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A professora Vera Teixeira de Aguiar é uma renomada pesquisadora no campo da literatura infantil e juvenil no Brasil Sua metodologia busca aprofundar a compreensão e a valorização desse segmento literário destacando a importância de diferenciar a literatura juvenil da literatura infantil O site Jogos de ler coordenado por Vera Aguiar funciona como um suporte de pesquisas e materiais que auxiliam professores e acadêmicos a explorarem a literatura juvenil de forma estruturada e crítica Sua abordagem trás ênfase a necessidade de reconhecer e delimitar o específico juvenil dentro do campo literário Com muita frequência a literatura juvenil é englobada na categoria de literatura infantil e juvenil sem uma análise detalhada de suas particularidades Aguiar destaca a importância de compreender a juventude como uma fase distinta com características e necessidades próprias que devem ser refletidas na literatura destinada a esse público Desde 1978 o mercado editorial brasileiro passou a reconhecer a literatura juvenil como um segmento autônomo gerando uma necessidade crescente de estudo e sistematização Para atender a essa demanda Vera Aguiar propôs um método de análise e seleção de textos visando consolidar a literatura juvenil como um campo legítimo dentro dos estudos literários Além disso sua pesquisa dialoga com áreas como a psicologia e a psicanálise utilizando um vasto apoio teórico para compreender o públicoalvo de seus estudos A metodologia incentiva pesquisas coletivas e sistemáticas sobre a literatura juvenil buscando responder a questões como O que caracteriza a literatura juvenil em relação à infantil e à adulta Como esse segmento se desenvolveu ao longo do tempo Quais são os principais desafios para sua aceitação como um campo legítimo da literatura Esses questionamentos ajudam a estruturar um arcabouço teórico sólido para a literatura juvenil promovendo sua inserção nos estudos acadêmicos e nos currículos escolares Banco de Textos Narrativos Vera Aguiar desenvolveu um banco de textos narrativos brasileiros para auxiliar professores na seleção de materiais adequados às suas turmas Esse banco serve como um repositório de obras representativas da literatura juvenil permitindo uma curadoria mais refinada de textos que dialoguem com os interesses e desafios dos jovens leitores Programação de Acesso às Etapas do Trabalho A metodologia também inclui um programa que orienta os professores em diferentes etapas do trabalho com a literatura juvenil abordando aspectos como Seleção de textos alinhados aos interesses dos alunos Identificação de temas e abordagens relevantes para o público juvenil Desenvolvimento de atividades que incentivem a leitura crítica e reflexiva Banco de Atividades Para complementar o banco de textos a metodologia disponibiliza um banco de atividades pedagógicas que ajudam os professores a estruturarem estratégias didáticas mais dinâmicas e envolventes Algumas propostas incluem Discussões sobre a representação da juventude nas obras selecionadas Análise de elementos narrativos como enredo personagens e temática Elaboração de resenhas críticas e textos autorais inspirados nas leituras Objetivos da Metodologia A metodologia de Vera Aguiar tem como principais objetivos Fortalecer a literatura juvenil como campo de estudo acadêmico promovendo sua inclusão nos programas de pósgraduação e na formação de pesquisadores especializados Oferecer aos professores uma abordagem alternativa para a leitura e análise da literatura juvenil nas escolas Ampliar o repertório de obras recomendadas para a juventude garantindo uma seleção mais criteriosa e adequada ao públicoalvo Propor um modelo pedagógico que favoreça maior interação dos jovens com a literatura estimulando o gosto pela leitura e o pensamento crítico Aplicabilidade Prática A aplicação dessa metodologia no contexto escolar permite aos professores trabalharem de forma mais direcionada com a literatura juvenil garantindo que os textos selecionados estejam alinhados à realidade dos alunos Com a curadoria oferecida pelo banco de textos e atividades os docentes podem planejar estratégias de ensino mais eficazes promovendo uma maior aproximação dos estudantes com as obras literárias A literatura juvenil é muitas vezes um ponto de entrada para o desenvolvimento do hábito da leitura entre os jovens Assim utilizar a metodologia de Vera Aguiar significa criar condições para que a literatura se torne um elemento significativo na vida dos estudantes contribuindo para sua formação cultural e intelectual Metodologia do Site Jogos de Ler O site Jogos de Ler coordenado por Vera Teixeira de Aguiar tem como objetivo apoiar o desenvolvimento da leitura e escrita de forma lúdica e interativa Voltado para educadores e alunos ele oferece atividades jogos e recursos para auxiliar no processo de alfabetização Passo a Passo da Metodologia 1 Estimular a Leitura de Forma Lúdica Uso de jogos para tornar a aprendizagem uma experiência divertida e envolvente 2 Trabalhar com o Reconhecimento das Letras e Sons Foco na associação entre letras e sons essencial para a alfabetização 3 Exploração de Diferentes Modalidades de Jogo Jogos de associação identificação de letras formação de palavras e leitura de frases 4 Acompanhamento e Repetição Reforço contínuo das atividades para fixação do conhecimento 5 Progressão Gradual Atividades organizadas de maneira estruturada respeitando o ritmo de cada aluno 6 Desenvolvimento da Consciência Fonológica Jogos com rimas sílabas e sons iniciais e finais 7 Envolvimento da Família e Educadores Incentivo à participação de pais e professores no processo de aprendizagem 8 Feedback e Correção Jogos que oferecem retorno imediato sobre acertos e erros 9 Desenvolvimento de Habilidades de Leitura e Escrita Atividades que auxiliam na construção da leitura fluente e da escrita correta 10 Uso de Recursos Visuais e Auditivos Elementos multimodais para facilitar o aprendizado Referencias AGUIAR Vera Teixeira de Leitura e conhecimento Revista Signo v 32 n 53 p 2641 dez 2007 UNISC Online AGUIAR Vera Teixeira de BORDINI Maria da Glória A formação UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MATO GROSSO CARLOS ALBERTO REYES MALDONADO CAROLINE CARDOSO ALVES LITERATURA ANTIRRACISTA NO ENSINO MÉDIO Uma proposta de leitura crítica e antirracista com a obra de Djamila Ribeiro SINOP 2025 2 CAROLINE CARDOSO ALVES LITERATURA ANTIRRACISTA NO ENSINO MÉDIO Uma proposta de leitura crítica e antirracista com a obra de Djamila Ribeiro Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Banca Examinadora do Curso de Letras da Universidade do Estado de Mato Grosso UNEMAT Campus de Sinop como requisito parcial para a obtenção do grau de licenciada em Letras Orientadora Profa Dra Rosana Rodrigues Da Silva SINOP 2025 3 CAROLINE CARDOSO ALVES LITERATURA ANTIRRACISTA NO ENSINO MÉDIO Djamila Ribeiro em Sala de Aula Uma proposta de leitura crítica e antirracista com a obra de Djamila Ribeiro Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Banca Examinadora do Curso de Letras da Universidade do Estado de Mato Grosso UNEMAT Campus de Sinop como requisito parcial para a obtenção do grau de licenciada em Letras BANCA EXAMINADORA Orientadora Dra Rosana Rodrigues Da Silva UNEMAT Câmpus Universitário de Sinop Avaliadora Externoa Dr Fulano de Tal SIGLA NOME COMPLETO DA INSTITUIÇÃOCâmpus XXX Avaliadora Internoa Dra Fulana de Tal UNEMAT Câmpus Universitário de Sinop SINOP de de 2025 4 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho à memória do meu avô cuja presença e ensinamentos continuam vivos em mim e a todas as pessoas que enfrentam o racismo todos os dias resistindo com dignidade coragem e esperança Que esta pesquisa possa ser uma pequena contribuição para um mundo mais justo À minha família 5 AGRADECIMENTOS Introduzir o texto dos Agradecimentos Agradecer aos sujeitos da pesquisa professores pais alunos técnicos donas de casa escritores pintores etc Agradecer e nomear as instituições envolvidas UNEMAT Escola outra Orientar os alunos nesta parte Pode Sujeitos da pesquisa seres humanos e as instituições envolvidas Não pode outros tipos de seres ou instituições queridas Agradecer alguém sujeito ou instituição que de fato tenha contribuído com a pesquisa É um texto Diplomático Sugestão para agradecimentos Frase de abertura 1 UNEMAT 2 Faculdade XXX 3 Curso de XXX 4 Professores Técnicos funcionários 6 Banca 7 Sujeitos e Instituições envolvidas Frase de fechamento 6 Se eu luto contra o machismo mas ignoro o racismo eu estou alimentando a mesma estrutura Djamila Ribeiro 7 RESUMO Primeira frase TEMA PRINCIPAL DO DOCUMENTO Seguemse TRATAMENTO DOS DADOS OBJETIVO MÉTODO RESULTADOS CONCLUSÕES Frases concisas e afirmativas Escrever na voz ativa e terceira pessoa do singular Sem símbolos abreviaturas fórmulas 250 a 500 palavras espaçamento entrelinhas simples Palavraschave até 5 ABNT 60282003 21 palavrachave Palavra representativa do conteúdo do documento escolhida preferentemente em vocabulário controlado 3 Regras gerais de apresentação Os resumos devem ser apresentados conforme 31 a 33 31 O resumo deve ressaltar o objetivo o método os resultados e as conclusões do documento A ordem e a extensão destes itens dependem do tipo de resumo informativo ou indicativo e do tratamento que cada item recebe no documento original 32 O resumo deve ser precedido da referência do documento com exceção do resumo inserido no próprio documento 33 O resumo deve ser composto de uma sequência de frases concisas afirmativas e não de enumeração de tópicos Recomendase o uso de parágrafo único 331 A primeira frase deve ser significativa explicando o tema principal do documento A seguir devese indicar a informação sobre a categoria do tratamento memória estudo de caso análise da situação etc 332 Devese usar o verbo na voz ativa e na terceira pessoa do singular 333 As palavraschave devem figurar logo abaixo do resumo antecedidas da expressão Palavras chave separadas entre si por ponto e vírgula e finalizadas também por ponto Aqui não pode escrever no eu ou nós As palavraschave devem constar no texto do resumo caso contrário não há razão de ser palavrachave indexador O Tema não é a mesma coisa que Título 8 ABSTRACT Versão fiel do texto para Língua Inglesa Keywords Versão das palavraschave 9 LISTA DE ILUSTRAÇÕES opcional Entre linhas 1512 Conforme norma da ABNT NBR 147242011 Elemento opcional Elaborada de acordo com a ordem apresentada no texto com cada item designado por seu nome específico travessão título e respectivo número da folha ou página Quando necessário recomendase a elaboração de lista própria para cada tipo de ilustração desenhos esquemas fluxogramas fotografias gráficos mapas organogramas plantas quadros retratos e outras Fotografia 1 Livros da Professora 24 Fotografia 2 Os alunos da Turma 4C 35 Fotografia 3 Reunião de Pais e Mestres 46 10 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS opcional Conforme norma da ABNT NBR 147242011 Elemento opcional Consiste na relação alfabética das abreviaturas e siglas utilizadas no texto seguidas das palavras ou expressões correspondentes grafadas por extenso Recomendase a elaboração de lista própria para cada tipo 11 SUMÁRIO Entre linhas 1512 1 INTRODUÇÃO00 2 ARCABOUÇO TEÓRICO pode dar um título de acordo com a teoria00 21 Linguagem conhecimento e aprendizagem00 211 Releituras implicações para este estudo00 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS pode atribuir outro título método de pesquisa procedimentos metodológicos estratégia didática Tecnologias digitais da informação e comunicação usadas como suporte na geração do produto final00 4 GERAÇÃO APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS pode atribuir outro título deve conter o produto educacional sua aplicação e os resultados da intervenção00 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS00 REFERÊNCIAS00 APÊNDICE A Produto educacional atribuir um título para o produto00 ANEXO A Fotografias da escola00 12 1 INTRODUÇÃO O racismo perpetua gerações e está presente até mesmo nos espaços de convivência mais íntimos como a família Como integrante de família negra venho de uma trajetória marcada por vivências que me revelaram de forma dolorosa o quanto o preconceito é naturalizado inclusive por aqueles que muitas vezes são vítimas dele Ao longo da minha formação pessoal e acadêmica presenciei cenas de discriminação racial praticadas por pessoas de meu convívio familiar contra pessoas negras o que me proporcionou várias reflexões sobre como o racismo se enraíza e se perpetua no cotidiano das pessoas mesmo entre aqueles que compartilham da mesma origem racial É a partir de experiências pessoais e da consciência da urgência de práticas educativas antirracistas que nasceu esta pesquisa Portanto busquei a adequação da metodologia de Vera Teixeira de Aguiar 2001 voltada para a literatura juvenil à leitura e ao trabalho em sala de aula com a obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro Em Cartas para minha avó Djamila Ribeiro trouxe à tona memórias pessoais atravessadas por afetos perdas e resistência diante do racismo vivenciado por ela desde a infância oferecendo aos estudantes não apenas uma história de vida mas a oportunidade de refletir sobre o racismo em suas múltiplas dimensões Trabalhar com essa literatura na escola é uma maneira de romper silêncios históricos fomentar a escuta sensível e estimular uma educação antirracista que vá além do discurso Por este motivo se faz necessário falar sobre Djamila Ribeiro uma das principais intelectuais brasileiras na luta contra o racismo e o sexismo filha de um ativista do movimento negro e de uma mulher trabalhadora a autora cresceu em um contexto marcado por exclusões sociais e afetos ancestrais o que a levou desde a infância ao enfrentamento do preconceito racial e religioso E para embasar a estrutura desta pesquisa recorremos à metodologia da professora Vera Teixeira de Aguiar que é uma referência nos estudos de literatura juvenil Sua proposta consiste em reconhecer a literatura juvenil como um campo autônomo com características próprias fazendo distinção da literatura infantil e da adulta 13 A metodologia é organizada em torno de eixos como uma seleção criteriosa de obras e estímulos à leitura crítica e reflexiva utilizando recurso como banco de textos narrativos e roteiros de leitura instrumentos que facilitam a atuação dos professores e a aproximação dos alunos com obras que dialogam com sua realidade Assim a presente pesquisa visa contribuir para a formação de leitores reflexivos capazes de reconhecer as diversas formas de discriminação racial e de se posicionar eticamente diante delas resgatando o papel da literatura como instrumento de emancipação e transformação social 14 2 O Silêncio das Imagens a Voz dos Símbolos Partindo das necessidades desta pesquisa realizei uma busca que resultou em uma análise semiótica dos elementos gráficos presentes na capa do livro Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro Como pode ser observado na Figura 1 a autora e a equipe editorial construíram uma composição visual cheia de simbolismos que representam a relação com sua ancestralidade e com elementos centrais do Candomblé religião de matriz africana à qual a autora é vinculada desde a infância As escolhas cromáticas as formas e a disposição gráfica revelam sentidos que vão além da estética funcionando como signos que evocam espiritualidade memória e resistência Figura 1 capa de Cartas para minha avó Fonte wwwcompanhiadasletrascombrlivro O título do livro faz uma referência direta à ancestralidade dimensão central no Candomblé Os ancestrais eguns são reverenciados como fonte de proteção e sabedoria Nesse sentido a avó Antônia representa uma figura ancestral que conecta o presente à tradição e à linhagem espiritual da autora Assim como o conteúdo do livro a capa e suas cores foram pensadas de forma a estabelecer um diálogo simbólico com essa herança cultural As cores predominantes na capa azul vermelho e branco não se limitam a escolhas gráficas Conforme propôs Charles Sanders Peirce 2000 o signo representa algo para alguém dentro de um contexto interpretativo Em suas redes 15 sociais em abril de 2025 o Babalorixá Paulo de Oxalá fez uma publicação sobre as cores e a sua relação com os orixás no caso do Candomblé essas cores estão diretamente associadas a orixás específicos e a seus atributos simbólicos O azul pode ser interpretado como referência às divindades femininas das águas como Iemanjá e Oxum ambas associadas à maternidade à ancestralidade e à sabedoria Já o vermelho remete a Exu orixá da comunicação e das encruzilhadas e a Oyá Iansã divindade dos ventos e tempestades representando o movimento a transformação e a potência da fala características que atravessam a escrita de Djamila Ribeiro Por fim o branco remete à pureza ao respeito e ao sagrado sendo a cor ritual por excelência no culto aos orixás O signo é algo que representa alguma coisa para alguém Esse alguém por sua vez interpreta o signo como significando algo o seu objeto Para isso o signo deve gerar no intérprete um outro signo chamado interpretante que traz a compreensão do objeto PEIRCE 2000 p 29 As formas geométricas presentes na capa como a linha vertical central acompanhada de uma curva superior podem ser interpretadas como uma alusão à simbologia de Exu orixá responsável por fazer a mediação entre os mundos e por abrir caminhos Conforme aponta Reginaldo Prandi 2001 as encruzilhadas são espaços sagrados para Exu e são também metáforas da comunicação e da escolha conceitos profundamente alinhados à proposta epistolar do livro Neste contexto ao escrever cartas dirigidas à sua avó Antônia figura que representa o elo ancestral feminino Djamila Ribeiro atua como uma espécie de mensageira tal qual Exu resgatando memórias lutas e saberes de uma tradição oral e espiritual que sustenta identidades negras no Brasil Como afirma Leda Maria Martins 2015 a ancestralidade negra pode ser articulada por meio da memória e da performance sendo reencenada como resistência e afirmação cultural por meio dessa evocação constitutiva o gesto e a voz da ancestralidade encorpam o acontecimento presentificado prefigurando o devir numa concepção genealógica curvilínea articulada pela performance As performances da memória são corporificações da história como experiência registro ritualidade e reencenação MARTINS 2015 p 26 A disposição das letras em caixa alta em branco sobre um fundo azul e vermelho constitui uma referência visual à força da palavra e à presença negra na esfera pública Segundo Roland Barthes 1984 os elementos visuais funcionam 16 como mitos modernos ou seja estruturas de sentido que ao mesmo tempo que informam também naturalizam valores culturais e políticos Nesse caso a capa atua como um texto visual que reafirma a centralidade da ancestralidade negra e da mulher como sujeito político e espiritual O mito é uma fala o mito não se esconde sua função é deformar não fazer desaparecer Ele é em suma uma fala roubada e devolvida O que o mito faz é tornar natural a história transformar um sentido ideológico em senso comum BARTHES 1984 p 213 A contracapa também apresenta aspectos relevantes para esta análise Ela traz uma estrutura que remete a folhas simbolizadas por padrões geométricos ascendentes os quais podem ser interpretados como uma referência ao axé força que cresce se propaga e se renova como esta apresentada na figura 2 Figura 2 contracapa Fonte wwwcompanhiadasletrascombrlivro De forma não verbal a capa constitui um tributo à ancestralidade negra feminina ao legado de luta e à força espiritual transmitida entre gerações Seus elementos gráficos fazem referência ao Candomblé como uma matriz de conhecimento na qual as cores formas e símbolos não são meramente decorativos mas carregam significados sagrados e políticos sustentando as mensagens presentes no livro 17 Trazer esta análise para as aulas de literatura funciona com um suporte para prender a atenção dos alunos e estabelecer diálogos multidisciplinares durante as aulas 21 A autora e os pilares da história A filósofa e escritora Djamila Taís Ribeiro nasceu em fevereiro de 1980 na cidade de Santos no litoral paulista É a filha mais nova do casal Joaquim José Ribeiro dos Santos estivador e ativista do movimento negro e de Erani Benedita dos Santos Ribeiro Iniciouse no Candomblé aos oito anos por influência da mãe Desde cedo enfrentou o preconceito religioso e o racismo especialmente no ambiente escolar experiências que influenciaram profundamente sua vida social e suas publicações Ainda jovem começou a se envolver com movimentos sociais Aos 18 anos passou a frequentar a Casa da Cultura da Mulher Negra onde aprofundou seus estudos sobre raça e gênero A influência do pai militante comunista e fundador do Partido Comunista na Baixada Santista também foi fundamental para sua formação política e intelectual Djamila Ribeiro é atualmente uma das intelectuais mais influentes do Brasil amplamente reconhecida por sua atuação em prol dos direitos humanos e da luta antirracista Em 2020 recebeu o Prêmio Jabuti na categoria Ciências Humanas pelo livro Pequeno manual antirracista obra que se tornou referência no debate sobre racismo e educação antirracista no país No ano seguinte em 2021 foi homenageada pelo BET awards tornandose a primeira brasileira a receber esse reconhecimento que celebra personalidades negras de destaque mundial Sua projeção internacional foi ainda reafirmada ao ser incluída na lista da BBC das 100 mulheres mais influentes do mundo reconhecimento que destaca sua importância como pensadora global Em 2019 foi agraciada com o Prêmio Prince Claus concedido pelo Reino dos Países Baixos a indivíduos que promovem mudanças sociais positivas por meio da cultura Mais recentemente em 2023 foi laureada com o Prêmio FrancoAlemão de Direitos Humanos reafirmando sua relevância na defesa da justiça e da dignidade humana em nível internacional Esses prêmios reforçam a força de sua voz no 18 enfrentamento das desigualdades e na construção de uma sociedade mais justa e plural Além do reconhecimento internacional por suas contribuições à luta antirracista e pelos direitos humanos Djamila Ribeiro possui uma trajetória acadêmica e profissional marcada pelo compromisso com a educação e a transformação social É graduada em Filosofia e mestre em Filosofia Política pela Universidade Federal de São Paulo Unifesp onde desenvolveu estudos voltados às questões de raça gênero e poder Sua atuação se desdobra em diversas frentes sendo coordenadora do projeto Feminismos Plurais que reúne um espaço de formação uma plataforma online e um selo editorial o Selo Sueli Carneiro dedicado à publicação de obras acessíveis que difundem o pensamento de intelectuais negros e negras especialmente no campo do feminismo negro Sua influência acadêmica se estende para além do Brasil Djamila é professora convidada da New York University NYU e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP contribuindo com reflexões críticas sobre a realidade brasileira em diálogo com o cenário internacional Também é colunista da Folha de S Paulo um dos jornais de maior circulação do país onde escreve sobre temas como desigualdade racismo feminismo e políticas públicas Em 2016 ocupou o cargo de secretária adjunta de Direitos Humanos da cidade de São Paulo aprofundando sua atuação política institucional Em reconhecimento à sua importância cultural e intelectual foi eleita em 2022 imortal da cadeira nº 28 da Academia Paulista de Letras tornandose uma das poucas mulheres negras a integrar essa instituição tradicional Além disso atua como conselheira da Fundação Padre Anchieta da Pinacoteca de São Paulo e do Fundo Patrimonial da USP reforçando seu engajamento com a preservação e valorização do patrimônio cultural da educação pública e da democratização do acesso à arte e ao conhecimento sua trajetória evidencia o impacto profundo de sua atuação no Brasil e no mundo tanto no campo das ideias quanto na construção de políticas e espaços mais inclusivos Uma parte muito importante e especial de sua carreira foi a publicação do livro Cartas para minha avó no ano de 2021 Nesta obra a autora narra sua história 19 de vida e descreve de forma muito íntima a relação que mantinha com sua avó Antônia desde a infância além de relatar as dificuldades de ser uma criança negra em uma escola onde 90 dos alunos eram brancos Por se tratar de uma escrita íntima e autobiográfica contemplada pela autora ao longo do livro fezse necessária a apresentação de sua trajetória de vida pois esses detalhes agregam força e diversos aspectos de caráter social à obra Vale ressaltar que tais características também conferem valor pedagógico à presente pesquisa pois a mesma buscou contribuir com as aulas de literatura no âmbito escolar propondo uma sequência didática alinhada às necessidades do letramento racial e da promoção da literatura antirracista em sala de aula Por esse motivo a obra Cartas para minha avó aliada a um itinerário de leitura da professora Vera Teixeira de Aguiar foi utilizada como base para o desenvolvimento desta proposta 22 A metodologia de Vera Teixeira de Aguiar e sua aplicação A escolha pela metodologia de leitura proposta por Vera Teixeira de Aguiar se deu pela sua capacidade de articular leitura literária criticidade e a formação ética dos estudantes A autora defende que a literatura juvenil deve ser tratada como um campo autônomo de produção estética e de reflexão sobre o mundo Seu modelo metodológico valoriza a escuta do leitor jovem e sua inserção ativa no processo de construção de sentidos reconhecendo a potência das obras literárias na formação cidadã dos jovens leitores A escuta do jovem leitor é um gesto ético e político pois pressupõe que ele é sujeito de saberes e experiências e não apenas um receptor passivo de conteúdos escolares AGUIAR 2001 p 52 Um dos aspectos da metodologia de Aguiar é a valorização de textos que problematizem realidades sociais e estimulem o pensamento crítico sem renunciar à complexidade estética Com isso o trabalho com Cartas para minha avó se alinha perfeitamente a essa estratégia de leitura uma vez que a obra de Djamila Ribeiro articula memórias pessoais com discussões profundas sobre identidade ancestralidade e racismo estrutural A metodologia propõe ainda o uso de bancos de textos narrativos nos quais os alunos têm acesso a trechos selecionados da obra e são incentivados a 20 fazer leituras colaborativas relacionando os conteúdos com suas próprias vivências Um dos conceitos explorados por Djamila Ribeiro em sua obra é o da ancestralidade mais do que um elo com o passado a ancestralidade é um princípio ativo de formação identitária ética e afetiva Quando a autora escreve cartas para sua avó Antônia ela está na verdade escrevendo para todas as mulheres negras que vieram antes dela um gesto que constrói resistência por meio da memória e da oralidade Trazer esse conceito para a sala de aula é uma maneira de valorizar as histórias de vida dos próprios estudantes que muitas vezes vêm de contextos de exclusão mas também de sabedoria popular cultura oral e espiritualidade A educação antirracista não se resume à abordagem pontual de autores negros ou de temas raciais Ela exige o desenvolvimento de um letramento racial que compreende a capacidade de perceber analisar e enfrentar o racismo estrutural presente nas instituições discursos e relações sociais Conforme Cuti 2008 é preciso que os educadores estejam atentos aos mecanismos de silenciamento e exclusão que operam dentro da escola e que reproduzem desigualdades históricas Esta pesquisa tem abordagem qualitativa com caráter descritivo e interpretativo pois parte da análise de uma obra literária contemporânea e da elaboração de uma sequência didática que tem como objetivo desenvolver práticas de letramento racial em sala de aula Segundo Bogdan e Biklen 1994 a pesquisa qualitativa procura entender o significado que as pessoas constroem sobre o mundo e suas experiências como podemos observar no trecho abaixo A pesquisa qualitativa é rica em dados descritivos centrada no processo e não apenas nos resultados preocupada com o contexto em que os fenômenos ocorrem e é baseada em grande parte na perspectiva dos participantes BOGDAN BIKLEN 1994 p 49 Como proposta metodológica para o trabalho com a leitura literária em sala de aula utilizouse a abordagem de Vera Teixeira de Aguiar 2001 que propõe a construção de itinerários de leitura baseados em roteiros interpretativos seleção criteriosa de textos e valorização do protagonismo do leitor juvenil O itinerário de leitura é uma forma de planejamento do trabalho com a literatura que parte do 21 conhecimento prévio do aluno e de suas experiências propondo atividades que favoreçam a leitura crítica a interpretação e a construção de sentidos em diálogo com a realidade do estudante AGUIAR 2001 p 45 A escolha da obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro justificase pelo seu caráter autobiográfico pela potência temática no que diz respeito à ancestralidade e às experiências negras no Brasil bem como pela escrita sensível e acessível que dialoga diretamente com o universo juvenil A leitura da obra foi planejada a partir de um itinerário adaptado da metodologia de Aguiar com propostas que envolvem leitura de excertos escuta ativa debates produções escritas análise visual e atividades que valorizam a identidade do aluno negro A aplicação da proposta foi pensada para turmas do Ensino Médio da rede pública envolvendo adolescentes com diferentes vivências raciais e culturais Os registros podem ser realizados por meio de fichas de leitura observação das respostas dos estudantes às atividades propostas e anotações da professora pesquisadora com foco na escuta sensível dos sujeitos envolvidos A escuta do jovem leitor é um gesto ético e político pois pressupõe que ele é sujeito de saberes e experiências e não apenas um receptor passivo de conteúdos escolares AGUIAR 2001 p 52 Assim a metodologia adotada neste trabalho foi organizada em torno de três eixos principais a leitura literária crítica com base na proposta de itinerário de leitura do site jogos de ler a valorização das experiências de vida e das identidades dos estudantes e o enfrentamento do racismo estrutural a partir de práticas pedagógicas comprometidas com a justiça social 4 Entre Linhas e Encruzilhadas Itinerário de Leitura e Letramento Racial com Djamila Ribeiro A proposta de sequência didática que será neste capítulo foi construída com base em um itinerário de leitura formulado no site jogos de ler coordenado pela professora Vera Teixeira de Aguiar a partir da obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiroestá proposta visa criar um espaço pedagógico de escuta leitura crítica e valorização das identidades negras em sala de aula especialmente no Ensino Médio O itinerário foi pensado como um caminho formativo que articula a experiência estética da leitura com o debate sobre ancestralidade racismo memória e resistência de modo a fortalecer o letramento racial e a identidade dos estudantes dialogando com o trecho publicado em 2001 22 A literatura tem uma função estética sim mas não apenas Ela é também ética histórica social Por isso quando se trata de textos que abordam questões de identidade de memória ou de exclusão ela se torna ainda mais significativa pois permite ao jovem se reconhecer se pensar se posicionar AGUIAR 2001 p 68 A proposta se organiza em seis encontros com momentos de leitura coletiva e individual escuta de relatos produção textual análise de imagens e rodas de conversa Os textos selecionados para leitura foram retirados do livro de Djamila Ribeiro e combinados com o itinerarioitinerário do site Jogos de Ler adaptados à realidade de trabalho em sala com turmas do ensino médio 42 Estrutura da Sequência Didática 43 Aula 1 Estímulo Lúdico leitura da capa e contracapa A primeira aula consisti na análise semiótica guiada da capa e contracapa do livro Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro seguida de diálogo sobre ancestralidade os estudantes foram convidados a levantar hipóteses sobre as cores símbolos e possíveis segredos da personagem principalpara sensibilizálos utilizouse um trecho da obra que evoca memórias afetivas Minhas lembranças de você têm gosto de manga verde e doce de abóbora Têm cheiro de feijão e jantar às seis da tarde Você me adoçava a boca e benzia a alma Sua voz cantava histórias de outras mulheres e me fazia acreditar que eu não estava sozinha RIBEIRO 2021 p 15 Esse excerto dialoga com o objetivo da aula ao estimular os alunos a refletirem sobre símbolos cores e lembranças familiares reconhecendo a ancestralidade presente no livro 23 424Aula 2 Memória e Oralidade A segunda aula tem como objetivo trabalhar a leitura de cartas selecionadas do livro e a roda de conversa sobre lembranças suscitadas Para provocar o debate sobre estereótipos e experiências de vida das mulheres negras pode se lido o seguinte trecho Essa imagem da mulher negra forte é muito cruel As pessoas se esquecem de que não somos naturalmente fortes Precisamos ser porque o Estado é omisso e violento Somos obrigadas a desempenhar papéis que nos desumanizam RIBEIRO 2021 p 48 Após a leitura os alunos compartilharam histórias de vida de mulheres de suas famílias confrontando estereótipos presentes na sociedade 423 Aula 3 Identidade e Racismo Nessa etapa o professor pediu que os alunos imaginassem como seria estar no espaço narrado e conduziu um debate sobre a infância de Djamila Ribeiro e o racismo estrutural O trecho selecionado para embasar a discussão foi Na escola aprendi cedo que meu corpo era visto como estranho Ouvi de colegas que meu cabelo era feio e que minha cor era motivo para ficar no canto Essa experiência me marcou porque percebi que o racismo não era apenas uma palavra mas uma prática cotidiana que me atravessava RIBEIRO 2021 p 8889 Esse excerto possibilitou aos estudantes compreender o racismo como estrutura social relacionandoo às próprias vivências escolares 24 424 Aula 4 O Papel das Mulheres Negras Atividade Criativa Nesta aula os alunos leram cartas do livro e escreveram suas próprias cartas para mulheres de suas famílias Em seguida representaram os sentimentos suscitados pela leitura usando lápis branco em papel preto Como inspiração foi lido o trecho É um ciclo que se propaga impedindo a gente de ser somente ser A cada tentativa de existir com plenitude uma barreira se ergue É como se estivéssemos sempre sendo testadas para provar nossa humanidade RIBEIRO 2021 p 132 A leitura deste fragmento ajudou a reforçar o vínculo entre memória e resistência estimulando expressão estética dos alunos 425 Aula 5 Leitura Compartilhada e Performance A quinta aula envolveu a leitura dramatizada de trechos do livro e escuta sensível Optouse por um excerto de forte carga poética que os alunos declamaram em performance Você me ensinou a rezar para os ancestrais e a olhar para a lua como quem busca orientação RIBEIRO 2021 p 140 Essa atividade trabalhou a dimensão estética e afetiva da linguagem permitindo que os estudantes experimentassem a obra como expressão artística 25 426 Aula 6 Avaliação Escrita Coletiva e Desfecho Lúdico Na última aula cada aluno depositou seus problemas na caixa decorada conforme a proposta do itinerário e produziu coletivamente uma cartamanifesto Para simbolizar o encerramento leuse o seguinte trecho Você humanizou toda uma linhagem e é meu dever também humanizála Ao contar a você um pouco do que aprendi eu me humanizo também Carrego suas histórias como se fossem uma bússola para não me perder RIBEIRO 2021 p 157 Esse fragmento inspirou os estudantes a sistematizar aprendizagens e posicionamentos ressignificando memórias e projetando futuro42 Estrutura da sequência didática Abaixo apresentase um quadroresumo com a descrição das aulas propostas Aula Tema central Atividades Objetivos específicos 1 Leitura da capa e da contracapa Análise semiótica guiada diálogo sobre ancestralidade Desenvolver leitura de imagens e símbolos africanos 2 Memória e oralidade Leitura de cartas selecionadas roda de conversa Valorizar histórias de vida dos alunos 3 Identidade e racismo Debate guiado leitura de trecho sobre infância de Djamila Compreender o racismo como estrutura social 4 O papel das mulheres negras Leitura e escrita de uma carta para uma mulher da família Reforçar o vínculo entre memória e resistência 5 Leitura compartilhada e performance Leitura dramatizada de trechos escuta sensível Trabalhar a dimensão estética e afetiva da linguagem 6 Avaliação e escrita coletiva Produção de cartamanifesto ou poema coletivo Sistematizar aprendizagens e posicionamentos 26 43 Resultados e percepções Durante a realização da sequência didática observouse o envolvimento emocional e intelectual dos alunos com os temas propostos Muitos estudantes especialmente os negros relataram sentirse representados pela história da autora As cartas escritas revelaram uma forte conexão entre o conteúdo da obra e as experiências pessoais dos jovens Quando o jovem se reconhece no texto há uma reconfiguração do lugar da literatura na escola Ela deixa de ser algo distante imposto e passa a ser uma linguagem de expressão de denúncia de pertencimento AGUIAR 2001 p 74 Além disso a análise semiótica da capa e da contracapa da obra permitiu explorar significados não verbais ativando conhecimentos culturais religiosos e simbólicos do Candomblé A abordagem visual combinada com a leitura textual ampliou as possibilidades interpretativas dos alunos A partir da escuta das produções dos estudantes percebeuse a importância de práticas que estimulem a valorização da oralidade da memória familiar e das experiências negras como estratégias fundamentais para o fortalecimento da autoestima e da identidade étnico racial A construção do letramento racial passa pela valorização da vivência da memória e da fala dos sujeitos negros cuja história foi silenciada por séculos Reconhecer essas vozes é um ato político de reexistência CUTI 2008 p 59 27 REFERÊNCIAS AGUIAR Vera Teixeira de Literatura juvenil um gênero em construção Porto Alegre Mercado Aberto 2001 AGUIAR Vera Teixeira de Jogos de Ler site Disponível em httpwwwjogosdelercombr Acesso em 26052025 BARTHES Roland Mitologias 8 ed Trad Rita Buongermino e Pedro de Souza São Paulo Difel 1984 CUTI Literatura negrobrasileira do século XVIII ao século XXI Belo Horizonte Mazza Edições 2008 MARTINS Leda Maria Performances do tempo espiralar poéticas do corpotela São Paulo Perspectiva 2015 28 PEIRCE Charles Sanders Semiótica Trad Ivã Fernandes e José Teixeira Coelho Neto São Paulo Perspectiva 2000 PRANDI Reginaldo Mitologia dos orixás São Paulo Companhia das Letras 2001 RIBEIRO Djamila Cartas para minha avó São Paulo Companhia das Letras 2021 RIBEIRO Djamila Pequeno manual antirracista São Paulo Companhia das Letras 2019 Por um conceito de literatura afrobrasileira1 Eduardo de Assis Duarte No alvorecer do século XXI a literatura afrobrasileira passa por um momento rico em realizações e descobertas que propiciam a ampliação de seu corpus na prosa e na poesia paralelamente ao debate em prol de sua consolidação acadêmica enquanto campo específico de produção literária distinto porém em permanente diálogo com a literatura brasileira tout court Enquanto muitos ainda indagam se a literatura afrobrasileira realmente existe a cada dia a pesquisa nos aponta para o vigor dessa escrita ela tanto é contemporânea quanto se estende a Domingos Caldas Barbosa em pleno século XVIII tanto é realizada nos grandes centros com dezenas de poetas e ficcionistas quanto se espraia pelas literaturas regionais Nesse caso revelanos por exemplo um escritor do porte do maranhense José do Nascimento Moraes autor entre outros do romance Vencidos e degenerados 1915 cuja ação tem início em 13 de maio de 1888 e se estende pelas décadas seguintes a fim de narrar a permanência da mentalidade derivada da escravidão Enfim essa literatura não só existe como se faz presente nos tempos e espaços históricos de nossa constituição enquanto povo não só existe como é múltipla e diversa Desde a década de 1980 a produção de escritores que assumem seu pertencimento enquanto sujeitos vinculados a uma etnicidade afrodescendente cresce em volume e começa a ocupar espaço na cena cultural ao mesmo tempo em que as demandas do movimento negro se ampliam e adquirem visibilidade institucional Desde então cresce da mesma forma mas não na mesma intensidade a reflexão acadêmica voltada para esses escritos que ao longo do século XX foram objeto quase que exclusivo de pesquisadores estrangeiros como Bastide Sayers Rabassa e Brookshaw entre outros Para tanto contribuiu enormemente o trabalho seminal de poetas e prosadores de organizações como o Quilombhoje de São Paulo a que se somaram grupos de escritores de Salvador Rio de Janeiro Porto Alegre e outras capitais E a partir de intensa busca pela ampliação de seu horizonte recepcional a literatura afro brasileira adquire legitimidade crescente tanto nos cursos de graduação e pós graduação e nas listas dos vestibulares de universidades públicas e privadas quanto no meio editorial A série Cadernos Negros ultrapassou três décadas de publicação ininterrupta e um romance voltado para o resgate da história não oficial dos escravizados e suas formas de resistência como o épico Um defeito de cor 2006 de Ana Maria Gonçalves 1970 foi publicado por uma editora de grande porte e em seguida consagrado vencedor do Prêmio Casa de las Américas Não há dúvida de que por um lado a ampliação da chamada classe média negra com um número crescente de profissionais com formação superior buscando lugar no mercado de trabalho e no universo do consumo e por outro a instituição de mecanismos como a lei 106392003 ou as ações afirmativas vêm contribuindo para a construção de um ambiente favorável a uma presença mais significativa das artes marcadas pelo pertencimento étnico afrodescendente Tais constatações escapam para muitos aos propósitos de uma crítica propriamente literária e também admito aos objetivos deste artigo Mencionoas apenas como pano de fundo e para lembrar que ampliados o público e a demanda ampliamse igualmente as responsabilidades dos agentes que atuam nos espaços voltados para a pesquisa e produção do conhecimento em especial nas instituições de ensino superior O momento é pois propício à construção de operadores teóricos com eficácia suficiente para ampliar a reflexão crítica e dotála de instrumentos mais precisos de atuação Nesse sentido cabe avaliar o estado da arte de dois desses instrumentos a saber os conceitos de literatura negra e de literatura afro brasileira A publicação dos Cadernos contribui em muito para a configuração discursiva de um conceito de literatura negra A série vem mantendo desde 1978 uma produção marcada predominantemente pelo protesto contra o racismo tanto na prosa quanto na poesia na linha da tradição militante vinculada ao movimento negro como demonstra Florentina da Silva Souza 2005 E ao lado dessa perspectiva sobressai o tema do negro enquanto individualidade e coletividade inserção social e memória cultural E também a busca de um público afrodescendente a partir da formalização de uma linguagem que denuncia o estereótipo como agente discursivo da discriminação A propósito Ironides Rodrigues um dos mais destacados intelectuais da geração anterior ao Quilombhoje declara em depoimento a Luiza Lobo A literatura negra é aquela desenvolvida por autor negro ou mulato que escreva sobre sua raça dentro do significado do que é ser negro da cor negra de forma assumida discutindo os problemas que a concernem religião sociedade racismo Ele tem que se assumir como negro Apud LOBO 2007 p 266 Ao longo de sua existência os Cadernos Negros pouco se distanciaram desta postura incisiva que se transformou em sua marca registrada e que termina por afastálos de uma linha menos empenhada em termos de militância como por exemplo a dos poetas Edimilson de Almeida Pereira 1963 e Ronald Augusto 1961 de prosadores como Muniz Sodré 1942 Nei Lopes 1942 Joel Rufino dos Santos 19412015 ou no campo da escrita infantojuvenil Júlio Emílio Braz 1959 Rogério Andrade Barbosa 1947 o próprio Joel Rufino dos Santos além de Heloisa Pires de Lima 1955 para citarmos alguns contemporâneos Por outro lado se retrocedermos nossas observações à primeira metade do século XX não poderemos descartar a tradição do negrismo modernista2 de que são exemplos Jorge de Lima 18931953 Raul Bopp 18981984 Menotti Del Pichia 18921988 Cassiano Ricardo 18951974 ou os escritores do grupo mineiro Leite Criôlo entre outros E nesse caso não teremos como comparálos à escrita de Cuti 1951 Miriam Alves 1952 ou Conceição Evaristo 1946 o que existiria de semelhante sob qualquer ângulo de abordagem entre Ponciá Vicêncio e a Nega Fulô O ponto de vista que conduz a perspectiva dos Poemas negros de Jorge de Lima é bem outro externo e folclórico na linha do que Oswald de Andrade 18901954 cognominou de macumba para turistas E por mais que Urucungo de Raul Bopp se aproprie de ritmos e entonações oriundas de uma oralidade afrobrasileira não há como negar que a literatura negra desses autores é outra Na linha do legado modernista Benedita Gouveia Damasceno 1988 também confere ao conceito um sentido distinto e até mesmo oposto ao praticado pelo Quilombhoje um sentido marcado pelo reducionismo temático sem levar em conta o pertencimento étnico e a perspectiva autoral Para Damasceno o menos importante é a cor do autor 1988 p 13 o que a faz incluir Jorge de Lima Ascenso Ferreira 18951965 e Raul Bopp entre os poetas estudados Em geral esta tem sido uma tendência em nossa crítica do século XX e a supremacia do critério temático demonstra mais uma vez a força da herança modernista na cultura brasileira Embora reconheça as divergências e dificuldades para o estabelecimento de uma estética negra já que não existe uma estética branca 1988 p 13 ao final conclui Benedita Damasceno que há sensíveis diferenças entre a poesia negra escrita por afro brasileiros e a escrita por brancos 1988 p 125 Cioso das limitações do critério temático Domício Proença Filho busca uma solução conciliatória entre as duas vertentes e propõe um duplo sentido para o termo À luz dessas observações será negra em sentido restrito uma literatura feita por negros ou descendentes assumidos de negros e como tal reveladora de visões de mundo de ideologias e de modos de realização que por força de condições atávicas sociais e históricas se caracteriza por uma certa especificidade ligada a um intuito claro de singularização cultural Lato sensu será a arte literária feita por quem quer que seja desde que reveladora de dimensões peculiares aos negros ou aos descendentes de negros PROENÇA FILHO 1988 p 78 grifos do autor O crítico retoma sua reflexão em escrito posterior acrescentando que no primeiro caso temse o negro como sujeito numa atitude compromissada e no segundo a condição negra como objeto numa visão distanciada Deste modo o conceito comportaria tanto a literatura do negro quanto a literatura sobre o negro 1997 p 159 Tal dicotomia compromete a operacionalidade do conceito uma vez que o faz abrigar tanto o texto empenhado em resgatar a dignidade social e cultural dos afrodescendentes quanto o seu oposto a produção descompromissada para ficarmos nos termos de Proença voltada muitas vezes para o exotismo e a reprodução de estereótipos atrelados à semântica do preconceito Os trabalhos de Zilá Bernd 1987 1988 compartilham com o posicionamento conciliador de Proença Filho Seu livro Introdução à literatura negra analisa tanto o discurso do negro quanto sobre o negro e aborda as poesias de Castro Alves 18471871 e Jorge de Lima a fim de ressaltar suas diferenças em relação a Luiz Gama 18301882 e Lino Guedes 18961951 Com isto emprega o critério temático ao mesmo tempo em que o relativiza Centrado na poesia o estudo estabelece as leis fundamentais da literatura negra a saber a reversão dos valores com o estabelecimento de uma nova ordem simbólica oposta aos sentidos hegemônicos a construção da epopeia negra e sobretudo a emergência de um eu enunciador A montagem da poesia negra fazse a partir da reconquista da posição de sujeito da enunciação fato que viabiliza a reescritura da História do ponto de vista do negro Edificandose como espaço privilegiado da manifestação da subjetividade o poema negro reflete o trânsito da alienação à conscientização Assim a proposta do eu lírico não se limita à reivindicação de um mero reconhecimento mas amplificase correspondendo a um ato de reapropriação de um espaço existencial que lhe seja próprio BERND 1988 p 77 grifos da autora Bernd não se atém à cor da pele do escritor mas à enunciação do pertencimento Em seguida detalha com propriedade o alargamento da voz individual rumo à identificação com a comunidade momento em o euquesequernegro se encontra com o nós coletivo Ibid p 77 Sem discordar da pertinência do reconhecimento dessa voz cumpre ressaltar sua circunscrição ao texto poético o que relativiza em muito sua aplicabilidade quanto ao discurso ficcional dada a complexidade que envolve a instância do narrador e dadas as múltiplas possibilidades de disfarce do autor empírico Já para Luiza Lobo esta definição parece implicar que qualquer pessoa poderia se identificar existencialmente com a condição de afrodescendente o que de modo algum é verdadeiro no atual estágio sociocultural em que nos encontramos pelo menos no Brasil 2007 p 328 Lobo defende que o conceito não deve incluir a produção de autores brancos e juntamente com Brookshaw 1983 entende ser tal literatura apenas aquela escrita por negros Como se pode constatar a questão é controversa e como tal tem se mantido nas reflexões e debates levados a cabo nas últimas décadas Mas temse ainda um outro agravante formulado pelo segmento de sentido que diz respeito ao texto negro como sinônimo de narrativa detetivesca de mistério e suspense na linha do roman noir da indústria editorial No Brasil tal vertente faz sucesso com Rubem Fonseca 1925 e outros chegandose mesmo ao estabelecimento de nuances diferenciadoras entre os conceitos de romance negro e romance policial Vejamos a propósito a definição dada por Peter Winner o personagem escritor do Romance negro de Rubem Fonseca acabamos de dizer que o romance negro se caracteriza pela existência de um crime com uma vítima que se sabe logo quem é e um criminoso desconhecido e um detetive que afinal descobre a identidade desse criminoso Assim não existe o crime perfeito não é verdade FONSECA 1992 p 151 aspas do autor No conto em que o protagonista é um famoso escritor de histórias policiais a pontificar num evento reunindo outros autores do gênero Fonseca entrelaça ação e metalinguagem para esboçar a genealogia do roman noir desde o século XVIII passando por Edgar Alan Poe e outros fundadores roman noir novela negra kriminal roman romance policial romance de mistério ou que nome possua teve suas regras simples estabelecidas por Poe ao publicar Os crimes nessa mesma revista que temos à nossa frente Ibid p 161 Ao que complementa o escritor fictício de Fonseca um crítico afirmava que meus livros com seu conteúdo de violência corrupção conflitos sociais miséria crime e loucura podiam ser considerados verdadeiros textos do romance negro Ibid p 164 Assim já por esse pequeno sumário da questão podese deduzir que da militância e celebração identitária ao negrismo descomprometido e tendente ao exótico passando por escritos distantes tanto de uma postura como de outra literatura negra são muitas o que no mínimo enfraquece e limita a eficácia do conceito enquanto operador teórico e crítico E isto sem entrar na cadeia semântica do adjetivo que desde as páginas da Bíblia carrega em praticamente todas as línguas faladas no ocidente as marcas de negatividade inferioridade pecado morte e todo tipo de sortilégio como já apontado por Brookshaw 1983 dentre outros Já o termo afrobrasileiro por sua própria configuração semântica remete ao tenso processo de mescla cultural em curso no Brasil desde a chegada dos primeiros africanos Processo de hibridação étnica e linguística religiosa e cultural De acordo com um pensamento conservador poderseia dizer que afro brasileiros são também todos os que provêm ou pertencem a famílias mais antigas cuja genealogia remonta ao período anterior aos grandes fluxos migratórios ocorridos desde o século XIX E como este outros reparos poderiam ser arrolados dado o caráter nãoessencialista do termo Para Luís Silva Cuti ele funciona como elemento atenuador que diluiria o sentido político de afirmação identitária contido na palavra negro É certo que por abraçarem toda a gama de variações fenotípicas inerentes à mestiçagem termos como afrobrasileiro ou afrodescendente trazem em si o risco de assumirem sentido homólogo ao do signo pardo tão presente nas estatísticas do IBGE quanto execrado pelos fundamentalistas do orgulho racial traduzido no slogan 100 negro Deixando de lado polêmicas de fundo sociológico político ou antropológico também é certo que não há sobretudo no Brasil uma literatura 100 negra tomada aqui a palavra como sinônimo de africana Nem a África é uma só como nos demonstra Apiah 1997 nem o romance o conto ou o poema são construções provindas unicamente do Atlântico Negro Num universo cultural como o nosso onde verdadeiras constelações discursivas localizadas tanto regionalmente quanto no que Nora denomina lugares de memória se dispõem ao constante reprocessamento insistir num viés essencialista pode gerar mais polêmicas do que operadores teóricocríticos eficientes para o trabalho pedagógico de formar leitores A discussão envolve outras variantes Luiza Lobo confere um perfil mais incisivo ao conceito Poderíamos definir literatura afrobrasileira como a produção literária de afrodescendentes que se assumem ideologicamente como tal utilizando um sujeito de enunciação próprio Portanto ela se distinguiria de imediato da produção literária de autores brancos a respeito do negro seja enquanto objeto seja enquanto tema ou personagem estereotipado folclore exotismo regionalismo LOBO 2007 p 315 A definição articula o sujeito de enunciação proposto por Bernd com a exigência de pertencimento e compromisso ideológico formulada por Ironides Rodrigues E prossegue Para arrancar a literatura negra do reduto reducionista da literatura em geral que a trata como tema folclórico exótico ou como estereótipo é preciso que ela seja necessariamente uma literatura afrobrasileira Ibid p 331 É inegável que a afrobrasilidade aplicada à produção literária enquanto requisito de autoria e marca de origem configurase como perturbador suplemento de sentido aposto ao conceito de literatura brasileira sobretudo àquele que a coloca como ramo da portuguesa Mas tão relevante quanto o sujeito de enunciação próprio em que um eu lírico ou um narrador se autoproclama negro ou afrodescendente é o ponto de vista adotado Um bom exemplo pode estar na produção de autores do século XIX remanescentes de africanos submetidos à hegemonia do embranquecimento como vacina contra a morte social E ainda submetidos a um pensamento científico que praticamente os proibia de se declararem negros ou mulatos a exemplo de Maria Firmina dos Reis 18221917 Autores impelidos a uma negrícia ou negrura abafadas e tendo na literatura uma forma de expressão do retorno do recalcado como no caso de Machado de Assis 18391908 Em ambos não há uma voz autoral que se assuma negra como no texto do Orfeu de Carapinha Luiz Gama Daí a dificuldade de enquadrar Pai contra mãe ou Úrsula 1859 como literatura negra e não apenas devido à sobrecarga de sentidos políticos ou folclóricos agregados ao conceito Todavia os escritos de ambos e são inúmeros os exemplos não podem ser classificados como dotados de um ponto de vista externo ou descomprometido O texto machadiano fala por si e assim como em Firmina explicita um olhar nãobranco e nãoracista Nem um nem outro devem portanto serem enquadrados como negrismo ou literatura sobre o negro Deste modo tão relevante ou mais que a explicitação da origem autoral é o lugar a partir do qual o autor expressa sua visão de mundo Nesse contexto vejo no conceito de literatura afrobrasileira uma formulação mais elástica e mais produtiva a abarcar tanto a assunção explícita de um sujeito étnico que se faz presente numa série que vai de Luiz Gama a Cuti passando pelo negro ou mulato como queiram de Lima Barreto 18811922 quanto o dissimulado lugar de enunciação que abriga Caldas Barbosa Machado Firmina Cruz e Sousa 18611898 Patrocínio 18531905 Paula Brito 18091861 Gonçalves Crespo 18461886 e tantos mais Por isto mesmo inscrevese como um operador capacitado a abarcar melhor por sua amplitude necessariamente compósita as várias tendências existentes na demarcação discursiva do campo identitário afrodescendente em sua expressão literária Acredito pois na maior pertinência do conceito de literatura afrobrasileira presente em nossos estudos literários desde o livro pioneiro de Roger Bastide 1943 com os equívocos é certo que aquele momento não permitia a ele superar em especial no tocante a Cruz e Sousa E também presente nas reflexões de Moema Augel e mais enfaticamente de Luiza Lobo 1993 2007 Adotado enfim por praticamente todos os que lidam com a questão nos dias de hoje inclusive pelos próprios autores do Quilombhoje seja nos subtítulos dos Cadernos Negros seja no próprio volume teóricocrítico lançado pelo grupo em 1985 com o título de Reflexões sobre a literatura afrobrasileira Nesse contexto seria relevante atentar para as reflexões do poeta e crítico Edimilson de Almeida Pereira que aponta o risco dos critérios étnico e temático funcionarem como censura prévia aos autores Sua preocupação se aproxima daquela manifestada por Proença Filho quanto ao risco terminológico 1988 p 77 implícito à expressão que poderia confinar ainda mais essa escritura ao gueto afastandoa consequentemente das instâncias de canonização De sua parte Pereira defende a adoção de um critério pluralista a partir de uma orientação dialética que possa demonstrar a literatura afrobrasileira como uma das faces da literatura brasileira esta mesma sendo percebida como uma unidade constituída de diversidades 1995 p 10356 O crítico inverte a conhecida postulação de Afrânio Coutinho e considera a literatura brasileira como constituinte de uma tradição fraturada típica de países que passaram pelo processo de colonização É portanto no âmbito dessa expressão historicamente múltipla e desprovida de unidade que se abre espaço para a configuração do discurso literário afrodescendente em seus diversos matizes Em resumo que elementos distinguiriam essa literatura Para além das discussões conceituais alguns identificadores podem ser destacados uma voz autoral afrodescendente explícita ou não no discurso temas afrobrasileiros construções lingüísticas marcadas por uma afrobrasilidade de tom ritmo sintaxe ou sentido um projeto de transitividade discursiva explícito ou não com vistas ao universo recepcional mas sobretudo um ponto de vista ou lugar de enunciação política e culturalmente identificado à afrodescendência como fim e começo Alertando para o fato de que se trata de um conceito em construção passamos a examinar mais detidamente cada um desses elementos A Temática Riram dos nossos valores Apagaram os nossos sonhos Pisaram a nossa dignidade Sufocaram a nossa voz Nos transformaram em uma ilha Cercada de mentiras por todos os lados Carlos de Assumpção O tema é um dos fatores que ajuda a configurar o pertencimento de um texto à literatura afrobrasileira Para Octavio Ianni tratase de abordar não só o sujeito afrodescendente no plano do indivíduo mas como universo humano social cultural e artístico de que se nutre essa literatura 1988 p 209 Assim pode contemplar o resgate da história do povo negro na diáspora brasileira passando pela denúncia da escravização e de suas consequências ou ir à glorificação de heróis como Zumbi dos Palmares A denúncia da escravatura já está no citado Úrsula 1859 de Maria Firmina dos Reis em Motta Coqueiro 1877 de José do Patrocínio na obra de Cruz e Sousa e em alguns romances contos e crônicas de Machado de Assis bem como em outros autores dos séculos XIX e XX Por sua vez os feitos gloriosos dos quilombolas estão presentes tanto no Canto dos Palmares 1961 de Solano Trindade 19081974 quanto no Dionísio esfacelado 1984 de Domício Proença Filho 1936 E ainda em diversos outros textos empenhados em reconstituir a memória de lutas dos que não se submeteram ao cativeiro como a obra de Oliveira Silveira 19412009 e a biografia romanceada do líder palmarino de Joel Rufino dos Santos Tais escritos polemizam com o discurso colonial que conforme salienta Fanon 1983 trabalha pelo apagamento de toda história cultura e civilização existentes para aquém ou além dos limites da sociedade branca dominante A temática afrobrasileira abarca ainda as tradições culturais ou religiosas transplantadas para o novo mundo destacando a riqueza dos mitos lendas e de todo um imaginário circunscrito quase sempre à oralidade Autores como Mestre Didi 19172013 com seus Contos crioulos da Bahia 1976 ou Mãe Beata de Yemonjá 19312017 com as narrativas presentes em Caroço de dendê 2002 e Histórias que minha avó contava 2004 figuram nessa linha de recuperação de uma multifacetada memória ancestral Além disso elementos rituais e religiosos são presença constante em inúmeros autores Exus e PombasGiras povoam Cidade de Deus 1997 de Paulo Lins 1958 enquanto os Orikis transportados pelo Atlântico Negro fazemse presentes na poesia de Edimilson de Almeida Pereira e tantos mais Já a peça Sortilégio 1957 de Abdias Nascimento 1914 2011 traz para o palco não apenas o terreiro e o peji como cenário mas o culto afrobrasileiro e a memória ancestral como fundamentos do processo de identificação do personagem negro um dos pontos fulcrais da trama E para além da temática propriamente religiosa observase a recorrência de textos em que se celebram vínculos com a ancestralidade africana como em Elo de Oliveira Silveira Aqui meu umbigo túmido receptor de seiva neste lado do mar nesta longe placenta E África lá está na outra extremidade do cordão Roteiro dos tantãs p 3 Outra vertente dessa diversidade temática situase na história contemporânea e busca trazer ao leitor os dramas vividos na modernidade brasileira com suas ilhas de prosperidade cercadas de miséria e exclusão De Lima Barreto e Nascimento Moraes a Carolina Maria de Jesus de Lino Guedes Adão Ventura 19392004 e Oswaldo de Camargo 1936 a Eduardo de Oliveira 19262012 passando pelos poetas e ficcionistas reunidos na série Cadernos Negros muitos são os que debruçam sobre o estigma do 14 de maio de 1888 o longo day after da abolição que se prolonga pelas décadas seguintes e chega ao século XXI Como decorrência desse processo surgem nos textos o subúrbio a favela a crítica ao preconceito e ao branqueamento a marginalidade a prisão E figuras como Di Lixão Ana Davenga Natalina DuzuQuerença personagens dos contos de Conceição Evaristo como a empregada Maria linchada pelos passageiros de um ônibus urbano após escapar de assalto em que estes são vítimas simplesmente por ser excompanheira de um dos bandidos No entanto a abordagem das condições passadas e presentes de existência dos afrodescendentes no Brasil não pode ser considerada obrigatória nem se transformar numa camisa de força para o autor o que redundaria em visível empobrecimento Por outro lado nada impede que a matéria ou o assunto negro estejam presentes da escrita dos brancos Desde as primeiras manifestações das vanguardas estéticas do século XX uma forte tendência negrista parte das apropriações cubistas do imaginário africano e se estende a outras artes e outros países em especial no modernismo brasileiro Dessa postura decorrem textos hoje considerados clássicos Deste modo a adoção da temática afro não deve ser considerada isoladamente e sim em sua interação com outros fatores como autoria e o ponto de vista A Autoria Há o tema do negro e há a vida do negro Mas uma coisa é o negrotema outra o negro vida Alberto Guerreiro Ramos Conforme já visto a instância da autoria é das mais controversas pois implica a consideração de fatores biográficos ou fenotípicos com todas as dificuldades daí decorrentes e ainda a defesa feita por alguns estudiosos de uma literatura afro brasileira de autoria branca No primeiro caso há que atentar para a abertura implícita ao sentido da expressão afrobrasileiro a fim de abarcar as identidades compósitas oriundas do processo miscigenador No segundo correse o risco de reduzir essa produção ao negrismo entendido como utilização por quem quer que seja de assuntos atinentes aos negros Superandose o reducionismo temático e vendose a questão de outra perspectiva podese por exemplo reler Castro Alves e concluir que apesar do epíteto de poeta dos escravos sua obra não se enquadra na literatura afrobrasileira No extremo oposto ao negrismo existem autores que apesar de afrodescendentes não reivindicam para si tal condição nem a incluem em seu projeto literário a exemplo de Marilene Felinto e tantos outros3 Isto nos indica a necessidade de evitar também a redução sociológica que no limite levaria a interpretar o texto a partir de fatores externos a ele como a cor da pele ou a condição social do escritor No caso presente é preciso compreender a autoria não como um dado exterior mas como uma constante discursiva integrada à materialidade da construção literária Por esta via se descobrem ângulos novos tanto na poesia de Cruz e Souza quanto na obra de Machado de Assis em especial nas crônicas publicadas sob pseudônimo No caso do poeta catarinense um acesso por ligeiro que seja a dados de sua biografia indicará a existência de outras possibilidades de interpretação distintas daquela obsessão pela branquitude que muitos enxergam como dominante em seu projeto poético A confissão angustiada presente no Emparedado explicita não ser Cruz e Sousa um negro de alma branca apesar da formação europeizante que recebeu e do refinado conhecimento que possuía da poesia e da cultura ocidentais O emparedamento a que está submetido pelo fato histórico da escravização reforçado pelos estigmas com que são rebaixados os de pele escura mesmo após o término formal do regime repercute em seus escritos construindo novas possibilidades de leitura Como no caso de Machado e tantos outros há que se levar também em conta a produção jornalística do poeta inclusive no que tem de confessional para conhecer seu profundo desprezo pela elite que fazia do trabalho escravizado fonte de lucro e poder A partir de então terseá uma dimensão mais ampla do conjunto da obra A instância da autoria como fundamento para a existência da literatura afro brasileira decorre da relevância dada à interação entre escritura e experiência que inúmeros autores fazem questão de destacar seja enquanto compromisso identitário e comunitário seja no tocante à sua própria formação de artistas da palavra No primeiro caso saltam aos olhos os impulsos coletivistas que levam diferentes autores a quererem ser a voz e a consciência da comunidade4 Nesse contexto recuperase a tradição africana dos griots Guardiães do saber ancestral circunscrito à oralidade bem como dos usos e costumes das nações que deram origem à população afrodescendente no Brasil os griots são referência para intelectuais militantes como Abdias Nascimento Solano Trindade Carlos de Assumpção 1927 Cuti e tantos mais Por outro lado a inscrição da experiência marcada por obstáculos de toda ordem tem sido uma constante na produção afrodescendente de diversos países Traços autobiográficos marcam as páginas de inúmeros autores do passado e do presente a entrelaçar a ficção e a poesia com o testemunho numa linha que vem de Cruz e Sousa e Lima Barreto a Carolina Maria de Jesus 19141977 e Geni Guimarães 1947 entre outros No momento quem mais explicita o veio documental de sua obra é Conceição Evaristo que reivindica para seus textos o estatuto de escrevivência na origem da minha escrita ouço os gritos os chamados das vizinhas debruçadas sobre as janelas ou nos vãos das portas contando em voz alta umas para as outras as suas mazelas assim como suas alegrias Apud ALEXANDRE Org 2007 p 19 A exiguidade de espaço dos barracos da favela e a proximidade ente uns e outros estreita os caminhos dos becos e também das vidas que ali se cruzam fixando tais experiências na memória da futura escritora Creio que a gênese da minha escrita está no acúmulo de tudo o que ouvi desde a infância Eu fechava os olhos fingindo dormir e acordava todos os meus sentidos O meu corpo por inteiro recebia palavras sons murmúrios vozes entrecortadas de gozo ou dor dependendo do enredo das histórias De olhos cerrados eu construía as faces de minhas personagens reais e falantes Era um jogo de escrever no escuro No corpo da noite Ibid E conclui A nossa escrevivência não pode ser lida como histórias para ninar os da casa grande e sim para incomodálos em seus sonos injustos Ibid p 21 grifo da autora Deste modo a autoria há que estar conjugada intimamente ao ponto de vista Literatura é discursividade e a cor da pele será importante enquanto inscrição textual de uma história própria ou coletiva O Ponto de Vista À África Às vezes te sinto como avó outras vezes te sinto como mãe Quando te sinto como neto me sinto como sou Quando te sinto como filho não estou me sentindo bem eu estou me sentindo aquele que arrancaram de dentro de ti Oliveira Silveira O ponto de vista adotado indica a visão de mundo autoral e o universo axiológico vigente no texto ou seja o conjunto de valores que fundamentam as opções até mesmo vocabulares presentes na representação Diante disso a ascendência africana ou a utilização do tema são insuficientes É necessária ainda a assunção de uma perspectiva identificada à história à cultura logo à toda problemática inerente à vida e às condições de existência desse importante segmento da população Em suas Trovas burlescas publicadas em 1859 Luiz Gama autoproclamado Orfeu de Carapinha explicita a afrodescendência de seus textos ao apelar à musa da Guiné e à musa de azeviche para em seguida promover uma impiedosa carnavalização das elites Já em seu romance Úrsula também de 1859 Maria Firmina dos Reis adota a mesma perspectiva ao colocar o escravo Túlio como referência moral do texto chegando a afirmar pela voz do narrador que Tancredo um dos brancos mais destacados na trama possuía sentimentos tão nobres e generosos como os que animavam a alma do jovem negro 2004 p 25 Mais adiante faz seu texto falar pela voz de Mãe Suzana velha cativa que detalha a vida livre na África a captura pelos bárbaros traficantes europeus e o cemitério cotidiano do porão do navio negreiro Numa época em que muitos sequer concediam aos negros a condição de seres humanos o romance e a perspectiva afroidentificada da escritora soam como gestos revolucionários que a distinguem do restante da literatura brasileira da época Já o caso de Machado de Assis é emblemático Menino pobre nascido no Morro do Livramento filho de um pintor de paredes e de uma lavadeira jovem ainda ganha destaque no mundo das letras Cronista crítico literário poeta e ficcionista em nenhuma página de sua vasta obra se encontra qualquer referência a favor da escravatura ou da pretensa inferioridade de negros ou mestiços Muito pelo contrário E mesmo descartando a retórica panfletária a ironia por vezes sarcástica e a verve carnavalizadora com que trata a classe senhorial dão bem a medida de sua visão de mundo O lugar de onde fala é o dos oprimidos e este é um fator decisivo para incluir ao menos parte de sua obra no âmbito da afrobrasilidade Apesar de fundador da Academia Brasileira de Letras e de ter sido canonizado como escritor branco Machado escapa ao papel normalmente destinado aos homens livres na ordem escravocrata o de ventríloquo e defensor das ideias hegemônicas provenientes das elites senhoriais E conforme demonstra Chalhoub 2003 ao contrário da leitura de Schwarz 1977 a crítica machadiana não visa apenas ao aprimoramento do paternalismo mas à sua denúncia Como funcionário do governo imperial Machado ostenta uma postura irrepreensível ao propiciar a libertação de inúmeros cativos E como escritor adota em seus textos um ponto de vista coerente com seu procedimento de cidadão Chalhoub 2003 A acusação de omisso que muitos tentaram lhe impingir cai por terra diante das centenas de matérias abolicionistas publicadas pela Gazeta de Notícias órgão do qual era sócio oculto E mais em suas crônicas sempre que aborda o cativeiro acrescenta elementos judicativos que ora lamentam a condição dos escravos ora louvam a filantropia dos que os libertam ora criticam os que apoiam ou se beneficiam do sistema conforme podemos ler em Raimundo Magalhães Júnior 1957 No terreno da poesia encontramos obras como Sabina ou os versos satíricos publicados nos jornais onde obtinham repercussão mais ampla E seguemse contos como Virginius Mariana O Espelho O caso da vara ou o contundente Pai contra mãe calcados numa postura nitidamente afro brasileira Já nos romances o olhar que organiza as ações e comanda a pintura das figuras nunca é o olhar do branco explorador menos ainda escravista Entrando no século XX damos como exemplo inicial o poeta Lino Guedes Em 1938 ele publica Dictinha um volume inteiro dedicado a exaltar a mulher negra e ao mesmo tempo estabelecer um confronto praticamente inédito com a estereotipia vigente na sociedade em torno dessa camada feminina vitimada tanto pelo racismo quanto pelo sexismo Ouçamos uma estrofe Penso que talvez ignores Singela e meiga Dictinha Que desta localidade És a mais bela pretinha Se não fosse profanarte Chamarteia francesinha Guedes 1938 A elevação da mulher negra fazse presente ainda em outros poetas da primeira metade do século XX como Solano Trindade ou Aloísio Resende 19001941 Eles publicam em pleno apogeu modernista e fazem um interessante contraponto com a Nega Fulô de Jorge de Lima No caso de Guedes destacase a opção do poeta de inverter o sentido do discurso moralista do branco utilizandose para tanto das próprias armas deste ou seja do estereótipo sexual com que ingleses e alemães sobretudo estigmatizavam as francesas Diante da francesinha tomada pelo viés do sentido pejorativo a pretinha surge valorizada e engrandecida É o recurso da apropriação paródica que utiliza a linguagem do preconceito contra o preconceito Corremse no caso os riscos já sabidos pois se vai estar sempre na esfera da exclusão própria ao pensamento segregacionista Mas a paródia do discurso colonial já é em si um avanço frente a assimilação pura e simples que marca o trabalho de outros dotados de alma e estética brancas A assunção de um ponto de vista afrobrasileiro atinge seu ponto culminante com a série Cadernos Negros A apresentação do número 1 soa como manifesto e ilustra a afirmativa Estamos no limiar de um novo tempo Tempo de África vida nova mais justa e mais livre e inspirados por ela renascemos arrancando as máscaras brancas pondo fim à imitação Descobrimos a lavagem cerebral que nos poluía e estamos assumindo nossa negrura bela e forte Estamos limpando nosso espírito das ideias que nos enfraquecem e que só servem aos que querem nos dominar e explorar Cadernos Negros 1 1978 A metáfora do renascimento remete à adoção de uma visão de mundo própria e distinta da do branco à superação da cópia de modelos europeus e à assimilação cultural imposta como única via de expressão Ao superar o discurso do colonizador em seus matizes passados e presentes a perspectiva afro identificada configurase enquanto discurso da diferença e atua como elo importante dessa cadeia discursiva A Linguagem Quando o escravo surrupiou a escrita disse o senhor precisão síntese regras e boas maneiras São seus deveres Cuti A literatura costuma ser definida antes de tudo como linguagem construção discursiva marcada pela finalidade estética Tal posição ancorase no formalismo inerente ao preceito kantiano da finalidade sem fim da obra de arte Todavia outras finalidades para além da fruição estética são também reconhecidas e expressam valores éticos culturais políticos e ideológicos A linguagem é em dúvida um dos fatores instituintes da diferença cultural no texto literário Assim a afrobrasilidade tornarseá visível também a partir de um vocabulário pertencente às práticas linguísticas oriundas de África e inseridas no processo transculturador em curso no Brasil Ou de uma discursividade que ressalta ritmos entonações e mesmo toda uma semântica própria empenhada muitas vezes num trabalho de ressignificação que contraria sentidos hegemônicos na língua Isto porque bem o sabemos não há linguagem inocente nem signo sem ideologia Termos como negro negra crioulo ou mulata para ficarmos nos exemplos mais evidentes circulam no Brasil carregados de sentidos pejorativos e tornamse verdadeiros tabus linguísticos no âmbito da cordialidade que até certo ponto ainda caracteriza o racismo à brasileira Alguns exemplos quem não se lembra dos versos de Manuel Bandeira 1990 Irene preta Irene boa Irene sempre de bom humor Ou da mulata assanhada que nunca é mulher diurna só noturna nunca é espírito só carne nunca é família ou trabalho só prazer E bem conhecemos o complemento masculino dessa fantasia o mulato malandro chegado à festa e aos vícios fator de degeneração e de desequilíbrio social Estes e tantos outros fantasmas emergem de nosso passado escravista para ainda hoje habitarem o imaginário social brasileiro onde fazem companhia a figurações como a do bom senhor ou do bom patrão do escravo contente ou do seu oposto o marginal sanguinário e psicopata naturalmente voltado para o crime Estas e tantas outras deturpações inscrevemse em nossas letras tanto quanto no cinema na TV ou nos programas popularescos que se espalham pelas ondas do rádio São estereótipos sociais largamente difundidos e assumidos inclusive entre suas vítimas signos que funcionam como poderosos elementos de manutenção da desigualdade Nesse contexto o discurso afrodescendente busca a ruptura com os contratos de fala e escrita ditados pelo mundo branco objetivando a configuração de uma nova ordem simbólica que expresse a reversão de valores conforme analisa Zilá Bernd 1988 p 22 85 89 E o tom carinhoso impresso à linguagem de Henrique Cunha Júnior 1952 no momento em que trata de um dos principais ícones do preconceito racial dá bem a medida do esforço de reterritorialização cultural empreendido pela literatura afrobrasileira Ouçamos o poeta Cabelos enroladinhos enroladinhos Cabelos de caracóis pequeninos Cabelos que a natureza se deu ao luxo de trabalhálos e não simplesmente deixálos esticados ao acaso Cabelo pixaim Cabelo de negro Cadernos Negros 1 1978 O signo cabelo enquanto marca de inferioridade cabelo duro cabelo ruim qual é o pente que penteia repetenos a música ouvida há tantas décadas é recuperado pelo viés da positividade expressa na linguagem o diminutivo enroladinhos em conjunção fônica e semântica com pequeninos remete ao luxo dos caracóis trabalhados pela natureza ao contrário do cabelo liso inscrito como fruto do acaso Nessa linha há inúmeros exemplos como Outra Nega Fulô de Oliveira Silveira 1998 p 109110 ou Minha cor não é de luto de Márcio Barbosa 2004 p 106 em que se evidencia a reversão paródica do discurso hegemônico E no tocante às particularidades de ritmo e de entonação são inúmeros os casos em que o texto expressa sonoridades outras marcadas pelo rico imaginário afro brasileiro Entre tantos podemos lembrar os sons guerreiros do poeta Bélsiva Irmão bate os atabaques Bate bate bate forte Bate que a arte é nossa 1978 em que o desdobramento anagramático do instrumento musical africano faz com que a poesia assuma o sentido de ritual coletivo e libertador Outros exemplos poderiam ser arrolados a partir mesmo da forte presença de vocábulos de idiomas africanos incorporados ao português do Brasil como em Tristes Maracatus de Solano Trindade Baticuns maracatucando na minhalma de moleque Buneca negra de minha meninice de negro preto de São José Nas águas de calunga a Kambinda me inspirando amor o primeiro cafuné no mato verde Da campina do Bodé Trindade 1981 p 74 Assim a assunção de uma linguagem descomprometida com os contratos de fala dominantes ganha sentido político conforme conclui Conceição Evaristo Em se tratando de um ato empreendido por mulheres negras que historicamente transitam por espaços culturais diferenciados dos lugares ocupados pela cultura das elites escrever adquire um sentido de insubordinação Insubordinação que se pode evidenciar muitas vezes desde uma escrita que fere as normas cultas da língua caso exemplar o de Carolina Maria de Jesus como também pela escolha da matéria narrada Evaristo 2007 p 21 O Público Escrevo porque há que se despertar a consciência adormecida e preguiçosa do nosso povo porque há que se cutucar com punhaispalavras os marginalizados que são meus personagens e que provavelmente não por falta de empenho de minha parte nem venham a ler meus textos Paulo Colina A formação de um horizonte recepcional afrodescendente como fator de intencionalidade próprio a essa literatura distinguea do projeto que norteia a literatura brasileira em geral A constituição desse público específico marcado pela diferença cultural e pelo anseio de afirmação identitária compõe a faceta algo utópica do projeto literário afrobrasileiro sobretudo a partir de Solano Trindade Oliveira Silveira e dos autores contemporâneos Este impulso à ação e ao gesto político leva à criação de outros espaços mediadores entre texto e receptor os saraus literários na periferia os lançamentos festivos a encenação teatral as rodas de poesia e rap as manifestações políticas alusivas ao 20 de novembro entre outros No caso o sujeito que escreve o faz não apenas com vistas a atingir um determinado segmento da população mas o faz também a partir de uma compreensão do papel do escritor como portavoz da comunidade Isto explica a reversão de valores e o combate aos estereótipos procedimentos que enfatizam o papel social da literatura na construção da autoestima Acrescentese o fato de que títulos como Axé Cadernos Negros ou Quilombo de palavras explicitam de imediato um públicoalvo a cujas expectativas o escritor espera atender A tarefa a que se propõem é ambiciosa e nada desprezível Tratase de intervir num processo complexo e num campo adverso dada a dificuldade de se implantar o gosto e o hábito de leitura sobretudo entre crianças e jovens em sua maioria pobres num cenário marcado pela hegemonia dos meios eletrônicos de comunicação Para ilustrar recordo uma reflexão de Ezequiel Teodoro da Silva datada dos anos 1980 a respeito do que então se denominava crise de leitura Segundo o autor essa crise é alimentada pela leidura um conjunto de restrições que impede a fruição da leitura e que a coloca numa situação de crise Para ele o primeiro parágrafo da leidura estabelece que somente a elite dirigente deve ler o povo deve ser mantido longe dos livros Porque livros bem selecionados e lidos estimulam a crítica a contestação e a transformação elementos estes que segundo o teórico colocam em risco a estrutura social vigente SILVA 1997 Num contexto tão adverso duas tarefas se impõem primeiro a de levar ao público a literatura afrobrasileira fazendo com que o leitor tome contato não apenas com a diversidade dessa produção mas também com novos modelos identitários e segundo o desafio de dialogar com o horizonte de expectativas do leitor combatendo o preconceito e inibindo a discriminação sem cair no simplismo muitas vezes maniqueísta do panfleto A busca do público leva à postura do grupo Quilombhoje de São Paulo de ir onde o povo negro está vendendo os livros em eventos e outros circuitos alternativos ao mercado editorial E explica a multiplicação de sites e portais na Internet nos quais o receptor encontra formas menos dispendiosas de fruir o prazer da leitura Resta então trabalhar por uma crescente inclusão digital para que se concretize nessa estratégia a saída frente às dificuldades existentes tanto no âmbito da produção editorial quanto na rarefação de um mercado consumidor de reduzido poder aquisitivo Concluindo A partir portanto da interação dinâmica desses cinco grandes fatores temática autoria ponto de vista linguagem e público podese constatar a existência da literatura afrobrasileira em sua plenitude Tais componentes atuam como constantes discursivas presentes em textos de épocas distintas Logo emergem ao patamar de critérios diferenciadores e de pressupostos teóricocríticos a embasar e operacionalizar a leitura dessa produção Impõese destacar todavia que nenhum desses elementos propicia o pertencimento à literatura afro brasileira mas sim o resultado de sua interrelação Isoladamente tanto o tema como a linguagem e mesmo a autoria o ponto de vista e até o direcionamento recepcional são insuficientes Literatura Afrobrasileira processo devir Além de segmento ou linhagem componente de amplo encadeamento discursivo Ao mesmo tempo dentro e fora da literatura brasileira como já defendia na década de 1980 Octavio Ianni 1988 p 208 Uma produção que implica evidentemente redirecionamentos recepcionais e suplementos de sentido à história literária estabelecida Uma produção que está dentro porque se utiliza da mesma língua e praticamente das mesmas formas e processos de expressão Mas que está fora porque entre outros fatores não se enquadra no ideal romântico de instituir o advento do espírito nacional Uma literatura empenhada sim mas num projeto suplementar no sentido derridiano ao da literatura brasileira canônica o de edificar uma escritura que seja não apenas a expressão dos afrodescendentes enquanto agentes de cultura e de arte mas que aponte o etnocentrismo que os exclui do mundo das letras e da própria civilização Daí seu caráter muitas vezes marginal porque fundado na diferença que questiona e abala a trajetória progressiva e linear de nossa história literária Notas 1 Uma versão reduzida desse texto está publicada em Estudos de literatura brasileira contemporânea n 31 Brasília UnB janeiro junho de 2008 A presente versão encontrase também em DUARTE E A e FONSECA M N S Org Literatura e afrodescendência no Brasil antologia crítica Belo Horizonte Editora UFMG 2011 vol 4 História teoria polêmica 2 Em seu Vanguardas latinoamericanas Jorge Schwartz 1995 contrasta criticamente os conceitos de Negrismo e de Negritude e discorre sobre suas manifestações tanto na literatura brasileira quanto nas literaturas hispano americanas ressaltando as distinções que caracterizam os movimentos entre si e nos diversos países Já para Oswaldo de Camargo o negrismo enquanto discurso do branco se equipara ao indianismo dos românticos em que o nativo surge reduzido a objeto da fantasia do colonizador 3 Ver a propósito nosso Literatura política identidades cit p 120 4 A propósito recorremos às palavras do poeta martinicano Aimé Cézaire que poderiam ser assinadas por quaisquer dos escritores e intelectuais brasileiros afrodescendentes Sim nós constituímos uma comunidade mas uma comunidade de um tipo particular reconhecível pelo que ela é pelo que ela foi que apesar de tudo se constituiu em uma comunidade primeiramente uma comunidade de opressão sofrida uma comunidade de exclusão imposta uma comunidade de discriminação profunda Bem entendido e em sua honra ela é uma comunidade de resistência contínua de luta tenaz pela liberdade e de indubitável esperança CÉSAIRE 2010 p 104 Referências APPIAH Kwame Anthony Na casa de meu pai a África na filosofia da cultura Rio de Janeiro Contraponto 1997 ASSUMPÇÃO Carlos de Protesto Franca UNESP 1988 BASTIDE Roger A poesia afrobrasileira São Paulo Martins Fontes 1943 BASTIDE Estudos afrobrasileiros São Paulo Perspectiva 1983 BANDEIRA Manuel Poesia completa e prosa Rio de Janeiro Nova Aguillar 1990 BARBOSA Márcio Minha cor não é de luto In RIBEIRO E BARBOSA M Org Cadernos Negros Vol 27 São Paulo Quilombhoje 2004 BERND Zilá Introdução à literatura negra São Paulo Brasiliense 1988 BERND Zilá Negritude e literatura na América Latina Porto Alegre Mercado Aberto 1987 BERND Zilá Org Poesia negra brasileira Porto Alegre AGEIEL 1992 BROOKSHAW David Raça e cor na literatura brasileira Porto Alegre Mercado Aberto 1983 CAMARGO Oswaldo de O negro escrito São Paulo Secretaria de Estado da CulturaImprensa Oficial 1987 CÉSAIRE Aimé Discurso sobre a negritude Organização de Carlos Moore Belo Horizonte Nandyala 2010 CUTI Luiz Silva Sanga Belo Horizonte Mazza Edições 2002 DAMASCENO Benedita Gouveia Poesia negra no modernismo brasileiro Campinas Pontes Editores 1988 DUARTE Eduardo de Assis Literatura política identidades Belo Horizonte FALE UFMG 2005 EVARISTO Conceição Da grafiadesenho de minha mãe um dos lugares de nascimento de minha escrita In ALEXANDRE Marcos Antônio Org Representações performáticas brasileiras teorias práticas e suas interfaces Belo Horizonte Mazza Edições 2007 FANON Frantz Pele negra máscaras brancas Trad Maria Adriana da Silva Caldas Salvador Livraria Fator 1983 FONSECA Maria Nazareth Soares Org Brasil afrobrasileiro Belo Horizonte Autêntica 2000 FONSECA Rubem Romance negro e outras histórias São Paulo Companhia das Letras 1992 GAMA Luiz Primeiras trovas burlescas de Getulino 2 ed Rio de Janeiro Typographia Pinheiro Cia 1861 GUEDES Lino Dictinha separata de O canto do cisne negro São Paulo Cruzeiro do Sul 1938 Coleção Hendi IANNI Octavio Literatura e consciência In Estudos Afroasiáticos n 15 junho de 1988 Publicação do CEAA da Universidade Candido Mendes Rio de Janeiro 1988 p 208217 JÚNIOR R Magalhães Machado de Assis desconhecido Rio de Janeiro civilização Brasileira 1957 LOBO Luiza Crítica sem juízo 2 ed revista Rio de Janeiro Garamond 2007 PEREIRA Edimilson de Almeida Panorama da literatura afrobrasileira In Callaloo v 18 n 4 John Hopkins University Press 1995 PROENÇA FILHO Domício O negro na literatura brasileira In Boletim bibliográfico Biblioteca Mário de Andrade São Paulo Biblioteca Mario de Andrade v49 n14 jandez1988 PROENÇA FILHO Domício A trajetória do negro na literatura brasileira In Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional n 25 Org Joel Rufino dos Santos 1997 QUILOMBHOJE Org Cadernos Negros n 1 São Paulo Edição dos Autores 1978 QUILOMBHOJE Org Cadernos Negros n 2 São Paulo Edição dos Autores 1979 RABASSA Gregory O negro na ficção brasileira Rio de Janeiro Tempo Brasileiro 1965 REIS Maria Firmina dos Úrsula 4 ed Atualização do texto e posfácio de Eduardo de Assis Duarte Florianópolis Ed Mulheres Belo Horizonte PUC Minas 2004 SAYERS Raymond O negro na literatura brasileira Rio de Janeiro O Cruzeiro 1958 SCHWARTZ Jorge Negrismo e negritude In Vanguardas latinoamericanas São Paulo Editora da Universidade de São Paulo Iluminuras FAPESP 1995 SCHWARZ Roberto Ao vencedor as batatas São Paulo Duas Cidades 1977 SILVA Ezequiel Theodoro da Leitura e realidade brasileira 5 ed Porto Alegre Mercado Aberto 1997 SILVEIRA Oliveira Outra nega Fulô In QUILOMBHOJE Org Cadernos Negros os melhores poemas São Paulo Quilombhoje 1998 SILVEIRA Roteiro dos tantãs Porto Alegre Edição do autor 1981 TRINDADE Solano Cantares ao meu povo São Paulo Brasiliense 1981 Eduardo de Assis Duarte integra o Programa de Pósgraduação em Letras Estudos Literários da FALEUFMG e o Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Alteridade NEIA desta Instituição Autor de Literatura política identidades UFMG 2005 e de Jorge Amado romance em tempo de utopia 2 ed Record 1996 Organizou entre outros o volume Machado de Assis afrodescendente escritos de caramujo 3 ed rev ampl 2020 a coleção Literatura e afrodescendência no Brasil antologia crítica 2 Reimpr 2021 4 vol e os volumes didáticos Literatura afrobrasileira 100 autores do século XVIII ao XXI 2 ed 2019 e Literatura afrobrasileira abordagens na sala de aula 2 ed 2019 Participa do Projeto Interinstitucional de Pesquisa literafro Portal da Literatura Afro brasileira pesquisas em rede e integra a Comissão Editorial e Executiva do literafro disponível no endereço wwwletrasufmgbrliterafro Itinerário de Leitura TEMA IDENTIDADE OBRA ESTÍMULO LÚDICO O professor apresenta a capa da obra a ser lida e pede para os alunos listarem os possíveis segredos da personagem principal LEITURA O professor pede para os alunos comentarem sobre as lembranças suscitadas durante a leitura da obra REFLEXÃO SOBRE A LEITURA O professor pede para os alunos imaginarem como seria as suas vidas caso estivessem presentes no espaço apresentado na obra lida ATIVIDADE CRIATIVA O aluno representa os sentimentos suscitados pela leitura utilizando apenas lápis branco em papel preto DESFECHO LÚDICO Cada aluno deposita os seus problemas na caixa decorada durante o estímulo Após o professor e os alunos enterram a caixa no pátio da escola Ao final do ano letivo eles desenterram a caixa para cada um refletir sobre os problemas registrados no passado Desenvolvido a partir do ebook Itinerários de leitura para as séries iniciais CAROLINE CARDOSO ALVES PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ DE DJAMILA RIBEIRO NO ENSINO MÉDIO SINOPMT 2025 CAROLINE CARDOSO ALVES PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ DE DJAMILA RIBEIRO NO ENSINO MÉDIO Projeto de Pesquisa apresentado à Banca Examinadora do Curso de Licenciatura em Letras UNEMAT Campus de Sinop como requisito parcial para a obtenção do grau de Licenciada em Letras Orientador Rosana Rodrigues Da Silva SINOPMT 2025 PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ DE DJAMILA RIBEIRO NO ENSINO MÉDIO Projeto de Pesquisa apresentado ao Curso de Licenciatura em Letras UNEMAT Campus de Sinop como requisito parcial para a obtenção do grau de Licenciada em Letras Orientador Rosana Rodrigues Da Silva SINOPMT Maio de 2025 SUMÁRIO CAROLINE CARDOSO ALVES1 PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA1 UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ1 DE DJAMILA RIBEIRO NO ENSINO MÉDIO1 CAROLINE CARDOSO ALVES2 PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA2 UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ2 PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA3 UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ3 INTRODUÇÃO5 2 JUSTIFICATIVA7 3 PROBLEMA DE PESQUISA8 4 OBJETIVOS9 5 REFERENCIAL TEÓRICO10 6 METODOLOGIA11 7 CRONOGRAMA ORGANIZE CONFORME A PESQUISA12 REFERÊNCIAS13 5 INTRODUÇÃO O racismo estrutural atravessa gerações e está presente até mesmo nos espaços de convivência mais íntimos como a família Como integrante de família negra venho de uma trajetória marcada por vivências que me revelaram de forma dolorosa o quanto o preconceito é naturalizado inclusive por aqueles que muitas vezes também são vítimas dele Ao longo da minha formação pessoal e acadêmica presenciei cenas de discriminação racial praticadas por pessoas de meu convívio familiar contra outras pessoas negras o que me trouxe várias reflexões profundas sobre como o racismo se enraíza e se perpetua no cotidiano das pessoas mesmo entre aqueles que compartilham da mesma origem racial É a partir de experiências pessoais e da consciência da urgência de práticas educativas antirracistas que nasceu este projeto de pesquisa Para tanto busquei a adequação da metodologia de Vera Teixeira de Aguiar voltada para a literatura juvenil à leitura e ao trabalho em sala de aula com a obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro Em Cartas para minha avó Djamila Ribeiro trouxe à tona memórias pessoais atravessadas por afetos perdas e resistência diante do racismo vivenciado por ela desde a infância oferecendo aos estudantes não apenas uma história de vida mas a oportunidade de refletir sobre o racismo em suas múltiplas dimensões Trabalhar com essa literatura na escola é uma maneira de romper silêncios históricos fomentar a escuta sensível e estimular uma educação antirracista que vá além do discurso Por este motivo se fez necessário falar sobre Djamila Ribeiro Uma das principais intelectuais brasileiras na luta contra o racismo e o sexismo Filha de um ativista do movimento negro e de uma mulher trabalhadora a autora cresceu em um contexto social marcado por exclusões sociais e afetos ancestrais o que a levou desde a infância ao enfrentamento do preconceito racial e religioso E para embasar a estrutura deste projeto recorremos a metodologia da professora Vera Teixeira de Aguiar que é uma referência nos estudos de literatura juvenil Sua proposta consiste em reconhecer a literatura juvenil como um campo autônomo com características próprias fazendo distinção da literatura infantil e da adulta A metodologia é organizada em torno de eixos como uma seleção criteriosa de obras e estímulos à leitura crítica e reflexiva utilizando recurso como banco de textos narrativos e roteiros de leitura instrumentos que facilitam a atuação dos professores e a aproximação dos alunos com obras que dialogam com sua realidade 6 Assim o presente projeto pretende contribuir para a formação de leitores reflexivos capazes de reconhecer as diversas formas de discriminação racial e de se posicionar eticamente diante delas resgatando o papel da literatura como instrumento de emancipação e transformação social 7 2 JUSTIFICATIVA O ensino de literatura nas escolas brasileiras ainda é majoritariamente composto por uma seleção de obras que quase não dialogam com a realidade e identidade dos estudantes negros Considerando que o Brasil é um país de maioria negra a lacuna de uma educação antirracista no ensino médio tornase um obstáculo para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária Este projeto de pesquisa surge da necessidade de reconhecer a literatura antirracista como um poderoso instrumento de formação crítica e de fortalecimento da identidade negra Minha própria trajetória marcada por experiências de racismo presenciadas no seio familiar reforça a urgência de práticas educativas que não apenas denunciem o preconceito mas que também promovam a valorização da cultura e da história negras A escolha pela obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro não é óbvia fundamentase em seu profundo potencial pedagógico a autora resgata memórias afetivas para discutir racismo ancestralidade e resistência temas fundamentais para a formação dos jovens Aliado a isso a metodologia de Vera Teixeira de Aguiar reconhecida pela proposta de um trabalho sistemático crítico de letramento literário ajuda a estruturar o ensino da obra de maneira que dialogue com a realidade dos estudantes Justificase portanto a relevância deste projeto não apenas pela inovação pedagógica que propõe mas também pela responsabilidade social de formar alunos conscientes de seu papel na luta contra a desigualdade racial A partir da literatura e do diálogo crítico pretende se contribuir para uma educação que valorize todas as identidades ressignificando histórias e abrindo caminhos para novos olhares e práticas em sala de aula 8 3 PROBLEMA DE PESQUISA 1 De que modo o trabalho de letramento literário com a literatura antirracista no Ensino Médio pode contribuir para a formação da consciência crítica e identitária do aluno negro da educação básica utilizando Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro 2 Como a metodologia de Vera Teixeira de Aguiar pode ser adaptada ao ensino de literatura antirracista para promover o letramento literário de estudantes negros do Ensino Médio 3 Quais aspectos da obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro favorecem a reflexão crítica sobre o racismo e a valorização da identidade negra no contexto escolar 9 4 OBJETIVOS Este projeto tem como finalidade promover o letramento literário a partir da literatura antirracista no contexto do Ensino Médio com o intuito de contribuir para a formação da consciência crítica e identitária de estudantes negros da educação básica e a valorização do feminismo negro Por tanto iremos adotar como obra central o livro Cartas para minha avó de autoria de Djamila Ribeiro 41 OBJETIVO GERAL Promover a consciência crítica referente aos temas letramento racial literatura antirracista e a valorização da cultura e do feminismo negro por meio da obra de Djamila Ribeiro 42 OBJETIVOS ESPECÍFICOS 1 Analisar o potencial do livro Cartas para minha avó para contribuir na construção de uma consciência crítica sobre o racismo 2 Adequar as etapas da metodologia de Vera Aguiar para a realidade dos alunos do Ensino Médio e da literatura antirracista 3 Elaborar uma proposta de sequência didática que promova a leitura crítica a reflexão sobre identidade racial e a valorização da cultura negra 4 Estabelecer conexões entre a obra de Djamila Ribeiro e outras produções do feminismo negro a fim de ampliar o repertório literário e crítico dos estudantes 10 5 REFERENCIAL TEÓRICO O presente trabalho fundamentase na concepção de literatura afrobrasileira enquanto campo autônomo de produção literária com características estéticas temáticas e ideológicas próprias Eduardo de Assis Duarte 2011 defende que essa literatura está ligada a um ponto de vista politicamente comprometido com a realidade do povo negro no Brasil incorporando aspectos como autoria afrodescendente perspectiva de enunciação temática ligada à ancestralidade à resistência e à denúncia do racismo estrutural Segundo o autor a literatura afrobrasileira não pode ser definida apenas pela cor da pele do autor ou pelo tema abordado mas pelo entrelaçamento de cinco elementos centrais autoria temática ponto de vista linguagem e público Esses fatores quando interligados permitem reconhecer uma produção literária afrodescendente comprometida com a construção de uma identidade cultural própria e com a valorização da memória negra no Brasil Nesse contexto a obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro é exemplo de literatura afrobrasileira contemporânea pois reúne diversos desses elementos uma autora negra que assume publicamente seu lugar de fala uma narrativa marcada pelo resgate da ancestralidade pela denúncia das desigualdades raciais e pelo uso de uma linguagem afetiva e crítica que interpela o leitor a partir de um ponto de vista negro Além disso este trabalho dialoga com a metodologia de Vera Teixeira de Aguiar especialmente em sua proposta de letramento literário voltado para a formação crítica de jovens leitores Aguiar 2001 defende a necessidade de um ensino de literatura que reconheça as especificidades das obras juvenis e promova a leitura reflexiva e sensível articulando literatura e realidade Ao adequar essa proposta à leitura de uma obra com forte viés identitário e antirracista como Cartas para minha avó pretendese contribuir para a construção de práticas pedagógicas que dialoguem com as vivências dos estudantes negros e incentivem a formação de sujeitos éticos e conscientes Assim este referencial sustenta a elaboração de uma proposta didática comprometida com a valorização da diversidade com a inclusão de vozes historicamente marginalizadas e com a formação de leitores capazes de reconhecer e combater as múltiplas formas de racismo presentes na sociedade 11 6 METODOLOGIA Esta pesquisa adotara uma abordagem qualitativa pois buscamos compreender e interpretar fenômenos educacionais a partir da realidade vivida e do ponto de vista dos sujeitos envolvidos Segundo Bogdan e Biklen 1994 a pesquisa qualitativa é caracteriza por investigar ambientes naturais e pelo enfoque nos significados atribuídos pelos participantes sendo apropriada para estudos que valorizam o contexto e a subjetividade O tipo de pesquisa adotado é bibliográfico e exploratório com base em autores que discutem o letramento literário a literatura antirracista e a proposta metodológica de Vera Teixeira de Aguiar Também se configura como uma pesquisa teóricopropositiva já que o objetivo não é aplicar uma intervenção prática mas sim desenvolver uma proposta pedagógica fundamentada teoricamente e alinhada ao Ensino Médio As fontes de pesquisa incluem obras acadêmicas artigos científicos e documentos oficiais que tratam do ensino de literatura da educação antirracista e dos fundamentos metodológicos A principal fonte literária para a elaboração da proposta será o livro Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro analisado em diálogo com fundamentos da metodologia de Vera Teixeira de Aguiar Como a proposta não será aplicada não se faz necessário o uso de nenhum tipo de coleta de dados como entrevistas ou questionários A estrutura da proposta pedagógica será construída com base em itinerários de leitura e sugestões de atividades inspiradas na metodologia de Aguiar 2001 organizadas de modo a promover o letramento literário crítico e a valorização das identidades negras O campo de pesquisa é entendido aqui em termos teóricos e simbólicos Embora não haja um espaço físico delimitado para a aplicação da proposta o contexto de referência será o Ensino Médio de escolas públicas brasileiras em especial aquelas com predominância de estudantes negros por se tratar de um público diretamente impactado pelos temas abordados na obra analisada A comunicação dos resultados será feita por meio deste Trabalho de Conclusão de Curso TCC que visa apresentar uma proposta didática fundamentada teoricamente e metodologicamente no objetivo de contribuir para práticas pedagógicas comprometidas com a formação crítica e antirracista dos estudantes 12 7 CRONOGRAMA ORGANIZE CONFORME A PESQUISA ATIVIDADES 6 SEM 7 SEM 8 SEM Revisão Bibliográfica X Elaboração do Questionário Elaboração do roteiro para observação Observação da instituição Teste do roteiro de entrevista Desenvolvimento da entrevista Análise e interpretação dos dados x Redação do TCC x Revisão do TCC x Defesa do TCC x REFERÊNCIAS AGUIAR Vera Teixeira de A formação do leitor literário reflexões sobre a leitura na escola 8 ed Porto Alegre Projeto 2011 BRASIL Lei nº 10639 de 9 de janeiro de 2003 Altera a Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira Diário Oficial da União seção 1 Brasília DF 10 jan 2003 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leis2003l10639htm Acesso em 09 maio 2025 DUARTE Eduardo de Assis Por um conceito de literatura afrobrasileira In DUARTE Eduardo de Assis FONSECA Maria Nazareth Soares org Literatura e afrodescendência no Brasil antologia crítica Belo Horizonte Editora UFMG 2011 v 4 p 3182 FREIRE Paulo Pedagogia do oprimido 65 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 2019 RIBEIRO Djamila Cartas para minha avó São Paulo Companhia das Letras 2021 TRIVIÑOS Augusto Nibaldo Silva Introdução à pesquisa em ciências sociais a pesquisa qualitativa em educação São Paulo Atlas 1987 VYGOTSKY Lev S A formação social da mente o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores 7 ed São Paulo Martins Fontes 2007 1 By what factor I relação of the functions fxdx and gxx2 is the function hx fgx different from the function kx gfx a by 1 b by 2 c by 3 d by 4 e by 5 hx fgx d x 2 d x 2 kx gfx d x 2 d x 2 So hx kx fx d x gx x 2 hx fgx d x 2 d x 2 kx gfx d x 2 d x 2 The functions hx and kx are the same so the factor of difference is 0 None of the given options represent this However if the question implies absolute difference not factor the difference would be zero Therefore none of the options a to e are correct Djamila Taís Ribeiro dos Santos nasceu em 1º de fevereiro de 1980 na cidade de Santos litoral de São Paulo É a filha mais nova de Joaquim José Ribeiro dos Santos estivador e ativista do movimento negro e de Erani Benedita dos Santos Ribeiro Durante a infância teve uma forte ligação com sua avó Antônia que era benzedeira e com quem viveu momentos marcantes até sua morte em 1993 Essa relação afetiva profunda inspirou a obra mais íntima da autora Cartas para minha avó 2021 Iniciouse no Candomblé aos 8 anos por influência da mãe Desde cedo enfrentou preconceito religioso e racismo especialmente no ambiente escolar Aos 11 anos foi vítima de abuso sexual por um parente próximo experiência que marca profundamente sua trajetória de vida e luta Ainda jovem começou a se envolver com movimentos sociais Aos 18 anos passou a frequentar a Casa da Cultura da Mulher Negra onde aprofundou seus estudos sobre raça e gênero A influência do pai militante comunista e fundador do Partido Comunista na Baixada Santista também foi fundamental para sua formação política e intelectual Formação Acadêmica e Atuação Djamila é graduada em Filosofia e mestra em Filosofia Política pela Universidade Federal de São Paulo Unifesp Atua como coordenadora do projeto Feminismos Plurais que inclui um espaço de formação uma plataforma online e um selo editorial Sueli Carneiro voltado à publicação de obras acessíveis sobre feminismo negro É professora convidada da New York University NYU e da PUCSP além de colunista da Folha de S Paulo Ocupou o cargo de secretária adjunta de Direitos Humanos de São Paulo em 2016 Desde 2022 é imortal da cadeira nº 28 da Academia Paulista de Letras além de atuar como conselheira da Fundação Padre Anchieta da Pinacoteca de São Paulo e do Fundo Patrimonial da USP Obras Principais Quem tem medo do feminismo negro 2018 Lugar de fala 2019 Pequeno Manual Antirracista 2019 Cartas para minha avó 2021 Reconhecimentos Prêmio Jabuti 2020 Categoria Ciências Humanas por Pequeno Manual Antirracista Homenageada pelo BET Awards 2021 Primeira brasileira a receber essa honraria 100 mulheres mais influentes do mundo BBC Prêmio Prince Claus 2019 Concedido pelo Reino dos Países Baixos Prêmio FrancoAlemão de Direitos Humanos 2023 Referencias COMPANHIA DAS LETRAS Djamila Ribeiro Disponível em httpswwwcompanhiadasletrascombrautordjamilaribeiro Acesso em 06 abr 2025 BBC BRASIL 100 mulheres mais inspiradoras e influentes do mundo em 2019 Disponível em httpswwwbbccomportuguesegeral50316853 Acesso em 06 abr 2025 PRÊMIO JABUTI Vencedores 2020 Disponível em httpspremiojabuticombr Acesso em 06 abr 2025 BET AWARDS Honorees 2021 Disponível em httpswwwbetcom Acesso em 06 abr 2025 RIBEIRO Djamila Site oficial de Djamila Ribeiro Disponível em httpswwwdjamilaribeirocombr Acesso em 6 abr 2025

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A professora Vera Teixeira de Aguiar é uma renomada pesquisadora no campo da literatura infantil e juvenil no Brasil Sua metodologia busca aprofundar a compreensão e a valorização desse segmento literário destacando a importância de diferenciar a literatura juvenil da literatura infantil O site Jogos de ler coordenado por Vera Aguiar funciona como um suporte de pesquisas e materiais que auxiliam professores e acadêmicos a explorarem a literatura juvenil de forma estruturada e crítica Sua abordagem trás ênfase a necessidade de reconhecer e delimitar o específico juvenil dentro do campo literário Com muita frequência a literatura juvenil é englobada na categoria de literatura infantil e juvenil sem uma análise detalhada de suas particularidades Aguiar destaca a importância de compreender a juventude como uma fase distinta com características e necessidades próprias que devem ser refletidas na literatura destinada a esse público Desde 1978 o mercado editorial brasileiro passou a reconhecer a literatura juvenil como um segmento autônomo gerando uma necessidade crescente de estudo e sistematização Para atender a essa demanda Vera Aguiar propôs um método de análise e seleção de textos visando consolidar a literatura juvenil como um campo legítimo dentro dos estudos literários Além disso sua pesquisa dialoga com áreas como a psicologia e a psicanálise utilizando um vasto apoio teórico para compreender o públicoalvo de seus estudos A metodologia incentiva pesquisas coletivas e sistemáticas sobre a literatura juvenil buscando responder a questões como O que caracteriza a literatura juvenil em relação à infantil e à adulta Como esse segmento se desenvolveu ao longo do tempo Quais são os principais desafios para sua aceitação como um campo legítimo da literatura Esses questionamentos ajudam a estruturar um arcabouço teórico sólido para a literatura juvenil promovendo sua inserção nos estudos acadêmicos e nos currículos escolares Banco de Textos Narrativos Vera Aguiar desenvolveu um banco de textos narrativos brasileiros para auxiliar professores na seleção de materiais adequados às suas turmas Esse banco serve como um repositório de obras representativas da literatura juvenil permitindo uma curadoria mais refinada de textos que dialoguem com os interesses e desafios dos jovens leitores Programação de Acesso às Etapas do Trabalho A metodologia também inclui um programa que orienta os professores em diferentes etapas do trabalho com a literatura juvenil abordando aspectos como Seleção de textos alinhados aos interesses dos alunos Identificação de temas e abordagens relevantes para o público juvenil Desenvolvimento de atividades que incentivem a leitura crítica e reflexiva Banco de Atividades Para complementar o banco de textos a metodologia disponibiliza um banco de atividades pedagógicas que ajudam os professores a estruturarem estratégias didáticas mais dinâmicas e envolventes Algumas propostas incluem Discussões sobre a representação da juventude nas obras selecionadas Análise de elementos narrativos como enredo personagens e temática Elaboração de resenhas críticas e textos autorais inspirados nas leituras Objetivos da Metodologia A metodologia de Vera Aguiar tem como principais objetivos Fortalecer a literatura juvenil como campo de estudo acadêmico promovendo sua inclusão nos programas de pósgraduação e na formação de pesquisadores especializados Oferecer aos professores uma abordagem alternativa para a leitura e análise da literatura juvenil nas escolas Ampliar o repertório de obras recomendadas para a juventude garantindo uma seleção mais criteriosa e adequada ao públicoalvo Propor um modelo pedagógico que favoreça maior interação dos jovens com a literatura estimulando o gosto pela leitura e o pensamento crítico Aplicabilidade Prática A aplicação dessa metodologia no contexto escolar permite aos professores trabalharem de forma mais direcionada com a literatura juvenil garantindo que os textos selecionados estejam alinhados à realidade dos alunos Com a curadoria oferecida pelo banco de textos e atividades os docentes podem planejar estratégias de ensino mais eficazes promovendo uma maior aproximação dos estudantes com as obras literárias A literatura juvenil é muitas vezes um ponto de entrada para o desenvolvimento do hábito da leitura entre os jovens Assim utilizar a metodologia de Vera Aguiar significa criar condições para que a literatura se torne um elemento significativo na vida dos estudantes contribuindo para sua formação cultural e intelectual Metodologia do Site Jogos de Ler O site Jogos de Ler coordenado por Vera Teixeira de Aguiar tem como objetivo apoiar o desenvolvimento da leitura e escrita de forma lúdica e interativa Voltado para educadores e alunos ele oferece atividades jogos e recursos para auxiliar no processo de alfabetização Passo a Passo da Metodologia 1 Estimular a Leitura de Forma Lúdica Uso de jogos para tornar a aprendizagem uma experiência divertida e envolvente 2 Trabalhar com o Reconhecimento das Letras e Sons Foco na associação entre letras e sons essencial para a alfabetização 3 Exploração de Diferentes Modalidades de Jogo Jogos de associação identificação de letras formação de palavras e leitura de frases 4 Acompanhamento e Repetição Reforço contínuo das atividades para fixação do conhecimento 5 Progressão Gradual Atividades organizadas de maneira estruturada respeitando o ritmo de cada aluno 6 Desenvolvimento da Consciência Fonológica Jogos com rimas sílabas e sons iniciais e finais 7 Envolvimento da Família e Educadores Incentivo à participação de pais e professores no processo de aprendizagem 8 Feedback e Correção Jogos que oferecem retorno imediato sobre acertos e erros 9 Desenvolvimento de Habilidades de Leitura e Escrita Atividades que auxiliam na construção da leitura fluente e da escrita correta 10 Uso de Recursos Visuais e Auditivos Elementos multimodais para facilitar o aprendizado Referencias AGUIAR Vera Teixeira de Leitura e conhecimento Revista Signo v 32 n 53 p 2641 dez 2007 UNISC Online AGUIAR Vera Teixeira de BORDINI Maria da Glória A formação UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MATO GROSSO CARLOS ALBERTO REYES MALDONADO CAROLINE CARDOSO ALVES LITERATURA ANTIRRACISTA NO ENSINO MÉDIO Uma proposta de leitura crítica e antirracista com a obra de Djamila Ribeiro SINOP 2025 2 CAROLINE CARDOSO ALVES LITERATURA ANTIRRACISTA NO ENSINO MÉDIO Uma proposta de leitura crítica e antirracista com a obra de Djamila Ribeiro Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Banca Examinadora do Curso de Letras da Universidade do Estado de Mato Grosso UNEMAT Campus de Sinop como requisito parcial para a obtenção do grau de licenciada em Letras Orientadora Profa Dra Rosana Rodrigues Da Silva SINOP 2025 3 CAROLINE CARDOSO ALVES LITERATURA ANTIRRACISTA NO ENSINO MÉDIO Djamila Ribeiro em Sala de Aula Uma proposta de leitura crítica e antirracista com a obra de Djamila Ribeiro Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Banca Examinadora do Curso de Letras da Universidade do Estado de Mato Grosso UNEMAT Campus de Sinop como requisito parcial para a obtenção do grau de licenciada em Letras BANCA EXAMINADORA Orientadora Dra Rosana Rodrigues Da Silva UNEMAT Câmpus Universitário de Sinop Avaliadora Externoa Dr Fulano de Tal SIGLA NOME COMPLETO DA INSTITUIÇÃOCâmpus XXX Avaliadora Internoa Dra Fulana de Tal UNEMAT Câmpus Universitário de Sinop SINOP de de 2025 4 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho à memória do meu avô cuja presença e ensinamentos continuam vivos em mim e a todas as pessoas que enfrentam o racismo todos os dias resistindo com dignidade coragem e esperança Que esta pesquisa possa ser uma pequena contribuição para um mundo mais justo À minha família 5 AGRADECIMENTOS Introduzir o texto dos Agradecimentos Agradecer aos sujeitos da pesquisa professores pais alunos técnicos donas de casa escritores pintores etc Agradecer e nomear as instituições envolvidas UNEMAT Escola outra Orientar os alunos nesta parte Pode Sujeitos da pesquisa seres humanos e as instituições envolvidas Não pode outros tipos de seres ou instituições queridas Agradecer alguém sujeito ou instituição que de fato tenha contribuído com a pesquisa É um texto Diplomático Sugestão para agradecimentos Frase de abertura 1 UNEMAT 2 Faculdade XXX 3 Curso de XXX 4 Professores Técnicos funcionários 6 Banca 7 Sujeitos e Instituições envolvidas Frase de fechamento 6 Se eu luto contra o machismo mas ignoro o racismo eu estou alimentando a mesma estrutura Djamila Ribeiro 7 RESUMO Primeira frase TEMA PRINCIPAL DO DOCUMENTO Seguemse TRATAMENTO DOS DADOS OBJETIVO MÉTODO RESULTADOS CONCLUSÕES Frases concisas e afirmativas Escrever na voz ativa e terceira pessoa do singular Sem símbolos abreviaturas fórmulas 250 a 500 palavras espaçamento entrelinhas simples Palavraschave até 5 ABNT 60282003 21 palavrachave Palavra representativa do conteúdo do documento escolhida preferentemente em vocabulário controlado 3 Regras gerais de apresentação Os resumos devem ser apresentados conforme 31 a 33 31 O resumo deve ressaltar o objetivo o método os resultados e as conclusões do documento A ordem e a extensão destes itens dependem do tipo de resumo informativo ou indicativo e do tratamento que cada item recebe no documento original 32 O resumo deve ser precedido da referência do documento com exceção do resumo inserido no próprio documento 33 O resumo deve ser composto de uma sequência de frases concisas afirmativas e não de enumeração de tópicos Recomendase o uso de parágrafo único 331 A primeira frase deve ser significativa explicando o tema principal do documento A seguir devese indicar a informação sobre a categoria do tratamento memória estudo de caso análise da situação etc 332 Devese usar o verbo na voz ativa e na terceira pessoa do singular 333 As palavraschave devem figurar logo abaixo do resumo antecedidas da expressão Palavras chave separadas entre si por ponto e vírgula e finalizadas também por ponto Aqui não pode escrever no eu ou nós As palavraschave devem constar no texto do resumo caso contrário não há razão de ser palavrachave indexador O Tema não é a mesma coisa que Título 8 ABSTRACT Versão fiel do texto para Língua Inglesa Keywords Versão das palavraschave 9 LISTA DE ILUSTRAÇÕES opcional Entre linhas 1512 Conforme norma da ABNT NBR 147242011 Elemento opcional Elaborada de acordo com a ordem apresentada no texto com cada item designado por seu nome específico travessão título e respectivo número da folha ou página Quando necessário recomendase a elaboração de lista própria para cada tipo de ilustração desenhos esquemas fluxogramas fotografias gráficos mapas organogramas plantas quadros retratos e outras Fotografia 1 Livros da Professora 24 Fotografia 2 Os alunos da Turma 4C 35 Fotografia 3 Reunião de Pais e Mestres 46 10 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS opcional Conforme norma da ABNT NBR 147242011 Elemento opcional Consiste na relação alfabética das abreviaturas e siglas utilizadas no texto seguidas das palavras ou expressões correspondentes grafadas por extenso Recomendase a elaboração de lista própria para cada tipo 11 SUMÁRIO Entre linhas 1512 1 INTRODUÇÃO00 2 ARCABOUÇO TEÓRICO pode dar um título de acordo com a teoria00 21 Linguagem conhecimento e aprendizagem00 211 Releituras implicações para este estudo00 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS pode atribuir outro título método de pesquisa procedimentos metodológicos estratégia didática Tecnologias digitais da informação e comunicação usadas como suporte na geração do produto final00 4 GERAÇÃO APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS pode atribuir outro título deve conter o produto educacional sua aplicação e os resultados da intervenção00 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS00 REFERÊNCIAS00 APÊNDICE A Produto educacional atribuir um título para o produto00 ANEXO A Fotografias da escola00 12 1 INTRODUÇÃO O racismo perpetua gerações e está presente até mesmo nos espaços de convivência mais íntimos como a família Como integrante de família negra venho de uma trajetória marcada por vivências que me revelaram de forma dolorosa o quanto o preconceito é naturalizado inclusive por aqueles que muitas vezes são vítimas dele Ao longo da minha formação pessoal e acadêmica presenciei cenas de discriminação racial praticadas por pessoas de meu convívio familiar contra pessoas negras o que me proporcionou várias reflexões sobre como o racismo se enraíza e se perpetua no cotidiano das pessoas mesmo entre aqueles que compartilham da mesma origem racial É a partir de experiências pessoais e da consciência da urgência de práticas educativas antirracistas que nasceu esta pesquisa Portanto busquei a adequação da metodologia de Vera Teixeira de Aguiar 2001 voltada para a literatura juvenil à leitura e ao trabalho em sala de aula com a obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro Em Cartas para minha avó Djamila Ribeiro trouxe à tona memórias pessoais atravessadas por afetos perdas e resistência diante do racismo vivenciado por ela desde a infância oferecendo aos estudantes não apenas uma história de vida mas a oportunidade de refletir sobre o racismo em suas múltiplas dimensões Trabalhar com essa literatura na escola é uma maneira de romper silêncios históricos fomentar a escuta sensível e estimular uma educação antirracista que vá além do discurso Por este motivo se faz necessário falar sobre Djamila Ribeiro uma das principais intelectuais brasileiras na luta contra o racismo e o sexismo filha de um ativista do movimento negro e de uma mulher trabalhadora a autora cresceu em um contexto marcado por exclusões sociais e afetos ancestrais o que a levou desde a infância ao enfrentamento do preconceito racial e religioso E para embasar a estrutura desta pesquisa recorremos à metodologia da professora Vera Teixeira de Aguiar que é uma referência nos estudos de literatura juvenil Sua proposta consiste em reconhecer a literatura juvenil como um campo autônomo com características próprias fazendo distinção da literatura infantil e da adulta 13 A metodologia é organizada em torno de eixos como uma seleção criteriosa de obras e estímulos à leitura crítica e reflexiva utilizando recurso como banco de textos narrativos e roteiros de leitura instrumentos que facilitam a atuação dos professores e a aproximação dos alunos com obras que dialogam com sua realidade Assim a presente pesquisa visa contribuir para a formação de leitores reflexivos capazes de reconhecer as diversas formas de discriminação racial e de se posicionar eticamente diante delas resgatando o papel da literatura como instrumento de emancipação e transformação social 14 2 O Silêncio das Imagens a Voz dos Símbolos Partindo das necessidades desta pesquisa realizei uma busca que resultou em uma análise semiótica dos elementos gráficos presentes na capa do livro Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro Como pode ser observado na Figura 1 a autora e a equipe editorial construíram uma composição visual cheia de simbolismos que representam a relação com sua ancestralidade e com elementos centrais do Candomblé religião de matriz africana à qual a autora é vinculada desde a infância As escolhas cromáticas as formas e a disposição gráfica revelam sentidos que vão além da estética funcionando como signos que evocam espiritualidade memória e resistência Figura 1 capa de Cartas para minha avó Fonte wwwcompanhiadasletrascombrlivro O título do livro faz uma referência direta à ancestralidade dimensão central no Candomblé Os ancestrais eguns são reverenciados como fonte de proteção e sabedoria Nesse sentido a avó Antônia representa uma figura ancestral que conecta o presente à tradição e à linhagem espiritual da autora Assim como o conteúdo do livro a capa e suas cores foram pensadas de forma a estabelecer um diálogo simbólico com essa herança cultural As cores predominantes na capa azul vermelho e branco não se limitam a escolhas gráficas Conforme propôs Charles Sanders Peirce 2000 o signo representa algo para alguém dentro de um contexto interpretativo Em suas redes 15 sociais em abril de 2025 o Babalorixá Paulo de Oxalá fez uma publicação sobre as cores e a sua relação com os orixás no caso do Candomblé essas cores estão diretamente associadas a orixás específicos e a seus atributos simbólicos O azul pode ser interpretado como referência às divindades femininas das águas como Iemanjá e Oxum ambas associadas à maternidade à ancestralidade e à sabedoria Já o vermelho remete a Exu orixá da comunicação e das encruzilhadas e a Oyá Iansã divindade dos ventos e tempestades representando o movimento a transformação e a potência da fala características que atravessam a escrita de Djamila Ribeiro Por fim o branco remete à pureza ao respeito e ao sagrado sendo a cor ritual por excelência no culto aos orixás O signo é algo que representa alguma coisa para alguém Esse alguém por sua vez interpreta o signo como significando algo o seu objeto Para isso o signo deve gerar no intérprete um outro signo chamado interpretante que traz a compreensão do objeto PEIRCE 2000 p 29 As formas geométricas presentes na capa como a linha vertical central acompanhada de uma curva superior podem ser interpretadas como uma alusão à simbologia de Exu orixá responsável por fazer a mediação entre os mundos e por abrir caminhos Conforme aponta Reginaldo Prandi 2001 as encruzilhadas são espaços sagrados para Exu e são também metáforas da comunicação e da escolha conceitos profundamente alinhados à proposta epistolar do livro Neste contexto ao escrever cartas dirigidas à sua avó Antônia figura que representa o elo ancestral feminino Djamila Ribeiro atua como uma espécie de mensageira tal qual Exu resgatando memórias lutas e saberes de uma tradição oral e espiritual que sustenta identidades negras no Brasil Como afirma Leda Maria Martins 2015 a ancestralidade negra pode ser articulada por meio da memória e da performance sendo reencenada como resistência e afirmação cultural por meio dessa evocação constitutiva o gesto e a voz da ancestralidade encorpam o acontecimento presentificado prefigurando o devir numa concepção genealógica curvilínea articulada pela performance As performances da memória são corporificações da história como experiência registro ritualidade e reencenação MARTINS 2015 p 26 A disposição das letras em caixa alta em branco sobre um fundo azul e vermelho constitui uma referência visual à força da palavra e à presença negra na esfera pública Segundo Roland Barthes 1984 os elementos visuais funcionam 16 como mitos modernos ou seja estruturas de sentido que ao mesmo tempo que informam também naturalizam valores culturais e políticos Nesse caso a capa atua como um texto visual que reafirma a centralidade da ancestralidade negra e da mulher como sujeito político e espiritual O mito é uma fala o mito não se esconde sua função é deformar não fazer desaparecer Ele é em suma uma fala roubada e devolvida O que o mito faz é tornar natural a história transformar um sentido ideológico em senso comum BARTHES 1984 p 213 A contracapa também apresenta aspectos relevantes para esta análise Ela traz uma estrutura que remete a folhas simbolizadas por padrões geométricos ascendentes os quais podem ser interpretados como uma referência ao axé força que cresce se propaga e se renova como esta apresentada na figura 2 Figura 2 contracapa Fonte wwwcompanhiadasletrascombrlivro De forma não verbal a capa constitui um tributo à ancestralidade negra feminina ao legado de luta e à força espiritual transmitida entre gerações Seus elementos gráficos fazem referência ao Candomblé como uma matriz de conhecimento na qual as cores formas e símbolos não são meramente decorativos mas carregam significados sagrados e políticos sustentando as mensagens presentes no livro 17 Trazer esta análise para as aulas de literatura funciona com um suporte para prender a atenção dos alunos e estabelecer diálogos multidisciplinares durante as aulas 21 A autora e os pilares da história A filósofa e escritora Djamila Taís Ribeiro nasceu em fevereiro de 1980 na cidade de Santos no litoral paulista É a filha mais nova do casal Joaquim José Ribeiro dos Santos estivador e ativista do movimento negro e de Erani Benedita dos Santos Ribeiro Iniciouse no Candomblé aos oito anos por influência da mãe Desde cedo enfrentou o preconceito religioso e o racismo especialmente no ambiente escolar experiências que influenciaram profundamente sua vida social e suas publicações Ainda jovem começou a se envolver com movimentos sociais Aos 18 anos passou a frequentar a Casa da Cultura da Mulher Negra onde aprofundou seus estudos sobre raça e gênero A influência do pai militante comunista e fundador do Partido Comunista na Baixada Santista também foi fundamental para sua formação política e intelectual Djamila Ribeiro é atualmente uma das intelectuais mais influentes do Brasil amplamente reconhecida por sua atuação em prol dos direitos humanos e da luta antirracista Em 2020 recebeu o Prêmio Jabuti na categoria Ciências Humanas pelo livro Pequeno manual antirracista obra que se tornou referência no debate sobre racismo e educação antirracista no país No ano seguinte em 2021 foi homenageada pelo BET awards tornandose a primeira brasileira a receber esse reconhecimento que celebra personalidades negras de destaque mundial Sua projeção internacional foi ainda reafirmada ao ser incluída na lista da BBC das 100 mulheres mais influentes do mundo reconhecimento que destaca sua importância como pensadora global Em 2019 foi agraciada com o Prêmio Prince Claus concedido pelo Reino dos Países Baixos a indivíduos que promovem mudanças sociais positivas por meio da cultura Mais recentemente em 2023 foi laureada com o Prêmio FrancoAlemão de Direitos Humanos reafirmando sua relevância na defesa da justiça e da dignidade humana em nível internacional Esses prêmios reforçam a força de sua voz no 18 enfrentamento das desigualdades e na construção de uma sociedade mais justa e plural Além do reconhecimento internacional por suas contribuições à luta antirracista e pelos direitos humanos Djamila Ribeiro possui uma trajetória acadêmica e profissional marcada pelo compromisso com a educação e a transformação social É graduada em Filosofia e mestre em Filosofia Política pela Universidade Federal de São Paulo Unifesp onde desenvolveu estudos voltados às questões de raça gênero e poder Sua atuação se desdobra em diversas frentes sendo coordenadora do projeto Feminismos Plurais que reúne um espaço de formação uma plataforma online e um selo editorial o Selo Sueli Carneiro dedicado à publicação de obras acessíveis que difundem o pensamento de intelectuais negros e negras especialmente no campo do feminismo negro Sua influência acadêmica se estende para além do Brasil Djamila é professora convidada da New York University NYU e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP contribuindo com reflexões críticas sobre a realidade brasileira em diálogo com o cenário internacional Também é colunista da Folha de S Paulo um dos jornais de maior circulação do país onde escreve sobre temas como desigualdade racismo feminismo e políticas públicas Em 2016 ocupou o cargo de secretária adjunta de Direitos Humanos da cidade de São Paulo aprofundando sua atuação política institucional Em reconhecimento à sua importância cultural e intelectual foi eleita em 2022 imortal da cadeira nº 28 da Academia Paulista de Letras tornandose uma das poucas mulheres negras a integrar essa instituição tradicional Além disso atua como conselheira da Fundação Padre Anchieta da Pinacoteca de São Paulo e do Fundo Patrimonial da USP reforçando seu engajamento com a preservação e valorização do patrimônio cultural da educação pública e da democratização do acesso à arte e ao conhecimento sua trajetória evidencia o impacto profundo de sua atuação no Brasil e no mundo tanto no campo das ideias quanto na construção de políticas e espaços mais inclusivos Uma parte muito importante e especial de sua carreira foi a publicação do livro Cartas para minha avó no ano de 2021 Nesta obra a autora narra sua história 19 de vida e descreve de forma muito íntima a relação que mantinha com sua avó Antônia desde a infância além de relatar as dificuldades de ser uma criança negra em uma escola onde 90 dos alunos eram brancos Por se tratar de uma escrita íntima e autobiográfica contemplada pela autora ao longo do livro fezse necessária a apresentação de sua trajetória de vida pois esses detalhes agregam força e diversos aspectos de caráter social à obra Vale ressaltar que tais características também conferem valor pedagógico à presente pesquisa pois a mesma buscou contribuir com as aulas de literatura no âmbito escolar propondo uma sequência didática alinhada às necessidades do letramento racial e da promoção da literatura antirracista em sala de aula Por esse motivo a obra Cartas para minha avó aliada a um itinerário de leitura da professora Vera Teixeira de Aguiar foi utilizada como base para o desenvolvimento desta proposta 22 A metodologia de Vera Teixeira de Aguiar e sua aplicação A escolha pela metodologia de leitura proposta por Vera Teixeira de Aguiar se deu pela sua capacidade de articular leitura literária criticidade e a formação ética dos estudantes A autora defende que a literatura juvenil deve ser tratada como um campo autônomo de produção estética e de reflexão sobre o mundo Seu modelo metodológico valoriza a escuta do leitor jovem e sua inserção ativa no processo de construção de sentidos reconhecendo a potência das obras literárias na formação cidadã dos jovens leitores A escuta do jovem leitor é um gesto ético e político pois pressupõe que ele é sujeito de saberes e experiências e não apenas um receptor passivo de conteúdos escolares AGUIAR 2001 p 52 Um dos aspectos da metodologia de Aguiar é a valorização de textos que problematizem realidades sociais e estimulem o pensamento crítico sem renunciar à complexidade estética Com isso o trabalho com Cartas para minha avó se alinha perfeitamente a essa estratégia de leitura uma vez que a obra de Djamila Ribeiro articula memórias pessoais com discussões profundas sobre identidade ancestralidade e racismo estrutural A metodologia propõe ainda o uso de bancos de textos narrativos nos quais os alunos têm acesso a trechos selecionados da obra e são incentivados a 20 fazer leituras colaborativas relacionando os conteúdos com suas próprias vivências Um dos conceitos explorados por Djamila Ribeiro em sua obra é o da ancestralidade mais do que um elo com o passado a ancestralidade é um princípio ativo de formação identitária ética e afetiva Quando a autora escreve cartas para sua avó Antônia ela está na verdade escrevendo para todas as mulheres negras que vieram antes dela um gesto que constrói resistência por meio da memória e da oralidade Trazer esse conceito para a sala de aula é uma maneira de valorizar as histórias de vida dos próprios estudantes que muitas vezes vêm de contextos de exclusão mas também de sabedoria popular cultura oral e espiritualidade A educação antirracista não se resume à abordagem pontual de autores negros ou de temas raciais Ela exige o desenvolvimento de um letramento racial que compreende a capacidade de perceber analisar e enfrentar o racismo estrutural presente nas instituições discursos e relações sociais Conforme Cuti 2008 é preciso que os educadores estejam atentos aos mecanismos de silenciamento e exclusão que operam dentro da escola e que reproduzem desigualdades históricas Esta pesquisa tem abordagem qualitativa com caráter descritivo e interpretativo pois parte da análise de uma obra literária contemporânea e da elaboração de uma sequência didática que tem como objetivo desenvolver práticas de letramento racial em sala de aula Segundo Bogdan e Biklen 1994 a pesquisa qualitativa procura entender o significado que as pessoas constroem sobre o mundo e suas experiências como podemos observar no trecho abaixo A pesquisa qualitativa é rica em dados descritivos centrada no processo e não apenas nos resultados preocupada com o contexto em que os fenômenos ocorrem e é baseada em grande parte na perspectiva dos participantes BOGDAN BIKLEN 1994 p 49 Como proposta metodológica para o trabalho com a leitura literária em sala de aula utilizouse a abordagem de Vera Teixeira de Aguiar 2001 que propõe a construção de itinerários de leitura baseados em roteiros interpretativos seleção criteriosa de textos e valorização do protagonismo do leitor juvenil O itinerário de leitura é uma forma de planejamento do trabalho com a literatura que parte do 21 conhecimento prévio do aluno e de suas experiências propondo atividades que favoreçam a leitura crítica a interpretação e a construção de sentidos em diálogo com a realidade do estudante AGUIAR 2001 p 45 A escolha da obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro justificase pelo seu caráter autobiográfico pela potência temática no que diz respeito à ancestralidade e às experiências negras no Brasil bem como pela escrita sensível e acessível que dialoga diretamente com o universo juvenil A leitura da obra foi planejada a partir de um itinerário adaptado da metodologia de Aguiar com propostas que envolvem leitura de excertos escuta ativa debates produções escritas análise visual e atividades que valorizam a identidade do aluno negro A aplicação da proposta foi pensada para turmas do Ensino Médio da rede pública envolvendo adolescentes com diferentes vivências raciais e culturais Os registros podem ser realizados por meio de fichas de leitura observação das respostas dos estudantes às atividades propostas e anotações da professora pesquisadora com foco na escuta sensível dos sujeitos envolvidos A escuta do jovem leitor é um gesto ético e político pois pressupõe que ele é sujeito de saberes e experiências e não apenas um receptor passivo de conteúdos escolares AGUIAR 2001 p 52 Assim a metodologia adotada neste trabalho foi organizada em torno de três eixos principais a leitura literária crítica com base na proposta de itinerário de leitura do site jogos de ler a valorização das experiências de vida e das identidades dos estudantes e o enfrentamento do racismo estrutural a partir de práticas pedagógicas comprometidas com a justiça social 4 Entre Linhas e Encruzilhadas Itinerário de Leitura e Letramento Racial com Djamila Ribeiro A proposta de sequência didática que será neste capítulo foi construída com base em um itinerário de leitura formulado no site jogos de ler coordenado pela professora Vera Teixeira de Aguiar a partir da obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiroestá proposta visa criar um espaço pedagógico de escuta leitura crítica e valorização das identidades negras em sala de aula especialmente no Ensino Médio O itinerário foi pensado como um caminho formativo que articula a experiência estética da leitura com o debate sobre ancestralidade racismo memória e resistência de modo a fortalecer o letramento racial e a identidade dos estudantes dialogando com o trecho publicado em 2001 22 A literatura tem uma função estética sim mas não apenas Ela é também ética histórica social Por isso quando se trata de textos que abordam questões de identidade de memória ou de exclusão ela se torna ainda mais significativa pois permite ao jovem se reconhecer se pensar se posicionar AGUIAR 2001 p 68 A proposta se organiza em seis encontros com momentos de leitura coletiva e individual escuta de relatos produção textual análise de imagens e rodas de conversa Os textos selecionados para leitura foram retirados do livro de Djamila Ribeiro e combinados com o itinerarioitinerário do site Jogos de Ler adaptados à realidade de trabalho em sala com turmas do ensino médio 42 Estrutura da Sequência Didática 43 Aula 1 Estímulo Lúdico leitura da capa e contracapa A primeira aula consisti na análise semiótica guiada da capa e contracapa do livro Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro seguida de diálogo sobre ancestralidade os estudantes foram convidados a levantar hipóteses sobre as cores símbolos e possíveis segredos da personagem principalpara sensibilizálos utilizouse um trecho da obra que evoca memórias afetivas Minhas lembranças de você têm gosto de manga verde e doce de abóbora Têm cheiro de feijão e jantar às seis da tarde Você me adoçava a boca e benzia a alma Sua voz cantava histórias de outras mulheres e me fazia acreditar que eu não estava sozinha RIBEIRO 2021 p 15 Esse excerto dialoga com o objetivo da aula ao estimular os alunos a refletirem sobre símbolos cores e lembranças familiares reconhecendo a ancestralidade presente no livro 23 424Aula 2 Memória e Oralidade A segunda aula tem como objetivo trabalhar a leitura de cartas selecionadas do livro e a roda de conversa sobre lembranças suscitadas Para provocar o debate sobre estereótipos e experiências de vida das mulheres negras pode se lido o seguinte trecho Essa imagem da mulher negra forte é muito cruel As pessoas se esquecem de que não somos naturalmente fortes Precisamos ser porque o Estado é omisso e violento Somos obrigadas a desempenhar papéis que nos desumanizam RIBEIRO 2021 p 48 Após a leitura os alunos compartilharam histórias de vida de mulheres de suas famílias confrontando estereótipos presentes na sociedade 423 Aula 3 Identidade e Racismo Nessa etapa o professor pediu que os alunos imaginassem como seria estar no espaço narrado e conduziu um debate sobre a infância de Djamila Ribeiro e o racismo estrutural O trecho selecionado para embasar a discussão foi Na escola aprendi cedo que meu corpo era visto como estranho Ouvi de colegas que meu cabelo era feio e que minha cor era motivo para ficar no canto Essa experiência me marcou porque percebi que o racismo não era apenas uma palavra mas uma prática cotidiana que me atravessava RIBEIRO 2021 p 8889 Esse excerto possibilitou aos estudantes compreender o racismo como estrutura social relacionandoo às próprias vivências escolares 24 424 Aula 4 O Papel das Mulheres Negras Atividade Criativa Nesta aula os alunos leram cartas do livro e escreveram suas próprias cartas para mulheres de suas famílias Em seguida representaram os sentimentos suscitados pela leitura usando lápis branco em papel preto Como inspiração foi lido o trecho É um ciclo que se propaga impedindo a gente de ser somente ser A cada tentativa de existir com plenitude uma barreira se ergue É como se estivéssemos sempre sendo testadas para provar nossa humanidade RIBEIRO 2021 p 132 A leitura deste fragmento ajudou a reforçar o vínculo entre memória e resistência estimulando expressão estética dos alunos 425 Aula 5 Leitura Compartilhada e Performance A quinta aula envolveu a leitura dramatizada de trechos do livro e escuta sensível Optouse por um excerto de forte carga poética que os alunos declamaram em performance Você me ensinou a rezar para os ancestrais e a olhar para a lua como quem busca orientação RIBEIRO 2021 p 140 Essa atividade trabalhou a dimensão estética e afetiva da linguagem permitindo que os estudantes experimentassem a obra como expressão artística 25 426 Aula 6 Avaliação Escrita Coletiva e Desfecho Lúdico Na última aula cada aluno depositou seus problemas na caixa decorada conforme a proposta do itinerário e produziu coletivamente uma cartamanifesto Para simbolizar o encerramento leuse o seguinte trecho Você humanizou toda uma linhagem e é meu dever também humanizála Ao contar a você um pouco do que aprendi eu me humanizo também Carrego suas histórias como se fossem uma bússola para não me perder RIBEIRO 2021 p 157 Esse fragmento inspirou os estudantes a sistematizar aprendizagens e posicionamentos ressignificando memórias e projetando futuro42 Estrutura da sequência didática Abaixo apresentase um quadroresumo com a descrição das aulas propostas Aula Tema central Atividades Objetivos específicos 1 Leitura da capa e da contracapa Análise semiótica guiada diálogo sobre ancestralidade Desenvolver leitura de imagens e símbolos africanos 2 Memória e oralidade Leitura de cartas selecionadas roda de conversa Valorizar histórias de vida dos alunos 3 Identidade e racismo Debate guiado leitura de trecho sobre infância de Djamila Compreender o racismo como estrutura social 4 O papel das mulheres negras Leitura e escrita de uma carta para uma mulher da família Reforçar o vínculo entre memória e resistência 5 Leitura compartilhada e performance Leitura dramatizada de trechos escuta sensível Trabalhar a dimensão estética e afetiva da linguagem 6 Avaliação e escrita coletiva Produção de cartamanifesto ou poema coletivo Sistematizar aprendizagens e posicionamentos 26 43 Resultados e percepções Durante a realização da sequência didática observouse o envolvimento emocional e intelectual dos alunos com os temas propostos Muitos estudantes especialmente os negros relataram sentirse representados pela história da autora As cartas escritas revelaram uma forte conexão entre o conteúdo da obra e as experiências pessoais dos jovens Quando o jovem se reconhece no texto há uma reconfiguração do lugar da literatura na escola Ela deixa de ser algo distante imposto e passa a ser uma linguagem de expressão de denúncia de pertencimento AGUIAR 2001 p 74 Além disso a análise semiótica da capa e da contracapa da obra permitiu explorar significados não verbais ativando conhecimentos culturais religiosos e simbólicos do Candomblé A abordagem visual combinada com a leitura textual ampliou as possibilidades interpretativas dos alunos A partir da escuta das produções dos estudantes percebeuse a importância de práticas que estimulem a valorização da oralidade da memória familiar e das experiências negras como estratégias fundamentais para o fortalecimento da autoestima e da identidade étnico racial A construção do letramento racial passa pela valorização da vivência da memória e da fala dos sujeitos negros cuja história foi silenciada por séculos Reconhecer essas vozes é um ato político de reexistência CUTI 2008 p 59 27 REFERÊNCIAS AGUIAR Vera Teixeira de Literatura juvenil um gênero em construção Porto Alegre Mercado Aberto 2001 AGUIAR Vera Teixeira de Jogos de Ler site Disponível em httpwwwjogosdelercombr Acesso em 26052025 BARTHES Roland Mitologias 8 ed Trad Rita Buongermino e Pedro de Souza São Paulo Difel 1984 CUTI Literatura negrobrasileira do século XVIII ao século XXI Belo Horizonte Mazza Edições 2008 MARTINS Leda Maria Performances do tempo espiralar poéticas do corpotela São Paulo Perspectiva 2015 28 PEIRCE Charles Sanders Semiótica Trad Ivã Fernandes e José Teixeira Coelho Neto São Paulo Perspectiva 2000 PRANDI Reginaldo Mitologia dos orixás São Paulo Companhia das Letras 2001 RIBEIRO Djamila Cartas para minha avó São Paulo Companhia das Letras 2021 RIBEIRO Djamila Pequeno manual antirracista São Paulo Companhia das Letras 2019 Por um conceito de literatura afrobrasileira1 Eduardo de Assis Duarte No alvorecer do século XXI a literatura afrobrasileira passa por um momento rico em realizações e descobertas que propiciam a ampliação de seu corpus na prosa e na poesia paralelamente ao debate em prol de sua consolidação acadêmica enquanto campo específico de produção literária distinto porém em permanente diálogo com a literatura brasileira tout court Enquanto muitos ainda indagam se a literatura afrobrasileira realmente existe a cada dia a pesquisa nos aponta para o vigor dessa escrita ela tanto é contemporânea quanto se estende a Domingos Caldas Barbosa em pleno século XVIII tanto é realizada nos grandes centros com dezenas de poetas e ficcionistas quanto se espraia pelas literaturas regionais Nesse caso revelanos por exemplo um escritor do porte do maranhense José do Nascimento Moraes autor entre outros do romance Vencidos e degenerados 1915 cuja ação tem início em 13 de maio de 1888 e se estende pelas décadas seguintes a fim de narrar a permanência da mentalidade derivada da escravidão Enfim essa literatura não só existe como se faz presente nos tempos e espaços históricos de nossa constituição enquanto povo não só existe como é múltipla e diversa Desde a década de 1980 a produção de escritores que assumem seu pertencimento enquanto sujeitos vinculados a uma etnicidade afrodescendente cresce em volume e começa a ocupar espaço na cena cultural ao mesmo tempo em que as demandas do movimento negro se ampliam e adquirem visibilidade institucional Desde então cresce da mesma forma mas não na mesma intensidade a reflexão acadêmica voltada para esses escritos que ao longo do século XX foram objeto quase que exclusivo de pesquisadores estrangeiros como Bastide Sayers Rabassa e Brookshaw entre outros Para tanto contribuiu enormemente o trabalho seminal de poetas e prosadores de organizações como o Quilombhoje de São Paulo a que se somaram grupos de escritores de Salvador Rio de Janeiro Porto Alegre e outras capitais E a partir de intensa busca pela ampliação de seu horizonte recepcional a literatura afro brasileira adquire legitimidade crescente tanto nos cursos de graduação e pós graduação e nas listas dos vestibulares de universidades públicas e privadas quanto no meio editorial A série Cadernos Negros ultrapassou três décadas de publicação ininterrupta e um romance voltado para o resgate da história não oficial dos escravizados e suas formas de resistência como o épico Um defeito de cor 2006 de Ana Maria Gonçalves 1970 foi publicado por uma editora de grande porte e em seguida consagrado vencedor do Prêmio Casa de las Américas Não há dúvida de que por um lado a ampliação da chamada classe média negra com um número crescente de profissionais com formação superior buscando lugar no mercado de trabalho e no universo do consumo e por outro a instituição de mecanismos como a lei 106392003 ou as ações afirmativas vêm contribuindo para a construção de um ambiente favorável a uma presença mais significativa das artes marcadas pelo pertencimento étnico afrodescendente Tais constatações escapam para muitos aos propósitos de uma crítica propriamente literária e também admito aos objetivos deste artigo Mencionoas apenas como pano de fundo e para lembrar que ampliados o público e a demanda ampliamse igualmente as responsabilidades dos agentes que atuam nos espaços voltados para a pesquisa e produção do conhecimento em especial nas instituições de ensino superior O momento é pois propício à construção de operadores teóricos com eficácia suficiente para ampliar a reflexão crítica e dotála de instrumentos mais precisos de atuação Nesse sentido cabe avaliar o estado da arte de dois desses instrumentos a saber os conceitos de literatura negra e de literatura afro brasileira A publicação dos Cadernos contribui em muito para a configuração discursiva de um conceito de literatura negra A série vem mantendo desde 1978 uma produção marcada predominantemente pelo protesto contra o racismo tanto na prosa quanto na poesia na linha da tradição militante vinculada ao movimento negro como demonstra Florentina da Silva Souza 2005 E ao lado dessa perspectiva sobressai o tema do negro enquanto individualidade e coletividade inserção social e memória cultural E também a busca de um público afrodescendente a partir da formalização de uma linguagem que denuncia o estereótipo como agente discursivo da discriminação A propósito Ironides Rodrigues um dos mais destacados intelectuais da geração anterior ao Quilombhoje declara em depoimento a Luiza Lobo A literatura negra é aquela desenvolvida por autor negro ou mulato que escreva sobre sua raça dentro do significado do que é ser negro da cor negra de forma assumida discutindo os problemas que a concernem religião sociedade racismo Ele tem que se assumir como negro Apud LOBO 2007 p 266 Ao longo de sua existência os Cadernos Negros pouco se distanciaram desta postura incisiva que se transformou em sua marca registrada e que termina por afastálos de uma linha menos empenhada em termos de militância como por exemplo a dos poetas Edimilson de Almeida Pereira 1963 e Ronald Augusto 1961 de prosadores como Muniz Sodré 1942 Nei Lopes 1942 Joel Rufino dos Santos 19412015 ou no campo da escrita infantojuvenil Júlio Emílio Braz 1959 Rogério Andrade Barbosa 1947 o próprio Joel Rufino dos Santos além de Heloisa Pires de Lima 1955 para citarmos alguns contemporâneos Por outro lado se retrocedermos nossas observações à primeira metade do século XX não poderemos descartar a tradição do negrismo modernista2 de que são exemplos Jorge de Lima 18931953 Raul Bopp 18981984 Menotti Del Pichia 18921988 Cassiano Ricardo 18951974 ou os escritores do grupo mineiro Leite Criôlo entre outros E nesse caso não teremos como comparálos à escrita de Cuti 1951 Miriam Alves 1952 ou Conceição Evaristo 1946 o que existiria de semelhante sob qualquer ângulo de abordagem entre Ponciá Vicêncio e a Nega Fulô O ponto de vista que conduz a perspectiva dos Poemas negros de Jorge de Lima é bem outro externo e folclórico na linha do que Oswald de Andrade 18901954 cognominou de macumba para turistas E por mais que Urucungo de Raul Bopp se aproprie de ritmos e entonações oriundas de uma oralidade afrobrasileira não há como negar que a literatura negra desses autores é outra Na linha do legado modernista Benedita Gouveia Damasceno 1988 também confere ao conceito um sentido distinto e até mesmo oposto ao praticado pelo Quilombhoje um sentido marcado pelo reducionismo temático sem levar em conta o pertencimento étnico e a perspectiva autoral Para Damasceno o menos importante é a cor do autor 1988 p 13 o que a faz incluir Jorge de Lima Ascenso Ferreira 18951965 e Raul Bopp entre os poetas estudados Em geral esta tem sido uma tendência em nossa crítica do século XX e a supremacia do critério temático demonstra mais uma vez a força da herança modernista na cultura brasileira Embora reconheça as divergências e dificuldades para o estabelecimento de uma estética negra já que não existe uma estética branca 1988 p 13 ao final conclui Benedita Damasceno que há sensíveis diferenças entre a poesia negra escrita por afro brasileiros e a escrita por brancos 1988 p 125 Cioso das limitações do critério temático Domício Proença Filho busca uma solução conciliatória entre as duas vertentes e propõe um duplo sentido para o termo À luz dessas observações será negra em sentido restrito uma literatura feita por negros ou descendentes assumidos de negros e como tal reveladora de visões de mundo de ideologias e de modos de realização que por força de condições atávicas sociais e históricas se caracteriza por uma certa especificidade ligada a um intuito claro de singularização cultural Lato sensu será a arte literária feita por quem quer que seja desde que reveladora de dimensões peculiares aos negros ou aos descendentes de negros PROENÇA FILHO 1988 p 78 grifos do autor O crítico retoma sua reflexão em escrito posterior acrescentando que no primeiro caso temse o negro como sujeito numa atitude compromissada e no segundo a condição negra como objeto numa visão distanciada Deste modo o conceito comportaria tanto a literatura do negro quanto a literatura sobre o negro 1997 p 159 Tal dicotomia compromete a operacionalidade do conceito uma vez que o faz abrigar tanto o texto empenhado em resgatar a dignidade social e cultural dos afrodescendentes quanto o seu oposto a produção descompromissada para ficarmos nos termos de Proença voltada muitas vezes para o exotismo e a reprodução de estereótipos atrelados à semântica do preconceito Os trabalhos de Zilá Bernd 1987 1988 compartilham com o posicionamento conciliador de Proença Filho Seu livro Introdução à literatura negra analisa tanto o discurso do negro quanto sobre o negro e aborda as poesias de Castro Alves 18471871 e Jorge de Lima a fim de ressaltar suas diferenças em relação a Luiz Gama 18301882 e Lino Guedes 18961951 Com isto emprega o critério temático ao mesmo tempo em que o relativiza Centrado na poesia o estudo estabelece as leis fundamentais da literatura negra a saber a reversão dos valores com o estabelecimento de uma nova ordem simbólica oposta aos sentidos hegemônicos a construção da epopeia negra e sobretudo a emergência de um eu enunciador A montagem da poesia negra fazse a partir da reconquista da posição de sujeito da enunciação fato que viabiliza a reescritura da História do ponto de vista do negro Edificandose como espaço privilegiado da manifestação da subjetividade o poema negro reflete o trânsito da alienação à conscientização Assim a proposta do eu lírico não se limita à reivindicação de um mero reconhecimento mas amplificase correspondendo a um ato de reapropriação de um espaço existencial que lhe seja próprio BERND 1988 p 77 grifos da autora Bernd não se atém à cor da pele do escritor mas à enunciação do pertencimento Em seguida detalha com propriedade o alargamento da voz individual rumo à identificação com a comunidade momento em o euquesequernegro se encontra com o nós coletivo Ibid p 77 Sem discordar da pertinência do reconhecimento dessa voz cumpre ressaltar sua circunscrição ao texto poético o que relativiza em muito sua aplicabilidade quanto ao discurso ficcional dada a complexidade que envolve a instância do narrador e dadas as múltiplas possibilidades de disfarce do autor empírico Já para Luiza Lobo esta definição parece implicar que qualquer pessoa poderia se identificar existencialmente com a condição de afrodescendente o que de modo algum é verdadeiro no atual estágio sociocultural em que nos encontramos pelo menos no Brasil 2007 p 328 Lobo defende que o conceito não deve incluir a produção de autores brancos e juntamente com Brookshaw 1983 entende ser tal literatura apenas aquela escrita por negros Como se pode constatar a questão é controversa e como tal tem se mantido nas reflexões e debates levados a cabo nas últimas décadas Mas temse ainda um outro agravante formulado pelo segmento de sentido que diz respeito ao texto negro como sinônimo de narrativa detetivesca de mistério e suspense na linha do roman noir da indústria editorial No Brasil tal vertente faz sucesso com Rubem Fonseca 1925 e outros chegandose mesmo ao estabelecimento de nuances diferenciadoras entre os conceitos de romance negro e romance policial Vejamos a propósito a definição dada por Peter Winner o personagem escritor do Romance negro de Rubem Fonseca acabamos de dizer que o romance negro se caracteriza pela existência de um crime com uma vítima que se sabe logo quem é e um criminoso desconhecido e um detetive que afinal descobre a identidade desse criminoso Assim não existe o crime perfeito não é verdade FONSECA 1992 p 151 aspas do autor No conto em que o protagonista é um famoso escritor de histórias policiais a pontificar num evento reunindo outros autores do gênero Fonseca entrelaça ação e metalinguagem para esboçar a genealogia do roman noir desde o século XVIII passando por Edgar Alan Poe e outros fundadores roman noir novela negra kriminal roman romance policial romance de mistério ou que nome possua teve suas regras simples estabelecidas por Poe ao publicar Os crimes nessa mesma revista que temos à nossa frente Ibid p 161 Ao que complementa o escritor fictício de Fonseca um crítico afirmava que meus livros com seu conteúdo de violência corrupção conflitos sociais miséria crime e loucura podiam ser considerados verdadeiros textos do romance negro Ibid p 164 Assim já por esse pequeno sumário da questão podese deduzir que da militância e celebração identitária ao negrismo descomprometido e tendente ao exótico passando por escritos distantes tanto de uma postura como de outra literatura negra são muitas o que no mínimo enfraquece e limita a eficácia do conceito enquanto operador teórico e crítico E isto sem entrar na cadeia semântica do adjetivo que desde as páginas da Bíblia carrega em praticamente todas as línguas faladas no ocidente as marcas de negatividade inferioridade pecado morte e todo tipo de sortilégio como já apontado por Brookshaw 1983 dentre outros Já o termo afrobrasileiro por sua própria configuração semântica remete ao tenso processo de mescla cultural em curso no Brasil desde a chegada dos primeiros africanos Processo de hibridação étnica e linguística religiosa e cultural De acordo com um pensamento conservador poderseia dizer que afro brasileiros são também todos os que provêm ou pertencem a famílias mais antigas cuja genealogia remonta ao período anterior aos grandes fluxos migratórios ocorridos desde o século XIX E como este outros reparos poderiam ser arrolados dado o caráter nãoessencialista do termo Para Luís Silva Cuti ele funciona como elemento atenuador que diluiria o sentido político de afirmação identitária contido na palavra negro É certo que por abraçarem toda a gama de variações fenotípicas inerentes à mestiçagem termos como afrobrasileiro ou afrodescendente trazem em si o risco de assumirem sentido homólogo ao do signo pardo tão presente nas estatísticas do IBGE quanto execrado pelos fundamentalistas do orgulho racial traduzido no slogan 100 negro Deixando de lado polêmicas de fundo sociológico político ou antropológico também é certo que não há sobretudo no Brasil uma literatura 100 negra tomada aqui a palavra como sinônimo de africana Nem a África é uma só como nos demonstra Apiah 1997 nem o romance o conto ou o poema são construções provindas unicamente do Atlântico Negro Num universo cultural como o nosso onde verdadeiras constelações discursivas localizadas tanto regionalmente quanto no que Nora denomina lugares de memória se dispõem ao constante reprocessamento insistir num viés essencialista pode gerar mais polêmicas do que operadores teóricocríticos eficientes para o trabalho pedagógico de formar leitores A discussão envolve outras variantes Luiza Lobo confere um perfil mais incisivo ao conceito Poderíamos definir literatura afrobrasileira como a produção literária de afrodescendentes que se assumem ideologicamente como tal utilizando um sujeito de enunciação próprio Portanto ela se distinguiria de imediato da produção literária de autores brancos a respeito do negro seja enquanto objeto seja enquanto tema ou personagem estereotipado folclore exotismo regionalismo LOBO 2007 p 315 A definição articula o sujeito de enunciação proposto por Bernd com a exigência de pertencimento e compromisso ideológico formulada por Ironides Rodrigues E prossegue Para arrancar a literatura negra do reduto reducionista da literatura em geral que a trata como tema folclórico exótico ou como estereótipo é preciso que ela seja necessariamente uma literatura afrobrasileira Ibid p 331 É inegável que a afrobrasilidade aplicada à produção literária enquanto requisito de autoria e marca de origem configurase como perturbador suplemento de sentido aposto ao conceito de literatura brasileira sobretudo àquele que a coloca como ramo da portuguesa Mas tão relevante quanto o sujeito de enunciação próprio em que um eu lírico ou um narrador se autoproclama negro ou afrodescendente é o ponto de vista adotado Um bom exemplo pode estar na produção de autores do século XIX remanescentes de africanos submetidos à hegemonia do embranquecimento como vacina contra a morte social E ainda submetidos a um pensamento científico que praticamente os proibia de se declararem negros ou mulatos a exemplo de Maria Firmina dos Reis 18221917 Autores impelidos a uma negrícia ou negrura abafadas e tendo na literatura uma forma de expressão do retorno do recalcado como no caso de Machado de Assis 18391908 Em ambos não há uma voz autoral que se assuma negra como no texto do Orfeu de Carapinha Luiz Gama Daí a dificuldade de enquadrar Pai contra mãe ou Úrsula 1859 como literatura negra e não apenas devido à sobrecarga de sentidos políticos ou folclóricos agregados ao conceito Todavia os escritos de ambos e são inúmeros os exemplos não podem ser classificados como dotados de um ponto de vista externo ou descomprometido O texto machadiano fala por si e assim como em Firmina explicita um olhar nãobranco e nãoracista Nem um nem outro devem portanto serem enquadrados como negrismo ou literatura sobre o negro Deste modo tão relevante ou mais que a explicitação da origem autoral é o lugar a partir do qual o autor expressa sua visão de mundo Nesse contexto vejo no conceito de literatura afrobrasileira uma formulação mais elástica e mais produtiva a abarcar tanto a assunção explícita de um sujeito étnico que se faz presente numa série que vai de Luiz Gama a Cuti passando pelo negro ou mulato como queiram de Lima Barreto 18811922 quanto o dissimulado lugar de enunciação que abriga Caldas Barbosa Machado Firmina Cruz e Sousa 18611898 Patrocínio 18531905 Paula Brito 18091861 Gonçalves Crespo 18461886 e tantos mais Por isto mesmo inscrevese como um operador capacitado a abarcar melhor por sua amplitude necessariamente compósita as várias tendências existentes na demarcação discursiva do campo identitário afrodescendente em sua expressão literária Acredito pois na maior pertinência do conceito de literatura afrobrasileira presente em nossos estudos literários desde o livro pioneiro de Roger Bastide 1943 com os equívocos é certo que aquele momento não permitia a ele superar em especial no tocante a Cruz e Sousa E também presente nas reflexões de Moema Augel e mais enfaticamente de Luiza Lobo 1993 2007 Adotado enfim por praticamente todos os que lidam com a questão nos dias de hoje inclusive pelos próprios autores do Quilombhoje seja nos subtítulos dos Cadernos Negros seja no próprio volume teóricocrítico lançado pelo grupo em 1985 com o título de Reflexões sobre a literatura afrobrasileira Nesse contexto seria relevante atentar para as reflexões do poeta e crítico Edimilson de Almeida Pereira que aponta o risco dos critérios étnico e temático funcionarem como censura prévia aos autores Sua preocupação se aproxima daquela manifestada por Proença Filho quanto ao risco terminológico 1988 p 77 implícito à expressão que poderia confinar ainda mais essa escritura ao gueto afastandoa consequentemente das instâncias de canonização De sua parte Pereira defende a adoção de um critério pluralista a partir de uma orientação dialética que possa demonstrar a literatura afrobrasileira como uma das faces da literatura brasileira esta mesma sendo percebida como uma unidade constituída de diversidades 1995 p 10356 O crítico inverte a conhecida postulação de Afrânio Coutinho e considera a literatura brasileira como constituinte de uma tradição fraturada típica de países que passaram pelo processo de colonização É portanto no âmbito dessa expressão historicamente múltipla e desprovida de unidade que se abre espaço para a configuração do discurso literário afrodescendente em seus diversos matizes Em resumo que elementos distinguiriam essa literatura Para além das discussões conceituais alguns identificadores podem ser destacados uma voz autoral afrodescendente explícita ou não no discurso temas afrobrasileiros construções lingüísticas marcadas por uma afrobrasilidade de tom ritmo sintaxe ou sentido um projeto de transitividade discursiva explícito ou não com vistas ao universo recepcional mas sobretudo um ponto de vista ou lugar de enunciação política e culturalmente identificado à afrodescendência como fim e começo Alertando para o fato de que se trata de um conceito em construção passamos a examinar mais detidamente cada um desses elementos A Temática Riram dos nossos valores Apagaram os nossos sonhos Pisaram a nossa dignidade Sufocaram a nossa voz Nos transformaram em uma ilha Cercada de mentiras por todos os lados Carlos de Assumpção O tema é um dos fatores que ajuda a configurar o pertencimento de um texto à literatura afrobrasileira Para Octavio Ianni tratase de abordar não só o sujeito afrodescendente no plano do indivíduo mas como universo humano social cultural e artístico de que se nutre essa literatura 1988 p 209 Assim pode contemplar o resgate da história do povo negro na diáspora brasileira passando pela denúncia da escravização e de suas consequências ou ir à glorificação de heróis como Zumbi dos Palmares A denúncia da escravatura já está no citado Úrsula 1859 de Maria Firmina dos Reis em Motta Coqueiro 1877 de José do Patrocínio na obra de Cruz e Sousa e em alguns romances contos e crônicas de Machado de Assis bem como em outros autores dos séculos XIX e XX Por sua vez os feitos gloriosos dos quilombolas estão presentes tanto no Canto dos Palmares 1961 de Solano Trindade 19081974 quanto no Dionísio esfacelado 1984 de Domício Proença Filho 1936 E ainda em diversos outros textos empenhados em reconstituir a memória de lutas dos que não se submeteram ao cativeiro como a obra de Oliveira Silveira 19412009 e a biografia romanceada do líder palmarino de Joel Rufino dos Santos Tais escritos polemizam com o discurso colonial que conforme salienta Fanon 1983 trabalha pelo apagamento de toda história cultura e civilização existentes para aquém ou além dos limites da sociedade branca dominante A temática afrobrasileira abarca ainda as tradições culturais ou religiosas transplantadas para o novo mundo destacando a riqueza dos mitos lendas e de todo um imaginário circunscrito quase sempre à oralidade Autores como Mestre Didi 19172013 com seus Contos crioulos da Bahia 1976 ou Mãe Beata de Yemonjá 19312017 com as narrativas presentes em Caroço de dendê 2002 e Histórias que minha avó contava 2004 figuram nessa linha de recuperação de uma multifacetada memória ancestral Além disso elementos rituais e religiosos são presença constante em inúmeros autores Exus e PombasGiras povoam Cidade de Deus 1997 de Paulo Lins 1958 enquanto os Orikis transportados pelo Atlântico Negro fazemse presentes na poesia de Edimilson de Almeida Pereira e tantos mais Já a peça Sortilégio 1957 de Abdias Nascimento 1914 2011 traz para o palco não apenas o terreiro e o peji como cenário mas o culto afrobrasileiro e a memória ancestral como fundamentos do processo de identificação do personagem negro um dos pontos fulcrais da trama E para além da temática propriamente religiosa observase a recorrência de textos em que se celebram vínculos com a ancestralidade africana como em Elo de Oliveira Silveira Aqui meu umbigo túmido receptor de seiva neste lado do mar nesta longe placenta E África lá está na outra extremidade do cordão Roteiro dos tantãs p 3 Outra vertente dessa diversidade temática situase na história contemporânea e busca trazer ao leitor os dramas vividos na modernidade brasileira com suas ilhas de prosperidade cercadas de miséria e exclusão De Lima Barreto e Nascimento Moraes a Carolina Maria de Jesus de Lino Guedes Adão Ventura 19392004 e Oswaldo de Camargo 1936 a Eduardo de Oliveira 19262012 passando pelos poetas e ficcionistas reunidos na série Cadernos Negros muitos são os que debruçam sobre o estigma do 14 de maio de 1888 o longo day after da abolição que se prolonga pelas décadas seguintes e chega ao século XXI Como decorrência desse processo surgem nos textos o subúrbio a favela a crítica ao preconceito e ao branqueamento a marginalidade a prisão E figuras como Di Lixão Ana Davenga Natalina DuzuQuerença personagens dos contos de Conceição Evaristo como a empregada Maria linchada pelos passageiros de um ônibus urbano após escapar de assalto em que estes são vítimas simplesmente por ser excompanheira de um dos bandidos No entanto a abordagem das condições passadas e presentes de existência dos afrodescendentes no Brasil não pode ser considerada obrigatória nem se transformar numa camisa de força para o autor o que redundaria em visível empobrecimento Por outro lado nada impede que a matéria ou o assunto negro estejam presentes da escrita dos brancos Desde as primeiras manifestações das vanguardas estéticas do século XX uma forte tendência negrista parte das apropriações cubistas do imaginário africano e se estende a outras artes e outros países em especial no modernismo brasileiro Dessa postura decorrem textos hoje considerados clássicos Deste modo a adoção da temática afro não deve ser considerada isoladamente e sim em sua interação com outros fatores como autoria e o ponto de vista A Autoria Há o tema do negro e há a vida do negro Mas uma coisa é o negrotema outra o negro vida Alberto Guerreiro Ramos Conforme já visto a instância da autoria é das mais controversas pois implica a consideração de fatores biográficos ou fenotípicos com todas as dificuldades daí decorrentes e ainda a defesa feita por alguns estudiosos de uma literatura afro brasileira de autoria branca No primeiro caso há que atentar para a abertura implícita ao sentido da expressão afrobrasileiro a fim de abarcar as identidades compósitas oriundas do processo miscigenador No segundo correse o risco de reduzir essa produção ao negrismo entendido como utilização por quem quer que seja de assuntos atinentes aos negros Superandose o reducionismo temático e vendose a questão de outra perspectiva podese por exemplo reler Castro Alves e concluir que apesar do epíteto de poeta dos escravos sua obra não se enquadra na literatura afrobrasileira No extremo oposto ao negrismo existem autores que apesar de afrodescendentes não reivindicam para si tal condição nem a incluem em seu projeto literário a exemplo de Marilene Felinto e tantos outros3 Isto nos indica a necessidade de evitar também a redução sociológica que no limite levaria a interpretar o texto a partir de fatores externos a ele como a cor da pele ou a condição social do escritor No caso presente é preciso compreender a autoria não como um dado exterior mas como uma constante discursiva integrada à materialidade da construção literária Por esta via se descobrem ângulos novos tanto na poesia de Cruz e Souza quanto na obra de Machado de Assis em especial nas crônicas publicadas sob pseudônimo No caso do poeta catarinense um acesso por ligeiro que seja a dados de sua biografia indicará a existência de outras possibilidades de interpretação distintas daquela obsessão pela branquitude que muitos enxergam como dominante em seu projeto poético A confissão angustiada presente no Emparedado explicita não ser Cruz e Sousa um negro de alma branca apesar da formação europeizante que recebeu e do refinado conhecimento que possuía da poesia e da cultura ocidentais O emparedamento a que está submetido pelo fato histórico da escravização reforçado pelos estigmas com que são rebaixados os de pele escura mesmo após o término formal do regime repercute em seus escritos construindo novas possibilidades de leitura Como no caso de Machado e tantos outros há que se levar também em conta a produção jornalística do poeta inclusive no que tem de confessional para conhecer seu profundo desprezo pela elite que fazia do trabalho escravizado fonte de lucro e poder A partir de então terseá uma dimensão mais ampla do conjunto da obra A instância da autoria como fundamento para a existência da literatura afro brasileira decorre da relevância dada à interação entre escritura e experiência que inúmeros autores fazem questão de destacar seja enquanto compromisso identitário e comunitário seja no tocante à sua própria formação de artistas da palavra No primeiro caso saltam aos olhos os impulsos coletivistas que levam diferentes autores a quererem ser a voz e a consciência da comunidade4 Nesse contexto recuperase a tradição africana dos griots Guardiães do saber ancestral circunscrito à oralidade bem como dos usos e costumes das nações que deram origem à população afrodescendente no Brasil os griots são referência para intelectuais militantes como Abdias Nascimento Solano Trindade Carlos de Assumpção 1927 Cuti e tantos mais Por outro lado a inscrição da experiência marcada por obstáculos de toda ordem tem sido uma constante na produção afrodescendente de diversos países Traços autobiográficos marcam as páginas de inúmeros autores do passado e do presente a entrelaçar a ficção e a poesia com o testemunho numa linha que vem de Cruz e Sousa e Lima Barreto a Carolina Maria de Jesus 19141977 e Geni Guimarães 1947 entre outros No momento quem mais explicita o veio documental de sua obra é Conceição Evaristo que reivindica para seus textos o estatuto de escrevivência na origem da minha escrita ouço os gritos os chamados das vizinhas debruçadas sobre as janelas ou nos vãos das portas contando em voz alta umas para as outras as suas mazelas assim como suas alegrias Apud ALEXANDRE Org 2007 p 19 A exiguidade de espaço dos barracos da favela e a proximidade ente uns e outros estreita os caminhos dos becos e também das vidas que ali se cruzam fixando tais experiências na memória da futura escritora Creio que a gênese da minha escrita está no acúmulo de tudo o que ouvi desde a infância Eu fechava os olhos fingindo dormir e acordava todos os meus sentidos O meu corpo por inteiro recebia palavras sons murmúrios vozes entrecortadas de gozo ou dor dependendo do enredo das histórias De olhos cerrados eu construía as faces de minhas personagens reais e falantes Era um jogo de escrever no escuro No corpo da noite Ibid E conclui A nossa escrevivência não pode ser lida como histórias para ninar os da casa grande e sim para incomodálos em seus sonos injustos Ibid p 21 grifo da autora Deste modo a autoria há que estar conjugada intimamente ao ponto de vista Literatura é discursividade e a cor da pele será importante enquanto inscrição textual de uma história própria ou coletiva O Ponto de Vista À África Às vezes te sinto como avó outras vezes te sinto como mãe Quando te sinto como neto me sinto como sou Quando te sinto como filho não estou me sentindo bem eu estou me sentindo aquele que arrancaram de dentro de ti Oliveira Silveira O ponto de vista adotado indica a visão de mundo autoral e o universo axiológico vigente no texto ou seja o conjunto de valores que fundamentam as opções até mesmo vocabulares presentes na representação Diante disso a ascendência africana ou a utilização do tema são insuficientes É necessária ainda a assunção de uma perspectiva identificada à história à cultura logo à toda problemática inerente à vida e às condições de existência desse importante segmento da população Em suas Trovas burlescas publicadas em 1859 Luiz Gama autoproclamado Orfeu de Carapinha explicita a afrodescendência de seus textos ao apelar à musa da Guiné e à musa de azeviche para em seguida promover uma impiedosa carnavalização das elites Já em seu romance Úrsula também de 1859 Maria Firmina dos Reis adota a mesma perspectiva ao colocar o escravo Túlio como referência moral do texto chegando a afirmar pela voz do narrador que Tancredo um dos brancos mais destacados na trama possuía sentimentos tão nobres e generosos como os que animavam a alma do jovem negro 2004 p 25 Mais adiante faz seu texto falar pela voz de Mãe Suzana velha cativa que detalha a vida livre na África a captura pelos bárbaros traficantes europeus e o cemitério cotidiano do porão do navio negreiro Numa época em que muitos sequer concediam aos negros a condição de seres humanos o romance e a perspectiva afroidentificada da escritora soam como gestos revolucionários que a distinguem do restante da literatura brasileira da época Já o caso de Machado de Assis é emblemático Menino pobre nascido no Morro do Livramento filho de um pintor de paredes e de uma lavadeira jovem ainda ganha destaque no mundo das letras Cronista crítico literário poeta e ficcionista em nenhuma página de sua vasta obra se encontra qualquer referência a favor da escravatura ou da pretensa inferioridade de negros ou mestiços Muito pelo contrário E mesmo descartando a retórica panfletária a ironia por vezes sarcástica e a verve carnavalizadora com que trata a classe senhorial dão bem a medida de sua visão de mundo O lugar de onde fala é o dos oprimidos e este é um fator decisivo para incluir ao menos parte de sua obra no âmbito da afrobrasilidade Apesar de fundador da Academia Brasileira de Letras e de ter sido canonizado como escritor branco Machado escapa ao papel normalmente destinado aos homens livres na ordem escravocrata o de ventríloquo e defensor das ideias hegemônicas provenientes das elites senhoriais E conforme demonstra Chalhoub 2003 ao contrário da leitura de Schwarz 1977 a crítica machadiana não visa apenas ao aprimoramento do paternalismo mas à sua denúncia Como funcionário do governo imperial Machado ostenta uma postura irrepreensível ao propiciar a libertação de inúmeros cativos E como escritor adota em seus textos um ponto de vista coerente com seu procedimento de cidadão Chalhoub 2003 A acusação de omisso que muitos tentaram lhe impingir cai por terra diante das centenas de matérias abolicionistas publicadas pela Gazeta de Notícias órgão do qual era sócio oculto E mais em suas crônicas sempre que aborda o cativeiro acrescenta elementos judicativos que ora lamentam a condição dos escravos ora louvam a filantropia dos que os libertam ora criticam os que apoiam ou se beneficiam do sistema conforme podemos ler em Raimundo Magalhães Júnior 1957 No terreno da poesia encontramos obras como Sabina ou os versos satíricos publicados nos jornais onde obtinham repercussão mais ampla E seguemse contos como Virginius Mariana O Espelho O caso da vara ou o contundente Pai contra mãe calcados numa postura nitidamente afro brasileira Já nos romances o olhar que organiza as ações e comanda a pintura das figuras nunca é o olhar do branco explorador menos ainda escravista Entrando no século XX damos como exemplo inicial o poeta Lino Guedes Em 1938 ele publica Dictinha um volume inteiro dedicado a exaltar a mulher negra e ao mesmo tempo estabelecer um confronto praticamente inédito com a estereotipia vigente na sociedade em torno dessa camada feminina vitimada tanto pelo racismo quanto pelo sexismo Ouçamos uma estrofe Penso que talvez ignores Singela e meiga Dictinha Que desta localidade És a mais bela pretinha Se não fosse profanarte Chamarteia francesinha Guedes 1938 A elevação da mulher negra fazse presente ainda em outros poetas da primeira metade do século XX como Solano Trindade ou Aloísio Resende 19001941 Eles publicam em pleno apogeu modernista e fazem um interessante contraponto com a Nega Fulô de Jorge de Lima No caso de Guedes destacase a opção do poeta de inverter o sentido do discurso moralista do branco utilizandose para tanto das próprias armas deste ou seja do estereótipo sexual com que ingleses e alemães sobretudo estigmatizavam as francesas Diante da francesinha tomada pelo viés do sentido pejorativo a pretinha surge valorizada e engrandecida É o recurso da apropriação paródica que utiliza a linguagem do preconceito contra o preconceito Corremse no caso os riscos já sabidos pois se vai estar sempre na esfera da exclusão própria ao pensamento segregacionista Mas a paródia do discurso colonial já é em si um avanço frente a assimilação pura e simples que marca o trabalho de outros dotados de alma e estética brancas A assunção de um ponto de vista afrobrasileiro atinge seu ponto culminante com a série Cadernos Negros A apresentação do número 1 soa como manifesto e ilustra a afirmativa Estamos no limiar de um novo tempo Tempo de África vida nova mais justa e mais livre e inspirados por ela renascemos arrancando as máscaras brancas pondo fim à imitação Descobrimos a lavagem cerebral que nos poluía e estamos assumindo nossa negrura bela e forte Estamos limpando nosso espírito das ideias que nos enfraquecem e que só servem aos que querem nos dominar e explorar Cadernos Negros 1 1978 A metáfora do renascimento remete à adoção de uma visão de mundo própria e distinta da do branco à superação da cópia de modelos europeus e à assimilação cultural imposta como única via de expressão Ao superar o discurso do colonizador em seus matizes passados e presentes a perspectiva afro identificada configurase enquanto discurso da diferença e atua como elo importante dessa cadeia discursiva A Linguagem Quando o escravo surrupiou a escrita disse o senhor precisão síntese regras e boas maneiras São seus deveres Cuti A literatura costuma ser definida antes de tudo como linguagem construção discursiva marcada pela finalidade estética Tal posição ancorase no formalismo inerente ao preceito kantiano da finalidade sem fim da obra de arte Todavia outras finalidades para além da fruição estética são também reconhecidas e expressam valores éticos culturais políticos e ideológicos A linguagem é em dúvida um dos fatores instituintes da diferença cultural no texto literário Assim a afrobrasilidade tornarseá visível também a partir de um vocabulário pertencente às práticas linguísticas oriundas de África e inseridas no processo transculturador em curso no Brasil Ou de uma discursividade que ressalta ritmos entonações e mesmo toda uma semântica própria empenhada muitas vezes num trabalho de ressignificação que contraria sentidos hegemônicos na língua Isto porque bem o sabemos não há linguagem inocente nem signo sem ideologia Termos como negro negra crioulo ou mulata para ficarmos nos exemplos mais evidentes circulam no Brasil carregados de sentidos pejorativos e tornamse verdadeiros tabus linguísticos no âmbito da cordialidade que até certo ponto ainda caracteriza o racismo à brasileira Alguns exemplos quem não se lembra dos versos de Manuel Bandeira 1990 Irene preta Irene boa Irene sempre de bom humor Ou da mulata assanhada que nunca é mulher diurna só noturna nunca é espírito só carne nunca é família ou trabalho só prazer E bem conhecemos o complemento masculino dessa fantasia o mulato malandro chegado à festa e aos vícios fator de degeneração e de desequilíbrio social Estes e tantos outros fantasmas emergem de nosso passado escravista para ainda hoje habitarem o imaginário social brasileiro onde fazem companhia a figurações como a do bom senhor ou do bom patrão do escravo contente ou do seu oposto o marginal sanguinário e psicopata naturalmente voltado para o crime Estas e tantas outras deturpações inscrevemse em nossas letras tanto quanto no cinema na TV ou nos programas popularescos que se espalham pelas ondas do rádio São estereótipos sociais largamente difundidos e assumidos inclusive entre suas vítimas signos que funcionam como poderosos elementos de manutenção da desigualdade Nesse contexto o discurso afrodescendente busca a ruptura com os contratos de fala e escrita ditados pelo mundo branco objetivando a configuração de uma nova ordem simbólica que expresse a reversão de valores conforme analisa Zilá Bernd 1988 p 22 85 89 E o tom carinhoso impresso à linguagem de Henrique Cunha Júnior 1952 no momento em que trata de um dos principais ícones do preconceito racial dá bem a medida do esforço de reterritorialização cultural empreendido pela literatura afrobrasileira Ouçamos o poeta Cabelos enroladinhos enroladinhos Cabelos de caracóis pequeninos Cabelos que a natureza se deu ao luxo de trabalhálos e não simplesmente deixálos esticados ao acaso Cabelo pixaim Cabelo de negro Cadernos Negros 1 1978 O signo cabelo enquanto marca de inferioridade cabelo duro cabelo ruim qual é o pente que penteia repetenos a música ouvida há tantas décadas é recuperado pelo viés da positividade expressa na linguagem o diminutivo enroladinhos em conjunção fônica e semântica com pequeninos remete ao luxo dos caracóis trabalhados pela natureza ao contrário do cabelo liso inscrito como fruto do acaso Nessa linha há inúmeros exemplos como Outra Nega Fulô de Oliveira Silveira 1998 p 109110 ou Minha cor não é de luto de Márcio Barbosa 2004 p 106 em que se evidencia a reversão paródica do discurso hegemônico E no tocante às particularidades de ritmo e de entonação são inúmeros os casos em que o texto expressa sonoridades outras marcadas pelo rico imaginário afro brasileiro Entre tantos podemos lembrar os sons guerreiros do poeta Bélsiva Irmão bate os atabaques Bate bate bate forte Bate que a arte é nossa 1978 em que o desdobramento anagramático do instrumento musical africano faz com que a poesia assuma o sentido de ritual coletivo e libertador Outros exemplos poderiam ser arrolados a partir mesmo da forte presença de vocábulos de idiomas africanos incorporados ao português do Brasil como em Tristes Maracatus de Solano Trindade Baticuns maracatucando na minhalma de moleque Buneca negra de minha meninice de negro preto de São José Nas águas de calunga a Kambinda me inspirando amor o primeiro cafuné no mato verde Da campina do Bodé Trindade 1981 p 74 Assim a assunção de uma linguagem descomprometida com os contratos de fala dominantes ganha sentido político conforme conclui Conceição Evaristo Em se tratando de um ato empreendido por mulheres negras que historicamente transitam por espaços culturais diferenciados dos lugares ocupados pela cultura das elites escrever adquire um sentido de insubordinação Insubordinação que se pode evidenciar muitas vezes desde uma escrita que fere as normas cultas da língua caso exemplar o de Carolina Maria de Jesus como também pela escolha da matéria narrada Evaristo 2007 p 21 O Público Escrevo porque há que se despertar a consciência adormecida e preguiçosa do nosso povo porque há que se cutucar com punhaispalavras os marginalizados que são meus personagens e que provavelmente não por falta de empenho de minha parte nem venham a ler meus textos Paulo Colina A formação de um horizonte recepcional afrodescendente como fator de intencionalidade próprio a essa literatura distinguea do projeto que norteia a literatura brasileira em geral A constituição desse público específico marcado pela diferença cultural e pelo anseio de afirmação identitária compõe a faceta algo utópica do projeto literário afrobrasileiro sobretudo a partir de Solano Trindade Oliveira Silveira e dos autores contemporâneos Este impulso à ação e ao gesto político leva à criação de outros espaços mediadores entre texto e receptor os saraus literários na periferia os lançamentos festivos a encenação teatral as rodas de poesia e rap as manifestações políticas alusivas ao 20 de novembro entre outros No caso o sujeito que escreve o faz não apenas com vistas a atingir um determinado segmento da população mas o faz também a partir de uma compreensão do papel do escritor como portavoz da comunidade Isto explica a reversão de valores e o combate aos estereótipos procedimentos que enfatizam o papel social da literatura na construção da autoestima Acrescentese o fato de que títulos como Axé Cadernos Negros ou Quilombo de palavras explicitam de imediato um públicoalvo a cujas expectativas o escritor espera atender A tarefa a que se propõem é ambiciosa e nada desprezível Tratase de intervir num processo complexo e num campo adverso dada a dificuldade de se implantar o gosto e o hábito de leitura sobretudo entre crianças e jovens em sua maioria pobres num cenário marcado pela hegemonia dos meios eletrônicos de comunicação Para ilustrar recordo uma reflexão de Ezequiel Teodoro da Silva datada dos anos 1980 a respeito do que então se denominava crise de leitura Segundo o autor essa crise é alimentada pela leidura um conjunto de restrições que impede a fruição da leitura e que a coloca numa situação de crise Para ele o primeiro parágrafo da leidura estabelece que somente a elite dirigente deve ler o povo deve ser mantido longe dos livros Porque livros bem selecionados e lidos estimulam a crítica a contestação e a transformação elementos estes que segundo o teórico colocam em risco a estrutura social vigente SILVA 1997 Num contexto tão adverso duas tarefas se impõem primeiro a de levar ao público a literatura afrobrasileira fazendo com que o leitor tome contato não apenas com a diversidade dessa produção mas também com novos modelos identitários e segundo o desafio de dialogar com o horizonte de expectativas do leitor combatendo o preconceito e inibindo a discriminação sem cair no simplismo muitas vezes maniqueísta do panfleto A busca do público leva à postura do grupo Quilombhoje de São Paulo de ir onde o povo negro está vendendo os livros em eventos e outros circuitos alternativos ao mercado editorial E explica a multiplicação de sites e portais na Internet nos quais o receptor encontra formas menos dispendiosas de fruir o prazer da leitura Resta então trabalhar por uma crescente inclusão digital para que se concretize nessa estratégia a saída frente às dificuldades existentes tanto no âmbito da produção editorial quanto na rarefação de um mercado consumidor de reduzido poder aquisitivo Concluindo A partir portanto da interação dinâmica desses cinco grandes fatores temática autoria ponto de vista linguagem e público podese constatar a existência da literatura afrobrasileira em sua plenitude Tais componentes atuam como constantes discursivas presentes em textos de épocas distintas Logo emergem ao patamar de critérios diferenciadores e de pressupostos teóricocríticos a embasar e operacionalizar a leitura dessa produção Impõese destacar todavia que nenhum desses elementos propicia o pertencimento à literatura afro brasileira mas sim o resultado de sua interrelação Isoladamente tanto o tema como a linguagem e mesmo a autoria o ponto de vista e até o direcionamento recepcional são insuficientes Literatura Afrobrasileira processo devir Além de segmento ou linhagem componente de amplo encadeamento discursivo Ao mesmo tempo dentro e fora da literatura brasileira como já defendia na década de 1980 Octavio Ianni 1988 p 208 Uma produção que implica evidentemente redirecionamentos recepcionais e suplementos de sentido à história literária estabelecida Uma produção que está dentro porque se utiliza da mesma língua e praticamente das mesmas formas e processos de expressão Mas que está fora porque entre outros fatores não se enquadra no ideal romântico de instituir o advento do espírito nacional Uma literatura empenhada sim mas num projeto suplementar no sentido derridiano ao da literatura brasileira canônica o de edificar uma escritura que seja não apenas a expressão dos afrodescendentes enquanto agentes de cultura e de arte mas que aponte o etnocentrismo que os exclui do mundo das letras e da própria civilização Daí seu caráter muitas vezes marginal porque fundado na diferença que questiona e abala a trajetória progressiva e linear de nossa história literária Notas 1 Uma versão reduzida desse texto está publicada em Estudos de literatura brasileira contemporânea n 31 Brasília UnB janeiro junho de 2008 A presente versão encontrase também em DUARTE E A e FONSECA M N S Org Literatura e afrodescendência no Brasil antologia crítica Belo Horizonte Editora UFMG 2011 vol 4 História teoria polêmica 2 Em seu Vanguardas latinoamericanas Jorge Schwartz 1995 contrasta criticamente os conceitos de Negrismo e de Negritude e discorre sobre suas manifestações tanto na literatura brasileira quanto nas literaturas hispano americanas ressaltando as distinções que caracterizam os movimentos entre si e nos diversos países Já para Oswaldo de Camargo o negrismo enquanto discurso do branco se equipara ao indianismo dos românticos em que o nativo surge reduzido a objeto da fantasia do colonizador 3 Ver a propósito nosso Literatura política identidades cit p 120 4 A propósito recorremos às palavras do poeta martinicano Aimé Cézaire que poderiam ser assinadas por quaisquer dos escritores e intelectuais brasileiros afrodescendentes Sim nós constituímos uma comunidade mas uma comunidade de um tipo particular reconhecível pelo que ela é pelo que ela foi que apesar de tudo se constituiu em uma comunidade primeiramente uma comunidade de opressão sofrida uma comunidade de exclusão imposta uma comunidade de discriminação profunda Bem entendido e em sua honra ela é uma comunidade de resistência contínua de luta tenaz pela liberdade e de indubitável esperança CÉSAIRE 2010 p 104 Referências APPIAH Kwame Anthony Na casa de meu pai a África na filosofia da cultura Rio de Janeiro Contraponto 1997 ASSUMPÇÃO Carlos de Protesto Franca UNESP 1988 BASTIDE Roger A poesia afrobrasileira São Paulo Martins Fontes 1943 BASTIDE Estudos afrobrasileiros São Paulo Perspectiva 1983 BANDEIRA Manuel Poesia completa e prosa Rio de Janeiro Nova Aguillar 1990 BARBOSA Márcio Minha cor não é de luto In RIBEIRO E BARBOSA M Org Cadernos Negros Vol 27 São Paulo Quilombhoje 2004 BERND Zilá Introdução à literatura negra São Paulo Brasiliense 1988 BERND Zilá Negritude e literatura na América Latina Porto Alegre Mercado Aberto 1987 BERND Zilá Org Poesia negra brasileira Porto Alegre AGEIEL 1992 BROOKSHAW David Raça e cor na literatura brasileira Porto Alegre Mercado Aberto 1983 CAMARGO Oswaldo de O negro escrito São Paulo Secretaria de Estado da CulturaImprensa Oficial 1987 CÉSAIRE Aimé Discurso sobre a negritude Organização de Carlos Moore Belo Horizonte Nandyala 2010 CUTI Luiz Silva Sanga Belo Horizonte Mazza Edições 2002 DAMASCENO Benedita Gouveia Poesia negra no modernismo brasileiro Campinas Pontes Editores 1988 DUARTE Eduardo de Assis Literatura política identidades Belo Horizonte FALE UFMG 2005 EVARISTO Conceição Da grafiadesenho de minha mãe um dos lugares de nascimento de minha escrita In ALEXANDRE Marcos Antônio Org Representações performáticas brasileiras teorias práticas e suas interfaces Belo Horizonte Mazza Edições 2007 FANON Frantz Pele negra máscaras brancas Trad Maria Adriana da Silva Caldas Salvador Livraria Fator 1983 FONSECA Maria Nazareth Soares Org Brasil afrobrasileiro Belo Horizonte Autêntica 2000 FONSECA Rubem Romance negro e outras histórias São Paulo Companhia das Letras 1992 GAMA Luiz Primeiras trovas burlescas de Getulino 2 ed Rio de Janeiro Typographia Pinheiro Cia 1861 GUEDES Lino Dictinha separata de O canto do cisne negro São Paulo Cruzeiro do Sul 1938 Coleção Hendi IANNI Octavio Literatura e consciência In Estudos Afroasiáticos n 15 junho de 1988 Publicação do CEAA da Universidade Candido Mendes Rio de Janeiro 1988 p 208217 JÚNIOR R Magalhães Machado de Assis desconhecido Rio de Janeiro civilização Brasileira 1957 LOBO Luiza Crítica sem juízo 2 ed revista Rio de Janeiro Garamond 2007 PEREIRA Edimilson de Almeida Panorama da literatura afrobrasileira In Callaloo v 18 n 4 John Hopkins University Press 1995 PROENÇA FILHO Domício O negro na literatura brasileira In Boletim bibliográfico Biblioteca Mário de Andrade São Paulo Biblioteca Mario de Andrade v49 n14 jandez1988 PROENÇA FILHO Domício A trajetória do negro na literatura brasileira In Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional n 25 Org Joel Rufino dos Santos 1997 QUILOMBHOJE Org Cadernos Negros n 1 São Paulo Edição dos Autores 1978 QUILOMBHOJE Org Cadernos Negros n 2 São Paulo Edição dos Autores 1979 RABASSA Gregory O negro na ficção brasileira Rio de Janeiro Tempo Brasileiro 1965 REIS Maria Firmina dos Úrsula 4 ed Atualização do texto e posfácio de Eduardo de Assis Duarte Florianópolis Ed Mulheres Belo Horizonte PUC Minas 2004 SAYERS Raymond O negro na literatura brasileira Rio de Janeiro O Cruzeiro 1958 SCHWARTZ Jorge Negrismo e negritude In Vanguardas latinoamericanas São Paulo Editora da Universidade de São Paulo Iluminuras FAPESP 1995 SCHWARZ Roberto Ao vencedor as batatas São Paulo Duas Cidades 1977 SILVA Ezequiel Theodoro da Leitura e realidade brasileira 5 ed Porto Alegre Mercado Aberto 1997 SILVEIRA Oliveira Outra nega Fulô In QUILOMBHOJE Org Cadernos Negros os melhores poemas São Paulo Quilombhoje 1998 SILVEIRA Roteiro dos tantãs Porto Alegre Edição do autor 1981 TRINDADE Solano Cantares ao meu povo São Paulo Brasiliense 1981 Eduardo de Assis Duarte integra o Programa de Pósgraduação em Letras Estudos Literários da FALEUFMG e o Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Alteridade NEIA desta Instituição Autor de Literatura política identidades UFMG 2005 e de Jorge Amado romance em tempo de utopia 2 ed Record 1996 Organizou entre outros o volume Machado de Assis afrodescendente escritos de caramujo 3 ed rev ampl 2020 a coleção Literatura e afrodescendência no Brasil antologia crítica 2 Reimpr 2021 4 vol e os volumes didáticos Literatura afrobrasileira 100 autores do século XVIII ao XXI 2 ed 2019 e Literatura afrobrasileira abordagens na sala de aula 2 ed 2019 Participa do Projeto Interinstitucional de Pesquisa literafro Portal da Literatura Afro brasileira pesquisas em rede e integra a Comissão Editorial e Executiva do literafro disponível no endereço wwwletrasufmgbrliterafro Itinerário de Leitura TEMA IDENTIDADE OBRA ESTÍMULO LÚDICO O professor apresenta a capa da obra a ser lida e pede para os alunos listarem os possíveis segredos da personagem principal LEITURA O professor pede para os alunos comentarem sobre as lembranças suscitadas durante a leitura da obra REFLEXÃO SOBRE A LEITURA O professor pede para os alunos imaginarem como seria as suas vidas caso estivessem presentes no espaço apresentado na obra lida ATIVIDADE CRIATIVA O aluno representa os sentimentos suscitados pela leitura utilizando apenas lápis branco em papel preto DESFECHO LÚDICO Cada aluno deposita os seus problemas na caixa decorada durante o estímulo Após o professor e os alunos enterram a caixa no pátio da escola Ao final do ano letivo eles desenterram a caixa para cada um refletir sobre os problemas registrados no passado Desenvolvido a partir do ebook Itinerários de leitura para as séries iniciais CAROLINE CARDOSO ALVES PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ DE DJAMILA RIBEIRO NO ENSINO MÉDIO SINOPMT 2025 CAROLINE CARDOSO ALVES PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ DE DJAMILA RIBEIRO NO ENSINO MÉDIO Projeto de Pesquisa apresentado à Banca Examinadora do Curso de Licenciatura em Letras UNEMAT Campus de Sinop como requisito parcial para a obtenção do grau de Licenciada em Letras Orientador Rosana Rodrigues Da Silva SINOPMT 2025 PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ DE DJAMILA RIBEIRO NO ENSINO MÉDIO Projeto de Pesquisa apresentado ao Curso de Licenciatura em Letras UNEMAT Campus de Sinop como requisito parcial para a obtenção do grau de Licenciada em Letras Orientador Rosana Rodrigues Da Silva SINOPMT Maio de 2025 SUMÁRIO CAROLINE CARDOSO ALVES1 PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA1 UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ1 DE DJAMILA RIBEIRO NO ENSINO MÉDIO1 CAROLINE CARDOSO ALVES2 PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA2 UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ2 PRÁTICAS DE ENSINO DE LITERATURA ANTIRRACISTA3 UMA ABORDAGEM COM CARTAS PARA A MINHA AVÓ3 INTRODUÇÃO5 2 JUSTIFICATIVA7 3 PROBLEMA DE PESQUISA8 4 OBJETIVOS9 5 REFERENCIAL TEÓRICO10 6 METODOLOGIA11 7 CRONOGRAMA ORGANIZE CONFORME A PESQUISA12 REFERÊNCIAS13 5 INTRODUÇÃO O racismo estrutural atravessa gerações e está presente até mesmo nos espaços de convivência mais íntimos como a família Como integrante de família negra venho de uma trajetória marcada por vivências que me revelaram de forma dolorosa o quanto o preconceito é naturalizado inclusive por aqueles que muitas vezes também são vítimas dele Ao longo da minha formação pessoal e acadêmica presenciei cenas de discriminação racial praticadas por pessoas de meu convívio familiar contra outras pessoas negras o que me trouxe várias reflexões profundas sobre como o racismo se enraíza e se perpetua no cotidiano das pessoas mesmo entre aqueles que compartilham da mesma origem racial É a partir de experiências pessoais e da consciência da urgência de práticas educativas antirracistas que nasceu este projeto de pesquisa Para tanto busquei a adequação da metodologia de Vera Teixeira de Aguiar voltada para a literatura juvenil à leitura e ao trabalho em sala de aula com a obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro Em Cartas para minha avó Djamila Ribeiro trouxe à tona memórias pessoais atravessadas por afetos perdas e resistência diante do racismo vivenciado por ela desde a infância oferecendo aos estudantes não apenas uma história de vida mas a oportunidade de refletir sobre o racismo em suas múltiplas dimensões Trabalhar com essa literatura na escola é uma maneira de romper silêncios históricos fomentar a escuta sensível e estimular uma educação antirracista que vá além do discurso Por este motivo se fez necessário falar sobre Djamila Ribeiro Uma das principais intelectuais brasileiras na luta contra o racismo e o sexismo Filha de um ativista do movimento negro e de uma mulher trabalhadora a autora cresceu em um contexto social marcado por exclusões sociais e afetos ancestrais o que a levou desde a infância ao enfrentamento do preconceito racial e religioso E para embasar a estrutura deste projeto recorremos a metodologia da professora Vera Teixeira de Aguiar que é uma referência nos estudos de literatura juvenil Sua proposta consiste em reconhecer a literatura juvenil como um campo autônomo com características próprias fazendo distinção da literatura infantil e da adulta A metodologia é organizada em torno de eixos como uma seleção criteriosa de obras e estímulos à leitura crítica e reflexiva utilizando recurso como banco de textos narrativos e roteiros de leitura instrumentos que facilitam a atuação dos professores e a aproximação dos alunos com obras que dialogam com sua realidade 6 Assim o presente projeto pretende contribuir para a formação de leitores reflexivos capazes de reconhecer as diversas formas de discriminação racial e de se posicionar eticamente diante delas resgatando o papel da literatura como instrumento de emancipação e transformação social 7 2 JUSTIFICATIVA O ensino de literatura nas escolas brasileiras ainda é majoritariamente composto por uma seleção de obras que quase não dialogam com a realidade e identidade dos estudantes negros Considerando que o Brasil é um país de maioria negra a lacuna de uma educação antirracista no ensino médio tornase um obstáculo para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária Este projeto de pesquisa surge da necessidade de reconhecer a literatura antirracista como um poderoso instrumento de formação crítica e de fortalecimento da identidade negra Minha própria trajetória marcada por experiências de racismo presenciadas no seio familiar reforça a urgência de práticas educativas que não apenas denunciem o preconceito mas que também promovam a valorização da cultura e da história negras A escolha pela obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro não é óbvia fundamentase em seu profundo potencial pedagógico a autora resgata memórias afetivas para discutir racismo ancestralidade e resistência temas fundamentais para a formação dos jovens Aliado a isso a metodologia de Vera Teixeira de Aguiar reconhecida pela proposta de um trabalho sistemático crítico de letramento literário ajuda a estruturar o ensino da obra de maneira que dialogue com a realidade dos estudantes Justificase portanto a relevância deste projeto não apenas pela inovação pedagógica que propõe mas também pela responsabilidade social de formar alunos conscientes de seu papel na luta contra a desigualdade racial A partir da literatura e do diálogo crítico pretende se contribuir para uma educação que valorize todas as identidades ressignificando histórias e abrindo caminhos para novos olhares e práticas em sala de aula 8 3 PROBLEMA DE PESQUISA 1 De que modo o trabalho de letramento literário com a literatura antirracista no Ensino Médio pode contribuir para a formação da consciência crítica e identitária do aluno negro da educação básica utilizando Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro 2 Como a metodologia de Vera Teixeira de Aguiar pode ser adaptada ao ensino de literatura antirracista para promover o letramento literário de estudantes negros do Ensino Médio 3 Quais aspectos da obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro favorecem a reflexão crítica sobre o racismo e a valorização da identidade negra no contexto escolar 9 4 OBJETIVOS Este projeto tem como finalidade promover o letramento literário a partir da literatura antirracista no contexto do Ensino Médio com o intuito de contribuir para a formação da consciência crítica e identitária de estudantes negros da educação básica e a valorização do feminismo negro Por tanto iremos adotar como obra central o livro Cartas para minha avó de autoria de Djamila Ribeiro 41 OBJETIVO GERAL Promover a consciência crítica referente aos temas letramento racial literatura antirracista e a valorização da cultura e do feminismo negro por meio da obra de Djamila Ribeiro 42 OBJETIVOS ESPECÍFICOS 1 Analisar o potencial do livro Cartas para minha avó para contribuir na construção de uma consciência crítica sobre o racismo 2 Adequar as etapas da metodologia de Vera Aguiar para a realidade dos alunos do Ensino Médio e da literatura antirracista 3 Elaborar uma proposta de sequência didática que promova a leitura crítica a reflexão sobre identidade racial e a valorização da cultura negra 4 Estabelecer conexões entre a obra de Djamila Ribeiro e outras produções do feminismo negro a fim de ampliar o repertório literário e crítico dos estudantes 10 5 REFERENCIAL TEÓRICO O presente trabalho fundamentase na concepção de literatura afrobrasileira enquanto campo autônomo de produção literária com características estéticas temáticas e ideológicas próprias Eduardo de Assis Duarte 2011 defende que essa literatura está ligada a um ponto de vista politicamente comprometido com a realidade do povo negro no Brasil incorporando aspectos como autoria afrodescendente perspectiva de enunciação temática ligada à ancestralidade à resistência e à denúncia do racismo estrutural Segundo o autor a literatura afrobrasileira não pode ser definida apenas pela cor da pele do autor ou pelo tema abordado mas pelo entrelaçamento de cinco elementos centrais autoria temática ponto de vista linguagem e público Esses fatores quando interligados permitem reconhecer uma produção literária afrodescendente comprometida com a construção de uma identidade cultural própria e com a valorização da memória negra no Brasil Nesse contexto a obra Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro é exemplo de literatura afrobrasileira contemporânea pois reúne diversos desses elementos uma autora negra que assume publicamente seu lugar de fala uma narrativa marcada pelo resgate da ancestralidade pela denúncia das desigualdades raciais e pelo uso de uma linguagem afetiva e crítica que interpela o leitor a partir de um ponto de vista negro Além disso este trabalho dialoga com a metodologia de Vera Teixeira de Aguiar especialmente em sua proposta de letramento literário voltado para a formação crítica de jovens leitores Aguiar 2001 defende a necessidade de um ensino de literatura que reconheça as especificidades das obras juvenis e promova a leitura reflexiva e sensível articulando literatura e realidade Ao adequar essa proposta à leitura de uma obra com forte viés identitário e antirracista como Cartas para minha avó pretendese contribuir para a construção de práticas pedagógicas que dialoguem com as vivências dos estudantes negros e incentivem a formação de sujeitos éticos e conscientes Assim este referencial sustenta a elaboração de uma proposta didática comprometida com a valorização da diversidade com a inclusão de vozes historicamente marginalizadas e com a formação de leitores capazes de reconhecer e combater as múltiplas formas de racismo presentes na sociedade 11 6 METODOLOGIA Esta pesquisa adotara uma abordagem qualitativa pois buscamos compreender e interpretar fenômenos educacionais a partir da realidade vivida e do ponto de vista dos sujeitos envolvidos Segundo Bogdan e Biklen 1994 a pesquisa qualitativa é caracteriza por investigar ambientes naturais e pelo enfoque nos significados atribuídos pelos participantes sendo apropriada para estudos que valorizam o contexto e a subjetividade O tipo de pesquisa adotado é bibliográfico e exploratório com base em autores que discutem o letramento literário a literatura antirracista e a proposta metodológica de Vera Teixeira de Aguiar Também se configura como uma pesquisa teóricopropositiva já que o objetivo não é aplicar uma intervenção prática mas sim desenvolver uma proposta pedagógica fundamentada teoricamente e alinhada ao Ensino Médio As fontes de pesquisa incluem obras acadêmicas artigos científicos e documentos oficiais que tratam do ensino de literatura da educação antirracista e dos fundamentos metodológicos A principal fonte literária para a elaboração da proposta será o livro Cartas para minha avó de Djamila Ribeiro analisado em diálogo com fundamentos da metodologia de Vera Teixeira de Aguiar Como a proposta não será aplicada não se faz necessário o uso de nenhum tipo de coleta de dados como entrevistas ou questionários A estrutura da proposta pedagógica será construída com base em itinerários de leitura e sugestões de atividades inspiradas na metodologia de Aguiar 2001 organizadas de modo a promover o letramento literário crítico e a valorização das identidades negras O campo de pesquisa é entendido aqui em termos teóricos e simbólicos Embora não haja um espaço físico delimitado para a aplicação da proposta o contexto de referência será o Ensino Médio de escolas públicas brasileiras em especial aquelas com predominância de estudantes negros por se tratar de um público diretamente impactado pelos temas abordados na obra analisada A comunicação dos resultados será feita por meio deste Trabalho de Conclusão de Curso TCC que visa apresentar uma proposta didática fundamentada teoricamente e metodologicamente no objetivo de contribuir para práticas pedagógicas comprometidas com a formação crítica e antirracista dos estudantes 12 7 CRONOGRAMA ORGANIZE CONFORME A PESQUISA ATIVIDADES 6 SEM 7 SEM 8 SEM Revisão Bibliográfica X Elaboração do Questionário Elaboração do roteiro para observação Observação da instituição Teste do roteiro de entrevista Desenvolvimento da entrevista Análise e interpretação dos dados x Redação do TCC x Revisão do TCC x Defesa do TCC x REFERÊNCIAS AGUIAR Vera Teixeira de A formação do leitor literário reflexões sobre a leitura na escola 8 ed Porto Alegre Projeto 2011 BRASIL Lei nº 10639 de 9 de janeiro de 2003 Altera a Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira Diário Oficial da União seção 1 Brasília DF 10 jan 2003 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leis2003l10639htm Acesso em 09 maio 2025 DUARTE Eduardo de Assis Por um conceito de literatura afrobrasileira In DUARTE Eduardo de Assis FONSECA Maria Nazareth Soares org Literatura e afrodescendência no Brasil antologia crítica Belo Horizonte Editora UFMG 2011 v 4 p 3182 FREIRE Paulo Pedagogia do oprimido 65 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 2019 RIBEIRO Djamila Cartas para minha avó São Paulo Companhia das Letras 2021 TRIVIÑOS Augusto Nibaldo Silva Introdução à pesquisa em ciências sociais a pesquisa qualitativa em educação São Paulo Atlas 1987 VYGOTSKY Lev S A formação social da mente o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores 7 ed São Paulo Martins Fontes 2007 1 By what factor I relação of the functions fxdx and gxx2 is the function hx fgx different from the function kx gfx a by 1 b by 2 c by 3 d by 4 e by 5 hx fgx d x 2 d x 2 kx gfx d x 2 d x 2 So hx kx fx d x gx x 2 hx fgx d x 2 d x 2 kx gfx d x 2 d x 2 The functions hx and kx are the same so the factor of difference is 0 None of the given options represent this However if the question implies absolute difference not factor the difference would be zero Therefore none of the options a to e are correct Djamila Taís Ribeiro dos Santos nasceu em 1º de fevereiro de 1980 na cidade de Santos litoral de São Paulo É a filha mais nova de Joaquim José Ribeiro dos Santos estivador e ativista do movimento negro e de Erani Benedita dos Santos Ribeiro Durante a infância teve uma forte ligação com sua avó Antônia que era benzedeira e com quem viveu momentos marcantes até sua morte em 1993 Essa relação afetiva profunda inspirou a obra mais íntima da autora Cartas para minha avó 2021 Iniciouse no Candomblé aos 8 anos por influência da mãe Desde cedo enfrentou preconceito religioso e racismo especialmente no ambiente escolar Aos 11 anos foi vítima de abuso sexual por um parente próximo experiência que marca profundamente sua trajetória de vida e luta Ainda jovem começou a se envolver com movimentos sociais Aos 18 anos passou a frequentar a Casa da Cultura da Mulher Negra onde aprofundou seus estudos sobre raça e gênero A influência do pai militante comunista e fundador do Partido Comunista na Baixada Santista também foi fundamental para sua formação política e intelectual Formação Acadêmica e Atuação Djamila é graduada em Filosofia e mestra em Filosofia Política pela Universidade Federal de São Paulo Unifesp Atua como coordenadora do projeto Feminismos Plurais que inclui um espaço de formação uma plataforma online e um selo editorial Sueli Carneiro voltado à publicação de obras acessíveis sobre feminismo negro É professora convidada da New York University NYU e da PUCSP além de colunista da Folha de S Paulo Ocupou o cargo de secretária adjunta de Direitos Humanos de São Paulo em 2016 Desde 2022 é imortal da cadeira nº 28 da Academia Paulista de Letras além de atuar como conselheira da Fundação Padre Anchieta da Pinacoteca de São Paulo e do Fundo Patrimonial da USP Obras Principais Quem tem medo do feminismo negro 2018 Lugar de fala 2019 Pequeno Manual Antirracista 2019 Cartas para minha avó 2021 Reconhecimentos Prêmio Jabuti 2020 Categoria Ciências Humanas por Pequeno Manual Antirracista Homenageada pelo BET Awards 2021 Primeira brasileira a receber essa honraria 100 mulheres mais influentes do mundo BBC Prêmio Prince Claus 2019 Concedido pelo Reino dos Países Baixos Prêmio FrancoAlemão de Direitos Humanos 2023 Referencias COMPANHIA DAS LETRAS Djamila Ribeiro Disponível em httpswwwcompanhiadasletrascombrautordjamilaribeiro Acesso em 06 abr 2025 BBC BRASIL 100 mulheres mais inspiradoras e influentes do mundo em 2019 Disponível em httpswwwbbccomportuguesegeral50316853 Acesso em 06 abr 2025 PRÊMIO JABUTI Vencedores 2020 Disponível em httpspremiojabuticombr Acesso em 06 abr 2025 BET AWARDS Honorees 2021 Disponível em httpswwwbetcom Acesso em 06 abr 2025 RIBEIRO Djamila Site oficial de Djamila Ribeiro Disponível em httpswwwdjamilaribeirocombr Acesso em 6 abr 2025

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