·
Serviço Social ·
Filosofia
Send your question to AI and receive an answer instantly
Recommended for you
4
Fichamento-Teoria-Marxista-do-Valor-Alfredo-Saad
Filosofia
UFPB
44
O Nacional e o Popular na Música Brasileira: Análise e Referências
Filosofia
UFPB
2
Normas ABNT Resenha Acadêmica - Formatação Detalhada e Guia Completo
Filosofia
UFPB
3
Guia Completo Normas de Formatação ABNT para Resenhas Acadêmicas
Filosofia
UFPB
130
Economia Política: uma introdução crítica
Filosofia
UFPB
3
Jane Adams e Mary Richmond: Pensamento, Influências e Serviço Social Brasileiro
Filosofia
UFPB
2
Estudo Dirigido Marx e Engels - Análise do Manifesto Comunista
Filosofia
UFPB
4
Hedonismo-Prazeres-e-o-Sentido-da-Vida-Reflexoes
Filosofia
UFPB
2
Prova Marxismo Mais-Valia e Trabalho - NETO Braz e SAAD Filho
Filosofia
UFPB
4
Fichamento Economia Politica Netto e Braz Imperialismo - Análise Crítica
Filosofia
UFPB
Preview text
Dante Moreira Leite e a Crítica à Ideologia do Caráter Nacional Brasileiro Aléxia Pádua Franco João Carlos da Silva e Maria Cristina Pina O homem não tem natureza tem apenas história Evaldo Cabral de Mello Dante Moreira Leite 19271976 formado em filosofia pela USP e professor do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho nesta mesma instituição realizou pesquisas cujo tema central foi a questão das diferenças dos preconceitos e estereótipos disseminados pela cultural letrada Suas investigações voltadas mais para a área da psicologia têm caráter interdisciplinar ao dialogar com a antropologia e sociologia em busca de uma abordagem cultural e social para questões psicológicas e individuais e com a literatura procurando interligar razão e sensibilidade O livro O caráter nacional brasileiro história de uma ideologia é resultado de sua tese de doutorado defendida em 1954 na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP e reescrita em 1968 para publicação Nele é feita uma discussão sobre a ideologia do caráter nacional brasileiro a partir do percurso histórico das idéias produzidas sobre o Brasil pela cultura letrada desde a chegada dos portugueses no século XVI até meados do século XX Assim Dante Moreira Leite elabora uma análise crítica dos estereótipos e ideologias presentes nos escritos clássicos sobre o Brasil de Pero Vaz de Caminha até autores contemporâneos seus com a intenção de mapear as raízes e características desse caráter nacional e suas implicações Antes porém na primeira parte do livro o autor discute as diferentes formulações do caráter nacional de um país elaboradas pela cultura letrada européia França Alemanha e norteamericana a qual influenciou os escritos sobre o Brasil Através destas análises Dante Moreira Leite demonstra as contradições e a fragilidade das formulações sobre o caráter nacional que apresentam os aspectos psicológicos de um povo sem relacionálos com fatores econômicos políticos e sociais que neles interferem Denuncia também a tentativa de generalizar características particulares de um grupo ou classe de uma épocalocal específicos como se fossem de toda uma nação e a criação de preconceitos ao estrangeiro que justifica a continuidade do desprezo e dominação de uma classe ou povo sobre outro Em suma Leite procura mostrar como as formulações do caráter nacional são pseudocientíficas e constituem ideologias conservadoras ou burguesas que deformam a realidade no intuito de fortalecer e manter o status quo Segundo Bosi 1983 p XXIV as reflexões de Dante Moreira Leite fazemnos pensar se há um caráter nacional ou apenas formas históricas e mutáveis de aculturação diferentes para cada classe social ou para cada grupo etário Na sua luta contra o racismo contra os nacionalismos de direita ainda remanescentes da II Guerra Mundial e contra as justificativas de dominação de um povo sobre outro próprias do imperialismo Leite defende a segunda alternativa apoiandose na psicanálise de Freud e no marxismo Em Marx Leite identificase com a preocupação com os aspectos sócioeconômicos que interferem nos traços psicológicos e culturais de um povo e com a abordagem que visa estudar mais o caráter de classe do que de nação ou seja que enfoca as lutas de classe dentro de uma sociedade e não a questão da homogeneidade nacional Por outro lado em Freud o autor encontra o pressuposto de que para além das pretensas personalidades nacionais há um gênero humano geral uma unidade biopsíquica criada na tensão entre o desejo id e a censura deste pelas instituições sociais superego Antes de fazer as análises críticas mais específicas sobre as formulações do caráter nacional brasileiro e até para norteálas Dante Moreira Leite faz uma contextualização da origem do sentimento nacionalista na história européia observando suas diferenças e semelhanças com outros sentimentos como a xenofobia e xenofilia etnocentrismo e racismo que também envolvem a relação entre conhecidos e interferem na relação do conhecido com o estranho Inicialmente ele observa como os contatos entre o conhecido e o estranho geram sentimentos ambivalentes A reação ao estranho pode envolver tanto o medo desconfiança preconceito rejeição xenofobia quanto à curiosidade desejo de descobrir e conquistar A reação ao conhecido pode ser de prazer conforto harmonia ou tédio desinteresse desprezo xenofilia Além disso tais contatos que existem deste a Grécia Antiga e são cada vez mais freqüentes entre diferentes culturas fenômeno que Leite denomina de cosmopolitismo podem ser construtivos quando muitas civilizações desenvolvemse após o contato com outros costumes estimuladas pela diversidade e antagonismo ou destrutivos quando um grupo destrói a cultura do outro como os europeus fizeram com os indígenas Outro conceito trabalhado por Dante Moreira Leite é o de etnocentrismo que representa o costume de colocarmos o grupo a que fazemos parte como o centro de tudo superior aos outros Apresenta a posição de Summer que o liga aos sentimentos de patriotismo no qual as massas opõemse a universalidade autoafirmamse enquanto grupo e de chauvinismo que é o patriotismo com violência desencadeando no autoritarismo Leite discorda de Summer pois para ele não há uma ligação natural entre etnocentrismo e patriotismo sentimento nacionalista enquanto o segundo é em relação a um país que não tem costumes homogêneos o primeiro ocorre em grupos menores com costumes homogêneos Além disso para Leite o sentimento nacionalista não é espontâneo das massas mas sim imposto pelos grupos dominantes Por último Dante Moreira Leite examina as diferenças e semelhanças entre o racismo e o nacionalismo Enquanto o primeiro justifica a desigualdade por questões biológicas naturais e existe dentro de uma nação para justificar divisão de classescastas o segundo justifica hierarquias entre nações e tem um conteúdo histórico cultural e político No entanto o racismo aproximase do nacionalismo quando é utilizado para justificar o domínio de um povo sobre outro como ocorreu no expansionismo colonial O darwinismo social que argumenta cientificamente que a evolução da humanidade dáse pela dominação e até destruição das raças menos capazes por raças superiores foi inclusive utilizado no final do século XIX e início do XX para mascarar a contradição entre imperialismo e interesses democráticos e liberais Após conceituar todos estes sentimentos Leite contextualiza a origem do sentimento nacionalista o qual originouse de diferentes formas conforme país e época fortalecendose a partir de fins do século XVIII com consolidação dos Estados Nacionais estados modernos Em Portugal antes do século XVIII já existia um nacionalismo nãodominante o qual pode ser observado em Os Lusíadas 1572 de Camões quando este comparava Portugal com outras terras Na França este sentimento surge com a Revolução Francesa em 1789 ao defender um governo escolhido pelo povo e não de origem divina Em várias outras regiões do continente europeu como a Alemanha o nacionalismo desenvolveuse a partir das Guerras Napoleônicas no início do século XIX quando a invasão dos exércitos de Napoleão Bonaparte imperialismo francês estimulava o sentimento nacionalista nas regiões invadidas Na América o nacionalismo começa a se desenvolver com os movimentos de emancipação das colônias via importação das idéias liberaisnacionalistas da Europa Aí são construídos mitos e símbolos como bandeira hino heróis nacionais datas cívicas para fortalecer o sentimento nacionalista1 Segundo Leite na história do sentimento nacionalista houve o desenvolvimento tanto do nacionalismo doentio e expansionista que destrói outros povos como o nazismo quanto do nacionalismo saudável reivindicatório que se defende do imperialismo de outros povos como o nacionalismo sulamericano No geral a origem do nacionalismo entre um povo caracterizase pela exaltação das suas qualidades que para terem sua grandeza afirmada são comparadas com outros povos que 1 José Murilo de Carvalho em A formação das almas o imaginário da república no Brasil São Paulo Companhia das Letras 1990 discute como isto ocorre no Brasil republicano são colocados como inferiores Tal sentimento nasce nas classes mais ilustradas e é imposto pelos grupos dominantes às outras classes através da educação dos meios de comunicação Um exemplo disto no Brasil é a Reforma Capanema para o ensino secundário que vigorou de 1942 a 1961 época do nacionaldesenvolvimentismo no Brasil e que contem um artigo que defende que o ensino secundário se destina à preparação dos homens que deverão assumir responsabilidades maiores dentro da sociedade e da nação portadores das concepções e atitudes espirituais que é preciso infundir nas massas e outro que ressalta o cuidado especial na Educação Moral e Cívica de seus alunos buscando neles formar como base do patriotismo a compreensão da continuidade histórica do povo brasileiro de seus problemas e desígnios de sua missão em meio aos povos grifo nosso Assim o nacionalismo pode se entendido em suas origens como uma ideologia burguesa que pretende unir o povo acabar com privilégios da nobreza e do clero para beneficiar o comércio e urbanização Isto é o nacionalismo cria a união nacional e esta fortalece a união econômica Além de o sentimento nacionalista ter sido influenciado pela Revolução Francesa pensamento iluminista contra poder divino do rei e a favor de governo eleito pelo povo sintetizado por Condorcet a forma atual de caráter nacional decorre do romantismo alemão que tem Herder como um de seus representantes O iluminismo francês representa a origem política do nacionalismo Valoriza a razão e acredita na evolução linear do espírito humano em cujo processo todos os homens e nações têm igual contribuição Assim defende que as artificiais diferenças entre as nações devem ser eliminadas Não há a preocupação em exaltar as particularidades nacionais pois no século XVIII a França era forte e hegemônica não precisando provar sua unidade pois já era bem conhecida pela Europa Já o romantismo alemão significa a origem estética do nacionalismo Valoriza o sentimento e a intuição e acredita que cada povonação tem uma peculiaridade histórica um desenvolvimento autônomo Assim acentua as peculiaridades individuais regionais e nacionais procurando fortalecer a língua nacional e ressaltando a cultura e tradição popular No entanto não há o interesse em colocar uma nação como superior a outra ao contrário da explicação racista de caráter nacional que se desenvolve mais tarde no final do século XIX e início do XX A necessidade de destacar o valor das peculiaridades da nação tinha relação com o fato da Alemanha ao contrário da França estar fragmentada precisando criar um espírito nacional e provar a unidade alemã Hegel concilia estas duas tendências ao dizer que a história humana tem uma unidade a manifestação do espírito universal mas este se manifesta de forma diversa nas várias nações Após desenvolver esta caracterização geral do nacionalismo e suas origens Dante Moreira Leite historiciza o processo de reformulação do conceito de caráter nacional baseado em questões raciais e culturais entre os séculos XIX e XX por europeus como franceses e alemães e por norteamericanos que desenvolveram idéias que alimentam a cultura intelectual do Brasil A partir daí Leite começa a elaborar uma história literária da ideologia do caráter nacional brasileiro ou seja começa a analisar diferentes formulações do caráter nacional brasileiro através de obras literárias que tenham um conjunto de idéias sobre isto mais sistematizadas menos acidentais como as que aparecem em algumas músicas e poemas Para tanto o autor divide estas formulações em quatro fases destacando o que há de comum na caracterização nacional feita pelos diferentes autores examinados em cada época sem deixar de discutir suas diferenças FASE COLONIAL 15001822 que se refere à descoberta da terra e ao movimento nativista ROMANTISMO PÓSINDEPENDÊNCIA Brasil Império 18221880 que trata da independência política e da formação de uma imagem positiva do Brasil e dos brasileiros sofrendo influência do romantismo alemão e sendo marcada pela xenofobia REALISMO Brasil República 18801950 que cria uma imagem pessimista do brasileiro influenciada pelas teorias racistas e pela xenofilia Esta é a fase que realmente representa a formação da ideologia do caráter nacional brasileiro mas para ser entendida segundo ele precisa ser relacionada com períodos anteriores e posteriores a ela A DÉCADA DE 1950 quando ocorre o desenvolvimento econômico e a superação do caráter nacional brasileiro através de escritos mais preocupados com o caráter técnicocientífico e que criticam as teorias racistas os determinismos culturais ressaltando as influências sócio econômicas Neste texto apresentaremos apenas a análise do autor sobre as duas primeiras fases e alguns dos representantes da terceira Sílvio Romero Afonso Celso e Euclides da Cunha Porém antes de apresentar suas análises sobre cada uma destas fases Dante Moreira Leite discute os referenciais teóricometodológicos que utilizou para realizar suas investigações No exame das obras literárias que selecionou combina análises qualitativas e quantitativas para evitar tanto o subjetivismo da análise meramente qualitativa que pode ficar limitada às impressões do pesquisador quanto para superar a superficialidade da análise quantitativa Assim tabula os traços psicológicos dos brasileiros em cada autor investigado e depois faz uma análise de conteúdo procurando compreender os traços psicológicos que aparecem em cada autor as influências que recebeu de outros autores suas contradições Neste trabalho Leite baseiase em procedimentos recémintroduzidos nas ciências sociais do Brasil naquele momento por intelectuais que procuram desenvolver estudos científicos simpáticos às classes desprotegidas Isto é pretende garantir um estatuto científico dos saberes e seu uso democrático ético igualitário e solidário ao contrário do que ocorria na maior parte da cultura letrada predominante até os anos 50 a qual tinha vínculos estreitos com as classes dominantes É essa perspectiva que é criticada por Carlos Guilherme da Mota 1994 ao perceber no discurso de Dante Moreira Leite uma tentativa de construção de uma análise livre de ideologias pois científica construída por intelectuais formados nos rigores das ciências sociais desenvolvidas até então Mota aproxima essa análise da concepção de Mannheim sobre a missão dos intelectuais desvinculados das classes ou sem compromisso com as classes dominantes portanto mais propícia a um discurso sem vínculo ideológico Questiona nesse discurso a tentativa de através de um aparato científico fugir da ideologia o que classifica como Ideologia da Superação da Ideologia Porém é nesta perspectiva que Dante Moreira Leite procura construir um saber científico não dogmático mas diferenciando a ciência natural que pretende um conhecimento objetivo universal absoluto portanto inquestionável da ciência humana Nesta Leite acredita que ao invés da neutralidade há um enraizamento históricosocial da teoria pois seu objeto é dinâmico e não estático como o da ciência natural Segundo Dante Moreira Leite o pesquisador objetivo em certos domínios das ciências humanas é uma ficção Mesmo quando estudamos acontecimentos humanos já distantes no tempo e no espaço não ficamos neutros Se aceitamos estes princípios bem gerais compreendemos a existência não só de níveis diferentes de conhecimento nas ciências humanas mas de perspectivas diferentes p 179 Enfim para Leite as verdades das ciências humanas não podem ser universais atemporais No entanto não deixam de ser verdades pois representam teorias mais corretas para um determinado momento histórico para um determinado grupo Feitas estas observações mais gerais quanto aos referenciais teóricometodológicos que utiliza para analisar as formulações do caráter nacional brasileiro Dante Moreira Leite recorta o período colonial de Pero Vaz de Caminha até a Independência Aqui identifica traços significativos que marcaram e marcam o jeito de ser brasileiro ou melhor a idéia do que é ser brasileiro agrupando os autores em dois blocos os cronistasensaístas e os poetas Analisa brevemente as obras de Pero Vaz de Caminha Gandavo Gabriel Soares de Souza Fernão Cardim Ambrósio Fernandes Brandão Frei Vicente de Salvador Sebastião da Rocha Pita e as poesias de Bento Teixeira Manuel Botelho de Oliveira Manuel de Santa Maria Itaparica e Gregório de Matos Frei José de Santa Rita Durão Cláudio Manoel da Costa José Basílio da Gama Inácio José de Alvarenga Peixoto Domingos Caldas Barbosa Uma observação inicial que o autor faz é que essas obras embora produzidas nos século XVI e XVII em sua maioria só foram publicadas e divulgadas em maior escala no século XIX com o crescimento do acesso ao ensino e aos livros Isso significa segundo ele que podemos analisar o papel delas na consolidação de uma idéia de nação tão própria do dezenove brasileiro Sem desconsiderar as especificidades das obras Dante Moreira Leite destaca alguns aspectos em comum que perpassam a todas a admiração pela natureza tropical o interesse pela vida do indígena o desejo de ver o progresso do país a crítica ao governo da metrópole e a alguns comportamentos considerados característicos dos colonos p 203 Esses traços vão influenciar também a produção do romantismo no século XIX que retoma em graus variados principalmente as marcas do nativismo A poesia vai destacar mais intensamente esse nativismo principalmente as produções do século XVIII mas ele destaca a presença de Gregório de Matos com uma poesia marcada pela crítica à vida social além da celebração da natureza feita pelos nativistas2 No século XIX pósindependência as produções literárias vão marcar o movimento denominado romantismo No Brasil segundo o autor esse movimento vai adquirir especificidades para além das semelhanças com o movimento europeu É o contexto dos movimentos de formação nacional da manifestação do nacionalismo e ao mesmo tempo do desenvolvimento do individualismo e da vida familiar da educação da expansão do liberalismo econômico Segundo Dante Moreira Leite no Brasil o romantismo foi marcado em linhas gerais pelo ambiente de entusiasmo pela vida nacional de confiança no futuro do jovem país de celebração de sua natureza de elogios à inspiração de seus jovens poetas p 219 Esta caracterização mostra como é falsa a ruptura desses escritores com seus antecedentes do período colonial de quem mantiveram o sentimento nativista e admiração pela natureza 2 É bom destacar aqui a crítica feita por Alfredo Bosi 1992 do pensamento de Gregório de Matos localizandoo enquanto um monarquista que não se conforma com o desenvolvimento da vida mercantil e a perda dos privilégios de sua classe Bem diferente da visão geral que se divulgou desse poeta a qual Dante Moreira Leite reproduz em sua obra Também aqui ele vai analisar poetas e romancistas identificando o que há de comum entre eles e em que medida produziram elementos do caráter nacional Alguns autores são privilegiados na análise José Bonifácio Gonçalves Dias José de Alencar e Castro Alves No geral o romantismo brasileiro é caracterizado pela produção de elementos ideológicos tendo como base três dimensões a exaltação da natureza o indianismo e o idioma nacional Esses poetas e escritores foram responsáveis pela produção da imagem do nacional recorrendo para isso à junção da natureza ao homem brasileiro num movimento de celebração da natureza tropical e do indígena Aqui o autor faz uma crítica ao caráter ideológico do indianismo principalmente a partir de José de Alencar cuja obra reunia a opção pelo mítico e o distante passado construído e não relacionado ao processo de colonização O índio cantado em verso e prosa é a encarnação da passado medieval não vivido pelo Brasil é o exótico que não ameaça a ordem vigente principalmente a escravidão e a situação de miséria por que passavam os indígenas no século XIX o índio real Por isso o autor destaca o caráter ideológico desse movimento Outro aspecto que vai compor essa ideologia é a defesa de uma língua nacional como parte da especificidade nacional brasileira Daí Dante Moreira Leite conclui que coube ao romantismo a produção de símbolos que marcaram o nacionalismo brasileiro Já nos finais do dezenove alguns poetas românticos vão começar a tocar na questão da escravidão e sua abolição No geral esse movimento desconsidera a questão não fazendo qualquer referência Castro Alves é o poeta que melhor exemplifica essa mudança de atitude com uma produção crítica e denunciando os maus tratos vividos pelos negros no Brasil Essa crítica segundo Dante M Leite vai ser melhor desenvolvida com a geração que se segue caracterizada como realistas Esses realistas mudam no sentido de tratar de questões sociais de abandonar temas exóticos míticos Para iniciar a caracterização desse movimento o autor escolhe analisar a obra de Sílvio Romero que segundo ele teve um papel importante ao influenciar gerações futuras que pensaram o Brasil3 A partir de 1870 percebese uma intensificação no desenvolvimento e divulgação do conhecimento científico marcado pelas produções positivistas No Brasil é o momento de início efetivo da transição do trabalho escravo para o trabalho livre o início do desenvolvimento da industrialização e a intensificação dos problemas sociais com a urbanização crescente e a imigração Nesse contexto vai viver Sílvio Romero O autor constrói uma imagem intrigante e ambígua de Silvio Romero caracterizado como um intelectual com limites de formação porém com potencialidades impressionantes para pensar o Brasil Formado em Direito em Recife viveu alguns anos no Rio de Janeiro 3 Vários escritores vão ser influenciados pelas idéias de Sílvio Romero Podemos citar alguns Euclides da Cunha Oliveira Viana Gilberto Freyre participou ativamente do seu tempo segunda metade do século XIX 18511914 Presenciou o avanço da ciência e a divulgação do evolucionismo de Darwin que marcou profundamente os autores que o influenciaram Rénan Taine Max Muller Scherer Gobineau além de Conte Buckle Spencer e o próprio Darwin entre outros Conforme Dante Moreira Leite esses autores foram lidos por Romero muitas vezes de forma ambígua e incoerente o que se justifica pelo pouco e circunstancial acesso a essas leituras Além disso Romero tentou interpretar o Brasil a luz desses autores porém buscando uma especificidade Sua concepção sustentase na determinação dos critérios físicos e biológicos o meio e a raça Aqui está a primeira contradição explicar a inserção do Brasil na civilização européia embora admitindo sua formação a partir de raças inferiores Essa concepção leva à interpretação do inevitável domínio da raça branca pois sendo superior às outras naturalmente sobressairia Outro aspecto que vai destacar na interpretação de Romero é sua crítica ao romantismo aqui também paradoxal Ao mesmo tempo em que nega o desenvolvimento autônomo do país pregado pelos românticos procura a característica nacional dos autores brasileiros seu valor Faz isso a partir da valorização de uma cultura mestiça com predomínio do branco diferente dos românticos que escolhem o índio como modelo nacional A história do Brasil é explicada por Romero a partir de cinco fatores o português o negro o índio o meio físico e a imitação estrangeira Não aceita totalmente a determinação do clima para explicar o atraso nacional mas muitas vezes admite algumas características do brasileiro como resultantes dos fatores naturais ou primários Como fatores secundários nessa explicação apresenta os étnicos a formação do Brasil a partir das três raças produziu uma subraça mestiça original com o predomínio da raça branca Defende o processo natural de branqueamento com o predomínio da raça superior embora muitas vezes defenda a necessidade da imigração européia para evitar a degeneração total Essa mistura entre raças para Romero atinge também as idéias e sentimentos Dante apresenta a análise feita por Sílvio Romero marcadamente positivista o negro estaria na fase teológica do fetichismo o índio na astrolatria e o português na monoteísta com resquício do politeísmo Isso explica segundo ele a falta de unidade nas tradições brasileiras e na nossa literatura Outra dimensão de explicação do Brasil é a econômica Aqui Dante identifica outra contradição de Romero Ao explicar o processo colonial recorre aos aspectos econômicos desconsiderando as determinações de clima e raça levantados em outros momentos Sua história da literatura acompanha as fases econômicas brasileiras No geral a crítica feita a Sílvio Romero em O caráter nacional brasileiro sustentase na constante contradição teórica e pessoal que viveu este autor desejoso de aplicar as teorias racistas à realidade brasileira embora esta mesma realidade negasse essas teorias e ao mesmo tempo esperançoso de igualar o Brasil com as grandes potências mundiais Inglaterra Alemanha França e Estados Unidos Assim de um lado reforça o caráter apático sem iniciativa do brasileiro e critica sua imitação ao estrangeiro por outro lado prega o exemplo a ser seguido dos anglogermânicos Seu nacionalismo é cheio de incongruências e Dante Moreira Leite o classifica como um realista pessimista que ao contrário de Machado de Assis não foi capaz de universalizar seu pensamento permanecendo provinciano Afirma ser ele um revoltado capaz de baterse contra valores aceitos mas incapaz de buscar valores substitutos a não ser pela invocação de uma autoridade intelectual superior ou de uma raça melhor p 254 Este último aspecto marcou fortemente sua caracterização psicológica do brasileiro e vai influenciar gerações posteriores de autores que pensaram o Brasil como Euclides da Cunha cuja obra Dante analisará após examinar os escritos de Afonso Celso no livro Porque me Ufano do Meu país 1900 o qual apresenta uma visão otimista e ingênua do Brasil4 destoando deste contexto de realismo pessimista Afonso Celso defende ser preciso desenvolver desde a tenra idade a educação moral das crianças construindo um amor à pátria justificado em sua importância Assim voltado apenas para a realidade de sua classe social mais rica e moradora da região litorânea do Brasil colocase contrário às posições pessimistas e pejorativas em relação à nacionalidade brasileira Ser brasileiro segundo ele deve ser motivo de orgulho pois apesar das contradições sociais nenhum país era constituído de tantas vantagens como o Brasil muitas vezes invejado por outras nações O autor enumera então onze motivos da superioridade do Brasil grandeza territorial beleza riqueza do país variedade e amenidade do clima ausência de calamidades naturais excelência dos elementos que entraram na formação do tipo nacional nobres predicados do caráter nacional o Brasil nunca sofreu humilhações nunca foi vencido procedimento cavalheiresco e digno com os outros povos as glórias a colher no Brasil a história do Brasil p 258 Neste sentido ele reforça as interpretações nativistas e românticas elaboradas desde a colônia exalta personalidades do período monárquico como D Pedro II e a Princesa Isabel e enaltece as qualidades do índio negro e do branco raças formadoras de nosso país Destaca 4 No curso de Graduação em Filosofia realizado na Universidade Estadual de São Paulo USP Dante Moreira Leite ao desenvolver uma pesquisa sobre os preconceitos e valores de patriotismo divulgados nas obras didáticas primárias já havia analisado estas idéias de Afonso Celso que muito influenciaram os livros de Educação Moral e Cívica ainda as qualidades do homem brasileiro que reforçam a superioridade do Brasil sentimento de independência hospitalidade afeição à ordem paz melhoramento paciência e resignação doçura longaminidade e desinteresse escrúpulo no cumprimento das obrigações contraídas caridade acessibilidade tolerância ausência de preconceito honradez pública e particular p 264 Também levanta alguns aspectos que considera defeitos do brasileiro falta de iniciativa decisão e firmeza os quais significam desvios de conduta gerados principalmente pela escravidão que a educação tinha a tarefa de corrigir Enfim utilizando o critério da comparação entre o Brasil e os países europeus escolhidos pela sua história secular Afonso Celso sustenta uma visão otimista do caráter nacional brasileiro a qual será abalada por Euclides da Cunha no livro Os Sertões de 1902 O livro de Euclides da Cunha surge a partir de uma reportagem jornalística da última fase da revolta de Canudos e ao descrever a revolta e suas causas revela uma realidade ainda pouco conhecida do Brasil uma nova maneira de interpretar a situação nacional expressando um realismo muitas vezes assustador Dante Moreira Leite analisa o conteúdo ideológico do livro o qual segundo ele tenta formular uma filosofia da história brasileira ao procurar entender como um doente mental Antônio Conselheiro mobilizou milhares de pessoas que enfrentarem vários sacrifícios inclusive quatro expedições do exército nacional Ao fazer isto Euclides da Cunha ultrapassa os limites de uma interpretação política republicanista contra um movimento de resistência monarquista e transformase em uma visão social e histórica da realidade nacional Euclides da Cunha seguindo a tradição de Silvio Romero tenta escrever um livro de ciência partindo do pressuposto de que um país se explica pelas relações entre raça e meio geográfico Assim Os Sertões descreve de maneira dramática a terra semideserto no interior do nordeste brasileiro o homem mestiçagem embaralhada de 03 raças índio negro português e a luta embate entre os fanáticos de Canudos e as tropas do governo No entanto como duas das raças que formam o povo brasileiro negros e portugueses estão fora de seu habitat encontra dificuldades para usar coerentemente a teoria evolucionista de Darwin que o influencia e segundo a qual baseada em estudos feitos na Europa o meio determina a raça Surge então uma contradição nas análises de Euclides da Cunha Se por um lado conclui que não temos e nunca teremos uma unidade de raça por outro acredita podermos no futuro após fortalecermos nossa unidade nacional autônoma formar uma raça histórica Inverte assim o pensamento europeu se lá supunha que foram as raças que formaram a nação aqui é a nação que formaria a raça Em relação à nossa falta de unidade racial Euclides discute as diferenças entre o povo do litoral e do sertão No litoral temos o paulista que é a mestiçagem entre o índio e o colono e o mulato que é o cruzamento do branco com o negro que vinha ocorrendo desde Portugal Ambos caracterizamse pela fraqueza desequilíbrio instabilidade pois devido ao clima ameno do sul entraram em contato com civilizações superiores às quais tiveram que se adaptar sem conseguir acompanhálas ou absorvêlas No sertão temos os jagunços ou sertanejos que como descendentes dos paulistas que entraram para o interior do Brasil resultam do cruzamento do índio com o colono mas são mais fortes aventureiros e autônomos pois ficaram isolados pela adversidade do clima do semideserto não tendo que se adaptar a civilizações superiores Quanto à possibilidade de formação de uma raça nacional histórica Euclides da Cunha baseiase no sertanejo jagunço que em suas palavras simboliza a rocha viva da nacionalidade e representa uma nova constituição da raça brasileira no lugar do mestiço que muitas vezes expressa fragilidade e instabilidade de comportamento Enfim influenciado por Silvio Romero Euclides da Cunha é outro representante do realismo pessimista mas enquanto o primeiro defende o branqueamento do povo brasileiro através da imigração o segundo encontra a solução para a instabilidade e acomodação do mestiço povo brasileiro nos sertanejos e seu isolamento Dante Moreira Leite para revelar o caráter ideológico da teoria racial de Euclides da Cunha discute os seus equívocos O primeiro foi o de basearse na teoria que defende que o clima influencia na configuração da raça e ao mesmo tempo acreditar que o sertanejo descendente do paulista formado no sul mantém as suas características primitivas Como isto é possível se o clima do sertão onde vive o sertanejo é tão diferente do clima do sul onde surgiu o paulista Isso ocorreria mais por questões sociais que Euclides não comenta do que questões biológicas O segundo foi analisar o episódio de Canudos segundo o darwinismo social que argumenta que a evolução humana se dá pelo choque de raças em diferentes estágios Isto conduz a idéia apresentada no início de Os sertões de que os sertanejos eram raças inferiores que seriam esmagadas pelas raças superiores exército nacional Idéia que se contradiz com sua defesa posterior de que os sertanejos simbolizariam a rocha viva da nacionalidade representando a futura raça histórica brasileira Como os sertanejos seriam a base de nossa futura raça se eles estavam fadados a serem destruídos por raças superiores A obra de Euclides da Cunha é um exemplo da literatura regionalista no pré modernismo que apesar de destacar os tipos característicos de uma região acaba construindo uma ideologia do caráter nacional brasileiro ao ver uma região como mais característica do Brasil do que outra no caso de Euclides opõese a região litorânea vista como frágil e decadente à região sertaneja onde estaria o brasileiro autêntico Como ele muitos outros escritores regionalistas valorizaram a figura do caipira constituindo a literatura sertaneja Afonso Arinos Minas Gerais Valdomiro Silveira e Cornélio Pires São Paulo João Simões Lopes Neto e Alcides Maia Rio Grande do Sul Hugo de Carvalho Ramos Goiás Catulo da Paixão Cearense Ceará Monteiro Lobato surge como uma voz destoante que ao descrever o caipira de São Paulo ao invés de celebrálo faz uma crítica severa a ele e ao seu culto construindo uma imagem negativa do caipira através do Jeca Tatu indiferente aos grandes acontecimentos nacionais incapaz de trabalho organizado incapaz de montar e manter uma habitação decente incapaz de sentimento de pátria mas cheio de crendices e de uma religião inteiramente deformada repleta de fatalismo p 280 Enfim Dante Moreira Leite ao observar a fragilidade das ideologias do caráter nacional brasileiro e os preconceitos por ela disseminados como discutido anteriormente pretende criticar a idéia de que há um caráter nacional determinado por fatores raciais culturais ou religiosos que justifica o subdesenvolvimento do Brasil como se este fosse naturalmente inferior a outros povos Ao invés disso Leite defende que a dominação de um país pelo outro é um processo político econômico e social constituído historicamente pelos países capitalistas centrais e por isto pode ser modificado Neste sentido ele segundo Neves e Schmidt busca um conhecimento comprometido com a constituição de uma comunidade humana capaz de conviver tolerar e aprender com a diferença p 86 que rompa com os estereótipos e revele como o espírito humano se exprime de maneira particular e não uniformemente No entanto esta valorização da originalidade das pessoas e grupos não o leva a defender o isolamento das culturas o que causa a esterilidade cultural o comodismo e monotonia Para Leite o desenvolvimento de uma cultura específica é mais rico quando esta entra em contato com outras culturas o qual raramente é destrutivo e na maioria das vezes estimula a curiosidade e criação Enfim sugere a construção de um nacionalismo que não destrua as peculiaridades internas a nação e que conviva com outros nacionalismos sem relações hierárquicas ou xenófobas Infelizmente ao contrário deste ideal no cenário mundial desde o fim do século XX estamos experimentando o acirramento do nacionalismo destrutivo quando vivenciamos ataques terroristas a invasão dos EUA a países como Iraque entre outros exemplos Ainda hoje muitos materiais didáticos recémpublicados divulgam uma visão romântica da nossa identidade nacional ao destacar a integração o encontro pacificado entre diferentes culturas através de miscigenações sincretismos relações de confiança sem considerar os conflitos e confrontos envolvidos nesse processo Encontramos um exemplo disto em uma apostila adotada no programa de Alfabetização Solidária desenvolvido nos anos 90 pelo governo FHC5 Para se ensinar a letra P a apostila sugere trabalhar uma ilustração que mostra o asiático o índio o africano e o português lado a lado de braços dados com o mapa do Brasil ao fundo e o texto intitulado Povo Brasileiro Os indígenas que aqui viviam junto com os europeus africanos e asiáticos que imigraram para cá formaram o povo brasileiro Essa mistura de raças proporciona ao Brasil uma cultura rica dinâmica e variada A força dessa nossa gente trabalhadora é que mantém esse país e nos dá a esperança de um futuro melhor grifo nosso Este texto e imagem arquitetam o que Giroux 1993 p 567 denomina de pluralismo liberal brando ao buscar uma convivência pacífica entre as diferenças nivelandoas como se todas tivessem o mesmo valor social ignorando os conflitos e tensões gerando uma tolerância perversa e até legitimando as desigualdades sociais Criase uma sensação coletiva de familiaridade abolese o sentimento de adversidade e desenvolvese o de solidariedade reciprocidade entre todos que se imaginam fazendo parte de um mesmo grupo apesar das suas diferenças No entanto apesar desta permanência das visões xenófobas ou românticas do caráter nacional encontramos atualmente na educação escolar várias propostas que têm princípios semelhantes aos defendidos por Dante Moreira Leite Teóricos da pedagogia crítica como Giroux Peter McLaren Tomas Tadeu da Silva têm proposto uma educação multiculturalista Acreditam que a escola apesar de normalmente basearse no etnocentrismo cultural reproduzindo o racismo o sexismo e as desigualdades sociais cumprindo sua tradicional tarefa de homogeneização social e cultural pode desenvolver um processo educativo diferente voltado para as necessidades interesses e sensibilidades dos grupos subordinados e marginalizados Por ser um espaço de interação de homens e mulheres de migrantes de diversas regiões de diferentes faixas etárias grupos sociais raciais étnicos religiosos a escola pode resgatar e estudar criticamente suas formas heterogêneas de vida em múltiplos contextos históricos e culturais mostrando as relações sejam de aproximação ou conflito existentes entre eles Acreditam que assim os estudantes conseguirão apropriarse ativamente do conhecimento escolar descobrindo os sujeitos e vozes sociais que ele destaca ou silencia desmistificando a sua neutralidade questionando a hegemonia da cultura da classe social que controla os bens materiais e simbólicos da sociedade explicitando a desigualdade social e a diversidade cultural presente na escola e na sociedade Essa comunicação recíproca entre diferentes esse contato com o outro melhora a compreensão do nós motivando a 5 BRASIL MEC Programa Educação para a Qualidade do Trabalho PréLivro de Alfabetização 2ª parte P 159160 Brasília MEC 1998 autocrítica de toda cultura e grupo social alargando o entendimento de si e do mundo propiciando o reconhecimento de que todos através de conflitos e contradições influenciam no processo histórico na conservação ou na transformação da sociedade e de que nada é natural e único criandose desta maneira perspectivas para se pensar e construir um futuro diferente novas identidades culturais em uma sociedade mais justa democrática e plural Porém uma questão permanece é possível esse ideal dentro dos marcos do capitalismo Portanto as análises de Dante Moreira Leite feitas nos anos 50 e 60 ainda apresentamse atuais para conhecermos as várias possibilidades de pensarmos a nossa identidade nacional suas implicações políticas sociais e culturais e a partir daí posicionarmonos frente aos diferentes projetos sociais e educacionais que coexistem na atualidade REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOSI Alfredo Aventuras e desventuras de uma Ideologia In LEITE Dante Moreira O Caráter Nacional Brasileiro São Paulo Pioneira 1983 Dialética da Colonização São Paulo Companhia das Letras 1992 BOSI Ecléa Dante Moreira Leite mestre da psicologia social Psicologia USP 2000 v 11 n2 p 1523 GIROUX Henry A O PósModernismo e a Discussão da Crítica Educacional In SILVA Tomaz Tadeu A Org Teoria Educacional Crítica em Tempos Modernos Porto Alegre Artes Médicas 1993 p 4169 LEITE Dante Moreira O Caráter Nacional Brasileiro 6 ed São Paulo Editora da UNESP 2002 MCLAREN Peter Multiculturalismo Crítico São Paulo Cortez 1997 MELLO Evaldo Cabral de A mudança da mudança Nossa História mar2004 ano 1 n5 p 98 MOTA Carlos Guilherme da Ideologia da Cultura Brasileira 19331974 9 ed São Paulo Ática 1994 PAIVA Geraldo José Dante Moreira Leite um pioneiro da psicologia social no Brasil Psicologia USP 2000 v 11 n2 p 2557 SCHMIDT Maria Luísa Sandoval e NEVES Tatiana Freitas Sockler Dante Moreira Leite ciência psicológica interdisciplinaridade e diferença Psicologia USP 2000 v 11 n2 p 59 88 SILVA Tomaz Tadeu da Os novos mapas culturais e o lugar do currículo numa paisagem pósmoderna In SILVA Tomaz Tadeu da MOREIRA Antônio Flávio Org Territórios Contestados o currículo e os novos mapas políticos e culturais Petrópolis Vozes 1995 p 184202 Texto produzido em maio de 2004 para o seminário apresentado na disciplina História da Cultura Brasileira e Educação ministrada pelo Profº Sérgio E M Castanho no Programa de PósGraduação em Educação da Universidade Estadual de Campinas UNICAMP Doutorandos no Programa de PósGraduação em Educação da Universidade Estadual de Campinas UNICAMP
Send your question to AI and receive an answer instantly
Recommended for you
4
Fichamento-Teoria-Marxista-do-Valor-Alfredo-Saad
Filosofia
UFPB
44
O Nacional e o Popular na Música Brasileira: Análise e Referências
Filosofia
UFPB
2
Normas ABNT Resenha Acadêmica - Formatação Detalhada e Guia Completo
Filosofia
UFPB
3
Guia Completo Normas de Formatação ABNT para Resenhas Acadêmicas
Filosofia
UFPB
130
Economia Política: uma introdução crítica
Filosofia
UFPB
3
Jane Adams e Mary Richmond: Pensamento, Influências e Serviço Social Brasileiro
Filosofia
UFPB
2
Estudo Dirigido Marx e Engels - Análise do Manifesto Comunista
Filosofia
UFPB
4
Hedonismo-Prazeres-e-o-Sentido-da-Vida-Reflexoes
Filosofia
UFPB
2
Prova Marxismo Mais-Valia e Trabalho - NETO Braz e SAAD Filho
Filosofia
UFPB
4
Fichamento Economia Politica Netto e Braz Imperialismo - Análise Crítica
Filosofia
UFPB
Preview text
Dante Moreira Leite e a Crítica à Ideologia do Caráter Nacional Brasileiro Aléxia Pádua Franco João Carlos da Silva e Maria Cristina Pina O homem não tem natureza tem apenas história Evaldo Cabral de Mello Dante Moreira Leite 19271976 formado em filosofia pela USP e professor do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho nesta mesma instituição realizou pesquisas cujo tema central foi a questão das diferenças dos preconceitos e estereótipos disseminados pela cultural letrada Suas investigações voltadas mais para a área da psicologia têm caráter interdisciplinar ao dialogar com a antropologia e sociologia em busca de uma abordagem cultural e social para questões psicológicas e individuais e com a literatura procurando interligar razão e sensibilidade O livro O caráter nacional brasileiro história de uma ideologia é resultado de sua tese de doutorado defendida em 1954 na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP e reescrita em 1968 para publicação Nele é feita uma discussão sobre a ideologia do caráter nacional brasileiro a partir do percurso histórico das idéias produzidas sobre o Brasil pela cultura letrada desde a chegada dos portugueses no século XVI até meados do século XX Assim Dante Moreira Leite elabora uma análise crítica dos estereótipos e ideologias presentes nos escritos clássicos sobre o Brasil de Pero Vaz de Caminha até autores contemporâneos seus com a intenção de mapear as raízes e características desse caráter nacional e suas implicações Antes porém na primeira parte do livro o autor discute as diferentes formulações do caráter nacional de um país elaboradas pela cultura letrada européia França Alemanha e norteamericana a qual influenciou os escritos sobre o Brasil Através destas análises Dante Moreira Leite demonstra as contradições e a fragilidade das formulações sobre o caráter nacional que apresentam os aspectos psicológicos de um povo sem relacionálos com fatores econômicos políticos e sociais que neles interferem Denuncia também a tentativa de generalizar características particulares de um grupo ou classe de uma épocalocal específicos como se fossem de toda uma nação e a criação de preconceitos ao estrangeiro que justifica a continuidade do desprezo e dominação de uma classe ou povo sobre outro Em suma Leite procura mostrar como as formulações do caráter nacional são pseudocientíficas e constituem ideologias conservadoras ou burguesas que deformam a realidade no intuito de fortalecer e manter o status quo Segundo Bosi 1983 p XXIV as reflexões de Dante Moreira Leite fazemnos pensar se há um caráter nacional ou apenas formas históricas e mutáveis de aculturação diferentes para cada classe social ou para cada grupo etário Na sua luta contra o racismo contra os nacionalismos de direita ainda remanescentes da II Guerra Mundial e contra as justificativas de dominação de um povo sobre outro próprias do imperialismo Leite defende a segunda alternativa apoiandose na psicanálise de Freud e no marxismo Em Marx Leite identificase com a preocupação com os aspectos sócioeconômicos que interferem nos traços psicológicos e culturais de um povo e com a abordagem que visa estudar mais o caráter de classe do que de nação ou seja que enfoca as lutas de classe dentro de uma sociedade e não a questão da homogeneidade nacional Por outro lado em Freud o autor encontra o pressuposto de que para além das pretensas personalidades nacionais há um gênero humano geral uma unidade biopsíquica criada na tensão entre o desejo id e a censura deste pelas instituições sociais superego Antes de fazer as análises críticas mais específicas sobre as formulações do caráter nacional brasileiro e até para norteálas Dante Moreira Leite faz uma contextualização da origem do sentimento nacionalista na história européia observando suas diferenças e semelhanças com outros sentimentos como a xenofobia e xenofilia etnocentrismo e racismo que também envolvem a relação entre conhecidos e interferem na relação do conhecido com o estranho Inicialmente ele observa como os contatos entre o conhecido e o estranho geram sentimentos ambivalentes A reação ao estranho pode envolver tanto o medo desconfiança preconceito rejeição xenofobia quanto à curiosidade desejo de descobrir e conquistar A reação ao conhecido pode ser de prazer conforto harmonia ou tédio desinteresse desprezo xenofilia Além disso tais contatos que existem deste a Grécia Antiga e são cada vez mais freqüentes entre diferentes culturas fenômeno que Leite denomina de cosmopolitismo podem ser construtivos quando muitas civilizações desenvolvemse após o contato com outros costumes estimuladas pela diversidade e antagonismo ou destrutivos quando um grupo destrói a cultura do outro como os europeus fizeram com os indígenas Outro conceito trabalhado por Dante Moreira Leite é o de etnocentrismo que representa o costume de colocarmos o grupo a que fazemos parte como o centro de tudo superior aos outros Apresenta a posição de Summer que o liga aos sentimentos de patriotismo no qual as massas opõemse a universalidade autoafirmamse enquanto grupo e de chauvinismo que é o patriotismo com violência desencadeando no autoritarismo Leite discorda de Summer pois para ele não há uma ligação natural entre etnocentrismo e patriotismo sentimento nacionalista enquanto o segundo é em relação a um país que não tem costumes homogêneos o primeiro ocorre em grupos menores com costumes homogêneos Além disso para Leite o sentimento nacionalista não é espontâneo das massas mas sim imposto pelos grupos dominantes Por último Dante Moreira Leite examina as diferenças e semelhanças entre o racismo e o nacionalismo Enquanto o primeiro justifica a desigualdade por questões biológicas naturais e existe dentro de uma nação para justificar divisão de classescastas o segundo justifica hierarquias entre nações e tem um conteúdo histórico cultural e político No entanto o racismo aproximase do nacionalismo quando é utilizado para justificar o domínio de um povo sobre outro como ocorreu no expansionismo colonial O darwinismo social que argumenta cientificamente que a evolução da humanidade dáse pela dominação e até destruição das raças menos capazes por raças superiores foi inclusive utilizado no final do século XIX e início do XX para mascarar a contradição entre imperialismo e interesses democráticos e liberais Após conceituar todos estes sentimentos Leite contextualiza a origem do sentimento nacionalista o qual originouse de diferentes formas conforme país e época fortalecendose a partir de fins do século XVIII com consolidação dos Estados Nacionais estados modernos Em Portugal antes do século XVIII já existia um nacionalismo nãodominante o qual pode ser observado em Os Lusíadas 1572 de Camões quando este comparava Portugal com outras terras Na França este sentimento surge com a Revolução Francesa em 1789 ao defender um governo escolhido pelo povo e não de origem divina Em várias outras regiões do continente europeu como a Alemanha o nacionalismo desenvolveuse a partir das Guerras Napoleônicas no início do século XIX quando a invasão dos exércitos de Napoleão Bonaparte imperialismo francês estimulava o sentimento nacionalista nas regiões invadidas Na América o nacionalismo começa a se desenvolver com os movimentos de emancipação das colônias via importação das idéias liberaisnacionalistas da Europa Aí são construídos mitos e símbolos como bandeira hino heróis nacionais datas cívicas para fortalecer o sentimento nacionalista1 Segundo Leite na história do sentimento nacionalista houve o desenvolvimento tanto do nacionalismo doentio e expansionista que destrói outros povos como o nazismo quanto do nacionalismo saudável reivindicatório que se defende do imperialismo de outros povos como o nacionalismo sulamericano No geral a origem do nacionalismo entre um povo caracterizase pela exaltação das suas qualidades que para terem sua grandeza afirmada são comparadas com outros povos que 1 José Murilo de Carvalho em A formação das almas o imaginário da república no Brasil São Paulo Companhia das Letras 1990 discute como isto ocorre no Brasil republicano são colocados como inferiores Tal sentimento nasce nas classes mais ilustradas e é imposto pelos grupos dominantes às outras classes através da educação dos meios de comunicação Um exemplo disto no Brasil é a Reforma Capanema para o ensino secundário que vigorou de 1942 a 1961 época do nacionaldesenvolvimentismo no Brasil e que contem um artigo que defende que o ensino secundário se destina à preparação dos homens que deverão assumir responsabilidades maiores dentro da sociedade e da nação portadores das concepções e atitudes espirituais que é preciso infundir nas massas e outro que ressalta o cuidado especial na Educação Moral e Cívica de seus alunos buscando neles formar como base do patriotismo a compreensão da continuidade histórica do povo brasileiro de seus problemas e desígnios de sua missão em meio aos povos grifo nosso Assim o nacionalismo pode se entendido em suas origens como uma ideologia burguesa que pretende unir o povo acabar com privilégios da nobreza e do clero para beneficiar o comércio e urbanização Isto é o nacionalismo cria a união nacional e esta fortalece a união econômica Além de o sentimento nacionalista ter sido influenciado pela Revolução Francesa pensamento iluminista contra poder divino do rei e a favor de governo eleito pelo povo sintetizado por Condorcet a forma atual de caráter nacional decorre do romantismo alemão que tem Herder como um de seus representantes O iluminismo francês representa a origem política do nacionalismo Valoriza a razão e acredita na evolução linear do espírito humano em cujo processo todos os homens e nações têm igual contribuição Assim defende que as artificiais diferenças entre as nações devem ser eliminadas Não há a preocupação em exaltar as particularidades nacionais pois no século XVIII a França era forte e hegemônica não precisando provar sua unidade pois já era bem conhecida pela Europa Já o romantismo alemão significa a origem estética do nacionalismo Valoriza o sentimento e a intuição e acredita que cada povonação tem uma peculiaridade histórica um desenvolvimento autônomo Assim acentua as peculiaridades individuais regionais e nacionais procurando fortalecer a língua nacional e ressaltando a cultura e tradição popular No entanto não há o interesse em colocar uma nação como superior a outra ao contrário da explicação racista de caráter nacional que se desenvolve mais tarde no final do século XIX e início do XX A necessidade de destacar o valor das peculiaridades da nação tinha relação com o fato da Alemanha ao contrário da França estar fragmentada precisando criar um espírito nacional e provar a unidade alemã Hegel concilia estas duas tendências ao dizer que a história humana tem uma unidade a manifestação do espírito universal mas este se manifesta de forma diversa nas várias nações Após desenvolver esta caracterização geral do nacionalismo e suas origens Dante Moreira Leite historiciza o processo de reformulação do conceito de caráter nacional baseado em questões raciais e culturais entre os séculos XIX e XX por europeus como franceses e alemães e por norteamericanos que desenvolveram idéias que alimentam a cultura intelectual do Brasil A partir daí Leite começa a elaborar uma história literária da ideologia do caráter nacional brasileiro ou seja começa a analisar diferentes formulações do caráter nacional brasileiro através de obras literárias que tenham um conjunto de idéias sobre isto mais sistematizadas menos acidentais como as que aparecem em algumas músicas e poemas Para tanto o autor divide estas formulações em quatro fases destacando o que há de comum na caracterização nacional feita pelos diferentes autores examinados em cada época sem deixar de discutir suas diferenças FASE COLONIAL 15001822 que se refere à descoberta da terra e ao movimento nativista ROMANTISMO PÓSINDEPENDÊNCIA Brasil Império 18221880 que trata da independência política e da formação de uma imagem positiva do Brasil e dos brasileiros sofrendo influência do romantismo alemão e sendo marcada pela xenofobia REALISMO Brasil República 18801950 que cria uma imagem pessimista do brasileiro influenciada pelas teorias racistas e pela xenofilia Esta é a fase que realmente representa a formação da ideologia do caráter nacional brasileiro mas para ser entendida segundo ele precisa ser relacionada com períodos anteriores e posteriores a ela A DÉCADA DE 1950 quando ocorre o desenvolvimento econômico e a superação do caráter nacional brasileiro através de escritos mais preocupados com o caráter técnicocientífico e que criticam as teorias racistas os determinismos culturais ressaltando as influências sócio econômicas Neste texto apresentaremos apenas a análise do autor sobre as duas primeiras fases e alguns dos representantes da terceira Sílvio Romero Afonso Celso e Euclides da Cunha Porém antes de apresentar suas análises sobre cada uma destas fases Dante Moreira Leite discute os referenciais teóricometodológicos que utilizou para realizar suas investigações No exame das obras literárias que selecionou combina análises qualitativas e quantitativas para evitar tanto o subjetivismo da análise meramente qualitativa que pode ficar limitada às impressões do pesquisador quanto para superar a superficialidade da análise quantitativa Assim tabula os traços psicológicos dos brasileiros em cada autor investigado e depois faz uma análise de conteúdo procurando compreender os traços psicológicos que aparecem em cada autor as influências que recebeu de outros autores suas contradições Neste trabalho Leite baseiase em procedimentos recémintroduzidos nas ciências sociais do Brasil naquele momento por intelectuais que procuram desenvolver estudos científicos simpáticos às classes desprotegidas Isto é pretende garantir um estatuto científico dos saberes e seu uso democrático ético igualitário e solidário ao contrário do que ocorria na maior parte da cultura letrada predominante até os anos 50 a qual tinha vínculos estreitos com as classes dominantes É essa perspectiva que é criticada por Carlos Guilherme da Mota 1994 ao perceber no discurso de Dante Moreira Leite uma tentativa de construção de uma análise livre de ideologias pois científica construída por intelectuais formados nos rigores das ciências sociais desenvolvidas até então Mota aproxima essa análise da concepção de Mannheim sobre a missão dos intelectuais desvinculados das classes ou sem compromisso com as classes dominantes portanto mais propícia a um discurso sem vínculo ideológico Questiona nesse discurso a tentativa de através de um aparato científico fugir da ideologia o que classifica como Ideologia da Superação da Ideologia Porém é nesta perspectiva que Dante Moreira Leite procura construir um saber científico não dogmático mas diferenciando a ciência natural que pretende um conhecimento objetivo universal absoluto portanto inquestionável da ciência humana Nesta Leite acredita que ao invés da neutralidade há um enraizamento históricosocial da teoria pois seu objeto é dinâmico e não estático como o da ciência natural Segundo Dante Moreira Leite o pesquisador objetivo em certos domínios das ciências humanas é uma ficção Mesmo quando estudamos acontecimentos humanos já distantes no tempo e no espaço não ficamos neutros Se aceitamos estes princípios bem gerais compreendemos a existência não só de níveis diferentes de conhecimento nas ciências humanas mas de perspectivas diferentes p 179 Enfim para Leite as verdades das ciências humanas não podem ser universais atemporais No entanto não deixam de ser verdades pois representam teorias mais corretas para um determinado momento histórico para um determinado grupo Feitas estas observações mais gerais quanto aos referenciais teóricometodológicos que utiliza para analisar as formulações do caráter nacional brasileiro Dante Moreira Leite recorta o período colonial de Pero Vaz de Caminha até a Independência Aqui identifica traços significativos que marcaram e marcam o jeito de ser brasileiro ou melhor a idéia do que é ser brasileiro agrupando os autores em dois blocos os cronistasensaístas e os poetas Analisa brevemente as obras de Pero Vaz de Caminha Gandavo Gabriel Soares de Souza Fernão Cardim Ambrósio Fernandes Brandão Frei Vicente de Salvador Sebastião da Rocha Pita e as poesias de Bento Teixeira Manuel Botelho de Oliveira Manuel de Santa Maria Itaparica e Gregório de Matos Frei José de Santa Rita Durão Cláudio Manoel da Costa José Basílio da Gama Inácio José de Alvarenga Peixoto Domingos Caldas Barbosa Uma observação inicial que o autor faz é que essas obras embora produzidas nos século XVI e XVII em sua maioria só foram publicadas e divulgadas em maior escala no século XIX com o crescimento do acesso ao ensino e aos livros Isso significa segundo ele que podemos analisar o papel delas na consolidação de uma idéia de nação tão própria do dezenove brasileiro Sem desconsiderar as especificidades das obras Dante Moreira Leite destaca alguns aspectos em comum que perpassam a todas a admiração pela natureza tropical o interesse pela vida do indígena o desejo de ver o progresso do país a crítica ao governo da metrópole e a alguns comportamentos considerados característicos dos colonos p 203 Esses traços vão influenciar também a produção do romantismo no século XIX que retoma em graus variados principalmente as marcas do nativismo A poesia vai destacar mais intensamente esse nativismo principalmente as produções do século XVIII mas ele destaca a presença de Gregório de Matos com uma poesia marcada pela crítica à vida social além da celebração da natureza feita pelos nativistas2 No século XIX pósindependência as produções literárias vão marcar o movimento denominado romantismo No Brasil segundo o autor esse movimento vai adquirir especificidades para além das semelhanças com o movimento europeu É o contexto dos movimentos de formação nacional da manifestação do nacionalismo e ao mesmo tempo do desenvolvimento do individualismo e da vida familiar da educação da expansão do liberalismo econômico Segundo Dante Moreira Leite no Brasil o romantismo foi marcado em linhas gerais pelo ambiente de entusiasmo pela vida nacional de confiança no futuro do jovem país de celebração de sua natureza de elogios à inspiração de seus jovens poetas p 219 Esta caracterização mostra como é falsa a ruptura desses escritores com seus antecedentes do período colonial de quem mantiveram o sentimento nativista e admiração pela natureza 2 É bom destacar aqui a crítica feita por Alfredo Bosi 1992 do pensamento de Gregório de Matos localizandoo enquanto um monarquista que não se conforma com o desenvolvimento da vida mercantil e a perda dos privilégios de sua classe Bem diferente da visão geral que se divulgou desse poeta a qual Dante Moreira Leite reproduz em sua obra Também aqui ele vai analisar poetas e romancistas identificando o que há de comum entre eles e em que medida produziram elementos do caráter nacional Alguns autores são privilegiados na análise José Bonifácio Gonçalves Dias José de Alencar e Castro Alves No geral o romantismo brasileiro é caracterizado pela produção de elementos ideológicos tendo como base três dimensões a exaltação da natureza o indianismo e o idioma nacional Esses poetas e escritores foram responsáveis pela produção da imagem do nacional recorrendo para isso à junção da natureza ao homem brasileiro num movimento de celebração da natureza tropical e do indígena Aqui o autor faz uma crítica ao caráter ideológico do indianismo principalmente a partir de José de Alencar cuja obra reunia a opção pelo mítico e o distante passado construído e não relacionado ao processo de colonização O índio cantado em verso e prosa é a encarnação da passado medieval não vivido pelo Brasil é o exótico que não ameaça a ordem vigente principalmente a escravidão e a situação de miséria por que passavam os indígenas no século XIX o índio real Por isso o autor destaca o caráter ideológico desse movimento Outro aspecto que vai compor essa ideologia é a defesa de uma língua nacional como parte da especificidade nacional brasileira Daí Dante Moreira Leite conclui que coube ao romantismo a produção de símbolos que marcaram o nacionalismo brasileiro Já nos finais do dezenove alguns poetas românticos vão começar a tocar na questão da escravidão e sua abolição No geral esse movimento desconsidera a questão não fazendo qualquer referência Castro Alves é o poeta que melhor exemplifica essa mudança de atitude com uma produção crítica e denunciando os maus tratos vividos pelos negros no Brasil Essa crítica segundo Dante M Leite vai ser melhor desenvolvida com a geração que se segue caracterizada como realistas Esses realistas mudam no sentido de tratar de questões sociais de abandonar temas exóticos míticos Para iniciar a caracterização desse movimento o autor escolhe analisar a obra de Sílvio Romero que segundo ele teve um papel importante ao influenciar gerações futuras que pensaram o Brasil3 A partir de 1870 percebese uma intensificação no desenvolvimento e divulgação do conhecimento científico marcado pelas produções positivistas No Brasil é o momento de início efetivo da transição do trabalho escravo para o trabalho livre o início do desenvolvimento da industrialização e a intensificação dos problemas sociais com a urbanização crescente e a imigração Nesse contexto vai viver Sílvio Romero O autor constrói uma imagem intrigante e ambígua de Silvio Romero caracterizado como um intelectual com limites de formação porém com potencialidades impressionantes para pensar o Brasil Formado em Direito em Recife viveu alguns anos no Rio de Janeiro 3 Vários escritores vão ser influenciados pelas idéias de Sílvio Romero Podemos citar alguns Euclides da Cunha Oliveira Viana Gilberto Freyre participou ativamente do seu tempo segunda metade do século XIX 18511914 Presenciou o avanço da ciência e a divulgação do evolucionismo de Darwin que marcou profundamente os autores que o influenciaram Rénan Taine Max Muller Scherer Gobineau além de Conte Buckle Spencer e o próprio Darwin entre outros Conforme Dante Moreira Leite esses autores foram lidos por Romero muitas vezes de forma ambígua e incoerente o que se justifica pelo pouco e circunstancial acesso a essas leituras Além disso Romero tentou interpretar o Brasil a luz desses autores porém buscando uma especificidade Sua concepção sustentase na determinação dos critérios físicos e biológicos o meio e a raça Aqui está a primeira contradição explicar a inserção do Brasil na civilização européia embora admitindo sua formação a partir de raças inferiores Essa concepção leva à interpretação do inevitável domínio da raça branca pois sendo superior às outras naturalmente sobressairia Outro aspecto que vai destacar na interpretação de Romero é sua crítica ao romantismo aqui também paradoxal Ao mesmo tempo em que nega o desenvolvimento autônomo do país pregado pelos românticos procura a característica nacional dos autores brasileiros seu valor Faz isso a partir da valorização de uma cultura mestiça com predomínio do branco diferente dos românticos que escolhem o índio como modelo nacional A história do Brasil é explicada por Romero a partir de cinco fatores o português o negro o índio o meio físico e a imitação estrangeira Não aceita totalmente a determinação do clima para explicar o atraso nacional mas muitas vezes admite algumas características do brasileiro como resultantes dos fatores naturais ou primários Como fatores secundários nessa explicação apresenta os étnicos a formação do Brasil a partir das três raças produziu uma subraça mestiça original com o predomínio da raça branca Defende o processo natural de branqueamento com o predomínio da raça superior embora muitas vezes defenda a necessidade da imigração européia para evitar a degeneração total Essa mistura entre raças para Romero atinge também as idéias e sentimentos Dante apresenta a análise feita por Sílvio Romero marcadamente positivista o negro estaria na fase teológica do fetichismo o índio na astrolatria e o português na monoteísta com resquício do politeísmo Isso explica segundo ele a falta de unidade nas tradições brasileiras e na nossa literatura Outra dimensão de explicação do Brasil é a econômica Aqui Dante identifica outra contradição de Romero Ao explicar o processo colonial recorre aos aspectos econômicos desconsiderando as determinações de clima e raça levantados em outros momentos Sua história da literatura acompanha as fases econômicas brasileiras No geral a crítica feita a Sílvio Romero em O caráter nacional brasileiro sustentase na constante contradição teórica e pessoal que viveu este autor desejoso de aplicar as teorias racistas à realidade brasileira embora esta mesma realidade negasse essas teorias e ao mesmo tempo esperançoso de igualar o Brasil com as grandes potências mundiais Inglaterra Alemanha França e Estados Unidos Assim de um lado reforça o caráter apático sem iniciativa do brasileiro e critica sua imitação ao estrangeiro por outro lado prega o exemplo a ser seguido dos anglogermânicos Seu nacionalismo é cheio de incongruências e Dante Moreira Leite o classifica como um realista pessimista que ao contrário de Machado de Assis não foi capaz de universalizar seu pensamento permanecendo provinciano Afirma ser ele um revoltado capaz de baterse contra valores aceitos mas incapaz de buscar valores substitutos a não ser pela invocação de uma autoridade intelectual superior ou de uma raça melhor p 254 Este último aspecto marcou fortemente sua caracterização psicológica do brasileiro e vai influenciar gerações posteriores de autores que pensaram o Brasil como Euclides da Cunha cuja obra Dante analisará após examinar os escritos de Afonso Celso no livro Porque me Ufano do Meu país 1900 o qual apresenta uma visão otimista e ingênua do Brasil4 destoando deste contexto de realismo pessimista Afonso Celso defende ser preciso desenvolver desde a tenra idade a educação moral das crianças construindo um amor à pátria justificado em sua importância Assim voltado apenas para a realidade de sua classe social mais rica e moradora da região litorânea do Brasil colocase contrário às posições pessimistas e pejorativas em relação à nacionalidade brasileira Ser brasileiro segundo ele deve ser motivo de orgulho pois apesar das contradições sociais nenhum país era constituído de tantas vantagens como o Brasil muitas vezes invejado por outras nações O autor enumera então onze motivos da superioridade do Brasil grandeza territorial beleza riqueza do país variedade e amenidade do clima ausência de calamidades naturais excelência dos elementos que entraram na formação do tipo nacional nobres predicados do caráter nacional o Brasil nunca sofreu humilhações nunca foi vencido procedimento cavalheiresco e digno com os outros povos as glórias a colher no Brasil a história do Brasil p 258 Neste sentido ele reforça as interpretações nativistas e românticas elaboradas desde a colônia exalta personalidades do período monárquico como D Pedro II e a Princesa Isabel e enaltece as qualidades do índio negro e do branco raças formadoras de nosso país Destaca 4 No curso de Graduação em Filosofia realizado na Universidade Estadual de São Paulo USP Dante Moreira Leite ao desenvolver uma pesquisa sobre os preconceitos e valores de patriotismo divulgados nas obras didáticas primárias já havia analisado estas idéias de Afonso Celso que muito influenciaram os livros de Educação Moral e Cívica ainda as qualidades do homem brasileiro que reforçam a superioridade do Brasil sentimento de independência hospitalidade afeição à ordem paz melhoramento paciência e resignação doçura longaminidade e desinteresse escrúpulo no cumprimento das obrigações contraídas caridade acessibilidade tolerância ausência de preconceito honradez pública e particular p 264 Também levanta alguns aspectos que considera defeitos do brasileiro falta de iniciativa decisão e firmeza os quais significam desvios de conduta gerados principalmente pela escravidão que a educação tinha a tarefa de corrigir Enfim utilizando o critério da comparação entre o Brasil e os países europeus escolhidos pela sua história secular Afonso Celso sustenta uma visão otimista do caráter nacional brasileiro a qual será abalada por Euclides da Cunha no livro Os Sertões de 1902 O livro de Euclides da Cunha surge a partir de uma reportagem jornalística da última fase da revolta de Canudos e ao descrever a revolta e suas causas revela uma realidade ainda pouco conhecida do Brasil uma nova maneira de interpretar a situação nacional expressando um realismo muitas vezes assustador Dante Moreira Leite analisa o conteúdo ideológico do livro o qual segundo ele tenta formular uma filosofia da história brasileira ao procurar entender como um doente mental Antônio Conselheiro mobilizou milhares de pessoas que enfrentarem vários sacrifícios inclusive quatro expedições do exército nacional Ao fazer isto Euclides da Cunha ultrapassa os limites de uma interpretação política republicanista contra um movimento de resistência monarquista e transformase em uma visão social e histórica da realidade nacional Euclides da Cunha seguindo a tradição de Silvio Romero tenta escrever um livro de ciência partindo do pressuposto de que um país se explica pelas relações entre raça e meio geográfico Assim Os Sertões descreve de maneira dramática a terra semideserto no interior do nordeste brasileiro o homem mestiçagem embaralhada de 03 raças índio negro português e a luta embate entre os fanáticos de Canudos e as tropas do governo No entanto como duas das raças que formam o povo brasileiro negros e portugueses estão fora de seu habitat encontra dificuldades para usar coerentemente a teoria evolucionista de Darwin que o influencia e segundo a qual baseada em estudos feitos na Europa o meio determina a raça Surge então uma contradição nas análises de Euclides da Cunha Se por um lado conclui que não temos e nunca teremos uma unidade de raça por outro acredita podermos no futuro após fortalecermos nossa unidade nacional autônoma formar uma raça histórica Inverte assim o pensamento europeu se lá supunha que foram as raças que formaram a nação aqui é a nação que formaria a raça Em relação à nossa falta de unidade racial Euclides discute as diferenças entre o povo do litoral e do sertão No litoral temos o paulista que é a mestiçagem entre o índio e o colono e o mulato que é o cruzamento do branco com o negro que vinha ocorrendo desde Portugal Ambos caracterizamse pela fraqueza desequilíbrio instabilidade pois devido ao clima ameno do sul entraram em contato com civilizações superiores às quais tiveram que se adaptar sem conseguir acompanhálas ou absorvêlas No sertão temos os jagunços ou sertanejos que como descendentes dos paulistas que entraram para o interior do Brasil resultam do cruzamento do índio com o colono mas são mais fortes aventureiros e autônomos pois ficaram isolados pela adversidade do clima do semideserto não tendo que se adaptar a civilizações superiores Quanto à possibilidade de formação de uma raça nacional histórica Euclides da Cunha baseiase no sertanejo jagunço que em suas palavras simboliza a rocha viva da nacionalidade e representa uma nova constituição da raça brasileira no lugar do mestiço que muitas vezes expressa fragilidade e instabilidade de comportamento Enfim influenciado por Silvio Romero Euclides da Cunha é outro representante do realismo pessimista mas enquanto o primeiro defende o branqueamento do povo brasileiro através da imigração o segundo encontra a solução para a instabilidade e acomodação do mestiço povo brasileiro nos sertanejos e seu isolamento Dante Moreira Leite para revelar o caráter ideológico da teoria racial de Euclides da Cunha discute os seus equívocos O primeiro foi o de basearse na teoria que defende que o clima influencia na configuração da raça e ao mesmo tempo acreditar que o sertanejo descendente do paulista formado no sul mantém as suas características primitivas Como isto é possível se o clima do sertão onde vive o sertanejo é tão diferente do clima do sul onde surgiu o paulista Isso ocorreria mais por questões sociais que Euclides não comenta do que questões biológicas O segundo foi analisar o episódio de Canudos segundo o darwinismo social que argumenta que a evolução humana se dá pelo choque de raças em diferentes estágios Isto conduz a idéia apresentada no início de Os sertões de que os sertanejos eram raças inferiores que seriam esmagadas pelas raças superiores exército nacional Idéia que se contradiz com sua defesa posterior de que os sertanejos simbolizariam a rocha viva da nacionalidade representando a futura raça histórica brasileira Como os sertanejos seriam a base de nossa futura raça se eles estavam fadados a serem destruídos por raças superiores A obra de Euclides da Cunha é um exemplo da literatura regionalista no pré modernismo que apesar de destacar os tipos característicos de uma região acaba construindo uma ideologia do caráter nacional brasileiro ao ver uma região como mais característica do Brasil do que outra no caso de Euclides opõese a região litorânea vista como frágil e decadente à região sertaneja onde estaria o brasileiro autêntico Como ele muitos outros escritores regionalistas valorizaram a figura do caipira constituindo a literatura sertaneja Afonso Arinos Minas Gerais Valdomiro Silveira e Cornélio Pires São Paulo João Simões Lopes Neto e Alcides Maia Rio Grande do Sul Hugo de Carvalho Ramos Goiás Catulo da Paixão Cearense Ceará Monteiro Lobato surge como uma voz destoante que ao descrever o caipira de São Paulo ao invés de celebrálo faz uma crítica severa a ele e ao seu culto construindo uma imagem negativa do caipira através do Jeca Tatu indiferente aos grandes acontecimentos nacionais incapaz de trabalho organizado incapaz de montar e manter uma habitação decente incapaz de sentimento de pátria mas cheio de crendices e de uma religião inteiramente deformada repleta de fatalismo p 280 Enfim Dante Moreira Leite ao observar a fragilidade das ideologias do caráter nacional brasileiro e os preconceitos por ela disseminados como discutido anteriormente pretende criticar a idéia de que há um caráter nacional determinado por fatores raciais culturais ou religiosos que justifica o subdesenvolvimento do Brasil como se este fosse naturalmente inferior a outros povos Ao invés disso Leite defende que a dominação de um país pelo outro é um processo político econômico e social constituído historicamente pelos países capitalistas centrais e por isto pode ser modificado Neste sentido ele segundo Neves e Schmidt busca um conhecimento comprometido com a constituição de uma comunidade humana capaz de conviver tolerar e aprender com a diferença p 86 que rompa com os estereótipos e revele como o espírito humano se exprime de maneira particular e não uniformemente No entanto esta valorização da originalidade das pessoas e grupos não o leva a defender o isolamento das culturas o que causa a esterilidade cultural o comodismo e monotonia Para Leite o desenvolvimento de uma cultura específica é mais rico quando esta entra em contato com outras culturas o qual raramente é destrutivo e na maioria das vezes estimula a curiosidade e criação Enfim sugere a construção de um nacionalismo que não destrua as peculiaridades internas a nação e que conviva com outros nacionalismos sem relações hierárquicas ou xenófobas Infelizmente ao contrário deste ideal no cenário mundial desde o fim do século XX estamos experimentando o acirramento do nacionalismo destrutivo quando vivenciamos ataques terroristas a invasão dos EUA a países como Iraque entre outros exemplos Ainda hoje muitos materiais didáticos recémpublicados divulgam uma visão romântica da nossa identidade nacional ao destacar a integração o encontro pacificado entre diferentes culturas através de miscigenações sincretismos relações de confiança sem considerar os conflitos e confrontos envolvidos nesse processo Encontramos um exemplo disto em uma apostila adotada no programa de Alfabetização Solidária desenvolvido nos anos 90 pelo governo FHC5 Para se ensinar a letra P a apostila sugere trabalhar uma ilustração que mostra o asiático o índio o africano e o português lado a lado de braços dados com o mapa do Brasil ao fundo e o texto intitulado Povo Brasileiro Os indígenas que aqui viviam junto com os europeus africanos e asiáticos que imigraram para cá formaram o povo brasileiro Essa mistura de raças proporciona ao Brasil uma cultura rica dinâmica e variada A força dessa nossa gente trabalhadora é que mantém esse país e nos dá a esperança de um futuro melhor grifo nosso Este texto e imagem arquitetam o que Giroux 1993 p 567 denomina de pluralismo liberal brando ao buscar uma convivência pacífica entre as diferenças nivelandoas como se todas tivessem o mesmo valor social ignorando os conflitos e tensões gerando uma tolerância perversa e até legitimando as desigualdades sociais Criase uma sensação coletiva de familiaridade abolese o sentimento de adversidade e desenvolvese o de solidariedade reciprocidade entre todos que se imaginam fazendo parte de um mesmo grupo apesar das suas diferenças No entanto apesar desta permanência das visões xenófobas ou românticas do caráter nacional encontramos atualmente na educação escolar várias propostas que têm princípios semelhantes aos defendidos por Dante Moreira Leite Teóricos da pedagogia crítica como Giroux Peter McLaren Tomas Tadeu da Silva têm proposto uma educação multiculturalista Acreditam que a escola apesar de normalmente basearse no etnocentrismo cultural reproduzindo o racismo o sexismo e as desigualdades sociais cumprindo sua tradicional tarefa de homogeneização social e cultural pode desenvolver um processo educativo diferente voltado para as necessidades interesses e sensibilidades dos grupos subordinados e marginalizados Por ser um espaço de interação de homens e mulheres de migrantes de diversas regiões de diferentes faixas etárias grupos sociais raciais étnicos religiosos a escola pode resgatar e estudar criticamente suas formas heterogêneas de vida em múltiplos contextos históricos e culturais mostrando as relações sejam de aproximação ou conflito existentes entre eles Acreditam que assim os estudantes conseguirão apropriarse ativamente do conhecimento escolar descobrindo os sujeitos e vozes sociais que ele destaca ou silencia desmistificando a sua neutralidade questionando a hegemonia da cultura da classe social que controla os bens materiais e simbólicos da sociedade explicitando a desigualdade social e a diversidade cultural presente na escola e na sociedade Essa comunicação recíproca entre diferentes esse contato com o outro melhora a compreensão do nós motivando a 5 BRASIL MEC Programa Educação para a Qualidade do Trabalho PréLivro de Alfabetização 2ª parte P 159160 Brasília MEC 1998 autocrítica de toda cultura e grupo social alargando o entendimento de si e do mundo propiciando o reconhecimento de que todos através de conflitos e contradições influenciam no processo histórico na conservação ou na transformação da sociedade e de que nada é natural e único criandose desta maneira perspectivas para se pensar e construir um futuro diferente novas identidades culturais em uma sociedade mais justa democrática e plural Porém uma questão permanece é possível esse ideal dentro dos marcos do capitalismo Portanto as análises de Dante Moreira Leite feitas nos anos 50 e 60 ainda apresentamse atuais para conhecermos as várias possibilidades de pensarmos a nossa identidade nacional suas implicações políticas sociais e culturais e a partir daí posicionarmonos frente aos diferentes projetos sociais e educacionais que coexistem na atualidade REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOSI Alfredo Aventuras e desventuras de uma Ideologia In LEITE Dante Moreira O Caráter Nacional Brasileiro São Paulo Pioneira 1983 Dialética da Colonização São Paulo Companhia das Letras 1992 BOSI Ecléa Dante Moreira Leite mestre da psicologia social Psicologia USP 2000 v 11 n2 p 1523 GIROUX Henry A O PósModernismo e a Discussão da Crítica Educacional In SILVA Tomaz Tadeu A Org Teoria Educacional Crítica em Tempos Modernos Porto Alegre Artes Médicas 1993 p 4169 LEITE Dante Moreira O Caráter Nacional Brasileiro 6 ed São Paulo Editora da UNESP 2002 MCLAREN Peter Multiculturalismo Crítico São Paulo Cortez 1997 MELLO Evaldo Cabral de A mudança da mudança Nossa História mar2004 ano 1 n5 p 98 MOTA Carlos Guilherme da Ideologia da Cultura Brasileira 19331974 9 ed São Paulo Ática 1994 PAIVA Geraldo José Dante Moreira Leite um pioneiro da psicologia social no Brasil Psicologia USP 2000 v 11 n2 p 2557 SCHMIDT Maria Luísa Sandoval e NEVES Tatiana Freitas Sockler Dante Moreira Leite ciência psicológica interdisciplinaridade e diferença Psicologia USP 2000 v 11 n2 p 59 88 SILVA Tomaz Tadeu da Os novos mapas culturais e o lugar do currículo numa paisagem pósmoderna In SILVA Tomaz Tadeu da MOREIRA Antônio Flávio Org Territórios Contestados o currículo e os novos mapas políticos e culturais Petrópolis Vozes 1995 p 184202 Texto produzido em maio de 2004 para o seminário apresentado na disciplina História da Cultura Brasileira e Educação ministrada pelo Profº Sérgio E M Castanho no Programa de PósGraduação em Educação da Universidade Estadual de Campinas UNICAMP Doutorandos no Programa de PósGraduação em Educação da Universidade Estadual de Campinas UNICAMP