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Fisiologia Vegetal

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EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE XEROFITISMO\n\nMÁRIO G. FERRI EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE XEROFITISMO\n\nMÁRIO G. FERRI\nDept. de Botânica\nFac. Fil. Cienc. e Letras,\nUniv. de São Paulo,\n\nO termo xerófita foi usado pela primeira vez por Schouw, em 1822 (cf. Grieve, 1955, Killian e Lemaître, 1956, Oppenheimer (1959) para indicar plantas de ambientes secos. Foi Schimper (1889) quem pôs em evidência o fato de que muitas plantas xerofíticas apresentavam um certo número de características morfológicas que ele supunha peculiares a elas. Em 1911 Fitting mostrou que uma Zigófilacea, Peagonum harmala, que não apresentava, de forma evidente, aquelas características atribuídas por Schimper às plantas de ambientes secos, era, ainda, perfeitamente adaptada a viver nesses ambientes. As estruturas mencionadas teriam, segundo Schimper, o papel de reduzir o consumo de água; Peagonum harmala não restringia tal consumo e Fitting explicou o fato pelos altos valores osmóticos (até 100 Atm) das células das raízes, o que permitia a essa planta retirar água de solos relativamente secos. Altos valores de transpiração em plantas de habitats secos foram determinados por Maximov, em 1923. Ele verificou que muitas plantas de deserto, mesmo com suprimento de água relativamente escasso, não diminuem o consumo, mas suportam elevadas perdas. Agravando-se a seca, todavia, elas fecham perfeitamente os estômatos e sua cutícula oferece proteção muito eficiente, reduzindo a transpiração a um nível mínimo. Tais fatos levaram Maximov a uma nova conceituação de xerofitismo; xerofítas são plantas de habitats secos, capazes de diminuir a transpiração ao mínimo, quando em condições de deficiência de água.\n\nEntregue para publicação em 1960. XEROFITISMO\n\nShreve, em 1924, encontrou, em Encelia farinosa, aumento do poder de retenção de água nas folhas. Esses elementos fisiológicos, que garantem à planta sobreviver em condições áridas, terão, certamente, maior importância para a sua adaptação às condições de ambiente seco do que os elementos morfológicos inventariados por Schimper (cf. também Killian e Lemaître). Mesmo as reservas de água, comuns em muitas plantas de ambientes secos, têm papel limitado, como salientou Thoday (1931). Essas reservas esgotam-se, finalmente, quando a seca se prolonga e, neste caso, outro mecanismo protetor, também frequente, pode ocorrer: a queda das folhas. Este fenômeno é periódico em certas plantas e características do grupo das xerofíticas, criado por Schimper, junto às xerofítas e às higrofíticas; tornou-se, porém, um fenômeno permanente e de ocorrência comum, em muitas plantas como certas Cactáceas, Esclerocactáceas, Asclepiadáceas, etc., as quais já reduziam suas folhas, reduzindo, assim, permanentemente, a superfície transpiração, realizando, então, um novo modo de consumo do recurso. Houvemente, pois, como vimos, na evolução do conceito de xerofitismo, uma primeira fase em que certas características morfológicas eram tidas como prova de adaptação às condições de seca (Schimper, 1889). Em uma segunda fase, demonstrou-se que, mesmo, plantas sem tais caracteres, podem ser bem adaptadas à seca (Fitting, 1911). Surgiu, mais tarde, a ideia de que bou adaptação é a que permite à planta consumir água livremente, enquanto possível, para reduzir o consumo ao mínimo, somente quando as condições se agravarem (Maimon, 1923 a 1931). Deu-se, desta maneira, um deslocamento da ênfase das características morfológicas para as fisiológicas, na conceituação do xerofitismo e surgiu, dessa forma, a necessidade de distinguir entre xerofitismo e xeromorfismo. Como elementos de xerofitismo enumeraram-se (vide tambem Arens, 1958): 1 - redução da superficie foliar; 2 - nervuras densas; 3 - muitos estômatos pequenos por unidade superficial; 4 - estômatos subtendidos em depressões epidérmicas; 5 - células epidérmicas pequenas; 6 - revestimento externamente pelos; 7 - paredes das células epidérmicas espessas; 8 - esclerânquima; 9 - presença de cera, taninos, óleos voláteis, resinas, mucilagens; 11 - várias camadas de parênquima paliçádico; 12 - hipoderme e parênquima aquífero, etc. Dividiu-se quanto à utilidade destes elementos xeromorfos na adaptação da planta a condições secas não tardaram em surgir. Já em 1914, Kamerling empregou o termo \"pseudo-xerófitas\" para designar plantas xeromorfas que, todavia, possuem elevada transpiração. Shreve (1924) negou toda e qualquer correlação entre xeromorfismo e transpiração. Kump (1930), Ferri (1944), Evenari (1949), entre outros, mostraram que não há, necessariamente, correlação entre a espessura da cutícula e o valor da transpiração cuticular. Wood, em 1933, descreveu a ocorrência de uma vegetação esclerófila no oeste da Austrália, em lugares com precipitação superior à evaporação, em todos os meses. Em 1953, Hygen admitiu que o xeromorfismo pode não ter utilidade como elemento de proteção contra a seca e pode até ser prejudicial à planta. Em outros autores encontraram-se dados sobre este problema (Killian e Lemée, 1956; Stocker, 1956, por exemplo) que, todavia, ainda se encontra por resolver, pois, há autores que continuam afirmando a importância do xeromorfismo na resistência à seca. Carr e Gaff (1959), por exemplo, atribuem às membranas espessas um papel protetor pela água que contém e que é cedida ao ambiente, retardando, dessa forma, a perda de água do protoplasma. Em 1955, Ferri mostrou que a vegetação permanente, arbórea e arbustiva, dos cerrados brasileiros, é acentuadamente xeromorfa, embora não esteja fisiologicamente adaptada a reduzir a transpiração. Enquanto isso, a flora da caatinga, com xeromorfismo pouco pronunciado, possui boa adaptação para a sobrevivência em ambiente incomparavelmente mais árido em que se encontra. O mesmo autor mostrou (1960) que, na caatinga do Rio Negro (Amazônia), em habitat em que evidentemente não falta água, a vegetação, destituída em geral de adaptações fisiológicas para suportar a seca, apresenta, todavia, muitos elementos de xeromorfismo. Arens (1958), revendeu o problema do xeromorfismo foliar, lembrou a importância de se considerar o metabolismo todo da planta. A literatura especializada contém inúmeros informes relativos à xeromorfia, alguns podendo ser encontrados nos trabalhos de Grieve (1953), Killian e Lemée (1956), Stocker (1956) e Arens (1958), entre outros. Este último autor admite que o escleromorfismo foliar pode ser determinado por diversas causas que interferem no balanço entre os hidratos de carbono produzidos e os consumidos pela planta, de tal forma a determinar uma relação superior a 1, o que significa um acúmulo dessas substâncias. Interpretação semelhante encontra-se em Killian e Lemée que salientam a importância da relação trófica N + H2O. Todos os fatores tendentes a elevar essa relação favoreceriam o desenvolvimento de caracteres xeromorfos, pois o excesso de carboidratos seria acumulado na forma de membranas espessas, etc. Torna-se, pois, evidente, a necessidade de distinguir entre xeromorfismo, determinado por falta de água, e outro fenômeno que leva a mesma consequência aparente, mas que teria causas fundamentalmente diversa. Se essa causa residir em deficiências nutricionais que levam ao desenvolvimento de determinados caracteres, o fenômeno terá o nome específico de \"escleromorfismo oligotrófico\". Verificou-se há muito que inúmeras xerofíticas não são xeromorfas, enquanto que certas higrofíticas sim. A literatura refere-se a tais plantas como xerofíticas higrômorfas e higrófitas xeromorfas, respectivamente (Montfort, 1918). Stocker (1956) cita como o mais interessante exemplo conhecido, o caso da vegetação do cerrado e da caatinga, no Brasil. A última, em seu comportamento fisiológico, revela-se xerofitica, embora não apresente notável xeromorfismo, enquanto que a primeira, de comportamento não xerofitico, é nitidamente xeromorfa (Ferri, 1955). Para explicar esses fatos, aparentemente paradoxais, Ferri admitiu que os elementos que, no conjunto, constituem o xeromorfismo, determinam certa proteção contra a seca, mas, em geral, menor que a resultante de mecanismos fisiológicos. É fácil imaginar que as plantas do cerrado sejam, em ambas as condições, muito intensas nem duradouras; ainda são elementos mais eficientes de proteção. Isso garante a sobrevivência em condições extremamente adversas. Na caatinga, só terão sobrevivido as espécies nas quais as adaptações fisiológicas tinham aparecido antes ou simultaneamente. Aqueles em que apenas as adaptações morfológicas hajam surgido, terão sido eliminadas, porque tais adaptações não lhes deram toda a proteção requerida pelo meio. XEROFITISMO\n\ncaatinga, ela seria de valor negativo e a seleção tenderia a desfazê-la por eliminação dos caracteres menos favoráveis.\n\nDo exposto depende-se a complexidade que o problema do xerofitismo atinge. E em virtude dessa complexidade, a literatura em - contra- - se cheia de opiniões contraditórias sobre o conceito do xerofitismo. Ainda hoje, qual o critério que se deve seguir para considerar xerófita determinada planta, é um problema não resolvido. Alguns autores, como Oppenheimer (1959) não incluem entre as xerófitas, plantas que, como as anuis, completam o seu ciclo antes que a seca fique sentindo seus efeitos. Para, as plantas não resistentes à seca, mas logo dela. Essas plantas são as chamadas \"drought-es- caping\", desde Kearney e Shantz (1911). Para Levitt e col. (1960) não basta a resistência à seca para considerar uma planta como xerófitas. Para tanto, além da possibilidade de habitar em climas secos, é preciso que possua propriedades que a defi- niam como xerófita.\n\nCom estas considerações em vista, Levitt e col. enquadram como xerófitas, 1 - plantas capazes de reduzir o consumo de água a um mínimo (\"water-savers - drought avoiding\"); 2 - plantas capazes de obter grandes quantidades de água durante a seca (\"water- spenders - drought-evading\"); 3 - plantas capazes de completar seu ciclo antes que a seca chegue ao apogeu (\"emeras - drought- escaping\"); 4 - plantas capazes de sobreviver a um considerado est- a cimento (\"drought-tolerant\"). Estas seriam diversas modalidades de resistir à seca. Aliadas à habilidade de crescer e se desenvolver num clima seco conferiam às plantas a qualidade de xerófitas.\n\nKilluin e Lemée (1956) consideram como xerófitas plantas das seguintes categorias: 1 - anuais (efêmeras); 2 - esclerófilas de folhas persistentes; 3 - com restrição da transpiração durante a seca, b - com transpiração elevada mesmo durante a seca (plantas de raízes profundas); c - intermediárias entre a e b; 3 - xeromorfas afiladas; 4 - plantas: vivazes cicófolias, a - que passam a estacão seca em vida ativa, reduzindo ou não o consumo de água e b - que passam a estacão seca em repouso; esta categoria se subdivide em duas outras; a das vivazes efêmeras, que passam a estacão seca em vida subterrâ- nea e a das caméfitas, que perdem as folhas nessa estacão (\"drought-enduring\"); 5 - plantas que reduzem a superfície transpiran- te na época seca; 6 - suculentas, que podem apresentar caules suculentos desprovidos de folhas (certas Cactáceas, Euphorbiá- ceas, Asclepiadáceas, etc.) e plantas com folhas suculentas (como certas Crassuláceas, por exemplo).\n\nO estudo da literatura mostra, pois, como dissemos, que as opiniões sobre o conceito do xerofitismo encontram-se divididas. Tudo depende, evidentemente, de como se define esse fenômeno. Se ele for definido como adaptação à vida nas condições de ambientes áridos, parecerá. A primeira vista, não poderiam ser tidas como xerófitas plantas que, embora tenham grande resistência à seca, não ocorrem nessas ambientes. De outro lado, a definirmos xerofitismo como resis- tência à seca, poderemos considerar como xerófita toda e qualquer planta que apresente tal resistência, não importando a sua diversidade.\n\nNa mesma categoria, podemos considerar os indivíduos, colocando-se toda e qualquer espécie que num ambiente que em geral é úmi- do mas eventualmente pode, ao menos em algum de seus nichos, revelar-se seco, possam se encontrar xerófitas? XEROFITISMO\n\nSe assim procedermos, passaremos a definir xerofítas como plan- tas adaptadas a resistirem à seca. E, nesse caso, xerofitismo será a capacidade das plantas de resistirem à seca em qualquer grau, even- tual em muitos ambientes, obrigatoriamente em outros.\n\nAssim admitindo, encontraremos xerófitas nos mais variados am- bientes e nos mais diversos tipos de vegetação. Haverá algum incon- veniente nisso? Poderia ser lembrado como tal, o reunir na mesma categoria plantas de proveniências muito diversas.\n\nNão nos parece, entretanto, que isso seja, realmente, uma des- vantagem, mas, ao contrário, uma virtude desse sistema, por refletir melhor a realidade.\n\nCom efeito, nenhum ambiente é perfeitamente homogêneo: No ambiente da mata, como no de qualquer outro tipo de vegetação, te- mos um mosaico de nichos ecológicos diversos, de condições mais secas uns, mais úmidas outros. E o mesmo nicho, úmido hoje, pode- rás estar seco amanhã. Por que surpreender-se, pois, que no ambi- ente geral da floresta pluvial, mas ocupando nichos diversos, encon- trem-se higrófitas e xerófitas?\n\nCom efeito, as pesquisas de Coutinho (1960), revelam que na mata pluvial tropical encontram-se inúmeros exemplos de xeromor- fis- mo, bem como de adaptações fisiológicas a condições de aridez, tais adaptações aparecem, sobretudo, entre trepadeiras que podem ter problemas de condução (cf. também Gessner, 1956.) e nas epi- fitas e herbáceas terrestres, cujos sistemas radiculares, aérea ou de- semolvidos em camadas superficiais que secam facilmente, podem encontrar-se em ambientes, ao menos temporariamente muito secos.\n\nAssim, por exemplo, quando se considera a categoria das An- giospermas, nela se colocam todas as plantas que produzem flores, não importando quão diversas sejam, umas das outras, quanto a to- dos os demais caracteres.\n\nSe consideramos a categoria das xerófitas como a de plantas adaptadas a ambientes áridos, reuniremos nessa categoria plantas dos mais diversos tipos, dos mais variados comportamentos, dos mais diferentes ambientes, pois a expressão ambientes áridos comporta e engloba locais de condições as mais diversas.\n\nHá, todavia, algo de comum nesses ambientes - a escassez de água (Cf. Meigs, 1953.). É, pois, este elemento, que comunica a todos ambientes áridos - escassez de água - que permite reunir na cate- goria das xerófitas as plantas que neles vivem.\n\nPor que não incluir, então, na mesma categoria, plantas que, embora de ambientes diversos dos áridos, apresentem em comum com as que neles vivem, adaptações que permitam sobrevivência em es- cas- sez de água, ainda que por período mais curto? mento é comparável à de outras, de ambientes muito mais secos, como, por exemplo, Selaginella convoluta, da caatinga, que Morello (1954) verificou persistir viva em umidade relativa de 0% durante 25 dias.\nA nosso ver o xerofitismo é um fenômeno geral, que pode manifestar-se em graus diversos. Nos ambientes áridos predominam condições mais severas, nos não áridos condições mais brandas; eventualmente, ainda que por períodos relativamente breves, pode haver condições mais úmidas em ambiente árido que em úmido. Trata-se, pois, de um fenômeno quantitativo e não qualitativo. Não há uma qualidade específica de plantas de ambientes áridos e outra de plantas de ambientes úmidos, que permitam distingui-las. É por causa dessa ausência da qualidade específica que as higrofítas são, em geral, caracterizadas negativamente, isto é, pela falta das qualidades que possuímos peculiares aos xerófitas, às quais, todavia, não é só isso. São qualidades comuns a todas as plantas, nas quais se apresentam uma maior naquelas que até agora costumamos chamar de xerófitas.\nTodas as plantas de xerófitas, que sejam ambientes de seca, em geral, devem estar adaptadas a suportar, por períodos variados, diversas de seca. Umas toleram apenas uma seca moderada por período muito curto; outras suportam seca intensa, por períodos muito extensos. Essa admissão é imperativa, se consideramos que a vida vegetal surgiu na água e que só posteriormente as plantas conquistaram a terra; e desde que o fizeram, todas tiveram que enfrentar, num período ou noutro, no decurso da evolução, o problema da seca, em grau mais ou menos acentuado. Sobrevivem e hoje existem, óbvia mente, as que estavam adaptadas, de qualquer forma, a suportar a falta de água, grande ou pequena, por pouco ou por muito tempo.\nAssim, todas as plantas que hoje existem possuem xerofitismo em grau maior ou menor, de acordo com o ambiente em que foram selecionadas. É por isso, justamente, por todas possuírem esta qualidade, que encontramos a maior dificuldade em caracterizar o xerofitismo. Se se tratasse de algo peculiar a um grupo limitado de plantas, essa qualidade se revelaria imediatamente.\nPara concluir, resumimos: 1 - o termo \"xerofitismo\" deve ser usado como sinônimo da expressão \"resistência à seca\"; 2 - como todas as plantas têm, em graus variados, tal resistência, todas as plan