·

Psicologia ·

Psicologia Social

Send your question to AI and receive an answer instantly

Ask Question

Preview text

NORBERT ELIAS O PROCESSO CIVILIZADOR Volume 1 Uma História dos Costumes APRESENTAÇÃO RENATO JANINE RIBEIRO JORGE ZAHAR EDITOR Norbert Elias o Processo Civilizador Volume I Uma Hist6ria dos Costumes Traduiio Ruy JUNOMANN RevisiIo e apresentaiIo RBNATO JANINB RIBBIRO 15340 00B E4Iip V J IBC J 990 J iBB J B J S9001B BB74 Jorge Zahar Editor Rio de Janeiro Publicado originalmente sob 0 titulo Vber den Prozess der Zivilisation voll em 1939 por Hauszurn Falken de Basi16ia Sufa Traduao autorizada da versao inglesa feita por Edmund Jephcott publicada por Basil Blackwell de Oxford Inglaerra em 1978 Copyright i 1939 Norbert Elias Elias Norbert 18971990 E41p 0 processo civilizador I Norbert Elias tradu8o Ruy 2ed Jungman revisao e apresenla8o Renato Janine Ribeiro v1 2ed Rio de Janeiro Jorge ZaharEd 1994 2v Traduio de Door den Prozess der Zivilisation vol 1 Conteddo vl Uma hist6ria dos costumes v2 Fonnaao do eslado e civiliz8ao ISBN 85711O106X v 1 8571102570 v2 lCultura 2 Civilizaao 3 Ocidente Hist6ria 4 Sociologia polftica I Ribeiro Renato Janine II Titulo FR G S I Blblloteca Setrial de Bibliolccoia e conlunjcaao I I N 1 U i Chamada Obra CDD900 CDU008 931286 Copyright 1990 d ediilo em Ifngua portuguesa Jorge Zahar Editor Ltda rua M6xico 31 sobreloja 20031144 Rio de Janeiro RJ tel 021 24002261 fax 021 2625123 Composiaoeletr8nica TopTextos Edi6esGr4ficas Ltda Impressao Tavares e Tristao Ltda Ediao para 0 Brasil ReimpressOoS 1994 1995 1996 Todos os direitos reservados A reproduao nioautorizada desta publicailo no todo ou em parte constitui violao do copyright Lei 5988 CIPBrasil Catalog8ionafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ Sumario Apresentaiio a Norbert Elias Renata Janine Ribeiro l Prefcio 13 capitulo urn Da Sociognese dos Conceitos de Civilizaiio e Cultura 21 Parte I Sociogenese da diferena entre Kultur e Zivilisation no emprego alemiio 23 I Introdullio 23 II Desenvolvimento da antitese entre Kultur e ZivilisatioN 27 III Exemplos de atitudes de corte Da Alemanha 29 IV A ctasse media e a nobreza de corte oa Alemanha 34 V Exemplos literarios da relacao entre a Intelligentsia de classe media alema e a corte 39 VI 0 teellO do clemento social e 0 progresso do social oa antftese entre Kultur e Zivilisation 46 Parte 11 Sociogenese do conceito de Civilisation na Frana 51 I Introducao 51 II Sociogenese da fisiocracia e do movimento de reforma frances 56 capitulo dois A Civilizaiio como Transformaiio do Comportamento Humano 65 I 0 desenvolvimento do conceito de Civiiitej 67 II Dos cOstumes medievais 73 III 0 problema da mudanca de cornportamento durante a Renascena 82 IV Do comportamento a mesa 95 Exemplos 95 Cornenttirios sobre os exemplos 109 Grupe 1 Urn breve estudo das sociedades a que se referem as cita6es 109 Grupo 2 Do costume de comer came 24 V Mudan de alilOOe em relao a funl6 corporai IJS Exemploa IJS Algumas obaerva aobre 01 exemplos e sobre est mudanas em geral 139 VI Do h6bilo de 8IIOar 147 Exemptoa 147 Coment4rio obre os exemptos 152 VII Do h6bito de OIcarrar ISS Exemplol ISS Alguns comentAriol sobre os exemplos J58 VIII Do comportamento no quarto 162 Exemploa 162 Alguns coment6nOl sobre os exemplos 164 IX Mudan de atitude nas relac6es entre os sexos 169 X Mudanas Da agressividade 189 XI Cenas da vida de urn cavaleiro medieval 202 Ap6ndice Introduao a Ediio de 1968 214 Notas 252 Dedlcado Ii memoria de meus pals Hermann Elias falecldo em Breslau em 1940 e Sophia Elias morIa em Auschwitz 1941 Agrlldcimentos especiais ao professor Paulo Vizioli pelarevisiio dos textqs lledievais e pela tudugiio de alguns poemas do ingles medieval Os EDITOREs Apresentaiio a Norbert Elias Este e urn dos livros mais notaveis que foram escritos em noss seculo apresentando 0 que poderiamos chamar de uma hist6ria dos sentimentos Quase que na mesma epoca que 0 Outono da Jdade Media de Huizinga e que 0 mais aventuroso 0 Arnor e a Ocidente de Denis de Rougemont este livro tem com eles em comum 0 carater empolgante da leitura 0 uso da forma literaria como urn documento privilegiado de conhecimento 0 interesse nas formas de sentir e imaginar como tema de estudo A diferenga esta em que 0 teferencial de Elias e mais sociol6gico ao passo que Rougemont e francamente um ensafsta e Huizinga um historiadorfil6sofo Norbert Elias ainda nao e conhecido entre n6s como merece mesmo com 0 aumento da difusao da hist6ria das mentalidades talvez porque seja esta uma disciplina que teve na Franga sua patria enquanto Elias pertence a uma tradigao intelectual bastante diferente alema S6 isto pode eltplicar a demora com que foi lido nao s6 aqui mas na pr6pria Franga Neste Iivro as questoes que se colocam sao apesar das aparcncias fundamentais Apesar das aparcncias porque Elias Iida mesmo e com as aparcncias como os homens se tornaram educados e comegaram a tratarse com boas maneiras Embora os historiadores tenham se debrugado desde alguns anos sobre temas cada vez menores antes tidos por inclignos da grande hist6ria 0 tema desta obra parece singularmente inatual hoje 0 desenvolvimento da gentileza da cortesia da urbanidade palavras queja dizem uma e outra de onde vieram soa pouco oportuno quando tanto se celebra a verdade dos sentimentos a sinceridade e a franqueza enquanto o mundo do artiffcio quer 0 da corte francesa do ReiSol quer 0 da socie dade vitoriana do selfcontrol e contestado em fungao da enorme repressao que efetuou E no entanto e com prazer que lemos estas paginas em que como num romance vemos lentamente aparecerem as regras mais elementa res aparentemente de comportamento nao escarrar nao comer com as maos nao por a bota em cima da mesa Mais que contar anedotas porem Elias esta mostrando algo que sempre Ibe foi muito caro enquanto teoria 0 desenvolvimento dos modos de conduta a civilizagao dos costumes como se chamou a tradugiio francesa deste Iivro prov que nao existe atitude natural no homem Acostu mamonos a imaginar que tal ou qual forma de trato emelhor porque melhor 10 o prOCeS80 civiUzador expressa a natureza humana nada disso diz Elias na verdade 0 que houve foi urn condicionamento por este lado ele e levemente behaviorista e urn adestramento por aqui ele remete a Nietzsche e a Freud Dos debitos para com os psic6logos ele pr6prio fala bern como de seus referenciais sociol6 gicos na IntrodUfQo de 1968 que vai no fim deste volume Seria born recor darmos urn pouco Nietzsche Nurn de seus mais importantes livros Da genealogia da moral Nietzsche inSisle em como foi diffcil e que custos teve para 0 homem a instaura io da moral ou mesmo se quisermos de vlirias morais Em outras palavras a moratidade niio e urn trao natural nem legado da graa de Deus ela foi adquirida por urn processo de adestramento que terminou fazendo do homem urn animal interessante um ser previdente e previsfvel Foi preciso que pela dor ele constituisse uma mem6ria mas niio no sentido aparente de apenas niio esquecer 0 passado onde ela mais importa e quando se faz prospectiva quando se torna como que urn programa de atuiio marcando 0 sujeito para lembrar bern 0 que prometeu 0 que disse de modo a niio 0 descumprir A mem6ria importa niio tanto pelo conhecimento que traz mas pela aiio que ela governa 0 seu custo ea dor Foi precilO torturar para produzila e Pierre Clastres num artigo retomou esta ideia descre vendo os ritos de iniciaiio dos rapazes fndios como sendo liOes de mem6ria futura inscriiio no corpo e na mente da lei da igualdade E desta maneira que Norbert Elias pensa Pode respeitar os costumes que se civilizaram transparece ate mesmo sua simpatia por eles mas sempre tern em mente que 0 condicionamento foi e e caro Uma responsabi Iidade enorrne vai pesando sobre 0 homem II medida que ele se civiliza E isso tanto se entende II luz das torturas fisicas ou psfquicas destas ele fala em belas paginas sobre a educaiio das crianas que Nietzsche havia iden tificado na origem da cultura quanta II luz do que Freud diz no fim da vida sobre a pr6pria civiliziio quanto mais aumenta mais cresce a infelicidade Sabemos que esta equaiio foi e tern side bastante contestada curiosa acaso que a InlrodUfQo de Norbert Elias date do mesnw ano de 1968 que marcou a explosio do movimento estudantil e paralelamente a publicaiio do livro de Marcuse Eros e civilizarao2 que e justamente a primeira grande critica dirigida II ideia de que 0 custo da Kultur esta na infelicidade no cres cente recalcamento das pulsoes cuja satisfiio nos pode fazer felizes E esle urn ponto a discutir e sobre 0 qual duvido que haja resposta convincente pelo menos por ora 1 Da tortura nas sociedades primitivas in A Sociedade contra 0 Estado Rio Francisco Alves 2 Rio de Janeiro ZahaT 1968 8 ed 1981 apeentaao 11 o que podemos notar porem e que a evidencil aparente parece nao ter confirmado Elias no vetor que supunha cle continuaria orientandoa evoiJo uma palavra que ele usa e hoje desperta bastante cdtica dos costumes humanos Afinal atualmentese privilegia mais a franqueza mais o desnudamento que 0 recato extremo nilo apenas no plano fisico como no psiquico Richard Sennett em seu 0 declinio do homem publico 8 prop6e justamente ao contrario de Elias entender como distintivo dos ultimos duzentos anos urn triunfo da intimidade uma enfase cada vez maior na publicaao do que outrora seria intimo e recatado A pr6pria psicanalise representaria com 0 papel dado a vida sexual no tratamento urn dos exem plos de como apostamos na revelliilo de nossos afetos mais secretos com a esperana de assim encontrarmos uma vida melhor ou uma cura nai uma certa estranheza que podemos sentir a leitura de Norbert Elias 0 que por sinal em nada reduz 0 valor de sua obra que s6 pode aurnontar com 0 debate que suscite Alcrn disso 0 autor tern consciencia da dificuldade em relaiio a evoluilo por ele proposta e soube se defender ja meio scculo atras referindose ao uso de roupas de banho que 1JI0stra vam mais partes do corpo comentou que elas exigiam por parte dos ho mens e das mulheres urn autocontrole bern maior do que lpIando os cor pos se escondiam A libertaao dos costumes didamos entao a seguiIo implica urn acrescimo de responsabilidade e seria jusiamente este 0 custo maior trazido a nossas pulsaes Ha mais contudo o que pode tambcm ser discutido nesta obra de Elias e a ideia de que existe um sentido na histOria Com freqUencia ele volta a sua ideia reguladora de que fenomenos a primeira vista carcntes de sentido se en minados a olho nu ou na escala do tempo imediato revelam porem seu nexo quando postos contra urna medida de longo prazo Temos ai mais urna convergencia de Elias com os historiadorcs franceses das mentalida des adeptos da Ionga duraao como a medida mais adequada para es todar a hist6ria Esta medida de longo prazo ou curva de civilizailo como a chama adquire especial importilncia quando passa a defiuir pelo menos os ultimos setecentos anos da aventura bumana E verdade que Elias nilo chega a apresentar essa evoluilo como sendo a unica possivel me nos ainda como necessaria para 0 homem Mas nilo e menos verdade que a seu ver lla 6 definitivae deade que tomou conta do OCidente foi assumln do Urn carater irreversivel a tal ponto fica pelo menos sugerido que ter minara por mundia1itPTse alterando lambem os costumes dos povos que mais primitivos vivem hoje de urn modo que se compara aEuropa medieval o problema aqui 6 urn s6 e casa benl com a questilo de fato que antes suscitamos sera que 0 gradual refinamenlo dos costumes continua 3 S Paulo Companhia das Lelras 1988 12 o processo civilitador sendo 0 que marca nossa sociedade ou hoje nos encaminhamos em sen tido inverso ao que Elias descreve s6 que agora a questao 6 de prin cipio e mais propriamente te6rica e nao de fato tem cabimento apontar urn sentido na hist6ria como faz Elias Pois ainda que 0 sentido seja preeario em seus comos ele termina por apoderarse do ritmo hist6rico ou meIhor dizendo da consciencia e da fe do historiador e este nlio mais se liberta do senlido que antes apontou Mas nada disso limita 0 alcance desta obra que foi uma das primei ras a perscrutar dentro da ciencia social tal como a conhecemos 0 por menor a minucia 0 irrelevante para dele extrair nlio s6 0 pensamento que porta embutido como mais que tudo uma lilio notavel sobre a cultura e seus custos alem de uma indagalio sobre seu valor Depois deste livro que no microsc6pio enxerga a lio de foras que s6 se manifestam na vertente de seculos que exigiriam entlio como instrumento um macros c6pio 0 estudo da hist6ria da psicologia ou da sociologia nlio pode ser o mesmo porque ele poe em xeque varias verdades aceilas E nem pode ser a mesma a nossa valoralio dos ultimos seculos do que chamamos de civilizalio ou progresso e e esle 0 valor da obra de Elias para 0 fl 16sofo ou para 0 leilor comum que Ie por prazer para conhecer talvez para se aUloconhecer RBNATO JANINB RlBBIRO Sete Praias junho de 198 Prefacio Este Iivro tem como tema fundamental os tipos de comportamento consi derados lipicos do bomem civilizado ocidental E muito simples 0 proble ma que coloca 0 bomem ocidental nem sempre se comportou da maneira que estamos acostumados a considerar como tipica ou como sinal carac terfstico do borneOl civilizado Se urn borneOl da atual sociedade civili zada ocidental fosse de repente transportado para uma epoca remota de sua pr6pria sociedade tal como 0 perfodo medievofeudal descobriria nele muHo do que julga incivilizado em outras sociedades modemas Sua rea ao em pouco diferiria da que nele e despertada no presente pelo compor tamento de pessoas que vivem em sociedades feudais fOra do Mundo Oci dental Dependendo de sua situaao e inclinoes sentirseia atraldo pela vida mais desregrada mais descontrafda e aventurosa das classes superio res desta sociedade ou repelido pelos costumes barbaros pela pobreza e rudeza que nele encontraria E como quer que entendesse sua pr6pria civi Iizao ele concluiria da maneira a mais inequlvoca que a sociedade existente nesses tempos preteritos da bist6ria ocidental nao era civilizada no mesmo sentido e no mesmo grau que a sociedade ocidental modema Este estado de coisas talvez parea 6bvio a numerosas pessoas e al guns juigarao desnecessano referilo aqui Mas ele necessariamente acarre ta perguntas que nao podemos com a mesma justia dizer que estejam claramente presentes na consciencia das atuais geraoes embora estas ques tOes nao deixem de ter importiincia para uma compreensao de n6s mesmos Como ocorreu reamente essa mudana esse processo civilizador do Ooi dente Em que consistiu E quais foram suas causas ou foras motivado ras E intenao deste estudo contribuir para a soluao dessas principais questoes A fim de facilitar a compreensao deste livro e destarte servir como introduao as pr6prias questoes afigurasenos necessario examinar os significados e entendirnento atribuidos ao conceito de civilizaao na Ale manha e na Frana Esta analise constitui 0 primeiro capitulo Talvez aju de urn pouco 0 leitor considerar os conceitos de Kultur e civilisation como A Introduo it edio alema de 1968 pode er lida it pag 214 14 o processo civilirador um pouco menos rigida e inequivocamente opostos E isto podera tambem dar uma pequena contribui9ao ao aprimoramento da maneira como ao longo da hist6ria os alemaes vern interpretando 0 comportamento de fran ceses e ingleses e como franceses e ingleses veem 0 comportamento ale mao No fim porem servin tambem para esclarecer certos aspectos tipi cos do processo civilizat6rio A fim de abordar as principais questoes tomase necessario em pri meiro lugar formar uma ideia mais clara de como 0 comportamento e a vida afetiva dos povos ocidentais mudou lentamente ap6s a Idade Media o segundo capitulo propoese a mostrar como islo aconteceu Tenta com tanta simplicidade e clareza quanta possivel abrir caminho a compreensao do processo pslquico civilizador E possivel que a ideia de um processo psiquico que se estenda por gera90es pare9a arriscada e duvidosa ao pen samento hist6rico modemo Mas nao e possivel concluir de maneira pu ramente te6rica e especulativa se as mudan9as psiquicaS observaveis no curso da hist6ria ocidental ocorreram em uma dada ordem e dire9ao S6 o estudo atento dos documentos da experiencia hist6rica podera demons trar 0 que e correto ou nao nessas teorias Este 0 motivo por que nao se toma viavel aqui quando ainda nao podemos pressupor 0 conhecimento desse material documentlirio adiantar um curto esb090 preliminar da es trutura e ideias blisicas de todo 0 livro Gradualmente elas adquirirlio for ma mais s6lida na observa9ao constante dos fatos hist6ricos e verifica9ao e revisao constantes do que foi estudado antes atraves do que s6 mais tarde entrou no campo de observa9ao Por isto mesmo as partes isoladas deste estudo sua estrutura e metoda provavelmente s6 se tomarao com pletamente inteligiveis quando percebidas em seu todo Tera que ser sufi ciente aqui a fim de facilitar a compreensao do leitor destacar alguns pro blemaso segundo capitulo contem certo nUmero de series de exemplos Ser vem eles para mostrar 0 desenvolvimento em forma acelerada Em poucas paginas vemos como no curso de seeulos 0 padrao de comportamento humano na mesma ocasiao muda muito gradualmente em uma dirC9ao especifica Vemos pessoas a mesa seguimolas quando vao para a cama ou se envolvem em choques hostis Nestas e em outras atividades elementares muda lentamente a maneira como 0 individuo comportase e sente Esta mudan9a ocorre no rumo de uma civiliza9ao gradual mas s6 a expe riencia hist6rica toma mws claro 0 que esta palavra reillmente significa Mostra por exemplo 0 papel fundamental desempenhado nesse processo civilizador por uma mudan9a muito especifica nos sentimentos de vergonha e delicadeza Muda 0 padrao do que a sociedade exige e profbe Em conC junto com isto movese 0 palamar do desagrado e medo socialmente ins tilados E desponta a questao dos mOOos sociogenicos como um dos pro blemas fundamentais do processo civilizador Tfdcio 15 Ha outra faixa de questoes estreitamente relacionada com isto A dis tancia em comportamento e estrutura psiquica total entre crianas e adul tos aurnenta no curso do processo civilizat6rio Aqui por exemplo reside a explicaao de por que algumas pessoas ou gropos de pessoas nos pare cern umais jovens ou mais infantis e outras mais velhas OU rnais adultas 0 que estamos tentando expressar dessa maneira sao diferenas no tipo e estligio do processo civilizador que essas sociedades atingiram Mas esta IS urna questao aut6noma que nao cabe no qUadro deste estudo As senes de exemplos e suas interpretaoes no segundo capitulo demons tram com muita clareza urn fato 0 processo especifico de crescimento psicol6gico nas sociedades ocidentais que com tanta freqUencia ocupa a mente de psic6logos e pedagogos modemos nada mais IS do que 0 processo civilizador individual a que todos os jovens como resultado de urn proces so civilizador social operante durante muitos s6culos sao automaticamente submetidos desde a mais tenra infancia em maior ou menor grau e com maior ou menor sucesso A psicogenese do que constitui 0 adulto na so ciedade civilizada nao pode por isso mesmo ser compreendida se estuda da independentemente da sociogenese de nossa civilizao Por efeito de uma lei sociogenetica basica 0 individuo em sua curta hist6ria passa mais uma vez atraves de alguns dos processos que a sOciedade experimen tou em sua longa hist6ria Constitui objetivo do capitulo terceiro que enfeixa a maior parte do segundo volume tomar mais acessiveis 11 compreensao certos processos ha muito tempo operantes nesta longa hist6ria da sociedade Ble procura no contexto de certo numero de areas precisamente definidas esclarecer Esla expressio nio deve SCI entendida como significando que todas as fases indi viduais da hist6ria de um8 sociedade sao reproduzidas na hist6ria do individuo ci vilizado Nada selia mais absurdo do que procurar urns era feudal agrAria uma Renascena ali urn perfodo absolutista de cortc na vida do individuo Tado8 os conceitos desse tipo rcferemse A estrutura de grupos sociais inteiros o que cabe sel frisado agui e 0 simples fato de que mesmo na sociedade civi lizada neoburn SCI humane chega civiIizado ao mundo e que processo civilizador individual que ele obrigatoriamente sofre 6 uma fUICio do processo civilizador social Por conseguinte a estrutura dos sentimentos e conscicia da crianta guarda Bern duvida certa semelhanca com a de pessoas incivis 0 mesmo se aplica ao estrato psicol6gico em adultos que com 0 propcsso da civilizaCio 6 submetido com maior au menor rigor a uma censura e em consequencia encontra nos mhos uma vAlvula de escape Mas desde que em nossa sociedade todo ser humano estA exposto desde o primeiro momenta da vida A influencia e A intervencao modeladora de adultos civiIizados ele deve de fato passar por urn processo civiIizador para atingir 0 padrao alcancado por sua sociedade no curso da hist6ria mas nio atraves das fases historicas individuais do processo civilizador social Programado para futura publicacao no Brasil por esta editors Nota do Editor J 16 o processo civilitador como e por que no curso da sua historia a estrutura da sociedade ociden tal muda continuamente e simultaneamente sugere por que nessas mesmas areas mudam 0 padriio de comportamento e a constituiao psiquica dos povos do Ocidente Conhecemos por exemplo a paisagem social de principios da Idade Media E grande 0 numero de castelos maiores e menores e tomaramse feudalizadas ate mesmo as areas urbanizadas anteriormente Seils centros igualmente sao formados por castelos e terras de senhores originmos da classe guerreira Colocase a questao Quais os conjuntos de relacionamen tos sociais que pressionam no sentido de desenvolver 0 que chamamos sis tema feudal Tentamos entao demonstrar alguns desses mecanismos de feudalizaao Vemos tambem como a partir da paisagem castela emergem juntamente com urn born nUmero de povoados livres de artesaos e comer ciantes uma grande quantidade de Estados feudais mais extensose mais ricos Na propria classe guerreira feudal surgem formas de estratos supe riores cada vez mais distintos Suas residncias sao os centros autenticos dos cantos e poemas liricos dos trovadores por urn lado e das formas cor teses de comportamento por outro Se no inicip do primeiro volume 0 padriio cortes de conduta e citado como ponto de partida de certo numero de seqiiencias de exemplos que dao ideia da mudana subseqUente da cons tituiiio psiqnica nesta parte temos acesso a sociognese dessas prOprias formas de comportamento courtois au vemos par exemplo como se desenvolve a forma primitiva do que chamamos Estado Na era do absolutismo sob 0 lema da civilidade o comportamento evolui de modo muito claro para 0 padrao que denota mos hoje por urn derivado da palavra civilite como comportamento civi lizado Parece assim necessmo na elucidaao desse processo civilizador formac uma ideia mais clara do que deu origem aos regimes absolutistas e por conseguinte ao estado absolutista Mas nao e so a observaao ou o estudo do passado que aponta nessa diriio grande numero de estudos contempodineos sugere convincentemente que a estrutura do comportamen to civilizado esta estreitamente interrelacionada com a organizaao das sO ciedades ocidentais sob a forma de Estados A questao em outras pala vras transformase na seguinte de que forma a sociedade extremamente descentralizada de principios da Idade Media na qual numerosos guerrei ros de maior ou menor importiincia eram os autenticos governantes do ter ritorio ocidental veio a transformarse em uma das sociedades interna mente mais ou menos pacificadas mas extemamente belicosas que chama mos de Estados Que diniimica de interdependencia humana pressiona para a integraao de areas cada vez mais extensas sob urn aparelho governamen tal relativamente estavel e centralizado Talvez para a primeira vista uma complicaao dispensavel estudar a gnese de cada formaiio historica Mas uma vez que todos os fenOme l preacio 17 nos hist6ricos tanto atitudes humanas como instituioes SOCIalS realmen te se desenvolveram em alguma epoca de que modo podem os sistemas de pensamento se revelar simples ou adequados para explicar esses feno menos se por urna esp6cie de abstraao artificial eles isolam os fenome nos de seu f1uxo natural historico privamnos de seu carMer de movimento e processo e tentam compreendSlos Como se fossem formaoes estaticas scm considerar como surgiram e como mudam Nao e 0 preconceito teo rico mas a propria experiSncia que instam conosco para procurarmos meios e maneiras intelectuais de traar urn curso entre 0 Cita deste estatismo que tende a descrever todos os movimentos historicos como algo estaciona rio e scm evoluao e 0 Caribde do relativismo historico que vS a historia apenas em transformaao constante sem chegar a ordem subjacente a esta transformao e as leis que governam a formaao de estruturas historicas Pois 6 isto 0 que tentamos fazer aqui As pesquisas sociogenetica e psico genetica propoemse a revelar a ordem subjacente as mudanas historicas sua mecamca e mecanismos concretos e parece que desta maneira gran de numero de questOes que julgamos hoje complicadas ou muito al6m da compreensao podem receber respostas bern simples e precisas Por esta razao este estudo investiga tambem a sociogSnese do Estado m para cilar urn unico aspecto da historia da formaao e estrutura do Estado 0 problema do monopolio da fora Observou Max Weber prin cipalmente por questao de definiao que urna das instituioes constitutivas exigidas pela organizaao social que denominamos Estado e 0 monop6lio do exerclcio da foa flsica Aqui tentase revelar algo dos processos his t6ricos concretps que desde 0 tempo em que 0 exercfcio da fora era pri vilegio de urn pequeno numero de guerreiros rivais gradualmente impeliu a sociedade para essa centralizaao e monopolizaao do uso da violSncia fisica e de seus instrumentos Podese demonstrar que a tendSncia para for mar esses monopolios nessa epoca passada de nossa historia nem e mais facU nem mais dificU de compreender que por exemplo a forte tendSncia a monopolizaao em nossa propria epoca Dal seguese que nao e dificit de compreender que com esta monopolizao da violSncia ffsica como ponto de intersecao de grande numero de interconexoes sociais sao radicalmente mudados todo 0 aparelho que modela 0 individuo 0 modo de operaao das exigSncias e proibioes sociais que Ihe moldam a constituiao social e acima de tudo os tipos de medos que desempenham um papel em sua vida Finalmente a conelusao Esbo de uma Teoria de Civilizaao destaca mais uma vez as ligaoes entre mudanas na estrutura da socie dade e mudanas na estrutura do comportamento e da constituiao psiqui ca Grande parte do que so podia ser sugerido antes na descriao de pro cessos historicos concretos e entao formulado explicitamente Encontramos rtI llo M a 311i11nQA J 18 a processo civilizador aqui por exemplo urn curto bosqucjo da estrutura dos medos experimen tados sob a forma de vergonha e delicadeza comO uma especie de suma rio teorico do que antes emergiu por si mesmo do estudo de documentos historicos achamos uma expIicaiio do rnotivo por que exatarnente medos desse tipo desempenham papel de especial imporliincia no progresso do me canismo civilizador e simultaneamente alguma luz e lanada sobre a for maiio do superego e sobre a relaao entre impulsos conscientes e incons cientes lla psique do homem civilizado It dada aqui uma resposta Ii ques tao dos processps historicos a questao de como todos esses processos que consistem de llada mais do que aoes de pessoas isoladas apesar disso dao origem a instituioes e formaoes que nem foram pretendidas nem planeja das por qualquer individuo singular na forma que concretamente assumem E por ultimo em urn amplo sumario estas introvisoes do passado sao combinadas em urn unico quadro com experiencias do presente Este estudo por conseguinte coloca e desenvolve urn problema de ra mificaoes muito extensas Mas nao finge solucionalo Delimita urn campo de observaao que ate agora so escassamente foi visilado e empreende Os primeiros passos na busca de urna explicaao Ou tros terao que ser dados Deliberadamentc deixei de abordar numerosas qucstoes e aspectos que se equacionaram por si mesmos no curso deste estudo Nao foi minha in tenao construir no ar uma teoria geral da civilizaao e em seguida des cobrir se ela concordava com a experiencia Em vez disso pareceume que a tarefa principal consistia em comear recuperando dentro de uma area limitada a percepiio perdida do processo em questao da transformaao peculiar do comportamento humano em segUida procurar obter ceria com preensiio de suas causas e finalmente reunir as introvisoes teoricas porven tura encontradas no caminho Se consegui lanar urn alicerce razoavelmen te seguro para ulterior reflexiio e pesquisa nesta direao este estudo atin giu todas as metas a que se propos Seriio necessarias a reflexao de muitas pessoas e a cooperaiio de diferentes ramos do conhecimento hoje freqiien temente divididos por barreiras artificiais para que gradualmente sejam respondidas as questoes levantadas no curso deste estudo Dizem elas res peito Ii psicologia filologia etnologia e antropologia nao menos que Ii so ciologia ou aos diferentes ramos da pesquisa historica Nao obstante as questoes coloeadas por este livro tem origem nao tanto na tradiao erudita no sentido mais estreito da palavra como nas experiencias a cuja sombra todos vivemos experiencias das crises e trans forma6es da civilizaao ocidental ate agora e na simples necessidade de compreender 0 que realmente significa essa civilizaao Mas nao fui orien tado neste estudo pela ideia de que nosso modo civilizado de comporta mento C 0 mais avanado de todos os humanamente possiveis nem pela opiniao de que a eivilizaao e a pior forma de vida e que esta condenada r preJdcio 19 ao desaparecimento Tudo a que se pode dizer hoje e que com a civiliza io gradual surge certo numero de dificuldades especlficas civilizacionais Mas nao podemos dizer que ja compreendemos par que concretamente nos atormentamos desta maneira Sentimos que nos metemos atraves da civi Iizaao em certos emaranhados desconhecidos de povos menos civiJizados Mas sabemos tambem que esses povos menos civilizados sao por seu lado atormentados par dificuldades e medos dos quais nao mais sofremos ou pelo menos nao no mesmo grau Talvez tudo isso possa ser vista com urn pouco mais de clareza se for compreendido comorealmente operam esses proeessos eivilizadores De qualquer modo foi este urn dos desejos com que comecei a trabalbar neste Iivro E possivel que com uma compreensao mais clara deles possamos algum dia tamar acessiveis a urn controle mais consciente esses processos que hoje ocorrem em nos e a nossa volta de uma forma nlio muito diferente dos fenamenos naturais processos que enfren tamos da mesma maneira que 0 homem medieval enfrentava as foras da natureza Quanta a mim fui obrigado no curso deste estudo a revisar meu pen samento sabre grande nUmero de assuntos e nao posso poupar a leitor da ne cessidade de travar conhecimento com cefto numero de aspectos e expres soes pollcO comuns Acima de tudo a natureza dos processos hist6ricos do que se poderia chamar de mecAnica evolucionaria da historian tornou se mais clara para mim como tambem suas relaoes com os processos psi quicos Termos como sociogenese e psicogenese vida afetiva e controle de instintos compulsOes externas e internas patamar de embarao poder so cial mecanismo de monop6lio e varios outros dao expressao a isto Mas fiz a menor concesslio possivel a necessidade de expressar com novas pa lavras coisas novas que se tornaram visiveis Mas basta no tocante ao tema deste Iivro No presente estudo e em certo numero de pesquisas preliminares in dispensaveis recebi conselbos e apoio de varias fontes Desejo aqui agra decer expressamente a todas lll pessoas e instituiOes que me auxiliaram A amplialio de minha Habilitationschrift e urn extenso estudo da no breza realeza e sociedadc de corte na Frana que constitui a base deste Iivro foram posslveis gras ao apoio da SteunFond de Amsterdam Meus agradecimentos a fundalio e ao professor Frijda de Amsterdam e ao pro fessor Bougie de Paris pela grande bondade e interesse que demonstraram durante meus trabalhos em Paris No tocante ao trabalho realizado em Landres recebi generoso apoio da Woburn House Londres A esta instituilio e acima de tudo ao pro fessor Ginsberg de Londres professor H Loewe de Cambridge e A Ma kower MA de Londres meus profundos agradecimentos Sem a ajuda dessa instituiao e dessas pessoas meu trabalbo nunca teria sido concluldo Ao professor K Mannheim de Londres minha gratidlio pela ajuda e con J 20 o processo civiliador selhos E nao sou menos grato a meus amigos Gisele Freund D Phil Paris M Braun D Phil Ph D Cambridge A GliiQksmann D Med Cambridge H Rosenhaupt D Phil Chicago e R Bonwit Londres pelo auxilio e pelas discussoes nas quais muitas coisas foram tornadas claras para mim NORBERT ELIAS Setembro de 1936 r capitulo urn DA SOCIOGNESE DOS CONCEITOS DE CIVILIZAAO E CULTURA r parte I Sociogenese da diferena entre kultur e zivilisation no emprego alemao I Introducao I 0 eoneeito de eivilizaao referese a uma grande variedade de fatos ao nivel da teenologia ao tipo de maneiras ao desenvolvimento dos eonhecimentos eientfficos as ideias religiosas e aos costumesPode So re ferir ao tipo de habioes ou a maneira como homens e mulheres vivem juntos a forma de puniao determinada pdo sistema judieiario on ao modo como sao preparados os a1imentos Rigorosanlente falando nada ha que nao possa ser feito de fonna civilizada ou uincivilizada Dai ser sempre di ncil sumariar em algumas palavras tudo a que se polie deserever como ei vilizaiio Mas se examinamos a que realmente constitui a funao geial do con ceito de eivilizaao e que qualidade comum leva todas essas varias atitu des e atividades humanas a serem deseritas como eivilizadas partimos de uma deseoberta muito simples cste conceito expressa a conseieneia que 0 Oei dente tern de si mesmo Poderiamos ate dizer a conseieneia nacicinal Ele resume tudo em que a soeiedade oeidental dos ultinios dais ou tres seeulos se julga superior a soeiedades mais antigas ou a soeiedades contemporaneas mais primitivas Com essa palavra a soeiedade oeidental proeura des crever a que the constitui a carater especial e aquila de que se orgulha a nivel de sua tecnologia a natureza de suas maneiras a desenvolvimento de sua cultura eientffica au visao do mundo e muito mais 2 Civilizaao porem nao significa a mesma eoisa para diferen tes nOcs oeidentais Acima de tudo e grande a diferena entre a forma como ingleses e franceses empregam a palavra par urn lado e os alemaes par outro Para as primeiros a conceito resume em uma unica palavra seu orgulho pela importancia de suas na6es para 0 progresso do Ocidente e da humauidade Ja no emprego que Ihe e dado pelos alemaes Zivilisation significa algo de fato util mas apesar dissoapenas urn valor de segunda classe compreendendo apenas a aparencia externa de seres humanos a su perficie da existencia humana A palavra pela qual os alemaes se interpretam que mais do que qualquer outra expressalhes 0 orgulho em snas proprias realiza6es e no proprio ser e Kulrur 3 Urn fenomeno peculiar Palavras como civilizalio em frances ou ingles ou 0 alemao Kultur sao inteiramente claras no emprego interno da sociedade a que pertencem Mas a forma pela qual uma parte do mun do esta ligada a elas a maneira pela qual incluem certas areas e excl uem outras como a caisa mais natural as avalia6cs ocultas que implicitamente fazem com elas tudo isto torna dificil definiIas para urn estranho o conceito frances e ingIes de civilizaao pode se referir a fatos polfticos ou economicos religiosos ou tecnicos marais au sociais 0 conceito alemao de Kultur alude basicamente a fatos intelectuais artisticos e religiosos e apre senta a tendencia de traar uma nitida linha divis6ria entre fatos deste tipo por urn lado e fatos politicos econ6micos e sociais por Dutro 0 conceito frances e ingles de civilizaao pode se referir a reaIiza6es mas tambem a atitudes au comportamento de pessoas POllCO importando se realizaram au nao alguma coisa No conceito alemao de Kultur em contraste a referencia a comporlamento 0 valor que a pessoa tern em virtude de sua mera exis tencia e conduta sem absolutamente qualquer realizao e muito secundario o sentido especificarnente alemao do conceito de Kutur encontra sua expres sao mais clara em seu derivado 0 adjetivo kulturell que descreve 0 carater e 0 valor de determinados produtos humanos e nao 0 valor intrinseco da pessoa Esta palavra 0 conceito inerente a kulturell porem nao pode ser traduzido exatamente para 0 frances e 0 ingles A palavra kultiviert cultivado aproximase muito do conceito ocidental de civiIizaao Ate certo ponto representa a forma mais alta de ser civilizado Ate mesmo pessoas e familias que nada realizaram de kulturell podem ser kultiviert Tal como a palavra civilizado kultiviert referese prirnariamente a forma da conduta ou comportamento da pessoa Descreve a qualidade social das pessoas snas habitalioes suas maneiras sua lala snas raupas ao contrario de kulturell que nao alude diretamente as proprias pessoas mas exclusivamente a realiza6es humanas peculiares 4 Hii outra diferena entre os dois conceitos estreitamente vinculada a isto CiviIiza9aO descreve urn processo au pelo menos seu resultado Diz respeito a algo que esta em movimento constante movendose incessan temente para a frente 0 conceito alemao de kultur no emprego corrente irnplica uma relao diferente com movimento Reportase a produtos huma nos que sao smelhantes a flares do campol a obras de arte IiVIOS siste 24 o processo civilitador 24 o processo civilizador seu orgulho pela importancia de suas noes para a progresso do acidente e da humanidade Ia no emprego que Ihe e dado pelos alemaes Zivilisation significa alga de fato otil mas apesar disso apenas urn valor de segunda classe compreendendo apenas a aparencia extema de seres humanos a su perficie da existencia humana A palavra pela qual os alemaes se interpretam que mais do que qualquer outra expressaIhes 0 orgulho em suas proprias realiza90es e no proprio ser e Kultur 3 Urn fenomeno peculiar Palavras como civiliza9iio em frances au ingles au a alemao Kutur sao inteiramente claras no emprego interno da sociedade a que pertencem Mas a forma pela qual uma parte do mun do esta ligada a elas a maneira pela qual incluem certas areas e excllem outras como a coisa mais natural as avalia90es ocultas que implicitamente fazem com elas tudo isto toma dificil definiIas para urn estranho a conceito frances e ingles de civiliza9ao pode se referir a fatos politicos ou economicos religiosos ou tecnicos marais au sociais 0 onceito alemAo de Kutur alude basicamente a fatos intelectuais artisticos e religiosos e apre senta a tendencia de tra9ar uma nitida linha divisoria entre fatos deste tipo par urn lado e fatos politicos economicos e sociais par outro a conceito frances e ingles de civiliza9ao pode se referir a realiza90es mas tarnbem a atitudes au comportamento de pessoas pouco importando se realizaram au nao alguma coisa No conceito alemao de Kultur em contraste a referencia a comportamento a valor que a pessoa tern em virtude de sua mera exis tencia e conduta sem absolutamente qualquer realizao e muito secundario a sentido especificarnente alemao do conceito de Kultur encontra sua expres sao mais clara em seu derivado a adjetivo kulturel que descreve a carater e a valor de determinados produtos humanos e nao 0 valor intrfnseco da pessoa Esta palavra 0 conceito inerente a kulturel porem nao pode ser traduzido exatarnente para 0 frances e 0 ingles A palavra kultiviert cultivado aproximase muito do conceito ocidental de civiliza9ao Ate certo ponto represcnta a forma mais alta de ser civilizado Ate mesmo pessoas e familias que nada realizaram de kulturel podem ser kultiviert Tal como a palavra civilizado kultiviert referese primariamente a forma da conduta au comportamento da pessoa Descreve a qualidade social das pessoas suas habitaoes snas maneiras sua fala suas roupas aD contrario de kuturel que nao alude diretamente as proprias pessoas mas exclusivamente a realiza90es humanas peculiares 4 Ha outra diferen9a entre os dais conceitos estreitarnente vinculada a isto Civilizacao descreve urn processo OU pelo menDs sell resultado Diz respeito a algo que estii em movimento constanle movendose incessan temente para a frente a conceilo alemao de kultur no emprego corrente implica uma reliio diferenle com movimento Reporlase a produlos huma nos que sao smelhantes a flares do campo 1 a obras de arle livros siste conceitos de civilizoiio e culturo 25 mas religiosos ou filosoficos nos quais se expressa a individualidade de urn pavo 0 conceito de Kultur delimita Ate certo ponto 0 conceito de civilizagao minimiza as diferengas nacio nais entre os povos enfatiza 0 que e comum a todos os seres humanos ou na opiniao des que 0 possuem deveria seIo Manifesta a autoconfianga de povos cuias fronteiras nacionais e identidade nacional fcram tao plena mente estabelecidos desde secules que deixaram de ser tema de qualquer discussao povos que ha muito se expandiram fora de suas fronteiras e colo nizaram terras muitoalem delas Em contraste 0 conceito alemao de Kultur da enfase especial a dife rengas nacionais e 11 identidade particular de grupos Principalmente em virtude disto 0 conceito adquiriu em campos como a pesquisa etnologica e antropologica uma significagao muito alem da area lingiiistica alema e da situagao em que se originou 0 conceito Mas esta situagao e aquela de urn povo que de acordo com os padroes ocidentais conseguin apenas muito tarde a unificaao politica e a consolidagao e de cuias fronteiras durante seculos ou mesmo ate 0 presente territorios repetidamente se desprenderam ou ameagaram se separar Enquanto 0 conceito de civUizagao inclui a fungao de dar expressao a urna tendencia continuamente expansionista de grupos colonizadores 0 conceito de Kultur reflete a consciencia de si mesma de urna nagao que teve de buscar e constituir incessante e novamente suas frontei ras tanto po sentido politico como espiritual e repetidas vezes perguntar a si mesma Qual e realmente nossa idcntidade A orientaao do conceito alemao dcultura com sua tendencia 11 demarcagao e enfase em diferengas e no seu detalhamento entre grupos corresponde a este processo historico As perguntas 0 que e realmente frances 0 que e realmente ingles hit muito deixaram de serassunto de discussao para franceses e ingleses Du rante seculos porem a questao 0 que e realmente alemao reclamou sempre resposta Vma resposta a esta pergunta uma entre varias outras reside em urn aspecto peculiar do conceito de Kultur 5 As autoimagens nacionais representadas por conceitos como Kultur e civilizaao assumem formas muito difcrentes Par mais diferente que seja a autoimagem dos alemaes que falam com orgulho de sua Kultur e a de franceses e ingleses que pensam com orgulho em sua civilizaao todos consideram axiomatico que a sua e a maneira como 0 mundo dos homens como urn todo quer ser visto e iulgado 0 alemao pode quem sabe tentar explicar a franceses e ingleses 0 que entende pelo conceito de Kultur Mas dificilmente pode comunicar 0 minimo que seja do meio formativo nacionai cspecifico e valores emocionais axiomaticos que para ele a palavra reveste Franceses ou ingleses poderao talvez dizer ao alemao que elementos Iomam 0 conceito de civilizagao a suma da autoimagem nacional Mas por mais razoavel e racional que esle conceito Ihes parega ele tambOm nasce de urn conjunto cspecifico de situagoes historicas e esta cercado tambem por J 26 o proClSSO civiUzador uma atmosfera emocional e tradicional dificil de definir mas que apesar disso constituiParte integral de seu significado E a discussao descamba realmente para a inutilidade quando 0 alemao tenta demonstrar ao frances e ao ingles por que 0 conceito de Zivilisation de fato representa urn valor para ele embora apenas de segnnda classe 6 Conceitos como esses dois tem algo do carater de palavras que ocasionalmente surgem em algum grupo mais estreito tais como familia seita classe escolar ou associaao e que dizem muito para 0 iniciado e pouquissi mo para 0 estranho Assumem forma na base de experiencias comuns Cres cern e mudam com 0 grupo do qual Sao expressao Situaao e hist6ria do grupo refletemse nelas E permanecem incoloresnunca se toroam plena mente vivas para aqueles que nao compartilham tais experiencias que nao falam a partir da mesma tradiao e da mesma situaao as conceitos de Kultur e civilizaao para sermos exatos portam 0 selo nao de seitas ou famflias mas de povos inteiros ou talvez apenas de certas classes Mas em muitos aspectos 0 que se aplica a palavras especffi cas de grupos menores estendese tambem a eles sao usados basicamente por e para povos que compartiham uma tradiao e situaao particulares Conceitos matematicos podem ser separados do grupo que os usa Trian gnlos admitem explicaoes sem referencia a sjtua6es hist6ricas Mas 0 mesmo nao acontece com conceitos como civilizaao e Kultur Talvez aconta que determinados individuos os tenham formado com base em material lin giiislico ja disponlvel de seu pr6prio grupo ou pelo menos Ihes tenham atri bUldo um novo significado Mas eles lanaram ralzes Estabeleceramse Qutros os captaram em seu novo significado e forma desenvolvendoose polindoos na fala e na escrita Foram usados repetidamente ate se tomarem instrumenlos eficientes para expressar 0 que pessoas experimentaram em comum e querem comunicar Tornaramse palavras da moda conceitos de emprego comum no linguajar diario de uma dada socjedade Este fato de monstra que nao representam apenas necessidades individuais mas coletivas de expressao A hist6ria coletiva neles se cristalizou e ressoa a indivlduo encontfa essa cristalizaao ja em suas possibilidades de uso Nao sabe bern por que este significado e esta delimitaao estao implicadas nas palavras por que exatamente esta nuance e aquela possibilidade delas podem ser deri vadas Usaas porque he parece uma coisa natural porque desde a infaocia aprende aver 0 mundo atraves da lente desses conceitos a processo social de sua genese talvez tenha sido esquecido ha muito Uma geraao os trans mite a outra sem estar consciente do processo como urn todo e os conceitos sobtevivem enquanto csta cristalizaao de experiencias passadas e situaoes reliver urn valor existencial uma funao na existencia concreta da sociedade isto e enquanto gera6es sucessivas puderem identificar suas pr6prias experiencias no significado das palavras as termos morrem aos poucos qual do as funoes e experiencias na vida concreta da sociedade deixam de se conceito de civiliUJfiio e culturG 17 vincular a eles Em outras ocasi6es eles apenas adormecem ou 0 fazem em certos aspectos e adquirem urn novo valor existencial comuma nova situa io Sio relembrados entio porque alguma coisa no estado presenle da socie dade encontra expressio na cristalizaio do passado corporificada nBS pa lavras II Desenvolvimento da Antftese entre Kultur e Zivilisation 2 7 E claro que a funio do conceito germAnico de Kulur ganhou vida nova em 1919 e nos anos precedentes em parte porque uma guerra foi travada contra a Alemanha em nome da civilizio e por causa da auto imagem que OS alemies tiveram que redefinir na situaio criada pelo tratado de paz Mas e igualmentc claro e isto pode ser provado que ale cerlo ponto a situailo hist6rica da Alemanha ap6s a guerra apenas deu novo impulso a uma antltese que ha muito tempo encontrara expressilo atraves desses dois conceitos retroagindo isso ate 0 seeuloxvyi Parece que foi Kant quem primeiro expressou uma experiencia e anti teses especfficas de sua sociedade em conceitos correlacionados Em 1784 escreveu ele nas Ideios sabre uma Historia Universal do Ponto de Vista de urn Cidadiio do Mundo Cultivados a um alto grau pela arte e pela ciencia somos civilizados a tal ponto que estamos sobrecarregados por todos os tipos de decoro e decencia social A ideia da moralidade acrescentava e parte da cullura A aplica io desta ideia porem que resulta apenas na analogia de moralidade no amor 8 honra e a decencia visivel equivale apenas ao processo civilizador Por mais que essa formulaio da antitese jli para no momenta de sua genese proxima da nossa seu ponto de partida concreto nas experien cias e situaio de fins do seeulo XVIII embora nio carea de conexilo his t6rica com as experiencias nas quais assenla seu uso presente ela e apesar disso muito diferente 0 contraste aqui caso em que as portavozes da bur Referencia ao tratado de Versalhes que pOs fim a Primeira Guerra Mundial a qual Elias escrevendo antes da Segunda se refere sempre como a guerra exceto obviamente Da introduao por eie redigida em 1968 e que vai em apendice Extre mamente lesivo para as pOtencias que haviam perdido a guerra 0 tratado de Versalhes causou rnuila ievolta e indignaao especialmente entre os aiernaes RJR J conceito de civiliUJrio e cultur 37 vincular a etes Em outras ocasioes eles apenas adormecem ou 0 fazem em certos aspectos e adquirem um novo valor existencial comuma nova situa ao Sao relembrados entio porque alguma coisa no estado presente da socie dade encontra expressiio na cristalizaiio do passado corporificada nas pa lavras II Desenvolvimento da Antitese entre Kultur e Zivilisation 2 7 claro que a funao do conceito germanico de Kulllr ganhou vida nova em 1919 e nos anos precedentes em parte porque uma guerra foi travada contra a Alemanha em nome da civilizao e por causa da auto imagem que os alemies tiveram que redefinir na situaao criada pelo tratado de paz 0 Mas e igualmente claro e isto pode ser provado que ate certo ponto a situao hist6rica da Alemanha ap6s a guerra apenas deu novo impulso a uma anlltese que M muito tempo encontrara expressio atraves desses dois conceitos retroagindo isso ate 0 seculoXVJlI Parece que foi Kant quem primeiro expressou uma experiencia e anli teses especfficas de sua sociedade em conceitos correlacionados Em 1784 escreveu ele nas dew sabre uma Hisaria Universal do Ponto de Vista de urn Cidadiio do Mundo Cultivados a um alto grau pela arte e pela ciencia somos civilizados a tal ponto que estamos sobrecarregados por todos os tipos de decoro e decencia social A ideia da moralidade acrescenlava e parte da cultura A aplica iio desta ideia porem que resulta apenas na analogia de moralidade no amor i honra e 11 decencia visivel equivale apenas ao processo civilizador Por mais que essa formulaiio da antilese ja para no momento de sua genese proxima da nossa seu ponto de partida concreto nas experien cias e situaiio de fins do seculo XVIII embora nio carea de conexiio his t6rica com as experiencias nas quais assenta seu uso presente ela e apesar disso muito diferente 0 contraste aqui caso em que os portavozes da bllr Referencia ao tratado de Versalhes que pOs fim a Primeira Guerra Mundial a quat Elias escrevendo antes da Segunda se refere sempre como a guerra exceto obviamente na introducao por ele redigida em 1968 e que vai em apendice Extre mamente lesivo para as pOtencias que haviam perdido a guerra 0 tratado de Versalhes causou muila revolta e indignacao especialmente entre Os alemaes RJR 28 o processo civiizador guesia alema em desenvolvimento a intelligentsia 3 alema de classe media falam ainda em grande parte do ponto de vista de urn cidadao do mundo relacionase apenas vagamente e na melhor das bip6teses secundariamentc com urn contraste nacional Seu aspecto principal e urn contraste intemo na sociedadc um contraste social que apesar de tudo porta dentro de si de forma significativa 0 germe do contraste nacional 0 contraste entre a nobre za cortesa que usava predominantemente a lingua francesa e era civilizada segundo 0 modelo frances e urn cstralo de intelligentsia de cIasse media que falava alemao recrutado principalmente entre os servidores dos principes burgueses ou funcionarios publicos no sentido mais amplo e ocasionalmente tambem em meio a nobrcza proprietljria de terras Esta intelUgentsia constituia urn estrato muito distante da atividade po litica mal pensava em termos pOliticos e apenas experimenta1mente em termas nacionais sua legitimaao consistia principalmente em suas realijjes intelectuais cientificas ou artisticas Em contraposiao a ela ha uma classe superior que nada realiza no sentido em que as OUlras 0 fazem mas para cuja autoimagein e autojustificaao a modelagemde seu comportamento caracteristico e diferente e fundamental E e ncssa classe em que pensa Kant quando fala de ser civilizado a tal ponto que estamos sobrecarregados de mero decoro e deeencia social e de analogia de moralidade com amOt a bonra E e na polemica entre 0 estrato da intelligentsia alema de classe media e a etiqueta da cIassecortesa superior e govemante que se origina o contraste entre Kultur e Zivilisation na Alemattha A polemica no entanto era mais antiga e mais ampla do que sua cristalizao nesses dois conceitos 8 Suas origens podem ser buscadas em meados do seculo XVIII ainda que apenas como urn murmurio do pensamento muitQ mais abafado do que ficara na segunda metade do seculo Uma boa ideia disto pode ser obtida em artigossobre Hot Hoflichkeit e Hofmann Corte Cortesia Cortesao excessivamenie longos para aqui serem reproduzidos na integra pUblicados no Zedler Universal Lexicon de 1736 A cortesia indubitavelmente deriva seu nome da corte e da vida cortesI As cortes dos grandes senhores sio teatros em que tados querem fazer sua fortuna Isla pade ser adquirido conquistandose 0 favor do principe e dOl membros mais importantes de sua corte 0 individua por conseguinte nio poupa esforcos para se tornar agraClavel a eIes E nada realiza ista methor do que fazer 0 outro acreditar que estarnos prontos para serviIo ate 0 mbimo de nossa capacidade e em todas as condicoes Nao obstante nem sempre estamos em cODdies de assirn proceder e talvez pOT boas razOes nao queiramos assim asic A cortesia serve como substituto de tudo isto Atraves deja damos 80 outro tan aaran tilts atraves de nossa conduta visivel que ele forma urna expectative favontvel de nossa disposicao de serviIo Isto the desperta8 confian8 cia qual se desen volve imperceptivtHmente urna afeicao par nOO com o resultado de que ele se torna ansioso para nos azero bern Isto e tao comum nocaso da cortesia que confere urnavantagem especial Aqueles que 8 possuem Sem dUvida de veriam realmente ser a habilidade e a virtude as fatores que nos conquJatassem conceitos de civilizu9iio e cultura 29 a estima da pessoa Mas como sao poucos os juZes corretos das duas E quan tos menos as consideram dignas de honra As pessoas preocupadas demais com exterioridades sao muito mais influenciadas pelo que atinge extemamente seus sentidos especialmente quando as circWlStancias concomitantes sio de ordem a afetarlhes especialmente a vontade Isto funciona com tada a precisao no caso do cortesao Em termos simples sem interpreta9ao filos6fica e em rela9ao clara com configura90es sociais especificas e expressa aqui a mesina antitese fonnulada por Kant refinada e aprofundada no contraste entre cultura e civiliza9ao cortesia externa enganadora vs virtude autentica Mas 0 autor apenas menciona isto de passagem e com urn suspiro de resigna9ao Ap6s os meados do seculo 0 tom muda gradualmente A autolegitima9ao da classe media pela virtude e as realiza90es tomamse mais precisas e enfaticas e a polemica cOn tra as maneiras externas e superficiais encontradas nas cortes fica mais explfcita III Exemplos de Atitudes de Corte na Alemanha 9 Nao e facil falar sobre a A1emanha em termos gerais uma vez que nessa epoca notarnse caracteristicas especiais em cada urn de SellS rnuitos Estados Mas apenas algumas serao finalmente decisivas para 0 desenvoI vimento do todo Delas 0 resto se segue naturalmente Alem disso certos fenomenos geraig apresentamse mais ou menos claramente em toda parte Para come9ar ha 0 despovoamento e a pavorosa devasta9ao econo mica do ais ap6s a Guerra dos Trinta Anos No seculo XVII e ainda mesmo no seculo XVIII a A1emanha e em particular a burguesia alema sao pobres em compara9ao com os padr6es frances e ingles 0 comercio em especial 0 comrcio externo que fora altamente desenvolvido em partes do pais no seculo XVI esta em ruinas Desmoronou a imensa riqueza das gran des casas mercantis parcialmente devido a mudan9a nas rotas de comercio devido a descoberta de novas terras no ultramar e ate certo ponto em conseqiiencia do lange caos da guerra 0 que sobra e uma burguesia de pequenas cidades de horizontes estreitos vivendo basicamente do atendimen to de necessidades locais E pouco 0 dinheiro disponivel para luxos tais como Iiteratura e arte Nas cortes noS casos em que ha recursos suficientes as pessoas imitam in satisfatoriamente a conduta da corte de Luis XIV e falam frances 0 alemao a Ifngua das classes baixa e media e pesadao e incomodo Leibniz 0 unico 30 o processo civilizador fi16sofo cortesiio alemlio 0 unico grande alemao dessa epoca cujo nome des perta aplausos em circulos cortesaos mais amplos escreve e fala frances ou latim raramente 0 idioma nativo E 0 problema da lingua 0 problema do que pode ser feito com este desengonado idioma ocupao tambem como ocupou tantos outros o frances espalhase das cortes para a camada superior da burguesia Todas as honnetes gens gente de bern todas as pessoas de conseqiiencia o falam Falar frances e 0 simbolo de sratus de toda a classe superior Em 1730 a noiva de Gottsched escreve a seu prometido Nada e mais plebeu do que eserever cartas em alemao Se 0 individuo fala alemao e considerado de born tom incluir tantas palavras francesas quanta possive Em 1740 E de Mauvillon escreveu em suas Lettres FrQ1lfoises et Germaniques Ha apenas alguns anos nao se diziam quatro palavras de alemao sem se acrescentar duas francesas Isso era Ie bel usage 0 born emprego E ele tern mais a dizer sobre 0 aspecto barbara da lingua alema Sua natureza diz e detre rude et barbare ser rude e barbara 1 Saxonios afirmam que quon parle mieux IAllemand en Saxe quen aucun autre endroit de IEmpire 0 alemao e mais bern falado na Saxonia do que em qualquer outra parte do Imperio Os austriacos fazem a mesma alegaao a respeito de si mesmos no que sao acompanhados por bavaros brandenburguenses e suios Alguns estudiosos continua Mauvillon querem estabelecer regras de gramatiCll mas il est difficile quune Nation qui contient dans son sein tant de Peuples independans les uns des autres se soumette aux decisions dun petit nombre des Savans e dificil para uma naao que abrange tantos povos independentes entre si submeterse as deci s6es de urn pequeno numero de sabios Neste como em numerosos outros campos a classe media pequena e impotente couberam as tarefas que na Frana e Inglaterra eram desempe nhadas principalmente pela corte e pela classe alta aristocratica Foram os servidores de principes cultos que tentaram em primeiro lugar criar em uma classe intelectual particular as modelos do que 0 alemao e e desta maneira estabelecer pelo menos nesta esfera intelectual uma unidade ale rna que ainda nao parece realizavel na esfera politica 0 conceito de Kultur tern a mesma funao Mas no inicio a maior parte do que ve na Alemanha parece tosco e atrasado a Mauvillon urn observador bern versado na civilizaao francesa Referese ele a literatura e a lingua nos termos seguintes Milton Boileau Pope Racine Tasso Moliere e praticamente todos os poetas importantes foram traduzidos na maioria das linguas europeias Os poetas alemaes na maior parte sao apenas tradutores E continua Deemme urn nome criativo em seu Parnaso citemme urn poeta alemao que de dentro de si mesmo tirou uma obra de reputaao De safioos a fazeIo 8 r i conceilOs de civiizQriio e cultura 31 10 Poderiamos dizer que esta era a opiniao leiga de urn frances mal orientado Em 1780 porem 40 anos ap6s Mauvillon e nove anos antes da Revoluao Francesa quando Frana e Inglaterra ja haviam ultrapassado as fases decisivas de seu desenvolvimento cultural e nacional quando as Hnguas desses dois paises ocidentais haviam muito tempo antes encontrado sua forma classica e permanente Frederico 0 Grande publica uma obra intitulada De la litterature alertUlnde 9 na qual lamenta 0 escasso e insuficiente desenvol vimento da literatura alema alinha mais ou menos as mesmas afirmaoes so bre a lingua alema que haviam saido da pena de Mauvillon e explica como em sua opinHio pode ser remediada a lamentavel situaao Sobre a lingua alema diz Consideroa uma lingua semibarbara que se fraciona em tantos dialetos diferentes como a Alemanha tern provincias Cada grupo local esta convencido de que seu patois e 0 melhor Descreve o baixo nivel da literatura lamenta 0 pedantismo dos intelectuais alemaes e 0 pouco desenvolvimento da ciencia do pais Mas encontra tambem uma razao para isto considera 0 empobrecimento alemao como resultado de guerras incessantes e do insuficiente desenvolvimento do comercio e da bur guesia uNao is diz eie lao espirito ou ao geoio da na9ao que devemos atri buir 0 pequeno progresso que fizemos mas por a culpa em uma sucessao de fatos tristes uma guerra ap6s outra que nos deixou arruinados e pobres DaD so em dinheiro mas em homcns tambem Fala do lento comeo da recuperaao da prosperidade 0 Terceiro Estado nao mais enlanguece em vergonhosa degradaao Pais edueam seus fillios sem se endividarem Eis que comea a feliz revoluiio que esperamos E profetiza que com crescente prosperidade ocorrera tambem urn floresci mento da arte e ciencia alemas urn proccsso civilizador que dara aos alemaes urn lugar igual entre as demais naoes e e esta a feliz revoluao a que se refere E comparase a Moises que anteviu 0 renascimento de seu povo scm experimentaIo 11 Tinha razao Frederico Urn ano ap6s a publicaao de sua obra em 1781 vern a luz Die Rauber Os Bandidos de Schiller e a eritiea da razlio pura de Kant seguidos em 1787 por Don Carlos do primeiro autor e lphigenie de Goethe Dai se seguiu todo 0 florescimento da literatura e filosofia alema que conhecemos E tudo isto parecia he confirmar a pro fecia Esta nova eflorescencia porem estivera ha muito tempo em gestao A lingua alema nao adquiriu esse novo poder expressivo em apenas dois ou tres anos Em 1780 ano de publicaao de De La litterature allemande esta lingua hli muito deixara de ser 0 patois semibarbaro a que se refcria Fre derico Ja surgira uma colao completa de obras que hoje em retrospecto consideramos de grande imporllincia 0 Gotz von Berlinchigen de Goethe 32 o processo civiljrador chegara as ruas sete anos antes Werther ja estava em circulaao Lessing jii publicara a maior parte de suas obras dramaticas e teoricas incluindo Laokoon Laocoonte em 1776 e Die Hamburgische Dramaturgie Drama tnrgia de Hamburgo em 1767 Frederico falecera em 1781 apos a publica ao de seu trabalho Os escrltos de Klopstock haviam sido publicados muito antes como 0 Messias que veio a lume em 1748 Tudo isto sem conlar 0 Sturm und Drang pas de Herder e uma serie completa de romances muito lidos tais como Das Fraulein von Sternheim de Sophie de la Roche Muito tempo antes despontara na Alemanha uma classe de compradores um publi co burgues mesmo que ainda relativamente diminuto que se interessava por essas obras Ondas de grande agitaao intelectual varreram a Alemanha e encontraram expressao em artigcs livros peas de teatro e outras obras A lingua alema tornarase rica e flexlve Nada disto Frederico sequer sugere em seu trabalho Ou nao 0 ve ou nao Ihe atribui importancia Menciona uma unica obra da jovem geraao a maior obra do periodo de Sturm ulld Drang e do entusiasmo por Shakespea re Gotz von Berlinchingen Caracteristicamente alude a essa obra em cone xao com a educao e formas de divertimento das basses classes os estratos mais baixos da populaao A fim de se convencerem da falta de gosto que reina Da Alemanha ate nossos dias basta comparecer aos espetAculos publicos Neles verao encenadas as obras abominaveis de Shakespeare traduzidas para nossa lingua a plat6ja inteira entra em extase quando escula essas farsas dignas dos selvageDs do Canada Des crevoas nestes termos porque elas pecam contra todas as regras do teatTo regIas que DaD sao em absoluto arhitrarias OIhem para os carregadores e coveiros que aparecem no palco e fazem dis cursos bern dignos deles depois deles entram reis e rainhas De que modo pode esta mix6rdia de humildade e grandiosidade de bufonaria e tragedia ser como vente e agradaveJ Podemos perdoar Shakespeare por esses erros bizarros 0 comeco das artes nunea e seu ponto dematuridade Mas vejam em seguida GOt von Berlinchingen que faz seu aparecimento no palco uma imitacao detestavel dessas horriveis obras inglesas enquanto 0 publico aplaude e enttlsiasticamente exige a repeticio dessas nojentas imbeci lidades E continua Depois de me ter referido as classes baixas e necessario que eu prossiga com a mesma franqneza no tocante as universidades 12 0 bomem que assim fala e 0 que fez mais do que qualquer de seus contemporaneos pelo desenvolvimento politico e econ6mico da Prussia e talvez indiretamente pelo desenvolvimento politico da Alemanha Mas a tradiao intelectual em que se formou e que nele encontra expressao e a comum a boa sociedade da Europa a tradiao aristocratica da sodedade de corte anterior a naao E ele Ibe fala a lingua a frances Pelos padroes L conceitos de civiizariio e cultura 33 h de seu gosto mede a vida intelectual da A1emanha Os modelos prescritos lbe determinam 0 julgamento Outros desla sociedade muito tempo antes referiamse a Shakespeare de forma bastante parecida Em 1730 por exem plo Voltaire deu expressao a pensamentos muito semelbantes no Discours sur la tragMie no qual apresenta a tragectia Brutus De modo algum finjo aprovar as irregularidades barbaras que a saturam a tragedia Julio Cesar de Shakespeare Surpreende apenas que nao haja ainda mais disto numa obra escrita em uma era de iguorancia por urn homem que nem mesmo conhecia latim e que nao teve mestre exceto seu pr6prio genio o que Frederico 0 Grande diz sobre Shakespeare e na verdade a opi niao geral da classe alta da Europa que s6 se expressava em frances Ele nem copia nem plagia Voltaire 0 que escreve e sua sincera opiniao pessoaI Nao acha graga nos chistes rudes e incivilizados de coveiros e gente da mesma laia ainda mais se aparecem misturados com os grandes senti mentos tragicos de principes e reis Acha que nada disso tern forma clara e concisa e que sao prazeres das classes baixas E desta maneira que seus comentarios devem ser compreelldidos nao sao nem mais nem menos indi viduais que a lingua francesa que usa Como ela atestam sua filiagao a uma sociedade particular E 0 paradoxo de que enquanto sua polftica era prus siana sua tradigao esMtica era francesa ou mais exatamente absolutista de corte nao e tao acentuado como os atuais conceitos de uniformidade nacia nal poderiam sugerir Ele esta inseparavelmente ligado 11 estrutura peculiar dessa sociedade de corte cujas instituigoes e interesses eram muitifanamente fragmentados mas cuja estratificagao social se fazia em estamentos cujo gosto estilo e Ifngua eram de maneira geral os mesmos por tada a Europa As peculiaridades dessa situagao ocasionalmente geravam conflitos in timos no jovem Frederico e aDs poucos ele se deu conta de que os interesses do governante da Prussia nem sempre podiam ser conciliados com a reve rencia pela Franga e a observancia de costumes cortesaos 10 Durante tada sua vida esses conflitos ocasionaram certa desarmonia entre 0 que ele fazia como governante e 0 que escrevia e publicava como ser humano e filosofo Os sentimentos da intelligentsia burguesa alema em relagao a ele mos travam as vezes urn igual paradoxo Seus sucessos militares e polfticos deram a autoconsciencia alema urn tonico de que ha muito carecia e para muitos ele se transformou em her6i nacionaI Mas sua atitude em questoes de Ifngua e gosto que encontrou expressao na obra sobre a literatura alema embora nao apenas nela era exatamente 0 que a intelligentsia do pais melbor dizen do enquanto intelligentsia alema tinha que combater A situagao dessa classe tinha seu analogo em quase todos os maiores Estados alemaes e em muitos dos menores No topo por quase tada a Ale manha situavamse individuos ou grupos que falavam frances e decidiam a politica No outro lado havia uma intelligentsia de fala alema que de modo geral nenhuma influencia exercia sobre OS fatos politicos De suas fileiras 34 o processo civililador sairam basicamente o homens por conta dos quais a Alemanha foi chamada de terra de poetas e pensadores E deles conceitos como Bildung e Kultur receberam seu cunho e substancia especificamente alemiies IV A Classe Media e a Nobreza de Corte na Alemanha 13 Constituiria urn projeto notavel e sobremaneira fascinante de monstrar 0 quanto as condioes espirituais e ideais especlficas de uma socie dade absolutista de corte encontraram expressiio na trag6dia francesa qlie Frederico 0 Grande contrapoe as tragedias de Shakespeare e 0 Gott A im portancia da boa forma a marca caracterislica de toda sociedadei auten lica 0 controle dos sentimentos individuais pela raziio esta uma necessidade vital para todos os cortesiios 0 comportamento reservado e a eliminaiio de todas as expressoesplebeias sinal especlfico de uma fase particular na rota para a civi1izaiio tudo isto tern sua mais pura manifestaiio na trag6dia classica a que tern que ser ocultado na vida cortesii todos os sentimentos e atitudes vulgares tudo 0 que a pessoa niio diz tampouco aparece na trag6dia Gente de baixa posiiio social que para esta classe significa tambem carater vii nela niio tern lugar Sua forma eclara transparente precisamente regulada tal como a etiqueta e a vida cortesa em geral 11 Apresenta os membros da corte como eles gostariam de ser e ao mesmo tempo como os pdncipes absolutos os querem ver E todos os que viveram sob 0 molde desla situaao social fossem ingleses prussianos ou franceses tiveram seu gosto conformado ao mesmo padrao a pr6prio Dryden que depois de Pope e 0 mais conhecido poeta cortesiio da Inglaterra escreveu sobre 0 teatro primeiro ingles quase na mesma veia que Frederico 0 Grande e Voltaire leiamos 0 epilogo de Conquest of Granada Tendo a finura wit atingido urn mais alto grau B nossa lfngua nativa se tornado mais refinada e livre Mulheres e homeDs ora falam com rnais graca wit Em suas conversas do que os poetas as descreveni a vinculo com a estratificao social e muito clara no julzo estetico Frederico igualmente defendese da falta de gosto de se justapor no palco a grandeza tragica de prfncipes e rainhas com a rudeza de carrega dores e coveiros Como poderia ter ele compreendido e aprovado uma obra dramatica e literaria que focalizava acirna de tudo a luta contra di ferenas de classe urn trabalho que tinha a iIiteniio de mostrar que nao r conceitos de civilizaciio e cultura 35 s6 os sofrimentos de principes e reis e da aristocracia cortesa mas tambem os de pessoas situadas mais baixo na classe social tern sua grandeza e sua tragedia Na Alemanha igualmente a burguesia tornase mais pr6spera 0 rei da Prussia percebe este fato e diz a si mesmo que ele levara ao despertar da arte e da ciencia a uma feliz revoluao A burguesia porem fala uma lingua diferente da usada pelo rei Os ideals e gosto da juventude bur guesa seus modelos de conduta saO quase 0 oposto dos seus Em Dichlung und Wahrheit Poesia e verdade Livro 9 escreve Goe the Em Estrasburgo na fronteira francesa libertamonos imediatamente do espirito dos franceses Descobrimos que seu estilo de vida era regula mentado e aristocratico demais fria a sua poesia destrutiva sua critica li teraria e abstrusa e insatisfat6ria sua filosofia Escreve Golz com este estado de espirito Como poderia Frederico 0 Grande 0 homem do gosto esclarecido do absolutismo racional e aristo cniticocortesao teIo compreendido De que modo poderia 0 rei ter apra vado as peas e teorias de Lessing que elogia em Shakespeare exatamente o que Frederico condena que as obras do dramaturgo ingles ajustamse muito mais ao gosto do povo do que os classicos franceses Se alguem houvesse traduzido as obrasprimas de Shakespeare para os nossos alemaes sei com certeza que teria colWdo melhores resul tados do que fazendoos conhecer Corneille ou Racine Para comear as pessoas sentiriam muito mais prazer nele do que neles Lessing escreve estas palavras em suas Carlas sobre a ileralura rnais recente Parte I carta 17 e pede e escreve dramas burgueses apropria dos a recemdespertada autoconsciencia da classe burguesa porque acredita que os membros da corte nao possuem 0 direito exclusivo de serem gran des Esta odiosa distinao que os homens traaram entre si diz a na tureza desconhece Ela distribui as qualidades do coraao sem qualquer pre ferencia pelos nobres e pelos ricos12 Todo 0 movimento literario da segunda metade do seculo XVIII e produto de uma classe social e conseqiientemente de ideais esteticos que se opoe as inclinaoes sociais e esteticas de Frederico Par isso mesmo nada tern a Ihe dizer e ele par seu lado ignora as foras vitais jaativas a sua volta e condena 0 que nao pode ignorar tal cOmo 0 GOlz Este movi mento literario alemao cujos expoentes incluem Klopstock Herder Les sing os poetas do Slurm und Drang os poetas de sensibilidade e 0 cir culo conhecido C0010 Gallinger Hain 0 jovem Goethe 0 jovem Schiller e tantos outros certamente DaD e urn movimento politico Com raras exce oes nao encontramos na Alemanha antes de 1789 ideia alguma de aao politica concreta nada que lembre a formaao de partido polftico ou pro grama partidario Mas de fato encontramos sobretudo no mundo oficial prussiano propostas e tambem 0 inicio pratico de reformas em termos de 36 u processo civrlizador absolutismo esclarecido Em fil6sofos como Kant deparamos com 0 desen volvimento de principios basicos gerais que em parte se opoem diretamen te as condioes vigentes Nos trabalhos da jovem geraao do Gallinger Rain surgem manifestaoes de violento 6dio a principes cortes aristocra tas afrancesadores a imoralidade das cortes e a frigidez intelectual E por toda a parte entre os jovens da classe media identificamos sonhos vagos de urna nova Alemanha unida de urna vida natural natural em contraste coin a vida antinatural da sociedade de corte e freqUente mente um irresistivel deleite com sua pr6pria exuberancia de sentimentos Pensamentos sentimentos mas nada que pudesse em qualquer sentido culminar em aao politica concreta A estrutura desta sociedade absolutista de pequenos Estados nao proporcionava uma abertura a ela Ele mentos burgueses adquiriram autoconfiana mas 0 arcabouo dos Estados absolutistas permaneceu inabalado Os elementos burgueses foram excluidos de toda e qualquer atividade Na melhor das hip6teses podiam pensar e escrever independentemente mas nao agir da mesma forma Nessa situaao a literatura tornase 0 escoadouro mais importante Nela a nova autoconfiana e 0 vago descontentamento com a ordem vi gente expressamse de forma mais ou menos encoberta Nela que 0 apa relbo dos Estados absolutos havia liberado ate certo ponto a geraao jo vem da classe media contrapunha seus novos sonhos e ideias contrarias e com eles a lingua alema aos ideais cortesaos Conforme dito acima 0 movimento Iitenirlo da segunda metade do seculo XVIII nao tem carater politico embora no sentido 0 mais amplo possivel constitua manifestaao de um movimento social uma transforma ao da sociedade Para sermos exatos a burguesia COmo um todo nele ain da nao encontrava expressao Ele comeou sendo a efusao de uma especie de vanguarda burguesa 0 que descrevemos aqui como intelligentsia de classe media numerosos individuos na mesma situaao e de origens sociais semelbantes espalbados por todo 0 pais pessoas que se compreendiam por que estavam na mesma situaao 56 raramente membros dessa vanguarda Se reuniam em algum lugar como grupo durante urn periodo maior ou me nor de tempo Quase sempre viviam isolados ou s6s formando uma elite em relaao ao povo mas pessoas de segunda classe aos olbos da aristocracia cortesa Repetidamente encontramos nessas obras a ligaao entre tal posiao social e os ideais nelas postuados 0 amor a natureza e a liberdade a exa taao solitiiria a rendiao as emooes do coraao sem 0 freio da razao fria No Werther enjo sucesso demonstra como esses sentimentos cram tipicos de uma dada geraao isto e dito de maneira bern clara e inequivoca Em data de 24 de dezembro de 1771 lemos 0 sofrimento resplen decente 0 tedio reinante entre as pessoas detestaveis aqui reunidas a com r conceito8 de civiliziio e cullura 37 petilio entre elas por posiliO a maneira como constantemente procuram meios de urn pasar na frente do outro E em 8 de janeiro de 1772 Que tipos de pessoas slio estas cuja alma inteira se radica no cerimonial e cujos pensamentos e desejos 0 ano inteiro centralizamse em como podem aproximar uma cadeira da mesa E em 15 de maro de 1772 Rilho os dentes Ap6s 0 jantar na casa do conde andamos de urn lado para 0 outro no grande parque Apro ximase a hora social Penso sabe Deus sobre nada Ele permanece ali os nobres chegam As mulheres murmuram entre si alguma coisa circula entre os homens Finalmente 0 conde urn tanto embaraado pedelhe que se re tire A nobreza sentese insultada ao ver um burgues entre seus membros Sabe diz 0 conde acho que os convivas estiio aborrecidos em veIo aqui Afasteime discretamente da Hustre campaohia e me dirigi a M a fim de observar 0 pOrdosol do alto da colina enquanto lia no meu Homero 0 canto que celebra como Ulisses foi hospitaleiramente rece bido pelos excelentes guardadores de porcos Por um lado superficiaJidade cerimonia conversas formais por ou tro vida interior profundidade de sentimento absorclio em livros desen volvimento da personalidade individual Temos 0 mesmo contraste referido por Kant na antitese entre Kultur e civilizariio apIicado aqui a uma situa lio social muito especifica No Werther Goethe mostra tambem com particular clareza as duas frentes entre as quais vive a burguesia 0 que mais me irrita lemos na anotalio de 24 de dezembro de 1771 e nossa odiosa situalio burguesa Para ser franco sei tlio bern como qualquer outra pessoa como slio neces sarias as diferenas de classe quantas vantagens eu mesmo lhes devo Ape nas DaD deviam se levantar diretamente como obstaculos no meu caminho eoisa alguma caracteriza melhor a consciencia de classe media do que essa declaralio As portas debaixo devem permanecer fechadas As que ficam adma tem que estar abertas E como todas as classes medias esta estava aprisionada de uma maneira que Ihe era peculiar nao podia pensar em derrubar as paredes que bloqueavam a ascensao por medo de que as que a separavam dos estratos mais baixos pudessem ceder ao ataque Todo 0 movimento foi de ascensao para a nobreza 0 bisavo de Goethe fora ferreiroIs seu avo alfaiate e em seguida estalajadeiro com uma clien tela cortesa e maneiras cortesasburguesas 18 abastado seu pai tornouse conselheiro imperial burgues rico de meios independentes possuidor de ti tulo Sua mlie era filha de uma famflia patricia de Frankfurt o pai de Schiller era cirurgiao e mais tarde major mal remunerado mas seu ava bisavo e tataravo haviam sido padeiros De origens sociais se melhantes ora mais pr6ximas ora mais remotas dos oficios e da adminis tralio de nivel medio vieram Schubart BUrger Winkelmann Herder Kant Friedrich August Wolff Fichte e mnitos outrps membros do movimento 1 IlIIOTPClA 38 o processo civilhador 14 Na Frana ocorria um movimento analogo Ali tambem em conexao com mudana social semelhante grande numero de hOmens nota veis emergiram de drculos da classe media entre eles Voltaire e Diderot Na Frana porem esses talentos eram recebidos e asimilados sem maiores dificuldades pela grande sociedade de corte de Paris Ja na Alemanha aos filhos da nascente classe media que se distinguiam pclo talento e inteligell cia era negado acesso na sua grande maioria a vida cortesaaristocratica i Uns poucos como Goethe conquistaram certa preeminencia nesses circu los Mas aparte 0 fato de a corte de Weimar ser pequena e relativamente pobre Goethe foi uma exceao De modo geral permaneceram muito altas segundo os padroes ocidentais as paredes entre a irttelligentsia de classe media e a classe superior aristocratica na Alemanha Em 1740 0 frances Mauvillon anota que observamos nos gentilhomens a1emaes wn ar alta neiro que chega ao ponto da arrogancia Emproados de uma Iinhagem cuja extensao estao sempre prontos a provar desprezam todos aqueles que nao sao analogamente bern dotados Raramente continua contraem me salliances Mas nao menos raramente sao vistos comportandose de forma simples e afavel com membros da ciasse media E se desdenham conubio com eles ainda menos lhes procuram a companhia quaisquer que sejam seus meritos14 Nesta divisao social muito nitida entre nobreza e classe media confir mada por incontaveis documentos um fator decisivo era sem duvida a in digencia relativa de ambas Isto levava os nobres a se isolarem utilizando a prova de ancestralidade como 0 instrumento mais importante para Ihes preservar a existencia social privilegiada Por outro lado bloqueava a clas se media alema a principal rota pela qual ascendiam os elementos burgue ses de paises ocidentais casavam e eram recebidos pela aristocracia atra YeS do dinheiro Mas quaisquer que tenham sido as causas sem duvida altamente complexas dessa separaao muito nitida 0 resultante baixo grau de fu sao entre os modelos aristocraticos de corte e os valores baseados no me rito intrfnseco por um lado e os modelos e valores burgueses fundamenta dos nas realizaoes por outro influenciou durante longo tempo 0 carater nacional alemao a medida que este foi emergindo desiie entao Esta divisao explica por que uma corrente lingiiistica principal a linguagem dos alemaes educados e quase toda a tradiao intelectual recente enfeixada na literatura receberam seus impulsos decisivos e aprovaao de um estrato intelectual de classe media que era muito mais pura e especificamente classe media que a correspondente intelligentsia francesa emesmo mais que a inglesa esta ultima parecendo ocupar uma posiao intermediaria entre as da Frana e Alemanha A postura de autoisolamento 0 destaque ao especffico eao distintivo que antes vimos na comparaao entre 0 conceito alemao de Kultur e 0 oci r fi concellos de civilizacQo e cultura 39 dental de civilizaao aqui reaparecem como caracteristicos do desenvol vimento hist6rico alemao Mas nao foi s6 externamente que a Frana se expandiu e colonizou outras terras mais cedo em comparaao com a Alemanha Internamente tambem movimentos amllogos sao muitas vezes identificados em sua hist6 ria mais recente De particular importiincia neste sentido foi a difusao de maneiras aristocraticas de corte a tendencia da aristocracia de corte a as similar e por assim dizer colonizar elementos de outras classes 0 orgulho social da aristocracia francesa e sempre muito grande e a enfase em dife renas de classes nunca perde importiincia para ela As paredes que a cer cam porem tern mais aberturas e 0 acesso a aristocracia e assim a assi milaao de outros grupos desempenha aqui urn papel muito maior do que na Alemanha A expansao mais vigorosa do imperio alemao ocorre em contraste na Idade Media A partir dessa epoca 0 Reich alemao diminuiu lenta mas inin terruptamente Mesmo antes da Guerra dos Trinta Anos e muito mais ap6s os territ6rios alemaes sao confinados de todos os lados e forte pressao e aplicada em quase todas suas fronteiras externas Por isso mesmo as lutas dentro da Alemanha entre os varios grupos sociais que competiam por oportunidades limitadas e pela sobrevivencia e por conseguinte as tenden cias para distinoes e exclusoes mutuas em geral foram mais intensas do que nos pafses ocidentais em expansiio Tanto quanto a fragmentaao do territ6rio alemao em grande numero de Estados soberanos foi este isola mento extreme de grandes segmentos da nobreza face a classe media alema que dificultou a formaao de uma sociedade unificada central que esta belecesse urn modelo 0 que em outros paises adquiriu importiincia decisi va pelo menos como fase no caminho da nacionalidade pondo sua marca em certas fases na lingua nas artes nas maneiras e oa estrutura das emo Oes v Exemplos Literarios da Relaiio entre a Intelligentsia de Classe Media Alemii e a Corte 15 Os livros de classe media que obtiveram grande sucesso de pu blico ap6s meados do seculo XVIII isto e no periodo em que essa classe se expandia em prosperidade e autoconfiana mostram com muita clareza a que profundidade eram sentidas essas diferenas Demonstram tambem que as diferenas entre a estrutura e a vida da classe media por 40 o processo civifizador urn lado e a classe superior cortesa por outro eram acompanhadas por diferenas na estrutura do comporlamento vida emocional aspiraoes e moralidade E indicam por fora unilateralmente como elas eram vistas no campo da classe media Temos urn exemplo disto no conhecido romance de Sophie de la Ro che Das Friiulein von Sternheim que toroou a autora uma das mulheres mais famosas de seu tempo Todo 0 meu ideal de jovem mulher escreveu Caroline Flachsland a Herder depois de ler Sternheim suave delicada caridosa orguIhosa virtuosa e enganada Passei preciosas e maravilhosas horas lendo 0 livro Ai de mim como ainda estou longe de meu ideal de mim mesma16 o curioso paradoxo existente no fato de que Caroline Flachsland como tantas outras mulheres de formaao semeIhante ama seu pr6prio so frimento que incluia ser enganada juntamente com caridade orgulho e virtude entre as qualidades da herofna ideal com que deseja se parecer e altamente caracteristico do estado emocional da intelligentsia de classe media e em especial das muIheres entre ela nessa era de sensibilidade A herofna de classe media e enganada porum cortesao aristocratico A adver teocia 0 mooo de urn sedutor socialmente superior que nao pode ca sarse com a moa por causa da distancia social 0 desejo de receber sua atenao 0 fascinio da ideia de penetrar no circulo fechado e perigoso e finalmente a empatia identificadora com a moa enganada tudo isto cons titui exemplo da ambivalencia especifica que obcecava a vida emocional dos membros da classe media e nao apenas de mulheres no toeante 11 aristocracia Das Friiulein von Sternheim e neste aspecto a contrapartida feminina de Werther Ambas as obras tratam de emaranhamentos especffi cos de classes que se traduzem em sentimentalismo sensibilidade e nuan jas correlatas de emoao o problema de que trata 0 romance Uma moa do campo de altos principies originara de uma classe de proprietarios de terra chega 11 corte o principe aparentado com ela pelo lade da mae a deseja como amante Nao vendo outra lescapat6ria ela busca protao junto ao vilao do ro mance urn lorde ingles que vive na corte e que fala exatamente como numerosos circules de classe media teriam imaginado que fala urn sedu tor aristocratico e que produz urn efeitocOmico porque em seus pensa mentos ele se censura usando expressoes de classe media Mas graas a ele tambem a herofna conserva sua virtude sua superioridade moral compen saoes por sua inferioridade de classe e morre E e assim que fala a herofna Fraulein von Sternheim filha de urn co ronel agraciado com urn tillllo 17 Ver como 0 tom 0 estado de esplrito que est6 Da mods Da corte reprlme os anseios mais nobres de urn coracao admiravel por natureza ver como evitar as zombarias de senhoras e cavalheiros elegantes significa rir e concordar COm conceitos de civilizQriio e cultura eles eucheme de desprezo e piedade A sede de dislraeoes de novos alavios de admiraeao por urn trajo uma peea de mobiliario urn novo prato absurdo oh minha Emilia como se agita e adoece minha alma Nao vou falar da falsa ambieao que trama tantas intrigas vis rasteja diante do pecado ocultado pela prosperidade considera com desprezo a virtude e 0 merito e indiferente fal com que outros se sintam infelizes tou convencida tia diz ela apas alguns dias no palacio de que a vida da corte nlio se coaduna com meu carater Meus gostos minhas in clinaoes divergem dela de todas as maneiras E confesso a minha bondosa tia que iria embora mais feliz do que aqui cheguei Querida Sophie responde a tia voce e rtalmente uma ma ex traordinariamente encantadora mas 0 velho vigario he encheu a cabea de icteias pedantes Esquaas urn pouco Em outro trecho Sophie escreve Meu amor pela Alemanha acaba deme envolver em uma conversa na qual tentei defender os meritos da mliepatria Falei com tanto entusiasmo que minha tia me disse depois que en tinha feito uma bela demonstralio de ser neta de urn professor Esta repreenslio me deixou mortificada Foram insultadas as cinzas de meu pai e avo o clerigo e 0 professor estes slio realmente os dois representantes mais importantes da intelligentsia administrativa de classe media duas fi guras sociais que desempenharampapel decisivo na forma9lio e difuslio de uma nova lingua alemli culta Este exemplo mostra com muita clareza como 0 vago sentimento nacional desses circulos com suas inclina90es es pirituais naopoliticas parece burgues a aristocracia das pequenas cortes Ao mesmo tempo clerigo e professor chamam aten9lio para 0 centro so cial mais importante na modela9lio e dissemina9lio da cultura de classe me dia alemli a universidade Dela gera9lio apas gera9lio de estudantes disse minaram pelo pais como mestres clerigos e administradores de nivel me dio urn complexo de ideias e ideais marcados de uma maneira particular A universidade alemli foi nesse sentido 0 contrapeso da classe media II corte Desta maneira e nas palavras com que 0 pastor poderia fulminaIo do pulpito que 0 villio da corte se expressa na imagina9lio da classe media voce sabe que nunca concedi ao amor qualquer Qutro poder sobre meus sentidos cujos mais delicados e vivos preres propicia Todas as classes de beleza se entregaram a mim Delas fiquei saciado Os moralistas podem dizer 0 que quiserem sobre as fioas redes e armadilhas com as quais capturei a virtude e 0 orguIho a sabelloria e a frigidez 0 coquetismo e mesmo a religiosidade de todo 0 Mundo feminino 0 amour satisfez minha vaidade Trouxe do mais atrasado lugar do campo uma fiIha de coronel cujo corpo mente e canUer sao tao encantadores que 42 o processo civilizador T Vinle e cinco anos depois antfleses ideias e problemas correlalos se mellianles ainda podem merecer urn sucesso de livraria Em 1796 0 Agnes von Lilieno de Caroline von Volzogen aparecc nas Horen de Schiller Nesle romance a mae da alta arislocracia que por raz6es rnisleriosas lem que maodar educar a filha fora do circulo da corle diz Siotame quase grata pela prudencia que me obriga a mantela longe do cireuto no qual me tornei infeliz Uma formacao seria e s6lida da mente 6 rara oa alta sociedade Voce poderia terse transformado em uma pequena baneea que danea de urn Jado para 0 Dutro ao sabor da opiniao E a herofna diz de si mesma 2 Eu pOlleD sabia da vida conveQcional e da linguagem de pessoas mundanas Meus princlpios simples achavam paradoxais muitas coisas que uma mente lamada mais maldvel peo habito acelta sem esforco Para mim era tiD natural como a Daite seguindose aD dia lamentar a jovem enganada e odiar 0 enganador preferir a virtude A honra e a honra A vantagem propria Na opiniao dessa sociedade eu via todas essas ideias de cabeca para baixo Ela descreve em seguida 0 principe urn produto da civiIizaao fran cesafI2 o prCncipe que tinha entre 60 e 70 anos de idade opnml8 a si mesmo e aos demais com a rlgida e antiga etiqueta que os filhos dos principes alemlies haviam aprendido na corte do rei frances e transplantado para seu pr6prio solo embora reconhecidamente em dimensoes a1go reduzidas 0 principe aprendera pela idade e h4bito a moverse quase com naturalidade sob esta pesada arma dura de cerim6nia Com relacao as mUlheres observava a cortesia elegante exagerada da era preterita da cavalaria andante de modo que sua pessoa nao thes era desagrad4vel mas ele nao podia deixar nem por urn instante a esrera das boas maneiras sem se tornar insuportavel SellS filhos viam no pai apenas o despot As maneiras caricaturais entre os membros da corte ora me pareciam ri dlculas ora lamentaveis A reverencia com que podiam ao aparecimento de seu senhor convocar imediatamente do coracao para as maos e pes 0 oIhar gra doso ou raivoso que Ihes trespassava 0 corpa como um choque etricoJ a concordAncia imediata de suas opini6es com as palavras mais recentes C4foas dos lAbios principescos tudo isto achei incompreensivel Pareceume qu estava assistindo a urn teatro de marionetes Cortesia submissao boas maneiras por urn lado e educaao s6lida e prefereneia pela virtude anles da hoora por oulro a Iileralura alema na segunda melade do seculo XVIII abunda dessas anlileses Em data reeen Ie como 23 de oUlubro de 1828 Eckermann diz a Goelhe Uma educaao lao eomplela como 0 GraoDuque Iarece ler recebido e sem duvida rara en Revista literaria Horas RJR conceito de civiliao e culturo 43 tre personagens principescos Muito rara responde Goethe Ha muitos para ser exato que podem conversar inteligentemente sobre qualquer as sunto mas nao possuem conhecimentos profundos e apenas arranham a su perficie E isto nao e de espantar se pensamos nas espantosas distra6es e truncamentos que a vida da corte acarreta Em uma ocasiao utiliza com grande c1areza 0 conceito de Kultur nes te contexto As pessoas com quem convivi diz nao tinham ideia do que seja erudiao Eram cortesaos alemaes e esta classe nao possui nenhu ma Kultur E Knigge observa eerta vez explieitamente Onde mais do que aqui na Alemanha os eortesaos formam uma espeeie separada 16 Em todas essas cites ha uma situaao social bern definida E a mesma que se observa por tras do contraste que Kant estabeleee entre Kultur e civilizaao Mas mesmo independentemente desses coneeitos essa fase e as experiencias dela derivadas gravaramse com profundidade na tra diao alema 0 que se manifesta nesse conceito de Kultur na antllese entre profundeza e superficialidade e em muitos conceitos eorrelatos e aclma de tudo a autoimagem do estrato inteleetual de classe media Esta e uma ca mada relativamente delgada que se estende por toda a area e por conse guinte e individualizada em alto grau e em uma forma particular Nao constitui como aeontece com a corte um cfreulo fechado urna socieda de Comp6ese predominantemente de administradores de servidores civis no sentido mais amplo da palavra isto e de pessoas que direta ou indi retamente obtem sua renda da corte mas que com poucas exces nao pertencem 11 boa sociedade cortesa 11 classe alta aristocratica E uma classe de intelectuais com ampla formagao de classe media A burguesia co mercial que poderia ter servido como publico para os escritores e relati vamente subdesenvolvida na maioria dos Estados alemaes no seculo XVIII A ascensao para a prosperidade apenas ensaia os prlmeiros passos nesse pc dodo Ate certo ponto por conseguinte os escritores e intelectuais alemiles como que flutuam no ar Mente e Iivros sao seu refugio e dominio e as realizagoes na erudiaoe na arte seu motive de orguho Dificilmente exis Ie para esta c1asse oportunidade de aao politica de metas politicas Para ela 0 comercio e a ordem economica em conformidade com a etrutura da vida que levam e da ociedade onde se integram sao interesses marginais o comercio as comunicaoes e as industrias saO relativamente subdesenvol vidos e ainda necessitam na maior parte de proteao e promogao mediante uma politica mercantilista e nao de libertagao de suas restrioes 0 que legitima a seus pr6prios olhos a intelligentsia de c1asse media do seculo XVIII 0 que fomece os alicerces 11 sua autoimagem e orguho situase alem da economia e da politica Reside no que exatamente por esta razao e chamado de das rein Geistige 0 puramente espiritual em Iivros traba ho de erudigao religiao arte filosofia no enriquecimento interno na for magao intelectual Bildung do indivlduo principalmente atraves de livros o processo civilizodor na personalidade Em consequencia os lemas que expressam essa autoima gem da classe intelectual Iema termos tais como Bildung e Kultur ten dem a tracar uma nltida distincao entre realizacaes nas areas que cabamos de mencionar esta esfera puramente espiritual concebida como a unica de valor autentico e a esfer polltica econllmica e social em contrste fron tal Como os lemas da burguesia ascendente na Franca e Inglaterra 0 des tino peculiar da burguesia alema sua longa impotencia politico e a tar dia unificaCao nacional atuaram continuamente na mesma direcao refor cando conceitos e ideais desse tipo Desta maneira 0 desenvolvimento do conceito de K ultur e os ideais que 0 mesmo corporificava refletiram a po siCao da intelligentsia Iema destitulda de uma hinterlandia social impor tante e que sendo a primeira formaCao 1urguesa no pals desenvolveu Uma autoimagem manifestamente burguesa ideias especificamente de c1asse me dia e urn arsenal de conceitos incisivos dirigidos contra a c1asse alta cortesa Ainda de acordo com a situacao em que vivia delineavase 0 que esta intelligentsia considerava como mais merecedor de oposiCao na classe supe rior como sendo a antltese da Bildung e da Kultur Mas 0 ataque so e diri gido rara hesitante e em geral resignadamente contra os privilegios politicos ou sociais da aristocracia Em vez disso voltase predominanternente contra seu comportarnento humano Uma descriCao muito esclarecedora da diferenca eutre esta classe inte lectual alema e sua contrapartida francesa e tambem encontrada nas con versas de Goethe com Eckermann Ampere chega a Weimar Goethe nao o conhecia pessoalmente mas com freqiiencia 0 elogiara para Eckermann Para espanto de todo mundo descobrese que 0 festejado Monsieur Ampere e urn alegre jovem na casa dos 20 anos Eckermann manifesta surpresa e Goethe responde quintafeira 23 de maio de 1827 Nao tern sido fAcit para voce em sua terra nativa e n6s no centro da Ale mtlnha tivemos que pagar muito caro pela pouca sabedoria que possuimos Isto porque no fundo levamos uma vida isotada pauprrima Pouquissima cuItura nos chega do pr6prio pavo e todos nossos homens de talento estao dispersos peto pais Umesta em Viena outro em Berlim urn terceiro em Konigsberg a quarto emBonn ou Dusseldorf todos separados entre si por 50 ou 100 milhas de modo que e uma raridade 0 cantata pessoal au uma troea pessoal de id6ias Sinto 0 que isto significa quando homens como Alexander von Humboldt pas sam por aqui e fazem com que meus estudos progridam mais num unico dia do que 5e eu tivesse viajado urn ano inteiro em meu caminho solitario Mas agora imagine uma cidade como Paris onde as mentes mais notaveis ae todo 0 reino esHio reunidas num mica lugar e em seu intercambio com peticao e rivalidade diarias eles se ensinam e se estimulam a prosseguir onde o melhor de tdas as esferas da natureza e da arte de toda a superHcie da terra pode ser visto em todas as ocasi6es Imagine essa metr6pole onde cada penta que se transp6e e cada praca que se cruza evecam urn grande passado E em tudo isto noao pense na Paris de uma epoca mon6tona e embotada mas na Paris do seeulo XIX onde durante tres geraoes graeRS a homens como conceios de civilitacdoH e cuiuTaH 45 Molire Voltaire e Diderot essa riqueza de idias foi posta em circulao como em nenhuma outra parte de todo 0 globo e compreender4 que Urna boa mente como a de Amre tendo se desenvolvido em meio a tal abundlncia pode muito bern chegar a Set alguma coisa no seu 24 ano de vida Mais adiante diz Goethe com refereneia a Merimee Na Alemanha nao podemos ter esperana de produzir obra tao madura em idade tao jovem Isto nao e culpa do individuo mas do estado cultural da naao e da grande dificuldade que todos experimentamos em sozinhos abrir ca minho A vista de tais palavras que neste contexto introdut6rio tern que ser vir como documentaao tomase muito claro como a fragmentaao poli tiea da Alemanha se Iigou a uma estrutura bem especffica tanto da classe intelectual quanta de seu comportamento social e maneira de pensar Na Frana as membros da intelligentsia estao reunidos em urn unico lugar sao mantidos juntos em uma boa soeiedade mais ou menos unificado e central na Alemanha com suas numerosas e relativamente pequenas ca pitais nao h3 essa boa sociedade central e unificada Neste caso a intel ligentsia eslli dispersa par todo 0 pais Na Frana a conversa e urn dos mais importantes meios de comunicaao e alem disso hii seculos e uma arte na Alemanha 0 meio de comunicaao mais importante e 0 livro e e uma lingua escrita unificada e nao uma falada que essa classe inte Jcctual desenvolve Na Frana ate os jovens vivem em urn ambiente de rica e estimulante inteJeetualidade mas 0 jovem membro da classe media alema tern que subir a muito custo em relativa solidao e isoJamento as mecanismos de progresso social sao diferentes nos dois paises E final mente as paIavras de Goethe mostram com grande clareza 0 que real mente significa uma intelligentsia de classe media sem uma hinterlandia soeial Anteriormente citamos urn trecho em que ele atribui pouca cultura a cortesaos Nesta ultima ele diz 0 mesmo a respeito do povo comum Kultur e Bidung sao os lemas e caracteristicas de urn delgado estrato in termedhirio que nasceu do povo Nao s6 a pequena classe cortesa acima dela mas ate meSmo 0 estrato mais amplo em baixo ainda demonstram rclativamente pouca compreensao pelas realiza6es de sua pr6pria elite Nao obstante exatamente este subdesenvolvimento de uma classe bur guesa mais ampla profissional e uma das razOes por que a luta da van guarda da dasse media a intelligentsia burguesa contra a classe cortesa superior e dirigida predommantemente contra a conduta da mesma contra caracterfsticas humanas gerais como superficialidade polidez de fachada insinceridade e assim par diante Ate mesma as poucas cita5es aqui transcritas mostram com extrema clareza essas conex5es Reconhecidamen te s6 em raros casas e sem grande enfase a ataque se volta contra conceitos J 46 o prOCeS80 civilizador especificos contrarios aqueles que serviram para a autolegitimaao da clas se intelectual alema conceitos tais como Bidung e Kultur Urn dos poucos conceitos contrarios especificos e civilizaao no sentido kantiano VI o Recuo do Elemento Social e 0 Progresso do Social na Antitese entre Kultur e Zivilisation 17 Se a antitese e expressa por estes ou por outros conceitos uma coisa fica sempre clara 0 contraste de caracteristicas humanas particula res que mais tarde servem principalmente para patentear uma antitese na cional surge aqui principalmente como manifestaao de urna antltese social Como experiencia subjacente a formulaao de pares de opostos tais como profundeza e supedicialidade uhonestidade e falsidade polidez de fachada e autentica virtude e dos quais entre outras coisas brata a antltese entre Zivilisation e Kulur descobrimos em uma fase particular do desenvolvimento alemao a tensao entre a intelligentsia de c1asse media e a aristocracia cortesa tl verdade que nunca se esquece por completo a liga ao entre 0 refinamento cortesao e a vida francesa G C H Lichtenberg trata disso com grande c1areza em urn de seus aforismos ao falar da dife rena entre a promesse francesa e a Versprechung alema Parte 3 1775 177924 A ultima e cumprida diz mas nao a primeira A utilidade das palavras francesas no alemao 0 que me surpreende e que isto nao teoba sido notado A palavra francesa dli a ideia alema com uma mistura de fraude ou no seu significado cortesao Uma invenao Erfindung e algo novo e uma decouverte algo velho com urn novo nome Colombo descobriu entdeckte a America e ela foi a decouverte de Americo Vespucio Na verdade gout e gosto Geschmack sao quase antiteticas e pessoas de gout raramente tern muito born gosto Mas s6 depois da Revoluao Francesa e que a ideia da aristocracia cortesii alemii indubitavelmente reeua e a ideia da Frana e das potencias ocidentais em geral passa ao primeiro plano no conceito de civilizaiio e ideias semelhantes Vejamos urn exemplo tipico em 1797 foi publicado urn pequeno livro de autoria do emigre frances Menuret intitulado Essai sur la ville dHam bourg Urn cidadiio de Hamburgo 0 conego Meyer escreve 0 segointe co menHirio sobre a obra HamburliIo 45 ainda atrasada Ap6s urna 6poca famosa bern famosa e quando grandes numeros de imigrantes se estabeleccram aqui cIa fez progressos real r conceilOs de civiliCliio e CUltUTO H 47 mente mas para aumentar alo digo completar sua felicidade ista teria que se pedir a Deus mas sua civi1izao seu avan na carreira da ciencia e da arte nas quais como sabem continuamos ainda no Norte ela ainda precisa de certo mirnero de anos ou de eventos que atraiam para 5i novas multid6es de estrangeiros contanto que nAo scjam mais multid6es de seus civiIizados com patriotas e urn sumenta da oputancia Aqui por conseguinte os conceitos de civilizado e civilizao ja eslao inequivocamente ligados a imagem do frances Com a lenta ascensao da burguesia alema de classe de segunda cate goria para depositaria da consciencia nacional e finalmente muito tarde e com reservas para classe governante de uma classe que no inicio foi obrigada a se ver ou legitimar principalmente se contrastando com a classe superior aristocratica de corte e em seguida definindose contra naoes concorrentes a antitese entre Julture Zivilisation com todos seus significados correlatos muda em significaao e funao de antiese prima riamente social tornase primariamente nacional E urn desenvolvimento paralelo e experimentado por aquilo que e jul gado especificamente alemao aqui igualmente numerosas caracteristicas sociais originariamente de classe media estampadas nas pessoas por sua siluaao social transformamse em caracteristicas nacionais A honestidade e a sinceridade por exemplo sao neste momento contrastadas como carac teristicas alemas a cortesia dissimuladora A sinceridade porem da forma aqui usada emergia inicialmente como trao caracteristico de pessoa da classe media em contraste com 0 mundano ou 0 cortesao Isto igualmente e visto com clareza em uma conversa entre Eckermann e Goethe Eu em geral leva para a sociedade diz Eckermann no dia 2 de maio de 1824 minhas simpatias e antipatias e uma certa necessidade de amar e ser amado Procuro uma personalidade que se conforme a minha natu reza A essa pessoa eu gostaria de me entregar inteiramente e nada ter a ver com as demais Essa sua tendencia natural responde Goethe na verdade oao e do tipo sociavel Ainda assim 0 que seria de toda nOSsa educaao se nao es tivessemos dispostos a superar nossas tendencias naturais uma grande tolice exigir que outras pessoas se harmonizem conosco Eu nunca fiz isso Consegui por esta raziio desenvolver a capacidade de conversar com todas as pessoas s6 assim obtemos conhecimento do carater humano bern como a necessaria habilidade na vida Isto porque perante naturezas opostas temos que nos controlar se queremos noS dar bern com elas Voce deveria agir da meSma maneira Nao hli como evitar isso voce tern que viver em sociedade nao importa 0 que diga Sao ainda em sua maior parte desconhecidas a sociogenese e a psico genese do comportamento humano Ate mesmo colocar quest6es a esse res peito pode parecer estranho Ainda assim e fate observavel que pessoas de 48 o processo civili1ador unidades sociais diferentes comportamse de forma diferente e em maneiras muito especificas Acostumamonos a considerar isto natural Falamos do campons ou do cortesao do ingles ou do alemao do homem medieval e do homem do seculo XX e queremos dizer que as pessoas das unidade sociais indicadas por tais conceitos comportamse uniformemente de uma maneira especifica que transcende todas as diferen9as individuais quando comparadas com as de individuos de grupos comparativos por exemplo o campones em muitos aspectos comportase de modo diferente do corte sao 0 ingles ou 0 frances do alemao e 0 homem medieval do homem do seculo XX pouco importando 0 qianto mais possam ter em comum como seres humanos Modos de comportamento que diferem dessa maneira sao visiveis na conversa citada acima entre Eckermann e Goethe Este ultimo e um homem indiViualizado em grau particularmente elevado Em decorrencia de seu deslino social modos de comportamento com origens sociais diferentes fundemse nele em uma unidade especifica Ele suas opinioes e seu com portamento certamente nao sao nunca de todo tipicos de quaisquer grupos sociais e situa90es pelas quais passou Mas nessa cita9ao ele fala com gran de conhecimento como homem do mundo como cortesao com base em experiencias que necessariamente sao estranhas a Eckermann Ele entende a compulsao de abafar os pr6prios senlimentos de suprimir simpatias e antipatias compulsao inerente 11 Vida cortesa e que freqiientemente e in terpretada por pessoas de situa90es sociais diferentes e por conseguinte com uma diferente estrutura afetiva como sendo desonestidade ou insin ceridade E com 0 grau de consciencia que 0 distingue como um relativo estranho a todos os grupos sociais ele enfaliza 0 aspecto benefico huma no de sua modera9ao em afetos individuais Seu comentario e um dos poucos pronunciamentos alemaes dessa epoca a reconhecer algo do valor social da cortesia e dizer alguma coisa positiva sobre a habilidade social Na Fran9a e na Inglaterra onde a sociedade desempenhou papel muito mas importante no desenvolVimento global da na9ao as tendencias de com portamento de que ele fala tiveram tambem embora menos consciente mente do que no seu caso uma importancia muito maior E ideias de tipo semelhante incluindo a de que pessoas devem se harmonizar entre si e demonstrar considera9ao reciproca que 0 individuo nem sempre deve dar vazao as suas emooes reaparecem com grande freqUencia com 0 mesmo significado especificamente social que em Goethe na literatura cor tesa da Fran9a por exemplo Como um reflexo por assim dizer esses pen samentos eram propriedade individual de Goethe Mas situa90es sociais semelhantes a vida no monde geraram em toda a Europa preceitos e modos de comportamento semelhantes Analogamente 0 comportamento deserito par Eckermann como seu em compara9ao com a serenidade aparente e a afabilidade que ocultam r conceitos de civilizQfiio e cultura 49 sentimentos reprimidos que se desenvolveu inicialmente nessa fase do mun do aristocnitico de corte c1aramente pode ser reconhecido como ongl nandose na esfera de c1asse media de pequenas cidades da epoca E cer tamente naD e encontrado apenas na Alemanha nesta esfera Nesse pais porem devido a representaao com grande c1areza do ponto de vista de c1asse media pela intelligentsia estas e atitudes semelhaptes tomamse vi siveis em grau excepcional na literatura E se repetem nesta forma relati vamente pura produzida na divisao mais nitida e mais rigorosa entre as circulos da corte e da c1asse media e acima de tudo no comportamento social dos alemaes As unidades sociais que chamamos na6es diferem muito na estrutura da personalidade de seus memhros nos esquemas atraves dos quais a vida emocional do individuo e moldada sob pressao da tradiao institucionali zada e da situaao vigente 0 tipico no comportamento descrito par Ecker man e uma forma especifica de economia de afetos que consiste na clara admissao de inclina6es individuais que Goethe considera insociliveis e contrarias a fonnaao de afetos necessaria para que haja sociedade Na opiniao de Nietzsche muitas decadas mais tarde esta atitude sem pre foi tipica e nacional dos alemaes Por certo sofreu modifica6es no curso da hist6ria e nao tern mais a mesma finalidade social que no tempo de Eckermann Nietzsche a ridiculariza 0 alemao diz em AIem do Bem e do Mal Morismo 244 adora a sinceridade e a integridade Como e confortador ser sincero e integro Este e talvez 0 mais perigoso e enga nador de todos os disfarces no qual 0 alemao e perito esta honestidade alema confidencial obsequiosa que sempre mostra suas cartas 0 alemao se entrega olhando ao mesmo tempo com seus confiantes e azuis olhos alemaes e as estrangeiros imediatamente 0 confundem com sen camisao de dormir Este deixando de lade 0 juizo de valor unilateral e urn dos muitos exemplos de como com a lenta ascensao da c1asse media suas caracteristicas sociais espedficas se transformaram em caracteristicas na donais o mesmo e claro na opiniao seguinte de Fontane sobre a Inglaterra encontrada em Ein Sommer in London Dessau 1852 A Inglaterra e a Alemanha se re1acionam da mesma maneira Que forma e con teudo aparencia e realidade Ao contrario das coisas que em nenhurn outro palS do rnundo exibem a rnesma soIidez que na Inglaterra as pessoas se dis tinguem pela forma pela aparencia mais visfvel 0 individuo nao precisa sex urn cavalheiro precisa apenas dos meios para parecer que C e se torna tal 0 indi viduo nao precisa ter razio precisa apenas colocarse dentro das formas da razoabilidade e tera razao Par toda a parte aparencia Em neohurn lugar inclinase mais 0 homem a abandonarse cegamente ao mero brilho de urn nome 0 alernAo vive para viver 0 ingles para representar 0 alernao vive para si mesmo 0 ingles vive para os outros 50 o procesw civilirador I Talvez seja necessario mostrar com que exatidao esta Ultima ideia coin cide com a antitese entre Eckermann e Goethe Dou plena expressao as minhas simpatias e antipatias diz Eckermann Temos que procurar mes mo a contragosto harmonizarnos com os demais argumenla Goethe 0 ingles observa Fontane tern mil confortos mas nenhum confOl to 0 lugar do conforto e tornado pela ambi9ao Ele esta sempre pronto para ser recebido e conceder audiencias Muda de roupa tres vezes ao dia a mesa observa e tambem na sala de estar e de visitas cerlas leis pres critas de decoro 1 urn homem disdiltO urn fenomeno que nos impressio na urn mestre de quem recebemos li90es Mas com nosso assombro se mistura uma nostalgia infinita de nossa Alemanha pequenoburguesa onde as pessoas nao tern mesmo uma vaga ideia de como representar mas sao capazes de tao esplendida confortavel e aconchegantemente viverem o conceito de civiliza9ao nao e mencionado E a iMia de Kultur alema aparece nesse trecho apenas remotamenle Mas vemos nesse exemplo como tambem em todas essas reflexoes que a antitese alema entre Zivil sation e Kultur nao se suslenta sozinha e parle de urn contexto mais amplo 1 em sUina a expressao da autoimageni alema E aponla para as dUe ren9as em autolegitima9ao em carater e comportamenlo total que no inf cio existiram preponderantemente embora nao exclusivamente entre de terminadas classes e em seguida entre a na9ao alema e outras na90es parte II Sociogenese do conceito de civilisation na Frana I Introdu4ao 1 Seria incompreensivel que na antitese alema entre Hidung e Kultur por urn lado e a mera Ziviisation extema por outro a anlftese social interna recuasse e a nacional se tomasse dominante nao tivesse 0 desen volvimento da burguesia francesa seguido em certos aspectos exatamente o curso oposto ao tornado pela alema Na Frana a intelligentsia burguesa e grupos importantes da classe media foram atraidos relativamente cedo para a sociedade cortesa 0 velho meio de distinao da nobreza alema a prova de ancestralidade que mais tarde numa transformaao burguesa assumiu nova vida na legisla ao racial alema certamente nao esteve de todo ausente na tradiao francesa mas sobretudo depois do estabelecimento e consolidaiio da rna narquia absoluta nao desempenhou mais urn papel decisivo como barrei ra entre as classes A infiltraao de circulos burgueses por tradioes especi ficamente aristocrilticas que na Alemanha com a separaao mais rigorosa entre as classes produziu efeito profundo apenas em certas esferas como a li1itar sendo nas demais muito limitada teve proporoes muHo diferen tes na Frana Nela jil no seculo XVllI nao havia mais qualquer grande diferena em costumes entre os principais grupos burgueses e a aristocra cia de corte E mesmo que com a ascensao mais forte da c1asse media a partir de meados do seculo XVlII ou em outras palavras Com a am Referenda A le8istao antisemita imposla pelos nazistas nos anos 30 RJR 52 o processo civilizador pliaao da sociedade aristocratica atraves da maior assimilaao de gropos importantes de classe media comportamento e costumes mudassem de vagar isto aconteceu sem ruptura como continuagao direta da tradigao aristocratica de corte do seculo XVII Tanto a burguesia de corte c9mo a aristocracia de corte falavam a mesma lingua liam os mesmos livros e observavam COm gradagoes particulares as mesmas maneiras E quando as disparidades sociais e economicas explodiram 0 contexto institucional do ancien regime quando a burguesia tornouse uma nagao muito do que ori ginariamente fora carater social especifico e distintivo da aristocracia de corte e depois tambem dos grupos burgueses de corte tomouse em urn movimento cada vez mais amplo e sem duvida com alguma modificagao cariiter naciona As convengoes de estilo as formas de interclmbio social o controle das emogoes a estima pela cortesia a irnportancia da boa fala c da conversa a eloqiiencia da Iinguagem e muito mais tudo isto e ini cialmente formado na Franga dentro da sociedade de corte e depois gra dualmente passa de carliter social para naciona Aqui tambern Nietzsche percebeu claramente a diferenga Em todos os lugares onde havia uma corte diz ele em Para Atem do Bem e do Mal Aforismo OJ hava uma lei da fala certa e por conseguinte tambem uma lei de stilo para todos os que escreviam A linguagem de corte alem disso e a lingua do cortesao que nao tern urn tema especial e que mesmo em conversas sabre assuntos eruditos profue todas as expressoes tecnicas porque elas tern urn ressaibo de especiaIizagao este 0 motivo por que em palses que possuem uma cultura de corte 0 termo tecnico e tudo 0 que trai 0 especialista e uma macula estillstica Agora que todas as cortes se transformaram em caricaturas ficamos surpreendidos ao descobrir que mesmo Voltaire era muito exigente neste particular 0 fato e que todos es tamos emancipados do gosto da corte enquanto que Voltaire era a sua consumaao Na Alemanha a intelligentsia de classe media cheia de aspiragoes do seculo XVIII formada em universidades que se especializavam em deter minados assuntos desenvolveu autoexpressao e cultura pr6prias nas artes e ciencias Na Franga a burguesia ja era desenvolvida e pr6spera em urn gran inteiramente diferente A emergente intelligentsia possula alem da aris tocracia tambem urn numeroso publico burgues A pr6pria intelligentsia como outras formaoes de classe media foi assimilada pelo circulo de corte E acontecen que a classe media alema com sua ascensao finito lenta para o espirito nacional carla vez mais identificou como carater nacionaI da vi zinha naao aqueles tipos de comportamento que havia observado primeira e predominantemente em suas pr6prias cortes E tendo ou julgado eSse comportamento como de segunda classe ou 0 rejeitada como incompatlvel com sua pr6pria estmtura ljfetiva desaprovouo tamb6m em maior ou me nor grau nos vizinhos r conceito de civiliz e cultura 53 l 2 Talvez pare9a paradoxal que na Alemanha onde as barreiras so ciais entre a classe media e a aristocracia eram mais altas menos nUffiero sos os contatos sociais e mais consideniveis as diferen9as em maneiras durante muito tempo as discrepancias e tensoes entre as classes nao tenham tido expressao politica ao passo que na Fran9a onde eram mais baixas as barreiras de classee incomparavelmente mais intimas os contatos sociais entre elas a atividade politica da burguesia tenba se desenvolvido mais cedo e chegado a uma precoce solU9ao politica a tensao entre elas o paradoxo no entanto e apenas aparente A longa recusa da politi ca real a conceder 0 exercicio de fun90es politicas a nobreza francesa 0 envolvimento desde cedo de elementos burgueses no governo e na adminis lra9ao 0 acesso deles ate mesmo as mais altas fun90es goverriamentais sua influencia e prom090es na corte tudo isto teve duas conseqtiencias por urn lado 0 contato social intimo e continjlo entre elementos de origem social diferente e por outro a oportunidade de elementos burgueses se cmpenbarem em atividade politica logo que amadureceu a situa9ao social e antes disso urn forte treinamento politico e uma tendencia a pensar em lermos politicos Nos Estados alemaes de modo geral aconleceu quase exatamente 0 oposto Os mais altos cargos do governo eram via de regra reservados a nobreza No minimo ao contnirio de sua contrapartida fran cesa a nobreza alema desempcnhou urn papel decisivo na mais alta admi nistra9ao do Eslado Sua for9a como classe autonoma nunca foi tao radi calmente quebrada como na Fran9a Em contraste a for9a de classe da burguesia em conformidade com seu pader economica permaneceu rela tivamente fraca na Alemanha ate bem dentro do seculo XIX A separa9ao mais radical entre os elementos de classe media e a aristocracia de corte refletiaIhes a fraqueza economica comparativa e a exclusao dos cargos mais importantes do Estado 3 A estrutura social francesa lornou possivel que a oposiao mode rada que veio crescendo lentamente desde meados do seculo XVIII se fi zesse representar com certo sucesso noS circulos mais internos da corte Seus representantes porem ainda nao formavam urn partido Outras for mas de lUIa politica ajustavamse melhor a estrutora institucional do ancien regime Formavam eles na corte uma camarilha embora sem organiz3lao definida mas eram apoiados por pessoas e grupos que formavam a socie dade de corte mais ampla e no proprio pais A grande variedade de inte resses sociais encontrava expressao na corte em conflitos entre essas cliques reconhecidamente de forma urn tanto vaga e com forte infusao de interesses pessoais os mais diversos mas ainda assim esses conflitos vinham ji lume e eram soIucionados o conceito frances de civilisation exatamente como 0 conceito alemao correspondente de Kultur emergiu nesse movimento de oposi9ao na segun da metade do seculo XVIII Seu processo de forma9ao fun9ao e significa 54 o procefSO civilitador do foram tao diferentes dos impHcitos no conceito alemao como as cir cunstancias e costumes da classe media nos dois paises Nao deixa de ser interessante observar como 0 conceito frances de civilisation tal como surge inicialmente na Iiteratura assemelbase ao con ceito ao qual muitos anos depois Kant opos seu conceito de Kultur A primeira evidencia literiiria da evoluao do verbo civiliser para 0 conceito de civilisation e encontrada de acordo com descobertas modernas25 na obra de Mirabeau 0 pai na decada de 1760 Maravilhome de ver diz ele como nossas opinioes cuHas faIsas em todos as sentidos se enganam no que consideramos ser civilizaao Se perguntar 0 que e civilizaao a maioria das pessoas responderia sua vizaao de maneiras urbanidade polidez e a difusao do conhecimento de tal modo que inclua 0 decoro no lugar de leis detalhadas e tudo isso me parece ser apenas a mascara da virtude e nao sua face e civilizaao nada faz pela sociedade se nao lhe da por igual a forma e a substancia da virtude 26 Isto parecese muito com 0 que entao se dizia na Alemanha sobre os costumes de corte Mirabeau igualmente compara 0 que a maio ria das pessoas segundo ele considera ser civiIizaao isto e polidez e boas maneiras com 0 ideal em cujo nome a classe media em toda a Eu ropa se alinhava contra a aristocracia de corte e atraves do qual se legi timou 0 ideal da virtude Ele tambem exatamente como Kant vin cula 0 conceito de civilizaao as caracteristicas especfficas da adstocracia de corte e com razao isto porque 0 homme civilise nada mais era do que uma versao urn tanto ampHada daquele tipo humano que representava o verdadeiro ideal da sociedade de corte 0 honnere homme Civilise era como cultive poli ou police urn dos muitos termos nao fafO usados quase como sinonirnos com as quais as membros da corte gostavam de designar em sentido amplo ou restrito a qualidade especffica de seu pr6prio comportamento e com os quais comparavam 0 refinamento de suas maneiras sociais seu padrao com as maneiras de indivfduos mais simples e socialmente inferiores Conceitos como politesse ou civilite tinham antes de formado e fir mado 0 conceito civilisation praticamente a mesma funao que este ultimo expressar a autoimagem da classe alta europeia em comparaao com ou tras que sens membros consideravam mais simples au mais primitivos e ao mesmo tempo caracterizar 0 tipo especffico de comportamento atra yeS do qual essa classe se sentia diferente de todos aqueles que julgava mais simples e mais primitivos As palavras de Mirabeau deixam muito clara a extensao em que 0 conceito de civiliz3930 foi inicialmente uma continu393o direta de outras encarnaiies da autoconsciencia de corte Se eu pergun tar 0 que e civilizaao a maioria das pessoas responderia suavizaao de maneiras polidez e caisas assim E Mirabeau da mesma forma que Rous seau embora talvez com rnais moderaao inverte as valorizaoes existen r conceios de civiiariio e cuiuTa 55 tes VOCe e sua civilizaao diz ele da qual se sente tao orgulhoso acre ditando que 0 eleva acima do homem simples tem pouquissimo valor Em todas as linguas em todas as idades a descriao do amor de pastores por seus rebanhos e seus caes toea nossa alma por embotada que esta esteja pela busca do luxo e de uma falsa civilizaao 27 A atilude da pessoa em relaao ao homem simples e acima de tuda em relaao ao homem simples na sua forma mais extrema 0 sel vagem e em toda parte na segunda metade do seculo XVIII um sim bolo de sua posiao no debate interno social Rousseau lanou 0 ataque mais radical a ordem de valores dominante em seu tempo e exatamente por este motivo sua importancia direta para 0 movimento de reforma de cortec1asse media da intelligentsia francesa foi menor do que paderia ser sugerido por sua ressonancia entre a apolitica embora intelectualmente mais radical intelligentsia de classe media da Alemanba A despeito de todo 0 radicalismo de sua critica social porem Rousseau nao cbegou a forjar urn contraconceito inclusivo e unlflcado contra 0 qual lanar as cri ticas acumuladas Mirabeau pai criao ou pelo menos e 0 primeiro a usaIo em seus escritos Talvez ele bouvesse circulado antes em conversas Do homme civilise ele deriva uma caracteristica geral da sociedade civilisation Sua critica social como a de outros fisiocratas porem e moderada Per manece inteiramente dentro do contexto do sistema social vigente e na verdade a critica de urn reformador Enquanto os membros da intelligentsia alema de c1asse media pelo menos na mente nos devaneios de seus Ii vros forjam conceitos que divergem frontalmente dos modelos da classe alta e desta maneira lutam em territ6rio politicamente neutro todas as ba talbas que nao podem travar no plano politico e social porque as instilui oes e relaoes de poder existentes Ihes negam instrumentos e mesmo alvos enquanto e1es em seus livros op6em as caracterlsticas humanas da c1asse alta seus pr6prios novos ideais e modelos de comportamento a intelli gentsia reformista de corte da Frana permanece durante muho tempo no contexto da tradiao de corte Esses franceses desejam melhorar modificar adaptar A parte alguns estranhos como Rousseau nao opoem ideais e mo delos radicalmente diferentes 11 ordem dominante mas ideais reformados e modelos dessa ordem As palavras falsa civilizaao contern tudo 0 que a diferencia do movimento alemao Os escritores franceses sugerem que a falsa civilizaao deve ser substituida pela autentica Nao opoem ao homme civilise urn modclo humano radicalmente diferente como faz a intelligentsia burguesa alema com 0 termo gebildeter Mensch homem educado e com a ideia de personalidade Em vez disso escolhem modelos de corte a fim de desenvolveIos e transformaIos Dirigemse a uma intelligentsia cri tica que direta ou indiretamente escreve e luta dentro do amplo contexto de uma sociedape de corte IL 56 o processo civilizador II Sociogenese da Fisiocracia e do Movimento de Reforma Frances 4 Recordemos a situaiio da Frana ap6s meados do seeulo XVIII Os principios mediante os quais era governada e sobre os quais em particular fundamentavamse a tributaiio e os direitos alfandeganos eram de modo geral os mesmos que nos tempos de Colbert As relaoes inter nas de poder e interesses a estrutura social da pr6pria Frana porem ba viam mudado radicalmente 0 protecionismo rigoroso a defesa da industria nacional e da atividade comercial contra a concorrencia estrangeira ba viaro na verdade contribuido decisivamente para 0 desenvolvimento da vida economica aumentando assim 0 que importava mais que tudo para o rei e seus representantes a capacidade tributria do pais As barreiras ao comercio de ceTeais as monop6lios 0 sistema de armazenamento e as muras tarifarios entre as provincias protegiam em parte os interesses 10 cais mas acima de tuda haviam de tempos em tempos preservado a parte mais importante para a paz do rei e talvez a de toda a Frana Paris das conseqiiencias extremas das ms colheitas e dos preos em alta da fome e da revolta Mas entrementes haviamse expandido a capital e a populaiio do pais Comparadas com 0 tempo de Colbert as relaoes de comercio ha viam se tornado mais densas e amplas a atividade industrial mais vigorosa as comunica6es melhores e mais Intimas a integracao economica e a inter dependencia do territ6rio frances Segmentos da burguesia comaram a achar incomodos e absurdos a tributaiio tradicional e 0 sistema de direitos aduaneiros sob cuja proteiio tinham crescido A pequena nobreza rural e latifundiarios como Mirabeau viam nas restrioes rercantilistas a ccono mia agricola urn impedimento e niio urn incentivo II produiio do campo Nisto aproveitaram bastante as li6es de urn sistema comereial ingles mais livr E mais importante que tudo uma parte da pr6pria alta administra iio reconhecia os efeitos nocivos do sistema vigente II frente desses admi nistradores despontavam os seus tipos mais progressistas os intendentes de provincia representantes da uniea forma moderna de buroeracia que 0 ancien regime produzira a tiniea fun9aO administrativa que nao era como as demais negodvel e portanto hereditria Esses elementos progres sistas da administraiio formaram urna das mais importantes pontes entre a exigencia de reforma que se fazia sentir no pais e a corte Direta ou in diretamente representaram na luta entre os grupos de corte por posioes politicas decisivas principalmente os ministerios urn papel de grande importaneia Iii notamos acima que essas lutas nao eram ainda os conflitos mais impessoais politicos que se tomaram 1lais tarde quando os varios inte resses seriam representados por partidos em urn sistema parlamentar Os grupos da corte que pelas mais diversas razoes competiam nela por in f1ueneia e cargos porem eram ao mesmo tempo nucleos sociais atraves dos quais os interesses de grupos e classes maiores podiam encontrar ex pressao no centro controlador do paisDesta maneira tendeneias reformis tas eram tambem representadas na corte Pela segunda metade do seculo XVIII os reis nao mais governavam arbitrariamente Muito mais visivelmente do que Luis XIV por exemplo eram prisioneiros de processos sociais e dependentes de cliques e facoes da corte algumas das quais se prolongavam extensa e profundamente pelo pais enos circulos de classe media A fisiocracia constitui uma das manifestaoes te6ricas dessas lutas in testinas Nao se limita em absoluto Ii economia sendo na verdade urn sis tema em grande escala de reforma politica e soeial Contem de forma in cisiva abstrata dogmatica endurecida ideias que expressas de maneira menos te6rica dogmatica e precisa isto e como exigencias praticas de re formas caracterizam todo 0 movimento do qual Turgot na ocasiao encarregado das finanas foi urn dosexpoentes Se esta tendeneia que nem tinha nome nem organizaao unificada tivesse que reeebeIo poderia ser chamada de burocraeia reformista Mas esses administradores tinham tambem indubitavelmente por tras de si segmentos da intelligentsia e da burguesia comercial Entre os que desejavam e exigiam reforma de resto lavravam consi deraveis diferenas de opinioes sobre 0 tipo de reforma necessaria Alguns eram inteiramente a favor de uma reforma do sistema de tributaao e da maquinaria estatal mas tambern muito mais proteeionists do que os fi siocratas por exemplo Forbonnais foi urn dos principais representantes dessa tendencia mas seria interpretaIo mal e a outros das mesnias ideias incluiIos por causa de sua atitude mais fortemente protecionista sem mais ressalvas entre os mercantilistas A polemica entre Forbonnais e os fisio cratas e a antevisao de urna divergencia que na moderna sociedade indus trial levaria a repetidos choques entre os defensores do livre comercio e os do proteeionismo Mas ambos os lados fazem paite do movimento refor mista de classe media Por outro lado nao era em absoluto verdade que tada a burguesia de sejasse a reforma e que apenas a aristocracia a ela se opusesse Houve certo numero de grupos claramente identificaveis de classe media que resistiram ate 0 fim a qualquer tentativa de reforma e cuja existeneia na verdade es r II I f conceios de civilizai1o e cullura 57 MlIl w tJ I 11 l I J T fl 11 58 o processo civilizador L tava ligada 11 preserva9lio do anden regime na sua forma original Esses grupos inclufam a maioria dos altos administradores a noblesse de robe cujos cargos eram propriedade de famflia no mesmo sentido em que uma fabrica ou empresa e hoje propriedade hereditaria Inclufam tamhem as guildas de oficios e em born numero os financistas E se a reforma fra cassou na Fran9a se as disparidades da sociedade finalmente romperam de forma violenta 0 tecido da estrutura institucional do ancien regime grande parte da responsabilidade coube 11 oposi9lio desses grupos de c1asse media Esta descri9lio mostra com grande clareza um aspecto importante neste contexto ao passo que na Fran9a dessa epoca a classe media ja repre sentava urn papel poWico 0 mesmo nlio acontecia na Alemanha Nesta 0 estrato intelectual limitasc 11 esfera da mente e das ideias na Fran9a jun tamente com todas as demais questaes humanas as problemas sociais eco nomicos administrativos e politicos se situavam dentro da faixa de interes ses da intelligentsia de corteclasse media Os sistemas alemaes de pensa mento em contraste eram apenas academicos Tinham por base social as universidades Ja a base social de onde emergiu a fisiocraeia eram a corte e a sociedade de corte onde 0 esfor90 intelectual visava a objetivos con cretas especfficos t3is como influenciar 0 rei au suas amantcs 5 Sao bern conhecidas as ideias basicas de Quesnay e dos fisiocra tas No seu Tableau economique 1758 Quesnay descreve a vida econo mica da sociedade como urn processo mais au menos autonomo urn cfrculo fechado de produ9ao circula9ao e reprodu9ao de bens Fala das leis natu rais de uma vida social em harmonia com a razao Baseando sua argumen ta9ao nessa ideia Quesnay opaese 11 interven9ao arbitrliria dos governan tes no ciclo economico Deseja que estejam conscientes das leis deste a fim de guiarlbes os processos em vez de baixar decretos desinformados ao sa bor do capricho Exige a liberdade de comercio em particular do comercio de cereais porque a autoregula9ao 0 livre jogo de for9as criam em sua opiniao uma ordem mais benefica para consumidores e produtores do que a regulallenta9ao tradicional vinda de cima e as incontaveis barreiras ao comercio entre provincias e entre palses Mas admite francamente que os processos autoreguladores devem ser compreendidos e orientados por uma burocracia sabia e esclarecida Temos aqui acima de tudo a diferen9a na maneira como os reformadores fran ceses e os ingleses reagiram 11 descoberta da autoregula9ao na vida econo mica Quesnay e sellS seguidores permanecem sem exceao no contexto do sistema monarquico vigente Deixam intocados os elementos basicos do an cien regime e de sua estrutura institucional E isto se apliea ainda mais aos segmentos da administra9ao e intelligentsia cujas posi90es mais Se aproxima vam da sua e que de forma menos abstrata menos extremada e de cunho mais pratico chegam a resultados semelhantes aos do grupo principal dos fisiocratas No fundo a posi9aO comum a todos cles e por demais simples em conceito8 de civilizllfiio e cultura 59 tenuos aproximados nao e verdade que os governantes sejam todopodero sos e possam regular todos os assuntos humanos como julguem conveniente A sociedade e a economia tem leis pr6prias que resistem a interferencia irracional de governantes e da for9a Por conseguinte deve ser fonuada uma administra9ao esclarecida racional que governe de acordo com as leis naturais dos processos sociais e destarte de acordo com a razio 6 0 termo civilisation no momento em que foi cunhado era urn claro reflexo dessas ideias reformistas Mesmo que neste termo a ideia de homme civilise conduza a urn conceito indicativo de costumes e condi90es da sociedade vigente como urn todo ele e em primeiro lugar e acima de tudo uma expressao de oposi9ao de crltica social A isto se adiciona a compreensao de que 0 governo nao pode baixar decretos a seu talante mas enfrenta resistencia automatica de for9as sociais anonimas se suas determi na90es nao forem orientadas por urn exato conhecimento dessas for9as e leis a compreensao de que ate mesmo 0 governo mais absoluto e impo tente diante do dinamismo do desenvolvimento social e de que 0 desastre e 0 caos 0 sofrimento e a afli9ao sao deflagrados pelo govemo arbitrario antitlatural irracional Conforme ja foi dito acima esta compreensio se expressa na ideia fisiocrata de que os fatos sociais tais como os feno menos naturais sao partes de urn processo ordenado Esta mesma compre ensao manifestase na evolu9ao do anterior civilise para 0 termo civilisa tion contribuindo para Ihe dar urn significado que transcende 0 indivlduo As dores de parto da revolu9ao industrial que nao podiam ser mais compreendidas como resultado de a9ao do governo ensinaram ao homem por urn curto momento e pela primeira vez a pensar em si mesmo e em sua existencia social como urn processo Se estudamos inicialmente 0 termo civilisation na obra de Mirabeau percebemos claramente que esta desco berta 0 leva a considerar a uma nova luz toda a moralidade de seu tempo Vern a considerar esta moralidade esta civilizacao tambem como uma manifesta9ao dclica e deseja que os governantes Ihes percebam as leis a fim de usalas Este 0 sentido do termo civilisation nessa fase inicial de Seu emprego No seu Ami des hommes argumenta Mirabeau em certa altura que superabundancia de dinheiro reduz a popula9ao de modo que aumenta o consumo por indivlduo Acha que esse excesso de dinheiro caso se torne grande demais expulsa a industria e as artes lan9ando desta ma neira os Estados na pobreza e no despovoarnento E continua A vista disto notamos como 0 ciclo de barMrie adecadoncia passando pela civi Iiza9ao c a riqueza poderia ser invertido por urn ministro alerta e habil e nova corda seria dada a maquina antes que ela parasse 28 Esta frase realmente sumaria tudo 0 que se tornaria caracterstico em termos fiUitO gerais do ponto de vista fundamental dos fisiocratas a concep9ao de eco nomia popula9ao e finalmente costumes como urn todo interrelacio 60 o pr0cesso civilitador i nado desenvolvendose ciclicamente e a tendencia politica reformista que dirige finalmente este conhecimento aos governantes a fim de capacitaIos pela compreensao dessas leis a orientar os processos sociais de uma ma neira mais esclarecida e racional do que ate entao Na dedicat6ria que Mirabeau faz ao rei em 1760 de seu Theorie de lImp6t no qual recomenda ao monarca 0 plano fisiocrata de reforma tributaria continua presente a mesma ideia 0 exemplo de todos os irn perios que precederam 0 de Vossa Majestade e que completaram 0 cicio de civiliza9ao seria prova detalhada do que acabo de propor A critica de Mirabeau nobre proprietmo de terras a riqueza ao luxo e a todos os costumes vigentes da uma colora9ao especial a suas ideias A verdadeira civiliza9ao pensa situase em urn cicIo entre a barbarie e a falsa civiliza9ao decadente gerada pela superabundllncia de dinheiro A missao do governo esclarecido e dirigir este automatismo de modo que a sociedade possa fIorescer em urn curso medio entre a barbarie e a de cadencia Aqui toda a faixa de problemas latentes em civiliza9ao ja c discernivel rio momenta da forma9ao do conceito Ja nessa fase ela esta ligada a ideia de decadencia ou declfnio que reemerge repetidamente em forma visivel ou velada segundo 0 ritmo das crises ciclicas Mas pode mos tambCm ver claramente que este desejo de reforma permanece sem exct9ao dentro do contexto do sistema social vigente manipulado de cima e que nao opoe ao que critica nos costumes do tempo uma imagem ou conceito absolutamente novos mas em vez disso parte da ordem existen te desejando meThorala atraves de medidas habeis e esclarecidas toma das peIo governo a faIsa civiIizacao mais uma vez se tornani boa e au tentica 7 Nesta concep9ao de civiliza9ao talvez haja inicialmente numero sas nuances isoladas de significado Mas ela contern elementos que atendem as necessidades gerais e experiencia dos drculos reformistas e progressista da sociedade parisiense E 0 conceito ganha urn emprego cada vez maior nesses circulos a medida que se acelera 0 movimento de reforma com a crescente comercializa9ao e industrializa9ao o ultimo periodo do reinado de Luis XV constitui uma epoca de vi sivel debilidade e desordem no velho sistema Crescem as tens6es internas e externas Multiplicamse os sinais de transforma9ao social Em 1773 caixotes de cM sao lan9ados ao mar no porto de Boston Em 1776 as colonias americanas da Inglaterra declaram sua independen cia 0 governo proclama ela e nomeado para assegurar a felicidade do pavo Caso nao obtenha sucesso neste particular a maioria do povo tern o direito de destituilo Os circulos da classe media francesa simpaticos 11 reforma observam com a maior atel9aO 0 que acontece no outro lado do mar e tambem com uma simpalia na qual suas tendencias sociais reformistas se misturam r conceilOs de civiir e cultura 61 com a crescente hostilidade nacional contra a Inglaterra mesmo que suas mentes mais influentes pensem em tudo menos na derrubada da monaro quia Simultaneamente a partir de 1774 ha a crescente impressao de que Ii inevitavel 0 confronto com a Inglaterra e de que preparativos devem set feitos para a guerra No mesmO ano 1774 morre Luis XV Sob 0 novo monarca a luta pela reforma dos sistemas administrativo e tributario Ii imediatamente reiniciada com renovado vigor tanto nos circulos mais res tritos quanta mais amplos da corte Como resultado desses conflitos Tur got Ii aclamado no mesmo ano ao se tomar controleur general des finan ces por todos os elementos reformistas e progressistas do pais Finalmente chegou a tao retardada hora da justi9a escreveu o fisiD crata Baudeau sobre a nomea9ao de Turgot Na mesma ocasiao afirmou DAlembert Se 0 bern nao prevalecer agora Ii porque 0 bern Ii impos sive E Voltaire lamenta estar as portas da morte no momento em que pode observar que a virtude e a razao foram postas em seus lugares Nesses mesmos anos a palavra civilisation surge pela primeira vez como urn conceito amplamente usado e mais ou menos preciso Na pri meira edi9ao da Histoire philosophique et polltique des etabllssements et du commerce des Europeens dans les deux ndes 1770 do padre Ray nal a palavra nao ocorre nem uma Mica vez na segunda 1774 ela e usada freqiientemente e sem a menor varia9ao de significado como termo indispensavel e geralmente entendido30 No Systeme de lanature de Holbach publicado em 1770 nao apa rcce a palavra civilisation Mas no seu systeme soci4 editado em 1774 ela Ii usada com freqiiencia Diz ele por exemplo Nada ha que oponha mais obstaculos no caminho da felicidade publica do progresso da razao humana de toda a civiliza9ao dos homens do que as guerras continuas para os quais principes estouvados sao atraidos a cada momento s Ou em outro trecho A razao humana nao e ainda suficientemente exercitada a civilizllfiio dos povos niio se completou ainda obstaculos inumeraveis se opuseram ate agora ao progresso do conhecimento uti cujo avan90 s6 podera contribuir para 0 aperfei90amento de nosso governo nossas leis nOSsa educaao nossas instituioes e Dassa moral 32 o conceito subjacente a esse movimento esclarecido de reforma social mente critico e sempre 0 mesmo que 0 aprimoramento das institui90es da educa9ao e da lei sera realizado pelo aumento dos conhecimentos Isto nao significa erudi9ao no sentido alemao do seculo XVIII porquanto os que aqui se expressam nao sao professores universiblrios mas escritores funcionarios intelectuais cidadaos refinados dos mais diversos tipos uni dos atraves do medium da boa sociedade os salons 0 progresso sera obtido por conseguinte em primeiro lugar pela ilustra9ao dos reis e gover nantes emconfonnidade com a urazao OU a natureza 0 que vern a ser 82 o procel8O civilivulof amesma coisa e em seguida pela nomeao para os principais cargos de homens esclarecidos isto e reformistas Certo aspecto desse pro cesso progressista total passou a ser designado por um conceito fum civi lisation 0 que era visivel na Versiio individual que Mirabeau tinha do con ceito 0 que nao fora ainda polillo pela sociedade e que era caractenstico de todos os movimentos de reforma era encontrado tambem aqui uma meia afirmaao e uma meia negaao da ordem vigente A sociedade deste ponto de vista atingira uma fase particular na rota para a civilizaao Mas era insuficiente Nao podia ficar parada nesse ponto 0 processo con tinuava e devia ser levado adiante a civilizaao dos povos ainda nao se completou Dnas ideias se fundem no conceito de civilizaao Por um lado ela constitui um contraconceito geral a outro estagio da sociedade a barba rie Este sentimento ha muito permeava a sociedade de corte Encontrara sua expressao aristocratica de COrte em termos como politesse e dvilite Mas os povos nao estao ainda suficientemente civilizados dizem os homens do movimento de reforma de corteclasse media A civilizaao nao e apenas um estado mas um processo que deve prosseguir Este e 0 novo elemento manifesto o termo civilisation Ele absorve muito do que sempre fez a corte acreditar ser em comparaao com os que vivem de maneira mais simples mais incivilizada ou mais barbara um tipo mais elevado de sociedade a idia de urn padrao de moral e costumes isto e tato social consideraao pelo pr6ximo e numerosos complexos semeIbantes Nas maos da classe media em ascensao na boca dos membros do movimento refor mista e ampliada a ideia sobre 0 que e necessario para tornar civilizada uma sociedade 0 processo de civilizaao do Estado a Constituiao a edu caao e por conseguinte os segmentos mais numerosos da populaao a eliminaao de tudo 0 que era ainda barbaro ou irracional nas condiOes vigentes fossem as penalidades legais as restrioes de classe 11 burguesia ou as barreiras que impediam 0 desenvolvimento do comercio este pro cesso civilizador devia segnirse ao refinamento de maneiras e 11 pacifica ao interna do pais pelos reis 0 rei conseguiu disse certa vez Voltaire a respeito da era de Luis XIV transformar uma naao ate entao turbulenta em urn povo pacifico perigoso apenas para seus inimigos As maneiras foram suavizadas 33 Mais tarde veremos com mais detaIbes como foi importante essa pacifica iio interna para 0 processo civilizador Condorcet contudo que era em comparaao a Voltaire um reformista de geraao mais jovem e ja muito mais inclinado 11 oposiao comenta da seguinte maneira a reflexao acima de Voltaire A despeito da barbiirie de algumas das leis a despeito das faIbas dos princfpios administrativos do aumento dos impostos de sua forma pesada da dureza das leis fiscais a despeito das maximas perni ciosas que pautam a legislaao governamental sobre comercio e industria e finalmente a despeito da perseguiao aos protestantes podemos obser var que 0 povo no reino vivia em paz sob a protao da lei Essa enumeraao que nao deixa de ser uma justificaao integral da ordem vigente da ideia de muitas coisas que se pensa carecer de reforma Fosse ou nao 0 termo civilisation usado aqui explicitamente ele se rela ciona com tudo isso com tudo 0 que ainda e barbaro Esta discussao mostra com muita c1areza a divergencia entre os fatos que ocorriam na A1emanba e os conceitos vigentes no pais demonstra que os membros da emergente intelligentsia de classe media situamse na Frana parcialmente no circulo da corte e assim na tradiao aristocratica de corte Falam a lingua desse cireulo e a desenvolvem ainda mais Seus com portamentos e emoes sao com algumas modificaoes modelados segun do 0 padrao dessa tradiao Seus conceitos e ideias nao sao em absoluto meras antileses aos da aristocracia Em tomo de conceitos aristocraticos de corte como a ideia de ser civilizado cristalizamse de conformidade com sua posiao social no circulo da corte mais ideias que apontam rei vindicaoes politicas e economicas ideias que devido a situaao social di ferente e a diferente faixa de experiencia da intelligentsia germanica eram em grande parte estranbas a ela e de qualquer modo para eta menos re levantes A burguesia francesa politicamente aliva pelo menos parcialmente desejosa de reformas e ate durante um curto periodo revolucionaria permarieceu estreitamente vinculada a tradiao de corte em seu comporta mento e no controle de suas emoOes mesmo depois de demolido 0 edifi cio do velho regime Isto porque gras a estreito contato entre circulos aristocraticos e de c1asse media grande parte das maneiras cortesas muito tempo antes da revoluao haviam sido tambem aceitas pela c1asse media Podese depreender ento que a revoluao burguesa na Frana embora destruindo a velha estrutura politica nao subverteu a unidade dos costu mes tradicionais A intelligentsia alema de classe media de todo impotente na esfera politica embora intelectualmente radical forjou uma tradiao pr6pria pu ramente burguesa divergindo radicalmente da tradiao da aristocracia de corte e de seus modelos 0 carater nacional alemao que aos poucos des pontou no seculo XIX nao era para sermos exatos inteiramente destitui do de elementos aristocraticos assimilados pela burguesia Nao obstante no tocante a grandes areas da tradiao cultural e do comporlamento as caracteristicas especificamente de classe mooia predominaram sobretudo na divisao social mais nitida entre os circulos burgues e aristocratico e com ela uma heterogeneidade relativa nos costumes alemaes sobreviveu muito depois do seculo XVIII o conceilo frances de civilisation reflete 0 fado social especifico da burguesia da naao exatamente como 0 conceito de Kultur reflete 0 ale rI I conceito de ffcil1ilizacoo e cultura 63 64 o processo civilitador 1 mao 0 conceito de civilisation e inicialmente como acontece com 0 de Kultur urn instrumento dos circulos de classe media acima de tudo da intelligentsia de classe media no conflito social interno Com a aseen sao da burguesia ele veio tambem a sintetizar a nagao a expressar a autoimagem nacional Na propria revolugao a civilisation que natural mente referese sobretudo a urn processo gradual a urna evolugao e Ilao abandonou ainda sen significado original como programa de reforma nao desempenha qualquer papel de relevo entre os slogans revolucionarios Tor nandose a revolugao mais moderada pouco depois da virada do seculo ela inicia sua jornada como urn brado de uniao por todo 0 mundo Ja em uma epoea tao remota como essa atingia urn nlvel de significado que justi ficava as aspiraoes francesas de expansao nacional e colonizaao Em 1798 partindo para 0 Egito Napoleao grita para suas tropas Soldados estais iniciando urna conquista de conseqiiencias incalculaveis para a eivi lizagao Ao eontrario da situaao vigente ao ser formado 0 coneeito a partir de entao as nagoes consideram 0 processo de civilizaao como ter minado em suas sociedades elas sao as transmissoras a outrem de uma ci vilizaao existente ou acabada as portaestandartes da civilizaao em marcha Do processo anterior de civilizagao nada resta na consciencia da sociedade exeeto urn vago residuo Seus resultados sao aceitos simples mente como expressao de seus proprios talentos mais altos nao interess o fato e a questao de como no decorrer dos seculos 0 comportamento eivilizado se cristalizou E a consciencia de sua propria superioridade dessa civilizaao passa a servir pelo menos as naoes que se tornaram con quistadoras de colonias e por conseguinte um tipo de classe superior para grandes segmentos do mundo naoeuropeu como justificativa de seu do minio no mesmo grau em que antes os aneestrais do coneeito de civiliza gao politesse e civilite serviram de justificagao a aristocracia de corte Na verdade uma fase fundamental do processo civilizador foi conelui da no exato momento em que a conscincia de civilizagao a consciencia da superioridade de seu pr6prio comportamento e sua corporificagao na cieneia tecnologia ou arte comegaram a se espraiar por todas as nag6es do Oeidente Esta fase primitiva do processo civilizador aquela em que a conscien cia do processo mal existia e 0 conceito de civilizagao sequer surgira ainda sera discutida no capitulo seguinte IL capitulo dois A CIVILIZAAO COMO TRANSFORMAAO DO COMPORTAMENTO HUMANO L capitulo dais A CIVILIZAAO COMO TRANSFORMAAO DO COMPORTAMENTO HUMANO I o Desenvolvimento do Conceito de Civilite 1 A antitese fundamental que expressa a autoimagem do Ocidente na Idade Media opoe Cristianismo a paganismo ou para ser mals exato o Cristianismo correto romanolatino por urn lado e 0 paganismo e a heresia incluindo 0 Cristianismo grego e oriental por outro1 Em nome da Cruz e mais tarde da civilizalio a sociedade do Ocidente empenhase durante a Idade Media em guerras de colonizalio e expan sao E a despeito de toda a sua secularizalio 0 lema civilizaao conser va sempre urn eco da Cristandade Latina e das Cruzadas de cavaleiros e senhores feudals A lembrana de que a cavalaria e a fe romanolatina re presenta urna fase peculiar da sociedade ocidental urn estagio pelo qual passaram todos os grandes povos do Ocidente certamente nlio desapareceu o conceito de civilite adquiriu significado para 0 mundo Ocidental numa epoca em que a sociedade cavaleirosa e a unidade da Igreja Cat6li ca se esboroavam a encarnlio de urna sociedade que como estagio especifico da formalio dos costumes ocidentais ou civilizalio nlio foi menos importante do que a sociedade feudal que a precedeu 0 conceito de civilite tamblm constitui expresslio e simbolo de urna formalio social que enfeixava as mais variadas nacionalidades na qual como na Igreja uma lingua comum e falada inicialmente 0 Italiano e em seguida cada vez mais 0 frances Essas linguas assumem a funlio antes desempenhada pelo latim Traduzem a unidade da Europa e simultaneamente a nova forma lio social que the fornece a espinha dorsal a sociedade de corte A situa lio a autoimagem e as caracteristicas dessa sociedade encontram expres slio no conceito de civilite 68 o processo civilizador 2 Este conceito recebeu seu cunha e fun9ao especificos aqui discuti dos no segundo quartel do seculo XVI Seu ponto de partida individual pode ser determinado com exatidao Deve ele 0 significado espedfico ado tado pela sociedade a urn curto tratado de autoria de Erasmo de Rotter dam De civilitate morum puerilium Da civilidade em criamas que veio a luz em 1530 Esta obra evidentemente tratava de urn tema que estava maduro para discussao Teve imediatamente uma imensa circula9ao pas sando par sucessivas edi90es Ainda durante a vida de Erasmo islo e nos primeiros seis anos apos a publica9ao teve mais de 30 reedi90es2 No conjunto houve mais de 130 edi90es 13 das quais em data tao recente como a seculo XVIII Praticamente nao tern limites a numero de tradu 900s imita90es e seqUencias Dais anos apos a publica9ao do tratado apareceu sua primeira tradu9ao inglesa Em 1534 veio a lume sob a forma de catecismo e nesta ocasiao ja era adotado como livratexlo para educa 9ao de meninos Seguiramse tradu90es para a alemao e a tcheco Em 1537 1559 1569 e 1613 apareccu em frances com novas tradu90es todas as vezes Ja no seculo XVI urn tipo particular de familia de caracteres tipogni ficas frances reeebeu a nome civilite tirado da obra de Mathurin Cordier urn frances que combinava doutrinas colhidas no tratado de Erasmo com as de outro humanista Johannes Snlpicius E urn grupo inteira de livras direta au indiretamente influenciados pelo tratado de Erasmo surgiu sob a titulo Civilite au Civilite puerile E foram impressos ate fins do seculo XVIII nessa familia de caracteres tipograficos civilite3 3 Neste particular como ocorre com tanta freqUencia na historia das palavras e aconteceria mais tarde na evolu9aO do conceito de civilite para civilisation urn indivfduo serviu como instigador Com seu tratado Eras mo den nova nitidez e for9a a uma palavra muito antiga e comum civilitas Intencionalmente au nao ele obviamente expressou na palavra alga que atendia a uma necessidade social da epoca 0 conceito civilitas dai em diante ficou gravado na consciencia do povo com 0 sentido especial que recebeu no tratado de Erasmo Palavras correspondentes surgiram em va rias linguas a francesa civilite a inglesa civility a italiana civilitil e a ale rna Zivilitiit que reeonheeidamente nunca alcan90u a mesma extensao que as palavras correspondentes nas outras grandes cuHuras o aparecimento mais au menos subito de palavras em linguas quase sempre indica mudan9as na vida do proprio povo sobretudo quando os novas conceitos estao destinados a se tomarem fundamentais e de longa dura9ao como esses o proprio Erasmo talvez nao tenha atribuido no conjunto total de sua oeuvre qualquer importiincia especial ao seu curto tratado De civilitate morum puerilium Diz ele na introdu9ao que a arte de educar jovens envol ve vanas disciplinas mas que a civilitas morum e apenas uma delas e nao civilizariio como translormaiio do comportamento 69 nega que ela e crassissima phiosophiae pars a parte mais grosseira da fi losofia Este tratado revestese de uma importancia especial menos como fenameno au obra isolada do que como sintoma de mudann uma concre tizaao de processos sociais Acima de tudo e a sua ressonancia a eleva ao da palavratitulo a condiao de expressao fundamental de autointcr pretaao da sociedade europeia que nos chama a atenao para a tratado 4 a que aborda a tratado Seu terna deve nos explicar para que fim e em que sentido era necessario 0 novo conceito Deve canter indicatOcs das mudanas e processos sociais que puseram a palavra em moda a livro de Erasmo trata de urn assunto muito simples a comporta menta de pessoas em sociedade e acima de tudo embora nao exclu sivamente do decoro corporal externa E dedicadoa urn menino Dobre fiIho de principe e escrito para a educaao de crianas Contem reflexoes simples enunciadas com grande seriedade embora ao mesmo tempo com muita zombaria e ironia tudo isso em linguagem clara e polida e com in vejavel precisao Podese dizer que nenhum de seus sucessores jamais igua lou esse tratado em fora c1areza e carater pessoa Examinandoo mais detidamente percebemos par tras dele urn mundo e urn estilo de vida que em muitos aspectos para sermos exatos assemelhase muito ao nosso embora seja ainda bem remota em outros a tralado fala de atitudes que perdemos que alguns de nos chamariamos talvez de barbaras au inci vilizadas Fala de muitas coisas que desde entao se tornaram impublica veis e de muitas outras que hoje sao aceitas como naturais4 Erasmo fala par exemplo da maneira como as pessoas olham Em bora seus comentarios tenham par intentao instruir confirmam tambern a observaao direta e viva de que ele era capaz Sint oculi placidi vere cundi compositi diz ele non torvi quod est truculentiae nan vagiac volubiles quod est insaniae non limi quat est suspiciosorum et insidias mo letium E dificil traduzir isto sem uma grande alteraao de tom a olhar esbugalhado e sinal de estupidez a olhar fixo sinal de inercia 0 olhar dos que tern inclinaao para a ira e cortante demais e vivo e eloqUente 0 dos impudicos se seu olhar demonstra uma mente placida e afabilidade respei tosa isto e a melhor Nao por acaso que as antigos dizem os olhos sao o espelho da alma Animf sedem esse in oeutis A postura as gestos 0 vestmlrio as express6es faciais este com portamento externo de que cuida a tratado e a manifestaao do homem interior inteiro Erasmo sabe disso e vez par outra 0 declara explicita mente Embora este decoro corporal externo proceda de uma mente bern constituida nao obstante descobrimos as vezes que par falta de instruao essa graa falta em homens excelentes e cultas Nao deve haver meleca nas narinas diz ele mais adiante a campones enxuga 0 nariz no bone ou no casaco e a fabricante de salsichas no brao au no cotovelo Ninguem demonstra decoro usando a mao e em seguida 70 o processo civilizador enxugandoa na roupa mais decente pegar 0 catarro em urn pano pre ferivelmente se afastando dOll circunstantes Se quando 0 individuo se assoa com dois dedos alguma coisa cai no chao ele deve pisaIa imediatamente com 0 pe 0 mesmo se aplica ao escarro Com 0 mesmo infinito cuidado e naturalidade com que essas coisas sao ditas a mera men9ao das quais choca 0 homem civilizado de um estagio posterior mas de diferente forma9ao afetiva somos ensinados a como sentar ou curnprimentar alguem So descritos gestos que se toma ram estranhos para n6s como por exemplo ficar de pe sobre uma perna s6 E bern que caberia pensar que muitos dos movimentos estranhos de caminhantes e dan9arinos que vemos em pinturas ou estatuas medievais nao representam apenas 0 jeito do pintor ou escultor mas preservam tambem gestos e movimentos reais que se tornaram estranhos para n6s materializa90es de uma estrutura mental e emocional diferente Quanto mais estudamos 0 pequeno tratado mais claro se torna 0 quadro de uma sociedade com modos de comportamento em alguns aspec tos semelhantes aos nossos e tambem de muitas maneiras distantes Vemos por exemplo pessoas sentadas It mesa A dextris sit poculum et cultellus escarius rite purgatus ad laevam panis diz Erasmo 0 copo de pe e a faca bern limpa It direita e It esquerda 0 pao Assim e como deve ser posta a mesa A maioria das pessoas porta uma face e dal 0 preceito de mantela limpa Praticamente nao existem garfos e quando os ha sao para tirar carne de uma travessa Facas e colheres sao com freqiiencia usadas em COmum Nem sempre ha talheres especiais para todos se the oferecern alguma coisa liquida liz Erasmo provea e em seguida devolva a colher depois de tela secado Quando sao trazidos pratos de carne geralmente cada pessoa corta seu peda90 pegao com a mao e coloeao nos pratos se os houver ou na falta deles sobre urna grossa fatia de pao A palavra quadra usada por Eras mo pode significar claramente ou prato de metal ou fatia de pao Quidam ubi vix bene considerint mox manus in epulas conjiciuDt Algumas pessoas metem as maos Das travessas mal se sentam diz Erasmo Lobos e glutoes fazem isso Nao seja 0 primeiro a servirse da travessa que e trazida It mesa Deixe para camponeses enfiar os dedos no caldo Nao cutuque em volta da travessa mas pegue 0 primeiro peda90 que se apre sentar E da mesma maneira que demonstra falta de educa9ao cutucar todo o prato com a mao in orones platinae plagas manum mittere tam pouco e muito pouco polido girar 0 prato de servir para pegar a melhor POr9ao 0 que nao pode pegar com as maos pegue com a quadra Se alguem lhe passa urn peda90 de bolo ou torta com uma colher pegueo ou com sua quadra ou pegue a colher oferecida pODha 0 alimeDto na quadra e de volva a colher L civilitDfOO como IranormafQO do comportamento Conforme ja mencionado os pratos sao tambem raros Quadros mos trando cenas de mesa dessa epoca ou anterior sempre retratam 0 mesmo espetaculo estranho para n6s que e indicado no tratado de Erasmo A mesa e as vezes forrada com rico tecidos as vezes nao mas sempre sao poucas as coisas que nela M recipientes para beber saleiro facas colhe res e s6 As vezes vemos fatias de pao as quadrae que em frances sao chamadas de tranchoir ou tailoir Todos do rei e rainha ao campones e sua mulher comem com as maos Na classe alta ha maneiras mais refina das de fazer isso Devese lavar as maos antes de uma refeiao diz Eras mo Mas nao M ainda sabonete para esse fim Geralmente 0 conviva e tende as maos e 0 pajem derrama agua sobre elas A agua e as vezes leve mente perfumada com camomila ou rosmaninho Na boa sodedade nin guem poe ambas as maos na travessa e mais refinado usar apenas tres dedos de uma mao Est e urn dos sinais de distinao que separa a classe alta da baixa Os dedos ficam engordurados Digitos unctos vel ore praelingere vel ad tunicam extergere incivile est diz Erasmo Nao e polido lambelos ou enxugaIos no casaco Freqiientemente se oferece aos ouiros 0 copo ou todos bebem na caneca comum Mas Erasmo adverte Enxugue a boca antes Voce talvez queira oferecer a alguem de quem gosta a came que esta comendo Evile isso diz Erasmo Nao e muito decoroso oferecer a alguem alguma coia semimastigada E acrescenta Mergulhar no molho o pao que mordeu e comportarse como um campones e demonstra pouca eleganda retirar da boca a comida mastigada e recolocaIa na quadra Se nao conegue engolir 0 alimento virese discretamente e cuspao em algum ugar E repete born se a conveTSa interrompe ocasionalmente a refeiiio Algumas pessoas comem e bebem sem parar nao porque estejam com fome ou sede mas porque de outra maneira nao podem controlar seus movi mentos Tern que coar a caba esgaravatar os dentes gesticular com as maos brincar com a faca ou nao podem deixar de tossir fungar e cuspir Tudo isto realmente tern origem no embarao do rUstico e parece uma for ma de loucura Mas e tambem necessario e possvel a Erasmo dizer Nao exponha sem necessidade as partes a que a Natureza conferiu pudor Alguns re comendam diz ele que os meninos devem reter os ventos comprimindo a barriga Mas dessa maneira podese contrair uma doena E em outro trecho Reprimere sonitum quem natura fert ineptorum est qui plus tri buunt civilitati quam saluti Os tolos que valorizam mals a civilidade do que a saude reprimem sons naturais Nao tenha receio de vomitar se a isto obrigado pois nao e vomitar mas reter 0 vomito na garganta que e torpe 7Z o processo civilizadJr 5 Com grande cuidado Erasmo delimita em seu tratado toda a faixa de conduta humana as principais situa90es da vida social e de convivio Com a mesma naturalidade fala das questoes mais elementares e sutis das rela90es humanas No primeiro capitulo trata das condi90es decorosa e indecorosa de todo 0 corpo no segundo da cultura corporal nd tercei fa de maneiras nos lugares sagrados no quarto em banquetes no quinto em reunioes no sexto nos divertimentos e no setimo no quarto de dormir Na discussao dessa faixa de questoes Erasmo deu urn novo impulso ao conceito de civilitas Nem sempre pode nossa consciencia sem hesita9ao recordar essa outra fase de nossa pr6pria hist6ria Perdeuse para n6s a franqueza des preocupada com que Erasmo e seu tempo podiam discutir todas as areas da conduta humana Grande parte do que ele diz utlrapcassa nosso patamar de delicadeza Mas este e precisamente urn dos problemas que nos propomos a estu dar aqui Rastreando a transforma9ao de conceitos atraves dos quais dife rentes sociedades procuraram se expressar recuando do conceito de civi liza9ao para seu ancestral civilite descobrimonos de repente na pista do pr6prio processo civilizador da mudan9a concreta no comportamento que ocorreu no Ocidente E urn dos sintomas do processo civilizador e ser em bara90so para n6s falar ou mesmo ouvir muito do que Erasmo diz a maior ou menor desconforto que sentimos com pessoas que discutem ou mencio nam suas fun90escorporais mais abertamente que ocultam ou restringem essas fun90es menos que n6s e urn dos sentimentos dominantes no juizo de valor barbara ou incivilizado Tal entaD e a natureza do mal estar que nos causa a incivilizacao OU em termos mais precisos e menos valorativos 0 malestar ante uma diferente estrutura de em090es o diferente padrao de repugnancia ainda hoje encontrado em numerosas sociedades que chamamos de naoeivilizadas 0 0padrao de repugnancia que precedeu 0 nosso e e sua precondi9ao Surge entao a questao de saber como e por que a sociedade ocidental mOveuse realmente de urn padrao para outro como foi civilizada No estudo desse processo de civilizacao nao podemos deixar de sentir desconforto e embara90 born estarmos conscientes dele necessario peloo menos enquanto estudamos ess prE cesso tentar suspender todos os sentimentos de embara90 e superioridade tOOos Q juizos de valor e criticas associadas aos conceitos de civjljiado ou incivil Nosso tipo de comportamento evoluiu daquilo que chamamos de incivil Esses conceitos porem apreendem a mudan9a de forma exces No original como na traducao ha urn trocadilho com a obra de Freud que em portugues e conhecida como Malestar na civiJizQfllo RJR civiliza9QO como ransjorma9iio docomporameno I sivamente eshitica e grosseira Na verOade nossos termoschdlizadoe incivil nao constituem unia antitese do tipo existente entre 0 bem e 0 mal m representam sim fases em urn desenvolvimento que alem do I mis ainda continna E rbem possivel qne nosso estagio de civilizaao nosso comportamento venham despertar em nossos descendentes urn embarao semelhante ao que as vezes sentimos ante o comportamento de nossos an I cestraiS 0 comportamento social e a expressao de emooes passaram de uma forma e padrao que nao eram urn comeo que nao podiam em senti do absolnto e indiferenciado ser designados de incivil para 0 nosso que denotamos com a palavra civilizado E para compreender este ultimo temos que recuar no tempo ate aquilo de onde emergiu A civilizaao que estamos acostumados a considerar como uma posse que aparentemente nos chega pronta e acabada sem que perguntemos como viemos a possui la e urn processo ou parte de urn processo em que n6s mesmos estamos envolvidos Todas as caracteristicas distintivas que Ihe atribuimos a exis tencia de maquinaria descobertas cientificas formas de Estado ou 0 que quer que scja atestam a existencia de urna estrutura particular de rela oes humanas de uma estrutura social peculiar e de correspondentes for mas de comportamento Resta saber se a mudana em comportamento no processo social da civilizaao do homem pode ser compreendida pelo menos em fases isoladas e em seus aspectos elementares com qualquer grau de precisao Yi I II lU O If l Dos Costumes Medievais I No De civilitate morum puerilium de Erasmo de Rotterdam e dis cemivel urn tipo especial de comportamento social Mesmoaqui dificil mente se apliea a antitese simples de civiHzado e incivil o que houve antes de Erasmo Foi ele 0 primeiro a interessarse por esses assuntos De modo algum Questoes semelhantes ocuparam os homens da Idade Media da Antigiiidade grecoromana e sem duvida tambem de civiliza oes anteriores assemelhadas Este processo que nao teve fim pode ser remontado indefinidamente ao passado De onde quer que comecemos observamas movimento algo que aconteceu antes Limites precisam ser traados a uma indagaiio ro traspectiva preferivelmente correspondendo as fases do pr6prio processo 74 o processo civifizadoT L Aqui 0 padrao medieval deve ser suficiente como ponto de partida sem ser em si mesmo minuciosamente examinado de modo que 0 movimento a curva de desenvolvimento que 0 Iiga a era moderna possa ser seguida A Idade Media deixounos grande volume de informaOes sobre 0 que era considerado comportamento socialmente aceitavel Neste particular tamb6m preceitos sobre a conduta as refeioes tamb6m tinham importan cia muito especial Comer e heber nessa epoca ocupavam uma posiao muito mais central na vida social do que hoje quando propiciavam com freqUencia embora nem sempre 0 meio e a introduao as conver sas e ao convivio Religiosos cultos redigiam as vezes em latim normas de comporta mento que servem de testemunho do padrao vigente na sociedade Hugo de Sao Vitor falecido em 1141 em seu De institutione novitiarum es tuda estas entre outras questoes 0 judeu espanhol batizado Petrus Alphon si tratou delas em sua obra Disciplina clericalis em princfpios do seculo XII Joao de Garland dedicou aos costumes e em especial as maneiras II mesa parte dos 662 versos latinos que em 1241 apareceram sob 0 titulo Morale scolarium Alem dessas normas sobre comportamento discutidas pela sociedade re ligiosa de fala latina houve a partir do seculo XIII documentos corres pondentes nas varias Iinguas leigas e acima de tudo no inlcio proce dentes das cortes da nobreza guerreira As primeiras noticias sobre as maneiras que prevaleciam na alta classe secular sao sem duvida as que vern da Provena e da vizinha e cultural mente aparentada Italia 0 primeiro trabalho alemiio sobre a courtoisie e tambem de autoria de urn italiano Thomasin von Zirklaria e intitulado 0 Convidado Italiano Der wiilsche Gast traduzido por Ruckert para 0 alemiio moderno Oulra obra de Thomasin em italiano transmitenos em seu titulo alemiio uma forma antiga do conceito de cortesia Hoflichkeit Refereese ele a esse livro que se perdera como urn buoch von der hiifs cheit Originarios dos mesmos circulos da tradiao cavalariacorte sao os 50 Courtesies de autoria de Bonvicino da Riva e 0 Hozucht Maneiras Cor tesas atribuldo a Tannhauser Essas normas tambem ocasionalmente en contradas nos grandes poemas epicos da sociedade cavaleirosa como por exemplo 0 Roman de la Rose do seculo XIV 0 Book 0 Nurture escri to em versos ingleses provavelmente no seculo XV ja e urn compendio exaustivo de comportamento para 0 jovem nobre a servio de urn grande senhor como tambem mais resumidamente 0 The Babees Book7 Alem disso existe principalmente em versoes dos seculos XIV e XV mas provavelmente em parte pelo menos mais antiga em tema uma serie inteira de poemas chamados de mnemonicos a fim de inculcar boas manei civiJiiGfQo como translormaao do comportamento 5 ras a mesa Tischzuchten de variada extensao e nas mais diversas linguas A aprendizagem de cor como meio para educar ou condicionar IeSlmpe nha11a urnpapeL muito mais importante na sociedade medieval onde ls Iivros eram relalivamente raros e caros do que hoje eesses preceitos ri mados etam urn dos meios usados para gravar na mem6ria da pessoa 0 que eladevia e nao devia fazer em sociedade e acima de tudo a mesa 2 Esses Tischzuehten ou disciplinas a mesa como trabalhos medie vais sobre maneiras de autores conhecidos nao sao produtos individuais no sentido moderno registro das ideias singulares de determinada pessoa em uma sociedade extensamente individualizada a que nos chegou por escrito sao fragmentos de uma grande tradiao oral reflexos do que era realmente costumeiro nessa sociedade Esses fragmentos sao importantes exatamente porque descrevem nao 0 que era grande ou extraordimirio mas os aspectos lipicos da sociedade Ate mesmo puemas que sobreviveram sob urn nome especifico como 0 Hofzucht de Trannhauser ou 0 Book of Nur ture de John Russel nada mais sao do que versOes individuais de urn dos muitos elementos da tradiao correspondente a estrutura dessa sociedade as que os registraram nao foram os legisladores ou criadores de tais pre ceitos mas colecionadores compiladores das injunoes e tabus costumei ros na sociedade Por essa razao haja ou nao uma conexao Iiteraria pre ceitos semelhantes reaparecem em quase todos esses trabalhos Sao refle xos dos mesmos costumes testemunhos de urn dado elenco de formas de comportamento e emooes na vida da pr6pria sociedade Talvez seja possivel com urn exame mais atento descobrir certas di ferenas de costumes entre as diversas tradioes nacionais e as varjaoes nos padroes sociais Talvez 0 material revele tambem algumas mudanas na mesma tradiao Parece por exemplo que a substancia e talvez tam bern os costumes da sociedade passaram par certas mudanas nos seculos XIV e XV com a ascensao das guildas de oficios e de elementos burgue ses da mesma forma que em tempos modernos modelos de comporta mento originarios da aristocracia de corte foram adotados por circulos bur gueses Nao foi feito ainda nm estudo mais minucioso dessas modificaoes ocorridas no comportamento medieval Basta mencionalas aqui nao es quecendo que esse padrao medieval nao era destituido de movimento in terno e certamente nao foi 0 princfpio nem 0 primeiro degrau do pro cesso de civilizal3o nem representa como se afirmou algumas vezes 0 estagio de barbarismo ou primitividade Era urn padrao diferente do nosso se melhor ou pior nao vern ao caso E se em nossa recherche du temps perdu fomos levados de volla pas so a passo do seculo XVIII para 0 XVI e do XVI para as seculos XIII e XII isto nao implica que eSlejamos como ja alertamos antes na expecta IL 16 o processo civiUzador I tiva de encontrar 0 comeo do processo civilizador Sera tarefa mais do que suficiente para nossos fins atuais tentar a curta jomada da fase medieval para a primeira modema em uma tentativa de compreender 0 que real mente aconteceu aos seres hurnanos nessa transiao 3 0 padrao de born comportamento na Idade Media como todos os padroes depois estabelecidos erepresentado por urn conceito bern claro Atraves dele a classe alta secular da Idade Media ou pelo menos alguns de seus principais grupos deu expressao a sua autoimagem ao que em sua propria estimativa tornavaa excepcional 0 conceito que resumia a autoconsciencia aristocnitica e 0 comportamento socialmente aceillivel apa receu em frances como courtoisie em ingles como courtesy em italiano como cortezial juntamente com outros termos correlatos amiude em forma divergente Em alemao foi de igual maneira em diferentes versoes Mvel cheit ou hiibescheit e tambem zuht Todos essesconceitos se referem dire tamente e de modo muito mais claro que outros posteriores com ames rna funao a urn determinado lugar na sociedade Dizem f assim como as pessoas se comportam na corte Com esses termos certos grupos impor tantes do estrato secular superior 0 que nao significa a classe de cavaleiros como um todo mas principalmente os circulos cortesaos que gravitavam em torno dos grandes senhores feudais designavam 0 que os distinguia a seus proprios olhos isto e 0 codigo especifico de comportamento que surgiu inicialmente nas grandes cortes feudais e em seguida se disseminou por estratos mais amplos Este processo de diferenciaao contudo pode ser ignorado aqui Comparado com periodos posteriores a grande unifor midade nas boas e mas inaneiras aqui referida 0 que chamamos de uni dado padrao e impressionante Como e esse padriio 0 que desponta como comportamento tipico como 0 carater geral de seus preceitos Em primeiro lugar algo que em comparaao com epocas posteriores poderia ser chamado de sua simplicidade ou ingenuidade Sao menos nu merosas como alias em todas as sociedades em que as emo90es sao mani festadas mais violenta ou diretamente as nuanas psicologicas e as com plexidades no conjunto geral de ideias Ha amigos e inimigos desejo a aversao gente boa e rna Deveis seguir 0 exemplo de homens honrados e verter vaSSa ira sobre as maus Lemos isso em urna traduao alema do Disticho Catanis 0 codigo de comportamento de curso geral em toda a Idade Media sob a egide de Catao Ou em outro trecho Quando teus companheiros te irritarem filho meo cuidado para nao te enrai veceres tanto que lamentes teus atos depois 9 cjvjljzaao como lransormacao do comportamento No ato de comer tambem tudo e mais simples e sao menos restrin gidos os impulsos e inclinaOes Urn homern refinado nao deve fazer barulho de su com a colher quando estiver em boa companhia Esta ea maneira como Be comportam na corte pessoas que e entregam a hAbitos grosseiros o trecho acima foi extrafdo do HojzuchtO de Tannhiiuser A Hiibsche Leute gente fina e constitufda de nobres de pessoal da corte As normas do Hofzucht se destinam expressamente a classe superior aoscavaleiros que vivem na corte 0 comportamento nobre corles e constantemente comparado com as maneiras rudes a conduta dos camponeses Algumas pessoas rnordern 0 pao e em seguida grosseiramente mergulhamno Da travessa Pessoas refiDadas rejeitam essas MaDeiras rudes 11 Se deu uma mordida no pao nao 0 molhe novamente na travessa de usa comum Camponeses podem fazer isso mas nao gente fina Muitas pessoas rOem urn 0550 e depois recolocamno Da travessa e isto e uma falta grave 12 Nao jogue ossos roidos na travessa de uso comum Em outroS relatos descobrimos que era costumeiro jogalos no chao Outro preceito estabelece o homem que limpa pigarreando a garganta quando come e 0 que se assoa na toalha da mesa sao ambos maleducadosJ isto te garanto 13 Vejamos outro Se Lim homem a mesa limpa 0 nariz com a mao porque nao sabe como pro cederJ entao e urn idiota podes acreditar 14 Usaf a mao para limpar a nariz era caisa comum Nao existiam ainda lenos Mas a mesa certo cuidado devia ser tornado e de maneira alguma devia alguem assoarse na toalha Os comensais sao ainda advertidos para nao estalar os ibios nem bufar Se urn homem bufa como uma foca quando come como acontece com algumas pessoas e estaJa os beios como urn campones bavaro enHio ele renunciou a toda a boa educacao 15 Se 0 individuo tern que se coar nao deve fazelo com a mao mas usar 0 casaco Nao coces a garganta com a mao limpa enquanto estiveres comendo se tiveres que fazer isso fazeo polidamente com 0 casaco16 78 o procellO civiliVJdor Todos usavam as maos para tirar os alimentos da travessa comum Por essa razao nao deviam tocar nas orelhas nariz ou olhos NAo e decente enfiar Os dedos nos ouvidos au olhos como fazem algumas pessoas nem esgaravatar 0 oariz enquanto se come Esses tras bAbitas sio inde caralOs 17 As maos devem ser lavadas antes das refei6es Soubemos que alguns camern sern lav6las se verdade ista e urn mau sinal Que 08 seus dedos fiquem paralisadosl 18 No Ein spruch der ze tische kert Uma palavra aqueles a mesa outro Tischucht do qual 0 Hofzucht de Tannhiiuser apresenta muitos ecos recomendase que a pessoa coma com uma s6 mao e que se esta comendo com outra pessoa no mesmo prato 0ll fatia de pao como freqiientemente acontecia use a mao de fora Deves sempre comer com a mio de fora Se teu companheiro seRtase A tua direita come com 8 esquerda Abstemte de comer com smbu as mios 20 Se nao tern uma toalha lemos na mesma obra nao enxugue as maDS no casaco mas deixeas secar no ar21 au Toms cuidado para que qualquer que seja tU8 necessidade nio fiques rubori zado de embar8o 22 Tampouco constitui boas maneiras afrouxar 0 cinto a mesa23 Tudo isso e recomendado a adultos e nao apenas a crianas Em nossa opiniao essas normas parecem muito elementares para serem dadas a gente de classe superior mais elementares em muitos aspectos do que na atual fase de comportamento e geralmente aceito como habitual no estrato ruralcampones E 0 mesmo padrao surge com algumas varia6es na literatura cortes de outras areas lingiiisticas 4 No caso de uma dessas diferentes tradi6es que partindo de cer tas formas latinas desemboca principalmente no c6digo de maneiras fran ces mas talvez tamMm no italiano e no provenal uma compi1aao foi feita das regras que mais se repetem na maioria ou em todas as variantes24 Elas sao de maneira geral as mesmas encontradas no Tischzuchten ale mao Em primeiro lugar ha a instruao de dar graas que e encontrada tamMm em Tannhiiuser Uma vez ap6s outra encontramos advertencias para que cada urn ocupe 0 lugar que Ihe foi desiguado e nao toque a mesa no nariz e orelhas Nao ponha os cotovelos em cima da mesa dizem freqiientemente Mostre Urn rosto alegre Nao fale demais Sao freqiiente os lembretes para nao se coar ou cair vorazmente sobre os alimentos Nem deve 0 individuo pilr 0 que teve na bocade volta na travessa comum civilizafao como transormafao do comportamento 79 Este conselbo tambCm e repetido com freqiiencia Nao menos freqiiente e a instruao de lavar as maos antes de comer ou toear no saleiro com pedaos de comida A recomendaao seguinte tambem e repetida muitas ve zes nao limpe os dentes com a faca Niio cuspa em cima ou por cima da mesa Nao pa repeti9ao de urn prato que ja foi tirado da mesa Uma ins tru9ao comum e nao soltar gases a mesa Enxugue a boca antes de beber Nao faa pouco da comida nem diga coisa alguma que possa irritar os demais Nao Iimpe os dentes com a toalha da mesa Se molhou 0 piio no vinho bebao ou derrame 0 resto Nao ofere9a aos demais 0 resto de sua sopa ou do pao que ja mordeu Nao se assoe com barulho excessivo Nao adormea a mesa E assim por diante Indica90es do mesmo c6digo de boas e mas maneiras sao encontradas tambem em outras coletaneas de versos mnem6nicos semelhantes sobre etiqueta em tradi90es nao diretamente Iigadas a francesa que acabamos de mencionar Todos confirmam certo padrao de relaoes entre as pessoas a estrutura da sociedade e a psique medieval Siio sociogeneticas e psicoge neticas as similaridades entre essas coletlineas Pode haver embora nao necessariamente uma rela9ao Iiterana entre todos esses preceitos franceses ingleses italianos alemaes e latinos As diferenas entre eles sao menos importantes que seus aspectos comuns que correspondem a unidade do comportamento concreto na classe superior medieval quando comparada com 0 periodo moderno Para dar urn exemplo as Cortesias de Bonvicino da Riva urn dos guias de mesa mais pessoais e gra9as ao desenvolvimento da Italia mais Havanados contem a parte os preceitos mencionados na coletanea francesa instru90es para se virar quando se tosse e espirra e nao lamber os dedos A pessoa diz ele deve evitar pegar os melbores peda90s no prato e cortar sem excessos os peda90s de pao Nao deve toear a borda do capo comum com os dedos e seguralo com ambas as maos Neste tra balbo tambem a substlincia da courtoisie do padrao dos costumes e de modo geral a mesma E nao deixa de ser interessante notar que quando o Cortesias foi revisto tres seculos depois entre todas as regras dadas por Da Riva apenas duas sem muita importlincia foram alteradas 0 editor aconselha a nao tocar a borda do copo comum nem seguralo com ambas as maos e que se varias pessoas estiverem bebendo nele nao se deve nele molhar 0 pao Da Riva recomendava apenas que 0 vinho assim usado fosse derramado ou bebido25 Uma ideia semelhante pode ser formada a vista da tradi9aO alema o Tischzuhten do qual temos exemplares datados do seculo XV emprega urn tom algo mais rude do que 0 Convidado italiano de Thomasin von Zirkla ria ou 0 Hotzucht de Tannhiiuser 0 padrao de boas e mas maneiras po rem praticamente nao parece teT mudado muito Ia observamos que em urn dos manuais mais modemos que tem muito em comum Com os mais 80 o processo civilizadoT retirar garf como utensilio para que uma duzia de antigos ja mencionados surge uma nova recomenda9ao a de nao cuspir na mesa mas apenas sob ela au na parede E isto e interpretado como sin toma de deteriora9ao das maneiras Mas e mais questionavel se as coisas eram feitas de modo diferente no seculo precedente especialmente porque regras semelhantes oriundas de periodos anteriores sao transmitidas pela tradi9ao francesa E a que se pode derivar da literatura no sentido mais amplo e confirmado por quadros Neste particular igualmente sao neces sarios estudos mais detalhados Mas em compara9ao com epocas posterio res as quadros de pessoas a mesa mostram ate bem dentro do seculo XV pouquissimos utensilios mesmo que em alguns detalhes algumasmudan 9as tenham indubitavelmente ocorrido Nas casas dos mais ricos as pratos sao em geral tirados de urn aparador embora freqiientemente selli ne nhuma ordem especial Todos tiram au mandam tirar 0 que lhes agrada no momenta As pessoas se servem em travessas comuns Os s6lidos principalmente a carne sao pegados com a mao e os liquidos com con chas au colheres Mas sopas e molhos ainda sao freqiientemente bebidos levandose a boca as pratos au travessas Durante multo tempo alem disso nao houve utensflios especiais para diferentes alimentos Eram usadas as mesmas facas e colheres E tambem as mesmos copas Freqiientemente dais comensais comiam na mesma quadra Esta era se assim podemos dizer a tecnicapadrao de comer na Idade Media que corresponde a urn padrao muito especial de rela90es humanas e estrutura de sentimentos Nesse padrao conforme ja dissemos ocorreu grande numero de modifica90es e introdu9ao de nuances Se pessoas de diferentes categorias comiam ao mesmo tempo as de categoria mais alta tinham precedencia quando lavavam as maos par exemplo au quando se serviam de urn prato As formas dos utensHios variaram muito ao longo dos seculos Houve modas mas tambem uma tendencia muito clara para o conservantismo a despeito das flutua90es nelas A alta classe secular por exemplo adotava urn luxo extraordinario a mesa Nao era uma po breza de utensilios que mantinha a padrao mas simplesmente a fato de que nada mais fosse necessario Comer dessa maneira era considerado natural Era conveniente para essas pessoas Mas elas gostavam tamMm de ostentar riqueza e categoria pela opulencia dos utensilios e da deco ra9ao da mesa Nas mesas dos ricos do seculo XIII as colheres eram de ouro cristal coral ou ofita Ocasionalmente lemos que durante a Quaresma eram usadas facas com cabo de ebano e na Pascoa de marfim e incrustadas no Pentecoste As colheres de sopa sao redondas e bern planas de modo que a pessoa quando as usava era obrigada a abrir bern a boca Do seculo XIV em diante elas passaram a ser feitas em forma oval Ao fim da Idade Media 0 garfo surgiu alimentos da travessa comum Nada menos civilizaiio como translormiio do comportamenlo 81 o inventario mesa men de valor de Carlos V Ja em utensilios opulentos de sao encontrados entre os objetos de Carlos de Savoia muito rico dona urn tinieD garfo26 5 Freqiientemente se diz 0 quwto nos progredimos alem desse padrao embora em geral DaD fique bern claro quem e 0 nos com quem a pessoa se identifica nessas ocasioes como se merecesse parte do credito Mas 0 juizo oposto e tambem possivel 0 que realmente mudou Uns poucos costumes nada mais E alguns observadores parecem incli nados a julgar esses costumes mais ou menos da mesma maneira por que hoje julgariamos crianas Se urn homem de born senso tivesse dito a essas pessoas que seus costumes eram desagradaveis e antihigienicos se tivessem side ensinadas a comer com facas e garfos essas maneiras rudes teriam rapidamente desaparecido Mas nao se podem isolar as maneiras a mesa Elas sao Urn segmento e bern caracteristico da totalidade de formas socialmente instaladas de conduta Seu padrao corresponde a uma estrutura social bern definida o que resta aver e que estrutura e esta 0 comportamento das pessoas na Idade Media nao era menos rigidamente determinado pelo seu total de vida por toda estrutura da existencia como nosso proprio comportamento e codigo social sao para nos determinantes As vezes uma pequena frase mostra como esses costumes estavam enraizados e deixa claro que devem ser compreendidos nao apenas como alga negativo como ufalta de civilizagRo ou de conhecimento como e tao facil supor de nosso ponto de vista mas como algo que atendia as necessidades dessas pessoas e que Ihes pareciam importante e necessario para elas exatamente dessa forma No seculo XI urn doge de Veneza casouse com uma princesa grega No circulo bizanlino da princesa 0 garfo era evidentemente usado De qual quer modo sabemos que ela levava 0 alimento a boca usando urn pe queno garfo de ouro com dois dentes Z7 Este fato porem provocou urn horrivel esciindalo em Veneza Esta novidade foi considerada urn sinal tao exagerado de refinamento que a do garesa recebeu severas repreens6es dos eclesiasticos que invocaram para ela a ira divina Pouco depois ela foi acometida de uma doena repulsiva e Sao Boaventura nao hesitou em declarar que isto foi urn castigo de Deus Mais cinco seculos se passariam antes que a estrutura das rela6es hu manas mudasse 0 suficiente para que 0 uso desse utensilio atendesse a uma necessidade mais geral Do seculo XVI em diante pelo menos nas classes altas 0 garfo passou a ser usado como utensilio para comer chegando atra yes da Itlilia primeiramente a Frana e em seguida a Inglaterra e Alema nha depois de ter servido durante algum tempo apenas para relirar ali mentos solidos da travessa Henrique ITI introduziuo na Frana trazen i1 82 o processo civilizador l doo pravavelmente de Veneza Seus cortesaos nao foram pouco ridiculari zados por essa maheira afetada de comer e no prindpio nao eram mui to hlIbeis no usa do utensilio pelo menos se dizia que metade da comida caia do gada no caminho do prato a boca Em data tao recente como a se culo XVII a garfo era ainda basicamente artigo de luxo da classe alta geralmente feito de prata au aura 0 que achamos inteiramente natural porque fomos adaptados e condicionados a esse padrao social desde a mais teura infancia teve no inicio que ser lenta e laboriosamente adquirido e desenvolvido pela sociedade como urn todo Isto nao se aplica menos a uma coisa pequena e aparentemente insignificante como urn gada do que as formas de comportamento que nos parecem mais importantes28 Nao obstante a atitude que acabamos de descrever no tocante a ino Vll9ao do garfo demonstra alga com especial clareza As pessoas que co miam juntas na maneira costumeira na Idade Media pegando it carne com as dedos na mesma travessa bebendo vinho no mesmb calice tomando a sopa na mesma sopeira au prato fundo com todas as demais peculiarida des dos exemplos dados e dos que serao ainda apresentados essas pes soas tinham entre si relaaes diferentes das que hoje vivemos E isto envolve nao 86 0 nive de consciencia clara radonal pois sua vida ernc cional revestiase tambem de uma diferente estrutura e carater Suas emo aes eram condicionadas a formas de rela6es e conduta que em compa r9aO com as atuais padraes de condicionamento parecemnos embarao sas au pelo menos sem atrativos 0 que faltava nesSe mundo courtois au no mInima nao havia sido desenvolvido no mesmo gran era a parede invi sivel de emoaes que parece hoje se erguer entre urn corpo humano e ou tro repelindo e separando a parede que e freqiientemente perceptivel a mera aproximaao de alguma coisa que esteve em cantata com a boca au as maos de outra pessoa e que se manifesta como embarao a mera vista de muitas funoes corporais de outrem e nao raro a sua mera men9ao ou como urn sentimento de vergonha quando nossas proprias funaes sao ex pastas a vista de outros e em aDoluto apenas nessas ocasiaes III o Problema da Mudanla de Comportamento durante a Renascena I Seriam par acaso e1evados as patamares de embarao e vergonha a epoca de Erasmo Contem seu tratado indicaaes de que estavam se ob servando as fronteiras da sensibilidade e da reserva que as pessoas espe ravam entre si Nao ha boas razaes para supor que tenha sido assim Os tra r civilizafQO como transformaciio do camperamenta 83 L balhos de humanistas sobre maneiras formam uma especie de ponte entre as da Idade Media e os tempos modernos 0 tratado de Erasmo 0 ponto alto de uma serie de trabalbos humanistas sobre 0 assunto apresentava tamb6m essa dupla face Em muitos aspectos situase inteiramente na tra di9aO medieval Uma boa parte das regras e preceitos dos escritQs corteses reaparece em seu tratado Mas simultaneamente este anuncia com cla reza alguma coisa nova Nele desenvolvese gradualmente urn conceito que empurraria para 0 segundo plano oconceito de cortesia da cavalariafeuda Iismo No decorrer do seculo XVI 0 uso do conceito de courtoisie dimi nui lentamente na classe enquanto 0 de civilite tornase mais comum e fi nalmente assume a preponderancia pelo menos na Fran9a do seculo XVII Isto e sinal de uma mudan9a comportamental de grandes propor90es Nao ocorreu claro pela substitui9ao abrupta de urn ideal de born com portamento por outro radicalmente diferente 0 De civilitate morum pue rilium de Erasmo para Iimitar por ora a discussao a este trabalho situase em muitos aspectos conforme dito acima inteiramente na tradi 9aO medieval Nele praticamente reaparecem todas as regras da sociedade cortes Ainda se come carne com a mao mesmo que Erasmo enfatize que deve ser apanhada com tres dedos e nao com a mao toda t repetido ainda o preceito de nao cair como urn glutao sobre a comida bern como a re comenda9aO de lavar as maos antes de jantar e os anatemas contra escar rar assoarse 0 uso indevido da faca e muitos outros Erasmo quem sabe podia conhecer urn ou outro dos Tischzuchten rimados ou os escritos de sacerdotes que tratavam desses assuntos Muitos desses escritos circulavam amplamente e e improvavel que tenham escapado It sua aten9aO 0 que se pode demonstrar com mais clareza e sua rela9ao com a heran9a da anti guidade No caso desse tratado isto e visto em parte nos comentarios de seus contemporaneos e resta a ser examinado com mais detalhes seu Ingar na rica discussao humanista desses problemas de educa9ao e decoro Mas quaisquer quepossam ser as interconexoes litenirias de maior interesse neste contexto sao as sociogeneticas Com toda certeza Erasmo nao com pilou simplesmente esse tratado It vista de outros Iivros Tal como todos os que refletem sabre essas questoes ele tinha diante dos olhos urn c6digo social especial urn padrao especial de maneiras Este tratado e na verda de uma coletanea de observa90es feitas na vida e na sOciedade fl como disse alguem mais tarde urn pouco do trabalho de todo mundo E se nada mais seu sucesso sua fapida disseminal80 e seu emprego como ma nual educativo para meninos mostram ate que ponto atendia a uma neees sidade social e como registrava os modelos de comportamento para os quais estavam maduros as tempos e que a sociedade ou mais exata mente a classe alta em primeiro lugar exigia 2 A sociedade estava em transi98o 0 mcsmo acontecia com as maneiras Ate mesmo no tom na maneira de ver sentimos que a despeito 84 o processo civilizador de todo seu apego a Idade Media alguma coisa nova estava a caminho A simplicidade como a experimentamos a oposiao simples entre born e man e entre compassivo e cruel haviam se perdido As pessoas encaravam as caisas com mais diferenciacao ista e COm urn contrale mais forte de SUas em6es Nao sao tanto ou pelo menos nao exclusivamente as proprias regras au as maneiras a que se referem que distinguem uma parte dos escritos humanistas acima de tudo 0 tratado de Erasmo dos codigos corteses Mas em primeiro lugar seu tom sua maneira de ver As mesmas regras sociais que na Idade Media eram transmitidas impessoalmente de boca em boca sao nesse momento referidas a maneira e coma enfase de alguem que nao esta apenas passando adiante a Iradiao nao importando quantos escritos medievais e acima de tudo antigas possa ter absorvido mas que observou tudo isso pessoalmente que regiSlra experiencia Mesmo que isso nao fosse visto no proprio De dvilitate morum pueri lium isto saberiamos a vista de escritos anteriores de Erasmo nos quais a fusao da tradiao medieval e antiga Com sua propria experiencia se ex pressa talvez mais clara e diretamente Nos seus Co6quios obra que cer tamente se abeBerou em parte em modelos antigos acima de tudo Lu ciano e especialmente no dialogo Diversoria BasBeia 1523 Erasmo des creve experiencias que sao retomadas e ampliadas em seu tratado posterior Diversoria trata das diferenas entre as maneiras observadas em esta lagens alemas e francesas Descreve por exemplo a interior de uma esta lagem alema cerca de 80 ou 90 pessoas estao sentadas salientando a au tor que nao sao apenas pessoas comuns mas tambem homens ricas no bres homens mulheres e crianas todos juntos E cada urn esta fazenda a que julga necessaria Urn lava as roupas e pendura as peas molhadas em cima do forno Outra lava as maos Mas a tigela e tao limpa diz a au tor que a pessoa precisa de outra para se limpar da agua forte a cheiro de alho e outros adores desagradaveis Pessoas escarram par toda a parte Alguem esta limpando as botas em cima da mesa Em seguida a refelao e trazida Todos molham 0 pao na travessa mordem e molham no ovamente 0 lugar e sujo e ruim 0 vinho Se alguem pede vinho me lhor a estalajadeira responde Ja hospedei muitos nobres e condes Se a vinho naD lhe serve procure outras acomodac6es o estranho que chega ao pais enfrenta tempos especialmente dificeis Os outros olhamno fixamente como se ele fosse urn animal fabuloso vin do da Africa Alem do mais essas pessoas reconhecem como seres huma nos apenas os nobres de seu proprio pais A sala esta quente demais todos suam molhamse e se enxugam Ha sem duvida entre elas alguns que tern alguma doena oculta Prova velmente diz 0 autor Ua maioria sofre da doena espanhola e por isso nao devem inspirar menos medo que os leprosos civilizariio como Iransformiio do comportamenlo 8S Gente valente diz 0 outro IIbrincam e nao se importam com coisa alguma Mas essa valentia ja custou muitas vidas 0 que devem eles fazer Estao acostumados a isso e urn homem corajoso nio se arrufna com seus habitos 3 Vemos que Erasmo como outros autores que antes e depois dele escreveram sobre conduta e acima detudo urn compilador de boas ou mas maneiras que encontra na pr6pria vida social E e principalmente isto que explica 0 acordo e as divergencias entre esses autores Que seus trabalhos nlio contenham tanto quanto outros a que habitualmente dedi camos mais atenao as ideias extraordimirias de urn individuo notavel que sejam forados por seu pr6prio tema a se concentrarem estreitamente na realidade social e 0 que Ihes confere a importancia que tern como fontes de informa6es sobre processos sociais As observa6es de Eramo sobre esle assunto devem apesar de tudo ser incluidas juntamente com algumas de outros autores da mesma epoca entre as exc6es a tradiao dos Irabalhos sobre maneiras Isto porque nelas a apresentaao de preceitos e regras parcialmente muito antigos esta impregnada de urn temperamento muito particular E isto e precisamente por outro lado urn sinal dos tempos uma expressao da transformaao da sociedade urn sintoma do que ja e enganosamente chamado de indi vidualizalio E indica tamMm outra coisa 0 problema do comportamento na sociedade evidentemente assumiu tal importancia nesse periodo que mesmo pessoas de extraordinario talento e renome nlio desdenham tratar do mesmo Mais tarde essa tarefa volta de modo geral a mentes de se gundo e terceiro calibre que imitam continuam ampliam dando mais uma vet origem a uma tradilio mais impessoal ainda que nao tao forte mente como na Idade Media de Iivros sobre maneiras As transi6es sociais vinculadas a mudanas na conduta maneiras e sentimentos de embarao serlio estudadas em separado mais tarde Nao obs tante uma indicaao das mesmas e necessaria aqui para compreendermos a posiao de Erasmo e por conseguinte seu estilo de comentar maneiras o tratado de Erasmo surge em uma epoca de reagrupamento social e a expressao de urn frutifero penodo de transiao ap6s 0 afrouxamento da hierarquia social medieval e antes da estabilizaao da moderna Perten ce a uma fase em que a velha nobreza de cavaleiros feudais estava ainda em declinio enquanto se encontrava em formaao a nova aristocracia das cortes absolutistas Esta situalio deu entre outros a representantes da pequena c1asse intelectual secularburguesa e assim a Erasmo nao apenas oportunidade de elevarse socialmente obter renome e autoridade mas tambem a possibilidade de usar a franqueza e imparcialidade que nao esli veram presentes no mesmo grau nem antes nem depois Esta oporlunidade de distanciarse que permitiu a representantes individuais da classe inte 86 o prOCe880 civilizador lectual nao se identificarem total e incondicionalmente com quaisquer gru pas sociais do mundo em que viviam embora claro sempre permane cessem mais pr6ximos de urn deles encontrou tambem expressiio em De Civilirate morum puerilium Erasmo de modo algum iguora ou oculta as disparidades sociais Percebe com grande exatidao que os autenticos viveiros do que sao consideradas boas maneiras em sua epoca sao as cortes principescas Diz por exemplo ao jovem principe a quem dedica 0 trata do Encaminharei vossa juventudepara as maneiras apropriadas a urn menino nao porque preciseis grandemente desses preceitos desde a primei ra infancia fostes educado entre gente da corte e desde cedo tivestes urn excelente instrutor ou porque tudo 0 que se diz neste tratado a v6s se aplique pois sois de sangue principesco e nascido para govemar Mas manifesta tambem de forma bern pronunciada a autoconfiana caracteristica do intelectual que subiu graas 11 cultura e a seus escritos que e legitimado por seus livras a confiana em si mesmo de Um membro da classe humanista que pode manter distancia ate mesmo dos estratos governantes e de Suas opinioes por mais vinculado a eles que possa estar A modestia acima de tudo assenta bern no menina diz ele ao fim da dedicat6ria ao jovem principe e especialmente ao menino nobre E acres centa Que outros pintem leoes aguias e outras criaturas em suas cotas darmas Nobreza mais autentica e possuida por aqueles que podem gravar em seus escudos tudo 0 que conseguirarn pelo cultivo das artes e das ciencias Esta e a linguagem a autoimagem tipica do intelectual nessa fase do desenvolvimento social A semelhana sociogenetica e psicogenetica dessas ideias com as da classe intelectual alema do seculo XVIII que foi resumi da para ela em conceilos como Kultur e Bildung tornase imediatamente visive No periodo que se seguiu imediatamente ao tempo de Erasmo po rem poucas pessoas teriam tido a confiana ou mesmo a oportunidade social de expressar abertamente esses pensamentos em uma dedicat6ria a urn nobre Com a crescente estabilizaao da hierarquia social urn pronun ciamento desses teria sido cada vez mais considerado como falta de tato e talvez mesmo como ofensa A observancia mais exata no comportamen to das diferenas em posiao tomaCse dai em diante a essencia da cortesia o requisito basico da civilite pelo menos na Frana A aristocracia e a intel ligentsia burguesa convivem mas e urn imperativo do tato observar as dic ferenas sociais e lhes dar expressao inequivoca na conduta socia Na Ale manha em contraste sempre houve do tempo dos humanistas em diante uma intelligentsia burguesa cnjos membras com poucas exc6es viveram mais ou menDs longe da sociedade aristocratica de corte uma elite intelec tual de carater especificamente classe media 4 A evoluao das obras alemas sobre maneiras ea forma como essa literatura difere da francesa priporciona inu1eras ilustraoes deste fato dvilizaijo como transformatiio do comporlamento 87 L N6s nos alongariamos demais se fossemos esludar islo em detalhe mas precisamos pensar apenas em urn trabalho como 0 Grobianus30 de Dede kind e ua amplamente circulada e influente traduao alema de autoria de Kaspar Scheidt para nolar a diferena Em loda a Iileratura grobianisch a1ema na qual temperada com zombaria e desdem encontra expressao uma necessidade muito seria de suaviz39ao de maneiras mastra inequivoca mente e com maior pureza do que qualquer das tradioes correspondentes de oulras nacionalidades 0 cariter especificamente c1asse media de seus eseritores que incluem religiosos e meslresescola protestantes E 0 caso e parecido na maior parte do que se escreveu na Alemanha sobre maneiras e etiqueta Nao ha duvida de que as maneiras que aqui servem de modelo slio principalmente as que se observam nas corles Mas desde que as mu ralhas sociais entre a burguesia e a nobreza corlesa sao relativamente altas os autores burgueses de livros posleriores sobre maneiras geralmente as expoem como alguma coisa eslranha que tern que ser aprendida porque e assim que as coisas sao feitas na corte Por mais conhecedores do assunto que esses autores possam ser falam dele como eslranhos nao raro com uma visivel falla de jeilo E urn estrato social relativamenle confinado re gional e pobre que escreve na Alemanha no perfodo seguinte e em espe cial ap6s a Guerra dos Trinta Anos E s6 na segunda melade do seculo XVIII quando a intelligentsia burguesa alema como uma especie de van guarda da burguesia comercial consegue novas oportunidades de progresso social e mais liberdade de movimenlo e que ouvimos novamente a Ifngua e a manifestaao de uma autoimagem semelhanle i dos humanistas em especial de Erasmo Mesmo nesse instanle contudo dificilmenle se e que a1guma vez se diz aberlamente aos nobres que seus brasoes valem menos que 0 cultivo das artes liberales mesmo que islo seja com grande freqiien cia 0 que se tern em mente o que foi mostrado no capilulo introdul6rio sobre 0 movimenlo de fins do seculo XVIII remete a uma tradiao multo mais antiga a uma caracterfstica estrulural geral da sociedade alema decorrenle do crescimen to tao vigoroso das cidades e da c1asse burguesa perto do lim da Idade Media Na Frana e esporadicamente na Inglalerra e llalia cerIa propor ao de escritores burgue acha que pertence aoS Cfrculos da aristocracia Na Alemanha ista acontece muito menos Nos outros palses os autares nao s6 escrevem principalmente para os circulos das aristocracias das cortes mas se identificam tambern em muito com suas maneiras costumes e opi nioes Na Alemanha e multo mais fraca considerada menos natural e muito mais rara essa idenlificaao dos membros da intelligentsia com a alta c1asse de corte A posiao duvid9sa que ocupam junlamenle com ertas decon fiana daqueles que C legitimam principalmente em virtude de suas ma neiras cortesia ou desenvoltura no comportamento e parte de uma longa 88 o proctsso civilizador Iradiao especialmente porque os valores da aristocracia alema de corte que se decompoe em numerosos circulos mais ou menos amplos nao e unificada em uma usociedade grande e central e alem disso e burocra tizada desde cedo nao podem ser desenvolvidos tao plenamente como nos paises ocidentais Em vez 9isso surge aqui mais nitidamente do que nesses paises urn cisma entre a tradiao culturalburocratica baseada na universidade da Kultur de classe media por urn lado e a tradiao bu rocraticomilitar nao menos burocratizada da nobreza por oUlro 5 0 tratado de Erasmo sobre maneiras teve influencia tanto na A1e manha e Inglaterra como na Frana e Italia 0 que Iiga sua atitude a da intelligentsia alema posterior e a falta de identifjcaao com a classe alta de corte e sna observaao de que 0 estudo da civilidade e sem duvida erassissima philosophiae indica urna escala de valores que nao deixava de ter certo parentesco com a avaliaao feita na tradiao alema da Zivilisa tion e Kultur Em conseqiiencia Erasmo nao ve seus preceitos como dirigidos a uma classe particular Nao atribui enfase especial a distinoes sociais se igno ramos a critica ocasional a camponeses e pequenos negociantes e preci samente essa falta de orientaao social especifica nos preceitos sua apre sentaao como regras humanas gerais que Ihe distingue 0 tratado dos que o sucederam na tradiiio italiana e especialmente francesa Erasmo diz simplesmente por exemplo Incessus nee fractus sit nec praeceps 0 passo nem deve ser demasiado lento nem demasiado nipido Pouco depois no Galatea 0 italiano Giovanni Della Casa afirma a mesma coisa Cap VI 5 Parte III Mas para ele 0 mesmo preceito tern uma funiio direta e 6bvia como meio de distiniio social Non dee Ihuomo nobile correre per via ne troppo affretarsi che cio conviene a palafreniere e non a gentilhuomo Ne percio si dee andare si lento ne si conregnoso COme femmina 0 Come sposa 0 Dobre oao deve correr como urn lacaio nem andar tiio vagarosamente como mulheres ou noivas caracteristico e concorda com todas as nossas demais observaoes que uma traduao alemii do Galatea uma ediao em cinco idiomas de 1609 Genebra procura invariavelmente como a traduao latina e aD contrario de todas as outras apagar as diferenciaoes sociais contidas no original 0 trecho acima citado por exemplo e traduzido da seguinte maneira Por conse guinte urn oobre ou qualquer Dutro homem de hanra DaD deve correr na rua ou apressarse demais uma vez que isto e pr6prio de lacaio e nao de cavalheiro Nem deve andar lentamente demais como se fosse uma majestosa matrona ou uma jovem noiva p 562 As palavras homem de honra sao inseridas aqui possivelmcnte como referencia aos conselheiros burgueses Mudanas semelhantes sao en contradas em muitos outros trechos Ao passo que 0 italiano diz simples civiizaiio como transformafiio do comporlamenlo 89 L mente gentilhuomo e 0 frances gentilhomme 0 alemao fala de homem virtuoso e honrado e 0 Iatirn em homo honestus et bene moratus Estes exemplos poderiam ser mUltiplicados Erasmo continua a escrever na mesma veia Como resultado os pre eeitos que farnece sem quaisquer caracteristicas saciais reaparecem varias vezes nas tradioes italiana e francesa Com limitaoes mais nitidas 11 classe alta ao passo que na Alemanha a tendencia de obliterar as caracterfsticas sociais permanece mesmo que durante longo perfodo quase nenhum escri tor atinja 0 grau de imparcialidade social demonstrado por Erasmo Neste aspecto ele ocupa uma posiiio sem igual entre todos os que escrevem sobre 0 assunto E ela tem origem em seu carater pessoal Mas ao mesmo tempo transcende 0 carater pessoal e aponta para essa fase relativamente curta de relaxamento entre duas grandes pocas caracterizadas por hierar quias sociais mais inflexlveis A fecundidade dessa situaao transit6ria de afrouxamento percepti vel uma vez ap6s outra na maneira como Erasmo observa as pessoas Ela Ihe permite criticar os aspectos rusticos vulgares ou grosseiros sem aceitar incondicionalmente como fez depois a maioria 0 comportamen to dos grandes senhores cujo circulo era em ultima analise como ele mesmo diz 0 viveiro da conduta refinada Ele percebe com clareza a na tureza exagerada forada de muitos costumes da corte e nao tern receio de dizer isso Falando da maneira de cerrar os labios por exemplo diz Eo ainda menos elegante contrair os labios de tempos em tempos como se assoviando para si mesmo Isto pode ser deixado aos grandes senhores quando passeiam entre a multidao Ou quando diz Deves deixar a uns poucos cortesaos 0 prazer de apertar 0 piio na mao e em seguida partilo com os dedas Deves sim cortaIo decentemente com uma faca 6 Aqui mais uma vez vernos COm grande clareza a diferena entre esta e a maneira medieval de dar instruoes sobre comportamento Ante riormente diziase as pcssoas apenas para dar urn exemplo Corta e naD rompas 0 pac 31 Essas regras sao tiradas diretamente da experiencia de Erasmo e da obscrvaao Os preceitos tradicionais espelho de costumes sempre repetidos graas a suas observaoes como que despertam de urn antigo sono Por exempo uma velha regra dizia Nao caia vorazmente sobre a comida Nao coma pao antes de ser lIervidB a comida pais isto pareceria voracidade Lembrelle de esvBziar e enxugar a boca antes de beber 32 Erasmo da 0 mesmo conselho mas ao fazeIo ve pessoas bern a sua frente algumas diz devoram em vez de comer como se estivessem prestes a serem levadas para a prisao ou fossem ladroes se fartando do produto da pithagem Outros poem tanta comida na boca que as bochechas 90 o processo civilizador T Se enchem como foles Outros ainda arreganham as dentes quando cameO e assim produzem ruidos como se fossem porcos E seguese a regra geral que foi e obviamente tinha que seT repetida muitas vezes Ore plena vel bibere vel loqui nee honestum nee tutum Comer au beber com a boca cheia nem e elegante nem seguro Em tudo isto alem da tradiao medieval hi par certo muito que re troage a Antiguidade Mas ler agua a visao ever enriquece a leilura e a escrita o vestuario diz ele a certa altura e em certa sentido 0 corpo do corp0 Dele podemos deduzir a atitude da alma E da exemplos de que maneira de vestir corresponde a esla ou aquela condiao espiritual Este e 0 primordio de urn tipo de observaao que mais tarde sera chamado de psicoI6gica 0 novo estagio da cortesia e sua representaao sumariados no conceito de civilite esta estreitamente vinculado a essa maneira de ver e aDS pOlleos isto se acentua ainda mais A fim de ser realmente cortes segundo os padroes da civiliti 0 indivfduo e ate certo ponto obrigado a observar a olhar em volta e prestar atenao as pessoas e aos seus motivos Nisto tambern anunciase uma nova relaao entre urn homem e outro uma nova forma de integraao Nem bern passados 150 anos quando a civiliti se tomara uma forma estavel e firme de comportamento na alta classe francesa de corte no lrWnde urn de seus membros comea sua exposiao da science du monde com as seguintes palavras Pareceme que para adquirir 0 que e denominado de ciencia do mundo 0 indivfduo tern em primeiro lugar de procurar conhe cer os homens como eles sao em geral e em seguida obter conhecimento particular daqueles com quem tern que conviver isto e conhecimento de suas incinaoes e boas e mas opinioes de suas virtudes e de seus de feitas 33 a que e dito nesse trecho com grande precisao e lucidez foi anteci pado per Erasmo Mas esta tendencia cada vez mais geral da sociedade e por conseguinte dos escritores de igar 0 particular ao geral nao so lendo mas iambem vendo e encontrada nao apenas em Erasmo mas tamMm em ivros de outros renascentistas sobre maneiras e certamente nao apenas neles 7 Se nos perguntam por conseguinte sobre as novas tendencias 34 que fazem seu aparecimento no estilo erasmiano de observar 0 comporta mento de pessoas respondemos que esta e uma delas No processo de transformacao e inovaao que designamos peto termo Renascen9a 0 que era considerado como apropriado e uimpr6prio nas re1acoes humanas sem duvida mudou em certa medida Mas a raptura nao foi marcada por uma subita exigencia de novos estilos de comportamento opostos aos an tigos A tradiao de courtoisie e mantida em muitos aspectos pela sociedade civilitarQO como Iransormarao do comporameno 91 1 que adota 0 conceito de civilitas como no Civilitas morum puerilium para indicar born comportamento social A tendencia cada vez maior das pessoas a se observarem e aos demais e urn dos sinais de que tOOa a questlio do comportamento estava nessa ocasilio assumindo urn novo caraler as pessoas se moldavam as outras mais deliberadamenle do que na Idad Media Diziase a e1as faam islo nlio faa aquilo Mas de modo geral muita coisa era tolerada Durante seculos aproximadamente as mesmas regras elementares segundo nossos padroes foram repetidas obviamente sem criar babitos firmes Neste momento a situalio muda Aumenta a coalio exer cida por urna pessoa sobre a outra e a exigencia de born comportamen to e colocada mais enfaticamente Todos os problemas Iigados a com portarnento assumem nova importancia 0 fato de que Erasmo tenha reu nido em urn trabalho em prosa regras de conduta que haviam sido trans mitidas principalmente em versos mnemonicos ou espalhadas em lralados sobre oUlros assuntos e que tenha pela primeira vez dedicado urn Iivro inteiro a questlio do comportamento em sociedade e nlio apenas a mesa e urn claro sinal da crescente importancia do tema como tambem 0 foi 0 sucesso do Iivro3 E 0 aparecimento de trabalhos semelhantes como 0 Cortesiio de Castiglione ou o Galatea de Della Casa para citar apenas os mais conhecidos aponta na mesma direlio Os processos sociais subja centes ja foram indicados e serlio discutidos adiante em mais detalhes os velhos laos sociais estlio se nlio quebrados pelo menos muito frouxos e em processo de transformalio Individuos de diferentes origens sociais slio reunidos de cambulhada Acelerase a circulalio social de grupos e indivi duos que sobem e deseem na sociedade Em seguida lentamente durante 0 seculo XVImais cedo aqui mais tarde ali e em quase toda a parte com nurnerosos reveses ate bern dentro do seculo XVII uma hierarquia social mais rigida coma a se firmar mais urna vez e de elementos de origens sociais diversas formase uma nova classe superior uma nova aristocracia Exatamente por esta razaq 3 ques tlio de born comportamento uniforme tornase cada vez mais candente es pecialmente porque a estrutura alterada da nova classe alta expoe cada individuo de seus membros em uma extenslio sem precedentes as pressoes dos demais e do controle social E e neste contexto que surgem os traba lhos de Erasmo Castiglione Della Casa e outros autores sobre as boas ma neiras Foradas a viver de uma nova maneira em sociedade as pessoas tornamse mais sensfveis as pressoes das outras Nao bruscamente mas bern devagar 0 c6digo de comportamento tomaSo mais rigoroso e aumenta o grau de consideralio esperado dos demais 0 senso do que fazer e nlio fazer para nlio ofender ou ehoear os outros tornase mais sutil e em con junto com as novas relaoes de poder 0 imperativo social de nao ofender os semelhantes toniase mais estrito em comparalio com a fase precedente o processQ civiliador As regras de courtoisie prescreviam tambem Nada diga que p08sa provocar conflito ou irritar os outros Non dicas verbum cuiquam quot ei sit acerbum 36 Seja urn born companheir de mesa Espera meu filho comportate com boas maneiras Quando a mesa te sentares para a tua refeicio Em cada agrupamento e em cada companhia Vai disposto a ser Hio sociAvel Que os homens falem de ti de modo elogioso Pois podes bern crer por tua conduta Que irio condenarte ou louvarte Isto e 0 que lemos no Book of Curtesye 37 ingles Em termos pura mente factuais muito do que Erasmo diz apresenta a mesma tendencia Mas sao inconfundiveis a mudanca de tom 0 aumento da sensibilidade a observacao humana mais apurada e a compreensao mais clara do que esta acontecendo E estes sao sobremodo evidentes em sua observacao que en contramos ao fim do tratado Nesse ponto Erasmo abandona 0 modelo fixo do born comportamento juntamente com a arrogancia que geral mente 0 acompanba e volta a relacionar a conduta com uma humanidade mais abrangente Seja tolerante com as ofensas dos demais Esta e a prin cipal virtude da dvilitas da cortesia Urn companbeiro nao lbe deve ser menos querido porque tern piores maneiras Hli pessoas que compensam a rusticidlde de seu comportamento com outros talentos E mais adiante acrescenta Se urn de seus camaradas inadvertidamente 0 ofende diga Ihe isso a s6s e bondosamente Isto e civilidade Mas esta atitude apenas manifesta mais uma vez 0 quao pouco Eras mo a despeito de toda sua estreita ligacao com a aristocracia de corte de sua epoca identificase com ela mantendo tambem distancia do c6digo que ela observa Galatea extrai seu nome de uma historieta na qual 0 preceito de Eras mo Oigalhe isso a s6s e bondosamente aplicase na realidade Uma ofen sa e corrigida exatamente dessa maneira Mas neste caso 0 carater de corte desses costumes e enfatizado e visto como evidente a bispo de Verona relata 0 trabalho italianoas reeebe certo dia a vi sita do duque Ricardo Ele parece ao bispo e 11 sua corte urn gentilissime cavaliere e di belIissime maniere 0 anfitrilio observa em sen visitante uma linica falta Mas nada diz A partida do duque 0 bispo ordena a um ho mem de sua corte Galateo que 0 acompanhe Galateo tem maneiras ex tremamente finas adquiridas nas cortes dos grandes molto havea de suoi di usato aIle corti de gran Signori Isto e explicitamente enfatizado 1 civilizariio como transformariio do comportamento 93 ste Galateo em conseqiiencia acompanha 0 duque Ricardo durant parte do caminho e Ihe diz antes de se despedir Seu senhor 0 bispo gas taria de dar ao duque urn presente de despedida 0 bispo nunca em tada sua vida vira urn nobre com maneiras mais refinadas que 0 duque Des cobrira nele uma unica falta estala os Iiibios alto demais quando come produzindo urn ruido desagradavel para os demais InformaIo desta res triao e 0 presente de despedida do bispo que ele implora nao seja mal recebido A regra de nao estalar os labios quando se come e tambem encontra da COm freqiiencia em instru6es medievais Sua ocorrencia no inicio do Iivro porem mostra claramente 0 que mudou Demonstra nao s6 quanta importancia e nesse momenta atribwda ao bom comportamento mas acima de tudo COInO aumentou a pressao que as pessoas exercem recipro camente umas sobre as outras Tornase imediatamente claro que esta ma neira polida extremamente gentil e relativamente atenciosa de corrigir al guem sobretudo quando exercida por urn superior e urn meio muito mais forte de controle social muito mais eficaz para nculcar habitos duradou dos do que 0 insulto a zombaria ou ameaa de violencia fisica Nos diversos paises formamse sociedades pacificadas 0 velho c6digo de comportamento e transformado mas apenas de maneira muito gradual o controle social no entanto tornase mais imperativo E acima de tudo lentamente muda a natureza e 0 mecanismo do controle das emo6es Na Idade Media 0 padrao de boas e mas maneiras a despeito de todas as disparidades regionais e sociais evidentemente nao mudou de qualquer for ma decisiva Repetidamente ao longo dos seculos as mesmas boas e mas maneiras sao mencionadas 0 c6digo social s6 conseguiu consolidar babi tos duradouros numa quantidade limitada de pessoas Nesse momento com a transforrnaao estrutural da sociedade com 0 novo modelo de Tela6es humanas ocorre devagar uma mudana aumenta a compulsao de policiar o proprio comportamento Em conjunto com isto e posto em movimento o modelo de comportamento o Book ot Curtesye de Caxton provavelmente de fins do seculo XV ja da inequivoca expressao a essa impressao de que habitos costumes e regras de conduta se acham em estado de f1uidez39 Coisas outrora usadas sio postas de lado agora E novas artes diariamente se inventam Em condiao alguma os atos dos homens permanecem Sao mutliveis e se alteram COm freqiiencia Coisas jli permitidas agora sao reprovadas E depois disto hao de exattarse coisas A que hoje se atribui apenas urn baixo pr 94 o ppcesso civilitador J Isto parece na verdade urn lema de todo 0 movimento que esta ocor rendo Thingis somtyme alowed is now repreuid 0 sCeulo XVI perma nece ainda inteiramente dentro da transi9ao asmo e seus contempora neos ainda podem falar sobre coisas fun90es modos de se comportar que urn ou dois sCeulos depois sao acompanhados de sentimentos de vergonha e embara90 e cuja menao ou exibi9ao em publico sao proscritas pela so ciedade Com a mesma simplicidade e clareza com que ele e Della Casa discutem questoes tais como maior tato e decoro Erasmo diz tambem Nao se mova para frente e para tras na cadeira Quem faz isso speciem habet subinde ventris flatum emittentis ant emittere conantis da a im presao de constantemente soltar ou tentar soltar ventosidades intestinais Isto mostra ainda a velha despreoeupa9ao na referencia a fuu90es corpo rais que era caracteristica das gentes da Idade Media embora enriquecida pela observa9ao pela considera9ao ao que os outros podem pensar Co mentarios desse tipo sao feitos com grande freqiincia o exame do comportamento humano no sCeuio XVI e de seu c6digo de conduta lan9a 0 observador de urn lado para outro entre impressOes do tipo Isto ainda e inteiramente medieval e f exatamente assim que nos nos sentimos hoje E e exatamente essa aparente contradi9ao que cor responde sem duvida a realidade As pessoas dessa epoca possuem dupla face Encontramse em uma ponte Conduta e c6digo de conduta estao em movimento mas 0 movimento e muito lento E adma de tudo ao obser var urn unico estagio ficamos sem urn criterio seguro de aferi9ao 0 que e flutua9ao acidental Quando e onde alguma coisa esta progredindo Quando alguma coisa esta caindo em desuso Corresponde realmente a uma mudan9a numa dirC9ao definida Esta a sociedade europeia sob a egide da palavra civiite movendose aos poucos para aquele tipo de com portamento refinado aquele padrao de conduta habitos e controle de emogoes que em nossa mente e caracteristico de sociedade ucivilizada de civilizaao ocidental 8 Nao e tarefa das mais faceis tornar esse movimento bern visivel sobretudo porque ele ocone com grande lentidao em passos bern pe quenos por assim dizer e porque nele acontecem tambem multiplas fluU89oes seguindo curvas mais curtas ou mais longas evidente que nao basta estudar isoladamente cada unica fase a qual esta ou aquela de clara9ao sobre costumes e maneiras se refere Temos que tentar enfoear o pr6prio movimento ou pelo menos urn grande segmento dele como urn todo como se acelerado Imagens devem ser postas juntas em uma serie a fim de nos proporcionar uma visao geral de urn aspecto particular do processo que se desenrola a transforma9ao gradual de comportamento e em090es 0 patamar que se alarga da aversao Os livros sobre boas maneiras oferecemnos uma oportunidade neste particular No toeante a aspectos isolados do comportamento humano em civiizariio como tramlormariio do comportamento 95 especial dos habitos a mesa eles nos fomecem informa6es detaThadas sempre sobre 0 mesmo aspecto da vida social que se estendem mais ou menos sem interrupao mesmo que elas ocorram a intervalos fortuitos de pelo menos 0 seculo XIII aos seculos XIX e XX Neste caso as ima gens podem ser vistas em serie e tornados vislveis segmentos do processo totaL E lalvez seja uma vantagem e nao a contrario que modos de com portamento de urn tipo relativamente simples e elementar sejam observa dos nos quais e relativamente pequeno 0 escopo para variaao individual Esses Tischzuchten e livros sabre boas maneiras constituem urn ge nero literario em si Se a herana escrita do passado e examinada princi palmentc do ponto de vista do que estamos acostumados a chamar de Uimportancia liteniria enHio a maior parte deles nao tern valor Mas se analisamos os modos de comportamento que em todas as idades cada socledade esperou de seus membros tentando condicionaIos a eles se desejamos observar mudanas de habitos regras e tabus sociais entao essas instrUl6es sabre comportamento correto embora talvez sem valor como literatura adquirem especial importancia Lanam alguma luz sbre elemen tos do processo social em re1aao aos quais s6 possulmos pelo menos no que se refere ao passado pouqulssimas informa6es diretas Mostramnos com exatidao a que estamos procurando isto e 0 padrao de habitos e comportamento a que a sociedade em uma dada epoca procurou acos tumar 0 individuo Esses poemas e tratados sao em si mesmo instrumentos diretos de ucondicionamento ou modelaaO40 de adapta9aO do indivi duo a esses modos de comportamento que a estrutura e situaao da socie dade onde vive tornam necessarios E mostram ao mesma tempo atraves do que censuram e elogiam a divergencia entre a que era considerado em epocas diferentes maneiras boas e mas IV Do Comportamento it Mesa parte I Exemptos a Exemplos que representam 0 comportamenlo da c1asse alta em forma razoavelmente pura i II 96 Seculo XIII o processo civiirador A J Vejamos 0 poema de Tannhiiuser sobre as maneiras corteses 1 Considero homem bern educado aquele que sempre pratiea boas maneiras e nunea se MOstra grasseiro 2 Hci muitas rarmas de boas maneiras e elas servem a muitos bons fins 0 homem que as adata nunca erra 25 Quando comes DaO esquelas as pobres Deus te recompensanl se os tratares bondQsamente 33 Urn homem refinado nao deve arrotar oa cather quando acompanhado E assim que se comportam pessoas oa corte que praticam rna conduta 31 NaG e polido beber no prato embora alguns que aprovam esse grasseira habito insolentemente levantem 0 prato e 0 sorvam como se Cassero loucos 41 Os que cacm sobre os pratos como 8uinos quando cameroJ bufando re pugnantemente e estalando Os 14bios No verso 25 Cf com a primeira regra de Bonvicino da Riva A primeira e esta quando a mesa pensa primeiro nos pobres enos necessitados De Ein spruch der ze tische kert Uma palavra aqueles a mesa42 313 Nilo deves beber no prato Com uma cother e correto 315 Os que se levantam e ungam repugnantemente sobre os pratos como se fossem suinos pertencem it classe dos animais do campo 319 BuCar como urn salmao comer voraz e rUidosamente como urn texugo e queixarse enquanto come eis tres coisas inteiramente indecorosas ou Em Cortesias de Bonvicino da Riva Nao arrotes quando estiveres comendo com uma cother Isto e urn habito bestial ou Em The Book of Nurture and School of Good Manners 43 201 E nao sorvas ruidosamente a tua sopa Em momento algum em toda a tua vida t c il cjvjljtaao como transformiio do comportamento 97 4S A18ums pessoas mordem urn peda de pio e em seguida mergulhamno grosseiramente no prato Pessoas refinadas rejeitam essas mAs maneiras 49 Algumas pessoas roem 0 osso e recolocamno oa travessa Isto e uma grave fllta de eduCBl80 53 Os que gostam de mostarda e sal devem ter 0 cuidado de evitar 0 suja hAbito de neles pOr os dedos 57 0 homem que limpa a garganta pigarreando quando come e 0 que se assoa na toalha da mess sio ambos maleducados isto vOs garanto 65 0 homem que quer falar e comer ao mesmo tempoJ e fala no sono nunca descansara tranqiiitamente 69 Nao sejas barulhento A mesa como algumas pessoas sio Lembraivos meus amigos que coisa alguma e tao grosseira 81 Considero maneiras ssimas alguem com a boca cheia de comida e que bebe ao mesmo tempo como se fosse urn animal No verso 45 Cf Ein spruch der ze tische kert 346 Que as pessoas refinadas sejam poupadas daqueles que roem os ossas e os recolocam na travessa ou De Quisquis es in mensa Para aqueles a mesa44 Urns porlao que foi provada nao deve ser devolvida ao prato de servir No verso 65 Cf Slans puer in mensam 0 menina a mesa45 22 Numquan ridebis nee faberis ore repleto lamais rias ou converses com a boca cheia No verso 81 Cf Quisquis es in mensa 15 Qui vult potare debet prius os vacuare Se queres beber em primeiro lugar esvazia a boca ou De The Babees Book 149 E de modo algum bebas com a boca cheia 98 o processo civilizador 8S Nio deves soprar sua bebida como alguns gostam de fazer Isto 6 urn abito grossciro que deve au evitado 94 Antes de beber eoxug8 a boca para nio sujar a bebida Este ato de cor lesia deve scr observado em todas as ocasi6es 105 B rna educaiio inclinarse sobre a mesa quando Be come como tamMm conservar 0 capacete quando se serve senhara 109 Nao coces 0 pescoCo com a mao nua quando estiveres eomenda Se ti veres que razer issa usa educadamente 0 easaCO 113 E e mais decoroso cocatse assim do que sujar a mio Os presentes nOlam quem se comporta dessa maneira 117 Nao limpes os dentes com a ponta da laea como fazem algumas pesao8S Isto e urn mau habita 125 Se alguem esla acostumado a arrouxar 0 cinto a mesa acredita quando digo que ele nio 6 urn verdadeiro corteslo 129 Se urn homem a mesa limpa 0 nariz com a mio e nio sabe que nio deve Cazer 100 entao acredita ele 6 urn idiota No verso 85 Ct com The Book of Curtesye4Il Ill Niio sopres tua bebida ou toa comida Nero para esCriAIas nem para aquece18s No verso 94 Ct The Babees Book 1SS Quando beberes enxuga a boca com urn pano ou De Coneoonce de table Guia de comportamento 11 mesa7 Nao babes enquanto hebes porque isto 6 urn hAbito vergonhoso No verso 105 Cf The Babees Book Nem sejas visto debrurado sobre a mesa No verso 117 Ct Stans puer in mensam48 30 Mensa cuUeHo dentes mundare caveto Evita a mesa limpar os dentes com a faca civili109Qo como Ironsjormofiio do comporlamenlo 99 141 Ouvi dizer que alguns comem sem lavar as maos se isto e verdade e urn mau sinal Que seus dedos fiquem paraliticos 157 Nao e educado enfiar as dedos nas orelhas au nos olhos como fazem algumas pessoas ou introduzilos no nariz Quando estiveres comendo Esses tres habitos sao feios B Seculo XV De Sensuivent Ies conenances de Ia table Estas sao boas maneiras a mesa49 I Aprende estas regras II Toma 0 cuidado de limpar e cortar as unhas Sujeira sob as unhas tomase pe rigoso quando a pessoa se COfJa III Lava as maos quando te levantas e antes de todas as refeicoes XII Nilo sejas 0 primeiro a se servir de urn prato XIII Nilo reponhas em seu prato 0 que esteve em tua boca No verso 141 Cf Stans pue in mensam 11 IIlotis manibus escas ne sumpseris unquam Nunea pegues comida com maos que nao foram lavadas No verso 157 Cf Quisquis es in mensa 9 Non tangas autes nudis digitis neque nares Nao toques as orelhas ou as narinas com as dedos nus Esta pequena seleao de trechos foi compilada ap6s urn curto exame de varios guias de comportamento a mesa e na corte Esta lange de ser exaus tiva A intenlio e apenas a de dar ao leitor uma ideia de como eram semelhantes em tom e substancia essas regras em diferentes tradiiies e di ferentes paises da Idade Media 109 o processo civiliador XIV Nao ofereeas a ninguem urn pedaco que ja mordeste XV Nao mastigues nada que vais teT que cuspir novamente XVII E rna educacao salgar comida no saleiro XXIV A mesa mantemte tranqiiilo calado e cortes XXVI Se partiste pao dentro de seu copo de vinho bebe 0 vinho ou jogao fora XXXI Nao te cmpanzines ou seras obrigado a cometer uma quebra de boas maneiras XXXIV Nao te coces a mesa cOm as maos ou com a toalha c II 1530 De De civilitate morum puerilium Da civilidade em meninosl de Erasrno de Rotterdam Cap 4 Se urn guardanapo e fornecido ponhao sobre 0 ambro esquerdo ou no braco Se esta scotada com pessoas de categoria tire 0 Chapell e cuide para que o cabelo esteja bern penteado Seu clilice e faca devidamente limpos devem ficar a direita 0 pao a es querda Algumas pessoas levam as maos aD prato de servir logo que se scotam Lobos fazem isso Nao seja 0 primeiro a tocar 0 prato que foi trazido nao s6 porque isto demonstra gua mas tambem porque e perigoso Isto porque alguem que poe sem saber a1guma coisa quente Da boca tern ou de cuspila ou se a engolir vai queirnar a garganta Em ambos Os casos ele se torna tao ridfculo como digno de pena E urna boa eoisa esperar urn poueo antes de comer de modo a que a menino se acosturne a controlar suas inc1inac6es E grosseira enfiar as dedos no molho Deve tirar 0 que quer corn faca C garfo Nao deve procurar em todo 0 prato a melhor parte como fazero os epi euristas mas pegue 0 que por aeaso estiver a sua frente Se the afereeem alguma caisa liquida provea e devolva a calher mas antes sequea em seu guardanapo civilizaiio como translormaiio do comportamento 101 l feio lamber dedos gordurosos ou seeAlos no easaeo Melhor e usar a toalha da mesa ou 0 guardanapo D 1558 De Galateo de Giovanni della Casa arcebispo de Benevenlo cila9ao ex lraida daedi9ao em cinco idiomas Genebra 1609 p 68 o que voce pensa que estc Bispo e sua nobre corte i Vescove e a sua nobile brigaa teriam dito daquelcs que vernos as vezes caidos como poreos com seus focinhos na sopa sem erguer a cabeca e virar as olhos e ainda menos as maos da cornida resfoIegando com as bochechas como se estivessem soprando uma trompa au abanando urn fogo nao comendo mas se empanzinando sujan do os bracos ate quase as cotovelos e dcpois reduzindo seus guardanapos a urn estado que faria urn trapo de cozinha parecer limpo Nao obstante esses pareas nao tern vergonha de usar os guardanapos assim emporcalhados para enxugar a suor 0 qual devido a maneira voraz e exees siva como camero freqiicntcmente lhes escorre da testa e rosto para 0 pescoco e mesmo assoar neles 0 oariz como fazem muitas vezes E 1560 De uma Civilit de C Calviac 50 copiado quase servilmenle de Erasmo mas com alguns comenlarios independenles Quando a crianca se senta se hOllver urn guardanapo no prato a sua frente pegaloa eo coloeara no braco esquerdo ou rio ombro Em seguida colocara o pao a esquerda e a faca a direita juntamente com 0 copo se desejar dei xalo na mesa e Se isto puder ser feito convenientemente sem incomodar nin guem Porque pode aconteCer que 0 capo nao possa ser deixado a esquerda ou a direita oa mesa sem atrapalhar alguern A crianea precisa ter discernimento para cornpreeoder as necessidades da situaeao em que se encontra Ao comer deve pegar a primeira poreao ao alcance da mao na tabua de cortaro Se houver molhos deve rnergulhar decorosamente neles 0 pedaco sem vi ralo depois de molhaIo urn lado E de grande necessidade que a crianea aprenda desde cedo a trinchar uma perna de carneiro uma perdiz urn coelho e coisas 8ssim E grosseiro demais para urna crianea oferecer a alguem algum Ossa que ja roeu ou algo que nao queira comer a menos que de a seu servifal grio do autor Tampouco e decoroso que tire da boca alguma coisa que ja mastigou e a coloque na tabua de cortar a menos que seja urn pequeno ossa do qual jA sugou o tutano para passar 0 tempo enquanto esperava a sobremesa Ap6s sugaIo devee colocaIo no seu prato onde deve pOr tambm os caroeos de cereja arneixas e frutas assim urna vez que nao fica bern enaoHlos ou cuspiIos no chao A crianea nao deve rocr indecorosamente ossas como fazem os caes 102 o processO civiizaduf Quando qise servirse de sal deve pegalo com a ponta da raca e nao com tres dedos A criaca deve cortar a came em pedacos bern pequenos em sua tabuR de cortar e nao deve levar a carne a boca ora com uma mao ora com outra como pequenas criancas que esUio aprendendo a comer mas fazelo sempre com a mao direita pegando 0 paa e a carne decentemente com apenas tfes dedas Quanto a maneira de mastigar ela varia conforme 0 pais Os alemaes mas tigaro com a boca fechada e acham feio proceder de outra forma Os franceses pdT outro lado deixam a boca meio aberta e achamo jeito dos alernaes muito suja Os italianos agem de maneira muito indolente e as franceses mais ruido samente achando a maneira italiana delicada e pretensiosa demais E assim cada naao apresenta alguma coisa pr6pria diferente das demais A criana em vista disso deve proceder de acordo com os cOstumes do lugar onde estA Alem disso os atemaes usam colheres quando tomam sopa au tudo 0 que e liquido e os italianos garfos Os franceses usam urn ou outro conforme lhes parece apropriado e mais conveniente Os italianos preferem em geral que haja uma faca paracada pessoa Os alemaes porem atribuem urna importancia especial a isto a ponto de ficarem muito aborrecidos se atguem pede ou lsa uma faca na frente deles 0 sistema frances e inteiramente diferente a mesa inteira cheia de pessoas usa apenas duas OU tres facas sem criar caso quando alguem pede ou usa uma faca pr6pria ou a cede a outrem se a possui De modo que se alguem pedirIhe a faca a crianra deve passa1a depois de limpAla no seu guardanapo segurandoa pela ponta e oferecendo 0 caboa pessoa que a pede porque de outfa maneira nao seria delicado F 1 I Entre 1640 e 1680 De uma caniio de autoria do marques de Coulanges 5 No passado as pessoas comiam em urn prato comum e enfiavam 0 pao e as dedos no molho Hoje todos comern com colher e garfo em seu pr6prio prato e urn criado lava de vez em quando as talheres no buflet G 1672 De Nouveau tTaite de dvilite de Antoine de Courtin pp 127 273 Se lodos estao se servindo do mesmo prato evite por nele a mao antes que 0 lenham leito as pessoas de mais alta categoriaJ e trate de tirar 0 alimento ape nas da parte do prato que esta a sua frente Ainda menos deve pegar as me thores por6es mesmo que aconteea voce ser a ultimo a se servir Cabe observar ainda que voce sempre deve limpar a cather quando de pais de usaIa quiser tirar alguma coisa de outro prato havendo pessoas taO delicadas que nao querem tomar 0 sopa no qual mergulhou a coher depols de a ter levado a boca Griro do autor E ainda mais se est1s a mesa de pessoas refinadas nao e suficiente en xugar a colher Nao deves usaIa mais e sim pedir outra Alem disso em mui tos lugares colheres sao trazidas com os pratos e estas servem apenas para lirar a sopo e os molhos Grifo do autor civiliZQfOO como translormao do comporamento 103 Voce nAa deve tomar a sopa Da sopeira mas coloc41a no seu prato fun do Se ela estiver guente derosia indelicado soprar cada colherada Deve es pelal at que cstric Se tiver a infelicidade de queimar a boca deve Buportar isla pacientemente se puder sem demonstrar mas se a queimadura for insuportlivel como At vezes acontece deve antes que os outros nOlem pegsr seu prato imediatamente com ua mAo e ledIo A boca eJ enquanto cobee a boca com 8 outla mAo devolver 80 prato 0 que tern Da boca e rapidamente passAlo 80 lacaio atrAs de sua ca deira A civilidade requer que vou seja polido mas Ilio espera que cometa auicidio E muito indelicado tocar qualquer coisa gordurosa melha ou xarape etc com Os dedos A parte 0 fato de que 0 obriga a coroetcr maia dois ou tres atos indelicados Urn deles seria freqiientemente limpar a mio no guarda napo e sujAIo como Be fosse urn trape de cozinha de modo que as pessoas que o vissem enxugar abaca com eles se sentissem nauseadas Outro seria limpsr os dedos no pia 0 que mais urns vez 6 sumamente grosseiro 0 terceiro seria lambelos 0 que constitui 0 auge da indedncia Como hA muitos Icostumes que jA niudaram nio duvido que vrios destes mudario tambem no futuro Antigamente a pessoa podia mothar a pao no mOlho contallto apenas que na a tivesse mordida ainda Hoje isto seria uma mostra de rusticidade Antigamente a pessoa podia tirar da boca 0 Que nao podia comer e jo glo no chio contanto que 0 fizesse habilmente Hoje isto seria sumamente repugnante H 1717 De De a science du monde et des connoissances utiles a la conduite de a vie pp 97 101 Na Alemanha enos Reinos do Norte e cortes e decente a principe beber pri melro A saude daqueles que recehe e em seguida oferecerIhea 0 menno copo ou cAlice geralmente cheio do mesmo vinho Nem 6 falta de polidez entre eles beber nC mesmo capo mas sinal de Ihane7A e amizade A mulher tamm hebe inicialrnente e em seguida passa seu copo ou Manda que seja levado a pessoa a quem quer homenagear com 0 mesmo vinho que bebeu a sua saude sem que slo seja considerado como um favor especial como e entre nOs IGrifo do autor Nao posso aprovar responde uma senhora sem ofeosa para os cavatheirQs do norte esta maneira de beber no mesmo capo e ainda menos beber 0 que as senhoras deixaram Isto revestese de urn ar de impropriedade que me faz desejar que dcmonstrassem outros sinais de sua Ihaneza b Exemplos de livros que como 0 Les Regles de la bienseance et de I a civilite chretienne de La Salle representam a dissemina9iio de maneiras e modelos cortesiios por estratos mais amplos da burguesia ou como 0 Exem plo I refletem com grande fidelidade apenas 0 padriio burgues e provavel mente provincillno dos seus tempos o processo civiliudor No Exempl0 I que data mais ou menos de 1714 pessoas ainda se servem de urn prato comum Nada se diz sobre pegar a carne que se tern no pr6prio prato com as maos E as maneiras grosseiras mencionadas de sapareeeram quase inteiramente da classe alta A CiviliM de 1780 Exemplo L e urn pequeno livro de 48 paginas impressa em Caen em pessiroos tipos civilite mas sem data 0 catalogo do Museu Britanico mencionao com urn ponto de interrogaao no lugar da data De qualquer modo e urn exempl0 do grande numero de livros ou panfletos baratos sobre civilite que se espalharam por tada Frana no seculo XVIII Este a julgar pelo tom geral dirigiase claramente a mora dores de pequenas cidades das provincias Em nenhuma outra obra do seculo XVIII sobre civilite citada aqui as fun6es corporais sao discutidas COm maior franqueza 0 padrao que 0 livro prop6e lembra em muitos aspec tos 0 que 0 De civilitate de Erasmo atribuiu iI classe alta Constitui ainda coisa natural pegar a comida com as maos Este exemplo pareceunos uti aqui para complementar outras transcri6es e sobretudo para lembrar ao leitor que 0 movimento deve or estudado em toda a sua polifonia de muitas camadas naD como lm1a linha mas como uma esp6cie de fuga com uma sucessao de movimentosmotifssemelhantes em niveis diferentes o Exemplo M de i 786 mostra com grande clareza a disseminaao dos costumes de cima para baixo E muito caracterlstico porque contern grande numero de costumes que foram subseqiientemente adotados pela sociedade civilizada como urn todo mas sao aqui meridianamente visfveis como cos tumes especilicos da classe alta de corte que parecem ainda relativamente estranhos a burguesia Muitos costumes permaneceram como civilizados exatamente na forma que se apresentam nesse trabalho como maneiras cortesas A citaao de 1859 Exemplo N dstinasea lembrar ao leitor que no secwo XIX como hoje todo 0 movimento ja fora inteiramente esquecido que 0 padrao de civilizaao que na realidade fora adotado apenas em data bern recente era aceito como natural sendo 0 que 0 precedera consi derado como barbaro I 1714 De uma anonima Civilite frantaise Liege 17147 p 48 Nao e educado beber a sopa do prato a menos que voce esteia no seio de sua pr6pria famnia e apenas nesta ocasiao se tomon a maior parte com a colher Hoje se trata da British Library que deixou de ser a biblioteca do Museu Bri tanico para se tornar instituicao aut6noma RJR civiljtaiio como transformao do comportamento lOS Se a sopa vern numa sopeira comurn na sua vez pegue um pouca sem precipitaAo Nao conserve sempre a faca na mao como fazem camponeses mas pe auea apenas quando deta precisar Quando estiver sendo servido de rne nao 6 elegante pegaRla com a miio Deve pegar a prato com a mio esquerda enquanto segura a garfo au a faca com a direita E contra 0 decoro dar a came a pessoas para que a cheirem e nao deve em hip6ese algoma devolver a came ao prato comum so a cheirou Se tira came do prato comum nio escolha as melhores pors Corte com a faca mantendo im6vel 8 came no prato com 0 garfo que usarA para pOr em seu prato 0 pedaco que cortou Nio toque por conseguinte Da came com a mao nada 6 dito aqui a respeito de tocar com da a came que ia estA no proprio prato Nao jogue no chao ossos cascas de ovos ou casca de qualquer fruta o mesmo se aplica a C8rOos de frutas E mais educado tiralos da boca com dais dedos do que cuspilos Da mAo J 1729 De Lea Regles de la bjensance et de la civjlit chrtjenne de La Salle Rouen 1729 p 87 De Cosas a Serem Uaadas a Mesa pedaco com a primeiro com urn antos de rlimpalos A mesa vael deve usar guardanapo prato faca cother e garfo Seria inteira mente contr4rio 60 born tom dispensar urn desses utensilios l reteieRo Cabe A pessoa de mais alta posicao no grupo desdobrar primeiro seu guarda napo e os demais devem esperar at6 que ele 0 faca antes de abrirem as seus Quando as pessoas sao aproximadamente iguais todas devem desdobratos juntas aem cerim6nia NB Com a democfatizacao da sociedade e da famnia isto Ie tomou a regra A estrutura social neste caso ainda do tipo hiedrquico aristocr4tico reOetese na mais elementar das retacoes humanas E errado usar 0 guardanapo para enxugar 0 rosto e mais ainda Iimpar os dentes com ele e seria uma das mais graves infrac6es da civili4ade usato para seassoar 0 emprego que pode e deve dar ao guardanapo e de enxu gar a boca labios e dedos quando estiverem engordurados limpar a faca antes de cortar 0 pao e fazer 0 mesmo com a cother e 0 garfo depois de usalos NB Bste 6 urn dos muitos exemptos do extraordinario controle do comporta menta concretizados em nossos habitos a mesa 0 emprego de cada utensrtio 6 limitado e definido por grande numero de regras bern precisas Nenhuma deJas e evidente por si mesma como pareceram a geracOes posteriores Seu usa foi desenvoJvido aos poucos em conjunto com a estrutura e mudancas nas rela 6es humanas Quando os dedos estao engordurados limpeos de pao que deve set deixado em seguida no prato guardanapo a fim de nio sujaIo muito Quando a coJher a garfo au a faca ostio BUjOS au engordurados 6 muito errado lambelos e nao 6 educado IimpdIos ou qualquer outra coisa na toalha 106 o processo civilizador da mesa Nestas e em ocasi6es semelhantes use 0 guardanapo e no tocantc A toalha deve ter 0 cuidado de mantcIa scropre limpa e nela nao derramar agua vinho OU qualquer caisa que possa manchaIa Quando 0 prato esta suja de maDeira alguma raspeo com a cather a faea para limpalo nem limpeo ou 0 fundo de qualquer Dutro prato com os dedos isla e muito grasseiro Ou DaD dee toealos OU se liver oportunidade dt troclllos deve pedic Dutro A mesa nao conserve 0 tempo todo a faca A mao Basta pegaIa quando dela precisar E tambem muito grosseiro pOe urn pedao de pao oa boca enquanta segura a faca com a mio e 0 corta E ainda mais fazer isso com a ponta da faca o mesmo procedimento deve seT observado quando se comero maas piras e algumas outras frutas NB Exemplos de tabus relativos a lacas e contra o born tom segurar a faca ou a colher com tada mio como se fosseuI11 porrete segureas sempre com os dedos Nao use 0 garfo para levar Hquidos a boca a calher e 0 utensilio indi cado para esse fim E sempre educado Usar 0 garfo para levar came a boca pois 0 born tom niio permite que se toque com os dedos quaquer coisa gordurosa grifo do autor nem tamlem molhas ou xaropes Se alguem faz isso nio pade deixar de cometer depois varias incivilidades tais como limpar freqUentemente os dedos no guarda napa 0 que 0 tornaria muito sujo ou no pio 0 que seria muito indelicado au ainda lamber os dedos 0 que nao e permitido a pessoas refinadas bern nascidas Toda esta passagem como varias outras foi extraida do Nouveau traire de A de Courlin 1672 Cf Exemplo G acima Ela reaparece lambem em outras obras do seculo XVIII sobre a civilidade A razao dada para a proi biao de comer com os dedos e muito instrutiva Em Courtin igualmente ela se aplica inicialmente apeuas a dedos engordurados especialmente com mollio desde que isto provoca atos que Sao desagradaveis de observar Em La Salle isto nao e inteiramente compativel com 0 que e1e diz em outro trecho Se seus dedos estao engordurados etc A proibiao nao e nem de longe tao autoevidente como hoje Vemos como aos poucos transforma sc em urn habito internalizado em parte do autocontrole No critico periodo do fim do reinado de Luis XV no qual conformc mostramos antes 0 anseio de reforma e intensificado COmo sinal externo das mudanas sociais e 0 conceito de civilizaao galga 0 primeiro plano a Civilire de La Salle que passara antes por varias ediOes praticamente sem alteraao e revisado As mudanas no padrao sao multo instrutivas Exem plo K abaixo Em alguns aspectos sao multo extensas A diferena ja se constata no que nao mai precisa ser dito Muitos capitulos tornamse meno res Muitas mas maneiras antes disculidas em detalhe merecem apenas uma refen1ncia de passagem 0 mesmo se aplica a numerosas funoes corporais anteriormente comentadasem grande extensao e minucia 0 tom to em geral menos suave e nao rara muito mais duro do que na primeira versao T civiliariio como tranoTmaciio do comportameno K 107 1 1774 De Les Rgles de la bienseallcc et de lacivilite ehretienne de La Salle ed de 1774 p 45 e segs o guardanapo que posta sobre 0 prato tendo a finalid41de de preservar a roupa de manchal e autras lujeiras inseparAveis de refei deve ser colocado IObre a pessoa de modo que cubra 8 parte fronteirs do corpo at6 05 joelh08 passando sob a gala mas nio por dentm dela A cather garfo e faca devem semplo ser colocados A direita A calher destinase A iOBestAo do Ilquidos e 0 garfo pata pePl carnes solida Quando urn au outro estiverem sujas podem ser limpos com 0 guarda napa se outro aervio nio puder ser obtido DeveIe eviler limpAlos com a toalha da mess 0 que oonstitui um8 impropriodade imperdoAvel Quando 0 prato estiver sup deveBe pedir outro Seria rcvottantemente grosseiro limpar a colher 0 garfo au a faca com as dedas Em boas mesa servilrais atentos mudam as pratos aem que aeja preciso pedir isso Nada 6 mail impr6prio do que larober 01 dedo toear na came e levilos a boca com a mllo mexer 0 molha com oa dedO au entia enliar nele 0 pAo com 0 garfo e depoil chupiIo Nunca Ie deve pegar sal com Os dedos B muito comum que crians em pilhem uma porlrio em cima de outra e rneamo que tirem da boca al80ma coisa que mastigaram e joguem fora peda08 coni 01 dedos Tudo isto antes foi mencionado como exemplos de mau comportamento mas agora 6 apontado apenas comomAst manttiras de crianas Adultos nio fazem mai essas coisas Nada 6 mais grosseiro do que levar carne ao nariz para cheirAla pedir que outros a cheirem constitui mais uma grosseria com 0 dono da mesa se encontrar sujeira Da cornida dev Iivrarse da coroida 8em dar demoritrao L 1780 De urn trabalho anomrno La Civilite honete sic pour les enfants eaen sern data p 35 Em scguida ele colocarA o guardanapo sObre 0 corpo 0 pao a esquerda e a faca A direita a fim de cortar a came scm despedaaIa A seqUncia aqui descrita e encontrada em numerosos documental 0 procedimento mais elemen lar antes habitual tambem na classe alta consiste em partir 0 pao com as maos Aqui se descreve 0 estAgio seguinte em que a carne e partida com a faca o emprego do garfo nao e mencionado Arrancar pedacos da carne e consi derado habito nistico e coraIa evidentemente maneira urbana Ele tamb6m tomara cuidado para nao pOr a faca na boca Nao deve deixar as maos em cima do prato nem par os cotovelos sabre ele porque isto s6 e leito petos velhos e pelos doontes 108 o proceuo clIilitQdor A CriaO8 bem educada sera a 61tima a so sonir Ie eativer Da companhia de seus superiores em scguida se for came coriAlaa com elegAncia e a comer6 com o pia E urn hAbito rUstieo e gtosseiro tirar came mastisada da boca 0 ColdIa no prato Nem dove epor oa travesaa alguma coiaa que dela tirou M I 1786 De uma conversa sobre 0 poeta Delille e oabade Cosson Hi pouco tempo 0 shade Casson professor de Belas Letr81 do Col18e Mazarin faloome a respeito de um jantsf a que comparecera alguns diu antell com algumas pessoas da corte em Versalhes Aposto disse eu a elc que voc6 cometeu urna cenlma de galea 0 que e que voc6 quer diur com iao respondeu imediatamento 0 sbade Cosson muito perturbado Acho que fiz tudo da mearna maneira que todo mundo Que presunao Aposto que nAo fez nada damesma maneira que tocio mundo Mas You me limitar 80 jantsr Em primeiro lugar 0 que fez com 0 guardanapo quando se sentou Com 0 guardanapo Fiz 0 que todo Mundo fez Abrio desdobreio e prendio por urn canto na casa de urn botio Bern meu querido amigo voce fai 0 mica que fez issa A gente nia abre todo a guardanapo colocao sabre os joelhos B como roi que tamou a sopa Com todo mundo acho Peguei a colher com uma mio e 0 sarfo com a outra 0 garfo Deus do ceu Ninguem usa garfo para tamar sopa Maa diga como foi que COrneu 0 pio Certamente igual a todo mundo Corteio bern certinho com a faca Oh Deus do ceu a gente parte a pAo com a mia nAo com a faea Vamos continuar 0 cafe cOJDO fei que 0 tomou Como todo mundo para dizer a verdade Estava fervendo de modo que derrameio urn pouquinho de cada vez no pires Bern voce de maneira alguma tomouo como todD Mundo Todos bebem a cafe da xfcaraJ nunca do pires N 1859 De The Habits Of Good society Londres 1859 2 ed verbatim 1889 p 257 Os garfos foram indubitavetmente uma inveno posterior aos dedas maa uma vez que naa somas canibais sintome inclinado a pensar que os garfos foram urna boa invenao cvzacao com translormao do comportamento parte II Comentarios sabre as Exemplos Grupo I Urn Breve Estudo das Sociedades a que se Referern as Citai5es i 109 1 As transeri6es foram reunidas aqui a fim de exemplifiear urn pro eesso real uma mudana no eomporlamento de pessoas De odo geral os exemplos foram selecionados de modo a que pudessem ser tfpieos de pelo menos eertos grupos au estratos soeiais Nenhuma pessoa isolada nem mesmo urn indivfduo tao ilustre como Erasmo inventou a savoirvivre de seu tempo Ouvimos pessoas de diferentes epocas falando mais ou menos sobre 0 mesmo assunto Desta maneira as mudanas se tornaram mais claras do que se as tivessemos descrito em nossas proprias palavras Pelo menos do seculo XVI em diante as injun6es e proibi6es pelas quais e modelado 0 individuo de eonformidade com 0 padrao observado na sociedade estao em movimentoihinterrupto Este movimento par certo nao e perfeitamentc retilfneo mas atraves de todas as suas flutuaoes e curvas individuais uma tendeneia global clara e apesar de tudo perceptive se estas vozes dos seculos passados sao cuvidas em conjunto Os tratados do seculo XVI sobre as boas maneiras sao obra da nova aristocracia de corte que esta se aglutinando aos poucos a partir de elemen tos de varias origens sociais Com ela surge urn diferente codigo de compor tamento De Courtin na segunda metade do seculo XVII fala a partir de uma soeiedade de corte que e a mais plenamente consolidada a da cortc de Luis XIV E sc dirige principalmente a pessoas de categoria pessoas que nlio vivem diretamcntc na corte mas que desejam conhecer bern as manciras c costumes que ncla tern curso Mirma ele no prefacio Este tratado nao se destina 11 impressao mas apenas a atender ao cavalheiro de provincia que solieitou ao autor como amigo particular seu que ministrasse alguns preceitos de eivilidade ao seu filho que ele tencionava cnviar 11 corte quando completasse seus estudos Ele 0 autortempreendeu este trabalho apenas para conhecimento de gentes bemnascidas apenas a elas e dirigido e particularmente it juventude que podera eneontrar alguma utilidade nestes pequenos conselhos ja que nem 110 o processo civilitador I IJj todos tern a oportunidade nem dispoem de meios para virem a corte em Paris aprender oS refinament05 da pOlidez Pessoas que vivem 011 fazem parte do circulo que d8 exemplo nao pre cisam de livros para saber como alguem deve se comportar Isto e 6bvio Por isso e importante descobrir com que intenoes e para que publico esses preceitos sao escritos e publicados preceitos que originariamente sao 0 segredo distintivo dos fechados circulos da aristocracia de corte o publico visado e muito claro Enfatizase que os conselhos sao apenas para as honnees gens isto e de modo geral gente da classe alta Em pri meiro lugar 0 livr atende a necessidade da nobreza provinciana de se in formar sabre 0 comportamento na corte e a16m disso a de estrangeiros Hus tres Mas podese supor que 0 sucesso apreciavel deste livro resultou entre outras coisas do interesse despertado nos principais estratos burgueses Ha muito material que demonstra como nesse perfodo os costumes comporta mento e modas da corte espraiavamse ininterruptamente pelas classes medias a as onde eram imitados e mais ou menDs a erados de acordo com as di ferentes sitUllOes sociais Perdern assim dessa maneira e ate certo ponto seu carater como meio de identificaao da classe alta Sao de certa forma desvalorizados Este fato obriga os que estao acima a se esmerarem em mais refinamentos e aprimoramento da conduta E e desse mecanismo o desenvolvimento de costumes de corte sua difusao para baixo sua leve deformiio social sua desvalorizaao como sinais de distinao que 0 movimento constante nos padrOes de eomportamento na c1asse alta recebe em parte sua motivaao 0 impurtante e que nessa mudana nas invenOes e modas do comportamento na corte que a primeira vista talvez param ca6ticas e acidentais com 0 passar do tempo emergem certas dirOes ou linhas de desenvolvimento Elas ineluem por exemplo 0 que pode ser des crito como 0 avano do patamar do embarao e da vergonha sob a forma de refinamento ou como civilizao Urn dinamismo social especifico desencadeia outro de natureza psicol6gica que manifesta suas pr6prias leal dades 2 No sCeulo XVllI aumenta a riqueza e com ela progridem as classes medias 0 circulo de corte inclui nesse momento ao lade de elemen tos aristocraticos urn maior numero de burgueses do que no seculo preceden te mas sem que jamais desapaream as diferenas em categoria social Pouco antes da Revoluao Francesa intensificouse ainda mais a tendencia da aristocracia socialmente em declinio a fecharse Nao obstante essa sociedade de corte ampliada na qual se misturavam elemenos aristocraticos e burgueses e onde nao havia barreiras claras vedando a ascensao deve ser considerada como urn todo Compreende ela a elite hierarquicamente estruturada do pais A compulsao para nela penetrar ou pelo menos imitala aumenta sem cessar com a crescente interdepen dencia e prosperidade de estratos mais ponderaveis Os clrculos clericais r civiJizariio como transjorma9iio do comportamento 111 acima de todos tornamse Os divulgadores dos costumes de corte 0 controle das emooes 0 a formaao diseiplinada docomportamento como urn todo que sob 0 nome de eidade se desenvolveram na c1asse alta como fenOmeno apenas secular 0 social como consequencia de certas formas de vida social apresentam afinidades com tendeneias particulares no comportamento ecle siiistico traeliciona A civilidade ganha urn novo alieerce religioso e cristao A Igreja revelaso como tantas vezes oeorreu urn dos mais importantes orgaos da difusao deestilos de comportamento pelos esratos mais baixos E surpreendente diz 0 veneriivel padre La SalIe no infeio do prefii eio a suas regras de eivilidade crista que a maioria dos cristaos considere o decom 0 a civilidade como uma quaidade purameme humana 0 mundana 0 nao pensaodo em elevar mais ainda sua mente nlio a considere uma vir tude relaeionada a Deus aD proximo a nos mesmos Isto mostra bem quaD pouco cristianismo existe no mundo E como boa parte da educaao na Frana so encontrava nas maos de organismos eclesiiisticos foi acima de tudo ainda que nao exclusivamente atraves da mediaao da IgIeja que uma mare montante de civilidade inundou 0 pais Usados como manuais na edu caao elementar de crianas esses livretos cram impressos 0 distribuidos juntamente com as primeiras lioes de leitura 0 escrita Exatamente por esse motivo 0 conceito de civilidade perde cada vez mais valor para a elite socia Ele coma a passar por urn processo seme Ihante ao que atingiu aotes 0 conceito de cortesia Dissertaiio sobre a Ascensiio e Queda dOB Conceitos de Courtoisie e Civilite 3 Cortesia referiase inieialmente as formas de comportamento que so desenvolveram nas cortes dos grandes senbores feudais Ainda durante a Idade Media porem 0 significado da palavra perdeu muito de sua limitaao original social a corte entrando tambem em uso nos circulos burgueses Com a lenta extinao da nobreza guerreira baseada no cavaleiro 0 no senbor feudal e a formaao de uma nova aristocracia de monareas absolutos no curso dos seculos XVI e XVII 0 eonceito de eivilidade elevouse lenta mente a categoria de comportamento social aceitiive A cartesia e a civilidad conviveram lado a lado durante 0 periodo da soeiedade de transiao na Frana do seeulo XVI que era urn misto de soeiedade cavaleirosafeudal 0 de monarquia absoluta No seeulo XVII porem 0 conceito de cortesia saiu gradualmente de moda na FrilOa No mundo isto c na alta sociedade RJR 112 o prOC6SS0 civiliuulor As palavras courtois e courtoisie diz um autor frances em 1675 comClam a envelheoer e nao constitnem mais bom uso Dizemos hoje civil Iwnneste civilite 1w1llWStete De fato a palavra courtoisie parece neSSe momento ser um conceito burgues Meu vizinho 0 burgues diz de acordo com a linguagem dos burgueses de Paris afavol e cortes courtois Ele nao se expressa ele gantemente porque as palavras cortes e afavel raramente sao usadas entre pessnas do mundo e as palavras civil e decente lwnnte substituiram nas da mesma maneira que civilidade e decencia tomaram 0 lugar de cortesia e afabilidade Isto e 0 que lemos em uma conversa sob 0 titulo Du bon et du T1IQUVais usage dans les manreres de sexprimer Des falons de parler bourgeoise de autoria de F de Callieres 1694 pp 110 e segs De maneira muito parecida no seciJlo XVIII 0 conceito de civilidade perdeu aos poucns a primazia na alta sociedade de corte Esta classe sofre um processo muito lento de transformagao de aburguesamento que pelo menos ate 1750 e sempre combinado com 0 processo inverso de assimilagao pela COrle de elementos burgueses Algo do problema resultante e percebido por exemplo quando em 1745 0 abade Gedoyn no ensaio intitulado De Iur banite romaine Oeuvres diverses p 173 discute a questao do motivo por que na sua pr6pria sociedade a palavra urbanite embora se relira a algo muito fino nunca leve 0 mesmo curso que civilite humanite politesse ou galanterie e responde Urbanitas significava aquela polidez de lingua mente e maneiras ligadas singularmente a cidade de Roma que era chamada par excellence a Urbs a cidade ao passo que entre n6s onde esta polidez nao e privilegio de qualquer cidade em particular nem mesmo da capital mas apenas da corte 0 termo urbanidade tornase urn termo que podemos dispensar So nos damos cnnta que cidade nessa epoca refenaso mais ou menos a boa sociedade burguesa em contraste com a sociedade mais limitada da corte percebemos a irnportfulcia para a epoca da questao aqui colocada Na maior parte dos textos desse periodo 0 uso de civilite dirninui como aqui em comparagao com politesse e a identificagao de todo esse complexo de ideias com a humonite emerge com moos nitidez Ja em 1733 Voltaire na dedicat6ria de seu Zaire a urn burgues A M Faulkner comerciante ingles manifestou com grande clareza essas tenden cias Desde a regencia de Ana dAustria os franceses tern sido 0 povo mais sociave1 e mais polido do mundo e esta polidez niio e em absoluto wna questiio arbitrQria tal como essa que e chamada de civilidade mas uma lei da natureza que eles felizmente cultivaram mais do que os outros povos Tal como 0 conceito de cortesia antes 0 de civilidade comega 1enta mente a afundar Pouco depois 0 conteudo deste e de termos correlatos e absorvido e ampliado em urn novo conceito na expressao de uma nova forma de autoconsciencia 0 conceito de civilisation Cortesia civilidade e civjJjzaiio como Iransormao do comportameno 113 L civilizalio assinalam tres estagios de desenvolvimento social Indicam qual sociedade fala e e interpelada Nlio obstante a mudana concreta no com portamento das classes altas a expanslio de modelos de comportamento que daf em diante serlio chamados de civilizados ocorrem pelo menos na medida em que slio visiveis nas areas aqui discutidas na fase intermediana o conceito de civilizallio indica com clareza em seu uso no seculo XIX que 0 processo de civilizallio ou em termos mals rigorosos uma lase desse processo fora completado e esquecido As pessoas querem apenas que esse prooesso se realize em outras nalOes e tambem durante urn periodo nas classes mais baixas de sua pr6pria sociedade Para as classes alta e media da sooiedade civilizallio parece firmemente enraizada Querem acima de tudo difundiIa e no m3ximo ampliala dentro do padrlio ja conhecido Os exemplos citados mostram claramente 0 movimento romo a esse padrlio nas fases que precederam as cortes do absolutismo Panorama da Curva Evolutiva da Civilizaao dos Habitos a Mesa 4 Ao fim do steulo XVIII pouco antes da revolullio a classe ala francesa adotou mais ou menos 0 padrlio i mesa e certamente nlio s6 este que aos poucos seria considerado como natural por toda a sooiedade civili zada 0 Exemplo M datado de 1786 e muito instrutivo neste particular mostra como costume ainda indisputavelmente de corte 0 mesmo modo de usar 0 guardanapo que em breve se tornaria costumeiro em toda a sociedade burguesa civilizada Indica que 0 garfo nlio era mais usado para se tamar a sopa a necessidade do qual para sermos exatos s6 e compreendida se lem brarmos que a sopa freqiientemente continha e ainda contem na Franla mals conteudo s6lido do que agora em outros paises E ainda a requisito de nlio cortar com faca mas romper com as mlios a plio i mesa um costume que depois foi demooratizado 0 mesmo se aplica i maneira como se hebe o cafe Estes slio apenas alguns exemplos de como se formou nosso ritual diano Se esta serie fosse continuada ate 0 presente outras mudanas de detalhe seriam notadas novos imperativos slio acrescentados relaxamse outros anti gos emerge uma riqueza de varialOes nacionais e sociais e se constata a infil tralio na classe media na classeoperana e nO campesinato do ritual uni forme da civilizlio A regulalio dos impulsos que sua aquisillio requer varia multo em fora Mas a base essencial do que e obrigat6rio e do que e proi bide na sooiedade civilizada 0 padrlio da t6cnica de comer a maneira de usar faca garfo colher prato individual guardanapo e outros utensilias estes permanecem imutaveis em seus aspectos essenciais Ate mesmo 0 sur gimento da tecnologia em todas as areas inclusive na da cozlnha 114 o processo civilizador com a introduao de novas formas de energia deixou virtualmente inalteradas as tecnicas a TIleSa e outeas formas de comportamento S6 com uma verifi C3aO muito minuciosa e que observamos os traos de uma tendencia que continua a desenvolverse o que muda ainda acima de tudo e a tecnologia da produao Ja a tecnologia do consumo foi desenvolvida por formaoes sociais que eram em urn grau ounea igualado antes classes de consumo Com seu declinio social o nipido c intenso refinamento das tecoicas de consumo cessa estas passam ao que se torna entao a esfera privada da vida em contraste com a ocupa cional Conscqiientemente 0 dtmo de movimento e mudana nessas esferas que havia sido relativamente nipido durante 0 estagio das ccrtes absolutas rerluzse mais uma vez Ate mesmo as formas dos utensilios da mesa pratos travessas faca garfos e coheres dai em diante nada mais fazem do que variar temas do seculo XVIII e precedentes Por certo ha ainda muitas mudanas em deta hes Urn exemplo e a diferenciaao dos utensilios Em muitas ocasioes nao s6 os pratos sao trocados depois de cada tipo de comida mas tambern os utensilios Ja nao basta comer apenas com a faca garfo e colher em vez de se usarem as maos Cada vez mais na classe alta urn implemento especial e usado para cada tipo de comida Coheres de sopa facas de peixe e facas de carne sao postas em urn dos lados do prato Garfos para hors doeuvre peixe e carne no outro Do ludo oposto ao conviva ficam 0 garfo a coher ou a faca segundo 0 costume do pais para os doces E para as sobreme sas e frotas outros implementos sao trazidos Todos esses utensilios tern forma e fun5es diferentes Sao ora majores Ora menaces quando nao mais redon dos ou mais pontudos Mas examinandose bern notase que na realidade nao representam nada de novo Eles uunbem sao variaes do mesmo tema diferencioes dentro do mesmo padrao E s6 em alguns pontos acima de tudo no uso da faca comam a aparecer inovaoes lentas que trans cendem 0 padrao ja adotado Mais tarde teremos algo a dizer sobre isto 5 Em certo sentido algo analogo aplicase ao periodo que terminou no seculo XV Ate essa data por razoes muito diferentes a tecnic padrao a mesa 0 conjunto basico do que era socialmente proibido e permi tido como 0 comportamento das pessoas entre si e consigo mesmas das quais essas proibioes einjunf6es eram expressao permanece relativamente constante em seus aspectos basicos meSmo que aqui tambom as modas va riaes regionais e sociais flutuaoes e um lento movimento em uma dirao dada nao estivessem inteiramente ausentes Nem podem as transioes de uma fase para outra serem detenninadas com absoluta exatidao 0 movirnento mais rapido comea tardiamente aqui mais cedo acola e em toda parte deparamos com pequenas alteroes pre parat6rias Nao obstante a forma geral da curva e por toda a parte mais ou menos a mesma em primeiro lugar a fase medieval com certo climax no civllizartio como Iransformariio do comporlamenro 115 f1orescimento da sociedade feudal e cortes assinalada pelo babito de comer com as maos Em seguida uma fase de movimento e mudan9a relativamente nipidos abrangendo aproximadamenle os seculos XVI XVII e XVIII na qual a compulsao para uma conduta refinada a mesa pression constantemen te na mesma direao na de urn novo padrao de maneiras a mesa Dai em diante observamos uma fase que permanece dentro do padrao ja atingido embora com urn movimento muito lento sempre numa certa dire 9ao 0 refinamento da conduta diaria nunca perde de todo nem mesmo neste perfodo sua importancia como instrumento de diferencia9aO social Mas desde essa fase nao desempenha 0 mesmo papel que na fase precedente Mais do que antes 0 dinheiro tomase a base das disparidades sociais E 0 que as pessoas concretamente realizam e produzem tomase mais importante que suas maneiras 6 Tornados em conjunto os exemplos mostram com grande clarcza como se desenvolveu esse movimento As proibi90es da sociedade medieval mesmo nas cortes feudais ainda nao impoem quaisquer grandes restri90es ao jogo de em09Oes Comparado com eras posteriores 0 controle social e suave As maneiras em rela9ao as antigas sao relaxadas em todos os senti dos da palavra A pessoa nao deve fungar nem estalar os labios enquanto come Nem cuspir de urn lado a outro da mesa nem assoarse na toalha pois esta e usada para limpar os dedos de gordwa ou nos dedos os dedos que tocam a travessa de servir comum Comer com outras pesseas no mesmo prato ou travessa e aceito como natural 0 individuo deve apenas evitar cair sobre 0 prato de servir como se fosse urn porco e devolver a comida mastigada a travessa comum Muitos desses costumes sao ainda menciollados no tratado de Erasmo e em sua adapta9ao por Calviac Com mais clareza do que examinando apenas uma que Dutra maneira da epoca ao estudarmos a movimento como urn todo vemos que teudencia ele segue Os talheres ainda sao em numero limitado o pao fica a esquerda a faca e 0 copo a direita so isto 0 garfo ja e men cionado embora com fUl1ao limitada como instrumento para tirar 0 alimen to de urn prato de servir comum E tal como 0 len90 0 guardanapo ja apa rece ambos ainda sinal de transiao como guarni5es opcionais e nao necessarias se tern leno dizem as preceitos usea em vez dos declos Se urn guardanapo fornecido passeo pelo ombro esquerdo Cento e cin qUenta anos depois 0 guardanapo e 0 len90 sao mais ou menos indispensa veis a vida de corte E semelhante a curva seguida por outros babitos e costumes Inicial mente a sopa costuma ser bebida seja na sopeira comum seja com a concha usada por varias pessoas Nos escritos corteses prescrito 0 uso da collier Ela tambem sera entao usada por varias pessoas Outro passo mostrzdo na cita9aO extraida de Calviac por volta de 1560 Diz ele que era costume alemao permitir que cada conviva usasse sua propria colher 0 passo 116 o processo civilizador seguinte e indieado pelo lexlo de Courtin relativo ao ana de 1672 Nessa ocaslaO DaD se toma mais a sopa na sopeira comum mal derramase urn pouco no proprio praIa usandose a propria colher Mas havia pessoas somas inforrnados no texto que eram Hio delicadas que nao queriam tamar a sopa de uma sopeira em que outros haviam mergulhado uma colher ja usada Era par conseguinte necessaria limpar a colher com a guardanapo antes de ca loeala na sopeira E algumas pcssoas queriam ainda mais Para elas a pessoa nlio devia abwlutamente por novamente na sopeira uma colher usada Devia sim pedir uma colher limpa para esse fim DescriOes como essas demanstram nlio so que todo a ritual de viver juntos estava em movimento mas tambem que as pessoas se conscientizavam dessa mudana Nesse tempo gradualmente a costume ora aceito como natural de tamar sopa esta sendo estabelecido todos tem seu pr6prio pratoe colher e a sopa e servida com um implemento especializado 0 ato de comer adqui rira urn novo eslilo correspondendo as novas necessidades da vida social Coisa alguma nas maneiras a mesa e evidente par si mesma au produto por assim dizer de urn sentimento natural de delicadeza A colher garfo e guardanapo nao foram inventados como utensHios tecnicos com finalidades 6bvias e instruOes claras de usa No decorrer de seculos na relalio social e no emprego direto suas funiies foram gradualmente sendo definidas suas formas investigadas e consolidadas Todos os costumes no ritual em mutalio par mais insignificantes estabeleceramse com infinita lentidlio ate mesmo formas de comportamento que nos parecem elementares ou simplesmente razoaveis tal como 0 costume de ingerir liquidos apenas Com a coTher Todos os movimentos da mao como por exemplo a maneira como se segura e movimenta a faca colher e garfo slio padronizados apenas gra dualmente E s6 vemos a mecanismo de padronizaao em sua seqUencia se examinamos como um todo a serie de imagens Ha um circulo na corle mais au menos limitado que inicialmente cria os modelos apenas para atender as necessidades de sua pr6pria situaiio social e em conformidade com a con dilio psico16gica correspondente a mesma Mas e evidente que a estrutura e a desenvolvimento da sociedade francesa como um todo fazem com que estratos cada vez mais amplos se mostrem desejosos e mesmo sequiosos de adotar os modelos desenvolvidos em uma classe mais alta eles se difundem tambem com grande lentidlio par toda a sociedade e certamente nlio sem passarem nesse proeesso por algumas modificaiies A transmisslio dos modelos de uma unidade soeial a outra ora do centro de uma sociedade para seus postos fronteirios como par exempli da corte parisiense para outras cortes ora na mesma unidade politicoCsocial como por exemplo na Frana au Saxonia de cima para baixo au de baixo para cima deve ser considerado em todo a processo civilizador como urn dos mais importantes dos movimentos individuais 0 que os exemplos mostram civilizaiio como transformaiio do comportamento 117 oS apenas urn segmento limitado desses movimentos Nao apenas as maneira a mesa mas tambem formas de pensar ou falar em suma do comportamento em geral sao moldadas de maneira semelhante em toda a Frana mesmo que se observem diferengas importantes no tempo e estrutura de seus padroes de desenvolvimento A elaboraao de urn dado ritual de rela5es humanas no curso do desenvolvimento social e psicol6gico nao pode ser isolada mesmo que aqui como primeira tentativa tenha sido possivel seguir urn unien segmento Urn curto exemplo do processo de civilizaao da fala poden servir como aviso de que a observao das maneiras e suas transfor maoes expoe apenas urn segmento muito simples e de facil acesso do que e urn processo de mudanga social muito mais abrangente Dissertaiio sobre a Modelaiio da Fala na Corte 7 No caso da fala tambern urn circulo limitado crion inicialmente certos padroes Como na Alemanha embora em muito menor grau a lingua falada na sociedade da corte era diferente da falada pela burguesia Voces sabem lemos em uma pcquena obra que em sen tempo foi muito popular Mots ala mode de eallieres na ediao de 1693 p 46 que o burgues fala de modo muito diferente de n6s Se examinarmos mais de perto 0 que e denominado de fala burguesa e 0 que e chamado de expressao da alta sociedade de corte descobrimos 0 mesmo fenomeno que pode ser observado nos costumes a mesa e nas ma neiras em geral muito do que no seculo XVII e ate certo ponto no seculo XVIII era a forma de expressao e linguagem caracteristicas da sociedade de corte tornouse gradualmente a lingua nacional francesa o jovem M Thibault filho de pais burgueses enos apresentado em visita a uma pequena sociedade aristocratiea A dona da casa pergunta pela saude de seu pai Ele e seu humilde servidor Madame responde Thibault e continua acamado como a senhora bemsabe ja que teve um bocado de vezes a gentileza de perguntar pelo seu estado de saude A situaao e clara Existe certo contato social entre 0 clrculo aristocra tieo e a familia burguesa A dona da casa mencionou antes esse fato Diz tambem que 0 velho Thibault e urn homem muito born nao sem acrescentar que essas relag5es as vezes sao muito uteis a aristocracia porque tais pessoas afinal de contas tern dinheiro Neste ponto lembramonos da estrutura muito diferente da sociedade alema Os contatos sociais nessa epoca porem evidentemente nao sao intimas suficiente se deixarmos de lado a intelligentsia burguesa para apagar as diferenas lingiifsticas entre as classes Quase todas as palavras que 0 jovem Thibault diz sao pelos padr5es da sociedade de corte desajeitadas e canhes 118 o processo civilizador r tras com hiilito de burguesia como dizem os cortesaos Na sociedade de corte ninguem diz como bern sabe urn bocado de vezes Oll acamado comme bien sravez souvemes fois maladi Ninguem diz COmo 0 fez M Thibault na conversa que se seguiu le vous demande excuse Peo que me escuse Na sociedade de corte dizse como hoje na sociedade burguesa le vous demande pardon Com seu perdao M Thibault continua Un mien ami un mien parent un mien cousin Um amigo meu etc em vez do refinado un de mes amis un de mes parents p 20 E diz deffunct mon pere Ie pauvre deffunct defunto E Ihe explicam queessa nao e uma das expressoes que a civilidade intro duziu entre os bemfalantes Nao se diz que um homem virou defunto quando faleceu p 22 A palavra pode ser usada no maximo quando se diz temos que oral a Deus pela alma dos defuntos mas aqueles que falam bem dizem antes meu falecido pai 0 falecido duque etc feu man pere etc E observam que pelo pobre defunto is uma maneira muito burgue sa de falar 8 Neste particular tambem como aconteceu com as maneiras oeoree uma esp6cie de moviruento em duplo sentido a burguesia e pol assiru dizer acortesada e a aristocracia aburguesada Ou para set mais preciso a burguesia e influenciada pelo comportamento da corte e viceversa A influen cia de baixo para cirna e certamente muito mais fraca no seculo XVII na Fraiwa do que no seculo XVIII Mas nao esta de todo ausente 0 castelo de VauxIe Vicomte de propriedade do intendente burgues das finanas Nico las Fougeut e anterior a regia Versalhes e de muitas maneiras he serviu de modelo Este e um claro exemplo A riqueza dos principais estratos bur gueses compele os que estao acima a competir com eles E a chegada inces sante de burgueses aos clrculas da corte gera tamhem um movimento espe clfico na fala a nova substancia humana traz tamoom consigo uma nova substancia lingUfstica 0 jargao da burguesia para os cfrculos aristocraticos Elementos sellS estao sendo constantemente assimilados pela linguagem da corte refinados polidos transformados Sao em wna palavra acortejados isto e adaptados ao padrao de sensibilidade dos clrculos de corte Trans formamse assim em meios para distinguir as gens de la cour da burguesia e depois talvez muito depois penetram de novo na burguesia assim refi nados e modificados a fim de se tornarem especificamente burgueses Ha diz 0 duque em uma das conversas transcritas pOl Callieres Du bon et du mauvais usage p 98 uma maneira de falar muito comum entre Os burgueses de Paris e mesmo entre alguns cortesaas educados na burgue sia Consste em dizer voyons voir em vez de dizer voyons vejamos evi tando 0 verba voir que einteiramente inutil e desagradavel neste contexto Literalmente voyonJ voir seria vejamos ver RJR Mas recentemente entrou em uso prossegue 0 duque outro feio torneio de frase que comou entre as pessoas mais baixas e fez sua fortuna na corte como aqueles favoritos sem merito que nela subiam nos velhos dias Tratase de it en sfait bieng significando que alguem e sutil e inteligente Ate as damas da corte estao comando a usaIo E por ai vai Os burgueses e mesmo alguns elementos da corte dizem n faut que nous faisions cela em vez de n faut que nous fassions cela Alguns dizem uon za e ron zest e nao 0 refinado ron a e ron est Dizem Je Ie lai em vez de Je rai Em quase todos esses casos a forma lingiiistica que aqui aparece como de corte tomouse de fato 0 costume nacional Mas ha tambem exemplos de formas lingiiisticas de corte que sao gradualmente abandonadas como refinadas demais afetadas demais 9 Tudo isto esclarece simultaneamente 0 que antes dissemos sobre as diferenas sociogeneticas entre os caracteres nacionais frances e alemao A lingua e uma das manifestaOes mais acessiveis do que consideramos como carater nacionaI Aqui podemos ver com um unico exemplo concreto como esse carater peculiar e tipico e refinado em contato com certas forma90es sociais A lingua francesa foi decisivamente marcada pela corte e pela so ciedade de corte No tocante 11 lingua alema a Camara e Chancelaria Impe riais desempenharam durante algum tempo 0 mesmo papel ainda que nao exercessem nem de longe a mesma influencia da corle francesa Em data tao recente como 1643 algutm alega que sua linguagem e exemplar porque modelada nos escritos da Camara de Speyer Nessa ocasiao eram as uni versidades que haviam conquistado quase a mesma importancia para a cul tura e a lingua alema que a corte na Fran9a Essas duas entidades estreita e socialmente relacionadas a Chancelaria e a universidade porern influen ciaram menos a fala do que a literatura Formaram a lingua escrita nao atraves das conversas mas do documento das cartas e dos livros E quando Nietzs che observa que ate mesmo as can90es alemiis de heber sao eruditas ou se compara a elimina9ao de termos especializados pelo cortes Voltaire com 0 modo como os alemaes os usavam percebe com grande clareza os resultados desses diferentes fenomenos hist6ricos 10 Se na Fran9a as gens de la cour dizem Esta frase esta correta e esta incorreta uma pergunta importante surge que merece pelo menDs ser abordada de passagem Por que padroes ela esta realmente julgando 0 que r civiliZQfQO como IransformafDo do camportamenta 119 Ii II I Em il faut que nous laislOn5 eela esta sendo usado um indicativa no lugar do subjuntivo e preciso que lQVmos isso em vez de Iamos Za e rest sao urn erro que ainda hoje acontece e considerado bastante vulgar 0 de fazer uma Iigaao da vogal inicial com uma consoante 8 anterior daf 0 BOm Z 86 que ne8te caso inexistente 0 ultimo exemplo 6 urna repeticao do pronome 0 dito duBS vezes RJR 10 o prOCeSBO civillrador e correto e incorreto na Iinguagem Que criterios usa para selecionar polir e modificar expressOes As vezes essa pr6pria gente reflete sobre 0 assunto 0 que diz sobre ele e 11 primeira vista surpreendente e de qualquer modo sua importAncia ultrapassa a esfera da linguagem Frases palavras e nuanas slio corretas porque e1es os membros da elite social as usarn E slio incorretas porlue inferiores sociais as usam M Thibault defendese algumas vezes quando he dizem que e incorreta esta ou aquela construlio de frase Estou muito agradecido ii senhora Ma dame diz Du bon et du mauvais usagepo 23 pe1o trabaIho que esta tendo em me ensinar mas me parece que a palavra defunto e muito conhe cida e usada por muita gente de boa educalio hotes gens E bern possivel responde a senhora que haja muitas pessoas bern educadas que nlio conham suficientemente bern a delicadeza de nossa lin gua 0 o uma delicadeza que e sentida por apenas um pequeno numero de pessoas bemfalantes e que as leva a nlio dizer que urn homem virou de funto a fim de dizer que ele faleceu Urn pequeno circulo de pessoas e bern versado nessa delicadeza de Iinguagem Falar como elas e igual a falar corretamente 0 que os outros dizem nlio conta Os juizos de valor slio apodicticos Qualquer razlio alem de N6s a elitefalamos assim e s6 n6s temos sensibilidade para a lingua nlio e necessaria nem conhecida Quanto a erros cometidos contra 0 born uso dizse em outro trecho desde que nlio hii regras claras eles depen dem apenas do consentimento de certo nllmero de pessoas educadas cujos oovidos estlio acostumados a certas maneiras de falar e as preferem a 00 tras p 98 E em seguida slio listltdas as palavras a evitar Palavras antiquadas slio impr6prias para a fala comum seria Pala vras muito novas despertam suspeita de afetalio poderiamos talvez di zer de esnobismo Palavras eruditas que recendem a latim ou grego slio suspeitas a todas as gens du rrwnde Cercam os que as uSlim de uma atmosfe ra de pedantismo se slio conhecidas outras palavras que dizem a mesma coisa com simplicidade Palavras em callio usadas por gente comum devem ser evitadas com todo 0 cuidado porquanto demonstram que elas tern baixa edulio E oS a respeito dessas palavras isto e palavras em callio diz 0 bemfalante corteslio que falamos neste conte1tto querendo falar da oposiiio entre Iinguagem de corte e burguesa A raziio dada para 0 expurgo de palavras inferiores da lingua oS 0 refinamento dos sentimentos que desempenha urn papel nada pequeno em todo 0 processo civilizador Mas este refinamento distintivo de urn gropo relativamente pequeno Ou 0 individuo tern essa sensibilidade ou nlio esta e aproxirnadamente a atitude do instrutor As peSoas que possuem r civiJjzaiio como transformaao do comportamenlo 121 esta delicadeza Urn pequeno circulo determinam par consenso a que deve ser considerado born au mau Em outras palavras dentre todos os argumentos racionais que pode riam ser apresentados para a escolha de express5es a argumento social de que alga e melbor porque e a usado pela classe alta au mesmo par ape nas urna elite dela e sem duvida a mais importante Palavras antiquadas palavras que sairam de moda sao usadas pela geraao mais antiga au par aqueles que nao estao em cantata permanente e direto coma vida da corte as decasses Urn numero excessivo de no vas palavras sao usadas par urn grupo de jovens que ainda nao foram acei tos que falam uma giria especial parte da qual talvez amanha esteja em moda Palavras eruditas sao usadas como na Alemanha par pessoas educadas nas universidades especialmente par advogados e altos adminis lradores isto e na Frana pela noblesse de robe Expressoes inferiores sao todas as palavras usadas da burguesia para baixo A polemica lingUis tica corresponde a uma estratificaao social bern definida bern caracteris tica Indica e delimita a grupo que em dado momenta exerce controle sa bre a Hngua em sentido mais amplo as gens de la cour mas em sentido mais restrito urn circulo menor sumamente aristocnltico qu temporaria mente exerce influencia na corle e que com todo cuidado se distingue dos arrivistas sociais as cortesaos egressos dos viveiros burgueses dos anti quados dos Ujovens dos concorrentes uesnobes da geraao em ascensao e par ultimo mas nao menos importante dos funcionarios especializados oriundos das universidades Esse circulo constitui a influeneia predominan te na formaao da linguagem nessa epoca A maneira como falam as mem bros desses cfrculos mais amplos au mais restritos da corte e como se deve falar falar comme il taut Nesta esfera sao formados as modelos de fala que subseqiientemente se espalham em ondas mais longas au mais curtas A maneira como uma Hngua 50 desenvolve e e definida corresponde a uma certa estrutura social Conseqiientemente do seculo XVIII em dian te a influencia burguesa sabre a lingua francesa lentamente ganha foras Esta longa passagem atraves de urn eSlagiO dominado pela aristocracia da corte ainda hoje se percebe na Hngua francesacomo na alema ainda se nota que passou pela dominaao de uma intelligentsia educada de clas50 mooia E em todos as Casas em que elites au pseudoelites se formam na soeiedade burguesa francesa elas assimilam na linguagem essas tendencias mais antigas e mais distintas Criterios Apresentados para Distinguir 0 Born Comportamento e 0 Mau 11 A linguagem e uma das formas assumidas pela vida social au men al Grande parte do que 50 pode observar na maneira como a linguagem 122 o processo dviizador e plasmada tomase tambem evidente em outras formas que a sociedade assume 0 modo como pessoas argumentam que este ou aquele comporta mento ou costume a mesa e melhor que outro por exemplo mal se pode distinguir da milOeira como alegam que urna expressao lingiifstica e prefe rivel a outra Isto nao corresponde a expectativa que talvez tenha urn observador do seculo XX Ele par exemplo acha talvez que a eliminaao do hbito de comer com as maos a adao do garfo as louas e talheres indivi duais e todos os demais rituais de seu pr6prio padrao podem ser expli cados por razoes higienicas Isto porque e esta a maneira como ele mes mo explica de modo geral esses costumes Mas 0 fato e que em data tao recente como a segunda metade do seculo XVIII praticamente nada desse tipo condicionava 0 maior controle que as pessoas impunham a si mellIlas De qualquer modo as ehamadas explicaoes racionais tern bern pouca irnportiincia em comparaao com outras Nas prirneiras fases a necessidade de controle em geral era explicada assim Faa isto ou nao faa aquilo porque nao e cortes nao e fino Urn unabre nao faz essas cOisas No maximo a razao dada era a considera ao pelo embarao acaso eriado para outrem como no Hozucht de Tan nhiiuser que eliz Nao Ie eoces cam a maO com que pegas tambem 0 prato comum de servir Teus eompanheiros a mesa podem notar isto POTtanto usa 0 casaco para te eOares Exemplo A v 109 e segs E e claro que o patamar do embarao difere aqui do que foi observado no periodo se guinte Mais tarde argumentos semelhantes m usados para tudo Nao faa isso porque nao e edueado ou bienseant Ou urn argumento como esse era usado para expliear 0 respeito devido a pessoas de categoria social su perior Assim como aconteceu com a maneira por que foi afeioada a fala tamMm na formaao de Outros aspectos do comportamento em sociedade as motivaoes socfais e a adaptaao do comportamento aos modelos vigen tes em cfrculos influentes foram de longe os motivos mais importantes Ate mesmo as expressoes usadas na motivaao do born comportamento a mesa eram com freqiiencia as mesmas usadas para motivar a fala cor reta Em Du bon et du 1Iauvajs usage dans les manieres de sexprim Callieres se refere porexemplo a esta ou aquela expressao que a civiJi dade introduziu entre pessoas que falam corretamente p 22 Exatamente 0 mesmo eonceito de civilite tamb6m e reiterado poT COUT tin e La Salle para dedarar 0 que e correto e incorreto nas maneiras E da mesma forma que Callieres fala simplesmente de pessoas qui parlent bien que falam bern Courtin ao tim do Exemplo G diz Antigamente ti nhamos licena para fazer isto mas hoje nao e mais permitido Em 1694 ClvilizafQO como JransormafQO do comportamento 123 afirma Callieres que ha muilas pessoas que nlio sao suficientemente versa das na delicatesse da linguagem Cest cette delicatesse qui nest connue que dun petit nombre de gens E esta delicadeza que sO oS conhecida de pequeno numero de pessoas Courtin usa a mesma expressao em 1672 quando declara que oS sempre necessario limpar a colher antes de colocala no prato comum se a pessoa ja a uscu havendo pessoas tlio delicadas que nao gostariam de tomar urna sopa na qual voce mergulhou a colher de pois de teIa levado 11 boca Exemplo G Esta delicatesse esta sensibilidade e urn sentimento altamente desen volvido de embarao sao no inicio aspectos caracteristicos de pequenos cir culos da corte e depois da sociedade da corte como urn todo Isto se aplica a linguagem exatamente da mesma maneira que aos babitos 11 mesa Nao se diz nem se pergunta em que se baseia essa delicadeza e por que ela exige que se faa isto e nlio aquilo 0 que se observa e apenas que a delicade za ou mehor 0 patamar do embarao esta avanando Juntamente com uma situalio social muito especifica os sentimentos e emolies come am a ser transformados na classe alta e a estrutura da sociedade como urn todo pennile que as emlies assim modificadas se difundam lentamen te pela sociedade Nada indica que a condiao afetiva 0 grau de sensibi lidade sejam mudados pelo que descrevemos como evidentemenle racio nal isto e pela compreenslio demonstravel de dadas conexlies causais Courtin nao diz como se diria mais tarde que algumas pessoas acham antihigienico ou prejudicial 11 saude tomar sopa na mesma sopeira com outras pessoas Nao ha duvida de que a delicadeza de sentimentos e aguada sob pressao da situaao da corte isto de uma maneira que mais tarde sera parcialmente justificada por estudos cientificos mesmo que grande parte dos tabus que as pessoas gradualmente se impliem em seus contatos reciprocos parte esta muito maior do que em geral se pensa nlio tenha a menor ligaao com a higiene sendo motivada ainda hoje apenas por uma delicadeza de sentimentos De qualquer modo 0 pro cesso se desenvolve em alguns aspectos de uma maneira que e 0 exato oposto do que em geral hoje se suplie Em primeiro lugar ao longo de urn periodo extenso e em conjunto com uma mudana especifica nas rela lies humanas isto oS na sociedade e elevado 0 patamar de embarao A estrutura das emolies a sensibilidade e 0 comportamento das pessoas mudam a despeito de varialies em uma direlio bern clara Entao num dado momento esta conduta e reconhecida como higienicamente correta isto e e justificada por uma clara percepao de conexlies causais 0 que he da mais consistencia e eficacia A expanslio do patamar do embarao talvez se ligue ocasionalmente a experiencias mais ou menos indefinidas e de inicio racionalmente inexplicaveis de como certas doenas sao transmiti das ou mais exatamente talvez se ligue a medos e preocupalies vagas e por conseguinte nao esclarecidos que apontam ambiguamente na direao r 124 o processo civiitador r 1 que mais tarde sera confirmada pela racionalizaao A compreensao ra cional porem nao e 0 que condiciona a civilizaao dos habitos a mesa ou outras formas de comportamento Neste contexto e altamente instrutivo 0 estreito paralelo entre a ci vilizaao dos habitos it mesa e da fala Fica claro que a mudana do com portamento it mesa e parte de uma transformaao muito extensa por que passam sentimentos e atitudes humanas Tambem se ve em que grau as for as motivadoras desse fenomeno se originam na estrutura social na ma neira como as pessoas estao ligadas entre si Vemos com mais clareza como clrculos relativamente pequenos iniciam 0 movimento e como 0 processo aos poucos se transmite a segmentos maiores Esta difusao porem pres sup6e contatos muito especificos e por conseguinte uma estrutura bern definida da sociedade Alem do mais eia certamente nao poderia ter ocor rido se naohouvessem sido estabelecidas para classes mais amplas e nao apenas para os CIrculos que criaram 0 modelo condi6es de vida ou em outras palavras uma situaao social que tornassem possivel e ne cessaria uma transformaao gradual das em6es e do comportamento wn avano no patamar do embara o processo que assim emerge lembra na sua forma embora nao em substancia processos quimicos nos quais urn Iiquido cujo todo Ii sujeito a condi6es de mudana quimica como por exemplo a cristaliza ao comea adquirindo forma cristalina em urn pequeno micleo enquan to 0 resto s6 gradualmente se cristaliza em torno dele Nada seria mais er roneo do que considerar 0 micleo da cristalizaao como causa da trans formaao o fate de uma dada classe em uma fase ou outra do desenvolvimento social formar 0 centro de urn processo c desta forma fornecer modelos para outras classes e de que estes modelos sejam difundidos e aceitos por elas ja pressup6e uma situaao social e uma estrutura especial de socie dade como urn todo em virtude da qual a urn cfrculo e cometida a funao de criaI modelos e a outro as de difundiIos e assimilaIos Adiante discu tiremos em detalhes os tipos de mudana na integraao social que detona ram essas mudanas no compoltamento Grupo 2 Do Costume de Comer Carne 1 Embora os fenomenos humanos sejam atitudes desejos oupro dutos da a1io do homem possam seI examinados em si independente mente de suas liga6es Com a vida social eles por natureza nada mais sao que concretiza6es de rela6es e compoltamento materializa6es da vida civililQfiiO como tronsformofao do comportamento 125 social e mental Isto se aplica a fala que nada mais e que relaOes humanas transformadas em som e tambem a arte ciencia economia e politica e nlio menos a fenomenos que se classificam como importanus em nossa es cala de valores e a outros que nos parecem triviais e insignificantes Nlio raro slio exatamente estes ultimos os fenomenos triviais que nos dlio in trovisOes claras e simples da estrutura e desenvolvimento da psique e suas relaOes que nOs eram negadas pelos primeiros As atitudes do homem em relalio ao conSUmo de carne por exemplo slio muito esclarecedoras no tocante a dinamica das relaoes humanas e as estruturas da personalidade Na Idade Media as pessoas oscilam entre pelo menos tres conjuntos de comportamento no tocante a carne Aqui como em centenas de outros fenomenos notamos a extrema diversidade de comportamento caractedsti ca da sociedade medieval em comparalio com sua equivalente moderna A estrutura social do medievo admite bern pouco a difuslio de modelos desenvolvidos em urn centro social especifico pela sociedade como urn todo Certos ripos de comportamento predominam por vezes no seio de uma dada classe social por todo 0 Mundo Ocidental enquanto em uma diferente classe ou estamento 0 comportamento difere muito Por esta ra zao as diferenas comportamentais entre classes distintas na mesma regilio slio muitas vezes mais acentuadas do que as existentes entre representantes regionalmente separados da mesma classe social E se os tipos de compor tamento passam de uma classe a outra 0 que decerto ocorre 0 que mais os altera radicalmente mesmo e 0 isolamento maior ou menor entre elas A relalio com 0 consumo de carne oscila no mundo medieval entre os dois pOlos seguintes Por um lado na classe alta secular 0 consumo de came e muito alto se comparado com 0 padrao de nossos tempos Pre valece a tendencia de devorar quantidades de carne que nos parecem fan tasticas Por outro nos mosteiros predomina a abstenlio ascetica de toda carne abstenlio esta que resulta de autorenuncia e nlio de carencia e e amiude acompanhada de radical deprecialio ou restrilio a ingestao de alimentos Desses circulos partem manifestaoes de forte averslio a glu tonaria de leigs da classe alta o consumo de carne pela classe mais baixa os camponeses e tam bem com freqUencia muito limitado nlio por necessidade espiritual ou par renuncia voluntaria por causa de Deus ou do aMm mas por mera es cassez 0 gado e caro e por isso mesmo destinado durante longo pedodo apenas as mesas dos dominantes USe 0 campones criava gado diziase56 era principalmente para os privilegiados a nobreza e os burgueses nao esquecendo os religiosos que variavam do ascetismo a aproximadamente o mesmo comportamento da classe alta secular Sao limitados os dados exatos sobre 0 consumo de carne pelas classes aitas na Idade Media e no inicio da era moderna Havia Sem duvida grandes diferenas entre os ca 126 o processo civilizador valeiros e os grandes senhores feudais Com freqiiencia 0 padrao de vida das cavaleiros mal se diferenciava daquele em que viviam os camponeses Um calculo do uso da came de vaca em uma corte do norte da Ale manha em data relativamente recente 0 seculo XVII indica um consumo de cerca de um quilo per capita ao dia alem de grandes quantidades de came de caa aves e peixes As especiarias desempenham papel impor tante e as verduras muito secundrio Outras informa6es apontam mais ou menos na mesma direao Mas 0 assunto precisa ainda ser investigado em detalhe 2 Ja outra mudana pode ser documentada com maisexatidao A maneira como a carne era servida mudou consideravelmente da Idade Me dia ate a epoca atua E das mais inslrutivas a curva dessa mudana Na classe alta medieval 0 animal mortoou grandes parIes do mesmo eram trazidas inteiras para a mesa Nao s6 peixes eaves inteiras as vezes com as penas mas tambem coelhos cordeiros e quartos de veado aparecem na mesa para nao mencionar pedaos maiores de carne de caa porcas e bois assados no espeto o animal e trinchado a mesa Este 0 motivo por que livros sobre boas maneiras repetem ate 0 seculo XVII e as vezes ate no seculo XVIII que e importante que 0 homem educado saiba trinchar bem Discenda a primis statim annis secandi ratio A maneira correta de trinchar deve ser en sinada desde as primeiros anos diz Erasmo em 1530 Quando servindo instrui Courtin em 1672 a pessoa deve sempre dar a outrem a melhor parello e conservar para si a menor e em nada taear exceto com 0 gada Este e 0 motivo por que se urna pessoa de alta categoria lhe pede algo que esta it sua frente e importante que voce saiba como cortar a carne corn elegancia e metoda e identificar as melhores pedacos a fim de pader servila com civilidade A maneira de cortar DaO e ensinada aqui urna vez que se trala de assunto sabre 0 qual foram escritos livros especializados nos quais todas as pecas sao representadas a fim de mostrar onde a carne deve ser inicialmente segurada com urn garfo para cortiiIa pais como dissemos acima a carne nunca deve ser tocada pela mao nem mesmo quando se a come em seguida onde a faca deve ser colocada para oortaIa que pedaco deve ser separado inicialmente qual 0 melhor pedaco e 0 pedaco de honra que deve ser servido a pessoa de mais alta categoria presente E facit aprender a trinchar depois de a pessoa ter frequentado tres ou quatro vezes uma boa mesa e par esta rauo nao IS vergonha pedir desculpa e deixar a outrem a tarefa que mio podemos realizar o equivalente alemao 0 New vermehrtes TriruierBiichlein Novo e ampliado manual de trinchamento impresso em Rintelen em 1650 diz Vma vez que 0 cargo de trinchador em uma corte principesca nao e considerado o mais baixo mas figura entre as mais respeitados a pessoa que 0 exerce deve par conseguinte ser ou da nobreza ou de outra boa origem de corpo espigado e bern proporeionado bons e fortes bracos e maos ageis Em todos os trinehos I J civjljzaiio como transjormariio do comportamento 127 L publicos ela deve absterse de grandes movimentos e de cerimonias inuteis e tolas e tomar todo cuidado para nao ficar nervosa de modo a niio trazer desonra a si mesma por tremor do corpo e das maos e porque de qualquer maneira isto DaO cabe em mesas principescas o mncho e a distribui9ao da carne sao honras especiais A tarefa cabe em especial ao dono da casa ou a h6spedes ilustres a quem ele solicita que realize 0 trabalho Os jovens e os de classe inferior nao devem interferir no ato de servir mas apenas aceitar 0 que Ihes for entregue na sua vez diz a CiviliM fraise anonima de 1714 No seculo XVII 0 trincho da carne a mesa deixa gradualmente de ser na aristocracia francesa uma pericia indispenslivel ao homem do mundo tal como a ca9a a esgrima e a dan9a 0 trecho citado de Courtin indica esse fato 3 0 fato de desaparecer gradualmente 0 costume de colocar na mesa grandes peda90s de animal para serem trinchados Iigase a muitos fatores Urn dos mais importantes talvez scja a redu9ao gradual do tamanho da uni dade familiar como parte do movimento de familias mais numerosas para familias inenores em seguida ocorre a transferncia de atividades de pro dU9ao e processamento como fiaao tecelagem e abate de animais da casa para especialistas artesaos mercadores e fabricantes que as desempenham profissionalmente enquanto a familia tomase basicamente uma unidade de consumo Neste caso tamhem a tenMncia psicol6gica acompanha urn processo social mais amplo hoje causaria repugnancia a muitas pessoas se elas ou outras tivessem que trinchar meio novilho ou urn porco a mesa ou cortar a carne de um faisao ainda adomado com suas penas Hoi mesmo des gens si delicats pessoas tao delicadas para repetir a frase de Courtin com referencia a urn processo correIato para quem a vista de a90ugues com 0 corpo de animais mortos exposlos e sumamente desagradlivel e outras que por senlimentos mais ou menos racionalmente disfar9ados de nojo se recusam terminantemente a comer carne Mas estas sao novidades no patamar de repugnancia que uhrapassam 0 padrao de sociedade civilizada do seculo XX e por isso mesmo sao consideradas anor mais Nao obstante nao podemos ignorar que foram progressos desse tipo S coincidiram com a dirC9ao do desenvolvimento social mais amplo que deram origem no passado a mudan9as de padriio e que este avano espe cifico do patamar da repugnancia encaminhase na mesma dire9ao seguida ate entao Esta dirC9ao e bern clara A partir de urn padrao de sentimentos segundo o qual a vista e mncho de um animal morto a mesa eram coisas realmente agradliveis ou pelo menos nao desagradliveis 0 desenvolvimento levou a outro padrao pelo qual a lembran9a de que 0 prato de carne tern algo aver com 0 sacrificio do animal e evitada a todo custo Em muitos de nossos 128 o processo civilitodor pratos de came a forma do animal e tao disfarada e alterada pela arte de ua preparalio e trincho que quando a comemos quase nlio nos Iembra mos de sua origem Sera mostrado que as pessoas no curso do processo civilizat6rio pro curam suprimir em si mesmas todas as caracteristicas que julgam animais De igual maneira suprimem essas caracteristicas em seus alimentos Nesta area iguairnente 0 desenvolvimento tampouco e uniforme em toda a parte Na lnglaterra por exemplo onde muitos aspectos da vida as formas mais antigas slio mais preservadas do que no continente europeu 0 ato de servir grandes pedaos de came e com eles a tarefaque cabe ao dono da casa de trincMla e serviIa sobrevive sob a forma do quarto com osso e tudo em maior extenslio do que na sociedade urbana da Ale manha e Frana Nlio Obstante inteiramente 11 parte 0 fato de que 0 quarto atual e em si uma forma muito reduzida da colocalio na mesa de grandes pedaos de carne nlio deixou de haver rea6es a ele que assinalam 0 avano do patamar da repugoancia A adolio do sistema russo de maneiras 11 mesa na sociedade em meados do Ultimo seculo foi Ulll movimento nessa dirlio Nossos maiores agradecmentos ao novo sistema diz um livro ingles sobre boas maneiras The Habits of Good Society 1859 slio me recidos por ter ele banido aquele barbarismo insuportavel 0 quarto de boi Coisa alguma pode fazer com que urn quarto de boi para elegante ao mesmo tempo que oculta 0 dono da casa e 0 condena ao sofrimento do trincho A verdade e que a menos que nosso apetite seja multo voraz a vista de tanta carne cheirando mal em seu molho Ii suficiente para destruiIo Inteiramente e um enorme quarto de animal parece escolhido sob medida para repuguar 0 epicurista Se absolutamente consumidos os quartos devem ser postos em uma mesa lateral onde ficarlio longe da vista p 314 A tendencia cada vez mais forte de remover 0 desagradavel da vista aplicase com raras exc6es ao trincho do animal inteiro o ato de trinchar conforme demonstram os exemplos outrora consti tuiu parte importante da vida social da classe alta Depois 0 espetaculo passou a ser julgado crescentemente repugnante 0 trincho em si nlio desa parece uma vez que 0 animal claro tern que ser cortado antes de ser comido o repugnante porem Ii removido para 0 fundo da vida social Especialistas cuidam disso no ougue ou na cozinha Repetidamente iremos ver como e caracteristico de todo 0 processo que chamamos de civilizaao esse movi mento de segregalio este ocultamento para longe da vista daquilo que se tornou repugnante A curva que OCOrre do trincho de grande parte do auimal ou do animal inteiro passando pelo avano do patamar da repug nancia 11 vista dos animais mortos para a transferencja do trincho a enclaves especializados por tras das cenas constitui uma tipica curva civilizadora Resta a ser investigado ate que ponto processos parecidos slio sUbjacen tes a fenomenos semelhantes em outras sociedades Na antiga civilizalio cjvilizaiio como translormaiio do comportamento 129 L chinesa mais qiie em qualquer outra 0 ocultamento do ate de trinchar por tnls das cenas foi efetuado mais cedo e mais radicalmente do que no Ociden teo Na China 0 processo e levado Hio longe que se trincha e corta toda carne em urn lugar inteiramente reservado e a faca e inteiramente banida do usa a mesa o Us da Faca it Mesa 4 A faca iguaimente pela pr6pria natureza de seu uso social reflete mudanas na personalidade humana com suas mutaveis compulsoes e dese jos Bla e materializaao de situaoes hist6ricas e de fidelidades estruturais da sociOOade Uma coisa acima de todas e caracterfstica de seu uso como utensilio da mesa em nossa atual sociOOade ocidental as inumeraveis proibioes e tabus que a ccrcam A faca e com certeza urn instrumento perigoso ja no que poderfainos chamar de sentido racional E uma arma de ataque Provoca ferirnentos e descarna animais que foram abatidos Mas esse aspecto obviamente perigoso esta inado de emoes A faca tornase slmbolo dos sentimentos os mais diversos ligados a sua funao e forma mas nao dOOuzidos Iogicamente de sua finalidade 0 medo que desperta ultrapassa 0 racional e e maior do que 0 perigo calculavel pro vave E 0 mesmo vale quanto ao prazer que seu uso e aparencia despertam mesmo que este aspecto seja hoje menos evidente De acordo com a estru tura de nossa sociedade 0 ritual diario de seu uso e hoje determinado mais pelo desagrado e mOOo do que pelo prazer que a cercaPor isso seu uso mesmo a refeiao e restringido por grande numero de proibioes Estas con forme ja dissemos estendese muito alem do puramente funcional Mas para todas elas nos ocorre facilmente uma explicaao racional em geral vaga e nem sempre facil de se provar S6 quando esses tabus sao examinados em conjunto surge a suposiao de que a atitude social em relatao a faca e as regras que he pautam 0 uso a mesa e acima de tulo os tabus que a cercam sao primariamente de natureza emodona Medo repugnancia culpa associaoes e emooes dos tipos os mais dlspares he exageram 0 peri go rea B e exatamente isto 0 que ancora tao firme e profundamente essas proibit6es na personalidade e hes da 0 carater de tabus 5 Na Idade Media com sua classe dominante de guerreiros e a cons tante disposiao para a luta e em conformidade com 0 estagio de controle de emoes e face aos regulamentos relativamente tolerantes impostos as compulsoes sao muito poucas as proibioes relativas as facas Nao limpe os dentes com a faca e uma exigencia constante mas e a principal proibi tao e nao aponta para futuras restrioes ao utensilio Alem do mais a faca 130 o processo civiizador e de longe 0 utensilio mais importante a mesa Que seja levada a boca e algo que se aceita como natural Mas M indica90es em fins da Idade Media mais diretas ainda que em qualquer periodo posterior de que a cautela necessaria no uso da faca tern origem nao so na considera9ao racional de que 0 individuo pode cortarse ou machucarse de alguma maneira mas acima de tudo na em09ao pro vocada pela vista ou icteia de uma faca apontada para 0 proprio rosto Nao vottes tua faca para 0 rosto Pois hli nisso perigo e grande risco Lemos no Book of Curtesye de Caxton v 28 Aqui como em toda parte mais tarde esta de fato presente 0 elemento de perigo racionalmente calcuhi vel e a advertencia se refere a isso Mas sao a memoria e associa9ao da faca com a morte e 0 perigo 0 significado simbolico do instrumento somados a cada vez maior pacifica9ao interna da sociedade e a gradual preponderancia de sentimentos de desagrado com sua presen9a que levam a limita9ao e sus pensao final de seu uso em sociedade A simples vista de uma faca apontada para 0 rosto provoca medo Nao voltes a faca contra 0 rosto porque nisto ha razao para muito medo Esta e a base emocional de urn poderoso tabu de uma epoca posterior que profbe que se leve a faca a boca o caso e semelhante a proibi9ao que em nossa serie de exemplos foi mencionada pela primeira vez par Calviac em 1560 ao fim do Exemplo E 50 passa uma faca a alguem peguea pela ponta e Ihe ofere9a 0 cabo porque nao seria polido agir de outra maneira Neste exemplo como era tao comum ate que em fase posterior a crian 9a recebesse urna explica9ao racional de todas as proibi90es nenhuma explica9ao e dada para 0 ritual social exceto que nao seria polido proceder de outra maneira Mas nao e dificil perceber 0 significado emocional dessa instru9ao ninguem deve virar a ponta da faca na dire9ao de alguem como se num ataque 0 mero significado simbolico desse ato a recorda9ao de uma amea9a belicosa e desagradave Aqui tambem 0 ritual da faca contem urn elemento raciona 0 individuo poderia usar 0 ato de passar a faca a fim de cravaIa inesperadamente em alguem Urn ritual social e formado em torno desse perigo porque 0 gesto amea9ador em si se enraiza em urn nivel emocional como fonte geral de desagrado simbolo de morte e perigo A sociedade que nessa epoca come9a a limitar cada vez mais os perigos reais que amea9am 0 homem e em conseqiiencia a remodelar sua vida afetiva coloca tambem cada vez mais barreiras em torno dos simbolos dos gestos e dos instrumentos de perigo Aumentam assim as restri90es e proibi90es ao uso da faca juntamente com as limita90es impostas ao individuo 6 Se deixamos de lado os detalhes desse fenameno e estudamos ape nas 0 resultado a forma atual do ritual da faca descobrimos uma espantosa abundancia de tabus de variada severidade 0 imperativo de nunca levar r I civilizorQo como lransjormofiio do comportameno 131 a faca a boca urn dos mais srios e mais conhecidos Quase dispensa dizer que ele exagera em excesso 0 perigo real e provavel isto porque os grupos sociais acostumadosa usalas e comer com elas raramente se machucam ao fazeIo A proibiao transformouse em urn modo de distinao social Na sensaao desagradavel que nos assalta a mera vista de algum pondo uma faca na boca tudo isto se apresenta simultaneamente 0 modo geral que 0 simbolo desperta e 0 medo mais especifico de degradaao social que pais e educadores desde cedo ligaram a essa pratica com suas advertencias de que ista DaD se faz Mas ha outras proibiOes a respeito das facas que pouco ou nada tern a ver com perigo direto ao corpo e que parecem apontar para outros signi ficados simb6licos que nao a associaao com a guerra A proibiao muito rigorosa de se comer peixe COm faca ladeada e alterada hoje pela adoao de uma faca especial parece a primeira vista muito obscura em seu significado emocional embora a teoria psicanalitica aponte pelo menos para uma explicaao Ha uma proibiao muito conhecida de pegar talheres espe cialmente facas com a mao inteira como se fosse urn porrete como diz La Salle embora no caso ele se referisse apenas ao garfo e a colher Exem plo J Ha ainda obviamente a tendencia geral a eliminar ou pelo menos restringir 0 contato da faca com objetos redondos ou ov6ides A mais conhe cida e uma das mais graves dessas proibi6es a relativa a cortar batatas com faca Mas a proibiao menos rigorosa de cortar bolinhos de massa ou abrir ovos quentes com faca aponta tanibm na mesma dirao e as vezes em circulos muito sensiveis encontramos a tendencla de evitar cortar malias ou mesmo laranjas dessa maneira Eu poderia sugerir que nenhum epicurista jarnais cortou malia com faca e que a laranja deve ser descascada com uma colher diz The Habits of Good Society de 1859 e 1889 7 Mas estas proibies particulares mais ou menos rigorosas cuja lista poderia ser certamente ampliada sao em certo sentido apenas exemplos de uma linha geral de desenvolvirnento muito caracterfstica no usa da faca Ha uma tendencja que lentamente se infiltra em toda a sociedade civilizada de alto a baixo no sentido de restringir 0 uso da faca no contexto das tecnicas em uso a mesa e em todos os casos possiveis nao usala em absoluto A tendencia surge pela prirneira vez em urn preceito aparentemente tao trivial e 6bvio como 0 citado no Exemplo I Nao conserve sempre a faca na mao como fazem os camponeses mas peguea apenas quando dela ne cessitar 0 preceito evidentemente muito forte em meados do ultimo seculo quando 0 livro ingles de boas maneiras que acabamos de citar The Habits of Good Society diz Permitame darlhe uma regra tudo 0 que puder ser cortado sem faca deve ser cortado apenas com 0 garfo E prcei sarnos apenas observar 0 uso nos dias de hoje para encontrar confirmada essa tendencia Este urn dos poucos casas claros de um fenomeno que 132 o proceSO civilizador I eslli come9ando a transcender 0 padrao de teenica e ritual ii mesa atingido pela sociedade cortesli Mas claro isto nlio quer dizer que a civiliza9lio do Ocidente continuani realmente nesta dirC9lio E urn come90 uma possi bilidade como tantas outras que surgem em todas as sociedades Ainda assim nlio e inconcebivel que a prepara9lio dos alimentos na cozinha evolua em uma dirC9lio que restrinja ainda mais 0 usa da faca ii mesa deslocandoa ainda rnais do que ate agora para enclaves especializados que se situam em segundo plano Fortes movimentos retroativos nlio slio certamente impensaveis E bern sabido que as condi90es de vida na I Guerra Mundial automaticamente pro vocaram a suspenslio de alguns dos tabus da civilizalio de tempos de paz as trincheiras oficiais e soldados quando necessario comiam usando facas e 0 patamar de delicadeza encolheuse com grande rapidez sob a presslio de uma situa9lio inescapavel A parte essas interruNOes sempre possiveis e que pooem tambem levar a novas configuroes de costumes e bastante clara a linha do desenvolvi mento no emprego da faca 60 A regula9lio e 0 controle das em096es intensi ficamse As instru90es e proibi96es a respeito de urn instrumento amea9ador tornamse cada vez mais numerosas e diferenciadas Finalmente 0 emprego do simbolo ameador e tlio limitado quanto possivel Nlio podemos evitar comparar a dirC9lio dessa curva de civiliza9lio com o costume ha muito praticado na Otina Neste pais como se sabe a faca desapareceu ha muitos seeulns como utensilio de mesa Para muitos chine ses e inteiramente incivil a maneira como os europeus camero Os europeus sao barbaros dizem eles eles camem com espadas Podemos supor que este costume esta ligado ao fato de que desde ha muito tempo a classe alta que criava os modelos na Otina nlio foi guerreira mas uma classe pacifica em altissimo grau uma sociedade de funcionarios publicos eruditos Do Uso do Garfo a Mesa 8 Qual a real utilidade do garfo Serve para levar a boca a comida que ja foi cortada Por que precisamos de urn garfo para fazer isso Por que nlio usamos os dedos Porque isso to coisa de canibal como disse em 1859 o Romem ii Janela do Clube 0 anonimo autor de The Habits of Good Society Par que to coisa de canibal comer com os dedos Isso nlio to per gunta E evidentemente canibalesco barbaro incivil au a que quer mais que se queira chamaIo Mas essa to exatamente a pergunta Par que to mais civilizado comer com garfo Porque e antihigienico comer com as dedas 18to parece convincente Para nossa sensibilidade e antihigienico se diferentes pessoas poem as dedOS r civiizaiio como translormaiio do camportamenta 133 nO mesmo prato porque M 0 perigo de contagio de doenas atraves de contatos com elas Parece que tdos tememos que os outros estejam doentes A explicaao porem nao satisfaz inteiramente Hoje nao comemos em pratos comuns Todos levam 11 boca a comida que tiraram do proprio prato PegaIa no proprio prato com os dedos nao pode ser mais antihigienico do que levar 11 boca com os dedos urn pedao de bolo de pao de chocolate ou qualquer outra coisa Neste caso por que precisamos realmente de garfo Por que e barbaro e incivil levar 11 boca com a mao a comida tirada do proprio pratu Porque e repugnante sujar os dedos ou pelo menos ser visto em sociedade com os dedos sujos A eliminaao do ato de comer com a mao do proprio prato pouco tem a ver com 0 perigo de contrair doena a chamada explicayiio racional Estudando nossos sentimentos em relaao ao ritual do garfo podemos ver com especial c1areza que a primeira autoridadeem nossa esco lha entre comportamento ucivilizado e incivil amesa e 0 nosso sentimento de repugnancia 0 garfo nada mais e que a corporificaao de um padrao especifico de em6es e um nivelespecifico de nojo Por tras da mudanya nas tecnicas 11 mesa ocorridli entre a Idade Media e os tempos modemos reaparece 0 mesmo processo que emergiu na analise de outras explicita6es desse mesmo processo uma mudana na estrutura de impuisos e em6es Tipos de comportamento que na Idade Media nao eram julgados no minimo repugnantes sao crescentemente acompanhados de sentimentos desa gradaveis 0 padrao de delicadeza encontra expressao em proibi6es sociais correspondentes Esses tabus tanto quando podem ser apurados nada mais sao do que sentimentos rituaJizados ou institucionalizados de desagrado anti patia repugnancia medo ou vergonha sentimentos estes que foram social mente aJimentados em condi6es muito especificas e que sao constantemente reproduzidos nap s6 mas principalmente porque se tornaram institucional mente enraizados em urn dado ritual em dadas formas de conduta as exernplos demonstram uma amostragem certamentc limitada e numa seleao algo aleatoria de afirma6es como na fase de desenvolvi mento na qual 0 uso do garfo ainda nao era considerado natural e lenta mente ampliada a sensaiio de desagrado que primeiro se formou em urn circulo fechado E muito grosseiro diz Courtin em 1672 Exemplo G Htocar qualquer caisa gordurosa molho xarope etc com as dedas a pane o fato de que isto 0 obriga a cometer mais dois ou tres atos indelicados Urn deles seria enxugar freqiientemente a mao no guardanapo e sujaIo como se fosse um trapo de cozinha de modo que as pessoas que 0 vissem limpar a boca com ele se sentissem nauseadas Outro seria limpar os dedos no pao o que mais uma vez e sumamente grosseiro N B Os termos franceses prope e malpropre usados por Courtin e explicados em um de seus capitulos coincidem menos com os termos alemaes relativo a llmpo e sujo sauber 134 o procelJSO civilizador r e unsauber do que a palavra mais freqUente no passado proper 0 ter ceiro seria lambelos 0 que constitui 0 auge da falta de educa9aO A Civilite de La Salle Exemplo J 1729 que ensina a conduta da c1asse alta a circulos mais amplos relata em uma de suas paginas Quando os dodos estao engordurados limpeos primeiro com um peda90 de pao Isto mostra como estava longe de ter aceita9aO geral mesmo nessa epooa o padrao de delicadeza que eourtin ja propusera decadas antes Por outro lado La Sallerepete literalmente 0 preceito de Counin de que a Bienseance nao pennite que se toque com os dedos qualquer coisa gordurosa tampouco molhos ou xaropes E exatamente como Caurtin menciona entre as incivi lites que se seguem limpar os dedos no pao e lamber os dedos alem de sujar 0 guardanapo Padese ver que as maneiras nestes casos continuam em processo de fonna9aO 0 novo padrao nao surge da noite para 0 dia Algumas fonnas de comportamento sao proibidas nao porque sejam antihigienicas mas por que sao feias 11 vista e geram assooia90es desagradaveis A vergonha de dar esse espetaculo antes ausente e 0 medo de provocar tais associR9iies difun demse gradualmente dos circulos que estabelecem 0 padrao para outros mais amplos atraves de numerOSas autoridades e institui90es Nao obstante uma vez sejam despertados e firmemente estabelecidos na sooiedade esses senti mentos atraves de certos rituais COmo 0 que envolve 0 garfo sao constan temente reproduzidos enquanto a estrutura das rela90es humanas nao for fundamentalmente alterada A gera9ao mais antiga para quem esse padrlio de conduta e aceito como natural insiste com as crian9as que nao vern ao mundo ja munidas desses sentimentus e deste padrao paia que se controlem mais ou menos rigorosamente de acordo com os mesmos e contenham seus impulsos e inclina90es Se tenta tocar alguma coisa pegajosa umida ou gor durosa com os dedos a crian9a e repreendida Voce nao deve fazer isso Gente fina nao faz isso E 0 desagrado com tal conduta que e assim des pertado pelo adulto finalmente cresce com 0 habito sem ser induzido por outra pessoa Em grande parte contudo a conduta e vida instintiva da crian9a sao postas 11 for9a meSmo sem palavras no mesmo molde e na mesma dirC9aO pelo fato de que urn dado usn da faca e do garfo por exemplo esta intei ramente firtnado no mundo adulto isto e pelo exemplo do meio Uma vez que a pressao e coa9lio exercidas por adultos individuais e aliada da pressao e exemplo de todo 0 mundo em volta a maioria das crian9as quando crescem esquece ou reprime relativamente codo 0 fato de que seus sentimen tos de vergonha e embarR9o de prazer e desagrado Sao moldados e obrigados a se conformar a certo padrao de pressao e compulsao externas Tudo isso Ihes parece altamente pessoal algo intemo implantado neles pela natureza Embora seja ainda bern vislvel nos escritos de Courtin e La Salle que os adultos tambem foram inicialmente dissuadidos de comer Com os dodos por consideraao para com 0 proximo par polidez para poupar a outros um espetaculo desagradavel e a si mesmos a vergonha de serem vistos com as IDaOS sujas mais tarde isto se torna cada vez mais urn automatismo interior a marca da sociedade no ser interno 0 superego que proibe ao individuo comer de quaiquer maneira que nao com 0 gado 0 padrao social a que 0 individuo fora inicialmente obrigado a se conformar porrestriao externa e finalmente reproduzido mals suavemente ou menos no seu intimo atraves de urn autocontrole que opera mesmo contra seus desejos conscientes Desta forma 0 processo sociohistorico de seculos no curso do qual o padrao do que e julgado vergonhoso e ofensivo e lentamente elevado reencenase em forma abreviada na vida do ser humane individual Se qui sessemos expressar processos repetitivos desse tipo sob a forma de leis po deriamos falar como urn paralelo as leis da biogenese de uma lei funda mental de sociogenese e psicogenese r I civilizQfiiO como transformafao do comporamento 135 v Mudanfas de Atitude em Relafiio a Funfoes Corporais Exemplos Sceulo XVI A De Sensuivent les contenances de la table VIU Antes de sentarse certifiquese de que seu assento nao roi emporcathado B De Ein spruch der ze tische k2rt 329 Nao se toque por baixo das roupas com as mAos nuBS C 1530 Extraido de De civilitate morum plIerilium de Erasmo Os excertos foram retirados da edilio de Col6nia de i530 que provavelmente ja fora lanada com finalidades educativas Sob 0 titulo aparece a seguinte nota Reconhe cida pelo autor e elucidada com novos esc6Iios por Gisbrtus Longolius Ul trajectinus Col6nia no ano XXX 15300 fato de essas questoes serem 136 o processo civiliador discutidas de tal rnaneira em Iivros escolares torna particuiarmente clara a diferen9a com atitudes posteriores E indelicado cumprimentar alguem que esteja urinando ou defecando A pessoa bern educada sempre deve evitar expor sern necessidade as partes as quais a natureza atribuiu pudor Se a necessidade Ii compete isto deve ser leito com decencia e cesena mesmo que ninguem mais esteja presente Isto porque 08 anjos estao sempre presentese oada mais Ihe agrada em urn menino do que pudor 0 companheiro e guardiao da decencia Se produz vergonha moa tealas 80S olhos dos demais ainda menos devem set elas expostas peto toque Prender a urioa e prejudicial a saude e urinar em segredo diz bern do pudor HfL aqueles que ensinam que 0 menino deve prender os gases com primindoos no intestino Mas nao e conveniente esforcandose para parecer educado contrair uma doenea Se for passivel retirarse do ambiente que isto seja feito a S68 Mas em caso contrario de acordo com 0 antigo proverbio que a tosse esconda 0 sam Alem do mais por que esses mesmos trabalhos nao ensinam que meninos nao devem defecar urna vez que6 mais perigoso prender os gases do que conter os intestinos Istoe comentado assim nos esc6lios p 33 Para contrail uma doenea Escute a velha maxima sabre 0 sam do vento Se ele puder ser salta sem ruido isto sera melhor Mas ainda methor ser saito com ruido do que contido A esta altura porem teria sido uti suprimir a sensacao de embaraeo de modo au a acalmar 0 corpo ou seguindo 0 conselho de todos os medicos apertar bern juntas as ntidegas e agir de acordo com as sugestoes do epigrams de Aethon Fazia de tudo para nao peidar explosivamente em Iugar sagrado e orou a Zeus embora com as nauegas comprimidas 0 som do peido espe cialmente das pessoas que se encontram em lugar elevado e horrivel Sacriffcios devem ser feitos com as ntidegas fortemente comprimidas Tossir para ocultar 0 som explosivo Aqueles que pOrque esUio embara cados mlo querem que 0 vento explosivo seja escutado simulam urn ataque de tosse Siga a regra de uma quilfade Substitua os peidos por acessos de tOlse Considerando a insalubridade de reter 0 peido Ha uns dois versol no volume II dos epigramas de NicharchOs em que ele descreve a capacidade do peido retido de provocar doencas mas uma vez que esses versos sao citados por todo mundo nio vou comentalos aqui o cuidado e a seriedade irnperturbliveis com que sao publicarnente discutidas questoes que rnais tarde tomararnse altarnente privadas e rigo rosarnente proibidas em sociedade deixa bern clara a rnudan9a da fronteira do ernbara9o 0 fate de que sentirnentos de vergonha sao rnencionados fre qiiente e explicitarnente na discussao rnostra bern a diferena no padrao D 1558 De Galateo de Del1a Casa extrafdo da edi9ao em cinco idiornas Genebra 1609 p 32 Alem do mais nao fi bern a urn homem decoroso e honrado prepararse para se aliviar oa presenca de outraspessoas nem ergner 8 roupas depois civjlizariio como transormariio do comportamento 137 na presenca delas Analogamente nao lavani as maos ao voltar para a soeie dade decente vindo de lugares privativos uma vez que a razao para lavatas provocani pensamentos desagradaveis nas pessoas Pela mesma razao nao e ha bito refinado Quando se encontra alguma coisa repugnante oa rua como as vezes acontece virarse imediatamente para 0 companheiro e Ihe chamar a atncao para isso E ainda mais incorreto segurar a coisa ma1cheirosa para que 0 Dutro a cheirt como alguns tern 0 costume de fazer e que mesffiO insistam em que o outro faea isso erguendo a coisa fedorenta ate suas narinas e dizendo Ell gostaria de saber 0 que e que voce aeba disto quando seria melbor dizer Porque fede nao a cheire E 1570 Dos Regutamentos da Corle de Wernigerode 1570 o individuo nao deve como rusticos que DaO Creqiientaram a corte ou viveram entre pessoas refinadas e respeitaveis aliviarse sem vetgonha ou reserva na Crente de senhoras ou diante das portas ou janetas de cAmaras da corte ou de outros aposentos Muito ao contrario todos devem em todas as ocasiOes e em tod05 os lugares comportarse de modo sensato cortas e respeitoso em palavra e gesto F 1589 Dos Regu1amentos da Corle de Brunswick 1589 Que ninguem quem quer que passa ser antes durante ou ap6s as reIeis cedo ou tarde suje as escadas corredores ou armario com urina ou outras sujeiras mas que vA para os locais prescritos e convenientea para se aliviar G c 1619 Richard Weste The Booke of Demeanor and the Aowance and Dissallo wanee of Certaine Misdemeanors in Companie 143 Nao permitas que teus membros intimos sejam expostos a vista e mui vergonhoso e exeerando detestAvel e rude Nao segures a urina ou os gases que incomodam teu corpo desde que 0 faeas em segredo nao to perturbes por isso 138 o processo civilizador H 1694 Da correspondencia da duquesa de Orleans 9 de outubro de 1694 outra fonte data esta carta de 25 de agosto de 1718 o cheiro do lodacal e horrivet Paris e urn lugar horroroso As ruas cheiram tao mal que DaD se pode sair de casso 0 calor extreme esta provocando 0 apodrecimento de grande quantidade de carne e peixe e isto juntamente COm a multidiio de pessoas que fazem na rua produz urn cheiro tao detesMvel que nAo pode set suportado I 1729 De Les Regles de la biensearue et de la civilite chretienne de La Salle Rouen 1729 pag 45 e segs Faz parte do decoro e do pudor cobrir todas as partes do carpo com excecao da cabe8 e das maos Devese tomar cuidado para nao toear com as maos nuas qualquer parle do corpo que nao e habitualmente deixada descoberta E se for obrigado a assim proceder ista deve seT leita com grande cautela Voce precisa acostumarse 80 sofrimento e ao desconforto sem se contorcer esfre garse ou coarse E muito maiscontrario a decncia e a propriedade tocar ou ver em outra pessoa principalmente do sexo oposto aquilo que os Ceus profbem que voce olhe em si mesmo Quando precisar urinar deve sempre retirarse para urn local nao freqiientado E e correto mesmo no caso de criancas cumprir outras func6es naturais em locais onde nio possaro ser vistas E muito grosseiro soUar gases do corpo quando em companhia de oulras pessoas seja par cima seja por baixo mesrno que islo seja leila sern ruido Esta regra que esta de acordo com 0 costume mais recente e exatamente o oposto do prescrito nos Exemplos C e G E vergonhoso e indecente assim preceder de maneira que possa ser escutada por outras pessoas Nao e nunca correto referir se a partes do corpo que devem ficar cobertas nem de certas necessidades corporais a que a Natureza nos sujeitou nem mesmo mencionsIas o desenvolvimento alemao foi algo mais lento que 0 frances Conforme demonstra a seleao seguinte em data tao recente como a primeira metade do secul0 XVIlI e recomendada uma norma que consiste no mesmo padrao de maneiras encontrado no trecho de Erasmo citado acima E indelicado cumprimentar alguem que esteja urinando OU defecando J 1731 Da obra de Johann Christian Barth A Etica galame na qual se mostra como wn moro deve fazerse apreciado no mundo galante atraves de moes reinadas e palavras agratMveis Escrito especialmente para 0 proveito e prazer r I L civiltarao como Iranslormaciio do comportamemo 139 de IOdos as apreciadores das boas maneiras de hoje em dia 4 ed Dresden e Leipzig 1731 p 288 Se passsr por uma pessoa que eshi se aliviando voc6 deve comportarse como se nla a visse de maDeira que 6 indelicado cumpriment41a K 1774 Da obra de La Salle Les Regles de la bienseance et de fa civilile chretienne ed de 1774 p 24 0 capitulo intitulado Das Partes do Corpo que Devem ser Ocultadas e das Necessidades Naturais cobre nada menos que duas paginas e meia na edilio anterior e mal chega a uma e meia na edilio de 1774 0 trecho Devese tomarcuidado para nlio tocar etc oS omitido Muita coisa que podia e devia ser mencionada nlio oS rnais referida Faz parte do deearo e do recata cobrir todas as parte do corpo exceto a cabeca e 8J milos No tocante as necessidades naturaisJ 6 correta mesmo no caao de crian satisfazelas apenas oode a pessoa nia puder ser vista Niio IS nunea certo referirse as partes do tarpa que devem estar sempre escondidas e As neceuidades corporais a que a natureza nOl sujeitou ou mesmo mencion41as L 1768 Carta de Madame du Deffand a Madame de Choiseul 9 de maio de 1768 eo transcrita como exemplo do valor de prestigio de certo utensilio Eu galteria de Ihe contar Querida avO como contei ao reverendlssimo ahade a minha enorme surpresa quando urn grande saeo que a senhoTa me enviou foi trazido A minha cama na manhA de ontem Apresseime a abril0 enfiei a mao e eneontrei uma boa quantidade de ervilhas verdes e tamb6m urn vaso que rapidamente tirei dati de dentro era urn urinol Mas era de tal beleza e magnificeneia que as pessoas de minha famnia disseram a uma s6 VOZ que ele devia ser usado como molheira 0 urinal icou em exposiriio durante toda a noite de ontem e joi admirado par todos Quanto As ervilhas n6s as comemos ate nilo sobrar Dada Algumas Observar5es sabre as Exemplas e sabre estas Mudanas em Geral 1 Os versos courtois pGUCO dizem sobre esteassunto SaG relativa mente pOucas as injun5es e proib5es sociais nesta area Neste particular tambem pelo menos na sociedade secular tudo e mais descontraido mais frouxo Nem as proprias fun6es nem falar sobre elas ou as associa6es que despertam sao assuntos taG intimos e privadGs tao carregados de sentimen tos de vergonha e embarao como se tornariam mais tarde I 140 o processo civilizodor o Iralado de Erasmo assinala lambern no loeanle a essas areas urn ponlo na curva de civiliza9ao que represenla por urn lado uma nolavel ele va9ao do patamar de vergonha em compara9ao com a epoca precedente e por oulro se confronlado com lempos mais recenles uma Iiberdade na refe rencia a fun5es naturais uma falta de vergonha que para a maioria das pessoas que adolam 0 padrao alual pode a principio parecer incompreensivel e nao raro embaraosa Mas ao mesmo lempo e muito claro que esse tralado lem precisamente a fun9ao de cullivar senlimenlOS de vergonba A referencia 11 onipresen9a de anjos usada para juslificar 0 controle de impulsos aos quais a crian9a esta acostumada e bern caracledslica A maneira como a ansiedade e desper lada nos jovens a fim de for9aIos a reprimir 0 prazer de acordo com 0 padrao de condula soeial muda com a passagem dos seculos Aqui a ansie dade despertada em conexao com a renuncia 11 salisfa9ao instinliva e ex plicada a si mesmo e aos demais em lermos de espiritos eXlemos Alguro tempo depois a reslri9ao aUloimposta junlamenle com 0 medo a vergonha e a recusa a comeler qualquer infra9ao frequentemente apareee pelo menOS na classe alla na soeiedade aristoenilica de corle como vergonha e medo a outras pessoas Em circulos mais amplos reconhecidamente a refereneia a anjos da guarda e usada durante muito tempo como instrumenlo para con dicionar crian9as Diminui urn POllCO quando raz5es higienicas e de saude reeebcm mais enfase e se pretende obter urn cerlo grau de controle dos impulsos e das em09Ocs Essas razoes higienicas passam entao a desempe nhar urn papel imporlante nas ideias dos adullos sobre 0 que e civilizado em geral sem que se perceba que rela9ao elas lem com 0 condicionamenlo das crian9as que esta sendo pralicado Apenas a partir dessa pereeP9ao con ludo e que 0 que ha nelas de raeional pode ser distinguido do que e apenas aparenlemente racional iSlo e fundamentado principalmenle na repugnancia enos sentimentos de vergonha dos adullos 2 Conforme ja mencionamos em sell tratado Erasmo funciona como indicador de urn novo padrao de vergonha e repugnancia que come9a a se formar lenlamenle na alIa classe secular Mas ainda assim fala como se fossem naturais caisas que depois tornaramse embara90sas quando men cionadas Romem cuja delicadeza de senlimenlos e demonstrada uma vez apos outra nesse mesmo Iralado ele nada ve de mal em chamar por seus nomes fUD90eS corporais que de acordo com flOSSOS padr6cs atuais nao podem ser sequer mencionadas em seeiedade e ainda menos em Iivros sobre eliquela Mas nao h3 conlradi9ao entre essa delicadeza e esla preoeupa9ao Ele fala a parlir de oulra fase de controle e dominio das em09Ocs A diferen9a de padrao vigenle na sociedade de Erasmo lornase claro quando lemos como era comum encontrar alguem qui urinam rOOdil aul alvum exonerat urinando ou defecando E a maior liberdade com que pessoas podiam nessa epoea satisfazer e falar de suas fun90es corporais diante 1 civilizariio como transtormariio do comportamenlo 141 l de outras pessoas lembra 0 comportamento que aindahoje pode ser encon trado em todo 0 Oriente Mas a delicadeza impede que se cumprimente alguem encontrado nessa situaao A diferena de padrao e visivel tambem quando ele diz que nao e de born tom exigir que 0 jovem ventris flatum retineat prenda as ventosida des porque ele poderia por urbanidade contrair uma doena E faz comen tarios semelhantes sobre 0 espirrar e outros atos Notese que em seu tratado nao sac freqiientes os argumentos de natu reza medica Quando aparecem e quase sempre como no caso acima para se opor a exigencia de que se restrinjam fun6es naturais ao passo que mais tarde sobretudo no seculo XIX cles servem quase sempre como instrumen tos para compelir ao controle e a renuncia de uma satisfaao instintiva SO no seculo XX e que aparece uma ligeira relaxaao 3 as exemplos extraidos da obra de La Salle devem ser suficientes para indicar como estava se desenvolvendo 0 sentimento de delicadeza Mais uma vez e muito iustrutiva a diferena entre as edi6es de 1729 e 1774 Indubitavelmente mesmo a ediao anterior ja mencona urn padrac de deli cadeza muito diferente do que e encontrado no tratado de Erasmo A exigen cia de que todas as fun6es naturais sejam vedadas a vista de outras pessoas e feita de maneira inequivoca mesmo que 0 modo pelo qual e formulada indique que 0 comportamento real das pessoas adultas e crianas nao se conforma ainda amesma Embora diga que nao e muito delicado ate mesmo falar de tais fun6es ou das partes do corpo nelas envolvidas La Salle ainda assim as descreve com uma minucia de detalhes que nos espanta Da as coisas seus verdadeiros nomes ja que nao constam da Civiiite de Courtin datada de 1672 que se destinava ao uso das classes altas Na segunda ediao do livro de La Salle igualmente sao omitidas todas as referencias detalhadas Cada vez mais essas necessidades sao ignoradas Simplesmente lembraIas ternase embaraoso para a pessoa na presena de outras que nao sejam muito intimas e em sociedade tudo 0 que mesmo remota ao associativamente as lembre e evilado Ao mesmo tempo os exemplos deixam claro a lentidao com que se de senvolvia 0 processo de suprimir essas fun5es da vida social Material sufi ciente 66 sobreviveu exatamente porque 0 silencio sobre esses assuntos nao ra observado antes ou 0 era menos a que em geral falta 6 a ideia de que informaao desse tipo tenha mais do que valor de curiosidade e por isso mesmo ela raramente e sintetizada em uma ideia da linha geral do desen volvimento Nao obstante se adotamos urn ponto de vista abrangente emerge urn padrao que e tipico do processo civilizatorio 4 No inicio essas fun6es e sua exposiao Sao acompanhadas apenas de leves sentimentos de vergonha e repugnancia e por isso mesmo sujeitas apenas a modesto isolamento e controle Sao aceitas como tao naturais como 142 o processo civilitador pentear os cabelos ou calar os sapatos As crianas eram portanto condicio nadas de maneira analoga para uma coisa ou outra Conta em sequencia exata diz 0 mestreescola a urn aluna em urn livro escolar de 1568 os dialogos de Mathurin Cordier para escolares 61 0 que fizeste entre acordar e tomar 0 desjejum Escutai com toda atenao me ninos para que aprendais a imitar vaSSa colega Acordei diz 0 aluno usaf da carna vesti a camisa ca1cei as meias e os sapatos fechei 0 einto urinei na parede do patio tirei agua do balde e lavei as maos e 0 rosto secandoos com urn pano etc Em epocas posteriores 0 ato praticado no patiO pelo menos em urn livro escrito como este expressamente como manual de instruao e exemplo teria sido simplesmente ignorado como sem importiincia Neste caso nao e particularmente sem importancia nem importante E aceito como na tural como qualquer outra coisa A crianga que quisesse contar hoje essa necessidade 0 faria OU COffiO urna especie de piada encarando 0 convite do mestre literalmente demais ou se referiria a ela usando de circunl6quiOS Mas com toda a probabilidade esconderia seu embarao COm urn sarrisa e urn sorriso Ude compreensao dos colegas expressao de uma pequena infragao de urn tabu seria a reaaO A conduta dos adultos corresponde a esses diferentes tipOS de condicio namentO Durante muito tempo a rna e quase todOS OS locais onde a pessoa por acaso se encontrasse serviam para a rnesma finalidade que 0 muro do patio mencionado acima Nao e nem mesmo raro recorrer aescada aOS cantOS da sala ou aos beirais das muralhas de urn castelo se a pessOa sente tais necessidades Os Exemploo E e F deixam isto claro Mas mostram tambem que dada a interdependencia especifica e permanente das muitas pessoas que viviam na corte uma pressao era exercida de cima no sentido de urn controle mais rigorOSo dOS impulsos e pm conseguinte para maior autodominio o controle mais rigoroso de impulsOS e emOgoes e inicialmente imposto por elementos de alta categmia social aos seus inferimes ou no maximo aos seus socialmente iguas S6 relativamente mais tarde quando a classe burguesa compreendendo urn maior numero de pares sociais tornase a classe superior governante e que a familia vern a ser a unica ou para ser mais exata a principal e dominante instituigao com a fungao de instilar con trole de impulsos S6 entao a dependencia social da crianga face aos pais tornase particularmente importante como alavanca para a regulagao e mol dagem socialment requeridas dos impulsos e das emOgoes No estagio das cortes feudais e ainda mais nas dos monarcas absolutos elas proprias desempenhavam em grande parte eSSa fungao para a classe alta No estagio posterior boa parte do que se tornou segunda natureza para nos nao havia sido ainda inculcado dessa forma como urn autocontrole auto matico urn habito que dentro de certos limites funciona tamhem quando a pessoa esta sozinha Ao contrario 0 controle dos instintos era inicialmente civilizariio como lransforma9iio do comportameno 143 imposto apenas quando na companhia de outras pessoas isto e mais cons cientemente por razoes sociais Tanto 0 tipo como 0 graude controle corres pondem a posilio social da pessoa que os impoe em relalio a posilio da queles em cuja companhia esta Isto muda lentamente a medida que as pessoas se aproximam mais socialmente e se torna menos rigido 0 carater hierarquico da sociedade Aumentando a interdependencia com a elevalio da divisao do trabalho todos se tornam cada vez mais dependentes dos demais os de alta categoria social dos socialmente inferiores e mais fracos Estes ultimos tornamse a tal ponto iguais aos primeiros que eles os social mente superiores sentem vergonha ate mesmo de seus inferiores S6 nesse momenta e que a armadura dos controles e vestida em urn grau aceito como natural nas sociedades democraticas industrializadas Tirando da riqueza de exemplos urn unico caso que mostra com parti cular clareza 0 contraste que bern compreendido lana luz sobre todo 0 fenomeno Della Casa da em seu Galateo uma lista de maus procedimentos que devem ser evitadcs A pessoa nao deve cair no sono quando em com panhia de outras nao deve tirar cartas do bolso e Ielas nlio deve aparar e limper as unhas Alem disso continua ele p 92 a pessoa nao deve sentarse de costas ou com 0 posterior voltado para outra nem elevar uma coxa tao alta que membras do corpo humano que devem estar recatada mente cobertos em todas as ocasioes possam ficar expostos a vista Porque isto e coisas semelhantes naG se fazem exceto entre pessoas ante as quais niio sentimos vergonha se non tra qnelle persone ch lhuom nOn riverisce E verdade que um grande senhor pode fazer isso diante de um de seus ser vifais ou na presenra de um amigo de classe inferior parque assim proce dendo niio demonstraria arroglincia mas sim particular afeifilo e amizade Ha pessoas diante das quais nos sentimos envergonhados e outras com quem isso nao acontece 0 sentimento de vergonha e evidentemente uma funao social modelada segundo a estrutura social Ista talvez nao seja expressado com tanta clareza 0 comportamento correspondente porem esta amplamente documentado Na Franao ainda no secnlo XVII reis e grandes senhores recebiam inferiores que hes mereciam especial favor em ocasi6es em que como diria mais tarde 0 ditado alemao ate mesmo 0 imperador deveria ficar sozinno Receber inferiores quando se acordava e estava se vestindo ou indo dormir foi coisa natural durante todo urn periodo E mostra exatamente 0 estagio em que estava 0 sentimento de vergonha quando a amante de Voltaire a marquesa de Chatelet fica inteiramente nua diante de urn servial durante 0 banho de tal maneira que 0 deixa perturbado e enta 0 repreende porque 0 lacaio nao esta derramando corretamente a ligna quente O o comportamento que em sociedades industrializadas mais democratiza das e cercado de tabus por todos os lados com sentimentos inculcados de vergonha ou embarao em graus variaveis e neste caso adotado apenas em L 144 o processo civilizador parte E omitido na companhia de pessoas de categoria igual ou inferior Nesta area tambem a coaao e 0 controle SaO autoimpostos da mesma ma neira que foi vista antes no tocante as maneiras a mesa Nem acredito lemos no Galateo p 580 que seja correto servir urn prato comum desti nado a todos os convidados a menos que a pessoa que serve seja de cate goria social mais alta de modo que os que SaO servidos se sintam por isso especialmente homenageados Isto porque quando feito entre iguais parece que aquele que serve se coloca parciaImente acima dos outros Nessa sociedade hierarquicamente estruturada todos os atos praticados na presena de numerosas pessoas adquiriam valor de prestigio Por este motive 0 controle das emo6es aquilo que chamamos polidez revestia uma forma diferente da que adotou mais tarde epoca em que diferenas externas em categOria haviam sido parcialmente niveladas 0 que se menciona aqui e um caso especial de intercmbio entre iguais que uma pessoa nao deve servir outra e que mais tarde se toma a pratiea gera Em sociedade todos Sl servem pessoalmente e todos comeam a comer no mesmo momento A situaao e analoga no tocante a exposiao do corpo Inicialmente tomase uma infraao repugnante mostrarse de qualquer manera diante de pessoas de categoria mais alta ou iguaI Mas no caso de inferiores a semi nudez ou mesmo a nudez pode ate ser sinal de benevolencia Porem depois quando todos se tornam socialmente mais iguais a pratica lentamente se torna mal vista em qualquer caso A referencia social a vergonha eao embaro desaparece cada vez mais da consciencia Exatamente porque a injunao social de nao se mostrar ou desincumbirse de fun6es naturais opera nesse momento no tocante a todos e e gravada nesta forma na criana ela parece ao adulto uma injunao de seu pr6prio ser interno e assume a forma de um autocontrole rnais ou menos total e automatico 5 Este isolamento das fun6es naturais da vida publica e a corres pondente regulao ou moldagens das necessidades instintivas pocem s6 se tomaram possiveis porque juntamente com a sensibilidade crescente surgiu um aparelhamento tennico que solucionou de maneira muito satisfat6ria 0 problema de eliminaao dessas funoes na vida social e seu deslocamento para locais mais discretos A situaao nao foi diferente no tocante as manei ras it mesa 0 processo de mudana social e 0 avano das fronteiras da ver gonha e do palamar de repugnncia nao podem ser explicados por qualquer eondiao isolada e decerto nao pelo desenvolvimento da tecnologia OU pelas descobertas cientificas Muito ao contrario nao seria dificil demonstrar as bases socogeneticas e psicogenelicas dessas invenoes e descobertas Uma vez posta em movimento a reformulaao das necessidades huma nas devido a transformaiio generaIizada das rela6es entre os homens 0 desenvolvirnento de aparelhagem tecnica correspQndente ao padrao mudado consolidou os novos habitos em um grau extraordinario Este aparelho con tribuiu para a reproduao constante do padrao e para sua disserninaiio cjviizaiio como ransjormariio do comportamento 145 Nao deixa de ser interessante observar que hoje Mcada de 1930 epoca em que este padrao de conduta se consoJidou tanto que 0 aceito como inlei ramente natural certa relaxaao esta comeando sobretudo em comparaao com 0 seculo XIX pclo menos no que diz respeito a referencias verbais a funoes corporais A liberdade c despreocupaao com que as pessoas dizem o que tern que ser feito sem 0 menor embaraco sem 0 riso au 0 sorriso forado que acompanham urn tabu infringido aumentaram visivelmente no periodo do pasguerra Mas isto tal como os costumes modernos de banho e dana 0 possivel apenas porque 0 nivel habitual de autocontrole tcnica e institucionalmente consolidado a capacidade do individuo de restringir suas necessidades e comportamento de acordo com os sentimentos mais atuais sobre 0 que 0 desgostoso foram atingidos 0 que se observa e uma relaxa ao dentro do contexto de urn padrao ja firmemente radicado 6 0 padrao que esta emergindo em nossa fase de civilizaao caracte rizase par uma profunda discrepancia entre 0 comportamento dos chamados aduItos e das crianas Estas tern no espao de alguns anos que atingir 0 nivel avanado de vergonha e nojo que demorou scuIos para se desenvolver A vida instintiva delas tern que ser rapidamente submetida ao controle rigo roso e modelagem especifica que dao a nossa sociedade seu carater e que se formou na lentidao dos sculos Nisto os pait sao apenas os instrumentos arniude inadequados os agentes primarios do condicionamento Atraves deles e de miIhares de Ol1tros instrumentos e sempre a sociedade como urn todo todo 0 conjunto de seres humanos que exerce pressao sobre a nova geraao levandoa mais perfeitamente ou menos para sens fins Na Idade Media tambern era a sociedade como urn todo que exercia essa pressao formativa mesmo que conforme demonstraremos adiante em maior detaIhe os mecanismos e 6rgaos de condicionamento particularmen te na classe alta foosem muito diferentes dos que temos hoje Mas acima de tudo 0 controle e 0 comedimento aos quais a vida instintiva dos adultos estava sljeita foram muito menores do que na fase seguinte da civilizaao como em conseqiiencia foi tambem menor a diferena em comportamento elltre adultos e crianas As inclinaoes e tendencias individuais que os escritos medievais sobre etiqueta buscavam controlar eram com freqiiencia as mesmas que podem ser hoje facilmente observadas nas crianas Nao obstante elas sao tratadas hoje lao cedo que certos tipos de mau procedimento que eram muito co muns no mundo medieval raramente se manifestam na vida social de nossos dias As crianas sao hoje advertidas a nao pegar na mesa 0 que querem a DaO se carem e DaO tocarem no nariz orelhas ouvidos ou outras partes do corpo quando se senlam para comer Sao educadas para nao falar ou heber com a boca cheia derramar coisas na mesa e assim por diante Muilas dessas regras jli sao encontradas no Hofzucht de Tannhauser por exemplo 146 o processo civilizador mas dirigidas nao a crian93S e sim inequivocadamente a adultos Isto se torna ainda mais claro se nos lembramos da maneira como os adultos satis faziarn suas necessidades naturais Isso freqtientemente ocorria como mos tram as exemplos deuma maneira que em criancas hoje apenas seria tolerada Com grande freqiiencia as necessidades eram satisfeitas onde e quando sentidas 0 grau de comedimento e controle esperado pelos adultos entre si nao era maior do que 0 imposto as crianas Era pequena medida pelos padr6es de hoje a distaneia que separava adultos de crianas Atualmente 0 circulo de preceitos e normas e lraado com tanta nitidez em volta das pessoas a censura e pressao da vida social que lhes modela os Mbitos sao tao fortes que as jovens tern apenas uma alternativa subme terse ao padrao de comportamento exigido pela sociedade au ser excluido da vida num ambiente decente A criana que nao atinge 0 nfvel de con trole das emooes exigido pela soeiedade e ccnsiderada como docnte anor mal criminosa au simplesmente insuportavel do ponto de vista de uma determinada casta ou classe e cm conseqiiencia excluida da vida da mesma Na verdade do ponto de vista psicol6gico os termos doente uanormal criminoso e uinsuportavel nao tern dentro de eertos limites outro significado 0 modo como sao compreendidos varia de acordo com os modelos historicamente mutaveis da formacao de afetos Muito instrutiva neste particular e a conclusao do Exemplo D E ainda mais incorieto segurar a coisa malcheirosa para que 0 Dutro a cheire etc As endeneias instintivas e 0 comportamento desse tipo de acordo com 0 padrao de vergonha e nojo hoje vigcnle simplesmente excluiria como Udoente patoI6gica dcgencrada do convivio dos demais uma pessoa que assim procedesse Se a inclinaao para tal comportamento se manifes tasse publicamente a possoa dependendo de sua posiao soeial seria confi nada em casa au internada em uma instituiao Na melhor das hip6teses se essa tendencia Se manifestasse apenas dentro de casa a u especialista em doenas nervosas seria cometida a tarefa de ccnigir 0 condicionamento mal sucedido dessa pcssoa De modo geral sob as pressoes do condicionamento impulsos dessc tipo desapareceram da conscieneia do adulto no estado de vigilia SO a psicanalise e que as descobre sob a forma de desejos insatisfeitos ou irrealizaveis que sao descritos como a nivel inconsciente ou ooirieo da mente E estes desejos tern de fato em nossa sociedade 0 carater de urn residuo infantil porque 0 padrao social dos adultas torna necessaria a completa supressaa e transformacao dessas tendencias de modo que elas parecem quando Ocorrem em adultos1 urn resto da infancia o padrao de delicadeza postulado no Galateo exige tambem urn afas7 tamenta dessas tendencias instintivas A pressao para transformar essas in clina6es exercida sabre a individuo pela sociedade porem e minima em comparacao com a de hoje Os sentimentos de repugnancia desagrado ou nojo despertados por talcomportamento sao nos termos do antigo padrao civililaiio como transorma9QO do comporfamento 147 L incomparavemente mais fracos que os nossos Por isso mesmo e muito menos rigoroso 0 interdito a manifestalio desses sentimentos Esse compor tamento DaD e considerado como uma anomalia pato16gica au uma per versio mas sim como uma ofensa contra o tato a polidez 0 born estilo Della Casa fala desse mau procedimento com enfase bern pouco maior do que poderfamos falar hoje de alguem que roesse as unhas em publiCO 0 pr6prio fato de ele falar de tais coisas mostra como era entlio considerada in6cua essa pratica Nao obstante de cert maneira esse exemplo assinala urn momento decisivo Caberia supor que a manifestaiio desses sentimentos ocorria tamhem no perfodo anterior Mas s6 nesse instante eles comeam a atrair a ateniio A sociedade esta aos poucos comeando a suprimir 0 componente de prazer positive de certas funOes mediante 0 engendramento da ansiedade ou mais exatamente esta tornando esse prazer privado e secreta isto e repri mindoo no indivlduo enquanto fomenta em6es negativamente carregadas desagrado repugniincia nojo como as unicos sentimentos aceitaveis em sociedade Mas exatamente par causa desse aumento da proibilio social de muitos impulsos pela sua represslio na superflcie da vida social e na consciencia do individuQ necessariamente aumenta a distancia entre a estru tura da personalidade e 0 comportamento de adultos e crianas VI Do Hlibito de Assoarse Exemplos A Secuo XIII De De fa zinquanta cortesie da tavofa CinqUenta cortesias a mesa de Bonvesin de a Riva B011vicino da Riva a Regras para cavalheiros Quando assoar 0 nariz au tossir virese de modo que nada caia em cima da mesa b Normas para pajens e serviais Pox la trentena e questa zaschun cortese donzeJlo Che se vore monda 10 naxoJ com Ii drapi se faza bello r I 148 0 processo civilizador Chi mangia over chi menestraJ no desofia con Ie die Con Ii drapi da pey se monda vostca cortexia B SecuIn XV De Ein spruch der ze tische kert indelicado assoar 0 nariz na toalha da mesa c De Sensuivent les contenances de la table Nao assoe 0 nariz com a mesma mao Que usa para segurar a carne D De A Cabanes Moeurs intimes du temps passe Paris 1910 1 p 101 No secuIo xv as pessoas assoavam 0 oariz com epoea nao se pejavam de reproduzir 0 gesto em em SellS monumentos Entre os cavaleiros os plourans a sepultura de Felipe 0 Ousado urn deles e vista assoando 0 nariz no casaco e Dutro nos dedas E SecuIn XVI De De civilitate morum pueriliwn de Erasmo Cap I Assoar 0 nariz no Chapell ou Da roupa e grasseiro cotovelo e coisa de mercador Tampouco e muito Nao e inteiramente claro 0 significado dessa passagern b 0 evidente 6 se dirige especialrnente a pessoas que servem a mesa Urn comentador Uguacef Pisano diz Os chamados donizelli sao belos jovens e servicais das grandes res Esses donizelli nao podiam sentarse a mesma mesa que os cavaleiros ou isto fosse permitido tinham que se sentar em uma cadeira mais baixa Bles especie de pajens e de qualquer modo inferiores socialmente sao assim instru A trigesima primeira cortesia e a seguinte todo donzel courtois que deBe assoar 0 nariz deve se embelezar com urn pano Quando estiver comendo ou aerv nao deve assoar 0 nariz com os dedos E cortes usar a faixa do pe Segundo nota do editor The Babees Book vol 2 p 14 a cortesia colllid em assoar 0 nariz com os dedos da mao esquerda se a pessoa cornia e tirava da travessa comum com a direita 148 o processo civililodor Chi mangia over chi menestraJ no desofia con Ie die Con Ii drapi da pey se monda vostra cortexia B Seculo XV De Ein spruch der Ze tische kert a inrlelicado assoar 0 oariz oa toalha da mesa c De Sensuivent les contenances de la table Nao assoe 0 oariz com a mesma mao que usa para segurar 8 carne D De A Cabanos Moeurs intimes du temps passe Paris 1910 I serle p 101 No seeula XV as pessoas assoavam 0 oariz com as dedos e as escultores da epoea nao se pejavam de reproduzir 0 gesto em forma passavelmente rcalista em seus monumentos Entre os cavaleiros os plourans it sepultura de Felipe 0 Ousado em Dijonl urn deles e vista assoando 0 oariz no casaco e ootro nos dedas E Seculo XVI De De civilitate morum pueriliwn de Erasmo Cap I Assoar 0 oariz no chapeu ou oa Toupa e grasseiro e fazeIc com 0 braca ou cotovelo e coisa de mercador Tampouco e muito mais educado usar a mao Nao e inteiramente claro 0 significado dessa passagem b 0 evidente e que se dirige especialmente a pessoas que servem it mesa Urn comentador Uguaccione Pisano diz Os chamados donilelli sao heIas javens e servicais das grandes senho res Esses donilelli nao podiam sentarse it mesma mesa que os cavaleiros au se isto fosse permitido tinham que se sentar em uma cadeira mais baixa Eles urna especie de pajens e de qualquer modo inferiores socialmente sao assim instruidos A trigesima primeira cortesia e a seguinte todD donzel courtois que desejar assoar 0 nariz deve se embelezar com urn pano Quando estiver comendo au servindo nao deve assoar 0 oariz com as dedos E cortes usar a faixa do pc Segundo nota do editor The Babees Book vol 2 p 14 a cortesia consistia em assoaT 0 oariz com os dedos da mao esquerda se a pessoa cornia e tirava came da ravessa comum com a direita r cilliitaao como translormaiio do camportamenta 149 L se imediatamente limpa a meleea oa roupa 0 correta e limpar as narinas com urn lenco e fazer isla enquanto se vila se pessoas mais respeitaveis estiverem presentes Se alguma coisa cai no chao enquanto se assoa 0 nariz devese imediata mente pisala com 0 pe Dos esc6lios a respeito dessa passagem Entre a meleea e 0 escarro ha pouea diferenca cxceto que 0 primeiro fluido deve ser interpretado como mais grosso e 0 segundo como mais sujo Os autores latinos confundem constantemente 0 babador 0 guardanapo ou qua1 quer pedaco de Hoho com 0 leoO F 1558 De Galateo de Della Casa trnsedto da ediiio em cineo idiomas Genebra 1609 pp 72 44 618 Nao ofereca 0 leneD a ninguem a menos que ele esteja recemlavado Tampouco e correto apOs assoar 0 narizabrir 0 lenco e olhar dlntro dele como se perolas e rubis pudessem ter cardo de sua cabeca 0 que direi entao daqueles Que enfiam 0 lenco na boca G De A abanes Moeurs intimes du temps passe 910 pp 103 168 102 Extraido de Martial dAuvergue Arres damour Decretos de amor a fim de que eta DaO 0 esquecesse ele mandou the faztr urn dos mais belos e sun tuosos dos lencos no qual seu nome estava gravado em letras entrelacadas da fonna a mais bela pois eram ligadas a urn lindo coraCao dourado orlado por mimisculos ilhozes em forma de coraeao Extraldo de LestoiI Journal dHenri IV Em 1594 Henrique IV perguntou ao seu criado quantas camisas possua e este respondeu Uma dezena majestade e algumas rasgadas E quantos tencos perguntou a rei Nao tenho uns oito No momento apenas cinco retrucou criado Em 1599 ao ser feito inventario da amante de Henrique IV foram eneon trados cinco leneos trabalhados em aura prata e seda no valor de 100 coroas No seeulo XVI contanos Monteit na Franca como em toda parte as pessoas comWls assoavam a nariz sem Jeneo mas entre as burgueses era costume aeeito usar a mansa do casaeo Quanta aos ricos levavam urn lence no bolso Por conseguinte para dizer que urn homem erica dizemos que ele nao assoa 0 nariz na manga Este pedace de tecido devia ficar pendente da cinta da mulher juntamente com suas chaves Tal como 0 garfo a cadeiraretrete etc 0 len foi no princiPia urn artigo de luxe muito caro civiizaroo como transormariio do comportamento 149 se imediatamente limpa a meleea na roupa 0 correto e limpar as narinas com urn leneo e fazer isto enquanto se vita Se pessoas mais respeitaveis estiverem presentes Se alguma coisa cai no chao enquanto se assoa 0 nariz devese imediata mente pfsAla com 0 pe Dos esc6lios a respeito dessa passagem Entre a meleca e 0 eseano ha pouea diferenea cxceto que 0 primeiro fluido deve ser interpretado como mais grosso e 0 segundo como mais sujo Os autores latinos confundem eonstanternente 0 babador 0 guardanapo au qual quer pedaeo de Iinho com 0 lenco F 1558 De Galateo de Della Casa transcrito da ediiio em cinco idiomas Genebra 1609 pp 72 44 618 Nao ofereea 0 leneo a ninguem a menos que ele esteja recernIavado Tampouco e correto ap6s assoar 0 narizabrir 0 lenco e olhardentro dele como se peralas e rubis pudessem ter eaido de sua eabeca 0 que direi entao daqueles Que eufiam 0 leneo na boca G De A Cabanes Moeurs intimes du temps passe 1910 pp 103 168 102 Extraido de Martial dAuvergue Arrets damour Decretos de amor a fim de que ela DaO a esquecesse ele mandou lhe faztr urn dos mais belos e sun tuosos dos leneos no qual seu nome estava gravado em letras entrelaeadas da fonna a mais bela pais eram ligadas a urn lindo coraelio dourado orIado por minUsculos ilhozes em forma de coraeao Exteaido de Lestoil Journal dHenri IV Em 1594 Henrique IV perguntou ao seu ceiado quantas camisas possufa e este respondeu Uma dezena majestade e algumas rasgadas E quantos leneos perguntou 0 rei Nao tenho uns oito No momento apenas cinco retrucou 0 criado Em 1599 ao ser feito 0 inventario da amante de Henrique IV foram encon trados cinco leneos trabalhados em ouro prata e seda no valor de 160 coroas No seeulo XVI contanos Monteil na Franca como em toda parte as pessoas comuns assoavam a nariz sem leneo mas entre os burgueses era costume aceito usar a manga do casaco Quanto aos rices levavam um lenco no bolso Por conseguinte para dizer que urn homem erica dizemos que ele nlio assoa o naeiz na manga Este pedaco de tecido devia ficar pendente da cinta da mulher juntamente com aUas chaves Tal como 0 garfo a cadeiraretrete etc 0 lenco foi no principio um artigo de luxo muito caro 150 Fins do seculo XVII o processo civilizador H o Auge do Refinamento Primeiros Conselhos sobre Boas Maneiras e Comedimento 1672 De Courtin Nouveau traite de civilite A mesa assoar abertamente 0 oariz no lenco scm se ocullaT atras do guarda napo e enxugar 0 suor com ele sao habitos sujos que dio a todos desejo de vomitar Evite bocejar assoar 0 Dariz e escarrar Se for obrigado a proceder assim em lugares mantidos limpos use 0 lenco ao mesmo tempo virando 0 rosto e ocultandose com a mao esquerda e nio olhe para 0 leneD depois I 1694 De Menage Dictionnaire erymologique de la langue tramaise Lenco para assoar 0 nariz Uma vez que 8 expressao assoar 0 nariz da uma impressAo muito desagra davel as senhoras devem chamalo de lenco e nilo de lenco para assaar 0 nariz NB Mouchoir de poche Taschenlych handkerchief como expressio mal polida A palavra relativa a funCOes que se tomaram desagradAveis 6 eJiminada Seculo XVIII Notese a crescente distancia entre adultos e crianas ApenaS as crian as podem ainda pelo menos na c1asse media comportarse como os adultos o faziam na Idade Media J 1714 De uma Civilite franraise anonima Liege 1714 p 141 Tenha todo cuidado de nao assoar 0 nariz nos dedos ou na manga como crjaa Use 0 leneo e nao olhe para ele depois K 1729 De La Salle Les Regles de la bienseance et de la civilite chretienne Rouen 1729 no capitulo intituJado Do Nariz e da Maneira de Assoar 0 Nariz e Espirrar p 23 muito indelicado esgaravatar as narinas com os dedos e ainda mais insupor favel por na boca 0 que se tirou do nariz Evil limpar 0 nariz com a mao nua ou assoarse na manga OU nas roupas inteiramente eontrario ao deeoro assoar 0 nariz com dois dedos e em s J civilizafiio como Iransformafiio do camportomento 151 bem sabido limpas por os roupa E estar sempre guida lancar a sujeira no chao e enxugar Os dedos como e feio ver tal snjeira nas ronpas que devem mats pobre que seja a pessoa Ha pessoas que tapam uma narina com 0 dedo e soprando pela outra jogam no chao a snjeira que esta dentro Pessoas que assim procedem nao sabem 0 que e decaro Voce deve usar sempre 0 lenlo para assoar 0 nariz e nunea qualqucr outra coisa e ao fazeIo esconda 0 rosto com 0 Chapell Urn exemplo parti cularmente claro da difusao de costumes da corte atraves dests obra Evite produzir fuldo quando assosr 0 nariz Antes de 8880810 e indeli cado passar muito tempo tirando 0 leoco do bolso Demonstra falta de respeito para com U pessoas com quem se esta desdobraIo em lugares diferentes para ver de que lado vai usaIo Voce deve tirar 0 leneo do boIso e us6lo rapida mente de maneira tal que mal seja notado pelos demais Depois de assoarse deve ter 0 cuidado de nao olhar dentro do lenco 0 correto e dobnllo imediatamente e recolocalo no boIso L 1774 De La Salle Les Regles de la bienseance et de la civilite chrhienne ed de 1774 pp 14 e segs 0 capitulo nessa edigao so intitula Do Nariz e e mais curto Todos os movimentos voluntarios com 0 nariz sejam feitos pela mao Oll por outra maneira saO indelicados e infantis Colocar os dedos dentro do nariz e uma impropriedade revoltante e tocandoo com muita freqiiencia inc6modos podem resultar qUe sao senidos durante muio tempo Crianeas cometem muito esse lapso Os pais devem corrigiU rigorosamente Voce deve observar ao assoar 0 nariz tOOas as regras da propriedade e ia limpeza Como se ve sao evitados todos os detalhes Esta avangando a conspi ragao do silencio Ela se baseia na pressuposigao que evidentemente nao podia ser feila a epoca da edigao anterior de que todos os detalhes sao conhecidos dos adultos e podem ser controlados no seio da familia M 1797 De La Mesangere Le voyageur de Paris 1797 vol 2 p 95 Aqui a 6tica e provavelmente em maior grau que nos exemplos precedentes do mesmo seculo ados membros mais jovens da boa sociedade Ha alguns anos as pessoas faziam uma arte do ato de assoar 0 nariz Urn imi tava 0 som do trompete outro 0 miado do gato A peiao resiia em nao fazer nem muito nem pouco ruido Este argumento ausente na edicao anterior mOstra c1aramente que a referencia a danos a saude comeca a emergir aos poucos como instrumento de condicionamento muitas vczes substituindo a advertencia sobre 0 respeito devido aos superiores l 152 o processo civilizador Comentarios sabre os Exemplos 1 Na sociedade medieval as pessoas geralmente assoavam 0 nariz nas maos da mesma forma que comiam com elas Este fata tornava necessa rias regras especiais sobre a limpeza do oariz amesa A polidez a courtoisie requeria que 0 individuo assoasse 0 nariz com a mao esquerda se pegasse a carne com a direita Esta regra parem era na verdade restrita a mesa e surgiu exclusivamente par considera9ao aos demais A sensa9ao desagradavd freqiientemente despertada hoje pela mera ideia de sujar os dedos dessa maneira nem sequer existia de inicio Mais uma vez os exemplos mostram com grande clareza a lentidao com que se desenvolveram os instrumentos aparentemente mais simples da civiliza9ao Ilustram tambem ate certo ponto as precondi90es sociais e psi cologics necessarias para tornar geral a necessidade e 0 uso de urn instru mento tao simples 0 uSo do len90 como 0 do garfo surgiu primeiro na Italia e se difundiu devido a seu valorde prestigio As mullieres prendiam ao cinto 0 peda90 de pano ricamente bordado e precioso Os jovens esno bes da Renascen9a ofereciamnos a outras pessoas ou levavamnos na boca E como eram preciosos e relativamente caros no inicio sellUSO naD ecomum nem mesmo na alta classe Henrique IV ao fim do seculo XVI possuia conforme sabemos pelo Exemplo G apenas cinco len90s Em geral se con siderava sinal de riqueza DaD assoar 0 nariz na mao nem na manga mas no leno Luis XIV foi 0 primeiro a possuir urn suprimento abundante de len90S e no seu reinada a usa dos mesmos generalizouse pelo menos nos cfrculos da corte 2 Neste particular como ocorre com tanta freqiiencia a epoca de transi9ao 6 muito clara em Erasmo E correto usar urn len90 diz eIe e se pessoas de posi9ao social mais alta esHio presentes virese aD assoar nariz Mas ele tamb6m diz Se assoar 0 nariz com dois dedos e alguma coisa cair no chao pise em cima dela 0 uso do len90 e conhecdo mas nao muito difun dido mesmo na classe alta para a qual ele escreve Dois seculos mais tarde a situa9ao e quase 0 inverso 0 uso do len90 tornouse generalizado pelo menos entre as pessoas que alegam saber como se comportar Mas 0 usa das maos naD desapareceu inteiraente A vista dos exemplos acima tornouse rna educa9ao OU pelo menDs COtTlurn e vulgar Lemos com divertimento as grada90es estabelecidas por La Salle entre viain para certas maneiras fiUitO grosseiras de assoar 0 nariz com a mao e Ires contraire iJ fa bienseance para a maneira melhor de fazeIo com dois dedos Exemplos H J K L Logo que 0 len90 come9a a ser usado repetese a proilli9ao a uma nova forma de rna educaao que surge ao mesmo tempo com 0 novo costume a proibiao de olhar dentro do len90 depois de usado Exemplos F H civilizafiio como transformafiio do comportamento 153 J K L Quase parece que inclina6es que ficaram sujeitas a certo controle e comedimento com a adoao do leno estariam dessa maneira procurando uma nova maneira de se manifestarem De qualquer modo uma tendencia instintiva que apaiece hoje no maximo no inconsciente nos sonhos na esfera privada au mais conscientemente apenas em locais fechados au seja o interesse pelas secre6es corporais mostrase aqui em urn estagio mais anti go do processo historico com mais clareza e franqueza numa forma que hoje e norrnalmente vislvel apenas em crianas Na segunda ediao de La Salle como em outros casos e omitida a maior parte das regras muito detalhadas da primeira 0 uso do leno tornouse mais geral e evidente par si mesmo Nao e mais necessario ser tao explfcito Aiel do mais e menor a inclinaao de falar nesses detalhes que La Salle originariamente comentou direta e longamente sem qualquer embarao Mais enfase por outro lado e dada ao mau hlibito de crianas de enfiar as dedos no nariz Como em outros Mbitos infantis a aviso medico apareee agora em conjunto ou em lugar do social como instrumento de condicionamento com referencia ao mal que pode decorrer de fazer tal coisa com freqUen cia excessiva Vemos ai urn exemplo de mudana na maneira de condicionar alguem que ja havia sido considerada de outros pontos de vista Ate essa ocasiao os habitos eram quase sempre julgados claramente em sua relaao com outras pessoas e se eram proibidos pelo menos na classe alta secular era porque podiam ser incomodos on embaraosos para terceiros ou porque revelasse falta de respeito Mas agora os babitos sao condenados cada vez mais como tais em si e nao pelo que possaro acarretar a outras pessoas Desta maneira impulsos on inclina6es socialmente indesejaveis sao repri midas com mais rigor Sao associados ao embarao ao medo 11 vergonha ou 11 culpa mesIllo quando a individuo esta sozinba Grande parte do que cbamamos de razoes de moralidade ou moral preenche as niesmas fun90es que as rawes de uhigiene ou higienicas condicionar as crianas a aceitar determinado padrao social A modelagem par esses meios objetiva a tornar automatico 0 comportamento socialmente desejavel 11ma questao de autocon trole fazendo com que 0 mesmo parea 11 mente do mdividuo resultar de seu livre arbitrio e ser de interesse de sua propria saude OU dignidade huma na SO com 0 aparecimento dessa maneira de consolidar habitos ou em outras palavras de condicionamento que ganha predominancia com a ascensao da classe media e que 0 conflito entre impulsos e tendencias socialmente inad missiveis por urn lado e 0 padrao de exigencias sociais feitas ao individuo por outro assume a forma rigorosamente definida e fundamental as teorias psicologicas dos tempos modemos acima de tudo a psicanalise E bern posslvel que sempre tenha havido neuroses Mas as neuroses que venJo boje por toda a parte saO uma forma historica especifica de conflito que precisa de uma elucidaao psicogenetica e sociogenetica 3 Uma indicaao dos mecanismos de repressao talvez ja esteja cantida L iI i I I r 154 o pTOCeSSO ctviizador r nos dois versos citados de Bonvicino da Riva Exemplo A A diferena entre 0 que e esperado de cavaleiros e senhores por urn lado e dos donizeli pajens ou criados por outro lembranos urn fenomeno social bern documen tado Os senbores julgam desagradavel a vista das funoes corporais de seus servidores obrigamnos as inferiores sociais em seu arnbiente imediato a controlar e restringir essas fun6es isto de uma maneira que no inicio nao impoem a si mesmos 0 verso alusivo aos senhores diz apenas Se assoar o nariz virese de modo a que nada caia sobre a mesa Nao ha menao de uso de urn pano Deveremos acreditar que 0 uso de urn pedao de pano para limpar 0 nariz era ja considerado tao natural nessa sociedade que nao se juIgava mais necessario mencionaIo em urn livro de maneiras Isto e alta mente improvave Os serviais por outro lado sao claramente instruidos a nao usar os dedos mas as bandagens dos pes se tiverem que se assoar Para sermos exatos esta interpretaao dos dois versos nao pode ser considerada como absoutamente correta Mas nao faltarao exemplos numerosos mesmo para demonstrar que funes julgadas desagradaveis e desrespeitosas em infe riores nao causam eur si vergonba aos superiores Este fato assume especial importancia com a transformaao aa sociedade sob 0 absolutismo e por conseguinte nas cortes absolutistas onde a classe superior a aristocracia como urn todo tornonse com o graus inerentes a hierarquia uma classe subser viente e socialmente dependente Este fenomeno a prirneira vista sumamente paradoxal de uma classe superior que socialmente vive no estado de maior dependencia sera discutido mais tarde em outro contexto Aqui podemos apenas observar que esta dependencia social e sua estrutura se revestem de importancia para a estrutura e padrao das restrioes as emooes Os exem plos alias contem numerosas indicaoes de como essas restrioes sao inten sificadas com a crescente dependencia da classe alta Nao e acidente que 0 priIlleiro auge de refinamento ou cfelicadeza na maneira de assoar 0 nariz e nao Iipenas neste particular ocorra em uma fase em que a depen dencia e subserviencia da classe superior aristocratica atinjam 0 maximo 0 periodo de Luis XIV Exemplos H e I Essa dependencia explica tambern 0 aspecto duplo que os padr6es de comportamento e os instrumentos de civilizaao assumem pelo menos nesse estagio formativo Expressam e certo uni grau de compulsao e renUncia mas tambem se transformam imediatamente em arma contra os inferiores sociais em uma maneira de separar 0 leno 0 garfo os pratos individuais e todos seus implementos correlatos sao no inicio artigos ee luxo dotados de urn valor de prestigio social especial Exemplo G A dependencia social em que vive a classe superior que a substitui a burguesia e diferente para sermos exatos daquela em que vivia a aristocra cia da corte mas tende Ii ser mais pronunciada e mais irresistive De modo geral mal nos damos conta hoje do fenomeno unico e espan toso jue e uma classe alta trabalhadora Por que ela se submete a essa civilizofQo comQ Ircmformao do comportamento 166 I 1 comptllsao mesmo que seja a classe dominante e por conseguinte nao esteja sob ordens para fazeIo A pergunta exige uma resposta mais deta lbada do que seria possivel neste contexto 0 que se evidencia contudo e o paralelo com 0 que se disse sobre a mudana nos instrumentos e formas de condicionamento No estagio da aristocracia de corte as restriOes impos tas as inclina6es e emoiies baseavamse principalmente em consideraao e respeito devidos a outras pessoas e acima de tudo aos superiores sociais No estagio subseqiiente a rem1ncia e 0 controle de impulsos e muito menos determinado por pessoas particulares Expressada provis6ria e aproximativa mente nesse instante mais diretamente do que antes slio ail compuls6es menos visfveis e mais impessoais da interdependencia social a divisao do trabalbo 0 mercado a competiao que imp6em restriOes e controle aos impulsos e em6es Sao essas pressoes e os correspondentes tipos de explicalio e condicionamento acima mencionados que fazem parecer que o comportamento socialmente desejavel seja gerado voluntariamente pelo pr6prio indivfduo por sua pr6pria iniciativa Isto se aplica a regulaao e as restrioes de impulsos necesslirias ao trabalho e tambem a todo padrao de aoordo com 0 qual eles sao modelados nas sociedades industrializadas bur guesas 0 padrao de controle das inclina6es do que deve e nlio deve ser controlado regulado e transformallo certamente nao e 0 mesmo neste esta gio do que no precedente da aristocracia de corte Conforme os diferentes tipos de interdependencia a 80ciedade burguesa aplica restri6rs mais fortes a cerlos impulsos ao passe que certas reslri6es que eram aristocraticas sao transformadas para se adaptarem a nova siluaao Alem disso padr6es na cionais mais claramente distintos de controle de impulsos sao formados corn base ern varios elementos Em ambos os casos na sociedade aristocratica da corte e nas sociedades burguesas dos seculos XIX e XX as classes superio res sao socialrnente oontroladas ern escala particularmente alta 0 papel fun damental desernpenhado por essa crescente dependencia das classes superiores como mola propulsora da civilizaao sera dernonstrado adiante VII Do Habito de Escarrar Exemplos Idade Media A De Staw puer in mensam 70 27 Nao escarres por cima au sabre a mesa 37 Nao scarres a bacia quando estiveres lavando as maos 156 De ConterlCe de tablef1 o proceso civilizador B 29 Nilo escarres sobre a mesa S1 Niio escarres Da bacia quando estiveres lavando as maDs mas aD lado dela c De The Book of Curtesye T2 8S Se cuspires por sobre a mesa ou entio sohre ela Has de passar por homem descort J33 Quando te lavares ap6s a refeiao Nao CuspSS Da bacia nem borrues gua D De Zamcke Del deutsche Caw p 137 276 Niio escarres por cima da meS8 como fazem as cacadores E 1530 De De dvilitale 1Wrum puerilium de Erasmo Virese quando escarrar para que 0 escarro nao caia sQhre atguem Se atguma coisa purulenta cai no chao deve ser pisada para que nAo provoque repugnllncia em alguem Se nilo tens condiOes de fazer isse pegue 0 esputo em urn pequeno pedaco de pana E indelicado engolir a saliva como tambem aqueles que vemos escarrando a cada trs palavras nao por necessidade mas por habito F 1558 De Galateo de Della Casa extraido da edi9ao em cinco idiomas Gene bra 1609 p 570 E tambem indelicado a pessoa cocarse a mesa Nessa OC8slao e lugar 0 hamem deve tambem absterse tanto quanto passIvel de escarrare se nao puder evitaIo inteiramente isto deve ser feito educadamente e sem chamar atencao Ouco freqiientemente dizer que povos inteiros viveram com tanla moderllcao e se conduziram com tanto decoro que escarrar tomouse inteiramente desneces sArio para eles Por que entao nao poderemos evitar isso apenas por urn curto tempo Isto e durante as refeic6es A restricao ao hAbito aplicavase apenas a hora das refeicOes civilizarao como transformariio do comporamento G 1672 De Courtin Nouveau traite de eivilire p 273 151 o costume que acabamos de mencionar nao significa que a malona das leis a este respeito sejam imutAveis E da mesma maneira que hA muitas que ja mu daram nao duvido que muitas destas mudarao no futuro Antigamente por exemplo era permitido escarrar no chilo na presenra de pessOCl8 de categaria sendo suficiente quese cobrisse 0 esputo com 0 p Hoje isla e uma indecencia Nos velhos tempos a pessoa podia bocejar contanto que nio falasse en quanta assim procedia Hoje uma pessoa de POSil80 ficaria cbocada com tal conduta H 1714 De uma Civilite tramaise anonima Liege 1714 pp 67 41 Escarrar freqiientemente 6 desagradAvel Quando necess4rio devese esconder isso tanto quanto possivel evitandose sujar pessoas au suas roupas pouca importa quem sejam nem mesmo nas brasas ao lado do fogo B quando escarrar deve pisar imediatamente no esputo Nas casas dos grandes as pessoas escarram no leo Nao senta bern escarrar pels janela ou no fogo Nao escarre tao longe que tenbs que procurar 0 escarro para pisalo com o pl I 1729 De La Salle Les Regles de la bienseance et de la eivilite ehretienne Rouen 1729 p 35 Voc8 nao deve absterse de escarrar e 6 muito grosseiro engolir 0 que deve seT cuspido Isso pade causar repugnAncia nos outros Ainda assim nao deve acostumarse a escarrar demais e sem neceasidade Isto 6 nao s6 grosseiro mas enoja e aborrece as pessoaa Quando estiver nl presenra de pessoas bemnascidas e em Iugares que sao mantidos Iimpes 6 edu cado escarrar dentro do lenlo ao mesmO tempo virandose levemente para urn lado E mesmo de boas maneiras para todos acostumaremse a escarrar dentro do lenlo quando estiverem nas casas dos grandes e em todos as Iugares com pisos encerados ou de parqu8 Mas 6 ainda mais necessAria adquirir 0 h4bito de assim preceder quando na igreja tanto quanto passivel Acontece muitas vezes porem que nenhum chAo de cozinha ou de cocheira 6 mais sujo de que 0 da igreja Depois de escarrar no leno voc8 deve dobraIo imediatamente sem olbar para ele e colocaIo no bolso Deve tomar lodo cuidado para nunca escarrar na pr6pria reupa au na de outra pesoa Se notar escarro no chio deve imediatamente pisaMlo com 0 16 Se observ6Io no case de algu6m Dio IS deli cado dizer isso mas dar ordens a urn criado para limpAMIo Se nlio houver urn us o proceuo civiliador criado prt v0c6 mlIIlo dove rIirA1o oem lOr DOtado Isto porque a boa od consilt omnlo chamar a ateno da peaaoa para qualquor coiaa quo ofmdela ou oonfundila J 1774 De La Salle Les Regles de 1a bienshmce et de 1a civilit chrtienne ed de 1774 p 20 Nesta ediiio 0 capitulo inlltulado Dos Hlibitos de Bo cejar Escarrar e Tossir que cobre quatro pliginas Das edi6es anteriores reduzse a urna unica Na igreja nas C888I dOl grandes em todOI o lugarel onde reina a limpeza voc dove oscarrar no len Conalitui um IUlbito impordoavlment srolllCiro do crianI cuspir no rosto de seus companheirO de folguedOi Nio U castigo que seja suficiento para casas maneiras deplorAveia como tamb6m para quem cospe peIaa janow nas paredes enos m6veis K 1859 De The Habits of Good Society p 256 Bocarrar a tOOo momento um b4bito ropusnante Nio precioo dizor mail do que nunu 50 entregue a ele A16m de groueiro e atroz d muito rvim para G ladde L 1910 De Cabanes Moeurs intimes du temps pos p 264 voce j4 notou que hoje relegamol psra atgum cano discreto 0 que nOSSOI psis nlo hesitavam em exibir abertamente Por iaso mIIIlO corta Intima d mobiliArio tinba um lupr d honra ningu6m pensava em ocult4la da vista o mesmo Ie splica a outre pep de mobOia nlo mais encontrada em resi dencial modemas cujo deaaparecimento alau6m lamentarA talvez neata era de bacitofobia estou me referindo A ecarradoira Alguns comenrdrios sobre OS Exemplos 1 Tal como os demais grupos de exemp1os a serie de transcries sobre 0 hlibito de escarrar demonslra com muita clareza que desde a ldade Media 0 comportamento mudou em urn dada diriio No caso do costume de escarrar 0 movimento e inconfundive1mente do tipo que chamamos de progresso Escarrar com freqiincia e mesmo hoje uma das experincias qu muitos europeus julgam especialistas desagradliveis quando viajam pe10 Onente ou pela Africa juntameDte com a fa1ta de limpeza Se partiram Com preconcep6es idealizadas acham a experincia deccpcionantc e ju1 civiltziio como ranalorm do comportamento 159 gam confirmados seus sentimentos sobre 0 progresso da civilizaao oci dental Mas ha nlio mais de quatro seculos este costume ilio era menos geral e comum no Ocidente como mostram os exemplos Tornados em conjunto dlio uma demonstralio muito clara da maneira como ocorreu o processo civilizador 2 Os exemplos delineiam urn movimento que passou pelos seguin tes estagios Os guias de boas maneiras a mesa latinos ingleses franceses e alemlies confirmam 0 fato de que na Idade Media nlio era s6 um cos tume mas uma necessidade geral escarrar com freqUencia E era tambem muito comum nas cortes dos senhores feudais A unica grande restriao imp6sta era nlio fazelo por cima ou em cima da mesa Nem escarrar na bacia em que se lavava a boca ou as mlios mas ao lado Essasproibi5es slio repetidas de modo tlio estereotipado nos guias corteses que podemos bem irnaginar a freqiiencia desse exemplo de ma educlio A presslio da sociedade medieval sobre esse costume nunca se torna tlio forte ou 0 condicionamento tlio irresistive1 que ele desaparea da vida social Vemos aqui mais uma vez a diferena entre 0 controle social no estagio medieval enos posteriores No seculo XVI a presslio social tomase mais forte exigido que se pise 0 esputo pelo menos se contiver purulencia diz Erasmo que aqui como sempre assinala a situalio de transilio E mais uma vez 0 uso de um pedo de pano IS mencionado como maneira possivel nlio ueces saria de contro1ar 0 costume que aos poucos vai se tomando mais e mais repugnante o passo seguinte IS mostrado com clareza pelo comentario de Courtin datado de 1672 Antigamente era permitido escarrar no chlio na pre sena de pessoas de categoria sendo suficiente que se cobrisse 0 esputo com 0 pIS Hoje isto IS urna indecencia Analogamente encontramos na Civilt de 1714 que visa a um publico mais amplo Devese esconder isso tanto quanta possivel evitandose su jar pessoas ou suas roupas Nas casas dos grandes as pessoas escarram no leno Em 1729 La Salle estende a mesma regra a todos os lugares que slio mantidos limpos E acrescentou que na igreja tambem as pessoas devem se acostumar a usar os lenos e nao 0 cblio Em 1774 0 costume e mesmo falar nele haviamse tornado muito mais repugnantes Em 1859 escarrar a todo momenta IS um habito re pugnante Apesar disso e pelo menos nas residencias a escarradeira como utensflio para controlar esse babito de acordo com 0 padrlio em evoluao de delicadeza ainda conserva grande importancia no secu10 XIX Cabanes em 1910 1embranos que tal como outros utensflios ct Exem plo L e1e evo1uiu 1entamente passando de objeto de prestfgio para uten sflio privado I I 160 o processo civilizador Aos poucos tamMm esse utensilio tomase dispensavel Em grandes segmentos da sociedade ocidentaI ate mesmo a necessidade de escarrar ocasionalmente parece ter desaparecido de todo Urn padrao de delicadeza e moderaao semelhante ao que Della Casa conhecia apenas da lehura de escritores antigos tempo em que povos inteiros viveram com tanta moderaao e se conduziram com tanto decoro que escarrar tornouse inteiramente dispensavel para eles Exemplo F fora mais uma vez atingido 3 Tabus e restrioes de vanos tipos acompanham aexpectoraao de catarro como de outras funoes corporais em muitas sociedades tanto primitivas como ucivilizadas 0 que as distingue e 0 fato de que nas primeiras eles sao sempre mantidos por medo de outras pessoas ou seres mesmo que imaginarios isto e por controles extemos ao passo que nas ultimas sao transforrnados mais ou menos completamente em con troles intemos As tendencias proibidas por exemplo a tendencia para escarrar desaparecem em parte da consciencia sob pressao desse controle interno ou como pOderia ser tamMm chamado do superego e do habito de previsao 0 que sobra na consciencia como motivaao da ansiedade e alguma consideraao de longo prazo Assim em nossa epoca 0 mOOo de escarrar e os sentimentos de vergonha e repugnancia nos quais isto se ex pressa concentramse na ideia mais precisamente definida e logicamente compreensivel de certas doenas e suas causas e nao em tomo da ima gem de influencias magicas deuses espiritos ou demonios Mas a serie de exemplos mostra tambem com grande c1areza que a compreensao racional das origens de certas doenas do perigo do esputo como transmissor nao e a causa primaria do mOOo e da repugnancia nem a mola propulsora da civi Iizaao a foa por tras das mudanas no comportamento no tocante ao habilo de escarrar No infcio e duranle urn longo periodo a relenao do esputo e expres samente desencorajada EngoIiIo e rna OOucaao diz Erasmo Exemplo E E ale mesmo em 1729 La Salle diz Voce nao deve absterse de escar rar Exemplo 1 Durante seculos nao ha a mais vaga indicaao das ra zoes higienicas para as proibioes e restrioes que acompanham a tendencia a escarrar A compreensao racional do perigo do esputo e alcanda ape nas em urn estagio muito tardio da mudana de comportamento e num certo sentido retrospectivamente no seculo XIX E mesmo entao a refe rencia ao que e indelicado e repugnante em tal comportamenlo ainda apa rece separada ao lado da referencia a seus maus efeitos sobre a saude AIem de grosseiro e atroz e muito ruim para a saude diz 0 Exemplo K Vale a pena deixar esclarecido de uma vez por todas que algo que sabemos ser prejudicial a saude de maneira alguma desperta necessariamente sentimentos de desagrado ou vergonha E reciprocamente algo que desperta esses sentimentos nao lem que ser prejudicial a saude Alguem que coma cjvjlizaiio como translormaiio do comportameno 161 hoje barulhentamente ou com as maos provoca profundo desagrado mas sem que haja 0 menor receio pela saude E nem a idaa de ler com rna ilu minaao nem a de gas venenoso por exemplo despertam sentimentos de desagrado ou vergonha remotamente semelhantes embora sejam 6bvias suas mas conseqiiencias para a saude Desta maneira 0 nojo da expectoraao e os tabus que a cercam aumentam muito antes que as pessoas tenham uma ideia clara da transmissao de certas doenas pelo escarro a que inicialmente prova e agrava os sentimentos de nojo e as restri6es e a transformaao das relaoes e dependencia humanas Antigamente era permitido escarrar ou bocejar abertamente hoje uma pessoa de posiao fiearia chocada com isso diz 0 Exemplo G A motivaao fundada na consideraao social surge muito antes da motivaao por conhecimento cientifico a rei como sinal de respeito exige esse comportamento de seus cortesaos Nos circulos da corte este sinal da dependencia em que ela vive a crescente compulsao para controlarse e moderarse tomase uma marea de distinao a mais que e imediatamente imitada abaixo e difundida com a ascensao de classes mais numerosas E aqui como nas precedentes curvas de civilizaao a admoef taao Isso nao se faz com a qual a moderaao 0 medo e a repugnllncia sao inculcados s6 muito depois e ligada como resultado de certa demo cratizaao a uma teoria cientifica com um argumento que se aplica por igual a todos os homens qualquer que seja sua posiao ou status a impulso primario a essa lenta repressao de uma inclinaao que antes era forte e ge ral nao vern da compreensao racional das causas das doenas mas con forme sera discutido em detalhe mais adiante de mudanas na maneira como as pessoas vivem juntas na estrutura da sociedade 4 A modificaao do Mbito de escarrar e finalmente a eliminaao mais ou menos completa de sua necessidade constitui urn born exemplo da maleabilidade da vida psiquica Pode ser que essa necessidade tenha sido compensada por outras como por exemplo a necessidade de fumar ou debilitada por certas mudanas na dieta Mas e certo que 0 grau de su pressao que se tornou possivel neste caso nao aconteceu no tocante a moitas outras inclina6es A tendencia a escarrar como a de examinar 0 esputo mimcionada nesses exemplos e substituivel Ela se manifesta agora apenas em crianas e em analise de sonhos e sua eliminaao e vista no riso espe cifieo que nos sacode quando essas coisas sao mencionadas abertamente Outras necessidades nao sao tao substituiveis ou maleaveis na mesma extensao E isto coloca a questao do limite da transformabilidade da perso nalidade humana Sem duvida ela e submissa a certas fidelidades que podem ser chamadas naturais a processo hist6rico modificaa dentro desses li mites a grau em que a vida e 0 comportamento humanos podem ser mol dados por processos hist6ricos nao foi ainda analisado em suiciente deta lhe De qualquer modo tudo isso mostra mais uma vez como processos naturais e hist6ricos se influenciam mutua e inseparavelmente A formao 162 o procesw civiizador de sentimentos de vergonha e asco e os avanos no patamar da delicadeza sao simultaneamente processos naturais e hist6ricos Essas formas de emo 6es sao manifesta6es da natureza humana em condi6es sociais especificas e reagem por sua vez sobre 0 processo s6ciohist6rico como um de sens elementos E dificil concluir se a oposiao radical entre civilizaao e natureza e mais do que uma expressao das tens6es da pr6pria psique civilizada de um desequiHbrio especifico na vida psiquica gerado no estiigio recente da civilizaao ocidental De qualquer modo a vida psiquica de povos primiti vos nao e menos historicamente isto e socialmente marcada do que a dos pavos civilizados mesmo que os primeiros mal estejam conscientes de sua pr6pria hist6ria Nao hii urn ponto zero na historicidade do desenvolvi mento humano da mesma forma que nao hii na socialidade na interdepen dencia social dos homens Nos pavos primitivos e civilizados obselVam se as mesmas proibi6es e restri6es socialmente induzidas juntamente com suas equivalentes psiquicas socialmente induzidas ansiedades prazer a aver sao desagrado e deleite No minimo por conseguinte nao e muito claro 0 que se tern em vista quando 0 chamado padrao primitivo e oposto como natural ao ucivilizado como social e hist6rico No que interessa as fun 6es psiquicas do homem processos naturais e hist6ricos trabalham indis soluvelmente juntos VIII Do Comportamento no Quarto Exemplos A Seculo XV De Sians puer in mensam livro ingles de maneiras 11 mesa datado do pe dodo 14631483 215 E se assim acontecer a noile ou em qualquer tempo De teres que te deitar com qualquer homem que seja superior a ti Reservalhe 0 lado da cama que mais seja do agrado dele E deitate no Dutro lado pais e aquele 0 teu quinhl1o civilizOfiio como transormaciio do comportamento Nem vAs para a cama primeiro a menos que teu superior te convide Pois isso nia 6 cortesia assim diz o Dootor Paler 223 E quando estiveres oa cama Manda a cortesia Que te deites com os pCs e as mios bern retos Quando tiverdes conversado 0 que v6s desejaveis dizlhe boaDoile scm demor POis isso 6 grande cortesia como hAs de compreender 163 L Deixe que seu superior cseolha 0 lade da cama oode vai dormir nao vlipara a cams primeiro ate Que ele lhe diga diz 0 dr Paler Quando eativerem ambos na cams deitese estirado e dip Boanoite depois de terminarem a conversa B 1530 De De civilitate morum puerilium de Erasmo Cap 12 Do Quarto de Dormir Quando ae despir quando Be levantar nio se esqu do decoro e cuidado para nio expor aos othos de outras pessoas qualquer coisa que a moralidade e a natureza exigem que scja ocultada Se dividir a cama com urn companheiro deitese sossegadamente Niio mexa 0 carpot pois isto pode descobrilo ou cawar inconveniencia 80 campa nheiro puxando dele as cobertas c 1555 De Des bonnes moeurs et honnestes contelUlnres de Pierre Broil Lyons 1555 Se divide urna cama com outro homem fique im6vel Tome cuidado para nao aborrec610 nem Be descobrir com movimentos bruscos E se ete estiver dormindo cuidado para nao acorciAlo D 1729 De La Salle us Regles de la bienseanre et de la civilit chrtienne Ronen 1729 p 55 Voce nao deve nem se despir nem ir para a cama na presenca de qualquer outra pessoa Acima de tudo a meow que seja casado nio deve ir para cams na presenca de qualquer pessoa do outro sexo 164 o processo civilirador E ainda menas permissIvel que pessoas de sexos diferentcs durmam Da mesma cama 8 menas que sejam crianas muito pequenas Se for forcado por necessidade inevitavel a dividir a cams com outra pessoa do mesmo sexo em uma viagern nao e correto ficar tao perto dela que a perturbe au mesmo toque e ainda menas decente pOT suas pernas entre as pernas da outra Tambem e muito incorreto e indelicado divertirse com conversa e prosa Quando se levantar nao deve deixar a cams descoberta nem pOr sua touea de dormir numa cadeira au em alguro Iugar oode possa servista E 1774 De La Salle Les Regles de la bienseance et de la civilite chretienne ed de 1774 p31 Constitui urn estranho ebwo razef com que duas pessoas de scxo diferente dUT mam no mcsmo quarto Se a necessidade iato exigic voce deve cuidar para que as camas fiquem aeparadas e que 0 pudor nio aofra de maneira alguma com essa mistura S6 a penuria extrema pode desculpar essa pratica Se for obrigado a dividir a cama com urna pessoa do rnesrno sexo 0 que raramente acontece deve manter um rigoroso e vigilante recato Ao acordar tendo repousado 0 suficiente voc deve sair da cama com o apropriado decoro e nunca ficar na cama conversando ou ocupandose de outras coisas Nada indica com mais clareza indolSncia e frivolidade a cama des tinaae ao descanso corporal e a nada maia Alguns comentdrios sobre os Exemplos 1 0 quarto de dormir tomouse uma das areas mais privadas e intimas da vida humana Tal como a maior parte das demais funOes corporais 0 sono foi sendo transferido para 0 fundo da vida social A fa milia nuclear continua a ser 0 unico enclave legftimo socialmente sancio nado para esta e muitas outras funoes humanas Suas paredes visiveis e invisfveis edam os aspectos mais privados Uintimas irrepreensivelmente animais da existencia humana a vista de outras pessoas Na sociedade medieval essa funao nao fora assim privatizada e se parada do resto da vida social Era intelramente normal receber visitantes em quartos com camas e as pr6prias camas tinham valor de prestigio re acionado com sua opulencia Era muito comum que muitas pessoas pas sassem a noite no mesmo quarto na c1asse alta 0 senhor com seus servi ais a dona da casa com sua dama ou damas de companhia em outras classes mesmo homens e muheres no mesmo quarto3 e nao raro h6spedes que iam passar a noite ali4 2 Os que nao dormiam vestidos despiamse intelramente De modo gera as pessoas dormiam nuas na sociedade leiga e nas ordens monasti cas inteiramente vestidas ou vestidas de acordo com 0 rigor das regras r civiliaao como IransjormafiJo do comporamento 165 A regra de Silo Benedito datando de pelo menos 0 sulo VI eXlgla que os membros da ordem dormissem COm suas vestimentas e ate mesmo conservassem 0 cinto No seculo XII quando a ordem Se tomou mais pr6sPJra e poderosa e menos severas as restrigoes asceticas os monges de Cluny tiveram permisslio para dormir sem roupas Os cistercianos a epoca em que lutavam por reformas voltaram a vellia regra beneditina Roupas de dormir especiais nunca slio mencionadas nas regras momlsticas do pe dodo e ainda menos nos documentos poemas epicos ou ilustragi5es dei xados pela sociedade secular Isto se aplicava tamMm as mulheres No minimo era incomum ir para a cama com a roupa de uso diiirio Isto des pertava a suspeita de que a pessoa pudesse ter algum defeito corporal por que outra razlio 0 corpo devia ser oeultado e de fato isto usual mente aeontecia No Roman de la violette por exempfo a eriada surpre sa pergunta a patroa por que ela vai dormir de eamisa e esta ultima expli ca que e por causa de uma marea que tem no eorpo Esta despreocupaglio em mostrar 0 eorpo nu e 0 que mostra quanto a fronteira da vergonha e vista com especial clareza nas maneiras ao ba uho Em epocas posteriores causou surpresa saher que os eavaleiros me dievais eram atendidos no banho por mulheres do mesmo modo eram elas que lhes levavam a eama a bebida de despedida da noite Pareee ter sido pnitiea comum pelo menos nas eidades despirse em casa antes de ir para a easa de banhos muito freqUente diz um observador ver 0 pai mida mais usando que ealgi5es aeompanhado da esposa e dos filhos nus correr pelas ruas de sua casa para os banhos Quantas vezes vi mo cinhas de dez doze quatorze dezesseis e dezoito anos inteiramente nuas exceto par uma curia bata muitas vezes rasgada e urn trajo de banho es mulambado na frente e atnis Com isto aherto aos pes e com as maos de corosamente as costas eorrendo de suas casas ao meiodia pelas longas ruas em direglio aos banhos E quantos eorpos nus de rapazes de dez doze quatorze e dezesseis anos correndo ao lado delas 17 Esta despreocupaglio desaparece lentamente no seculo XVI e mais ra pidamente nos seculos XVII XVllI e XIX no inieio nas classes altas e muito mais devagar nas baixas Ate entlio todo 0 estilo de vida com a maior intimidade dos individuos tornava a vista do corpo nu pelo menos no lugar apropriado incomparavelmente mais comum do que nos primeiros estagios da era modema Chegamos a concluslio surpreendente disse al guem com referencia a Alemanha que a vista da nudez total era a regra diaria ate 0 seculo XVI Todos se despiam inteiramente a noite antes de ir dormir e da mesma maneira nenhuma roupa era usada nos banhos a vapor 78 E isto por cerlO nao se aplicava apenas a Alemanha As pessoas adotavam uma atitude menos inibida ou poderiamos dizer mais infantil com relaglio ao corpo e a muitas de suas fungOes Os costumes ligados 166 o processo civilizador ao ato de ir dormir porem mostram menos isso do que os babitos de banho 3 Uma camisola especial comeou a ser adotada lentamente mais ou menos na ocasiao em que acontecia 0 mesmo com 0 garfo e 0 leno Tal como outros implementos de civilizaao espalhouse de forma bem gradual pela Europa E como eles era simbolo de uma mudana decisiva que ocorria nessa epoca nos seres humanos Aumentava a sensibilidade COm tudo aquilo que entrava em contato com 0 corpo A vergonha passou a acompanhar formas de comportamento que antes haviam estado livres desse sentimento 0 processo psicol6gico ja descrito na Biblia percebendo que estavam nus ficaram envergonhados isto e urn avano da fron teira da vergonha urn movimento em dirao a mais comedimento re petese aqui como aconteceu tantas vezes no curso da hist6ria Desaparece a despreocupaao em mostrarse nu como tambem ern satisfazer necessi dades corporais na frente dos outros Tornandose menos comum na vida social eSSe espelaculo adquire uma nova importincia a descriao do corpo nll na arte Mais do que ate entao tornase uma imagem onlrie3 urn em blcma de desejos irrealizados Para usar a palavra de Schiller tomase sentimental em comparaltao com a ingenuidade de fases anteriores Na sociedade de cprte da Frana onde levantarse e ir dormir pelo menos no caso dos grandes senhores e senhoras estao incorporados soli damente II vida social a camisola como todas as formas de vestuario que aparecem na vida comunitaria do homem assume funoes representa tivas a medida que se desenvolve Isto muda quando com a ascensao de classes mais numerosas levantarse e deitarse tornamse caisas intiPlas e sao deslocadas da vida social para 0 interior da familia nuclear As geraoes que se seguiram II Primeira Guerra Mundial noS seiJs livros de etiqueta lembram com certa ironia e nao sem urn leve es tremecimento esse perfodo quando a discreao de funoes como dor mir despirse e veslirse era imposta com especial severidade a simples menao das mesmas ja sendo objeto de proibioes relativamente pesadas Urn livro ingles de boas maneiras diz em 1936 talvez com leve exagero mas por certo nao de todo sem justificaao Durante a Era E1egante antes da Guerra acampar ao ar livre era a uniea maneira atraves da qual escri tores respeitaveis podiam abordar a questao do sono Nesses dias senhores e senhoras nao iam para a cama II noite eles se retiravam Como faziam isso nao era da conta de ninguem 0 escritor que pensasse de maneira cfi ferente descobria que era excluido das bibliotecas circulantes 19 Neste particular tambem houve certa reaao e re1axaao desde a guerra Isto esteve claramente ligado II crescente mobilidade da sociedade II difusao dos esportes a excursoes e viagens e tambem II separaao relalivamente cedo dos jovens da comunidade familiar A transiao da camisola para 0 pijama isto e para um trajo de dormir mais socialmente apresentavel 1 if civiliZQfiio como transormOfQo do comportamento 161 Ii constitui urn sintoma desta situaao A mudana nao e como se pens al gumas vezes apenas urn movimento de retrogressao uma diminuiao dos sentimentosde vergonha ou delicadeza ou quem sabe uma liberaao e descontrole de ansias instintivas mas 0 desenvolvimento de urna forma que se ajusta a nosso padrao avanado de delicadeza e da situaao especffica em que a atual vida social coloea 0 individuo 0 ato de dormir nao e mais tao intima e segregado como no estagio precedente Ha mais situa6es em que pessoas veem estranhos dormindo despindose ou vestindose Como resultado as roupas de dormir como alias tamb6m as roupas de baixo desenvolveramse e transformaramse de tal modo que 0 usuario nao precisa sentirse envergonhado quando visto por outros nessas situa6es As rou pas de dormir da fase ptecedente despertavam sentimentos de vergonha e embarao exatamente porque eram relativamente informes Nao havia in tenao de que fossem vistas par pessoa fora do clrculo familiar Por urn lado a camisola do seculo XIX assinala uma epoca em que a vergonha e 0 embarao no toeante 11 exposiao do corpo eram tao intensas e intemali zadas que as formas corporais tinham que ser inteiramente cobertas mesmo que 0 individuo estivesse sozinho ou no circulo familiar mais intimo por Dutro caracteriza uma epoca na qual a esfera intima e privada l porque era tao severamente separada do resto da vida social nao fora ainda em grande extensao articulada e padronizada Esta combinaao peculiar de sen timentos fortemente intemalizados compulsivos de delicadeza ou morali dade cOm a faita de padronizaao social no relativo a esferas de privaci dade e caracterlstica da sociedade do seculo XIX e nao pouco da nossa80 4 Os exemplos dao uma ideia aproximada de como darmir toman dase aos poucos situao mais intima e privada e separado da maioria das demais relacoes sociais e como as regras passadas aos jovens assumem uma conotaao moralistica especifica com 0 aumento dos sentimentos de vergonha Na citaao medieval Exemplo A 0 comedimento exigido dos jovens e explicado pela consideraaodevida aos demais pelo respeito aos superiores sociais Na verdade diz Se dividir a cama com alguem seu su perior perguntelhe que lado prefere e nao se deite ate que ele 0 convide pois de outra maneira nao e cortes E na imitaao francesa de Johannes Sulpi cius por Pierre Broe Exemplo C prevalece a mesma atitude Nao in comodes 0 vizinho quando ele cair no sono cuidado para nao acordaIo etc Em Erasmo comamos a entrever uma exigencia moral que requer certa comportamento nao por consideracao a DutTas pessoas mas pOT si mesma Quando se despir quando se levantar nao se esqua do decoro Mas predomina ainda a ideia do costume social da consideraao pela outra pessoa 0 contraste com 0 periodo posterior tornase muito claro se lem bramos que essas regras mesmo as do dr Paler Exemplo A dirigiamse inegavelmente a pessoas que lam dormir despidas Que estranhos dorms sem na mesma cama a julgar pela maneira como a situaao foi discutida L i II 168 o processo civilitador nao parecia estranho nem de nenhuma maneira impr6prio mesmo na epa ca de Erasmo Nas citaOes do seculo XVIII a tendencia nao continua em Hnha reta em parte porque ela nao se limita mais predominantemente a classe alta Mas no entretempo mesmo em outras classes tornouse indubitavelmente mais raro que jovens dividissem a cama com outra pessoa Se for foado par necessidade inevitavel a dividir a cama com outra pessoa em uma viagem nao 0 correto ficar tao perto dele que a perturbe au meSmo 0 toque escreve La Salle Exemplo D e Voce nao deve nem se despir nem ir para a cama na presena de qualquer outra pessoa Na ediao de 1774 as detalhes sao mais uma vez evitados em todos as casas possiveis E a tom 0 visivelmente mais severo Se for forado a dividir a cama com uma pessoa do mesmo sexo a que raramente aconte ce deve manter urn rigoroso e vigilante recato Exemplo E Este 0 a tom da injunao moral Ate mesmo dar uma razao tomouse penoso para a adulto Pela ameaa do tom a criana e levada a associar essa situaao a perigo Quanta mais a padrao natural de delicadeza e vergonha parece aos adultos e quanta mais a controle civilizado de ansias instintivas e aceito como natural mais incompreensivel se torna para as adultos que as crian as nao sintam por natureza esta delicadeza e vergonha Necessariamente as crianas tocam repetidamente a patamar adulto de embarao e uma vez que nao estao ainda adaptadas transgridem as tabus da sociedade cruzam 0 patamar adulto de vergonha e penetram em zonas de perigo emocionais que a pr6prio adulto s6 com dificuldade consegue controlar Nesta situao 0 adulto nao explica as exigencias que faz em materia de comportamento Nao tern como fazeIo adequdamente Esta tao condicio nado que se conforma de maneira mais au menos automatica a urn padrao social Qualquer autro comportamento qualquer desobediencia as proibi iies ou restriiies que prevalecem em sua sociedade implica perigo e uma desvalorizaao das restriiies que ele mesmo se impiie A conotaao pe culiarmente emocional tao amiude ligada a exigencias morais a severidade agressiva e ameaadora com que sao freqUentemene defendidas refletem a ameaa que qualquer desafio as proibiiies representa para a equilibria instavel de todos aqueles a cujos olhos a padrao de comportamento da sociedade se tornou mais ou menos uma segunda natureza Essas atitu des sao sintomas da ansiedade despertada nos adultos em todos as casas em que a estrutura de sua pr6pria vida instintiva e com ela sua pr6pria existncia social e ordem social onde se radica e mesmo remotamente ameaada Uma serie completa de conflitos especfficos acima de tudo aque les entre pais geralmente malpreparados para condicionar e filhos con flilos decorrentes do avano da fronleira da vergonha e da crescente dis lancia enlre geriies e par conseguinle fundamentados em grande parte civilizado como ransjormtlio do comporamento 169 na estrutura da pr6pria sociedade civilizada e explicada por tal situa ao Esta alias s6 em tempos relativamente recentes veio a ser compreen dida pela sociedade e antes de tudo por pequenos grupos de educadores profissionais E 86 agora na era que tem side chamada de 0 seculo da criana surge 0 entendimento de que dado 0 aumento da distlincia entre uns e outros crianas nao podem se comportar como adultos que lenta mente iriam penetrando no clrculo familiar com os apropriados conselhos e instru6es pedag6gicos No longo perfodo precedente prevalecia a atitude mais severa de que a moralidade e 0 respeito pelos tabus deviam estar presentes nas crianas desde os primeiros anos E nlio se pode por certo dizer que esta atitude desapareceu de todo nos dias atuais Os exemplos sobre 0 comportamento no quarto de dormir transmi tem a um segmento limitado uma certa impressao de que s6 tardiamente a tendencia para adotar essas atitudes atingiu seu pleno desenvolvimento na educaao secular A linha seguida por esse desenvolvimento quase dispensa elucidaao ulterior Neste particular tamMm mais ou menos da mesma maneira que no caso dos habitos 11 mesa a parede entre pessoas a reserva a barreira emocional erigida pelo condicionamento entre um corpo e outro cresceram sem cessar Dividir urna cama com pessoas estranhas ao clrculo familiar fica cada vez mais embaraoso A menos que a necessidade determine 0 contrario tornase comum mesmo na familia que cada um tenha sua pr6 pria cama e finalmente nas classes media e alta seu proprio quarto Desde cedo as crianas sao treinadas nesse isolamento dos demais com todos os habitos e experiencias que isto traz 86 se lembrarmos como pare cia natural na Idade Media que estranhos crianas e adultos compartilhas sem a mesma cama e que poderemos compreender que mudanas nos rela cionamentos interpessoais se manifestam em nossa maneira de viver Ere conher como esta longe de axiomatico que a cama e 0 corpo devam formar essas zonas de perigo psicol6gicas como aconte na fase mais re cente da civilizaao IX Mudanas de Atitude nas Relaoes entre os Sexos I 0 sentimento de vergonha que cerca as rela6es sexuais humanas tern aumentado e mudado muito no processo de civilizaao81 Isto se ma nifesta com especial clareza na dificuldade experimentada por adultos nos estagios mais recentes de civilizaao em falar com crianas sobre essas re o processo civilizadof la Hoje porem esta dificuldade parece quase natural Afigurase que por raziies quase biol6gicas a crUma nada sabe sobre as relaiies entre os sexos e que e tarefa extremamente delicada e dificil esclarecer a meninas e meninos em crescimento 0 que esta acontecendo com eles e 0 que acontece em volta A extensao em que esta situaao muito longe de ser evidente por si mesma constitui mais urn resultado do processo civilizat6rio s6 e entendida se observamos 0 comportamento de pessoas em um estagio dife rente de desenvolvimento 0 destino que coube aos famosos Col6quios de Erasmo constitui um born exemplo no particular Descobriu Erasmo que uma das obras de sua juventude fora publicada sem sua permissao de forma deturpada com acrescimos de outras pessoas e em parte em mau estilo Revisoua e ele proprio a publicou sob novo titulo de 1522 Familiarum colloquiorum formulae non tantum ad linguam puerilem expoliandam verum etiam ad vitam instituendam Co16quios fami Iiares destinados nao s6 a aprimorar a foguados jovens mas tambem a educaIospara a vida Trabalhou nesse texto ampliandoo e melhorandoo ate pouco antes de sua morte A obra transformouse no que desejara nao s6 em urn Iivro em que meDinos pudessem aprender bom estilo latino mas que poderia servir tamMm como sugere 0 titulo para apresentaIos a vida Os ColO quios tornaramse urn dos trabalhos mais famosos e mais lidos de sua epo ca Da mjsma forma que seu tratado De civilitate morum puerilium tive ram inumeras ediiies e tradu6es E como ele essa obra tornouse urn Iivrtexto um trabalhopadrao na educaao de meninos Dificilmente outra coisa da uma impressao mais contundente da mudana ocorrida na socie dade ocidenal no processo de civilizaao do que a critica a que essa obra foi submetida por aqueles que aiItda se julgavam obrigados a se preocupar com ela no secula XIX Urn influente educador alemao Von Raumer a comentanos seguintes termos em sua Geschichte der Piitklgogik Rist6ria da Pedagogiall2 Como pOde urn livro como esse ser adotado em inumeras escolas 0 que crianas tern a ver com esses sAtiros A tatera de reformar 6 assunto para homens ma duros Que sentido deviam meninos encontrar em di610gos sobre tantos assuntos dos quais nada entendiam conversas nasquais as mestres sio ridicularizados au entre duBS mulheres sabre seus maridos entre urn pretendente e a maca que estA cortejando au no col6quio uAdoleacentis et Scorti 0 Adolescente e a Prostituta Bste ultimo dilllogo lembra a mAxima de Schiller intitulada KUJ1stgriff 0 jito USe quer por igual agradar 0 mundano e 0 divino mostrelhea 08 prazeres da carne mas mostrelhes 0 demonio tambem Erasmo descreve aqui 0 desejo carnal na forma mais crua e em seguida acrescenta alguma coisa supostamente edificante Esse livro 6 recomendado peto Doctor Theologiae a urn menino de oito anos na suposicao de que ele pode beneficiar se com sua leitura civilizoiio como translormacdo do comporlamento 171 o livro e realmente dedicado ao jovem filho do editor de Erasmo e 0 pai evidentemente nao sentiu escrupulos em publicaIo 2 0 livro provocou violentas criticas tao logo apareceu Mas nao dirigidas principalmente a seus aspectos morais 0 principal alvo era 0 intelectual 0 homem que nem era protestante ortodoxo nem cat6lico ri goroso A Igreja Cat6lica acil1la de todas combateu os Co16quios que in dubitavelmente contem ocasionais ataques virulentos a institui5es e ordens da Igreja e logo os pas no Index Contra isto porem deve ser visto 0 extraordinario sucesso dos Col6 quios e acima de tudo sua adao como livrotexto De 1526 em diante comenta Huizinga em seu Erasmus Londres 1924 p 199 houve du rante dois seeulos uma serie quase ininterrupta de edi5es e traduoes Nesse periodo por conseguinte 0 tratado de Erasmo deve ter perma necido como uma especie de trabalhopadrao para urn nUmero muito con sideravel de pessoas De que maneira devemos entender a diferena entre seu ponto de vista e o do critico do stculo XIX No seu trabalho Erasmo de fato trata de numerosas coisas que com a progresso da civilizaao haviam sido cada vez mais ocultadas dos olhos de crianas e que no seculo XIX em nenbuma circunstncia teriam sido usadas como material de leitura para crianas dll maneira que Erasmo de sejara e expressamente declarara na dedicat6ria a seu afilhado de seis ou oito anos Como frisa 0 critico do seculo XIX Erasmo apresenta nos dialogos um jovem fazendo a corte a uma ma Mostra uma mulher quei xandose do mau comportamento do marido E ha mesmo uma conversa entre urn rapaz e uma prostituta Nao obstante esses dialogos confirmam exatamente da mesma manei ra que 0 tratado De civilitate morm pueriium a delicadeza de Erasmo em todas as questoes relativas 11 regulaao da vida instintiva mesmo que nao corresponda inteiramente ao nosso pr6prio padrao Representam mesmo em cjmparaao com 0 padrao dasociedade secular medieval e ate com 0 da sociedade secular de nossa pr6pria epoca uma mudana muito conside ravel rumo ao tipo de controle das nsjas instintivas que 0 seculo XIX justificaria acima de tudo sob a forma de moralidade Nao ha duvida que 0 jovem que corteja a moa no col6quio Proci et puellae Namoro declara com grande franqueza 0 que quer dela Fala Ihe de seu amor por ela Quando ela resiste retruca que ela puxou metade de sua alma para fora do corpO Diz que e permissivel e certo conceber filhos PedeIhe que imagine como seria lindo quando ele como rei e ela como rainha govemassem seus filhos e serviais Esta ideia mostra com grande clareza como urns distncia psicol6gica menor entre adultos e crian as acompanhava com muita freqiiencia a distncia social mais longa Fi nalmente a m cede Concorda em tomarse sua esposa Mas preserva conforme diz a honra de sua virgindade Guardaa para ele diz RecusaIhe 172 o processo civilizador mesmo urn beijo E como ele nao desiste de ganhar 0 beijo ela risonhamen Ie he diz que desde que nas proprias palavras dele Ihe puxara metade da alma do corpo e ele esta quase morto tem receio de que com um beijo possa puxar inteiramente a alma para fora e mataIo 3 Conforme ja meneionado Erasmo foi ocasionalmente censurado pela Igreja mesmo ao tempo em que ainda vivia pela imoralidade do Co6quios Mas nao devemos ser induzidos em eITo por esse fato e tirar falsas conclusoes sobre 0 padrao concreto parlicularrnente 0 vigente na sociedade secular Um tratado eserito contra os Co6quios de Erasmo de uma posiao conseientemente catolica e sobre 0 qual falaremos mais adian te nao difere em nada do Iivro atacado no que diz respeito a refereneias francas a assuntos sexuais 0 seu autor tambem era humanista A novidade dos trabahos humanistas e em especial dos trabalhos de Erasmo era exa tamente a de nao conforrnarse ao padrao da sociedade religiosa mas ser escrito do ponto de vista e para a sociedade secular Os humanistas eram representantes de urn movimenlo que buscava Ii bertar a lingua latina de seu confinamento a esfera e tradiao eclesiasticas e tomaIa a lingua da sociedade secular pelo menos da classe alta secular Urn sinal nada trivial da mudana na estrutura da soeiedade ocidental ja vista em tantos outros aspectos deste estudo e a fate de que seus consti tuintes seculares sentem nesse momento crescente necessidade de uma Iite ratura secular erudita Os humanistas sao as molas propulsoras dessa mu dana os agentes dessa necessidade da classe alta secular Em suas obras a palavra escrita mais uma vez aproximase da vida social mundana Ex perieneias dessa vida encontram acesso direto a Iiteratura erudita Esta Iambem e uma das vertentes do grande movimento de eivilizaao E e aqui que tem que ser procurada uma das expIicaoes da revivescencia da antigiiidade Erasmo deu certa vez incisiva expressao a esse processo exatamente na defesa dos seus Col6quios Da mesma forma que S6crates trouxe a fi losofia dos ceus para a terra eu levei a filosofia aos jogos e aos banque tes diz nas notas a De utilitate coloquiorum que acrescentou aos Col6 quios ed de 1655 p 668 Por essa razao esses escritos podem ser cor retamente considerados como representando 0 padrao de comportamento da sociedade secular pouco importando 0 quanto suas exigencias de con trole dos instintos e moderaao de comportamento possam ter transcendido esse padrao e representado uma antevisao do futuro um ideal Em De utilltate coloquiorum diz Erasmo no tocante ao dialogo Proci et pueIIae acima mencionado Eu desejaria que todos os preten dentes fossem iguais ao que descrevi e que conversassem da mesma manel ra quando pensassem em casamento o que parece ao observador do seculo XIX a mais baixa deseriao de desejo carnal 0 que mesmo pelos padroes atuais de vergonha deve ser civiizaiio como ransformaiio do comportamento 173 guardado em sHencio particularmente diante de crianas afigurase a Eras mo e a SeuS contemporaneos que ajudam a difundir sua obra como um modelo de conversa idealmente apropriado para servir de exemplo aos jovens e ainda na maior parte urn ideal quando comparado com 0 que realmente acontecia em volta deles 4 0 caso e semelhante nos outros dialogos mencionados por Von Raurner A mulher que Se queixa do marido e dito que ela tera que mudar seU pr6prio comportamento e que depois 0 marido mudara 0 SeU E a conversa do jovem com a prostituta termina com a condenaiio por ele do indecoroso estilo de vida que ela leva E preciso escutar toda a conversa pessoalmente para compreender 0 que Erasmo deseja erigir como exemplo para os jovens A moa Lucretia niio ve 0 jovem Sophronius ha muito tempo E com toda clareza ela 0 convida a fazer 0 que ele veio a sua casa para fazer Mas ele pergunta se ela tern certeza de que niio poderiio ser vistos se e1a niio tern urn quarto mais escuro E quando ela 0 leva para esse local ele novamente tem escrupulos Tem ela realmente certeza que ninguem pode veIos Ninguem pode nos ver ou ouvir nem mesmo uma pUlga diz ela Por que hesita 0 jovem porem pergunta Nem mesmo Deus Nem mesmo os anjos E ele passa entiio a converteIa com todas as artes da dialetica PerguntaIhe se ela tern muitas inimigas se niio gostaria de aborreceIas Ela niio irritaria suas inimigas renunciando a vida naquela casa e tomandose uma mulher honrada E finalmente a convence Secretamente ele alugara urn quarto para ela na casa de uma mu lher respeitavel E no inicio cuidara do sustento dela 0 texto desse trecho do dialogo e 0 seguinte SOPHRONIUS Nondum hie locus mihi videtur satis secretus LUCRETIA Unde iste noVDs pudor Est mihi museion84 ubi repono mundum meum locus adeo obscurus ut vix ego te visura sim aut te me SOPH Circumspice rimas omnes LUC Rima nulla est SOPH Nullus est inpropinquo qui nos exaudiat LUC Ne musca quidem mea lux Quid cunctaris SOP Fallemus heic oculos Dei LUC Nequaquam ile perspicit omnia SOPH Et angelorum SOPH Este lugar nao me parece suficientemente reservado LUC Como e que voc ficou tao envergonhado assim tao de repente Bern venha para men vestiario par ticular E tao escuro III que a gente quase nao vai se ver SOPH Examine todas as Cta LUC Nao M Cresta nenhuma SOPH Nao lui ningu6m por perto que possa nos escutar LUC Nem mesmo urna mosca meu querido Por que eslA hesi tando SOPH Podemos escapar aqui do olho de Deus LUC Claro que Dio Etc tudo ve SOPH E do anjo 174 o processo civiliador Por mais imoral que a apresentiio dessa situaiio em um livre para crianas logo all tente plirecer a um observador de um periodo posterior niio e dificil compreender que do ponto de vista de um padriio social diferente e de uma diferente estmtura de sentimentos ele pudesse ser altamente moral e edificante A mesma linha de desenvolvimento a mesma diferena de padroes poderia ser demonstrada por gmnde numero de exemplos Com uma certa impotancia 0 observador do seculo XIX e ate certo ponto do seculo XX v8se diante de modelos e regras de condicionamento do passado E ate que compreendamos que nosso pr6prio patamar de repugniincia nossa pr6 pria estrutura de seittimentos evoluiram em um processo estruturado e seguem evoluindo continua realmente quase incompreensivel do atual ponto de vista como dialogos como esses pudessem ser incluidos em um livro escolar ou deliberadamente produzidos como material de leitura para crianas Mas esta e exatamente a raziio por que nosso pr6prio padriio incluindo nossa atitude em relalio as crianas deve ser compreendido como algo que evoluiu Autores mais ortodoxos que Erasmo fizeram a mesma coisa que ele A fim de substituir os ColOquios suspeito de heresia outros dialogos fo ram escritos couforme ja mencionado por um cat6lico rigoroso Tem 0 titulo de lohannis Morisoti medici coloquiorwn ibri quatuor ad Cons tantinum fiiwn Quatro livres de col6quios destinados a meu filbo Cons tantino por Jean Morisot Basileia 1549 Slio tambem escritos como manual para meninos uma vez que como diz 0 autor Morisot ficamos amiude em duvida nos CoOquios de Erasmo se estamos escutando um cristlio ou um paglio E em avaliaoes posteriores desta obra contrana escrita de um ponto de vista estrilamenle cat6lico 0 mesmo fenomeno reaparecell6 Mas sera suficiente apresenlar 0 trabalbo da forma COmo se reflete em um jufzo de 191188 No trebalho de Morisot as meninu mo e muIheres desempenham urn papel ainda mais importante do que no de Erasmo Em grande m1mero de dililogos 86 etas falam e suas coDversas que mesmo no primeiro e segundo livrea em absoluto sio sempre inocentea frequentemente Be concentram nos dois ulti mas 81 em assuntos tio perigosos que s6 podemos mesmo balancar a CAbeca e perguntar 0 severo Morisot escreveu mesmo isto pata 0 fillie Reconhecemos que nao devemos esquecer que 0 culo XVI pouco sabia de recato e freqiien temente oferecia aoa estudantes nos sellS livras de exercfcios material que nosaos pedagogos dispensariam com prazer Mas outra perguntal De que modo Morisot iniaginou que eases diailogos fossem seT wadas na pratiea Meninos rapazes e homens jamais poderiam war como modelo de fala latina uma conversa em que 56 aparecem mulherea Morisot por conseguinte nio methor que 0 des prezado Blaamo perdeu de vista a finalidade didAtica do livro r clviltzaao como translormaiio do comportamento 175 A pergunta nao 6 dificil de responder 5 0 proprio Erasmo nunca perdeu de vista sua finalidade dida tica Seu comentario De utilitate colloquiorum mostrao inequivocamente Nele deixa explicita que finalidade didalica objetivava com suas conver slis ou mais exatamente 0 que queria transmilir ao jovem Sobre a con versa entre 0 jovem e a prostituta por exemplo diz 0 que poderia ter eu dito que tivesse sido mais eficaz para convencer 0 jovem da necessidade de pudor e de tirar a ma de casas tao perigosas e infarnes Nao ele nunca perdeu de vista a finalidade pedagogica Ele tinha memmente urn padrao diferente de vergonba Queria simplesmente mostrar ao jovem 0 mundo como em urn espelbo ensinar 0 que devia ser evitado e 0 que era conducente a uma vida tranqiiila In senili colloquio quam multa velut in speculo exbibentur quae vel fugienda sunt in vita vel vitam reddunt tran quiIlam Nestes colOquios senis quantas coisas sao refletidas de que de vemos fugir nit vida ou que tomem a vida tranqiiila A mesma intenao sem duvida animou as conversas de Morisot e uma atitude semelhante transparece em muitos outros escritos OOucacionais da epoca Todos eles se prop5effi a apresentar a vida 30 menino como diz Erasmo88 Com isto referemse a vida de adultos Em periodos posteriores notarsea uma tendencia crescente a dizer e mostrar como as crianas de vern e nao devem se comportar Mas aqui 0 que se mostra a e1as apresen tandolbes a vida 6 como os adultos devem e nao devem se conduzir Esta 6 a diferena E nao se adotou uma via ou outra como resultado de reflexao teorica Para Erasmo e seus contemporaneos era natural falar a crianas dessa maneira Mesmo que submissos e socialmente dependentes meninos vi viarn desde cOOo na mesma esfera social dos adultos E estes nao se impu nham nem em atas nem em palavras 0 mesmo comedimento no tocante a vida social que aconteceria depois Dado 0 diferente estado de controle de sentimentos gerado no individuo pela estrutura das rela6es interpessoais a id6ia de esconder rigorosamente esses impulsos no sigilo e na privacidade sena muito estranha para os proprios adultos Tudo isto para comear reduzia a distancia entre os padroes comportamentais e emocionais de adul tos e crian93s Vemos mais uma vez como e importante para a compre ensao de uma constituiao psiquica mais antiga e de nossa propria observar 0 aumento dessa distancia a formaao gradual de uma area se gregada especial na qual as pessoas vern aos poucos 1I passar os primeiros doze quinze e agora quase vinte anos de sua vida 0 desenvolvimento bio J6gico humano em tempos rnais antigos nao tomou urn curso diferente do de hoje S6 COm relaao a essa mudana social podemos compreender me lhor todos os problemas de crescer como seapresentam haje e com eIes os residuos infantis na estrutura de personalidade de pessoas crescidas adultos A diferena mais pronunciada entre as roupas de crianas e adultos em nosso temlo e apenas uma expressao particularmente visivel 116 o processo civilizador desse fato E tambem essa diferena era minima no tempo de Erasmo e durante um longo periodo depois 6 A urn observador modemo talvez surpreenda 0 mero fato de Eras mo em seus Co16quios falar a urna criana de prostitutas e das casas em que elas viviam Em nosso estagio de civilizaao parece imoral ate mesmo reconhecer em um livro escolar a existencia desses antros Eles na verdade existiram e existem como enclaves mesmo na sociOOade dos seculos XIX e XX Mas 0 mOOo e a vergonha com que a area sexual da vida instintiva como muitas outras e cercada desde os primeiros anos a conspirao do silencio observada no discurso social a respeito desses assuntos esta pra ticamente completa proibida a simples menao de tais opiniOes e ins tituioes na vida social e referencias a ela na presena de crianas Sao um crime que Ibes macula a alma ou no minimo um eITO muito grave de con dicionamento Nos tempos de Erasmo era considerado como natural que as crianas soubessem da existencia dessas casas Ninguem as escondia Na melbor das hip6teses as crianas eram advertidas contra elas Erasmo faz justamente isso Se lermos apenas os livros educativos da epoca a menao de tais instituioes sociais podera ate parecer urna ideia peculiar a idiossincrasia do individuo Erasmo Mas ao sabermos como crianas viviam realmente com adultos e como era tenUe 0 veu de sigilo entre os pr6prios adultos e em conseqiiencia entre eles e as crianas compreendemos que conver sas como as redigidas por Erasmo e Morisotse relacionam diretamente ao padrao vigente em suas epocas Eles podiam contar com 0 fato de que crianas sabiam de tudo a esse respeito Era algo aceito como natural E acbaram que era seu dever como educadores mostrar as crianas como deviam se conduzir no tocante a essas instituioes Talvez nao para siguificativo lembrar que essas casas eram discutidas abertamente nas universidades Mas os estudantes ingressavam na univer sidade muito mals jovens do que boje Constitui bom exemplo do tema deste capitulo observar que a prostituta era t6pico ate mesmo de discursos publicos clrnicos nas universidades Em 1500 um mestre de artes em Hei delberg falou De fide meretricum in suos amatores Da fidelidade das prostitutas aos seus amantes outro rie fide concubinarum 03 fideli dade de concubinas urn terceiro sobre Do monop6lio da guilda dos sui nos e mais Um De generibus ebriosorum et ebrietate vitanda Dos tipos de bebados e de como evitar a embriaguez E exatamente 0 mesmo fenlmeno transparece em numerosos sermOes da epoca Niio M indicaao de que as erianas fossem excluidas das pla teias Essa forma de relaao extraconjugal era certamente condenada nos cfrculos eclesiasticos e em muitos seculares Mas a proibiao social nao estava ainda gravada como autocontrole no individuo a ponto de tornar embaraoso 0 proprio fato de falar nesse assunto em publico A sociedade civilizaciio como translormacao do comportdmento 177 nao proibira ainda todos os discursos que mostrassem que 0 individuo sa bia de alguma coisaa esse respeito Esta diferena se torna ainda mais clara se levamos em conta a situa ao nas cidades rnedievais das rnulberes que vendiarn seus favores Como ocorrehoje em muitas sociedades fora da Europa elas tinham urn lugar pr6prio e bern definido na vida publica da cidade medieval Em algumas cidades disputavam ate corridas em dias de festa Com freqiiencia erarn enviadas para dar as boasvindas a visitantes ilustres Em 1438 por exem plo nos assentamentos da escrituraao da cidade de Viena lemos Pelo vinho para as mulheres comuns 96 Kreutzers Para as mulberes que foram ao encontro do rei 96 Kreutzers para 0 vinho 91 au 0 prefeito e 0 conse Iho da cidade conseguiam para visitantes ilustres acesso gratuito aos pros tfbulos Em 1434 0 imperador Segismundo agradeceu publicamente ao ma gistrado da cidade de Berna por ter posto 0 prostlbulo gratuitamente a sua disposiao e de seus acompanhantes durante tres dias Isto tal como o banquete fazia parte da hospitalidade concedida a visitantes de alta classe As prostitutas formavam na vida da cidade uma guilda com certos di reitos e obrigaOes como qualquer outra categoria profissional E como qualquer outro grupo profissional ocasionalmente se defendiam contra con correncia desleal Em 1500 por exemplo certo n6mero delas procurou 0 prefeito de uma cidade alema para se quebtar de olltra casa onde era pra tieada a profissao para a qual a delas tinha a exclusividade Ihl 0 prefeito deulbes permissao para entrar nessa casa onde elas quebraram tudo e sur raram a madame Em outra ocasiao arrastaram uma concorrente de sua casa e obrigaramna a morar na delas Em suma a situaao social das prostitutas era semelhante it do car rasco baixa e desprezada mas inteiramente publica e nao encerrada em sigilo Esta forma de relaao extraconjugal entre homem e mulher nao fora ainda removida para 0 fundo da cena 7 Ate certo ponto isto aplicavase tambem iis relaoes sexuais em geral mesmo as mammonais as costumes nos casamentos daonos uma ideia disso A procissao a dimara nupcial era Iiderada pelos padrinhos A noiva era despida pelas damas decompanhia e tinha que tirar tudo a leito nupcial precisava ser montado na presena de testemunhas para que 0 casamento fosse valido Eles se deitavam juntos Uma vez na cama voces estao devidamente casados dizia 0 ditado Em fins da Idade Media este costume mudou gradualmente e 0 casal teve permissao de se deitar vestido Sem duvida esses costumes variavam urn pouco segundo classes e paises Ainda assim a velha forma foi conservada em Lii beek por exemplo ate a primeira decada do seculo XVII94 Mesmo Da sociedade absolutista da Frana Doiva e noivo eram levados a cama pelos 178 o processo civilizador convidados despidos e presenteados com suas camisolas Tudo isto e sinto matico de um diferente padrllo de vergonha a respeito das reloes entre os sexos Atraves desses exemplos formamos uma percewllo mais clara do padrllo especffico de vergonha que aos poucos se torna predominante nos seculos XIX e XX Nesse periodo mesmo entre adultos tudo 0 que fosse relativo 11 vida sexual foi escondido ao maximo e removido para 0 fundo da cena Esse 0 motivo por que foi possivel e tambem necessario ocultar este lade da vida das crian9as durante longo periodo Nas fases precedentes das rela90es entre os sexos juntamente com as institui90es atinentes a elas incorporavase muito mais diretamente 11 vida publica Por isso mes mo nada mais natural que as crian9as conhecessem desde muito cedo esse lado da vida Do ponto de vista do condicionamento nllo M necessidade de sobrecarregar essa esfera da vida com tabus e sigilo na extenslio que se tornou necessaria em uma fase posterior da eiviliza9lio devido urn dife I rente padrllo de comportamento Na sociedade aristocrMica de corte a vida sexual era pOI certo muito mais escondida do que na soeiedade medieval 0 que 0 observador de uma soeiedade industrializadaburguesa amiude interpreta como frivolidade da soeiedade de corte nada mais e do que essa orienta9lio rumo 11 privacidade 1 Nllo obstante medidos pelo padrlio de controle dos impulsos na pr6pria soeiedade burguesa 0 ocuItamento e a segregllo da sexualidade na vida social tanto quanto na conseiencia foram relativamente sem importcia nessa fase Aqui tambem 0 julgamento de fases posteriores e com fre qiiencia induzido em erro porque os padrOes da pessoa que julga e da aris tocracia de corte slio considerados como absolutos e nlio como opostos inseparaveis e tambem porque 0 padrllo pr6prio e utilizado como medida de todos os demais Nesta soeiedade tambm a relativa franqueza com que lS fun90es na turais slio comentadas entre adultos acompanhada por maior liberdade de fala e a9lio na presen9a de crian9as Slio numerosos os exemplos a este respeito Em urn exemplo parlicularmente ilustrativo numa corte no se culo XVII vive uma pequenina Mlle de Bouillon que tern seis anos de idade As senhoras das cortes conversam muito com ela e certo dia fa zem uma brincadeira tentam convencer a menina que ela esta gravida menininha nega isso Defende5O absolutamente impossivel diz e discutem muito Certo dia porem ao acordar descobre urn reeemnaseido na cama ao seu lado Espantada diz ela em toda sua inocencla De modo que isto 86 aconteceu com a Virgem Maria e comigo porque nlio senti ne nhuma dor Essas palavras passam de boca em boca e a pequeno caso trnase a diversiio de toda a corte A crian9a recebe visitas como e 0 costume nessas ocasioes A pr6pria Rainha vem consolaIa e se ofereeer como madrinha do bebe A brincadeira continua e a menininha e pres civilizorao como tronsormorao do comportamento 179 sionada para dizer quem e 0 pai do bebe Finalmente ap6s urn periodo de arduas reflexoes ela chega a conclusao que s6 podem ser 0 Rei ou 0 Conde de Guiche desde que sao os dols unicos homens que he derani urn beljo9S Ninguem leva a mal a brincadeira Ela se enquadra inteira mente no padrao vigente Ninguem ve nela urn perigo a adaptaao da crian a a esse paddio OU a sua pureza espiritual e evidentemente nao e consi derada em nada contraria a sua educaao religiosa 8 S6 aos jJoucos e mais tarde e que uma associaao mais forte de sexualidade COm vergonhae embarao e a correspondente restriao ao com portamento se espraia mais ou menos uniformemente por toda a sociedade E s6 quando cresce a distancia entre adutlos e crianas e que 0 esclare cimento de questoes sexuais se toma urn problema agudo Citamos acima a critica aos Col6quios de Erasmo formulada pelo co nhecido educador Von Raumer 0 quadro de toda essa curva de desenvol vimento tornase ainda mais nitido se estudamos a maneira como o pro blema da educaao sexual a adapta9ao da crian9a ao padrao vigente em sua sociedade se colocou para esse educador Em 1857 Von Raumer pu blicou uma curta obra intitulada A Eductlfiio das Meninas 0 que ele pres creve no livro p 72 como modelo de comportamento para adultos em resposta a perguntas de natureza sexual feita pelas suas filhas certamente nao era a fulica forma possivel de conduta em sua epoca mas apesar disso e altamente caracteristico do padrao vigente no seculo XIX nas instru90es dadas tanto a meninas quanto a meninos Algumasmiies slio de opjniiio fundamentalmente incorreta a meu ver de que as filhas deve ser dado conhecimento profundo de todas as circunstancias da famflia mesmo de relalOes entre os seXQS e de que devem ser iniciadas nas coisas que serao seu destino se jamais vierem a casar Seguindo 0 exemplo de Rous seau esta opiniao degenerou e se transformou na caricatura mais grosseira e rnais repulsiva do Seminario Filantr6pico de Dessau Outras maes exageram oa direao contraria dizendo as filhas aquilo que logo que se tornam mais velhas temque se revelar como total falsidade Como em todos os outros casos isto condenavel Estos coisos nlio devem ser comentadas absolutamente na ptesenra de crianras e ainda menos ern tom de misterio que provavelmente s6 Ihes aguara a curiosidade As crianas devern ser deixadas par tanto tempo quanto for possivel na crena de que urn anjo traz para a mae os bebes Esta lenda costumeira em algumas regi6es e muito melhor do que a historia da cegonha comum em outros lugares As crianas se reatmente crescem sob Os olhos da mae raramente fazern perguntas a esse respeito nem mesmo se a mae impedida pelo parto de telas em volta de si Se meninas perguntarem mais tarde como hebes chegam ao mundo devese responder que 0 born Deus da a mae 0 hebe que tern urn anjo da guarda no ceu que certamente desernpenhou urn papel invisivel na concretizatao dessagrande alegria Voce nao precisa saber nem poderia compreender como Deus da as crianas As meninas devem se contentar corn essas respostas em cem casos e constitui dever da mae ocupar os 180 o proceso civilitador pensamentos das filhas de modo tao completo com 0 bela e 0 hom que e1as nao tenham tempo para pensar nessea assuntOIl A mle deve dizer apenas uma vez com lada seriedade NAo seria bom para voce conhecer essaa coisaa e deve tomar cuidado para nao escutar nada que se dip a esse respeito Uma mOr realmente bern educada sentirA daJ em diantc versonba ao ouvir coisaa desse teor r Entre a maneira de falar sobre relaoes sexuais representada por Eras mo e a representada aqui por Von Raumer e visivel uma curva de civili zaao semelhante a mostrada em mais detalhe na mariifestaao de outros impulsos No processo civilizador a sexualidade tambem e cada vez mais transferida para tras da cena da vida social e isolada em urn enclave par ticular a familia nuclear De maneira identica as relaoes entre os sexos sao segregadas colocadas atras de paredes da consciencia Vma aura de embarao a manifestaao de urn mOOo sociogenetico cerca essa esfera da vida Mesmo entre adultos e referida apenas com cautela e circunl6quios E no easo de crianas especialmente de meninas essas caisas nao sao tanto quanto possivel absolutamente mencionadas Von Raumer nao da ra zOes por que nao se deva falar sobre elas com as crianas Ele poderia ter dito que e desejavel preservar a pureza espiritual das meninas por tanto tempo quanto possive Mas mesmo essa razao seria apenas uma expressao a mais do quanto haviam avanado em seu tempoa submersao gradual des ses impulsos na vergonha e no embarao Neste momento e tao natural nao falar nesses assuntos como era falar no tempo de Erasmo E 0 fato de que ambas as testemunhas convocadas aqui Erasmo e Von Raumer fos sem cristaos piedosos que buscavam sua autoridade em Deus destaca ain da mais a diferena Evidentemente nao sao racionais os motivos subjacentes ao modelo proposto por VOn Raumer Examinado racionalmente 0 problema abor dado por ele permanece sem soluao e 0 que ele diz soa contradit6rio Nao explica como e quando a menina deve ser levada a compreender 0 que eshl acontecendo e 0 que the acontecera A preocupaao principal e a ne cessidade de incu1car recato isto e sentimento de vergonha medo em barao e culpa ou mais exatamente comportamento que se conforme ao padrao social E sentimos como e imensamente dificil para 0 pr6prio edu cador veneer a resistencia da vergoriha e do embarao que para ele en vOlve essa esfera Notamos algo da profunda confusao na qual esse fato social colocou 0 individuo 0 Unico conselho que 0 educador tern para dar as maes e evitar contato em todos os casos possiveis com essas coisas o que esta em jogo aqui nao e a falta de percepao ou a inibiao de uma pessoa em particular mas urn problema social e nao individual Apenas aos poucos coml se atraves de introvisao obtida retrospectivamente fo ram formulados metodos mais eficazes para adaptar a criana ao grau mais civilizaiio como Iransormaiio do comportamento 181 alIa de dominio comedimento sexual ao controlc il transformaao e a inibiao de impulsos que fcram indispensaveis II vida nessa sociedade o proprio Von Raumer nota em certo sentido que essa area da vida nao devia ser envolvida par uma aura de misterio que pravavelmenle so Ihes aguara a curiosidade Mas uma vez que isto se larnou urn misterio na sociedade ele nao pode escapar da necessidade de recamendar sigilo em suas proprias regras A mae deve dizer apenas uma vez cam toda serie dadeNao seria born para voce canhecer essas coisas Nem motivas racionais nem razoes praticas Ihe delerminam primariamente a alilude mas sim a vergonha dos proprios adultos que se lornou compulsiva Sao as proibioes sociais e resistencias neles mesmos seu proprio superego que as faz guardar silencio Para Erasmo e seus contemporaneos conforme vimos 0 problema nao esla em esclarecer a criana sabre as relaoes entre homem e mulher As crianas descobrem isto par si mesmas atraves do tipo de instituioes e vida social onde creseem Sendo menor a reserva das adultos e menor tambem a discrepancia entre a que e abertamente permitido e a que acorre par tras da cena Aqui a principal tarefa do educador cansiste em guiar a criana naquilo que ela ja sabe na direaa coneta au para ser mais exato na direao desejada porele educador E e issa a que Erasmo pro cura fazer atraves de conversas como a da mOla com seu pretendente e a do rapaz com a prastitula 0 sucessa do livro mostra que Erasmo dedilhau a nota certa no que interessava a muites de seus centemporaneos Uma vez que no curso do processo civilizador 0 impulso sexual como tanlos outros esta sujeilo a controle e transformaaa cada vez mais rigaro sas muda a problema que ele coloca A pressaa apHcada sabre adultos para privatizar todos seus impulsos em especial os sexuais a canspiraao de silencio as restrioes socialmente geradas a fala 0 carater emocional menle carregado da maioria das palavras relativas a ardores sexuais tudo isla conslroi uma grossa parede de sigilo em valta do adolescenle o que torna a eselarecimento sexual tao dificil a derrubada desse muro que urn dia sera necessaria nao e so a necessidade de fazer 0 adoles cente conformarse ao mesmo padrao de controle de instinlos e de domi nio como a adulto E acima de tudo a estrulura de personalidade dos proprios adultos que lorna dificil falar sobre ossas coisas secretas Com grande freqiiencia as adultos nao encontram a lorn nem as palavras As pa lavras chulas que conhecem estaa fara de cogitaao Os termos cienti ficas sao desconhecidos de muilos As considera6es teoricas em s1 nao aju dam E sao as repressoes sociogeneticas neles que resistem II palavra Dai a conselho de Von Raumer falar a miuimo possivelsobre esses assuntos A situaao e ainda mais agravada pelo fato de que as tarefas de condicio nar e ensinar cabem cada vez mais exclusivamente aos pais As miiltiplas rela de amor entre mae pai e filho tendem a aumentar a resistencia L 182 o processo civilizador a Iratardessas questaes nao s6 por parte da criana mas tambem do pai ou da mae A vista de tudo isso tornase claro como deve ser colocada a ques tao da infancia as problemas psicol6gicos de individuos que crescem nao podem ser compreendidos se forem considerados como se desenvolvendo uniformemente em todas as epocas hist6ricas as problemas relativos a cnscienia e impulsos instintivos da criana variam com a natureza das rela6es entre ela e os adultos Essas relaaes tem em todas as sociedades uma forma especifica correspondente as peculiaridades de sua estmtura Na sociedade cavaleirosa diferem da vigente na sociedade burguesa urbana sao diferentes em toda a sociedade secular da Idade Media do que acon tece nos tempos modernos Por iso mesmo os problemas decorrentes da adaptaao e modelaao de adolescentes ao padrao dos adultos por exem plo os problemas especificos da puberdade em nossa sociedade civilizada s6 podem ser compreendidos em relaao a fase hist6rica a estmtura da sociedade como urn todo que exige e mantem esse padrao de camporta mento adulto e esta forma especial de relacionamento entre adultos e crianas 9 Urn processo civilizador analogo ao da educaao sexual poderia ser demonstrado a respeito do casamento e de sua evoluao na sociedade ocidenta Em termos gerais e indubitavelmente correto que 0 casamento monogamico conslitui a instituiao predominante reguladora das rela6es sexuais no Ocidente Nao obstante 0 controle efetivo e a modelaao das rela6es sexuais mudou consideravelmente no CUfO da hist6ria ocidenta A Igreja evidentemente lutou desde cedo pelo casamento monogamico Mas o casamento assume essa forma rigorosa como inslituiao ocial obrigat ria para ambos os sexos apenas em urn estagio posterior quando os impul sos e ardores cafram sob controle mais firme e estrito Porque s6 entao as rela6es extramatrimonials dos homens foram na verdade proibidas so cialmente ou pelo menOs sujeitas a sigilo absoluto Em fases anteriores dependendo do balano do poder social entre os sexos as rela6es extra conjugais para os homens e as vezes tambem para as mullieres eram acei tas mais ou menos como naturais pela sociedade secular Ate 0 seculo XVI ouvimos referido COm grande freqiiencia que nas familias dos cida daos mas respeilaveis os filhos legitimos e ilegitimos do marido sao cria dos juntos e que nenhum segredo e feito da diferena na presena das pr6prias crianas a homem nao fora ainda forado socialmente a senlit vergonha de seus relacionamentos extramaritais A despeilo de todas as ten dencias compensadoras que sem duvida jli existem cotuma ser aceito como Lembremos que este livro roi escrito em 1939 RJR civilizafiio como transformacao do comportamento 183 natural que os filbos bastardos faam parte da familia que 0 pai deva pro verIbes 0 futuro e nos casos de fjlbas arranjarllies urn casamento bonra do Mas sem diivida isto levou mais de uma vez a urn srio desentendi mento 96 entre marida e mulher A situaao do filho ilegitimo nao e sempre e em toda a parte a mesma na Idade Media Apesar disso porem durante longo tempo nao ba sinal da tendencia ao segredo que mais tarde numa sociedade burguesaprofis sional respondera iI tendencia a urn confinamento mais rigoroso da sexua lidade na relaao de urn homem com uma iinica mulher no controle mais rigoroso dos impulsos sexuais e na pressao mais forte das proibi5es so ciais Neste particular tamMm as exigencias da Igreja nao podem ser con sideradas como 0 padrao vigente na sociedade secular Na realidade se nao sempre na lei a situaao de filhos ilegitimos na familia diferia da dos filhos legitimos apenas no sentido em que os primeiros nao herdavam 0 status do pai nem de modo geral sua riqueza ou pete menes nao na mesma proporao que os legitimos Que pessoas da classe alta chamassem a si mesmas clara e orgulhosamente de bastardos e fato bern eonbecido97 o casamento nas gaciedades de cortes absolutistas dos seculos XVII e XVIlI derivava seu carater especial do fato de que devido iI estrutura das mesmas pela primeira vez fora quebrada 0 dominic do marido sabre a esposa 0 poder social da esposa e quase igual ao do marido A opini3o social c formulada em alto grau pelas mulheres E se a sociedade ate entao aceitara apenas as rela5es extraeonjugais dos homens considertmdo as do scxo socialmente mais fraco como mais ou menos repreensiveis essas rela5es por parte das mulheres parecem nesse momento dentro de certos limites devido iI mudana no equilibrio de poder entre os sexas como legitimas Resta mostrar no detalhe que importancia essa primeira grande mu dana nas rela5es de poder ou se preferirem esta primeira onda de eman cipacao de mulheres nas cortes absolutistas teve no processo civilizador no deslocamento da fronteira de vergonha e do embaraT e no fortaleei mento do controle social sobre 0 individuo Da mesma forma que as mu danas nas rela5es de poder a ascensao social de outros grupas sociais exigiu novas formas de controle dos impulsos em urn nivel inteimediario entre as previamente impostos aos governantes e aosgovernados de modo que esse fortalecimento da posiao feminina na sociedade implicou dizendo esquematicamente uma diminuiao nas restri5es aoS seus impulsos e urn aumerito das restri6es nos dos homens Ao mesmo tempo forou ambos os sexos a arlotar uma autodisciplina nOva e mais rigorosa em suas rela 5es reciprocas No famoso romalce La Princesse de Cleves de autoria de Madame de I Fayette 0 marido da princes que sabe que ela esta apaixonada pelo duque de Nemours diz Confiarei apenas em voce Este e 0 caminho que l I 184 o processo civilirador meu coraall me aconselha a tomar e tambem a razao Com urn tempera mento como 0 seu djxandolhe ua liberdade eu the etabelero limite mtJj estreitos do que eu poderia fazer cumprir 98 Este e urn exemplo da autodisciplina exigida por essa situaao para ambos os sexos 0 marido sabe que nao pode conservar a esposa pela fora Nao tresvaria nem berra porque a esposa ama outro homem nem apel para seus direitos como marido A opiniao publica nao coonestaria nada disso Ele 50 wntrola Mas ao fazeIo espera dela a mesma autodisciplina que impoe a si mesmo Isto e urn exemplo muito caracteristico de uma nova constelaao que surge com a reduao da desigualdade social entre os sexos Fundamentalmente nao e tal ou qual marido enquanto individuo que con cede essa liberdade a esposa Ela se fundamenta na estrutura da pr6pria sociedade Mas exige tambem urn novo tipo de comportamento Produz confIitos muito especificos E certamente ha grande numero de mulheres nessa sociedade que usam de tal liberdade Ha evidencia de sobra de que nessa aristocracia de corte a restriao a rela6es sexuais ao casamento era freqiientemente considerada como burguesa e socialmente descabida Nao obstante tudo isto da uma ideia de como urn tipo especifico de liberdade cOrresponde diretamente a formas e estagios particulares de interdependen cia social entre seres humanos As formas lingiiIsticas naodinamicas as quais continuamos presos opoem liberdade a coerao como se fossem ceu e inferno A curto prazo esse raciocinio etil opostos absolutos muitas vezes se mostra razoavelmente adequado Para quem estii na prisao 0 mundo do outro lado das grades C urn mundo de liberdade Mas examinando 0 assunto com rnais enidado nao hii ao contrario do que sugerem antiteses como essas uma suposta liberdade absoluta se por ela entendemos total independencia e ausencia de qualquer coaao social 0 que hii e libertaao deuma forma de restri ao opressiva ou intoleravel para outra menos pesada Dessa maneira 0 processo civilizador a despeito da transformaao e aumento das limita6es que impoe as emoes e acompanhado permanentemente por tipos de Ii bertaao dos mais diversos A forma de casamento nas cortes absolutistas simbolizada pela igual disposiao de salas de estar e quartos de dormirpara homens e mulheres nas mansoes da aristocracia de corte constitui um dos muitos exemplos desta situaao A mulher eramais livre de restrioes ex ternas do que na sociedade feudal Mas a coaao interior que ela era obri gada a impor a si mesma de acordo com a forma dl integraao I com 0 c6digo de comportamento em vigor na sociedade de corte quI Sl origina vam ambos dos mesmos aspectos estrunurais dessa sociedadl quI Ingendra ram sua liberaao havia aumentado para Ila I para os homens em confronto com a sociedadl cavaleirosa o mesmo vemos se comparamos a forma burguesa dl casamento do seClo XIX com a da aristocracia dl cortI dos seculos XVII I XVIIl civilizopio como translormaiio do comportamento 185 Neste ultimo periodo a burguesia como urn todo esta livre das pressoes de uma sociedade absolutista estatal Burgueses e burguesas libertaramse das limitaoes externas a que estiveram sujeitos como pessoas de segunda classe na hierarquia dos estamentos Aumentou 0 entrelaamento de comercio e dinheiro cujo creseimento Ihes deu 0 poder social necessario para se li bertarem Mas neste aspecto as limitaoes soeiais do individuo tambem sao mais fortes do que antes 0 padrao de autocontenao imposto as pes soas da soeiedade burguesa por suas ocupa6es e em muitos aspectos di ferente do imposto a vida emoeional pelas fun6es da soeiedade de corte Em numerosas facetas da economia emocional as fUllOeS burguesas aeima de tudo a vida empresarial exigem e geram maior autocontrole do que as funocs de corte 0 motivo por que 0 trabalho como ocupaao que com a ascensao da burguesia se tomou estilo geral de vida deveria exigir urna disciplina parlicularrnente rigorosa da sexualidade e uma questao independente as liga6es entre a estrutura da personalidade e a soeial no seculo XIX nao cabem aqui Nao obstante para os padroes da sociedade burguesa 0 controle da sexualidade e a forma de casamento vigentes na soeiedade de corle eram extremamente debeis A opiniiio soeial condena agora no seculo XIX todas as relaoes extramatrimoniais entre os se xos embora nesta esfera ao contrario da sociedade de corle 0 poder social do marido volte a ser maior que 0 da esposa de modo que a violaao do tabu pelo marido geralmente e julgada com mais condescendeneia do que a mesma falta comelida pelas mulheres Mas ambas as uebras padrao tern nessa epoca de ser inteiramente exeluidas da vida social ofkial Ao contrario do que acontece na corte devem ser rigorosamente confinadas atnis da cena banidas para 0 reino do segredo Este e apenas urn dos mul tos exemplos do aumento da reserva e do autocontrole que 0 individuo enllio se impoe 10 0 processo civilizador nao segue uma linha reta A tendeneia ge ral da mudana pode ser identificada como aqui fizemos Em escala menor observamos as mais diversos movimentos que se entrecruzam murlanas e surtos nesta ou naquela direao Mas se estudamos 0 movimento da pers pectiva de grandes perfodos de tempo vemos claramente que diminuem as compulsoes originadas diretamente na ameaa do uso das armas e da fora fisica e que as formas de dependeneia que levam a regulaao dos efeitos sob a forma de autocontrole gradualmente aumentam Esta mu danca desponta em seu aspecto mais retillneo se ohservamos as homens da classe alta do tempo ista e a classe composta inicialmente de guer reiras ou cavaleiros em seguida de cortesaos e finalmente de profissionais burgueses Se analisamos 0 teeido de muitas camadas do desenvolvimento historico contudo verificamos que 0 movimento e infinitamente mais com plexo Em todas as fases ocorrem numerosas fluluaoes freqUentes avanos ou recuos dos controles internos e externos Q estudo dessas flutua6es 186 o pTOCeSSO civilizadoT particularmente das mais pr6ximas de n6s no tempo pode facilmente obs coreeer a tendencia geraL Uma delas esta presente ainda hoje na mem6ria de todos no periodo que se seguiu a I Guerra Mundial em comparaao com 0 periodo anterior a guerra parece ter ocorrido uma relaxaao da moral Certo numero de limitaOes impostas ao comportamento antes da guerra debilitouse ou desapareceu inteiramente Muitas coisas antes proi bidas passaram a ser permitidas Visto bem de perto 0 movimento parece estar ocorrendo na direao oposta a demonstrada aqui a levar a uma rela ao dos controles impostos ao individuo pela vida social Apurandose 0 exame parem nao e dificil Dotar que ista e apenas umll essao mnito Iigeira uma das flutuaoes que constantemente ocorrem na complexidade do movimento hist6rico em cada fase do processo total Um dos exemplos no particular e 0 das roupas de banho No seculo XIX cairia nO ostracismo social a mulher que usasse em pUblico os cos tumes de banho ora comuns Mas essa mudana e com ela toda a difusao do esporte entre ambos os sexos pressupOe um padrao muito elevado de controle de impulsos S6 numa sociedade na qual urn alto grau de controle e esperado como normal e na qual as mulheres estao da mesma forma que os homens absolutamente seguras de que cada individuo e limitado pelo autocontrole e por urn rigoroso c6digo de etiqleta podiam surgir trajos de banho e esporte com eSSe relativo grau de Iiberdade E uma re laxaao que ocorre dentro do contexto de urn padrao civilizado partie cula de comportamento envolvendo um alto grau de Iimitaao automa tica e de transformaao de emOOes condicionados para se tomarem Mbitos Paralelamente contudo encontramos tambem em nossa propria epoca os precursores de uma mudana para 0 cultivo de restrioes novas e mais rigorosas Em algumas sociedades sao feitas tentativas de estabelecer uma regulamentaao social e controle de emOoes muito mais forte e consciente do que 0 padrao ate entao predominante um padrao de modelaao que impoe renuncias e transforrnaao de impulsos ao individuo com vastas con seqiiencias para a vida humana que ainda mal sao previsiveis II Pouco importand0 por conseguinte como as tendencias podem se entrecruzar avanar e recuar relaxar au apertar em pequena escala a direao do movimento principal tanto quanto visivel ate agora e a mesma para todos os tipos de comportamento 0 processo de civilizaao do impulso sexual visto em escala mais ampla corre paralelo ao de outros impulsos sejam quais forem as diferenas sociogeneticas de detalhes que possam estar presentes Neste campo tamMm se medido pelos dos padrocs masculinos nas sucessivas classes dominantes 0 contrale tomase sempre mais rigoroso 0 instinto e lento mas progressivamente eliminado da vida publica da sociedade Aumenta tamMm a reserva que deve ser observada nas referencias a ele E esta limitaao como todas as demais e feita cum prir cada vez menos pela fora fisica direta Na verdade e cultivada desde tenta idade no individuo como autocontrole habitual pela estrutura da vida social pela pressao das instituioes em geral e por certos 6rgaos exe cutivos da saciedade acima de tudo pela familia em particular Por con seguinte as injunoes e proibioes sociais tomamse cada vez mais parte do ser de urn superego estritamente regulado Tal como outros impulsos a sexualidade e confinada cada vez moos exc1usivamente tanto para as homens como para as mulheres num enclave particular 0 casamento socialmente legitimado A tolerancia social para com outros relacianamentos tanto de marido como de mulher que de ma neira nenhuma faltava antes e reprimida cada vez mais OOnda que com altos c baixos Todas as violaoes dessas restrioes e tudo 0 que conduz a uma delas e por conseguinte relegado ao reino do segredo do que nao pode ser mencionado sem perda de prestigio ou de posiao social E da mesma forma que a familia nuclear s6 aos poucos se tomou e de forma tao exclusiva 0 iinico enclavelegitimo da sexualidade e de todas as funoes intimas de homens e mulheres assim tambem s6 em urn estagio tardio ela se transformou no 6rgao principal para cultivar 0 controle so cialmente exigido dos impulsos e do compartamento dos jovens Antes de ser alcanado este grau de restriao e privacidade e ate que 0 isolamento da vida instintiva da vida piiblicafosse rigorosamente prescrito a tarefa do condicionamento precoce nao dependia tanto do pai e da mae Todas as pessoas que intervinham no cuidado das crianas e quando a privaci dade era menor e 0 interior da casa menos isolado elas eram numerosas desempenhavam urn pape Alem disso a pr6pria familia era geralmente mais numerosa e na classe alta mais abundantes os servidores do mesticos naqueles tempos As pessoas falavam em geral com mais fran queza sobre os varios aspectos da vida instintiva e cediam mars livremente aos seus pr6prios impulsos em atos e palavras Era menor a vergonha asso ciada a sexualidade E ista 0 que torna tao diffcil de entender por peda gogas de uma fase posterior 0 trabalha educacional de Erasmo acima ci tado Assim 0 candicianamento a reproduao de habitos sociais na crian a nao ocoma tao exclusivamente atras de portas fechadas por assilD dizer mas de forma mais direta napresenla de outras pessoas Um forma de maneira nenhuma rara desse tipo de candicionamento na classe alta pode ser encantrada par exemplo no diario do dr Jean Heroard que regis tra dia a dia e quase hora a hara a infilncia de Luis XIII 0 que ele dizia e fazia enquanto crescia Naa deixa de ter urn toque paradoxa 0 fata de que a medida que aumentam 0 contrale a restriQaa e a acultamento de ardores e impulsos que sao exigidos do individuo pela sociedade e por conseguinte se toma maisdiffcil a condicionamento dos jovens rnais a tarefa de instilar os ha bitos socialmente requeridos se concentre na famma nuclear no pai e na mae 0 mecanismo de condicianamento contudo pauco difere do usado tiviJizaQo como transormaiio do comportamento 187 188 o proceuo civiliVJ40r em epocas anteriores Isto porque nao implica uma supervisao mais rigo rosa da tarefa ou planejamento mais exato que leve em eonta as circuns tancias especiais da criana mas e efetuado principalmente e por meios automaticos e ale certo ponto par reflexos Aconstelaao socialmente modelada de hlibitos e impulsos dos pais da origem a outra semelhante no filho Bias podem operar ou na mesma direao ou em outra inteiramente diferente da desejada ou esperada pelos pais com base em seu proprio condicionarnento A interrelaao dos hlibitos de pais e filhos atraves da qual a vida instintiva da criana e lentamente modelada e assim determi nada par nada menos do que pela razao Conduta e plilavras associadas pelos pais 11 vergonha e repugniincia sao muito cedo associadas da mesma maneira pelos filhos atraves de manifesta6es de desagrado dos pais pOI pressao mais ou menos suave Desta maneira 0 padrao social de vergonha e repugniincia e gradualmente reproduzido no filho Mas esse padrao forma simultaneamente a base e 0 contexto das mais diversas forma6es de im pulsos individuais A maneira como a personalidade em crescimento e mo delada em casas particulares por essa incessante interaiio social entre os sentimentos hlibitos e rea6es de pais e filhos e no momento em grande parte imprevisivel e incalculavel 12 A tendencia do processo civilizador a tornar mais intimas tadas as fun6es corporais a encerralas em enclaves particulares a colocalas atras de portas fechadas produz diversas conseqiiencias Uma das mais importante ja observada em conexao COm varias outras formas de impul sos notamos com especial c1areza no desenvolvimento de limita6es civi lizadoras i sexualidade Eo a peculiar divisao dentro do homem que se acen lua na mesma medida em que os aspectos da vida humana que podem ser exibidos na vida social slio separados dos que nao podem e que devem permanecer privados au secretos A sexualidade tal como todas as demais fun6es humanas naturais e fenomeno de todos conhecido e e parte de toda vida humana Vimos como todas essas furi6es sao aos pou cos carregadas com vergonha e embarao sociogeneticos de modo que a simples Jnenao delas em sociedade passa cada vez mais a estar sujeita a grande numero de controles e proibi6es Cada vez mais as pessoas man tern as proprias fun6e e tudo 0 que as lembra ocultas uma das outras Nos casos em que isto nao e possivel como no casamento par exemplo a vergonha a embarao 0 medo e todas as demais emooes associadas a essas foras motivadoras da vida humana sao dominados por urn ritual social precisamente regulado e par certas formulas de ocultaniento a flm de preservar 0 padrlio devergonhaEm outras palavras com 0 avano da civilizaao a vida dos seres humanos fica cadavez mais dividida entre uma esfera intima e uma publica entre cOlriportamento secreto e publicoE esta divisao e aceita como tao natural lornase urn habito tao compulsi va que mal e percebida pela consciencia v civilirofOO como translormafoo do camporamento 189 Juntamente corn essa crescente divisao do comportamento no que e c nao e publicamente permitido a cstrutura da personalidade tambem se transforma As proibioes apoiadas em sanoes sociais reproduzemse no individuo como formas dc autocontrole A pressao para restringir seus im pulsos e a vcrgonha sociogenetica que os cerca estes sao transformados tao completamente em babitos que nao podemos resistir a eles mesmo quan do estamos sozinhos na esfcra privada Impulsos que prometem e tabus e proibioes que negam prazeres sentimentos socialmente gerados de vergo nha e repugnancia entram em luta no interior do indivfduo Este conformc ja apontamos e 0 cstado de coisas que Freud tenta descrever atraves de conceitos como superego e inconsciente QU como se diz nao sem razOes na faia diaria como subconsciente Mas como quer que seja expresso o c6digo social de conduta gravse de tal forma no ser humano desta ou daquela forma que se torna elemento constituinte do indivfduo E este ele mento 0 superego tal como a estrutura da personalidade do individuo como urn todo necessaria e constantemente muda com 0 c6digo social de comportamento e a estrutura da sociedade A accotuada divisao do cgo ou consciencia caracterfstica do homem cm nossa fase de civilizaao que en contra expressao em termos como superego e inconscientc correspon de Ii cisilo especifica no comportamento que a sociedade civilizada exige de seus membros igual ao grau de regulamentaao e restriilo impostas Ii expressilo de necessidades profundas e impulsos Tendencias nessa dirilo podemse desenvolver sob qualquer forma na sociedade humana mesmo naquelas que chamamos de primitivas Mas a fora adquirida em socie dades como a nossa por essa diferenciailo e a forma como ela aparece silo reflexo de urn desenvolvimento hist6rico particular silo resultado de urn processo civilizador E lsso 0 que temos em mente quando nos referimos aqui Ii constante correspondencia entre a estrutura social e a estrutura da personalidade do ser individual x Mudanas na Agressividade A estrutura emocional do homem e urn todo Podemos dar a instintos particulares diferentes nomes de acordo com suas diferentes orientaoes e funOes falar de fome ou de necessidade de escarrar de dcsejos sexuais e de impulsos agressivos mas na vida esses varios instintos nao podem ser mais separados do que 0 corilo do estomago ou 0 sangue no cerebro do 190 o processo civilizador sangue nos orgaos genitais Eles se complementam e em parte se substituem transformamse dentro de certos limites e se compensam mutuamente Uma perturbaao aqui manifestase ali Em suma e1es formam uma especie de circuito no ser humano urn sistema parcial dentro do sistema total do or ganisrno Sua estrutura e ainda obscura sob finitos aspectos mas nao ha duvida que sua forma socialmente impressa e de importimcia decisiva para o funcionamento tanio da sociedade como dos individuos que a comp6em A maneira cOmo hoje falamos em impulsos ou manifesta6es emocio nais leva as vezes a supor que temos dentro de nos urn feixe inteiro de motiva6es diferentes entre si Referimonos a uma pulsao de morte ou a urn impulso de autoafirmaao como se fossem substancias quimicas diferentes Isto nao quer dizer que a observaao dessas diferentcs puls6es no individuo DaD passa ser extremamente frutifera e instrutiva Mas as ca tegorias pelas quais essas observa6es sao classificadas permanecerao im potentes diante de sens objctos vivos se DaD conseguirem expressar a uni dade e a totalidade da vida instintiva e a ligaao de cada tendencia pulsional particular com essa totalidade Conseqiientemente a agressividade que sera objeto deste capitulo nao e uma especie separada de pulsao No maximo s6 poderemos falar em pulsao agressiva se permanecermos conscientes de que ele se refere a uma funao pulsional particular dentro da totalidade de urn organismo e de que mudanas nessa funao indicam mudanas na estrutura da personalidade como urn todo 0 padrao de agrcssividade seu tom e intensidade nao e hoje exa tamente uniforme entre as diferentes na6es do Ocidente Mas essas dife renas que de perto as vezes parecem muito grandes desaparecem se a agressividade das na6es civilizadas for comparada com a de sociedades em urn diferente estagio do controle de emo6es Comparada com a furia dos guerreiros abissinios reconhecidamente impotentes contra 0 aparato tecnico do exercito civilizado ou COm a fer9cidade das tribos a epoca das Grandes Migra6es a agressividade mesmo das na6es mais belicosas do mundo civilizado parece bern pequena Como todos os demais instintos ela e condicionada mesmo em a6es visivelmente militares pelo eslado adiantado da divisao de fun6es e pelo decorrente aumento na depen dencia dos individuos entre si e face ao aparato tecnico confinada e domada por inumeraveis regras e proibi6es que se transformaram em autolimita6es Foi tao transformada refinada civilizada como todas A guerra da Abissinia como era entiio conhecida a Eti6pia era recente as fas cistas italianos haviam invadido 0 pafs em 1935 e no ano seguinte conseguiram aparentemente controlar a situacao e coroar 0 rei da Italia Vitor Emanuel III im perador da Eti6pia A guerra continuou porm e em 1941 as ingleses expulsaram O italianos e restauraram 0 negus Haile Selassie RJR civiirao como translormacQo do comportamento 191 as outras formas de prazer e sua violencia imediata e descontrolada apa rece apenas em sonhos ou em explosOes isoladas que explicamos como patol6gicas Nesta area emocional a do teatro das colisoes hostis entre homens ocorreram como em todas as outras as mesmas transforma90es hist6ricas Nao importando em que ponto se situa a Idade Media nessa transforma9ao bastara estudar aqui 0 padrao de sua c1asse governante secular os guerreiros como ponto de partida a fim de i1ustrar 0 padrao geral desse desenvolvi mento A libelll9ao das emQ90es em batalba durante a Idade Media nao era talvez tao desinibida como no periodo anterior das Grandes Migra 90eS Mas era bastante franca e desinibida em compara9ao com a medida dos tempos mOOernos Neste ultimo a crueldade e a alegria coni a destrui 9ao e 0 tormento de outrem tal como a prova de superioridade fisica foram colocadas sob um controle social cada vez mais forIe amparado na organiza9ao estatal TOOas essas formas de prazer limitadas por amea935 de desagrado gradualmente vieram a se expressar apenas indiretamente em uma forma refinada E s6 em epocas de subleva9ao social ou quando o controle social e mais frouxo como por exemplo em regioes coloniais elas se manifestam mais direta e livremente menos controladas pela ver gonha e a repugnancia 2 A vida na sociedade medieval tendia na dirao oposta A pilba gem a guerra a ca9a de homens e animais totlas estas eram necesSi dades vitais que devido a estrutura da sociedade ficavam a vista de todos E assim para os fortes e os poderosos formavam parte dos prazeres da vida Eu vos digo conta um hino de guerra atribuido ao menestrel Ber tran de Borntoo que nem comer nem beber nem dormir tem tanto sabor para mim cOmo ouvir 0 grito Para a frente de ambos os lados e cavalos sem cavaleiros refugando e relinchando ouvir 0 grito Acudi Acudi ever o pequeno e 0 pOOeroso tombarem na grama das trincheiras e os mortos atravessados pela madeira de lan9as adornadas com flamulas Ate mesmo a forma literaria da uma impressao da selvageria original do sentimento Em outro trecho canta Bertran de Born Esta se aproxi mando a esta9ao agradavel quando nossOS navios tocarao a term quando o rei Ricardo vira alegre e orgulboso como nunca Agora veremos ouro e prata correrem os recernconstruidos parapeitos de pedra cairao com urn som que alegrara 0 cora9ao rnuralhas ruiriio torres balan9ariio e desmo ronarao e nossos inimigos provarao 0 gosto da cadeia e das correntes Amo o entrevero do azul e do vermelhiio dos escudos das flarnulas e bandeiras de rnuitas cores as tendas e ricos pavilh6es espalhados pela planicie a quebra de lan9as a perfura9ao de escudos os capacetes faiscautes fendidos pela clava os golpes dados e recebidos I 19Z o processo civilitador A guerra declara uma das chansons de geste significa descer como o mais forte sobre 0 inimigo cortar suas Yideiras arrancar pelas raizes suas arvores assolar suas terras tomarde assalto seus castelos entupir seus poos e matar suas gentes Urn particular prazer vern da mutilaao de prisioneiros Por minha bonra diz 0 rei na mesma canao rio do que dizeis nao dou urn ceitil por vossas amea9as cobrirei de vergonha cada cavaleiro que capturar cor tarei seu nariz ou orelhas Se for sargento ou mercador perdera urn p6 ou urn braolOl Essas coisas notese nao saO ditas apenas em can90es Esses poemas epicos constituem parte integral da vida social E expressam muito mais diretamente os sentimentos dos ouvintes a quem se dirigem do que a maior parte de nossa Iiteratura Podem talvez exagerar nos detalhes Mesmo na era da cavalaria 0 dinheiro ja tinba em certas ocasioes algum poder para subjugar e transformar emoes Geralmente s6 os pobres e bumildes pelos quais nao se podia esperar resgate consideravel eram mutilados e eram poupados os cavaleiros que tinham quem pagasse por eles As crllnicas que documentaram diretamente a vida social do perfodo contem amplo teste munho dessas atitudes Elas eram escritas na maior parte por religiosos Os julzos de valor que contem sao por conseguinte amiude os do grupo mais fraco amea9a do pela classe guerreira Nao obstante 0 quadro que nos transmitem e inteiramente autentico Ele passa a vida lemos a respeito de urn cava leiro na rapinagem destruindo igrejas atacando peregrinos oprimindo viuvas e 6rfaos Sente especial prazer em mutilar inocentes Em urn unico mosteiro 0 dos monges negros de Sarlat ha 150 homens e mulheres cujas maos ele corlou ou cujos olbos arrancou E sua esposa 6 igualmente cruel Ela 0 ajuda nas execuoes E sente prazer em torturar mulheres pobres Mandalhes cortar os seios ou extrair as unhas de modo a que nao possam mais trabalhar 102 Essas explosoes emocionais podem ainda oeorrer como fenllmenos ex cepeionais como degeneraao patoI6gica em fases posteriores do desen volvimento social Mas no caso que ora estudamos nao bavia poder social punitivo A unica ameaa 0 unieo perigo que podia instilar mOOo era 0 de ser venddo em batallia por urn adversario mais forte Deixando de lado uma pequena elite 0 saque a rapinagem e 0 assassinato eram pratieas comuns da sociooade guerreira dessa epoea conforme anotou Luehaire 0 historiador da sociedade franeesa do seeulo XIII Ha pouea evidencia de que as coisas fossem diferentes em outros paises ou nos s6eulos que se seguiram Explos6es de crueldade nao exclufam ningn6m da vida social Seus autores nao eram banidos 0 prazer de matar e torturar era grande e socialmente permitido At6 certo ponto a propria estrutura social impe J civilizafiio comolramjormafiio do comporlamenlo 193 lia seus membros nessa direiio fazendo com que parecesse necessario e praticamente vantajoso comportarse dessa maneira a que pOl exemplo devia ser feito com prisioneiros Era pouco 0 dinheiro nessa sociedade Se os prisioneiros podiam pagar e alem disso eram membros da mesma class do vitorioso exerciase certo grau de con teniio Mas os outros ConservaIos vivos significava alimentaIos Devol velos significava aumentar a riqueza e 0 poder de luta do inimgo Isto por que os suditos isto e os que trabalhavam serviam e lutavam faziam parte da riqueza da classe governante daquele tempo De modo que os prisioneiros eram mortos 011 devolvidos tiio mutilados que niio preslavam rnais para servio de guerra ou trabalho a mesmo se aplicava a destruiao de campos plantados entupimento de poos e abate de arvores Em urn sociedade prcdominantemente agraria na qual as posses fixas representa yam a maior parte da propriedade isto tambern servia para enfraquccer 0 inimigoA emotividade mais forte do comportamento era ate certo ponto socialmente necessaria As pcssoas se comportavam de maneira socialmente uti e tinham prazer nisso E estava inteiramente de acordo com o grau mais baixo de controle social e domlnio da vida instintiva que esse prazer na destruiiio pudcsse as vczes ceder atraves de uma identificaiio ine perada com a vitima e sem duvida tambcm como expressiio do medo e da culpa gerados pela precariedade permanente desse tipo de vida a extremos de compaixiio a vitorioso de hoje era derrotado amanhii pOl algum aci dente capturado e sua vida corria perigo No meio dessas perpetuas as censoes e quedas dessa aHernancia de caadas humanas em tempo de guer ra com a caa a animais ou os torneios justas que eram os divertimen tos em tempo de paz pouco podia ser previsto a fuluro era relativa lIente incerto mesmo para os que haviam fugido do mundo S6 Deus e a lealdade de algumas pessoas tinham alguma permanencia a mOOo rei nava em toda a parte e 0 indivfduo tinha que estar sempre em guarda E da mesma forma que 0 destino da pessoa podia mudar abruptamente assim sua alegria podia transformarse em medo e este mOOo pOl seu turno ce der lugar com igual brusquidiio a algum novo prazer A maior parte da classe governante secular da Idade MCdia levava a vida de chefs de bandos armados Esta vida formava 0 gosto e os htibitos dos indivfduos Anais que nos foram deixados pOl essa sociedade tra9am de modo geral urn quadro semelhante ao das sociedades feudais de nossos pr6prios tempos e demonstram urn padriio comparavel de comportamento Apenas uma pequena elite da qual teremos mais a dizer adiante se afas tava urn pouco dessa norma a guerreiro da Idade MCdia nao amava s6 a guerra vivia dela Pas sava a juventude preparandose para isso Ao chegar a idade apropriada era armado cavaleiro e fazia a guerra enquanto as foras Ihe permitiam ate a velhice Sua vida niio tinha outra funiio Seu lugar de moradia era 194 o processo civililodor uma torre de vlgla uma fortaleza simultaneamente arma de ataque e de fesa Se par acidente par exceao vivia cm paz precisava pelo menos da ilusao da guerra Lutava em tarneios e estes muitas vezes POllCO diferiam de autenticas batalhas Para a sociedade da epoca a guerra era 0 estado normal diz Lu chaire historiador do seculo XIII E Huizinga a respeito dos scculos XIV c XV comenta uA forma cronica que a guerra costumava assumir a per turbaao continua de cidade e campo par todos as lipos de maltas perigo sas a ameaa permnncnte de sentenas duras c imprevisiveis nos tribunais alimentavam urn sentimento geral de incerteza 104 No seculo XV como no seculo IX au no XIII a eavaleiro ainda do expressao a seu prazer na guerra mesmo que naG mais tao francamentc e da mesma forma que antes A guerra e uma alegre empresa 105 Quem diz isso e Jcan de Bueil Perdendo a favor do rei nesse momenta dita a hist6ria de sua vida a urn criado Carre a ana de 1465 Nao e mais a cavaleiro inteiramente livre independente quem fala a pequeno rei em seu domfnio E alguem que esta a servi90 de outrem A guerra e uma alegre empresa Todos nos nos amamos tanto em tempos de guerra Se vemos que a causa e justa e que nossos parentcs Intam corajosarnente higrimas nos acorrem aos olhos Uml doce alegria nasee em nosso coraao no sentimento de nassa honesta leal dade reciproca c venda 0 amigo tao bravamente arriscar seu corpo ao perigo a fim de manter e cumprir a mandamento de Deus resolvemos ir a frente e mOITer ou viver com ele e nunca deixaIo par causa de urn amorzfnho Isto traz tal deleite que aquele que nao a senliu nao podc saber como e maravilhoso Credes que alguem que sentiu isso tem medo da morte Ii impassive Ele se sente tlio fortalecido tao delicado que nem mesmo sabe onde esta Realmente ele nada teme no mundo Esta e a alegria da guerra com certeza mas DaD mais a prazer direto na caada humana no relampejar de espadas no relincho dos corceis no medo e na morte do inimigo como e bela ouviIos gritar Acudi acudi au velos cafdos com a corpo aberto de um lado a outro 100 Nesse momento a prazer esta na proximidade dos amigos no entusiasmo par uma justa causa e mais do que antes encontramos a alegria da guerra servindo como intoxicante para veneer 0 medo Sentimentos muito simples e poderosos falam aqui 0 homem mata entregase inteiramente 11 luta ve a amigo lutar Luta a seu lado Esquece se de onde esta Esquece a pr6pria morte E esplendido 0 que mais 3 Ha prova evidente de que a atHude em relaao 11 vida e 11 morte na classe alta secular da Idade Media nlio e de modo algum a predomi nante nos Iivros da dasse alta edesiastica que geralmente consideramos tfpica dessa epoca Isto porque para a classe clerical superior ou pelo civiliza9iio como transorma9Qo do comportamento 195 menos para seus portavozes a maneira como se leva a vida e determinada pela meditaao da morte e do que vern depois no outro mundo Na cIasse alta secular isto uao aeontece sempre POP mais que fre qiientes estados de espirito e fases de animo desse tipo possam existir na vida de todos os cavaleiros hi prova repetida de uma atitude muito dife rente Uma vez apos outra ouvimos uma advertencia que nao concorda inteiramente com 0 quadropadrao que hoje formamos da Idade Media nao permita que sua vida seja governada pela meditaao da morte Ama os prazeres desta vida Nul curtois ne doit blamer joie mais toujours joie aimer Nenhum homem cortes deve injuriar a alegria mas amala07 Isto e urn comando de cortesia extraido de um romance de principios do seculo XIII Ou de urn perfodo muito depois 0 jovem deve ser alegre e levar uma vida delei tosa Nao e bom para 0 jovem ser triste e melancolico 100 Nessas pala vras a gente cavaleirosa que certamente nao tinha necessidade de ser me lancolica contrastase com os religiosos que sem duvida se mostravam freqiientemente tristes e f6nebres Esta atitude muito longe de ser uma negaao da vida e manifestada com particular entusiasmo e clareza no tocante a morte em alguns versos do Distiche Catonis que foram transmitidos de uma geraao a outra du rante toda a Idade Media 0 fato de a vida ser incerta e urn dos temas fun damentais e repetidos nesses versos 109 A todos n6s uma dura e incerta vida 6 dada Mas isto nao leva Ii concIusao de que 0 individuo deva pensar na mor te e no que acontece depois mas sim Se a morte ternes em sofrimento vivenis Ou em outro trecho expressado com particular cIareza e beJeza 110 Sabemos bern que a morte vira e que nosso futuro e desconhecido sorrateira como urn Iadrio ela vira e corpo e alma separara Assim tern fe e confianca nao temas demais a morte pois se assim 0 fizeres a alegria nunca mais sera tua consorte Nada sobre a outra vida Aquele que permite que sua vida seja gover nada pela meditaao da morte nunca mais tera alegria Nao M duvida de que os cavaleiros se julgavam crislaos autenticos e suas vidas estavam sa turadas de ideias e rituais tradicionais da fe crista Mas 0 cristianismo es tava Iigado em Sua mente conforme suas diferentes situaoes social e psi r 196 o processo civilizador r r i col6gica a uma escala de valores inteiramente diferente da que existia paw os reigiosos que escreviam e iam ivros A fe dos cavaleiros tinha uma substaneia e tom inteiramente diferentes Ela nao os impedia de saboreal plenamente as alegrias do mundo nem de pilhar e matar Isto era parte de sua fungao social atributo de sua classe motivo de orgulho Nao temer a morte era necessidade vital para 0 cavaleiro Ele tinha que lutar A estru tura e tensoes dessa sociedade transformavam isto em condigao inescapavel para 0 individuo 4 Mas na soeiedade medieval essa permanente disposigao de lutar de armas oa mao era necessidade vital naD 86 para as guerreiros para classe cavaleirosa A vida dos burgueses nas cidades caracterizavase pOl rixas mais ou menos graves em gran fiUitO mais alto do que em tempo posteriores e nelas tambem a beligerancia 0 6dio e 0 prazer em ator mentar os demais eram mais desinibidos do que na fase subseqUente Com a lenta ascensao do Terceiro Estado cresceram as tensoes na sociedade medieval E nao foi apenas a arma do dinheiro que fez ascender o burgues 0 roubo a luta a pilhagem a inimizade tradicional entre fa milias tudo isto desempenhava urn papel de importaneia nao menor na populagao urbana que na pr6pria classe guerreira Vejamos para dar apenas urn exemplo 0 destino de Mathieu dEscouchy Ele e natural da Picardia e urn dos numerosos homens do seculo xv que escreveu uma Cronica11I Pela sua Cronica caberia supor que fosse urn modesto homem de letras que dedicava seu tempo a meti culosos trabalhos hist6ricos Mas se tentamos descobrir em documentos alguma coisa de sua vida emerge urn quadro inteiramente distinto 112 Mathieu dEscouchy inicia sua carreira de magistrado como conselheiro jurado e preboste prefeito da cidade de P6ronne entre 1440 e 1450 Desde 0 comeco vernoto envolvido em urna rixa com a familia do procurador da cidade Jean Froment uma rixa que e disputada em processos judiciais Em primeiro lugar cabe ao procurador acusar dEscouchy de falsificaeao de maeda e assassinato ou de exces et atternptaz 0 preboste por seu lado ameaca a viuva de seu inimigo com uma investigaeao por pratica de magia A mulher obtern urn man dado obrigando dEscouchy a transferir a investigaCao para as maos da jusHea o caso e levado ao parlamento de Paris e dEscouchy vai para a prisao pela primeira vez VemoIo preso seis vezes depois 0 mais das vezes como acusada e uma vez como prisioneiro de guerra Ein todos os casos urn crime grave foi cometido e mais de urna vez ele e posta a ferros A serie de acusacoes Tecpro cas entre as famnias Froment e dEscouchy e interrompida par urn choque vio lento no qual 0 filho de Froment fere dEscouchy Ambos contratam sicarios para acabar com a vida do outro Quando essa longa inimizadeentre familias sai de cena e substitufda por novos ataques Desta vez 0 preboste e ferido por urn monge Novas acusacoes e em 1461 dEscouchy e transferido para Neste aparentemente sob suspeita de ter comeHdo atos criminosos Ainda assim nada disto 0 impede de ter uma carreira bemsucedida Tornase intendente preboste de Ribemont procurador do rei em SaintQuentin ee elevado a nobreza ApOs novos ferimentos prisoes e condenacoes reencontramolo em servico de guer civilitaiio como translormaao do comportamento 197 ra E leito prisioneiro de guerra De uma campanha posterior volta aleijado para easa Contrai nCJpcias mas isto nao signifiea 0 comeco de uma vida tranqiiila ReencontramQolo sendo levado prisioneiro para Paris como criminoso e assassi no aeusado de forjar sinetes mais urna vez envolvido em urna rixa com urn magistrado de Cornpihne E levado a admitir sua culpa mediante tortura tern negado urn pedido de perdao e eondenado reabititado condenado novamente atc que desapareeem dos doeumentos sinais de sua existencia Estee apenas urn dentre inumeniveis exemplos Temos outros nas co nhecidas miniaturas do livro de horas do duque de Berry1I3 As pes soas durante muito tempo acreditaram diz 0 editor da obra e algumas ainda continuam convencidas dislo hoje que as miniaturas dQ seculo XV sao obras de monges serios e freiras piedosas que trabalhavam na paz de seus mosteiros e conventos Isto e possiveI em certos casos Mas de modo geral a situaao era muito diferente Foram pessoas mundanas mestres artesMs os autores dessas belas obras e a vida desses artistas seculares estevemuito lange de ser edificante Ouvimos falar repetidamente de atos que pelos atuais padroes de nossa sociedade seriam profligados como criminosos e tidos socialmente como intoleniveis Par exemplo pintores se acusam mutuamente de roubo depois urn deles auxiIiado par parentes esfaqueia e mata 0 outro na rua 0 duque de Berry que precisa do Iraba Iho do assassino e obrigado a pedir para ele uma anistia uma leIIre de remission Outro rapta uma menina de oito anos a fim de casarse com ela naturalmente contra a vontade dos pais Essas letres de rtmission mos tramnos que tais rixas sangrentas ocorriam par toda parte nao niro du rando muitos anos as vezes culminando em verdadeitas batalhas em 10 gradouros publicos E isto Se aplica tanto a mercadores e artesaos como a cavaleiros Como acontece em todos as outros paises que adotam formas sociais semelhantes par exemplo hoje na Eli6pia e no Afeganistao os nobres possuem bandos de capangas dispostos a ludo Durante a dia ele anda constantemente acompanhado de serviais e gente annada para levar a cabo suas rixas as roturiers plebeus as cidadaos nao podem se dar a esse luxo mas tern seus parentes e amigos que correm em sua ajuda nao raro em grande numero equipados com todos os tipos de armas terrfveis que os coutumes locais as ordenancas locais em vao profbem Esses burgueses 1ambem quando tern que se vingar sao de gllerre em questoes de rixas 114 As autoridades urbanas tentam sem resultado acabar com essas bri gas entre familias as magistrados convocam os contendores ordenam a cessaao da luta emitem decretos e mandados Durante algum tempo ludo corre bern Em seguida uma nova rixa surge e outra se reacende Dois associes se desavem por questiies de neg6cios discutem 0 conflito tomase violento urn dia se encontram em urn local pUblico e urn mata a outro11 Urn estalajadeiro acusa outro de Ihe roubar as clientes Tomamse inimigos 198 o prOCeS50 civiUrador mortai Urn diz umas palavras maliciosas sobre 0 outro e surge uma guerra entre familias As vinganas entre familias as rixas privadas as vendetas por con seguinte nao ocorriam apenas entre a nobreza Nas cidades do seculo XV nao sao menos comuns as guerras entre familias e grupos As pessoas hu mildes tambem os chapeleiros os alfaiates os pastores eram rapi drssimas no sacar a faca u bern conhecido como eram violentos os cos tumes no seculo XV COm que brutalidade as paixiies eram acalmadas a despeito do medo do inferno a despeito das restriiies das distiniies de classe e do sentimento cavaleiroso de honra a despeito da bonomia e ale gria das relar6es socials 116 Nao que as pessoas andassem sempre de cara feia arcos retesados e postura marcial como slmbolo claro e visivel de sua pericia belicosa Muito ao contrario em urn momento estao pilheriando no outro trocam zomba rias uma palavra leva a outra e de repente emergindo do riso se veem no meio de uma rixa feroz Grande parte do que nos parece contradit6rio a intensidade da religiosidade 0 grande medo do inferno 0 sentimento de culpa as penitencias as explosiies desmedidas de alegria e divertimen to a siibita explosao de fora incontrolavel do 6dio e da beligerancia tudo isso tal como a rapida mudana de estados de animo e na realidade sintoma da mesma estrutura social e de personalidade as instintos as emo iies eram liberados de forma mais livre mais direta mals aberta do que mais tarde S6 para n6s para que tudo e rnais controlado moderado cal culado em qnem tabus sociais mergulham muito mais fundamente no te cido da vida instintiva como forma de autocontrole e que esta visivel in tensidade de religiosidade beligerancia ou crue1dade parece contradit6ria A religiao a crena na onipotencia punitiva ou premiadora de Deus nunca teve em si urn efeito ucivilizador ou de controle de emoiies Muito ao contrario a religHio e sempre exatamente tao civilizada como a socie dade ou classe que a sustenta E porque as emiies sao expressas nessa epoca de uma maneira que em nosSo mundo e geralmente observada em criao8s chamamos de infantis essas manifestaoes e formas de com portamento Em todos os casos em que abrimos documentos dessa epoca encon tramos a mesma coisa uma vida na qual a estrutura emocional era dife rente da nossa uma existencia sem segurana e com 0 minimo de pensa mento sobre 0 futuro Quem quer que nao amasse ou odiasse ao maximo nessa sociedade quem quer que nao soubesse defender sua posiao no jogo das paixiies podia entrar para urn mosteiro para todos os efeitos Na vida mundana ele estava tao perdido como inversamente estaria numa socieda de posterior e particularmente na corte 0 homem que nao pudesse con troIalas nao pudesse esconder e civilizar suas emoes civilizaiio como translomaiio do comportamento 199 L 5 Em ambos os casos e a estrutura da sociedade que exige e gera urn padrao especifico de contrale emocional N6s com nossos costu mes e habitos pacificos com 0 cuidado e a proteao que 0 estado moderno prodigaliza sobre a propriedade e a pessoa dificilmente podemos formar uma id6ia dessa outra sociedade ou como diz Luchaire Nessa epoea 0 pais se desintegrara em provincias e Os babitantes de cada urna delas formavam uma especie de pequena naeao que abominava todas as deroais As provIncias eram por sua vez divididas em urn numero imenso de estados feu dais cujos senhores se combatiam cern cessar Nao apenas os grandes senhores os baroes mas tambem os senhores meDores das mansoes solarengas viviam em triste isolamento e se ocupavam sem cessar em travar a guerra contra seus llsoberanos seus iguais ou seus siiditos Alem disso havia uma rivalidade per manente entre uma cidade e outra entre as aldeias entre Os vales e guerras constantes entre vizinhos que pareciam surgir da propria multiplicidade dessas unidades territoriais111 Esta descriao ajudanos a ver com mais clareza algo que ate agora s6 foi dito em termos gerais isto e a conexao entre estrutura social e a estrutu ra da personalidade Nessa sociedade nao havia poder central suficientemente forte para obrigar as pessoas a se controlarem Mas se nesta regiao ou na quela 0 poder de uma autoridade central crescia se em uma area maior ou menor as pessoas eram foradas a viver em paz entre si a modela9ao das emooes e os padroes da economia dos instintos lentamente mudavam Con forme veremos no detalhe mais adiante a reserva e a uconsideraao mutua entre as pessoas aumentavam inicialmente na vida social dhiria cornum E a descarga de emooes em ataque ffsico se limitava a certo enclaves tempo rais e espaciais Uma vez tivesse 0 monop6lio da fora fisica passado a auto ridades centrais nem todos os homens fortes podiam se dar ao prazer do ataque ffsico Isto passava nesse instante a ser reservado aqueles poucos legi timados pela autoridade central como por exemplo a poHcia contra crimi nasos e a numeros maiores apenas em tempos excepcionais de guerra ou revoluao na luta socialmente legitimada contra inimigos internos ou externos Mas ate mesmo esses enclaves temporais ou espaciais na sociedade ci vilizada nos quais se deu maior liberdade a beligerancia acima de tndo nas guerras entre nagoes tornaramse mais impessoais e levavam cada vez menos a uma descarga emocional marcada pelo imediatismo e inte11sidade da fase medieval 0 controle e a transformaao da agressao cultivado na vida diaria da sociedade civilizada nao podem ser investidos simplesmente mesmo nesses enclaves Ainda assim isso poderia acontecer com maior rapi dez do que poderiamos supor nao tivesse 0 combate ffsico direto entre urn homem e seu odiado adversario cedido lugar a uma luta mecanizada que exige rigoroso controle dos afetos Mesmo nas guerras do mundo civilizado o indivfduo nao pode mais dar redea livre ao prazer provocado pela vista do inimigo mas lutar pouco importando como se sinta obedecendo ao co mando de chefes invisiveis ou apenas indiretamente visiveis econtra inimi gas freqiientemeore invisiveis au s6 indiretamente visiveis E foi preciso uma imensa perturbaiio social aguada par propaganda habilmente concertada para reacender e legitimar em grandes massas de pessoas as instintos social menre proibidos 0 prazer de matar e a destruiilo que foram eliminados do cotidiano da vida civilizada 6 Reconhecidamente essas emolies de fato tern em forma refina da racionalizada seu lugar legltimo e precisamente definido na vida coti diana da sociedade civiIizada Esto e mUito caracterlstico do tiPO de trans formaiio atraves do qual se civ izam as emoes Para dar urn exemplo a beligerancia e a agressiio enco tram expressiio socialmente permitida nos jogos esportivos E elas se manifestam especialmente em participar como espectador como por exemplo em lutas de boxe na identificailo ima ginaria com urn pequeno numero de combatentes a quem uma liberdade moderada e precisamente regulainentada e concedida para liberailo dessas emlies E este viver deemolies assistindo ou mesmo apenas escutando como par exemplo a urn comentario na radio e urn aspecto particularmen te caracterlstico da sociedade civilizada Esse aspecto determina em parte a maneira como se escrevem livros e peas de teatro e influencia decisivamente a papel do cinema em nosso mundo Essa transformaao do que inicialmen te se exprimia em uma manifestaiio ativa e frequentemente agressiva no prazer passivoe mais controlado de asistir isto e em mero prazer do olho ja e iniciada na educaiio e nas regras de condicionamento dos jovens Naediilo de 1774 da Civilite de La Salle lemos p 23 Crianas gostam de tocar em roupas e em outras coisas que Ihes agradam as milos Esta ansia deve ser corrigida e devem ser ensinadas a tocar a que veem apenas com os alhos Hoje essa regra e aceita quase como natural Eo altamente caracterlstico do homem civilizado que seja proibido par autocontrole socialmente inculca do de espontaneamente tocar naquilo que deseja ama au odeia Toda a modelailo de seus gestos pouco importando como 0 padrao possa diferir entre as nalies ocidentais no tocante a detalhes edecisivamente influen ciada por essa necessidade Ja mostramos paginas atras como 0 emprego do sentido do olfato a tendencia de cheirar 0 alimento ou outras coisas veio a ser restringido como algo animal Aqui temos uma das interconexlies atra ves da qual urn diferente 6rgiio dos sentidos a olho assume importancia muito especifica na sociedade civilizada De maneira semeThante a da oreTha e talvez ainda mais 0 olho se torna urn mediador do prazer precisamenle porque a satisfaiio direta do desejo pelo 1razer foi circunscrita par grande numero de barreiras e proibilies Mas mesmo dentm dessa transferOlicia de emolies de ailo direta para o ala de apenas ver ha uma clara curva de moderailo e humanizailo na 1 I 200 o processo civilizadof civilizafao como transformarao do comportamento 201 transformalio das emoes A luta de boxe para mencionar apenas urn exemplo e urna forma fortemente temperada dos impulsos de agressividade e crueldade em comparalio com as prazeres visuais de epocas mais antigas Urn exemplo do seculo XVI pode servir de ilustrlio Foi escolhido entre grande numero de outros porque mostra uma instituilio na qual a satisfalio visual da ansia pela crueldade do prazer em observar a dar sendo infligida emerge com especial pureza sem qualquer justificalio racional au disfarce como castigo au meio de disciplinar Na Paris no seculo XVI urn dos grandesprazeres nas festividades do dia de Slio Jolio 24 de junho consislia em queimar vivos uma au duas duzias de gatos Esta cerimonia era famosa A populalio se reunia musica solene era tocada e sob uma especie de forca erguiase uma pira enorme Em seguida urn saco au cesta contendo as gatos era pendurado na forca a saco au cesta comava a queimar as gatos cafam na pira e queimavam ate a marte enquanto a multidlio se regozijava em meio a enorme algazarra Geralmente a rei e a rainha compareciam As vezes concediase ao rei au ao delfim a honra de acender a pira E sabemos tambem que certa vez aten dendo a urn pedido especial do rei Carlos IX uma Japosa foi capturada e queimada tambem 118 Certamente este nlio e na realidade urn espeHiculo pior do que aqueima de hereticos au as torturas e execoes publicas de tOdos as tipos Apenas parece pior porque 0 prazer em torturar criaturas vivas mostrase tlio nua mente e sem proposito sem qualquer desculpa aceitavel pela razao a aseo despertado em nos pelo mero relato desse costume realio que deve ser considerada normal pelo padrlio moderno de controle de emoes de monstra mais uma vez a mudana a lange prazo na estrutura da persona lidade Ao mesmo tempo permitenos ver com grande clareza urn aspecto dessa mudana grande parte do que antes despertava prazer hoje provoca nojo Hoje como naquela epoca nlio slio apenas sentimentos individuais que estlio envolvidos A queima de gatos no Dia de Slio Jolio era urn costume social como a boxe au a corrida de cavalas na saeiedade moderna E em ambos as casas as divertimentos criados pela soeiedade para seu prazer materializam urn padrlio soeial de emoes dentro do qual todos as padroes individuais de controle das mesmas par mais variados que possam ser estlio contidos Todos as que cafrem fora dos limites desse padrlio social slio considerados uanormais Por conseguinte alguem que desejasse gratificar seu prazer 1 maneira do seculo XVI queimando gatos seria hoje conside rado anormal simplesmente porque 0 condicionamento normal em nosso estagio de eivilizalio restringe a manifestalio de prazer nesses atos mediante lIIIa ansiade instilada sob a forma de autoconlrole Neste caso obviamente opera o mesmo tipo de mecanisme psicol6gico com base do qual ocorreu a mudaria a lange prazo da personalidade manifestaOes socialmente inde sejaveis de instinfos e prazer slio ameaadas e punidas com medidas que 1 202 o processo civilizador geram e reforam desagrado e ansiedade Na repetiao constante do desagra do despertado pelas ameaas e na habituaao a esse rilmo 0 desagrado do minante e compulsoriamente associado ate mesmo a comportamentos que na sua origem possam ser agradaveis Dessa maneira 0 desagrado e a ansie dade socialmente despertados hoje representados embora nem sempre nem exclusivamente pelos pais lutam com desejos ocultos 0 que foi mostrado aqui de diferentes angulos como urn avano nas fronteiras da vergonha do patamar da repugnancia des padr6es das emo6es provavel mente foi posto em movirnento por mecanismos como esses Resta estudar em mais detalhes que mudana na estrutura social desen cadeou realmente esses mecanismos psicol6gicos que mudanas nas compul soes externas puseram em movimento essa civilizaltao das emooes e do comportamento XI Cenas da Vida de urn Cavaleiro Medieval A questao por que 0 comportamento e as emoes dos homens mudam e na reaUdade a mesma pergunta por que mudam suas formas de vida Na sociedade medieval desenvolveramse certas formas de vida e 0 individuG era obrigado a viver dentro delas como cavaleiro artesao ou servo da gleba Em sociedades posteriores diferentes oportunidades diferentes formas de vida surgiram as quais 0 individuo tinha que se adaptar Se pertencia a nobreza podia levar a vida de cortesao Mas nao podia mais mesmo que isso desejasse e muitos desejaram levar a vida mais desinibida do cava leiro A partir de certo tempo essa funao esse estilo de vida desapareceu da estrutura da sociedade Outras fun6es como as de artesao de guilda e de padre que desempenharam papel extraordinario na fase medieval perde ram em grande parte sua importancia na estrutura total das rela6es sociais Par que essas fun5es e formas de vida as quais 0 individuo tem que se adaptar como a moldes mais ou menos fixos mudam no curso da historia Conforme dissemos acima esta e realmente a mesma questao por que senti mentos e emoes a estrutura de anseios e impulsos e tudo ligado a eles mudam tambem Ja falamos bastante sobre os padr6es emocionais da c1asse alta medie val A fim de complementar essas informa6es e ao rilesmo tempo articulalas com as causas das mudanas por que passaram esses padr6es acrescentare mas agora uma curta descriao da maneira como viviam OS cavaleiros medie vais e assim do espao social que a sociedade abria a individuos de nas Il 1 civjljtaiio como ransJormao do comportamento 203 cimento nobre e dentro do qual tambem os confinava 0 quadro desse espao social a imagem do cavaleiro em geral foi cercado pela obscuridade logo depois do que e chamado de decllnio dessa classe Se 0 guerreiro medieval era ou nao visto como 0 nobre cavaleiro lembrados apenas os aspectos grandiosos belos aventurescos e comoventes dessa vida ou como 0 se nhor feudal 0 opressor dos camponeses enfatizandose apenas os aspectos selvagens crueis barbaros de sua vida 0 quadro simples da vida real dessa classe foi geratmente distorcido pelos valores e nostalgia da epoca do obser vador Alguns desenhos ou pelo menos suas descri6cs podem contribuir para restaurar 0 quadro AJem de uns poucos escritos da epoca sao as obras de escultores e pintores do periodo que transmitem 0 que melhor distingue sua atmosfera ou como poderiamos dizer seu carater emocional a maneira como difere do nosso ainda que apenas alguns desses trabalhos reflitam a vida do cavaleiro medieval em seu contexto real Urn dos poucos livros de gravuras desse tipo embora de urn periodo relativamente tardio entre 1475 e 1480 constitui a sequencia de desenhos que se tornou conhecida sob 0 nome nao muito apropriado de Mittelalterliches Hausbuch Livro de ima gens da Idade Media E desconhecido 0 nome do artista que os desenhou mas ele deve ter conhecido muito bern a vida cavaleirosa de seu tempo Alem do mais ao contrario de muitos de seus colegas artesaos deve ter visto 0 mundo ccm olhos de cavaleiro identificandose profundamente COm seus valores sociais Uma indicalio neste sentido ea inc1usao em urn desenho Ie urn homem de seu pr6prio oficio como 0 unico artesao vestido com trajos de corte como tambem a moa s suas costas que pOe a mao em seu ombro e por quem ele c1aramente expressa seus sentimentos Talvez seja urn auto retrato 119 Esses desenhos referemse ao periodo final da cavalaria epoca de Carlos 0 Temerario e de Maximiliano 0 Ultimo cavaleiro Podemos con cluir dos braslies que esses dois ou cavaleiros Iigados a eles estao represen tados em urn desenho ou mais Nao ha duvida disseram entendidos que temos diante de n6s 0 proprio Carlos 0 Temerario ou urn cavaleiro borgui nhao de sua entourage 120 Talvez certo numero de desenhos de torneios mostre diretamente as justas que se seguiram ao asserlio de Neuss 1475 realizado durante 0 casamento de Maximiliano com a filha de Carlos 0 Te merario Maria de Borgonha De qualquer modo os que desfilam diante de n6s ja sao membros de uma era de transiiio na qual a aristocracia cavalei rosa esta scndo gradualmente substituida pela aristocracia de corte Ha muita coisa tamMm nos desenhos que nos lembra 0 cortesao Nao obstante des proporcionam de maneira geral uma ideia muito fiel do espao social do cavaleiro da maneira como ele ocupa seus dias do que via em volta e como via E 0 que e que n6s vemos Quase sempre campo aberto dificilmente algo que lembre a cidade Pequenas aldeias campos plantados arvores prados 204 o processo civilitador colinas pequenos trechos de rio e com freqiiencia 0 castelo Mas nada M no desenho do estado de espirito nostalgico da atitude sentimental em relaao a natureza que lentamente se tornam perceptiveis nao muito depois a medida que os principais nobres tern que abandonar com freqiiencia sempre maior a vida relativamente descontraida de suas propriedades ancestrais e ficam cada vez mais presos a corte semiurbana e na dependencia de reis ou prfncipes Esta e uma das mais importantes diferenas no tom emocional transmitidas pelos desenhos Em periods posteriores a consciencia do artis ta seleciona 0 material a SUa disposiao fazendo isto de maneira mito rigo rosa e especffica que Ihe expressa diretamente 0 gosto ou para sermos mais exatos sua estrutura afetiva A natureza 0 campo aberto mostrada em primeiro lugar e acima de tudo apenas como fundo para figuras humanas adquire urn brilho nostalgico a medida que aumenta 0 confinamento da classe superior nas cidades e cortes e se torna mais perceptivel a cisao entre vida urbana e rural Ou a natureza assume tal como as figuras humanas que envolvc nos desenhos urn carater sublime representativo De qualquer modo M mudana na seleao pelo semimenlo no que atrai 0 sentimento na rcpre scntaao da natureza e no que e julgado desagradavel ou penoso E 0 mesmo se aplica as pessoas representadas Para 0 publico da corte absoluta grande parte do que realmente existe no campo na natureza nao mais se retrata A colina e mostrada mas nao a fora nela plantada nem 0 cadaver pendu nido 0 campo e mostrado mas nao mais 0 campones esfarrapado tocando penosamente seus cavalos Tudo 0 que e eomum e vulgar da mesma forma que desaparece da linguagem de corte desaparecc tambem dos quadros e desenhos destinados a aristocracia de corte Nos desenhos do Hausbuch que nos dao uma ideia da estrutura de sentimentos da classe alta em fins do periodo medieval isto nao acontece Neles todos esses elementos a forca os servos esmulambados OS labo rfpsos camponeses sao vistos como na vida real Nilo sao enfatizados em espirito de protest a maneira de epocas posteriores mas mostrados como algo muito natural parte do ambiente da vida diliria tal como 0 ninho da cegonha ou a torre da igreja Urn nilo e mais doloroso na vida que 0 outro e assim aparecem nos desenhos Na verdade comoem toda a parte na Idade Media era parte inseparavel da existencia dos ricos e dos nobres que existis sem tambem camponeses e artesilos trabalhando para eles e mendigos e alei jados com as milos estendidas Nao ha para 0 nobre nenhuma ameaa nisso nem ele se identifica com eles 0 espetaculo nao evoca qualquer sentimento doloroso E com grande freqiiencia 0 labrego e 0 campones sao mesmo objetos de brincadeiras Os desenhos revelam a mesma atitude Primeiro M uma seqUencia de desenhos mostmrido pessoas emconstelaoes particulares Nao silo pessoas agrupadas diretarnente em volta do cavaleiro mas deixiun claro como e 0 que ele ve 11 sua volta Seguemse paginas mostrando como 0 cavaleiro passa civiliafiio como translormafiio do comportamento 205 a vida suas ocupa6es e prazeres Comparados com epocas posteriores todos confirmam 0 mesmo padrao de repugnancia e as mesmas atitudessociais No inicio por exemplo vemos pessoas nascidas para a vida rural No primeiro plano urn pobre homem esta destripando urn cavalo morto ou talvez cortando a carne dele que possa ser aproveitada Ao curvarse suas calltas escorregam urn pouco para baixo deixando visivel parte das nadegas que saO cheiradas por urn porco que esta atras dele Uma velha fragi semiesfar rapada passa coxeando amparada em muletas Em uma pequena caverna ao lado da estrada vemos urn pobre miseravel sentado com as maos e os pes no tronco e ao lado dele uma mulher com uma das maos no tronco e a outra em correntUm trabalhador esta labutando em urn curso dagua que desaparece entre as mores e as colinas A distancia vemos urn agricultor e seu jovem filho arando laboriosamente urn campo com ajuda de urn cavalo Ainda mais longe urn homem andrajoso e levado para a forca com urn homem armado usando chapeu emplumado andando orgulhosamente a seu lado no outro lado do condenado urn monge com a cabea coberta por urn capuzestendelhe urn grande crucifixo Atras dele vern a cavalo 0 cavaleiro e dois de seus homens No alto da colina erguese a forca com urn corpo pendurado e uma roda de tortura sobre a qual vemos urn cadaver Aves negras voam em volta Uma delas bica 0 cadaver o cadafalso nao eem nada enfatizado Esta ali como se fosse urn riacho ou uma arvore e e visto da mesma maneira quando 0 cavaleiro sai para caar Urn grupo inteiro passa 0 senhor e a senhora freqiientemente montados no mesmo cavalo 0 cervo desaparecc em urn pequeno bosque Urn veado parece cstar ferido Mais para 0 fundo vemos uma pequena aldeia ou talvez seja o patio de uma casa po 0 monjolo catavento alguns predios 0 agri cultor e visto lavrando urn campo Alto de urn lado erguese 0 castelo no outro numa colina mais baixa em frente a roda de tortura e a forca com urn corpo passaros voando em volta A forca 0 sfmbolo do poder judiciiirio de cavaleiro e parte do ambien te de sua vida Talvez nao seja muito importante mas de qualquer maneira nao e urn espetacuio particularmente dolaroso Senten a execu ao morte tudo isto e uma presena constante nessa vida Elas tamMm nao foram ainda removidas para tras da cena E 0 mesmO acontece com os pobres e os trabalhadores Quem cuiti varia nossos campos para nos se fosseis senbores todos vos pergunta Berthold von Regensburg em urn de seus sermoes no seculo XIII 11 E em outra altura diz com clareza ainda maior Eu vas direi cristaos como 0 Deus TodoPaderoso organizou a Cristandade dividindoa em dez tipos de pessoas e que tipos de servi os os mais humides devem aos mais nobres como seus governantes Os tres primeiros SaO os mais altos e mais exaltados que Deus TodoPoderoso pessoalmente escolheu e ungiu de modo que OS outros sete a eles ficassem sujeitos e os servissem22 A mesma atitude em 206 o processo civilizador relaao 11 vida ainda 0 encontrada nesses quadros do seculo XV Nao 0 nada desagradavel mas faz parte da ordem natural e inquestionada do mundo que guerreiros e nobres tenham 6cio para se divertirem enquanto os demais tra balham para eles Nao ha identificaao de urn homem com outro Nem mesmo no horizonte dessa vida surge ideia de que todos os homens sao iguais Mas talvez por isso mesmo 0 espetaculo de trabalhadores em sua faina nada tenha de vergonhoso ou embaraoso Urn dos quadros da mansao feudal mostra os prazeres dos senhores Uma jovem dama nobre einge seu jovem amigo com uma coroa de louros Ele a puxa para si Outro par sai a passeio bern abraado A velha servat faz cara de raiva para os jogos amorosos dos jovens Perto OS servos traba lham Urn varre 0 patio outro penteia 0 cavalo urn terceiro da comida aos patos Uma criadinha acenalhe de uma janela Ele se volta e logo depois desaparecera casa adentro Senhoras nobres divertindse Folguedos de cam poneses no segundo plano No telhado uma cegonha faz estardalhayo Em outra cena vemos urn pequeno patio junto a urn lago Na ponte urn jovem nobre e sua esposa debruados sobre a balaustrada observam servos na agua pegando peixes e patos Tres jovens senhoras passeiam de barco Movimento de gente moitas 11 distancia as muralhas de uma pequena cidade Ou vemos trabalhadores construindo uma casa em frente a uma colina arborizada Tuneis foram escavados na pequena colina para tirar pedras Traballiadores sao vistos cortandoas e outros carregandoas para longe Mais perto de n6s homens trabalham no predio semiterminado No primeiro plano traballiadores discutem prestes a Se engalfinharem e esfaquearem 0 senhor do castelo nao muito distante deles chama a atenao da esposa para a tur bulenta cena A completa calma do senhor e da esposa contrasta nitidamente com OS gestos violentos dos querelantes A rale briga 0 senhor nada tern a ver com isso Ele vive em outra esfera Nao sao tanto os fatos em si que em patte nao diferem muito dos de hoje mas aeima de tudo 0 fato e a maneira como sao apresentados que enfatizam a nova situaao emotiva As classes altas de fases posteriores nlio aceitariam esses desenhos Nao apelavam para seus sentimentos Nao eram belos Nao faziam parte da arte Nos periodos que se seguiram e prin cipalmente entre os holandeses que mostram estratos da classe media que nada tinham de cortesaos que encontramos por exemplo na obra de Breu ghel urn padrao de repugnaneia que Ihe permite trazer para as telas aleija dos camponeses cadafalsos ou pessoas que se aliviam de necessidades cor 4 porais Mas 0 padrao visto neles esta vinculado a sentimentos sociais muito diferentes dos que vemos nesses quadros em que aparece a classe alta de fins do periodo medieval Neste era coisa natural que as classes trabalhadoras existissem Elas sao mesmo figura indispensavel na paisagem da existeneia feudal 0 senhor civiilaiio como transformarao do comporlamento 207 vive entre elas Nao a choca vcr as servos trabalhando a seu lado nem tambem sc estes se divertem 11 sua maneira Muito ao contrario constitui parte inte gral de sua autoestima ter em volta de si pessoas que nao sao iguais a ele e das quais e senhor Esse senlimento surge repelidamente nos desenhos Dificilmente encontramos urn deles em que as ocupaiies e gestos corteses nao sejam contrastados com as mais vulgares das classes baixas Quando ele manta cila ama au dana tudo 0 que faz e nobre e cortes e tudo 0 que os servos e camponeses fazem e grosseiro e rUstico as senlimentos da classe alta ainda nao exigem que todo a vulgar seja eliminado da vida e par conseguinte dos desenhos Eo gratificante para as nobres saber que sao diferentes dos demais A vista do contraste agura a alegrla de vlver e cabe recordar que em uma forma mals moderada algo do prazer proporcionado par esses contrastes ainda se encontra par exemplo em Shakespeare Em todos as pontos em que examinamos a herana da classe alta medieval de paramos com a mesma atitude em forma pura Quanto mais avanam a in lcrdependencia e a divisao de trabalho na sociedade mais dependente a classe alta se torna das outras e maior par conseguinte a fora social destas pelo menos potencialmente Mesmo quando ela ainda e principalmente uma classe guerreira quando mantem as outras classes dependentes sobretudo pela espada e a monopolio das armas algum grau de dependencia dessas outras classes nao esta de todo ausente Mas e incomparavelmente menor c menor tambem C conforme veremos em mais detalhes adiante a pressao vinda de baixo Em cansequencia a sensa de dominio da classe alta seu dcsprezo pelas demais e muito mais franco e muito menes forte a pressao sabre ela para praticar moderaao e controlar seus impulsos Raramente 0 senso de dominio natural a essas classes e seu desprezo patriarcal pelas outras foram tao vividamente retratados como nesses dese nbos Isto e indicado nao so no gesto com que 0 nobre mostra 11 esposa as artesaos que discutem e as trabalhadores em uma especie de fundiCao que tapam a nariz com as dedos para evitar a fumaa malcheirosa nao s6 quando a senhor observa seus servos pescando ou na cena repetida da forca com urn corpo pendurado mas tambem na maneira natural e casual em que os gestos mais nobres do cavaleiro sao justapostos aos mais grosseiros do povo Ha uma cena de torneio Musicos tocam Bobos dao cambalhotas desa jeitadas as nobres espectadores estao montados frequentemente 0 seubor e a senhora no meSilla cavalo e conversam entre si Dois cavaleiros alga desajeitados em suas pesadas armaduras eSperam no entro Amigos Ihes dao conseIhos Urn deles e visto justainente recebendo a longa lana Em seguida urn arauto toea a trambeta Os cavaleiros arrernetem urn contra 0 outro as lanas niveladas No fundo contrastando com a ocupao cortes dos seubores vemos as passatempos vulgares do povo uma corrida de cava los acompanhada de todos as tipos de absurdos Urn bomem aferrase 11 civilizapio como translormaao do comportamenfo 207 L vive entre elas Nao a choca ver as servos trabalhando a seu iado nem tambem se estes se divertem it sua maneira Muito ao contnirio constitui parte inte gral de sua autoestima ter em volta de si pessoas que nao sao iguais a ele e das quais e senhor Esse sentimento surge repetidamente nos deseohos Dificilmente encontramos urn deles em que as ocupaOes e gestos corteses nao sejam contrastados com as mais vulgares das classes baixas Quando ele manta caa ama au dana tudo a que faz e nobre e cortes e tudo a que as servos e camponeses fazem e grosseiro e rUstico as sentimentos da classe alta ainda nao exigem que todo a vulgar seja eliminado da vida e par conseguinte dos desenhos E gratificante para as nobres saber que sao diferentes dos demais A vista do contraste agura a alegria de viver e cabe recordar que em uma forma mais moderada alga do prazer proporcionado par esses contrastes ainda se encontra par exemplo em Shakespeare Em todos as pontos em que examinamos a herana da classe alta medieval de paramos com a mesma atitude em forma pura Quanta mais avanltam a in lerdependencia e a divisao de trabalho na sociedade mais dependente a classe alta se torna das outras e maior par conseguinte a fora social destas pelo menos potencialmente Mesmo quando ela ainda e principalmente uma classe guerreira quando mantern as outras classes dependentes sobretudo pela espada c a monopolio das armas algum grau de dependencia dessas outras classes nao esta de todo ausente Mas e incomparavelmente menor e menor tambem e conforme veremos em mais detalhes adiante a pressaa vinda de baixo Em cansequencia a sensa de dominio da classe alta seu desprezo pelas demais e muito mais franco e muito menes forte a pressao sabre ela para praticar moderaao e controlar seus impulsos Raramente 0 senso de dominio natural a essas classes e seu desprezo patriarcal pelas outras foram tao vividamente retratados como nesses dese nhos Isla e indicado nao so no gcsto com que a nobre mostra a esposa as artesaos que discuteni e as trabalhadores em uma especie de fundiao que tapam a nariz com as dedos para evitar a fumaa malcheirosa nao so quando a senhor observa seus servos peseando au na cena repetida da forca com urn corpo pendurado mas tambern na maneira natural e casual em que as gestos mais nobres do cavaleiro sao justapostos aos mais grosseiros do povo Hii uma cena de torneio Musicos tocam Bobos dao cambalhotas desa jeitadas as nobres espectadores estao montados freqiientemente a seohor e a senhora no mesmo cavalo e conversam entre si pois cavaleiros alga desajeitados em suas pesadas armaduras esperam no centro Amigos lhes dao conselhos Urn deles e vista justainente recebendo a longa lana Em seguida urn arauto toca a trombeta Os cavaleiros arremetcm urn contra 0 outro as lanas niveladas No fundo contrastando com a ocupaao cortes dos senhores vemos as passatempos vulgares do povo uma canida de cava los acompanhada de todos as tipos de absurdos Urn homem aferrase it I 208 o prOCfSSO civilitador T cauda de um dos cavalos a cavaleiro fica furioso as outros aoitam suas montarias epartem em um galope algo grotesco Vemos um acampamento militar Uma barricada circular foi construfda com os reparos dos canhoes Dentro dela tendas resplandecentes com seus varios brasoes e flamulas No centro cercado por seus cavaleiros vemos o rei ou mesmo 0 proprio imperador Um mensageiro a cavalo chega justa mente nesse momento Mas nos portoes do acampamento mendigas sentam se com seus filhos torcendo as maos enquanto um homem a cavalo e usando armadura chega trazendo um prisioneiro em grilhfies Mais no fundo vemos um campones arando um campo Do lado de fora do parapeito ossas espa Ihados esqueletos de animais um cavalo morto sendo comido por um corvo e um cao Junto de urna carraum servo agaehado se alivia au vemos cavaleirOs atacando uma aldeia numa guerra No primeiro plano um dos soldados esta esfaqueaodo um campones cafdo a direita apa rentemente em uma capela um segundo homem IS apunhalado e sao roubadas suas posses No telhado cegonhas acomodadas tranquilamente em seus ninhos Mais para 0 fundo um campones tenta escapar pulando uma cerca mas urn cavaleiro montado 0 pega pela fralda da camisa Uma camponesa grita torcendo as maos Um campones agrilhoado lastimoso e desgraado esta sendo espancado na caa por um cavaleiro montado Mais para 0 fundo cavaleiros ateiam fogo a uma casa um deles toca 0 gado para lange e ataea a mulher do lavrador que tentl deteIo no alto na pequena torre da igreja da aldeia camponeses se escondem e rostos apavorados olham pela janela Muito longe ao alto de uma pequena colina erguese um mosteiro fortificado por tras das altas muralhas vemos 0 telhado da igreja com uma cruz Ainda mais alto na colina urn castelo ou outra parte do mosteiro sas foram as idlSias sugeridas ao artista pelo signa do deus da guerra as desenhos parecem maravilhosamente cheios de vida Como em numerosos outros desenhos sentimos que algo que foi realmente experimentado se de senrola ante nossos olhos E reagimos assim porque os desenhos ainda oao sao sentimentais porque nao manifestam 0 maior domioio das emoes que a partir dessa data e por muito tempo levou a arte de classe alta a expressar cada vez mais exclusivamente suas fantasias desiderativas e a levou a suprimir tudo 0 que conflitasse com 0 padrao de uma crescente repugnan cia Esses desenhos mostram com simplicidade como 0 cavaleiro sente e ve o mundo A selao de sentiinentos a tela colocada sobre as emooes que s6 admite nos desenhos 0 que e agradave1 e exclui 0 doloroso e 0 embara oso permite ainda assim que passem desimpedidos numerosos fatos que mais tarde ganham expresslio apenas quando um processo consciente ou in consciente contra a censura dos impulsos pela c1asse alta esta sendo expres sado e sao portarito algo exagerados Neste caso 0 do Hausbuch 0 cam pones nlio IS digno de pena nem IS representante da virtude Nem e represen tante de feins vlcios Ele IS simpJesmente infeliz e algo ridiculo exatamente civilitatiio como tran5ormiio do comportamento 209 L como 0 cavaleiro 0 ve 0 mundo revolve em lorno do cavaleiro Caes famin lOs mulheres pedinles cavalos apodrecendo servos agachados junlo a para peitos de acampamento aldeias em chamas camponeses que sao saqueados e assassinados Iwlo islo e parle lao integral do ambienle dessa gcnte como as juslas e as caadas Foi assim que Deus fez 0 mundo alguns sao gover nantes oulros servos Nada ha de embaraoso nisso A mesma diferena no padrao de senlimentos entre essa expirante soeie dade de fidalgos cavaleiros e a subseqUente sociedade absolutista de corte tambem se ve na representaao do amor Ha urn desenho alusivo a esses assuntos do coraao Mais uma vez olhamos para 0 campo descampado Vemos pequenos morros urn rio coleante moilas e urn pequeno bosque No primeiro plano tres ou quairo pares de jovens nobressempre urn jovem senhor e uma jovem senhora juntos Andam em circulo ao som de musica cerimoniosamente elegantes usando todos os sapalos de biqueiras longas da moda Seus movimentos sao compassados e circulares urn dos nobrcs traz uma grande pluma rio chapeu outros ostentam guirlandas nos cabelos Talvez estejamos observando algoma especie de dana lenla Atras delcs vemos tres rapazolas que estao tocando ha uma mesa com frutas e bebidas e urn jovem recostado nela e que ira servir os alimenlos No lado oposto fechado por cerca e portao estendese urn pequeno jardim Arvores formam urn espece de caramanchao embaixo do qual ha uma banheira de forma oval Nela eSla senlado urn rapaz nu que agarra ardentemente uma ma nua que esla enlrando na banheira onde ele Se enconlra Como no caso acima uma velha serva que eSla Irazendo frulas e bebidas olha de cara feia para os folguedos amorosos dos jovens E assim como os senhores se divertem no primeiro plano os servos 0 fazem no fundo da cena Urn deles cai sobre uma rapariga que esla deilada no chao com as saias levantadas Ele olha em volta mais uma vez para vcr se ha alguem por perlo No outro ado dois jovens do povo dan9am lambem lao ando no ar os braos e pernas como da09arinos mouriscos urn terceiro toca para eles Ou vemos no campo aberlo uma pequena casa de banho de pedra com urn pequeno patio em frenle cercada por urn mueo dc pedra A vista alcan9a um poueD mais alem Notamos a indicaao de um caminho moitas 1Jm renque de arvores perdendose a distancia No patio jovens casais passeiam ou se sentam urn deles admira a elegante fonle outros conversam e urn dos rapazes sustenta um falcao na mao Caes urn macaeo pequeno Planlas em vasos Podemos ver 0 que se passa na casa de banho alraves de uma janela grande aberla e arqueada Dois rapazes e uma mQ9a senlamse nus na agua lado a ladoe conversamUma segunda m09a ja nua esta juslamcnte abrin do a poria para enlrar na agua com cles Na grande abObada aberta da casa urn rapaz senlado loca algoma coisa em urn violao para os banhilas 210 o processo civilizador Sob a arcada ha uma torneira de onde escorre agua Na frente da casa bebidas sao postas a esfriar em uma pequena banheira cheia dagua Numa mesa proxima veemse frutas e urn calice A mesa encontrase urn jovem uma coroa de Jouros em volta da cabea que eJegantemente ele apaia nas maos No segundo andar da casa de baOOos uma empregada e urn servo observam os divertimentos de seus seOOores No deseOOo como se pode ver a relalio er6tica entre os sexos e muito mais clara do que na fase posterior quando ela sera apenas sugerida tanto na vida social como na pintura de uma maneira que embora compreensfvel a todos e porem semivelada A nudez ainda nao esta associada a vergdnha a tal ponto que para contornar controles internos e externos s6 possa apare ccr sentimentalmente em quadros como costume por assim dizer de gregos e romanos Mas tampouco 0 corpo nu e mostrado na cena da maneira que as vezes aparece em epocas posteriores em desenhos privados que circula yam secretamente de mao em mao Essas cenas de amor sao tudo menos obscenas 0 amor e apresentado nelas como tudo 0 mais na vida do cavaleiro fidalgo torneios cadas campanhas pilhagens As cerfis nao slio especialmente ressaltadas Nao sentimos em sua representaao coisa alguma da violencia da tendencia para excitar au gratificar a satisfaao de desejos negados na vida caracteristica de tudo o que e obsceno Esse desenho nao nasce de urna alma oprimida nem revela nada de secreta mediante a vio laao de tabus Tudoparece se passar em um clima de absoluta despreocupa ao Aqui tambem 0 artista deseOOou 0 que ele mesmo deve ter visto corn grande freqUencia na vida E por causa dessa despreocupaao desta natu ralidade com que em comparaao com nooso padrao de vergonha e embara o as relaoes entre os sexos sao apresentadas chamamos essa atitude de ingenua Mesmo no Hausbuch encontramos ocasionalmente uma piada que e para 0 nosso gosto absolutamente chula como alias tambem em outros artistas dessa fase como por exemplo em Mestre E F e talvez em copias que foram feitas dele mesmo no popularizador Mestre das Banderalas 10 A adao desses temas por urn copista popularizador que era possivelmente ate mesmo urn monge indica como era diferente 0 padrao social de vergonha Essas coisas sao mostradas com a mesma naturalidadc que alguns detalhes do vestulirio E uma piada certamente grosseira se quisermos classificaIa assim mas realmente nao mais grosseira do que a piada que 0 artista se permite quando faz a fralda da camisa do campones escapar das calas ao tentar fugir da pilhagem de modo que 0 cavaleiropossa agarralo pela cami sa OU quando d a velha criada que observa os jogos amorosos dos jovens uma expressao de raiva como se zombando dela por ser velha demais para esses folguedos amorosos Todas essas cenas sao 0 retrato de uma sociedade na qual as pessoas davam vazao a impulsos e sentimentos de fonna incomparavelmente mais r civiliatao COmo lranslormao 40 cbmportamento zu L faeil rapida espontanea e aberta do que hoje na qual as emo6es eram menos controladas e em conseqiieneia menos reguladas e passiveis de oscUar mais violentamente entre extremos Nesse padrao de regulagao das emogoes que foi caracteristico de toda a sociedade secular da Idade Media entre os campones como entre os cavaleiros e fidalgos certamente nao faltaram grandes variag6es E as pessoasque se conformavam a esse padrao se sujei tavam a grande numero de restrig6es em seus impulsos Mas tais restries e controles Se faziam em uma diregao diferente e em grau menor que em periodos posteriores e nao assumiam a forma de autocontrole constante quase automatico 0 tipo de integragao e interdependeneia em que viviam essas pessoas nao as compelili a absterse de fungoes corporais uma na frente da outra ou a controlar Seus impulsos agressivOB na mesma extensao que na fase seguinte Isto se aplica a todos Mas claro para os camponeses a margem para agressao era mais restrita do que para 0 cavaleiro isto c restrita a sens pares No caso do cavaleiro ela era menos restrita fora de sua classe do que dentro dela porquanto aqui era regulada pelo c6digo da cavalaria Vma iestrigao de ordem social as vezes se impunha ao campones pelo simples fato de que nao tinha 0 suficiente para comer Isto certa11ente representa urn controle de impulsos do mais alto grau e que afeta todo 0 comportamento do ser humano Mas ningucm prestava atengao a isso e esta situagao social dificilmente Ihe tornava necessario irnpor controles a si mesmo quando assoava 0 nariz escarraV3 ou pegava vorazmente comida na mesa Nesta diregao a coagao na classe cavaleirosa era mais forte Por mais uniforme por conseguinte que 0 padrao medieval de controle das emogoes parega em comparagao com situagoes posteriores ele inclufa grandes diferengas corres pondentes a estratificagao secular da propria sociedadepara nada dizer da sociedade clerical Essas diferengas nao foram ainda analisadas em detalhe Sao visfveisnesses desenhos se os gestos comedidos e as vezes mesmo afetados dos nobres sao comparados com as movimentos desajeitados de criados e camponeses A manifestagao de sentimentos na sociedade medieval C de maneira geral mais espontanea e solta do que no periodO seguinte Mas nao e livre ou sem modelagem social em qualquer sentido absoluto 0 homem sem res trig6es e um fantasma Reconhecidamente a natureza a forga 0 detalha mento de proibigoes controles e dependencias mudam de centenas de manei ras e com elas a tensao e 0 equilibrio das emogoes e de identica maneira o grau e tipo de satisfagao que 0 individuo procura e consegue Tomadas em conjunto essas cenas dao certa iMia de onde 0 cavaleiro ou fidalgo procurava e encontrava gratificagao Nessa epoca ele talvez ja fre qiientasse mais a corie do que antes Mas 0 castelo e 0 solar a colina 0 riacho os campos e aldeias as arvores e bosques anda formam 0 pano de fundo de sua vida aceitos como naturais econsderados sem nenhum senti 212 o processo civilizador mentalismo Nesse ambiente ele esta em casa e e senhor Divide basicamente sua vida entre guerra justas caadas e amoco Mas no pr6prio seculo XV e mais ainda no seculo XVI muda a situa ao Nas cortes semiurbanas de principes e reis formase uma nova aristo cracia parcialmente com elementos da velba nobreza e em parte com novos elementos em ascensao com urn novo espao social novas fun6es e em conseqiiencia uma diferente estrutura emociona As pr6prias pessoas sentem eSSa diferena e a manifestam Em 1562 um homem chamado Jean du Peyrat traduz para a frances 0 Iivra de Della Casa sabre boas maneiras DaIhe 0 titulo de Galalee ou la lIUlnlere el fasson comme Ie gentilhomme se doil gouverner en louIe compagnie Galatea ou a maneira como 0 cavalheiro deve conduzirse em todos as tipos de compa nhia Mesmo no titulo e claramente expressa a maior compulsao nesse mo menta imposta aos nobres Mas e a proprio Peyrat que na introduao frisa explicitamente a diferena entre as exigencias que a vida costumava fazer an cavaleiro e as que ora sao impostas aos nobres pela vida na corte Toda a virtude e perfeiao do cavalheiro Seohor nio cansisle emaClcatar cor retamente urn cavao mancjar urna lana manterse em pastura reta dentro da armadura usar todos as tipos de armas comportarse decorosamente entre as senhorss ou na perseguiao do arnor pois esta e ainda urna das coisas que ie esperam do cavalheiro Ha atern disso 0 servio II mesa peraole reis e princi pes a maoeira de ajustar a pr6pria linguagem as pessoas de acorda com sua posiciio e qualidade seus alhares gestos e mesmo Os menores sinais e pisca delas dolho que possam fazer Aqui sao exatamente enumeradas as mesmas coisas que constituem a virtude a perfeiao e as atividades costumeiras dos nobres que vemos nos desenhos do Hausbueh feitos de armas e de amor Contrastados com eles M as perfei6es adicionais e a nova esfera de vida do nobre a servio do principe Urn novo comedimentD urn contrale e reulaao novo e mais ex tensos do comportamento que a velha vida cavaleirosa fazia necessaria au possivel sao agora exigidos do nobre Sao resultado da nova e maior depen dencia em que foi colocado a nobre Ele nao e mais urn homem relativamente livre senbor de seu castelo do castelo que e sua patria Agora vive na corte Serve ao prfncipe Prestalhe servios a mesa E na corte vive cercado de pessoas Tem que comportarse em relaao a cada uma delas em exata con formidade com a sua posiao e a delas na vida Precisa aprender a ajustar seu gestos exatamente as diferentes esta6es e posi6es das pessoas na corte medir com perfeiao a linguagem e mesmo controlar exatamente os movi mentos dos olbos E uma nova autodisciplina uma reserva incomparavelmen te mais forte que e imposta as pessoas pelo novo espao social e as novas laos de interdependencia A atitude cuja forma ideal era expressada pelo conceito de courtoisle esta cedendo lugar a outra traduzida cada vez rnais pelo coneeito de elvilile I J civilitCJiio como transjormariio do comportamento 213 A tradulio do Galateo por Jean du Peyrat representa tambem lingUis ticamente esse periodo de transilio Ate 1530 ou 1535 0 conceito de cortesia predomina mais ou menos exclusivamente na Frana Em fins do seculo 0 conceito de civilidade ganha lentamente precedencia sem que 0 outro se perea de todo Na Frana por volta do ano de 1562 os dois slio usados sem qualquer precedencia vislvel de urn ou de outro Em sua dedicatoria diz Peyrat Que este livro que trata da educalio de urn jovem corteslio e cava Iheiro seja bern recebido por aqueleque e como que urn paradigma e urn espelho para OS outros em cortesia civilidade boas maneiras e costumes dignos de louvor o homem a quem essas palavras slio dirigidas e aquele mesmo Henrique de Bourbon Principe de Navarra cuja vida simboliza mais visivelmente que todas esta transilio do homem cavaleiroso para 0 cortes e que como Hen rique IV estava destinado a ser 0 executor direto dessa mudana na Frana sendo obrigado muitas vezes contra a vontade a compelir ou mesmo con denar a morte aqueles que resistiam aqueles que nlio compreendiam que de senhores e cavaleiros livres teriam que se transformar em servidores depen dentes do rei 12 c4l r Apendice Introduao a Ediao de 1968 1 Pensando e teorizando a respeito da estrutura e controle das emo6es humanas nos dias correntes contentamonos em geral em usar como prova observa6es colhidas nas sociedades mais desenvolvidas de hoje Assim agimos na suposiao tacita de que e posslvel elaborar teorias sobre as estruturas emocionais do homem em geral com base no estudo de pessoas em uma sociedade especlfica que pode ser observada aqui e agora a nossa Nao obstante ha numerosas observ6es relativamente acesslveIs indicando que podem diferir 0 padrao e modelo de controle das emo6es em sociedades que se encontrem em diferentes estagios de desenvolvimento e mesmo em diferentes estratos da mesma sociedade Se estamos OU nao interessados no desenvolvimento de paIses europeusque prossegue ha seculos ou no dos cha mados palses em desenvolvimento em outras partes do mundo 0 fato e que deparamns com grande freqUencia com observa6es que dao origem it pergunta seguinte como e por que no curso de transforma6es genus da sociedade que ocorrem em longos pedQdos de tempo e em determinada dire ao e para as quais foi adotado 0 termo desenvolvimento a afetivi dade do comportamento e experiencia humanos 0 controle de em6es in dividuais por limita6es extern e internas e neste sentido a estrutura de todas as formas de expressao saO alterados em uma direao particular Essas mudanas sao indicadas na fala diaria quando dizemos que pessoas de nossa pr6pria sociedade sao mais civilizadas do que antes ou que as de outras sociedades sao mais incivis ou mnos civilizaqas ou mesmo mais bar baras que as da nOSsa Sao 6bvios os julzos de valor contidos nessas pala vras embora sejam menos 6bvios os fatos a que se referem Isto acontece em parte porque os estudos empiricos de transforma6es a longo prazit de estruturas de personalidadee em especial de controle de emo6es dao ori gem a grandes dificuldades no estagio atual das pesquisas sociol6gicas A frente do interesse sociol6gco no presente encontramos processos de prazo relativamente curto e em geral apenas problemas relativos a urn dado esta do da sociedade As transforma6es a longo prazo das estruturas sociais e d 7 apendice 215 po conseguinte tambem das estruturas da personalidade perderamse de vista na maioria dos casos a presente estudo diz respeito a esses processos de longo prazo A sua compreensao pode ser facilitada por uma curta indicaao dos varios tipos que esses processos assumem Para comar podemos distinguir duas dire oes principais nas mudanas estruturais das sociedades as que tendem para maier diferenciaao e integraao e as que tendem para menos Alem disso ha urn terceiro tipo de processo social no curso do qual e mUdada a estru tura de uma sociedade ou de alguns de seus aspectos particulares mas sem haver tendencia de aumento ou diminuiao no nivel de diferenciaao e inte graao Por ultimo sao incontaveis as mudanas na sociedade que nao im plicam mudana em sua estrutura Este trabalho nao faz justia a toda a eomplexidade dessas mudanas porquanlo numerosas formas hibridas e nao raro varios tipos de mudana mesmo em direoes opostas podem ser obser vadas simultaneamente na mesma sociedade Mas por ora este curto esbo dos diferentes tipos de mudana deve bastar para indicar os problemas de que trata este studo a primeiro velume concentrase acima de tudo na questao de saber se a suposiao baseada em observaoes dispersas de que ha mudanas a longo prazo nas emooes e estruturas de controle das pcssoas em sociedades particulares mudanas que se desenvolvem ao longo de uma unica e mesma dirao durante grande numero de geraoes pode ser confirmada por evidencia fidedigna e encontrar comprovaao factual Este volume por conseguinte eontem urn relato de procedimentos e achados sociologicos cujo equivalente mas conhecido nas ciencias fisicas sao 0 experimento e seus resultados Diz respeilo 11 descobertae elucidaao do que realmente ecorre no campo de indagaao ainda nao explorado om 0 qual se relacionam nossas quest6es a descoberta e definiao de ligaoes factuais A dcmonstraao de uma mudana em emoes e eSlruturas de controle humanas que ocorre ao longo de muilas geraoes e na mesma direao ou em curtas palavras 0 aumento do reforo e diferenciaao dos controles gera outra questao E possivel relacionar essa mudana a Iongo prazo nas estruturas da personalidade com mudanas a longo prazo na sociedade como urn todo que de igual maneira tendem a uma direao particular a um nivel mais alto de difereneiaao e inlegraao social a segundo volume trata desses problemas No tocante a essas mudan9as estruturais a longo prazo da sociedade falta tambem prova empirica Tornause por conscguintc necessaria no segundo volume dcdiear parte do mesmo 11 descoberta e elucidaao das liga oes factuais nesta segunda area A questao e se uma mudana estrutural da sociedade como urn todo tendendo a um nivel mais alto de diferenciaao e integraao pode ser demonstrada com ajuda de evidencia empirica confia vel Isto se revelou possivel a processo de formaiio dos Estados Nadonals r 216 o p10CeflO ciiUudDr 111 discutido no segundo volume constitui um exemplo desse tipo de mudlliia esrutura Finalmente em um esbo provis6rio de uma teoria de civilizailo ela borase um modelo a fim de demonstrar possiveis ligaoes entre a mudana a longo prazo nas estruturas da personalidade no rumo da consolidailo e diferenciailo dos controles emocionais e a mudana a longo prazo na estru tura social com vistas a um nivel mas alto de diferenciailo e integrailo como por exemplo visando a uma dierenciailo e prolongamento das cadeias de interdependencia e a consolidailo dos controles estatais II Facilmente se pode compreender que ao adotar uma metodologia voltada para ligaoes factuais e suas explicaoes isto urn enfoque empirico e te6 rico preocupado com mudanas estruturais de longo prazo de urn tipo espe cifico ou desenvolvimento abandonamos as ideias metaflsicas que vinculam 0 conceito de desenvolvimento Ii nilo ou de uma necessidadc mecanica ou de uma finalidade teleol6gica 0 conceito de civilizailo con forme demonstra 0 primeiro capitulo deste volume tern sido freqUentemente usado em sentido semimetafisico e permaneceu sumamente nebuloso ate hoje Aqui fazse uma tentativa de isolar 0 nucleo factual a que se refere a ideia corrente precientifica de processo civilizador Este nucleo consiste princi palmente na mudana estrutural ocorrida em pessoas na dircilo de maior consolidailo e diferenciailo de seus controles emocionais e por conseguinte de sua experiencia como por exemplo na forma de urn avano do patamar de vergonha e riojo e de sua conduta como por exemplo na diferenciailo dos utensilios usados a mesa A tarefa seguinte colocada pela demonstra ilo de tal mudana em uma direilo espedfica ao longo de muitas geraOes consiste em fornecer uma explicaiio Um esbo de explicailo conforme ja mencionado sera encontrado ao fim do segundo volume Mas com ajuda de uma investigaiio deste tipo despedimonos tambem das teorias de mudana social hoje predominantes que no curso do tempo substituiram na pesquisa sociol6gica uma anterior centralizada na velha e semimetaffsica ideia de desenvolvimento Tanto quanta se pode vcr essas teorias correntes quase nunca distinguem de forma inequivoca entre os diferentes tipos de mudana social resumidamente mencionados antes Em particular ainda faltam teorias empiricamente baseadas paraexplicar 0 tipo de mudanas sociais de longo prazo que assumem a forma de processo e acima de tudo de desenvolvimento Quando trabalhava neste Iivro pareceume muito claro que estava lan ando os alicerces de uma teoria sociol6gica nilodogmatica empiricmente baseada de processos sociais em geral e de desenvolvimento social em par ticular Acreditava que era inteiramente 6bvio que a investigilo e 0 modelo final do processo a longo prazo de formailo do Estado a ser encontrado r apendice 217 L no segundo volume podiam servir igualmente bern como modelos da dina mica de tonga prazo das sociedades em uma dada direao a qual se refere o conceito de desenvolvimento social Nao acreditava na ocasiao que fosse necessario dizer explicitamente que este estudo nem era de uma evoluao no sentido do seculo XIX de urn progresso automotico nem de uma mudan a social inespecifica no sentido do seculo XX Naquele tempo isto me pareceu tao 6bvio que deixei de mencionar explicitamente essas implicaoes twricas A introduao a segunda ediao me dO a oportunidade de corrigir essa omissao III o desenvolvimento social abrangente aqui estudado e apresentado numa de suas principais manifestaoes a marcha da integraao ao longo de vorios seculos urn processo de formaao de Estados complementado por urn processo de diferenciaao crescente e um processo configurado que a despeito da osciIaao de movimentos contrarios mantern quando analisado ao longo de um extenso periodo de tempo uma direao constante Podese dcmonstrar que essa mudana estrutural em uma direao especifica aconte ceu de fato independentemente de como a valorizemos A prova factual e o que nos interessa aqui 0 mera conceito de mudana social nao basta como instrumento de pesquisa para explicar esses fatos Uma simples mu dana pode ser do mesmo tipo que se observa em uma nuvem ou em um ane1 de fumaa ora parecem uma coisa ora parecem outra Um conceito de mudana social que nao estabela uma clara distinao entre as mudanas que se relacionam com a estrutura da sociedade e as que nao e alem do mais entre mudanas estruturais scm uma direao especifica e as que seguem urn rumo particular ao longo de varias geraoes como por exemplo para maior ou menor complexidade e urn instrumento muito imperfeito de pesquisa sociol6gica A situaao e semelhante no tocante a grande mimera de outros poble mas aqui estudados Quando apos varios estudos preparatorios que me per mitiram investigar a evidencia documentoria e explorar os problemas teoricos gradualmente emergentes 0 caminho para uma ossfvel soluao pareceu mais claro tomeime consciente de que este estudo ajuda a solucionar 0 renitente problema da Iigaao entre estruturas psicol6gicas individuals as assim cha madas estruturas de personalidade e as formas criadas par grandes mimeros de indivfduos interdependentes as estruturas sociais E a faz porque aborda ambos as tipos de estruturas nao como fixos como em geral acontece mas como mutoveis como aspectos interdependentes do mesmo desenvolvimento do longo prazo IV Se as varias disciplinas academicas cujos campos de estudo sao tocados por este estulio incluindo acima de tudo a sociologia jo tivessem l r 218 o process civilizador r alcanado 0 estagio de maturidade cientifica que e no prescntc desfrutado por muitas das ciencias naturais poderia esperarse que urn estudo cuidado samente documentado de proccssos de longo prazo como os da civilizaao ou da formaao do Estado com as propostas tearicas dele desenvolvidas fosse assimilado seja na sua totalidade ou em alguns de seus aspectos apos rigorosos testes e discussao apos a exclusao pela critica de todo conteudo improprio ou refutado pelo repositorio de conhecimentos empiricos e teori cos dessa disciplina Uma vez que 0 progresso do saber depende em grande parte do intercambio e fertilizaao cruzada de numerosos colegas e do de senvolvimento continuo do cstoquc comum dos conhecimcntos poderseia esperar que trinta anos depois este estudo ou se livesse tornado parte do fundopadrao de conhecimentos da disciplina ou tivesse sido mais ou menos superado pelo trabalho de outros autores e posto de lado Em vez disso descubro uma geraao depois que este cSlUdo conserva 0 carater de obra pioneira em urn campo problematico que hoje dificilmente precisa menos que ha trinta anos do estudo simultaneo nos planas empirico e tearicD que se encontra nestas paginas Aumentou a compreensao da urgen cia dos problemas aqui discutidos Em toda a parte observase que estudiosos tenteiam na direao desses problemas Nao faltaram tentativas posteriores de resolver problemas para cuja soluao a documentaao empirica contida nestes dois volumes procura contribuir Mas nao acreditamos que tenham tido su cesso essas ultimas tentalivas A fim de exemplificar este fato bastani discutir a maneira como a lomern que e atualmente considerado 0 principal teorico da sociologia Talcott Parsons tenta colocar e solucionar alguns dos problemas aqui estudados E earacterfstico do enfoque tearico de Parsons tentar dissecar analiticamente em seus componenteselementares como disse ele certa vez os diferentes tipos de sociedades em seu campo de observaao A urn tipo particular de COm ponente elementar ele chamou de variaveis de padrao Essas variaveis de padrao incluem a dicotomia entre afelividade e neutralidade afetiva Sua concepao pode ser mais bern entendida comparandoso a sociedade com urn jogo de cartas cada tipo de sociedade na opIuiao de Parsons representa uma mao diferente Ascartas porem sao sempre as mesmaS e seu numero e pequeno por mais diversas que sejam suas faces Uma das cartas C0111 que 0 jogo edisputado e a polaridade entre afelividade e neutralidade afetiva Parsons concebeu originanamente essa idea segundo nos diz analisando os tipos de soejedade de Tonnies a Gemeinschaft comunidade e Gesellschaft sociedade A comunidade parece acreditar ele caracterizase pela afe tividasIe e a sociedade pela neutralidade afetiva Mas ao determinar as diferenas entre diferentes tipos de sociedade e diferentes tipos de relaciona mentos dentro da mesma ele atribui a essa variavel de padrao no jogo de eartas como a outras urn significado inteiramente geral No mesmo contexto Parsons trata do problema da relaao entre estrutura social e personalidade 2 aplndice 219 Indica que conquanti antes os tivesse interpretado simplesmente como sis temas de aao humana estreitamente vinculados e interatuantes agora pode declarar com certeza que em urn sentido te6rico eles silo fases ou aspectos diferentes de urn unico e mesmo sistema de ao fundamental nustra isto com urn exemplo explicando que 0 que no plano sociol6gico pode ser con siderado como uma institucionalizailo da neutralidade afetiva e essencial mente 0 mesmo que no nivel da personalidade pode ser considerado como a imposiao da ren6ncia It gratificaao imediata no interesse da organizaao disciplinada e dos objetivos a longo prazo da personalidade Sera util talvez para a compreensao deste estudo comparar essa ultima tentativa de solucionar tal problema com a anterior reproduzida aqui sem altera9es A diferena fundamental na metodologia clentifica e na concep ao dos objetivos da teoria sICioI6gica fica evidente mesmo neste curto exemplo da maneira como Parsons trata tais problemas 0 que neste Iivro com ajuda de extensa docurnenlaao empfrica se mostra que e urn processo Parsons pela natureza estatica de seus conceitos reduz retrospectivamente e em minha apiniao sem nenhuma necessidade a estados Em vez de urn pro cesso relativamente complexo mediante 0 qual a vida afetiva das pessoas gradualmente levada a urn maior e mais uniforme controle de emoijes mas certamente nao a urn estado de total neutralidade afetiva Parsons sugere uma simples oposiao entre dois estados afetividadee neutralidade afetiva que supostamente eSariam presentes em graus diferentes em diferen tes tipos de sociedade tal como quantidades difereilles de substancias quimi cas Ao reduzir a dois diferentes estados 0 que empiricamente se demonstrou neste livro ser urn processo e que necessita ser interpretado teoricamente como tal Parsons privase da possibilidade de descobrir como as peculiaridades das sociedades a que se refere devem ser realmente explicadas Tanto quanto se pode depreender ele sequer Ievanta a questao da explicaao Os diferentes estados denotados pelas antfteses das variaveis de padrao sao ao que parece simplesmente dados Nesse tipo de teorizaao desaparece a mudana estru tural sutHmente organizada na direao de urn maior e mais uniforme con trole de emoes que pode ser observado na realidade Os fenomenos sociais na verdade so podem ser observados como evoluindo e tendo evoluido Sua dissecaao por meio de pares de conceitos que restringem a analise a dois estados antiteticos representa urn desnecessario empobrecitpento da percep ao sociologica tanto a nivel empirico como te6rico Por certo constitui missail de toda teoria sociol6gica esclarecer as ca racteristicas que todas as sociedades humanas possiveis possuem em comum o conceito de processo social tal como tantos outros usados neste estudo exerce precisamente essafunao As categorias basicas selecionadas por Parsons no entanto parecemme arbitrarias no mais alto gran Subjacentes a elas h3 a noao tacita nao comprovada e supostamente axiomatica de que o objetivo de tOda teoria cientifica 0 de reduzir tudo 0 que e variavel a algo 220 o pr0C6SS0 civiliadOT invariavel e simplilicar todos OS fenomenos complexos dissecandoos em seus componentes individuais o exemplo da teoria de Parsons no entanto sugere que a teorizaiio no campo da sociologia e mais complicada do que simplificado por uma sistematica reduiio dos processos sociais a estados sociais e de fenomenos complexos heterogeneos a componentes mais simples e s6 aparentemente ho mogeneos Este tipo de reduiio e abstraiio poderia justificarse como metodo de teorizaao apenas se levasse inequivocamente a uma compreensiio mais clara e profunda pelos homens de si mesmos como sociedades e como indi viduos Em vez disso descobrimos que as teorias formuladas por esses meto dos tal como a teoria do epiciclo de Ptolomeu exigem construoes auxilia res desnecessariamente complicadas a fim de fazer com que concordem COm os fatos observaveis Nao raro elas parecem nuvens escuras das quais daqui e dali caem uns poucos raios de luz que tocam a terra V Urn exemplo disto e que sera discutido mais extensamente adiante e a tentativa que faz Parsons de elaborar um modelo tearico da relaiio entre estruturas de personalidade e estmturas sociais Neste esforo duas icteias nao muito compativeis sao confundidas com freqUencia a nao de que individuo e sociedade ego e Usistema social seriam duas entidades existindo independentemente uma da outra sendo 0 individuo considerado como a realidade concreta e a sociedade tratada como epifenomeno e a nao de que as duas sao pianos diferentes mas inseparaveis do universo formado pelo homem Alem disso conceitos como ego e sistema social e todos os demais a elesrelacionados e que se referem a homens como individuos e como sociedades sao usados por Parsons exceto quando emprega categorias psicanaliticas como se a condiiio normal de ambos pudesse ser considerada como urn estado inalterave Este estudo nao pode ser devidamente compreendido Se a visiio do que e realmente observaveJ em seres humanos for barrada por tais n6es E nao pode se esquecermos que conceitos como indivfduo e sociedade nao dizem respeito a dais objetos que existiriam separadamente mas a aspectos diferentes embora in separaveis dos mesmos seres humanos e que ambos os aspectos e os seres humanos em geral habitualmente participam de uma transforrnaao estrutu ra Ambos se revestem do carater de processos e nao ha a menor necessi dade na elaboraao de teorias sobre seres humanos de abstrairse este pro cessocarater Na verdade e indispensavel que 0 conceito de processo scja incluido em teorias sociol6gicas ou de outra natureza que tratem de seres humanos Conforme demonstrado neste estudo a relaao entre 0 individuo e as estruturas sociais so pode ser esclarecida se ambos forem investigados como entidades em mutaao e evoluao SO entao sera possivel construir modelos de seus relacionamentos como e feito aqui que concordam com i apendice ZZI fatos demonstraveis Podese dizer com absoluta certeza que a relaao entre o que e denominado conceitualmente de indivlduo e de sociedade perw manecera incompreensvel enquanto esses conceitos forem usados como se representassem dois corpos separados e mesmo corpas habitlialmente em repouso que s6 entram em contato urn com 0 outro depois per assim dizer Sem jamais dizer isto clara e abertamente Parsons e todos os sociologos da mesma inclinaao imaginam que existam separadamente essas coisas a que se referem 98 conceitos de individual e sociedade Assim para dar apenas urn exemplo Parsons adota a nao ja desenvolvida por Durkheim de que a relaao entre individuo e sociedade e uma interpenetraao do indivlduo e do sistema social Como quer que essa interpenetraao seja concebida 0 que mais pode essa met8fora significar serrao que estamos tra tando de duas entidades diferentes que primeiro existem separadamente e que depois se interpenetram1 8 Esse fato deixa clara a diferena entre as dois enfoques sociologicos Neste estudo a possibilidade de discernir com rnais precisao a conexao entre estruturas individuais e sociais resulta da recusa de abstrair 0 processo de evoluao de ambaS como se fosse algo incidental ou meramente historico Isto porque as estruturas da personalidade e da sociedade evoluem em uma interrelaao indissoluvel Jamais se pode dizer com absoluta certeza que os membros de uma sociedade siio civilizados Mas com base em pesquisas sis tematicas caleadas em evidencia demonstnivel cabe dizer com alto grau de certeza que alguns grupos de pessoas tornaramse mais civilizados sem neces sariamente implicar que e melhor ou pior ou tem valor positivo au negativo tornarse mais civilizado Nao obstante podese demonstrar sem dificuldade que tal mudana nas estruturas de personalidade e um aspecto especifico do desenvolvimento de estruturas sociais E 0 que tentaremos fazer no que se segue Nao surpreendc encontrar em Parsons e em muitos outros te6ricos mO demos no campo da sociologia uma tendencia a reduzir processos a estados mesmo quando esses autores se ocupam explicitamente do problema da mu dana social De conformidade com a tendencia predominante em sociologia Parsons toma como ponto de partida a hipotese de que todas as sociedades existem normalmente em um estado de equlibrio imutavel que e homeosta ticamente preservado Elas mudam sup6e ele quando esse estado normal de equilibrio social e perturbado par exemplo pela violaao de normas sociais pela quebra da conformidade A mudana social surge assim como um fenomeno resultante da disfunao acidental externamente motivada de um sistema social normalmente bern equilibrado Alem do mais a sociedade assim perturbada se esfora na opiniao de Parsons para voltar ao estado de re pansa Mais cedo ou mais tarde segundo ele urn sistema diferente com Urn equilibria diferente e estabelecido que mais uma vez se mantem mais OU menos automaticamente a despeito de oscila6es no estado dado Em l 222 o processo cil1i1iQldor I uma palavra 0 conceito de mudaa social referese aqui a urn estado transit6rio enlre dois eslados normais de imulabilidade provocado por uma disfuniio Aqui lambem emerge com grande clareza a diferena enlre os enfoques te6ricos represenlados por esle eSlUdo e 0 de Parsons e sua escola o presenle esludosustenla a ideia baseada em abundante material documen tario de que a mudana e uma caracterfstica normal da sociedade Uma seqUencia estrutural de mudana conlfnuaserve aqui como marco de refe rencia para a investigaao de estados localizados em pontos particulares no tempo Na opiniiio sociol6gica predominante reciprocamente as situ sociais tratadas como se normalmente existissem em estado de repOuso servem como marcos de referencia para lodas as mudanas Desta maneira ela considera sociedade como urn sistema social e este como urn sistema em eslado de repouso Mesmo quando esta envolvida uma sociedade rela livamente diferenciada e altamente desenvolvida com freqiiencia se tenta consideraIa como em repouso e autosuficiente Nao se considera essencial ao estudo pergunlar por que e como essa sociedade allamenle desenvolvida evoluiu para esse eslado de diferenciaao De conformidade com 0 marco de referencia eslalico das teorias dos sistemas predominanles as mudanas processos e fenomenos sociais que incluem 0 desenvolvimento de urn eSlado ou de um processo civilizador surgem apenas como algo adicional uma mera introdulio hisI6rica cuja invesligaao e explicalio bem podem ser dispensadas chegandocse a uma compreenslio do sislema social e de sua estrutura e funOes como podem ser observados aqui e agora de urn ponto de vista de curiO prazo Essas pr6prias ferramentas conceilUais inc1uindo conceitos como estruturas e ufunao que servem como emble mas da escola sociol6gica moderna dos funcionalislas estruturais trazem a marca de urn lipo especifico de raciocfnio que reduz processos i condiao de estados Claro seus formuladores nlio podem ignorar inteiramente a ideia de que estruturas e funcoes da unidade social ou de suas partes que descrevem como estados evoluem e mudam Mas os problemas assim colo cados em paula sao reconciliados com 0 modo estatico de pensamento ao serem encerrados em urn capitulo especial com 0 lilulo Mudana Social como se 0 fenomeno fosse suplernentar aos problemas do sislema normalmen te imutvel Desta maneira a mudanca social em si 6 tratada como urn alributo do estado de repouso Em oulras palavras a atitude basica orienta da para a ideia de estado e reconciliada COm observaOes empiricas de mu dana social ao se introdlizirem no museu de cera te6rico dos fen6menos sociais estaticos mnis algumas figuras igualmenle im6veis com os r6tules de mudana social ou processo social Desta maneira os problemas da mudana social sao em certo sentido congelados e tornados in6cuos para uma sociologia orientada para a ideia de estado E assim aconleceu que 0 conceito dedesenvolvimenlo social desapareceu pralicamente por comple to das teorias sociol6gicas medernas paradoxalmente numa fase de de J apbldice 223 senvolvimento social em que na real vida social e em parte tambem na pesquisa sociologica empirica as pessoas se interessam mais intensa e cons cientemente do que nunca pelos problemas do desenvolvimento social VI Ao escrever uma introduao a um livro que tanto no aspecto teorico quanto no empirico se opoe frontalmente as tendencias gerais da sociologia contemporanea senti certa obrigaao de dizer ao leitor clara e inequivoca mente como e por que os problemas aqui colocados e os passos dados para solucionaIos diferem dos pregados pelo tipo predominante de sociolo gia e particularmente pelos da sociologia teorica Com este propOsito nao pude evitar inteiramente a questao de como deve ser explicado 0 fato de que a sociologia para cujos principais representantes no seculo XIX os proble mas dos processos sociais de longo prazo eram de primordial interesse tor nouse no seculo XX uma sociologia de estados iSIO a tal ponto que a in vestigaao de processos sociais de grande duraao praticamente desapareceu de suas atividades de pesquisa Dentro do escopo desta introduao nao Pllde ter a pretensao de discutir com a exaustividade que merecem 0 deslocamento do centro de interesse da pesquisa sociologica e a mudana radical em toda a maneira de pensar ligada a ela 0 problema porem e importante demais para compreensao do que se segue e alem disso para 0 desenvolvimento ulterior da sociologia para ser omitido em completo sHencio Vou por con seguinte limitarme a pinar alguns elementos no complexo de condi6es responsaveis por essa regressao no aparato intelectual da sociologia e no concomitante estreitamento de seu campo de indagaao A razao mais obvia par que a percepao da importancia dos problemas da mudana social a longo prazo da sociogenese e desenvolvimento de for ma6es sociais de todos OS tipos se perdeu na maior parte para os sociologos e por que entre eles 0 conceito de desenvolvimento calu em descredito e encontrada na reaao de muitos deles acima de tudo dos principais teo ticos do seculo XX a alguns aspectos de teorias notaveis do seculo XIX Foi demonstrado que os modelos teoricos de desenvolvimento social de longo prazo elaborados no seculo XIX por homens como Comte Spencer Marx Hobhouse e muitos outros fundamentaramse em parte em hipoteses con dicionadas principalmente pelos ideais politicos e filosOficos desses homens e apenas secundariamente pelas suas reloes com os fatas Geraoes poste riores tiveram a disposiao uma massa de fatos muito maior e em constante expansao 0 reexame das teorias de desenvolvimento classieas do seculo XIX a luz das descobertas mais abrangentes de geraoes subseqUentes fez com que numerosos aspectos dos anteriores modelos de processos parecessem duvidosos ou pelo menos necessitados de tevisao Muitos dos artigos de fe sociologicos pioneiros nao foram mais aceitos pelos sociologos do seculo XX Eles incluiam acima de tudo a crena em que 0 desenvolvimento da sociedade 0 necessariamente uma evoluiio para 0 melhor urn movimento na direao do progresso Esta crena foi categoricamente rejeitada por muitos soci610gos posteriores de acordo com sua pr6pria experiencia social Re trospectivamente podiam ver com maior clareza que os modelos anteriores de desenvolvimento compreendiam uma mistura de nes relativamente ba seadas em fatos e de carater ideol6gico Em uma disciplina madura poderseia entao encetar o trabalho de corrigir e revisar os modelos anteriores de desenvolvimento Ou se tentaria verificar que aspectos das velhas teorias poderiam ser usados como base para pesquisa ulterior a luz das conhecimento factuais mais amplos agora dispo niveis e quais deveriam ser reconhecidos como manifestaiio de preconceitos politicos ou filosoficos ultrapassados no tempo e enterrados com uma lapide conveniente no cemiterio das doutrinas mortas Em vez disso ocorreu uma reaiio extremamente violenta contra 0 tipo de teoria sociol6gica preocupada com processos sociais de longo prazo 0 estudo desses fenomenos de longa duraao foi qmise universalmente execrado movendose 0 centro do interesse em urn contraataque radical ao tipo mais antigo de teoria para a investigaao de dados sobre sociedades concebi das como normalmente existentes em um estado de repouso e equilibrio Lado a lado com isto ocorreu 0 enrijecimento de uma serie de crlticas este reotipadas contra as teorias sociol6gicas mals antigas e muitos de seus con ceitos fundamentais particularmente 0 do desenvolvimentu social Uma vez que esses soci610gos nilo se preocuparam em fazer uma distinilo entre ele mentos baseados em fatas e os de natureza ideol6gica no conceito de desen volvimento toda discussao dos processos sociais de longa duraao em par ticular ados processos de desenvolvimento foi dai em diante vinculada a um ou outro dos sistemas de ideias do seculo XIX e acima de tudo a ideia de que desenvolvimento social fosse ocorrendo em linha reta sem conflito ou dialeticamente com conflito devia automaticamente ser uma mudana para 0 melhor urn movimento na direao do progresso A partir dessa data pareceu quase anacronico alguem ocuparse de questoes como 0 desenvolvi mento social Oizse algumas vezes que generais ao planejar a estrategia de uma nova guerra utilizam como modelos as estrategias das antigas Supor sem restrioes que conceitos como desenvolvimento social e processos sociais de longo prazo inevitavelmente inc1uem a velha ideia de progresso implica conduzirse de maneira semelhante Encontramos no contexto da sociologia por conseguinte urn fenomeno intelectual que envolve uma oscilaao radical do pendulo de uma posio unilateral para outra oposta e nao menos unilateral A fase em que os te6 ricos da sociologia procuravam principalmente modelos de desenvolvimento social a longo prazo sucedeu outra em que se interessam principalmente por modelos de sociedades em estado de repouso e imutabilidade Se a pesquisa outrora se fundamentou numa suposiao basica digamos heracliteana de que 224 o processo civilizador 1 I l I tJpendice 225 tudo esta em movimento com a diferena que era aceito como certo que 0 fluxo ocorria na dirao do melhoramento ela se baseia agora em uma ideia eleatica Os eleaticos ou eleatas segundo se sabe imaginavam 0 vilo de uma flecha como uma serie de e6tados de repouso Na verdade parecia lhes que a flecha nao se movia absolutamente Isto porque em qualquer dado momento ela estava em urn dado lugar A suposiao de muites te6ricos mo demos de que as sociedades em geral sao encontradas em estado de equili brio de tal modo que 0 desenvolvimento social da humanidade a longo prazo parece uma cadeia de tipos sociais estaticos lembra muito a conceao elea tica do v60 da flecha De que modo pode ser explicada essa virada do pen dulo de urn extrema a outro do desenvolvimento da sociologia A primeira vista parece que a principal razao da mudana na orientaao te6rica foi uma reaao de cientistas que protestavam em nome do carater cientifico de sua pesquisa contra a interferencia de ideias pOliticas e filosofi cas na leoria de seu tema de estudos Expoentes das teorias modernas de estado inclinamse amiude para essa explicaao A urn exame mais atento contudo descobrimos que ela e inadequada A reaao contra a sociologia do desenvolvimtnto predominante no seculo XIX nao se voltou simples mente contra 0 primado de ideais a dominaao de doutrinas sociais precon cebidas em nome da objetividade cientifica Nao foi tampoucopura expressao do interesse de rasgar 0 veu de id6ias de pouca duraao sobre 0 que a socie dade devia ser a fim de compreenderlhe e identificarlhe a verdadeira dina mica e funcionamento Se no seculo XIX concepoes especificas do que devia ser ou do que se desejava que fosse conceoes ideologicas especi ficas levaram a urn interesse fundamental pelo desenvolvimento dasocie dade no seculo XX outras conce6es do que devia ser o era desejavel outras concepoes ideologicas geraram pronunciado interesse entre os principais te6ricos pelo estado da sociedade como ela se encontra negligen ciando os problemas da diniimica das formaoes sociais e sua falta de inte resse por problemas de processo de longa duraao e por tOOas as oportuni dades de explicaao que 0 estudo desses problemas proporciona Esta mudaniR radical no carater dos ideais sociais mencionada neste caso particular na evoluao da sociologia nao constitui fenilmeno isolado E sintomatica de uma mudana mais abrangente ou geral nos ideais predomi nantes nos paises em que se concentra 0 principal trabalho da sociologia Esta mudana indica por seu lado a transformaao especifica que vern oconendo desde 0 seculo XIX e prossegue no seculo XX nas relaes internas e exter nas dos jlStados industriais mais antigose desenvolvidos Espero que seja suficiente aqui como sumano de uma pesquisa mais extensa indicar em poucas palavras os principais contornos dessa transformaao Isto facili tara a compreensiio de estudos sociologicos que como este que 0 leitor tern em maos atribuem importancia fundamental ao estudo dos processos de longo prazo 0 objetivo nao e atacar outros ideais em nome dos ideais que temos l o processo civilizador mas procurar compreender melbor a estrutura desses processos em si e eman cipar 0 arcabouo trorico da pesquisa sociol6gica da primazia de ideais e doutrinas sociais Isto porque s6 poderemos reunir conbecimentos sociol6 gicos adequados 0 suficiente para serem usados na soluao dos agudos pro blemas da sociedade se quando equacionamos e resolvemos problemas sado 16gicosdeixamos de subordinar ainvestigaao do que ea ideias preconce bfdas a respeito do que as solu6es devem ser VII Nos paises em fase de industrializaao do seenlo XIX onde foram es critos os primeiros grandes trabalbos pioneiros de sociologia as vozes que expressavam as crenas ideais esperanas e objetivos a longo prazo das nascentes classes industriais ganharam aos poucos vantagens sobre as que procuravam preservar a ordem social existente no interesse das tradicionais elites de poderdinasticas de corte aristocraticas ou patricias Foram as pri meiras em conformidade com sua situaao ie classes emergents que ali mentaam altas expectativas de um futuro melbor E como seus ideais S concentravam nao no presente mas no futuro sentiram um interesse todo especial pela iidmica pelo desenvolvimento da sociedade Juntamente com uma ou outra dessas classes industriais emergentes os soci610gos da epoca procuraram obter confirmaao de que o desenvolvirnento da humanidade se daria na dirao de seus desejos e esperanas Fizeram isso estudando a dirao e as foras motivadoras do desenvolvimento social ate entao E muito dificil porem distinguir em retrospecto entre doutrinas heteronomas repletas de ideais de curto prazo condicionados pela epoca em que apa receram e os modelos conceituais que se revestem de importancia inde pendentemente desses ideais e exclusivamente no que tange a fatos veri ficaveis Por outro lado no mesmo seculo seriam ouvidas vozes que por uma ou outra razao opunbamse 11 transformaao da sociedade pela via da in dustrializaao cuja fe social era orientada para a conserva9ao da heran9a existente e que ofereciam aos que viam no presente um estado de dete rioraao 0 ideal de um passado melhor Representavam elas nao s6 as elites preindustriais dos Estados dinasticos mas tambem grupos mais am plos de trabalhadores acima de tudo os que se ocupavam na agricul tura e oficios artesanais enjo melo de vida tradicional estava sendo cor roido pelo avano da industrializaao Eram os adversilrios de todos aque les que falavam do ponto de vista das crescentes classes trabalhadoras in dustriais e que de conformidade com a situaao ascendente dessas clas ses buscavam inspira9ao na crena em um futuro melhor no progresso da humanidade Desta maneira no seculo XIX 0 coro de vozes dividiase en tre os que exaltavam um passado melhor e os que cantavam um futuro mais risonbo aperuice Entre os soci610gos cuja imagem de sociedade se orientava para 0 progresso e um futuro melhor eram encontrados conforme sabemos porta vozes das duas classes industriais Incluiam eles homens como Marx e Engels que se identificavam com a c1asse operaria industril e tambem so ci610gos burgueses como Comte no inicio do seculo XIX e Hobhouse no fim Os portavozes dessas duas classes industriais em ascensao inbam ple na confian no futuro melhoramento da condiao humana ainda que va riasse muito 0 que concebiam como melhoramento e progresso dependen do da classe a que pertencessem e essencial compreender a intensidade do interesse pelos problemas do desenvolvimento social no seculo XIX e per guntar em que se fundamentavam esses interesses se queremos entender por que a crena no progresso se desvaneceu no serolo XX e por que cor respondentemente declinou entre os soci610gos 0 interesse pelos pr061emas do desenvolvimento social a longo prazo Mas para compreender essa mudana nao e suficiente conIorme ja indicado estudar apenas as formas das classes as relaoes socials dentro dos Estados A ascensao das classes industriais nos Estados que se indus trializavam na Europa aconteceu lado a lado com a ascensao ininterrupta das pr6prias naoes Nesse seculo essas naOes se aCicataram mutuamente numa rivaHdade constante para impor sua predominancia a naoes menos desenvolvidas mais do que em qualquer outro periodo da hist6ria Nao apenas as classes neles existentes mas tambem esses Estadossociedades enquanto totalidades eram formaoes sociais em expansao e ascensao Poderiamos talvez nos sentir tentados a atribuir a crena no progres so nas obras escritas na Europa nos seculos anteriores ao seculo XX ao avano da ciencia e da tecnologia Mas seria uma expHcaao insuficiente o quao pouco a experiencia do progresso cientffico e tecnol6gico isolada mente gera em termos de idealiziio do progresso de fe confiante no me lhoramento continuo da condiao humana e demonstrado COm bastante c1areza pelo seculo XX 0 grau e ritmo reais do progresso da ciencia e tecnologia neste seculo excederam por margem consideravel os ocorridos em seculos anteriores Da mesmamaneira 0 padrao de vida das maSSas nos paises da primeira onda de industrializaao subiu mais no seculo XX doue nos anteriores Melhorou 0 estado de saude e cresceu a expectativa de vida Mas no coro total da epoca as vozes que proclamam 0 pro gresso como algo vaHoso que veem no aprimoramento da condiao do ho mem a pea principal do ideal social e que acreditam sinceramente em um futuro melhor para a humanidade tomaramse visivelmente menos nume rosas No outro lado do coro as vozes dos que lanam duvida sobre todos esses fenomenos que nao anteveem um melhor futuro para a humanidade ou mesmo para sua pr6pria naao e cuja fe social basica se concentra ao contrario no presente cotuo seu mais aIlo valor na conservaiio de sua pr6pria naao na idealizaiio da ordem social existente ou mesmo no seu 228 o prOCeS60 civilizador I passado heranga e ordem tradicional estao aumentando no seculo XX e tomandase gradualmente mais fortes Nos seculos anteriores nos quais 0 progresso real ja era palpavel ainda que lento e relativamente limitado a ideia de mais progresso no futuro revestia 0 carater de urn ideal pelo qual seus defensores se esforgavam e que possuia alto valor exatamente como ideal No seculo XX epoca em que 0 progresso real na ciencia tec nologia saude e padrao de vida e nao menos na redugao das disparidades entre as pessoas excede de muito nas nagoes industrializadas ha mais tem po 0 progresso conseguido em todos os seculos anteriores 0 progresso dei xou para muitas pessoas de ser um ideal E estao se tomando mais nume rosas as vozes dos que duvidam de todo esse progresso real Sao muitas as razoes para essa reviravolta Nem todas precisam ser consideradas aqui As guerras repetidas 0 perigo incessante de guerra e a ameaga de armas nucleares e cientificas certamente contribuem para essa coincidencia de progresso em aeeleragao particularmente nos campos cien tifico e tecnico com confianga decrescente no seu valor e no progresso em geral Mas 0 desprezo com que 0 seculo XX trata a crenga rasa no pra gresso dos seculos anteriores ou sua ideia de desenvolvimento progressivo da sociedade humana as obstrugOes que impedem os soci610gos de ver e identificar os problemas dos processos sociais a longo praza 0 desapare cimento quase completo do conceito de desenvolvimento social dos textos sociol6gicos estes e outros sintomas de uma virada extrema do pendulo intelectual nao sao suficientemente explicados pelas perturbagoes das guer ras e fenomenos correlatos A fim de compreendelos temos que levar em conta tambem as mudangas especificas ocorridas neste seculo na estru tura intema geral e na posigao intemacional das grandes nagoes industria lizadas do seculo XIX Nessas nagoes os representantes das duas classes industriais a burgue sia industrial e 0 operariado estao firmemente entrinchelrados como grupos dominantes em seus Estados contra as antigas elites dinasticas e aristocni ticas cujo poder era basicamente militar Essas duas classes se controlam mutuamente em um equilibrio amiude precario e sempre instavel de ten sOes coma classe operaria tradicional ainda em posigao mais fraca mas ganhando lentamente forgas As classes nascentes do seculo XIX que tive ram que lutar em seus Estados contra a elite dinastica tradicional e para as quais desenvolvimento progresso e um meIhor futuro eram nao s6 fa tos mas tambem urn ideal de grande significagao emocional tomaramse neste seculo as classes industriais mais ou menos tradicionais cujos repre sentantes estao instalados institucionalmente como grupos govemantes ou cogovernantes Parcialmente como s6dos e ate certo ponto como adversa rios os representantes da burguesia industrial e do operariado tradiciona formam agora a principal elite das nagoes da primeira onda de industriali apendice zaao Em conseqiiencia a par da consciencia e dos ideais de c1asse e em certa medida como disfarce para e1es a consciencia nacional e 0 ideal de sua propria naao como valor supremo desempenham urn papel de impor tancia crescente nas duas classes industriais em primeiro lugar na bur guesia industrial mas crescentemente tambem no operariado Vistas como urn ideal contudo as na6es voltam hoje a atenao para o que ja existe Uma vez que os representantes das duas classes industriais mais poderosas e numerosas tern hoje acesso a posi6es de poder no Estado a naao organizada dessa forma desponta emocional e ideologicamente como 0 mais alto valor em sua presente condiao Alem do mais emo cional e ideologicamente ela parece eterna imutavel em seus aspectos essenciais As mudanas historicas afetariam apenas os aspectos externos a pava a na930 aparentemente nao mudadam Os ingleses os alemaes os franceses os italianos e os naturais de todas as na90es sedam para aqueles que as constituem etemos Em sua essencia sedam sempre os mesmos estejamos nos falando do seculo X ou do seculo XX Alem do mais nao foram apenas as duas classes industriais nas na6es ha mais tempo industrializadas que mudaram de uma vez por todas no decorrer deste seculo A ascensao das na6es europeias e de suas repre sentantes em outras partes do mundo que prosseguira durante seculos len tamente se deteve no atual Para sermos exatos sua atual vantagem sobre na6es naoeuropeias eom algumas exc6es comou grande e durante algum tempo ate mesmo aumentou Formouse e fortaleceuse a ideia po rem na era de ascendencia indisputada das na6es europeias ideia que e recorrente entre todos os grupos poderosos e dominantes no mundo de que o poder que podiam exercer sobre outras na6es era manifestaao de urna missao eterna que hes fora concedida par Deus pela natureza au pelo des tino hist6rieo expressao deuma superioridade de essencia sabre os menos poderosos Esta ideia de superioridade axiomatica profundamente enraiza da na autoimagem das na6es industrializadas M mais tempo foi profon damente abalada pelo curso do desenvolvimento neste seculo 0 choque de realidade experimentado quando a ideal nacional colidiu com a reali dade social foi absorvido de maneira diferente em cada naao de acordo com seu proprio desenvolvimento e a natureza especifica de sua autoirna gem nacionai No caso da Alemanha a importancia mais geral dessa coli sao foi inicialmente ocultada pelo choque mais direto das derrotas milita res Mas e indicativo tanto da solidez dos velhos ideais nacionais quanto da relativa autonomia deste fenomeno como um todo que mesmo nos pai ses vitoriosos na segunda guerra europeiaamericana tantO quanta se pode saber apenas pouqufssimas pessoas se deram conta imediatamente apos a vitoria de como radical e fundamentalmente a conflito militar entre dois grupos de paises relativamente muito desenvolvidos lhes reduziria 0 poder global sobre os paises menos desenvolvidos sendo que esta reduao ja es 230 o processo civilizador L tava em gesta9ao desde algum tempo antes Como freqUentemente acon teee esta subita diminui9ao de poder encontrou despreparadas e confusas as na90es antes tao poderosas As oportunidades reais de progresso de urn futuro melhor sao ainda ignorandose a possibilidade regressiva de uma guerra muito gran des para as primeiras na90es que se industrializaram Mas em compara9ao com suas autoimagens tradicionais nas quais a ideia de sua pr6pria civi liza9ao ou cullura nacional e em geral entronizada como 0 mais alto valor da humanidade 0 futuro e decepcionante A ideia da natureza e valor ex cepcionais da pr6pria na9ao serve freqUentemente omo legitima9ao de sua reivindicR9ao a Iiderar todas as demais E foi essa autoimagem essa pre tensao a Iideran9a pelas na90es industrializadas mai antigas que softeu um abalo na segunda metade desle eculo provocado por um aumento ain da muito Iimitado de poder das sociedades mais pobres sociedades prein dustriais previamente dependentes e parcialmente subjugadas de outras par tes do mundos Em outras palavras este cheque de realidade na medida em que afeta o valor emotivo do estado atual de uma nao no tocante as suas futuras possibilidades meramerite refor9a uma tendencia ja existente no sentimento nacional de que a na9ao e e sempre foi com sua heran9a etema inaltera vel e possui um valor afetivo muito maior como meio de autolegitimao e como expressao da escala nacional de valores e ideal nacional do que qualquer promessa ou ideal localizado no futuro 0 ideal nacional des via a aten9i1o do que muda para 0 duradouro e 0 imutavel Este aspecto da transforma9ao que corre nos Estados europeus e tambem em eerto nfunero de outros naoeuropeus mas Iigados a eles fez se acompanhar de mudan9as especfficas na esfera das ideias e modos de pensamento dos intelectuais Nos seculos XVIII e XIX os fiMsofos e s ci610gos que falavam em sociedade pensavam geralmente em sociedade burguesa isto e em aspectos da vida social que pareciam situarse alem dos aspectos dinasticos e militares do Estado De conformidade com a situa9i10 em que viviam e com seus ideals como portavozes de grupos que estavam de maneira geral excluidos do acesso as posi90es mais im portantes do poder estatal esses homens quando falavam em sociedade tinham geralmente em mente uma sociedade humana que transcendia todas as fronteiras nacionais Com a ascensao ao poder de Estado de grande nu mero de representantes dessas dUas classes industriais e com 0 correspon dente surgimento nelas de ideais nacionais particularrnenteem suas eli tes representativas govemantes esta conceNao de sociedade mudou tam bem na sociologia Na sociedade em geral os varios ideais de classe dos segmentos indus triais mistraramse e interpenetraramse cada vez mais com ideais nacio nais Nilo hl duvida de que ideais nacionais conservadores e liberais apre sentam uma nuana diferente de nacionalismo que nao os das variedades comunista ou socialista Mas essas nuanas influenciaram muito pouco Se 6 que chegaram a fazeIo os grandes contornos da mudana que OCorreu nas classes industriais tradicionais em relaao ao Estado e i nagao incluin do seus portavozes politicos e inte1ectuais quando elas deixando de ser grupos excluidos do poder central de Estado passaram realmente a consti tuir a naao cujos lideres representaram e exerceram 0 poder Correspon deu a esse fenomeno 0 fato de que numerosos soci610gos do seculo XX quando se referem i sociedade nao pensam mais como acontecia com os sens predecessores em uma sociedade burguesa ou em uma socie dade humana al6m do Estado mas cada vez mais na imagem ideal algo diluida de uma nagaoEstado Na concao geral de sociedade desses so ci610gos como algo abstraido da realidade da nagaoEstado as nuanas politicas e ideol6gicas acima referidas sao maisuma vez encontradas Entre os principais te6ricossociol6gicos do seculo XX deparamos com ma lizes conservadores e liberais e tambem socialistas e comunistas nessa ima gem de sociedade Vma vez que neste seculo a sociologia americana assumiu por algum tempo 0 papel liderante no desenvolvimento do aspecto te6rico dessa ciencia 0 tipo dominante de teoria desse perodoreHetiu 0 carater especifico de seu ideal nacional predominante dentro do qual os aspectos conservador e liberal nao sao tao radicalmente diferentes ou julgados anti teticos como em alguns Estados nacionais da Europa particularmente na AlemRnha Na discussao sociol6gica e igualmenteno debate filos6fico a rejeiao de certos aspectos das teorias sociol6gicas do s6culo XIX acima de tudo de sua orientagao para 0 desenvolvimento social e 0 conceito de pro gresso freqiientemente se apresentou como se eslivesse baseada exclusi vamente na inadequaao factual dessas teorias Mas 0 curto estudo que aqui fizemos de uma das principais tendencias estruturais no desenvolvi mento das relagoes dentro das nagoes industrializadas hli mais tempo e entre elas pOe em relevo mais nitido certos aspectos ideol6gicos dessa rejeiiio De acordo com 0 conceito de ideologia desenvolvido no seio da tradiao marxista poderamos tenlaf explicar os aspectos ideol6gicos da negligencia a que foi relegado 0 desenvolvimento social e a preocupagao com 0 estado dos sistemas sociais dominantes nas teorias sociol6gicas recentes exclusiva mente por referencia a ideais de classes cujas esperangas anseios e ideais estao relacionados nao com 0 futuro mas com a manutengao da ordem existente Mas esta explicaao classista das crengas e ideais sociais impli citos na tcoria sociol6gica jli nao 6 satisfat6ria em nosso seculo Neste te mos que levar em conta tambem 0 desenvolvimento de ideais nacionais que transcendem classes sociais a fim de entender os aspectos ideol6gicos das teorias sociol6gicas A integragao das duas classes industriais em uma estrutura estatal previamente governada par minorias preindustriais nume apendice 231 232 o processo civilizador I ricamente bem pequenas a ascensao de ambas as classes a uma poslao em que seus representantes desempenham urn papel mais ou menos domi nante no Estado e no qual nem mesmo os setores mais fracos do opera riado podem ser governados sem seu consentimento e a resultante identi ficaao mais forte de ambas as classes com a naao todos esses fatores dao uma foraespecial nas atitudes sociais de nossa epoca a crena na pr6pria naao de cada um como um dos mais altos valores da vida huma na 0 alongamento e a multiplicaao de cadeias de interdependencia entre os Estados e 0 agravamento de tensOes e conflitos espedficos entre eles resultantes dessa orientaao as importantissimas gnerras de Iibertaao na cional e a ameaa sempre presente de gljerra geral todos esses fatores contribuiram para 0 crescimento de padrOes de pensamento centralizados na naao E foi a convergencia dessas duas Iinhas de desenvolvimento intraEs tados e interEstados nas naOes induslrializadas mais antigas que debilitou o ideal de progresso a orientaao da flO e do desejo para um futuro mellior e por conseguinte tambem uma compreensao do passado como desenvolvi mento Combinadas essas duas Iinhas de desenvolvimento acabaram substi tnindo esse tipo de ideal por oulros que visavam a conservaao e defesa da ordem existente Estes se referem a algo que se julga imutavel e realizado no presente a naao etema As vozes que proclamavam a crena em um fu turo mellior e no progresso da humanidade como seus ideais cederam lu gar como segmento dominante do coro social misto da epoca aquelas vo zes que dao mais importancia ao valor do que existe e acima de tudo ao valor imemorial de suas pr6prias naOes pelas quais numa serie de guer ras grandes e pequenas muitas pessoas perderam a vida Este foi em sens contomos gerais 0 desenvolvimento estrutuml geral que se reflete na formulaao de teorias sobre a sociedade As teorias que refletem os ideais das classes emergentes em sociedades industrializadas em expanslio sao substituidas por oulras dominadas pelos ideais de classes mais ou me nos tradicionais em sociedades altamente desenvolvidas cujo crescimento alcanou ou ullrapassou seu ponto culminante Como exemplo desse tipo de teoria sociol6gica talvez seja suficiente citar urn de seus conceitos caracteristicos 0 de sistema social da fonna usada por Parsons mas certamente nao apenas por ele 0 conceito expressa com clareza a maneira como a sociedade agora e concebida Urn siste ma social 0 uma sociedade em equillbrio Pequenas oscilaoes desse equillbrio de fato ocorrem mas em geral a sociedade existe em estado de repouso TOOas as suas partes segundo essa conceao estao via de reo gra harmoniosamente sintonizadas umas com as outras TOOos os que a ela pertencem sao geralmente sintonizados pelo mesmo tipo de socializa ao as mesmas normas Todos sao habitualmente bem integrados em seus atos respeitam os mesmos valores e desempenham sem dificuldade os pa apendice 233 peis que hes sao atribuidos Normalmente nao ocorrem conflitos entre eles Estes tais como mudanas no sistema sao manifestaoes de disfun6es Em surna a imagem de sociedade representada teoricamente por este con ceito de sistema social revelase a um exame mais atento ser a imagem ideal de urna naao todos os que a comp6em obedecem as mesmas nor mas na base da mesma socializaao sustentam os mesmos valores e dessa maneira vivem normalmente em uma harmonia bem integrada entre si Nessa concepao de sistema social em outras palavras podese discernir a imagem da naao como comunidade Supoese tacitamente que nesse sistema haja urn grau relativamente alto de igualdade entre as pessoas uma vez que a integraao repousa na identica socializaao das mesmas na uniformidade de seus valores e normas em todo 0 sistema Esse sistema por conseguinte e urna construao absliraida de urna naaoEstado demo craticamente concebida De qualquer lado que seja examinada essa cons truao fica borrada a distinao entre 0 que a naao e e 0 que deve ser Da mesma forma que os modelos sociol6gicos de desenvolvimento do pro cesso social desejado eram apresentados no secnlo XIX mesclados com observaoes realistas como fatos neste seculo os modelos de urn siste ma social desejado e ideal de integraao harmoniosa entre todas as par tes da naao e tambem apresentado combinado com observaoes realis tas como algo que existe como urn fato Mas no primeira caso e 0 fu turo e no ultimo 0 presente 0 Estado nacional ora existente que e idea lizado Uma mistura do e com 0 que deve ser de analises factuais e postulados normativos relaeionados primariamente com uma sociedade de urn tipo bern definido urn Estado naeional concebido de forma amplamente igualitaria apresentase assim como a pea central deuma teoria que pre tende servir de modelo para 0 estudo eientffico de sociedades em todas as epocas e lugares Preeisamos apenas levantar a questao de se e como essas teorias derivadas basicamente das soeiedades do presente constituidas em Estados nacionais sociedades mais ou menos democraticas que pres sup6em uma elevada integraao das pessoas num sistema social como alga autoevidente e desejavel e que por conseguinte implicam urn estagio reia tivamente avanado de democratizaao soeial sao aplicaveis a socieda des em diferentes estagios de desenvolvimento 1ue sao menos centralizadas e democratizadas para entao percebermos a fraqueza de uma teoria geral elaborada a partir da perspectiva tao afastada do presente estado de nossa pr6pria sociedade Se estes modelos de sistema social forem submetidos a testes de aplicabilidade como instrumentos teoricos para 0 estudo cientl fico de uma soeiedade com alta percentagem de escravos au siiditos que nao gozam de liberdade ou a Estados feudais ou hierarquicos isto e a sociedades nas quais nem mesma as leis se aplicam a tadas para nada dizer das mesmas normas e valores logo se vera como realmente sao o processo civilizador centralizados no presente esses modelos sociol6gicos de sistemas concebi dos como estados o que ilustramos aqui como 0 exemplo de sistema social poderia mos tambem mostrar sem dificuldade que se aplica a outros conceitos da sociologia contemporanea dominante Conceitos como estrutura fun ion unorma uintegracao e upapel representam sem exciio em suas formas correntes tentativas de conceitualizar certos aspectos das socieda des humanas abstraindoas de sua dinfimica de sua genese de seu cara ter como processo de seu desenvolvimento A rejeiao da compreensao ideol6gica pelo seaulo XIX desses aspectos dinfimicos da sociedade pode por conseguinte ser vista nao s6 como critica a esses aspectos ideol6gicos em nome da preocupaao cientffica com os fatos mas acima de tudo como critica a ideals mais antigos que nao mais correspondem as condiOes e ex periencia atuais e que por isso mesmo foram rejeitados em nome de ideals posteriores Esta substituiao de uma ideologia por outra explica 0 fato de que niio foram simplesmente os elementos ideol6gicos no conceito so ciol6gico de desenvolvimento no seeulo XIX os postos em duvida mas 0 pr6prlo conceito de desenvolvimento 0 prOprio estudo de problemas de desenvolvimento social de longo prazo da sociogenese e da psicogenese Em suma 0 be1e foi jogado fora juntamente com a agua do banho o presente estudo que trata mais uma vez de processos socials sera compreendido melhor se for lembrado esse desenvolvimento da sociologia te6rica A tendencia a condenaras ideologias sociais do seeulo XIX do ponto de vista das do seeulo XX parece e1lc1uir a ideia de que processos de longo prazo possam ser objeto de estudo sem urn motive ideol6gico isto e sem que 0 autor sob a pretensao de referlrse ao que e ou era fale na realidade no que acredita ou no que deseja que seja Se 0 presente estudo tern itlguma importfincia em absoluto isto resulta de sua oposiao a esta misturado que e com 0 que devia ser de analise cientffica com ideal Indica a possibilidade de Iibertar 0 estudo da sociedade da servidiio a ideologias sociais Isto nao quer dizer que urn estudo de problemas sociais que exclua ideias politicas e filos6ficas implique renunciar a possibilidade de influenciar 0 curso dos fatos politicos atraves dos resultados da pesquisa 0 que ocorre e 0 oposto A utilidade da pesquisa sociol6gica como instrumento da pratica social s6 aumenta se 0 pesquisador nao se engana projetando aquilo que deseja aquilo que acredita que deve ser em sua investigaao do que e e oi VIII A fim de compreender a barreira que as maneiras predominantes de pensar e sentir ergueram ao estudo de mudanas de longo prazo nas estru turas social e da personalidade e assim na maneira de compreender apndice 231 este livro nlio basta remontar as origens da imagem dos homens como sociedades da imagem de sociedade necessario tambem ter em mente o desenvolvimento da imagem dos homens como individuos da imagem da personalidade Conforme ja meneionamos uma das peculiaridades da imagem tradicional do homem e que as pessoas freqUentemente falam e pensam em individuos e sociedades como se fossem dois fenomenos com existencia separada dos quais alem disso um e com freqUencia co05i derado real e 0 outro irreal em vez de dois aspectos diferentes do mesmo ser humano Essa curiosa aberralio do pensamento alem disso tampouco pode ser compreendida sem urn exame ainda que superficial de seu conteudo ideo l6gico implieito A divislio da imagem da humanidade em imagem do ho mem como individuo e sua imagem como sociedade possui raizes que se ramificam muito Um dos ramos e urna cislio muito caracteristica nos ideai encontrados a um exame atento em todos os Estados nacionais mais de senvolvidos e talvez de forma mais pronunciada naqueles que possuem uma forte tradilio liberal No desenvolvimento dos sistemas de valores de te das essas naiiesEstados descobrimos por urn lado urna corrente que considera a sociedade como um tQdo a nlio como 0 mais alto dos va lores e por outro uma vertente que pastula 0 individuo inteiramente auto suficiente 0 individuo livre a personalidade fechada como 0 mais alto valor Nem sempre e facH harmonizar esses dois valores mais altos H3 situaoes em que os dois ideais slio simplesmente irreconciliaveis Mas em geral ninguem eofrenta francamente esse problema Falase com grande entusiasmo na liberdade e independencia do individuo e com calor nlio menor na liberdade e independeneia de sua pr6pria nalio 0 primeiro ideal cria a expectativa de que 0 membro individual do Estado nacional a des peito de seu senso de perteneer a urna comunidade e de interdependeneia com outros pode tomar decisiies de maneira inteiramente autosuficiente ignorando os demais 0 segundo gera a expectativa concretizada sobre tudo nas guerras mas tambem com grande frequencia em tempo e paz de que 0 individuo deve e tem que subordinar tudo 0 que possui mes rno a vida a sobrevivencia do Utodo social Essa eislio nos ideais essa contradilio no ethos no qual sao educadas as pessoas encontra expressao em teorias sociol6gicas Algumas delas to mam como ponto de partida 0 individuo independente autosufieiente como a verdadeira realidade e por conseguinte como 0 objeto autentico da eieneia social outras comeam COm a tolalidade social independente Algumas tentam harmonizar as duas concepoes geralmente sem indicar como e possivel reconciliar a ideia de um individuo inteiramente indepen dente e livre com a de uma totalidade social igualmente independente e livre e nlio raro sem perceber por inteiro a natureza do problema 0 re flexo dessa persistente divislio interna entre os dois ideais e visto acima de tudo nas teorias de soci610gos cujo ideal nacional tem uma cor conser vadoraliberal 0 trabalbo te6rico de Max Weber ainda que nao 0 seu trabalbo empirico e as teorias de seu sucessor Talcott Parsons saO exemplos disto Talvez baste como ilustraao voltar mais urna vez ao que ja dissemos sobre a concepao que Parsons prop1ie da relaiio entre individuo e socie dade entre 0 ator individual e 0 sistema social Uma descriao dessa relaao esta contida na metMora da interpenetraao que mostra com grande clareza 0 importante papel desempenbado pela ideia de existencia separada dos dois aspectos humanos A concretizaao do ideal por con seguinte encontra expressao ness edificio conceitual nao s6 na ideia do sistema social como uma especifica imagem ideal da naao mas tambem na do ator individual 0 ego como imagem ideal do indivfduo livre que existe independente de todos os demais Em ambos os casos a imagem ideal do te6rico e transformada em suas maos sem que ele se de conta disso em a1go que realmente existe 1sto porque no tocante tambem i imagem do indivfduo 0 que na mente do te6rico deve existir a imagem do indivfduo inteiramente livre e independente e tratada como se fosse a imagem do que 0 individuo realmente e Ora nao e certamente este 0 lugar para esmiuar as razoes para essa cisiio amplamente difundida no pensamento sobre 0 que sao os seres hu manos Mas as preocupaoes do presente estudo nao podem ser devidamen te compreendidas enquanto os problemas do processo civilizador forem aOOr dados com as ideias sobre 0 individuo que acabamos de mencionar No curso deste processo as estruturas do ser humano individual sao mudadas em uma dada direao E isto 0 que 0 conceito de civilizao no sentido factual usado aqui realmente significa A imagem hoje corrente do indivi duo como urn ser inteiramente independente e autosuficiente e dificil de reconciliar com os fatos reunidos nestas paginas Ela impede a compreen sao dos processos a 10ngo prazo por que passam as pessoas nos pIanos individual e social Ocasionalmente para ilustrar sua imagem de personali dade Parsons usa a elba metafora da personalidade do ator humano como uma caixa preta8 ista e urn recipiente fechado dentro do qual ocor rem certos processos individuais Essa metifora e tirada do instrumental da psicologia Basicamente ela significa que tudo 0 que pode ser cientifi camente observado em urn ser humano e seu comportamento Podemos observar 0 que a caixa preta faz Mas 0 que ocarre dentro da caixa aquila que e chamado de alma au mente 0 fantasma na maqui na como 0 chamou urn fil6sofo ingles 9 nao e objeto da investigaao cientffica Nao podemos evitar neste contexto de estOOar em detalhe uma imagem do individuo que desempenha urn papel consideravel nas ciencias humanas no presente e que par isso mesmo contribui para a negligencia 236 o processo cil1ilizador apendice 237 com que sao consideradas as mudanlas de longo prazo em seres humanos no curso do desenvolvimento social enquanto tema de pesquisa A imagem do individuo como ser inteiramente livre independente uma personalidade fechada que e por dentro inteiramente autosuficien tc e separada de todos os demais tern por tras de si uma longa tradilao no desenvolvimento das sociedades europeias Na filosofia classica essa figura entra em cena como sujeito epistemol6gico Neste papel como homo philosophicus 0 individuo obtem conhecimento do mundo externo de uma forma inteiramente autonoma Nao precisa aprender receber seus co nhecimentos de outros 0 fato de que chegou ao mundo como crianla 0 procsso inteiro de seu desenvolvimento ate a vida adulta e como adullo sao ignorados como irrelevantes por essa imagem do homem No desenvol vimento da humanidade foram precisos milhares de anos para que 0 ho mem comelasse a compreender as relaloes entre os fenomenos naturais 0 curso das estrelas a chuva e 0 sol 0 trovao e 0 raio como manifestalOes de uma seqUencia de conexoes causais cegas irnpessoais inteiramente me clinicas e regulares Mas a personalidade fechada do homo philosophieus aparentemente percebe essa cadeia causal meciinica e regular quando adullo simplesmente abrindo os olhos sem precisar aprender coisa alguma sobre eia com seus semelhantes e de modo inteiramente independente do estagio de conhecimentos aIcanlado pela sociedade 0 processo 0 ser humano individual como urn processo de crescimento seres humanos reunidos como urn processo no desenvolvimento da humanidade e reduzido no pensa mento a urn estado Como adullo 0 individuo abre os olhos e nao s6 re conhece independentementc aqui e agora sem aprender nada com os de mais 0 que sao esses objetos que ve nao s6 sabe imediatamente 0 que deve classifie3r como animado e inanimado como mineral vegetal au ani mal mas sabe imediatamente no mesmo instante que estao Jigados causal mente de acordo com leis naturais A questao para os fil6sofos consiste meramente em saber se ele obtem esses conhecimentos de conexoes cau sais aqui e agora oa base de sua experiencia se em Qutras palavras essas conexiies sao uma propriedade de fatos observaveis fora dele ou se sao alguma caisa radicada oa natureza da razao humana e acrescentada de dentro do ser humano aD que nele cotra vindo de fora atraves dos 6rgaos dos sentidos Se partimos dessa imagem de homem do homo philo sophicus que nunca foi crianla e aparentemente chegou ao mundo como aduito nao ha como escapar do impasse epistemol6gico 0 pensamento oscila impotente entre 0 Cila do positivismo e 0 Caribde do apriorismo E assim se comporta exatamente porque 0 que e realmente observavel en quanto processo urn desenvolvimento do macrocosmo social no qual 0 de senvolvimento do microcosmo individual tambem pode ser observado e re duzido no pensamento a urn estado a urn ato de perCePlaO que ocorre aqui e agora Vimos aqui urn exemplo da forla iIilm que a incapacidade de con 238 o processo civilirador ceber processos a lange prazo isto e mudanas estruturadas nas configu raoes formadas por grande nlimero de seres humanos interdependentes ou de compreender os seres humanos que formam essas configuraOes est ligada a um certo tipo de imagem do homem e da sua percep9ao de si mesmo Pessoas para quem parece axiom9Jico que seu pr6prio ser ou ego ou 0 que mais possa ser chamado existe por assim dizer dentro delas isolOOo de todas as demais pessoas e coisas externas tem dificuldade em atribuir importlincia a esses fatos que indicam que os individuos desde 0 inlcio de sua vida existem em interdependencia dos outros Tem dificulda de em conceberas pessoas como relativa mas nao absolutamente auto nomas e interdependentes formando configura90es mutaveis entre si Uma vez que a primeira percep9ao de si mesmo parece autoevidente para aque les que a aceitam eles nao podem facilmente levar em conta fatos que demonstram que esse tipo de perceao esta por definiao limitado a so ciedades particulares que surge em conjunto com certos tipos de interde pendencia de la90s sociais entre pessoas em suma que e uma peculi ridade estrutural de um estagio especifico do desenvolvimento da civiliza ao correspondendo a urn estagio especifico de diferenciaao e individuali zaao de grupos humanos Se crescemes em um desses grupos nao pode mos facilmente imaginar que possa haver pessoas que nao se vivenciam dessa maneira como individuos inteiramente autosuficientes isolados de todos os demais seres e coisas Este tipo de autoperceao parece 6bvio um sintoma do estado humane eterno parece ter simplesmente a aulO percepao normal natural e univeal de todos os seres humanos A con cao do individuo como homo clausus um pequeno mundo em si mesmo que em ultima analise existe inteiramente independente do grande mundo externo determina a imagem do homem em geral Todo outro ser humane e igualmente visto como homo clausus Seu mlc1eo seu ser seu verdadeiro eu aparecem igualmente como algo nele que esta separado por uma parede invislvel de tudo 0 que e externo incluindo lodos os demais seres humanos A natureza dessa parede em si porem quase nunca e examinada e nunca e devidamente explicada Sera 0 corpo 0 vase que contem fechado em si 0 ser verdadeiro Sera a pele a fronleira entre 0 interno e 0 ex terno 0 que no homem e a capsula e 0 que e 0 conte6do A experien cia do interno e do externo parecem tao autoevidentes que essas quest6es raramente sao colocadas aparentemente nao requerem exame ul terior 0 indivlduo se satisfaz com a melMora espacial de interno e ex terno mas DaO faz nenhuma tentativa seria de localizar 0 interior no espa90 Embora esta omissao em investigar cada urn suas pr6prias pressu posioes dificilmenle seja apropriada ao procedimento cientifico tal ima gem preconcebida do homo clausus domina 0 palco nao s6 na sociedade em geral mas tambem nas ciencias humanas Seus derivatives incluem nao sO 0 lradicional homo philosophicus a imagem do homem da epistemolo apendice Z39 gia c1assica mas lambem 0 homo oeconomicus 0 homo psychologicus 0 homo historicus e nao menos 0 homo sociologicus em sua versao moder na As imagens do individuo traladas por Descartes Max Weber Parsons c muilos oulros soci6Iogos sao da mesma origem Como fil6sofos fizeram anles deles muilos soei6Iogos aceitam hoje esla aUlopercePlao e a imagem do individuo a ela correspondenle como base ainda que nao leslada para suas leorias Nao se afaslam dela ao examinaIa e a por em d6vida sua ade qualao Em conseqiiencia esse lipo de auloperCeplao e imagem do indi viduo ami6de coexiste sem modificalao com lenlalivas de abolir a redulao a eslados Em Parsons por exemplo a imagem eslalica do ego 0 alor individual 0 adullo abstraido do processo de creseimento coexistem sem nenhuma medialao com ideias psieanaHticas que ele absorveu em sua leo ria ideias que se relaeionam nao com 0 estado da vida adulta mas com o processo de tornarse adulto com individuo enquanto processo aber 10 na interdependencia indissoI6veI com outros individuos Como resultado as ideias dos te6ricos soeiais constantemente mergulham em heeos dos quais aparentemente nao h3 saida 0 individuo ou mais exalamente aquilo a que se refere 0 tual conceito de individuo reaparece uma vez ap6s outra como algo que existe fora da soeiedade Aquilo a que se refere o conceito de sociedade volta repetidamente como algo que exisle fora e alem do individuo Aparentemente temos escolha apenas entre abordagens teO ricas que apresentam 0 individuo como 0 que realmente existe alem da sociedade 0 autenticamente real sendo vista a sociedade como urna abstralao como algo que realmente nao exisle e outros enfoques te6ricos que colocam a sociedade como urn sistema urn fato social sui gene ri uma realidade de tipo peculiar para alem dos individuos No maximo poderemos como e ocasionalmente feito em uma solulao aparente do problema justapor as duas concePloes sem ligaIas a do individuo como homo clausus como ego como individuo para alem da soeiedade e a da sociedade como urn sistema extemo e para alem do indivfduo Mas com isto nao se elimina a incompatibilidade entre as duas conceploes A fim de superar esse becosem saida da sociologia e das eiencias soeiais em geral e necessario deixar clara a inadequalao de ambas as concePlOes a de individuos fora da soeiedade e igualmente a de uma sociedade fora de individuos Isto e dificil enquanto 0 senso de encapsulamenlo do ser den tro de si mesmo servir de base nao comprovada para a imagem do indivf duo e enquanto em conjunlo com islo os conceitos de indivfduo e so ciedade forem aceitos como se relaeionados com eslados imulaveis A armadilha coneeilual na qual estamos sendo conlinuamenle colhi dos par id6ias estaticas como individuo e usociedade 86 pode ser aber ta se como e fcllo aqui elas sao desenvolvidas ainda mais em conjunto com eSludos empiricos islo de maneira lal que os dois conceilos sejam levados a se referirem a processos Essa lentaliva porem e inieialmente 240 o processo civilizador bloqueada pela extraordiniiria conviao implantada nas sociedades eurl peias desde aproximadamente OS dias da Renascena peta autopercepao de seres humanos em termos de seu pr6prio isolamento da completa sepa raao entre seu interior e tudo 0 que e exterior Em Descartes a per cepao do isolamento do individuo que como ego pensante dentro de sua pr6pria caba confronta todo 0 mundo extemo e algo debilitada pela ideia de Deus Na sociologia moderna a mesma experiencia blIsica tern expressao te6rica no ego atuante que confronta as pessoas externas como outras A parte a monadologia leibniziana dificilmente se encontra na tradiao filos6ficosociol6gicaum unico enfoque do problema que parta da base de uma multiplicidade de seres humanos Leibniz que fez exata mente isso s6 0 conseguiu pondo sua versao do homo clausus as mona das sem janelas em relaaoumas com as outras atraves de uma constru ao metaflsica Ainda assim a monadologia constituiu um primeiro avano no rumo exatamente do tipo de modelo hoje tao necessario para 0 maior desenvolvimento da sociologia 0 passo decisivo dado por Leibniz foi urn ato de autodistanciamento que he permitiu formular a ideia de que a pessoa poderia experimentarse ou vivenciarse nao como um ego COn frontando todas as demais peswas e coisas mas como um ser entre outros Foi caracteristico do tipo predominante de experiencia em todo aquele pe ciado que a visao geocentrica do mundo da era precedente fosse substi tuida apenas na area da natureza inanimada por uma visao do mundo que exigia do sujeito de experiencia um grau mais alto de autodistanciamento a nao de que nao era ele 0 centro do mundo Na reflew do homem wbre si mesmo a visao geocentrica do mundo foi em grande parte preser vada na egocentrica que a substituiu No centro do universo humano ou assim pareceu situavase cada ser humano isolado como individuo inteira mente independente de todos os demais Nada e mais caractecistico da maneira incondicional como ainda hoje quando pensamos em Seres humanos 0 individuo separado e usado como ponto de partida do que 0 fato de que ninguem fala em homines sociolo gille ou oeconomiae quando se refere 11 imagem do homem nas ciencias so ciais mas sempre em um ser humano Unico homo sociologicus ou ooco nomicus Desse ponto de vista conceitual a sociedade Se apresenta final mente como urn conjunto de individuos inteiramente independentes entre si cuja verdadeira essencia esta aferrolhada no intimo de cada urn e que por conseguinte s6 se comunicam externamente e a partir rla superficie Temos que pedir ajuda a uma soluao metafisica como fez Leibniz se partindo de monadas humanas e extrahumanas sem janelas fechadas que remos justificar a ideia de que interdependencia e comunicaao entre elas ou a percepao pelos seres humanos da interdependencia e da comunica iio silo possiveis Estejamos ou no tratando de seres humanos em seus papeis como sujeitos confrontando objetos ou em seus papeis como apn4jce 241 individuos confrontando IIsociedade em ambos os casos 0 problema e apresentado como Se urn ser hurnano aduUo inteiramente isolado e auto suficiente isto e em uma forma que reflete a autopercepao predomi nante das pessoas na era moderua cristalizada em nm conceito objetivador constitufsse 0 marco de referencia 0 que e discutido e sua relaao COm algo fora dele concebido tal como 0 ser humano isolado como esta do com a natureza ou a sociedade Existe esse algo Ou e ele produ zido apenas por urn processo mental ou de qualquer maneira fundamen tado principalmente em urn processo mental IX Vejamos se conseguimos deixar claro qual e 0 problema que esta sendo realmente discutido aqui Nao estamos interessados em por em duvida a autenticidade da autopercepao que encontra expressao na imagem do bo mem como homo clausus e suas muitas variaoes A questao e se essa au topercepao e a imagem do homem na qual ela se cristaliza com grande espontaneidade e em reflexao pode servir de ponto de partida confiavel para uma tentativa de obter compreensao adequada do ser humano em geral e por conseguinte tambem de si mesmo pouco irnportando se essa tentativa e de natureza fil0s6fica ou sociol6gica Justificase esta e a questao colocar na base das leorias filos6ficas de percao e conhecimento e das teorias sociol6gicas e de outras ciencias humanas como suposiao axiomatica que nao admite outra explicaao a nitida linha divi s6ria entre 0 que esta dentro do bomem e 0 mundo exteruo urna di visao que freqiientemente aparece dada diretamente na autoconsciencia e que alem disso deitou profundas raizes nas traoes intelectuais e lin giiisticas europeias sem urn exame critico e sistematico de sua validade Esta conceNao tern exibido durante certo penodo de desenvolvlmen to uma extraordinaria persistencia encontrada nos trabalhos escritos de todos os grupos cujo poder de refledo e autoconsciencia atingiram urn estagio no qual as pessoas estao em condioes nao s6 de pensar mas tambem de estar conscientes de si mesmas e refletir sobre si mesmas como seres pensantes Ja era encontrada na filosofia platonica e em certo numero de outras escolas filos6ficas da antigiiidade A ideia do ser encapsulado conforme ja dissemos constitui urn dos leitmotifs recorrentes da filosofia moderna desde 0 sujeito pensante de Descartes as monadas scm janelas de Leibniz e ao sujeito kantiano do conhecimento que nunca pode romper inteiramente sua concha aprionstica para chegar a coisa em si ate 0 prolongamento mais recente da mesma ideia basica 0 individuo inteira mente autosuficiente para a16m da perspectiva do pensamento e da per cepiio reificados em entendimento Verstand e razao Vermunft ate 0 inteiro User do homem sua existencia nas numerosas versoes da filosofia existencialista ou ate a aao humana enquanto ponto de partida o processo civilizador da teoria social de Max Weber por exemplo 0 qual inteiramente de acordo com a cisao acima mencionada fez a tentativa nao de todo bem sucedida de estabelecer uma distinao entre aao social e aao nao social ista e presumivelmente uma aao puramente individual Mas fanamos uma ideia muHo inadequada da natureza dessa autoper ceao e imagem do homem se elas fossem compreendidas apenas como ideias encontradas em trabalbos eruditos A falta de janelas nas monadas os problemas que cercam 0 Iwmo clausus 0 que urn homem como Leibni7 tenta tornar pelo menos suportavel com soluao especulativa indicando possibilidade de rela6es entre elas isso hoje e aceito como evidente por si mesmo e nao apenas por eruditos Esta autopercepao tambem se encon tra em forma menos racionalizada na literatura de ficao como por exemplo no lamento de Virginia Woolf sobre a incomunicabilidade da ex periencia como causa da solidao humana Ou tambem se encontra no con ceilo de alienaao usado nas ultimas decadas com freqUencia crescente tanto dentro como fora da literatura nas mais diferentes varia6es Nao deixaria de ser interessante verificar de forma mais sistematica se e em que medida as grada6es e varia6es desse tipo de autopercepao se estendem aos virios grupos de elite e aos estratos mais amplos das sociedades mais desenvolvidas Mas os exemplos sao achamos suficientes para indicar como e persistente e aceito como natural nas sociedades da Europa moderna a impressao das pessoas que seu pr6prio ser sua verdadeira identida de sao como que coisas fechadas dentro delas separadas de todas as outras pessoas e coisas externas embora conforme ja mencionado ninguem ache tao simples assim mostrar claramente onde e 0 que sao essas paredes ou barreiras que confinam 0 ser interno como urn vasa confina seu conteudo e 0 separa do que esta fora Estaremos nos acaso tratando como tantas vezes parece ser de uma experiencia eterna fundamental de todos os seres humanos que nao admite qualquer outra explicaao ou apenas do tipo de autoperceao que caracteriza urn certo estagio no de senvolvimento de configura6es formadas por pessoas e das pessoas que as formam No contexto deste livro a dlscussao desse complexo de problemas re vestese de uma significaao dupla Por urn lado 0 processo civilizador nao poile ser compreendido enquanto nos apegarmos a esse tipo de auto percepao e considerarmos a imagem do homo clausus como axiomatica nao sujeita a discussao como fonte de problemas Por outro a teoria de civilizaao desenvolvida neste estudo oferece urn metodo para a soluao desses problemas A discussao desta imagem do homem serve em primeiro lugar para aumentar a compreensao do estudo que se segue sobre 0 processo civilizador F posslvel contudo que 0 leitor possa obter uma me lbor compreensao desta discussao introdut6ria do angulo do fim deste livro isto e de urn quadro mais abrangente do processo em causa Bastara indi 7 apendice car aqui a Iigaao que existe entre os problemas colocados pelo conceito de homO clausus e 0 processo civilizador Podemos ter uma ideia clara e simples dessa ligaao bastando lembrar primeiro a mudana na autoperceao que foi influenciada pelo abandono da visao geocentrica do mundo Muitas vezes essa transiao e apresentada simplesmente como urna revisao e ampliaao ou prolongamento dos co nhecimentos que havia sobre os moyimentos das estrelas Mas e 6bvio que essa mudana na concepao das cpnfiguraoes estelares nao teria sido pos sivel se a imagem prevalecente do homem nao houvesse sido seriamente abalada enquanto tal se as pessoas nao se houvessem tornado capazes de se enxergar a uma luz diferente da anterior De muita importancia para os homens em toda a parte e aquele modo de experiencia mediante 0 qual eles se colocam no centro dos assuntos publicos nao apenas como indivi duos mas como grupos A visao geocentrica do mundo e a expressao desse egocentrismo espontaneo e irrefletido do homem e ainda e inequivocamente encontrada hoje nas ideias de pessoas situadas fora do reino da natureza como por exemplo os modos socio16gicos de pensamento centrados na nalio ou no individuo isolado A experiencia geocentrica ainda e acessivel mesmo hoje a qualquer pessoa como um plano possivel de percepao SO que nao mais constitui o plano dominante de percepao no pensamento publico Quando dizemos e na verdade vemos que 0 sol nasce no leste e se poe a oeste espon taneamente vivenciamos a nOs mesmos e a terra em que vivemos como a centro do cosmos como 0 quadro de referencia para os movimentos das estrelas Nao foram sirnplesmente as novas descobertas 0 aumento cumu lativo dos conhecimentos sobre as objetos da reflexao humana que se fi zeram necessarios para tornar possivel a transieyao de uma visao do mundo de geocentrica para heliocentrica 0 que foi necessario acima de tudo foi urn aumento na capacidade do homem para se distanciar mentalmente de si mesmo Modos cientificos de pensamento nao podem ser desenvolvidos nem se tomar geralmente aceitos a menos que as pessoas renunciem a sua inclinaao primaria irreflelida e espontanea a compreender todas as suas experiencias em termos de seu prop6sito e significado para si mesmas 0 desenvolvimento que levou a urn conhecimento mais profundo e ao cres cente controle da natureza foi por conseguinte se considerado deste as pecto tambm 0 desenvolvimento no sentido de maor autocontrolc pelo homem Nao e possivel entrar em mais detalhes aqui sobre as ligaoes entre o desenvolvimento do metoda cientifico pelo qual se adquire conhecimento de objetos por um lado e 0 desenvolvimento de novas atitudes do homem para consigo mesmo novas estruturas de personalidade e especialmente mudaneyas ruffio a urn maior cantrale das emoey5es e autodistanciamento pot outro Talvez contribua para a compreensao destes problemas lembrar 244 o processo civilitador i a egocentrismo espontaneo irrefletido de pensamento que podemos obser var a qualquer momento nas crianas de nossa propria sociedade Um con trole mals rigoroso das emoijes desenvolvido em sociedade e aprendido pelo individuo e acima de tudo um grau mais alto de controle emocional autonomo foi necessario para que a visao do mundo centralizada na terra e nas pessoas que nela vivem fosse superada por outra que como a visao heliocentrica concorda melbor com os fatos observaveis mas que era de inicio menos gratificante emocionalmente porquanto tirava 0 homem de sua posiao no centro do universo e 0 colocava em um dos muitos plane tas que revolvem em torno do centro A passagem da compreensao da na tureza legitimada pela fe tradicional para outra baseada na pesquisa cien tifica e a mudan rumo a maior controle emocional que essa passagem acarretou e um aspecto do processo civilizador que no estudo que ora republico examino a partir de outros aspectos Mas naquele estagio particular do desenvolvimento desses instrumen tos conceituais de estudo da natureza extrahumana mais relacionados ao objeto do que ao sujeito porem visivelmente nao era possivel ineluir no estudo e menos ainda estudar enquanto tal esta propria mudana civiliza dora 0 movimento em dirao a um autocontrole mais forte e mais inter nalizado que estava ocorrendo no proprio homem 0 que estava aconte cendo nos seres humanos i medida que aumentavam sua compreensao da natureza permaneceu de inicio inacessivel i introvisao cientifica Nao e das menores caracteristicas daquele eslagio de autoconseiencia que as teo rias elassicas do conhecimento que 0 representavam lenham se preocupado muito mais com os problemas do objeto do conhecimento do que com 0 sujeito do conhecimento mais com a perceao do objeto do que com a autopercepao Mas se estes ultimos nao sao incluidos desde 0 inicio no equacionamento dos problemas epistemologicos entao este proprio equa cionamento leva a um impasse de allernativas igualmente inadequadas o desenvolvimento da ideia de que a terra gira em torno do sol de uma maneira puramente mecanica de acordo com leis naturais ista e de uma maneira que de forma alguma e determinada por qualquer finali dade referfda i humanidade e por conseguinte nao mais possui qualquer notavel importancia emocional para 0 homem pressupunha e exigia ao mesmo tempo urn desenvolvimento nos pr6prios seres humanos no senti do de aumento do controle emocional maior conteao da sensaao es pontanea de que tudo 0 que experimentassem e tudo que lhes dissesse res peito expressavli uma inlenao urn destino uma finalidade que se relacio nava com eles prOprios Agora na epoca que chamamos de moderna os homens chegaram a um eslgio de autodistanciamento que lbes permite conccber as processos naturais como uma esfera autonoma que opera sem intenao finalidade ou destino em uma forma puramente mecanica ou causal e que tem significaao ou finalidade para eles apenas se estiverem aplndice 245 L em condioes atraves do conhecimento objetivo de controlalos e desta maneira darlhes significado e finalidade Mas nesse estagio ainda nao sao capazes de se distanciarem 0 suficiente de si mesmos para tornarem seu pr6prio autodistanciamento sua pr6pria contenao de em6es em suma as condi6es de seu pr6prio papel como 0 sujeito da compreensao cientifica da natureza objeto do conhecimento e da indagaao cientffiea Encontramos aqui uma das chaves para entender por que 0 problema do conhecimento cientffico assumiu a forma hoje familiar da epistema logia europia classiea 0 distanciamento do sujeito pensante face a seus objetos no ato do pensamento cognitivo e 0 controle emocional assim re querido nao pareceu aos quepensaram nesse assunto em tal estagio como um ato de distanciamento mas como uma distancia realmente existente como uma condiao eterna de separaao espacial entre 0 aparelho mental aparentemente fechado dentro do homem enquanto entendimento ou razao e os objetos externos separados dele por uma parede invisivel Se antes virnos como os ideais podem transformar coisas despercebi das em alguma coisa realmente existente como 0 deve se transforma no aqui nos vemos perante urna reificaao de tipo diferente 0 ato de distanciamerito conceitual dos objetos do pensamento que qual quer reflexao mais emocionalmente controlada envolve que as observa oes e 0 pensamento cientifico em particular exigem e que ao mesmo tempo as torna possiveis aparece a autopercao neste estagio como uma distancia que existe de fato entre 0 sujeito pensante e os objetos de sen pensamento E 0 maior controle de impulsos afetivos diante dos objetos de pensamento e de observaao que acompanha todos os passos no sentido de maior distanciamento conceitual aparece neste momenta na autoper ceao das pessoas como uma grade que existe realmente e que separa e exclui 0 ser razao ou existencia dependendo do ponto de vista do Mundo externo ao indivfduo o fato de que e em parte a razao por que a partir de fins da Idade Media e principios da Renascena tenha havido uma mudanga particular mente forte no autocontrole individual acima de tudo 0 fortalecimento de um autocontrole que atua independentemente de agentes extcmos como um automatismo autoativador reveladoramente chamado hoje de interna lizado e apresentado em mais detalhes e de outras perspectivas no es tudo que se segue A transformagao de compulsao externa interpessoal em compulsao interna individual que agora continua a aumentar leva a uma situagao em que muitos impulsos afetivos nao podem ser mais vivenciados tao espontaneamente como antes Os autocontroles individuais auti omos criados dessa maneira na vida social tais como 0 pensamento racional e a consciencia moral nesse momento se interp5em mais severamente do que nunca entre os impulsos espontaneos e emocionais por um lado e os musculos do esqueleto por outro impedjndo mais eficazmente os primei 246 o processo civiizador ros de comandar os segundos isto e de polos em aiio sem a permissao desses mecanismos de controle Esse e 0 nucleo da mudana estrutural e nas peculiaridades estruturais do indivlduo que se refletem na autopercepao da Renascena em diante na nao de um ego individual fechado em seu receptaculo no ser se parado por uma parede invisivel do que acontece no lado de fora Sao esses autocontroles eivilizadores funcionando em parte automaticamente que agora sao experimentados na autoperceao individual como uma parede quer entre 0 sujeito e 0 objeto quer entre seu pr6prio eu e as de mais pessoas sociedade A mudana no rumo de urna maior individualizaao ocorrida durante a Renascena e muito conhecida Este estudo tra um quadro algo mais detalhado desse fenomeno em termos de estrutura de personalidade Si multaneamente indica conexoes que ainda nao foram devidamente escla recidas A transiao da experiencia da natureza como paisagem em frente ao observador da experiencia da natureza como objeto de percao se parado de seu sujeito como por uma parede invisivel a transiao da auto perceao intensificada do individuo como enlidade inteiramente autosu ficiente independente e separada de outras pessoas e de coisas estes e mnitos outros fenomenos da epoca exibem as meSmas caracteristicas estru turais da mesma mudana civilizadora Todos eles mostram as marcas da transiao para um estagio ulterior de autoconscieneia no qual 0 autocon trole embutido das emoes tomase mais forte e maior 0 distanciamento reflexivo enquanto a espontaneidade da aao afetiva dirninni e no qual as pessoas sentem essas suas peculiaridades mas ainda nao se distaneiam o suficiente delas em pensamento para fazerem de si mesmas um objclo de investigaao Chegamos assim um pouco mais perto do centro da estrutura da per sonalidade individual subjacente a experieneia de si mesmo do homo clau sus Se perguntamos mais uma vez 0 que realmente deu origem a esse conceito de individuo como encapsulado dentm de si mesmo separado de tudo 0 que existe fora dele e 0 que a capsula e 0 encapsulado rea1 mente siguificam em termos humanos podemos ver agora a dirao em que deve ser procurada a resposta 0 controle mais firme mais geral e uniforme das emooes caracteristico dessa mudana eivilizadora juntamen te COm 0 aumento de compuls6os idtemas que mais implacavelmente do que antes impedem que todos os impulsos espontaneos se manifestem di reta e motoramente em aao sem a intervenao de mecanismos de con trole sao 0 que e experimentado como a capsula a parede invisivel que separa 0 mundo interno do indivfduo do mundo externo ou em dife rentes versoes 0 sujeito de cogniao de seu objeto 0 ego do outro 0 individuo da sociedade 0 que esta encapsulado sao os impulsos ins tintivos e emocionais aos quais e negado acesso direto ao aparelho motor apOndice Eles surgem na autopercepao como 0 que e ocultado de todos os demais e nao raro como 0 verdadeiro ser 0 nucleo da individualidade A expres sao 0 homem interior e urna metMora conveniente mas que induz em erro Ha boa razao para dizer que 0 cerebro humano se localiza dentro do cranio e 0 coraao dentro da calxa toracica Nestes casos podemos dis tinguir elaramente 0 continente do conteudo 0 que se localiza dentro de paredes e 0 que fica fora e em que consistem as paredes divis6rias Mas se as mesmas figuras de ret6rica forem aplicadas a estruturas de persona lidade elas se tomam impr6prias A relaao entre controle de instintos e impulsos instintivos para mencionar apenas um exemplo nao e uma re laao espacial 0 primeiro nao tem a forma de urn vaso que contenha 0 segundo lIa escolas de pensamento que consideram os mecanismos de controle a consciencia ou razao como mais importantes e ha outras que atribuem maior importancia aos impulsos instintivos ou emocionais Mas se nao estamos dispostos a discutir sobre valores se limitamos nossos es foros a investigaao do que existe descobrlmos que nao ha aspecto estru tural no homem que justifique chamarmos uma coisa de nueleo do homem e outra de casca Rigorosamente falando todo complexo de tensiies tais como sentimentos e pensamentos au comportamento espontaneo e contro lado consiste de atividades humanas Se em vez dos habituais conceitos substancia como sentimentos e razao usarmos conceitos de atividade fica mals facil compreender que embora a imagem de externo e inter no de casca de urn receptaculo contendo algo dentro seja aplicavel a aspectos fisicos do ser humano ela nao pode ser aplicada a estrutura da personalidade ao ser humano vivo como urn todo Neste nivel nada ha que lembre urn continente nada que possa justificar metiiforas como a que fala do interno de um ser humano A intuiao da existencia de uma parede de alguma coisa dentro do homem separandoo ilo mundo ex terno par moos genuina que possa ser como intuiao nao corresponde a nenhurna coisa no hornem que tenha 0 carater de urna real parede Lem brarnos que Goethe disse certa vez que a natureza nao tern nueleo nem casea e que nela nao hii interno nem externo Isto tambern e verdade para as seres humanos Por urn 1000 portanto a teoria de civilizaao que 0 estudo seguinte tenta formular ajudanos a ver a imagem enganosa do homem no que cha mamos de era moderna como menos evidente por 8i mesma e a distan darnos dela de modo que se possa comar a trabalhar uma imagem do homem menos orientada pelos sentimentos da pr6pria pessoa e Pelos jufzos de valor a eles atribuidos do que para os homens enquanto objeto concre to de pensamento e observao Por outro e necessaria uma critica a mo derna irnagem do homem para que possarnos compreender 0 processo d VlIizador Isto porque no curso deste processo muda a estrutura dos seres o proceuo civilitador humanos individuais que se tomam mais civilizados E enquanto enca ramIOS 0 ser humano individual como urn continente fechado com uma caSca extema e urn nucleo escondido no seu interior naopoderemoo com preender urn processo civilizador que se prolongapor varias geraoes no curso das quais a estrutura da personalidade do ser humane individual muda sem que mude a natureza dele Isto deve bastar aqui como introdao a urna reorientaao da auto consciencia individual e ao resultante desenvolvimento da imagem do ho mem sem os quais fica muito limitada nossa capacidade de conceber urn processo civilizador ou urn processo de lange prazo que envolva estruturas sociais e de personalidade Enquanto 0 conceito de individuo estiver ligado a autopercepao do ego em urna gaiola fechada dificilmente poderemos conceber a sociedade como outra coisa que urn conjunto de monadas sem janelas Conceitoscomo estrutura social processo social ou de senvolvimento social parecem enta na melhor das hip6teses criaoes ar tificials dos soci610gos como as construoes ideal tipicas de que os cien tistas necessitam para instaurar alguma ordem pelo menos no pensamento no que parece em verdade ser uma acurnulaao inteiramente desorgani zada e desestruturada de agentes individuais absolutamente independentes Como se ve 0 real eSlado de coisas e 0 exato oposto A ideia de individuos decidindo agindo e existindo com absoluta independencia urn do outro e urn produto artificial do homem caracteristico de urn dado estagio do desenvolvimento de sua autopercepao Depende parcialmeute de urna confusao de ideais e fatoo e ate certo ponto da materializao de mecanismos de autocontrole individuais da separaao dos impulsos emo cionais individuais frente ao aparelho motor do controle direto sobre os movimentos corporais e as aoes Esta autopercepao em termos do pr6prio isolamento da parede invi sivel que separa 0 ser interior de todas as pessoas e coisas extemas tem para grandenUmero de pessoas na era moderna a mesma fora ime diata que a convicao de que 0 sol girava em tome de uma terra situada no centro do cosmos possuia na Idade Media Tal como antes a visao geocen trica do universo fisico a imagem egocentrica do universo social certamen te podera ser vencida por uma visao mais realista embora emocionalmente menos atraente A emoao pode persistir ou nao e questao aberta ate que ponto 0 sentimento de isolamento e alienaiao pode ser atribuido a inepcia e ignorancia no desenvolvimento de autocontroles individuals e ate que ponto as caracteristicas das sociedades avanadas Da mesma forma que a predominancia publica de imagens emocionalmente menos atraentes de urn universo fisico nao centrado na terra nao apagou inteiramente a experien cia autocentrada mais privada do sol como girando em tome da terra a ascensao de urna imagem mais objetiva do homem no pensamento pUblico talvez nao apague necessariaIllente a experiencia centrada no ego de uma QlIndice 249 parede invisivel a separar 0 mundo interior de cada um do mundo ex temo Mascertamente nlio e impossivel desalojar essa experiencia e a imagem do homem a ela correspondente de sua aceitalio axiomatica nas pesquisas em ciencias humanas Neste volume e no que se segue podemos ver pelo menos os comeos de uma imagem do homem que concorda me Ihor com observaOes imparciais e por esta razlio facilita 0 acesso a pro blemas que com os do processo civilizador ou de construlio de Estados permanecem mais ou menos inacessiveis do ponto de vista da velha imagem do homem ou que como 0 problema da relalio entre individuos e socie dade continuamente dlio origem desse ponto de vista a soluoes desne cessariamente complicadas e nunca inteiramente satisfat6rias A imagem do homem como personalidade fechada e substituida aqui pela de personalidade aberta que possui um maior ou menor grau mas nunca absoluto ou total de autonomia face a de outras pessoas e que na realidade durante toda a vida e fundamentalmente orientada para outras pessoas e dependente delas A rede de interdependencias entre os seres humanos e 0 que os liga Elas formam 0 nexo do que e aqui chamado con figuralio ou seja uma estrutura de pessoas mutuamente orientadase de pendentes Vma vez que as pessoas slio mais ou menos dependentes entre si inicialmente por alio da natureza e mais tarde atraves da aprendizagem social da educalio socializalio e necessidades reciprocas socialmente ge radas elas existem poderiamos nos arriscar a dizer apenas como plurali dades apenas como configuraoes Este 0 motivo por que conforme afir mado antes nlio e particularmente frutffero conceber os homens a imagem do homem individual Muito mais apropriado sera conjecturar a imagem de numerosas pessoas interdependentes formando configuraoes isto e gru pos ou sociedades de tipos diferentes entre si Vista deste ponto de vista blisico desaparece a cislio na vislio tradicional do homem 0 conceito de configuralio foi introduzido exatamente porque expressa mais clara e ine quivocamente 0 que chamamos de sociedade que os atuais instrumentos conceituais da sociologia nao sendo nem uma abstralio de atributos de individuos que existem sem uma sociedade nem urn sistema ou totali dade para alem dos individuos mas a rede de interdependencias pOI eles formada Certamente e possivel falar de urn sistema social formado de in dividuos Mas as conotaoes associadas ao conceito de sistema social na sociologia modema fazem com que patea fOIada essa expresslio Alem do mais tabilidade0 conceito do sistema e prejudicado pela ideia correlata de imu o que temos em mente com 0 conceito de configuraao pode ser con venientemente explicado com referencia as danas de sallio Elas slio na verdade 0 exemplo mais simples que poderiamos escolher Pensemos na mazurca no minueto na polonaise no tango ou no rocknroll A imagem de configuraoes moveis de pessoas interdependentes na pista de dana talvez tome mais facH imaginar Estados cidades familias e tambem sis temas capitalistas comunistas e feudais como configura90es Usando eSle conceito podemos eliminar as antiteses chegando finalmente a valores e ideais diferentes implicados hoje no uso das palavras individuo e so ciedade Certamente podemos falar na dan9a em termos gerais mas nin guem a imaginara como wna estrutura fora do individuo ou como wna mera abstra9ao As mesmas configura90es podem certamente ser dan9adas por diferentes pessoas mas sem uma pluralidade de individuos reciproca mente orientados e dependentes nao ha dan9a Tal como todas as demai configura90es sociais a da dan9a e relativamente independente dos indivi duos especfficos que a formam aqui e agora mas nao de individuos como tais Seria absurdo dizer que as dan9as sao construoes mentais abstraidas de observa90es de individuos consideradosseparadamente 0 mesmo se aplica a todas as demais configura90es Da mesma maneira que as peque nas configura6es da dan9a mudam tomandose ora mais lentas ora mais rapidas tambem assim gradualmente ou com maior subitaneidade acontece Com as conigura90es maiores que chamamos de sociedades 0 estudo que se segue diz respeito a essas mudan9as Desta maneira 0 ponto de partida para 0 estudo do processo de forma9ao do Estado e uma COll figuraao constituida de nwnerosas unidades sociais relativamente peque nas em livre competi9ao wnas com as outras A investigaao mostra como e por que essa configura9ao muda Demonstra simultaneamente que ha ex plica90es que nao revestem 0 carater de explica90es causais Islo porque uma mudana na configura9ao e explicada em parte pela dinamica end6 gena dela mesma a tendencia a formar monop6lios que e imanente a uma configurao de unidades liwemente competitivas entre si 0 estudo mos tra por conseguinte como no curso dos seeulos a configura9ao inicial se transforma em outra naqual essas grandes oportunidades de poder mo nopoHstico sao ligadas a uma unica posi9ao social a monarquia e nenhum ocupante de qualquer outra posi9ao social na rede de interdepen dencias pode competir com 0 monarca Ao mesmo tempo indica como as estruturas de personalidade dos seres humanos mudam tambem em con junto com essas mudan9as de configura9ao Numerosas questoes que merecem ser abordadas em uma introduao tiveram que ser omitidas aqui De outra forma a introdu9ao teria se trans formado em urn volume separado Limitadas como sao contudo estas re flexoes mostram talvez que a compreensao do estudo que se segue requer uma reorienta9ao muito extensa do pensamento e imagina9ao sociol6gicos hojepredominantes Certamente nao e facil a ninguem distanciarse da ideia de si mesmo e de todo ser hwnano individual como sendo urn homo clau sus Mas sem distanciarse dessa ideia ninguem pode de maneira nenhu rna compreender 0 que se tem em mente quando urn processo civilizador e referido comouma transforma9ao de estruturas individuais Analogamen 250 o processo civilizador r apbufice 251 te nao e faeU desenvolver tanto a eapacidade imaginativa que a pessoa seja eapaz de pensar em eonfiguraoes e alem disso em eonfiguraoes eujas earaeteristieas normais ineluem uma tendneia para mudar as vezes ate em uma dirCao espeeffiea Nesta introduao me propus diseutir alguns problemas fundamentais que easo nao houvessem sido diseutidos teriam criado ohstaeulo II eom preensao deste Iivro As ideias aqui expandidas nao sao absolutamente sim ples embora me tenha esforado para apresentaIas de maneira a mais simples possive Espero que possam faeiIitar e aprofundar a eompreensiio e talvez tambem 0 prazer proporcionado por este Iivro Leicester julho de 1968 NE Notas CAPITULO UM 1 Oswald Spengler The Decline of the West Londres 1926 p 21 A todas as culturas se abrem possibilidades novas de expressao que surgem amadurecem de cacm e nunes mais voltam Essas cuIturas essencias vitais sublimadas crescem com a rnesma saberha falta de prop6sito das flores do campo Pertencem como as plantas e as animais a Natureza viva de Goethe e nao a Natureza morta de New ton 2 Toda a questao da evolucao dos conceitos de Kultur e Zivilisation precisa de uina analise mais extensa do que e passive1 aqui oode 0 problema 86 pade seT bre vemente colocado Nac obstante algumas oolas podem fortalecer as ideias expostas no textc POOese demonstrar que no sceula XIX e particularmente ap6s 1870 epoca em que a Alemanha era forte na Europa e tambCm potncia colonial em expansao re duziuse consideravelmente em algumas ocasioes a antitese entre as duas palavras referindase cuItura como ocorre hoje na Inglaterra e ate certo ponto na Franca apenas a urna Area particular ou forma mais alta de civilizacao Assirn por exemplo Friedrich Jodi no seu Die Kulturgeschitchtschreibung Halle 1878 p 3 define a hist6ria cultural geral como a hist06ria da civilizacao cf tambem ibid p 25 GP Kolb em sua Geschichte der Menschheit und der Cultur 1843 e em uma edicao posterior que tern 0 titulo CulturGeschichte der Menschheit inclui em seu conceito de cultura a idia de progresso que em gersl hoje excluida da mesma Baseia ele sua concepciio de Kultur explicitamente no conceito de Zivilisation de Buckle Mascomo diz Jodi Die Kulturgeschichtschreibung p 36 0 ideal de Kolt retira seus aspectos essenciais de concepcQes e condi moderna no tocante a Ii berdade politica social e religiosa e poderia ser facilmente incluido em urn progra rna polftico partidlirio Em outras paIavras Kolb 6 urn progressista urn liberal do periodo anterior a 1848 poca esta em que 0 conceito de Kultur tamMm se aproximava do conceito ocidental de civilizaCiio Apesar disso a edicao de 1897 do Konversationslexicon de Meyer ainda declara Civilizacio 0 estligio pelo qual tern qUe passar urn povo bArbaro a fim de atiJlgir uma Kultur mais aIta em industria arte ciencia e atitudes Por mais que 0 conceito alemlio de Kultur pareea As vezes Be aproximar do con ceito frances e ingles em tais afinnacoes 0 sentimento de q Zivilisation 6 urn valor de segunda classe em comparaeao com Kultur nunes desaparece inteiramente na Aleanha mesmo nesse perfodo E uma manifestacao de afirmacao da Alema nha contra os pafses ocidentais que se cnsideram como os portaestandartes da civi lizacao e da tensao entre eles Sua fora muda com 0 grau e tipo dessa tensao A hist6ria dos conceitos alernaes de Zivilisation e KultUT estli intimamente interligada notas 253 com a hist6ria das reiacOes entre a Inglaterra Franca e Alemanha Seus constituin tes sio certas circunstancias poUticas que persistiram atraves de muitas fases de de senvolvimento emergindo tanto na constituicao psico16gica dos alemaes como em seus conceitos e acima de tudo nos que IheB expressam a autoimagem Cf tamm Conrad Hermann Philosophie der Geschichte 1870 onde se refere a Franca como 0 pais da civilizacao a Inglaterra como 0 da cultura material e a Alemanha como 0 da Bildung ideal A cxpressao cultura material corrente na Inglaterra e Franca virtualmente desapareceu do uso alemao comum ainda que nao de todo da terminologia erudita 0 conceito de Kultur fundiuse por completo n fala comum com 0 que aqui e chamado de deale Hildung Os ideais de Kultur e Bildung sempre foram estreitamente relacionados embora a referencia a realizacOes humanas objetivas tenha se tornado gradualmente mais importante no conceito de Kultur 3 Sobre 0 problema da intelligentsia ver em particular K Mannheim Ideology and Utopia An Introduction to the Sociology oj Knowledege Londres 1936 S bre 0 mesmo assunto consultar tambCm K Mannheim Man and Society in an Age 01 Reconstruction Landres 1940 e H Weil Die Entstehung des Detschen Bildung prinzips Bonn 1930 Cap S 4 Grosses voflstiinndiges UniversalLexikon oller WissenschJten und Kunste Leip zig e Halle loh H Zedler 1736 fodos os itlicos nas citacoes sao do autor Cf tambCm 0 verbete Cortesao Pessoa que serve em uma posiCao de respeito na corte de urn principe A vida na corte sempre foi descrita por urn lado como perigosa devido ao favor capri choso do principe as muitas pessoas invejosas aos caluniadoreB ocultos e aos inimi gos declarados e por outro como depravada dadas a ociosidade a lascivia e 0 luxo freqtientemente associados a ela Em todos os tempos porem houve cortesaos que prudentemente evitaram euas armadilhas e vigitantemente escaparam das tenta da iniqUidade e assim foram dignos exemplos de cortesios fcHzeB e virtuosos Apesar disso nao se diz sem certa rwo que mais perto da corte mais perto do demonio Cf tamlem 0 verbete Corte Se todos Os Sl1ditos estivessem profundamente convencidos de que honravam seus principes por seus meritos internos nao haveria necessidade de pompa externa Da forma como sao as caisas contudo a maior parte des suditos permanece apegada a extemalidades Urn principe continua a ser 0 mes mo ande sozinho ou cercado de grande cornitiva Nao obstante nio faltam exem plos de cas05 em que 0 priticipe atraiu pouca ou nenhuma atencao circulando sozi nho entre seus suditos mas foi recebido de maneira inteiramente diferente quando agiu de acordo com sua posiio Por esta rwo e necessArio que 0 principe tenha servidores nao s6 para governar a terra mas tamMm por raz6es de apar1cia ex tema e para seu pr6prio servico Ideias semelhantes js haviam sido expressadas no seculo XVII como por exemplo no Discurs vd Holflichkeit 0665 cr E Cohn Gesellschajtsideale und Gesellschafts roman des 17 Johrhunderts BerlimJ 1921 p 12 0 contraste alemao entre corte sia extema e merito interno 6 tAo ve1ho quanta 0 absolutismo alemiio e quanto a fraqueza social da burguesia nacional perante os circulos de corte do perlodo fra queza esta que deve ser eIitendida Dio menos em relacao A for9a particular da bur guesia na rase precedente 5 Citado por Aronson Lessing et les classiques franfais Montpellier 1935 p 18 6 E de Mauvitlon Lettres jranraises et germaniques Landres 1740 p 430 7 Ibid p 427 8 Ibid pp 461462 9 Reproduzido no Deutsche Literaturdenkmale Heilbronn 1883 vol 16 254 o processo cillilizador 10 Cf Arnold Berney Friedrich der Ore Tubingen 1934 p 71 11 Cf Httner Geschichte der Literalur 18 lahrhundert vot 1 p 10 4Nio se pode Degar que 0 testra frances 6 Da sua essencia mals profunda 0 drama da corte o drama da etiqueta A prerrogativa de ser um hei tr4gico estA liaada a mais ri gorosa etiqueta da corte 12 GE LeIsing Briefe GUS dem zweiten Teil der Schriften Goschen 1753 ci tado em Aronson Lessing p 161 13 Eats referenda e as que se Beguem foram extrafdas de Lamprecht Deutsche Geschichte Freiburg 1906 vol 8 pte I p 195 14 Mauvillori Lellres PP 398 e sep IS Sophie de 18 Roche Geschichte des Fraulein von Sternheim 1771 Berlim Kuno Ridderhoff 1907 16 No Nachlass de Herder vol 3 pp 6768 17 Sophie de 18 Roche Fraulein von SternheimJ p 99 18 Ibid p 25 19 Ibid p 90 20 Caroline von WallOpn Agnes von Lilien pubticado nas Horen de Schiller 1796 publicado como Iivro em 1798 Um curto fragmonto fui reproduzido no Deutsche NationalLiteralu Berlim e Stuttgart vot 137 p 2 a citacio 6 cia p 375 21 Ibid p 363 22 Ibid p 364 23 Grimms Wjerbuch verbete Hofleute cortesio 24 Ibid 2S Brunot na sua Hidoire de 10 langue ranrase cita 0 U80 cia palavra civilisQtion por Turgot Mas nao pareee inteiramente certo que 0 pr6prio Turgot tenha uaado essa palavra Foi impossvel encontrala em uma pesquisa leita em SU88 obras com uma 6nica exceo no fndice Its edic6es de Dupont de Nemours e de Schelle Mas esse Iodice geral provavetmente roi organizado nao por Turgot mas par Dupont de Nemours Se contudo procuramos nia a palavra mas a id6ia e 0 significado de lato material 8uficiente encontramos no Turgot de 1751 E talvez nia aeja ocioso citar ista como Urn exemplo de como certs ideia se forma na mente do pessoas com base em certas experiancias e depois gradualmente urna palavra especffica associase a easa idia a essa Area conceitual Niio foi por acaso que em sua edio de Turgot Dupont de Nemour deu como conteudo da seao mencionada 0 titulo La civilisation et la nature Ba13 so con tern a antiga id6ia de civilizao it qual a palavra gradualmente passou a se referir Urna carta de apresentacao it editora das Lettres dune peruvienne Madame de Graffigny da a Turgot a oportunidade de expressar suu idias sobre a relaio en tTe 0 selvagern e 0 homme police Oeuvres de Turgot ed G Scbelle Paris 1913 vol 1 p 243 A peruana devia estudar diz ele as vantagena reclprocas do selva gem e do homme police Preferir 0 selvagem 6 uma afirmaio ridfcula Que eia 8 refute que cIa mostre que Os vlcios que acham08 SCI produto da politesse sio matos 80 coraio humano ADos mais tarde Mirabeau utilizaria 0 termo civilisation maia abrangentc e mais dinAmico no mesmo scntido em que Turgot utitiza aqui 0 termo politesse embera com uma avaliaio oposta 26 Sobre este e pontos subseqiientes vcr 1 Moras Ursprung und Enlwicklung des Berils Zivilisation in Frankreich 17561830 em Hamburger Studien zu Volksturn und Kultur der Romonen Hamburgo 1930 vol 6 p38 27 Ibid p 37 noas 255 L 28 Ibid p 36 29 cr Lavisse Hilloire de France Paris 1910 vol 9 pte I p 23 30 cr Moras Ursprun p 50 31 Baron dHolbach Systeme cia ou principe nalurei de la morale et de 10 polilque Loodres 1774 vol 3 p 113 citado em Moras Ursprung p 50 32 Baron dHolbach Sylltme p 162 33 Voltaire Sieele de Loui XIV in Oeuvre Complete Pari Gamier 1878 vol 14 pte I p 516 CAPITULO DOIS 1 SR Wallach Dill abendliindische Gemeinschaltsbewrustsein in MitllaIter LeUp zig e Berlim 1928 Beirage ur Kultugeschichte des Mittellasters und der Renais sance ed W Goetz vol 34 pp 2529 Aqui latinos refere5O a Cristandade Lati na isto 6 80 Ocidente em geral 2 A Bibliotheca Erasmiana Gand 1893 registra 130 edic6eB ou mais exata mente 131 inctuindo 0 texto de 1526 que infeJimlente nAo eonsegUi encontrar de modo que nio aei em que medida coincide com edicoes subseqiientes Depois do COI6quios Moriae en comium dos Adagia e 0 De duplici capla ver borum ac rerum commentarii De civilitate conseguiu 0 maior nunero de edicoes entre as obras de Erasmo Para uma tahela do mlmero de edicoes de tadas as obras de Erasmo cf Mangan Life Character and Influence of Desideriul Erasus nl Rotterdam Londrcs 1927 vol 2 pp 396 e legs Se for levada em conta a longa l1Crie de trabathos mail au menos estreitamente ligados ao manual de civilidade de Erasmo e aaim 0 grande raio de seu sucesso sua importincia em comparacao com suss outras obru aem duvida deve ser considerada ainda mais alta Uma idia do im pacto direto de suas obras 6 dada notando quais delas foram traduzidas de Ungua erudita para lfnguas populares Nlo hA ainda porm uma anAlise completa deale fato Segundo M Mann Erasme et les debuts de 10 reforme JranfDise Paris 1934 p 181 0 fato mais surpreendente peto menos no que interessava A Franca a preponderAncia de livros de instruclo ou religiosidade sabre os de divertimento ou sAtira 0 Elogio da loucura os Col6quioa praticarnente nlo tern lugar nelta lista Foram os Ad6gios a Prepararao para a morte e a Civilidade para mennos que atrafram os tradutores e que 0 publico exigiu Urna anAlise semelhante de au cesso nas regiDes de Ungua atemA e hotandesa provavelmente teria resultados silO di ferentes Podeae supor que os escritos satlricos nessas regi6es tiveram sucesso alga maior cf nota 30 o sucesso da ediciio Jatina do De Civilitate certamente foi muito grande Kir chhoff em Leipziger Sortimentshiindler in 16 Jarhundert citado por WH Woodward em Desideriua Erasmus CambPidge 1904 p 156 n 3 verificou que nos ano de 1547 1551 e 1558 nada menOa que 654 exemplares do De civiitate estavam em cir culacio e que nenhum outro Jivro de Erasmo era Jiatado em tais numeras 3 Comp e nota sobre as obras que tratam de civilidade de autoria de A Bon neau em sua edicAo de Civilite puerile vet n 35 4 A deapeito do sucesso da obra em seu pr6prio tempo este trabalho reecbeu relativamente pouca atencao Da Iiteratura mais reeente sobre Erasmo Tendo em vista o tema do Jivro islo 6 muito compreensivel 0 tema costumes maneiras etiqueta cOdigos deconduta por mais informativo que seja para a educacAo de pessoas e para suas reJac6es tern talvez interesse apenas Iimitado para historiadores de idias o que Ehrismann diz da HoJzucht Disciptina na corte em que Geschichte der o processo civilitador deutschen Literalur bis zum Ausgang des Mittelaters vol 6 pte 2 p 330 6 trpico de uma avaliao de erudito freqUentemente encontrada neue campo Urn livro de instru6es para joveDs d nascimento nobre Nio Ie eleva ao mvel de urn emiDa mento soble virtude Na Franca por6m livros de boas maneiras de urn certo perfodo 0 s6cul0 XVII receberam Atencio crescente durante algum tempo eatimuladtl aem duvida peto trabalha de D Parole citado Da nota 98 e acima de tudo peto Mudo abrangente de M Magendic La politesse mondaine Paris 1925 Analogamente 0 mudo de B Groethujsen Origines de lesprit bourgeois en France Paris 1927 utiliza obras literarias de tipo mais ou menos comum como ponto de partida para trar urns certa linha nas mudanrr8S ocorridas em pessoas e naa modifica6es do padrao social d por exemplo pp 45 e segs o material usado no Capitulo n deste estudo fica urn grau abaixo se podemos assim dizer das obras acima mencionadas Mas ele talvez tamWm moore a impor tAncia dessa literatura Kmenor para a compreensao das grandes mudanlrU ocorridaa na estrutura de pessoase seus relacionamentos S Reproduzido em parte in A Franklin La Vie Pivee dtJulreois Ie repaa Pari 1889 pp 164 166 que alinha numerosas Dutra cita sobre esse auunto 6 Reproduzido em The Babees Book Frederick FornivaU org Loodr 1868 p 2 Para cORhecer outros livros ingleses italianosJ franceses e alemiel cf Early English Text Society Extra serie no 8 F J Furnivan org Londr 1869 incluindo A Booke of Precedence e outros A educacio do jovem nobre no aerviCO a cssa de urn dos grandes do pals mostrada com grande clareza nesees tivros inglesee sobre 0 condicionamento juvenil Urn observador italiano de COItumes in glesesJ escrevendo por volta do ano 1500J diz que os ingleses adotaram esse COlrtume JXlrque 0 indivfduo 6 mais bern servido por eetranhos do Que por ew pr6prios mhos Caso tivessem seus filhos em casa eriam sido obrigados a lhee servir a mesrna comida que preparavam para si mesmos Ver introducAo a A FileenthCenlury Cour tesy Book RW Chambers org Londres 1914 p 6 NAn 6 sem interesse notar que esse observador italianoJ ecrevendo em 1500 enfatiza que os ingleses entendeiJ sAo grandes epicuros Para mais referencias ver M e CH Quennel A History of Everyday Thin in England Londres 1931 vol I p 144 7 Organizado por F J Fumivall ver a nO 6 acima Para informac6ea sobrt a Iiteratura alema desse gneroJ com referetlcia A literatura correepondente em outrat Unguas cr G Ehrismann Geschichte vol 6 pte 2 discURO p 326 eiraa A mesa p 328 P Merker e W StammlerJ Reallexikon der deulchen Lileralurges chichle vol 3 verbete sobre maneiras A mesa P Merker e H Teske Thomai von Zercaere Heidelberg 1933 pp 122 e seas 8 Para a verdo alerna usada aqui ver ZerockeJ Der deulsche Calo Leipzig 1852 9 Ibid p 39 v 233 10 TannhauserJ Die Horuchl em Der Dichler Tannhiiwer J Siebert org Halle 1934 p 196 vv 33 eseI II Ibid vv 45 eseI 12 Ibid vv 49 eseI 13 Ibid vv 57 e segs 14 Ibid vv 129 eseI 15 Ibid vv 61 e segs 16 Ibid vv 109 eseI 17 Ibid vv 157 e segs 18 Ibid vv 141 e segs 19 Zarncke Der deulsche CtJlo p 136 r 1 nolas Z57 20 Ibid p 137 vv 287 e sogs 21 Ibid p 136 vv 258 0 segs 22 Ibid vv 263 0 segs 23 Tannhauser Holzucht vv 125 e segs 24 Glixelli Les Contenances de table 25 The Babees Book e A Booke oj Precedence ver nota 6 26 cr A von GloichenRusswunn Die gOlische Well Stuttgart 1922 p 320 e segs 27 Ver A Caban Moeurs intimes du temps passe Paris 1910 I serie p 248 28 Ibid p 252 29 A Bomer Amtand und Etiketle in den Theorien der Humanisten em Neue Jahrbucher fur dm Kltuisische Alterurn 14 Leipzig 194 30 Catacterfstica do estilo burgues alemiio de prescrever normas sobre maneiras 80 fim da Idade Media e Da Renascenca e a grobianische Umkehrung inversio mal educada 0 autor ridiculariza a rnA conduta parecendo recomendala 0 humor c a sAtira que mail tarde gradualmente desaparecem da tradicao sterna ou pelO menOB tomamse vatores de segunda classe sao dominantes nessa rase da 80ciedade burguesa A inversiio satfrica de preceitos pode ser remontada a Uma fonna especificamente urbana e burguesa de instilar maneiras peto menos ate 0 Rculo XV A repetida norma de nao cair vorazmente sobre a comida 6 oUvida por exemplo em urn pe queno poema dessa epees Wie der maister sein nun lernet em zamcke Der deutsche Cato p 148 Gedenk und merk waz ich dir sag wan man dir die kost her trag so bis der erst in der schizzel gedenk und scheub in deinen drizzel als groz klampen als ain saw Lembrese quando a comida for trazida seja 0 pimeiro a atacala Enfie grandes naeos garganta abaixo como se Cosse urn porco A Dorma de naQ fucar a travessa proeurando Os melhores pedacos reaparece Da slguinte venao Bei aHem dem daz ieh dir ler grab in der sehizzel hin und her oaeh dem aller besten stuck daz dir gefall daz selh daz zuck und leg erz auf dein teller drat acht nieht wer daz fur libel hat o que ensino e 0 seguinte procure 0 melhor pedaco no prato pegue 0 pedaco que achar melhor ponhao em seu prato e DaO de a Illinima importdncia a quem Behar isso ruim Na traduCao alema do Grobianus feita par Kaspar Scheidt Worms 1555 repro duzida no Neuedruck deutscher Literaturwerke des 16 und 17 Jahrhunderts nOs 34 e 35 Halle 1882 p 17 vv 223 e segs a instrucao de limpar 0 oariz oa ocasiao oportuoa aparece da seguiote maneira Bs ist der brauch in frembden Ianden Als India wo galt verhanden r 258 o processo civilizador Auch cdcl gstein und perlin got Dass mans an dnasen hencken thnl Saleh gut hat dir das gtuck nit bschert Drum hor was zu deinr oasen hart Bin wllster kengel reehter leng Auss beiden lochem aussher heng Wie lang eisz zapffen an dem hauss Das ziert dein Dasen uberausz E costume em paises estrangeiros oode aura j6ias e peralas sao encontrados usalas penduradas no oariz Uma vez que somos menos afortunados aprenda 0 que deve usar no oariz urn 10ngo e imundo fio escorrendo de ambas as narinas tal como pingentes de gelo de uma easa isl0 adomaria admiravelmente seu nariz Doch halt in allen diogen moss Dass nit der kenge werd zu gross Darumb hah dir ein soIches mess Wenn er dir fleusst hiss in das gfress Vod dir auff heiden lefftzen leit Dann ist die nass zu butsen zeit Auff beide ermel wUsch den rotz Dasz wer es seh vor unlust kotz Mantenhase vigilante em todas as coisas e quando 0 fio ficar eomprido demais escorrer pela boca e labios e tempo de limpar 0 nariz Limpe a meleea em ambas as rnangas para que todos os que isso veern possam vomitar de nojo Obviamente a finalidade desses conselhos e instruir a pessoa a fazer 0 oposto Na pagina de rosto da edicao de Worms de 1551 por exemplo lemos Lisz wot disz buchlin offt und vii Vnd thu allzeit das widerspil Leia este livreto com freqiiencia e faca sempre 0 contrario A fim de elucidar 0 carater especificamente burgues desse livro vale a pena citar a dedicat6ria constante da edicao de Helbach de 1567 Dedicado por Wenderlin Helbach humilde vigario de Eckhardtschausen ao hon rado e cullo cavalheiro Adamus Lonicerus doutor em medicina e medico municipal de Frankfurt am Main e a Johannes Cnipius Andronicus cidadao da mesma cidade meus graciosos senhores e bons amigos o pr6prio e longo titulo do Grobianus latino pede proporcionar certa base para fixar 0 tempo em que 0 conceito de civilitas no sentido que Ihe foi dado por Erasmo e provavelmente como consequencia do sucesso do livro comecou a difundirse peto estrato alemao que escrevia em tatirn No titulo do Grobianus de 1549 isto ainda nao ocorre Nete lernos Chlevastes Studiosae luventuti Na edicao de 1552 na mesma passagem aparece a palavra civtlitas episcoptes studiosae inventuti civititatem otat E assim perrnanece ate a edicao de 1584 A edicao de 1661 do Grobianus e aduzido urn extrato do De civtlitate morum puerilium de Erasmo Finalmente na nova traducao de 1708 encontrarnos urna nota Escrito em veia pOOtica para 0 descortes Monsieur CabecaDura e destinado ao divertimento de todas as mentes serias e civililadas Nesta edicao muito e dito em tom mais suave e de notas 259 l maneira bern mais velada Com 0 aumento da civilizacao os preccitos da fase anterior que a despeito de toda sua satiea tinham uma intencao muito seria tornam se simples materia de riso 0 que simboliza simultaneamente a superioridade da nova fase e uma ligeira violacao de seus tabus 31 The Babees Book p 344 32 Glixelli Les Contenances Romania vol 47 p 31 vv 133 e segs 33 Francois de Callieres De fa science du monde et des conlloissances utiles ir la conduite de la vie Bruxelas 1717 p 6 34 Arthur Denecke Beitrage zur Entwicklungsgeschichte des gcseltschattichen Anstandsgefiihls in Zeitschrilt fur Deutsche Kulturgeschicht ed C Meyer Nova SCrie vol 2 nO 2 Berlim 1892 p 175 cita as norroas seguintes como novas em Erasmo Se ate agora aprendemos as id6ias sabre maneiras mesa que prevalcciam nos cfrculos mais altos do povo comum no famoso livro de Erasmo De civilitate morum puerjlium sao expostos preceitos de boa conduta para urn principe As JicOes seguintes sao novas Se the fornecerem urn guardanapo a mesa devese passa 10 par cima do ombro au braea esquerdo Erasmo diz ainda Devese sentar scm chapeu a mesa se Os costumes do pais nao profbem isso Deve por 0 copo e a faca a direita do prato 0 pao A esquerda Este ultimo nao deve ser partido mas cortado E ineorreto e prejudicial a saude comeear a refeieao bebendo E grosseiro eoHar os dedos no caldo De urn born pedaco que the e oferecido tireapenas uma parte e passe 0 resto A pessoa que 0 ofereee ou A pessoa ao seu lado Alimentos s61idos oferecidos devem ser recebidos com os dedos ou no prato individual liquidos ofere cidos em cother devem ser tornados na boca mas e preciso limpar a colher antes de devolvela Se 0 alimento oferecido nao for sadio em ncnhuma hip6tese diga Eu nao posso comer isso apenas se desculpe polidarnente Todo hornem refinado deve saber trinchar todos Os tipos de carne Nao jogue no chao ossos e restos E sadio comer carne epao juntos Algumas pessoas engolem vorazmente quando Comem Urn jovem s6 deve falar a mesa 0 necessario Se voce rnesmo estivcr oferecendo uma refeicao peca desculpa por sua exigiiidade e de maneira nenhuma mencione os precos dos varios ingredientes Tudo e oferecido com a mao direita Podese vcr que a despeito da cautela do educador de principes e do refinamento de alguns detalhes de modo gera1 esta prescnte nessas nonnas 0 mcsmo espfrito Que nas maneiras A mesa da c1asse media Analogamente os ensinamentos de Erasmo diferem principalmente das demais formas sociais de conduta apenas oa ampla co bertufa dos preceitos destinarlos a outros cfrculos uma vez que ele se preocupa em pelo menos fazer urn inventaiio completo para aqueta epoca A citacao complementa ate certo ponto outras eonsiderac6es Infelizmente Denecke limita sua comparacao as maneiras A mesa na Alemanha A fim de confirmarlhe os resultados seria necessaria uma comparacao com livros de boas maneiras em ingles e frances e acima de tudo com os preceitos de conduta de humanistas anteriores 35 Cf La civilite puerile par Erasme de Rotterdam precede dune notice sur les libres de civiite depuis Ie XVI siicle par Alcide Boneau Paris 1877 Erasmo teria tido modelos Obviamellte ele nao inventou 0 savoirvivre e muito antes dele as regras gerais haviam sido estatuidas Nao obstante ele foi 0 primeiro a tratar 0 assunto de maneira especial e completa nenhum dos autores acima citados imaginou a civilidade ali se preferirem 0 decoro como sendo capaz de fornecer tema a urn estudo separado Aqui e ali formularam preceitos que naturalmente se relacionavam com educaCao moralidade moda ou higiene Uma observacao semelhante e feita a respeito do Galateo de Giovanni della Cass primeira cdicao com outros adendos do autor 1558 na introducao de IE Spingam p xvi a prna edicao intitulada Galateo of Manners and Behavior Londres 1914 Constitui talvez uJI1a contribuicao a outros trabalhos sobre este assunto observar que 260 g processo civilizador ja existiam oa literatura inglesa do secula xv pocmas mais longos publicados pela Early Text Society tratando da maDeira de vestir do comportamento na igreja A mesa etc quase tao abrangentes como 0 tratado de Erasmo Nao IS impossvel que Erasmo tenha conhecido alguma caisa desses poernas o certo e que 0 tema da eduacao dos meninos revestiase de alto grau de opor tunidade nos circulos humanistas nos anos que precederam 0 aparecimento do pe queno livro de Erasmo Muito diferentes dos versos De moribus in mensa servandis de Johannes Sulpicius vieram a lume para mencionar apenas alguns Disciplina et puerorum institutio 1525 de Brunfet De instituenda vita 1529 de Hegendorff e Formulae puerilium coloquiorum 1528 de S Heyden Cf Merker e Stammler Reallexikon verbete sabre maneiras a mesa 36 Maneiras latinas a mesa Quisquis es in mensa v 18 in Glixelli Les Conte nances p 29 37 Book 01 Curtesye de Caxton Early English Text Society Extra Series 00 3 ed FI Furnivall Londres 1868 p 22 38 Della Casa Galateo pte 1 Caps 1 5 39 Book 01 Curtesye de Caxton p 45 v 64 40 Na literatura behaviorista americana foi definido preeisamente eerto numero de termos que com algumas modifieacoes sao uteis e mesmo indispensaveis no estudo do passado Ineluem etes lsoeializacao da crianca d por exemplo JB Watson Pychological Care 01 Inlant and Child p 112 e formacao de habitos e condi cionarnento cf Watson Psychology Irom the Standpoint 01 a Behaviorist p 312 41 Tanhauser Rolzucht pp 195 e segs 42 Zarneke Der Deutsche Cato pp 138 e segs 43 Cf The Babees Book p 76 46 Ibid p 302 47 Ibid pte 2 p 32 48 Ibid 49 Ibid pIe 2 p 8 50 Cf A Franklin Les Repas pp 194 e segs 51 Ibid p 42 52 Ibid p 283 53 Dam Bouhours Remarques nouvelles sur 10 tongue fronroise Paris 1676 vol 1 p 51 54 Francois de Calleres Du bon et du mauvais usage dans les manieres de sex primer Des lorons de parler bourgeoises en quoy eIles sont differentes de celles de ta cour Paris 1694 p 12 Entao um laeaio se aproximou a rim de informar a senhora que Monsieur Thibault 0 fitho queria lhe falar Muito bern disse a senha ra Mas antes de reeeheto preciso 1he dizer quem e M Thibault Ete e filho de urn burgues amigo meu de Paris urna dessas pessoas rieas e as vezes uteis a pessoas de posicao para lhes emprestar dinheiro 0 filho e urn jovern que vern estudando com a intencao de exereer urn cargo publico mas que precisa ser expurgado dos maus cOstumes e linguagem da burguesia 55 Andressen e Stephan Beitrage zur Geschichte der Gottdorlfer Rotund Stoats verwaltung von 15941659 Kiel vol 1 p 26 nota 1 56 Leon Sahler Montbeliard a table Memoires de fa Societe dEmufation de Montbeliard Montbeliard 1907 vol 34 p 156 57 Cf Andersen e Stephan Beitrage vol 1 p 12 58 Cf Platina De honesta vofuptate et valitudine 1475 livro 6 p 14 Toda a curva civilizadora e clararnente vislvel em urna carta ao editor com 0 titulo Obseuridades no Ato de Assar urn Boi publieada no Times de Londres no dia 8 d maio de 1937 poueo antes das eerimonias da eoroacao e obviamente sugerida pela notas 181 recordacao de festividades semelhantes no passado Estando ansioso para saber como muitas pessoas devem estar em uma oeasillo como esta qual a melhor maneira de assar urn hoi inteiro procurei me informar no Smithfield Market Mas deacobri ape nas que ninguem no Smithfield sabia como eu ia obter urn hoi inteiro e ainda menos enfiaIo num espeto assalo trinchalo e eonsumilo A questAo toda e muito decepeionaote No dia 14 de maio oa mesma p4gina do Times 0 chef da cozinha do Simpsons situado no Strand da instrucoes para assar urn boi inteiro e ums ilustracao na mesma edicao mostra urn boi no espeto 0 debate que prosseguiu du rante algum tempo nas colun8 do Times da certa impressAo do desaparecimento gradual do costume de assar animais inteiros mesmo em oeasiOes em que Urn es forco e feito para preservar costumes tradieionais S9 Gred Freudenthal Gestaltwandel der biJrgerlichen und proletarischen Haus wirlschaft mit besonderer Berucksichtigung des Typenwandels von Fau und Familie von 1760 bis zur Gegenwart dissertacao Frankfurt am Main Wiirzburg 1934 60 Ver Andressen e Stephan Beilrage vol 1 p 10 que contero tambem a in formacao de que 0 uso do garfo comecou a se difundir pelo estrato superior da soeiedade no norte pelos principios do seeulo XVII 61 Cf Zamcke Der deutsche Cato p 138 62 Ver Kurt Treuseh von ButtIar Das tiigtiche Leben an den deutschen Fiirs tenhofen des 16 lahrhunderts in Zeitschrift fiJr Kulturgeschichte Weimar 1897 vol 4 p 13 nota 63 cr Ibid 64 Cf The Babees Book p 295 65 Citado em Cabanees Moeurs p 292 66 A melhor introducao ao assunto a de A Franklin Les Soinl de la toilette Paris 1877 e aCima de tudo La Civilite Paris 1908 do mesmo autor vol 2 onde numerosas citac6es ilustrativas sao reunidas em apendice Algumas coisas que autor diz no entanto devem ser lidas com espfrito critico uma vez que ele nem sempre distingue bern 0 que e tipico de uma dada epoca e 0 que nela considerado como excepcional 67 Mathurin Cordier Colloquiorum scholasticorum libri quatuor Paris 1588 livro 2 colloquium 54 Exemplum ad pueros in simplicit narratione exercendos 68 Algum material nao muito acessivel pode set encontrado em De Laborde Le Palais Mazain Paris 1816 Ver por exemplo a nota a pAgina 337 SerA ne cessario entrar em detalhes 0 papel quase poUtico desempenhado durante tada essa epoea Kculo XVII pela cadejraretrete permitenos falar dela sem falsa vergonha e dizer que pessoas usavam esse utensilio e a passares provencal Uma das amantes de Henrique IV Madame de Vemeuii queria 0 seu urinol no quarto 0 que seria uma falta de decoro em nossos dias mas que naquela pouco mais era do que urna liberdade Iigeiramente banaL A importante informacao contida nessas notas necessita tambem de exame euida doso se queremos ganhar perspectiva dos padroes observados pelas vArias classes Uma das maneiras de chegar as origens desses padroes consistiria em urn estudo preciso de bens deixados em testamento A respeito do trecho sobre 0 habito de assoarse poderiamos meneionar aqui por exemplo que Erasmo deixou tanto quanta se pade saber hoje 0 numero espantosamente alto de 39 lencos mas apenas urn garfo de ouro e outro de prata Ver lnventarium iiber dieHinterlassenschaft des Erasmus ed L Sieber BasihSil1 1889 reproduzido 110 Zeitschrift fur Kutturgeschichte Weimar 1897 vol 4 pp 434 e segs Uma grande riqueza de informacoes interessantes consta do Gargantua e Pan tagruel de Rabehiis No tocante ao assunto funcoes corporais por exemplo ver o livro I cap 13 262 o pracelso civilirador 69 George Brandes transcreve esse trecho das mem6rias em seu livro Voltaire Berlim 8 d vol pp 340 e scgs e 0 comenta da seguinte maneira Nao a embaraCA ser vista nUB peto criado nao 0 considerava como urn homem em relao a eJa como mulher 70 The Babee Book pte 2 p 32 71 Ibid pte 2 p 7 72 Ibid p 301 e ego 73 cr Rudeck Gechiche der offenlichen Sittlichkei Jena 1887 p 397 74 T Wright The Home 01 Other Day Londre 1871 p 269 7S Olto Zockler Alkee und Monchum Frankfurt 1897 p 364 76 T Wright Home p 269 taroMm Cabanes Moeurs inimes 21 serie p 166 Ver taroMm G Zappert Ober dos Badewesen in mittelalterIicher und Fopiiterer Zeit in Archiv fur Kund OSterr Geschichtsquellen Viens 1859 vol 21 Sobre a fun caa da cama na casa ver GG Coulton Social Life in Britain Cambridge 1919 p 386 oode a escassez de camas e 0 usa inquestionAvel delas por varias pessoas e sucinta e claramente demonstrado 77 Citado em M Bauer Das Liebesleben in der deutschen Vergangenheit Ber lim 1924 p 208 78 Rudeck Geschichte der offentlichen Silllichkeit p 399 79 pro Hopton e A Balliol Bed Manners Landres 1936 p 93 80 Certamente nao houve falta de reaCao aos pijamas Urn exempla americana dido particutarmente interessante para esta argumentacao e 0 seguinte extraido de The People 26 de jUlho de 1936 Homens mAsculos nAo usam pijamas Usam camisoloes e desprezam homens que usam essas coisas efeminadas que sao os pijamas Theodore Roosevelt usava cami soUlo Bern como Washington Lincoln Napoleao Nero e muitos outros homens amoaOl Esses argumentos em favor dos camisoloes e contra as pijamas sao apresentados pelo dr Davis de Ottawa que fundou Urn clube de usulirios de camisol6es 0 clube tern uma filiaJ em Montreal e urn forte grupa em Nova York Seu objetivo vol tar a popuJarizar 0 camisolao como urn sinal de autentica masculinidade Eaas palavras indicam a disseminaciio do usa dos pijamas no periodo relativa mente curto transcorrido desde a guerra E ainda mais claro que 0 uso de pijamas pelas mulheres vern diminuindo tam b6m hA algum tempo 0 que os substitui e claramente urn derivado do vestido de naite longo e uma expressao das mesmas tendencias sociais incluindo a rcacao con tra a mssculinizacAo das mulheres e uma tendencia a maior diferenciacao social bern como a simples necessidade de certa harmonia entre costumes de Doite e cOs tumes de dormir Exatamente por essa razio uma comparacao entre essas novas camisolas e as do passado mostram com especial clareza 0 que tern sido chamado de estado subdesenvolvido da esfera Intima Esta camisola de hoje parecese muito mail com urn vestido e tern linhas muito mais elegantes que as antigas 81 M Ginsberg Sociology Landres 1934 p 118 Se tendencias inatas sao ou nAo sao reprimidas sublirnadas au recebem plena liberdade para se expressarem depende em grande parte do tipo de vida familiar e das tradi6es da sociedade mais ampa Considerese por exemplo a dificuldade de determinar se a aversao a rela6es incestuosas tern uma base instintiva ou 0 desemaranhamento dos fatores genticos subjacentes as vArias formas de chime sexual As tendencias inatas em uma possuem certa plasticidade e seu modo de expressao repressao ou sublimaao e em graus variAveis socialmente condicionado o presente estudo dli origem a idias muito semelhantes Tenta acima de tudo na concludo do segundo volume demonstrar que 0 controle da vida instintiva in 1I0tCU cluindo seus aspectos compulsivos 6 funcio de inteedependnci8S sociais Que persistem durante toda a vida Essas dependancias do indivfduo variam em estrutura segundo a estrutura da sociedade As varia6es nessa estrutura correspondem as diferenC8S em estrutura de personalidade que podem ser observadas na bist6ria Caberia recordar a esta altura que observac6es semelhantes sio consignadas de orma inequfvoca nos Ensaios de Montaigne livro 1 cap 23 As leis da consciencia que dizemos nascerem da natureza nascem do costume quem quer que considere com veneracao fntima as opini6es e costumes apro vados e aeeitos A sua volta nAo pode ignoraIos sem remorso ou observalos sem aplauso Pareceme que a fora do costume foi bern compreendida pelo criador da fabula da mulher atdea que tendo ao nascer 0 habito de acariciar e carregr de urn lado para outro urn novilho e continuando a fazer isso desde entao continuou a carregAlo em virtude do costume quando 0 animal jA eatava inteiramente crescido Usus ellicacissimus rerum omnrum mogrster Com tanta freqiiencia pelo costume como pela doen diz Arist6teles mulheres puxam os cabelos roem as unhas comero brasas e terra e tanto por costume como por natureza homens tern relaOes com homens Particularmente consonante com os achados do presente estudo 6 a id6ia de que o remorso e tamb6m a estrutura psiquica aqui estudada segundo principios freuw dianos ainda que com urn significado ligeiramente diferente com 0 nome de SU perego 6 sravada no indivfduo pels sociedade em que ele cresce em urns pa lavra que seu superego 6 sociogen6tico Neste particular dificilmente precisa ser dito mas talvez valha a pena enfatizar explicitamente 0 quanto este estudo deve As descobertas de Freud e da escola psica naUtica As ligaoes sio 6bvias a todos os familiarizados com os eseritos psicanati ticos e nio nos pareeeu necessArio mencionAlos em determinados exemploa espe cialmente porque isto nio poderia tee sido feito sem longas ressalvas Tampouco as diferenas que nao sio pequenas entre todo 0 enfoque de Freud e 0 adotado neste estudo foram explicitBUlente enfatizadas sobretudo porque Os dois poderiam talvez ap6s alguma discussAo ser conciliados sem excessiva dificuldade Pareceunoa mais importante construir urna perapectiva intelectual especial com toda clareza passive1 sem nos desviar para discuas6ea a eada volta da estrada 82 Von Raumer Geschichte der Piidogogik Stutgar 1857 pte 1 p 100 83 Sobre todaa essaa questoes ct Huizinga Erus Nova York e Londres 1924 p 200 0 que Erasmo realmente exigia do Mundo e da humanidade a ma neira como imaginavam aquela sociedade apaixonadamente desejada purificada cris tA de boa moral 6 ardente simplicidade moderacao bondade tolerAncia e paz iato em nenhuma parte podemos encontrar de maneira tio clara e bem expressa do que nos Coldquim 84 Museion diz a edicio de 1665 a pa1avra referente a urn comodo priva tivo 8S A confusio do observador de uma poca posterior nio 6 menor quando se ve eonfrontado com a moral e os costumes de uma fase anterior QUe traduzem urn diferente padr1io de vergonha Isto se aplica em especial aos costumes medievais no banho No seculo XIX de infcio pareee incompreenslvel que as pessoas na Idade Media nio tivessem vergonha de Be banharem juntas em grandes mimeros e com freqUencia os dois sexos juntos 264 o pracesso civiliador 1 Alwin Schult Deutsches Leben im XIV und XV lahrhundert Viena 1892 pp 68 e segs comenta essa questao da seguinte maneira Ternos dais interessantes desenhos de urna dessas casas de banho Eu gostaria de dizer logo no inicio que considero as desenhos exagerados e que no minha opiniiio a predjeiic medieval por brincadeiras Tudes erraaaterra interleriu neles A miniatura de Breslau nos mastra uroa fila de banheiros dentro de eada urna das quais ha urn homem e urna mulher sentados urn de Crente para 0 outro Uma tabua passada de urn lade a outro da banheira serve como mesa que e feTrada por urn pano bonito e em cima ha frotas bebidas etc Os ho mens tern faixas em volta da cabeca e usam tangas as mulheres usam pen teados eolares etc mas afora isso esUio inteiramente nuBS A miniatura de Leipzig e parecida exceto que as banheiras estao separadas sobre cada uma delas ha uma eSpCcie de toldo com cortinas que podem ser puxadas 0 com portamento nessas casas de banho nao e excessivamente decoroso e as mu lhere decentes sem duvida se mantinham afastadas delas De modo geraI con tudo os sexos viviam certamente segregados as autoridades da cidade com cer teza nao teriam tolerado que se escarnecesse abertamente de todo pudor Nao deixa de ter interesse notar como a condicio afetiva e 0 padrio de repugnan cia de seu pr6prio tempo pOs na boca do autoT a suposicao que de modo gerat os sexes eram certamente segregades muito embora a prova hist6rica que ele mes mo produz aponte para uma conc1usao contrAria Comparese a informacAo factual e a atitude simplesmente descritiva no tocante a essas diferencas de padrao em PS Allen The Age oj Erasmus Oxford 1914 pp 204 e segs 86 Ver A Bomer Aus dem Kampj gegen die Colloquia fomiliora des Erasmus em Archiv fur Kullurgeschichte Leipzig e Berlim 1911 vol 9 pte 1 p 32 87 A Bomer escreve neste particular Nos dois iiltimos livros que se destinl yam a homens maduros e idosos Toda 0 Iivro porem 6 dedicado por Morisot an seu jovem filho e todo ele foi concebido como manual escolar Nele Morisot discute os diferentes estagios da vida Apresenta a crianea indivfduos crescidos homens e mulheres joveDs e velhos de modo que ela possa conhecelos e compreendelos c ver 0 que sao boa e rna conduta neste mundo A ideia de qUe certas partes do livro destinavamse a ser lidas apeoas por mulheres ou apenas por velhos foi claramente posta na mente do autor por sua compreensivel perplexidade diante da idia de que tudo isto tivesse sido concebido como material de leitura para criancas 88 E importante para compreender toda esta questAo saber que a idade de ca samento nessa sociedade era menor do que em 6pocas posteriores Nesse perlodo escreve R Kobner referindose a Idade Mdia homens e mu lheres casavamse freqiientemente muito cedo A Igreja davalhes 0 direito de casar logo que atingissem a maturidade sexual Os Tapa7e casaVBm entre os 15 e os 19 anos e as moeas entre 13 e 15 Este costume sempre roi considerado como uma peculiaridade caracteristica da sociedade daquela poca Ver R Kohner Die Eheaulassung des Qusgehenden Mittelaliers em Archiv jur Kulturgeschichte Leipzig e Berlim 1911 vol 9 no 2 0 leito nteressado em informa e abundante documentacao a esse respeito deve consulta a Early English Text Society Orig Se riesno 108 ed F J Furnivall Landres 1897 incluindo ChildMariage Divorces and Ratifications etc Nesses textos casamento possfvel mencionado como de 14 anos para rapazes e 12 para as mocas p xix 89 F Zamcke Die deutsche Universitat im Mittelalter Leipzig 1857 Beitrag I pp 49 e egs l 1 notas Z65 l 90 Bauer Das LiebesIeben p 136 91 W RUdeck Geschichte der 61entlichen Sitlichkeil n Deutschland lena 1897 p 33 92 Ibid p 33 93 K Schafer Wie man friiher beiratete Zeilschrifl fur deutsche Kulturges chichte Berlim 1891 vol 2 00 1 p 31 94 W RUdeck p 319 9S Brienne Memoires vol 2 p 11 citado em Laborde Palois Mazorn nota 522 96 F von Bezold Bin Kolner Gedenkbuch des XVI Jahrhunderts em Aus Millelalter und Renaissance Munique e Berlim 1918 p 159 97 W Rudeck p 171 Allen Age of Erasmus p 205 A Hyma The Youth 0 Erasmus University of Michigan Press 1930 pp S6 e segs Ver tambem Regnault La Condition uridique du bdtard au moyen age Pont Audemer 1922 onde con tudo estudada a situa1io legal e niio reat do bastardo 0 direito consuetudin6rio ingles assume com freqiiencia urna atitude pouco benevolente para com o bastardo Resta a investigar se 0 direito costumeiro expressa nesses casos a opiniao real de direrentes estratos da sociedade au apenas a de urn deles E fato conhecido que at6 0 culo XVII na corte real francesa as filhos legi timos e bastardos eram criados juntos Luis XIII por exemplo odiava sua meia irma Mesmo em crianca ele dizia 0 seguinte do meio irmiio Oosto mais de minha irma pequena do que dele porque ele nAo esteve comigo na barriga de minha mae como eta 98 D Parodie Lhonnete homme et lideal moral du XVlIe et du XVllie 8i dc Revue Pedacogique 1921 vol 78 nO 2 pp 94 e segs 99 cr por exemplo Peters The Institutionalised SexTaboo em Knight Pe ters e B1anchard Taboo and Genetles p 181 Um estudo de 150 mocas feitas peto autor em 191617 apurou a existencia de tabus em pensamento e conversas entre moeas bern educadas dos seguintes as suntos que etas caracterizaram como indelicado poluidor e uma coisa inteiramente fora dos conhecimentos de uma senhora 1 Coisas contr6rias aos costumes freqiienfemente classificadas como mls e imorais 2 Coisas nojentas como funeaes corporais tanto norrnais como pato16gicas e tadas as implicacOes de falta de higiene 3 Coisas sobrenaturais que dao arrepios Da gente e coisas suspeitas 4 Muitas fonnas de vida animal qUe mocas geralmente temem au conside ram sujas S Diferencas de sexos 6 Diferencas de idade 7 Todos os assuntos referentes a urn duplo padrao de moratidade 8 Todos os assuntos ligados a casamento gravidez e parto 9 AlusOes a qualquer parte do corpa exceto a cabeca e as maos 10 Polftica II ReligiAo 100 A Luchaire La Societe ranfaise au temps de PhilippeAuguste Paris 1909 p 273 101 Ibid p 275 102 Ibid p 272 103 Ibid p 278 266 o proceSSQ civiliador 104 J Huizinga Herbst des Millealters Studien ubeT Lebens und Geitetilorm des 4 und 15 lahrhunderts in Frankreich und in den Niederlanden Munique 1924 p 32 105 Extraido de Le Jouvencel Lebensgeschichte des Rilters Jean de Bueil ed Kervyn de Lettenhove in Chastellain Oeuvres vol 8 citado em Huizinga Herbst p 94 106 Ver p xxx 107 H Dupin La Couroisie au moyen age paris 1931 p 79 108 Ibid p 77 109 Zarncke Der deutsche CalO pp 36 e segs vv 167 e segs 178 e segs 110 Ibid p 48 vv 395 e segs 111 Huizinga Herbst pp 32 e segs 112 L Mirat Les dOrgemont leur ongme leur fortune etc Paris 1913 P Champion Franfois Villano Sa vie et son temps Paris 1913 vol 2 pp 230 e segs citado em Huizinga Herbst p 32 113 P Durrieu Les tres belles heures de Notre Dame du Duc Jean de Berry Paris 1922 p 68 114 Ch PetitDutaillis Documents nouveaux sur Ies moeurs popuaires et Ie droit de vengeance dans Ies PaysBas au XV siecle Paris 1908 p 47 115 Ibid p 162 116 Ibid p 5 117 Luchaire La Societe fran9aise PP 278 e segs 118 Para maiores detalhes sobre este assunto ver A Franklin Paris et Ie Parisiens au seizieme siecle Paris 1921 pp 508 e segs tl9 Th Bossert menciona na introducao que escreveu para 0 Hausbuch p 20 uma gravura do mesmo artista na qual ele ridiculariza a nobreza recente a Ansia do burgues por bras6es e costumes cavaleirosos Isto pade apontar na mesma direcao 120 Introducao a Das Mittelalterliche Hausbuch cd HT Bossert e W Storck Leipzig 1912 pp 27 e segs 121 Berthold von Regensburg Deutsche Predigten ed Pfeiffer e Strobl Viena 1862I880 pp 27 e segs 122 Ibid vol 1 cento e quarenta e urn pp 24 e segs 123 Max Lehrs Der Meister mit den Bandrollen Dresden 1886 pp 26 e aegs 124 Estudaremos agora usando uma nota de rodape urn probleJIla especial de corrente de urn material sobre a civilizacao do comportamento que nio foi incluido no texto parcialmente por raz6es de espaco e ate certo ponto porque nao parecia contribuir com nada essencialmente novo para a compreensao dos contornos principais de civilizacio Ainda assim este problema merece alguma atencio A relaeAo dos povos ocidentais com a limpezl a lavagem e 0 banho mostra durante longo periodo de tempo a mesma cueva de transformacao examinada no texto de varios Angulos diferentes 0 impulso para a limpeza regular e limpeza corporal constante para co mar nio deriva de uma noeao claramente definida de higiene de uma compre ensio clara ou como dizemos habitualmente racional do perigo da sujeira para a saude A relacao com a lavagem tambem muda em conjunto com a transfonnacao nos relacionamentos humanos mencionada no texto e que sera estudada em maiores detalhes no segundo volume No inicio era considerado natural que as pessoas se lavassem regularmente apenas como sinal de respeito aos demais especialmente aos superiores sociais isto 6 por razoes sociais sob a pressao de compulsoes externas mais ou menos percepUveis A lavagem regular e omitida ou limitada ao minimo exigido pelo bemestar pessoal imediato quando estio ausentes essas compuls6es externas quando a posio social nio a exige Hoje 0 banho e a limpeza do corpa sao instilados no individuo desde L notas tenra idade COmo umaespcie de h6bito autom6tico de modo que gradualmente dftaparece de sua consciencia a ideia de que toma banho e se disciplina a manter uma higiene constante por respeito aos outros e peio menos originalmente por insH B8io de outras pessoas isto e por rawes de compulsio extema Ele se lava por compulsao interna mesrno que nio esteja presente alguem que possa cenluraIo ou punito se nio agir assirn Se nio faz isso achamol hoje 0 que nio acontecia antes que ele nio foi inteiramente bern condicionado aD padrio social vigente A mesma mudan no comportarnento e na vida afetiva que surgiu no estudo de outras curvas de civi1izaao e tambem vista aqui As relaes sociais sao transfor madas de tal modo que as compuls6es que as pessoas exercem pmss sobre as outras sao convertidas em formas mais ou menos pronunciadas de autocompulsao no indi vkluo A formaao do superego e consolidada E em suma aquele setor do indi viduo que representa 0 c6digo social seu proprio superego que hoje constrangeo indivfduo a se lavar e limpar regutarmente 0 mecanismo tomase talvez aimla maia claro se lembrarmos que hoje os homens se barbeiarn mesrno que nao haja obrigacao social de fareIo e mesmo que essa omissAo certamente nao seja prejudicial A saude A Iavagem regular com sabao e agua e Dutro desses atos compulsivos cultivados em nossa sociedade peta natureza de nosso condicionamento e consolidados em DOssa consciencia por exp1ica6es de higiene racionais Talvez seja suficiente Deste partiCUlar documentar essa mudana com evidencia recolhida no trabalho de outro observador IE Spingam comenta Da introdu a uma traducao inglesa do Galatea de Della Casa The Humanist Library org de L Einstein LOJldres 1914 vol 8 p xxv Nosso interesse e apenas pela sociedade secular e nela descobrimos que a limpeza era levada em contS somente na medida em que fosse uma necessidade social se e Que isso realmente acontecia como neces sidade individual ou habito eta mal aparece 0 padrao de maneirassociais de Della Casa apticase tamm aqui a limpeza era ditada pela necessidade de agrader 80s outros e nao poT causa de qualquer exigencia interior do instinto individuaL Tudo iaso mudou A limpeza pessoal devido a sua eompleta aceitaC40 como necessidade individual deixou virtualmente de interessar em qualquer ponto ao problema das maneiras na sociedade A curva de mudan delineiase aqui com c1areza aimla maior porque 0 observador torna 0 padrao de sua propria sociedade 0 desejo interno de limpeza como dado sem perguntar como e por que ele emergiu do outro padrao no curso da hit6ria Hoje na verdade de modo geral sao apenas as crianlas que tomam banho e se timparn apenas sob pressao externa e compulsao direta de fora por consideracao aqueles de quem dependem Nos adultos conforme dissemos esse comportamento esta se tomando gradualmente urna autocompulsiio Reencontramos aqui 0 que foi antes chamado de lei fundamental da sociogenese A hist6ria da sociedade refletese na hist6ria dos indivfduos que a compeem 0 indi viduo tern que passar novamente em forma abreviada pelo processo civilizador que a sociedade como urn todo pereorreu durante muitos seculos porquanto ele nao chega civilizado ao mundo Mas ha ouho ponto nessa curva de ciilizacao que mereee estudo Para ele a julgar por relatos de numerosol observadores que as pessoas nos sculos XVI e XVII eram para usar de urn eufemismo menos Iimpas do que nos seculos precedentes Quando essas observaloes sao 5ubmetidas a teste descobrimos que sao corretas peto menos em urn ponto pareee que 0 uS da 8gua como meio de banho e limpeza declinou urn poueo na transiao para os tempos modemos pelo menos no tocante a vida dss classes altas Se a mudana e considerada desta maneira uma explicacao simples se sugere por 5i mesm mas que certamente precisa de confirmaao mais exata Era fato muito conhecido ao fim da Idade Media que as pessoas podiam contrair doen las mesmo de natureza fatal nas casas de banho A fim de compreender 0 efeito 268 o processo civifizador l I de tal descoberta temos que nos colocar Da conscilncia daquela sociedade Da qual Is conexOes causais oeste caso a natureza da transmissao de doenas e infecc6es cram ainda urn tanto vagas 0 que podia set gravado Da consciencia era 0 fato simple os baohos de Agua cram perigosos a pessoa podia envenenarse neles Isl0 porqu era dessa maneira como uma especie de envenenamento que a ratio humana naqucla epoea assimilava as infeccoes de massa as pestes que varriarn a sociedade em DU merosas oodas Sabemos da existencia e compreendemos 0 pavor que tOffiava conta das pessoas quando surgiam essas pestes Nao era urn medo que pudesse como em nosso estagio de experiencia social set limitado e orientado para certos canais por conhecimentos exatos da conexao causal e por conseguinte dos limites do perigo E e muito possivel que naquela epoca a Uso de agua especialmentede agua quentc para 0 banho estivesse ligado a urn medo relativamente vago desse tipo que exa gerava grandemente a perigo real Mas se numa sociedade nesse estado de experiencia urn objcto ou forma de com portamento e associado dessa maneira ao medo pode demorar muito tempo antes que esse medo e seus sirnbolos e as correspondentes proibic6es e resistencia nova mente desaparam No curso de geralOes a recordacao da causa original do medo pode muito bern desaparecer 0 que permanece vivo na consciencia do pavo e talvez apenas urn sentimento transmitido de uma geralao a outra de que 0 perigo esta Iigado ao usa de agua e urn desconforto geral urn sentimento de antipatia par esse costume que e socialmente reforcado com frequencia Assim encontramos no seculo XVI por exemplo pronunciamentos como 0 seguinte Estuves et bains je VOllS en prie FuyesIes ou VOUs en mounes Fuja de suadouros e de banhos imploroIhe ou VOce morre Isto 6 dito por urn medico Guillaume Bunel em 1513 entre outros conselhos contra a peste Oeuvre excellente et a chascun desiranl soy de peste preserver reimpressa por Ch J Richelet Le Mans 1836 Precisamos apenas observar de nosso ponto de vista COmo conselhos certos e id6ias fantasticamente erradas se misturam a fim de compreender os efeitos de urn conselha menos lirnitado que a nosso No seculo XVIl e mesmo no XVIII encontramos ainda numerosas advertencias contra 0 uso de 6gua uma vez que entre outras rawes era prejudicial it pelee poderia causar resfriados Isto parece realmente uma mare de medo em lenta progressao mas no estado atuat da pesquisa nao passa de uma hip6tese De qualquer modo a hip6tese demonstra claramente uma coisa como esses feno menos poderiam ser explicados E dessa forma demonstra urn fato altamente carac teristico de todo processo civilizador Este processo ocorre em conjunto com uma limitacao progressiva de perigos extemos e assim com uma limitacao e canalizacao do medo Que eles provocam Os perigos tomamse mais ca1cuhiveis emais regulados os caminhos e abrangencia dos medos A vida nos parece hoje ainda bastante incerta mas isto nio pede nem mesmo se comparar it inseguranca do individuo oa sociedade medieval 0 maior controle das fontes do medo lentamente estabelecido Da transilao para nossa estrutura social sem duvida uma das precondicoes mais elementares para 0 padrao de conduta que expressamos com 0 conceito civilizacao A arma dura da conduta civilizada poderia desmoronar com grande rapidez se atrav6s de uma mudanca na sociedade a grau de inseguranca que antes existiu voltasse a nos atingir e se a perigo se tornasse tao incalcuhivel como outrora Medos correspondentes logo depois arrebentariam os limites que hoje Ihes sio impastos noas 269 Nao obstante uma forma espedfica de medo de fato cresce com 0 aumento da civilizaCao 0 medo interno semiinconscieme de uma quebra das restricoes impostas ao homem civilizado Algumas ideias finais sobre esse assunto serio encontradas no segundo volume na BecaO Esboco de uma Teoria de CivilizaCiio NOTAS A INTRODUCiO DE 1968 1 Talcott Parsons Essays in Sociological Theory Glencoe 1963 p 359 e segs 2 Ibid 359 3 T Parsonlf Social Structure and Personality Glencoe 1963 pp 82 258 e segs 4 A idcia de qUe a mudanca social deve ser entendida em termos de uma mu danca de estrutura provocada por uma disfuncAo de urn estado normatmente estAvel e encontrada em numerosos lugares na obra de Parsons CF por exemplo T Parw sons e NJ Smelser Economy and Society Londres 1957 pp 247 e segs AnaIoga mente em Robert K Merton Social Theory and Social Structure Glencoe 1959 p 122 urn estado social ideal embora aparentemente entendido como real no qual nao ha contradicoes nem tensoes e comparado com outro no qual esses fen6menos so ciais considerados como disfuncionais exercem pressao no sentido da cmudanca sobre uma estrutura social normalmente livre de tensoes e imutavel o problema posto aqui em discussao como se pode veT nao e identico ao tradi cionalmente discutido em termos dos conceitos estatico e dinAmico A discussao tradicional freqiientemente envolve a questao de qual metodo e preferivel no exame de fenomenos saciais Se 0 que limita s indagaao a urn segmento particular do tempo ou se 0 que implica 0 estudo de processos mais extensos Aqui em contraste nio sito 0 metodo sociol6gico ou mesmo a seleao de problemas sociol6icos como tais o qUe esta em discussao mas as concepcoes de sociedades de configuracoes humanas subjacentes ao emprego de vArios mctodos e tipos de selecao de problemas 0 que se diz aqui nio e contra a possibilidade de se investigarem sociologicamente condic6es sociais de curto prazo sendo este tipo de problema inteiramente legitimo e indispensavel a indagaCao sociol6gica 0 que se contesta e certo tipo de concepcao te6rica fre qiiente mas nio em absoluto necessariamente associada as investigacoes ou estudos sociol9gicosempiricos de estados E de certo inteiramente passivel empreender pesqui sas empiricas de estados enquanto seusam modelos de mudancas processes e fenO w menos sociais de urn tipo ou de outro como marcos de referencia te6ricos 0 debate sobre a relacao entre estatica social e dinamica social sofre com a diferenciacio poueo clara entre a pesquisa empirica de problemas sociol6gicos de curto prazo e os metodos de indagaCao apropriados a eles por urn lado e os modelos te6ricos pelos quais expicitamente ou nao 0 estudioso se orienta no equacionamento dos problemas e na apresentacao dos resultados da pesquisa por outro 0 emprego que Merton faz dos termos estatico e CfdinAmico no treeho acima citado demonstra com grande clareza essa falta de capacidade para diferenciar como quando ele diz que dentro da teoria de funCao sociol6gics a brecha entre estAtica e dinAmica pade ser transposta considerandose que discrepAncias tens6es e antiteses sao disfuncio nais em termos do sistema social existente e por conseguinte significam disfun cao mas sao uteis do ponto de vista da mudanca 5 As tendencias das naOes europeias para maior unificaCao podem certamente derivar boa parte de sua fora propulsora da consolidsao e ampliacao das cadeias de interdependencias acima de tudo nas esferas economics e militar Mas roi 0 cho que sofrido pelas autoimagens tradicionais dos paises euopeus qu deu origem em 270 o processo civiliador l todas essas nacoes a disposicao de adaptar suas atitudes hesitante e experimental mente pete menos no comeco Da direcao de maior interdependencia funcional a despeito da tradicao centrada Da oaCao A dificuldadedesse empreendimento reside precisarnente no CltD de que como resultado de uma socializacao de criancas e adul tos centrada Da nacao lodas elas ocupam a posiciio emocional dominante em seu pavo ao passo que a formacao transnacional mais vasta que eslli evoluindo possui no inieio para e1es apenas urna significacao racional mas dificilmente emocional 6 Esla diferenca mereceria urn estudo comparative mais extenso do que e pos sivel aqui Mas de modo gerat ela pade seT explicada em poucas palavras Tern a ver com 0 tipo e amplidao dos valores das elites de poder preindustriais que passam para os vaJores dos estratos industriais e seus representantes quando estes sobem ao poder Na Alemanha mas tambem em outros palses do continente europeu pode4se observar urn tipo de conservantismo burgues que e determinado em grall muito alto pelos valores das elites de poder dinAsticasagrAriasrnilitares preindustriais Esses va Jores incluem urn menosprezo muito forte por tudo 0 que e referido como 0 Mundo do eomereio isto e comercio e industria e urn valor inequivocamente mais alto atribufdo ao Estado ao todo social em contraste com 0 indivfduo Em todos os easos em que esses valores desempenharn urn papel importante no conservantismo du classes industriais eles compreensivelmente contem uma visivel tendncia antiliberal Nesta tradiao sentimentos negativos sao atribufdos a alta estima dapersonalidade individual da iniciativa individual e da avaliaCao eorrespondentemente mais baixa da totalidade estatal ou em outras palavras aos vatores do mundo comercial que plei teiam uma livre concorrincia Nos paIses em que membros da elite agniria preindustrial mantiveramse menos rigorosamente distaneiados na sua vida prAtiea e em seus vaJores das operaoes co merciais e de todos os que ganham a vida com essas operaOes e onde 0 parler dos prineipes e dos cfrculos de cprte como centro do Estado se viu limitado como DB Inglaterra ou inexistente como na America os grupos burgueses em sua ascensao gradual para se tomarem a classe dominante eriaram urn tip de eonservantismo que visiveJmente roi altamente eompatfvel com os ideais de oaojntervencao do Es tado de liberdade do indivfduo e por conseguinte com valores especificamente libe rais Mais serA dito no texto algumas das difieuldades especffieas desse nacionalismo liberalconservador desta defesa simultanea que aparentemente nao cria problemas do indivfduo e da naao como os mais altos vatores 7 A substituicao de uma ideologia orientada para 0 futuro por outra orientada para 0 presente e as vezes ocultada por urn passe de magica intelectual que pode ser reeomendado a qualquer soci61ogo interessado no estudo das ideologias como urn excelente exemplo do tipo rnais sutH de fonnacao de ideotogias A orientacao das vArias ideologias centradas oa ordern existente como 0 mailjl alto ideal prOOm As vezes 0 resultado de que os expoentes desses valores em particular mas nio ex clusivamente os expoentes de suas nuancas conservadorasliberais apresentarn suas posieoes como simples declaraeoes naoideo16gicas de fatos e restringem 0 eonceito de ideologia aqueles tipos que se propOem a mudar a ordem vigente especialmente dentro do Estado Urn exemplo do disfarce de ideologia no desenvolvimento da sO ciedade aterna e a bern conhecida Realpolitik Este argumento parte da ideiaj eon eebida como uma dec1aracao puramente de fato de que na poUtica intemacional todas as naeoes realrnente exploram seu poder potencial com vistas aointeresse na cional de maneira implacavel e ilimitada Esta aparente declaracao de fato serviu para justifiear urn ideal centralizado na naeao uma versiio moderna do ideal maquis velieo que afirma que a polftica nacional deve ser aplicada no campo intemacional aem eonsideraeao pelas demais mas exctusivamente no interesse naeional Bste ideal notQ3 271 da Realpolitike de fato irrea1 porque na verdade tOOas as nacOes dependem umas das outras Uma corrente semelhante de pensamento encontrada em tempos mais recentes e de conformidade com a tTadicao americana em forma mais rnoderada num livro de urn soci610go americano Daniel Bell que tern 0 revelador Utulo The End oJ Ideology Nova York 1961 Bell tambetn parte da suposicao de que a luta peto poder entre grupos orgllnizados ern busca de suas pr6prias vantagens IS urn fato Con clui deste fato de forma muito parecida com os defensores atemaes da Realpolitik que 0 polCtico na perseguilao das metas de pader de seu grupo deve internr sem compromissos eticos nas lutas de poder de diferentes grupos Ao mesmo tempo ale ga Bell que este programa nlio 6 uma profissiio de fe poHtica urn sistema de vaJo res preconcebido isto e uma ideologia ibid p 279 Faz urn esfono para limitaT esse conceito exclusivamente As doutrinas politicas que visarn a mudar a ordem exis tente Esquece que e possivel tratar a ordem existente nao apenas como urn simples fato mas como urn valoT lastreado em emolOes como urn ideal como algo que por TazOes morais deve existir Nao distingue a investigacao cienUfica do que 6 e a de fesa ideo16gica do que 6 como materiaHzacao de urn ideal altamente valorado TOT nase muito claTo que 0 ideal de Bell e 0 Estado que ete descreve como urn fato A democracia escreve outro soci6logo americano Seymour Martin Lipset nao e apenas au sequer principatmente urn meio atraves do qual diferentes grupos pos sam a1cancar seus fins ou buscar uma boa sociedade Ela 6 a boa sociedade mesma em operacao Political Man Nova York 1960 p 403 Mais tarde Lipset medifi cou ate certo ponto essa dec1araeao Mas este e outros pronunciamentos de impor tantes soci610gos americanos sao exempJos de como at6 mesmo Os representantes mais inteligentes da lIociologia americana tm poucas condieoes para resistir A pressao ex traordinariamente forte de sua sociedade para implantar a conformidade intelectual e como eata situaello lhes debilita as facutdades crfticas Enquanto isto acontecer en quanto os valores e ideais centrados na naello dominarem a eorizadOS principais soci6Iogos americanos em tal grau enquanto eles nao puderem preender que a socioIogia nilo pode ser conduzida de urn ponto de vista primariam te nacional tan to como a ffsiea a innuncia predominante dos mesmos representarm perigo mui to grande para 0 desenvoIvimento mundial dB sociologia Como se pode ver 0 fim da ideologia ainda nao est A vista entre os soci6Jogos Incidentalmente aIgo semelhante provavelmente teria que ser dito a respeito da sociotogia TUssa se a mesma exercesse anAloga influneia dominante Mas tanto quan ta sei embora esteja sendo feito na URSS urn niimero crescente de pesquisas 0 ciol6gicas dificilmente hli nesse pafs ainda uma sociologia te6rica Isto 6 compreen slvel porquanto seu lugar 6 ocupado na Uniao Sovietica nilo tanto peto sistema de Marx e Engels mas por urn edificio intelectuat marxista elevado ao tatus de urn credo Tal como a teoria americana dominante de socjedade a russa e urn construto te6rico baseado na naelio Deste lado tamb6m 0 fim da ideologia certamente nlio esta A vista na teorizacao sociologica Mas isto nao e rauo para que os estudiosos nao se esforcem ao mliximo para pOr fim a essa autoiluslio continua a esse mascara mento constante de ideais sociais de curto prazo como se fossem teorias sociol6gicas etemamente vlilidas 8 Talcott Parsons Societies Evolufioary and Comparative Perspectives En glewood Cliffs NJ 1966 p 20 Este processo ocone dentro da caixa preta que e a personalidade do ator 9 Gilbert Ryle The Concept 01 Mind Londres 1949 Iudice Remissivo absolutismo 15163651 86 154 183184204 agressividade atitudes em relaC8o a 93 190201 sadismo 191193200202 guerra 191 199 alerna Hngua 27 2936 e a burguesia 2735366364 alema literatura 3034 35373942 Ver tambem Alemanha Alemanha 2326 2729 30 3346 5253 burguesia 2728 29 3233 34384344454651536364 nobreza de corte 27293438 3942 intelligentsia 2729 30 3334 3942 4346 carater nacional 2326 2728 3839 49 50 fragmentacr80 politica 29313839 Ver lambtfm Kultur Zivilization Alembert Jean 61 alienaao 241243 Alphonsi Petrus 74 disciplina clericalis 74 Ampere Andre 4445 ansiedade 139140 168169 Ver rambem vergonha aristocracla 2728 29 3334 3438 39 394251525659 87 9192 109110 113 116119 139140 153155202203206208 Ver lambtfm burguesis classes distincao entre corte nobreza de Babees Book 7475 97 Barth Johann Christian 138 A etica galante 138 Baudeau61 Berry duque de 197198 Bildung 34434651 86 Ver tambem Kultur Boileau 30 Bteughel 206207 BOrger 37 Broe Pierre 163164 167 Des bonnes moeurs et honnestes contentallces 163 167 burguesia classe media 2729 3334 34383839424445465153 5356 5659 6064 8688 110111 142143 154155 184186 Ver tamWm aristocracia classes distiocr80 entre Intelligentsia Cabanes A 148 149 158 159 Moeurs intimes 148 149 159 Callieres Franois de 103 111112 117 118 120 122 De La science du monde et des connoisances utiles d La conduite de Ia vie 103 111112 Du bon et du mauvais usage 118 120 122 mots d La mode 117 Calviac C 101102 115 civilite 101102 camponeses 202203 205 208209 Ver tambem classes distincao entre Carlos 0 Temerario 203 casamento 182185 273 274 processo civililador Castiglione Giovanni 91 Courtier 91 cat6lica Igreja 67170172 Ver ambim cristianismo cavalaria 196 202213 Ver ambim ldade Media Caxton 9394 97 129130 Book oCurtesye 92 93 97130 Chatelet marquess de 143 China 128129 132 civilisation 13145153565861 6164 homme civilise 54 55 59 6162 VeT tambem civilite Frana Civilii 6768 7173 8283 8991 9495 110113212213 Ver ambim civilisation cortesia FraDlta civilizaY3o definiYiio de 131523 processo de 1315 16 18192425 252663649495 161162 182183 185188 198200 classes distimao entre3435 3639 48508689109111205206 Ver tambem aristocracia burguesia corte nobrez8 de camponeses comer e beber 73 7682 8890 9293 9599 104107 113118 129135 Ver lamhem comer utensfiios para mesa maneiras a comer utensflios para 7982 101103 113118 128136 garfos 8082 108109 132136 facas 128133 colheres 7980 Ver lambem mesa maneiras Ii Carote Auguste 223 227 Condorcet 62 Cordier Mathurin 68 142 Comeille Pierre 35 corporais atitudes em relalJao as funpes 7173 129140 140143 187190 Ver tambem modestia vergonha corte nobreza de 2729 3438 3942 5556 142143205208 Ver ambim aristocracia burguesia crtesia courtoisie Hojlichkeit 2829 4248497477 8284 86 9091 111112216 Ver tambtfm civilite Cosson ahade 108109 Coulange marques de 102 Courtin Antoine de 102103 106 109 122124 126128 133135 150 151 159160 Nouveau traite de civilite 102103 106 122123 157 159 crian9as 6768 8586 139146 168169 169177186188200 educa9ao 67688587168169 sexualidade 169177186190200201 vergonha 144146 cristianismo 67110112170172 195196204206 Ver ambim cat6lica Igreja Da Riva Bonvicino 74 79 9697 147148 154 courtesies 74 79 96147148 De Berry Ver Berry duque de DeclaralJao de independencia EVA 6061 Dedekind 87 Grobiauus 87 De la Roche Sophie 32 3940 delicadeza delicatesse 7173 122124 127129131132 140143 159160 Ver tambtfm modestia vergonha Della Casa Giovanni 88899094 101 136137143144 146147 149 156157159160 Galeeo 8889 9091 9293 100101136137143146147 149 156157 159 Descartes Rene 238239 240 241242 DEscouchy Mathieu 196197 Diderot Denis 3738 4445 Disticha Carons 76 199 Dryden John 34 Conquest of Granada 34 Durkheim Emile 220221 Eckermann Johann Peter 4244 4750 e1eatas 224225 embaralJo delicatesse Ver delicadeza vergonha emOlJoes controle das 8384144147 188189198200 Ver ambim psicogenese Engels Friedrich 227 Erasmo Desiderio 6770 7172 737482868890 100101 104 126135136139141 148 152 155156 163 169175 179181 186187 g Indice 275 Co6quios 84 170173 174175 176 179 De dvitae morum puerillum 6769 71727383848690100101 104 135136 148149 155156 163170171 Diversoria 84 escarrar 155161 Estado nacioDal Ver Inglaterra Frana Alemanha fala e seu uso 117121 122123 diferenas entre classes 116139 famOla como regulador social 142 144145 feudalismo Ver Idade Media Fichte 37 fisiocratas 5660 Flachsland Caroline 40 Fontane Theodor 49 Ein Sommer in London 49 Forbonnais 57 Frana 2426 3839 4264 aristocracia 38394251525659 burguesia 515556596064 Ver tambim civiliz89io civiliti francesa lingua Francesa Hogua os Alemanha 27 2933 Francesa Revolucao 31 Frederico 0 Grande 3135 De la lintfrature allemande 3134 Freud Sigmund VeT psicanalise Garland Johannes von 74 Morale scolarium 74 Gedoyn abade 112 De lurbanitt romain 112 Goethe Johann Wolfgang von 3133 3538 4041 4345 4749 Correspondencia com Eckermann 43 4345 Dichtung und Wahrheit 35 Gotz von BerUchingen 3133 3435 lphigenie 31 Werther 32 3638 4041 Gottsched 30 Ganinger Hain 3S Habirs of Good Society 128 131 132 Henrique ill 1 Henrique IV 149 152 213 Herder Johann Gottfried 32 35 37 40 Hoflichkeit Ver Cortesia Hobhouse 223 227 Holbach 6062 Systeme de La Nature 61 Systeme sociale 6062 Hugo de Silo Vltor 74 De institutione novitarum 74 Huizinga 171 194 Erasmus 171 Humboldt Alexander von 44 Idade Media 67 7382 203213 ilegitimidade 182183 Ver tamblm casamento Inglaterra 24 25 48 49 50 instintos repressao dos 142147 152154 155 181183 186 197200 Intelligentsia 2729 30 33 3942 4346 Kant hnmanuel 2728 29 3132 3538 5354 241242 Cdtica da raziio pura 31 Ideas sabre uma histdria universal do ponto de vista de um cidadao do mundo27 Klopstock Friedrich Gottlieb 32 35 Messias 32 Knigge 43 Kuhur 131423273033343738 4344 4546 50 86 88 e a identidade alerna 2326 e Zivilisation 2324284547 Ver tambim Alemanha Zivilisation La Fayette Madame de 183 La Princese de Clives 183 La Mesangere 151 Le voyageur de Paris 151 La Salle 103104 105108 133134 138139 150154 157158 163165 168 203 Les Regles de La bienseance el de La civilirt ehretienne 103 105106 107 133134 138139 140141 150151 152 153 157158 159160 163165 168 200201 lavagem 71 7779 Ver tambim limpeza 276 processo civilizador Leibniz Gottfried 2930 240 241242 Lessing Gotthold 32 35 Cartas sobre a literatuTa mais recente 35 Hamburgische Dramaturgic 32 Laokoon32 limpeza 7071 7779 158160 Luchaire 191192 194 199 Lus XIII 187 Lus XIV 29 57 152 Luis XV 60 maneiras na Idade Media 7382 na Renascena 8295 Ver tambem mesa maneiras a Marx Karl 223 227 Mauvillon E de 3031 38 Lettres Franroises et Germaniques 3031 Maximiliana 203 media classe Ver burguesia Merime Prosper 45 mesa maneiras a 6972 7881 8486 9293 9599 100108 Frana vs Alemanha 8486 Idade Media 9599 Renascellf8 99104 Ver tambim comer e beber comer utensilios para Milton John 31 Mirabeau Victor 54 56 5960 62 Ami des hommes 59 Theorie de limpot 60 Mittelalterliches Hausbuch 203209 modestia 70 86 136140 143144 162164 165168 186 Ver rambtfm vergonha Moliere leanBaptiste 30 momistica vida 164165 moralidade 27 153 Morisotus 174176 Johannis Morisoti medici colloquiarum libr quatour 174 mulheres papel das 183186 Napo1eiio I 6364 nariz habho de assoar 06970 7778 147151 Yer tambem cprporais fumoes natureza 3637 161162204 Nietzsche Friedrich 49 52119 Atem do bern e do mal 49 52 nudez 143144 165166 Ver rambim modestia vergonha Paris 4445 Parsons Talcott 218220 232 235237 238239 Peyrat Jean du 212213 politesse 5455 62 112 Yer tambem civilite Pope Alexander 30 34 psicaruilise 130131 146147 153 psicognese 1415 1617 1920 135 Yer rambem Sociogenese quarto comportamento no 162169 Quesnay Franois 58 Tableau economique 58 Racine Jean 12 35 Raynal 61 Hisroire philosophique et politique des erablissemenrs et du commerce des Europeens dans ies deux Indes 61 Reforma 36 5662 Renascema 8295 Ver ramMm Idade Media Roman de la rose 74 Rousseau JeanJacques 55 Russel John 75 Book of Nurture 75 sadismo 191193 200202 Ver rambim agressividade Sao Boaventura 8182 Scheidt Kaspar 87 Schiller Friedrich 31 35 3738 170171 Die Rauber 31 Don Carlos 31 Schubart 37 sexualidade atitudes em rel39ao a 168189 e crianas 169181 186188 e vergonha 178181 Shakespeare William 3132 34 35 206207 Julio Cesar 33 sociogenese 1415 1920 135188189 Ver tambem sociologia indice 277 J sociologia 214238 Spencer 223 Sturm und Drang 32 3536 Sulpicius Johannes 68 Tannhauser 74 7677 7879 95 121122 145146 Hosueht 75 77 7879 121122 145146 Tasso 30 tecnologia 2324 113114 71sehzuehten 75 95 trabalho 154155 Trinla Anos Guerra dos 29 3839 87 Turgot 57 61 ventosidades flatulencia 9395 136 140141 vergonha 1415 171882849394 136 139141 143145 160161 165167178181188189 Voltaire Frantois Marie 33 38 4445 526162 112 119 Brutus 33 Discours sur fa tragedie 33 Zaire 112 Von Raummer169170 172173 178182 A educat1o das meninas 179180 181182 Geschichte der Piidagogik 170 173 Weber Max 17 236 239 242 Weste Richard 137 Booke of Demeanor 136137 Winckelmann 37 Wolff 37 Wolzogen Caroline von 42 Agnes von Lilien 42 Woolf Virginia 242 Zarncke 156 Der deursche Cato 156 Zedler Universal Lexikou 2829 Zirklaria Thomasin von 74 79 Convidado italiano 74 79 Hofliehkeit 74 79 Zivilisation 24 26 28 4647 50 Ver tambcm Kultur meu guru atividade Para garantir a quantidade de páginas solicitadas deixarei cada tópico iniciado em páginas diferentes Introdução O filme O bicho de sete cabeças aborda a jornada do jovem chamado Neto interpretado pelo ator Rodrigo Santoro onde após o pai encontrar um cigarro de maconha em seu casaco decide o internar em um hospital psiquiátrico sem o consentimento do filho O filme retrata os diversos abusos sofridos pelo jovem que mesmo sem ser analisado devidamente foi medicado e usado pelo próprio médico para ser mais um paciente e com isso manter as verbas do governo para a instituição o que nos mostra que no período que ainda eram permitidos os manicômios no Brasil muitas vezes pessoas saudáveis eram expostas àquela realidade e acabaram desenvolvendo problemas neurológicos devido ao trauma os remédios e o tratamento de choque Após sua saída o rapaz se mostrou conturbado e em um estado quase catatônico retornando à instituição após perder o controle durante uma festa sendo internado em um hospital psiquiátrico prisional onde sofreu agressões de diversos níveis e até mesmo tentou cometer suicídio Neto mostrou remorso pelo pai mas ao sair daquela realidade pode sair e se tornar um ativista antimanicomial Por ser baseado em uma história real podemos ter uma breve noção da realidade de algumas pessoas que viveram essa situação no país O malestar na civilização Nessa obra Freud afirmava que existem três fontes de onde vem o nosso sofrer a prepotência da natureza a fragilidade de nosso corpo e a insuficiência das normas que regulam os vínculos humanos na família no Estado e na sociedade Se formos relacionar essa afirmação com o filme citado anteriormente podemos identificar esses três fatores primeiro citando a insuficiência das normas no meio familiar mostrando a fragilidade da relação de Neto com seu pai e a submissão da mãe além dos conflitos constantes justamente pela falta de comunicação e aplicação bemsucedida das normas Quanto à fragilidade do nosso corpo isso foi observável enquanto Neto ficou internado a primeira vez e como o excesso de medicamentos e o tratamento de choque o afetou de forma negativa podendo mostrar que o que é feito no corpo pode afetar até os fatores psíquicos e cognitivos Por fim quanto a prepotência da natureza Freud dizia que nunca dominaremos completamente a natureza e nosso organismo ele mesmo parte dessa natureza será sempre uma construção transitória limitada em adequação e desempenho ou seja ser quem ele era e as escolhas que tomou para si foi o bastante dentro do contexto familiar para que fosse colocado exposto a uma situação de internação e podemos relacionar essa prepotência com as consequências seguintes Boa parte da culpa por nossa miséria vem do que é chamado de nossa civilização essa frase de Freud nos faz refletir não somente quanto a história vivida por Neto mas por todos os outros ali internados e a realidade sofrida para que o filme fosse criado a situação de miséria falta de esperança desespero e abandono era clara em todos aqueles que eram submetidos pelos princípios e interesses da civilização a experimentarem aquela realidade Freud ainda diz nessa obra em meio a sua reflexão que descobriuse que o homem se torna neurótico porque não pode suportar a medida de privação que a sociedade lhe impõe em prol de seus ideais culturais e concluiuse então que se estas exigências fossem abolidas ou bem atenuadas isto significaria um retorno a possibilidades de felicidade Essa mensagem passada em 1930 pode ser relatada tão bem em um filme contemporâneo Em relação à época de Freud Deixando claro que de fato essa afirmação tem embasamento e foi representada de forma clara com a mudança de comportamento e o estado da psiquê de Neto após ser privado de sua liberdade daquela maneira Durante essa obra Freud faz uma crítica à civilização e o processo evolutivo dela nos fazendo refletir sobre as normas que são feitas não para beneficiar e garantir o bemestar de todos e sim estabelecer padrões para que aqueles que não pertencerem a esses padrões possam ser descartados e submetidos à situação de privação maus tratos e inferioridade assim como foi relatado no filme não só pelo personagem principal O processo civilizador Elias nos traz nessa obra uma visão mais sociológica sobre o desenvolvimento das civilizações humanas nos fazendo refletir sobre as aparências propriamente ditas levantando questionamentos sobre quando a educação vestimenta postura classe social e entre outros aspectos fez com que indivíduos passassem a receber postos distintos dentro de uma sociedade O desenvolvimento dos modos de conduta a civilização dos costumes como nomeia Elias ele busca provar nessa obra que não se trata de algo natural do ser humano e sim algo que passamos acreditar a medida da evolução das civilizações Todos esses questionamentos levantados por Elias também podem ser exemplificados através do filme O bicho de sete cabeças inclusive a partir do próprio título Se formos pensar chamamos assim algo complicado confuso e fora dos padrões de normalidade algo ou alguém que se encontra fora das normas da normalidade aceita socialmente e que por não sabermos como conviver com essa aberração buscamos meios de nos livrar dela Outro ponto que podemos pensar são em algumas falas ditas pelo pai de Neto como O que as pessoas vão pensar sobre essas suas atitudes ou Não quero que digam que tenho um filho maconheiro Essas falas são grandes exemplificações sobre como a civilização se tornou padronizada e o quanto os indivíduos lutam para serem pertencentes e manter aqueles que estão ao seu redor na mesma padronização Para Elias o que houve foi um condicionamento e um adestramento na nossa sociedade o que condiz com tudo que foi citado e exemplificado anteriormente Podemos notar através de sua obra que a evidência aparente parece não ter confirmado Elias no vetor que supunha ele continuaria orientando a evolução dos costumes humanos como foi dito por Ribeiro na apresentação da obra de Elias Afinal atualmente se privilegia mais a franqueza mais o desnudamento que o recato extremo tanto no plano físico como no psíquico Elias acreditava que o quão mais recatado e educado melhor aquele indivíduo seria aceito na sociedade por mais que atualmente a honestidade e a ideia de ser original agrade porém tudo só é aceito até certo ponto No filme essa questão foi demonstrada de forma clara com a reação das pessoas de fora da realidade e convívio familiar de Neto reagiram e olhavam para ele após ele ser liberto de sua primeira internação ou seja ele estava fora do padrão estabelecido como muito recatado mas já passava demais do limite de originalidade e problemas julgados aceitáveis na civilização Cultura um conceito antropológico Se oferecêssemos aos homens a escolha de todos os costumes do mundo aqueles que lhes parecessem melhor eles examinariam a totalidade e acabariam preferindo os seus próprios costumes tão convencidos estão de que estes são melhores do que todos os outros Essa afirmação feita por Laraia em seu texto chama bastante atenção justamente por nos lembrar que não se trata unicamente de um fator coletivo de uma mesma sociedade mas pode envolver princípios individuais No filme podemos notar isso tanto olhando individualmente para os personagens ou agrupando aqueles que tomam atitudes acreditando que estão fazendo o correto ou o melhor Esse ponto de vista não se trata apenas dos familiares de Neto mas até mesmo os médicos enfermeiros e outras pessoas manifestam que seus ideais sejam eles adquiridos de maneira cultural dentro da sociedade ou meio familiar são os ideais e tudo aquilo que foge dos seus princípios não deve ser aceito Podemos refletir a partir desse trecho de Laraia onde é dito que Mas outros obstáculos para a investigação das leis da natureza humana surgem das considerações metafísicas e teológicas A noção popular do livrearbítrio humano envolve não somente a liberdade de agir de acordo com motivações mas também o poder de quebrar a continuidade e de agir sem causa uma combinação que pode ser grossamente ilustrada pela analogia de uma balança algumas vezes agindo de modo usual mas também possuindo faculdade de agir por ela própria a favor ou contra os pesos Este ponto de vista de uma ação anômica dos desejos que é incompatível com o argumento científico subexiste como opinião manifesta ou latente na mente humana e afeta fortemente a sua visão teórica da história Trazendo um pouco para fora do contexto do filme o trecho acima nos faz pensar sobre a capacidade de cada cultura estabelecer o que é julgado certo e o que é errado e também determinar como serão tratados aqueles que não respondem a esse padrão muitas vezes sendo esses julgados como padrões de normalidade o que foi bem claro no filme Pessoas perdiam seu direito de ser livres simplesmente porque alguém os deixou ali sem exames sem amparo ou explicação isso foi manifestado logo na primeira internação de Neto nos fazendo pensar e repensar sobre onde a ciência alega que aquela situação era adequada E por que ela alega Onde estariam os direitos desses indivíduos E o mais importante por que muitas pessoas agiam como se aquilo fosse o ideal Microfísica do Poder Utilizando a sinopse para a coletânea de Foucault podemos saber que o seu conteúdo é espelhado no poder nas sociedades modernas sua configuração sua difusão no corpo social seu exercício em instituições sua relação com a produção da verdade as resistências que suscita Além disso eles explicam o método genealógico elaborado por Foucault para analisar como e por que os saberes se constituem a partir de práticas políticas e econômicas Toda essa temática abordada por Foucault através de entrevista é um conteúdo de extrema importância não só para os estudiosos mas para todos aqueles que fazem parte da sociedade já que de maneira reflexiva nos é permitido pensar sobre como o poder pode beneficiar alguns corromper outros e destruir quem fica abaixo disso tudo No filme um exemplo claro dessa hierarquização do poder nas instituições é o momento em que o psiquiatra está falando no telefone dizendo que aumentará o número de pessoas internadas para que as verbas governamentais continuem entrando No hospital ele era o cargo máximo e com isso ele aproveitou desse seu posto para manipular as informações de tempo de tratamento de Neto para seus familiares fazia que os enfermeiros acreditassem que estavam fazendo o certo e os ajudava a se sentirem superiores àqueles que eram usados apenas como instrumentos para manter o poder institucional da forma em que estava ou seja os chamados loucos viciados os que estavam ali para serem tratados mas viviam em situação de pura negligência Rejeitar a identificação entre poder e aparelho de Estado dando importância à rede de poderes moleculares que se expande por toda a sociedade segundo caracterizar o poder não apenas como repressivo mas também como disciplinar normalizador terceiro analisar o saber como peça de um dispositivo político que o produz e é intensificado por ele Esses foram os três objetivos de Foucault ele buscava aplicar o conhecimento como forma de poder provavelmente boa parte do seu conhecimento e entendimento colaboraria para que o Brasil não precisasse hoje de uma luta antimanicomial por talvez aquele tipo de instituição Construída daquela forma e relatada no filme de modo semelhante com a realidade existisse O conhecimento como forma de poder poderia evitar que os postos altos a burguesia assim dizendo se aproveitassem daqueles que estão mais vulneráveis para através de sua vulnerabilidade conseguirem benefícios próprios e que sim de fato aplicassem o conhecimento para um tratamento mais humano e adequado Conclusão O filme nos faz pensar em fatores sociais ligados não só ao bemestar generalizado e suas crenças como também nas consequências que foram geradas ao longo dos anos física financeira e psicologicamente àqueles que não faziam parte do que era estabelecido como adequado certo e normal pela civilização também nos mostrou como o poder financeiro e de status pode beneficiar ou negligenciar um indivíduo Os textos usados para se correlacionarem com a problemática do filme nos auxilia a ter um pensamento ainda mais profundo e maior entendimento sobre a mensagem a ser passada