente às experiências humanas mimetizadas em cada um dos cordéis lidos Por fim duas das respostas pontuadas pelos discentes se voltavam para nostalgia presente nos cordéis lidos Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 340 Calar Os textos pra mim foram todos positivos me ajudaram bastante e fizeram parte da minha vida de uma forma muito especial Pedro Malazartes As histórias tinha sic muita nostalgia e eram bons os textos Um dos alunos destacou que os textos contribuíram para sua vida de forma significativa e especial Neste sentido tendo em vista que os textos da literatura de cordel contemplam em suas narrativas temáticas do cotidiano costumes crenças de um povo além de sobretudo narrar grandes histórias de personagens imaginários como príncipes e princesas de reinos distantes até fatos verídicos da realidade de uma comunidade talvez tenha sido esta grande variedade para os alunos o motivo de identificação que fez com que essas leituras se tornassem significativas e especiais para eles Por isso procuramos também saber quais cordéis chamaram mais atenção dos alunos Creuza Cesário e Valdivino destacaram O filho de Evangelista do Pavão Misterioso de Manoel Apolinário Pereira como sendo a leitura que mais lhes cativou entretanto apenas Cesário de alguma forma esclarece o motivo pelo qual essa leitura lhe chamou a atenção quando diz O filho de Evangelista do pavão misterioso por que contava uma história bem diferente e interessante e com bastante mistério Ao destacar que o referido cordel lhe chamou a atenção por conter bastante mistério acreditamos que o aluno está se referindo ao fato de o pavão de alumínio presente no cordel caracterizarse como um elemento surpresa que provoca uma reviravolta na história e na vida dos personagens Desta forma tendo em vista que inicialmente não é revelado o significado do pavão para a história a narrativa tornouse aos olhos do aluno uma história repleta de mistério que foi sendo desvendado na leitura de cada verso de cada estrofe Já Evangelista que provavelmente não lembrou o título do cordel de que mais gostou escreveu uma espécie de pequeno resumo do texto para se referir a sua história preferida Foi um que a família foi toda comida por onças restando apenas um sobrevivente que fugiu Me tocou bastante esse cordel por o personagem ter tido forças de continuar o seu caminho sozinho e lutando por sobrevivência Assim a partir das informações fornecidas por ele tendo conhecimento das leituras que foram realizadas no Clube sabemos que Evangelista está se referindo ao cordel A moça que mais sofreu na Paraíba do Norte de Antônio Américo de Medeiros cuja personagem principal Judite buscando fugir da fome e da seca faz junto com a sua família um longo trajeto a pé durante o qual acaba perdendo todos os seus parentes em Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 341 um ataque de onças Embora não lembre o título do cordel o aluno recorda bem os acontecimentos da história e na sua resposta ainda aproveita para justificar o motivo de ter gostado do cordel a persistência e a força da protagonista que mesmo tendo perdido toda a família conseguiu encontrar forças para lutar por sua sobrevivência Floriano por sua vez ao ocultar parte do título do cordel que lhe chamou mais atenção estava se referindo a Futebol no inferno de José Soares Ele não explica por que censurou a palavra inferno tampouco por que apesar disso foi justamente este o cordel que mais gostou Se não podemos aventar resposta para o primeiro caso para o segundo no entanto acreditamos que o fato de os alunos morarem em uma região onde a prática de futebol é uma atividade muito recorrente principalmente nos finais de semana quando as famosas peladas são para os moradores da região uma das mais importantes formas de sociabilização e lazer fez com que Floriano se identificasse com a leitura de Futebol no Inferno estabelecendo assim conexões entre o texto lido e as suas vivências na região onde mora Esmeralda Frederica e Genival destacaram em suas respostas que não recordavam os títulos dos cordéis Esmeralda alega que a sua falta de memória em relação aos títulos devese ao fato de já fazer algum tempo desde os encontros quando foram realizadas as leituras dos cordéis A resposta da aluna de certo modo é coerente uma vez que quando aplicamos o questionário já haviam se passado cinco meses desde a data do último encontro do Clube Frederica destaca que não se lembra e por isso não pode apontar nenhum texto Genival também destaca que não recorda nenhum título dos cordéis lidos e pede desculpas por isso Por fim Calar e Pedro Malazarte alegam que todos os cordéis foram importantes Pedro Malazarte não explica o porquê entretanto Calar diz que a variedade dos cordéis lidos ao longo do Clube de Leitura fez com que ele se sentisse mais envolvido com os textos da literatura de cordel A nosso ver o fato de a cada semana lermos sobre um tema diferente fez com que todos os cordéis fossem na opinião de Calar considerados importantes e tudo isso só foi possível devido à literatura de cordel abarcar os mais variados temas indo das histórias jocosas aos dramas históricos passando por folhetos circunstanciais ou de acontecido HAURÉLIO 2013 p 35 Já quando perguntados se consideravam as leituras realizadas no Clube boas escolhas todos os alunos que responderam ao questionário afirmaram que sim porém apenas alguns deles alegaram o motivo que fazia com que eles tivessem tal opinião sobre os textos lidos As respostas apresentadas por Creuza e Evangelista trazem algo de semelhante Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 342 Creuza Sim porque sempre é real Evangelista Sim pois de uma forma diferente sempre falava sobre nossa realidade só precisávamos interpretar melhor Ambos os alunos consideram as leituras boas escolhas pelo fato de apresentarem acontecimentos próximos da realidade deles Vale ressaltar que muitas leituras realizadas no Clube de fato apresentavam situações bastante fantasiosas entretanto quando os alunos mencionam acontecimentos da nossa realidade acreditamos que eles se referem a aspectos reflexivos presentes nas leituras como por exemplo as histórias de amores proibidos presentes no cordel Romance do Pavão Misterioso de José Camelo de Melo ou mesmo a fidelidade de um cão ao seu dono expressa no cordel Cachorro dos Mortos de autoria de Leandro Gomes de Barros os erros cometidos na juventude conforme exposto no texto A história de um filho errante e as preces de uma mãe de Antônio Carlos e entre outros temas abordados nos cordéis lidos Neste sentido os textos da literatura de cordel foram considerados na opinião dos alunos uma boa escolha por apresentar experiências que talvez pudessem ter sido partilhadas por eles em alguma etapa de suas vidas Na perspectiva dos alunos Floriano e Frederica as obras lidas foram considerados uma boa escolha por eles também terem participado do processo de seleção dos textos tendo em vista que nos encontros do Clube de Leitura sempre pedíamos que os alunos indicassem temáticas e assuntos que gostariam de ler ou mesmo selecionávamos alguns títulos de cordéis e pedíamos que eles votassem nos textos que gostariam de ler nas semanas seguintes como ilustra a imagem abaixo exibida antes do término de mais um encontro do clube de leitura Figura 1 Votação realizada ao final de um encontro para decidirmos as leituras das próximas semanas Fonte Acervo da pesquisadora Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 343 Assim a partir das capas e títulos dos cordéis expostos os alunos votavam nos textos que mais lhes chamaram a atenção e gostariam que fossem lidos nos próximos encontros Desta forma levando em consideração a opinião e as escolhas dos integrantes do Clube planejávamos os próximos encontros a partir do cordel mais votado Querendo investigar as singularidades das práticas de leitura do Clube em relação às realizadas em sala de aula tendo em vista que eram notórios o interesse a participação e a frequência dos alunos nos encontros do Clube perguntamos a eles o que consideravam como diferencial de um em comparação ao outro Em resposta ao questionamento Creuza afirma que a diferença entre as atividades desenvolvidas no Clube em comparação com as que aconteciam em sala de aula estava na participação Segundo a discente no Clube as interações se davam de maneira mais expressiva o que contribuía para que a leitura se tornasse mais divertida e significativa Isso se diferencia do que tradicionalmente é proposto pela cultura escolar no Brasil que equivocadamente promove o silenciamento dos alunos Nosso sistema escolar como raríssimas exceções que fazem mais confirmar a regra é muito hábil em formar bocas e mentes silenciosas como afirmam Ferrarezi e Carvalho 2017 Por isso diferente do que ocorre em sala de aula no Clube de Leitura de acordo com Creuza os alunos possuíam espaço de fala fazendo que se sentissem parte essencial da atividade então mais do que simples participantes que liam textos da literatura de cordel os alunos eram a peçachave da ação aqueles que partilhavam suas experiências de vidas as impressões de leitura os conhecimentos adquiridos confrontando seus horizontes de expectativas entre si mesmos e com o horizonte dos próprios textos lidos Já para Evangelista o fato de os textos da literatura de cordel conterem em suas histórias aspectos da realidade e do cotidiano fazia que as leituras se tornassem mais divertidas visto que de acordo com o aluno os textos lidos na escola eram mais difíceis de serem compreendidos Provavelmente o aluno encontrou nos textos trabalhados no Clube de Leitura certa facilidade de compreensão devido ao fato de os cordéis tratarem de assuntos que de alguma forma se relacionavam com as experiências de vida partilhadas por ele Em contrapartida ainda segundo Evangelista os textos abordados em sala de aula se distanciavam de sua realidade e portanto eram menos compreendidos pelos estudantes Isso porque geralmente o que circula como texto no interior das práticas de leitura na escola são materiais anódinos que pouco dizem para os alunos Texto não é exercício de cobrança mas de diálogo de encontro de vivência de trocas de experiências Os cordéis trabalhados no Clube Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 344 enquadraramse nessa concepção de texto e por isso na opinião dos integrantes as leituras eram mais divertidas do que as que costumam ser realizadas no espaço da sala de aula Na opinião de Esmeralda as leituras do Clube aconteciam de forma espontânea e por não se sentirem obrigados a realizaremnas tudo acontecia de forma mais natural sem nenhuma pressão segundo a aluna O fato de as leituras acontecerem de forma compartilhada coletiva foi o que Frederica destacou como sendo o diferencial do Clube Neste sentido a dinâmica de pedir que cada aluno participasse lendo ao menos uma estrofe foi na opinião dessa integrante o que tornou os encontros mais interativos talvez isso se deva ao fato de que na sala de aula nem todos os alunos se sintam à vontade para ler porque tomam a leitura nessas ocasiões como momentos de avaliação e as interações e participações não aconteçam com frequência o que torna a leitura mais cansativa e restrita a poucos alunos porque em sala de aula o texto deixa de ser objeto de leitura e passa a ser instrumento para a testagem de conteúdos geralmente de natureza gramatical Do texto passase à primazia de fragmentos os quais são utilizados para exemplificação de taxonomias gramaticais Logo ler como experiência formativa deixou de ser importante e para isso não há mais tempo na escola uma vez que o importante é ler para realizar alguma tarefa isto é para mostrar serviço Entretanto a escola se esquece de que lemos não apenas porque precisamos realizar certas atividades pragmáticas porque precisamos realizar uma atividade racional Lemos porque sentimos a necessidade de entrar em contato com bens simbólicos porque sentimos fome de fabulação porque precisamos preencher as necessidades de fantasia e de desejo como já o disse Antonio Candido Ler aponta para uma necessidade existencial do próprio homem Sentimos fome do contato com objetos estéticos A arte nos apascenta o espírito ou o inquieta mas em um ou em outro caso isso é catártico Logo os encontros do Clube de Leitura que coordenamos afiguraramse para seus integrantes como um evento catártico porque concorreram para que cada um dos alunos pudesse experienciar o prazer decorrente da expiação dos próprios sentimentos e também da transformação de suas convicções Houve pois uma identificação entre o leitor e aquilo que ele via representado na obra Essa identificação por sua vez contribuiu para que esses alunos na condição de receptores dos cordéis pudessem em certa medida mudar de comportamento social libertandose de algumas amarras do cotidiano de modo que viessem a ampliar sua visão e julgar os fatos e a realidade ao seu redor NÓBREGA p 245 como pretendemos demonstrar na seção abaixo em que descrevemos como se deu o encontro para a leitura do cordel Futebol no Inferno de José Soares texto Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 345 escolhido pela maioria dos integrantes do clube como o que mais chamou a atenção deles e do qual dizem ter gostado mais 31 De uma partida de futebol no Inferno descrição e reflexão em torno de um encontro do clube de leitura O compartilhamento de obras e leituras com outras pessoas tornase essencial uma vez que o leitor em formação se beneficia das competências dos outros para construir o sentido e obter o prazer de entender mais e melhor os livros Além disso o compartilhamento de leituras em virtude de sua dimensão socializadora faz com que a pessoa se torne parte de uma comunidade de leitores com referências e cumplicidades mútuas COLOMER 2007 Diante deste contexto os encontros do Clube de Leitura buscaram permitir aos alunos essa dimensão socializadora e a partir dela criar condições para que eles ampliassem a percepção crítica em relação à literatura de cordel No que concerne ao encontro em que lemos e discutimos o texto Futebol no inferno de José Soares observamos que as ideias compartilhadas entre os próprios alunos faziam com que a compreensão do texto se desse de forma mais interativa e contextualizada visto que a todo o momento eles compartilhavam ideias e informações sobre a leitura sobre as regras do futebol comparando as partidas disputadas pelos seus times com a que era descrita no cordel de José Soares Talvez essa participação se deva como já o dissemos em outro momento ao fato de o futebol se caracterizar como uma prática socializadora e de lazer para a comunidade onde os alunos residem e a partir desta relação afetuosa com o esporte os alunos conseguirem estabelecer conexões com o texto lido porque para eles parafraseando Castro 2020 o futebol não é apenas uma prática esportiva mas sim um evento próprio da cultura local deles que veicula significados a partir dos quais é possível as relações sociais que os alunos constroem entre si e o próprio entorno Assim antes de iniciarmos a leitura do cordel como sempre procedíamos em todos os encontros realizamos uma atividade motivacional Nesse dia a motivação buscava fazer com que os alunos descobrissem o título do texto que seria lido Para tanto por meio de algumas pistas presentes em um jogo online Wordwall os discentes desvendaram os enigmas e chegaram ao título O Futebol no inferno Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 346 Figura 2 Jogo no aplicativo Wordwall para os alunos adivinharem o título do cordel Fonte Acervo da pesquisadora Um detalhe merece destaque após a revelação do título do cordel através do jogo citado um aluno afirmou já conhecer a história e destacou que o texto era muito bom e divertido O fato de o discente já conhecer o cordel nos chamou bastante atenção visto que nos encontros até então realizados essa situação nunca havia acontecido Dessa forma com o intuito de sabermos se o aluno havia lido o cordel a pedido de algum professor na escola ou se o leu de forma espontânea perguntamos de que forma ele havia conhecido o texto Em resposta o aluno destacou que o lera após ouvir o comentário de um colega quando então decidiu conhecer a história O aluno foi motivado a ler o texto pela influência exercida pelo colega mas também pelo título do texto e as demais informações presentes na capa do cordel Entretanto de maneira geral a temática que estabelecia conexão com o futebol agradou não só a este aluno que já conhecia o texto mas a todos os participantes tanto os meninos quanto as meninas Assim antes mesmo de darmos início à leitura os alunos começaram a associar o cordel aos seus times de futebol nacionais e aos times locais que jogavam no sítio onde eles moravam Refletindo sobre essa situação e levando em consideração os dizeres de Bordini e Aguiar 1988 p18 percebemos que o primeiro passo para a formação do hábito de leitura é a oferta de livros próximos à realidade do leitor que levantem questões significativas para ele Ou seja se a leitura de alguma forma faz com que o aluno ative uma rede de conhecimentos prévios e experiências de vida partilhadas por eles quanto mais o texto estiver próximo do horizonte de expectativa do aluno a leitura se tornará um evento significativo Afinal Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 347 A formação escolar do leitor passa pelo crivo da cultura em que este se enquadra Se a escola não efetua o vínculo entre a cultura grupal ou de classe e o texto a ser lido o aluno não se reconhece na obra porque a realidade representada ali não lhe diz respeito BORDINI AGUIAR 1988 p 16 Desta forma tornase necessário estabelecer uma relação entre leitor e obra a ser lida e sob este aspecto observamos que o cordel Futebol no inferno conseguiu de forma significativa cativar os alunos tento em vista que os discentes foram capazes de estabelecer relações de sentido com o texto lido mobilizando saberes advindos da relação com outros textos já lidos ou decorrentes da própria experiência de vida de cada um dos estudantes O cordel O Futebol no Inferno é formado por um total de 30 sextilhas e como o próprio título sugere narra uma partida de futebol ocorrida nas profundezas do inferno envolvendo duas equipes O time de satanás e o Quadro de Lampião Durante a narrativa vão sendo apresentados todos os elementos presentes em uma partida de futebol Entretanto existem algumas diferenças como por exemplo o campo tem uma medição uma pouco mais extensa mil metros de comprimento por quinhentos de largura para a arbitragem são dez juízes reservas que ficam de prontidão a CBF Confederação Brasileira de Futebol é no cordel substituída por CBI Confederação Brasileira do Inferno dentre outros elementos pontuados ao longo do texto que tornam a história ainda mais fabulosa Assim no decorrer da atividade de leitura para tornarmos o encontro mais dinâmico intercalamos durante a leitura compartilhada e em voz alta algumas pausas para realizamos perguntas que buscavam organizar as ideias dos alunos para que eles resumissem e recapitulassem os personagens e tudo o que havia sido lido até o momento Dessa forma os alunos tendo como norte as nossas perguntas iam oralmente reconstruindo com suas próprias palavras os passos percorridos durante a história Apresentávamos também alguns questionamentos que tinham como objetivo levantar inferências para que os alunos não só lançassem mão da estratégia de resumir e recapitular as informações do texto mas também fossem capazes de refletirem acerca do que poderia acontecer posteriormente nas próximas páginas do cordel Neste sentido solicitamos que eles apresentassem suposições de que personalidades poderiam compor o time de Satanás o rival de Lampião na disputa do futebol no inferno As hipóteses apresentadas foram na sequência da leitura sendo confirmadas positivamente tendo em vista que os discentes apresentaram como respostas os seguintes dizeres Não eram pessoas Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 348 normais Os outros coisa ruim Um monte de diabos vermelhos Assim tendo em vista a negatividade expressa pela figura de Satanás e todos os conhecimentos prévios que os alunos acumulam sobre o anjo que caiu do céu estes logo afirmaram que o time de Satanás só poderia ser composto por pessoas de má índole e portanto chamam de Coisa ruim que é uma expressão no imaginário popular associada ao diabo ou a todos aqueles que agem sob a influência dele À medida que íamos lendo o cordel notávamos que a leitura envolvia os alunos e pouco a pouco nem precisávamos solicitar que lessem as estrofes pois eles mesmo tomavam a iniciativa e encaminhavam a leitura Em relação aos momentos de pausa em que conversávamos sobre as informações do texto tudo acontecia de forma muito espontânea Os alunos pareciam se sentir à vontade para expressar as suas opiniões E talvez isto se deva ao fato de que quando um aluno abria o microfone para comentar alguma informação do texto todos os demais integrantes da ação monstravamse atentos a ouvir e aproveitavam a resposta do colega para acrescentar algum outro aspecto que lhe parecia importante Em relação à participação e à interação do aluno que já conhecia o cordel de José Soares este sempre fazia questão de comentar e expor a sua opinião sobre a leitura entretanto era prontamente advertido pelos colegas que pediam que ele não falasse muita coisa pois conhecendo o texto com certeza em algum momento poderia deixar escapar algum detalhe importante da história Assim com medo de que o aluno sem querer revelasse o final do cordel e portanto anulasse o mistério e as expectativas construídas por eles os alunos pediam não dê spoiler não por favor O aluno de fato não revelou o final do cordel antes da hora esperada Encerradas a leitura e a discussão do texto chegamos ao momento final do encontro quando buscamos ouvir o que os alunos acharam do cordel Eles afirmaram terem sido positivamente surpreendidos que a leitura havia sido muito divertida e que o texto era de fato muito bom Entretanto quando perguntados por que consideravam o texto bom alegaram que a partida de futebol narrada na história de fato nunca existiu e que se tratava de algo inventado pelo cordelista e por isso a história era muito legal porque lhes permitia imaginar muitas coisas que não são possíveis na realidade Um aluno chegou a mencionar o fato de a bola da partida possuir um peso elevado Não tem como chutar uma bola de 10 quilos só nessa partida mesmo Desta forma o que fez com que os alunos considerassem o cordel Futebol no Inferno uma leitura positiva foi justamente o fato de eles poderem imaginar construir hipóteses que não necessariamente precisavam condizer com a realidade pois a própria história era marcada por um viés fabuloso que cativava os alunos à medida que eles iam lendo Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 349 as estrofes do cordel Assim levando em consideração a experiência de leitura com o cordel de José Soares percebemos que a capacidade inventiva da literatura o seu aspecto de fabulação foi o que mais prendeu os alunos mesmo o cordel O futebol no Inferno tendo como referência algo comum do dia a dia uma partida de futebol Conclusão A realização do Clube de Leitura nos permite reiterar que a leitura se caracteriza como uma atividade de grande relevância social na vida do ser humano Entretanto para que ela se torne uma prática mais efetiva na vida dos nossos jovens sobretudo a leitura literária e em especial a de cordéis é preciso que nas escolas sejam desenvolvidas atividades que levem em consideração alguns aspectos considerados importantes tais quais a cultura de que fazem parte os alunos as experiências de leitura já vivenciadas por eles os conhecimentos prévios existentes Tudo isso é importante mas não o suficiente se não for também criado um ambiente de leitura que permita ao aluno espaço de fala para que este se sinta confortável para ler e expressar sua opinião sem julgamentos e correções Neste contexto se o objetivo da escola é formar leitores capazes de se posicionar de forma crítica diante do texto mais do que colocá los em contato com textos literários é preciso que o mediador responsável os motive por meio de estratégias que proporcionem ao leitor em formação autonomia para se expressar e compartilhar dentro do grupo suas impressões e opiniões acerca do texto lido O Clube de Leitura aqui descrito ainda que em um espaço curto de tempo foi uma ação de grande relevância no processo de formação leitora dos alunos da escola em que atuamos A seleção dos textos a linguagem dos cordéis lidos as temáticas próximas dos interesses dos alunos tudo isso contribuiu para que os alunos vivenciassem a experiência do clube de forma ativa lendo comentando compartilhando opiniões e se posicionando de forma crítica frente aos textos com os quais se deparavam em cada encontro Segundo a professora de língua portuguesa dos integrantes do clube a passagem pelo Clube de Leitura propiciou aos alunos a ampliação de suas experiências de leitura e um contato efetivo com diferentes textos da literatura de cordel Já para nós a vivência no Clube de Leitura revelou que o processo de formação de leitores exige um conhecimento dos sujeitos que queremos que se tornem leitores efetivos planejamento das ações didáticas tendo em vista o universo cultural desses sujeitos e seus horizontes de expectativas sem no entanto restringirse apenas a isso e certa dose de coragem para experimentar procedimentos didáticos escolhas de temáticas e de gêneros a fim Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 350 de que ao final o percurso trilhado com ou sem desvios configurese significativo para o docente mediador mas sobretudo para seus alunos REFERÊNCIAS ANDRÉ Marli Eliza Dalmazo Afonso de Etnografia da prática escolar Campinas Papirus 2005 BORDINI Maria da Glória AGUIAR Vera Teixeira de Literatura a formação do leitor alternativas metodológicas Porto Alegre Mercado Aberto 1988 CANDIDO Antônio O direito à Literatura In Vários escritores Rio de Janeiro Duas Cidades 2004 COSSON Rildo Círculos de Leitura e Letramento Literário São Paulo Contexto 2014 CASTRO Laís Santos Futebol e literatura na aula de educação física possibilidades transdisciplinares em uma escola pública em João Pessoa PB Dissertação Mestrado em profissional em formação de professores Universidade Estadual da Paraíba Pró Reitoria de Pós graduação e Pesquisa Campina Grande 2020 p 264 COLOMER Teresa Andar entre livros A leitura literária na escola São Paulo Global 2007 FERRAREZI JR Celso CARVALHO Robson S de De alunos a leitores o ensino da leitura na educação básica São Paulo Parábola 2017 GOMES Francisco Alberto A literatura de cordel como proposta pedagógica de leitura na formação de leitores um estudo em uma escola estadual de ensino médio na cidade do Brejo da CruzPB João Pessoa Periódicos 2021 HAURÉLIO Marco Literatura de cordel do sertão à sala de aula São Paulo Paulus 2013 MARIA Luzia de O clube do livro ser leitor que diferença faz São Paulo Global 2016 MARINHO Ana Cristina PINHEIRO Hélder Cordel no cotidiano escolar São Paulo Cortez 2012 MARTINS Aulus Mandagará Poesia experiência e autobiografia João Cabral e a Descoberta da Literatura In Texto Poético v 14 n 25 juldez 2018 p 469481 MEDEIROS Hadoock Ezequiel Araújo de PINHEIRO José Helder Palmas gritos assovios A leitura de cordel na sala de aula In Leia na escola v 14 n2 2014 p 4657 NÓBREGA Maria Marta dos Santos Silva Por uma metodologia triangular para o ensino de literatura contribuições da experiência estética de Jauss In MILREU Isis RODRIGUES Márcia Candeia Orgs Ensino de língua e literatura políticas práticas e projetos Campina Grande BagagemUFCG 2012 p 235251 PEREIRA José Tiago Marinho A formação de leitores na EJA o letramento literário a partir do cordel Dissertação Mestrado Profissional em formação de professores Universidade Estadual da Paraíba Centro de Educação Campina Grande 2015 SOUZA Willian Eduardo Righini de Clubes de leitura entre sociabilidade e crítica literária In Londrina v 23 n 3 setdez 2018 p 673 695
Texto de pré-visualização
Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 326 LEITURA CORDEL E FORMAÇÃO DE LEITORES EXPERIÊNCIAS EM UM CLUBE DE LEITURA ONLINE SILVA Jaqueline Avelino da1 SILVA Marcelo Medeiros da2 RESUMO Este artigo objetiva compreender de que forma as experiências de leitura de cordel em um clube online contribuíram para a formação leitora de estudantes de uma escola municipal localizada na zona rural de Monteiro Paraíba no período em que atuamos como bolsistas do Programa de Residência Pedagógica Para tanto além de notas de diário de campo valemonos de um questionário aplicado aos alunos que participaram do clube de leitura e à professora de Língua Portuguesa da turma e supervisora da intervenção Metodologicamente esta pesquisa consiste em um estudo de caso de cunho qualitativo e ancorase teoricamente nas discussões de Candido 2004 Marinho e Pinheiro 2012 e Medeiros e Pinheiro 2014 que nos serviram de suporte para pensarmos o lugar da Literatura e do cordel na formação de leitores bem como nos pressupostos de Cosson 2014 Luzia de Maria 2016 e Souza 2018 que por sua vez nos foram imprescindíveis na reflexão sobre os clubes de leitura A análise e os resultados obtidos nos permitiram identificar que o clube de leitura a seleção dos cordéis a linguagem deles e as temáticas trabalhadas contribuíram para que os discentes envolvidos vivenciassem a experiência do clube de forma ativa isto é lendo comentando compartilhando opiniões e se posicionando de forma crítica frente aos textos e com isso desejassem continuar presentes a cada encontro do clube PALAVRASCHAVE Literatura de Cordel clube de leitura formação de leitores ensino remoto READING CORDEL AND FORMATION OF READERS AN EXPERIENCE AT AN ONLINE CLUB ABSTRACT This paper aims to understand how cordel reading experiences at an online club contributed to the reading formation of students from a Town School placed at the countryside of 1 Graduada em Letras Língua Portuguesa pela Universidade Estadual da Paraíba CCHE Email jaquelineasilva262gmailcom 2 Professor doutor da Universidade Estadual da Paraíba CCHE Email marcelomedeirossilvayahoocombr Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 327 Monteiro city Paraíba at time we were scholarship of the Pedagogical Residence Program For this purpose besides the notes of a field diary we have relied on a questionary which was applied with the students who participated of the reading club and with their Portuguese Language Teacher who supervisioned our intervention Methodologically this research has a qualitative slant and it has been supported theorically on the discussions by Candido 2004 Marinho and Pinheiro 2012 and Medeiros and Pinheiro 2014 who supported us to think about the place of the Literature and the Cordel in the formation of readers as well as on the pressuposts by Cosson 2014 Luzia of Maria 2016 and Souza 2018 who were in their turn indispensable into the reflection about the reading clubs The analysis and the results has gotten allowed us to indentify that the reading club which was observed by us even in a short period of time it was a relevant action in the reading formation process of the students In this way the selection of cordels their language and the worked thematics contributed for the students has to lived the experience of the club in a active way in another words reading commenting sharing opinions and placing theirselves in critical way before the texts and with that for they to wish to continue presented every single gathering of the club KEYWORDS Cordel Literature reading club formation of readers remote teaching INTRODUÇÃO A leitura constitui uma das atividades mais essenciais à vida humana porque o ato de ler nos forma como sujeitos de uma sociedade Além disso essa prática nos transforma uma vez que amplia os nossos conhecimentos desenvolve a capacidade de criticidade e estimula a nossa imaginação criativa Por isso as ações de promoção à leitura são imprescindíveis à formação humana e encontram na escola a sua instância de fomento mais importante razão por que as práticas de leitura ocorridas no interior dessa instituição têm sido escopo de várias pesquisas Na esteira de tais trabalhos o presente artigo se volta para a descrição e a reflexão de ações didáticas realizadas em um subprojeto de Língua Portuguesa do Programa Residência Pedagógica da Universidade Estadual da Paraíba campus VI desenvolvido em MonteiroPB entre os anos de 2020 e 2021 em uma escola pública do referido município Tais ações estiveram voltadas para a promoção da leitura com alunos do ensino fundamental e tomaram a forma de um clube de leitura cujos encontros aconteciam semanalmente entre novembro de 2020 e agosto de 2021 e dos quais participaram dezesseis estudantes com idade entre 12 doze e 19 dezenove anos que cursavam o ensino fundamental II Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 328 Tendo em vista a impossibilidade de atividades presenciais por causa do contexto pandêmico vivido desde 2020 a criação de um clube de leitura online foi um espaço importante para a realização das intervenções didáticas mas sobretudo para a promoção de ações voltadas às atividades de leitura a partir de escolhas metodologias e objetivos distintos dos que comumente marcam as práticas de leitura no interior da sala de aula Assim ao refletirmos sobre o quanto o trabalho e o fomento às atividades de leitura no contexto das salas de aula pelo Brasil são em muitas situações deixados equivocadamente em um segundo plano priorizamos para que fossem a leitura e os textos literários em especial os cordéis o centro das nossas ações dentro do Programa de Residência Pedagógica no âmbito do qual se deu a experiência que iremos relatar mais à frente Pensando nessa priorização do trabalho com o texto a nossa primeira atitude foi o cuidado na seleção do que convinha ser lido ao longo do clube Assim era importante que as leituras realizadas de alguma forma levassem em consideração as experiências de vida e a realidade das pessoas envolvidas na ação Foi por este motivo que o cordel se tornou o gênero escolhido para compor o repertório de objetos de leitura de nossas ações didáticas uma vez que o gênero em questão nos possibilitaria uma proximidade com o universo de vivências dos alunos que participariam do clube de leitura tendo em vista que o cordel é uma manifestação cultural nordestina que em parte circula no município onde vivem os alunos e desfruta de certo prestígio dentre os bens símbolicos a que esses estudantes têm acesso Além disso a escolha por tal gênero deveuse também ao fato de que quando embasadas a partir da Literatura de cordel as atividades de leitura ampliam as possibilidades de ensino na medida em que proporcionam um ambiente favorável para o deleite e ao mesmo tempo para a criação e a construção de um imaginário a partir da leitura de folhetos de cordel já que nestes podemos encontrar uma variedade surpreendente de temas situações humanas tragédias comédias casos inusitados relatos históricos que podem ser escopo em sala de aula de situações diversas de leitura de encantamento o que certamente favorecerá aproximação entre texto e leitor O presente artigo está organizado da seguinte forma após esta introdução na seção 2 trazemos uma discussão teórica sobre as contribuições da literatura de cordel na formação de leitores e sobre os clubes de leitura como metodologia eficaz na formação de leitores de cordel A seção 3 está dividida em duas partes na primeira delas analisamos as respostas de um questionário que foi aplicado aos participantes do clube de leitura e que buscava compreender de acordo com a perspectiva dos discentes a importância das ações de leitura realizadas no Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 329 clube online na segunda parte tomando como base as notas dos diários de campo descrevemos as ações de leitura desenvolvidas em um dos encontros do clube Na seção 4 chegamos às considerações finais do artigo 1 Revisão da literatura 11 Cordel e leitura contribuição para a formação de leitores Considerando o histórico de acesso desigual à educação em nosso país não é de todo descabida a afirmação de que nos lugares mais recônditos onde o Estado não se pôde fazer presente plenamente garantindo acesso à educação de qualidade o cordel educou parte de nosso país Quando não educou no sentido formal do termo preencheu em muitos dos cidadãos brasileiros a necessidade de fantasia e de desejo como podemos perceber na leitura do poema Descoberta da Literatura de João Cabral de Melo Neto que ilustra a importância cultural do cordel em nosso país em especial na região Nordeste No diaadia do engenho toda a semana durante cochichavamme em segredo saiu um novo romance E da feira do domingo me traziam conspirantes para que os lesse e explicasse um romance de barbante Sentados na roda morta de um carro de boi sem jante ouviam o folheto guenzo a seu leitor semelhante com as peripécias de espanto preditas pelos feirantes Embora as coisas contadas e todo o mirabolante em nada ou pouco variassem nos crimes no amor nos lances e soassem como sabidas de outros folhetos migrantes a tensão era tão densa subia tão alarmante que o leitor que lia aquilo como puro altofalante e sem querer imantara todos ali circunstantes receava que confundissem o de perto com o distante o ali com o espaço mágico seu franzino com o gigante e que o acabassem tomando pelo autor imaginante ou tivesse que afrontar as brabezas do brigante E acabaria não fossem contar tudo à Casagrande na moita morta do engenho um filhoengenho perante cassacos do eito e de tudo se estava dando ao desplante de ler letra analfabeta de curumba no caçanje próprio dos cegos de feira muitas vezes meliantes Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 330 O poema acima retrata as memórias de uma experiência de leitura com a literatura de cordel O eulírico filho de dono do engenho possui o domínio da leitura e narra a experiência em que trabalhadores do engenho trazem da feira de domingo romances de barbantes folhetos de cordel e o pedem para ler e explicar as histórias a eles Assim sentados na roda morta de um carro de boi sem jante os trabalhadores do engenho vivenciam uma experiência em uma roda de leitura ouvem atentos as narrativas de cordel que se tornam nesse contexto decisivas em suas vidas visto que é no ouvir que estes trabalhadores se tornam leitores Dessa forma a plateia iletrada sentada naquela roda de carro de boi vivencia o prazer de participar de uma roda de leitura compartilhada onde o ato de ler é uma resposta a uma necessidade a de fabulação Nesse caso sendo fabulação a literatura de cordel assim como as demais formas de literatura acaba se configurando como um desejo de toda e qualquer cultura porque o contar e o ouvir histórias é algo que está intrinsecamente ligado ao ser humano O poema de João Cabral de Melo Neto atualiza pois na esteira do pensamento de Antonio Candido acerca da função social da literatura a ideia de ser esta um direito humano porque se configura como uma necessidade humana tendo em vista que ninguém pode passar vinte e quatro horas sem mergulhar no universo da ficção e da poesia CANDIDO 2004 p 175 e também porque a literatura é o meio para o qual projetamos nossos desejos sonhos raivas frustações É o ímã que atrai as nossas descargas emocionais Por isso é fator indispensável de humanização e sendo assim confirma no homem a sua humanidade inclusive porque atua em grande parte no subconsciente e no inconsciente CANDIDO 2004 p 175 Logo a literatura não é uma experiência inofensiva Ela atua na formação da personalidade sem corromper ou edificar visto que trazendo livremente em si o que chamamos o bem e o que chamamos o mal humaniza em sentido profundo porque faz viver CANDIDO 2004 p 176 Nesse sentido o eulírico do poema Descoberta da Literatura não é apenas compreendido como um eu que compartilha de forma biográfica uma situação em que lia romances de cordel para os trabalhadores mas o poema transmite ao leitor as memórias de um eu que reflete acerca de uma experiência literária em que a literatura de cordel como elemento cultural se instala em seu imaginário Dessa forma a palavra descoberta que dá nome ao poema não evoca apenas o conhecimento daquilo que outrora era tido como segredo e não podia chegar aos ouvidos da CasaGrande mas representa sobretudo uma experiência literária profunda e significativa tanto para o eulírico como para os trabalhadores que ouvem atentos as narrativas de cordel MARTINS 2018 Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 331 Assim tendo em vista a importância histórica do cordel na formação de muitos leitores sobretudo na região Nordeste considerando as experiências humanas que os folhetos de barbantes trazem esses são importantes para a formação humana dos sujeitos e por isso devem fazer parte dos materiais de leitura para as práticas que ocorrem no interior da escola uma vez que conforme afirma Gomes 2021 p 8 O trabalho com a leitura ligada a esse tipo de produção artística oferece mais oportunidade de observar e compreender o mundo à sua volta o que possibilita ao aluno um ganho maior de autonomia de outras possibilidades de aquisição do conhecimento Em consonância com essa afirmação Pereira 2015 lembra que No cordel os fatos narrados são acontecimentos presenciados ou conhecidos pelos escritores e pelo público Se outrora versavam geralmente sobre façanhas extraordinárias de vaqueiros de conversas entre animais histórias de valentões fazendeiros beatos cangaceiros matutos astuciosos enfim um conjunto de personagens que lembrava pessoas e práticas existentes no cotidiano da sociedade no sertão nordestino na atualidade não há limites para temas os mais diversos assuntos viram poesia na pena do poeta popular PEREIRA 2015 p 45 Nesse sentido observase que o cordel resgata em seus versos traços da cultura popular da oralidade e principalmente coloca em pauta temáticas que circulam no meio social dos alunos o que faz desse gênero um verdadeiro convite para o deleite em uma boa narrativa capaz de envolver toda a comunidade no processo de leitura e discussão de maneira análoga ao que é narrado por João Cabral de Melo Neto no poema que trouxemos no início desta seção e que mostra o quanto a literatura de cordel servia de alimento tanto para o sujeito letrado o filho das elites dos engenhos quanto para os trabalhadores do eito que sentiam necessidade de fantasia e de desejo e por isso valiamse da literatura de cordel para preencher tal necessidade Levandose em consideração que o percurso de formação de leitores se dá por meio de um processo paulatino de constantes e efetivas atividades de leitura e discussão de textos reiterar a necessidade da presença da Literatura de cordel no fomento de práticas de incentivo à leitura é acima de tudo valorizar a cultura nordestina é enxergar nesta literatura uma rica diversidade em abordagens e temas que quando associados a metodologias coerentes tornase uma importante ferramenta para provocar a emoção dos alunos e refinar a emoção estética deles Afinal um bom leitor não é aquele que simplesmente decodifica palavras de um texto mas sim aquele que é capaz de associar a leitura realizada com o mundo que está a sua volta Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 332 e com as suas próprias experiências de vida em um processo por meio do qual vai refinando suas emoções e aprimorando a sua consciência de ser e estar no mundo Assim reiterando a importância da escolarização do cordel tendo em vista o potencial formativo que esse gênero possui mas tendo também consciência de que essa escolarização não pode ocorrer de qualquer forma é que a partir de Marinho e Pinheiro 2012 resgatamos algumas sugestões de procedimentos que podem ser empregadas no trabalho com a Literatura de cordel em sala de aula e das quais nos valemos em alguns dos encontros do clube de leitura Para esses autores uma primeira atividade que pode ser realizada em sala de aula até porque ela atende bem a perspectiva de interdisciplinaridade tão em voga é discutir e trabalhar as ilustrações típicas dos folhetos que são as xilogravuras MARINHO E PINHEIRO 2012 p 131 Nesse caso o professor pode solicitar aos alunos que a partir da associação entre imagens que compõem a xilogravura e o título dos cordéis os alunos levantem suposições do que pode vir acontecer na narrativa Além disso podem ser pensadas atividades que adicionem outros elementos para serem abordados junto com a Literatura de cordel tais como a musicalização de estrofes o trabalho de escuta de canções que apresentem relação com o texto que será lido Afinal a musicalização de algumas estrofes ou mesmo o simples fato de iniciar a aula ouvindo uma música pode atrair os alunos visto que a sonorização pode trazer um sentimento a mais para a compreensão e fruição do texto tornando a atividade de leitura mais prazerosa Eis um fato que talvez seja instrumento de vivências agradáveis em sala de aula Cantar com toda a turma uma canção cantar em pequenos grupos sugerir que os próprios alunos criem música para as histórias é um começo de conversa MARINHO PINHEIRO 2012 p132 No entanto se a musicalização das estrofes não for uma realidade possível para a turma podem ser levadas músicas que se associem ao cordel trabalhado em sala para serem ouvidas antes da leitura do texto afinal a vertente da MPB bebeu e continua bebendo no fecundo poço do Cordel Compositores nordestinos souberam redimensionar ritmos criar uma música com face peculiar MARINHO PINHEIRO 2012 p 132 Desta forma ao estabelecer essa aproximação do educando com temas presentes na cultura popular e sobretudo por possibilitar diferentes formas de abordagens em sala a Literatura de cordel tornase uma rica fonte para o desenvolvimento de atividades de leitura e o aprimoramento do letramento literário dos alunos Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 333 12 Clube de leitura uma metodologia para a formação de leitores de cordel Para início de conversa gostaríamos de trazer a seguinte fala Professora por que aqui no clube do livro literatura é tão legal e na sala de aula é tão chata Esse questionamento está relatado no livro O clube do livro ser leitor que diferença faz de Luzia de Maria 2016 e nos faz refletir sobre quais procedimentos e metodologias tornam a leitura na perspectiva desta aluna uma atividade significativa quando realizada em um clube do livroleitura ao contrário das atitudes e posicionamentos que são tomadas em sala de aula para que esta mesma atividade se torne algo enfadonho e chato para os estudantes Para discorrer sobre o assunto parece indispensável sabermos como se configura e se caracteriza um clube de leitura para assim compreendermos o que existe por trás da oposição entre ler dentro e fora da sala de aula Segundo Cosson 2014 p 138 os clubes de leitura são uma forma de interação social por meio da qual as práticas de leitura ganham a especificidade e concentricidade dos gestos espaços e hábitos Esses espaços não são simplesmente os locais onde acontece a leitura de um livro ou texto literário tampouco se configuram como encontros para uma mera discussão de um determinado texto Pelo contrário os clubes de leitura são eventos de interlocução em que predominam a coletividade o compartilhamento de perspectivas e a interação social e para cujo funcionamento os seguintes elementos são essenciais leitores um grupo de pessoas entre dez e vinte cinco pessoas vários exemplares de livros ou seja cada participante deve ter um exemplar da obra a ser discutida e por fim um coordenador uma pessoa que deve moderar as reuniões além de estimular a participação e organizar as atividades do grupo COSSON 2014 p 153 De maneira geral um clube de leitura a depender do perfil objetivos e interesses dos participantes pode assumir abordagens distintas e não precisa ocorrer necessariamente de forma presencial Os espaços virtuais têm fomentado o surgimento de vários clubes para a discussão de uma miríade de temas autores e obras Sobre a importância pedagógica dos clubes de leitura no espaço virtual Cosson 2014 afirma Os clubes do livro online podem igualmente ser um instrumento didático de grande alcance entre os jovens Como uma atividade escolar eles ampliam o tempo destinado às discussões sobre a obra permitem que os alunos mais tímidos participem com mais facilidade oferecem um tempo maior para os Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 334 alunos lerem a contribuição dos colegas e se pronunciarem com maior organização do pensamento entre outros benefícios COSSON 2014 p 151 Assim por não exigirem o deslocamento físico forjar uma maior privacidade e de certa forma facilitar o contato entre sujeitos afins pelo mundo os clubes de leitura online tornamse uma importante opção para o compartilhamento de leituras SOUZA 2018 p 683 Sobre esse assunto Cosson 2014 p 154 salienta que os espaços de promoção à leitura como os clubes de leitura promovem a interação entre textos e leitores entre leitura e literatura entre o privado e o coletivo As leituras são portanto expostas e os sentidos dados ao mundo por meio delas são discutidos e reconstruídos Assim participar de um clube de leitura é compartilhar com um grupo de pessoas as interpretações impressões e percepções acerca de um texto e dos modos como somos afetados por esse texto Entretanto vale ressaltar que todo esse processo deve ser desenvolvido com o auxílio de um mediador que incentive os participantes a apresentarem as mais diversas opiniões sobre o que escolherem como objeto de leitura para o clube Por isso o primeiro acordo a ser estabelecido entre os membros de um clube de leitura e igualmente entre professores e alunos é este Assim como uma regra básica sem a qual nenhum clube de leitura ou espaço de aprendizado pode funcionar é que seja garantido a todos o seu direito à fala Mas isso implica que seja cobrado de todos o respeito ao colega o dever de silenciar e ouvir quando a fala pertence a outro seja ele o professor ou algum aluno LUZIA DE MARIA 2016 p 29 Neste sentido os clubes de leitura devem ser antes de qualquer coisa um espaço de respeito ao posicionamento e à opinião do outro afinal o diferencial desses clubes é justamente a forma como os textos são abordados a mediação e principalmente os espaços de fala concedidos aos seus integrantes Tudo concorre para que haja a cada encontro a promoção de interações de diálogos Desta forma os espaços de fomento à leitura do texto literário como os clubes ou os círculos de leitura presencial ou remotamente devem sempre ser incentivados de modo que alcancem o maior número possível de jovens para que estes possam ser paulatinamente inseridos em práticas de leitura que lhes sejam mais significativas e possam contribuir para a sua formação como cidadão e como ser humano no geral Por isso é importante que as ações de promoção à leitura e a manutenção de espaços de fomento à leitura existam efetivamente no interior da escola e sejam devidamente planejados Formar leitor exige tempo e planejamento Não se forma leitor da noite para o dia nem Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 335 tampouco de qualquer maneira Acreditamos que foi essa consciência acerca da responsabilidade política e pedagógica que envolve a formação de leitores e o cuidado no planejamento das nossas ações didáticas desde a seleção dos textos até a escolha dos procedimentos didáticos para a entrada do texto na sala de aula que garantiram o êxito do clube de leitura que coordenamos com estudantes do ensino fundamental Para corroborar essa nossa hipótese passamos a analisar o questionário aplicado com os integrantes do clube de leitura mas antes apresentaremos brevemente a metodologia e os procedimentos que nos guiaram na realização da experiência de que o presente texto constitui uma reflexão 2 Metodologia Como estudo de caso na esteira de André 2005 a pesquisa de que se origina o presente artigo é uma investigação sobre a formação de leitores na educação básica a partir da reflexão sobre a realização por meio da plataforma do Google Meet de um clube online em que de novembro de 2020 a agosto de 2021 foram lidos um conjunto de cordéis com alunos do ensino fundamental II de uma escola da rede pública de ensino do município de Monteiro PB onde atuávamos como bolsistas do subprojeto de Língua Portuguesa vinculado ao Programa de Residência Pedagógica do Centro de Ciências Humanas e Exatas CCHE campus VI da Universidade Estadual da Paraíba O nosso corpus constituiuse inicialmente das respostas dos integrantes a um questionário que foi aplicado a eles após o encerramento das atividades do clube de leitura Esse questionário foi produzido via formulário Google e era composto por um total de 15 quinze questionamentos abertos que objetivavam apurar a percepção dos alunos acerca de três momentos específicos as perguntas iniciais buscavam compreender como os alunos se enxergavam enquanto leitores e que leituras costumavam realizar antes de participarem do clube Em um segundo momento as perguntas se direcionavam a tentar compreender de que forma as atividades e as estratégias de leitura desenvolvidas no clube contribuíram para a formação leitora deles Por fim o terceiro bloco de perguntas buscava identificar como os alunos se avaliavam enquanto leitores após terem participado do clube de leitura Desta forma conseguimos contato com um total de 10 dez participantes os quais prontamente aceitaram responder ao questionário A maioria era do sexo feminino 8 oito e apenas 2 dois eram do sexo masculino Para preservar a identidade de nossos colaboradores durante a análise de suas respostas atribuímos a cada um deles um nome fictício que remete Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 336 aosàs protagonistas dos cordéis lidos ao longo do clube Assim mais adiante em nossa análise aparecerão Creuza e Evangelista do Romance do Pavão Misterioso Pedro Malazarte de As palhaçadas de Pedro Malazarte Calar Valdivino Esmeralda e Floriano de Cachorro dos Mortos Genival e Cesário de O filho de Evangelista do pavão Misterioso e por fim Frederica personagem de A sedutora Maldita Posteriormente tomamos como corpus também as notas em nosso diário reflexivo as quais nos permitiram descrever como se deu a realização dos encontros Entretanto no presente texto deternosemos apenas à descrição e reflexão de um único encontro não só para que se possa compreender como o clube de leitura funcionava mas também para ilustrar a metodologia e os procedimentos didáticos empregados em cada um deles Assim como precisamos operar por recorte optamos por descrever o encontro em que se leu o cordel Futebol no inferno de autoria do José Soares Tal escolha não foi aleatória mas levou em conta os dados do questionário segundo os quais esse foi o cordel que mais cativou os nossos colaboradores tendo em vista que o tema dele estava mais próximo de seus horizontes de expectativa já que a prática de futebol é uma das mais frequentes redes de sociabilidade na região onde moram os participantes do clube de leitura Vale ressaltar que o número de encontros do clube de leitura não corresponde entretanto ao de cordéis lidos visto que para a leitura de alguns textos como Cachorro dos Mortos de Leandro Gomes de Barros A Sedutora Maldita de Manuel d Almeida Filho A moça que mais sofreu na Paraíba do Norte de Antônio Américo Medeiros O mistério dos três anéis e o Morcego Humano ambos de autoria de Delarme Monteiro O massacre de Canudos de Varneci Santos do Nascimento e O Filho de Evangelista do Pavão Misterioso de Manoel Apolinário Pereira foi necessário destinar mais de um encontro tendo em vista que eram cordéis mais extensos cuja leitura não se encerrava em uma única tarde período em que nos reuníamos via plataforma do Google Meet Ainda assim o clube de leitura teve no total vinte e sete encontros nos quais os estudantes tiveram a oportunidade de conhecer dezoito importantes cordelistas e entraram em contato com vinte e um cordéis alguns dos quais considerados cânones de nossa literatura popular Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 337 3 Resultados 31 Leitores de Cordel em formação experiências em um Clube de Leitura online Nesta seção a partir da análise do questionário aplicado com os integrantes do clube de leitura procuramos 1 compreender as práticas e hábitos de leituras vivenciados pelos alunos antes desse projeto 2 identificar como foi a experiência de participar do clube e as impressões dos integrantes em relação aos cordéis lidos nos encontros e 3 refletir sobre o que eles acreditam ser semelhante ou discrepante do trabalho com a leitura na sala de aula em comparação com as atividades desenvolvidas no clube de leitura bem como 4 investigar de que forma a participação no clube e as leituras do gênero cordel realizadas contribuíram na vida dos integrantes enquanto leitores em formação Assim no que tange às práticas e hábitos de leitura vivenciados pelos alunos antes do Clube de Leitura em resposta ao questionamento sobre esse aspecto duas alunas apontaram gostar de poesiaversos e afirmaram ler com frequência Um aluno destacou já ter conhecimento do gênero cordel e que este tipo de texto fazia parte do seu repertório de leitura Outra aluna destacou ler notícias e textos disponíveis na internet e o restante dos entrevistados afirmou que suas leituras se restringiam a gibis contos e textos presentes nos livros didáticos da escola Entretanto quando pensamos a leitura desenvolvida somente a partir dos livros didáticos como é colocado por um dos alunos nos deparamos com uma situação grave visto que o livro didático sozinho não é suficiente para uma eficaz formação de leitores tendo em vista que muitas vezes oferece apenas fragmentos de textos literários e geralmente os aborda do ponto de vista gramatical BORDINI AGUIAR 1988 p 33 Dessa forma pelas colocações dos alunos é possível observar que as práticas de leituras desempenhadas por eles talvez não acontecessem com frequência nem tampouco parecem ser levadas a sério visto que as respostas apresentadas pelos discentes expressavam uma vaguidão o que nos leva a crer que estas leituras aconteciam esporadicamente e de forma aleatória seja por não terem acesso a livros de literatura seja por não haver alguém que mediasse o contato deles com esses gêneros Assim quando questionados com que frequência realizavam essas leituras os alunos pontuaram pouca assiduidade e relataram que quase nunca tiravam tempo para ler por deleite por prazer Um aluno pontuou que o hábito de leitura não era algo presente em sua vida e apenas lia quando precisava tirar alguma dúvida ou mesmo quando necessitava estudar para alguma prova Outro aluno destacou que passava semanas sem ao menos pegar em um livro em um texto e só realmente lia quando algum professor propunha a atividade Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 338 Já quando perguntados sobre o que fazia com que eles retornassem todas as quintas feiras para participarem dos encontros do Clube de Leitura observamos que as respostas dos alunos entrevistados apontam para um incentivo por parte da docente de Língua Portuguesa que os convidou a participar da atividade A aluna Creuza por exemplo destacou Fiquei sabendo pela professora de português que mim sic fez o convite de participar O que mim sic fez querer participar foi que gosto muito de lê sic e tive certeza q sic entrando nesse grupo só tinha a ganhar Se o convite da docente foi importante a curiosidade acerca do que era um clube de leitura e de como funcionaria também foi outro elemento motivador para atrair interessados como afirmam Frederica Evangelista e Pedro Malazartes Frederica Minha professora me falou a forma que funcionava como eles iam nos ensinar achei interessante e quis participar Evangelista Minha professora me comunicou e me influenciou a participar pois ela viu que seria algo bom pra mim eu tive curiosidade de saber como funcionava e acabei entrando Pedro Malazarte a professora de Português me chamou fiquei curioso e fui pra conhecer Já as respostas de Valdivino e Calar respectivamente Por que eu achava bem divertida as aulas etc e A professora quem sic me falou do clube fui a primeira vez e resolvi continuar participando por que achei legal expressam não só o motivo que os trouxe ao clube como também o que os fez continuarem participando dos encontros Ao serem convidados pela professora eles vão vivenciar as suas primeiras descobertas e experiências em um evento formativo como o que estávamos coordenando e a partir das percepções iniciais resolvem continuar fazendo parte da atividade Parece que já no encontro inicial os alunos percebem que as leituras coletivas desenvolvidas por nós poderiam ser uma forma de ampliarem seus horizontes culturais por meio do diálogo e do compartilhamento de ideias COSSON 2014 Posteriormente com intuito de realizarmos uma avaliação geral acerca dos aspectos que os alunos consideravam importantes nas atividades desenvolvidas no Clube de Leitura perguntamos o que eles destacavam como positivo nos encontros de que participaram Assim de maneira geral observamos que em suas respostas fizeram menção a três aspectos a as interações e participações durante os encontros b a organização e atuação dos residentes e c a escolha dos cordéis a serem lidos Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 339 Metade dos alunos considera como aspectos positivos do Clube de Leitura a interação e a participação dos integrantes Segundo eles os encontros se tornavam mais dinâmicos e contribuíam para que de certo modo eles ficassem desinibidos e perdessem a vergonha de ler em público Assim ainda que essa leitura fosse mediada pela tela de um computador ou celular uma vez que como já dissemos todos os encontros do Clube de Leitura ocorreram de modo remoto em virtude do contexto pandêmico ao contrário do espaço de sala de aula em que muitos relataram ter vergonha de ler no ambiente online do Clube de Leitura os alunos afirmaram se sentirem à vontade para ler comentar e interagir durante os encontros Dessa forma o espaço do Clube foi para eles um ambiente que proporcionou liberdade para que pudessem se expressar e partilhar suas respectivas opiniões Afinal o primeiro acordo a ser estabelecido entre os membros de um clube de leitura e igualmente entre professores e alunos é como o dissemos citando Luzia de Maria 2016 justamente o direito à fala e a ser ouvido Por lhes ter sido facultado esse direito é que os integrantes do Clube de Leitura ligavam seus microfones seja para emitirem alguma opinião acerca do que era lido eou perguntado seja para lerem algum trecho do cordel que era objeto de leitura do dia Três alunos afirmaram que para eles o aspecto positivo foi a execução de cada encontro do Clube ressaltando o trabalho desempenhado pelos residentes no planejamento e a atenção que eles concediam aos integrantes do Clube Creuza A interpretação dos residentes e dos professores que compõem o clube de leitura Frederica A forma como o pessoal organizava o encontro Cesário Professores muito bons divertidos alegres que nos motivava sic a ler fazendo com que voltássemos toda semana Em uma das respostas um entrevistado alega que o incentivo dos bolsistas era o que o fazia retornar toda semana Assim na função de mediadores conseguimos criar as condições para que os alunos pudessem acolher o texto e se sentissem participantes efetivos em cada encontro do clube Mais do que apresentar o cordel aos discentes os residentes construíram estratégias de compreensão para que os estudantes fossem capazes de agir diante do texto comentando e compartilhando as suas impressões de leitura de maneira crítica mas também sensível frente às experiências humanas mimetizadas em cada um dos cordéis lidos Por fim duas das respostas pontuadas pelos discentes se voltavam para nostalgia presente nos cordéis lidos Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 340 Calar Os textos pra mim foram todos positivos me ajudaram bastante e fizeram parte da minha vida de uma forma muito especial Pedro Malazartes As histórias tinha sic muita nostalgia e eram bons os textos Um dos alunos destacou que os textos contribuíram para sua vida de forma significativa e especial Neste sentido tendo em vista que os textos da literatura de cordel contemplam em suas narrativas temáticas do cotidiano costumes crenças de um povo além de sobretudo narrar grandes histórias de personagens imaginários como príncipes e princesas de reinos distantes até fatos verídicos da realidade de uma comunidade talvez tenha sido esta grande variedade para os alunos o motivo de identificação que fez com que essas leituras se tornassem significativas e especiais para eles Por isso procuramos também saber quais cordéis chamaram mais atenção dos alunos Creuza Cesário e Valdivino destacaram O filho de Evangelista do Pavão Misterioso de Manoel Apolinário Pereira como sendo a leitura que mais lhes cativou entretanto apenas Cesário de alguma forma esclarece o motivo pelo qual essa leitura lhe chamou a atenção quando diz O filho de Evangelista do pavão misterioso por que contava uma história bem diferente e interessante e com bastante mistério Ao destacar que o referido cordel lhe chamou a atenção por conter bastante mistério acreditamos que o aluno está se referindo ao fato de o pavão de alumínio presente no cordel caracterizarse como um elemento surpresa que provoca uma reviravolta na história e na vida dos personagens Desta forma tendo em vista que inicialmente não é revelado o significado do pavão para a história a narrativa tornouse aos olhos do aluno uma história repleta de mistério que foi sendo desvendado na leitura de cada verso de cada estrofe Já Evangelista que provavelmente não lembrou o título do cordel de que mais gostou escreveu uma espécie de pequeno resumo do texto para se referir a sua história preferida Foi um que a família foi toda comida por onças restando apenas um sobrevivente que fugiu Me tocou bastante esse cordel por o personagem ter tido forças de continuar o seu caminho sozinho e lutando por sobrevivência Assim a partir das informações fornecidas por ele tendo conhecimento das leituras que foram realizadas no Clube sabemos que Evangelista está se referindo ao cordel A moça que mais sofreu na Paraíba do Norte de Antônio Américo de Medeiros cuja personagem principal Judite buscando fugir da fome e da seca faz junto com a sua família um longo trajeto a pé durante o qual acaba perdendo todos os seus parentes em Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 341 um ataque de onças Embora não lembre o título do cordel o aluno recorda bem os acontecimentos da história e na sua resposta ainda aproveita para justificar o motivo de ter gostado do cordel a persistência e a força da protagonista que mesmo tendo perdido toda a família conseguiu encontrar forças para lutar por sua sobrevivência Floriano por sua vez ao ocultar parte do título do cordel que lhe chamou mais atenção estava se referindo a Futebol no inferno de José Soares Ele não explica por que censurou a palavra inferno tampouco por que apesar disso foi justamente este o cordel que mais gostou Se não podemos aventar resposta para o primeiro caso para o segundo no entanto acreditamos que o fato de os alunos morarem em uma região onde a prática de futebol é uma atividade muito recorrente principalmente nos finais de semana quando as famosas peladas são para os moradores da região uma das mais importantes formas de sociabilização e lazer fez com que Floriano se identificasse com a leitura de Futebol no Inferno estabelecendo assim conexões entre o texto lido e as suas vivências na região onde mora Esmeralda Frederica e Genival destacaram em suas respostas que não recordavam os títulos dos cordéis Esmeralda alega que a sua falta de memória em relação aos títulos devese ao fato de já fazer algum tempo desde os encontros quando foram realizadas as leituras dos cordéis A resposta da aluna de certo modo é coerente uma vez que quando aplicamos o questionário já haviam se passado cinco meses desde a data do último encontro do Clube Frederica destaca que não se lembra e por isso não pode apontar nenhum texto Genival também destaca que não recorda nenhum título dos cordéis lidos e pede desculpas por isso Por fim Calar e Pedro Malazarte alegam que todos os cordéis foram importantes Pedro Malazarte não explica o porquê entretanto Calar diz que a variedade dos cordéis lidos ao longo do Clube de Leitura fez com que ele se sentisse mais envolvido com os textos da literatura de cordel A nosso ver o fato de a cada semana lermos sobre um tema diferente fez com que todos os cordéis fossem na opinião de Calar considerados importantes e tudo isso só foi possível devido à literatura de cordel abarcar os mais variados temas indo das histórias jocosas aos dramas históricos passando por folhetos circunstanciais ou de acontecido HAURÉLIO 2013 p 35 Já quando perguntados se consideravam as leituras realizadas no Clube boas escolhas todos os alunos que responderam ao questionário afirmaram que sim porém apenas alguns deles alegaram o motivo que fazia com que eles tivessem tal opinião sobre os textos lidos As respostas apresentadas por Creuza e Evangelista trazem algo de semelhante Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 342 Creuza Sim porque sempre é real Evangelista Sim pois de uma forma diferente sempre falava sobre nossa realidade só precisávamos interpretar melhor Ambos os alunos consideram as leituras boas escolhas pelo fato de apresentarem acontecimentos próximos da realidade deles Vale ressaltar que muitas leituras realizadas no Clube de fato apresentavam situações bastante fantasiosas entretanto quando os alunos mencionam acontecimentos da nossa realidade acreditamos que eles se referem a aspectos reflexivos presentes nas leituras como por exemplo as histórias de amores proibidos presentes no cordel Romance do Pavão Misterioso de José Camelo de Melo ou mesmo a fidelidade de um cão ao seu dono expressa no cordel Cachorro dos Mortos de autoria de Leandro Gomes de Barros os erros cometidos na juventude conforme exposto no texto A história de um filho errante e as preces de uma mãe de Antônio Carlos e entre outros temas abordados nos cordéis lidos Neste sentido os textos da literatura de cordel foram considerados na opinião dos alunos uma boa escolha por apresentar experiências que talvez pudessem ter sido partilhadas por eles em alguma etapa de suas vidas Na perspectiva dos alunos Floriano e Frederica as obras lidas foram considerados uma boa escolha por eles também terem participado do processo de seleção dos textos tendo em vista que nos encontros do Clube de Leitura sempre pedíamos que os alunos indicassem temáticas e assuntos que gostariam de ler ou mesmo selecionávamos alguns títulos de cordéis e pedíamos que eles votassem nos textos que gostariam de ler nas semanas seguintes como ilustra a imagem abaixo exibida antes do término de mais um encontro do clube de leitura Figura 1 Votação realizada ao final de um encontro para decidirmos as leituras das próximas semanas Fonte Acervo da pesquisadora Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 343 Assim a partir das capas e títulos dos cordéis expostos os alunos votavam nos textos que mais lhes chamaram a atenção e gostariam que fossem lidos nos próximos encontros Desta forma levando em consideração a opinião e as escolhas dos integrantes do Clube planejávamos os próximos encontros a partir do cordel mais votado Querendo investigar as singularidades das práticas de leitura do Clube em relação às realizadas em sala de aula tendo em vista que eram notórios o interesse a participação e a frequência dos alunos nos encontros do Clube perguntamos a eles o que consideravam como diferencial de um em comparação ao outro Em resposta ao questionamento Creuza afirma que a diferença entre as atividades desenvolvidas no Clube em comparação com as que aconteciam em sala de aula estava na participação Segundo a discente no Clube as interações se davam de maneira mais expressiva o que contribuía para que a leitura se tornasse mais divertida e significativa Isso se diferencia do que tradicionalmente é proposto pela cultura escolar no Brasil que equivocadamente promove o silenciamento dos alunos Nosso sistema escolar como raríssimas exceções que fazem mais confirmar a regra é muito hábil em formar bocas e mentes silenciosas como afirmam Ferrarezi e Carvalho 2017 Por isso diferente do que ocorre em sala de aula no Clube de Leitura de acordo com Creuza os alunos possuíam espaço de fala fazendo que se sentissem parte essencial da atividade então mais do que simples participantes que liam textos da literatura de cordel os alunos eram a peçachave da ação aqueles que partilhavam suas experiências de vidas as impressões de leitura os conhecimentos adquiridos confrontando seus horizontes de expectativas entre si mesmos e com o horizonte dos próprios textos lidos Já para Evangelista o fato de os textos da literatura de cordel conterem em suas histórias aspectos da realidade e do cotidiano fazia que as leituras se tornassem mais divertidas visto que de acordo com o aluno os textos lidos na escola eram mais difíceis de serem compreendidos Provavelmente o aluno encontrou nos textos trabalhados no Clube de Leitura certa facilidade de compreensão devido ao fato de os cordéis tratarem de assuntos que de alguma forma se relacionavam com as experiências de vida partilhadas por ele Em contrapartida ainda segundo Evangelista os textos abordados em sala de aula se distanciavam de sua realidade e portanto eram menos compreendidos pelos estudantes Isso porque geralmente o que circula como texto no interior das práticas de leitura na escola são materiais anódinos que pouco dizem para os alunos Texto não é exercício de cobrança mas de diálogo de encontro de vivência de trocas de experiências Os cordéis trabalhados no Clube Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 344 enquadraramse nessa concepção de texto e por isso na opinião dos integrantes as leituras eram mais divertidas do que as que costumam ser realizadas no espaço da sala de aula Na opinião de Esmeralda as leituras do Clube aconteciam de forma espontânea e por não se sentirem obrigados a realizaremnas tudo acontecia de forma mais natural sem nenhuma pressão segundo a aluna O fato de as leituras acontecerem de forma compartilhada coletiva foi o que Frederica destacou como sendo o diferencial do Clube Neste sentido a dinâmica de pedir que cada aluno participasse lendo ao menos uma estrofe foi na opinião dessa integrante o que tornou os encontros mais interativos talvez isso se deva ao fato de que na sala de aula nem todos os alunos se sintam à vontade para ler porque tomam a leitura nessas ocasiões como momentos de avaliação e as interações e participações não aconteçam com frequência o que torna a leitura mais cansativa e restrita a poucos alunos porque em sala de aula o texto deixa de ser objeto de leitura e passa a ser instrumento para a testagem de conteúdos geralmente de natureza gramatical Do texto passase à primazia de fragmentos os quais são utilizados para exemplificação de taxonomias gramaticais Logo ler como experiência formativa deixou de ser importante e para isso não há mais tempo na escola uma vez que o importante é ler para realizar alguma tarefa isto é para mostrar serviço Entretanto a escola se esquece de que lemos não apenas porque precisamos realizar certas atividades pragmáticas porque precisamos realizar uma atividade racional Lemos porque sentimos a necessidade de entrar em contato com bens simbólicos porque sentimos fome de fabulação porque precisamos preencher as necessidades de fantasia e de desejo como já o disse Antonio Candido Ler aponta para uma necessidade existencial do próprio homem Sentimos fome do contato com objetos estéticos A arte nos apascenta o espírito ou o inquieta mas em um ou em outro caso isso é catártico Logo os encontros do Clube de Leitura que coordenamos afiguraramse para seus integrantes como um evento catártico porque concorreram para que cada um dos alunos pudesse experienciar o prazer decorrente da expiação dos próprios sentimentos e também da transformação de suas convicções Houve pois uma identificação entre o leitor e aquilo que ele via representado na obra Essa identificação por sua vez contribuiu para que esses alunos na condição de receptores dos cordéis pudessem em certa medida mudar de comportamento social libertandose de algumas amarras do cotidiano de modo que viessem a ampliar sua visão e julgar os fatos e a realidade ao seu redor NÓBREGA p 245 como pretendemos demonstrar na seção abaixo em que descrevemos como se deu o encontro para a leitura do cordel Futebol no Inferno de José Soares texto Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 345 escolhido pela maioria dos integrantes do clube como o que mais chamou a atenção deles e do qual dizem ter gostado mais 31 De uma partida de futebol no Inferno descrição e reflexão em torno de um encontro do clube de leitura O compartilhamento de obras e leituras com outras pessoas tornase essencial uma vez que o leitor em formação se beneficia das competências dos outros para construir o sentido e obter o prazer de entender mais e melhor os livros Além disso o compartilhamento de leituras em virtude de sua dimensão socializadora faz com que a pessoa se torne parte de uma comunidade de leitores com referências e cumplicidades mútuas COLOMER 2007 Diante deste contexto os encontros do Clube de Leitura buscaram permitir aos alunos essa dimensão socializadora e a partir dela criar condições para que eles ampliassem a percepção crítica em relação à literatura de cordel No que concerne ao encontro em que lemos e discutimos o texto Futebol no inferno de José Soares observamos que as ideias compartilhadas entre os próprios alunos faziam com que a compreensão do texto se desse de forma mais interativa e contextualizada visto que a todo o momento eles compartilhavam ideias e informações sobre a leitura sobre as regras do futebol comparando as partidas disputadas pelos seus times com a que era descrita no cordel de José Soares Talvez essa participação se deva como já o dissemos em outro momento ao fato de o futebol se caracterizar como uma prática socializadora e de lazer para a comunidade onde os alunos residem e a partir desta relação afetuosa com o esporte os alunos conseguirem estabelecer conexões com o texto lido porque para eles parafraseando Castro 2020 o futebol não é apenas uma prática esportiva mas sim um evento próprio da cultura local deles que veicula significados a partir dos quais é possível as relações sociais que os alunos constroem entre si e o próprio entorno Assim antes de iniciarmos a leitura do cordel como sempre procedíamos em todos os encontros realizamos uma atividade motivacional Nesse dia a motivação buscava fazer com que os alunos descobrissem o título do texto que seria lido Para tanto por meio de algumas pistas presentes em um jogo online Wordwall os discentes desvendaram os enigmas e chegaram ao título O Futebol no inferno Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 346 Figura 2 Jogo no aplicativo Wordwall para os alunos adivinharem o título do cordel Fonte Acervo da pesquisadora Um detalhe merece destaque após a revelação do título do cordel através do jogo citado um aluno afirmou já conhecer a história e destacou que o texto era muito bom e divertido O fato de o discente já conhecer o cordel nos chamou bastante atenção visto que nos encontros até então realizados essa situação nunca havia acontecido Dessa forma com o intuito de sabermos se o aluno havia lido o cordel a pedido de algum professor na escola ou se o leu de forma espontânea perguntamos de que forma ele havia conhecido o texto Em resposta o aluno destacou que o lera após ouvir o comentário de um colega quando então decidiu conhecer a história O aluno foi motivado a ler o texto pela influência exercida pelo colega mas também pelo título do texto e as demais informações presentes na capa do cordel Entretanto de maneira geral a temática que estabelecia conexão com o futebol agradou não só a este aluno que já conhecia o texto mas a todos os participantes tanto os meninos quanto as meninas Assim antes mesmo de darmos início à leitura os alunos começaram a associar o cordel aos seus times de futebol nacionais e aos times locais que jogavam no sítio onde eles moravam Refletindo sobre essa situação e levando em consideração os dizeres de Bordini e Aguiar 1988 p18 percebemos que o primeiro passo para a formação do hábito de leitura é a oferta de livros próximos à realidade do leitor que levantem questões significativas para ele Ou seja se a leitura de alguma forma faz com que o aluno ative uma rede de conhecimentos prévios e experiências de vida partilhadas por eles quanto mais o texto estiver próximo do horizonte de expectativa do aluno a leitura se tornará um evento significativo Afinal Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 347 A formação escolar do leitor passa pelo crivo da cultura em que este se enquadra Se a escola não efetua o vínculo entre a cultura grupal ou de classe e o texto a ser lido o aluno não se reconhece na obra porque a realidade representada ali não lhe diz respeito BORDINI AGUIAR 1988 p 16 Desta forma tornase necessário estabelecer uma relação entre leitor e obra a ser lida e sob este aspecto observamos que o cordel Futebol no inferno conseguiu de forma significativa cativar os alunos tento em vista que os discentes foram capazes de estabelecer relações de sentido com o texto lido mobilizando saberes advindos da relação com outros textos já lidos ou decorrentes da própria experiência de vida de cada um dos estudantes O cordel O Futebol no Inferno é formado por um total de 30 sextilhas e como o próprio título sugere narra uma partida de futebol ocorrida nas profundezas do inferno envolvendo duas equipes O time de satanás e o Quadro de Lampião Durante a narrativa vão sendo apresentados todos os elementos presentes em uma partida de futebol Entretanto existem algumas diferenças como por exemplo o campo tem uma medição uma pouco mais extensa mil metros de comprimento por quinhentos de largura para a arbitragem são dez juízes reservas que ficam de prontidão a CBF Confederação Brasileira de Futebol é no cordel substituída por CBI Confederação Brasileira do Inferno dentre outros elementos pontuados ao longo do texto que tornam a história ainda mais fabulosa Assim no decorrer da atividade de leitura para tornarmos o encontro mais dinâmico intercalamos durante a leitura compartilhada e em voz alta algumas pausas para realizamos perguntas que buscavam organizar as ideias dos alunos para que eles resumissem e recapitulassem os personagens e tudo o que havia sido lido até o momento Dessa forma os alunos tendo como norte as nossas perguntas iam oralmente reconstruindo com suas próprias palavras os passos percorridos durante a história Apresentávamos também alguns questionamentos que tinham como objetivo levantar inferências para que os alunos não só lançassem mão da estratégia de resumir e recapitular as informações do texto mas também fossem capazes de refletirem acerca do que poderia acontecer posteriormente nas próximas páginas do cordel Neste sentido solicitamos que eles apresentassem suposições de que personalidades poderiam compor o time de Satanás o rival de Lampião na disputa do futebol no inferno As hipóteses apresentadas foram na sequência da leitura sendo confirmadas positivamente tendo em vista que os discentes apresentaram como respostas os seguintes dizeres Não eram pessoas Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 348 normais Os outros coisa ruim Um monte de diabos vermelhos Assim tendo em vista a negatividade expressa pela figura de Satanás e todos os conhecimentos prévios que os alunos acumulam sobre o anjo que caiu do céu estes logo afirmaram que o time de Satanás só poderia ser composto por pessoas de má índole e portanto chamam de Coisa ruim que é uma expressão no imaginário popular associada ao diabo ou a todos aqueles que agem sob a influência dele À medida que íamos lendo o cordel notávamos que a leitura envolvia os alunos e pouco a pouco nem precisávamos solicitar que lessem as estrofes pois eles mesmo tomavam a iniciativa e encaminhavam a leitura Em relação aos momentos de pausa em que conversávamos sobre as informações do texto tudo acontecia de forma muito espontânea Os alunos pareciam se sentir à vontade para expressar as suas opiniões E talvez isto se deva ao fato de que quando um aluno abria o microfone para comentar alguma informação do texto todos os demais integrantes da ação monstravamse atentos a ouvir e aproveitavam a resposta do colega para acrescentar algum outro aspecto que lhe parecia importante Em relação à participação e à interação do aluno que já conhecia o cordel de José Soares este sempre fazia questão de comentar e expor a sua opinião sobre a leitura entretanto era prontamente advertido pelos colegas que pediam que ele não falasse muita coisa pois conhecendo o texto com certeza em algum momento poderia deixar escapar algum detalhe importante da história Assim com medo de que o aluno sem querer revelasse o final do cordel e portanto anulasse o mistério e as expectativas construídas por eles os alunos pediam não dê spoiler não por favor O aluno de fato não revelou o final do cordel antes da hora esperada Encerradas a leitura e a discussão do texto chegamos ao momento final do encontro quando buscamos ouvir o que os alunos acharam do cordel Eles afirmaram terem sido positivamente surpreendidos que a leitura havia sido muito divertida e que o texto era de fato muito bom Entretanto quando perguntados por que consideravam o texto bom alegaram que a partida de futebol narrada na história de fato nunca existiu e que se tratava de algo inventado pelo cordelista e por isso a história era muito legal porque lhes permitia imaginar muitas coisas que não são possíveis na realidade Um aluno chegou a mencionar o fato de a bola da partida possuir um peso elevado Não tem como chutar uma bola de 10 quilos só nessa partida mesmo Desta forma o que fez com que os alunos considerassem o cordel Futebol no Inferno uma leitura positiva foi justamente o fato de eles poderem imaginar construir hipóteses que não necessariamente precisavam condizer com a realidade pois a própria história era marcada por um viés fabuloso que cativava os alunos à medida que eles iam lendo Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 349 as estrofes do cordel Assim levando em consideração a experiência de leitura com o cordel de José Soares percebemos que a capacidade inventiva da literatura o seu aspecto de fabulação foi o que mais prendeu os alunos mesmo o cordel O futebol no Inferno tendo como referência algo comum do dia a dia uma partida de futebol Conclusão A realização do Clube de Leitura nos permite reiterar que a leitura se caracteriza como uma atividade de grande relevância social na vida do ser humano Entretanto para que ela se torne uma prática mais efetiva na vida dos nossos jovens sobretudo a leitura literária e em especial a de cordéis é preciso que nas escolas sejam desenvolvidas atividades que levem em consideração alguns aspectos considerados importantes tais quais a cultura de que fazem parte os alunos as experiências de leitura já vivenciadas por eles os conhecimentos prévios existentes Tudo isso é importante mas não o suficiente se não for também criado um ambiente de leitura que permita ao aluno espaço de fala para que este se sinta confortável para ler e expressar sua opinião sem julgamentos e correções Neste contexto se o objetivo da escola é formar leitores capazes de se posicionar de forma crítica diante do texto mais do que colocá los em contato com textos literários é preciso que o mediador responsável os motive por meio de estratégias que proporcionem ao leitor em formação autonomia para se expressar e compartilhar dentro do grupo suas impressões e opiniões acerca do texto lido O Clube de Leitura aqui descrito ainda que em um espaço curto de tempo foi uma ação de grande relevância no processo de formação leitora dos alunos da escola em que atuamos A seleção dos textos a linguagem dos cordéis lidos as temáticas próximas dos interesses dos alunos tudo isso contribuiu para que os alunos vivenciassem a experiência do clube de forma ativa lendo comentando compartilhando opiniões e se posicionando de forma crítica frente aos textos com os quais se deparavam em cada encontro Segundo a professora de língua portuguesa dos integrantes do clube a passagem pelo Clube de Leitura propiciou aos alunos a ampliação de suas experiências de leitura e um contato efetivo com diferentes textos da literatura de cordel Já para nós a vivência no Clube de Leitura revelou que o processo de formação de leitores exige um conhecimento dos sujeitos que queremos que se tornem leitores efetivos planejamento das ações didáticas tendo em vista o universo cultural desses sujeitos e seus horizontes de expectativas sem no entanto restringirse apenas a isso e certa dose de coragem para experimentar procedimentos didáticos escolhas de temáticas e de gêneros a fim Jangada ano 10 nr 20 jul 2022abr 2023 ISSN 23174722 Página 350 de que ao final o percurso trilhado com ou sem desvios configurese significativo para o docente mediador mas sobretudo para seus alunos REFERÊNCIAS ANDRÉ Marli Eliza Dalmazo Afonso de Etnografia da prática escolar Campinas Papirus 2005 BORDINI Maria da Glória AGUIAR Vera Teixeira de Literatura a formação do leitor alternativas metodológicas Porto Alegre Mercado Aberto 1988 CANDIDO Antônio O direito à Literatura In Vários escritores Rio de Janeiro Duas Cidades 2004 COSSON Rildo Círculos de Leitura e Letramento Literário São Paulo Contexto 2014 CASTRO Laís Santos Futebol e literatura na aula de educação física possibilidades transdisciplinares em uma escola pública em João Pessoa PB Dissertação Mestrado em profissional em formação de professores Universidade Estadual da Paraíba Pró Reitoria de Pós graduação e Pesquisa Campina Grande 2020 p 264 COLOMER Teresa Andar entre livros A leitura literária na escola São Paulo Global 2007 FERRAREZI JR Celso CARVALHO Robson S de De alunos a leitores o ensino da leitura na educação básica São Paulo Parábola 2017 GOMES Francisco Alberto A literatura de cordel como proposta pedagógica de leitura na formação de leitores um estudo em uma escola estadual de ensino médio na cidade do Brejo da CruzPB João Pessoa Periódicos 2021 HAURÉLIO Marco Literatura de cordel do sertão à sala de aula São Paulo Paulus 2013 MARIA Luzia de O clube do livro ser leitor que diferença faz São Paulo Global 2016 MARINHO Ana Cristina PINHEIRO Hélder Cordel no cotidiano escolar São Paulo Cortez 2012 MARTINS Aulus Mandagará Poesia experiência e autobiografia João Cabral e a Descoberta da Literatura In Texto Poético v 14 n 25 juldez 2018 p 469481 MEDEIROS Hadoock Ezequiel Araújo de PINHEIRO José Helder Palmas gritos assovios A leitura de cordel na sala de aula In Leia na escola v 14 n2 2014 p 4657 NÓBREGA Maria Marta dos Santos Silva Por uma metodologia triangular para o ensino de literatura contribuições da experiência estética de Jauss In MILREU Isis RODRIGUES Márcia Candeia Orgs Ensino de língua e literatura políticas práticas e projetos Campina Grande BagagemUFCG 2012 p 235251 PEREIRA José Tiago Marinho A formação de leitores na EJA o letramento literário a partir do cordel Dissertação Mestrado Profissional em formação de professores Universidade Estadual da Paraíba Centro de Educação Campina Grande 2015 SOUZA Willian Eduardo Righini de Clubes de leitura entre sociabilidade e crítica literária In Londrina v 23 n 3 setdez 2018 p 673 695