·
Cursos Gerais ·
Português
Envie sua pergunta para a IA e receba a resposta na hora
Recomendado para você
Texto de pré-visualização
ODISSEIA HOMERO ODISSEIA HOMERO ODISSEIA HOMERO TRADUÇÃO CHRISTIAN WERNER ODISSEIA APRESENTAÇÃO RICHARD P MARTIN Proezas e performances A Odisseia traça o fim de uma viagem a volta ao lar depois de vinte anos de um guerreiro veterano e marinheiro sofredor Odisseu retoma a vida na ilha de Ítaca na hora certa Seu filho Telêmaco está no limiar da idade adulta plena enquanto a paciente esposa Penélope começa a perder as esperanças e considera a possibilidade de se casar outra vez É mais difícil dizer quando essa história começa porque o destino de Odisseu está ligado ao da cidade de Troia E sob certo ponto de vista a destruição de Troia pelas mãos das tropas gregas vingadoras estava em progresso havia muito remontando à origem do cosmos Podemos recriar a história dos mitos gregos que muito provavelmente eram conhecidos do público da Odisseia e lembrar que já em tempos antigos existiam variantes versões até mesmo contraditórias desses acontecimentos Dentre as fontes dessas histórias encontrase a Teogonia de Hesíodo mais ou menos contemporânea do surgimento da poesia homérica no século VIII aC e os chamados ciclos épicos dos séculos VII e VI aC completando o ciclo troiano dos quais chegaram até nós apenas citações fortuitas e poucos resumos de tramas de fontes posteriores Gaia a Terra foi uma das primeiras criaturas Ela tramou para que seu marido impiedosamente opressivo Urano céu fosse destronado pelo filho deles Crono que por sua vez foi derrotado por Zeus o neto favorito de Gaia num levante familiar de consequências universais Aconselhado por sua avó primeva Zeus conquistou a coroa do céu ao recrutar para suas batalhas contra a geração mais velha de deuses os monstruosos Cem Braços que tinham sido presos por tiranos divinos anteriores Também aconselhado por ela ele engoliu uma de suas primeiras esposas Métis inteligência astuta e assim armado com cautelosa sabedoria veio a garantir que seu próprio reino jamais fosse derrubado Em vez de gerar um filho mais forte que Zeus como havia sido predito Métis desamparada ficou bem encolhida dentro do marido e deu à luz Atena que nasceu já adulta da cabeça do chefe dos deuses Zeus portanto tinha uma dívida com Gaia Com o passar do tempo e as reclamações dela do fardo sempre mais pesado dos homens Zeus concebeu uma guerra de grandes proporções para diminuir a população mundial e aliviar a carga da superfície da Terra As condições para a guerra de Troia brotaram de outro casamento divino impedido um casamento de herói um estupro e um sequestro Zeus desejava a ninfa Tétis uma das cinquenta filhas do deus do mar Nereu Mas ainda uma vez temia que caso esposasse uma deusa poderosa um filho seu poderia acabar querendo substituílo Então inventou um motivo para casar Tétis com um mortal inocente Peleu como recompensa pelo comportamento devoto desse herói Foi nesse casamento esplêndido que Discórdia Éris que não fora convidada lançou entre os convivas uma maçã com a inscrição kallistei à mais bela Atena Hera e Afrodite reclamaram o prêmio O pai dos deuses escolheu um troiano chamado Páris para julgar a questão Rejeitando as promessas das outras duas deusas ele escolheu Afrodite e recebeu Helena como recompensa A mãe dela Leda fora certa vez possuída à força por Zeus disfarçado de cisne O nascimento esdrúxulo de Helena de dentro de um ovo pressagiava uma vida notável Quando atingiu a idade de casar tinha pretendentes em todos os cantos da Grécia Menelau filho de Atreu foi o eleito e para evitar qualquer conflito todos os pretendentes se viram forçados a um juramento de que tudo fariam para libertar Helena se algum dia ela estivesse em perigo Odisseu de Ítaca que havia sugerido essa ideia foi por sua vez ajudado pelo pai mortal de Helena Tíndaro que convenceu sua sobrinha primairmã de Helena a se casar com o jovem O nome dela era Penélope Por fim a fuga ou rapto como preferem alguns e suas consequências Numa visita a Menelau na residência do casal em Esparta Páris encontrou a recompensa prometida no concurso de beleza e com a ajuda dos dons sedutores de Afrodite convenceu Helena a partir com ele para Troia pondo assim em movimento a mobilização das forças gregas para punir o transgressor ocidental Nessa época Odisseu e Penélope acabavam de ser abençoados com o primogênito e o pai orgulhoso relutante em deixar Ítaca para recuperar Helena tentou enganar o grupo que o recrutava liderado por Agamêmnon irmão do marido ofendido Usando um gorro de pele embora fosse verão ele começou a arar seu campo com uma combinação ridícula de boi e cavalo Mas um dos visitantes Palamedes recusouse a acreditar que Odisseu fosse louco Pegou Telêmaco o filhinho de Odisseu dos braços da babá e colocou a criança na frente do arado Quando Odisseu desviou para não machucar o filho a mentira se revelou Lá foi ele para a guerra O cerco de Troia durou dez anos Depois da morte de Aquiles e Heitor os principais guerreiros de ambos os lados os gregos seguiram o conselho de Odisseu e se infiltraram na cidade escondidos dentro do Cavalo de Troia No caos e matança subsequentes a esse ataque surpresa Troia caiu mas o templo de Atena dentro da cidadela foi violado por invasores Consequentemente a ira da deusa perseguiria os gregos inclusive Odisseu na volta para casa O regresso dos heróis foi narrado numa epopeia antiga hoje perdida chamada Nostoi Algo semelhante a esse poema deve ser o corpo da canção de Fêmio o bardo local de Ítaca que canta para os pretendentes sobre a jornada de volta ao lar dos gregos fatigados pela guerra 1 325ss Mais adiante dentro da própria Odisseia tomamos conhecimento da volta bemsucedida de Nestor 3 130ss de como Ájax perdeu a vida da viagem tristemente retardada de Menelau e do retorno fatal de seu irmão Agamêmnon tudo em 4 351ss Cada uma dessas histórias contrasta com a narrativa geral da viagem de Odisseu Em particular a história de Agamêmnon esfaqueado pela esposa e pelo amante dela logo depois do retorno triunfal é uma advertência em forma de alerta explícito para Odisseu da parte de ninguém menos que a própria vítima no mundo inferior 11 441ss É aí também que Odisseu encontra o grande Aquiles que escolheu uma vida breve de glória em vez de uma vida longa de volta a sua terra natal Em outro notável contraste com o destino de seus antigos camaradas de combate Odisseu consegue ao mesmo tempo a fama e o retorno em segurança para obter a glória justamente através da volta para casa Nisso ele enfim se dá melhor que seu velho rival heroico Seu regresso a Ítaca envolve mais uma batalha dessa vez contra 108 jovens os arrogantes pretendentes de Penélope alguns deles seus conterrâneos da ilha Reempossado em seu devido lugar ladeado pelo filho e pelo pai Odisseu é um modelo de inteligência cuidado e perseverança É o suprassumo do sobrevivente Mesmo em tempos antigos reconheciase que a poesia homérica apresentava essas histórias da Guerra de Troia de uma forma singular No século IV aC Aristóteles em seu estudo sobre história e teoria literária a Poética 1459b observou que Homero toma apenas uma porção da história e faz uso de muitos episódios como o Catálogo das Naus e outros por meio dos quais diversifica sua poesia Mas os outros fazem seus poemas sobre uma pessoa um tempo uma ação com muitas partes da forma como o criador dos Cantos cíprios e da Pequena Ilíada fez Em resumo a epopeia homérica tem unidade enquanto os poemas cíclicos são apenas coletâneas Dessa forma a Ilíada focaliza apenas alguns dias do último ano da guerra a disputa entre Agamêmnon e seu melhor guerreiro Aquiles com seus resultados devastadores No final do poema Aquiles ainda está vivo o Cavalo e a queda de Troia ainda estão no futuro o poeta se esquiva de contar a saga toda Mesmo assim graças a alusões artísticas e justaposições dentro da história a força emocional dos acontecimentos futuros marca cada parte do poema Através da morte de Heitor pela mão de Aquiles e da incursão de Príamo ao campo grego para recuperar o corpo de seu filho sentimos no nível mais pessoal o páthos de uma cidade condenada Se a Ilíada é uma saga longa condensada de modo brilhante e intensamente focada a Odisseia é mais uma história simples contada através de uma narrativa complexa A história do herói da Guerra de Troia começa quase no final de seu retorno usa flashbacks para dar conta dos anos anteriores sincroniza diversas subtramas e apresenta eventos importantes sobretudo por lembranças e pela perspectiva de outros Em outras palavras já no começo da literatura ocidental quase todos os recursos do cinema e do romance modernos são expostos com maestria Os quatro primeiros cantos divisão tradicional do tamanho de capítulos do poema são um belo exemplo da narração indireta da Odisseia Não encontramos o herói Até mesmo seu nome é postergado em alguns versos uma vez que o poema começa com um substantivo genérico Do varão me narra Musa do muitasvias que muito vagou após devastar a sacra cidade de Troia Em vez de pôr Odisseu em cena desde o início o poeta engenhosamente nos faz ouvir outras pessoas falando sobre o herói os deuses sua esposa e filho aqueles que sentem saudade dele e aqueles que querem tomar seu lugar Seu impacto ganha mais força exatamente pela ausência É natural que a ausência de Odisseu tenha maior efeito sobre seu filho agora com vinte anos Telêmaco só conhece o pai pelo que contam os outros Mas então é posto em ação para sair e descobrir o destino de Odisseu por meio de uma combinação de fatores os planos dos deuses a crescente impaciência dos pretendentes de sua mãe e sua própria maioridade A história de sua própria odisseia em miniatura visitando os heróis que voltaram Nestor e Menelau e a trama dos pretendentes para assassinálo ocupam os quatro primeiros cantos Eles são chamados de Telemaquia ou a história de Telêmaco Muitos críticos do século XIX afirmaram que integravam outra composição agregada com pouca elegância ao poema Mas as escassas incoerências que embasaram essa crítica são em muito superadas pelas ressonâncias ricas e significativas que emergem quando lemos a Odisseia dessa forma como a história de um pai sendo aos poucos conhecido por seu filho Telêmaco dentro do poema é como nós fora dele um público para o passado heroico Essa estratégia poética não só é atraente e persuasiva em termos de narrativa como também é culturalmente adequada uma vez que as noções gregas de proeza heroica e história familiar sempre ligaram intimamente a fama de pai e filho Nos melhores casos os filhos dão continuidade à fama de seus pais ou a aumentam Odisseu na Ilíada chega a fazer juramentos com a expressão como pai de Telêmaco afirmativa de que aquilo que diz é tão verdadeiro quanto sua paternidade O próprio nome Telêmaco que quer dizer lutar longe é um adjetivo aplicável a Odisseu tanto com o sentido de arqueiro como de guerreiro que lutou na distante Troia mais que um epíteto adequado ao filho É como se a identidade do filho dependesse das ações do pai Ironicamente a Odisseia começa com Telêmaco duvidando que Odisseu seja de fato seu pai 1 21516 Um dos objetivos principais dos quatro primeiros cantos é mostrar que o jovem merece ser reconhecido pelos outros como filho de Odisseu e que possui as qualidades inatas que garantem seu laço paterno Nos quatro cantos seguintes do poema o centro da atenção é Odisseu então na última parte de sua viagem Ao mesmo tempo que Telêmaco sai em viagem para saber do pai perdido o herói começa a se aproximar de Ítaca A ausência fortuita de Posêidon da companhia dos deuses permite que Atena com o consentimento de Zeus liberte seu favorito da ilha de Calipso onde estava preso havia sete anos cada dia mais inquieto embora junto da bela ninfa Outro naufrágio levao à terra dos feácios onde Odisseu revelando sua identidade convence a família real a lhe dar retorno seguro para casa O poema deixa claro que Odisseu fascina sua plateia com uma performance muito parecida com a do poeta real da composição ele assume o posto de narrador nos quatro cantos seguintes tecendo uma história de suas aventuras anteriores que inclui canibais gigantes feiticeiras sedutoras monstros marinhos videntes mágicos fantasmas ingredientes eternos das histórias populares de todo o mundo elaboradas numa narrativa autobiográfica Ao mesmo tempo que oferece a história desse marinheiro a Odisseia se dá ao trabalho de construir um pano de fundo cuidadosamente nuançado da história que Odisseu relata Nós o vemos encantando a plateia ouvimos as reações dessa mesma plateia inclusive quando decidem cobrir o narrador de mais presentes podemos imaginar o bardo local Demódoco escutando com admiração e inveja esse contador de histórias recémchegado tudo isso certamente para indicar como nós como plateia devemos receber e apreciar toda a Odisseia homérica Mais eletrizante ainda ao colocar assim a odisseia das aventuras do herói o poeta nos provoca com a ideia de que toda a autobiografia pode ser ela própria em grande parte uma conveniente ficção Podemos notar a sequência e a forma dessa performance solicitada As histórias que Odisseu relata parecem seguir um ritmo de dois episódios curtos depois um longo mais dois curtos seguidos de outro longo Por exemplo os cícones e os lotófagos são descritos em menos de quarenta versos eles levam ao episódio dos ciclopes que faz uso de dez vezes mais versos para ser narrado O mesmo acontece com as três histórias seguintes Eolo curta lestrigões curta e Circe longa O efeito é quase o de uma maré Outro padrão sutil vem à tona se considerarmos os episódios em termos sociais Cada lugar que Odisseu descreve representa uma variante das condições de vida grega se definirmos essas condições básicas como uma família estendida a adoração dos deuses centrada no sacrifício e a agricultura Os ciclopes são um exemplo negativo eles não têm agricultura não têm leis vivem sozinhos e não se reúnem em assembleias deficiências inconcebíveis numa comunidade grega Os lotófagos vivem aparentemente sem memória cultural e levam os outros a esquecer Circe e Calipso deusas que vivem sozinhas encarnam o que é impossível para mulheres gregas Os feácios por outro lado parecem quase gregos Adoram deuses reconhecíveis gostam de canções de bardos e apreciam esportes competitivos Mas estão distantes de qualquer conflito real e portanto do heroísmo uma limitação impensável para comunidades antigas de verdade Em resumo a história de Odisseu funciona como uma lente de aumento ou vara de medida esclarecendo e marcando o que se define como humano e helênico Não surpreende que pesquisadores em busca de alegorias tenham encontrado terreno fértil nessas histórias Uma linha de leitura já corrente no século II aC via a jornada de Odisseu como a saga de toda alma seduzida pelos bens e preocupações do mundo mas resistindo ao canto das sereias e conseguindo voltar a seu lar celestial Em tempos mais recentes a crítica psicanalítica descobriu fantasias oralnarcisistas ou simbolismo fálico subjacentes ao texto Ambientalistas podem ler nessas histórias considerações sobre o uso e abuso dos recursos naturais ou uma celebração da tecnologia Tal flexibilidade e infinita riqueza de sugestões mantém a história viva No plano cognitivo podemos traçar uma curva ascendente ao longo das recordações de Odisseu e encontrar a história da educação De seu selvagem ataque pirata inicial aos cícones até seu desafio quase fatal ao ciclope enraivecido e mais além até sua perda de tudo o que tinha ficamos com a sensação de que o herói de fato aprende Ele se tornou mais sábio e nos torna mais sábios por ter visto as cidades e captado o modo de pensar de muitos povos Embora seja um momento central e um tour de force dentro da Odisseia a história de aventura contada do canto 9 até o 12 na voz do próprio herói surpreendentemente constitui apenas um sexto de todo o poema No entanto cristaliza e destila todos os temas principais do resto da composição Muitos dos temas presentes na história das aventuras são desenvolvidos do canto 13 até o 24 abrangendo o tempo da volta de Odisseu a Ítaca através dos encontros com seus criados e seu filho da luta com os pretendentes e do tão esperado encontro com a esposa Por exemplo por essa história ficamos sabendo como Odisseu com frequência deparou com terras desconhecidas e então o vemos fazendo mais uma dessas descobertas mas a de sua própria ilha Ouvimos a respeito do poder de mulheres espertas Circe e Calipso sobretudo enquanto na história externa contada pelo poeta mais que pelo próprio Odisseu tais figuras fortes são recorrentes na forma de Penélope Clitemnestra e a rainha feácia Arete talvez não por coincidência parte da plateia da história contada por Odisseu A comida sempre reaparece constituindo problemas distintos nos episódios dos lotófagos do ciclope de Circe e em especial do gado de Sol enquanto a narrativa externa lida com o apetite insaciável dos pretendentes De fato o poema toma o cuidado de traçar um paralelo entre a tripulação inconsequente de Odisseu que devorou os rebanhos de Sol e os arrogantes pretendentes exaurindo em continuação o estoque doméstico do herói ausente Assim como o deus destruiu os homens de Odisseu o guerreiro que volta para casa eliminará os intrusos Disfarce astúcia o uso inteligente da persuasão tudo isso ocorre na história interna dos cantos 9 a 12 e encontra ressonância na narrativa mais geral E por meio do episódio do ciclope seu comportamento sua cegueira o cumprimento da maldição de Posêidon nossa atenção é atraída especialmente para a noção de justiça cósmica Esse conceito chamado diké abrangia para os gregos arcaicos não apenas o funcionamento adequado da natureza mas de todo tipo de relações sociais sobretudo o tratamento adequado aos estrangeiros Não por acaso a história geral faz de Odisseu um vingador que retorna um algoz da hubris dos pretendentes um restaurador da ordem e um representante da justiça de Zeus na terra Sob essa luz a performance permanente da Odisseia na cultura grega representou não apenas um entretenimento duradouro mas uma constante reafirmação de valores culturais da busca de uma sociedade por sua estabilidade e inteireza Poema e poeta De onde vem a nossa Odisseia Talvez seja útil recuar no tempo As traduções contemporâneas do épico partem de uma edição grega do poema bastante padronizada quase sempre o texto da Oxford Classical editado por Thomas W Allen 2ª ed 19171 O texto de Allen para a Oxford foi resultado de muitos anos de minucioso trabalho editorial Como esse processo é crucial para o estabelecimento de um texto porém invisível para a maioria dos leitores vale a pena delinear aqui o básico Edições impressas da Odisseia estão em circulação desde 1488 quando Demetrius Chalcondyles um grego que vivia em Florença usou pela primeira vez a tecnologia recém inventada do tipo móvel para conservar a joia da literatura grega antiga a poesia homérica Até então os poemas haviam sido transmitidos apenas em manuscritos laboriosamente copiados à mão Cerca de cem desses manuscritos da Odisseia chegaram aos nossos dias Estão guardados em bibliotecas por toda a Europa de Moscou Bratislava e Viena até Florença Veneza Cidade do Vaticano Munique Paris e Oxford e suas datas variam do século X dC ao século XVI alguns tendo sido produzidos mesmo depois do surgimento da imprensa Todos esses exemplares são baseados em manuscritos ainda mais antigos que não existem mais copiados por escribas profissionais gregos monges ou leigos em pergaminho ou em séculos mais recentes em papel Um estudioso que busque uma visão mais completa de uma obra antiga não pode confiar apenas nas primeiras edições impressas mas deve recuar tanto quanto possível na direção da antiguidade Portanto através de uma combinação de viagem e pesquisa do uso de facsímiles ou relatos de outros estudiosos Allen fez uma colação ou trabalho de comparação sistemática palavra por palavra de todos os manuscritos que conseguiu encontrar Quando existem tantos manuscritos gregos como é o caso de Homero e mais ainda do Novo Testamento há variações inevitáveis de um para outro Isso se dá por causa da atividade generalizada de fazer cópias e cópias de cópias de um texto popular no tempo anterior à imprensa Todo escriba podia cometer erros mesmo quando muito atento Às vezes os próprios escribas estavam fazendo cotejos e combinando a informação de diversos manuscritos a seu dispor As diferenças são em geral pequenas mudanças de tempo verbal uso de uma forma mais antiga ou mais recente de um adjetivo variações de grafia e assim por diante Em diversos documentos porém a variação tem de fato um impacto sobre a trama ou a caracterização Allen editou tudo aquilo em que os manuscritos coincidiam e onde eram discordantes escolheu a melhor variante baseado no que sabia sobre uso estilo métrica e dicção poética homérica É evidente que os editores da Odisseia e eles têm sido muitos ao longo dos séculos nunca concordam quando se trata de escolhas individuais quanto à melhor leitura Às vezes para dar sentido a uma passagem um editor recomenda uma palavra ou forma grega que não ocorre em nenhum manuscrito a chamada emenda Por isso edições acadêmicas como a de Allen sempre registram ao pé de cada página as variantes e uma seleção das especulações de editores anteriores Dois exemplos podem esclarecer o processo 1 Quando a tripulação de Odisseu estava esperando o ciclope voltar à sua caverna acenderam uma fogueira Tendo lá aceso o fogo e fizeram oferendas aos deuses sacrificamos conforme McCrorie traduz o verbo grego ethusamen seguindo o texto de Allen para Od 9 2312 O editor da Oxford escolheu seguir versões em que esse verbo aparece caracterizando os homens como cumpridores do rito Mas como consta em suas notas diversos manuscritos inclusive um exemplar do século XI de Florença atribuem ao verbo grego desse verso o sentido de restos apenas em lugar de sacrifício detalhe pequeno mas que dá colorido à passagem 2 Às vezes a parte questionada se estende por vários versos como no verso 93 do canto 1 quando Atena está descrevendo como irá inspirar Telêmaco a viajar em busca de notícias do pai O verso em todos os manuscritos diz Vou enviálo a Esparta e à arenosa Pilos No entanto em uma família bastante grande de manuscritos correlatos seguemse dois outros versos E dali para Creta até o senhor Idomeneu que foi o segundo a voltar de Troia Evidentemente esses versos não correspondem à trama do poema na forma como nos chegou em nenhum manuscrito Telêmaco nunca vai a Creta Mas eles nos provocam com a possibilidade de ter existido uma versão mais elaborada da Telemaquia cantos 14 do poema Essa foi a trajetória da Odisseia até a Idade Média Devemos ter presente que no período anterior ao Renascimento italiano seria difícil que alguém na Europa Ocidental conhecesse o poema diretamente Caso se fizesse alguma ideia de quem era Odisseu era por meio de citações latinas do final da Antiguidade ou pela menção de Ulisses a versão latina de seu nome por autores romanos bem conhecidos como Virgílio Ovídio Sêneca Horácio e Estácio Dante que coloca Ulisses no canto 26 de seu Inferno conhecia ou inventou uma versão do destino do herói totalmente distanciada da tradição grega e com certeza ausente em Homero A partir do século XIII e em especial depois da queda de Constantinopla para os turcos otomanos em 1453 uma corrente de estudiosos gregos emigrou para a Itália e se voltou para o Ocidente É plausível que devamos a disseminação de manuscritos da Odisseia a esses intelectuais bizantinos e seus alunos O negócio de copiar o poema de geração em geração havia se expandido às terras falantes do grego ainda na Antiguidade Os manuscritos medievais em que a tradução de McCrorie se apoia em última análise são um pontofinal Mas como podemos dizer se esses manuscritos o mais antigo é de cerca do ano 900 de nossa era preservam com alguma exatidão o que os gregos da era arcaica sabiam da Odisseia de Homero Ainda hoje a questão suscita acalorados debates entre homeristas Uma espécie de fonte de controle do nosso texto veio de fato crescendo ao longo do século passado especificamente fragmentos de papiros isto é pedaços de rolos antigos Material de escrita barato e então muito difundido feito de fibras vegetais o papiro apodrece na maioria dos climas Felizmente a areia seca do Egito que era um centro de cultura grecoromana preserva esse material Exploradores do século XIX descobriram grande quantidade de papiros em geral rasgados em antigos monturos de lixo ou usados para forrar esquifes de múmias Esses papiros que arqueólogos continuam descobrindo todos os anos em geral contêm apenas poucas linhas Mas o que sobrevive datado de cerca de 300 aC a 200 da nossa era é suficiente para demonstrar que os textos dos livros manuscritos medievais preservam em termos gerais os mesmos versos conhecidos pelos leitores de Homero em rolos de papiro da Antiguidade Mas o caminho dá algumas voltas até recuarmos ao período grego arcaico quando a Odisseia foi registrada por escrito Em primeiro lugar não se pode ignorar o fato de que uma porção dos primeiros textos em papiro contém versos extras comparados aos textos padrão construídos em manuscritos completos na Idade Média Os versos desses papiros espúrios por assim dizer soam como preenchimento descrições adicionais ou cenas complicadas que no geral têm paralelos em outros pontos do poema De onde vêm esses versos Muito possivelmente refletem várias tradições de recitação do poema correntes por volta de 300 aC Aqui entra um segundo fator o academismo antigo Logo depois da época de Alexandre o Grande que difundiu a cultura grega até a Índia surgiram dois grandes centros de conhecimento um em Pérgamo cerca de 120 quilômetros a sudeste da antiga Troia no que é hoje a Turquia e outro em Alexandria no Egito A poesia homérica era não só a favorita de Alexandre dizem que ele dormia com uma cópia da Ilíada debaixo do travesseiro como também um símbolo valioso da difusão da alta cultura grega Intelectuais gregos ardorosos eruditos e competitivos reunidos em centros de estudos mantidos pela realeza escreviam e discutiam sobre a poesia homérica em todos os detalhes concebíveis desde o uso de pronomes até a dieta alimentar dos heróis observavam atentos que as personagens nunca comiam peixe Um resultado de toda essa atividade acadêmica de Zenódoto Aristófanes de Bizâncio e do grande Aristarco foi ao que tudo indica o estabelecimento de um texto antigo razoavelmente padronizado por volta de 150 aC pelo menos depois dessa data versos extras ocorrem com muito menor frequência nos papiros A Odisseia e a Ilíada devem ter passado por uma espécie de processo de peneiramento uma padronização que lamentavelmente pode ter apagado algumas variações interessantes que floresceram até então Alguns estudiosos especulam que a Odisseia devia ser por volta de 400 aC um tanto mais longa do que a nossa versão ou bem diferente dependendo da cidade onde se adquiria o texto ou o que é mais presumível de quem o recitava Platão que nasceu em 427 aC cita como homéricos muitos versos que não existem em nenhum de nossos textos ou que têm construção bastante diferente À medida que recuamos no tempo a Odisseia se encontra mais e mais nas mãos de intérpretes orais como o rapsodo costurador de canção chamado Íon em torno de quem Platão escreveu um diálogo homônimo Esse recitador no relato literário de Platão diz ter conhecimento enciclopédico porque conhece a poesia homérica muito bem e Homero já era considerado um sábio universal na época de Platão Essa parece ser uma atitude comum em relação ao poeta do século V aC quando grande parte do que era tido por educação se construía no aprendizado detalhado das epopeias Como rapsodo Íon competia com outros intérpretes em festivais internacionais Ele costumava também explicar Homero nos intervalos da apresentação dos poemas como uma palestra dramática Não é difícil imaginar esses intérpretes rapsódicos variando expandido ou enfatizando trechos do poema conforme as particularidades do público Não existe nenhuma prova de que se limitassem a um texto exato É possível também que as andanças de Odisseu fossem representadas por intérpretes que estavam eles próprios acostumados a viajar de uma praça a outra sem parar Essa associação entre herói fictício e poeta de fato ocorre ainda hoje entre cantores épicos egípcios como demonstrou o folclorista Dwight Reynolds Não parece enfim muito distante do rapsodo historicamente comprovado intérprete que afirma reproduzir a Odisseia de Homero o fenômeno de um poeta de maestria oral compor no próprio ato da performance e variar sua composição de acordo com a plateia da forma como poetas orais e mesmo cantores de rap ativos hoje em dia em várias culturas ainda costumam fazer Mas aqui chegamos às regiões mais turvas na busca pela Odisseia o reino da chamada questão homérica Será que existiu de fato um bardo chamado Homero Se existiu terá sido ele o primeiro a escrever ou ditar a Odisseia e a Ilíada E se era um poeta oral praticante o que o ou a motivou a mudar de tecnologia Não sabemos com certeza data local ou circunstâncias do registro escrito da Odisseia É bem provável que o poema tenha se cristalizado ao longo de gerações de performances orais ao vivo e competições no período entre 800 aC e 500 aC Ao que tudo indica foi registrado por escrito bastante tarde talvez sob o patronato dos governantes Pisistrátidas de Atenas c 540510 aC em função dos concursos de poesia homérica em festivais veja Nagy 2002 Tampouco contamos com qualquer informação confiável a respeito do poeta Homero Os gregos do período clássico acreditavam que ele tinha vivido na Jônia hoje costa ocidental da Turquia cerca de quatrocentos anos depois da Guerra de Troia que teve lugar segundo a avaliação antiga por volta de 1150 aC É totalmente possível que um grande intérprete chamado Homero tenha existido na época mas é pouco crível que tenha sido responsável por nossa Odisseia em sua presente forma Mesmo que ele seja o autor num sentido moderno responsável pela escolha de cada palavra do poema conforme o conhecemos hoje não devemos esquecer que a obra como demonstram suas alusões estilo e linguagem arcaica artificial também deve ser extremamente tradicional As diversas camadas linguísticas da Odisseia sugerem que alguns elementos devem ser oriundos do próprio período que celebra a época dos heróis da era micênica c 16001200 aC Portanto existe ao menos uma verdade simbólica embutida em uma das muitas lendas que circularam a respeito de Homero segundo a qual ele era o filho de Telêmaco filho de Odisseu Independentemente de quando o poema tenha sido concebido seu autor graças à Musa sentiuse em contato quase imediato com seus eventos O resultado é a composição vívida e eterna que podemos ler ouvir e avaliar ainda hoje A técnica homérica A textura da Odisseia e da Ilíada a construção de cenas discursos e versos pode ser mais bem apreciada à luz de técnicas encontradas em epopeias tradicionais orais do tipo apresentado ainda hoje em algumas partes do mundo sobretudo na Ásia Central e na África e antes comum em toda a Europa Cinco argumentos que se entrelaçam sustentam a ideia de que a poesia homérica como a conhecemos vem de uma forma artística que não contava com a escrita Primeiro o poema em si descreve a arte de narrar histórias sobre heróis e deuses empregando palavras relacionadas a canção nunca mencionando escrita ou mesmo recitação Por exemplo o cantor feácio Demódoco no canto 8 canta três composições bastante diferentes duas delas semelhantes a flashes de noticiário a respeito da Guerra de Troia enquanto a terceira relata como o deus Hefesto surpreendeu sua esposa adúltera Afrodite Fêmio o bardo de Ítaca respondendo ao capricho da plateia os inquietos pretendentes de Penélope canta sobre a volta desastrada dos gregos inclusive Odisseu como esperavam os pretendentes Penélope pode pedir que ele mude de assunto 1 33744 assim como Odisseu pode pedir uma performance específica a Demódoco 8 492 A poesia de Homero pode não ter sido composta dessa maneira interativa aberta à plateia mas pelo menos quer supor suas raízes em situações assim A Odisseia é uma história poderosa uma narrativa sobre a memória a volta para casa a necessidade humana e o desejo É também um poema finamente tecido com todo o poder e a beleza que brotam do uso preciso de palavras e imagens Mas acima de tudo é resultado de uma tradição centenária de apresentações públicas uma tradição que a poesia em si identifica com o cantar de histórias No grego homérico o poeta é um cantor aoidos e seu trabalho é a canção aoidé palavra que acaba entrando para o inglês e para o português como ode A Odisseia começa com o poeta pedindo a uma deusa que conte a história do muitasvias Ele invoca uma Musa uma das nove filhas de Memória Não por acaso essas divindades narrativas nos emprestam a palavra música Mais uma vez a poesia homérica se apresenta como algo que vai além do discurso comum algo mais perto da voz especial dos deuses uma forma de arte próxima do puro som harmonioso A tradição da canção épica que nos legou a Odisseia está longe de ser primitiva Ao contrário a poesia homérica é consciente ao extremo de seu próprio instrumento A Odisseia ainda mais que a outra grande epopeia que chegou até nós a Ilíada reflete repetidas vezes sobre o poder do canto narrativo para entronizar os feitos dos heróis e transmitilos às gerações futuras Consequentemente na cultura que o poema descreve os cantores ocupam um lugar de alta honra Para um pretendente a herói não entrar no repertório épico de um cantor significava o esquecimento no que diz respeito ao futuro renome Colocando de outra forma a razão pela qual hoje conhecemos Odisseu e Aquiles Helena e Penélope é que a poesia épica cumpriu sua orgulhosa e ambiciosa promessa de imortalidade de fama imorredoura A etimologia da própria palavra para fama na linguagem homérica deixa claro até que ponto todo esse sistema do canto celebrador dependia do desempenho oral Pois kleos fama ou glória é literalmente aquilo que é ouvido A palavra inglesa loud sonoro alto e clamor em português pela via do latim clamor vem da mesma raiz Segundo as evidências arqueológicas demonstram que algo como a Guerra de Troia ocorreu na região descrita nos poemas com armas de bronze como aquelas que Homero descreve e com a consequente destruição e deslocamento de populações Além disso a datação tradicional antiga da guerra no século XII aC se encaixa no relato homérico de uma geração heroica final Mas a escrita alfabética para registrar os relatos em verso ou prosa dessa guerra só estava disponível na Grécia em 800 aC na melhor das hipóteses pela estimativa da maioria dos estudiosos pelo menos trezentos anos à frente Portanto uma tradição oral de algum tipo deve ter existido antes dos textos homéricos A evidência da língua de Homero fornece uma terceira confirmação O grego da Odisseia nunca foi uma língua falada em nenhuma época ou região Multifacetado e às vezes bastante conservador o dialeto homérico parece ter sido forjado por e para poetas entre outras peculiaridades contém formas que não possuem nenhuma base histórica em comparação com outras línguas correlatas mas que são convenientes para a métrica Ao mesmo tempo retém uma porção de formas de um dado conceito tal como pertencente a mim mas apenas quando as formas mantêm métricas distintas úteis como superior e super em português que oferecem convenientemente alternativas métricas ao poeta Em resumo a língua poética é tradicional e abarca gerações A quarta prova de um Homero oral vem da dicção poética Em sua pesquisa de doutoramento nos anos 1920 e 1930 sobre fórmulas repetidas na poesia homérica um jovem californiano Milman Parry descobriu que havia uma economia em ação ao investigar com rigor o sistema bem conhecido de adjetivos aplicados a personagens importantes dos poemas Os personagens chamados de péligeiro Aquiles e muitaastúcia Odisseu são descritos em outros versos do poema como o brilhante Aquiles ou o muito hábil Odisseu Quando isso acontece não há mudança perceptível na ênfase narrativa Ao contrário os sintagmas em questão produzem uma forma métrica diferente É preciso ter em mente que o verso homérico consiste de seis pés com os cinco primeiros compostos ou por um dáctilo uma sílaba longa mais duas curtas UU ou um espondeu duas sílabas longas O último pé do sexto verso é um espondeu ou um troqueu uma longa e uma curta U uma marcada concluindo o efeito rítmico que a tradução de McCrorie capta brilhantemente Ora o adjetivo péligeiro com o nome Aquiles é em grego podas ókus Akhilleus sintagma que preenche uma posição métrica ocupando dois pés e meio do verso hexâmetro dáctilo UUUU Mas se substituirmos pelo adjetivo brilhante ao lado do nome do personagem obteremos um segmento métrico curto ocupando dois pés dios Akhilleus UU Contando esses sintagmas Parry provou que para todas e cada uma das figuras heroicas ou divinas principais em Homero existia um e quase sempre apenas um epíteto por posição métrica e caso gramatical sujeito objeto genitivo e assim por diante Portanto a poesia homérica mais uma vez representa uma forma artística tradicional multigeracional pela simples razão de que nenhum poeta individual teria a motivação de divisar tal sistema tão completo e econômico Ela foi criada provavelmente para a composição rápida do verso na performance ao vivo conforme a poesia efetivamente apresenta a si própria com coerência O quinto argumento o da prova comparativa está relacionado ao anterior Parry e seu colaborador Albert Lord descobriram em trabalho de campo na antiga Iugoslávia que sistemas de dicção extensos e úteis semelhantes a esse eram empregados por intérpretes iletrados da poesia heroica tradicional servocroata3 Desde seu trabalho dos anos 1930 pesquisadores de campo confirmaram essa tendência em dezenas de outros sistemas de poética oral Diante dessas indicações não podemos pretender ler a Odisseia do jeito que se lê uma epopeia escrita seja a Eneida de Virgílio a Divina comédia de Dante ou o Paraíso perdido de Milton Mais importante nossa leitura deve levar em consideração a ressonância de sintagmas repetidos uma vez que podemos ter certeza de que quase todos esses sintagmas já existiam na tradição poética e eram portanto conhecidos de uma plateia que ouvia a performance épica de Homero Um poeta como o autor da Odisseia é capaz de criar efeitos significativos evocando no momento exato o mundo de associações embutido em um único sintagma que foi usado por gerações em muitos outros poemas com um escopo de significados que sua plateia é capaz de apreciar John Miles Foley Foley 1991 e 1999 chamou a poesia que disso resultou de arte imanente pois nesse meio de expressão o caráter alusivo enfatizado por fórmulas produz profundidades que vão muito além da superfície límpida do poema Como os leitores modernos não conhecem o contexto em que essa arte começou a florescer podemos esperar no máximo recuperar o espectro de significados de um sintagma olhando todas as suas ocorrências e calculando o efeito que teria se a plateia trouxesse para a compreensão da cena um reconhecimento de todas as outras situações em que um sintagma particular foi ou poderia ser usado A técnica é diferente da técnica do romance O leitor de Os europeus ou de Ulysses só descobre aos poucos página a página como são ricos certos sintagmas que James ou Joyce destinam a seus protagonistas Cada romance cria sua própria linguagem enquanto o épico oral grego contava com a longa experiência do público de uma rica tradição de recitação já carregada de significado para envolver e comover seus ouvintes de imediato Consideremos por exemplo a maneira como a caracterização de Telêmaco acontece na Odisseia com a ajuda de um estilo baseado na fórmula Na primeira vez que vemos Telêmaco 1 113 Atena disfarçada de Mentes acabou de chegar ao palácio de Ítaca Telêmaco a vê antes de qualquer outro τὴν δὲ πολὺ πρῶτος ἴδε Τηλέμαχος θεοειδής Primeiro a vêla foi o deiforme Telêmaco Theoeidés deiforme é uma das quatro fórmulas epítetosubstantivo para Telêmaco no caso nominativo ou de sujeito O simples fato de o poeta usar um epíteto para Telêmaco aqui quando o vemos pela primeira vez indica que a cena imediatamente seguinte é importante para o entendimento de seu caráter O epíteto é como uma nota musical única soando no início de uma composição Além disso ele ocorre em contraste com qualquer um dos três outros epítetos que Homero poderia ter usado para Telêmaco se tivesse moldado o verso um pouquinho diferente hieré é força sagrada pepnumenos inteligente e hérós o herói À medida que o poema progride o epíteto theoeidés vem a se relacionar com um tema essencial da Odisseia de como a aparência às vezes entra em conflito com a verdadeira identidade ou habilidade Odisseu disfarçado faz um sermão sobre aparências depois de caçoarem dele nos jogos dos feácios 8 16685 Na situação dramática dessa passagem ter uma boa aparência eidos indica que a pessoa nem fala bem nem é de fato muito inteligente É significativo que o jovem ilhéu Euríalo que tem habilidade atlética mas nenhuma elegância retórica seja o objeto da repreensão de Odisseu no decorrer do episódio feácio nós assistimos a seu aprendizado No final do canto 8 ele tem a inteligência e a elegância de oferecer a Odisseu uma espada e um pedido de desculpas Ora esse processo de educação é exatamente o que acontece com Telêmaco no decorrer da Odisseia como um todo conforme muitos críticos observaram O adjetivo theoeidés marca o modo como Homero maneja esse tema tradicional que podemos chamar de o herói amadurece Quando a plateia ligada no sistema de sintagmas tradicional ouve pela primeira vez Telêmaco descrito como deiforme ela recebe um pacote de mensagens temáticas e direções narrativas potenciais No entanto esse processo não se dá sem suspense O filho de Odisseu pode acabar sendo como os outros que receberam esse epíteto Páris na Ilíada Alexandros theoeidés uma figura menos que heroica que depende da aparência para se virar ou Euríalo ingenuamente arrogante mas educável De fato cada uma dessas duas alternativas temáticas surge no decorrer da Odisseia o adjetivo theoeidés é usado três vezes para descrever um ou outro da dupla de pretendentes principais em Ítaca o jovem arrogante Eurímaco e Antínoo tipos perigosos que não gostam de Telêmaco O jovem bom mas não perfeito aparece também na figura do vidente Teoclímeno ao qual o epíteto theoeidés é aplicado cinco vezes e cujo nome em si que ouve o deus se encaixa com seu sentido Quando esse jovem fugitivo encontra Telêmaco vemos um importante estágio do crescimento deste sem questionar ele fica amigo do proscrito mostrando assim que assimilou o código cultural referente a hóspedesamigos É tal a qualidade artística da repetição de fórmulas que é possível traçar linhas temáticas similares acompanhando o desenvolvimento de qualquer epíteto do poema Outro recurso poderoso usado na Odisseia é a caracterização por meio de discursos Calculouse que mais de metade do poema é apresentado nesse formato Além de ser um estilo poético discursar era com toda a probabilidade um fenômeno cultural importante Os gregos antigos de todos os períodos admiravam a habilidade retórica A Ilíada conta como Aquiles foi criado para ser um orador de discursos e agente de feitos Il 9 443 Parte da atração e da influência da poesia homérica em eras posteriores vem de sua excelência na mimese a representação de discurso direto Platão por outro lado aponta essa mesma técnica mimética como o perigo central dentro do épico homérico quando o baniu de sua cidade estado ideal em A república Esses discursos podem ser comandos ameaças ou promessas proferidas de um personagem para outro discursos públicos a assembleias rememorações em companhia de convivas em um jantar ou mesmo monólogos dirigidos ao próprio coração e mente como o discurso que Odisseu faz quando se vê correndo o risco de morrer afogado 5 299312 Em vez de contar à plateia o que se passa na mente dos personagens do poema o autor faz essas figuras falarem consigo mesmas O resultado é que ficamos com uma sensação de intimidade de intensa interação entre os heróis homéricos e seu ambiente e dos meios específicos como se apresentam para o mundo Outro refinamento na técnica consiste em justapor os discursos de diferentes personagens a fim de expressar conflito ou sugerir emoções mais profundas não expressas A conversa entre Helena e Menelau no canto 4 235 89 quando cada um conta uma história para seus visitantes representa essa arte contrastante em sua forma mais elevada Sem nenhum indício pela voz do próprio narrador criase mesmo assim a impressão de que o herói envelhecido e sua esposa que um dia causou tanta destruição ainda estão imersos em suas queixas e protestos recíprocos A série de encontros entre Odisseu e sua esposa Penélope que se estende do canto 19 até o 23 permite que o leitor intua como é o relacionamento deles mais que qualquer informação que o narrador pudesse fornecer E os paralelos próximos criados por esse uso de discursos diretos em série por exemplo as cinco histórias contadas por Odisseu disfarçado em Ítaca ou os encontros de Telêmaco com Nestor e Menelau enriquecem ainda mais o poema com sutis variações Se com as fórmulas o poeta joga com o conhecimento comum de alusão e associação da plateia com os discursos ele pode produzir novos e múltiplos pontos de vista Uma terceira característica técnica o símile pode ser considerado uma combinação da tradição da fórmula com o uso inovador do discurso O símile homérico muitas vezes compreende mais detalhes do que podemos julgar necessários para fazer um cotejo Vejamos dois exemplos que ocorrem no começo do canto 20 quando Odisseu deitado sem dormir se zanga com a visão das serviçais dormindo com os pretendentes seu coração dentro latia Como a cadela envolvendo os frágeis filhotes ao estranhar um varão late sôfrega por brigar assim em seu íntimo latia irritado com as vis ações versos 1316 Depois de descrever como Odisseu controla sua raiva Após golpear o peito reprovou o coração com o discurso o poeta continua e seu coração obediente de todo aguentou e resistiu sem cessar ele próprio reviravase para lá e para cá Como quando o varão forte fogo ardendo a um bucho cheio de sangue e gordura para lá e para cá gira almejando que bem rápido fique assado assim ele para lá e para cá reviravase cogitando versos 2328 Os detalhes aparentemente alheios porém evocam muitas coisas que uma comparação mais breve deixa passar Se o poeta tivesse dito apenas seu coração rosnava como um cão a imagem poderia nos tocar mas se perderia a possibilidade de um impacto emocional posterior A versão expandida de um jeito ao mesmo tempo estranhamente fora de sincronia e inteiramente apropriado associa Odisseu a uma figura feminina a mãe dos filhotes que late para defendêlos contra um macho intromissor Em termos da trama geral Odisseu por meio do símile tornouse igual a Penélope uma mulher ferozmente independente que resiste às incursões masculinas em sua casa De associação mais imediata podemos lembrar a cena ocorrida não muito antes quando Odisseu chegando disfarçado a seu próprio palácio é reconhecido por Argos o cão que deixou para trás vinte anos antes Agora infestado de carrapatos e abandonado incapaz de se mover do monte de excremento onde se encontra o cachorro abana o rabo com dificuldade e expira quando seu antigo dono passa por ele 17 291327 Essa ligeira dissonância criada pelo símile lembra à plateia que Odisseu embora na aparência velho e inútil no momento como Argos logo assumirá o papel de cão de guarda e mesmo caçador ao castigar os pretendentes Os símiles portanto empregam artisticamente num formato comprimido duas outras técnicas frequentes na poesia homérica o uso do flashback e da previsão O segundo símile mencionado acima na qual o herói é comparado a uma linguiça num primeiro momento pode parecer um lugarcomum cômico até arbitrariamente antiheroico O único ponto de ligação aparente vem da similaridade de movimento uma vez que tanto o herói como a carne giram como que no espeto E mais uma vez a técnica homérica repousa em nosso reconhecimento do lapso entre o evento imediato da trama e o remodelamento retórico dele Odisseu não consegue dormir porque está em um momento de crise ansioso quanto a sua capacidade de planejar e levar a cabo uma chacina enquanto o cozinheiro anônimo do símile tem de lidar apenas com a preparação da comida Mesmo assim podemos imaginar que o guerreiro veterano podia muito bem desejar ser o cozinheiro pacífico de forma que o símile é então focalizado na própria consciência do personagem que pretende descrever Vale a pena lembrar afinal que quando vislumbramos Odisseu pela primeira vez no poema ele está ansioso por ver a fumaça subir da chaminé de sua casa Além disso o cozinheiro e o herói desejam ambos intensamente alguma coisa O desejo do cozinheiro é explicitado ele quer assar a carne e ele ao menos tem como realizar isso Ao trazer à mente esse desejo universal o poeta faz sua plateia adivinhar quase sentir o gosto do imediatismo impositivo do desejo de vingança de Odisseu sem nem mencionálo nesse momento A insinuação é que também Odisseu logo estará no comando para não dizer que cozinhará os pretendentes Por fim ambos os símiles desse trecho o cachorro e o cozinheiro tornam públicas ao menos em sua memorável imagética direções de pensamento internas particulares Ao se referir a ações cotidianas recorrentes tornam natural e não problemática o que é de fato uma vingança singular e um tanto questionável e de proporções épicas A história e a Odisseia Os progressos da arqueologia da linguística e do estudo comparativo da cultura ao longo do século passado deixaram claro que o mundo pintado nas epopeias de Homero é uma criação poética Tem elementos de eras da civilização grega que vão desde 1400 aC até o período da tirania de Pisístrato e seus herdeiros em Atenas em meados do século VI Assim como a cultura grega os épicos absorveram influências do Oriente Médio e do Egito talvez até do mar Negro e além Ao mesmo tempo os elementos básicos do mundo homérico são constantes na história e na vida social mediterrânea as atividades de luta e navegação o comércio a colonização a viticultura e a agricultura a criação de assentamentos Embora as técnicas de todas essas áreas mudem ao longo dos séculos as atividades em si apresentam longos trechos de continuidade até mesmo no século XXI Não cabe aqui nem mesmo o mais breve esboço da história da Grécia Bastará observar que os falantes do grego devem ter se afastado por volta de 1900 aC dos falantes de línguas próximas os dialetos dentro da família indoeuropeia que evoluíram para as famílias linguísticas itálica indoarianas germânica celta eslava e outras viajando das estepes do sul da Rússia ou da região do Cáucaso penetraram nos Bálcãs no então longínquo sul Em torno das costas do Egeu encontraram altas civilizações já estabelecidas entre elas os egípcios e os minoicos um povo não grego centrado em Creta Com o tempo a cultura guerreira grega baseada em cidadelas e comando personalista fez empréstimos culturais dos minoicos e outros povos anteriores e depois tomou o seu lugar no que é hoje a Grécia central e as ilhas O período micênico c 16001200 aC assim chamado em função de uma das principais cidades Micenas se encerrou não é claro por quê com uma série de destruições das quais a Guerra de Troia é muito provável uma reminiscência abstrata destilada Depois da Antiguidade a existência de Troia e da guerra em torno dela foi tomada como mera fábula Quando as viagens ao Oriente ressurgiram durante o século XVIII antiquários começaram a notar íntima semelhança entre as paisagens da época e as descrições homéricas da área da Ásia Menor associada às antigas lendas No século XIX a busca romântica pelas origens e a crescente devoção europeia a um passado clássico idealizado se combinaram para chamar mais atenção para os vestígios físicos do passado culminando nos anos 1870 com as investigações de um arqueólogo diletante rico Heinrich Schliemann No grande sítio arqueológico de Hissarlik no oeste da Turquia moderna Schliemann cavou e encontrou as ruínas de uma cidade antiga camada sobre camada que datavam do século XII aC e ainda mais antigas A Troia enterrada havia muito voltava de repente à luz As escavações no local continuam até hoje Embora nenhuma inscrição ou objeto indique que esse seja o lugar que os gregos cercaram e destruíram esta foi muito claramente uma cidade extensa e rica com grandes muralhas e portões não diferentes daqueles descritos na Ilíada É pouco questionado de que se trata de Troia Diversas de suas camadas Troias VI e VII datadas por volta da época da guerra troiana como computado pelos próprios antigos apresentam sinais de saque e incêndio Não se pode provar se os gregos do continente Agamêmnon dos micênicos Menelau de Esparta e companheiros efetuaram o ataque em algum momento entre 1325 e 1200 aC Nem se sabe quem eram os troianos em termos étnicos e linguísticos ou onde foram parar os restos de sua população As migrações para a Ásia Menor continental sobretudo os assentamentos costeiros da Jônia começaram antes do colapso da cultura palaciana micênica na Grécia continental Foi talvez durante esse período que a história de uma grande cultura nesses lugares uma vez dominados pelos gregos ganhou popularidade Não é impossível que a saga da Guerra de Troia remonte até mesmo em algum tipo de forma versificada aos fatos reais do século XII aC Os poemas que temos preservam alguns elementos que são de tempos micênicos tanto linguística como culturalmente Assim os heróis de ambas as epopeias usam com regularidade armas e implementos de bronze o ferro que se tornou o metal mais comum depois do fim da cultura micênica na chamada Idade das Trevas de 1100800 aC é raras vezes mencionado A luta com carros é conhecida Os desenhos de escudos elmos e espadas coincidem com objetos encontrados no século XII Lugares nomeados no texto como fonte de tropas e navios em muitos casos nem eram habitados depois do século XII e portanto os poemas devem preservar deles uma memória histórica antiga E a confederação guerreira que dominou Troia parece se encaixar no padrão assentamentocidadela da época que as epopeias se propõem descrever A arqueologia mostra que Pilo e Tiro Micenas e Tebas eram centros importantes na idade do bronze e essas cidades figuram com destaque nas epopeias Ao mesmo tempo é claro que séculos de transmissão e remodelamento dos poemas dentro de uma tradição oral permitiram que elementos históricos de outras eras se entrelaçassem às linhas mais antigas Por exemplo embora carros sejam usados os heróis param e descem deles para lutar ao contrário do uso que se fazia deles em culturas mais para o leste o que leva a pensar que o poeta não tinha certeza de como eram empregados de fato na guerra Alguns objetos e nome de locais já do século VI aC foram detectados nas epopeias embora o autor evidentemente tenha tentado arcaizar As estruturas políticas da pólis cidadeestado cristalizadas pela primeira vez no século VIII aC e a importância do santuário de Apolo em Delfos fenômeno do século VII são outros traços não micênicos importantes Já se disse que a ênfase na própria expedição grega unificada deve estar ligada a instituições panhelênicas que se desenvolveram no século VIII reunindo gregos de todas as regiões depois de vários séculos de isolamento Nagy 1999 Muitos indícios apontam portanto para um período de quatro séculos posteriores à Guerra de Troia como o período de incubação crucial para tradições épicas em contínuo desenvolvimento Se a cidadela em ruínas objeto do cerco legendário foi revelada o que dizer do lugar de onde Odisseu saiu para ir a Troia e sua história Ítaca hoje é uma ilha rochosa a cerca de cinquenta quilômetros da costa ocidental da Grécia continental Pequena o suficiente para ser percorrida de bicicleta em um único dia não é nem rica em antiguidade nem famosa a não ser como lar e reino de Odisseu Assim como a cidade de Troia não há como afirmar se a ilha hoje chamada Ítaca ou Thiaki era o lugar imaginado pelo poeta da Odisseia Escavações em curso por uma equipe da Universidade de Washington em St Louis descobriram até agora restos que podem ser micênicos cuja identidade ainda não está esclarecida De qualquer forma vale a pena lembrar que mesmo dentro do poema a vida em Ítaca dificilmente se comparava ao esplendor dos palácios visitados por Telêmaco no continente O jovem herói conta a seu anfitrião Menelau que sua ilha natal ao contrário de Esparta não tem espaço suficiente para criar cavalos Sob outros aspectos também podemos considerar que Ítaca fosse menos poderosa e importante Desprovida de grandes forças seu comandante Odisseu devia operar por outros meios seu caráter indireto e astuto se encaixa no panorama de recursos reduzidos de seu compacto reino No entanto a morada de Odisseu mesmo de forma discreta apresenta sinais de um centro econômico real O rei tem rebanhos e manadas em outras ilhas e no continente Empregados como o porcariço Eumeu que foi obtido por compra ou conquista mantêm os recursos da casa grande As mulheres estão sempre trabalhando no palácio produzindo tecidos E o grande depósito de Odisseu que Penélope visita no canto 21 está cheio de ouro bronze e ferro Esses bens imperecíveis eram usados ao longo de todos os primeiros tempos gregos para construir relações de trocas recíprocas com outros aristocratas por meio de presentes ostentatórios Os presentes de Menelau e Alcínoo se encaixam nessa dinâmica Odisseu como somos informados no canto 1 verso 177 tinha o costume de fazer visitas mesmo antes de suas viagens Fora de ação durante vinte anos no entanto ele não só perdeu a oportunidade de participar desses importantes intercâmbios de prestígio como também sofreu a ameaça de perder seu gado pela depredação dos pretendentes O disfarce de mendigo que assume em Ítaca se aproxima perigosamente da verdade A Odisseia parece reconhecer quão tênue é a linha divisória entre a existência confortável e a penúria Sem dúvida na economia de subsistência em que vivia a maioria dos gregos de muitas eras essa lição faz sentido A insistência do poema na perda e no ganho reflete ansiedades reais de que os infortúnios econômicos de apenas um homem pudessem comprometer as vidas de seus descendentes durante um longo tempo Leitores modernos estão interessados na história da política e da economia contudo devemos lembrar que também se pode falar de história no âmbito dos sentimentos e atitudes condicionados por um conjunto de experiências reais A maneira como os gregos do passado reagiam com criatividade às exigências e desafios de seu próprio tempo isso também é história Enquadrada na narrativa do regresso de Odisseu a ideia persistente de que cada pessoa precisa de um lugar é tomada como um fato sem apologia sentimentalismo ou melodrama Só nas ficções criadas por Odisseu ie 14 199ss é que ouvimos falar de homens vagando em busca apenas de aventura Sentese que por baixo da eloquência e da economia da Odisseia existe a experiência de gerações de gregos ansiando por um lar exilados políticos guerreiros colonizadores marinheiros bardos itinerantes Como os turbulentos séculos em que surgiram numerosas cidadesestados gregas de 900 a 700 aC coincidem com o desenvolvimento da poesia épica é ainda mais plausível que as plateias sentissem empatia com uma história de volta ao lar como essa Em sua destilação de sentimentos e celebração da sobrevivência mais do que na representação de fatos sociais é que a epopeia pretende contar as verdades do passado Os deuses de Homero Outra faceta atraente da epopeia homérica é o retrato persuasivo que ela traça de um mundo além do humano Os deuses e deusas da Grécia arcaica são como humanos em quase tudo menos numa coisa nunca morrem Sem idade e imortais alimentados por néctar e ambrosia com ikhór cristalino correndo nas veias em vez de sangue os deuses vivem tranquilos numa calma desanuviada nas alturas nevadas do monte Olimpo ao norte da Grécia Podem teoricamente ignorar os humanos limitados pela morte Mas na imaginação grega os deuses precisam das pessoas tanto quanto as pessoas precisam deles Os poemas homéricos revelam um fascínio por esse elo simbiótico entre deuses e mortais um contato sempre oscilante entre adoração e antagonismo Os deuses são muito mais que uma fantasia homérica Durante milênios os gregos adoraram as divindades mencionadas nas epopeias e muitas mais Não há como ter alguma certeza do que de fato tinham em mente ao fazêlo Mas se tomarmos a Odisseia como guia era algo assim deuses são inquisitivos intrometidos orgulhosos de seus humanos favoritos e perigosamente suscetíveis de se enraivecer Para conservar seu favor os mortais precisam oferecer sacrifícios certificarse de preencher as narinas celestes com o aroma da carne assada O ritual de verter vinho associado à oração também funciona para aplacar os deuses O herói luta para conquistar a única imortalidade acessível a humanos a fama épica kleos Para tanto precisa vencer obstáculos com ajuda divina ou ser espetacularmente derrotado ao desprezála Podese ver Odisseu envolvido numa questão religiosa testando a eficácia de sua atitude em relação ao divino e determinando para si mesmo se os deuses vão lhe dar ouvidos e ajudálo O divino está em toda parte em Homero sua poesia é profundamente teológica Uma razão para a a epopeia se deter tanto em banquetes e bebidas por exemplo é porque esses eventos são cruciais na Grécia arcaica cada refeição era também um ato religioso Cada amanhecer é com efeito obra de uma deusa Aurora Lua e sol rios cavernas e árvores são deuses ou abrigam um habitante divino Num nível emocional mais profundo ouvimos ao longo de toda a Odisseia que os humanos descendem efetivamente de Zeus de Ares ou de Posêidon Odisseu o herói desse poema tem uma ancestralidade interessante seu avô materno Autólico cujo nome significa o próprio lobo é um trickster e ladrão que em algumas versões do mito era filho de Hermes deus conivente A versão homérica abranda esse passado sombrio defendendo em vez dela a história de que Hermes ensinou a Autólico a arte do roubo 19 395 98 Isso levanta a questão da moralidade dos deuses homéricos Não muito depois de as epopeias ganharem forma os filósofos já começavam a criticar suas divindades Disse um moralista do século VI Xenófanes Homero atribui aos deuses tudo o que é mais vergonhoso entre mortais Eles roubam cometem adultério e enganam uns aos outros No começo do século IV aC Platão chegou ao ponto de banir a poesia de Homero da cidade idealizada moralmente íntegra que esboça em sua obra A república A seu ver a boa ordem do Estado era ameaçada não só quando seus líderes liam a respeito e imitavam os personagens que Homero apresentava como incapazes de controlar suas emoções Era um risco também que seus habitantes acreditassem em divindades menos que perfeitas Os deuses de Homero podem constituir paradigmas éticos pobres mas mesmo assim encarnam verdades reais São de fato poderes maiores que nós em ação no mundo Esses poderes parecem caprichosos e às vezes cruéis Emoções assoladoras desejo ardente embriaguez a ira da guerra de onde mais elas poderiam vir senão de deuses Chamar essas experiências respectivamente de Afrodite Dionísio e Ares era darlhes nome mas ao mesmo tempo controlálas Pois os deuses uma vez humanizados funcionam como uma família expandida e um tanto disfuncional na qual existe ao menos alguma organização Governando do alto está Zeus que impõe suas ordens com raios brancos ardentes Hades e Posêidon seus irmãos têm seus lugares no mar e debaixo da terra Outros deuses e deusas alinhamse como filhos ou filhas de Zeus Há uma bela economia em tal sistema politeísta um deus equilibra o outro de um modo quase comicamente doméstico Se a mãe Hera diz não você pode pedir para o pai Zeus Humanos conseguem o que pedem rezando a quantos deuses desejarem Quando se trata da Odisseia Atena merece atenção especial Embora não se saiba da história por Homero o nascimento fora do comum da deusa virgem filha de Métis astuta inteligência é bem conhecido Podemos questionar por que essa deusa das habilidades inclusive a habilidade da guerra fica tão ligada ao modesto mortal Odisseu Em primeiro lugar ao que parece porque ele é como ela de fato seu epíteto usual é polimétis literalmente possuidor de grande inteligência astuta No entanto sentese um elemento de competição no relacionamento deles Uma conversa reveladora entre deusa e protegido ocorre no canto 13 quando Odisseu acabou de voltar a sua ilha Em resposta à sua conveniente ficção sobre como chegou em casa Atena responde com uma repreensão amigável e um toque de orgulho Não ias nem mesmo estando em tua terra cessar os engodos e discursos furtivos que do fundo te são caros Vamos não falemos mais disso ambos conhecemos maneios pois és de longe o melhor de todos os mortais em planos e discursos e eu entre todos os deuses na astúcia famosa e nos maneios versos 29399 Muitas histórias míticas contam de humanos que desafiaram os deuses e perderam Então parte do suspense da Odisseia deve brotar precisamente dessa perigosa colaboração entre divino e mortal Odisseu irá de alguma forma ultrapassar a linha Ele será bom a ponto de conquistar a admiração e ajuda da deusa Ou se gaba demais da própria habilidade correndo o risco de despertar o ciúme de Atena e cortejar o abandono ou a morte Na Odisseia Zeus seu irmão Posêidon e sua filha Atena são poderes mais que arbitrários ou independentes O poeta desde o começo da epopeia enfatiza as complexas relações e repercussões familiares envolvidas quando essas três divindades se imiscuem em questões de justiça humana Zeus o deuschefe é responsável por manter a justiça em nível cósmico Se alguém grego ou troiano é maltratado Zeus pode ser invocado para testemunhar o ultraje e tomar a ação corretiva Ele às vezes usa seus raios explosivos Ao mesmo tempo tanto Atena como Posêidon têm reclamações contra os gregos por injúrias pessoais a dessacralização do templo troiano de Atena e o cegamento do ciclope Polifemo filho de Posêidon Então Zeus enquanto mantém a ordem no mundo tem de trabalhar também a harmonia do Olimpo A esse respeito as aventuras de Odisseu levam os deuses a uma nova compreensão de suas limitações e interdependência Assim um humano que respeita a religião pode alterar as configurações do divino Nesse sentido de ética humana e divina a Odisseia em especial é diferente de narrativas de vingança mais simples Esta epopeia não trata de vingança brutal ou violência gratuita Ao longo de todo o poema a justeza de atos importantes humanos ou divinos é cuidadosamente analisada debatida e avaliada Disputas são discutidas e pesadas pelas várias figuras envolvidas Já se pode ver em ação o espírito analítico que impregna o exame que Platão faz da justiça em seu diálogo A república séculos depois À primeira vista o mundo da Odisseia pode parecer sem lei Seus habitantes claramente vivem sem regras formais escritas estabelecidas e impostas por autoridades legais Mas a justiça não depende de leis De fato a palavra grega diké com frequência traduzida como justiça está mais próxima de ideias como costume hábito e adequação O jeito como estão as coisas normalmente quando família comunidade e mundo estão em ordem é o jeito como as coisas devem estar E isso não depende da adesão a algum código externo de comportamento Diké nesse sentido grego arcaico pode mesmo ser descrita como obra da natureza Quando por exemplo Odisseu encontra sua mãe no mundo inferior e não pode abraçála ela lhe diz que esse é o jeito diké de mortais quando morrem terem suas almas voando embora como um sonho enquanto o corpo é queimado 11 21824 Animais também podem ter diké Mas tanto humanos como animais às vezes ultrapassam os limites dessa justiça natural Eles o fazem quando perturbam a ordem das coisas seja se recusando a dar aos outros o que lhes é de direito seja por tentar tirar os bens ou a honra de outrem Essas ações ao contrário de diké são chamadas em grego de hubris Na Odisseia os pretendentes de Penélope encarnam o comportamento da hubris Eles não só estão rompendo as normas da hospitalidade parte importante da diké como cortejam com arrogância a rainha sem levar em conta precedentes verdade ou costume Eles arruínam a casa e desonram seus habitantes Odisseu ao contrário ao longo de todo o poema emprega sua sabedoria natural para se adaptar à maneira das coisas e à vontade dos deuses É isso mais que sua piedosa integridade que o torna justo em termos homéricos Sua vitória miraculosa sobre os 108 pretendentes é uma confirmação de que Zeus e os deuses olímpicos conservam o equilíbrio do mundo Ultrapassar os limites acaba atraindo retaliação Odisseu é o agente dessa justiça divina Para apreciar por completo a postura ética da Odisseia pode ser útil conhecer algo mais sobre o elo entre justiça e hospitalidade Na Grécia antiga os conceitos de anfitrião hóspede e estranho são expressos por uma única palavra xenos A ideia unificada tão diferente da forma como nós distinguimos os três conceitos pode ser vista em ação ao longo de toda a Odisseia Com insistência o poema põe em primeiro plano o tema da xenia a relação hóspedeanfitrião A trama se desenrola em função dessa ideia e os personagens do ciclope até os pretendentes são julgados pela maneira como exercem o ideal do tratamento adequado a estranhos Xenia em resumo representa a epítome da moralidade da Odisseia Não é de surpreender que numa cultura arcaica préalfabetizada onde não havia instituições internacionais ou normas reconhecidas o comportamento correto em relação a estranhos fosse considerado obrigação sagrada O mesmo fenômeno pode ser observado ainda hoje em culturas pequenas e isoladas Essa era com efeito a única maneira pela qual indivíduos podiam sobreviver além dos limites de sua comunidade local Zeus tinha um título especial Xenios para denotar seu papel como protetor de estrangeiros Qualquer infração era pois uma ofensa contra o deus supremo Xenia representa um exemplochave de uma exigência cultural maior de reciprocidade Podese ver esse grande princípio em ação numa série de outras áreas mencionadas nos poemas homéricos O sacrifício de animais as orações e a guerra eram baseados na ideia de que esse equilíbrio tinha de ser mantido dando ou retribuindo favores ou hostilidade fosse entre humanos ou entre humanos e deuses As expectativas recíprocas subjacentes à xenia podem explicar a semântica do termo Assim como qualquer estranho era um hóspede em potencial e tinha de ser tratado como tal qualquer hóspede era por implicação um anfitrião em potencial uma vez que se esperava que ele retribuísse qualquer tratamento que houvesse recebido Toda a saga da Guerra de Troia pode ser interpretada como um exemplo mítico das catástrofes produzidas por relações impróprias entre anfitrião e hóspede Páris o jovem príncipe troiano era hóspede de Menelau em Esparta quando fugiu com a esposa do anfitrião Helena Os comandantes gregos que haviam jurado ajudar Menelau foram obrigados a vingar esse crime contra a xenia até o extremo de cercar e arrasar Troia Dessa forma o mito funciona como um precedente legal justificando as práticas societárias por referência a um caso A volta de Odisseu desde Troia é portanto a continuação de uma lição de moral acerca da necessidade de manter o equilíbrio na intersecção dos níveis social e cósmico Se Odisseu é bem tratado está tudo bem no mundo A importância de um tema assim como a maioria das ações sociais significativas na Odisseia pode ser medida pela quantidade de vezes que o tema reaparece Além disso a repetição vem na forma de roteiros estilizados quase previsíveis que os homeristas chamam de cenas típicas É difícil dizer se os roteiros são recursos poéticos ou rituais sociais um reforça o outro O típico é o estrangeiro ser bem recebido com palavras gentis com a oferta de um banho e roupas limpas comida e bebida e sem perguntas enquanto não forem cumpridas essas preliminares Ele é estimulado a ficar o quanto quiser Ao partir lhe são fornecidos transporte e presentes Esses preciosos itens de troca constituem uma combinação de suvenir e declaração para o mundo da excelência do comportamento do anfitrião porque a xenia assim como tudo o mais na cultura grega podia se tornar competitiva Se guerreiros como Odisseu podem se transformar em paradigmas de um comportamento que a divindade aprova não é de surpreender que mortais especiais possam obter um lugar separado do de outros humanos mais próximo dos deuses em termos de celebridade e poder A ideia do herói como alguém entre homem e deus é uma invenção especificamente grega Por todo o mundo grego os túmulos de homens e mulheres que obtiveram fama na comunidade eram locais de adoração desde pelo menos o século VIII aC até mesmo na era cristã Vale notar que nem todos eram de jeito nenhum heroicos no sentido corrente de hoje Os hérós e héroiné não eram seres primordialmente morais mas sim pessoas de grande força ou de conexões especiais com o divino O poder de amaldiçoar ou causar dano a outros marcava o status de herói tanto quanto a coragem em prol da sociedade esse era o lado escuro do poder de fazer o bem ou curar Héracles cujas aventuras o levaram por todo o mundo conhecido combinava de maneira conspícua a coragem do guerreiro com seu comportamento anômalo furioso mesmo às vezes desculpado como loucura enviada por sua nêmesis Hera Ele morreu mas paradoxalmente viveu para sempre ao ser levado para o Olimpo depois de sua morte feroz no monte Eta Sua história pode ser tomada como um paradigma para outras o herói luta governa muitas vezes peca morre e ganha fama pós morte uma forma de imortalidade ao lado de seu poder semidivino Mesmo o parricida Édipo era associado a honras heroicas em diversos lugares a peça Édipo em Colono de Sófocles conta da luta entre Atenas e Tebas na disputa pelo prêmio de abrigar seu túmulo Dentre aqueles associados à saga de Troia figuras como Aquiles Menelau Agamêmnon e Diomedes eram adorados com ritos de sacrifício específicos do culto aos heróis em santuários por todo o Egeu Os aspectos perigosos do herói podem ser em parte vislumbrados nas histórias sobre cada um desses homens tanto dentro das epopeias homéricas quanto além delas A fúria sagrada de Aquiles que causou a destruição de seus próprios companheiros na guerra bem como sua capacidade guerreira contra os troianos comprovava seus poderes heroicos Centenas de outros heróis muitos deles desconhecidos no geral são nomeados em outras fontes literárias ou em inscrições uma vez que cada comunidade de alguma importância podia exibir seu herói local Os pretensos túmulos de heróis e heroínas atraíam pessoas em busca da bênção e proteção que ancestrais assim poderosos poderiam prover Trabalhos arqueológicos recentes demonstram que em muitos casos esses cultos começavam em tumbas reais de pessoas da era micênica talvez locais redescobertos no século VIII e depois No nível civil as figuras heroicas eram muitas vezes pioneiros fundadores de uma cidade ou colônia e assim constituíam epítomes da história e das ambições de uma comunidade O fato de líderes de expedições colonizadoras serem por vezes assassinos fugitivos em nada diminuía sua heroicização A história de Odisseu une diversos desses traços Primeiro há indícios de que era adorado como herói em Ítaca com a consagração de trípodes arcaicos feita numa caverna perto da baía Polis a data da sagração é discutível século VIII ou III aC Segundo no século VI aC e muito provavelmente antes a Teogonia de Hesíodo atribuía a Odisseu dois filhos com Circe chamados Latino e Ágrio que afirmavase terem governado junto com Telêmaco os etruscos do ocidente Em outras palavras Odisseu era ao mesmo tempo herói e pai de heróis colonizadores Por fim em sua fúria justificada contra os pretendentes Odisseu se assemelha a seu rival Aquiles como expoente de ira divina Personagem e triângulo doméstico A Odisseia contém dezenas de personagens Parte do encanto do poema está em sua capacidade de criar um mundo fictício realista povoado não apenas por heróis mas por escravos e criados que os servem pastores e cocheiros além de bardos e videntes Segundo um importante tratado sobre arte literária Do sublime atribuído a certo Longino e presumivelmente escrito no século I de nossa era os esboços de vida cotidiana da casa de Odisseu constantes do poema eram comédia de costumes IX 15 kómóidia tis estin éthologoumené Apesar de toda a profusão de personagens o poema permanece focado em torno de três mortais Odisseu seu filho e sua esposa O papel de Telêmaco como um foco da narrativa e figura próxima do público já foi mencionado Mas que dizer de seus pais Um folclorista classificaria Odisseu o protagonista compacto rijo que derrota grandes feras como aquela figura universal do trickster Esses personagens brotam da profundidade dos mitos Tricksters bem conhecidos dos nativos norteamericanos e da África personagens como Aranha Corvo ou Coiote dão forma à maneira como o cosmos é organizado criando novas terras ou inventando habilidades ou elementos essenciais como a tecelagem ou o fogo Hermes em algumas versões um ancestral de Odisseu se encaixa nesse aspecto o Hino a Hermes mostra sua invenção do sacrifício por exemplo enquanto Odisseu apresenta qualidade de trickster numa dimensão mais humana Assim como as figuras folclóricas ele está associado à comida como o mendigo esfaimado ou o senhor que dá vinho aos ciclopes bem como o único guerreiro da Ilíada a insistir com Aquiles para que coma antes da batalha Como o trickster ele é conhecido pelas relações com mulheres e comportamento lúbrico Suas aventuras muitas vezes envolvem animais Ele próprio não é bestial mas goza mesmo assim de um status limítrofe por vezes na fronteira entre o mundo humano e o natural Podese ler seu personagem como um avanço além da amoralidade do trickster como ele sabe muito sobre comida pode também resistir a tentações cf o gado de Sol e como sabe muito sobre mulheres também pode resistir a Circe e a Calipso ao menos no final Odisseu encarna as exigências mais rígidas do éthos heroico embora possa ser excessivo chamálo de trickster ético A Odisseia porém é mais que uma narrativa picaresca sobre um herói trickster A mudança fundamental do folclore para o épico ou diriam alguns protorromance depende da decisão do poeta de cravar Odisseu num conjunto de relacionamentos com outros personagens um ambiente raro para o trickster em geral um lobo solitário A Odisseia insiste nessas conexões sociais por sua própria estrutura entrelaçando as histórias de Telêmaco e Penélope com a de Odisseu e emoldurando o todo dentro do motivo de uma família que com cautela avança ao encontro do destino Vale a pena apontar ainda que a volta ao lar nostos de Odisseu é uma volta ao mesmo tempo pessoal e sociopolítica Isso torna a Odisseia mais complexa e realista do que um simples romance sobre um casal que se reencontra De fato quando ouvimos falar de Odisseu pela primeira vez no poema Penélope ainda nem foi mencionada ele está sentado na praia da ilha de Calipso desejando ver a fumaça da chaminé de seu lar Um enraizamento e segurança mais amplos estão em questão com sua volta Odisseu precisa de seu lugar no padrão social como rei guerreiro aristocrata pai marido filho tanto quanto anseia pela intimidade privada com a esposa Por outro lado seu reencontro com Penélope renova toda Ítaca até mesmo Laerte seu pai rejuvenesce e quando o poema termina três gerações estão juntas uma imagem ideal de continuidade e regeneração Isso quer dizer enfim que o caráter de Odisseu no poema é uma função de sua abertura sua habilidade de se permitir confiar em outros poucos como Nausícaa de perder ao menos um pouco da desconfiança do solitário Engodo e espírito de sobrevivência o legado do trickster permitem que ele chegue em casa onde imaginação empatia e uma sensação de responsabilidade mais ampla completam sua reintegração mesmo depois de vinte anos de ausência E que dizer da mulher que esperou todos esses anos No final da Odisseia sentimos que o heroísmo feminino é tão importante senão mais que o masculino O heroísmo de Penélope assume uma forma que William Faulkner identificaria milênios depois entre os sobreviventes do Sul torturado dos Estados Unidos uma calada capacidade de suportar Não podemos separar a caracterização de Penélope do cuidadoso tratamento do poeta com as mulheres em geral As mulheres no poema são muito fascinantes porque seus retratos tendem a se sobrepor e ressoar Penélope e a ninfa Calipso são ambas tecelãs e criadoras com uma ligação profunda com Odisseu Helena parece Circe em seu conhecimento de drogas e seus efeitos sobre os homens Arete a rainha dos feácios governa a casa da ilha assim como Penélope ela assim como sua filha Nausícaa e a ninfa Leucoteia revelamse benfeitoras durante a busca do herói E claro Atena a astuta e sábia protetora de Odisseu assume algo de todos esses papéis femininos como diretora de cena da trama e traça a volta do herói Odisseu parece tão intimamente ligado a ela como à sua sofredora esposa Dada sua importância uma teoria sobre a origem do poema sugere que a Odisseia foi registrada por escrito em Atenas especificamente em honra da padroeira divina daquela cidade São tantos e tão artísticos os retratos de mulheres fortes e fascinantes na Odisseia que mais de um crítico propôs que o poema tivesse sido composto para uma plateia predominantemente feminina Indo um pouco mais longe o romancista inglês Samuel Butler publicou em 1897 The Authoress of the Odyssey A autora da Odisseia no qual sugere que uma moça escreveu a epopeia alguém como Nausícaa Sabendo o tipo de recepção que seu livro bastante irônico receberia dos homeristas verdadeiros de seu tempo Butler divagou assim Será que os eminentes estudiosos homéricos encontraram tamanha seriedade nas partes mais humorísticas da Odisseia porque eles teriam colocado a seriedade ali Para os sérios tudo é sério A visão de Butler infelizmente vem carregada de uma dose de sexismo vitoriano para ele os indícios de um autor feminino eram dados por traços da Odisseia como um tom mais leve um interesse narrativo em dinheiro e em mentiras e em certa confusão na descrição do cordame dos navios Ele observou com correção que ninguém ri das mulheres na Odisseia mesmo que as pessoas riam com bastante frequência na Odisseia como um todo vinte e três vezes contra onze vezes na Ilíada O que Butler e outros caracterizaram como uma diferença de visões de gênero nos dois poemas pode ter mais a ver com o tema e o conteúdo A Odisseia parece ser muito mais humana prática e pragmática mais interessada no cotidiano que naquilo que é exclusivamente heroico mais religiosa no sentido de que mostra a imanência do divino e os deuses moldando um final feliz e mais esperançosa que a Ilíada ao menos na sugestão de que é possível voltar para casa Se isso reflete um ponto de vista feminino depende é evidente de como determinada cultura conceitua o gênero É inegável que os traços mais sofisticados de caracterização e insight psicológico na Odisseia têm como centro uma mulher Penélope No decorrer do poema nós a vemos como mãe ansiosa lidando com um filho que atinge a maioridade como esposa fiel saudosa do marido ausente há vinte anos como chefe de uma casa real de grande dimensão e como objeto do desejo de uma multidão de jovens pretendentes determinados De fato a história é tanto sobre Penélope quanto sobre Odisseu Em sua inteligência e firmeza ela permite que ele sobreviva uma vez em casa E é seu astuto teste final da cama que o leva a reconhecer seu laço emocional com ela por ser um emblema dessa ligação Mas arrolar as qualidades de Penélope como se nunca fossem postas em dúvida é desperdiçar o suspense que a narrativa do poema consegue criar e manter Ela vai continuar firme O que ela quer de verdade Em anos recentes vimos numerosos estudos sobre Penélope inspirados por abordagens feministas Cohen 1995 FelsonRubin 1997 Katz 1991 e Doherty 1995 Com a ajuda deles podemos apreciar melhor a complexidade e mesmo a ambivalência que o poeta homérico embutiu no retrato da rainha de Ítaca A decisão de Penélope de aparecer diante dos pretendentes embora declare abominálos e de instituir o concurso de arco e flecha justo quando seu marido voltou deixa a plateia se perguntando sobre sua motivação e método Ela cedeu relutante às exigências dos pretendentes ou ao contrário intuiu que o sofredor Odisseu está de volta Será possível que a vida solitária tenha lhe dado uma nova independência de forma que ela ao contrário de suas primas Helena e Clitemnestra possa efetivamente tomar boas decisões na ausência do marido Ela é de fato a força que mantém a casa E o que tudo isso pode ter significado para uma plateia grega arcaica A descrição do poema homérico como a da trama de relações que Penélope mantém permanece forte e provocante e o poema chega vívido ao século XXI TRADUÇÃO José Rubens Siqueira 1 As obras citadas encontramse listadas na Bibliografia p 625 2 Escolha igualmente adotada pelo tradutor da presente edição conforme atestam as versões entre colchetes 3 Uma versão ficcional das pesquisas empreendidas por Parry e seu assistente pode ser encontrada no romance Dossiê H do escritor albanês Ismail Kadaré trad Bernardo Joffily São Paulo Companhia das Letras 2001 N E INTRODUÇÃO CHRISTIAN WERNER Para o verbete odisseia encontramos no Dicionário Houaiss da língua portuguesa três acepções 1 longa perambulação ou viagem marcada por aventuras eventos imprevistos e singulares 2 narração de viagem cheia de aventuras singulares e inesperadas 3 travessia ou investigação de caráter intelectual ou espiritual Embora não o esgotem esses sentidos abarcam o conteúdo do poema atribuído a Homero sobretudo quando se compara a Odisseia a outro poema épico grego a Ilíada atribuído por muitos desde a Antiguidade ao mesmo Homero As obras deixaram duas expressões em português que aludem ao modo como se deu a recepção dos poemas no Ocidente gregos e troianos em referência a um par de opostos inconciliáveis e odisseia que antes de tudo remete a um percurso cheio de dificuldades e que convida a uma narração As acepções em estado de dicionário embora de forma mais restrita ou seja sem dar conta de uma complexa teia mitopoética fazem parte da história do termo grego nostos cujo sentido básico e mais comum é retorno sendo composto por um lexema presente em nost algia palavra moderna que designa a dor causada por uma distância virtualmente intransponível de um lugar ou tempo familiar e desejável A raiz verbal do substantivo nostos porém tem a conotação mais precisa de voltar são e salvo para casa e também a de retornar da morte para a vida Frame 2009 a primeira acepção do dicionário longa perambulação está presente em nostos ao passo que a segunda narração de viagem pertence à história de outro substantivo que parece compartilhar da mesma raiz noos que se refere em Homero a uma faculdade cognitiva ligada à visão e pode ser traduzido por mente ideia e espírito Tais sentidos de nostos apontam para uma constelação mítica na qual se articulam duas imagens ou ideias o percurso da morte para a vida e o caminho da escuridão para a luz Vejamos de que forma eles marcam a Odisseia a partir de um roteiro que investiga os significados da palavra Antes contudo passemos por um rápido resumo da narrativa O poema começa quando o herói decide retornar a sua ilha Ítaca e retomar o poder sobre ela e sua casa instigado e auxiliado por dois deuses Atena que por diversas vezes estará ao lado de Odisseu também conhecido por Ulisses que deriva através do latim Ulixes das variantes dialetais gregas Oluteus Oluxeus e Oulixês entre outras e Zeus que em última instância tem controle sobre o retorno do herói Marks 2008 Bakker 2013 Nos cantos de 1 a 4 o leitor acompanha Telêmaco e os pretendentes de Penélope que tendo se declarado viúva viuse cercada de um bando de jovens que a cortejam não escolhe nenhum acreditando no regresso do marido Para pressionála os pretendentes dilapidam as riquezas de Odisseu enormes rebanhos de gado e ovelhas Telêmaco sentindose prejudicado recebe uma visita de Atena e resolve partir em busca de novas acerca do pai Começa por visitar dois nobres Nestor e Menelau antigos companheiros de arma de Odisseu Vinte anos antes Odisseu participara da guerra contra Troia também referida como Ílion Páris filho de Príamo rei de Troia seduzira a belíssima Helena mulher de Menelau rei de Esparta Odisseu e seus companheiros de Ítaca e cercanias engrossaram o enorme contingente de tropas gregas4 sob o comando de vários heróis como Agamêmnon comandante supremo irmão de Menelau Aquiles Ájax Nestor e Diomedes As tropas guerrearam Troia por dez anos até aniquilar a cidade matar a população masculina e escravizar mulheres e crianças valendose do bemsucedido artifício do cavalo de madeira que permitiu superar as muralhas de proteção Fora uma guerra motivada tanto pela reparação da desonra causada pelo rapto de uma rainha casada com um nobre poderoso quanto pela perspectiva de bens materiais que a vitória propiciaria àqueles que resistissem até o triunfo final Terminada a guerra alguns heróis chegaram rápida e facilmente em casa outros como Menelau e Odisseu nem tanto No canto 5 Odisseu está numa ilha distante das terras conhecidas pelos homens cuja senhora é a ninfa Calipso de quem se vê obrigado a ser amante Por ordem dos deuses a ninfa permite que ele parta O herói se lança ao mar numa jangada destruída em uma tempestade enviada pelo deus que é seu antagonista o senhor dos mares Posêidon Náufrago Odisseu chega a Esquéria ilha do povo feácio É muito bem recebido pelo casal real Arete e Alcínoo e sua filha Nausícaa que o celebram em banquetes jogos esportivos e performances do poeta local o excelente e cego Demódoco O bardo canta três histórias a briga entre Odisseu e Aquiles em certo momento da Guerra de Troia o adultério de Afrodite com Ares e a tomada de Troia por meio da emboscada do cavalo de madeira comandada por Odisseu cantos 68 Só depois dessa terceira história o herói é confrontado pelo rei para revelar sua identidade numa longa madrugada ele conta todas as aventuras pelas quais passou até chegar à ilha de Calipso entre elas o cegamento do ciclope Polifemo a resistência ao canto das Sirenas e o ano que passou com outra ninfa a maga Circe cantos 912 No canto 13 enfim Odisseu desembarca em Ítaca Obedecendo a um conselho de Atena que o torna irreconhecível ao transformálo em mendigo ele não revelará a identidade a seus familiares É como mendigo e declarandose cretense que aparece a seu fiel porqueiro Eumeu canto 14 e com ele adentra sua antiga casa canto 18 não sem antes mais uma vez com o auxílio da deusa identificarse ao filho canto 16 Sofrerá várias humilhações em sua própria morada cantos 1721 mas também cativará Penélope ainda sem conhecer a identidade do estrangeiro porém curiosamente à vontade na presença dele a rainha estabelece uma prova entre os pretendentes para escolher o novo marido desposará quem for capaz de manejar o arco de Odisseu e fazer a flecha passar entre doze machados canto 19 Ninguém consegue salvo o mendigo canto 21 que dirige a segunda flecha contra um dos líderes dos pretendentes na sequência todos são chacinados canto 22 Enfim Odisseu revela sua identidade à esposa passa com ela a noite canto 23 e no dia seguinte precisa enfrentar os parentes furiosos dos pretendentes mortos canto 24 Mas Zeus interfere impedindo outra escaramuça e o poema termina O retorno a casa Quando pensamos em Odisseu logo nos ocorre o estratagema de sua devotada Penélope que de dia tecia uma mortalha para o sogro Laerte e à noite a desfazia ou as aventuras a que o herói sobrevive depois que os navios sob seu comando deixam Troia O poema tematiza sua própria condição de existência como uma rememoração de façanhas de homens notáveis no passado ou seja sugere que existe para rememorar aproximar do presente uma linhagem de homens para sempre extinta que um dia estiveram próximos dos deuses a quem se ligavam por parentesco ainda que distante os heróis Graziosi Haubold 2005 Além de honra e riqueza todo herói que se destacasse nos combates em Troia conquistaria a fama a ser perpetuada entre as gerações futuras inclusive e em especial como canto poético Assim o herói supremo da Ilíada é Aquiles graças a ele o poema existe Odisseu por seu turno ao embarcar rumo a sua ilha leva na bagagem enorme riqueza provas de sua honra e a glória de ter sido o derradeiro responsável pelo êxito da batalha final A tudo isso porém são dados valores cambiáveis à medida que a Odisseia transcorre e um mundo diverso daquele da Ilíada é apresentado no poema A Ilíada ou seja a representação da Guerra de Troia e daquilo que motivou as ações de seus combatentes é o passado da Odisseia O leitor moderno pode já ter deparado com obras que remetem a determinado aspecto da Odisseia a saber o dos problemas enfrentados por combatentes que retornam de uma guerra árdua pensemos por exemplo em Mrs Dalloway de Virginia Woolf e nos filmes sobre os norteamericanos que combateram no Vietnã A Odisseia elabora uma postura crítica ou pelo menos polêmica em relação ao modo como a Guerra de Troia conferiu fama heroica a Odisseu e outros gregos É crítica por exemplo ao acentuar danos irreparáveis causados à casa de um senhor quando de sua ausência excessivamente prolongada Clitemnestra esposa de Agamêmnon trai o marido ausente com Egisto que mata o titular quando ele retorna É polêmica ao contrapor feitos heroicos e suas consequências como o regresso de Odisseu e a morte de Aquiles Quando se menciona um fato que do ponto de vista da viagem de volta do herói esqueleto do poema está no passado distante como o retorno do generalíssimo Agamêmnon a sua casa onde em companhia de sua valiosa concubina troiana Cassandra filha de Príamo é vítima de emboscada essa história embutida coloca o poema sob determinada perspectiva não há como Odisseu ter certeza de que Penélope não será a sua Clitemnestra e isso explica que ele aceite a tática de Atena O fracasso da volta de Agamêmnon episódio várias vezes lembrado na Odisseia sugere que a glória obtida pela destruição de Troia nada garante a posteriori a não ser algum tipo de lembrança O Odisseu que a Odisseia quer que admiremos não é o herói das façanhas guerreiras em Troia Quando navega ao longo da ilha das Sirenas amarrado ao mastro de seu barco é o único ouvinte de seus feitos pregressos narrados pelas criaturas míticas com um canto cuja finalidade é atrair para a morte quem o escuta quando vestido com sua armadura atravessa o estreito entre Cila um monstro que vive numa caverna e Caríbdis um espetacular redemoinho é o espectador impotente da patética morte de seis companheiros Nesses e em outros momentos não é o herói em primeiro lugar que nos causa admiração mas o estranho e fascinante mundo que conhecemos por intermédio dele Também no Hades quando Odisseu conversa com seus pares mortos Agamêmnon e Aquiles não se trata de uma conversa para lembrar as façanhas do passado e sim de um lamento causado pela morte contra a qual só resta como consolo para quem não pode voltar para casa o valor do filho potencial herdeiro e perpetuador da linhagem do pai Assunção 2003 Algo diferente acontece naquela que é a aventura emblemática de Odisseu o cegamento do ciclope Polifemo Assistimos ao embate simbólico entre as duas mais importantes potências que podem se manifestar nas ações de um herói a força bruta pela qual se distinguem por exemplo Aquiles e Héracles outro herói que no poema se opõe a Odisseu embora sobretudo como arqueiro permita ao poeta usálo também como figura paralela a Odisseu e a astúcia cujo representante humano mais destacado é o próprio Odisseu no plano divino Atena e Hermes que se dela fosse desprovido jamais teria sido capaz de discernir o único modo de escapar da caverna habitada por aquele ser de força descomedida Odisseu é impotente para vencer Polifemo numa luta aberta a tática dos fortes e rápidos como Aquiles e Diomedes e à espera do momento correto de agir vê perderem a vida alguns de seus companheiros vítimas do canibalismo da criatura monstruosa O herói até procura evocar a fama do exército aqueu em particular a de Agamêmnon como prestigioso cartão de visitas mas o ciclope divertese com a ingenuidade do estranho que não conhece os costumes locais em muito pouco semelhantes a instituições e hábitos civilizados Num átimo porém a inteligência de Odisseu aparentemente falha por têlo conduzido a uma arapuca arma um plano genial em cujo centro está a absoluta negação do que é representado no heroísmo iliádico Odisseu autodenominase Ninguém o oposto do herói que em momentos de luta aguerrida gosta de bradar nome e linhagem Esse falso nome vai confundir os outros ciclopes que alertados por Polifemo já cego não compreendem o que ele diz e o abandonam É nos instantes em que se sacrificam os protocolos heroicos mais prezados no mundo da guerra que Odisseu consegue escapar da morte Paradoxalmente porém a Odisseia repetidas vezes confere a seu herói uma identidade passageira de guerreiro belicoso Quando por fim revela seu nome ao ciclope já se afastando da praia Odisseu deixa de ser Ninguém e fixa naquela terra selvagem sua identidade heroica Assim possibilita que Polifemo filho de Posêidon faça uma prece ao pai pedindo que o retorno de Odisseu seja o mais sofrido e longo possível É graças à revelação de sua identidade que o ciclope pode reagir sem o nome do adversário não há magia eficaz contra ele e pelas ações de Posêidon o poema existe Dessa forma ainda que a narrativa reitere não haver raposa mais sagaz que esse herói sua ingenuidade ao entrar na caverna repleta de sinais sinistros e sua arrogância ao bradar seu nome épico nos indicam que heróis não são figuras a serem emuladas em seu todo mas antes agentes de histórias impressionantes e portanto portadores de qualidades notáveis em um mundo que não é aquele do público do poema O que está em jogo é a caracterização de Odisseu ela seria inconsistente já que em alguns instantes não age como o herói que personifica a astúcia Por um lado ao contrário de seus companheiros ele não foi um bom leitor dos sinais oferecidos pela caverna e só depois percebe que nada pode contra o ciclope restandolhe mediante a tática apropriada aguardar o momento propício da fuga Por outro mesmo que tenhamos a impressão de que a astúcia sucumbe no final ao enérgico ânimo que faz dos heróis homens física e mentalmente superiores a nós ainda assim o que garante não só a salvação de Odisseu mas também o trecho mais prazeroso da história são sua astúcia e a capacidade de não se deixar dominar pelo agudo sofrimento de ver os companheiros sendo devorados pela criatura antropófaga Quando já em Ítaca buscar forças para enfrentar praticamente sozinho os mais de cem pretendentes de sua esposa ele relembrará o embate com Polifemo Werner 2009 Nesse momento é de sua astúcia excepcional que recorda e não da bazófia que encerra o episódio indicandonos o que há de exemplar e admirável na aventura uma das razões para ela continuar a ser cantada A viagem de Odisseu tem três momentos no primeiro perde paulatinamente as naus em que ele e os companheiros partiram de Troia no segundo já sozinho enfrenta o naufrágio da balsa que construíra na ilha de Calipso e chega à terra dos feácios Esquéria A partir desse momento Posêidon nada mais poderá contra seu inimigo e a deusa protetora de Odisseu Atena passará a zelar pelo mortal que afirma ser seu preferido por assemelharse a ela o que não significa que no restante do percurso o herói se eximirá de tomar decisões delicadas ou suportar grande sofrimento sozinho Odisseu não é apenas astuto mas resiliente Mesmo que o narrador nos conte desde o início que o herói tem uma aliada desse porte em nenhum momento ele nos deixa esquecer que Odisseu está submetido à mesma fragilidade humana que marca a condição de outros sofredores como o porqueiro Eumeu seu fiel escravo Se a Ilíada é o poema do herói que por seu caráter e decisões apressa seu percurso rumo à morte Odisseu é aquele que dela sempre de novo escapa Pucci 1995 Não é com pompa e circunstância que o náufrago anuncia sua identidade àqueles que o acolhem em Esquéria calejado demora a permitir que seus anfitriões o casal real e sua filha saibam que têm diante de si um mortal excepcional Não deixa de ser curioso esse processo que só em parte pode ser compreendido como a paulatina ressurreição de uma morte simbólica que culminou nos inúmeros anos que teve de passar na ilha de Calipso a que encobre Vernant em Schein 1996 Segal 1994 Logo antes de revelar sua identidade ao ouvir o aedo feácio Demódoco cantar a história da conquista de Troia o narrador diz que Odisseu chorava como uma mulher de cidade conquistada viúva a ser levada como escrava pelo inimigo após perder o marido na guerra Essa imagem uma das várias comparações ou símiles estendidos que marcam o estilo homérico sugere que as histórias que Odisseu conta na sequência para se apresentar ao povo que o conduzirá são e salvo para casa não são apenas o movimento encomiástico de reconquista de sua identidade ou seja um mero retorno a uma situação inicial Odisseu não é mais o mesmo entre outras razões porque pelos cantos poéticos que ouve entre os feácios sobre sua participação na guerra de Troia ele compreende de outro modo o que viveu Halliwell 2011 Peponi 2012 Uma dimensão de luto jamais deixará o herói paralela ao permanente sofrimento que na comparação a mulher cativa enfrentará para sempre longe do marido e à mercê de uma vida de pesados trabalhos Também não é suficiente supor que um certo realismo psicológico exija que na narração da chegada à terra dos feácios Odisseu alquebrado viajante nu não se jacte de saída de sua identidade para não ser confundido com um ninguém mentiroso Ou então supor que o narrador prolongue sua narrativa somente para aumentar a tensão utilizando uma estrutura temática que explorará ao máximo quando Odisseu chegar a Ítaca a do forasteiro que aparenta ser alguém sem eira nem beira que precisa conquistar a simpatia dos anfitriões em terra estranha Uma odisseia é um nostos porque quem está longe de casa só consegue retornar graças à ajuda de um terceiro Frame 2009 Odisseu por pouco não regressa logo após a guerra Voltava com Nestor mas se desentende com ele e dá meiavolta rumo a Troia para se encontrar com Agamêmnon Ora Nestor é justamente aquele que traz para casa mesmo radical verbal presente em nostos de sorte que apenas quando Odisseu encontra o benévolo mas sobretudo firme e justo rei Alcínoo aquele que traz para casa por meio de sua força seu retorno pode ser bemsucedido Frame 2009 Uma vez em Ítaca iniciase a segunda parte do poema quando Odisseu assume o disfarce de um cretense atingido pelas vicissitudes do destino e vagamundo para sobreviver depende da bondade alheia e da própria astúcia O cretense consegue a simpatia de Eumeu e após Atena promover o reencontro e reconhecimento entre Odisseu e Telêmaco o herói dirigese a sua propriedade A viagem do filho Não é apenas a viagem de Odisseu que compõe a estrutura narrativa do poema mas também uma outra que de forma extraordinária posterga a efetiva entrada em cena do herói principal ao mesmo tempo que coloca em perspectiva sua gesta um contraexemplo da tese de Erich Auerbach segundo a qual só vale o primeiro plano na narrativa homérica não havendo uma busca de perspectiva espacial e temporal Auerbach 1976 Mas o retorno de Odisseu é narrado a partir de outros retornos Quando a história começa a situação é de crise tanto para o herói esquecido há tempos pelos deuses na ilha de Calipso quanto para sua família O filho na fronteira entre a adolescência e a vida adulta ainda não é senhor de sua casa tomada pelos jovens pretendentes que de forma abusiva e vil consomem o patrimônio de Odisseu em banquetes diários único modo de pressionar a rainha Como são mais de cem pretendentes filhos de famílias notáveis de Ítaca e cercanias não há nenhuma medida prática por meio da qual o jovem possa pôr fim ao abuso Além disso Telêmaco cresceu sem pai ou seja sem um exemplo que lhe fizesse discernir o que ele próprio herdou de sua respeitável linhagem A mãe de Odisseu já está morta e o avô paterno Laerte vive no campo como um pobre eremita cuja única companhia são os escravos É Atena que de novo transmutada em um aliado da família primeiro Mentes depois Mentor consegue fazer com que Telêmaco encontre em si mesmo a motivação necessária para enfim sair de sua letargia infantil Werner 2010 e 2013 Quando mais tarde Odisseu já em Ítaca entra em casa disfarçado e no final da prova do arco estabelecida por Penélope dispara a primeira flecha contra seus inimigos ele pode contar com a ajuda de um jovem que temos certeza não desapontará o pai O narrador mostra que a herança dos valores que distinguem os ancestrais é um processo complexo e para quem a ele assiste assombroso Se Homero fosse confrontado com uma discussão paradigmática cara à intelectualidade grega do século V aC qual seja se o comportamento virtuoso de um indivíduo é inato ou adquirido não parece que ele optaria por um dos polos Todos os interlocutores de Telêmaco têm certeza de estar diante do filho de Odisseu e não só pela semelhança física mas o próprio Telêmaco só entende o que isso significa em termos de direitos e deveres a partir do contato com seus pares e do choque contra seus inimigos Nos quatro cantos iniciais do poema Telêmaco é potencialmente o protagonista da história É certo que durante todo esse tempo Odisseu e a vingança inevitável contra os pretendentes são trazidos à consciência do leitor Telêmaco porém filho único assim como único filho varão de Laertes foi Odisseu é quem continuará a linhagem do pai e será seu herdeiro em Ítaca O percurso heroico de Odisseu seria virtualmente inútil se não tivesse um filho que desse continuidade ao prestígio de seu nome Não surpreende portanto que o jovem não ocupe a posição de mero espectador passivo das façanhas inigualáveis do pai e como ouvinte daquelas da velha guarda de Troia A situação é bem diferente do que vemos na Troia da Ilíada onde um herói no auge do vigor físico Heitor é o comandante supremo do exército pois seu pai Príamo é um ancião que apenas mantém certo poder político na cidade O filho de Heitor Astíanax por sua vez é uma criança Tanto Telêmaco quanto Odisseu durante suas viagens correm riscos diversos e precisam ser exímios leitores dos mais diferentes sinais mormente daqueles que se manifestam nos discursos de seus interlocutores Nesses momentos de leitura eles também necessitam ser hábeis manipuladores de palavras Isso não muda quando ambos já tendo travado contato entram na casa de Odisseu e socializam com os pretendentes Penélope e os escravos sem poder revelar nada acerca da identidade verdadeira do combalido cretense Na casa de Odisseu porém imprevistos acontecem como em toda odisseia a velha ama Euricleia reconhece o herói por uma cicatriz juvenil Auerbach 1976 Duarte 2012 Tão perto tão longe mesmo na véspera de sua derradeira vingança para a qual o efeito surpresa mencionado inúmeras vezes ao longo do poema parece decisivo Odisseu corre um último grande risco Nesse momento entretanto somos confrontados de forma clara e inequívoca com um dado que permanecia disperso no poema mediado por seu avô materno o notório ladrão e mentiroso Autólico Odisseu tem uma relação especial com Hermes deus de ladrões mercadores e viajantes no universo da Odisseia a fronteira entre as três categorias não é muito nítida A maestria na dissimulação e na maquinação de estratagemas infalíveis quando o fracasso parece eminente manifesta nas ações e falas de Odisseu e Telêmaco tem uma pré história e disso nos damos conta num momento em que aparentemente por um descuido o herói de novo quase põe tudo a perder As narrativas A Odisseia é um poema que contém um número bastante acentuado de narrativas dentro da narrativa principal curtas e longas até longuíssima como no caso das aventuras contadas por Odisseu aos feácios do canto 9 ao 12 narra tudo o que lhe acontecera inclusive relatos que ele ouviu desde que saíra de Troia As histórias são narradas por bardos profissionais por criaturas divinas ou assombrosas ou então por aqueles que vivenciaram o que contam verdadeiras mentirosas duvidosas ou sonhadas Tomemos como primeiro exemplo o episódio da cicatriz mencionada há pouco Embora seja o narrador que o conte no momento mesmo em que a ama vê a cicatriz e reconhece seu senhor não fica claro se o ponto de vista adotado por ele é o seu mesmo narrador objetivo ou de uma das personagens envolvidas Odisseu ou ama que naquele momento como que teria se lembrado do evento que liga Odisseu a todos os servidores mais velhos da casa De fato o caráter objetivo da narrativa homérica é um equívoco no mínimo parcial na recepção dos poemas o narrador conhece vários modos de embutir diferentes olhares o de personagens e dele próprio em sua narrativa De Jong 2001 Embora nem sempre seja óbvio por que algumas histórias são apresentadas com mais detalhes e outras com menos basta comparar o modo como o narrador transmite as três canções cantadas pelo bardo feácio Demódoco no canto 8 é sempre significativa a ocasião em que alguém decide rememorar determinado evento passado Quase nunca é o narrador que conta algo que aconteceu antes do evento que abre o poema a decisão dos deuses de permitir que Odisseu partisse da ilha de Calipso e que Telêmaco fosse em busca de notícias do pai Toda narrativa interna à narrativa principal é um ato de comunicação que envolve as personagens mas também um ato dirigido ao ouvinte externo ao poema Estão em jogo de forma bastante concentrada diferentes níveis de comunicação pelo modo de as personagens se comunicarem entre si o narrador se comunica com seu público Como fez no início do canto 9 o narrador também poderia ter dado a palavra a Odisseu na prolongada noite em que o herói enfim se reúne com a esposa no canto 23 Todavia não ouvimos Odisseu inebriando Penélope com a narrativa de sua viagem apenas a voz do narrador que não repete tudo de que já tomamos conhecimento anteriormente mas faz um breve resumo Isso indica o domínio da narração pois uma narrativa tão longa ao final do poema seria um anticlímax No entanto essa razão digamos técnica não é a única Em primeiro lugar na terra da vida boa e tranquila que é a ilha dos feácios não pode faltar um excelente aedo confrade de Homero como ele cego Graziosi 2002 conhecedor de façanhas humanas e divinas tão bom que graças à Musa narra eventos cuja veracidade precisão e completude são elogiadas por alguém que deles participou o próprio Odisseu Werner 2013 As histórias de Demódoco porém também funcionam como uma estrutura contrastiva ou no mínimo como um proêmio para a longuíssima narração de Odisseu Mortais só excepcionalmente podem afirmar que determinado deus agiu entre os homens mas mesmo sem a lira e a onisciência que a Musa fornece a um bardo Odisseu é dotado de algo que os gregos conceitualizaram por meio da Musa a capacidade de fazer uma narrativa transformar acontecimentos terríveis numa experiência que causa deleite Halliwell 2011 Mais que deleitar Odisseu é capaz como as Sirenas de enfeitiçar seu público madrugada adentro Peponi 2012 Se há um contador de histórias insuperável na Odisseia esse é Odisseu Por meio das narrativas de Odisseu o próprio Homero reforça seu domínio sobre as muitas idas e vindas que dão forma ao poema monumental e atestam seu domínio da tradição épica e folclórica que ultrapassa o próprio poema como Odisseu ele é um mestre dos volteios reais e metafóricos espaciais temporais e retóricos ou seja um homem muitasvias polutropos adjetivo que qualifica o herói no primeiro verso do poema Pucci 1998 Ao invés de contar a história de Odisseu de modo linear desde o fim de Troia até sua morte distribui por todo o poema histórias e historietas rememorações e previsões pertinentes à guerra e a seus heróis todas elas guardando as mais diversas camadas de sentido que cumpre tanto aos receptores internos quanto aos externos ao poema perceber e interpretar Werner 2011 O mundo percorrido por Odisseu na sua década de errância não pertence às terras conhecidas pelos ouvintes de Homero a viagem de Odisseu é uma viagem pelo imaginário e por meio dele Isso não significa que os ouvintes e leitores de Homero na recepção do poema na Antiguidade tenham entendido o poema como uma ficção Não se duvidava por exemplo que a Guerra de Troia tivesse acontecido mas muito cedo se defendeu que Homero cometera excessos típicos dos poetas cujo propósito era deleitar seu público O poema se tornou canônico era ouvido e lido por toda a elite mas intelectuais de cepas diversas apresentavam correções aos eventos e informações relatados no poema Algo não muito diferente fazem os modernos quando em um mapa do mundo mediterrâneo traçam a viagem de Odisseu eliminando aquilo que há de maravilhoso Não há mapa capaz de reproduzir a ilha de Eólo o senhor dos ventos uma terra que se move Na melhor das hipóteses qualquer traçado contemporâneo é uma ficção aproximativa na pior um falseamento do modo como Homero e seus espectadores pensavam o mundo por meio da poesia Assim por exemplo não há nenhuma palavra na Grécia arcaica ou clássica que se aplique àquilo que chamamos de mar Mediterrâneo As coordenadas utilizadas pelo narrador para localizar seus ouvintes são outras Claro que algumas delas são geopolíticas e dizem respeito ao mundo dos ouvintes mas não temos mais acesso a esse mundo O sítio arqueológico encontrado na Turquia no século XIX pelo alemão Schliemann talvez seja o da cidade que em um processo longo e para sempre perdido entrou na literatura grega e ocidental sob o nome de Troia ou seja sofreu uma guerra que passou a ser cantada em poemas Ou talvez não Por isso muito mais importantes para entendermos como um poeta falava de um mundo desconhecido para seus ouvintes gregos são as coordenadas antropológicas que dão forma à narrativa do herói essas sim bastante familiares Ao contar aos feácios o que viu e o que sofreu Odisseu ao mesmo tempo diz como é ou deveria ser o mundo e o homem grego quais as normas de uma sociedade civilizada quais os limites entre homens deuses e animais e até onde o engenho humano permite o domínio de forças indômitas VidalNaquet em Segal 1996 Os ciclopes e Polifemo por exemplo são uma versão exacerbada dos incivilizados pretendentes de Penélope Bakker 2013 Alcínoo e os feácios idealmente tão hospitaleiros são tão justos e prósperos quanto Odisseu e Ítaca sob o seu reinado no passado e no futuro Além de Odisseu saber contar verdades com aparência para nós de mentiras ao longo da história da recepção da Odisseia mais de uma vez se assinalou que o herói teve sorte de encontrar um público tão crédulo quanto os feácios ele também é exímio contador de mentiras com aparência de verdades Malta 2012a Kelly 2008 Essa é mais uma razão para ouvirmos o longo relato do mestre do discurso antes de sua noite de segundas núpcias com Penélope pois desde o instante em que chega a Ítaca até o momento em que ainda como cretense conversa a sós com a esposa ele encanta quem o ouve às vezes mais às vezes menos criando uma falsa biografia que altera de acordo com seus ouvintes ocasionais e quiçá a partir de outras versões antigas da história de seu retorno Devemos nos perguntar portanto se quando os ouvintes de Odisseu e o narrador o comparam a um aedo o narrador nos indica haver algo no modo como Odisseu constrói suas histórias que independe do conteúdo de verdade da narrativa Pratt 1993 Só Odisseu é chamado na Ilíada e na Odisseia de poluainos Esse adjetivo épico é composto por muito polu e pelo substantivo ainos termo polissêmico que se refere a um tipo especial de discurso Nagy 1979 Quem denomina Odisseu dessa forma muitahistória são as Sirenas e em vista do contexto seu objetivo pode ser o de bajulálo como alguém que é muitoelogiado ou seja objeto de muitas histórias entre elas por exemplo a Ilíada onde o adjetivo aparece mais vezes que na Odisseia ou então como alguém que conta muitas histórias mas nesse caso decerto não conhece tantas histórias quanto elas Pucci 1998 Ainos porém não é qualquer história mas aquela por meio da qual o narrador conta algo que desafia o interlocutor a buscar e compreender além da superfície um sentido profundo entendese assim por que o termo passou a ser utilizado entre outros para um tipo de narrativa que conhecemos como fábula No final do canto 14 Odisseu em sua identidade de mendigo cretense lança mão de um ainos muito elogiado por Eumeu cujo objetivo é conseguir emprestado um manto para suportar a noite fria na cabana do porqueiro A história que carrega um elogio tanto de Odisseu sua personagem central quanto de forma algo ambígua do próprio cretense tem uma função material pragmática interna ao poema qual seja conseguir o manto Um nível de comunicação homólogo está presente na situação em que Odisseu conta sua longa história aos feácios embora nem eles nem o narrador da Odisseia se refiram a essa narrativa como um ainos Odisseu lucra uma quantidade nada desprezível de presentes de seus ouvintes após interromper sua narrativa e sugerir que já estaria na hora de ir se deitar Tanto no ainos contado a Eumeu quanto nas aventuras narradas aos feácios o que menos interessa a nós no momento em que Odisseu relata como cegou Polifemo ou conversou com Aquiles no Hades é se a história é verdadeira ou não em que pese o curioso elogio feito por Alcínoo a Odisseu quando da mencionada interrupção A narração precisa atingir seu objetivo e esse mesmo quando for material e ele com frequência o é dadas as condições de vida de aedos e mendigos grandes contadores de histórias no poema é secundário em relação ao louvor ou à censura direto ou indireto dos valores compartilhados ou não por quem narra e sua plateia Boas histórias sempre na forma e no conteúdo na Odisseia pelo menos idealmente parece não haver separação entre ambos refletem pessoas dignas o que por sua vez depende sempre do contexto da comunicação Não há como Odisseu ser louvado por Polifemo por exemplo Penélope Telêmaco e Eumeu sempre que ouvirem de um estranho que aporta em Ítaca notícias alvissareiras acerca de Odisseu têm motivos de sobra para desconfiar das intenções do interlocutor mesmo quando ele é um adivinho que nós sabemos ter razão ou então o próprio Odisseu disfarçado Malta 2012b Depois de acompanharmos as performances verbais e não verbais de Odisseu em Ítaca vemos com outros olhos o modo como conquistou a confiança dos feácios Em última instância a história e a identidade de um indivíduo não são dados inequívocos pois dependem de repetidas performances e sempre correm o risco de se tornar outra coisa Não por acaso o ceticismo qualidade que Penélope demonstra ter em alto grau é tão valorizado no poema Zerba 2009 Para o cenário que o naufrágio de Odisseu nu e sozinho cria na terra dos feácios já somos preparados de antemão pois Telêmaco também viaja e depara nos cantos 3 e 4 com homens justos cortes suntuosas e contadores de histórias É por meio do que é narrado em Pilos onde reina Nestor e em Esparta governada por Menelau que conhecemos outros casais e outras histórias de retorno um sentido suplementar de nostos na poesia épica grega Assim como Penélope para Odisseu Helena e Clitemnestra têm um papel fundamental no retorno de Menelau e Agamêmnon respectivamente Se Clitemnestra é uma adúltera para quem a Odisseia não tem quase nenhuma palavra simpática Helena é uma figura ambígua em geral odiada mas também encantadora e admirada Werner 2011 Em parte é como se o poema precisasse ao mesmo tempo exibir uma heroína virtuosa ao máximo Penélope como responsável última pelo retorno do herói principal e em contraponto flertar com imagens femininas imorais e amoralmente sensuais Katz 1991 Felson 1997 No canto 8 que narra o dia em que desde a aurora tudo parece levar apenas ao embarque de Odisseu rumo a Ítaca somos surpreendidos pelo segundo canto de Demódoco que recria o adultério de Afrodite deusa da beleza e do amor e na Odisseia esposa de Hefesto o hábil deus dos artesãos o amante é Ares deus da guerra na sua face mais violenta e desregrada Aqui é difícil não pensar em Odisseu e Penélope Essa história recontextualiza a briga que acabara de acontecer entre o herói e alguns feácios arrogantes jovens excessivamente confiantes em seu vigor físico avatares de Ares que durante uma série de disputas esportivas zombam de Odisseu Esse se mostra superior aos outros competidores no lançamento de disco e deixa claro que venceria em todas as outras modalidades exceto na corrida Com isso a tessitura narrativa reforça uma série de paralelos possíveis entre Odisseu e Hefesto de um lado ambos sobrepujados num primeiro momento por machos mais vistosos e de outro Aquiles e Ares guerreiros confiantes no próprio vigor E não só porque o primeiro canto de Demódoco já tivera Odisseu como um de seus personagens mas porque a oposição entre as esferas da astúcia e da força é um tema subjacente a todo o canto 8 Desse modo porém de alguma forma Penélope se avizinha de Afrodite ou seja sua fidelidade recebe estranhos holofotes e a potência de Odisseu é posta em suspenso se no canto 5 ele é um amante cansado é só no canto 10 que o veremos satisfazendo a ninfa Circe A exploração dos papéis sexuais do homem e da mulher casados ou na idade de casar é uma constante no poema e é sempre significativa basta compararmos os cantos 3 e 4 complementares e inversamente simétricos no que diz respeito aos casais que hospedam Telêmaco No início do episódio dos feácios tudo gira em torno de Nausícaa virgem nubente e assim o casamento como instituição social fundamental marca toda a estada de Odisseu para quem porém a união com a jovem não é uma opção pois como sabemos desde a separação entre o herói e Calipso Penélope e Ítaca jamais deixam de suscitar uma saudade quase mortal em Odisseu salvo durante o ano que passa indolente com Circe Por quê então o narrador da Odisseia em um episódio que mostra feácios e Odisseu se divertindo escolhe como vítima de adultério um deus que tanto se assemelha a Odisseu A explicação de que o canto complementando uma intervenção de Alcínoo e um prazeroso espetáculo de dança apazigua os ânimos do brioso Odisseu e dos inconsequentes feácios é por certo pertinente Depois de Odisseu passar uma descompostura naqueles que lembram os pretendentes de Penélope Louden 1999 assinalando que a beleza física não é nada se comparada a um discurso bemfeito no qual forma e conteúdo moral se espelham Demódoco ao retratar um deus feio mas muito hábil que supera um deus muito mais belo e rápido coloca numa chave potencialmente jocosa a moral que Odisseu havia apresentado com seriedade Todavia se observarmos com atenção veremos que quem ri são alguns deuses de Odisseu e dos feácios apenas se diz que sentiram prazer o efeito esperado de um canto ao fim de um agradável banquete Além disso resta o problema do objeto de desejo Afrodite Na cena divina ouvimos Hermes comentar que mesmo se tivesse passado por situação ainda mais vergonhosa que a de Ares teria valido a pena dormir com a supremamente desejada Afrodite Com isso ficamos com duas morais a séria e a jocosa Será que na Odisseia temos de fato apenas uma Penélope aquela que sofre por conta da ausência do marido Por um lado sim se Hermes consegue se identificar com Ares para nós receptores da Odisseia é impossível nos identificarmos com os pretendentes pois a vileza deles e o sofrimento da rainha são inequívocos no mundo mortal do poema que também é o nosso Devemos levar em conta porém que a identidade de Penélope mais que a de qualquer outra personagem do poema é construída através dos olhos e sobretudo dos relatos dos outros basta atentarmos ao que diz Atena sobre ela a Odisseu quando este chega a Ítaca ou então à interpretação dada por Odisseu ao comportamento de Penélope quando ela aparece aos pretendentes e deles pede presentes ao anunciar que enfim chegou o momento de se casar Assim se no primeiro canto somos apresentados a uma sofredora reduzida a um papel meramente passivo sobretudo agora que o filho parece começar a tomar as rédeas da casa no canto seguinte um dos líderes dos pretendentes Antínoo que até no nome é anti a inteligência noos necessária para o nostos apresenta Penélope como a principal responsável pela invasão da casa de Odisseu já que durante três anos ela ludibriou quem a cortejava com a promessa de que escolheria o preferido assim que concluísse a mortalha que ela astuta desmanchava A identidade de Penélope talvez seja tão elusiva dada a quantidade de papéis narrativos que precisa executar mãe preocupada com a vida do filho viúva declarada que precisa controlar seus pretendentes de quem contudo arranca presentes esposa fiel que decide sozinha organizar uma prova para escolher o novo marido Felson 1997 Muito se discutiu sobre a função da tessitura da mortalha na economia da Odisseia já que a relação entre a rainha e aqueles que a cortejam e vale dizer o prazo para a escolha do marido não parece depender da descoberta da artimanha Não se avança muito ao supor que a história seja tão ligada à representação tradicional de Penélope que não haveria como não ser incluída mesmo no caso de ter sofrido notável alteração em vez de fazer um vestido de casamento que uma vez terminado permitiria as bodas Penélope a lutuosa faz uma mortalha mais produtivo é verificarmos que a história da mortalha é contada três vezes ao longo do poema em contextos bem distintos e por outras personagens mas com os mesmos versos o que nos oferece uma situação diametralmente oposta por exemplo às três canções de Demódoco Na primeira vez no canto 2 Antínoo apresenta uma Penélope em franca oposição à personagem sofredora e algo passiva do canto anterior mas é justo essa imagem da rainha ardilosa que em filigrana a acompanha em algumas de suas cenas sobretudo nos cantos 18 e 19 e que culmina no truque da cama ao qual submete Odisseu no canto 23 quando sem ter certeza de que o homem que tem diante de si é seu marido diz que ele pode dormir no leito do casal que porém não está mais nos mesmos aposentos Ora a cama uma obraprima de carpintaria Odisseu como artesão jamais poderia ter sido deslocada de onde estava a não ser por um homem o que indicaria que Penélope lhe tinha sido infiel Quando Odisseu reage indicando conhecer a cama que nunca fora vista por mais ninguém além do casal e de uma velha serva fiel Penélope tem certeza de que o marido voltou Enquanto Antínoo revela o engodo da mortalha durante uma assembleia de itacenses para mostrar a Telêmaco e aos demais habitantes não necessariamente comprometidos com os pretendentes que é Penélope a causadora da atual desgraça do jovem fazendo com que a riqueza de sua família seja literalmente devorada a rainha no canto 19 repete a história na conversa que tem com o cretense Odisseu em um encontro ansiado pelos receptores do poema Assim como Arete a rainha feácia a primeira atitude de Penélope ao ficar sozinha com o estranho é perguntar quem ele é Como já fizera em Esquéria Odisseu burla seu interlocutor e talvez o próprio receptor pois ele elogia a rainha por meio de um símile como se estivesse elogiando um rei Levaniouk 2011 Não surpreende que o longo diálogo entre os esposos no canto 19 seja uma das passagens nas quais alguns leitores julgam identificar um diálogo cifrado entre Odisseu e Penélope através do qual ambos conversariam sobre a identidade verdadeira já reconhecida de Odisseu Duarte 2012 Por mais engenhosa que seja essa interpretação ela está em contradição com uma série de outras cenas em particular o reconhecimento por meio do leito conjugal o verdadeiro clímax no reencontro entre marido e mulher O elogio indireto do rei Odisseu funciona como pano de fundo para um novo elogio de Odisseu ou melhor para a contraposição entre duas situações a presente de Penélope que não poderia ser mais desgraçada e o significado do retorno do marido para ela É nesse momento que a rainha conta a seu ouvinte que embora seja esperta a astúcia é sua única defesa contra a violência dos jovens a época dos ardis passou e não lhe resta nenhuma outra medida para evitar o que menos quer o casamento Não surpreenderia se agora Odisseu revelasse sua identidade para acalmar a esposa mas esse instante não vem Mesmo assim é sobre Odisseu que os dois conversam já que o cretense como fizera com Eumeu mas não diante dos pretendentes evoca os instantes em que compartilhou da companhia do memorável herói Nesse momento a frágil rainha que sofre demais ao se sentir para sempre longe do marido mas ao mesmo tempo experimenta certo consolo e prazer ao ouvir histórias sobre ele por intermédio de alguém que sem nenhuma dúvida com ele se parece inclusive no físico não poderia estar mais distante da personagem do truque da mortalha mormente por ser ela mesma vítima de uma armação o disfarce de Odisseu que ao compor e recompor suas biografias espelha uma manifestação da arte da solerte tecelã Clayton 2004 Nesse sentido é quase que por um acerto de contas poético que a penúltima burla do poema a última é a identidade falsa apresentada por Odisseu ao pai será aplicada com sucesso pela rainha e a vítima será Odisseu Se no canto de Demódoco o truque é de Hefesto e Afrodite é só um corpo sem voz ainda que belíssimo vítima passiva da armadilha no leito conjugal em Ítaca Penélope usa a cama construída com habilidade pelo marido como uma artimanha que confirma em definitivo a identidade dele e a astúcia dela A odisseia de Odisseu é concluída graças a Penélope Enfim no último canto ainda ouvimos mais uma vez a história da mortalha A cena se passa no Hades onde se encontram primeiro as almas ou espectros de Aquiles e Agamêmnon que comparam o clímax fúnebre de suas carreiras heroicas e depois chegam as almas dos pretendentes Um deles ao conversar com Agamêmnon resume os eventos de Ítaca inserindo a mesma história já conhecida os mesmos versos Mais uma vez o contexto requalifica a história do ponto de vista dos pretendentes foi apenas graças a Penélope que Odisseu obteve a vitória contra eles ou seja juntos enganaram os pretendentes e idealizaram a prova do arco Essa última manifestação de um pretendente é mais um sinal claro de que as histórias narradas no poema não podem ser entendidas fora de seu contexto de enunciação pois se trata de uma percepção equivocada dos eventos e as múltiplas relações entre quem narra o que é narrado e quem ouve dentro e fora do poema nem sempre saltam aos olhos ou são corretamente apreendidas por quem ouve Ironicamente a narração do pretendente faz com que Agamêmnon produza o elogio mais contundente de Penélope em todo o poema A investigação Como já deve ter ficado claro até aqui a Odisseia é em vários níveis composta por travessias que também são intelectuais Odisseu aprende que o tipo de heroísmo que fez dele um vencedor em Troia tem seus limites no novo mundo de seu longo retorno e que as façanhas que realizou em Troia têm outro sentido quando lhes é dada uma forma por meio de um canto poético Telêmaco aprende que sua herança genética ou seja o heroísmo do pai depende de uma aprendizagem prática na qual é fundamental que ele e seus interlocutores o vejam de fato como filho de Odisseu Penélope a cética em nenhum momento pode se entregar a suas emoções e se submeter a uma das diferentes pressões que sofre Zerba 2009 Em suma aprendemos nós que todas as personagens têm propósitos e sentimentos em relação aos quais devemos medir tudo o que eles fazem e dizem Apesar de o estilo oral do poema dificultar uma distinção semântica precisa entre os vários termos que se referem a órgãos emocionais e cognitivos humanos bem como a suas faculdades é o noos aquele que mais particularmente circunscreve um tipo de inteligência que se distingue por não se submeter com facilidade à influência das emoções No Hades descrito por Odisseu no canto 11 por exemplo o adivinho tebano Tirésias é entre os espectros que lá se encontram o único a quem foi disponibilizada essa faculdade ou seja só ele ainda consegue saber de algo que extrapola a memória e pode auxiliar Odisseu em seus feitos futuros É graças a Tirésias que Odisseu sabe como agir quando chegar à ilha dos bois do Sol derradeira escala para os companheiros de Odisseu ainda vivos àquela altura da viagem canto 12 Ressaltese que não basta o conhecimento objetivo o herói informa aos companheiros que eles não podem devorar os bois sagrados e mesmo assim eles sucumbem ao apetite Bakker 2013 Se compararmos o Odisseu desse episódio com aquele que a despeito de todos os sinais negativos e da vontade dos companheiros medrosos quis entrar na caverna de Polifemo e lá permanecer até o dono voltar vemos que a contenção parece ser algo que a personagem adquire ao longo de seu retorno e não uma marca tradicional do herói Ao completar a fuga bemsucedida da caverna do ciclope Odisseu não consegue deixar de bradar seu nome e reafirmar sua identidade heroica mais tarde porém concluída a vingança contra os pretendentes a ama Euricleia quer extravasar sua alegria por meio de gritos rituais e é de imediato contida pelo herói Se no episódio do ciclope a bazófia de se fazer conhecido possibilitou a vingança de Posêidon em Ítaca Odisseu terá que firmar um acordo político com seus concidadãos um pacto que ultrapasse o ciclo de vinganças para conquistar paz e prosperidade em casa e na ilha Feito inédito no mundo dos heróis como fica claro pelo modo como Zeus é obrigado a intervir na derradeira cena do poema quando Odisseu mais uma vez parece incorporar o furor guerreiro tão típico da Ilíada e que manifestara em sua partida da ilha dos ciclopes Odisseu portanto é um herói da contenção do autodomínio não só porque seu retorno é bemsucedido por conta dessa qualidade mas porque é para ela que apontam todas as histórias acerca de suas façanhas em Troia mencionadas na Odisseia Entretanto não há como negar um resíduo inquietante de uma moral guerreira que poderíamos chamar de iliádica Toda investigação ou aprendizagem que graças ao fluxo da narrativa marca uma personagem do poema é antes de tudo um movimento de que o receptor é convidado a participar e ao mesmo tempo uma cena construída para que o próprio receptor decida o que lhe foi mostrado e dito Assim os cantos iniciais são uma pequena odisseia de Telêmaco uma viagem intelectual e real durante a qual o jovem precisa coletar elementos para deliberar sobre o destino de sua propriedade seriamente ameaçada Ao mesmo tempo o narrador nos apresenta uma série de indícios que nos leva a refletir acerca das dificuldades do retorno de Odisseu por exemplo até que ponto são elas resultado da ação de homens ou deuses Nem tudo é dito de forma inequívoca embora seja uma análise recorrente do discurso épico supor que o narrador nos informa tudo aquilo que julga importante para que acompanhemos sua narração e dela tiremos o máximo deleite Quando Telêmaco chega a Esparta cidade regida por Menelau logo fica claro para o ouvinte que o jovem não se dirigirá a um rei ou a um pai mas sobretudo a um casal com uma história que produz marcas evidentes no presente Na casa que recebe Telêmaco e seu companheiro de viagem Pisístrato filho de Nestor festejamse dois casamentos um dos quais é o do filho bastardo do rei Grandaflição Impossível não lembrar do rapto de Helena que tanto sofrimento causou não só a Menelau como a todos os gregos e por causa do qual Menelau teve apenas uma filha que também casa nesse mesmo dia com sua mulher legítima Na sequência o narrador descarta os casamentos revelando uma arbitrariedade que explicita a função deles qual seja evocar as consequências da união entre Helena e Páris Ao fim do banquete no qual os dois hóspedes se entretiveram Helena decide honrar a memória do desaparecido Odisseu e propõe que se contem histórias troianas É curioso que em nenhuma delas a personagem central seja o herói em ambas Helena é a protagonista tanto na primeira narrada pela própria rainha na qual se caracteriza como esposa devotada ao primeiro marido além de vítima da mesma Afrodite que ajuda Odisseu a conquistar Troia como na segunda narrada por Menelau quando ela já desposou Deífobo irmão de Páris àquela altura já morto e quase põe a perder o decisivo truque dos gregos o cavalo de madeira O narrador não é explícito mas é difícil não pensar que a segunda história é apresentada por Menelau para que Telêmaco e nós tenhamos outra impressão de sua esposa Penélope decerto não é Helena mas as duas histórias não deixam de apontar para o momento em que Odisseu estará de volta e dependerá de mulheres de cuja fidelidade em última instância não tem certeza Olson 1995 De fato todas as histórias e historietas do poema relacionamse com o enredo principal o retorno de Odisseu mas os vínculos precisam ser construídos e reconstruídos pelos ouvintes pois às vezes como no caso do segundo canto de Demódoco eles são ambíguos assim como muitas vezes são ambíguos os sinais que as personagens principais do poema constantemente interpretam Arma importante contra aquilo que não se domina é o ceticismo Sintomaticamente o único lugar em que Odisseu parece estar à vontade é a terra dos feácios onde tanto Nausícaa quanto Alcínoo nada dizem que lhe cause desconfiança comparese com a reação do herói ao acordar em Ítaca após ter sido conduzido pelos feácios algo tanto mais notável se pensarmos nas situações muito parecidas narradas entre os cantos 9 e 12 nas quais um rei ou uma ninfa quase causaram sua desgraça entre os lestrigões por exemplo quando a filha do rei leva um companheiro de Odisseu diretamente para o estômago do pai e na ilha de Circe quando a maga quase transforma Odisseu em um animal Até mesmo em Atena ele não confia incondicionalmente e com razão pois a deusa e ele mesmo são mestres do disfarce e do engodo Além disso embora em Troia ela tenha reiteradas vezes se revelado sua aliada ele não mais vivenciou seus favores ao embarcar de volta muito pelo contrário Odisseu quando enfim desembarca em Ítaca não reconhece a terra natal Os motivos não são enunciados de forma unívoca na narração o que sugere que não só as personagens ao interagirem como também o leitor precisam tomar cuidado com o que ouvem Por um lado Atena cria uma neblina por outro Odisseu afastado por vinte anos tem o álibi de não reconhecer o que lhe era familiar O narrador talvez esteja fazendo uso da estrutura que a crítica homérica chama dupla motivação decisões desejos ou pensamentos de mortais podem ser expressos ao mesmo tempo como oriundos dos deuses e de um órgão ou faculdade cognitiva e ou emocional Pelliccia 1995 No canto 13 a intervenção de Atena representaria a própria decisão do herói ou seja não revelar sua identidade para ninguém Embora não se possa descartar que esse modelo esteja subjacente ao episódio em questão ele não serve todavia para explicar as idas e vindas do verdadeiro duelo que se estabelece entre a deusa e o herói e o narrador não se esforça por esclarecer se Atena espalhou a neblina apenas para que pudesse metamorfosear Odisseu e com ele preparar a vingança vindoura Por outro lado nesse momento ainda não sabemos se Odisseu conseguirá ser sempre o herói astucioso que decide não agir de modo intempestivo essa dúvida é parte integrante da caracterização do herói ou seja do ritmo de suas aventuras passadas e futuras Odisseu oscila entre o descontrole e um total controle e isso faz parte de sua caracterização tradicional de sorte que na recepção de sua identidade heroica na literatura posterior essa pôde refletir valores ora positivos ora negativos No primeiro momento da cena entre Atena e o herói a atividade de reconhecimento diz respeito ao que se vê Assim não apenas Ítaca mas também a deusa são desconhecidas ao herói já que Atena aparece disfarçada de jovem pastor Quanto a Odisseu não lhe restam senão as palavras para alterar a realidade vista por seu interlocutor pois acredita encontrar se numa situação que lhe é amplamente desfavorável não sabe onde está nem com quem está lidando e precisa proteger seu notável tesouro os incontáveis presentes que recebeu dos nobres feácios Tratase do primeiro momento em que cria uma biografia mentirosa o disfarce de cretense Dessa forma entre a deusa e o herói que excelem na astúcia respectivamente dentre deuses e homens pelo menos é o que a deusa afirma fica estabelecido um embate mais ou menos inofensivo que retorna mesmo depois de parecer concluído por meio da revelação da identidade de Atena Clay 1997 Decidir quem é o vencedor ou seja quem se mostra mais esperto em relação às intenções do outro fica a cargo do leitor Por um lado a persona de pastor adotada por Atena não consegue fazer Odisseu revelar quem é por outro Odisseu declara que ele também sabe reconhecer um deus quando afirma em retrospectiva que a menina que o ajudou na ilha dos feácios canto 7 era na verdade a deusa disfarçada informação que o narrador já nos dera nesse episódio mas que parecia não ser do conhecimento de Odisseu As semelhanças da cena entre a deusa e o herói e a do teste da cama arquitetado por Penélope não parecem casuais em ambas a realidade não é clara para o indivíduo Assim na Odisseia o que importa para que os heróis permaneçam vivos e realizem seus objetivos é a inteligência e a astúcia que não se contentam com a superfície aparente e sabem criar disfarces e mentiras Todavia as intersecções entre o que se vê e o que não se vê e entre o que é dito e o que não é dito produzem constantes interrogações acerca da caracterização de suas principais personagens em especial de Penélope e de Odisseu O poema é fruto de um truque do seu narrador a construção de um texto que não deixa de ser aberto mesmo ao recebermos satisfeitos um final feliz para o casal de Ítaca 4 O adjetivo grego não aparece nos poemas homéricos mas sim os intercambiáveis dânao aqueue argivo DA TRADUÇÃO Para a presente tradução da Odisseia baseeime no texto grego das três edições citadas na Bibliografia ao final deste volume bem como em pesquisas da bibliografia crítica5 As características gerais mais relevantes que procurei conferir à tradução foram clareza fluência e poeticidade elementos fundamentais do original Sintaticamente o texto grego é em geral simples quanto ao vocabulário mesmo o sentido de termos compostos que só eram usados no dialeto homérico costumava ser cristalino para os ouvintes antigos por isso a opção por termos compostos não eruditos derivados da simples justaposição entre termos correntes do vernáculo Clareza e fluência não são estranhas a um poema narrativo oral ainda que tenha sido escrito já nos séculos VIII ou VII aC durante vários séculos ele teve na performance oral seu meio precípuo de transmissão e recepção De qualquer forma a Odisseia independentemente do modo como adquiriu a forma em que hoje é editada resultou de uma tradição poética oral com protocolos particulares A tradução procura reproduzir pelo menos alguns elementos próprios de tal oralidade como por exemplo a repetição de expressões e estruturas poéticas pois o modo como o sentido é construído na recepção do poema depende de tais repetições Foley 1991 e 1999 Para que elas fizessem sentido para um leitor da tradução optouse por reproduzir o mesmo conteúdo do verso original sempre que isso não forçasse uma ordem sintática estranha demais no português Dessa forma preservouse boa parte dos enjambements que em Homero são de vários tipos quanto à estrutura sintática grosso modo os que ocorrem quando o sentido de um verso está completo no final mas o verso seguinte compõe sua expansão De muitos homens viu urbes e a mente conheceu e muitas aflições sofreu ele no mar e aqueles na sua variação sintaticamente mais marcada quando uma frase carece de um elemento essencial ao final do verso Do varão me narra Musa do muitasvias que muito vagou após devastar a sacra cidade de Troia estes últimos menos comuns Colaboram para o ritmo e a construção de sentido do poema tanto os enjambements quanto a posição em que determinado termo ou fórmula da qual se fala mais abaixo se encontra no verso Um exemplo no qual fica clara a importância conferida ao enjambement 1 32527 e 340 42 Entre eles cantor cantava bem famoso e quietos sentados ouviam Dos aqueus cantava o retorno funesto que desde Troia impôslhes Palas Atena bebam vinho Mas interrompe esse canto funesto que sempre no peito meu coração tortura depois que assaltoume aflição inesquecível Primeiro o narrador versos 32527 e depois Penélope versos 34042 empregam o mesmo adjetivo na mesma posição métrica em enjambement para qualificar ela o próprio canto apresentado naquele momento ele talvez ambiguamente o tema do canto O modo semelhante e distinto como ambos caracterizam o canto é acentuado pelo enjambement e salienta um problema que é construído em vários níveis nessa cena bastante importante A fórmula é um dos principais elementos definidores da poesia oral grega em hexâmetros podendo ser entendida como um grupo de palavras reiterado sempre na mesma posição métrica Ela é um meio expressivo que faz parte de uma linguagem particular qual seja a dos poemas arcaicos em hexâmetros um autor a designou como os sintagmas épicos mais perfeitos gramaticalmente métrica fonética e semanticamente Bakker 2005 p 123 O sistema de fórmulas foi um meio utilizado pelo aedo para tornar presente no momento da performance do poema uma realidade ausente o mundo passado dos heróis Bakker 1997 Uma fórmula portanto não é apenas um meio de expressão mas também de performance a forma marcada de comunicação entre um aedo e seu público permitindo que se evoque um mundo que não existe mais e que se espera continue a ser evocado pelas gerações futuras De modo mais restrito fórmulas constituídas por um nome acompanhado de um epíteto um termo qualificativo em geral um adjetivo sugerem uma realidade própria que tem um sentido determinado no e pelo contexto épico Assim Atena olhosdecoruja não é a deusa Atena cultuada em uma cidade específica cercada de determinados mitos locais e sim a Atena tal como configurada na poesia homérica e que se pretende faça sentido para todos os gregos Vale lembrar que uma religião politeísta é fenômeno marcado pela pluralidade de sorte que os poemas homéricos à medida que se tornaram canônicos na Grécia arcaica de algum modo também contribuíram para criar ou reforçar algum tipo de unidade religiosa por tênue que fosse Outro exemplo 1 32831 Em cima compreendeu no juízo seu inspirado canto a filha de Icário Penélope bemajuizada e a elevada escadaria de sua morada desceu não sozinha mas com ela seguiam duas criadas Não sozinha em enjambement não tem apenas a função de informar ao ouvinte que Penélope estava acompanhada A utilização dessa expressão na mesma posição do verso sublinha para um ouvinte familiarizado com a linguagem formular do gênero que uma mulher nobre não costuma aparecer sozinha diante de homens que não sejam da sua família e isso é particularmente relevante para Penélope caracterizada no poema como avessa aos pretendentes portanto reticente em deixar os aposentos femininos Em todas as demais passagens 6 84 18 207 19 601 em que a expressão surge nessa mesma posição do verso ou seja comportase como uma fórmula tratase da mesma situação social A mulher é geralmente Penélope e a fórmula participa da construção de uma cena em que se narra o deslocamento da rainha por sua casa No modelo de tradução pelo qual se optou aqui também é importante que a expressão formular e a elevada escadaria de sua morada desceu ocupe um verso inteiro como no original grego porque quando a personagem tem uma fala antes de se locomover a fórmula que antecede não sozinha é outra 18 2067 e 19 6001 Assim falou e desceu dos aposentos lustrosos não sozinha mas com ela seguiam duas criadas Isso disse e subiu aos aposentos lustrosos não sozinha mas com ela iam outras criadas Num primeiro momento a variação nas expressões que denotam o movimento da rainha parece ser de menor importância contingência do estilo oral Todavia no caso da passagem do canto 1 enfatizase por meio da elevada escadaria não só a riqueza da casa de Odisseu mas sobretudo a distância física e moral entre Penélope e os pretendentes Quanto às outras duas passagens com a fórmula para duas criadas é somente aqui no verso anterior à repetição que se utiliza a expressão formular desceu subiu dos aos aposentos lustruosos Tratase da narração de dois eventos que ocorrem no mesmo dia aquele em que Odisseu enfim vê sua mulher e com ela conversa a fórmula delimita no tempo o encontro daqueles que ainda não podem se unir como casal Assim a expressão aposentos lustrosos está ligada à união marital entre os dois e só é empregada mais uma vez 22 428 em referência a esses mesmos aposentos imediatamente antes da noite de núpcias entre os dois Desse modo a tradução foi elaborada para permitir ao leitor a reconstrução desses nexos oriundos da repetição de palavras ou grupos de palavras sobretudo quando na mesma posição do verso já que no poema verificase a reiteração de cenas inteiras por exemplo a recepção de um hóspede de ações específicas a tríplice repetição do engodo de Penélope ou de versos isolados como visto acima Além disso ao não variar a tradução de determinado termo marquei o uso reiterado de palavras que têm um caráter metonímico forte ou seja definem temas ou personagens fama e cognatos por exemplo traduzem kleos um termo que define a própria poesia épica Diversas expressões ou termos isolados são destacados no original por meio da posição início ou fim de versos como o tematicamente muito importante retorno retornar Inteligente é um adjetivo que utilizo apenas para traduzir um particípio grego que na maior parte das vezes qualifica Telêmaco personagem que se não passa por certa iniciação ao longo do poema no mínimo se vê em certas situações nas quais para se sair bem precisa agir de forma homóloga ao heroísmo do pai Ora é para isso que o adjetivo aponta desde o início do poema Sua reiteração contribui para cristalizar a caracterização da personagem tornandoa mais presente para o ouvinte do poema Enfeitiçar é um dos termos que no poema designam o efeito de um canto poético sobre seu público o outro muito mais comum é agradar Ao termo portanto precisa ser conferido o devido destaque e sua particularidade é assinalada já na primeira vez em que aparece no poema 1 33780 Fêmio sabes muito outro feitiço que age sobre os mortais ações de varões e deuses que cantores tornam famosas Seu conteúdo metapoético é essencial para a compreensão do poema e para isso os três sintagmas fundamentais dos dois versos citados cujos núcleos são feitiço ações e tornam famosas devem ser distinguidos na forma como aparecem no original Nem todas as fórmulas homéricas são aqui traduzidas por fórmulas equivalentes em português apenas quando são particularmente significativas e ou não exigem contorcionismo sintático Na tradução de epítetos que em grego são compostos por uma única palavra sempre se buscou em primeiro lugar a clareza de expressão clareza que também é seu atributo na dicção homérica Os epítetos porém são traduzidos de maneiras diversas epítetos especiais por exemplo Atena olhosdecoruja esses epítetos distintivos ou seja que costumam caracterizar apenas uma única realidade são constitutivos da poesia épica grega e portanto receberam uma tradução distintiva por meio de adjetivos compostos por justaposição Espero que tal opção reproduza pelo menos em parte a combinação de estranheza e familiaridade que tais adjetivos causavam à audiência antiga Às vezes um deus é referido no poema apenas por seu epíteto por exemplo tremeterra e jubacobalto para Posêidon Argifonte para Hermes e Citereia para Afrodite esses dois últimos epítetos não traduzidos porque seu sentido se perdeu ou melhor todas as interpretações oferecidas são incertas epítetos genéricos como excelso epítetos ornamentais dessa espécie são com frequência traduzidos por adjetivos simples ou sintagmas cuja estrutura seja comum na sintaxe da língua portuguesa pois tais epítetos junto com o substantivo que qualificam sobretudo quando na mesma posição do verso funcionam metonimicamente como se viu acima no emprego da expressão não sozinha Enumero a seguir algumas fórmulas cujo sentido talvez não seja claro à primeira vista para o leitor da tradução o sacro ímpeto de Alcínoo linguagem arcaica ou arcaizante é uma perífrase do nome do agente no caso Alcínoo sacra força de Héracles Telêmaco é uma fórmula homóloga dirigiuselhes e nomeouos com o tempo nomear nessa e em fórmulas paralelas perdeu o sentido de chamar alguém pelo nome e tornouse virtualmente sinônimo de dirigirse a alguém varões que sobre a terra comem pão a fórmula reitera um traço inalienável da humanidade a de que os homens comem pão e portanto não são deuses animais ou criaturas intermediárias entre essas três categorias principais deusa divina fórmula pleonástica que pode ser aplicada a qualquer deusa matança e perdição esse é um outro caso em que dois elementos virtualmente sinônimos são usados em combinação o termo aqui traduzido por perdição pode ter tido no início o sentido de destino uma fórmula sinônima dessa é negra perdição da morte mar embaçado referese ao horizonte no mar quando o limite entre céu e mar parece se dissolver em uma bruma leitos bem perfurados enfatiza a excelência da carpintaria ou seja uma cama cujas partes estão bem encaixadas medo amarelo aponta para a palidez resultante do medo bem femininas mulheres enfatiza a oposição entre mulheres e homens Assim como uma performance épica na época de composição dos poemas representava um distanciamento significativo do tempo do lugar e em especial da linguagem do públicoalvo a presente tradução não recuou diante da tarefa de recriar mesmo que contra certas estruturas morfossintáticas da língua portuguesa alguns elementos distintivos da linguagem artificial da poesia épica arcaica por exemplo o uso bastante comum de um verbo acompanhado de um sujeito ou objeto com a mesma raiz entre eles cantor cantava 1 325 Isso foi feito levandose em conta que ainda que a tradução num primeiro momento possa soar estranha para um falante do português a leitura contínua possibilitará que o texto se torne cada vez mais familiar e fluente É necessário levar em conta que a comunicação entre o aedo e seu público é oral o que também ajuda a explicar construções sintáticas como a seguinte na qual o falante como que muda de intenção sintática no meio da frase 8 23640 Estranho como não nos desagrada o que falas mas queres revelar a excelência que te segue encolerizado porque a ti esse varão erguido na pista provocou como mortal algum depreciaria tua excelência todo que soubesse em seu juízo falar com acerto As fórmulas que introduzem ou fecham discursos diretos são de propósito mais duras sintaticamente no português pois na performance dos poemas marcam a passagem do discurso de um sujeito de performance para outro quais sejam o aedo Homero narrador e a personagem Bakker 2013 Em geral quando a sintaxe soar arrevesada é porque ela acentua algo significativo Assim quando Penélope conta para o cretense Odisseu que primeiro o deus soprou em meu juízo um manto após grande urdidura armar no palácio tramar fina e bem longa tal sintaxe reproduz uma espécie de contraponto entre a ação de tecer e destecer De qualquer forma oralmente pode soar bem menos barroca No grego homérico é muito comum a estrutura enfática do husteron proteron primeiro o que vem depois Em português sempre que o texto soasse muito estranho não mantive essa forma Assim em vez de cresceram e nasceram optei por nasceram e cresceram Não segui sempre os nomes da mitologia grega consagrados em português Assim adotei Sirenas na Odisseia apenas duas criaturas que vivem numa ilha para quebrar a ideia comum de que as criaturas que Odisseu encontra em sua viagem se assemelham às sereias da mitologia nórdica Diversos idiomas possuem dois termos distintos para essas criaturas bastante diversas em inglês mermaids e sirens Odisseu e não Ulisses foi escolhido sobretudo para facilitar o jogo de linguagem que é feito no poema com palavras da família de odiar Optei por traduzir alguns nomes próprios pois faz parte da dicção épica a exploração poética e temática desses nomes mas não traduzi nenhum nome de personagem central único critério rígido adotado para a decisão acerca de quais nomes verter ou não Escolhi traduzir boa parte dos nomes de três grupos principais certos acidentes geográficos como a pedra Corvo personagens secundárias cujo nome contribui para criar uma espécie de atmosfera épica pensemos nos nomes dos jagunços figurantes em Grande sertão veredas ou apontar determinado tema e a maioria das personagens feácias com exceção das centrais pois elas remetem em sua quase totalidade ao ambiente marítimo e compõem um catálogo a certa altura de nomes falantes noms parlants um típico tour de force do aedo grego comparemos com o catálogo de nereidas na Ilíada e o das filhas de Oceano na Teogonia No final do volume apresentamos um glossário composto por todos os nomes que receberam uma versão traduzida no poema acompanhados do equivalente grego e eventualmente de uma explicação adicional acerca da tradução Também acrescentamos ao glossário a maioria dos nomes não traduzidos cujo sentido parece ser explorado no poema ou em algum momento da evolução da tradição oral épica Para esse segundo grupo o nome vem acompanhado de uma tradução e eventualmente uma sumária explicação de seu sentido Utilizei mui que soa arcano na fórmula mui sacra Pilos O tom do adjetivo contribui para a caracterização da cidade e sua ligação com seu rei o ancião Nestor Ao termo polvo preferi muitospés 5 432 por acreditar que o leitor atento saberá de que animal se trata e porque muitos fortalece a relação com Odisseu caracterizado por uma série de epítetos com muito No imaginário grego o polvo também é uma criatura astuta Vernant Detienne 2008 Uma família de termos importante no poema diz respeito à realidade da pólis Urbe e cidade são usados indistintamente busquei refletir de alguma forma o caráter fluido da nova realidade política e social que adquiria forma clássica durante os séculos de cristalização da linhagem do poema Neste também não há rigor no emprego dos termos que se referem a essa realidade Outro termo de difícil tradução tendo em vista a realidade social grega é xenos que traduzo por estranho seu sinônimo estrangeiro hóspede ou aliado dependendo do contexto Aliado deve ser entendido como uma aliança pacífica entre nobres ou seja não se trata de um contexto de guerra mas de algo próximo daquilo que entendemos por amizade com a componente afetiva menos marcada e a presença de uma característica moral pois o termo e seus cognatos implicam um feixe de deveres e direitos que devem ser respeitados por ambas as partes da relação Não é possível reconstruir com exatidão um modelo de moradia a partir do vocabulário utilizado na Odisseia o que chamamos de casa ou moradia tem como equivalentes diversos termos gregos Por um lado o palácio de Menelau e o de Alcínoo claramente evocam estruturas mais majestosas que o período histórico em que o poema tomou forma por outro não se trata de uma reprodução dos palácios micênicos De qualquer forma o palácio de Odisseu a cabana de Eumeu ou a gruta de Calipso refletem uma mesma estrutura básica cujo centro é uma construção quadrangular megaron que no singular traduziuse por salão e no plural por salões ou palácio pois sua estrutura básica é um salão junto ao qual há um ou mais quartos Nele aconteciam todas as atividades sociais masculinas Esse termo aparece também no plural podendo apenas indicar que se trata de uma casa majestosa ou sugerir que ao contrário do normal uma casa muito rica poderia ter mais de um salão À entrada da casa se chega por meio de um pátio O que se traduziu por pórtico colunata e vestíbulo diz respeito à entrada da casa mas não lhes é dada uma descrição arquitetônica nem mínima nos poemas No salão havia uma espécie de lareira usada para aquecimento e preparo de refeições No caso da morada de Odisseu Penélope passa a maior parte do tempo nas dependências exclusivas das mulheres no segundo andar ou seja ela não é obrigada a frequentar o salão onde se reúnem os pretendentes mas há certo contato pois ela ouve o que lá se passa e vice versa Também há um ou mais depósitos um deles referido como quarto de Odisseu no qual se guardam provisões e riquezas talvez em uma espécie de porão Duas atividades muito apreciadas competições esportivas e dança são realizadas em espaços próprios ao ar livre respectivamente traduzidos por pista e arena O leitor moderno vai estranhar como vários objetos reluzem em Homero desde pés até roupas passando por poltronas em geral isso se dá pelo uso extensivo de azeite de oliva Serviços domésticos e agrícolas ou pecuários são realizados sobretudo por empregados que alguns especialistas definem como escravos outros como trabalhadores livres dependentes Diversos termos são utilizados em referência a eles enfatizando sobretudo a relação entre o empregado e a casa na qual trabalha Por isso o mesmo indivíduo no poema pode ser referido como escravo criado ou servo Thalmann 1998 Os termos arauto e assistente aludem a homens livres que realizam diversos tipos de atividades o arauto é encarregado por exemplo de levar mensagens acompanhar chefes em missões importantes e convocar assembleias os assistentes compõem uma categoria mais geral e podem inclusive abarcar os arautos sendo incumbidos entre outros afazeres de diversas tarefas domésticas como preparar uma refeição Rei é um termo que em Homero não se refere a uma monarquia dinástica de sorte que em uma mesma comunidade como em Ítaca pode haver diversos reis que são os homens mais poderosos política e economicamente Rei portanto não é uma tradução ideal mas é tradicional já que mesmo em Homero toda comunidade tem um governante cuja autoridade predomina sobre os outros homens poderosos e que costuma ser passada de pai para filho Um prática social bastante comum em Homero é a súplica que pode ser realizada por meio de uma cerimônia ritual ou no outro extremo apenas por meio de um discurso mais ou menos formalizado O gesto central é o toque nos joelhos daquele que se encontra em vantagem ou seja que recebe a súplica Quando o próprio toque não for possível ou desejável a menção dele tocar os joelhos pode ser meramente incorporada no discurso As capacidades mentais e emocionais bem como os órgãos que por elas são responsáveis e seu próprio resultado eram compreendidos pelos gregos na época de Homero de um modo totalmente diverso daquele de hoje Toda tradução portanto será meramente aproximativa Assim embora nenhum valor fosse atribuído ao cérebro utilizamos mente para traduzir uma faculdade que se desenvolve no peito ou simplesmente no íntimo a região de todas essas faculdades As duas principais são o juízo uma faculdadeórgão sobretudo intelectivo e ânimo sobretudo emocional Ímpeto é uma emoção ou faculdade central que diz respeito à energia sentida por um humano para realizar uma tarefa com frequência guerreira e que comumente é referida como advinda da atuação direta de um deus sobre o humano Outro campo semântico de difícil tradução diz respeito ao destino sorte quinhão fado A referência principal é o momento da morte como em o quinhão funesto da morte O quinhão de Odisseu cumprelhe porém também é o de um dia retornar a Ítaca A porção de vida que cada um tem pode ser referida como algo tecido pelas Fiandeiras quando do nascimento já que a sina de todos os mortais é por definição morrer após certo lapso de tempo Nem todas as ações dos homens encontramse predeterminadas ou dependem de uma decisão dos deuses para ocorrer mas quando estes decidem algo prender no jugo não há como o mortal escapar Quando alguém morre de forma inesperada ou de forma rápida e indolor falase das flechas de Ártemis ou Apolo dependendo do sexo do morto Por fim algumas notas que esclarecem elementos de ordem diversa no poema os números identificam os versos CANTO 1 110 O grego bebia o vinho diluindoo em água 122 O sentido da fórmula palavras plumadas não é mais inequívoco para nós mas plumadas pode se referir ao voo das aves ou de flechas ou seja ao modo como um discurso se dirige do falante para o ouvinte ou mais precisamente ao discurso que atinge seu alvo 344 Hélade referese a uma região da Grécia continental 349 Comegrão fórmula que reforça através do modo de alimentação a mortalidade dos humanos ou seja a diferença entre eles e os deuses 440 Leito bemperfurado o sentido exato do epíteto se perdeu uma possibilidade é que se referia ao modo como cordas eram presas no leito para sustentar um colchão CANTO 2 80 O cetro é marca de autoridade utilizado em diferentes contextos na assembleia ele fica na mão daquele que tem a palavra 135 Erínias são divindades ctônicas terríveis ligadas sobretudo à vingança 227 Ancião referese a Laerte CANTO 3 2 Páramo muitobronze referese ao céu portanto talvez a sua firmeza e solidez ou ao brilho das moradas dos deuses CANTO 5 33334 Leucoteia é o nome que essa heroína Ino ganhou após morrer e ser divinizada CANTO 6 106 Leto fecundada por Zeus gerou Apolo e Ártemis deuses flecheiros 162 Broto de palmeira no templo de Apolo em Delos aqui utilizado para enfatizar a altura portanto a beleza a juventude e o valor de Nausícaa de Jong 2001 CANTO 10 8182 Comentadores divergem na interpretação de Lamos e Telépilos o primeiro talvez seja outro nome do rei dos lestrigões ou mais provavelmente do fundador da cidade e o segundo o nome da cidade CANTO 11 235 Aqui se inicia o que os eruditos chamam de catálogo de heroínas ou seja uma sucessão de mulheres da idade dos heróis boa parte delas parceira sexual de deuses de quem geraram filhos homens 271 Epicasta é outro nome de Jocasta mãe e esposa de Édipo 291 A história do adivinho que conquistou a filha de Neleu é contada com outras informações no canto 15 versos 225ss 300 O destino postmortem dos gêmeos Castor e Pólux ou Polideuces varia nas fontes aqui às vezes estão no Hades às vezes entre os deuses tal imortais 601 Héracles aqui é tratado como possuidor de dupla natureza pois ao morrer sua alma ou espectro rumou para o Hades mas ao mesmo tempo foi imortalizado e está no Olimpo casado com Juventude 623 Cérbero é o cão que vigia a entrada ou melhor a saída da morada de Hades 634 Gorgô é um monstro que inspira terror em quem para ele olha CANTO 12 172 Branquearam a água com os pinhos polidos referese à espuma produzida na água do mar pelo movimento incessante dos remos CANTO 14 1457 Eumeu por excesso de zelo não nomeia Odisseu porque seu nome remete a ódio CANTO 18 6 O trocadilho é com Íris a mensageira dos deuses na Ilíada na Odisseia é Hermes CANTO 19 179 Minos tem uma relação especial com Zeus mas o que exatamente é dito aqui permance obscuro é provável a relação com algum ritual de renovação da ordem social por meio de leis portanto com o renascimento reinício de uma comunidade Levaniouk 2011 404 O que Euricleia discretamente sugere é que Odisseu receba o nome Muitorogado 518 Difícil reconstituir a história aludida por Penélope pois pode remeter a duas histórias conhecidas distintas ainda que interrelacionadas em uma delas as personagens são as irmãs Procne Filomela o rei Tereu e seu filho Ítis nessa se conta de uma mãe que mata seu filho para vingarse da violência do marido contra sua irmã Todas as personagens envolvidas no final transformamse em pássaros Na outra versão aquela à qual provavelmente Penélope alude Levaniouk 2011 Filomela é casada com Zeto rei que construiu as muralhas de Tebas e por ter somente um filho Ítilo tem inveja de Anfíon irmão gêmeo do rei e de sua esposa Níobe que têm vasta prole Ao tentar matar o primogênito desse casal mata sem querer o próprio filho e se transforma no rouxinol que à noite entoa lamentoso canto 57375 Aqui é mencionado pela primeira vez o procedimento do concurso com o arco cujos detalhes serão informados nos cantos 20 e sobretudo 21 O arco é de um modelo tal que a corda não permanece fixa nas duas extremidades ou seja cada atirador precisa retesála armar o arco antes de vergálo o que é bastante difícil Os machados que deveriam ser atravessados pelo arco são fixados no pátio ou no salão onde na sequência Odisseu matará todos os pretendentes CANTO 20 66 As filhas de Pandareu têm uma vida tão desafortunada que literalmente perdem sua face humana e são transformadas em criaturas terríveis vingativas como as Erínias Levaniouk 2011 p 278 156 Tratase de um festa anual em honra de Apolo que acontece no início da primavera ou seja na segunda metade do poema o frio do final do inverno ainda é constante CANTO 21 295 Referência à luta entre centauros e lapitas comandados por Peirítoo cujo casamento foi perturbado por um centauro que bebeu demais foi punido e depois debalde buscou vingança CANTO 22 444 Afrodite aqui é virtualmente sinônimo de desejo sexual CANTO 23 275 Destróijoio é como o povo que desconhece a navegação e seus instrumentos se referirá ao remo de Odisseu assemelhado a uma ferramenta agrícola CANTO 24 40 O que normalmente se traduz por memória é de fato uma capacidade mais ampla não apenas mental mas também física diz respeito à capacidade de pôr em prática um conhecimento no caso como o guerreiro está morto ele não pode agir como um cavaleiro 413 Rumor é aqui uma divindade 5 As passagens assinaladas entre colchetes são prováveis interpolações tardias ou seja versos adicionados em um momento da transmissão dos textos em que o poema na Antiguidade já recebera uma forma escrita razoavelmente estável Versos seguidos por uma numeração acrescida de um a são encontrados em um número muito pequeno de manuscritos e podem ter sido acrescentados ao poema em uma fase relativamente tardia de sua transmissão na Antiguidade PERSONAGENS PRINCIPAIS AGAMÊMNON comandou os aqueus em Troia quando volta da guerra é morto pela esposa Clitemnestra que vivia em adultério com Egisto ALCÍNOO rei dos feácios povo ligado ao deus Posêidon ANTICLEIA mãe de Odisseu morre antes de o filho voltar para Ítaca ANTÍNOO junto com Eurímaco lidera os pretendentes de Penélope AQUILES jovem herói não muito depois de derrotar o maior guerreiro troiano Heitor é morto pelo irmão deste Páris em conjunto com Apolo ARETE esposa de Alcínoo rei feácio AUTÓLICO avô materno de Odisseu no imaginário grego o espertalhão por excelência cujo equivalente divino é Hermes CALIPSO ninfa que ajuda o náufrago Odisseu e o toma por marido na sua ilha durante sete anos CASSANDRA filha de Príamo e Hécuba no final da guerra tornase concubina de Agamêmnon ao lado de quem morre assassinada CIRCE ninfa que conhece magia num primeiro momento tenta prejudicar Odisseu e seus companheiros mas depois os ajuda CLITEMNESTRA esposa de Agamêmnon e mãe de Orestes vive em adultério com Egisto e participa da morte do marido e sua concubina quando estes chegam a Micenas DEMÓDOCO bardo cego dos feácios EUMEU porqueiro foi escravizado quando criança de origem nobre é um fiel servidor da família de Odisseu EURÍALO jovem nobre feácio desafia Odisseu e uma vez que esse se mostra superior oferece lhe um presente valioso para se desculpar EURICLEIA fiel servidora da família de Odisseu de quem foi ama é de origem nobre EURÍLOCO principal companheiro de Odisseu cujas instruções nem sempre segue EURÍMACO junto com Antínoo um dos líderes dos pretendentes de Penélope FÊMIO bardo que os pretendentes obrigam a cantar na casa de Odisseu FILOCTETES guerreiro aqueu é picado por uma cobra e por conta do fedor da ferida é abandonado em uma ilha no caminho para Troia é resgatado anos depois porque ele eou seu arco são imprescindíveis para a conquista da cidade FILOITIO pastor de bois de Odisseu HEITOR grande herói troiano filho de Príamo e Hécuba esposo de Andrômaca e pai de Astíanax HELENA esposa de Menelau está na origem da guerra de Troia por ter sido raptada ou seduzida no imaginário grego antigo são equivalentes por Páris jovem da família real de Troia só teve uma filha com Menelau HÉRACLES herói da geração que antecede a dos heróis que lutaram em Troia excelente arqueiro também se destaca pela força LAERTE pai de Odisseu quando este partiu para Troia já não era mais o rei de Ítaca vive afastado do ambiente político em situação precária MENELAU esposo de Helena também demorou para chegar a Esparta sua cidade NAUSÍCAA filha adolescente portanto em idade de casar de Alcínoo NEOPTÓLEMO filho de Aquiles com a princesa Deidamia é levado a Troia quase no fim da guerra pois uma profecia dizia que a cidade só seria tomada se ele e Filoctetes lá estivessem na conquista da cidade mata Príamo e o pequeno Astíanax o caçula de Heitor e Andrômaca NESTOR ancião que lutou em Troia sábio conselheiro perdeu seu filho Antíloco na guerra mora com a esposa e outros filhos homens em Pilos ODISSEU rei de Ítaca participou da guerra de Troia para onde foi quando Telêmaco seu único filho com Penélope ainda era bebê ORESTES filho de Agamêmnon vinga a morte do pai matando a mãe e seu marido Egisto PENÉLOPE esposa de Odisseu e parente de Clitemnestra e Helena POLIFEMO ciclope que captura Odisseu e é por ele cegado filho de Posêidon PRÍAMO ancião troiano ainda era rei da cidade embora não lutasse no campo de batalha na conquista da cidade é morto por Neoptólemo TELÊMACO filho único de Odisseu e Penélope tem cerca de vinte anos quando Odisseu chega a Ítaca Do varão me narra Musa do muitasvias que muito vagou após devastar a sacra cidade de Troia De muitos homens viu urbes e a mente conheceu e muitas aflições sofreu ele no mar em seu ânimo 5 tentando garantir sua vida e o retorno dos companheiros Nem assim os companheiros socorreu embora ansiasse por iniquidade própria a deles pereceram tolos que as vacas de Sol Hipérion devoraram Esse porém tiroulhes o dia do retorno 10 De um ponto daí deusa filha de Zeus fala também a nós Os outros todos que escaparam do abrupto fim estavam em casa após escapar da guerra e do mar Somente a ele do retorno privado e da mulher detinha augusta ninfa Calipso deusa divina 15 em cava gruta almejando que fosse seu esposo Mas quando o ano chegou e os ciclos volveramse os deuses destinaramlhe à casa retornar rumo a Ítaca e nem lá escapou de provas e estava entre os seus Os deuses se apiedavam todos 20 salvo Posêidon Incansável manteve a ira contra o excelso Odisseu até esse em sua terra chegar Porém aquele foi ter com etíopes distantes moradores etíopes divididos em dois grupos varões dos extremos uns onde Hipérion mergulha outros onde levanta 25 para aceitar hecatombe de touros e carneiros Nisso deleitavase sentado no banquete e os outros no palácio de Zeus Olímpio estavam reunidos Entre eles tomou a palavra o pai de varões e deuses lembrarase no ânimo do impecável Egisto 30 a quem matou o filho de Agamêmnon o afamado Orestes Dele lembrouse e entre os imortais palavras enunciou Incrível não é que os mortais responsabilizam aos deuses Dizem de nós vir os males mas eles também por si mesmos graças a sua iniquidade além do quinhão têm aflições 35 como agora Egisto além do quinhão do filho de Atreu desposou a lídima esposa e a ele que retornara matou sabendo do abrupto fim pois já lhe disséramos enviando Hermes o Argifonte agudamirada que não o matasse nem cortejasse a consorte 40 Por Orestes se dará a vingança pelo filho de Atreu quando tornarse jovem e desejar sua terra Assim falou Hermes mas não persuadiu ao juízo de Egisto benevolente Agora tudo junto pagou E a ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja 45 Ó nosso pai filho de Crono supremo entre poderosos deveras jaz esse aí em merecido fim assim também pereça todo que fizer tais ações Mas pelo atilado Odisseu dilacerase meu coração pelo desditoso longe dos seus há muito sofre misérias 50 em ilha correntosa onde fica o umbigo do mar ilha arvorejada onde uma deusa habita filha de Atlas juízoruinoso que do mar todo as profundas conhece e o próprio sustém pilares grandes que mantêm a terra e o páramo separados 55 Sua filha segura o desgraçado lamentador e sempre com moles e solertes contos tenta enfeitiçálo para Ítaca olvidar Mas Odisseu ansiando somente mirar fumaça irrompendo de sua terra deseja morrer Para ele nem assim 60 aponta teu coração Olímpio Acaso Odisseu junto a naus argivas não te agradou com caros sacrifícios na larga Troia Por que contra ele esse ódio Zeus Respondendo disselhe Zeus juntanuvens Minha filha que palavra te escapou da cerca de dentes 65 Como eu nesse caso esqueceria o divino Odisseu aos mortais superior na mente e nos sacrifícios dados aos deuses imortais que do largo páramo dispõem Mas Posêidon o terrasustém sem cessar continua colérico pelo ciclope de quem Odisseu o olho cegou 70 o excelso Polifemo cuja robustez supera a de todos os ciclopes Gerouo Toossa a ninfa filha de Fórcis que cuida do mar ruidoso unida a Posêidon em côncava gruta Depois disso a Odisseu Posêidon tremesolo 75 não tenta matar mas faz vagar longe da pátria Mas vamos nós aqui planejemos todos o retorno para que chegue Posêidon porá de lado sua cólera pois por certo não poderá contra todos os deuses imortais em oposição brigar sozinho 80 A ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja Nosso pai filho de Crono supremo entre poderosos se isso agora é caro aos deuses ditosos que retorne Odisseu muitojuízo a sua casa e Hermes então o condutor Argifonte 85 instiguemos à ilha Ogígia para sem demora à ninfa belastranças anunciar o firme desígnio o retorno de Odisseu juízopaciente para que retorne Mas eu partirei para Ítaca a fim de seu filho mais instigar e ímpeto pôr em seu peito 90 que à ágora chame os aqueus cabelocomprido e anuncie a todos os pretendentes que sempre abatem suas copiosas ovelhas e lunadas vacas trôpegas Vou enviálo a Esparta e à arenosa Pilos para do retorno do caro pai se informar caso algo ouvir 95 e que pertençalhe distinta fama entre os homens Após falar assim atou aos pés belas sandálias imortais douradas que a levavam sobre as águas e sobre a terra semfim com lufadas de vento Tomou a brava lança afiada com ponta de bronze 100 pesada grande robusta com que subjuga filas de varões heróis contra quem tem rancor a de pai ponderoso E partiu dos cumes do Olimpo lançouse e parou na cidade de Ítaca no pórtico de Odisseu no umbral do pátio e na palma trazia lança brônzea 105 semelhante ao aliado líder dos táfios Mentes Achou claro os arrogantes pretendentes eles com pedras diante das portas deleitavam o ânimo sentados no couro de bois que eles mesmos abateram Para eles os arautos e ágeis assistentes 110 misturavam uns vinho e água nas ânforas outros com esponjas esburacadas mesas lavavam e dispunham e muita carne partiam Primeiro a vêla foi o deiforme Telêmaco sentado entre pretendentes agastado no coração 115 no íntimo mirava o distinto pai ao voltar um dia fizesse esses pretendentes pela casa se dispersar retomasse ele mesmo sua prerrogativa e regesse sua casa Nisso refletia sentado entre os pretendentes e viu Atena Foi logo ao pórtico indignado no ânimo 120 por um hóspede tardar nos portões Parado perto apertoulhe a mão direita tomou a lança brônzea e falando dirigiulhe palavras plumadas Saudação estranho por nós serás acolhido Depois após tomar parte no jantar enunciarás o que precisas 125 Assim falou tomou a frente e seguiuo Palas Atena Quando eles estavam dentro da alta casa a lança postou levandoa até um grande pilar dentro de um guardalança bempolido onde outras lanças de Odisseu juízopaciente havia muitas 130 a ela guiou à poltrona na qual estendera um tecido bela artificiosa embaixo para os pés banqueta Ao lado para si pôs variegada cadeira longe dos outros pretendentes para o estranho agastado com o alarido não se enfastiar do jantar em meio a soberbos 135 e para que o interrogasse acerca do pai ausente Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente 140 e junto muitos petiscos oferecendo o que havia O trinchador tomou e dispôs gamelas com carnes de todo tipo e junto deles punha taças douradas e para eles o arauto vinha amiúde escançar E entraram os arrogantes pretendentes Então esses 145 em ordem sentaramse em cadeiras e poltronas Para eles os arautos vertiam água nas mãos e pão as escravas à frente amontoavam em cestas e moços preencheram ânforas com bebida 148ª e a todos distribuíam após verter as primícias nos cálices E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos 150 Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida aos pretendentes interessou no peito outra coisa canto e dança esses o suplemento do banquete Lira muito bela um arauto pôs nas mãos de Fêmio que cantava aos pretendentes obrigado 155 E ele dedilhando a lira entoava belo prelúdio mas Telêmaco dirigiuse a Atena olhosdecoruja perto pondo a cabeça para não os ouvirem os outros Caro hóspede te indignarás contra minha fala Bem a eles isto interessa lira e canto 160 é fácil pois comida de outrem devoram de graça do varão cujos ossos brancos já apodrecem na chuva jazendo em terra firme ou ondas no mar os fazem rolar Se vissem que a Ítaca esse homem retornou todos rezariam para ser mais ligeiros nos pés 165 que mais abastados com ouro e vestes Não está morto assim vil quinhão e não temos consolo ainda que algum dos homens terrestres afirme que voltará perdeuse seu dia de retorno Mas vamos dizeme isto e conta com precisão 170 quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais Chegaste em que nau Como os nautas a ti conduziram até Ítaca Quem proclamaram ser De modo algum creio que a pé aqui chegaste A mim diz isto a verdade para eu bem saber 175 se é tua primeira visita ou se já és aliado da família pois muitos varões vinham a nossa casa outros pois ele buscava a companhia de homens A ele então replicou a deusa Atena olhosdecoruja Portanto a ti com muita precisão isso direi 180 Proclamo ser Mentes do atilado Anquíalo o filho e reino sobre o povo táfio Cheguei há pouco com nau e companheiros singrando o vinoso mar rumo a homens outralíngua até Temessa atrás de bronze e levo ardente ferro 185 Minha nau está aqui no campo longe da cidade na baía de Rêitron sob o Néion coberto de mato Aliados proclamamos ser um da família do outro há tempo caso ao ancião perguntares indo até ele ao herói Laerte que dizem não vir mais 190 à cidade mas distante no sítio sofre misérias com velha criada que a ele comida e bebida dispõe quando a fadiga se apossa de seus membros arrastandose pelo seu fértil vinhedo no morro Então vim pois falaram que ele estava na cidade 195 teu pai mas eis que deuses o tiraram do caminho Não está morto sobre a terra o divino Odisseu mas ainda vivo creio é retido no extenso mar em ilha correntosa e homens cruéis o detêm selvagens que algures o seguram contra a vontade 200 Agora para ti eu adivinharei como no ânimo lançam os imortais e como acredito que se dará não sendo adivinho nem conhecendo aves ao claro Não ficará mais muito tempo longe da cara terra pátria nem se grilhões de ferro o detiverem 205 planejará seu retorno já que é o muitotruque Mas vamos dizeme isto e conta com precisão se de fato grande assim és filho dele de Odisseu Incrível na cabeça e nos belos olhos assemelhaste àquele pois bem amiúde nos reunimos um com o outro 210 antes de ele embarcar para Troia aonde também outros argivos os melhores foram em suas cavas naus Desde então Odisseu eu não vi nem ele a mim A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Portanto eu a ti hóspede com muita precisão direi 215 Minha mãe diz que dele sou filho mas eu mesmo não sei ninguém por si só sua origem conhece Tomara tivesse eu sido filho de algum ditoso varão que envelhecesse junto a seus bens Agora de quem se tornou o mais desventurado dos mortais 220 dele afirmam que nasci já que isso tu me indagas A ele então replicou a deusa Atena olhosdecoruja Os deuses por certo não tornaram inglória tua linhagem para o futuro pois a ti desse feitio Penélope gerou Mas vamos dizeme isto e conta com precisão 225 que banquete que multidão é essa Precisas disso Festa ou casamento Pois um almoço isso não é porque a mim desmedidos com soberba parecem banquetearse pela casa Um varão se indignaria vendo tanta vergonha todo sensato que chegasse 230 A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Hóspede já que isso me perguntas e investigas naquela época esta casa rica e impecável devia ser enquanto aquele varão ainda estava na cidade Mas outro desejo foi o dos deuses maquinando males 235 ao tornarem desaparecido aquele mais que a todos os homens pois até com ele morto não me afligiria assim se entre seus companheiros tivesse sido subjugado em Troia ou nos braços dos seus após arrematar a guerra Então todos os aqueus lhe teriam erigido um túmulo 240 e a seu filho teria granjeado grande fama para o futuro A ele porém as Harpias agarraram sem rumor partiu desaparecido despercebido e dores e lamentos deixoume aflito não gemo por aquele somente pois deuses me armaram outras agruras vis 245 Quantos nobres têm poder sobre as ilhas Dulíquion Same e a matosa Zacintos e quantos regem pela rochosa Ítaca tantos cortejam minha mãe e esgotam a casa Ela nem recusar as hediondas bodas nem as completar 250 disso não é capaz eles porém devastam comendo minha casa Logo despedaçarão também a mim E a ele atenazada dirigiuse Palas Atena Incrível por certo do afastado Odisseu muito precisas nos aviltantes pretendentes desceria os braços 255 Ah Se de volta à casa nas portas da frente estivesse com elmo escudo e duas lanças tal como eu pela primeira vez o mirei em nossa casa bebendo e deleitandose voltando de Éfira de junto de Ilo filho de Mermero 260 pois Odisseu foi também até lá sobre nau veloz em busca de poção assassina para com ela untar flechas pontabrônzea Mas aquele não lha deu pois temia indignar os deuses semprevivos mas meu pai lha deu pois o amava por demais 265 Assim Odisseu encontrasse os pretendentes todos seriam destinoveloz e bodasamargas Não isto repousa nos joelhos dos deuses se após retornar ele se vingará ou não em seu palácio já a ti peço que ponderes 270 como expulsarás os pretendentes do salão Vamos agora ouve e atenta a meu discurso amanhã convoca à ágora os heróis aqueus e discurso enuncia a todos os deuses por testemunhas Pretendentes ordena que se dispersem a suas casas 275 e tua mãe se o ânimo impelea a ser desposada que vá logo à morada do pai que muito possui eles irão preparar as bodas e dispor um dote de grande monta o que convém seguir com a filha amada Já a ti darei arguto conselho caso fores persuadido 280 equipa nau excelente com vinte remadores e parte em busca de novas do pai há tempo ausente para o caso de um mortal algo te dizer ou ouvires o rumor de Zeus que mais que tudo traz fama aos homens Primeiro vai a Pilos e interroga o divino Nestor 285 e de lá até Esparta para junto do loiro Menelau ele foi dos aqueus couraçabrônzea o último a chegar Se ouvires da subsistência e do retorno de teu pai sim embora arruinado ainda aguentarias um ano se ouvires que ele está morto e não vive mais 290 após retornares então à cara terra pátria erguelhe cenotáfio e também oferta oferendas à farta quanto convém e dá a mãe a um varão Mas quando tiveres aquilo feito e completado planeja então no juízo e no ânimo 295 como os pretendentes em teu palácio matarás com truque ou às claras tu não precisas continuar com tolices pois não tens mais idade Não escutaste que fama logrou o divino Orestes entre todos os homens após matar o assassino do pai 300 Egisto astúciaardilosa que matara seu pai glorioso Também tu amigo pois te vejo muito belo e alto sê bravo para também gerações futuras te elogiarem Mas eu descerei agora à nau veloz até os companheiros que impacientes me aguardam 305 que a ti isso ocupe e atenta a meu discurso A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Hóspede por certo com benevolência dizes isso como pai para filho e disso nunca me esquecerei Mas vamos fica embora sôfrego pela rota 310 para que banho tomado após deleitar teu coração com um dom rumes ao navio de ânimo alegre algo valioso e muito belo que te será preciosidade minha algo com que caros aliados a aliados presenteiam A ele então respondeu a deusa Atena olhosdecoruja 315 Não me segures mais pois almejo partir o dom que teu coração pede que me dês no retorno seja dado para eu o levar para casa após muito belo pegares para ti haverá retribuição Ela após falar assim partiu Atena olhosdecoruja 320 e como ave pela chaminé voou e no ânimo dele pôs ímpeto e audácia e fêlo lembrarse do pai ainda mais que no passado Ele em seu juízo refletiu e pasmouse no ânimo pensou tratarse de um deus Presto foi aos pretendentes herói igual ao deus 325 Entre eles cantor cantava bem famoso e quietos sentados ouviam Dos aqueus cantava o retorno funesto que desde Troia impôslhes Palas Atena Em cima compreendeu no juízo seu inspirado canto a filha de Icário Penélope bemajuizada 330 e a elevada escadaria de sua morada desceu não sozinha mas com ela seguiam duas criadas Quando alcançou os pretendentes divina mulher parou ao lado do pilar do teto sólida construção após puxar para diante da face o véu reluzente 335 e criadas devotadas uma de cada lado se postaram Aos prantos então dirigiuse ao divino cantor Fêmio sabes muito outro feitiço que age sobre os mortais ações de varões e deuses que cantores tornam famosas desses canta um sentado junto deles e quietos 340 bebam vinho Mas interrompe esse canto funesto que sempre no peito meu coração tortura depois que assaltoume aflição inesquecível De notável pessoa tenho saudade lembrandome sempre do varão cuja fama é ampla na Hélade até o meio de Argos 345 A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Ora minha mãe por que te desagrada que o leal cantor deleite como a mente o instiga Não são os cantores os responsáveis mas de algum modo Zeus ele que dá ao homem comegrão como quiser a cada um 350 Não cabe indignação contra ele ao cantar a má sorte dos dânaos os homens com efeito tornam mais famoso o canto que for o mais recente a circundar os ouvintes Que teu coração e ânimo suportem ouvir pois não só Odisseu perdeu o dia do retorno 355 em Troia muitos outros heróis também pereceram Mas entra na casa e cuida de teus próprios afazeres do tear e da roca e ordena às criadas que executem o trabalho o discurso ocupará os varões todos mormente a mim de quem é o poder na casa 360 Ela ficou pasma e foi de volta à casa pois o inteligente discurso do filho pôs no ânimo Subiu aos aposentos com as criadas mulheres e chorou por Odisseu caro esposo até sono doce lançarlhe sobre as pálpebras Atena olhosdecoruja 365 E os pretendentes iniciaram arruaça no umbroso palácio todos rezaram para a seu lado no leito deitarse Entre eles o inteligente Telêmaco tomou a palavra Pretendentes de minha mãe de brutal desmedida agora deleitemonos com o banquete e que barulheira 370 não haja pois isto é belo ouvir um aedo deste feitio semelhante a deuses na voz humana Pela manhã indo até a ágora sentemonos todos e eu vos enunciarei um discurso resoluto abandonai o palácio cuidai de outros banquetes 375 comendo vossos bens indo de uma casa a outra Se isto vos parece mais lucrativo e melhor o sustento de um só homem ser destruído de graça devastaio mas eu clamarei aos deuses semprevivos que Zeus um dia conceda que a retribuição ocorra 380 então seríeis destruídos de graça dentro de casa Assim falou e todos com dentes mordendo os lábios admiraramse de Telêmaco pois falou com audácia A ele então dirigiuse Antínoo filho de Persuasivo Telêmaco deveras te ensinam os próprios deuses 385 a seres falaaltiva e falares com audácia Que não a ti de Ítaca cercadademar o filho de Crono torne rei o que te cabe por linhagem pelo legado paterno A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Antínoo te irritarás contra minha fala 390 Até isso caso Zeus o desse eu gostaria de conquistar Dizes que é o que há de pior entre os homens De modo algum é ruim ser rei Rápido sua casa tornase rica e ele mesmo é mais honrado Mas na verdade reis aqueus também há outros 395 muitos em Ítaca cercadademar jovens e anciãos que um deles isso tudo possua pois morreu o divino Odisseu Eu todavia serei senhor de nossa casa e de escravos que para mim apresou o divino Odisseu A ele então Eurímaco filho de Polibo retrucou 400 Telêmaco repousa nos joelhos dos deuses quem em Ítaca cercadademar será rei dos aqueus e que tu mantenhas teus bens e reine sobre tua casa Que não venha varão que contra ti com violência arranque teus bens enquanto Ítaca for habitada 405 Mas querote nobre indagar acerca do hóspede de onde vem aquele varão De que terra proclama ser Qual é sua linhagem e o solo pátrio Traz notícia de que teu pai está voltando ou atrás de necessidade própria vem aqui 410 Quão súbita foi a partida veloz e não ficou para travar contato vil não aparentava ser A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Eurímaco por certo perdeuse o retorno de meu pai não mais confio em notícias se vêm de alhures 415 nem atento à profecia que minha mãe para a casa chamando um profeta dele indague Aquele é meu aliado paterno de Tafos e proclama ser Mentes do atilado Anquíalo o filho e reina sobre o navegador povo táfio 420 Isso falou Telêmaco e no juízo reconheceu a deusa imortal E aqueles para a dança e o desejável canto volveramse e deleitaramse e ficaram até a noite Enquanto se deleitavam veiolhes a negra noite Então para se deitar voltaram a suas casas 425 Telêmaco onde no pátio muito belo seu quarto de alto pédireito fora feito em local todo protegido lá rumou ao leito cogitando muita coisa no juízo A seu lado trazia tochas ardentes a sempre devotada Euricleia filha de Voz filho de Persuadidor 430 a qual um dia Laerte comprou usando seus bens ela ainda na puberdade e deu vinte bois como à devotada esposa honravaa no palácio e no leito nunca a tomou evitando a raiva da mulher a seu lado trazia tochas ardentes das escravas era 435 a que dele mais gostava e o criou quando pequeno Ele abriu as portas do quarto sólido sentouse na cama e tirou a túnica macia e essa lançou nas mãos da anciã de espírito agudo Ela após dobrar a túnica dela cuidar 440 e pendurála num gancho junto ao leito bemperfurado saiu do quarto fechou a porta com maçaneta prateada e puxou o ferrolho por meio da correia Lá ele por toda a noite coberto por velo ponderava em seu juízo o trajeto que planejara Atena Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos pôsse para fora do leito o caro filho de Odisseu vestiu suas vestes pendurou a espada afiada no ombro atou aos pés reluzentes belas sandálias 5 e saiu do quarto de frente semelhante a um deus De imediato aos arautos claravoz ordenou convocar à ágora os aqueus cabelocomprido Aqueles os convocaram e estes se reuniram bem rápido Então após estarem reunidos todos juntos 10 foi à ágora e na palma trazia lança brônzea não sozinho mas dois lépidos cães seguiam com ele Prodigiosa graça vertia Atena sobre ele e todo o povo contemplouo em sua chegada Sentouse no assento do pai anciãos deramlhe lugar 15 Dentre eles o herói Egípcio começou a falar já encurvado pela idade e com muita experiência Também seu filho o lanceiro Antifo para Ílion belospotros rumara em cavas naus com o excelso Odisseu mas matouo o selvagem ciclope 20 na cava gruta e por último aprontouo para o jantar Tinha três outros filhos um juntavase aos pretendentes Eurínomo e dois cuidavam dos campos paternos Nem assim daquele olvidou lamentandose atormentado Por ele vertendo lágrimas tomou a palavra e disse 25 Ouvi agora de mim itacenses o que vou falar nossa assembleia não se reuniu nem houve sessão desde que o divino Odisseu partiu em cavas naus E agora quem a reuniu Quem tanto necessita algum dos jovens varões ou dos mais velhos 30 Ouviu notícia de um exército a caminho do que nos deveria falar ao claro por antes saber ou anuncia e revela outro tema público Nobre pareceme abençoado Que para ele Zeus complete o que deseja de bom em seu juízo 35 Isso disse e o prenúncio alegrou o caro filho de Odisseu não ficou tempo sentado e desejou falar Postouse no meio da ágora o cetro pôs em sua mão o arauto Persuadidor versado no inteligente Então primeiro ao ancião abordando disse 40 Ancião esse varão não está longe logo saberás quem eu reuni o povo enorme aflição me atinge Não ouvi notícia de um exército a caminho do que vos deveria falar ao claro por antes saber nem anuncio ou revelo outro tema público 45 mas minha própria necessidade um mal tombou em casa dois até primeiro perdi o nobre pai que um dia entre vós aqui reinava e era como um pai amigável agora porém um muito maior que logo a casa toda de todo irá despedaçar e todo o sustento perder 50 Pretendentes atacam minha mãe contra sua vontade caros filhos de varões que justo aqui são os melhores eles que à casa do pai dela têm pavor de partir Icário que deveria ele fazer o noivado da filha e entregála a quem quisesse a quem o agradasse 55 E eles frequentando nossa casa todos os dias abatendo bois ovelhas e gordas cabras festejam e bebem fulgente vinho levianos Isso se desperdiça à larga Não há varão tal como era Odisseu para afastar o dano da casa 60 Nós não temos como afastálos sim também depois mostraremos ser débeis e pouco versados em bravura Por certo me defenderia se capacidade eu tivesse Houve ações não mais toleráveis e não é decoroso como minha casa está em ruínas indignaivos também 65 envergonhaivos diante de outros homens vizinhos os que moram nos arredores E temei a ira dos deuses para que não se realinhem irritados com vis ações Suplico por Zeus Olímpio e por Têmis que dissolve e instaura assembleias de homens 70 recuai amigos deixaime sozinho ser torturado por funesta dor a não ser que meu pai o distinto Odisseu inimigo tenha infligido males a aqueus belasgrevas pelos quais vingandovos males infligis inimigos esses aí instigando A mim seria mais vantajoso 75 que comêsseis meus bens imóveis e o gado se vós os tivésseis comido logo haveria compensação sim pela cidade rogaríamos com discursos pedindo bens até que tudo fosse recuperado Mas agora dores ineludíveis lançais em meu ânimo 80 Após falar assim irado lançou o cetro ao chão e lágrimas jorraram e piedade tomou todo o povo Então todos os outros atentaram e ninguém ousou responder a Telêmaco com duros discursos Só Antínoo respondendo lhe disse 85 Telêmaco falaaltiva de ímpeto incontido que falaste aviltandonos Gostarias de nos pregar a mácula Contra ti nada fizeram os pretendentes aqueus e sim tua cara mãe destacada conhecedora de estratagemas Já é o terceiro ano e rápido será o quarto 90 desde que frustra o ânimo no peito dos aqueus A todos dá esperança e faz promessas a cada varão enviando recados e sua mente concebe outra coisa Pois cogitou este outro ardil no juízo após grande urdidura armar no palácio tramava 95 fina e bem longa De imediato nos disse Moços meus pretendentes morto o divino Odisseu esperai mesmo ávidos por desposarme até o manto eu completar que meus fios em vão não se percam mortalha para o herói Laerte para quando a ele 100 o quinhão funesto agarrar o da morte dolorosa que contra mim no povo aqueia alguma se indigne se ele sem pano jazer depois que muito granjeou Assim falou e foi persuadido nosso ânimo orgulhoso E então de dia tramava a enorme urdidura 105 e à noite desenredavaa com tochas postadas ao lado Três anos o truque não se notou e persuadiu os aqueus mas ao chegar o quarto ano e a primavera se achegar 107ª as luas finando e muitos dias passarem uma das mulheres falou a que sabia ao claro e a apanhamos desenredando a trama radiante 110 E assim ela a completou a contragosto obrigada A ti os pretendentes isto responderão para que saibas tu mesmo em teu ânimo e saibam todos os aqueus envia de volta tua mãe e ordenalhe que aceite casar com quem o pai mandar e a ela agradar 115 Se ainda retardar muito tempo os filhos de aqueus refletindo no ânimo no que sobremodo lhe deu Atena a técnica de trabalhos bem belos um juízo distinto e truques que nunca ouvimos de alguém nem das antigas as que no passado viveram aqueias belastranças 120 Tiro Alcmena e Micena belastranças nenhuma delas ideias semelhantes às de Penélope conheceu porém a que pensou não é moderada Bom teus recursos e teus bens eles comerão enquanto ela mantiver esta ideia essa que agora 125 os deuses põem em seu peito grande fama para si adquire mas para ti a saudade de muitos recursos Nós não iremos antes aos campos nem a outro lugar até que seja desposada pelo aqueu que ela quiser A ele então o inteligente Telêmaco retrucou 130 Antínoo é impossível afastar de casa contra sua vontade quem me gerou quem me criou e meu pai está alhures vivo ou morto É injusto eu pagar elevada compensação a Icário se de bom grado eu fizer minha mãe retornar Sofrerei males da parte de meu pai e outros o deus 135 me dará pois minha mãe invocará as hediondas Erínias ao deixar sua casa Indignação contra mim os homens mostrarão assim eu nunca direi esse discurso Abandonai o palácio cuidai de outros banquetes 140 comendo vossos bens indo de uma casa a outra Se isto vos parece melhor e mais lucrativo o sustento de um só homem ser destruído de graça devastaio mas clamarei aos deuses semprevivos que Zeus um dia conceda que a retribuição ocorra 145 então seríeis destruídos de graça dentro de casa Assim falou Telêmaco e duas águias Zeus amplavisão envioulhe do alto do pico do monte em voo As duas por um tempo voaram com lufada de vento próximas uma da outra esticando as asas 150 mas quando alcançaram o meio da ágora muitafala lá após voltear bateram suas asas rápido miraram as cabeças de todos e tinham a ruína nos olhos com as garras arranharam faces e pescoços e à direita lançaramse através das casas da cidade deles 155 Eles pasmaramse com as aves ao vêlas e revolveram no ânimo o que iria de fato se completar Entre eles também falou o velho herói Haliterses filho de Buscador o único a superar os de sua idade no conhecimento das aves e nos enunciados proféticos 160 Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Ouvi agora de mim itacenses o que vou falar falo sobretudo aos pretendentes quando isto revelo Contra eles rola grande desgraça pois Odisseu não muito tempo longe dos seus ficará mas talvez já 165 esteja perto e para esses aí engendra matança e perdição para todos também será um mal para muitos outros de nós moradores de Ítaca bemavistada Não bem antes planejemos como os faremos parar que eles por si parem pois isso lhes é de pronto muito melhor 170 Não adivinho sem experiência mas sei fazêlo bem Afirmo que também para ele tudo se completou como lhe discursei quando para Ílion embarcavam os argivos e com eles partiu Odisseu muitaastúcia após muitos males sofrer e perder todos os companheiros 175 irreconhecível para todos no vigésimo ano em casa chegaria Tudo isso agora se completa A ele então Eurímaco filho de Polibo retrucou Ancião vamos agora adivinha para teus filhos em casa para que um mal não sofram no futuro 180 nisso sou muito melhor adivinho que tu São muitas as aves que sob os raios do sol zanzam nem todas proféticas Odisseu porém longe pereceu e assim também tu com ele devias ter morrido não enunciarias tantas profecias 185 e o já encolerizado Telêmaco não atiçarias assim para tua casa aguardando um dom caso ele o levar Eu porém te falarei e isto se completará se com muito saber antigo ao varão mais jovem induzindo com palavras incitas a endurecer 190 a ele mesmo primeiro ocorrerão mais problemas e nada poderá realizar por causa deles e para ti ancião imporemos pena que no ânimo doerá pagar duro te será o sofrimento A Telêmaco diante de todos eu mesmo aconselharei 195 que a sua mãe ele ordene voltar à casa do pai e eles as bodas irão preparar e dispor um dote de grande monta o que convém seguir com filha amada Não creio que antes cessarão os filhos de aqueus a difícil corte pois seja como for a ninguém tememos 200 por certo não a Telêmaco embora sendo muitodiscurso nem atentamos para profecia que tu ancião anuncias irrealizável e és mais odiado ainda Já os bens serão vilmente consumidos e jamais iguais haverá enquanto ela atrasar os aqueus 205 nessas bodas mas nós aguardando todos os dias por sua excelência disputamos e atrás de outras não vamos das adequadas ao casamento conosco A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Eurímaco e todos os outros ilustres pretendentes 210 isso de vós não mais suplico nem disso falo Já o conhecem os deuses e todos os aqueus Mas vamos daime nau veloz e vinte companheiros que para mim ida e volta efetuarão o percurso Sim irei a Esparta e à arenosa Pilos 215 buscar notícia do retorno do pai há tempo ausente caso um mortal algo me disser ou ouvir o rumor de Zeus que mais que tudo traz fama aos homens Se da subsistência e do retorno de meu pai ouvir sim embora arruinado ainda aguentaria um ano 220 se ouvir que ele está morto e não vive mais após retornar então à cara terra pátria irei lhe erguer cenotáfio e também ofertarei oferendas à farta quanto convém e a um varão darei a mãe Após falar assim sentouse e entre eles ergueuse 225 Mentor que do impecável Odisseu era companheiro e este ao embarcar confioulhe toda a propriedade que obedecesse ao ancião e com firmeza tudo guardasse Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Ouvi agora de mim itacenses o que vou falar 230 que nunca mais um rei portacetro seja solícito suave e amigável nem no juízo saiba o medido mas sempre seja duro e cometa iniquidades pois ninguém se lembra do divino Odisseu dentre aqueles que regeu e era como um pai amigável 235 Mas não me oponho aos arrogantes pretendentes quando agem violentos com tramoias da mente arriscando suas cabeças devoram com violência a casa e de Odisseu afirmam nunca irá retornar Não me indigno com o resto do povo como todos 240 estão quietos sentados ao invés de abordandoos segurardes sendo muitos os poucos pretendentes E a ele Leócrito filho de Fortificante retrucou Insultante Mentor doido no juízo que coisa falaste instigandoos a nos fazer parar É difícil por um banquete 245 brigar contra varões que estão em maior número Ainda que o itacense Odisseu ao voltar em pessoa concebesse no ânimo expulsar do salão os ilustres pretendentes que se banqueteiam na casa a esposa mesmo dele muito carente não se alegraria 250 com sua volta lá mesmo alcançaria ultrajante fado se combatesse o grupo tu não falaste com adequação Vamos dispersaivos cada um rumo a sua lida e para este aí apressarão a rota Mentor e Haliterses os quais desde o início são companheiros do pai 255 Mas creio por muito tempo sentado notícias ouvirá em Ítaca e nunca completará essa rota Assim ele falou e rápido dissolveu a assembleia Eis que se dispersaram cada um rumo a sua casa e os pretendentes foram à casa do divino Odisseu 260 Telêmaco afastandose até a orla do oceano lavou as mãos no mar cinzento e orou a Atena Ouveme deus que ontem vieste até nossa casa e me ordenaste em nau sobre o mar embaçado buscar notícia do retorno do pai há tempo ausente 265 e partir Tudo isso atrasam os aqueus e sobretudo os pretendentes com sua vil arrogância Assim falou orando e das cercanias veiolhe Atena semelhante a Mentor no corpo e na voz humana e falando dirigiulhe palavras plumadas 270 Telêmaco doravante não serás vil nem imponderado se de fato em ti foi instilado o bom ímpeto do pai distinto como ele era para completar palavra e ação então vã não será a rota nem incompleta Mas se não és rebento dele e de Penélope 275 então não espero que completes o que concebes Sim poucos filhos com o pai se parecem a maioria é pior e poucos melhores que o pai Mas como doravante não serás vil nem imponderado e a astúcia de Odisseu de modo algum te falta 280 há a expectativa então de que completes esses feitos Por ora ignora plano e mente dos pretendentes irresponsáveis pois nem são ponderados nem civilizados Não conhecem a negra perdição da morte que deles está perto todos em um só dia perecerão 285 Não mais será postergada a rota que concebes para ti eu sou um tal companheiro de teu pai que irei preparar nau veloz e contigo seguirei Já tu indo para casa juntate aos pretendentes apronta provisões e em vasilhas tudo acomoda 290 vinho em ânforas duplaalça e cevada tutano de varões em peles compactas eu entre o povo companheiros voluntários rápido selecionarei Há naus muitas em Ítaca cercadademar novas e antigas dessas escolherei para ti uma excelente 295 e iremos ligeiro aprontála e lançar ao amplo mar Assim falou Atena filha de Zeus e não muito tempo Telêmaco demorouse após ouvir a voz humana do deus E foi a sua casa agastado em seu coração Achou os arrogantes pretendentes em seu palácio 300 pelando cabras e queimando cerdas de cevados no pátio Eis que Antínoo riu e foi direto a Telêmaco deulhe forte aperto de mão dirigiuselhe e nomeouo Telêmaco falaaltiva de ímpeto incontido que outra vileza no peito não te ocupe palavra ou ação 305 mas por mim come e bebe igual no passado Por certo tudo isto os aqueus realizarão para ti nau e seletos remadores para bem rápido chegares à mui sacra Pilos atrás de notícia do ilustre pai A ele então o inteligente Telêmaco retrucou 310 Antínoo não é possível entre vós soberbos banquetear atento e se gaudiar tranquilo Não basta já terdes devastado muitos e distintos bens meus como pretendentes Eu ainda era tolo Agora sou grande e ao ouvir um discurso dos outros 315 entendo além disso cresce meu ânimo tentarei lançar perniciosa perdição contra vós ou já em Pilos ou aqui mesmo nessa terra Eu irei e não será vã a rota que menciono passageiro pois dono nem de navio nem de remadores 320 sou assim creio pareceuvos mais vantajoso Falou e puxou sua mão da mão de Antínoo fácil E os pretendentes preparavam o banquete na casa Debochavam dele e o ridicularizavam com palavras e desse modo falavam os jovens arrogantes 325 Por certo Telêmaco cogita nossa matança Ou trará alguns protetores da arenosa Pilos ou até de Esparta pois agora seu anseio é terrível ou pretende também ir a Éfira de fértil solo para de lá trazer droga tiravida 330 lançála numa ânfora e perdernos a todos Por sua vez retrucava outro dos jovens arrogantes Quem sabe também ele próprio sobre cava nau longe dos seus pereça vagando como Odisseu Assim ele avolumaria ainda mais nosso trabalho 335 todos os bens dividiríamos e a propriedade daríamos a sua mãe e a quem a desposasse Assim falavam e ele ao quarto altoteto do pai desceu amplo onde havia ouro e bronze amontoados roupas em baús e perfumado óleo em profusão 340 Dentro cântaros com vinho antigo doce de beber estavam de pé contendo divina bebida pura ajustados em fila junto à parede caso um dia Odisseu a casa retornasse após padecer muita agonia Na frente com tranca portas sólidas bem justas 345 duplas por lá a governanta de noite e de dia passava tudo guardando com mente multiperspicaz Euricleia filha de Voz filho de Persuadidor A ela dirigiuse Telêmaco após chamála ao quarto Mãezinha vamos derrama vinho em ânforas duplaalça 350 doce o mais saboroso depois do que tu guardas pensando neste desditoso caso vier de alhures o divinal Odisseu após fugir da perdição da morte Enche doze e cerra todas com tampos Despejame cevada em alforjes bemcosturados 355 que haja vinte medidas de cereal cevada moída na mó Tu mesma sê a única a saber tudo esteja posto junto pois à noite eu o recolherei quando já tiver a mãe subido aos aposentos e pensado no repouso irei com efeito a Esparta e à arenosa Pilos 360 buscar notícia do retorno do caro pai caso algo ouvir Assim falou e pôsse a ulular a cara nutriz Euricleia e lamentandose dirigiulhes palavras plumadas Por quê filho querido veio a teu juízo essa ideia Como queres percorrer a extensa terra 365 sendo o amado único Ele pereceu apartado da pátria o divinal Odisseu em terra estrangeira Eles logo que fores contra ti planejarão males por trás para morreres por um ardil e tudo isso dividirão Não permanece aqui junto ao que é teu não careces 370 pelo mar ruidoso sofrer males nem ficar à deriva A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Coragem mãezinha o plano não existe sem um deus Não jura que a minha mãe isso não relatarás antes do décimo primeiro décimo segundo dia 375 ou até que ela tenha saudade e ouça que parti para com seu choro a catita cútis não machucar Isso disse e a velha jurou a grande jura dos deuses E depois que jurou por completo essa jura logo derramoulhe vinho em ânforas duplaalça 380 e despejoulhe cevada em alforjes bemcosidos Telêmaco indo para casa juntouse aos pretendentes Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja assemelhada a Telêmaco toda a cidade percorreu e de pé ao lado de cada herói enunciava o discurso 385 pedindo que se reunissem à noite junto à nau veloz Ela então a Ponderado o ilustre filho de Prudente pediu nau veloz ele benevolente prometeulha E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam nisso empurrou a nau veloz ao mar e nela colocou 390 todo cordame que levam as naus bomconvés Postoua na ponta do porto ao redor nobres companheiros em grupo reuniramse a deusa instigava cada um Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja partiu rumo à casa do divino Odisseu 395 lá sobre os pretendentes verteu doce sono fêlosos vagar bêbados e derrubou as taças das mãos Apressavamse pela urbe em ir dormir e pouco tempo ficavam sentados pois sono caía sobre suas pálpebras Já Telêmaco a ele dirigiuse Atena olhosdecoruja 400 após chamálo para fora do palácio bom para morar semelhante a Mentor no corpo e na voz humana Telêmaco já teus companheiros belasgrevas estão sentados junto aos remos e aguardam tua partida sim vamos não atrasemos mais tempo a jornada 405 Falou assim e foi na frente Palas Atena célere ele depois atrás das pegadas da deusa E quando tinham descido até a nau e o mar toparam na praia os companheiros cabelocomprido E entre eles falou a força sacra de Telêmaco 410 Para cá amigos busquemos as provisões já tudo foi reunido na casa Minha mãe de nada sabe nem as escravas e uma só ouviu meu discurso Após falar assim foi na frente e eles o seguiam Tendo tudo trazido sobre a nau bomconvés 415 depositaram como pedira o caro filho de Odisseu Telêmaco embarcou na nau e Atena comandava sentouse na popa da nau e próximo dela sentouse Telêmaco E os outros soltaram os cabos e após embarcar sentaram junto aos calços dos remos 420 A eles brisa bemvinda enviou Atena olhosdecoruja Zéfiro sopradoalto zunindo sobre o mar vinoso Telêmaco instigando os companheiros ordenoulhes pegar no cordame e eles ouviram quem os instigou O mastro de abeto dentro da côncava enora 425 ergueram fixaram e prenderam com estais e içaram a branca vela com tiras de couro bemtrançadas Vento inflou o meio da vela e nos dois lados onda agitada púrpura rugia na proa e a nau se movia e ela corria onda abaixo cumprindo o percurso 430 E prenderam o cordame ao longo da negra nau veloz e puseram de pé as ânforas cheias de vinho libavam aos imortais deuses sempiternos e entre todos mais à filha de Zeus a olhosdecoruja Toda a noite e pela aurora ela a rota percorria E sol levantouse e deixou o oceano bem belo até o páramo muitobronze para brilhar a imortais e a humanos mortais sobre o solo fértil E eles a Pilos a cidade bemconstruída de Neleu 5 chegaram Os habitantes na orla do mar sacrificavam touros negros a Posêidon o tremesolo jubacobalto Eram nove grupos de assentos e quinhentos estavam sentados em cada e cada um ofertava nove touros Enquanto comeram vísceras ao deus queimavam coxas 10 e aqueles aportaram direto a vela da nau simétrica após baixar recolheram atracaramna e desceram Telêmaco desembarcou da nau e Atena comandava A ele primeiro dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Telêmaco não precisas mais ter vergonha nem um pouco 15 Vê por isso navegaste pelo oceano para teres notícia do pai onde a terra o oculta e qual destino alcançou Vai agora direto a Nestor domacavalos que saibamos o plano que ele guarda no peito Suplicalhe tu mesmo que fale sem subterfúgios 20 Algo falso não dirá pois é muito inteligente A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Mentor como então devo chegar como saudálo Ainda não sou versado em discursos argutos Varão jovem tem vergonha de inquirir um mais velho 25 A ele então dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Telêmaco uma ideia tu mesmo terás em teu juízo e outra a divindade vai sugerir pois não acredito que em oposição aos deuses foste gerado e nutrido Falou assim e foi na frente Palas Atena 30 célere ele depois atrás das pegadas da deusa Chegaram à reunião e aos assentos dos varões de Pilos e lá sentado Nestor com os filhos companheiros ao redor preparando o banquete assavam e espetavam a carne Então viram os estranhos e todos foram juntos 35 com as mãos os saudaram e pediram que sentassem Primeiro Pisístrato filho de Nestor achegouse tomou a mão de ambos e acomodouos junto ao banquete em velos macios sobre a areia do mar ao lado do irmão Trasímedes e de seu pai 40 Deulhes porções de vísceras e vinho vertia em cálice dourado com uma saudação dirigiuse a Palas Atena filha de Zeus portaégide Agora estranho faze oração ao senhor Posêidon topastes com seu banquete ao virdes para cá 45 Mas quando tiveres libado e orado como é a norma dê também para esse aí o cálice de vinho doce como mel para libar pois creio que ele também aos imortais faça preces todos os homens precisam dos deuses Mas é mais jovem tem a mesma idade que eu 50 por isso a ti por primeiro darei a taça dourada Assim falou e entregoulhe o cálice com doce vinho e alegrouse Atena com o inteligente varão civilizado pois a ela por primeiro deu a taça dourada De imediato orou com fervor ao senhor Posêidon 55 Ouve Posêidon sustématerra e não relutes para nós que oramos em completar estes feitos A Nestor primeiro e aos filhos concede majestade e depois aos outros confere agradável retribuição a todos os pílios pela esplêndida hecatombe 60 Dê ainda que Telêmaco e eu retornemos após fazer aquilo pelo qual para cá viemos com negra nau veloz Assim fez a prece e ela mesma tudo completou E deu a Telêmaco o belo cálice duplaalça do mesmo modo fez a prece o caro filho de Odisseu 65 Aqueles após assar a carne de fora e a tirar de espetos repartiramna e partilharam majestoso banquete Mas apaziguado o desejo por bebida e comida entre eles começou a falar o gerênio o cavaleiro Nestor Vê agora é mais adequado investigar e questionar 70 quem são os estranhos pois se deleitaram com a comida Estranhos quem sois Donde navegastes por fluentes vias Acaso devido a um assunto ou levianos vagais tal como piratas ao mar Esses vagam arriscando suas vidas levando dano a gentes alheias 75 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou corajosamente coragem no peito a própria Atena pôs para que acerca do pai ausente o interrogasse e para que lhe pertencesse distinta fama entre os homens Nestor filho de Neleu grande majestade dos aqueus 80 perguntas de onde somos eu te contarei Nós de Ítaca sob o Néion chegamos o assunto de que falo é privado não da cidade A vasta fama de meu pai persigo esperando algo ouvir do divino Odisseu juízopaciente que um dia dizem 85 contigo combatendo aniquilou a cidade dos troianos Vê de todos os outros que guerrearam contra troianos sabemos onde cada um finouse em funesto fim a ele até fim ignoto impôs o filho de Crono Ninguém pode dizer ao claro quando finouse 90 se em terra firme subjugado por varões inimigos se também no oceano entre as ondas de Anfitrite Por isso cheguei agora a teus joelhos esperando quereres narrar sua funesta ruína se acaso viste com teus olhos ou ouviste de outro o discurso 95 de que vaga infeliz ao extremo assim a mãe o gerou Nada edulcores com respeito ou piedade por mim mas contame bem com que visão te deparaste Suplicote se um dia para ti meu pai o nobre Odisseu cumpriu palavra ou ação sob promessa 100 na terra troiana onde sofrestes desgraças aqueus Disso agora para mim te lembra e narrame sem evasivas A ele então respondeu o gerênio o cavaleiro Nestor Amigo já que me lembraste da agonia que naquela terra suportamos filhos de aqueus de ímpeto incontido 105 de quanto com as naus sobre o mar embaçado vagando atrás de butim aonde Aquiles comandasse de quanto em torno da grande urbe do senhor Príamo lutamos lá então quantos morreram os melhores lá repousa o guerreiro Ájax lá Aquiles 110 lá Pátroclo conselheiro de mesmo peso que deuses lá meu caro filho não só forte como destemido Antíloco notável como lesto corredor e guerreiro muitos outros males além desses sofremos que homem mortal poderia enunciálos todos 115 Nem se ficasses cinco mesmo seis anos a meu lado e inquirisses quantos males lá sofreram os divinos aqueus antes irritado para tua terra pátria voltarias Nove anos contra eles costuramos males com cuidado com todo truque e quase não os completou o filho de Crono 120 Lá ninguém queria rivalizar em astúcia diante dele pois o divino Odisseu por demais sobressaía com todo truque o teu pai caso de fato fores dele o rebento Reverência me toma ao mirarte quanto aos discursos são adequados e não seria de crer 125 um varão mais jovem discursar com tal adequação Lá durante essa época eu e o divino Odisseu nunca divergimos nem na assembleia nem no conselho mas em um só ânimo com ideia e refletida decisão pensávamos como se daria o melhor para os aqueus 130 Porém após saquear a escarpada urbe de Príamo partimos nas naus e um deus dispersou os aqueus e Zeus então no juízo armou funesto retorno para os argivos pois nem ponderados nem civilizados eram todos assim muitos deles toparam sorte ruim 135 graças à ira ruinosa da olhosdecoruja a de pai ponderoso que instituiu disputa entre ambos os filhos de Atreu Os dois chamaram à assembleia todos os aqueus à toa sem adequação quando o sol se punha e eles foram nocauteados por vinho os filhos de aqueus 140 e discursaram discursos o porquê de a tropa reunir Lá Menelau ordenou a todos os aqueus que se lembrassem do retorno sobre o amplo dorso do mar e a Agamêmnon de todo não agradou pois queria a tropa refrear e fazer sacras hecatombes 145 a fim de apaziguar a terrível raiva de Atena Tolo não sabia que não seria convencida a mente dos deuses semprevivos não dá volta logo Assim os dois retrucando com duras palavras firmes ficaram e ergueramse os aqueus belasgrevas 150 com ruído prodigioso e a decisão dupla agradoulhes À noite descansamos revolvendo no juízo duras ações uns contra os outros então Zeus forjou nefasta desgraça pela manhã puxamos naus alguns até o divino mar e nelas pusemos bens e mulheres cinturamarcada 155 Mas metade da tropa persistiu em ficar para trás lá mesmo com o filho de Atreu Agamêmnon pastor de tropa metade embarcamos e dirigimos as naus que rápido navegavam e um deus alisou o mar muitomonstro Chegando a Tenedos fizemos sacrifícios aos deuses 160 ansiando ir para casa e Zeus não projetava o retorno implacável ele que uma segunda vez instigou disputa vil Uns partiram após voltar às naus ambicurvas em torno do senhor Odisseu o atilado variegadaastúcia de novo levando apoio ao filho de Atreu Agamêmnon 165 mas eu com o conjunto das naus que me seguiam parti pois sabia que a divindade armava males E partiu o filho viril de Tideu e instigou companheiros Bem depois atrás de nós partiu o loiro Menelau em Lesbos alcançounos ao revolvermos o longo trajeto 170 ou prosseguiríamos ao norte da escarpada Quios junto à ilha de Psira tendo ela à esquerda ou ao sul de Quios ao longo da ventosa Mimas Pedimos ao deus que exibisse um prodígio e ele a nós mostrou e ordenou que rumo a Euboia o meio do mar 175 cortássemos para bem rápido escapar do nefasto E pôsse a soprar sibilante vento as naus mui ligeiro atravessaram o piscoso percurso e em Gueraistos à noite aportaram A Posêidon muitas coxas de touros depusemos após medir a grande superfície das águas 180 Era o quarto dia quando em Argos às naus simétricas os companheiros do filho de Tideu Diomedes domacavalos atracaram mas eu até Pilos segui e nunca cessou a brisa depois que o deus começou a fazêla soprar Assim cheguei filho querido na ignorância nada sabia 185 daqueles aqueus quem se salvou quem foi destruído Uma vez sentado em meu palácio as informações que tive como é norma aprenderás e não te esconderei Falouse que chegaram bem os mirmidões famosos na lança que o ilustre filho do animoso Aquiles conduziu 190 e a salvo a Filoctetes o radiante filho de Poias Idomeneu conduziu até Creta todos os companheiros que escaparam da guerra e o mar de nenhum o privou Do filho de Atreu até vós já ouvistes mesmo longe vivendo como voltou e como Egisto armou seu funesto fim 195 Todavia esse aí pagou de volta de forma lastimável Como é bom que o varão morto ainda deixe um filho pois também Orestes se vingou do assassino do pai Egisto astúciaardilosa que matara seu pai glorioso Também tu amigo pois te vejo muito belo e alto 200 sê bravo para também gerações futuras te elogiarem A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Nestor filho de Neleu grande majestade dos aqueus deveras ele se vingou e os aqueus levarão sua extensa fama um canto aos vindouros 205 Ah Se deuses me revestissem com tão grande força para vingarme dos pretendentes pela acre transgressão desmedidos que contra mim engenham ações iníquas Mas os deuses não me destinaram tal fortuna a meu pai e a mim Agora todavia cumpre aguentar 210 A ele então respondeu o gerênio o cavaleiro Nestor Amigo já que disso me lembraste em tua fala dizem que por causa de tua mãe muitos pretendentes em teu palácio em oposição a ti engenham males Dizeme se és oprimido de bom grado ou se o povo 215 te odeia na cidade seguindo sugestão do deus Quem sabe um dia se vingue de sua violência ao chegar ou sozinho ou todos os aqueus presentes também Que a ti deseje ser cara Atena olhosdecoruja assim como um dia se ocupou do majestoso Odisseu 220 na terra troiana onde nós aqueus sofremos agonias pois nunca vi deuses assim às claras sendo caros como ao lado daquele às claras esteve Palas Atena se a ti assim desejar ser cara e cuidar com o ânimo com isso alguns deles se esqueceriam das bodas 225 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Ancião creio que nunca essa palavra se completará falaste grande demais espantome Não tenho esperança de que isso ocorreria nem se deuses o quisessem A ele então dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja 230 Telêmaco que palavra te escapou da cerca de dentes Fácil o deus querendo e de longe salva um varão Eu mesmo preferiria após padecer muita agonia voltar para casa e ver o dia do retorno a voltar e ser morto no lar como a Agamêmnon 235 Egisto e sua esposa mataram com um truque Todavia a morte imparcial nem mesmo os deuses até a varão amado são capazes de afastar sempre que o quinhão funesto agarra o da morte dolorosa Então a ela o inteligente Telêmaco retrucou 240 Mentor não falemos mais disso mesmo aflitos aquele nunca mais terá retorno de verdade mas já planejaramlhe os imortais a negra perdição da morte Agora acerca de outra história quero inquirir e questionar Nestor pois é mais civilizado e prudente que outros 245 três são as gerações de varões dizem que já regeu e para mim parece um deus quando o miro Nestor filho de Neleu narra tu a verdade como morreu o filho de Atreu Agamêmnon amplopoder Onde estava Menelau Que fim lhe armou 250 Egisto astúciaardilosa Pois alguém bem melhor matou Ocorreu não estar na Argos aqueia mas alhures vagava entre os homens e teve coragem de matálo A ele então respondeu o gerênio o cavaleiro Nestor Portanto eu a ti filho falarei toda a verdade 255 Isso tu mesmo podes adivinhar como teria ocorrido se tivesse se deparado com Egisto vivo no palácio o filho de Atreu ao voltar de Troia o loiro Menelau então sobre ele morto não teriam terra amontoado mas a ele cães e aves teriam devorado 260 jazendo no solo longe da urbe e a ele nenhuma aqueia teria pranteado pois feito bem inaudito armou Enquanto lá completávamos muitas provações ele plácido no interior de Argos nutrepotro buscava enfeitiçar a esposa de Agamêmnon com palavras 265 Ela no início rejeitava a ação ultrajante divina Clitemnestra pois tinha um juízo valoroso Ao lado havia um varão cantor a quem muito pediu o filho de Atreu indo a Troia que guardasse a consorte Mas quando o quinhão dos deuses a prendeu no jugo 270 então aquele conduziu esse cantor a uma ilha deserta deixouo como presa e butim às aves de rapina e ambos querendo conduziua até sua casa Muitas coxas queimou sobre sacros altares de deuses e muitas oferendas pendurou tecidos e ouro 275 completou feito inaudito que nunca no ânimo esperara Quanto a nós navegávamos juntos vindos de Troia o filho de Atreu e eu sabendo ser caros um ao outro Mas ao chegarmos à sacra Súnion ponta de Atenas lá Febo Apolo ao timoneiro de Menelau 280 com suas flechas suaves matou após chegar enquanto tinha nas mãos o leme da célere nau matou a Frôntis filho de Onetor superior aos outros no pilotar um navio quando sopram rajadas Assim ele lá foi retido embora sôfrego pela rota 285 até enterrar o companheiro e oferecer oferendas Mas quando também ele célere indo sobre o mar vinoso em côncavas naus o escarpado monte Maleia alcançou então rota hedionda Zeus amplavisão planejou e verteu sopro de ventos sibilantes 290 e ondas inchadas portentosas feito morros Lá após as naus separar umas achegou de Creta onde cidônios moravam junto às correntes do Iardano Há uma pedra lisa e escarpada que cai no oceano no extremo de Gortina no mar embaçado 295 lá Noto empurrou grande onda rumo à ponta oeste até Faisto e pequena pedra a grande onda quebrou As naus vê foram lá e com esforço da morte escaparam os varões mas às naus contra os recifes destroçaram as ondas todavia cinco outras naus proacobalto 300 achegaramse do Egito vento e água levandoas Assim ele lá juntando muitos recursos e ouro vagou com as naus em meio a homens outralíngua nisso armava Egisto em casa estas funestas ações matou o filho de Atreu e o povo esteve sob seu jugo 305 Por sete anos reinou sobre Micenas muitoouro então no oitavo veiolhe um mal o divino Orestes voltou de Atenas e matou o assassino de seu pai Egisto astúciaardilosa que a seu pai glorioso matara Após matálo aos argivos deu banquete fúnebre 310 pela mãe hedionda e pelo covarde Egisto no mesmo dia veiolhe Menelau bomnogrito trazendo bens tantos quanto as naus puderam levar Também tu amigo não vagues tempo longe de casa deixando teus bens para trás e em tua casa varões 315 tão soberbos que não te devorem tudo dividindo teus bens e tu o trajeto faças em vão Mas eu insisto e reclamo que até Menelau vás é ele que voltou há pouco do estrangeiro destes homens de onde nunca no ânimo esperariam 320 voltar todos que primeiro tempestades desviaram no mar tão grande de onde nem mesmo aves no mesmo ano voltam pois é grande e fero Mas agora vai com tua nau e teus companheiros se queres ir por terra para ti há carro e cavalos 325 e há meus filhos que teus condutores serão até a divina Lacedemônia onde vive o loiro Menelau Suplicalhe tu mesmo que fale sem subterfúgios Algo falso não dirá pois é muito inteligente Assim falou o sol desceu e vieram as trevas 330 E entre eles falou a deusa Atena olhosdecoruja Ancião isso contaste ponto por ponto mas agora cortai as línguas e misturai o vinho para que a Posêidon e a outros imortais libemos e nos ocupemos do descanso pois é hora 335 A luz já desceu rumo às trevas e não convém tardarse no banquete dos deuses mas retornar Falou a filha de Zeus e eles ouviram sua voz humana para eles os arautos vertiam água nas mãos e moços preencheram ânforas com bebida 340 e a todos distribuíam após verter as primícias nos cálices As línguas lançavam ao fogo e de pé sobre elas libavam Mas depois de libar e beber quanto quis o ânimo então Atena e o deiforme Telêmaco ambos prepararamse para voltar à cava nau 345 Mas Nestor os conteve e abordouos com palavras Que Zeus e outros deuses imortais impeçam isso que vós para longe de mim rumo à nau veloz partis como de alguém sem vestimenta desvalido que não tem lençóis e muitas capas em casa 350 nem para si nem para hóspedes terem sono suave Mas possuo sim capas e belas mantas Por certo o caro filho desse varão Odisseu não repousará na plataforma da nau enquanto eu viver e depois ficarem meus filhos no palácio 355 para hóspedes hospedar todo que vier a minha casa A ele então dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Isso falaste bem caro ancião convém que a ti Telêmaco obedeça já que é muito mais decoroso assim Mas ao passo que ele agora te seguirá para dormir 360 em teu palácio eu por outro lado à negra nau irei para encorajar os companheiros e dizerlhes tudo Proclamo ser entre eles o único de mais idade o restante varões mais jovens seguem por amizade todos com idade igual à do animoso Telêmaco 365 Lá eu descansaria junto à negra nau côncava agora mas de manhã até os animosos caucônios irei onde obrigação me é devida nem recente nem pequena Já tu a ele pois alcançou tua casa envia com o carro e um filho dêlhe os cavalos 370 que correm mais ligeiro os melhores em força Assim falou e partiu Atena olhosdecoruja feito britaossos e pasmaramse todos os aqueus O ancião admirouse quando viu com seus olhos tomou a mão de Telêmaco dirigiuselhe e nomeouo 375 Amigo não espero que fraco e covarde serás se a ti tão jovem deuses acompanham condutores Esse não era outro dos que habitam as moradas olímpias mas a filha de Zeus Tritoguêneia trazbutim que também honrava a teu nobre pai entre os argivos 380 Mas senhora sê propícia dáme distinta fama a mim meus filhos e minha respeitável consorte para ti sacrificarei novilha largafronte indomada que nunca um varão sob o jugo guiou essa te sacrificarei após envolver com ouro os chifres 385 Assim falou rezando e o ouviu Palas Atena A estes conduziu o gerênio o cavaleiro Nestor a seus filhos e genros até sua bela morada Quando alcançaram a esplêndida casa desse senhor em ordem sentaramse nas cadeiras e poltronas 390 Aos que chegavam o ancião misturou na ânfora vinho suave que no décimo primeiro ano a governanta abriu após afrouxar a cobertura esse na ânfora o ancião misturou e libando rezou à Atena a filha de Zeus portaégide 395 Mas depois de libar e beber quanto quis o ânimo os outros para se deitar voltaram a suas casas mas a ele fez lá deitar o gerênio o cavaleiro Nestor a Telêmaco o caro filho do divino Odisseu num leito perfurado sob a colunata ressoante 400 junto a Pisístrato boalança líder de varões que de seus filhos ainda solteiro vivia no palácio Ele mesmo se deitou no interior da alta casa e a senhora esposa preparoulhe cama e lençóis Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos 405 pôsse para fora do leito o gerênio o cavaleiro Nestor Após sair sentouse nas pedras polidas que estavam diante de suas altas portas brancas lustradas com óleo sobre elas antes Neleu sentava conselheiro de mesmo peso que deuses 410 mas ele já subjugado pela morte partira ao Hades e agora Nestor o gerênio sentava guardião dos aqueus com o cetro Em torno os filhos em grupo reuniramse após virem dos quartos Siso Troposo Perseu Areto e o notável Trasímedes 415 A eles então juntouse o sexto o herói Pisístrato e ao lado puseram o deiforme Telêmaco Entre eles começou a falar o gerênio o cavaleiro Nestor Céleres caros filhos cumprime um desejo para por primeiro entre os deuses eu propiciar Atena 420 que visível a mim veio ao rico banquete do deus Vamos que vá um à planície atrás de vaca para logo chegar e a conduza um varão vaqueiro de bois outro indo à negra nau do animoso Telêmaco guie todos os seus companheiros e deixe só dois 425 outro a Laerque verteouro para cá ordene vir a fim de envolver com ouro os chifres da vaca Os restantes ficai aqui reunidos e instruí lá dentro as escravas na casa que preparem esplêndido banquete e tragam assentos madeira para o entorno e água clara 430 Assim falou e todos eles agiram a vaca veio da planície e vieram da simétrica nau veloz os companheiros do enérgico Telêmaco e veio o ferreiro com as ferramentas na mão meios para efetuar sua arte a bigorna o martelo e a bemfeita pinça 435 com os quais trabalhava o ouro e veio Atena para os sacrifícios receber O ancião cavaleiro Nestor deu o ouro aquele então com perícia os chifres da vaca envolveu para a deusa ao ver a oferenda se alegrar A vaca conduziam pelos chifres Troposo e Siso 440 Numa bacia florida Areto trouxe do quarto água para eles e na outra mão numa cesta trazia grãos de cevada Trasímedes firme guerreiro machado afiado na mão estava ao lado para a vaca golpear Perseu tinha a gamela O ancião cavaleiro Nestor 445 com água e cevada iniciou o rito efusivo a Atena rezou ao dar primícias lançando pelos da cabeça no fogo Mas após rezar e lançar grãos de cevada para frente logo o filho de Nestor o magnânimo Trasímedes golpeoua parado perto o machado decepou os tendões 450 do pescoço e soltou o ímpeto da vaca e elas ulularam as filhas as noras e a respeitável esposa de Nestor Eurídice a mais velha das filhas de Glorioso Os outros depois erguendoa do chão largasrotas seguraramna e degoloua Pisístrato líder de tropa 455 Ao jorrar negro sangue a vida deixou os ossos e logo a desmembraram rápido deceparam as coxas tudo pela ordem com gordura encobriramnas camada dupla e sobre elas puseram peças cruas Queimavaas sobre toras o ancião e nelas fulgente vinho 460 aspergia perto jovens com garfos cincopontas nas mãos Mas após queimar coxas e comer vísceras cortaram o restante transpassaram em espetos e assaram tendo nas mãos os espetos pontiagudos Nisso banhara a Telêmaco a bela Policasta 465 a mais jovem filha de Nestor filho de Neleu Depois de o banhar e ungir à larga com óleo lançou belo manto e uma túnica em torno dele e ele saiu da banheira no porte semelhante a imortais indo para junto de Nestor pastor de tropa sentouse 470 Tendo assado a carne de fora e a tirado dos espetos banquetearamse sentados nobres varões se ergueram e vinho escançavam em cálices dourados Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida entre eles começou a falar o gerênio o cavaleiro Nestor 475 Filhos vamos para Telêmaco cavalos belapelagem trazei e jungi ao carro para que percorram a rota Assim falou e eles o ouviram direito e obedeceram e céleres jungiram cavalos velozes ao carro Nele a governanta colocou pão e vinho 480 e alimentos que comem reis criados por Zeus Então Telêmaco subiu no carro muito belo ao lado o filho de Nestor Pisístrato líder de tropa no carro subiu e as rédeas segurou com as mãos Chicoteou para puxarem e eles de bom grado voaram 485 pela planície e deixaram a escarpada cidade de Pilos Agitaram o dia todo o jugo que levavam nos dois lados E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam e chegaram a Feras rumo à casa de Diocles o filho de Tocaioso que Alfeio gerou como filho 490 Lá descansaram à noite e ele lhes regalou Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos jungiram os cavalos e subiram no variegado carro e partiram do pórtico da colunata ressoante Chicoteou para puxarem e eles de bom grado voaram 495 Atingiram a planície fértil onde então tentaram findar o trajeto e os rápidos cavalos alongaram o passo E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam E eles chegaram à cava Lacedemônia cavernosa e dirigiramse à casa do majestoso Menelau Acharamno em sua propriedade dando festa a camaradas pelas bodas do filho e da filha impecável 5 Essa ao filho de Aquiles rompebatalhão enviava em Troia primeiro prometeu e indicou que a daria e os deuses lhes completavam as bodas A ela pois com cavalos e carro enviava em viagem à urbe bem famosa dos mirmidões a quem aquele regia 10 Para o filho de Esparta fez conduzir a filha de Defensor para o muito amado que lhe nascera o forte Grandaflição de escrava deuses não deram mais rebento a Helena desde que primeiro gerou a filha encantadora Hermíone que tinha a formosura da dourada Afrodite 15 Assim banqueteavam na enorme casa de alto pédireito os vizinhos e camaradas do majestoso Menelau com deleite E entre eles cantava divino cantor com a lira dois acrobatas entre eles liderando canto e dança volteavam no meio 20 Pois aqueles dois no pórtico da casa eles e os cavalos o herói Telêmaco e o radiante filho de Nestor esperavam achegandose viuos o senhor Verídico ágil assistente do majestoso Menelau e foi levar a notícia na casa ao pastor de tropa 25 parado perto dirigiulhe palavras plumadas Há dois estranhos aqui Menelau criadoporZeus dois varões assemelhados à linhagem do grande Zeus Pois dize devemos soltar seus velozes cavalos ou enviálos de partida a outro para que os acolha 30 Muito perturbado a ele dirigiuse o loiro Menelau Nunca foste tolo Verídico filho de Auxiliador no passado agora como criança falas tolices Vê nós dois após amiúde comer regalos de outros homens aqui chegamos esperando que Zeus 35 no futuro nos poupe de agonia Pois solta os cavalos dos estranhos e façaos adentrar para festejar Assim falou e ele correu pelo salão e chamou outros ágeis assistentes que seguiram junto a ele Soltaram do jugo os cavalos suados 40 e prenderamnos nos estábulos equestres a eles jogaram espelta e com ela branca cevada os carros apoiaram nas paredes resplandecentes e os hóspedes introduziram na casa divina Mirandoa admiravamse com a casa do rei criadoporZeus 45 assim como o do sol ou da lua clarão havia pela casa de alto pédireito do majestoso Menelau Tendose deleitado em mirar com os olhos entraram na bempolida banheira e banharamse Após as escravas banhálos untálos com óleo 50 e em torno lançar espessas capas e túnicas em poltronas sentaramse junto a Menelau filho de Atreu Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa 55 Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente e junto muitos petiscos oferecendo o que havia O trinchador tomou e dispôs gamelas com carnes de todo o tipo e junto deles punha taças douradas Saudandoos dirigiuselhes o loiro Menelau 60 De pão servivos e alegraivos e após partilhar do jantar perguntaremos quem sois que varões Em vós não pereceu a linhagem dos pais mas sois de linhagem dos que são reis criadosporZeus os portacetro pois vis não gerariam gente de tal índole 65 Falou e passoulhes com a mão nacos de gordo lombo de boi assado pois com eles fora homenageado E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida então Telêmaco falava ao filho de Nestor 70 perto pondo a cabeça para não os ouvirem os outros Observa filho de Nestor tu que agradas meu ânimo o relampejo do bronze pela casa ruidosa e o do ouro do âmbar da prata e do marfim Morada assim por dentro creio ser a de Zeus Olímpio 75 com tanta coisa sem conta reverência me toma ao mirar No que disse prestou atenção o loiro Menelau que falando dirigiulhes palavras plumadas Caros filhos nenhum mortal deveria disputar com Zeus imortais são suas posses e morada 80 dos varões algum talvez disputará comigo em posses Sim após muito padecer e muito vagar conduzias nas naus e no oitavo ano cheguei depois de vagar por Chipre Fenícia e entre egípcios os etíopes alcancei os sidônios os erembos 85 e a Líbia onde cordeiros de súbito têm chifres completos Três vezes ovelhas procriam no ciclo de um ano lá nem senhor nem pastor têm carência de queijo e de carne e nem de leite doce mas sempre têm leite abundante para a ordenha 90 Enquanto eu por aí recolhendo muitos recursos vagava outro assassinou meu irmão às ocultas de surpresa com truque da nefasta esposa assim reino não me agradando dessas posses Dos pais deveis ter ouvido isso sejam eles quem 95 forem pois muito padeci e perdi a propriedade bem boa para morar com muita coisa preciosa Eu deveria até com a terça parte em casa ter vivido e os varões a salvo os que morreram na ampla Troia longe de Argos nutrepotro 100 Mas ainda que chorando a todos angustiado muitas vezes sentado em nosso palácio primeiro com lamento deleitome no peito depois paro rápido alguém se sacia do lamento gelado a eles todos não choro tanto embora atormentado 105 quanto a um único que me faz odiar sono e alimento ao lembrar pois nenhum aqueu tanto aguentou quanto Odisseu aguentou e assumiu Assim foi preciso ele sofrer agruras e eu dor sempre inesquecível por ele pois há muito está ausente e nada sabemos 110 se está vivo ou morto Talvez chorem por ele agora Laerte o ancião a prudente Penélope e Telêmaco que deixou recémnascido em casa Assim falou e naquele instigou desejo de chorar o pai após do pai ouvir lágrimas das pálpebras ao chão lançou 115 a capa púrpura tendo puxado para diante dos olhos com ambas as mãos Mirouo Menelau e então cogitou no juízo e no ânimo se deixaria que ele mesmo se lembrasse do pai ou primeiro o interrogaria e com minúcias iria testálo 120 Enquanto revolvia isso no juízo e no ânimo Helena para fora do perfumado quarto altoteto veio semelhante a Ártemis rocadourada Para ela Adreste postou cadeira bemfeita e Alcipe trazia uma manta de lã suave 125 Filó trazia prateada cesta que lhe oferecera Alcandra esposa de Polibo que morava na Tebas egípcia onde a maior parte da riqueza está nas casas ele deu a Menelau duas banheiras prateadas uma dupla de trípodes e dez medidas de ouro 130 À parte a esposa regalou Helena com belas graças deulhe roca dourada e uma cesta prateada com rodas com acabamento em ouro na borda Essa trouxe a criada Filó e a pôs junto de Helena repleta de fio preparado e sobre ela 135 a roca estava estendida carregada de roxa lã Sentouse na cadeira e embaixo para os pés banqueta De pronto questionou o marido acerca de tudo E sabemos Menelau criadoporZeus quem esses varões proclamam ser para vir a nossa casa 140 Enganome ou digo a verdade Pedeme o ânimo Pois afirmo que nunca vi alguém tão parecido homem ou mulher e reverência me toma ao mirar como esse aí se parece com o filho do enérgico Odisseu Telêmaco que deixou recémnascido em casa 145 aquele varão quando por mim caradecadela aqueus foram até Troia incitando guerra tenaz Respondendo disselhe o loiro Menelau Agora eu também percebo mulher como comparas daquele sim são tais pés e tais mãos 150 o brilho dos olhos a cabeça e os cabelos acima Há pouco eu lembrandome sobre Odisseu discursei o quanto aquele agoniado aguentou por mim e ele verteu choro agudo sob as celhas a capa púrpura tendo puxado para diante dos olhos 155 A ele então Pisístrato filho de Nestor retrucou Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa deveras esse aí é o filho daquele como dizes mas ele é judicioso e considera indigno no ânimo chegar pela primeira vez e falar impertinências 160 diante de ti cuja voz nos deleita como a do deus A mim enviou o gerênio o cavaleiro Nestor para seguilo como condutor ele desejava te ver para que lhe sugiras alguma palavra ou ação Muitas aflições tem o filho de pai que se foi 165 no palácio onde não há outros que o ajudem assim agora para Telêmaco ele se foi e outros não há esses que na cidade afastariam o mal Respondendo disselhe o loiro Menelau Incrível deveras o filho de caro varão a minha casa 170 veio ele que por mim aguentou muitas provas pensei que dele ao voltar seria mais amigo que de outros argivos se pelo mar tivesse aos dois permitido o retorno com naus velozes ocorrer o Olímpio Zeus amplavisão Em Argos tornaria uma urbe seu lar e casa lhe faria 175 de Ítaca conduzindoo com suas posses seu filho e todo o povo após uma única cidade ter evacuado entre as que há na região e por mim são regidas Estando aqui amiúde nos reuniríamos a nós nada mais separaria em nossa amizade e deleite recíprocos 180 antes que a negra nuvem da morte nos encobrisse Mas isso deve ter invejado o próprio deus o que deixou sem retorno apenas aquele infeliz Assim falou e neles todos instigou desejo por choro Chorava a argiva Helena nascida de Zeus 185 choravam Telêmaco e Menelau filho de Atreu e nem o filho de Nestor manteve os olhos sem lágrimas lembrarase no ânimo do impecável Antíloco morto pelo filho radiante da resplandecente Aurora Após dele lembrarse falou palavras plumadas 190 Filho de Atreu Nestor o ancião dizia que superas os mortais em inteligência quando de ti lembrávamonos em nosso palácio e nos questionávamos um ao outro Agora se acaso for possível ouveme eu não me deleito com lamentos no jantar e também Aurora 195 nascecedo haverá Não me indigna em absoluto que se chore o homem que morre e o fado alcança É só esta a honraria aos lamentáveis mortais tosarse a cabeleira e lágrimas lançar face abaixo Também meu irmão está morto e não foi o pior 200 dos argivos Tu deves sabêlo já eu nunca o encontrei nem vi e superior a outros dizem que foi Antíloco superior como lesto corredor e guerreiro Respondendo disselhe o loiro Menelau Meu caro já que disseste tudo que inteligente varão 205 diria e faria e mesmo um que fosse mais velho sim és de tal pai pois falas o que é inteligente Fácil se reconhece rebento de varão a quem o filho de Crono destina fortuna quando ele casa e nasce e assim concedeu a Nestor para sempre todo dia 210 que ele envelheça agradavelmente em seu palácio e os filhos sejam sensatos e os melhores na lança Deixemos de lado o choro que antes ocorreu lembremonos de novo do jantar e que vertam água nas mãos Discursos também haverá na aurora 215 para que Telêmaco e eu conversemos entre nós Assim falou e Seguro verteu água nas mãos o ágil assistente do majestoso Menelau E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas então teve outra ideia Helena nascida de Zeus 220 de pronto lançou droga no vinho do qual bebiam contra aflição e raiva para o oblívio de todos os males Quem a tomasse após ser misturada na ânfora nesse dia não lançaria lágrimas face abaixo nem se a mãe e o pai tivessem morrido 225 nem se na sua frente irmão ou filho querido com bronze tivessem matado e a ele visto com os olhos A filha de Zeus possuía tais drogas astuciosas benignas que lhe deu Polidamna esposa de Tôn no Egito onde o solo fértil produz inúmeras 230 drogas muitas benignas misturadas muitas funestas e cada um é médico habilidoso superior a todos os homens sim são da estirpe de Peã Após lançála e ordenar que o vinho se escançasse de novo respondendo com um discurso falou 235 Filho de Atreu Menelau criadoporZeus e também vós filhos de nobres varões o deus a um logo a outro Zeus confere um bem ou um mal pois pode tudo Agora continuai o banquete sentados no palácio e deleitaivos com discursos pois contarei o que convém 240 Tudo eu não vou enunciar nem especificar quantas provas enfrentou o perseverante Odisseu mas só esta que executou e ousou o vigoroso varão na terra troiana onde sofrestes desgraças aqueus A si mesmo com golpes ultrajantes desfigurou 245 jogou trapos vis nos ombros e semelhante a um servo imergiu na urbe amplasruas dos varões inimigos Ocultando a si mesmo assemelhouse a outro herói Pedinte ele que um tal não era entre as naus aqueias A ele semelhante imergiu na urbe troiana e calaramse 250 todos eu fui a única a reconhecêlo naquele estado e o interroguei Ele com argúcia esquivavase Mas quando o banhei e ungi com óleo vestio com vestes e jurei poderosa jura que antes não revelaria Odisseu entre os troianos 255 antes que ele chegasse às rápidas naus e às cabanas e então contoume toda a ideia dos aqueus Muitos troianos tendo matado com bronze pontiagudo dirigiuse aos argivos e levou muita informação Nisso outras troianas ulularam alto e meu peito 260 alegrouse pois meu coração já se inclinara a retornar para casa logo e lastimava a loucura que Afrodite dera ao me levar para lá longe da cara terra pátria eu deixando para trás a filha o tálamo e o esposo que de nada carece no juízo e na aparência 265 Respondendo disselhe o loiro Menelau Por certo isso tudo mulher falaste com adequação De muitos já apreendi o plano e a mente de varões heróis e percorri a extensa terra mas nunca alguém assim eu vi com os olhos 270 tal era o caro coração de Odisseu juízopaciente Que foi isto que executou e ousou o vigoroso varão no cavalo falquejado onde assentados todos os melhores argivos trazíamos matança e perdição aos troianos Foste depois tu até lá deve ter te ordenado 275 a divindade que quis dar glória aos troianos a ti enquanto vinhas seguia o teomórfico Deífobo Três vezes circundaste a cava tocaia tocandoa e chamavas pelo nome os melhores dânaos copiando a voz das mulheres de todos os argivos 280 E eu o filho de Tideu e o divino Odisseu sentados no meio escutamos quando gritaste Nós os outros dois pusemonos de pé com vontade ou de ir para fora ou de dentro logo responder mas Odisseu segurounos e conteve nossa ânsia 285 Todos os outros ficaram atentos filhos de aqueus e só Anticlo quis responderte com palavras Mas Odisseu apertoulhe a boca com as mãos fortes sem cessar e salvou todos os aqueus enquanto o retinha para longe levoute Palas Atena 290 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa assim é pior isso não o afastou do funesto fim nem se de ferro fosse no íntimo seu coração Vamos dirijamonos à cama para também agora 295 adormecidos sob o doce sono nos deleitarmos Assim falou e a argiva Helena ordenou às escravas que postassem camas sob a colunata belas mantas púrpura lançassem em cima estendessem lençóis e por último pusessem capas de lã para que se cobrissem 300 Elas saíram do salão levando a tocha nas mãos e estenderam a cama aos hóspedes conduzia o arauto Esses no vestíbulo da casa lá mesmo dormiram o herói Telêmaco e o radiante filho de Nestor O filho de Atreu dormiu no interior da alta casa 305 ao lado Helena peplobomtalhe deitouse divina mulher Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos pôsse para fora do leito Menelau bomnogrito vestiu as vestes pendurou a espada afiada no ombro e atou aos pés reluzentes belas sandálias 310 saiu do quarto de frente semelhante a um deus Junto a Telêmaco sentouse dirigiuselhe e nomeouo Que necessidade te trouxe aqui herói Telêmaco à divina Lacedemônia sobre as amplas costas do mar Algo público ou privado Isso me narra sem evasivas 315 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa vim para me narrares soada acerca do pai Minha casa é devorada os férteis campos destruídos a casa cheia de hostis varões e eles sempre abatem 320 minhas numerosas ovelhas e lunadas vacas trôpegas pretendentes de minha mãe de brutal desmedida Assim agora me achego de teus joelhos se quiseres narrar seu funesto fim se acaso viste com teus olhos ou ouviste o discurso de outro 325 que vaga infeliz ao extremo assim a mãe o gerou Nada edulcores com respeito ou piedade por mim mas contame bem com que visão te deparaste Suplicote se um dia para ti meu pai nobre Odisseu cumpriu palavra ou ação sob promessa 330 na terra troiana onde sofrestes desgraças aqueus Disso agora para mim te lembra e narra sem evasivas Muito perturbado a ele dirigiuse o loiro Menelau Incrível deveras no leito de varão juízoforte cobiçaram deitarse eles próprios sendo covardes 335 Como quando a cerva na moita de forte leão adormece os filhotes lactentes recémnascidos e investiga encostas e vales herbosos pastando e ele então se achega de seu leito e sobre aqueles dois lança fado ultrajante 340 assim Odisseu sobre eles ultrajante fado lançará Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo com o porte que então em Lesbos bemconstruída na disputa com Filomeleides ele se ergueu lutou e o derrubou com força e se alegraram todos os aqueus 345 assim aos pretendentes encontrasse Odisseu todos seriam destinoveloz e bodasamargas Quanto ao que me indagas e suplicas eu não tergiversarei pelas bordas nem te enganarei mas do que me falou o veraz ancião marítimo 350 disso nada esconderei de ti nem palavra ocultarei No Egito ansioso por retornar os deuses a mim ainda mantinham pois não lhes fizera hecatombes completas os deuses sempre queriam a lembrança do dever Bem uma ilha lá existe no mar muito encapelado 355 diante do Egito e a denominam Faros tão distante dele quanto cava nau um dia inteiro realiza quando um vento sibilante sopra de trás Há um porto seguro donde naus simétricas se lançam rumo ao mar após tirar a água escura 360 Lá deuses mantinhamme há vinte dias nunca ventos havia que soprassem para o mar os que de naus tornamse condutores sobre as amplas costas do mar Toda a comida e o ímpeto dos varões se teriam esgotado se um deus não me tivesse lamentado de mim se apiedado 365 a filha do altivo Proteu o ancião marítimo Eidotea pois sobremodo instiguei seu ânimo Ela me achou andando só longe de companheiros pois sempre vagavam em volta da ilha e pescavam com anzóis recurvos a fome a torturar o estômago 370 Ela de pé perto de mim dirigiume a palavra e disse És tão tolo estranho e juízofrouxo ou de bom grado deixas estar e te deleitas com a agonia Pois há tempo na ilha és contido nenhuma saída consegues achar e murcha o coração dos companheiros 375 Assim falou e eu respondendo lhe disse Eu te anuncio seja que deusa tu fores que não sou detido aqui de bom grado mas devo ter ofendido os imortais que do largo páramo dispõem Quanto a ti dizeme e os deuses sabem de tudo 380 que imortal me detém e afastou do caminho e do retorno como eu voltarei sobre o mar piscoso Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Portanto eu te falarei estranho com muita precisão Costuma vir para cá o veraz ancião marítimo 385 imortal o egípcio Proteu que do oceano todo as profundas conhece subordinado a Posêidon dizem que ele é meu pai e que me gerou Se acaso o emboscares e conseguir pegar ele te dirá o caminho os pontos do trajeto 390 e o retorno como voltarás sobre o mar piscoso Também te dirá ó criadoporZeus se quiseres qualquer mal ou bem que em teu palácio ocorreu enquanto te ausentas por longo e difícil trajeto Assim falou e eu respondendo lhe disse 395 Tu mesma planeja a tocaia contra o ancião divino para que antevendome ou pressentindo não escape é difícil para um varão mortal dominar o deus Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Portanto eu a ti com muita precisão direi 400 Quando o sol já atinge o meio do firmamento então vem do mar o veraz ancião marítimo com lufada de Zéfiro encoberto pelo revolto escuro após sair deitase para dormir nas cavas grutas Em torno dele filhotes de focas da bela filha do mar 405 juntos cochilam do mar cinzento tendo emergido exalando acre odor do mar profundo Lá eu conduzindote quando a aurora surgir te deitarei na fileira e tu seleciona companheiros três os melhores junto às naus bomconvés 410 Todos os malefícios te direi que vêm de tal ancião As focas primeiro irá contar e inspecionar mas quando todas viu e enumerou de cinco em cinco ele irá se deitar no meio como pastor no rebanho de ovelhas Mas uma vez que o virdes repousarse 415 nesse momento fazei uso de vigor e força contendeo lá mesmo que se agite ávido por safarse Ele tentará tornandose tudo o que sobre a terra há de movente e também água e fogo flamadivina Quanto a vós firme aguentai e apertaio mais 420 Mas quando ele mesmo te inquirir com palavras tal como era quando o viste repousarse nesse instante cessa a força e solta o ancião herói e pergunta qual deus te oprime e do retorno como voltarás sobre o mar piscoso 425 Assim falou e mergulhou no mar fazonda eu até as naus que estavam nas dunas fui e muito meu coração revolveuse enquanto ia Mas após descer até a nau e o mar preparamos o jantar e veio a noite imortal 430 e então repousamos junto à rebentação do mar Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então ao longo da orla do mar largapassagem fui e com ganas ajoelheime aos deuses levei três companheiros aqueles em quem mais confiava para toda a 435 operação Eidotea após mergulhar no amplo ventre do mar trouxe quatro peles de focas do oceano todas recémtiradas armava um truque contra o pai Tendo escavado leitos nas dunas marinhas aguardava sentada e nós fomos para bem perto dela 440 deitamonos em fila e pele lançou sobre cada um Lá deuse a mais terrível tocaia pois terrível a tortura do odor nefasto de focas nutridas pelo mar quem ao lado de monstro marinho dormiria Mas ela nos salvou e planejou grande ajuda 445 trouxe ambrosia e pôs sob o nariz de cada um pois bem doce exalava e destruiu o odor do monstro A manhã toda aguardamos com ânimo resistente e as focas vieram do mar em conjunto Elas então em fila deitaramse junto à rebentação do mar 450 o ancião ao meiodia veio do mar achou as focas bemnutridas todas inspecionou e contou seu número A nós contou primeiro entre os monstros e no ânimo não pensou ser um truque então também ele se deitou Nós berrando arremetemos e em volta os braços 455 lançamos e o ancião não esqueceu da arte ardilosa mas primeiro tornouse um leão com bela juba e depois serpente pantera e grande javali e tornouse fluida água e árvore copaelevada E nós firme aguentávamos com ânimo resistente 460 Mas quando cansouse o ancião perito em malefícios nesse momento inquirindome com palavras falou Que deus contigo filho de Atreu planejou tal plano para com tocaia eu ser pego sem remédio De que precisas Assim falou e eu respondendo lhe disse 465 Tu sabes ancião por que me inquires com evasivas que há tempo na ilha sou detido nenhuma saída consigo achar e murchame o coração no íntimo Quanto a ti dizeme e os deuses sabem de tudo que imortal me detém e afastou do caminho 470 e do retorno como eu voltarei sobre o mar piscoso Assim falei e ele logo respondendo disseme Por certo deverias a Zeus e aos outros deuses ter feito belo sacrifício e embarcado para rápido chegar a tua pátria navegando sobre o mar vinoso 475 Antes não terás teu quinhão ver os teus e atingir a casa bemconstruída e tua terra pátria só depois que voltares à água do Egito do rio caído de Zeus e fizeres sagradas hecatombes aos deuses imortais que do largo páramo dispõem 480 os deuses então te darão o trajeto que desejas Assim falou e meu coração rachouse porque ordenoume de novo sobre o mar embaçado viajar ao Egito um longo e difícil trajeto Assim mesmo respondendo com um discurso falei 485 Isso portanto completarei ancião como ordenas Mas vamos dizeme isto e conta com precisão todos com as naus a salvo chegaram os aqueus os que Nestor e eu deixamos ao sair de Troia ou um finouse em amargo fim em sua nau 490 ou nos braços dos seus após arrematar a guerra Assim falei e ele logo respondendo disseme Filho de Atreu por que me indagas isso Tu não precisas saber nem conhecer minha mente afirmo que tu pouco tempo não chorarás após de tudo estares a par 495 Sim muitos deles morreram muitos restaram só dois chefes dos aqueus couraçabrônzea no retorno morreram também tu na luta estavas E um único ainda vivo é retido no extenso mar Ájax foi subjugado entre as naus longoremo 500 Primeiro Posêidon aproximouo das Pedras Gyras enormes e salvouse para fora do mar teria escapado da perdição embora odiado por Atena se não tivesse lançado soberba fala grande loucura disse que contra deuses escapou de grande abismo de mar 505 Mas a ele seus altos brados Posêidon ouviu presto após tomar o tridente nas mãos robustas golpeou a Pedra Gyra e fendeua em duas Parte lá mesmo ficou parte no mar caiu onde estivera Ájax em sua grande loucura 510 levouo pelo infinito mar fazonda Assim lá pereceu após engolir água salgada Teu irmão mais ou menos fugiu da perdição e escapou em cavas naus salvouo a senhora Hera Mas quando quase iria o escarpado monte Maleia 515 atingir então após apanhálo uma rajada pelo mar piscoso levouo com gemidos profundos até o limite das lavouras onde habitara Tiestes no passado e então morava o filho de Tiestes Egisto Mas quando também de lá surgia seguro retorno 520 de novo os deuses desviaram o vento em casa chegaram e ele alegre desembarcou na terra pátria e beijava tocandoa sua pátria dele muitas cálidas lágrimas caíam pois feliz viu sua terra Mas viuo da atalaia o vigia que postara 525 Egisto astúciaardilosa prometeralhe como paga dois talentos de ouro Ficou de guarda um ano que não viesse de súbito e se lembrasse da força impetuosa E foi levar a notícia na casa ao pastor de tropa Presto Egisto planejou ardiloso estratagema 530 após escolher no povo vinte os melhores heróis armou tocaia e do outro lado pediu que se desse banquete E ele foi chamar Agamêmnon pastor de tropa com cavalos e carro cogitando ações ultrajantes Sem ele saber do fim levouo para cima e o matou 535 após o banquete como quem mata um boi no cocho Poupouse companheiro algum que seguia o filho de Atreu nenhum de Egisto todos mortos no palácio Assim falou e meu coração rachouse chorava sentado na areia e não mais meu coração 540 quis ficar vivo e enxergar a luz do sol Mas depois que chorei e rolei até me fartar então disseme o veraz ancião marítimo Filho de Atreu não chores mais tanto tempo pois nada realizaremos mas bem rápido 545 experimenta como chegarás à terra pátria De fato ou o alcançarás ainda vivo ou Orestes antes e tu participarias do funeral Assim falou e meu coração meu ânimo orgulhoso de novo em meu peito embora atormentado jubilou 550 e falando dirigilhe palavras plumadas Desses então eu sei tu o terceiro varão nomeia seja quem for o ainda vivo retido no extenso mar ou morto embora atormentado quero ouvir Assim falei e ele logo respondendo disseme 555 O filho de Laerte que em Ítaca tem sua casa vio numa ilha vertendo copiosas lágrimas no palácio da ninfa Calipso que a ele obrigado retém não consegue atingir sua pátria terra Não tem naus com remos nem companheiros 560 que o levariam sobre as amplas costas do mar E para ti não há dito divino Menelau criadoporZeus que em Argos nutrepotro vais morrer e achar o fado mas a ti até o campo Elísio os limites da terra os imortais conduzirão onde está o loiro Radamanto 565 lá a subsistência é a mais fácil para os homens não há neve nem forte tempestade nem chuva mas sempre rajadas de Zéfiro soprando soantes Oceano envia para refrescar os homens porque tens Helena e para eles és genro de Zeus 570 Assim falou e mergulhou no mar fazonda e eu até as naus com os excelsos companheiros fui e muito meu coração revolveuse enquanto ia Mas após descermos até a nau e o mar preparamos o jantar e veio a noite imortal 575 e então repousamos junto à rebentação do mar Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos primeiro puxamos as naus até o divino mar e colocamos mastros e velas nas naus simétricas tendo embarcado sentaramse junto aos calços 580 e alinhados o mar cinzento golpeavam com remos De novo no Egito o rio caído de Zeus ancorei as naus e fiz hecatombes completas Depois de suspender a raiva dos deuses semprevivos ergui cenotáfio a Agamêmnon para inextinguível ser sua fama 585 Após isso completar retornei e deramme uma brisa os imortais que rápido me conduziram à terra pátria Pois bem agora fica em meu palácio até chegar o décimo primeiro décimo segundo dia Aí te enviarei são e salvo e darei radiantes presentes 590 três cavalos e um carro bempolido depois te darei bela taça para que libes aos deuses imortais lembrandote de mim todos os dias A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Filho de Atreu por muito tempo não me retenhas aqui 595 Até mesmo um ano junto a ti eu conseguiria ficar e não teria saudade de casa ou dos pais às maravilhas ouvindo teus discursos e palavras deleitome Mas já se impacientam os companheiros na mui sacra Pilos e tempo tu aqui me reténs 600 Já o dom o que me deres seja algo precioso cavalos não conduzirei a Ítaca mas para ti mesmo aqui os deixarei para tua glória pois reges planície larga na qual há muito trevo há junça trigo espelta e branca cevada em largas espigas 605 Já em Ítaca não há trilhas largas nem prado é nutrecabra e mais agradável que nutrepotro Nenhuma ilha é para cavalos nem tem prado essas que jazem sobre o mar e Ítaca supera todas Assim falou e sorriu Menelau bomnogrito 610 com a mão acariciouo dirigiuselhe e nomeouo És de sangue valoroso caro filho pois falas assim portanto eu farei a troca pois sou capaz Dos dons de quantos haveres há em minha casa vou te dar o mais belo e o mais valioso 615 Vou te dar uma ânfora bemfeita de prata ela é toda e sua borda tem acabamento em ouro obra de Hefesto Deuma o herói Lúzio rei dos sidônios quando em sua casa albergoume ao lá passar no retorno com ela quero te presentear 620 Assim eles disso falavam entre si e convivas vieram à morada do rei divino Conduziam ovelhas e traziam fortificante vinho e pão enviaramlhes as esposas belovéu Assim eles preparavam a refeição no palácio 625 E os pretendentes diante do salão de Odisseu deleitavamse com discos e lanças arremessandoos em solo nivelado como no passado desmedidos Sentados estavam Antínoo e o deiforme Eurímaco chefes dos pretendentes de longe os melhores em valor 630 O filho de Prudente Ponderado deles aproximouse e a Antínoo inquirindoo com um discurso dirigiuse Antínoo acaso sabemos ou não em nosso juízo quando Telêmaco voltará da arenosa Pilos Partiu levandome uma nau ela me é necessária 635 para cruzar até a espaçosa Élida onde tenho cavalos doze fêmeas e lactentes mulas robustas não domadas uma delas trarei e devo domar Assim falou e espantaramse no ânimo não pensaram que fora à Pilos de Neleu mas alhures lá mesmo 640 no campo estivesse com as ovelhas ou o porqueiro A ele então disse Antínoo filho de Persuasivo Narrame sem evasivas quando partiu e que jovens seguiramno De Ítaca seletos ou seus próprios empregados e escravos Também isso poderia realizar 645 Quanto a isto dizeme a verdade para eu bem saber se à força contra tua vontade tomou a negra nau ou de bom grado lha deste ao pedir com um discurso A ele o filho de Prudente Ponderado retrucou Eu de bom grado lha dei o que faria qualquer outro 650 quando um homem tal inquieto no ânimo lhe solicitasse Seria difícil negar o dom Jovens do povo os melhores depois de nós esses o seguiram percebi que embarcou como chefe Mentor ou um deus que a ele em tudo se assemelhava 655 Mas isto me espantou vi aqui o divino Mentor ontem de manhã mas embarcara na nau para Pilos Após assim falar dirigiuse à casa do pai e desses dois irritouse o ânimo arrogante Fizeram os pretendentes sentarse e pararam os jogos 660 E entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo atormentado seu juízo enegrecido de muito ímpeto encheuse e seus olhos pareciam fogo cintilante Incrível completou feito inaudito com soberba Telêmaco esse trajeto críamos que não o completaria 665 Se contra tantos o jovem menino partiu assim após puxar a nau e escolher do povo os melhores dano ulterior começará a ocorrer mas que sua força Zeus destrua antes que nossa desgraça se torne Vamos daime nau veloz e vinte companheiros 670 para que na sua volta de tocaia o vigiemos no canal entre Ítaca e a escarpada Samos que seja lastimável sua viagem motivada pelo pai Assim falou e todos aprovavam e o incitavam presto após se erguerem foram à casa de Odisseu 675 Eis que Penélope muito tempo não ignorou os discursos que os pretendentes ruminaram no juízo Faloulhe o arauto Médon que soubera dos planos estando fora do pátio e eles dentro o plano tramavam E foi pela casa levar a notícia a Penélope 680 Quando passou pela soleira dirigiuselhe Penélope Arauto por que te enviaram os pretendentes ilustres Para ordenares às escravas do divino Odisseu que cessem os afazeres e lhes preparem o banquete Nunca tivessem vindo me cortejar ou mesmo se reunido 685 que pela última e derradeira vez agora aqui jantem Vós amiúde reunidos tantos recursos devastais as posses do atilado Telêmaco Nada dos vossos pais ouvistes no passado ainda crianças como foi Odisseu entre vossos genitores 690 nada fazendo nem falando de imoderado contra alguém nesta terra Isso é o costume dos reis divinos entre os mortais odiará um a outro pode querer bem Ele nunca de modo algum foi iníquo para um varão Mas esse vosso ânimo e ações ultrajantes 695 se mostram e não há gratidão no futuro por boa conduta E a ela dirigiuse Médon versado no inteligente Vê bem rainha que isso fosse o mal maior Todavia outra coisa muito mais grave e aflitiva pensam os pretendentes não o complete o filho de Crono 700 Telêmaco anseiam matar com bronze afiado à casa voltando partiu atrás de novas do pai rumo à mui sacra Pilos e à divina Lacedemônia Assim falou e os joelhos e o coração dela fraquejaram tempo ficou sem fala de palavras seus dois olhos 705 encheramse de lágrimas e a voz abundante contevese Bem depois respondendo com palavras lhe disse Arauto por que meu menino partiu Ele não precisava embarcar em naus velozes que são cavalos marinhos próprios de varões e atravessam águas extensas 710 Para que seu nome não fique entre os homens E a ela dirigiuse Médon versado no inteligente Não sei ou algum deus o instigou ou o próprio ânimo foi impelido a ir a Pilos para informarse do retorno de seu pai ou de que fado alcançou 715 Tendo falado assim saiu pela casa de Odisseu A ela envolveu aniquiladora aflição e não mais suportou ficar na banqueta mesmo muitas havendo na casa e sentouse na soleira do quarto bemtrabalhado infeliz chorando em torno escravas soluçavam 720 todas tantas quantas na casa havia jovens e velhas Entre elas chorando sem parar Penélope falou Ouvi queridas o Olímpio em excesso deume dores mais que a todas que comigo cresceram e nasceram eu que primeiro perdi o nobre marido ânimoleonino 725 que em todas as qualidades supera os dânaos nobre cuja fama é ampla na Hélade até o meio de Argos Agora porém rajadas agarraram meu menino amado do palácio sem registro e que partira nem ouvi Terríveis Nem vós pusestes no juízo cada uma 730 me acordar no leito cientes ao claro no ânimo quando ele subiu na cava nau negra Se eu tivesse ouvido que se lançaria nesse trajeto então por certo ficaria embora ávido por partir ou nesse palácio me deixaria morta 735 Agora ligeiro alguém chame Finório o ancião meu escravo que deume meu pai quando vim para cá e meu jardim muitaárvore mantém para que bem rápido ele conte a Laerte tudo isso sentado ao lado e assim talvez após no juízo um plano tramar 740 saia de casa e se lamurie para o povo esses com ganas em matar seu descendente e do excelso Odisseu A ela então dirigiuse a cara ama Euricleia Moça querida matame tu com bronze impiedoso ou me deixa na casa mas nada te ocultarei 745 Sabia eu de tudo e fornecilhe quanto me ordenou comida e doce vinho e arrancoume poderosa jura que não te falasse antes do décimo segundo dia ou até que tivesses saudade e ouvisses que partira para com teu choro a catita cútis não machucar 750 Mas após te lavar vestir roupas limpas no corpo e subir aos aposentos com tuas criadas mulheres faze uma prece a Atena filha de Zeus portaégide então até mesmo da morte ela o poderá salvar E não desgrace o ancião desgraçado não creio 755 que a deuses ditosos a estirpe de Arquésio de todo seja odiosa mas ainda haverá quem se ocupe da casa grandiosa e dos férteis campos ao longe Isso dito o choro acalmou e de seus olhos se afastou Ela após se lavar vestir roupas limpas no corpo 760 e subir aos aposentos com suas criadas mulheres pôs grãos de cevada no cesto e orou a Atena Escutame rebento de Zeus portaégide Atritone se um dia no palácio para ti o muitaastúcia Odisseu queimou gordas coxas ou de boi ou de ovelha 765 disso agora para mim te lembra protege meu caro filho e afasta os pretendentes dotados de vil arrogância Isso disse e ululou e a deusa ouviulhe a prece E os pretendentes iniciaram uma arruaça no umbroso palácio desse modo falavam os jovens arrogantes 770 Claro as bodas conosco a rainha muitopretendente apronta e não sabe que a morte do filho foi arranjada Assim diziam mas não sabiam o que fora arranjado Entre eles Antínoo tomou a palavra e disse Insanos escapai de discursos soberbos 775 todos vós que ninguém anuncie também lá dentro Vamos fiquemos de pé em silêncio e realizemos o discurso que no juízo agradou a nós todos Isso disse e escolheu os vinte melhores heróis e se encaminharam à nau veloz na orla do oceano 780 A nau por primeiro ao mar profundo puxaram mastro e velas puseram na negra nau e aprontaram os remos nas correias de couro tudo em ordem e desfraldaram a branca vela As armas lhes trouxeram assistentes magnânimos 785 Após puxála da praia para a água desembarcaram lá partilharam do jantar e aguardaram a chegada da noite Ela no andar de cima Penélope bemajuizada jazia sem comer sem tocar em comida ou bebida revolvendo se seu filho impecável escaparia da morte 790 ou seria subjugado pelos pretendentes soberbos Aquilo que no meio de varões o leão cogita com medo ao fecharem ardiloso cerco em torno dele enquanto revolvia isso veiolhe sono prazeroso adormecia reclinada e relaxavam todas suas articulações 795 Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja criou um espectro de corpo feito mulher Altiva a filha de Icário grandiosoânimo que Eumelo desposou em Feras habitando Enviouo à morada do divino Odisseu 800 para que de Penélope que se lamentava gemendo afastasse o choro e lamento lacrimoso Entrou no quarto passando pela correia do ferrolho parou acima da cabeça e dirigiulhe o discurso Dormes Penélope agastada no caro coração 805 Não a ti não permitem os deuses de vida tranquila que chores ou te atormentes pois deve retornar teu menino de modo algum foi ofensivo aos deuses A ela então respondeu Penélope bemajuizada docemente bem adormecida nos portais oníricos 810 Por quê irmã vieste para cá Não costumas aparecer já que muito longe distante habitas Então me ordenas parar com a agonia e as dores muitas que me perturbam no juízo e no ânimo eu que primeiro perdi o nobre marido ânimoleonino 815 que em todas as qualidades supera os dânaos nobre cuja fama é ampla na Hélade até o meio de Argos Agora porém o menino querido partiu em cava nau tolo não conhecendo bem labutas nem assembleias Por esse eu choro até mesmo mais que por aquele 820 Por esse eu tremo e tenho medo que algo sofra entre os da região aonde vai ou no mar inimigos há muitos que contra ele engenham ansiando matálo antes que atinja a terra pátria A ela respondendo falou o débil espectro 825 Coragem e em teu juízo não temas em excesso poderosa guia vai com ele a quem também outros varões rezam para que os acompanhe pois é capaz Palas Atena de ti ao lamuriarte apiedase ela agora me enviou até ti para isso anunciar 830 A ela então dirigiuse Penélope bemajuizada Se és mesmo um deus e de um deus a voz escutaste vamos contame também acerca daquele sofredor se em algum lugar ainda vive e vê a luz do sol ou já está morto e na morada de Hades 835 A ela respondendo falou o débil espectro Daquele não te farei um relato contínuo se está vivo ou morto é ruim lançar frases ao vento Isso disse e junto ao ferrolho pelo batente deslizou rumo às lufadas de vento e ela pulou do sono 840 a filha de Icário seu caro coração rejubilou tão efetivo o sonho ao irromper no apogeu da noite E os pretendentes embarcaram e cruzavam fluentes vias revolvendo a abrupta morte de Telêmaco no juízo Há uma ilha no meio do mar rochosa 845 no meio entre Ítaca e a escarpada Samos Astéris pequenina na qual há portos abriganau um de cada lado lá esperavamno de tocaia os aqueus Aurora de junto do ilustre Títono do leito ergueuse para levar luz a imortais e a mortais os deuses estavam em assembleia e entre eles Zeus trovejanoalto cujo poder é o maior 5 Atena relatavalhes as muitas agruras de Odisseu lembrandose ele na casa da ninfa a preocupava Zeus pai e outros ditosos deuses semprevivos nunca mais alguém seja solícito suave e amigável como rei portacetro nem no juízo saiba o medido 10 mas sempre seja duro e cometa iniquidades pois ninguém se lembra do divino Odisseu aqueles que regeu e era como um pai amigável Mas ele está numa ilha sofrendo forte agonia no palácio da ninfa Calipso que o retém 15 e ele não consegue atingir sua terra pátria Não tem naus com remos nem companheiros que o levariam sobre as amplas costas do mar Agora porém anseiam matar o menino amado ao voltar para casa partiu atrás de novas do pai 20 rumo à mui sacra Pilos e à divina Lacedemônia E a ela respondendo falou Zeus juntanuvens Minha filha que palavra te escapou da cerca de dentes Vê bem essa ideia não ponderaste tu mesma que Odisseu daqueles se vingue ao chegar 25 Telêmaco envia tu com habilidade pois és capaz para que ileso de todo sua pátria terra alcance e os pretendentes na nau de volta retornem Falou e a Hermes o caro filho dirigiuse Hermes sim tu pois de resto és o mensageiro 30 à ninfa belastranças anuncia o firme desígnio o retorno de Odisseu juízopaciente que retornará nem por deuses escoltado nem por homens mortais mas ele em balsa muitacorda sofrendo misérias no vigésimo dia alcançará Esquéria grandesglebas 35 a terra dos feácios na origem próximos dos deuses do fundo do peito como a um deus irão honrálo e numa nau conduzirão à cara terra pátria bronze ouro a granel e vestes tendolhe dado muito o que nem de Troia teria ganhado Odisseu 40 ainda que incólume voltasse com sua parte do butim Assim seu quinhão é ver os seus e atingir a casa com alto teto e a sua terra pátria Isso disse e não desobedeceu o condutor Argifonte Presto então atou aos pés belas sandálias 45 imortais douradas que o levavam sobre as águas e sobre a terra semfim com lufadas de vento Tomou a vara com que encanta olhos de varões de quem quer e outros adormecidos desperta com ela nas mãos voou o poderoso Argifonte 50 Cruzou a Piéria e do céu tombou no mar apressouse sobre as ondas feito gaivota que pelos feros ventres do mar ruidoso a caçar peixes as cerradas asas nágua molha a ela semelhante por muita onda Hermes deixouse ir 55 Mas quando atingiu a ilha longínqua lá saindo do mar violeta à terra firme foi até alcançar a grande gruta onde morava a ninfa belastranças e encontroua dentro Fogo na lareira intenso ardia e até longe o odor 60 de cedro bemrachado e tuia recendia pela ilha queimados e ela dentro cantando com bela voz ativa junto ao tear tramava com áurea lançadeira Bosque havia em torno da caverna verdejante amieiro choupopreto e perfumado cipreste 65 Lá repousavam aves asacomprida corujas falconetes corvos línguacomprida marinhos que se ocupam de feitos marítimos Aí enroscavase em torno da cava gruta vinha exuberante florejante com uvas 70 Fontes em linha quatro fluíam com límpida água próximas entre si cada uma correndo para um lado Em torno prados macios com violeta e aipo floriam mesmo um imortal lá chegando se admiraria ao olhar e se deleitaria no juízo 75 Lá parado admiravase o condutor Argifonte Mas depois que tudo admirou em seu ânimo presto foi à ampla gruta Vendoo de frente não o desconheceu Calipso deusa divina pois não se desconhecem os deuses mutuamente 80 os imortais nem se um bem longe habita Ao enérgico Odisseu dentro não encontrou mas ele chorava na praia sentado como antes com lágrimas gemidos e aflições lacerando o ânimo costumava mirar o mar ruidoso vertendo lágrimas 85 E a Hermes perguntou Calipso deusa divina tendoo feito sentarse em poltrona brilhante lustrosa Por que até mim vieste Hermes bastãodourado respeitável e caro Não costumas aparecer Fala o que pensas o ânimo ordena que eu cumpra 90 se posso cumprir e se é algo que deve sêlo Vem mais para frente para eu te honrar com um dom Isso tendo dito a deusa pôs ao lado uma mesa após enchêla de ambrosia e misturou o tinto néctar e ele bebia e comia o condutor Argifonte 95 Após jantar e o ânimo fortificar com a comida então a ela com palavras respondendo disse Perguntas deusa por que eu deus vim a ti sem subterfúgios narrarei a história tu o pedes Zeus me ordenou que cá viesse sem eu querer 100 quem de bom grado cruzaria tanta água salgada incontável Não há urbe de homens perto que a deuses fazem sacrifícios e hecatombes seletas Mas não pode à mente de Zeus portaégide outro deus nem ultrapassar nem frustrar 105 Diz que um varão está aí o mais lastimoso de todos os varões que em volta da urbe de Príamo lutaram nove anos e no décimo a cidade pilharam e foram para casa no retorno porém ofenderam a Atena que instigoulhes vento danoso e grandes ondas 110 Então os outros todos pereceram nobres companheiros e eis que vento e ondas trouxeramno para cá A ele agora te ordenou de pronto o enviar de volta não lhe cumpre aqui longe dos seus morrer mas ainda é seu quinhão ver os seus e alcançar 115 a casa com alto teto e sua terra pátria Assim falou e tremeu Calipso deusa divina e falando dirigiulhe palavras plumadas Sois terríveis deuses ciumentos mais que todos com deusas vos irritais quando deitamse com varões 120 às claras ou se uma faz dele seu homem amado Assim quando a Órion agarrou Aurora dedosróseos com ela irritaramse os deuses de vida tranquila até que a ele em Ortígia a tronodourado pura Ártemis com suas flechas suaves veio e matou 125 Assim quando a Jasão Deméter belastranças cedendo a seu ânimo uniuse em enlace amoroso sobre pousio com três sulcos pouco tempo ignorouo Zeus que o matou lançando um raio cintilante Assim agora irritaivos comigo deuses por ter um mortal 130 A ele eu salvei enquanto a quilha cavalgava sozinho pois sua nau veloz com um raio cintilante Zeus atingiu e despedaçou no meio do mar vinoso Então os outros todos pereceram nobres companheiros mas eis que a ele vento e ondas para cá trouxeram 135 A ele eu acolhia alimentava e dizia que o faria imortal e sem velhice por todos os dias Mas como não pode à mente de Zeus portaégide outro deus nem ultrapassar nem frustrar que vá se ele o está incitando e instigando 140 sobre o mar ruidoso Conduzilo porém não posso não tenho naus com remos nem companheiros que o conduziriam sobre as amplas costas do mar Mas a ele solícita vou sugerir e não esconder como alcançará ileso de todo sua terra pátria 145 E a ela dirigiuse o condutor Argifonte Assim agora enviao de volta e à cólera de Zeus atenta que nunca no porvir rancoroso a ti seja cruel Isso dito partiu o poderoso Argifonte e ela até o enérgico Odisseu a senhora ninfa 150 foi logo após ouvir o comunicado de Zeus Achouo na praia sentado nunca em seus olhos as lágrimas secavam e iase sua doce vitalidade chorando pelo retorno pois já não lhe agradava a ninfa Mas à noite dormia obrigado 155 na cava gruta sem querer junto a ela que queria de dia nas pedras e nas praias sentado lacerando o ânimo com lágrimas gemidos e aflições mirava o mar ruidoso vertendo lágrimas Parada próximo faloulhe a deusa divina 160 Desditoso não chores mais aqui nem tua vida se esvaia pois agora muito solícita de volta te enviarei Vamos corta grandes troncos e com bronze constrói larga balsa e o deque prende sobre ela ereto para que te leve pelo mar embaçado 165 Quanto a mim pão água e vinho tinto deliciosos disporei que de ti a fome afastariam e com roupas te cobrirei e enviarei brisa detrás para que ileso de todo tua terra pátria alcances se quiserem os deuses que do largo páramo dispõem 170 esses que são mais fortes que eu para pensar e realizar Assim falou e tremeu o muitatenência divino Odisseu e falando dirigiulhe palavras plumadas Claro deusa que tu armas algo outro não a condução quando pedes que de balsa cruze grande abismo de mar 175 assombroso e aflitivo esse nem simétricas naus velozes cruzam felizes com a brisa de Zeus E nem eu contra ti numa balsa embarcaria exceto se ousares deusa a grande jura jurarme de que não planejarás contra mim outra desgraça 180 Assim falou e sorriu Calipso deusa divina com a mão acariciouo dirigiuselhe e nomeouo De fato és trapaceiro versado em sagacidade que discurso é esse que planejaste para falar Agora saibam disso a terra o largo páramo acima 185 e a água que flui para baixo o Stíx esse o maior juramento o mais terrível entre os deuses ditosos de que não planejarei contra ti outra desgraça Mas penso e planejarei exatamente o que para mim mesma eu armaria se tivesse tal necessidade 190 Vê minha mente é moderada e em mim mesma o ânimo no peito não é de ferro mas compassivo Falou assim e foi na frente a deusa divina célere ele depois atrás das pegadas da deusa E chegaram à cava gruta a deusa e o varão 195 e ele lá sentouse na poltrona donde se erguera Hermes e a ninfa serviu todo tipo de iguaria para comer e beber o que mortais varões comem ela sentouse em face do divino Odisseu e junto dela as escravas puseram ambrosia e néctar 200 E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após deleitaremse com bebida e comida entre eles começou a falar Calipso deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque então de fato para casa à cara terra pátria 205 de pronto queres ir Sê feliz apesar de tudo Se soubesses em teu juízo quantas agruras deverás aguentar antes de atingir a terra pátria ficando aqui mesmo comigo cuidarias desta casa e imortal serias embora ansiando ver 210 tua esposa que sempre desejas todos os dias Com certeza não pior que ela proclamo ser nem no porte nem no físico pois não é possível que as mortais disputem com imortais em porte e aparência Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 215 Senhora deusa não me odeies por isso Também sei de tudo que comparada a ti a bemajuizada Penélope é pior em aparência e altura a quem mira de frente ela é mortal e tu imortal e sem velhice Mas quero ainda assim e desejo todos os dias 220 voltar para casa e ver o dia do retorno Se de novo um deus me golpear no mar vinoso resistirei tendo no peito ânimo resistente pois já muito demais sofri e muito aguentei em ondas e guerra que depois de tudo venha o retorno 225 Assim falou o sol desceu e vieram as trevas os dois tendo ido ao recesso da cava gruta deleitaramse com o amor lado a lado ficando Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos Odisseu presto vestiu capa e túnica 230 e ela grande manto branco vestiu a ninfa leve e gracioso a cintura cingiu com cinto belo dourado e sobre a cabeça deitou o véu Então projetou a condução do enérgico Odisseu deulhe grande machado ajustado à palma da mão 235 brônzeo nas duas pontas agudo nele havia um cabo de oliveira muito belo bemengastado Deulhe depois enxó bempolida e guiouo na vereda ao extremo da ilha onde havia grandes árvores amieiro chouponegro e abeto alcançaocéu 240 há muito sem seiva secas que fácil lhe flutuariam Mas após lhe mostrar onde havia grandes árvores ela foi para casa Calipso deusa divina e ele cortou os troncos e rápido realizou sua obra Vinte derrubou ao todo podouos com o bronze 245 aplanou habilmente e endireitou com o prumo Trouxe a verruma Calipso deusa divina furou então todos e encaixouos entre si e a todos ajustou com pregos e encaixes O espaço do casco da nau que torneia um varão 250 mercante larga bemversado em carpintaria tão larga balsa construiu Odisseu O deque ao erguer e estruturar com vários apoios fazia e completavao com largas pranchas Nele erguia um mastro e uma verga a ele adaptada 255 depois disso fez um leme para manobrar Circundoua toda com cerca de salgueiro defesa contra ondas nela despejou muita madeira Trouxe panos Calipso deusa divina para fazer a vela ele bem artefatou até isso 260 Nela prendeu braços adriças e escotas Com alavancas então empurroua ao mar divino Era o quarto dia e para ele tudo foi completado e no quinto enviouo da ilha a divina Calipso tendoo banhado e vestido com vestes olorosas 265 Dentro pôslhe a deusa um odre de vinho escuro esse um e outro de água grande e também comida num alforje pôslhe alimentos deliciosos muitos e brisa fez que soprasse tranquila e tépida Feliz com a brisa soltou a vela o divino Odisseu 270 Ele manobrou hábil com o leme sentado sono em suas pálpebras não tombou mirando as Plêiades e Boeiro que tarde se põe e a Ursa que Carro também denominam ela que no mesmo lugar se volta e em Órion se fixa 275 a única a não partilhar dos banhos no Oceano de fato ordenaralhe Calipso deusa divina que cruzasse o mar com ela a sua esquerda Já dezessete dias navegava o mar cruzando e no décimo oitavo surgiram montes umbrosos 280 da terra dos feácios do ponto mais próximo a ele assemelhavase a um escudo no mar embaçado E a ele voltando dos etíopes o poderoso tremesolo de longe dos montes dos sólimos viu surgiulhe singrando pelo mar Irouse no peito ainda mais 285 agitou a cabeça e a seu ânimo discursou Incrível por certo os deuses mudaram de opinião acerca de Odisseu enquanto eu entre etíopes estava já próximo está da terra feácia onde lhe cumpre escapar do grande limite de agonia que o atinge 290 Mas creio que o perseguirei até se fartar de desgraça Isso dito reuniu nuvens e o mar turvou as mãos no tridente atiçou todas as rajadas de todos os ventos e com nuvens encobriu terra e mar por igual e a noite desceu do céu 295 Juntos Euro e Noto caíram o tempestuoso Zéfiro e Bóreas nascido do páramo e grande onda rolava Então fraquejaram os joelhos e o coração de Odisseu e perturbado falou a seu ânimo enérgico Ai de mim pobre coitado o que ainda me resta 300 Temo que tudo que a deusa falou seja infalível disse que eu no mar antes de atingir a terra pátria enfrentaria aflições tudo isso agora se completa Com que nuvens cinge Zeus o largo páramo turvou o mar e arremessamse rajadas 305 de todos os ventos agora é certo meu abrupto fim Três vezes ditosos quatro os dânaos que morreram na ampla Troia obsequiando os filhos de Atreu Tivesse eu morrido e meu destino alcançado no dia em que contra mim lanças brônzeas numerosos 310 troianos lançaram em torno do finado filho de Peleu Teria obtido oferendas e minha fama os aqueus levariam agora me foi destinado ser alcançado por morte deplorável Após falar assim grande onda o golpeou do alto terrível impetuosa e chacoalhou a balsa 315 Para longe da balsa ele próprio caiu e o leme das mãos deixou ir ao meio quebroulhe o mastro rajada de ventos mesclados terrível Longe a vela e a verga caíram no mar Sob a água segurouo muito tempo e não pôde 320 logo subir sob o furor da grande onda as vestes o oprimiam as que lhe dera a divina Calipso Bem depois emergiu e da boca cuspiu água do mar acre que em abundância da cabeça escorria Nem assim da balsa esqueceu embora acabado 325 mas lançandose nas ondas agarroua e no meio sentouse da morte certeira tentando escapar Levavaa grande onda pela corrente para lá e para cá Como Bóreas no fim do verão leva espinhos de cardo pelo plaino e em profusão se prendem um ao outro 330 assim pelo mar ventos a levavam para lá e para cá ora Noto a Bóreas lançavaa para que fosse levada ora Euro a Zéfiro deixavaa para ser perseguida E viuo a filha de Cadmo Ino lindacanela Leucoteia que antes fora mortal com voz humana 335 e agora no mar partilhava da honra dos deuses Ela apiedouse de Odisseu sofrendo à deriva feito gaivota em voo emergiu do oceano sentouse sobre a balsa muitacorda e enuncioulhe Desditoso por que assim a ti Posêidon tremesolo 340 odeia terrível já que te engendra muitos males Vê não te destruirá embora muito encolerizado Mas aja assim e creio que não te falta entendimento após tirar as roupas deixa a balsa entregue aos ventos e nadando com os braços esforçate pelo retorno 345 à terra dos feácios onde teu destino é escapar Vamos esse véu sob o peito ajeita imortal não temas sofrer nem ser destruído Mas quando com as mãos tocares terra firme soltao e o lança rumo ao mar vinoso 350 bem longe da terra e virate para o outro lado Após falar assim a deusa deulhe o véu e ela de volta no mar mergulhou no fazonda à gaivota assemelhada e onda escura encobriua Mas ele cogitou o muitatenência divino Odisseu 355 e perturbado falou a seu ânimo enérgico Ai de mim que um ardil não tenha de novo tramado o imortal quando me ordena desembarcar da balsa Ainda não obedecerei pois longe com os olhos a terra eu vi onde ela me disse que escaparia 360 Mas assim agirei e pareceme ser o melhor enquanto houver troncos com encaixes ajustados aqui ficarei e resistirei sofrendo agonias mas quando uma onda dissipar a balsa nadarei pois não é possível prever algo melhor 365 Enquanto revolvia isso no juízo e no ânimo lançoulhe grande onda Posêidon tremesolo terrível e aflitiva arqueada e golpeouo Como o vento bravio que dissipa uma pilha de palha seca e a ela dispersa para todos os lados 370 assim dispersou seus grandes troncos E Odisseu cavalgava o tronco como a guiar um cavalo de corrida Despiuse da roupa que lhe dera a divina Calipso e de imediato o véu sob o peito ajeitou de cabeça jogouse no mar estendendo os braços 375 ansiando nadar Viuo o poderoso tremesolo moveu a cabeça e a seu ânimo discursou Assim agora após muitos males sofrer vague no mar até homens criados por Zeus encontrar Mas nem assim espero desprezarás a desgraça 380 Falou assim chicoteou os cavalos belapelagem e foi até Aigas onde fica sua morada gloriosa Porém Atena filha de Zeus teve outra ideia dos outros ventos deles o percurso estancou e ordenou a todos que parassem e repousassem 385 e instigou o ventoso Bóreas que quebrou as ondas para que ao navegador povo feácio se juntasse Odisseu linhagemdivina e fugisse da perdição da morte Lá duas noites e dois dias na onda potente vagava e seu coração amiúde pressentiu o fim 390 Mas quando trouxe o terceiro dia Aurora belastranças então o vento parou e a calmaria surgiu sem ventos ele próximo viu a terra com muito aguçado olhar erguido por grande onda Como quando aos filhos felicidade traz a vida 395 do pai que jaz doente sofrendo lancinante agonia definhando há tempo pois hedionda divindade atacouo e então para sua felicidade deuses o livram da desgraça tal felicidade sentiu Odisseu ao ver terra e bosque e nadou com pressa de pôr os pés em terra firme 400 Mas quando estava à distância de um grito ouviu um rugido contra os rochedos do oceano roncava grande onda contra a seca terra firme quebrando terrível tudo coberto de espuma do mar sem angras protetoras de navios nem ancoradouros 405 cabos salientes havia e recifes e rochas Então fraquejaram os joelhos e o coração de Odisseu e perturbado ele falou a seu ânimo enérgico Ai após Zeus a mim conceder sem esperança ver a terra e eu completar a travessia desse abismo 410 não se mostra saída para fora do mar cinza Lá fora há rochas pontiagudas em torno a onda freme com estrondo e lisa a rocha se ergue fundo é o mar até a beira e impossível com os pés ambos se firmar e escapar da desgraça 415 Que a mim tentando sair não lance contra o penedo grande onda agarrandome será vão meu ímpeto Se mais para diante eu nadar para acaso encontrar praias oblíquas e angras do oceano temo que uma rajada novamente me agarre 420 e pelo mar piscoso me leve com gemidos profundos ou que do mar uma divindade envie contra mim enorme monstro um dos tantos que nutre a famosa Anfitrite pois sei do ódio que me tem o famoso tremeterra Enquanto revolvia isso no juízo e no ânimo 425 grande onda o levou rumo ao áspero cabo Lá a pele teria sido lacerada e os ossos partidos se em seu juízo tal não lhe pusesse Atena olhosdecoruja com ambas as mãos arremetendose agarrou o penedo e nele grudouse gemendo até a grande onda passar 430 E assim dela escapou mas em refluxo a ele de novo golpeou arremetendose e longe lançouo ao mar Como quando o muitospés da toca é arrancado e nas ventosas copiosos pedregulhos se prendem assim nas rochas de suas mãos corajosas 435 a pele foi lacerada e a ele grande onda encobriu Lá o infeliz Odisseu mais que seu quinhão teria morrido se sagacidade não lhe tivesse dado Atena olhosdecoruja emergindo das ondas que quebravam rumo à costa nadava pelo lado mirando a terra se acaso achasse 440 praias oblíquas e angras do oceano Mas quando diante da boca do rio belofluxo chegou nadando aí pareceulhe ponto excelente livre de rochas e havia proteção contra o vento reconheceuo em seu fluxo e rezou em seu íntimo 445 Ouveme senhor seja quem fores muitoimplorado vou a ti fugindo do mar das ameaças de Posêidon É digno de respeito também aos deuses imortais todo varão que chega depois de vagar como eu agora alcanço tua corrente e joelhos após muito aguentar 450 Pois senhor apiedate teu suplicante proclamo ser Isso dito ele logo parou sua corrente conteve a onda na frente dele produziu calmaria e salvouo rumo à foz do rio Então os dois joelhos vergou e os robustos braços o mar dobrara seu coração 455 Inchada estava sua carne e muito mar gotejava da boca e da pele Eis que ele sem fôlego e sem voz jazia exaurido e fadiga terrível o atingiu Quando voltou a si e no peito o ânimo se recompôs então sim soltou de si o véu da deusa 460 No rio deságuanomar deixouo tombar de volta levouo grande onda com a corrente e logo Ino recebeuo com suas mãos ele após do rio se afastar sob o junco arrojouse e beijou o solo fértil Perturbado falou a seu ânimo enérgico 465 Ai de mim o que devo sofrer O que ainda me resta Se no rio ao longo da incômoda noite eu vigiar que a geada vil e junto o fresco orvalho não subjuguem o ânimo esgotado pela exaustão a brisa sopra do rio gelada antes da aurora 470 Mas se subir ao penhasco e ao bosque umbroso nos cerrados arbustos adormecer se permitirem o frio e a fadiga e até mim o doce sono vier temo tornarme presa e butim de feras Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim 475 foi ao bosque que encontrou junto a uma clareira próximo à água Eis que se pôs sob dois arbustos nascidos no mesmo lugar zambujeiro e oliveira Não os cortava o ímpeto de ventos que sopram úmidos e nunca o sol luzidio com seus raios os atingia 480 nem chuva os cruzava de todo tão compactos nasceram enredados um ao outro Debaixo Odisseu meteuse e presto juntou um leito com suas mãos largo pois havia um monte de folhas em abundância quantidade para dois três homens se protegerem 485 contra o inverno ainda que fosse muito duro Vendoo alegrouse o muitatenência divino Odisseu deitouse no centro e sobre si entornou um monte de folhas Como quando alguém oculta um tição na cinza negra no limite das lavouras onde não há outros vizinhos 490 e salva o germe do fogo para não precisar acender alhures assim Odisseu cobriuse com as folhas E nele Atena vertia sono sobre os olhos para rápido o livrar da fadiga penosa após encobrir suas pálpebras Assim ele lá dormia o muitatenência divino Odisseu dominado por sono e fadiga E Atena foi até a terra a cidade dos varões feácios Eles antes moravam na espaçosa Hipereia 5 próximo aos ciclopes varões arrogantes que os lesavam pois na força eram superiores De lá fêlos erguerse o deiforme Nauveloz e assentouos em Esquéria longe de varão comegrão em volta puxou muro para a cidade construiu casas 10 fez templos de deuses e dividiu as glebas Mas ele já subjugado pela morte partira ao Hades e Alcínoo regia versado em projetos vindos de deuses À sua casa foi a deusa Atena olhosdecoruja o retorno do enérgico Odisseu armando 15 Foi até o quarto muito artificioso no qual uma moça dormia semelhante a imortais no físico e na aparência Nausícaa filha do enérgico Alcínoo e junto duas criadas cuja beleza vinha das Graças de cada lado do umbral as brilhantes portas trancadas 20 Como o sopro do vento lançouse à cama da moça parou acima da cabeça e dirigiulhe o discurso assemelhada à filha de Dimas famoso pelas naus de mesma idade que ela e agradável a seu ânimo Semelhante a ela disselhe Atena olhosdecoruja 25 Nausícaa como a mãe te gerou assim desleixada Tuas vestes lustrosas jazem descuidadas e tuas bodas estão perto onde tu mesma deves belezas trajar e as de outros providenciar de quem te conduzir graças a isso marcha entre os homens um dizer 30 bom e o pai e a senhora mãe se agradam Vamos temos que lavar tudo quando a aurora surgir contigo seguirei como ajudante para que rápido aprontes pois não serás virgem por muito tempo Pela cidade já te cortejam os melhores 35 entre todos os feácios onde está tua própria família Vamos incita o famoso pai antes da aurora a preparar mulas e carro para que conduza cintos peplos e lustrosas mantas Também para ti mesma será bem melhor que ir 40 com os pés os poços são bem longe da cidade Ela após falar assim partiu Atena olhosdecoruja ao Olimpo onde dizem a sede dos deuses sempre segura ficar não é sacudido por ventos nunca por chuva é molhado nem neve a ele se achega mas o céu de todo 45 se estende sem nuvens e acima corre branco clarão ali deleitamse os deuses ditosos todos os dias Para lá foi a olhosdecoruja após instruir a moça Logo veio Aurora belotrono que a despertou Nausícaa belopeplo presto espantouse com o sonho 50 e saiu pela casa para anunciar aos genitores e lá dentro os encontrou ao caro pai e à mãe Essa sentada junto à lareira com criadas mulheres volteava fios púrpura na roca e com aquele na porta deparou de saída para encontrar reis renomados 55 no conselho chamado por ilustres feácios Ela parada bem perto disse ao caro pai Querido papai não poderias prepararme um carro alto boasrodas para eu levar esplêndidas vestes ao rio para lavar aquelas minhas que sujas estão 60 Também convém que tu na companhia dos próceres planejes planos com roupas limpas sobre a pele E são cinco os teus filhos que vivem no palácio dois deles casados três florescentes solteiros eles sempre querem com roupas recémlavadas 65 ir à arena de dança tudo isso ocupa meu juízo Assim falou com vergonha de nomear vicejantes bodas ao caro pai ele tudo percebeu e reagiu com o discurso Não te nego as mulas criança ou outra coisa Vai e para ti os escravos prepararão um carro 70 alto boasrodas equipado com a parte superior Isso dito deu a ordem aos escravos e eles obedeceram Eles então fora o carro boasrodas com mulas aprontavam conduziam as mulas e jungiram ao carro e a moça trazia do quarto resplandecentes roupas 75 Essas ela dispôs sobre o carro bempolido A mãe na canastra punha iguarias deliciosas de todo o tipo punha alimentos e vertia vinho em odre de cabra e a moça embarcou no carro Deulhe fluido óleo de oliva em lécito dourado 80 para que se ungisse com suas criadas mulheres Ela pegou o chicote e as rédeas lustrosas e chicoteou para puxarem e as mulas faziam estrépito Esticavamse sem cessar levavam a roupa e a ela não sozinha mas com ela seguiam duas criadas 85 Quando alcançaram a mui bela corrente do rio onde as tinas eram perenes e muita água bela corre do fundo para limpar até o bem sujo lá elas desatrelaram as mulas para longe do carro Enxotaramnas ao longo do vertiginoso rio 90 para pastarem capim doce como mel e outras do carro pegavam a roupa com as mãos e levavam à água escura e pisoteavamna nas tinas rápido rivalizando Mas depois de lavar e limpar toda a sujeira em ordem estenderamna ao longo da orla onde o mar 95 ao bater na praia mais lavava pedregulhos Elas se banharam e ungiram à larga com óleo partilharam o almoço junto às margens do rio e aguardaram a roupa secar sob os raios do sol Mas após as escravas e ela deleitaremse com comida 100 brincavam com a bola tendo as fitas soltado e entre elas Nausícaa alvosbraços dirigia a música Tal vai Ártemis pelos montes a vertesetas ou pelo muito elevado Taigeto ou pelo Erimanto deleitandose com javalis e corças velozes 105 Com ela as ninfas filhas de Zeus portaégide campestres brincam e no juízo se alegra Leto aquela mantém cabeça e fronte acima de todas é fácil de reconhecer e todas são belas assim entre as criadas sobressaía a virgem indomada 110 Mas quando ia de novo retornar para casa após jungir as mulas e dobrar as belas vestes teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja Odisseu despertaria e veria a moça de bela face para que ela o guiasse à cidade dos varões feácios 115 A rainha então lançou a bola para uma criada ela errou a criada e em fundo remoinho caiu Soltaram alto grito e despertou o divino Odisseu Sentandose revolvia no juízo e no ânimo Ai de mim dessa vez atinjo a terra de que mortais 120 Serão eles desmedidos selvagens e não civilizados ou hospitaleiros com mente que teme o deus É como se me envolvesse feminina gritaria de moças de ninfas que habitam escarpados cumes de montes fontes de rios e campos forrageiros 125 talvez esteja perto de homens dotados de fala Pois bem eu mesmo vou verificar e ver Isso dito dos arbustos emergiu o divino Odisseu e do bosque cerrado quebrou com mão encorpada ramo folheado para no corpo proteger as vergonhas de homem 130 Foi como leão da montanha confiante na bravura que vem castigado por chuva vento e seus olhos faíscam Mas ele vai para o meio de bois e ovelhas ou atrás de corças selvagens ordenalhe o estômago que para testar as ovelhas vá a uma casa protetora 135 assim ia Odisseu às moças belastranças unirse embora nu a necessidade o atingiu Aterrorizante pareceu a elas enfeado pela salsugem e abalaram uma para cada lado nas praias salientes Só a filha de Alcínoo ficou pois nela Atena 140 pôs coragem no peito e tirou o medo dos membros Parada encarouo ele Odisseu cogitou se tocando os joelhos suplicaria à moça de bela face ou assim mesmo de longe com palavras amáveis suplicaria que mostrasse a cidade e desselhe roupas 145 Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim de longe suplicar com palavras amáveis para a moça não se enraivecer tocada nos joelhos De pronto amável e vantajoso discurso lhe disse Implorote senhora és uma deusa ou mortal 150 Se és deusa uma das que do largo páramo dispõem a ti eu a Ártemis a filha do grande Zeus comparo próxima em aparência altura e físico se és um mortal dos que moram sobre a terra três vezes ditosos são teu pai e a senhora tua mãe 155 três vezes ditosos os irmãos muito o ânimo deles sempre com gáudio rejubila por tua causa ao mirarem tal rebento dirigirse à arena Será no coração de longe o mais ditoso de todos quem prevalecer com dádivas e para casa te conduzir 160 Nunca vi mortal assim com meus olhos homem nem mulher e reverência me toma ao mirarte Sim em Delos certa vez junto ao altar de Apolo um tal broto de palmeira jovem e ascendente percebi pois fui também até lá e grande tropa seguiame 165 em jornada na qual muitas agruras me atingiriam assim como ao vêlo assombreime no ânimo muito tempo pois nunca ascendeu tal tronco da terra a ti mulher admiro assombrome e temo terrivelmente tocarte os joelhos e cruel aflição me atinge 170 Ontem no vigésimo dia escapei do mar vinoso até então onda e ventosas rajadas sempre me levavam desde a ilha de Ogígia Agora a divindade me expeliu para que também aqui eu sofra um mal não creio que cessará mas deuses antes completarão ainda muitos 175 Tem piedade senhora de ti após padecer muito mal achegueime por primeiro não conheço nenhum outro homem dos que dispõem dessa cidade e terra Mostra a cidade e dême trapos para recobrirme se trouxeste um saco de roupas ao vires para cá 180 Que deuses te deem tudo que desejas em teu juízo marido e casa e te presenteiem com concórdia distinta de fato nada é mais forte e melhor que isto quando em concórdia nas ideias dominam a casa marido e mulher há muitas agonias a inimigos 185 e alegrias a amigos e a reputação deles é máxima A ele então Nausícaa alvosbraços retrucou Estranho como não pareces ser vil nem insensato herói e Zeus mesmo o Olímpio fortuna distribui aos homens aos distintos e aos vis o que ele quer a cada um 190 também a ti talvez isso deu porém cumpre aguentares Pois bem já que alcanças nossa terra e cidade não carecerás de veste nem de outra coisa que convém a calejado suplicante diante de nós A urbe te mostrarei e vou dizerte o nome do povo 195 são os feácios que habitam essa cidade e região e eu mesma sou a filha do enérgico Alcínoo de quem depende o vigor e a força dos feácios Assim falou e deu ordens às criadas belastranças Criadas parai Para onde fugis ao ver o herói 200 Acaso pensais tratarse de um varão inimigo Não existe este varão humano mortal nem nascerá o que chegar à terra dos varões feácios trazendo briga somos caríssimos aos imortais Habitamos bem longe no mar muito encapelado 205 nos confins e nenhum outro mortal nos frequenta Mas esse aí desgraçado chega aqui após vagar e agora cumpre dele cuidar sob Zeus estão todos os estranhos e mendigos e o dom é pequeno e querido Vamos criadas dai comida e bebida ao estranho 210 e banhaio no rio onde há proteção contra o vento Isso dito elas pararam entre si deram ordens e acomodaram Odisseu junto à proteção ordens de Nausícaa filha do enérgico Alcínoo ao lado dele puseram manto e túnica para vestirse 215 deramlhe num lécito dourado fluido óleo de oliva e lhe pediram que se banhasse nas correntes do rio Sim então entre as criadas falou o divino Odisseu Criadas ficai paradas assim longe para eu mesmo banharme tirando a salsugem dos ombros e com óleo 220 me ungir há tempo meu corpo não vê unguento Diante de vós eu não me banharei pois tenho pudor de ficar nu no meio de moças belastranças Assim falou e foram para longe e informaram a jovem E ele com água do rio lavou a pele o divino Odisseu 225 da salsugem que cobria o dorso e os largos ombros e da cabeça removeu a sujeira do mar ruidoso Mas após tudo lavar e à larga se ungir vestiu as vestes que lhe dera a virgem indomada e a ele tornou Atena nascida de Zeus 230 maior e mais encorpado a quem o visse e da cabeça fez tombar madeixas cacheadas semelhantes a jacintos Como quando reveste a prata com ouro o varão habilidoso a quem ensinaram Hefesto e Palas Atenas técnica de todo o tipo e completa obras graciosas 235 assim sobre ele verteu graça na cabeça e nos ombros Então sentouse afastandose até a orla do oceano fulgurante em beleza e graça e a moça contemplavao Então entre as criadas belastranças ela falou Escutaime criadas alvosbraços vou falar 240 Com a ajuda de todos os deuses que do Olimpo dispõem esse homem veio frequentar os excelsos feácios antes com efeito pareceume ser ordinário agora parece com deuses que do largo páramo dispõem Tomara homem assim fosse chamado de meu marido 245 morando nessa terra e lhe agradasse ficar aqui mesmo Vamos criadas dai comida e bebida ao estranho Assim falou e elas a ouviram direito e obedeceram e junto a Odisseu puseram comida e bebida Ele bebia e comia o muitatenência divino Odisseu 250 à larga há muito tempo não tocava em comida E Nausícaa alvosbraços teve outra ideia após dobrar as vestes colocouas no belo carro jungiu as mulas fortecasco e ela mesma subiu Exortou Odisseu dirigiuselhe e nomeouo 255 Agora estranho põete à cidade para que te guie à casa de meu atilado pai onde tu afirmo conhecerás entre todos os feácios os melhores Mas aja assim e creio que não te falta entendimento ao passarmos pelos campos e culturas dos homens 260 marcha rápido junto às criadas atrás das mulas e do carro e eu na estrada serei a condutora E ao pisarmos na cidade rodeada por muralha elevada belo porto há em cada lado da cidade e a entrada é estreita até a via naus ambicurvas 265 são puxadas Todas têm uma rampa cada uma Lá fica a ágora em torno do belo templo de Posêidon ajustada com blocos arrastados de pedreira Lá ocupamse com o cordame das negras naus com cabos e velas e afilam seus remos 270 Aos feácios arco e aljava não interessam mas velas remos de naus e naus simétricas com as quais se alegram cruzando o mar cinza Deles evito fala amarga que ninguém por trás me insulte e são bastante soberbos na cidade 275 Talvez um mais vil diga assim após encontrarnos Quem é esse que segue Nausícaa belo e alto um estranho Onde o achou Sim será seu marido Por certo cuidou de alguém à deriva longe de sua nau varão de terra distante pois não os há nas cercanias 280 ou até ela depois de prece deus muito rogado chegou após do páramo descer e a terá por todos os dias É melhor ela própria circulando se achou marido alhures de fato ela desonra na cidade aqueles feácios que a cortejam muitos e distintos 285 Assim falarão essas seriam as críticas contra mim Também me indignaria contra toda que isso fizesse uma que contra os seus vivos o pai e a mãe se unisse a varões antes de atingir bodas públicas Estranho atenta assim a minha palavra para que logo 290 obtenhas condução e retorno da parte de meu pai Toparemos o bosque radiante de Atena junto à trilha álamos lá corre fonte e no entorno há um prado lá fica o domínio de meu pai e luxuriante vinhedo tão longe da cidade quanto a distância de um grito 295 Lá sentado aguarda um tempo até nós irmos à cidade e chegarmos à casa de meu pai Mas quando creres que nós chegamos à casa então também vai à cidade dos feácios e indaga pela casa de meu pai o enérgico Alcínoo 300 É fácil de reconhecer e até uma criança tola te guiaria de fato não são semelhantes a ela as casas dos feácios tal é a casa de Alcínoo herói Mas quando te abarcarem o pátio e a casa muito rápido cruza o salão até alcançares 305 minha mãe Ela sentase junto à lareira à luz do fogo volteando fios púrpura na roca assombro à visão reclinada contra a coluna criadas sentamse atrás dela Aí mesmo a poltrona de meu pai está escorada na qual bebe vinho sentado como um imortal 310 Passa por ele e braços em torno dos joelhos da mãe lança a fim de que o dia do retorno vejas rápido com alegria mesmo se és de bem longe Se ela em seu ânimo for benévola para contigo há a expectativa então de ver os teus e voltar 315 para a casa bemconstruída e à tua terra pátria Após falar assim açoitou com chicote luzidio as mulas elas rápido deixaram as correntes do rio Corriam bem e trotavam bem com seus cascos e ela conduzia direito para que junto seguissem a pé 320 as criadas e Odisseu com juízo aplicava o açoite E o sol mergulhou e eles alcançaram o famoso bosque consagrado a Atena onde sentouse o divino Odisseu De imediato orou à filha do grande Zeus Ouveme rebento de Zeus portaégide Atrítone 325 pelo menos agora me escuta pois antes nunca escutaste o golpeado ao golpearme o famoso tremeterra Dá que aos feácios eu chegue amigo e digno de piedade Assim falou rezando e ouviuo Palas Atena e a ele ainda não apareceu de frente pois respeitava 330 o irmão do pai ele com veemência manteve a cólera contra o excelso Odisseu até esse em sua terra chegar Assim ele rezava o muitatenência divino Odisseu e a força das mulas levava a moça à cidade Ela quando chegou à esplêndida casa do pai freouas no pórtico os irmãos em torno dela 5 postaramse semelhantes a imortais do carro soltaram as mulas e para dentro levaram as vestes Ela mesma foi a seu quarto acenderalhe o fogo a anciã de Apeiraie a camareira Eurimédussa que um dia naus ambicurvas trouxeram de Apeiraie 10 elegeramna honraria para Alcínoo pois todos os feácios regia e como a um deus o povo o ouvia essa criou Nausícaa alvosbraços no palácio Ela atiçoulhe o fogo e dentro preparou o jantar Então Odisseu moveuse rumo à cidade em torno Atena 15 verteu densa bruma benévola para Odisseu para que nenhum animoso feácio topandoo provocasseo com palavras e perguntasse quem era Mas quando ia penetrar na cidade adorável então topouo a deusa Atena olhosdecoruja 20 semelhante a jovem menina levando um cântaro Parou diante dele e ele a interpelou o divino Odisseu Criança não me conduzirias à casa do varão Alcínoo que rege entre esses homens De fato eu calejado estranho aqui chego 25 de longe terra distante daí não conheço nenhum homem dos que dispõem dessa cidade e da terra A ele então dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Portanto eu pai estrangeiro a casa que me pedes mostrarei já que mora perto de meu pai impecável 30 Mas vai bem quieto e eu na estrada te conduzirei e não encares homem algum nem o interrogues Vê eles não toleram muito homens estrangeiros nem são hospitaleiros com quem vem dalhures Confiantes em suas naus velozes rápidas 35 cruzam o grande mar pois isso lhes deu o tremesolo suas naus são rápidas como asa ou pensamento Falou assim e foi na frente Palas Atena célere ele depois atrás das pegadas da deusa Os feácios famosos pelas naus não o perceberam 40 passando por eles na cidade de fato Atena não permitia a belastranças fera deusa pois névoa prodigiosa verteu sobre ele benévola em seu ânimo Assombrouse Odisseu com portos e naus simétricas com a ágora dos próprios heróis e grandes muralhas 45 altas equipadas com estacas assombro à visão Mas quando chegaram à esplêndida casa do rei entre eles começou a falar a deusa Atena olhosdecoruja Esta é a casa pai estrangeiro que me pedes para indicarte Toparás os reis criados por Zeus 50 partilhando banquete Tu entra e no ânimo nada temas pois o varão audacioso o melhor em todos os feitos revelase ainda que venha dalhures Bem primeiro à senhora alcançarás no palácio Arete é o nome pelo qual é chamada e os mesmos 55 progenitores tem que geraram o rei Alcínoo Primeiro a Nauveloz Posêidon tremesolo gerou com Periboia na beleza a melhor das mulheres a mais jovem filha do enérgico Eurimédon que um dia foi rei dos autoconfiantes gigantes 60 Mas perdeu o iníquo povo e perdeuse a si mesmo com ela Posêidon uniuse e gerou a criança o animoso Nauveloz que os feácios regia Nauveloz gerou Rompedor e Alcínoo Ao primeiro alvejou Apolo arcodeprata sem varão 65 e recémcasado e na casa deixou única filha Arete dela Alcínoo fez sua consorte e honroua como não é honrada na terra outra mulher das que hoje sob os varões a casa mantêm Assim ela de coração foi e tem sido honrada 70 pelos caros filhos pelo próprio Alcínoo e pelo povo que olhandoa como a um deus saúdamna com discursos quando anda na cidade Sim a ela não faltam ideias nobres solve brigas daqueles com quem for bénevola até varões 75 Se ela em seu ânimo for benévola para contigo há a expectativa de ver os teus e voltar para a casa altoteto e tua terra pátria Após falar assim partiu Atena olhosdecoruja sobre o mar ruidoso deixou a encantadora Esquéria 80 dirigiuse a Maratona e a Atenas amplasvias e entrou na casa protetora de Erecteu E Odisseu ia à casa famosa de Alcínoo muita coisa seu coração revolvia ele de pé antes de atingir o brônzeo portal Assim como o do sol ou da lua clarão havia 85 pela casa de alto pédireito do enérgico Alcínoo Paredes brônzeas estendiamse nas duas direções do umbral ao fundo e em torno cornija de lápislazúli douradas portas fechavam a sólida casa prateados batentes estavam de pé no brônzeo portal 90 prateado lintel sobre eles e a maçaneta era dourada Dourados e prateados cães havia de cada lado que Hefesto fizera com arguto discernimento para vigiarem a morada do enérgico Alcínoo sendo imortais e sem velhice por todos os dias 95 Lá poltronas havia apoiadas na parede nos dois lados do umbral ao fundo formação contínua onde mantos finos bemtecidos foram lançados obra de mulheres Lá os líderes dos feácios costumavam sentarse bebendo e comendo pois possuíam em abundância 100 Dourados mancebos sobre bases bemfeitas estavam de pé com tochas ardentes nas mãos à noite iluminando a casa para os convidados Cinquenta escravas havia em sua casa mulheres Umas moem em moinhos manuais grãos cor de maçã 105 outras tecem a trama e volteiam os fios na roca sentadas tais como as folhas do choupo altaneiro dos tecidos da fechada trama pinga fluido óleo Como os feácios mais hábeis que todos os varões em guiar nau veloz sobre o mar assim as mulheres 110 na arte do tear sobremodo lhes deu Atena a técnica de trabalhos bem belos e juízo distinto Fora do pátio próximo às portas havia grande pomar de quatro medidas e cerca corria de ambos os lados Lá havia grandes árvores verdejantes 115 pereiras romãzeiras e macieiras frutoradiante doces figueiras e oliveiras verdejantes Delas nunca um fruto se perde ou falta inverno ou verão o ano inteiro não é perene o sopro de Zéfiro e faz uns crescer e outros madurar 120 Pera após pera amadurece maçã após maçã uva após uva figo após figo Lá a sua vinha muitofruto está enraizada uma parte trecho ensolarado de solo plano é seca pelo sol e outras partes eles recolhem 125 e outras pisoteiam na frente há cachos lançando flor e outros escurecem aos poucos Lá canteiros arranjados junto à fileira mais externa têm plantas de todo o tipo cintilando o ano inteiro Dentro há duas fontes uma por todo o jardim 130 é distribuída outra sob o umbral do pátio se lança à alta casa donde os citadinos pegavam água tais na casa de Alcínoo os radiantes dons de deuses Lá parado admiravase o muitatenência divino Odisseu Mas depois de com tudo se admirar em seu ânimo 135 célere por sobre o umbral entrou na casa Encontrou os líderes e capitães dos feácios libando com cálices a Argifonte agudamirada a quem por último libavam ao lembrarse do repouso E ele cruzou o salão o muitatenência divino Odisseu 140 e junto densa bruma que em torno dele vertia Atena até alcançar Arete e o rei Alcínoo Em torno dos joelhos de Arete Odisseu lançou os braços e a bruma definida pela deusa foi dele afastada Eles se calaram pela casa ao ver o herói 145 espantados com a visão e Odisseu fez a súplica Arete filha do excelso Rompedor teu esposo e teus joelhos alcanço após muito aguentar e esses convivas deuses a eles deem fortuna durante suas vidas e cada um legue aos filhos 150 os bens no palácio e a honraria a que deu o povo Mas minha condução acelerai para eu chegar à pátria rápido pois longe dos meus há muito sofro misérias Após falar assim sentouse nas cinzas da lareira junto ao fogo e eles todos atentos se calaram 155 Bem depois tomou a palavra o ancião herói Donodenau que entre os varões feácios era o mais velho e em discursos superior com muito saber antigo Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Alcínoo isto não é o melhor nem conveniente 160 um estranho sentarse no chão nas cinzas da lareira esses aí aguardam teu discurso contidos Vamos o estranho em poltrona pinosdeprata faze sentar após erguêlo e aos arautos ordena que vinho misturem para a Zeus prazernoraio 165 libarmos ele que a respeitáveis suplicantes acompanha e que a governanta dê algo ao estranho para jantar Então quando isso ouviu o sacro ímpeto de Alcínoo tomou Odisseu pela mão o atilado variegadaastúcia ergueuo da lareira e indicoulhe resplendente poltrona 170 após fazer o filho se levantar Domapovo saúdaheróis sentado a seu lado e de quem mais gostava Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa 175 Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente e junto muitos petiscos oferecendo o que havia Ele bebia e comia o muitatenência divino Odisseu Nisso ao arauto falou o ímpeto de Alcínoo Mentenomar mistura na ânfora e distribui o vinho 180 a todos no salão para que a Zeus prazernoraio libemos ele que a respeitáveis suplicantes acompanha Assim falou e Mentenomar misturou vinho adoçajuízo e a todos distribuiu após verter as primícias nos cálices Mas depois de libar e beber quanto quis o ânimo 185 entre eles Alcínoo tomou a palavra e disse Atenção líderes e capitães dos feácios vou falar o que o ânimo me ordena no peito Agora após o banquete vade dormir de volta à casa e pela manhã após mais anciãos convocar 190 entreteremos o estranho no palácio e aos deuses faremos belos sacrifícios e depois também da condução lembraremos para o estranho livre de esforço e pena sob a nossa condução alcançar sua terra pátria rápido com alegria mesmo se é de bem longe 195 Que no percurso não sofra nenhum mal e desgraça antes de desembarcar em sua terra lá então sofrerá o que para ele o destino e as pesadas Fiandeiras com linho fiaram ao nascer quando a mãe o gerou Mas se algum dos imortais chegou do páramo 200 então outra coisa é isso que os deuses engenham Sempre no passado deuses apareciam vívidos para nós ao fazermos esplêndidas hecatombes e partilhavam do banquete sentados conosco E se um de nós viajante mesmo sozinho os topa 205 não se disfarçam pois deles somos próximos como os ciclopes e as tribos selvagens dos gigantes Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Alcínoo outra coisa deve ocupar teu juízo pois não me assemelho a imortais que do largo páramo dispõem 210 nem no porte nem no físico mas a humanos mortais De quem vós sabeis que demais suportaram agonia a esses homens em meus sofrimentos me igualaria Sim e ainda mais desgraças eu poderia enunciar todo o conjunto que devido aos deuses aguentei 215 Mas permitime acabar o jantar mesmo angustiado depois do hediondo estômago nada mais canalha existe e que faz com que seja lembrado à força até por alguém dilacerado no íntimo e aflito Assim também me aflijo no íntimo e ele sem cessar 220 ordename comer e beber e de tudo a mim faz esquecer tudo que sofri e exige que eu o encha Vós apressaivos quando a aurora surgir para me desembarcar desgraçado em minha pátria ainda que muito sofra que a vida se vá eu vendo 225 meus bens escravos e a enorme casa de alto pédireito Assim falou e todos aprovavam e incitavam o rei a conduzir o estranho pois falara com adequação E depois de libar e beber quanto quis o ânimo os outros para se deitar voltaram a suas casas 230 e ele no salão ficou o divino Odisseu e junto dele Arete e o deiforme Alcínoo sentados e criados retiravam os apetrechos do jantar Entre eles Arete alvosbraços iniciou os discursos pois reconhecera manto e túnica ao ver as vestes 235 belas que ela própria tecera com criadas mulheres falando dirigiulhe palavras plumadas Estranho isto primeiro eu mesma te perguntarei quem és tua origem Quem te deu essas vestes Não dizias que após vagar pelo mar aqui chegaste 240 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia É difícil rainha fazer um relato contínuo pois muitas agruras me deram os deuses celestes mas isto eu te direi o que me inqueres e questionas Uma ilha Ogígia longe no mar encontrase 245 Lá a filha de Atlas a ardilosa Calipso mora a belastranças fera deusa ninguém a ela se une nenhum deus nenhum homem mortal Mas a mim desgraçado divindade guiou a seu lar sozinho pois minha nau veloz com raio cintilante 250 Zeus atingiu e despedaçou no meio do mar vinoso Lá pereceram todos os outros nobres companheiros mas eu após abraçar a quilha da nau ambicurva nove dias fui levado no décimo a mim na noite negra deuses achegaram da ilha de Ogígia onde Calipso 255 belastranças mora fera deusa que após me apanhar acolheume gentil me alimentava e dizia que me faria imortal e sem velhice por todos os dias Mas a mim nunca meu ânimo no peito persuadiu Lá fiquei sete anos contínuos e as vestes sempre 260 com lágrima molhava as imortais que me deu Calipso Mas quando chegou em seu curso o oitavo ano então ordenoume que retornasse incitada por anúncio de Zeus ou a ideia dela mudou Envioume sobre balsa muitacorda e deume muito 265 comida e doce vinho vestiume com vestes imortais e fez que a brisa soprasse tranquila e tépida Dezessete dias naveguei cruzando o mar e no décimo oitavo surgiram montes umbrosos da vossa terra e rejubilou meu caro coração 270 o do desventurado eu ainda devia juntarme à agonia muita que sobre mim instigou Posêidon tremesolo Ele impelindo ventos contra mim bloqueou o curso agitou o mar extraordinário e de modo algum a onda permitiume gemendo sem cessar ser levado na balsa 275 A ela depois uma rajada destroçou já eu nadando cortei esse abismo até que da terra vossa vento e água levando achegaramme Lá ao tentar sair onda teria me forçado contra a costa lançandome às grandes rochas num ponto infeliz 280 Mas recuando nadei de volta até chegar a um rio que me pareceu ponto excelente livre de rochas e havia proteção contra o vento Já fora caí e recompus meu fôlego e a noite divina chegou eu tendo saído para longe do rio 285 caído de Zeus adormeci nas moitas e em torno folhas amontoei E um deus vertia sono semfim Lá entre as folhas agastado em meu coração dormi a noite toda durante a aurora e o meio do dia O sol mergulhou e o doce sono deixoume 290 criadas de tua filha na praia percebi brincando entre as quais ela semelhante a deusas A ela supliquei e não deixou de acertar ideia nobre como não esperarias que alguém mais jovem ao toparte fizesse sim os mais jovens são sempre insensatos 295 Ela deume alimento suficiente e fulgente vinho banhoume no rio e deume essas vestes O que te contei apesar de angustiado é a verdade A ele então Alcínoo respondeu e disse Estranho não foi apropriado isso que pensou 300 minha filha pois a ti com criadas mulheres não guiou à nossa casa e tu suplicaste primeiro a ela Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Herói não censures por mim a moça impecável ela de fato ordenou que eu seguisse com as criadas 305 mas fui eu quem não quis com medo da reprovação para teu ânimo não se ressentir com a visão somos rancorosos as tribos de homens sobre a terra A ele então Alcínoo respondeu e disse Estranho meu caro coração no peito não é do tipo 310 a ter raiva à toa tudo que é moderado é melhor Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo que alguém sendo assim como és e pensando como eu tenha a minha filha e eu o chame de meu genro aqui ficando uma casa e riquezas eu te daria 315 se quisesses ficar contra a vontade não te conteria feácio algum isso não seria caro a Zeus pai Eu mesmo marco essa condução quero que saibas para amanhã tu o tempo todo dominado pelo sono dormirás e eles remarão na calmaria até que chegues 320 a tua pátria em casa ao lugar que te é caro ainda que seja bem mais distante que a Eubeia dizem que fica longe ao máximo os que a viram do nosso povo quando ao loiro Radamanto conduziram para que visitasse Titiô filho de Terra 325 Foram até lá e sem fadiga chegaram ao alvo e no mesmo dia retornaram de volta para casa Conhecerás tu mesmo em teu juízo quão excelentes são minhas naus e os moços no jogar água com o remo Isso dito alegrouse o muitatenência divino Odisseu 330 Rezando eis que falou dirigiuselhe e nomeouo Zeus pai tomara que tudo quanto falou complete Alcínoo dele sobre o solo fértil a fama seria inextinguível e eu chegaria à pátria Assim falavam essas coisas entre si 335 e Arete alvosbraços ordenou às criadas que postassem camas sob a colunata belas mantas púrpura lançassem em cima estendessem lençóis e por último pusessem capas de lã para que se cobrisse E elas saíram do salão com tocha nas mãos 340 mas após aprontar a cama compacta afobadas incitaram Odisseu com palavras a achegarse Mexete ao leito estranho a cama está pronta para ti Assim falavam e ficou feliz com a ideia de repousar Assim ele lá dormia o muitatenência divino Odisseu 345 num leito perfurado sob a colunata ressoante e Alcínoo deitouse no interior da alta casa e ao lado a senhora esposa preparou cama e lençóis Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos saiu do leito o sacro ímpeto de Alcínoo e o divinal levantouse Odisseu arrasaurbe A eles conduziu o sacro ímpeto de Alcínoo 5 à ágora dos feácios construída ao lado de seus navios Após chegar sentaramse nas pedras polidas vizinhos e ela percorreu a cidade Palas Atena assemelhada ao arauto do atilado Alcínoo tramando o retorno do enérgico Odisseu 10 e de pé ao lado de cada herói enunciava o discurso Vamos lá líderes e capitães dos feácios ide à ágora para vos informardes do estranho que há pouco chegou à casa do atilado Alcínoo após vagar no mar no porte semelhante a imortais 15 Falou assim e incitou o ímpeto e ânimo de cada um Rápido ágora e assentos encheramse de mortais reunidos muitos então viram e contemplaram o filho atilado de Laerte Sim nele Atena verteu prodigiosa graça na cabeça e nos ombros 20 e fêlo maior e mais encorpado a quem o visse para que se tornasse caro a todos os feácios assombroso e respeitável e cumprisse as provas muitas nas quais os feácios testaram Odisseu Então após estarem reunidos todos juntos 25 entre eles Alcínoo tomou a palavra e disse Atenção líderes e capitães dos feácios vou falar o que o ânimo me ordena no peito Este estranho não sei quem é vagava e me alcançou ou vindo dos homens do levante ou do poente 30 condução tenta apressar e suplica que seja certa Que nós como no passado apressemos sua condução com efeito ninguém que alcança minha casa espera muito tempo aflito por causa de condução Vamos puxemos até o divino mar negra nau 35 virgem e que moços cinquenta e dois escolhamse entre o povo os que soem ser os melhores Após vós todos terdes prendido nos toletes os remos desembarcai então ocupaivos com rápido banquete vindo até nós eu vos receberei a todos bem 40 Aos moços é isso que peço mas os outros vós reis portacetro até minha bela morada ide para que no palácio ao estranho acolhamos que ninguém recuse Fazei chamar o divino cantor Demódoco a ele a divindade sobremodo deu canto 45 para deleitar por onde o ânimo o incita a cantar Após falar assim foi na frente e eles o seguiam os portacetro e o arauto foi atrás do divino cantor E os moços selecionados cinquenta e dois foram como ordenara à orla do mar ruidoso 50 Mas após descerem até a nau e o mar puxaram negra nau ao mar profundo mastro e vela colocaram na negra nau e aprontaram os remos nas correias de couro tudo em ordem e desfraldaram a vela branca 55 Da praia para a água a posicionaram e então rumaram à grande casa do atilado Alcínoo Colunata pátio e casa estavam cheios de varões reunidos sim eram muitos jovens e velhos Para eles Alcínoo fez abater doze ovelhas e cabras 60 oito porcos dentebranco e dois lunados bois esfolaram e prepararamnos para amável banquete E o arauto achegouse conduzindo o leal cantor a quem demais a Musa amou e lhe deu um bem e um mal privouo dos olhos e deulhe doce canto 65 Mentenomar pôslhe poltrona pinosdeprata no meio dos convivas apoiandoa contra enorme pilar em um gancho pendurou a lira aguda aí sobre sua cabeça e indicou como pegar com as mãos o arauto ao lado pôs cesta e bela mesa 70 ao lado taça de vinho para beber quando o ânimo pedisse E os outross esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida a Musa atiçou o cantor a cantar famosos feitos de varões porções do enredo cuja fama então ao largo páramo chegava 75 a disputa entre Odisseu e Aquiles filho de Peleu como então pelejaram no rico banquete dos deuses com palavras assombrosas o rei de varões Agamêmnon alegravase na mente pois os melhores aqueus brigavam Assim de fato anunciaralhe no oráculo Febo Apolo 80 na mui divina Pito quando cruzou o umbral de pedra atrás do oráculo Então rodava o início da desgraça para troianos e dânaos mediante os planos do grande Zeus Isso cantava o cantor muito glorioso e Odisseu pegou o grande manto púrpura com as mãos robustas 85 por sobre a cabeça conchegouo e encobriu a bela face tinha vergonha dos feácios por chorar sob as celhas Quando o divino cantor parava de cantar enxugava as lágrimas puxava o manto da cabeça e tomando o cálice duplaalça libava aos deuses 90 mas quando recomeçava e instigavamno a cantar os nobres feácios pois deleitavamse com as palavras de novo Odisseu encobria a cabeça e lamentavase Todos os outros não notavam que chorava e Alcínoo foi o único que o observou e percebeu 95 sentado perto e ouviu seus profundos gemidos De pronto entre os feácios navegadores falou Atenção líderes e capitães dos feácios já saciamos o ânimo com o banquete compartilhado e a lira essa parceira do banquete abundante 100 agora vamos sair e experimentar as provas todas para que o estranho narre a quem lhe é caro após retornar à casa quanto superamos os outros no boxe na luta nos saltos e com os pés Após falar assim foi na frente e eles o seguiam 105 Em um gancho pendurou a lira aguda tomou a mão de Demódoco e levouo do salão o arauto guiouo pela via que tomaram os outros os melhores feácios para admirar as provas Foram à ágora e a eles juntouse grande multidão 110 miríades e jovens levantaramse muitos e nobres Ergueramse Topodanau Velosnomar Remador Barqueiro Popeiro Pertomar Remeiro Marinheiro Proeiro Velocista Embarquenau e Cercomar filho de Muitanau esse de Carpinteiro 115 e também Amplomar semelhante a Ares destróigente filho de Chumbodanau e o melhor em beleza e porte entre todos os feácios após o impecável Domapovo Levantaramse três filhos do impecável Alcínoo Domapovo Marinho e o excelso Nauglorioso 120 E eles por primeiro puseramse à prova com os pés Sua corrida estendiase a partir da marca todos juntos céleres voaram erguendo poeira do plaino Bem superior no correr foi o impecável Nauglorioso tanto quanto fazem duas mulas no pousio arado 125 tão adiantado alcançou o povo e o resto atrás Outros na luta pungente se puseram à prova nessa então Amplomar superou todos os nobres No salto Cercomar a todos ultrapassou no disco então bem melhor que todos foi Remador 130 e no boxe Domapovo valoroso filho de Alcínoo Após no juízo deleitaremse todos com as provas entre eles falou Domapovo filho de Alcínoo Vamos amigos perguntemos ao estranho se uma prova aprendeu e conhece No físico ao menos não é vil 135 nas coxas panturrilhas ambos os braços em cima robusto pescoço e grande vigor de juventude não carece mas foi alquebrado por muitos males Eu não digo haver outro mal maior que o mar para debilitar um varão ainda que seja bem forte 140 A ele então Amplomar respondeu e disse Domapovo essa palavra falaste com adequação Tu mesmo agora o desafia enunciando um discurso Quando isso ouviu o valoroso filho de Alcínoo foi postarse no centro e a Odisseu dirigiuse 145 Vai lá também tu pai estrangeiro tenta as provas se talvez uma aprendeste pareces conhecer provas Sim nada traz fama maior ao varão ele vivo que o que executa com os pés e suas mãos Vai tenta dispersa agruras para longe do ânimo 150 não mais será postergada a rota mas para ti nau já foi puxada e há companheiros a postos Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Domapovo por que isso me impões melindrandome Agruras há em meu juízo bem mais que provas 155 eu que antes muito sofri e muito aguentei e agora em vossa assembleia precisando retornar estou sentado suplicando ao rei e a todo o povo E a ele Amplomar respondeu e provocouo de frente Sim estranho eu nem te assemelho a herói versado 160 em provas tais como há muitas entre os homens mas a quem amiúde com nau de muitos calços chefe de marinheiros esses que são mercadores fica atento à carga e de olho em mercadorias e no lucro cobiçado não pareces um atleta 165 Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Estranho não falaste bem varão iníquo pareces Certo os deuses não conferem graças a todo varão nem físico nem juízo nem eloquência De fato um na aparência é varão mais débil 170 mas deus coroa suas palavras com formosura outros deleitamse em mirálo e ele fala de forma segura com amável respeito destacase na aglomeração e ao se deslocar na urbe miramno como a um deus Já outro quanto à aparência é semelhante a imortais 175 mas a graça envolvente não coroa suas palavras assim também tua aparência é proeminente e outra nem um deus a faria mas na mente não és sagaz Perturbaste meu ânimo no caro peito falando sem elegância Eu não desconheço provas 180 como tu discursas mas entre os primeiros penso ter estado ao confiar na juventude e em meus braços Agora estou preso a miséria e aflições a muito resisti cruzando guerras de homens e ondas pungentes Mas mesmo após muitos males sofrer à prova me porei 185 insultoso foi o discurso e me incitaste ao falar Falou e com capa e tudo pulou e tomou o disco maior maciço mais pesado e nem um pouco menor que o tipo com o qual os feácios disputaram entre si Após girálo lançouo de sua mão robusta 190 A pedra zuniu e eles se encolheram contra o chão feácios longoremo varões famosos pelas naus com o lanço da pedra Sobrepujou outras marcas veloz correndo de sua mão Atena fixou o limite e no corpo de um varão dirigiuselhe e nomeouo 195 Também um cego estranho distinguiria essa marca com o toque pois misturada não está com o resto a primeira entre todas e tu fica confiante na prova nenhum feácio a alcançará nem lançará mais longe Isso dito jubilou o muitatenência divino Odisseu 200 alegre ao notar companheiro afável na pista E então mais leve entre os feácios falou Essa aí agora alcançai jovens logo outra depois lançarei a tal distância penso eu ou ainda maior A quem quer que coração e ânimo impelir 205 que venha pôrse à prova pois me zangastes demais no boxe na luta ou até com os pés não me oponho qualquer feácio salvo o próprio Domapovo Pois ele me hospeda quem combateria um amigo Insensato claro é aquele varão um nada 210 quem resolve disputar provas com quem o hospeda em cidade estrangeira destituise de tudo Quanto ao resto nenhum rejeito nem menosprezo mas quero conhecêlos e medirme de frente Em tudo não sou ruim em todas as provas dos homens 215 Sei bem manusear o arco todo polido seria o primeiro a flechar um varão na turba de inimigos ainda que vários muitos companheiros estivessem parados próximo a flechar heróis Só Filoctetes superavame com o arco 220 na terra troiana quando nós aqueus disparávamos Quanto aos outros afirmo ser muito melhor que eles tantos mortais quanto hoje sobre a terra comem pão Com os varões de antanho não quererei disputar nem com Héracles nem com Eurito da Oicália 225 esses sim até com imortais disputavam no arco e flecha Assim logo morreu o grande Eurito e não chegou à velhice em seu palácio pois zangado Apolo matouo porque o desafiara a atirar com o arco Lança atiro tão longe quanto nenhum outro a flecha 230 Só temo que com os pés ultrapasseme um feácio pois de modo deveras ultrajante fui subjugado em meio a muitas ondas já que cuidados na nau não eram perenes por isso meus membros frouxos estão Assim falou e eles todos atentos se calavam 235 Somente Alcínoo respondendo lhe disse Estranho como não nos desagrada o que falas mas queres revelar a excelência que te segue encolerizado porque a ti esse varão erguido na pista provocou como mortal algum depreciaria tua excelência 240 todo que soubesse em seu juízo falar com acerto mas agora atenta minha palavra para também a outro herói mencionares quando em teu palácio te banqueteares com tua esposa e teus filhos lembrando a nossa excelência feitos que também a nós 245 Zeus confere sem parar desde o tempo dos pais Não somos impecáveis boxeadores nem lutadores mas com pés corremos rápido e com naus os melhores sempre nos são caros o banquete a lira as danças as vestes para trocar os banhos quentes e os leitos 250 Pois bem feácios que sois os melhores dançarinos folgai para que o estranho diga a quem lhe é caro após retornar à casa quanto superamos os outros na navegação nos pés na dança e no canto Para Demódoco alguém partindo logo a lira aguda 255 traga a que em algum lugar está em nossa casa Assim falou o teomórfico Alcínoo e o arauto saiu para trazer a côncava lira da casa do rei Do povo ergueramse organizadores seletos nove ao todo que tudo bem montavam nas pistas 260 alisaram a arena e aumentaram uma bela pista E o arauto aproximouse levando a lira aguda a Demódoco ele foi ao meio e ao redor moços púberes versados em dança estavam à espera E golpearam a pista divina com os pés Odisseu 265 contemplou o cintilar dos pés e admirouse no ânimo Então aquele dedilhando a lira entoou belo prelúdio acerca do amor entre Ares e Afrodite belagrinalda como na primeira vez uniramse na casa de Hefesto às ocultas presenteou à larga e aviltou cama e lençóis 270 do senhor Hefesto Presto veiolhe um mensageiro Sol que os percebera na união amorosa Hefesto quando ouviu o discurso aflitivo foi à ferraria ruminando males no fundo do juízo pôs sobre o cepo a grande bigorna e forjou laços 275 inquebráveis inafrouxáveis para lá ficarem imóveis Mas após montar zangado o ardil para Ares foi ao quarto onde ficava sua cama querida Em torno dos postes jogou laços abarcando todos os lados e muitos de cima caíam pendendo da vigamestra 280 leves teias de aranha que ninguém poderia ver nem os deuses ditosos montara algo bem ardiloso Mas após estender todo o ardil pela cama simulou ir a Lemnos cidade bemconstruída entre todas de longe sua terra mais cara 285 Cega vigia não mantinha Ares rédeadourada quando viu Hefesto artefamosa ir para longe dirigiuse à casa do bem famoso Hefesto almejando amor com Citereia belagrinalda Ela há pouco do pai muito possante o filho de Crono 290 chegara e sentarase e ele entrou na casa deulhe forte aperto de mão dirigiuselhe e nomeoua Ali querida deitados na cama deleitemonos Hefesto não está mais em casa mas já foi a Lemnos encontrar os cíntios línguaagreste 295 Assim falou e ela alegrouse com a ideia de repousar Subiram no leito e deitaramse em volta os laços artificiosos de Hefesto muitojuízo irromperam e não se podia mexer membro algum nem o erguer Então perceberam que não havia como fugir 300 E achegouse deles o bem famoso duascurvas depois de meiavolta antes de chegar em Lemnos pois Sol permanecia de vigia e avisaralhe E foi a sua casa agastado em seu coração Parado no pórtico zanga selvagem o atingiu 305 deu berro aterrorizante e gritou a todos os deuses Zeus pai e outros ditosos deuses semprevivos vinde cá para verdes feitos risíveis e intoleráveis como a mim zambo a filha de Zeus Afrodite sempre desonra e ama Ares infernal 310 pois ele é belo e tem o pé perfeito mas eu nasci fraco Para mim nenhum outro é responsável exceto os dois pais que não me deveriam ter gerado Mas vide onde os dois fazem amor deitados após subir em meu leito atormentome vendo 315 Não espero que se deitem assim nem por pouco tempo embora bem enamorados logo os dois não quererão estar dormindo Mas o ardil o laço os conterá até que o pai devolva na totalidade as dádivas que pus em suas mãos pela moça caradecadela 320 já que sua filha é bela mas não é pudica Assim falou e deuses reuniramse na casa chãobrônzeo veio Posêidon sustématerra veio o supercorredor Hermes e veio o senhor agedelonge Apolo Deusas mulheres por pudor ficaram todas em casa 325 Pararam no pórtico os deuses oferentes de bens e riso inextinguível irrompeu entre os deuses ditosos ao verem as artes de Hefesto muitojuízo E assim falavam fitando quem estava ao lado Ações vis não excelem o lento alcança o rápido 330 assim como Hefesto mesmo lento agarrou Ares Assim eles disso falavam entre si e a Hermes disse o filho de Zeus o senhor Apolo Hermes filho de Zeus condutor doador de bens eis que gostarias imobilizado por laços poderosos 335 de deitar na cama ao lado da dourada Afrodite A ele respondeu o condutor Argifonte Tomara isso ocorresse senhor Apolo alvejadelonge Que três vezes mais laços invencíveis me detivessem e vós me observásseis deuses e todas as deusas 340 mas eu deitaria junto à dourada Afrodite Assim falou e o riso irrompeu entre os deuses imortais Mas o riso não tomou Posêidon e pedia sem cessar a Hefesto obrasfamosas que Ares libertasse e falando dirigiulhe palavras plumadas 345 Liberteo e eu prometo que ele como ordenas vai te pagar tudo que se deve entre deuses imortais E a ele dirigiuse o bem famoso duascurvas De mim Posêidon sustématerra isso não peças reles é a garantia garantida em nome do reles 350 Como eu te prenderia entre os deuses imortais se Ares partisse após escapar do dever e do laço E a ele de novo dirigiuse Posêidon tremesolo Hefesto se Ares de fato após escapar do dever partir em fuga eu mesmo te pagarei isso 355 E a ele então respondeu o bem famoso duascurvas Não é possível nem convém rejeitar tua palavra Após falar assim o ímpeto de Hefesto soltou o laço E quando os dois foram soltos do laço bem forte presto se foram ele pôsse em direção à Trácia 360 e ela alcançou Chipre Afrodite amasorriso rumo a Pafos onde tinha santuário e altar fragrante Lá as Graças banharamna e untaram com óleo imortal o que cobre os deuses semprevivos e vestiramna com vestes desejáveis assombro à visão 365 Isso o cantor bem famoso cantava e Odisseu deleitavase no espírito ao ouvilo ele e o restante dos feácios longoremo varões famosos pelas naus E Alcínoo pediu que Marinho e Domapovo sozinhos dançassem pois deles ninguém era rival 370 Quando eles a linda bola nas mãos pegaram púrpura que lhes fizera o atilado Polibo essa um lançava em direção às nuvens umbrosas curvado para trás e o outro da terra saltava para o alto e amparavaa fácil antes de atingir o chão com os pés 375 Mas após se porem à prova com a bola direto para cima então os dois dançaram sobre a terra nutremuitos revezando amiúde os outros moços batiam as mãos parados na pista e com isso era grande o barulho Então a Alcínoo falou o divino Odisseu 380 Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos prometeste que os dançarinos são os melhores e assim se verificou reverência me toma ao mirálos Isso dito jubilou o sacro ímpeto de Alcínoo e de imediato falou entre os feácios navegadores 385 Atenção líderes e capitães dos feácios o estrangeiro pareceme deveras inteligente Vamos demolhe um regalo como é adequado Na cidade doze reis muito destacados têm poder como chefes e eu mesmo o décimo terceiro 390 cada um de vós para ele manto bemlavado túnica e uma medida de ouro valioso buscai Que logo tudo reunido tragamos para que com isso nas mãos alegre no ânimo o estranho vá ao jantar Que Amplomar com ele se reconcilie com palavras 395 e um dom pois uma palavra não falou com adequação Assim falou e todos os outros aprovavam e o incitavam e cada um despachou seu arauto para trazer os presentes A ele então Amplomar respondeu e disse Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos 400 portanto me reconciliarei com o estranho como pedes Vou lhe dar esta espada toda de bronze cujo punho é de prata e bainha de marfim recémtrabalhado a envolve para ele será de muita valia Após falar pôs nas mãos a espada pinosdeprata 405 e continuando dirigiulhe palavras plumadas Sê feliz pai estrangeiro se foi falada uma palavra fera que rajadas de vento rápido a agarrem e levem Ver a esposa e a pátria alcançar que deuses isso a ti concedam pois longe dos teus há muito sofres desgraças 410 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Também tu amigo sê bem feliz e os deuses te deem fortuna Que nunca no futuro da espada que deste tenhas saudade pois nos reconciliamos por meio de presente e palavras Falou e em torno dos ombros pôs a espada pinosdeprata 415 O sol mergulhou e gloriosos dons eramlhe trazidos Ilustres arautos os levavam à casa de Alcínoo após recebêlos os filhos do impecável Alcínoo junto à mãe respeitável puseram os belos presentes Aos homens conduziu o sacro ímpeto de Alcínoo 420 e após chegar sentaramse em altas poltronas Então a Arete dirigiuse o ímpeto de Alcínoo Aqui mulher traze bem destacado baú o melhor dentro põe manto bemlavado e túnica tu mesma No fogo esquentai um caldeirão e aqueceilhe água 425 para que banhado e tendo visto todos os bem dispostos dons esses que os impecáveis feácios cá trouxeram com o banquete se deleite ouvindo o canto do aedo E a ele eu ofertarei essa minha bela taça de ouro para que de mim se lembrando todos os dias 430 libe no palácio a Zeus e aos outros deuses Assim falou e Arete entre as servas pediu que pusessem grande trípode no fogo rápido A trípode para o banho puseram sobre o fogo ardente e dentro vertiam água e abaixo queimavam madeira 435 O fogo rodeava o ventre da trípode e a água aquecia ao estrangeiro Arete trazia do quarto muito belo baú e nele punha os magníficos dons vestes e ouro que os feácios lhe deram nele ela mesma colocou um manto e bela túnica 440 e falando dirigiulhe palavras plumadas Vê logo a tampa e célere em cima dá um nó para que ninguém te cause prejuízo na viagem quando dormires doce sono indo na negra nau Ao ouvir isso o muitatenência divino Odisseu 445 logo a tampa encaixou e célere em cima deu um nó variegado que um dia lhe ensinara a senhora Circe De pronto a governanta pediulhe que se banhasse entrando na banheira feliz no ânimo ele viu a água quente já que amiúde não recebia cuidados 450 desde que deixara a morada de Calipso belajuba antes fora cuidado sem cessar como um deus Após as escravas o banharem e untarem com óleo lançaram em torno dele bela capa e túnica e fora da banheira até aos varões bebevinho 455 foi Nausícaa cuja beleza provinha de deuses de pé ao lado de pilar do teto sólida construção admirou Odisseu ao vêlo com os olhos e falando dirigiulhe palavras plumadas Sê feliz estranho e que também um dia na pátria 460 de mim te lembres a primeira a quem deves o resgate Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Nausícaa filha do enérgico Alcínoo que assim agora fixe Zeus ressoante marido de Hera voltar para casa e ver o dia de retorno 465 então a ti também lá rezarei como a um deus sempre todos os dias pois tu me deste a vida moça Falou e foi sentar na poltrona junto ao rei Alcínoo Eles já distribuíam porções e misturavam o vinho E o arauto achegouse conduzindo o leal cantor 470 Demódoco honrado pelo povo eis que o sentou em meio aos convivas apoiandoo contra enorme pilar Então ao arauto dirigiuse Odisseu muitaastúcia após cortar um naco do lombo do qual restou grande parte um porco dentebranco e farta banha havia em torno 475 Arauto vamos dá essa carne para que ele a coma a Demódoco e eu o saudarei embora angustiado para todos os homens sobreaterra os cantores têm porção de honra e respeito pois seus enredos a Musa ensina e ama a raça dos cantores 480 Assim falou e o arauto levandoa pôs nas mãos do herói Demódoco que a aceitou e alegrouse no ânimo E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida então a Demódoco falou Odisseu muitaastúcia 485 Demódoco eu te louvo como a nenhum mortal ou a Musa ensinoute a filha de Zeus ou Apolo cantas com muita elegância a sorte dos aqueus quanto fizeram sofreram e aguentaram os aqueus como se lá tivesses estado ou de outrem escutado 490 Pois bem passa adiante e canta a arte do cavalo o de madeira que Epeu produziu com Atena ardil que à acrópole conduziu o divino Odisseu após enchêlo de varões que Ílion aniquilaram Se a mim essas coisas com adequação contares 495 logo a todos os homens também discursarei que o deus benevolente conferiute inspirado canto Isso dito ele instigado pela deusa começava e exibia o canto tomando o trecho onde eles após em naus bomconvés embarcar singravam tendo lançado fogo nas tendas 500 os argivos e outros já rodeavam o bem famoso Odisseu sentados na ágora dos troianos encobertos no cavalo pois os próprios troianos puxaramno à acrópole Ele estava nessa posição e parolavam muito e sem ordem sentados a sua volta E três intenções lhes agradavam 505 ou trespassar a oca madeira com bronze impiedoso ou lançálo das pedras após empurrálo ao topo ou deixálo grande dom propiciador de deuses E foi assim de fato que depois iria cumprirse o destino era a ruína quando a urbe encobrisse 510 grande cavalo de madeira onde sentados todos os melhores argivos estivessem levando matança e perdição aos troianos Cantava como os filhos dos aqueus saquearam a urbe despejados do cavalo após da oca tocaia sair Cantavaos devastando a íngreme cidade por todo lado 515 e Odisseu rumo à morada de Deífobo indo semelhante a Ares com o excelso Menelau Disse que lá ousou e sofreu o mais terrível combate e então venceu graças à animosa Atena Isso o cantor bem famoso cantava e Odisseu 520 derretiase e lágrimas molhavam sob as pálpebras a face Como a mulher cai sobre o caro marido e o chora o qual na frente de sua cidade e do povo caiu tentando afastar para urbe e filhos o dia impiedoso a ele morrendo e convulsionandose ela vê 525 e o abraça e ulula com agudos Mas aqueles por trás golpeandoa com lanças nas costas e ombros levamna como escrava vida de pena e agonia e com a dor mais lamentável soçobra sua face assim Odisseu sob as celhas vertia lágrimas lamentáveis 530 Ninguém mais notou que derramava lágrimas Alcínoo foi o único que o observou e percebeu sentado perto dele e ouviu seus profundos gemidos Logo falou entre os feácios navegadores Atenção líderes e capitães dos feácios 535 Que Demódoco ponha de lado a lira aguda seu canto não mais alegrando a todos Desde que no jantar ergueuse o divino cantor desde então nunca cessou o agonizante choro o estranho grande tormento envolve seu juízo 540 Ponha de lado e por igual nos deleitaremos todos anfitriões e hóspede pois bem mais belo será assim por causa do hóspede respeitável isto foi arranjado condução e amados dons que amigos lhe damos O hóspede e o suplicante valem como irmão 545 ao varão que alcança discernimento mesmo leve Assim também tu não escondas com ideias ladinas o que te indagar é mais belo que tu fales Dize teu nome como lá te chamavam mãe e pai e os outros que na cidade e nas cercanias habitam 550 Entre os homens ninguém é de todo sem nome nem o vil nem o nobre após de primeiro nascer mas um nome os genitores a todo que geram atribuem Digame tua terra o povo e a cidade para que lá te levem mirando com o juízo as naus 555 De fato não há timoneiros entre os feácios nem lemes existem que outras naus possuem elas conhecem os pensamentos e o juízo dos varões e de todos conhecem as cidades e os campos férteis dos homens e rápido cruzam o abismo do mar 560 encobertas em bruma e nuvens e nunca têm medo de dano sofrer ou de ser destruídas Mas isto um dia eu ouvi dizer meu pai Nauveloz falava que Posêidon se irritaria conosco pois somos seguros condutores de todos 565 Disse que um dia a engenhosa nau de varões feácios voltando da condução sobre o mar embaçado golpearia e com grande morro encobriria nossa urbe Assim falava o ancião e isso o deus pode completar ou deixar incompleto como for caro a seu ânimo 570 Mas vamos dizeme isto e conta com precisão para onde vagaste que regiões de homens atingiste e que habitantes e urbes boas para morar os que são cruéis selvagens e não civilizados e os amigos de hóspedes com mente que teme o deus 575 Fala por que choras e te lamentas dentro no ânimo ao ouvir o destino dos argivos dânaos e de Ílion Isso deuses arranjaram e destinaram a ruína aos homens para que fosse canto aos vindouros Acaso também morreu diante de Troia parente teu 580 nobre um genro ou sogro Eles são os mais próximos após os de sangue os da própria família Ou um varão companheiro sabedor do que apraz nobre De fato não é pior que um irmão quem sendo companheiro sabe o que é inteligente Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos eis algo belo ouvir um aedo deste feitio semelhante a deuses na voz humana 5 Não há eu afirmo feito mais agradável que o gáudio a dominar todo o povo e na casa convivas prestam atenção ao cantor sentados em ordem e ao lado abundam as mesas em pão e carne e vinho tirando da ânfora 10 traz o escanção e entorna nos cálices isso em meu juízo parece ser o mais belo E teu ânimo de minhas tristes agruras inclinase a indagar para ainda mais aflito eu gemer O que então primeiro o quê por último contarei 15 Muitas agruras deramme deuses celestes Agora o nome enunciarei primeiro para vós também o saberdes e eu se escapar do dia impiedoso vosso aliado ser embora longe habitando Sou Odisseu filho de Laerte que por ardis por todos 20 os homens sou conhecido minha fama o páramo atinge Habito a bemavistada Ítaca nela há um monte Nériton folhasfarfalhantes saliente perto muitas ilhas encontramse próximas umas das outras Dulíquion Same e a matosa Zacintos 25 Ela própria baixa jaz no mar e é a última rumo às trevas e as outras separadas à aurora e ao sol bruta mas bela nutremoços Eu de forma alguma consigo ver algo mais doce que a terra da gente Sim lá me detinha Calipso deusa divina 30 na cava gruta almejando que fosse seu esposo igualmente Circe me deteve em seu palácio a ardilosa de Aiaie almejando que fosse seu esposo Mas a mim nunca meu ânimo no peito persuadiu Assim nada mais doce que a terra da gente ou os pais 35 há ainda que alguém em terra estrangeira longe habite gorda propriedade afastado dos pais Vamos que também meu retorno muitaagrura eu narre o que Zeus me enviou quando eu voltava de Troia Levandome de Ílion o vento achegoume dos cícones 40 de Ismaros lá eu saqueei a cidade e os matei Da cidade tendo tomado esposas e muitas posses dividimos para eu ninguém deixar sem sua parte Então pedi que recuássemos com pé ágil e esses grandes tolos não obedeceram 45 Lá bebiam muito vinho junto à costa abatiam muitas ovelhas e lunadas vacas trôpegas Nisso os remanescentes cícones outros cícones chamaram esses que eram seus vizinhos muitos e melhores habitando no interior sabendo com carros 50 combater contra varões e se necessário a pé E vieram em número de folhas e flores na primavera na aurora então veio o sinistro destino de Zeus até nós desventurados para sofrermos muita aflição Postados combateram junto às naus velozes 55 atingindose uns aos outros com brônzeas lanças Durante a manhã enquanto crescia o sacro dia firmes resistimos a eles embora em maior número quando Sol se curvou rumo à hora de soltar os bois então os cícones subjugandoos vergaram os aqueus 60 Seis de cada nau companheiros belasgrevas pereceram o restante escapamos do quinhão da morte De lá navegamos para diante atormentados no coração voltando da morte após perder caros companheiros Mas não quis que as naus ambicurvas seguissem 65 sem três vezes gritarmos o nome dos pobres companheiros eles que pereceram no plaino mortos pelos cícones Zeus juntanuvens instigou vento bravio com tempestade prodigiosa e com nuvens encobriu terra e mar por igual e a noite desceu do céu 70 Elas então foram levadas de lado e suas velas a força do vento rasgou em três quatro pedaços Recolhemos às naus os trapos apavorados e remamos com avidez rumo à costa Lá por duas noites e dois dias sempre sem parar 75 ficamos consumindo o ânimo em fadiga e aflições Mas quando trouxe o terceiro dia Aurora belastranças após erguer os mastros e içar as brancas velas sentamos e vento e timoneiros as dirigiam E agora ileso teria chegado à terra pátria 80 mas ao tentar dobrar o cabo Maleia ondas corrente e Bóreas desviaramme e vaguei para longe de Citera De lá nove dias fui levado por ventos ruinosos sobre o mar piscoso mas no décimo desembarcamos na terra dos lotófagos que comem alimento floral 85 Lá fomos para terra firme e tiramos a água e os companheiros logo jantaram junto às naus velozes Mas depois de consumirmos comida e bebida então pedi a companheiros que fossem pesquisar quem seriam os varões que sobre a terra comem pão 90 após dois escolher e um terceiro arauto enviar com eles Eles logo após partir juntaramse a varões lotófagos Pois os lotófagos não armaram o fim dos companheiros nossos mas deramlhes lótus como alimento Todo aquele que comesse o fruto meloso do lótus 95 não desejava servir de mensageiro nem retornar mas preferia lá mesmo com os varões lotófagos comendo lótus permanecer e esquecer o retorno A eles que choravam conduzi às naus à força e nas cavas naus empurrandoos sob os bancos prendi 100 e aos outros ordenei leais companheiros que sem demora embarcassem nas rápidas naus para ninguém do lótus comer e do retorno esquecer Eles logo embarcaram e sentaram junto aos calços e alinhados golpeavam o mar cinzento com remos 105 De lá navegamos para diante atormentados no coração E à terra dos ciclopes soberbos desregrados chegamos eles que confiantes nos deuses imortais não plantam árvores com as mãos nem aram mas sem semear nem arar isso tudo germina 110 trigo cevada e videiras que produzem vinho de grandes uvas que a chuva de Zeus lhes fomenta Eles não têm assembleias decisórias nem normas mas habitam os cumes de montes elevados em cavas grutas e cada um impõe normas 115 sobre filhos e mulheres e não cuidam uns dos outros E pequena ilha lá se espraia à margem do porto nem perto nem longe da terra dos ciclopes matosa nela há cabras inumeráveis selvagens movimento de homens não as afasta 120 nem caçadores a frequentam os que no mato sofrem agonias percorrendo os picos dos montes Eis que não é coberta por rebanhos nem lavouras mas ela sem que se semeie e are todos os dias está privada de homens mas nutre cabras que balem 125 Pois não há junto aos ciclopes naus facevermelha nem varões construtores de naus lá há que fariam naus bomconvés capazes de tudo realizar indo às cidades dos homens tantas vezes quanto os varões uns até os outros com naus cruzam o mar 130 para eles também a ilha tornariam habitável De modo algum é ruim e tudo produziria na estação Nela há prados junto à costa do mar cinzento úmidos macios inesgotáveis seriam as videiras Nela há campos planos densas espigas de trigo sempre 135 colheriam na estação visto o muito chorume no solo Há porto seguro onde de cabos não se precisa nem lançar âncoras nem prender amarras mas tendo aportado ficar o tempo até o ânimo dos nautas os instigar e as brisas soprarem 140 E na cabeça do porto flui água radiante fonte de uma caverna em torno álamos cresceram Para lá navegávamos e um deus nos guiava pela noite sombria e nada se revelava à visão a bruma em torno era densa e nem a lua 145 do céu se mostrava encoberta por nuvens Com isso ninguém fitava a ilha com os olhos e nem grandes ondas rolando rumo à praia vimos antes de as naus bomconvés aportarem Estando as naus atracadas recolhemos todas as velas 150 e na rebentação do mar desembarcamos lá adormecemos e aguardamos a divina Aurora Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos admirados com a ilha por ela perambulamos Ninfas filhas de Zeus portaégide impeliam 155 cabras montesas para o almoço dos companheiros Rápido arcos curvos e dardos com longo soquete pegamos das naus e arranjados em grupos de três atiramos e deus logo nos deu bichos arrebatadores Doze naus me seguiam e a cada uma 160 nove cabras couberam só para mim foram dez Então assim o dia inteiro até o pôr do sol ficamos compartilhando carne semfim e doce vinho pois não se consumira o vinho tinto das naus mas sobrava muito cada um em ânforas duplaalça 165 havia posto após tomarmos a sacra urbe do cícones A terra dos ciclopes que perto viviam observávamos sua fumaça e o som de ovelhas e cabras Quando o sol mergulhou e vieram as trevas então repousamos na rebentação do mar 170 Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então eu realizando assembleia disse entre eles Os outros vós aqui ficai meus leais companheiros mas eu com minha nau e meus companheiros vou verificar esses homens de que tipo eles são 175 se desmedidos selvagens e não civilizados ou hospitaleiros com mente que teme o deus Dito isso embarquei e pedi aos companheiros que também embarcassem e os cabos soltassem Logo embarcaram e sentaramse junto aos calços 180 e alinhados golpeavam o mar cinzento com remos Mas ao chegarmos a esse lugar que perto ficava lá vimos no extremo uma caverna junto ao mar alta à sombra de loureiros Lá grande rebanho ovelhas e cabras pernoitava em torno cerca 185 alta se construíra com blocos de uma pedreira com grandes pinheiros e carvalhos altacopa Lá pernoitava um varão portentoso ele que o rebanho sozinho apascentava afastado aos outros não visitava mas longe vivendo normas ignorava 190 De fato era um assombro portentoso não parecia um varão comepão mas um pico matoso dos altos montes que surge só longe dos outros Então aos demais leais companheiros pedi que lá junto à nau ficassem e guardassem a nau 195 mas eu após escolher doze nobres companheiros fui Levava um odre de cabra com vinho escuro doce que me dera Máron filho de Euantes sacerdote de Apolo que zela por Ismaros porque junto com filho e esposa nós o protegemos 200 venerandoo pois habitava bosque arvorejado de Febo Apolo Deume presentes radiantes de ouro bem trabalhado sete pesos me deu me deu ânfora toda de prata e depois vinho em doze ânforas duplaalça ao todo verteu 205 doce puro bebida divina A esse ninguém conhecia nem escravo nem criado em sua casa só ele próprio a cara esposa e uma só governanta Quando alguém bebesse esse vinho tinto doce como mel enchia um cálice e doze medidas de água 210 vertia um doce aroma da ânfora emanava prodigioso então impossível seria absterse Eu trazia um grande odre cheio dele e também acepipes no alforje logo meu ânimo orgulhoso pensou que encontraria varão vestido com grande bravura 215 selvagem não conhecendo bem tradições nem normas Céleres nos dirigimos ao antro e dentro não o achamos mas apascentava no pasto gordos rebanhos Após chegar ao antro a tudo contemplamos cestos abarrotados de queijo cercados repletos 220 de ovelhas e cabritos separados por categorias encerrados à parte os mais velhos à parte medianos à parte filhotes Todas as vasilhas transbordavam de soro e baldes e tigelas fabricadas com as quais ordenhava Lá os companheiros suplicaramme para primeiro 225 pegar algum queijo e voltar e depois ligeiro até a nau veloz cabritos e ovelhas dos cercados arrastar e navegar pela água salgada mas não obedeci e teria sido muito mais vantajoso para poder vêlo esperando que me desse regalos 230 Pois após surgir não seria amável com os companheiros Tendo lá aceso o fogo sacrificamos e também nós comemos parte do queijo e dentro o esperamos sentados até voltar com ovelhas trazia ponderoso peso de madeira seca que seria usado para seu jantar 235 Lançandoo fora do antro produziu um estrondo nós com medo recuamos até o fundo do antro Ele à ampla gruta tocou o gordo rebanho tantas quantas ordenhava e os machos deixou fora carneiros e bodes no exterior atrás da alta cerca 240 Então ergueu e pôs na entrada grande rocha ponderosa a ela nem vinte e dois carros ótimos de quatro rodas solevariam do solo tal rochedo alcantilado colocou na entrada Sentado ordenhava ovelhas e cabras balentes 245 tudo com adequação e pôs um filhote sob cada uma Logo metade do branco leite separou para coalhar e pôs os coalhos após juntálos em cestos trançados metade lá colocou em barris para que estivesse disponível para ele beber em seu jantar 250 Mas após ocuparse de suas tarefas com zelo então ao acender o fogo viunos e perguntou Estranhos quem sois Donde navegastes por fluentes vias Acaso devido a um assunto ou levianos vagais tal qual piratas ao mar Esses vagam 255 arriscando suas vidas levando dano a gentes alheias Assim falou e nosso coração rachouse atemorizados com a voz pesada e o portento em si Mesmo assim com palavras respondendo disselhe Nós aqueus vindos de Troia vagamos longe do curso 260 devido a todos os ventos pelo grande abismo de mar e ansiando ir para casa por outra rota outros percursos viemos assim talvez Zeus quis armar um plano Tropa de Agamêmnon filho de Atreu proclamamos ser desse cuja fama é agora a maior sob o páramo 265 devastou grande cidade e tropas dilacerou muitas Nós porém chegando a esses teus joelhos nos dirigimos esperando nos hospedares bem ou mesmo dares um regalo o que é costume entre hóspedes Mas respeita os deuses poderoso somos teus suplicantes 270 Zeus é o vingador de suplicantes e hóspedes o doshóspedes que respeitáveis hóspedes acompanha Assim falei e logo respondeu com impiedoso ânimo És tolo estrangeiro ou vieste de longe tu que me pedes aos deuses temer ou evitar 275 Os ciclopes não se preocupam com Zeus portaégide nem com deuses ditosos pois somos bem mais poderosos nem eu para evitar a braveza de Zeus a ti pouparia ou a teus companheiros se o ânimo não me pedisse Mas dizeme onde aportaste a nau engenhosa 280 algures no extremo ou perto preciso saber Assim falou testandome e eu bem arguto percebi respondendo disselhe com palavras ardilosas Minha nau sucumbiu a Posêidon tremesolo contra rochedo lançoua nos limites de vossa terra 285 levandoa rumo ao cabo vento trouxea do mar Mas eu com esses aí escapei do abrupto fim Assim falei e não me respondeu com impiedoso ânimo mas de súbito sobre os companheiros estendeu as mãos e tendo dois agarrado como cachorrinhos ao chão 290 arrojouos miolos escorriam no chão e molhavam o solo Após cortálos em pedaços aprontou o jantar comiaos como leão da montanha e nada deixou vísceras carnes e ossos cheios de tutano Nós aos prantos erguemos os braços a Zeus 295 vendo o feito terrível e a impotência deteve o ânimo Mas quando o ciclope encheu o grande estômago após comer carne humana e depois beber leite puro deitouse no antro esticandose entre o rebanho Considerei no enérgico ânimo dele chegar 300 mais perto puxar a espada afiada da coxa e golpear no peito onde o diafragma segura o fígado após alcançar com a mão mas outro ânimo impediu Lá mesmo também nós nos finaríamos em abrupto fim da alta entrada não teríamos conseguido no braço 305 afastar a ponderosa pedra que lá depositara Assim gemendo aguardamos a divina Aurora Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos ele acendeu o fogo e ordenhou esplêndido rebanho tudo com adequação e sob cada fêmea deixou o filhote 310 Mas após ocuparse de suas tarefas com zelo de novo ele agarrou dois de nós e o almoço preparou Almoçou e para fora do antro tocou o gordo rebanho tendo removido fácil a grande rocha mas então de volta a pôs como se tampa pusesse na aljava 315 Com forte assobio ao monte levou o gordo rebanho o ciclope mas eu permaneci ruminando males esperando me vingar e Atena me dar o triunfo Este em meu ânimo mostrouse o plano melhor jazia junto ao cercado grande vara do ciclope 320 verde de oliveira podara a vara a fim de levála quando secasse Observando nós a julgamos grande tal mastro de negra nau vinteremos amplo navio mercante que cruza o grande abismo tal seu tamanho tal a espessura a quem a visse 325 Postado dela cortei um pau de uma braça passeio aos companheiros e pedi que o raspassem Eles deixaramno liso e eu afiei posicionado a ponta e logo o tomei e no fogo chamejante girei Condicioneio bem escondendoo sob o esterco 330 que grassava pela caverna em abundância Aos outros pedilhes que tirassem na sorte quem ousaria comigo após erguer a estaca friccionar seus olhos quando doce sono o alcançasse Foram destinados quem eu mesmo teria escolhido 335 quatro e eu mesmo o quinto entre eles me incluí E à noite voltou apascentando o rebanho belapelagem Logo à ampla gruta tocou o gordo rebanho todo ele besta alguma deixou dentro da alta cerca ou pensando algo ou como um deus ordenara 340 Então ergueu e pôs na entrada a grande rocha sentado ordenhava ovelhas e cabras balentes tudo com adequação e pôs um filhote sob cada uma Mas após ocuparse de suas tarefas com zelo de novo ele agarrou dois de nós e preparou o jantar 345 Então dirigime ao ciclope parado perto com uma cumbuca com vinho escuro nas mãos Ciclope aqui bebe vinho após comer carne humana para saberes que vinho é esse que continha a nossa nau era libação para ti caso a mim apiedandose 350 à casa conduzisses mas tua loucura é insuportável Implacável Como no futuro te alcançará algum outro dos muitos homens Pois com adequação não agiste Falei ele aceitou e tudo bebeu deleitouse ao extremo ao beber a doce bebida e pediume de novo a segunda vez 355 Sê gentil e dáme mais um e digame teu nome de pronto para eu te dar um regalo que te agradará De fato também aos ciclopes o solo fértil produz vinho de grandes uvas que a chuva de Zeus lhes fomenta Mas este é destilado da ambrosia e do néctar 360 Assim falou e eu de novo passeilhe fulgente vinho três vezes dei três vezes tudo bebeu com insensatez Mas quando o vinho circundou o juízo do ciclope então a ele me dirigi com palavras amáveis Ciclope perguntas meu nome famoso a ti eu 365 direi e tu dáme um regalo como prometeste Ninguém é meu nome Ninguém denominamme a mãe o pai e todos os outros companheiros Isso falei e ele logo respondeume com ânimo impiedoso Ninguém comerei por último dentre seus companheiros 370 os outros antes esse será teu regalo Falou e após reclinarse caiu de costas e então deitouse o encorpado pescoço de lado e dele o sono dominatudo apossouse a garganta regurgitava vinho e nacos de carne humana sob o peso do vinho vomitava 375 Então empurrei a estaca embaixo do monte de cinzas para esquentála com palavras a todos os companheiros encorajava para ninguém recuar de medo Mas quando a estaca de oliveira embora verde no fogo quase ia queimar e refulgia às maravilhas 380 então rápido retireia e em torno companheiros postaramse a divindade neles soprou grande coragem Eles após pegar a estaca de oliveira afiada na ponta empurraramna no olho e eu erguido sobre ela giravaa como um varão fura a madeira do navio 385 com furador e quem está abaixo o gira com correia tocandoo de cada lado e ele corre sempre sem parar assim da estaca pontaembrasa tomamos em seu olho a girávamos e sangue fluía em torno dela quente O calor chamuscou em volta toda sua pálpebra e a celha 390 e a pupila queimava suas raízes crepitavam com o fogo Como quando o ferreiro mergulha na água fria grande machado ou enxó ao querer enrijálos e alto eles sibilam este de novo é o vigor do aço assim chiava seu olho em torno da estaca de oliveira 395 e aterrorizante alto bradou e em torno a rocha rugia Nós com medo recuamos Mas ele a estaca puxou do olho salpicada de muito sangue Depois lançoua para longe com as mãos fora de si e alto chamava os ciclopes que nas cercanias 400 moravam em cavernas entre os picos ventosos Tendo ouvido o grito cada um acorria de um lado e de pé em torno da gruta indagavam o que o afligia O quê Polifemo tanto te perturba para assim gritares através da noite imortal e tirarnos do sono 405 Por certo ninguém quer teus rebanhos contra tua vontade Por certo ninguém tenta matarte com ardil ou violência A eles então do antro falou o poderoso Polifemo Amigos Ninguém tenta com ardil e não com violência Eles em resposta falavam as palavras plumadas 410 Se então ninguém a ti que estás sozinho violenta de modo algum é possível evitar a doença de Zeus mas tu faze uma prece ao pai o senhor Posêidon Assim falaram afastandose e meu coração sorriu pois meu nome enganouos e a impecável astúcia 415 E o ciclope gemendo e contorcendose em dores apalpandoa com as mãos afastou a pedra da entrada e ele na entrada sentouse após estender os braços esperando pegar um de nós entre as ovelhas que saíam Assim esperava em seu juízo que eu fosse tolo 420 E eu refletia como se daria a melhor solução se descobriria soltura da morte para mim e os demais companheiros todos os ardis um plano eu tramava lutando pela vida pois perto grande perigo havia Este em meu ânimo mostrouse o plano melhor 425 havia carneiros machos bemnutridos de espesso velo belos e grandes carregados de roxa lã eles quieto juntos eu prendia com vime bemtrançado sobre o qual dormia o portento ciclope que ignorava regras e tomava três a três o do meio levava um homem 430 os outros iam de cada lado salvando os companheiros Três carneiros levavam cada herói quanto a mim pois macho havia de longe o melhor de todo o rebanho agarreilhe as costas sob o ventre felpudo enroleime e me estendi com as mãos no prodigioso velo 435 enroscado sem cessar segureime com ânimo resistente Assim gemendo aguardamos a divina Aurora Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então ao pasto disparavam carneiros e bodes e as fêmeas baliam nos cercados não ordenhadas 440 os úberes a explodir O senhor torturado por dor sinistra apalpava o dorso de toda ovelha cada uma de pé isto ele tolo não percebeu que os homens se agarravam ao peito das ovelhas lanosas Último do rebanho o carneiro passava pela entrada 445 repleto de lã e de mim com pensamentos cerrados Após tateálo disselhe o forte Polifemo Carneirinho por que me vais assim pela gruta do rebanho o último Não costumas marchar atrás de ovelhas mas o primeiro entre todos pastas as tenras flores do pasto 450 a passos largos o primeiro a chegar às correntes dos rios o primeiro que almeja retornar ao curral à noite agora o derradeiro Por certo tu do senhor tens saudade do olho A ele cegou um homem vil com desprezíveis companheiros após subjugar o juízo com vinho 455 Ninguém que afirmo ainda não ter escapado do fim Se pudesses pensar como eu e ter linguagem para falar aonde aquele se esquiva de meu ímpeto então seus miolos pela caverna para lá e para cá ele golpeado se espalhariam no solo e meu coração 460 se aliviaria dos males que me deu esse nada Ninguém Falou assim e deixou o carneiro partir pela entrada Afastados um pouco da gruta e da cerca primeiro do carneiro me soltei e soltei os companheiros Ligeiro os carneiros e bodes péfino fartos em gordura 465 amiúde olhando em volta guiamos até à nau chegar nossos companheiros ficaram felizes conosco que escapamos da morte aos outros deploravam gemendo Mas não permiti com as celhas negava a cada um que chorassem e ordenei que rápido o rebanho belapelagem 470 se lançasse na nau e se navegasse pela salsa água Logo embarcaram sentaramse junto aos calços e alinhados golpeavam com remos o mar cinzento Mas quando estava à distância de um grito eu então me dirigi ao ciclope com provocações 475 Ciclope não seria de homem covarde que irias comer companheiros na cava gruta com violência brutal Por certo te atingiriam as ações sinistras implacável sem escrúpulos em comer hóspedes em tua casa por isso puniramte Zeus e outros deuses 480 Assim falei e ele enraiveceuse muito no coração lançou após rebentálo o pico de grande monte que tombou bem na frente da nau proacobalto por pouco e falhou em atingir a ponta do leme E o mar agitouse por causa da rocha que caiu 485 A nau para terra firme levava a onda em refluxo um vagalhão do altomar e fêla dirigirse à costa Mas eu com as mãos tendo pegado haste bem longa alavanquei a nau aos companheiros pedi incitandoos que tocassem os remos para escaparmos do dano 490 sinalizando com a cabeça peito para frente remaram Mas após percorrer no mar distância duas vezes maior então quis chamar o ciclope em volta com fala amável companheiros tentavam conterme de todos os lados Implacável Por que queres provocar o varão selvagem 495 Agora mesmo projetou projétil ao mar e levou a nau de novo à costa e já pensávamos lá perecer Se ele ouvir o som ou a fala de alguém despedaçará nossas cabeças e as tábuas da nau ao projetar rochedo pontudo tão longe arremessa 500 Assim falaram mas sem convencer meu ânimo enérgico e respondendo disselhe com ânimo rancoroso Ciclope se a ti algum homem mortal interpelar sobre o ultrajante cegamento do olho afirma que Odisseu arrasaurbe te cegou 505 o filho de Laerte que tem sua casa em Ítaca Assim falei e ele bramou e respondeume com o discurso Incrível de fato alcançoume velho dito divino Havia aqui um adivinho varão belo e grande Telemo filho de Eurimo que superior na adivinhação 510 envelheceu adivinhando para os ciclopes afirmoume que tudo isso se completaria no futuro que nas mãos de Odisseu eu perderia a visão Mas sempre esperei que um herói grande e belo aqui chegasse investido de grande bravura 515 agora a mim um pequeno um nada um fracote o olho cegou após me subjugar com vinho Mas te achega Odisseu para serte hospitaleiro e instigar o famoso tremeterra a te dar condução pois dele eu sou filho e meu pai ele proclama ser 520 Ele mesmo se quiser me curará e nenhum outro dos deuses ditosos e dos homens mortais Assim falou e eu respondendo lhe disse Tomara fosse capaz de a ti de vida e vitalidade privado enviar à morada de Hades para baixo 525 assim como o olho não te curará o tremesolo Assim falei e ele então ao senhor Posêidon rezou estendendo os braços ao páramo estrelado Ouveme Posêidon sustématerra jubacobalto Se deveras sou teu e meu pai proclamas ser 530 dáme que Odisseu arrasaurbe à casa não volte o filho de Laerte que tem sua casa em Ítaca Mas se é seu quinhão ver os seus e alcançar a casa bemconstruída e a sua terra pátria chegue tarde mal após perder todo companheiro 535 e em nau alheia e encontre desgraças em casa Assim falou rezando e ouviuo o jubacobalto E ele de novo rocha muito maior tendo erguido giroua e lançou e aplicou força incomensurável E tombou atrás da nau proacobalto 540 por pouco e falhou em atingir a ponta do leme E o mar agitouse por causa da rocha que caiu Onda a nau levou para frente e fêla atingir terra firme Mas quando atingimos a ilha onde as outras naus bomconvés estavam e ao redor companheiros 545 persistiam em lamentarse sempre a nos aguardar dirigimonos para lá a nau atracamos na praia e desembarcamos na rebentação do mar Tiradas da côncava nau as bestas do ciclope dividimolas para que a ninguém faltasse sua parte 550 O carneiro só para mim os companheiros belasgrevas deram honraria na divisão do rebanho A ele na praia a Zeus nuvemnegra filho de Crono que rege todos imolei e suas coxas queimei Mas ele desprezou o sacrifício e cogitava como soçobrariam todas 555 as naus bomconvés e meus leais companheiros Então assim o dia inteiro até o pôr do sol ficamos compartilhando carne semfim e doce vinho e quando o sol mergulhou e vieram as trevas repousamos na rebentação do mar 560 Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos eu mesmo pedi aos companheiros incitandoos que embarcassem e soltassem os cabos Logo embarcaram e sentaramse junto aos calços e alinhados golpeavam o mar cinzento com remos 565 De lá navegamos para diante atormentados no coração voltando da morte após perder caros companheiros E à ilha de Eolo chegamos Lá morava o filho de Cavaleiro Eolo caro aos deuses imortais na ilha flutuante em volta de toda ela muralha brônzea inquebrável se ergue como rocha lisa 5 Dele também vivem doze rebentos no palácio seis filhas e seis filhos em plena juventude Lá ele as filhas deu aos filhos como esposas eles sempre junto ao caro pai e à devotada mãe banqueteavamse Havia comida em profusão 10 e a casa cheirosa reverberava no pátio de dia e à noite junto às esposas respeitadas dormem com cobertas nos leitos bemperfurados E chegamos a sua cidade e à bela morada Mês inteiro hospedoume e perguntava de tudo 15 de Ílion das argivas naus e do retorno dos aqueus e eu tudo a ele ponto por ponto contei Mas quando também eu pedi a viagem e roguei ser conduzido não negou e preparou a condução Deume saco de couro que tirara de boi noveanos 20 onde prendeu as rotas dos ventos uivantes pois o filho de Crono fêlo supervisor de ventos que interrompesse ou instigasse qual quisesse Na cava nau amarrouo com corda fulgurante prateada para impedir o menor escoamento 25 mas para mim fez soprar a lufada de Zéfiro para levar as naus e a nós mesmos Mas não iria completarse nossa própria insensatez nos destruiu Nove dias navegamos sem parar noite e dia e no décimo já aparecia o solo pátrio 30 e até víamos homens perto mantendo o fogo Lá doce sono se achegou de mim exausto sempre controlei o pé da nau e a nenhum outro companheiro a dera para logo chegarmos à terra pátria E os companheiros com palavras falavam entre si 35 e disseram que eu levava ouro e prata para casa presentes do enérgico Eolo filho de Cavaleiro E assim falavam fitando quem estava ao lado Incrível como ele é caro e honrado entre todos os homens cuja cidade e terra alcança 40 Muita coisa traz de Troia belas posses do butim mas nós após completar rota igual para casa voltaremos com as mãos vazias Agora deulhe isso agradandoo por amizade Eolo Vamos rápido olhemos o que é isso 45 quanto ouro e prata há dentro do saco Isso falaram e venceu o plano vil dos companheiros Soltaram o saco e todos os ventos jorraram uma rajada logo os apanhou e levou para o altomar choravam para longe da terra pátria Já eu 50 após despertar no ânimo impecável cogitei ou morreria no mar para fora da nau me atirando ou quieto resistiria e ainda entre os vivos ficaria Mas resisti e aguentei e encoberto na nau jazia e as naus foram levadas por rajadas ruins de vento 55 de novo à ilha de Eolo e gemiam os companheiros Lá fomos para terra firme e tiramos a água e os companheiros logo jantaram junto às naus velozes Mas depois de consumirmos comida e bebida então eu junto com um arauto e um companheiro 60 fui à gloriosa morada de Eolo encontreio banqueteandose com a mulher e os filhos Entrando na casa rente ao batente na soleira sentamos e eles pasmaramse no ânimo e indagaram Como vieste Odisseu Que divindade ruim te atacou 65 Por certo te enviamos gentis para chegares a tua pátria em casa ao lugar que te é caro Assim falaram e eu lhes disse angustiado no coração Injuriaramme maus companheiros e além deles o sono terrível Mas ajudai amigos pois tendes esse poder 70 Assim falei abordandoos com palavras macias mas se calavam e o pai respondeu com o discurso Sai da ilha bem rápido mais desprezível dos mortais não é de praxe eu enviar de volta ou nortear o varão que hostilizam os deuses ditosos 75 Sai já que hostilizado pelos deuses assim chegaste Dito isso com gemidos profundos saí expulso da casa De lá navegamos para diante angustiados no coração Remada pungente oprimia o ânimo dos varões pois por nosso desatino não havia mais condução 80 Seis dias navegamos sem parar de noite e de dia no sétimo chegamos à escarpada cidade de Lamos a lestrigônia Telépilos onde pastor a pastor chama trazendo o rebanho e o outro levando responde Lá o varão insone conquistaria dupla paga 85 uma apascentando bois outra vigiando brancas ovelhas próximos são os caminhos da noite e do dia Lá fomos ao porto glorioso que circunda rochedo alcantilado por toda a extensão de ambos os lados e cabos salientes um defronte ao outro 90 na boca projetamse e a entrada é estreita lá dentro eles aportaram todos as naus ambicurvas Eis que elas dentro do cavo porto foram presas lado a lado de fato nele nunca crescia uma onda grande ou pequena e havia luzidia calmaria 95 Somente eu contive fora a negra nau aí mesmo no extremo e com cabos prendi à rocha Pusme de pé após subir à escarpada atalaia lá não havia campos arados por bois ou varões vimos somente fumaça irrompendo da terra 100 Então ordenei que companheiros investigassem quem seriam os varões que sobre a terra comem pão dois escolhi e um terceiro arauto enviei com eles Desembarcaram e foram à urbe por via plana de onde carros dos altos montes desciam com madeira 105 Uma moça encontraram diante da urbe pegando água a filha altiva do lestrigão Antífates Ela descera até a fonte a belascorrentes Artácia de lá até a urbe carregavam água Eles de pé ao lado interpelavamna e inquiriam 110 quem era o rei deles e sobre quem regia De pronto ela indicou a grandiosa casa do pai Eles após chegarem à gloriosa casa a esposa acharam alta como o pico de um monte e a abominaram Ela logo fez chamar da ágora o glorioso Antífates 115 seu marido que contra eles armou funesto fim Presto agarrou um companheiro e preparou a refeição os outros dois fugindo em disparada chegaram às naus E aquele lançou um grito pela urbe tendo ouvido acorriam os altivos lestrigões cada um de um lado 120 miríades não assemelhados a varões mas a gigantes Dos rochedos lançavam penedos pesados demais para varões logo nefasto estrondo as naus percorreu de homens destruídos e naus destroçadas tal peixes trespassados acabaram em detestável jantar 125 Enquanto eles os destruíam no porto mui profundo eu após puxar da coxa a afiada espada com ela cortei os cabos da nau proacobalto logo pedi a meus companheiros incitandoos que tocassem os remos para escaparmos do dano 130 eles todos se apressaram pois temeram o fim Com satisfação mar adentro escapou das rochas salientes minha nau as outras em conjunto lá ficaram destruídas Então navegamos para diante atormentados no coração voltando da morte após perder caros companheiros 135 E chegamos à ilha de Aiaie onde morava Circe belastranças fera deusa com voz humana irmã de sangue do sinistro Aietes ambos nasceram de Sol iluminamortal tendo por mãe Persa que Oceano gerou como filha 140 Na praia aportamos a nau em silêncio em porto abriganau e um deus nos guiava Lá desembarcamos dois dias e duas noites jazemos fadiga e aflições consumindo nosso ânimo Mas quando trouxe o terceiro dia Aurora belastranças 145 peguei minha lança e a afiada espada e rápido para longe da nau subi a um mirante esperando ver lavouras de homens e ouvir uma voz Pusme de pé após subir à escarpada atalaia e fumaça surgiume da terra largasrotas 150 no palácio de Circe através do capão cerrado e do mato Meditei então no juízo e no coração se investigaria após ver a fumaça fulgente E pareceume ao refletir ser mais vantajoso assim primeiro ir à nau veloz na orla do oceano 155 alimentar os companheiros e fazêlos investigar Mas quando estava perto da nau ambicurva comigo sozinho um deus comoveuse e à trilha um grande cervo galhudo enviou para mim Esse ao rio rumava vindo do pasto no bosque 160 para beber pois o ímpeto do sol já o atormentava Enquanto ele descia na espinha no meio das costas eu o atingi a lança brônzea certeira atravessoua Ele tombou no pó berrando e seu ânimo voou para longe Com o pé sobre ele a lança brônzea do ferimento 165 arranquei Após depôla aí mesmo no chão deixeia de lado apanhei galhos e vime e com corda de uma braça bemtrançada nos dois lados tendo torcido prendi os pés do assombroso prodígio e me dirigi à negra nau levandoo nas costas 170 apoiado na lança pois impossível sobre o ombro levar com um braço bastante grande era o animal Jogueio diante da nau e despertei os companheiros com fala amável achegandome a cada homem Amigos por certo não desceremos embora angustiados 175 à morada de Hades antes que chegue o dia fatal Vamos enquanto na nau veloz houver comida e bebida lembremonos de comer e não nos esgotemos de fome Assim falei e presto obedeceram a minhas palavras Eles se descobriram junto à praia do mar ruidoso 180 e contemplaram o cervo muito grande era o animal Mas após se deleitar em mirar com os olhos lavaram as mãos e prepararam bem majestoso jantar Então assim o dia inteiro até o pôr do sol ficamos compartilhando carne semfim e doce vinho 185 e quando o sol mergulhou e vieram as trevas repousamos na rebentação do mar Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então eu realizando assembleia disse entre eles Ouvi meu discurso companheiros mesmo sofrendo 190 Amigos não sabemos onde é a treva onde a aurora nem onde o Sol iluminamortal vai sob a terra nem onde sobe Mas planejemos ligeiro se ainda haverá uma ideia eu não creio que haja De fato após subir à escarpada atalaia observei 195 a ilha que o mar infindo circunda como coroa A própria se estende rasa fumaça no meio dela vi com meus olhos através de capão cerrado e mato Assim falei e o coração rachouselhes ao lembraremse dos feitos do lestrigão Antífates 200 e da violência do ciclope o enérgico devoragente Choravam alto vertendo copiosas lágrimas mas em vão de nada adiantou prantearem Em dois grupos todos os companheiros belasgrevas dividi e atribuí um líder a ambos 205 Uns liderei os outros o deiforme Euríloco As pedras num elmo brônzeo sacudimos rápido Para fora pulou a pedra do enérgico Euríloco Partiu e com ele vinte e dois companheiros aos prantos deixaramnos lamentandoos para trás 210 Acharam no vale a casa bemconstruída de Circe de pedras polidas num local todo protegido No entorno havia lobos da montanha e leões que ela enfeitiçara após lhes dar nocivas drogas Eles não atacaram os homens pelo contrário 215 mexendo os longos rabos puseramse de pé Tal cães que junto ao senhor que sai da mesa rabeiam sempre lhes traz o que agrada o ânimo assim em torno deles lobos garrapotente e leões rabeavam E eles temeram ao ver os terríveis portentos 220 Postaramse no pórtico da deusa belastranças e ouviam Circe dentro cantando com bela voz ativa junto ao grande tear imortal tal como são as finas graciosas e radiantes obras das deusas Entre eles começou a falar Cidadão líder de varões 225 para mim o mais próximo e devotado dos companheiros Amigos dentro alguém ativa junto ao tear com graça canta e todo o solo em torno ressoa ou deusa ou mulher vamos gritemos sem demora Assim falou e eles chamaram com brados 230 Ela logo saindo abriu as portas resplandecentes e convidouos Seguiramna todos em ignorância Euríloco deixouse ficar pois pensou ser um ardil Fêlos sentarse dentro nas cadeiras e poltronas e para eles queijo cevada e mel amarelo 235 no vinho prâmnio mexeu e ao alimento misturou drogas funestas para de todo esquecerem a pátria Mas depois que lhes deu e beberam de pronto com golpes de vara no chiqueiro os confinou Eles de porcos tinham a cabeça o som as cerdas 240 e o corpo mas a mente era firme como antes Assim pranteando foram confinados e para eles Circe lançou frutos do azevinho do carvalho e da cornácea o que porcos leitonosolo sempre comem Euríloco presto rumou à negra nau veloz 245 para dar notícia dos companheiros o amargo destino Não foi capaz de dizer palavra embora ansiando o peito golpeado por dor enorme seus olhos enchiamse de lágrimas e o ânimo pensava em lamento Mas após todos com afeto lhe perguntarem 250 então contou o fim dos companheiros restantes Fomos pelo bosque como pediste ilustre Odisseu encontramos no vale casa bemconstruída bela de pedras polidas num local todo protegido Lá ativa junto a grande tear cantava de forma aguda 255 ou deusa ou mulher e eles chamaram com brados Ela logo saindo abriu as portas resplandecentes e convidouos eles todos seguiramna em ignorância Mas eu deixeime ficar pensando ser um ardil E sumiram em conjunto e nenhum deles 260 reapareceu sentado vigiei muito tempo Assim falou e eu a espada pinosdeprata em volta dos ombros lancei grande brônzea e arco e flechas e presto pedilhe que me guiasse pelo mesmo caminho Mas ele com as mãos em meus joelhos suplicoume 265 e lamentandose dirigiume palavras plumadas Não me obrigue a ir criadoporZeus deixame aqui sei que nem tu mesmo voltarás nem um outro de teus companheiros trarás Rápido com estes partamos pois ainda escaparíamos do dia danoso 270 Assim falou mas eu respondendo lhe disse Euríloco pois que fiques aqui neste lugar comendo e bebendo junto à negra nau côncava Eu irei para mim é imperiosa a necessidade Assim falando da nau afasteime e do mar 275 Mas quando ia ao longo do vale sagrado alcançar a grande casa de Circe muitasdrogas lá Hermes bastãodourado encontrou a mim em direção à casa ele semelhante a jovem varão na prima barba cuja juventude é a mais graciosa 280 deume forte aperto de mão e dirigiume a palavra Não infeliz aonde pelos cumes vais sozinho ignorante da terra Teus companheiros na casa de Circe como porcos estão confinados em buraco bemcercado Acaso vens libertálos Afirmo que nem mesmo tu 285 retornarás e até tu ficarás onde os outros estão Vamos a ti livrarei dos males e salvarei aqui com essa droga benigna à casa de Circe vai ela afastará de tua cabeça o dia danoso A ti direi todos os astutos malefícios de Circe 290 vai te preparar mingau e na comida porá drogas Mas nem assim te poderá enfeitiçar não o permitirá a droga benigna que te darei e direi tudo Quando Circe te golpear com a vara bem longa então tu após puxar a afiada espada da coxa 295 lançate contra Circe como que louco por matála Ela temerosa pedirá que deites no leito Tu então não mais rejeites o leito da deusa para ela libertar teus companheiros e cuidar de ti mas pedelhe que jure a grande jura dos ditosos 300 de que outra desgraça não planejará contra ti para que quando nu não te deixe vil e emasculado Disse isso e deume a droga Argifonte após puxála do solo e mostroume sua natureza Na raiz era preta e ao leite assemelhavase a flor 305 os deuses chamamna moli Extraíla é difícil para homens mortais mas os deuses podem tudo Hermes então partiu rumo ao alto Olimpo pela ilha matosa e eu à casa de Circe fui e muito meu coração se revolveu enquanto ia 310 Posteime na porta da deusa belastranças 310ª Circe dentro eu ouvia cantando com bela voz Lá parado gritei e a deusa ouviu minha voz Ela logo saindo abriu as portas resplandecentes e convidoume e eu a segui angustiado no coração Dentro fezme sentar em poltrona pinosdeprata 315 bela artificiosa embaixo para os pés banqueta Fezme um mingau em cálice dourado para eu beber e nele a droga lançou refletindo vilezas no ânimo E quando mo deu bebi e não me enfeitiçou e após golpear com a vara dirigiume a palavra 320 Vai já ao chiqueiro deita com os outros companheiros Assim falou e eu puxei a afiada espada da coxa e lanceime contra Circe como que louco por matála Ela gritando alto jogouse tocou meus joelhos e lamentandose dirigiume palavras plumadas 325 quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais Espantame bebeste a droga e não foste enfeitiçado Nenhum outro homem não resiste a essa droga se a bebe mal ela deixa a cerca dos dentes tu tens no peito espírito que não se pode encantar 330 Então tu és Odisseu muitasvias do qual sempre afirmou que viria Argifonte bastãodourado e de Troia voltas com negra nau veloz Vamos põe a espada na bainha e os dois então subiremos em nosso leito para que tendonos unido 335 num enlace amoroso confiemos um no outro Assim falou mas eu respondendo lhe disse Circe como pedes para ser amigável contigo De meus companheiros fizeste porcos no palácio e tendome aqui pedes com mente ardilosa 340 que vá ao quarto e suba em teu leito para que nu me tornes vil e emasculado Eu não poderia querer subir em teu leito exceto se ousasses deusa a grande jura me jurar de que contra mim outra desgraça não planejarás 345 Assim falei e ela logo jurou como eu pedira Então após jurar por completo essa jura nisso eu subi ao leito bem belo de Circe Enquanto isso criadas estavam ocupadas no palácio quatro as que faziam o trabalho da casa 350 Eis que elas provinham das fontes dos bosques e dos rios sagrados que correm até o mar Nas poltronas uma delas lançava belas mantas púrpura em cima e embaixo punha panos outra diante das poltronas estendia mesas 355 de prata e sobre elas dispunha cestas de ouro a terceira em ânfora de prata misturou vinho adoçajuízo doce e dispôs os cálices de ouro a quarta trouxe água e acendeu o fogo alto sob a grande trípode e a água esquentava 360 Mas quando a água ferveu no bronze lúzio sentoume na banheira e com a grande trípode me banhou cabeça ombros após a água temperar até arrancar fadiga tiraânimo de meus membros Após me banhar e ungir à larga com óleo 365 em torno de mim lançou bela capa e túnica e lá dentro fezme sentar em poltrona pinosdeprata bela artificiosa embaixo para os pés banqueta Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada 370 para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente e junto muitos petiscos oferecendo o que havia Ela me disse para comer e tal não agradou a meu ânimo sentado refletia e o ânimo percebeu vilezas 375 Quando Circe me viu sentado e não sobre a comida esticando as mãos mas com aflição hedionda chegando mais perto dirigiume palavras plumadas Por que assim Odisseu sentado como um mudo o ânimo consomes e não tocas em comida e bebida 380 Acaso supões outro ardil Não precisas temer pois já te jurei o forte juramento Assim falou mas eu a ela respondendo disse Circe que homem no caso de ser sensato antes ousaria compartilhar de comida e bebida 385 antes de soltar e ver com os olhos os companheiros Mas se solícita pedes para beber e comer solta os leais companheiros para eu os ver com os olhos Assim falei e Circe partiu para fora do salão com a vara na mão abriu as portas do chiqueiro 390 e tangeuos assemelhados a cevados de nove anos Eles postaramse um diante do outro e ela por eles passando ungia cada um com outra poção De seus membros caíam cerdas que antes gerou a poção ruinosa que lhes dera a senhora Circe 395 e logo tornaramse varões mais jovens que dantes e muito mais belos e melhores a quem os mirasse Reconheceramme e cada um apertoume as mãos Em todos surgiu o lamento desejável e pela casa soou ruído aterrorizante a própria deusa apiedavase 400 Ela de pé perto de mim falou a deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque vai agora à nau veloz na orla do oceano Primeiro puxai a nau para a terra firme e os bens e todas as armas depositai em caverna 405 tu mesmo volta e conduzes os leais companheiros Assim falou e obedeceu meu ânimo orgulhoso e me encaminhei à nau veloz na orla do oceano Então achei os leais companheiros na nau veloz infelizes chorando vertendo copiosas lágrimas 410 Como bezerros campestres circundam vacas do rebanho quando elas vão ao curral após saciarse de pasto todos juntos saltam diante delas e estábulos não mais os retêm mas mugindo sem parar correm em torno das mães assim eles ao me verem com os olhos 415 vertiam lágrimas Ao ânimo deles parecia ser como se tivessem chegado a sua pátria e cidade Ítaca escarpada onde nasceram e foram criados Lamentandose dirigiamme palavras plumadas Como nos alegramos com teu retorno criadoporZeus 420 como se houvéssemos chegado a Ítaca a terra pátria Vamos contanos do fim dos outros companheiros Assim falaram mas eu lhes disse com palavras macias Primeiro puxemos a nau para a terra firme e os bens depositemos em caverna e todas as armas 425 E apressaivos todos em seguir junto comigo para verdes os companheiros na sacra casa de Circe bebendo e comendo pois em abundância possuem Assim falei e presto obedeceram minhas palavras Euríloco foi o único a tentar conter os companheiros 430 e falando dirigiulhes palavras plumadas Coitados aonde vamos Qual desses males desejais Penetrar na morada de Circe que a todos tornará porcos ou lobos ou leões e como tais sua grande casa vigiaríamos obrigados 435 Assim o ciclope os prendeu quando ao pátio foram nossos companheiros e com eles esse ousado Odisseu Também aqueles pereceram pela sua iniquidade Assim falou mas eu no espírito meditei se após puxar da coxa a espada aguçada 440 com ela deceparia sua cabeça e a derrubaria no solo embora contraparente próximo mas com fala amável companheiros tentavam conterme de todos os lados Divinal deixemos se tu o ordenas que ele fique aqui junto à nau e a guarde 445 guianos até a sacra morada de Circe Assim falando afastaramse da nau e do mar E nem Euríloco junto à cava nau ficou para trás mas seguiu temeu minha terrível reprovação Nisso aos outros companheiros na casa Circe 450 banhou gentilmente ungiu à larga com óleo e em torno lançou espessas capas e túnicas achamos a todos no palácio em belo banquete Eles após terem se visto de frente e se reconhecido pranteavam lamentandose e em volta a casa gemia 455 Ela de pé perto de mim falou a deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque agora não mais inflameis choro copioso também sei quantas aflições sofrestes no mar piscoso quanto dano varões hostis causaram em terra firme 460 Mas vamos consumi a comida e bebei o vinho até de novo recuperardes o ânimo no peito como quando primeiro partistes da terra pátria a escarpada Ítaca Agora exaustos e desanimados sempre lembrais a errância cruel Nunca vosso 465 ânimo festeja pois sofrestes demais Assim falou e nosso ânimo orgulhoso obedeceu E lá por todos os dias durante o ciclo de um ano quedamos compartilhando carne semfim e doce vinho mas quando o ano chegou e as estações deram a volta 470 as luas finando e os longos dias passaram leais companheiros chamaramme para fora e disseram Insano agora te lembra do solo pátrio se foi pelo deus definido salvarte e alcançar a casa bemconstruída e a tua terra pátria 475 Assim falaram e obedeceu meu ânimo orgulhoso Então assim o dia inteiro até o pôr do sol quedamos compartilhando carne semfim e doce vinho E quando o sol mergulhou e vieram as trevas eles deitaramse pelos umbrosos salões 480 Mas eu subi ao bem belo leito de Circe e supliqueilhe pelos joelhos e a deusa ouviu minha voz e falando dirigilhe palavras plumadas Circe cumprame a promessa que prometeste para casa enviarme meu ânimo já está ávido 485 e o dos companheiros que desgastam meu coração em volta de mim gemendo quando acaso estás longe Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitostruques não mais a contragosto fiqueis na minha casa 490 Mas carece primeiro completar outra rota e ir à morada de Hades e da atroz Perséfone para consultar a alma do tebano Tirésias o adivinho cego de quem o juízo é seguro para ele embora morto Perséfone deu espírito 495 só ele é inteligente sombras os outros adejam Assim falou e meu coração rachouse chorava deitado na cama e meu coração não quis ficar vivo e mirar a luz do sol Mas depois que chorei e rolei até me fartar 500 a ela falando dirigi palavras plumadas Circe mas quem nessa rota será o guia Nunca alguém atingiu o Hades com negra nau Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque 505 que a falta de guia junto à nau não te ocupe Fixa o mastro desfralda a branca vela e senta a brisa de Bóreas a levará Mas após atravessar o Oceano com a nau onde há pequena praia e os bosques de Perséfone 510 choupos altos e salgueiros que perdem a fruta a nau lá mesmo atraca no Oceano fundoredemunho e tu próprio vai à casa bolorenta de Hades Lá no Aquerôn desembocam Piriflégueton e Cóquito que é uma queda de água do Stíx 515 uma rocha e a confluência de dois rios ressoantes lá então herói te aproxima e como te ordeno fosso cava em torno de um cúbito de altura e largura e em sua borda verte libação a todos os mortos primeiro misto com mel depois com vinho doce 520 e a terça com água em cima asperge branca cevada Com zelo suplica às tíbias cabeças dos mortos que uma vez em Ítaca irás vaquilhona a melhor sacrificar no palácio enchendo o fogo de valores a Tirésias só para ele imolarás à parte ovelha 525 toda negra a que sobressai entre vossos rebanhos Após suplicar com votos ao glorioso grupo de mortos lá sacrifica carneiro adulto e uma fêmea negra dirigidos ao Érebo e te vira para longe tu mesmo mirando as correntes do rio lá muitas 530 almas de finados defuntos chegarão Então aos companheiros incita e ordenalhes que as bestas deitadas abatidas por bronze impiedoso queimem após esfolálas e rezem aos deuses ao altivo Hades e à atroz Perséfone 535 tu mesmo após puxar a espada afiada da coxa senta e não permitas que tíbias cabeças de mortos se acheguem do sangue antes de ouvires Tirésias Então o adivinho logo virá até ti ó líder de tropa para dizerte a rota os pontos do trajeto 540 e o retorno como voltarás no mar piscoso Assim falou e logo veio Aurora tronodourado Ela mesma capa e túnica com vestes vestiume e ela grande manto branco vestiu a ninfa leve e gracioso a cintura cingiu com cinto 545 belo dourado e sobre a cabeça deitou o véu Eu cruzando a casa instigava os companheiros com fala amável achegandome a cada homem Agora não mais dormindo resfolegai o doce sono mas vamos pois já me orientou a senhora Circe 550 Assim falei e de todos convenci o ânimo orgulhoso Mas nem mesmo de lá levei incólumes os companheiros O mais jovem Ilusório nem sobremodo bravo na guerra nem em seu juízo ajustado longe de companheiros sobre a casa sacra de Circe 555 deitouse sob o peso do vinho desejando frescor Ao ouvir a surda arruaça de moventes companheiros de chofre se ergueu e esqueceu em seu juízo de descer de volta dirigindose à alta escadaria e direto do alto do teto caiu Quebrou o pescoço 560 separado das vértebras e a alma desceu ao Hades Quando estavam por partir disselhes o discurso Acreditais suponho à cara terra pátria estar indo mas outra rota marcounos Circe à morada de Hades e da atroz Perséfone 565 para consultar a alma do tebano Tirésias Assim falei e o coração rachouselhes Sentados lá mesmo choravam e os cabelos arrancavam mas em vão de nada adiantou prantear Mas enquanto à nau veloz na orla do oceano 570 íamos angustiados vertendo copiosas lágrimas Circe já tendo lá estado na negra nau carneiro adulto prendeu e uma fêmea negra após passar à socapa quem ao deus que não quer com os olhos veria na ida ou na volta Após descermos à nau e ao mar primeiro a puxamos até o divino oceano e dispusemos mastro e vela na negra nau após as bestas pegar e pôlas a bordo também nós 5 subimos angustiados vertendo copiosas lágrimas Para nós detrás da nau proacobalto soprava nobre companheira benigna brisa enchevela que enviara Circe beloscachos fera deusa de humana voz Nós cuidamos de cada cordame na nau 10 e sentamos e vento e timoneiro a dirigiam O dia todo ela singrou a vela esticada E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam e ela chegou ao confim de Oceano fundascorrentes Lá fica o povo a cidade dos varões cimérios 15 em bruma e nuvens encoberta nunca a eles Sol luzidio mira de cima com os raios nem quando avança rumo ao páramo estrelado nem quando do páramo se dirige à terra sempre noite letal se espraia sobre os pobres mortais 20 Chegando lá atracamos a nau e dela as bestas tiramos então ao longo da corrente de Oceano nos dirigimos à terra que Circe indicara Lá os animais do sacrifício Perimedes e Euríloco seguraram e eu puxei a afiada espada da coxa 25 cavei um fosso cerca de um cúbito de altura e largura e em sua borda verti libação a todos os mortos primeiro misto com mel depois com vinho doce e a terça com água em cima aspergi branca cevada Com zelo supliquei às tíbias cabeças dos mortos 30 que uma vez em Ítaca iria vaquilhona a melhor sacrificar no palácio e encher o fogo de valores a Tirésias só para ele imolaria à parte ovelha toda negra a que sobressaísse entre nossos rebanhos Após a eles ao grupo de mortos com voto e súplica 35 suplicar peguei as bestas e cortei seu pescoço na direção do fosso e fluía sangue escuro Elas se reuniram as almas de finados defuntos subindo do Érebo moças jovens solteiros anciãos que muito penaram noivas delicadas com ânimo recémafligido 40 e muitos feridos por lanças de bronze varões mortos em guerra com armas ensanguentadas A maioria acorria para o fosso de todos os lados com grito prodigioso e um medo amarelo atingiume Então aos companheiros incitei e ordeneilhes 45 que aos bichos deitados abatidos por bronze impiedoso queimassem após esfolálos e rezassem aos deuses ao forte Hades e à atroz Perséfone eu mesmo após puxar a espada afiada da coxa sentei e não permiti que tíbias cabeças de mortos 50 se achegassem do sangue antes de ouvir Tirésias Primeiro veio a alma de Ilusório o companheiro ainda não enterrado sob a terra largasrotas o corpo na casa de Circe deixamos para trás não chorado não sepulto pois impelianos outra ação 55 Quando o vi chorei e apiedeime no ânimo e falando dirigilhe palavras plumadas Ilusório como desceste às trevas brumosas Chegaste antes a pé que eu com negra nau Assim falei e ele bramou e respondeume com discurso 60 Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque perdeume o quinhão danoso do deus e vinho ilimitado deitado na morada de Circe não pensei descer de volta dirigindome à alta escadaria e direto do alto do teto caí quebrei o pescoço 65 separado das vértebras e a alma desceu ao Hades Agora te suplico por aqueles lá trás ausentes por tua esposa e teu pai que te criou quando pequeno e por Telêmaco o único que no palácio deixaste sei que indo daqui da casa de Hades 70 dirigirás a nau engenhosa até a ilha de Aiaie lá senhor peçote então que lembres de mim Não me deixes não chorado e não sepulto ao partir e te afastar para eu não te trazer a cólera de deuses mas me queime com todas as armas que tive 75 e ergueme junto à orla do mar cinzento cenotáfio de varão infeliz notícia também aos vindouros Completame isso e crava no túmulo o remo com que vivo remava junto de meus companheiros Assim falou e eu respondendo lhe disse 80 Isso infeliz te completarei e executarei Assim nós dois trocando palavras tristes ficamos eu sobre o sangue empunhando a espada e acolá muito falava o espectro do companheiro E achegouse a alma de minha finada mãe 85 a filha do enérgico Autólico Anticleia que viva deixei para trás quando fui à sacra Ílion Quando a vi chorei e apiedeime no ânimo embora bem aflito nem assim deixei que primeiro ela se achegasse do sangue antes de eu ouvir Tirésias 90 E veio a alma do tebano Tirésias com um cetro dourado reconheceume e disse Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque por que de novo infeliz deixaste a luz do sol e vieste para ver mortos e a região sem deleite 95 Pois arredate do fosso e afasta a espada afiada para eu beber do sangue e falarte sem evasivas Assim falou e eu recolhi a espada pinosdeprata e enfieia na bainha Após beber o sangue escuro a mim dirigiuse com palavras o adivinho impecável 100 Buscas retorno doce como o mel ilustre Odisseu esse o deus tornará difícil para ti Não creio que irá te ignorar o tremeterra com rancor no ânimo irado pois cegaste seu filho querido Porém ainda assim mesmo sofrendo males chegaríeis 105 se quiseres conter teu ânimo e o dos companheiros quando primeiro achegares a nau engenhosa da ilha Trinácia após escapar do mar violeta e achardes pastando vacas e robustas ovelhas de Sol que tudo enxerga e tudo ouve 110 Se as deixares ilesas e cuidares do retorno também Ítaca mesmo sofrendo males alcançaríeis se as lesares então te prevejo o fim de barco e companheiros Tu mesmo se escapares chegarás tarde mal em nau alheia 115 sem companheiro algum encontrarás desgraças em casa varões soberbos que devoram teus recursos cortejando a excelsa esposa e oferecendo dádivas Contudo vingarás a violência deles ao chegar Mas quando aos pretendentes em teu palácio 120 matares com truque ou às claras com bronze agudo então pega um remo maneável e marcha até alcançares varões que não conhecem o mar nem comem comida misturada a grãos de sal eles claro não conhecem naus facepúrpura 125 nem remos maneáveis que são as asas das naus Sinal te direi inequívoco e não o irás ignorar quando contigo depararse outro passante e disser que tens destróijoio sobre o ombro ilustre então após na terra cravares o remo maneável 130 fazeres belos sacrifícios ao senhor Posêidon carneiro touro e javali doméstico reprodutor retorna para casa e oferta sacras hecatombes aos deuses imortais que do largo páramo dispõem a todos pela ordem Do mar virá a ti 135 bem suave a morte ela que te abaterá debilitado por idade lustrosa e em volta as gentes serão afortunadas Isso te digo sem evasivas Assim falou mas eu respondendolhe disse Tirésias isso destinaram os próprios deuses 140 Mas vamos dizeme isto e conta com precisão lá vejo a alma de minha finada mãe ela quieta sentada perto do sangue a seu filho não ousa mirar de frente nem dirigir a palavra Diga senhor como ela saberia que este sou eu 145 Assim falei e ele logo respondendo disseme Simples palavra te direi e no juízo porei a todo que permitires dos mortos finados achegarse do sangue esse vai te falar sem evasivas A quem negares esse de volta irá para trás 150 Após falar a alma entrou na casa de Hades a do senhor Tirésias após contar o dito divino mas eu lá fiquei imóvel até que a mãe a mim veio e bebeu sangue escuro de pronto me conheceu e lamentandose dirigiume palavras plumadas 155 Filho meu como desceste às trevas brumosas ainda vivo É difícil aos mortais ver isto aqui No meio há grandes rios e assombrosas correntes e primeiro Oceano que não é possível cruzar a pé se alguém não tiver nau engenhosa 160 Só agora de Troia chegas aqui após vagar com nau e companheiros muito tempo Não foste a Ítaca nem viste no palácio tua mulher Assim falou mas eu respondendo lhe disse A necessidade minha mãe me trouxe até Hades 165 para consultar a alma do tebano Tirésias ainda não me acheguei da Acaia nem a minha terra desci mas sempre vago em agonia desde o dia em que segui o divino Agamêmnon até Ílion belospotros para troianos combater 170 Mas vamos dizeme e conta com precisão que sina de morte dolorosa te subjugou Doença alongada Ártemis vertesetas com suas flechas suaves achegandose matoute Falame algo do pai e do filho que deixei para trás 175 se minha honraria ainda é deles ou já um outro varão a tem e afirmam que nunca retornarei Falame da intenção e mente da lídima esposa se fica ao lado do filho e firme tudo guarda ou se já a desposou quem for o melhor dos aqueus 180 Assim falei e ela logo respondeu a senhora mãe É claro que ela aguarda com ânimo resistente em teu palácio para ela sempre agonizantes esvaem as noites e os dias e verte lágrimas Ninguém tem tua bela honraria mas plácido 185 Telêmaco gere os domínios e de banquetes partilhados participa dos quais convém varão sentenciador ocuparse todos o convidam Teu pai fica lá mesmo no campo e à urbe não desce não tem como leito estrado capas e mantas lustrosas 190 mas ele no inverno com escravos dorme na casa no pó perto do fogo e vestes vis vestem sua pele mas quando vem o verão e a opulenta época de frutas em toda parte no fértil vinhedo no morro amontoamse leitos de folhas caídas no chão 195 Lá deita aflito e enorme angústia avulta no juízo ansiando teu retorno e cruel velhice o alcança Assim também pereci e alcancei o fado a mim nem no palácio a vertesetas agudamirada com suas flechas suaves achegandose matoume 200 nem até mim veio doença que sobremodo com hedionda definhação dos membros tira a vida de mim a saudade de ti os planos teus ilustre Odisseu e a suavidade tua arrebataramme a melíflua vida Assim falou e eu quis após cogitar no juízo 205 pegar a alma de minha finada mãe Três vezes lanceime e pegála o ânimo pedia três vezes de minhas mãos como sombra ou sonho voou No coração minha dor faziase mais aguda e falando dirigilhe palavras plumadas 210 Minha mãe por que te esquivas se anseio pegarte para no Hades abraçandonos com carinho ambos nos deleitarmos com gemido gelado Isto é um espectro que até mim a ilustre Perséfone instigou para que ainda mais aflito eu gema 215 Assim falei e ela logo respondeu a senhora mãe Ai de mim filho meu herói em suprema desdita a ti Perséfone filha de Zeus não está ludibriando mas essa é a marca dos mortais quando alguém morre Não mais os tendões seguram carnes e ossos 220 mas a eles o ímpeto superior do fogo chamejante subjuga e assim que a vida deixa os ossos brancos a alma como um sonho esvoaça e voa embora Mas almeja ir de pronto rumo à luz sabe de tudo isso para no futuro também falares a tua mulher 225 Assim nós dois trocávamos palavras e mulheres vieram pois as instigara a ilustre Perséfone tantas quantas eram as esposas e filhas dos melhores Elas em torno do sangue negro juntas se reuniram e eu decidia como iria a cada uma questionar 230 Este em meu ânimo mostrouse o plano melhor após desembainhar aguçada espada da coxa grossa não permitia que junto bebessem todas o sangue negro Elas enfileiradas achegavamse e cada uma sua origem anunciava e eu a todas questionava 235 A primeira que vi foi Tiro nobrepai que disse ser rebento do impecável Salmoneu e disse ser esposa de Creteu filho de Eolo Ela pelo rio se apaixonou o divino Enipeu que de longe o mais belo dos rios fluía pela terra 240 e assim visitava as belas correntes de Enipeu Eis que assemelhado a ele o terrasustém tremeterra na foz do rio vertiginoso ao lado dela se deitou eis que agitada onda cercouos igual a um monte abobadada e escondeu o deus e a mulher mortal 245 E soltou seu cinto virginal e sono verteulhe Quando o deus completou os feitos amorosos apertoulhe a mão dirigiuselhe e nomeoua Deleitate com o amor mulher tempo passando gerarás crianças radiantes pois vãos não são os enlaces 250 de imortais e tu as cria e alimenta Agora vai para casa contémte e não me nomeies quanto a mim vê sou Posêidon tremesolo Após falar assim mergulhou no mar fazonda E ela após engravidar gerou Pélias e Neleu 255 e tornaramse dois fortes assistentes do grande Zeus ambos Pélias na espaçosa Iolcos morava rica em ovelhas o outro na arenosa Pilos Estes outros com Creteu gerou augusta mulher Aison Feres e Amitáon alegre na luta de carros 260 Depois dela vi Antíope a filha de Asopo que no abraço de Zeus proclama ter deitado e gerou duas crianças Anfíon e Zeto os primeiros a fundar o sítio de Tebas seteportões e murálo pois sem muros não eram capazes 265 de habitar a espaçosa Tebas embora fortes os dois Depois dela vi Alcmena a esposa de Anfitríon que a Héracles espíritoousado ânimoleonino gerou após unirse em seu abraço a Zeus poderoso e Mégara a filha do autoconfiante Creonte 270 possuíaa o filho de Anfitríon com ímpeto sempre rijo E vi a mãe de Édipo a bela Epicasta que feito inaudito fizera com mente ignorante ao ser desposada pelo filho ele após matar o pai a desposou logo deuses expuseramnos aos homens 275 Mas ele sofrendo agonias em Tebas muito amada regia os cadmeus graças a planos ruinosos de deuses e ela foi à casa de Hades o poderoso porteiro após apertar um nó abrupto da alta viga no quarto tomada pela dor Deixoulhe aflições no futuro 280 muitas tantas quantas as Erínias da mãe completam E vi Clóris bem bela que um dia Neleu desposou pela beleza pois deu miríades de dádivas a filha mais nova de Anfíon filho de Iaso que então em Orcômenos na Mínia regia com força 285 Ela regia Pilos e geroulhe crianças radiantes Nestor Crômio e o bem honrado Periclímeno Além deles gerou a altiva Peró maravilha para os mortais a quem todos os vizinhos cortejavam e Neleu só a daria a quem lunadas vacas largafronte 290 tomasse do brioso Íficles e de Fílace trouxesse feito difícil Só o adivinho impecável prometeu trazêlas e o duro quinhão do deus o enredou laços cruéis e pastores rústicos Mas quando meses e dias completaramse 295 e o ano fechou seu ciclo e voltaram as estações eis que então o brioso Íficles o soltou pois falou a palavra divina completavase o plano de Zeus E vi Leda a consorte de Tíndaro ela que de Tíndaro gerou duas crianças juízoforte 300 Castor domacavalos e Polideuces bomdepunho a esses ambos vivos contém a terra brotagrão Eles mesmo abaixo da terra têm a honra de Zeus ora estão vivos em dias alternados ora de novo mortos atribuiuselhes honra como aos deuses 305 E depois dela Ifimédeia consorte de Aloeu mirei que dizia terse unido a Posêidon Assim gerou duas crianças e tiveram vida curta o excelso Óton e Efialtes grandefama A eles nutriu o solo fértil para serem os mais altos 310 e de longe os mais belos depois do glorioso Órion com nove anos de fato tinham eles nove cúbitos de largura e de altura alcançavam nove braças Até contra imortais no Olimpo ameaçaram instaurar combate de guerra encapelada 315 O Ossa ansiaram pôr sobre o Olimpo e sobre o Ossa Pélio folhasfarfalhantes para alcançar o páramo E teriam tal feito completado houvessem chegado à juventude matouos o filho de Zeus que Leto belajuba gerou a ambos antes que florescesse a barba sob a têmpora 320 e vicejante penugem o queixo cobrisse E Fedra e Prócris eu vi e a bela Ariadne filha de Minos sinistro ela que um dia Teseu de Creta levava ao morro da Atenas sagrada e não a desfrutou antes matoua Ártemis 325 na correntosa Dia com o testemunho de Dioniso Vi Maira Climene e a hedionda Erifila que ouro valioso recebeu por seu marido A todas não vou enunciar nem especificar tantas as esposas e filhas de heróis que vi 330 a noite imortal findaria antes Mas é hora de dormir ou indo à nau veloz até os companheiros ou aqui a condução ocupará os deuses e vós Assim falou e eles todos atentos se calavam tomados por feitiço no umbroso salão 335 Entre eles Arete alvosbraços tomou a palavra Feácios como parecevos ser esse varão em aparência altura e dentro no juízo equilibrado Pois bem é meu hóspede e cada um partilha da honra Por isso não às pressas o enviai de volta nem os dons 340 restringi ele assim carente pois vós muitos haveres tendes no palácio devido aos deuses Entre eles então falou o ancião o herói Donodenau que dos varões feácios era o mais velho 343ª em discursos superior com muito saber antigo Amigos nem longe do alvo nem de nossa opinião 345 discursa a rainha bemajuizada vamos obedecei De Alcínoo aqui presente dependem palavra e ação A ele por sua vez Alcínoo respondeu Essa palavra portanto assim se dará se eu vivo reino sobre o navegador povo feácio 350 Embora o hóspede anseie por retornar peço aguente ficar até amanhã quando os dons eu completar A condução ocupará os varões todos mormente a mim de quem é o poder na cidade Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 355 Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos se ordenasses que eu até um ano aqui ficasse instigasses a condução e desses radiantes dons até disso eu gostaria e seria bem mais vantajoso com a mão mais cheia voltar à cara pátria 360 também mais respeitado e caro aos varões eu seria a todos quantos me vissem a Ítaca retornar A ele por sua vez Alcínoo respondeu e disse Odisseu ao te mirar de ti não supomos que sejas trapaceiro e furtivo tal como muitos 365 que a negra terra nutre homens em profusão que forjam mentiras cuja fonte ninguém veria Tua é a formosura das palavras tens juízo distinto e contaste a história hábil como um cantor funestas agruras dos argivos todos e de ti mesmo 370 Mas vamos dizeme isto e conta com precisão se viste companheiros excelsos esses que contigo seguiram até Ílion e lá alcançaram o fado Bem longa é essa noite ilimitada e não é hora de dormir no salão tu relatame feitos prodigiosos 375 Até a divina aurora eu resistiria se para mim no salão aguentasses discursar essas tuas agruras Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos há hora para muitas histórias e hora para o sono 380 Se ainda almejas ouvir eu não recusaria falarte de outros fatos ainda mais pungentes que esses agruras de meus companheiros que depois morreram escaparam da triste batalha contra os troianos e no retorno pereceram devido a vil mulher 385 Então dispersou a pura Perséfone as almas das bem femininas mulheres e achegouse a alma de Agamêmnon filho de Atreu aflita em torno outras reunidas as que com ele na casa de Egisto morreram e alcançaram o fado 390 Reconheceume logo ao verme com os olhos choro agudo verteu copiosas lágrimas abrindo os braços para mim com gana de abraçar Mas sua força não era mais firme nem o vigor como no passado fora sobre os membros recurvos 395 Quando eu o vi chorei e apiedeime no ânimo e falando dirigilhe palavras plumadas Majestoso filho de Atreu rei de varões Agamêmnon que sina que morte dolorosa te subjugou Estavas numa nau e subjugoute Posêidon 400 após instigar sopro não invejável de ventos difíceis Varões hostis causaramte dano em terra firme ao quereres roubar bois ou belos rebanhos de ovelhas Ou então lutavas por uma cidade e mulheres Assim falei e ele logo respondendo disseme 405 Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque não estava numa nau nem subjugoume Posêidon após instigar sopro não invejável de ventos difíceis nem varões hostis causaramme dano em terra firme mas Egisto preparou o quinhão da morte 410 e matoume com a nefasta esposa após me chamar à casa depois do banquete como quem mata boi no cocho Morri de morte deplorável ao redor outros companheiros sem cessar foram mortos como porcos dentebranco na casa de rico varão que muito possui 415 quando de casamento festa ou farta celebração Já encaraste a matança de muitos varões mortos em luta singular e também em batalha audaz mas isto tendo visto lamentarias demais no ânimo como em volta das ânforas e das mesas cheias 420 jazíamos no salão e todo o chão fumegava com sangue Pungentíssima ouvi a voz da filha de Príamo Cassandra a quem matou Clitemnestra astúciaardilosa em volta de mim eu sobre a terra ergui os braços e lanceios ao morrer pela espada A caradecadela 425 afastouse e mesmo eu indo ao Hades não ousou com as mãos cerrar meus olhos e pressionarme a boca Assim nada é mais terrível e canalha que a mulher aquela que em seu juízo lança tais feitos tal foi o feito ultrajante que aquela armou 430 ao preparar a morte do marido legítimo Eu supus que daria felicidade a meus filhos e escravos ao chegar em casa ela versada no funesto verteu vergonha sobre si e as gerações futuras das bem femininas mulheres ainda que uma seja honesta 435 Assim falou e eu respondendo lhe disse Incrível por certo à estirpe de Atreu Zeus amplavisão odiou desde o início usando femininas artimanhas por causa de Helena muitos de nós perecemos e para ti quando longe Clitemnestra armou um ardil 440 Assim falei e ele logo respondendo me disse Por isso agora não sejas meigo com a esposa e não lhe reveles todo o discurso que bem conheces mas digalhe algo e o resto mantenha oculto Mas não para ti Odisseu a morte virá da mulher 445 deveras sensata projetos conhece bem no juízo a filha de Icário a bemajuizada Penélope De fato recémcasada nós a largamos ao ir para a guerra seu filho estava no peito infante ele que agora ocupa lugar entre os varões 450 afortunado sim a ele o caro pai verá ao voltar e ele ao pai abraçará o que é a norma Minha esposa nem que de meu filho com os olhos me fartasse permitiu antes a mim mesmo matou Outra coisa te direi e tu em teu juízo a guarda 455 em segredo não às claras à tua cara terra pátria leva a nau pois nada é confiável entre as mulheres Mas vamos dizeme isto e conta com precisão se ouvistes que algures ainda vive meu filho ou em Orcômenos ou na arenosa Pilos 460 ou junto a Menelau na ampla Esparta não está morto mas sobre a terra o divino Orestes Assim falou e eu respondendo lhe disse Filho de Atreu por que me perguntas isso Nada sei se está vivo ou morto é ruim lançar ditos ao vento 465 Assim nós dois trocávamos palavras hediondas de pé aflitos vertendo copiosas lágrimas e achegouse a alma de Aquiles filho de Peleu e a de Pátroclo e a do impecável Antíloco e a de Ájax que em beleza e porte era o melhor 470 de todos os aqueus depois do impecável Aquiles Reconheceume a alma do péligeiro descendente de Áiaco e lamentandose dirigiume palavras plumadas Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque seu terrível que feito ainda maior armarás no juízo 475 Como ousaste descer ao Hades onde os mortos sem o juízo moram espectros de mortais esgotados Assim falou e eu respondendo lhe disse Aquiles filho de Peleu de longe o melhor dos aqueus vim por precisar de Tirésias para que me aconselhe 480 um plano como chegar à escarpada Ítaca ainda não me acheguei da Acaia nem a minha terra desci mas sofro sempre Aquiles não há varão mais ditoso que tu no passado nem no futuro pois antes vivo a ti honrávamos como aos deuses 485 nós argivos e agora reges soberano entre os mortos aqui assim tendo morrido não te aflijas Aquiles Assim falei e ele logo respondendo disseme Não me edulcores a morte ilustre Odisseu Preferiria vivente ser empregado em outro lugar 490 junto a homem sem gleba e com poucos víveres a reger entre todos os mortos desassomados Vamos narrame uma história de meu filho ilustre ou foi à guerra para se destacar ou não foi E me fala do impecável Peleu se de algo soubeste 495 ou ainda mantém honraria entre os muitos mirmidões ou o desonram pela Hélade e por Ftia pois a idade restringe seus braços e pernas Fosse eu seu protetor sob os raios do sol como um dia atuei na ampla Troia ao matar 500 gente excelente defendendo os aqueus Se assim mesmo curto tempo fosse eu à casa do pai faria meu ímpeto e braços intocáveis odiados àqueles que o violentam e da honraria querem afastálo Isso falou e eu respondendo lhe disse 505 Bem do impecável Peleu nada soube mas de teu filho do caro Neoptólemo enunciarei toda a verdade como me pedes pois eu próprio a ele em cava nau simétrica conduzi de Skyros até os aqueus belasgrevas 510 Quando diante da urbe troiana ponderávamos planos sempre por primeiro falava e não errava no discurso o excelso Nestor e eu só nós o superávamos Mas ao combatermos no plaino troiano com bronze nunca na multidão ficava nem na tropa de varões 515 mas bem à frente corria com ímpeto sem rival muitos varões matou na refrega terrível Todos eu não vou anunciar nem nomear quanta gente matou defendendo os argivos só como matou o filho de Telefo com bronze 520 o herói Eurípilo e muitos companheiros com ele ceteus pereceram por causa de dons femininos Ele foi o mais belo que vi após o divino Mêmnon Mas quando subimos no cavalo que laborara Epeu os melhores argivos e tudo foi ordenado por mim 525 quando abrir a arguta tocaia e quando fechála nisso os outros líderes e dirigentes dânaos lágrimas enxugavam e seus membros tremiam embaixo Ele nunca de modo algum eu vi com meus olhos nem empalidecer na bonita pele nem da face 530 lágrimas enxugar Ele amiúde me suplicava para sair do cavalo e agarrava o cabo da espada e a pesada lança de bronze males desejando a troianos Porém após saquear a escarpada urbe de Príamo com distinto quinhão e honraria embarcou na nau 535 ileso nem atingido por bronze agudo nem ferido em combate mano a mano o que sucede na guerra Ares enlouquece às cegas Assim falei e a alma do péligeiro descendente de Áiaco partiu a passos largos pelo prado de asfódelos 540 com júbilo pois seu filho eu disse ser insigne E as outras almas de defuntos finados de pé aflitas inquiriam cada uma suas agruras Sozinha a alma de Ájax filho de Télamon postouse distante enraivecida pela vitória 545 quando eu o venci ao pleitear junto às naus as armas de Aquiles fixouas a senhora sua mãe e filhos de troianos e Palas Atena julgaram Tomara não tivesse eu vencido essa disputa por causa delas a terra se apossou de notável pessoa 550 Ájax que na aparência e nos feitos sobrepujou os outros dânaos logo atrás do impecável Aquiles E a ele me dirigi com palavras amáveis Ájax filho do impecável Télamon não irias nem morto esquecer a raiva contra mim pelas armas 555 nefastas Deuses tornaramnas desgraça aos argivos Como torre para eles pereceste os aqueus por ti igual à cabeça de Aquiles filho de Peleu afligiramse sem parar ao faleceres Nenhum outro é responsável mas Zeus a tropa de lanceiros dânaos 560 odiou de forma terrível e para ti fixou o destino Mas vem aqui senhor para escutares palavras nossas subjuga o ímpeto e o ânimo orgulhoso Assim falei ele nada retrucou e foi atrás de outras almas rumo ao Érebo de defuntos finados 565 Podia porém ter falado mesmo com raiva e eu a ele mas meu ânimo quis no caro peito enxergar as almas dos outros mortos Vi Minos o filho radiante de Zeus com cetro dourado aplicando as normas aos mortos 570 sentado cercandoo pediam do senhor as sentenças sentados e de pé pela casa de Hades com largo portão Depois dele percebi o portentoso Órion agrupando feras pelo prado de asfódelos as que ele mesmo matou em montanhas solitárias 575 com estaca toda brônzea nas mãos inquebrável E Titiô enxerguei o filho da majestosa Terra jazendo no solo sobre nove medidas de campo arado e dois abutres sentados de cada lado rasgavam seu fígado furando o peritônio ele não se defendia com as mãos 580 Tentou violentar Leto a majestosa consorte de Zeus indo ela a Pito após cruzar o Panopeu belasarenas E sim vi Tântalo com seu duro sofrimento de pé na lagoa a água batia em seu queixo Na posição do sedento para beber não a alcançava 585 quando o ancião se curvava com gana de beber nisso a água sumia engolida e em volta dos pés surgia a negra terra e a divindade deixavaa seca Árvores copaelevada deitavam frutos do topo pereiras romãzeiras macieiras frutoradiante 590 figueiras doces e oliveiras verdejantes quando o ancião se esticava para as pegar com as mãos o vento as arrojava rumo a nuvem umbrosa E sim vi Sísifo com seu duro sofrimento carregando pedra portentosa com as duas mãos 595 Ele apoiandose nas mãos e nos pés empurrava a pedra morro acima mas quando ia lançála por sobre o cume Crátaiis a revolvia então de volta ao solo rolava a rocha aviltante Mas ele de novo a empurrava retesandose suor 600 escorria dos membros e poeira lançavase da cabeça Depois dele percebi a força de Héracles o espectro pois ele mesmo entre deuses imortais deleitavase em festas com Juventude lindacanela filha do grande Zeus e de Hera sandáliadourada 605 À volta dele estrídulo de mortos como se de aves terrorizados para todo lado feito noite lúgubre trazia seu arco nu e na corda a flecha esquadrinhando fero sempre como se fosse atirar aterrorizante no peito em diagonal talabarte 610 cinturão dourado com obras maravilhosas ursos porcos agrestes leões de olhar cobiçoso batalhas combates matanças e carnificinas Que o artesão não tenha artefatado outro assim esse que tal cinturão colocou sob a sua arte 615 Presto me reconheceu ao verme com os olhos e lamentandose dirigiume palavras plumadas Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque coitado também arrastas um danoso quinhão o que eu mesmo suportava sob os raios do sol 620 Eu era o filho de Zeus filho de Crono mas sofria ilimitada agonia muito tempo fui subordinado a herói bem mais fraco que me impôs duras provas Uma vez também cá me enviou para levar o cão nenhuma outra prova pensou me seria mais brutal 625 Ao cão eu venci e conduzi para fora do Hades Hermes me guiou e também Atena olhosdecoruja Após falar a alma entrou de volta na casa de Hades mas eu lá fiquei imóvel caso algum ainda viesse dos varões heróis que no passado morreram 630 Teria ainda visto os varões de antanho que desejava Teseu e Peirítoo filhos bem majestosos de deuses mas grupos de mortos milhares perto juntaramse com ruído prodigioso um medo amarelo atingiume que a cabeça de Gorgô portento assombroso 635 da casa de Hades me enviaria a ilustre Perséfone Então de pronto fui à nau e pedi aos companheiros que embarcassem e os cabos soltassem Eles logo embarcaram e sentaramse junto aos calços 638ª alinhados golpeavam o mar cinzento com remos A nau ao longo do rio Oceano a corrente conduzia 640 primeiro com remadas e depois bela brisa Depois de deixar a corrente do rio oceano a nau alcançou a onda do mar largapassagem e a ilha de Aiaie onde de Aurora nascecedo ficam arenas e morada e os levantes de Sol 5 dirigimonos para lá atracamos na praia e desembarcamos na rebentação do mar Lá adormecemos e aguardamos a divina Aurora Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então enviei companheiros à casa de Circe 10 para buscar o cadáver o morto Ilusório Cortamos os troncos onde a praia é mais saliente e o enterramos angustiados vertendo copiosas lágrimas Após queimar o morto e as armas do morto erguemos um cenotáfio sobre ele arrastamos 15 uma lápide e no topo cravamos o remo maneável Tudo realizamos em sequência eis que Circe não ignorou nossa volta do Hades e ligeiro veio após arrumarse com ela criadas traziam pão muita carne e fulgente vinho tinto 20 Ela postada no centro falou a deusa divina Terríveis vós que vivos descestes à casa de Hades homens bimortos quando os demais só uma vez morrem Mas vamos consumi a comida e bebei o vinho aqui mesmo o dia todo despontando a aurora 25 navegareis E eu irei a rota indicar e tudo sinalizar para que vítima de tramoia pungente no mar ou em terra não padeceis sofrendo miséria Assim falou e obedeceu nosso ânimo orgulhoso Então o dia inteiro até o pôr do sol assim 30 ficamos compartilhando carne semfim e doce vinho Quando o sol mergulhou e vieram as trevas eles deitaramse ao longo da popa da nau ela tomoume a mão longe dos caros companheiros me acomodou deitouse ao lado e interrogoume 35 e eu tudo a ela ponto por ponto contei Então a mim dirigiuse com palavras a senhora Circe Tudo isso foi assim completado agora ouve como te digo e o próprio deus te lembrará Primeiro alcançarás as Sirenas elas que a todos 40 os homens enfeitiçam todo que as alcançar Aquele que se achegar na ignorância e escutar o som das Sirenas para ele mulher e crianças pequenas não mais aparecerão nem rejubilarão com seu retorno à casa pois as Sirenas com canto agudo o enfeitiçam 45 sentadas no prado tendo ao redor monte de putrefatos ossos de varões e suas peles ressequidas Passa ao largo e tampa os ouvidos dos companheiros com amolecida cera melosa para que nenhum outro as ouça mas tu mesmo se quiseres ouve 50 após te prenderem as mãos e os pés na nau veloz reto no mastro e nele se amarrarem os cabos para que te deleites com a voz das duas Sirenas Se suplicares aos companheiros que te soltem que eles com ainda mais laços te prendam 55 Após os companheiros te guiarem ao largo delas dessa vez não mais te direi com detalhes qual das rotas será a tua mas tu mesmo no ânimo considera vou te falar das duas direções A partir daí há rochas salientes e contra elas 60 ressoa grande vaga de Anfitrite olhocobalto Plânctas vê denominamnas os deuses ditosos Por lá nenhum alado consegue passar nem pombos tímidos os que levam ambrosia a Zeus pai a um deles a rocha lisa sempre agarra 65 mas outro o pai envia para completar o número Por lá nunca escapou nau de varões uma que fosse tábuas de naus mescladas a corpos de heróis ondas do mar e rajadas de fogo maligno as levam Só navegou por aí aquela nau cruzamar 70 Argó por todos conhecida navegando desde Aietes presto a teriam lançado contra as grandes rochas mas Hera a guiou pois que Jasão lhe era caro Encontrarás dois penedos um alcança o largo páramo e tem o pico agudo envolvido por nuvem 75 cobalto esta nunca fenece e nunca o céu cobre seu pico nem no verão nem na época de frutas Não o subiria um varão mortal nem percorreria nem se vinte braços e pernas tivesse a pedra é lisa semelhante a uma bempolida 80 No meio do penedo há uma gruta penumbrosa voltada para oeste rumo ao Érebo e vós junto dela dirigireis a cava nau ilustre Odisseu Da côncava nau nem um varão animoso com arco flechando alcançaria a cava gruta 85 É aí que mora Cila de latido assombroso Sua voz ao ladrar de um filhote de cão equivale mas ela mesma é portento vil ninguém se jubilaria ao vêla nem mesmo um deus Ela tem doze pés todos sem panturrilha 90 e seis são os pescoços bem longos e em cada um uma aterrorizante cabeça com dentes em três fileiras cerrados e múltiplos cheios de negra morte Até a metade na cava gruta está embrenhada e mantém as cabeças fora da furna assombrosa 95 lá mesmo pesca em volta do penedo buscando delfins focas e se acaso pega maior portento dos que milhares cria Anfitrite altogemido Nunca se ouviram nautas incólumes proclamar ter escapado com a nau leva em cada cabeça 100 um herói após arrancálo da nau proacobalto O outro penedo verás que é mais raso Odisseu os dois próximos entre si à distância de uma flecha Nele há uma grande figueira abundante em folhas abaixo dela a divina Caríbdis sorve negra água 105 Três vezes esguicha ao dia três vezes sorve assombrosa que lá não te encontres durante o sorvo do mal não te protegeria nem mesmo o tremesolo Rápido do penedo de Cila bem achegando a nau passa ao largo pois é muito melhor 110 lastimar da nau seis companheiros que todos juntos Assim falou mas eu a ela terrorizado disse Vamos deusa digame sem evasivas se acaso poderia esquivarme da nefasta Caríbdis e resistir à outra quando ela tentar lesar meus companheiros 115 Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Terrível Não é que os feitos marciais te ocupam tanto o labor que não te submetes a deuses imortais Ela não é mortal vê mas um mal imortal assombrosa aflitiva selvagem e indomável 120 não é caso de bravura o melhor é dela fugir Se te demoras armado junto à pedra temo que de novo atacando a ti alcance as cabeças todas e agarre número igual de heróis Mas passa com todo ímpeto grita por Crátaiis 125 a mãe de Cila que a gerou como desgraça aos mortais Ela então a impedirá de atacar uma segunda vez E à ilha de Trinácia chegarás lá muitas vacas de Sol e ovelhas robustas pastam Sete rebanhos de vacas há e tantos de belas ovelhas 130 cada um com cinquenta Elas não têm descendentes e nunca soçobram Divinas são as pastoras ninfas belastranças Luzidia e Brilhosa essas que a divina Neaira gerou para Sol Hipérion e a elas após nutrir e gerar a senhora mãe 135 transladou à ilha de Trinácia para longe morarem e vigiarem as ovelhas paternas e as vacas lunadas Se as deixares intactas e cuidares do retorno também Ítaca mesmo sofrendo males alcançaríeis se as lesares então prevejote o fim 140 de barco e companheiros Tu mesmo se escapares chegarás tarde mal após perder todo companheiro Assim falou e logo veio Aurora tronodourado Ela então para dentro da ilha partiu divina deusa mas eu fui de volta à nau e pedi aos companheiros 145 que entrassem e os cabos soltassem Eles logo embarcaram e sentaramse junto aos calços e alinhados golpeavam o mar cinzento com remos Para nós detrás da nau proacobalto soprava nobre companheira benigna brisa enchevela que enviara 150 Circe beloscachos fera deusa de humana voz De pronto após cuidar de cada cordame na nau sentamos e vento e timoneiro a dirigiam Então aos companheiros disse aflito no coração 153ª Ouvi meu discurso companheiros mesmo sofrendo Amigos não carece que só um ou dois conheçam 155 os ditos divinos que Circe me anunciou deusa divina Assim eu falarei para que cientes ou morramos ou evitando a perdição da morte escapemos Das Sirenas prodigiosas primeiro mandou que evitemos sua voz e o prado florido 160 Mandou ainda que só eu a voz ouvisse pois a mim com nó apertado prendei para imóvel eu aí mesmo quedar reto no mastro e nele fiquem amarrados os cabos Se eu vos suplicar e solicitar que me soltem que então vós com mais laços me amarreis 165 Tudo isso relatei e expus aos companheiros nisso a nau engenhosa célere alcançou a ilha das Sirenas uma brisa favorável a impelia Logo depois o vento parou uma calmaria surgiu sem ventos e a divindade amainou as ondas 170 De pé companheiros enrolaram a vela da nau Puseramna na cava nau e eles junto aos remos sentados branquearam a água com os pinhos polidos E eu a um grande naco de cera com bronze afiado fragmentei e apertava com mãos robustas 175 Logo a cera amoleceu pois impeliua a grande pressão e o raio de Sol o senhor Hipérion tampei os ouvidos de cada um dos companheiros Na nau prenderamme mãos e pés por igual reto no mastro e nele amarraram os cabos 180 sentados golpeavam o mar cinzento com remos Mas quando estávamos à distância de um grito rápido viajando elas não ignoraram a nau saltadora surgir próxima e deram vazão a canto agudo Vem cá Odisseu muitahistória grande glória dos aqueus 185 ancora tua nau para ouvires nossa voz Nunca ninguém passou por aqui em negra nau sem antes ouvir a melíflua voz que vem de nossa boca mas ele se deleita e parte com mais saber De fato sabemos tudo que na extensa Troia 190 aguentaram argivos e troianos por obra dos deuses Sabemos tudo que ocorre sobre a terra nutremuitos Assim falaram lançando belíssima voz Meu coração quis ouvir e num movimento das celhas solicitei aos companheiros que me soltassem eles remavam 195 De pronto ergueramse Perimedes e Euríloco e com mais laços prenderamme e apertaram bem Depois que por elas passamos então nem mais ouvimos o tom das Sirenas nem seu canto e presto meus leais companheiros retiraram a cera 200 que tampara seus ouvidos e soltaramme dos laços Quando deixamos essa ilha logo depois vi fumaça e grande onda e escutei um rugido Eles se assustaram voaram os remos das mãos e todos atroaram na corrente parou lá mesmo 205 a nau e braços não mais moviam os remos propulsores Eu cruzando a nau instigava os companheiros com fala amável achegandome a cada homem Amigos por certo não somos inexpertos em males Este mal vede não é maior que quando o ciclope 210 prendeunos na cava gruta com violência brutal mas também lá com minha excelência plano e mente escapamos e creio que disso lembraremos Mas vamos o que eu falar obedeçamos todos Com os cabos golpeai a profunda rebentação do mar 215 sentados junto às correias esperando Zeus conceder que evadamos e escapemos desse fim e para ti timoneiro isto imponho e no ânimo lançao pois controlas o leme da cava nau a nau afasta para longe daquela fumaça e da onda 220 busca o penedo e que a nau de ti não escape mudando de rumo e nos lances no mal Assim falei e presto obedeceram minhas palavras De Cila não mais falei flagelo invencível para que temerosos os companheiros não abdicassem 225 da remada e se abrigassem a si mesmos E então a ordem pungente de Circe negligenciei pois pedira que não me armasse eu entrei na armadura gloriosa e duas lanças grandes peguei nas mãos e subi na plataforma da nau 230 na proa aí esperei que primeiro surgisse Cila rochosa que trazia desgraça aos companheiros Nenhures pude vislumbrála e meus olhos cansaram esquadrinhando em toda direção a rocha embaciada E nós entre lamentações navegávamos o estreito 235 de um lado Cila de outro a divina Caríbdis terrível sorvia água salina do mar Quando regurgitava como caldeirão em fogo alto efervescia toda agitada e para o alto a espuma tombava sobre os picos dos dois penedos 240 Mas quando engolia água salina do mar para dentro aparecia inteira agitada e ao redor as rochas fremiam terríveis e embaixo surgia a terra cobalto com areia e um medo amarelo atingiuos Nós a miramos temendo o fim 245 então Cila da côncava nau tomoume seis companheiros nos braços e força os melhores Quando fitei a nau veloz e também os companheiros já vislumbrei seus pés e braços acima alçados ao alto e gritavam chamandome 250 pelo nome a última vez aflitos no coração Como quando de um cabo pescador com longa vara lança petiscos como isca a peixes miúdos ao mar arremessa um chifre de boi campestre fisga um peixe puxao para fora e ele se convulsiona 255 assim eles convulsionandose eram alçados à rocha Lá na entrada devorouos enquanto guinchavam e estendiam os braços a mim em terrível refrega Foi a mais deplorável cena que vi com meus olhos de tudo que aguentei cruzando as rotas do mar 260 Mas após dos rochedos escaparmos da fera Caríbdis e de Cila logo depois à impecável ilha do deus chegamos lá estavam as belas vacas largafronte e muitas ovelhas robustas de Sol Hipérion Então quando eu ainda estava no mar da negra nau 265 ouvi o mugido de vacas sendo encurraladas e o balido das ovelhas e em meu ânimo caiu a palavra do adivinho cego o tebano Tirésias e de Circe de Aiaie que com insistência me ordenou evitar a ilha de Sol deleitamortal 270 Então aos companheiros disse aflito no coração Ouvi meu discurso companheiros mesmo sofrendo pois vos direi os ditos proféticos de Tirésias e de Circe de Aiaie que com insistência me ordenou evitar a ilha de Sol deleitamortal 275 dizia lá estar o mais terrível mal para nós Vamos ao largo dessa ilha guiai a negra nau Assim falei e de cada um o coração se rachou Logo Euríloco respondeu com hediondo discurso És terrível Odisseu teu ímpeto sobeja teus membros 280 nunca cansam é de supor seres todo de ferro tu que a companheiros extenuados por sono e fadiga não permites desembarcar em terra onde de novo na ilha correntosa faríamos saborosa refeição mas pedes que erremos em vão na noite veloz 285 vagando para longe da ilha no mar embaçado À noite duros ventos destroçadores de naus ocorrem para onde alguém fugiria do abrupto fim se acaso de chofre viesse rajada de vento de Noto ou do revolto Zéfiro os que mais 290 despedaçam naus à revelia dos senhores deuses Mas agora por certo obedeçamos à negra noite e preparemos o jantar aguardando junto à nau veloz na aurora embarcando nós a lançaremos ao amplo mar Isso falou Euríloco e aprovaram os demais companheiros 295 Então percebi que a divindade armava males e falando dirigilhe palavras plumadas Euríloco deveras forçaime eu sendo um só Vamos agora juraime todos vigoroso juramento se um rebanho de vacas ou grande tropa de ovelhas 300 acharmos que ninguém com iniquidade vil mate uma vaca ou ovelha tranquilos comei o alimento que deu Circe imortal Assim falei e eles logo juraram como eu pedi E após jurar por completo esse juramento 305 ancoramos em porto cavo a nau engenhosa perto de água doce e os companheiros desceram da nau e depois prepararam o jantar com destreza E após apaziguar o desejo por bebida e comida choravam ao lembrarse dos caros companheiros 310 os que Cila comeu pegandoos da cava nau enquanto choravam veiolhes sono prazeroso No terço final da noite findo o périplo dos astros Zeus juntanuvens instigou vento bravio com prodigiosa tempestade e com nuvens encobriu 315 terra e mar por igual e a noite desceu do céu Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos puxamos o barco e o levamos à cava gruta lá havia belas arenas e assentos de ninfas Então eu realizando assembleia disse entre eles 320 Amigos como na nau veloz há comida e bebida fiquemos longe daquelas vacas para não sofrermos essas vacas e robustas ovelhas são de fero deus de Sol que tudo enxerga e tudo ouve Assim falei e de todos convenci o ânimo orgulhoso 325 Mês inteiro incessante Noto soprou e nenhum outro vento surgiu depois exceto Euro e Noto Enquanto tinham pão e vinho tinto distanciaramse das vacas almejando seu sustento Mas quando toda a comida da nau esgotouse 330 e errantes por necessidade acossavam presas peixes e aves o que lhes chegasse às mãos com anzóis recurvos e a fome torturava o estômago nisso parti para dentro da ilha para aos deuses rogar esperando que um me mostrasse a rota de volta 335 Quando dentro da ilha escapei dos companheiros após lavar as mãos onde havia proteção contra o vento rezei a todos os deuses que do Olimpo dispõem e eles vertiam doce sono sobre minhas pálpebras E Euríloco entre os companheiros iniciou plano vil 340 Ouvi meu discurso companheiros mesmo sofrendo Há muitas mortes hediondas para os pobres mortais e o mais deplorável é morrer achar o fado de fome Mas vamos toquemos as melhores vacas de Sol e sacrifiquemos aos deuses que do largo páramo dispõem 345 E se chegarmos a Ítaca à terra pátria de imediato a Sol Hipérion ergueremos templo rico onde poremos oferendas muitas e valiosas E se enraivecido pelas vacas chifrereto ele quiser destruir a nau e o apoiarem os demais deuses 350 prefiro de uma vez boca aberta na onda perder a vida a fenecer longo tempo numa ilha deserta Isso falou Euríloco e aprovaram os demais companheiros De imediato tocaram as melhores vacas de Sol das cercanias pois não longe da nau proacobalto 355 pastavam as lunadas belas vacas largafronte a essas cercaram e oraram aos deuses após colher delicadas folhas de carvalho altacopa pois não tinham branca cevada na nau bomconvés E depois de orar degolar e esfolar 360 deceparam as coxas e com gordura as encobriram camada dupla e sobre elas puseram peças cruas Sem vinho para aspergir no chamejante sacrifício libavam com água e assavam todas as vísceras Mas após queimarem coxas e comerem vísceras 365 trincharam o restante e transpassaram em espetos Nisso o sono prazeroso abandonou minhas pálpebras e me encaminhei à nau veloz e à orla do oceano Quando estava perto da nau ambicurva circundoume o doce odor de gordura 370 Com um clamor entre os deuses imortais fizme ouvir Zeus pai e outros ditosos deuses semprevivos deveras para a ruína me adormecestes em sono impiedoso e os companheiros à espera armaram grande feito Rápido até Sol Hipérion foi o mensageiro 375 Brilhosa peplobomtalhe pois matamos as vacas dele Logo aos imortais falou irado no coração Zeus pai e outros ditosos deuses semprevivos puni os companheiros de Odisseu filho de Laerte que brutais mataramme as vacas elas que a mim 380 dão alegria quando vou ao páramo estrelado e quando me dirijo do céu de volta à terra Se não me pagarem compensação devida descerei ao Hades e brilharei entre os mortos Em resposta disselhe Zeus juntanuvens 385 Sol quanto a ti brilha para os imortais e humanos mortais sobre o solo fértil já eu rápido posso lançar um raio cintilante na nau veloz e estilhaçála no meio do mar vinoso Pois isso eu ouvi de Calipso belastranças 390 e ela disse ter ouvido do condutor Hermes Quando desci até a nau e o mar pusme a ralhar com cada um mas remédio algum conseguimos achar as vacas já estavam mortas Logo os deuses exibiramlhes um prodígio 395 as peles caminhavam as carnes nos espetos mugiam cozidas ou cruas e o som era como o das vacas Por seis dias então meus leais companheiros banquetearamse tocando as melhores vacas de Sol quando o sétimo dia fixou Zeus filho de Crono 400 então o vento parou de correr com a tempestade e nós logo embarcamos e lançamola ao amplo mar após erguer o mastro e as brancas velas içar Mas quando deixamos a ilha nenhuma outra terra apareceu exceto o páramo e o mar 405 e então nuvem cobalto pôs o filho de Crono sobre a cava nau e o mar escureceu abaixo dela Ela não correu muito mais tempo rápido veio guinchando Zéfiro correndo com grande tempestade A rajada de vento rasgou os estais do mastro 410 ambos o mastro caiu para trás e todo cordame tombou no porão eis que ele na popa da nau golpeou a cabeça do timoneiro e despedaçou os ossos todos da cabeça semelhante a um mergulhador caiu da plataforma e o ânimo orgulhoso deixou os ossos 415 Zeus trovejou e junto lançou um raio sobre a nau ela inteira sacolejou golpeada pelo raio de Zeus e de enxofre se encheu e os companheiros caíram da nau A eles quais corvosmarinhos em volta da negra nau as ondas levavam e o deus negoulhes o retorno 420 Já eu perambulava pela nau até que uma onda soltou as tábuas da quilha essa nua a vaga levava E uma onda arrancou o mastro e arremessouo contra a quilha mas nele penduravase o patarrás feito de pele bovina Com ele ambos juntei quilha e mastro 425 e sentado sobre eles fui levado por ventos ruinosos Nisso Zéfiro parou de correr com a tempestade e rápido veio Noto trazendo aflições ao meu ânimo para que ainda medisse a destrutiva Caríbdis Por toda a noite fui levado e ao nascer do sol 430 cheguei ao penedo de Cila e à fera Caríbdis Essa sorvia água salina do mar mas eu na grande figueira alçado ao alto nela preso segureime como morcego Impossível apoiarme com os pés firmemente ou subir 435 as raízes estavam bem longe os galhos bem no alto longos e grandes sombreavam Caríbdis Firme me segurei até ela de volta regurgitar mastro e quilha para mim ansioso vieram por fim Na hora em que sai da ágora para jantar o varão 440 o que julga muita contenda de animosos pleiteadores nessa hora de Caríbdis surgiram os destroços Deixei que braços e pernas do alto despencassem e no meio ribombei ao lado da madeira comprida sentado sobre ela remei com minhas mãos 445 O pai de varões e deuses não mais permitiu que Cila eu encarasse pois não escaparia de abrupto fim De lá nove dias fui levado e a mim na décima noite da ilha de Ogígia achegaram os deuses onde Calipso mora a belastranças fera deusa com voz humana 450 que me acolhia e zelava Por que isso te reconto Pois já ontem te narrei na casa para ti e à altiva esposa detesto de novo recontar o falado por completo Assim falou e todos atentos se calaram tomados por feitiço pelos umbrosos salões A ele por sua vez Alcínoo respondeu e disse Odisseu como vieste a minha casa chãobrônzeo 5 grandiosa por isso creio que não vagando de novo de volta retornarás ainda que muito sofreste A cada um de vós varões dou essa ordem a todos que no meu palácio o vinho fulgente dos conselheiros sempre bebeis e prestais atenção ao cantor 10 roupas para o hóspede já no baú bempolido estão ouro muito artificioso e todos os outros dons que os comandantes feácios cá trouxeram vamos ofereçamolhe grande trípode e caldeirão cada varão a nós depois amealhando junto ao povo 15 se retribuirá é duro um só ser generoso de graça Assim falou Alcínoo e agradoulhes o discurso eles para se deitar voltaram a suas casas Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos à nau apressaramse e levaram fortificante bronze 20 O sacro ímpeto de Alcínoo acomodou os objetos sob os bancos ao percorrer a nau que aos companheiros não estorvassem ao impulsionála com sua remada e foram à casa de Alcínoo e ocuparamse do banquete Sacrificoulhes um boi o sacro ímpeto de Alcínoo 25 a Zeus nuvemnegra o filho de Crono que a todos rege Queimadas as coxas partilharam com deleite majestoso banquete e entre eles cantava divino cantor Demódoco honrado pelo povo Mas Odisseu amiúde dirigia a cabeça ao sol resplandecente 30 ansioso que se pusesse sim tinha gana de retornar Como quando almeja comer o varão cujos bois vinosos o dia todo pousio acima tracionam arado articulado ele se alegra ao se pôr a luz do sol é hora de jantar e os joelhos fraquejam quando vai 35 assim para Odisseu alegria se pôs a luz do sol De pronto entre os feácios navegadores falou e sobretudo a Alcínoo fez um discurso revelador Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos conduzime incólume após libarem e alegraivos 40 Pois já se completou o que meu caro ânimo queria condução e caros dons que esses os deuses celestes me tornem afortunados em casa a impecável consorte após retornar eu encontre com os meus ilesos Vós aqui ficando regozijaivos com as esposas 45 lídimas e os filhos que deuses concedam sucesso vário e que mal algum ocorra na cidade Assim falou e todos aprovavam e o incitavam a conduzir o hóspede pois falara com adequação E ao arauto falou o ímpeto de Alcínoo 50 Mentenomar mistura na ânfora e distribui o vinho a todos no salão para que após rezar a Zeus pai conduzamos o hóspede a sua terra pátria Isso dito Mentenomar misturou vinho adoçajuízo e distribuiuo a todos achegandose e aos deuses 55 ditosos libaram os que do largo páramo dispõem a partir de seus assentos E ergueuse o divino Odisseu nas mãos de Arete pôs o cálice duplaalça e falando dirigiulhe palavras plumadas Sê feliz rainha sem cessar até a velhice 60 e a morte chegarem essas aos homens sobrevêm Eu estou retornando tu nesta casa te deleita com os filhos o povo e o rei Alcínoo Isso disse e sob o umbral marchou o divino Odisseu O ímpeto de Alcínoo enviou com ele um arauto 65 para guiálo à nau veloz e à orla do oceano Eis que Arete enviava escravas mulheres com ele uma com o manto bemlavado nas mãos e a túnica a outra com o compacto baú carregado a terceira levava pão e vinho tinto 70 E após descerem até a nau e o mar logo tudo toda comida e bebida depuseram os ilustres condutores após receber na cava nau e acomodaram para Odisseu manta e linho na plataforma da cava nau para dormir profundo 75 na popa Ele mesmo embarcou e deitouse em silêncio eles sentaramse junto aos calços a par em ordem e o cabo soltaram da pedra furada Quando se reclinaram e com o remo jogaram água um sono prazeroso caíalhe sobre as pálpebras 80 profundo dulcíssimo de perto semelhante à morte A nau como um quarteto de cavalos machos no plaino todos juntos instigados por golpes de chicote para cima pulando efetuam rápido o trajeto assim a sua popa pulava e onda atrás 85 agitada grande aviavase do mar ressoante Ela muito segura corria firme nem gavião a acompanharia a mais ligeira das aves Assim ela rápido correndo cortou as ondas do mar levando o varão com projetos similares aos dos deuses 90 que antes muitas aflições sofreu em seu ânimo cruzando guerras de homens e ondas pungentes agora sereno dormia esquecido do que sofrera Quando o astro ia alto o mais luzente que mormente vem anunciar a luz de Aurora nascecedo 95 da ilha achegouse a nau cruzamar Há um porto de Fórcis o ancião do mar na cidade de Ítaca Aí mesmo há dois salientes cabos abruptos a partir do porto agachandose Eles rebatem grande onda que ventos bravos 100 trazem de fora dentro sem laços permanecem naus bomconvés ao atingirem o meio a ancoragem Há na cabeça do porto uma oliveira folhalonga e perto dela a agradável caverna brumosa consagrada a ninfas chamadas Náiades 105 Nela há ânforas e vasos duplaalça de pedra lá então abelhas fazem colmeias Nela há teares de pedra bem longos onde ninfas tramam mantos púrpura assombro à visão nela há águas permanentes E tem duas entradas 110 uma do lado de Bóreas os homens podem usar a outra do lado de Noto é dos deuses nunca por aí entram os homens é via dos imortais Nesse porto entraram conhecendoo de antemão Depois a nau aportou em terra firme mais ou menos até a metade 115 ligeiro pois impelida pela mão de tais remadores Eles da nau firmebanco desembarcaram em terra e primeiro ergueram Odisseu da cava nau junto com o linho e as mantas lustrosas e puseramno sobre a areia dominado pelo sono 120 e ergueram os bens que a ele feácios ilustres deram graças à animosa Atena pois ia para casa Assim agruparam tudo ao pé da oliveira fora do caminho para que homem viajante algum antes de Odisseu acordar passando o lesasse 125 e eles retornaram para casa Mas tremesolo não esqueceu as ameaças com que ao excelso Odisseu antes ameaçara e indagou o desígnio de Zeus Zeus pai eu nunca mais entre deuses imortais serei honrado quando a mim mortais não honram 130 justo os feácios que são de minha estirpe De fato pensei que Odisseu muito mal sofreria antes de chegar em casa do retorno nunca o privei de todo desde que tu primeiro juraste e sinalizaste eles o levaram em nau veloz pelo mar dormindo 135 depuseramno em Ítaca e deramlhe dons incontáveis bronze ouro a granel veste tecida muito o que nem de Troia teria recebido Odisseu ainda que incólume tivesse chegado com sua parte do butim Respondendo disselhe Zeus juntanuvens 140 Incrível tremeterra amplopoder como falaste Por certo não te desonram os deuses difícil seria golpear com desonras o mais respeitável e nobre Ainda que a ti um varão cedendo à força e ao vigor não honrasse depois sempre tens a vingança 145 Faça como quiseres e te for caro ao ânimo E a ele respondeu Posêidon tremesolo De imediato eu faria nuvemnegra como dizes mas sempre respeito e evito teu ânimo Agora porém quero a bem bela nau dos feácios 150 voltando da condução sobre o mar embaçado golpear para que cessem afinal e abdiquem da condução de homens e com grande morro encobrir sua urbe Respondendo disselhe Zeus juntanuvens Querido isto ao meu ânimo parece ser o melhor 155 quando a ela prestes a atracar já mirar todo o povo a partir da cidade tornea pedra perto da terra semelhante a nau veloz para se espantarem todos os homens e que morro não encubra sua urbe Após isso escutar Posêidon tremesolo 160 pôsse rumo a Esquéria onde vivem os feácios Lá aguardou e ela bem perto chegou a nau cruzamar facilmente impelida Para perto dela foi tremesolo e tornoua pedra e enraizou nas profundas após golpeála com a mão para baixo e ele partiu 165 Eles entre si falavam palavras plumadas os feácios navegadores varões famosos pelas naus E assim falavam fitando quem estava ao lado Ai de mim pois quem prendeu a nau veloz no mar prestes a atracar Já estava toda visível 170 Assim falavam e não sabiam o que fora arranjado E entre eles Alcínoo tomou a palavra e disse Incrível de fato alcançoume um velho dito divino de meu pai dizia que Posêidon se irritaria conosco pois somos seguros condutores de todos 175 Disse que um dia bem bela nau de varões feácios voltando da condução sobre o mar embaçado seria destroçada e um grande morro encobriria nossa urbe Assim falava o ancião e tudo isso agora se completa Mas vamos o que eu disser obedeçamos todos 180 Cessai a condução de mortais quando um deles chegar a nossa cidade e a Posêidon touros doze escolhidos sacrifiquemos esperando que se apiede e que um grande morro não encubra nossa urbe Assim falou e eles temeram e prepararam os touros 185 E assim eles rezavam ao senhor Posêidon dirigentes e capitães do povo dos feácios de pé em volta do altar E acordou o divino Odisseu do sono na terra pátria e não a conheceu já há muito afastado pois um deus vertia bruma em torno 190 Palas Atena filha de Zeus para que a ele mesmo tornasse irreconhecível e a ele tudo explicasse e que não o conhecessem esposa conterrâneos e os seus antes de os pretendentes expiarem toda a transgressão Assim tudo parecia mudar de forma para o senhor 195 as sendas contínuas e os portos seguros rochedos alcantilados e árvores verdejantes De pé tendose erguido observou a terra pátria e então bramou bateu em suas duas coxas com a palma das mãos e lamuriandose disse 200 Ai de mim dessa vez atinjo a terra de que mortais Serão eles desmedidos selvagens e não civilizados ou hospitaleiros com mente que teme o deus Aonde devo levar esses muitos bens Por onde eu vago Que eu tivesse ficado junto aos feácios 205 lá mesmo eu até a outro rei poderoso teria ido e ele depois de me acolher me faria retornar Agora não sei onde os guardar mas aqui não os deixarei que não se tornem butim para outros Incrível não em tudo ponderados e civilizados 210 foram os líderes e capitães dos feácios eles que me trouxeram a outra terra falaram que a mim conduziriam a Ítaca bemavistada e não cumpriram Zeus dossuplicantes os puna que também a outros homens observa e pune quem comete uma falta 215 Mas chega que eu observe e conte as riquezas temo que partiram na cava nau levandome algo Após falar assim as trípodes bem belas e bacias contava o ouro e as belas vestes tecidas De nada sentiu falta Lamentava a terra pátria 220 arrastandose ao longo da praia do mar bem ressoante lamuriandose muito E das cercanias veiolhe Atena semelhante no corpo a jovem varão pastor de ovelhas todo delicado tal como são os filhos de senhores com manto engenhoso dupla dobra nos ombros 225 nos pés reluzentes trazia sandálias e nas mãos a lança Vendoa Odisseu jubilou foi até ela e falando dirigiulhe palavras plumadas Meu caro como és o primeiro que topo nessa terra saúdote e não vem até mim com mente vil 230 mas protege isto e protege a mim a ti eu mesmo rezo como ao deus e de teus joelhos me achego E dizeme isto a verdade para eu bem saber que terra que povo que varões vivem aqui Acaso uma ilha bemavistada ou uma ponta 235 de terra grandesglebas jaz inclinada rumo ao mar E a ele dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja És tolo estranho ou chegaste de longe se indagas acerca desta terra Não é de todo assim sem nome muitos conhecemna bem 240 os que habitam na direção da aurora e do sol e os que mais atrás rumo à treva brumosa Ela é escarpada não é boa para cavalgar e não é muito pobre mas larga não é Nela de fato o cereal é ilimitado e nela vinho 245 há sempre a tomam a chuva e o farto orvalho É boa para criaremse cabras e bois há bosques de todo o tipo e bebedouros perenes nela há Assim o nome de Ítaca estranho chegou a Troia que dizem ficar longe da terra aqueia 250 Isso falou e jubilou o muitatenência divino Odisseu alegre com sua terra pátria como lhe disse Palas Atena filha de Zeus portaégide e falando dirigiulhe palavras plumadas a ela não disse a verdade refreou o discurso 255 a mente muitaargúcia a calcular no peito Ouvi falar de Ítaca também na ampla Creta longe no mar e agora eu mesmo chego com estas riquezas tantas ainda deixei a meus filhos e me exilei pois matei o caro filho de Idomeneu 260 Tocaioso nos pés veloz que na ampla Creta vencia com os pés ligeiros varões diligentes porque quis se apropriar de todo o meu butim troiano pelo qual sofri aflições no ânimo cruzando guerras de homens e ondas pungentes 265 porque a seu pai eu não servi nem agradei na terra troiana mas liderei outros companheiros Com lança brônzea o atingi ele que voltava do campo de tocaia perto da trilha eu e um companheiro uma noite muito escura tomava o páramo e a nós homem 270 nenhum percebeu e sem ser notado tirei sua vida Mas depois de matálo com o bronze afiado de pronto fui a uma nau a ilustres fenícios supliquei e parte do butim para seu gáudio lhes dei pedilhes que me admitissem e levassem a Pilos 275 ou à divina Élida onde dominam os epeus Mas então a força do vento os afastou de lá muito contra sua vontade e não quiseram enganarme de lá vagando chegamos aqui à noite Com esforço remamos à baía e nenhum de nós 280 se lembrou de comer mesmo muito carentes mas assim após desembarcar da nau deitamos todos Lá de mim exausto o doce sono se achegou e eles tendo recolhido minhas riquezas da cava nau puseramnas onde eu mesmo repousava na areia 285 Embarcaram rumo à Sidônia bemhabitada mas eu fui deixado angustiado no coração Assim falou e sorriu a deusa Atena olhosdecoruja e acariciouo com a mão já no corpo como uma mulher bela grande e conhecedora de radiantes trabalhos 290 e falando dirigiulhe palavras plumadas Ladino e furtivo aquele que te ultrapassasse em todos os ardis mesmo se um deus te topasse Terrível variegadaastúcia insaciável de ardis Não ias nem mesmo estando em tua terra cessar os engodos 295 e discursos furtivos que do fundo te são caros Vamos não falemos mais disso ambos conhecemos maneios pois és de longe o melhor de todos os mortais em planos e discursos e eu entre todos os deuses na astúcia famosa e nos maneios e não reconheceste 300 Palas Atena filha de Zeus que sempre em todas as tarefas está junto a ti e te protege e caro a todos os feácios também te tornou Agora porém aqui vim para contigo tramar um truque e esconder toda a riqueza que a ti os ilustres feácios 305 deram graças a meu plano e mente para te trazer à casa e vim dizer quantas agruras em tua casa construída deverás suportar resiste mesmo sob pressão Não declares para nenhum homem ou mulher ninguém que chegaste após vagar mas em silêncio 310 sofre muitas aflições submisso à violência dos varões Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia É difícil deusa a um mortal frente a ti reconhecerte mesmo bem destro pois te tornas semelhante a tudo Isto eu sei bem que no passado eras minha amiga 315 enquanto em Troia peleávamos os filhos de aqueus Porém após saquear a escarpada urbe de Príamo partimos nas naus e um deus dispersou os aqueus e depois não mais te vi filha de Zeus nem percebi entrares em minha nau para de mim afastares aflição 320 Mas sempre com coração dividido em meu peito vaguei até que deuses me livraram da desgraça Por fim na gorda cidade dos feácios encorajandome com palavras à urbe me guiaste Agora pelo pai me atiro a teus joelhos não creio 325 ter chegado à bemavistada Ítaca mas por outra terra erro e creio que tu melindrandome falaste isso para iludires meu juízo dizeme se deveras à cara pátria cheguei E a ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja 330 Sempre há em teu peito uma tal ideia por isso não consigo te deixar quando estás mal porque és decente sagaz e prudente Outro varão que chegasse após vagar feliz iria até seu palácio para ver filhos e esposa 335 a ti não é caro saber nem te informar antes de testar tua esposa que está sentada no palácio e para ela sempre agonizantes se esvaem as noites e os dias a verter lágrimas Eu porém disto nunca duvidei mas no ânimo 340 sabia que retornarias após perder todo companheiro mas eu não quis vê lutar contra Posêidon irmão de meu pai com rancor contra ti no ânimo irado pois cegaste seu filho querido Mas vamos Ítaca te mostrarei para te convenceres 345 aquela é a baía de Fórcis o ancião do mar e aquela na cabeça do porto a oliveira folhalonga e perto dela a agradável caverna brumosa consagrada a ninfas chamadas Náiades aquela é a ampla gruta arqueada onde tu amiúde 350 sacrificaste hecatombes completas às ninfas e aquele é o Nérito monte revestido com um bosque A deusa disse isso dissipou a bruma e surgiu a região e então jubilou o muitatenência divino Odisseu alegre com sua terra e beijou o solo fértil 355 De pronto rezou às ninfas após erguer as mãos Ninfas Náiades filhas de Zeus eu nunca pensei que vos fosse ver Agora com preces suaves alegraivos também daremos dádivas como antes se me permitir a solícita filha de Zeus a trazbutim 360 eu mesmo viver e ela deixar meu caro filho crescer E a ele dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Coragem que isso não te ocupe o juízo os bens no recesso da caverna prodigiosa ponhamos logo para ficarem protegidos 365 e cogitaremos como se dará de longe o melhor Após dizer isso a deusa penetrou na gruta brumosa tateando atrás de buracos pelas paredes já Odisseu presto tudo trazia ouro rígido bronze e vestes bemfeitas coisas que os feácios lhe deram 370 Isso bem condicionou e uma pedra depôs na entrada Palas Atena a filha de Zeus portaégide E os dois sentados ao pé da sacra oliveira planejavam o fim dos pretendentes soberbos Então tomou a palavra a deusa Atena olhosdecoruja 375 Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque planeja como descer o braço nos aviltantes pretendentes que já três anos em teu salão arrogamse senhores cortejando a excelsa esposa e oferecendo dádivas ela sempre chorando teu retorno no ânimo 380 a todos dá esperança e faz promessas a cada varão enviando recados e sua mente concebe outra coisa Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Incrível a sorte ruim de Agamêmnon filho de Atreu por certo seria a minha perecer no palácio 385 se não me tivesses deusa tudo dito ponto por ponto Mas vamos trama o plano de como me vingarei deles fica tu junto a mim lançando ímpeto muitacoragem como quando arrancamos as reluzente faixas de Troia Se ficares assim zelosa junto a mim olhosdecoruja 390 até mesmo contra trezentos varões eu lutaria contigo senhora deusa se me socorresses solícita E a ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja Por certo junto a ti não te perderei de vista quando te ocupares disso creio que muitos 395 respingarão o chão semfim com sangue e miolos os varões pretendentes que devoram teus recursos Vamos te farei irreconhecível para todos os homens enrugarei a bela pele sobre os membros recurvos destruirei as madeixas loiras da cabeça com trapos 400 te vestirei visão que torna odioso quem os usa opacos ficarão teus olhos antes tão belos para que pareças repulsivo a todos os pretendentes a tua mulher e ao filho ele que no palácio deixaste Tu mesmo primeiro te dirijas ao porqueiro 405 o guardião de teus porcos contigo também gentil que quer bem a teu filho e à prudente Penélope Vais encontrálo junto às porcas elas pastam junto à pedra Corvo sobre a fonte Aretusa bebendo água escura e comendo bolotas deliciosas 410 que engordam o rico toicinho dos porcos Lá permanece e junto a ele tudo pergunta enquanto eu for até Esparta belasmulheres chamar Telêmaco teu caro filho Odisseu que à espaçosa Lacedemônia até Menelau 415 partiu para se informar de tua fama se ainda vivias Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia E por que não lhe disseste sabendo tudo no juízo Para que ele também vagando por aí sofresse agonias no mar ruidoso e os outros comessem seus recursos 420 E a ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja Que ele não te cause tanta inquietação Eu mesma o conduzi para conquistar distinta fama ao ir para lá ele não está se esfalfando mas tranquilo está na casa do filho de Atreu junto a riqueza indizível 425 É certo que jovens o tocaiam com negra nau ansiando matálo antes que atinja a terra pátria mas nisso não creio antes ainda a terra cobrirá alguns varões pretendentes que devoram teus recursos Após falar assim com a vara tocouo Atena 430 Enrugou a bela pele sobre os membros recurvos destruiu as madeixas loiras da cabeça com a pele de um velho ancião envolveu todos os membros e deixou opacos os olhos antes tão belos Envolveuo com outro trapo vil e uma túnica 435 rasgados sujos desfigurados por vil fumaça e enrolouo na grande pele de um cervo veloz gasta Deulhe bastão e repulsivo alforje todo rasgado e nele uma corda havia sua alça Os dois ponderaram assim e separaramse Ela então 440 foi à divina Lacedemônia atrás do filho de Odisseu Mas ele da baía marchou pela trilha escarpada mato acima pelos cumes para onde a ele Atena indicou o divino porcariço que de seus recursos mais cuidava ele dentre os servos do divino Odisseu 5 Eis que no vestíbulo o encontrou sentado onde muro alto em local todo protegido fora erguido belo e grande todo em volta o muro o porqueiro mesmo erguera para os porcos ausente o senhor distante da senhora e do ancião Laerte 10 com blocos arrastados e um arbusto espinhoso coroando Puxou por fora estacas contínuas nas duas direções cerradas e numerosas após fender o negror do carvalho No interior do cercado fez doze chiqueiros perto um do outro leitos de porcos em cada 15 cinquenta porcos que deitam no solo estavam presos fêmeas reprodutoras Machos passavam a noite fora bem menos numerosos escasseavam pois comiamnos os excelsos pretendentes já que o porqueiro enviava sempre o melhor de todos os bemnutridos cevados 20 desses havia trezentos e sessenta Com eles cães quais feras sempre passavam a noite quatro que criara o porqueiro líder de varões O homem ajustava sandálias em torno dos pés cortando bovina pele bemtratada os outros já 25 se haviam ido um para cada lado com os porcos reunidos os três obrigado o quarto enviara para a cidade levando porco aos soberbos pretendentes para o abaterem e com carne saciar o ânimo De chofre avistaram Odisseu os cães ladradores 30 Eles ruidosos correram mas Odisseu sentouse astucioso e o bastão caiu de sua mão Lá ao lado de sua quinta teria sofrido dor ultrajante mas o porqueiro rápido pés ligeiros foi atrás lançandose ao pórtico e o couro caiu de sua mão 35 Aos brados dispersou os cães um para cada lado com pedras sucessivas e dirigiuse ao senhor Ancião quase meus cães te despedaçavam num instante e entornarias ignomínia sobre mim Já me deram os deuses outras aflições e gemidos 40 angustiado lamentandome pelo excelso senhor fico sentado e crio para outros porcos cevados como alimento mas ele desejoso por comida vaga por povo e cidade de varões outralíngua se em algum lugar ainda vive e vê a luz do sol 45 Vem à cabana sigamos ancião para que também tu após com comida e bebida saciarte no ânimo fales donde és e quantas agruras suportaste Dito isso à cabana conduziuo o divino porcariço e fêlo sentarse galhos espessos jogou 50 e sobre eles estendeu pele de felpudo bode selvagem na qual dormia grande e espessa Odisseu alegrouse por assim ser recebido dirigiuselhe e nomeouo Que Zeus te dê anfitrião e os outros deuses imortais o que mais desejas pois solícito me recebeste 55 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Estranho não é minha norma desonrar um estranho nem se pior que tu chegasse de fato sob Zeus estão todos os estranhos e mendigos Pequeno e querido é o nosso dom pois esse é o hábito dos escravos sempre temerosos 60 quando têm o poder senhores jovens Por certo os deuses estancaram seu retorno ele que iria me acolher com atenção e ofertar bens tanto quanto dá a seu servo um bondoso senhor casa gleba e mulher muitopretendente 65 se para ele muito labuta e o deus propicia a lida como também propiciou essa lida onde fico De muito me teria valido o senhor se aqui tivesse envelhecido mas morreu Como devia a linhagem de Helena morrer ajoelhada pois soltou os joelhos de muito varão 70 aquele também foi pela honra de Agamêmnon até Ílion belospotros para combater troianos Dito isso com o cinto rápido prendeu a túnica e foi aos chiqueiros onde confinava grupos de leitões De lá pegou dois levouos e a ambos abateu 75 queimou as cerdas cortouos e transpassou nos espetos Após tudo assar levou e pôs diante de Odisseu quente espetos e tudo e aspergiu branca cevada Então na cumbuca misturou vinho doce como mel e ele mesmo defronte sentouse e incitandoo disse 80 Come agora hóspede o que cabe aos escravos leitões porcos cevados comem os pretendentes sem atentar no juízo ao olhar divino ou à compunção Pois os deuses ditosos não gostam de ações terríveis mas honram a tradição as ações moderadas dos homens 85 Pois inimigos hostis esses que sobre terra estrangeira marcham e Zeus lhes dá butim enchem as naus e embarcam para retornar à casa e em seu juízo cai o forte medo do olhar divino mas aqueles sabem ouviram a voz de um deus 90 do fim funesto dele se não querem tradicionalmente cortejar nem retornar aos seus mas tranquilos os bens abocanham brutos sem restrição Tantas quantas são as noites e os dias de Zeus nunca sacrificam só uma vítima ou duas 95 brutos devastam o vinho exaurindoo Sim suas provisões eram incontáveis tais nenhum varão herói possui nem no escuro continente nem na própria Ítaca Nem de vinte heróis é tamanha a riqueza e eu para ti contarei 100 doze rebanhos bovinos no continente tantos de ovelhas tantos de porcos machos tantos dispersos de cabras apascentam estrangeiros e varões pastores dele mesmo Aqui rebanhos de cabras dispersos onze no total nos confins se apascentam e distintos varões vigiam 105 Sempre um deles a cada dia levalhes uma cabeça das bemnutridas cabras a que parecer a melhor Mas eu guardo e protejo essas porcas aqui e o melhor dos porcos seleciono e enviolhes Isso disse o outro com gosto carne comia e vinho bebia 110 voraz quieto e engendrava males aos pretendentes Após jantar e fortificar o ânimo com a comida também deulhe após enchêla a caneca da qual bebia cheia de vinho Ele a aceitou alegrouse no ânimo e falando dirigiulhe palavras plumadas 115 Amigo quem é que te comprou usando seus bens assim tão rico e poderoso como dizes Falavas que pereceu devido à honra de Agamêmnon Dizeme talvez o conheça de alhures tal homem Zeus talvez saiba e os demais deuses imortais 120 se eu poderia têlo visto e anunciar pois longe vaguei E a ele respondeu o porqueiro líder de varões Ancião nenhum varão chegando após vagar aquele anunciando convenceria a mulher e o caro filho pois carentes de cuidados varões vagantes 125 mentem e não querem o que é verdade enunciar Aquele que vagando a cidade de Ítaca alcança vai até minha senhora com palavreado embusteiro ela o recebe bem acolhe e tudo apura e lamentandose tombamlhe lágrimas das pálpebras 130 norma para a mulher se o marido alhures perece Ligeiro também tu ancião fabricarias um conto se alguém capa e túnica vestes te desse Dele já devem os cães e as aves velozes a pele dos ossos estar puxando e a vida o deixou 135 ou no mar comeramno os peixes e seus ossos jazem na costa cobertos por muita areia Assim lá pereceu e agruras ulteriores aos amigos todos sobretudo a mim se puseram nunca outro senhor assim amigável terei em lugar algum 140 nem se à casa do pai e da mãe novamente chegar onde primeiro nasci e fui criado Nem por eles ainda choro tanto embora ansiando com os olhos vêlos estando na terra pátria mas a saudade do ausente Odisseu me domina 145 Eu a ele hóspede embora não esteja aqui me acanho para nomear demais me estimava e zelava no ânimo não denominoo irmão até estando longe E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Amigo já que de todo o negarás dizes que nunca 150 aquele voltará e teu ânimo é sempre incrédulo pois eu não enunciarei assim mas jurando que Odisseu está retornando Bom anúncio seja o meu de pronto quando aquele vier e sua casa alcançar me vestirás com belas vestes capa e túnica 155 antes embora bem necessitado nada receberia Pois odioso igual aos portões de Hades a mim aquele se torna quem cedendo à pobreza usa palavreado embusteiro Saiba agora Zeus antes dos deuses a hospitaleira mesa e o fogolar do impecável Odisseu ao qual cheguei 160 por certo tudo isso completase como afirmo Neste mesmo período interlunar chegará aqui Odisseu a lua minguando e depois crescendo à casa irá retornar e vingarse de todo aquele que aqui desonra sua esposa e o filho ilustre 165 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Ancião eis que nem eu essa recompensa pagarei nem Odisseu virá mais para casa mas tranquilo bebe e lembremos adiante outras coisas e disso não me faze lembrar sim o ânimo em meu peito 170 afligese quando sou lembrado do devotado senhor O juramento pois abandonemos e Odisseu venha como a ele queremos eu Penélope o ancião Laerte e o deiforme Telêmaco Agora há inconsolável dor pelo filho que gerou Odisseu 175 Telêmaco Após os deuses o nutrirem feito broto pensava que ele também entre varões não seria pior que seu caro pai admirável em porte e beleza mas um imortal golpeouo no juízo equilibrado ou um homem partiu atrás de novas do pai 180 rumo à mui sacra Pilos A ele os ilustres pretendentes na volta para casa tocaiam para a linhagem desaparecer de Ítaca sem o nome ficar o do excelso Arquésio Pois a ele deixemos de lado ou será pego ou escapará sobreposta a mão do filho de Crono 185 Mas vamos ancião tuas próprias agruras relatame e dizeme a verdade para eu bem conhecêla quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais Chegaste em que nau Como a ti os nautas conduziram até Ítaca Quem proclamaram ser 190 De modo algum creio que a pé aqui chegaste Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Portanto a ti com muita precisão isso direi Houvessenos agora por bom tempo comida e doce vinho e nós dentro da cabana ficássemos 195 para calmo banquete e os outros seguissem obrando fácil então até durante um ano inteiro não cessaria de contar as agruras que trago no ânimo todo o conjunto que pelo poder dos deuses aguentei Proclamo ser de uma linhagem da ampla Creta 200 o filho de abastado varão Muitos outros filhos na casa nasceram e cresceram legítimos da esposa Geroume comprada mãe concubina mas a mim igual aos naturais honrava Castor filho de Latidor de cuja linhagem proclamo ser 205 ele que um dia como deus honrouse na terra cretense por conta da fortuna riqueza e filhos majestosos Mas a ele veio a sina da morte e levouo à casa de Hades e eles os recursos dividiram os filhos magnânimos e jogaram a sorte 210 e bem pouco me deram uma casa atribuíram Foime dada mulher de família abastada graças a minha excelência pois eu não era enganoso nem fugia da guerra Agora tudo já ficou para trás mas de forma geral os vestígios se miras creio 215 reconheceres ainda que me tome abundante miséria Por certo audácia me deram Ares e Atena e força rompebatalhão Quando escolhia para tocaia varões excelentes engendrando males a inimigos nunca o ânimo orgulhoso pressentia minha morte 220 ao contrário após bem na frente saltar com lança matava quem dentre os varões inimigos recuasse com os pés Esse eu era na guerra mas o trabalho não me era caro tampouco o senso doméstico que cria radiantes crianças sempre me foram caras naus com remos 225 guerras dardos bempolidos e flechas coisas funestas que para os outros horripilantes são Mas isso erame caro o que o deus pôs no juízo cada varão se deleita em trabalhos distintos Pois antes de pisarem em Troia os filhos de aqueus 230 nove vezes comandei varões em naus velozes contra varões estrangeiros e cabiame muita coisa Disso escolhia bens encantadores e muito erame atribuído logo minha casa enricou e então fizme assombroso e respeitável entre os cretenses 235 Mas quando esta rota hedionda Zeus amplavisão planejou a que soltou joelhos de muitos varões nisso insistiam que eu e o esplêndido Idomeneu liderássemos naus até Ílion e não havia meio de recusar atavanos a dura fala do povo 240 Nove anos lá combatemos os filhos de aqueus e no décimo a urbe de Príamo pilhamos e partimos para casa nas naus e um deus dispersou os aqueus E para mim coitado armou males Zeus astucioso só um mês aguardei deleitado com os filhos 245 a lídima esposa e os bens mas então ao Egito o ânimo ordenoume navegar e preparei naus com excelsos companheiros Nove naus preparei e rápido a tropa foi reunida Por seis dias então meus leais companheiros 250 banquetearamse e eu providenciava muita vítima para sacrificar aos deuses e àqueles dar um banquete No sétimo embarcamos e da ampla Creta navegamos com Bóreas belo vento sopradoalto fácil como se descendo um caudal e nenhuma 255 nau me foi danificada mas ilesos e saudáveis ficamos e vento e timoneiros as dirigiam No quinto dia atingimos o caudaloso Egito e ancorei no rio Egito as naus ambicurvas Então pedi aos leais companheiros 260 que lá ficassem junto às naus e as guardassem e instiguei batedores a buscar atalaias Aqueles cederam à desmedida seguindo seu ímpeto e ligeiro os bem belos campos de varões egípcios destruíam levavam mulheres e crianças pequenas 265 e matavam os outros Logo à cidade chegou a gritaria Tendo ouvido a algaravia quando a aurora surgiu vieram o plaino todo encheuse de soldados carros e relampejo brônzeo Lá Zeus prazernoraio lançou fuga vil em meus companheiros e ninguém suportou 270 o enfrentamento pois por todos os lados males havia Lá mataram a muitos dos nossos com bronze afiado e a outros vivos levaram como escravos Mas para mim o próprio Zeus no juízo esta ideia criou eu devia era ter morrido achado o destino 275 lá mesmo no Egito pois ainda uma desgraça me coube rápido tirei da cabeça o elmo bemconstruído o escudo dos ombros e a lança soltei da mão Dirigime para diante dos cavalos do rei tomeilhe os joelhos e beijei Ele acolheume e apiedouse 280 a mim que chorava pôs no carro e levou para casa De fato contra mim muitos arremeteram com chuços ansiando matarme sim sobremodo enraivecidos Mas ele os continha e considerava a cólera de Zeus doshóspedes que mais se indigna com vis ações 285 Então sete anos lá mesmo fiquei e acumulei muitos bens junto aos varões egípcios todos me regalavam Mas quando sobreveio em seu curso o oitavo ano nisso chegou um varão fenício mestre de engodos velhaco que já fizera muitos males aos homens 290 com seu juízo persuadiume a com ele ir à Fenícia onde ficavam sua casa e posses Então junto a ele fiquei no ciclo de um ano Mas quando dias e meses completaramse e o ano fechou seu ciclo e passaram as estações 295 rumo à Líbia colocoume em nau cruzamar planejando mentiras para eu levar carga com ele de sorte a lá me vender e obteria preço indizível Obrigado seguilhe na nau embora intuindo Ela corria com Bóreas belo vento sopradoalto 300 no meio para lá de Creta e Zeus armavalhes o fim Mas quando deixamos Creta nenhuma outra terra apareceu exceto o páramo e o mar e então nuvem cobalto pôs o filho de Crono sobre a cava nau e o mar escureceu abaixo dela 305 E Zeus trovejou e junto lançou raio sobre a nau ela inteira sacolejou golpeada pelo raio de Zeus e encheuse de enxofre e da nau caíram todos A eles quais corvosmarinhos em volta da negra nau levavam as ondas e o deus negoulhes o retorno 310 Mas o próprio Zeus para mim aflito no ânimo o mastro indômito da nau proanegra pôs nas mãos para poder escapar da desgraça Nele enroscado fui levado por ventos ruinosos Nove dias fui levado no décimo da terra dos tesprótios 315 achegoume rolando uma grande onda na noite negra Lá de mim cuidou o rei dos tesprótios Salvador um herói sem cobrar de fato seu caro filho chegou e levoume dobrado por friagem e exaustão para casa após pelo braço me erguer até chegar à morada do pai 320 Vestiume com uma capa e uma túnica Então de Odisseu fui informado aquele dizia têlo hospedado e acolhido quando ia à terra pátria e mostroume as riquezas que Odisseu amealhara bronze ouro e ferro muito trabalhado 325 Agora até a décima geração um por um alimentariam tantos haveres do senhor havia em seu palácio Dele disseme que fora a Dodona para do divino carvalho altacopa escutar a vontade de Zeus como voltaria para a gorda cidade de Ítaca 330 já há muito afastado ou às claras ou às ocultas jurou para mim mesmo entre libações que puxara uma nau e preparara companheiros que o conduziriam à cara terra pátria Mas antes enviou a mim calhou ir uma nau 335 de homens tesprótios a Dulíquion muitotrigo Pediu gentilmente que para lá me levassem até o rei Acasto E agradoulhes no juízo plano vil contra mim para eu entrar de todo na miséria da desdita Quando longe da terra singrava a nau cruzamar 340 logo contra mim engenhavam o dia da escravidão despiramme as vestes capa e túnica e cobriramme com outro trapo vil e uma túnica trapagem que podes ver diante dos olhos À noite chegamos aos campos de Ítaca bemavistada 345 Então amarraramme na nau bomconvés com corda bemtrançada firme desembarcaram e com avidez junto à praia do mar fizeram o jantar Mas meu laço afrouxaram os próprios deuses fácil com trapo encobrindo a cabeça 350 desci pela prancha de carga e aproximei do mar o peito e então com ambos os braços por aí remei nadando e bem rápido estava fora longe deles Lá subi numa área com capão bem florido e deiteime agachado eles gemendo alto 355 zanzavam Porém não lhes pareceu vantajoso investigar alhures e de volta de novo embarcavam na cava nau Esconderamme os próprios deuses fácil e a mim guiando aproximaram da quinta de habilidoso varão ainda é meu destino viver 360 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Pobre hóspede sim meu ânimo muito agitaste falando disso tudo que já sofreste e de quanto vagaste Mas não foi elegante penso nem disso me convencerás a menção a Odisseu Por que tu sendo tal careces 365 levianamente mentir Eu mesmo bem conheço o retorno de meu senhor odiado por todos os deuses de todo muito pois não o subjugaram entre troianos ou nos braços dos seus após arrematar a guerra Morto em guerra todos os aqueus lhe teriam erigido um túmulo 370 e seu filho teria granjeado grande fama para o futuro A ele porém as Harpias agarraram sem registro Mas eu junto aos porcos apartado nem à cidade vou salvo se para algo Penélope bemajuizada reclamar que eu vá quando acaso chega notícia 375 Mas aqueles lá sentados indagam cada detalhe uns aflitos por causa do senhor há tempo ausente outros alegres a comida a devorar de graça Mas não me é caro indagar nem perguntar desde que certo varão etólio me enganou com um discurso 380 ele após matar um varão e pela terra muito vaguear chegou a minha morada e eu o aninhei Disse que em Creta junto a Idomeneu viuo reparando naus que rajadas despedaçaram e disse que chegaria no verão ou na época das frutas 385 muitos bens trazendo com excelsos companheiros Também tu velho aflito como um deus te trouxe a mim não tentes me comprazer nem enfeitiçar com mentiras não por causa disso eu te respeitarei e acolherei mas por temer a Zeus doshóspedes e de ti me apiedar 390 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Deveras esse teu ânimo no peito é incrédulo tanto que mesmo jurando não te induzi nem convenci Mas agora vamos um acordo façamos depois testemunhas de ambos serão os deuses que têm o Olimpo 395 Se retornar teu senhor para essa morada vesteme com vestes capa e túnica e me envia até Dulíquion onde no ânimo foime caro estar Se teu senhor não chegar como estou dizendo instiga os escravos a lançarme da grande rocha 400 para que outro mendigo evite te iludir Respondendo disselhe o divino porqueiro Hóspede assim eu de boa fama e prestígio gozaria entre os homens de imediato e no futuro se eu que te levei à cabana e te dei regalos 405 depois te matasse e privasse do caro ânimo com fervor ofenderia Zeus filho de Crono Agora é hora de comer que logo meus companheiros cá estivessem para na cabana prepararmos saboroso jantar Enquanto assim falavam entre si 410 para perto porcos e varões porcariços vieram Às fêmeas confinaram nos espaços para dormir e estrídulo indizível partiu das porcas encerradas Ele a seus companheiros isto ordenou o divino porcariço Trazei o melhor porco para eu sacrificar ao hóspede 415 longínquo nós mesmos nos beneficiaremos em agonia há tempo vivendo sofrendo por porcos dentebranco outros nossa fadiga incompensada devoram Isso dito rachou lenha com bronze impiedoso e eles trouxeram um porco bem gordo de cinco anos 420 Então o puseram na lareira O porqueiro não esqueceu os imortais pois tinha um juízo bom ele como primícias no fogo lançou cerdas da cabeça do porco dentebranco e rezou a todos os deuses pelo retorno de Odisseu muitojuízo a sua casa 425 De pé golpeouo com toco de carvalho inteiriço e a vida o abandonou Eles o degolaram queimaram cerdas e logo o desmembraram o porqueiro dispôs peças cruas primícias de todos os membros na gorda banha Isso no fogo lançou após aspergir grãos de cevada 430 cortaram o restante transpassaram em espetos assaram com todo o cuidado tudo retiraram e o conjunto lançaram à mesa O porqueiro ergueuse para trinchar no juízo bem sabia o correto E tudo em sete partes separou dividindo 435 uma única às ninfas e a Hermes o filho de Maia dispôs após rezar e as restantes ofereceu a cada um A Odisseu honrou com nacos extensos de lombo do porco dentebranco e enalteceu o ânimo do senhor A ele falando dirigiuse Odisseu muitaastúcia 440 Tomara Eumeu te tornes tão caro a Zeus pai como a mim que com tantas benesses me honras Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Come insano hóspede e deleitate com isto que temos o deus uma coisa dará outra negará 445 como em seu ânimo quiser pois pode tudo Falou e sacrificou o consagrado a deuses sempiternos após libar fulgente vinho a Odisseu arrasaurbe o pôs em suas mãos e esse sentouse junto a sua parte Pão distribuialhes Dopátio a quem o próprio 450 porqueiro adquirira sozinho ausente o senhor sem o conhecimento da senhora e do ancião Laerte junto aos táfios comprouo usando seus bens E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida 455 Dopátio retirou o pão e eles após de pão e carne fartarse para o repouso apressaramse E a noite chegou sinistra lua escura Zeus choveu toda a noite e soprou o grande Zéfiro sempre chuvoso E entre eles falou Odisseu para testar o porqueiro 460 a ver se despindose ele lhe daria a capa ou a outro companheiro incitaria pois que dele cuidava bastante Escuta agora Eumeu e todos os outros companheiros gabandome contarei uma história o vinho impõe doido e te insta embora muitojuízo a cantar 465 e rir levianamente impulsionate a dançar e enunciar uma história que é melhor silenciar Mas como já soltei a língua não me esquivarei Tomara eu fosse jovem e minha força segura como quando sob Troia sofremos ordenada tocaia 470 Comandavam Odisseu e Menelau filho de Atreu e com eles o terceiro a liderar era eu pois mandaram Quando chegamos à urbe e sua muralha escarpada nós em torno da cidade por entre cerrados arbustos em meio a juncos do pântano tombados sob as armas 475 jazíamos e a noite chegou sinistra junto Bóreas gelada e de cima vinha neve como geada fria e gelo se acumulava em volta dos escudos Lá todos os outros dispunham de capas e túnicas e dormiam tranquilos os escudos a cobrirlhe os ombros 480 mas eu a capa ao partir com companheiros deixei insensato por não pensar que faria frio e segui só com escudo e cinturão resplandecente No terço final da noite concluído o périplo das estrelas então me dirigi a Odisseu que estava próximo 485 com o cotovelo o cutuquei e ele sem demora entendeu Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque não mais entre os vivos ficarei já que a mim a friagem extenua pois capa não tenho Induziume a divindade a vir só com túnica agora não há mais como fugir 490 Assim falei e então ele teve esta ideia no ânimo distinto como ele era para planejar e combater e pôsse a falar em voz baixa e dirigiume o discurso Quieto agora que nenhum outro aqueu te escute Falou e sobre o cotovelo ergueu a cabeça e enunciou 495 Ouvi amigos veio até mim no sono divino sonho Bem distantes das naus estamos tomara alguém pudesse dizer ao filho de Atreu Agamêmnon pastor de tropa que ordenasse mais homens viessem das naus Assim falou e lançouse Toas o filho de Andráimon 500 célere deixando para trás a capa marrom pôsse a correr rumo às naus Eu sob suas roupas deiteime feliz e brilhou Aurora tronodourado Fosse eu agora assim jovem e minha força segura um porqueiro me daria na quinta uma capa 505 por duas razões amizade e respeito por bom herói E agora me desonram eu com roupas vis sobre a pele Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Ancião tua história é impecável a que contaste nenhuma palavra desvantajosa e sem adequação pronunciaste 510 assim não disporás de veste nem de outra coisa que convém a um suplicante calejado diante de nós agora mas de manhã sacudirás teus trapos Pois não há muitas capas e túnicas sobressalentes aqui para vestir uma somente para cada homem 515 Mas quando voltar o caro filho de Odisseu ele te dará vestimentas capa e túnica e te enviará para onde teu coração e ânimo impelem Assim falou ergueuse e pôslhe perto do fogo o leito e nele lançou peles de ovelhas e cabras 520 Aí Odisseu deitouse E uma capa sobre ele lançou compacta e grande que sobressalente tinha pronta para vestir quando fizesse mau tempo assustador Assim Odisseu aí repousou e ao lado dele os varões repousaram jovens Ao porqueiro 525 desagradava o repouso lá dormir longe dos porcos então preparavase para sair Odisseu alegrouse pois que cuidava de seus recursos mesmo ele distante Primeiro espada afiada lançou em torno do ombro robusto em volta vestiu a capa protetora bem compacta 530 agarrou o couro de grande cabra bemnutrida e pegou afiada lança proteção contra cães e varões E foi descansar onde os porcos dentebranco sob rocha côncava dormiam ao abrigo de Bóreas E até a espaçosa Lacedemônia Palas Atena foi ao ilustre filho do animoso Odisseu lembrar do retorno e incitálo a retornar Encontrou Telêmaco e o radiante filho de Nestor 5 deitados no vestíbulo do majestoso Menelau o filho de Nestor era dominado por sono macio e a Telêmaco doce sono não dominava mas no ânimo na noite imortal inquietações com o pai o acordavam Parada perto disselhe Atena olhosdecoruja 10 Telêmaco não mais é belo longe de casa vagares deixaste bens para trás e em tua casa varões tão soberbos que não te devorem tudo teus bens dividindo e tu o trajeto faças em vão Mas rápido instiga Menelau bomnogrito 15 a enviarte para ainda topares em casa a mãe impecável Pois seu pai e irmãos já a incentivam a ser desposada por Eurímaco ele supera todos os pretendentes com dons e aumenta as dádivas do pai que contra tua vontade não se levem bens da casa 20 Pois tu sabes é tal o ânimo no peito da mulher quer expandir a casa daquele que a desposa e dos filhos anteriores e do caro esposo não mais se lembra quando morto nem indaga Deverias tu mesmo voltando tudo entregar 25 à escrava que te parecer ser a mais nobre até deuses te revelarem majestosa consorte Outra palavra te direi e tu compreendea no ânimo os melhores pretendentes deliberadamente te tocaiam no canal entre Ítaca e a escarpada Samos 30 ansiando matarte antes que atinjas a terra pátria Não creio nisso porém antes mesmo a terra cobrirá os varões pretendentes que devoram teus recursos Mas para longe das ilhas afasta a nau engenhosa e também à noite navega chegará a ti uma brisa 35 que te envia um dos imortais que te guarda e protege E quando chegares à primeira praia de Ítaca expede à cidade a nau e todos os companheiros e tu mesmo primeiro ao porqueiro te dirijas o guardião de teus porcos contigo também gentil 40 Lá descansa à noite e expedeo à cidade para anunciar a Penélope bemajuizada que estás são e salvo e de Pilos retornaste Ela após falar assim partiu ao elevado Olimpo e ele ao filho de Nestor despertou do doce sono 45 chutandoo com o pé e lhe dirigiu o discurso Acorda Pisístrato filho de Nestor os cavalos monocasco traze e junge ao carro para percorrermos a rota A ele então Pisístrato filho de Nestor retrucou Telêmaco não há como mesmo com pressa partir 50 pela noite escura a guiálos logo virá a aurora Espera até que traga presentes e no carro os ponha o herói filho de Atreu Menelau famosonalança e te anime com palavras suaves e de volta te envie Desse o hóspede se lembra todos os dias 55 do varão hospitaleiro que demonstrar amizade Assim falou e logo veio Aurora tronodourado E achegouse deles Menelau bomnogrito após erguerse do leito de junto de Helena belasmadeixas A ele então vislumbrou o caro filho de Odisseu 60 apressado a túnica lustrosa em torno da pele vestiu lançou grande manto nos ombros robustos o herói foi para fora e parado ao lado disselhe Telêmaco o caro filho do divino Odisseu Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa 65 já agora me envia de volta à cara terra pátria Já deseja meu ânimo vê partir para casa E a ele então respondeu Menelau bomnogrito Telêmaco não por muito tempo aqui te deterei se anseias pelo retorno indignome contra todo 70 varão hospitaleiro que com excesso acolhe ou com excesso odeia tudo que é medido é melhor Igual mal incitar o hóspede que não quer partir a fazêlo e reter o que está apressado Carece acolher o hóspede presente e despedirse do que quer ir 75 Mas fica até que eu traga presentes belos e os ponha no carro tu com os olhos os veja e eu diga às mulheres que no salão preparem o almoço com o que há em profusão Ambos há majestade e esplendor e também auxílio se após comer se percorre a extensa terra semfim 80 Se queres perambular na Hélade até o meio de Argos para eu mesmo contigo seguir jungirei cavalos e às urbes dos homens te guiarei ninguém a nós enviará de volta assim mas nos oferecerão ou alguma trípode de fino bronze ou uma bacia 85 ou duas mulas ou uma taça de ouro A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa quero já retornar até os meus pois atrás não deixei ao vir um guardião de minhas posses 90 que procurando o excelso pai eu mesmo não pereça ou que algum bem valioso do palácio se perca Ao ouvir isso Menelau bomnogrito logo a sua esposa e às escravas ordenou preparar almoço com o que havia em profusão 95 E achegouse Verídico filho de Auxiliador após erguerse do leito pois não morava muito longe mandouo acender o fogo Menelau bomnogrito e carne assar e ele ouviu e obedeceu Menelau desceu ao aposento oloroso 100 não sozinho com ele iam Helena e Grandaflição Mas quando chegaram onde estavam seus bens o filho de Atreu tomou de um cálice duplaalça e ao filho Grandaflição pediu que separasse uma ânfora de prata Helena postouse junto às arcas 105 onde havia peplos bem ornados que ela mesma lavrara Pegou um único deles e levou divina mulher o que era o mais belo com ornamentos e o maior e como um astro refulgia estava embaixo de todos E deslocaramse de volta pela casa até alcançar 110 Telêmaco e a ele disse o loiro Menelau Telêmaco o retorno como em teu juízo concebes que isso te cumpra Zeus o ressoante marido de Hera Dos dons de quantos bens há em minha casa eu te darei o mais belo e mais valioso 115 Uma ânfora bemfeita te darei de prata ela é toda e sua borda tem acabamento em ouro obra de Hefesto Deuma o herói Lúzio rei dos sidônios quando em sua casa albergoume ao lá passar no retorno com ela te quero presentear 120 Falou assim e nas mãos colocou o cálice duplaalça o herói filho de Atreu Eis que a ânfora luzidia trazia o forte Grandaflição e pôs diante dele de prata Ao lado postouse Helena belaface com o peplo nas mãos dirigiuselhe e nomeouo 125 Dom também eu filho querido este te dou lembrança das mãos de Helena para as bodas desejadas que tua esposa o use entrementes junto à cara mãe deposita no palácio Que tu alegre voltes à casa bemconstruída e a tua terra pátria 130 Falou assim e nas mãos o pôs e ele alegre recebeu Esses dons acomodou na cesta o herói Pisístrato após recebêlos e tudo admirou em seu ânimo E levouos para a casa Menelau de loiro cabelo Então os fez sentar em cadeiras e poltronas 135 Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente e junto muitos petiscos oferecendo o que havia 140 Junto o filho de Auxiliador partia carne e a distribuía e o filho do majestoso Menelau escançava vinho E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida então Telêmaco e o radiante filho de Nestor 145 jungiram os cavalos subiram no variegado carro e partiram do pórtico da colunata ressoante E atrás deles ia o filho de Atreu o loiro Menelau com vinho adoçajuízo na mão direita em cálice dourado para os dois libarem e partir 150 Parado diante dos cavalos saudandoos disse Sede felizes jovens e a Nestor pastor de tropa falai pois para mim era como um pai amigável enquanto em Troia peleávamos os filhos de aqueus A ele então o inteligente Telêmaco retrucou 155 Deveras a ele ó criado por Zeus como dizes tudo ao chegarmos contaremos Tomara eu assim após retornar a Ítaca encontrando Odisseu em casa pudesse falar que tendo de ti obtido toda a amizade parti e levei bens em profusão e distintos 160 Depois de ter falado em sua direção voou à direita uma águia com cintilante gansa doméstica do pátio nas garras um prodígio seguiamna berrando varões e mulheres Ela deles se aproximou e à direita adejou diante dos cavalos Aqueles vendoa 165 alegraramse e no peito de todos o ânimo esquentou Entre eles Pisístrato filho de Nestor tomou a palavra Analisa Menelau criadoporZeus líder de tropa se o deus mostrou o presságio a nós dois ou a ti Assim falou e cogitou Menelau caroaAres 170 como após pensar com adequação lhe responderia Antes dele Helena peplobomtalhe falou o discurso Ouvime eu adivinharei como em meu ânimo lançam os imortais e creio que assim se completará Como aquela pegou a gansa criada na propriedade 175 ao vir da montanha onde família e filhote estão assim Odisseu após muitos males sofrer e muito vagar à casa irá retornar e vingarse ou também já em casa está e a todos os pretendentes engendra um mal A ela então o inteligente Telêmaco retrucou 180 Que agora assim fixe Zeus ressoante marido de Hera então a ti também lá rezarei como a um deus Falou e sobre os cavalos lançou o chicote eles bem rápido saltaram através da cidade sôfregos pela planície Agitaram o dia todo o jugo que levavam nos dois lados 185 E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam E chegaram a Feras rumo à casa de Diocles o filho de Tocaioso que Alfeio gerou como filho Lá descansaram à noite e ele lhes regalou Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos 190 jungiram os cavalos e subiram no variegado carro e partiram do pórtico da colunata ressoante Chicoteou para puxarem e eles de bom grado voaram Eis que rápido chegaram à escarpada cidade de Pilos então Telêmaco interpelou o filho de Nestor 195 Filho de Nestor como aceitarias e cumpririas meu discurso Aliados para sempre proclamamos ser por causa da amizade dos pais mas somos coetâneos Este caminho levará ainda mais à concórdia Não me afastes da nau criadoporZeus deixame aqui 200 que o ancião sem eu querer não me retenha em casa ansiando acolherme carece que eu chegue bem rápido Assim falou e o filho de Nestor planejou em seu ânimo como aceitaria e cumpriria com adequação Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim 205 dirigiu os cavalos à nau veloz e à orla do mar na popa da nau desembarcou os belos dons vestes e ouro que Menelau ao outro dera e a ele incitando dirigiu palavras plumadas Com zelo agora embarca e incita todo companheiro 210 antes que eu em casa chegue e informe o ancião Tudo isto conheço bem no juízo e no ânimo como o ânimo dele é brutal não te deixará ir mas ele mesmo cá virá te chamar e não creio que ele voltará sem nada pois estará enraivecido de todo 215 Falou assim chicoteou os cavalos belapelagem de volta à urbe dos pílios e rápido em casa chegou E Telêmaco instigando os companheiros ordenou Organizai o equipamento companheiros na negra nau e nós mesmos embarquemos para realizar a rota 220 Assim falou e eles o ouviram direito e obedeceram e logo embarcaram e sentaram junto aos calços Ele isto preparava e rezava e libava a Atena junto à popa da nau e das cercanias veiolhe um varão de terra distante fugindo de Argos pois a um varão matara 225 e era adivinho Quanto à família descendia de Melampo que antes morava em Pilos mãe de ovelhas e cabras rico entre os pílios notável habitante Então partiu à cidade de outros fugindo da pátria e do animoso Neleu o mais ilustre dos vivos 230 que dele muita riqueza no ciclo de um ano reteve à força Então ele no palácio de Fílaco preso com laço difícil sofria fortes agonias por causa da filha de Neleu e do desvario profundo que lhe pôs no juízo a deusa Erínia visitantedacasa 235 Mas ele escapou da morte tangeu bois muitomugido de Filace até Pilos vingouse do feito ultrajante contra o excelso Neleu e como esposa para o irmão conduziua à casa deste E ele chegou à cidade de outros a Argos nutrepotros pois aí eralhe destinado 240 habitar sendo o rei de muitos argivos Lá desposou sua mulher fez casa grandiosa e gerou Antífates e Adivinhoso filhos poderosos Antífates gerou o animoso Oicleio e Oicleio Anfiarau moveexército 245 ao qual demais amaram Zeus portaégide e Apolo com todo amor e não atingiu o umbral da velhice mas pereceu em Tebas por causa de dons femininos Dele os filhos foram Alcmaion e Anfíloco Adivinhoso por sua vez gerou Polifeides e Ilustre 250 Mas a Ilustre raptou Aurora tronodourado por sua beleza para que ficasse entre imortais e um adivinho do autoconfiante Polifeides Apolo fez de longe o melhor dos mortais após morrer Anfiarau Ele para Hiperésia mudouse com raiva do pai 255 onde morando adivinhava para todo mortal Eis que o filho desse chegou de nome Teoclímeno que então perto de Telêmaco se pôs alcançouo libando e rezando junto à negra nau veloz e falando dirigiulhe palavras plumadas 260 Meu caro já que te alcanço sacrificando nesta terra suplico pelos sacrifícios e pela divindade e depois por ti próprio e pelos companheiros que te seguem Diga a mim que inquiro o que é veraz e não ocultes quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais 265 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Pois eu te falarei estranho com muita precisão Sou de uma família de Ítaca e meu pai é Odisseu se um dia existiu agora já pereceu em funesto fim Por isso agora após obter companheiros e negra nau 270 parti e busquei notícia do pai há tempo ausente E a ele dirigiuse o deiforme Teoclímeno Assim também eu da pátria saí após matar varão de meu povo Muitos irmãos e parentes tinha por Argos nutrepotros com grande poder sobre aqueus 275 para evitar a negra perdição da morte que deles vem exileime pois cumpreme vagar entre os homens Mas admiteme na nau exilado suplicote que eles não me matem pois creio ser perseguido A ele então o inteligente Telêmaco retrucou 280 Claro como queres não te afastarei da nau simétrica mas vem lá serás acolhido com o que temos Após falar assim tomoulhe a lança brônzea estendeua na plataforma da nau ambicurva e ele mesmo embarcou na nau cruzamar 285 Sentouse na popa da nau e junto dele fez sentar Teoclímeno e os outros soltaram os cabos Telêmaco instigando os companheiros pediulhes pegar no cordame e eles com avidez obedeceram O mastro de abeto dentro da côncava enora 290 ergueram fixaram e prenderam com estais e içaram branca vela com tiras de couro bemtrançadas A eles brisa bemvinda enviou Atena olhosdecoruja ventando agitada pelo céu para que bem rápido a nau efetuasse a corrida pela água salina do mar 295 Passou ao largo de Cruno e Cálcis belascorrentes E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam e ela alcançou Feas impulsionada pela brisa de Zeus e passou pela diva Élida onde dominam os epeus Lá então direcionoua rumo às ilhas Ligeiras 300 revolvendo se escaparia da morte ou seria pego Nisso os dois na cabana Odisseu e o divino porcariço jantavam e junto deles jantavam os outros varões Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida entre eles falou Odisseu testando o porqueiro 305 ou ainda o acolheria com atenção e diria para ficar lá mesmo na quinta ou o expediria à cidade Escuta agora Eumeu e todos os outros companheiros de manhã almejo retornar à cidade para mendigar que a ti e aos companheiros eu não esgote 310 Mas aconselhame bem e oferta um nobre guia que me leve até lá pela urbe eu mesmo por necessidade vagarei esperando me estendam caneca e pãozinho E tendo ido à casa do divino Odisseu um anúncio faria à bemajuizada Penélope 315 e me juntaria aos pretendentes soberbos esperando me darem refeição pois têm comida a granel Logo poderia bem servilos no que quisessem Pois eu falarei e tu compreende e me escuta por meio de Hermes condutor que aos feitos 320 de todos os homens graça e majestade confere nenhum mortal disputaria comigo em serviços montar bem o fogo rachar madeira combustível trinchar e assar e escançar serviços que aos bons prestam os inferiores 325 Bem perturbado a ele dirigiuse o porqueiro Eumeu Ai de mim hóspede por que ao teu juízo essa ideia veio Tu deveras almejas lá perecer se de fato queres penetrar na hoste de pretendentes cuja desmedida e violência atinge o céu ferroso 330 Saiba que não são dessa espécie aí os seus serviçais mas jovens bemvestidos com capas e túnicas sempre reluzentes suas cabeças e belas faces esses que àqueles servem bempolidas mesas estão sempre cheias de pão carnes e vinho 335 Não fica ninguém se irrita com tua presença nem eu nem nenhum companheiro que comigo está Mas quando voltar o caro filho de Odisseu ele com vestes te vestirá capa e túnica e te enviará aonde coração e ânimo te impelem 340 E a ele respondeu o muitatenência divino Odisseu Tomara Eumeu te tornes tão caro a Zeus pai como a mim pois cessaste minha errância agonia terrível Perambulação nada pior existe entre os mortais mas devido ao funesto estômago tem vis agruras 345 o varão a quem atingem errância miséria e aflição Agora como me reténs e ordenas que o aguarde vamos falame da mãe do divino Odisseu e do pai que ele ao partir deixou no umbral da velhice se ainda estão entre os vivos sob os raios do sol 350 ou já estão mortos na morada de Hades E a ele dirigiuse o porqueiro líder de varões Portanto a ti hóspede com muita precisão direi Laerte ainda vive e para Zeus reza sempre que a vida desapareça de seus membros na casa 355 assustador como chora pelo filho ausente e pela lídima esposa atilada que a ele demais afligiu ao perecer e tornouo um velho prematuro Ela pereceu de aflição pelo filho majestoso em morte deplorável assim não morra quem 360 dos que nesta terra moram me é caro e benfeitor De fato enquanto ela vivia embora muito aflita então erame caro algo indagar e perguntar pois ela mesma criou a mim e Ctimena peplobomtalhe a filha altiva a mais nova das crianças que gerou 365 com ela fui criado e honravame bem pouco menos Quando ambos atingimos a juventude muito amada casaramna em Same e adquiriram muitos dons a mim com vestes capa e túnica aquela cobriu bem belas para os pés deu alpercatas 370 e ao campo me enviou ainda mais me amava Agora sinto falta disso mas para mim mesmo os deuses ditosos propiciam a lida onde fico disso comi e bebi e dei aos que se deve respeito Da senhora não é possível ouvir algo amável 375 nem palavra nem ação desde que o mal caiu na casa os varões soberbos E escravos demais almejam diante da senhora conversar e de tudo se informar comer e beber e então também algo levar para si ao campo do que sempre esquenta o ânimo dos servos 380 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Incrível quando eras tão pequeno porqueiro Eumeu muito vagaste para longe de tua pátria e dos pais Mas vamos dizeme isto e conta com precisão ou foi devastada a cidade de varões com amplas ruas 385 na qual habitavam teu pai e a senhora mãe ou a ti isolado junto a ovelhas ou junto a bois varões inimigos com naus pegaram e venderam para a casa desse varão que pagou preço digno E a ele dirigiuse o porqueiro líder de varões 390 Hóspede já que isso me perguntas e investigas em silêncio presta atenção deleitate e bebe vinho sentado Essas noites são infindáveis é possível dormir é possível deleitarse em ouvir Não carece que tu antes da hora te deites muito sono também irrita 395 Quanto aos outros a quem o ânimo do coração impele retiremse e durmam despontando a aurora comam e sigam com os porcos do senhor Nós dois na cabana bebendo e banqueteando com as agruras um do outro deploráveis nos deleitemos 400 lembrando mais tarde até com aflições deleitase o varão todo que muitos males sofreu e muito vagou Mas isto eu te direi o que me inquires e questionas Há uma ilha chamada Síria se já escutaste para cima da ilha Codorna onde os raios do sol voltam 405 não populosa por demais mas de fato boa bom gado boas ovelhas rica em vinho muito trigo A fome nunca atinge a comunidade e nenhuma outra doença hedionda sobrevém aos pobres mortais mas quando as tribos de homens envelhecem na urbe 410 vem Apolo arcodeprata com Ártemis e com suas flechas suaves chega e mata Há duas cidades e para elas tudo em dois é dividido sobre essas duas meu pai regia Ricoso filho de Açodado semelhante aos imortais 415 Lá chegaram varões fenícios famosos pelas naus velhacos trazendo milhares de adornos na negra nau Havia na casa de meu pai mulher fenícia bela e grande conhecedora de radiantes trabalhos Eis que iludiramna os muito experientes fenícios 420 Primeiro na lava de roupa um deles junto à cava nau uniuse a ela em enlace amoroso isso que ilude o juízo de bem femininas mulheres ainda que honestas sejam Indagou depois quem seria e de onde teria vindo Ela de pronto indicou a grandiosa casa de meu pai 425 De Sídon muitobronze proclamo ser e sou filha de Aribas cujas riquezas abundam mas os táfios varões piratas me raptaram ao voltar do mercado cá me trouxeram e venderam para a casa desse varão que pagou preço digno 430 E dirigiuselhe o varão que a ela se unira em segredo Portanto agora voltarias conosco para casa para veres a grandiosa casa do pai e da mãe e a eles Por certo ainda vivem e são ditos ricos E a ele dirigiuse a mulher e reagiu com o discurso 435 Isso seria possível se pelo menos quisésseis nautas com jura garantir que para casa me levarão a salvo Assim falou e eles todos logo juraram como pediu E após jurar por completo esse juramento entre eles de novo falou a mulher e reagiu com o discurso 440 Silêncio agora nenhum se dirija a mim com palavras um de vossos companheiros encontrandose ou na rua ou junto à fonte para ninguém ir à casa ao ancião informar o qual após refletir me prenderá com laço difícil e conceberá vosso fim 445 Mantende no juízo o discurso e apressai os negócios Mas quando a nau já estiver plena de recursos enviai à casa rápido uma mensagem trarei inclusive ouro todo o que estiver à mão Também gostaria de dar outra paga pela viagem 450 o filho do bom varão no palácio eu crio ele é tão ladino também corre porta afora Eu o traria à nau e para vós preço altíssimo renderia onde o vendêsseis entre homens outralíngua E ela após falar assim partiu à bela morada 455 eles lá permanecendo junto a nós um ano todo na côncava nau negociaram muitos recursos Mas quando a cava nau carregada estava para o retorno enviaram um mensageiro para avisar a mulher Chegou um varão multiperspicaz à casa de meu pai 460 com corrente de ouro entrelaçado com âmbar Nela no salão as escravas e a senhora mãe puseram as mãos em volta e com os olhos miravam preço oferecendo e ele àquela acenou em silêncio Então após acenar partiu rumo à côncava nau 465 e ela pegoume pela mão e saiu de casa porta afora Encontrou no vestíbulo cálices e mesas de varões convivas que assessoravam meu pai Tinham ido a uma sessão para a fala do povo e ela rápido três taças ocultou sob o colo 470 e levouas eu a segui por conta de cego juízo E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam e nós fomos ao porto famoso apressandonos onde estava a nau saltadora dos varões fenícios Eles então embarcaram e cruzavam fluentes caminhos 475 após embarcarem a nós dois e Zeus lançava a brisa Seis dias navegamos sem parar de noite e de dia mas quando o sétimo dia fixou Zeus filho de Crono então atingiu àquela mulher Ártemis vertesetas e no porão ribombou após cair como andorinhadomar 480 Para tornarse butim de focas e peixes jogaramna e eu fui deixado angustiado no coração E de Ítaca achegaramse levandoos vento e água onde Laerte comproume usando seus bens Assim esta terra eu vi com meus olhos 485 E o divinal Odisseu respondeulhe com o discurso Eumeu sim muito agitaste meu ânimo no peito falando dessas tantas aflições que já sofreste no ânimo Mas para ti junto ao mal pôs também algo bom Zeus pois chegaste após muito penar à casa de varão 490 amigável que agora te fornece alimentos e bebida gentil e vives com bons recursos mas eu após vagar por muitas urbes de mortais chego aqui Assim eles disso falavam entre si e não dormiram um tempo longo mas curto 495 logo veio Aurora belotrono Aproximandose da praia os companheiros de Telêmaco soltaram vela abaixaram mastro rápido e à ancoragem a nau impulsionaram com remos Lançaram a âncora e prenderam os cabos da popa eles mesmos desembarcaram na rebentação do mar 500 prepararam refeição e misturaram fulgente vinho Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida entre eles o inteligente Telêmaco tomou a palavra Vós agora à cidade guiai a negra nau mas eu irei às terras cultivadas e aos pastores 505 descerei à noite à cidade após ver meus campos De manhã vos ofertarei uma recompensa belo banquete com carnes e vinho suave E a ele dirigiuse o deiforme Teoclímeno Aonde eu filho querido devo ir Devo chegar à casa 510 de que varão dos que regem pela rochosa Ítaca Ou devo ir direto à casa de tua mãe e tua A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Em outras condições eu te mandaria até nós não carecem regalos mas para ti mesmo 515 será pior pois eu estarei longe e a ti a mãe não verá pois com frequência aos pretendentes na casa não se mostra mas longe em cima tece a trama Mas outro varão te indico a quem poderás te dirigir Eurímaco o filho radiante do atilado Polibo 520 a quem agora como a um deus os itacenses miram também é o mais nobre varão que espera desposar minha mãe e possuir a honraria de Odisseu Mas disto sabe Zeus Olímpio morando no céu se para eles antes das bodas cumprirá o dia danoso 525 Assim para ele após falar voou à direita uma ave gavião o rápido mensageiro de Apolo nos pés depenava um pombo e deixava cair penas no chão entre a nau e o próprio Telêmaco Teoclímeno afastandoo dos companheiros 530 deulhe forte aperto de mão e dirigiulhe a palavra Telêmaco não sem o concurso do deus voou o pássaro à direita reconheço nele olhando de frente um presságio Não há outra linhagem mais régia que a tua na cidade de Ítaca vós sois mais potentes sempre 535 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Ah Se essa palavra hóspede se cumprisse então rápido conhecerias a amizade e muitos dons meus tantos que se alguém te visse te diria ditoso Falou e interpelou Peiraio confiável companheiro 540 Peiraio filho de Clítio tu em tudo é quem mais me atende entre os companheiros que a Pilos foram comigo também agora o estranho conduza e em tua casa gentil o acolhe e honra até eu chegar A ele então retrucou Peiraio famosonalança 545 Telêmaco mesmo se ficares muito tempo aqui eu o hospedarei e a ele regalos não serão necessários Após falar assim foi até a nau e pediu aos companheiros que também eles embarcassem e soltassem os cabos Eles logo embarcaram e sentaramse junto aos calços 550 E Telêmaco atou aos pés belas sandálias e tomou a brava lança afiada com ponta de bronze da plataforma da nau e eles soltaram os cabos Após afastála navegavam à cidade como pedira Telêmaco o caro filho do divino Odisseu 555 rápido avançando os pés levaramno até o pátio onde havia miríades de porcas com as quais o porqueiro distinto dormia versado no que agrada aos senhores Nisso os dois na cabana Odisseu e o divino porcariço preparavam o desjejum de manhã após acender o fogo e enviaram os pastores com o conjunto de porcos E para Telêmaco abanaram o rabo os cães ladradores 5 e não ladraram com sua chegada Viu o divino Odisseu os cães abanando o rabo e o som de pés o envolveu Eis que logo a Eumeu dirigiu palavras plumadas Eumeu por certo cá chegará um companheiro ou outro conhecido pois os cães não ladram 10 mas abanam o rabo e escuto o ruído de pés Não havia terminado a fala quando seu caro filho parou no pórtico Estuporado ergueuse o porqueiro e de suas mãos caíram as vasilhas com que se ocupava misturando fulgente vinho Ele apresentouse ao senhor 15 beijouo na cabeça nos dois belos olhos e em ambas as mãos e dele tombou espessa lágrima Como um pai com afeto saúda o caro filho que chega de terra distante no décimo ano único e muito amado por quem sofreu agonia demais 20 assim ao deiforme Telêmaco o porcariço divino beijou e abraçouo todo como a quem da morte escapou Chorando dirigiulhe palavras plumadas Chegaste Telêmaco doce luz não mais eu a ti pensava ver depois que partiste com a nau a Pilos 25 Mas vamos entra caro filho para que no ânimo me deleite vendote há pouco de volta aqui dentro Por certo não vens amiúde ao campo nem aos pastores mas ficas na urbe pois assim deve agradarte no ânimo observar a reunião infernal de varões pretendentes 30 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Será assim papá por tua causa vim para cá para que te veja com os olhos e escute palavra se minha mãe ainda se mantém no palácio ou já um outro varão a desposou e quiçá na cama de Odisseu 35 carente de ocupantes há vis teias de aranha E a ele dirigiuse o porqueiro líder de varões É claro que ela aguarda com ânimo resistente em teu palácio para ela sempre agonizantes esvaem as noites e os dias e verte lágrimas 40 Após falar assim tomoulhe a lança brônzea e ele foi para dentro cruzou o umbral de pedra Quando achegouse cedeulhe assento o pai Odisseu Telêmaco do outro lado conteveo e disse Senta estranho nós também temos assento alhures 45 em nossa quinta há um varão aqui que o arranjará Isso disse e ele de novo sentou Para o outro o porqueiro jogou galhos verdes e um velo sobre eles lá então sentouse o caro filho de Odisseu Para eles o porqueiro dispôs gamelas com carnes 50 cozidas que na véspera deixaram ao comer pão amontoava com zelo em cestas e eis que na cumbuca misturou vinho doce como mel ele próprio sentouse diante do divino Odisseu E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos 55 Mas após apaziguar o desejo por comida e bebida nisso Telêmaco interpelou o divino porcariço Papá de onde veio esse estranho Como nautas trouxeramno até Ítaca Quem proclamaram ser De modo algum creio que a pé aqui chegou 60 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Portanto eu te falarei filho toda a verdade Proclama ser de uma família da ampla Creta e diz ter perambulado por muitas urbes vagando isso destinoulhe a divindade 65 Agora porém fugiu da nau de varões tesprótios e chegou a minha quinta e eu o porei em tuas mãos Faça como quiseres teu suplicante proclama ser A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Eumeu deveras aflitiva essa fala que falaste 70 Como é que ao estranho eu acolherei em casa Eu próprio sou jovem e nos braços não confio para afastar um varão quando primeiro endurece No peito de minha mãe o ânimo cogita dividido ou ficar aqui junto a mim e dirigir a casa 75 respeitando a cama do marido e a fala do povo ou já seguir quem for dos aqueus o melhor varão que a corteja no palácio e que mais oferta Mas ao estranho pois alcançou tua casa vou vestilo com capa e túnica belas vestes 80 darei uma espada duaslâminas e sandálias para os pés e enviarei aonde coração e ânimo o impelem Se queres cuida dele tu e retémno na quinta vestes para cá enviarei e também comida para que a ti e aos companheiros não esgote 85 Para lá entre os pretendentes eu não o permitiria ir pois se entregam a desmedida assaz iníqua que não o provoquem minha aflição seria terrível Mesmo a um varão altivo é difícil fazer algo em meio aos outros em número tão superior 90 E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Amigo como é norma que eu também responda ao ouvirte dilacerase meu caro coração tais as iniquidades que falastes pretendentes engenham no palácio em oposição a ti sendo quem és 95 Dizeme és oprimido de bom grado ou a ti o povo odeia na região seguindo a sugestão de um deus Ou em algo censura irmãos justo em quem um varão na peleja confia mesmo se ocorre grande contenda Tomara fosse eu tão jovem como jovem é meu ânimo 100 ou o filho do impecável Odisseu eu fora ou mesmo o próprio que chegasse vagando resta ainda uma parte de esperança logo depois poderia cortar minha cabeça um herói hostil caso eu não me tornasse um mal para todos eles achegando ao salão de Odisseu filho de Laerte 105 Se eles mais numerosos me subjugassem preferiria assassinado em meu palácio estar morto a sempre afrontar estes ultrajes eles a maltratar estranhos e arrastar escravas de forma ultrajante na bela morada 110 emborcando vinho e comendo pão assim à toa sem fim para um feito sem remate A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Portanto a ti hóspede com muita precisão direi Nem todo o povo com ódio contra mim endurece 115 nem censuro irmãos justo em quem um varão na peleja confia mesmo se ocorre grande contenda Em nossa linhagem o filho de Crono só dá um único o único filho que Arquésio gerou foi Laerte o único então Odisseu a quem como pai gerou Odisseu 120 o único a mim no palácio gerou e deixou sem desfrutar Por isso agora miríades de inimigos na casa há Com efeito quantos nobres têm poder sobre as ilhas Dulíquion Same e a matosa Zacintos e quantos regem pela rochosa Ítaca 125 tantos cortejam minha mãe e esgotam a casa Ela nem recusar as hediondas bodas nem as completar disso não é capaz eles porém devastam comendo minha casa Logo despedaçarão também a mim Não isso repousa nos joelhos dos deuses 130 Papá vai bem rápido e à prudente Penélope diga que estou são e salvo e de Pilos cheguei Eu ficarei aqui mesmo e tu para cá retorna após só a ela anunciares que nenhum outro aqueu seja informado muitos contra mim engenham males 135 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Compreendo reflito pedes para quem isso entende Mas vamos dizeme isto e conta com precisão se também pela mesma via levo o anúncio a Laerte desventurado que há tempo tão aflito por Odisseu 140 observa os cultivos e com os escravos na casa bebe e come quando o ânimo no peito ordena e agora desde que tu com nau partiste a Pilos dizem que ele não come nem bebe como sempre nem os cultivos olha mas com gemido e lamento 145 senta chorando e soçobra a pele em volta dos ossos A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Tanto pior Ainda assim o deixemos embora angustiados Se para os mortais tudo dependesse da vontade primeiro escolheríamos o dia do retorno de meu pai 150 Mas vai dá o recado e volta e não perambules pelos campos atrás dele e instrua a mãe a mandar criada governanta o mais rápido possível às ocultas ela poderá dar o recado ao ancião Falou e o porqueiro com as mãos pegou sandálias 155 atouas aos pés e à cidade rumou E Atena não ignorou o porcariço Eumeu saindo da quinta e se achegou o corpo como de uma mulher bela grande e conhecedora de radiantes trabalhos Parou no vestíbulo da cabana aparecendo a Odisseu 160 Telêmaco não a viu diretamente nem observou nem sempre os deuses a todos aparecem vívidos mas Odisseu e os cães a viram e não latiram e com ganidos fugiram ao outro lado da quinta Ela com as celhas sinalizou notoua o divino Odisseu 165 saiu do salão para além do grande muro do pátio e parou diante dela E a ele disse Atena Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque diga já agora a teu filho uma palavra e não ocultes para após talhar a perdição da morte aos pretendentes 170 irdes à cidade bem famosa os dois eu própria não estarei muito tempo longe de vós sôfrega por guerrear Falou e com a dourada vara golpeouo Atena Primeiro para ele manto bemlavado e túnica pôs em torno do peito e ampliou seu porte e juventude 175 Logo tornouse pelebronzeada o maxilar esticouse e preta ficou a barba em volta do queixo Ela após agir assim partiu de volta e Odisseu foi à cabana O caro filho assombrouse com ele receou ser um deus lançou os olhos ao outro lado 180 e falando dirigiulhe palavras plumadas Diferente de antes estranho surgiste agora mesmo tens outras vestes e tua pele não é a mesma Por certo és um deus eles que do largo páramo dispõem Sê propício para te darmos sacrifícios comprazedores 185 e dons de ouro bemfeitos e poupa os nossos A ele respondeu o muitatenência divino Odisseu Não sou um deus por que me comparas a imortais Porém sou teu pai aquele por quem gemes e sofres muita agonia submetido à violência de varões 190 Após falar assim beijou o filho e da face escorreram lágrimas ao chão antes as contivera Não convencido de que era seu pai Telêmaco de novo a ele dirigiu palavras em resposta e disse Tu não és Odisseu o meu pai mas divindade que a mim 195 enfeitiça para que chorando ainda mais eu gema Por certo um varão mortal não engendraria isso com sua própria mente exceto se o deus ele mesmo viesse e querendo fácil tornasseo jovem ou velho Com efeito há pouco eras velho e vestias andrajos 200 agora te assemelhas a deuses que do largo páramo dispõem Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Telêmaco não convém com o caro pai aqui dentro ficares aturdido em excesso nem te admirares Vê nenhum outro Odisseu ainda virá para cá 205 mas eu aqui tal e qual após muito sofrer muito vagar cheguei no vigésimo ano à terra pátria Mas sabe que este feito foi de Atena trazbutim a qual me torna assim como quer pois é capaz ora semelhante a um mendigo ora de novo 210 a um jovem varão com belas vestes no corpo É fácil para os deuses que do largo páramo dispõem ou glorificar um homem mortal ou rebaixálo Após falar assim sentouse e Telêmaco abraçou o nobre pai e gemeu vertendo lágrimas 215 E nesses dois foi instigado desejo por lamento choravam alto com mais veemência que pássaros britaossos ou abutres garraadunca cujo filhotes camponeses sequestram antes de tornaremse alados assim eles sob as celhas vertiam lágrimas lamentáveis 220 Enquanto choravam teria se posto a luz do sol se Telêmaco não tivesse logo interpelado o pai Pois a ti em que nau agora caro pai nautas te conduziram até Ítaca Quem proclamaram ser De modo algum creio que a pé aqui chegaste 225 E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Portanto eu a ti filho contarei a verdade Feácios trouxeramme famosos pelas naus também a outros homens conduzem aqueles que os alcançarem a mim trouxeram em nau veloz pelo mar dormindo 230 depuseramme em Ítaca e deramme dons incontáveis bronze ouro a granel veste tecida Isso graças aos deuses encontrase numa gruta agora aqui vim por instruções de Atena para planejarmos a matança dos inimigos 235 Mas vamos dizme o número de pretendentes para que eu saiba quantos e que varões são após ter cogitado em meu ânimo impecável ponderarei ou só nós dois poderemos resistir os únicos ou deveremos a outros buscar 240 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Pai sempre ouvi de tua grande fama lanceiro nos braços e refletido nos planos mas falaste grande demais espantome não teria como dois varões combaterem contra muitos e altivos 245 De pretendentes não há uma dezena ou só duas mas muito mais logo saberás aqui o número De Dulíquion cinquenta e dois jovens seletos e seis servos os seguem de Same são vinte e quatro heróis 250 de Zacintos vinte são os jovens aqueus e da própria Ítaca doze os melhores todos e com eles estão o arauto Médon um divino cantor e dois assistentes versados trinchadores Se a eles todos encararmos quando dentro estiverem 255 que não te seja amarga e cruel a vingança pela violência Mas tu se puderes cogitar algum protetor pondera um que nos protegesse com ânimo solícito E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Portanto eu falarei e tu compreende e me escuta 260 e observa se para nós Atena com o pai Zeus bastará ou se devo cogitar algum outro protetor A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Distintos sim esses dois protetores de quem falas embora no alto nas nuvens sentados eles a outros 265 varões também regem e a deuses imortais E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Sabe que os dois muito tempo não ficarão longe do combate violento quando entre os pretendentes e nós em meu palácio o ímpeto de Ares se decidir 270 Mas agora quando a aurora aparecer parte para casa e reúnete aos pretendentes soberbos o porcariço me levará mais tarde à cidade eu assemelhado a um mendigo débil e velho Se me desonrarem pela casa que teu caro coração 275 resista no peito mesmo que eu sofra de forma vil ainda que na casa pelos pés me puxem porta afora ou com petardos me atinjam tu ao vires te contém Claro mandeos interromper tal loucura com palavras amáveis convencendoos a ti eles não 280 obedecerão pois perto deles já chega o dia fatal Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança quando a muitoplano puser em meu juízo Atena a ti farei um sinal com a cabeça e presta atenção tantas armas de guerra quantas há no palácio 285 guardaas no fundo do quarto de alto pédireito todas e aos pretendentes com palavras macias ludibria ao te arguirem sentindo falta delas Tireias da fumaça pois não pareciam mais com aquelas que Odisseu deixou para trás ao ir a Troia 290 mas se desfiguraram tão atingidas foram pelo bafo do fogo Ademais o filho de Crono pôs algo maior no meu juízo que bêbados após começar briga entre vós não vos ferissem uns aos outros e estragassem o banquete e a corte o ferro por si puxa o homem 295 Só para nós duas espadas e duas lanças deixa e duas adargas para pegar com as mãos de sorte a nos lançar sobre elas e as agarrar e a eles Palas Atena enfeitiçará e também o astucioso Zeus Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança 300 se de verdade és meu e de nosso sangue que ninguém saiba que Odisseu está dentro que Laerte disso não saiba nem o porqueiro nenhum servo nem a própria Penélope mas só tu e eu conheceremos a intenção das mulheres 305 Ainda poderíamos testar os escravos varões quem acaso nos honra e teme no ânimo e quem é malcriado e te desonra sendo quem és Respondendo disselhe o filho ilustre Pai meu ânimo também depois penso 310 conhecerás não me dominam ideias frouxas Mas isso eu não penso que será uma vantagem para nós dois e peçote que ponderes Muito tempo ficarás em vão testando cada um campos percorrendo e eles no palácio tranquilos 315 os bens abocanham brutos sem restrição Mas eu peço que examines as mulheres as que te desonram e as que são inocentes aos varões eu não quereria pela quinta que os testássemos isso faremos depois 320 se de verdade sabes de prodígio de Zeus portaégide Assim eles disso falavam entre si e eis que a Ítaca foi guiada a nau engenhosa que trouxe Telêmaco e todos os companheiros de Pilos Quando eles entraram no porto bem profundo 325 puxaram a negra nau para a terra firme as armas lhes carregaram assistentes autoconfiantes e logo até Clítio levaram os presentes bem belos Mas um arauto enviaram à casa de Odisseu para fazer o anúncio à bemajuizada Penélope 330 que Telêmaco estava no campo e mandara a nau à cidade singrar para que temerosa no ânimo a altiva senhora não vertesse lágrima suave E os dois toparamse arauto e divino porqueiro por causa do mesmo anúncio a ser dado à mulher 335 Mas quando atingiram a casa do divino senhor o arauto junto às servas no meio delas falou Vê rainha teu caro filho já voltou E para Penélope falou o porcariço parado perto tudo que o caro filho pedira que lhe enunciasse 340 Mas depois que transmitiu o anúncio inteiro foi em direção aos porcos e deixou casa e salão E os pretendentes perturbados e abatidos no ânimo saíram do palácio para além do grande muro do pátio e lá mesmo diante dos portões sentaramse 345 Entre eles Eurímaco filho de Polibo começou a falar Amigos feito inaudito com soberba foi cumprido por Telêmaco esse trajeto Cremos que não o cumpriria Vamos negra nau puxemos a que for a melhor e reunamos marinheiros remadores que de pronto 350 àqueles anunciarão que rápido à casa retornem Não havia sido dito tudo quando Anfínomo viu a nau após afastarse de seu lugar no porto bem profundo eles recolhendo a vela e segurando os remos nas mãos Gargalhou com prazer e dirigiuse aos companheiros 355 Não enviemos mais o anúncio eilos aí dentro Ou um deus lhes disse isso ou viram eles mesmos a nau passando e não conseguiram alcançála Assim falou ergueramse e foram à orla do mar Rápido puxaram a negra nau para a terra firme 360 e assistentes autoconfiantes lhes levaram as armas Eles à ágora foram em grupo e a ninguém mais permitiam nem jovem nem velho com eles sentar Entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo Incrível como os deuses livraram da desgraça esse varão 365 De dia vigias sentavamse pelos picos ventosos sempre se revezando quando o sol se punha nunca em terra descansávamos à noite mas no mar com nau veloz navegando esperávamos a diva Aurora tocaiando Telêmaco para pegálo e matálo 370 nisso eis que um deus o levou para casa Nós aqui para ele planejemos funesto fim para Telêmaco que de nós não escape pois não creio estando ele vivo que esses feitos serão realizados Ele próprio é hábil na mente 375 e o povo não nos traz mais apoio Mexeivos antes que ele convoque os aqueus para a ágora não creio que relaxará mas se entregará à ira e de pé entre todos contará que lhe costuramos morte abrupta mas não o alcançamos 380 e eles não aprovarão ao ouvir os feitos danosos que não nos inflijam dano e nos expulsem de nossa terra obrigandonos a partir para outras regiões Que o matemos após pegálo no campo longe da urbe ou na senda retenhamos seus recursos e posses 385 após tudo dividir entre nós com adequação e a propriedade a daremos a sua mãe e a quem a desposar Se a vós esse discurso desagrada e antes preferis que ele viva e mantenha todos os bens paternos então não devoremos aos montes as posses fascinantes 390 aqui reunidas mas cada um da sua morada que a corteje tentando com dádivas ela então casará com quem mais ofertar e a ela for destinado Assim falou e eles todos atentos se calaram E entre eles Anfínomo tomou a palavra e disse 395 o ilustre filho de Niso o senhor filho de Areto ele que da herbosa fértil Dulíquion conduzia pretendentes e quem a Penélope mais agradava pelos discursos pois tinha juízo valoroso Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse 400 Amigos eu não gostaria que Telêmaco fosse assassinado é terrível a linhagem divina matar primeiro indaguemos os planos dos deuses Se permitirem as normas do grande Zeus eu mesmo o matarei e exortarei todos os outros 405 se os deuses desencorajarem peço que desistam Assim falou Anfínomo e agradoulhes o discurso Presto após se eguerem foram à casa de Odisseu chegaram e sentaramse nas poltronas polidas E ela outra coisa pensou Penélope bemajuizada 410 aparecer aos pretendentes donos de brutal desmedida Soubera no palácio do planejado fim de seu filho falaralhe o arauto Médon que dos planos se inteirara E pôsse rumo ao salão com suas criadas mulheres Quando alcançou os pretendentes divina mulher 415 parou ao lado do pilar do teto sólida construção após puxar para diante da face o véu reluzente e a Antínoo reprovou dirigiuselhe e nomeouo Antínoo desmedido artífice de males e dizem de ti na terra de Ítaca que entre os camaradas és o melhor 420 em planos e discursos mas estás longe de sêlo Louco por que tu para Telêmaco o quinhão da morte costuras e desconsideras os suplicantes dos quais é Zeus testemunha Não é pio costurar males um para o outro Não sabes de quando aqui chegou teu pai em fuga 425 temendo o povo Sim estavam muito enraivecidos porque tendose ligado aos piratas táfios ele lesara os tesprótios que eram nossos aliados A ele quiseram destruir arrancar seu coração e devorar o rico e delicioso sustento 430 mas Odisseu a eles ansiosos segurou e conteve Agora comes em sua casa de graça cortejas a esposa o filho tentas matar e a mim me enche de aflições Para e exorta os outros a também parar A ela Eurímaco filho de Polibo retrucou 435 Filha de Icário Penélope bemajuizada coragem que isso não te ocupe o juízo Não existe o varão nem existirá nem nascerá que contra Telêmaco teu filho descerá o braço enquanto eu viver e sobre a terra vigiar 440 Pois assim eu falarei e de fato isto se completará de pronto seu negro sangue jorrará em volta da lança nossa pois também a mim Odisseu arrasaurbe amiúde em seus joelhos me sentava carne assada punhame nas mãos e serviame o vinho tinto 445 Por isso Telêmaco me é de longe o mais caro de todos os varões e por certo peçolhe não temer morte advinda de pretendentes a dos deuses não se evita Assim falou encorajador e ele mesmo preparava seu fim Ela após subir aos aposentos lustrosos 450 chorou por Odisseu caro esposo até para ela o sono doce sobre as pálpebras lançar Atena olhosdecoruja À noite o divino porqueiro com Odisseu e o filho veio ter eles diligentes preparavam o jantar após abater um porco de um ano E Atena 455 postandose perto a Odisseu filho de Laerte com golpes da vara de novo fez dele um ancião e vestiulhe vestes ordinárias no corpo para o porcariço ao vêlo não o reconhecer e à prudente Penélope correr a anunciar incapaz de segurar no juízo 460 A ele Telêmaco por primeiro o discurso enunciou Já chegaste divino Eumeu Que relato corre a cidade Acaso os arrogantes pretendentes já voltaram da tocaia ou ainda lá me esperam a caminho de casa Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu 465 Isso não me interessou apurar e indagar quando à cidade desci o ânimo pediume bem rápido após o anúncio fazer que para cá retornasse Topoume o veloz mensageiro dos companheiros o arauto que por primeiro falou palavra a tua mãe 470 Outra coisa sei pois vi com os olhos já acima da cidade onde fica a colina de Hermes ia andando quando vi uma nau veloz dirigirse a nosso porto muitos varões sobre ela havia cheia de escudos e lanças duascurvas 475 pensei que esses fossem eles mas não sei Assim falou e sorriu a sacra força de Telêmaco olhando para o pai e evitando os olhos do porcariço Eles após concluir a tarefa e terem aprontado o jantar jantaram e ao ânimo porção alguma faltou 480 Mas após apaziguar o desejo por comida e bebida lembraramse do repouso e aceitaram o dom do sono Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos depois de atar aos pés belas sandálias Telêmaco o caro filho do divino Odisseu tomou a brava lança que à sua palma se adequava 5 e ansiando ir à urbe falou a seu porcariço Sim papá eu irei à cidade para que a mim minha mãe me veja não creio que ela interrompa o hediondo pranto e o lamento lacrimoso antes de verme em pessoa E a ti peço isto 10 esse infeliz estranho leva à cidade para que lá refeição mendigue Quem quiser lhe dará caneca e pãozinho eu não posso a todos os homens sustentar tenho aflições no ânimo Se o estranho ficar muito irado pior para ele 15 será vê éme caro a verdade enunciar Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Amigo nem eu mesmo desejo aqui permanecer Para o mendigo é melhor na cidade que no campo mendigar refeição quem quiser me dará 20 Não estou mais na idade de ficar na quinta para submeterme em tudo ao senhor que ordena Mas vá que me leve esse varão a quem tu pedes logo após eu me aquecer com o fogo e o calor despontar Ruins ao extremo essas roupas que não me dobre 25 a geada matutina dizeis que a cidade é distante Assim falou e Telêmaco marchou ao longo do pátio veloz nos pés e engendrava males aos pretendentes Mas quando atingiu a casa boa para morar a lança postou levandoa até enorme pilar 30 ele foi para dentro cruzando o umbral de pedra A primeira a vêlo foi a nutriz Euricleia a estender velos sobre artificiosas poltronas aos prantos logo acorreu a ele as outras escravas de Odisseu juízopaciente reuniamse 35 em volta dele e beijavamlhe com afeto cabeça e ombros E ela saiu do quarto Penélope bemajuizada semelhante a Ártemis ou dourada Afrodite em torno do caro filho lançou os braços aos prantos beijouo na cabeça e nos dois belos olhos 40 e lamentandose dirigiulhe palavras plumadas Chegaste Telêmaco doce luz não mais pensava verte após teres partido com a nau para Pilos de surpresa a minha revelia atrás de novas do caro pai Vamos contame com que visão te deparaste 45 A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Minha mãe favor não chorar nem meu coração no peito agitar pois escapei de abrupto fim mas após te lavar vestir roupas limpas no corpo e subir aos aposentos com tuas criadas mulheres 50 reza a todos os deuses que sacrifícios completos farás se acaso Zeus completar a vingança Quanto a mim rumarei à ágora para chamar o estranho que de lá trouxe quando voltei Envieio na frente com os excelsos companheiros 55 e pedi a Peiraio que o levasse a sua casa que gentil o acolhesse e honrasse até minha chegada Assim ele falou e para ela o discurso foi plumado Ela após se lavar e vestir roupas limpas no corpo rezou a todos os deuses que sacrifícios completos 60 faria se acaso Zeus completasse a vingança Telêmaco então cruzou o salão e saiu com a lança dois lépidos cães seguiam com ele Eis que prodigiosa graça sobre ele vertia Atena todo o povo contemplavao em sua chegada 65 E os arrogantes pretendentes reuniramse em torno dele falando como nobres e no juízo ruminando males Mas ele evitou a grande aglomeração e onde Mentor sentouse e Antifo e Haliterses todos desde o início companheiros de seu pai 70 para lá se dirigiu e sentou e inqueriamno de tudo E deles aproximouse Peiraio famosonalança levando o estranho à ágora pela urbe muito tempo Telêmaco não ficou longe do estranho logo achegouse E a ele Peiraio por primeiro o discurso enunciou 75 Telêmaco manda logo mulheres a minha casa para buscar as dádivas que te deu Menelau A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Peiraio não sabemos como se darão as coisas Se a mim os orgulhosos pretendentes no palácio 80 de surpresa matarem e dividirem todos os bens paternos prefiro que tu não um deles as possuas e aproveites e se eu lograr contra eles matança e perdição e então para mim alegre levaas à casa com alegria Assim falou e guiou o calejado estranho à morada 85 E quando atingiram a casa boa para morar depuseram as capas nas cadeiras e poltronas foram até a banheira bempolida e se banharam Após as escravas banhálos untálos com óleo e em torno lançar espessas capas e túnicas 90 saíram da banheira e sentaram nas cadeiras Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente 95 e junto muitos petiscos oferecendo o que havia A mãe sentouse defronte junto ao pilar do salão reclinada na cadeira volteando os finos fios E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por comida e bebida 100 entre eles começou a falar Penélope bemajuizada Telêmaco subirei aos aposentos e deitarei na cama que me é rica em gemidos sempre úmida com minhas lágrimas desde que Odisseu partiu com os filhos de Atreu a Ílion e não pudeste 105 antes de os orgulhosos pretendentes chegarem a essa casa do retorno de teu pai falarme às claras se algo ouviste A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Portanto eu a ti mãe contarei a verdade Partimos rumo a Pilos e Nestor pastor de tropa 110 Após me receber em sua alta casa acolheume gentil como o pai a seu filho que há pouco voltou depois de tempo assim ele de mim cuidou gentil com os filhos majestosos Acerca de Odisseu juízopaciente disse que nunca 115 ouviu de mortal se estava vivo ou morto e a mim ao filho de Atreu Menelau famosonalança enviou com cavalos e carro bemajustado Lá vi a argiva Helena graças à qual muito aguentaram argivos e troianos por obra dos deuses 120 Então perguntoume logo Menelau bomnogrito de que eu carecia para ir à divina Lacedemônia e eu conteilhe toda a verdade Então a mim com palavras respondendo disse Incrível deveras no leito de varão juízoforte 125 cobiçaram deitarse eles próprios sendo covardes Como quando a cerva na toca de um leão bota os recémnascidos lactentes para dormir e investiga encostas e vales herbosos a pastar e então a fera se achega a seu leito 130 e sobre aqueles dois lança fado ultrajante assim Odisseu sobre eles lançará fado ultrajante Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo com o porte que então em Lesbos bemconstruída na disputa com Filomeleides se ergueu lutou 135 e o derrubou com força e se alegraram todos os aqueus assim aos pretendentes encontrasse Odisseu todos seriam destinoveloz e bodasamargas Quanto ao que me indagas e suplicas eu não tergiversarei pelas bordas nem te enganarei 140 mas do que me falou o veraz ancião marítimo disso nada esconderei de ti nem palavra ocultarei Disse que numa ilha o viu sofrendo fortes agonias no palácio da ninfa Calipso que a ele à força retém não consegue atingir sua terra pátria 145 Não tem naus com remos nem companheiros que o levariam sobre as amplas costas do mar Assim falou o filho de Atreu Menelau famosonalança Após isso completar retornei deramme uma brisa os imortais que rápido me conduziram à terra pátria 150 Assim falou e agitou o ânimo dela no peito Também entre eles falou o deiforme Teoclímeno Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte ele não sabe ao claro já minha fala entende com precisão para ti adivinharei e não esconderei 155 Saiba agora Zeus antes dos deuses e a hospitaleira mesa e o fogolar do impecável Odisseu ao qual cheguei que Odisseu já está na terra pátria sentado ou circulando informado dessas vis ações a todos os pretendentes engendra um mal 160 tal o presságio que eu na nau bomconvés sentado observei e bradei a Telêmaco E a ele dirigiuse Penélope bemajuizada Ah Se essa palavra hóspede se cumprisse então rápido conhecerias a amizade e muitos dons 165 meus tantos que se alguém te visse te diria ditoso Assim eles disso falavam entre si e os pretendentes diante do salão de Odisseu deleitavamse com discos e arremesso de lanças em solo nivelado desmedidos como no passado 170 Mas na hora do jantar quando vieram os rebanhos do campo de todo o lado e os que sempre os guiavam então lhes disse Médon era ele o que mais agradava dos arautos e no banquete juntavase a eles Jovens agora que vos haveis deleitado no peito com as provas 175 dirigivos à casa para prepararmos o banquete não é ruim fazer a refeição na hora certa Isso disse ergueramse e persuadidos pelo discurso foram E quando atingiram a casa boa para morar capas depuseram nas cadeiras e poltronas 180 e grandes ovelhas e gordas cabras abateram e abateram porcos cevados e um boi do rebanho preparativos para o banquete E aqueles do campo à cidade se puseram em marcha Odisseu e o divino porcariço Entre eles começou a falar o porqueiro líder de varões 185 Assim seja hóspede já que tens gana de ir à cidade hoje como meu senhor impôs por certo eu preferiria que aqui ficasses como protetor da quinta Mas eu o respeito e temo que contra mim no futuro ralhe são duras as censuras dos senhores 190 Agora vamos vê já passou a maior parte do dia e logo à noitinha te será mais frio Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Compreendo reflito pedes para quem isso entende Pois vamos e tu então segue sempre na frente 195 Dême o cajado se acaso tens um cortado para apoio pois dissestes ser a via bem acidentada Falou e sobre os ombros lançou o repulsivo alforje todo rasgado e nele a alça era uma corda e Eumeu deulhe um bastão perfeito 200 Os dois partiram e cães e varões pastores na quinta ficaram protegendoa Ele à cidade guiou o senhor com aparência de mendigo débil e velho apoiado no bastão vestes ordinárias vestia no corpo Mas quando descendo pela via escarpada 205 estavam perto da cidade e à fonte chegaram trabalhada belofluxo onde os citadinos pegavam água construída por Ítaco Nérito e Polictor em volta havia bosque de álamos nutridos por água todo em círculo e para baixo fluía água fria 210 do alto de um rochedo sobre ele fora erguido um altar às ninfas onde todos os viandantes sacrificavam lá alcançouos Preto filho de Finório tocando cabras distintas entre todos os caprinos refeição para os pretendentes seguiamno dois pastores 215 Vendoos dirigiuselhes e nomeouos com ralho terrível e ultrajante e o coração de Odisseu agitouse Agora de fato o vil ao vil com razão conduz como o deus sempre leva o igual ao igual Desgraçado porqueiro para onde levas esse glutão 220 mendigo encrenqueiro comedor de sobras de jantar Encostado em muito umbral roçará os ombros mendigando nacos não espadas nem bacias Se tu mo desses para tornarse protetor da quinta limpar currais e levar folhagem aos cabritos 225 poderia bebendo soro até engrossar a coxa Mas sim como aprendeu serviços vis não quererá fazer o serviço mas curvandose pelos arredores prefere mendigando engordar seu estômago insaciável Mas eu te falarei e isto se completará 230 se ele se dirigir à casa do divino Odisseu a muitas banquetas lançadas pelas mãos dos varões suas costelas extenuarão ao ser atingido na casa Isso disse avançou e com o pé saltou insensato contra a coxa o golpe não o pôs para fora da trilha 235 mas firme permaneceu Ele Odisseu cogitou se indo atrás com o cajado tiraria sua vida ou contra o solo lançaria a cabeça após erguêlo pelo meio mas aguentou contevese no juízo Com aquele o porqueiro ralhou encarandoo e alto orou mãos para cima 240 Ninfas da fonte filhas de Zeus se um dia Odisseu coxas queimouvos encobertas com gorda gordura de ovelhas e cabritos para mim cumpri este desejo que volte esse varão e o guie a divindade Então espantaria toda tua radiância 245 que agora desmedido carregas sempre vagando pela urbe e as cabras pastores ruins as aniquilam A ele então Preto replicou o pastor de cabras Incrível como falou o cão perito em malefícios A ele um dia eu mesmo sobre negra nau bomconvés 250 guiarei para longe de Ítaca para onde me renda boa quantia Ah Se a Telêmaco atingisse Apolo arcodeprata hoje no palácio ou pelos pretendentes fosse subjugado assim como Odisseu longe perdeu o dia do retorno Isso disse e deixouos lá e eles tranquilos se foram 255 ele marchou e bem rápido chegou à casa do senhor Logo foi para dentro e entre os pretendentes sentouse diante de Eurímaco de quem mais gostava A seu lado naco das carnes puseram os que serviam e governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente 260 para comer Para perto Odisseu e o divino porcariço vieram e pararam e envolveuos a cadência da côncava lira Fêmio entoavalhes um prelúdio E Odisseu pegando o porqueiro pelo braço falou Sim Eumeu essa de fato é a bela casa de Odisseu 265 é fácil de reconhecer mesmo se vista entre muitas Cômodos em sucessão seu pátio se completa com muro e cornijas e os portões são engenhosos duplos nenhum homem os equiparia melhor Percebo que nela se banqueteiam muitos 270 varões pois se espraia odor de gordura e dentro a lira soa a que os deuses fizeram companheira do banquete Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Reconheceste fácil pois de resto não és imponderado Mas vamos ponderemos como serão estas ações 275 ou tu por primeiro entra na casa boa para morar e te junta aos pretendentes e eu ficarei aqui ou se quiseres aguarda e eu irei antes Mas não te demores que ninguém percebendote fora te atinja ou golpeie peço que ponderes 280 E a ele respondeu o muitatenência divino Odisseu Compreendo reflito pedes para quem isso entende Pronto vai antes e eu aqui ficarei pois não sou inexperto em socos e arremessos Meu ânimo aguenta já sofri muitos males 285 em ondas e guerra que depois disto aquilo ocorra Não é possível escamotear o sôfrego estômago funesto que confere muitos males aos homens por causa dele equipamse naus firmebancos e pelo mar ruidoso levam males aos inimigos 290 Assim eles disso falavam entre si E um cão deitado ergueu cabeça e orelhas Argo de Odisseu juízopaciente ao qual ele mesmo criou mas dele não desfrutou antes à sacra Ílion partiu No passado levavamno os jovens varões 295 atrás de cabras selvagens coelhos e cervos no presente desprezado jazia ausente o senhor sobre muito esterco de bois e mulas que diante dos portões acumulavase até que o levassem os escravos de Odisseu para estercar o grande terreno 300 Lá jazia o cão Argo cheio de carrapato E então quando percebeu Odisseu próximo ele abanou o rabo deixou cair as duas orelhas e depois não conseguiu mais perto de seu mestre chegar E ele olhando para longe secou as lágrimas 305 evitando fácil Eumeu e rápido perguntoulhe Eumeu é bem espantoso que jaza esse cão no esterco É belo no porte e isto não sei ao claro se além da bela estampa era rápido na corrida ou somente como os cães de mesa dos varões 310 são por causa da radiância tratamnos os senhores Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu De fato esse cão do varão que longe morreu se no porte e nos feitos fosse tal como quando ao ir a Troia deixouo para trás Odisseu 315 logo mirandoo admirarias rapidez e bravura Não escapava no âmago da mata profunda o animal que perseguisse era também perito em pegadas Agora passa mal pois seu senhor distante da pátria finou e dele as mulheres negligentes não tratam 320 Escravos quando os senhores não mais comandam então não querem mais fazer o apropriado de metade da excelência priva Zeus amplavisão ao varão que o dia escravizador agarra Isso dito entrou na casa boa para morar 325 e foi direto ao salão atrás dos ilustres pretendentes Quanto a Argo apanhouo o destino da negra morte assim que viu Odisseu no vigésimo ano Ao porqueiro o primeiro a vêlo entrar no salão foi o deiforme Telêmaco que rápido o chamou 330 até si acenando Ele observou e pegou uma banqueta nela o trinchador sentava muita carne trinchando aos pretendentes que na casa se banqueteavam levoua à mesa de Telêmaco e postoua diante dele onde então sentouse Para ele o arauto 335 uma porção pegou serviua e tirou pão do cesto Logo atrás dele entrou na casa Odisseu com a aparência de mendigo débil e velho apoiado no bastão vestes ordinárias no corpo vestia Sentouse no umbral de freixo das portas 340 apoiado no batente de cipreste que um dia carpinteiro aplanou hábil e com o prumo endireitou Telêmaco chamou o porqueiro até si e dirigiuse a ele após tomar um pão inteiro do cesto bem belo e carne tanta quanta em suas mãos cabia 345 Leva isso dá ao estranho e peçalhe que mendigue achegandose a todos os pretendentes pudor não é boa companhia para um varão necessitado Isso dito em seguida partiu o porcariço que então dirigiulhe palavras plumadas 350 Hóspede Telêmaco te dá isso e pede que mendigues achegandote a todos os pretendentes pudor não é bom diz para um varão pedinte Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Senhor Zeus seja Telêmaco fortunado entre os varões 355 e lhe ocorra tudo que deseja em seu juízo Falou e com as duas mãos recebeu e acomodou a comida lá mesmo diante dos pés sobre o ultrajante alforje e comia enquanto o cantor no palácio cantava Quando tinha jantado e o divino cantor calara 360 os pretendentes iniciaram arruaça no palácio E Atena postandose perto de Odisseu filho de Laerte instigouo a recolher migalhas entre os pretendentes e a reconhecer quem era correto e quem desregrado mas nem assim protegeria algum do mal 365 Pôsse a pedir a cada um da esquerda para a direita estendia a mão como se já mendigasse há muito Eles apiedados lhe davam e pasmados inquiriam um ao outro quem seria e de onde teria vindo Entre eles falou Preto o pastor de cabras 370 Ouvime pretendentes da esplêndida rainha acerca desse estranho pois sim já antes o vi De fato até aqui o porqueiro conduziuo e dele não sei ao claro de que linhagem proclama ser Isso dito Antínoo com palavras provocou o porqueiro 375 Notório porqueiro por que à cidade tu a ele guiaste Não temos vagamundos suficientes mendigos encrenqueiros comedores de sobras do jantar Ou não te basta que devorem o sustento de teu senhor os aqui reunidos e tu também o chamaste para dentro 380 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Antínoo embora sejas distinto bem não falaste quem chama um estrangeiro quando está de visita a um terceiro exceto no caso de um destes profissionais adivinho médico de males carpinteiro 385 ou também cantor inspirado que deleita cantando São esses os mortais chamados pela terra semfim a um mendigo que o iria dilapidar ninguém chamaria Mas sempre és duro mais que todos os pretendentes com os escravos de Odisseu em especial comigo eu 390 não me importo enquanto a prudente Penélope e o deiforme Telêmaco viverem no palácio A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Quieto a ele não respondas demais com palavras Antínoo costuma provocar de forma vil sempre 395 com duros discursos e instiga também os demais Falou e a Antínoo dirigiu palavras plumadas Antínoo cuidas bem de mim como do filho o pai ao pedires que ao estranho se escorrace do salão com discurso coativo que isso o deus não complete 400 Vai dálhe algo não me recuses pois peçoo eu Nisso não te envergonhes de minha mãe ou de outro escravo dos que vivem na casa do divino Odisseu Mas não há em teu peito uma tal ideia preferes bem mais comer a obsequiar alguém 405 E a ele Antínoo respondendo disse Telêmaco falaaltiva de ímpeto incontido que falaste Se todos os pretendentes tanto lhe entregassem por três meses a propriedade o manteria longe Assim falou e de debaixo da mesa puxou 410 a banqueta onde apoiava os pés luzidios ao festar Os outros todos colaboraram e pejaram o alforje de pão e carne Pois ligeiro teria Odisseu voltado à soleira e provado a dádiva dos aqueus postouse porém junto a Antínoo e disselhe 415 Dá amigo o pior dos aqueus não me pareces ser mas o melhor pois te assemelhas a um rei Por isso é preciso que da comida dês ainda mais que os outros e eu te glorificarei pela terra semfim Também eu um dia entre os homens morei em casa 420 rica afortunado e amiúde obsequiava um errante fosse como ele fosse e do que precisasse ao chegar tinha miríades de escravos e muita outra coisa com que se vive bem e se é tido como rico Mas Zeus filho de Crono destruiu quis de algum modo 425 ele que a mim com piratas muito errantes incitoume ir ao Egito um longo trajeto para que me arruinasse E ancorei no rio Egito as naus ambicurvas Então pedi aos leais companheiros que lá ficassem junto às naus e as guardassem 430 e instiguei batedores a buscar atalaias Aqueles cederam à desmedida seguindo seu ímpeto e bem rápido os bem belos campos de varões egípcios destruíam levavam mulheres e crianças pequenas e a outros matavam Logo a gritaria chegou à cidade 435 Tendo ouvido a algaravia quando a aurora surgiu vieram o plaino todo pejouse de soldados e carros e relampejo brônzeo Lá Zeus prazernoraio lançou vil pavor em meus companheiros nenhum suportou ficar imóvel a encarar pois por todos os lados males havia 440 Lá a muitos dos nossos mataram com bronze afiado e a outros vivos levaram para trabalhos forçados A mim rumo a Chipre deramme a aliado que chegara Dominador filho de Iaso que regia Chipre com vigor Assim de lá cheguei aqui sofrendo misérias 445 A ele por sua vez Antínoo respondeu e disse Que divindade trouxe essa miséria flagelo do jantar Postate assim no centro afastado de minha mesa para que rápido não vejas amargos Egito e Chipre que audacioso e aviltante pedinte és tu 450 Em sequência pedes a cada um e eles dão levianos pois não existe contenção nem remorso no ofertar bens alheios pois há muito para cada um Recuando disselhe Odisseu muitaastúcia Incrível tanto te falta em juízo quanto te sobra em estampa 455 A quem alcançasse tua casa nem grão de sal darias tu que agora sentado na mesa alheia nada me pudeste do pão pegar e ofertar e há muito disponível Assim falou e Antínoo enraiveceuse mais no coração olhouo de cima e dirigiulhe palavras plumadas 460 Agora creio não será bonito como salão afora recuarás pois falas até insultos Isso dito tomou a banqueta e acertou o ombro direito de Odisseu bem no alto Ele postouse como uma pedra firme e o projétil de Antínoo não o desequilibrou 465 quieto meneou a cabeça ruminando males Retornando à soleira sentouse no chão o alforje bemfornido depôs e entre os pretendentes falou Ouvime pretendentes da esplêndida rainha vou falar o que o ânimo me ordena no peito 470 Por certo não há angústia nem aflição no juízo quando um homem combatendo por seus bens é atingido seja pelos bois ou brancas ovelhas mas Antínoo me atingiu por causa do reles estômago funesto que confere muitos males aos homens 475 Mas se acaso para mendigos há deuses e Erínias que antes das bodas a morte certeira alcance Antínoo E a ele dirigiuse Antínoo filho de Persuasivo Come tranquilo estranho sentado ou vai a outro lugar que os jovens pela casa não te puxem ao falares assim 480 ou pelo pé ou pelo braço rasgandote inteiro Assim falou e eles todos se indignaram por demais e desse modo falavam os jovens arrogantes Antínoo não foi bonito atingir o miserável errante Maldito se acaso for algum deus celeste 485 Deuses assemelhados a estranhos de outras terras tomando todas as formas percorrem as cidades a observar a desmedida dos homens e a boa norma Isso diziam os pretendentes e ele desprezou os discursos Telêmaco foi tomado de angústia enorme no coração 490 mas lágrima ao solo não verteu das pálpebras quieto meneou a cabeça ruminando males Como Penélope bemajuizada escutou quando ele foi atingido no salão entre as escravas disse Tomara desse modo te atinja Apolo arcofamoso 495 E a ela a governanta Eurínome dirigiu o discurso Que a nossos votos se una a realização nenhum desses aí alcançaria a Aurora belotrono E a ela dirigiuse Penélope bemajuizada Mãezinha odiosos são todos pois engenham males 500 e Antínoo é quem mais se assemelha à negra morte Um hóspede miserável erra pela casa aos homens mendigando pois a necessidade impõe então todos os outros o abarrotaram e obsequiaram e ele com a banqueta atingiuo abaixo do ombro direito 505 Ela assim falava entre as escravas mulheres sentada no aposento e ele jantava o divino Odisseu E ela chamou o divino porqueiro até si e dirigiuselhe Anda divino Eumeu vai até o estranho e lhe diga que venha para que o saúde e interrogue 510 se acaso de Odisseu juízopaciente tem informação ou o viu com os olhos parece alguém que muito vagou Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Se para ti rainha se calassem os aqueus o que ele discursa enfeitiçaria teu caro coração 515 Por três noites o tive e por três dias segureio na cabana fui o primeiro que alcançou após fugir da nau mas não concluiu a narração de sua desgraça Como um varão observa o cantor que dos deuses aprendeu e canta palavras desejáveis aos mortais 520 que têm ganas de ouvilo sem cessar quando canta assim ele me enfeitiçou sentado no meu salão Afirma ter laços ancestrais de hospitalidade com Odisseu quando morava em Creta onde está a linhagem de Minos Assim de lá chegou aqui sofrendo misérias 525 rolorolando Reivindica ter ouvido acerca de Odisseu que perto está na fértil terra dos varões tesprótios vivo e bens em profusão traz para sua morada E a ele replicou Penélope bemajuizada Vai chamao aqui para ele o expor diante de mim 530 Que aqueles se divirtam sentados na frente das portas ou aqui pela casa pois seu ânimo é gaudioso Claro suas posses intactas estão na propriedade pão e doce vinho isso comem seus servos e eles frequentando nossa casa todos os dias 535 abatendo bois ovelhas e gordas cabras festejam e bebem fulgente vinho levianos Isso se desperdiça à larga Não há varão tal como era Odisseu para afastar o dano da casa Se Odisseu voltasse e alcançasse sua terra pátria 540 logo com seu filho iria vingarse da violência dos varões Assim falou e Telêmaco alto espirrou e em volta a casa ameaçadora ecoou Riu Penélope e eis que logo a Eumeu dirigiu palavras plumadas Vai chama o estranho para encontrarme aqui 545 Não viste que meu filho espirrou para todas as palavras Assim não ficaria incompleta a morte dos pretendentes de todos e nenhum escaparia da perdição da morte Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança se eu reconhecer que ele sem evasivas tudo expõe 550 vou vestilo com capa e túnica belas vestes Isso disse e partiu o porcariço após ouvir o discurso e parado perto dirigiulhe palavras plumadas Pai estrangeiro chamate Penélope bemajuizada a mãe de Telêmaco o ânimo lhe pede 555 inquirir do esposo embora agruras tenha sofrido Se reconhecer que tu sem evasivas tudo expões vai vestirte com capa e túnica das quais careces por demais a mendigar pão pela comunidade o estômago encherás darteá quem quiser 560 E a ele replicou o muitatenência divino Odisseu Eumeu eu logo sem evasivas tudo exporia à filha de Icário Penélope bemajuizada conheço isso bem pois aguentamos igual agonia Mas temo a reunião dos cruéis pretendentes 565 cuja desmedida e violência atingem o céu ferroso Pois agora quando esse varão aí eu andava pela casa e nada de ruim fizera atingiume e feriu disso nem Telêmaco me protegeu nem algum outro Por isso agora peça a Penélope que no palácio 570 espere embora ávida até o sol se pôr que então me indague acerca do marido o dia de retorno sentandome mais perto junto ao fogo Vê roupas tenho ordinárias bem sabes pois supliquei a ti primeiro Assim falou e saiu o porqueiro após ouvir o discurso 575 A ele ao passar pela soleira dirigiuse Penélope Tu não o trazes Eumeu O que pensou o errante Acaso teme alguém em excesso ou por outra razão mostra pudor pela casa É ruim um errante pudico Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu 580 Discursa com adequação o que outro também pensaria tentando evitar a desmedida dos varões arrogantes Mas pede que tu esperes até o sol se pôr Também para ti mesma será bem melhor rainha sozinha quando ao estranho falar uma palavra e ouvir 585 E a ele replicou Penélope bemajuizada Insensato não é o estranho pensa nas consequências Pois tais não há por aí entre homens mortais tão desmedidos varões que engenham iníquas ações Ela assim falou e foi o porcariço divino 590 até o grupo de pretendentes após tudo expor De pronto a Telêmaco dirigiu palavras plumadas perto pondo a cabeça para não os ouvirem os outros Meu caro partirei para cuidar dos porcos e disto de teu e meu sustento que aqui tudo seja tua atribuição 595 Primeiro zela por ti e pondera no ânimo para que nada sofras muitos aqueus atentam vilezas que Zeus os destrua antes que se tornem nossa desgraça A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Será assim papá parte após petiscares 600 de manhã vem e traga belos animais para o sacrifício E eu e os imortais nos ocuparemos daquilo tudo Isso dito aquele de novo sentouse na cadeira bempolida Tendose saciado no ânimo de comida e bebida foi em direção aos porcos e deixou os muros e o salão 605 cheio de convivas Eles com a dança e o canto deleitavamse pois já se aproximara o fim da tarde E chegou o mendigo das redondezas que pela urbe de Ítaca mendigava e sobressaía com estômago louco por comer e beber sem cessar não tinha força nem vigor mas na aparência era bem grande de se ver 5 Seu nome era Borregoso puserao sua augusta mãe ao nascer os jovens todos chamavamno Iro pois levava mensagens sempre que pedissem Ao chegar tentou expulsar Odisseu de sua casa e provocativo dirigiulhe palavras plumadas 10 Sai do pórtico velho que não te puxem logo o pé Não percebes que todos piscam para mim e pedem que te puxe Eu porém tenho pudor Vamos senão presto brigamos também a socos Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia 15 Insano não faço nem falo nada ruim contra ti nem invejo que alguém até muito separe e te dê Essa soleira abarcará os dois e não carece que invejes o que é de outro a mim pareces um errante como eu e os deuses vão oferecer fortuna 20 A socos não me desafies demais não me enraiveças que eu embora velho não te manche peito e lábios de sangue ainda mais tranquilidade haveria para mim amanhã pois não creio que tu te voltarias uma segunda vez ao salão de Odisseu filho de Laerte 25 Enraivecido disselhe o errante Iro Incrível não é que o glutão fala de forma loquaz como velha no forno Contra ele armarei vilezas vou golpeálo com as duas mãos e no chão cada dente dos maxilares quebrarei como de porco destróicolheita 30 Agora cintate para que todos nos assistam lutando como combaterias varão mais jovem Assim eles diante das portas altas na soleira polida animosos discutiam A ambos escutou o ímpeto sagrado de Antínoo 35 que gargalhou com prazer e disse aos pretendentes Amigos por certo antes não ocorreu algo semelhante nunca tal deleite o deus conduziu a esta casa o estrangeiro e Iro estão brigando entre si vão combater a socos rápido vamos incitálos 40 Assim falou e todos eles pularam rindo e reuniramse em torno dos mendigos maltrapilhos E entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo Ouvime pretendentes orgulhosos vou falar Buchos de cabra aí no fogo para o jantar 45 dispusemos após enchêlos de banha e sangue Aquele que vencer e for o mais forte que avance e da iguaria o que quiser escolha ele mesmo sempre aqui entre nós comerá e nenhum outro mendigo pedinte permitiremos que se misture 50 Assim falou Antínoo e agradoulhes o discurso Com mente ardilosa disselhes Odisseu muitaastúcia Amigos é impossível com varão mais jovem lutar um velho varão combalido pela carência mas impeleme o estômago este vilão a me subjugar a golpes 55 Vamos agora juraime todos vigorosa jura que ninguém apoiando Iro com braço pesado a mim golpeie e seja iníquo e à força submetame a ele Assim falou e todos eles juraram como pediu Porém após jurarem por completo essa jura 60 entre eles falou a força sacra de Telêmaco Hóspede se o orgulhoso ânimo do coração te impele a repelilo a nenhum dos outros aqueus temas pois quem te acertar combaterá mais homens Sou eu que te hospedo e dois reis aprovaram 65 Eurímaco e Antínoo ambos inteligentes Assim falou e todos aprovaram E Odisseu cintouse com trapos na genitália mostrou as coxas belas e grandes e apareceram seus ombros largos o peito e os braços robustos e Atena 70 achegandose inchou os membros do pastor de homens Os pretendentes todos irritaramse com soberba e assim falavam fitando quem estava ao lado Logo Iro exIro obterá um mal autoinfligido tal é a coxa que de sob os trapos o velho mostra 75 Assim falavam e Iro sentiuse mal no ânimo Mesmo assim após cintálo à força servos levaramno medroso e as carnes tremiam em torno dos membros Antínoo reprovouo dirigiuselhe e nomeouo Agora exibidão não deverias existir nem ter nascido 80 se de fato para ele tremes e te apavoras assim para velho varão combalido pela carência que o atingiu Mas o que te direi isto também se cumprirá se ele te vencer e for o mais forte te enviarei ao continente após te lançar em negra nau 85 rumo ao rei Apresador flagelo de todos os mortais que deve te cortar o nariz e as orelhas com impiedoso bronze arrancar os genitais e dar crua refeição aos cães Assim falou e mais tremeram seus membros embaixo Levaramno ao centro e os dois estenderam os braços 90 Então cogitou o muitatenência divino Odisseu se o golpearia de sorte que a alma lá o deixasse caído ou se o golpearia de leve e o deixaria estendido no chão Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim ele o golpearia de leve para os aqueus não perceberem 95 Então mãos para cima Iro golpeou seu ombro direito e Odisseu golpeoulhe o pescoço sob a orelha e o osso adentro esmagou de pronto à boca subiu sangue vermelho e ele tombou no pó gritando e mordeu os dentes chutando a terra e os pretendentes ilustres 100 erguendo as mãos morreram de rir E Odisseu arrastouo do pórtico pelo pé para alcançar o pátio e os portões da colunata contra o muro do pátio encostouo e fêlo sentarse na mão pôslhe o bastão e falando dirigiulhe palavras plumadas 105 Agora senta afugentando cães e porcos não sejas tu o chefe de estranhos e mendigos sendo reles para que não proves mal ainda maior Falou e sobre os ombros lançou o repulsivo alforje todo rasgado e nele como alça havia uma corda 110 Retornando à soleira sentouse e eles entraram rindo com prazer e saudaramno com palavras Que Zeus te dê estranho e os outros deuses imortais o que mais desejas e caro for a teu ânimo tu que fizeste aquele insaciável parar de errar 115 pelas redondezas logo o levaremos ao continente rumo ao rei Apresador flagelo de todo mortal Isso dito alegrouse o divino Odisseu Eis que Antínoo pôslhe ao lado um grande bucho cheio de gordura e sangue e Anfínomo 120 tirou dois pães da cesta e pôs ao lado com cálice dourado cumprimentouo e disse Sê feliz pai estrangeiro tenhas ainda que no futuro fortuna agora de fato estás preso a muitos males Respondendo disse Odisseu muitaastúcia 125 Anfínomo deveras me pareces ser inteligente Tens um pai de valor de Niso de Dulíquion ouvi a nobre fama que é bom e rico dele dizem que nasceste e pareces varão decente Por isso te direi e que me compreenda e me escute 130 nada mais débil que o homem a terra nutre entre tudo que sobre a terra respira e circula Nunca alguém pensa que no futuro um mal sofrerá enquanto deuses ofertam sucesso e os joelhos se mexem mas quando deuses venturosos completam o funesto 135 também isso sem o querer suporta com ânimo resistente É tal a mente dos homens sobreaterra como o dia que conduz o pai de varões e deuses Também eu um dia seria fortunado entre os varões mas fiz muita coisa iníqua cedendo à força e ao vigor 140 confiante em meu pai e em meus irmãos Por isso jamais um varão ignore as regras mas quieto suporte os dons de deuses o que derem Que iniquidades vejo os pretendentes maquinar Devastam as posses e desonram a esposa 145 do varão que penso não mais dos seus e do solo pátrio longe ficará por longo tempo está bem perto Mas que um deus à casa te acompanhe que não te depares com ele quando retornar para sua terra pátria creio que não sem sangue os pretendentes e ele 150 se distinguirão após entrar sob seu teto Isso disse e após libar bebeu o vinho doce como mel e de volta pôs o cálice nas mãos do ordenador de tropa E esse cruzou o salão agastado em seu coração curvando a cabeça pois já via o mal no ânimo 155 Nem assim fugiu da morte também o prendeu Atena para as mãos e a lança de Telêmaco o subjugarem à força De volta logo sentouse na poltrona de onde se erguera E no juízo dela pôs a deusa Atena olhosdecoruja no da filha de Icário Penélope bemajuizada 160 aos pretendentes aparecer para sobremodo alargar o ânimo dos pretendentes e tornarse honrada diante do marido e do filho mais que no passado Deu risada inútil dirigiu a palavra e nomeou Eurínome meu ânimo deseja não como antes 165 aparecer aos pretendentes embora de todo odiados ao filho diria uma palavra que isto seria mais vantajoso não concordar em tudo com os pretendentes soberbos que falam bem mas por trás pensam vilezas E a ela a governanta Eurínome dirigiu o discurso 170 Por certo isso tudo criança falaste com adequação Vamos e a teu filho diga uma palavra e não esconda após lavar a pele e ungir o rosto com o rosto manchado por lágrimas assim não vás pois é pior sempre se afligir sem cessar 175 Com efeito já está na idade teu filho quem tu muito rogaste aos deuses veres com barba E a ela replicou Penélope bemajuizada Eurínome embora preocupada não me induzas lavar a pele e ungirme com óleo 180 minha radiância os deuses que têm o Olimpo destruíram desde que aquele partiu em cavas naus Mas peça para mim que Autónoe e Hipodameia venham para junto a mim se postarem nos salões Sozinha não irei até os varões pois tenho pudor 184ª de unirme obrigada aos pretendentes soberbos 185 Assim falou e a anciã saiu cruzando o salão anunciando às mulheres e instigandoas a ir Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja na filha de Icário vertia doce sono adormecia reclinada e fraquejaram todas suas juntas 190 aí mesmo na cadeira Nisso a deusa divina davalhe dons imortais para os aqueus contemplála Primeiro sua bela pele limpou com cosmético imortal com o qual Citereia belacoroa se unge quando vai à desejável dança das Graças 195 Fêla maior e mais encorpada a quem a visse e mais alva a fez que marfim talhado Ela após assim agir partiu a deusa divina E vieram as servas alvosbraços do salão com ruído achegandose Doce sono deixoua 200 ela esfregou o rosto com as mãos e disse Sim a mim em terrível aflição sono macio encobriu Tomara morte assim macia me desse a pura Ártemis agora logo para não mais lamentandome no ânimo desgastar a vitalidade saudosa do caro esposo 205 de sua excelência múltipla pois superava os aqueus Assim falou e desceu dos aposentos lustrosos não sozinha mas com ela seguiam duas criadas Quando alcançou os pretendentes divina mulher parou ao lado do pilar do teto sólida construção 210 após puxar para diante da face o véu reluzente e criada devotada uma de cada lado se postou Lá fraquejaram os joelhos deles o desejo enfeitiçoulhes o ânimo e todos rezaram para deitarse a seu lado no leito E ela falou a Telêmaco seu caro filho 215 Telêmaco não mais teu juízo é seguro nem tua ideia quando criança até mais no juízo aplicavas tua esperteza Agora que és grande e alcanças a medida da juventude alguém de fora diria que de varão afortunado és rebento ao mirarte o tamanho e a beleza 220 não mais teu juízo é apropriado nem tua ideia vê esse feito que no palácio ocorreu tu permitiste que o estranho fosse assim ultrajado E agora se algo o estranho em nosso palácio sentado sofresse graças a pungente mautrato 225 Para ti haveria vergonha e entre os homens vexame A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Minha mãe não fico indignado que disso tens raiva mas no ânimo penso e conheço cada coisa as nobres e as piores no passado ainda era tolo 230 Mas vê não posso pensar tudo de modo inteligente sentados junto a mim um ali outro lá confundemme esses aí refletindo vilezas e não há quem me ajude Vê a luta do estranho e de Iro não ocorreu como queriam os pretendentes e na força aquele foi melhor 235 Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo que agora em nosso palácio os pretendentes deixassem pender as cabeças subjugados uns no pátio outros na casa os membros a fraquejar como agora os de Iro que lá nos portões do pátio está sentado 240 a cabeça curva igual a um ébrio incapaz de endireitarse de pé ou de voltar à casa ou aonde for seu retorno pois os membros fraquejam Assim eles disso falavam entre si E Eurímaco com palavras dirigiuse a Penélope 245 Filha de Icário Penélope bemajuizada se te vissem todos os aqueus na jônia Argos mais pretendentes em vosso palácio de manhã se banqueteariam pois ultrapassas as mulheres em aparência altura e por dentro juízo equilibrado 250 E a ele então respondeu Penélope bemajuizada Eurímaco minha excelência aparência e porte os imortais destruíram quando a Ílion embarcavam os argivos e ia com eles meu marido Odisseu Se ele viesse e de minha vida cuidasse 255 maior seria minha fama e mais bela a situação Agora me angustio tantos os males que o deus me enviou Sim quando foi e deixou a terra pátria tomoume a mão direita pelo pulso e me disse Mulher não creio que os aqueus belasgrevas 260 de Troia voltarão bem todos incólumes pois dizem que os troianos são varões guerreiros tanto lanceiros quanto arqueadores de flechas e montadores de cavalos cascoveloz que bem rápido decidem grande justa em guerra niveladora 265 Assim não sei se o deus me trará de volta ou serei pego lá mesmo em Troia que aqui tudo seja tua atribuição Lembrate do pai e da mãe no palácio como agora ou ainda mais estando eu longe mas quando vires barba no menino 270 sê desposada por quem quiseres após tua casa deixar Assim aquele falou tudo isso agora se completa Noite haverá em que a hedionda boda se achegará de mim maldita de quem Zeus tirou a fortuna Mas esta angústia terrível atinge o ânimo do coração 275 não é essa a tradição dos pretendentes de antanho esses que valorosa mulher e filha de homem rico querem cortejar e com outros disputam Eles mesmos trazem bois e robustas ovelhas banquete à família da jovem e dão radiantes dons 280 mas não a comida de outrem devoram de graça Isso dito alegrouse o muitatenência divino Odisseu porque ela arrancava dons enfeitiçava o ânimo com palavras amáveis mas sua mente concebia outra coisa E a ela replicou Antínoo filho de Persuasivo 285 Filha de Icário Penélope bemajuizada presentes dos aqueus que para cá quiserem trazêlos recebeos não é belo recusar um dom E nós não iremos antes aos campos nem alhures até que sejas desposada pelo aqueu que for o melhor 290 Assim falou Antínoo e agradoulhes o discurso Para trazer os dons cada um despachou seu arauto Para Antínoo trouxe grande peplo bem belo variegado nele havia fivelas doze no total douradas ajustadas com fechos bemtorcidos 295 Colar para Eurímaco bem artificioso presto trouxe de ouro entrelaçado com âmbar como o sol Brincos para Euridamas dois assistentes trouxeram três olhos tal uma amora e bem graciosos reluziam Do senhor Pisandro filho de Polictor 300 gargantilha trouxe o assistente adorno bem belo Cada um dos aqueus trouxe um belo dom Ela então subiu aos aposentos a divina mulher e com ela servas levavam os bem belos dons e aqueles para a dança e o desejável canto 305 volveramse e deleitaramse e ficaram até a noite Enquanto se deleitavam veiolhes a negra noite De pronto três braseiros postaramse no palácio para alumiar neles em volta lenha se pôs sem seiva há muito seca recémrachada com bronze 310 e junto misturaramse gravetos em turnos iluminavam as escravas de Odisseu juízopaciente Mas a essas ele próprio o divinal falou Odisseu muitaastúcia Escravas de Odisseu senhor há tempo ausente dirigivos à morada onde está a respeitável senhora 315 junto a ela na roca fiai e deleitaia sentadas no salão ou cardai a lã com as mãos eu providenciarei luz para todos esses aí Caso eles queiram aguardar Aurora belotrono não me vencerão sou deveras muitaresistência 320 Assim falou e elas riram olhandose entre si Reprovouo com uma afronta Preta belaface a essa Finório gerou e dela Penélope cuidou crioua como filha e brinquedos lhe deu para o ânimo Mas nem assim afligiase no juízo por Penélope 325 a Eurímaco uniase e o amava Ela a Odisseu reprovou com palavras insultuosas Estranho insolente tu és alguém alucinado no juízo e não queres ir dormir na casa do artífice de bronze ou num galpão ficas aqui falando muito 330 com audácia entre muitos homens e no ânimo não temes por certo vinho domina teu juízo ou sempre tens uma mente tal porque falas em vão ou estás fora de ti pois a Iro venceste aquele errante Que logo outro melhor que Iro contra ti não se erga 335 um que te golpeie em volta da cabeça com braço robusto e para fora da casa te leve sujo com muito sangue Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Bem rápido direi a Telêmaco cadela como falas eu indo até ele para que lá te corte em pedaços 340 Assim falando com palavras amedrontou as mulheres Cruzaram o salão e fraquejaram seus membros de temor pois pensaram que ele enunciara a verdade E ele alumiando junto aos braseiros chamejantes ficou a todos mirando o coração revolvia em seu ânimo 345 outra coisa que não ficaria incompleta Atena de modo algum deixou os arrogantes pretendentes reprimiremse no opróbrio aflitivo para ainda mais a angústia entrar no coração de Odisseu filho de Laerte Entre eles Eurímaco filho de Polibo começou a falar 350 provocando Odisseu e riso nos companheiros gerou Ouvime pretendentes da esplêndida senhora vou falar o que o ânimo me ordena no peito Não sem um deus chegou este homem à casa de Odisseu pareceme de todo que a fulgência das tochas é dele 355 da sua cabeça pois nela não há cabelo nem pouco Falou e nisso dirigiuse a Odisseu arrasaurbe Estranho gostarias de empregarte se eu te escolhesse no limite das lavouras a paga te será suficiente recolhendo espinheiros e plantando grandes árvores 360 Lá forneceria eu mesmo alimento constante com vestes te vestiria e para os pés daria alpercatas Mas sim como aprendeste serviços vis não quererás fazer o serviço mas curvarse pelas redondezas preferes para poder engordar teu estômago insaciável 365 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Tomara Eurímaco rivalizássemos ambos no campo durante a primavera quando os dias são longos no pasto foice eu teria boacurva e tu também isso terias para no campo nos testarmos 370 jejuando até a escuridão total e pasto haveria Se bois também houvesse para conduzir os melhores ardentes enormes ambos saciados de pasto mesma idade tração igual boa força seriam quatro medidas e o torrão cederia sob o arado 375 assim me verias se os sulcos de uma só vez não cortaria Se guerra também de um lado o filho de Crono instigasse hoje e para mim houvesse um escudo duas lanças e um elmo todo de bronze ajustado nas têmporas assim me verias unindome aos primeiros na vanguarda 380 e não falarias insultos contra esse meu estômago Mas és muito desmedido e tua mente é intratável e acreditas ser alguém grande e poderoso porque te reúnes com poucos e não valorosos Se Odisseu voltasse e alcançasse sua terra pátria 385 logo para ti essas portas embora muito largas seriam estreitas ao tentares fugir pórtico afora Assim falou e Eurímaco enraiveceuse mais no coração olhou de baixo e dirigiulhe palavras plumadas Canalha rápido te aprontarei um mal do jeito que falas 390 com audácia entre muitos homens e no ânimo não temes por certo o vinho domina teu juízo ou sempre tens uma mente tal porque falas em vão ou estás fora de ti pois a Iro venceste o errante Assim falou e pegou uma banqueta e Odisseu 395 junto aos joelhos de Anfínomo de Dulíquion sentou temendo Eurímaco que acabou por atingir do escanção o braço direito a jarra ao cair no chão atroou e o varão gritou de dor e caiu de costas na poeira E os pretendentes iniciaram arruaça no umbroso palácio 400 e assim falavam fitando quem estava ao lado O estranho vagando alhures deveria ter morrido antes de chegar assim não liberaria tal tumulto Agora brigamos por causa de mendigos e com o banquete fino não haverá prazer pois vence o mais infame 405 E entre eles falou a força sacra de Telêmaco Insanos enlouqueceis e não mais ocultais no ânimo a comida e a bebida um dos deuses vos instiga Mas após o banquete vade dormir de volta à casa quando o ânimo pedir mas eu não persigo ninguém 410 Assim falou e todos os dentes mordendo os lábios admiraramse de Telêmaco pois falou com audácia E entre eles Anfínomo tomou a palavra e disse o ilustre filho de Niso o senhor filho de Areto Amigos ninguém por ocasião de fala civilizada 415 abordando com palavras confrontantes endureceria nem maltrateis o estranho nem de resto um dos escravos que vivem na casa do divino Odisseu Vamos que o escanção verta as primícias nos cálices para tendo libado irmos dormir de volta à casa 420 que com o estranho deixemos no palácio de Odisseu que se preocupe Telêmaco pois sua casa amiga alcançou Isso disse e falou um discurso que agradou a todos Para eles na ânfora fez a mistura o herói Caminheiro o arauto de Dulíquion era o assistente de Anfínomo 425 E a todos serviu achegandose eles aos deuses ditosos libaram e beberam do vinho doce como mel Mas depois de libar e beber quanto o ânimo quis partiram para descansar cada um rumo a sua casa Mas ele no salão ficou o divino Odisseu a matança dos pretendentes cogitando com Atena De pronto a Telêmaco dirigiu palavras plumadas Telêmaco carece dentro guardar as armas de guerra 5 todas e aos pretendentes com palavras macias persuadir quando te arguirem sentindo sua falta Tireias da fumaça pois não parecem mais com estas as que Odisseu ao ir a Troia deixou para trás mas se desfiguraram tanto atingiuas o bafo do fogo 10 Além disso o deus soprou algo mais grave no juízo que bêbados não instaurásseis briga entre vós ferísseivos uns aos outros e estragásseis o banquete e a corte o ferro ele mesmo puxa o homem Assim falou Telêmaco obedeceu ao caro pai 15 e após chamála para si disse à ama Euricleia Mãezinha vamos segura as mulheres no salão até que eu guarde no quarto as belas armas do pai na casa a fumaça delas se apossa descuidadas já que ausente o pai eu era tolo mas agora 20 quero pôlas onde o bafo do fogo não chega E a ele replicou a querida ama Euricleia Que agora filho te aposses da reflexão para ocuparte da casa e vigiar todos os bens Vamos quem então irá contigo e levará a luz 25 já que não deixas sair as escravas que alumiariam A ela então o inteligente Telêmaco retrucou O estranho aí não deixarei inativo quem de meu cereal pegue mesmo de longe tendo chegado Assim ele falou e para ela o discurso foi plumado 30 e trancou as portas do palácio bom para morar Eis que os dois se levantaram Odisseu e o filho ilustre e carregavam elmos escudos umbigados e lanças afiadas na frente Palas Atena munida de lâmpada dourada produzia bem bela luz 35 Nisso de súbito falou Telêmaco ao pai Pai grande assombro sim vejo com os olhos tudo as paredes do palácio as belas traves as vigas de abeto os pilares que se sobreerguem pareceme aos olhos como se de fogo chamejante 40 Aqui há um deus dos que do largo páramo dispõem Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Quieto contém tua mente e nada perguntes essa é a tradição dos deuses que do Olimpo dispõem Mas vai te deitar e eu ficarei aqui 45 para ainda às escravas e a tua mãe provocar ela lamentandose indagará acerca de tudo Assim falou e Telêmaco cruzou o salão sob tochas luzentes indo descansar no quarto onde sempre deita quando doce sono o alcança 50 nisso lá também dormiu e aguardava a divina Aurora Mas ele no salão ficou o divino Odisseu a matança dos pretendentes cogitando com Atena E ela saiu do quarto Penélope bemajuizada semelhante a Ártemis ou à dourada Afrodite 55 Junto ao fogo postaramlhe a cadeira onde sentavase bemacabada com marfim e ouro que um dia fez Icmálio o artesão e embaixo pôs banqueta para os pés em cima dela jogaram grande velo Lá sentouse então Penélope bemajuizada 60 E do salão vieram as escravas alvosbraços Elas retiraram o excesso de comida as mesas e os cálices de onde beberam os poderosos varões o fogo dos braseiros lançaram no chão e neles novas achas muitas queimaram para alumiar e aquecer 65 Preta a Odisseu reprovou uma segunda vez Estranho também agora importunarás aqui à noite circulando pela casa e espiarás as mulheres Não Aproveita o banquete insolente e sai pela porta ou rápido atingido por brasa porta afora te irás 70 Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Insana por que me coages assim com ânimo rancoroso Por eu estar sujo vestir ordinárias vestes sobre a pele e mendigar pelos arredores A necessidade me compele Assim são os varões mendigos e vagamundos 75 Também eu um dia afortunado entre os homens morei em casa rica e amiúde obsequiava um errante fosse como ele fosse e do que precisasse ao chegar tinha miríades de escravos e muita outra coisa com que se vive bem e se é tido como rico 80 Mas Zeus filho de Crono destruiu quis de algum modo Por isso agora também tu mulher não percas toda a radiância com que agora entre escravas és superior que a senhora rancorosa não endureça contra ti ou volte Odisseu ainda resta parte de esperança 85 Mesmo que tenha morrido e assim não mais retorne o filho porém já tem o valor do pai graças a Apolo Telêmaco no salão das mulheres ele a nenhuma iníqua ignora pois não tem mais idade Assim falou escutoulhe Penélope bemajuizada 90 e à serva reprovou dirigiuselhe e nomeoua De modo algum atrevida cadela petulante ignorei teu inaudito feito com que besuntarás tua cabeça Sabias tudo direito pois de mim mesma ouviste que a este estranho eu iria no palácio 95 indagar acerca do esposo pois sofro copiosa angústia Falou e à governanta Eurínome disse o discurso Eurínome traze banqueta e velo sobre ela para que sentado o estranho fale sua fala e escute de mim pois quero interrogálo 100 Assim falou e ela de pronto trouxe e postou banqueta bempolida e jogou sobre ela um velo lá sentouse então o muitatenência divino Odisseu Entre eles começou a falar Penélope bemajuizada Estranho eu mesma primeiro te porei esta questão 105 quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Mulher a ti nenhum mortal pela terra semfim censuraria tua fama chega ao largo páramo como a de um rei impecável que temente ao deus 110 regendo sobre muitos e altivos varões sustenta as boas tradições e a negra terra produz trigo e cevada as árvores carregam de fruto as ovelhas se reproduzem sem vacilar o mar fornece peixes e o povo graças à boa liderança excele 115 Por isso agora apura de mim o restante em tua casa só não me indagues linhagem e terra pátria para não encheres ainda mais meu ânimo com dores ao me fazeres lembrar sou muitogemido demais Não carece que eu na casa de outrem com lamento e pranto 120 me sente pois é pior sempre sem trégua se afligir Que nenhuma escrava se indigne comigo nem mesmo tu e diga que navego em choro o juízo nocauteado por vinho E a ele respondeu Penélope bemajuizada Estranho minha excelência aparência e porte 125 os imortais destruíram quando a Ílion embarcavam os argivos e ia com eles meu marido Odisseu Se ele viesse e de minha vida cuidasse maior seria minha fama e mais bela a situação Agora me angustio tantos males o deus me enviou 130 Com efeito quantos nobres têm poder sobre as ilhas Dulíquion Same e a matosa Zacintos e quantos habitam ao longo de Ítaca bemavistada esses cortejamme sem que eu queira e esgotam a casa Por isso nem a estranhos atento nem a suplicantes 135 ou a algum dos arautos esses profissionais mas saudosa de Odisseu derretome no caro coração Eles aplicamse às bodas e eu arremato truques Primeiro o deus soprou em meu juízo um manto após grande urdidura armar no palácio tramar 140 fina e bem longa De imediato lhes disse Moços meus pretendentes morto o divino Odisseu esperai mesmo ávidos por desposarme até o manto eu completar que meus fios em vão não se percam mortalha para o herói Laerte para quando a ele 145 o quinhão funesto agarrar o da morte dolorosa que contra mim no povo aqueia alguma se indigne se ele sem pano jazer depois que muito granjeou Assim falei e foi persuadido o ânimo orgulhoso E então de dia eu tramava a enorme urdidura 150 e nas noites desenredavaa à luz de tochas Três anos não fui notada e persuadi os aqueus mas ao chegar o quarto ano e a primavera se aproximar as luas finando e muitos dias passando então a mim por meio de servas cadelas insolentes 155 eles me pegaram e com palavras me repreenderam E assim completei a mortalha a contragosto obrigada Agora não consigo escapar das bodas nem outro plano mais intento muito me instigam os pais a casar e o filho irritase com quem devora o sustento 160 e disso ele sabe pois já é varão sobremodo capaz de ocuparse da casa a quem Zeus fortuna oferta Mas mesmo assim me fala tua linhagem donde és de carvalho não és nem de rocha como no velho dito Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 165 Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte não cessarás de indagar acerca de minha origem Pois eu te direi Por certo me entregarás a angústia maior que a que suporto é o que ocorre quando está longe de sua pátria o varão por tanto tempo quanto eu agora 170 tendo vagado por muita urbe de mortais sofrendo agonias Mas também assim falarei do que me perguntas e apuras Há uma terra Creta no meio do mar vinoso bela e fértil banhada por correntes nela há muitos homens semfim e noventa cidades 175 Todas falam outras línguas mescladas numa aqueus noutra verocretenses enérgicos noutra cidônios dórios triplotronco e pelasgos divinos Entre elas há Cnossos grande cidade onde por nove anos reinava Minos íntimo do grande Zeus 180 pai de meu pai o animoso Deucálion Deucálion a mim gerou e ao senhor Idomeneu Mas este em naus recurvas rumo a Ílion partiu com os filhos de Atreu Meu nome famoso é Abrasador o mais jovem na família e ele é o mais velho e aguerrido 185 Lá eu vi Odisseu e deilhe dons de hóspede Também a ele a Creta levouo a força do vento ansiava ir a Troia após vagar para longe de Maleia Ancorou em Amniso onde fica a caverna de Eileitiia em angra difícil e com esforço escapou das rajadas 190 Logo perguntou de Idomeneu ao subir à cidade disse ser seu aliado caro e respeitável Já era a décima ou undécima aurora para ele que ia com suas naus recurvas rumo a Ílion Leveio para casa e bem hospedei 195 acolhendoo gentil com o muito que na casa havia e a ele e aos outros companheiros que o seguiam dei cevada da comunidade juntei fulgente vinho e bois para sacrificar de sorte a saciar seu ânimo Lá ficaram doze dias os divinos aqueus 200 detinhaos o grande vento Bóreas que sobre a terra não deixava ficarse de pé e dura divindade instigavao no décimo terceiro o vento caiu e eles partiram Falava contando muito fato enganoso como genuíno Penélope ao ouvir chorava a pele derretia 205 Como derrete a neve para baixo nos cumes dos montes essa que Euro derrete quando Zéfiro o deixa cair e ao derreter os rios correm cheios assim derretia sua bela face vertendo lágrimas pranteando o marido a seu lado sentado E Odisseu 210 lamentando no ânimo apiedavase da esposa e os olhos como se cornos ou ferro firmes estavam serenos nas pálpebras com truque conteve as lágrimas Ela após deleitarse com o lamento muitalágrima de novo com palavras respondendo lhe disse 215 Pois agora a ti estranho creio que testarei se de verdade lá com excelsos companheiros hospedaste meu marido no palácio como dizes Falame que vestes no corpo vestia como ele mesmo estava bem como seus companheiros 220 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Ó mulher é difícil de alguém há tanto tempo longe falar pois este já lhe é o vigésimo ano desde que de lá saiu e partiu de minha pátria mas te direi como ele aparece em meu íntimo 225 Capa púrpura de lã tinha o divino Odisseu uma dupla nela havia uma fivela de ouro com duplo entalhe e na frente um artefato com as patas dianteiras um cão segurava um veado variegado mirandoo convulsionarse todos isto admiravam 230 o cão mirava o corço os dois de ouro sufocandoo e o outro ansiando escapar convulsionavase nas patas E a túnica observei lustrosa no corpo tal como a casca de uma cebola seca era assim macia e fúlgida como o sol 235 De fato muitas mulheres o contemplavam Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança não sei ou isso vestia no corpo Odisseu de casa ou um companheiro presenteouo ao sair em nau veloz ou alhures algum aliado pois de muitos Odisseu 240 era amigo poucos aqueus a ele assemelhavamse Também eu lhe dei brônzea espada e uma dupla túnica bela púrpura com franjas e com respeito envieio à nau bomconvés E um arauto pouco mais velho que ele 245 seguiao também dele te falarei como era ombros arqueados pele escura cabeleira lanosa Passolargo de nome mais que a seus outros companheiros honravao Odisseu pois no juízo adequavase a ele Assim falou e nela instigou mais desejo por choro 250 reconhecendo os sinais seguros que lhe enunciou Odisseu Ela após deleitarse com o lamento muitalágrima então respondendo com um discurso lhe disse Pois agora hóspede se antes já mereceras piedade agora em meu palácio terás estima e respeito 255 pois eu mesma lhe dei essas roupas das quais falaste trouxeas do quarto dobradas e a elas juntei luzidia fivela para adornálo Mas a ele jamais saudarei de novo ao voltar para casa sua cara terra pátria Por isso com má sorte sobre cava nau Odisseu 260 partiu para vivenciar a inominável RuinosaÍlion Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte não mais a bela pele arruínes agora nem o ânimo derretas chorando o esposo Não me indigno de modo algum 265 mulheres também lamentam outros ao perder um varão consorte para quem filhos gerou após unirse em amor que não apenas Odisseu que dizem ser feito deus Mas cessa o choro e apreende minha fala sem evasivas para ti discursarei e não esconderei 270 que acerca do retorno de Odisseu eu já ouvi está perto no fértil povoado dos varões tesprótios vivo e traz bens em profusão e distintos pedindo pela região Mas os leais companheiros perdeu e a côncava nau no mar vinoso 275 ao sair da ilha de Trinácia tinham ódio por ele Zeus e Sol pois às suas vacas mataram os companheiros Todos eles pereceram no mar encapelado mas a ele sobre a quilha da nau uma onda jogou na terra a terra dos feácios na origem próximos dos deuses 280 eles de coração honraramno como a um deus deramlhe muitos dons e quiseram eles mesmos leválo para casa incólume Há tempo aqui Odisseu estaria mas vê isto pareceulhe mais vantajoso no ânimo bens juntar percorrendo a extensa terra 285 mais que os homens mortais muita vantagem conhece Odisseu e mortal algum seria seu rival Assim me contou o rei dos tesprótios Salvador jurou para mim mesmo entre libações que puxara uma nau e preparara companheiros 290 que o conduziriam à cara terra pátria Mas antes enviou a mim calhou ir uma nau de homens tesprótios a Dulíquion muitotrigo Mostroume as riquezas que amealhara Odisseu agora até a décima geração um por um alimentariam 295 tantos haveres do senhor havia em seu palácio Dele disseme que foi a Dodona para do divino carvalho altacopa escutar a vontade de Zeus como voltaria para a cara terra pátria já há muito afastado se às claras ou às ocultas 300 Assim ele desse modo está seguro e já chegará bem perto e longe dos seus e do solo pátrio ficará por pouco tempo De tudo vou te dar um juramento saiba agora Zeus primeiro supremo deus e o melhor e o fogolar do impecável Odisseu ao qual cheguei 305 por certo tudo isso completase como afirmo Neste mesmo período interlunar chegará aqui Odisseu a lua minguando e depois crescendo E a ele replicou Penélope bemajuizada Ah Se essa palavra hóspede se cumprisse 310 então rápido conhecerias a amizade e muitos dons meus tantos que se alguém te visse te diria ditoso Mas como no ânimo me ocorre assim mesmo será nem Odisseu virá mais para casa nem tu condução obterás pois senhores não há mais na casa 315 tal como Odisseu entre os varões se um dia viveu para receber e acompanhar hóspedes respeitáveis Mas criadas lavaio armai um leito estrado lençóis e mantas lustrosas para aquecendose bem alcançar Aurora belotrono 320 Amanhã bem cedo banhaio e ungio e que almoce ao lado de Telêmaco sentado no salão Entre aqueles pior para quem destróiânimo molestálo desta casa nada mais obterá mesmo enraivecido ao extremo 325 Pois hóspede como saberás se outra mulher sobrepujo na mente e astúcia refletida se sujo vestido com andrajos no palácio comeres Os homens chegam ao fim em pouco tempo Quem for ele mesmo intratável e versado no intratável 330 contra ele todos os mortais invocam males futuros enquanto viver e dele morto todos debocham quem for ele mesmo impecável e versado no impecável sua extensa fama espalham os aliados entre todos os homens e muitos dizem que é nobre 335 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte quanto aos lençóis e mantas lustrosas sãome odiosos desde que me afastei dos montes nevados de Creta viajando sobre nau longoremo 340 deitome como sempre passei as noites insones Muitas noites de fato em abrigo noturno ultrajante passei e aguardei a divina Aurora belotrono Nem a meu ânimo lavaremme os pés agrada não tocará meu pé alguma mulher 345 daquelas que te fazem o trabalho da casa salvo se houver vetusta anciã sempre devotada uma que sofreu no juízo tanto quanto eu não me incomodaria se uma tal meus pés lavasse E a ele replicou Penélope bemajuizada 350 Caro hóspede nunca varão tão inteligente mais caro hóspede de longe alcançou minha casa tão inteligente e sensato é tudo o que falas Sim tenho uma anciã com ideias argutas no juízo ela que bem nutriu e criou aquele infeliz 355 e recebeuo nos braços quando primeiro gerouo a mãe essa lavará teus pés embora sendo bem fraca Vamos agora após levantares bemajuizada Euricleia lava o coetâneo de teu senhor talvez de Odisseu os pés e as mãos já sejam assim como os dele 360 Na desgraça os mortais envelhecem rápido Assim falou e a anciã cobriu a face com as mãos lágrimas quentes verteu e falou uma fala chorosa Ai de mim filho nada posso fazer por ti a quem embora temente ao deus Zeus abominou entre os homens 365 Nunca mortal algum a Zeus prazernoraio queimou tantas coxas gordas ou hecatombes seletas quantas tu a ele com preces ofereceste para atingires idade reluzente e criares o filho ilustre e agora só de ti tirou de todo o dia do retorno 370 Assim também dele debocharam mulheres de estranhos longínquos ao atingir uma casa famosa como de ti essas cadelas aqui debocharam todas lançam opróbrio e tanta vergonha que agora as evitas ao não permitires que os pés te lavem a mim sem eu não querer 375 pediu a filha de Icário Penélope bemajuizada Teus dois pés lavarei por ti e pela própria Penélope já que dentro de mim o ânimo foi instigado por agruras Vamos agora atenta à fala que vou falar já muitos estranhos calejados aqui chegaram 380 mas afirmo nunca ter visto alguém tão parecido em corpo voz e pés com Odisseu como pareces tu Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Anciã assim falam todos que viram com os olhos a nós dois que ambos muito nos assemelhamos 385 um ao outro como tu mesma refletindo dizes Assim falou e a anciã pegou resplandecente bacia na qual pés limpava e muita água derramou nela fria e depois quente misturou E Odisseu sentouse longe da lareira e dirigiuse logo à penumbra 390 de pronto em seu ânimo temeu que ela ao tocálo a cicatriz percebesse e suas ações se esclarecessem Próxima lavava seu senhor de pronto reconheceu a cicatriz a de quando javali com branco dente o feriu ao ir ao Parnasso atrás de Autólico e seus filhos 395 o distinto pai de sua mãe superior aos homens no roubo e no juramento o próprio deus o presenteou Hermes a esse queimava comprazedoras coxas de ovelhas e cabritos e ele solícito o acompanhava E Autólico foi à gorda comunidade de Ítaca 400 e encontrou a criança recémnascida de sua filha Euricleia a pôs nos caros joelhos dele no fim do jantar dirigiuselhe e nomeouo Autólico agora tu mesmo acha o nome o que darás à criança de tua cara criança para ti muitorogado ele é 405 A ela por sua vez Autólico respondeu e disse Meu genro e filha colocai o nome que vou falar com o ódio de muitos eu mesmo cheguei aqui de varões e mulheres pela terra nutremuitos que seu nome epônimo seja Odisseu Quanto a mim 410 quando ao tornarse jovem à grande casa materna fores ao Parnasso onde estão meus bens deles eu lhe darei e a ele agradado de volta enviarei Por isso foi Odisseu para receber presentes radiantes Eis que a ele Autólico e os filhos de Autólico 415 saudaram com as mãos e palavras amáveis a mãe da mãe Muidivina abraçou Odisseu e beijouo na cabeça e nos dois belos olhos E Autólico ordenou que os filhos majestosos o almoço preparassem e o ouviram 420 Rápido trouxeram boi macho de cinco anos esfolaram e desmembraramno por inteiro cortaram com destreza transpassaram em espetos assaram com todo o cuidado e dividiram as porções Então assim o dia inteiro até o pôr do sol 425 jantaram e o ânimo não careceu de banquete parelho e quando o sol mergulhou e vieram as trevas então repousaram e aceitaram o dom do sono Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos foram para a caça tanto os cães quanto os próprios 430 filhos de Autólico com eles ia o divino Odisseu Rumaram à escarpada montanha coberta de mata o Parnasso e rápido atingiram as fendas ventosas Então o Sol começou a alcançar as glebas vindo do corremacio Oceano suavecorrente 435 e eles o vale atingiram os caçadores à frente à procura de pegadas iam os cães e atrás os filhos de Autólico com eles o divino Odisseu seguia perto dos cães brandindo lança sombralonga E lá na toca compacta espreitava grande javali 440 Não a cortava o ímpeto de ventos que sopram úmidos nunca o sol luzidio com seus raios a atingia nem chuva a cruzava por completo tão compacta era e havia um monte de folhas grande abundância Envolveuo o som dos pés de varões e cães 445 ao chegarem caçando ele de frente moita afora a crina bem eriçada mirando com fogo nos olhos pôsse perto deles Eis que Odisseu foi o primeiro a lançarse erguendo a longa lança na mão encorpada ansioso por ferilo e o javali antecipouse e feriuo 450 sobre o joelho e muita carne extraiu com o dente lançandose de lado mas não atingiu o osso do herói E Odisseu golpeouo acertando sua espádua direita e certeira atravessou a ponta da lança luzidia tombou no pó berrando e sua vida voou para longe 455 Daquele então os caros filhos de Autólico cuidaram e o ferimento do impecável excelso Odisseu destros ataram com um encanto o negro sangue contiveram e rápido rumaram à morada do caro pai Eis que a ele Autólico e os filhos de Autólico 460 curaram direito e lhe deram dádivas radiantes alegre com alegria amigável enviaramo logo a Ítaca Por ele o pai e a senhora mãe alegraramse ao retornar e inqueriramno de tudo a cicatriz de como a obteve e ele contoulhes bem 465 como ao caçar machucouo javali com branco dente ao ir ao Parnasso com os filhos de Autólico Então a anciã com as mãos para baixo pegou reconheceu a cicatriz ao nela encostar e empurrou o pé para longe a panturrilha caiu na bacia o bronze estrepitou 470 e para o outro lado inclinouse água entornou pelo chão Alegria e aflição tomaram seu juízo seus dois olhos de lágrimas se encheram e a voz abundante contevese Tocandoo no queixo dirigiuse a Odisseu De fato és Odisseu querida criança mas antes 475 não te reconheci antes de tocar todo o meu senhor Falou e fitou Penélope com os olhos querendo indicar que o caro esposo lá dentro estava Ela não foi capaz de mirar direto ou perceber pois Atena desviou sua mente E Odisseu 480 com a mão direita alcançoua pegoua pelo pescoço com a outra puxoua mais perto de si e falou Mãezinha por que queres destruirme Tu me nutriste nesse teu peito agora após padecer muita agonia cheguei no vigésimo ano à terra pátria 485 Mas como ponderaste e o deus lançou em teu ânimo quieta que nenhum outro no palácio te escute Pois assim eu falarei e isto se cumprirá se o deus fizer eu subjugar os ilustres pretendentes nem a ti embora minha ama pouparei quando as outras 490 escravas mulheres em meu palácio eu matar E a ele replicou a bemajuizada Euricleia Meu filho que palavra te escapou da cerca de dentes Pois sabes este é meu ímpeto firme e inflexível aguentarei como se eu fosse de pedra dura ou ferro 495 Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança se o deus te fizer subjugar os ilustres pretendentes então te enumerarei as mulheres no palácio as que te desonram e as que são inocentes Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 500 Mãezinha por que falas delas Disso não careces Eu mesmo irei bem ponderar e observar cada uma Mas silencia o discurso e entrega aos deuses Assim falou e a anciã saiu cruzando o salão para buscar água que derramara toda 505 Então após o lavar e ungir à larga com óleo de novo para perto do fogo Odisseu puxou a banqueta para se aquecer e encobriu a cicatriz sob os trapos E entre eles começou a falar Penélope bemajuizada Eu mesma hóspede ainda te porei esta pequena questão 510 sim logo será a hora do prazeroso repouso a quem quer que o doce sono agarrar ainda que inquieto Mas a divindade deume aflição desmesurada de dia deleitome com lamentos gemendo e olhando para minhas obras e as das servas na casa 515 mas quando a noite vem e o repouso agarra todos deito no leito e em volta de meu coração pulsante copiosas aflições agudas me perturbam a lamentadora Como quando a filha de Pandareu a filomela do verde com graça canta ao postarse recente a primavera 520 sentada entre as folhas copiosas das árvores ela que amiúde modulando verte som bem ecoante deplorando o filho o caro Ítilo que um dia com bronze matou por engano o filho do rei Zeto assim também meu ânimo acirrase em duas direções 525 a ver se fico ao lado do filho e firme tudo guardo meus bens escravos e a enorme e alta casa respeitando a cama do marido e a fala do povo ou se já sigo quem for o melhor dos aqueus que me corteja no salão oferecendo dádivas semfim 530 Enquanto meu filho ainda era tolo e juízofrouxo ele não me permitia casar e deixar a morada do esposo agora que é grande e alcança a medida da juventude já me roga que retorne para fora do palácio impaciente com as posses que os aqueus lhe devoram 535 Mas vamos escuta e responde a este meu sonho Meus vinte gansos pela casa comem o trigo da água e ao vêlos rejubilome Vinda de um monte grande águia com bico curvo o pescoço de todos quebra e os mata deixaos empilhados 540 juntos na casa e ascende rumo ao céu divino Mas eu pranteava e ululava no sonho e a minha volta reuniramse aqueias belastranças eu triste chorando pois a águia matarame os gansos Voltando pousou numa projeção da cumeeira 545 e com voz humana quis me conter e disse Coragem filha de Icário grandefama não é sonho mas ótima realidade a se cumprir para ti Os gansos são os pretendentes e eu uma ave águia era antes e agora como teu marido voltei 550 e contra todos os pretendentes lançarei ultrajante destino Assim falou e o doce sono deixoume esquadrinhei em torno e percebi os gansos na casa debicando trigo junto à gamela onde costumam Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 555 Mulher não é possível responder ao sonho dobrandoo para outro lado pois a ti o próprio Odisseu informou como cumprirá a ruína surge aos pretendentes a todos e nenhum escapará da perdição da morte E a ele replicou Penélope bemajuizada 560 Bem estranho insolúveis intrincados sonhos ocorrem e nem tudo se cumpre para os homens Pois de dois tipos são os portões dos tíbios sonhos um é feito com chifres o outro é de marfim Dos sonhos os que passam pelo marfim talhado 565 esses emaranhamse levando palavras irrealizáveis os que passam pela porta de cornos polidos esses realizam o que é real quando um mortal os vê Mas para mim não creio que daí o terrível sonho veio por certo a mim e ao filho daria felicidade 570 Mas outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança esta aurora aí já virá vil de se nomear que da casa de Odisseu me afastará agora estabelecerei prova com os machados esses que ele em seu palácio em ordem fixava como escoras de quilha doze no total 575 posicionado bem longe ele disparava a flecha através Agora incumbirei aos pretendentes esta prova quem mais fácil armar o arco com o punho e flechar por meio de todos os doze machados a esse eu seguirei apartandome desta casa 580 marital muito bela plena de vitualhas de que um dia creio lembrarei mesmo que em sonho Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte agora não mais postergues essa prova no palácio 585 antes para ti o muitaastúcia voltará para cá Odisseu antes que esses aí esse arco bempolido manuseando retesarem a corda e flecharem através do ferro E a ele replicou Penélope bemajuizada Se quisesses a mim estranho sentado no palácio 590 deleitar doce sono não cairia sobre minhas pálpebras Mas não é possível que fiquem sempre sem sono os homens a cada coisa atribuíram um quinhão os imortais para os mortais sobre o solo fértil Mas quanto a mim após subir aos aposentos 595 repousarei na cama que me foi feita rica em gemidos sempre úmida com minhas lágrimas desde que Odisseu partiu para vivenciar a inominável RuinosaÍlion Lá eu descansarei e tu descansa aqui na casa ou no chão estendendote ou que te armem a cama 600 Isso disse e subiu aos aposentos lustrosos não sozinha mas com ela iam outras criadas Após subir aos aposentos com as servas mulheres chorou por Odisseu caro esposo até para ela sono doce sobre as pálpebras lançar Atena olhosdecoruja Assim no vestíbulo deitouse o divino Odisseu embaixo estendeu pele de boi não curtida e sobre ela muitos velos de ovelhas que os aqueus imolavam Eurínome lançou uma capa por cima dele deitado 5 Lá Odisseu cogitando no ânimo males aos pretendentes jazia desperto e as mulheres salão afora correram elas que aos pretendentes se uniam há tempo uma para a outra exibindo risada e gáudio E o ânimo dele agitouse no caro peito 10 muito cogitou no juízo e no ânimo se indo atrás arranjaria a morte de cada uma ou deixaria se unirem aos pretendentes soberbos a última e derradeira vez seu coração dentro latia Como a cadela envolvendo os frágeis filhotes 15 ao estranhar um varão late sôfrega por brigar assim em seu íntimo latia irritado com as vis ações Após golpear o peito reprovou o coração com o discurso Suporta coração suportaste outro feito mais canalha no dia em que o ciclope de potência incontida comeu 20 os altivos companheiros tu resististe até a astúcia a ti conduzir para fora do antro pensando que morrerias Assim falou abordando o caro coração no peito e seu coração obediente de todo aguentou e resistiu sem cessar ele próprio reviravase para lá e para cá 25 Como quando o varão forte fogo ardendo a um bucho cheio de sangue e gordura para lá e para cá gira almejando que bem rápido fique assado assim ele para lá e para cá reviravase cogitando como desceria os braços nos aviltantes pretendentes 30 ele um só contra muitos E das cercanias veiolhe Atena desceu do páramo de corpo semelhante a uma mulher parou acima de sua cabeça e dirigiulhe o discurso Como de novo acordaste herói em máxima desdita Essa é tua casa essa é tua mulher na casa 35 e o menino assim como se deseja ser um filho A ela respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Por certo isso tudo deusa falaste ponto por ponto mas algo meu ânimo aqui no íntimo cogita como nos aviltantes pretendentes descerei os braços 40 um único sendo eles estão sempre juntos lá dentro Além disso algo maior no juízo cogito mesmo que eu matasse graças a Zeus e a ti como eu me safaria Peço que tu isso ponderes A ele então replicou a deusa Atena olhosdecoruja 45 Que tinhoso Alguém já ouve o companheiro inferior que é mortal e não conhece tantos planos e eu sou uma deusa que te guarda para sempre em todos os labores Vou te falar de forma explícita se uma emboscada de cinquenta homens mortais 50 nos cercasse sôfregos em Ares por matarnos aos dois também deles tangerias vacas e robustas ovelhas Pois que também o sono te pegue é irritante vigiar toda a noite desperto e já te esquivarás dos males Assim falou e sono vertia sobre suas pálpebras 55 e ela de pronto foi ao Olimpo divina deusa Quando prendeuo o sono soltando tribulações do ânimo soltamembros a esposa acordou a sempre devotada e chorava sentada sobre o leito macio Mas após se fartar de chorar em seu ânimo 60 a Ártemis por primeiro rezou a divina mulher Ártemis senhora deusa filha de Zeus que para mim flecha no peito agora lances e me tomes a vida nesse momento ou então me agarre uma rajada leveme embora pelos caminhos brumosos 65 e me lance na foz de Oceano fluidevolta Como quando rajadas tomaram as filhas de Pandareu os deuses destruíram seus pais e elas restaram órfãs no palácio e delas cuidou a divina Afrodite com queijo doce mel e prazeroso vinho 70 Hera deulhes mais que a todas as mulheres formosura e sensatez altura entregou a pura Ártemis e a técnica de trabalhos esplêndidos ensinou Atena Quando a divina Afrodite subiu ao grande Olimpo para pedir a meta das bodas vicejantes para as jovens 75 a Zeus prazernoraio pois ele sabe bem de tudo o que é e não é do destino dos homens mortais nisso as Harpias agarraram as jovens e deramnas às hediondas Erínias para servilas comigo desaparecessem os que têm casas olímpias 80 ou me atingisse Ártemis belastranças para que Odisseu eu fitasse quando eu descesse para debaixo da terra hedionda e aqui não enchesse de gáudio a mente de um varão inferior Mas isso também é um mal suportável quando alguém de dia chora o coração atormentase à larga 85 e sono dominao à noite ele faz esquecer de tudo de bens e males depois que as pálpebras encobre Mas para mim até sonhos ruins enviou o deus Idêntico a ele dormiu comigo de novo essa noite tal como era quando foi com o exército meu coração 90 alegrouse pois pensei não ser sonho mas realidade Assim falou e logo veio Aurora tronodourado A voz da esposa em prantos ouviu o divino Odisseu então cogitou e pareceulhe em seu ânimo que ela já o reconhecia de pé junto a sua cabeça 95 Pois após juntar manto e velo nos quais dormira pôlos no salão sobre uma poltrona e o couro de boi levar para fora a Zeus orou mãos para cima Zeus pai se a mim com intenção à firme e úmida terra à minha trouxestes após me lesardes demais 100 prenúncio pronuncie um dos homens que desperta dentro e fora prodígio de Zeus ademais apareça Assim falou rezando e ouviuo Zeus astucioso e logo trovejou do Olimpo fulgurante do alto das nuvens e jubilou o divino Odisseu 105 Prenúncio vindo da casa mulher emitiu moleira perto junto a seus moinhos os do pastor de tropa nos quais labutavam doze mulheres ao todo preparando cevada e flocos de trigo tutano de varões As outras dormiam após o trigo terem moído 110 e só ela ainda não parara e era a mais fraca Ela deteve o moinho e disse a frase um sinal para Odisseu Zeus pai que aos deuses e homens reges com vigor trovejaste do páramo estrelado onde nuvem não há é prodígio que mostras a alguém 115 Efetua agora também para mim infeliz a frase que direi seja esta a última e derradeira vez que os pretendentes partilham do amável banquete no palácio de Odisseu eles afrouxaram meus joelhos a prepararlhes cevada uma fadiga aflitiva agora ocorra seu último banquete 120 Assim falou e alegraram o divino Odisseu a soada e o trovão de Zeus pensou que se puniriam os infratores As outras escravas ao longo da bela casa de Odisseu reuniramse e na lareira atiçavam o fogo incansável E Telêmaco da cama se ergueu herói igual ao deus 125 vestiu suas vestes pendurou a espada afiada no ombro atou aos pés reluzentes belas sandálias e tomou a brava lança afiada com ponta de bronze Eis que se postou na soleira e se dirigiu a Euricleia Querida mãezinha como honraste o estranho na casa 130 Com cama e comida ou jaz assim descuidado Pois desse jeito é minha mãe embora sensata é confuso como honra quem é entre os homens mortais o pior e o mais valoroso desonra e envia de volta E a ele replicou a bemajuizada Euricleia 135 A ela inocente não culpes agora filho Vinho bebeu sentado enquanto quis De pão disse não mais ter fome pois ela perguntoulhe Mas quando se lembrou do repouso e do sono ela pediu às escravas que aprontassem o estrado 140 Ele como alguém de todo lastimoso e desventurado não quis repousar em leitos e mantas mas em pele de boi não curtida e velo de ovelhas dormiu no vestíbulo e nós o cobrimos com uma capa Assim falou e Telêmaco cruzou o salão com a lança 145 e dois lépidos cães seguiam com ele Foi à ágora para junto dos aqueus belasgrevas Ela a seu turno ordenou às escravas divina mulher Euricleia filha de Voz filho de Persuadidor Mexeivos vós aí mãos à obra varrei a casa 150 e borrifai e nas poltronas bemfeitas cobertas lançai púrpura e vós aí esfregai com esponjas todas as mesas por inteiro limpai as ânforas e os cálices duplaalça vós aí atrás de água ide à fonte e trazei voltando bem rápido 155 Pouco tempo os pretendentes se ausentarão do salão mas bem cedo voltarão pois para todos é a festa Assim falou e elas a ouviram direito e obedeceram Vinte delas foram à fonte com água escura e as outras lá mesmo na casa labutavam com destreza 160 E entraram os servos orgulhosos eles então bem e com destreza lenha racharam e as mulheres voltaram da fonte Depois deles veio o porcariço conduzindo três cevados os melhores entre todos A esses deixou pastando no belo pátio 165 e ele próprio a Odisseu com agrados dirigiuse Hóspede acaso os aqueus te olham com mais atenção ou te desonram no palácio como antes Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Tomara Eumeu os deuses punissem a infâmia 170 que eles com violência ultrajante engenham na casa de outrem e não compartilham de respeito Assim eles disso falavam entre si E Preto aproximouse deles o pastor de cabras e com ele dois pastores tocavam cabras 175 caprinos seletos refeição dos pretendentes A essas prenderam sob a colunata ressoante e ele próprio dirigiuse a Odisseu com provocações Estranho também agora importunarás aqui na casa mendigando aos homens e não sairás pela porta 180 De modo algum creio que nos separaremos antes de provar os braços pois tu sem elegância mendigas também alhures há banquetes de aqueus Assim falou e não se lhe dirigiu Odisseu muitaastúcia mas quieto meneou a cabeça ruminando males 185 Como terceiro juntouselhes Filoitio líder de varões guiando vaquilhona aos pretendentes e gordas cabras Transportaramnos balseiros eles que também a outros homens conduzem quem quer que a eles chegue Prendeuas bem sob a colunata ressoante 190 e ele próprio questionou o porqueiro parado perto Quem é esse estranho porqueiro recémchegado a nossa morada Proclama ser de quais varões Qual é sua linhagem e o solo pátrio Desventurado no porte parece um senhor real 195 Mas os deuses atormentam os homens muito errantes sempre que até para reis destinam agonia Falou saudouo com a mão direita de pé ao lado e falando dirigiulhe palavras plumadas Sê feliz pai estrangeiro tenhas mesmo no futuro 200 fortuna agora de fato estás preso a muitos males Zeus pai deus algum é mais destrutivo que tu não te compunge que varões após gerálos tu se unam a miséria e aflições deploráveis Suei quando te percebi e meus olhos lacrimejaram 205 ao lembrarme de Odisseu já que penso que aquele com trapos tais entre os homens vaga se em algum lugar ainda vive e vê a luz do sol Se já está morto na morada de Hades ai de mim pelo impecável Odisseu que me alocou 210 para vacas ainda pequeno na terra dos cefalênios Agora elas tornaramse ilimitadas e melhor não vingaria para um varão a cepa de vacas largafronte Outros me pedem que as conduza para eles mesmos comêlas e o filho no palácio desconsideram 215 e com o olhar dos deuses não tremem já anseiam os bens dividir o senhor há tempo ausente Mas meu ânimo no caro peito por isso revirase demais é um grande mal havendo o filho buscar a terra de outros partindo com vacas e tudo 220 até varões estranhos mas o que me arrepia é ficar aqui sentado junto a vacas de terceiros a sofrer agonias Há tempo já teria a outro rei poderoso alcançado em fuga pois aqui não é mais suportável mais ainda creio que o miserável caso volte um dia 225 faria esses pretendentes pela casa dispersar Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Vaqueiro como nem vil nem insensato herói pareces e reconheço também eu que sensatez atinge teu juízo por isso te direi e ainda grande jura jurarei 230 saiba agora Zeus primeiro supremo deus e o melhor e o fogolar do impecável Odisseu ao qual cheguei por certo estando tu aqui chegará em casa Odisseu e com teus olhos enxergarás se quiseres os pretendentes mortos que aqui se arrogam senhores 235 E a ele replicou o varão vaqueiro de bois Ah Se essa palavra estranho cumprisse o filho de Crono saberias que força é a minha como agem os braços Do mesmo modo Eumeu rezou a todos os deuses pelo retorno de Odisseu muitojuízo a sua casa 240 Assim eles disso falavam entre si Os pretendentes para Telêmaco o quinhão da morte arranjavam e veiolhes do lado esquerdo uma ave águia voaalto e levava um tímido pombo Entre eles Anfínomo tomou a palavra e disse 245 Meus caros este plano não nos será bemsucedido a morte de Telêmaco vamos lembremos do banquete Assim falou Anfínomo e agradoulhes o discurso Entrando na casa do divino Odisseu mantos depuseram nas cadeiras e poltronas 250 abateram grandes ovelhas e gordas cabras e abateram porcos cevados e uma vaca do rebanho Após assar as vísceras distribuíamnas e vinho nas ânforas misturavam as taças repartia o porqueiro E distribuíalhes pão Filoitio líder de varões 255 em belas cestas e Preto escançava E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos E Telêmaco alocou Odisseu aplicando sua esperteza dentro do bemerigido salão junto ao umbral de pedra após lá postar banqueta ultrajante e pequena mesa 260 Ao lado pôs pedaços das vísceras verteu vinho em cálice dourado e dirigiulhe o discurso Ali agora senta e com os varões bebe vinho eu próprio afastarei de ti provocações e braços de todos os pretendentes pois não é comunitária 265 esta casa mas de Odisseu e para mim a adquiriu Vós pretendentes afastai o ânimo da reprovação e dos braços para que disputa e briga não comecem Assim falou e todos os dentes mordendo os lábios admiraramse de Telêmaco pois falou com audácia 270 E entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo Embora seja duro aceitemos aqueus o discurso de Telêmaco enunciou grandes ameaças contra nós Sim Zeus não permitiu o filho de Crono caso contrário já o teríamos interrompido no salão embora orador potente 275 Assim falou Antínoo e desprezou o discurso Arautos pela cidade a sacra hecatombe aos deuses levavam e eles reuniramse os aqueus longasmadeixas sob o bosque umbroso de Apolo alvejadelonge Aqueles após assar a carne de fora e a tirar dos espetos 280 repartiramna e partilharam majestoso banquete Junto a Odisseu um pedaço puseram os que serviam igual ao que receberam os outros pois isso ordenou Telêmaco o caro filho do divino Odisseu De modo algum Atena permitiu que os arrogantes pretendentes 285 se reprimissem no tratamento vexatório para ainda mais angústia entrar no coração de Odisseu filho de Laerte Entre os pretendentes havia um varão que ignorava regras tinha o nome de Ctesipo e morava em Same Ele agora confiante nos bens de seu pai 290 cortejava a esposa de Odisseu há muito ausente Ele então entre os soberbos pretendentes falou Ouvime pretendentes orgulhosos vou falar Como convém há tempo o hóspede já tem uma porção igual pois não é belo nem civilizado frustrar 295 os hóspedes de Telêmaco todo que vier a esta casa Que também eu lhe dê um dom para ele próprio oferecer uma honraria à serva do banho ou a um outro dos escravos que vivem na casa do divino Odisseu Isso dito jogou um pé de vaca com a mão encorpada 300 tirandoo da cesta Odisseu evitouo ligeiro inclinando a cabeça e sorriu no ânimo deveras sardônico e atingiu a bemfeita parede A Ctesipo Telêmaco reprovou com o discurso Ctesipo por certo isto foi vantajoso para tua vida 305 não acertaste o hóspede o próprio evitou o projétil Na certa eu te acertaria ao meio com lança afiada e ao invés das bodas teu pai se ocuparia do enterro Assim que em minha casa ninguém afrontas demonstre mas em meu ânimo penso e conheço cada coisa 310 as nobres e as piores no passado ainda era tolo Mas embora até suportemos observar isso tudo o abate de ovelhas o consumo de vinho e comida é duro para um só muitos conter Mas chega não mais me infligi males como inimigos 315 Se já tendes gana de matarme com bronze até disso eu gostaria e seria bem mais vantajoso estar morto que sempre afrontar estes ultrajes estranhos maltratados e escravas mulheres seduzidas de forma ultrajante na bela morada 320 Assim falou e eles todos atentos se calavam Bem depois Agelau filho de Domador falou entre eles Amigos ninguém por ocasião de fala civilizada endureceria replicando com palavras hostis não maltrateis o estranho nem de resto algum 325 dos escravos que vivem na casa do divino Odisseu Para Telêmaco e a mãe eu mesmo diria uma fala amigável se agradasse ao coração de ambos Enquanto o vosso ânimo no peito esperava pelo retorno de Odisseu muitojuízo a sua casa 330 não cabia indignação por aguardar e conter os pretendentes na casa pois isto era mais vantajoso o retorno de Odisseu ele chegar de volta em casa agora isto já é evidente ele não mais retornará Vamos sentado ao lado da mãe enumerelhe isto 335 despose quem for o melhor varão e mais ofertar para que tu satisfeito administres todos os bens paternos comendo e bebendo e ela dirija a casa de outrem A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Por Zeus não Agelau e pelas aflições de meu pai 340 que alhures longe de Ítaca morreu ou está vagando não atraso as bodas de minha mãe mas peço que despose quem quiser e doulhe dádivas indizíveis Envergonhome de escorraçála da casa obrigada com um discurso impositivo que isso o deus não realize 345 Isso disse Telêmaco entre os pretendentes Palas Atena provocou riso inextinguível e desnorteou suas ideias Eles então riam mas com alheios maxilares e eis que comiam carne sangrenta seus olhos enchiamse de lágrimas e o ânimo pensava em lamento 350 Também entre eles falou o deiforme Teoclímeno Miseráveis que mal é este de que sofreis A noite recobre vossas cabeças faces e embaixo os joelhos o gemido é uma tocha nas faces o choro e de sangue estão borrifadas paredes e belas traves 355 cheio de espectros está o vestíbulo cheio o pátio ansiando ir ao Érebo rumo às trevas o sol sumiu do páramo e névoa danosa espalhouse Assim falou e eles todos riram dele com prazer Entre eles Eurímaco filho de Polibo começou a falar 360 Está louco o estranho recémchegado de alhures Mas a ele jovens rápido conduzi porta afora para chegar à ágora já que isso assemelhase à noite A ele por sua vez falou o deiforme Teoclímeno Eurímaco não te peço que me ofereças condutores 365 Tenho olhos ouvidos ambos os pés e mente perfeita no peito em nada ultrajante com eles sairei pela porta pois percebo vir contra vós um mal do qual não fugirá nem escapará nenhum de vós pretendentes que pela casa do excelso Odisseu 370 violentos com varões engenham ações iníquas Isso dito saiu da casa boa para morar e rumou à de Peiraio que solícito o recebeu E todos os pretendentes olhandose uns aos outros provocavam Telêmaco rindo dos estrangeiros 375 E desse modo falavam os jovens arrogantes Telêmaco ninguém tem piores hóspedes que tu Tens esse aí um errante impertinente carente de comida e vinho em trabalho algum experiente nem na força mas só um peso para a terra 380 quanto ao outro aqui postouse para adivinhar Mas se eu te convencesse digo que seria mais vantajoso após lançar os estranhos em nau de muitos calços à Sicília os enviar que te renderiam certo valor Isso diziam os pretendentes e ele desprezou os discursos 385 mas quieto observou o pai sempre aguardando quando nos aviltantes pretendentes desceria os braços E ela defronte colocou uma banqueta bem bela a filha de Icário Penélope bemajuizada e ouviu o discurso de cada um dos varões no salão 390 Eles então rindo prepararam a refeição agradável e deliciosa pois muitos animais imolaram nada seria mais desprazeroso que um jantar como esse que logo iriam a deusa e o poderoso varão instaurar aqueles por primeiro engenharam ultrajes E no juízo dela pôs a deusa Atena olhosdecoruja no da filha de Icário Penélope bemajuizada apresentar aos pretendentes o arco e o ferro cinza no palácio de Odisseu apetrechos e início da matança 5 Subiu a elevada escadaria de sua morada e com a mão encorpada pegou a chave boacurva bela e dourada e tinha um cabo de marfim Pôsse rumo ao quarto com as servas mulheres o bem no fundo lá estavam os haveres do senhor 10 bronze ouro e ferro muito trabalhado E lá estavam o arco esticaevolta e a aljava portaflecha e nela havia muitas setas desoladoras dons que lhe deu o aliado ao topálo na Lacedemônia Ífito filho de Eurito semelhante aos imortais 15 Os dois na Messênia encontraramse um ao outro na casa do atilado Tocaioso quanto a Odisseu viera atrás de uma dívida que todo o povo lhe devia ovelhas e cabras de Ítaca os varões messênios levaram trezentas em naus muitocalço e pastores 20 Por isso fora Odisseu em missão pela longa rota ainda menino enviaramno o pai e os outros anciãos Já Ífito buscava as éguas que perdera doze fêmeas com lactentes mulas robustas Essas então também se tornaram destino de matança para ele 25 quando encontrou o filho ânimopotente de Zeus o herói Héracles experto em grandes feitos Matou a Ífito que hospedava em sua própria casa Héracles terrível desrespeitando os deuses e a mesa que a seu lado pusera ainda assim até o matou 30 e ele mesmo manteve as éguas fortecasco no palácio Perguntando por elas Ífito encontrou Odisseu e deulhe o arco que no passado carregava o grande Eurito e esse ao filho deixara ao morrer na casa de alto pédireito A ele Odisseu deu espada afiada e brava lança 35 o início de confiável aliança Não junto à mesa conheceramse um ao outro Antes o filho de Zeus matou Ífito filho de Eurito semelhante aos imortais que lhe dera o arco A este nunca o divino Odisseu quando ia para a guerra sobre as negras naus 40 escolhia mas aí mesmo lembrança do caro aliado guardava no palácio e carregavao em sua própria terra Quando ela chegou àquele quarto a divina mulher e pisou no umbral de madeira que um dia artesão aplanou hábil endireitou com o prumo 45 e nele ajustou batentes e pôs portas brilhantes de pronto ela soltou a correia da maçaneta enfiou a chave e mirando em frente empurrou os ferrolhos das portas Essas rangeram como um touro pastando no prado assim rangeram as belas portas 50 golpeadas pela chave e presto se lhe escancararam Ela então dirigiuse ao estrado elevado lá baús havia e neles encontravamse roupas perfumadas Esticandose do prego desenganchou o arco acomodado num estojo que o envolvia brilhante 55 Sentada lá mesmo descansandoo nos caros joelhos chorou bem alto e tomou o arco do senhor Após deleitarse com o lamento muitalágrima rumou ao salão atrás dos ilustres pretendentes tendo na mão o arco esticaevolta e a aljava 60 portaflecha e nela havia muitas setas desoladoras Com ela servas levavam uma caixa onde havia muito ferro e bronze apetrechos do senhor Quando alcançou os pretendentes divina mulher parou ao lado do pilar do teto sólida construção 65 após puxar para diante da face o véu reluzente e criada devotada uma de cada lado se postou Presto entre os pretendentes tomou a palavra e disse Ouvime pretendentes orgulhosos vós que esta casa atacai para comer e beber sempre sem parar 70 o varão há muito ausente e nenhuma outra evasiva que fosse conseguistes arrumar mas que ansiais desposarme e tornar sua mulher Bem pretendentes agi eis o prêmio a prova será o manuseio do grande arco do divino Odisseu 75 quem mais fácil armar o arco com o punho e flechar através de todos os doze machados a esse eu seguirei apartandome desta casa marital muito bela plena de vitualhas de que um dia creio lembrarei ainda que em sonho 80 Assim falou e pediu a Eumeu divino porcariço que apresentasse o arco e o ferro cinza aos pretendentes Com lágrimas Eumeu recebeuo e depôs no chão o vaqueiro também chorava pois viu o arco do senhor E Antínoo falou dirigiuselhes e nomeouos 85 Rústicos tolos atentos somente ao efêmero dois coitados por que lágrimas derramai e a mulher o ânimo em seu peito agitais É natural que seu ânimo revolva em aflição pois perdeu o caro consorte Porém em silêncio comei sentados ou porta afora 90 aos prantos saí deixando o arco aqui mesmo aos pretendentes prova inócua pois não creio que facilmente esse arco bem polido será armado Não há varão entre todos estes aqui tal como era Odisseu eu próprio o vi 95 tenho na memória e era ainda criança tola Assim falou e o ânimo dele no peito esperava retesar a corda e flechar através do ferro A uma flecha ele seria o primeiro a provála das mãos do impecável Odisseu a quem desonrava 100 sentado nos salões a instigar os pretendentes E entre eles falou a sacra força de Telêmaco Incrível de fato Zeus filho de Crono fezme tolo Minha cara mãe me disse embora sendo sensata que seguiria um outro apartandose desta casa 105 e eu estou rindo deleitome no ânimo estúpido Bem pretendentes agi pois eis que se revela o prêmio tal mulher no presente não há em terra aqueia nem na sacra Pilos em Argos ou Micenas nem na própria Ítaca nem no escuro continente 110 Vós mesmos disso sabeis por que louvar minha mãe Pois bem não remancheis com desculpas nem vos desvieis da fixação do arco por muito tempo Vamos ver Também eu próprio poderia testarme no arco se eu vergar e flechar através do ferro 115 não me angustiaria se a senhora mãe esta casa deixasse indo com outro quando eu para trás ficaria capaz de apossarme dos belos apetrechos do pai Falou e após levantarse dos ombros tirou a capa púrpura bem como a espada afiada puxou 120 Primeiro cravou os machados tendo cavado um sulco para todos único longo com o prumo endireitouos e socou a terra ao redor Todos se espantaram ao ver com que adequação os cravou e nunca antes os vira Eis que se postou na soleira e experimentava o arco 125 Três vezes abalouo com gana de vergálo três vezes relaxou embora esperasse isto no ânimo retesar a corda e flechar através do ferro Então teria com força vergado puxando uma quarta vez mas Odisseu acenando a cabeça conteveo em sua ânsia 130 E entre eles falou a força sacra de Telêmaco Incrível por certo no futuro serei vil e fracote ou sou muito jovem e nos braços ainda não confio para afastar um varão quando mais velho endurece Mas ide vós que na força sois melhores que eu 135 o arco experimentai e finalizemos a prova Isso dito postou o arco no chão longe de si apoiandoo contra as portas bempolidas justas apoiou o projétil veloz na bela extremidade do arco e sentouse de volta na poltrona de onde se erguera 140 E entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo Todos os pretendentes postaivos em ordem pela direita a partir do lugar de onde se serve o vinho Assim falou Antínoo e agradoulhes o discurso E Leodes ergueuse primeiro o filho de Olhovíneo 145 ele era o áugure deles e junto da bela ânfora sentavase sempre bem no fundo só a ele a iniquidade era odiosa e indignavase contra todos os pretendentes Ele foi o primeiro a pegar o arco e o projétil veloz Eis que se postou na soleira experimentava o arco 150 e não o vergou antes cansou relaxando as mãos indolentes delicadas E entre os pretendentes falou Amigos eu não o vergo que outro o pegue Este arco de fato privará muitos nobres de seu ânimo e vida pois é muito melhor 155 estar morto que vivo errar o alvo pelo qual sempre nos reunimos aqui todos os dias à espera Ainda agora no juízo cada um espera e deseja desposar Penélope a consorte de Odisseu mas quando testar o arco e derse conta 160 então que corteje outra das aqueias belopeplo tentandoa com dádivas Quanto a Penélope então desposará aquele que mais ofertar e for o destinado Assim falou e postou o arco longe de si apoiandoo contra as portas bempolidas justas 165 apoiou o projétil veloz na bela extremidade do arco e sentouse de volta na poltrona de onde se erguera E Antínoo reprovouo dirigiuselhe e nomeouo Leodes que palavra te escapou da cerca de dentes assombrosa e aflitiva e indignome ao ouvir 170 Sim se este arco aqui privar os nobres de seu ânimo e vida é porque não lograste tu vergálo Pois a ti a senhora mãe não gerou tão valoroso a ponto de ser arqueador de arco e flechas mas outros vergarão ligeiro os pretendentes ilustres 175 Assim falou e chamou Preto o pastor de cabras Vamos lá Preto acende o fogo nos salões põe ao lado uma grande banqueta e sobre ela um velo e traze de dentro grande naco de sebo para que jovens esquentando untando com óleo 180 o arco experimentemos e finalizemos a prova Assim falou e Preto logo acendeu o fogo incansável trouxe a banqueta pôs ao lado e sobre ela um velo E trouxe de dentro grande naco de sebo Com ele jovens esquentando tentaram e não conseguiam 185 vergar pois eram carentes e muito de força Antínoo ainda aguardava e o deiforme Eurímaco chefes dos pretendentes de longe os melhores em excelência E ambos saíram da casa ao mesmo tempo juntos o vaqueiro e o porcariço do divino Odisseu 190 e ele próprio saiu atrás deles o divino Odisseu Mas quando longe das portas e fora do pátio estavam pôsse a falar e a eles com palavras amáveis dirigiuse Vaqueiro e também tu porcariço eu poderia algo dizer ou devo esconder Mas meu ânimo pede que revele 195 Como vós seríeis na defesa de Odisseu se acaso chegasse bem assim de chofre e um deus o trouxesse Defenderíeis os pretendentes ou Odisseu Falai como a vós coração e ânimo impelem E a ele replicou o varão vaqueiro de bois 200 Tomara pai Zeus completes esse desejo Que voltasse aquele varão e o guiasse a divindade saberias que força é a minha como agem os braços Do mesmo modo Eumeu rezou a todos os deuses pelo retorno de Odisseu muitojuízo a sua casa 205 E após reconhecer desses a mente veraz de novo a eles com palavras respondendo disse Sim em casa sou eu mesmo aqui aguentei muitos males e cheguei no vigésimo ano à terra pátria Reconheço que dentre os servos só vi a vós dois 210 desejosos da minha presença não ouvi nenhum outro rezando para eu à casa retornar Para os dois como se dará contarei a verdade se um deus me permitir subjugar os ilustres pretendentes farei conduzir esposas para ambos e oferecerei bens 215 e casas bemfeitas perto de mim depois para mim sereis companheiros e irmãos de Telêmaco Pois bem que um sinal inequívoco outro eu mostre para me reconhecerem e se assegurarem no ânimo a cicatriz que me deixou um dia javali com branco dente 220 quando fui ao Parnasso com os filhos de Autólico Isso dito afastou os trapos da grande cicatriz Os dois ao verem bem e observarem tudo choravam lançaram os braços em volta do atilado Odisseu e beijavam com afeto cabeça e ombros dele 225 do mesmo modo Odisseu beijou cabeças e mãos E choraram tanto que o sol se teria posto se o próprio Odisseu não os tivesse contido e dito Cessai o pranto e o lamento que ninguém ao sair do salão veja e vá falar lá dentro 230 Entrai um por um não todos juntos primeiro eu depois vós E que este seja o sinal os restantes todos os pretendentes ilustres não deixarão que me sejam dados o arco e a aljava mas tu divino Eumeu levando o arco pela casa 235 nas minhas mãos o põe e diz às mulheres que cerrem as portas do salão compactas justas Se alguma dentro ouvir gemido ou ruído de varões no nosso cercado que pelas portas não saiam mas fiquem lá mesmo atentas na lida 240 A ti divino Filoitio encarrego de trancares as portas do pátio com o ferrolho e célere em cima finalizar com um nó Isso dito entrou na casa boa para morar e então sentouse na banqueta de onde se erguera Também entraram os dois escravos do divino Odisseu 245 Eurímaco já o arco brandia nas mãos esquentandoo aqui e ali na fulgência do fogo nem assim foi capaz de armálo e forte gemeu no glorioso coração perturbado dirigiuselhes e nomeouos Incrível minha aflição é por mim mesmo e por todos 250 Não lamento tanto pelas bodas embora isso me atormente há muitas outras aqueias umas na própria Ítaca cercadademar outras nas cidades restantes mas que de tal modo carentes somos da força do excelso Odisseu que não conseguimos vergar 255 o arco ignomínia a se noticiar também aos vindouros A ele então dirigiuse Antínoo filho de Persuasivo Eurímaco não será assim Também tu percebes Sim agora há na comunidade a festa do deus sagrada quem estiraria o arco Não tranquilos 260 deponhamono E os machados todos podemos deixálos de pé não creio que alguém os pegará após entrar no salão de Odisseu filho de Laerte Vamos que o escanção verta as primícias nos cálices para tendo libado guardarmos o arco recurvado 265 Pela manhã ordenai a Preto o pastor de cabras cabras trazer notáveis entre todos os rebanhos caprinos para tendo coxas disposto a Apolo arcofamoso o arco experimentarmos e finalizar a prova Assim falou Antínoo e agradoulhes o discurso 270 Para eles os arautos vertiam água nas mãos e moços preencheram ânforas com bebida e a todos distribuíam após verter primícias nos cálices Mas depois de libar e beber tudo que quis o ânimo com mente ardilosa disselhes Odisseu muitaastúcia 275 Ouvime pretendentes da esplêndida senhora vou falar o que o ânimo me ordena no peito Sobremodo a Eurímaco e ao deiforme Antínoo eu suplico pois esta palavra falou com adequação cessar agora com o arco e entregar aos deuses 280 pela manhã o deus dará supremacia a quem quiser Mas vamos daime o arco bempolido para entre vós eu testarme nos braços e na força ou ainda tenho vigor sobre os membros recurvos tal como no passado ou já foi perdido por meu desleixo e errância 285 Assim falou e eles todos se indignaram por demais com medo de que armasse o arco bempolido Antínoo reprovouo dirigiuselhe e nomeouo Pobre estrangeiro não tens juízo nem um pouco Não te contentas em tranquilo entre nós soberbos 290 jantar não ser privado de tua porção e ouvir nossas conversas e falas Nenhum outro estranho e mendigo ouve as nossas falas O vinho doce como mel te perturba o que também a outros lesa quem o toma vorazmente e sem medida bebe 295 O vinho também ao centauro o esplêndido Eurítion cegou no salão do animoso Peirítoo quando foi até os lápitas ele cegou o juízo com vinho e louco aprontou vilezas na morada de Peirítoo A aflição tomou conta dos heróis e pórtico afora 300 arrastaramno de chofre com impiedoso bronze orelha e nariz tendo ceifado ele cego em seu juízo partiu suportando sua ruína com ânimo juízocego Daí para centauros e varões se deu a contenda e mal para si mesmo aquele primeiro trouxe bêbado 305 Assim também para ti grande desgraça anuncio se o arco armares de fato não toparás com a bondade de alguém em nossa vizinhança e a ti para longe em negra nau rumo ao rei Apresador flagelo de todos os mortais te enviaremos e de lá não te salvarás Vamos bebe 310 tranquilo e não disputes contra varões mais jovens E a ele replicou Penélope bemajuizada Antínoo não é belo nem civilizado frustrar os hóspedes de Telêmaco todo que vier a esta casa Esperas se esse estranho o grande arco de Odisseu 315 armar confiante em seus braços e força que para casa me conduza e torne sua esposa Nem ele mesmo no peito isso espera nenhum de vós por causa disso aflito no ânimo jante aqui pois não convém de modo algum 320 E a ela Eurímaco o filho de Polibo retrucou Filha de Icário Penélope bemajuizada não pensamos que ele te conduzirá nem convém mas envergonhanos o dizer de varões e mulheres que nunca diga algum outro aqueu mais vil 325 Sim varões bem piores que o impecável varão cortejam a esposa e de modo algum armam o arco bempolido Mas um outro varão mendigo que chegou após vagar fácil vergou o arco e lançou através do ferro Assim dirão e contra nós haveria essas críticas 330 E a ele replicou Penélope bemajuizada Eurímaco não é possível nos arredores boa fama terem esses que desonrando comem a propriedade de nobre varão por que justo isso propondes como crítica Esse estranho é bem grande e robusto 335 e proclama na linhagem ser filho de pai valoroso Pois bem dailhe o arco bempolido para vermos Pois assim eu falarei e isto se cumprirá se ele o armar e Apolo lhe conferir o triunfo vestiloei com capa e manto belas vestes 340 e darei afiada lança proteção contra cães e varões e espada duaslâminas darei sandálias para os pés e o enviarei para onde coração e ânimo o impelem A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Minha mãe mais do que eu nenhum aqueu tem 345 o direito de dar ou negar o arco a quem eu quiser nem dentre todos que regem pela rochosa Ítaca nem de todos os das ilhas rumo a Élis nutrepotros ninguém poderá me impedir se eu quiser de ao estranho dar de uma vez esse arco para o levar 350 Mas entra na casa e cuida de teus próprios afazeres do tear e da roca e às criadas ordena que o trabalho executem o arco ocupará os varões todos mormente a mim de quem é o poder na casa Ela ficou pasma e foi de volta à casa 355 pois o inteligente discurso do filho pôs no ânimo Tendo subido aos aposentos com as servas mulheres chorou por Odisseu caro esposo até para ela sono doce lançar sobre as pálpebras Atena olhosdecoruja E pegou o arco curvo e levavao o divino porcariço 360 Eis que todos os pretendentes gritaram no palácio e desse modo falavam os jovens arrogantes Para onde levas o curvo arco porqueiro desgraçado inepto Logo sobre porcos cães ligeiros te comerão só longe dos homens os que criaste se Apolo 365 e os outros deuses imortais nos forem propícios Assim falavam e ele pôs o que levava no mesmo lugar com medo pois muitos no palácio gritaram E Telêmaco ameaçando do outro lado bradou Papá leva o arco não podes a todos acatar 370 senão eu embora mais jovem te persigo no campo lançando pedras na força sou superior Tomara desse modo a todos esses que estão pela casa os pretendentes eu fosse superior nos braços e na força então rápido de forma medonha a uns enviaria de volta 375 para fora de minha casa pois engenham males Assim falou e eles todos riram dele com prazer os pretendentes e deixaram de lado a dura raiva por Telêmaco e levando o arco pela casa o porcariço o pôs nas mãos do atilado Odisseu parado ao lado 380 E após chamála para si disse à ama Euricleia Telêmaco te pede bemajuizada Euricleia que cerres as portas do salão compactas justas se alguma criada dentro ouvir gemido ou ruído de varões no nosso cercado que pelas portas 385 não saia mas fique lá mesmo atenta na lida Assim ele falou e para ela o discurso foi plumado e trancou as portas do palácio bom para morar Em silêncio da casa saltou Filoitio porta afora e trancou então as portas do pátio bemmurado 390 Jazia sob a colunata um cabo de nau ambicurva de papiro com o qual prendeu as portas e entrou Então sentouse na banqueta de onde se erguera olhando para Odisseu Esse já brandia o arco virandoo para todo lado testando aqui e ali 395 se vermes teriam comido os chifres ausente o senhor E assim falavam fitando quem estava ao lado Por certo era algum conhecedor de arcos talvez alhures ele tenha um assim em casa ou intencione fazer um do modo como nas mãos 400 acionao aqui e ali vagabundo calejado em vilania Por sua vez dizia outro dos jovens arrogantes Tomara um dia tope com o sucesso num grau tal quanto for sua capacidade de armar o arco Isso diziam os pretendentes e Odisseu muitaastúcia 405 logo após manusear o grande arco e olhálo inteiro como quando um varão hábil na lira e no canto fácil retesa em torno do novo pino a corda e prende nos dois lados a bemtrançada tripa de ovelha assim sem esforço ao grande arco vergou Odisseu 410 Tendoa pegado com a mão direita testou a corda em sua mão cantou belamente igual a andorinha no canto Grande angústia se apossou dos pretendentes e sua cor mudou E Zeus ribombou forte revelando sinais Então alegrouse o muitatenência divino Odisseu 415 pois prodígio envioulhe o filho de Crono curvaastúcia Pegou uma flecha rápida que ao seu lado estava na mesa nua no interior da cava aljava estavam as outras das quais logo iriam os aqueus experimentar Pondoa contra o braço do arco puxou corda e fendas 420 de lá mesmo da banqueta sentado e lançou a flecha mirando em frente e acertou o topo do cabo de todos os machados cruzou toda a extensão porta afora a flecha pesada de bronze E a Telêmaco disse Telêmaco esse hóspede sentado em teu palácio 425 não te denigre e não errei o alvo nem me cansei vergando o arco meu ímpeto ainda é firme não aquele que com desonra depreciaram os pretendentes Chegou a hora de também preparar o jantar dos aqueus à luz do dia e depois além disso divertirse 430 com música e lira essas o suplemento do banquete Falou e com as celhas sinalizou e embainhou aguda espada Telêmaco o caro filho do divino Odisseu em torno da lança pôs a cara mão e perto do outro junto à poltrona se pôs armado com bronze fulgente E ele se despiu dos trapos Odisseu muitaastúcia saltou na grande soleira com o arco e a aljava cheia de flechas despejou as rápidas setas aí mesmo diante dos pés e aos pretendentes falou 5 Essa disputa inócua já foi completada agora outro alvo que nunca um varão atingiu conhecerei se acertálo e Apolo me der o triunfo Falou e contra Antínoo direcionou a flecha afiada Quanto a este ia levar à boca bela taça 10 dourada duplaalça e já a brandia nas mãos para vinho beber no ânimo não se ocupava de sua morte Quem pensaria entre varões em banquete que um único entre muitos ainda que fosse bem forte lhe prepararia a morte vil negra perdição 15 A ele Odisseu mirando a goela com seta atingiu e certeira o delicado pescoço a ponta atravessou Tombou para o outro lado ao ser atingido o cálice caiulhe da mão e logo das narinas jorrou espesso sangue rápido para longe de si a mesa 20 empurrou com o golpe do pé e jogou os comes no chão pão e carne assada mancharamse E os pretendentes iniciaram arruaça pela casa ao verem caído o varão ergueramse das poltronas chocados e puseramse a esquadrinhar todo o lugar até a bemfeita parede 25 nenhures escudo havia nem brava lança para pegar E ralharam contra Odisseu com raivosas palavras É grave estranho flechares varões nunca mais outras provas toparás agora é certa tua abrupta ruína Mataste o herói que de longe era o melhor 30 dos jovens em Ítaca por isso abutres te comerão aqui Falavam assim todos eles pois pensavam que Odisseu matara o varão sem querer tolos não percebiam que também a todos eles o nó da morte já se amarrara Olhando de cima disselhes Odisseu muitaastúcia 35 Cães críeis que eu não mais chegaria de volta à casa da terra dos troianos pois assoláveis minha morada vos deitáveis com as servas mulheres à força cortejáveis eu próprio ainda vivo minha esposa nem temendo os deuses que do largo páramo dispõem 40 nem que algum homem se indignasse no futuro agora a vós todos o nó da morte está amarrado Assim falou e medo amarelo atingiuos todos e cada um esquadrinhou por onde escaparia 43ª do abrupto fim Lá todos atentos se calavam só Eurímaco respondendo lhe disse 45 Se deveras como o itacense Odisseu voltaste isto falaste com correção os aqueus fizeram muita coisa iníqua no palácio muita no campo Mas ele jaz aí aquele que de tudo é culpado Antínoo pois ele planejava esses feitos todos 50 por certo não tão carente ou desejoso das bodas mas com ideias que não lhe completou o filho de Crono ser rei na cidade de Ítaca bemconstruída ele próprio e matar teu filho numa emboscada Agora ele está morto e é justo e tu poupa o povo 55 teu Nós no futuro após juntar indenização na cidade por tudo que foi bebido e comido no palácio cada um por si levando reparação valendo vinte bois em bronze e ouro te compensaremos até teu coração rejubilar antes disso é compreensível tua raiva 60 Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Eurímaco nem se me compensásseis com toda a herança paterna que agora é vossa e se somásseis mais de alhures nem assim ainda repousariam meus braços da matança antes de os pretendentes expiarem toda a transgressão 65 Agora encontrase diante de vós lutar ou tentar fugir caso alguém da perdição da morte logre se safar penso porém que ninguém escapará do abrupto fim Assim falou e fraquejaram os joelhos e o coração deles Entre eles falou Eurímaco de novo a segunda vez 70 Amigos esse varão não conterá os braços intocáveis mas agora que pegou o bempolido arco e a aljava a partir da soleira polida flechará até nos matar a todos Pois lembremonos do prazer da luta espadas desembainhai e contraponde mesas 75 às setas sinarápida que todos contra ele juntos avancemos procurando afastálo da soleira e da porta subamos à cidade e um grito de alerta rápido ocorra Assim logo o varão aí flecharia uma última vez Tendo dito isso puxou a espada afiada 80 brônzea nas duas pontas aguda e saltou contra ele com rugido horrífico ao mesmo tempo o divino Odisseu a seta disparava e atingiulhe o peito junto aos mamilos e o projétil veloz perfurou seu fígado Eis que da mão soltou a espada no chão e abraçando uma mesa 85 tombou contorcendose e jogou comida no chão e taça duplaalça bateu a fronte no chão aflito no ânimo e com ambos os pés a poltrona chutando fêla oscilar pelos olhos vertiase escuridão E Anfínomo irrompeu contra o majestoso Odisseu 90 saltando na sua frente e puxou a afiada espada a ver se talvez o fizesse da porta recuar Mas eis que antes Telêmaco o atingiu de trás com lança pontadebronze no meio dos ombros e impeliua através do peito com estrondo o varão caiu e sua fronte inteira golpeou a terra 95 Telêmaco apressouse deixando a lança sombralonga aí mesmo em Anfínomo temia que um aqueu ao puxar a lança sombralonga ou o golpeasse investindo com a espada ou o acertasse ele inclinado Pôsse a correr bem ligeiro alcançou o caro pai 100 e parado perto dirigiulhe palavras plumadas Pai já te trarei escudo e duas lanças e elmo todo de bronze nas têmporas ajustado e eu mesmo vou e me revestirei e darei ao porcariço e ao vaqueiro outras armas é melhor estar armado 105 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Traze correndo enquanto há setas para me defender temo que me empurrem para longe da porta estando só Assim falou e Telêmaco obedeceu ao caro pai e rumou ao quarto onde jaziam suas armas gloriosas 110 De lá quatro escudos tirou oito lanças e quatro elmos pontabrônzea com espessa crina Foi e levouos e bem ligeiro alcançou o caro pai Primeiro ele mesmo vestiu o bronze no corpo também os dois escravos vestiram bela armadura 115 e circundaram Odisseu o atilado variegadaastúcia Ele enquanto havia flechas para se defender os pretendentes um por um em sua casa atingia mirandoos e eles caíam uns sobre os outros Mas quando as setas abandonaram o senhor que flechava 120 contra o batente do bemconstruído salão apoiou o arco em repouso contra a parede resplandecente em volta dos ombros pôs o escudo quatrocamadas e sobre a altiva cabeça colocou o elmo bemfeito com crina e a terrível crista moviase para baixo 125 e escolheu duas bravas lanças armadas com bronze Uma porta traseira havia na bemfeita parede e junto à extremidade da soleira do bemconstruído salão uma passagem selada por portas bem justas levava a um corredor Odisseu pediu ao divino porcariço que se postasse 130 perto dela era o único ponto de assalto E entre aqueles falou Agelau anunciando palavra a todos Amigos alguém não subiria pela porta traseira e falaria ao povo e um grito de alerta rápido ocorreria Assim agora logo o varão aí flecharia uma última vez 135 A ele então replicou Preto o pastor de cabras Impossível Agelau criadoporZeus perigosa é a proximidade entre as belas portas e o pátio difícil cruzar a boca do corredor Até um só varão a todos conteria um que fosse bravo Pois bem trarei do quarto armamento 140 para vos armardes pois lá dentro penso e não alhures depuseram as armas Odisseu e o filho ilustre Dito isso subiu Preto o pastor de cabras para os quartos de Odisseu pelas aberturas do salão De lá pegou doze escudos número igual de lanças 145 e tantos elmos pontadebronze com espessa crina voltou e bem rápido levandoas deu aos pretendentes Então os joelhos e o coração de Odisseu fraquejaram ao vêlos vestir as armas e com as mãos as lanças compridas manejar a tarefa pareceulhe grande 150 De pronto a Telêmaco dirigiu palavras plumadas Telêmaco por certo no palácio uma das mulheres conspira um combate ruim para nós ou Preto A ele então falou o inteligente Telêmaco Pai nisto eu próprio errei e nenhum outro 155 é responsável a porta compacta justa aberta deixei isso detectou o espião muito bom Pois vai divino Eumeu fecha a porta do quarto e observa se é alguma das mulheres que realiza isso ou o filho de Finório Preto no que acredito 160 Assim eles disso falavam entre si E de volta ao quarto foi Preto o pastor de cabras buscar belas armas o divino porcariço viu e logo disse a Odisseu que estava próximo Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque 165 lá de novo vai para o quarto o varão infernal aquele que pensamos fosse tu dizme sem evasivas devo eu matálo caso seja mais forte ou tragoo aqui para que ele expie as transgressões muitas tantas quantas armou em tua casa 170 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Aos pretendentes ilustres Telêmaco e eu deteremos no palácio ainda que venham com ímpeto vós os dois prendei seus braços e pernas juntos por trás jogaio no quarto e o prendei nas tábuas por trás 175 Após amarrar uma corda trançada em torno dele puxai para o alto do pilar e aproximai das vigas para ainda vivo por muito tempo sofrer dores cruéis Assim falou e eles o ouviram direito e obedeceram rumaram ao quarto e ele lá dentro ignorouos 180 Preto no fundo do quarto procurava por armas e os dois cada um ao lado de um umbral esperaram Quando cruzava a soleira Preto o pastor de cabras levava em uma mão um belo elmo de quatro camadas na outra largo escudo antigo salpicado de ferrugem 185 do herói Laerte que quando jovem o portava mas então largado e soltas as correias nas costuras os dois num salto agarraramno e puxaramno para dentro pelo topete ao solo jogaramno aflito no coração e prenderam seus pés e mãos com laço apertado 190 puxando muito bem as pontas como ordenara o filho de Laerte divino Odisseu muitatenência após amarrar corda trançada em torno dele alçaramno para o alto do pilar e o aproximaram das vigas Provocando a ele te dirigiste porqueiro Eumeu 195 Agora Preto vigiarás à vera por toda a noite em cama macia deitado como te convém das correntes de Oceano a dedosróseos tu não ignorarás em sua vinda a tronodourado quando trazes cabras para os pretendentes prepararem banquete na casa 200 Assim ele foi deixado estendido com laço nefasto e os dois vestiram suas armas fecharam a porta brilhante e foram até Odisseu o atilado variegadaastúcia Lá respirando ímpeto enfrentavamse na soleira os quatro poucos e os outros dentro da casa muitos e nobres 205 E para perto deles achegouse a filha de Zeus Atena semelhante a Mentor no corpo e na voz humana Vendoa Odisseu alegrouse e lhe disse Mentor afasta a desgraça e lembra do caro companheiro pois muito fiz para ti e tens a mesma idade que eu 210 Assim falou pensando ser Atena moveexército E do outro lado os pretendentes gritaram no palácio primeiro reprovoua Agelau filho de Domador Mentor que Odisseu não te persuada com palavras a combater os pretendentes e defendêlo 215 Creio que nossa ideia se realizará assim quando os matarmos ao pai e ao filho então tu também estarás morto pelo que pretendes fazer no palácio pagarás com a própria cabeça Após eliminarmos vossa violência com bronze 220 tantos bens quantos tens os de dentro e os de fora nós os juntaremos aos de Odisseu e aos teus filhos não deixaremos que vivam no palácio nem que as filhas e a devotada esposa andem pela cidade de Ítaca Isso dito Atena enraiveceuse mais no coração 225 e ralhou contra Odisseu com raivosas palavras Odisseu teu ímpeto não é mais tão firme nem tão bravo és como quando por Helena alvosbraços de nobre pai por nove anos troianos combateste sempre sem cessar e muitos varões mataste na refrega terrível 230 e com teu plano tomouse a urbe amplasruas de Príamo Como agora quando alcançaste tua casa e teus bens gemes em face dos pretendentes para ser bravo Pois vem cá querido põete do meu lado e me observa para que saibas quem é para ti entre varões inimigos 235 Mentor filho de Bravo na retribuição pelo benfazer Isso disse mas de modo algum deu a vitória decisiva pois ainda claro testava a força e a bravura de Odisseu e de seu filho majestoso Ela própria para cima da viga mestra do salão enegrecido 240 lançouse e sentou de frente similar a uma andorinha Aos pretendentes instigavam Agelau filho de Domador Eurínomo Anfimédon Demoptólemo Pisandro filho de Polictor e o atilado Polibo eram dos pretendentes de longe os melhores em valor 245 entre os que ainda viviam e lutavam por suas almas aos outros já haviam subjugado o arco e as setas em massa Entre eles falou Agelau anunciando palavra a todos Amigos o varão aí logo conterá os braços intocáveis também Mentor já foi após falar bazófias vãs 250 e eles foram deixados sozinhos nas portas da frente Assim agora não lanceis todos juntos as lanças longas mas vamos atirai primeiro vós seis esperando que Zeus conceda Odisseu ser atingido e a glória granjeada Os outros não preocupam no caso de ele cair 255 Assim falou e eles todos atiraram como pediu ansiosos e todos os projéteis Atena tornou estéreis Um deles o batente do bemconstruído salão atingiu outro a porta compacta justa De outro o chuço pesado de bronze caiu na parede 260 Mas após evitarem as lanças dos pretendentes entre eles tomou a palavra o muitatenência divino Odisseu Amigos agora eu diria que nós também atirássemos no grupo de pretendentes que aspiram matarnos acrescentando males aos anteriores 265 Assim falou e eles todos atiraram lanças agudas mirando em frente a Demoptólemo Odisseu a Euríades Telêmaco a Élato o porcariço e a Pisandro matou o varão vaqueiro de bois Assim todos juntos morderam o chão incomensurável 270 os pretendentes dirigiramse ao fundo do salão saltaram à frente e puxaram as lanças dos corpos E de novo os pretendentes atiraram lanças agudas ansiosos e a maioria dos projéteis Atena tornou estéreis Um deles o batente do bemconstruído salão 275 atingiu outro a porta compacta justa De outro o chuço pesado de bronze caiu na parede Anfimédon atingiu Telêmaco no carpo da mão de raspão e o bronze feriu a pele mais externa Ctesipo a Eumeu por cima do escudo seu ombro riscou 280 com grande lança que voou e caiu no chão Eles de novo em volta do atilado Odisseu variegadaastúcia atiraram lanças agudas no grupo de pretendentes Então a Euridamas atingiu Odisseu arrasaurbe a Anfimédon Telêmaco e a Polibo o porcariço 285 a Ctesipo na sequência o varão vaqueiro de bois atingiu no peito e proclamando lhe disse Filho de Politerses amaprovocação nunca jamais cedendo à insensatez fales grande entrega o discurso aos deuses pois são muito superiores 290 Isso aí é teu presente em troca do pé de boi que deste ao excelso Odisseu quando pela casa mendigava Assim falou o vaqueiro de lunados bois Odisseu com longa lança feriu o filho de Domador no corpo a corpo Telêmaco feriu Leócrito filho de Fortificante 295 com lança no meio do estômago e o bronze o transpassou caiu de frente e golpeou o chão com toda a fronte E então Atena destróimortal ergueu a égide do alto do telhado e o juízo deles se apavorou Fugiram de medo no salão como rebanho de vacas 300 a elas um moscardo dardejante ataca e agita na estação primaveril quando os dias são longos E aqueles como abutres com garra adunca e bico curvo que descem das montanhas e arremetem contra aves essas na planície disparam esquivandose nas nuvens 305 e eles com um impulso matamnas e defesa alguma há nem fuga e os varões se comprazem com a captura assim eles num rompante contra os pretendentes golpeavam pela casa Gemido aviltante deles partia cabeças golpeadas e todo o chão fumegava com sangue 310 E Leodes num rompante tocou os joelhos de Odisseu e suplicando dirigiulhe palavras plumadas Toco teus joelhos Odisseu tenhame respeito e piedade Afirmo que nunca a uma das mulheres no palácio falei ou algo iníquo fiz mas aos outros 315 pretendentes tentei conter a todo que isso fizesse Mas não os convenci a tirar as mãos das vilezas assim um destino ultrajante topa com a iniquidade Mas eu entre eles o áugure nada tendo feito cairei pelas boas ações não há gratidão no futuro 320 Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Vê se proclamas entre eles ter sido o áugure deves ter amiúde rezado no palácio para que remoto fosse meu doce retorno minha esposa te seguisse e gerasse crianças 325 por isso não deverias escapar da morte tenebrosa Isso dito com a mão encorpada pegou a espada deitada que Agelau deixara tombar no chão abatido Com ela seu pescoço varou pelo meio Balbuciando a cabeça uniuse à poeira 330 O cantor filho de Térpio fugia da negra morte Fêmio que cantava aos pretendentes obrigado Postouse perto da porta traseira nas mãos a lira aguda dividido cogitou no juízo ou esgueirarse do salão até o altar do grande Zeus 335 do pátio bemconstruído e sentarse onde amiúde Laerte e Odisseu queimaram coxas de bois ou suplicar pelos joelhos após correr até Odisseu Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim tocar os joelhos de Odisseu filho de Laerte 340 E ele depôs a côncava lira no chão entre a ânfora e a poltrona pinosdeprata Correu então até Odisseu tocou nos seus joelhos e suplicando dirigiulhe palavras plumadas Toco teus joelhos Odisseu tenhame respeito e piedade 345 Para ti no futuro tormento haverá se um cantor matares eu que canto para deuses e homens O que sei vem de mim e deus em meu juízo enredos de todo o tipo plantou e convém junto a ti cantar como a um deus Assim não almejes degolarme 350 Também Telêmaco isto poderia dizer teu caro filho que eu nem de bom grado nem com aspirações tua casa frequentava para cantar aos pretendentes após os banquetes muito mais numerosos e fortes guiavamme obrigado Assim falou e escutoulhe a sacra força de Telêmaco 355 e logo disse a seu pai que estava próximo Contemte não fira esse aí inocente com bronze Também salvemos o arauto Médon que sempre de mim se ocupou em nossa casa quando eu era criança se já não o matou Filoitio ou o porqueiro 360 ou ele em tua mira entrou ao te agitares pela casa Isso disse e ouviuo Médon versado no inteligente agachado jazia sob uma poltrona envolto no couro de boi recémesfolado para fugir da negra morte Logo veio de sob a poltrona despiu a pele de boi 365 e então correu até Telêmaco tocou nos seus joelhos e suplicando dirigiulhe palavras plumadas Amigo eu estou aqui te acalma e diga ao pai que com força total não me fira com o bronze afiado com raiva dos varões pretendentes que devastaramlhe 370 os bens no palácio e a ti tolos não honraram Sorrindo disselhe Odisseu muitaastúcia Coragem pois esse aí já te acolheu e salvou para que saibas no ânimo e fales também a outro que muito melhor que a maldade é o benfazer 375 Mas após saírem pela porta do palácio sentai longe da matança no pátio tu e o cantor muitafala enquanto eu pela casa trabalhar no que for preciso Assim falou e os dois saíram do salão sentaramse junto ao altar do grande Zeus 380 esquadrinhando todo o lugar sempre esperando a morte Odisseu esquadrinhou toda sua casa caso ainda um varão vivo estivesse oculto em fuga da negra morte Viuos absolutamente todos em sangue e poeira caídos muitos como peixes aos quais pescadores 385 rumo à cava praia para fora do mar cinzento retiram com rede esburacada e eles todos saudosos das ondas do mar empilhamse sobre a areia deles o resplandescente sol tira a vida assim os pretendentes um sobre o outro empilhados 390 Então a Telêmaco falou Odisseu muitaastúcia Telêmaco vamos chama a ama Euricleia vou falar uma fala que me inquieta Isso disse e Telêmaco obedeceu ao caro pai e após sacudir a porta falou à ama Euricleia 395 Mexate para cá vetusta anciã tu que as mulheres escravas as nossas no palácio espionas vem chamate meu pai quer falarte algo Assim ele falou e para ela o discurso foi plumado Abriu as portas do palácio bom para morar 400 e veio e Telêmaco liderava na frente Achou depois Odisseu entre os corpos defuntos salpicado de sangue e sujeira como um leão que marcha após comer um boi campestre todo o seu peito e as faces nos dois lados 405 têm sangue terrível de se encarar de frente assim estava Odisseu salpicado nas pernas e braços Ela quando viu os corpos e o sangue infindável pôsse a ulular já que vira grande feito mas Odisseu seguroua e contevea em sua ânsia 410 Falando dirigiulhe palavras plumadas No ânimo anciã comprazete contémte e não ulules não é pio sobre varões defuntos se jactar O quinhão dos deuses subjugouos e feitos terríveis não estimavam nenhum dos homens mortais 415 nem vil nem mesmo nobre todo que a eles chegasse assim um destino ultrajante topa com a iniquidade Mas vamos enumerame tu as mulheres do palácio as que me desonram e as que são inocentes E a ele replicou a cara ama Euricleia 420 Portanto eu a ti filho contarei a verdade Cinquenta mulheres tens no palácio escravas a quem ensinamos a executar os serviços desenredar a lã e longe ficar do amasio escravo Doze delas no total embarcaram no aviltamento 425 não prezando a mim nem à própria Penélope Telêmaco só agora cresceu e a ele a mãe não permitia dar ordens acerca das escravas mulheres Pois bem eu subirei aos aposentos lustrosos e falarei a tua esposa sobre quem o deus sono enviou 430 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Ainda não a despertes diz às mulheres que aqui venham essas que antes engenharam ultrajes Assim falou e a anciã saiu pelo palácio anunciando às mulheres e instigandoas a ir 435 Mas ele a Telêmaco ao vaqueiro e ao porcariço após chamálos até si dirigiu palavras plumadas Começai a levar os corpos e ordenai às mulheres que depois às poltronas bem belas e às mesas com água e esponjas esburacadas limpem 440 Mas quando tiverdes arrumado toda a casa conduzi as escravas para fora do bemerigido salão e no espaço entre a rotunda e o impecável muro do pátio acertaias com espadas aguçadas até de todas terdes tirado as almas e elas esquecido Afrodite 445 que sob os pretendentes possuíam e uniamse às ocultas Assim falou e as mulheres vieram juntas todas lamentandose de forma atroz vertendo copiosas lágrimas Primeiro levaram os corpos dos defuntos e os depuseram sob a colunata do pátio bemmurado 450 empilhandoos um sobre o outro Odisseu dava ordens ele próprio impelindoas Elas os levavam obrigadas E depois às poltronas bem belas e às mesas com água e esponjas esburacadas limparam Telêmaco o vaqueiro e o porcariço com pás 455 o chão da casa sólida construção raspavam e as servas levavam os corpos para fora e depunham Mas quando já haviam arrumado o salão inteiro as escravas foram levadas para fora do bemerigido salão no espaço entre a rotunda e o impecável muro do pátio 460 e agrupadas no aperto de onde não se podia escapar E entre eles o inteligente Telêmaco começou a falar Vede com morte limpa eu não tiraria a vida delas que insultos entornaram sobre minha cabeça e nossa mãe e ao lado dos pretendentes dormiam 465 Assim falou e o cabo de nau proanegra após prender no grande pilar jogou em volta da rotunda e para cima bem esticou para pé algum atingir o chão Como quando melros asacomprida ou pombas chocamse com uma rede disposta num arbusto 470 arremetendo para o abrigo e hediondo leito lhes cabe assim elas em fila tinham as cabeças e ao redor de cada uma nos pescoços havia nós para provocar deplorável fim Convulsionaram os pés pouco tempo de fato não muito E para fora arrastaram Preto pelo pórtico e pátio 475 dele as narinas e orelhas com bronze impiedoso cortaram e os genitais arrancaram crua refeição aos cães e deceparamlhe as mãos e os pés com ânimo rancoroso Depois de lavar as mãos e os pés foram para a casa até Odisseu e o feito estava pronto 480 E ele dirigiuse à cara ama Euricleia Traze enxofre anciã remédio de males e trazeme fogo para que eu fumigue o salão e tu a Penélope ordena que venha aqui com servas mulheres e apressa todas as escravas pela casa para virem 485 E a ele dirigiuse a cara ama Euricleia Sim meu filho isso falaste com adequação Mas vamos trarei para ti capa e manto vestes que não assim coberto com trapos nos largos ombros fiques no palácio isso poderia causar indignação 490 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Agora antes de mais nada que fogo eu tenha no palácio Assim falou e não desobedeceu a cara ama Euricleia e sim trouxe fogo e enxofre E Odisseu fumigou direito o salão a casa e o pátio 495 E a anciã saiu pela bela casa de Odisseu anunciando às mulheres e impelindoas a ir e elas saíram do salão com tocha nas mãos Elas claro abraçavam e saudavam Odisseu e beijavam com afeto cabeça ombros 500 e mãos pegandoas e atingiuo um doce desejo por pranto e gemido e no juízo a todas reconheceu E a anciã subiu aos aposentos exultante para dizer à senhora que o caro esposo dentro estava os joelhos se aceleraram os pés em ligeira sucessão Parou na cabeceira e lhe dirigiu o discurso 5 Acorda Penélope cara filha e vejas com teus olhos o que desejas todos os dias Odisseu chegou alcançou a casa ainda que tarde Matou os pretendentes arrogantes que sua casa lesavam os bens comiam e o filho constrangiam 10 E a ela replicou Penélope bemajuizada Cara mãezinha louca te tornaram os deuses capazes de fazer insensato mesmo quem é muito refletido e pôr na trilha da prudência quem tem juízo frouxo eles até a ti lesaram antes com ânimo moderado 15 Por que debochas de mim que tenho ânimo aflito falando coisas sem nexo e até me despertas do sono doce que cobriu minhas pálpebras e me prendeu Nunca dormi desse jeito desde que Odisseu partiu para vivenciar a inominável RuinosaÍlion 20 Pois bem agora desce e vai de volta ao salão Se até mim outra das mulheres que me pertencem tivesse vindo e isso anunciado despertandome do sono então rápido de forma medonha a teria mandado embora de volta para o salão nisso a velhice conta a teu favor 25 E a ela replicou a cara ama Euricleia Não debocho de ti filha cara mas vê à vera Odisseu chegou e alcançou a casa como afirmo o hóspede que todos desonraram no palácio Telêmaco claro há tempo sabia que dentro estava 30 mas com prudência as ideias do pai ocultou até se vingarem da violência dos varões arrogantes Assim falou e aquela se comprouve e pulando da cama enroscouse na anciã lançou lágrimas das pálpebras e falando dirigiulhe palavras plumadas 35 Pois bem cara mãezinha narrame sem evasivas se deveras já alcançou a casa como afirmas como nos aviltantes pretendentes desceu os braços um único sendo eles dentro ficavam sempre juntos E a ela replicou a cara ama Euricleia 40 Não vi não fui informada só o gemido ouvi ao serem mortos nós no fundo do bemerigido quarto estávamos terrorizadas contidas por portas bemjustas até que por fim teu filho me chamou do salão Telêmaco pois o pai o enviara para que me chamasse 45 Encontrei Odisseu de pé entre os cadáveres defuntos eles cercandoo ocupavam o chão duro jazendo um sobre o outro vendo teu ânimo jubilaria ele salpicado de sangue e sujeira como um leão Agora todos já estão juntos nos portões do pátio 50 e ele a casa bem bela fumiga tendo aceso grande fogo envioume para te chamar Mas vem que vós dois embarqueis no gáudio ambos no caro coração pois muitos males sofrestes Agora por fim este longo desejo foi realizado 55 ele chegou vivo a seu lar e achou a ti e ao menino no palácio com ele aqueles agiram mal os pretendentes e deles todos vingouse em sua casa E a ela replicou Penélope bemajuizada Cara mãezinha ainda não proclames alto exultante 60 Sabes que felicidade daria sua presença no palácio a todos sobretudo a mim e ao filho que geramos mas essa narração não é verdadeira como falas pois um deus matou os pretendentes ilustres irritado com a violência aflitiva e os feitos vis 65 Não estimavam nenhum dos homens mortais nem vil nem mesmo nobre todo que os alcançasse assim pela iniquidade sofreram um mal Mas Odisseu perdeu o retorno longe da Acaia e pereceu E a ela replicou a cara ama Euricleia 70 Filha que palavra te escapou da cerca de dentes O marido na casa junto à lareira e disseste que nunca em casa chegaria teu ânimo é sempre incrédulo Pois bem para ti sinal inequívoco outro direi a cicatriz que lhe infligiu o javali com branca presa 75 Essa ao banhálo observei e quis dizerte mas a mim pondome na boca as mãos ele não permitiu falar graças à mente muitaargúcia Mas vem eu porei a mim mesma em jogo se te engano matame em morte miserável 80 E a ela respondeu Penélope bemajuizada Mãezinha para ti é difícil dos deuses sempiternos descobrir os planos mesmo sendo multiperspicaz ainda assim vamos atrás de meu filho para eu ver os varões pretendentes mortos e quem os matou 85 Assim falou e desceu dos aposentos seu coração muito revolvia ou de longe ao amado marido iria inquirir ou de pé a seu lado beijarialhe a face e a mão tomaria E ela para dentro foi cruzou o umbral de pedra e sentouse então diante de Odisseu à luz do fogo 90 no lado oposto eis que ele contra enorme pilar sentado para baixo olhava a ver se algo lhe diria a altiva cônjuge depois de o ver com os olhos Quieta ficou tempo imóvel estupor em seu coração com o olhar ora em seu rosto o reconhecia 95 ora o desconhecia com roupas vis sobre a pele E Telêmaco reprovoua dirigiuselhe e nomeoua Minha mãe desmãe que ânimo intratável Por que meu pai assim desdenhas e não junto dele sentada com palavras o interrogas ou investigas 100 Por certo outra esposa não assim com ânimo resistente se afastaria do marido que após aguentar muitos males chegasse no vigésimo ano à terra pátria teu coração sempre é mais duro que pedra E a ele replicou Penélope bemajuizada 105 Filho meu no peito o estupor domina meu ânimo não sou capaz de dizer palavra nem de indagar nem de encarar de frente Se de verdade é Odisseu e alcançou a casa por certo nós dois nos reconheceremos um ao outro ainda melhor temos 110 sinais ocultos de outrem que só nós dois conhecemos Assim falou e sorriu o muitatenência divino Odisseu De pronto a Telêmaco dirigiu palavras plumadas Telêmaco quanto a tua mãe deixa que no palácio me teste rápido ponderará e com mais vigor ainda 115 Agora estou sujo e visto ordinárias vestes sobre a pele por isso me desonra e ainda não pensa que sou ele Nós cogitaremos qual será de longe a melhor solução De fato se alguém mata um só herói na cidade atrás do qual não há muitos que o ajudem 120 foge abandonando parentes e a terra pátria quanto a nós o esteio matamos os melhores moços em Ítaca peço que tu isso ponderes A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Disso cuida tu caro pai que tua é a melhor 125 astúcia entre os homens isso se diz e contigo nenhum outro varão entre os homens mortais disputaria Nós com sofreguidão junto seguiremos e não penso que se carecerá de bravura tanta quanto a força deixar Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 130 Portanto eu falarei como me parece ser o melhor Primeiro vos lavai e vesti com túnicas e ordenai às escravas no palácio que vestes escolham e que o divino cantor levando a lira aguda para nós conduza uma dança amiga de folguedos 135 assim diria haver bodas na casa alguém ao ouvir ou quem subir pela rua ou habitar em torno Antes não se espraie na cidade o relato da matança dos varões pretendentes antes de sairmos até nosso sítio muitaárvore Lá então 140 ponderaremos que vantagem o Olímpio concederá Assim falou e eles o ouviram direito e obedeceram Primeiro se lavaram e vestiram túnicas e aprontaramse as mulheres e o divino cantor pegou a côncava lira e neles instigou o desejo 145 por doce música e dança impecável A grande casa reverberava com os pés dos varões que dançavam e das mulheres belacinta E assim falava quem fora da casa ouvisse Por certo um já desposou a rainha muitopretendente 150 a terrível que não suportou de seu marido legítimo guardar a grande casa para sempre até ele chegar Assim diziam mas não sabiam o que fora arranjado E ao enérgico Odisseu em sua casa a governanta Eurínome lavou e com óleo ungiu 155 e em torno dele belo manto lançou e uma túnica Por sobre sua cabeça muita beleza verteu Atena maior e mais encorpado a quem o visse da fronte fez tombar madeixas cacheadas semelhantes a jacintos Como quando reveste a prata com ouro o varão 160 habilidoso a quem ensinaram Hefesto e Palas Atena técnica de todo o tipo e completa obras graciosas assim verteu graça sobre ele na cabeça e nos ombros E saiu da banheira no porte semelhante a imortais Logo sentouse de novo na poltrona de onde se erguera 165 em face de sua esposa e a ela disse o discurso Insana mais que o das bem femininas mulheres tornaram duro teu coração os que têm morada olímpia outra mulher não assim com ânimo resistente se afastaria do marido que após aguentar muitos males 170 chegasse no vigésimo ano à terra pátria Pois bem mãezinha apronta a cama para mesmo só eu deitar sim o coração no seu peito é de ferro E a ele replicou Penélope bemajuizada Insano em nada sou altiva nem indiferente 175 nem estou admirada demais sei muito bem como eras quando de Ítaca saíste sobre nau longoremo Pois bem aprontalhe o leito sólido Euricleia fora do bemerigido quarto aquele que ele mesmo fez aí posiciona o leito sólido e joga os lençóis 180 velos capas e mantas lustrosas Assim falou testando o marido e Odisseu perturbado disse à sempre devotada esposa Ó mulher deveras aflitiva essa fala que falaste Quem pôs a cama alhures Seria difícil 185 até para um bem destro exceto se o deus ele mesmo querendo fácil a pusesse em outro lugar Dos varões nenhum vivente mortal nem muito jovem fácil a removeria pois grande sinal foi feito na cama fabricada eu mesmo a laborei e nenhum outro 190 Arbusto folhalonga oliveira crescia dentro da cerca florescente em seu auge era maciço como um pilar Envolvendoo construí um tálamo terminei com pedras uma ao lado da outra cobrio com um telhado e portas coloquei bem unidas em compacto ajuste 195 Depois podei a folhagem da oliveira folhalonga e cortando fora o toro da raiz polio com bronze bem e com destreza e com o prumo o endireitei fabricando uma coluna e as pranchas furei com verruma Tendo por ela iniciado moldei a cama até terminar 200 artificiando com ouro prata e marfim nela estiquei luzente tira de couro de boi vermelha Assim esse sinal te anuncio e de nada sei ou ainda está imóvel mulher a cama ou já algum varão a pôs alhures cortando embaixo a base da oliveira 205 Assim falou e os joelhos e o coração dela fraquejaram reconhecendo os sinais seguros que lhe enunciou Odisseu aos prantos foi logo até ele as mãos em volta do pescoço de Odisseu lançou beijou sua fronte e disse Não te ressintas comigo Odisseu pois de resto mais 210 que todos eras inteligente os deuses nos deram agonia os que não nos permitiram ficar um com o outro gozar a juventude e chegar ao umbral da velhice Mas agora não me odeies por isto nem te indignes por que não te saudei com afeto tão logo te vi 215 Pois sempre meu ânimo no caro peito tremia que um mortal me ludibriasse com palavras ao chegar pois muitos planejam estratagemas vis Também não a argiva Helena gerada de Zeus a varão estrangeiro teria se unido em enlace amoroso 220 se soubesse que de volta os filhos marciais dos aqueus iriam conduzila para casa à cara pátria O deus instigoua a executar a ação ultrajante antes ela não pôs em seu próprio coração a cegueira funesta que também para nós seria a origem do luto 225 Agora pois já contaste os sinais inequívocos de nossa cama a qual outro mortal nunca viu mas só tu eu e minha serva uma única Actóris que me deu meu pai quando vim para cá a que nos guardou as portas do sólido quarto 230 já convences meu ânimo embora seja bem intratável Assim falou e nele mais ainda instigou o desejo por choro soluçava segurando a esposa perfeita sempre devotada Como quando a terra dá felicidade aos que nadam àqueles cuja nau engenhosa Posêidon em altomar 235 golpeou impulsionada por vento e vaga potente poucos escapam da cinzenta água salgada até a terra nadando e muita salsugem gruda na pele felizes pisam na terra após fugir da desgraça assim deulhe felicidade o marido quando ela o viu 240 e não havia como soltar os alvos braços de seu pescoço Enquanto choravam teria surgido Aurora dedosróseos se não tivesse tido outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja a noite em seu final estendeu e a Aurora a seu turno a tronodourado conteve no Oceano e não deixou os cavalos 245 péveloz jungir os que trazem luz aos homens Luzidio e Brilho os potros que conduzem Aurora Então falou à sua esposa Odisseu muitaastúcia Mulher ainda não ao fim de todas as provas chegamos pois depois ainda haverá labor desmesurado 250 muito e duro e carece que eu o cumpra por inteiro Pois assim adivinhoume a alma de Tirésias no dia em que desci à morada de Hades em busca do retorno dos companheiros e do meu Pois bem vamos para a cama mulher que agora 255 nos deleitemos com o doce sono E a ele replicou Penélope bemajuizada O leito vê tu o terás sempre que no ânimo teu quiseres já que os deuses te permitiram voltar à casa bemconstruída e a tua terra pátria 260 Mas como ponderaste e o deus lançou em teu ânimo vamos falame da prova pois também depois penso serei informada e saber logo de fato pior não é Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Insana por que de novo insistindo muito pedes 265 que eu fale Mas eu te direi e nada esconderei Por certo teu ânimo não jubilará nem eu mesmo jubilo pois a muitas cidades de mortais mandoume partir tendo nas mãos um remo maneável até alcançar varões que o mar não conhecem 270 nem comem comida misturada a grãos de sal eles claro não conhecem naus facepúrpura nem remos maneáveis que são as asas das naus Este sinal me disse inequívoco e não o ocultarei de ti quando comigo depararse outro passante 275 e disser que tenho destróijoio sobre o ilustre ombro então pediume para na terra cravar o remo fazer belos sacrifícios ao senhor Posêidon carneiro touro e javali doméstico reprodutor retornar para casa e ofertar sacras hecatombes 280 aos deuses imortais que do largo páramo dispõem a todos pela ordem Do mar me virá bem suave a morte ela que me abaterá debilitado por idade lustrosa e em volta as gentes serão afortunadas Isso tudo me disse se completará 285 E a ele replicou Penélope bemajuizada Se de fato ao menos a velhice completarem os deuses há a expectativa então de que escaparás de males Assim eles disso falavam entre si nisso Eurínome e a ama aprontaram o leito 290 com roupa macia sob tochas iluminadoras Mas após fazer a cama sólida afobadas a anciã retornou à casa para descansar e Eurínome a camareira a eles conduziu no percurso à cama com uma tocha nas mãos 295 e após guiálos ao quarto voltou Eles então felizes atingiram a cama antiga E Telêmaco o vaqueiro e o porcariço pararam os pés na dança e pararam as mulheres e eles mesmos deitaramse pelos umbrosos salões 300 Após os dois se deleitarem com o amor prazeroso deleitaramse com histórias que um narrava ao outro ela o que suportou no palácio divina mulher a observar a infernal reunião de varões pretendentes que por causa dela muitos bois e robustas ovelhas 305 abatiam e dos cântaros muito vinho foi tirado e o divinal Odisseu quantas agruras infligiu aos homens e quanto ele mesmo agoniado aguentou tudo ele contou Ela deleitouse escutando e o sono não tombou em suas pálpebras antes de ele tudo contar 310 Começou como primeiro subjugou os cícones e depois chegou à gorda lavoura dos varões lotófagos e quanto o ciclope realizou e como fez pagar sua pena pelos altivos companheiros que comeu sem piedade e como alcançou Eolo que solícito o recebeu 315 e lhe deu condução e ainda não devia a cara pátria atingir mas agarraramno rajadas de vento e com gemidos profundos pelo mar piscoso foi levado e como alcançou a lestrigônia Telépilos e esses que destruíram naus e companheiros belasgrevas 320 todos Odisseu o único escapou em negra nau E contou o truque e a muita ardileza de Circe e como foi à casa bolorenta de Hades para consultar a alma do tebano Tirésias com nau muitocalço e viu todos os companheiros 325 e a mãe que o gerou e criou quando pequeno e como ouviu o som das Sirenas incessantes como alcançou as pedras Plânctas e a fera Caríbdis e Cila da qual varões nunca escaparam incólumes e como os companheiros abateram vacas de Sol 330 e como com raio fumoso Zeus trovejanoalto atingiu a nau veloz e pereceram os nobres companheiros todos por igual mas ele escapou da nefasta perdição e como alcançou a ilha Ogígia e a ninfa Calipso que o reteve almejando que fosse seu esposo 335 e na cava caverna o alimentava e dizia que o faria imortal e sem velhice por todos os dias mas a ele nunca persuadiu seu ânimo no peito e como alcançou após muito penar os feácios eles que de coração como a um deus o honraram 340 e numa nau conduziram à cara terra pátria tendo lhe dado bronze ouro a granel e vestes Isso claro falou por último quando o doce sono soltamembros o assaltou soltando as tribulações do ânimo Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja 345 quando supôs que Odisseu em seu ânimo tivesse gozado o leito e o sono com sua esposa de pronto do Oceano à tronodourado nascecedo incitou para trazer luz aos homens E Odisseu pulou da cama macia e deu uma ordem à esposa 350 Mulher já estamos saciados de muitas provas os dois tu aqui meu retorno muitaagrura pranteando mas Zeus e outros deuses a mim aflito ansiando longe me seguravam da terra pátria Agora após alcançarmos os dois o leito desejado 355 dos bens que tenho cuida no palácio e ovelhas as que soberbos pretendentes devastaram muitas eu mesmo apresarei e outras os aqueus nos darão até terem enchido todos os currais Quanto a mim porém irei ao sítio muitaárvore 360 para ver o nobre pai que sofre copiosa angústia para ti mulher isto peço embora sejas sensata logo haverá uma notícia ao nascer do sol sobre os varões pretendentes que matei no palácio após subir aos aposentos com as servas mulheres 365 senta não olhes para ninguém nem faças perguntas Assim falou e sobre os ombros pôs as belas armas incitou Telêmaco o vaqueiro e o porcariço e a todos pediu pegarem aprestos de guerra com as mãos Eles não lhe desobedeceram armaramse com bronze 370 abriram as portas e se foram e chefiava Odisseu Luz já havia sobre a terra e então a eles Atena após com a noite ocultálos ligeiro retirouos da cidade E Hermes o cilênio convocou as almas dos varões pretendentes Tinha nas mãos a vara bela dourada com que enfeitiça os olhos dos varões que bem entender e outros adormecidos desperta 5 Com ela agita e conduz e elas seguem guinchando Como morcegos no recesso de prodigioso antro guinchando voam quando da colônia algum tomba da pedra seguramse mutuamente no alto assim elas guinchando seguiam juntas chefiavaas 10 o benéfico Hermes pelos caminhos brumosos Margearam as correntes de Oceano e a pedra Leucas e até os portões de Sol e a terra dos Sonhos foram e rápido desceram o prado de asfódelos onde habitam as almas espectros dos esgotados 15 E encontraram a alma de Aquiles filho de Peleu e a de Pátroclo e a do impecável Antíloco e a de Ájax que foi o melhor em beleza e porte de todos os aqueus depois do impecável filho de Peleu Assim eles em torno dele juntaramse e para perto 20 achegouse a alma de Agamêmnon filho de Atreu aflita em torno outras reunidas as que com ele morreram na casa de Egisto e alcançaram o fado A ele por primeiro falou a alma do filho de Peleu Filho de Atreu dizíamos tu a Zeus prazernoraio 25 seres por demais caro todos os dias dentre varões heróis porque regias sobre muitos e altivos na terra troiana onde aqueus agonias sofremos Sim e cedo também te atingiria o quinhão funesto que ninguém que nasceu evita 30 Como devias gozando da prerrogativa de tua regência ter morrido e encontrado o destino na região troiana Então todos os aqueus teriam erigido um túmulo a ti e também a teu filho grande fama granjeado para o futuro agora foite destinado ser pego por morte deplorável 35 A ele por sua vez falou a alma do filho de Atreu Próspero filho de Peleu Aquiles semelhante aos imortais tu que morreste em Troia longe de Argos a tua volta outros foram mortos os melhores filhos de troianos e aqueus combatendo por ti tu no turbilhão de poeira 40 jazias grande na grandeza sem memória da equitação E nós combatemos o dia inteiro de forma alguma teríamos findo a luta se Zeus com tempestade não a tivesse Mas depois que às naus te levamos longe da luta depositamos sobre o leito e limpamos a bela pele 45 com água quente e óleo em torno de ti muita lágrima cálida vertiam os aqueus e tosavam madeixas E a mãe veio do mar com imortais marítimas após ouvir o anúncio e um grito pelo mar espraiouse prodigioso e um tremor balançou todos os aqueus 50 Então teriam se arremessado rumo às cavas naus se o varão com muito saber antigo não os tivesse contido Nestor cujo plano também no passado era o melhor Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Deteivos argivos não fujais juventude dos aqueus 55 Essa aí é a mãe do mar com imortais marítimas vem para encontrar o filho falecido Isso dito eles pararam a fuga os animosos aqueus Em volta de ti postaramse as filhas do ancião do mar infelizes gemendo e vestiramte com vestes imortais 60 Musas nove no total alternandose com bela voz cantavam o treno lá não verias sem lágrima nenhum argivo de tal forma ressoou a música aguda Pois a ti dezessete noites e dias sem parar choramos deuses imortais e homens mortais 65 No décimo oitavo te demos ao fogo em tua volta muitas ovelhas e cabras matamos bem gordas e lunadas vacas Queimavas em vestes de deuses com muito óleo e doce mel e muitos heróis aqueus moviamse em armas em volta da pira onde queimavas 70 infantaria e combatentes com carro Grande alarido se fez Mas após a chama de Hefesto terminar contigo pela manhã coligimos teus ossos fúlgidos Aquiles e pusemos em vinho puro e óleo Tua mãe ofertou dourada ânfora duplaalça oferenda de Dioniso 75 disse ser trabalho do bem famoso Hefesto Nela jazem teus ossos fúlgidos ilustre Aquiles misturados com os do morto Pátroclo filho de Menoitio separados dos de Antíloco que mais honravas entre todos os outros companheiros após a morte de Pátroclo 80 Em torno deles grande e impecável túmulo ergueu o sacro exército dos lanceiros argivos no cabo saliente sobre o largo Helesponto para ser longevisível a partir do mar aos varões esses que vivem agora e os que haverá no futuro 85 E a mãe pediu dos deuses bem belos prêmios e fixouos no meio da pista para os melhores aqueus Já participei do funeral de muitos varões heróis quando uma vez falecido o rei os jovens se cintam e se aprontam para as provas 90 mas tendoos visto terias muito admirado no ânimo tais os bem belos prêmios que para ti a deusa fixou Tétis pésdeprata eras muito caro aos deuses Assim tu nem após morrer perdeste o nome mas sempre entre todos os homens tua fama será distinta Aquiles 95 E eu Que prazer foi este após arrematar a guerra No retorno Zeus me armou funesta destruição pelas mãos de Egisto e da maldita esposa Assim eles disso falavam entre si E achegouse deles o condutor Argifonte 100 guiando as almas dos pretendentes que Odisseu dominou Os dois pasmos foram direto quando as viram A alma de Agamêmnon filho de Atreu reconheceu o caro filho de Melaneu o esplêndido Anfimédon ele fora seu aliado quando em Ítaca morava 105 A ele por primeiro falou a alma do filho de Atreu Anfimédon o que sofrestes para baixar à terra lúgubre todos seletos coetâneos Ninguém de outra forma distinguiria e escolheria na cidade melhores varões Estáveis numa nau e subjugouvos Posêidon 110 após instigar ventos difíceis e grandes ondas Varões hostis causaramvos dano em terra firme ao quererdes bois roubar ou belos rebanhos de ovelhas Ou então lutáveis por uma cidade e mulheres Diz a mim que inquiro proclamo ser teu aliado 115 Ou não te lembras quando fui até lá a vossa casa com o excelso Menelau para instigar Odisseu a junto seguir até Ílion sobre naus bomconvés Por uma lua inteira ao todo cruzamos o amplo mar com esforço tendo convencido Odisseu arrasaurbe 120 E a ele por sua vez falou a alma de Anfimédon Majestoso filho de Atreu rei de varões Agamêmnon lembrome ó criadoporZeus de tudo isso que falaste e a ti eu tudo bem direito e com precisão contarei nossa nociva morte certeira tal como se efetuou 125 Cortejávamos a esposa de Odisseu há tempo ausente ela nem recusava as hediondas bodas nem as completava planejando para nós a negra perdição da morte Pois cogitou este outro ardil no juízo após grande urdidura armar no palácio tramava 130 fina e bem longa De imediato nos disse Moços meus pretendentes morto o divino Odisseu esperai mesmo ávidos por desposarme até o manto eu completar que meus fios em vão não se percam mortalha para o herói Laerte para quando a ele 135 o quinhão funesto agarrar o da morte dolorosa que contra mim no povo aqueia alguma se indigne se ele sem pano jazer depois que muito granjeou Assim falou e foi persuadido nosso ânimo orgulhoso E então de dia tramava a enorme urdidura 140 e nas noites desenredavaa com tochas postadas ao lado Três anos o truque não se notou e persuadiu os aqueus mas ao chegar o quarto ano e a primavera se achegar as luas finando e muitos dias passaram uma das mulheres falou a que sabia ao claro 145 e a apanhamos desenredando a trama radiante E assim ela a completou a contragosto obrigada Justo quando mostrou a capa após tramar a urdidura lavada semelhante ao sol ou à lua nisso divindade vil trouxe Odisseu de um lugar 150 até o limite das lavouras onde habitava o porqueiro Até lá foi o caro filho do divino Odisseu vindo da arenosa Pilos com negra nau Os dois para os pretendentes elaboraram morte vil e rumaram à cidade bem famosa Odisseu 155 depois mas Telêmaco liderava na frente Trouxeo o porcariço com vestes vis sobre a pele assemelhado a um débil e velho mendigo apoiado no bastão ordinárias vestes no corpo vestia Nenhum de nós foi capaz de reconhecer que ele era Odisseu 160 ao mostrarse de chofre nem os mais velhos mas dele debochamos e lhe atiramos coisas E por um tempo resistiu sendo atingido e reprovado em seu palácio com ânimo resistente mas quando o incitou o espírito de Zeus portaégide 165 com Telêmaco pegou as bem belas armas depositouas no quarto e passou os ferrolhos e ele com sua muitaargúcia pediu à esposa que apresentasse aos pretendentes o arco e o ferro cinza para nós desventurados apetrechos e o início da matança 170 E nenhum de nós conseguiu retesar a corda do arco poderoso por sermos carentes de força e muito Mas quando as mãos de Odisseu tocaram o grande arco todos nós reclamamos com palavras que o arco não se lhe desse nem se muito pedisse 175 e somente Telêmaco nos fez concordar Ele recebeuo com a mão o muitatenência divino Odisseu e fácil vergou o arco e lançou através do ferro Eis que se postou na soleira e despejou as rápidas setas esquadrinhando terrível e atingiu o rei Antínoo 180 Depois contra os demais disparou tristes projéteis mirando em frente e eles caíam uns sobre os outros É evidente que um deus era deles ajudante Logo por toda a casa seguindo seu ímpeto matavam ao redor Gemido ultrajante deles partia 185 cabeças golpeadas e todo o chão fumegava com sangue Assim nós Agamêmnon morremos de quem agora ainda os corpos sem os ritos jazem no palácio de Odisseu os parentes ainda não sabem em suas casas eles que após limpar o negro sangue dos ferimentos 190 e nos expor lamentariam essa a honraria dos mortos A ele por sua vez falou a alma do filho de Atreu Afortunado filho de Laerte Odisseu muitotruque deveras com grande excelência conquistaste esposa quão valoroso juízo teve a impecável Penélope 195 filha de Icário quão bem se lembrou de Odisseu seu varão legítimo Por isso sua fama nunca findará a de sua excelência e aos humanos farão um canto agradável os imortais pela prudente Penélope Não armou vis ações como a filha de Tindareu 200 que ao marido legítimo matou e hediondo canto haverá entre os homens e dura reputação atribuirá às bem femininas mulheres mesmo às honestas Assim eles disso falavam entre si de pé na morada de Hades sob os confins da terra 205 E os outros desceram da cidade e logo chegaram ao sítio belamente arranjado de Laerte que um dia o próprio Laerte adquiriu depois que muito labutou Aí era sua propriedade abrigo corria por todo o entorno no qual costumavam comer sentarse e dormir 210 os escravos obrigados que faziam o que ele quisesse Aí mandava mulher siciliana anciã que do ancião cuidava gentil no campo longe da cidade Lá Odisseu aos escravos e ao filho falou o discurso Vós ide agora para dentro da casa bemconstruída 215 e como refeição presto sacrificai um porco o melhor quanto a mim testarei nosso pai se me reconhece e observa com os olhos ou desconhece pois longe estive muito tempo Após falar aos escravos entregou as armas guerreiras 220 Eles depois rápido alcançaram a casa e Odisseu foi averiguar mais perto do pomar muitofruto Quando desceu pelo grande pomar não achou Finório um escravo ou os filhos mas eis que eles para recolher espinheiros úteis como cerca do pomar 225 haviam saído e deles na estrada o ancião era o líder Ao pai sozinho achou no pomar bemarranjado cavando em volta de uma árvore Vestia suja túnica remendada ultrajante em volta da panturrilha de couro polainas costuradas amarrara evitando arranhões 230 e luvas nas mãos por causa de amoreiras Na cabeça trazia um gorro de cabra avultando a angústia Quando então o viu o muitatenência divino Odisseu torturado pela velhice e com enorme angústia no juízo postouse sob elevada pereira e lágrimas verteu 235 Então cogitou no juízo e no ânimo beijar e abraçar seu pai e com minúcias contar como voltou e alcançou a terra pátria ou primeiro o interrogaria e com minúcias o testaria Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim 240 primeiro testálo com palavras provocadoras Nisso refletindo foi direto lá mesmo o divino Odisseu Aquele cabeça abaixada desenterrava uma árvore parado ao lado disselhe o filho ilustre Ancião imperícia não te domina no trato 245 do pomar mas teu cuidado domina bem Não há de todo nem planta nem figueira nem videira nenhuma oliveira nem pereira nem canteiro sem teu cuidado no jardim Outra coisa te direi e não ponhas raiva no ânimo a ti mesmo o valoroso cuidado não domina mas velhice 250 funesta te domina secura vil e vestes ultrajantes Por certo não devido à inação um senhor descuida de ti e nada de um escravo assoma em ti ao mirarse aparência e altura pois pareces um varão que é rei Pareces alguém que após se banhar e comer 255 suavemente repousa pois é tradição dos anciãos Pois bem falame disto e conta com precisão de que varão és escravo De quem o pomar que cuidas A mim diz isto a verdade para eu bem saber se esta aonde cheguei é deveras Ítaca como me disse 260 aquele varão que há pouco topei ao vir para cá não muito prestativo pois tudo não aguentou falar e ouvir minha palavra quando perguntei acerca de meu aliado se acaso vive e existe ou já está morto na morada de Hades 265 Pois eu te falarei e tu compreende e me escuta certa vez hospedei um varão na cara terra pátria que chegou até nós e nunca outro mortal mais caro hóspede de longe alcançou minha casa Proclamou ser de Ítaca quanto à família e disse 270 que Laerte filho de Arquésio era seu pai A ele eu levei para casa e bem hospedei acolhendoo gentil com o muito que havia na casa e deilhe os presentes dons de hóspede que convém Deilhe sete pesos de ouro bemtrabalhado 275 deilhe uma ânfora toda de prata com desenho floral doze túnicas simples número igual de cobertas tantos belos mantos e somado a isso tantas túnicas à parte mulheres versadas em trabalhos impecáveis quatro formosas as que ele mesmo quisesse escolher 280 E a ele respondeu o pai vertendo copiosas lágrimas Estranho a esta terra chegas da qual perguntas e varões desmedidos e iníquos a dominam Premiasteo com presentes miríades ofertando estéreis se o tivesses alcançado vivo na cidade de Ítaca 285 então ele te enviaria de volta retribuindo com belos dons e nobre hospedagem essa é a norma para quem inicia Pois bem dizeme isto e conta com precisão qual já é o ano desde que o hospedaste teu hóspede infeliz meu filho se um dia existiu 290 desventurado que longe dos caros e do solo pátrio ou no mar comeramno os peixes ou em terra firme tornouse presa de feras e aves de rapina A ele mãe não amortalhou e chorou nem o pai esses que o geramos nem a esposa muitadádiva a prudente Penélope 295 ululou pelo marido junto ao leito como convém após cerrar os olhos essa é a honraria dos mortos A mim diz isto a verdade para eu bem saber quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais E onde está a nau veloz que aqui trouxe a ti 300 e excelsos companheiros Ou como passageiro chegaste em nau alheia e eles se foram após desembarcarte Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Portanto a ti tudo direi com muita precisão Eu sou de Alibas onde habito morada gloriosa 305 filho do senhor Afidas filho de Polipêmon e meu nome é Seleto Mas a mim divindade fez vagar para longe da Sicília até sem querer cá chegar minha nau está aqui no campo longe da cidade Mas para Odisseu este já é o quinto ano 310 desde que de lá partiu e saiu de minha pátria desventurado Ótimas lhe foram as aves ao se ir destras com que eu me alegrei enviandoo de volta e ele se alegrou ao partir no ânimo ambos esperávamos ainda nos encontrar aliados e dar dons radiantes 315 Isso disse e ao outro encobriu escura nuvem de angústia com ambas as mãos tendo apanhado fuliginoso pó verteuo sobre a grisalha cabeça gemendo sem cessar O ânimo do outro se agitou e subindo as narinas já o ímpeto lancinante eclodia ao mirar o caro pai 320 E beijouo e abraçou após saltar até ele e disse Sim aquele por quem indagas pai sou eu mesmo aqui e cheguei no vigésimo ano à terra pátria Mas contém o pranto e o lamento lacrimoso Pois eu te falarei e é imperiosa a pressa apesar de tudo 325 matei os pretendentes em nossa casa punindo o opróbrio aflitivo e as vis ações A ele por sua vez Laerte respondeu e disse Se deveras como Odisseu meu filho chegaste sinal inequívoco dizeme agora para eu me convencer 330 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia A cicatriz primeiro esta aqui observa com os olhos a que no Parnasso me deixou javali com branco dente quando lá fui tu me enviaste e a senhora mãe até Autólico o caro pai da mãe para eu receber 335 presentes que após vir aqui me prometeu e indicou Pois bem que a ti das árvores pelo pomar bemarranjado eu fale as que um dia me deste e eu te pedi cada uma ainda criança seguindote pelo jardim por elas caminhávamos e tu falaste o nome de cada uma 340 Pereiras treze me deste e dez macieiras figueiras quarenta assim filas de videiras nomeaste para me dar cinquenta uma por vez frutificando o ano inteiro ali no alto há uvas de todos os tipos sempre que as estações de Zeus sobre elas pesam de cima 345 Assim falou e os joelhos e o coração dele fraquejaram reconhecendo os sinais seguros que lhe enunciou Odisseu Em torno do caro filho lançou os braços a ele ao desmaiar amparouo o muitatenência divino Odisseu Quando voltou a si e no peito o ânimo se recompôs 350 retomou a palavra e respondeulhe Zeus pai por certo ainda sois deuses no alto Olimpo se de fato os pretendentes pagaram pela iníqua desmedida Agora tenho terrível temor no juízo que logo todos venham para cá os itacenses e mensagens 355 enviem por todo lugar até as cidades dos cefalênios Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Coragem que isso não ocupe teu juízo Mas vamos à casa que fica perto do pomar até lá Telêmaco o vaqueiro e o porcariço 360 enviei para que bem rápido preparassem refeição Após assim falarem dirigiramse à bela casa Eles quando atingiram a casa boa para morar acharam Telêmaco o vaqueiro e o porcariço cortando muita carne e misturando fulgente vinho 365 Nisso ao enérgico Laerte em sua propriedade a serva siciliana lavou e com óleo ungiu e em torno dele bela capa lançou e Atena achegandose inchou os membros do pastor de homens e maior e mais encorpado fêlo para quem olhasse 370 E saiu da banheira o caro filho espantouse com ele quando o viu semelhante a deuses imortais de frente e falando dirigiulhe palavras plumadas Pai deveras a ti um dos deuses sempiternos em aparência e altura fez melhor para quem te olhar 375 A ele então o inteligente Laerte retrucou Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo tal como quando Nérico tomei bemconstruída cidade num cabo do continente regendo os cefalênios que eu assim ontem estando em nossa morada 380 com armas nos ombros tivesse postadome e afastado os varões pretendentes assim teria soltado seus joelhos de muitos no palácio e terias alegradote no íntimo Assim eles disso falavam entre si Após concluírem a tarefa e aprontado o banquete 385 em ordem sentaramse nas cadeiras e poltronas Ali teriam posto a mão no almoço e para perto veio o ancião Finório e junto os filhos desse ancião extenuados pela lida após sair e chamálos a mãe a anciã siciliana que os criou e de Laerte 390 cuidava gentil pois a velhice o capturara Eles ao verem Odisseu e avaliarem no ânimo ficaram parados no salão estuporados Odisseu com palavras amáveis abordandoos disse Ancião senta para o almoço olvidai o assombro 395 há tempo aspirando pôr a mão na comida esperamos no salão sempre vos aguardando Assim falou e Finório foi direto abrindo os braços os dois pegou as mãos de Odisseu pelo punho beijouas e falando dirigiulhe palavras plumadas 400 Amigo já que retornaste a nós desejosos demais e não mais crendo e os próprios deuses te guiaram salve e sê muito feliz e deuses te deem fortuna A mim diz isto a verdade para eu bem saber ou já sabe ao claro a bemajuizada Penélope 405 que tu retornaste aqui ou expeçamos um mensageiro Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Ancião ela já sabe por que carece que disso te ocupes Isso disse e ele de novo sentouse na cadeira bempolida Também os filhos de Finório em volta ao glorioso Odisseu 410 saudaram com palavras apertaramlhe as mãos e em ordem sentaramse ao lado de Finório seu pai Assim em volta do banquete se ocupavam no salão E Rumor o mensageiro rápido percorreu toda a cidade relatando a perdição da hedionda morte dos pretendentes 415 Eles assim que ouviram cada um acorreu de outro lado com queixume e gemido à frente da morada de Odisseu Os corpos cada família retirou da casa e enterrou os de outras cidades a família encarregava pescadores que os levassem para casa pondoos sobre naus velozes 420 E eles à ágora foram em grupo angustiados no coração Então após estarem reunidos todos juntos entre eles Persuasivo levantouse e falou pois por seu filho brutal aflição jazia no peito Antínoo a quem por primeiro matou o divino Odisseu 425 Por ele vertendo lágrimas tomou a palavra e disse Amigos feito inaudito esse varão armou contra aqueus aqueles com naus conduziu muitos e nobres e destruiu as côncavas naus e destruiu toda a tropa estes de longe os melhores cefalênios matou após chegar 430 Pois mexeivos antes que ele rápido alcance Pilos ou a divina Élida onde dominam os epeus vamos ou depois seremos sempre ridicularizados Isto é opróbrio a se noticiar também aos vindouros se não castigarmos aos assassinos dos filhos 435 e irmãos para mim no juízo não seria doce viver mas rápido morreria e aos defuntos me uniria Mas vamos que aqueles não atravessem antes Assim falou chorando e piedade atingiu todos os aqueus E deles achegaramse Médon e o divino cantor 440 vindos do palácio de Odisseu após o sono os deixar e postaramse no meio assombro tomou cada varão Entre eles falou Médon versado no inteligente Ouvime agora itacenses pois Odisseu não sem a ajuda dos deuses imortais armou esses feitos 445 eu próprio vi o deus não mortal que de Odisseu achegouse e a Mentor em tudo se assemelhava E o deus imortal ora aparecia diante de Odisseu encorajandoo ora agitando os pretendentes tremulavaos pela casa e eles caíam uns sobre os outros 450 Assim falou e medo amarelo atingiuos todos Entre eles também falou o ancião o herói Haliterses filho de Buscador o único que via o passado e o futuro Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Ouvi agora de mim itacenses o que vou falar 455 por causa de vossa vileza esses feitos ocorreram não vos persuadi nem Mentor pastor de homens a fazer vossos filhos interromper a loucura eles que feito inaudito fizeram com iniquidade vil devastando as posses e desonrando a esposa 460 de nobre varão afirmavam que nunca retornaria Agora assim ocorra que eu vos persuada do que digo não vamos que a ninguém acometa um mal autoinfligido Assim falou e um grupo se ergueu com grande alarido mais da metade os outros juntos lá mesmo ficaram 465 A uns não agradou o discurso no juízo mas Persuasivo persuadiu outros que logo se apressaram rumo às armas Mas após vestirem o bronze lampejante sobre a pele em conjunto reuniramse diante da espaçosa cidade A eles Persuasivo passou a liderar em sua tolice 470 Pensou que puniria o assassinato do filho mas não iria de novo retornar e lá mesmo alcançaria seu destino E Atena a Zeus filho de Crono dirigiuse Ó nosso pai filho de Crono supremo entre poderosos diga a mim que inquiro o que tua ideia dentro contém 475 Guerra danosa ulterior e combate terrível arranjarás ou imporás amizade entre os dois lados Respondendo disselhe Zeus juntanuvens Minha filha por que isso me perguntas e apuras Vê bem essa ideia não ponderaste tu mesma 480 que deles Odisseu se vingasse ao chegar Faz como quiseres mas digote o que convém Já que aos pretendentes castigou o divino Odisseu que ele após firmarem pacto confiável reine sempre e nós quanto à matança de filhos e irmãos 485 imponhamos o olvido que sejam eles amigáveis entre si como antes e que haja riqueza e paz em abundância Isso disse e instigou Atena que já o ansiava antes e ela partiu tendose lançado dos cumes do Olimpo Após estes apaziguarem o desejo por comida adoçajuízo 490 entre eles tomou a palavra o muitatenência divino Odisseu Alguém deveria sair e ver temo que estejam perto Assim falou e o filho de Finório saiu como pediu postouse na soleira e viu perto todos aqueles De pronto a Odisseu dirigiu palavras plumadas 495 Eles já estão aí perto armemonos bem ligeiro Assim falou e eles apressaramse e vestiram as armas quatro em volta de Odisseu e os seis filhos de Finório Entre eles Laerte e Finório vestiram as armas embora fossem grisalhos guerreiros pelas circunstâncias 500 Mas após sobre a pele vestir o bronze lampejante abriram as portas se foram e chefiava Odisseu E achegouse deles a filha de Zeus Atena semelhante a Mentor no corpo e na voz humana Vendoa alegrouse o muitatenência divino Odisseu 505 e de pronto falou a Telêmaco seu caro filho Telêmaco agora isto entenderás tu mesmo chegando onde os melhores entre os varões combatentes se medem não aviltar a linhagem dos ancestrais que também antes na bravura e virilidade excelemos sobre toda a terra 510 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Verás se quiseres caro pai a mim com esse ânimo não aviltando tua linhagem como dizes Assim falou e Laerte alegrouse e enunciou o discurso Que dia tenho hoje caros deuses Deveras alegrome 515 meu filho e seu filho rivalizam em excelência E parada ao lado disselhe Atena olhosdecoruja Filho de Arquésio mais caro de todos os companheiros tendo rezado à filha olhosdecoruja e a Zeus pai brande e de pronto arremessa a lança sombralonga 520 Isso dito grande potência insuflou Palas Atena Tendo então rezado à grande filha de Zeus brandiu e de pronto arremessou a lança sombralonga e atingiu Persuasivo através do elmo facebrônzea Esse a lança não afastou e o bronze o varou 525 com estrondo caiu e retiniu sua armadura Caíram sobre os da vanguarda Odisseu e o filho ilustre e golpearam com espadas e lanças duascurvas E agora a todos teriam matado e deixado sem retorno se Atena a filha de Zeus portaégide 530 não tivesse com a voz gritado e contido todo o povo Abstendevos da guerra aflitiva itacenses para sem sangue vos separardes bem rápido Assim falou Atena e o amarelo medo dominouos Eles se assustaram das mãos voaram as armas 535 e todas no chão caíram quando a voz da deusa soou e voltaramse para a cidade almejando permanecer vivos E aterrorizante berro deu o muitatenência divino Odisseu e arremeteu após se agachar feito águia voaalto Então o filho de Crono lançou raio fumoso 540 e caiu diante da olhosdecoruja a paiponderoso Então a Odisseu falou Atena olhosdecoruja Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque contémte para com a justa da guerra niveladora que não te tenha raiva o filho de Crono Zeus amplavisão 545 Assim falou Atena e ele obedeceu e alegrouse no ânimo Um pacto para o futuro impôs entre ambas as partes Palas Atena a filha de Zeus portaégide semelhante a Mentor no corpo e na voz humana POSFÁCIO LUIZ ALFREDO GARCIAROZA A Odisseia é a narrativa de um retorno o retorno de Odisseu Ulisses a Ítaca sua terra natal após ter participado do cerco à cidade de Ílion Troia A Ilíada por sua vez é a narrativa das últimas semanas da Guerra de Troia ambas atribuídas ao poeta aedo Homero que teria vivido no século VIII aC Mais do que a narrativa de um retorno a Odisseia é a narrativaretorno ou a narrativa acontecimento do retorno de Odisseu E aqui o acontecimento não é uma experiência vivida por alguém algo percebido ou mesmo sofrido mas algo narrado por alguém algo que se passa no âmbito da fala e não da experiência subjetiva O objeto dessa narrativa acontecimento pode ser real imaginário fictício Ele é para os ouvintes de Homero tão verdadeiro como as sereias que atraem para a morte Odisseu e seus companheiros ou como Aquiles Heitor e o ciclope Polifemo bem como Apolo e Atena deuses protetores dos heróis guerreiros durante os combates Não está em questão se eles existem ou não se são verdadeiros ou fictícios sua realidade consiste em serem narrados pelo poetaaedo Assim a Odisseia não é o relato da longa e atribulada viagem de Odisseu em sua volta ao lar tal como a Ilíada não é o relato da Guerra de Troia Ou seja os dois poemas com seus mais de 27 mil versos não têm valor documental Mesmo porque Homero teria vivido no século VIII aC enquanto a Guerra de Troia teria se dado no século XIII aC Homero não poderia ter sido testemunha dos combates na planície de Troia ou do retorno de Odisseu nem poderia ter se valido do testemunho dos próprios combatentes Os heróis da Guerra de Troia Aquiles Heitor Nestor Menelau Agamêmnon e o próprio Odisseu teriam vivido por volta de 1200 aC Quatro ou cinco séculos separam Homero dos gregos e troianos protagonistas da Ilíada e da Odisseia Acrescentese a isso o fato de a escrita passar a ser usada no mundo grego somente no final do século VIII aC e constatase que Homero e seus heróisguerreiros eram pois analfabetos A escrita chamada Linear B desaparecera juntamente com a destruição e a extinção da civilização micênica no século XI aC Não havia portanto possibilidade de registro escrito ser utilizado por Homero quatro séculos mais tarde ao compor a Odisseia Isso significa que a Odisseia não foi escrita por Homero Essa narrativa era cantada pelo poeta em suas apresentações aos aristoi a aristocracia guerreira da Grécia arcaica Homero era um aedo um portador da palavra poética que com seus cantos remetia os ouvintes aos acontecimentos originais aos gestos dos deuses e dos heróis ao tempo mítico dos começos O próprio passado ao qual ele se referia não era propriamente um passado mas outra dimensão do cosmos outra dimensão do tempo e do espaço à qual somente o aedo com auxílio das Musas tinha acesso Se a Odisseia não foi escrita por Homero mas composta oralmente por ele séculos depois dos supostos eventos por conseguinte Odisseu e sua mulher Penélope assim como seu filho Telêmaco e os demais protagonistas da Odisseia não são propriamente existentes eles existem enquanto narrados cantados por Homero ou se preferirmos existem tanto quanto existiram o aedo cego Demódoco a feiticeira Circe a bela princesa Nausícaa o monstro Cila ou o cão Argos de Odisseu O mesmo raciocínio pode ser aplicado à Ilíada Não há nenhum registro concreto referente a uma guerra que tivesse durado uma década ocorrida no século XIII aC e cujo término teria se dado com o cerco e a tomada de Troia pelos gregos Portanto a longa e minuciosa narrativa de Homero consiste em ser uma narrativa épica e nada mais Ela não remete a uma guerra que teria ocorrido na região de Troia o que não exclui a possibilidade de ter ocorrido um pequeno conflito entre gregos e troianos por volta do século XIII aC A chamada Guerra de Troia com seus heróis Aquiles Heitor Agamêmnon é a Ilíada assim como o retorno de Odisseu para Ítaca é a Odisseia ambos poemas épicos compostos por Homero Levado ao extremo esse raciocínio pode colocar em dúvida a própria existência de Homero Na Grécia arcaica Homero poderia designar tanto um poeta aedo único como um grupo deles Em uma cultura exclusivamente oral os poetas aedos eram a memória viva Cabia a eles cantar em seus poemas o tempo passado o tempo presente e o tempo futuro visto serem os aedos sacralizados pelos deuses e inspirados pelas Musas O aedo não era poeta porque fazia poesia mas fazia poesia porque era poeta vidente profeta sábio Desse modo poderíamos imaginar tanto um grupo de poetas aedos que desde o século XIII aC cantava e transmitia de geração a geração as narrativas lendárias de uma Troia arcaica destruída pelos gregos e do retorno de Odisseu a Ítaca como poderíamos imaginar um indivíduo singular um aedo solitário chamado Homero compondo e narrando cantando pelas cidades da Grécia esses dois poemas Não há historicamente nenhuma prova concreta a favor de uma ou de outra hipótese Dispomos apenas de traços mnêmicos conservados durante séculos pela tradição e que posteriormente foram transcritos da forma oral para a escrita em lascas de madeira papiro pele animal até chegar ao papel e que 23 séculos depois em 1488 foram impressos em Florença Foi no entanto a Homero poeta do século VIII aC que a tradição atribuiu a autoria da Ilíada e da Odisseia O mais surpreendente no entanto é que a argumentação sobre a natureza do objeto da narrativa pode ser aplicada também ao narrador O próprio Homero talvez seja uma criação da Odisseia e da Ilíada Podemos concordar que a tese é improvável mas não impossível No canto 9 da Odisseia Odisseu herói de Homero assume a primeira pessoa e a narrativa épica passa a se dar no interior de uma outra em que o herói da segunda narrativa é o objeto da primeira e Odisseu se torna simultaneamente herói e narrador da mesma forma Demódoco o aedo cego do canto 8 da Odisseia poderia ser o próprio Homero6 Esse desdobramento porém só pode ser feito com a condição de descredenciarmos ou desqualificarmos o estatuto de aedo atribuído ao poeta mestre da verdade da Grécia arcaica o que implicaria a desqualificação da figura do aedo enquanto tal Não estamos discutindo aqui a autoria dos poemas questão inexistente na Grécia arcaica mas defendendo a autenticidade da Odisseia e da Ilíada como poemas em versos hexâmetros compostos no século VIII aC e atribuídos nominalmente a um poeta chamado Homero cuja existência ainda é um enigma a ser decifrado mas cujos poemas épicos são eternos Mesmo quando questionada a autoria da Ilíada e da Odisseia não resta dúvida quanto à autenticidade de ambos os poemas isto porque como assinala Bernard Knox7 a língua de Homero nunca foi falada por ninguém é uma língua artificial uma criação dos próprios versos épicos que passou a ser empregada pelos aedos e mantida por séculos no canto dos poetas pela sua qualidade literária Quanto à existência de Homero e ao fato de ser ele o autor da Odisseia e da Iliada temos que no final do século VIII aC século de Homero a escrita renasce na Grécia Não aquela micênica extinta havia séculos mas uma nova que absorveu palavras e signos de diferentes dialetos da língua falada na Grécia e do alfabeto fenício Com o renascimento da escrita é provável que os escribas eruditos do final do século VIII e começo do VII aC tenham transcrito os poemas cantados narrados por Homero para o papiro e posteriormente para o papel A primeira pergunta que nos ocorre é quem ditou os poemas para os escribas O próprio Homero Alguém além dele saberia de cor os 27 109 versos que compõem a Odisseia e a Ilíada Se não foi ele quem teria sido A quem Homero confiaria o que hoje em dia chamaríamos de seu projeto editorial A segunda pergunta é mais delicada Se nem mesmo Homero sabia cada verso da Ilíada e da Odisseia já que o poeta aedo não decorava fiel e integralmente o poema ele fazia uso de um estoque de versos fórmulas estas sim decoradas a partir dos quais recompunha o poema ele improvisava em cima de uma estrutura decorada de modo que a cada apresentação do poeta aedo uma nova Ilíada e uma nova Odisseia eram cantadas narradas então qual Odisseia foi ditada para os escribas A mais próxima da original Mas qual original Se tanto a Odisseia como a Ilíada eram textos orais compostos para serem ouvidos e não para serem lidos como apontar o texto oral original Não há nem nunca houve Odisseia original a primeira Odisseia A Odisseia legítima é aquela cantada pelo aedo inspirado pelas Musas para a escuta dos aristoi Não resta dúvida quanto ao fato de a Odisseia ser posterior à Ilíada Há passagens na Odisseia que remetem a acontecimentos da Ilíada ao passo que o contrário não ocorre É o caso do episódio do cavalo de Troia que não é mencionado na própria Ilíada e recebe uma referência breve e incompleta no canto 4 da Odisseia apesar de ser o ardil inventado por Odisseu para ultrapassar as muralhas de Troia A dúvida algumas vezes levantada é se os dois poemas foram criações do mesmo poeta A Ilíada canta as façanhas do heróiguerreiro principalmente a fúria desmedida de Aquiles contra Heitor e o seu ressentimento desmedido contra Agamêmnon a Odisseia por sua vez é o poema das aventuras e desventuras de Odisseu em seu retorno a Ítaca e aos braços de Penélope No entanto a disparidade de tema e de ênfase não sugere diferentes poetas aedos a qualidade literária a harmonia dos versos hexâmetros está presente em ambos Até mesmo o canto 22 apontado por alguns críticos como a parte da Odisseia que pelo conteúdo destoaria do conjunto do poema como se tivesse sido composto por outro aedo pode ser tomado como o Homero da Odisseia buscando no Homero da Ilíada a fúria insana de Aquiles para compor a sequência de cenas finais do retorno de Odisseu Final digno do maior poema épico do Ocidente Resta ainda a lenda segundo a qual Homero era cego Analfabeto e cego Soam excessivas duas características tão restritivas atribuídas ao homem que criou os dois poemas seminais da literatura que até hoje alimentam não somente a ela mas também as artes cênicas e o imaginário do homem ocidental Como isso seria possível A resposta pode ser que esse homem não era deficiente mas privilegiado O poeta aedo da Grécia arcaica não era uma pessoa comum tampouco um aristoi ele se apresentava como portador de um dom divino o de ser inspirado pelas Musas A primeira frase da Odisseia é Do varão me narra Musa do muitasvias que muito vagou após devastar a sacra cidade de Troia Quem é esse me da frase senão o aedo que cantava o poema e pedia a inspiração da Musa isto é o próprio Homero Seja quem for que tenha sido Homero resta pouca dúvida quanto ao fato de os dois poemas serem obra de um mesmo poeta É praticamente impossível que duas pessoas ainda que dois aedos tenham composto ao mesmo tempo os versos hexâmetros dactílicos de que são feitos os dois poemas Também é pouco admissível que o segundo poema Odisseia tenha sido criado em data posterior sobre o modelo do primeiro Ilíada escrito por um poeta laico isto é não aedo O dom do aedo não podia ser mantido nem transmitido no ou pelo texto escrito O canto do aedo é a palavra sacralizada pelas divindades Apolo e Mnemosyne Cada Odisseia legítima é uma repetição diferencial Um acontecimento único Não há um modelo e suas cópias cada cópia é um novo canto cantado pelo poeta inspirado Pela mesma razão o poema não pode ser ouvido por uma pessoa comum e repetido por ela para outros ouvintes A palavra do poeta não era uma moeda que pudesse ser passada adiante por quem a recebesse a não ser que esse alguém fosse outro aedo O próprio ato da escuta se tornava sacralizado quando se tratava da escuta do canto do aedo Sem dúvida essa magia que unia a narrativa e a escuta num mesmo acontecimento sacralizado pelas Musas foi perdida ao ser transcrito o poema Aquilo que era a narrativa do poeta aedo deixou de ser um acontecimento para se transformar em documento escrito ainda que ditado pelo poeta o que era poesia sagrada tornouse poesia laica podendo ser copiada e multiplicada ao infinito Apesar da perda da sacralidade a Odisseia permanece passados quase 3 mil anos o maior poema épico da literatura ocidental 6 Cf Frederico Lourenço Prefácio in Homero Odisseia trad Frederico Lourenço São Paulo Penguin Classics Companhia das Letras 2011 p 101 7 Cf Bernard Knox Introdução ibid p 19 O SILÊNCIO DAS SEREIAS FRANZ KAFKA Comprovação de que mesmo meios insuficientes e até infantis podem servir à salvação A fim de se proteger das sereias Odisseu entupiu de cera os ouvidos e mandou que o acorrentassem com firmeza ao mastro É claro que desde sempre todos os viajantes teriam podido fazer algo assim a não ser aqueles aos quais as sereias atraíam já desde muito longe mas o mundo inteiro sabia que de nada adiantava O canto das sereias impregnava tudo que dirá um punhado de cera e a paixão dos seduzidos teria arrebentado muito mais que correntes e mastro Nisso porém Odisseu nem pensava embora talvez já tivesse ouvido falar a respeito confiava plenamente no punhado de cera e no feixe de correntes e munido de inocente alegria com os meiozinhos de que dispunha partiu ao encontro das sereias As sereias contudo possuem uma arma ainda mais terrível que seu canto seu silêncio É certo que nunca aconteceu mas seria talvez concebível que alguém tivesse se salvado de seu canto de sua mudez jamais O sentimento de têlas vencido com as próprias forças a avassaladora arrogância daí resultante nada neste mundo é capaz de conter E de fato as poderosas cantoras não cantaram quando Odisseu chegou fosse porque acreditassem que só o silêncio podia com aquele oponente ou porque a visão da bem aventurança no rosto dele que não pensava senão em cera e correntes as tivesse feito esquecer todo o canto Odisseu porém não ouviu seu silêncio por assim dizer acreditou que cantassem e que só ele estivesse a salvo de ouvilas com um olhar fugaz observou primeiro o movimento de seus pescoços o respirar fundo os olhos cheios de lágrimas a boca semiaberta e acreditou que fizessem parte das árias soando inaudíveis a seu redor Mas logo tudo isso resvalou por seus olhos voltados para o longe as sereias verdadeiramente desapareceram e justo quando estava mais próximo delas ele já nem mais sabia de sua existência Elas por sua vez mais belas que nunca esticavamse e giravam o corpo deixando os cabelos horripilantes soprar livres ao vento e alongando as garras na rocha não queriam mais seduzir mas somente apanhar ainda pelo máximo de tempo possível o brilho que refletia dos grandes olhos de Odisseu Se as sereias tivessem consciência teriam sido aniquiladas então mas permaneceram Apenas Odisseu escapoulhes Dessa história aliás relatase ainda um complemento Dizse que Odisseu era tão astuto uma tal raposa que nem mesmo a deusa do destino logrou penetrar em seu íntimo embora isto já não seja compreensível à razão humana talvez ele tenha de fato percebido que as sereias estavam mudas tendo então de certo modo contraposto a elas e aos deuses toda a simulação acima tão somente como um escudo 1917 TRADUÇÃO Sergio Tellaroli ÍTACA KONSTANTINOS KAVÁFIS Se partires um dia rumo a Ítaca faz votos de que o caminho seja longo repleto de aventuras repleto de saber Nem Lestrigões nem os Ciclopes nem o colérico Posídon te intimidem eles no teu caminho jamais encontrarás se altivo for teu pensamento se sutil emoção teu corpo e teu espírito tocar Nem Lestrigões nem os Ciclopes nem o bravio Posídon hás de ver se tu mesmo não os levares dentro da alma se tua alma não os puser diante de ti Faz votos de que o caminho seja longo Numerosas serão as manhãs de verão nas quais com que prazer com que alegria tu hás de entrar pela primeira vez um porto para correr as lojas dos fenícios e belas mercancias adquirir madrepérolas corais âmbares ébanos e perfumes sensuais de toda a espécie quanto houver de aromas deleitosos A muitas cidades do Egito peregrina para aprender para aprender dos doutos Tem todo o tempo Ítaca na mente Estás predestinado a ali chegar Mas não apresses a viagem nunca Melhor muitos anos levares de jornada e fundeares na ilha velho enfim rico de quanto ganhaste no caminho sem esperar riquezas que Ítaca te desse Uma bela viagem deute Ítaca Sem ela não te ponhas a caminho Mais do que isso não lhe cumpre darte Ítaca não te iludiu se a achas pobre Tu te tornaste sábio um homem de experiência e agora sabes o que significam Ítacas 1911 TRADUÇÃO José Paulo Paes GLOSSÁRIO DE NOMES PRÓPRIOS Para a tradução dos nomes e a composição deste glossário cf Da tradução no início deste volume foram utilizados diversos livros que constam na bibliografia especialmente Snell et al 19552010 Frame 2009 e Finkelberg 2011 Na primeira parte as entradas se referem aos nomes utilizados na tradução com seus equivalentes mais conhecidos na segunda a lista é invertida informando os nomes próprios aqui utilizados a partir dos mais conhecidos em geral o nome grego vernaculizado Nessa segunda parte em algumas entradas proponho uma tradução para o nome em outras uma paráfrase Quando há divergências entre os eruditos acerca do sentido de um nome optei por informar apenas os mais aceitos Não são todos os nomes próprios da Odisseia que constam a seguir apenas os mais significativos para o poema e ou os que ilustram a atmosfera do gênero épico além de algumas das personagens centrais com nomes cristalizados no imaginário ocidental Primeira parte Nomes próprios traduzidos ABRASADOR Áiton AÇODADO Ormeno ADIVINHOSO Mântio ALTIVA Iftima AMPLOMAR Euríalo APRESADOR Équeto AURORA Éos AUXILIADOR Boetoo BARQUEIRO Nauteu BORREGOSO Arnaio BRANCADEUSA Leucoteia BRAVO Alcimo BRILHO Lampo BRILHOSA Lampetia BUSCADOR Mastor CAMINHEIRO Múlio CARPINTEIRO Técton CAVALEIRO Hipotes CERCOMAR Anfíalo CHUMBODANAU Naubolo CIDADÃO Polites CODORNA Ortígia CORVO Córax DEFENSOR Alector DOMADOR Damastor DOMAPOVO Laodamas DOMINATOR Dmétor DONODENAU Equeneu DOPÁTIO Messáulio EMBARQUENAU Anabesineu FINÓRIO Dólio FORTIFICANTE Euenor GLORIOSO Climeno GRAÇA Cárite GRANDAFLIÇÃO Megapentes ILUSÓRIO Elpenor ILUSTRE Cleito JUVENTUDE Hebe LATIDOR Hílax LUZIDIA Faetussa LUZIDIO Faêton LÚZIO Fáidimo MARINHEIRO Ponteu MARINHO Hálio MENTENOMAR Pontônoo MUIDIVINA Anfitee MUITANAU Polineu MUITAPOSSE Polipêmon MUITOSDOMA Polidamna NÃOPOUPA Afidas NAUGLORIOSO Clitoneu NAUVELOZ Nausítoo OLHOVÍNEO Oinops PASSOLARGO Euríbates PEDINTE Dectes PERSUADIDOR Pisenor PERSUASIVO Eupeites PONDERADO Noêmon POPEIRO Primneu PRETA Melantó PRETO Melanteu Melântio nomes intercambiáveis PROEIRO Proreu PRUDENTE Frônio REMADOR Elatreu REMEIRO Eretmeu RICOSO Ctésio ROMPEDOR Rexenor RUMOR Ossa SALVADOR Fêidon SEGURO Asfalíon SELETO Epérito SISO Equéfron SOL Hélio TOCAIOSO Orstíloco TOPODANAU Acroneu TROPOSO Estratio VELOCISTA Tôon VELOSNOMAR Ocíalo VERÍDICO Eteoneu VOZ Óps Segunda parte Nomes próprios conhecidos ACRONEU Topodanau AFIDAS Nãopoupa AGELAU o que conduz o exército ÁITON Abrasador ALCIMO Bravo ALCÍNOO aquele que leva para casa com sua força ALCMAION destemido ALECTOR Defensor ANABESINEU Embarquenau ANFÍALO Cercomar ANFIARAU mui sacro ANFÍLOCO que arma uma tocaia em torno ANFIMÉDON o que protege em torno ANFITEE Muidivina ANQUÍALO que está perto do mar ANTICLEIA oposta à fama ou com fama correspondente ANTICLO o que vai contra a glória de outrem ANTÍFATES golpeador ANTÍNOO o que tem uma mente contrária ou o que é contra o retorno ARETE rogada ARETO rogado ARNAIO Borregoso ASFALÍON Seguro AUTÓLICO o próprio lobo ou um verdadeiro lobo BOETOO Auxiliador CALIPSO ocultadora CARÍBDIS o poeta mesmo faz a sua etimologia ao escolher um verbo que sonoramente remete ao nome e foi traduzido por deglutir 12 104 CÁRITE Graça CASTOR o animal ou superador CILA o próprio poeta explica o nome ao mencionar que faz um som como o latido de um filhote de cão termo que remete em grego a Cila 12 85 CLEITO Ilustre CLIMENE gloriosa CLIMENO Glorioso CLITONEU Nauglorioso CLÓRIS lívida CÓRAX Corvo CTÉSIO Ricoso DAMASTOR Domador DECTES Pedinte DEMÓDOCO recebido pelo povo DMÉTOR Dominator DÓLIO Finório EGÍPCIO muito provavelmente o nome está ligado ao Egito EIDOTEA que tem aparência divina ELATREU Remador ELPENOR Ilusório seu nome vem de elpis expectativa equivocada ÉOS Aurora EPÉRITO Seleto EQUÉFRON Siso EQUENEU Donodenau ÉQUETO Apresador ERETMEU Remeiro ESTRATIO Troposo ETEONEU Verídico EUANTES vicejante EUENOR Fortificante EUMEU o que vai atrás do bem EUPEITES Persuasivo EURÍALO Amplomar EURÍBATES Passolargo EURICLEIA que tem ampla fama EURIDAMAS amplojugo EURÍLOCO que realiza ampla tocaia EURÍMACO que realiza amplo combate EURIMÉDON que tem amplo domínio EURIMÉDUSSA equivalente feminino de Eurimédon EURÍNOME aquela que tem amplo comando EURÍNOMO equivalente masculino de Eurínome FAÊTON Luzidio FAETUSSA Luzidia FÁIDIMO Lúzio FÊIDON Salvador FÊMIO famoso ou que torna famoso FRÔNIO Prudente FRÔNTIS zelo HÁLIO Marinho HALITERSES talvez corajoso no mar HARPIA redemoinho HEBE Juventude HÉLIO Sol HÍLAX Latidor HIPOTES Cavaleiro IFTIMA Altiva LAMPETIA Brilhosa LAMPO Brilho LAODAMAS Domapovo LEUCOTEIA Brancadeusa MAIRA cintilante MÂNTIO Adivinhoso MASTOR Buscador MEGAPENTES Grandaflição MELANTEU MELÂNTIO nomes intercambiáveis Preto MELANTÓ Preta MENTES possante MENTOR potente ou conselheiro MESSÁULIO Dopátio MÚLIO Caminheiro NAUBOLO Chumbodanau NAUSÍTOO Nauveloz NAUTEU Barqueiro NELEU talvez impiedoso tendo em vista a história na qual a personagem aparece NESTOR seu nome está ligado a retorno e mente espírito NOÊMON Ponderado OCÍALO Veloznomar ODISSEU a etimologia é desconhecida mas o poema joga com algumas potencialidades sobretudo ser objeto de ódio OINOPS Olhovíneo ONETOR fomentador ÓPS Voz ORMENO Açodado ORSTÍLOCO Tocaioso OSSA Rumor ORTÍGIA Codorna PEIRÍTOO mui veloz PENÉLOPE etimologicamente a derivação mais provável é de penelops um tipo de ave dágua PISANDRO persuade varão PISENOR Persuadidor PISÍSTRATO persuade exército POLIDAMNA o que a muitos domina POLIFEIDES poupa muitos POLIFEMO ligado a fama POLINEU Muitanau POLIPÊMON Muitaposse POLITERSES mui corajoso POLITES Cidadão PONTEU Marinheiro PONTÔNOO Mentenomar PRIMNEU Popeiro PROREU Proeiro REXENOR Rompedor TÉCTON Carpinteiro TÊMIS regraou norma TEOCLÍMENO conhecido dos deuses ou que ouve algo dos deuses TÉRPIO que produz deleite TOAS provável relação com veloz e correr que mesmo se não for etimológica pode ser derivado de um adjetivo étnico é sonora TÔON Velocista BIBLIOGRAFIA Outras edições ALLEN T W 191719 Homeri Opera v 34 2ª ed Oxford Oxford University Press MÜHL Peter von der 1984 Homeri Odyssea 3ª ed Leipzig Teubner SCHADEWALDT Wolfgang 2007 Homer Die Odyssee Tradução Düsseldorf Artemis Winkler THIEL Helmut van 1991 Homerii Odyssea Hildesheim Olms Obras de referência e comentários AMEIS K F C HENTZE P CAUER 1920 Homers Odyssee Für den Schulgebrauch erklärt Leipzig Teubner BOWIE A M 2013 Homer Odyssey Books XIII and XIV Cambridge Cambridge University Press CHANTRAINE Pierre 194853 Grammaire homérique 2 v Paris Klincksieck GARVIE A F 1994 Homer Odyssey Books VIVIII Cambridge Cambridge University Press HEUBECK Alfred et al 198892 A Commentary on Homers Odyssey Oxford Oxford University Press LATACZ Joachim Anton BIERL orgs 2000 Homers Ilias Gesamtkommentar Berlim De Gruyter RUTHERFORD R B 1992 Homer Odyssey Books XIX and XX Cambridge Cambridge University Press SNELL Bruno et al 19552010 Lexikon des frühgriechischen Epos Göttingen Vandenhoeck Ruprecht STANFORD William B 1965 The Odyssey of Homer 2 vols Londres Macmillan STEINER Deborah 2010 Homer Odyssey Books XVII and XVIII Cambridge Cambridge University Press Estudos ALLAN William 2006 Divine Justice and Cosmic Order in Early Greek Epic The Journal of Hellenic Studies v 126 pp 135 ASSUNÇÃO Teodoro R 2003 Ulisses e Aquiles repensando a morte Odisseia XI 47891 Kriterion v 107 pp 100 09 200304 Nota sobre o gastér funesto e ultracão na Odisseia Kléos Revista de Filosofia Antiga v 78 pp 5569 2009 Nourritures dans lOdyssée Fruits légumes et les oies de Pénélope Nuntius antiquus v 4 pp 16280 AUERBACH Erich 1976 A cicatriz de Ulisses in Mimesis A representação da realidade na literatura ocidental trad George Bernard Sperber2ª ed São Paulo Perspectiva AUSTIN Norman 1975 Archery at the Dark of the Moon Berkeley University of California Press BAKKER Egbert J 1997 Poetry in Speech Orality and Homeric Discourse Ithaca Cornell University Press 2005 Pointing to the Past From Formula to Performance in Homeric Poetics Washington DC Center for Hellenic Studies 2013 The Meaning of Meat and the Structure of the Odyssey Cambridge Cambridge BAKKER Egbert J Ahuvia KAHANE 1997 Written Voices Spoken Signs Tradition Performance and the Epic Text Washington DC Center for Hellenic Studies BERGREN Ann 2008 Weaving Truth Essays on Language an the Female in Greek Thought Washington DC Center for Hellenic Studies BESSLICH Siegfried 1966 Schweigen Verschweigen Übergehen Die Darstellung des Unausgesprochenen in der Odyssee Heidelberg Carl Winter BONIFAZI Anna 2009 Inquiring into Nostos and its Cognates American Journal of Philology v 130 pp 481 510 2012 Homers Versicolored Fabric Washington DC Center for Hellenic Studies BUTTI DE LIMA Paulo 2003 A prosa de Homero Phaos v 3 pp 5376 CAIRNS Douglas L 1993 Aidôs The Psychology and Ethics of Honour and Shame in Ancient Greek Literature Oxford Oxford University Press CALVINO Italo 1993 As odisseias na Odisseia in Por que ler os clássicos trad Nilson Moulin São Paulo Companhia das Letras CLAY Jenny S 1997 The Wrath of Athena Gods and Men in the Odyssey Lanham Rowman Littlefield CLAYTON Barbara 2004 A Penelopean Poetics Reweaving the Feminine in Homers Odyssey Lanham Lexington COHEN Beth org 1995 Distaff Side Representing the Female in Homers Odyssey Oxford Oxford University Press COOK Erwin F 1995 The Odyssey in Athens Myths of Cultural Origin Ithaca Cornell University Press CROTTY Kevin 1994 The Poetics of Supplication Homers Iliad and Odyssey Ithaca Cornell University Press DETIENNE Marcel JeanPierre VERNANT 1989 Les Ruses de lintelligence La Métis des grecs Paris Flammarion ed bras Métis As astúcias da inteligência trad Filomena Hirata São Paulo Odysseus 2008 DOHERTY Lillian E 1995 Siren Songs Gender Audiences and Narrators in the Odyssey Ann Arbor University of Michigan Press 2009 org Oxford Readings in Classical Studies Homers Odyssey Oxford Oxford University Press DOUGHERTY Carol 2001 The Raft of Odysseus The Ethnographic Imagination of Homers Odyssey Oxford Oxford University Press DUARTE Adriane da S 2001 As relações entre retorno e glória na Odisseia Letras clássicas n 5 pp 8998 2012 Cenas de reconhecimento na poesia grega Campinas Editora da Unicamp EDWARDS Anthony T 1985 Achilles in the Odyssey Königstein Hain ERBSE Hartmut 1972 Beiträge zum Verständnis der Odyssee Berlim De Gruyter FELSON Nancy 1997 Regarding Penelope From Courtship to Poetics Norman Londres University of Oklahoma Press FENIK Bernard 1974 Studies in the Odyssey Wiesbaden Franz Steiner FINKELBERG M org 2011 The Homer encyclopedia 3 v Malden WileyBlackwell FOLEY John M 1985 Oralformulaic Theory and Research An Introduction and Annotated Bibliography Nova York Garland Publishing 1991 Immanent Art From Structure to Meaning in Traditional Oral Epic Bloomington Indiana University Press 1993 Traditional Oral Epic The Odyssey Beowulf and the SerboCroatian Return Song Berkeley University of California Press 1999 Homers Traditional Art University Park Pennsylvania State University Press 2005 org A Companion to Ancient Epic Oxford Blackwell FORD Andrew 1992 Homer The Poetry of the Past Ithaca Cornell University Press FRAME Douglas 2009 Hippota Nestor Washington DC Center for Hellenic Studies GOLDHILL Simon 1991 The Poets Voice Essays on Poetics and Greek Literature Cambridge Cambridge University Press GRAZIOSI Barbara 2002 Inventing Homer The Early Reception of Epic Cambridge Cambridge University Press GRAZIOSI Barbara Emily GREENWOOD orgs 2007 Homer in the Twentieth Century Between World Literature and the Western Canon Oxford Oxford University Press GRAZIOSI Barbara Johannes HAUBOLD 2005 Homer The Resonance of Epic Londres Duckworth HALL Edith 2008 The Return of Ulysses A Cultural History of Homers Odyssey Baltimore Johns Hopkins University Press HALLIWELL Stephen 2011 Between Ecstasy and Truth Interpretations of Greek Poetics from Homer to Longinus Oxford Oxford University Press HAUBOLD Johannes 2000 Homers People Epic Poetry and Social Formation Cambridge Cambridge University Press DE JONG Irene J F 1999 org Homer Critical Assessments Londres Routledge 2001 A Narratological Commentary on the Odyssey Cambridge Cambridge University Press KAHANE Ahuvia 2005 Diachronic Dialogues Authority and Continuity in Homer and the Homeric Tradition Lanham Rowman Littlefield KATZ Marilyn A 1991 Penelopes Renown Meaning and Indeterminacy in the Odyssey Princeton Princeton University Press KELLY Adrian 2008 Performance and Rivalry Homer Odysseus and Hesiod in M Revermann P Wilson org Performance Iconography Reception Studies in Honour of Oliver Taplin Oxford Oxford University Press LEDBETTER Grace M 2003 Poetics Before Plato Interpretation and Authority in Early Greek Theories of Poetry Princeton Princeton University Press LEVANIOUK Olga A 2011 Eve of the Festival Making Myth in Odyssey 19 Washington DC Center for Hellenic Studies LORD Albert B 1960 The Singer of Tales CambridgeMA Harvard University Press LOUDEN Bruce 1999 The Odyssey Structure Narration and Meaning Baltimore Johns Hopkins University Press LOWE N J 2000 The Classical Plot and the Invention of Western Narrative Cambridge Cambridge University Press MALTA André 2012a Homero múltiplo São Paulo Edusp 2012b Penélope e a arte da indecisão na Odisseia Nuntius antiquus v 8 pp 728 MARKS Jim 2008 Zeus in the Odyssey Washington DC Center for Hellenic Studies MARTIN Richard P 1984 Hesiod Odysseus and the Instruction of Princes Transactions and Proceedings of the American Philological Association v 114 pp 2948 1993 Telemachus and the Last Hero Song Colby Quarterly v 29 pp 22240 MINCHIN Elizabeth 2001 Homer and the Resources of Memory Somme Applications of Cognitive Theory to the Iliad and the Odyssey Oxford Oxford University Press MONTANARI Franco org 2002 Omero tremila anni dopo Roma Edizioni di Storia e Letteratura MORRIS Ian Barry POWELL orgs 1997 A New Companion to Homer Leiden Brill MOST Glenn W 1989 The Structure and Function of Odysseus Apologoi Transactions and Proceedings of the American Philological Association v 119 pp 1530 MOULTON Carroll 1977 Similes in the Homeric Poems Göttingen Vandenhoeck Ruprecht NAGY Gregory 1974 Comparative Studies in Greek and Indic Meter Cambridge MA Harvard University Press 1990 Greek Mythology and Poetics Ithaca Cornell University Press 1999 The Best of the Achaeans Concepts of the Hero in Archaic Greek Poetry 2ª ed Baltimore Johns Hopkins University Press 2002 Platos Rhapsody and Homers Music The Poetics of the Panathenaic Festival in Classical Athens Cambridge MA Atenas Center of Hellenic Studies 2010 Homer the Preclassic Berkeley Los Angeles Londres University of California Press 2012 Signs of Hero Cult in Homeric Poetry in F Montanari A Rengakos C Tsagalis orgs Homeric Contexts Neoanalysis and the Interpretation of Oral Poetry Trends in Classics Supplementary Volumes 12 Berlim De Gruyter pp 2774 OLSON S Douglas 1995 Blood and Iron Stories and Storytelling in Homers Odyssey Leiden Brill PAPADOPOULOUBELMEHDI Ioanna 1994 Le Chant de Pénélope Poétique du tissage féminin dans lOdyssée Paris Belin PARRY Milman 1971 The Making of Homeric Verse The Collected Papers of Milman Parry Oxford Oxford University Press PELLICIA Hayden 1995 Mind Body and Speech in Homer and Pindar Göttingen Vandenhoeck Ruprecht PEPONI AnastasiaErasmia 2012 Frontiers of Pleasure Models of Aesthetic Response in Archaic and Classical Greek Thought Oxford Oxford University Press PERADOTTO John 1990 Man in the Middle Voice Name and Narrative in the Odyssey Princeton Princeton University Press PRATT Louise H 1993 Lying and Poetry from Homer to Pindar Falsehood and Deception in Archaic Greek Poetics Ann Arbor University of Michigan Press PUCCI Pietro 1995 Odysseus Polutropos Intertextual Readings in the Odyssey and the Iliad Ithaca Cornell University Press 1998 The Song of the Sirens Essays on Homer Lanham Rowman Littlefield REYNOLDS Dwight 1995 Heroic Poets Poetic Heroes the Etnography of Performance in an Arabic Oral Epic Tradition Ithaca NY Cornell University Press RICHARDSON Scott D 1990 The Homeric Narrator Nashville Vanderbilt University Press ROOD Naomi J 2006 Implied Vengeance in the Simile of Grieving Vultures Odyssey 16 21619 Classical Quarterly v 56 pp 111 RÖSLER Wolfgang 1980 Die Entdeckung der Fiktionalität in der Antike Poetica 12 pp 283319 RÜTER Klaus 1969 Odysseeinterpretationen Untersuchungen zum ersten Buch und zur Phaiakis Göttingen Vandenhoeck Ruprecht SAÏD Suzanne 1979 Les crimes des prétendants la maison dUlysse et les festins de l Odyssée in S Saïd F Desbordes J Bouffartigue A Moreau eds Études de littérature ancienne Paris Presses de lÉcole Normale Supérieure SCHEIN Seth L org 1996 Reading the Odyssey Selected Interpretive Essays Princeton Princeton University Press SCODEL Ruth 2002 Listening to Homer Tradition Narrative and Audience Ann Arbor University of Michigan Press SEAFORD Richard 1994 Reciprocity and Ritual Homer and Tragedy in the Developing CityState Oxford Oxford University Press SEGAL Charles 1994 Singers Heroes and Gods in the Odyssey Ithaca Cornell University Press THALMANN William G 1984 Conventions of Form and Thought in Early Greek Epic Baltimore Johns Hopkins University Press 1998 The Swineherd and the Bow Representations of Class in the Odyssey Ithaca Londres Cornell University Press VAN DER VALK Marchinus H A L H 1949 Textual Criticism of the Odyssey Leiden Sijthoff WERNER Christian 2001 A ambiguidade do kleos na Odisseia Letras clássicas v 5 pp 99108 2005a Os limites da autoridade de Odisseu na Odisseia Calíope v 13 pp 929 2005b A liberdade restrita do aedo homérico Línguas Letras v 6 pp 17182 2009 Reputação e presságio na assembleia homérica Poluphemos em Odisseia 2 150 PhaoS v 9 pp 2952 2010 A deusa compõe um mito O jovem Odisseu em busca de veneno Odisseia 1 25568 Nuntius Antiquus v 6 pp 727 2011 O mito do retorno dos heróis de Troia e as funções narrativas dos presságios na Odisseia de Homero História imagem e narrativas n 12 pp 123 2012 Afamada estória Famigerado Primeiras estórias e o canto IX da Odisseia Nuntius Antiquus v 8 n 1 pp 2950 PDF 2013 A presença do ausente e a performance do kleos no canto I da Odisseia in R Brose et al orgs Oralidade escrita e performance na antiguidade Fortaleza Expressão Gráfica Editora WEST Martin L 1997 The East Face of Helicon West Asiatic Elements in Greek Poetry and Myth Oxford Oxford University Press ZERBA Michelle 2009 What Penelope Knew Doubt and Scepticism in the Odyssey Classical Quarterly v 59 pp 29531 SOBRE OS AUTORES HOMERO Poeta ao qual se atribuíram os poemas épicos Ilíada e Odisseia É pouco provável que um poeta com esse nome tenha existido e não é mais possível reconstruir com um mínimo de precisão o processo pelo qual entre os séculos VIII e VI aC o texto dos poemas adquiriu a forma na qual hoje são lidos Uma das razões é que quase nada sabemos acerca do uso da escrita na Grécia no século VIII aC nem por que nem quando alguém teve a ideia de escrever um poema já que performances poéticomusicais faziam parte do cotidiano grego ou seja ainda no século V aC esse era o modo principal de recepção de uma composição poética Por muito tempo a poesia oral épica era composta no momento mesmo de sua apresentação Muitos estudiosos modernos creem que um poeta muito bom tenha desenvolvido com o uso da escrita um poema monumental a Ilíada e que quando se apresentava diante do público deixava de improvisar episódios individuais da tradição heroica grega e declamava trechos do poema que passou a ser conhecido em toda a Grécia Se isso for verdade e disso nunca teremos certeza então também é provável que um outro poeta teria composto um segundo poema monumental a Odisseia tentando sobrepujar o autor da Ilíada Fato é que ainda no século VI aC Homero na Grécia era o nome associado a um gênero poético o épico e a ele também eram atribuídos outros poemas Somente no século V aC a Ilíada e a Odisseia adquiriram em Atenas um estatuto canônico tal que todo poema épico posterior passou a ser medido em relação a eles ou a emulálos Não à toa várias cidades gregas disputaram desde cedo a honra de ter sido a terra natal do bardo Outra história que se conta sobre ele é que era cego assim como seu confrade Demódoco personagem da Odisseia Para tornar vivo o passado heroico o poeta se abençoado pelas Musas não precisaria ter visto nada do que conta Dizer que Homero era cego é apontar para características da própria tradição épica CHRISTIAN WERNER Nascido em Santa Cruz do Sul RS em 1970 é professor livredocente de língua e literatura grega na Universidade de São Paulo Publicou traduções de Eurípides Duas tragédias gregas Hécuba e Troianas Martins Fontes 2005 e Hesíodo Teogonia e Trabalhos e dias Hedra 2013 Autor de inúmeros artigos e capítulos de livro sobre literatura grega sobretudo a poesia épica e trágica é um dos líderes do grupo de pesquisa Gêneros Poéticos na Grécia Antiga Tradição e Contexto Também tem se dedicado a investigar a recepção de Homero na prosa de João Guimarães Rosa AGRADECIMENTOS A tradução da Odisseia teve uma longa gestação o que espero lhe ter sido benéfica Parte substancial do trabalho foi realizada com um auxílio à pesquisa da Fapesp entre 2007 e 2008 agradeço não apenas à instituição mas também ao parecerista anônimo que comentou a tradução Amigos e colegas contribuíram de modos diversos e preciosos Adriane Duarte Robert de Brose Filomena Hirata Maria Beatriz Florenzano Teodoro R Assunção Jaa Torrano André Malta Campos Pedro Paulo Funari Lucia Sano Jacyntho L Brandão Zélia de Almeida Cardoso Mary Lafer Caroline Evangelista Lopes Alisson A de Araújo Leonardo Vieira e Júlio de Figueiredo Lopes Rego Um agradecimento especial a Tania Bueno de Paula e à direção e equipe da Biblioteca Florestan Fernandes o coração da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo cujo trabalho permite que o meu aconteça Por fim é um privilégio ter esta tradução publicada pela Cosac Naify agradeço a Augusto Massi o primeiro a se interessar por ela e a sua acolhida posterior por Cassiano Elek Machado Milton Ohata e Florencia Ferrari A tradução não teria alcançado a forma presente sem o zelo e a inteligência de Mariana Delfini e sobretudo Maria Emília Bender para quem vão as palavras do rei Alcínoo Tua é a formosura das palavras em ti tens juízo distinto e contaste a história hábil como um cantor Dedico a tradução a Erika Werner pelo amor paciência e companheirismo CRÉDITOS A apresentação de Richard P Martin foi originalmente publicada em The Odyssey tradução para o inglês de Edward McCrorie e aqui traduzida com a permissão de Johns Hopkins University Press 2004 Johns Hopkins University Press O silêncio das sereias foi escrito em 23 de outubro de 1917 publicado em Beim Bau der chinesischen Mauer und andere Schriften aus dem Nachlaß in der Fassung der Handschrift Frankfurt am Main Fischer 1994 Ítaca foi escrito em 1911 e integra o livro Poemas Seleção estudo crítico notas e tradução de José Paulo Paes Rio de Janeiro José Olympio 2006 A editora agradece a Sergio Telarolli por ceder gentilmente a tradução de O silêncio das sereias de Franz Kafka e a Dora Paes e a Editora José Olympio pela tradução de Ítaca de Konstantinos Kaváfis Cosac Naify 2014 ebook 2014 Colagens ODIRES MLÁSZHO Coordenação editorial MARIA EMÍLIA BENDER Assistente editorial ELOAH PINA Preparação MARIANA DELFINI Revisão THIAGO LINS CLÁUDIA CANTARIN Projeto gráfico original ELAINE RAMOS GABRIELA CASTRO Adaptação e coordenação digital ANTONIO HERMIDA Produção de ePub JOANA DE CONTI 1ª edição eletrônica 2014 Nesta edição respeitouse o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa Dados Internacionais de Catalogação na Publicação CIP Câmara Brasileira do Livro SP Brasil Odisseia Homero Tradução e introdução Christian Werner São Paulo Cosac Naify 2014 ISBN 9788540508590 1 Literatura grega 2 Poesia épica clássica I Werner Christian II Martin Richard P III GarciaRoza Luiz Alfredo IV Kafka Franz V Kaváfis Konstantinos Índices para catálogo sistemático 1 Literatura grega Poesia épica 883 COSAC NAIFY rua General Jardim 770 2 andar 01223010 São Paulo SP cosacnaifycombr 11 3218 1444 atendimento ao professor 11 3823 6560 professorcosacnaifycombr fb twitter blog youtube Este ebook foi projetado e desenvolvido em setembro de 2014 com base na 1ª edição impressa de 2014 FONTES Minion e National SOFTWARE LibreOffice e Writer2ePub de Luca Calcinai SUMÁRIO Capa Apresentação Richard P Martin Introdução Christian Werner Da tradução Personagens principais Odisseia Canto 1 Canto 2 Canto 3 Canto 4 Canto 5 Canto 6 Canto 7 Canto 8 Canto 9 Canto 10 Canto 11 Canto 12 Canto 13 Canto 14 Canto 15 Canto 16 Canto 17 Canto 18 Canto 19 Canto 20 Canto 21 Canto 22 Canto 23 Canto 24 Posfácio Luiz Alfredo Garciaroza O silêncio das sereias Franz Kafka Ítaca Konstantinos Kaváfis Glossário de nomes próprios Bibliografia Autores Créditos Redes Sociais Colofão
Envie sua pergunta para a IA e receba a resposta na hora
Recomendado para você
Texto de pré-visualização
ODISSEIA HOMERO ODISSEIA HOMERO ODISSEIA HOMERO TRADUÇÃO CHRISTIAN WERNER ODISSEIA APRESENTAÇÃO RICHARD P MARTIN Proezas e performances A Odisseia traça o fim de uma viagem a volta ao lar depois de vinte anos de um guerreiro veterano e marinheiro sofredor Odisseu retoma a vida na ilha de Ítaca na hora certa Seu filho Telêmaco está no limiar da idade adulta plena enquanto a paciente esposa Penélope começa a perder as esperanças e considera a possibilidade de se casar outra vez É mais difícil dizer quando essa história começa porque o destino de Odisseu está ligado ao da cidade de Troia E sob certo ponto de vista a destruição de Troia pelas mãos das tropas gregas vingadoras estava em progresso havia muito remontando à origem do cosmos Podemos recriar a história dos mitos gregos que muito provavelmente eram conhecidos do público da Odisseia e lembrar que já em tempos antigos existiam variantes versões até mesmo contraditórias desses acontecimentos Dentre as fontes dessas histórias encontrase a Teogonia de Hesíodo mais ou menos contemporânea do surgimento da poesia homérica no século VIII aC e os chamados ciclos épicos dos séculos VII e VI aC completando o ciclo troiano dos quais chegaram até nós apenas citações fortuitas e poucos resumos de tramas de fontes posteriores Gaia a Terra foi uma das primeiras criaturas Ela tramou para que seu marido impiedosamente opressivo Urano céu fosse destronado pelo filho deles Crono que por sua vez foi derrotado por Zeus o neto favorito de Gaia num levante familiar de consequências universais Aconselhado por sua avó primeva Zeus conquistou a coroa do céu ao recrutar para suas batalhas contra a geração mais velha de deuses os monstruosos Cem Braços que tinham sido presos por tiranos divinos anteriores Também aconselhado por ela ele engoliu uma de suas primeiras esposas Métis inteligência astuta e assim armado com cautelosa sabedoria veio a garantir que seu próprio reino jamais fosse derrubado Em vez de gerar um filho mais forte que Zeus como havia sido predito Métis desamparada ficou bem encolhida dentro do marido e deu à luz Atena que nasceu já adulta da cabeça do chefe dos deuses Zeus portanto tinha uma dívida com Gaia Com o passar do tempo e as reclamações dela do fardo sempre mais pesado dos homens Zeus concebeu uma guerra de grandes proporções para diminuir a população mundial e aliviar a carga da superfície da Terra As condições para a guerra de Troia brotaram de outro casamento divino impedido um casamento de herói um estupro e um sequestro Zeus desejava a ninfa Tétis uma das cinquenta filhas do deus do mar Nereu Mas ainda uma vez temia que caso esposasse uma deusa poderosa um filho seu poderia acabar querendo substituílo Então inventou um motivo para casar Tétis com um mortal inocente Peleu como recompensa pelo comportamento devoto desse herói Foi nesse casamento esplêndido que Discórdia Éris que não fora convidada lançou entre os convivas uma maçã com a inscrição kallistei à mais bela Atena Hera e Afrodite reclamaram o prêmio O pai dos deuses escolheu um troiano chamado Páris para julgar a questão Rejeitando as promessas das outras duas deusas ele escolheu Afrodite e recebeu Helena como recompensa A mãe dela Leda fora certa vez possuída à força por Zeus disfarçado de cisne O nascimento esdrúxulo de Helena de dentro de um ovo pressagiava uma vida notável Quando atingiu a idade de casar tinha pretendentes em todos os cantos da Grécia Menelau filho de Atreu foi o eleito e para evitar qualquer conflito todos os pretendentes se viram forçados a um juramento de que tudo fariam para libertar Helena se algum dia ela estivesse em perigo Odisseu de Ítaca que havia sugerido essa ideia foi por sua vez ajudado pelo pai mortal de Helena Tíndaro que convenceu sua sobrinha primairmã de Helena a se casar com o jovem O nome dela era Penélope Por fim a fuga ou rapto como preferem alguns e suas consequências Numa visita a Menelau na residência do casal em Esparta Páris encontrou a recompensa prometida no concurso de beleza e com a ajuda dos dons sedutores de Afrodite convenceu Helena a partir com ele para Troia pondo assim em movimento a mobilização das forças gregas para punir o transgressor ocidental Nessa época Odisseu e Penélope acabavam de ser abençoados com o primogênito e o pai orgulhoso relutante em deixar Ítaca para recuperar Helena tentou enganar o grupo que o recrutava liderado por Agamêmnon irmão do marido ofendido Usando um gorro de pele embora fosse verão ele começou a arar seu campo com uma combinação ridícula de boi e cavalo Mas um dos visitantes Palamedes recusouse a acreditar que Odisseu fosse louco Pegou Telêmaco o filhinho de Odisseu dos braços da babá e colocou a criança na frente do arado Quando Odisseu desviou para não machucar o filho a mentira se revelou Lá foi ele para a guerra O cerco de Troia durou dez anos Depois da morte de Aquiles e Heitor os principais guerreiros de ambos os lados os gregos seguiram o conselho de Odisseu e se infiltraram na cidade escondidos dentro do Cavalo de Troia No caos e matança subsequentes a esse ataque surpresa Troia caiu mas o templo de Atena dentro da cidadela foi violado por invasores Consequentemente a ira da deusa perseguiria os gregos inclusive Odisseu na volta para casa O regresso dos heróis foi narrado numa epopeia antiga hoje perdida chamada Nostoi Algo semelhante a esse poema deve ser o corpo da canção de Fêmio o bardo local de Ítaca que canta para os pretendentes sobre a jornada de volta ao lar dos gregos fatigados pela guerra 1 325ss Mais adiante dentro da própria Odisseia tomamos conhecimento da volta bemsucedida de Nestor 3 130ss de como Ájax perdeu a vida da viagem tristemente retardada de Menelau e do retorno fatal de seu irmão Agamêmnon tudo em 4 351ss Cada uma dessas histórias contrasta com a narrativa geral da viagem de Odisseu Em particular a história de Agamêmnon esfaqueado pela esposa e pelo amante dela logo depois do retorno triunfal é uma advertência em forma de alerta explícito para Odisseu da parte de ninguém menos que a própria vítima no mundo inferior 11 441ss É aí também que Odisseu encontra o grande Aquiles que escolheu uma vida breve de glória em vez de uma vida longa de volta a sua terra natal Em outro notável contraste com o destino de seus antigos camaradas de combate Odisseu consegue ao mesmo tempo a fama e o retorno em segurança para obter a glória justamente através da volta para casa Nisso ele enfim se dá melhor que seu velho rival heroico Seu regresso a Ítaca envolve mais uma batalha dessa vez contra 108 jovens os arrogantes pretendentes de Penélope alguns deles seus conterrâneos da ilha Reempossado em seu devido lugar ladeado pelo filho e pelo pai Odisseu é um modelo de inteligência cuidado e perseverança É o suprassumo do sobrevivente Mesmo em tempos antigos reconheciase que a poesia homérica apresentava essas histórias da Guerra de Troia de uma forma singular No século IV aC Aristóteles em seu estudo sobre história e teoria literária a Poética 1459b observou que Homero toma apenas uma porção da história e faz uso de muitos episódios como o Catálogo das Naus e outros por meio dos quais diversifica sua poesia Mas os outros fazem seus poemas sobre uma pessoa um tempo uma ação com muitas partes da forma como o criador dos Cantos cíprios e da Pequena Ilíada fez Em resumo a epopeia homérica tem unidade enquanto os poemas cíclicos são apenas coletâneas Dessa forma a Ilíada focaliza apenas alguns dias do último ano da guerra a disputa entre Agamêmnon e seu melhor guerreiro Aquiles com seus resultados devastadores No final do poema Aquiles ainda está vivo o Cavalo e a queda de Troia ainda estão no futuro o poeta se esquiva de contar a saga toda Mesmo assim graças a alusões artísticas e justaposições dentro da história a força emocional dos acontecimentos futuros marca cada parte do poema Através da morte de Heitor pela mão de Aquiles e da incursão de Príamo ao campo grego para recuperar o corpo de seu filho sentimos no nível mais pessoal o páthos de uma cidade condenada Se a Ilíada é uma saga longa condensada de modo brilhante e intensamente focada a Odisseia é mais uma história simples contada através de uma narrativa complexa A história do herói da Guerra de Troia começa quase no final de seu retorno usa flashbacks para dar conta dos anos anteriores sincroniza diversas subtramas e apresenta eventos importantes sobretudo por lembranças e pela perspectiva de outros Em outras palavras já no começo da literatura ocidental quase todos os recursos do cinema e do romance modernos são expostos com maestria Os quatro primeiros cantos divisão tradicional do tamanho de capítulos do poema são um belo exemplo da narração indireta da Odisseia Não encontramos o herói Até mesmo seu nome é postergado em alguns versos uma vez que o poema começa com um substantivo genérico Do varão me narra Musa do muitasvias que muito vagou após devastar a sacra cidade de Troia Em vez de pôr Odisseu em cena desde o início o poeta engenhosamente nos faz ouvir outras pessoas falando sobre o herói os deuses sua esposa e filho aqueles que sentem saudade dele e aqueles que querem tomar seu lugar Seu impacto ganha mais força exatamente pela ausência É natural que a ausência de Odisseu tenha maior efeito sobre seu filho agora com vinte anos Telêmaco só conhece o pai pelo que contam os outros Mas então é posto em ação para sair e descobrir o destino de Odisseu por meio de uma combinação de fatores os planos dos deuses a crescente impaciência dos pretendentes de sua mãe e sua própria maioridade A história de sua própria odisseia em miniatura visitando os heróis que voltaram Nestor e Menelau e a trama dos pretendentes para assassinálo ocupam os quatro primeiros cantos Eles são chamados de Telemaquia ou a história de Telêmaco Muitos críticos do século XIX afirmaram que integravam outra composição agregada com pouca elegância ao poema Mas as escassas incoerências que embasaram essa crítica são em muito superadas pelas ressonâncias ricas e significativas que emergem quando lemos a Odisseia dessa forma como a história de um pai sendo aos poucos conhecido por seu filho Telêmaco dentro do poema é como nós fora dele um público para o passado heroico Essa estratégia poética não só é atraente e persuasiva em termos de narrativa como também é culturalmente adequada uma vez que as noções gregas de proeza heroica e história familiar sempre ligaram intimamente a fama de pai e filho Nos melhores casos os filhos dão continuidade à fama de seus pais ou a aumentam Odisseu na Ilíada chega a fazer juramentos com a expressão como pai de Telêmaco afirmativa de que aquilo que diz é tão verdadeiro quanto sua paternidade O próprio nome Telêmaco que quer dizer lutar longe é um adjetivo aplicável a Odisseu tanto com o sentido de arqueiro como de guerreiro que lutou na distante Troia mais que um epíteto adequado ao filho É como se a identidade do filho dependesse das ações do pai Ironicamente a Odisseia começa com Telêmaco duvidando que Odisseu seja de fato seu pai 1 21516 Um dos objetivos principais dos quatro primeiros cantos é mostrar que o jovem merece ser reconhecido pelos outros como filho de Odisseu e que possui as qualidades inatas que garantem seu laço paterno Nos quatro cantos seguintes do poema o centro da atenção é Odisseu então na última parte de sua viagem Ao mesmo tempo que Telêmaco sai em viagem para saber do pai perdido o herói começa a se aproximar de Ítaca A ausência fortuita de Posêidon da companhia dos deuses permite que Atena com o consentimento de Zeus liberte seu favorito da ilha de Calipso onde estava preso havia sete anos cada dia mais inquieto embora junto da bela ninfa Outro naufrágio levao à terra dos feácios onde Odisseu revelando sua identidade convence a família real a lhe dar retorno seguro para casa O poema deixa claro que Odisseu fascina sua plateia com uma performance muito parecida com a do poeta real da composição ele assume o posto de narrador nos quatro cantos seguintes tecendo uma história de suas aventuras anteriores que inclui canibais gigantes feiticeiras sedutoras monstros marinhos videntes mágicos fantasmas ingredientes eternos das histórias populares de todo o mundo elaboradas numa narrativa autobiográfica Ao mesmo tempo que oferece a história desse marinheiro a Odisseia se dá ao trabalho de construir um pano de fundo cuidadosamente nuançado da história que Odisseu relata Nós o vemos encantando a plateia ouvimos as reações dessa mesma plateia inclusive quando decidem cobrir o narrador de mais presentes podemos imaginar o bardo local Demódoco escutando com admiração e inveja esse contador de histórias recémchegado tudo isso certamente para indicar como nós como plateia devemos receber e apreciar toda a Odisseia homérica Mais eletrizante ainda ao colocar assim a odisseia das aventuras do herói o poeta nos provoca com a ideia de que toda a autobiografia pode ser ela própria em grande parte uma conveniente ficção Podemos notar a sequência e a forma dessa performance solicitada As histórias que Odisseu relata parecem seguir um ritmo de dois episódios curtos depois um longo mais dois curtos seguidos de outro longo Por exemplo os cícones e os lotófagos são descritos em menos de quarenta versos eles levam ao episódio dos ciclopes que faz uso de dez vezes mais versos para ser narrado O mesmo acontece com as três histórias seguintes Eolo curta lestrigões curta e Circe longa O efeito é quase o de uma maré Outro padrão sutil vem à tona se considerarmos os episódios em termos sociais Cada lugar que Odisseu descreve representa uma variante das condições de vida grega se definirmos essas condições básicas como uma família estendida a adoração dos deuses centrada no sacrifício e a agricultura Os ciclopes são um exemplo negativo eles não têm agricultura não têm leis vivem sozinhos e não se reúnem em assembleias deficiências inconcebíveis numa comunidade grega Os lotófagos vivem aparentemente sem memória cultural e levam os outros a esquecer Circe e Calipso deusas que vivem sozinhas encarnam o que é impossível para mulheres gregas Os feácios por outro lado parecem quase gregos Adoram deuses reconhecíveis gostam de canções de bardos e apreciam esportes competitivos Mas estão distantes de qualquer conflito real e portanto do heroísmo uma limitação impensável para comunidades antigas de verdade Em resumo a história de Odisseu funciona como uma lente de aumento ou vara de medida esclarecendo e marcando o que se define como humano e helênico Não surpreende que pesquisadores em busca de alegorias tenham encontrado terreno fértil nessas histórias Uma linha de leitura já corrente no século II aC via a jornada de Odisseu como a saga de toda alma seduzida pelos bens e preocupações do mundo mas resistindo ao canto das sereias e conseguindo voltar a seu lar celestial Em tempos mais recentes a crítica psicanalítica descobriu fantasias oralnarcisistas ou simbolismo fálico subjacentes ao texto Ambientalistas podem ler nessas histórias considerações sobre o uso e abuso dos recursos naturais ou uma celebração da tecnologia Tal flexibilidade e infinita riqueza de sugestões mantém a história viva No plano cognitivo podemos traçar uma curva ascendente ao longo das recordações de Odisseu e encontrar a história da educação De seu selvagem ataque pirata inicial aos cícones até seu desafio quase fatal ao ciclope enraivecido e mais além até sua perda de tudo o que tinha ficamos com a sensação de que o herói de fato aprende Ele se tornou mais sábio e nos torna mais sábios por ter visto as cidades e captado o modo de pensar de muitos povos Embora seja um momento central e um tour de force dentro da Odisseia a história de aventura contada do canto 9 até o 12 na voz do próprio herói surpreendentemente constitui apenas um sexto de todo o poema No entanto cristaliza e destila todos os temas principais do resto da composição Muitos dos temas presentes na história das aventuras são desenvolvidos do canto 13 até o 24 abrangendo o tempo da volta de Odisseu a Ítaca através dos encontros com seus criados e seu filho da luta com os pretendentes e do tão esperado encontro com a esposa Por exemplo por essa história ficamos sabendo como Odisseu com frequência deparou com terras desconhecidas e então o vemos fazendo mais uma dessas descobertas mas a de sua própria ilha Ouvimos a respeito do poder de mulheres espertas Circe e Calipso sobretudo enquanto na história externa contada pelo poeta mais que pelo próprio Odisseu tais figuras fortes são recorrentes na forma de Penélope Clitemnestra e a rainha feácia Arete talvez não por coincidência parte da plateia da história contada por Odisseu A comida sempre reaparece constituindo problemas distintos nos episódios dos lotófagos do ciclope de Circe e em especial do gado de Sol enquanto a narrativa externa lida com o apetite insaciável dos pretendentes De fato o poema toma o cuidado de traçar um paralelo entre a tripulação inconsequente de Odisseu que devorou os rebanhos de Sol e os arrogantes pretendentes exaurindo em continuação o estoque doméstico do herói ausente Assim como o deus destruiu os homens de Odisseu o guerreiro que volta para casa eliminará os intrusos Disfarce astúcia o uso inteligente da persuasão tudo isso ocorre na história interna dos cantos 9 a 12 e encontra ressonância na narrativa mais geral E por meio do episódio do ciclope seu comportamento sua cegueira o cumprimento da maldição de Posêidon nossa atenção é atraída especialmente para a noção de justiça cósmica Esse conceito chamado diké abrangia para os gregos arcaicos não apenas o funcionamento adequado da natureza mas de todo tipo de relações sociais sobretudo o tratamento adequado aos estrangeiros Não por acaso a história geral faz de Odisseu um vingador que retorna um algoz da hubris dos pretendentes um restaurador da ordem e um representante da justiça de Zeus na terra Sob essa luz a performance permanente da Odisseia na cultura grega representou não apenas um entretenimento duradouro mas uma constante reafirmação de valores culturais da busca de uma sociedade por sua estabilidade e inteireza Poema e poeta De onde vem a nossa Odisseia Talvez seja útil recuar no tempo As traduções contemporâneas do épico partem de uma edição grega do poema bastante padronizada quase sempre o texto da Oxford Classical editado por Thomas W Allen 2ª ed 19171 O texto de Allen para a Oxford foi resultado de muitos anos de minucioso trabalho editorial Como esse processo é crucial para o estabelecimento de um texto porém invisível para a maioria dos leitores vale a pena delinear aqui o básico Edições impressas da Odisseia estão em circulação desde 1488 quando Demetrius Chalcondyles um grego que vivia em Florença usou pela primeira vez a tecnologia recém inventada do tipo móvel para conservar a joia da literatura grega antiga a poesia homérica Até então os poemas haviam sido transmitidos apenas em manuscritos laboriosamente copiados à mão Cerca de cem desses manuscritos da Odisseia chegaram aos nossos dias Estão guardados em bibliotecas por toda a Europa de Moscou Bratislava e Viena até Florença Veneza Cidade do Vaticano Munique Paris e Oxford e suas datas variam do século X dC ao século XVI alguns tendo sido produzidos mesmo depois do surgimento da imprensa Todos esses exemplares são baseados em manuscritos ainda mais antigos que não existem mais copiados por escribas profissionais gregos monges ou leigos em pergaminho ou em séculos mais recentes em papel Um estudioso que busque uma visão mais completa de uma obra antiga não pode confiar apenas nas primeiras edições impressas mas deve recuar tanto quanto possível na direção da antiguidade Portanto através de uma combinação de viagem e pesquisa do uso de facsímiles ou relatos de outros estudiosos Allen fez uma colação ou trabalho de comparação sistemática palavra por palavra de todos os manuscritos que conseguiu encontrar Quando existem tantos manuscritos gregos como é o caso de Homero e mais ainda do Novo Testamento há variações inevitáveis de um para outro Isso se dá por causa da atividade generalizada de fazer cópias e cópias de cópias de um texto popular no tempo anterior à imprensa Todo escriba podia cometer erros mesmo quando muito atento Às vezes os próprios escribas estavam fazendo cotejos e combinando a informação de diversos manuscritos a seu dispor As diferenças são em geral pequenas mudanças de tempo verbal uso de uma forma mais antiga ou mais recente de um adjetivo variações de grafia e assim por diante Em diversos documentos porém a variação tem de fato um impacto sobre a trama ou a caracterização Allen editou tudo aquilo em que os manuscritos coincidiam e onde eram discordantes escolheu a melhor variante baseado no que sabia sobre uso estilo métrica e dicção poética homérica É evidente que os editores da Odisseia e eles têm sido muitos ao longo dos séculos nunca concordam quando se trata de escolhas individuais quanto à melhor leitura Às vezes para dar sentido a uma passagem um editor recomenda uma palavra ou forma grega que não ocorre em nenhum manuscrito a chamada emenda Por isso edições acadêmicas como a de Allen sempre registram ao pé de cada página as variantes e uma seleção das especulações de editores anteriores Dois exemplos podem esclarecer o processo 1 Quando a tripulação de Odisseu estava esperando o ciclope voltar à sua caverna acenderam uma fogueira Tendo lá aceso o fogo e fizeram oferendas aos deuses sacrificamos conforme McCrorie traduz o verbo grego ethusamen seguindo o texto de Allen para Od 9 2312 O editor da Oxford escolheu seguir versões em que esse verbo aparece caracterizando os homens como cumpridores do rito Mas como consta em suas notas diversos manuscritos inclusive um exemplar do século XI de Florença atribuem ao verbo grego desse verso o sentido de restos apenas em lugar de sacrifício detalhe pequeno mas que dá colorido à passagem 2 Às vezes a parte questionada se estende por vários versos como no verso 93 do canto 1 quando Atena está descrevendo como irá inspirar Telêmaco a viajar em busca de notícias do pai O verso em todos os manuscritos diz Vou enviálo a Esparta e à arenosa Pilos No entanto em uma família bastante grande de manuscritos correlatos seguemse dois outros versos E dali para Creta até o senhor Idomeneu que foi o segundo a voltar de Troia Evidentemente esses versos não correspondem à trama do poema na forma como nos chegou em nenhum manuscrito Telêmaco nunca vai a Creta Mas eles nos provocam com a possibilidade de ter existido uma versão mais elaborada da Telemaquia cantos 14 do poema Essa foi a trajetória da Odisseia até a Idade Média Devemos ter presente que no período anterior ao Renascimento italiano seria difícil que alguém na Europa Ocidental conhecesse o poema diretamente Caso se fizesse alguma ideia de quem era Odisseu era por meio de citações latinas do final da Antiguidade ou pela menção de Ulisses a versão latina de seu nome por autores romanos bem conhecidos como Virgílio Ovídio Sêneca Horácio e Estácio Dante que coloca Ulisses no canto 26 de seu Inferno conhecia ou inventou uma versão do destino do herói totalmente distanciada da tradição grega e com certeza ausente em Homero A partir do século XIII e em especial depois da queda de Constantinopla para os turcos otomanos em 1453 uma corrente de estudiosos gregos emigrou para a Itália e se voltou para o Ocidente É plausível que devamos a disseminação de manuscritos da Odisseia a esses intelectuais bizantinos e seus alunos O negócio de copiar o poema de geração em geração havia se expandido às terras falantes do grego ainda na Antiguidade Os manuscritos medievais em que a tradução de McCrorie se apoia em última análise são um pontofinal Mas como podemos dizer se esses manuscritos o mais antigo é de cerca do ano 900 de nossa era preservam com alguma exatidão o que os gregos da era arcaica sabiam da Odisseia de Homero Ainda hoje a questão suscita acalorados debates entre homeristas Uma espécie de fonte de controle do nosso texto veio de fato crescendo ao longo do século passado especificamente fragmentos de papiros isto é pedaços de rolos antigos Material de escrita barato e então muito difundido feito de fibras vegetais o papiro apodrece na maioria dos climas Felizmente a areia seca do Egito que era um centro de cultura grecoromana preserva esse material Exploradores do século XIX descobriram grande quantidade de papiros em geral rasgados em antigos monturos de lixo ou usados para forrar esquifes de múmias Esses papiros que arqueólogos continuam descobrindo todos os anos em geral contêm apenas poucas linhas Mas o que sobrevive datado de cerca de 300 aC a 200 da nossa era é suficiente para demonstrar que os textos dos livros manuscritos medievais preservam em termos gerais os mesmos versos conhecidos pelos leitores de Homero em rolos de papiro da Antiguidade Mas o caminho dá algumas voltas até recuarmos ao período grego arcaico quando a Odisseia foi registrada por escrito Em primeiro lugar não se pode ignorar o fato de que uma porção dos primeiros textos em papiro contém versos extras comparados aos textos padrão construídos em manuscritos completos na Idade Média Os versos desses papiros espúrios por assim dizer soam como preenchimento descrições adicionais ou cenas complicadas que no geral têm paralelos em outros pontos do poema De onde vêm esses versos Muito possivelmente refletem várias tradições de recitação do poema correntes por volta de 300 aC Aqui entra um segundo fator o academismo antigo Logo depois da época de Alexandre o Grande que difundiu a cultura grega até a Índia surgiram dois grandes centros de conhecimento um em Pérgamo cerca de 120 quilômetros a sudeste da antiga Troia no que é hoje a Turquia e outro em Alexandria no Egito A poesia homérica era não só a favorita de Alexandre dizem que ele dormia com uma cópia da Ilíada debaixo do travesseiro como também um símbolo valioso da difusão da alta cultura grega Intelectuais gregos ardorosos eruditos e competitivos reunidos em centros de estudos mantidos pela realeza escreviam e discutiam sobre a poesia homérica em todos os detalhes concebíveis desde o uso de pronomes até a dieta alimentar dos heróis observavam atentos que as personagens nunca comiam peixe Um resultado de toda essa atividade acadêmica de Zenódoto Aristófanes de Bizâncio e do grande Aristarco foi ao que tudo indica o estabelecimento de um texto antigo razoavelmente padronizado por volta de 150 aC pelo menos depois dessa data versos extras ocorrem com muito menor frequência nos papiros A Odisseia e a Ilíada devem ter passado por uma espécie de processo de peneiramento uma padronização que lamentavelmente pode ter apagado algumas variações interessantes que floresceram até então Alguns estudiosos especulam que a Odisseia devia ser por volta de 400 aC um tanto mais longa do que a nossa versão ou bem diferente dependendo da cidade onde se adquiria o texto ou o que é mais presumível de quem o recitava Platão que nasceu em 427 aC cita como homéricos muitos versos que não existem em nenhum de nossos textos ou que têm construção bastante diferente À medida que recuamos no tempo a Odisseia se encontra mais e mais nas mãos de intérpretes orais como o rapsodo costurador de canção chamado Íon em torno de quem Platão escreveu um diálogo homônimo Esse recitador no relato literário de Platão diz ter conhecimento enciclopédico porque conhece a poesia homérica muito bem e Homero já era considerado um sábio universal na época de Platão Essa parece ser uma atitude comum em relação ao poeta do século V aC quando grande parte do que era tido por educação se construía no aprendizado detalhado das epopeias Como rapsodo Íon competia com outros intérpretes em festivais internacionais Ele costumava também explicar Homero nos intervalos da apresentação dos poemas como uma palestra dramática Não é difícil imaginar esses intérpretes rapsódicos variando expandido ou enfatizando trechos do poema conforme as particularidades do público Não existe nenhuma prova de que se limitassem a um texto exato É possível também que as andanças de Odisseu fossem representadas por intérpretes que estavam eles próprios acostumados a viajar de uma praça a outra sem parar Essa associação entre herói fictício e poeta de fato ocorre ainda hoje entre cantores épicos egípcios como demonstrou o folclorista Dwight Reynolds Não parece enfim muito distante do rapsodo historicamente comprovado intérprete que afirma reproduzir a Odisseia de Homero o fenômeno de um poeta de maestria oral compor no próprio ato da performance e variar sua composição de acordo com a plateia da forma como poetas orais e mesmo cantores de rap ativos hoje em dia em várias culturas ainda costumam fazer Mas aqui chegamos às regiões mais turvas na busca pela Odisseia o reino da chamada questão homérica Será que existiu de fato um bardo chamado Homero Se existiu terá sido ele o primeiro a escrever ou ditar a Odisseia e a Ilíada E se era um poeta oral praticante o que o ou a motivou a mudar de tecnologia Não sabemos com certeza data local ou circunstâncias do registro escrito da Odisseia É bem provável que o poema tenha se cristalizado ao longo de gerações de performances orais ao vivo e competições no período entre 800 aC e 500 aC Ao que tudo indica foi registrado por escrito bastante tarde talvez sob o patronato dos governantes Pisistrátidas de Atenas c 540510 aC em função dos concursos de poesia homérica em festivais veja Nagy 2002 Tampouco contamos com qualquer informação confiável a respeito do poeta Homero Os gregos do período clássico acreditavam que ele tinha vivido na Jônia hoje costa ocidental da Turquia cerca de quatrocentos anos depois da Guerra de Troia que teve lugar segundo a avaliação antiga por volta de 1150 aC É totalmente possível que um grande intérprete chamado Homero tenha existido na época mas é pouco crível que tenha sido responsável por nossa Odisseia em sua presente forma Mesmo que ele seja o autor num sentido moderno responsável pela escolha de cada palavra do poema conforme o conhecemos hoje não devemos esquecer que a obra como demonstram suas alusões estilo e linguagem arcaica artificial também deve ser extremamente tradicional As diversas camadas linguísticas da Odisseia sugerem que alguns elementos devem ser oriundos do próprio período que celebra a época dos heróis da era micênica c 16001200 aC Portanto existe ao menos uma verdade simbólica embutida em uma das muitas lendas que circularam a respeito de Homero segundo a qual ele era o filho de Telêmaco filho de Odisseu Independentemente de quando o poema tenha sido concebido seu autor graças à Musa sentiuse em contato quase imediato com seus eventos O resultado é a composição vívida e eterna que podemos ler ouvir e avaliar ainda hoje A técnica homérica A textura da Odisseia e da Ilíada a construção de cenas discursos e versos pode ser mais bem apreciada à luz de técnicas encontradas em epopeias tradicionais orais do tipo apresentado ainda hoje em algumas partes do mundo sobretudo na Ásia Central e na África e antes comum em toda a Europa Cinco argumentos que se entrelaçam sustentam a ideia de que a poesia homérica como a conhecemos vem de uma forma artística que não contava com a escrita Primeiro o poema em si descreve a arte de narrar histórias sobre heróis e deuses empregando palavras relacionadas a canção nunca mencionando escrita ou mesmo recitação Por exemplo o cantor feácio Demódoco no canto 8 canta três composições bastante diferentes duas delas semelhantes a flashes de noticiário a respeito da Guerra de Troia enquanto a terceira relata como o deus Hefesto surpreendeu sua esposa adúltera Afrodite Fêmio o bardo de Ítaca respondendo ao capricho da plateia os inquietos pretendentes de Penélope canta sobre a volta desastrada dos gregos inclusive Odisseu como esperavam os pretendentes Penélope pode pedir que ele mude de assunto 1 33744 assim como Odisseu pode pedir uma performance específica a Demódoco 8 492 A poesia de Homero pode não ter sido composta dessa maneira interativa aberta à plateia mas pelo menos quer supor suas raízes em situações assim A Odisseia é uma história poderosa uma narrativa sobre a memória a volta para casa a necessidade humana e o desejo É também um poema finamente tecido com todo o poder e a beleza que brotam do uso preciso de palavras e imagens Mas acima de tudo é resultado de uma tradição centenária de apresentações públicas uma tradição que a poesia em si identifica com o cantar de histórias No grego homérico o poeta é um cantor aoidos e seu trabalho é a canção aoidé palavra que acaba entrando para o inglês e para o português como ode A Odisseia começa com o poeta pedindo a uma deusa que conte a história do muitasvias Ele invoca uma Musa uma das nove filhas de Memória Não por acaso essas divindades narrativas nos emprestam a palavra música Mais uma vez a poesia homérica se apresenta como algo que vai além do discurso comum algo mais perto da voz especial dos deuses uma forma de arte próxima do puro som harmonioso A tradição da canção épica que nos legou a Odisseia está longe de ser primitiva Ao contrário a poesia homérica é consciente ao extremo de seu próprio instrumento A Odisseia ainda mais que a outra grande epopeia que chegou até nós a Ilíada reflete repetidas vezes sobre o poder do canto narrativo para entronizar os feitos dos heróis e transmitilos às gerações futuras Consequentemente na cultura que o poema descreve os cantores ocupam um lugar de alta honra Para um pretendente a herói não entrar no repertório épico de um cantor significava o esquecimento no que diz respeito ao futuro renome Colocando de outra forma a razão pela qual hoje conhecemos Odisseu e Aquiles Helena e Penélope é que a poesia épica cumpriu sua orgulhosa e ambiciosa promessa de imortalidade de fama imorredoura A etimologia da própria palavra para fama na linguagem homérica deixa claro até que ponto todo esse sistema do canto celebrador dependia do desempenho oral Pois kleos fama ou glória é literalmente aquilo que é ouvido A palavra inglesa loud sonoro alto e clamor em português pela via do latim clamor vem da mesma raiz Segundo as evidências arqueológicas demonstram que algo como a Guerra de Troia ocorreu na região descrita nos poemas com armas de bronze como aquelas que Homero descreve e com a consequente destruição e deslocamento de populações Além disso a datação tradicional antiga da guerra no século XII aC se encaixa no relato homérico de uma geração heroica final Mas a escrita alfabética para registrar os relatos em verso ou prosa dessa guerra só estava disponível na Grécia em 800 aC na melhor das hipóteses pela estimativa da maioria dos estudiosos pelo menos trezentos anos à frente Portanto uma tradição oral de algum tipo deve ter existido antes dos textos homéricos A evidência da língua de Homero fornece uma terceira confirmação O grego da Odisseia nunca foi uma língua falada em nenhuma época ou região Multifacetado e às vezes bastante conservador o dialeto homérico parece ter sido forjado por e para poetas entre outras peculiaridades contém formas que não possuem nenhuma base histórica em comparação com outras línguas correlatas mas que são convenientes para a métrica Ao mesmo tempo retém uma porção de formas de um dado conceito tal como pertencente a mim mas apenas quando as formas mantêm métricas distintas úteis como superior e super em português que oferecem convenientemente alternativas métricas ao poeta Em resumo a língua poética é tradicional e abarca gerações A quarta prova de um Homero oral vem da dicção poética Em sua pesquisa de doutoramento nos anos 1920 e 1930 sobre fórmulas repetidas na poesia homérica um jovem californiano Milman Parry descobriu que havia uma economia em ação ao investigar com rigor o sistema bem conhecido de adjetivos aplicados a personagens importantes dos poemas Os personagens chamados de péligeiro Aquiles e muitaastúcia Odisseu são descritos em outros versos do poema como o brilhante Aquiles ou o muito hábil Odisseu Quando isso acontece não há mudança perceptível na ênfase narrativa Ao contrário os sintagmas em questão produzem uma forma métrica diferente É preciso ter em mente que o verso homérico consiste de seis pés com os cinco primeiros compostos ou por um dáctilo uma sílaba longa mais duas curtas UU ou um espondeu duas sílabas longas O último pé do sexto verso é um espondeu ou um troqueu uma longa e uma curta U uma marcada concluindo o efeito rítmico que a tradução de McCrorie capta brilhantemente Ora o adjetivo péligeiro com o nome Aquiles é em grego podas ókus Akhilleus sintagma que preenche uma posição métrica ocupando dois pés e meio do verso hexâmetro dáctilo UUUU Mas se substituirmos pelo adjetivo brilhante ao lado do nome do personagem obteremos um segmento métrico curto ocupando dois pés dios Akhilleus UU Contando esses sintagmas Parry provou que para todas e cada uma das figuras heroicas ou divinas principais em Homero existia um e quase sempre apenas um epíteto por posição métrica e caso gramatical sujeito objeto genitivo e assim por diante Portanto a poesia homérica mais uma vez representa uma forma artística tradicional multigeracional pela simples razão de que nenhum poeta individual teria a motivação de divisar tal sistema tão completo e econômico Ela foi criada provavelmente para a composição rápida do verso na performance ao vivo conforme a poesia efetivamente apresenta a si própria com coerência O quinto argumento o da prova comparativa está relacionado ao anterior Parry e seu colaborador Albert Lord descobriram em trabalho de campo na antiga Iugoslávia que sistemas de dicção extensos e úteis semelhantes a esse eram empregados por intérpretes iletrados da poesia heroica tradicional servocroata3 Desde seu trabalho dos anos 1930 pesquisadores de campo confirmaram essa tendência em dezenas de outros sistemas de poética oral Diante dessas indicações não podemos pretender ler a Odisseia do jeito que se lê uma epopeia escrita seja a Eneida de Virgílio a Divina comédia de Dante ou o Paraíso perdido de Milton Mais importante nossa leitura deve levar em consideração a ressonância de sintagmas repetidos uma vez que podemos ter certeza de que quase todos esses sintagmas já existiam na tradição poética e eram portanto conhecidos de uma plateia que ouvia a performance épica de Homero Um poeta como o autor da Odisseia é capaz de criar efeitos significativos evocando no momento exato o mundo de associações embutido em um único sintagma que foi usado por gerações em muitos outros poemas com um escopo de significados que sua plateia é capaz de apreciar John Miles Foley Foley 1991 e 1999 chamou a poesia que disso resultou de arte imanente pois nesse meio de expressão o caráter alusivo enfatizado por fórmulas produz profundidades que vão muito além da superfície límpida do poema Como os leitores modernos não conhecem o contexto em que essa arte começou a florescer podemos esperar no máximo recuperar o espectro de significados de um sintagma olhando todas as suas ocorrências e calculando o efeito que teria se a plateia trouxesse para a compreensão da cena um reconhecimento de todas as outras situações em que um sintagma particular foi ou poderia ser usado A técnica é diferente da técnica do romance O leitor de Os europeus ou de Ulysses só descobre aos poucos página a página como são ricos certos sintagmas que James ou Joyce destinam a seus protagonistas Cada romance cria sua própria linguagem enquanto o épico oral grego contava com a longa experiência do público de uma rica tradição de recitação já carregada de significado para envolver e comover seus ouvintes de imediato Consideremos por exemplo a maneira como a caracterização de Telêmaco acontece na Odisseia com a ajuda de um estilo baseado na fórmula Na primeira vez que vemos Telêmaco 1 113 Atena disfarçada de Mentes acabou de chegar ao palácio de Ítaca Telêmaco a vê antes de qualquer outro τὴν δὲ πολὺ πρῶτος ἴδε Τηλέμαχος θεοειδής Primeiro a vêla foi o deiforme Telêmaco Theoeidés deiforme é uma das quatro fórmulas epítetosubstantivo para Telêmaco no caso nominativo ou de sujeito O simples fato de o poeta usar um epíteto para Telêmaco aqui quando o vemos pela primeira vez indica que a cena imediatamente seguinte é importante para o entendimento de seu caráter O epíteto é como uma nota musical única soando no início de uma composição Além disso ele ocorre em contraste com qualquer um dos três outros epítetos que Homero poderia ter usado para Telêmaco se tivesse moldado o verso um pouquinho diferente hieré é força sagrada pepnumenos inteligente e hérós o herói À medida que o poema progride o epíteto theoeidés vem a se relacionar com um tema essencial da Odisseia de como a aparência às vezes entra em conflito com a verdadeira identidade ou habilidade Odisseu disfarçado faz um sermão sobre aparências depois de caçoarem dele nos jogos dos feácios 8 16685 Na situação dramática dessa passagem ter uma boa aparência eidos indica que a pessoa nem fala bem nem é de fato muito inteligente É significativo que o jovem ilhéu Euríalo que tem habilidade atlética mas nenhuma elegância retórica seja o objeto da repreensão de Odisseu no decorrer do episódio feácio nós assistimos a seu aprendizado No final do canto 8 ele tem a inteligência e a elegância de oferecer a Odisseu uma espada e um pedido de desculpas Ora esse processo de educação é exatamente o que acontece com Telêmaco no decorrer da Odisseia como um todo conforme muitos críticos observaram O adjetivo theoeidés marca o modo como Homero maneja esse tema tradicional que podemos chamar de o herói amadurece Quando a plateia ligada no sistema de sintagmas tradicional ouve pela primeira vez Telêmaco descrito como deiforme ela recebe um pacote de mensagens temáticas e direções narrativas potenciais No entanto esse processo não se dá sem suspense O filho de Odisseu pode acabar sendo como os outros que receberam esse epíteto Páris na Ilíada Alexandros theoeidés uma figura menos que heroica que depende da aparência para se virar ou Euríalo ingenuamente arrogante mas educável De fato cada uma dessas duas alternativas temáticas surge no decorrer da Odisseia o adjetivo theoeidés é usado três vezes para descrever um ou outro da dupla de pretendentes principais em Ítaca o jovem arrogante Eurímaco e Antínoo tipos perigosos que não gostam de Telêmaco O jovem bom mas não perfeito aparece também na figura do vidente Teoclímeno ao qual o epíteto theoeidés é aplicado cinco vezes e cujo nome em si que ouve o deus se encaixa com seu sentido Quando esse jovem fugitivo encontra Telêmaco vemos um importante estágio do crescimento deste sem questionar ele fica amigo do proscrito mostrando assim que assimilou o código cultural referente a hóspedesamigos É tal a qualidade artística da repetição de fórmulas que é possível traçar linhas temáticas similares acompanhando o desenvolvimento de qualquer epíteto do poema Outro recurso poderoso usado na Odisseia é a caracterização por meio de discursos Calculouse que mais de metade do poema é apresentado nesse formato Além de ser um estilo poético discursar era com toda a probabilidade um fenômeno cultural importante Os gregos antigos de todos os períodos admiravam a habilidade retórica A Ilíada conta como Aquiles foi criado para ser um orador de discursos e agente de feitos Il 9 443 Parte da atração e da influência da poesia homérica em eras posteriores vem de sua excelência na mimese a representação de discurso direto Platão por outro lado aponta essa mesma técnica mimética como o perigo central dentro do épico homérico quando o baniu de sua cidade estado ideal em A república Esses discursos podem ser comandos ameaças ou promessas proferidas de um personagem para outro discursos públicos a assembleias rememorações em companhia de convivas em um jantar ou mesmo monólogos dirigidos ao próprio coração e mente como o discurso que Odisseu faz quando se vê correndo o risco de morrer afogado 5 299312 Em vez de contar à plateia o que se passa na mente dos personagens do poema o autor faz essas figuras falarem consigo mesmas O resultado é que ficamos com uma sensação de intimidade de intensa interação entre os heróis homéricos e seu ambiente e dos meios específicos como se apresentam para o mundo Outro refinamento na técnica consiste em justapor os discursos de diferentes personagens a fim de expressar conflito ou sugerir emoções mais profundas não expressas A conversa entre Helena e Menelau no canto 4 235 89 quando cada um conta uma história para seus visitantes representa essa arte contrastante em sua forma mais elevada Sem nenhum indício pela voz do próprio narrador criase mesmo assim a impressão de que o herói envelhecido e sua esposa que um dia causou tanta destruição ainda estão imersos em suas queixas e protestos recíprocos A série de encontros entre Odisseu e sua esposa Penélope que se estende do canto 19 até o 23 permite que o leitor intua como é o relacionamento deles mais que qualquer informação que o narrador pudesse fornecer E os paralelos próximos criados por esse uso de discursos diretos em série por exemplo as cinco histórias contadas por Odisseu disfarçado em Ítaca ou os encontros de Telêmaco com Nestor e Menelau enriquecem ainda mais o poema com sutis variações Se com as fórmulas o poeta joga com o conhecimento comum de alusão e associação da plateia com os discursos ele pode produzir novos e múltiplos pontos de vista Uma terceira característica técnica o símile pode ser considerado uma combinação da tradição da fórmula com o uso inovador do discurso O símile homérico muitas vezes compreende mais detalhes do que podemos julgar necessários para fazer um cotejo Vejamos dois exemplos que ocorrem no começo do canto 20 quando Odisseu deitado sem dormir se zanga com a visão das serviçais dormindo com os pretendentes seu coração dentro latia Como a cadela envolvendo os frágeis filhotes ao estranhar um varão late sôfrega por brigar assim em seu íntimo latia irritado com as vis ações versos 1316 Depois de descrever como Odisseu controla sua raiva Após golpear o peito reprovou o coração com o discurso o poeta continua e seu coração obediente de todo aguentou e resistiu sem cessar ele próprio reviravase para lá e para cá Como quando o varão forte fogo ardendo a um bucho cheio de sangue e gordura para lá e para cá gira almejando que bem rápido fique assado assim ele para lá e para cá reviravase cogitando versos 2328 Os detalhes aparentemente alheios porém evocam muitas coisas que uma comparação mais breve deixa passar Se o poeta tivesse dito apenas seu coração rosnava como um cão a imagem poderia nos tocar mas se perderia a possibilidade de um impacto emocional posterior A versão expandida de um jeito ao mesmo tempo estranhamente fora de sincronia e inteiramente apropriado associa Odisseu a uma figura feminina a mãe dos filhotes que late para defendêlos contra um macho intromissor Em termos da trama geral Odisseu por meio do símile tornouse igual a Penélope uma mulher ferozmente independente que resiste às incursões masculinas em sua casa De associação mais imediata podemos lembrar a cena ocorrida não muito antes quando Odisseu chegando disfarçado a seu próprio palácio é reconhecido por Argos o cão que deixou para trás vinte anos antes Agora infestado de carrapatos e abandonado incapaz de se mover do monte de excremento onde se encontra o cachorro abana o rabo com dificuldade e expira quando seu antigo dono passa por ele 17 291327 Essa ligeira dissonância criada pelo símile lembra à plateia que Odisseu embora na aparência velho e inútil no momento como Argos logo assumirá o papel de cão de guarda e mesmo caçador ao castigar os pretendentes Os símiles portanto empregam artisticamente num formato comprimido duas outras técnicas frequentes na poesia homérica o uso do flashback e da previsão O segundo símile mencionado acima na qual o herói é comparado a uma linguiça num primeiro momento pode parecer um lugarcomum cômico até arbitrariamente antiheroico O único ponto de ligação aparente vem da similaridade de movimento uma vez que tanto o herói como a carne giram como que no espeto E mais uma vez a técnica homérica repousa em nosso reconhecimento do lapso entre o evento imediato da trama e o remodelamento retórico dele Odisseu não consegue dormir porque está em um momento de crise ansioso quanto a sua capacidade de planejar e levar a cabo uma chacina enquanto o cozinheiro anônimo do símile tem de lidar apenas com a preparação da comida Mesmo assim podemos imaginar que o guerreiro veterano podia muito bem desejar ser o cozinheiro pacífico de forma que o símile é então focalizado na própria consciência do personagem que pretende descrever Vale a pena lembrar afinal que quando vislumbramos Odisseu pela primeira vez no poema ele está ansioso por ver a fumaça subir da chaminé de sua casa Além disso o cozinheiro e o herói desejam ambos intensamente alguma coisa O desejo do cozinheiro é explicitado ele quer assar a carne e ele ao menos tem como realizar isso Ao trazer à mente esse desejo universal o poeta faz sua plateia adivinhar quase sentir o gosto do imediatismo impositivo do desejo de vingança de Odisseu sem nem mencionálo nesse momento A insinuação é que também Odisseu logo estará no comando para não dizer que cozinhará os pretendentes Por fim ambos os símiles desse trecho o cachorro e o cozinheiro tornam públicas ao menos em sua memorável imagética direções de pensamento internas particulares Ao se referir a ações cotidianas recorrentes tornam natural e não problemática o que é de fato uma vingança singular e um tanto questionável e de proporções épicas A história e a Odisseia Os progressos da arqueologia da linguística e do estudo comparativo da cultura ao longo do século passado deixaram claro que o mundo pintado nas epopeias de Homero é uma criação poética Tem elementos de eras da civilização grega que vão desde 1400 aC até o período da tirania de Pisístrato e seus herdeiros em Atenas em meados do século VI Assim como a cultura grega os épicos absorveram influências do Oriente Médio e do Egito talvez até do mar Negro e além Ao mesmo tempo os elementos básicos do mundo homérico são constantes na história e na vida social mediterrânea as atividades de luta e navegação o comércio a colonização a viticultura e a agricultura a criação de assentamentos Embora as técnicas de todas essas áreas mudem ao longo dos séculos as atividades em si apresentam longos trechos de continuidade até mesmo no século XXI Não cabe aqui nem mesmo o mais breve esboço da história da Grécia Bastará observar que os falantes do grego devem ter se afastado por volta de 1900 aC dos falantes de línguas próximas os dialetos dentro da família indoeuropeia que evoluíram para as famílias linguísticas itálica indoarianas germânica celta eslava e outras viajando das estepes do sul da Rússia ou da região do Cáucaso penetraram nos Bálcãs no então longínquo sul Em torno das costas do Egeu encontraram altas civilizações já estabelecidas entre elas os egípcios e os minoicos um povo não grego centrado em Creta Com o tempo a cultura guerreira grega baseada em cidadelas e comando personalista fez empréstimos culturais dos minoicos e outros povos anteriores e depois tomou o seu lugar no que é hoje a Grécia central e as ilhas O período micênico c 16001200 aC assim chamado em função de uma das principais cidades Micenas se encerrou não é claro por quê com uma série de destruições das quais a Guerra de Troia é muito provável uma reminiscência abstrata destilada Depois da Antiguidade a existência de Troia e da guerra em torno dela foi tomada como mera fábula Quando as viagens ao Oriente ressurgiram durante o século XVIII antiquários começaram a notar íntima semelhança entre as paisagens da época e as descrições homéricas da área da Ásia Menor associada às antigas lendas No século XIX a busca romântica pelas origens e a crescente devoção europeia a um passado clássico idealizado se combinaram para chamar mais atenção para os vestígios físicos do passado culminando nos anos 1870 com as investigações de um arqueólogo diletante rico Heinrich Schliemann No grande sítio arqueológico de Hissarlik no oeste da Turquia moderna Schliemann cavou e encontrou as ruínas de uma cidade antiga camada sobre camada que datavam do século XII aC e ainda mais antigas A Troia enterrada havia muito voltava de repente à luz As escavações no local continuam até hoje Embora nenhuma inscrição ou objeto indique que esse seja o lugar que os gregos cercaram e destruíram esta foi muito claramente uma cidade extensa e rica com grandes muralhas e portões não diferentes daqueles descritos na Ilíada É pouco questionado de que se trata de Troia Diversas de suas camadas Troias VI e VII datadas por volta da época da guerra troiana como computado pelos próprios antigos apresentam sinais de saque e incêndio Não se pode provar se os gregos do continente Agamêmnon dos micênicos Menelau de Esparta e companheiros efetuaram o ataque em algum momento entre 1325 e 1200 aC Nem se sabe quem eram os troianos em termos étnicos e linguísticos ou onde foram parar os restos de sua população As migrações para a Ásia Menor continental sobretudo os assentamentos costeiros da Jônia começaram antes do colapso da cultura palaciana micênica na Grécia continental Foi talvez durante esse período que a história de uma grande cultura nesses lugares uma vez dominados pelos gregos ganhou popularidade Não é impossível que a saga da Guerra de Troia remonte até mesmo em algum tipo de forma versificada aos fatos reais do século XII aC Os poemas que temos preservam alguns elementos que são de tempos micênicos tanto linguística como culturalmente Assim os heróis de ambas as epopeias usam com regularidade armas e implementos de bronze o ferro que se tornou o metal mais comum depois do fim da cultura micênica na chamada Idade das Trevas de 1100800 aC é raras vezes mencionado A luta com carros é conhecida Os desenhos de escudos elmos e espadas coincidem com objetos encontrados no século XII Lugares nomeados no texto como fonte de tropas e navios em muitos casos nem eram habitados depois do século XII e portanto os poemas devem preservar deles uma memória histórica antiga E a confederação guerreira que dominou Troia parece se encaixar no padrão assentamentocidadela da época que as epopeias se propõem descrever A arqueologia mostra que Pilo e Tiro Micenas e Tebas eram centros importantes na idade do bronze e essas cidades figuram com destaque nas epopeias Ao mesmo tempo é claro que séculos de transmissão e remodelamento dos poemas dentro de uma tradição oral permitiram que elementos históricos de outras eras se entrelaçassem às linhas mais antigas Por exemplo embora carros sejam usados os heróis param e descem deles para lutar ao contrário do uso que se fazia deles em culturas mais para o leste o que leva a pensar que o poeta não tinha certeza de como eram empregados de fato na guerra Alguns objetos e nome de locais já do século VI aC foram detectados nas epopeias embora o autor evidentemente tenha tentado arcaizar As estruturas políticas da pólis cidadeestado cristalizadas pela primeira vez no século VIII aC e a importância do santuário de Apolo em Delfos fenômeno do século VII são outros traços não micênicos importantes Já se disse que a ênfase na própria expedição grega unificada deve estar ligada a instituições panhelênicas que se desenvolveram no século VIII reunindo gregos de todas as regiões depois de vários séculos de isolamento Nagy 1999 Muitos indícios apontam portanto para um período de quatro séculos posteriores à Guerra de Troia como o período de incubação crucial para tradições épicas em contínuo desenvolvimento Se a cidadela em ruínas objeto do cerco legendário foi revelada o que dizer do lugar de onde Odisseu saiu para ir a Troia e sua história Ítaca hoje é uma ilha rochosa a cerca de cinquenta quilômetros da costa ocidental da Grécia continental Pequena o suficiente para ser percorrida de bicicleta em um único dia não é nem rica em antiguidade nem famosa a não ser como lar e reino de Odisseu Assim como a cidade de Troia não há como afirmar se a ilha hoje chamada Ítaca ou Thiaki era o lugar imaginado pelo poeta da Odisseia Escavações em curso por uma equipe da Universidade de Washington em St Louis descobriram até agora restos que podem ser micênicos cuja identidade ainda não está esclarecida De qualquer forma vale a pena lembrar que mesmo dentro do poema a vida em Ítaca dificilmente se comparava ao esplendor dos palácios visitados por Telêmaco no continente O jovem herói conta a seu anfitrião Menelau que sua ilha natal ao contrário de Esparta não tem espaço suficiente para criar cavalos Sob outros aspectos também podemos considerar que Ítaca fosse menos poderosa e importante Desprovida de grandes forças seu comandante Odisseu devia operar por outros meios seu caráter indireto e astuto se encaixa no panorama de recursos reduzidos de seu compacto reino No entanto a morada de Odisseu mesmo de forma discreta apresenta sinais de um centro econômico real O rei tem rebanhos e manadas em outras ilhas e no continente Empregados como o porcariço Eumeu que foi obtido por compra ou conquista mantêm os recursos da casa grande As mulheres estão sempre trabalhando no palácio produzindo tecidos E o grande depósito de Odisseu que Penélope visita no canto 21 está cheio de ouro bronze e ferro Esses bens imperecíveis eram usados ao longo de todos os primeiros tempos gregos para construir relações de trocas recíprocas com outros aristocratas por meio de presentes ostentatórios Os presentes de Menelau e Alcínoo se encaixam nessa dinâmica Odisseu como somos informados no canto 1 verso 177 tinha o costume de fazer visitas mesmo antes de suas viagens Fora de ação durante vinte anos no entanto ele não só perdeu a oportunidade de participar desses importantes intercâmbios de prestígio como também sofreu a ameaça de perder seu gado pela depredação dos pretendentes O disfarce de mendigo que assume em Ítaca se aproxima perigosamente da verdade A Odisseia parece reconhecer quão tênue é a linha divisória entre a existência confortável e a penúria Sem dúvida na economia de subsistência em que vivia a maioria dos gregos de muitas eras essa lição faz sentido A insistência do poema na perda e no ganho reflete ansiedades reais de que os infortúnios econômicos de apenas um homem pudessem comprometer as vidas de seus descendentes durante um longo tempo Leitores modernos estão interessados na história da política e da economia contudo devemos lembrar que também se pode falar de história no âmbito dos sentimentos e atitudes condicionados por um conjunto de experiências reais A maneira como os gregos do passado reagiam com criatividade às exigências e desafios de seu próprio tempo isso também é história Enquadrada na narrativa do regresso de Odisseu a ideia persistente de que cada pessoa precisa de um lugar é tomada como um fato sem apologia sentimentalismo ou melodrama Só nas ficções criadas por Odisseu ie 14 199ss é que ouvimos falar de homens vagando em busca apenas de aventura Sentese que por baixo da eloquência e da economia da Odisseia existe a experiência de gerações de gregos ansiando por um lar exilados políticos guerreiros colonizadores marinheiros bardos itinerantes Como os turbulentos séculos em que surgiram numerosas cidadesestados gregas de 900 a 700 aC coincidem com o desenvolvimento da poesia épica é ainda mais plausível que as plateias sentissem empatia com uma história de volta ao lar como essa Em sua destilação de sentimentos e celebração da sobrevivência mais do que na representação de fatos sociais é que a epopeia pretende contar as verdades do passado Os deuses de Homero Outra faceta atraente da epopeia homérica é o retrato persuasivo que ela traça de um mundo além do humano Os deuses e deusas da Grécia arcaica são como humanos em quase tudo menos numa coisa nunca morrem Sem idade e imortais alimentados por néctar e ambrosia com ikhór cristalino correndo nas veias em vez de sangue os deuses vivem tranquilos numa calma desanuviada nas alturas nevadas do monte Olimpo ao norte da Grécia Podem teoricamente ignorar os humanos limitados pela morte Mas na imaginação grega os deuses precisam das pessoas tanto quanto as pessoas precisam deles Os poemas homéricos revelam um fascínio por esse elo simbiótico entre deuses e mortais um contato sempre oscilante entre adoração e antagonismo Os deuses são muito mais que uma fantasia homérica Durante milênios os gregos adoraram as divindades mencionadas nas epopeias e muitas mais Não há como ter alguma certeza do que de fato tinham em mente ao fazêlo Mas se tomarmos a Odisseia como guia era algo assim deuses são inquisitivos intrometidos orgulhosos de seus humanos favoritos e perigosamente suscetíveis de se enraivecer Para conservar seu favor os mortais precisam oferecer sacrifícios certificarse de preencher as narinas celestes com o aroma da carne assada O ritual de verter vinho associado à oração também funciona para aplacar os deuses O herói luta para conquistar a única imortalidade acessível a humanos a fama épica kleos Para tanto precisa vencer obstáculos com ajuda divina ou ser espetacularmente derrotado ao desprezála Podese ver Odisseu envolvido numa questão religiosa testando a eficácia de sua atitude em relação ao divino e determinando para si mesmo se os deuses vão lhe dar ouvidos e ajudálo O divino está em toda parte em Homero sua poesia é profundamente teológica Uma razão para a a epopeia se deter tanto em banquetes e bebidas por exemplo é porque esses eventos são cruciais na Grécia arcaica cada refeição era também um ato religioso Cada amanhecer é com efeito obra de uma deusa Aurora Lua e sol rios cavernas e árvores são deuses ou abrigam um habitante divino Num nível emocional mais profundo ouvimos ao longo de toda a Odisseia que os humanos descendem efetivamente de Zeus de Ares ou de Posêidon Odisseu o herói desse poema tem uma ancestralidade interessante seu avô materno Autólico cujo nome significa o próprio lobo é um trickster e ladrão que em algumas versões do mito era filho de Hermes deus conivente A versão homérica abranda esse passado sombrio defendendo em vez dela a história de que Hermes ensinou a Autólico a arte do roubo 19 395 98 Isso levanta a questão da moralidade dos deuses homéricos Não muito depois de as epopeias ganharem forma os filósofos já começavam a criticar suas divindades Disse um moralista do século VI Xenófanes Homero atribui aos deuses tudo o que é mais vergonhoso entre mortais Eles roubam cometem adultério e enganam uns aos outros No começo do século IV aC Platão chegou ao ponto de banir a poesia de Homero da cidade idealizada moralmente íntegra que esboça em sua obra A república A seu ver a boa ordem do Estado era ameaçada não só quando seus líderes liam a respeito e imitavam os personagens que Homero apresentava como incapazes de controlar suas emoções Era um risco também que seus habitantes acreditassem em divindades menos que perfeitas Os deuses de Homero podem constituir paradigmas éticos pobres mas mesmo assim encarnam verdades reais São de fato poderes maiores que nós em ação no mundo Esses poderes parecem caprichosos e às vezes cruéis Emoções assoladoras desejo ardente embriaguez a ira da guerra de onde mais elas poderiam vir senão de deuses Chamar essas experiências respectivamente de Afrodite Dionísio e Ares era darlhes nome mas ao mesmo tempo controlálas Pois os deuses uma vez humanizados funcionam como uma família expandida e um tanto disfuncional na qual existe ao menos alguma organização Governando do alto está Zeus que impõe suas ordens com raios brancos ardentes Hades e Posêidon seus irmãos têm seus lugares no mar e debaixo da terra Outros deuses e deusas alinhamse como filhos ou filhas de Zeus Há uma bela economia em tal sistema politeísta um deus equilibra o outro de um modo quase comicamente doméstico Se a mãe Hera diz não você pode pedir para o pai Zeus Humanos conseguem o que pedem rezando a quantos deuses desejarem Quando se trata da Odisseia Atena merece atenção especial Embora não se saiba da história por Homero o nascimento fora do comum da deusa virgem filha de Métis astuta inteligência é bem conhecido Podemos questionar por que essa deusa das habilidades inclusive a habilidade da guerra fica tão ligada ao modesto mortal Odisseu Em primeiro lugar ao que parece porque ele é como ela de fato seu epíteto usual é polimétis literalmente possuidor de grande inteligência astuta No entanto sentese um elemento de competição no relacionamento deles Uma conversa reveladora entre deusa e protegido ocorre no canto 13 quando Odisseu acabou de voltar a sua ilha Em resposta à sua conveniente ficção sobre como chegou em casa Atena responde com uma repreensão amigável e um toque de orgulho Não ias nem mesmo estando em tua terra cessar os engodos e discursos furtivos que do fundo te são caros Vamos não falemos mais disso ambos conhecemos maneios pois és de longe o melhor de todos os mortais em planos e discursos e eu entre todos os deuses na astúcia famosa e nos maneios versos 29399 Muitas histórias míticas contam de humanos que desafiaram os deuses e perderam Então parte do suspense da Odisseia deve brotar precisamente dessa perigosa colaboração entre divino e mortal Odisseu irá de alguma forma ultrapassar a linha Ele será bom a ponto de conquistar a admiração e ajuda da deusa Ou se gaba demais da própria habilidade correndo o risco de despertar o ciúme de Atena e cortejar o abandono ou a morte Na Odisseia Zeus seu irmão Posêidon e sua filha Atena são poderes mais que arbitrários ou independentes O poeta desde o começo da epopeia enfatiza as complexas relações e repercussões familiares envolvidas quando essas três divindades se imiscuem em questões de justiça humana Zeus o deuschefe é responsável por manter a justiça em nível cósmico Se alguém grego ou troiano é maltratado Zeus pode ser invocado para testemunhar o ultraje e tomar a ação corretiva Ele às vezes usa seus raios explosivos Ao mesmo tempo tanto Atena como Posêidon têm reclamações contra os gregos por injúrias pessoais a dessacralização do templo troiano de Atena e o cegamento do ciclope Polifemo filho de Posêidon Então Zeus enquanto mantém a ordem no mundo tem de trabalhar também a harmonia do Olimpo A esse respeito as aventuras de Odisseu levam os deuses a uma nova compreensão de suas limitações e interdependência Assim um humano que respeita a religião pode alterar as configurações do divino Nesse sentido de ética humana e divina a Odisseia em especial é diferente de narrativas de vingança mais simples Esta epopeia não trata de vingança brutal ou violência gratuita Ao longo de todo o poema a justeza de atos importantes humanos ou divinos é cuidadosamente analisada debatida e avaliada Disputas são discutidas e pesadas pelas várias figuras envolvidas Já se pode ver em ação o espírito analítico que impregna o exame que Platão faz da justiça em seu diálogo A república séculos depois À primeira vista o mundo da Odisseia pode parecer sem lei Seus habitantes claramente vivem sem regras formais escritas estabelecidas e impostas por autoridades legais Mas a justiça não depende de leis De fato a palavra grega diké com frequência traduzida como justiça está mais próxima de ideias como costume hábito e adequação O jeito como estão as coisas normalmente quando família comunidade e mundo estão em ordem é o jeito como as coisas devem estar E isso não depende da adesão a algum código externo de comportamento Diké nesse sentido grego arcaico pode mesmo ser descrita como obra da natureza Quando por exemplo Odisseu encontra sua mãe no mundo inferior e não pode abraçála ela lhe diz que esse é o jeito diké de mortais quando morrem terem suas almas voando embora como um sonho enquanto o corpo é queimado 11 21824 Animais também podem ter diké Mas tanto humanos como animais às vezes ultrapassam os limites dessa justiça natural Eles o fazem quando perturbam a ordem das coisas seja se recusando a dar aos outros o que lhes é de direito seja por tentar tirar os bens ou a honra de outrem Essas ações ao contrário de diké são chamadas em grego de hubris Na Odisseia os pretendentes de Penélope encarnam o comportamento da hubris Eles não só estão rompendo as normas da hospitalidade parte importante da diké como cortejam com arrogância a rainha sem levar em conta precedentes verdade ou costume Eles arruínam a casa e desonram seus habitantes Odisseu ao contrário ao longo de todo o poema emprega sua sabedoria natural para se adaptar à maneira das coisas e à vontade dos deuses É isso mais que sua piedosa integridade que o torna justo em termos homéricos Sua vitória miraculosa sobre os 108 pretendentes é uma confirmação de que Zeus e os deuses olímpicos conservam o equilíbrio do mundo Ultrapassar os limites acaba atraindo retaliação Odisseu é o agente dessa justiça divina Para apreciar por completo a postura ética da Odisseia pode ser útil conhecer algo mais sobre o elo entre justiça e hospitalidade Na Grécia antiga os conceitos de anfitrião hóspede e estranho são expressos por uma única palavra xenos A ideia unificada tão diferente da forma como nós distinguimos os três conceitos pode ser vista em ação ao longo de toda a Odisseia Com insistência o poema põe em primeiro plano o tema da xenia a relação hóspedeanfitrião A trama se desenrola em função dessa ideia e os personagens do ciclope até os pretendentes são julgados pela maneira como exercem o ideal do tratamento adequado a estranhos Xenia em resumo representa a epítome da moralidade da Odisseia Não é de surpreender que numa cultura arcaica préalfabetizada onde não havia instituições internacionais ou normas reconhecidas o comportamento correto em relação a estranhos fosse considerado obrigação sagrada O mesmo fenômeno pode ser observado ainda hoje em culturas pequenas e isoladas Essa era com efeito a única maneira pela qual indivíduos podiam sobreviver além dos limites de sua comunidade local Zeus tinha um título especial Xenios para denotar seu papel como protetor de estrangeiros Qualquer infração era pois uma ofensa contra o deus supremo Xenia representa um exemplochave de uma exigência cultural maior de reciprocidade Podese ver esse grande princípio em ação numa série de outras áreas mencionadas nos poemas homéricos O sacrifício de animais as orações e a guerra eram baseados na ideia de que esse equilíbrio tinha de ser mantido dando ou retribuindo favores ou hostilidade fosse entre humanos ou entre humanos e deuses As expectativas recíprocas subjacentes à xenia podem explicar a semântica do termo Assim como qualquer estranho era um hóspede em potencial e tinha de ser tratado como tal qualquer hóspede era por implicação um anfitrião em potencial uma vez que se esperava que ele retribuísse qualquer tratamento que houvesse recebido Toda a saga da Guerra de Troia pode ser interpretada como um exemplo mítico das catástrofes produzidas por relações impróprias entre anfitrião e hóspede Páris o jovem príncipe troiano era hóspede de Menelau em Esparta quando fugiu com a esposa do anfitrião Helena Os comandantes gregos que haviam jurado ajudar Menelau foram obrigados a vingar esse crime contra a xenia até o extremo de cercar e arrasar Troia Dessa forma o mito funciona como um precedente legal justificando as práticas societárias por referência a um caso A volta de Odisseu desde Troia é portanto a continuação de uma lição de moral acerca da necessidade de manter o equilíbrio na intersecção dos níveis social e cósmico Se Odisseu é bem tratado está tudo bem no mundo A importância de um tema assim como a maioria das ações sociais significativas na Odisseia pode ser medida pela quantidade de vezes que o tema reaparece Além disso a repetição vem na forma de roteiros estilizados quase previsíveis que os homeristas chamam de cenas típicas É difícil dizer se os roteiros são recursos poéticos ou rituais sociais um reforça o outro O típico é o estrangeiro ser bem recebido com palavras gentis com a oferta de um banho e roupas limpas comida e bebida e sem perguntas enquanto não forem cumpridas essas preliminares Ele é estimulado a ficar o quanto quiser Ao partir lhe são fornecidos transporte e presentes Esses preciosos itens de troca constituem uma combinação de suvenir e declaração para o mundo da excelência do comportamento do anfitrião porque a xenia assim como tudo o mais na cultura grega podia se tornar competitiva Se guerreiros como Odisseu podem se transformar em paradigmas de um comportamento que a divindade aprova não é de surpreender que mortais especiais possam obter um lugar separado do de outros humanos mais próximo dos deuses em termos de celebridade e poder A ideia do herói como alguém entre homem e deus é uma invenção especificamente grega Por todo o mundo grego os túmulos de homens e mulheres que obtiveram fama na comunidade eram locais de adoração desde pelo menos o século VIII aC até mesmo na era cristã Vale notar que nem todos eram de jeito nenhum heroicos no sentido corrente de hoje Os hérós e héroiné não eram seres primordialmente morais mas sim pessoas de grande força ou de conexões especiais com o divino O poder de amaldiçoar ou causar dano a outros marcava o status de herói tanto quanto a coragem em prol da sociedade esse era o lado escuro do poder de fazer o bem ou curar Héracles cujas aventuras o levaram por todo o mundo conhecido combinava de maneira conspícua a coragem do guerreiro com seu comportamento anômalo furioso mesmo às vezes desculpado como loucura enviada por sua nêmesis Hera Ele morreu mas paradoxalmente viveu para sempre ao ser levado para o Olimpo depois de sua morte feroz no monte Eta Sua história pode ser tomada como um paradigma para outras o herói luta governa muitas vezes peca morre e ganha fama pós morte uma forma de imortalidade ao lado de seu poder semidivino Mesmo o parricida Édipo era associado a honras heroicas em diversos lugares a peça Édipo em Colono de Sófocles conta da luta entre Atenas e Tebas na disputa pelo prêmio de abrigar seu túmulo Dentre aqueles associados à saga de Troia figuras como Aquiles Menelau Agamêmnon e Diomedes eram adorados com ritos de sacrifício específicos do culto aos heróis em santuários por todo o Egeu Os aspectos perigosos do herói podem ser em parte vislumbrados nas histórias sobre cada um desses homens tanto dentro das epopeias homéricas quanto além delas A fúria sagrada de Aquiles que causou a destruição de seus próprios companheiros na guerra bem como sua capacidade guerreira contra os troianos comprovava seus poderes heroicos Centenas de outros heróis muitos deles desconhecidos no geral são nomeados em outras fontes literárias ou em inscrições uma vez que cada comunidade de alguma importância podia exibir seu herói local Os pretensos túmulos de heróis e heroínas atraíam pessoas em busca da bênção e proteção que ancestrais assim poderosos poderiam prover Trabalhos arqueológicos recentes demonstram que em muitos casos esses cultos começavam em tumbas reais de pessoas da era micênica talvez locais redescobertos no século VIII e depois No nível civil as figuras heroicas eram muitas vezes pioneiros fundadores de uma cidade ou colônia e assim constituíam epítomes da história e das ambições de uma comunidade O fato de líderes de expedições colonizadoras serem por vezes assassinos fugitivos em nada diminuía sua heroicização A história de Odisseu une diversos desses traços Primeiro há indícios de que era adorado como herói em Ítaca com a consagração de trípodes arcaicos feita numa caverna perto da baía Polis a data da sagração é discutível século VIII ou III aC Segundo no século VI aC e muito provavelmente antes a Teogonia de Hesíodo atribuía a Odisseu dois filhos com Circe chamados Latino e Ágrio que afirmavase terem governado junto com Telêmaco os etruscos do ocidente Em outras palavras Odisseu era ao mesmo tempo herói e pai de heróis colonizadores Por fim em sua fúria justificada contra os pretendentes Odisseu se assemelha a seu rival Aquiles como expoente de ira divina Personagem e triângulo doméstico A Odisseia contém dezenas de personagens Parte do encanto do poema está em sua capacidade de criar um mundo fictício realista povoado não apenas por heróis mas por escravos e criados que os servem pastores e cocheiros além de bardos e videntes Segundo um importante tratado sobre arte literária Do sublime atribuído a certo Longino e presumivelmente escrito no século I de nossa era os esboços de vida cotidiana da casa de Odisseu constantes do poema eram comédia de costumes IX 15 kómóidia tis estin éthologoumené Apesar de toda a profusão de personagens o poema permanece focado em torno de três mortais Odisseu seu filho e sua esposa O papel de Telêmaco como um foco da narrativa e figura próxima do público já foi mencionado Mas que dizer de seus pais Um folclorista classificaria Odisseu o protagonista compacto rijo que derrota grandes feras como aquela figura universal do trickster Esses personagens brotam da profundidade dos mitos Tricksters bem conhecidos dos nativos norteamericanos e da África personagens como Aranha Corvo ou Coiote dão forma à maneira como o cosmos é organizado criando novas terras ou inventando habilidades ou elementos essenciais como a tecelagem ou o fogo Hermes em algumas versões um ancestral de Odisseu se encaixa nesse aspecto o Hino a Hermes mostra sua invenção do sacrifício por exemplo enquanto Odisseu apresenta qualidade de trickster numa dimensão mais humana Assim como as figuras folclóricas ele está associado à comida como o mendigo esfaimado ou o senhor que dá vinho aos ciclopes bem como o único guerreiro da Ilíada a insistir com Aquiles para que coma antes da batalha Como o trickster ele é conhecido pelas relações com mulheres e comportamento lúbrico Suas aventuras muitas vezes envolvem animais Ele próprio não é bestial mas goza mesmo assim de um status limítrofe por vezes na fronteira entre o mundo humano e o natural Podese ler seu personagem como um avanço além da amoralidade do trickster como ele sabe muito sobre comida pode também resistir a tentações cf o gado de Sol e como sabe muito sobre mulheres também pode resistir a Circe e a Calipso ao menos no final Odisseu encarna as exigências mais rígidas do éthos heroico embora possa ser excessivo chamálo de trickster ético A Odisseia porém é mais que uma narrativa picaresca sobre um herói trickster A mudança fundamental do folclore para o épico ou diriam alguns protorromance depende da decisão do poeta de cravar Odisseu num conjunto de relacionamentos com outros personagens um ambiente raro para o trickster em geral um lobo solitário A Odisseia insiste nessas conexões sociais por sua própria estrutura entrelaçando as histórias de Telêmaco e Penélope com a de Odisseu e emoldurando o todo dentro do motivo de uma família que com cautela avança ao encontro do destino Vale a pena apontar ainda que a volta ao lar nostos de Odisseu é uma volta ao mesmo tempo pessoal e sociopolítica Isso torna a Odisseia mais complexa e realista do que um simples romance sobre um casal que se reencontra De fato quando ouvimos falar de Odisseu pela primeira vez no poema Penélope ainda nem foi mencionada ele está sentado na praia da ilha de Calipso desejando ver a fumaça da chaminé de seu lar Um enraizamento e segurança mais amplos estão em questão com sua volta Odisseu precisa de seu lugar no padrão social como rei guerreiro aristocrata pai marido filho tanto quanto anseia pela intimidade privada com a esposa Por outro lado seu reencontro com Penélope renova toda Ítaca até mesmo Laerte seu pai rejuvenesce e quando o poema termina três gerações estão juntas uma imagem ideal de continuidade e regeneração Isso quer dizer enfim que o caráter de Odisseu no poema é uma função de sua abertura sua habilidade de se permitir confiar em outros poucos como Nausícaa de perder ao menos um pouco da desconfiança do solitário Engodo e espírito de sobrevivência o legado do trickster permitem que ele chegue em casa onde imaginação empatia e uma sensação de responsabilidade mais ampla completam sua reintegração mesmo depois de vinte anos de ausência E que dizer da mulher que esperou todos esses anos No final da Odisseia sentimos que o heroísmo feminino é tão importante senão mais que o masculino O heroísmo de Penélope assume uma forma que William Faulkner identificaria milênios depois entre os sobreviventes do Sul torturado dos Estados Unidos uma calada capacidade de suportar Não podemos separar a caracterização de Penélope do cuidadoso tratamento do poeta com as mulheres em geral As mulheres no poema são muito fascinantes porque seus retratos tendem a se sobrepor e ressoar Penélope e a ninfa Calipso são ambas tecelãs e criadoras com uma ligação profunda com Odisseu Helena parece Circe em seu conhecimento de drogas e seus efeitos sobre os homens Arete a rainha dos feácios governa a casa da ilha assim como Penélope ela assim como sua filha Nausícaa e a ninfa Leucoteia revelamse benfeitoras durante a busca do herói E claro Atena a astuta e sábia protetora de Odisseu assume algo de todos esses papéis femininos como diretora de cena da trama e traça a volta do herói Odisseu parece tão intimamente ligado a ela como à sua sofredora esposa Dada sua importância uma teoria sobre a origem do poema sugere que a Odisseia foi registrada por escrito em Atenas especificamente em honra da padroeira divina daquela cidade São tantos e tão artísticos os retratos de mulheres fortes e fascinantes na Odisseia que mais de um crítico propôs que o poema tivesse sido composto para uma plateia predominantemente feminina Indo um pouco mais longe o romancista inglês Samuel Butler publicou em 1897 The Authoress of the Odyssey A autora da Odisseia no qual sugere que uma moça escreveu a epopeia alguém como Nausícaa Sabendo o tipo de recepção que seu livro bastante irônico receberia dos homeristas verdadeiros de seu tempo Butler divagou assim Será que os eminentes estudiosos homéricos encontraram tamanha seriedade nas partes mais humorísticas da Odisseia porque eles teriam colocado a seriedade ali Para os sérios tudo é sério A visão de Butler infelizmente vem carregada de uma dose de sexismo vitoriano para ele os indícios de um autor feminino eram dados por traços da Odisseia como um tom mais leve um interesse narrativo em dinheiro e em mentiras e em certa confusão na descrição do cordame dos navios Ele observou com correção que ninguém ri das mulheres na Odisseia mesmo que as pessoas riam com bastante frequência na Odisseia como um todo vinte e três vezes contra onze vezes na Ilíada O que Butler e outros caracterizaram como uma diferença de visões de gênero nos dois poemas pode ter mais a ver com o tema e o conteúdo A Odisseia parece ser muito mais humana prática e pragmática mais interessada no cotidiano que naquilo que é exclusivamente heroico mais religiosa no sentido de que mostra a imanência do divino e os deuses moldando um final feliz e mais esperançosa que a Ilíada ao menos na sugestão de que é possível voltar para casa Se isso reflete um ponto de vista feminino depende é evidente de como determinada cultura conceitua o gênero É inegável que os traços mais sofisticados de caracterização e insight psicológico na Odisseia têm como centro uma mulher Penélope No decorrer do poema nós a vemos como mãe ansiosa lidando com um filho que atinge a maioridade como esposa fiel saudosa do marido ausente há vinte anos como chefe de uma casa real de grande dimensão e como objeto do desejo de uma multidão de jovens pretendentes determinados De fato a história é tanto sobre Penélope quanto sobre Odisseu Em sua inteligência e firmeza ela permite que ele sobreviva uma vez em casa E é seu astuto teste final da cama que o leva a reconhecer seu laço emocional com ela por ser um emblema dessa ligação Mas arrolar as qualidades de Penélope como se nunca fossem postas em dúvida é desperdiçar o suspense que a narrativa do poema consegue criar e manter Ela vai continuar firme O que ela quer de verdade Em anos recentes vimos numerosos estudos sobre Penélope inspirados por abordagens feministas Cohen 1995 FelsonRubin 1997 Katz 1991 e Doherty 1995 Com a ajuda deles podemos apreciar melhor a complexidade e mesmo a ambivalência que o poeta homérico embutiu no retrato da rainha de Ítaca A decisão de Penélope de aparecer diante dos pretendentes embora declare abominálos e de instituir o concurso de arco e flecha justo quando seu marido voltou deixa a plateia se perguntando sobre sua motivação e método Ela cedeu relutante às exigências dos pretendentes ou ao contrário intuiu que o sofredor Odisseu está de volta Será possível que a vida solitária tenha lhe dado uma nova independência de forma que ela ao contrário de suas primas Helena e Clitemnestra possa efetivamente tomar boas decisões na ausência do marido Ela é de fato a força que mantém a casa E o que tudo isso pode ter significado para uma plateia grega arcaica A descrição do poema homérico como a da trama de relações que Penélope mantém permanece forte e provocante e o poema chega vívido ao século XXI TRADUÇÃO José Rubens Siqueira 1 As obras citadas encontramse listadas na Bibliografia p 625 2 Escolha igualmente adotada pelo tradutor da presente edição conforme atestam as versões entre colchetes 3 Uma versão ficcional das pesquisas empreendidas por Parry e seu assistente pode ser encontrada no romance Dossiê H do escritor albanês Ismail Kadaré trad Bernardo Joffily São Paulo Companhia das Letras 2001 N E INTRODUÇÃO CHRISTIAN WERNER Para o verbete odisseia encontramos no Dicionário Houaiss da língua portuguesa três acepções 1 longa perambulação ou viagem marcada por aventuras eventos imprevistos e singulares 2 narração de viagem cheia de aventuras singulares e inesperadas 3 travessia ou investigação de caráter intelectual ou espiritual Embora não o esgotem esses sentidos abarcam o conteúdo do poema atribuído a Homero sobretudo quando se compara a Odisseia a outro poema épico grego a Ilíada atribuído por muitos desde a Antiguidade ao mesmo Homero As obras deixaram duas expressões em português que aludem ao modo como se deu a recepção dos poemas no Ocidente gregos e troianos em referência a um par de opostos inconciliáveis e odisseia que antes de tudo remete a um percurso cheio de dificuldades e que convida a uma narração As acepções em estado de dicionário embora de forma mais restrita ou seja sem dar conta de uma complexa teia mitopoética fazem parte da história do termo grego nostos cujo sentido básico e mais comum é retorno sendo composto por um lexema presente em nost algia palavra moderna que designa a dor causada por uma distância virtualmente intransponível de um lugar ou tempo familiar e desejável A raiz verbal do substantivo nostos porém tem a conotação mais precisa de voltar são e salvo para casa e também a de retornar da morte para a vida Frame 2009 a primeira acepção do dicionário longa perambulação está presente em nostos ao passo que a segunda narração de viagem pertence à história de outro substantivo que parece compartilhar da mesma raiz noos que se refere em Homero a uma faculdade cognitiva ligada à visão e pode ser traduzido por mente ideia e espírito Tais sentidos de nostos apontam para uma constelação mítica na qual se articulam duas imagens ou ideias o percurso da morte para a vida e o caminho da escuridão para a luz Vejamos de que forma eles marcam a Odisseia a partir de um roteiro que investiga os significados da palavra Antes contudo passemos por um rápido resumo da narrativa O poema começa quando o herói decide retornar a sua ilha Ítaca e retomar o poder sobre ela e sua casa instigado e auxiliado por dois deuses Atena que por diversas vezes estará ao lado de Odisseu também conhecido por Ulisses que deriva através do latim Ulixes das variantes dialetais gregas Oluteus Oluxeus e Oulixês entre outras e Zeus que em última instância tem controle sobre o retorno do herói Marks 2008 Bakker 2013 Nos cantos de 1 a 4 o leitor acompanha Telêmaco e os pretendentes de Penélope que tendo se declarado viúva viuse cercada de um bando de jovens que a cortejam não escolhe nenhum acreditando no regresso do marido Para pressionála os pretendentes dilapidam as riquezas de Odisseu enormes rebanhos de gado e ovelhas Telêmaco sentindose prejudicado recebe uma visita de Atena e resolve partir em busca de novas acerca do pai Começa por visitar dois nobres Nestor e Menelau antigos companheiros de arma de Odisseu Vinte anos antes Odisseu participara da guerra contra Troia também referida como Ílion Páris filho de Príamo rei de Troia seduzira a belíssima Helena mulher de Menelau rei de Esparta Odisseu e seus companheiros de Ítaca e cercanias engrossaram o enorme contingente de tropas gregas4 sob o comando de vários heróis como Agamêmnon comandante supremo irmão de Menelau Aquiles Ájax Nestor e Diomedes As tropas guerrearam Troia por dez anos até aniquilar a cidade matar a população masculina e escravizar mulheres e crianças valendose do bemsucedido artifício do cavalo de madeira que permitiu superar as muralhas de proteção Fora uma guerra motivada tanto pela reparação da desonra causada pelo rapto de uma rainha casada com um nobre poderoso quanto pela perspectiva de bens materiais que a vitória propiciaria àqueles que resistissem até o triunfo final Terminada a guerra alguns heróis chegaram rápida e facilmente em casa outros como Menelau e Odisseu nem tanto No canto 5 Odisseu está numa ilha distante das terras conhecidas pelos homens cuja senhora é a ninfa Calipso de quem se vê obrigado a ser amante Por ordem dos deuses a ninfa permite que ele parta O herói se lança ao mar numa jangada destruída em uma tempestade enviada pelo deus que é seu antagonista o senhor dos mares Posêidon Náufrago Odisseu chega a Esquéria ilha do povo feácio É muito bem recebido pelo casal real Arete e Alcínoo e sua filha Nausícaa que o celebram em banquetes jogos esportivos e performances do poeta local o excelente e cego Demódoco O bardo canta três histórias a briga entre Odisseu e Aquiles em certo momento da Guerra de Troia o adultério de Afrodite com Ares e a tomada de Troia por meio da emboscada do cavalo de madeira comandada por Odisseu cantos 68 Só depois dessa terceira história o herói é confrontado pelo rei para revelar sua identidade numa longa madrugada ele conta todas as aventuras pelas quais passou até chegar à ilha de Calipso entre elas o cegamento do ciclope Polifemo a resistência ao canto das Sirenas e o ano que passou com outra ninfa a maga Circe cantos 912 No canto 13 enfim Odisseu desembarca em Ítaca Obedecendo a um conselho de Atena que o torna irreconhecível ao transformálo em mendigo ele não revelará a identidade a seus familiares É como mendigo e declarandose cretense que aparece a seu fiel porqueiro Eumeu canto 14 e com ele adentra sua antiga casa canto 18 não sem antes mais uma vez com o auxílio da deusa identificarse ao filho canto 16 Sofrerá várias humilhações em sua própria morada cantos 1721 mas também cativará Penélope ainda sem conhecer a identidade do estrangeiro porém curiosamente à vontade na presença dele a rainha estabelece uma prova entre os pretendentes para escolher o novo marido desposará quem for capaz de manejar o arco de Odisseu e fazer a flecha passar entre doze machados canto 19 Ninguém consegue salvo o mendigo canto 21 que dirige a segunda flecha contra um dos líderes dos pretendentes na sequência todos são chacinados canto 22 Enfim Odisseu revela sua identidade à esposa passa com ela a noite canto 23 e no dia seguinte precisa enfrentar os parentes furiosos dos pretendentes mortos canto 24 Mas Zeus interfere impedindo outra escaramuça e o poema termina O retorno a casa Quando pensamos em Odisseu logo nos ocorre o estratagema de sua devotada Penélope que de dia tecia uma mortalha para o sogro Laerte e à noite a desfazia ou as aventuras a que o herói sobrevive depois que os navios sob seu comando deixam Troia O poema tematiza sua própria condição de existência como uma rememoração de façanhas de homens notáveis no passado ou seja sugere que existe para rememorar aproximar do presente uma linhagem de homens para sempre extinta que um dia estiveram próximos dos deuses a quem se ligavam por parentesco ainda que distante os heróis Graziosi Haubold 2005 Além de honra e riqueza todo herói que se destacasse nos combates em Troia conquistaria a fama a ser perpetuada entre as gerações futuras inclusive e em especial como canto poético Assim o herói supremo da Ilíada é Aquiles graças a ele o poema existe Odisseu por seu turno ao embarcar rumo a sua ilha leva na bagagem enorme riqueza provas de sua honra e a glória de ter sido o derradeiro responsável pelo êxito da batalha final A tudo isso porém são dados valores cambiáveis à medida que a Odisseia transcorre e um mundo diverso daquele da Ilíada é apresentado no poema A Ilíada ou seja a representação da Guerra de Troia e daquilo que motivou as ações de seus combatentes é o passado da Odisseia O leitor moderno pode já ter deparado com obras que remetem a determinado aspecto da Odisseia a saber o dos problemas enfrentados por combatentes que retornam de uma guerra árdua pensemos por exemplo em Mrs Dalloway de Virginia Woolf e nos filmes sobre os norteamericanos que combateram no Vietnã A Odisseia elabora uma postura crítica ou pelo menos polêmica em relação ao modo como a Guerra de Troia conferiu fama heroica a Odisseu e outros gregos É crítica por exemplo ao acentuar danos irreparáveis causados à casa de um senhor quando de sua ausência excessivamente prolongada Clitemnestra esposa de Agamêmnon trai o marido ausente com Egisto que mata o titular quando ele retorna É polêmica ao contrapor feitos heroicos e suas consequências como o regresso de Odisseu e a morte de Aquiles Quando se menciona um fato que do ponto de vista da viagem de volta do herói esqueleto do poema está no passado distante como o retorno do generalíssimo Agamêmnon a sua casa onde em companhia de sua valiosa concubina troiana Cassandra filha de Príamo é vítima de emboscada essa história embutida coloca o poema sob determinada perspectiva não há como Odisseu ter certeza de que Penélope não será a sua Clitemnestra e isso explica que ele aceite a tática de Atena O fracasso da volta de Agamêmnon episódio várias vezes lembrado na Odisseia sugere que a glória obtida pela destruição de Troia nada garante a posteriori a não ser algum tipo de lembrança O Odisseu que a Odisseia quer que admiremos não é o herói das façanhas guerreiras em Troia Quando navega ao longo da ilha das Sirenas amarrado ao mastro de seu barco é o único ouvinte de seus feitos pregressos narrados pelas criaturas míticas com um canto cuja finalidade é atrair para a morte quem o escuta quando vestido com sua armadura atravessa o estreito entre Cila um monstro que vive numa caverna e Caríbdis um espetacular redemoinho é o espectador impotente da patética morte de seis companheiros Nesses e em outros momentos não é o herói em primeiro lugar que nos causa admiração mas o estranho e fascinante mundo que conhecemos por intermédio dele Também no Hades quando Odisseu conversa com seus pares mortos Agamêmnon e Aquiles não se trata de uma conversa para lembrar as façanhas do passado e sim de um lamento causado pela morte contra a qual só resta como consolo para quem não pode voltar para casa o valor do filho potencial herdeiro e perpetuador da linhagem do pai Assunção 2003 Algo diferente acontece naquela que é a aventura emblemática de Odisseu o cegamento do ciclope Polifemo Assistimos ao embate simbólico entre as duas mais importantes potências que podem se manifestar nas ações de um herói a força bruta pela qual se distinguem por exemplo Aquiles e Héracles outro herói que no poema se opõe a Odisseu embora sobretudo como arqueiro permita ao poeta usálo também como figura paralela a Odisseu e a astúcia cujo representante humano mais destacado é o próprio Odisseu no plano divino Atena e Hermes que se dela fosse desprovido jamais teria sido capaz de discernir o único modo de escapar da caverna habitada por aquele ser de força descomedida Odisseu é impotente para vencer Polifemo numa luta aberta a tática dos fortes e rápidos como Aquiles e Diomedes e à espera do momento correto de agir vê perderem a vida alguns de seus companheiros vítimas do canibalismo da criatura monstruosa O herói até procura evocar a fama do exército aqueu em particular a de Agamêmnon como prestigioso cartão de visitas mas o ciclope divertese com a ingenuidade do estranho que não conhece os costumes locais em muito pouco semelhantes a instituições e hábitos civilizados Num átimo porém a inteligência de Odisseu aparentemente falha por têlo conduzido a uma arapuca arma um plano genial em cujo centro está a absoluta negação do que é representado no heroísmo iliádico Odisseu autodenominase Ninguém o oposto do herói que em momentos de luta aguerrida gosta de bradar nome e linhagem Esse falso nome vai confundir os outros ciclopes que alertados por Polifemo já cego não compreendem o que ele diz e o abandonam É nos instantes em que se sacrificam os protocolos heroicos mais prezados no mundo da guerra que Odisseu consegue escapar da morte Paradoxalmente porém a Odisseia repetidas vezes confere a seu herói uma identidade passageira de guerreiro belicoso Quando por fim revela seu nome ao ciclope já se afastando da praia Odisseu deixa de ser Ninguém e fixa naquela terra selvagem sua identidade heroica Assim possibilita que Polifemo filho de Posêidon faça uma prece ao pai pedindo que o retorno de Odisseu seja o mais sofrido e longo possível É graças à revelação de sua identidade que o ciclope pode reagir sem o nome do adversário não há magia eficaz contra ele e pelas ações de Posêidon o poema existe Dessa forma ainda que a narrativa reitere não haver raposa mais sagaz que esse herói sua ingenuidade ao entrar na caverna repleta de sinais sinistros e sua arrogância ao bradar seu nome épico nos indicam que heróis não são figuras a serem emuladas em seu todo mas antes agentes de histórias impressionantes e portanto portadores de qualidades notáveis em um mundo que não é aquele do público do poema O que está em jogo é a caracterização de Odisseu ela seria inconsistente já que em alguns instantes não age como o herói que personifica a astúcia Por um lado ao contrário de seus companheiros ele não foi um bom leitor dos sinais oferecidos pela caverna e só depois percebe que nada pode contra o ciclope restandolhe mediante a tática apropriada aguardar o momento propício da fuga Por outro mesmo que tenhamos a impressão de que a astúcia sucumbe no final ao enérgico ânimo que faz dos heróis homens física e mentalmente superiores a nós ainda assim o que garante não só a salvação de Odisseu mas também o trecho mais prazeroso da história são sua astúcia e a capacidade de não se deixar dominar pelo agudo sofrimento de ver os companheiros sendo devorados pela criatura antropófaga Quando já em Ítaca buscar forças para enfrentar praticamente sozinho os mais de cem pretendentes de sua esposa ele relembrará o embate com Polifemo Werner 2009 Nesse momento é de sua astúcia excepcional que recorda e não da bazófia que encerra o episódio indicandonos o que há de exemplar e admirável na aventura uma das razões para ela continuar a ser cantada A viagem de Odisseu tem três momentos no primeiro perde paulatinamente as naus em que ele e os companheiros partiram de Troia no segundo já sozinho enfrenta o naufrágio da balsa que construíra na ilha de Calipso e chega à terra dos feácios Esquéria A partir desse momento Posêidon nada mais poderá contra seu inimigo e a deusa protetora de Odisseu Atena passará a zelar pelo mortal que afirma ser seu preferido por assemelharse a ela o que não significa que no restante do percurso o herói se eximirá de tomar decisões delicadas ou suportar grande sofrimento sozinho Odisseu não é apenas astuto mas resiliente Mesmo que o narrador nos conte desde o início que o herói tem uma aliada desse porte em nenhum momento ele nos deixa esquecer que Odisseu está submetido à mesma fragilidade humana que marca a condição de outros sofredores como o porqueiro Eumeu seu fiel escravo Se a Ilíada é o poema do herói que por seu caráter e decisões apressa seu percurso rumo à morte Odisseu é aquele que dela sempre de novo escapa Pucci 1995 Não é com pompa e circunstância que o náufrago anuncia sua identidade àqueles que o acolhem em Esquéria calejado demora a permitir que seus anfitriões o casal real e sua filha saibam que têm diante de si um mortal excepcional Não deixa de ser curioso esse processo que só em parte pode ser compreendido como a paulatina ressurreição de uma morte simbólica que culminou nos inúmeros anos que teve de passar na ilha de Calipso a que encobre Vernant em Schein 1996 Segal 1994 Logo antes de revelar sua identidade ao ouvir o aedo feácio Demódoco cantar a história da conquista de Troia o narrador diz que Odisseu chorava como uma mulher de cidade conquistada viúva a ser levada como escrava pelo inimigo após perder o marido na guerra Essa imagem uma das várias comparações ou símiles estendidos que marcam o estilo homérico sugere que as histórias que Odisseu conta na sequência para se apresentar ao povo que o conduzirá são e salvo para casa não são apenas o movimento encomiástico de reconquista de sua identidade ou seja um mero retorno a uma situação inicial Odisseu não é mais o mesmo entre outras razões porque pelos cantos poéticos que ouve entre os feácios sobre sua participação na guerra de Troia ele compreende de outro modo o que viveu Halliwell 2011 Peponi 2012 Uma dimensão de luto jamais deixará o herói paralela ao permanente sofrimento que na comparação a mulher cativa enfrentará para sempre longe do marido e à mercê de uma vida de pesados trabalhos Também não é suficiente supor que um certo realismo psicológico exija que na narração da chegada à terra dos feácios Odisseu alquebrado viajante nu não se jacte de saída de sua identidade para não ser confundido com um ninguém mentiroso Ou então supor que o narrador prolongue sua narrativa somente para aumentar a tensão utilizando uma estrutura temática que explorará ao máximo quando Odisseu chegar a Ítaca a do forasteiro que aparenta ser alguém sem eira nem beira que precisa conquistar a simpatia dos anfitriões em terra estranha Uma odisseia é um nostos porque quem está longe de casa só consegue retornar graças à ajuda de um terceiro Frame 2009 Odisseu por pouco não regressa logo após a guerra Voltava com Nestor mas se desentende com ele e dá meiavolta rumo a Troia para se encontrar com Agamêmnon Ora Nestor é justamente aquele que traz para casa mesmo radical verbal presente em nostos de sorte que apenas quando Odisseu encontra o benévolo mas sobretudo firme e justo rei Alcínoo aquele que traz para casa por meio de sua força seu retorno pode ser bemsucedido Frame 2009 Uma vez em Ítaca iniciase a segunda parte do poema quando Odisseu assume o disfarce de um cretense atingido pelas vicissitudes do destino e vagamundo para sobreviver depende da bondade alheia e da própria astúcia O cretense consegue a simpatia de Eumeu e após Atena promover o reencontro e reconhecimento entre Odisseu e Telêmaco o herói dirigese a sua propriedade A viagem do filho Não é apenas a viagem de Odisseu que compõe a estrutura narrativa do poema mas também uma outra que de forma extraordinária posterga a efetiva entrada em cena do herói principal ao mesmo tempo que coloca em perspectiva sua gesta um contraexemplo da tese de Erich Auerbach segundo a qual só vale o primeiro plano na narrativa homérica não havendo uma busca de perspectiva espacial e temporal Auerbach 1976 Mas o retorno de Odisseu é narrado a partir de outros retornos Quando a história começa a situação é de crise tanto para o herói esquecido há tempos pelos deuses na ilha de Calipso quanto para sua família O filho na fronteira entre a adolescência e a vida adulta ainda não é senhor de sua casa tomada pelos jovens pretendentes que de forma abusiva e vil consomem o patrimônio de Odisseu em banquetes diários único modo de pressionar a rainha Como são mais de cem pretendentes filhos de famílias notáveis de Ítaca e cercanias não há nenhuma medida prática por meio da qual o jovem possa pôr fim ao abuso Além disso Telêmaco cresceu sem pai ou seja sem um exemplo que lhe fizesse discernir o que ele próprio herdou de sua respeitável linhagem A mãe de Odisseu já está morta e o avô paterno Laerte vive no campo como um pobre eremita cuja única companhia são os escravos É Atena que de novo transmutada em um aliado da família primeiro Mentes depois Mentor consegue fazer com que Telêmaco encontre em si mesmo a motivação necessária para enfim sair de sua letargia infantil Werner 2010 e 2013 Quando mais tarde Odisseu já em Ítaca entra em casa disfarçado e no final da prova do arco estabelecida por Penélope dispara a primeira flecha contra seus inimigos ele pode contar com a ajuda de um jovem que temos certeza não desapontará o pai O narrador mostra que a herança dos valores que distinguem os ancestrais é um processo complexo e para quem a ele assiste assombroso Se Homero fosse confrontado com uma discussão paradigmática cara à intelectualidade grega do século V aC qual seja se o comportamento virtuoso de um indivíduo é inato ou adquirido não parece que ele optaria por um dos polos Todos os interlocutores de Telêmaco têm certeza de estar diante do filho de Odisseu e não só pela semelhança física mas o próprio Telêmaco só entende o que isso significa em termos de direitos e deveres a partir do contato com seus pares e do choque contra seus inimigos Nos quatro cantos iniciais do poema Telêmaco é potencialmente o protagonista da história É certo que durante todo esse tempo Odisseu e a vingança inevitável contra os pretendentes são trazidos à consciência do leitor Telêmaco porém filho único assim como único filho varão de Laertes foi Odisseu é quem continuará a linhagem do pai e será seu herdeiro em Ítaca O percurso heroico de Odisseu seria virtualmente inútil se não tivesse um filho que desse continuidade ao prestígio de seu nome Não surpreende portanto que o jovem não ocupe a posição de mero espectador passivo das façanhas inigualáveis do pai e como ouvinte daquelas da velha guarda de Troia A situação é bem diferente do que vemos na Troia da Ilíada onde um herói no auge do vigor físico Heitor é o comandante supremo do exército pois seu pai Príamo é um ancião que apenas mantém certo poder político na cidade O filho de Heitor Astíanax por sua vez é uma criança Tanto Telêmaco quanto Odisseu durante suas viagens correm riscos diversos e precisam ser exímios leitores dos mais diferentes sinais mormente daqueles que se manifestam nos discursos de seus interlocutores Nesses momentos de leitura eles também necessitam ser hábeis manipuladores de palavras Isso não muda quando ambos já tendo travado contato entram na casa de Odisseu e socializam com os pretendentes Penélope e os escravos sem poder revelar nada acerca da identidade verdadeira do combalido cretense Na casa de Odisseu porém imprevistos acontecem como em toda odisseia a velha ama Euricleia reconhece o herói por uma cicatriz juvenil Auerbach 1976 Duarte 2012 Tão perto tão longe mesmo na véspera de sua derradeira vingança para a qual o efeito surpresa mencionado inúmeras vezes ao longo do poema parece decisivo Odisseu corre um último grande risco Nesse momento entretanto somos confrontados de forma clara e inequívoca com um dado que permanecia disperso no poema mediado por seu avô materno o notório ladrão e mentiroso Autólico Odisseu tem uma relação especial com Hermes deus de ladrões mercadores e viajantes no universo da Odisseia a fronteira entre as três categorias não é muito nítida A maestria na dissimulação e na maquinação de estratagemas infalíveis quando o fracasso parece eminente manifesta nas ações e falas de Odisseu e Telêmaco tem uma pré história e disso nos damos conta num momento em que aparentemente por um descuido o herói de novo quase põe tudo a perder As narrativas A Odisseia é um poema que contém um número bastante acentuado de narrativas dentro da narrativa principal curtas e longas até longuíssima como no caso das aventuras contadas por Odisseu aos feácios do canto 9 ao 12 narra tudo o que lhe acontecera inclusive relatos que ele ouviu desde que saíra de Troia As histórias são narradas por bardos profissionais por criaturas divinas ou assombrosas ou então por aqueles que vivenciaram o que contam verdadeiras mentirosas duvidosas ou sonhadas Tomemos como primeiro exemplo o episódio da cicatriz mencionada há pouco Embora seja o narrador que o conte no momento mesmo em que a ama vê a cicatriz e reconhece seu senhor não fica claro se o ponto de vista adotado por ele é o seu mesmo narrador objetivo ou de uma das personagens envolvidas Odisseu ou ama que naquele momento como que teria se lembrado do evento que liga Odisseu a todos os servidores mais velhos da casa De fato o caráter objetivo da narrativa homérica é um equívoco no mínimo parcial na recepção dos poemas o narrador conhece vários modos de embutir diferentes olhares o de personagens e dele próprio em sua narrativa De Jong 2001 Embora nem sempre seja óbvio por que algumas histórias são apresentadas com mais detalhes e outras com menos basta comparar o modo como o narrador transmite as três canções cantadas pelo bardo feácio Demódoco no canto 8 é sempre significativa a ocasião em que alguém decide rememorar determinado evento passado Quase nunca é o narrador que conta algo que aconteceu antes do evento que abre o poema a decisão dos deuses de permitir que Odisseu partisse da ilha de Calipso e que Telêmaco fosse em busca de notícias do pai Toda narrativa interna à narrativa principal é um ato de comunicação que envolve as personagens mas também um ato dirigido ao ouvinte externo ao poema Estão em jogo de forma bastante concentrada diferentes níveis de comunicação pelo modo de as personagens se comunicarem entre si o narrador se comunica com seu público Como fez no início do canto 9 o narrador também poderia ter dado a palavra a Odisseu na prolongada noite em que o herói enfim se reúne com a esposa no canto 23 Todavia não ouvimos Odisseu inebriando Penélope com a narrativa de sua viagem apenas a voz do narrador que não repete tudo de que já tomamos conhecimento anteriormente mas faz um breve resumo Isso indica o domínio da narração pois uma narrativa tão longa ao final do poema seria um anticlímax No entanto essa razão digamos técnica não é a única Em primeiro lugar na terra da vida boa e tranquila que é a ilha dos feácios não pode faltar um excelente aedo confrade de Homero como ele cego Graziosi 2002 conhecedor de façanhas humanas e divinas tão bom que graças à Musa narra eventos cuja veracidade precisão e completude são elogiadas por alguém que deles participou o próprio Odisseu Werner 2013 As histórias de Demódoco porém também funcionam como uma estrutura contrastiva ou no mínimo como um proêmio para a longuíssima narração de Odisseu Mortais só excepcionalmente podem afirmar que determinado deus agiu entre os homens mas mesmo sem a lira e a onisciência que a Musa fornece a um bardo Odisseu é dotado de algo que os gregos conceitualizaram por meio da Musa a capacidade de fazer uma narrativa transformar acontecimentos terríveis numa experiência que causa deleite Halliwell 2011 Mais que deleitar Odisseu é capaz como as Sirenas de enfeitiçar seu público madrugada adentro Peponi 2012 Se há um contador de histórias insuperável na Odisseia esse é Odisseu Por meio das narrativas de Odisseu o próprio Homero reforça seu domínio sobre as muitas idas e vindas que dão forma ao poema monumental e atestam seu domínio da tradição épica e folclórica que ultrapassa o próprio poema como Odisseu ele é um mestre dos volteios reais e metafóricos espaciais temporais e retóricos ou seja um homem muitasvias polutropos adjetivo que qualifica o herói no primeiro verso do poema Pucci 1998 Ao invés de contar a história de Odisseu de modo linear desde o fim de Troia até sua morte distribui por todo o poema histórias e historietas rememorações e previsões pertinentes à guerra e a seus heróis todas elas guardando as mais diversas camadas de sentido que cumpre tanto aos receptores internos quanto aos externos ao poema perceber e interpretar Werner 2011 O mundo percorrido por Odisseu na sua década de errância não pertence às terras conhecidas pelos ouvintes de Homero a viagem de Odisseu é uma viagem pelo imaginário e por meio dele Isso não significa que os ouvintes e leitores de Homero na recepção do poema na Antiguidade tenham entendido o poema como uma ficção Não se duvidava por exemplo que a Guerra de Troia tivesse acontecido mas muito cedo se defendeu que Homero cometera excessos típicos dos poetas cujo propósito era deleitar seu público O poema se tornou canônico era ouvido e lido por toda a elite mas intelectuais de cepas diversas apresentavam correções aos eventos e informações relatados no poema Algo não muito diferente fazem os modernos quando em um mapa do mundo mediterrâneo traçam a viagem de Odisseu eliminando aquilo que há de maravilhoso Não há mapa capaz de reproduzir a ilha de Eólo o senhor dos ventos uma terra que se move Na melhor das hipóteses qualquer traçado contemporâneo é uma ficção aproximativa na pior um falseamento do modo como Homero e seus espectadores pensavam o mundo por meio da poesia Assim por exemplo não há nenhuma palavra na Grécia arcaica ou clássica que se aplique àquilo que chamamos de mar Mediterrâneo As coordenadas utilizadas pelo narrador para localizar seus ouvintes são outras Claro que algumas delas são geopolíticas e dizem respeito ao mundo dos ouvintes mas não temos mais acesso a esse mundo O sítio arqueológico encontrado na Turquia no século XIX pelo alemão Schliemann talvez seja o da cidade que em um processo longo e para sempre perdido entrou na literatura grega e ocidental sob o nome de Troia ou seja sofreu uma guerra que passou a ser cantada em poemas Ou talvez não Por isso muito mais importantes para entendermos como um poeta falava de um mundo desconhecido para seus ouvintes gregos são as coordenadas antropológicas que dão forma à narrativa do herói essas sim bastante familiares Ao contar aos feácios o que viu e o que sofreu Odisseu ao mesmo tempo diz como é ou deveria ser o mundo e o homem grego quais as normas de uma sociedade civilizada quais os limites entre homens deuses e animais e até onde o engenho humano permite o domínio de forças indômitas VidalNaquet em Segal 1996 Os ciclopes e Polifemo por exemplo são uma versão exacerbada dos incivilizados pretendentes de Penélope Bakker 2013 Alcínoo e os feácios idealmente tão hospitaleiros são tão justos e prósperos quanto Odisseu e Ítaca sob o seu reinado no passado e no futuro Além de Odisseu saber contar verdades com aparência para nós de mentiras ao longo da história da recepção da Odisseia mais de uma vez se assinalou que o herói teve sorte de encontrar um público tão crédulo quanto os feácios ele também é exímio contador de mentiras com aparência de verdades Malta 2012a Kelly 2008 Essa é mais uma razão para ouvirmos o longo relato do mestre do discurso antes de sua noite de segundas núpcias com Penélope pois desde o instante em que chega a Ítaca até o momento em que ainda como cretense conversa a sós com a esposa ele encanta quem o ouve às vezes mais às vezes menos criando uma falsa biografia que altera de acordo com seus ouvintes ocasionais e quiçá a partir de outras versões antigas da história de seu retorno Devemos nos perguntar portanto se quando os ouvintes de Odisseu e o narrador o comparam a um aedo o narrador nos indica haver algo no modo como Odisseu constrói suas histórias que independe do conteúdo de verdade da narrativa Pratt 1993 Só Odisseu é chamado na Ilíada e na Odisseia de poluainos Esse adjetivo épico é composto por muito polu e pelo substantivo ainos termo polissêmico que se refere a um tipo especial de discurso Nagy 1979 Quem denomina Odisseu dessa forma muitahistória são as Sirenas e em vista do contexto seu objetivo pode ser o de bajulálo como alguém que é muitoelogiado ou seja objeto de muitas histórias entre elas por exemplo a Ilíada onde o adjetivo aparece mais vezes que na Odisseia ou então como alguém que conta muitas histórias mas nesse caso decerto não conhece tantas histórias quanto elas Pucci 1998 Ainos porém não é qualquer história mas aquela por meio da qual o narrador conta algo que desafia o interlocutor a buscar e compreender além da superfície um sentido profundo entendese assim por que o termo passou a ser utilizado entre outros para um tipo de narrativa que conhecemos como fábula No final do canto 14 Odisseu em sua identidade de mendigo cretense lança mão de um ainos muito elogiado por Eumeu cujo objetivo é conseguir emprestado um manto para suportar a noite fria na cabana do porqueiro A história que carrega um elogio tanto de Odisseu sua personagem central quanto de forma algo ambígua do próprio cretense tem uma função material pragmática interna ao poema qual seja conseguir o manto Um nível de comunicação homólogo está presente na situação em que Odisseu conta sua longa história aos feácios embora nem eles nem o narrador da Odisseia se refiram a essa narrativa como um ainos Odisseu lucra uma quantidade nada desprezível de presentes de seus ouvintes após interromper sua narrativa e sugerir que já estaria na hora de ir se deitar Tanto no ainos contado a Eumeu quanto nas aventuras narradas aos feácios o que menos interessa a nós no momento em que Odisseu relata como cegou Polifemo ou conversou com Aquiles no Hades é se a história é verdadeira ou não em que pese o curioso elogio feito por Alcínoo a Odisseu quando da mencionada interrupção A narração precisa atingir seu objetivo e esse mesmo quando for material e ele com frequência o é dadas as condições de vida de aedos e mendigos grandes contadores de histórias no poema é secundário em relação ao louvor ou à censura direto ou indireto dos valores compartilhados ou não por quem narra e sua plateia Boas histórias sempre na forma e no conteúdo na Odisseia pelo menos idealmente parece não haver separação entre ambos refletem pessoas dignas o que por sua vez depende sempre do contexto da comunicação Não há como Odisseu ser louvado por Polifemo por exemplo Penélope Telêmaco e Eumeu sempre que ouvirem de um estranho que aporta em Ítaca notícias alvissareiras acerca de Odisseu têm motivos de sobra para desconfiar das intenções do interlocutor mesmo quando ele é um adivinho que nós sabemos ter razão ou então o próprio Odisseu disfarçado Malta 2012b Depois de acompanharmos as performances verbais e não verbais de Odisseu em Ítaca vemos com outros olhos o modo como conquistou a confiança dos feácios Em última instância a história e a identidade de um indivíduo não são dados inequívocos pois dependem de repetidas performances e sempre correm o risco de se tornar outra coisa Não por acaso o ceticismo qualidade que Penélope demonstra ter em alto grau é tão valorizado no poema Zerba 2009 Para o cenário que o naufrágio de Odisseu nu e sozinho cria na terra dos feácios já somos preparados de antemão pois Telêmaco também viaja e depara nos cantos 3 e 4 com homens justos cortes suntuosas e contadores de histórias É por meio do que é narrado em Pilos onde reina Nestor e em Esparta governada por Menelau que conhecemos outros casais e outras histórias de retorno um sentido suplementar de nostos na poesia épica grega Assim como Penélope para Odisseu Helena e Clitemnestra têm um papel fundamental no retorno de Menelau e Agamêmnon respectivamente Se Clitemnestra é uma adúltera para quem a Odisseia não tem quase nenhuma palavra simpática Helena é uma figura ambígua em geral odiada mas também encantadora e admirada Werner 2011 Em parte é como se o poema precisasse ao mesmo tempo exibir uma heroína virtuosa ao máximo Penélope como responsável última pelo retorno do herói principal e em contraponto flertar com imagens femininas imorais e amoralmente sensuais Katz 1991 Felson 1997 No canto 8 que narra o dia em que desde a aurora tudo parece levar apenas ao embarque de Odisseu rumo a Ítaca somos surpreendidos pelo segundo canto de Demódoco que recria o adultério de Afrodite deusa da beleza e do amor e na Odisseia esposa de Hefesto o hábil deus dos artesãos o amante é Ares deus da guerra na sua face mais violenta e desregrada Aqui é difícil não pensar em Odisseu e Penélope Essa história recontextualiza a briga que acabara de acontecer entre o herói e alguns feácios arrogantes jovens excessivamente confiantes em seu vigor físico avatares de Ares que durante uma série de disputas esportivas zombam de Odisseu Esse se mostra superior aos outros competidores no lançamento de disco e deixa claro que venceria em todas as outras modalidades exceto na corrida Com isso a tessitura narrativa reforça uma série de paralelos possíveis entre Odisseu e Hefesto de um lado ambos sobrepujados num primeiro momento por machos mais vistosos e de outro Aquiles e Ares guerreiros confiantes no próprio vigor E não só porque o primeiro canto de Demódoco já tivera Odisseu como um de seus personagens mas porque a oposição entre as esferas da astúcia e da força é um tema subjacente a todo o canto 8 Desse modo porém de alguma forma Penélope se avizinha de Afrodite ou seja sua fidelidade recebe estranhos holofotes e a potência de Odisseu é posta em suspenso se no canto 5 ele é um amante cansado é só no canto 10 que o veremos satisfazendo a ninfa Circe A exploração dos papéis sexuais do homem e da mulher casados ou na idade de casar é uma constante no poema e é sempre significativa basta compararmos os cantos 3 e 4 complementares e inversamente simétricos no que diz respeito aos casais que hospedam Telêmaco No início do episódio dos feácios tudo gira em torno de Nausícaa virgem nubente e assim o casamento como instituição social fundamental marca toda a estada de Odisseu para quem porém a união com a jovem não é uma opção pois como sabemos desde a separação entre o herói e Calipso Penélope e Ítaca jamais deixam de suscitar uma saudade quase mortal em Odisseu salvo durante o ano que passa indolente com Circe Por quê então o narrador da Odisseia em um episódio que mostra feácios e Odisseu se divertindo escolhe como vítima de adultério um deus que tanto se assemelha a Odisseu A explicação de que o canto complementando uma intervenção de Alcínoo e um prazeroso espetáculo de dança apazigua os ânimos do brioso Odisseu e dos inconsequentes feácios é por certo pertinente Depois de Odisseu passar uma descompostura naqueles que lembram os pretendentes de Penélope Louden 1999 assinalando que a beleza física não é nada se comparada a um discurso bemfeito no qual forma e conteúdo moral se espelham Demódoco ao retratar um deus feio mas muito hábil que supera um deus muito mais belo e rápido coloca numa chave potencialmente jocosa a moral que Odisseu havia apresentado com seriedade Todavia se observarmos com atenção veremos que quem ri são alguns deuses de Odisseu e dos feácios apenas se diz que sentiram prazer o efeito esperado de um canto ao fim de um agradável banquete Além disso resta o problema do objeto de desejo Afrodite Na cena divina ouvimos Hermes comentar que mesmo se tivesse passado por situação ainda mais vergonhosa que a de Ares teria valido a pena dormir com a supremamente desejada Afrodite Com isso ficamos com duas morais a séria e a jocosa Será que na Odisseia temos de fato apenas uma Penélope aquela que sofre por conta da ausência do marido Por um lado sim se Hermes consegue se identificar com Ares para nós receptores da Odisseia é impossível nos identificarmos com os pretendentes pois a vileza deles e o sofrimento da rainha são inequívocos no mundo mortal do poema que também é o nosso Devemos levar em conta porém que a identidade de Penélope mais que a de qualquer outra personagem do poema é construída através dos olhos e sobretudo dos relatos dos outros basta atentarmos ao que diz Atena sobre ela a Odisseu quando este chega a Ítaca ou então à interpretação dada por Odisseu ao comportamento de Penélope quando ela aparece aos pretendentes e deles pede presentes ao anunciar que enfim chegou o momento de se casar Assim se no primeiro canto somos apresentados a uma sofredora reduzida a um papel meramente passivo sobretudo agora que o filho parece começar a tomar as rédeas da casa no canto seguinte um dos líderes dos pretendentes Antínoo que até no nome é anti a inteligência noos necessária para o nostos apresenta Penélope como a principal responsável pela invasão da casa de Odisseu já que durante três anos ela ludibriou quem a cortejava com a promessa de que escolheria o preferido assim que concluísse a mortalha que ela astuta desmanchava A identidade de Penélope talvez seja tão elusiva dada a quantidade de papéis narrativos que precisa executar mãe preocupada com a vida do filho viúva declarada que precisa controlar seus pretendentes de quem contudo arranca presentes esposa fiel que decide sozinha organizar uma prova para escolher o novo marido Felson 1997 Muito se discutiu sobre a função da tessitura da mortalha na economia da Odisseia já que a relação entre a rainha e aqueles que a cortejam e vale dizer o prazo para a escolha do marido não parece depender da descoberta da artimanha Não se avança muito ao supor que a história seja tão ligada à representação tradicional de Penélope que não haveria como não ser incluída mesmo no caso de ter sofrido notável alteração em vez de fazer um vestido de casamento que uma vez terminado permitiria as bodas Penélope a lutuosa faz uma mortalha mais produtivo é verificarmos que a história da mortalha é contada três vezes ao longo do poema em contextos bem distintos e por outras personagens mas com os mesmos versos o que nos oferece uma situação diametralmente oposta por exemplo às três canções de Demódoco Na primeira vez no canto 2 Antínoo apresenta uma Penélope em franca oposição à personagem sofredora e algo passiva do canto anterior mas é justo essa imagem da rainha ardilosa que em filigrana a acompanha em algumas de suas cenas sobretudo nos cantos 18 e 19 e que culmina no truque da cama ao qual submete Odisseu no canto 23 quando sem ter certeza de que o homem que tem diante de si é seu marido diz que ele pode dormir no leito do casal que porém não está mais nos mesmos aposentos Ora a cama uma obraprima de carpintaria Odisseu como artesão jamais poderia ter sido deslocada de onde estava a não ser por um homem o que indicaria que Penélope lhe tinha sido infiel Quando Odisseu reage indicando conhecer a cama que nunca fora vista por mais ninguém além do casal e de uma velha serva fiel Penélope tem certeza de que o marido voltou Enquanto Antínoo revela o engodo da mortalha durante uma assembleia de itacenses para mostrar a Telêmaco e aos demais habitantes não necessariamente comprometidos com os pretendentes que é Penélope a causadora da atual desgraça do jovem fazendo com que a riqueza de sua família seja literalmente devorada a rainha no canto 19 repete a história na conversa que tem com o cretense Odisseu em um encontro ansiado pelos receptores do poema Assim como Arete a rainha feácia a primeira atitude de Penélope ao ficar sozinha com o estranho é perguntar quem ele é Como já fizera em Esquéria Odisseu burla seu interlocutor e talvez o próprio receptor pois ele elogia a rainha por meio de um símile como se estivesse elogiando um rei Levaniouk 2011 Não surpreende que o longo diálogo entre os esposos no canto 19 seja uma das passagens nas quais alguns leitores julgam identificar um diálogo cifrado entre Odisseu e Penélope através do qual ambos conversariam sobre a identidade verdadeira já reconhecida de Odisseu Duarte 2012 Por mais engenhosa que seja essa interpretação ela está em contradição com uma série de outras cenas em particular o reconhecimento por meio do leito conjugal o verdadeiro clímax no reencontro entre marido e mulher O elogio indireto do rei Odisseu funciona como pano de fundo para um novo elogio de Odisseu ou melhor para a contraposição entre duas situações a presente de Penélope que não poderia ser mais desgraçada e o significado do retorno do marido para ela É nesse momento que a rainha conta a seu ouvinte que embora seja esperta a astúcia é sua única defesa contra a violência dos jovens a época dos ardis passou e não lhe resta nenhuma outra medida para evitar o que menos quer o casamento Não surpreenderia se agora Odisseu revelasse sua identidade para acalmar a esposa mas esse instante não vem Mesmo assim é sobre Odisseu que os dois conversam já que o cretense como fizera com Eumeu mas não diante dos pretendentes evoca os instantes em que compartilhou da companhia do memorável herói Nesse momento a frágil rainha que sofre demais ao se sentir para sempre longe do marido mas ao mesmo tempo experimenta certo consolo e prazer ao ouvir histórias sobre ele por intermédio de alguém que sem nenhuma dúvida com ele se parece inclusive no físico não poderia estar mais distante da personagem do truque da mortalha mormente por ser ela mesma vítima de uma armação o disfarce de Odisseu que ao compor e recompor suas biografias espelha uma manifestação da arte da solerte tecelã Clayton 2004 Nesse sentido é quase que por um acerto de contas poético que a penúltima burla do poema a última é a identidade falsa apresentada por Odisseu ao pai será aplicada com sucesso pela rainha e a vítima será Odisseu Se no canto de Demódoco o truque é de Hefesto e Afrodite é só um corpo sem voz ainda que belíssimo vítima passiva da armadilha no leito conjugal em Ítaca Penélope usa a cama construída com habilidade pelo marido como uma artimanha que confirma em definitivo a identidade dele e a astúcia dela A odisseia de Odisseu é concluída graças a Penélope Enfim no último canto ainda ouvimos mais uma vez a história da mortalha A cena se passa no Hades onde se encontram primeiro as almas ou espectros de Aquiles e Agamêmnon que comparam o clímax fúnebre de suas carreiras heroicas e depois chegam as almas dos pretendentes Um deles ao conversar com Agamêmnon resume os eventos de Ítaca inserindo a mesma história já conhecida os mesmos versos Mais uma vez o contexto requalifica a história do ponto de vista dos pretendentes foi apenas graças a Penélope que Odisseu obteve a vitória contra eles ou seja juntos enganaram os pretendentes e idealizaram a prova do arco Essa última manifestação de um pretendente é mais um sinal claro de que as histórias narradas no poema não podem ser entendidas fora de seu contexto de enunciação pois se trata de uma percepção equivocada dos eventos e as múltiplas relações entre quem narra o que é narrado e quem ouve dentro e fora do poema nem sempre saltam aos olhos ou são corretamente apreendidas por quem ouve Ironicamente a narração do pretendente faz com que Agamêmnon produza o elogio mais contundente de Penélope em todo o poema A investigação Como já deve ter ficado claro até aqui a Odisseia é em vários níveis composta por travessias que também são intelectuais Odisseu aprende que o tipo de heroísmo que fez dele um vencedor em Troia tem seus limites no novo mundo de seu longo retorno e que as façanhas que realizou em Troia têm outro sentido quando lhes é dada uma forma por meio de um canto poético Telêmaco aprende que sua herança genética ou seja o heroísmo do pai depende de uma aprendizagem prática na qual é fundamental que ele e seus interlocutores o vejam de fato como filho de Odisseu Penélope a cética em nenhum momento pode se entregar a suas emoções e se submeter a uma das diferentes pressões que sofre Zerba 2009 Em suma aprendemos nós que todas as personagens têm propósitos e sentimentos em relação aos quais devemos medir tudo o que eles fazem e dizem Apesar de o estilo oral do poema dificultar uma distinção semântica precisa entre os vários termos que se referem a órgãos emocionais e cognitivos humanos bem como a suas faculdades é o noos aquele que mais particularmente circunscreve um tipo de inteligência que se distingue por não se submeter com facilidade à influência das emoções No Hades descrito por Odisseu no canto 11 por exemplo o adivinho tebano Tirésias é entre os espectros que lá se encontram o único a quem foi disponibilizada essa faculdade ou seja só ele ainda consegue saber de algo que extrapola a memória e pode auxiliar Odisseu em seus feitos futuros É graças a Tirésias que Odisseu sabe como agir quando chegar à ilha dos bois do Sol derradeira escala para os companheiros de Odisseu ainda vivos àquela altura da viagem canto 12 Ressaltese que não basta o conhecimento objetivo o herói informa aos companheiros que eles não podem devorar os bois sagrados e mesmo assim eles sucumbem ao apetite Bakker 2013 Se compararmos o Odisseu desse episódio com aquele que a despeito de todos os sinais negativos e da vontade dos companheiros medrosos quis entrar na caverna de Polifemo e lá permanecer até o dono voltar vemos que a contenção parece ser algo que a personagem adquire ao longo de seu retorno e não uma marca tradicional do herói Ao completar a fuga bemsucedida da caverna do ciclope Odisseu não consegue deixar de bradar seu nome e reafirmar sua identidade heroica mais tarde porém concluída a vingança contra os pretendentes a ama Euricleia quer extravasar sua alegria por meio de gritos rituais e é de imediato contida pelo herói Se no episódio do ciclope a bazófia de se fazer conhecido possibilitou a vingança de Posêidon em Ítaca Odisseu terá que firmar um acordo político com seus concidadãos um pacto que ultrapasse o ciclo de vinganças para conquistar paz e prosperidade em casa e na ilha Feito inédito no mundo dos heróis como fica claro pelo modo como Zeus é obrigado a intervir na derradeira cena do poema quando Odisseu mais uma vez parece incorporar o furor guerreiro tão típico da Ilíada e que manifestara em sua partida da ilha dos ciclopes Odisseu portanto é um herói da contenção do autodomínio não só porque seu retorno é bemsucedido por conta dessa qualidade mas porque é para ela que apontam todas as histórias acerca de suas façanhas em Troia mencionadas na Odisseia Entretanto não há como negar um resíduo inquietante de uma moral guerreira que poderíamos chamar de iliádica Toda investigação ou aprendizagem que graças ao fluxo da narrativa marca uma personagem do poema é antes de tudo um movimento de que o receptor é convidado a participar e ao mesmo tempo uma cena construída para que o próprio receptor decida o que lhe foi mostrado e dito Assim os cantos iniciais são uma pequena odisseia de Telêmaco uma viagem intelectual e real durante a qual o jovem precisa coletar elementos para deliberar sobre o destino de sua propriedade seriamente ameaçada Ao mesmo tempo o narrador nos apresenta uma série de indícios que nos leva a refletir acerca das dificuldades do retorno de Odisseu por exemplo até que ponto são elas resultado da ação de homens ou deuses Nem tudo é dito de forma inequívoca embora seja uma análise recorrente do discurso épico supor que o narrador nos informa tudo aquilo que julga importante para que acompanhemos sua narração e dela tiremos o máximo deleite Quando Telêmaco chega a Esparta cidade regida por Menelau logo fica claro para o ouvinte que o jovem não se dirigirá a um rei ou a um pai mas sobretudo a um casal com uma história que produz marcas evidentes no presente Na casa que recebe Telêmaco e seu companheiro de viagem Pisístrato filho de Nestor festejamse dois casamentos um dos quais é o do filho bastardo do rei Grandaflição Impossível não lembrar do rapto de Helena que tanto sofrimento causou não só a Menelau como a todos os gregos e por causa do qual Menelau teve apenas uma filha que também casa nesse mesmo dia com sua mulher legítima Na sequência o narrador descarta os casamentos revelando uma arbitrariedade que explicita a função deles qual seja evocar as consequências da união entre Helena e Páris Ao fim do banquete no qual os dois hóspedes se entretiveram Helena decide honrar a memória do desaparecido Odisseu e propõe que se contem histórias troianas É curioso que em nenhuma delas a personagem central seja o herói em ambas Helena é a protagonista tanto na primeira narrada pela própria rainha na qual se caracteriza como esposa devotada ao primeiro marido além de vítima da mesma Afrodite que ajuda Odisseu a conquistar Troia como na segunda narrada por Menelau quando ela já desposou Deífobo irmão de Páris àquela altura já morto e quase põe a perder o decisivo truque dos gregos o cavalo de madeira O narrador não é explícito mas é difícil não pensar que a segunda história é apresentada por Menelau para que Telêmaco e nós tenhamos outra impressão de sua esposa Penélope decerto não é Helena mas as duas histórias não deixam de apontar para o momento em que Odisseu estará de volta e dependerá de mulheres de cuja fidelidade em última instância não tem certeza Olson 1995 De fato todas as histórias e historietas do poema relacionamse com o enredo principal o retorno de Odisseu mas os vínculos precisam ser construídos e reconstruídos pelos ouvintes pois às vezes como no caso do segundo canto de Demódoco eles são ambíguos assim como muitas vezes são ambíguos os sinais que as personagens principais do poema constantemente interpretam Arma importante contra aquilo que não se domina é o ceticismo Sintomaticamente o único lugar em que Odisseu parece estar à vontade é a terra dos feácios onde tanto Nausícaa quanto Alcínoo nada dizem que lhe cause desconfiança comparese com a reação do herói ao acordar em Ítaca após ter sido conduzido pelos feácios algo tanto mais notável se pensarmos nas situações muito parecidas narradas entre os cantos 9 e 12 nas quais um rei ou uma ninfa quase causaram sua desgraça entre os lestrigões por exemplo quando a filha do rei leva um companheiro de Odisseu diretamente para o estômago do pai e na ilha de Circe quando a maga quase transforma Odisseu em um animal Até mesmo em Atena ele não confia incondicionalmente e com razão pois a deusa e ele mesmo são mestres do disfarce e do engodo Além disso embora em Troia ela tenha reiteradas vezes se revelado sua aliada ele não mais vivenciou seus favores ao embarcar de volta muito pelo contrário Odisseu quando enfim desembarca em Ítaca não reconhece a terra natal Os motivos não são enunciados de forma unívoca na narração o que sugere que não só as personagens ao interagirem como também o leitor precisam tomar cuidado com o que ouvem Por um lado Atena cria uma neblina por outro Odisseu afastado por vinte anos tem o álibi de não reconhecer o que lhe era familiar O narrador talvez esteja fazendo uso da estrutura que a crítica homérica chama dupla motivação decisões desejos ou pensamentos de mortais podem ser expressos ao mesmo tempo como oriundos dos deuses e de um órgão ou faculdade cognitiva e ou emocional Pelliccia 1995 No canto 13 a intervenção de Atena representaria a própria decisão do herói ou seja não revelar sua identidade para ninguém Embora não se possa descartar que esse modelo esteja subjacente ao episódio em questão ele não serve todavia para explicar as idas e vindas do verdadeiro duelo que se estabelece entre a deusa e o herói e o narrador não se esforça por esclarecer se Atena espalhou a neblina apenas para que pudesse metamorfosear Odisseu e com ele preparar a vingança vindoura Por outro lado nesse momento ainda não sabemos se Odisseu conseguirá ser sempre o herói astucioso que decide não agir de modo intempestivo essa dúvida é parte integrante da caracterização do herói ou seja do ritmo de suas aventuras passadas e futuras Odisseu oscila entre o descontrole e um total controle e isso faz parte de sua caracterização tradicional de sorte que na recepção de sua identidade heroica na literatura posterior essa pôde refletir valores ora positivos ora negativos No primeiro momento da cena entre Atena e o herói a atividade de reconhecimento diz respeito ao que se vê Assim não apenas Ítaca mas também a deusa são desconhecidas ao herói já que Atena aparece disfarçada de jovem pastor Quanto a Odisseu não lhe restam senão as palavras para alterar a realidade vista por seu interlocutor pois acredita encontrar se numa situação que lhe é amplamente desfavorável não sabe onde está nem com quem está lidando e precisa proteger seu notável tesouro os incontáveis presentes que recebeu dos nobres feácios Tratase do primeiro momento em que cria uma biografia mentirosa o disfarce de cretense Dessa forma entre a deusa e o herói que excelem na astúcia respectivamente dentre deuses e homens pelo menos é o que a deusa afirma fica estabelecido um embate mais ou menos inofensivo que retorna mesmo depois de parecer concluído por meio da revelação da identidade de Atena Clay 1997 Decidir quem é o vencedor ou seja quem se mostra mais esperto em relação às intenções do outro fica a cargo do leitor Por um lado a persona de pastor adotada por Atena não consegue fazer Odisseu revelar quem é por outro Odisseu declara que ele também sabe reconhecer um deus quando afirma em retrospectiva que a menina que o ajudou na ilha dos feácios canto 7 era na verdade a deusa disfarçada informação que o narrador já nos dera nesse episódio mas que parecia não ser do conhecimento de Odisseu As semelhanças da cena entre a deusa e o herói e a do teste da cama arquitetado por Penélope não parecem casuais em ambas a realidade não é clara para o indivíduo Assim na Odisseia o que importa para que os heróis permaneçam vivos e realizem seus objetivos é a inteligência e a astúcia que não se contentam com a superfície aparente e sabem criar disfarces e mentiras Todavia as intersecções entre o que se vê e o que não se vê e entre o que é dito e o que não é dito produzem constantes interrogações acerca da caracterização de suas principais personagens em especial de Penélope e de Odisseu O poema é fruto de um truque do seu narrador a construção de um texto que não deixa de ser aberto mesmo ao recebermos satisfeitos um final feliz para o casal de Ítaca 4 O adjetivo grego não aparece nos poemas homéricos mas sim os intercambiáveis dânao aqueue argivo DA TRADUÇÃO Para a presente tradução da Odisseia baseeime no texto grego das três edições citadas na Bibliografia ao final deste volume bem como em pesquisas da bibliografia crítica5 As características gerais mais relevantes que procurei conferir à tradução foram clareza fluência e poeticidade elementos fundamentais do original Sintaticamente o texto grego é em geral simples quanto ao vocabulário mesmo o sentido de termos compostos que só eram usados no dialeto homérico costumava ser cristalino para os ouvintes antigos por isso a opção por termos compostos não eruditos derivados da simples justaposição entre termos correntes do vernáculo Clareza e fluência não são estranhas a um poema narrativo oral ainda que tenha sido escrito já nos séculos VIII ou VII aC durante vários séculos ele teve na performance oral seu meio precípuo de transmissão e recepção De qualquer forma a Odisseia independentemente do modo como adquiriu a forma em que hoje é editada resultou de uma tradição poética oral com protocolos particulares A tradução procura reproduzir pelo menos alguns elementos próprios de tal oralidade como por exemplo a repetição de expressões e estruturas poéticas pois o modo como o sentido é construído na recepção do poema depende de tais repetições Foley 1991 e 1999 Para que elas fizessem sentido para um leitor da tradução optouse por reproduzir o mesmo conteúdo do verso original sempre que isso não forçasse uma ordem sintática estranha demais no português Dessa forma preservouse boa parte dos enjambements que em Homero são de vários tipos quanto à estrutura sintática grosso modo os que ocorrem quando o sentido de um verso está completo no final mas o verso seguinte compõe sua expansão De muitos homens viu urbes e a mente conheceu e muitas aflições sofreu ele no mar e aqueles na sua variação sintaticamente mais marcada quando uma frase carece de um elemento essencial ao final do verso Do varão me narra Musa do muitasvias que muito vagou após devastar a sacra cidade de Troia estes últimos menos comuns Colaboram para o ritmo e a construção de sentido do poema tanto os enjambements quanto a posição em que determinado termo ou fórmula da qual se fala mais abaixo se encontra no verso Um exemplo no qual fica clara a importância conferida ao enjambement 1 32527 e 340 42 Entre eles cantor cantava bem famoso e quietos sentados ouviam Dos aqueus cantava o retorno funesto que desde Troia impôslhes Palas Atena bebam vinho Mas interrompe esse canto funesto que sempre no peito meu coração tortura depois que assaltoume aflição inesquecível Primeiro o narrador versos 32527 e depois Penélope versos 34042 empregam o mesmo adjetivo na mesma posição métrica em enjambement para qualificar ela o próprio canto apresentado naquele momento ele talvez ambiguamente o tema do canto O modo semelhante e distinto como ambos caracterizam o canto é acentuado pelo enjambement e salienta um problema que é construído em vários níveis nessa cena bastante importante A fórmula é um dos principais elementos definidores da poesia oral grega em hexâmetros podendo ser entendida como um grupo de palavras reiterado sempre na mesma posição métrica Ela é um meio expressivo que faz parte de uma linguagem particular qual seja a dos poemas arcaicos em hexâmetros um autor a designou como os sintagmas épicos mais perfeitos gramaticalmente métrica fonética e semanticamente Bakker 2005 p 123 O sistema de fórmulas foi um meio utilizado pelo aedo para tornar presente no momento da performance do poema uma realidade ausente o mundo passado dos heróis Bakker 1997 Uma fórmula portanto não é apenas um meio de expressão mas também de performance a forma marcada de comunicação entre um aedo e seu público permitindo que se evoque um mundo que não existe mais e que se espera continue a ser evocado pelas gerações futuras De modo mais restrito fórmulas constituídas por um nome acompanhado de um epíteto um termo qualificativo em geral um adjetivo sugerem uma realidade própria que tem um sentido determinado no e pelo contexto épico Assim Atena olhosdecoruja não é a deusa Atena cultuada em uma cidade específica cercada de determinados mitos locais e sim a Atena tal como configurada na poesia homérica e que se pretende faça sentido para todos os gregos Vale lembrar que uma religião politeísta é fenômeno marcado pela pluralidade de sorte que os poemas homéricos à medida que se tornaram canônicos na Grécia arcaica de algum modo também contribuíram para criar ou reforçar algum tipo de unidade religiosa por tênue que fosse Outro exemplo 1 32831 Em cima compreendeu no juízo seu inspirado canto a filha de Icário Penélope bemajuizada e a elevada escadaria de sua morada desceu não sozinha mas com ela seguiam duas criadas Não sozinha em enjambement não tem apenas a função de informar ao ouvinte que Penélope estava acompanhada A utilização dessa expressão na mesma posição do verso sublinha para um ouvinte familiarizado com a linguagem formular do gênero que uma mulher nobre não costuma aparecer sozinha diante de homens que não sejam da sua família e isso é particularmente relevante para Penélope caracterizada no poema como avessa aos pretendentes portanto reticente em deixar os aposentos femininos Em todas as demais passagens 6 84 18 207 19 601 em que a expressão surge nessa mesma posição do verso ou seja comportase como uma fórmula tratase da mesma situação social A mulher é geralmente Penélope e a fórmula participa da construção de uma cena em que se narra o deslocamento da rainha por sua casa No modelo de tradução pelo qual se optou aqui também é importante que a expressão formular e a elevada escadaria de sua morada desceu ocupe um verso inteiro como no original grego porque quando a personagem tem uma fala antes de se locomover a fórmula que antecede não sozinha é outra 18 2067 e 19 6001 Assim falou e desceu dos aposentos lustrosos não sozinha mas com ela seguiam duas criadas Isso disse e subiu aos aposentos lustrosos não sozinha mas com ela iam outras criadas Num primeiro momento a variação nas expressões que denotam o movimento da rainha parece ser de menor importância contingência do estilo oral Todavia no caso da passagem do canto 1 enfatizase por meio da elevada escadaria não só a riqueza da casa de Odisseu mas sobretudo a distância física e moral entre Penélope e os pretendentes Quanto às outras duas passagens com a fórmula para duas criadas é somente aqui no verso anterior à repetição que se utiliza a expressão formular desceu subiu dos aos aposentos lustruosos Tratase da narração de dois eventos que ocorrem no mesmo dia aquele em que Odisseu enfim vê sua mulher e com ela conversa a fórmula delimita no tempo o encontro daqueles que ainda não podem se unir como casal Assim a expressão aposentos lustrosos está ligada à união marital entre os dois e só é empregada mais uma vez 22 428 em referência a esses mesmos aposentos imediatamente antes da noite de núpcias entre os dois Desse modo a tradução foi elaborada para permitir ao leitor a reconstrução desses nexos oriundos da repetição de palavras ou grupos de palavras sobretudo quando na mesma posição do verso já que no poema verificase a reiteração de cenas inteiras por exemplo a recepção de um hóspede de ações específicas a tríplice repetição do engodo de Penélope ou de versos isolados como visto acima Além disso ao não variar a tradução de determinado termo marquei o uso reiterado de palavras que têm um caráter metonímico forte ou seja definem temas ou personagens fama e cognatos por exemplo traduzem kleos um termo que define a própria poesia épica Diversas expressões ou termos isolados são destacados no original por meio da posição início ou fim de versos como o tematicamente muito importante retorno retornar Inteligente é um adjetivo que utilizo apenas para traduzir um particípio grego que na maior parte das vezes qualifica Telêmaco personagem que se não passa por certa iniciação ao longo do poema no mínimo se vê em certas situações nas quais para se sair bem precisa agir de forma homóloga ao heroísmo do pai Ora é para isso que o adjetivo aponta desde o início do poema Sua reiteração contribui para cristalizar a caracterização da personagem tornandoa mais presente para o ouvinte do poema Enfeitiçar é um dos termos que no poema designam o efeito de um canto poético sobre seu público o outro muito mais comum é agradar Ao termo portanto precisa ser conferido o devido destaque e sua particularidade é assinalada já na primeira vez em que aparece no poema 1 33780 Fêmio sabes muito outro feitiço que age sobre os mortais ações de varões e deuses que cantores tornam famosas Seu conteúdo metapoético é essencial para a compreensão do poema e para isso os três sintagmas fundamentais dos dois versos citados cujos núcleos são feitiço ações e tornam famosas devem ser distinguidos na forma como aparecem no original Nem todas as fórmulas homéricas são aqui traduzidas por fórmulas equivalentes em português apenas quando são particularmente significativas e ou não exigem contorcionismo sintático Na tradução de epítetos que em grego são compostos por uma única palavra sempre se buscou em primeiro lugar a clareza de expressão clareza que também é seu atributo na dicção homérica Os epítetos porém são traduzidos de maneiras diversas epítetos especiais por exemplo Atena olhosdecoruja esses epítetos distintivos ou seja que costumam caracterizar apenas uma única realidade são constitutivos da poesia épica grega e portanto receberam uma tradução distintiva por meio de adjetivos compostos por justaposição Espero que tal opção reproduza pelo menos em parte a combinação de estranheza e familiaridade que tais adjetivos causavam à audiência antiga Às vezes um deus é referido no poema apenas por seu epíteto por exemplo tremeterra e jubacobalto para Posêidon Argifonte para Hermes e Citereia para Afrodite esses dois últimos epítetos não traduzidos porque seu sentido se perdeu ou melhor todas as interpretações oferecidas são incertas epítetos genéricos como excelso epítetos ornamentais dessa espécie são com frequência traduzidos por adjetivos simples ou sintagmas cuja estrutura seja comum na sintaxe da língua portuguesa pois tais epítetos junto com o substantivo que qualificam sobretudo quando na mesma posição do verso funcionam metonimicamente como se viu acima no emprego da expressão não sozinha Enumero a seguir algumas fórmulas cujo sentido talvez não seja claro à primeira vista para o leitor da tradução o sacro ímpeto de Alcínoo linguagem arcaica ou arcaizante é uma perífrase do nome do agente no caso Alcínoo sacra força de Héracles Telêmaco é uma fórmula homóloga dirigiuselhes e nomeouos com o tempo nomear nessa e em fórmulas paralelas perdeu o sentido de chamar alguém pelo nome e tornouse virtualmente sinônimo de dirigirse a alguém varões que sobre a terra comem pão a fórmula reitera um traço inalienável da humanidade a de que os homens comem pão e portanto não são deuses animais ou criaturas intermediárias entre essas três categorias principais deusa divina fórmula pleonástica que pode ser aplicada a qualquer deusa matança e perdição esse é um outro caso em que dois elementos virtualmente sinônimos são usados em combinação o termo aqui traduzido por perdição pode ter tido no início o sentido de destino uma fórmula sinônima dessa é negra perdição da morte mar embaçado referese ao horizonte no mar quando o limite entre céu e mar parece se dissolver em uma bruma leitos bem perfurados enfatiza a excelência da carpintaria ou seja uma cama cujas partes estão bem encaixadas medo amarelo aponta para a palidez resultante do medo bem femininas mulheres enfatiza a oposição entre mulheres e homens Assim como uma performance épica na época de composição dos poemas representava um distanciamento significativo do tempo do lugar e em especial da linguagem do públicoalvo a presente tradução não recuou diante da tarefa de recriar mesmo que contra certas estruturas morfossintáticas da língua portuguesa alguns elementos distintivos da linguagem artificial da poesia épica arcaica por exemplo o uso bastante comum de um verbo acompanhado de um sujeito ou objeto com a mesma raiz entre eles cantor cantava 1 325 Isso foi feito levandose em conta que ainda que a tradução num primeiro momento possa soar estranha para um falante do português a leitura contínua possibilitará que o texto se torne cada vez mais familiar e fluente É necessário levar em conta que a comunicação entre o aedo e seu público é oral o que também ajuda a explicar construções sintáticas como a seguinte na qual o falante como que muda de intenção sintática no meio da frase 8 23640 Estranho como não nos desagrada o que falas mas queres revelar a excelência que te segue encolerizado porque a ti esse varão erguido na pista provocou como mortal algum depreciaria tua excelência todo que soubesse em seu juízo falar com acerto As fórmulas que introduzem ou fecham discursos diretos são de propósito mais duras sintaticamente no português pois na performance dos poemas marcam a passagem do discurso de um sujeito de performance para outro quais sejam o aedo Homero narrador e a personagem Bakker 2013 Em geral quando a sintaxe soar arrevesada é porque ela acentua algo significativo Assim quando Penélope conta para o cretense Odisseu que primeiro o deus soprou em meu juízo um manto após grande urdidura armar no palácio tramar fina e bem longa tal sintaxe reproduz uma espécie de contraponto entre a ação de tecer e destecer De qualquer forma oralmente pode soar bem menos barroca No grego homérico é muito comum a estrutura enfática do husteron proteron primeiro o que vem depois Em português sempre que o texto soasse muito estranho não mantive essa forma Assim em vez de cresceram e nasceram optei por nasceram e cresceram Não segui sempre os nomes da mitologia grega consagrados em português Assim adotei Sirenas na Odisseia apenas duas criaturas que vivem numa ilha para quebrar a ideia comum de que as criaturas que Odisseu encontra em sua viagem se assemelham às sereias da mitologia nórdica Diversos idiomas possuem dois termos distintos para essas criaturas bastante diversas em inglês mermaids e sirens Odisseu e não Ulisses foi escolhido sobretudo para facilitar o jogo de linguagem que é feito no poema com palavras da família de odiar Optei por traduzir alguns nomes próprios pois faz parte da dicção épica a exploração poética e temática desses nomes mas não traduzi nenhum nome de personagem central único critério rígido adotado para a decisão acerca de quais nomes verter ou não Escolhi traduzir boa parte dos nomes de três grupos principais certos acidentes geográficos como a pedra Corvo personagens secundárias cujo nome contribui para criar uma espécie de atmosfera épica pensemos nos nomes dos jagunços figurantes em Grande sertão veredas ou apontar determinado tema e a maioria das personagens feácias com exceção das centrais pois elas remetem em sua quase totalidade ao ambiente marítimo e compõem um catálogo a certa altura de nomes falantes noms parlants um típico tour de force do aedo grego comparemos com o catálogo de nereidas na Ilíada e o das filhas de Oceano na Teogonia No final do volume apresentamos um glossário composto por todos os nomes que receberam uma versão traduzida no poema acompanhados do equivalente grego e eventualmente de uma explicação adicional acerca da tradução Também acrescentamos ao glossário a maioria dos nomes não traduzidos cujo sentido parece ser explorado no poema ou em algum momento da evolução da tradição oral épica Para esse segundo grupo o nome vem acompanhado de uma tradução e eventualmente uma sumária explicação de seu sentido Utilizei mui que soa arcano na fórmula mui sacra Pilos O tom do adjetivo contribui para a caracterização da cidade e sua ligação com seu rei o ancião Nestor Ao termo polvo preferi muitospés 5 432 por acreditar que o leitor atento saberá de que animal se trata e porque muitos fortalece a relação com Odisseu caracterizado por uma série de epítetos com muito No imaginário grego o polvo também é uma criatura astuta Vernant Detienne 2008 Uma família de termos importante no poema diz respeito à realidade da pólis Urbe e cidade são usados indistintamente busquei refletir de alguma forma o caráter fluido da nova realidade política e social que adquiria forma clássica durante os séculos de cristalização da linhagem do poema Neste também não há rigor no emprego dos termos que se referem a essa realidade Outro termo de difícil tradução tendo em vista a realidade social grega é xenos que traduzo por estranho seu sinônimo estrangeiro hóspede ou aliado dependendo do contexto Aliado deve ser entendido como uma aliança pacífica entre nobres ou seja não se trata de um contexto de guerra mas de algo próximo daquilo que entendemos por amizade com a componente afetiva menos marcada e a presença de uma característica moral pois o termo e seus cognatos implicam um feixe de deveres e direitos que devem ser respeitados por ambas as partes da relação Não é possível reconstruir com exatidão um modelo de moradia a partir do vocabulário utilizado na Odisseia o que chamamos de casa ou moradia tem como equivalentes diversos termos gregos Por um lado o palácio de Menelau e o de Alcínoo claramente evocam estruturas mais majestosas que o período histórico em que o poema tomou forma por outro não se trata de uma reprodução dos palácios micênicos De qualquer forma o palácio de Odisseu a cabana de Eumeu ou a gruta de Calipso refletem uma mesma estrutura básica cujo centro é uma construção quadrangular megaron que no singular traduziuse por salão e no plural por salões ou palácio pois sua estrutura básica é um salão junto ao qual há um ou mais quartos Nele aconteciam todas as atividades sociais masculinas Esse termo aparece também no plural podendo apenas indicar que se trata de uma casa majestosa ou sugerir que ao contrário do normal uma casa muito rica poderia ter mais de um salão À entrada da casa se chega por meio de um pátio O que se traduziu por pórtico colunata e vestíbulo diz respeito à entrada da casa mas não lhes é dada uma descrição arquitetônica nem mínima nos poemas No salão havia uma espécie de lareira usada para aquecimento e preparo de refeições No caso da morada de Odisseu Penélope passa a maior parte do tempo nas dependências exclusivas das mulheres no segundo andar ou seja ela não é obrigada a frequentar o salão onde se reúnem os pretendentes mas há certo contato pois ela ouve o que lá se passa e vice versa Também há um ou mais depósitos um deles referido como quarto de Odisseu no qual se guardam provisões e riquezas talvez em uma espécie de porão Duas atividades muito apreciadas competições esportivas e dança são realizadas em espaços próprios ao ar livre respectivamente traduzidos por pista e arena O leitor moderno vai estranhar como vários objetos reluzem em Homero desde pés até roupas passando por poltronas em geral isso se dá pelo uso extensivo de azeite de oliva Serviços domésticos e agrícolas ou pecuários são realizados sobretudo por empregados que alguns especialistas definem como escravos outros como trabalhadores livres dependentes Diversos termos são utilizados em referência a eles enfatizando sobretudo a relação entre o empregado e a casa na qual trabalha Por isso o mesmo indivíduo no poema pode ser referido como escravo criado ou servo Thalmann 1998 Os termos arauto e assistente aludem a homens livres que realizam diversos tipos de atividades o arauto é encarregado por exemplo de levar mensagens acompanhar chefes em missões importantes e convocar assembleias os assistentes compõem uma categoria mais geral e podem inclusive abarcar os arautos sendo incumbidos entre outros afazeres de diversas tarefas domésticas como preparar uma refeição Rei é um termo que em Homero não se refere a uma monarquia dinástica de sorte que em uma mesma comunidade como em Ítaca pode haver diversos reis que são os homens mais poderosos política e economicamente Rei portanto não é uma tradução ideal mas é tradicional já que mesmo em Homero toda comunidade tem um governante cuja autoridade predomina sobre os outros homens poderosos e que costuma ser passada de pai para filho Um prática social bastante comum em Homero é a súplica que pode ser realizada por meio de uma cerimônia ritual ou no outro extremo apenas por meio de um discurso mais ou menos formalizado O gesto central é o toque nos joelhos daquele que se encontra em vantagem ou seja que recebe a súplica Quando o próprio toque não for possível ou desejável a menção dele tocar os joelhos pode ser meramente incorporada no discurso As capacidades mentais e emocionais bem como os órgãos que por elas são responsáveis e seu próprio resultado eram compreendidos pelos gregos na época de Homero de um modo totalmente diverso daquele de hoje Toda tradução portanto será meramente aproximativa Assim embora nenhum valor fosse atribuído ao cérebro utilizamos mente para traduzir uma faculdade que se desenvolve no peito ou simplesmente no íntimo a região de todas essas faculdades As duas principais são o juízo uma faculdadeórgão sobretudo intelectivo e ânimo sobretudo emocional Ímpeto é uma emoção ou faculdade central que diz respeito à energia sentida por um humano para realizar uma tarefa com frequência guerreira e que comumente é referida como advinda da atuação direta de um deus sobre o humano Outro campo semântico de difícil tradução diz respeito ao destino sorte quinhão fado A referência principal é o momento da morte como em o quinhão funesto da morte O quinhão de Odisseu cumprelhe porém também é o de um dia retornar a Ítaca A porção de vida que cada um tem pode ser referida como algo tecido pelas Fiandeiras quando do nascimento já que a sina de todos os mortais é por definição morrer após certo lapso de tempo Nem todas as ações dos homens encontramse predeterminadas ou dependem de uma decisão dos deuses para ocorrer mas quando estes decidem algo prender no jugo não há como o mortal escapar Quando alguém morre de forma inesperada ou de forma rápida e indolor falase das flechas de Ártemis ou Apolo dependendo do sexo do morto Por fim algumas notas que esclarecem elementos de ordem diversa no poema os números identificam os versos CANTO 1 110 O grego bebia o vinho diluindoo em água 122 O sentido da fórmula palavras plumadas não é mais inequívoco para nós mas plumadas pode se referir ao voo das aves ou de flechas ou seja ao modo como um discurso se dirige do falante para o ouvinte ou mais precisamente ao discurso que atinge seu alvo 344 Hélade referese a uma região da Grécia continental 349 Comegrão fórmula que reforça através do modo de alimentação a mortalidade dos humanos ou seja a diferença entre eles e os deuses 440 Leito bemperfurado o sentido exato do epíteto se perdeu uma possibilidade é que se referia ao modo como cordas eram presas no leito para sustentar um colchão CANTO 2 80 O cetro é marca de autoridade utilizado em diferentes contextos na assembleia ele fica na mão daquele que tem a palavra 135 Erínias são divindades ctônicas terríveis ligadas sobretudo à vingança 227 Ancião referese a Laerte CANTO 3 2 Páramo muitobronze referese ao céu portanto talvez a sua firmeza e solidez ou ao brilho das moradas dos deuses CANTO 5 33334 Leucoteia é o nome que essa heroína Ino ganhou após morrer e ser divinizada CANTO 6 106 Leto fecundada por Zeus gerou Apolo e Ártemis deuses flecheiros 162 Broto de palmeira no templo de Apolo em Delos aqui utilizado para enfatizar a altura portanto a beleza a juventude e o valor de Nausícaa de Jong 2001 CANTO 10 8182 Comentadores divergem na interpretação de Lamos e Telépilos o primeiro talvez seja outro nome do rei dos lestrigões ou mais provavelmente do fundador da cidade e o segundo o nome da cidade CANTO 11 235 Aqui se inicia o que os eruditos chamam de catálogo de heroínas ou seja uma sucessão de mulheres da idade dos heróis boa parte delas parceira sexual de deuses de quem geraram filhos homens 271 Epicasta é outro nome de Jocasta mãe e esposa de Édipo 291 A história do adivinho que conquistou a filha de Neleu é contada com outras informações no canto 15 versos 225ss 300 O destino postmortem dos gêmeos Castor e Pólux ou Polideuces varia nas fontes aqui às vezes estão no Hades às vezes entre os deuses tal imortais 601 Héracles aqui é tratado como possuidor de dupla natureza pois ao morrer sua alma ou espectro rumou para o Hades mas ao mesmo tempo foi imortalizado e está no Olimpo casado com Juventude 623 Cérbero é o cão que vigia a entrada ou melhor a saída da morada de Hades 634 Gorgô é um monstro que inspira terror em quem para ele olha CANTO 12 172 Branquearam a água com os pinhos polidos referese à espuma produzida na água do mar pelo movimento incessante dos remos CANTO 14 1457 Eumeu por excesso de zelo não nomeia Odisseu porque seu nome remete a ódio CANTO 18 6 O trocadilho é com Íris a mensageira dos deuses na Ilíada na Odisseia é Hermes CANTO 19 179 Minos tem uma relação especial com Zeus mas o que exatamente é dito aqui permance obscuro é provável a relação com algum ritual de renovação da ordem social por meio de leis portanto com o renascimento reinício de uma comunidade Levaniouk 2011 404 O que Euricleia discretamente sugere é que Odisseu receba o nome Muitorogado 518 Difícil reconstituir a história aludida por Penélope pois pode remeter a duas histórias conhecidas distintas ainda que interrelacionadas em uma delas as personagens são as irmãs Procne Filomela o rei Tereu e seu filho Ítis nessa se conta de uma mãe que mata seu filho para vingarse da violência do marido contra sua irmã Todas as personagens envolvidas no final transformamse em pássaros Na outra versão aquela à qual provavelmente Penélope alude Levaniouk 2011 Filomela é casada com Zeto rei que construiu as muralhas de Tebas e por ter somente um filho Ítilo tem inveja de Anfíon irmão gêmeo do rei e de sua esposa Níobe que têm vasta prole Ao tentar matar o primogênito desse casal mata sem querer o próprio filho e se transforma no rouxinol que à noite entoa lamentoso canto 57375 Aqui é mencionado pela primeira vez o procedimento do concurso com o arco cujos detalhes serão informados nos cantos 20 e sobretudo 21 O arco é de um modelo tal que a corda não permanece fixa nas duas extremidades ou seja cada atirador precisa retesála armar o arco antes de vergálo o que é bastante difícil Os machados que deveriam ser atravessados pelo arco são fixados no pátio ou no salão onde na sequência Odisseu matará todos os pretendentes CANTO 20 66 As filhas de Pandareu têm uma vida tão desafortunada que literalmente perdem sua face humana e são transformadas em criaturas terríveis vingativas como as Erínias Levaniouk 2011 p 278 156 Tratase de um festa anual em honra de Apolo que acontece no início da primavera ou seja na segunda metade do poema o frio do final do inverno ainda é constante CANTO 21 295 Referência à luta entre centauros e lapitas comandados por Peirítoo cujo casamento foi perturbado por um centauro que bebeu demais foi punido e depois debalde buscou vingança CANTO 22 444 Afrodite aqui é virtualmente sinônimo de desejo sexual CANTO 23 275 Destróijoio é como o povo que desconhece a navegação e seus instrumentos se referirá ao remo de Odisseu assemelhado a uma ferramenta agrícola CANTO 24 40 O que normalmente se traduz por memória é de fato uma capacidade mais ampla não apenas mental mas também física diz respeito à capacidade de pôr em prática um conhecimento no caso como o guerreiro está morto ele não pode agir como um cavaleiro 413 Rumor é aqui uma divindade 5 As passagens assinaladas entre colchetes são prováveis interpolações tardias ou seja versos adicionados em um momento da transmissão dos textos em que o poema na Antiguidade já recebera uma forma escrita razoavelmente estável Versos seguidos por uma numeração acrescida de um a são encontrados em um número muito pequeno de manuscritos e podem ter sido acrescentados ao poema em uma fase relativamente tardia de sua transmissão na Antiguidade PERSONAGENS PRINCIPAIS AGAMÊMNON comandou os aqueus em Troia quando volta da guerra é morto pela esposa Clitemnestra que vivia em adultério com Egisto ALCÍNOO rei dos feácios povo ligado ao deus Posêidon ANTICLEIA mãe de Odisseu morre antes de o filho voltar para Ítaca ANTÍNOO junto com Eurímaco lidera os pretendentes de Penélope AQUILES jovem herói não muito depois de derrotar o maior guerreiro troiano Heitor é morto pelo irmão deste Páris em conjunto com Apolo ARETE esposa de Alcínoo rei feácio AUTÓLICO avô materno de Odisseu no imaginário grego o espertalhão por excelência cujo equivalente divino é Hermes CALIPSO ninfa que ajuda o náufrago Odisseu e o toma por marido na sua ilha durante sete anos CASSANDRA filha de Príamo e Hécuba no final da guerra tornase concubina de Agamêmnon ao lado de quem morre assassinada CIRCE ninfa que conhece magia num primeiro momento tenta prejudicar Odisseu e seus companheiros mas depois os ajuda CLITEMNESTRA esposa de Agamêmnon e mãe de Orestes vive em adultério com Egisto e participa da morte do marido e sua concubina quando estes chegam a Micenas DEMÓDOCO bardo cego dos feácios EUMEU porqueiro foi escravizado quando criança de origem nobre é um fiel servidor da família de Odisseu EURÍALO jovem nobre feácio desafia Odisseu e uma vez que esse se mostra superior oferece lhe um presente valioso para se desculpar EURICLEIA fiel servidora da família de Odisseu de quem foi ama é de origem nobre EURÍLOCO principal companheiro de Odisseu cujas instruções nem sempre segue EURÍMACO junto com Antínoo um dos líderes dos pretendentes de Penélope FÊMIO bardo que os pretendentes obrigam a cantar na casa de Odisseu FILOCTETES guerreiro aqueu é picado por uma cobra e por conta do fedor da ferida é abandonado em uma ilha no caminho para Troia é resgatado anos depois porque ele eou seu arco são imprescindíveis para a conquista da cidade FILOITIO pastor de bois de Odisseu HEITOR grande herói troiano filho de Príamo e Hécuba esposo de Andrômaca e pai de Astíanax HELENA esposa de Menelau está na origem da guerra de Troia por ter sido raptada ou seduzida no imaginário grego antigo são equivalentes por Páris jovem da família real de Troia só teve uma filha com Menelau HÉRACLES herói da geração que antecede a dos heróis que lutaram em Troia excelente arqueiro também se destaca pela força LAERTE pai de Odisseu quando este partiu para Troia já não era mais o rei de Ítaca vive afastado do ambiente político em situação precária MENELAU esposo de Helena também demorou para chegar a Esparta sua cidade NAUSÍCAA filha adolescente portanto em idade de casar de Alcínoo NEOPTÓLEMO filho de Aquiles com a princesa Deidamia é levado a Troia quase no fim da guerra pois uma profecia dizia que a cidade só seria tomada se ele e Filoctetes lá estivessem na conquista da cidade mata Príamo e o pequeno Astíanax o caçula de Heitor e Andrômaca NESTOR ancião que lutou em Troia sábio conselheiro perdeu seu filho Antíloco na guerra mora com a esposa e outros filhos homens em Pilos ODISSEU rei de Ítaca participou da guerra de Troia para onde foi quando Telêmaco seu único filho com Penélope ainda era bebê ORESTES filho de Agamêmnon vinga a morte do pai matando a mãe e seu marido Egisto PENÉLOPE esposa de Odisseu e parente de Clitemnestra e Helena POLIFEMO ciclope que captura Odisseu e é por ele cegado filho de Posêidon PRÍAMO ancião troiano ainda era rei da cidade embora não lutasse no campo de batalha na conquista da cidade é morto por Neoptólemo TELÊMACO filho único de Odisseu e Penélope tem cerca de vinte anos quando Odisseu chega a Ítaca Do varão me narra Musa do muitasvias que muito vagou após devastar a sacra cidade de Troia De muitos homens viu urbes e a mente conheceu e muitas aflições sofreu ele no mar em seu ânimo 5 tentando garantir sua vida e o retorno dos companheiros Nem assim os companheiros socorreu embora ansiasse por iniquidade própria a deles pereceram tolos que as vacas de Sol Hipérion devoraram Esse porém tiroulhes o dia do retorno 10 De um ponto daí deusa filha de Zeus fala também a nós Os outros todos que escaparam do abrupto fim estavam em casa após escapar da guerra e do mar Somente a ele do retorno privado e da mulher detinha augusta ninfa Calipso deusa divina 15 em cava gruta almejando que fosse seu esposo Mas quando o ano chegou e os ciclos volveramse os deuses destinaramlhe à casa retornar rumo a Ítaca e nem lá escapou de provas e estava entre os seus Os deuses se apiedavam todos 20 salvo Posêidon Incansável manteve a ira contra o excelso Odisseu até esse em sua terra chegar Porém aquele foi ter com etíopes distantes moradores etíopes divididos em dois grupos varões dos extremos uns onde Hipérion mergulha outros onde levanta 25 para aceitar hecatombe de touros e carneiros Nisso deleitavase sentado no banquete e os outros no palácio de Zeus Olímpio estavam reunidos Entre eles tomou a palavra o pai de varões e deuses lembrarase no ânimo do impecável Egisto 30 a quem matou o filho de Agamêmnon o afamado Orestes Dele lembrouse e entre os imortais palavras enunciou Incrível não é que os mortais responsabilizam aos deuses Dizem de nós vir os males mas eles também por si mesmos graças a sua iniquidade além do quinhão têm aflições 35 como agora Egisto além do quinhão do filho de Atreu desposou a lídima esposa e a ele que retornara matou sabendo do abrupto fim pois já lhe disséramos enviando Hermes o Argifonte agudamirada que não o matasse nem cortejasse a consorte 40 Por Orestes se dará a vingança pelo filho de Atreu quando tornarse jovem e desejar sua terra Assim falou Hermes mas não persuadiu ao juízo de Egisto benevolente Agora tudo junto pagou E a ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja 45 Ó nosso pai filho de Crono supremo entre poderosos deveras jaz esse aí em merecido fim assim também pereça todo que fizer tais ações Mas pelo atilado Odisseu dilacerase meu coração pelo desditoso longe dos seus há muito sofre misérias 50 em ilha correntosa onde fica o umbigo do mar ilha arvorejada onde uma deusa habita filha de Atlas juízoruinoso que do mar todo as profundas conhece e o próprio sustém pilares grandes que mantêm a terra e o páramo separados 55 Sua filha segura o desgraçado lamentador e sempre com moles e solertes contos tenta enfeitiçálo para Ítaca olvidar Mas Odisseu ansiando somente mirar fumaça irrompendo de sua terra deseja morrer Para ele nem assim 60 aponta teu coração Olímpio Acaso Odisseu junto a naus argivas não te agradou com caros sacrifícios na larga Troia Por que contra ele esse ódio Zeus Respondendo disselhe Zeus juntanuvens Minha filha que palavra te escapou da cerca de dentes 65 Como eu nesse caso esqueceria o divino Odisseu aos mortais superior na mente e nos sacrifícios dados aos deuses imortais que do largo páramo dispõem Mas Posêidon o terrasustém sem cessar continua colérico pelo ciclope de quem Odisseu o olho cegou 70 o excelso Polifemo cuja robustez supera a de todos os ciclopes Gerouo Toossa a ninfa filha de Fórcis que cuida do mar ruidoso unida a Posêidon em côncava gruta Depois disso a Odisseu Posêidon tremesolo 75 não tenta matar mas faz vagar longe da pátria Mas vamos nós aqui planejemos todos o retorno para que chegue Posêidon porá de lado sua cólera pois por certo não poderá contra todos os deuses imortais em oposição brigar sozinho 80 A ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja Nosso pai filho de Crono supremo entre poderosos se isso agora é caro aos deuses ditosos que retorne Odisseu muitojuízo a sua casa e Hermes então o condutor Argifonte 85 instiguemos à ilha Ogígia para sem demora à ninfa belastranças anunciar o firme desígnio o retorno de Odisseu juízopaciente para que retorne Mas eu partirei para Ítaca a fim de seu filho mais instigar e ímpeto pôr em seu peito 90 que à ágora chame os aqueus cabelocomprido e anuncie a todos os pretendentes que sempre abatem suas copiosas ovelhas e lunadas vacas trôpegas Vou enviálo a Esparta e à arenosa Pilos para do retorno do caro pai se informar caso algo ouvir 95 e que pertençalhe distinta fama entre os homens Após falar assim atou aos pés belas sandálias imortais douradas que a levavam sobre as águas e sobre a terra semfim com lufadas de vento Tomou a brava lança afiada com ponta de bronze 100 pesada grande robusta com que subjuga filas de varões heróis contra quem tem rancor a de pai ponderoso E partiu dos cumes do Olimpo lançouse e parou na cidade de Ítaca no pórtico de Odisseu no umbral do pátio e na palma trazia lança brônzea 105 semelhante ao aliado líder dos táfios Mentes Achou claro os arrogantes pretendentes eles com pedras diante das portas deleitavam o ânimo sentados no couro de bois que eles mesmos abateram Para eles os arautos e ágeis assistentes 110 misturavam uns vinho e água nas ânforas outros com esponjas esburacadas mesas lavavam e dispunham e muita carne partiam Primeiro a vêla foi o deiforme Telêmaco sentado entre pretendentes agastado no coração 115 no íntimo mirava o distinto pai ao voltar um dia fizesse esses pretendentes pela casa se dispersar retomasse ele mesmo sua prerrogativa e regesse sua casa Nisso refletia sentado entre os pretendentes e viu Atena Foi logo ao pórtico indignado no ânimo 120 por um hóspede tardar nos portões Parado perto apertoulhe a mão direita tomou a lança brônzea e falando dirigiulhe palavras plumadas Saudação estranho por nós serás acolhido Depois após tomar parte no jantar enunciarás o que precisas 125 Assim falou tomou a frente e seguiuo Palas Atena Quando eles estavam dentro da alta casa a lança postou levandoa até um grande pilar dentro de um guardalança bempolido onde outras lanças de Odisseu juízopaciente havia muitas 130 a ela guiou à poltrona na qual estendera um tecido bela artificiosa embaixo para os pés banqueta Ao lado para si pôs variegada cadeira longe dos outros pretendentes para o estranho agastado com o alarido não se enfastiar do jantar em meio a soberbos 135 e para que o interrogasse acerca do pai ausente Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente 140 e junto muitos petiscos oferecendo o que havia O trinchador tomou e dispôs gamelas com carnes de todo tipo e junto deles punha taças douradas e para eles o arauto vinha amiúde escançar E entraram os arrogantes pretendentes Então esses 145 em ordem sentaramse em cadeiras e poltronas Para eles os arautos vertiam água nas mãos e pão as escravas à frente amontoavam em cestas e moços preencheram ânforas com bebida 148ª e a todos distribuíam após verter as primícias nos cálices E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos 150 Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida aos pretendentes interessou no peito outra coisa canto e dança esses o suplemento do banquete Lira muito bela um arauto pôs nas mãos de Fêmio que cantava aos pretendentes obrigado 155 E ele dedilhando a lira entoava belo prelúdio mas Telêmaco dirigiuse a Atena olhosdecoruja perto pondo a cabeça para não os ouvirem os outros Caro hóspede te indignarás contra minha fala Bem a eles isto interessa lira e canto 160 é fácil pois comida de outrem devoram de graça do varão cujos ossos brancos já apodrecem na chuva jazendo em terra firme ou ondas no mar os fazem rolar Se vissem que a Ítaca esse homem retornou todos rezariam para ser mais ligeiros nos pés 165 que mais abastados com ouro e vestes Não está morto assim vil quinhão e não temos consolo ainda que algum dos homens terrestres afirme que voltará perdeuse seu dia de retorno Mas vamos dizeme isto e conta com precisão 170 quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais Chegaste em que nau Como os nautas a ti conduziram até Ítaca Quem proclamaram ser De modo algum creio que a pé aqui chegaste A mim diz isto a verdade para eu bem saber 175 se é tua primeira visita ou se já és aliado da família pois muitos varões vinham a nossa casa outros pois ele buscava a companhia de homens A ele então replicou a deusa Atena olhosdecoruja Portanto a ti com muita precisão isso direi 180 Proclamo ser Mentes do atilado Anquíalo o filho e reino sobre o povo táfio Cheguei há pouco com nau e companheiros singrando o vinoso mar rumo a homens outralíngua até Temessa atrás de bronze e levo ardente ferro 185 Minha nau está aqui no campo longe da cidade na baía de Rêitron sob o Néion coberto de mato Aliados proclamamos ser um da família do outro há tempo caso ao ancião perguntares indo até ele ao herói Laerte que dizem não vir mais 190 à cidade mas distante no sítio sofre misérias com velha criada que a ele comida e bebida dispõe quando a fadiga se apossa de seus membros arrastandose pelo seu fértil vinhedo no morro Então vim pois falaram que ele estava na cidade 195 teu pai mas eis que deuses o tiraram do caminho Não está morto sobre a terra o divino Odisseu mas ainda vivo creio é retido no extenso mar em ilha correntosa e homens cruéis o detêm selvagens que algures o seguram contra a vontade 200 Agora para ti eu adivinharei como no ânimo lançam os imortais e como acredito que se dará não sendo adivinho nem conhecendo aves ao claro Não ficará mais muito tempo longe da cara terra pátria nem se grilhões de ferro o detiverem 205 planejará seu retorno já que é o muitotruque Mas vamos dizeme isto e conta com precisão se de fato grande assim és filho dele de Odisseu Incrível na cabeça e nos belos olhos assemelhaste àquele pois bem amiúde nos reunimos um com o outro 210 antes de ele embarcar para Troia aonde também outros argivos os melhores foram em suas cavas naus Desde então Odisseu eu não vi nem ele a mim A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Portanto eu a ti hóspede com muita precisão direi 215 Minha mãe diz que dele sou filho mas eu mesmo não sei ninguém por si só sua origem conhece Tomara tivesse eu sido filho de algum ditoso varão que envelhecesse junto a seus bens Agora de quem se tornou o mais desventurado dos mortais 220 dele afirmam que nasci já que isso tu me indagas A ele então replicou a deusa Atena olhosdecoruja Os deuses por certo não tornaram inglória tua linhagem para o futuro pois a ti desse feitio Penélope gerou Mas vamos dizeme isto e conta com precisão 225 que banquete que multidão é essa Precisas disso Festa ou casamento Pois um almoço isso não é porque a mim desmedidos com soberba parecem banquetearse pela casa Um varão se indignaria vendo tanta vergonha todo sensato que chegasse 230 A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Hóspede já que isso me perguntas e investigas naquela época esta casa rica e impecável devia ser enquanto aquele varão ainda estava na cidade Mas outro desejo foi o dos deuses maquinando males 235 ao tornarem desaparecido aquele mais que a todos os homens pois até com ele morto não me afligiria assim se entre seus companheiros tivesse sido subjugado em Troia ou nos braços dos seus após arrematar a guerra Então todos os aqueus lhe teriam erigido um túmulo 240 e a seu filho teria granjeado grande fama para o futuro A ele porém as Harpias agarraram sem rumor partiu desaparecido despercebido e dores e lamentos deixoume aflito não gemo por aquele somente pois deuses me armaram outras agruras vis 245 Quantos nobres têm poder sobre as ilhas Dulíquion Same e a matosa Zacintos e quantos regem pela rochosa Ítaca tantos cortejam minha mãe e esgotam a casa Ela nem recusar as hediondas bodas nem as completar 250 disso não é capaz eles porém devastam comendo minha casa Logo despedaçarão também a mim E a ele atenazada dirigiuse Palas Atena Incrível por certo do afastado Odisseu muito precisas nos aviltantes pretendentes desceria os braços 255 Ah Se de volta à casa nas portas da frente estivesse com elmo escudo e duas lanças tal como eu pela primeira vez o mirei em nossa casa bebendo e deleitandose voltando de Éfira de junto de Ilo filho de Mermero 260 pois Odisseu foi também até lá sobre nau veloz em busca de poção assassina para com ela untar flechas pontabrônzea Mas aquele não lha deu pois temia indignar os deuses semprevivos mas meu pai lha deu pois o amava por demais 265 Assim Odisseu encontrasse os pretendentes todos seriam destinoveloz e bodasamargas Não isto repousa nos joelhos dos deuses se após retornar ele se vingará ou não em seu palácio já a ti peço que ponderes 270 como expulsarás os pretendentes do salão Vamos agora ouve e atenta a meu discurso amanhã convoca à ágora os heróis aqueus e discurso enuncia a todos os deuses por testemunhas Pretendentes ordena que se dispersem a suas casas 275 e tua mãe se o ânimo impelea a ser desposada que vá logo à morada do pai que muito possui eles irão preparar as bodas e dispor um dote de grande monta o que convém seguir com a filha amada Já a ti darei arguto conselho caso fores persuadido 280 equipa nau excelente com vinte remadores e parte em busca de novas do pai há tempo ausente para o caso de um mortal algo te dizer ou ouvires o rumor de Zeus que mais que tudo traz fama aos homens Primeiro vai a Pilos e interroga o divino Nestor 285 e de lá até Esparta para junto do loiro Menelau ele foi dos aqueus couraçabrônzea o último a chegar Se ouvires da subsistência e do retorno de teu pai sim embora arruinado ainda aguentarias um ano se ouvires que ele está morto e não vive mais 290 após retornares então à cara terra pátria erguelhe cenotáfio e também oferta oferendas à farta quanto convém e dá a mãe a um varão Mas quando tiveres aquilo feito e completado planeja então no juízo e no ânimo 295 como os pretendentes em teu palácio matarás com truque ou às claras tu não precisas continuar com tolices pois não tens mais idade Não escutaste que fama logrou o divino Orestes entre todos os homens após matar o assassino do pai 300 Egisto astúciaardilosa que matara seu pai glorioso Também tu amigo pois te vejo muito belo e alto sê bravo para também gerações futuras te elogiarem Mas eu descerei agora à nau veloz até os companheiros que impacientes me aguardam 305 que a ti isso ocupe e atenta a meu discurso A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Hóspede por certo com benevolência dizes isso como pai para filho e disso nunca me esquecerei Mas vamos fica embora sôfrego pela rota 310 para que banho tomado após deleitar teu coração com um dom rumes ao navio de ânimo alegre algo valioso e muito belo que te será preciosidade minha algo com que caros aliados a aliados presenteiam A ele então respondeu a deusa Atena olhosdecoruja 315 Não me segures mais pois almejo partir o dom que teu coração pede que me dês no retorno seja dado para eu o levar para casa após muito belo pegares para ti haverá retribuição Ela após falar assim partiu Atena olhosdecoruja 320 e como ave pela chaminé voou e no ânimo dele pôs ímpeto e audácia e fêlo lembrarse do pai ainda mais que no passado Ele em seu juízo refletiu e pasmouse no ânimo pensou tratarse de um deus Presto foi aos pretendentes herói igual ao deus 325 Entre eles cantor cantava bem famoso e quietos sentados ouviam Dos aqueus cantava o retorno funesto que desde Troia impôslhes Palas Atena Em cima compreendeu no juízo seu inspirado canto a filha de Icário Penélope bemajuizada 330 e a elevada escadaria de sua morada desceu não sozinha mas com ela seguiam duas criadas Quando alcançou os pretendentes divina mulher parou ao lado do pilar do teto sólida construção após puxar para diante da face o véu reluzente 335 e criadas devotadas uma de cada lado se postaram Aos prantos então dirigiuse ao divino cantor Fêmio sabes muito outro feitiço que age sobre os mortais ações de varões e deuses que cantores tornam famosas desses canta um sentado junto deles e quietos 340 bebam vinho Mas interrompe esse canto funesto que sempre no peito meu coração tortura depois que assaltoume aflição inesquecível De notável pessoa tenho saudade lembrandome sempre do varão cuja fama é ampla na Hélade até o meio de Argos 345 A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Ora minha mãe por que te desagrada que o leal cantor deleite como a mente o instiga Não são os cantores os responsáveis mas de algum modo Zeus ele que dá ao homem comegrão como quiser a cada um 350 Não cabe indignação contra ele ao cantar a má sorte dos dânaos os homens com efeito tornam mais famoso o canto que for o mais recente a circundar os ouvintes Que teu coração e ânimo suportem ouvir pois não só Odisseu perdeu o dia do retorno 355 em Troia muitos outros heróis também pereceram Mas entra na casa e cuida de teus próprios afazeres do tear e da roca e ordena às criadas que executem o trabalho o discurso ocupará os varões todos mormente a mim de quem é o poder na casa 360 Ela ficou pasma e foi de volta à casa pois o inteligente discurso do filho pôs no ânimo Subiu aos aposentos com as criadas mulheres e chorou por Odisseu caro esposo até sono doce lançarlhe sobre as pálpebras Atena olhosdecoruja 365 E os pretendentes iniciaram arruaça no umbroso palácio todos rezaram para a seu lado no leito deitarse Entre eles o inteligente Telêmaco tomou a palavra Pretendentes de minha mãe de brutal desmedida agora deleitemonos com o banquete e que barulheira 370 não haja pois isto é belo ouvir um aedo deste feitio semelhante a deuses na voz humana Pela manhã indo até a ágora sentemonos todos e eu vos enunciarei um discurso resoluto abandonai o palácio cuidai de outros banquetes 375 comendo vossos bens indo de uma casa a outra Se isto vos parece mais lucrativo e melhor o sustento de um só homem ser destruído de graça devastaio mas eu clamarei aos deuses semprevivos que Zeus um dia conceda que a retribuição ocorra 380 então seríeis destruídos de graça dentro de casa Assim falou e todos com dentes mordendo os lábios admiraramse de Telêmaco pois falou com audácia A ele então dirigiuse Antínoo filho de Persuasivo Telêmaco deveras te ensinam os próprios deuses 385 a seres falaaltiva e falares com audácia Que não a ti de Ítaca cercadademar o filho de Crono torne rei o que te cabe por linhagem pelo legado paterno A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Antínoo te irritarás contra minha fala 390 Até isso caso Zeus o desse eu gostaria de conquistar Dizes que é o que há de pior entre os homens De modo algum é ruim ser rei Rápido sua casa tornase rica e ele mesmo é mais honrado Mas na verdade reis aqueus também há outros 395 muitos em Ítaca cercadademar jovens e anciãos que um deles isso tudo possua pois morreu o divino Odisseu Eu todavia serei senhor de nossa casa e de escravos que para mim apresou o divino Odisseu A ele então Eurímaco filho de Polibo retrucou 400 Telêmaco repousa nos joelhos dos deuses quem em Ítaca cercadademar será rei dos aqueus e que tu mantenhas teus bens e reine sobre tua casa Que não venha varão que contra ti com violência arranque teus bens enquanto Ítaca for habitada 405 Mas querote nobre indagar acerca do hóspede de onde vem aquele varão De que terra proclama ser Qual é sua linhagem e o solo pátrio Traz notícia de que teu pai está voltando ou atrás de necessidade própria vem aqui 410 Quão súbita foi a partida veloz e não ficou para travar contato vil não aparentava ser A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Eurímaco por certo perdeuse o retorno de meu pai não mais confio em notícias se vêm de alhures 415 nem atento à profecia que minha mãe para a casa chamando um profeta dele indague Aquele é meu aliado paterno de Tafos e proclama ser Mentes do atilado Anquíalo o filho e reina sobre o navegador povo táfio 420 Isso falou Telêmaco e no juízo reconheceu a deusa imortal E aqueles para a dança e o desejável canto volveramse e deleitaramse e ficaram até a noite Enquanto se deleitavam veiolhes a negra noite Então para se deitar voltaram a suas casas 425 Telêmaco onde no pátio muito belo seu quarto de alto pédireito fora feito em local todo protegido lá rumou ao leito cogitando muita coisa no juízo A seu lado trazia tochas ardentes a sempre devotada Euricleia filha de Voz filho de Persuadidor 430 a qual um dia Laerte comprou usando seus bens ela ainda na puberdade e deu vinte bois como à devotada esposa honravaa no palácio e no leito nunca a tomou evitando a raiva da mulher a seu lado trazia tochas ardentes das escravas era 435 a que dele mais gostava e o criou quando pequeno Ele abriu as portas do quarto sólido sentouse na cama e tirou a túnica macia e essa lançou nas mãos da anciã de espírito agudo Ela após dobrar a túnica dela cuidar 440 e pendurála num gancho junto ao leito bemperfurado saiu do quarto fechou a porta com maçaneta prateada e puxou o ferrolho por meio da correia Lá ele por toda a noite coberto por velo ponderava em seu juízo o trajeto que planejara Atena Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos pôsse para fora do leito o caro filho de Odisseu vestiu suas vestes pendurou a espada afiada no ombro atou aos pés reluzentes belas sandálias 5 e saiu do quarto de frente semelhante a um deus De imediato aos arautos claravoz ordenou convocar à ágora os aqueus cabelocomprido Aqueles os convocaram e estes se reuniram bem rápido Então após estarem reunidos todos juntos 10 foi à ágora e na palma trazia lança brônzea não sozinho mas dois lépidos cães seguiam com ele Prodigiosa graça vertia Atena sobre ele e todo o povo contemplouo em sua chegada Sentouse no assento do pai anciãos deramlhe lugar 15 Dentre eles o herói Egípcio começou a falar já encurvado pela idade e com muita experiência Também seu filho o lanceiro Antifo para Ílion belospotros rumara em cavas naus com o excelso Odisseu mas matouo o selvagem ciclope 20 na cava gruta e por último aprontouo para o jantar Tinha três outros filhos um juntavase aos pretendentes Eurínomo e dois cuidavam dos campos paternos Nem assim daquele olvidou lamentandose atormentado Por ele vertendo lágrimas tomou a palavra e disse 25 Ouvi agora de mim itacenses o que vou falar nossa assembleia não se reuniu nem houve sessão desde que o divino Odisseu partiu em cavas naus E agora quem a reuniu Quem tanto necessita algum dos jovens varões ou dos mais velhos 30 Ouviu notícia de um exército a caminho do que nos deveria falar ao claro por antes saber ou anuncia e revela outro tema público Nobre pareceme abençoado Que para ele Zeus complete o que deseja de bom em seu juízo 35 Isso disse e o prenúncio alegrou o caro filho de Odisseu não ficou tempo sentado e desejou falar Postouse no meio da ágora o cetro pôs em sua mão o arauto Persuadidor versado no inteligente Então primeiro ao ancião abordando disse 40 Ancião esse varão não está longe logo saberás quem eu reuni o povo enorme aflição me atinge Não ouvi notícia de um exército a caminho do que vos deveria falar ao claro por antes saber nem anuncio ou revelo outro tema público 45 mas minha própria necessidade um mal tombou em casa dois até primeiro perdi o nobre pai que um dia entre vós aqui reinava e era como um pai amigável agora porém um muito maior que logo a casa toda de todo irá despedaçar e todo o sustento perder 50 Pretendentes atacam minha mãe contra sua vontade caros filhos de varões que justo aqui são os melhores eles que à casa do pai dela têm pavor de partir Icário que deveria ele fazer o noivado da filha e entregála a quem quisesse a quem o agradasse 55 E eles frequentando nossa casa todos os dias abatendo bois ovelhas e gordas cabras festejam e bebem fulgente vinho levianos Isso se desperdiça à larga Não há varão tal como era Odisseu para afastar o dano da casa 60 Nós não temos como afastálos sim também depois mostraremos ser débeis e pouco versados em bravura Por certo me defenderia se capacidade eu tivesse Houve ações não mais toleráveis e não é decoroso como minha casa está em ruínas indignaivos também 65 envergonhaivos diante de outros homens vizinhos os que moram nos arredores E temei a ira dos deuses para que não se realinhem irritados com vis ações Suplico por Zeus Olímpio e por Têmis que dissolve e instaura assembleias de homens 70 recuai amigos deixaime sozinho ser torturado por funesta dor a não ser que meu pai o distinto Odisseu inimigo tenha infligido males a aqueus belasgrevas pelos quais vingandovos males infligis inimigos esses aí instigando A mim seria mais vantajoso 75 que comêsseis meus bens imóveis e o gado se vós os tivésseis comido logo haveria compensação sim pela cidade rogaríamos com discursos pedindo bens até que tudo fosse recuperado Mas agora dores ineludíveis lançais em meu ânimo 80 Após falar assim irado lançou o cetro ao chão e lágrimas jorraram e piedade tomou todo o povo Então todos os outros atentaram e ninguém ousou responder a Telêmaco com duros discursos Só Antínoo respondendo lhe disse 85 Telêmaco falaaltiva de ímpeto incontido que falaste aviltandonos Gostarias de nos pregar a mácula Contra ti nada fizeram os pretendentes aqueus e sim tua cara mãe destacada conhecedora de estratagemas Já é o terceiro ano e rápido será o quarto 90 desde que frustra o ânimo no peito dos aqueus A todos dá esperança e faz promessas a cada varão enviando recados e sua mente concebe outra coisa Pois cogitou este outro ardil no juízo após grande urdidura armar no palácio tramava 95 fina e bem longa De imediato nos disse Moços meus pretendentes morto o divino Odisseu esperai mesmo ávidos por desposarme até o manto eu completar que meus fios em vão não se percam mortalha para o herói Laerte para quando a ele 100 o quinhão funesto agarrar o da morte dolorosa que contra mim no povo aqueia alguma se indigne se ele sem pano jazer depois que muito granjeou Assim falou e foi persuadido nosso ânimo orgulhoso E então de dia tramava a enorme urdidura 105 e à noite desenredavaa com tochas postadas ao lado Três anos o truque não se notou e persuadiu os aqueus mas ao chegar o quarto ano e a primavera se achegar 107ª as luas finando e muitos dias passarem uma das mulheres falou a que sabia ao claro e a apanhamos desenredando a trama radiante 110 E assim ela a completou a contragosto obrigada A ti os pretendentes isto responderão para que saibas tu mesmo em teu ânimo e saibam todos os aqueus envia de volta tua mãe e ordenalhe que aceite casar com quem o pai mandar e a ela agradar 115 Se ainda retardar muito tempo os filhos de aqueus refletindo no ânimo no que sobremodo lhe deu Atena a técnica de trabalhos bem belos um juízo distinto e truques que nunca ouvimos de alguém nem das antigas as que no passado viveram aqueias belastranças 120 Tiro Alcmena e Micena belastranças nenhuma delas ideias semelhantes às de Penélope conheceu porém a que pensou não é moderada Bom teus recursos e teus bens eles comerão enquanto ela mantiver esta ideia essa que agora 125 os deuses põem em seu peito grande fama para si adquire mas para ti a saudade de muitos recursos Nós não iremos antes aos campos nem a outro lugar até que seja desposada pelo aqueu que ela quiser A ele então o inteligente Telêmaco retrucou 130 Antínoo é impossível afastar de casa contra sua vontade quem me gerou quem me criou e meu pai está alhures vivo ou morto É injusto eu pagar elevada compensação a Icário se de bom grado eu fizer minha mãe retornar Sofrerei males da parte de meu pai e outros o deus 135 me dará pois minha mãe invocará as hediondas Erínias ao deixar sua casa Indignação contra mim os homens mostrarão assim eu nunca direi esse discurso Abandonai o palácio cuidai de outros banquetes 140 comendo vossos bens indo de uma casa a outra Se isto vos parece melhor e mais lucrativo o sustento de um só homem ser destruído de graça devastaio mas clamarei aos deuses semprevivos que Zeus um dia conceda que a retribuição ocorra 145 então seríeis destruídos de graça dentro de casa Assim falou Telêmaco e duas águias Zeus amplavisão envioulhe do alto do pico do monte em voo As duas por um tempo voaram com lufada de vento próximas uma da outra esticando as asas 150 mas quando alcançaram o meio da ágora muitafala lá após voltear bateram suas asas rápido miraram as cabeças de todos e tinham a ruína nos olhos com as garras arranharam faces e pescoços e à direita lançaramse através das casas da cidade deles 155 Eles pasmaramse com as aves ao vêlas e revolveram no ânimo o que iria de fato se completar Entre eles também falou o velho herói Haliterses filho de Buscador o único a superar os de sua idade no conhecimento das aves e nos enunciados proféticos 160 Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Ouvi agora de mim itacenses o que vou falar falo sobretudo aos pretendentes quando isto revelo Contra eles rola grande desgraça pois Odisseu não muito tempo longe dos seus ficará mas talvez já 165 esteja perto e para esses aí engendra matança e perdição para todos também será um mal para muitos outros de nós moradores de Ítaca bemavistada Não bem antes planejemos como os faremos parar que eles por si parem pois isso lhes é de pronto muito melhor 170 Não adivinho sem experiência mas sei fazêlo bem Afirmo que também para ele tudo se completou como lhe discursei quando para Ílion embarcavam os argivos e com eles partiu Odisseu muitaastúcia após muitos males sofrer e perder todos os companheiros 175 irreconhecível para todos no vigésimo ano em casa chegaria Tudo isso agora se completa A ele então Eurímaco filho de Polibo retrucou Ancião vamos agora adivinha para teus filhos em casa para que um mal não sofram no futuro 180 nisso sou muito melhor adivinho que tu São muitas as aves que sob os raios do sol zanzam nem todas proféticas Odisseu porém longe pereceu e assim também tu com ele devias ter morrido não enunciarias tantas profecias 185 e o já encolerizado Telêmaco não atiçarias assim para tua casa aguardando um dom caso ele o levar Eu porém te falarei e isto se completará se com muito saber antigo ao varão mais jovem induzindo com palavras incitas a endurecer 190 a ele mesmo primeiro ocorrerão mais problemas e nada poderá realizar por causa deles e para ti ancião imporemos pena que no ânimo doerá pagar duro te será o sofrimento A Telêmaco diante de todos eu mesmo aconselharei 195 que a sua mãe ele ordene voltar à casa do pai e eles as bodas irão preparar e dispor um dote de grande monta o que convém seguir com filha amada Não creio que antes cessarão os filhos de aqueus a difícil corte pois seja como for a ninguém tememos 200 por certo não a Telêmaco embora sendo muitodiscurso nem atentamos para profecia que tu ancião anuncias irrealizável e és mais odiado ainda Já os bens serão vilmente consumidos e jamais iguais haverá enquanto ela atrasar os aqueus 205 nessas bodas mas nós aguardando todos os dias por sua excelência disputamos e atrás de outras não vamos das adequadas ao casamento conosco A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Eurímaco e todos os outros ilustres pretendentes 210 isso de vós não mais suplico nem disso falo Já o conhecem os deuses e todos os aqueus Mas vamos daime nau veloz e vinte companheiros que para mim ida e volta efetuarão o percurso Sim irei a Esparta e à arenosa Pilos 215 buscar notícia do retorno do pai há tempo ausente caso um mortal algo me disser ou ouvir o rumor de Zeus que mais que tudo traz fama aos homens Se da subsistência e do retorno de meu pai ouvir sim embora arruinado ainda aguentaria um ano 220 se ouvir que ele está morto e não vive mais após retornar então à cara terra pátria irei lhe erguer cenotáfio e também ofertarei oferendas à farta quanto convém e a um varão darei a mãe Após falar assim sentouse e entre eles ergueuse 225 Mentor que do impecável Odisseu era companheiro e este ao embarcar confioulhe toda a propriedade que obedecesse ao ancião e com firmeza tudo guardasse Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Ouvi agora de mim itacenses o que vou falar 230 que nunca mais um rei portacetro seja solícito suave e amigável nem no juízo saiba o medido mas sempre seja duro e cometa iniquidades pois ninguém se lembra do divino Odisseu dentre aqueles que regeu e era como um pai amigável 235 Mas não me oponho aos arrogantes pretendentes quando agem violentos com tramoias da mente arriscando suas cabeças devoram com violência a casa e de Odisseu afirmam nunca irá retornar Não me indigno com o resto do povo como todos 240 estão quietos sentados ao invés de abordandoos segurardes sendo muitos os poucos pretendentes E a ele Leócrito filho de Fortificante retrucou Insultante Mentor doido no juízo que coisa falaste instigandoos a nos fazer parar É difícil por um banquete 245 brigar contra varões que estão em maior número Ainda que o itacense Odisseu ao voltar em pessoa concebesse no ânimo expulsar do salão os ilustres pretendentes que se banqueteiam na casa a esposa mesmo dele muito carente não se alegraria 250 com sua volta lá mesmo alcançaria ultrajante fado se combatesse o grupo tu não falaste com adequação Vamos dispersaivos cada um rumo a sua lida e para este aí apressarão a rota Mentor e Haliterses os quais desde o início são companheiros do pai 255 Mas creio por muito tempo sentado notícias ouvirá em Ítaca e nunca completará essa rota Assim ele falou e rápido dissolveu a assembleia Eis que se dispersaram cada um rumo a sua casa e os pretendentes foram à casa do divino Odisseu 260 Telêmaco afastandose até a orla do oceano lavou as mãos no mar cinzento e orou a Atena Ouveme deus que ontem vieste até nossa casa e me ordenaste em nau sobre o mar embaçado buscar notícia do retorno do pai há tempo ausente 265 e partir Tudo isso atrasam os aqueus e sobretudo os pretendentes com sua vil arrogância Assim falou orando e das cercanias veiolhe Atena semelhante a Mentor no corpo e na voz humana e falando dirigiulhe palavras plumadas 270 Telêmaco doravante não serás vil nem imponderado se de fato em ti foi instilado o bom ímpeto do pai distinto como ele era para completar palavra e ação então vã não será a rota nem incompleta Mas se não és rebento dele e de Penélope 275 então não espero que completes o que concebes Sim poucos filhos com o pai se parecem a maioria é pior e poucos melhores que o pai Mas como doravante não serás vil nem imponderado e a astúcia de Odisseu de modo algum te falta 280 há a expectativa então de que completes esses feitos Por ora ignora plano e mente dos pretendentes irresponsáveis pois nem são ponderados nem civilizados Não conhecem a negra perdição da morte que deles está perto todos em um só dia perecerão 285 Não mais será postergada a rota que concebes para ti eu sou um tal companheiro de teu pai que irei preparar nau veloz e contigo seguirei Já tu indo para casa juntate aos pretendentes apronta provisões e em vasilhas tudo acomoda 290 vinho em ânforas duplaalça e cevada tutano de varões em peles compactas eu entre o povo companheiros voluntários rápido selecionarei Há naus muitas em Ítaca cercadademar novas e antigas dessas escolherei para ti uma excelente 295 e iremos ligeiro aprontála e lançar ao amplo mar Assim falou Atena filha de Zeus e não muito tempo Telêmaco demorouse após ouvir a voz humana do deus E foi a sua casa agastado em seu coração Achou os arrogantes pretendentes em seu palácio 300 pelando cabras e queimando cerdas de cevados no pátio Eis que Antínoo riu e foi direto a Telêmaco deulhe forte aperto de mão dirigiuselhe e nomeouo Telêmaco falaaltiva de ímpeto incontido que outra vileza no peito não te ocupe palavra ou ação 305 mas por mim come e bebe igual no passado Por certo tudo isto os aqueus realizarão para ti nau e seletos remadores para bem rápido chegares à mui sacra Pilos atrás de notícia do ilustre pai A ele então o inteligente Telêmaco retrucou 310 Antínoo não é possível entre vós soberbos banquetear atento e se gaudiar tranquilo Não basta já terdes devastado muitos e distintos bens meus como pretendentes Eu ainda era tolo Agora sou grande e ao ouvir um discurso dos outros 315 entendo além disso cresce meu ânimo tentarei lançar perniciosa perdição contra vós ou já em Pilos ou aqui mesmo nessa terra Eu irei e não será vã a rota que menciono passageiro pois dono nem de navio nem de remadores 320 sou assim creio pareceuvos mais vantajoso Falou e puxou sua mão da mão de Antínoo fácil E os pretendentes preparavam o banquete na casa Debochavam dele e o ridicularizavam com palavras e desse modo falavam os jovens arrogantes 325 Por certo Telêmaco cogita nossa matança Ou trará alguns protetores da arenosa Pilos ou até de Esparta pois agora seu anseio é terrível ou pretende também ir a Éfira de fértil solo para de lá trazer droga tiravida 330 lançála numa ânfora e perdernos a todos Por sua vez retrucava outro dos jovens arrogantes Quem sabe também ele próprio sobre cava nau longe dos seus pereça vagando como Odisseu Assim ele avolumaria ainda mais nosso trabalho 335 todos os bens dividiríamos e a propriedade daríamos a sua mãe e a quem a desposasse Assim falavam e ele ao quarto altoteto do pai desceu amplo onde havia ouro e bronze amontoados roupas em baús e perfumado óleo em profusão 340 Dentro cântaros com vinho antigo doce de beber estavam de pé contendo divina bebida pura ajustados em fila junto à parede caso um dia Odisseu a casa retornasse após padecer muita agonia Na frente com tranca portas sólidas bem justas 345 duplas por lá a governanta de noite e de dia passava tudo guardando com mente multiperspicaz Euricleia filha de Voz filho de Persuadidor A ela dirigiuse Telêmaco após chamála ao quarto Mãezinha vamos derrama vinho em ânforas duplaalça 350 doce o mais saboroso depois do que tu guardas pensando neste desditoso caso vier de alhures o divinal Odisseu após fugir da perdição da morte Enche doze e cerra todas com tampos Despejame cevada em alforjes bemcosturados 355 que haja vinte medidas de cereal cevada moída na mó Tu mesma sê a única a saber tudo esteja posto junto pois à noite eu o recolherei quando já tiver a mãe subido aos aposentos e pensado no repouso irei com efeito a Esparta e à arenosa Pilos 360 buscar notícia do retorno do caro pai caso algo ouvir Assim falou e pôsse a ulular a cara nutriz Euricleia e lamentandose dirigiulhes palavras plumadas Por quê filho querido veio a teu juízo essa ideia Como queres percorrer a extensa terra 365 sendo o amado único Ele pereceu apartado da pátria o divinal Odisseu em terra estrangeira Eles logo que fores contra ti planejarão males por trás para morreres por um ardil e tudo isso dividirão Não permanece aqui junto ao que é teu não careces 370 pelo mar ruidoso sofrer males nem ficar à deriva A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Coragem mãezinha o plano não existe sem um deus Não jura que a minha mãe isso não relatarás antes do décimo primeiro décimo segundo dia 375 ou até que ela tenha saudade e ouça que parti para com seu choro a catita cútis não machucar Isso disse e a velha jurou a grande jura dos deuses E depois que jurou por completo essa jura logo derramoulhe vinho em ânforas duplaalça 380 e despejoulhe cevada em alforjes bemcosidos Telêmaco indo para casa juntouse aos pretendentes Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja assemelhada a Telêmaco toda a cidade percorreu e de pé ao lado de cada herói enunciava o discurso 385 pedindo que se reunissem à noite junto à nau veloz Ela então a Ponderado o ilustre filho de Prudente pediu nau veloz ele benevolente prometeulha E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam nisso empurrou a nau veloz ao mar e nela colocou 390 todo cordame que levam as naus bomconvés Postoua na ponta do porto ao redor nobres companheiros em grupo reuniramse a deusa instigava cada um Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja partiu rumo à casa do divino Odisseu 395 lá sobre os pretendentes verteu doce sono fêlosos vagar bêbados e derrubou as taças das mãos Apressavamse pela urbe em ir dormir e pouco tempo ficavam sentados pois sono caía sobre suas pálpebras Já Telêmaco a ele dirigiuse Atena olhosdecoruja 400 após chamálo para fora do palácio bom para morar semelhante a Mentor no corpo e na voz humana Telêmaco já teus companheiros belasgrevas estão sentados junto aos remos e aguardam tua partida sim vamos não atrasemos mais tempo a jornada 405 Falou assim e foi na frente Palas Atena célere ele depois atrás das pegadas da deusa E quando tinham descido até a nau e o mar toparam na praia os companheiros cabelocomprido E entre eles falou a força sacra de Telêmaco 410 Para cá amigos busquemos as provisões já tudo foi reunido na casa Minha mãe de nada sabe nem as escravas e uma só ouviu meu discurso Após falar assim foi na frente e eles o seguiam Tendo tudo trazido sobre a nau bomconvés 415 depositaram como pedira o caro filho de Odisseu Telêmaco embarcou na nau e Atena comandava sentouse na popa da nau e próximo dela sentouse Telêmaco E os outros soltaram os cabos e após embarcar sentaram junto aos calços dos remos 420 A eles brisa bemvinda enviou Atena olhosdecoruja Zéfiro sopradoalto zunindo sobre o mar vinoso Telêmaco instigando os companheiros ordenoulhes pegar no cordame e eles ouviram quem os instigou O mastro de abeto dentro da côncava enora 425 ergueram fixaram e prenderam com estais e içaram a branca vela com tiras de couro bemtrançadas Vento inflou o meio da vela e nos dois lados onda agitada púrpura rugia na proa e a nau se movia e ela corria onda abaixo cumprindo o percurso 430 E prenderam o cordame ao longo da negra nau veloz e puseram de pé as ânforas cheias de vinho libavam aos imortais deuses sempiternos e entre todos mais à filha de Zeus a olhosdecoruja Toda a noite e pela aurora ela a rota percorria E sol levantouse e deixou o oceano bem belo até o páramo muitobronze para brilhar a imortais e a humanos mortais sobre o solo fértil E eles a Pilos a cidade bemconstruída de Neleu 5 chegaram Os habitantes na orla do mar sacrificavam touros negros a Posêidon o tremesolo jubacobalto Eram nove grupos de assentos e quinhentos estavam sentados em cada e cada um ofertava nove touros Enquanto comeram vísceras ao deus queimavam coxas 10 e aqueles aportaram direto a vela da nau simétrica após baixar recolheram atracaramna e desceram Telêmaco desembarcou da nau e Atena comandava A ele primeiro dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Telêmaco não precisas mais ter vergonha nem um pouco 15 Vê por isso navegaste pelo oceano para teres notícia do pai onde a terra o oculta e qual destino alcançou Vai agora direto a Nestor domacavalos que saibamos o plano que ele guarda no peito Suplicalhe tu mesmo que fale sem subterfúgios 20 Algo falso não dirá pois é muito inteligente A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Mentor como então devo chegar como saudálo Ainda não sou versado em discursos argutos Varão jovem tem vergonha de inquirir um mais velho 25 A ele então dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Telêmaco uma ideia tu mesmo terás em teu juízo e outra a divindade vai sugerir pois não acredito que em oposição aos deuses foste gerado e nutrido Falou assim e foi na frente Palas Atena 30 célere ele depois atrás das pegadas da deusa Chegaram à reunião e aos assentos dos varões de Pilos e lá sentado Nestor com os filhos companheiros ao redor preparando o banquete assavam e espetavam a carne Então viram os estranhos e todos foram juntos 35 com as mãos os saudaram e pediram que sentassem Primeiro Pisístrato filho de Nestor achegouse tomou a mão de ambos e acomodouos junto ao banquete em velos macios sobre a areia do mar ao lado do irmão Trasímedes e de seu pai 40 Deulhes porções de vísceras e vinho vertia em cálice dourado com uma saudação dirigiuse a Palas Atena filha de Zeus portaégide Agora estranho faze oração ao senhor Posêidon topastes com seu banquete ao virdes para cá 45 Mas quando tiveres libado e orado como é a norma dê também para esse aí o cálice de vinho doce como mel para libar pois creio que ele também aos imortais faça preces todos os homens precisam dos deuses Mas é mais jovem tem a mesma idade que eu 50 por isso a ti por primeiro darei a taça dourada Assim falou e entregoulhe o cálice com doce vinho e alegrouse Atena com o inteligente varão civilizado pois a ela por primeiro deu a taça dourada De imediato orou com fervor ao senhor Posêidon 55 Ouve Posêidon sustématerra e não relutes para nós que oramos em completar estes feitos A Nestor primeiro e aos filhos concede majestade e depois aos outros confere agradável retribuição a todos os pílios pela esplêndida hecatombe 60 Dê ainda que Telêmaco e eu retornemos após fazer aquilo pelo qual para cá viemos com negra nau veloz Assim fez a prece e ela mesma tudo completou E deu a Telêmaco o belo cálice duplaalça do mesmo modo fez a prece o caro filho de Odisseu 65 Aqueles após assar a carne de fora e a tirar de espetos repartiramna e partilharam majestoso banquete Mas apaziguado o desejo por bebida e comida entre eles começou a falar o gerênio o cavaleiro Nestor Vê agora é mais adequado investigar e questionar 70 quem são os estranhos pois se deleitaram com a comida Estranhos quem sois Donde navegastes por fluentes vias Acaso devido a um assunto ou levianos vagais tal como piratas ao mar Esses vagam arriscando suas vidas levando dano a gentes alheias 75 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou corajosamente coragem no peito a própria Atena pôs para que acerca do pai ausente o interrogasse e para que lhe pertencesse distinta fama entre os homens Nestor filho de Neleu grande majestade dos aqueus 80 perguntas de onde somos eu te contarei Nós de Ítaca sob o Néion chegamos o assunto de que falo é privado não da cidade A vasta fama de meu pai persigo esperando algo ouvir do divino Odisseu juízopaciente que um dia dizem 85 contigo combatendo aniquilou a cidade dos troianos Vê de todos os outros que guerrearam contra troianos sabemos onde cada um finouse em funesto fim a ele até fim ignoto impôs o filho de Crono Ninguém pode dizer ao claro quando finouse 90 se em terra firme subjugado por varões inimigos se também no oceano entre as ondas de Anfitrite Por isso cheguei agora a teus joelhos esperando quereres narrar sua funesta ruína se acaso viste com teus olhos ou ouviste de outro o discurso 95 de que vaga infeliz ao extremo assim a mãe o gerou Nada edulcores com respeito ou piedade por mim mas contame bem com que visão te deparaste Suplicote se um dia para ti meu pai o nobre Odisseu cumpriu palavra ou ação sob promessa 100 na terra troiana onde sofrestes desgraças aqueus Disso agora para mim te lembra e narrame sem evasivas A ele então respondeu o gerênio o cavaleiro Nestor Amigo já que me lembraste da agonia que naquela terra suportamos filhos de aqueus de ímpeto incontido 105 de quanto com as naus sobre o mar embaçado vagando atrás de butim aonde Aquiles comandasse de quanto em torno da grande urbe do senhor Príamo lutamos lá então quantos morreram os melhores lá repousa o guerreiro Ájax lá Aquiles 110 lá Pátroclo conselheiro de mesmo peso que deuses lá meu caro filho não só forte como destemido Antíloco notável como lesto corredor e guerreiro muitos outros males além desses sofremos que homem mortal poderia enunciálos todos 115 Nem se ficasses cinco mesmo seis anos a meu lado e inquirisses quantos males lá sofreram os divinos aqueus antes irritado para tua terra pátria voltarias Nove anos contra eles costuramos males com cuidado com todo truque e quase não os completou o filho de Crono 120 Lá ninguém queria rivalizar em astúcia diante dele pois o divino Odisseu por demais sobressaía com todo truque o teu pai caso de fato fores dele o rebento Reverência me toma ao mirarte quanto aos discursos são adequados e não seria de crer 125 um varão mais jovem discursar com tal adequação Lá durante essa época eu e o divino Odisseu nunca divergimos nem na assembleia nem no conselho mas em um só ânimo com ideia e refletida decisão pensávamos como se daria o melhor para os aqueus 130 Porém após saquear a escarpada urbe de Príamo partimos nas naus e um deus dispersou os aqueus e Zeus então no juízo armou funesto retorno para os argivos pois nem ponderados nem civilizados eram todos assim muitos deles toparam sorte ruim 135 graças à ira ruinosa da olhosdecoruja a de pai ponderoso que instituiu disputa entre ambos os filhos de Atreu Os dois chamaram à assembleia todos os aqueus à toa sem adequação quando o sol se punha e eles foram nocauteados por vinho os filhos de aqueus 140 e discursaram discursos o porquê de a tropa reunir Lá Menelau ordenou a todos os aqueus que se lembrassem do retorno sobre o amplo dorso do mar e a Agamêmnon de todo não agradou pois queria a tropa refrear e fazer sacras hecatombes 145 a fim de apaziguar a terrível raiva de Atena Tolo não sabia que não seria convencida a mente dos deuses semprevivos não dá volta logo Assim os dois retrucando com duras palavras firmes ficaram e ergueramse os aqueus belasgrevas 150 com ruído prodigioso e a decisão dupla agradoulhes À noite descansamos revolvendo no juízo duras ações uns contra os outros então Zeus forjou nefasta desgraça pela manhã puxamos naus alguns até o divino mar e nelas pusemos bens e mulheres cinturamarcada 155 Mas metade da tropa persistiu em ficar para trás lá mesmo com o filho de Atreu Agamêmnon pastor de tropa metade embarcamos e dirigimos as naus que rápido navegavam e um deus alisou o mar muitomonstro Chegando a Tenedos fizemos sacrifícios aos deuses 160 ansiando ir para casa e Zeus não projetava o retorno implacável ele que uma segunda vez instigou disputa vil Uns partiram após voltar às naus ambicurvas em torno do senhor Odisseu o atilado variegadaastúcia de novo levando apoio ao filho de Atreu Agamêmnon 165 mas eu com o conjunto das naus que me seguiam parti pois sabia que a divindade armava males E partiu o filho viril de Tideu e instigou companheiros Bem depois atrás de nós partiu o loiro Menelau em Lesbos alcançounos ao revolvermos o longo trajeto 170 ou prosseguiríamos ao norte da escarpada Quios junto à ilha de Psira tendo ela à esquerda ou ao sul de Quios ao longo da ventosa Mimas Pedimos ao deus que exibisse um prodígio e ele a nós mostrou e ordenou que rumo a Euboia o meio do mar 175 cortássemos para bem rápido escapar do nefasto E pôsse a soprar sibilante vento as naus mui ligeiro atravessaram o piscoso percurso e em Gueraistos à noite aportaram A Posêidon muitas coxas de touros depusemos após medir a grande superfície das águas 180 Era o quarto dia quando em Argos às naus simétricas os companheiros do filho de Tideu Diomedes domacavalos atracaram mas eu até Pilos segui e nunca cessou a brisa depois que o deus começou a fazêla soprar Assim cheguei filho querido na ignorância nada sabia 185 daqueles aqueus quem se salvou quem foi destruído Uma vez sentado em meu palácio as informações que tive como é norma aprenderás e não te esconderei Falouse que chegaram bem os mirmidões famosos na lança que o ilustre filho do animoso Aquiles conduziu 190 e a salvo a Filoctetes o radiante filho de Poias Idomeneu conduziu até Creta todos os companheiros que escaparam da guerra e o mar de nenhum o privou Do filho de Atreu até vós já ouvistes mesmo longe vivendo como voltou e como Egisto armou seu funesto fim 195 Todavia esse aí pagou de volta de forma lastimável Como é bom que o varão morto ainda deixe um filho pois também Orestes se vingou do assassino do pai Egisto astúciaardilosa que matara seu pai glorioso Também tu amigo pois te vejo muito belo e alto 200 sê bravo para também gerações futuras te elogiarem A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Nestor filho de Neleu grande majestade dos aqueus deveras ele se vingou e os aqueus levarão sua extensa fama um canto aos vindouros 205 Ah Se deuses me revestissem com tão grande força para vingarme dos pretendentes pela acre transgressão desmedidos que contra mim engenham ações iníquas Mas os deuses não me destinaram tal fortuna a meu pai e a mim Agora todavia cumpre aguentar 210 A ele então respondeu o gerênio o cavaleiro Nestor Amigo já que disso me lembraste em tua fala dizem que por causa de tua mãe muitos pretendentes em teu palácio em oposição a ti engenham males Dizeme se és oprimido de bom grado ou se o povo 215 te odeia na cidade seguindo sugestão do deus Quem sabe um dia se vingue de sua violência ao chegar ou sozinho ou todos os aqueus presentes também Que a ti deseje ser cara Atena olhosdecoruja assim como um dia se ocupou do majestoso Odisseu 220 na terra troiana onde nós aqueus sofremos agonias pois nunca vi deuses assim às claras sendo caros como ao lado daquele às claras esteve Palas Atena se a ti assim desejar ser cara e cuidar com o ânimo com isso alguns deles se esqueceriam das bodas 225 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Ancião creio que nunca essa palavra se completará falaste grande demais espantome Não tenho esperança de que isso ocorreria nem se deuses o quisessem A ele então dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja 230 Telêmaco que palavra te escapou da cerca de dentes Fácil o deus querendo e de longe salva um varão Eu mesmo preferiria após padecer muita agonia voltar para casa e ver o dia do retorno a voltar e ser morto no lar como a Agamêmnon 235 Egisto e sua esposa mataram com um truque Todavia a morte imparcial nem mesmo os deuses até a varão amado são capazes de afastar sempre que o quinhão funesto agarra o da morte dolorosa Então a ela o inteligente Telêmaco retrucou 240 Mentor não falemos mais disso mesmo aflitos aquele nunca mais terá retorno de verdade mas já planejaramlhe os imortais a negra perdição da morte Agora acerca de outra história quero inquirir e questionar Nestor pois é mais civilizado e prudente que outros 245 três são as gerações de varões dizem que já regeu e para mim parece um deus quando o miro Nestor filho de Neleu narra tu a verdade como morreu o filho de Atreu Agamêmnon amplopoder Onde estava Menelau Que fim lhe armou 250 Egisto astúciaardilosa Pois alguém bem melhor matou Ocorreu não estar na Argos aqueia mas alhures vagava entre os homens e teve coragem de matálo A ele então respondeu o gerênio o cavaleiro Nestor Portanto eu a ti filho falarei toda a verdade 255 Isso tu mesmo podes adivinhar como teria ocorrido se tivesse se deparado com Egisto vivo no palácio o filho de Atreu ao voltar de Troia o loiro Menelau então sobre ele morto não teriam terra amontoado mas a ele cães e aves teriam devorado 260 jazendo no solo longe da urbe e a ele nenhuma aqueia teria pranteado pois feito bem inaudito armou Enquanto lá completávamos muitas provações ele plácido no interior de Argos nutrepotro buscava enfeitiçar a esposa de Agamêmnon com palavras 265 Ela no início rejeitava a ação ultrajante divina Clitemnestra pois tinha um juízo valoroso Ao lado havia um varão cantor a quem muito pediu o filho de Atreu indo a Troia que guardasse a consorte Mas quando o quinhão dos deuses a prendeu no jugo 270 então aquele conduziu esse cantor a uma ilha deserta deixouo como presa e butim às aves de rapina e ambos querendo conduziua até sua casa Muitas coxas queimou sobre sacros altares de deuses e muitas oferendas pendurou tecidos e ouro 275 completou feito inaudito que nunca no ânimo esperara Quanto a nós navegávamos juntos vindos de Troia o filho de Atreu e eu sabendo ser caros um ao outro Mas ao chegarmos à sacra Súnion ponta de Atenas lá Febo Apolo ao timoneiro de Menelau 280 com suas flechas suaves matou após chegar enquanto tinha nas mãos o leme da célere nau matou a Frôntis filho de Onetor superior aos outros no pilotar um navio quando sopram rajadas Assim ele lá foi retido embora sôfrego pela rota 285 até enterrar o companheiro e oferecer oferendas Mas quando também ele célere indo sobre o mar vinoso em côncavas naus o escarpado monte Maleia alcançou então rota hedionda Zeus amplavisão planejou e verteu sopro de ventos sibilantes 290 e ondas inchadas portentosas feito morros Lá após as naus separar umas achegou de Creta onde cidônios moravam junto às correntes do Iardano Há uma pedra lisa e escarpada que cai no oceano no extremo de Gortina no mar embaçado 295 lá Noto empurrou grande onda rumo à ponta oeste até Faisto e pequena pedra a grande onda quebrou As naus vê foram lá e com esforço da morte escaparam os varões mas às naus contra os recifes destroçaram as ondas todavia cinco outras naus proacobalto 300 achegaramse do Egito vento e água levandoas Assim ele lá juntando muitos recursos e ouro vagou com as naus em meio a homens outralíngua nisso armava Egisto em casa estas funestas ações matou o filho de Atreu e o povo esteve sob seu jugo 305 Por sete anos reinou sobre Micenas muitoouro então no oitavo veiolhe um mal o divino Orestes voltou de Atenas e matou o assassino de seu pai Egisto astúciaardilosa que a seu pai glorioso matara Após matálo aos argivos deu banquete fúnebre 310 pela mãe hedionda e pelo covarde Egisto no mesmo dia veiolhe Menelau bomnogrito trazendo bens tantos quanto as naus puderam levar Também tu amigo não vagues tempo longe de casa deixando teus bens para trás e em tua casa varões 315 tão soberbos que não te devorem tudo dividindo teus bens e tu o trajeto faças em vão Mas eu insisto e reclamo que até Menelau vás é ele que voltou há pouco do estrangeiro destes homens de onde nunca no ânimo esperariam 320 voltar todos que primeiro tempestades desviaram no mar tão grande de onde nem mesmo aves no mesmo ano voltam pois é grande e fero Mas agora vai com tua nau e teus companheiros se queres ir por terra para ti há carro e cavalos 325 e há meus filhos que teus condutores serão até a divina Lacedemônia onde vive o loiro Menelau Suplicalhe tu mesmo que fale sem subterfúgios Algo falso não dirá pois é muito inteligente Assim falou o sol desceu e vieram as trevas 330 E entre eles falou a deusa Atena olhosdecoruja Ancião isso contaste ponto por ponto mas agora cortai as línguas e misturai o vinho para que a Posêidon e a outros imortais libemos e nos ocupemos do descanso pois é hora 335 A luz já desceu rumo às trevas e não convém tardarse no banquete dos deuses mas retornar Falou a filha de Zeus e eles ouviram sua voz humana para eles os arautos vertiam água nas mãos e moços preencheram ânforas com bebida 340 e a todos distribuíam após verter as primícias nos cálices As línguas lançavam ao fogo e de pé sobre elas libavam Mas depois de libar e beber quanto quis o ânimo então Atena e o deiforme Telêmaco ambos prepararamse para voltar à cava nau 345 Mas Nestor os conteve e abordouos com palavras Que Zeus e outros deuses imortais impeçam isso que vós para longe de mim rumo à nau veloz partis como de alguém sem vestimenta desvalido que não tem lençóis e muitas capas em casa 350 nem para si nem para hóspedes terem sono suave Mas possuo sim capas e belas mantas Por certo o caro filho desse varão Odisseu não repousará na plataforma da nau enquanto eu viver e depois ficarem meus filhos no palácio 355 para hóspedes hospedar todo que vier a minha casa A ele então dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Isso falaste bem caro ancião convém que a ti Telêmaco obedeça já que é muito mais decoroso assim Mas ao passo que ele agora te seguirá para dormir 360 em teu palácio eu por outro lado à negra nau irei para encorajar os companheiros e dizerlhes tudo Proclamo ser entre eles o único de mais idade o restante varões mais jovens seguem por amizade todos com idade igual à do animoso Telêmaco 365 Lá eu descansaria junto à negra nau côncava agora mas de manhã até os animosos caucônios irei onde obrigação me é devida nem recente nem pequena Já tu a ele pois alcançou tua casa envia com o carro e um filho dêlhe os cavalos 370 que correm mais ligeiro os melhores em força Assim falou e partiu Atena olhosdecoruja feito britaossos e pasmaramse todos os aqueus O ancião admirouse quando viu com seus olhos tomou a mão de Telêmaco dirigiuselhe e nomeouo 375 Amigo não espero que fraco e covarde serás se a ti tão jovem deuses acompanham condutores Esse não era outro dos que habitam as moradas olímpias mas a filha de Zeus Tritoguêneia trazbutim que também honrava a teu nobre pai entre os argivos 380 Mas senhora sê propícia dáme distinta fama a mim meus filhos e minha respeitável consorte para ti sacrificarei novilha largafronte indomada que nunca um varão sob o jugo guiou essa te sacrificarei após envolver com ouro os chifres 385 Assim falou rezando e o ouviu Palas Atena A estes conduziu o gerênio o cavaleiro Nestor a seus filhos e genros até sua bela morada Quando alcançaram a esplêndida casa desse senhor em ordem sentaramse nas cadeiras e poltronas 390 Aos que chegavam o ancião misturou na ânfora vinho suave que no décimo primeiro ano a governanta abriu após afrouxar a cobertura esse na ânfora o ancião misturou e libando rezou à Atena a filha de Zeus portaégide 395 Mas depois de libar e beber quanto quis o ânimo os outros para se deitar voltaram a suas casas mas a ele fez lá deitar o gerênio o cavaleiro Nestor a Telêmaco o caro filho do divino Odisseu num leito perfurado sob a colunata ressoante 400 junto a Pisístrato boalança líder de varões que de seus filhos ainda solteiro vivia no palácio Ele mesmo se deitou no interior da alta casa e a senhora esposa preparoulhe cama e lençóis Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos 405 pôsse para fora do leito o gerênio o cavaleiro Nestor Após sair sentouse nas pedras polidas que estavam diante de suas altas portas brancas lustradas com óleo sobre elas antes Neleu sentava conselheiro de mesmo peso que deuses 410 mas ele já subjugado pela morte partira ao Hades e agora Nestor o gerênio sentava guardião dos aqueus com o cetro Em torno os filhos em grupo reuniramse após virem dos quartos Siso Troposo Perseu Areto e o notável Trasímedes 415 A eles então juntouse o sexto o herói Pisístrato e ao lado puseram o deiforme Telêmaco Entre eles começou a falar o gerênio o cavaleiro Nestor Céleres caros filhos cumprime um desejo para por primeiro entre os deuses eu propiciar Atena 420 que visível a mim veio ao rico banquete do deus Vamos que vá um à planície atrás de vaca para logo chegar e a conduza um varão vaqueiro de bois outro indo à negra nau do animoso Telêmaco guie todos os seus companheiros e deixe só dois 425 outro a Laerque verteouro para cá ordene vir a fim de envolver com ouro os chifres da vaca Os restantes ficai aqui reunidos e instruí lá dentro as escravas na casa que preparem esplêndido banquete e tragam assentos madeira para o entorno e água clara 430 Assim falou e todos eles agiram a vaca veio da planície e vieram da simétrica nau veloz os companheiros do enérgico Telêmaco e veio o ferreiro com as ferramentas na mão meios para efetuar sua arte a bigorna o martelo e a bemfeita pinça 435 com os quais trabalhava o ouro e veio Atena para os sacrifícios receber O ancião cavaleiro Nestor deu o ouro aquele então com perícia os chifres da vaca envolveu para a deusa ao ver a oferenda se alegrar A vaca conduziam pelos chifres Troposo e Siso 440 Numa bacia florida Areto trouxe do quarto água para eles e na outra mão numa cesta trazia grãos de cevada Trasímedes firme guerreiro machado afiado na mão estava ao lado para a vaca golpear Perseu tinha a gamela O ancião cavaleiro Nestor 445 com água e cevada iniciou o rito efusivo a Atena rezou ao dar primícias lançando pelos da cabeça no fogo Mas após rezar e lançar grãos de cevada para frente logo o filho de Nestor o magnânimo Trasímedes golpeoua parado perto o machado decepou os tendões 450 do pescoço e soltou o ímpeto da vaca e elas ulularam as filhas as noras e a respeitável esposa de Nestor Eurídice a mais velha das filhas de Glorioso Os outros depois erguendoa do chão largasrotas seguraramna e degoloua Pisístrato líder de tropa 455 Ao jorrar negro sangue a vida deixou os ossos e logo a desmembraram rápido deceparam as coxas tudo pela ordem com gordura encobriramnas camada dupla e sobre elas puseram peças cruas Queimavaas sobre toras o ancião e nelas fulgente vinho 460 aspergia perto jovens com garfos cincopontas nas mãos Mas após queimar coxas e comer vísceras cortaram o restante transpassaram em espetos e assaram tendo nas mãos os espetos pontiagudos Nisso banhara a Telêmaco a bela Policasta 465 a mais jovem filha de Nestor filho de Neleu Depois de o banhar e ungir à larga com óleo lançou belo manto e uma túnica em torno dele e ele saiu da banheira no porte semelhante a imortais indo para junto de Nestor pastor de tropa sentouse 470 Tendo assado a carne de fora e a tirado dos espetos banquetearamse sentados nobres varões se ergueram e vinho escançavam em cálices dourados Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida entre eles começou a falar o gerênio o cavaleiro Nestor 475 Filhos vamos para Telêmaco cavalos belapelagem trazei e jungi ao carro para que percorram a rota Assim falou e eles o ouviram direito e obedeceram e céleres jungiram cavalos velozes ao carro Nele a governanta colocou pão e vinho 480 e alimentos que comem reis criados por Zeus Então Telêmaco subiu no carro muito belo ao lado o filho de Nestor Pisístrato líder de tropa no carro subiu e as rédeas segurou com as mãos Chicoteou para puxarem e eles de bom grado voaram 485 pela planície e deixaram a escarpada cidade de Pilos Agitaram o dia todo o jugo que levavam nos dois lados E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam e chegaram a Feras rumo à casa de Diocles o filho de Tocaioso que Alfeio gerou como filho 490 Lá descansaram à noite e ele lhes regalou Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos jungiram os cavalos e subiram no variegado carro e partiram do pórtico da colunata ressoante Chicoteou para puxarem e eles de bom grado voaram 495 Atingiram a planície fértil onde então tentaram findar o trajeto e os rápidos cavalos alongaram o passo E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam E eles chegaram à cava Lacedemônia cavernosa e dirigiramse à casa do majestoso Menelau Acharamno em sua propriedade dando festa a camaradas pelas bodas do filho e da filha impecável 5 Essa ao filho de Aquiles rompebatalhão enviava em Troia primeiro prometeu e indicou que a daria e os deuses lhes completavam as bodas A ela pois com cavalos e carro enviava em viagem à urbe bem famosa dos mirmidões a quem aquele regia 10 Para o filho de Esparta fez conduzir a filha de Defensor para o muito amado que lhe nascera o forte Grandaflição de escrava deuses não deram mais rebento a Helena desde que primeiro gerou a filha encantadora Hermíone que tinha a formosura da dourada Afrodite 15 Assim banqueteavam na enorme casa de alto pédireito os vizinhos e camaradas do majestoso Menelau com deleite E entre eles cantava divino cantor com a lira dois acrobatas entre eles liderando canto e dança volteavam no meio 20 Pois aqueles dois no pórtico da casa eles e os cavalos o herói Telêmaco e o radiante filho de Nestor esperavam achegandose viuos o senhor Verídico ágil assistente do majestoso Menelau e foi levar a notícia na casa ao pastor de tropa 25 parado perto dirigiulhe palavras plumadas Há dois estranhos aqui Menelau criadoporZeus dois varões assemelhados à linhagem do grande Zeus Pois dize devemos soltar seus velozes cavalos ou enviálos de partida a outro para que os acolha 30 Muito perturbado a ele dirigiuse o loiro Menelau Nunca foste tolo Verídico filho de Auxiliador no passado agora como criança falas tolices Vê nós dois após amiúde comer regalos de outros homens aqui chegamos esperando que Zeus 35 no futuro nos poupe de agonia Pois solta os cavalos dos estranhos e façaos adentrar para festejar Assim falou e ele correu pelo salão e chamou outros ágeis assistentes que seguiram junto a ele Soltaram do jugo os cavalos suados 40 e prenderamnos nos estábulos equestres a eles jogaram espelta e com ela branca cevada os carros apoiaram nas paredes resplandecentes e os hóspedes introduziram na casa divina Mirandoa admiravamse com a casa do rei criadoporZeus 45 assim como o do sol ou da lua clarão havia pela casa de alto pédireito do majestoso Menelau Tendose deleitado em mirar com os olhos entraram na bempolida banheira e banharamse Após as escravas banhálos untálos com óleo 50 e em torno lançar espessas capas e túnicas em poltronas sentaramse junto a Menelau filho de Atreu Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa 55 Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente e junto muitos petiscos oferecendo o que havia O trinchador tomou e dispôs gamelas com carnes de todo o tipo e junto deles punha taças douradas Saudandoos dirigiuselhes o loiro Menelau 60 De pão servivos e alegraivos e após partilhar do jantar perguntaremos quem sois que varões Em vós não pereceu a linhagem dos pais mas sois de linhagem dos que são reis criadosporZeus os portacetro pois vis não gerariam gente de tal índole 65 Falou e passoulhes com a mão nacos de gordo lombo de boi assado pois com eles fora homenageado E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida então Telêmaco falava ao filho de Nestor 70 perto pondo a cabeça para não os ouvirem os outros Observa filho de Nestor tu que agradas meu ânimo o relampejo do bronze pela casa ruidosa e o do ouro do âmbar da prata e do marfim Morada assim por dentro creio ser a de Zeus Olímpio 75 com tanta coisa sem conta reverência me toma ao mirar No que disse prestou atenção o loiro Menelau que falando dirigiulhes palavras plumadas Caros filhos nenhum mortal deveria disputar com Zeus imortais são suas posses e morada 80 dos varões algum talvez disputará comigo em posses Sim após muito padecer e muito vagar conduzias nas naus e no oitavo ano cheguei depois de vagar por Chipre Fenícia e entre egípcios os etíopes alcancei os sidônios os erembos 85 e a Líbia onde cordeiros de súbito têm chifres completos Três vezes ovelhas procriam no ciclo de um ano lá nem senhor nem pastor têm carência de queijo e de carne e nem de leite doce mas sempre têm leite abundante para a ordenha 90 Enquanto eu por aí recolhendo muitos recursos vagava outro assassinou meu irmão às ocultas de surpresa com truque da nefasta esposa assim reino não me agradando dessas posses Dos pais deveis ter ouvido isso sejam eles quem 95 forem pois muito padeci e perdi a propriedade bem boa para morar com muita coisa preciosa Eu deveria até com a terça parte em casa ter vivido e os varões a salvo os que morreram na ampla Troia longe de Argos nutrepotro 100 Mas ainda que chorando a todos angustiado muitas vezes sentado em nosso palácio primeiro com lamento deleitome no peito depois paro rápido alguém se sacia do lamento gelado a eles todos não choro tanto embora atormentado 105 quanto a um único que me faz odiar sono e alimento ao lembrar pois nenhum aqueu tanto aguentou quanto Odisseu aguentou e assumiu Assim foi preciso ele sofrer agruras e eu dor sempre inesquecível por ele pois há muito está ausente e nada sabemos 110 se está vivo ou morto Talvez chorem por ele agora Laerte o ancião a prudente Penélope e Telêmaco que deixou recémnascido em casa Assim falou e naquele instigou desejo de chorar o pai após do pai ouvir lágrimas das pálpebras ao chão lançou 115 a capa púrpura tendo puxado para diante dos olhos com ambas as mãos Mirouo Menelau e então cogitou no juízo e no ânimo se deixaria que ele mesmo se lembrasse do pai ou primeiro o interrogaria e com minúcias iria testálo 120 Enquanto revolvia isso no juízo e no ânimo Helena para fora do perfumado quarto altoteto veio semelhante a Ártemis rocadourada Para ela Adreste postou cadeira bemfeita e Alcipe trazia uma manta de lã suave 125 Filó trazia prateada cesta que lhe oferecera Alcandra esposa de Polibo que morava na Tebas egípcia onde a maior parte da riqueza está nas casas ele deu a Menelau duas banheiras prateadas uma dupla de trípodes e dez medidas de ouro 130 À parte a esposa regalou Helena com belas graças deulhe roca dourada e uma cesta prateada com rodas com acabamento em ouro na borda Essa trouxe a criada Filó e a pôs junto de Helena repleta de fio preparado e sobre ela 135 a roca estava estendida carregada de roxa lã Sentouse na cadeira e embaixo para os pés banqueta De pronto questionou o marido acerca de tudo E sabemos Menelau criadoporZeus quem esses varões proclamam ser para vir a nossa casa 140 Enganome ou digo a verdade Pedeme o ânimo Pois afirmo que nunca vi alguém tão parecido homem ou mulher e reverência me toma ao mirar como esse aí se parece com o filho do enérgico Odisseu Telêmaco que deixou recémnascido em casa 145 aquele varão quando por mim caradecadela aqueus foram até Troia incitando guerra tenaz Respondendo disselhe o loiro Menelau Agora eu também percebo mulher como comparas daquele sim são tais pés e tais mãos 150 o brilho dos olhos a cabeça e os cabelos acima Há pouco eu lembrandome sobre Odisseu discursei o quanto aquele agoniado aguentou por mim e ele verteu choro agudo sob as celhas a capa púrpura tendo puxado para diante dos olhos 155 A ele então Pisístrato filho de Nestor retrucou Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa deveras esse aí é o filho daquele como dizes mas ele é judicioso e considera indigno no ânimo chegar pela primeira vez e falar impertinências 160 diante de ti cuja voz nos deleita como a do deus A mim enviou o gerênio o cavaleiro Nestor para seguilo como condutor ele desejava te ver para que lhe sugiras alguma palavra ou ação Muitas aflições tem o filho de pai que se foi 165 no palácio onde não há outros que o ajudem assim agora para Telêmaco ele se foi e outros não há esses que na cidade afastariam o mal Respondendo disselhe o loiro Menelau Incrível deveras o filho de caro varão a minha casa 170 veio ele que por mim aguentou muitas provas pensei que dele ao voltar seria mais amigo que de outros argivos se pelo mar tivesse aos dois permitido o retorno com naus velozes ocorrer o Olímpio Zeus amplavisão Em Argos tornaria uma urbe seu lar e casa lhe faria 175 de Ítaca conduzindoo com suas posses seu filho e todo o povo após uma única cidade ter evacuado entre as que há na região e por mim são regidas Estando aqui amiúde nos reuniríamos a nós nada mais separaria em nossa amizade e deleite recíprocos 180 antes que a negra nuvem da morte nos encobrisse Mas isso deve ter invejado o próprio deus o que deixou sem retorno apenas aquele infeliz Assim falou e neles todos instigou desejo por choro Chorava a argiva Helena nascida de Zeus 185 choravam Telêmaco e Menelau filho de Atreu e nem o filho de Nestor manteve os olhos sem lágrimas lembrarase no ânimo do impecável Antíloco morto pelo filho radiante da resplandecente Aurora Após dele lembrarse falou palavras plumadas 190 Filho de Atreu Nestor o ancião dizia que superas os mortais em inteligência quando de ti lembrávamonos em nosso palácio e nos questionávamos um ao outro Agora se acaso for possível ouveme eu não me deleito com lamentos no jantar e também Aurora 195 nascecedo haverá Não me indigna em absoluto que se chore o homem que morre e o fado alcança É só esta a honraria aos lamentáveis mortais tosarse a cabeleira e lágrimas lançar face abaixo Também meu irmão está morto e não foi o pior 200 dos argivos Tu deves sabêlo já eu nunca o encontrei nem vi e superior a outros dizem que foi Antíloco superior como lesto corredor e guerreiro Respondendo disselhe o loiro Menelau Meu caro já que disseste tudo que inteligente varão 205 diria e faria e mesmo um que fosse mais velho sim és de tal pai pois falas o que é inteligente Fácil se reconhece rebento de varão a quem o filho de Crono destina fortuna quando ele casa e nasce e assim concedeu a Nestor para sempre todo dia 210 que ele envelheça agradavelmente em seu palácio e os filhos sejam sensatos e os melhores na lança Deixemos de lado o choro que antes ocorreu lembremonos de novo do jantar e que vertam água nas mãos Discursos também haverá na aurora 215 para que Telêmaco e eu conversemos entre nós Assim falou e Seguro verteu água nas mãos o ágil assistente do majestoso Menelau E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas então teve outra ideia Helena nascida de Zeus 220 de pronto lançou droga no vinho do qual bebiam contra aflição e raiva para o oblívio de todos os males Quem a tomasse após ser misturada na ânfora nesse dia não lançaria lágrimas face abaixo nem se a mãe e o pai tivessem morrido 225 nem se na sua frente irmão ou filho querido com bronze tivessem matado e a ele visto com os olhos A filha de Zeus possuía tais drogas astuciosas benignas que lhe deu Polidamna esposa de Tôn no Egito onde o solo fértil produz inúmeras 230 drogas muitas benignas misturadas muitas funestas e cada um é médico habilidoso superior a todos os homens sim são da estirpe de Peã Após lançála e ordenar que o vinho se escançasse de novo respondendo com um discurso falou 235 Filho de Atreu Menelau criadoporZeus e também vós filhos de nobres varões o deus a um logo a outro Zeus confere um bem ou um mal pois pode tudo Agora continuai o banquete sentados no palácio e deleitaivos com discursos pois contarei o que convém 240 Tudo eu não vou enunciar nem especificar quantas provas enfrentou o perseverante Odisseu mas só esta que executou e ousou o vigoroso varão na terra troiana onde sofrestes desgraças aqueus A si mesmo com golpes ultrajantes desfigurou 245 jogou trapos vis nos ombros e semelhante a um servo imergiu na urbe amplasruas dos varões inimigos Ocultando a si mesmo assemelhouse a outro herói Pedinte ele que um tal não era entre as naus aqueias A ele semelhante imergiu na urbe troiana e calaramse 250 todos eu fui a única a reconhecêlo naquele estado e o interroguei Ele com argúcia esquivavase Mas quando o banhei e ungi com óleo vestio com vestes e jurei poderosa jura que antes não revelaria Odisseu entre os troianos 255 antes que ele chegasse às rápidas naus e às cabanas e então contoume toda a ideia dos aqueus Muitos troianos tendo matado com bronze pontiagudo dirigiuse aos argivos e levou muita informação Nisso outras troianas ulularam alto e meu peito 260 alegrouse pois meu coração já se inclinara a retornar para casa logo e lastimava a loucura que Afrodite dera ao me levar para lá longe da cara terra pátria eu deixando para trás a filha o tálamo e o esposo que de nada carece no juízo e na aparência 265 Respondendo disselhe o loiro Menelau Por certo isso tudo mulher falaste com adequação De muitos já apreendi o plano e a mente de varões heróis e percorri a extensa terra mas nunca alguém assim eu vi com os olhos 270 tal era o caro coração de Odisseu juízopaciente Que foi isto que executou e ousou o vigoroso varão no cavalo falquejado onde assentados todos os melhores argivos trazíamos matança e perdição aos troianos Foste depois tu até lá deve ter te ordenado 275 a divindade que quis dar glória aos troianos a ti enquanto vinhas seguia o teomórfico Deífobo Três vezes circundaste a cava tocaia tocandoa e chamavas pelo nome os melhores dânaos copiando a voz das mulheres de todos os argivos 280 E eu o filho de Tideu e o divino Odisseu sentados no meio escutamos quando gritaste Nós os outros dois pusemonos de pé com vontade ou de ir para fora ou de dentro logo responder mas Odisseu segurounos e conteve nossa ânsia 285 Todos os outros ficaram atentos filhos de aqueus e só Anticlo quis responderte com palavras Mas Odisseu apertoulhe a boca com as mãos fortes sem cessar e salvou todos os aqueus enquanto o retinha para longe levoute Palas Atena 290 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa assim é pior isso não o afastou do funesto fim nem se de ferro fosse no íntimo seu coração Vamos dirijamonos à cama para também agora 295 adormecidos sob o doce sono nos deleitarmos Assim falou e a argiva Helena ordenou às escravas que postassem camas sob a colunata belas mantas púrpura lançassem em cima estendessem lençóis e por último pusessem capas de lã para que se cobrissem 300 Elas saíram do salão levando a tocha nas mãos e estenderam a cama aos hóspedes conduzia o arauto Esses no vestíbulo da casa lá mesmo dormiram o herói Telêmaco e o radiante filho de Nestor O filho de Atreu dormiu no interior da alta casa 305 ao lado Helena peplobomtalhe deitouse divina mulher Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos pôsse para fora do leito Menelau bomnogrito vestiu as vestes pendurou a espada afiada no ombro e atou aos pés reluzentes belas sandálias 310 saiu do quarto de frente semelhante a um deus Junto a Telêmaco sentouse dirigiuselhe e nomeouo Que necessidade te trouxe aqui herói Telêmaco à divina Lacedemônia sobre as amplas costas do mar Algo público ou privado Isso me narra sem evasivas 315 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa vim para me narrares soada acerca do pai Minha casa é devorada os férteis campos destruídos a casa cheia de hostis varões e eles sempre abatem 320 minhas numerosas ovelhas e lunadas vacas trôpegas pretendentes de minha mãe de brutal desmedida Assim agora me achego de teus joelhos se quiseres narrar seu funesto fim se acaso viste com teus olhos ou ouviste o discurso de outro 325 que vaga infeliz ao extremo assim a mãe o gerou Nada edulcores com respeito ou piedade por mim mas contame bem com que visão te deparaste Suplicote se um dia para ti meu pai nobre Odisseu cumpriu palavra ou ação sob promessa 330 na terra troiana onde sofrestes desgraças aqueus Disso agora para mim te lembra e narra sem evasivas Muito perturbado a ele dirigiuse o loiro Menelau Incrível deveras no leito de varão juízoforte cobiçaram deitarse eles próprios sendo covardes 335 Como quando a cerva na moita de forte leão adormece os filhotes lactentes recémnascidos e investiga encostas e vales herbosos pastando e ele então se achega de seu leito e sobre aqueles dois lança fado ultrajante 340 assim Odisseu sobre eles ultrajante fado lançará Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo com o porte que então em Lesbos bemconstruída na disputa com Filomeleides ele se ergueu lutou e o derrubou com força e se alegraram todos os aqueus 345 assim aos pretendentes encontrasse Odisseu todos seriam destinoveloz e bodasamargas Quanto ao que me indagas e suplicas eu não tergiversarei pelas bordas nem te enganarei mas do que me falou o veraz ancião marítimo 350 disso nada esconderei de ti nem palavra ocultarei No Egito ansioso por retornar os deuses a mim ainda mantinham pois não lhes fizera hecatombes completas os deuses sempre queriam a lembrança do dever Bem uma ilha lá existe no mar muito encapelado 355 diante do Egito e a denominam Faros tão distante dele quanto cava nau um dia inteiro realiza quando um vento sibilante sopra de trás Há um porto seguro donde naus simétricas se lançam rumo ao mar após tirar a água escura 360 Lá deuses mantinhamme há vinte dias nunca ventos havia que soprassem para o mar os que de naus tornamse condutores sobre as amplas costas do mar Toda a comida e o ímpeto dos varões se teriam esgotado se um deus não me tivesse lamentado de mim se apiedado 365 a filha do altivo Proteu o ancião marítimo Eidotea pois sobremodo instiguei seu ânimo Ela me achou andando só longe de companheiros pois sempre vagavam em volta da ilha e pescavam com anzóis recurvos a fome a torturar o estômago 370 Ela de pé perto de mim dirigiume a palavra e disse És tão tolo estranho e juízofrouxo ou de bom grado deixas estar e te deleitas com a agonia Pois há tempo na ilha és contido nenhuma saída consegues achar e murcha o coração dos companheiros 375 Assim falou e eu respondendo lhe disse Eu te anuncio seja que deusa tu fores que não sou detido aqui de bom grado mas devo ter ofendido os imortais que do largo páramo dispõem Quanto a ti dizeme e os deuses sabem de tudo 380 que imortal me detém e afastou do caminho e do retorno como eu voltarei sobre o mar piscoso Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Portanto eu te falarei estranho com muita precisão Costuma vir para cá o veraz ancião marítimo 385 imortal o egípcio Proteu que do oceano todo as profundas conhece subordinado a Posêidon dizem que ele é meu pai e que me gerou Se acaso o emboscares e conseguir pegar ele te dirá o caminho os pontos do trajeto 390 e o retorno como voltarás sobre o mar piscoso Também te dirá ó criadoporZeus se quiseres qualquer mal ou bem que em teu palácio ocorreu enquanto te ausentas por longo e difícil trajeto Assim falou e eu respondendo lhe disse 395 Tu mesma planeja a tocaia contra o ancião divino para que antevendome ou pressentindo não escape é difícil para um varão mortal dominar o deus Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Portanto eu a ti com muita precisão direi 400 Quando o sol já atinge o meio do firmamento então vem do mar o veraz ancião marítimo com lufada de Zéfiro encoberto pelo revolto escuro após sair deitase para dormir nas cavas grutas Em torno dele filhotes de focas da bela filha do mar 405 juntos cochilam do mar cinzento tendo emergido exalando acre odor do mar profundo Lá eu conduzindote quando a aurora surgir te deitarei na fileira e tu seleciona companheiros três os melhores junto às naus bomconvés 410 Todos os malefícios te direi que vêm de tal ancião As focas primeiro irá contar e inspecionar mas quando todas viu e enumerou de cinco em cinco ele irá se deitar no meio como pastor no rebanho de ovelhas Mas uma vez que o virdes repousarse 415 nesse momento fazei uso de vigor e força contendeo lá mesmo que se agite ávido por safarse Ele tentará tornandose tudo o que sobre a terra há de movente e também água e fogo flamadivina Quanto a vós firme aguentai e apertaio mais 420 Mas quando ele mesmo te inquirir com palavras tal como era quando o viste repousarse nesse instante cessa a força e solta o ancião herói e pergunta qual deus te oprime e do retorno como voltarás sobre o mar piscoso 425 Assim falou e mergulhou no mar fazonda eu até as naus que estavam nas dunas fui e muito meu coração revolveuse enquanto ia Mas após descer até a nau e o mar preparamos o jantar e veio a noite imortal 430 e então repousamos junto à rebentação do mar Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então ao longo da orla do mar largapassagem fui e com ganas ajoelheime aos deuses levei três companheiros aqueles em quem mais confiava para toda a 435 operação Eidotea após mergulhar no amplo ventre do mar trouxe quatro peles de focas do oceano todas recémtiradas armava um truque contra o pai Tendo escavado leitos nas dunas marinhas aguardava sentada e nós fomos para bem perto dela 440 deitamonos em fila e pele lançou sobre cada um Lá deuse a mais terrível tocaia pois terrível a tortura do odor nefasto de focas nutridas pelo mar quem ao lado de monstro marinho dormiria Mas ela nos salvou e planejou grande ajuda 445 trouxe ambrosia e pôs sob o nariz de cada um pois bem doce exalava e destruiu o odor do monstro A manhã toda aguardamos com ânimo resistente e as focas vieram do mar em conjunto Elas então em fila deitaramse junto à rebentação do mar 450 o ancião ao meiodia veio do mar achou as focas bemnutridas todas inspecionou e contou seu número A nós contou primeiro entre os monstros e no ânimo não pensou ser um truque então também ele se deitou Nós berrando arremetemos e em volta os braços 455 lançamos e o ancião não esqueceu da arte ardilosa mas primeiro tornouse um leão com bela juba e depois serpente pantera e grande javali e tornouse fluida água e árvore copaelevada E nós firme aguentávamos com ânimo resistente 460 Mas quando cansouse o ancião perito em malefícios nesse momento inquirindome com palavras falou Que deus contigo filho de Atreu planejou tal plano para com tocaia eu ser pego sem remédio De que precisas Assim falou e eu respondendo lhe disse 465 Tu sabes ancião por que me inquires com evasivas que há tempo na ilha sou detido nenhuma saída consigo achar e murchame o coração no íntimo Quanto a ti dizeme e os deuses sabem de tudo que imortal me detém e afastou do caminho 470 e do retorno como eu voltarei sobre o mar piscoso Assim falei e ele logo respondendo disseme Por certo deverias a Zeus e aos outros deuses ter feito belo sacrifício e embarcado para rápido chegar a tua pátria navegando sobre o mar vinoso 475 Antes não terás teu quinhão ver os teus e atingir a casa bemconstruída e tua terra pátria só depois que voltares à água do Egito do rio caído de Zeus e fizeres sagradas hecatombes aos deuses imortais que do largo páramo dispõem 480 os deuses então te darão o trajeto que desejas Assim falou e meu coração rachouse porque ordenoume de novo sobre o mar embaçado viajar ao Egito um longo e difícil trajeto Assim mesmo respondendo com um discurso falei 485 Isso portanto completarei ancião como ordenas Mas vamos dizeme isto e conta com precisão todos com as naus a salvo chegaram os aqueus os que Nestor e eu deixamos ao sair de Troia ou um finouse em amargo fim em sua nau 490 ou nos braços dos seus após arrematar a guerra Assim falei e ele logo respondendo disseme Filho de Atreu por que me indagas isso Tu não precisas saber nem conhecer minha mente afirmo que tu pouco tempo não chorarás após de tudo estares a par 495 Sim muitos deles morreram muitos restaram só dois chefes dos aqueus couraçabrônzea no retorno morreram também tu na luta estavas E um único ainda vivo é retido no extenso mar Ájax foi subjugado entre as naus longoremo 500 Primeiro Posêidon aproximouo das Pedras Gyras enormes e salvouse para fora do mar teria escapado da perdição embora odiado por Atena se não tivesse lançado soberba fala grande loucura disse que contra deuses escapou de grande abismo de mar 505 Mas a ele seus altos brados Posêidon ouviu presto após tomar o tridente nas mãos robustas golpeou a Pedra Gyra e fendeua em duas Parte lá mesmo ficou parte no mar caiu onde estivera Ájax em sua grande loucura 510 levouo pelo infinito mar fazonda Assim lá pereceu após engolir água salgada Teu irmão mais ou menos fugiu da perdição e escapou em cavas naus salvouo a senhora Hera Mas quando quase iria o escarpado monte Maleia 515 atingir então após apanhálo uma rajada pelo mar piscoso levouo com gemidos profundos até o limite das lavouras onde habitara Tiestes no passado e então morava o filho de Tiestes Egisto Mas quando também de lá surgia seguro retorno 520 de novo os deuses desviaram o vento em casa chegaram e ele alegre desembarcou na terra pátria e beijava tocandoa sua pátria dele muitas cálidas lágrimas caíam pois feliz viu sua terra Mas viuo da atalaia o vigia que postara 525 Egisto astúciaardilosa prometeralhe como paga dois talentos de ouro Ficou de guarda um ano que não viesse de súbito e se lembrasse da força impetuosa E foi levar a notícia na casa ao pastor de tropa Presto Egisto planejou ardiloso estratagema 530 após escolher no povo vinte os melhores heróis armou tocaia e do outro lado pediu que se desse banquete E ele foi chamar Agamêmnon pastor de tropa com cavalos e carro cogitando ações ultrajantes Sem ele saber do fim levouo para cima e o matou 535 após o banquete como quem mata um boi no cocho Poupouse companheiro algum que seguia o filho de Atreu nenhum de Egisto todos mortos no palácio Assim falou e meu coração rachouse chorava sentado na areia e não mais meu coração 540 quis ficar vivo e enxergar a luz do sol Mas depois que chorei e rolei até me fartar então disseme o veraz ancião marítimo Filho de Atreu não chores mais tanto tempo pois nada realizaremos mas bem rápido 545 experimenta como chegarás à terra pátria De fato ou o alcançarás ainda vivo ou Orestes antes e tu participarias do funeral Assim falou e meu coração meu ânimo orgulhoso de novo em meu peito embora atormentado jubilou 550 e falando dirigilhe palavras plumadas Desses então eu sei tu o terceiro varão nomeia seja quem for o ainda vivo retido no extenso mar ou morto embora atormentado quero ouvir Assim falei e ele logo respondendo disseme 555 O filho de Laerte que em Ítaca tem sua casa vio numa ilha vertendo copiosas lágrimas no palácio da ninfa Calipso que a ele obrigado retém não consegue atingir sua pátria terra Não tem naus com remos nem companheiros 560 que o levariam sobre as amplas costas do mar E para ti não há dito divino Menelau criadoporZeus que em Argos nutrepotro vais morrer e achar o fado mas a ti até o campo Elísio os limites da terra os imortais conduzirão onde está o loiro Radamanto 565 lá a subsistência é a mais fácil para os homens não há neve nem forte tempestade nem chuva mas sempre rajadas de Zéfiro soprando soantes Oceano envia para refrescar os homens porque tens Helena e para eles és genro de Zeus 570 Assim falou e mergulhou no mar fazonda e eu até as naus com os excelsos companheiros fui e muito meu coração revolveuse enquanto ia Mas após descermos até a nau e o mar preparamos o jantar e veio a noite imortal 575 e então repousamos junto à rebentação do mar Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos primeiro puxamos as naus até o divino mar e colocamos mastros e velas nas naus simétricas tendo embarcado sentaramse junto aos calços 580 e alinhados o mar cinzento golpeavam com remos De novo no Egito o rio caído de Zeus ancorei as naus e fiz hecatombes completas Depois de suspender a raiva dos deuses semprevivos ergui cenotáfio a Agamêmnon para inextinguível ser sua fama 585 Após isso completar retornei e deramme uma brisa os imortais que rápido me conduziram à terra pátria Pois bem agora fica em meu palácio até chegar o décimo primeiro décimo segundo dia Aí te enviarei são e salvo e darei radiantes presentes 590 três cavalos e um carro bempolido depois te darei bela taça para que libes aos deuses imortais lembrandote de mim todos os dias A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Filho de Atreu por muito tempo não me retenhas aqui 595 Até mesmo um ano junto a ti eu conseguiria ficar e não teria saudade de casa ou dos pais às maravilhas ouvindo teus discursos e palavras deleitome Mas já se impacientam os companheiros na mui sacra Pilos e tempo tu aqui me reténs 600 Já o dom o que me deres seja algo precioso cavalos não conduzirei a Ítaca mas para ti mesmo aqui os deixarei para tua glória pois reges planície larga na qual há muito trevo há junça trigo espelta e branca cevada em largas espigas 605 Já em Ítaca não há trilhas largas nem prado é nutrecabra e mais agradável que nutrepotro Nenhuma ilha é para cavalos nem tem prado essas que jazem sobre o mar e Ítaca supera todas Assim falou e sorriu Menelau bomnogrito 610 com a mão acariciouo dirigiuselhe e nomeouo És de sangue valoroso caro filho pois falas assim portanto eu farei a troca pois sou capaz Dos dons de quantos haveres há em minha casa vou te dar o mais belo e o mais valioso 615 Vou te dar uma ânfora bemfeita de prata ela é toda e sua borda tem acabamento em ouro obra de Hefesto Deuma o herói Lúzio rei dos sidônios quando em sua casa albergoume ao lá passar no retorno com ela quero te presentear 620 Assim eles disso falavam entre si e convivas vieram à morada do rei divino Conduziam ovelhas e traziam fortificante vinho e pão enviaramlhes as esposas belovéu Assim eles preparavam a refeição no palácio 625 E os pretendentes diante do salão de Odisseu deleitavamse com discos e lanças arremessandoos em solo nivelado como no passado desmedidos Sentados estavam Antínoo e o deiforme Eurímaco chefes dos pretendentes de longe os melhores em valor 630 O filho de Prudente Ponderado deles aproximouse e a Antínoo inquirindoo com um discurso dirigiuse Antínoo acaso sabemos ou não em nosso juízo quando Telêmaco voltará da arenosa Pilos Partiu levandome uma nau ela me é necessária 635 para cruzar até a espaçosa Élida onde tenho cavalos doze fêmeas e lactentes mulas robustas não domadas uma delas trarei e devo domar Assim falou e espantaramse no ânimo não pensaram que fora à Pilos de Neleu mas alhures lá mesmo 640 no campo estivesse com as ovelhas ou o porqueiro A ele então disse Antínoo filho de Persuasivo Narrame sem evasivas quando partiu e que jovens seguiramno De Ítaca seletos ou seus próprios empregados e escravos Também isso poderia realizar 645 Quanto a isto dizeme a verdade para eu bem saber se à força contra tua vontade tomou a negra nau ou de bom grado lha deste ao pedir com um discurso A ele o filho de Prudente Ponderado retrucou Eu de bom grado lha dei o que faria qualquer outro 650 quando um homem tal inquieto no ânimo lhe solicitasse Seria difícil negar o dom Jovens do povo os melhores depois de nós esses o seguiram percebi que embarcou como chefe Mentor ou um deus que a ele em tudo se assemelhava 655 Mas isto me espantou vi aqui o divino Mentor ontem de manhã mas embarcara na nau para Pilos Após assim falar dirigiuse à casa do pai e desses dois irritouse o ânimo arrogante Fizeram os pretendentes sentarse e pararam os jogos 660 E entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo atormentado seu juízo enegrecido de muito ímpeto encheuse e seus olhos pareciam fogo cintilante Incrível completou feito inaudito com soberba Telêmaco esse trajeto críamos que não o completaria 665 Se contra tantos o jovem menino partiu assim após puxar a nau e escolher do povo os melhores dano ulterior começará a ocorrer mas que sua força Zeus destrua antes que nossa desgraça se torne Vamos daime nau veloz e vinte companheiros 670 para que na sua volta de tocaia o vigiemos no canal entre Ítaca e a escarpada Samos que seja lastimável sua viagem motivada pelo pai Assim falou e todos aprovavam e o incitavam presto após se erguerem foram à casa de Odisseu 675 Eis que Penélope muito tempo não ignorou os discursos que os pretendentes ruminaram no juízo Faloulhe o arauto Médon que soubera dos planos estando fora do pátio e eles dentro o plano tramavam E foi pela casa levar a notícia a Penélope 680 Quando passou pela soleira dirigiuselhe Penélope Arauto por que te enviaram os pretendentes ilustres Para ordenares às escravas do divino Odisseu que cessem os afazeres e lhes preparem o banquete Nunca tivessem vindo me cortejar ou mesmo se reunido 685 que pela última e derradeira vez agora aqui jantem Vós amiúde reunidos tantos recursos devastais as posses do atilado Telêmaco Nada dos vossos pais ouvistes no passado ainda crianças como foi Odisseu entre vossos genitores 690 nada fazendo nem falando de imoderado contra alguém nesta terra Isso é o costume dos reis divinos entre os mortais odiará um a outro pode querer bem Ele nunca de modo algum foi iníquo para um varão Mas esse vosso ânimo e ações ultrajantes 695 se mostram e não há gratidão no futuro por boa conduta E a ela dirigiuse Médon versado no inteligente Vê bem rainha que isso fosse o mal maior Todavia outra coisa muito mais grave e aflitiva pensam os pretendentes não o complete o filho de Crono 700 Telêmaco anseiam matar com bronze afiado à casa voltando partiu atrás de novas do pai rumo à mui sacra Pilos e à divina Lacedemônia Assim falou e os joelhos e o coração dela fraquejaram tempo ficou sem fala de palavras seus dois olhos 705 encheramse de lágrimas e a voz abundante contevese Bem depois respondendo com palavras lhe disse Arauto por que meu menino partiu Ele não precisava embarcar em naus velozes que são cavalos marinhos próprios de varões e atravessam águas extensas 710 Para que seu nome não fique entre os homens E a ela dirigiuse Médon versado no inteligente Não sei ou algum deus o instigou ou o próprio ânimo foi impelido a ir a Pilos para informarse do retorno de seu pai ou de que fado alcançou 715 Tendo falado assim saiu pela casa de Odisseu A ela envolveu aniquiladora aflição e não mais suportou ficar na banqueta mesmo muitas havendo na casa e sentouse na soleira do quarto bemtrabalhado infeliz chorando em torno escravas soluçavam 720 todas tantas quantas na casa havia jovens e velhas Entre elas chorando sem parar Penélope falou Ouvi queridas o Olímpio em excesso deume dores mais que a todas que comigo cresceram e nasceram eu que primeiro perdi o nobre marido ânimoleonino 725 que em todas as qualidades supera os dânaos nobre cuja fama é ampla na Hélade até o meio de Argos Agora porém rajadas agarraram meu menino amado do palácio sem registro e que partira nem ouvi Terríveis Nem vós pusestes no juízo cada uma 730 me acordar no leito cientes ao claro no ânimo quando ele subiu na cava nau negra Se eu tivesse ouvido que se lançaria nesse trajeto então por certo ficaria embora ávido por partir ou nesse palácio me deixaria morta 735 Agora ligeiro alguém chame Finório o ancião meu escravo que deume meu pai quando vim para cá e meu jardim muitaárvore mantém para que bem rápido ele conte a Laerte tudo isso sentado ao lado e assim talvez após no juízo um plano tramar 740 saia de casa e se lamurie para o povo esses com ganas em matar seu descendente e do excelso Odisseu A ela então dirigiuse a cara ama Euricleia Moça querida matame tu com bronze impiedoso ou me deixa na casa mas nada te ocultarei 745 Sabia eu de tudo e fornecilhe quanto me ordenou comida e doce vinho e arrancoume poderosa jura que não te falasse antes do décimo segundo dia ou até que tivesses saudade e ouvisses que partira para com teu choro a catita cútis não machucar 750 Mas após te lavar vestir roupas limpas no corpo e subir aos aposentos com tuas criadas mulheres faze uma prece a Atena filha de Zeus portaégide então até mesmo da morte ela o poderá salvar E não desgrace o ancião desgraçado não creio 755 que a deuses ditosos a estirpe de Arquésio de todo seja odiosa mas ainda haverá quem se ocupe da casa grandiosa e dos férteis campos ao longe Isso dito o choro acalmou e de seus olhos se afastou Ela após se lavar vestir roupas limpas no corpo 760 e subir aos aposentos com suas criadas mulheres pôs grãos de cevada no cesto e orou a Atena Escutame rebento de Zeus portaégide Atritone se um dia no palácio para ti o muitaastúcia Odisseu queimou gordas coxas ou de boi ou de ovelha 765 disso agora para mim te lembra protege meu caro filho e afasta os pretendentes dotados de vil arrogância Isso disse e ululou e a deusa ouviulhe a prece E os pretendentes iniciaram uma arruaça no umbroso palácio desse modo falavam os jovens arrogantes 770 Claro as bodas conosco a rainha muitopretendente apronta e não sabe que a morte do filho foi arranjada Assim diziam mas não sabiam o que fora arranjado Entre eles Antínoo tomou a palavra e disse Insanos escapai de discursos soberbos 775 todos vós que ninguém anuncie também lá dentro Vamos fiquemos de pé em silêncio e realizemos o discurso que no juízo agradou a nós todos Isso disse e escolheu os vinte melhores heróis e se encaminharam à nau veloz na orla do oceano 780 A nau por primeiro ao mar profundo puxaram mastro e velas puseram na negra nau e aprontaram os remos nas correias de couro tudo em ordem e desfraldaram a branca vela As armas lhes trouxeram assistentes magnânimos 785 Após puxála da praia para a água desembarcaram lá partilharam do jantar e aguardaram a chegada da noite Ela no andar de cima Penélope bemajuizada jazia sem comer sem tocar em comida ou bebida revolvendo se seu filho impecável escaparia da morte 790 ou seria subjugado pelos pretendentes soberbos Aquilo que no meio de varões o leão cogita com medo ao fecharem ardiloso cerco em torno dele enquanto revolvia isso veiolhe sono prazeroso adormecia reclinada e relaxavam todas suas articulações 795 Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja criou um espectro de corpo feito mulher Altiva a filha de Icário grandiosoânimo que Eumelo desposou em Feras habitando Enviouo à morada do divino Odisseu 800 para que de Penélope que se lamentava gemendo afastasse o choro e lamento lacrimoso Entrou no quarto passando pela correia do ferrolho parou acima da cabeça e dirigiulhe o discurso Dormes Penélope agastada no caro coração 805 Não a ti não permitem os deuses de vida tranquila que chores ou te atormentes pois deve retornar teu menino de modo algum foi ofensivo aos deuses A ela então respondeu Penélope bemajuizada docemente bem adormecida nos portais oníricos 810 Por quê irmã vieste para cá Não costumas aparecer já que muito longe distante habitas Então me ordenas parar com a agonia e as dores muitas que me perturbam no juízo e no ânimo eu que primeiro perdi o nobre marido ânimoleonino 815 que em todas as qualidades supera os dânaos nobre cuja fama é ampla na Hélade até o meio de Argos Agora porém o menino querido partiu em cava nau tolo não conhecendo bem labutas nem assembleias Por esse eu choro até mesmo mais que por aquele 820 Por esse eu tremo e tenho medo que algo sofra entre os da região aonde vai ou no mar inimigos há muitos que contra ele engenham ansiando matálo antes que atinja a terra pátria A ela respondendo falou o débil espectro 825 Coragem e em teu juízo não temas em excesso poderosa guia vai com ele a quem também outros varões rezam para que os acompanhe pois é capaz Palas Atena de ti ao lamuriarte apiedase ela agora me enviou até ti para isso anunciar 830 A ela então dirigiuse Penélope bemajuizada Se és mesmo um deus e de um deus a voz escutaste vamos contame também acerca daquele sofredor se em algum lugar ainda vive e vê a luz do sol ou já está morto e na morada de Hades 835 A ela respondendo falou o débil espectro Daquele não te farei um relato contínuo se está vivo ou morto é ruim lançar frases ao vento Isso disse e junto ao ferrolho pelo batente deslizou rumo às lufadas de vento e ela pulou do sono 840 a filha de Icário seu caro coração rejubilou tão efetivo o sonho ao irromper no apogeu da noite E os pretendentes embarcaram e cruzavam fluentes vias revolvendo a abrupta morte de Telêmaco no juízo Há uma ilha no meio do mar rochosa 845 no meio entre Ítaca e a escarpada Samos Astéris pequenina na qual há portos abriganau um de cada lado lá esperavamno de tocaia os aqueus Aurora de junto do ilustre Títono do leito ergueuse para levar luz a imortais e a mortais os deuses estavam em assembleia e entre eles Zeus trovejanoalto cujo poder é o maior 5 Atena relatavalhes as muitas agruras de Odisseu lembrandose ele na casa da ninfa a preocupava Zeus pai e outros ditosos deuses semprevivos nunca mais alguém seja solícito suave e amigável como rei portacetro nem no juízo saiba o medido 10 mas sempre seja duro e cometa iniquidades pois ninguém se lembra do divino Odisseu aqueles que regeu e era como um pai amigável Mas ele está numa ilha sofrendo forte agonia no palácio da ninfa Calipso que o retém 15 e ele não consegue atingir sua terra pátria Não tem naus com remos nem companheiros que o levariam sobre as amplas costas do mar Agora porém anseiam matar o menino amado ao voltar para casa partiu atrás de novas do pai 20 rumo à mui sacra Pilos e à divina Lacedemônia E a ela respondendo falou Zeus juntanuvens Minha filha que palavra te escapou da cerca de dentes Vê bem essa ideia não ponderaste tu mesma que Odisseu daqueles se vingue ao chegar 25 Telêmaco envia tu com habilidade pois és capaz para que ileso de todo sua pátria terra alcance e os pretendentes na nau de volta retornem Falou e a Hermes o caro filho dirigiuse Hermes sim tu pois de resto és o mensageiro 30 à ninfa belastranças anuncia o firme desígnio o retorno de Odisseu juízopaciente que retornará nem por deuses escoltado nem por homens mortais mas ele em balsa muitacorda sofrendo misérias no vigésimo dia alcançará Esquéria grandesglebas 35 a terra dos feácios na origem próximos dos deuses do fundo do peito como a um deus irão honrálo e numa nau conduzirão à cara terra pátria bronze ouro a granel e vestes tendolhe dado muito o que nem de Troia teria ganhado Odisseu 40 ainda que incólume voltasse com sua parte do butim Assim seu quinhão é ver os seus e atingir a casa com alto teto e a sua terra pátria Isso disse e não desobedeceu o condutor Argifonte Presto então atou aos pés belas sandálias 45 imortais douradas que o levavam sobre as águas e sobre a terra semfim com lufadas de vento Tomou a vara com que encanta olhos de varões de quem quer e outros adormecidos desperta com ela nas mãos voou o poderoso Argifonte 50 Cruzou a Piéria e do céu tombou no mar apressouse sobre as ondas feito gaivota que pelos feros ventres do mar ruidoso a caçar peixes as cerradas asas nágua molha a ela semelhante por muita onda Hermes deixouse ir 55 Mas quando atingiu a ilha longínqua lá saindo do mar violeta à terra firme foi até alcançar a grande gruta onde morava a ninfa belastranças e encontroua dentro Fogo na lareira intenso ardia e até longe o odor 60 de cedro bemrachado e tuia recendia pela ilha queimados e ela dentro cantando com bela voz ativa junto ao tear tramava com áurea lançadeira Bosque havia em torno da caverna verdejante amieiro choupopreto e perfumado cipreste 65 Lá repousavam aves asacomprida corujas falconetes corvos línguacomprida marinhos que se ocupam de feitos marítimos Aí enroscavase em torno da cava gruta vinha exuberante florejante com uvas 70 Fontes em linha quatro fluíam com límpida água próximas entre si cada uma correndo para um lado Em torno prados macios com violeta e aipo floriam mesmo um imortal lá chegando se admiraria ao olhar e se deleitaria no juízo 75 Lá parado admiravase o condutor Argifonte Mas depois que tudo admirou em seu ânimo presto foi à ampla gruta Vendoo de frente não o desconheceu Calipso deusa divina pois não se desconhecem os deuses mutuamente 80 os imortais nem se um bem longe habita Ao enérgico Odisseu dentro não encontrou mas ele chorava na praia sentado como antes com lágrimas gemidos e aflições lacerando o ânimo costumava mirar o mar ruidoso vertendo lágrimas 85 E a Hermes perguntou Calipso deusa divina tendoo feito sentarse em poltrona brilhante lustrosa Por que até mim vieste Hermes bastãodourado respeitável e caro Não costumas aparecer Fala o que pensas o ânimo ordena que eu cumpra 90 se posso cumprir e se é algo que deve sêlo Vem mais para frente para eu te honrar com um dom Isso tendo dito a deusa pôs ao lado uma mesa após enchêla de ambrosia e misturou o tinto néctar e ele bebia e comia o condutor Argifonte 95 Após jantar e o ânimo fortificar com a comida então a ela com palavras respondendo disse Perguntas deusa por que eu deus vim a ti sem subterfúgios narrarei a história tu o pedes Zeus me ordenou que cá viesse sem eu querer 100 quem de bom grado cruzaria tanta água salgada incontável Não há urbe de homens perto que a deuses fazem sacrifícios e hecatombes seletas Mas não pode à mente de Zeus portaégide outro deus nem ultrapassar nem frustrar 105 Diz que um varão está aí o mais lastimoso de todos os varões que em volta da urbe de Príamo lutaram nove anos e no décimo a cidade pilharam e foram para casa no retorno porém ofenderam a Atena que instigoulhes vento danoso e grandes ondas 110 Então os outros todos pereceram nobres companheiros e eis que vento e ondas trouxeramno para cá A ele agora te ordenou de pronto o enviar de volta não lhe cumpre aqui longe dos seus morrer mas ainda é seu quinhão ver os seus e alcançar 115 a casa com alto teto e sua terra pátria Assim falou e tremeu Calipso deusa divina e falando dirigiulhe palavras plumadas Sois terríveis deuses ciumentos mais que todos com deusas vos irritais quando deitamse com varões 120 às claras ou se uma faz dele seu homem amado Assim quando a Órion agarrou Aurora dedosróseos com ela irritaramse os deuses de vida tranquila até que a ele em Ortígia a tronodourado pura Ártemis com suas flechas suaves veio e matou 125 Assim quando a Jasão Deméter belastranças cedendo a seu ânimo uniuse em enlace amoroso sobre pousio com três sulcos pouco tempo ignorouo Zeus que o matou lançando um raio cintilante Assim agora irritaivos comigo deuses por ter um mortal 130 A ele eu salvei enquanto a quilha cavalgava sozinho pois sua nau veloz com um raio cintilante Zeus atingiu e despedaçou no meio do mar vinoso Então os outros todos pereceram nobres companheiros mas eis que a ele vento e ondas para cá trouxeram 135 A ele eu acolhia alimentava e dizia que o faria imortal e sem velhice por todos os dias Mas como não pode à mente de Zeus portaégide outro deus nem ultrapassar nem frustrar que vá se ele o está incitando e instigando 140 sobre o mar ruidoso Conduzilo porém não posso não tenho naus com remos nem companheiros que o conduziriam sobre as amplas costas do mar Mas a ele solícita vou sugerir e não esconder como alcançará ileso de todo sua terra pátria 145 E a ela dirigiuse o condutor Argifonte Assim agora enviao de volta e à cólera de Zeus atenta que nunca no porvir rancoroso a ti seja cruel Isso dito partiu o poderoso Argifonte e ela até o enérgico Odisseu a senhora ninfa 150 foi logo após ouvir o comunicado de Zeus Achouo na praia sentado nunca em seus olhos as lágrimas secavam e iase sua doce vitalidade chorando pelo retorno pois já não lhe agradava a ninfa Mas à noite dormia obrigado 155 na cava gruta sem querer junto a ela que queria de dia nas pedras e nas praias sentado lacerando o ânimo com lágrimas gemidos e aflições mirava o mar ruidoso vertendo lágrimas Parada próximo faloulhe a deusa divina 160 Desditoso não chores mais aqui nem tua vida se esvaia pois agora muito solícita de volta te enviarei Vamos corta grandes troncos e com bronze constrói larga balsa e o deque prende sobre ela ereto para que te leve pelo mar embaçado 165 Quanto a mim pão água e vinho tinto deliciosos disporei que de ti a fome afastariam e com roupas te cobrirei e enviarei brisa detrás para que ileso de todo tua terra pátria alcances se quiserem os deuses que do largo páramo dispõem 170 esses que são mais fortes que eu para pensar e realizar Assim falou e tremeu o muitatenência divino Odisseu e falando dirigiulhe palavras plumadas Claro deusa que tu armas algo outro não a condução quando pedes que de balsa cruze grande abismo de mar 175 assombroso e aflitivo esse nem simétricas naus velozes cruzam felizes com a brisa de Zeus E nem eu contra ti numa balsa embarcaria exceto se ousares deusa a grande jura jurarme de que não planejarás contra mim outra desgraça 180 Assim falou e sorriu Calipso deusa divina com a mão acariciouo dirigiuselhe e nomeouo De fato és trapaceiro versado em sagacidade que discurso é esse que planejaste para falar Agora saibam disso a terra o largo páramo acima 185 e a água que flui para baixo o Stíx esse o maior juramento o mais terrível entre os deuses ditosos de que não planejarei contra ti outra desgraça Mas penso e planejarei exatamente o que para mim mesma eu armaria se tivesse tal necessidade 190 Vê minha mente é moderada e em mim mesma o ânimo no peito não é de ferro mas compassivo Falou assim e foi na frente a deusa divina célere ele depois atrás das pegadas da deusa E chegaram à cava gruta a deusa e o varão 195 e ele lá sentouse na poltrona donde se erguera Hermes e a ninfa serviu todo tipo de iguaria para comer e beber o que mortais varões comem ela sentouse em face do divino Odisseu e junto dela as escravas puseram ambrosia e néctar 200 E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após deleitaremse com bebida e comida entre eles começou a falar Calipso deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque então de fato para casa à cara terra pátria 205 de pronto queres ir Sê feliz apesar de tudo Se soubesses em teu juízo quantas agruras deverás aguentar antes de atingir a terra pátria ficando aqui mesmo comigo cuidarias desta casa e imortal serias embora ansiando ver 210 tua esposa que sempre desejas todos os dias Com certeza não pior que ela proclamo ser nem no porte nem no físico pois não é possível que as mortais disputem com imortais em porte e aparência Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 215 Senhora deusa não me odeies por isso Também sei de tudo que comparada a ti a bemajuizada Penélope é pior em aparência e altura a quem mira de frente ela é mortal e tu imortal e sem velhice Mas quero ainda assim e desejo todos os dias 220 voltar para casa e ver o dia do retorno Se de novo um deus me golpear no mar vinoso resistirei tendo no peito ânimo resistente pois já muito demais sofri e muito aguentei em ondas e guerra que depois de tudo venha o retorno 225 Assim falou o sol desceu e vieram as trevas os dois tendo ido ao recesso da cava gruta deleitaramse com o amor lado a lado ficando Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos Odisseu presto vestiu capa e túnica 230 e ela grande manto branco vestiu a ninfa leve e gracioso a cintura cingiu com cinto belo dourado e sobre a cabeça deitou o véu Então projetou a condução do enérgico Odisseu deulhe grande machado ajustado à palma da mão 235 brônzeo nas duas pontas agudo nele havia um cabo de oliveira muito belo bemengastado Deulhe depois enxó bempolida e guiouo na vereda ao extremo da ilha onde havia grandes árvores amieiro chouponegro e abeto alcançaocéu 240 há muito sem seiva secas que fácil lhe flutuariam Mas após lhe mostrar onde havia grandes árvores ela foi para casa Calipso deusa divina e ele cortou os troncos e rápido realizou sua obra Vinte derrubou ao todo podouos com o bronze 245 aplanou habilmente e endireitou com o prumo Trouxe a verruma Calipso deusa divina furou então todos e encaixouos entre si e a todos ajustou com pregos e encaixes O espaço do casco da nau que torneia um varão 250 mercante larga bemversado em carpintaria tão larga balsa construiu Odisseu O deque ao erguer e estruturar com vários apoios fazia e completavao com largas pranchas Nele erguia um mastro e uma verga a ele adaptada 255 depois disso fez um leme para manobrar Circundoua toda com cerca de salgueiro defesa contra ondas nela despejou muita madeira Trouxe panos Calipso deusa divina para fazer a vela ele bem artefatou até isso 260 Nela prendeu braços adriças e escotas Com alavancas então empurroua ao mar divino Era o quarto dia e para ele tudo foi completado e no quinto enviouo da ilha a divina Calipso tendoo banhado e vestido com vestes olorosas 265 Dentro pôslhe a deusa um odre de vinho escuro esse um e outro de água grande e também comida num alforje pôslhe alimentos deliciosos muitos e brisa fez que soprasse tranquila e tépida Feliz com a brisa soltou a vela o divino Odisseu 270 Ele manobrou hábil com o leme sentado sono em suas pálpebras não tombou mirando as Plêiades e Boeiro que tarde se põe e a Ursa que Carro também denominam ela que no mesmo lugar se volta e em Órion se fixa 275 a única a não partilhar dos banhos no Oceano de fato ordenaralhe Calipso deusa divina que cruzasse o mar com ela a sua esquerda Já dezessete dias navegava o mar cruzando e no décimo oitavo surgiram montes umbrosos 280 da terra dos feácios do ponto mais próximo a ele assemelhavase a um escudo no mar embaçado E a ele voltando dos etíopes o poderoso tremesolo de longe dos montes dos sólimos viu surgiulhe singrando pelo mar Irouse no peito ainda mais 285 agitou a cabeça e a seu ânimo discursou Incrível por certo os deuses mudaram de opinião acerca de Odisseu enquanto eu entre etíopes estava já próximo está da terra feácia onde lhe cumpre escapar do grande limite de agonia que o atinge 290 Mas creio que o perseguirei até se fartar de desgraça Isso dito reuniu nuvens e o mar turvou as mãos no tridente atiçou todas as rajadas de todos os ventos e com nuvens encobriu terra e mar por igual e a noite desceu do céu 295 Juntos Euro e Noto caíram o tempestuoso Zéfiro e Bóreas nascido do páramo e grande onda rolava Então fraquejaram os joelhos e o coração de Odisseu e perturbado falou a seu ânimo enérgico Ai de mim pobre coitado o que ainda me resta 300 Temo que tudo que a deusa falou seja infalível disse que eu no mar antes de atingir a terra pátria enfrentaria aflições tudo isso agora se completa Com que nuvens cinge Zeus o largo páramo turvou o mar e arremessamse rajadas 305 de todos os ventos agora é certo meu abrupto fim Três vezes ditosos quatro os dânaos que morreram na ampla Troia obsequiando os filhos de Atreu Tivesse eu morrido e meu destino alcançado no dia em que contra mim lanças brônzeas numerosos 310 troianos lançaram em torno do finado filho de Peleu Teria obtido oferendas e minha fama os aqueus levariam agora me foi destinado ser alcançado por morte deplorável Após falar assim grande onda o golpeou do alto terrível impetuosa e chacoalhou a balsa 315 Para longe da balsa ele próprio caiu e o leme das mãos deixou ir ao meio quebroulhe o mastro rajada de ventos mesclados terrível Longe a vela e a verga caíram no mar Sob a água segurouo muito tempo e não pôde 320 logo subir sob o furor da grande onda as vestes o oprimiam as que lhe dera a divina Calipso Bem depois emergiu e da boca cuspiu água do mar acre que em abundância da cabeça escorria Nem assim da balsa esqueceu embora acabado 325 mas lançandose nas ondas agarroua e no meio sentouse da morte certeira tentando escapar Levavaa grande onda pela corrente para lá e para cá Como Bóreas no fim do verão leva espinhos de cardo pelo plaino e em profusão se prendem um ao outro 330 assim pelo mar ventos a levavam para lá e para cá ora Noto a Bóreas lançavaa para que fosse levada ora Euro a Zéfiro deixavaa para ser perseguida E viuo a filha de Cadmo Ino lindacanela Leucoteia que antes fora mortal com voz humana 335 e agora no mar partilhava da honra dos deuses Ela apiedouse de Odisseu sofrendo à deriva feito gaivota em voo emergiu do oceano sentouse sobre a balsa muitacorda e enuncioulhe Desditoso por que assim a ti Posêidon tremesolo 340 odeia terrível já que te engendra muitos males Vê não te destruirá embora muito encolerizado Mas aja assim e creio que não te falta entendimento após tirar as roupas deixa a balsa entregue aos ventos e nadando com os braços esforçate pelo retorno 345 à terra dos feácios onde teu destino é escapar Vamos esse véu sob o peito ajeita imortal não temas sofrer nem ser destruído Mas quando com as mãos tocares terra firme soltao e o lança rumo ao mar vinoso 350 bem longe da terra e virate para o outro lado Após falar assim a deusa deulhe o véu e ela de volta no mar mergulhou no fazonda à gaivota assemelhada e onda escura encobriua Mas ele cogitou o muitatenência divino Odisseu 355 e perturbado falou a seu ânimo enérgico Ai de mim que um ardil não tenha de novo tramado o imortal quando me ordena desembarcar da balsa Ainda não obedecerei pois longe com os olhos a terra eu vi onde ela me disse que escaparia 360 Mas assim agirei e pareceme ser o melhor enquanto houver troncos com encaixes ajustados aqui ficarei e resistirei sofrendo agonias mas quando uma onda dissipar a balsa nadarei pois não é possível prever algo melhor 365 Enquanto revolvia isso no juízo e no ânimo lançoulhe grande onda Posêidon tremesolo terrível e aflitiva arqueada e golpeouo Como o vento bravio que dissipa uma pilha de palha seca e a ela dispersa para todos os lados 370 assim dispersou seus grandes troncos E Odisseu cavalgava o tronco como a guiar um cavalo de corrida Despiuse da roupa que lhe dera a divina Calipso e de imediato o véu sob o peito ajeitou de cabeça jogouse no mar estendendo os braços 375 ansiando nadar Viuo o poderoso tremesolo moveu a cabeça e a seu ânimo discursou Assim agora após muitos males sofrer vague no mar até homens criados por Zeus encontrar Mas nem assim espero desprezarás a desgraça 380 Falou assim chicoteou os cavalos belapelagem e foi até Aigas onde fica sua morada gloriosa Porém Atena filha de Zeus teve outra ideia dos outros ventos deles o percurso estancou e ordenou a todos que parassem e repousassem 385 e instigou o ventoso Bóreas que quebrou as ondas para que ao navegador povo feácio se juntasse Odisseu linhagemdivina e fugisse da perdição da morte Lá duas noites e dois dias na onda potente vagava e seu coração amiúde pressentiu o fim 390 Mas quando trouxe o terceiro dia Aurora belastranças então o vento parou e a calmaria surgiu sem ventos ele próximo viu a terra com muito aguçado olhar erguido por grande onda Como quando aos filhos felicidade traz a vida 395 do pai que jaz doente sofrendo lancinante agonia definhando há tempo pois hedionda divindade atacouo e então para sua felicidade deuses o livram da desgraça tal felicidade sentiu Odisseu ao ver terra e bosque e nadou com pressa de pôr os pés em terra firme 400 Mas quando estava à distância de um grito ouviu um rugido contra os rochedos do oceano roncava grande onda contra a seca terra firme quebrando terrível tudo coberto de espuma do mar sem angras protetoras de navios nem ancoradouros 405 cabos salientes havia e recifes e rochas Então fraquejaram os joelhos e o coração de Odisseu e perturbado ele falou a seu ânimo enérgico Ai após Zeus a mim conceder sem esperança ver a terra e eu completar a travessia desse abismo 410 não se mostra saída para fora do mar cinza Lá fora há rochas pontiagudas em torno a onda freme com estrondo e lisa a rocha se ergue fundo é o mar até a beira e impossível com os pés ambos se firmar e escapar da desgraça 415 Que a mim tentando sair não lance contra o penedo grande onda agarrandome será vão meu ímpeto Se mais para diante eu nadar para acaso encontrar praias oblíquas e angras do oceano temo que uma rajada novamente me agarre 420 e pelo mar piscoso me leve com gemidos profundos ou que do mar uma divindade envie contra mim enorme monstro um dos tantos que nutre a famosa Anfitrite pois sei do ódio que me tem o famoso tremeterra Enquanto revolvia isso no juízo e no ânimo 425 grande onda o levou rumo ao áspero cabo Lá a pele teria sido lacerada e os ossos partidos se em seu juízo tal não lhe pusesse Atena olhosdecoruja com ambas as mãos arremetendose agarrou o penedo e nele grudouse gemendo até a grande onda passar 430 E assim dela escapou mas em refluxo a ele de novo golpeou arremetendose e longe lançouo ao mar Como quando o muitospés da toca é arrancado e nas ventosas copiosos pedregulhos se prendem assim nas rochas de suas mãos corajosas 435 a pele foi lacerada e a ele grande onda encobriu Lá o infeliz Odisseu mais que seu quinhão teria morrido se sagacidade não lhe tivesse dado Atena olhosdecoruja emergindo das ondas que quebravam rumo à costa nadava pelo lado mirando a terra se acaso achasse 440 praias oblíquas e angras do oceano Mas quando diante da boca do rio belofluxo chegou nadando aí pareceulhe ponto excelente livre de rochas e havia proteção contra o vento reconheceuo em seu fluxo e rezou em seu íntimo 445 Ouveme senhor seja quem fores muitoimplorado vou a ti fugindo do mar das ameaças de Posêidon É digno de respeito também aos deuses imortais todo varão que chega depois de vagar como eu agora alcanço tua corrente e joelhos após muito aguentar 450 Pois senhor apiedate teu suplicante proclamo ser Isso dito ele logo parou sua corrente conteve a onda na frente dele produziu calmaria e salvouo rumo à foz do rio Então os dois joelhos vergou e os robustos braços o mar dobrara seu coração 455 Inchada estava sua carne e muito mar gotejava da boca e da pele Eis que ele sem fôlego e sem voz jazia exaurido e fadiga terrível o atingiu Quando voltou a si e no peito o ânimo se recompôs então sim soltou de si o véu da deusa 460 No rio deságuanomar deixouo tombar de volta levouo grande onda com a corrente e logo Ino recebeuo com suas mãos ele após do rio se afastar sob o junco arrojouse e beijou o solo fértil Perturbado falou a seu ânimo enérgico 465 Ai de mim o que devo sofrer O que ainda me resta Se no rio ao longo da incômoda noite eu vigiar que a geada vil e junto o fresco orvalho não subjuguem o ânimo esgotado pela exaustão a brisa sopra do rio gelada antes da aurora 470 Mas se subir ao penhasco e ao bosque umbroso nos cerrados arbustos adormecer se permitirem o frio e a fadiga e até mim o doce sono vier temo tornarme presa e butim de feras Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim 475 foi ao bosque que encontrou junto a uma clareira próximo à água Eis que se pôs sob dois arbustos nascidos no mesmo lugar zambujeiro e oliveira Não os cortava o ímpeto de ventos que sopram úmidos e nunca o sol luzidio com seus raios os atingia 480 nem chuva os cruzava de todo tão compactos nasceram enredados um ao outro Debaixo Odisseu meteuse e presto juntou um leito com suas mãos largo pois havia um monte de folhas em abundância quantidade para dois três homens se protegerem 485 contra o inverno ainda que fosse muito duro Vendoo alegrouse o muitatenência divino Odisseu deitouse no centro e sobre si entornou um monte de folhas Como quando alguém oculta um tição na cinza negra no limite das lavouras onde não há outros vizinhos 490 e salva o germe do fogo para não precisar acender alhures assim Odisseu cobriuse com as folhas E nele Atena vertia sono sobre os olhos para rápido o livrar da fadiga penosa após encobrir suas pálpebras Assim ele lá dormia o muitatenência divino Odisseu dominado por sono e fadiga E Atena foi até a terra a cidade dos varões feácios Eles antes moravam na espaçosa Hipereia 5 próximo aos ciclopes varões arrogantes que os lesavam pois na força eram superiores De lá fêlos erguerse o deiforme Nauveloz e assentouos em Esquéria longe de varão comegrão em volta puxou muro para a cidade construiu casas 10 fez templos de deuses e dividiu as glebas Mas ele já subjugado pela morte partira ao Hades e Alcínoo regia versado em projetos vindos de deuses À sua casa foi a deusa Atena olhosdecoruja o retorno do enérgico Odisseu armando 15 Foi até o quarto muito artificioso no qual uma moça dormia semelhante a imortais no físico e na aparência Nausícaa filha do enérgico Alcínoo e junto duas criadas cuja beleza vinha das Graças de cada lado do umbral as brilhantes portas trancadas 20 Como o sopro do vento lançouse à cama da moça parou acima da cabeça e dirigiulhe o discurso assemelhada à filha de Dimas famoso pelas naus de mesma idade que ela e agradável a seu ânimo Semelhante a ela disselhe Atena olhosdecoruja 25 Nausícaa como a mãe te gerou assim desleixada Tuas vestes lustrosas jazem descuidadas e tuas bodas estão perto onde tu mesma deves belezas trajar e as de outros providenciar de quem te conduzir graças a isso marcha entre os homens um dizer 30 bom e o pai e a senhora mãe se agradam Vamos temos que lavar tudo quando a aurora surgir contigo seguirei como ajudante para que rápido aprontes pois não serás virgem por muito tempo Pela cidade já te cortejam os melhores 35 entre todos os feácios onde está tua própria família Vamos incita o famoso pai antes da aurora a preparar mulas e carro para que conduza cintos peplos e lustrosas mantas Também para ti mesma será bem melhor que ir 40 com os pés os poços são bem longe da cidade Ela após falar assim partiu Atena olhosdecoruja ao Olimpo onde dizem a sede dos deuses sempre segura ficar não é sacudido por ventos nunca por chuva é molhado nem neve a ele se achega mas o céu de todo 45 se estende sem nuvens e acima corre branco clarão ali deleitamse os deuses ditosos todos os dias Para lá foi a olhosdecoruja após instruir a moça Logo veio Aurora belotrono que a despertou Nausícaa belopeplo presto espantouse com o sonho 50 e saiu pela casa para anunciar aos genitores e lá dentro os encontrou ao caro pai e à mãe Essa sentada junto à lareira com criadas mulheres volteava fios púrpura na roca e com aquele na porta deparou de saída para encontrar reis renomados 55 no conselho chamado por ilustres feácios Ela parada bem perto disse ao caro pai Querido papai não poderias prepararme um carro alto boasrodas para eu levar esplêndidas vestes ao rio para lavar aquelas minhas que sujas estão 60 Também convém que tu na companhia dos próceres planejes planos com roupas limpas sobre a pele E são cinco os teus filhos que vivem no palácio dois deles casados três florescentes solteiros eles sempre querem com roupas recémlavadas 65 ir à arena de dança tudo isso ocupa meu juízo Assim falou com vergonha de nomear vicejantes bodas ao caro pai ele tudo percebeu e reagiu com o discurso Não te nego as mulas criança ou outra coisa Vai e para ti os escravos prepararão um carro 70 alto boasrodas equipado com a parte superior Isso dito deu a ordem aos escravos e eles obedeceram Eles então fora o carro boasrodas com mulas aprontavam conduziam as mulas e jungiram ao carro e a moça trazia do quarto resplandecentes roupas 75 Essas ela dispôs sobre o carro bempolido A mãe na canastra punha iguarias deliciosas de todo o tipo punha alimentos e vertia vinho em odre de cabra e a moça embarcou no carro Deulhe fluido óleo de oliva em lécito dourado 80 para que se ungisse com suas criadas mulheres Ela pegou o chicote e as rédeas lustrosas e chicoteou para puxarem e as mulas faziam estrépito Esticavamse sem cessar levavam a roupa e a ela não sozinha mas com ela seguiam duas criadas 85 Quando alcançaram a mui bela corrente do rio onde as tinas eram perenes e muita água bela corre do fundo para limpar até o bem sujo lá elas desatrelaram as mulas para longe do carro Enxotaramnas ao longo do vertiginoso rio 90 para pastarem capim doce como mel e outras do carro pegavam a roupa com as mãos e levavam à água escura e pisoteavamna nas tinas rápido rivalizando Mas depois de lavar e limpar toda a sujeira em ordem estenderamna ao longo da orla onde o mar 95 ao bater na praia mais lavava pedregulhos Elas se banharam e ungiram à larga com óleo partilharam o almoço junto às margens do rio e aguardaram a roupa secar sob os raios do sol Mas após as escravas e ela deleitaremse com comida 100 brincavam com a bola tendo as fitas soltado e entre elas Nausícaa alvosbraços dirigia a música Tal vai Ártemis pelos montes a vertesetas ou pelo muito elevado Taigeto ou pelo Erimanto deleitandose com javalis e corças velozes 105 Com ela as ninfas filhas de Zeus portaégide campestres brincam e no juízo se alegra Leto aquela mantém cabeça e fronte acima de todas é fácil de reconhecer e todas são belas assim entre as criadas sobressaía a virgem indomada 110 Mas quando ia de novo retornar para casa após jungir as mulas e dobrar as belas vestes teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja Odisseu despertaria e veria a moça de bela face para que ela o guiasse à cidade dos varões feácios 115 A rainha então lançou a bola para uma criada ela errou a criada e em fundo remoinho caiu Soltaram alto grito e despertou o divino Odisseu Sentandose revolvia no juízo e no ânimo Ai de mim dessa vez atinjo a terra de que mortais 120 Serão eles desmedidos selvagens e não civilizados ou hospitaleiros com mente que teme o deus É como se me envolvesse feminina gritaria de moças de ninfas que habitam escarpados cumes de montes fontes de rios e campos forrageiros 125 talvez esteja perto de homens dotados de fala Pois bem eu mesmo vou verificar e ver Isso dito dos arbustos emergiu o divino Odisseu e do bosque cerrado quebrou com mão encorpada ramo folheado para no corpo proteger as vergonhas de homem 130 Foi como leão da montanha confiante na bravura que vem castigado por chuva vento e seus olhos faíscam Mas ele vai para o meio de bois e ovelhas ou atrás de corças selvagens ordenalhe o estômago que para testar as ovelhas vá a uma casa protetora 135 assim ia Odisseu às moças belastranças unirse embora nu a necessidade o atingiu Aterrorizante pareceu a elas enfeado pela salsugem e abalaram uma para cada lado nas praias salientes Só a filha de Alcínoo ficou pois nela Atena 140 pôs coragem no peito e tirou o medo dos membros Parada encarouo ele Odisseu cogitou se tocando os joelhos suplicaria à moça de bela face ou assim mesmo de longe com palavras amáveis suplicaria que mostrasse a cidade e desselhe roupas 145 Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim de longe suplicar com palavras amáveis para a moça não se enraivecer tocada nos joelhos De pronto amável e vantajoso discurso lhe disse Implorote senhora és uma deusa ou mortal 150 Se és deusa uma das que do largo páramo dispõem a ti eu a Ártemis a filha do grande Zeus comparo próxima em aparência altura e físico se és um mortal dos que moram sobre a terra três vezes ditosos são teu pai e a senhora tua mãe 155 três vezes ditosos os irmãos muito o ânimo deles sempre com gáudio rejubila por tua causa ao mirarem tal rebento dirigirse à arena Será no coração de longe o mais ditoso de todos quem prevalecer com dádivas e para casa te conduzir 160 Nunca vi mortal assim com meus olhos homem nem mulher e reverência me toma ao mirarte Sim em Delos certa vez junto ao altar de Apolo um tal broto de palmeira jovem e ascendente percebi pois fui também até lá e grande tropa seguiame 165 em jornada na qual muitas agruras me atingiriam assim como ao vêlo assombreime no ânimo muito tempo pois nunca ascendeu tal tronco da terra a ti mulher admiro assombrome e temo terrivelmente tocarte os joelhos e cruel aflição me atinge 170 Ontem no vigésimo dia escapei do mar vinoso até então onda e ventosas rajadas sempre me levavam desde a ilha de Ogígia Agora a divindade me expeliu para que também aqui eu sofra um mal não creio que cessará mas deuses antes completarão ainda muitos 175 Tem piedade senhora de ti após padecer muito mal achegueime por primeiro não conheço nenhum outro homem dos que dispõem dessa cidade e terra Mostra a cidade e dême trapos para recobrirme se trouxeste um saco de roupas ao vires para cá 180 Que deuses te deem tudo que desejas em teu juízo marido e casa e te presenteiem com concórdia distinta de fato nada é mais forte e melhor que isto quando em concórdia nas ideias dominam a casa marido e mulher há muitas agonias a inimigos 185 e alegrias a amigos e a reputação deles é máxima A ele então Nausícaa alvosbraços retrucou Estranho como não pareces ser vil nem insensato herói e Zeus mesmo o Olímpio fortuna distribui aos homens aos distintos e aos vis o que ele quer a cada um 190 também a ti talvez isso deu porém cumpre aguentares Pois bem já que alcanças nossa terra e cidade não carecerás de veste nem de outra coisa que convém a calejado suplicante diante de nós A urbe te mostrarei e vou dizerte o nome do povo 195 são os feácios que habitam essa cidade e região e eu mesma sou a filha do enérgico Alcínoo de quem depende o vigor e a força dos feácios Assim falou e deu ordens às criadas belastranças Criadas parai Para onde fugis ao ver o herói 200 Acaso pensais tratarse de um varão inimigo Não existe este varão humano mortal nem nascerá o que chegar à terra dos varões feácios trazendo briga somos caríssimos aos imortais Habitamos bem longe no mar muito encapelado 205 nos confins e nenhum outro mortal nos frequenta Mas esse aí desgraçado chega aqui após vagar e agora cumpre dele cuidar sob Zeus estão todos os estranhos e mendigos e o dom é pequeno e querido Vamos criadas dai comida e bebida ao estranho 210 e banhaio no rio onde há proteção contra o vento Isso dito elas pararam entre si deram ordens e acomodaram Odisseu junto à proteção ordens de Nausícaa filha do enérgico Alcínoo ao lado dele puseram manto e túnica para vestirse 215 deramlhe num lécito dourado fluido óleo de oliva e lhe pediram que se banhasse nas correntes do rio Sim então entre as criadas falou o divino Odisseu Criadas ficai paradas assim longe para eu mesmo banharme tirando a salsugem dos ombros e com óleo 220 me ungir há tempo meu corpo não vê unguento Diante de vós eu não me banharei pois tenho pudor de ficar nu no meio de moças belastranças Assim falou e foram para longe e informaram a jovem E ele com água do rio lavou a pele o divino Odisseu 225 da salsugem que cobria o dorso e os largos ombros e da cabeça removeu a sujeira do mar ruidoso Mas após tudo lavar e à larga se ungir vestiu as vestes que lhe dera a virgem indomada e a ele tornou Atena nascida de Zeus 230 maior e mais encorpado a quem o visse e da cabeça fez tombar madeixas cacheadas semelhantes a jacintos Como quando reveste a prata com ouro o varão habilidoso a quem ensinaram Hefesto e Palas Atenas técnica de todo o tipo e completa obras graciosas 235 assim sobre ele verteu graça na cabeça e nos ombros Então sentouse afastandose até a orla do oceano fulgurante em beleza e graça e a moça contemplavao Então entre as criadas belastranças ela falou Escutaime criadas alvosbraços vou falar 240 Com a ajuda de todos os deuses que do Olimpo dispõem esse homem veio frequentar os excelsos feácios antes com efeito pareceume ser ordinário agora parece com deuses que do largo páramo dispõem Tomara homem assim fosse chamado de meu marido 245 morando nessa terra e lhe agradasse ficar aqui mesmo Vamos criadas dai comida e bebida ao estranho Assim falou e elas a ouviram direito e obedeceram e junto a Odisseu puseram comida e bebida Ele bebia e comia o muitatenência divino Odisseu 250 à larga há muito tempo não tocava em comida E Nausícaa alvosbraços teve outra ideia após dobrar as vestes colocouas no belo carro jungiu as mulas fortecasco e ela mesma subiu Exortou Odisseu dirigiuselhe e nomeouo 255 Agora estranho põete à cidade para que te guie à casa de meu atilado pai onde tu afirmo conhecerás entre todos os feácios os melhores Mas aja assim e creio que não te falta entendimento ao passarmos pelos campos e culturas dos homens 260 marcha rápido junto às criadas atrás das mulas e do carro e eu na estrada serei a condutora E ao pisarmos na cidade rodeada por muralha elevada belo porto há em cada lado da cidade e a entrada é estreita até a via naus ambicurvas 265 são puxadas Todas têm uma rampa cada uma Lá fica a ágora em torno do belo templo de Posêidon ajustada com blocos arrastados de pedreira Lá ocupamse com o cordame das negras naus com cabos e velas e afilam seus remos 270 Aos feácios arco e aljava não interessam mas velas remos de naus e naus simétricas com as quais se alegram cruzando o mar cinza Deles evito fala amarga que ninguém por trás me insulte e são bastante soberbos na cidade 275 Talvez um mais vil diga assim após encontrarnos Quem é esse que segue Nausícaa belo e alto um estranho Onde o achou Sim será seu marido Por certo cuidou de alguém à deriva longe de sua nau varão de terra distante pois não os há nas cercanias 280 ou até ela depois de prece deus muito rogado chegou após do páramo descer e a terá por todos os dias É melhor ela própria circulando se achou marido alhures de fato ela desonra na cidade aqueles feácios que a cortejam muitos e distintos 285 Assim falarão essas seriam as críticas contra mim Também me indignaria contra toda que isso fizesse uma que contra os seus vivos o pai e a mãe se unisse a varões antes de atingir bodas públicas Estranho atenta assim a minha palavra para que logo 290 obtenhas condução e retorno da parte de meu pai Toparemos o bosque radiante de Atena junto à trilha álamos lá corre fonte e no entorno há um prado lá fica o domínio de meu pai e luxuriante vinhedo tão longe da cidade quanto a distância de um grito 295 Lá sentado aguarda um tempo até nós irmos à cidade e chegarmos à casa de meu pai Mas quando creres que nós chegamos à casa então também vai à cidade dos feácios e indaga pela casa de meu pai o enérgico Alcínoo 300 É fácil de reconhecer e até uma criança tola te guiaria de fato não são semelhantes a ela as casas dos feácios tal é a casa de Alcínoo herói Mas quando te abarcarem o pátio e a casa muito rápido cruza o salão até alcançares 305 minha mãe Ela sentase junto à lareira à luz do fogo volteando fios púrpura na roca assombro à visão reclinada contra a coluna criadas sentamse atrás dela Aí mesmo a poltrona de meu pai está escorada na qual bebe vinho sentado como um imortal 310 Passa por ele e braços em torno dos joelhos da mãe lança a fim de que o dia do retorno vejas rápido com alegria mesmo se és de bem longe Se ela em seu ânimo for benévola para contigo há a expectativa então de ver os teus e voltar 315 para a casa bemconstruída e à tua terra pátria Após falar assim açoitou com chicote luzidio as mulas elas rápido deixaram as correntes do rio Corriam bem e trotavam bem com seus cascos e ela conduzia direito para que junto seguissem a pé 320 as criadas e Odisseu com juízo aplicava o açoite E o sol mergulhou e eles alcançaram o famoso bosque consagrado a Atena onde sentouse o divino Odisseu De imediato orou à filha do grande Zeus Ouveme rebento de Zeus portaégide Atrítone 325 pelo menos agora me escuta pois antes nunca escutaste o golpeado ao golpearme o famoso tremeterra Dá que aos feácios eu chegue amigo e digno de piedade Assim falou rezando e ouviuo Palas Atena e a ele ainda não apareceu de frente pois respeitava 330 o irmão do pai ele com veemência manteve a cólera contra o excelso Odisseu até esse em sua terra chegar Assim ele rezava o muitatenência divino Odisseu e a força das mulas levava a moça à cidade Ela quando chegou à esplêndida casa do pai freouas no pórtico os irmãos em torno dela 5 postaramse semelhantes a imortais do carro soltaram as mulas e para dentro levaram as vestes Ela mesma foi a seu quarto acenderalhe o fogo a anciã de Apeiraie a camareira Eurimédussa que um dia naus ambicurvas trouxeram de Apeiraie 10 elegeramna honraria para Alcínoo pois todos os feácios regia e como a um deus o povo o ouvia essa criou Nausícaa alvosbraços no palácio Ela atiçoulhe o fogo e dentro preparou o jantar Então Odisseu moveuse rumo à cidade em torno Atena 15 verteu densa bruma benévola para Odisseu para que nenhum animoso feácio topandoo provocasseo com palavras e perguntasse quem era Mas quando ia penetrar na cidade adorável então topouo a deusa Atena olhosdecoruja 20 semelhante a jovem menina levando um cântaro Parou diante dele e ele a interpelou o divino Odisseu Criança não me conduzirias à casa do varão Alcínoo que rege entre esses homens De fato eu calejado estranho aqui chego 25 de longe terra distante daí não conheço nenhum homem dos que dispõem dessa cidade e da terra A ele então dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Portanto eu pai estrangeiro a casa que me pedes mostrarei já que mora perto de meu pai impecável 30 Mas vai bem quieto e eu na estrada te conduzirei e não encares homem algum nem o interrogues Vê eles não toleram muito homens estrangeiros nem são hospitaleiros com quem vem dalhures Confiantes em suas naus velozes rápidas 35 cruzam o grande mar pois isso lhes deu o tremesolo suas naus são rápidas como asa ou pensamento Falou assim e foi na frente Palas Atena célere ele depois atrás das pegadas da deusa Os feácios famosos pelas naus não o perceberam 40 passando por eles na cidade de fato Atena não permitia a belastranças fera deusa pois névoa prodigiosa verteu sobre ele benévola em seu ânimo Assombrouse Odisseu com portos e naus simétricas com a ágora dos próprios heróis e grandes muralhas 45 altas equipadas com estacas assombro à visão Mas quando chegaram à esplêndida casa do rei entre eles começou a falar a deusa Atena olhosdecoruja Esta é a casa pai estrangeiro que me pedes para indicarte Toparás os reis criados por Zeus 50 partilhando banquete Tu entra e no ânimo nada temas pois o varão audacioso o melhor em todos os feitos revelase ainda que venha dalhures Bem primeiro à senhora alcançarás no palácio Arete é o nome pelo qual é chamada e os mesmos 55 progenitores tem que geraram o rei Alcínoo Primeiro a Nauveloz Posêidon tremesolo gerou com Periboia na beleza a melhor das mulheres a mais jovem filha do enérgico Eurimédon que um dia foi rei dos autoconfiantes gigantes 60 Mas perdeu o iníquo povo e perdeuse a si mesmo com ela Posêidon uniuse e gerou a criança o animoso Nauveloz que os feácios regia Nauveloz gerou Rompedor e Alcínoo Ao primeiro alvejou Apolo arcodeprata sem varão 65 e recémcasado e na casa deixou única filha Arete dela Alcínoo fez sua consorte e honroua como não é honrada na terra outra mulher das que hoje sob os varões a casa mantêm Assim ela de coração foi e tem sido honrada 70 pelos caros filhos pelo próprio Alcínoo e pelo povo que olhandoa como a um deus saúdamna com discursos quando anda na cidade Sim a ela não faltam ideias nobres solve brigas daqueles com quem for bénevola até varões 75 Se ela em seu ânimo for benévola para contigo há a expectativa de ver os teus e voltar para a casa altoteto e tua terra pátria Após falar assim partiu Atena olhosdecoruja sobre o mar ruidoso deixou a encantadora Esquéria 80 dirigiuse a Maratona e a Atenas amplasvias e entrou na casa protetora de Erecteu E Odisseu ia à casa famosa de Alcínoo muita coisa seu coração revolvia ele de pé antes de atingir o brônzeo portal Assim como o do sol ou da lua clarão havia 85 pela casa de alto pédireito do enérgico Alcínoo Paredes brônzeas estendiamse nas duas direções do umbral ao fundo e em torno cornija de lápislazúli douradas portas fechavam a sólida casa prateados batentes estavam de pé no brônzeo portal 90 prateado lintel sobre eles e a maçaneta era dourada Dourados e prateados cães havia de cada lado que Hefesto fizera com arguto discernimento para vigiarem a morada do enérgico Alcínoo sendo imortais e sem velhice por todos os dias 95 Lá poltronas havia apoiadas na parede nos dois lados do umbral ao fundo formação contínua onde mantos finos bemtecidos foram lançados obra de mulheres Lá os líderes dos feácios costumavam sentarse bebendo e comendo pois possuíam em abundância 100 Dourados mancebos sobre bases bemfeitas estavam de pé com tochas ardentes nas mãos à noite iluminando a casa para os convidados Cinquenta escravas havia em sua casa mulheres Umas moem em moinhos manuais grãos cor de maçã 105 outras tecem a trama e volteiam os fios na roca sentadas tais como as folhas do choupo altaneiro dos tecidos da fechada trama pinga fluido óleo Como os feácios mais hábeis que todos os varões em guiar nau veloz sobre o mar assim as mulheres 110 na arte do tear sobremodo lhes deu Atena a técnica de trabalhos bem belos e juízo distinto Fora do pátio próximo às portas havia grande pomar de quatro medidas e cerca corria de ambos os lados Lá havia grandes árvores verdejantes 115 pereiras romãzeiras e macieiras frutoradiante doces figueiras e oliveiras verdejantes Delas nunca um fruto se perde ou falta inverno ou verão o ano inteiro não é perene o sopro de Zéfiro e faz uns crescer e outros madurar 120 Pera após pera amadurece maçã após maçã uva após uva figo após figo Lá a sua vinha muitofruto está enraizada uma parte trecho ensolarado de solo plano é seca pelo sol e outras partes eles recolhem 125 e outras pisoteiam na frente há cachos lançando flor e outros escurecem aos poucos Lá canteiros arranjados junto à fileira mais externa têm plantas de todo o tipo cintilando o ano inteiro Dentro há duas fontes uma por todo o jardim 130 é distribuída outra sob o umbral do pátio se lança à alta casa donde os citadinos pegavam água tais na casa de Alcínoo os radiantes dons de deuses Lá parado admiravase o muitatenência divino Odisseu Mas depois de com tudo se admirar em seu ânimo 135 célere por sobre o umbral entrou na casa Encontrou os líderes e capitães dos feácios libando com cálices a Argifonte agudamirada a quem por último libavam ao lembrarse do repouso E ele cruzou o salão o muitatenência divino Odisseu 140 e junto densa bruma que em torno dele vertia Atena até alcançar Arete e o rei Alcínoo Em torno dos joelhos de Arete Odisseu lançou os braços e a bruma definida pela deusa foi dele afastada Eles se calaram pela casa ao ver o herói 145 espantados com a visão e Odisseu fez a súplica Arete filha do excelso Rompedor teu esposo e teus joelhos alcanço após muito aguentar e esses convivas deuses a eles deem fortuna durante suas vidas e cada um legue aos filhos 150 os bens no palácio e a honraria a que deu o povo Mas minha condução acelerai para eu chegar à pátria rápido pois longe dos meus há muito sofro misérias Após falar assim sentouse nas cinzas da lareira junto ao fogo e eles todos atentos se calaram 155 Bem depois tomou a palavra o ancião herói Donodenau que entre os varões feácios era o mais velho e em discursos superior com muito saber antigo Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Alcínoo isto não é o melhor nem conveniente 160 um estranho sentarse no chão nas cinzas da lareira esses aí aguardam teu discurso contidos Vamos o estranho em poltrona pinosdeprata faze sentar após erguêlo e aos arautos ordena que vinho misturem para a Zeus prazernoraio 165 libarmos ele que a respeitáveis suplicantes acompanha e que a governanta dê algo ao estranho para jantar Então quando isso ouviu o sacro ímpeto de Alcínoo tomou Odisseu pela mão o atilado variegadaastúcia ergueuo da lareira e indicoulhe resplendente poltrona 170 após fazer o filho se levantar Domapovo saúdaheróis sentado a seu lado e de quem mais gostava Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa 175 Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente e junto muitos petiscos oferecendo o que havia Ele bebia e comia o muitatenência divino Odisseu Nisso ao arauto falou o ímpeto de Alcínoo Mentenomar mistura na ânfora e distribui o vinho 180 a todos no salão para que a Zeus prazernoraio libemos ele que a respeitáveis suplicantes acompanha Assim falou e Mentenomar misturou vinho adoçajuízo e a todos distribuiu após verter as primícias nos cálices Mas depois de libar e beber quanto quis o ânimo 185 entre eles Alcínoo tomou a palavra e disse Atenção líderes e capitães dos feácios vou falar o que o ânimo me ordena no peito Agora após o banquete vade dormir de volta à casa e pela manhã após mais anciãos convocar 190 entreteremos o estranho no palácio e aos deuses faremos belos sacrifícios e depois também da condução lembraremos para o estranho livre de esforço e pena sob a nossa condução alcançar sua terra pátria rápido com alegria mesmo se é de bem longe 195 Que no percurso não sofra nenhum mal e desgraça antes de desembarcar em sua terra lá então sofrerá o que para ele o destino e as pesadas Fiandeiras com linho fiaram ao nascer quando a mãe o gerou Mas se algum dos imortais chegou do páramo 200 então outra coisa é isso que os deuses engenham Sempre no passado deuses apareciam vívidos para nós ao fazermos esplêndidas hecatombes e partilhavam do banquete sentados conosco E se um de nós viajante mesmo sozinho os topa 205 não se disfarçam pois deles somos próximos como os ciclopes e as tribos selvagens dos gigantes Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Alcínoo outra coisa deve ocupar teu juízo pois não me assemelho a imortais que do largo páramo dispõem 210 nem no porte nem no físico mas a humanos mortais De quem vós sabeis que demais suportaram agonia a esses homens em meus sofrimentos me igualaria Sim e ainda mais desgraças eu poderia enunciar todo o conjunto que devido aos deuses aguentei 215 Mas permitime acabar o jantar mesmo angustiado depois do hediondo estômago nada mais canalha existe e que faz com que seja lembrado à força até por alguém dilacerado no íntimo e aflito Assim também me aflijo no íntimo e ele sem cessar 220 ordename comer e beber e de tudo a mim faz esquecer tudo que sofri e exige que eu o encha Vós apressaivos quando a aurora surgir para me desembarcar desgraçado em minha pátria ainda que muito sofra que a vida se vá eu vendo 225 meus bens escravos e a enorme casa de alto pédireito Assim falou e todos aprovavam e incitavam o rei a conduzir o estranho pois falara com adequação E depois de libar e beber quanto quis o ânimo os outros para se deitar voltaram a suas casas 230 e ele no salão ficou o divino Odisseu e junto dele Arete e o deiforme Alcínoo sentados e criados retiravam os apetrechos do jantar Entre eles Arete alvosbraços iniciou os discursos pois reconhecera manto e túnica ao ver as vestes 235 belas que ela própria tecera com criadas mulheres falando dirigiulhe palavras plumadas Estranho isto primeiro eu mesma te perguntarei quem és tua origem Quem te deu essas vestes Não dizias que após vagar pelo mar aqui chegaste 240 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia É difícil rainha fazer um relato contínuo pois muitas agruras me deram os deuses celestes mas isto eu te direi o que me inqueres e questionas Uma ilha Ogígia longe no mar encontrase 245 Lá a filha de Atlas a ardilosa Calipso mora a belastranças fera deusa ninguém a ela se une nenhum deus nenhum homem mortal Mas a mim desgraçado divindade guiou a seu lar sozinho pois minha nau veloz com raio cintilante 250 Zeus atingiu e despedaçou no meio do mar vinoso Lá pereceram todos os outros nobres companheiros mas eu após abraçar a quilha da nau ambicurva nove dias fui levado no décimo a mim na noite negra deuses achegaram da ilha de Ogígia onde Calipso 255 belastranças mora fera deusa que após me apanhar acolheume gentil me alimentava e dizia que me faria imortal e sem velhice por todos os dias Mas a mim nunca meu ânimo no peito persuadiu Lá fiquei sete anos contínuos e as vestes sempre 260 com lágrima molhava as imortais que me deu Calipso Mas quando chegou em seu curso o oitavo ano então ordenoume que retornasse incitada por anúncio de Zeus ou a ideia dela mudou Envioume sobre balsa muitacorda e deume muito 265 comida e doce vinho vestiume com vestes imortais e fez que a brisa soprasse tranquila e tépida Dezessete dias naveguei cruzando o mar e no décimo oitavo surgiram montes umbrosos da vossa terra e rejubilou meu caro coração 270 o do desventurado eu ainda devia juntarme à agonia muita que sobre mim instigou Posêidon tremesolo Ele impelindo ventos contra mim bloqueou o curso agitou o mar extraordinário e de modo algum a onda permitiume gemendo sem cessar ser levado na balsa 275 A ela depois uma rajada destroçou já eu nadando cortei esse abismo até que da terra vossa vento e água levando achegaramme Lá ao tentar sair onda teria me forçado contra a costa lançandome às grandes rochas num ponto infeliz 280 Mas recuando nadei de volta até chegar a um rio que me pareceu ponto excelente livre de rochas e havia proteção contra o vento Já fora caí e recompus meu fôlego e a noite divina chegou eu tendo saído para longe do rio 285 caído de Zeus adormeci nas moitas e em torno folhas amontoei E um deus vertia sono semfim Lá entre as folhas agastado em meu coração dormi a noite toda durante a aurora e o meio do dia O sol mergulhou e o doce sono deixoume 290 criadas de tua filha na praia percebi brincando entre as quais ela semelhante a deusas A ela supliquei e não deixou de acertar ideia nobre como não esperarias que alguém mais jovem ao toparte fizesse sim os mais jovens são sempre insensatos 295 Ela deume alimento suficiente e fulgente vinho banhoume no rio e deume essas vestes O que te contei apesar de angustiado é a verdade A ele então Alcínoo respondeu e disse Estranho não foi apropriado isso que pensou 300 minha filha pois a ti com criadas mulheres não guiou à nossa casa e tu suplicaste primeiro a ela Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Herói não censures por mim a moça impecável ela de fato ordenou que eu seguisse com as criadas 305 mas fui eu quem não quis com medo da reprovação para teu ânimo não se ressentir com a visão somos rancorosos as tribos de homens sobre a terra A ele então Alcínoo respondeu e disse Estranho meu caro coração no peito não é do tipo 310 a ter raiva à toa tudo que é moderado é melhor Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo que alguém sendo assim como és e pensando como eu tenha a minha filha e eu o chame de meu genro aqui ficando uma casa e riquezas eu te daria 315 se quisesses ficar contra a vontade não te conteria feácio algum isso não seria caro a Zeus pai Eu mesmo marco essa condução quero que saibas para amanhã tu o tempo todo dominado pelo sono dormirás e eles remarão na calmaria até que chegues 320 a tua pátria em casa ao lugar que te é caro ainda que seja bem mais distante que a Eubeia dizem que fica longe ao máximo os que a viram do nosso povo quando ao loiro Radamanto conduziram para que visitasse Titiô filho de Terra 325 Foram até lá e sem fadiga chegaram ao alvo e no mesmo dia retornaram de volta para casa Conhecerás tu mesmo em teu juízo quão excelentes são minhas naus e os moços no jogar água com o remo Isso dito alegrouse o muitatenência divino Odisseu 330 Rezando eis que falou dirigiuselhe e nomeouo Zeus pai tomara que tudo quanto falou complete Alcínoo dele sobre o solo fértil a fama seria inextinguível e eu chegaria à pátria Assim falavam essas coisas entre si 335 e Arete alvosbraços ordenou às criadas que postassem camas sob a colunata belas mantas púrpura lançassem em cima estendessem lençóis e por último pusessem capas de lã para que se cobrisse E elas saíram do salão com tocha nas mãos 340 mas após aprontar a cama compacta afobadas incitaram Odisseu com palavras a achegarse Mexete ao leito estranho a cama está pronta para ti Assim falavam e ficou feliz com a ideia de repousar Assim ele lá dormia o muitatenência divino Odisseu 345 num leito perfurado sob a colunata ressoante e Alcínoo deitouse no interior da alta casa e ao lado a senhora esposa preparou cama e lençóis Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos saiu do leito o sacro ímpeto de Alcínoo e o divinal levantouse Odisseu arrasaurbe A eles conduziu o sacro ímpeto de Alcínoo 5 à ágora dos feácios construída ao lado de seus navios Após chegar sentaramse nas pedras polidas vizinhos e ela percorreu a cidade Palas Atena assemelhada ao arauto do atilado Alcínoo tramando o retorno do enérgico Odisseu 10 e de pé ao lado de cada herói enunciava o discurso Vamos lá líderes e capitães dos feácios ide à ágora para vos informardes do estranho que há pouco chegou à casa do atilado Alcínoo após vagar no mar no porte semelhante a imortais 15 Falou assim e incitou o ímpeto e ânimo de cada um Rápido ágora e assentos encheramse de mortais reunidos muitos então viram e contemplaram o filho atilado de Laerte Sim nele Atena verteu prodigiosa graça na cabeça e nos ombros 20 e fêlo maior e mais encorpado a quem o visse para que se tornasse caro a todos os feácios assombroso e respeitável e cumprisse as provas muitas nas quais os feácios testaram Odisseu Então após estarem reunidos todos juntos 25 entre eles Alcínoo tomou a palavra e disse Atenção líderes e capitães dos feácios vou falar o que o ânimo me ordena no peito Este estranho não sei quem é vagava e me alcançou ou vindo dos homens do levante ou do poente 30 condução tenta apressar e suplica que seja certa Que nós como no passado apressemos sua condução com efeito ninguém que alcança minha casa espera muito tempo aflito por causa de condução Vamos puxemos até o divino mar negra nau 35 virgem e que moços cinquenta e dois escolhamse entre o povo os que soem ser os melhores Após vós todos terdes prendido nos toletes os remos desembarcai então ocupaivos com rápido banquete vindo até nós eu vos receberei a todos bem 40 Aos moços é isso que peço mas os outros vós reis portacetro até minha bela morada ide para que no palácio ao estranho acolhamos que ninguém recuse Fazei chamar o divino cantor Demódoco a ele a divindade sobremodo deu canto 45 para deleitar por onde o ânimo o incita a cantar Após falar assim foi na frente e eles o seguiam os portacetro e o arauto foi atrás do divino cantor E os moços selecionados cinquenta e dois foram como ordenara à orla do mar ruidoso 50 Mas após descerem até a nau e o mar puxaram negra nau ao mar profundo mastro e vela colocaram na negra nau e aprontaram os remos nas correias de couro tudo em ordem e desfraldaram a vela branca 55 Da praia para a água a posicionaram e então rumaram à grande casa do atilado Alcínoo Colunata pátio e casa estavam cheios de varões reunidos sim eram muitos jovens e velhos Para eles Alcínoo fez abater doze ovelhas e cabras 60 oito porcos dentebranco e dois lunados bois esfolaram e prepararamnos para amável banquete E o arauto achegouse conduzindo o leal cantor a quem demais a Musa amou e lhe deu um bem e um mal privouo dos olhos e deulhe doce canto 65 Mentenomar pôslhe poltrona pinosdeprata no meio dos convivas apoiandoa contra enorme pilar em um gancho pendurou a lira aguda aí sobre sua cabeça e indicou como pegar com as mãos o arauto ao lado pôs cesta e bela mesa 70 ao lado taça de vinho para beber quando o ânimo pedisse E os outross esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida a Musa atiçou o cantor a cantar famosos feitos de varões porções do enredo cuja fama então ao largo páramo chegava 75 a disputa entre Odisseu e Aquiles filho de Peleu como então pelejaram no rico banquete dos deuses com palavras assombrosas o rei de varões Agamêmnon alegravase na mente pois os melhores aqueus brigavam Assim de fato anunciaralhe no oráculo Febo Apolo 80 na mui divina Pito quando cruzou o umbral de pedra atrás do oráculo Então rodava o início da desgraça para troianos e dânaos mediante os planos do grande Zeus Isso cantava o cantor muito glorioso e Odisseu pegou o grande manto púrpura com as mãos robustas 85 por sobre a cabeça conchegouo e encobriu a bela face tinha vergonha dos feácios por chorar sob as celhas Quando o divino cantor parava de cantar enxugava as lágrimas puxava o manto da cabeça e tomando o cálice duplaalça libava aos deuses 90 mas quando recomeçava e instigavamno a cantar os nobres feácios pois deleitavamse com as palavras de novo Odisseu encobria a cabeça e lamentavase Todos os outros não notavam que chorava e Alcínoo foi o único que o observou e percebeu 95 sentado perto e ouviu seus profundos gemidos De pronto entre os feácios navegadores falou Atenção líderes e capitães dos feácios já saciamos o ânimo com o banquete compartilhado e a lira essa parceira do banquete abundante 100 agora vamos sair e experimentar as provas todas para que o estranho narre a quem lhe é caro após retornar à casa quanto superamos os outros no boxe na luta nos saltos e com os pés Após falar assim foi na frente e eles o seguiam 105 Em um gancho pendurou a lira aguda tomou a mão de Demódoco e levouo do salão o arauto guiouo pela via que tomaram os outros os melhores feácios para admirar as provas Foram à ágora e a eles juntouse grande multidão 110 miríades e jovens levantaramse muitos e nobres Ergueramse Topodanau Velosnomar Remador Barqueiro Popeiro Pertomar Remeiro Marinheiro Proeiro Velocista Embarquenau e Cercomar filho de Muitanau esse de Carpinteiro 115 e também Amplomar semelhante a Ares destróigente filho de Chumbodanau e o melhor em beleza e porte entre todos os feácios após o impecável Domapovo Levantaramse três filhos do impecável Alcínoo Domapovo Marinho e o excelso Nauglorioso 120 E eles por primeiro puseramse à prova com os pés Sua corrida estendiase a partir da marca todos juntos céleres voaram erguendo poeira do plaino Bem superior no correr foi o impecável Nauglorioso tanto quanto fazem duas mulas no pousio arado 125 tão adiantado alcançou o povo e o resto atrás Outros na luta pungente se puseram à prova nessa então Amplomar superou todos os nobres No salto Cercomar a todos ultrapassou no disco então bem melhor que todos foi Remador 130 e no boxe Domapovo valoroso filho de Alcínoo Após no juízo deleitaremse todos com as provas entre eles falou Domapovo filho de Alcínoo Vamos amigos perguntemos ao estranho se uma prova aprendeu e conhece No físico ao menos não é vil 135 nas coxas panturrilhas ambos os braços em cima robusto pescoço e grande vigor de juventude não carece mas foi alquebrado por muitos males Eu não digo haver outro mal maior que o mar para debilitar um varão ainda que seja bem forte 140 A ele então Amplomar respondeu e disse Domapovo essa palavra falaste com adequação Tu mesmo agora o desafia enunciando um discurso Quando isso ouviu o valoroso filho de Alcínoo foi postarse no centro e a Odisseu dirigiuse 145 Vai lá também tu pai estrangeiro tenta as provas se talvez uma aprendeste pareces conhecer provas Sim nada traz fama maior ao varão ele vivo que o que executa com os pés e suas mãos Vai tenta dispersa agruras para longe do ânimo 150 não mais será postergada a rota mas para ti nau já foi puxada e há companheiros a postos Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Domapovo por que isso me impões melindrandome Agruras há em meu juízo bem mais que provas 155 eu que antes muito sofri e muito aguentei e agora em vossa assembleia precisando retornar estou sentado suplicando ao rei e a todo o povo E a ele Amplomar respondeu e provocouo de frente Sim estranho eu nem te assemelho a herói versado 160 em provas tais como há muitas entre os homens mas a quem amiúde com nau de muitos calços chefe de marinheiros esses que são mercadores fica atento à carga e de olho em mercadorias e no lucro cobiçado não pareces um atleta 165 Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Estranho não falaste bem varão iníquo pareces Certo os deuses não conferem graças a todo varão nem físico nem juízo nem eloquência De fato um na aparência é varão mais débil 170 mas deus coroa suas palavras com formosura outros deleitamse em mirálo e ele fala de forma segura com amável respeito destacase na aglomeração e ao se deslocar na urbe miramno como a um deus Já outro quanto à aparência é semelhante a imortais 175 mas a graça envolvente não coroa suas palavras assim também tua aparência é proeminente e outra nem um deus a faria mas na mente não és sagaz Perturbaste meu ânimo no caro peito falando sem elegância Eu não desconheço provas 180 como tu discursas mas entre os primeiros penso ter estado ao confiar na juventude e em meus braços Agora estou preso a miséria e aflições a muito resisti cruzando guerras de homens e ondas pungentes Mas mesmo após muitos males sofrer à prova me porei 185 insultoso foi o discurso e me incitaste ao falar Falou e com capa e tudo pulou e tomou o disco maior maciço mais pesado e nem um pouco menor que o tipo com o qual os feácios disputaram entre si Após girálo lançouo de sua mão robusta 190 A pedra zuniu e eles se encolheram contra o chão feácios longoremo varões famosos pelas naus com o lanço da pedra Sobrepujou outras marcas veloz correndo de sua mão Atena fixou o limite e no corpo de um varão dirigiuselhe e nomeouo 195 Também um cego estranho distinguiria essa marca com o toque pois misturada não está com o resto a primeira entre todas e tu fica confiante na prova nenhum feácio a alcançará nem lançará mais longe Isso dito jubilou o muitatenência divino Odisseu 200 alegre ao notar companheiro afável na pista E então mais leve entre os feácios falou Essa aí agora alcançai jovens logo outra depois lançarei a tal distância penso eu ou ainda maior A quem quer que coração e ânimo impelir 205 que venha pôrse à prova pois me zangastes demais no boxe na luta ou até com os pés não me oponho qualquer feácio salvo o próprio Domapovo Pois ele me hospeda quem combateria um amigo Insensato claro é aquele varão um nada 210 quem resolve disputar provas com quem o hospeda em cidade estrangeira destituise de tudo Quanto ao resto nenhum rejeito nem menosprezo mas quero conhecêlos e medirme de frente Em tudo não sou ruim em todas as provas dos homens 215 Sei bem manusear o arco todo polido seria o primeiro a flechar um varão na turba de inimigos ainda que vários muitos companheiros estivessem parados próximo a flechar heróis Só Filoctetes superavame com o arco 220 na terra troiana quando nós aqueus disparávamos Quanto aos outros afirmo ser muito melhor que eles tantos mortais quanto hoje sobre a terra comem pão Com os varões de antanho não quererei disputar nem com Héracles nem com Eurito da Oicália 225 esses sim até com imortais disputavam no arco e flecha Assim logo morreu o grande Eurito e não chegou à velhice em seu palácio pois zangado Apolo matouo porque o desafiara a atirar com o arco Lança atiro tão longe quanto nenhum outro a flecha 230 Só temo que com os pés ultrapasseme um feácio pois de modo deveras ultrajante fui subjugado em meio a muitas ondas já que cuidados na nau não eram perenes por isso meus membros frouxos estão Assim falou e eles todos atentos se calavam 235 Somente Alcínoo respondendo lhe disse Estranho como não nos desagrada o que falas mas queres revelar a excelência que te segue encolerizado porque a ti esse varão erguido na pista provocou como mortal algum depreciaria tua excelência 240 todo que soubesse em seu juízo falar com acerto mas agora atenta minha palavra para também a outro herói mencionares quando em teu palácio te banqueteares com tua esposa e teus filhos lembrando a nossa excelência feitos que também a nós 245 Zeus confere sem parar desde o tempo dos pais Não somos impecáveis boxeadores nem lutadores mas com pés corremos rápido e com naus os melhores sempre nos são caros o banquete a lira as danças as vestes para trocar os banhos quentes e os leitos 250 Pois bem feácios que sois os melhores dançarinos folgai para que o estranho diga a quem lhe é caro após retornar à casa quanto superamos os outros na navegação nos pés na dança e no canto Para Demódoco alguém partindo logo a lira aguda 255 traga a que em algum lugar está em nossa casa Assim falou o teomórfico Alcínoo e o arauto saiu para trazer a côncava lira da casa do rei Do povo ergueramse organizadores seletos nove ao todo que tudo bem montavam nas pistas 260 alisaram a arena e aumentaram uma bela pista E o arauto aproximouse levando a lira aguda a Demódoco ele foi ao meio e ao redor moços púberes versados em dança estavam à espera E golpearam a pista divina com os pés Odisseu 265 contemplou o cintilar dos pés e admirouse no ânimo Então aquele dedilhando a lira entoou belo prelúdio acerca do amor entre Ares e Afrodite belagrinalda como na primeira vez uniramse na casa de Hefesto às ocultas presenteou à larga e aviltou cama e lençóis 270 do senhor Hefesto Presto veiolhe um mensageiro Sol que os percebera na união amorosa Hefesto quando ouviu o discurso aflitivo foi à ferraria ruminando males no fundo do juízo pôs sobre o cepo a grande bigorna e forjou laços 275 inquebráveis inafrouxáveis para lá ficarem imóveis Mas após montar zangado o ardil para Ares foi ao quarto onde ficava sua cama querida Em torno dos postes jogou laços abarcando todos os lados e muitos de cima caíam pendendo da vigamestra 280 leves teias de aranha que ninguém poderia ver nem os deuses ditosos montara algo bem ardiloso Mas após estender todo o ardil pela cama simulou ir a Lemnos cidade bemconstruída entre todas de longe sua terra mais cara 285 Cega vigia não mantinha Ares rédeadourada quando viu Hefesto artefamosa ir para longe dirigiuse à casa do bem famoso Hefesto almejando amor com Citereia belagrinalda Ela há pouco do pai muito possante o filho de Crono 290 chegara e sentarase e ele entrou na casa deulhe forte aperto de mão dirigiuselhe e nomeoua Ali querida deitados na cama deleitemonos Hefesto não está mais em casa mas já foi a Lemnos encontrar os cíntios línguaagreste 295 Assim falou e ela alegrouse com a ideia de repousar Subiram no leito e deitaramse em volta os laços artificiosos de Hefesto muitojuízo irromperam e não se podia mexer membro algum nem o erguer Então perceberam que não havia como fugir 300 E achegouse deles o bem famoso duascurvas depois de meiavolta antes de chegar em Lemnos pois Sol permanecia de vigia e avisaralhe E foi a sua casa agastado em seu coração Parado no pórtico zanga selvagem o atingiu 305 deu berro aterrorizante e gritou a todos os deuses Zeus pai e outros ditosos deuses semprevivos vinde cá para verdes feitos risíveis e intoleráveis como a mim zambo a filha de Zeus Afrodite sempre desonra e ama Ares infernal 310 pois ele é belo e tem o pé perfeito mas eu nasci fraco Para mim nenhum outro é responsável exceto os dois pais que não me deveriam ter gerado Mas vide onde os dois fazem amor deitados após subir em meu leito atormentome vendo 315 Não espero que se deitem assim nem por pouco tempo embora bem enamorados logo os dois não quererão estar dormindo Mas o ardil o laço os conterá até que o pai devolva na totalidade as dádivas que pus em suas mãos pela moça caradecadela 320 já que sua filha é bela mas não é pudica Assim falou e deuses reuniramse na casa chãobrônzeo veio Posêidon sustématerra veio o supercorredor Hermes e veio o senhor agedelonge Apolo Deusas mulheres por pudor ficaram todas em casa 325 Pararam no pórtico os deuses oferentes de bens e riso inextinguível irrompeu entre os deuses ditosos ao verem as artes de Hefesto muitojuízo E assim falavam fitando quem estava ao lado Ações vis não excelem o lento alcança o rápido 330 assim como Hefesto mesmo lento agarrou Ares Assim eles disso falavam entre si e a Hermes disse o filho de Zeus o senhor Apolo Hermes filho de Zeus condutor doador de bens eis que gostarias imobilizado por laços poderosos 335 de deitar na cama ao lado da dourada Afrodite A ele respondeu o condutor Argifonte Tomara isso ocorresse senhor Apolo alvejadelonge Que três vezes mais laços invencíveis me detivessem e vós me observásseis deuses e todas as deusas 340 mas eu deitaria junto à dourada Afrodite Assim falou e o riso irrompeu entre os deuses imortais Mas o riso não tomou Posêidon e pedia sem cessar a Hefesto obrasfamosas que Ares libertasse e falando dirigiulhe palavras plumadas 345 Liberteo e eu prometo que ele como ordenas vai te pagar tudo que se deve entre deuses imortais E a ele dirigiuse o bem famoso duascurvas De mim Posêidon sustématerra isso não peças reles é a garantia garantida em nome do reles 350 Como eu te prenderia entre os deuses imortais se Ares partisse após escapar do dever e do laço E a ele de novo dirigiuse Posêidon tremesolo Hefesto se Ares de fato após escapar do dever partir em fuga eu mesmo te pagarei isso 355 E a ele então respondeu o bem famoso duascurvas Não é possível nem convém rejeitar tua palavra Após falar assim o ímpeto de Hefesto soltou o laço E quando os dois foram soltos do laço bem forte presto se foram ele pôsse em direção à Trácia 360 e ela alcançou Chipre Afrodite amasorriso rumo a Pafos onde tinha santuário e altar fragrante Lá as Graças banharamna e untaram com óleo imortal o que cobre os deuses semprevivos e vestiramna com vestes desejáveis assombro à visão 365 Isso o cantor bem famoso cantava e Odisseu deleitavase no espírito ao ouvilo ele e o restante dos feácios longoremo varões famosos pelas naus E Alcínoo pediu que Marinho e Domapovo sozinhos dançassem pois deles ninguém era rival 370 Quando eles a linda bola nas mãos pegaram púrpura que lhes fizera o atilado Polibo essa um lançava em direção às nuvens umbrosas curvado para trás e o outro da terra saltava para o alto e amparavaa fácil antes de atingir o chão com os pés 375 Mas após se porem à prova com a bola direto para cima então os dois dançaram sobre a terra nutremuitos revezando amiúde os outros moços batiam as mãos parados na pista e com isso era grande o barulho Então a Alcínoo falou o divino Odisseu 380 Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos prometeste que os dançarinos são os melhores e assim se verificou reverência me toma ao mirálos Isso dito jubilou o sacro ímpeto de Alcínoo e de imediato falou entre os feácios navegadores 385 Atenção líderes e capitães dos feácios o estrangeiro pareceme deveras inteligente Vamos demolhe um regalo como é adequado Na cidade doze reis muito destacados têm poder como chefes e eu mesmo o décimo terceiro 390 cada um de vós para ele manto bemlavado túnica e uma medida de ouro valioso buscai Que logo tudo reunido tragamos para que com isso nas mãos alegre no ânimo o estranho vá ao jantar Que Amplomar com ele se reconcilie com palavras 395 e um dom pois uma palavra não falou com adequação Assim falou e todos os outros aprovavam e o incitavam e cada um despachou seu arauto para trazer os presentes A ele então Amplomar respondeu e disse Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos 400 portanto me reconciliarei com o estranho como pedes Vou lhe dar esta espada toda de bronze cujo punho é de prata e bainha de marfim recémtrabalhado a envolve para ele será de muita valia Após falar pôs nas mãos a espada pinosdeprata 405 e continuando dirigiulhe palavras plumadas Sê feliz pai estrangeiro se foi falada uma palavra fera que rajadas de vento rápido a agarrem e levem Ver a esposa e a pátria alcançar que deuses isso a ti concedam pois longe dos teus há muito sofres desgraças 410 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Também tu amigo sê bem feliz e os deuses te deem fortuna Que nunca no futuro da espada que deste tenhas saudade pois nos reconciliamos por meio de presente e palavras Falou e em torno dos ombros pôs a espada pinosdeprata 415 O sol mergulhou e gloriosos dons eramlhe trazidos Ilustres arautos os levavam à casa de Alcínoo após recebêlos os filhos do impecável Alcínoo junto à mãe respeitável puseram os belos presentes Aos homens conduziu o sacro ímpeto de Alcínoo 420 e após chegar sentaramse em altas poltronas Então a Arete dirigiuse o ímpeto de Alcínoo Aqui mulher traze bem destacado baú o melhor dentro põe manto bemlavado e túnica tu mesma No fogo esquentai um caldeirão e aqueceilhe água 425 para que banhado e tendo visto todos os bem dispostos dons esses que os impecáveis feácios cá trouxeram com o banquete se deleite ouvindo o canto do aedo E a ele eu ofertarei essa minha bela taça de ouro para que de mim se lembrando todos os dias 430 libe no palácio a Zeus e aos outros deuses Assim falou e Arete entre as servas pediu que pusessem grande trípode no fogo rápido A trípode para o banho puseram sobre o fogo ardente e dentro vertiam água e abaixo queimavam madeira 435 O fogo rodeava o ventre da trípode e a água aquecia ao estrangeiro Arete trazia do quarto muito belo baú e nele punha os magníficos dons vestes e ouro que os feácios lhe deram nele ela mesma colocou um manto e bela túnica 440 e falando dirigiulhe palavras plumadas Vê logo a tampa e célere em cima dá um nó para que ninguém te cause prejuízo na viagem quando dormires doce sono indo na negra nau Ao ouvir isso o muitatenência divino Odisseu 445 logo a tampa encaixou e célere em cima deu um nó variegado que um dia lhe ensinara a senhora Circe De pronto a governanta pediulhe que se banhasse entrando na banheira feliz no ânimo ele viu a água quente já que amiúde não recebia cuidados 450 desde que deixara a morada de Calipso belajuba antes fora cuidado sem cessar como um deus Após as escravas o banharem e untarem com óleo lançaram em torno dele bela capa e túnica e fora da banheira até aos varões bebevinho 455 foi Nausícaa cuja beleza provinha de deuses de pé ao lado de pilar do teto sólida construção admirou Odisseu ao vêlo com os olhos e falando dirigiulhe palavras plumadas Sê feliz estranho e que também um dia na pátria 460 de mim te lembres a primeira a quem deves o resgate Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Nausícaa filha do enérgico Alcínoo que assim agora fixe Zeus ressoante marido de Hera voltar para casa e ver o dia de retorno 465 então a ti também lá rezarei como a um deus sempre todos os dias pois tu me deste a vida moça Falou e foi sentar na poltrona junto ao rei Alcínoo Eles já distribuíam porções e misturavam o vinho E o arauto achegouse conduzindo o leal cantor 470 Demódoco honrado pelo povo eis que o sentou em meio aos convivas apoiandoo contra enorme pilar Então ao arauto dirigiuse Odisseu muitaastúcia após cortar um naco do lombo do qual restou grande parte um porco dentebranco e farta banha havia em torno 475 Arauto vamos dá essa carne para que ele a coma a Demódoco e eu o saudarei embora angustiado para todos os homens sobreaterra os cantores têm porção de honra e respeito pois seus enredos a Musa ensina e ama a raça dos cantores 480 Assim falou e o arauto levandoa pôs nas mãos do herói Demódoco que a aceitou e alegrouse no ânimo E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida então a Demódoco falou Odisseu muitaastúcia 485 Demódoco eu te louvo como a nenhum mortal ou a Musa ensinoute a filha de Zeus ou Apolo cantas com muita elegância a sorte dos aqueus quanto fizeram sofreram e aguentaram os aqueus como se lá tivesses estado ou de outrem escutado 490 Pois bem passa adiante e canta a arte do cavalo o de madeira que Epeu produziu com Atena ardil que à acrópole conduziu o divino Odisseu após enchêlo de varões que Ílion aniquilaram Se a mim essas coisas com adequação contares 495 logo a todos os homens também discursarei que o deus benevolente conferiute inspirado canto Isso dito ele instigado pela deusa começava e exibia o canto tomando o trecho onde eles após em naus bomconvés embarcar singravam tendo lançado fogo nas tendas 500 os argivos e outros já rodeavam o bem famoso Odisseu sentados na ágora dos troianos encobertos no cavalo pois os próprios troianos puxaramno à acrópole Ele estava nessa posição e parolavam muito e sem ordem sentados a sua volta E três intenções lhes agradavam 505 ou trespassar a oca madeira com bronze impiedoso ou lançálo das pedras após empurrálo ao topo ou deixálo grande dom propiciador de deuses E foi assim de fato que depois iria cumprirse o destino era a ruína quando a urbe encobrisse 510 grande cavalo de madeira onde sentados todos os melhores argivos estivessem levando matança e perdição aos troianos Cantava como os filhos dos aqueus saquearam a urbe despejados do cavalo após da oca tocaia sair Cantavaos devastando a íngreme cidade por todo lado 515 e Odisseu rumo à morada de Deífobo indo semelhante a Ares com o excelso Menelau Disse que lá ousou e sofreu o mais terrível combate e então venceu graças à animosa Atena Isso o cantor bem famoso cantava e Odisseu 520 derretiase e lágrimas molhavam sob as pálpebras a face Como a mulher cai sobre o caro marido e o chora o qual na frente de sua cidade e do povo caiu tentando afastar para urbe e filhos o dia impiedoso a ele morrendo e convulsionandose ela vê 525 e o abraça e ulula com agudos Mas aqueles por trás golpeandoa com lanças nas costas e ombros levamna como escrava vida de pena e agonia e com a dor mais lamentável soçobra sua face assim Odisseu sob as celhas vertia lágrimas lamentáveis 530 Ninguém mais notou que derramava lágrimas Alcínoo foi o único que o observou e percebeu sentado perto dele e ouviu seus profundos gemidos Logo falou entre os feácios navegadores Atenção líderes e capitães dos feácios 535 Que Demódoco ponha de lado a lira aguda seu canto não mais alegrando a todos Desde que no jantar ergueuse o divino cantor desde então nunca cessou o agonizante choro o estranho grande tormento envolve seu juízo 540 Ponha de lado e por igual nos deleitaremos todos anfitriões e hóspede pois bem mais belo será assim por causa do hóspede respeitável isto foi arranjado condução e amados dons que amigos lhe damos O hóspede e o suplicante valem como irmão 545 ao varão que alcança discernimento mesmo leve Assim também tu não escondas com ideias ladinas o que te indagar é mais belo que tu fales Dize teu nome como lá te chamavam mãe e pai e os outros que na cidade e nas cercanias habitam 550 Entre os homens ninguém é de todo sem nome nem o vil nem o nobre após de primeiro nascer mas um nome os genitores a todo que geram atribuem Digame tua terra o povo e a cidade para que lá te levem mirando com o juízo as naus 555 De fato não há timoneiros entre os feácios nem lemes existem que outras naus possuem elas conhecem os pensamentos e o juízo dos varões e de todos conhecem as cidades e os campos férteis dos homens e rápido cruzam o abismo do mar 560 encobertas em bruma e nuvens e nunca têm medo de dano sofrer ou de ser destruídas Mas isto um dia eu ouvi dizer meu pai Nauveloz falava que Posêidon se irritaria conosco pois somos seguros condutores de todos 565 Disse que um dia a engenhosa nau de varões feácios voltando da condução sobre o mar embaçado golpearia e com grande morro encobriria nossa urbe Assim falava o ancião e isso o deus pode completar ou deixar incompleto como for caro a seu ânimo 570 Mas vamos dizeme isto e conta com precisão para onde vagaste que regiões de homens atingiste e que habitantes e urbes boas para morar os que são cruéis selvagens e não civilizados e os amigos de hóspedes com mente que teme o deus 575 Fala por que choras e te lamentas dentro no ânimo ao ouvir o destino dos argivos dânaos e de Ílion Isso deuses arranjaram e destinaram a ruína aos homens para que fosse canto aos vindouros Acaso também morreu diante de Troia parente teu 580 nobre um genro ou sogro Eles são os mais próximos após os de sangue os da própria família Ou um varão companheiro sabedor do que apraz nobre De fato não é pior que um irmão quem sendo companheiro sabe o que é inteligente Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos eis algo belo ouvir um aedo deste feitio semelhante a deuses na voz humana 5 Não há eu afirmo feito mais agradável que o gáudio a dominar todo o povo e na casa convivas prestam atenção ao cantor sentados em ordem e ao lado abundam as mesas em pão e carne e vinho tirando da ânfora 10 traz o escanção e entorna nos cálices isso em meu juízo parece ser o mais belo E teu ânimo de minhas tristes agruras inclinase a indagar para ainda mais aflito eu gemer O que então primeiro o quê por último contarei 15 Muitas agruras deramme deuses celestes Agora o nome enunciarei primeiro para vós também o saberdes e eu se escapar do dia impiedoso vosso aliado ser embora longe habitando Sou Odisseu filho de Laerte que por ardis por todos 20 os homens sou conhecido minha fama o páramo atinge Habito a bemavistada Ítaca nela há um monte Nériton folhasfarfalhantes saliente perto muitas ilhas encontramse próximas umas das outras Dulíquion Same e a matosa Zacintos 25 Ela própria baixa jaz no mar e é a última rumo às trevas e as outras separadas à aurora e ao sol bruta mas bela nutremoços Eu de forma alguma consigo ver algo mais doce que a terra da gente Sim lá me detinha Calipso deusa divina 30 na cava gruta almejando que fosse seu esposo igualmente Circe me deteve em seu palácio a ardilosa de Aiaie almejando que fosse seu esposo Mas a mim nunca meu ânimo no peito persuadiu Assim nada mais doce que a terra da gente ou os pais 35 há ainda que alguém em terra estrangeira longe habite gorda propriedade afastado dos pais Vamos que também meu retorno muitaagrura eu narre o que Zeus me enviou quando eu voltava de Troia Levandome de Ílion o vento achegoume dos cícones 40 de Ismaros lá eu saqueei a cidade e os matei Da cidade tendo tomado esposas e muitas posses dividimos para eu ninguém deixar sem sua parte Então pedi que recuássemos com pé ágil e esses grandes tolos não obedeceram 45 Lá bebiam muito vinho junto à costa abatiam muitas ovelhas e lunadas vacas trôpegas Nisso os remanescentes cícones outros cícones chamaram esses que eram seus vizinhos muitos e melhores habitando no interior sabendo com carros 50 combater contra varões e se necessário a pé E vieram em número de folhas e flores na primavera na aurora então veio o sinistro destino de Zeus até nós desventurados para sofrermos muita aflição Postados combateram junto às naus velozes 55 atingindose uns aos outros com brônzeas lanças Durante a manhã enquanto crescia o sacro dia firmes resistimos a eles embora em maior número quando Sol se curvou rumo à hora de soltar os bois então os cícones subjugandoos vergaram os aqueus 60 Seis de cada nau companheiros belasgrevas pereceram o restante escapamos do quinhão da morte De lá navegamos para diante atormentados no coração voltando da morte após perder caros companheiros Mas não quis que as naus ambicurvas seguissem 65 sem três vezes gritarmos o nome dos pobres companheiros eles que pereceram no plaino mortos pelos cícones Zeus juntanuvens instigou vento bravio com tempestade prodigiosa e com nuvens encobriu terra e mar por igual e a noite desceu do céu 70 Elas então foram levadas de lado e suas velas a força do vento rasgou em três quatro pedaços Recolhemos às naus os trapos apavorados e remamos com avidez rumo à costa Lá por duas noites e dois dias sempre sem parar 75 ficamos consumindo o ânimo em fadiga e aflições Mas quando trouxe o terceiro dia Aurora belastranças após erguer os mastros e içar as brancas velas sentamos e vento e timoneiros as dirigiam E agora ileso teria chegado à terra pátria 80 mas ao tentar dobrar o cabo Maleia ondas corrente e Bóreas desviaramme e vaguei para longe de Citera De lá nove dias fui levado por ventos ruinosos sobre o mar piscoso mas no décimo desembarcamos na terra dos lotófagos que comem alimento floral 85 Lá fomos para terra firme e tiramos a água e os companheiros logo jantaram junto às naus velozes Mas depois de consumirmos comida e bebida então pedi a companheiros que fossem pesquisar quem seriam os varões que sobre a terra comem pão 90 após dois escolher e um terceiro arauto enviar com eles Eles logo após partir juntaramse a varões lotófagos Pois os lotófagos não armaram o fim dos companheiros nossos mas deramlhes lótus como alimento Todo aquele que comesse o fruto meloso do lótus 95 não desejava servir de mensageiro nem retornar mas preferia lá mesmo com os varões lotófagos comendo lótus permanecer e esquecer o retorno A eles que choravam conduzi às naus à força e nas cavas naus empurrandoos sob os bancos prendi 100 e aos outros ordenei leais companheiros que sem demora embarcassem nas rápidas naus para ninguém do lótus comer e do retorno esquecer Eles logo embarcaram e sentaram junto aos calços e alinhados golpeavam o mar cinzento com remos 105 De lá navegamos para diante atormentados no coração E à terra dos ciclopes soberbos desregrados chegamos eles que confiantes nos deuses imortais não plantam árvores com as mãos nem aram mas sem semear nem arar isso tudo germina 110 trigo cevada e videiras que produzem vinho de grandes uvas que a chuva de Zeus lhes fomenta Eles não têm assembleias decisórias nem normas mas habitam os cumes de montes elevados em cavas grutas e cada um impõe normas 115 sobre filhos e mulheres e não cuidam uns dos outros E pequena ilha lá se espraia à margem do porto nem perto nem longe da terra dos ciclopes matosa nela há cabras inumeráveis selvagens movimento de homens não as afasta 120 nem caçadores a frequentam os que no mato sofrem agonias percorrendo os picos dos montes Eis que não é coberta por rebanhos nem lavouras mas ela sem que se semeie e are todos os dias está privada de homens mas nutre cabras que balem 125 Pois não há junto aos ciclopes naus facevermelha nem varões construtores de naus lá há que fariam naus bomconvés capazes de tudo realizar indo às cidades dos homens tantas vezes quanto os varões uns até os outros com naus cruzam o mar 130 para eles também a ilha tornariam habitável De modo algum é ruim e tudo produziria na estação Nela há prados junto à costa do mar cinzento úmidos macios inesgotáveis seriam as videiras Nela há campos planos densas espigas de trigo sempre 135 colheriam na estação visto o muito chorume no solo Há porto seguro onde de cabos não se precisa nem lançar âncoras nem prender amarras mas tendo aportado ficar o tempo até o ânimo dos nautas os instigar e as brisas soprarem 140 E na cabeça do porto flui água radiante fonte de uma caverna em torno álamos cresceram Para lá navegávamos e um deus nos guiava pela noite sombria e nada se revelava à visão a bruma em torno era densa e nem a lua 145 do céu se mostrava encoberta por nuvens Com isso ninguém fitava a ilha com os olhos e nem grandes ondas rolando rumo à praia vimos antes de as naus bomconvés aportarem Estando as naus atracadas recolhemos todas as velas 150 e na rebentação do mar desembarcamos lá adormecemos e aguardamos a divina Aurora Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos admirados com a ilha por ela perambulamos Ninfas filhas de Zeus portaégide impeliam 155 cabras montesas para o almoço dos companheiros Rápido arcos curvos e dardos com longo soquete pegamos das naus e arranjados em grupos de três atiramos e deus logo nos deu bichos arrebatadores Doze naus me seguiam e a cada uma 160 nove cabras couberam só para mim foram dez Então assim o dia inteiro até o pôr do sol ficamos compartilhando carne semfim e doce vinho pois não se consumira o vinho tinto das naus mas sobrava muito cada um em ânforas duplaalça 165 havia posto após tomarmos a sacra urbe do cícones A terra dos ciclopes que perto viviam observávamos sua fumaça e o som de ovelhas e cabras Quando o sol mergulhou e vieram as trevas então repousamos na rebentação do mar 170 Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então eu realizando assembleia disse entre eles Os outros vós aqui ficai meus leais companheiros mas eu com minha nau e meus companheiros vou verificar esses homens de que tipo eles são 175 se desmedidos selvagens e não civilizados ou hospitaleiros com mente que teme o deus Dito isso embarquei e pedi aos companheiros que também embarcassem e os cabos soltassem Logo embarcaram e sentaramse junto aos calços 180 e alinhados golpeavam o mar cinzento com remos Mas ao chegarmos a esse lugar que perto ficava lá vimos no extremo uma caverna junto ao mar alta à sombra de loureiros Lá grande rebanho ovelhas e cabras pernoitava em torno cerca 185 alta se construíra com blocos de uma pedreira com grandes pinheiros e carvalhos altacopa Lá pernoitava um varão portentoso ele que o rebanho sozinho apascentava afastado aos outros não visitava mas longe vivendo normas ignorava 190 De fato era um assombro portentoso não parecia um varão comepão mas um pico matoso dos altos montes que surge só longe dos outros Então aos demais leais companheiros pedi que lá junto à nau ficassem e guardassem a nau 195 mas eu após escolher doze nobres companheiros fui Levava um odre de cabra com vinho escuro doce que me dera Máron filho de Euantes sacerdote de Apolo que zela por Ismaros porque junto com filho e esposa nós o protegemos 200 venerandoo pois habitava bosque arvorejado de Febo Apolo Deume presentes radiantes de ouro bem trabalhado sete pesos me deu me deu ânfora toda de prata e depois vinho em doze ânforas duplaalça ao todo verteu 205 doce puro bebida divina A esse ninguém conhecia nem escravo nem criado em sua casa só ele próprio a cara esposa e uma só governanta Quando alguém bebesse esse vinho tinto doce como mel enchia um cálice e doze medidas de água 210 vertia um doce aroma da ânfora emanava prodigioso então impossível seria absterse Eu trazia um grande odre cheio dele e também acepipes no alforje logo meu ânimo orgulhoso pensou que encontraria varão vestido com grande bravura 215 selvagem não conhecendo bem tradições nem normas Céleres nos dirigimos ao antro e dentro não o achamos mas apascentava no pasto gordos rebanhos Após chegar ao antro a tudo contemplamos cestos abarrotados de queijo cercados repletos 220 de ovelhas e cabritos separados por categorias encerrados à parte os mais velhos à parte medianos à parte filhotes Todas as vasilhas transbordavam de soro e baldes e tigelas fabricadas com as quais ordenhava Lá os companheiros suplicaramme para primeiro 225 pegar algum queijo e voltar e depois ligeiro até a nau veloz cabritos e ovelhas dos cercados arrastar e navegar pela água salgada mas não obedeci e teria sido muito mais vantajoso para poder vêlo esperando que me desse regalos 230 Pois após surgir não seria amável com os companheiros Tendo lá aceso o fogo sacrificamos e também nós comemos parte do queijo e dentro o esperamos sentados até voltar com ovelhas trazia ponderoso peso de madeira seca que seria usado para seu jantar 235 Lançandoo fora do antro produziu um estrondo nós com medo recuamos até o fundo do antro Ele à ampla gruta tocou o gordo rebanho tantas quantas ordenhava e os machos deixou fora carneiros e bodes no exterior atrás da alta cerca 240 Então ergueu e pôs na entrada grande rocha ponderosa a ela nem vinte e dois carros ótimos de quatro rodas solevariam do solo tal rochedo alcantilado colocou na entrada Sentado ordenhava ovelhas e cabras balentes 245 tudo com adequação e pôs um filhote sob cada uma Logo metade do branco leite separou para coalhar e pôs os coalhos após juntálos em cestos trançados metade lá colocou em barris para que estivesse disponível para ele beber em seu jantar 250 Mas após ocuparse de suas tarefas com zelo então ao acender o fogo viunos e perguntou Estranhos quem sois Donde navegastes por fluentes vias Acaso devido a um assunto ou levianos vagais tal qual piratas ao mar Esses vagam 255 arriscando suas vidas levando dano a gentes alheias Assim falou e nosso coração rachouse atemorizados com a voz pesada e o portento em si Mesmo assim com palavras respondendo disselhe Nós aqueus vindos de Troia vagamos longe do curso 260 devido a todos os ventos pelo grande abismo de mar e ansiando ir para casa por outra rota outros percursos viemos assim talvez Zeus quis armar um plano Tropa de Agamêmnon filho de Atreu proclamamos ser desse cuja fama é agora a maior sob o páramo 265 devastou grande cidade e tropas dilacerou muitas Nós porém chegando a esses teus joelhos nos dirigimos esperando nos hospedares bem ou mesmo dares um regalo o que é costume entre hóspedes Mas respeita os deuses poderoso somos teus suplicantes 270 Zeus é o vingador de suplicantes e hóspedes o doshóspedes que respeitáveis hóspedes acompanha Assim falei e logo respondeu com impiedoso ânimo És tolo estrangeiro ou vieste de longe tu que me pedes aos deuses temer ou evitar 275 Os ciclopes não se preocupam com Zeus portaégide nem com deuses ditosos pois somos bem mais poderosos nem eu para evitar a braveza de Zeus a ti pouparia ou a teus companheiros se o ânimo não me pedisse Mas dizeme onde aportaste a nau engenhosa 280 algures no extremo ou perto preciso saber Assim falou testandome e eu bem arguto percebi respondendo disselhe com palavras ardilosas Minha nau sucumbiu a Posêidon tremesolo contra rochedo lançoua nos limites de vossa terra 285 levandoa rumo ao cabo vento trouxea do mar Mas eu com esses aí escapei do abrupto fim Assim falei e não me respondeu com impiedoso ânimo mas de súbito sobre os companheiros estendeu as mãos e tendo dois agarrado como cachorrinhos ao chão 290 arrojouos miolos escorriam no chão e molhavam o solo Após cortálos em pedaços aprontou o jantar comiaos como leão da montanha e nada deixou vísceras carnes e ossos cheios de tutano Nós aos prantos erguemos os braços a Zeus 295 vendo o feito terrível e a impotência deteve o ânimo Mas quando o ciclope encheu o grande estômago após comer carne humana e depois beber leite puro deitouse no antro esticandose entre o rebanho Considerei no enérgico ânimo dele chegar 300 mais perto puxar a espada afiada da coxa e golpear no peito onde o diafragma segura o fígado após alcançar com a mão mas outro ânimo impediu Lá mesmo também nós nos finaríamos em abrupto fim da alta entrada não teríamos conseguido no braço 305 afastar a ponderosa pedra que lá depositara Assim gemendo aguardamos a divina Aurora Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos ele acendeu o fogo e ordenhou esplêndido rebanho tudo com adequação e sob cada fêmea deixou o filhote 310 Mas após ocuparse de suas tarefas com zelo de novo ele agarrou dois de nós e o almoço preparou Almoçou e para fora do antro tocou o gordo rebanho tendo removido fácil a grande rocha mas então de volta a pôs como se tampa pusesse na aljava 315 Com forte assobio ao monte levou o gordo rebanho o ciclope mas eu permaneci ruminando males esperando me vingar e Atena me dar o triunfo Este em meu ânimo mostrouse o plano melhor jazia junto ao cercado grande vara do ciclope 320 verde de oliveira podara a vara a fim de levála quando secasse Observando nós a julgamos grande tal mastro de negra nau vinteremos amplo navio mercante que cruza o grande abismo tal seu tamanho tal a espessura a quem a visse 325 Postado dela cortei um pau de uma braça passeio aos companheiros e pedi que o raspassem Eles deixaramno liso e eu afiei posicionado a ponta e logo o tomei e no fogo chamejante girei Condicioneio bem escondendoo sob o esterco 330 que grassava pela caverna em abundância Aos outros pedilhes que tirassem na sorte quem ousaria comigo após erguer a estaca friccionar seus olhos quando doce sono o alcançasse Foram destinados quem eu mesmo teria escolhido 335 quatro e eu mesmo o quinto entre eles me incluí E à noite voltou apascentando o rebanho belapelagem Logo à ampla gruta tocou o gordo rebanho todo ele besta alguma deixou dentro da alta cerca ou pensando algo ou como um deus ordenara 340 Então ergueu e pôs na entrada a grande rocha sentado ordenhava ovelhas e cabras balentes tudo com adequação e pôs um filhote sob cada uma Mas após ocuparse de suas tarefas com zelo de novo ele agarrou dois de nós e preparou o jantar 345 Então dirigime ao ciclope parado perto com uma cumbuca com vinho escuro nas mãos Ciclope aqui bebe vinho após comer carne humana para saberes que vinho é esse que continha a nossa nau era libação para ti caso a mim apiedandose 350 à casa conduzisses mas tua loucura é insuportável Implacável Como no futuro te alcançará algum outro dos muitos homens Pois com adequação não agiste Falei ele aceitou e tudo bebeu deleitouse ao extremo ao beber a doce bebida e pediume de novo a segunda vez 355 Sê gentil e dáme mais um e digame teu nome de pronto para eu te dar um regalo que te agradará De fato também aos ciclopes o solo fértil produz vinho de grandes uvas que a chuva de Zeus lhes fomenta Mas este é destilado da ambrosia e do néctar 360 Assim falou e eu de novo passeilhe fulgente vinho três vezes dei três vezes tudo bebeu com insensatez Mas quando o vinho circundou o juízo do ciclope então a ele me dirigi com palavras amáveis Ciclope perguntas meu nome famoso a ti eu 365 direi e tu dáme um regalo como prometeste Ninguém é meu nome Ninguém denominamme a mãe o pai e todos os outros companheiros Isso falei e ele logo respondeume com ânimo impiedoso Ninguém comerei por último dentre seus companheiros 370 os outros antes esse será teu regalo Falou e após reclinarse caiu de costas e então deitouse o encorpado pescoço de lado e dele o sono dominatudo apossouse a garganta regurgitava vinho e nacos de carne humana sob o peso do vinho vomitava 375 Então empurrei a estaca embaixo do monte de cinzas para esquentála com palavras a todos os companheiros encorajava para ninguém recuar de medo Mas quando a estaca de oliveira embora verde no fogo quase ia queimar e refulgia às maravilhas 380 então rápido retireia e em torno companheiros postaramse a divindade neles soprou grande coragem Eles após pegar a estaca de oliveira afiada na ponta empurraramna no olho e eu erguido sobre ela giravaa como um varão fura a madeira do navio 385 com furador e quem está abaixo o gira com correia tocandoo de cada lado e ele corre sempre sem parar assim da estaca pontaembrasa tomamos em seu olho a girávamos e sangue fluía em torno dela quente O calor chamuscou em volta toda sua pálpebra e a celha 390 e a pupila queimava suas raízes crepitavam com o fogo Como quando o ferreiro mergulha na água fria grande machado ou enxó ao querer enrijálos e alto eles sibilam este de novo é o vigor do aço assim chiava seu olho em torno da estaca de oliveira 395 e aterrorizante alto bradou e em torno a rocha rugia Nós com medo recuamos Mas ele a estaca puxou do olho salpicada de muito sangue Depois lançoua para longe com as mãos fora de si e alto chamava os ciclopes que nas cercanias 400 moravam em cavernas entre os picos ventosos Tendo ouvido o grito cada um acorria de um lado e de pé em torno da gruta indagavam o que o afligia O quê Polifemo tanto te perturba para assim gritares através da noite imortal e tirarnos do sono 405 Por certo ninguém quer teus rebanhos contra tua vontade Por certo ninguém tenta matarte com ardil ou violência A eles então do antro falou o poderoso Polifemo Amigos Ninguém tenta com ardil e não com violência Eles em resposta falavam as palavras plumadas 410 Se então ninguém a ti que estás sozinho violenta de modo algum é possível evitar a doença de Zeus mas tu faze uma prece ao pai o senhor Posêidon Assim falaram afastandose e meu coração sorriu pois meu nome enganouos e a impecável astúcia 415 E o ciclope gemendo e contorcendose em dores apalpandoa com as mãos afastou a pedra da entrada e ele na entrada sentouse após estender os braços esperando pegar um de nós entre as ovelhas que saíam Assim esperava em seu juízo que eu fosse tolo 420 E eu refletia como se daria a melhor solução se descobriria soltura da morte para mim e os demais companheiros todos os ardis um plano eu tramava lutando pela vida pois perto grande perigo havia Este em meu ânimo mostrouse o plano melhor 425 havia carneiros machos bemnutridos de espesso velo belos e grandes carregados de roxa lã eles quieto juntos eu prendia com vime bemtrançado sobre o qual dormia o portento ciclope que ignorava regras e tomava três a três o do meio levava um homem 430 os outros iam de cada lado salvando os companheiros Três carneiros levavam cada herói quanto a mim pois macho havia de longe o melhor de todo o rebanho agarreilhe as costas sob o ventre felpudo enroleime e me estendi com as mãos no prodigioso velo 435 enroscado sem cessar segureime com ânimo resistente Assim gemendo aguardamos a divina Aurora Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então ao pasto disparavam carneiros e bodes e as fêmeas baliam nos cercados não ordenhadas 440 os úberes a explodir O senhor torturado por dor sinistra apalpava o dorso de toda ovelha cada uma de pé isto ele tolo não percebeu que os homens se agarravam ao peito das ovelhas lanosas Último do rebanho o carneiro passava pela entrada 445 repleto de lã e de mim com pensamentos cerrados Após tateálo disselhe o forte Polifemo Carneirinho por que me vais assim pela gruta do rebanho o último Não costumas marchar atrás de ovelhas mas o primeiro entre todos pastas as tenras flores do pasto 450 a passos largos o primeiro a chegar às correntes dos rios o primeiro que almeja retornar ao curral à noite agora o derradeiro Por certo tu do senhor tens saudade do olho A ele cegou um homem vil com desprezíveis companheiros após subjugar o juízo com vinho 455 Ninguém que afirmo ainda não ter escapado do fim Se pudesses pensar como eu e ter linguagem para falar aonde aquele se esquiva de meu ímpeto então seus miolos pela caverna para lá e para cá ele golpeado se espalhariam no solo e meu coração 460 se aliviaria dos males que me deu esse nada Ninguém Falou assim e deixou o carneiro partir pela entrada Afastados um pouco da gruta e da cerca primeiro do carneiro me soltei e soltei os companheiros Ligeiro os carneiros e bodes péfino fartos em gordura 465 amiúde olhando em volta guiamos até à nau chegar nossos companheiros ficaram felizes conosco que escapamos da morte aos outros deploravam gemendo Mas não permiti com as celhas negava a cada um que chorassem e ordenei que rápido o rebanho belapelagem 470 se lançasse na nau e se navegasse pela salsa água Logo embarcaram sentaramse junto aos calços e alinhados golpeavam com remos o mar cinzento Mas quando estava à distância de um grito eu então me dirigi ao ciclope com provocações 475 Ciclope não seria de homem covarde que irias comer companheiros na cava gruta com violência brutal Por certo te atingiriam as ações sinistras implacável sem escrúpulos em comer hóspedes em tua casa por isso puniramte Zeus e outros deuses 480 Assim falei e ele enraiveceuse muito no coração lançou após rebentálo o pico de grande monte que tombou bem na frente da nau proacobalto por pouco e falhou em atingir a ponta do leme E o mar agitouse por causa da rocha que caiu 485 A nau para terra firme levava a onda em refluxo um vagalhão do altomar e fêla dirigirse à costa Mas eu com as mãos tendo pegado haste bem longa alavanquei a nau aos companheiros pedi incitandoos que tocassem os remos para escaparmos do dano 490 sinalizando com a cabeça peito para frente remaram Mas após percorrer no mar distância duas vezes maior então quis chamar o ciclope em volta com fala amável companheiros tentavam conterme de todos os lados Implacável Por que queres provocar o varão selvagem 495 Agora mesmo projetou projétil ao mar e levou a nau de novo à costa e já pensávamos lá perecer Se ele ouvir o som ou a fala de alguém despedaçará nossas cabeças e as tábuas da nau ao projetar rochedo pontudo tão longe arremessa 500 Assim falaram mas sem convencer meu ânimo enérgico e respondendo disselhe com ânimo rancoroso Ciclope se a ti algum homem mortal interpelar sobre o ultrajante cegamento do olho afirma que Odisseu arrasaurbe te cegou 505 o filho de Laerte que tem sua casa em Ítaca Assim falei e ele bramou e respondeume com o discurso Incrível de fato alcançoume velho dito divino Havia aqui um adivinho varão belo e grande Telemo filho de Eurimo que superior na adivinhação 510 envelheceu adivinhando para os ciclopes afirmoume que tudo isso se completaria no futuro que nas mãos de Odisseu eu perderia a visão Mas sempre esperei que um herói grande e belo aqui chegasse investido de grande bravura 515 agora a mim um pequeno um nada um fracote o olho cegou após me subjugar com vinho Mas te achega Odisseu para serte hospitaleiro e instigar o famoso tremeterra a te dar condução pois dele eu sou filho e meu pai ele proclama ser 520 Ele mesmo se quiser me curará e nenhum outro dos deuses ditosos e dos homens mortais Assim falou e eu respondendo lhe disse Tomara fosse capaz de a ti de vida e vitalidade privado enviar à morada de Hades para baixo 525 assim como o olho não te curará o tremesolo Assim falei e ele então ao senhor Posêidon rezou estendendo os braços ao páramo estrelado Ouveme Posêidon sustématerra jubacobalto Se deveras sou teu e meu pai proclamas ser 530 dáme que Odisseu arrasaurbe à casa não volte o filho de Laerte que tem sua casa em Ítaca Mas se é seu quinhão ver os seus e alcançar a casa bemconstruída e a sua terra pátria chegue tarde mal após perder todo companheiro 535 e em nau alheia e encontre desgraças em casa Assim falou rezando e ouviuo o jubacobalto E ele de novo rocha muito maior tendo erguido giroua e lançou e aplicou força incomensurável E tombou atrás da nau proacobalto 540 por pouco e falhou em atingir a ponta do leme E o mar agitouse por causa da rocha que caiu Onda a nau levou para frente e fêla atingir terra firme Mas quando atingimos a ilha onde as outras naus bomconvés estavam e ao redor companheiros 545 persistiam em lamentarse sempre a nos aguardar dirigimonos para lá a nau atracamos na praia e desembarcamos na rebentação do mar Tiradas da côncava nau as bestas do ciclope dividimolas para que a ninguém faltasse sua parte 550 O carneiro só para mim os companheiros belasgrevas deram honraria na divisão do rebanho A ele na praia a Zeus nuvemnegra filho de Crono que rege todos imolei e suas coxas queimei Mas ele desprezou o sacrifício e cogitava como soçobrariam todas 555 as naus bomconvés e meus leais companheiros Então assim o dia inteiro até o pôr do sol ficamos compartilhando carne semfim e doce vinho e quando o sol mergulhou e vieram as trevas repousamos na rebentação do mar 560 Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos eu mesmo pedi aos companheiros incitandoos que embarcassem e soltassem os cabos Logo embarcaram e sentaramse junto aos calços e alinhados golpeavam o mar cinzento com remos 565 De lá navegamos para diante atormentados no coração voltando da morte após perder caros companheiros E à ilha de Eolo chegamos Lá morava o filho de Cavaleiro Eolo caro aos deuses imortais na ilha flutuante em volta de toda ela muralha brônzea inquebrável se ergue como rocha lisa 5 Dele também vivem doze rebentos no palácio seis filhas e seis filhos em plena juventude Lá ele as filhas deu aos filhos como esposas eles sempre junto ao caro pai e à devotada mãe banqueteavamse Havia comida em profusão 10 e a casa cheirosa reverberava no pátio de dia e à noite junto às esposas respeitadas dormem com cobertas nos leitos bemperfurados E chegamos a sua cidade e à bela morada Mês inteiro hospedoume e perguntava de tudo 15 de Ílion das argivas naus e do retorno dos aqueus e eu tudo a ele ponto por ponto contei Mas quando também eu pedi a viagem e roguei ser conduzido não negou e preparou a condução Deume saco de couro que tirara de boi noveanos 20 onde prendeu as rotas dos ventos uivantes pois o filho de Crono fêlo supervisor de ventos que interrompesse ou instigasse qual quisesse Na cava nau amarrouo com corda fulgurante prateada para impedir o menor escoamento 25 mas para mim fez soprar a lufada de Zéfiro para levar as naus e a nós mesmos Mas não iria completarse nossa própria insensatez nos destruiu Nove dias navegamos sem parar noite e dia e no décimo já aparecia o solo pátrio 30 e até víamos homens perto mantendo o fogo Lá doce sono se achegou de mim exausto sempre controlei o pé da nau e a nenhum outro companheiro a dera para logo chegarmos à terra pátria E os companheiros com palavras falavam entre si 35 e disseram que eu levava ouro e prata para casa presentes do enérgico Eolo filho de Cavaleiro E assim falavam fitando quem estava ao lado Incrível como ele é caro e honrado entre todos os homens cuja cidade e terra alcança 40 Muita coisa traz de Troia belas posses do butim mas nós após completar rota igual para casa voltaremos com as mãos vazias Agora deulhe isso agradandoo por amizade Eolo Vamos rápido olhemos o que é isso 45 quanto ouro e prata há dentro do saco Isso falaram e venceu o plano vil dos companheiros Soltaram o saco e todos os ventos jorraram uma rajada logo os apanhou e levou para o altomar choravam para longe da terra pátria Já eu 50 após despertar no ânimo impecável cogitei ou morreria no mar para fora da nau me atirando ou quieto resistiria e ainda entre os vivos ficaria Mas resisti e aguentei e encoberto na nau jazia e as naus foram levadas por rajadas ruins de vento 55 de novo à ilha de Eolo e gemiam os companheiros Lá fomos para terra firme e tiramos a água e os companheiros logo jantaram junto às naus velozes Mas depois de consumirmos comida e bebida então eu junto com um arauto e um companheiro 60 fui à gloriosa morada de Eolo encontreio banqueteandose com a mulher e os filhos Entrando na casa rente ao batente na soleira sentamos e eles pasmaramse no ânimo e indagaram Como vieste Odisseu Que divindade ruim te atacou 65 Por certo te enviamos gentis para chegares a tua pátria em casa ao lugar que te é caro Assim falaram e eu lhes disse angustiado no coração Injuriaramme maus companheiros e além deles o sono terrível Mas ajudai amigos pois tendes esse poder 70 Assim falei abordandoos com palavras macias mas se calavam e o pai respondeu com o discurso Sai da ilha bem rápido mais desprezível dos mortais não é de praxe eu enviar de volta ou nortear o varão que hostilizam os deuses ditosos 75 Sai já que hostilizado pelos deuses assim chegaste Dito isso com gemidos profundos saí expulso da casa De lá navegamos para diante angustiados no coração Remada pungente oprimia o ânimo dos varões pois por nosso desatino não havia mais condução 80 Seis dias navegamos sem parar de noite e de dia no sétimo chegamos à escarpada cidade de Lamos a lestrigônia Telépilos onde pastor a pastor chama trazendo o rebanho e o outro levando responde Lá o varão insone conquistaria dupla paga 85 uma apascentando bois outra vigiando brancas ovelhas próximos são os caminhos da noite e do dia Lá fomos ao porto glorioso que circunda rochedo alcantilado por toda a extensão de ambos os lados e cabos salientes um defronte ao outro 90 na boca projetamse e a entrada é estreita lá dentro eles aportaram todos as naus ambicurvas Eis que elas dentro do cavo porto foram presas lado a lado de fato nele nunca crescia uma onda grande ou pequena e havia luzidia calmaria 95 Somente eu contive fora a negra nau aí mesmo no extremo e com cabos prendi à rocha Pusme de pé após subir à escarpada atalaia lá não havia campos arados por bois ou varões vimos somente fumaça irrompendo da terra 100 Então ordenei que companheiros investigassem quem seriam os varões que sobre a terra comem pão dois escolhi e um terceiro arauto enviei com eles Desembarcaram e foram à urbe por via plana de onde carros dos altos montes desciam com madeira 105 Uma moça encontraram diante da urbe pegando água a filha altiva do lestrigão Antífates Ela descera até a fonte a belascorrentes Artácia de lá até a urbe carregavam água Eles de pé ao lado interpelavamna e inquiriam 110 quem era o rei deles e sobre quem regia De pronto ela indicou a grandiosa casa do pai Eles após chegarem à gloriosa casa a esposa acharam alta como o pico de um monte e a abominaram Ela logo fez chamar da ágora o glorioso Antífates 115 seu marido que contra eles armou funesto fim Presto agarrou um companheiro e preparou a refeição os outros dois fugindo em disparada chegaram às naus E aquele lançou um grito pela urbe tendo ouvido acorriam os altivos lestrigões cada um de um lado 120 miríades não assemelhados a varões mas a gigantes Dos rochedos lançavam penedos pesados demais para varões logo nefasto estrondo as naus percorreu de homens destruídos e naus destroçadas tal peixes trespassados acabaram em detestável jantar 125 Enquanto eles os destruíam no porto mui profundo eu após puxar da coxa a afiada espada com ela cortei os cabos da nau proacobalto logo pedi a meus companheiros incitandoos que tocassem os remos para escaparmos do dano 130 eles todos se apressaram pois temeram o fim Com satisfação mar adentro escapou das rochas salientes minha nau as outras em conjunto lá ficaram destruídas Então navegamos para diante atormentados no coração voltando da morte após perder caros companheiros 135 E chegamos à ilha de Aiaie onde morava Circe belastranças fera deusa com voz humana irmã de sangue do sinistro Aietes ambos nasceram de Sol iluminamortal tendo por mãe Persa que Oceano gerou como filha 140 Na praia aportamos a nau em silêncio em porto abriganau e um deus nos guiava Lá desembarcamos dois dias e duas noites jazemos fadiga e aflições consumindo nosso ânimo Mas quando trouxe o terceiro dia Aurora belastranças 145 peguei minha lança e a afiada espada e rápido para longe da nau subi a um mirante esperando ver lavouras de homens e ouvir uma voz Pusme de pé após subir à escarpada atalaia e fumaça surgiume da terra largasrotas 150 no palácio de Circe através do capão cerrado e do mato Meditei então no juízo e no coração se investigaria após ver a fumaça fulgente E pareceume ao refletir ser mais vantajoso assim primeiro ir à nau veloz na orla do oceano 155 alimentar os companheiros e fazêlos investigar Mas quando estava perto da nau ambicurva comigo sozinho um deus comoveuse e à trilha um grande cervo galhudo enviou para mim Esse ao rio rumava vindo do pasto no bosque 160 para beber pois o ímpeto do sol já o atormentava Enquanto ele descia na espinha no meio das costas eu o atingi a lança brônzea certeira atravessoua Ele tombou no pó berrando e seu ânimo voou para longe Com o pé sobre ele a lança brônzea do ferimento 165 arranquei Após depôla aí mesmo no chão deixeia de lado apanhei galhos e vime e com corda de uma braça bemtrançada nos dois lados tendo torcido prendi os pés do assombroso prodígio e me dirigi à negra nau levandoo nas costas 170 apoiado na lança pois impossível sobre o ombro levar com um braço bastante grande era o animal Jogueio diante da nau e despertei os companheiros com fala amável achegandome a cada homem Amigos por certo não desceremos embora angustiados 175 à morada de Hades antes que chegue o dia fatal Vamos enquanto na nau veloz houver comida e bebida lembremonos de comer e não nos esgotemos de fome Assim falei e presto obedeceram a minhas palavras Eles se descobriram junto à praia do mar ruidoso 180 e contemplaram o cervo muito grande era o animal Mas após se deleitar em mirar com os olhos lavaram as mãos e prepararam bem majestoso jantar Então assim o dia inteiro até o pôr do sol ficamos compartilhando carne semfim e doce vinho 185 e quando o sol mergulhou e vieram as trevas repousamos na rebentação do mar Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então eu realizando assembleia disse entre eles Ouvi meu discurso companheiros mesmo sofrendo 190 Amigos não sabemos onde é a treva onde a aurora nem onde o Sol iluminamortal vai sob a terra nem onde sobe Mas planejemos ligeiro se ainda haverá uma ideia eu não creio que haja De fato após subir à escarpada atalaia observei 195 a ilha que o mar infindo circunda como coroa A própria se estende rasa fumaça no meio dela vi com meus olhos através de capão cerrado e mato Assim falei e o coração rachouselhes ao lembraremse dos feitos do lestrigão Antífates 200 e da violência do ciclope o enérgico devoragente Choravam alto vertendo copiosas lágrimas mas em vão de nada adiantou prantearem Em dois grupos todos os companheiros belasgrevas dividi e atribuí um líder a ambos 205 Uns liderei os outros o deiforme Euríloco As pedras num elmo brônzeo sacudimos rápido Para fora pulou a pedra do enérgico Euríloco Partiu e com ele vinte e dois companheiros aos prantos deixaramnos lamentandoos para trás 210 Acharam no vale a casa bemconstruída de Circe de pedras polidas num local todo protegido No entorno havia lobos da montanha e leões que ela enfeitiçara após lhes dar nocivas drogas Eles não atacaram os homens pelo contrário 215 mexendo os longos rabos puseramse de pé Tal cães que junto ao senhor que sai da mesa rabeiam sempre lhes traz o que agrada o ânimo assim em torno deles lobos garrapotente e leões rabeavam E eles temeram ao ver os terríveis portentos 220 Postaramse no pórtico da deusa belastranças e ouviam Circe dentro cantando com bela voz ativa junto ao grande tear imortal tal como são as finas graciosas e radiantes obras das deusas Entre eles começou a falar Cidadão líder de varões 225 para mim o mais próximo e devotado dos companheiros Amigos dentro alguém ativa junto ao tear com graça canta e todo o solo em torno ressoa ou deusa ou mulher vamos gritemos sem demora Assim falou e eles chamaram com brados 230 Ela logo saindo abriu as portas resplandecentes e convidouos Seguiramna todos em ignorância Euríloco deixouse ficar pois pensou ser um ardil Fêlos sentarse dentro nas cadeiras e poltronas e para eles queijo cevada e mel amarelo 235 no vinho prâmnio mexeu e ao alimento misturou drogas funestas para de todo esquecerem a pátria Mas depois que lhes deu e beberam de pronto com golpes de vara no chiqueiro os confinou Eles de porcos tinham a cabeça o som as cerdas 240 e o corpo mas a mente era firme como antes Assim pranteando foram confinados e para eles Circe lançou frutos do azevinho do carvalho e da cornácea o que porcos leitonosolo sempre comem Euríloco presto rumou à negra nau veloz 245 para dar notícia dos companheiros o amargo destino Não foi capaz de dizer palavra embora ansiando o peito golpeado por dor enorme seus olhos enchiamse de lágrimas e o ânimo pensava em lamento Mas após todos com afeto lhe perguntarem 250 então contou o fim dos companheiros restantes Fomos pelo bosque como pediste ilustre Odisseu encontramos no vale casa bemconstruída bela de pedras polidas num local todo protegido Lá ativa junto a grande tear cantava de forma aguda 255 ou deusa ou mulher e eles chamaram com brados Ela logo saindo abriu as portas resplandecentes e convidouos eles todos seguiramna em ignorância Mas eu deixeime ficar pensando ser um ardil E sumiram em conjunto e nenhum deles 260 reapareceu sentado vigiei muito tempo Assim falou e eu a espada pinosdeprata em volta dos ombros lancei grande brônzea e arco e flechas e presto pedilhe que me guiasse pelo mesmo caminho Mas ele com as mãos em meus joelhos suplicoume 265 e lamentandose dirigiume palavras plumadas Não me obrigue a ir criadoporZeus deixame aqui sei que nem tu mesmo voltarás nem um outro de teus companheiros trarás Rápido com estes partamos pois ainda escaparíamos do dia danoso 270 Assim falou mas eu respondendo lhe disse Euríloco pois que fiques aqui neste lugar comendo e bebendo junto à negra nau côncava Eu irei para mim é imperiosa a necessidade Assim falando da nau afasteime e do mar 275 Mas quando ia ao longo do vale sagrado alcançar a grande casa de Circe muitasdrogas lá Hermes bastãodourado encontrou a mim em direção à casa ele semelhante a jovem varão na prima barba cuja juventude é a mais graciosa 280 deume forte aperto de mão e dirigiume a palavra Não infeliz aonde pelos cumes vais sozinho ignorante da terra Teus companheiros na casa de Circe como porcos estão confinados em buraco bemcercado Acaso vens libertálos Afirmo que nem mesmo tu 285 retornarás e até tu ficarás onde os outros estão Vamos a ti livrarei dos males e salvarei aqui com essa droga benigna à casa de Circe vai ela afastará de tua cabeça o dia danoso A ti direi todos os astutos malefícios de Circe 290 vai te preparar mingau e na comida porá drogas Mas nem assim te poderá enfeitiçar não o permitirá a droga benigna que te darei e direi tudo Quando Circe te golpear com a vara bem longa então tu após puxar a afiada espada da coxa 295 lançate contra Circe como que louco por matála Ela temerosa pedirá que deites no leito Tu então não mais rejeites o leito da deusa para ela libertar teus companheiros e cuidar de ti mas pedelhe que jure a grande jura dos ditosos 300 de que outra desgraça não planejará contra ti para que quando nu não te deixe vil e emasculado Disse isso e deume a droga Argifonte após puxála do solo e mostroume sua natureza Na raiz era preta e ao leite assemelhavase a flor 305 os deuses chamamna moli Extraíla é difícil para homens mortais mas os deuses podem tudo Hermes então partiu rumo ao alto Olimpo pela ilha matosa e eu à casa de Circe fui e muito meu coração se revolveu enquanto ia 310 Posteime na porta da deusa belastranças 310ª Circe dentro eu ouvia cantando com bela voz Lá parado gritei e a deusa ouviu minha voz Ela logo saindo abriu as portas resplandecentes e convidoume e eu a segui angustiado no coração Dentro fezme sentar em poltrona pinosdeprata 315 bela artificiosa embaixo para os pés banqueta Fezme um mingau em cálice dourado para eu beber e nele a droga lançou refletindo vilezas no ânimo E quando mo deu bebi e não me enfeitiçou e após golpear com a vara dirigiume a palavra 320 Vai já ao chiqueiro deita com os outros companheiros Assim falou e eu puxei a afiada espada da coxa e lanceime contra Circe como que louco por matála Ela gritando alto jogouse tocou meus joelhos e lamentandose dirigiume palavras plumadas 325 quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais Espantame bebeste a droga e não foste enfeitiçado Nenhum outro homem não resiste a essa droga se a bebe mal ela deixa a cerca dos dentes tu tens no peito espírito que não se pode encantar 330 Então tu és Odisseu muitasvias do qual sempre afirmou que viria Argifonte bastãodourado e de Troia voltas com negra nau veloz Vamos põe a espada na bainha e os dois então subiremos em nosso leito para que tendonos unido 335 num enlace amoroso confiemos um no outro Assim falou mas eu respondendo lhe disse Circe como pedes para ser amigável contigo De meus companheiros fizeste porcos no palácio e tendome aqui pedes com mente ardilosa 340 que vá ao quarto e suba em teu leito para que nu me tornes vil e emasculado Eu não poderia querer subir em teu leito exceto se ousasses deusa a grande jura me jurar de que contra mim outra desgraça não planejarás 345 Assim falei e ela logo jurou como eu pedira Então após jurar por completo essa jura nisso eu subi ao leito bem belo de Circe Enquanto isso criadas estavam ocupadas no palácio quatro as que faziam o trabalho da casa 350 Eis que elas provinham das fontes dos bosques e dos rios sagrados que correm até o mar Nas poltronas uma delas lançava belas mantas púrpura em cima e embaixo punha panos outra diante das poltronas estendia mesas 355 de prata e sobre elas dispunha cestas de ouro a terceira em ânfora de prata misturou vinho adoçajuízo doce e dispôs os cálices de ouro a quarta trouxe água e acendeu o fogo alto sob a grande trípode e a água esquentava 360 Mas quando a água ferveu no bronze lúzio sentoume na banheira e com a grande trípode me banhou cabeça ombros após a água temperar até arrancar fadiga tiraânimo de meus membros Após me banhar e ungir à larga com óleo 365 em torno de mim lançou bela capa e túnica e lá dentro fezme sentar em poltrona pinosdeprata bela artificiosa embaixo para os pés banqueta Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada 370 para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente e junto muitos petiscos oferecendo o que havia Ela me disse para comer e tal não agradou a meu ânimo sentado refletia e o ânimo percebeu vilezas 375 Quando Circe me viu sentado e não sobre a comida esticando as mãos mas com aflição hedionda chegando mais perto dirigiume palavras plumadas Por que assim Odisseu sentado como um mudo o ânimo consomes e não tocas em comida e bebida 380 Acaso supões outro ardil Não precisas temer pois já te jurei o forte juramento Assim falou mas eu a ela respondendo disse Circe que homem no caso de ser sensato antes ousaria compartilhar de comida e bebida 385 antes de soltar e ver com os olhos os companheiros Mas se solícita pedes para beber e comer solta os leais companheiros para eu os ver com os olhos Assim falei e Circe partiu para fora do salão com a vara na mão abriu as portas do chiqueiro 390 e tangeuos assemelhados a cevados de nove anos Eles postaramse um diante do outro e ela por eles passando ungia cada um com outra poção De seus membros caíam cerdas que antes gerou a poção ruinosa que lhes dera a senhora Circe 395 e logo tornaramse varões mais jovens que dantes e muito mais belos e melhores a quem os mirasse Reconheceramme e cada um apertoume as mãos Em todos surgiu o lamento desejável e pela casa soou ruído aterrorizante a própria deusa apiedavase 400 Ela de pé perto de mim falou a deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque vai agora à nau veloz na orla do oceano Primeiro puxai a nau para a terra firme e os bens e todas as armas depositai em caverna 405 tu mesmo volta e conduzes os leais companheiros Assim falou e obedeceu meu ânimo orgulhoso e me encaminhei à nau veloz na orla do oceano Então achei os leais companheiros na nau veloz infelizes chorando vertendo copiosas lágrimas 410 Como bezerros campestres circundam vacas do rebanho quando elas vão ao curral após saciarse de pasto todos juntos saltam diante delas e estábulos não mais os retêm mas mugindo sem parar correm em torno das mães assim eles ao me verem com os olhos 415 vertiam lágrimas Ao ânimo deles parecia ser como se tivessem chegado a sua pátria e cidade Ítaca escarpada onde nasceram e foram criados Lamentandose dirigiamme palavras plumadas Como nos alegramos com teu retorno criadoporZeus 420 como se houvéssemos chegado a Ítaca a terra pátria Vamos contanos do fim dos outros companheiros Assim falaram mas eu lhes disse com palavras macias Primeiro puxemos a nau para a terra firme e os bens depositemos em caverna e todas as armas 425 E apressaivos todos em seguir junto comigo para verdes os companheiros na sacra casa de Circe bebendo e comendo pois em abundância possuem Assim falei e presto obedeceram minhas palavras Euríloco foi o único a tentar conter os companheiros 430 e falando dirigiulhes palavras plumadas Coitados aonde vamos Qual desses males desejais Penetrar na morada de Circe que a todos tornará porcos ou lobos ou leões e como tais sua grande casa vigiaríamos obrigados 435 Assim o ciclope os prendeu quando ao pátio foram nossos companheiros e com eles esse ousado Odisseu Também aqueles pereceram pela sua iniquidade Assim falou mas eu no espírito meditei se após puxar da coxa a espada aguçada 440 com ela deceparia sua cabeça e a derrubaria no solo embora contraparente próximo mas com fala amável companheiros tentavam conterme de todos os lados Divinal deixemos se tu o ordenas que ele fique aqui junto à nau e a guarde 445 guianos até a sacra morada de Circe Assim falando afastaramse da nau e do mar E nem Euríloco junto à cava nau ficou para trás mas seguiu temeu minha terrível reprovação Nisso aos outros companheiros na casa Circe 450 banhou gentilmente ungiu à larga com óleo e em torno lançou espessas capas e túnicas achamos a todos no palácio em belo banquete Eles após terem se visto de frente e se reconhecido pranteavam lamentandose e em volta a casa gemia 455 Ela de pé perto de mim falou a deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque agora não mais inflameis choro copioso também sei quantas aflições sofrestes no mar piscoso quanto dano varões hostis causaram em terra firme 460 Mas vamos consumi a comida e bebei o vinho até de novo recuperardes o ânimo no peito como quando primeiro partistes da terra pátria a escarpada Ítaca Agora exaustos e desanimados sempre lembrais a errância cruel Nunca vosso 465 ânimo festeja pois sofrestes demais Assim falou e nosso ânimo orgulhoso obedeceu E lá por todos os dias durante o ciclo de um ano quedamos compartilhando carne semfim e doce vinho mas quando o ano chegou e as estações deram a volta 470 as luas finando e os longos dias passaram leais companheiros chamaramme para fora e disseram Insano agora te lembra do solo pátrio se foi pelo deus definido salvarte e alcançar a casa bemconstruída e a tua terra pátria 475 Assim falaram e obedeceu meu ânimo orgulhoso Então assim o dia inteiro até o pôr do sol quedamos compartilhando carne semfim e doce vinho E quando o sol mergulhou e vieram as trevas eles deitaramse pelos umbrosos salões 480 Mas eu subi ao bem belo leito de Circe e supliqueilhe pelos joelhos e a deusa ouviu minha voz e falando dirigilhe palavras plumadas Circe cumprame a promessa que prometeste para casa enviarme meu ânimo já está ávido 485 e o dos companheiros que desgastam meu coração em volta de mim gemendo quando acaso estás longe Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitostruques não mais a contragosto fiqueis na minha casa 490 Mas carece primeiro completar outra rota e ir à morada de Hades e da atroz Perséfone para consultar a alma do tebano Tirésias o adivinho cego de quem o juízo é seguro para ele embora morto Perséfone deu espírito 495 só ele é inteligente sombras os outros adejam Assim falou e meu coração rachouse chorava deitado na cama e meu coração não quis ficar vivo e mirar a luz do sol Mas depois que chorei e rolei até me fartar 500 a ela falando dirigi palavras plumadas Circe mas quem nessa rota será o guia Nunca alguém atingiu o Hades com negra nau Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque 505 que a falta de guia junto à nau não te ocupe Fixa o mastro desfralda a branca vela e senta a brisa de Bóreas a levará Mas após atravessar o Oceano com a nau onde há pequena praia e os bosques de Perséfone 510 choupos altos e salgueiros que perdem a fruta a nau lá mesmo atraca no Oceano fundoredemunho e tu próprio vai à casa bolorenta de Hades Lá no Aquerôn desembocam Piriflégueton e Cóquito que é uma queda de água do Stíx 515 uma rocha e a confluência de dois rios ressoantes lá então herói te aproxima e como te ordeno fosso cava em torno de um cúbito de altura e largura e em sua borda verte libação a todos os mortos primeiro misto com mel depois com vinho doce 520 e a terça com água em cima asperge branca cevada Com zelo suplica às tíbias cabeças dos mortos que uma vez em Ítaca irás vaquilhona a melhor sacrificar no palácio enchendo o fogo de valores a Tirésias só para ele imolarás à parte ovelha 525 toda negra a que sobressai entre vossos rebanhos Após suplicar com votos ao glorioso grupo de mortos lá sacrifica carneiro adulto e uma fêmea negra dirigidos ao Érebo e te vira para longe tu mesmo mirando as correntes do rio lá muitas 530 almas de finados defuntos chegarão Então aos companheiros incita e ordenalhes que as bestas deitadas abatidas por bronze impiedoso queimem após esfolálas e rezem aos deuses ao altivo Hades e à atroz Perséfone 535 tu mesmo após puxar a espada afiada da coxa senta e não permitas que tíbias cabeças de mortos se acheguem do sangue antes de ouvires Tirésias Então o adivinho logo virá até ti ó líder de tropa para dizerte a rota os pontos do trajeto 540 e o retorno como voltarás no mar piscoso Assim falou e logo veio Aurora tronodourado Ela mesma capa e túnica com vestes vestiume e ela grande manto branco vestiu a ninfa leve e gracioso a cintura cingiu com cinto 545 belo dourado e sobre a cabeça deitou o véu Eu cruzando a casa instigava os companheiros com fala amável achegandome a cada homem Agora não mais dormindo resfolegai o doce sono mas vamos pois já me orientou a senhora Circe 550 Assim falei e de todos convenci o ânimo orgulhoso Mas nem mesmo de lá levei incólumes os companheiros O mais jovem Ilusório nem sobremodo bravo na guerra nem em seu juízo ajustado longe de companheiros sobre a casa sacra de Circe 555 deitouse sob o peso do vinho desejando frescor Ao ouvir a surda arruaça de moventes companheiros de chofre se ergueu e esqueceu em seu juízo de descer de volta dirigindose à alta escadaria e direto do alto do teto caiu Quebrou o pescoço 560 separado das vértebras e a alma desceu ao Hades Quando estavam por partir disselhes o discurso Acreditais suponho à cara terra pátria estar indo mas outra rota marcounos Circe à morada de Hades e da atroz Perséfone 565 para consultar a alma do tebano Tirésias Assim falei e o coração rachouselhes Sentados lá mesmo choravam e os cabelos arrancavam mas em vão de nada adiantou prantear Mas enquanto à nau veloz na orla do oceano 570 íamos angustiados vertendo copiosas lágrimas Circe já tendo lá estado na negra nau carneiro adulto prendeu e uma fêmea negra após passar à socapa quem ao deus que não quer com os olhos veria na ida ou na volta Após descermos à nau e ao mar primeiro a puxamos até o divino oceano e dispusemos mastro e vela na negra nau após as bestas pegar e pôlas a bordo também nós 5 subimos angustiados vertendo copiosas lágrimas Para nós detrás da nau proacobalto soprava nobre companheira benigna brisa enchevela que enviara Circe beloscachos fera deusa de humana voz Nós cuidamos de cada cordame na nau 10 e sentamos e vento e timoneiro a dirigiam O dia todo ela singrou a vela esticada E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam e ela chegou ao confim de Oceano fundascorrentes Lá fica o povo a cidade dos varões cimérios 15 em bruma e nuvens encoberta nunca a eles Sol luzidio mira de cima com os raios nem quando avança rumo ao páramo estrelado nem quando do páramo se dirige à terra sempre noite letal se espraia sobre os pobres mortais 20 Chegando lá atracamos a nau e dela as bestas tiramos então ao longo da corrente de Oceano nos dirigimos à terra que Circe indicara Lá os animais do sacrifício Perimedes e Euríloco seguraram e eu puxei a afiada espada da coxa 25 cavei um fosso cerca de um cúbito de altura e largura e em sua borda verti libação a todos os mortos primeiro misto com mel depois com vinho doce e a terça com água em cima aspergi branca cevada Com zelo supliquei às tíbias cabeças dos mortos 30 que uma vez em Ítaca iria vaquilhona a melhor sacrificar no palácio e encher o fogo de valores a Tirésias só para ele imolaria à parte ovelha toda negra a que sobressaísse entre nossos rebanhos Após a eles ao grupo de mortos com voto e súplica 35 suplicar peguei as bestas e cortei seu pescoço na direção do fosso e fluía sangue escuro Elas se reuniram as almas de finados defuntos subindo do Érebo moças jovens solteiros anciãos que muito penaram noivas delicadas com ânimo recémafligido 40 e muitos feridos por lanças de bronze varões mortos em guerra com armas ensanguentadas A maioria acorria para o fosso de todos os lados com grito prodigioso e um medo amarelo atingiume Então aos companheiros incitei e ordeneilhes 45 que aos bichos deitados abatidos por bronze impiedoso queimassem após esfolálos e rezassem aos deuses ao forte Hades e à atroz Perséfone eu mesmo após puxar a espada afiada da coxa sentei e não permiti que tíbias cabeças de mortos 50 se achegassem do sangue antes de ouvir Tirésias Primeiro veio a alma de Ilusório o companheiro ainda não enterrado sob a terra largasrotas o corpo na casa de Circe deixamos para trás não chorado não sepulto pois impelianos outra ação 55 Quando o vi chorei e apiedeime no ânimo e falando dirigilhe palavras plumadas Ilusório como desceste às trevas brumosas Chegaste antes a pé que eu com negra nau Assim falei e ele bramou e respondeume com discurso 60 Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque perdeume o quinhão danoso do deus e vinho ilimitado deitado na morada de Circe não pensei descer de volta dirigindome à alta escadaria e direto do alto do teto caí quebrei o pescoço 65 separado das vértebras e a alma desceu ao Hades Agora te suplico por aqueles lá trás ausentes por tua esposa e teu pai que te criou quando pequeno e por Telêmaco o único que no palácio deixaste sei que indo daqui da casa de Hades 70 dirigirás a nau engenhosa até a ilha de Aiaie lá senhor peçote então que lembres de mim Não me deixes não chorado e não sepulto ao partir e te afastar para eu não te trazer a cólera de deuses mas me queime com todas as armas que tive 75 e ergueme junto à orla do mar cinzento cenotáfio de varão infeliz notícia também aos vindouros Completame isso e crava no túmulo o remo com que vivo remava junto de meus companheiros Assim falou e eu respondendo lhe disse 80 Isso infeliz te completarei e executarei Assim nós dois trocando palavras tristes ficamos eu sobre o sangue empunhando a espada e acolá muito falava o espectro do companheiro E achegouse a alma de minha finada mãe 85 a filha do enérgico Autólico Anticleia que viva deixei para trás quando fui à sacra Ílion Quando a vi chorei e apiedeime no ânimo embora bem aflito nem assim deixei que primeiro ela se achegasse do sangue antes de eu ouvir Tirésias 90 E veio a alma do tebano Tirésias com um cetro dourado reconheceume e disse Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque por que de novo infeliz deixaste a luz do sol e vieste para ver mortos e a região sem deleite 95 Pois arredate do fosso e afasta a espada afiada para eu beber do sangue e falarte sem evasivas Assim falou e eu recolhi a espada pinosdeprata e enfieia na bainha Após beber o sangue escuro a mim dirigiuse com palavras o adivinho impecável 100 Buscas retorno doce como o mel ilustre Odisseu esse o deus tornará difícil para ti Não creio que irá te ignorar o tremeterra com rancor no ânimo irado pois cegaste seu filho querido Porém ainda assim mesmo sofrendo males chegaríeis 105 se quiseres conter teu ânimo e o dos companheiros quando primeiro achegares a nau engenhosa da ilha Trinácia após escapar do mar violeta e achardes pastando vacas e robustas ovelhas de Sol que tudo enxerga e tudo ouve 110 Se as deixares ilesas e cuidares do retorno também Ítaca mesmo sofrendo males alcançaríeis se as lesares então te prevejo o fim de barco e companheiros Tu mesmo se escapares chegarás tarde mal em nau alheia 115 sem companheiro algum encontrarás desgraças em casa varões soberbos que devoram teus recursos cortejando a excelsa esposa e oferecendo dádivas Contudo vingarás a violência deles ao chegar Mas quando aos pretendentes em teu palácio 120 matares com truque ou às claras com bronze agudo então pega um remo maneável e marcha até alcançares varões que não conhecem o mar nem comem comida misturada a grãos de sal eles claro não conhecem naus facepúrpura 125 nem remos maneáveis que são as asas das naus Sinal te direi inequívoco e não o irás ignorar quando contigo depararse outro passante e disser que tens destróijoio sobre o ombro ilustre então após na terra cravares o remo maneável 130 fazeres belos sacrifícios ao senhor Posêidon carneiro touro e javali doméstico reprodutor retorna para casa e oferta sacras hecatombes aos deuses imortais que do largo páramo dispõem a todos pela ordem Do mar virá a ti 135 bem suave a morte ela que te abaterá debilitado por idade lustrosa e em volta as gentes serão afortunadas Isso te digo sem evasivas Assim falou mas eu respondendolhe disse Tirésias isso destinaram os próprios deuses 140 Mas vamos dizeme isto e conta com precisão lá vejo a alma de minha finada mãe ela quieta sentada perto do sangue a seu filho não ousa mirar de frente nem dirigir a palavra Diga senhor como ela saberia que este sou eu 145 Assim falei e ele logo respondendo disseme Simples palavra te direi e no juízo porei a todo que permitires dos mortos finados achegarse do sangue esse vai te falar sem evasivas A quem negares esse de volta irá para trás 150 Após falar a alma entrou na casa de Hades a do senhor Tirésias após contar o dito divino mas eu lá fiquei imóvel até que a mãe a mim veio e bebeu sangue escuro de pronto me conheceu e lamentandose dirigiume palavras plumadas 155 Filho meu como desceste às trevas brumosas ainda vivo É difícil aos mortais ver isto aqui No meio há grandes rios e assombrosas correntes e primeiro Oceano que não é possível cruzar a pé se alguém não tiver nau engenhosa 160 Só agora de Troia chegas aqui após vagar com nau e companheiros muito tempo Não foste a Ítaca nem viste no palácio tua mulher Assim falou mas eu respondendo lhe disse A necessidade minha mãe me trouxe até Hades 165 para consultar a alma do tebano Tirésias ainda não me acheguei da Acaia nem a minha terra desci mas sempre vago em agonia desde o dia em que segui o divino Agamêmnon até Ílion belospotros para troianos combater 170 Mas vamos dizeme e conta com precisão que sina de morte dolorosa te subjugou Doença alongada Ártemis vertesetas com suas flechas suaves achegandose matoute Falame algo do pai e do filho que deixei para trás 175 se minha honraria ainda é deles ou já um outro varão a tem e afirmam que nunca retornarei Falame da intenção e mente da lídima esposa se fica ao lado do filho e firme tudo guarda ou se já a desposou quem for o melhor dos aqueus 180 Assim falei e ela logo respondeu a senhora mãe É claro que ela aguarda com ânimo resistente em teu palácio para ela sempre agonizantes esvaem as noites e os dias e verte lágrimas Ninguém tem tua bela honraria mas plácido 185 Telêmaco gere os domínios e de banquetes partilhados participa dos quais convém varão sentenciador ocuparse todos o convidam Teu pai fica lá mesmo no campo e à urbe não desce não tem como leito estrado capas e mantas lustrosas 190 mas ele no inverno com escravos dorme na casa no pó perto do fogo e vestes vis vestem sua pele mas quando vem o verão e a opulenta época de frutas em toda parte no fértil vinhedo no morro amontoamse leitos de folhas caídas no chão 195 Lá deita aflito e enorme angústia avulta no juízo ansiando teu retorno e cruel velhice o alcança Assim também pereci e alcancei o fado a mim nem no palácio a vertesetas agudamirada com suas flechas suaves achegandose matoume 200 nem até mim veio doença que sobremodo com hedionda definhação dos membros tira a vida de mim a saudade de ti os planos teus ilustre Odisseu e a suavidade tua arrebataramme a melíflua vida Assim falou e eu quis após cogitar no juízo 205 pegar a alma de minha finada mãe Três vezes lanceime e pegála o ânimo pedia três vezes de minhas mãos como sombra ou sonho voou No coração minha dor faziase mais aguda e falando dirigilhe palavras plumadas 210 Minha mãe por que te esquivas se anseio pegarte para no Hades abraçandonos com carinho ambos nos deleitarmos com gemido gelado Isto é um espectro que até mim a ilustre Perséfone instigou para que ainda mais aflito eu gema 215 Assim falei e ela logo respondeu a senhora mãe Ai de mim filho meu herói em suprema desdita a ti Perséfone filha de Zeus não está ludibriando mas essa é a marca dos mortais quando alguém morre Não mais os tendões seguram carnes e ossos 220 mas a eles o ímpeto superior do fogo chamejante subjuga e assim que a vida deixa os ossos brancos a alma como um sonho esvoaça e voa embora Mas almeja ir de pronto rumo à luz sabe de tudo isso para no futuro também falares a tua mulher 225 Assim nós dois trocávamos palavras e mulheres vieram pois as instigara a ilustre Perséfone tantas quantas eram as esposas e filhas dos melhores Elas em torno do sangue negro juntas se reuniram e eu decidia como iria a cada uma questionar 230 Este em meu ânimo mostrouse o plano melhor após desembainhar aguçada espada da coxa grossa não permitia que junto bebessem todas o sangue negro Elas enfileiradas achegavamse e cada uma sua origem anunciava e eu a todas questionava 235 A primeira que vi foi Tiro nobrepai que disse ser rebento do impecável Salmoneu e disse ser esposa de Creteu filho de Eolo Ela pelo rio se apaixonou o divino Enipeu que de longe o mais belo dos rios fluía pela terra 240 e assim visitava as belas correntes de Enipeu Eis que assemelhado a ele o terrasustém tremeterra na foz do rio vertiginoso ao lado dela se deitou eis que agitada onda cercouos igual a um monte abobadada e escondeu o deus e a mulher mortal 245 E soltou seu cinto virginal e sono verteulhe Quando o deus completou os feitos amorosos apertoulhe a mão dirigiuselhe e nomeoua Deleitate com o amor mulher tempo passando gerarás crianças radiantes pois vãos não são os enlaces 250 de imortais e tu as cria e alimenta Agora vai para casa contémte e não me nomeies quanto a mim vê sou Posêidon tremesolo Após falar assim mergulhou no mar fazonda E ela após engravidar gerou Pélias e Neleu 255 e tornaramse dois fortes assistentes do grande Zeus ambos Pélias na espaçosa Iolcos morava rica em ovelhas o outro na arenosa Pilos Estes outros com Creteu gerou augusta mulher Aison Feres e Amitáon alegre na luta de carros 260 Depois dela vi Antíope a filha de Asopo que no abraço de Zeus proclama ter deitado e gerou duas crianças Anfíon e Zeto os primeiros a fundar o sítio de Tebas seteportões e murálo pois sem muros não eram capazes 265 de habitar a espaçosa Tebas embora fortes os dois Depois dela vi Alcmena a esposa de Anfitríon que a Héracles espíritoousado ânimoleonino gerou após unirse em seu abraço a Zeus poderoso e Mégara a filha do autoconfiante Creonte 270 possuíaa o filho de Anfitríon com ímpeto sempre rijo E vi a mãe de Édipo a bela Epicasta que feito inaudito fizera com mente ignorante ao ser desposada pelo filho ele após matar o pai a desposou logo deuses expuseramnos aos homens 275 Mas ele sofrendo agonias em Tebas muito amada regia os cadmeus graças a planos ruinosos de deuses e ela foi à casa de Hades o poderoso porteiro após apertar um nó abrupto da alta viga no quarto tomada pela dor Deixoulhe aflições no futuro 280 muitas tantas quantas as Erínias da mãe completam E vi Clóris bem bela que um dia Neleu desposou pela beleza pois deu miríades de dádivas a filha mais nova de Anfíon filho de Iaso que então em Orcômenos na Mínia regia com força 285 Ela regia Pilos e geroulhe crianças radiantes Nestor Crômio e o bem honrado Periclímeno Além deles gerou a altiva Peró maravilha para os mortais a quem todos os vizinhos cortejavam e Neleu só a daria a quem lunadas vacas largafronte 290 tomasse do brioso Íficles e de Fílace trouxesse feito difícil Só o adivinho impecável prometeu trazêlas e o duro quinhão do deus o enredou laços cruéis e pastores rústicos Mas quando meses e dias completaramse 295 e o ano fechou seu ciclo e voltaram as estações eis que então o brioso Íficles o soltou pois falou a palavra divina completavase o plano de Zeus E vi Leda a consorte de Tíndaro ela que de Tíndaro gerou duas crianças juízoforte 300 Castor domacavalos e Polideuces bomdepunho a esses ambos vivos contém a terra brotagrão Eles mesmo abaixo da terra têm a honra de Zeus ora estão vivos em dias alternados ora de novo mortos atribuiuselhes honra como aos deuses 305 E depois dela Ifimédeia consorte de Aloeu mirei que dizia terse unido a Posêidon Assim gerou duas crianças e tiveram vida curta o excelso Óton e Efialtes grandefama A eles nutriu o solo fértil para serem os mais altos 310 e de longe os mais belos depois do glorioso Órion com nove anos de fato tinham eles nove cúbitos de largura e de altura alcançavam nove braças Até contra imortais no Olimpo ameaçaram instaurar combate de guerra encapelada 315 O Ossa ansiaram pôr sobre o Olimpo e sobre o Ossa Pélio folhasfarfalhantes para alcançar o páramo E teriam tal feito completado houvessem chegado à juventude matouos o filho de Zeus que Leto belajuba gerou a ambos antes que florescesse a barba sob a têmpora 320 e vicejante penugem o queixo cobrisse E Fedra e Prócris eu vi e a bela Ariadne filha de Minos sinistro ela que um dia Teseu de Creta levava ao morro da Atenas sagrada e não a desfrutou antes matoua Ártemis 325 na correntosa Dia com o testemunho de Dioniso Vi Maira Climene e a hedionda Erifila que ouro valioso recebeu por seu marido A todas não vou enunciar nem especificar tantas as esposas e filhas de heróis que vi 330 a noite imortal findaria antes Mas é hora de dormir ou indo à nau veloz até os companheiros ou aqui a condução ocupará os deuses e vós Assim falou e eles todos atentos se calavam tomados por feitiço no umbroso salão 335 Entre eles Arete alvosbraços tomou a palavra Feácios como parecevos ser esse varão em aparência altura e dentro no juízo equilibrado Pois bem é meu hóspede e cada um partilha da honra Por isso não às pressas o enviai de volta nem os dons 340 restringi ele assim carente pois vós muitos haveres tendes no palácio devido aos deuses Entre eles então falou o ancião o herói Donodenau que dos varões feácios era o mais velho 343ª em discursos superior com muito saber antigo Amigos nem longe do alvo nem de nossa opinião 345 discursa a rainha bemajuizada vamos obedecei De Alcínoo aqui presente dependem palavra e ação A ele por sua vez Alcínoo respondeu Essa palavra portanto assim se dará se eu vivo reino sobre o navegador povo feácio 350 Embora o hóspede anseie por retornar peço aguente ficar até amanhã quando os dons eu completar A condução ocupará os varões todos mormente a mim de quem é o poder na cidade Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 355 Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos se ordenasses que eu até um ano aqui ficasse instigasses a condução e desses radiantes dons até disso eu gostaria e seria bem mais vantajoso com a mão mais cheia voltar à cara pátria 360 também mais respeitado e caro aos varões eu seria a todos quantos me vissem a Ítaca retornar A ele por sua vez Alcínoo respondeu e disse Odisseu ao te mirar de ti não supomos que sejas trapaceiro e furtivo tal como muitos 365 que a negra terra nutre homens em profusão que forjam mentiras cuja fonte ninguém veria Tua é a formosura das palavras tens juízo distinto e contaste a história hábil como um cantor funestas agruras dos argivos todos e de ti mesmo 370 Mas vamos dizeme isto e conta com precisão se viste companheiros excelsos esses que contigo seguiram até Ílion e lá alcançaram o fado Bem longa é essa noite ilimitada e não é hora de dormir no salão tu relatame feitos prodigiosos 375 Até a divina aurora eu resistiria se para mim no salão aguentasses discursar essas tuas agruras Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos há hora para muitas histórias e hora para o sono 380 Se ainda almejas ouvir eu não recusaria falarte de outros fatos ainda mais pungentes que esses agruras de meus companheiros que depois morreram escaparam da triste batalha contra os troianos e no retorno pereceram devido a vil mulher 385 Então dispersou a pura Perséfone as almas das bem femininas mulheres e achegouse a alma de Agamêmnon filho de Atreu aflita em torno outras reunidas as que com ele na casa de Egisto morreram e alcançaram o fado 390 Reconheceume logo ao verme com os olhos choro agudo verteu copiosas lágrimas abrindo os braços para mim com gana de abraçar Mas sua força não era mais firme nem o vigor como no passado fora sobre os membros recurvos 395 Quando eu o vi chorei e apiedeime no ânimo e falando dirigilhe palavras plumadas Majestoso filho de Atreu rei de varões Agamêmnon que sina que morte dolorosa te subjugou Estavas numa nau e subjugoute Posêidon 400 após instigar sopro não invejável de ventos difíceis Varões hostis causaramte dano em terra firme ao quereres roubar bois ou belos rebanhos de ovelhas Ou então lutavas por uma cidade e mulheres Assim falei e ele logo respondendo disseme 405 Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque não estava numa nau nem subjugoume Posêidon após instigar sopro não invejável de ventos difíceis nem varões hostis causaramme dano em terra firme mas Egisto preparou o quinhão da morte 410 e matoume com a nefasta esposa após me chamar à casa depois do banquete como quem mata boi no cocho Morri de morte deplorável ao redor outros companheiros sem cessar foram mortos como porcos dentebranco na casa de rico varão que muito possui 415 quando de casamento festa ou farta celebração Já encaraste a matança de muitos varões mortos em luta singular e também em batalha audaz mas isto tendo visto lamentarias demais no ânimo como em volta das ânforas e das mesas cheias 420 jazíamos no salão e todo o chão fumegava com sangue Pungentíssima ouvi a voz da filha de Príamo Cassandra a quem matou Clitemnestra astúciaardilosa em volta de mim eu sobre a terra ergui os braços e lanceios ao morrer pela espada A caradecadela 425 afastouse e mesmo eu indo ao Hades não ousou com as mãos cerrar meus olhos e pressionarme a boca Assim nada é mais terrível e canalha que a mulher aquela que em seu juízo lança tais feitos tal foi o feito ultrajante que aquela armou 430 ao preparar a morte do marido legítimo Eu supus que daria felicidade a meus filhos e escravos ao chegar em casa ela versada no funesto verteu vergonha sobre si e as gerações futuras das bem femininas mulheres ainda que uma seja honesta 435 Assim falou e eu respondendo lhe disse Incrível por certo à estirpe de Atreu Zeus amplavisão odiou desde o início usando femininas artimanhas por causa de Helena muitos de nós perecemos e para ti quando longe Clitemnestra armou um ardil 440 Assim falei e ele logo respondendo me disse Por isso agora não sejas meigo com a esposa e não lhe reveles todo o discurso que bem conheces mas digalhe algo e o resto mantenha oculto Mas não para ti Odisseu a morte virá da mulher 445 deveras sensata projetos conhece bem no juízo a filha de Icário a bemajuizada Penélope De fato recémcasada nós a largamos ao ir para a guerra seu filho estava no peito infante ele que agora ocupa lugar entre os varões 450 afortunado sim a ele o caro pai verá ao voltar e ele ao pai abraçará o que é a norma Minha esposa nem que de meu filho com os olhos me fartasse permitiu antes a mim mesmo matou Outra coisa te direi e tu em teu juízo a guarda 455 em segredo não às claras à tua cara terra pátria leva a nau pois nada é confiável entre as mulheres Mas vamos dizeme isto e conta com precisão se ouvistes que algures ainda vive meu filho ou em Orcômenos ou na arenosa Pilos 460 ou junto a Menelau na ampla Esparta não está morto mas sobre a terra o divino Orestes Assim falou e eu respondendo lhe disse Filho de Atreu por que me perguntas isso Nada sei se está vivo ou morto é ruim lançar ditos ao vento 465 Assim nós dois trocávamos palavras hediondas de pé aflitos vertendo copiosas lágrimas e achegouse a alma de Aquiles filho de Peleu e a de Pátroclo e a do impecável Antíloco e a de Ájax que em beleza e porte era o melhor 470 de todos os aqueus depois do impecável Aquiles Reconheceume a alma do péligeiro descendente de Áiaco e lamentandose dirigiume palavras plumadas Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque seu terrível que feito ainda maior armarás no juízo 475 Como ousaste descer ao Hades onde os mortos sem o juízo moram espectros de mortais esgotados Assim falou e eu respondendo lhe disse Aquiles filho de Peleu de longe o melhor dos aqueus vim por precisar de Tirésias para que me aconselhe 480 um plano como chegar à escarpada Ítaca ainda não me acheguei da Acaia nem a minha terra desci mas sofro sempre Aquiles não há varão mais ditoso que tu no passado nem no futuro pois antes vivo a ti honrávamos como aos deuses 485 nós argivos e agora reges soberano entre os mortos aqui assim tendo morrido não te aflijas Aquiles Assim falei e ele logo respondendo disseme Não me edulcores a morte ilustre Odisseu Preferiria vivente ser empregado em outro lugar 490 junto a homem sem gleba e com poucos víveres a reger entre todos os mortos desassomados Vamos narrame uma história de meu filho ilustre ou foi à guerra para se destacar ou não foi E me fala do impecável Peleu se de algo soubeste 495 ou ainda mantém honraria entre os muitos mirmidões ou o desonram pela Hélade e por Ftia pois a idade restringe seus braços e pernas Fosse eu seu protetor sob os raios do sol como um dia atuei na ampla Troia ao matar 500 gente excelente defendendo os aqueus Se assim mesmo curto tempo fosse eu à casa do pai faria meu ímpeto e braços intocáveis odiados àqueles que o violentam e da honraria querem afastálo Isso falou e eu respondendo lhe disse 505 Bem do impecável Peleu nada soube mas de teu filho do caro Neoptólemo enunciarei toda a verdade como me pedes pois eu próprio a ele em cava nau simétrica conduzi de Skyros até os aqueus belasgrevas 510 Quando diante da urbe troiana ponderávamos planos sempre por primeiro falava e não errava no discurso o excelso Nestor e eu só nós o superávamos Mas ao combatermos no plaino troiano com bronze nunca na multidão ficava nem na tropa de varões 515 mas bem à frente corria com ímpeto sem rival muitos varões matou na refrega terrível Todos eu não vou anunciar nem nomear quanta gente matou defendendo os argivos só como matou o filho de Telefo com bronze 520 o herói Eurípilo e muitos companheiros com ele ceteus pereceram por causa de dons femininos Ele foi o mais belo que vi após o divino Mêmnon Mas quando subimos no cavalo que laborara Epeu os melhores argivos e tudo foi ordenado por mim 525 quando abrir a arguta tocaia e quando fechála nisso os outros líderes e dirigentes dânaos lágrimas enxugavam e seus membros tremiam embaixo Ele nunca de modo algum eu vi com meus olhos nem empalidecer na bonita pele nem da face 530 lágrimas enxugar Ele amiúde me suplicava para sair do cavalo e agarrava o cabo da espada e a pesada lança de bronze males desejando a troianos Porém após saquear a escarpada urbe de Príamo com distinto quinhão e honraria embarcou na nau 535 ileso nem atingido por bronze agudo nem ferido em combate mano a mano o que sucede na guerra Ares enlouquece às cegas Assim falei e a alma do péligeiro descendente de Áiaco partiu a passos largos pelo prado de asfódelos 540 com júbilo pois seu filho eu disse ser insigne E as outras almas de defuntos finados de pé aflitas inquiriam cada uma suas agruras Sozinha a alma de Ájax filho de Télamon postouse distante enraivecida pela vitória 545 quando eu o venci ao pleitear junto às naus as armas de Aquiles fixouas a senhora sua mãe e filhos de troianos e Palas Atena julgaram Tomara não tivesse eu vencido essa disputa por causa delas a terra se apossou de notável pessoa 550 Ájax que na aparência e nos feitos sobrepujou os outros dânaos logo atrás do impecável Aquiles E a ele me dirigi com palavras amáveis Ájax filho do impecável Télamon não irias nem morto esquecer a raiva contra mim pelas armas 555 nefastas Deuses tornaramnas desgraça aos argivos Como torre para eles pereceste os aqueus por ti igual à cabeça de Aquiles filho de Peleu afligiramse sem parar ao faleceres Nenhum outro é responsável mas Zeus a tropa de lanceiros dânaos 560 odiou de forma terrível e para ti fixou o destino Mas vem aqui senhor para escutares palavras nossas subjuga o ímpeto e o ânimo orgulhoso Assim falei ele nada retrucou e foi atrás de outras almas rumo ao Érebo de defuntos finados 565 Podia porém ter falado mesmo com raiva e eu a ele mas meu ânimo quis no caro peito enxergar as almas dos outros mortos Vi Minos o filho radiante de Zeus com cetro dourado aplicando as normas aos mortos 570 sentado cercandoo pediam do senhor as sentenças sentados e de pé pela casa de Hades com largo portão Depois dele percebi o portentoso Órion agrupando feras pelo prado de asfódelos as que ele mesmo matou em montanhas solitárias 575 com estaca toda brônzea nas mãos inquebrável E Titiô enxerguei o filho da majestosa Terra jazendo no solo sobre nove medidas de campo arado e dois abutres sentados de cada lado rasgavam seu fígado furando o peritônio ele não se defendia com as mãos 580 Tentou violentar Leto a majestosa consorte de Zeus indo ela a Pito após cruzar o Panopeu belasarenas E sim vi Tântalo com seu duro sofrimento de pé na lagoa a água batia em seu queixo Na posição do sedento para beber não a alcançava 585 quando o ancião se curvava com gana de beber nisso a água sumia engolida e em volta dos pés surgia a negra terra e a divindade deixavaa seca Árvores copaelevada deitavam frutos do topo pereiras romãzeiras macieiras frutoradiante 590 figueiras doces e oliveiras verdejantes quando o ancião se esticava para as pegar com as mãos o vento as arrojava rumo a nuvem umbrosa E sim vi Sísifo com seu duro sofrimento carregando pedra portentosa com as duas mãos 595 Ele apoiandose nas mãos e nos pés empurrava a pedra morro acima mas quando ia lançála por sobre o cume Crátaiis a revolvia então de volta ao solo rolava a rocha aviltante Mas ele de novo a empurrava retesandose suor 600 escorria dos membros e poeira lançavase da cabeça Depois dele percebi a força de Héracles o espectro pois ele mesmo entre deuses imortais deleitavase em festas com Juventude lindacanela filha do grande Zeus e de Hera sandáliadourada 605 À volta dele estrídulo de mortos como se de aves terrorizados para todo lado feito noite lúgubre trazia seu arco nu e na corda a flecha esquadrinhando fero sempre como se fosse atirar aterrorizante no peito em diagonal talabarte 610 cinturão dourado com obras maravilhosas ursos porcos agrestes leões de olhar cobiçoso batalhas combates matanças e carnificinas Que o artesão não tenha artefatado outro assim esse que tal cinturão colocou sob a sua arte 615 Presto me reconheceu ao verme com os olhos e lamentandose dirigiume palavras plumadas Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque coitado também arrastas um danoso quinhão o que eu mesmo suportava sob os raios do sol 620 Eu era o filho de Zeus filho de Crono mas sofria ilimitada agonia muito tempo fui subordinado a herói bem mais fraco que me impôs duras provas Uma vez também cá me enviou para levar o cão nenhuma outra prova pensou me seria mais brutal 625 Ao cão eu venci e conduzi para fora do Hades Hermes me guiou e também Atena olhosdecoruja Após falar a alma entrou de volta na casa de Hades mas eu lá fiquei imóvel caso algum ainda viesse dos varões heróis que no passado morreram 630 Teria ainda visto os varões de antanho que desejava Teseu e Peirítoo filhos bem majestosos de deuses mas grupos de mortos milhares perto juntaramse com ruído prodigioso um medo amarelo atingiume que a cabeça de Gorgô portento assombroso 635 da casa de Hades me enviaria a ilustre Perséfone Então de pronto fui à nau e pedi aos companheiros que embarcassem e os cabos soltassem Eles logo embarcaram e sentaramse junto aos calços 638ª alinhados golpeavam o mar cinzento com remos A nau ao longo do rio Oceano a corrente conduzia 640 primeiro com remadas e depois bela brisa Depois de deixar a corrente do rio oceano a nau alcançou a onda do mar largapassagem e a ilha de Aiaie onde de Aurora nascecedo ficam arenas e morada e os levantes de Sol 5 dirigimonos para lá atracamos na praia e desembarcamos na rebentação do mar Lá adormecemos e aguardamos a divina Aurora Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos então enviei companheiros à casa de Circe 10 para buscar o cadáver o morto Ilusório Cortamos os troncos onde a praia é mais saliente e o enterramos angustiados vertendo copiosas lágrimas Após queimar o morto e as armas do morto erguemos um cenotáfio sobre ele arrastamos 15 uma lápide e no topo cravamos o remo maneável Tudo realizamos em sequência eis que Circe não ignorou nossa volta do Hades e ligeiro veio após arrumarse com ela criadas traziam pão muita carne e fulgente vinho tinto 20 Ela postada no centro falou a deusa divina Terríveis vós que vivos descestes à casa de Hades homens bimortos quando os demais só uma vez morrem Mas vamos consumi a comida e bebei o vinho aqui mesmo o dia todo despontando a aurora 25 navegareis E eu irei a rota indicar e tudo sinalizar para que vítima de tramoia pungente no mar ou em terra não padeceis sofrendo miséria Assim falou e obedeceu nosso ânimo orgulhoso Então o dia inteiro até o pôr do sol assim 30 ficamos compartilhando carne semfim e doce vinho Quando o sol mergulhou e vieram as trevas eles deitaramse ao longo da popa da nau ela tomoume a mão longe dos caros companheiros me acomodou deitouse ao lado e interrogoume 35 e eu tudo a ela ponto por ponto contei Então a mim dirigiuse com palavras a senhora Circe Tudo isso foi assim completado agora ouve como te digo e o próprio deus te lembrará Primeiro alcançarás as Sirenas elas que a todos 40 os homens enfeitiçam todo que as alcançar Aquele que se achegar na ignorância e escutar o som das Sirenas para ele mulher e crianças pequenas não mais aparecerão nem rejubilarão com seu retorno à casa pois as Sirenas com canto agudo o enfeitiçam 45 sentadas no prado tendo ao redor monte de putrefatos ossos de varões e suas peles ressequidas Passa ao largo e tampa os ouvidos dos companheiros com amolecida cera melosa para que nenhum outro as ouça mas tu mesmo se quiseres ouve 50 após te prenderem as mãos e os pés na nau veloz reto no mastro e nele se amarrarem os cabos para que te deleites com a voz das duas Sirenas Se suplicares aos companheiros que te soltem que eles com ainda mais laços te prendam 55 Após os companheiros te guiarem ao largo delas dessa vez não mais te direi com detalhes qual das rotas será a tua mas tu mesmo no ânimo considera vou te falar das duas direções A partir daí há rochas salientes e contra elas 60 ressoa grande vaga de Anfitrite olhocobalto Plânctas vê denominamnas os deuses ditosos Por lá nenhum alado consegue passar nem pombos tímidos os que levam ambrosia a Zeus pai a um deles a rocha lisa sempre agarra 65 mas outro o pai envia para completar o número Por lá nunca escapou nau de varões uma que fosse tábuas de naus mescladas a corpos de heróis ondas do mar e rajadas de fogo maligno as levam Só navegou por aí aquela nau cruzamar 70 Argó por todos conhecida navegando desde Aietes presto a teriam lançado contra as grandes rochas mas Hera a guiou pois que Jasão lhe era caro Encontrarás dois penedos um alcança o largo páramo e tem o pico agudo envolvido por nuvem 75 cobalto esta nunca fenece e nunca o céu cobre seu pico nem no verão nem na época de frutas Não o subiria um varão mortal nem percorreria nem se vinte braços e pernas tivesse a pedra é lisa semelhante a uma bempolida 80 No meio do penedo há uma gruta penumbrosa voltada para oeste rumo ao Érebo e vós junto dela dirigireis a cava nau ilustre Odisseu Da côncava nau nem um varão animoso com arco flechando alcançaria a cava gruta 85 É aí que mora Cila de latido assombroso Sua voz ao ladrar de um filhote de cão equivale mas ela mesma é portento vil ninguém se jubilaria ao vêla nem mesmo um deus Ela tem doze pés todos sem panturrilha 90 e seis são os pescoços bem longos e em cada um uma aterrorizante cabeça com dentes em três fileiras cerrados e múltiplos cheios de negra morte Até a metade na cava gruta está embrenhada e mantém as cabeças fora da furna assombrosa 95 lá mesmo pesca em volta do penedo buscando delfins focas e se acaso pega maior portento dos que milhares cria Anfitrite altogemido Nunca se ouviram nautas incólumes proclamar ter escapado com a nau leva em cada cabeça 100 um herói após arrancálo da nau proacobalto O outro penedo verás que é mais raso Odisseu os dois próximos entre si à distância de uma flecha Nele há uma grande figueira abundante em folhas abaixo dela a divina Caríbdis sorve negra água 105 Três vezes esguicha ao dia três vezes sorve assombrosa que lá não te encontres durante o sorvo do mal não te protegeria nem mesmo o tremesolo Rápido do penedo de Cila bem achegando a nau passa ao largo pois é muito melhor 110 lastimar da nau seis companheiros que todos juntos Assim falou mas eu a ela terrorizado disse Vamos deusa digame sem evasivas se acaso poderia esquivarme da nefasta Caríbdis e resistir à outra quando ela tentar lesar meus companheiros 115 Assim falei e ela logo respondeu deusa divina Terrível Não é que os feitos marciais te ocupam tanto o labor que não te submetes a deuses imortais Ela não é mortal vê mas um mal imortal assombrosa aflitiva selvagem e indomável 120 não é caso de bravura o melhor é dela fugir Se te demoras armado junto à pedra temo que de novo atacando a ti alcance as cabeças todas e agarre número igual de heróis Mas passa com todo ímpeto grita por Crátaiis 125 a mãe de Cila que a gerou como desgraça aos mortais Ela então a impedirá de atacar uma segunda vez E à ilha de Trinácia chegarás lá muitas vacas de Sol e ovelhas robustas pastam Sete rebanhos de vacas há e tantos de belas ovelhas 130 cada um com cinquenta Elas não têm descendentes e nunca soçobram Divinas são as pastoras ninfas belastranças Luzidia e Brilhosa essas que a divina Neaira gerou para Sol Hipérion e a elas após nutrir e gerar a senhora mãe 135 transladou à ilha de Trinácia para longe morarem e vigiarem as ovelhas paternas e as vacas lunadas Se as deixares intactas e cuidares do retorno também Ítaca mesmo sofrendo males alcançaríeis se as lesares então prevejote o fim 140 de barco e companheiros Tu mesmo se escapares chegarás tarde mal após perder todo companheiro Assim falou e logo veio Aurora tronodourado Ela então para dentro da ilha partiu divina deusa mas eu fui de volta à nau e pedi aos companheiros 145 que entrassem e os cabos soltassem Eles logo embarcaram e sentaramse junto aos calços e alinhados golpeavam o mar cinzento com remos Para nós detrás da nau proacobalto soprava nobre companheira benigna brisa enchevela que enviara 150 Circe beloscachos fera deusa de humana voz De pronto após cuidar de cada cordame na nau sentamos e vento e timoneiro a dirigiam Então aos companheiros disse aflito no coração 153ª Ouvi meu discurso companheiros mesmo sofrendo Amigos não carece que só um ou dois conheçam 155 os ditos divinos que Circe me anunciou deusa divina Assim eu falarei para que cientes ou morramos ou evitando a perdição da morte escapemos Das Sirenas prodigiosas primeiro mandou que evitemos sua voz e o prado florido 160 Mandou ainda que só eu a voz ouvisse pois a mim com nó apertado prendei para imóvel eu aí mesmo quedar reto no mastro e nele fiquem amarrados os cabos Se eu vos suplicar e solicitar que me soltem que então vós com mais laços me amarreis 165 Tudo isso relatei e expus aos companheiros nisso a nau engenhosa célere alcançou a ilha das Sirenas uma brisa favorável a impelia Logo depois o vento parou uma calmaria surgiu sem ventos e a divindade amainou as ondas 170 De pé companheiros enrolaram a vela da nau Puseramna na cava nau e eles junto aos remos sentados branquearam a água com os pinhos polidos E eu a um grande naco de cera com bronze afiado fragmentei e apertava com mãos robustas 175 Logo a cera amoleceu pois impeliua a grande pressão e o raio de Sol o senhor Hipérion tampei os ouvidos de cada um dos companheiros Na nau prenderamme mãos e pés por igual reto no mastro e nele amarraram os cabos 180 sentados golpeavam o mar cinzento com remos Mas quando estávamos à distância de um grito rápido viajando elas não ignoraram a nau saltadora surgir próxima e deram vazão a canto agudo Vem cá Odisseu muitahistória grande glória dos aqueus 185 ancora tua nau para ouvires nossa voz Nunca ninguém passou por aqui em negra nau sem antes ouvir a melíflua voz que vem de nossa boca mas ele se deleita e parte com mais saber De fato sabemos tudo que na extensa Troia 190 aguentaram argivos e troianos por obra dos deuses Sabemos tudo que ocorre sobre a terra nutremuitos Assim falaram lançando belíssima voz Meu coração quis ouvir e num movimento das celhas solicitei aos companheiros que me soltassem eles remavam 195 De pronto ergueramse Perimedes e Euríloco e com mais laços prenderamme e apertaram bem Depois que por elas passamos então nem mais ouvimos o tom das Sirenas nem seu canto e presto meus leais companheiros retiraram a cera 200 que tampara seus ouvidos e soltaramme dos laços Quando deixamos essa ilha logo depois vi fumaça e grande onda e escutei um rugido Eles se assustaram voaram os remos das mãos e todos atroaram na corrente parou lá mesmo 205 a nau e braços não mais moviam os remos propulsores Eu cruzando a nau instigava os companheiros com fala amável achegandome a cada homem Amigos por certo não somos inexpertos em males Este mal vede não é maior que quando o ciclope 210 prendeunos na cava gruta com violência brutal mas também lá com minha excelência plano e mente escapamos e creio que disso lembraremos Mas vamos o que eu falar obedeçamos todos Com os cabos golpeai a profunda rebentação do mar 215 sentados junto às correias esperando Zeus conceder que evadamos e escapemos desse fim e para ti timoneiro isto imponho e no ânimo lançao pois controlas o leme da cava nau a nau afasta para longe daquela fumaça e da onda 220 busca o penedo e que a nau de ti não escape mudando de rumo e nos lances no mal Assim falei e presto obedeceram minhas palavras De Cila não mais falei flagelo invencível para que temerosos os companheiros não abdicassem 225 da remada e se abrigassem a si mesmos E então a ordem pungente de Circe negligenciei pois pedira que não me armasse eu entrei na armadura gloriosa e duas lanças grandes peguei nas mãos e subi na plataforma da nau 230 na proa aí esperei que primeiro surgisse Cila rochosa que trazia desgraça aos companheiros Nenhures pude vislumbrála e meus olhos cansaram esquadrinhando em toda direção a rocha embaciada E nós entre lamentações navegávamos o estreito 235 de um lado Cila de outro a divina Caríbdis terrível sorvia água salina do mar Quando regurgitava como caldeirão em fogo alto efervescia toda agitada e para o alto a espuma tombava sobre os picos dos dois penedos 240 Mas quando engolia água salina do mar para dentro aparecia inteira agitada e ao redor as rochas fremiam terríveis e embaixo surgia a terra cobalto com areia e um medo amarelo atingiuos Nós a miramos temendo o fim 245 então Cila da côncava nau tomoume seis companheiros nos braços e força os melhores Quando fitei a nau veloz e também os companheiros já vislumbrei seus pés e braços acima alçados ao alto e gritavam chamandome 250 pelo nome a última vez aflitos no coração Como quando de um cabo pescador com longa vara lança petiscos como isca a peixes miúdos ao mar arremessa um chifre de boi campestre fisga um peixe puxao para fora e ele se convulsiona 255 assim eles convulsionandose eram alçados à rocha Lá na entrada devorouos enquanto guinchavam e estendiam os braços a mim em terrível refrega Foi a mais deplorável cena que vi com meus olhos de tudo que aguentei cruzando as rotas do mar 260 Mas após dos rochedos escaparmos da fera Caríbdis e de Cila logo depois à impecável ilha do deus chegamos lá estavam as belas vacas largafronte e muitas ovelhas robustas de Sol Hipérion Então quando eu ainda estava no mar da negra nau 265 ouvi o mugido de vacas sendo encurraladas e o balido das ovelhas e em meu ânimo caiu a palavra do adivinho cego o tebano Tirésias e de Circe de Aiaie que com insistência me ordenou evitar a ilha de Sol deleitamortal 270 Então aos companheiros disse aflito no coração Ouvi meu discurso companheiros mesmo sofrendo pois vos direi os ditos proféticos de Tirésias e de Circe de Aiaie que com insistência me ordenou evitar a ilha de Sol deleitamortal 275 dizia lá estar o mais terrível mal para nós Vamos ao largo dessa ilha guiai a negra nau Assim falei e de cada um o coração se rachou Logo Euríloco respondeu com hediondo discurso És terrível Odisseu teu ímpeto sobeja teus membros 280 nunca cansam é de supor seres todo de ferro tu que a companheiros extenuados por sono e fadiga não permites desembarcar em terra onde de novo na ilha correntosa faríamos saborosa refeição mas pedes que erremos em vão na noite veloz 285 vagando para longe da ilha no mar embaçado À noite duros ventos destroçadores de naus ocorrem para onde alguém fugiria do abrupto fim se acaso de chofre viesse rajada de vento de Noto ou do revolto Zéfiro os que mais 290 despedaçam naus à revelia dos senhores deuses Mas agora por certo obedeçamos à negra noite e preparemos o jantar aguardando junto à nau veloz na aurora embarcando nós a lançaremos ao amplo mar Isso falou Euríloco e aprovaram os demais companheiros 295 Então percebi que a divindade armava males e falando dirigilhe palavras plumadas Euríloco deveras forçaime eu sendo um só Vamos agora juraime todos vigoroso juramento se um rebanho de vacas ou grande tropa de ovelhas 300 acharmos que ninguém com iniquidade vil mate uma vaca ou ovelha tranquilos comei o alimento que deu Circe imortal Assim falei e eles logo juraram como eu pedi E após jurar por completo esse juramento 305 ancoramos em porto cavo a nau engenhosa perto de água doce e os companheiros desceram da nau e depois prepararam o jantar com destreza E após apaziguar o desejo por bebida e comida choravam ao lembrarse dos caros companheiros 310 os que Cila comeu pegandoos da cava nau enquanto choravam veiolhes sono prazeroso No terço final da noite findo o périplo dos astros Zeus juntanuvens instigou vento bravio com prodigiosa tempestade e com nuvens encobriu 315 terra e mar por igual e a noite desceu do céu Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos puxamos o barco e o levamos à cava gruta lá havia belas arenas e assentos de ninfas Então eu realizando assembleia disse entre eles 320 Amigos como na nau veloz há comida e bebida fiquemos longe daquelas vacas para não sofrermos essas vacas e robustas ovelhas são de fero deus de Sol que tudo enxerga e tudo ouve Assim falei e de todos convenci o ânimo orgulhoso 325 Mês inteiro incessante Noto soprou e nenhum outro vento surgiu depois exceto Euro e Noto Enquanto tinham pão e vinho tinto distanciaramse das vacas almejando seu sustento Mas quando toda a comida da nau esgotouse 330 e errantes por necessidade acossavam presas peixes e aves o que lhes chegasse às mãos com anzóis recurvos e a fome torturava o estômago nisso parti para dentro da ilha para aos deuses rogar esperando que um me mostrasse a rota de volta 335 Quando dentro da ilha escapei dos companheiros após lavar as mãos onde havia proteção contra o vento rezei a todos os deuses que do Olimpo dispõem e eles vertiam doce sono sobre minhas pálpebras E Euríloco entre os companheiros iniciou plano vil 340 Ouvi meu discurso companheiros mesmo sofrendo Há muitas mortes hediondas para os pobres mortais e o mais deplorável é morrer achar o fado de fome Mas vamos toquemos as melhores vacas de Sol e sacrifiquemos aos deuses que do largo páramo dispõem 345 E se chegarmos a Ítaca à terra pátria de imediato a Sol Hipérion ergueremos templo rico onde poremos oferendas muitas e valiosas E se enraivecido pelas vacas chifrereto ele quiser destruir a nau e o apoiarem os demais deuses 350 prefiro de uma vez boca aberta na onda perder a vida a fenecer longo tempo numa ilha deserta Isso falou Euríloco e aprovaram os demais companheiros De imediato tocaram as melhores vacas de Sol das cercanias pois não longe da nau proacobalto 355 pastavam as lunadas belas vacas largafronte a essas cercaram e oraram aos deuses após colher delicadas folhas de carvalho altacopa pois não tinham branca cevada na nau bomconvés E depois de orar degolar e esfolar 360 deceparam as coxas e com gordura as encobriram camada dupla e sobre elas puseram peças cruas Sem vinho para aspergir no chamejante sacrifício libavam com água e assavam todas as vísceras Mas após queimarem coxas e comerem vísceras 365 trincharam o restante e transpassaram em espetos Nisso o sono prazeroso abandonou minhas pálpebras e me encaminhei à nau veloz e à orla do oceano Quando estava perto da nau ambicurva circundoume o doce odor de gordura 370 Com um clamor entre os deuses imortais fizme ouvir Zeus pai e outros ditosos deuses semprevivos deveras para a ruína me adormecestes em sono impiedoso e os companheiros à espera armaram grande feito Rápido até Sol Hipérion foi o mensageiro 375 Brilhosa peplobomtalhe pois matamos as vacas dele Logo aos imortais falou irado no coração Zeus pai e outros ditosos deuses semprevivos puni os companheiros de Odisseu filho de Laerte que brutais mataramme as vacas elas que a mim 380 dão alegria quando vou ao páramo estrelado e quando me dirijo do céu de volta à terra Se não me pagarem compensação devida descerei ao Hades e brilharei entre os mortos Em resposta disselhe Zeus juntanuvens 385 Sol quanto a ti brilha para os imortais e humanos mortais sobre o solo fértil já eu rápido posso lançar um raio cintilante na nau veloz e estilhaçála no meio do mar vinoso Pois isso eu ouvi de Calipso belastranças 390 e ela disse ter ouvido do condutor Hermes Quando desci até a nau e o mar pusme a ralhar com cada um mas remédio algum conseguimos achar as vacas já estavam mortas Logo os deuses exibiramlhes um prodígio 395 as peles caminhavam as carnes nos espetos mugiam cozidas ou cruas e o som era como o das vacas Por seis dias então meus leais companheiros banquetearamse tocando as melhores vacas de Sol quando o sétimo dia fixou Zeus filho de Crono 400 então o vento parou de correr com a tempestade e nós logo embarcamos e lançamola ao amplo mar após erguer o mastro e as brancas velas içar Mas quando deixamos a ilha nenhuma outra terra apareceu exceto o páramo e o mar 405 e então nuvem cobalto pôs o filho de Crono sobre a cava nau e o mar escureceu abaixo dela Ela não correu muito mais tempo rápido veio guinchando Zéfiro correndo com grande tempestade A rajada de vento rasgou os estais do mastro 410 ambos o mastro caiu para trás e todo cordame tombou no porão eis que ele na popa da nau golpeou a cabeça do timoneiro e despedaçou os ossos todos da cabeça semelhante a um mergulhador caiu da plataforma e o ânimo orgulhoso deixou os ossos 415 Zeus trovejou e junto lançou um raio sobre a nau ela inteira sacolejou golpeada pelo raio de Zeus e de enxofre se encheu e os companheiros caíram da nau A eles quais corvosmarinhos em volta da negra nau as ondas levavam e o deus negoulhes o retorno 420 Já eu perambulava pela nau até que uma onda soltou as tábuas da quilha essa nua a vaga levava E uma onda arrancou o mastro e arremessouo contra a quilha mas nele penduravase o patarrás feito de pele bovina Com ele ambos juntei quilha e mastro 425 e sentado sobre eles fui levado por ventos ruinosos Nisso Zéfiro parou de correr com a tempestade e rápido veio Noto trazendo aflições ao meu ânimo para que ainda medisse a destrutiva Caríbdis Por toda a noite fui levado e ao nascer do sol 430 cheguei ao penedo de Cila e à fera Caríbdis Essa sorvia água salina do mar mas eu na grande figueira alçado ao alto nela preso segureime como morcego Impossível apoiarme com os pés firmemente ou subir 435 as raízes estavam bem longe os galhos bem no alto longos e grandes sombreavam Caríbdis Firme me segurei até ela de volta regurgitar mastro e quilha para mim ansioso vieram por fim Na hora em que sai da ágora para jantar o varão 440 o que julga muita contenda de animosos pleiteadores nessa hora de Caríbdis surgiram os destroços Deixei que braços e pernas do alto despencassem e no meio ribombei ao lado da madeira comprida sentado sobre ela remei com minhas mãos 445 O pai de varões e deuses não mais permitiu que Cila eu encarasse pois não escaparia de abrupto fim De lá nove dias fui levado e a mim na décima noite da ilha de Ogígia achegaram os deuses onde Calipso mora a belastranças fera deusa com voz humana 450 que me acolhia e zelava Por que isso te reconto Pois já ontem te narrei na casa para ti e à altiva esposa detesto de novo recontar o falado por completo Assim falou e todos atentos se calaram tomados por feitiço pelos umbrosos salões A ele por sua vez Alcínoo respondeu e disse Odisseu como vieste a minha casa chãobrônzeo 5 grandiosa por isso creio que não vagando de novo de volta retornarás ainda que muito sofreste A cada um de vós varões dou essa ordem a todos que no meu palácio o vinho fulgente dos conselheiros sempre bebeis e prestais atenção ao cantor 10 roupas para o hóspede já no baú bempolido estão ouro muito artificioso e todos os outros dons que os comandantes feácios cá trouxeram vamos ofereçamolhe grande trípode e caldeirão cada varão a nós depois amealhando junto ao povo 15 se retribuirá é duro um só ser generoso de graça Assim falou Alcínoo e agradoulhes o discurso eles para se deitar voltaram a suas casas Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos à nau apressaramse e levaram fortificante bronze 20 O sacro ímpeto de Alcínoo acomodou os objetos sob os bancos ao percorrer a nau que aos companheiros não estorvassem ao impulsionála com sua remada e foram à casa de Alcínoo e ocuparamse do banquete Sacrificoulhes um boi o sacro ímpeto de Alcínoo 25 a Zeus nuvemnegra o filho de Crono que a todos rege Queimadas as coxas partilharam com deleite majestoso banquete e entre eles cantava divino cantor Demódoco honrado pelo povo Mas Odisseu amiúde dirigia a cabeça ao sol resplandecente 30 ansioso que se pusesse sim tinha gana de retornar Como quando almeja comer o varão cujos bois vinosos o dia todo pousio acima tracionam arado articulado ele se alegra ao se pôr a luz do sol é hora de jantar e os joelhos fraquejam quando vai 35 assim para Odisseu alegria se pôs a luz do sol De pronto entre os feácios navegadores falou e sobretudo a Alcínoo fez um discurso revelador Poderoso Alcínoo insigne entre todos os povos conduzime incólume após libarem e alegraivos 40 Pois já se completou o que meu caro ânimo queria condução e caros dons que esses os deuses celestes me tornem afortunados em casa a impecável consorte após retornar eu encontre com os meus ilesos Vós aqui ficando regozijaivos com as esposas 45 lídimas e os filhos que deuses concedam sucesso vário e que mal algum ocorra na cidade Assim falou e todos aprovavam e o incitavam a conduzir o hóspede pois falara com adequação E ao arauto falou o ímpeto de Alcínoo 50 Mentenomar mistura na ânfora e distribui o vinho a todos no salão para que após rezar a Zeus pai conduzamos o hóspede a sua terra pátria Isso dito Mentenomar misturou vinho adoçajuízo e distribuiuo a todos achegandose e aos deuses 55 ditosos libaram os que do largo páramo dispõem a partir de seus assentos E ergueuse o divino Odisseu nas mãos de Arete pôs o cálice duplaalça e falando dirigiulhe palavras plumadas Sê feliz rainha sem cessar até a velhice 60 e a morte chegarem essas aos homens sobrevêm Eu estou retornando tu nesta casa te deleita com os filhos o povo e o rei Alcínoo Isso disse e sob o umbral marchou o divino Odisseu O ímpeto de Alcínoo enviou com ele um arauto 65 para guiálo à nau veloz e à orla do oceano Eis que Arete enviava escravas mulheres com ele uma com o manto bemlavado nas mãos e a túnica a outra com o compacto baú carregado a terceira levava pão e vinho tinto 70 E após descerem até a nau e o mar logo tudo toda comida e bebida depuseram os ilustres condutores após receber na cava nau e acomodaram para Odisseu manta e linho na plataforma da cava nau para dormir profundo 75 na popa Ele mesmo embarcou e deitouse em silêncio eles sentaramse junto aos calços a par em ordem e o cabo soltaram da pedra furada Quando se reclinaram e com o remo jogaram água um sono prazeroso caíalhe sobre as pálpebras 80 profundo dulcíssimo de perto semelhante à morte A nau como um quarteto de cavalos machos no plaino todos juntos instigados por golpes de chicote para cima pulando efetuam rápido o trajeto assim a sua popa pulava e onda atrás 85 agitada grande aviavase do mar ressoante Ela muito segura corria firme nem gavião a acompanharia a mais ligeira das aves Assim ela rápido correndo cortou as ondas do mar levando o varão com projetos similares aos dos deuses 90 que antes muitas aflições sofreu em seu ânimo cruzando guerras de homens e ondas pungentes agora sereno dormia esquecido do que sofrera Quando o astro ia alto o mais luzente que mormente vem anunciar a luz de Aurora nascecedo 95 da ilha achegouse a nau cruzamar Há um porto de Fórcis o ancião do mar na cidade de Ítaca Aí mesmo há dois salientes cabos abruptos a partir do porto agachandose Eles rebatem grande onda que ventos bravos 100 trazem de fora dentro sem laços permanecem naus bomconvés ao atingirem o meio a ancoragem Há na cabeça do porto uma oliveira folhalonga e perto dela a agradável caverna brumosa consagrada a ninfas chamadas Náiades 105 Nela há ânforas e vasos duplaalça de pedra lá então abelhas fazem colmeias Nela há teares de pedra bem longos onde ninfas tramam mantos púrpura assombro à visão nela há águas permanentes E tem duas entradas 110 uma do lado de Bóreas os homens podem usar a outra do lado de Noto é dos deuses nunca por aí entram os homens é via dos imortais Nesse porto entraram conhecendoo de antemão Depois a nau aportou em terra firme mais ou menos até a metade 115 ligeiro pois impelida pela mão de tais remadores Eles da nau firmebanco desembarcaram em terra e primeiro ergueram Odisseu da cava nau junto com o linho e as mantas lustrosas e puseramno sobre a areia dominado pelo sono 120 e ergueram os bens que a ele feácios ilustres deram graças à animosa Atena pois ia para casa Assim agruparam tudo ao pé da oliveira fora do caminho para que homem viajante algum antes de Odisseu acordar passando o lesasse 125 e eles retornaram para casa Mas tremesolo não esqueceu as ameaças com que ao excelso Odisseu antes ameaçara e indagou o desígnio de Zeus Zeus pai eu nunca mais entre deuses imortais serei honrado quando a mim mortais não honram 130 justo os feácios que são de minha estirpe De fato pensei que Odisseu muito mal sofreria antes de chegar em casa do retorno nunca o privei de todo desde que tu primeiro juraste e sinalizaste eles o levaram em nau veloz pelo mar dormindo 135 depuseramno em Ítaca e deramlhe dons incontáveis bronze ouro a granel veste tecida muito o que nem de Troia teria recebido Odisseu ainda que incólume tivesse chegado com sua parte do butim Respondendo disselhe Zeus juntanuvens 140 Incrível tremeterra amplopoder como falaste Por certo não te desonram os deuses difícil seria golpear com desonras o mais respeitável e nobre Ainda que a ti um varão cedendo à força e ao vigor não honrasse depois sempre tens a vingança 145 Faça como quiseres e te for caro ao ânimo E a ele respondeu Posêidon tremesolo De imediato eu faria nuvemnegra como dizes mas sempre respeito e evito teu ânimo Agora porém quero a bem bela nau dos feácios 150 voltando da condução sobre o mar embaçado golpear para que cessem afinal e abdiquem da condução de homens e com grande morro encobrir sua urbe Respondendo disselhe Zeus juntanuvens Querido isto ao meu ânimo parece ser o melhor 155 quando a ela prestes a atracar já mirar todo o povo a partir da cidade tornea pedra perto da terra semelhante a nau veloz para se espantarem todos os homens e que morro não encubra sua urbe Após isso escutar Posêidon tremesolo 160 pôsse rumo a Esquéria onde vivem os feácios Lá aguardou e ela bem perto chegou a nau cruzamar facilmente impelida Para perto dela foi tremesolo e tornoua pedra e enraizou nas profundas após golpeála com a mão para baixo e ele partiu 165 Eles entre si falavam palavras plumadas os feácios navegadores varões famosos pelas naus E assim falavam fitando quem estava ao lado Ai de mim pois quem prendeu a nau veloz no mar prestes a atracar Já estava toda visível 170 Assim falavam e não sabiam o que fora arranjado E entre eles Alcínoo tomou a palavra e disse Incrível de fato alcançoume um velho dito divino de meu pai dizia que Posêidon se irritaria conosco pois somos seguros condutores de todos 175 Disse que um dia bem bela nau de varões feácios voltando da condução sobre o mar embaçado seria destroçada e um grande morro encobriria nossa urbe Assim falava o ancião e tudo isso agora se completa Mas vamos o que eu disser obedeçamos todos 180 Cessai a condução de mortais quando um deles chegar a nossa cidade e a Posêidon touros doze escolhidos sacrifiquemos esperando que se apiede e que um grande morro não encubra nossa urbe Assim falou e eles temeram e prepararam os touros 185 E assim eles rezavam ao senhor Posêidon dirigentes e capitães do povo dos feácios de pé em volta do altar E acordou o divino Odisseu do sono na terra pátria e não a conheceu já há muito afastado pois um deus vertia bruma em torno 190 Palas Atena filha de Zeus para que a ele mesmo tornasse irreconhecível e a ele tudo explicasse e que não o conhecessem esposa conterrâneos e os seus antes de os pretendentes expiarem toda a transgressão Assim tudo parecia mudar de forma para o senhor 195 as sendas contínuas e os portos seguros rochedos alcantilados e árvores verdejantes De pé tendose erguido observou a terra pátria e então bramou bateu em suas duas coxas com a palma das mãos e lamuriandose disse 200 Ai de mim dessa vez atinjo a terra de que mortais Serão eles desmedidos selvagens e não civilizados ou hospitaleiros com mente que teme o deus Aonde devo levar esses muitos bens Por onde eu vago Que eu tivesse ficado junto aos feácios 205 lá mesmo eu até a outro rei poderoso teria ido e ele depois de me acolher me faria retornar Agora não sei onde os guardar mas aqui não os deixarei que não se tornem butim para outros Incrível não em tudo ponderados e civilizados 210 foram os líderes e capitães dos feácios eles que me trouxeram a outra terra falaram que a mim conduziriam a Ítaca bemavistada e não cumpriram Zeus dossuplicantes os puna que também a outros homens observa e pune quem comete uma falta 215 Mas chega que eu observe e conte as riquezas temo que partiram na cava nau levandome algo Após falar assim as trípodes bem belas e bacias contava o ouro e as belas vestes tecidas De nada sentiu falta Lamentava a terra pátria 220 arrastandose ao longo da praia do mar bem ressoante lamuriandose muito E das cercanias veiolhe Atena semelhante no corpo a jovem varão pastor de ovelhas todo delicado tal como são os filhos de senhores com manto engenhoso dupla dobra nos ombros 225 nos pés reluzentes trazia sandálias e nas mãos a lança Vendoa Odisseu jubilou foi até ela e falando dirigiulhe palavras plumadas Meu caro como és o primeiro que topo nessa terra saúdote e não vem até mim com mente vil 230 mas protege isto e protege a mim a ti eu mesmo rezo como ao deus e de teus joelhos me achego E dizeme isto a verdade para eu bem saber que terra que povo que varões vivem aqui Acaso uma ilha bemavistada ou uma ponta 235 de terra grandesglebas jaz inclinada rumo ao mar E a ele dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja És tolo estranho ou chegaste de longe se indagas acerca desta terra Não é de todo assim sem nome muitos conhecemna bem 240 os que habitam na direção da aurora e do sol e os que mais atrás rumo à treva brumosa Ela é escarpada não é boa para cavalgar e não é muito pobre mas larga não é Nela de fato o cereal é ilimitado e nela vinho 245 há sempre a tomam a chuva e o farto orvalho É boa para criaremse cabras e bois há bosques de todo o tipo e bebedouros perenes nela há Assim o nome de Ítaca estranho chegou a Troia que dizem ficar longe da terra aqueia 250 Isso falou e jubilou o muitatenência divino Odisseu alegre com sua terra pátria como lhe disse Palas Atena filha de Zeus portaégide e falando dirigiulhe palavras plumadas a ela não disse a verdade refreou o discurso 255 a mente muitaargúcia a calcular no peito Ouvi falar de Ítaca também na ampla Creta longe no mar e agora eu mesmo chego com estas riquezas tantas ainda deixei a meus filhos e me exilei pois matei o caro filho de Idomeneu 260 Tocaioso nos pés veloz que na ampla Creta vencia com os pés ligeiros varões diligentes porque quis se apropriar de todo o meu butim troiano pelo qual sofri aflições no ânimo cruzando guerras de homens e ondas pungentes 265 porque a seu pai eu não servi nem agradei na terra troiana mas liderei outros companheiros Com lança brônzea o atingi ele que voltava do campo de tocaia perto da trilha eu e um companheiro uma noite muito escura tomava o páramo e a nós homem 270 nenhum percebeu e sem ser notado tirei sua vida Mas depois de matálo com o bronze afiado de pronto fui a uma nau a ilustres fenícios supliquei e parte do butim para seu gáudio lhes dei pedilhes que me admitissem e levassem a Pilos 275 ou à divina Élida onde dominam os epeus Mas então a força do vento os afastou de lá muito contra sua vontade e não quiseram enganarme de lá vagando chegamos aqui à noite Com esforço remamos à baía e nenhum de nós 280 se lembrou de comer mesmo muito carentes mas assim após desembarcar da nau deitamos todos Lá de mim exausto o doce sono se achegou e eles tendo recolhido minhas riquezas da cava nau puseramnas onde eu mesmo repousava na areia 285 Embarcaram rumo à Sidônia bemhabitada mas eu fui deixado angustiado no coração Assim falou e sorriu a deusa Atena olhosdecoruja e acariciouo com a mão já no corpo como uma mulher bela grande e conhecedora de radiantes trabalhos 290 e falando dirigiulhe palavras plumadas Ladino e furtivo aquele que te ultrapassasse em todos os ardis mesmo se um deus te topasse Terrível variegadaastúcia insaciável de ardis Não ias nem mesmo estando em tua terra cessar os engodos 295 e discursos furtivos que do fundo te são caros Vamos não falemos mais disso ambos conhecemos maneios pois és de longe o melhor de todos os mortais em planos e discursos e eu entre todos os deuses na astúcia famosa e nos maneios e não reconheceste 300 Palas Atena filha de Zeus que sempre em todas as tarefas está junto a ti e te protege e caro a todos os feácios também te tornou Agora porém aqui vim para contigo tramar um truque e esconder toda a riqueza que a ti os ilustres feácios 305 deram graças a meu plano e mente para te trazer à casa e vim dizer quantas agruras em tua casa construída deverás suportar resiste mesmo sob pressão Não declares para nenhum homem ou mulher ninguém que chegaste após vagar mas em silêncio 310 sofre muitas aflições submisso à violência dos varões Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia É difícil deusa a um mortal frente a ti reconhecerte mesmo bem destro pois te tornas semelhante a tudo Isto eu sei bem que no passado eras minha amiga 315 enquanto em Troia peleávamos os filhos de aqueus Porém após saquear a escarpada urbe de Príamo partimos nas naus e um deus dispersou os aqueus e depois não mais te vi filha de Zeus nem percebi entrares em minha nau para de mim afastares aflição 320 Mas sempre com coração dividido em meu peito vaguei até que deuses me livraram da desgraça Por fim na gorda cidade dos feácios encorajandome com palavras à urbe me guiaste Agora pelo pai me atiro a teus joelhos não creio 325 ter chegado à bemavistada Ítaca mas por outra terra erro e creio que tu melindrandome falaste isso para iludires meu juízo dizeme se deveras à cara pátria cheguei E a ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja 330 Sempre há em teu peito uma tal ideia por isso não consigo te deixar quando estás mal porque és decente sagaz e prudente Outro varão que chegasse após vagar feliz iria até seu palácio para ver filhos e esposa 335 a ti não é caro saber nem te informar antes de testar tua esposa que está sentada no palácio e para ela sempre agonizantes se esvaem as noites e os dias a verter lágrimas Eu porém disto nunca duvidei mas no ânimo 340 sabia que retornarias após perder todo companheiro mas eu não quis vê lutar contra Posêidon irmão de meu pai com rancor contra ti no ânimo irado pois cegaste seu filho querido Mas vamos Ítaca te mostrarei para te convenceres 345 aquela é a baía de Fórcis o ancião do mar e aquela na cabeça do porto a oliveira folhalonga e perto dela a agradável caverna brumosa consagrada a ninfas chamadas Náiades aquela é a ampla gruta arqueada onde tu amiúde 350 sacrificaste hecatombes completas às ninfas e aquele é o Nérito monte revestido com um bosque A deusa disse isso dissipou a bruma e surgiu a região e então jubilou o muitatenência divino Odisseu alegre com sua terra e beijou o solo fértil 355 De pronto rezou às ninfas após erguer as mãos Ninfas Náiades filhas de Zeus eu nunca pensei que vos fosse ver Agora com preces suaves alegraivos também daremos dádivas como antes se me permitir a solícita filha de Zeus a trazbutim 360 eu mesmo viver e ela deixar meu caro filho crescer E a ele dirigiuse a deusa Atena olhosdecoruja Coragem que isso não te ocupe o juízo os bens no recesso da caverna prodigiosa ponhamos logo para ficarem protegidos 365 e cogitaremos como se dará de longe o melhor Após dizer isso a deusa penetrou na gruta brumosa tateando atrás de buracos pelas paredes já Odisseu presto tudo trazia ouro rígido bronze e vestes bemfeitas coisas que os feácios lhe deram 370 Isso bem condicionou e uma pedra depôs na entrada Palas Atena a filha de Zeus portaégide E os dois sentados ao pé da sacra oliveira planejavam o fim dos pretendentes soberbos Então tomou a palavra a deusa Atena olhosdecoruja 375 Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque planeja como descer o braço nos aviltantes pretendentes que já três anos em teu salão arrogamse senhores cortejando a excelsa esposa e oferecendo dádivas ela sempre chorando teu retorno no ânimo 380 a todos dá esperança e faz promessas a cada varão enviando recados e sua mente concebe outra coisa Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Incrível a sorte ruim de Agamêmnon filho de Atreu por certo seria a minha perecer no palácio 385 se não me tivesses deusa tudo dito ponto por ponto Mas vamos trama o plano de como me vingarei deles fica tu junto a mim lançando ímpeto muitacoragem como quando arrancamos as reluzente faixas de Troia Se ficares assim zelosa junto a mim olhosdecoruja 390 até mesmo contra trezentos varões eu lutaria contigo senhora deusa se me socorresses solícita E a ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja Por certo junto a ti não te perderei de vista quando te ocupares disso creio que muitos 395 respingarão o chão semfim com sangue e miolos os varões pretendentes que devoram teus recursos Vamos te farei irreconhecível para todos os homens enrugarei a bela pele sobre os membros recurvos destruirei as madeixas loiras da cabeça com trapos 400 te vestirei visão que torna odioso quem os usa opacos ficarão teus olhos antes tão belos para que pareças repulsivo a todos os pretendentes a tua mulher e ao filho ele que no palácio deixaste Tu mesmo primeiro te dirijas ao porqueiro 405 o guardião de teus porcos contigo também gentil que quer bem a teu filho e à prudente Penélope Vais encontrálo junto às porcas elas pastam junto à pedra Corvo sobre a fonte Aretusa bebendo água escura e comendo bolotas deliciosas 410 que engordam o rico toicinho dos porcos Lá permanece e junto a ele tudo pergunta enquanto eu for até Esparta belasmulheres chamar Telêmaco teu caro filho Odisseu que à espaçosa Lacedemônia até Menelau 415 partiu para se informar de tua fama se ainda vivias Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia E por que não lhe disseste sabendo tudo no juízo Para que ele também vagando por aí sofresse agonias no mar ruidoso e os outros comessem seus recursos 420 E a ele respondeu a deusa Atena olhosdecoruja Que ele não te cause tanta inquietação Eu mesma o conduzi para conquistar distinta fama ao ir para lá ele não está se esfalfando mas tranquilo está na casa do filho de Atreu junto a riqueza indizível 425 É certo que jovens o tocaiam com negra nau ansiando matálo antes que atinja a terra pátria mas nisso não creio antes ainda a terra cobrirá alguns varões pretendentes que devoram teus recursos Após falar assim com a vara tocouo Atena 430 Enrugou a bela pele sobre os membros recurvos destruiu as madeixas loiras da cabeça com a pele de um velho ancião envolveu todos os membros e deixou opacos os olhos antes tão belos Envolveuo com outro trapo vil e uma túnica 435 rasgados sujos desfigurados por vil fumaça e enrolouo na grande pele de um cervo veloz gasta Deulhe bastão e repulsivo alforje todo rasgado e nele uma corda havia sua alça Os dois ponderaram assim e separaramse Ela então 440 foi à divina Lacedemônia atrás do filho de Odisseu Mas ele da baía marchou pela trilha escarpada mato acima pelos cumes para onde a ele Atena indicou o divino porcariço que de seus recursos mais cuidava ele dentre os servos do divino Odisseu 5 Eis que no vestíbulo o encontrou sentado onde muro alto em local todo protegido fora erguido belo e grande todo em volta o muro o porqueiro mesmo erguera para os porcos ausente o senhor distante da senhora e do ancião Laerte 10 com blocos arrastados e um arbusto espinhoso coroando Puxou por fora estacas contínuas nas duas direções cerradas e numerosas após fender o negror do carvalho No interior do cercado fez doze chiqueiros perto um do outro leitos de porcos em cada 15 cinquenta porcos que deitam no solo estavam presos fêmeas reprodutoras Machos passavam a noite fora bem menos numerosos escasseavam pois comiamnos os excelsos pretendentes já que o porqueiro enviava sempre o melhor de todos os bemnutridos cevados 20 desses havia trezentos e sessenta Com eles cães quais feras sempre passavam a noite quatro que criara o porqueiro líder de varões O homem ajustava sandálias em torno dos pés cortando bovina pele bemtratada os outros já 25 se haviam ido um para cada lado com os porcos reunidos os três obrigado o quarto enviara para a cidade levando porco aos soberbos pretendentes para o abaterem e com carne saciar o ânimo De chofre avistaram Odisseu os cães ladradores 30 Eles ruidosos correram mas Odisseu sentouse astucioso e o bastão caiu de sua mão Lá ao lado de sua quinta teria sofrido dor ultrajante mas o porqueiro rápido pés ligeiros foi atrás lançandose ao pórtico e o couro caiu de sua mão 35 Aos brados dispersou os cães um para cada lado com pedras sucessivas e dirigiuse ao senhor Ancião quase meus cães te despedaçavam num instante e entornarias ignomínia sobre mim Já me deram os deuses outras aflições e gemidos 40 angustiado lamentandome pelo excelso senhor fico sentado e crio para outros porcos cevados como alimento mas ele desejoso por comida vaga por povo e cidade de varões outralíngua se em algum lugar ainda vive e vê a luz do sol 45 Vem à cabana sigamos ancião para que também tu após com comida e bebida saciarte no ânimo fales donde és e quantas agruras suportaste Dito isso à cabana conduziuo o divino porcariço e fêlo sentarse galhos espessos jogou 50 e sobre eles estendeu pele de felpudo bode selvagem na qual dormia grande e espessa Odisseu alegrouse por assim ser recebido dirigiuselhe e nomeouo Que Zeus te dê anfitrião e os outros deuses imortais o que mais desejas pois solícito me recebeste 55 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Estranho não é minha norma desonrar um estranho nem se pior que tu chegasse de fato sob Zeus estão todos os estranhos e mendigos Pequeno e querido é o nosso dom pois esse é o hábito dos escravos sempre temerosos 60 quando têm o poder senhores jovens Por certo os deuses estancaram seu retorno ele que iria me acolher com atenção e ofertar bens tanto quanto dá a seu servo um bondoso senhor casa gleba e mulher muitopretendente 65 se para ele muito labuta e o deus propicia a lida como também propiciou essa lida onde fico De muito me teria valido o senhor se aqui tivesse envelhecido mas morreu Como devia a linhagem de Helena morrer ajoelhada pois soltou os joelhos de muito varão 70 aquele também foi pela honra de Agamêmnon até Ílion belospotros para combater troianos Dito isso com o cinto rápido prendeu a túnica e foi aos chiqueiros onde confinava grupos de leitões De lá pegou dois levouos e a ambos abateu 75 queimou as cerdas cortouos e transpassou nos espetos Após tudo assar levou e pôs diante de Odisseu quente espetos e tudo e aspergiu branca cevada Então na cumbuca misturou vinho doce como mel e ele mesmo defronte sentouse e incitandoo disse 80 Come agora hóspede o que cabe aos escravos leitões porcos cevados comem os pretendentes sem atentar no juízo ao olhar divino ou à compunção Pois os deuses ditosos não gostam de ações terríveis mas honram a tradição as ações moderadas dos homens 85 Pois inimigos hostis esses que sobre terra estrangeira marcham e Zeus lhes dá butim enchem as naus e embarcam para retornar à casa e em seu juízo cai o forte medo do olhar divino mas aqueles sabem ouviram a voz de um deus 90 do fim funesto dele se não querem tradicionalmente cortejar nem retornar aos seus mas tranquilos os bens abocanham brutos sem restrição Tantas quantas são as noites e os dias de Zeus nunca sacrificam só uma vítima ou duas 95 brutos devastam o vinho exaurindoo Sim suas provisões eram incontáveis tais nenhum varão herói possui nem no escuro continente nem na própria Ítaca Nem de vinte heróis é tamanha a riqueza e eu para ti contarei 100 doze rebanhos bovinos no continente tantos de ovelhas tantos de porcos machos tantos dispersos de cabras apascentam estrangeiros e varões pastores dele mesmo Aqui rebanhos de cabras dispersos onze no total nos confins se apascentam e distintos varões vigiam 105 Sempre um deles a cada dia levalhes uma cabeça das bemnutridas cabras a que parecer a melhor Mas eu guardo e protejo essas porcas aqui e o melhor dos porcos seleciono e enviolhes Isso disse o outro com gosto carne comia e vinho bebia 110 voraz quieto e engendrava males aos pretendentes Após jantar e fortificar o ânimo com a comida também deulhe após enchêla a caneca da qual bebia cheia de vinho Ele a aceitou alegrouse no ânimo e falando dirigiulhe palavras plumadas 115 Amigo quem é que te comprou usando seus bens assim tão rico e poderoso como dizes Falavas que pereceu devido à honra de Agamêmnon Dizeme talvez o conheça de alhures tal homem Zeus talvez saiba e os demais deuses imortais 120 se eu poderia têlo visto e anunciar pois longe vaguei E a ele respondeu o porqueiro líder de varões Ancião nenhum varão chegando após vagar aquele anunciando convenceria a mulher e o caro filho pois carentes de cuidados varões vagantes 125 mentem e não querem o que é verdade enunciar Aquele que vagando a cidade de Ítaca alcança vai até minha senhora com palavreado embusteiro ela o recebe bem acolhe e tudo apura e lamentandose tombamlhe lágrimas das pálpebras 130 norma para a mulher se o marido alhures perece Ligeiro também tu ancião fabricarias um conto se alguém capa e túnica vestes te desse Dele já devem os cães e as aves velozes a pele dos ossos estar puxando e a vida o deixou 135 ou no mar comeramno os peixes e seus ossos jazem na costa cobertos por muita areia Assim lá pereceu e agruras ulteriores aos amigos todos sobretudo a mim se puseram nunca outro senhor assim amigável terei em lugar algum 140 nem se à casa do pai e da mãe novamente chegar onde primeiro nasci e fui criado Nem por eles ainda choro tanto embora ansiando com os olhos vêlos estando na terra pátria mas a saudade do ausente Odisseu me domina 145 Eu a ele hóspede embora não esteja aqui me acanho para nomear demais me estimava e zelava no ânimo não denominoo irmão até estando longe E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Amigo já que de todo o negarás dizes que nunca 150 aquele voltará e teu ânimo é sempre incrédulo pois eu não enunciarei assim mas jurando que Odisseu está retornando Bom anúncio seja o meu de pronto quando aquele vier e sua casa alcançar me vestirás com belas vestes capa e túnica 155 antes embora bem necessitado nada receberia Pois odioso igual aos portões de Hades a mim aquele se torna quem cedendo à pobreza usa palavreado embusteiro Saiba agora Zeus antes dos deuses a hospitaleira mesa e o fogolar do impecável Odisseu ao qual cheguei 160 por certo tudo isso completase como afirmo Neste mesmo período interlunar chegará aqui Odisseu a lua minguando e depois crescendo à casa irá retornar e vingarse de todo aquele que aqui desonra sua esposa e o filho ilustre 165 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Ancião eis que nem eu essa recompensa pagarei nem Odisseu virá mais para casa mas tranquilo bebe e lembremos adiante outras coisas e disso não me faze lembrar sim o ânimo em meu peito 170 afligese quando sou lembrado do devotado senhor O juramento pois abandonemos e Odisseu venha como a ele queremos eu Penélope o ancião Laerte e o deiforme Telêmaco Agora há inconsolável dor pelo filho que gerou Odisseu 175 Telêmaco Após os deuses o nutrirem feito broto pensava que ele também entre varões não seria pior que seu caro pai admirável em porte e beleza mas um imortal golpeouo no juízo equilibrado ou um homem partiu atrás de novas do pai 180 rumo à mui sacra Pilos A ele os ilustres pretendentes na volta para casa tocaiam para a linhagem desaparecer de Ítaca sem o nome ficar o do excelso Arquésio Pois a ele deixemos de lado ou será pego ou escapará sobreposta a mão do filho de Crono 185 Mas vamos ancião tuas próprias agruras relatame e dizeme a verdade para eu bem conhecêla quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais Chegaste em que nau Como a ti os nautas conduziram até Ítaca Quem proclamaram ser 190 De modo algum creio que a pé aqui chegaste Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Portanto a ti com muita precisão isso direi Houvessenos agora por bom tempo comida e doce vinho e nós dentro da cabana ficássemos 195 para calmo banquete e os outros seguissem obrando fácil então até durante um ano inteiro não cessaria de contar as agruras que trago no ânimo todo o conjunto que pelo poder dos deuses aguentei Proclamo ser de uma linhagem da ampla Creta 200 o filho de abastado varão Muitos outros filhos na casa nasceram e cresceram legítimos da esposa Geroume comprada mãe concubina mas a mim igual aos naturais honrava Castor filho de Latidor de cuja linhagem proclamo ser 205 ele que um dia como deus honrouse na terra cretense por conta da fortuna riqueza e filhos majestosos Mas a ele veio a sina da morte e levouo à casa de Hades e eles os recursos dividiram os filhos magnânimos e jogaram a sorte 210 e bem pouco me deram uma casa atribuíram Foime dada mulher de família abastada graças a minha excelência pois eu não era enganoso nem fugia da guerra Agora tudo já ficou para trás mas de forma geral os vestígios se miras creio 215 reconheceres ainda que me tome abundante miséria Por certo audácia me deram Ares e Atena e força rompebatalhão Quando escolhia para tocaia varões excelentes engendrando males a inimigos nunca o ânimo orgulhoso pressentia minha morte 220 ao contrário após bem na frente saltar com lança matava quem dentre os varões inimigos recuasse com os pés Esse eu era na guerra mas o trabalho não me era caro tampouco o senso doméstico que cria radiantes crianças sempre me foram caras naus com remos 225 guerras dardos bempolidos e flechas coisas funestas que para os outros horripilantes são Mas isso erame caro o que o deus pôs no juízo cada varão se deleita em trabalhos distintos Pois antes de pisarem em Troia os filhos de aqueus 230 nove vezes comandei varões em naus velozes contra varões estrangeiros e cabiame muita coisa Disso escolhia bens encantadores e muito erame atribuído logo minha casa enricou e então fizme assombroso e respeitável entre os cretenses 235 Mas quando esta rota hedionda Zeus amplavisão planejou a que soltou joelhos de muitos varões nisso insistiam que eu e o esplêndido Idomeneu liderássemos naus até Ílion e não havia meio de recusar atavanos a dura fala do povo 240 Nove anos lá combatemos os filhos de aqueus e no décimo a urbe de Príamo pilhamos e partimos para casa nas naus e um deus dispersou os aqueus E para mim coitado armou males Zeus astucioso só um mês aguardei deleitado com os filhos 245 a lídima esposa e os bens mas então ao Egito o ânimo ordenoume navegar e preparei naus com excelsos companheiros Nove naus preparei e rápido a tropa foi reunida Por seis dias então meus leais companheiros 250 banquetearamse e eu providenciava muita vítima para sacrificar aos deuses e àqueles dar um banquete No sétimo embarcamos e da ampla Creta navegamos com Bóreas belo vento sopradoalto fácil como se descendo um caudal e nenhuma 255 nau me foi danificada mas ilesos e saudáveis ficamos e vento e timoneiros as dirigiam No quinto dia atingimos o caudaloso Egito e ancorei no rio Egito as naus ambicurvas Então pedi aos leais companheiros 260 que lá ficassem junto às naus e as guardassem e instiguei batedores a buscar atalaias Aqueles cederam à desmedida seguindo seu ímpeto e ligeiro os bem belos campos de varões egípcios destruíam levavam mulheres e crianças pequenas 265 e matavam os outros Logo à cidade chegou a gritaria Tendo ouvido a algaravia quando a aurora surgiu vieram o plaino todo encheuse de soldados carros e relampejo brônzeo Lá Zeus prazernoraio lançou fuga vil em meus companheiros e ninguém suportou 270 o enfrentamento pois por todos os lados males havia Lá mataram a muitos dos nossos com bronze afiado e a outros vivos levaram como escravos Mas para mim o próprio Zeus no juízo esta ideia criou eu devia era ter morrido achado o destino 275 lá mesmo no Egito pois ainda uma desgraça me coube rápido tirei da cabeça o elmo bemconstruído o escudo dos ombros e a lança soltei da mão Dirigime para diante dos cavalos do rei tomeilhe os joelhos e beijei Ele acolheume e apiedouse 280 a mim que chorava pôs no carro e levou para casa De fato contra mim muitos arremeteram com chuços ansiando matarme sim sobremodo enraivecidos Mas ele os continha e considerava a cólera de Zeus doshóspedes que mais se indigna com vis ações 285 Então sete anos lá mesmo fiquei e acumulei muitos bens junto aos varões egípcios todos me regalavam Mas quando sobreveio em seu curso o oitavo ano nisso chegou um varão fenício mestre de engodos velhaco que já fizera muitos males aos homens 290 com seu juízo persuadiume a com ele ir à Fenícia onde ficavam sua casa e posses Então junto a ele fiquei no ciclo de um ano Mas quando dias e meses completaramse e o ano fechou seu ciclo e passaram as estações 295 rumo à Líbia colocoume em nau cruzamar planejando mentiras para eu levar carga com ele de sorte a lá me vender e obteria preço indizível Obrigado seguilhe na nau embora intuindo Ela corria com Bóreas belo vento sopradoalto 300 no meio para lá de Creta e Zeus armavalhes o fim Mas quando deixamos Creta nenhuma outra terra apareceu exceto o páramo e o mar e então nuvem cobalto pôs o filho de Crono sobre a cava nau e o mar escureceu abaixo dela 305 E Zeus trovejou e junto lançou raio sobre a nau ela inteira sacolejou golpeada pelo raio de Zeus e encheuse de enxofre e da nau caíram todos A eles quais corvosmarinhos em volta da negra nau levavam as ondas e o deus negoulhes o retorno 310 Mas o próprio Zeus para mim aflito no ânimo o mastro indômito da nau proanegra pôs nas mãos para poder escapar da desgraça Nele enroscado fui levado por ventos ruinosos Nove dias fui levado no décimo da terra dos tesprótios 315 achegoume rolando uma grande onda na noite negra Lá de mim cuidou o rei dos tesprótios Salvador um herói sem cobrar de fato seu caro filho chegou e levoume dobrado por friagem e exaustão para casa após pelo braço me erguer até chegar à morada do pai 320 Vestiume com uma capa e uma túnica Então de Odisseu fui informado aquele dizia têlo hospedado e acolhido quando ia à terra pátria e mostroume as riquezas que Odisseu amealhara bronze ouro e ferro muito trabalhado 325 Agora até a décima geração um por um alimentariam tantos haveres do senhor havia em seu palácio Dele disseme que fora a Dodona para do divino carvalho altacopa escutar a vontade de Zeus como voltaria para a gorda cidade de Ítaca 330 já há muito afastado ou às claras ou às ocultas jurou para mim mesmo entre libações que puxara uma nau e preparara companheiros que o conduziriam à cara terra pátria Mas antes enviou a mim calhou ir uma nau 335 de homens tesprótios a Dulíquion muitotrigo Pediu gentilmente que para lá me levassem até o rei Acasto E agradoulhes no juízo plano vil contra mim para eu entrar de todo na miséria da desdita Quando longe da terra singrava a nau cruzamar 340 logo contra mim engenhavam o dia da escravidão despiramme as vestes capa e túnica e cobriramme com outro trapo vil e uma túnica trapagem que podes ver diante dos olhos À noite chegamos aos campos de Ítaca bemavistada 345 Então amarraramme na nau bomconvés com corda bemtrançada firme desembarcaram e com avidez junto à praia do mar fizeram o jantar Mas meu laço afrouxaram os próprios deuses fácil com trapo encobrindo a cabeça 350 desci pela prancha de carga e aproximei do mar o peito e então com ambos os braços por aí remei nadando e bem rápido estava fora longe deles Lá subi numa área com capão bem florido e deiteime agachado eles gemendo alto 355 zanzavam Porém não lhes pareceu vantajoso investigar alhures e de volta de novo embarcavam na cava nau Esconderamme os próprios deuses fácil e a mim guiando aproximaram da quinta de habilidoso varão ainda é meu destino viver 360 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Pobre hóspede sim meu ânimo muito agitaste falando disso tudo que já sofreste e de quanto vagaste Mas não foi elegante penso nem disso me convencerás a menção a Odisseu Por que tu sendo tal careces 365 levianamente mentir Eu mesmo bem conheço o retorno de meu senhor odiado por todos os deuses de todo muito pois não o subjugaram entre troianos ou nos braços dos seus após arrematar a guerra Morto em guerra todos os aqueus lhe teriam erigido um túmulo 370 e seu filho teria granjeado grande fama para o futuro A ele porém as Harpias agarraram sem registro Mas eu junto aos porcos apartado nem à cidade vou salvo se para algo Penélope bemajuizada reclamar que eu vá quando acaso chega notícia 375 Mas aqueles lá sentados indagam cada detalhe uns aflitos por causa do senhor há tempo ausente outros alegres a comida a devorar de graça Mas não me é caro indagar nem perguntar desde que certo varão etólio me enganou com um discurso 380 ele após matar um varão e pela terra muito vaguear chegou a minha morada e eu o aninhei Disse que em Creta junto a Idomeneu viuo reparando naus que rajadas despedaçaram e disse que chegaria no verão ou na época das frutas 385 muitos bens trazendo com excelsos companheiros Também tu velho aflito como um deus te trouxe a mim não tentes me comprazer nem enfeitiçar com mentiras não por causa disso eu te respeitarei e acolherei mas por temer a Zeus doshóspedes e de ti me apiedar 390 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Deveras esse teu ânimo no peito é incrédulo tanto que mesmo jurando não te induzi nem convenci Mas agora vamos um acordo façamos depois testemunhas de ambos serão os deuses que têm o Olimpo 395 Se retornar teu senhor para essa morada vesteme com vestes capa e túnica e me envia até Dulíquion onde no ânimo foime caro estar Se teu senhor não chegar como estou dizendo instiga os escravos a lançarme da grande rocha 400 para que outro mendigo evite te iludir Respondendo disselhe o divino porqueiro Hóspede assim eu de boa fama e prestígio gozaria entre os homens de imediato e no futuro se eu que te levei à cabana e te dei regalos 405 depois te matasse e privasse do caro ânimo com fervor ofenderia Zeus filho de Crono Agora é hora de comer que logo meus companheiros cá estivessem para na cabana prepararmos saboroso jantar Enquanto assim falavam entre si 410 para perto porcos e varões porcariços vieram Às fêmeas confinaram nos espaços para dormir e estrídulo indizível partiu das porcas encerradas Ele a seus companheiros isto ordenou o divino porcariço Trazei o melhor porco para eu sacrificar ao hóspede 415 longínquo nós mesmos nos beneficiaremos em agonia há tempo vivendo sofrendo por porcos dentebranco outros nossa fadiga incompensada devoram Isso dito rachou lenha com bronze impiedoso e eles trouxeram um porco bem gordo de cinco anos 420 Então o puseram na lareira O porqueiro não esqueceu os imortais pois tinha um juízo bom ele como primícias no fogo lançou cerdas da cabeça do porco dentebranco e rezou a todos os deuses pelo retorno de Odisseu muitojuízo a sua casa 425 De pé golpeouo com toco de carvalho inteiriço e a vida o abandonou Eles o degolaram queimaram cerdas e logo o desmembraram o porqueiro dispôs peças cruas primícias de todos os membros na gorda banha Isso no fogo lançou após aspergir grãos de cevada 430 cortaram o restante transpassaram em espetos assaram com todo o cuidado tudo retiraram e o conjunto lançaram à mesa O porqueiro ergueuse para trinchar no juízo bem sabia o correto E tudo em sete partes separou dividindo 435 uma única às ninfas e a Hermes o filho de Maia dispôs após rezar e as restantes ofereceu a cada um A Odisseu honrou com nacos extensos de lombo do porco dentebranco e enalteceu o ânimo do senhor A ele falando dirigiuse Odisseu muitaastúcia 440 Tomara Eumeu te tornes tão caro a Zeus pai como a mim que com tantas benesses me honras Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Come insano hóspede e deleitate com isto que temos o deus uma coisa dará outra negará 445 como em seu ânimo quiser pois pode tudo Falou e sacrificou o consagrado a deuses sempiternos após libar fulgente vinho a Odisseu arrasaurbe o pôs em suas mãos e esse sentouse junto a sua parte Pão distribuialhes Dopátio a quem o próprio 450 porqueiro adquirira sozinho ausente o senhor sem o conhecimento da senhora e do ancião Laerte junto aos táfios comprouo usando seus bens E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida 455 Dopátio retirou o pão e eles após de pão e carne fartarse para o repouso apressaramse E a noite chegou sinistra lua escura Zeus choveu toda a noite e soprou o grande Zéfiro sempre chuvoso E entre eles falou Odisseu para testar o porqueiro 460 a ver se despindose ele lhe daria a capa ou a outro companheiro incitaria pois que dele cuidava bastante Escuta agora Eumeu e todos os outros companheiros gabandome contarei uma história o vinho impõe doido e te insta embora muitojuízo a cantar 465 e rir levianamente impulsionate a dançar e enunciar uma história que é melhor silenciar Mas como já soltei a língua não me esquivarei Tomara eu fosse jovem e minha força segura como quando sob Troia sofremos ordenada tocaia 470 Comandavam Odisseu e Menelau filho de Atreu e com eles o terceiro a liderar era eu pois mandaram Quando chegamos à urbe e sua muralha escarpada nós em torno da cidade por entre cerrados arbustos em meio a juncos do pântano tombados sob as armas 475 jazíamos e a noite chegou sinistra junto Bóreas gelada e de cima vinha neve como geada fria e gelo se acumulava em volta dos escudos Lá todos os outros dispunham de capas e túnicas e dormiam tranquilos os escudos a cobrirlhe os ombros 480 mas eu a capa ao partir com companheiros deixei insensato por não pensar que faria frio e segui só com escudo e cinturão resplandecente No terço final da noite concluído o périplo das estrelas então me dirigi a Odisseu que estava próximo 485 com o cotovelo o cutuquei e ele sem demora entendeu Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque não mais entre os vivos ficarei já que a mim a friagem extenua pois capa não tenho Induziume a divindade a vir só com túnica agora não há mais como fugir 490 Assim falei e então ele teve esta ideia no ânimo distinto como ele era para planejar e combater e pôsse a falar em voz baixa e dirigiume o discurso Quieto agora que nenhum outro aqueu te escute Falou e sobre o cotovelo ergueu a cabeça e enunciou 495 Ouvi amigos veio até mim no sono divino sonho Bem distantes das naus estamos tomara alguém pudesse dizer ao filho de Atreu Agamêmnon pastor de tropa que ordenasse mais homens viessem das naus Assim falou e lançouse Toas o filho de Andráimon 500 célere deixando para trás a capa marrom pôsse a correr rumo às naus Eu sob suas roupas deiteime feliz e brilhou Aurora tronodourado Fosse eu agora assim jovem e minha força segura um porqueiro me daria na quinta uma capa 505 por duas razões amizade e respeito por bom herói E agora me desonram eu com roupas vis sobre a pele Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Ancião tua história é impecável a que contaste nenhuma palavra desvantajosa e sem adequação pronunciaste 510 assim não disporás de veste nem de outra coisa que convém a um suplicante calejado diante de nós agora mas de manhã sacudirás teus trapos Pois não há muitas capas e túnicas sobressalentes aqui para vestir uma somente para cada homem 515 Mas quando voltar o caro filho de Odisseu ele te dará vestimentas capa e túnica e te enviará para onde teu coração e ânimo impelem Assim falou ergueuse e pôslhe perto do fogo o leito e nele lançou peles de ovelhas e cabras 520 Aí Odisseu deitouse E uma capa sobre ele lançou compacta e grande que sobressalente tinha pronta para vestir quando fizesse mau tempo assustador Assim Odisseu aí repousou e ao lado dele os varões repousaram jovens Ao porqueiro 525 desagradava o repouso lá dormir longe dos porcos então preparavase para sair Odisseu alegrouse pois que cuidava de seus recursos mesmo ele distante Primeiro espada afiada lançou em torno do ombro robusto em volta vestiu a capa protetora bem compacta 530 agarrou o couro de grande cabra bemnutrida e pegou afiada lança proteção contra cães e varões E foi descansar onde os porcos dentebranco sob rocha côncava dormiam ao abrigo de Bóreas E até a espaçosa Lacedemônia Palas Atena foi ao ilustre filho do animoso Odisseu lembrar do retorno e incitálo a retornar Encontrou Telêmaco e o radiante filho de Nestor 5 deitados no vestíbulo do majestoso Menelau o filho de Nestor era dominado por sono macio e a Telêmaco doce sono não dominava mas no ânimo na noite imortal inquietações com o pai o acordavam Parada perto disselhe Atena olhosdecoruja 10 Telêmaco não mais é belo longe de casa vagares deixaste bens para trás e em tua casa varões tão soberbos que não te devorem tudo teus bens dividindo e tu o trajeto faças em vão Mas rápido instiga Menelau bomnogrito 15 a enviarte para ainda topares em casa a mãe impecável Pois seu pai e irmãos já a incentivam a ser desposada por Eurímaco ele supera todos os pretendentes com dons e aumenta as dádivas do pai que contra tua vontade não se levem bens da casa 20 Pois tu sabes é tal o ânimo no peito da mulher quer expandir a casa daquele que a desposa e dos filhos anteriores e do caro esposo não mais se lembra quando morto nem indaga Deverias tu mesmo voltando tudo entregar 25 à escrava que te parecer ser a mais nobre até deuses te revelarem majestosa consorte Outra palavra te direi e tu compreendea no ânimo os melhores pretendentes deliberadamente te tocaiam no canal entre Ítaca e a escarpada Samos 30 ansiando matarte antes que atinjas a terra pátria Não creio nisso porém antes mesmo a terra cobrirá os varões pretendentes que devoram teus recursos Mas para longe das ilhas afasta a nau engenhosa e também à noite navega chegará a ti uma brisa 35 que te envia um dos imortais que te guarda e protege E quando chegares à primeira praia de Ítaca expede à cidade a nau e todos os companheiros e tu mesmo primeiro ao porqueiro te dirijas o guardião de teus porcos contigo também gentil 40 Lá descansa à noite e expedeo à cidade para anunciar a Penélope bemajuizada que estás são e salvo e de Pilos retornaste Ela após falar assim partiu ao elevado Olimpo e ele ao filho de Nestor despertou do doce sono 45 chutandoo com o pé e lhe dirigiu o discurso Acorda Pisístrato filho de Nestor os cavalos monocasco traze e junge ao carro para percorrermos a rota A ele então Pisístrato filho de Nestor retrucou Telêmaco não há como mesmo com pressa partir 50 pela noite escura a guiálos logo virá a aurora Espera até que traga presentes e no carro os ponha o herói filho de Atreu Menelau famosonalança e te anime com palavras suaves e de volta te envie Desse o hóspede se lembra todos os dias 55 do varão hospitaleiro que demonstrar amizade Assim falou e logo veio Aurora tronodourado E achegouse deles Menelau bomnogrito após erguerse do leito de junto de Helena belasmadeixas A ele então vislumbrou o caro filho de Odisseu 60 apressado a túnica lustrosa em torno da pele vestiu lançou grande manto nos ombros robustos o herói foi para fora e parado ao lado disselhe Telêmaco o caro filho do divino Odisseu Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa 65 já agora me envia de volta à cara terra pátria Já deseja meu ânimo vê partir para casa E a ele então respondeu Menelau bomnogrito Telêmaco não por muito tempo aqui te deterei se anseias pelo retorno indignome contra todo 70 varão hospitaleiro que com excesso acolhe ou com excesso odeia tudo que é medido é melhor Igual mal incitar o hóspede que não quer partir a fazêlo e reter o que está apressado Carece acolher o hóspede presente e despedirse do que quer ir 75 Mas fica até que eu traga presentes belos e os ponha no carro tu com os olhos os veja e eu diga às mulheres que no salão preparem o almoço com o que há em profusão Ambos há majestade e esplendor e também auxílio se após comer se percorre a extensa terra semfim 80 Se queres perambular na Hélade até o meio de Argos para eu mesmo contigo seguir jungirei cavalos e às urbes dos homens te guiarei ninguém a nós enviará de volta assim mas nos oferecerão ou alguma trípode de fino bronze ou uma bacia 85 ou duas mulas ou uma taça de ouro A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Filho de Atreu Menelau criadoporZeus líder de tropa quero já retornar até os meus pois atrás não deixei ao vir um guardião de minhas posses 90 que procurando o excelso pai eu mesmo não pereça ou que algum bem valioso do palácio se perca Ao ouvir isso Menelau bomnogrito logo a sua esposa e às escravas ordenou preparar almoço com o que havia em profusão 95 E achegouse Verídico filho de Auxiliador após erguerse do leito pois não morava muito longe mandouo acender o fogo Menelau bomnogrito e carne assar e ele ouviu e obedeceu Menelau desceu ao aposento oloroso 100 não sozinho com ele iam Helena e Grandaflição Mas quando chegaram onde estavam seus bens o filho de Atreu tomou de um cálice duplaalça e ao filho Grandaflição pediu que separasse uma ânfora de prata Helena postouse junto às arcas 105 onde havia peplos bem ornados que ela mesma lavrara Pegou um único deles e levou divina mulher o que era o mais belo com ornamentos e o maior e como um astro refulgia estava embaixo de todos E deslocaramse de volta pela casa até alcançar 110 Telêmaco e a ele disse o loiro Menelau Telêmaco o retorno como em teu juízo concebes que isso te cumpra Zeus o ressoante marido de Hera Dos dons de quantos bens há em minha casa eu te darei o mais belo e mais valioso 115 Uma ânfora bemfeita te darei de prata ela é toda e sua borda tem acabamento em ouro obra de Hefesto Deuma o herói Lúzio rei dos sidônios quando em sua casa albergoume ao lá passar no retorno com ela te quero presentear 120 Falou assim e nas mãos colocou o cálice duplaalça o herói filho de Atreu Eis que a ânfora luzidia trazia o forte Grandaflição e pôs diante dele de prata Ao lado postouse Helena belaface com o peplo nas mãos dirigiuselhe e nomeouo 125 Dom também eu filho querido este te dou lembrança das mãos de Helena para as bodas desejadas que tua esposa o use entrementes junto à cara mãe deposita no palácio Que tu alegre voltes à casa bemconstruída e a tua terra pátria 130 Falou assim e nas mãos o pôs e ele alegre recebeu Esses dons acomodou na cesta o herói Pisístrato após recebêlos e tudo admirou em seu ânimo E levouos para a casa Menelau de loiro cabelo Então os fez sentar em cadeiras e poltronas 135 Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente e junto muitos petiscos oferecendo o que havia 140 Junto o filho de Auxiliador partia carne e a distribuía e o filho do majestoso Menelau escançava vinho E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida então Telêmaco e o radiante filho de Nestor 145 jungiram os cavalos subiram no variegado carro e partiram do pórtico da colunata ressoante E atrás deles ia o filho de Atreu o loiro Menelau com vinho adoçajuízo na mão direita em cálice dourado para os dois libarem e partir 150 Parado diante dos cavalos saudandoos disse Sede felizes jovens e a Nestor pastor de tropa falai pois para mim era como um pai amigável enquanto em Troia peleávamos os filhos de aqueus A ele então o inteligente Telêmaco retrucou 155 Deveras a ele ó criado por Zeus como dizes tudo ao chegarmos contaremos Tomara eu assim após retornar a Ítaca encontrando Odisseu em casa pudesse falar que tendo de ti obtido toda a amizade parti e levei bens em profusão e distintos 160 Depois de ter falado em sua direção voou à direita uma águia com cintilante gansa doméstica do pátio nas garras um prodígio seguiamna berrando varões e mulheres Ela deles se aproximou e à direita adejou diante dos cavalos Aqueles vendoa 165 alegraramse e no peito de todos o ânimo esquentou Entre eles Pisístrato filho de Nestor tomou a palavra Analisa Menelau criadoporZeus líder de tropa se o deus mostrou o presságio a nós dois ou a ti Assim falou e cogitou Menelau caroaAres 170 como após pensar com adequação lhe responderia Antes dele Helena peplobomtalhe falou o discurso Ouvime eu adivinharei como em meu ânimo lançam os imortais e creio que assim se completará Como aquela pegou a gansa criada na propriedade 175 ao vir da montanha onde família e filhote estão assim Odisseu após muitos males sofrer e muito vagar à casa irá retornar e vingarse ou também já em casa está e a todos os pretendentes engendra um mal A ela então o inteligente Telêmaco retrucou 180 Que agora assim fixe Zeus ressoante marido de Hera então a ti também lá rezarei como a um deus Falou e sobre os cavalos lançou o chicote eles bem rápido saltaram através da cidade sôfregos pela planície Agitaram o dia todo o jugo que levavam nos dois lados 185 E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam E chegaram a Feras rumo à casa de Diocles o filho de Tocaioso que Alfeio gerou como filho Lá descansaram à noite e ele lhes regalou Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos 190 jungiram os cavalos e subiram no variegado carro e partiram do pórtico da colunata ressoante Chicoteou para puxarem e eles de bom grado voaram Eis que rápido chegaram à escarpada cidade de Pilos então Telêmaco interpelou o filho de Nestor 195 Filho de Nestor como aceitarias e cumpririas meu discurso Aliados para sempre proclamamos ser por causa da amizade dos pais mas somos coetâneos Este caminho levará ainda mais à concórdia Não me afastes da nau criadoporZeus deixame aqui 200 que o ancião sem eu querer não me retenha em casa ansiando acolherme carece que eu chegue bem rápido Assim falou e o filho de Nestor planejou em seu ânimo como aceitaria e cumpriria com adequação Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim 205 dirigiu os cavalos à nau veloz e à orla do mar na popa da nau desembarcou os belos dons vestes e ouro que Menelau ao outro dera e a ele incitando dirigiu palavras plumadas Com zelo agora embarca e incita todo companheiro 210 antes que eu em casa chegue e informe o ancião Tudo isto conheço bem no juízo e no ânimo como o ânimo dele é brutal não te deixará ir mas ele mesmo cá virá te chamar e não creio que ele voltará sem nada pois estará enraivecido de todo 215 Falou assim chicoteou os cavalos belapelagem de volta à urbe dos pílios e rápido em casa chegou E Telêmaco instigando os companheiros ordenou Organizai o equipamento companheiros na negra nau e nós mesmos embarquemos para realizar a rota 220 Assim falou e eles o ouviram direito e obedeceram e logo embarcaram e sentaram junto aos calços Ele isto preparava e rezava e libava a Atena junto à popa da nau e das cercanias veiolhe um varão de terra distante fugindo de Argos pois a um varão matara 225 e era adivinho Quanto à família descendia de Melampo que antes morava em Pilos mãe de ovelhas e cabras rico entre os pílios notável habitante Então partiu à cidade de outros fugindo da pátria e do animoso Neleu o mais ilustre dos vivos 230 que dele muita riqueza no ciclo de um ano reteve à força Então ele no palácio de Fílaco preso com laço difícil sofria fortes agonias por causa da filha de Neleu e do desvario profundo que lhe pôs no juízo a deusa Erínia visitantedacasa 235 Mas ele escapou da morte tangeu bois muitomugido de Filace até Pilos vingouse do feito ultrajante contra o excelso Neleu e como esposa para o irmão conduziua à casa deste E ele chegou à cidade de outros a Argos nutrepotros pois aí eralhe destinado 240 habitar sendo o rei de muitos argivos Lá desposou sua mulher fez casa grandiosa e gerou Antífates e Adivinhoso filhos poderosos Antífates gerou o animoso Oicleio e Oicleio Anfiarau moveexército 245 ao qual demais amaram Zeus portaégide e Apolo com todo amor e não atingiu o umbral da velhice mas pereceu em Tebas por causa de dons femininos Dele os filhos foram Alcmaion e Anfíloco Adivinhoso por sua vez gerou Polifeides e Ilustre 250 Mas a Ilustre raptou Aurora tronodourado por sua beleza para que ficasse entre imortais e um adivinho do autoconfiante Polifeides Apolo fez de longe o melhor dos mortais após morrer Anfiarau Ele para Hiperésia mudouse com raiva do pai 255 onde morando adivinhava para todo mortal Eis que o filho desse chegou de nome Teoclímeno que então perto de Telêmaco se pôs alcançouo libando e rezando junto à negra nau veloz e falando dirigiulhe palavras plumadas 260 Meu caro já que te alcanço sacrificando nesta terra suplico pelos sacrifícios e pela divindade e depois por ti próprio e pelos companheiros que te seguem Diga a mim que inquiro o que é veraz e não ocultes quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais 265 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Pois eu te falarei estranho com muita precisão Sou de uma família de Ítaca e meu pai é Odisseu se um dia existiu agora já pereceu em funesto fim Por isso agora após obter companheiros e negra nau 270 parti e busquei notícia do pai há tempo ausente E a ele dirigiuse o deiforme Teoclímeno Assim também eu da pátria saí após matar varão de meu povo Muitos irmãos e parentes tinha por Argos nutrepotros com grande poder sobre aqueus 275 para evitar a negra perdição da morte que deles vem exileime pois cumpreme vagar entre os homens Mas admiteme na nau exilado suplicote que eles não me matem pois creio ser perseguido A ele então o inteligente Telêmaco retrucou 280 Claro como queres não te afastarei da nau simétrica mas vem lá serás acolhido com o que temos Após falar assim tomoulhe a lança brônzea estendeua na plataforma da nau ambicurva e ele mesmo embarcou na nau cruzamar 285 Sentouse na popa da nau e junto dele fez sentar Teoclímeno e os outros soltaram os cabos Telêmaco instigando os companheiros pediulhes pegar no cordame e eles com avidez obedeceram O mastro de abeto dentro da côncava enora 290 ergueram fixaram e prenderam com estais e içaram branca vela com tiras de couro bemtrançadas A eles brisa bemvinda enviou Atena olhosdecoruja ventando agitada pelo céu para que bem rápido a nau efetuasse a corrida pela água salina do mar 295 Passou ao largo de Cruno e Cálcis belascorrentes E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam e ela alcançou Feas impulsionada pela brisa de Zeus e passou pela diva Élida onde dominam os epeus Lá então direcionoua rumo às ilhas Ligeiras 300 revolvendo se escaparia da morte ou seria pego Nisso os dois na cabana Odisseu e o divino porcariço jantavam e junto deles jantavam os outros varões Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida entre eles falou Odisseu testando o porqueiro 305 ou ainda o acolheria com atenção e diria para ficar lá mesmo na quinta ou o expediria à cidade Escuta agora Eumeu e todos os outros companheiros de manhã almejo retornar à cidade para mendigar que a ti e aos companheiros eu não esgote 310 Mas aconselhame bem e oferta um nobre guia que me leve até lá pela urbe eu mesmo por necessidade vagarei esperando me estendam caneca e pãozinho E tendo ido à casa do divino Odisseu um anúncio faria à bemajuizada Penélope 315 e me juntaria aos pretendentes soberbos esperando me darem refeição pois têm comida a granel Logo poderia bem servilos no que quisessem Pois eu falarei e tu compreende e me escuta por meio de Hermes condutor que aos feitos 320 de todos os homens graça e majestade confere nenhum mortal disputaria comigo em serviços montar bem o fogo rachar madeira combustível trinchar e assar e escançar serviços que aos bons prestam os inferiores 325 Bem perturbado a ele dirigiuse o porqueiro Eumeu Ai de mim hóspede por que ao teu juízo essa ideia veio Tu deveras almejas lá perecer se de fato queres penetrar na hoste de pretendentes cuja desmedida e violência atinge o céu ferroso 330 Saiba que não são dessa espécie aí os seus serviçais mas jovens bemvestidos com capas e túnicas sempre reluzentes suas cabeças e belas faces esses que àqueles servem bempolidas mesas estão sempre cheias de pão carnes e vinho 335 Não fica ninguém se irrita com tua presença nem eu nem nenhum companheiro que comigo está Mas quando voltar o caro filho de Odisseu ele com vestes te vestirá capa e túnica e te enviará aonde coração e ânimo te impelem 340 E a ele respondeu o muitatenência divino Odisseu Tomara Eumeu te tornes tão caro a Zeus pai como a mim pois cessaste minha errância agonia terrível Perambulação nada pior existe entre os mortais mas devido ao funesto estômago tem vis agruras 345 o varão a quem atingem errância miséria e aflição Agora como me reténs e ordenas que o aguarde vamos falame da mãe do divino Odisseu e do pai que ele ao partir deixou no umbral da velhice se ainda estão entre os vivos sob os raios do sol 350 ou já estão mortos na morada de Hades E a ele dirigiuse o porqueiro líder de varões Portanto a ti hóspede com muita precisão direi Laerte ainda vive e para Zeus reza sempre que a vida desapareça de seus membros na casa 355 assustador como chora pelo filho ausente e pela lídima esposa atilada que a ele demais afligiu ao perecer e tornouo um velho prematuro Ela pereceu de aflição pelo filho majestoso em morte deplorável assim não morra quem 360 dos que nesta terra moram me é caro e benfeitor De fato enquanto ela vivia embora muito aflita então erame caro algo indagar e perguntar pois ela mesma criou a mim e Ctimena peplobomtalhe a filha altiva a mais nova das crianças que gerou 365 com ela fui criado e honravame bem pouco menos Quando ambos atingimos a juventude muito amada casaramna em Same e adquiriram muitos dons a mim com vestes capa e túnica aquela cobriu bem belas para os pés deu alpercatas 370 e ao campo me enviou ainda mais me amava Agora sinto falta disso mas para mim mesmo os deuses ditosos propiciam a lida onde fico disso comi e bebi e dei aos que se deve respeito Da senhora não é possível ouvir algo amável 375 nem palavra nem ação desde que o mal caiu na casa os varões soberbos E escravos demais almejam diante da senhora conversar e de tudo se informar comer e beber e então também algo levar para si ao campo do que sempre esquenta o ânimo dos servos 380 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Incrível quando eras tão pequeno porqueiro Eumeu muito vagaste para longe de tua pátria e dos pais Mas vamos dizeme isto e conta com precisão ou foi devastada a cidade de varões com amplas ruas 385 na qual habitavam teu pai e a senhora mãe ou a ti isolado junto a ovelhas ou junto a bois varões inimigos com naus pegaram e venderam para a casa desse varão que pagou preço digno E a ele dirigiuse o porqueiro líder de varões 390 Hóspede já que isso me perguntas e investigas em silêncio presta atenção deleitate e bebe vinho sentado Essas noites são infindáveis é possível dormir é possível deleitarse em ouvir Não carece que tu antes da hora te deites muito sono também irrita 395 Quanto aos outros a quem o ânimo do coração impele retiremse e durmam despontando a aurora comam e sigam com os porcos do senhor Nós dois na cabana bebendo e banqueteando com as agruras um do outro deploráveis nos deleitemos 400 lembrando mais tarde até com aflições deleitase o varão todo que muitos males sofreu e muito vagou Mas isto eu te direi o que me inquires e questionas Há uma ilha chamada Síria se já escutaste para cima da ilha Codorna onde os raios do sol voltam 405 não populosa por demais mas de fato boa bom gado boas ovelhas rica em vinho muito trigo A fome nunca atinge a comunidade e nenhuma outra doença hedionda sobrevém aos pobres mortais mas quando as tribos de homens envelhecem na urbe 410 vem Apolo arcodeprata com Ártemis e com suas flechas suaves chega e mata Há duas cidades e para elas tudo em dois é dividido sobre essas duas meu pai regia Ricoso filho de Açodado semelhante aos imortais 415 Lá chegaram varões fenícios famosos pelas naus velhacos trazendo milhares de adornos na negra nau Havia na casa de meu pai mulher fenícia bela e grande conhecedora de radiantes trabalhos Eis que iludiramna os muito experientes fenícios 420 Primeiro na lava de roupa um deles junto à cava nau uniuse a ela em enlace amoroso isso que ilude o juízo de bem femininas mulheres ainda que honestas sejam Indagou depois quem seria e de onde teria vindo Ela de pronto indicou a grandiosa casa de meu pai 425 De Sídon muitobronze proclamo ser e sou filha de Aribas cujas riquezas abundam mas os táfios varões piratas me raptaram ao voltar do mercado cá me trouxeram e venderam para a casa desse varão que pagou preço digno 430 E dirigiuselhe o varão que a ela se unira em segredo Portanto agora voltarias conosco para casa para veres a grandiosa casa do pai e da mãe e a eles Por certo ainda vivem e são ditos ricos E a ele dirigiuse a mulher e reagiu com o discurso 435 Isso seria possível se pelo menos quisésseis nautas com jura garantir que para casa me levarão a salvo Assim falou e eles todos logo juraram como pediu E após jurar por completo esse juramento entre eles de novo falou a mulher e reagiu com o discurso 440 Silêncio agora nenhum se dirija a mim com palavras um de vossos companheiros encontrandose ou na rua ou junto à fonte para ninguém ir à casa ao ancião informar o qual após refletir me prenderá com laço difícil e conceberá vosso fim 445 Mantende no juízo o discurso e apressai os negócios Mas quando a nau já estiver plena de recursos enviai à casa rápido uma mensagem trarei inclusive ouro todo o que estiver à mão Também gostaria de dar outra paga pela viagem 450 o filho do bom varão no palácio eu crio ele é tão ladino também corre porta afora Eu o traria à nau e para vós preço altíssimo renderia onde o vendêsseis entre homens outralíngua E ela após falar assim partiu à bela morada 455 eles lá permanecendo junto a nós um ano todo na côncava nau negociaram muitos recursos Mas quando a cava nau carregada estava para o retorno enviaram um mensageiro para avisar a mulher Chegou um varão multiperspicaz à casa de meu pai 460 com corrente de ouro entrelaçado com âmbar Nela no salão as escravas e a senhora mãe puseram as mãos em volta e com os olhos miravam preço oferecendo e ele àquela acenou em silêncio Então após acenar partiu rumo à côncava nau 465 e ela pegoume pela mão e saiu de casa porta afora Encontrou no vestíbulo cálices e mesas de varões convivas que assessoravam meu pai Tinham ido a uma sessão para a fala do povo e ela rápido três taças ocultou sob o colo 470 e levouas eu a segui por conta de cego juízo E o sol mergulhou e todas as rotas escureciam e nós fomos ao porto famoso apressandonos onde estava a nau saltadora dos varões fenícios Eles então embarcaram e cruzavam fluentes caminhos 475 após embarcarem a nós dois e Zeus lançava a brisa Seis dias navegamos sem parar de noite e de dia mas quando o sétimo dia fixou Zeus filho de Crono então atingiu àquela mulher Ártemis vertesetas e no porão ribombou após cair como andorinhadomar 480 Para tornarse butim de focas e peixes jogaramna e eu fui deixado angustiado no coração E de Ítaca achegaramse levandoos vento e água onde Laerte comproume usando seus bens Assim esta terra eu vi com meus olhos 485 E o divinal Odisseu respondeulhe com o discurso Eumeu sim muito agitaste meu ânimo no peito falando dessas tantas aflições que já sofreste no ânimo Mas para ti junto ao mal pôs também algo bom Zeus pois chegaste após muito penar à casa de varão 490 amigável que agora te fornece alimentos e bebida gentil e vives com bons recursos mas eu após vagar por muitas urbes de mortais chego aqui Assim eles disso falavam entre si e não dormiram um tempo longo mas curto 495 logo veio Aurora belotrono Aproximandose da praia os companheiros de Telêmaco soltaram vela abaixaram mastro rápido e à ancoragem a nau impulsionaram com remos Lançaram a âncora e prenderam os cabos da popa eles mesmos desembarcaram na rebentação do mar 500 prepararam refeição e misturaram fulgente vinho Mas após apaziguar o desejo por bebida e comida entre eles o inteligente Telêmaco tomou a palavra Vós agora à cidade guiai a negra nau mas eu irei às terras cultivadas e aos pastores 505 descerei à noite à cidade após ver meus campos De manhã vos ofertarei uma recompensa belo banquete com carnes e vinho suave E a ele dirigiuse o deiforme Teoclímeno Aonde eu filho querido devo ir Devo chegar à casa 510 de que varão dos que regem pela rochosa Ítaca Ou devo ir direto à casa de tua mãe e tua A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Em outras condições eu te mandaria até nós não carecem regalos mas para ti mesmo 515 será pior pois eu estarei longe e a ti a mãe não verá pois com frequência aos pretendentes na casa não se mostra mas longe em cima tece a trama Mas outro varão te indico a quem poderás te dirigir Eurímaco o filho radiante do atilado Polibo 520 a quem agora como a um deus os itacenses miram também é o mais nobre varão que espera desposar minha mãe e possuir a honraria de Odisseu Mas disto sabe Zeus Olímpio morando no céu se para eles antes das bodas cumprirá o dia danoso 525 Assim para ele após falar voou à direita uma ave gavião o rápido mensageiro de Apolo nos pés depenava um pombo e deixava cair penas no chão entre a nau e o próprio Telêmaco Teoclímeno afastandoo dos companheiros 530 deulhe forte aperto de mão e dirigiulhe a palavra Telêmaco não sem o concurso do deus voou o pássaro à direita reconheço nele olhando de frente um presságio Não há outra linhagem mais régia que a tua na cidade de Ítaca vós sois mais potentes sempre 535 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Ah Se essa palavra hóspede se cumprisse então rápido conhecerias a amizade e muitos dons meus tantos que se alguém te visse te diria ditoso Falou e interpelou Peiraio confiável companheiro 540 Peiraio filho de Clítio tu em tudo é quem mais me atende entre os companheiros que a Pilos foram comigo também agora o estranho conduza e em tua casa gentil o acolhe e honra até eu chegar A ele então retrucou Peiraio famosonalança 545 Telêmaco mesmo se ficares muito tempo aqui eu o hospedarei e a ele regalos não serão necessários Após falar assim foi até a nau e pediu aos companheiros que também eles embarcassem e soltassem os cabos Eles logo embarcaram e sentaramse junto aos calços 550 E Telêmaco atou aos pés belas sandálias e tomou a brava lança afiada com ponta de bronze da plataforma da nau e eles soltaram os cabos Após afastála navegavam à cidade como pedira Telêmaco o caro filho do divino Odisseu 555 rápido avançando os pés levaramno até o pátio onde havia miríades de porcas com as quais o porqueiro distinto dormia versado no que agrada aos senhores Nisso os dois na cabana Odisseu e o divino porcariço preparavam o desjejum de manhã após acender o fogo e enviaram os pastores com o conjunto de porcos E para Telêmaco abanaram o rabo os cães ladradores 5 e não ladraram com sua chegada Viu o divino Odisseu os cães abanando o rabo e o som de pés o envolveu Eis que logo a Eumeu dirigiu palavras plumadas Eumeu por certo cá chegará um companheiro ou outro conhecido pois os cães não ladram 10 mas abanam o rabo e escuto o ruído de pés Não havia terminado a fala quando seu caro filho parou no pórtico Estuporado ergueuse o porqueiro e de suas mãos caíram as vasilhas com que se ocupava misturando fulgente vinho Ele apresentouse ao senhor 15 beijouo na cabeça nos dois belos olhos e em ambas as mãos e dele tombou espessa lágrima Como um pai com afeto saúda o caro filho que chega de terra distante no décimo ano único e muito amado por quem sofreu agonia demais 20 assim ao deiforme Telêmaco o porcariço divino beijou e abraçouo todo como a quem da morte escapou Chorando dirigiulhe palavras plumadas Chegaste Telêmaco doce luz não mais eu a ti pensava ver depois que partiste com a nau a Pilos 25 Mas vamos entra caro filho para que no ânimo me deleite vendote há pouco de volta aqui dentro Por certo não vens amiúde ao campo nem aos pastores mas ficas na urbe pois assim deve agradarte no ânimo observar a reunião infernal de varões pretendentes 30 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Será assim papá por tua causa vim para cá para que te veja com os olhos e escute palavra se minha mãe ainda se mantém no palácio ou já um outro varão a desposou e quiçá na cama de Odisseu 35 carente de ocupantes há vis teias de aranha E a ele dirigiuse o porqueiro líder de varões É claro que ela aguarda com ânimo resistente em teu palácio para ela sempre agonizantes esvaem as noites e os dias e verte lágrimas 40 Após falar assim tomoulhe a lança brônzea e ele foi para dentro cruzou o umbral de pedra Quando achegouse cedeulhe assento o pai Odisseu Telêmaco do outro lado conteveo e disse Senta estranho nós também temos assento alhures 45 em nossa quinta há um varão aqui que o arranjará Isso disse e ele de novo sentou Para o outro o porqueiro jogou galhos verdes e um velo sobre eles lá então sentouse o caro filho de Odisseu Para eles o porqueiro dispôs gamelas com carnes 50 cozidas que na véspera deixaram ao comer pão amontoava com zelo em cestas e eis que na cumbuca misturou vinho doce como mel ele próprio sentouse diante do divino Odisseu E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos 55 Mas após apaziguar o desejo por comida e bebida nisso Telêmaco interpelou o divino porcariço Papá de onde veio esse estranho Como nautas trouxeramno até Ítaca Quem proclamaram ser De modo algum creio que a pé aqui chegou 60 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Portanto eu te falarei filho toda a verdade Proclama ser de uma família da ampla Creta e diz ter perambulado por muitas urbes vagando isso destinoulhe a divindade 65 Agora porém fugiu da nau de varões tesprótios e chegou a minha quinta e eu o porei em tuas mãos Faça como quiseres teu suplicante proclama ser A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Eumeu deveras aflitiva essa fala que falaste 70 Como é que ao estranho eu acolherei em casa Eu próprio sou jovem e nos braços não confio para afastar um varão quando primeiro endurece No peito de minha mãe o ânimo cogita dividido ou ficar aqui junto a mim e dirigir a casa 75 respeitando a cama do marido e a fala do povo ou já seguir quem for dos aqueus o melhor varão que a corteja no palácio e que mais oferta Mas ao estranho pois alcançou tua casa vou vestilo com capa e túnica belas vestes 80 darei uma espada duaslâminas e sandálias para os pés e enviarei aonde coração e ânimo o impelem Se queres cuida dele tu e retémno na quinta vestes para cá enviarei e também comida para que a ti e aos companheiros não esgote 85 Para lá entre os pretendentes eu não o permitiria ir pois se entregam a desmedida assaz iníqua que não o provoquem minha aflição seria terrível Mesmo a um varão altivo é difícil fazer algo em meio aos outros em número tão superior 90 E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Amigo como é norma que eu também responda ao ouvirte dilacerase meu caro coração tais as iniquidades que falastes pretendentes engenham no palácio em oposição a ti sendo quem és 95 Dizeme és oprimido de bom grado ou a ti o povo odeia na região seguindo a sugestão de um deus Ou em algo censura irmãos justo em quem um varão na peleja confia mesmo se ocorre grande contenda Tomara fosse eu tão jovem como jovem é meu ânimo 100 ou o filho do impecável Odisseu eu fora ou mesmo o próprio que chegasse vagando resta ainda uma parte de esperança logo depois poderia cortar minha cabeça um herói hostil caso eu não me tornasse um mal para todos eles achegando ao salão de Odisseu filho de Laerte 105 Se eles mais numerosos me subjugassem preferiria assassinado em meu palácio estar morto a sempre afrontar estes ultrajes eles a maltratar estranhos e arrastar escravas de forma ultrajante na bela morada 110 emborcando vinho e comendo pão assim à toa sem fim para um feito sem remate A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Portanto a ti hóspede com muita precisão direi Nem todo o povo com ódio contra mim endurece 115 nem censuro irmãos justo em quem um varão na peleja confia mesmo se ocorre grande contenda Em nossa linhagem o filho de Crono só dá um único o único filho que Arquésio gerou foi Laerte o único então Odisseu a quem como pai gerou Odisseu 120 o único a mim no palácio gerou e deixou sem desfrutar Por isso agora miríades de inimigos na casa há Com efeito quantos nobres têm poder sobre as ilhas Dulíquion Same e a matosa Zacintos e quantos regem pela rochosa Ítaca 125 tantos cortejam minha mãe e esgotam a casa Ela nem recusar as hediondas bodas nem as completar disso não é capaz eles porém devastam comendo minha casa Logo despedaçarão também a mim Não isso repousa nos joelhos dos deuses 130 Papá vai bem rápido e à prudente Penélope diga que estou são e salvo e de Pilos cheguei Eu ficarei aqui mesmo e tu para cá retorna após só a ela anunciares que nenhum outro aqueu seja informado muitos contra mim engenham males 135 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Compreendo reflito pedes para quem isso entende Mas vamos dizeme isto e conta com precisão se também pela mesma via levo o anúncio a Laerte desventurado que há tempo tão aflito por Odisseu 140 observa os cultivos e com os escravos na casa bebe e come quando o ânimo no peito ordena e agora desde que tu com nau partiste a Pilos dizem que ele não come nem bebe como sempre nem os cultivos olha mas com gemido e lamento 145 senta chorando e soçobra a pele em volta dos ossos A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Tanto pior Ainda assim o deixemos embora angustiados Se para os mortais tudo dependesse da vontade primeiro escolheríamos o dia do retorno de meu pai 150 Mas vai dá o recado e volta e não perambules pelos campos atrás dele e instrua a mãe a mandar criada governanta o mais rápido possível às ocultas ela poderá dar o recado ao ancião Falou e o porqueiro com as mãos pegou sandálias 155 atouas aos pés e à cidade rumou E Atena não ignorou o porcariço Eumeu saindo da quinta e se achegou o corpo como de uma mulher bela grande e conhecedora de radiantes trabalhos Parou no vestíbulo da cabana aparecendo a Odisseu 160 Telêmaco não a viu diretamente nem observou nem sempre os deuses a todos aparecem vívidos mas Odisseu e os cães a viram e não latiram e com ganidos fugiram ao outro lado da quinta Ela com as celhas sinalizou notoua o divino Odisseu 165 saiu do salão para além do grande muro do pátio e parou diante dela E a ele disse Atena Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque diga já agora a teu filho uma palavra e não ocultes para após talhar a perdição da morte aos pretendentes 170 irdes à cidade bem famosa os dois eu própria não estarei muito tempo longe de vós sôfrega por guerrear Falou e com a dourada vara golpeouo Atena Primeiro para ele manto bemlavado e túnica pôs em torno do peito e ampliou seu porte e juventude 175 Logo tornouse pelebronzeada o maxilar esticouse e preta ficou a barba em volta do queixo Ela após agir assim partiu de volta e Odisseu foi à cabana O caro filho assombrouse com ele receou ser um deus lançou os olhos ao outro lado 180 e falando dirigiulhe palavras plumadas Diferente de antes estranho surgiste agora mesmo tens outras vestes e tua pele não é a mesma Por certo és um deus eles que do largo páramo dispõem Sê propício para te darmos sacrifícios comprazedores 185 e dons de ouro bemfeitos e poupa os nossos A ele respondeu o muitatenência divino Odisseu Não sou um deus por que me comparas a imortais Porém sou teu pai aquele por quem gemes e sofres muita agonia submetido à violência de varões 190 Após falar assim beijou o filho e da face escorreram lágrimas ao chão antes as contivera Não convencido de que era seu pai Telêmaco de novo a ele dirigiu palavras em resposta e disse Tu não és Odisseu o meu pai mas divindade que a mim 195 enfeitiça para que chorando ainda mais eu gema Por certo um varão mortal não engendraria isso com sua própria mente exceto se o deus ele mesmo viesse e querendo fácil tornasseo jovem ou velho Com efeito há pouco eras velho e vestias andrajos 200 agora te assemelhas a deuses que do largo páramo dispõem Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Telêmaco não convém com o caro pai aqui dentro ficares aturdido em excesso nem te admirares Vê nenhum outro Odisseu ainda virá para cá 205 mas eu aqui tal e qual após muito sofrer muito vagar cheguei no vigésimo ano à terra pátria Mas sabe que este feito foi de Atena trazbutim a qual me torna assim como quer pois é capaz ora semelhante a um mendigo ora de novo 210 a um jovem varão com belas vestes no corpo É fácil para os deuses que do largo páramo dispõem ou glorificar um homem mortal ou rebaixálo Após falar assim sentouse e Telêmaco abraçou o nobre pai e gemeu vertendo lágrimas 215 E nesses dois foi instigado desejo por lamento choravam alto com mais veemência que pássaros britaossos ou abutres garraadunca cujo filhotes camponeses sequestram antes de tornaremse alados assim eles sob as celhas vertiam lágrimas lamentáveis 220 Enquanto choravam teria se posto a luz do sol se Telêmaco não tivesse logo interpelado o pai Pois a ti em que nau agora caro pai nautas te conduziram até Ítaca Quem proclamaram ser De modo algum creio que a pé aqui chegaste 225 E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Portanto eu a ti filho contarei a verdade Feácios trouxeramme famosos pelas naus também a outros homens conduzem aqueles que os alcançarem a mim trouxeram em nau veloz pelo mar dormindo 230 depuseramme em Ítaca e deramme dons incontáveis bronze ouro a granel veste tecida Isso graças aos deuses encontrase numa gruta agora aqui vim por instruções de Atena para planejarmos a matança dos inimigos 235 Mas vamos dizme o número de pretendentes para que eu saiba quantos e que varões são após ter cogitado em meu ânimo impecável ponderarei ou só nós dois poderemos resistir os únicos ou deveremos a outros buscar 240 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Pai sempre ouvi de tua grande fama lanceiro nos braços e refletido nos planos mas falaste grande demais espantome não teria como dois varões combaterem contra muitos e altivos 245 De pretendentes não há uma dezena ou só duas mas muito mais logo saberás aqui o número De Dulíquion cinquenta e dois jovens seletos e seis servos os seguem de Same são vinte e quatro heróis 250 de Zacintos vinte são os jovens aqueus e da própria Ítaca doze os melhores todos e com eles estão o arauto Médon um divino cantor e dois assistentes versados trinchadores Se a eles todos encararmos quando dentro estiverem 255 que não te seja amarga e cruel a vingança pela violência Mas tu se puderes cogitar algum protetor pondera um que nos protegesse com ânimo solícito E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Portanto eu falarei e tu compreende e me escuta 260 e observa se para nós Atena com o pai Zeus bastará ou se devo cogitar algum outro protetor A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Distintos sim esses dois protetores de quem falas embora no alto nas nuvens sentados eles a outros 265 varões também regem e a deuses imortais E a ele dirigiuse o muitatenência divino Odisseu Sabe que os dois muito tempo não ficarão longe do combate violento quando entre os pretendentes e nós em meu palácio o ímpeto de Ares se decidir 270 Mas agora quando a aurora aparecer parte para casa e reúnete aos pretendentes soberbos o porcariço me levará mais tarde à cidade eu assemelhado a um mendigo débil e velho Se me desonrarem pela casa que teu caro coração 275 resista no peito mesmo que eu sofra de forma vil ainda que na casa pelos pés me puxem porta afora ou com petardos me atinjam tu ao vires te contém Claro mandeos interromper tal loucura com palavras amáveis convencendoos a ti eles não 280 obedecerão pois perto deles já chega o dia fatal Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança quando a muitoplano puser em meu juízo Atena a ti farei um sinal com a cabeça e presta atenção tantas armas de guerra quantas há no palácio 285 guardaas no fundo do quarto de alto pédireito todas e aos pretendentes com palavras macias ludibria ao te arguirem sentindo falta delas Tireias da fumaça pois não pareciam mais com aquelas que Odisseu deixou para trás ao ir a Troia 290 mas se desfiguraram tão atingidas foram pelo bafo do fogo Ademais o filho de Crono pôs algo maior no meu juízo que bêbados após começar briga entre vós não vos ferissem uns aos outros e estragassem o banquete e a corte o ferro por si puxa o homem 295 Só para nós duas espadas e duas lanças deixa e duas adargas para pegar com as mãos de sorte a nos lançar sobre elas e as agarrar e a eles Palas Atena enfeitiçará e também o astucioso Zeus Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança 300 se de verdade és meu e de nosso sangue que ninguém saiba que Odisseu está dentro que Laerte disso não saiba nem o porqueiro nenhum servo nem a própria Penélope mas só tu e eu conheceremos a intenção das mulheres 305 Ainda poderíamos testar os escravos varões quem acaso nos honra e teme no ânimo e quem é malcriado e te desonra sendo quem és Respondendo disselhe o filho ilustre Pai meu ânimo também depois penso 310 conhecerás não me dominam ideias frouxas Mas isso eu não penso que será uma vantagem para nós dois e peçote que ponderes Muito tempo ficarás em vão testando cada um campos percorrendo e eles no palácio tranquilos 315 os bens abocanham brutos sem restrição Mas eu peço que examines as mulheres as que te desonram e as que são inocentes aos varões eu não quereria pela quinta que os testássemos isso faremos depois 320 se de verdade sabes de prodígio de Zeus portaégide Assim eles disso falavam entre si e eis que a Ítaca foi guiada a nau engenhosa que trouxe Telêmaco e todos os companheiros de Pilos Quando eles entraram no porto bem profundo 325 puxaram a negra nau para a terra firme as armas lhes carregaram assistentes autoconfiantes e logo até Clítio levaram os presentes bem belos Mas um arauto enviaram à casa de Odisseu para fazer o anúncio à bemajuizada Penélope 330 que Telêmaco estava no campo e mandara a nau à cidade singrar para que temerosa no ânimo a altiva senhora não vertesse lágrima suave E os dois toparamse arauto e divino porqueiro por causa do mesmo anúncio a ser dado à mulher 335 Mas quando atingiram a casa do divino senhor o arauto junto às servas no meio delas falou Vê rainha teu caro filho já voltou E para Penélope falou o porcariço parado perto tudo que o caro filho pedira que lhe enunciasse 340 Mas depois que transmitiu o anúncio inteiro foi em direção aos porcos e deixou casa e salão E os pretendentes perturbados e abatidos no ânimo saíram do palácio para além do grande muro do pátio e lá mesmo diante dos portões sentaramse 345 Entre eles Eurímaco filho de Polibo começou a falar Amigos feito inaudito com soberba foi cumprido por Telêmaco esse trajeto Cremos que não o cumpriria Vamos negra nau puxemos a que for a melhor e reunamos marinheiros remadores que de pronto 350 àqueles anunciarão que rápido à casa retornem Não havia sido dito tudo quando Anfínomo viu a nau após afastarse de seu lugar no porto bem profundo eles recolhendo a vela e segurando os remos nas mãos Gargalhou com prazer e dirigiuse aos companheiros 355 Não enviemos mais o anúncio eilos aí dentro Ou um deus lhes disse isso ou viram eles mesmos a nau passando e não conseguiram alcançála Assim falou ergueramse e foram à orla do mar Rápido puxaram a negra nau para a terra firme 360 e assistentes autoconfiantes lhes levaram as armas Eles à ágora foram em grupo e a ninguém mais permitiam nem jovem nem velho com eles sentar Entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo Incrível como os deuses livraram da desgraça esse varão 365 De dia vigias sentavamse pelos picos ventosos sempre se revezando quando o sol se punha nunca em terra descansávamos à noite mas no mar com nau veloz navegando esperávamos a diva Aurora tocaiando Telêmaco para pegálo e matálo 370 nisso eis que um deus o levou para casa Nós aqui para ele planejemos funesto fim para Telêmaco que de nós não escape pois não creio estando ele vivo que esses feitos serão realizados Ele próprio é hábil na mente 375 e o povo não nos traz mais apoio Mexeivos antes que ele convoque os aqueus para a ágora não creio que relaxará mas se entregará à ira e de pé entre todos contará que lhe costuramos morte abrupta mas não o alcançamos 380 e eles não aprovarão ao ouvir os feitos danosos que não nos inflijam dano e nos expulsem de nossa terra obrigandonos a partir para outras regiões Que o matemos após pegálo no campo longe da urbe ou na senda retenhamos seus recursos e posses 385 após tudo dividir entre nós com adequação e a propriedade a daremos a sua mãe e a quem a desposar Se a vós esse discurso desagrada e antes preferis que ele viva e mantenha todos os bens paternos então não devoremos aos montes as posses fascinantes 390 aqui reunidas mas cada um da sua morada que a corteje tentando com dádivas ela então casará com quem mais ofertar e a ela for destinado Assim falou e eles todos atentos se calaram E entre eles Anfínomo tomou a palavra e disse 395 o ilustre filho de Niso o senhor filho de Areto ele que da herbosa fértil Dulíquion conduzia pretendentes e quem a Penélope mais agradava pelos discursos pois tinha juízo valoroso Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse 400 Amigos eu não gostaria que Telêmaco fosse assassinado é terrível a linhagem divina matar primeiro indaguemos os planos dos deuses Se permitirem as normas do grande Zeus eu mesmo o matarei e exortarei todos os outros 405 se os deuses desencorajarem peço que desistam Assim falou Anfínomo e agradoulhes o discurso Presto após se eguerem foram à casa de Odisseu chegaram e sentaramse nas poltronas polidas E ela outra coisa pensou Penélope bemajuizada 410 aparecer aos pretendentes donos de brutal desmedida Soubera no palácio do planejado fim de seu filho falaralhe o arauto Médon que dos planos se inteirara E pôsse rumo ao salão com suas criadas mulheres Quando alcançou os pretendentes divina mulher 415 parou ao lado do pilar do teto sólida construção após puxar para diante da face o véu reluzente e a Antínoo reprovou dirigiuselhe e nomeouo Antínoo desmedido artífice de males e dizem de ti na terra de Ítaca que entre os camaradas és o melhor 420 em planos e discursos mas estás longe de sêlo Louco por que tu para Telêmaco o quinhão da morte costuras e desconsideras os suplicantes dos quais é Zeus testemunha Não é pio costurar males um para o outro Não sabes de quando aqui chegou teu pai em fuga 425 temendo o povo Sim estavam muito enraivecidos porque tendose ligado aos piratas táfios ele lesara os tesprótios que eram nossos aliados A ele quiseram destruir arrancar seu coração e devorar o rico e delicioso sustento 430 mas Odisseu a eles ansiosos segurou e conteve Agora comes em sua casa de graça cortejas a esposa o filho tentas matar e a mim me enche de aflições Para e exorta os outros a também parar A ela Eurímaco filho de Polibo retrucou 435 Filha de Icário Penélope bemajuizada coragem que isso não te ocupe o juízo Não existe o varão nem existirá nem nascerá que contra Telêmaco teu filho descerá o braço enquanto eu viver e sobre a terra vigiar 440 Pois assim eu falarei e de fato isto se completará de pronto seu negro sangue jorrará em volta da lança nossa pois também a mim Odisseu arrasaurbe amiúde em seus joelhos me sentava carne assada punhame nas mãos e serviame o vinho tinto 445 Por isso Telêmaco me é de longe o mais caro de todos os varões e por certo peçolhe não temer morte advinda de pretendentes a dos deuses não se evita Assim falou encorajador e ele mesmo preparava seu fim Ela após subir aos aposentos lustrosos 450 chorou por Odisseu caro esposo até para ela o sono doce sobre as pálpebras lançar Atena olhosdecoruja À noite o divino porqueiro com Odisseu e o filho veio ter eles diligentes preparavam o jantar após abater um porco de um ano E Atena 455 postandose perto a Odisseu filho de Laerte com golpes da vara de novo fez dele um ancião e vestiulhe vestes ordinárias no corpo para o porcariço ao vêlo não o reconhecer e à prudente Penélope correr a anunciar incapaz de segurar no juízo 460 A ele Telêmaco por primeiro o discurso enunciou Já chegaste divino Eumeu Que relato corre a cidade Acaso os arrogantes pretendentes já voltaram da tocaia ou ainda lá me esperam a caminho de casa Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu 465 Isso não me interessou apurar e indagar quando à cidade desci o ânimo pediume bem rápido após o anúncio fazer que para cá retornasse Topoume o veloz mensageiro dos companheiros o arauto que por primeiro falou palavra a tua mãe 470 Outra coisa sei pois vi com os olhos já acima da cidade onde fica a colina de Hermes ia andando quando vi uma nau veloz dirigirse a nosso porto muitos varões sobre ela havia cheia de escudos e lanças duascurvas 475 pensei que esses fossem eles mas não sei Assim falou e sorriu a sacra força de Telêmaco olhando para o pai e evitando os olhos do porcariço Eles após concluir a tarefa e terem aprontado o jantar jantaram e ao ânimo porção alguma faltou 480 Mas após apaziguar o desejo por comida e bebida lembraramse do repouso e aceitaram o dom do sono Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos depois de atar aos pés belas sandálias Telêmaco o caro filho do divino Odisseu tomou a brava lança que à sua palma se adequava 5 e ansiando ir à urbe falou a seu porcariço Sim papá eu irei à cidade para que a mim minha mãe me veja não creio que ela interrompa o hediondo pranto e o lamento lacrimoso antes de verme em pessoa E a ti peço isto 10 esse infeliz estranho leva à cidade para que lá refeição mendigue Quem quiser lhe dará caneca e pãozinho eu não posso a todos os homens sustentar tenho aflições no ânimo Se o estranho ficar muito irado pior para ele 15 será vê éme caro a verdade enunciar Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Amigo nem eu mesmo desejo aqui permanecer Para o mendigo é melhor na cidade que no campo mendigar refeição quem quiser me dará 20 Não estou mais na idade de ficar na quinta para submeterme em tudo ao senhor que ordena Mas vá que me leve esse varão a quem tu pedes logo após eu me aquecer com o fogo e o calor despontar Ruins ao extremo essas roupas que não me dobre 25 a geada matutina dizeis que a cidade é distante Assim falou e Telêmaco marchou ao longo do pátio veloz nos pés e engendrava males aos pretendentes Mas quando atingiu a casa boa para morar a lança postou levandoa até enorme pilar 30 ele foi para dentro cruzando o umbral de pedra A primeira a vêlo foi a nutriz Euricleia a estender velos sobre artificiosas poltronas aos prantos logo acorreu a ele as outras escravas de Odisseu juízopaciente reuniamse 35 em volta dele e beijavamlhe com afeto cabeça e ombros E ela saiu do quarto Penélope bemajuizada semelhante a Ártemis ou dourada Afrodite em torno do caro filho lançou os braços aos prantos beijouo na cabeça e nos dois belos olhos 40 e lamentandose dirigiulhe palavras plumadas Chegaste Telêmaco doce luz não mais pensava verte após teres partido com a nau para Pilos de surpresa a minha revelia atrás de novas do caro pai Vamos contame com que visão te deparaste 45 A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Minha mãe favor não chorar nem meu coração no peito agitar pois escapei de abrupto fim mas após te lavar vestir roupas limpas no corpo e subir aos aposentos com tuas criadas mulheres 50 reza a todos os deuses que sacrifícios completos farás se acaso Zeus completar a vingança Quanto a mim rumarei à ágora para chamar o estranho que de lá trouxe quando voltei Envieio na frente com os excelsos companheiros 55 e pedi a Peiraio que o levasse a sua casa que gentil o acolhesse e honrasse até minha chegada Assim ele falou e para ela o discurso foi plumado Ela após se lavar e vestir roupas limpas no corpo rezou a todos os deuses que sacrifícios completos 60 faria se acaso Zeus completasse a vingança Telêmaco então cruzou o salão e saiu com a lança dois lépidos cães seguiam com ele Eis que prodigiosa graça sobre ele vertia Atena todo o povo contemplavao em sua chegada 65 E os arrogantes pretendentes reuniramse em torno dele falando como nobres e no juízo ruminando males Mas ele evitou a grande aglomeração e onde Mentor sentouse e Antifo e Haliterses todos desde o início companheiros de seu pai 70 para lá se dirigiu e sentou e inqueriamno de tudo E deles aproximouse Peiraio famosonalança levando o estranho à ágora pela urbe muito tempo Telêmaco não ficou longe do estranho logo achegouse E a ele Peiraio por primeiro o discurso enunciou 75 Telêmaco manda logo mulheres a minha casa para buscar as dádivas que te deu Menelau A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Peiraio não sabemos como se darão as coisas Se a mim os orgulhosos pretendentes no palácio 80 de surpresa matarem e dividirem todos os bens paternos prefiro que tu não um deles as possuas e aproveites e se eu lograr contra eles matança e perdição e então para mim alegre levaas à casa com alegria Assim falou e guiou o calejado estranho à morada 85 E quando atingiram a casa boa para morar depuseram as capas nas cadeiras e poltronas foram até a banheira bempolida e se banharam Após as escravas banhálos untálos com óleo e em torno lançar espessas capas e túnicas 90 saíram da banheira e sentaram nas cadeiras Uma criada despejou água trazida em jarra bela dourada sobre bacia prateada para que se lavassem ao lado estendeu polida mesa Governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente 95 e junto muitos petiscos oferecendo o que havia A mãe sentouse defronte junto ao pilar do salão reclinada na cadeira volteando os finos fios E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos Mas após apaziguar o desejo por comida e bebida 100 entre eles começou a falar Penélope bemajuizada Telêmaco subirei aos aposentos e deitarei na cama que me é rica em gemidos sempre úmida com minhas lágrimas desde que Odisseu partiu com os filhos de Atreu a Ílion e não pudeste 105 antes de os orgulhosos pretendentes chegarem a essa casa do retorno de teu pai falarme às claras se algo ouviste A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Portanto eu a ti mãe contarei a verdade Partimos rumo a Pilos e Nestor pastor de tropa 110 Após me receber em sua alta casa acolheume gentil como o pai a seu filho que há pouco voltou depois de tempo assim ele de mim cuidou gentil com os filhos majestosos Acerca de Odisseu juízopaciente disse que nunca 115 ouviu de mortal se estava vivo ou morto e a mim ao filho de Atreu Menelau famosonalança enviou com cavalos e carro bemajustado Lá vi a argiva Helena graças à qual muito aguentaram argivos e troianos por obra dos deuses 120 Então perguntoume logo Menelau bomnogrito de que eu carecia para ir à divina Lacedemônia e eu conteilhe toda a verdade Então a mim com palavras respondendo disse Incrível deveras no leito de varão juízoforte 125 cobiçaram deitarse eles próprios sendo covardes Como quando a cerva na toca de um leão bota os recémnascidos lactentes para dormir e investiga encostas e vales herbosos a pastar e então a fera se achega a seu leito 130 e sobre aqueles dois lança fado ultrajante assim Odisseu sobre eles lançará fado ultrajante Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo com o porte que então em Lesbos bemconstruída na disputa com Filomeleides se ergueu lutou 135 e o derrubou com força e se alegraram todos os aqueus assim aos pretendentes encontrasse Odisseu todos seriam destinoveloz e bodasamargas Quanto ao que me indagas e suplicas eu não tergiversarei pelas bordas nem te enganarei 140 mas do que me falou o veraz ancião marítimo disso nada esconderei de ti nem palavra ocultarei Disse que numa ilha o viu sofrendo fortes agonias no palácio da ninfa Calipso que a ele à força retém não consegue atingir sua terra pátria 145 Não tem naus com remos nem companheiros que o levariam sobre as amplas costas do mar Assim falou o filho de Atreu Menelau famosonalança Após isso completar retornei deramme uma brisa os imortais que rápido me conduziram à terra pátria 150 Assim falou e agitou o ânimo dela no peito Também entre eles falou o deiforme Teoclímeno Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte ele não sabe ao claro já minha fala entende com precisão para ti adivinharei e não esconderei 155 Saiba agora Zeus antes dos deuses e a hospitaleira mesa e o fogolar do impecável Odisseu ao qual cheguei que Odisseu já está na terra pátria sentado ou circulando informado dessas vis ações a todos os pretendentes engendra um mal 160 tal o presságio que eu na nau bomconvés sentado observei e bradei a Telêmaco E a ele dirigiuse Penélope bemajuizada Ah Se essa palavra hóspede se cumprisse então rápido conhecerias a amizade e muitos dons 165 meus tantos que se alguém te visse te diria ditoso Assim eles disso falavam entre si e os pretendentes diante do salão de Odisseu deleitavamse com discos e arremesso de lanças em solo nivelado desmedidos como no passado 170 Mas na hora do jantar quando vieram os rebanhos do campo de todo o lado e os que sempre os guiavam então lhes disse Médon era ele o que mais agradava dos arautos e no banquete juntavase a eles Jovens agora que vos haveis deleitado no peito com as provas 175 dirigivos à casa para prepararmos o banquete não é ruim fazer a refeição na hora certa Isso disse ergueramse e persuadidos pelo discurso foram E quando atingiram a casa boa para morar capas depuseram nas cadeiras e poltronas 180 e grandes ovelhas e gordas cabras abateram e abateram porcos cevados e um boi do rebanho preparativos para o banquete E aqueles do campo à cidade se puseram em marcha Odisseu e o divino porcariço Entre eles começou a falar o porqueiro líder de varões 185 Assim seja hóspede já que tens gana de ir à cidade hoje como meu senhor impôs por certo eu preferiria que aqui ficasses como protetor da quinta Mas eu o respeito e temo que contra mim no futuro ralhe são duras as censuras dos senhores 190 Agora vamos vê já passou a maior parte do dia e logo à noitinha te será mais frio Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Compreendo reflito pedes para quem isso entende Pois vamos e tu então segue sempre na frente 195 Dême o cajado se acaso tens um cortado para apoio pois dissestes ser a via bem acidentada Falou e sobre os ombros lançou o repulsivo alforje todo rasgado e nele a alça era uma corda e Eumeu deulhe um bastão perfeito 200 Os dois partiram e cães e varões pastores na quinta ficaram protegendoa Ele à cidade guiou o senhor com aparência de mendigo débil e velho apoiado no bastão vestes ordinárias vestia no corpo Mas quando descendo pela via escarpada 205 estavam perto da cidade e à fonte chegaram trabalhada belofluxo onde os citadinos pegavam água construída por Ítaco Nérito e Polictor em volta havia bosque de álamos nutridos por água todo em círculo e para baixo fluía água fria 210 do alto de um rochedo sobre ele fora erguido um altar às ninfas onde todos os viandantes sacrificavam lá alcançouos Preto filho de Finório tocando cabras distintas entre todos os caprinos refeição para os pretendentes seguiamno dois pastores 215 Vendoos dirigiuselhes e nomeouos com ralho terrível e ultrajante e o coração de Odisseu agitouse Agora de fato o vil ao vil com razão conduz como o deus sempre leva o igual ao igual Desgraçado porqueiro para onde levas esse glutão 220 mendigo encrenqueiro comedor de sobras de jantar Encostado em muito umbral roçará os ombros mendigando nacos não espadas nem bacias Se tu mo desses para tornarse protetor da quinta limpar currais e levar folhagem aos cabritos 225 poderia bebendo soro até engrossar a coxa Mas sim como aprendeu serviços vis não quererá fazer o serviço mas curvandose pelos arredores prefere mendigando engordar seu estômago insaciável Mas eu te falarei e isto se completará 230 se ele se dirigir à casa do divino Odisseu a muitas banquetas lançadas pelas mãos dos varões suas costelas extenuarão ao ser atingido na casa Isso disse avançou e com o pé saltou insensato contra a coxa o golpe não o pôs para fora da trilha 235 mas firme permaneceu Ele Odisseu cogitou se indo atrás com o cajado tiraria sua vida ou contra o solo lançaria a cabeça após erguêlo pelo meio mas aguentou contevese no juízo Com aquele o porqueiro ralhou encarandoo e alto orou mãos para cima 240 Ninfas da fonte filhas de Zeus se um dia Odisseu coxas queimouvos encobertas com gorda gordura de ovelhas e cabritos para mim cumpri este desejo que volte esse varão e o guie a divindade Então espantaria toda tua radiância 245 que agora desmedido carregas sempre vagando pela urbe e as cabras pastores ruins as aniquilam A ele então Preto replicou o pastor de cabras Incrível como falou o cão perito em malefícios A ele um dia eu mesmo sobre negra nau bomconvés 250 guiarei para longe de Ítaca para onde me renda boa quantia Ah Se a Telêmaco atingisse Apolo arcodeprata hoje no palácio ou pelos pretendentes fosse subjugado assim como Odisseu longe perdeu o dia do retorno Isso disse e deixouos lá e eles tranquilos se foram 255 ele marchou e bem rápido chegou à casa do senhor Logo foi para dentro e entre os pretendentes sentouse diante de Eurímaco de quem mais gostava A seu lado naco das carnes puseram os que serviam e governanta respeitável trouxe pão e pôs na frente 260 para comer Para perto Odisseu e o divino porcariço vieram e pararam e envolveuos a cadência da côncava lira Fêmio entoavalhes um prelúdio E Odisseu pegando o porqueiro pelo braço falou Sim Eumeu essa de fato é a bela casa de Odisseu 265 é fácil de reconhecer mesmo se vista entre muitas Cômodos em sucessão seu pátio se completa com muro e cornijas e os portões são engenhosos duplos nenhum homem os equiparia melhor Percebo que nela se banqueteiam muitos 270 varões pois se espraia odor de gordura e dentro a lira soa a que os deuses fizeram companheira do banquete Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Reconheceste fácil pois de resto não és imponderado Mas vamos ponderemos como serão estas ações 275 ou tu por primeiro entra na casa boa para morar e te junta aos pretendentes e eu ficarei aqui ou se quiseres aguarda e eu irei antes Mas não te demores que ninguém percebendote fora te atinja ou golpeie peço que ponderes 280 E a ele respondeu o muitatenência divino Odisseu Compreendo reflito pedes para quem isso entende Pronto vai antes e eu aqui ficarei pois não sou inexperto em socos e arremessos Meu ânimo aguenta já sofri muitos males 285 em ondas e guerra que depois disto aquilo ocorra Não é possível escamotear o sôfrego estômago funesto que confere muitos males aos homens por causa dele equipamse naus firmebancos e pelo mar ruidoso levam males aos inimigos 290 Assim eles disso falavam entre si E um cão deitado ergueu cabeça e orelhas Argo de Odisseu juízopaciente ao qual ele mesmo criou mas dele não desfrutou antes à sacra Ílion partiu No passado levavamno os jovens varões 295 atrás de cabras selvagens coelhos e cervos no presente desprezado jazia ausente o senhor sobre muito esterco de bois e mulas que diante dos portões acumulavase até que o levassem os escravos de Odisseu para estercar o grande terreno 300 Lá jazia o cão Argo cheio de carrapato E então quando percebeu Odisseu próximo ele abanou o rabo deixou cair as duas orelhas e depois não conseguiu mais perto de seu mestre chegar E ele olhando para longe secou as lágrimas 305 evitando fácil Eumeu e rápido perguntoulhe Eumeu é bem espantoso que jaza esse cão no esterco É belo no porte e isto não sei ao claro se além da bela estampa era rápido na corrida ou somente como os cães de mesa dos varões 310 são por causa da radiância tratamnos os senhores Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu De fato esse cão do varão que longe morreu se no porte e nos feitos fosse tal como quando ao ir a Troia deixouo para trás Odisseu 315 logo mirandoo admirarias rapidez e bravura Não escapava no âmago da mata profunda o animal que perseguisse era também perito em pegadas Agora passa mal pois seu senhor distante da pátria finou e dele as mulheres negligentes não tratam 320 Escravos quando os senhores não mais comandam então não querem mais fazer o apropriado de metade da excelência priva Zeus amplavisão ao varão que o dia escravizador agarra Isso dito entrou na casa boa para morar 325 e foi direto ao salão atrás dos ilustres pretendentes Quanto a Argo apanhouo o destino da negra morte assim que viu Odisseu no vigésimo ano Ao porqueiro o primeiro a vêlo entrar no salão foi o deiforme Telêmaco que rápido o chamou 330 até si acenando Ele observou e pegou uma banqueta nela o trinchador sentava muita carne trinchando aos pretendentes que na casa se banqueteavam levoua à mesa de Telêmaco e postoua diante dele onde então sentouse Para ele o arauto 335 uma porção pegou serviua e tirou pão do cesto Logo atrás dele entrou na casa Odisseu com a aparência de mendigo débil e velho apoiado no bastão vestes ordinárias no corpo vestia Sentouse no umbral de freixo das portas 340 apoiado no batente de cipreste que um dia carpinteiro aplanou hábil e com o prumo endireitou Telêmaco chamou o porqueiro até si e dirigiuse a ele após tomar um pão inteiro do cesto bem belo e carne tanta quanta em suas mãos cabia 345 Leva isso dá ao estranho e peçalhe que mendigue achegandose a todos os pretendentes pudor não é boa companhia para um varão necessitado Isso dito em seguida partiu o porcariço que então dirigiulhe palavras plumadas 350 Hóspede Telêmaco te dá isso e pede que mendigues achegandote a todos os pretendentes pudor não é bom diz para um varão pedinte Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Senhor Zeus seja Telêmaco fortunado entre os varões 355 e lhe ocorra tudo que deseja em seu juízo Falou e com as duas mãos recebeu e acomodou a comida lá mesmo diante dos pés sobre o ultrajante alforje e comia enquanto o cantor no palácio cantava Quando tinha jantado e o divino cantor calara 360 os pretendentes iniciaram arruaça no palácio E Atena postandose perto de Odisseu filho de Laerte instigouo a recolher migalhas entre os pretendentes e a reconhecer quem era correto e quem desregrado mas nem assim protegeria algum do mal 365 Pôsse a pedir a cada um da esquerda para a direita estendia a mão como se já mendigasse há muito Eles apiedados lhe davam e pasmados inquiriam um ao outro quem seria e de onde teria vindo Entre eles falou Preto o pastor de cabras 370 Ouvime pretendentes da esplêndida rainha acerca desse estranho pois sim já antes o vi De fato até aqui o porqueiro conduziuo e dele não sei ao claro de que linhagem proclama ser Isso dito Antínoo com palavras provocou o porqueiro 375 Notório porqueiro por que à cidade tu a ele guiaste Não temos vagamundos suficientes mendigos encrenqueiros comedores de sobras do jantar Ou não te basta que devorem o sustento de teu senhor os aqui reunidos e tu também o chamaste para dentro 380 Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Antínoo embora sejas distinto bem não falaste quem chama um estrangeiro quando está de visita a um terceiro exceto no caso de um destes profissionais adivinho médico de males carpinteiro 385 ou também cantor inspirado que deleita cantando São esses os mortais chamados pela terra semfim a um mendigo que o iria dilapidar ninguém chamaria Mas sempre és duro mais que todos os pretendentes com os escravos de Odisseu em especial comigo eu 390 não me importo enquanto a prudente Penélope e o deiforme Telêmaco viverem no palácio A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Quieto a ele não respondas demais com palavras Antínoo costuma provocar de forma vil sempre 395 com duros discursos e instiga também os demais Falou e a Antínoo dirigiu palavras plumadas Antínoo cuidas bem de mim como do filho o pai ao pedires que ao estranho se escorrace do salão com discurso coativo que isso o deus não complete 400 Vai dálhe algo não me recuses pois peçoo eu Nisso não te envergonhes de minha mãe ou de outro escravo dos que vivem na casa do divino Odisseu Mas não há em teu peito uma tal ideia preferes bem mais comer a obsequiar alguém 405 E a ele Antínoo respondendo disse Telêmaco falaaltiva de ímpeto incontido que falaste Se todos os pretendentes tanto lhe entregassem por três meses a propriedade o manteria longe Assim falou e de debaixo da mesa puxou 410 a banqueta onde apoiava os pés luzidios ao festar Os outros todos colaboraram e pejaram o alforje de pão e carne Pois ligeiro teria Odisseu voltado à soleira e provado a dádiva dos aqueus postouse porém junto a Antínoo e disselhe 415 Dá amigo o pior dos aqueus não me pareces ser mas o melhor pois te assemelhas a um rei Por isso é preciso que da comida dês ainda mais que os outros e eu te glorificarei pela terra semfim Também eu um dia entre os homens morei em casa 420 rica afortunado e amiúde obsequiava um errante fosse como ele fosse e do que precisasse ao chegar tinha miríades de escravos e muita outra coisa com que se vive bem e se é tido como rico Mas Zeus filho de Crono destruiu quis de algum modo 425 ele que a mim com piratas muito errantes incitoume ir ao Egito um longo trajeto para que me arruinasse E ancorei no rio Egito as naus ambicurvas Então pedi aos leais companheiros que lá ficassem junto às naus e as guardassem 430 e instiguei batedores a buscar atalaias Aqueles cederam à desmedida seguindo seu ímpeto e bem rápido os bem belos campos de varões egípcios destruíam levavam mulheres e crianças pequenas e a outros matavam Logo a gritaria chegou à cidade 435 Tendo ouvido a algaravia quando a aurora surgiu vieram o plaino todo pejouse de soldados e carros e relampejo brônzeo Lá Zeus prazernoraio lançou vil pavor em meus companheiros nenhum suportou ficar imóvel a encarar pois por todos os lados males havia 440 Lá a muitos dos nossos mataram com bronze afiado e a outros vivos levaram para trabalhos forçados A mim rumo a Chipre deramme a aliado que chegara Dominador filho de Iaso que regia Chipre com vigor Assim de lá cheguei aqui sofrendo misérias 445 A ele por sua vez Antínoo respondeu e disse Que divindade trouxe essa miséria flagelo do jantar Postate assim no centro afastado de minha mesa para que rápido não vejas amargos Egito e Chipre que audacioso e aviltante pedinte és tu 450 Em sequência pedes a cada um e eles dão levianos pois não existe contenção nem remorso no ofertar bens alheios pois há muito para cada um Recuando disselhe Odisseu muitaastúcia Incrível tanto te falta em juízo quanto te sobra em estampa 455 A quem alcançasse tua casa nem grão de sal darias tu que agora sentado na mesa alheia nada me pudeste do pão pegar e ofertar e há muito disponível Assim falou e Antínoo enraiveceuse mais no coração olhouo de cima e dirigiulhe palavras plumadas 460 Agora creio não será bonito como salão afora recuarás pois falas até insultos Isso dito tomou a banqueta e acertou o ombro direito de Odisseu bem no alto Ele postouse como uma pedra firme e o projétil de Antínoo não o desequilibrou 465 quieto meneou a cabeça ruminando males Retornando à soleira sentouse no chão o alforje bemfornido depôs e entre os pretendentes falou Ouvime pretendentes da esplêndida rainha vou falar o que o ânimo me ordena no peito 470 Por certo não há angústia nem aflição no juízo quando um homem combatendo por seus bens é atingido seja pelos bois ou brancas ovelhas mas Antínoo me atingiu por causa do reles estômago funesto que confere muitos males aos homens 475 Mas se acaso para mendigos há deuses e Erínias que antes das bodas a morte certeira alcance Antínoo E a ele dirigiuse Antínoo filho de Persuasivo Come tranquilo estranho sentado ou vai a outro lugar que os jovens pela casa não te puxem ao falares assim 480 ou pelo pé ou pelo braço rasgandote inteiro Assim falou e eles todos se indignaram por demais e desse modo falavam os jovens arrogantes Antínoo não foi bonito atingir o miserável errante Maldito se acaso for algum deus celeste 485 Deuses assemelhados a estranhos de outras terras tomando todas as formas percorrem as cidades a observar a desmedida dos homens e a boa norma Isso diziam os pretendentes e ele desprezou os discursos Telêmaco foi tomado de angústia enorme no coração 490 mas lágrima ao solo não verteu das pálpebras quieto meneou a cabeça ruminando males Como Penélope bemajuizada escutou quando ele foi atingido no salão entre as escravas disse Tomara desse modo te atinja Apolo arcofamoso 495 E a ela a governanta Eurínome dirigiu o discurso Que a nossos votos se una a realização nenhum desses aí alcançaria a Aurora belotrono E a ela dirigiuse Penélope bemajuizada Mãezinha odiosos são todos pois engenham males 500 e Antínoo é quem mais se assemelha à negra morte Um hóspede miserável erra pela casa aos homens mendigando pois a necessidade impõe então todos os outros o abarrotaram e obsequiaram e ele com a banqueta atingiuo abaixo do ombro direito 505 Ela assim falava entre as escravas mulheres sentada no aposento e ele jantava o divino Odisseu E ela chamou o divino porqueiro até si e dirigiuselhe Anda divino Eumeu vai até o estranho e lhe diga que venha para que o saúde e interrogue 510 se acaso de Odisseu juízopaciente tem informação ou o viu com os olhos parece alguém que muito vagou Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu Se para ti rainha se calassem os aqueus o que ele discursa enfeitiçaria teu caro coração 515 Por três noites o tive e por três dias segureio na cabana fui o primeiro que alcançou após fugir da nau mas não concluiu a narração de sua desgraça Como um varão observa o cantor que dos deuses aprendeu e canta palavras desejáveis aos mortais 520 que têm ganas de ouvilo sem cessar quando canta assim ele me enfeitiçou sentado no meu salão Afirma ter laços ancestrais de hospitalidade com Odisseu quando morava em Creta onde está a linhagem de Minos Assim de lá chegou aqui sofrendo misérias 525 rolorolando Reivindica ter ouvido acerca de Odisseu que perto está na fértil terra dos varões tesprótios vivo e bens em profusão traz para sua morada E a ele replicou Penélope bemajuizada Vai chamao aqui para ele o expor diante de mim 530 Que aqueles se divirtam sentados na frente das portas ou aqui pela casa pois seu ânimo é gaudioso Claro suas posses intactas estão na propriedade pão e doce vinho isso comem seus servos e eles frequentando nossa casa todos os dias 535 abatendo bois ovelhas e gordas cabras festejam e bebem fulgente vinho levianos Isso se desperdiça à larga Não há varão tal como era Odisseu para afastar o dano da casa Se Odisseu voltasse e alcançasse sua terra pátria 540 logo com seu filho iria vingarse da violência dos varões Assim falou e Telêmaco alto espirrou e em volta a casa ameaçadora ecoou Riu Penélope e eis que logo a Eumeu dirigiu palavras plumadas Vai chama o estranho para encontrarme aqui 545 Não viste que meu filho espirrou para todas as palavras Assim não ficaria incompleta a morte dos pretendentes de todos e nenhum escaparia da perdição da morte Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança se eu reconhecer que ele sem evasivas tudo expõe 550 vou vestilo com capa e túnica belas vestes Isso disse e partiu o porcariço após ouvir o discurso e parado perto dirigiulhe palavras plumadas Pai estrangeiro chamate Penélope bemajuizada a mãe de Telêmaco o ânimo lhe pede 555 inquirir do esposo embora agruras tenha sofrido Se reconhecer que tu sem evasivas tudo expões vai vestirte com capa e túnica das quais careces por demais a mendigar pão pela comunidade o estômago encherás darteá quem quiser 560 E a ele replicou o muitatenência divino Odisseu Eumeu eu logo sem evasivas tudo exporia à filha de Icário Penélope bemajuizada conheço isso bem pois aguentamos igual agonia Mas temo a reunião dos cruéis pretendentes 565 cuja desmedida e violência atingem o céu ferroso Pois agora quando esse varão aí eu andava pela casa e nada de ruim fizera atingiume e feriu disso nem Telêmaco me protegeu nem algum outro Por isso agora peça a Penélope que no palácio 570 espere embora ávida até o sol se pôr que então me indague acerca do marido o dia de retorno sentandome mais perto junto ao fogo Vê roupas tenho ordinárias bem sabes pois supliquei a ti primeiro Assim falou e saiu o porqueiro após ouvir o discurso 575 A ele ao passar pela soleira dirigiuse Penélope Tu não o trazes Eumeu O que pensou o errante Acaso teme alguém em excesso ou por outra razão mostra pudor pela casa É ruim um errante pudico Respondendo dissestelhe porqueiro Eumeu 580 Discursa com adequação o que outro também pensaria tentando evitar a desmedida dos varões arrogantes Mas pede que tu esperes até o sol se pôr Também para ti mesma será bem melhor rainha sozinha quando ao estranho falar uma palavra e ouvir 585 E a ele replicou Penélope bemajuizada Insensato não é o estranho pensa nas consequências Pois tais não há por aí entre homens mortais tão desmedidos varões que engenham iníquas ações Ela assim falou e foi o porcariço divino 590 até o grupo de pretendentes após tudo expor De pronto a Telêmaco dirigiu palavras plumadas perto pondo a cabeça para não os ouvirem os outros Meu caro partirei para cuidar dos porcos e disto de teu e meu sustento que aqui tudo seja tua atribuição 595 Primeiro zela por ti e pondera no ânimo para que nada sofras muitos aqueus atentam vilezas que Zeus os destrua antes que se tornem nossa desgraça A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Será assim papá parte após petiscares 600 de manhã vem e traga belos animais para o sacrifício E eu e os imortais nos ocuparemos daquilo tudo Isso dito aquele de novo sentouse na cadeira bempolida Tendose saciado no ânimo de comida e bebida foi em direção aos porcos e deixou os muros e o salão 605 cheio de convivas Eles com a dança e o canto deleitavamse pois já se aproximara o fim da tarde E chegou o mendigo das redondezas que pela urbe de Ítaca mendigava e sobressaía com estômago louco por comer e beber sem cessar não tinha força nem vigor mas na aparência era bem grande de se ver 5 Seu nome era Borregoso puserao sua augusta mãe ao nascer os jovens todos chamavamno Iro pois levava mensagens sempre que pedissem Ao chegar tentou expulsar Odisseu de sua casa e provocativo dirigiulhe palavras plumadas 10 Sai do pórtico velho que não te puxem logo o pé Não percebes que todos piscam para mim e pedem que te puxe Eu porém tenho pudor Vamos senão presto brigamos também a socos Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia 15 Insano não faço nem falo nada ruim contra ti nem invejo que alguém até muito separe e te dê Essa soleira abarcará os dois e não carece que invejes o que é de outro a mim pareces um errante como eu e os deuses vão oferecer fortuna 20 A socos não me desafies demais não me enraiveças que eu embora velho não te manche peito e lábios de sangue ainda mais tranquilidade haveria para mim amanhã pois não creio que tu te voltarias uma segunda vez ao salão de Odisseu filho de Laerte 25 Enraivecido disselhe o errante Iro Incrível não é que o glutão fala de forma loquaz como velha no forno Contra ele armarei vilezas vou golpeálo com as duas mãos e no chão cada dente dos maxilares quebrarei como de porco destróicolheita 30 Agora cintate para que todos nos assistam lutando como combaterias varão mais jovem Assim eles diante das portas altas na soleira polida animosos discutiam A ambos escutou o ímpeto sagrado de Antínoo 35 que gargalhou com prazer e disse aos pretendentes Amigos por certo antes não ocorreu algo semelhante nunca tal deleite o deus conduziu a esta casa o estrangeiro e Iro estão brigando entre si vão combater a socos rápido vamos incitálos 40 Assim falou e todos eles pularam rindo e reuniramse em torno dos mendigos maltrapilhos E entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo Ouvime pretendentes orgulhosos vou falar Buchos de cabra aí no fogo para o jantar 45 dispusemos após enchêlos de banha e sangue Aquele que vencer e for o mais forte que avance e da iguaria o que quiser escolha ele mesmo sempre aqui entre nós comerá e nenhum outro mendigo pedinte permitiremos que se misture 50 Assim falou Antínoo e agradoulhes o discurso Com mente ardilosa disselhes Odisseu muitaastúcia Amigos é impossível com varão mais jovem lutar um velho varão combalido pela carência mas impeleme o estômago este vilão a me subjugar a golpes 55 Vamos agora juraime todos vigorosa jura que ninguém apoiando Iro com braço pesado a mim golpeie e seja iníquo e à força submetame a ele Assim falou e todos eles juraram como pediu Porém após jurarem por completo essa jura 60 entre eles falou a força sacra de Telêmaco Hóspede se o orgulhoso ânimo do coração te impele a repelilo a nenhum dos outros aqueus temas pois quem te acertar combaterá mais homens Sou eu que te hospedo e dois reis aprovaram 65 Eurímaco e Antínoo ambos inteligentes Assim falou e todos aprovaram E Odisseu cintouse com trapos na genitália mostrou as coxas belas e grandes e apareceram seus ombros largos o peito e os braços robustos e Atena 70 achegandose inchou os membros do pastor de homens Os pretendentes todos irritaramse com soberba e assim falavam fitando quem estava ao lado Logo Iro exIro obterá um mal autoinfligido tal é a coxa que de sob os trapos o velho mostra 75 Assim falavam e Iro sentiuse mal no ânimo Mesmo assim após cintálo à força servos levaramno medroso e as carnes tremiam em torno dos membros Antínoo reprovouo dirigiuselhe e nomeouo Agora exibidão não deverias existir nem ter nascido 80 se de fato para ele tremes e te apavoras assim para velho varão combalido pela carência que o atingiu Mas o que te direi isto também se cumprirá se ele te vencer e for o mais forte te enviarei ao continente após te lançar em negra nau 85 rumo ao rei Apresador flagelo de todos os mortais que deve te cortar o nariz e as orelhas com impiedoso bronze arrancar os genitais e dar crua refeição aos cães Assim falou e mais tremeram seus membros embaixo Levaramno ao centro e os dois estenderam os braços 90 Então cogitou o muitatenência divino Odisseu se o golpearia de sorte que a alma lá o deixasse caído ou se o golpearia de leve e o deixaria estendido no chão Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim ele o golpearia de leve para os aqueus não perceberem 95 Então mãos para cima Iro golpeou seu ombro direito e Odisseu golpeoulhe o pescoço sob a orelha e o osso adentro esmagou de pronto à boca subiu sangue vermelho e ele tombou no pó gritando e mordeu os dentes chutando a terra e os pretendentes ilustres 100 erguendo as mãos morreram de rir E Odisseu arrastouo do pórtico pelo pé para alcançar o pátio e os portões da colunata contra o muro do pátio encostouo e fêlo sentarse na mão pôslhe o bastão e falando dirigiulhe palavras plumadas 105 Agora senta afugentando cães e porcos não sejas tu o chefe de estranhos e mendigos sendo reles para que não proves mal ainda maior Falou e sobre os ombros lançou o repulsivo alforje todo rasgado e nele como alça havia uma corda 110 Retornando à soleira sentouse e eles entraram rindo com prazer e saudaramno com palavras Que Zeus te dê estranho e os outros deuses imortais o que mais desejas e caro for a teu ânimo tu que fizeste aquele insaciável parar de errar 115 pelas redondezas logo o levaremos ao continente rumo ao rei Apresador flagelo de todo mortal Isso dito alegrouse o divino Odisseu Eis que Antínoo pôslhe ao lado um grande bucho cheio de gordura e sangue e Anfínomo 120 tirou dois pães da cesta e pôs ao lado com cálice dourado cumprimentouo e disse Sê feliz pai estrangeiro tenhas ainda que no futuro fortuna agora de fato estás preso a muitos males Respondendo disse Odisseu muitaastúcia 125 Anfínomo deveras me pareces ser inteligente Tens um pai de valor de Niso de Dulíquion ouvi a nobre fama que é bom e rico dele dizem que nasceste e pareces varão decente Por isso te direi e que me compreenda e me escute 130 nada mais débil que o homem a terra nutre entre tudo que sobre a terra respira e circula Nunca alguém pensa que no futuro um mal sofrerá enquanto deuses ofertam sucesso e os joelhos se mexem mas quando deuses venturosos completam o funesto 135 também isso sem o querer suporta com ânimo resistente É tal a mente dos homens sobreaterra como o dia que conduz o pai de varões e deuses Também eu um dia seria fortunado entre os varões mas fiz muita coisa iníqua cedendo à força e ao vigor 140 confiante em meu pai e em meus irmãos Por isso jamais um varão ignore as regras mas quieto suporte os dons de deuses o que derem Que iniquidades vejo os pretendentes maquinar Devastam as posses e desonram a esposa 145 do varão que penso não mais dos seus e do solo pátrio longe ficará por longo tempo está bem perto Mas que um deus à casa te acompanhe que não te depares com ele quando retornar para sua terra pátria creio que não sem sangue os pretendentes e ele 150 se distinguirão após entrar sob seu teto Isso disse e após libar bebeu o vinho doce como mel e de volta pôs o cálice nas mãos do ordenador de tropa E esse cruzou o salão agastado em seu coração curvando a cabeça pois já via o mal no ânimo 155 Nem assim fugiu da morte também o prendeu Atena para as mãos e a lança de Telêmaco o subjugarem à força De volta logo sentouse na poltrona de onde se erguera E no juízo dela pôs a deusa Atena olhosdecoruja no da filha de Icário Penélope bemajuizada 160 aos pretendentes aparecer para sobremodo alargar o ânimo dos pretendentes e tornarse honrada diante do marido e do filho mais que no passado Deu risada inútil dirigiu a palavra e nomeou Eurínome meu ânimo deseja não como antes 165 aparecer aos pretendentes embora de todo odiados ao filho diria uma palavra que isto seria mais vantajoso não concordar em tudo com os pretendentes soberbos que falam bem mas por trás pensam vilezas E a ela a governanta Eurínome dirigiu o discurso 170 Por certo isso tudo criança falaste com adequação Vamos e a teu filho diga uma palavra e não esconda após lavar a pele e ungir o rosto com o rosto manchado por lágrimas assim não vás pois é pior sempre se afligir sem cessar 175 Com efeito já está na idade teu filho quem tu muito rogaste aos deuses veres com barba E a ela replicou Penélope bemajuizada Eurínome embora preocupada não me induzas lavar a pele e ungirme com óleo 180 minha radiância os deuses que têm o Olimpo destruíram desde que aquele partiu em cavas naus Mas peça para mim que Autónoe e Hipodameia venham para junto a mim se postarem nos salões Sozinha não irei até os varões pois tenho pudor 184ª de unirme obrigada aos pretendentes soberbos 185 Assim falou e a anciã saiu cruzando o salão anunciando às mulheres e instigandoas a ir Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja na filha de Icário vertia doce sono adormecia reclinada e fraquejaram todas suas juntas 190 aí mesmo na cadeira Nisso a deusa divina davalhe dons imortais para os aqueus contemplála Primeiro sua bela pele limpou com cosmético imortal com o qual Citereia belacoroa se unge quando vai à desejável dança das Graças 195 Fêla maior e mais encorpada a quem a visse e mais alva a fez que marfim talhado Ela após assim agir partiu a deusa divina E vieram as servas alvosbraços do salão com ruído achegandose Doce sono deixoua 200 ela esfregou o rosto com as mãos e disse Sim a mim em terrível aflição sono macio encobriu Tomara morte assim macia me desse a pura Ártemis agora logo para não mais lamentandome no ânimo desgastar a vitalidade saudosa do caro esposo 205 de sua excelência múltipla pois superava os aqueus Assim falou e desceu dos aposentos lustrosos não sozinha mas com ela seguiam duas criadas Quando alcançou os pretendentes divina mulher parou ao lado do pilar do teto sólida construção 210 após puxar para diante da face o véu reluzente e criada devotada uma de cada lado se postou Lá fraquejaram os joelhos deles o desejo enfeitiçoulhes o ânimo e todos rezaram para deitarse a seu lado no leito E ela falou a Telêmaco seu caro filho 215 Telêmaco não mais teu juízo é seguro nem tua ideia quando criança até mais no juízo aplicavas tua esperteza Agora que és grande e alcanças a medida da juventude alguém de fora diria que de varão afortunado és rebento ao mirarte o tamanho e a beleza 220 não mais teu juízo é apropriado nem tua ideia vê esse feito que no palácio ocorreu tu permitiste que o estranho fosse assim ultrajado E agora se algo o estranho em nosso palácio sentado sofresse graças a pungente mautrato 225 Para ti haveria vergonha e entre os homens vexame A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Minha mãe não fico indignado que disso tens raiva mas no ânimo penso e conheço cada coisa as nobres e as piores no passado ainda era tolo 230 Mas vê não posso pensar tudo de modo inteligente sentados junto a mim um ali outro lá confundemme esses aí refletindo vilezas e não há quem me ajude Vê a luta do estranho e de Iro não ocorreu como queriam os pretendentes e na força aquele foi melhor 235 Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo que agora em nosso palácio os pretendentes deixassem pender as cabeças subjugados uns no pátio outros na casa os membros a fraquejar como agora os de Iro que lá nos portões do pátio está sentado 240 a cabeça curva igual a um ébrio incapaz de endireitarse de pé ou de voltar à casa ou aonde for seu retorno pois os membros fraquejam Assim eles disso falavam entre si E Eurímaco com palavras dirigiuse a Penélope 245 Filha de Icário Penélope bemajuizada se te vissem todos os aqueus na jônia Argos mais pretendentes em vosso palácio de manhã se banqueteariam pois ultrapassas as mulheres em aparência altura e por dentro juízo equilibrado 250 E a ele então respondeu Penélope bemajuizada Eurímaco minha excelência aparência e porte os imortais destruíram quando a Ílion embarcavam os argivos e ia com eles meu marido Odisseu Se ele viesse e de minha vida cuidasse 255 maior seria minha fama e mais bela a situação Agora me angustio tantos os males que o deus me enviou Sim quando foi e deixou a terra pátria tomoume a mão direita pelo pulso e me disse Mulher não creio que os aqueus belasgrevas 260 de Troia voltarão bem todos incólumes pois dizem que os troianos são varões guerreiros tanto lanceiros quanto arqueadores de flechas e montadores de cavalos cascoveloz que bem rápido decidem grande justa em guerra niveladora 265 Assim não sei se o deus me trará de volta ou serei pego lá mesmo em Troia que aqui tudo seja tua atribuição Lembrate do pai e da mãe no palácio como agora ou ainda mais estando eu longe mas quando vires barba no menino 270 sê desposada por quem quiseres após tua casa deixar Assim aquele falou tudo isso agora se completa Noite haverá em que a hedionda boda se achegará de mim maldita de quem Zeus tirou a fortuna Mas esta angústia terrível atinge o ânimo do coração 275 não é essa a tradição dos pretendentes de antanho esses que valorosa mulher e filha de homem rico querem cortejar e com outros disputam Eles mesmos trazem bois e robustas ovelhas banquete à família da jovem e dão radiantes dons 280 mas não a comida de outrem devoram de graça Isso dito alegrouse o muitatenência divino Odisseu porque ela arrancava dons enfeitiçava o ânimo com palavras amáveis mas sua mente concebia outra coisa E a ela replicou Antínoo filho de Persuasivo 285 Filha de Icário Penélope bemajuizada presentes dos aqueus que para cá quiserem trazêlos recebeos não é belo recusar um dom E nós não iremos antes aos campos nem alhures até que sejas desposada pelo aqueu que for o melhor 290 Assim falou Antínoo e agradoulhes o discurso Para trazer os dons cada um despachou seu arauto Para Antínoo trouxe grande peplo bem belo variegado nele havia fivelas doze no total douradas ajustadas com fechos bemtorcidos 295 Colar para Eurímaco bem artificioso presto trouxe de ouro entrelaçado com âmbar como o sol Brincos para Euridamas dois assistentes trouxeram três olhos tal uma amora e bem graciosos reluziam Do senhor Pisandro filho de Polictor 300 gargantilha trouxe o assistente adorno bem belo Cada um dos aqueus trouxe um belo dom Ela então subiu aos aposentos a divina mulher e com ela servas levavam os bem belos dons e aqueles para a dança e o desejável canto 305 volveramse e deleitaramse e ficaram até a noite Enquanto se deleitavam veiolhes a negra noite De pronto três braseiros postaramse no palácio para alumiar neles em volta lenha se pôs sem seiva há muito seca recémrachada com bronze 310 e junto misturaramse gravetos em turnos iluminavam as escravas de Odisseu juízopaciente Mas a essas ele próprio o divinal falou Odisseu muitaastúcia Escravas de Odisseu senhor há tempo ausente dirigivos à morada onde está a respeitável senhora 315 junto a ela na roca fiai e deleitaia sentadas no salão ou cardai a lã com as mãos eu providenciarei luz para todos esses aí Caso eles queiram aguardar Aurora belotrono não me vencerão sou deveras muitaresistência 320 Assim falou e elas riram olhandose entre si Reprovouo com uma afronta Preta belaface a essa Finório gerou e dela Penélope cuidou crioua como filha e brinquedos lhe deu para o ânimo Mas nem assim afligiase no juízo por Penélope 325 a Eurímaco uniase e o amava Ela a Odisseu reprovou com palavras insultuosas Estranho insolente tu és alguém alucinado no juízo e não queres ir dormir na casa do artífice de bronze ou num galpão ficas aqui falando muito 330 com audácia entre muitos homens e no ânimo não temes por certo vinho domina teu juízo ou sempre tens uma mente tal porque falas em vão ou estás fora de ti pois a Iro venceste aquele errante Que logo outro melhor que Iro contra ti não se erga 335 um que te golpeie em volta da cabeça com braço robusto e para fora da casa te leve sujo com muito sangue Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Bem rápido direi a Telêmaco cadela como falas eu indo até ele para que lá te corte em pedaços 340 Assim falando com palavras amedrontou as mulheres Cruzaram o salão e fraquejaram seus membros de temor pois pensaram que ele enunciara a verdade E ele alumiando junto aos braseiros chamejantes ficou a todos mirando o coração revolvia em seu ânimo 345 outra coisa que não ficaria incompleta Atena de modo algum deixou os arrogantes pretendentes reprimiremse no opróbrio aflitivo para ainda mais a angústia entrar no coração de Odisseu filho de Laerte Entre eles Eurímaco filho de Polibo começou a falar 350 provocando Odisseu e riso nos companheiros gerou Ouvime pretendentes da esplêndida senhora vou falar o que o ânimo me ordena no peito Não sem um deus chegou este homem à casa de Odisseu pareceme de todo que a fulgência das tochas é dele 355 da sua cabeça pois nela não há cabelo nem pouco Falou e nisso dirigiuse a Odisseu arrasaurbe Estranho gostarias de empregarte se eu te escolhesse no limite das lavouras a paga te será suficiente recolhendo espinheiros e plantando grandes árvores 360 Lá forneceria eu mesmo alimento constante com vestes te vestiria e para os pés daria alpercatas Mas sim como aprendeste serviços vis não quererás fazer o serviço mas curvarse pelas redondezas preferes para poder engordar teu estômago insaciável 365 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Tomara Eurímaco rivalizássemos ambos no campo durante a primavera quando os dias são longos no pasto foice eu teria boacurva e tu também isso terias para no campo nos testarmos 370 jejuando até a escuridão total e pasto haveria Se bois também houvesse para conduzir os melhores ardentes enormes ambos saciados de pasto mesma idade tração igual boa força seriam quatro medidas e o torrão cederia sob o arado 375 assim me verias se os sulcos de uma só vez não cortaria Se guerra também de um lado o filho de Crono instigasse hoje e para mim houvesse um escudo duas lanças e um elmo todo de bronze ajustado nas têmporas assim me verias unindome aos primeiros na vanguarda 380 e não falarias insultos contra esse meu estômago Mas és muito desmedido e tua mente é intratável e acreditas ser alguém grande e poderoso porque te reúnes com poucos e não valorosos Se Odisseu voltasse e alcançasse sua terra pátria 385 logo para ti essas portas embora muito largas seriam estreitas ao tentares fugir pórtico afora Assim falou e Eurímaco enraiveceuse mais no coração olhou de baixo e dirigiulhe palavras plumadas Canalha rápido te aprontarei um mal do jeito que falas 390 com audácia entre muitos homens e no ânimo não temes por certo o vinho domina teu juízo ou sempre tens uma mente tal porque falas em vão ou estás fora de ti pois a Iro venceste o errante Assim falou e pegou uma banqueta e Odisseu 395 junto aos joelhos de Anfínomo de Dulíquion sentou temendo Eurímaco que acabou por atingir do escanção o braço direito a jarra ao cair no chão atroou e o varão gritou de dor e caiu de costas na poeira E os pretendentes iniciaram arruaça no umbroso palácio 400 e assim falavam fitando quem estava ao lado O estranho vagando alhures deveria ter morrido antes de chegar assim não liberaria tal tumulto Agora brigamos por causa de mendigos e com o banquete fino não haverá prazer pois vence o mais infame 405 E entre eles falou a força sacra de Telêmaco Insanos enlouqueceis e não mais ocultais no ânimo a comida e a bebida um dos deuses vos instiga Mas após o banquete vade dormir de volta à casa quando o ânimo pedir mas eu não persigo ninguém 410 Assim falou e todos os dentes mordendo os lábios admiraramse de Telêmaco pois falou com audácia E entre eles Anfínomo tomou a palavra e disse o ilustre filho de Niso o senhor filho de Areto Amigos ninguém por ocasião de fala civilizada 415 abordando com palavras confrontantes endureceria nem maltrateis o estranho nem de resto um dos escravos que vivem na casa do divino Odisseu Vamos que o escanção verta as primícias nos cálices para tendo libado irmos dormir de volta à casa 420 que com o estranho deixemos no palácio de Odisseu que se preocupe Telêmaco pois sua casa amiga alcançou Isso disse e falou um discurso que agradou a todos Para eles na ânfora fez a mistura o herói Caminheiro o arauto de Dulíquion era o assistente de Anfínomo 425 E a todos serviu achegandose eles aos deuses ditosos libaram e beberam do vinho doce como mel Mas depois de libar e beber quanto o ânimo quis partiram para descansar cada um rumo a sua casa Mas ele no salão ficou o divino Odisseu a matança dos pretendentes cogitando com Atena De pronto a Telêmaco dirigiu palavras plumadas Telêmaco carece dentro guardar as armas de guerra 5 todas e aos pretendentes com palavras macias persuadir quando te arguirem sentindo sua falta Tireias da fumaça pois não parecem mais com estas as que Odisseu ao ir a Troia deixou para trás mas se desfiguraram tanto atingiuas o bafo do fogo 10 Além disso o deus soprou algo mais grave no juízo que bêbados não instaurásseis briga entre vós ferísseivos uns aos outros e estragásseis o banquete e a corte o ferro ele mesmo puxa o homem Assim falou Telêmaco obedeceu ao caro pai 15 e após chamála para si disse à ama Euricleia Mãezinha vamos segura as mulheres no salão até que eu guarde no quarto as belas armas do pai na casa a fumaça delas se apossa descuidadas já que ausente o pai eu era tolo mas agora 20 quero pôlas onde o bafo do fogo não chega E a ele replicou a querida ama Euricleia Que agora filho te aposses da reflexão para ocuparte da casa e vigiar todos os bens Vamos quem então irá contigo e levará a luz 25 já que não deixas sair as escravas que alumiariam A ela então o inteligente Telêmaco retrucou O estranho aí não deixarei inativo quem de meu cereal pegue mesmo de longe tendo chegado Assim ele falou e para ela o discurso foi plumado 30 e trancou as portas do palácio bom para morar Eis que os dois se levantaram Odisseu e o filho ilustre e carregavam elmos escudos umbigados e lanças afiadas na frente Palas Atena munida de lâmpada dourada produzia bem bela luz 35 Nisso de súbito falou Telêmaco ao pai Pai grande assombro sim vejo com os olhos tudo as paredes do palácio as belas traves as vigas de abeto os pilares que se sobreerguem pareceme aos olhos como se de fogo chamejante 40 Aqui há um deus dos que do largo páramo dispõem Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Quieto contém tua mente e nada perguntes essa é a tradição dos deuses que do Olimpo dispõem Mas vai te deitar e eu ficarei aqui 45 para ainda às escravas e a tua mãe provocar ela lamentandose indagará acerca de tudo Assim falou e Telêmaco cruzou o salão sob tochas luzentes indo descansar no quarto onde sempre deita quando doce sono o alcança 50 nisso lá também dormiu e aguardava a divina Aurora Mas ele no salão ficou o divino Odisseu a matança dos pretendentes cogitando com Atena E ela saiu do quarto Penélope bemajuizada semelhante a Ártemis ou à dourada Afrodite 55 Junto ao fogo postaramlhe a cadeira onde sentavase bemacabada com marfim e ouro que um dia fez Icmálio o artesão e embaixo pôs banqueta para os pés em cima dela jogaram grande velo Lá sentouse então Penélope bemajuizada 60 E do salão vieram as escravas alvosbraços Elas retiraram o excesso de comida as mesas e os cálices de onde beberam os poderosos varões o fogo dos braseiros lançaram no chão e neles novas achas muitas queimaram para alumiar e aquecer 65 Preta a Odisseu reprovou uma segunda vez Estranho também agora importunarás aqui à noite circulando pela casa e espiarás as mulheres Não Aproveita o banquete insolente e sai pela porta ou rápido atingido por brasa porta afora te irás 70 Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Insana por que me coages assim com ânimo rancoroso Por eu estar sujo vestir ordinárias vestes sobre a pele e mendigar pelos arredores A necessidade me compele Assim são os varões mendigos e vagamundos 75 Também eu um dia afortunado entre os homens morei em casa rica e amiúde obsequiava um errante fosse como ele fosse e do que precisasse ao chegar tinha miríades de escravos e muita outra coisa com que se vive bem e se é tido como rico 80 Mas Zeus filho de Crono destruiu quis de algum modo Por isso agora também tu mulher não percas toda a radiância com que agora entre escravas és superior que a senhora rancorosa não endureça contra ti ou volte Odisseu ainda resta parte de esperança 85 Mesmo que tenha morrido e assim não mais retorne o filho porém já tem o valor do pai graças a Apolo Telêmaco no salão das mulheres ele a nenhuma iníqua ignora pois não tem mais idade Assim falou escutoulhe Penélope bemajuizada 90 e à serva reprovou dirigiuselhe e nomeoua De modo algum atrevida cadela petulante ignorei teu inaudito feito com que besuntarás tua cabeça Sabias tudo direito pois de mim mesma ouviste que a este estranho eu iria no palácio 95 indagar acerca do esposo pois sofro copiosa angústia Falou e à governanta Eurínome disse o discurso Eurínome traze banqueta e velo sobre ela para que sentado o estranho fale sua fala e escute de mim pois quero interrogálo 100 Assim falou e ela de pronto trouxe e postou banqueta bempolida e jogou sobre ela um velo lá sentouse então o muitatenência divino Odisseu Entre eles começou a falar Penélope bemajuizada Estranho eu mesma primeiro te porei esta questão 105 quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Mulher a ti nenhum mortal pela terra semfim censuraria tua fama chega ao largo páramo como a de um rei impecável que temente ao deus 110 regendo sobre muitos e altivos varões sustenta as boas tradições e a negra terra produz trigo e cevada as árvores carregam de fruto as ovelhas se reproduzem sem vacilar o mar fornece peixes e o povo graças à boa liderança excele 115 Por isso agora apura de mim o restante em tua casa só não me indagues linhagem e terra pátria para não encheres ainda mais meu ânimo com dores ao me fazeres lembrar sou muitogemido demais Não carece que eu na casa de outrem com lamento e pranto 120 me sente pois é pior sempre sem trégua se afligir Que nenhuma escrava se indigne comigo nem mesmo tu e diga que navego em choro o juízo nocauteado por vinho E a ele respondeu Penélope bemajuizada Estranho minha excelência aparência e porte 125 os imortais destruíram quando a Ílion embarcavam os argivos e ia com eles meu marido Odisseu Se ele viesse e de minha vida cuidasse maior seria minha fama e mais bela a situação Agora me angustio tantos males o deus me enviou 130 Com efeito quantos nobres têm poder sobre as ilhas Dulíquion Same e a matosa Zacintos e quantos habitam ao longo de Ítaca bemavistada esses cortejamme sem que eu queira e esgotam a casa Por isso nem a estranhos atento nem a suplicantes 135 ou a algum dos arautos esses profissionais mas saudosa de Odisseu derretome no caro coração Eles aplicamse às bodas e eu arremato truques Primeiro o deus soprou em meu juízo um manto após grande urdidura armar no palácio tramar 140 fina e bem longa De imediato lhes disse Moços meus pretendentes morto o divino Odisseu esperai mesmo ávidos por desposarme até o manto eu completar que meus fios em vão não se percam mortalha para o herói Laerte para quando a ele 145 o quinhão funesto agarrar o da morte dolorosa que contra mim no povo aqueia alguma se indigne se ele sem pano jazer depois que muito granjeou Assim falei e foi persuadido o ânimo orgulhoso E então de dia eu tramava a enorme urdidura 150 e nas noites desenredavaa à luz de tochas Três anos não fui notada e persuadi os aqueus mas ao chegar o quarto ano e a primavera se aproximar as luas finando e muitos dias passando então a mim por meio de servas cadelas insolentes 155 eles me pegaram e com palavras me repreenderam E assim completei a mortalha a contragosto obrigada Agora não consigo escapar das bodas nem outro plano mais intento muito me instigam os pais a casar e o filho irritase com quem devora o sustento 160 e disso ele sabe pois já é varão sobremodo capaz de ocuparse da casa a quem Zeus fortuna oferta Mas mesmo assim me fala tua linhagem donde és de carvalho não és nem de rocha como no velho dito Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 165 Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte não cessarás de indagar acerca de minha origem Pois eu te direi Por certo me entregarás a angústia maior que a que suporto é o que ocorre quando está longe de sua pátria o varão por tanto tempo quanto eu agora 170 tendo vagado por muita urbe de mortais sofrendo agonias Mas também assim falarei do que me perguntas e apuras Há uma terra Creta no meio do mar vinoso bela e fértil banhada por correntes nela há muitos homens semfim e noventa cidades 175 Todas falam outras línguas mescladas numa aqueus noutra verocretenses enérgicos noutra cidônios dórios triplotronco e pelasgos divinos Entre elas há Cnossos grande cidade onde por nove anos reinava Minos íntimo do grande Zeus 180 pai de meu pai o animoso Deucálion Deucálion a mim gerou e ao senhor Idomeneu Mas este em naus recurvas rumo a Ílion partiu com os filhos de Atreu Meu nome famoso é Abrasador o mais jovem na família e ele é o mais velho e aguerrido 185 Lá eu vi Odisseu e deilhe dons de hóspede Também a ele a Creta levouo a força do vento ansiava ir a Troia após vagar para longe de Maleia Ancorou em Amniso onde fica a caverna de Eileitiia em angra difícil e com esforço escapou das rajadas 190 Logo perguntou de Idomeneu ao subir à cidade disse ser seu aliado caro e respeitável Já era a décima ou undécima aurora para ele que ia com suas naus recurvas rumo a Ílion Leveio para casa e bem hospedei 195 acolhendoo gentil com o muito que na casa havia e a ele e aos outros companheiros que o seguiam dei cevada da comunidade juntei fulgente vinho e bois para sacrificar de sorte a saciar seu ânimo Lá ficaram doze dias os divinos aqueus 200 detinhaos o grande vento Bóreas que sobre a terra não deixava ficarse de pé e dura divindade instigavao no décimo terceiro o vento caiu e eles partiram Falava contando muito fato enganoso como genuíno Penélope ao ouvir chorava a pele derretia 205 Como derrete a neve para baixo nos cumes dos montes essa que Euro derrete quando Zéfiro o deixa cair e ao derreter os rios correm cheios assim derretia sua bela face vertendo lágrimas pranteando o marido a seu lado sentado E Odisseu 210 lamentando no ânimo apiedavase da esposa e os olhos como se cornos ou ferro firmes estavam serenos nas pálpebras com truque conteve as lágrimas Ela após deleitarse com o lamento muitalágrima de novo com palavras respondendo lhe disse 215 Pois agora a ti estranho creio que testarei se de verdade lá com excelsos companheiros hospedaste meu marido no palácio como dizes Falame que vestes no corpo vestia como ele mesmo estava bem como seus companheiros 220 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Ó mulher é difícil de alguém há tanto tempo longe falar pois este já lhe é o vigésimo ano desde que de lá saiu e partiu de minha pátria mas te direi como ele aparece em meu íntimo 225 Capa púrpura de lã tinha o divino Odisseu uma dupla nela havia uma fivela de ouro com duplo entalhe e na frente um artefato com as patas dianteiras um cão segurava um veado variegado mirandoo convulsionarse todos isto admiravam 230 o cão mirava o corço os dois de ouro sufocandoo e o outro ansiando escapar convulsionavase nas patas E a túnica observei lustrosa no corpo tal como a casca de uma cebola seca era assim macia e fúlgida como o sol 235 De fato muitas mulheres o contemplavam Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança não sei ou isso vestia no corpo Odisseu de casa ou um companheiro presenteouo ao sair em nau veloz ou alhures algum aliado pois de muitos Odisseu 240 era amigo poucos aqueus a ele assemelhavamse Também eu lhe dei brônzea espada e uma dupla túnica bela púrpura com franjas e com respeito envieio à nau bomconvés E um arauto pouco mais velho que ele 245 seguiao também dele te falarei como era ombros arqueados pele escura cabeleira lanosa Passolargo de nome mais que a seus outros companheiros honravao Odisseu pois no juízo adequavase a ele Assim falou e nela instigou mais desejo por choro 250 reconhecendo os sinais seguros que lhe enunciou Odisseu Ela após deleitarse com o lamento muitalágrima então respondendo com um discurso lhe disse Pois agora hóspede se antes já mereceras piedade agora em meu palácio terás estima e respeito 255 pois eu mesma lhe dei essas roupas das quais falaste trouxeas do quarto dobradas e a elas juntei luzidia fivela para adornálo Mas a ele jamais saudarei de novo ao voltar para casa sua cara terra pátria Por isso com má sorte sobre cava nau Odisseu 260 partiu para vivenciar a inominável RuinosaÍlion Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte não mais a bela pele arruínes agora nem o ânimo derretas chorando o esposo Não me indigno de modo algum 265 mulheres também lamentam outros ao perder um varão consorte para quem filhos gerou após unirse em amor que não apenas Odisseu que dizem ser feito deus Mas cessa o choro e apreende minha fala sem evasivas para ti discursarei e não esconderei 270 que acerca do retorno de Odisseu eu já ouvi está perto no fértil povoado dos varões tesprótios vivo e traz bens em profusão e distintos pedindo pela região Mas os leais companheiros perdeu e a côncava nau no mar vinoso 275 ao sair da ilha de Trinácia tinham ódio por ele Zeus e Sol pois às suas vacas mataram os companheiros Todos eles pereceram no mar encapelado mas a ele sobre a quilha da nau uma onda jogou na terra a terra dos feácios na origem próximos dos deuses 280 eles de coração honraramno como a um deus deramlhe muitos dons e quiseram eles mesmos leválo para casa incólume Há tempo aqui Odisseu estaria mas vê isto pareceulhe mais vantajoso no ânimo bens juntar percorrendo a extensa terra 285 mais que os homens mortais muita vantagem conhece Odisseu e mortal algum seria seu rival Assim me contou o rei dos tesprótios Salvador jurou para mim mesmo entre libações que puxara uma nau e preparara companheiros 290 que o conduziriam à cara terra pátria Mas antes enviou a mim calhou ir uma nau de homens tesprótios a Dulíquion muitotrigo Mostroume as riquezas que amealhara Odisseu agora até a décima geração um por um alimentariam 295 tantos haveres do senhor havia em seu palácio Dele disseme que foi a Dodona para do divino carvalho altacopa escutar a vontade de Zeus como voltaria para a cara terra pátria já há muito afastado se às claras ou às ocultas 300 Assim ele desse modo está seguro e já chegará bem perto e longe dos seus e do solo pátrio ficará por pouco tempo De tudo vou te dar um juramento saiba agora Zeus primeiro supremo deus e o melhor e o fogolar do impecável Odisseu ao qual cheguei 305 por certo tudo isso completase como afirmo Neste mesmo período interlunar chegará aqui Odisseu a lua minguando e depois crescendo E a ele replicou Penélope bemajuizada Ah Se essa palavra hóspede se cumprisse 310 então rápido conhecerias a amizade e muitos dons meus tantos que se alguém te visse te diria ditoso Mas como no ânimo me ocorre assim mesmo será nem Odisseu virá mais para casa nem tu condução obterás pois senhores não há mais na casa 315 tal como Odisseu entre os varões se um dia viveu para receber e acompanhar hóspedes respeitáveis Mas criadas lavaio armai um leito estrado lençóis e mantas lustrosas para aquecendose bem alcançar Aurora belotrono 320 Amanhã bem cedo banhaio e ungio e que almoce ao lado de Telêmaco sentado no salão Entre aqueles pior para quem destróiânimo molestálo desta casa nada mais obterá mesmo enraivecido ao extremo 325 Pois hóspede como saberás se outra mulher sobrepujo na mente e astúcia refletida se sujo vestido com andrajos no palácio comeres Os homens chegam ao fim em pouco tempo Quem for ele mesmo intratável e versado no intratável 330 contra ele todos os mortais invocam males futuros enquanto viver e dele morto todos debocham quem for ele mesmo impecável e versado no impecável sua extensa fama espalham os aliados entre todos os homens e muitos dizem que é nobre 335 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte quanto aos lençóis e mantas lustrosas sãome odiosos desde que me afastei dos montes nevados de Creta viajando sobre nau longoremo 340 deitome como sempre passei as noites insones Muitas noites de fato em abrigo noturno ultrajante passei e aguardei a divina Aurora belotrono Nem a meu ânimo lavaremme os pés agrada não tocará meu pé alguma mulher 345 daquelas que te fazem o trabalho da casa salvo se houver vetusta anciã sempre devotada uma que sofreu no juízo tanto quanto eu não me incomodaria se uma tal meus pés lavasse E a ele replicou Penélope bemajuizada 350 Caro hóspede nunca varão tão inteligente mais caro hóspede de longe alcançou minha casa tão inteligente e sensato é tudo o que falas Sim tenho uma anciã com ideias argutas no juízo ela que bem nutriu e criou aquele infeliz 355 e recebeuo nos braços quando primeiro gerouo a mãe essa lavará teus pés embora sendo bem fraca Vamos agora após levantares bemajuizada Euricleia lava o coetâneo de teu senhor talvez de Odisseu os pés e as mãos já sejam assim como os dele 360 Na desgraça os mortais envelhecem rápido Assim falou e a anciã cobriu a face com as mãos lágrimas quentes verteu e falou uma fala chorosa Ai de mim filho nada posso fazer por ti a quem embora temente ao deus Zeus abominou entre os homens 365 Nunca mortal algum a Zeus prazernoraio queimou tantas coxas gordas ou hecatombes seletas quantas tu a ele com preces ofereceste para atingires idade reluzente e criares o filho ilustre e agora só de ti tirou de todo o dia do retorno 370 Assim também dele debocharam mulheres de estranhos longínquos ao atingir uma casa famosa como de ti essas cadelas aqui debocharam todas lançam opróbrio e tanta vergonha que agora as evitas ao não permitires que os pés te lavem a mim sem eu não querer 375 pediu a filha de Icário Penélope bemajuizada Teus dois pés lavarei por ti e pela própria Penélope já que dentro de mim o ânimo foi instigado por agruras Vamos agora atenta à fala que vou falar já muitos estranhos calejados aqui chegaram 380 mas afirmo nunca ter visto alguém tão parecido em corpo voz e pés com Odisseu como pareces tu Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Anciã assim falam todos que viram com os olhos a nós dois que ambos muito nos assemelhamos 385 um ao outro como tu mesma refletindo dizes Assim falou e a anciã pegou resplandecente bacia na qual pés limpava e muita água derramou nela fria e depois quente misturou E Odisseu sentouse longe da lareira e dirigiuse logo à penumbra 390 de pronto em seu ânimo temeu que ela ao tocálo a cicatriz percebesse e suas ações se esclarecessem Próxima lavava seu senhor de pronto reconheceu a cicatriz a de quando javali com branco dente o feriu ao ir ao Parnasso atrás de Autólico e seus filhos 395 o distinto pai de sua mãe superior aos homens no roubo e no juramento o próprio deus o presenteou Hermes a esse queimava comprazedoras coxas de ovelhas e cabritos e ele solícito o acompanhava E Autólico foi à gorda comunidade de Ítaca 400 e encontrou a criança recémnascida de sua filha Euricleia a pôs nos caros joelhos dele no fim do jantar dirigiuselhe e nomeouo Autólico agora tu mesmo acha o nome o que darás à criança de tua cara criança para ti muitorogado ele é 405 A ela por sua vez Autólico respondeu e disse Meu genro e filha colocai o nome que vou falar com o ódio de muitos eu mesmo cheguei aqui de varões e mulheres pela terra nutremuitos que seu nome epônimo seja Odisseu Quanto a mim 410 quando ao tornarse jovem à grande casa materna fores ao Parnasso onde estão meus bens deles eu lhe darei e a ele agradado de volta enviarei Por isso foi Odisseu para receber presentes radiantes Eis que a ele Autólico e os filhos de Autólico 415 saudaram com as mãos e palavras amáveis a mãe da mãe Muidivina abraçou Odisseu e beijouo na cabeça e nos dois belos olhos E Autólico ordenou que os filhos majestosos o almoço preparassem e o ouviram 420 Rápido trouxeram boi macho de cinco anos esfolaram e desmembraramno por inteiro cortaram com destreza transpassaram em espetos assaram com todo o cuidado e dividiram as porções Então assim o dia inteiro até o pôr do sol 425 jantaram e o ânimo não careceu de banquete parelho e quando o sol mergulhou e vieram as trevas então repousaram e aceitaram o dom do sono Quando surgiu a nascecedo Aurora dedosróseos foram para a caça tanto os cães quanto os próprios 430 filhos de Autólico com eles ia o divino Odisseu Rumaram à escarpada montanha coberta de mata o Parnasso e rápido atingiram as fendas ventosas Então o Sol começou a alcançar as glebas vindo do corremacio Oceano suavecorrente 435 e eles o vale atingiram os caçadores à frente à procura de pegadas iam os cães e atrás os filhos de Autólico com eles o divino Odisseu seguia perto dos cães brandindo lança sombralonga E lá na toca compacta espreitava grande javali 440 Não a cortava o ímpeto de ventos que sopram úmidos nunca o sol luzidio com seus raios a atingia nem chuva a cruzava por completo tão compacta era e havia um monte de folhas grande abundância Envolveuo o som dos pés de varões e cães 445 ao chegarem caçando ele de frente moita afora a crina bem eriçada mirando com fogo nos olhos pôsse perto deles Eis que Odisseu foi o primeiro a lançarse erguendo a longa lança na mão encorpada ansioso por ferilo e o javali antecipouse e feriuo 450 sobre o joelho e muita carne extraiu com o dente lançandose de lado mas não atingiu o osso do herói E Odisseu golpeouo acertando sua espádua direita e certeira atravessou a ponta da lança luzidia tombou no pó berrando e sua vida voou para longe 455 Daquele então os caros filhos de Autólico cuidaram e o ferimento do impecável excelso Odisseu destros ataram com um encanto o negro sangue contiveram e rápido rumaram à morada do caro pai Eis que a ele Autólico e os filhos de Autólico 460 curaram direito e lhe deram dádivas radiantes alegre com alegria amigável enviaramo logo a Ítaca Por ele o pai e a senhora mãe alegraramse ao retornar e inqueriramno de tudo a cicatriz de como a obteve e ele contoulhes bem 465 como ao caçar machucouo javali com branco dente ao ir ao Parnasso com os filhos de Autólico Então a anciã com as mãos para baixo pegou reconheceu a cicatriz ao nela encostar e empurrou o pé para longe a panturrilha caiu na bacia o bronze estrepitou 470 e para o outro lado inclinouse água entornou pelo chão Alegria e aflição tomaram seu juízo seus dois olhos de lágrimas se encheram e a voz abundante contevese Tocandoo no queixo dirigiuse a Odisseu De fato és Odisseu querida criança mas antes 475 não te reconheci antes de tocar todo o meu senhor Falou e fitou Penélope com os olhos querendo indicar que o caro esposo lá dentro estava Ela não foi capaz de mirar direto ou perceber pois Atena desviou sua mente E Odisseu 480 com a mão direita alcançoua pegoua pelo pescoço com a outra puxoua mais perto de si e falou Mãezinha por que queres destruirme Tu me nutriste nesse teu peito agora após padecer muita agonia cheguei no vigésimo ano à terra pátria 485 Mas como ponderaste e o deus lançou em teu ânimo quieta que nenhum outro no palácio te escute Pois assim eu falarei e isto se cumprirá se o deus fizer eu subjugar os ilustres pretendentes nem a ti embora minha ama pouparei quando as outras 490 escravas mulheres em meu palácio eu matar E a ele replicou a bemajuizada Euricleia Meu filho que palavra te escapou da cerca de dentes Pois sabes este é meu ímpeto firme e inflexível aguentarei como se eu fosse de pedra dura ou ferro 495 Outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança se o deus te fizer subjugar os ilustres pretendentes então te enumerarei as mulheres no palácio as que te desonram e as que são inocentes Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 500 Mãezinha por que falas delas Disso não careces Eu mesmo irei bem ponderar e observar cada uma Mas silencia o discurso e entrega aos deuses Assim falou e a anciã saiu cruzando o salão para buscar água que derramara toda 505 Então após o lavar e ungir à larga com óleo de novo para perto do fogo Odisseu puxou a banqueta para se aquecer e encobriu a cicatriz sob os trapos E entre eles começou a falar Penélope bemajuizada Eu mesma hóspede ainda te porei esta pequena questão 510 sim logo será a hora do prazeroso repouso a quem quer que o doce sono agarrar ainda que inquieto Mas a divindade deume aflição desmesurada de dia deleitome com lamentos gemendo e olhando para minhas obras e as das servas na casa 515 mas quando a noite vem e o repouso agarra todos deito no leito e em volta de meu coração pulsante copiosas aflições agudas me perturbam a lamentadora Como quando a filha de Pandareu a filomela do verde com graça canta ao postarse recente a primavera 520 sentada entre as folhas copiosas das árvores ela que amiúde modulando verte som bem ecoante deplorando o filho o caro Ítilo que um dia com bronze matou por engano o filho do rei Zeto assim também meu ânimo acirrase em duas direções 525 a ver se fico ao lado do filho e firme tudo guardo meus bens escravos e a enorme e alta casa respeitando a cama do marido e a fala do povo ou se já sigo quem for o melhor dos aqueus que me corteja no salão oferecendo dádivas semfim 530 Enquanto meu filho ainda era tolo e juízofrouxo ele não me permitia casar e deixar a morada do esposo agora que é grande e alcança a medida da juventude já me roga que retorne para fora do palácio impaciente com as posses que os aqueus lhe devoram 535 Mas vamos escuta e responde a este meu sonho Meus vinte gansos pela casa comem o trigo da água e ao vêlos rejubilome Vinda de um monte grande águia com bico curvo o pescoço de todos quebra e os mata deixaos empilhados 540 juntos na casa e ascende rumo ao céu divino Mas eu pranteava e ululava no sonho e a minha volta reuniramse aqueias belastranças eu triste chorando pois a águia matarame os gansos Voltando pousou numa projeção da cumeeira 545 e com voz humana quis me conter e disse Coragem filha de Icário grandefama não é sonho mas ótima realidade a se cumprir para ti Os gansos são os pretendentes e eu uma ave águia era antes e agora como teu marido voltei 550 e contra todos os pretendentes lançarei ultrajante destino Assim falou e o doce sono deixoume esquadrinhei em torno e percebi os gansos na casa debicando trigo junto à gamela onde costumam Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 555 Mulher não é possível responder ao sonho dobrandoo para outro lado pois a ti o próprio Odisseu informou como cumprirá a ruína surge aos pretendentes a todos e nenhum escapará da perdição da morte E a ele replicou Penélope bemajuizada 560 Bem estranho insolúveis intrincados sonhos ocorrem e nem tudo se cumpre para os homens Pois de dois tipos são os portões dos tíbios sonhos um é feito com chifres o outro é de marfim Dos sonhos os que passam pelo marfim talhado 565 esses emaranhamse levando palavras irrealizáveis os que passam pela porta de cornos polidos esses realizam o que é real quando um mortal os vê Mas para mim não creio que daí o terrível sonho veio por certo a mim e ao filho daria felicidade 570 Mas outra coisa te direi e tu em teu juízo a lança esta aurora aí já virá vil de se nomear que da casa de Odisseu me afastará agora estabelecerei prova com os machados esses que ele em seu palácio em ordem fixava como escoras de quilha doze no total 575 posicionado bem longe ele disparava a flecha através Agora incumbirei aos pretendentes esta prova quem mais fácil armar o arco com o punho e flechar por meio de todos os doze machados a esse eu seguirei apartandome desta casa 580 marital muito bela plena de vitualhas de que um dia creio lembrarei mesmo que em sonho Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Respeitável esposa de Odisseu filho de Laerte agora não mais postergues essa prova no palácio 585 antes para ti o muitaastúcia voltará para cá Odisseu antes que esses aí esse arco bempolido manuseando retesarem a corda e flecharem através do ferro E a ele replicou Penélope bemajuizada Se quisesses a mim estranho sentado no palácio 590 deleitar doce sono não cairia sobre minhas pálpebras Mas não é possível que fiquem sempre sem sono os homens a cada coisa atribuíram um quinhão os imortais para os mortais sobre o solo fértil Mas quanto a mim após subir aos aposentos 595 repousarei na cama que me foi feita rica em gemidos sempre úmida com minhas lágrimas desde que Odisseu partiu para vivenciar a inominável RuinosaÍlion Lá eu descansarei e tu descansa aqui na casa ou no chão estendendote ou que te armem a cama 600 Isso disse e subiu aos aposentos lustrosos não sozinha mas com ela iam outras criadas Após subir aos aposentos com as servas mulheres chorou por Odisseu caro esposo até para ela sono doce sobre as pálpebras lançar Atena olhosdecoruja Assim no vestíbulo deitouse o divino Odisseu embaixo estendeu pele de boi não curtida e sobre ela muitos velos de ovelhas que os aqueus imolavam Eurínome lançou uma capa por cima dele deitado 5 Lá Odisseu cogitando no ânimo males aos pretendentes jazia desperto e as mulheres salão afora correram elas que aos pretendentes se uniam há tempo uma para a outra exibindo risada e gáudio E o ânimo dele agitouse no caro peito 10 muito cogitou no juízo e no ânimo se indo atrás arranjaria a morte de cada uma ou deixaria se unirem aos pretendentes soberbos a última e derradeira vez seu coração dentro latia Como a cadela envolvendo os frágeis filhotes 15 ao estranhar um varão late sôfrega por brigar assim em seu íntimo latia irritado com as vis ações Após golpear o peito reprovou o coração com o discurso Suporta coração suportaste outro feito mais canalha no dia em que o ciclope de potência incontida comeu 20 os altivos companheiros tu resististe até a astúcia a ti conduzir para fora do antro pensando que morrerias Assim falou abordando o caro coração no peito e seu coração obediente de todo aguentou e resistiu sem cessar ele próprio reviravase para lá e para cá 25 Como quando o varão forte fogo ardendo a um bucho cheio de sangue e gordura para lá e para cá gira almejando que bem rápido fique assado assim ele para lá e para cá reviravase cogitando como desceria os braços nos aviltantes pretendentes 30 ele um só contra muitos E das cercanias veiolhe Atena desceu do páramo de corpo semelhante a uma mulher parou acima de sua cabeça e dirigiulhe o discurso Como de novo acordaste herói em máxima desdita Essa é tua casa essa é tua mulher na casa 35 e o menino assim como se deseja ser um filho A ela respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Por certo isso tudo deusa falaste ponto por ponto mas algo meu ânimo aqui no íntimo cogita como nos aviltantes pretendentes descerei os braços 40 um único sendo eles estão sempre juntos lá dentro Além disso algo maior no juízo cogito mesmo que eu matasse graças a Zeus e a ti como eu me safaria Peço que tu isso ponderes A ele então replicou a deusa Atena olhosdecoruja 45 Que tinhoso Alguém já ouve o companheiro inferior que é mortal e não conhece tantos planos e eu sou uma deusa que te guarda para sempre em todos os labores Vou te falar de forma explícita se uma emboscada de cinquenta homens mortais 50 nos cercasse sôfregos em Ares por matarnos aos dois também deles tangerias vacas e robustas ovelhas Pois que também o sono te pegue é irritante vigiar toda a noite desperto e já te esquivarás dos males Assim falou e sono vertia sobre suas pálpebras 55 e ela de pronto foi ao Olimpo divina deusa Quando prendeuo o sono soltando tribulações do ânimo soltamembros a esposa acordou a sempre devotada e chorava sentada sobre o leito macio Mas após se fartar de chorar em seu ânimo 60 a Ártemis por primeiro rezou a divina mulher Ártemis senhora deusa filha de Zeus que para mim flecha no peito agora lances e me tomes a vida nesse momento ou então me agarre uma rajada leveme embora pelos caminhos brumosos 65 e me lance na foz de Oceano fluidevolta Como quando rajadas tomaram as filhas de Pandareu os deuses destruíram seus pais e elas restaram órfãs no palácio e delas cuidou a divina Afrodite com queijo doce mel e prazeroso vinho 70 Hera deulhes mais que a todas as mulheres formosura e sensatez altura entregou a pura Ártemis e a técnica de trabalhos esplêndidos ensinou Atena Quando a divina Afrodite subiu ao grande Olimpo para pedir a meta das bodas vicejantes para as jovens 75 a Zeus prazernoraio pois ele sabe bem de tudo o que é e não é do destino dos homens mortais nisso as Harpias agarraram as jovens e deramnas às hediondas Erínias para servilas comigo desaparecessem os que têm casas olímpias 80 ou me atingisse Ártemis belastranças para que Odisseu eu fitasse quando eu descesse para debaixo da terra hedionda e aqui não enchesse de gáudio a mente de um varão inferior Mas isso também é um mal suportável quando alguém de dia chora o coração atormentase à larga 85 e sono dominao à noite ele faz esquecer de tudo de bens e males depois que as pálpebras encobre Mas para mim até sonhos ruins enviou o deus Idêntico a ele dormiu comigo de novo essa noite tal como era quando foi com o exército meu coração 90 alegrouse pois pensei não ser sonho mas realidade Assim falou e logo veio Aurora tronodourado A voz da esposa em prantos ouviu o divino Odisseu então cogitou e pareceulhe em seu ânimo que ela já o reconhecia de pé junto a sua cabeça 95 Pois após juntar manto e velo nos quais dormira pôlos no salão sobre uma poltrona e o couro de boi levar para fora a Zeus orou mãos para cima Zeus pai se a mim com intenção à firme e úmida terra à minha trouxestes após me lesardes demais 100 prenúncio pronuncie um dos homens que desperta dentro e fora prodígio de Zeus ademais apareça Assim falou rezando e ouviuo Zeus astucioso e logo trovejou do Olimpo fulgurante do alto das nuvens e jubilou o divino Odisseu 105 Prenúncio vindo da casa mulher emitiu moleira perto junto a seus moinhos os do pastor de tropa nos quais labutavam doze mulheres ao todo preparando cevada e flocos de trigo tutano de varões As outras dormiam após o trigo terem moído 110 e só ela ainda não parara e era a mais fraca Ela deteve o moinho e disse a frase um sinal para Odisseu Zeus pai que aos deuses e homens reges com vigor trovejaste do páramo estrelado onde nuvem não há é prodígio que mostras a alguém 115 Efetua agora também para mim infeliz a frase que direi seja esta a última e derradeira vez que os pretendentes partilham do amável banquete no palácio de Odisseu eles afrouxaram meus joelhos a prepararlhes cevada uma fadiga aflitiva agora ocorra seu último banquete 120 Assim falou e alegraram o divino Odisseu a soada e o trovão de Zeus pensou que se puniriam os infratores As outras escravas ao longo da bela casa de Odisseu reuniramse e na lareira atiçavam o fogo incansável E Telêmaco da cama se ergueu herói igual ao deus 125 vestiu suas vestes pendurou a espada afiada no ombro atou aos pés reluzentes belas sandálias e tomou a brava lança afiada com ponta de bronze Eis que se postou na soleira e se dirigiu a Euricleia Querida mãezinha como honraste o estranho na casa 130 Com cama e comida ou jaz assim descuidado Pois desse jeito é minha mãe embora sensata é confuso como honra quem é entre os homens mortais o pior e o mais valoroso desonra e envia de volta E a ele replicou a bemajuizada Euricleia 135 A ela inocente não culpes agora filho Vinho bebeu sentado enquanto quis De pão disse não mais ter fome pois ela perguntoulhe Mas quando se lembrou do repouso e do sono ela pediu às escravas que aprontassem o estrado 140 Ele como alguém de todo lastimoso e desventurado não quis repousar em leitos e mantas mas em pele de boi não curtida e velo de ovelhas dormiu no vestíbulo e nós o cobrimos com uma capa Assim falou e Telêmaco cruzou o salão com a lança 145 e dois lépidos cães seguiam com ele Foi à ágora para junto dos aqueus belasgrevas Ela a seu turno ordenou às escravas divina mulher Euricleia filha de Voz filho de Persuadidor Mexeivos vós aí mãos à obra varrei a casa 150 e borrifai e nas poltronas bemfeitas cobertas lançai púrpura e vós aí esfregai com esponjas todas as mesas por inteiro limpai as ânforas e os cálices duplaalça vós aí atrás de água ide à fonte e trazei voltando bem rápido 155 Pouco tempo os pretendentes se ausentarão do salão mas bem cedo voltarão pois para todos é a festa Assim falou e elas a ouviram direito e obedeceram Vinte delas foram à fonte com água escura e as outras lá mesmo na casa labutavam com destreza 160 E entraram os servos orgulhosos eles então bem e com destreza lenha racharam e as mulheres voltaram da fonte Depois deles veio o porcariço conduzindo três cevados os melhores entre todos A esses deixou pastando no belo pátio 165 e ele próprio a Odisseu com agrados dirigiuse Hóspede acaso os aqueus te olham com mais atenção ou te desonram no palácio como antes Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Tomara Eumeu os deuses punissem a infâmia 170 que eles com violência ultrajante engenham na casa de outrem e não compartilham de respeito Assim eles disso falavam entre si E Preto aproximouse deles o pastor de cabras e com ele dois pastores tocavam cabras 175 caprinos seletos refeição dos pretendentes A essas prenderam sob a colunata ressoante e ele próprio dirigiuse a Odisseu com provocações Estranho também agora importunarás aqui na casa mendigando aos homens e não sairás pela porta 180 De modo algum creio que nos separaremos antes de provar os braços pois tu sem elegância mendigas também alhures há banquetes de aqueus Assim falou e não se lhe dirigiu Odisseu muitaastúcia mas quieto meneou a cabeça ruminando males 185 Como terceiro juntouselhes Filoitio líder de varões guiando vaquilhona aos pretendentes e gordas cabras Transportaramnos balseiros eles que também a outros homens conduzem quem quer que a eles chegue Prendeuas bem sob a colunata ressoante 190 e ele próprio questionou o porqueiro parado perto Quem é esse estranho porqueiro recémchegado a nossa morada Proclama ser de quais varões Qual é sua linhagem e o solo pátrio Desventurado no porte parece um senhor real 195 Mas os deuses atormentam os homens muito errantes sempre que até para reis destinam agonia Falou saudouo com a mão direita de pé ao lado e falando dirigiulhe palavras plumadas Sê feliz pai estrangeiro tenhas mesmo no futuro 200 fortuna agora de fato estás preso a muitos males Zeus pai deus algum é mais destrutivo que tu não te compunge que varões após gerálos tu se unam a miséria e aflições deploráveis Suei quando te percebi e meus olhos lacrimejaram 205 ao lembrarme de Odisseu já que penso que aquele com trapos tais entre os homens vaga se em algum lugar ainda vive e vê a luz do sol Se já está morto na morada de Hades ai de mim pelo impecável Odisseu que me alocou 210 para vacas ainda pequeno na terra dos cefalênios Agora elas tornaramse ilimitadas e melhor não vingaria para um varão a cepa de vacas largafronte Outros me pedem que as conduza para eles mesmos comêlas e o filho no palácio desconsideram 215 e com o olhar dos deuses não tremem já anseiam os bens dividir o senhor há tempo ausente Mas meu ânimo no caro peito por isso revirase demais é um grande mal havendo o filho buscar a terra de outros partindo com vacas e tudo 220 até varões estranhos mas o que me arrepia é ficar aqui sentado junto a vacas de terceiros a sofrer agonias Há tempo já teria a outro rei poderoso alcançado em fuga pois aqui não é mais suportável mais ainda creio que o miserável caso volte um dia 225 faria esses pretendentes pela casa dispersar Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Vaqueiro como nem vil nem insensato herói pareces e reconheço também eu que sensatez atinge teu juízo por isso te direi e ainda grande jura jurarei 230 saiba agora Zeus primeiro supremo deus e o melhor e o fogolar do impecável Odisseu ao qual cheguei por certo estando tu aqui chegará em casa Odisseu e com teus olhos enxergarás se quiseres os pretendentes mortos que aqui se arrogam senhores 235 E a ele replicou o varão vaqueiro de bois Ah Se essa palavra estranho cumprisse o filho de Crono saberias que força é a minha como agem os braços Do mesmo modo Eumeu rezou a todos os deuses pelo retorno de Odisseu muitojuízo a sua casa 240 Assim eles disso falavam entre si Os pretendentes para Telêmaco o quinhão da morte arranjavam e veiolhes do lado esquerdo uma ave águia voaalto e levava um tímido pombo Entre eles Anfínomo tomou a palavra e disse 245 Meus caros este plano não nos será bemsucedido a morte de Telêmaco vamos lembremos do banquete Assim falou Anfínomo e agradoulhes o discurso Entrando na casa do divino Odisseu mantos depuseram nas cadeiras e poltronas 250 abateram grandes ovelhas e gordas cabras e abateram porcos cevados e uma vaca do rebanho Após assar as vísceras distribuíamnas e vinho nas ânforas misturavam as taças repartia o porqueiro E distribuíalhes pão Filoitio líder de varões 255 em belas cestas e Preto escançava E eles esticavam as mãos sobre os alimentos servidos E Telêmaco alocou Odisseu aplicando sua esperteza dentro do bemerigido salão junto ao umbral de pedra após lá postar banqueta ultrajante e pequena mesa 260 Ao lado pôs pedaços das vísceras verteu vinho em cálice dourado e dirigiulhe o discurso Ali agora senta e com os varões bebe vinho eu próprio afastarei de ti provocações e braços de todos os pretendentes pois não é comunitária 265 esta casa mas de Odisseu e para mim a adquiriu Vós pretendentes afastai o ânimo da reprovação e dos braços para que disputa e briga não comecem Assim falou e todos os dentes mordendo os lábios admiraramse de Telêmaco pois falou com audácia 270 E entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo Embora seja duro aceitemos aqueus o discurso de Telêmaco enunciou grandes ameaças contra nós Sim Zeus não permitiu o filho de Crono caso contrário já o teríamos interrompido no salão embora orador potente 275 Assim falou Antínoo e desprezou o discurso Arautos pela cidade a sacra hecatombe aos deuses levavam e eles reuniramse os aqueus longasmadeixas sob o bosque umbroso de Apolo alvejadelonge Aqueles após assar a carne de fora e a tirar dos espetos 280 repartiramna e partilharam majestoso banquete Junto a Odisseu um pedaço puseram os que serviam igual ao que receberam os outros pois isso ordenou Telêmaco o caro filho do divino Odisseu De modo algum Atena permitiu que os arrogantes pretendentes 285 se reprimissem no tratamento vexatório para ainda mais angústia entrar no coração de Odisseu filho de Laerte Entre os pretendentes havia um varão que ignorava regras tinha o nome de Ctesipo e morava em Same Ele agora confiante nos bens de seu pai 290 cortejava a esposa de Odisseu há muito ausente Ele então entre os soberbos pretendentes falou Ouvime pretendentes orgulhosos vou falar Como convém há tempo o hóspede já tem uma porção igual pois não é belo nem civilizado frustrar 295 os hóspedes de Telêmaco todo que vier a esta casa Que também eu lhe dê um dom para ele próprio oferecer uma honraria à serva do banho ou a um outro dos escravos que vivem na casa do divino Odisseu Isso dito jogou um pé de vaca com a mão encorpada 300 tirandoo da cesta Odisseu evitouo ligeiro inclinando a cabeça e sorriu no ânimo deveras sardônico e atingiu a bemfeita parede A Ctesipo Telêmaco reprovou com o discurso Ctesipo por certo isto foi vantajoso para tua vida 305 não acertaste o hóspede o próprio evitou o projétil Na certa eu te acertaria ao meio com lança afiada e ao invés das bodas teu pai se ocuparia do enterro Assim que em minha casa ninguém afrontas demonstre mas em meu ânimo penso e conheço cada coisa 310 as nobres e as piores no passado ainda era tolo Mas embora até suportemos observar isso tudo o abate de ovelhas o consumo de vinho e comida é duro para um só muitos conter Mas chega não mais me infligi males como inimigos 315 Se já tendes gana de matarme com bronze até disso eu gostaria e seria bem mais vantajoso estar morto que sempre afrontar estes ultrajes estranhos maltratados e escravas mulheres seduzidas de forma ultrajante na bela morada 320 Assim falou e eles todos atentos se calavam Bem depois Agelau filho de Domador falou entre eles Amigos ninguém por ocasião de fala civilizada endureceria replicando com palavras hostis não maltrateis o estranho nem de resto algum 325 dos escravos que vivem na casa do divino Odisseu Para Telêmaco e a mãe eu mesmo diria uma fala amigável se agradasse ao coração de ambos Enquanto o vosso ânimo no peito esperava pelo retorno de Odisseu muitojuízo a sua casa 330 não cabia indignação por aguardar e conter os pretendentes na casa pois isto era mais vantajoso o retorno de Odisseu ele chegar de volta em casa agora isto já é evidente ele não mais retornará Vamos sentado ao lado da mãe enumerelhe isto 335 despose quem for o melhor varão e mais ofertar para que tu satisfeito administres todos os bens paternos comendo e bebendo e ela dirija a casa de outrem A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Por Zeus não Agelau e pelas aflições de meu pai 340 que alhures longe de Ítaca morreu ou está vagando não atraso as bodas de minha mãe mas peço que despose quem quiser e doulhe dádivas indizíveis Envergonhome de escorraçála da casa obrigada com um discurso impositivo que isso o deus não realize 345 Isso disse Telêmaco entre os pretendentes Palas Atena provocou riso inextinguível e desnorteou suas ideias Eles então riam mas com alheios maxilares e eis que comiam carne sangrenta seus olhos enchiamse de lágrimas e o ânimo pensava em lamento 350 Também entre eles falou o deiforme Teoclímeno Miseráveis que mal é este de que sofreis A noite recobre vossas cabeças faces e embaixo os joelhos o gemido é uma tocha nas faces o choro e de sangue estão borrifadas paredes e belas traves 355 cheio de espectros está o vestíbulo cheio o pátio ansiando ir ao Érebo rumo às trevas o sol sumiu do páramo e névoa danosa espalhouse Assim falou e eles todos riram dele com prazer Entre eles Eurímaco filho de Polibo começou a falar 360 Está louco o estranho recémchegado de alhures Mas a ele jovens rápido conduzi porta afora para chegar à ágora já que isso assemelhase à noite A ele por sua vez falou o deiforme Teoclímeno Eurímaco não te peço que me ofereças condutores 365 Tenho olhos ouvidos ambos os pés e mente perfeita no peito em nada ultrajante com eles sairei pela porta pois percebo vir contra vós um mal do qual não fugirá nem escapará nenhum de vós pretendentes que pela casa do excelso Odisseu 370 violentos com varões engenham ações iníquas Isso dito saiu da casa boa para morar e rumou à de Peiraio que solícito o recebeu E todos os pretendentes olhandose uns aos outros provocavam Telêmaco rindo dos estrangeiros 375 E desse modo falavam os jovens arrogantes Telêmaco ninguém tem piores hóspedes que tu Tens esse aí um errante impertinente carente de comida e vinho em trabalho algum experiente nem na força mas só um peso para a terra 380 quanto ao outro aqui postouse para adivinhar Mas se eu te convencesse digo que seria mais vantajoso após lançar os estranhos em nau de muitos calços à Sicília os enviar que te renderiam certo valor Isso diziam os pretendentes e ele desprezou os discursos 385 mas quieto observou o pai sempre aguardando quando nos aviltantes pretendentes desceria os braços E ela defronte colocou uma banqueta bem bela a filha de Icário Penélope bemajuizada e ouviu o discurso de cada um dos varões no salão 390 Eles então rindo prepararam a refeição agradável e deliciosa pois muitos animais imolaram nada seria mais desprazeroso que um jantar como esse que logo iriam a deusa e o poderoso varão instaurar aqueles por primeiro engenharam ultrajes E no juízo dela pôs a deusa Atena olhosdecoruja no da filha de Icário Penélope bemajuizada apresentar aos pretendentes o arco e o ferro cinza no palácio de Odisseu apetrechos e início da matança 5 Subiu a elevada escadaria de sua morada e com a mão encorpada pegou a chave boacurva bela e dourada e tinha um cabo de marfim Pôsse rumo ao quarto com as servas mulheres o bem no fundo lá estavam os haveres do senhor 10 bronze ouro e ferro muito trabalhado E lá estavam o arco esticaevolta e a aljava portaflecha e nela havia muitas setas desoladoras dons que lhe deu o aliado ao topálo na Lacedemônia Ífito filho de Eurito semelhante aos imortais 15 Os dois na Messênia encontraramse um ao outro na casa do atilado Tocaioso quanto a Odisseu viera atrás de uma dívida que todo o povo lhe devia ovelhas e cabras de Ítaca os varões messênios levaram trezentas em naus muitocalço e pastores 20 Por isso fora Odisseu em missão pela longa rota ainda menino enviaramno o pai e os outros anciãos Já Ífito buscava as éguas que perdera doze fêmeas com lactentes mulas robustas Essas então também se tornaram destino de matança para ele 25 quando encontrou o filho ânimopotente de Zeus o herói Héracles experto em grandes feitos Matou a Ífito que hospedava em sua própria casa Héracles terrível desrespeitando os deuses e a mesa que a seu lado pusera ainda assim até o matou 30 e ele mesmo manteve as éguas fortecasco no palácio Perguntando por elas Ífito encontrou Odisseu e deulhe o arco que no passado carregava o grande Eurito e esse ao filho deixara ao morrer na casa de alto pédireito A ele Odisseu deu espada afiada e brava lança 35 o início de confiável aliança Não junto à mesa conheceramse um ao outro Antes o filho de Zeus matou Ífito filho de Eurito semelhante aos imortais que lhe dera o arco A este nunca o divino Odisseu quando ia para a guerra sobre as negras naus 40 escolhia mas aí mesmo lembrança do caro aliado guardava no palácio e carregavao em sua própria terra Quando ela chegou àquele quarto a divina mulher e pisou no umbral de madeira que um dia artesão aplanou hábil endireitou com o prumo 45 e nele ajustou batentes e pôs portas brilhantes de pronto ela soltou a correia da maçaneta enfiou a chave e mirando em frente empurrou os ferrolhos das portas Essas rangeram como um touro pastando no prado assim rangeram as belas portas 50 golpeadas pela chave e presto se lhe escancararam Ela então dirigiuse ao estrado elevado lá baús havia e neles encontravamse roupas perfumadas Esticandose do prego desenganchou o arco acomodado num estojo que o envolvia brilhante 55 Sentada lá mesmo descansandoo nos caros joelhos chorou bem alto e tomou o arco do senhor Após deleitarse com o lamento muitalágrima rumou ao salão atrás dos ilustres pretendentes tendo na mão o arco esticaevolta e a aljava 60 portaflecha e nela havia muitas setas desoladoras Com ela servas levavam uma caixa onde havia muito ferro e bronze apetrechos do senhor Quando alcançou os pretendentes divina mulher parou ao lado do pilar do teto sólida construção 65 após puxar para diante da face o véu reluzente e criada devotada uma de cada lado se postou Presto entre os pretendentes tomou a palavra e disse Ouvime pretendentes orgulhosos vós que esta casa atacai para comer e beber sempre sem parar 70 o varão há muito ausente e nenhuma outra evasiva que fosse conseguistes arrumar mas que ansiais desposarme e tornar sua mulher Bem pretendentes agi eis o prêmio a prova será o manuseio do grande arco do divino Odisseu 75 quem mais fácil armar o arco com o punho e flechar através de todos os doze machados a esse eu seguirei apartandome desta casa marital muito bela plena de vitualhas de que um dia creio lembrarei ainda que em sonho 80 Assim falou e pediu a Eumeu divino porcariço que apresentasse o arco e o ferro cinza aos pretendentes Com lágrimas Eumeu recebeuo e depôs no chão o vaqueiro também chorava pois viu o arco do senhor E Antínoo falou dirigiuselhes e nomeouos 85 Rústicos tolos atentos somente ao efêmero dois coitados por que lágrimas derramai e a mulher o ânimo em seu peito agitais É natural que seu ânimo revolva em aflição pois perdeu o caro consorte Porém em silêncio comei sentados ou porta afora 90 aos prantos saí deixando o arco aqui mesmo aos pretendentes prova inócua pois não creio que facilmente esse arco bem polido será armado Não há varão entre todos estes aqui tal como era Odisseu eu próprio o vi 95 tenho na memória e era ainda criança tola Assim falou e o ânimo dele no peito esperava retesar a corda e flechar através do ferro A uma flecha ele seria o primeiro a provála das mãos do impecável Odisseu a quem desonrava 100 sentado nos salões a instigar os pretendentes E entre eles falou a sacra força de Telêmaco Incrível de fato Zeus filho de Crono fezme tolo Minha cara mãe me disse embora sendo sensata que seguiria um outro apartandose desta casa 105 e eu estou rindo deleitome no ânimo estúpido Bem pretendentes agi pois eis que se revela o prêmio tal mulher no presente não há em terra aqueia nem na sacra Pilos em Argos ou Micenas nem na própria Ítaca nem no escuro continente 110 Vós mesmos disso sabeis por que louvar minha mãe Pois bem não remancheis com desculpas nem vos desvieis da fixação do arco por muito tempo Vamos ver Também eu próprio poderia testarme no arco se eu vergar e flechar através do ferro 115 não me angustiaria se a senhora mãe esta casa deixasse indo com outro quando eu para trás ficaria capaz de apossarme dos belos apetrechos do pai Falou e após levantarse dos ombros tirou a capa púrpura bem como a espada afiada puxou 120 Primeiro cravou os machados tendo cavado um sulco para todos único longo com o prumo endireitouos e socou a terra ao redor Todos se espantaram ao ver com que adequação os cravou e nunca antes os vira Eis que se postou na soleira e experimentava o arco 125 Três vezes abalouo com gana de vergálo três vezes relaxou embora esperasse isto no ânimo retesar a corda e flechar através do ferro Então teria com força vergado puxando uma quarta vez mas Odisseu acenando a cabeça conteveo em sua ânsia 130 E entre eles falou a força sacra de Telêmaco Incrível por certo no futuro serei vil e fracote ou sou muito jovem e nos braços ainda não confio para afastar um varão quando mais velho endurece Mas ide vós que na força sois melhores que eu 135 o arco experimentai e finalizemos a prova Isso dito postou o arco no chão longe de si apoiandoo contra as portas bempolidas justas apoiou o projétil veloz na bela extremidade do arco e sentouse de volta na poltrona de onde se erguera 140 E entre eles falou Antínoo filho de Persuasivo Todos os pretendentes postaivos em ordem pela direita a partir do lugar de onde se serve o vinho Assim falou Antínoo e agradoulhes o discurso E Leodes ergueuse primeiro o filho de Olhovíneo 145 ele era o áugure deles e junto da bela ânfora sentavase sempre bem no fundo só a ele a iniquidade era odiosa e indignavase contra todos os pretendentes Ele foi o primeiro a pegar o arco e o projétil veloz Eis que se postou na soleira experimentava o arco 150 e não o vergou antes cansou relaxando as mãos indolentes delicadas E entre os pretendentes falou Amigos eu não o vergo que outro o pegue Este arco de fato privará muitos nobres de seu ânimo e vida pois é muito melhor 155 estar morto que vivo errar o alvo pelo qual sempre nos reunimos aqui todos os dias à espera Ainda agora no juízo cada um espera e deseja desposar Penélope a consorte de Odisseu mas quando testar o arco e derse conta 160 então que corteje outra das aqueias belopeplo tentandoa com dádivas Quanto a Penélope então desposará aquele que mais ofertar e for o destinado Assim falou e postou o arco longe de si apoiandoo contra as portas bempolidas justas 165 apoiou o projétil veloz na bela extremidade do arco e sentouse de volta na poltrona de onde se erguera E Antínoo reprovouo dirigiuselhe e nomeouo Leodes que palavra te escapou da cerca de dentes assombrosa e aflitiva e indignome ao ouvir 170 Sim se este arco aqui privar os nobres de seu ânimo e vida é porque não lograste tu vergálo Pois a ti a senhora mãe não gerou tão valoroso a ponto de ser arqueador de arco e flechas mas outros vergarão ligeiro os pretendentes ilustres 175 Assim falou e chamou Preto o pastor de cabras Vamos lá Preto acende o fogo nos salões põe ao lado uma grande banqueta e sobre ela um velo e traze de dentro grande naco de sebo para que jovens esquentando untando com óleo 180 o arco experimentemos e finalizemos a prova Assim falou e Preto logo acendeu o fogo incansável trouxe a banqueta pôs ao lado e sobre ela um velo E trouxe de dentro grande naco de sebo Com ele jovens esquentando tentaram e não conseguiam 185 vergar pois eram carentes e muito de força Antínoo ainda aguardava e o deiforme Eurímaco chefes dos pretendentes de longe os melhores em excelência E ambos saíram da casa ao mesmo tempo juntos o vaqueiro e o porcariço do divino Odisseu 190 e ele próprio saiu atrás deles o divino Odisseu Mas quando longe das portas e fora do pátio estavam pôsse a falar e a eles com palavras amáveis dirigiuse Vaqueiro e também tu porcariço eu poderia algo dizer ou devo esconder Mas meu ânimo pede que revele 195 Como vós seríeis na defesa de Odisseu se acaso chegasse bem assim de chofre e um deus o trouxesse Defenderíeis os pretendentes ou Odisseu Falai como a vós coração e ânimo impelem E a ele replicou o varão vaqueiro de bois 200 Tomara pai Zeus completes esse desejo Que voltasse aquele varão e o guiasse a divindade saberias que força é a minha como agem os braços Do mesmo modo Eumeu rezou a todos os deuses pelo retorno de Odisseu muitojuízo a sua casa 205 E após reconhecer desses a mente veraz de novo a eles com palavras respondendo disse Sim em casa sou eu mesmo aqui aguentei muitos males e cheguei no vigésimo ano à terra pátria Reconheço que dentre os servos só vi a vós dois 210 desejosos da minha presença não ouvi nenhum outro rezando para eu à casa retornar Para os dois como se dará contarei a verdade se um deus me permitir subjugar os ilustres pretendentes farei conduzir esposas para ambos e oferecerei bens 215 e casas bemfeitas perto de mim depois para mim sereis companheiros e irmãos de Telêmaco Pois bem que um sinal inequívoco outro eu mostre para me reconhecerem e se assegurarem no ânimo a cicatriz que me deixou um dia javali com branco dente 220 quando fui ao Parnasso com os filhos de Autólico Isso dito afastou os trapos da grande cicatriz Os dois ao verem bem e observarem tudo choravam lançaram os braços em volta do atilado Odisseu e beijavam com afeto cabeça e ombros dele 225 do mesmo modo Odisseu beijou cabeças e mãos E choraram tanto que o sol se teria posto se o próprio Odisseu não os tivesse contido e dito Cessai o pranto e o lamento que ninguém ao sair do salão veja e vá falar lá dentro 230 Entrai um por um não todos juntos primeiro eu depois vós E que este seja o sinal os restantes todos os pretendentes ilustres não deixarão que me sejam dados o arco e a aljava mas tu divino Eumeu levando o arco pela casa 235 nas minhas mãos o põe e diz às mulheres que cerrem as portas do salão compactas justas Se alguma dentro ouvir gemido ou ruído de varões no nosso cercado que pelas portas não saiam mas fiquem lá mesmo atentas na lida 240 A ti divino Filoitio encarrego de trancares as portas do pátio com o ferrolho e célere em cima finalizar com um nó Isso dito entrou na casa boa para morar e então sentouse na banqueta de onde se erguera Também entraram os dois escravos do divino Odisseu 245 Eurímaco já o arco brandia nas mãos esquentandoo aqui e ali na fulgência do fogo nem assim foi capaz de armálo e forte gemeu no glorioso coração perturbado dirigiuselhes e nomeouos Incrível minha aflição é por mim mesmo e por todos 250 Não lamento tanto pelas bodas embora isso me atormente há muitas outras aqueias umas na própria Ítaca cercadademar outras nas cidades restantes mas que de tal modo carentes somos da força do excelso Odisseu que não conseguimos vergar 255 o arco ignomínia a se noticiar também aos vindouros A ele então dirigiuse Antínoo filho de Persuasivo Eurímaco não será assim Também tu percebes Sim agora há na comunidade a festa do deus sagrada quem estiraria o arco Não tranquilos 260 deponhamono E os machados todos podemos deixálos de pé não creio que alguém os pegará após entrar no salão de Odisseu filho de Laerte Vamos que o escanção verta as primícias nos cálices para tendo libado guardarmos o arco recurvado 265 Pela manhã ordenai a Preto o pastor de cabras cabras trazer notáveis entre todos os rebanhos caprinos para tendo coxas disposto a Apolo arcofamoso o arco experimentarmos e finalizar a prova Assim falou Antínoo e agradoulhes o discurso 270 Para eles os arautos vertiam água nas mãos e moços preencheram ânforas com bebida e a todos distribuíam após verter primícias nos cálices Mas depois de libar e beber tudo que quis o ânimo com mente ardilosa disselhes Odisseu muitaastúcia 275 Ouvime pretendentes da esplêndida senhora vou falar o que o ânimo me ordena no peito Sobremodo a Eurímaco e ao deiforme Antínoo eu suplico pois esta palavra falou com adequação cessar agora com o arco e entregar aos deuses 280 pela manhã o deus dará supremacia a quem quiser Mas vamos daime o arco bempolido para entre vós eu testarme nos braços e na força ou ainda tenho vigor sobre os membros recurvos tal como no passado ou já foi perdido por meu desleixo e errância 285 Assim falou e eles todos se indignaram por demais com medo de que armasse o arco bempolido Antínoo reprovouo dirigiuselhe e nomeouo Pobre estrangeiro não tens juízo nem um pouco Não te contentas em tranquilo entre nós soberbos 290 jantar não ser privado de tua porção e ouvir nossas conversas e falas Nenhum outro estranho e mendigo ouve as nossas falas O vinho doce como mel te perturba o que também a outros lesa quem o toma vorazmente e sem medida bebe 295 O vinho também ao centauro o esplêndido Eurítion cegou no salão do animoso Peirítoo quando foi até os lápitas ele cegou o juízo com vinho e louco aprontou vilezas na morada de Peirítoo A aflição tomou conta dos heróis e pórtico afora 300 arrastaramno de chofre com impiedoso bronze orelha e nariz tendo ceifado ele cego em seu juízo partiu suportando sua ruína com ânimo juízocego Daí para centauros e varões se deu a contenda e mal para si mesmo aquele primeiro trouxe bêbado 305 Assim também para ti grande desgraça anuncio se o arco armares de fato não toparás com a bondade de alguém em nossa vizinhança e a ti para longe em negra nau rumo ao rei Apresador flagelo de todos os mortais te enviaremos e de lá não te salvarás Vamos bebe 310 tranquilo e não disputes contra varões mais jovens E a ele replicou Penélope bemajuizada Antínoo não é belo nem civilizado frustrar os hóspedes de Telêmaco todo que vier a esta casa Esperas se esse estranho o grande arco de Odisseu 315 armar confiante em seus braços e força que para casa me conduza e torne sua esposa Nem ele mesmo no peito isso espera nenhum de vós por causa disso aflito no ânimo jante aqui pois não convém de modo algum 320 E a ela Eurímaco o filho de Polibo retrucou Filha de Icário Penélope bemajuizada não pensamos que ele te conduzirá nem convém mas envergonhanos o dizer de varões e mulheres que nunca diga algum outro aqueu mais vil 325 Sim varões bem piores que o impecável varão cortejam a esposa e de modo algum armam o arco bempolido Mas um outro varão mendigo que chegou após vagar fácil vergou o arco e lançou através do ferro Assim dirão e contra nós haveria essas críticas 330 E a ele replicou Penélope bemajuizada Eurímaco não é possível nos arredores boa fama terem esses que desonrando comem a propriedade de nobre varão por que justo isso propondes como crítica Esse estranho é bem grande e robusto 335 e proclama na linhagem ser filho de pai valoroso Pois bem dailhe o arco bempolido para vermos Pois assim eu falarei e isto se cumprirá se ele o armar e Apolo lhe conferir o triunfo vestiloei com capa e manto belas vestes 340 e darei afiada lança proteção contra cães e varões e espada duaslâminas darei sandálias para os pés e o enviarei para onde coração e ânimo o impelem A ela então o inteligente Telêmaco retrucou Minha mãe mais do que eu nenhum aqueu tem 345 o direito de dar ou negar o arco a quem eu quiser nem dentre todos que regem pela rochosa Ítaca nem de todos os das ilhas rumo a Élis nutrepotros ninguém poderá me impedir se eu quiser de ao estranho dar de uma vez esse arco para o levar 350 Mas entra na casa e cuida de teus próprios afazeres do tear e da roca e às criadas ordena que o trabalho executem o arco ocupará os varões todos mormente a mim de quem é o poder na casa Ela ficou pasma e foi de volta à casa 355 pois o inteligente discurso do filho pôs no ânimo Tendo subido aos aposentos com as servas mulheres chorou por Odisseu caro esposo até para ela sono doce lançar sobre as pálpebras Atena olhosdecoruja E pegou o arco curvo e levavao o divino porcariço 360 Eis que todos os pretendentes gritaram no palácio e desse modo falavam os jovens arrogantes Para onde levas o curvo arco porqueiro desgraçado inepto Logo sobre porcos cães ligeiros te comerão só longe dos homens os que criaste se Apolo 365 e os outros deuses imortais nos forem propícios Assim falavam e ele pôs o que levava no mesmo lugar com medo pois muitos no palácio gritaram E Telêmaco ameaçando do outro lado bradou Papá leva o arco não podes a todos acatar 370 senão eu embora mais jovem te persigo no campo lançando pedras na força sou superior Tomara desse modo a todos esses que estão pela casa os pretendentes eu fosse superior nos braços e na força então rápido de forma medonha a uns enviaria de volta 375 para fora de minha casa pois engenham males Assim falou e eles todos riram dele com prazer os pretendentes e deixaram de lado a dura raiva por Telêmaco e levando o arco pela casa o porcariço o pôs nas mãos do atilado Odisseu parado ao lado 380 E após chamála para si disse à ama Euricleia Telêmaco te pede bemajuizada Euricleia que cerres as portas do salão compactas justas se alguma criada dentro ouvir gemido ou ruído de varões no nosso cercado que pelas portas 385 não saia mas fique lá mesmo atenta na lida Assim ele falou e para ela o discurso foi plumado e trancou as portas do palácio bom para morar Em silêncio da casa saltou Filoitio porta afora e trancou então as portas do pátio bemmurado 390 Jazia sob a colunata um cabo de nau ambicurva de papiro com o qual prendeu as portas e entrou Então sentouse na banqueta de onde se erguera olhando para Odisseu Esse já brandia o arco virandoo para todo lado testando aqui e ali 395 se vermes teriam comido os chifres ausente o senhor E assim falavam fitando quem estava ao lado Por certo era algum conhecedor de arcos talvez alhures ele tenha um assim em casa ou intencione fazer um do modo como nas mãos 400 acionao aqui e ali vagabundo calejado em vilania Por sua vez dizia outro dos jovens arrogantes Tomara um dia tope com o sucesso num grau tal quanto for sua capacidade de armar o arco Isso diziam os pretendentes e Odisseu muitaastúcia 405 logo após manusear o grande arco e olhálo inteiro como quando um varão hábil na lira e no canto fácil retesa em torno do novo pino a corda e prende nos dois lados a bemtrançada tripa de ovelha assim sem esforço ao grande arco vergou Odisseu 410 Tendoa pegado com a mão direita testou a corda em sua mão cantou belamente igual a andorinha no canto Grande angústia se apossou dos pretendentes e sua cor mudou E Zeus ribombou forte revelando sinais Então alegrouse o muitatenência divino Odisseu 415 pois prodígio envioulhe o filho de Crono curvaastúcia Pegou uma flecha rápida que ao seu lado estava na mesa nua no interior da cava aljava estavam as outras das quais logo iriam os aqueus experimentar Pondoa contra o braço do arco puxou corda e fendas 420 de lá mesmo da banqueta sentado e lançou a flecha mirando em frente e acertou o topo do cabo de todos os machados cruzou toda a extensão porta afora a flecha pesada de bronze E a Telêmaco disse Telêmaco esse hóspede sentado em teu palácio 425 não te denigre e não errei o alvo nem me cansei vergando o arco meu ímpeto ainda é firme não aquele que com desonra depreciaram os pretendentes Chegou a hora de também preparar o jantar dos aqueus à luz do dia e depois além disso divertirse 430 com música e lira essas o suplemento do banquete Falou e com as celhas sinalizou e embainhou aguda espada Telêmaco o caro filho do divino Odisseu em torno da lança pôs a cara mão e perto do outro junto à poltrona se pôs armado com bronze fulgente E ele se despiu dos trapos Odisseu muitaastúcia saltou na grande soleira com o arco e a aljava cheia de flechas despejou as rápidas setas aí mesmo diante dos pés e aos pretendentes falou 5 Essa disputa inócua já foi completada agora outro alvo que nunca um varão atingiu conhecerei se acertálo e Apolo me der o triunfo Falou e contra Antínoo direcionou a flecha afiada Quanto a este ia levar à boca bela taça 10 dourada duplaalça e já a brandia nas mãos para vinho beber no ânimo não se ocupava de sua morte Quem pensaria entre varões em banquete que um único entre muitos ainda que fosse bem forte lhe prepararia a morte vil negra perdição 15 A ele Odisseu mirando a goela com seta atingiu e certeira o delicado pescoço a ponta atravessou Tombou para o outro lado ao ser atingido o cálice caiulhe da mão e logo das narinas jorrou espesso sangue rápido para longe de si a mesa 20 empurrou com o golpe do pé e jogou os comes no chão pão e carne assada mancharamse E os pretendentes iniciaram arruaça pela casa ao verem caído o varão ergueramse das poltronas chocados e puseramse a esquadrinhar todo o lugar até a bemfeita parede 25 nenhures escudo havia nem brava lança para pegar E ralharam contra Odisseu com raivosas palavras É grave estranho flechares varões nunca mais outras provas toparás agora é certa tua abrupta ruína Mataste o herói que de longe era o melhor 30 dos jovens em Ítaca por isso abutres te comerão aqui Falavam assim todos eles pois pensavam que Odisseu matara o varão sem querer tolos não percebiam que também a todos eles o nó da morte já se amarrara Olhando de cima disselhes Odisseu muitaastúcia 35 Cães críeis que eu não mais chegaria de volta à casa da terra dos troianos pois assoláveis minha morada vos deitáveis com as servas mulheres à força cortejáveis eu próprio ainda vivo minha esposa nem temendo os deuses que do largo páramo dispõem 40 nem que algum homem se indignasse no futuro agora a vós todos o nó da morte está amarrado Assim falou e medo amarelo atingiuos todos e cada um esquadrinhou por onde escaparia 43ª do abrupto fim Lá todos atentos se calavam só Eurímaco respondendo lhe disse 45 Se deveras como o itacense Odisseu voltaste isto falaste com correção os aqueus fizeram muita coisa iníqua no palácio muita no campo Mas ele jaz aí aquele que de tudo é culpado Antínoo pois ele planejava esses feitos todos 50 por certo não tão carente ou desejoso das bodas mas com ideias que não lhe completou o filho de Crono ser rei na cidade de Ítaca bemconstruída ele próprio e matar teu filho numa emboscada Agora ele está morto e é justo e tu poupa o povo 55 teu Nós no futuro após juntar indenização na cidade por tudo que foi bebido e comido no palácio cada um por si levando reparação valendo vinte bois em bronze e ouro te compensaremos até teu coração rejubilar antes disso é compreensível tua raiva 60 Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Eurímaco nem se me compensásseis com toda a herança paterna que agora é vossa e se somásseis mais de alhures nem assim ainda repousariam meus braços da matança antes de os pretendentes expiarem toda a transgressão 65 Agora encontrase diante de vós lutar ou tentar fugir caso alguém da perdição da morte logre se safar penso porém que ninguém escapará do abrupto fim Assim falou e fraquejaram os joelhos e o coração deles Entre eles falou Eurímaco de novo a segunda vez 70 Amigos esse varão não conterá os braços intocáveis mas agora que pegou o bempolido arco e a aljava a partir da soleira polida flechará até nos matar a todos Pois lembremonos do prazer da luta espadas desembainhai e contraponde mesas 75 às setas sinarápida que todos contra ele juntos avancemos procurando afastálo da soleira e da porta subamos à cidade e um grito de alerta rápido ocorra Assim logo o varão aí flecharia uma última vez Tendo dito isso puxou a espada afiada 80 brônzea nas duas pontas aguda e saltou contra ele com rugido horrífico ao mesmo tempo o divino Odisseu a seta disparava e atingiulhe o peito junto aos mamilos e o projétil veloz perfurou seu fígado Eis que da mão soltou a espada no chão e abraçando uma mesa 85 tombou contorcendose e jogou comida no chão e taça duplaalça bateu a fronte no chão aflito no ânimo e com ambos os pés a poltrona chutando fêla oscilar pelos olhos vertiase escuridão E Anfínomo irrompeu contra o majestoso Odisseu 90 saltando na sua frente e puxou a afiada espada a ver se talvez o fizesse da porta recuar Mas eis que antes Telêmaco o atingiu de trás com lança pontadebronze no meio dos ombros e impeliua através do peito com estrondo o varão caiu e sua fronte inteira golpeou a terra 95 Telêmaco apressouse deixando a lança sombralonga aí mesmo em Anfínomo temia que um aqueu ao puxar a lança sombralonga ou o golpeasse investindo com a espada ou o acertasse ele inclinado Pôsse a correr bem ligeiro alcançou o caro pai 100 e parado perto dirigiulhe palavras plumadas Pai já te trarei escudo e duas lanças e elmo todo de bronze nas têmporas ajustado e eu mesmo vou e me revestirei e darei ao porcariço e ao vaqueiro outras armas é melhor estar armado 105 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Traze correndo enquanto há setas para me defender temo que me empurrem para longe da porta estando só Assim falou e Telêmaco obedeceu ao caro pai e rumou ao quarto onde jaziam suas armas gloriosas 110 De lá quatro escudos tirou oito lanças e quatro elmos pontabrônzea com espessa crina Foi e levouos e bem ligeiro alcançou o caro pai Primeiro ele mesmo vestiu o bronze no corpo também os dois escravos vestiram bela armadura 115 e circundaram Odisseu o atilado variegadaastúcia Ele enquanto havia flechas para se defender os pretendentes um por um em sua casa atingia mirandoos e eles caíam uns sobre os outros Mas quando as setas abandonaram o senhor que flechava 120 contra o batente do bemconstruído salão apoiou o arco em repouso contra a parede resplandecente em volta dos ombros pôs o escudo quatrocamadas e sobre a altiva cabeça colocou o elmo bemfeito com crina e a terrível crista moviase para baixo 125 e escolheu duas bravas lanças armadas com bronze Uma porta traseira havia na bemfeita parede e junto à extremidade da soleira do bemconstruído salão uma passagem selada por portas bem justas levava a um corredor Odisseu pediu ao divino porcariço que se postasse 130 perto dela era o único ponto de assalto E entre aqueles falou Agelau anunciando palavra a todos Amigos alguém não subiria pela porta traseira e falaria ao povo e um grito de alerta rápido ocorreria Assim agora logo o varão aí flecharia uma última vez 135 A ele então replicou Preto o pastor de cabras Impossível Agelau criadoporZeus perigosa é a proximidade entre as belas portas e o pátio difícil cruzar a boca do corredor Até um só varão a todos conteria um que fosse bravo Pois bem trarei do quarto armamento 140 para vos armardes pois lá dentro penso e não alhures depuseram as armas Odisseu e o filho ilustre Dito isso subiu Preto o pastor de cabras para os quartos de Odisseu pelas aberturas do salão De lá pegou doze escudos número igual de lanças 145 e tantos elmos pontadebronze com espessa crina voltou e bem rápido levandoas deu aos pretendentes Então os joelhos e o coração de Odisseu fraquejaram ao vêlos vestir as armas e com as mãos as lanças compridas manejar a tarefa pareceulhe grande 150 De pronto a Telêmaco dirigiu palavras plumadas Telêmaco por certo no palácio uma das mulheres conspira um combate ruim para nós ou Preto A ele então falou o inteligente Telêmaco Pai nisto eu próprio errei e nenhum outro 155 é responsável a porta compacta justa aberta deixei isso detectou o espião muito bom Pois vai divino Eumeu fecha a porta do quarto e observa se é alguma das mulheres que realiza isso ou o filho de Finório Preto no que acredito 160 Assim eles disso falavam entre si E de volta ao quarto foi Preto o pastor de cabras buscar belas armas o divino porcariço viu e logo disse a Odisseu que estava próximo Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque 165 lá de novo vai para o quarto o varão infernal aquele que pensamos fosse tu dizme sem evasivas devo eu matálo caso seja mais forte ou tragoo aqui para que ele expie as transgressões muitas tantas quantas armou em tua casa 170 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Aos pretendentes ilustres Telêmaco e eu deteremos no palácio ainda que venham com ímpeto vós os dois prendei seus braços e pernas juntos por trás jogaio no quarto e o prendei nas tábuas por trás 175 Após amarrar uma corda trançada em torno dele puxai para o alto do pilar e aproximai das vigas para ainda vivo por muito tempo sofrer dores cruéis Assim falou e eles o ouviram direito e obedeceram rumaram ao quarto e ele lá dentro ignorouos 180 Preto no fundo do quarto procurava por armas e os dois cada um ao lado de um umbral esperaram Quando cruzava a soleira Preto o pastor de cabras levava em uma mão um belo elmo de quatro camadas na outra largo escudo antigo salpicado de ferrugem 185 do herói Laerte que quando jovem o portava mas então largado e soltas as correias nas costuras os dois num salto agarraramno e puxaramno para dentro pelo topete ao solo jogaramno aflito no coração e prenderam seus pés e mãos com laço apertado 190 puxando muito bem as pontas como ordenara o filho de Laerte divino Odisseu muitatenência após amarrar corda trançada em torno dele alçaramno para o alto do pilar e o aproximaram das vigas Provocando a ele te dirigiste porqueiro Eumeu 195 Agora Preto vigiarás à vera por toda a noite em cama macia deitado como te convém das correntes de Oceano a dedosróseos tu não ignorarás em sua vinda a tronodourado quando trazes cabras para os pretendentes prepararem banquete na casa 200 Assim ele foi deixado estendido com laço nefasto e os dois vestiram suas armas fecharam a porta brilhante e foram até Odisseu o atilado variegadaastúcia Lá respirando ímpeto enfrentavamse na soleira os quatro poucos e os outros dentro da casa muitos e nobres 205 E para perto deles achegouse a filha de Zeus Atena semelhante a Mentor no corpo e na voz humana Vendoa Odisseu alegrouse e lhe disse Mentor afasta a desgraça e lembra do caro companheiro pois muito fiz para ti e tens a mesma idade que eu 210 Assim falou pensando ser Atena moveexército E do outro lado os pretendentes gritaram no palácio primeiro reprovoua Agelau filho de Domador Mentor que Odisseu não te persuada com palavras a combater os pretendentes e defendêlo 215 Creio que nossa ideia se realizará assim quando os matarmos ao pai e ao filho então tu também estarás morto pelo que pretendes fazer no palácio pagarás com a própria cabeça Após eliminarmos vossa violência com bronze 220 tantos bens quantos tens os de dentro e os de fora nós os juntaremos aos de Odisseu e aos teus filhos não deixaremos que vivam no palácio nem que as filhas e a devotada esposa andem pela cidade de Ítaca Isso dito Atena enraiveceuse mais no coração 225 e ralhou contra Odisseu com raivosas palavras Odisseu teu ímpeto não é mais tão firme nem tão bravo és como quando por Helena alvosbraços de nobre pai por nove anos troianos combateste sempre sem cessar e muitos varões mataste na refrega terrível 230 e com teu plano tomouse a urbe amplasruas de Príamo Como agora quando alcançaste tua casa e teus bens gemes em face dos pretendentes para ser bravo Pois vem cá querido põete do meu lado e me observa para que saibas quem é para ti entre varões inimigos 235 Mentor filho de Bravo na retribuição pelo benfazer Isso disse mas de modo algum deu a vitória decisiva pois ainda claro testava a força e a bravura de Odisseu e de seu filho majestoso Ela própria para cima da viga mestra do salão enegrecido 240 lançouse e sentou de frente similar a uma andorinha Aos pretendentes instigavam Agelau filho de Domador Eurínomo Anfimédon Demoptólemo Pisandro filho de Polictor e o atilado Polibo eram dos pretendentes de longe os melhores em valor 245 entre os que ainda viviam e lutavam por suas almas aos outros já haviam subjugado o arco e as setas em massa Entre eles falou Agelau anunciando palavra a todos Amigos o varão aí logo conterá os braços intocáveis também Mentor já foi após falar bazófias vãs 250 e eles foram deixados sozinhos nas portas da frente Assim agora não lanceis todos juntos as lanças longas mas vamos atirai primeiro vós seis esperando que Zeus conceda Odisseu ser atingido e a glória granjeada Os outros não preocupam no caso de ele cair 255 Assim falou e eles todos atiraram como pediu ansiosos e todos os projéteis Atena tornou estéreis Um deles o batente do bemconstruído salão atingiu outro a porta compacta justa De outro o chuço pesado de bronze caiu na parede 260 Mas após evitarem as lanças dos pretendentes entre eles tomou a palavra o muitatenência divino Odisseu Amigos agora eu diria que nós também atirássemos no grupo de pretendentes que aspiram matarnos acrescentando males aos anteriores 265 Assim falou e eles todos atiraram lanças agudas mirando em frente a Demoptólemo Odisseu a Euríades Telêmaco a Élato o porcariço e a Pisandro matou o varão vaqueiro de bois Assim todos juntos morderam o chão incomensurável 270 os pretendentes dirigiramse ao fundo do salão saltaram à frente e puxaram as lanças dos corpos E de novo os pretendentes atiraram lanças agudas ansiosos e a maioria dos projéteis Atena tornou estéreis Um deles o batente do bemconstruído salão 275 atingiu outro a porta compacta justa De outro o chuço pesado de bronze caiu na parede Anfimédon atingiu Telêmaco no carpo da mão de raspão e o bronze feriu a pele mais externa Ctesipo a Eumeu por cima do escudo seu ombro riscou 280 com grande lança que voou e caiu no chão Eles de novo em volta do atilado Odisseu variegadaastúcia atiraram lanças agudas no grupo de pretendentes Então a Euridamas atingiu Odisseu arrasaurbe a Anfimédon Telêmaco e a Polibo o porcariço 285 a Ctesipo na sequência o varão vaqueiro de bois atingiu no peito e proclamando lhe disse Filho de Politerses amaprovocação nunca jamais cedendo à insensatez fales grande entrega o discurso aos deuses pois são muito superiores 290 Isso aí é teu presente em troca do pé de boi que deste ao excelso Odisseu quando pela casa mendigava Assim falou o vaqueiro de lunados bois Odisseu com longa lança feriu o filho de Domador no corpo a corpo Telêmaco feriu Leócrito filho de Fortificante 295 com lança no meio do estômago e o bronze o transpassou caiu de frente e golpeou o chão com toda a fronte E então Atena destróimortal ergueu a égide do alto do telhado e o juízo deles se apavorou Fugiram de medo no salão como rebanho de vacas 300 a elas um moscardo dardejante ataca e agita na estação primaveril quando os dias são longos E aqueles como abutres com garra adunca e bico curvo que descem das montanhas e arremetem contra aves essas na planície disparam esquivandose nas nuvens 305 e eles com um impulso matamnas e defesa alguma há nem fuga e os varões se comprazem com a captura assim eles num rompante contra os pretendentes golpeavam pela casa Gemido aviltante deles partia cabeças golpeadas e todo o chão fumegava com sangue 310 E Leodes num rompante tocou os joelhos de Odisseu e suplicando dirigiulhe palavras plumadas Toco teus joelhos Odisseu tenhame respeito e piedade Afirmo que nunca a uma das mulheres no palácio falei ou algo iníquo fiz mas aos outros 315 pretendentes tentei conter a todo que isso fizesse Mas não os convenci a tirar as mãos das vilezas assim um destino ultrajante topa com a iniquidade Mas eu entre eles o áugure nada tendo feito cairei pelas boas ações não há gratidão no futuro 320 Olhando de baixo disselhe Odisseu muitaastúcia Vê se proclamas entre eles ter sido o áugure deves ter amiúde rezado no palácio para que remoto fosse meu doce retorno minha esposa te seguisse e gerasse crianças 325 por isso não deverias escapar da morte tenebrosa Isso dito com a mão encorpada pegou a espada deitada que Agelau deixara tombar no chão abatido Com ela seu pescoço varou pelo meio Balbuciando a cabeça uniuse à poeira 330 O cantor filho de Térpio fugia da negra morte Fêmio que cantava aos pretendentes obrigado Postouse perto da porta traseira nas mãos a lira aguda dividido cogitou no juízo ou esgueirarse do salão até o altar do grande Zeus 335 do pátio bemconstruído e sentarse onde amiúde Laerte e Odisseu queimaram coxas de bois ou suplicar pelos joelhos após correr até Odisseu Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim tocar os joelhos de Odisseu filho de Laerte 340 E ele depôs a côncava lira no chão entre a ânfora e a poltrona pinosdeprata Correu então até Odisseu tocou nos seus joelhos e suplicando dirigiulhe palavras plumadas Toco teus joelhos Odisseu tenhame respeito e piedade 345 Para ti no futuro tormento haverá se um cantor matares eu que canto para deuses e homens O que sei vem de mim e deus em meu juízo enredos de todo o tipo plantou e convém junto a ti cantar como a um deus Assim não almejes degolarme 350 Também Telêmaco isto poderia dizer teu caro filho que eu nem de bom grado nem com aspirações tua casa frequentava para cantar aos pretendentes após os banquetes muito mais numerosos e fortes guiavamme obrigado Assim falou e escutoulhe a sacra força de Telêmaco 355 e logo disse a seu pai que estava próximo Contemte não fira esse aí inocente com bronze Também salvemos o arauto Médon que sempre de mim se ocupou em nossa casa quando eu era criança se já não o matou Filoitio ou o porqueiro 360 ou ele em tua mira entrou ao te agitares pela casa Isso disse e ouviuo Médon versado no inteligente agachado jazia sob uma poltrona envolto no couro de boi recémesfolado para fugir da negra morte Logo veio de sob a poltrona despiu a pele de boi 365 e então correu até Telêmaco tocou nos seus joelhos e suplicando dirigiulhe palavras plumadas Amigo eu estou aqui te acalma e diga ao pai que com força total não me fira com o bronze afiado com raiva dos varões pretendentes que devastaramlhe 370 os bens no palácio e a ti tolos não honraram Sorrindo disselhe Odisseu muitaastúcia Coragem pois esse aí já te acolheu e salvou para que saibas no ânimo e fales também a outro que muito melhor que a maldade é o benfazer 375 Mas após saírem pela porta do palácio sentai longe da matança no pátio tu e o cantor muitafala enquanto eu pela casa trabalhar no que for preciso Assim falou e os dois saíram do salão sentaramse junto ao altar do grande Zeus 380 esquadrinhando todo o lugar sempre esperando a morte Odisseu esquadrinhou toda sua casa caso ainda um varão vivo estivesse oculto em fuga da negra morte Viuos absolutamente todos em sangue e poeira caídos muitos como peixes aos quais pescadores 385 rumo à cava praia para fora do mar cinzento retiram com rede esburacada e eles todos saudosos das ondas do mar empilhamse sobre a areia deles o resplandescente sol tira a vida assim os pretendentes um sobre o outro empilhados 390 Então a Telêmaco falou Odisseu muitaastúcia Telêmaco vamos chama a ama Euricleia vou falar uma fala que me inquieta Isso disse e Telêmaco obedeceu ao caro pai e após sacudir a porta falou à ama Euricleia 395 Mexate para cá vetusta anciã tu que as mulheres escravas as nossas no palácio espionas vem chamate meu pai quer falarte algo Assim ele falou e para ela o discurso foi plumado Abriu as portas do palácio bom para morar 400 e veio e Telêmaco liderava na frente Achou depois Odisseu entre os corpos defuntos salpicado de sangue e sujeira como um leão que marcha após comer um boi campestre todo o seu peito e as faces nos dois lados 405 têm sangue terrível de se encarar de frente assim estava Odisseu salpicado nas pernas e braços Ela quando viu os corpos e o sangue infindável pôsse a ulular já que vira grande feito mas Odisseu seguroua e contevea em sua ânsia 410 Falando dirigiulhe palavras plumadas No ânimo anciã comprazete contémte e não ulules não é pio sobre varões defuntos se jactar O quinhão dos deuses subjugouos e feitos terríveis não estimavam nenhum dos homens mortais 415 nem vil nem mesmo nobre todo que a eles chegasse assim um destino ultrajante topa com a iniquidade Mas vamos enumerame tu as mulheres do palácio as que me desonram e as que são inocentes E a ele replicou a cara ama Euricleia 420 Portanto eu a ti filho contarei a verdade Cinquenta mulheres tens no palácio escravas a quem ensinamos a executar os serviços desenredar a lã e longe ficar do amasio escravo Doze delas no total embarcaram no aviltamento 425 não prezando a mim nem à própria Penélope Telêmaco só agora cresceu e a ele a mãe não permitia dar ordens acerca das escravas mulheres Pois bem eu subirei aos aposentos lustrosos e falarei a tua esposa sobre quem o deus sono enviou 430 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Ainda não a despertes diz às mulheres que aqui venham essas que antes engenharam ultrajes Assim falou e a anciã saiu pelo palácio anunciando às mulheres e instigandoas a ir 435 Mas ele a Telêmaco ao vaqueiro e ao porcariço após chamálos até si dirigiu palavras plumadas Começai a levar os corpos e ordenai às mulheres que depois às poltronas bem belas e às mesas com água e esponjas esburacadas limpem 440 Mas quando tiverdes arrumado toda a casa conduzi as escravas para fora do bemerigido salão e no espaço entre a rotunda e o impecável muro do pátio acertaias com espadas aguçadas até de todas terdes tirado as almas e elas esquecido Afrodite 445 que sob os pretendentes possuíam e uniamse às ocultas Assim falou e as mulheres vieram juntas todas lamentandose de forma atroz vertendo copiosas lágrimas Primeiro levaram os corpos dos defuntos e os depuseram sob a colunata do pátio bemmurado 450 empilhandoos um sobre o outro Odisseu dava ordens ele próprio impelindoas Elas os levavam obrigadas E depois às poltronas bem belas e às mesas com água e esponjas esburacadas limparam Telêmaco o vaqueiro e o porcariço com pás 455 o chão da casa sólida construção raspavam e as servas levavam os corpos para fora e depunham Mas quando já haviam arrumado o salão inteiro as escravas foram levadas para fora do bemerigido salão no espaço entre a rotunda e o impecável muro do pátio 460 e agrupadas no aperto de onde não se podia escapar E entre eles o inteligente Telêmaco começou a falar Vede com morte limpa eu não tiraria a vida delas que insultos entornaram sobre minha cabeça e nossa mãe e ao lado dos pretendentes dormiam 465 Assim falou e o cabo de nau proanegra após prender no grande pilar jogou em volta da rotunda e para cima bem esticou para pé algum atingir o chão Como quando melros asacomprida ou pombas chocamse com uma rede disposta num arbusto 470 arremetendo para o abrigo e hediondo leito lhes cabe assim elas em fila tinham as cabeças e ao redor de cada uma nos pescoços havia nós para provocar deplorável fim Convulsionaram os pés pouco tempo de fato não muito E para fora arrastaram Preto pelo pórtico e pátio 475 dele as narinas e orelhas com bronze impiedoso cortaram e os genitais arrancaram crua refeição aos cães e deceparamlhe as mãos e os pés com ânimo rancoroso Depois de lavar as mãos e os pés foram para a casa até Odisseu e o feito estava pronto 480 E ele dirigiuse à cara ama Euricleia Traze enxofre anciã remédio de males e trazeme fogo para que eu fumigue o salão e tu a Penélope ordena que venha aqui com servas mulheres e apressa todas as escravas pela casa para virem 485 E a ele dirigiuse a cara ama Euricleia Sim meu filho isso falaste com adequação Mas vamos trarei para ti capa e manto vestes que não assim coberto com trapos nos largos ombros fiques no palácio isso poderia causar indignação 490 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Agora antes de mais nada que fogo eu tenha no palácio Assim falou e não desobedeceu a cara ama Euricleia e sim trouxe fogo e enxofre E Odisseu fumigou direito o salão a casa e o pátio 495 E a anciã saiu pela bela casa de Odisseu anunciando às mulheres e impelindoas a ir e elas saíram do salão com tocha nas mãos Elas claro abraçavam e saudavam Odisseu e beijavam com afeto cabeça ombros 500 e mãos pegandoas e atingiuo um doce desejo por pranto e gemido e no juízo a todas reconheceu E a anciã subiu aos aposentos exultante para dizer à senhora que o caro esposo dentro estava os joelhos se aceleraram os pés em ligeira sucessão Parou na cabeceira e lhe dirigiu o discurso 5 Acorda Penélope cara filha e vejas com teus olhos o que desejas todos os dias Odisseu chegou alcançou a casa ainda que tarde Matou os pretendentes arrogantes que sua casa lesavam os bens comiam e o filho constrangiam 10 E a ela replicou Penélope bemajuizada Cara mãezinha louca te tornaram os deuses capazes de fazer insensato mesmo quem é muito refletido e pôr na trilha da prudência quem tem juízo frouxo eles até a ti lesaram antes com ânimo moderado 15 Por que debochas de mim que tenho ânimo aflito falando coisas sem nexo e até me despertas do sono doce que cobriu minhas pálpebras e me prendeu Nunca dormi desse jeito desde que Odisseu partiu para vivenciar a inominável RuinosaÍlion 20 Pois bem agora desce e vai de volta ao salão Se até mim outra das mulheres que me pertencem tivesse vindo e isso anunciado despertandome do sono então rápido de forma medonha a teria mandado embora de volta para o salão nisso a velhice conta a teu favor 25 E a ela replicou a cara ama Euricleia Não debocho de ti filha cara mas vê à vera Odisseu chegou e alcançou a casa como afirmo o hóspede que todos desonraram no palácio Telêmaco claro há tempo sabia que dentro estava 30 mas com prudência as ideias do pai ocultou até se vingarem da violência dos varões arrogantes Assim falou e aquela se comprouve e pulando da cama enroscouse na anciã lançou lágrimas das pálpebras e falando dirigiulhe palavras plumadas 35 Pois bem cara mãezinha narrame sem evasivas se deveras já alcançou a casa como afirmas como nos aviltantes pretendentes desceu os braços um único sendo eles dentro ficavam sempre juntos E a ela replicou a cara ama Euricleia 40 Não vi não fui informada só o gemido ouvi ao serem mortos nós no fundo do bemerigido quarto estávamos terrorizadas contidas por portas bemjustas até que por fim teu filho me chamou do salão Telêmaco pois o pai o enviara para que me chamasse 45 Encontrei Odisseu de pé entre os cadáveres defuntos eles cercandoo ocupavam o chão duro jazendo um sobre o outro vendo teu ânimo jubilaria ele salpicado de sangue e sujeira como um leão Agora todos já estão juntos nos portões do pátio 50 e ele a casa bem bela fumiga tendo aceso grande fogo envioume para te chamar Mas vem que vós dois embarqueis no gáudio ambos no caro coração pois muitos males sofrestes Agora por fim este longo desejo foi realizado 55 ele chegou vivo a seu lar e achou a ti e ao menino no palácio com ele aqueles agiram mal os pretendentes e deles todos vingouse em sua casa E a ela replicou Penélope bemajuizada Cara mãezinha ainda não proclames alto exultante 60 Sabes que felicidade daria sua presença no palácio a todos sobretudo a mim e ao filho que geramos mas essa narração não é verdadeira como falas pois um deus matou os pretendentes ilustres irritado com a violência aflitiva e os feitos vis 65 Não estimavam nenhum dos homens mortais nem vil nem mesmo nobre todo que os alcançasse assim pela iniquidade sofreram um mal Mas Odisseu perdeu o retorno longe da Acaia e pereceu E a ela replicou a cara ama Euricleia 70 Filha que palavra te escapou da cerca de dentes O marido na casa junto à lareira e disseste que nunca em casa chegaria teu ânimo é sempre incrédulo Pois bem para ti sinal inequívoco outro direi a cicatriz que lhe infligiu o javali com branca presa 75 Essa ao banhálo observei e quis dizerte mas a mim pondome na boca as mãos ele não permitiu falar graças à mente muitaargúcia Mas vem eu porei a mim mesma em jogo se te engano matame em morte miserável 80 E a ela respondeu Penélope bemajuizada Mãezinha para ti é difícil dos deuses sempiternos descobrir os planos mesmo sendo multiperspicaz ainda assim vamos atrás de meu filho para eu ver os varões pretendentes mortos e quem os matou 85 Assim falou e desceu dos aposentos seu coração muito revolvia ou de longe ao amado marido iria inquirir ou de pé a seu lado beijarialhe a face e a mão tomaria E ela para dentro foi cruzou o umbral de pedra e sentouse então diante de Odisseu à luz do fogo 90 no lado oposto eis que ele contra enorme pilar sentado para baixo olhava a ver se algo lhe diria a altiva cônjuge depois de o ver com os olhos Quieta ficou tempo imóvel estupor em seu coração com o olhar ora em seu rosto o reconhecia 95 ora o desconhecia com roupas vis sobre a pele E Telêmaco reprovoua dirigiuselhe e nomeoua Minha mãe desmãe que ânimo intratável Por que meu pai assim desdenhas e não junto dele sentada com palavras o interrogas ou investigas 100 Por certo outra esposa não assim com ânimo resistente se afastaria do marido que após aguentar muitos males chegasse no vigésimo ano à terra pátria teu coração sempre é mais duro que pedra E a ele replicou Penélope bemajuizada 105 Filho meu no peito o estupor domina meu ânimo não sou capaz de dizer palavra nem de indagar nem de encarar de frente Se de verdade é Odisseu e alcançou a casa por certo nós dois nos reconheceremos um ao outro ainda melhor temos 110 sinais ocultos de outrem que só nós dois conhecemos Assim falou e sorriu o muitatenência divino Odisseu De pronto a Telêmaco dirigiu palavras plumadas Telêmaco quanto a tua mãe deixa que no palácio me teste rápido ponderará e com mais vigor ainda 115 Agora estou sujo e visto ordinárias vestes sobre a pele por isso me desonra e ainda não pensa que sou ele Nós cogitaremos qual será de longe a melhor solução De fato se alguém mata um só herói na cidade atrás do qual não há muitos que o ajudem 120 foge abandonando parentes e a terra pátria quanto a nós o esteio matamos os melhores moços em Ítaca peço que tu isso ponderes A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Disso cuida tu caro pai que tua é a melhor 125 astúcia entre os homens isso se diz e contigo nenhum outro varão entre os homens mortais disputaria Nós com sofreguidão junto seguiremos e não penso que se carecerá de bravura tanta quanto a força deixar Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia 130 Portanto eu falarei como me parece ser o melhor Primeiro vos lavai e vesti com túnicas e ordenai às escravas no palácio que vestes escolham e que o divino cantor levando a lira aguda para nós conduza uma dança amiga de folguedos 135 assim diria haver bodas na casa alguém ao ouvir ou quem subir pela rua ou habitar em torno Antes não se espraie na cidade o relato da matança dos varões pretendentes antes de sairmos até nosso sítio muitaárvore Lá então 140 ponderaremos que vantagem o Olímpio concederá Assim falou e eles o ouviram direito e obedeceram Primeiro se lavaram e vestiram túnicas e aprontaramse as mulheres e o divino cantor pegou a côncava lira e neles instigou o desejo 145 por doce música e dança impecável A grande casa reverberava com os pés dos varões que dançavam e das mulheres belacinta E assim falava quem fora da casa ouvisse Por certo um já desposou a rainha muitopretendente 150 a terrível que não suportou de seu marido legítimo guardar a grande casa para sempre até ele chegar Assim diziam mas não sabiam o que fora arranjado E ao enérgico Odisseu em sua casa a governanta Eurínome lavou e com óleo ungiu 155 e em torno dele belo manto lançou e uma túnica Por sobre sua cabeça muita beleza verteu Atena maior e mais encorpado a quem o visse da fronte fez tombar madeixas cacheadas semelhantes a jacintos Como quando reveste a prata com ouro o varão 160 habilidoso a quem ensinaram Hefesto e Palas Atena técnica de todo o tipo e completa obras graciosas assim verteu graça sobre ele na cabeça e nos ombros E saiu da banheira no porte semelhante a imortais Logo sentouse de novo na poltrona de onde se erguera 165 em face de sua esposa e a ela disse o discurso Insana mais que o das bem femininas mulheres tornaram duro teu coração os que têm morada olímpia outra mulher não assim com ânimo resistente se afastaria do marido que após aguentar muitos males 170 chegasse no vigésimo ano à terra pátria Pois bem mãezinha apronta a cama para mesmo só eu deitar sim o coração no seu peito é de ferro E a ele replicou Penélope bemajuizada Insano em nada sou altiva nem indiferente 175 nem estou admirada demais sei muito bem como eras quando de Ítaca saíste sobre nau longoremo Pois bem aprontalhe o leito sólido Euricleia fora do bemerigido quarto aquele que ele mesmo fez aí posiciona o leito sólido e joga os lençóis 180 velos capas e mantas lustrosas Assim falou testando o marido e Odisseu perturbado disse à sempre devotada esposa Ó mulher deveras aflitiva essa fala que falaste Quem pôs a cama alhures Seria difícil 185 até para um bem destro exceto se o deus ele mesmo querendo fácil a pusesse em outro lugar Dos varões nenhum vivente mortal nem muito jovem fácil a removeria pois grande sinal foi feito na cama fabricada eu mesmo a laborei e nenhum outro 190 Arbusto folhalonga oliveira crescia dentro da cerca florescente em seu auge era maciço como um pilar Envolvendoo construí um tálamo terminei com pedras uma ao lado da outra cobrio com um telhado e portas coloquei bem unidas em compacto ajuste 195 Depois podei a folhagem da oliveira folhalonga e cortando fora o toro da raiz polio com bronze bem e com destreza e com o prumo o endireitei fabricando uma coluna e as pranchas furei com verruma Tendo por ela iniciado moldei a cama até terminar 200 artificiando com ouro prata e marfim nela estiquei luzente tira de couro de boi vermelha Assim esse sinal te anuncio e de nada sei ou ainda está imóvel mulher a cama ou já algum varão a pôs alhures cortando embaixo a base da oliveira 205 Assim falou e os joelhos e o coração dela fraquejaram reconhecendo os sinais seguros que lhe enunciou Odisseu aos prantos foi logo até ele as mãos em volta do pescoço de Odisseu lançou beijou sua fronte e disse Não te ressintas comigo Odisseu pois de resto mais 210 que todos eras inteligente os deuses nos deram agonia os que não nos permitiram ficar um com o outro gozar a juventude e chegar ao umbral da velhice Mas agora não me odeies por isto nem te indignes por que não te saudei com afeto tão logo te vi 215 Pois sempre meu ânimo no caro peito tremia que um mortal me ludibriasse com palavras ao chegar pois muitos planejam estratagemas vis Também não a argiva Helena gerada de Zeus a varão estrangeiro teria se unido em enlace amoroso 220 se soubesse que de volta os filhos marciais dos aqueus iriam conduzila para casa à cara pátria O deus instigoua a executar a ação ultrajante antes ela não pôs em seu próprio coração a cegueira funesta que também para nós seria a origem do luto 225 Agora pois já contaste os sinais inequívocos de nossa cama a qual outro mortal nunca viu mas só tu eu e minha serva uma única Actóris que me deu meu pai quando vim para cá a que nos guardou as portas do sólido quarto 230 já convences meu ânimo embora seja bem intratável Assim falou e nele mais ainda instigou o desejo por choro soluçava segurando a esposa perfeita sempre devotada Como quando a terra dá felicidade aos que nadam àqueles cuja nau engenhosa Posêidon em altomar 235 golpeou impulsionada por vento e vaga potente poucos escapam da cinzenta água salgada até a terra nadando e muita salsugem gruda na pele felizes pisam na terra após fugir da desgraça assim deulhe felicidade o marido quando ela o viu 240 e não havia como soltar os alvos braços de seu pescoço Enquanto choravam teria surgido Aurora dedosróseos se não tivesse tido outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja a noite em seu final estendeu e a Aurora a seu turno a tronodourado conteve no Oceano e não deixou os cavalos 245 péveloz jungir os que trazem luz aos homens Luzidio e Brilho os potros que conduzem Aurora Então falou à sua esposa Odisseu muitaastúcia Mulher ainda não ao fim de todas as provas chegamos pois depois ainda haverá labor desmesurado 250 muito e duro e carece que eu o cumpra por inteiro Pois assim adivinhoume a alma de Tirésias no dia em que desci à morada de Hades em busca do retorno dos companheiros e do meu Pois bem vamos para a cama mulher que agora 255 nos deleitemos com o doce sono E a ele replicou Penélope bemajuizada O leito vê tu o terás sempre que no ânimo teu quiseres já que os deuses te permitiram voltar à casa bemconstruída e a tua terra pátria 260 Mas como ponderaste e o deus lançou em teu ânimo vamos falame da prova pois também depois penso serei informada e saber logo de fato pior não é Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Insana por que de novo insistindo muito pedes 265 que eu fale Mas eu te direi e nada esconderei Por certo teu ânimo não jubilará nem eu mesmo jubilo pois a muitas cidades de mortais mandoume partir tendo nas mãos um remo maneável até alcançar varões que o mar não conhecem 270 nem comem comida misturada a grãos de sal eles claro não conhecem naus facepúrpura nem remos maneáveis que são as asas das naus Este sinal me disse inequívoco e não o ocultarei de ti quando comigo depararse outro passante 275 e disser que tenho destróijoio sobre o ilustre ombro então pediume para na terra cravar o remo fazer belos sacrifícios ao senhor Posêidon carneiro touro e javali doméstico reprodutor retornar para casa e ofertar sacras hecatombes 280 aos deuses imortais que do largo páramo dispõem a todos pela ordem Do mar me virá bem suave a morte ela que me abaterá debilitado por idade lustrosa e em volta as gentes serão afortunadas Isso tudo me disse se completará 285 E a ele replicou Penélope bemajuizada Se de fato ao menos a velhice completarem os deuses há a expectativa então de que escaparás de males Assim eles disso falavam entre si nisso Eurínome e a ama aprontaram o leito 290 com roupa macia sob tochas iluminadoras Mas após fazer a cama sólida afobadas a anciã retornou à casa para descansar e Eurínome a camareira a eles conduziu no percurso à cama com uma tocha nas mãos 295 e após guiálos ao quarto voltou Eles então felizes atingiram a cama antiga E Telêmaco o vaqueiro e o porcariço pararam os pés na dança e pararam as mulheres e eles mesmos deitaramse pelos umbrosos salões 300 Após os dois se deleitarem com o amor prazeroso deleitaramse com histórias que um narrava ao outro ela o que suportou no palácio divina mulher a observar a infernal reunião de varões pretendentes que por causa dela muitos bois e robustas ovelhas 305 abatiam e dos cântaros muito vinho foi tirado e o divinal Odisseu quantas agruras infligiu aos homens e quanto ele mesmo agoniado aguentou tudo ele contou Ela deleitouse escutando e o sono não tombou em suas pálpebras antes de ele tudo contar 310 Começou como primeiro subjugou os cícones e depois chegou à gorda lavoura dos varões lotófagos e quanto o ciclope realizou e como fez pagar sua pena pelos altivos companheiros que comeu sem piedade e como alcançou Eolo que solícito o recebeu 315 e lhe deu condução e ainda não devia a cara pátria atingir mas agarraramno rajadas de vento e com gemidos profundos pelo mar piscoso foi levado e como alcançou a lestrigônia Telépilos e esses que destruíram naus e companheiros belasgrevas 320 todos Odisseu o único escapou em negra nau E contou o truque e a muita ardileza de Circe e como foi à casa bolorenta de Hades para consultar a alma do tebano Tirésias com nau muitocalço e viu todos os companheiros 325 e a mãe que o gerou e criou quando pequeno e como ouviu o som das Sirenas incessantes como alcançou as pedras Plânctas e a fera Caríbdis e Cila da qual varões nunca escaparam incólumes e como os companheiros abateram vacas de Sol 330 e como com raio fumoso Zeus trovejanoalto atingiu a nau veloz e pereceram os nobres companheiros todos por igual mas ele escapou da nefasta perdição e como alcançou a ilha Ogígia e a ninfa Calipso que o reteve almejando que fosse seu esposo 335 e na cava caverna o alimentava e dizia que o faria imortal e sem velhice por todos os dias mas a ele nunca persuadiu seu ânimo no peito e como alcançou após muito penar os feácios eles que de coração como a um deus o honraram 340 e numa nau conduziram à cara terra pátria tendo lhe dado bronze ouro a granel e vestes Isso claro falou por último quando o doce sono soltamembros o assaltou soltando as tribulações do ânimo Então teve outra ideia a deusa Atena olhosdecoruja 345 quando supôs que Odisseu em seu ânimo tivesse gozado o leito e o sono com sua esposa de pronto do Oceano à tronodourado nascecedo incitou para trazer luz aos homens E Odisseu pulou da cama macia e deu uma ordem à esposa 350 Mulher já estamos saciados de muitas provas os dois tu aqui meu retorno muitaagrura pranteando mas Zeus e outros deuses a mim aflito ansiando longe me seguravam da terra pátria Agora após alcançarmos os dois o leito desejado 355 dos bens que tenho cuida no palácio e ovelhas as que soberbos pretendentes devastaram muitas eu mesmo apresarei e outras os aqueus nos darão até terem enchido todos os currais Quanto a mim porém irei ao sítio muitaárvore 360 para ver o nobre pai que sofre copiosa angústia para ti mulher isto peço embora sejas sensata logo haverá uma notícia ao nascer do sol sobre os varões pretendentes que matei no palácio após subir aos aposentos com as servas mulheres 365 senta não olhes para ninguém nem faças perguntas Assim falou e sobre os ombros pôs as belas armas incitou Telêmaco o vaqueiro e o porcariço e a todos pediu pegarem aprestos de guerra com as mãos Eles não lhe desobedeceram armaramse com bronze 370 abriram as portas e se foram e chefiava Odisseu Luz já havia sobre a terra e então a eles Atena após com a noite ocultálos ligeiro retirouos da cidade E Hermes o cilênio convocou as almas dos varões pretendentes Tinha nas mãos a vara bela dourada com que enfeitiça os olhos dos varões que bem entender e outros adormecidos desperta 5 Com ela agita e conduz e elas seguem guinchando Como morcegos no recesso de prodigioso antro guinchando voam quando da colônia algum tomba da pedra seguramse mutuamente no alto assim elas guinchando seguiam juntas chefiavaas 10 o benéfico Hermes pelos caminhos brumosos Margearam as correntes de Oceano e a pedra Leucas e até os portões de Sol e a terra dos Sonhos foram e rápido desceram o prado de asfódelos onde habitam as almas espectros dos esgotados 15 E encontraram a alma de Aquiles filho de Peleu e a de Pátroclo e a do impecável Antíloco e a de Ájax que foi o melhor em beleza e porte de todos os aqueus depois do impecável filho de Peleu Assim eles em torno dele juntaramse e para perto 20 achegouse a alma de Agamêmnon filho de Atreu aflita em torno outras reunidas as que com ele morreram na casa de Egisto e alcançaram o fado A ele por primeiro falou a alma do filho de Peleu Filho de Atreu dizíamos tu a Zeus prazernoraio 25 seres por demais caro todos os dias dentre varões heróis porque regias sobre muitos e altivos na terra troiana onde aqueus agonias sofremos Sim e cedo também te atingiria o quinhão funesto que ninguém que nasceu evita 30 Como devias gozando da prerrogativa de tua regência ter morrido e encontrado o destino na região troiana Então todos os aqueus teriam erigido um túmulo a ti e também a teu filho grande fama granjeado para o futuro agora foite destinado ser pego por morte deplorável 35 A ele por sua vez falou a alma do filho de Atreu Próspero filho de Peleu Aquiles semelhante aos imortais tu que morreste em Troia longe de Argos a tua volta outros foram mortos os melhores filhos de troianos e aqueus combatendo por ti tu no turbilhão de poeira 40 jazias grande na grandeza sem memória da equitação E nós combatemos o dia inteiro de forma alguma teríamos findo a luta se Zeus com tempestade não a tivesse Mas depois que às naus te levamos longe da luta depositamos sobre o leito e limpamos a bela pele 45 com água quente e óleo em torno de ti muita lágrima cálida vertiam os aqueus e tosavam madeixas E a mãe veio do mar com imortais marítimas após ouvir o anúncio e um grito pelo mar espraiouse prodigioso e um tremor balançou todos os aqueus 50 Então teriam se arremessado rumo às cavas naus se o varão com muito saber antigo não os tivesse contido Nestor cujo plano também no passado era o melhor Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Deteivos argivos não fujais juventude dos aqueus 55 Essa aí é a mãe do mar com imortais marítimas vem para encontrar o filho falecido Isso dito eles pararam a fuga os animosos aqueus Em volta de ti postaramse as filhas do ancião do mar infelizes gemendo e vestiramte com vestes imortais 60 Musas nove no total alternandose com bela voz cantavam o treno lá não verias sem lágrima nenhum argivo de tal forma ressoou a música aguda Pois a ti dezessete noites e dias sem parar choramos deuses imortais e homens mortais 65 No décimo oitavo te demos ao fogo em tua volta muitas ovelhas e cabras matamos bem gordas e lunadas vacas Queimavas em vestes de deuses com muito óleo e doce mel e muitos heróis aqueus moviamse em armas em volta da pira onde queimavas 70 infantaria e combatentes com carro Grande alarido se fez Mas após a chama de Hefesto terminar contigo pela manhã coligimos teus ossos fúlgidos Aquiles e pusemos em vinho puro e óleo Tua mãe ofertou dourada ânfora duplaalça oferenda de Dioniso 75 disse ser trabalho do bem famoso Hefesto Nela jazem teus ossos fúlgidos ilustre Aquiles misturados com os do morto Pátroclo filho de Menoitio separados dos de Antíloco que mais honravas entre todos os outros companheiros após a morte de Pátroclo 80 Em torno deles grande e impecável túmulo ergueu o sacro exército dos lanceiros argivos no cabo saliente sobre o largo Helesponto para ser longevisível a partir do mar aos varões esses que vivem agora e os que haverá no futuro 85 E a mãe pediu dos deuses bem belos prêmios e fixouos no meio da pista para os melhores aqueus Já participei do funeral de muitos varões heróis quando uma vez falecido o rei os jovens se cintam e se aprontam para as provas 90 mas tendoos visto terias muito admirado no ânimo tais os bem belos prêmios que para ti a deusa fixou Tétis pésdeprata eras muito caro aos deuses Assim tu nem após morrer perdeste o nome mas sempre entre todos os homens tua fama será distinta Aquiles 95 E eu Que prazer foi este após arrematar a guerra No retorno Zeus me armou funesta destruição pelas mãos de Egisto e da maldita esposa Assim eles disso falavam entre si E achegouse deles o condutor Argifonte 100 guiando as almas dos pretendentes que Odisseu dominou Os dois pasmos foram direto quando as viram A alma de Agamêmnon filho de Atreu reconheceu o caro filho de Melaneu o esplêndido Anfimédon ele fora seu aliado quando em Ítaca morava 105 A ele por primeiro falou a alma do filho de Atreu Anfimédon o que sofrestes para baixar à terra lúgubre todos seletos coetâneos Ninguém de outra forma distinguiria e escolheria na cidade melhores varões Estáveis numa nau e subjugouvos Posêidon 110 após instigar ventos difíceis e grandes ondas Varões hostis causaramvos dano em terra firme ao quererdes bois roubar ou belos rebanhos de ovelhas Ou então lutáveis por uma cidade e mulheres Diz a mim que inquiro proclamo ser teu aliado 115 Ou não te lembras quando fui até lá a vossa casa com o excelso Menelau para instigar Odisseu a junto seguir até Ílion sobre naus bomconvés Por uma lua inteira ao todo cruzamos o amplo mar com esforço tendo convencido Odisseu arrasaurbe 120 E a ele por sua vez falou a alma de Anfimédon Majestoso filho de Atreu rei de varões Agamêmnon lembrome ó criadoporZeus de tudo isso que falaste e a ti eu tudo bem direito e com precisão contarei nossa nociva morte certeira tal como se efetuou 125 Cortejávamos a esposa de Odisseu há tempo ausente ela nem recusava as hediondas bodas nem as completava planejando para nós a negra perdição da morte Pois cogitou este outro ardil no juízo após grande urdidura armar no palácio tramava 130 fina e bem longa De imediato nos disse Moços meus pretendentes morto o divino Odisseu esperai mesmo ávidos por desposarme até o manto eu completar que meus fios em vão não se percam mortalha para o herói Laerte para quando a ele 135 o quinhão funesto agarrar o da morte dolorosa que contra mim no povo aqueia alguma se indigne se ele sem pano jazer depois que muito granjeou Assim falou e foi persuadido nosso ânimo orgulhoso E então de dia tramava a enorme urdidura 140 e nas noites desenredavaa com tochas postadas ao lado Três anos o truque não se notou e persuadiu os aqueus mas ao chegar o quarto ano e a primavera se achegar as luas finando e muitos dias passaram uma das mulheres falou a que sabia ao claro 145 e a apanhamos desenredando a trama radiante E assim ela a completou a contragosto obrigada Justo quando mostrou a capa após tramar a urdidura lavada semelhante ao sol ou à lua nisso divindade vil trouxe Odisseu de um lugar 150 até o limite das lavouras onde habitava o porqueiro Até lá foi o caro filho do divino Odisseu vindo da arenosa Pilos com negra nau Os dois para os pretendentes elaboraram morte vil e rumaram à cidade bem famosa Odisseu 155 depois mas Telêmaco liderava na frente Trouxeo o porcariço com vestes vis sobre a pele assemelhado a um débil e velho mendigo apoiado no bastão ordinárias vestes no corpo vestia Nenhum de nós foi capaz de reconhecer que ele era Odisseu 160 ao mostrarse de chofre nem os mais velhos mas dele debochamos e lhe atiramos coisas E por um tempo resistiu sendo atingido e reprovado em seu palácio com ânimo resistente mas quando o incitou o espírito de Zeus portaégide 165 com Telêmaco pegou as bem belas armas depositouas no quarto e passou os ferrolhos e ele com sua muitaargúcia pediu à esposa que apresentasse aos pretendentes o arco e o ferro cinza para nós desventurados apetrechos e o início da matança 170 E nenhum de nós conseguiu retesar a corda do arco poderoso por sermos carentes de força e muito Mas quando as mãos de Odisseu tocaram o grande arco todos nós reclamamos com palavras que o arco não se lhe desse nem se muito pedisse 175 e somente Telêmaco nos fez concordar Ele recebeuo com a mão o muitatenência divino Odisseu e fácil vergou o arco e lançou através do ferro Eis que se postou na soleira e despejou as rápidas setas esquadrinhando terrível e atingiu o rei Antínoo 180 Depois contra os demais disparou tristes projéteis mirando em frente e eles caíam uns sobre os outros É evidente que um deus era deles ajudante Logo por toda a casa seguindo seu ímpeto matavam ao redor Gemido ultrajante deles partia 185 cabeças golpeadas e todo o chão fumegava com sangue Assim nós Agamêmnon morremos de quem agora ainda os corpos sem os ritos jazem no palácio de Odisseu os parentes ainda não sabem em suas casas eles que após limpar o negro sangue dos ferimentos 190 e nos expor lamentariam essa a honraria dos mortos A ele por sua vez falou a alma do filho de Atreu Afortunado filho de Laerte Odisseu muitotruque deveras com grande excelência conquistaste esposa quão valoroso juízo teve a impecável Penélope 195 filha de Icário quão bem se lembrou de Odisseu seu varão legítimo Por isso sua fama nunca findará a de sua excelência e aos humanos farão um canto agradável os imortais pela prudente Penélope Não armou vis ações como a filha de Tindareu 200 que ao marido legítimo matou e hediondo canto haverá entre os homens e dura reputação atribuirá às bem femininas mulheres mesmo às honestas Assim eles disso falavam entre si de pé na morada de Hades sob os confins da terra 205 E os outros desceram da cidade e logo chegaram ao sítio belamente arranjado de Laerte que um dia o próprio Laerte adquiriu depois que muito labutou Aí era sua propriedade abrigo corria por todo o entorno no qual costumavam comer sentarse e dormir 210 os escravos obrigados que faziam o que ele quisesse Aí mandava mulher siciliana anciã que do ancião cuidava gentil no campo longe da cidade Lá Odisseu aos escravos e ao filho falou o discurso Vós ide agora para dentro da casa bemconstruída 215 e como refeição presto sacrificai um porco o melhor quanto a mim testarei nosso pai se me reconhece e observa com os olhos ou desconhece pois longe estive muito tempo Após falar aos escravos entregou as armas guerreiras 220 Eles depois rápido alcançaram a casa e Odisseu foi averiguar mais perto do pomar muitofruto Quando desceu pelo grande pomar não achou Finório um escravo ou os filhos mas eis que eles para recolher espinheiros úteis como cerca do pomar 225 haviam saído e deles na estrada o ancião era o líder Ao pai sozinho achou no pomar bemarranjado cavando em volta de uma árvore Vestia suja túnica remendada ultrajante em volta da panturrilha de couro polainas costuradas amarrara evitando arranhões 230 e luvas nas mãos por causa de amoreiras Na cabeça trazia um gorro de cabra avultando a angústia Quando então o viu o muitatenência divino Odisseu torturado pela velhice e com enorme angústia no juízo postouse sob elevada pereira e lágrimas verteu 235 Então cogitou no juízo e no ânimo beijar e abraçar seu pai e com minúcias contar como voltou e alcançou a terra pátria ou primeiro o interrogaria e com minúcias o testaria Pareceulhe ao refletir ser mais vantajoso assim 240 primeiro testálo com palavras provocadoras Nisso refletindo foi direto lá mesmo o divino Odisseu Aquele cabeça abaixada desenterrava uma árvore parado ao lado disselhe o filho ilustre Ancião imperícia não te domina no trato 245 do pomar mas teu cuidado domina bem Não há de todo nem planta nem figueira nem videira nenhuma oliveira nem pereira nem canteiro sem teu cuidado no jardim Outra coisa te direi e não ponhas raiva no ânimo a ti mesmo o valoroso cuidado não domina mas velhice 250 funesta te domina secura vil e vestes ultrajantes Por certo não devido à inação um senhor descuida de ti e nada de um escravo assoma em ti ao mirarse aparência e altura pois pareces um varão que é rei Pareces alguém que após se banhar e comer 255 suavemente repousa pois é tradição dos anciãos Pois bem falame disto e conta com precisão de que varão és escravo De quem o pomar que cuidas A mim diz isto a verdade para eu bem saber se esta aonde cheguei é deveras Ítaca como me disse 260 aquele varão que há pouco topei ao vir para cá não muito prestativo pois tudo não aguentou falar e ouvir minha palavra quando perguntei acerca de meu aliado se acaso vive e existe ou já está morto na morada de Hades 265 Pois eu te falarei e tu compreende e me escuta certa vez hospedei um varão na cara terra pátria que chegou até nós e nunca outro mortal mais caro hóspede de longe alcançou minha casa Proclamou ser de Ítaca quanto à família e disse 270 que Laerte filho de Arquésio era seu pai A ele eu levei para casa e bem hospedei acolhendoo gentil com o muito que havia na casa e deilhe os presentes dons de hóspede que convém Deilhe sete pesos de ouro bemtrabalhado 275 deilhe uma ânfora toda de prata com desenho floral doze túnicas simples número igual de cobertas tantos belos mantos e somado a isso tantas túnicas à parte mulheres versadas em trabalhos impecáveis quatro formosas as que ele mesmo quisesse escolher 280 E a ele respondeu o pai vertendo copiosas lágrimas Estranho a esta terra chegas da qual perguntas e varões desmedidos e iníquos a dominam Premiasteo com presentes miríades ofertando estéreis se o tivesses alcançado vivo na cidade de Ítaca 285 então ele te enviaria de volta retribuindo com belos dons e nobre hospedagem essa é a norma para quem inicia Pois bem dizeme isto e conta com precisão qual já é o ano desde que o hospedaste teu hóspede infeliz meu filho se um dia existiu 290 desventurado que longe dos caros e do solo pátrio ou no mar comeramno os peixes ou em terra firme tornouse presa de feras e aves de rapina A ele mãe não amortalhou e chorou nem o pai esses que o geramos nem a esposa muitadádiva a prudente Penélope 295 ululou pelo marido junto ao leito como convém após cerrar os olhos essa é a honraria dos mortos A mim diz isto a verdade para eu bem saber quem és De que cidade vens Quais teus ancestrais E onde está a nau veloz que aqui trouxe a ti 300 e excelsos companheiros Ou como passageiro chegaste em nau alheia e eles se foram após desembarcarte Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Portanto a ti tudo direi com muita precisão Eu sou de Alibas onde habito morada gloriosa 305 filho do senhor Afidas filho de Polipêmon e meu nome é Seleto Mas a mim divindade fez vagar para longe da Sicília até sem querer cá chegar minha nau está aqui no campo longe da cidade Mas para Odisseu este já é o quinto ano 310 desde que de lá partiu e saiu de minha pátria desventurado Ótimas lhe foram as aves ao se ir destras com que eu me alegrei enviandoo de volta e ele se alegrou ao partir no ânimo ambos esperávamos ainda nos encontrar aliados e dar dons radiantes 315 Isso disse e ao outro encobriu escura nuvem de angústia com ambas as mãos tendo apanhado fuliginoso pó verteuo sobre a grisalha cabeça gemendo sem cessar O ânimo do outro se agitou e subindo as narinas já o ímpeto lancinante eclodia ao mirar o caro pai 320 E beijouo e abraçou após saltar até ele e disse Sim aquele por quem indagas pai sou eu mesmo aqui e cheguei no vigésimo ano à terra pátria Mas contém o pranto e o lamento lacrimoso Pois eu te falarei e é imperiosa a pressa apesar de tudo 325 matei os pretendentes em nossa casa punindo o opróbrio aflitivo e as vis ações A ele por sua vez Laerte respondeu e disse Se deveras como Odisseu meu filho chegaste sinal inequívoco dizeme agora para eu me convencer 330 Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia A cicatriz primeiro esta aqui observa com os olhos a que no Parnasso me deixou javali com branco dente quando lá fui tu me enviaste e a senhora mãe até Autólico o caro pai da mãe para eu receber 335 presentes que após vir aqui me prometeu e indicou Pois bem que a ti das árvores pelo pomar bemarranjado eu fale as que um dia me deste e eu te pedi cada uma ainda criança seguindote pelo jardim por elas caminhávamos e tu falaste o nome de cada uma 340 Pereiras treze me deste e dez macieiras figueiras quarenta assim filas de videiras nomeaste para me dar cinquenta uma por vez frutificando o ano inteiro ali no alto há uvas de todos os tipos sempre que as estações de Zeus sobre elas pesam de cima 345 Assim falou e os joelhos e o coração dele fraquejaram reconhecendo os sinais seguros que lhe enunciou Odisseu Em torno do caro filho lançou os braços a ele ao desmaiar amparouo o muitatenência divino Odisseu Quando voltou a si e no peito o ânimo se recompôs 350 retomou a palavra e respondeulhe Zeus pai por certo ainda sois deuses no alto Olimpo se de fato os pretendentes pagaram pela iníqua desmedida Agora tenho terrível temor no juízo que logo todos venham para cá os itacenses e mensagens 355 enviem por todo lugar até as cidades dos cefalênios Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Coragem que isso não ocupe teu juízo Mas vamos à casa que fica perto do pomar até lá Telêmaco o vaqueiro e o porcariço 360 enviei para que bem rápido preparassem refeição Após assim falarem dirigiramse à bela casa Eles quando atingiram a casa boa para morar acharam Telêmaco o vaqueiro e o porcariço cortando muita carne e misturando fulgente vinho 365 Nisso ao enérgico Laerte em sua propriedade a serva siciliana lavou e com óleo ungiu e em torno dele bela capa lançou e Atena achegandose inchou os membros do pastor de homens e maior e mais encorpado fêlo para quem olhasse 370 E saiu da banheira o caro filho espantouse com ele quando o viu semelhante a deuses imortais de frente e falando dirigiulhe palavras plumadas Pai deveras a ti um dos deuses sempiternos em aparência e altura fez melhor para quem te olhar 375 A ele então o inteligente Laerte retrucou Tomara ó Zeus pai Atena e Apolo tal como quando Nérico tomei bemconstruída cidade num cabo do continente regendo os cefalênios que eu assim ontem estando em nossa morada 380 com armas nos ombros tivesse postadome e afastado os varões pretendentes assim teria soltado seus joelhos de muitos no palácio e terias alegradote no íntimo Assim eles disso falavam entre si Após concluírem a tarefa e aprontado o banquete 385 em ordem sentaramse nas cadeiras e poltronas Ali teriam posto a mão no almoço e para perto veio o ancião Finório e junto os filhos desse ancião extenuados pela lida após sair e chamálos a mãe a anciã siciliana que os criou e de Laerte 390 cuidava gentil pois a velhice o capturara Eles ao verem Odisseu e avaliarem no ânimo ficaram parados no salão estuporados Odisseu com palavras amáveis abordandoos disse Ancião senta para o almoço olvidai o assombro 395 há tempo aspirando pôr a mão na comida esperamos no salão sempre vos aguardando Assim falou e Finório foi direto abrindo os braços os dois pegou as mãos de Odisseu pelo punho beijouas e falando dirigiulhe palavras plumadas 400 Amigo já que retornaste a nós desejosos demais e não mais crendo e os próprios deuses te guiaram salve e sê muito feliz e deuses te deem fortuna A mim diz isto a verdade para eu bem saber ou já sabe ao claro a bemajuizada Penélope 405 que tu retornaste aqui ou expeçamos um mensageiro Respondendo disselhe Odisseu muitaastúcia Ancião ela já sabe por que carece que disso te ocupes Isso disse e ele de novo sentouse na cadeira bempolida Também os filhos de Finório em volta ao glorioso Odisseu 410 saudaram com palavras apertaramlhe as mãos e em ordem sentaramse ao lado de Finório seu pai Assim em volta do banquete se ocupavam no salão E Rumor o mensageiro rápido percorreu toda a cidade relatando a perdição da hedionda morte dos pretendentes 415 Eles assim que ouviram cada um acorreu de outro lado com queixume e gemido à frente da morada de Odisseu Os corpos cada família retirou da casa e enterrou os de outras cidades a família encarregava pescadores que os levassem para casa pondoos sobre naus velozes 420 E eles à ágora foram em grupo angustiados no coração Então após estarem reunidos todos juntos entre eles Persuasivo levantouse e falou pois por seu filho brutal aflição jazia no peito Antínoo a quem por primeiro matou o divino Odisseu 425 Por ele vertendo lágrimas tomou a palavra e disse Amigos feito inaudito esse varão armou contra aqueus aqueles com naus conduziu muitos e nobres e destruiu as côncavas naus e destruiu toda a tropa estes de longe os melhores cefalênios matou após chegar 430 Pois mexeivos antes que ele rápido alcance Pilos ou a divina Élida onde dominam os epeus vamos ou depois seremos sempre ridicularizados Isto é opróbrio a se noticiar também aos vindouros se não castigarmos aos assassinos dos filhos 435 e irmãos para mim no juízo não seria doce viver mas rápido morreria e aos defuntos me uniria Mas vamos que aqueles não atravessem antes Assim falou chorando e piedade atingiu todos os aqueus E deles achegaramse Médon e o divino cantor 440 vindos do palácio de Odisseu após o sono os deixar e postaramse no meio assombro tomou cada varão Entre eles falou Médon versado no inteligente Ouvime agora itacenses pois Odisseu não sem a ajuda dos deuses imortais armou esses feitos 445 eu próprio vi o deus não mortal que de Odisseu achegouse e a Mentor em tudo se assemelhava E o deus imortal ora aparecia diante de Odisseu encorajandoo ora agitando os pretendentes tremulavaos pela casa e eles caíam uns sobre os outros 450 Assim falou e medo amarelo atingiuos todos Entre eles também falou o ancião o herói Haliterses filho de Buscador o único que via o passado e o futuro Refletindo bem entre eles tomou a palavra e disse Ouvi agora de mim itacenses o que vou falar 455 por causa de vossa vileza esses feitos ocorreram não vos persuadi nem Mentor pastor de homens a fazer vossos filhos interromper a loucura eles que feito inaudito fizeram com iniquidade vil devastando as posses e desonrando a esposa 460 de nobre varão afirmavam que nunca retornaria Agora assim ocorra que eu vos persuada do que digo não vamos que a ninguém acometa um mal autoinfligido Assim falou e um grupo se ergueu com grande alarido mais da metade os outros juntos lá mesmo ficaram 465 A uns não agradou o discurso no juízo mas Persuasivo persuadiu outros que logo se apressaram rumo às armas Mas após vestirem o bronze lampejante sobre a pele em conjunto reuniramse diante da espaçosa cidade A eles Persuasivo passou a liderar em sua tolice 470 Pensou que puniria o assassinato do filho mas não iria de novo retornar e lá mesmo alcançaria seu destino E Atena a Zeus filho de Crono dirigiuse Ó nosso pai filho de Crono supremo entre poderosos diga a mim que inquiro o que tua ideia dentro contém 475 Guerra danosa ulterior e combate terrível arranjarás ou imporás amizade entre os dois lados Respondendo disselhe Zeus juntanuvens Minha filha por que isso me perguntas e apuras Vê bem essa ideia não ponderaste tu mesma 480 que deles Odisseu se vingasse ao chegar Faz como quiseres mas digote o que convém Já que aos pretendentes castigou o divino Odisseu que ele após firmarem pacto confiável reine sempre e nós quanto à matança de filhos e irmãos 485 imponhamos o olvido que sejam eles amigáveis entre si como antes e que haja riqueza e paz em abundância Isso disse e instigou Atena que já o ansiava antes e ela partiu tendose lançado dos cumes do Olimpo Após estes apaziguarem o desejo por comida adoçajuízo 490 entre eles tomou a palavra o muitatenência divino Odisseu Alguém deveria sair e ver temo que estejam perto Assim falou e o filho de Finório saiu como pediu postouse na soleira e viu perto todos aqueles De pronto a Odisseu dirigiu palavras plumadas 495 Eles já estão aí perto armemonos bem ligeiro Assim falou e eles apressaramse e vestiram as armas quatro em volta de Odisseu e os seis filhos de Finório Entre eles Laerte e Finório vestiram as armas embora fossem grisalhos guerreiros pelas circunstâncias 500 Mas após sobre a pele vestir o bronze lampejante abriram as portas se foram e chefiava Odisseu E achegouse deles a filha de Zeus Atena semelhante a Mentor no corpo e na voz humana Vendoa alegrouse o muitatenência divino Odisseu 505 e de pronto falou a Telêmaco seu caro filho Telêmaco agora isto entenderás tu mesmo chegando onde os melhores entre os varões combatentes se medem não aviltar a linhagem dos ancestrais que também antes na bravura e virilidade excelemos sobre toda a terra 510 A ele então o inteligente Telêmaco retrucou Verás se quiseres caro pai a mim com esse ânimo não aviltando tua linhagem como dizes Assim falou e Laerte alegrouse e enunciou o discurso Que dia tenho hoje caros deuses Deveras alegrome 515 meu filho e seu filho rivalizam em excelência E parada ao lado disselhe Atena olhosdecoruja Filho de Arquésio mais caro de todos os companheiros tendo rezado à filha olhosdecoruja e a Zeus pai brande e de pronto arremessa a lança sombralonga 520 Isso dito grande potência insuflou Palas Atena Tendo então rezado à grande filha de Zeus brandiu e de pronto arremessou a lança sombralonga e atingiu Persuasivo através do elmo facebrônzea Esse a lança não afastou e o bronze o varou 525 com estrondo caiu e retiniu sua armadura Caíram sobre os da vanguarda Odisseu e o filho ilustre e golpearam com espadas e lanças duascurvas E agora a todos teriam matado e deixado sem retorno se Atena a filha de Zeus portaégide 530 não tivesse com a voz gritado e contido todo o povo Abstendevos da guerra aflitiva itacenses para sem sangue vos separardes bem rápido Assim falou Atena e o amarelo medo dominouos Eles se assustaram das mãos voaram as armas 535 e todas no chão caíram quando a voz da deusa soou e voltaramse para a cidade almejando permanecer vivos E aterrorizante berro deu o muitatenência divino Odisseu e arremeteu após se agachar feito águia voaalto Então o filho de Crono lançou raio fumoso 540 e caiu diante da olhosdecoruja a paiponderoso Então a Odisseu falou Atena olhosdecoruja Divinal filho de Laerte Odisseu muitotruque contémte para com a justa da guerra niveladora que não te tenha raiva o filho de Crono Zeus amplavisão 545 Assim falou Atena e ele obedeceu e alegrouse no ânimo Um pacto para o futuro impôs entre ambas as partes Palas Atena a filha de Zeus portaégide semelhante a Mentor no corpo e na voz humana POSFÁCIO LUIZ ALFREDO GARCIAROZA A Odisseia é a narrativa de um retorno o retorno de Odisseu Ulisses a Ítaca sua terra natal após ter participado do cerco à cidade de Ílion Troia A Ilíada por sua vez é a narrativa das últimas semanas da Guerra de Troia ambas atribuídas ao poeta aedo Homero que teria vivido no século VIII aC Mais do que a narrativa de um retorno a Odisseia é a narrativaretorno ou a narrativa acontecimento do retorno de Odisseu E aqui o acontecimento não é uma experiência vivida por alguém algo percebido ou mesmo sofrido mas algo narrado por alguém algo que se passa no âmbito da fala e não da experiência subjetiva O objeto dessa narrativa acontecimento pode ser real imaginário fictício Ele é para os ouvintes de Homero tão verdadeiro como as sereias que atraem para a morte Odisseu e seus companheiros ou como Aquiles Heitor e o ciclope Polifemo bem como Apolo e Atena deuses protetores dos heróis guerreiros durante os combates Não está em questão se eles existem ou não se são verdadeiros ou fictícios sua realidade consiste em serem narrados pelo poetaaedo Assim a Odisseia não é o relato da longa e atribulada viagem de Odisseu em sua volta ao lar tal como a Ilíada não é o relato da Guerra de Troia Ou seja os dois poemas com seus mais de 27 mil versos não têm valor documental Mesmo porque Homero teria vivido no século VIII aC enquanto a Guerra de Troia teria se dado no século XIII aC Homero não poderia ter sido testemunha dos combates na planície de Troia ou do retorno de Odisseu nem poderia ter se valido do testemunho dos próprios combatentes Os heróis da Guerra de Troia Aquiles Heitor Nestor Menelau Agamêmnon e o próprio Odisseu teriam vivido por volta de 1200 aC Quatro ou cinco séculos separam Homero dos gregos e troianos protagonistas da Ilíada e da Odisseia Acrescentese a isso o fato de a escrita passar a ser usada no mundo grego somente no final do século VIII aC e constatase que Homero e seus heróisguerreiros eram pois analfabetos A escrita chamada Linear B desaparecera juntamente com a destruição e a extinção da civilização micênica no século XI aC Não havia portanto possibilidade de registro escrito ser utilizado por Homero quatro séculos mais tarde ao compor a Odisseia Isso significa que a Odisseia não foi escrita por Homero Essa narrativa era cantada pelo poeta em suas apresentações aos aristoi a aristocracia guerreira da Grécia arcaica Homero era um aedo um portador da palavra poética que com seus cantos remetia os ouvintes aos acontecimentos originais aos gestos dos deuses e dos heróis ao tempo mítico dos começos O próprio passado ao qual ele se referia não era propriamente um passado mas outra dimensão do cosmos outra dimensão do tempo e do espaço à qual somente o aedo com auxílio das Musas tinha acesso Se a Odisseia não foi escrita por Homero mas composta oralmente por ele séculos depois dos supostos eventos por conseguinte Odisseu e sua mulher Penélope assim como seu filho Telêmaco e os demais protagonistas da Odisseia não são propriamente existentes eles existem enquanto narrados cantados por Homero ou se preferirmos existem tanto quanto existiram o aedo cego Demódoco a feiticeira Circe a bela princesa Nausícaa o monstro Cila ou o cão Argos de Odisseu O mesmo raciocínio pode ser aplicado à Ilíada Não há nenhum registro concreto referente a uma guerra que tivesse durado uma década ocorrida no século XIII aC e cujo término teria se dado com o cerco e a tomada de Troia pelos gregos Portanto a longa e minuciosa narrativa de Homero consiste em ser uma narrativa épica e nada mais Ela não remete a uma guerra que teria ocorrido na região de Troia o que não exclui a possibilidade de ter ocorrido um pequeno conflito entre gregos e troianos por volta do século XIII aC A chamada Guerra de Troia com seus heróis Aquiles Heitor Agamêmnon é a Ilíada assim como o retorno de Odisseu para Ítaca é a Odisseia ambos poemas épicos compostos por Homero Levado ao extremo esse raciocínio pode colocar em dúvida a própria existência de Homero Na Grécia arcaica Homero poderia designar tanto um poeta aedo único como um grupo deles Em uma cultura exclusivamente oral os poetas aedos eram a memória viva Cabia a eles cantar em seus poemas o tempo passado o tempo presente e o tempo futuro visto serem os aedos sacralizados pelos deuses e inspirados pelas Musas O aedo não era poeta porque fazia poesia mas fazia poesia porque era poeta vidente profeta sábio Desse modo poderíamos imaginar tanto um grupo de poetas aedos que desde o século XIII aC cantava e transmitia de geração a geração as narrativas lendárias de uma Troia arcaica destruída pelos gregos e do retorno de Odisseu a Ítaca como poderíamos imaginar um indivíduo singular um aedo solitário chamado Homero compondo e narrando cantando pelas cidades da Grécia esses dois poemas Não há historicamente nenhuma prova concreta a favor de uma ou de outra hipótese Dispomos apenas de traços mnêmicos conservados durante séculos pela tradição e que posteriormente foram transcritos da forma oral para a escrita em lascas de madeira papiro pele animal até chegar ao papel e que 23 séculos depois em 1488 foram impressos em Florença Foi no entanto a Homero poeta do século VIII aC que a tradição atribuiu a autoria da Ilíada e da Odisseia O mais surpreendente no entanto é que a argumentação sobre a natureza do objeto da narrativa pode ser aplicada também ao narrador O próprio Homero talvez seja uma criação da Odisseia e da Ilíada Podemos concordar que a tese é improvável mas não impossível No canto 9 da Odisseia Odisseu herói de Homero assume a primeira pessoa e a narrativa épica passa a se dar no interior de uma outra em que o herói da segunda narrativa é o objeto da primeira e Odisseu se torna simultaneamente herói e narrador da mesma forma Demódoco o aedo cego do canto 8 da Odisseia poderia ser o próprio Homero6 Esse desdobramento porém só pode ser feito com a condição de descredenciarmos ou desqualificarmos o estatuto de aedo atribuído ao poeta mestre da verdade da Grécia arcaica o que implicaria a desqualificação da figura do aedo enquanto tal Não estamos discutindo aqui a autoria dos poemas questão inexistente na Grécia arcaica mas defendendo a autenticidade da Odisseia e da Ilíada como poemas em versos hexâmetros compostos no século VIII aC e atribuídos nominalmente a um poeta chamado Homero cuja existência ainda é um enigma a ser decifrado mas cujos poemas épicos são eternos Mesmo quando questionada a autoria da Ilíada e da Odisseia não resta dúvida quanto à autenticidade de ambos os poemas isto porque como assinala Bernard Knox7 a língua de Homero nunca foi falada por ninguém é uma língua artificial uma criação dos próprios versos épicos que passou a ser empregada pelos aedos e mantida por séculos no canto dos poetas pela sua qualidade literária Quanto à existência de Homero e ao fato de ser ele o autor da Odisseia e da Iliada temos que no final do século VIII aC século de Homero a escrita renasce na Grécia Não aquela micênica extinta havia séculos mas uma nova que absorveu palavras e signos de diferentes dialetos da língua falada na Grécia e do alfabeto fenício Com o renascimento da escrita é provável que os escribas eruditos do final do século VIII e começo do VII aC tenham transcrito os poemas cantados narrados por Homero para o papiro e posteriormente para o papel A primeira pergunta que nos ocorre é quem ditou os poemas para os escribas O próprio Homero Alguém além dele saberia de cor os 27 109 versos que compõem a Odisseia e a Ilíada Se não foi ele quem teria sido A quem Homero confiaria o que hoje em dia chamaríamos de seu projeto editorial A segunda pergunta é mais delicada Se nem mesmo Homero sabia cada verso da Ilíada e da Odisseia já que o poeta aedo não decorava fiel e integralmente o poema ele fazia uso de um estoque de versos fórmulas estas sim decoradas a partir dos quais recompunha o poema ele improvisava em cima de uma estrutura decorada de modo que a cada apresentação do poeta aedo uma nova Ilíada e uma nova Odisseia eram cantadas narradas então qual Odisseia foi ditada para os escribas A mais próxima da original Mas qual original Se tanto a Odisseia como a Ilíada eram textos orais compostos para serem ouvidos e não para serem lidos como apontar o texto oral original Não há nem nunca houve Odisseia original a primeira Odisseia A Odisseia legítima é aquela cantada pelo aedo inspirado pelas Musas para a escuta dos aristoi Não resta dúvida quanto ao fato de a Odisseia ser posterior à Ilíada Há passagens na Odisseia que remetem a acontecimentos da Ilíada ao passo que o contrário não ocorre É o caso do episódio do cavalo de Troia que não é mencionado na própria Ilíada e recebe uma referência breve e incompleta no canto 4 da Odisseia apesar de ser o ardil inventado por Odisseu para ultrapassar as muralhas de Troia A dúvida algumas vezes levantada é se os dois poemas foram criações do mesmo poeta A Ilíada canta as façanhas do heróiguerreiro principalmente a fúria desmedida de Aquiles contra Heitor e o seu ressentimento desmedido contra Agamêmnon a Odisseia por sua vez é o poema das aventuras e desventuras de Odisseu em seu retorno a Ítaca e aos braços de Penélope No entanto a disparidade de tema e de ênfase não sugere diferentes poetas aedos a qualidade literária a harmonia dos versos hexâmetros está presente em ambos Até mesmo o canto 22 apontado por alguns críticos como a parte da Odisseia que pelo conteúdo destoaria do conjunto do poema como se tivesse sido composto por outro aedo pode ser tomado como o Homero da Odisseia buscando no Homero da Ilíada a fúria insana de Aquiles para compor a sequência de cenas finais do retorno de Odisseu Final digno do maior poema épico do Ocidente Resta ainda a lenda segundo a qual Homero era cego Analfabeto e cego Soam excessivas duas características tão restritivas atribuídas ao homem que criou os dois poemas seminais da literatura que até hoje alimentam não somente a ela mas também as artes cênicas e o imaginário do homem ocidental Como isso seria possível A resposta pode ser que esse homem não era deficiente mas privilegiado O poeta aedo da Grécia arcaica não era uma pessoa comum tampouco um aristoi ele se apresentava como portador de um dom divino o de ser inspirado pelas Musas A primeira frase da Odisseia é Do varão me narra Musa do muitasvias que muito vagou após devastar a sacra cidade de Troia Quem é esse me da frase senão o aedo que cantava o poema e pedia a inspiração da Musa isto é o próprio Homero Seja quem for que tenha sido Homero resta pouca dúvida quanto ao fato de os dois poemas serem obra de um mesmo poeta É praticamente impossível que duas pessoas ainda que dois aedos tenham composto ao mesmo tempo os versos hexâmetros dactílicos de que são feitos os dois poemas Também é pouco admissível que o segundo poema Odisseia tenha sido criado em data posterior sobre o modelo do primeiro Ilíada escrito por um poeta laico isto é não aedo O dom do aedo não podia ser mantido nem transmitido no ou pelo texto escrito O canto do aedo é a palavra sacralizada pelas divindades Apolo e Mnemosyne Cada Odisseia legítima é uma repetição diferencial Um acontecimento único Não há um modelo e suas cópias cada cópia é um novo canto cantado pelo poeta inspirado Pela mesma razão o poema não pode ser ouvido por uma pessoa comum e repetido por ela para outros ouvintes A palavra do poeta não era uma moeda que pudesse ser passada adiante por quem a recebesse a não ser que esse alguém fosse outro aedo O próprio ato da escuta se tornava sacralizado quando se tratava da escuta do canto do aedo Sem dúvida essa magia que unia a narrativa e a escuta num mesmo acontecimento sacralizado pelas Musas foi perdida ao ser transcrito o poema Aquilo que era a narrativa do poeta aedo deixou de ser um acontecimento para se transformar em documento escrito ainda que ditado pelo poeta o que era poesia sagrada tornouse poesia laica podendo ser copiada e multiplicada ao infinito Apesar da perda da sacralidade a Odisseia permanece passados quase 3 mil anos o maior poema épico da literatura ocidental 6 Cf Frederico Lourenço Prefácio in Homero Odisseia trad Frederico Lourenço São Paulo Penguin Classics Companhia das Letras 2011 p 101 7 Cf Bernard Knox Introdução ibid p 19 O SILÊNCIO DAS SEREIAS FRANZ KAFKA Comprovação de que mesmo meios insuficientes e até infantis podem servir à salvação A fim de se proteger das sereias Odisseu entupiu de cera os ouvidos e mandou que o acorrentassem com firmeza ao mastro É claro que desde sempre todos os viajantes teriam podido fazer algo assim a não ser aqueles aos quais as sereias atraíam já desde muito longe mas o mundo inteiro sabia que de nada adiantava O canto das sereias impregnava tudo que dirá um punhado de cera e a paixão dos seduzidos teria arrebentado muito mais que correntes e mastro Nisso porém Odisseu nem pensava embora talvez já tivesse ouvido falar a respeito confiava plenamente no punhado de cera e no feixe de correntes e munido de inocente alegria com os meiozinhos de que dispunha partiu ao encontro das sereias As sereias contudo possuem uma arma ainda mais terrível que seu canto seu silêncio É certo que nunca aconteceu mas seria talvez concebível que alguém tivesse se salvado de seu canto de sua mudez jamais O sentimento de têlas vencido com as próprias forças a avassaladora arrogância daí resultante nada neste mundo é capaz de conter E de fato as poderosas cantoras não cantaram quando Odisseu chegou fosse porque acreditassem que só o silêncio podia com aquele oponente ou porque a visão da bem aventurança no rosto dele que não pensava senão em cera e correntes as tivesse feito esquecer todo o canto Odisseu porém não ouviu seu silêncio por assim dizer acreditou que cantassem e que só ele estivesse a salvo de ouvilas com um olhar fugaz observou primeiro o movimento de seus pescoços o respirar fundo os olhos cheios de lágrimas a boca semiaberta e acreditou que fizessem parte das árias soando inaudíveis a seu redor Mas logo tudo isso resvalou por seus olhos voltados para o longe as sereias verdadeiramente desapareceram e justo quando estava mais próximo delas ele já nem mais sabia de sua existência Elas por sua vez mais belas que nunca esticavamse e giravam o corpo deixando os cabelos horripilantes soprar livres ao vento e alongando as garras na rocha não queriam mais seduzir mas somente apanhar ainda pelo máximo de tempo possível o brilho que refletia dos grandes olhos de Odisseu Se as sereias tivessem consciência teriam sido aniquiladas então mas permaneceram Apenas Odisseu escapoulhes Dessa história aliás relatase ainda um complemento Dizse que Odisseu era tão astuto uma tal raposa que nem mesmo a deusa do destino logrou penetrar em seu íntimo embora isto já não seja compreensível à razão humana talvez ele tenha de fato percebido que as sereias estavam mudas tendo então de certo modo contraposto a elas e aos deuses toda a simulação acima tão somente como um escudo 1917 TRADUÇÃO Sergio Tellaroli ÍTACA KONSTANTINOS KAVÁFIS Se partires um dia rumo a Ítaca faz votos de que o caminho seja longo repleto de aventuras repleto de saber Nem Lestrigões nem os Ciclopes nem o colérico Posídon te intimidem eles no teu caminho jamais encontrarás se altivo for teu pensamento se sutil emoção teu corpo e teu espírito tocar Nem Lestrigões nem os Ciclopes nem o bravio Posídon hás de ver se tu mesmo não os levares dentro da alma se tua alma não os puser diante de ti Faz votos de que o caminho seja longo Numerosas serão as manhãs de verão nas quais com que prazer com que alegria tu hás de entrar pela primeira vez um porto para correr as lojas dos fenícios e belas mercancias adquirir madrepérolas corais âmbares ébanos e perfumes sensuais de toda a espécie quanto houver de aromas deleitosos A muitas cidades do Egito peregrina para aprender para aprender dos doutos Tem todo o tempo Ítaca na mente Estás predestinado a ali chegar Mas não apresses a viagem nunca Melhor muitos anos levares de jornada e fundeares na ilha velho enfim rico de quanto ganhaste no caminho sem esperar riquezas que Ítaca te desse Uma bela viagem deute Ítaca Sem ela não te ponhas a caminho Mais do que isso não lhe cumpre darte Ítaca não te iludiu se a achas pobre Tu te tornaste sábio um homem de experiência e agora sabes o que significam Ítacas 1911 TRADUÇÃO José Paulo Paes GLOSSÁRIO DE NOMES PRÓPRIOS Para a tradução dos nomes e a composição deste glossário cf Da tradução no início deste volume foram utilizados diversos livros que constam na bibliografia especialmente Snell et al 19552010 Frame 2009 e Finkelberg 2011 Na primeira parte as entradas se referem aos nomes utilizados na tradução com seus equivalentes mais conhecidos na segunda a lista é invertida informando os nomes próprios aqui utilizados a partir dos mais conhecidos em geral o nome grego vernaculizado Nessa segunda parte em algumas entradas proponho uma tradução para o nome em outras uma paráfrase Quando há divergências entre os eruditos acerca do sentido de um nome optei por informar apenas os mais aceitos Não são todos os nomes próprios da Odisseia que constam a seguir apenas os mais significativos para o poema e ou os que ilustram a atmosfera do gênero épico além de algumas das personagens centrais com nomes cristalizados no imaginário ocidental Primeira parte Nomes próprios traduzidos ABRASADOR Áiton AÇODADO Ormeno ADIVINHOSO Mântio ALTIVA Iftima AMPLOMAR Euríalo APRESADOR Équeto AURORA Éos AUXILIADOR Boetoo BARQUEIRO Nauteu BORREGOSO Arnaio BRANCADEUSA Leucoteia BRAVO Alcimo BRILHO Lampo BRILHOSA Lampetia BUSCADOR Mastor CAMINHEIRO Múlio CARPINTEIRO Técton CAVALEIRO Hipotes CERCOMAR Anfíalo CHUMBODANAU Naubolo CIDADÃO Polites CODORNA Ortígia CORVO Córax DEFENSOR Alector DOMADOR Damastor DOMAPOVO Laodamas DOMINATOR Dmétor DONODENAU Equeneu DOPÁTIO Messáulio EMBARQUENAU Anabesineu FINÓRIO Dólio FORTIFICANTE Euenor GLORIOSO Climeno GRAÇA Cárite GRANDAFLIÇÃO Megapentes ILUSÓRIO Elpenor ILUSTRE Cleito JUVENTUDE Hebe LATIDOR Hílax LUZIDIA Faetussa LUZIDIO Faêton LÚZIO Fáidimo MARINHEIRO Ponteu MARINHO Hálio MENTENOMAR Pontônoo MUIDIVINA Anfitee MUITANAU Polineu MUITAPOSSE Polipêmon MUITOSDOMA Polidamna NÃOPOUPA Afidas NAUGLORIOSO Clitoneu NAUVELOZ Nausítoo OLHOVÍNEO Oinops PASSOLARGO Euríbates PEDINTE Dectes PERSUADIDOR Pisenor PERSUASIVO Eupeites PONDERADO Noêmon POPEIRO Primneu PRETA Melantó PRETO Melanteu Melântio nomes intercambiáveis PROEIRO Proreu PRUDENTE Frônio REMADOR Elatreu REMEIRO Eretmeu RICOSO Ctésio ROMPEDOR Rexenor RUMOR Ossa SALVADOR Fêidon SEGURO Asfalíon SELETO Epérito SISO Equéfron SOL Hélio TOCAIOSO Orstíloco TOPODANAU Acroneu TROPOSO Estratio VELOCISTA Tôon VELOSNOMAR Ocíalo VERÍDICO Eteoneu VOZ Óps Segunda parte Nomes próprios conhecidos ACRONEU Topodanau AFIDAS Nãopoupa AGELAU o que conduz o exército ÁITON Abrasador ALCIMO Bravo ALCÍNOO aquele que leva para casa com sua força ALCMAION destemido ALECTOR Defensor ANABESINEU Embarquenau ANFÍALO Cercomar ANFIARAU mui sacro ANFÍLOCO que arma uma tocaia em torno ANFIMÉDON o que protege em torno ANFITEE Muidivina ANQUÍALO que está perto do mar ANTICLEIA oposta à fama ou com fama correspondente ANTICLO o que vai contra a glória de outrem ANTÍFATES golpeador ANTÍNOO o que tem uma mente contrária ou o que é contra o retorno ARETE rogada ARETO rogado ARNAIO Borregoso ASFALÍON Seguro AUTÓLICO o próprio lobo ou um verdadeiro lobo BOETOO Auxiliador CALIPSO ocultadora CARÍBDIS o poeta mesmo faz a sua etimologia ao escolher um verbo que sonoramente remete ao nome e foi traduzido por deglutir 12 104 CÁRITE Graça CASTOR o animal ou superador CILA o próprio poeta explica o nome ao mencionar que faz um som como o latido de um filhote de cão termo que remete em grego a Cila 12 85 CLEITO Ilustre CLIMENE gloriosa CLIMENO Glorioso CLITONEU Nauglorioso CLÓRIS lívida CÓRAX Corvo CTÉSIO Ricoso DAMASTOR Domador DECTES Pedinte DEMÓDOCO recebido pelo povo DMÉTOR Dominator DÓLIO Finório EGÍPCIO muito provavelmente o nome está ligado ao Egito EIDOTEA que tem aparência divina ELATREU Remador ELPENOR Ilusório seu nome vem de elpis expectativa equivocada ÉOS Aurora EPÉRITO Seleto EQUÉFRON Siso EQUENEU Donodenau ÉQUETO Apresador ERETMEU Remeiro ESTRATIO Troposo ETEONEU Verídico EUANTES vicejante EUENOR Fortificante EUMEU o que vai atrás do bem EUPEITES Persuasivo EURÍALO Amplomar EURÍBATES Passolargo EURICLEIA que tem ampla fama EURIDAMAS amplojugo EURÍLOCO que realiza ampla tocaia EURÍMACO que realiza amplo combate EURIMÉDON que tem amplo domínio EURIMÉDUSSA equivalente feminino de Eurimédon EURÍNOME aquela que tem amplo comando EURÍNOMO equivalente masculino de Eurínome FAÊTON Luzidio FAETUSSA Luzidia FÁIDIMO Lúzio FÊIDON Salvador FÊMIO famoso ou que torna famoso FRÔNIO Prudente FRÔNTIS zelo HÁLIO Marinho HALITERSES talvez corajoso no mar HARPIA redemoinho HEBE Juventude HÉLIO Sol HÍLAX Latidor HIPOTES Cavaleiro IFTIMA Altiva LAMPETIA Brilhosa LAMPO Brilho LAODAMAS Domapovo LEUCOTEIA Brancadeusa MAIRA cintilante MÂNTIO Adivinhoso MASTOR Buscador MEGAPENTES Grandaflição MELANTEU MELÂNTIO nomes intercambiáveis Preto MELANTÓ Preta MENTES possante MENTOR potente ou conselheiro MESSÁULIO Dopátio MÚLIO Caminheiro NAUBOLO Chumbodanau NAUSÍTOO Nauveloz NAUTEU Barqueiro NELEU talvez impiedoso tendo em vista a história na qual a personagem aparece NESTOR seu nome está ligado a retorno e mente espírito NOÊMON Ponderado OCÍALO Veloznomar ODISSEU a etimologia é desconhecida mas o poema joga com algumas potencialidades sobretudo ser objeto de ódio OINOPS Olhovíneo ONETOR fomentador ÓPS Voz ORMENO Açodado ORSTÍLOCO Tocaioso OSSA Rumor ORTÍGIA Codorna PEIRÍTOO mui veloz PENÉLOPE etimologicamente a derivação mais provável é de penelops um tipo de ave dágua PISANDRO persuade varão PISENOR Persuadidor PISÍSTRATO persuade exército POLIDAMNA o que a muitos domina POLIFEIDES poupa muitos POLIFEMO ligado a fama POLINEU Muitanau POLIPÊMON Muitaposse POLITERSES mui corajoso POLITES Cidadão PONTEU Marinheiro PONTÔNOO Mentenomar PRIMNEU Popeiro PROREU Proeiro REXENOR Rompedor TÉCTON Carpinteiro TÊMIS regraou norma TEOCLÍMENO conhecido dos deuses ou que ouve algo dos deuses TÉRPIO que produz deleite TOAS provável relação com veloz e correr que mesmo se não for etimológica pode ser derivado de um adjetivo étnico é sonora TÔON Velocista BIBLIOGRAFIA Outras edições ALLEN T W 191719 Homeri Opera v 34 2ª ed Oxford Oxford University Press MÜHL Peter von der 1984 Homeri Odyssea 3ª ed Leipzig Teubner SCHADEWALDT Wolfgang 2007 Homer Die Odyssee Tradução Düsseldorf Artemis Winkler THIEL Helmut van 1991 Homerii Odyssea Hildesheim Olms Obras de referência e comentários AMEIS K F C HENTZE P CAUER 1920 Homers Odyssee Für den Schulgebrauch erklärt Leipzig Teubner BOWIE A M 2013 Homer Odyssey Books XIII and XIV Cambridge Cambridge University Press CHANTRAINE Pierre 194853 Grammaire homérique 2 v Paris Klincksieck GARVIE A F 1994 Homer Odyssey Books VIVIII Cambridge Cambridge University Press HEUBECK Alfred et al 198892 A Commentary on Homers Odyssey Oxford Oxford University Press LATACZ Joachim Anton BIERL orgs 2000 Homers Ilias Gesamtkommentar Berlim De Gruyter RUTHERFORD R B 1992 Homer Odyssey Books XIX and XX Cambridge Cambridge University Press SNELL Bruno et al 19552010 Lexikon des frühgriechischen Epos Göttingen Vandenhoeck Ruprecht STANFORD William B 1965 The Odyssey of Homer 2 vols Londres Macmillan STEINER Deborah 2010 Homer Odyssey Books XVII and XVIII Cambridge Cambridge University Press Estudos ALLAN William 2006 Divine Justice and Cosmic Order in Early Greek Epic The Journal of Hellenic Studies v 126 pp 135 ASSUNÇÃO Teodoro R 2003 Ulisses e Aquiles repensando a morte Odisseia XI 47891 Kriterion v 107 pp 100 09 200304 Nota sobre o gastér funesto e ultracão na Odisseia Kléos Revista de Filosofia Antiga v 78 pp 5569 2009 Nourritures dans lOdyssée Fruits légumes et les oies de Pénélope Nuntius antiquus v 4 pp 16280 AUERBACH Erich 1976 A cicatriz de Ulisses in Mimesis A representação da realidade na literatura ocidental trad George Bernard Sperber2ª ed São Paulo Perspectiva AUSTIN Norman 1975 Archery at the Dark of the Moon Berkeley University of California Press BAKKER Egbert J 1997 Poetry in Speech Orality and Homeric Discourse Ithaca Cornell University Press 2005 Pointing to the Past From Formula to Performance in Homeric Poetics Washington DC Center for Hellenic Studies 2013 The Meaning of Meat and the Structure of the Odyssey Cambridge Cambridge BAKKER Egbert J Ahuvia KAHANE 1997 Written Voices Spoken Signs Tradition Performance and the Epic Text Washington DC Center for Hellenic Studies BERGREN Ann 2008 Weaving Truth Essays on Language an the Female in Greek Thought Washington DC Center for Hellenic Studies BESSLICH Siegfried 1966 Schweigen Verschweigen Übergehen Die Darstellung des Unausgesprochenen in der Odyssee Heidelberg Carl Winter BONIFAZI Anna 2009 Inquiring into Nostos and its Cognates American Journal of Philology v 130 pp 481 510 2012 Homers Versicolored Fabric Washington DC Center for Hellenic Studies BUTTI DE LIMA Paulo 2003 A prosa de Homero Phaos v 3 pp 5376 CAIRNS Douglas L 1993 Aidôs The Psychology and Ethics of Honour and Shame in Ancient Greek Literature Oxford Oxford University Press CALVINO Italo 1993 As odisseias na Odisseia in Por que ler os clássicos trad Nilson Moulin São Paulo Companhia das Letras CLAY Jenny S 1997 The Wrath of Athena Gods and Men in the Odyssey Lanham Rowman Littlefield CLAYTON Barbara 2004 A Penelopean Poetics Reweaving the Feminine in Homers Odyssey Lanham Lexington COHEN Beth org 1995 Distaff Side Representing the Female in Homers Odyssey Oxford Oxford University Press COOK Erwin F 1995 The Odyssey in Athens Myths of Cultural Origin Ithaca Cornell University Press CROTTY Kevin 1994 The Poetics of Supplication Homers Iliad and Odyssey Ithaca Cornell University Press DETIENNE Marcel JeanPierre VERNANT 1989 Les Ruses de lintelligence La Métis des grecs Paris Flammarion ed bras Métis As astúcias da inteligência trad Filomena Hirata São Paulo Odysseus 2008 DOHERTY Lillian E 1995 Siren Songs Gender Audiences and Narrators in the Odyssey Ann Arbor University of Michigan Press 2009 org Oxford Readings in Classical Studies Homers Odyssey Oxford Oxford University Press DOUGHERTY Carol 2001 The Raft of Odysseus The Ethnographic Imagination of Homers Odyssey Oxford Oxford University Press DUARTE Adriane da S 2001 As relações entre retorno e glória na Odisseia Letras clássicas n 5 pp 8998 2012 Cenas de reconhecimento na poesia grega Campinas Editora da Unicamp EDWARDS Anthony T 1985 Achilles in the Odyssey Königstein Hain ERBSE Hartmut 1972 Beiträge zum Verständnis der Odyssee Berlim De Gruyter FELSON Nancy 1997 Regarding Penelope From Courtship to Poetics Norman Londres University of Oklahoma Press FENIK Bernard 1974 Studies in the Odyssey Wiesbaden Franz Steiner FINKELBERG M org 2011 The Homer encyclopedia 3 v Malden WileyBlackwell FOLEY John M 1985 Oralformulaic Theory and Research An Introduction and Annotated Bibliography Nova York Garland Publishing 1991 Immanent Art From Structure to Meaning in Traditional Oral Epic Bloomington Indiana University Press 1993 Traditional Oral Epic The Odyssey Beowulf and the SerboCroatian Return Song Berkeley University of California Press 1999 Homers Traditional Art University Park Pennsylvania State University Press 2005 org A Companion to Ancient Epic Oxford Blackwell FORD Andrew 1992 Homer The Poetry of the Past Ithaca Cornell University Press FRAME Douglas 2009 Hippota Nestor Washington DC Center for Hellenic Studies GOLDHILL Simon 1991 The Poets Voice Essays on Poetics and Greek Literature Cambridge Cambridge University Press GRAZIOSI Barbara 2002 Inventing Homer The Early Reception of Epic Cambridge Cambridge University Press GRAZIOSI Barbara Emily GREENWOOD orgs 2007 Homer in the Twentieth Century Between World Literature and the Western Canon Oxford Oxford University Press GRAZIOSI Barbara Johannes HAUBOLD 2005 Homer The Resonance of Epic Londres Duckworth HALL Edith 2008 The Return of Ulysses A Cultural History of Homers Odyssey Baltimore Johns Hopkins University Press HALLIWELL Stephen 2011 Between Ecstasy and Truth Interpretations of Greek Poetics from Homer to Longinus Oxford Oxford University Press HAUBOLD Johannes 2000 Homers People Epic Poetry and Social Formation Cambridge Cambridge University Press DE JONG Irene J F 1999 org Homer Critical Assessments Londres Routledge 2001 A Narratological Commentary on the Odyssey Cambridge Cambridge University Press KAHANE Ahuvia 2005 Diachronic Dialogues Authority and Continuity in Homer and the Homeric Tradition Lanham Rowman Littlefield KATZ Marilyn A 1991 Penelopes Renown Meaning and Indeterminacy in the Odyssey Princeton Princeton University Press KELLY Adrian 2008 Performance and Rivalry Homer Odysseus and Hesiod in M Revermann P Wilson org Performance Iconography Reception Studies in Honour of Oliver Taplin Oxford Oxford University Press LEDBETTER Grace M 2003 Poetics Before Plato Interpretation and Authority in Early Greek Theories of Poetry Princeton Princeton University Press LEVANIOUK Olga A 2011 Eve of the Festival Making Myth in Odyssey 19 Washington DC Center for Hellenic Studies LORD Albert B 1960 The Singer of Tales CambridgeMA Harvard University Press LOUDEN Bruce 1999 The Odyssey Structure Narration and Meaning Baltimore Johns Hopkins University Press LOWE N J 2000 The Classical Plot and the Invention of Western Narrative Cambridge Cambridge University Press MALTA André 2012a Homero múltiplo São Paulo Edusp 2012b Penélope e a arte da indecisão na Odisseia Nuntius antiquus v 8 pp 728 MARKS Jim 2008 Zeus in the Odyssey Washington DC Center for Hellenic Studies MARTIN Richard P 1984 Hesiod Odysseus and the Instruction of Princes Transactions and Proceedings of the American Philological Association v 114 pp 2948 1993 Telemachus and the Last Hero Song Colby Quarterly v 29 pp 22240 MINCHIN Elizabeth 2001 Homer and the Resources of Memory Somme Applications of Cognitive Theory to the Iliad and the Odyssey Oxford Oxford University Press MONTANARI Franco org 2002 Omero tremila anni dopo Roma Edizioni di Storia e Letteratura MORRIS Ian Barry POWELL orgs 1997 A New Companion to Homer Leiden Brill MOST Glenn W 1989 The Structure and Function of Odysseus Apologoi Transactions and Proceedings of the American Philological Association v 119 pp 1530 MOULTON Carroll 1977 Similes in the Homeric Poems Göttingen Vandenhoeck Ruprecht NAGY Gregory 1974 Comparative Studies in Greek and Indic Meter Cambridge MA Harvard University Press 1990 Greek Mythology and Poetics Ithaca Cornell University Press 1999 The Best of the Achaeans Concepts of the Hero in Archaic Greek Poetry 2ª ed Baltimore Johns Hopkins University Press 2002 Platos Rhapsody and Homers Music The Poetics of the Panathenaic Festival in Classical Athens Cambridge MA Atenas Center of Hellenic Studies 2010 Homer the Preclassic Berkeley Los Angeles Londres University of California Press 2012 Signs of Hero Cult in Homeric Poetry in F Montanari A Rengakos C Tsagalis orgs Homeric Contexts Neoanalysis and the Interpretation of Oral Poetry Trends in Classics Supplementary Volumes 12 Berlim De Gruyter pp 2774 OLSON S Douglas 1995 Blood and Iron Stories and Storytelling in Homers Odyssey Leiden Brill PAPADOPOULOUBELMEHDI Ioanna 1994 Le Chant de Pénélope Poétique du tissage féminin dans lOdyssée Paris Belin PARRY Milman 1971 The Making of Homeric Verse The Collected Papers of Milman Parry Oxford Oxford University Press PELLICIA Hayden 1995 Mind Body and Speech in Homer and Pindar Göttingen Vandenhoeck Ruprecht PEPONI AnastasiaErasmia 2012 Frontiers of Pleasure Models of Aesthetic Response in Archaic and Classical Greek Thought Oxford Oxford University Press PERADOTTO John 1990 Man in the Middle Voice Name and Narrative in the Odyssey Princeton Princeton University Press PRATT Louise H 1993 Lying and Poetry from Homer to Pindar Falsehood and Deception in Archaic Greek Poetics Ann Arbor University of Michigan Press PUCCI Pietro 1995 Odysseus Polutropos Intertextual Readings in the Odyssey and the Iliad Ithaca Cornell University Press 1998 The Song of the Sirens Essays on Homer Lanham Rowman Littlefield REYNOLDS Dwight 1995 Heroic Poets Poetic Heroes the Etnography of Performance in an Arabic Oral Epic Tradition Ithaca NY Cornell University Press RICHARDSON Scott D 1990 The Homeric Narrator Nashville Vanderbilt University Press ROOD Naomi J 2006 Implied Vengeance in the Simile of Grieving Vultures Odyssey 16 21619 Classical Quarterly v 56 pp 111 RÖSLER Wolfgang 1980 Die Entdeckung der Fiktionalität in der Antike Poetica 12 pp 283319 RÜTER Klaus 1969 Odysseeinterpretationen Untersuchungen zum ersten Buch und zur Phaiakis Göttingen Vandenhoeck Ruprecht SAÏD Suzanne 1979 Les crimes des prétendants la maison dUlysse et les festins de l Odyssée in S Saïd F Desbordes J Bouffartigue A Moreau eds Études de littérature ancienne Paris Presses de lÉcole Normale Supérieure SCHEIN Seth L org 1996 Reading the Odyssey Selected Interpretive Essays Princeton Princeton University Press SCODEL Ruth 2002 Listening to Homer Tradition Narrative and Audience Ann Arbor University of Michigan Press SEAFORD Richard 1994 Reciprocity and Ritual Homer and Tragedy in the Developing CityState Oxford Oxford University Press SEGAL Charles 1994 Singers Heroes and Gods in the Odyssey Ithaca Cornell University Press THALMANN William G 1984 Conventions of Form and Thought in Early Greek Epic Baltimore Johns Hopkins University Press 1998 The Swineherd and the Bow Representations of Class in the Odyssey Ithaca Londres Cornell University Press VAN DER VALK Marchinus H A L H 1949 Textual Criticism of the Odyssey Leiden Sijthoff WERNER Christian 2001 A ambiguidade do kleos na Odisseia Letras clássicas v 5 pp 99108 2005a Os limites da autoridade de Odisseu na Odisseia Calíope v 13 pp 929 2005b A liberdade restrita do aedo homérico Línguas Letras v 6 pp 17182 2009 Reputação e presságio na assembleia homérica Poluphemos em Odisseia 2 150 PhaoS v 9 pp 2952 2010 A deusa compõe um mito O jovem Odisseu em busca de veneno Odisseia 1 25568 Nuntius Antiquus v 6 pp 727 2011 O mito do retorno dos heróis de Troia e as funções narrativas dos presságios na Odisseia de Homero História imagem e narrativas n 12 pp 123 2012 Afamada estória Famigerado Primeiras estórias e o canto IX da Odisseia Nuntius Antiquus v 8 n 1 pp 2950 PDF 2013 A presença do ausente e a performance do kleos no canto I da Odisseia in R Brose et al orgs Oralidade escrita e performance na antiguidade Fortaleza Expressão Gráfica Editora WEST Martin L 1997 The East Face of Helicon West Asiatic Elements in Greek Poetry and Myth Oxford Oxford University Press ZERBA Michelle 2009 What Penelope Knew Doubt and Scepticism in the Odyssey Classical Quarterly v 59 pp 29531 SOBRE OS AUTORES HOMERO Poeta ao qual se atribuíram os poemas épicos Ilíada e Odisseia É pouco provável que um poeta com esse nome tenha existido e não é mais possível reconstruir com um mínimo de precisão o processo pelo qual entre os séculos VIII e VI aC o texto dos poemas adquiriu a forma na qual hoje são lidos Uma das razões é que quase nada sabemos acerca do uso da escrita na Grécia no século VIII aC nem por que nem quando alguém teve a ideia de escrever um poema já que performances poéticomusicais faziam parte do cotidiano grego ou seja ainda no século V aC esse era o modo principal de recepção de uma composição poética Por muito tempo a poesia oral épica era composta no momento mesmo de sua apresentação Muitos estudiosos modernos creem que um poeta muito bom tenha desenvolvido com o uso da escrita um poema monumental a Ilíada e que quando se apresentava diante do público deixava de improvisar episódios individuais da tradição heroica grega e declamava trechos do poema que passou a ser conhecido em toda a Grécia Se isso for verdade e disso nunca teremos certeza então também é provável que um outro poeta teria composto um segundo poema monumental a Odisseia tentando sobrepujar o autor da Ilíada Fato é que ainda no século VI aC Homero na Grécia era o nome associado a um gênero poético o épico e a ele também eram atribuídos outros poemas Somente no século V aC a Ilíada e a Odisseia adquiriram em Atenas um estatuto canônico tal que todo poema épico posterior passou a ser medido em relação a eles ou a emulálos Não à toa várias cidades gregas disputaram desde cedo a honra de ter sido a terra natal do bardo Outra história que se conta sobre ele é que era cego assim como seu confrade Demódoco personagem da Odisseia Para tornar vivo o passado heroico o poeta se abençoado pelas Musas não precisaria ter visto nada do que conta Dizer que Homero era cego é apontar para características da própria tradição épica CHRISTIAN WERNER Nascido em Santa Cruz do Sul RS em 1970 é professor livredocente de língua e literatura grega na Universidade de São Paulo Publicou traduções de Eurípides Duas tragédias gregas Hécuba e Troianas Martins Fontes 2005 e Hesíodo Teogonia e Trabalhos e dias Hedra 2013 Autor de inúmeros artigos e capítulos de livro sobre literatura grega sobretudo a poesia épica e trágica é um dos líderes do grupo de pesquisa Gêneros Poéticos na Grécia Antiga Tradição e Contexto Também tem se dedicado a investigar a recepção de Homero na prosa de João Guimarães Rosa AGRADECIMENTOS A tradução da Odisseia teve uma longa gestação o que espero lhe ter sido benéfica Parte substancial do trabalho foi realizada com um auxílio à pesquisa da Fapesp entre 2007 e 2008 agradeço não apenas à instituição mas também ao parecerista anônimo que comentou a tradução Amigos e colegas contribuíram de modos diversos e preciosos Adriane Duarte Robert de Brose Filomena Hirata Maria Beatriz Florenzano Teodoro R Assunção Jaa Torrano André Malta Campos Pedro Paulo Funari Lucia Sano Jacyntho L Brandão Zélia de Almeida Cardoso Mary Lafer Caroline Evangelista Lopes Alisson A de Araújo Leonardo Vieira e Júlio de Figueiredo Lopes Rego Um agradecimento especial a Tania Bueno de Paula e à direção e equipe da Biblioteca Florestan Fernandes o coração da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo cujo trabalho permite que o meu aconteça Por fim é um privilégio ter esta tradução publicada pela Cosac Naify agradeço a Augusto Massi o primeiro a se interessar por ela e a sua acolhida posterior por Cassiano Elek Machado Milton Ohata e Florencia Ferrari A tradução não teria alcançado a forma presente sem o zelo e a inteligência de Mariana Delfini e sobretudo Maria Emília Bender para quem vão as palavras do rei Alcínoo Tua é a formosura das palavras em ti tens juízo distinto e contaste a história hábil como um cantor Dedico a tradução a Erika Werner pelo amor paciência e companheirismo CRÉDITOS A apresentação de Richard P Martin foi originalmente publicada em The Odyssey tradução para o inglês de Edward McCrorie e aqui traduzida com a permissão de Johns Hopkins University Press 2004 Johns Hopkins University Press O silêncio das sereias foi escrito em 23 de outubro de 1917 publicado em Beim Bau der chinesischen Mauer und andere Schriften aus dem Nachlaß in der Fassung der Handschrift Frankfurt am Main Fischer 1994 Ítaca foi escrito em 1911 e integra o livro Poemas Seleção estudo crítico notas e tradução de José Paulo Paes Rio de Janeiro José Olympio 2006 A editora agradece a Sergio Telarolli por ceder gentilmente a tradução de O silêncio das sereias de Franz Kafka e a Dora Paes e a Editora José Olympio pela tradução de Ítaca de Konstantinos Kaváfis Cosac Naify 2014 ebook 2014 Colagens ODIRES MLÁSZHO Coordenação editorial MARIA EMÍLIA BENDER Assistente editorial ELOAH PINA Preparação MARIANA DELFINI Revisão THIAGO LINS CLÁUDIA CANTARIN Projeto gráfico original ELAINE RAMOS GABRIELA CASTRO Adaptação e coordenação digital ANTONIO HERMIDA Produção de ePub JOANA DE CONTI 1ª edição eletrônica 2014 Nesta edição respeitouse o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa Dados Internacionais de Catalogação na Publicação CIP Câmara Brasileira do Livro SP Brasil Odisseia Homero Tradução e introdução Christian Werner São Paulo Cosac Naify 2014 ISBN 9788540508590 1 Literatura grega 2 Poesia épica clássica I Werner Christian II Martin Richard P III GarciaRoza Luiz Alfredo IV Kafka Franz V Kaváfis Konstantinos Índices para catálogo sistemático 1 Literatura grega Poesia épica 883 COSAC NAIFY rua General Jardim 770 2 andar 01223010 São Paulo SP cosacnaifycombr 11 3218 1444 atendimento ao professor 11 3823 6560 professorcosacnaifycombr fb twitter blog youtube Este ebook foi projetado e desenvolvido em setembro de 2014 com base na 1ª edição impressa de 2014 FONTES Minion e National SOFTWARE LibreOffice e Writer2ePub de Luca Calcinai SUMÁRIO Capa Apresentação Richard P Martin Introdução Christian Werner Da tradução Personagens principais Odisseia Canto 1 Canto 2 Canto 3 Canto 4 Canto 5 Canto 6 Canto 7 Canto 8 Canto 9 Canto 10 Canto 11 Canto 12 Canto 13 Canto 14 Canto 15 Canto 16 Canto 17 Canto 18 Canto 19 Canto 20 Canto 21 Canto 22 Canto 23 Canto 24 Posfácio Luiz Alfredo Garciaroza O silêncio das sereias Franz Kafka Ítaca Konstantinos Kaváfis Glossário de nomes próprios Bibliografia Autores Créditos Redes Sociais Colofão