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DAMATTA Roberto Digressão A fábula das três raças ou o problema do racismo à brasileira In Relativizando Uma introdução à Antrop o logia Social Rio de Janeiro Rocco 2010 p 6495 Síntese 1 A perspectiva sociológica encontra resistências no cenário social brasileiro As doutrinas deterministas têm primazia tomam a frente Destas doutrinas deterministas vale destacar o nosso racismo expresso na fábula das três raças Além disso abraçamos outros determinismos como as teorias positivistas de Augusto Comte e o marxismo vulgar fundado na definição abrangente de econômico e forças produtivas p 6465 2 O caso do racismo à brasileira deve ser visto como prova da dificuldade de se pensar socialmente o Brasil Observase o nosso sistema hierarquizado como plenamente de acordo com os determinismos que veem o todo como algo concreto com cada coisa em seu lugar p 65 3 Não há uma distância tão radical como às vezes su põe o senso comum acerca da Antropologia entre a ideologia e os valores defendidos pelo corpo social e as teorias eruditas ou científicas p 6567 4 É preciso denunciar a imagem do antropólogo como uma versão acabada de cientista natural Nesta consciência social brasileira o antropólogo surgiu como alguém que estuda as raças ou melhor o plano de evolução das raças uma questão de tempo biológico nunca tempo social historicamente determinado p 6768 5 Às vezes o antropólogo surge na consciência popular não apenas como um cientista natural mas como uma espécie de economista Marx percebeu que há um éter das relações sociais e de produção mas será necessário resgatar o humano dentro do social Isto será proposto na especulação sobre o sentido psicológico da fábula das três raças e suas implicações para uma antropologia brasileira realmente libertadora p 6869 6 Essa fábula é importante porque permite juntar as duas pontas de nossa cultura o popular e o erudito ou científico p69 7 Eis a profundidade histórica da fábula das três raças cujos elementos sociais são o branco o negro e o indígena da construção de sua presença empírica ao seu uso como recurso ideológico na construção da identidade social do brasileiro Diferente do que ocorreu nos Estados Unidos foi criado no Brasil um triângulo de raças fundamental na compreensão de uma ideologia dominante à esquerda e à direita sobre essa triangulação étnica p70 8 No caso brasileiro parece ter ocorrido uma junção ideológica básica entre um sistema hierarquizado real e sua legitimação ideológica Catolicismo formalista a partir da colonização portuguesa escravização de índios e negros motivada pela religião e pela política civilizatória p 7071 9 O formalismo jurídico era a pedra de toque das sociedades hierarquizadas Nosso sistema colonial estava fundado numa hierarquia moderna era necessário dar tratamento a quem era devido ninguém era igual perante a lei p 7173 10 C omo legitimar as diferenças internas do país Para tornarse independente era necessário buscar a própria identidade Se antes a elite podia colocar todo o peso dos erros e das injustiças sobre o Rei e a Coroa Portuguesa em Lisboa a partir da Independência a elite foi buscar legitimar ideologicamente essas diferenças injustas na fábula das três raças e no racismo à brasileira que permitem conciliar impulsos contraditórios de nossa sociedade sem lhe fornecer uma transformação profunda O marco histórico das doutrinas raciais brasileiras é o período que antecede a Proclamação da República e a Abolição da Escravatura com a crise nas estruturas sociais p 7476 11 Se a ideologia católica e o formalismo jurídico que vieram de Portugal não eram mais suficientes para sustentarem o sistema hierarquizado seria preciso uma nova ideologia o racismo Mas a fábula das três raças se constitui como a mais poderosa força cultural do Brasil ideologia dominante o encontro harmonioso das três raças no plano biológico natural Umbanda carnaval música etc p 7677 12 As fontes eruditas do racismo brasileiro a partir do século XIX encontramse no cenário intelectual europeu das teorias evolucionistas como instrumento do imperialismo Gobineau sustentava a tese de que a sociedade brasileira era inviável população mestiça híbrida p 7779 13 Mas quais os pressupostos dessas teorias racistas a que cada raça ocupa um certo lugar na história da humanidade b determinismo fatores intrínsecos ao seu componente biológico p 7981 14 Em nossa formação social cultural e histórica há fatores de permanência de racismo como ideologia e como tema de reflexão científica a nem toda forma de determinismo foi aceita para discussão por ex o determinismo geográfico b o racismo não é um fenômeno social regional p 8183 15 Uma sociedade fortemente hierarquizada de profunda desigualdade Ninguém é igual entre si ou perante a lei Neste sistema não há necessidade de segregar o mestiço o mulato o índio ou o negro porque as hierarquias asseguram a superioridade do branco como grupo dominante algo tipicamente brasileiro como o samba e o carnaval A falta de segregação está vinculada à patronagem intimidade e consideração Neste sistema há uma ausência de valores igualitários sistema vertical p 8384 16 Em sistemas igualitários e individualizados como no caso dos Estados Unidos o mestiço era visto como elemento indesejável n o sistema hierarquizado de relações raciais Dois pontos muito importantes a as raças humanas tinham qualidades mas b seria preciso condenar suas relações O mulato no credo racial americano é classificado como negro Este é o pontochave dos racismos arianistas sobretudo norteamericano o problema real é considerar cada raça em si nunca considerando suas relações O credo igualitário o individualismo e o ideal de igualdade perante a lei criavam obstáculos insuperáveis às uniões entre negros e brancos exceto no que se refere às relações de trabalho Daí a Guerra Civil americana p 8586 17 Diferentemente do Brasil onde havia várias categorias de negros com posições sociais diferenciadas no sistema com o credo igualitário norteamericano se propôs a discriminação violenta na forma de segregação legal fundada em leis Esta foi a forma coerente de uma sociedade individualista resolver o problema da desigualdade onde o credo igualitário tem importância social determinativa p 8687 18 No plano erudito das doutrinações científicas ocorreu a doutrina racial que desencorajava o mulato como indesejável Esta era a solução científica para o paradoxo social norteamericano que situava brancos e negros em posições realmente diferentes e ao mesmo tempo no plano políticojurídico buscavase alcançar o credo nacional do ideal igualitário p 87 19 Esses fatores explicam o horror dos teóricos norteamericanos diante da realidade brasileira de tipos raciais intermediários Esse foi o modo brasileiro de enfrentar os dilemas do trabalho escravo em nosso sistema altamente hierarquizado onde cada ser humano tem seu lugar determinado e onde a igualdade não existe Isto nada tem a ver com o traço cultural português que herdamos como pretendeu Freyre p 8788 20 Sílvio Romero e Nina Rodrigues são doutrinadores fundamentais de nosso sistema racial A supremacia do branco ariano foi vista por eles no quadro geral do triângulo racial ao contrário do que ocorreu no caso norteamericano onde as raças são situadas como realidades individuais e isoladas O preconceito racial americano é de origem com base no sangue negro no caso brasileiro o preconceito é por marca onde há nuanças e gradações a raça não é o critério exclusivo e único de classificação social mas múltiplo envolvendo dinheiro e poder político Na classificação social norteamericana única há uma clara correlação com o igualitarismo o individualismo e a ética protestante de acordo com Max Weber p 8890 21 Os tipos de preconceito racial correspondem às ideologias dominantes de cada sociedade O racismo à brasileira recebeu influência intelectual dos racismos norteamericano e europeu que partem de uma realidade mais igualitária mas temem a miscigenação Em nosso caso esta influência de intelectuais racistas estrangeiros foi transformada por meio de um cenário hierarquizado e antiigualitário Nosso racismo se orienta para os interstícios do sistema isto é onde convivem múltiplas categorias sociais intermediárias que formam a totalidade da triangulação racial p 9091 22 No racismo à brasileira o triângulo das raças apresenta o branco no topo da pirâmide e negro e índio como pernas desse esquema que representa nossa sociedade As interações são vistas pelos teóricos racistas brasileiros como reduzindo as diferenças concretas sociais políticas e econômicas com base em descontinuidades abstratas a partir da noção semibiológica de raças As intermediações triangulares a fábula das três raças propõem o adiamento do conflito e do confronto isto é evitando reconhecer diretamente o caráter desigual e injusto da sociedade Daí a invenção do mulato que permite evitar o dualismo exclusivista norteamericano ou branco ou negro mas preserva o preconceito racial de marca em oposição ao de origem internalizado e despercebido p 9192 23 O racismo no Brasil ocorre por deslocarmos a ênfase e a realidade do problema houve uma mistificação do racismo ao situarmos a questão na biologia e na raça Com isso evitamos o problema real que diz respeito à percepção dos mecanismos de exploração social e política Posições ambíguas e conciliatórias no que se refere aos campos social político e religioso estão na base de nossa sociedade que pretende evitar a todo custo o conflito e o confronto preservando o sistema antiigualitário p 92 24 O racismo no Brasil foi uma ideologia importada do homem branco europeu Passamos a utilizar a noção de raça no quadro ideológicopolítico geral brasileiro hierarquizado A noção de raça e racismo à brasileira têm um valor socialmente significativo até hoje porque importamos a doutrinação racial europeia Passamos a identificar raça com etnia e cultura mas isto não tem valor científico Do ponto de vista biológico a raça é uma variação genética e adaptativa de uma mesma espécie Mas raça passou a ser vista no Brasil como algo que se confunde com etnia tendo assim uma natureza Com essa formulação confusa escapamos de enfrentar os problemas reais Nosso racismo é uma ideologia racial às avessas antiideológica um racismo que quer combater os racismos uma variante uma imagem de espelho do racismo europeu e norteamericano p 93 25 Não é à toa que infelizmente continuamos a ver a Antropologia Social como estudo das raças O antropólogo é visto como o grande eugenista que mistura as raças para criar finalmente um tipo brasileiro abrangido pela raça humana ou pela metarraça branca Gilberto Freyre Darcy Ribeiro Esse conceito errado de raça se situa na mesma tradição de Gobineau Sílvio Romero e Nina Rodrigues ao falarmos em raças europeias africanas ou indígenas como categorias explanatórias p 9394 26 Essa discussão de raças é uma questão de ideologias e valores Nós brasileiros recriamos a hierarquia que forma nosso esqueleto social evitando estudar o que é mais importante as relações entre as raças preferindo sempre o estudo das raças em si mesmas Ora isto tem atrasado a percepção sobre nós mesmos como cultura específica colocando tudo em termos de raças e nunca discutindo suas relações deturpamos o problema Com isso nos deixamos determinar por motivações biológicas confundindo o biológico com o social e o cultural que não percebemos não temos a devida consciência A discussão de raças neste sentido semibiológico é uma ideologia social p 94 27 Agora que conhecemos essa doutrina errônea podemos retomar o caminho do estudo antropológico devotado ao entendimento do que é social histórico e aberto ao sol do futuro e da esperança p 9495 Prof Dr Luís Carlos Silva de Sousa Disciplina Sociedade Diferenças e Direitos Humanos nos Espaços Lusófonos
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corpo social e as teorias eruditas ou científicas p 6567 4 É preciso denunciar a imagem do antropólogo como uma versão acabada de cientista natural Nesta consciência social brasileira o antropólogo surgiu como alguém que estuda as raças ou melhor o plano de evolução das raças uma questão de tempo biológico nunca tempo social historicamente determinado p 6768 5 Às vezes o antropólogo surge na consciência popular não apenas como um cientista natural mas como uma espécie de economista Marx percebeu que há um éter das relações sociais e de produção mas será necessário resgatar o humano dentro do social Isto será proposto na especulação sobre o sentido psicológico da fábula das três raças e suas implicações para uma antropologia brasileira realmente libertadora p 6869 6 Essa fábula é importante porque permite juntar as duas pontas de nossa cultura o popular e o erudito ou científico p69 7 Eis a profundidade histórica da fábula das três raças cujos elementos sociais são o branco o negro e o indígena da construção de sua presença empírica ao seu uso como recurso ideológico na construção da identidade social do brasileiro Diferente do que ocorreu nos Estados Unidos foi criado no Brasil um triângulo de raças fundamental na compreensão de uma ideologia dominante à esquerda e à direita sobre essa triangulação étnica p70 8 No caso brasileiro parece ter ocorrido uma junção ideológica básica entre um sistema hierarquizado real e sua legitimação ideológica Catolicismo formalista a partir da colonização portuguesa escravização de índios e negros motivada pela religião e pela política civilizatória p 7071 9 O formalismo jurídico era a pedra de toque das sociedades hierarquizadas Nosso sistema colonial estava fundado numa hierarquia moderna era necessário dar tratamento a quem era devido ninguém era igual perante a lei p 7173 10 C omo legitimar as diferenças internas do país Para tornarse independente era necessário buscar a própria identidade Se antes a elite podia colocar todo o peso dos erros e das injustiças sobre o Rei e a Coroa Portuguesa em Lisboa a partir da Independência a elite foi buscar legitimar ideologicamente essas diferenças injustas na fábula das três raças e no racismo à brasileira que permitem conciliar impulsos contraditórios de nossa sociedade sem lhe fornecer uma transformação profunda O marco histórico das doutrinas raciais brasileiras é o período que antecede a Proclamação da República e a Abolição da Escravatura com a crise nas estruturas sociais p 7476 11 Se a ideologia católica e o formalismo jurídico que vieram de Portugal não eram mais suficientes para sustentarem o sistema hierarquizado seria preciso uma nova ideologia o racismo Mas a fábula das três raças se constitui como a mais poderosa força cultural do Brasil ideologia dominante o encontro harmonioso das três raças no plano biológico natural Umbanda carnaval música etc p 7677 12 As fontes eruditas do racismo brasileiro a partir do século XIX encontramse no cenário intelectual europeu das teorias evolucionistas como instrumento do imperialismo Gobineau sustentava a tese de que a sociedade brasileira era inviável população mestiça híbrida p 7779 13 Mas quais os pressupostos dessas teorias racistas a que cada raça ocupa um certo lugar na história da humanidade b determinismo fatores intrínsecos ao seu componente biológico p 7981 14 Em nossa formação social cultural e histórica há fatores de permanência de racismo como ideologia e como tema de reflexão científica a nem toda forma de determinismo foi aceita para discussão por ex o determinismo geográfico b o racismo não é um fenômeno social regional p 8183 15 Uma sociedade fortemente hierarquizada de profunda desigualdade Ninguém é igual entre si ou perante a lei Neste sistema não há necessidade de segregar o mestiço o mulato o índio ou o negro porque as hierarquias asseguram a superioridade do branco como grupo dominante algo tipicamente brasileiro como o samba e o carnaval A falta de segregação está vinculada 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discriminação violenta na forma de segregação legal fundada em leis Esta foi a forma coerente de uma sociedade individualista resolver o problema da desigualdade onde o credo igualitário tem importância social determinativa p 8687 18 No plano erudito das doutrinações científicas ocorreu a doutrina racial que desencorajava o mulato como indesejável Esta era a solução científica para o paradoxo social norteamericano que situava brancos e negros em posições realmente diferentes e ao mesmo tempo no plano políticojurídico buscavase alcançar o credo nacional do ideal igualitário p 87 19 Esses fatores explicam o horror dos teóricos norteamericanos diante da realidade brasileira de tipos raciais intermediários Esse foi o modo brasileiro de enfrentar os dilemas do trabalho escravo em nosso sistema altamente hierarquizado onde cada ser humano tem seu lugar determinado e onde a igualdade não existe Isto nada tem a ver com o traço cultural português que herdamos como pretendeu Freyre p 8788 20 Sílvio Romero e Nina Rodrigues são doutrinadores fundamentais de nosso sistema racial A supremacia do branco ariano foi vista por eles no quadro geral do triângulo racial ao contrário do que ocorreu no caso norteamericano onde as raças são situadas como realidades individuais e isoladas O preconceito racial americano é de origem com base no sangue negro no caso brasileiro o preconceito é por marca onde há nuanças e gradações a raça não é o critério exclusivo e único de classificação social mas múltiplo envolvendo dinheiro e poder político Na classificação social norteamericana única há uma clara correlação com o igualitarismo o individualismo e a ética protestante de acordo com Max Weber p 8890 21 Os tipos de preconceito racial correspondem às ideologias dominantes de cada sociedade O racismo à brasileira recebeu influência intelectual dos racismos norteamericano e europeu que partem de uma realidade mais igualitária mas temem a miscigenação Em nosso caso esta influência de 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é mais importante as relações entre as raças preferindo sempre o estudo das raças em si mesmas Ora isto tem atrasado a percepção sobre nós mesmos como cultura específica colocando tudo em termos de raças e nunca discutindo suas relações deturpamos o problema Com isso nos deixamos determinar por motivações biológicas confundindo o biológico com o social e o cultural que não percebemos não temos a devida consciência A discussão de raças neste sentido semibiológico é uma ideologia social p 94 27 Agora que conhecemos essa doutrina errônea podemos retomar o caminho do estudo antropológico devotado ao entendimento do que é social histórico e aberto ao sol do futuro e da esperança p 9495 Prof Dr Luís Carlos Silva de Sousa Disciplina Sociedade Diferenças e Direitos Humanos nos Espaços Lusófonos