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1- INTRODUÇÃO A solidificação é um fenômeno de transformação de fases familiar e associado a nossa rotina diária, desde a produção de cubos de gelo até o manuseio de utensílios e componentes, os quais, na maioria dos casos, passaram pelo processo de solidificação em alguma etapa de sua fabricação. Com exceção dos artigos produzidos por metalurgia do pó, todos os demais passam, pelo menos uma vez, pelo processo de solidificação conforme fluxograma apresentado na Figura 1.1. Conforme fluxograma na Figura 1.1 observa-se que, mesmo após a conformação do produto semi-acabado, a solidificação pode ainda estar presente na etapa de acabamento do produto (solidificação na união de partes por meio de soldagem, refusão superficial por laser). A compreensão da teoria da solidificação é fundamental para o planejamento dos processos de fabricação, uma vez que permite o conhecimento dos fatores que influenciam a microestrutura e, portanto, a qualidade do produto. A estrutura que se forma imediatamente após a solidificação determina as propriedades do produto final. A solidificação é um campo complexo que envolve vários aspectos da Físico-Química, da Termodinâmica e da Cristalografia. O líquido, constituído de átomos de grande mobilidade e arranjados desordenadamente, se transforma num sólido em que os átomos formam modelo regular, ou reticulado cristalino, obedecendo a certas regras de cristalografia. Somente após o final da primeira metade do século XX os primeiros grupos de pesquisa passaram a analisar, de forma científica, os fenômenos que ocorrem durante a solidificação de materiais, até então só perduravam um grau de empirismo, particularmente na indústria de fundição. A partir destas pesquisas, os processos de fundição de lingotamento, incorporaram sensíveis inovações tecnológicas. Já há algum tempo, o interesse pela solidificação extrapola o campo das engenharias de materiais e metalúrgica, envolvendo inúmeros outros departamentos das ciências aplicadas, dando origem a novos conceitos da solidificação, agregado a fundamentos da eletrônica, mecânica, química, física, matemática aplicada, etc., é utilizado na solução de problemas tecnológicos concretos. Como exemplos podem ser citados: a) Purificação de materiais por refino zonal (baseado na rejeição de soluto ou solvente) e crescimento de cristais: a partir deste processo a indústria eletroeletrônica pode incorporar o refino zonal do silício para purezas maiores que 99,9999 viabilizando a fabricação de circuitos integrados com cristais de silício ultrapuro. b) Tratamentos superficiais por refusão com laser: consiste na modificação localizada de características mecânicas ou químicas sem necessidade de envolver o reprocessamento de todo o volume da peça. c) Obtenção de produtos acabados por solidificação rápida: fabricação de tiras finas de aços, com espessura da ordem de 1mm ou menos, a partir do estado líquido(consiste no vazamento do metal líquido entre dois rolos cilíndricos submetidos à rotação contínua e refrigerados internamente com água). 2 - NUCLEAÇÃO E CRESCIMENTO Como toda transformação de fases, a solidificação se processa em duas etapas sucessivas de nucleação e crescimento da nova fase em meio à anterior. O termo nucleação traduz o modo pelo qual a fase sólida surge de maneira estável no seio da fase líquida, sob a forma de pequenos núcleos cristalinos. O termo crescimento traduz o modo pelo qual esses núcleos crescem sob a forma de cristais ou grãos-cristalinos. A nucleação pode processar-se sob duas condições: (a) Nucleação homogênea: a fase sólida nucleia em meio à fase líquida, sem que haja interferência de agentes estranhos no sistema metal líquido/metal sólido. (b) Nucleação heterogênea: a fase sólida nucleia em meio à fase líquida, contando com a contribuição energética de agentes estranhos ao sistema, tais como, impurezas, inclusões sólidas, paredes do molde, inoculantes e aditivos. O estudo da solidificação envolve duas abordagens distintas. Na abordagem termodinâmica, analisam-se as energias envolvidas na solidificação enquanto na abordagem cinética, analisa-se a velocidade com que os processos (de nucleação e crescimento) acontecem. 2.1 Nucleação homogênea No estado líquido, os átomos, além de vibrarem, não possuem posição definida, pois estão em movimento dentro do líquido. Por se movimentarem, os átomos no estado líquido entram em colisão, envolvendo milhares de átomos simultaneamente. Pode-se imaginar que nesta colisão, surge um agrupamento momentâneo de átomos, formando um núcleo, com um dado arranjo atômico. [Image: Figura 2.1 - Colisão de átomos no líquido formando agrupamento de átomos.] Em sistemas sob pressão e temperatura constantes, a energia que controla o processo é a energia livre de Gibbs (G). Esta energia é definida por: G=H-TS Equação (2.1) Onde T é a temperatura, H é a entalpia e S a entropia da substância. A entalpia reflete uma medida da energia de ligação entre os átomos. Por outro lado, a entropia é a medida da desorganização interna da substância, ou seja, uma medida de como os átomos se arranjam. Em um sólido existe uma maior ordenação, isto é, menor entropia. A energia livre de Gibbs é um parâmetro indicador da estabilidade do sistema sob temperatura e pressão constantes. O sistema tende ao seu estado de mínima energia livre. Para a transformação de fases utiliza-se a variação da energia livre ΔG, sendo: ΔG=Gₛ - Gₗ Equação (2.2), ou ΔG= ΔH-TΔS Equação (2.3) Onde ΔH é a variação de entalpia e ΔS é a variação de entropia entre os estados de transformação (líquido e sólido). Como consequência do fato de que o sistema (sob temperatura e pressão constantes) tende a evoluir no sentido de minimizar a energia livre de Gibbs, temos que a variação desta energia (ΔG) é um valor que indica o sentido espontâneo de uma reação, de acordo com: Se ΔG>0: a reação não ocorre Se ΔG=0: a reação em equilíbrio Se ΔG<0: a reação ocorre (sentido espontâneo) Além de ΔG indicar a tendência de reação, tal valor é uma medida da energia disponível para que ocorra a reação sendo assim a força motriz da transformação. Quanto mais negativo ΔG, maior a tendência que ocorra a reação. À temperatura de fusão, T₁, a energia livre do líquido se iguala a do sólido: Hₗ-T₁Sₗ = Hₛ-T₁Sₛ Equação (2.4) ΔH=L (calor latente de fusão) ΔS= L/T₁ A equação anterior mostra que a variação em ordenação que ocorre pela transformação do líquido em sólido e pode ser quantificada pela relação entre o calor latente e a temperatura de fusão. Na Figura 2.2 mostra que na temperatura de fusão (T₁) as energias livres das duas fases são iguais. Abaixo da temperatura de fusão, o sólido é a fase estável já que apresenta menor energia livre. A uma temperatura T₂ abaixo de T₁, há uma quantidade maior de energia livre devido à transformação de um determinado volume de líquido em sólido. A uma temperatura T₃ < T₂, ocorre um decréscimo ainda maior de G. Isto significa que quanto maior o grau de super-resfriamento ΔT, maior a força motriz da transformação líquido/sólido. [Image: Figura 2.2 - Representação esquemática da variação da energia livre com a temperatura para um elemento puro.] O início da solidificação ocorre com a formação de núcleos sólidos estáveis. A formação de um núcleo envolve duas energias. A primeira é a energia de volume (ΔGv), resultante da transformação do líquido em sólido e que é liberada pelo sistema, atuando como força motriz da solidificação. A segunda é uma energia de superfície (ΔGspl) que surge devido à formação da interface sólido/líquido que exige consumo de energia pelo sistema e atua como barreira à solidificação. Assim: ΔGtotal = ΔGsup+ΔGvl. Equação (2.5) O núcleo formado somente sobrevive se a energia livre total diminuir. Essa condição sugere que a nucleação homogênea possa se dar por meio da formação de embriões esféricos, já que essa forma geométrica é a que apresenta a menor relação superfície/volume, ou seja, a geometria mais indicada energeticamente para a sobrevivência do embrião. Na Figura 2.3 são ilustradas as energias de volume e de superfície. Figura 2.3 - Variação na energia livre de Gibbs na nucleação homogênea. Observa-se que ΔG (total) é menor que zero para raio do núcleo igual a R1, o que sugere que o menor núcleo estável é aquele que possui raio R1. Todavia, caso se forme momentaneamente um núcleo com raio igual a R2 (onde ΔGtotal >0), têm-se duas possibilidades: - O núcleo pode perder átomos para o líquido, reduzindo seu tamanho, aumentando ΔGtotal (seta1), o que é termodinamicamente impossível. - Outra possibilidade é o núcleo ganhar átomos aumentando seu tamanho e consequentemente diminuindo ΔGtotal (seta 2), o que é termodinamicamente viável. Portanto, qualquer núcleo momentaneamente formado com tamanho entre Rc e R1, embora formado com ΔGtotal >0, tende a crescer, pois isto reduz ΔGtotal. Com base no exposto acima, resulta que existe um tamanho mínimo para que os núcleos possam crescer e se tornar estáveis. Este tamanho crítico é o chamado raio crítico (Rc). A este raio crítico corresponde um ΔG crítico, que é a barreira energética a ser vencida para haver solidificação. Desenvolvendo a equação 5 temos: ΔG = -1/3 × π × (rt)3×L× ΔT T + [4π × (rc2)] × γSL. Equação (2.6) 8 Onde: ySL = tensão superficial entre as fases sólida e líquida (energia por unidade de superfície). Derivando-se a equação 6 em função do raio e igualando a zero é possível determinar o raio crítico que é dado por: Rcr = 2ySL/L ΔT. Equação (2.7) e o valor de ΔG crítico determinado por: ΔGcrítico = 16π ySL3T L ΔT2. Equação (2.8) As equações (7) e (8) demonstram a dependência de Rc e ΔG crítico do super-resfriamento ΔT. Na vizinhança do ponto de fusão, Rc tende a infinito à medida que ΔG crítico aproxima-se de zero. Por outro lado, à medida que aumenta o super-resfriamento, ocorre um maior estímulo para a nucleação refletido em diminuição de Rc e ΔG crítico. A Tabela 2.1 resume os principais dados relativos à nucleação homogênea para uma série de elementos. Esses dados mostram que para alguns metais o valor de super-resfriamento máximo da ordem de 0,2Tf são exigidos para que ocorra a nucleação homogênea. Tabela 2.1 - Propriedades de interesse na nucleação de metais 8 Ouro 1336 230 0,172 132 67,4 5,1 Cobre 1356 236 0,174 177 205 4,9 Níquel 1725 319 0,185 255 297 4,5 Ferro 1809 295 0,163 204 272 4,0 A intensidade de formação de núcleos sólidos no meio da fase líquida é traduzida pela taxa de nucleação, I. I = (D/a2) 2 (C1 exp2 3 ΔG6)3kT. Equação (2.9) Onde: I - taxa de nucleação (núcleos/m3.s); a - distância que um átomo do líquido deve saltar para agregar-se ao embrião sólido(m); C1 - número de átomos/m3 no liquido; D- Coeficiente de difusão do líquido (m2/s); k - Constante de Boltzman = 1,38 x 10~23 J/K; 9 T- Temperatura de nucleação (Tf - ΔT). No caso de metais, pode-se assumir como valores típicos: C1 = 108m~3; D= 109 m2/s; e a = 0,3x10~9 m, de tal forma que a equação 9 toma a forma: í = 1010s exp (16πySL3Tf3kT). Equação (2.10) 2.2 - Nucleação heterogênea A nucleação heterogênea acontece quando a solidificação ocorre a partir de superfícies pré-existentes, tais como, paredes do molde ou quando da presença de partículas sólidas no líquido. A Figura 2.4, ilustra que a superfície a ser criada pela nucleação a partir de um substrato (nucleação heterogênea) é menor, comparada à da nucleação homogênea, podendo facilitar o processo, pois exige menor energia de interface. Figura 2.4 - Superfície a ser criada pela nucleação a partir de um substrato Considerando que o núcleo surge na forma de uma calota esférica sobre um substrato plano, conforme apresentado na Figura 2.5 a estabilidade do núcleo depende do equilíbrio mecânico das tensões superficiais no ponto de junção das três superfícies, ou seja: γL -γSL=γSt cosθ. Equação (2.11) Onde: γL - energia superficial líquido/substrato γSt- energia superficial sólido/substrato γSL- energia superficial sólido/líquido θ - ângulo de molhamento O ângulo de molhamento traduz a afinidade físico-química que existe entre o embrião e o substrato. 10 Figura 2.5 - Calota esférica de sólido formada sobre um substrato plano na nucleação heterogênea. A análise termodinâmica realizada para a nucleação homogênea pode ser aplicada para a nucleação heterogênea. Obtém-se, uma expressão para o raio crítico do núcleo sólido, idêntica a obtida para a nucleação homogênea, ou seja: R = \frac{2\gamma_{SL}}{\Delta G\_{LT}} Equação (2.12) A variação crítica da energia livre para a nucleação heterogênea é dada por: \Delta G\_{critico} = \frac{16\pi\gamma^3_{SL}T_f}{3(\Delta G)^2} \left [ \frac{1}{2} \left ( 2 − 3\cos\theta + \cos^3\theta \right ) \right ] Equação (2.13) θ = 0º θ = 180º MOLHAMENTO TOTAL MOLHAMENTO PARCIAL MOLHAMENTO NULO Nucleação Homogênea Figura 2.6 Para θ=180º, a variação crítica de energia livre é a mesma que para a nucleação homogênea, mas à medida que a molhabilidade vai aumentando e, consequentemente, θ vai diminuindo, a nucleação heterogênea vai se tornando um processo energeticamente cada vez mais favorável. A taxa de nucleação pode ser determinada por uma expressão análoga à apresentada para nucleação homogênea. I ≈ \left ( \frac{2}{\pi \nu \beta} \right ) \left ( \frac{2\pi \rho Z}{\sigma}\right ) C_s \exp \left (\frac{−16\pi\gamma^3(\Delta G)^2}{3k^3T^3}\right) f(θ) Equação (2.14) Onde: Ca − número de átomos na superfície do substrato por unidade de volume de líquido ≅10^{19} m^{-3}. f(θ) − fator de forma = \frac{1}{2}\left (2−3\cosθ+\cos^3θ\right) No caso particular dos metais a equação assume a forma: |I≈10^{b}|\exp\left (\frac{−16\pi\gamma^3(\Delta G)^2}{3k^3T^3}\right)f(θ) Equação (2.15) 2.3 − Agentes nucleantes A experiência prática mostra que o desempenho de uma peça fundida é tanto maior quanto menor for o tamanho médio dos grãos cristalinos que a constituem. Cada grão cresce a partir de um único núcleo, sendo, portanto, o número de núcleos que irá determinar o tamanho de grão final. As duas técnicas tradicionais de controle de tamanho de grão envolvem elevadas taxas de resfriamento e adição de agentes nucleantes ou refinadores de grão. A eficiência de um agente nucleante aumenta à medida que produza menores ângulos de contato entre a partícula nucleante, que age sob o composto substrato, e o núcleo sólido que está sendo formado. Isso implica, em elevada energia de superfície entre a partícula e o líquido, γ_{SL} e baixa energia de superfície entre o sólido formado e a partícula, γ_{ST}. A energia de superfície apresenta tendência de diminuição à medida que aumenta a similaridade entre os parâmetros das redes cristalinas do núcleo e do substrato nucleante, e também com a afinidade química entre eles. Além desses critérios, um agente nucleante deve ser o mais estável possível, sendo insolúvel no líquido, e apresentar o máximo de área superficial. Um aumento da rugosidade da superfície do nucleante diminui o ângulo de molhamento, tornando o agente mais eficiente. Representando a rugosidade por um parâmetro r, que define a relação entre as áreas real e projetada no contato núcleo/substrato nucleante, a equação que relaciona as energias de superfície, fica dada por: \cosθ = \frac{γ_{VL}−γ_{ST}}{γ_{SL}} Equação (2.16) Como r é maior que 1, o valor de \cosθ é maior do que no caso de um substrato nucleante com superfície lisa(r=1). Um parâmetro δ é utilizado para quantificar a similaridade dos parâmetros de rede entre o substrato nucleante e o núcleo sólido: δ = \frac{a_s−a_c}{a_c} Equação (2.17) onde: a_c − parâmetro de rede do núcleo sólido; a_s − parâmetro de rede do agente nucleante. Na prática comercial, agentes inoculantes são adicionados às ligas fundidas para produzir materiais de granulação fina. Estes incluem titânio e boro para ligas de alumínio, ferro-silício para ferros fundidos (nucleação da grafita), carbono para certas ligas de magnésio, e zircônia para outras. Em todos estes casos presume-se que o agente nucleante forma compostos com algum componente do metal e que este composto age como um substrato para a nucleação. O agente nucleante reduz o super-resfriamento necessário para a nucleação. O efeito do refinador de grão diminui com a temperatura e o tempo de manutenção do metal líquido. O efeito de fading do inoculante é explicado considerando-se que o núcleo heterogêneo altera sua composição ou suas características superficiais ou coalesce no metal com o tempo. A Tabela 2.2 mostra alguns compostos analisados como agentes nucleantes para o alumínio. Tabela 2.2 - Características de agentes nucleantes para o alumínio [Davies, 1973] Composto Estrutura δ Efeito nucleante VC Cúbica 0,014 Forte TiC Cúbica 0,060 Forte TiB2 Hexagonal 0,048 Forte AlB2 Hexagonal 0,038 Forte ZrC Cúbica 0,145 Forte NbC Cúbica 0,086 Forte W2C Hexagonal 0,035 Forte Fe3C Ortorrômbica 0,115 (a) Fraco 0,255 (b) Essa correlação entre valores baixos de δ e eficiência do agente nucleante nem sempre corresponde à realidade. A literatura mostra que a platina é um agente nucleante para o estanho, mais eficiente que a prata, que apresenta um parâmetro de rede mais próximo do estanho, o que demonstra que as características físico-químicas podem prevalecer sobre o parâmetro estrutural. Na Figura 2.7 são apresentadas variações na macroestrutura de uma liga AlMg pela utilização de agentes nucleantes para diferentes temperaturas de vazamento. Tr = 815ºC S/REFINO C/REFINO Tr = 750ºC Figura 2.7 - Influência do agente nucleante no refino de grão de uma liga AlMg. 2.4 - Nucleação dinâmica Consiste na aplicação de vibração em um líquido super-resfriado por meios mecânicos e ultra-som. A utilização de vibração a um líquido super-resfriado pode provocar a formação de núcleos sólidos mesmo em presença de super-resfriamentos mais baixos do que os normalmente exigidos. A explicação mais provável para o fenômeno é a de que o colapso de uma cavidade interna no líquido causa um aumento de pressão suficientemente grande para aumentar o ponto de fusão dos materiais que contraem ao solidificar-se, o que aumentaria proporcionalmente o super-resfriamento, gerando condições para a nucleação. Para materiais que expandem ao solidificar-se, a nucleação ocorreria após a rarefação que se segue ao pulso inicial de pressão. Quando se introduz uma vibração ao líquido, introduz-se, como consequência, correntes convectivas que podem romper as pontas de cristais em crescimento e distribuí-las no volume líquido onde atuarão como substratos nucleantes. 2.5 - Crescimento Após a consolidação do núcleo sólido, segue-se a fase de crescimento. A maneira pela qual o núcleo sólido cresce durante o processo de solidificação vai depender da estrutura atômica da interface sólido/líquido, que pode ser de dois tipos: (a) Interface difusa, que se caracteriza pela separação entre o sólido e o líquido por meio de uma faixa mista de regiões ordenadas e desordenadas com uma espessura aproximadamente de 50 átomos. É típico dos metais. (b) Interface faceteada ou lisa caracterizada pela separação entre a fase sólida e fase líquida por meio de uma faixa abrupta e nítida com não mais que 5 átomos de espessura. É típica dos materiais cerâmicos. O caso intermediário dos semicondutores é caracterizado por uma interface mista (difusa e lisa), dependendo da velocidade de crescimento. Os dois tipos de interface citados são apresentados esquematicamente na Figura 2.8. Figura 2.8 - Representação esquemática das interfaces difusa (a) e faceteada (b). A formação desses dois tipos de interface está ligada à variação de energia livre de superfície no momento da incorporação dos átomos às camadas atômicas de maior ordenação. Essa variação de energia livre de superfície, ΔGsup, é expressa por: ΔGsup/NkT = α p(1 − p) + p ln p + (α − p) ln(1 − p) Equação (2.18) onde: N= número de átomos na interface; k= constante de Boltzman (1,38 × 10^-23 J/K); Tf = temperatura de fusão; p= proporção de átomos ordenados na interface; α = constante adimensional de Jackson que define o tipo de material e é dada por: α = ΔSf/RTf = Δhf/R Equação (2.19) onde: L= calor latente de fusão; R= constante dos gases (8,31 J/mol K); ΔSf = entropia de fusão. A Figura 2.9 mostra a forma gráfica da equação 2.18 para vários valores de α. Figura 2.9 - Variação da energia livre de superfície com a fração de posições atômicas ocupadas. Para os metais α < α < 2, a interface sólido/líquido apresenta um mínimo de energia livre para cerca de 50% de ordenação atômica, o que permite a existência de uma interface difusa; para os cerâmicos α > 4; a interface apresenta um mínimo de energia livre para quase totalidade das posições atômicas ocupadas, o que leva a uma interface do tipo faceteada. Os metais crescem com interface difusa, segundo um regime de crescimento denominado normal. A velocidade média de crescimento (v) é relacionada com o super-resfriamento da interface (ΔT) pela relação: v = μhΔTf Equação (2.20) μh = K coeficiente cinético da ordem de 1 m/s K para os metais. No caso de crescimento com interface faceteada, considera-se que o crescimento ocorre pela nucleação homogênea de novas camadas na forma de discos que crescem lateralmente até que uma nova camada completa é formada. Nesse caso, a velocidade média de crescimento é dada por uma equação da forma: v= μcexp (− Δhf/RT) Equação (2.21) Onde μc e b são constantes. Na maioria dos estudos de cinética de crescimento de interfaces faceteadas, verificou-se que, quando são introduzidas discordâncias ao cristal, a velocidade de crescimento cresce rapidamente para valores de super-resfriamento da interface, relativamente baixos. Quando um cristal apresenta uma discordância em hélice na interface sólido/líquido, esta não se apresenta mais plana, mas sim com degraus aos quais os átomos vão sendo agregados, conforme esquematizado na Figura 2.10 (crescimento por discordância em hélice). Esse mecanismo apresenta uma lei de crescimento na forma: v = μdΔT² Equação (2.22) Onde μd é uma constante. Figura 2.10 - Esquema de crescimento por discordância em hélice. A Figura 2.11 a) mostra qualitativamente a variação da velocidade de crescimento com o super-resfriamento da interface, de acordo com a equação 2.22. A Figura 2.11 b) mostra a variação da velocidade de crescimento com o super-resfriamento para os regimes de crescimento normal, lateral e por discordância em hélice. Na Figura 2.11 b) mostra a necessidade de altos valores de super-resfriamento da interface para que ocorram valores para que ocorram valores observáveis de velocidade de crescimento para o caso de interfaces faceteadas. Figura 2.11 - Variação qualitativa da velocidade de crescimento com o super-resfriamento: a) (1) e (2) para interfaces difusas e (3) para interface facetada; b) comparação entre os três regimes de crescimento. 3 - REDISTRIBUIÇÃO DE SOLUTO As diferentes variáveis do processo de solidificação têm efeito sobre a composição química do sólido em crescimento. Para as ligas monofásicas, o sólido em crescimento apresenta com posição diferente da fase líquida. As variações das condições de crescimento resultam em variações na forma pela qual o soluto é distribuído entre as fases líquida e sólida, resultando em variações de composição química no metal solidificado. A incorporação de um soluto a um solvente leva à formação de uma solução binária que pode ser caracterizada através de um coeficiente de distribuição (ou redistribuição de soluto). No caso de soluções que apresentem fases com estados de agregação sólido e líquido em equilíbrio a uma determinada temperatura, pode-se definir o coeficiente de distribuição no equilíbrio (k), como a relação entre a concentração de soluto no sólido (C_s) e a correspondente concentração de soluto no líquido (C_l), ou seja: K = C_s/C_l Equação (3.1) A redistribuição de soluto pode ser controlada em determinadas condições de solidificação. Como exemplo citam-se os processo de refino zonal e processos de nivelamento por zona, empregados na dopagem de cristais ultrapuros. A maioria das situações de solidificação de ligas como os processos usuais de lingotamento, fundição e soldagem, pode ser tratada como se a interface sólido/líquido estivesse em um estado de equilíbrio, no qual sua velocidade de deslocamento é essencialmente controlada pela taxa de transporte de calor latente para fora da interface. A formação do sólido ocorre em condições tais que o sólido e o líquido junto à interface podem ser considerados em equilíbrio local, e tem suas composições dadas pelo diagrama de fases. Entretanto, em casos como o da solidificação de gotas a partir de líquidos super-resfriados, ou da solidificação de camadas de pequena espessura fundidas previamente através de laser, ocorrem velocidades de deslocamento da interface sólido/líquido da ordem de 100 mm/s ou mais, o que provoca um afastamento das condições locais de equilíbrio. Nestes casos, o valor de k se modifica com a velocidade da interface, até atingir a unidade quando ocorre solidificação sem redistribuição de soluto. Os diagramas de fases permitem a determinação do coeficiente de distribuição no equilíbrio em função da concentração de soluto e da temperatura. Considera-se que as linhas sólidas e líquidas são retas, conforme mostra a Figura 3.1, o coeficiente de distribuição de soluto é constante. O fato de se considerar k a constante facilita as abordagens teóricas sem afetar significativamente as conclusões. No caso em que a solubilidade do soluto no sólido for menor do que no líquido, o coeficiente de distribuição de soluto (k), será menor do que a unidade e na situação oposta, k > 1. Figura 3.1 - Representação Esquemática do Diagrama de Equilíbrio de Ligas Binárias: (a) k<1; (b) k>1. Analisando-se o resfriamento de um volume de líquido de composição nominal C_0, verifica-se que ao atingir-se a temperatura líquidus, o primeiro sólido a se formar deverá apresentar uma concentração menor do que a concentração do líquido que o origina, rejeitando consequentemente o soluto (k < 1), ou uma concentração maior que a nominal, rejeitando o solvente (k > 1). 3.1 - Solidificação em condições de equilíbrio Considera-se uma liga de composição k<1. No processo de solidificação em equilíbrio, a composição do sólido varia progressivamente desde a composição inicial C_i até o final C_s, enquanto, ao mesmo o tempo, a composição do líquido varia desde C_i até C_l. O fundamental no processo de solidificação em equilíbrio é que o líquido de composição uniforme, C_0, torna-se um sólido de composição uniforme, também C_s. Ou seja, a solidificação ocorre conforme previsto pelo diagrama de equilíbrio de fases. Figura 3.2 - Perfil de concentração de soluto em etapa intermediária da solidificação de uma barra em condições de equilíbrio. 3.2 - Solidificação fora do equilíbrio Mistura de soluto no líquido apenas por difusão Quando a velocidade de deslocamento da interface é suficientemente alta para impedir a solidificação em condições de equilíbrio, haverá um acúmulo de soluto nesta interface de modo que o primeiro sólido formado terá composição kC_0 até que este sólido atinja a composição C_0, o processo passa por um transiente inicial. Admitindo-se que a camada limite à frente da interface é muito menor que o comprimento da amostra, o processo atinge um estado estacionário que perdura até que a camada de líquido remanescente tenha comprimento aproximadamente igual ao da camada limite onde o processo passa agora por um transiente final. Na extremidade final da barra a concentração do líquido na interface assume valores menores que C_0/k e o sólido formado atinge concentrações maiores que C_s. A Figura 3.3 mostra uma representação esquemática do perfil do sólido formado nas três regiões. Figura 3.3 - Perfil de concentração de soluto nos transientes inicial e final: x_i - comprimento do transiente inicial. C_s = C_0 [1 - (1 - k) exp (-k D x_i)] Equação (3.2) X_i = 4D/u_k Equação (3.3) Onde D é o coeficiente de difusão do soluto no líquido. Quando o processo alcança o estado estacionário, as concentrações de soluto na interface são dadas respectivamente por C_s,i = C_0 e C_s,f = C_L/K. Para o estado estacionário, a quantidade de soluto que entra no elemento de volume deve ser igual à quantidade de soluto que sai deste mesmo elemento. O transiente final é caracterizado pela chegada da camada limite à extremidade da barra, o que conduz a concentração de soluto nesta extremidade ao limite imposto pela conservação de massas. Mistura completa de soluto no líquido sem difusão no sólido Nesta situação admite-se que o soluto encontra-se homogeneamente distribuído no líquido durante todo o processo e que a difusão no sólido é desprezível. A hipótese de concentração homogênea no líquido é razoável quando a amostra é bem pequena em relação à espessura da camada limite. A Figura 3.4 apresenta o perfil de concentração de soluto considerando-se a mistura de soluto no líquido apenas por difusão em uma etapa intermediária. Pela equação de Scheil (Scheil, 1942) a concentração de soluto no sólido pode ser dado por: Cs = kCo(1 - f)^(k-1) Equação (3.4) Figura 3.4 - Perfil de Concentração de Soluto em uma Etapa Intermediária da Solidificação com Mistura Completa no Líquido e sem Difusão no Sólido. C; - concentração eutética; Csm - concentração máxima de soluto do sólido em equilíbrio com o líquido de concentração eutética; &Cl - incremento na concentração de soluto do líquido em função de um avanço dfs(volume solidificado). A Figura 3.5 mostra um esquema do perfil de soluto resultante da solidificação de uma amostra nas condições mencionadas. Como o soluto rejeitado durante o processo é sempre homogeneamente distribuído no líquido, tudo se passa como se cada avanço da fronteira sólido/líquido uma nova linha de composição mais rica em soluto fosse submetida à solidificação, até o limite imposto pelo diagrama de fases. Este limite, no caso da Figura 3.3, seria o líquido de composição eutética em equilíbrio com o sólido de composição Cs. A partir deste ponto, todo o líquido remanescente estaria à composição eutética resultando em um determinado volume de sólido desta composição na extremidade final da amostra, conforme mostra o esquema da Figura 3.4. Figura 3.5 - Perfil de Concentração de Soluto no Final da Solidificação para Mistura completa no Líquido e ausência de difusão no sólido. 20 Outra forma de representar a Equação de Scheil é em termos das temperaturas do diagrama de fases. f_s = 1 - (T - T_r) / (T_m - T_r) Equação (3.5) Mistura completa de soluto no líquido com difusão no sólido Nos casos em que a difusão no sólido é considerável, este tipo de difusão é conhecido como difusão de retorno em função de ocorrer em sentido contrário ao da evolução da solidificação e foi objeto de abordagem de diversos autores. A solução clássica é de Brody e Flemings (Brody, 1966) e é baseada em um modelo de redistribuição unidimensional, de acordo com o esquema da Figura 3.6. A análise fundamenta-se na forma do perfil de soluto desta figura, onde a conservação de massas implica em: Δ_sL = A4 + Δ_L Equação (3.6) Figura 3.6 - Perfil de Concentração de Soluto em uma Etapa Intermediária da Solidificação com Mistura Completa no Líquido e Difusão no Sólido, antes e depois de um avanço df, na fração solidificada. Δ_sL - soluto rejeitado pelo sólido formado; A_l - parcela de soluto que aumenta a concentração do líquido; A_s - parcela de soluto que aumenta a concentração do sólido A análise de Brody e Flemings incorpora duas formas de deslocamento da interface: com velocidade constante; e com velocidade decrescendo parabolicamente com o tempo. Na primeira situação obtêm-se que o perfil de concentração soluto é dado pela equação 3.7 e para a segunda situação é dado pela equação 3.8. 21 Cs = kC0 [1 - (f_s / (1 + αkc))^(k-1)] Equação (3.7) Cs = kC0 [1 - (1 - 2αkc)f_s / (1 - αkc)]^(k-1)/(1 - αkc) Equação (3.8) A inserção de α=0,5 na equação 3.8 já a faz recair na Regra da Alavanca resultando que esta equação não possa traduzir a realidade de segregação de soluto em todo o campo de variação de α, sobretudo para altos valores deste parâmetro. Para atenuar o erro proveniente da quantificação do soluto de retorno para os casos de α elevado Clyne-Kurz (Clyne, 1981) desenvolveram uma solução aproximada, admitindo que o sólido constitui um sistema semi-infinito e que a curva de distribuição de soluto apresente uma forma exponencial. As modificações introduzidas conduzem a um parâmetro α_CL, que é função da constante α da análise de Brody e Flemings. Outra proposta foi formulada por Ohnaka e é baseada na solução da equação de difusão através do método do perfil integral, admitindo-se para tanto que a distribuição de soluto no sólido formado seja representada por uma expressão quadrática. Esta solução introduz também um novo parâmetro α_CL2 que também é função de α. As equações de Clyne-Kurz e de Ohnaka devem refletir essencialmente o mesmo perfil de segregação de soluto conforme pode ser visto na Figura 3.7. Figura 3.7 - Variação dos Parâmetros α_CL1 (Solução de Clyne-Kurz) e α_CL2 (Solução de Ohnaka), com α da Solução Clássica de Brody-Flemings. 22 Mistura parcial de soluto no líquido À medida que a solidificação evolui, conforme já foi analisado, ocorre rejeição progressiva de soluto, tendo como decorrência um aumento de sua concentração no líquido e um perfil crescente de soluto no sólido formado. Se o processo não ocorre de forma lenta, os átomos do soluto são rejeitados pela progressão do sólido a uma taxa maior que a necessária para que sejam difundidos através do volume do líquido, provocando um acúmulo de soluto à frente da interface sólido/líquido. É esta região enriquecida de soluto que irá determinar sua taxa de incorporação ao sólido. A Figura 3.8 apresenta um esquema desta situação física. Figura 3.8 – Acúmulo de Soluto junto à Interface S/L para Condições de Mistura Parcial no Líquido A mistura parcial de soluto no líquido, foi tratada originalmente por Burton, Prim e Slichter [Burton, 1953], que consideraram a mistura de soluto ocorrendo somente por difusão para 0 < x’ < δ, e que no volume de líquido restante as correntes de convecção sejam suficientes para manter a concentração uniforme (C^l). Por conveniência, nesta situação foi definido um coeficiente de redistribuição de soluto efetivo (kef) conforme equação 3.9: kef = \frac{k}{k+(1-k)exp\left(-\frac{νδ}{D}\right)} Equação (3.9) Esta expressão é utilizada para descrever a redistribuição de soluto em sistemas finitos desde que a espessura de δ seja pequena em comparação com o comprimento do sistema. Para isto, basta utilizar as relações apresentadas anteriormente, substituindo-se o coeficiente de distribuição (k) por kef, dentro de sua faixa de definição (k⩽kef⩽1,0). 3.3 - Análise comparativa de soluções para a evolução do perfil de soluto na solidificação A escolha da solução mais adequada para descrever a segregação de soluto em uma situação física real, vai depender do tipo de soluto a ser considerado, dos dados que se dispõe a respeito das propriedades da liga, tipo de análise que se pretende; quantitativa ou qualitativa, da precisão que se exige dos resultados, dentre outros aspectos. A Figura 3.9, apresenta uma descrição qualitativa do perfil de soluto obtido através da equação de Scheil, com kef substituindo k, porém omitindo transientes iniciais ou finais. Deve-se notar que no limite inferior (kef = k), recai-se no caso de mistura completa no líquido, e que o limite superior (kef =1,0) ocorre para solidificação em condições de equilíbrio. Figura 3.9 – Representação Qualitativa do Perfil de Segregação de Soluto através da Equação de Scheil com k = kef, para uma Liga de Composição C0. 3.4 – Consequências práticas do efeito da redistribuição e soluto Os efeitos da redistribuição de soluto em ligas são de grande interesse prático. O refino zonal, nivelamento zonal e dopagem seletiva são situações nas quais a redistribuição e soluto é utilizada para produção de materiais de altíssima pureza. O processo de refino zonal será tratado no capítulo seguinte. 4 - FUSÃO ZONAL O termo geral, fusão zonal, compreende uma família de métodos de controle da distribuição de impurezas solúveis nos materiais orgânicos e inorgânicos. É uma técnica amplamente utilizada devido ao maior grau de purificação obtido em comparação com o processo de solidificação normal. Uma zona líquida é formada a partir da fusão de uma pequena parte do material, a qual é lentamente deslocada ao longo da barra, permitindo manipular-se a distribuição das impurezas ao longo do sólido. Destacam-se os seguintes métodos de fusão zonal: Nivelamento zonal Consiste na passagem da zona líquida ao longo de uma barra de material originalmente não homogêneo repetidas vezes e alternando-se o sentido do deslocamento até que se consiga um perfil homogêneo de impurezas. Essa técnica permite que a impureza, ou elemento dopante, a ser distribuído uniformemente seja adicionado na quantidade desejada diretamente na zona líquida. Refino zonal A eliminação de impurezas de uma barra sólida, ou a separação de solutos de um solvente, pode ser conseguida passando-se a zona líquida repetidas vezes ao longo de uma barra do material. As impurezas são deslocadas na direção de uma das extremidades da barra onde ficam concentradas. Dopagem seletiva A fabricação de dispositivos eletrônicos exige a distribuição descontínua de impurezas em faixas, para a preparação das chamadas junções p-n. Partindo-se de um material ultrapuro, a adição seletiva e controlada de dopantes na zona líquida permite que seja alcançada uma distribuição compatível com as propriedades eletrônicas desejadas. 4.1 – Solidificação normal e determinação do coeficiente de redistribuição do soluto O perfil de segregação decorrente do processo de solidificação normal pode ser quantificado de acordo com as equações apresentadas no capítulo anterior, como por exemplo, a equação de Scheil, a qual devidamente modificada pela introdução do coeficiente kef é dado por: Cs = kefC0(1 − f)^{kef−1} Equação (4.1) A Figura 4.1 mostra curvas do perfil de concentração calculados de acordo com a equação (4.1) para valores kef variando de 0,01 a 5, onde nota-se o efeito purificador. Figura 4.1 – Perfis de concentração de soluto para solidificação normal com diferentes valores de Kef. Determinação do coeficiente de redistribuição de soluto No refino zonal é importante que os coeficientes de redistribuição dos solutos envolvidos sejam conhecidos. Pode-se determinar k através do diagrama de equilíbrio de fases e Kef é calculado utilizando-se a equação (3.9). A determinação de Kef relativo a uma impureza isolada, contida em um determinado material, pode ser realizada experimentalmente através de um equipamento tipo Bridgman. Para cada velocidade de deslocamento do forno de aquecimento, obtém-se amostras a partir das quais se determina o perfil de segregação por uma técnica de análise química pontual. O confronto da equação (4.1) com esse perfil experimental permite a determinação de Kef. A equação pode ser representada na forma: log Cs = logkef + (kef – 1)log(1 – fs) Equação (4.2) 4.2 Refino zonal Nessa técnica, ao invés da fusão completa da barra, somente uma pequena zona líquida é gerada e deslocada lentamente através da barra, conforme mostra esquematicamente a Figura 4.2. O soluto ou solvente rejeitado é acumulado nessa zona líquida e fica localizado na extremidade da barra. Essa zona líquida pode ser passada repetidas vezes ao longo da barra provocando um grau de purificação crescente. A eficiência do processo depende do valor de redistribuição do soluto, sendo mais eficiente para valores mais distantes da unidade. Figura 4.2 – Representação esquemática da técnica de fusão zonal horizontal. Na Figura 4.3 é apresentado esquematicamente o perfil de distribuição de uma impureza após a fusão zonal. Figura 4.3 – Perfil esquemático de distribuição de uma impureza após a fusão zonal. A eficiência do refino zonal, além do valor de k, depende também de uma série de parâmetros operacionais, tais como, tamanho da zona fundida, velocidade de deslocamento, grau de mistura do soluto no líquido, número de passes da zona líquida, etc. Distribuição de soluto na primeira passada A avaliação da distribuição de soluto ao longo da amostra baseia-se nas seguintes variáveis e hipóteses: a) O coeficiente de distribuição k é constante; b) O comprimento da zona líquida (l) e sua velocidade de deslocamento(v) são constantes em cada passada; c) A difusão de impurezas no sólido é desprezível; d) A concentração de soluto na zona líquida é uniforme; e) O sólido e o líquido têm densidades iguais; f) A concentração inicial C0 é uniforme ao longo da barra. As equações (4.3) e (4.4) permitem calcular o perfil de soluto na primeira passada do refino zonal, da posição x=0 até a posição x= l e da posição x= L - l e x= L, respectivamente. Cs = C0 [1 – (1 – k)exp(–k x)] Equação (4.3) Cs = C0 {1 – (1 – k)exp [–k ( x – l )]} {1 – [ (x – (x – l) ] k l} Equação (4.4) A Figura 4.4 mostra curvas de distribuição de soluto no sólido para vários valores de k, calculas a partir da equação (4.3). Figura 4.4 – Perfil de distribuição de soluto na primeira passada da fusão zonal para vários valores de K(l/L=0.1). No processo de refino zonal, a eficiência do processo de purificação fica efetivamente demonstrada quando a barra do material a ser purificada é submetida a múltiplas passadas. O processo de acúmulo de soluto nas extremidades da barra é gradativo, diminuindo de intensidade com o número crescente de passadas até que uma distribuição limite de soluto seja alcançada, a partir da qual o efeito purificador não corre mais em função de um equilíbrio entre fluxos de soluto. 4.3 – Crescimento de cristais Solidificação normal A técnica da solidificação normal vem sendo empregada há mais 80 anos no crescimento de monocristais de elementos puros e compostos orgânicos e inorgânicos. A Figura 4.5 apresenta esquemas representativos do processo realizado na forma vertical (método Bridgman e método Stockbarger) e horizontal. Os métodos Bridgman e Stockbarger são semelhantes diferindo apenas na existência de duas regiões distintas de aquecimento no método Stockbarger. Quando se utiliza apenas uma região de aquecimento como no caso do método Bridgman, o cristal após a solidificação atravessa uma região de temperaturas decrescentes e não uniformes podendo limitar a perfeição dos cristais em função das tensões decorrentes. Na solidificação normal horizontal, o material é colocado dentro de uma barqueta, que é inserida dentro do tubo que se desloca através do forno. Para facilitar o crescimento do monocristal, coloca-se uma semente (um cristal puro e com orientação cristalográfica pré-definida) na extremidade da barqueta na qual o material se solidificará primeiro. Na fase de aquecimento, tanto o material quanto parte da semente serão fundidos para assegurar a boa molhabilidade da semente pelo líquido. Figura 4.5 - Crescimento de monocristais por solidificação normal a) método Bridgman; b) método Stockbarger; c) solidificação normal horizontal. Refino zonal Embora o refino zonal tenha sido desenvolvido originalmente para eliminação de impurezas, o método pode combinar purificação com crescimento de cristais. Podem-se realizar várias passadas com o intuito de purificação terminando com uma passada final para o crescimento do cristal. Para materiais altamente reativos, foi desenvolvido o método de refino zonal vertical sem recipiente denominado refino zonal flutuante, mostrado esquematicamente na Figura 4.6. Esse método é o único adequado à preparação de materiais ultrapuros com pontos de fusão acima de 1400°C e permite a utilização de qualquer tipo de atmosfera. Nesse método a zona líquida desloca-se ao longo de uma barra cilíndrica do material disposta na posição vertical, e a tensão superficial tende a manter a zona líquida estável próxima do formato original da barra. Figura 4.6 - Representação esquemática do refino zonal flutuante. Crescimento Czochralski A técnica foi proposta por Czochralski em 1917 e, atualmente, é aplicada extensivamente na fabricação de cristais de materiais inorgânicos semicondutores, uma vez que a maioria desses materiais semicondutores sofre uma expansão ao solidificar-se e não pode crescer contida em um recipiente. Pode-se citar como exemplo o crescimento de monocristais de silício de alta perfeição para aplicação na fabricação de dispositivos eletrônicos e na confecção de células solares. A Figura 4.7 mostra um esquema ilustrativo da técnica. A rotação do eixo serve para manter uma agitação no líquido garantindo a uniformidade da composição do cristal. Figura 4.7 - Esquema do método Czochralski de crescimento de cristais. 5 – TRANSFERÊNCIA DE CALOR NA SOLIDIFICAÇÃO Na solidificação de um metal é fundamentalmente o processo de transferência de calor. O calor latente de fusão gasto para fundir o metal é liberado na interface sólido/líquido durante a solidificação e daí deve ser transferido para que o processo tenha continuidade. A velocidade de extração e transferência de calor através do metal tem relação direta com a velocidade de solidificação e com os gradientes térmicos do sistema, os quais têm influência significativa na qualidade metalúrgica final do metal solidificado. A análise do processo de transferência de calor na solidificação é uma ferramenta de controle e dimensionamento de sistemas metal/molde. A análise de transferência de calor na solidificação visa: a) Determinar a distribuição de temperatura, ou perfil térmico, do sistema analisado; b) Determinar a cinética de solidificação do metal, isto é, determinar o tempo necessário para solidificar uma determinada porção de metal. 5.1 – Modos de transferência de calor O calor é transferido através de três mecanismos básicos, sendo eles a condução, convecção e radiação. A Figura 4.1 evidencia todos os modos de transferência de calor que podem ocorrer durante a solidificação. Alguns destes modos de transferência de calor permanecem do início ao final da solidificação, enquanto outros são transitórios.
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1- INTRODUÇÃO A solidificação é um fenômeno de transformação de fases familiar e associado a nossa rotina diária, desde a produção de cubos de gelo até o manuseio de utensílios e componentes, os quais, na maioria dos casos, passaram pelo processo de solidificação em alguma etapa de sua fabricação. Com exceção dos artigos produzidos por metalurgia do pó, todos os demais passam, pelo menos uma vez, pelo processo de solidificação conforme fluxograma apresentado na Figura 1.1. Conforme fluxograma na Figura 1.1 observa-se que, mesmo após a conformação do produto semi-acabado, a solidificação pode ainda estar presente na etapa de acabamento do produto (solidificação na união de partes por meio de soldagem, refusão superficial por laser). A compreensão da teoria da solidificação é fundamental para o planejamento dos processos de fabricação, uma vez que permite o conhecimento dos fatores que influenciam a microestrutura e, portanto, a qualidade do produto. A estrutura que se forma imediatamente após a solidificação determina as propriedades do produto final. A solidificação é um campo complexo que envolve vários aspectos da Físico-Química, da Termodinâmica e da Cristalografia. O líquido, constituído de átomos de grande mobilidade e arranjados desordenadamente, se transforma num sólido em que os átomos formam modelo regular, ou reticulado cristalino, obedecendo a certas regras de cristalografia. Somente após o final da primeira metade do século XX os primeiros grupos de pesquisa passaram a analisar, de forma científica, os fenômenos que ocorrem durante a solidificação de materiais, até então só perduravam um grau de empirismo, particularmente na indústria de fundição. A partir destas pesquisas, os processos de fundição de lingotamento, incorporaram sensíveis inovações tecnológicas. Já há algum tempo, o interesse pela solidificação extrapola o campo das engenharias de materiais e metalúrgica, envolvendo inúmeros outros departamentos das ciências aplicadas, dando origem a novos conceitos da solidificação, agregado a fundamentos da eletrônica, mecânica, química, física, matemática aplicada, etc., é utilizado na solução de problemas tecnológicos concretos. Como exemplos podem ser citados: a) Purificação de materiais por refino zonal (baseado na rejeição de soluto ou solvente) e crescimento de cristais: a partir deste processo a indústria eletroeletrônica pode incorporar o refino zonal do silício para purezas maiores que 99,9999 viabilizando a fabricação de circuitos integrados com cristais de silício ultrapuro. b) Tratamentos superficiais por refusão com laser: consiste na modificação localizada de características mecânicas ou químicas sem necessidade de envolver o reprocessamento de todo o volume da peça. c) Obtenção de produtos acabados por solidificação rápida: fabricação de tiras finas de aços, com espessura da ordem de 1mm ou menos, a partir do estado líquido(consiste no vazamento do metal líquido entre dois rolos cilíndricos submetidos à rotação contínua e refrigerados internamente com água). 2 - NUCLEAÇÃO E CRESCIMENTO Como toda transformação de fases, a solidificação se processa em duas etapas sucessivas de nucleação e crescimento da nova fase em meio à anterior. O termo nucleação traduz o modo pelo qual a fase sólida surge de maneira estável no seio da fase líquida, sob a forma de pequenos núcleos cristalinos. O termo crescimento traduz o modo pelo qual esses núcleos crescem sob a forma de cristais ou grãos-cristalinos. A nucleação pode processar-se sob duas condições: (a) Nucleação homogênea: a fase sólida nucleia em meio à fase líquida, sem que haja interferência de agentes estranhos no sistema metal líquido/metal sólido. (b) Nucleação heterogênea: a fase sólida nucleia em meio à fase líquida, contando com a contribuição energética de agentes estranhos ao sistema, tais como, impurezas, inclusões sólidas, paredes do molde, inoculantes e aditivos. O estudo da solidificação envolve duas abordagens distintas. Na abordagem termodinâmica, analisam-se as energias envolvidas na solidificação enquanto na abordagem cinética, analisa-se a velocidade com que os processos (de nucleação e crescimento) acontecem. 2.1 Nucleação homogênea No estado líquido, os átomos, além de vibrarem, não possuem posição definida, pois estão em movimento dentro do líquido. Por se movimentarem, os átomos no estado líquido entram em colisão, envolvendo milhares de átomos simultaneamente. Pode-se imaginar que nesta colisão, surge um agrupamento momentâneo de átomos, formando um núcleo, com um dado arranjo atômico. [Image: Figura 2.1 - Colisão de átomos no líquido formando agrupamento de átomos.] Em sistemas sob pressão e temperatura constantes, a energia que controla o processo é a energia livre de Gibbs (G). Esta energia é definida por: G=H-TS Equação (2.1) Onde T é a temperatura, H é a entalpia e S a entropia da substância. A entalpia reflete uma medida da energia de ligação entre os átomos. Por outro lado, a entropia é a medida da desorganização interna da substância, ou seja, uma medida de como os átomos se arranjam. Em um sólido existe uma maior ordenação, isto é, menor entropia. A energia livre de Gibbs é um parâmetro indicador da estabilidade do sistema sob temperatura e pressão constantes. O sistema tende ao seu estado de mínima energia livre. Para a transformação de fases utiliza-se a variação da energia livre ΔG, sendo: ΔG=Gₛ - Gₗ Equação (2.2), ou ΔG= ΔH-TΔS Equação (2.3) Onde ΔH é a variação de entalpia e ΔS é a variação de entropia entre os estados de transformação (líquido e sólido). Como consequência do fato de que o sistema (sob temperatura e pressão constantes) tende a evoluir no sentido de minimizar a energia livre de Gibbs, temos que a variação desta energia (ΔG) é um valor que indica o sentido espontâneo de uma reação, de acordo com: Se ΔG>0: a reação não ocorre Se ΔG=0: a reação em equilíbrio Se ΔG<0: a reação ocorre (sentido espontâneo) Além de ΔG indicar a tendência de reação, tal valor é uma medida da energia disponível para que ocorra a reação sendo assim a força motriz da transformação. Quanto mais negativo ΔG, maior a tendência que ocorra a reação. À temperatura de fusão, T₁, a energia livre do líquido se iguala a do sólido: Hₗ-T₁Sₗ = Hₛ-T₁Sₛ Equação (2.4) ΔH=L (calor latente de fusão) ΔS= L/T₁ A equação anterior mostra que a variação em ordenação que ocorre pela transformação do líquido em sólido e pode ser quantificada pela relação entre o calor latente e a temperatura de fusão. Na Figura 2.2 mostra que na temperatura de fusão (T₁) as energias livres das duas fases são iguais. Abaixo da temperatura de fusão, o sólido é a fase estável já que apresenta menor energia livre. A uma temperatura T₂ abaixo de T₁, há uma quantidade maior de energia livre devido à transformação de um determinado volume de líquido em sólido. A uma temperatura T₃ < T₂, ocorre um decréscimo ainda maior de G. Isto significa que quanto maior o grau de super-resfriamento ΔT, maior a força motriz da transformação líquido/sólido. [Image: Figura 2.2 - Representação esquemática da variação da energia livre com a temperatura para um elemento puro.] O início da solidificação ocorre com a formação de núcleos sólidos estáveis. A formação de um núcleo envolve duas energias. A primeira é a energia de volume (ΔGv), resultante da transformação do líquido em sólido e que é liberada pelo sistema, atuando como força motriz da solidificação. A segunda é uma energia de superfície (ΔGspl) que surge devido à formação da interface sólido/líquido que exige consumo de energia pelo sistema e atua como barreira à solidificação. Assim: ΔGtotal = ΔGsup+ΔGvl. Equação (2.5) O núcleo formado somente sobrevive se a energia livre total diminuir. Essa condição sugere que a nucleação homogênea possa se dar por meio da formação de embriões esféricos, já que essa forma geométrica é a que apresenta a menor relação superfície/volume, ou seja, a geometria mais indicada energeticamente para a sobrevivência do embrião. Na Figura 2.3 são ilustradas as energias de volume e de superfície. Figura 2.3 - Variação na energia livre de Gibbs na nucleação homogênea. Observa-se que ΔG (total) é menor que zero para raio do núcleo igual a R1, o que sugere que o menor núcleo estável é aquele que possui raio R1. Todavia, caso se forme momentaneamente um núcleo com raio igual a R2 (onde ΔGtotal >0), têm-se duas possibilidades: - O núcleo pode perder átomos para o líquido, reduzindo seu tamanho, aumentando ΔGtotal (seta1), o que é termodinamicamente impossível. - Outra possibilidade é o núcleo ganhar átomos aumentando seu tamanho e consequentemente diminuindo ΔGtotal (seta 2), o que é termodinamicamente viável. Portanto, qualquer núcleo momentaneamente formado com tamanho entre Rc e R1, embora formado com ΔGtotal >0, tende a crescer, pois isto reduz ΔGtotal. Com base no exposto acima, resulta que existe um tamanho mínimo para que os núcleos possam crescer e se tornar estáveis. Este tamanho crítico é o chamado raio crítico (Rc). A este raio crítico corresponde um ΔG crítico, que é a barreira energética a ser vencida para haver solidificação. Desenvolvendo a equação 5 temos: ΔG = -1/3 × π × (rt)3×L× ΔT T + [4π × (rc2)] × γSL. Equação (2.6) 8 Onde: ySL = tensão superficial entre as fases sólida e líquida (energia por unidade de superfície). Derivando-se a equação 6 em função do raio e igualando a zero é possível determinar o raio crítico que é dado por: Rcr = 2ySL/L ΔT. Equação (2.7) e o valor de ΔG crítico determinado por: ΔGcrítico = 16π ySL3T L ΔT2. Equação (2.8) As equações (7) e (8) demonstram a dependência de Rc e ΔG crítico do super-resfriamento ΔT. Na vizinhança do ponto de fusão, Rc tende a infinito à medida que ΔG crítico aproxima-se de zero. Por outro lado, à medida que aumenta o super-resfriamento, ocorre um maior estímulo para a nucleação refletido em diminuição de Rc e ΔG crítico. A Tabela 2.1 resume os principais dados relativos à nucleação homogênea para uma série de elementos. Esses dados mostram que para alguns metais o valor de super-resfriamento máximo da ordem de 0,2Tf são exigidos para que ocorra a nucleação homogênea. Tabela 2.1 - Propriedades de interesse na nucleação de metais 8 Ouro 1336 230 0,172 132 67,4 5,1 Cobre 1356 236 0,174 177 205 4,9 Níquel 1725 319 0,185 255 297 4,5 Ferro 1809 295 0,163 204 272 4,0 A intensidade de formação de núcleos sólidos no meio da fase líquida é traduzida pela taxa de nucleação, I. I = (D/a2) 2 (C1 exp2 3 ΔG6)3kT. Equação (2.9) Onde: I - taxa de nucleação (núcleos/m3.s); a - distância que um átomo do líquido deve saltar para agregar-se ao embrião sólido(m); C1 - número de átomos/m3 no liquido; D- Coeficiente de difusão do líquido (m2/s); k - Constante de Boltzman = 1,38 x 10~23 J/K; 9 T- Temperatura de nucleação (Tf - ΔT). No caso de metais, pode-se assumir como valores típicos: C1 = 108m~3; D= 109 m2/s; e a = 0,3x10~9 m, de tal forma que a equação 9 toma a forma: í = 1010s exp (16πySL3Tf3kT). Equação (2.10) 2.2 - Nucleação heterogênea A nucleação heterogênea acontece quando a solidificação ocorre a partir de superfícies pré-existentes, tais como, paredes do molde ou quando da presença de partículas sólidas no líquido. A Figura 2.4, ilustra que a superfície a ser criada pela nucleação a partir de um substrato (nucleação heterogênea) é menor, comparada à da nucleação homogênea, podendo facilitar o processo, pois exige menor energia de interface. Figura 2.4 - Superfície a ser criada pela nucleação a partir de um substrato Considerando que o núcleo surge na forma de uma calota esférica sobre um substrato plano, conforme apresentado na Figura 2.5 a estabilidade do núcleo depende do equilíbrio mecânico das tensões superficiais no ponto de junção das três superfícies, ou seja: γL -γSL=γSt cosθ. Equação (2.11) Onde: γL - energia superficial líquido/substrato γSt- energia superficial sólido/substrato γSL- energia superficial sólido/líquido θ - ângulo de molhamento O ângulo de molhamento traduz a afinidade físico-química que existe entre o embrião e o substrato. 10 Figura 2.5 - Calota esférica de sólido formada sobre um substrato plano na nucleação heterogênea. A análise termodinâmica realizada para a nucleação homogênea pode ser aplicada para a nucleação heterogênea. Obtém-se, uma expressão para o raio crítico do núcleo sólido, idêntica a obtida para a nucleação homogênea, ou seja: R = \frac{2\gamma_{SL}}{\Delta G\_{LT}} Equação (2.12) A variação crítica da energia livre para a nucleação heterogênea é dada por: \Delta G\_{critico} = \frac{16\pi\gamma^3_{SL}T_f}{3(\Delta G)^2} \left [ \frac{1}{2} \left ( 2 − 3\cos\theta + \cos^3\theta \right ) \right ] Equação (2.13) θ = 0º θ = 180º MOLHAMENTO TOTAL MOLHAMENTO PARCIAL MOLHAMENTO NULO Nucleação Homogênea Figura 2.6 Para θ=180º, a variação crítica de energia livre é a mesma que para a nucleação homogênea, mas à medida que a molhabilidade vai aumentando e, consequentemente, θ vai diminuindo, a nucleação heterogênea vai se tornando um processo energeticamente cada vez mais favorável. A taxa de nucleação pode ser determinada por uma expressão análoga à apresentada para nucleação homogênea. I ≈ \left ( \frac{2}{\pi \nu \beta} \right ) \left ( \frac{2\pi \rho Z}{\sigma}\right ) C_s \exp \left (\frac{−16\pi\gamma^3(\Delta G)^2}{3k^3T^3}\right) f(θ) Equação (2.14) Onde: Ca − número de átomos na superfície do substrato por unidade de volume de líquido ≅10^{19} m^{-3}. f(θ) − fator de forma = \frac{1}{2}\left (2−3\cosθ+\cos^3θ\right) No caso particular dos metais a equação assume a forma: |I≈10^{b}|\exp\left (\frac{−16\pi\gamma^3(\Delta G)^2}{3k^3T^3}\right)f(θ) Equação (2.15) 2.3 − Agentes nucleantes A experiência prática mostra que o desempenho de uma peça fundida é tanto maior quanto menor for o tamanho médio dos grãos cristalinos que a constituem. Cada grão cresce a partir de um único núcleo, sendo, portanto, o número de núcleos que irá determinar o tamanho de grão final. As duas técnicas tradicionais de controle de tamanho de grão envolvem elevadas taxas de resfriamento e adição de agentes nucleantes ou refinadores de grão. A eficiência de um agente nucleante aumenta à medida que produza menores ângulos de contato entre a partícula nucleante, que age sob o composto substrato, e o núcleo sólido que está sendo formado. Isso implica, em elevada energia de superfície entre a partícula e o líquido, γ_{SL} e baixa energia de superfície entre o sólido formado e a partícula, γ_{ST}. A energia de superfície apresenta tendência de diminuição à medida que aumenta a similaridade entre os parâmetros das redes cristalinas do núcleo e do substrato nucleante, e também com a afinidade química entre eles. Além desses critérios, um agente nucleante deve ser o mais estável possível, sendo insolúvel no líquido, e apresentar o máximo de área superficial. Um aumento da rugosidade da superfície do nucleante diminui o ângulo de molhamento, tornando o agente mais eficiente. Representando a rugosidade por um parâmetro r, que define a relação entre as áreas real e projetada no contato núcleo/substrato nucleante, a equação que relaciona as energias de superfície, fica dada por: \cosθ = \frac{γ_{VL}−γ_{ST}}{γ_{SL}} Equação (2.16) Como r é maior que 1, o valor de \cosθ é maior do que no caso de um substrato nucleante com superfície lisa(r=1). Um parâmetro δ é utilizado para quantificar a similaridade dos parâmetros de rede entre o substrato nucleante e o núcleo sólido: δ = \frac{a_s−a_c}{a_c} Equação (2.17) onde: a_c − parâmetro de rede do núcleo sólido; a_s − parâmetro de rede do agente nucleante. Na prática comercial, agentes inoculantes são adicionados às ligas fundidas para produzir materiais de granulação fina. Estes incluem titânio e boro para ligas de alumínio, ferro-silício para ferros fundidos (nucleação da grafita), carbono para certas ligas de magnésio, e zircônia para outras. Em todos estes casos presume-se que o agente nucleante forma compostos com algum componente do metal e que este composto age como um substrato para a nucleação. O agente nucleante reduz o super-resfriamento necessário para a nucleação. O efeito do refinador de grão diminui com a temperatura e o tempo de manutenção do metal líquido. O efeito de fading do inoculante é explicado considerando-se que o núcleo heterogêneo altera sua composição ou suas características superficiais ou coalesce no metal com o tempo. A Tabela 2.2 mostra alguns compostos analisados como agentes nucleantes para o alumínio. Tabela 2.2 - Características de agentes nucleantes para o alumínio [Davies, 1973] Composto Estrutura δ Efeito nucleante VC Cúbica 0,014 Forte TiC Cúbica 0,060 Forte TiB2 Hexagonal 0,048 Forte AlB2 Hexagonal 0,038 Forte ZrC Cúbica 0,145 Forte NbC Cúbica 0,086 Forte W2C Hexagonal 0,035 Forte Fe3C Ortorrômbica 0,115 (a) Fraco 0,255 (b) Essa correlação entre valores baixos de δ e eficiência do agente nucleante nem sempre corresponde à realidade. A literatura mostra que a platina é um agente nucleante para o estanho, mais eficiente que a prata, que apresenta um parâmetro de rede mais próximo do estanho, o que demonstra que as características físico-químicas podem prevalecer sobre o parâmetro estrutural. Na Figura 2.7 são apresentadas variações na macroestrutura de uma liga AlMg pela utilização de agentes nucleantes para diferentes temperaturas de vazamento. Tr = 815ºC S/REFINO C/REFINO Tr = 750ºC Figura 2.7 - Influência do agente nucleante no refino de grão de uma liga AlMg. 2.4 - Nucleação dinâmica Consiste na aplicação de vibração em um líquido super-resfriado por meios mecânicos e ultra-som. A utilização de vibração a um líquido super-resfriado pode provocar a formação de núcleos sólidos mesmo em presença de super-resfriamentos mais baixos do que os normalmente exigidos. A explicação mais provável para o fenômeno é a de que o colapso de uma cavidade interna no líquido causa um aumento de pressão suficientemente grande para aumentar o ponto de fusão dos materiais que contraem ao solidificar-se, o que aumentaria proporcionalmente o super-resfriamento, gerando condições para a nucleação. Para materiais que expandem ao solidificar-se, a nucleação ocorreria após a rarefação que se segue ao pulso inicial de pressão. Quando se introduz uma vibração ao líquido, introduz-se, como consequência, correntes convectivas que podem romper as pontas de cristais em crescimento e distribuí-las no volume líquido onde atuarão como substratos nucleantes. 2.5 - Crescimento Após a consolidação do núcleo sólido, segue-se a fase de crescimento. A maneira pela qual o núcleo sólido cresce durante o processo de solidificação vai depender da estrutura atômica da interface sólido/líquido, que pode ser de dois tipos: (a) Interface difusa, que se caracteriza pela separação entre o sólido e o líquido por meio de uma faixa mista de regiões ordenadas e desordenadas com uma espessura aproximadamente de 50 átomos. É típico dos metais. (b) Interface faceteada ou lisa caracterizada pela separação entre a fase sólida e fase líquida por meio de uma faixa abrupta e nítida com não mais que 5 átomos de espessura. É típica dos materiais cerâmicos. O caso intermediário dos semicondutores é caracterizado por uma interface mista (difusa e lisa), dependendo da velocidade de crescimento. Os dois tipos de interface citados são apresentados esquematicamente na Figura 2.8. Figura 2.8 - Representação esquemática das interfaces difusa (a) e faceteada (b). A formação desses dois tipos de interface está ligada à variação de energia livre de superfície no momento da incorporação dos átomos às camadas atômicas de maior ordenação. Essa variação de energia livre de superfície, ΔGsup, é expressa por: ΔGsup/NkT = α p(1 − p) + p ln p + (α − p) ln(1 − p) Equação (2.18) onde: N= número de átomos na interface; k= constante de Boltzman (1,38 × 10^-23 J/K); Tf = temperatura de fusão; p= proporção de átomos ordenados na interface; α = constante adimensional de Jackson que define o tipo de material e é dada por: α = ΔSf/RTf = Δhf/R Equação (2.19) onde: L= calor latente de fusão; R= constante dos gases (8,31 J/mol K); ΔSf = entropia de fusão. A Figura 2.9 mostra a forma gráfica da equação 2.18 para vários valores de α. Figura 2.9 - Variação da energia livre de superfície com a fração de posições atômicas ocupadas. Para os metais α < α < 2, a interface sólido/líquido apresenta um mínimo de energia livre para cerca de 50% de ordenação atômica, o que permite a existência de uma interface difusa; para os cerâmicos α > 4; a interface apresenta um mínimo de energia livre para quase totalidade das posições atômicas ocupadas, o que leva a uma interface do tipo faceteada. Os metais crescem com interface difusa, segundo um regime de crescimento denominado normal. A velocidade média de crescimento (v) é relacionada com o super-resfriamento da interface (ΔT) pela relação: v = μhΔTf Equação (2.20) μh = K coeficiente cinético da ordem de 1 m/s K para os metais. No caso de crescimento com interface faceteada, considera-se que o crescimento ocorre pela nucleação homogênea de novas camadas na forma de discos que crescem lateralmente até que uma nova camada completa é formada. Nesse caso, a velocidade média de crescimento é dada por uma equação da forma: v= μcexp (− Δhf/RT) Equação (2.21) Onde μc e b são constantes. Na maioria dos estudos de cinética de crescimento de interfaces faceteadas, verificou-se que, quando são introduzidas discordâncias ao cristal, a velocidade de crescimento cresce rapidamente para valores de super-resfriamento da interface, relativamente baixos. Quando um cristal apresenta uma discordância em hélice na interface sólido/líquido, esta não se apresenta mais plana, mas sim com degraus aos quais os átomos vão sendo agregados, conforme esquematizado na Figura 2.10 (crescimento por discordância em hélice). Esse mecanismo apresenta uma lei de crescimento na forma: v = μdΔT² Equação (2.22) Onde μd é uma constante. Figura 2.10 - Esquema de crescimento por discordância em hélice. A Figura 2.11 a) mostra qualitativamente a variação da velocidade de crescimento com o super-resfriamento da interface, de acordo com a equação 2.22. A Figura 2.11 b) mostra a variação da velocidade de crescimento com o super-resfriamento para os regimes de crescimento normal, lateral e por discordância em hélice. Na Figura 2.11 b) mostra a necessidade de altos valores de super-resfriamento da interface para que ocorram valores para que ocorram valores observáveis de velocidade de crescimento para o caso de interfaces faceteadas. Figura 2.11 - Variação qualitativa da velocidade de crescimento com o super-resfriamento: a) (1) e (2) para interfaces difusas e (3) para interface facetada; b) comparação entre os três regimes de crescimento. 3 - REDISTRIBUIÇÃO DE SOLUTO As diferentes variáveis do processo de solidificação têm efeito sobre a composição química do sólido em crescimento. Para as ligas monofásicas, o sólido em crescimento apresenta com posição diferente da fase líquida. As variações das condições de crescimento resultam em variações na forma pela qual o soluto é distribuído entre as fases líquida e sólida, resultando em variações de composição química no metal solidificado. A incorporação de um soluto a um solvente leva à formação de uma solução binária que pode ser caracterizada através de um coeficiente de distribuição (ou redistribuição de soluto). No caso de soluções que apresentem fases com estados de agregação sólido e líquido em equilíbrio a uma determinada temperatura, pode-se definir o coeficiente de distribuição no equilíbrio (k), como a relação entre a concentração de soluto no sólido (C_s) e a correspondente concentração de soluto no líquido (C_l), ou seja: K = C_s/C_l Equação (3.1) A redistribuição de soluto pode ser controlada em determinadas condições de solidificação. Como exemplo citam-se os processo de refino zonal e processos de nivelamento por zona, empregados na dopagem de cristais ultrapuros. A maioria das situações de solidificação de ligas como os processos usuais de lingotamento, fundição e soldagem, pode ser tratada como se a interface sólido/líquido estivesse em um estado de equilíbrio, no qual sua velocidade de deslocamento é essencialmente controlada pela taxa de transporte de calor latente para fora da interface. A formação do sólido ocorre em condições tais que o sólido e o líquido junto à interface podem ser considerados em equilíbrio local, e tem suas composições dadas pelo diagrama de fases. Entretanto, em casos como o da solidificação de gotas a partir de líquidos super-resfriados, ou da solidificação de camadas de pequena espessura fundidas previamente através de laser, ocorrem velocidades de deslocamento da interface sólido/líquido da ordem de 100 mm/s ou mais, o que provoca um afastamento das condições locais de equilíbrio. Nestes casos, o valor de k se modifica com a velocidade da interface, até atingir a unidade quando ocorre solidificação sem redistribuição de soluto. Os diagramas de fases permitem a determinação do coeficiente de distribuição no equilíbrio em função da concentração de soluto e da temperatura. Considera-se que as linhas sólidas e líquidas são retas, conforme mostra a Figura 3.1, o coeficiente de distribuição de soluto é constante. O fato de se considerar k a constante facilita as abordagens teóricas sem afetar significativamente as conclusões. No caso em que a solubilidade do soluto no sólido for menor do que no líquido, o coeficiente de distribuição de soluto (k), será menor do que a unidade e na situação oposta, k > 1. Figura 3.1 - Representação Esquemática do Diagrama de Equilíbrio de Ligas Binárias: (a) k<1; (b) k>1. Analisando-se o resfriamento de um volume de líquido de composição nominal C_0, verifica-se que ao atingir-se a temperatura líquidus, o primeiro sólido a se formar deverá apresentar uma concentração menor do que a concentração do líquido que o origina, rejeitando consequentemente o soluto (k < 1), ou uma concentração maior que a nominal, rejeitando o solvente (k > 1). 3.1 - Solidificação em condições de equilíbrio Considera-se uma liga de composição k<1. No processo de solidificação em equilíbrio, a composição do sólido varia progressivamente desde a composição inicial C_i até o final C_s, enquanto, ao mesmo o tempo, a composição do líquido varia desde C_i até C_l. O fundamental no processo de solidificação em equilíbrio é que o líquido de composição uniforme, C_0, torna-se um sólido de composição uniforme, também C_s. Ou seja, a solidificação ocorre conforme previsto pelo diagrama de equilíbrio de fases. Figura 3.2 - Perfil de concentração de soluto em etapa intermediária da solidificação de uma barra em condições de equilíbrio. 3.2 - Solidificação fora do equilíbrio Mistura de soluto no líquido apenas por difusão Quando a velocidade de deslocamento da interface é suficientemente alta para impedir a solidificação em condições de equilíbrio, haverá um acúmulo de soluto nesta interface de modo que o primeiro sólido formado terá composição kC_0 até que este sólido atinja a composição C_0, o processo passa por um transiente inicial. Admitindo-se que a camada limite à frente da interface é muito menor que o comprimento da amostra, o processo atinge um estado estacionário que perdura até que a camada de líquido remanescente tenha comprimento aproximadamente igual ao da camada limite onde o processo passa agora por um transiente final. Na extremidade final da barra a concentração do líquido na interface assume valores menores que C_0/k e o sólido formado atinge concentrações maiores que C_s. A Figura 3.3 mostra uma representação esquemática do perfil do sólido formado nas três regiões. Figura 3.3 - Perfil de concentração de soluto nos transientes inicial e final: x_i - comprimento do transiente inicial. C_s = C_0 [1 - (1 - k) exp (-k D x_i)] Equação (3.2) X_i = 4D/u_k Equação (3.3) Onde D é o coeficiente de difusão do soluto no líquido. Quando o processo alcança o estado estacionário, as concentrações de soluto na interface são dadas respectivamente por C_s,i = C_0 e C_s,f = C_L/K. Para o estado estacionário, a quantidade de soluto que entra no elemento de volume deve ser igual à quantidade de soluto que sai deste mesmo elemento. O transiente final é caracterizado pela chegada da camada limite à extremidade da barra, o que conduz a concentração de soluto nesta extremidade ao limite imposto pela conservação de massas. Mistura completa de soluto no líquido sem difusão no sólido Nesta situação admite-se que o soluto encontra-se homogeneamente distribuído no líquido durante todo o processo e que a difusão no sólido é desprezível. A hipótese de concentração homogênea no líquido é razoável quando a amostra é bem pequena em relação à espessura da camada limite. A Figura 3.4 apresenta o perfil de concentração de soluto considerando-se a mistura de soluto no líquido apenas por difusão em uma etapa intermediária. Pela equação de Scheil (Scheil, 1942) a concentração de soluto no sólido pode ser dado por: Cs = kCo(1 - f)^(k-1) Equação (3.4) Figura 3.4 - Perfil de Concentração de Soluto em uma Etapa Intermediária da Solidificação com Mistura Completa no Líquido e sem Difusão no Sólido. C; - concentração eutética; Csm - concentração máxima de soluto do sólido em equilíbrio com o líquido de concentração eutética; &Cl - incremento na concentração de soluto do líquido em função de um avanço dfs(volume solidificado). A Figura 3.5 mostra um esquema do perfil de soluto resultante da solidificação de uma amostra nas condições mencionadas. Como o soluto rejeitado durante o processo é sempre homogeneamente distribuído no líquido, tudo se passa como se cada avanço da fronteira sólido/líquido uma nova linha de composição mais rica em soluto fosse submetida à solidificação, até o limite imposto pelo diagrama de fases. Este limite, no caso da Figura 3.3, seria o líquido de composição eutética em equilíbrio com o sólido de composição Cs. A partir deste ponto, todo o líquido remanescente estaria à composição eutética resultando em um determinado volume de sólido desta composição na extremidade final da amostra, conforme mostra o esquema da Figura 3.4. Figura 3.5 - Perfil de Concentração de Soluto no Final da Solidificação para Mistura completa no Líquido e ausência de difusão no sólido. 20 Outra forma de representar a Equação de Scheil é em termos das temperaturas do diagrama de fases. f_s = 1 - (T - T_r) / (T_m - T_r) Equação (3.5) Mistura completa de soluto no líquido com difusão no sólido Nos casos em que a difusão no sólido é considerável, este tipo de difusão é conhecido como difusão de retorno em função de ocorrer em sentido contrário ao da evolução da solidificação e foi objeto de abordagem de diversos autores. A solução clássica é de Brody e Flemings (Brody, 1966) e é baseada em um modelo de redistribuição unidimensional, de acordo com o esquema da Figura 3.6. A análise fundamenta-se na forma do perfil de soluto desta figura, onde a conservação de massas implica em: Δ_sL = A4 + Δ_L Equação (3.6) Figura 3.6 - Perfil de Concentração de Soluto em uma Etapa Intermediária da Solidificação com Mistura Completa no Líquido e Difusão no Sólido, antes e depois de um avanço df, na fração solidificada. Δ_sL - soluto rejeitado pelo sólido formado; A_l - parcela de soluto que aumenta a concentração do líquido; A_s - parcela de soluto que aumenta a concentração do sólido A análise de Brody e Flemings incorpora duas formas de deslocamento da interface: com velocidade constante; e com velocidade decrescendo parabolicamente com o tempo. Na primeira situação obtêm-se que o perfil de concentração soluto é dado pela equação 3.7 e para a segunda situação é dado pela equação 3.8. 21 Cs = kC0 [1 - (f_s / (1 + αkc))^(k-1)] Equação (3.7) Cs = kC0 [1 - (1 - 2αkc)f_s / (1 - αkc)]^(k-1)/(1 - αkc) Equação (3.8) A inserção de α=0,5 na equação 3.8 já a faz recair na Regra da Alavanca resultando que esta equação não possa traduzir a realidade de segregação de soluto em todo o campo de variação de α, sobretudo para altos valores deste parâmetro. Para atenuar o erro proveniente da quantificação do soluto de retorno para os casos de α elevado Clyne-Kurz (Clyne, 1981) desenvolveram uma solução aproximada, admitindo que o sólido constitui um sistema semi-infinito e que a curva de distribuição de soluto apresente uma forma exponencial. As modificações introduzidas conduzem a um parâmetro α_CL, que é função da constante α da análise de Brody e Flemings. Outra proposta foi formulada por Ohnaka e é baseada na solução da equação de difusão através do método do perfil integral, admitindo-se para tanto que a distribuição de soluto no sólido formado seja representada por uma expressão quadrática. Esta solução introduz também um novo parâmetro α_CL2 que também é função de α. As equações de Clyne-Kurz e de Ohnaka devem refletir essencialmente o mesmo perfil de segregação de soluto conforme pode ser visto na Figura 3.7. Figura 3.7 - Variação dos Parâmetros α_CL1 (Solução de Clyne-Kurz) e α_CL2 (Solução de Ohnaka), com α da Solução Clássica de Brody-Flemings. 22 Mistura parcial de soluto no líquido À medida que a solidificação evolui, conforme já foi analisado, ocorre rejeição progressiva de soluto, tendo como decorrência um aumento de sua concentração no líquido e um perfil crescente de soluto no sólido formado. Se o processo não ocorre de forma lenta, os átomos do soluto são rejeitados pela progressão do sólido a uma taxa maior que a necessária para que sejam difundidos através do volume do líquido, provocando um acúmulo de soluto à frente da interface sólido/líquido. É esta região enriquecida de soluto que irá determinar sua taxa de incorporação ao sólido. A Figura 3.8 apresenta um esquema desta situação física. Figura 3.8 – Acúmulo de Soluto junto à Interface S/L para Condições de Mistura Parcial no Líquido A mistura parcial de soluto no líquido, foi tratada originalmente por Burton, Prim e Slichter [Burton, 1953], que consideraram a mistura de soluto ocorrendo somente por difusão para 0 < x’ < δ, e que no volume de líquido restante as correntes de convecção sejam suficientes para manter a concentração uniforme (C^l). Por conveniência, nesta situação foi definido um coeficiente de redistribuição de soluto efetivo (kef) conforme equação 3.9: kef = \frac{k}{k+(1-k)exp\left(-\frac{νδ}{D}\right)} Equação (3.9) Esta expressão é utilizada para descrever a redistribuição de soluto em sistemas finitos desde que a espessura de δ seja pequena em comparação com o comprimento do sistema. Para isto, basta utilizar as relações apresentadas anteriormente, substituindo-se o coeficiente de distribuição (k) por kef, dentro de sua faixa de definição (k⩽kef⩽1,0). 3.3 - Análise comparativa de soluções para a evolução do perfil de soluto na solidificação A escolha da solução mais adequada para descrever a segregação de soluto em uma situação física real, vai depender do tipo de soluto a ser considerado, dos dados que se dispõe a respeito das propriedades da liga, tipo de análise que se pretende; quantitativa ou qualitativa, da precisão que se exige dos resultados, dentre outros aspectos. A Figura 3.9, apresenta uma descrição qualitativa do perfil de soluto obtido através da equação de Scheil, com kef substituindo k, porém omitindo transientes iniciais ou finais. Deve-se notar que no limite inferior (kef = k), recai-se no caso de mistura completa no líquido, e que o limite superior (kef =1,0) ocorre para solidificação em condições de equilíbrio. Figura 3.9 – Representação Qualitativa do Perfil de Segregação de Soluto através da Equação de Scheil com k = kef, para uma Liga de Composição C0. 3.4 – Consequências práticas do efeito da redistribuição e soluto Os efeitos da redistribuição de soluto em ligas são de grande interesse prático. O refino zonal, nivelamento zonal e dopagem seletiva são situações nas quais a redistribuição e soluto é utilizada para produção de materiais de altíssima pureza. O processo de refino zonal será tratado no capítulo seguinte. 4 - FUSÃO ZONAL O termo geral, fusão zonal, compreende uma família de métodos de controle da distribuição de impurezas solúveis nos materiais orgânicos e inorgânicos. É uma técnica amplamente utilizada devido ao maior grau de purificação obtido em comparação com o processo de solidificação normal. Uma zona líquida é formada a partir da fusão de uma pequena parte do material, a qual é lentamente deslocada ao longo da barra, permitindo manipular-se a distribuição das impurezas ao longo do sólido. Destacam-se os seguintes métodos de fusão zonal: Nivelamento zonal Consiste na passagem da zona líquida ao longo de uma barra de material originalmente não homogêneo repetidas vezes e alternando-se o sentido do deslocamento até que se consiga um perfil homogêneo de impurezas. Essa técnica permite que a impureza, ou elemento dopante, a ser distribuído uniformemente seja adicionado na quantidade desejada diretamente na zona líquida. Refino zonal A eliminação de impurezas de uma barra sólida, ou a separação de solutos de um solvente, pode ser conseguida passando-se a zona líquida repetidas vezes ao longo de uma barra do material. As impurezas são deslocadas na direção de uma das extremidades da barra onde ficam concentradas. Dopagem seletiva A fabricação de dispositivos eletrônicos exige a distribuição descontínua de impurezas em faixas, para a preparação das chamadas junções p-n. Partindo-se de um material ultrapuro, a adição seletiva e controlada de dopantes na zona líquida permite que seja alcançada uma distribuição compatível com as propriedades eletrônicas desejadas. 4.1 – Solidificação normal e determinação do coeficiente de redistribuição do soluto O perfil de segregação decorrente do processo de solidificação normal pode ser quantificado de acordo com as equações apresentadas no capítulo anterior, como por exemplo, a equação de Scheil, a qual devidamente modificada pela introdução do coeficiente kef é dado por: Cs = kefC0(1 − f)^{kef−1} Equação (4.1) A Figura 4.1 mostra curvas do perfil de concentração calculados de acordo com a equação (4.1) para valores kef variando de 0,01 a 5, onde nota-se o efeito purificador. Figura 4.1 – Perfis de concentração de soluto para solidificação normal com diferentes valores de Kef. Determinação do coeficiente de redistribuição de soluto No refino zonal é importante que os coeficientes de redistribuição dos solutos envolvidos sejam conhecidos. Pode-se determinar k através do diagrama de equilíbrio de fases e Kef é calculado utilizando-se a equação (3.9). A determinação de Kef relativo a uma impureza isolada, contida em um determinado material, pode ser realizada experimentalmente através de um equipamento tipo Bridgman. Para cada velocidade de deslocamento do forno de aquecimento, obtém-se amostras a partir das quais se determina o perfil de segregação por uma técnica de análise química pontual. O confronto da equação (4.1) com esse perfil experimental permite a determinação de Kef. A equação pode ser representada na forma: log Cs = logkef + (kef – 1)log(1 – fs) Equação (4.2) 4.2 Refino zonal Nessa técnica, ao invés da fusão completa da barra, somente uma pequena zona líquida é gerada e deslocada lentamente através da barra, conforme mostra esquematicamente a Figura 4.2. O soluto ou solvente rejeitado é acumulado nessa zona líquida e fica localizado na extremidade da barra. Essa zona líquida pode ser passada repetidas vezes ao longo da barra provocando um grau de purificação crescente. A eficiência do processo depende do valor de redistribuição do soluto, sendo mais eficiente para valores mais distantes da unidade. Figura 4.2 – Representação esquemática da técnica de fusão zonal horizontal. Na Figura 4.3 é apresentado esquematicamente o perfil de distribuição de uma impureza após a fusão zonal. Figura 4.3 – Perfil esquemático de distribuição de uma impureza após a fusão zonal. A eficiência do refino zonal, além do valor de k, depende também de uma série de parâmetros operacionais, tais como, tamanho da zona fundida, velocidade de deslocamento, grau de mistura do soluto no líquido, número de passes da zona líquida, etc. Distribuição de soluto na primeira passada A avaliação da distribuição de soluto ao longo da amostra baseia-se nas seguintes variáveis e hipóteses: a) O coeficiente de distribuição k é constante; b) O comprimento da zona líquida (l) e sua velocidade de deslocamento(v) são constantes em cada passada; c) A difusão de impurezas no sólido é desprezível; d) A concentração de soluto na zona líquida é uniforme; e) O sólido e o líquido têm densidades iguais; f) A concentração inicial C0 é uniforme ao longo da barra. As equações (4.3) e (4.4) permitem calcular o perfil de soluto na primeira passada do refino zonal, da posição x=0 até a posição x= l e da posição x= L - l e x= L, respectivamente. Cs = C0 [1 – (1 – k)exp(–k x)] Equação (4.3) Cs = C0 {1 – (1 – k)exp [–k ( x – l )]} {1 – [ (x – (x – l) ] k l} Equação (4.4) A Figura 4.4 mostra curvas de distribuição de soluto no sólido para vários valores de k, calculas a partir da equação (4.3). Figura 4.4 – Perfil de distribuição de soluto na primeira passada da fusão zonal para vários valores de K(l/L=0.1). No processo de refino zonal, a eficiência do processo de purificação fica efetivamente demonstrada quando a barra do material a ser purificada é submetida a múltiplas passadas. O processo de acúmulo de soluto nas extremidades da barra é gradativo, diminuindo de intensidade com o número crescente de passadas até que uma distribuição limite de soluto seja alcançada, a partir da qual o efeito purificador não corre mais em função de um equilíbrio entre fluxos de soluto. 4.3 – Crescimento de cristais Solidificação normal A técnica da solidificação normal vem sendo empregada há mais 80 anos no crescimento de monocristais de elementos puros e compostos orgânicos e inorgânicos. A Figura 4.5 apresenta esquemas representativos do processo realizado na forma vertical (método Bridgman e método Stockbarger) e horizontal. Os métodos Bridgman e Stockbarger são semelhantes diferindo apenas na existência de duas regiões distintas de aquecimento no método Stockbarger. Quando se utiliza apenas uma região de aquecimento como no caso do método Bridgman, o cristal após a solidificação atravessa uma região de temperaturas decrescentes e não uniformes podendo limitar a perfeição dos cristais em função das tensões decorrentes. Na solidificação normal horizontal, o material é colocado dentro de uma barqueta, que é inserida dentro do tubo que se desloca através do forno. Para facilitar o crescimento do monocristal, coloca-se uma semente (um cristal puro e com orientação cristalográfica pré-definida) na extremidade da barqueta na qual o material se solidificará primeiro. Na fase de aquecimento, tanto o material quanto parte da semente serão fundidos para assegurar a boa molhabilidade da semente pelo líquido. Figura 4.5 - Crescimento de monocristais por solidificação normal a) método Bridgman; b) método Stockbarger; c) solidificação normal horizontal. Refino zonal Embora o refino zonal tenha sido desenvolvido originalmente para eliminação de impurezas, o método pode combinar purificação com crescimento de cristais. Podem-se realizar várias passadas com o intuito de purificação terminando com uma passada final para o crescimento do cristal. Para materiais altamente reativos, foi desenvolvido o método de refino zonal vertical sem recipiente denominado refino zonal flutuante, mostrado esquematicamente na Figura 4.6. Esse método é o único adequado à preparação de materiais ultrapuros com pontos de fusão acima de 1400°C e permite a utilização de qualquer tipo de atmosfera. Nesse método a zona líquida desloca-se ao longo de uma barra cilíndrica do material disposta na posição vertical, e a tensão superficial tende a manter a zona líquida estável próxima do formato original da barra. Figura 4.6 - Representação esquemática do refino zonal flutuante. Crescimento Czochralski A técnica foi proposta por Czochralski em 1917 e, atualmente, é aplicada extensivamente na fabricação de cristais de materiais inorgânicos semicondutores, uma vez que a maioria desses materiais semicondutores sofre uma expansão ao solidificar-se e não pode crescer contida em um recipiente. Pode-se citar como exemplo o crescimento de monocristais de silício de alta perfeição para aplicação na fabricação de dispositivos eletrônicos e na confecção de células solares. A Figura 4.7 mostra um esquema ilustrativo da técnica. A rotação do eixo serve para manter uma agitação no líquido garantindo a uniformidade da composição do cristal. Figura 4.7 - Esquema do método Czochralski de crescimento de cristais. 5 – TRANSFERÊNCIA DE CALOR NA SOLIDIFICAÇÃO Na solidificação de um metal é fundamentalmente o processo de transferência de calor. O calor latente de fusão gasto para fundir o metal é liberado na interface sólido/líquido durante a solidificação e daí deve ser transferido para que o processo tenha continuidade. A velocidade de extração e transferência de calor através do metal tem relação direta com a velocidade de solidificação e com os gradientes térmicos do sistema, os quais têm influência significativa na qualidade metalúrgica final do metal solidificado. A análise do processo de transferência de calor na solidificação é uma ferramenta de controle e dimensionamento de sistemas metal/molde. A análise de transferência de calor na solidificação visa: a) Determinar a distribuição de temperatura, ou perfil térmico, do sistema analisado; b) Determinar a cinética de solidificação do metal, isto é, determinar o tempo necessário para solidificar uma determinada porção de metal. 5.1 – Modos de transferência de calor O calor é transferido através de três mecanismos básicos, sendo eles a condução, convecção e radiação. A Figura 4.1 evidencia todos os modos de transferência de calor que podem ocorrer durante a solidificação. Alguns destes modos de transferência de calor permanecem do início ao final da solidificação, enquanto outros são transitórios.