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Arquitetura e Urbanismo ·

Arquitetura

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TADAO ANDO • POR NOVOS HORIZONTES NA ARQUITETURA Este artigo polêmico, cujo título faz uma homenagem ao famoso manifesto de Le Corbusier, comenta sucintamente os defeitos da arquitetura moderna e pós-moderna. A referência ao “horizonte”, no título, indica uma necessidade de ampliação de perspectivas. A palavra não foi escolhida por acaso; pode-se interpretá-la como um sinal da importância da fenomenologia e do sítio no processo projetual e na teoria de Ando. Entrando na última década do milênio, Ando sugere a necessidade de um “desenvolvimento através e além do modernismo”, que somente poderá ser realizado por meio de uma “ação crítica”. Alguns aspectos dessa crítica são a distanciamento da função que ele impõe deliberadamente aos seus projetos (“nem sempre dou a meus espaços uma clara articulação funcional”), a tranquilidade resultante da simplicidade da forma e a inserção da natureza. O confronto com a natureza e a realidade concreta dos materiais tem a intenção de provocar reflexão. Ando reconhece que a arquitetura cria uma nova paisagem e por isso tem a responsabilidade de ressaltar as características particulares de um determinado lugar. Em outro trabalho, Ando afirmara que “a finalidade da arquitetura é basicamente a construção do lugar”.2 Essa arquitetura da interação entre a paisagem e a construção levou Ando a descobrir uma tensão vital que conduz a um desprendimento espiritual, semelhante talvez à concepção do habitar em Martin Heidegger. Embora o vocabulário de Ando se inspire em conceitos fenomenológicos, ele mesmo não menciona especificamente o essa tradição filosófica.3 Pode-se supor que conheceu os escritos de Christian Norberg-Schulz e de Kenneth Frampton sobre Heidegger e a arquitetura, e provavelmente também os de Vittorio Gregotti (caps. 9, 7). Seu forte compromisso com o sítio lembra a postura de Gregotti e de Raimund Abraham. Apesar das aparentes semelhanças com esses teóricos, Ando chamara a atenção para a importante diferença entre as atitudes ocidentais e orientais para com a natureza: a cultura japonesa enfatiza um limiar espiritual entre a construção e a natureza, enquanto a cultura ocidental lhes interpõe uma fronteira física. Ao aspirar a “um nível de abstração e universalidade” e ao mesmo tempo ao reconhecer o caráter diferenciado da cultura regional, o autodidata Ando tem sido citado como um exemplo do regionalismo crítico de Frampton (cap. 11). A obra desse arquiteto internacionalmente respeitado é lúcida e bem resolvida do ponto de vista técnico. Embora muitas vezes o concreto pareça ser o seu único material, Ando também enfatiza o uso da luz e do vento como elementos físicos de suas construções. Os textos teóricos de Ando atingem um grau de expressão poética semelhante ao de seus edifícios. TADAO ANDO Por novos horizontes na arquitetura O pensamento arquitetônico apoia-se na lógica abstrata. Por abstrato me refiro uma exploração meditativa que atinge a cristalização da complexidade e riqueza do mundo, e não a uma redução de sua realidade pela diminuição de sua concretude. Os melhores aspectos do modernismo não terão se originado desse tipo de pensamento arquitetônico? O pós-modernismo surgiu no passado recente para denunciar a pobreza do modernismo em um momento no qual esse movimento estava se deteriorando, tornando-se convencional e abandonando o papel que se arrogara como força de revitalização cultural. A arquitetura moderna havia se tornado mecânica, e os estilos pós-modernos se empenharam em recuperar a riqueza formal que o modernismo aparentemente descartara. Esse esforço sem dúvida alguma representou um passo na direção certa ao voltar-se para a história, o gosto e o ornamento, e devolveu à arquitetura uma certa concretude. No entanto, também este movimento rapidamente se atolou em excessos de vulgaridade, produzindo uma enxurrada de brincadeiras formalistas que mais confundiram do que inspiraram. O caminho mais promissor para a arquitetura contemporânea é o de um desenvolvimento que atravesse e supere o modernismo. Isso significa substituir os métodos mecânicos, letárgicos e medíocres, aos quais o modernismo sucumbiu pela vitalidade meditativa e abstrata que caracterizou os seus primórdios, de modo a criar ocasiões estimulantes para o pensamento que sejam capazes de nos levar ao século XXI. A criação de uma arquitetura capaz de infundir novo vigor no espírito humano deve abrir caminho no impasse atual da arquitetura. LÓGICA TRANSPARENTE A criação arquitetônica funda-se na ação crítica. Nunca se resume a um método para a solução de problemas por meio do qual determinadas condições são reduzidas a equações técnicas. A criação arquitetônica supõe a contemplação das origens e de todos os requisitos funcionais de um projeto e a subsequente determinação desses problemas essenciais. Somente dessa maneira o arquiteto pode manifestar na arquitetura o caráter de suas origens. Quando concebi o projeto do Museu Histórico Chikatsu-Asuka, em Osaka, em um sítio fundamental para a história antiga do Japão, compreendi a importância vital de conceber uma arquitetura que não desfigurasse a grandeza da paisagem local. Convenceu-me então na capacidade da arquitetura de introduzir uma nova paisagem e de rever criar um museu que pudesse acolher a paisagem ao seu redor nas exposições que programasse. Na sociedade contemporânea, a arquitetura é condicionada por fatores econômicos e na maior parte das vezes governada pela padronização e mediocridade. O projetista sério deve questionar inclusive os requisitos dados e refletir profundamente sobre o que realmente lhe está sendo encomendado. Esse tipo de investigação poderá revelar-lhe o caráter específico latente em uma encomenda e esclarecer o papel vital que uma lógica intrínseca comporta na realização de uma obra arquitetônica. Quando a lógica permeia o processo de projeto, o resultado é uma clareza de estrutura, ou da ordem espacial - acessível não só à percepção como à razão. Uma lógica transparente que impregna o todo e transcende a beleza superficial, ou a mera geometria, com seu valor intrínseco. ABSTRAÇÃO O mundo real é complexo e contraditório. No cerne da criação arquitetônica está a transformação da concretude do real, por meio de uma lógica transparente, em uma ordem espacial. Não se trata de uma abstração que suprime, mas de uma tentativa de reorganizar o real em torno de um ponto de vista intrínseco para ordená-lo mediante o poder de abstração. O ponto de partida de um problema arquitetônico - seja o lugar, a natureza, o estilo de vida ou a história - se expressa nessa evolução para o abstrato. Somente um esforço dessa natureza é capaz de produzir uma arquitetura rica e variada. Quando desenho uma residência - um continente para a habitação humana -procuro alcançar precisamente essa união entre a forma geométrica abstrata e a atividade humana diária. Na Row House (residência Azuma), em Suniyoshi, peguei uma casa de uma série de três habitações geminadas de madeira e a reconstruí como um espaço fechado de concreto, na tentativa de gerar um microcosmo no seu interior. A casa se divide em três seções, e a seção do meio é um pátio a céu aberto. Esse pátio é um exterior que preenche o interior, e seu movimento espacial é invertido e descontínuo. Como forma geométrica simples, a caixa de concreto é estática; mas como nela penetra a natureza e a casa é ativada pela vida humana, sua existência abstrata adquire inflexão no encontro com essa concretude. Minha principal preocupação nesse projeto foi estabelecer o grau de austeridade da forma geométrica capaz de se confundir com a vida humana. Esta preocupação também prevalece na Koshino House, na Kidosaki House, em outros de meus projetos residenciais ou outros tipos de construções. A abstração. geométrica se choca com a concretude humana e, então, a aparente contradição se dissolve na incongruência. A arquitetura criada naquele momento é preenchida por um espaço que provoca e inspira. NATUREZA Eu procuro instilar a presença da natureza em uma arquitetura construída com auste­ ridade mediante uma lógica transparente. Os elementos naturais - água, vento, luz e céu - trazem o contato com a realidade de volta a uma arquitetura derivada da refle­ xão ideológica, nela despertando a vida criada pelos próprios homens que a habitam. A tradição japonesa abraça uma sensibilidade para com a natureza diferente da ocidental. A vida humana não tem a pretensão de se opor à natureza e não se empenha em controlá-la, mas antes busca uma associação íntima com a natureza a fim de unir-se com ela. Pode-se até mesmo dizer que, no Japão, todas as formas de exercício espiritual são tradicionalmente realizadas no contexto da inter-relação do homem com a natureza. Esse tipo de sensibilidade engendrou uma cultura que diminui a ênfase na fronteira física entre a residência e a natureza circundante e que, ao contrário, instala um limiar espiritual. Ao mesmo tempo em que protege a habitação humana da natureza, procura trazê-la para dentro da casa. Não há uma demarcação clara entre interior e exterior, mas funa permeabilidade recíproca. Infelizmente, hoje a natureza perdeu muito de sua antiga abundância e a nossa capacidade de percebê-la morreu se enfraqueceu. Por isso, a arquitec­ tura contemporânea tem seu papel: ela cumpre o sentido de proporcionar às pessoas I lugares arquitetônicos que as façam... serem à presença da natureza. Quando isso acontece, a arquitetura transforma a natureza por meio da abstração e modifica o seu significado. Quando a água, o vento, a luz, a floresta e outros elementos naturais são arbitrados na arquitetura, esta se transforma em um lugar no qual as pessoas e a natureza se defrontam em permanente estado de tensão. Creio ser esse sentimento de tensão que poderia des­ pertar as sensibilidades espirituais latentes no homem contemporâneo. No Museu das Crianças, em Hyogo, organizei cada um dos elementos arquitec­ tônicos de modo a permitir encontros genuínos com a água, a floresta e o céu, em con­ dições ideais. Quando a presença da arquitetura transforma um lugar, dando-lhe uma nova intensidade, é possível descobrir uma nova relação com a natureza. LUGAR A presença da arquitetura - a despeito de seu caráter autossuficiente - cria inevitavel­ mente uma nova paisagem. Isso implica a necessidade de descobrir a arquitetura que o próprio sítio está pedindo. O Edifício Time, situado à margem do rio Takase, em Kyoto, nasceu do envolvi­ mento com o delicado corrente do que passa por perto. A praça do edifício em que se pode molhar a mão na água, o deque que passa por cima do córrego como uma ponte, o plano horizontal de aproximação que provêm das margens do rio e não de uma estrada - todos esses elementos servem para extrair o máximo de vida possível do extraordinário cenário da construção. O conjunto habitacional de Rokko, em Kobe, nasceu do cuidado com um sítio igualmente singular: neste caso, uma encosta de no máximo 60º de inclinação. A ideia do projeto foi de fazer a construção afogar-se I ao longo da encosta, controlando a sua projeção acima do solo a fim de misturá-la a densa floresta ao seu redor. Dessa maneira, a cada habitação é assegurada uma visão magnífica do oceano a partir de um terraço proporcionado pelo teto da casa vizinha abaixo. Todos os meus projetos, seja o Museu das Crianças, em Hyogo, seja o Museu da Floresta de Túmulos, em Kumamoto, seja o edifício central da Raika, ou o complexo comercial Festival, em Okinawa, são fruto de um esforço para criar uma paisagem, jo­ gando integralmente com as características do lugar. Eu componho arquitetura procurando encontrar uma lógica essencial inerente ao lugar. A pesquisa arquitetônica supõe uma responsabilidade de descobrir e revelar as características formais de um sítio, ao lado de suas tradições culturais, clima e aspectos naturais e ambientais, a estrutura da cidade que lhe constitui o seu pano de fundo, e os padrões de vida e costumes ancestrais que as pessoas levarão para o futuro. Sem senti­ Acha Nwoke Junior Ahamere Mr W A N N WKHWM 6