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Direito das Sucessões
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2020 02 13 PÁGINA I Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 CAPA THOMSON REUTERS REVISTA DOS TRIBUNAIS desta edição 2020 2020 02 13 PÁGINA 1 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 PRIMEIRAS PÁGINAS CURSO DE DIREITO CIVIL VOL 5 ED 2020 FAMÍLIA SUCESSÕES VOLUME 5 Autor Fábio Ulhoa Coelho desta edição 2020 Thomson Reuters Brasil Juliana Mayumi Ono Diretora responsável Av Dr Cardoso de Melo 1855 13º andar Vila Olímpia Tel 11 36138400 Fax 11 36138450 CEP 04548005 São Paulo SP Brasil Todos os direitos reservados Proibida a reprodução total ou parcial por qualquer meio ou processo especialmente por sistemas gráficos microfílmicos fotográficos reprográficos fonográficos videográficos Vedada a memorização eou a recuperação total ou parcial bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados Essas proibições aplicamse também às características gráficas da obra e à sua editoração A violação dos direitos autorais é punível como crime art 184 e parágrafos do Código Penal com pena de prisão e multa busca eapreensão e indenizações diversas arts 101 a 110 da Lei 9610 de 19021998 Lei dos DireitosAutorais O autor goza da mais ampla liberdade de opinião e de crítica cabendolhe a responsabilidade das ideias e dos conceitos emitidos em seu trabalho desta edição 2020 Central de Relacionamento Thomson Reuters Selo Revista dos Tribunais atendimento em dias úteis das 09h às 18h Tel 08007022433 email de atendimento ao consumidor sacrtthomsonreuterscom email para submissão dos originais avallivrothomsonreuterscom Conheça mais sobre Thomson Reuters wwwthomsonreuterscombr Acesse o nosso eComm wwwlivrariartcombr Fechamento desta edição 18112019 ISBN 9786550650759 2020 02 13 PÁGINA II Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 EXPEDIENTE Expediente Diretora de Conteúdo e Operações Editoriais Juliana Mayumi Ono Gerente de Conteúdo Milisa Cristine Romera Editorial Aline Marchesi da Silva Diego Garcia Mendonça Karolina de Albuquerque Araújo e Quenia Becker Gerente de Conteúdo Tax Vanessa Miranda de M Pereira Direitos Autorais Viviane M C Carmezim Assistente de Conteúdo Editorial Juliana Menezes Drumond Analista de Projetos Camilla Dantara Ventura Estagiários Alan H S Moreira e Bárbara Baraldi Sabino Produção Editorial Coordenação Andréia R Schneider Nunes Carvalhaes Especialistas Editoriais Gabriele Lais SantAnna dos Santos e Maria Angélica Leite Analista de Projetos Larissa Gonçalves de Moura Analistas de Operações Editoriais Caroline Vieira Damares Regina Felício Danielle Castro de Morais Mariana Plastino Andrade Mayara Macioni Pinto e Patrícia Melhado Navarra Analistas de Qualidade Editorial Ana Paula Cavalcanti Fernanda Lessa Rafael Ribeiro e Thaís Pereira Estagiárias Beatriz Fialho Tainá Luz Carvalho e Victória Menezes Pereira Capa Carla Lemos Controle de Qualidade da Diagramação Carla Lemos Equipe de Conteúdo Digital Coordenação Marcello Antonio Mastrorosa Pedro desta edição 2020 Analistas Jonatan Souza Luciano Guimarães Maria Cristina Lopes Araujo e Rodrigo Araujo Gerente de Operações e Produção Gráfica Mauricio Alves Monte Analistas de Produção Gráfica Aline Ferrarezi Regis e Jéssica Maria Ferreira Bueno Estagiária de Produção Gráfica Ana Paula Evangelista 2020 02 13 PÁGINA III desta edição 2020 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 FICHA CATALOGRÁFICA Ficha catalográfica Dados Internacionais de Catalogação na Publicação CIP Câmara Brasileira do Livro SP Brasil Coelho Fábio Ulhoa Curso de direito civil família sucessõesvolume 5 livro eletrônico Fábio Ulhoa Coelho 2 ed São Paulo Thomson Reuters Brasil 2020 6 Mb ePUB 2 ed em ebook baseada na 9 ed impressa Bibliografia ISBN 9786550650759 1 Direito civil 2 Direito civil BrasilI Título 1931928 CDU347 Índices para catálogo sistemático 1 Direito civil 347 Cibele Maria Dias Bibliotecária CRB89427 2020 02 13 PÁGINA IV desta edição 2020 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 DEDICATÓRIA Dedicatória Para Bachir Haidar Jorge 2020 02 13 PÁGINA RB11 desta edição 2020 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA 2020 02 13 PÁGINA RB11 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 55 INTRODUÇÃO AO DIREITO DE FAMÍLIA Capítulo 55 INTRODUÇÃO AO DIREITO DE FAMÍLIA I As Famílias Ninguém sabe com segurança como quando e em que circunstâncias ocorreu mas é certo que o Homo sapiens em determinado momento de sua trajetória evolutiva deixou de praticar relações sexuais quando o homem e a mulher descendiam do mesmo tronco Segundo uma teoria no início da sociedade humana a espécie vivia na mais completa promiscuidade Todos se guiavam exclusivamente pelos desejos e faziam sexo sem observar qualquer interdição Engels 18843133 Essa teoria não foi ainda confirmada nem rejeitada por estudos arqueológicos definitivos Se ela estiver certa a proibição do incesto foi a nossa primeira lei cf Pereira 20031622 caso errada a vedação de relações incestuosas seria uma característica biológica da espécie humana anterior mesmo à organização da sociedade A proibição do incesto provavelmente foi impulsionada pelo instinto de preservação da espécie A diversidade genética propicia combinações que tornam os seres mais aptos a enfrentar a seleção natural Por óbvio à época em que começou a praticar a proibição do incesto o Homo sapiens não tinha a menor ideia da importância disso para seu desenvolvimento Foi o puro instinto animal que o fez dividir as tribos em agrupamentos menores clãs segundo regras de quem podia e quem não podia manter relações sexuais Essa divisão está na origem da família A antropologia considera que na maioria das comunidades primitivas a segregação teve por referência um totem isto é um símbolo em geral de animal ou planta que marcava cada clã Homens e mulheres do totem do boi não podiam copular uns com os outros por exemplo mas somente com pessoas de outro totem O totemismo generalizouse nos fins do século XIX com a tentativa de alguma etnologia conferirlhe caráter universal todas as sociedades humanas primitivas teriam se organizado basicamente em clãs totêmicos e místico os povos primitivos cultivariam a crença de que cada um descendia realmente do animal ou da planta do totem mas nos anos 1960 demonstrouse que o clã totêmico se encontra na maioria mas não na totalidade das organizações sociais ditas primitivas A única característica universal de todas as comunidades humanas que serve de elo entre a condição natural e cultural da espécie é a proibição do incesto a primeira lei da nossa organização social cf LéviStrauss 1962 A explicação da origem da família como se vê está envolta em grandes incertezas Associase o seu surgimento porque conceitualmente não há outra alternativa ao da prática da proibição do incesto isto é à regulação das relações sexuais permitidas e proibidas Mas pouco se consegue avançar pela trilha da certeza científica no conhecimento de sua origem porque nunca houve como não há hoje em dia uma forma única de família Podemse estudar as famílias mas não a família Numa determinada sociedade definida por vetores de tempo e lugar é possível descrever uma ou duas estruturas predominantes de organização familiar Mas não tem sentido buscar uma única trajetória evolutiva que explique satisfatoriamente como se estruturam e quais são as funções de todas as famílias Logo mais farei referência a certos modelos família tradicional romântica e contemporânea que auxiliam o entendimento das transformações fundamentais pelas quais tem passado a família na civilização ocidental de origem europeia Eles não têm serventia por exemplo na compreensão da família muçulmana hindu ou em parte da oriental Das origens nebulosas façase então um enorme salto para a Antiguidade em que as incertezas no trato do assunto podem ser menores Em Roma é possível conhecer pelos registros o essencial senão tudo da família chefiada pelo cidadão romano Note que a sociedade romana já era muito complexa naquele tempo para abrigar uma única forma de família Pequenos comerciantes escravos libertos e o estrangeiro viviam em estruturas bem diferentes da descrita nos manuais de direito romano como característica da família de então Referese a descrição a rigor à família chefiada pelo cidadão romano o pater As funções da família nesse contexto eram muito diferentes e significativamente maio res que as da do nosso tempo Em primeiro lugar ela era também a principal unidade de produção de bens Comidas roupas móveis e tudo de que se necessitava para viver eram produzidos em princípio pela família O trabalho acontecia dentro da família nela incluíamse os escravos Além disso era também o núcleo religioso Cada família adorava seus próprios deuses e o pater era o sacerdote dos rituais A cura das enfermidades e amparo na velhice eram atribuições exclusivas da estrutura familiar Era na família igualmente que se desenvolvia do início ao fim a educação dos pequenos e a preparação do filho primogênito para a vida pública não havia escolas ou universidades naquele tempo Esposa e concubinas assim como os filhos irmãs solteiras e a mãe do pater moravam todos na mesma casa e estavam a exemplo dos escravos sob o pleno domínio dele Os filhos podiam ser vendidos como escravos ou mortos se assim o pater quisesse Nenhum deles tinha patrimônio próprio apenas com o objetivo de arregimentar melhores quadros para o exército atribuíase aos filhos a propriedade dos soldos e despojos Em termos esquemáticos podemse apontar as seguintes funções da família romana a função biológica relacionada à preservação e ao aprimoramento da espécie com a proibição do incesto a família romana garantia os benefícios da diversidade genética para as gerações subsequentes b função educacional pertinente à preparação dos filhos menores para a vida em sociedade mediante a introjeção dos valores que possibilitavam a organização da estrutura social nos moldes então existentes a mulher por exemplo submetiase ao domínio do pai e depois do marido porque a família lhe ensinava que assim devia ser c função econômica que compreende a produção dos bens necessários à vida humana como alimentos e mobília o excedente era trocado no comércio pelos bens que a família não produzia e de que necessitava d função assistencial pela qual a família amparava os seus principais membros nas enfermidades e velhice após a morte do marido a mãe e tios ficavam sob os cuidados do primogênito e função espiritual sendo a família o local privilegiado das práticas religiosas f função afetiva indispensável à estruturação psíquica do ser humano construção de sua identidade e autoestima a família é condição essencial para a felicidade Se adotarmos essa organização familiar da classe dominante romana como ponto de partida a história da família é uma história de perdas À medida que se torna mais complexa a sociedade subtrai funções da família A difusão do cristianismo retirou da família a função religiosa Algumas características dessa religião podem ser apontadas como causa A primeira é o monoteísmo à profusão de deuses familiares contrapôs a crença num único Deus pai de toda a humanidade A segunda a evangelização pela primeira vez na história uma religião atribuiuse a tarefa de converter todos para sua crença espalhando a Boa Nova A terceira característica do Cristianismo decisiva para tirar a religião do recesso doméstico e tornála pública é a apostólica só os escolhidos por Cristo direta os Apóstolos ou indiretamente os sacerdotes da Igreja fundada por Pedro podem presidir os rituais religiosos Nenhuma religião sem estas três características poderia ter desencadeado a desfuncionalização da família como centro religioso Ainda hoje é certo apelase para a espiritualização da vida familiar dizem os católicos que a família que reza unida permanece unida mas as religiões se praticam principalmente em templos públicos seguindose rituais presididos por sacerdotes Ligar os homens a Deus é sob o ponto de vista da corrente estrutura social uma profissão como outra qualquer As revoluções industriais por sua vez tiraram da família por completo a função econômica Antes delas outros fatos históricos contribuíram para a constituição de um espaço de trabalho estranho ao lar como a revitalização do comércio invenção dos bancos e seguradoras e formação das cidades ocorridas na Idade Média Foram as revoluções industriais no entanto que encerraram o processo Desde meados do século XIX a tendência é a de reunir a população em cidades onde cada pessoa mora num lugar dorme encontra os filhos faz algumas refeições repousa quando enfermo etc e trabalha noutro A desfuncionalização econômica da família terá um efeito claro no modelo de sua estruturação O chefe da família perde um poder significativo o de escolher com quem vão casar seus filhos A organização da economia já prescinde de um poderoso tirano à frente da unidade produtiva como forma de garantir seu funcionamento a empresa capitalista substitui a família na função econômica Outra importante função perdida pela família foi a educacional Ainda na Idade Média a Igreja Católica encarregouse de educar seus sacerdotes criando instituições que estão na origem das escolas As corporações de ofício cuidavam do treinamento de seus membros Também naquele tempo surgiram as primeiras universidades A família ficou encarregada então das primeiras letras e introjeção dos valores fundamentais A formação técnica e superior contudo por sua complexidade só podia ser alcançada fora de casa Com o desenvolvimento da ciência também a educação fundamental deixou de ser tarefa ao alcance da família Hoje em dia a criança já ingressa na escola em creches ou maternais tão logo abandona as fraldas em alguns casos antes mesmo disso A família ainda exerce certa função educacional mas nela aprendese menos que na escola tanto em relação às aptidões como também em medida crescente aos valores A função assistencialista a família vem perdendo a partir de meados do século XX mas o processo ainda está em curso Ainda não há acúmulo de trabalho suficiente para dispensála dos cuidados relacionados aos seus membros na doença e velhice Veja que na préhistória tribos inteiras podiam perecer de fome no inverno por não saber conservar os alimentos Foi necessário um certo grau de acumulação social para o ser humano dominar técnicas que garantissem a reprodução de sua força de trabalho A civilização que criamos pode deixar de existir por muitos fatores inclusive uma hecatombe nuclear mas não por causa de fome no inverno Garantimos já a reprodução da força de trabalho Mas ainda não temos suficiente acumulação social para garantir a recuperação dessa força Quando o ser humano adoece e não pode trabalhar a família tem cuidado dele assim como na velhice em que a força de trabalho do indivíduo muitas vezes desaparece e ele precisa contar com o amparo dos filhos A Seguridade Social está substituindo a família nessa função num lento processo histórico de avanços e recuos em que os países centrais do sistema capitalista naturalmente têmse saído melhor que os periféricos Coelho 199256 A função biológica a família está começando a perder O conhecimento humano já tem outros meios de garantir a diversidade genética além do limitado recurso da proibição do incesto Mas é cedo para dizer de que modo exatamente as clínicas médicas poderiam substituir a família nessa tarefa e quais seriam todas as implicações morais e jurídicas dessa desfuncionalização Dá para afirmar com certeza apenas que o processo já teve início Consideradas as funções da chefiada pelo cidadão romano como ponto de partida a família tem percorrido uma trajetória histórica de perdas No início desempenhava funções religiosas não havia religião fora de casa e econômicas na família se produziam os principais bens para subsistência de seus membros que perdeu totalmente Desempenhava também funções educacionais e assistenciais que em parte não tem mais As funções biológicas e afetivas são as que por enquanto mantêm as famílias E quanto à função afetiva Esta a família tem conservado Mais ainda dispensada das funções econômica religiosa e em parte da educacional e assistencial a família tende a ser cada vez mais o espaço para aflorar a afetividade contribuindo para que homens e mulheres cresçam psicologicamente sadios com autoestima e identidade É claro que muitas e muitas famílias não cumprem essa função a contento gerando para a sociedade pessoas perturbadas sexualmente reprimidas inseguras e infelizes Mas é provável que possa cada vez mais se dedicar à importante tarefa de estruturação psicológica de homens e mulheres pelo afeto na medida em que se fortaleçam os sistemas públicos de saúde e de seguridade social A família no ponto de chegada dessa história de perdas parece finalmente direcionarse para sua vocação de espaço da afetividade Nessa função ela representa uma organização social insubstituível Por enquanto 2 Modelos de família Não existiu como acentuado uma estrutura única de família A família extensa predominante no meio rural pernambucano do período colonial tem pouco em comum com a família nuclear que predominava na São Paulo do século XVIII Samara 1983 Nenhuma delas poderia ser chamada propriamente de modelo da família brasileira por exemplo E ainda é assim hoje em dia Não se consegue identificar uma estrutura única de família Centrada a atenção apenas no ambiente urbano podemse divisar os mais variados tipos há os núcleos compostos pelo esposo esposa e seus filhos biológicos o viúvo ou viúva e seus filhos biológicos ou adotivos pai ou mãe divorciados e seus filhos biológicos ou adotivos esposo esposa e os filhos deles de casamentos anteriores esposo esposa e o filho biológico de um deles havido fora do casamento esposo esposa e filho adotivo casais não casados com ou sem filhos pessoas do mesmo sexo com ou sem filhos biológicos ou adotivos de um deles ou de cada um deles a homossexual e o filho da companheira falecida avó e neto irmãs solteiras que vivem juntas etc A partir dessa enorme diversidade de tipos de família é possível porém a construção de alguns modelos teóricos que auxiliem a compreensão de sua trajetória evolutiva Correspondem esses modelos não somente ao tipo predominante em cada época mas principalmente à ideologia nela cultivada acerca de como se estrutura a família normal São modelos por outro lado aptos a auxiliarem na compreensão da família na civilização ocidental de raízes europeias não servindo necessariamente ao estudo de outras culturas São nesse sentido três os modelos de família tradicional romântica e contemporânea Na família tradicional que existiu até meados do século XIX o pai era o poderoso chefe em torno do qual gravitavam os demais membros A ele competiam todas as decisões escolher a profissão dos filhos homens definir as amizades que a mulher e filhas podiam cultivar determinar os horários em que elas podiam sair de casa e a companhia que estavam autorizadas a ter De todas as decisões que unilateralmente tinha o poder de tomar a mais importante era a escolha da pessoa com quem seus filhos iriam se casar Independentemente do sexo o filho casava com quem o pai determinava Na família romântica que existiu entre meados do século XIX até os anos 1960 o pai perde boa parte de seu poder tirânico mas continua ainda centralizando a vida da família As pessoas passam a gozar de certa liberdade na escolha do futuro cônjuge O casamento deixa de ser um contrato entre famílias quase sempre norteado pelos interesses econômicos dos pais tornase o encontro de seres que se identificam de algum modo Chamase romântica essa estrutura familiar porque com ela tem início o processo de despatrimonialização do direito de família Mas é apenas o início atente O jovem só se arriscava a pedir a mão em casamento da mulher amada se tivesse alguma esperança de não ser recusado pelo pai dela isto é se podia se apresentar como alguém em condições de proporcionarlhe um padrão de vida semelhante ao que tinha na casa do pai Na família do noivo em princípio o pai era apenas informado da decisão do filho mas este também se preocupava em tomar decisão que o agradasse para não correr o risco de sofrer algum prejuízo material deserção ou simples negativa de recursos A família contemporânea é resultado da mudança significativa na condição da mulher na sociedade ocorrida na segunda metade do século passado Podendo exercer sua sexualidade com mais liberdade graças à pílula anticoncepcional e ocupando no mercado de trabalho lugar de importância equivalente ao do homem a mulher pode ser independente não tem mais que aceitar minimamente a ideia de casar ou deixar de casar em função da vontade do pai A chefia da família contemporânea não é mais do homem e as decisões importantes domicílio local das férias redecoração da casa etc surgem de intensa negociação com a mulher e os filhos Quanto ao casamento destes os pais são meramente informados com mais ou menos solenidade acerca da decisão adotada diretamente pelos noivos Em termos esquemáticos o decisivo é a variância em cada modelo da competência para a decisão sobre o casamento dos filhos Na família tradicional os pais da noiva e do noivo contratavam o enlace Na romântica o noivo pedia a mão da noiva ao pai dela que podia impedir o casamento caso não o agradasse o pretendente já o pai do noivo era comunicado da decisão do filho Na família contemporânea a decisão é exclusiva dos diretamente interessados e tanto o pai da noiva como o do noivo são apenas informados Na civilização ocidental de raízes europeias são três os modelos de família tradicional em que os pais contratam o casamento dos filhos até meados do século XIX romântica em que o pai da noiva tem o direito de não autorizar o casamento de meados do século XIX até os anos 1960 contemporânea em que as pessoas casam com quem querem independentemente da vontade dos pais desde os anos 1960 Encontramse hoje famílias mais ou menos tradicionais ou românticas em que a figura do pai ainda tem proeminência Por meio de chantagens emocionais ou ameaça de redução de meios materiais de subsistência alguns homens conservadores procuram dar sobrevida a essas estruturas familiares arcaicas Quando o conseguem pagam e impõem aos filhos um altíssimo custo psicológico e acabam formando pessoas dessintonizadas com o seu tempo em prejuízo para toda a sociedade 3 O direito de família Cada ramo de saber adota conceito próprio de família Para a história e sociologia ela é o conjunto de pessoas que habitam a mesma casa A antropologia já a define em função da interdição de relações sexuais incestuosas Na psicanálise a definição parte dos papéis psicológicos desempenhados pelas pessoas O pai e a mãe não são necessariamente os fornecedores dos gametas mas aqueles que cumpriram determinadas funções na estruturação da psique da pessoa O direito por sua vez adota a definição de família tendo em vista certas relações jurídicas entre os sujeitos Na família as principais relações jurídicas são de um lado as horizontais e de outro as verticais As relações horizontais são as de conjugalidade empregada a expressão aqui num sentido muito amplo que abarca todos os enlaces entre duas pessoas adultas não irmãs voltadas à organização da vida em comum Mantêm relações horizontais de família os casados os que convivem em união estável em união livre e as pessoas de mesmo sexo em comunhão de vida As relações verticais são as de ascendência e descendência como as que unem pais aos filhos avós aos netos etc As relações horizontais dizem respeito em geral aos vínculos fundadores de novo núcleo familiar incluindo os estabelecidos pelo casamento de duas pessoas de sexo oposto mas não se limitando a essa hipótese Mas não são os únicos vínculos fundadores de nova família porque também ela se forma por relações verticais como no caso da adoção de filho por pessoa solteira divorciada ou viúva a geração e educação de criança por mulher não casada chamada produção independente o acolhimento do neto em sua casa pelos avós etc Enquanto as relações horizontais são atualmente voluntárias porque se estabelecem e se mantêm apenas se os dois sujeitos de direito querem ficar juntos as verticais são obrigatórias pelo menos pelo lado dos descendentes Os pais podem escolher ter ou não filhos quando adotam podem inclusive escolher o filho que querem Há assim uma certa liberdade mas uma vez feita a opção pela paternidade ou maternidade o vínculo durará a vida toda Os descendentes também se envolvem forçosamente numa relação vertical que dura a vida toda ou pelo menos até a morte dos ascendentes A explicação para isso é natural quando éramos nômades caçadores a família garantia aos pequenos alimento calor segurança e conhecimentos até a conquista da plena autonomia característica da vida adulta Na civilização a família exerce função semelhante cabendolhe preparar os filhos para a vida em sociedade preparo psicológico e obediência às principais regras morais jurídicas de etiqueta etc A relação vertical quando existente é imposta aos pais e filhos que dela não podem desligar se Enquanto não alcança sua independência material e psicológica o filho tem direito de ser educado criado e assistido pelos pais Depois de tornarse um ser independente continua preso à relação vertical que o enlaça por toda a vida dos pais porque é seu dever cuidar deles na velhice Se sempre existiram meios de desfazimento do vínculo de conjugalidade Cahali 19783033 por enquanto o direito não os conhece para os de ascendência e descendência pais e filhos não se separam Como dita a Constituição Federal os pais têm o dever de assistir criar e educar os filhos menores e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice carência ou enfermidade art 229 A natureza das relações familiares horizontais e verticais mudou significativamente na família contemporânea quando comparada à tradicional e romântica As relações horizontais deixaram de se fundar exclusivamente na monogamia vitalícia e passaram a admitir também a monogamia sucessiva como padrão A autoridade do pai foi substituída pela igualdade dos sujeitos em relação matrimonial Não há mais a necessidade da celebração do ritual do casamento para constituição do vínculo horizontal e formação da família Em alguns países não é mais imprescindível que os sujeitos da relação sejam de sexos opostos Tempo houve por outro lado em que as relações verticais provinham de fundo biológico Ascendentes e descendentes se definiam unicamente em função dos chamados laços de sangue O filho adotivo não participava da herança em igualdade de condições com os biológicos por exemplo Atualmente não há mais distinção jurídica nenhuma entre a filiação biológica e não biológica Aliás com a paternidade ou maternidade socioafetiva quem cuida duma criança como seu filho passa a ser pai ou mãe dela para o direito rompeuse de vez o fundamento biológico para as relações verticais Outra mudança importante foi a superação da abominável distinção entre filhos legítimos nascidos dentro do casamento e ilegítimos nascidos fora do casamento Há não muito tempo atrás esses últimos tinham na partilha menos direitos que aqueles Por fim os filhos não estão mais submetidos inteiramente à autoridade dos pais tendo voz ativa em muitos dos assuntos de seu interesse e da própria família em 1989 a ONU proclamou na Convenção sobre os Direitos da Criança o princípio do melhor interesse do filho nas relações com os pais Alterou por completo a base jurídica dessas relações tradicionalmente lastreadas nos interesses dos genitores Essas são como dito as principais relações familiares Há além das horizontais e verticais duas outras espécies de relação que para o direito também podem caracterizar a família São vínculos regidos pelo direito de família Tratase das relações colaterais que incluem as de fraternidade entre irmãos bilaterais ou unilaterais e as existentes entre tios e sobrinhos e as relações de afinidade estabelecidas pelo casamento entre cada cônjuge e os parentes consanguíneos do outro Um estatístico dificilmente consideraria existir família no vínculo de dois irmãos adultos moradores de cidades diferentes ou no existente entre exgenro e exsogra que não se encontram há anos Para o direito no entanto tais relações são familiares serão devidos alimentos se um irmão precisar e o outro tiver meios para os prover à falta de cônjuge convivente e outros parentes sucessíveis o sobrinho herda do tio exgenro e exsogra não podem casarse mesmo após decurso de longo tempo após o fim do casamento que estabeleceu a relação jurídica entre eles Essas duas relações jurídicas colateralidade e afinidade correspondem a situações de fato de menor relevância porque os conflitos de interesses em torno delas são bem mais raros que os atinentes às relações horizontais e verticais Há famílias sem relações horizontais a família monoparental por exemplo como há as desprovidas de relações verticais a constituída por casal sem filhos mas faltando essas relações e as demais juridicamente características do vínculo familiar como as de fraternidade ou afinidade não há família Para o direito assim família é o conjunto de dois ou mais sujeitos ligados por essas específicas relações jurídicas Portanto a família é fenômeno plural o filho havido fora do casamento e seu pai casado mantêm uma relação juridicamente regulada pelo direito de família Apesar de morarem em casas separadas e não conviverem integram uma família jurídica De fato pela ausência de coabitação e vínculos afetivos não se poderia falar aqui estritamente em família sob o ponto de vista sociológico e psicológico No censo por exemplo não aparecerão como membros da mesma unidade fami liar Mas juridicamente falando não é despropositado falarse numa espécie de família monoparental cujos membros têm direitos e deveres um para com o outro Por outro lado a pessoa pode ter mais de uma família O filho de pais divorciados por exemplo integra duas famílias monoparentais caso nenhum dos genitores tenha se casado novamente ou faça parte de união estável Assim o conceito dos velhos manuais jurídicos que identificavam a família a partir da existência de tronco ancestral comum Beviláqua 189615 Rodrigues 20044 não atende mais à complexa realidade dos nossos dias Além da superação do fundamento biológico dos vínculos familia res outra forte tendência do direito de família aponta para a primazia da afeição A família dispensada das pesadas funções que vinha e em certa medida vem exercendo tem meios para ser enfim o espaço da afetividade Essa tendência tem sido chamada de despatrimonialização do direito de família Esse ramo jurídico realmente se dedica cada vez mais a questões como direito de visita guarda conjunta primazia dos interesses dos filhos e outros que transcendem os aspectos meramente patrimoniais Não significa atente que tenha já ou venha num dia próximo a descuidar desses aspectos Só se e quando houver no futuro sistemas sociais consolidados de recuperação da força de trabalho e assistência à velhice a família poderá dedicarse exclusivamente à promoção da afetividade e liberarse por completo de funções patrimoniais Até lá institutos como alimentos e regime de bens do casamento continuarão o centro das atenções desse ramo jurídico Mas a despatrimonialização do direito de família é irrefreável Somente levando às últimas consequências o fundamento afetivo de constituição dos laços familiares poderá o direito de família por exemplo dar solução satisfatória aos inúmeros conflitos que surgirão das técnicas de fertilização assistida como o uso indevido dos gametas ou embriões a descoberta da identidade do doador do sêmen a deficiência na prestação dos serviços de guarda de material genético etc Quem já tem um pai numa relação socioafetiva não terá assim direito nenhum oponível ao fornecedor do sêmen ou seus sucessores Para o direito família é o conjunto de duas ou mais pessoas vinculadas por relações específicas tais as de conjugalidade ascendência e descendência fraternidade e outras No passado definiase em função de fatores biológicos que aos poucos foram substituídos por vínculos de afeição Em paralelo o direito de família apresenta a irrefreável tendência à despatrimonialização das relações familiares As principais normas legais de direito de família estão no Livro IV da Parte Especial do Código Civil arts 1511 a 1783 e disciplinam não só as relações típicas da família acima referidas conjugalidade descendência afinidade etc em seus aspectos pessoais e patrimoniais como também alguns outros institutos afins assim a tutela e curatela 4 Classificação das famílias No direito classificamse as famílias inicialmente em duas categorias as constitucionais e as não constitucionais As famílias constitucionais são as mencionadas na Constituição Federal art 226 São três a instituída pelo casamento pela união estável do homem e da mulher e a família monoparental isto é a formada por qualquer dos pais e seus descendentes Já as famílias não constitucionais são as demais vale dizer as não lembradas pelo constituinte Nessa ampla categoria incluemse por exemplo as derivadas de parcerias entre pessoas do mesmo sexo e as famílias não monogâmicas Entre as famílias constitucionais e as não constitucionais a diferença diz respeito unicamente à possibilidade de a lei ordinária estabelecer restrições específicas Se for um dia disciplinar a parceria de pessoas de mesmo sexo por exemplo a lei pode dispor validamente sobre a participação do parceiro sobrevivente na herança do falecido instituindo quotas inferiores à que atribui ao cônjuge na sucessão da pessoa casada Não haverá nenhuma inconstitucionalidade nessa diferenciação porque a parceria entre pessoas do mesmo sexo é uma família não constitucional Já ao disciplinar as uniões estáveis por exemplo o legislador não pode deixar de atribuir ao companheiro nenhum direito que tenha reconhecido ao cônjuge Como a união estável é família constitucional essa discriminação não é aceita pela ordem jurídica vigente O casamento será examinado com mais vagar apenas em função de sua maior complexidade Caps 56 e 57 As demais famílias ou entidades familiares as expressões são sinônimas examinamse na sequência Cap 59 5 Relações de Parentesco Por muito tempo a ciência considerou que a hereditariedade biológica era transmitida pelo sangue Expressões como laços de sangue sangue ruim ou sangue azul foram cunhadas em função dessa concepção que o conhecimento científico sustentou desde Aristóteles até o fim do século XIX Sabese atualmente porém que a hereditariedade biológica transmitese pelos genes encontrados na quase totalidade das células de nosso organismo Por incrível que pareça as únicas células do corpo humano que não possuem gene e portanto não transmitem nenhum traço hereditário são exatamente os glóbulos vermelhos do sangue BrodyBrody 1999334 Quando se chama consanguíneo ou natural certo parentesco pretendese destacar que a relação tem por pressuposto fático a transmissão da herança genética Distinguese assim do parentesco civil em que não se verifica tal transmissão CC art 1593 O filho biológico tem com o pai um vínculo de parentesco natural ao passo que o adotivo e o gerado por fecundação assistida heteróloga feita com espermatozoide fornecido por outro homem vinculase ao pai por parentesco civil A diferença hoje entre uma e outra categoria de parentesco é nenhuma tendo em vista a plena igualdade entre as espécies de filiação Os ascendentes e descendentes são parentes em linha reta assim os pais e filhos avós e netos bisavós e bisnetos etc CC art 1591 Os graus desse tipo de parentesco contamse pelo número de gerações Pai e filho são parentes em linha reta de primeiro grau avô e neto de segundo grau bisavô e bisneto terceiro e assim por diante art 1594 primeira parte Não há grau máximo no parentesco em linha reta de modo que a pessoa está ligada por vínculo de parentesco a todos os seus ascendentes e descendentes independentemente do número de gerações que os separam As pessoas que provêm de tronco comum mas não são parentes em linha reta estão ligadas por parentesco em linha colateral ou transversal CC art 1592 Irmãos são parentes colaterais porque têm ascendência comum mesmos pais quando bilaterais ou germanos mesmo pai ou mesma mãe quando unilaterais mas não descendem um do outro Também primos assim como tios e sobrinhos são parentes colaterais Os graus de parentesco na linha transversal contamse também por número de gerações mas subindo de um dos parentes até ao ascendente comum e descendo até encontrar o outro parente art 1594 in fine Desse modo irmãos são parentes colaterais de segundo grau Confirase tomando o exemplo dos germanos uma geração separa um dos irmãos dos pais que são os ascendentes comuns e mais uma geração separa estes do outro irmão no total duas gerações e portanto dois graus No caso de irmãos unilaterais o cálculo é o mesmo porque entre o ascendente comum o pai ou a mãe e cada um deles há igualmente uma geração Tio e sobrinho são parentes colaterais de terceiro grau O ascendente comum é o pai do tio que é também avô do sobrinho Entre o tio e o ascendente comum há uma geração entre o ascendente comum e o sobrinho duas No total são três gerações separando o tio do sobrinho e por isso o parentesco é de terceiro grau Entre primos com os mesmos avós os vulgarmente chamados de primosirmãos ou primos de primeiro grau há parentesco colateral de quarto grau Na subida até o ascendente comum são duas gerações e na descida mais duas Também é esse o parentesco existente entre tioavô e sobrinhoneto filho do sobrinho Na subida até o ascendente comum há uma geração e na descida mais três O parentesco transversal não vai além do quarto grau Os vulgarmente chamados primos de segundo grau por exemplo não são parentes O parentesco pode ser em linha reta em linha colateral ou por afinidade Parentes em linha reta são os ascendentes e descendentes como pais e filhos avós e netos etc Em linha colateral ou transversal são aqueles que provêm do mesmo tronco mas não em linha reta como irmãos tio e sobrinho etc O parentesco afim por sua vez é estabelecido pelo casamento ou pela união estável entre cada um dos cônjuges ou companheiros e os parentes do outro Nora e sogro são parentes por afinidade assim como um companheiro e os filhos do outro Por fim há parentesco por afinidade entre uma pessoa casada e os parentes do cônjuge dela Nesse caso é o matrimônio que gera o parentesco O esposo é parente por afinidade dos ascendentes pais avós etc descendentes filhos netos etc e irmãos da esposa Também a união estável gera o parentesco por afinidade entre cada companheiro e os parentes do outro CC art 1595 e 1º O término da sociedade conjugal ou da união estável extingue o parentesco afim exceto os de afinidade em linha reta que perduram por toda a vida dos parentes 2º A única consequência disso porém é o impedimento para o casamento de exgenro com exsogra de um dos excônjuges com filho do outro de mulher com o avô do antigo companheiro e assim por diante Cônjuges e companheiros não são parentes uns dos outros Integram uma mesma família constituída apenas pela relação de conjugalidade mas não mantêm entre eles nenhum vínculo de parentesco 6 Bem de família A garantia dos credores é o patrimônio do devedor Em outros termos quando alguém não cumpre determinada obrigação de fundo contratual ou legal o credor pode executar seu crédito requerendo em juízo a penhora de tantos bens do devedor quantos bastem à satisfação do devido O bem ou bens penhorados são então expropriados judicialmente para que seja pago o credor O objetivo do instituto do bem de família que nasceu no direito norteamericano em meados do século XIX e se espalhou por diversas legislações Azevedo 19742680 inclusive a brasileira é impedir que o devedor seja privado de moradia Considerase que por mais errado que tenha sido a atitude dele no descumprimento da obrigação exequenda não é justo senão em hipóteses excepcionais que fique numa situação patrimonial tão precária a ponto de perder inclusive a casa ou apartamento em que mora São duas as espécies de bem de família legal e convencional O bem de família legal está disciplinado na Lei n 800990 que estabelece a impenhorabilidade do imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar na cobrança de dívidas de qualquer natureza art 1º Dizse legal essa hipótese de bem de família porque sua instituição independe de qualquer declaração de vontade específica do devedor no sentido de subtraílo da garantia geral de seus credores Desse modo todo aquele que abre crédito a certa pessoa sabe que em caso de inadimplemento poderá buscar em juízo a penhora de qualquer bem do patrimônio dessa última menos o imóvel em que ela reside Quando a família possui mais de uma residência dos imóveis em que reside será impenhorável apenas o de menor valor Lei n 800990 art 5º parágrafo único A lei abre algumas exceções à impenhorabilidade do bem de família como por exemplo na execução de crédito decorrente do não pagamento de impostos incidentes sobre ele ou da hipoteca que o grava Lei n 800990 art 3º Nesses casos e nos demais excepcionados pela lei o bem de família responde pela obrigação do devedor tal como os demais de seu patrimônio A despeito do nome do instituto a impenhorabilidade do bem de família legal não se destina apenas a proteger os interesses de membros de entidades familiares Predomina na jurisprudência o entendimento de ser escopo do instituto a proteção do direito à moradia STJ Súmula 364 Desse modo é impenhorável também na forma da Lei n 800990 o imóvel em que vive pessoa solteira e solitária Gonçalves 2004519520 Por sua vez o bem de família convencional é instituído por declaração de vontade do titular da propriedade do bem clausulado Podem instituíla não somente os cônjuges companheiros ou o cabeça da família monoparental interessados em preservar determinados bens de seus patrimônios do risco da penhora como também terceiros que doam ou testam imóvel residencial para moradia do donatário ou legatário e sua família A declaração de instituição do bem de família deve ser feita por escritura pública ou testamento mas a impenhorabilidade somente passa a clausular o imóvel após o registro do título no Registro de Imóveis CC art 1714 No bem de família convencional fixou a lei um valor máximo A declaração de impenhorabilidade não pode recair sobre bens cujo valor ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição sem prejuízo do bem de família legal CC art 1711 Desse modo imagine que uma pessoa seja titular de bens no valor de 1000 entre os quais há quatro imóveis A B C e D no valor de 200 cada e bens móveis que juntos valem também 200 Presuma que essa pessoa mora num de seus imóveis com a família imóvel A Considere ademais que ela deve 400 Pois bem o valor do patrimônio líquido dessa pessoa é 600 1000 400 600 significa dizer que ela pode instituir como bem de família qualquer um dos imóveis em que não reside já que o valor dele corresponde a 13 do patrimônio líquido 600 3 200 Note que não compensa clausular o imóvel em que reside porque este já está a salvo de penhoras em razão da Lei n 800990 Pense então que essa pessoa declarou o imóvel B como bem de família Os credores se precisarem executar seus créditos só podem requerer a constrição judicial incidente sobre os outros dois imóveis C e D ou sobre bens do patrimônio mobiliário do devedor Ao instituir o bem de família sobre um imóvel residencial urbano ou rural o instituidor pode estender a cláusula de impenhorabilidade a valores mobiliários como ações emitidas por sociedades anônimas por exemplo cuja renda deve ser gasta na conservação do bem clausulado e sustento da família CC art 1712 Os valores mobiliários alcançados pela declaração instituinte do bem de família não podem ser mais valiosos que o prédio residencial à época da instituição e podem permanecer custodiados numa instituição financeira art 1713 Uma vez instituído o bem de família convencional o imóvel clausulado não poderá ser penhorado por dívidas posteriores ao registro do título no Registro de Imóveis salvo se pertinentes aos tributos incidentes sobre o prédio ou despesas de condomínio CC art 1715 De qualquer modo vendido o bem de família em execução de dívida constituída anteriormente ao registro da declaração instituinte ou na cobrança de tributos incidentes sobre ele o saldo se houver será utilizado na aquisição de outro prédio destinado igualmente à garantia do devedor e sua família Não sendo o saldo da venda judicial do bem de família suficiente para tanto deve ser investido em títulos da dívida pública para que a renda atenda ao sustento da entidade familiar a menos que o juiz considere mais conveniente outra solução art 1715 parágrafo único Cessam os efeitos da instituição do bem de família quando falecerem ambos os cônjuges ou companheiros ou alcançarem os filhos a maioridade salvo se sujeitos à curatela o que se verificar por último CC arts 1716 e 1722 A partir de então volta o bem a ser penhorável inclusive pelas dívidas posteriores à sua instituição que ainda não estiverem prescritas A dissolução da sociedade conjugal ou o fim da união estável não extingue o bem de família art 1721 O bem de família convencional clausula o bem também com a inalienabilidade Para sua alienação é necessária a concordância de todos os membros da entidade familiar e seus representantes legais quando incapazes A lei condiciona a alienação do bem de família também à oitiva do Ministério Público o que faz pressupor que depende o ato de autorização judicial CC desta edição 2020 art 1717 Também depende de o juiz autorizar a subrogação do bem de família em outro ou a extinção do gravame art 1719 O bem de família é o imóvel que não pode ser penhorado pela generalidade das dívidas de seu proprietário Há duas espécies de bem de família o legal disciplinado na Lei n 800990 e o convencional de que tratam os arts 1711 a 1722 do Código Civil Já há muito tempo é extremamente rara a instituição de bem de família convencional Em primeiro lugar porque o instituto do bem de família legal tem atendido satisfatoriamente os interesses dos devedores em conservar em caso de insolvência pelo menos a titularidade do imóvel residencial para seu abrigo e dos familiares Em segundo porque o Código Civil cercou o instituto do bem de família convencional de tantas formalidades que tornou cara sua instituição e praticamente incompatível sua disciplina jurídica com a dinâmica da economia dos nossos tempos 2020 02 13 PÁGINA RB21 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 56 CASAMENTO Capítulo 56 Casamento 1 Introdução Desde as primeiras lições ao estudante de direito é apresentada a noção de que o conhecimento jurídico não tem por objeto o plano do ser mas do deverser A partir de elaborações filosóficas mais ou menos sofisticadas como as da Teoria Pura do Direito de Kelsen o corte metodológico fndamental ou de meros e confortáveis recortes nos temas das aulas essa lei não é aplicada Isso é um outro problema transmitese a ideia de que o profissional da área tem de se preocupar apenas com a compreensão do padrão de comportamento preceituado pela norma jurídica Pretendese que o conhecimento jurídico sabe do mundo como ele deveria ser isto é o que ditam as leis e normas cuja obediência generalizada faria plenamente harmoniosa a convivência em sociedade Nada mais equivocado O tecnólogo e o profissional do direito como o estudioso de qualquer outra área do conhecimento humano têm por objeto de estudo o que existe e não o que deveria existir Não é o mundo como ele deveria ser de acordo com o molde da ordem jurídica o campo de saber da doutrina mas as relações sociais tais como realmente são Quer dizer não estudamos as normas postas mas os conflitos de interesses manifestados nas relações sociais e as formas de sua superação Leis e normas não são o modelo de como o mundo deveria ser mas parâmetros que norteiam a superação institucional dos conflitos de interesses Essa maneira equivocada de entender o objeto do conhecimento jurídico muitas vezes transparece no exame do casamento É comum apresentarse o instituto pela perspectiva de um padrão ideal e irreal mais ou menos definido pela ideologia corrente Ele é tido nesse contexto como o ato que institui plena comunhão de vida de duas pessoas pacifica a concupiscência legaliza as relações sexuais e as une em compromissos recíprocos de fidelidade respeito e assistência mútua bem como nos relativos à criação e educação dos filhos Não faltam também nesse modelo de enfoque do casamento sugestões mais ou menos veladas do caráter sacro da união Não é assim que quero tratar o assunto Ao contrário quero examinar o casamento como ele é para entender os conflitos reais que giram em torno dele e as vias de superação construídas pela ordem jurídica Não basta a norma legal ditar que o casamento estabelece comunhão plena de vida CC art 1511 para que assim seja Não interessa de verdade o que as pessoas imaginam corresponder ao relacionamento conjugal perfeito atrás do qual gastam a vida ou boa parte dela correndo mas a realidade cujo tecido nem sempre pulcro nos cerca por todos os lados 11 Casamento entre pessoas de sexos diferentes e de mesmo sexo Para outras áreas do conhecimento humano a questão não é tão simples assim mas para o direito existem apenas dois sexos o masculino e o feminino O sexo jurídico de uma pessoa é o constante dos assentamentos do Registro Civil que por sua vez espelham o conteúdo do atestado expedido pelo hospital ou maternidade em que ocorreu o parto ou a declaração do pai mãe ou de quem comunicou o nascimento Nos dois casos o sexo é definido pelo mero exame visual dos órgãos externos do bebê Se visível o pênis atribuise à pessoa o sexo masculino se a vagina o feminino Até maio de 2011 só podiam casarse no Brasil pessoas de sexos diferentes quer dizer um homem e uma mulher uma pessoa cujo assentamento civil lhe atribui o sexo masculino com outra registrada com o feminino Naquele mês o STF reconheceu por unanimidade que o direito brasileiro não tolera qualquer discriminação entre as uniões estáveis constituídas de um lado por pessoas de sexos diferentes e de outro por pessoas de mesmo sexo por força de seus princípios constitucionais que instituem os direitos à igualdade liberdade dignidade privacidade e não discriminação Ora como a Constituição Federal também estimula a conversão das uniões estáveis de homens e mulheres em casamento art 226 3º às uniões de pessoas do mesmo sexo não se pode negar igual tratamento O casamento pode ser assim no direito brasileiro tanto entre pessoas de sexos diferentes heteroafetivo ou heterossexual como entre pessoas do mesmo sexo homoafetivo ou homossexual A admissibilidade pelo direito brasileiro do casamento entre pessoas do mesmo sexo não decorreu de nenhuma alteração legislativa mas sim da evolução da jurisprudência e de norma do Conselho Nacional de Justiça Até a admissibilidade do casamento homoafetivo não havia nada mais desrespeitoso ao postulado normativo constitucional da dignidade humana que o desconhecimento da família constituída pela união de pessoas do mesmo sexo Os homossexuais se sentiam agredidos e injustiçados e com razão porque não podiam ter os mesmos direitos que os heterossexuais em relação aos seus parceiros no vínculo de conjugalidade Note que não se está falando de inacessibilidade aos direitos de conteúdo patrimonial Em relação a estes os institutos do direito contratual e real permitiam aos casais homossexuais alcançarem idêntica proteção à concedida por meio do direito de família aos heterossexuais A instituição de condomínio sobre os bens adquiridos durante a constância da parceria testamento cuidadosamente elaborado bem como a contratação sobre a obrigação pelas despesas comuns e previsão de ajuda pecuniária devida pelo mais abonado ao menos nos primeiros anos seguintes ao eventual término do relacionamento eram medidas por meio das quais os interesses econômicos dos casais homossexuais ficavam de modo geral satisfatoriamente atendidos O desrespeito ao postulado normativo da dignidade humana a que levava o desconhecimento pelo direito dessa espécie de entidade familiar encontravase na verdade no exercício dos direitos extrapatrimoniais titulados pelos cônjuges e companheiros No enfrentamento de questões sensíveis como por exemplo autorização para transplantes cremação do corpo ou doação de órgãos após o falecimento e vocação para curadoria em caso de interdição nenhum negócio jurídico praticado pelos homossexuais podia garantir a equiparação aos heterossexuais Em outros termos o desconhecimento pelo direito dos direitos patrimoniais titulados pelos membros da união familiar homossexual representava uma séria dificuldade mas que podia ser contornada A dos direitos extrapatrimoniais não havia como superar por negócios jurídicos celebrados pelas partes diretamente interessadas Em várias partes do mundo adotouse solução intermediária a meio passo entre de um lado a admissibilidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo e de outro a desconsideração da realidade dos enlaces homossexuais Falo da união civil incorporada a diversos ordenamentos jurídicos Em França em 1999 a lei introduziu a figura do pacte civil de solidarité PACS um contrato entre pessoas físicas maiores de sexos diferentes ou do mesmo sexo destinado à organização da vida em comum dos contratantes Por meio do PACS alguns dos direitos e obrigações derivados do casamento podem ser titulados pelos parceiros homossexuais mas não todos Ele não proporciona por exemplo o direito à adoção comum de filhos Outros ordenamentos jurídicos têm incorporado a união civil como Portugal que aboliu a diversidade sexual como requisito da união estável Inglaterra onde se admite o civil partnership e Alemanha Eingetrangene Lebenspartnerschaft Nos Estados Unidos podese encontrar a figura jurídica de maior envergadura no arco dessas soluções intermediárias No Estado de Vermont no fim de 1999 a Corte Suprema declarou inconstitucional uma lei estadual que expressamente negava aos casais do mesmo sexo direitos e obrigações iguais aos derivados do casamento Nessa decisão o Judiciário deu duas alternativas ao Legislativo equiparar por completo as duas hipóteses ou estatuir um regime específico para as uniões de homossexuais Optando pela última o Legislativo do Estado de Vermont baixou em meados de 2000 a lei instituindo a civil union A adoção de filhos comuns pelo casal do mesmo sexo é aceita assim como todos os demais direitos extrapatrimoniais próprios do casamento de heterossexuais Quaisquer cidadãos norteamericanos e mesmo os estrangeiros podemse vincular em união civil pelas leis de Vermont mesmo que não residam nesse Estado Roy 2002 Connecticut também incorporou ao seu direito a figura em 2005 mas os efeitos da união civil não se projetam naqueles estados da Federação em que não houver compatibilidade com a Constituição ou a legislação estaduais Jaluzot 2008376377 A união civil não significa juridicamente falando o mesmo que casamento Este continua a representar nas ordens jurídicas que optam pela união civil uma das hipóteses de conjugalidade exclusivamente entre pessoas de sexos diferentes Os únicos ordenamentos jurídicos que em meados de 2010 admitiam o casamento independentemente da diversidade ou identidade de sexo dos nubentes eram os da Holanda desde 2001 Bélgica 2003 Espanha Canadá 2005 e Argentina 2010 Nos Estados Unidos apenas em Massachusetts considerase existir o casamento entre pessoas do mesmo sexo em razão do transcurso do prazo concedido pela Corte Suprema daquele estado para que a matéria fosse objeto de disciplina legislativa sem que o Poder Legislativo tivesse se manifestado regularmente Jaluzot 2008 No Brasil o casamento pode ser entre pessoas de sexos diferentes heterossexual ou de mesmo sexo homossexual não em razão de expressa previsão legal mas por força da interpretação do Poder Judiciário à Constituição e normativa do Conselho Nacional de Justiça A admissibilidade do casamento homossexual no Brasil seguiu rumo próprio porque não decorreu de nenhuma previsão legal específica mas de construção jurisprudencial e normativas de órgãos correicionais Corregedorias de Justiça dos Estados e Conselho Nacional de Justiça A História é a seguinte No passado quando a ordem positiva nacional proclamava indissolúvel o casamento os Tribunais atentos aos clamores da realidade social construíram os instrumentos de proteção da união estável Não foi um processo célere nem indolor mas os membros do Poder Judiciário que se sensibilizaram com a situação das inúmeras famílias fundadas pelos desquitados então marginalizadas pela lei estiveram à altura dos desafios daquele tempo Deitando ao largo preconceitos foram gradativamente amparando os direitos da concubina e de seus filhos Os desafios do tempo atual são semelhantes e o Poder Judiciário respondeu a eles aplicando o regime jurídico da união estável às uniões nascidas de relacionamento entre pessoas do mesmo sexo Em 2011 depois de alguns precedentes nesse sentido Cahali 2004294320 Pereira 20046971 RT 849165 o Supremo Tribunal Federal reconheceu a admissibilidade no direito brasileiro da união estável entre pessoas do mesmo sexo Argumentando com os princípios constitucionais o Poder Judiciário adiantouse ao legislador ordinário e esclareceu a questão Reconheceuse que por meio de instrumento particular ou escritura pública pessoas do mesmo sexo podem contratar validamente a união estável que será equiparada para todos os efeitos jurídicos à de pessoas de sexos diferentes Em seguida à decisão do STF juízes de primeiro grau começaram a converter uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo em casamento Como a Constituição Federal estimula a conversão em casamento das uniões estáveis entre homem e mulher art 226 3º e a estas se equiparam por força de princípios constitucionais as uniões entre pessoas do mesmo sexo era decorrência lógica e jurídica necessária da decisão do STF que o direito brasileiro também não condicionasse o casamento à diferença de sexo dos cônjuges Não houve recurso do Ministério Público e essas decisões transitaram em julgado As Corregedorias Estaduais foram em seguida uniformizando a orientação aos cartórios de registro civil de pessoas naturais No Estado de São Paulo a Corregedoria da Justiça normatizou o assunto em dezembro de 2012 Em maio de 2013 em treze Estados da Federação normativas correicionais já orientavam os cartórios a não recusarem a habilitação de casamento apresentada por pessoas do mesmo sexo mas faltava uma norma geral de âmbito nacional Naquele mês o Conselho Nacional de Justiça baixou a Resolução 17513 vedando a recusa de habilitação e celebração do casamento ou conversão de união estável neste a pessoas do mesmo sexo Hoje de fato e de direito pessoas do mesmo sexo podem se casar no Brasil e titularem na plenitude os mesmos direitos dos casados com pessoas de sexos diferentes 12 Objetivos do casamento O que leva um homem e uma mulher a se casarem Sob o ponto de vista psicológico as respostas são diversas Para algumas formulações de inspiração freudiana o homem que não supera convenientemente o complexo de Édipo acaba casando com a mãe quer dizer com uma mulher com os mesmos traços psicológicos essenciais dela uma pessoa familiar a mulher por sua vez também casa com um homem que apresenta os traços psicológicos mais importantes da mãe mas dependendo da ligação que tem com o pai procura um marido com as características opostas das dele a filha do filósofo casase com o comerciante para que seu pai tenha preservado o lugar no coração dela Abstraindo contudo a complexa questão psicológica o que leva um homem e uma mulher ao casamento Começo a dar minha resposta destacando três motivações amor gratificação sexual e organização da vida O amor é um sentimento complexo talvez o mais complexo de todos Alguns de seus ingredientes são conhecidos a admiração e o respeito a vontade de partilhar tudo desde coisas miúdas até grandes projetos e conquistas a saudade constante mesmo quando pouca a distância e pouco o tempo da separação a mais ampla intimidade que conduz ao pleno relaxamento físico e mental que desarma completamente que permite explodir a autenticidade em mil direções Tudo isso é o amor mas ele seguramente é mais que isso O amor não é como a paixão que irrompe arrebatanos e de repente se esvai subitamente nos perguntamos onde ela está ele é resultado do convívio dos ajustes sutis de uma demorada e caprichada construção a dois Não existe o chamado amor platônico porque onde não houver correspondência não haverá espaço para o amor se brotar ou restar algum sentimento será doentio e egoísta o oposto do amor Quanto à gratificação sexual note que homens e mulheres não se comunicam com facilidade nesse terreno Os processos de excitamento e satisfação não são iguais para os dois sexos Enquanto os homens costumam ter o desejo despertado por simples estímulos visuais a maioria das mulheres depende de carícias físicas para se interessar pelo ato sexual Os homens em geral estimulamse para o sexo mesmo após um estafante dia de trabalho e ainda que a ligação afetiva com a parceira não seja intensa As mulheres ao contrário não se sentem normalmente dispostas quando cansadas ou caso não exista ou tenha esfriado o afeto em relação ao parceiro Após o orgasmo os homens desinteressamse com maior rapidez que as mulheres também como regra geral Essas diferenças provavelmente se explicam pelas necessidades de sobrevivência da espécie humana O macho precisa estar pronto para espalhar sua herança genética sempre que a oportunidade se apresenta e uma vez inseminada a fêmea acabou sua participação na reprodução da espécie A fêmea por sua vez deve ser seletiva procurando receber apenas material genético de primeira ordem para garantir o aprimoramento da espécie e simplesmente todo o processo natural de gestação do novo ser iniciado com o ato sexual é tarefa exclusiva dela intransferível Claro que no atual estágio de evolução cultural do ser humano tais diferenças arquetípicas na comunicação sexual não são mais imprescindíveis à preservação da espécie E apesar delas ou mesmo em razão delas muitos casais alcançam a gratificação sexual Por fim a organização da vida Como o aumento da complexidade do cotidiano tem sido crescente encontrar alguém disposto a repartir as tarefas cada vez mais complicadas de organização da vida representa um enorme passo rumo ao tratamento racional dessa questão Casar é também dividir tarefas Antes da revolução dos costumes da segunda metade do século XX as incumbências de cada cônjuge na organização da vida estavam predefinidas segundo o sexo Ao homem cabiam tarefas como trabalhar fora e trazer o dinheiro para a casa defender a mulher e filhos nos conflitos mais sérios com estranhos bem como administrar os interesses gerais da família definindo o local da residência a marca do automóvel destino de viagem de férias orçamento para a redecoração da sala etc À mulher por sua vez cabia o trabalho doméstico incluindo cozinhar limpar a casa lavar passar guardar e costurar as roupas além do cuidado e educação dos filhos Cada um sabia assim de antemão na verdade desde pequeno quais eram suas responsabilidades no casamento Após a revolução dos costumes não há mais nada definido a priori Cada casal deve contratar a divisão das tarefas de organização da vida na medida em que lhes convier Se agirem de modo racional procurarão distribuílas segundo a melhor aptidão de cada um em proveito dos dois Se um dos cônjuges é mais competente que o outro para fazer compras de supermercado por exemplo ganham ambos se essa tarefa lhe for atribuída em contrapartida o outro cônjuge assumirá afazer diverso compatível com suas habilidades A repartição das tarefas de organização da vida hoje em dia tem sido feita de comum acordo dos cônjuges independentemente do gênero afastandose de maneira progressiva os antigos esquemas item 2 As três motivações para o casamento aqui apresentadas são autônomas Amar ter gratificação sexual e organizar a vida podem combinarse ou não Alguém pode amar uma pessoa mesmo sem ter por ela qualquer atração sexual Pode amar também ainda que não consiga conviver com a pessoa amada na mesma casa Por outro lado duas pessoas que se satisfazem sexualmente de forma intensa e completa não precisam necessariamente se amar Igualmente o entrosamento sexual não é garantia nenhuma de que poderiam organizar racional e eficientemente a vida em comum Por fim homem e mulher podem dividir e executar as tarefas do cotidiano de modo altamente satisfatório sem que se amem ou tenham o mínimo interesse sexual um pelo outro Não há receita ou fórmula de felicidade mas como é grande a busca por parceiro ou parceira em que convirjam as três motivações amar ter gratificação sexual e poder organizar adequadamente a vida com uma só e mesma pessoa é provável que nela esteja um dos seus segredos Pois bem afinal o que leva um homem e uma mulher a se casarem É a organização da vida Não o amor nem a gratificação sexual Olhando à volta as experiências concretas de casamento que conhece o estudioso dos conflitos de interesses e de sua superação suficientemente distanciado chega a essa conclusão Tanto assim que sobrevivem muitos casamentos mesmo depois do fim de qualquer admiração ou respeito entre os cônjuges e do menor resquício de atração sexual desde que a vida continue estruturada os dois continuem trabalhando e repartindo boa parte do salário e cada um deles cuidando de suas tarefas levar o automóvel ao conserto gerenciar os serviços domésticos fazer supermercado fazer a declaração do imposto de renda discutir com o vizinho contratar e fiscalizar a manutenção dos equipamentos eletrodomésticos levar e buscar os filhos na escola etc De outro lado quando o matrimônio não facilita o gerenciamento do cotidiano o amor e a libido não têm sido suficientes para manter unidos os cônjuges Se o marido desempregase deixa de trazer dinheiro para casa acovardase nos desentendimentos com a vizinhança não troca as lâmpadas queimadas ou a mulher não mais capricha na comidinha deixa de empilhar a roupa suja executa mal e porcamente a limpeza da casa é difícil que tudo fique bem só porque os dois se amam ou se entendem maravilhosamente na cama Amor e sexo são motivações insuficientes para o casamento Conheço histórias de casamentos desfeitos porque terminou o amor mas conheço muito mais histórias de casamentos que persistiram apesar do fim do amor porque cada esposo continuou a cumprir sua parte na divisão das tarefas São três as motivações associadas ao casamento amor gratificação sexual e organização da vida Essa última é a decisiva Inúmeros casamentos sobrevivem sem amor e sexo mas dificilmente se mantêm se os cônjuges não executam satisfatoriamente as tarefas cotidianas que lhes incumbem Por fim pode alguém objetar que a maternidade ou paternidade seria uma das fortes motivações do matrimônio No passado sem dúvida hoje não mais Atualmente ninguém precisa casar para engravidar ou criar filhos a medicina sabe como fazer e a sociedade não rejeita a família monoparental voluntária Assim sendo quem se casa com o objetivo de ter filho a rigor está preocupado com a organização da própria vida Sabe ou intui que a gratificante experiência de ser mãe ou pai não virá desacompanhada de acentuado aumento nas tarefas do cotidiano Casado terá com quem as dividir 2 A condição da mulher no casamento heterossexual Homens e mulheres são diferentes em vários aspectos Sob o ponto de vista biológico as diferenças são muitas Além das diferenças biológicas há outras de ordem psicológica e cultural Dessas diferenças resultam variadas habilidades normalmente associadas a cada gênero da espécie humana As mulheres executam com mais eficiência determinadas tarefas do que os homens e viceversa Mas tome cuidado o discurso politicamente correto do nosso tempo condena a mínima menção às diferenças naturais na identificação das habilidades de cada gênero Procura esse discurso atribuir a maior ou menor eficiência na execução de certa tarefa a exclusivos fatores culturais em uma palavra à repugnante ideologia machista Mas deitandoo ao largo podemse apontar habilidades normalmente associadas a cada um dos sexos Em geral os homens saemse melhor que as mulheres ao levar o carro ao conserto e as mulheres são mais eficientes que os homens na organização de malas de viagem Claro qualquer mulher pode ser muito eficiente no trato com o mecânico assim como qualquer homem consegue arrumar uma mala de modo satisfatório Não há nenhuma tarefa da qual um determinado gênero por definição esteja afastado Pelo contrário todos podem fazer tudo com eficiência Determinadas tarefas contudo costumam ser mais fáceis para o homem e outras para a mulher Machismo nenhum existe na identificação de diferentes habilidades entre os gêneros Existe na verdade na hierarquização delas A ideologia machista se manifesta na afirmação de que as tarefas normalmente associadas ao homem são de importância superior às da mulher Dizer que os homens em geral têm mais facilidade com a instalação de programas no computador caseiro que as mulheres e que essas se viram melhor no gerenciamento da despensa doméstica não tem nada de preconceituoso O preconceito existe na afirmação de que instalar programas em computadores seria mais importante que gerenciar a despensa ou viceversa A preocupação do discurso politicamente correto é plenamente compreensível A ideologia da supremacia do homem é das mais antigas e só recentemente tem cedido aos valores da igualdade de gêneros mesmo assim a muito custo Um dos indicadores da forte presença dessa ideologia mas também de como ela temse enfraquecido nos últimos anos podese encontrar nos desenhos animados Quando eu era criança dois cartoons da HannaBarbera faziam enorme sucesso na televisão os Flintstones e os Jetsons Os Flintstones era ambientado na Idade da Pedra e os Jetsons no futuro Apesar do extraordinário distanciamento no tempo em que estavam ambientados os cartoons a estrutura familiar nos dois era a mesma o homem trabalhando fora e a mulher se desincumbindo das tarefas domésticas Tanto Fred Flintstones como George Jetson eram empregados descontentes com seu trabalho mas plenamente confortáveis na distribuição das tarefas de organização da vida com suas mulheres Vilma e Jane A eles cabia cuidar do animal da casa Fred toda noite tentava levar Dino ao quintal e George passeava com Astor na esteira rolante do prédio em que morava O resto era da exclusiva responsabilidade das mulheres Jane costumava reclamar de ter que apertar tantos botões para pôr em funcionamento máquinas fabulosas de lavar passar guardar limpar e cozinhar Não me lembro de Vilma reclamando de nada mas os pequenos dinossauros e outros animais que faziam as vezes de utilidades domésticas eram bastante reclamões Penso que a queixa de Jane só servia para ridicularizar a das mulheres reais daquele tempo que em sua maioria ao contrário das mães e avós delas podiam já contar com muitos aparelhos elétricos a facilitar o dia a dia e que o queixume dos animais usados como utilidades domésticas por Vilma sugeriam algo semelhante as mulheres tinham menos direito de reclamar que os eletrodomésticos De qualquer forma a mensagem tinha clareza solar a estrutura da família predominante na sociedade norteamericana até os anos 1960 era imutável existia desde o início e existiria para sempre A ideologia machista começou a declinar com o considerável aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho e a revolução dos costumes que o acompanhou A indesculpável diferença de salários pagos pelo mesmo trabalho a homens e mulheres ainda persiste em muitas economias capitalistas inclusive algumas das centrais mas é inegável que os valores de igualdade de gênero vêm penetrando a cultura e encurralando o machismo A mudança é notável mais uma vez nos desenhos animados Quem compara a produção de longasmetragens animados dos estúdios Disney o percebe com facilidade Enquanto Branca de Neve 1937 Cinderela 1950 e a bela adormecida Aurora 1959 são mulheres passivas totalmente dependentes do homem que amam Ariel 1989 Bela 1991 e Mulan 1998 são decididas sabem muito bem o que querem da vida e perseguem seus objetivos com as próprias forças conquistando na passagem o coração de seu bemamado A mudança na condição da mulher em relação ao casamento foi significativa com o surgimento da família contemporânea Compare a história de duas entertainers Carmem Miranda que viveu de 1909 a 1955 antes portanto da revolução dos costumes e Maria da Graça Meneghel a Xuxa nascida em 1963 em plena revolução Os biógrafos dizem que Carmem queria muito ser mãe mas não poderia realizar esse sonho se não fosse casada No tempo em que viveu certamente sofreria prejuízos irrecuperáveis em sua carreira artística se acaso engravidasse solteira Submeteuse então a um casamento estranho e infeliz para poder ser mãe mas não conseguiu ter filho Xuxa por sua vez é mãe solteira fato que em absolutamente nada atrapalha sua profissão Pelo contrário a gravidez e maternidade até ajudaram a atrair legitimamente mais a atenção da imprensa e dos fãs para o seu trabalho Um dos objetivos do casamento é a repartição das tarefas afetas à organização da vida cada vez mais complexas Até a revolução dos costumes dos anos 1960 a repartição era feita de acordo com a ideologia machista que reservava às mulheres todas as tarefas afetas à casa incumbindo ao marido a de prover o dinheiro Atualmente cada vez mais a repartição tem sido feita levando em consideração as aptidões de cada cônjuge Homens e mulheres se casam como visto para organizar suas vidas Dividir as tarefas domésticas de modo eficiente é a principal razão do casamento A eficiência pressupõe a divisão segundo as capacitações de cada um No passado quando a estrutura familiar era mais simples as tarefas estavam divididas de antemão cabendo ao homem prover dinheiro definir o domicílio da família e impor os castigos mais severos aos filhos desobedientes e à mulher cozinhar lavar passar costurar limpar a casa cuidar dos filhos e educálos Hoje em dia a divisão atende às conveniências de cada casal Se é mais fácil que o homem vá levar e buscar os filhos na escola cozinhar ou fazer o supermercado são dele essas tarefas se uma mulher tem mais facilidade que o seu marido para negociar o contrato de locação levar o carro ao conserto e fazer a declaração do imposto de renda cabe a ela cuidar desses assuntos Se afinal o que se busca é a eficiência no trato das coisas do dia a dia em proveito dos dois e dos filhos de nada valem os parâmetros de antanho na divisão de tarefas entre marido e mulher O que interessa é respeitar as habilidades que cada cônjuge revela possuir Esqueça o amor e a gratificação sexual o segredo dos casamentos duradouros não necessariamente felizes é a divisão racional das tarefas domésticas com respeito à individualidade dos cônjuges 3 Premissas fundamentais do casamento Para casarse a pessoa precisa ser capaz e estar desimpedida Essas são as premissas fundamentais A capacidade e o desimpedimento não se confundem Na primeira tem relevância o fator da idade dos nubentes As condições em que o casamento pode ocorrer variam segundo tenham já alcançado a idade núbil e a maioridade subitem 31 Os impedimentos por sua vez estão relacionados a fatores diversos alguns biológicos outros jurídicos Visam impedir o casamento conflitante com valores que o ser humano cultiva desde tempos imemoriais subitem 32 Ao lado das premissas fundamentais da capacidade e dos impedimentos situamse as causas suspensivas que obrigam aos nubentes a adoção do regime de separação de bens subitem 33 31 Capacidade A capacidade para o casamento é regida por normas específicas Relembrando a capacidade civil se inicia aos 18 anos Até fazer 16 a pessoa é absolutamente incapaz e sua vontade é em tudo irrelevante para a prática em nome dela de negócios jurídicos Basta a dos pais que no exercício do poder familiar a representa A partir do 16º aniversário a incapacidade é relativizada Embora a pessoa necessite ainda da assistência dos pais contra sua vontade já não se podem mais praticar negócios jurídicos em nome dela CC art 1634 V Em síntese para a prática de negócio jurídico em nome de menor absolutamente incapaz basta a vontade dos pais se o menor é relativamente incapaz é necessária a convergência das vontades dele e dos pais E a capacidade para o casamento Ela vem definida assim o homem e a mulher com dezesseis anos podem casar exigindose autorização de ambos os pais ou de seus representantes legais enquanto não atingida a maioridade civil CC art 1517 e não será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil art 1520 Em outros termos até completar 16 anos ninguém pode se casar nem mesmo com autorização do juiz Entre os 16 e 18 anos é necessária a convergência de vontade da pessoa que pretende se casar e de seus pais A diferença nesse último caso em relação à regra geral é meramente de forma os pais não assistem mas autorizam o ato Em termos substanciais não há diferença já que contra a vontade do menor relativamente incapaz ou de seus pais não haverá casamento como não pode haver qualquer outro negócio jurídico A autorização deve ser dada pelo titular ou titulares do poder familiar CC art 1634 III Se vivos os dois pais devem ambos concordar em expedila Havendo divergência qualquer um deles pode requerer ao juiz que a resolva CC art 1631 parágrafo único Tratase em princípio de ato discricionário O pai ou mãe pode conceder ou recusar a autorização em função exclusivamente do que pensam ser melhor ao filho Não há necessidade de motivação Denegada a autorização pelos pais ou por um deles o menor pode requerer ao juiz o suprimento Fala a lei em injustiça da denegação como fundamento para o juiz suprir o consentimento CC art 1519 o que confere ao Poder Judiciário ampla margem para atuação Se o juiz a quem couber julgar a demanda autorizasse o casamento de seu próprio filho se ele estivesse na mesma situação do requerente então terá sido injusta a recusa de autorização dos pais Caso contrário se o juiz colocandose na mesma situação daqueles pais também não autorizasse o filho a casarse então foi justa a denegação Até a celebração do casamento a autorização é revogável A revogação é também ato discricionário O pai ou mãe pode retirar sua concordância com o casamento se o fizer até a celebração sempre que entender que o passo não corresponde ao melhor para seu filho Como a motivação não é exigível na concessão também não se a exige para revogar Sendo injusta a revogação porém pode o menor requerer o suprimento da autorização Obtido poderá inclusive demandar perdas e danos contra aquele que havia dado o consentimento e posteriormente o retirou indevidamente Quando vivo um dos pais somente ele exerce sozinho o poder familiar Também no caso de ter sido um deles destituído desse poder cabe ao outro com exclusividade seu exercício A autorização para o casamento nesses casos é evidentemente do único titular do poder familiar É irrelevante se o destituído concorda ou discorda do casamento do filho sendo suficiente a aquiescência do outro Quando mortos os dois pais cabe ao tutor decidir se autoriza o matrimônio do menor Eventualmente a faculdade é titulada pelo curador se for um dos pais interdito e o juiz lhe tiver dado esse poder Nessas hipóteses todas o consentimento é suprível pelo juiz quando injusto e se tiver sido dado pode ser revogado até a celebração Até os 16 anos ninguém pode se casar nem mesmo com autorização judicial A partir dos 16 anos a pessoa tem capacidade para se casar mas enquanto não alcançar a maioridade 18 anos necessita da autorização do titular do poder familiar tutor ou curador Enquanto não alcançada a idade núbil quer dizer até os 16 anos o casamento simplesmente não pode ocorrer Os adolescentes não possuem maturidade psicológica suficiente para tomar o sério passo da união matrimonial Não raras vezes faltamlhes igualmente recursos materiais para os compromissos correspondentes Até 2019 o direito positivo admitia a autorização judicial para o casamento de pessoas sem idade núbil que só podia ser concedida em duas únicas hipóteses delineadas pela norma legal para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez O casamento no passado era causa de extinção de punibilidade de crimes contra os costumes como o de estupro corrupção de menores e outros CP arts 213 a 218 Se o rapaz de 18 estupra a menina de 14 anos comete crime punível com reclusão de 6 a 10 anos O casamento deles no entanto até 2005 extinguia a punibilidade do ilícito livrando o estuprador da pena Ao invés de proteger a vítima a regra penal protegia o criminoso Isso porque a menina era pressionada com a indispensável conivência dos pais a se casar antes da idade núbil só para poupar seu algoz da pena A extinção da punibilidade nesses casos era um resquício odioso de um tempo em que o defloramento da mulher antes do casamento causavalhe negativas consequências sociais entre as quais a extrema dificuldade de encontrar esposo A menina estuprada então era coagida a se casar com o próprio estuprador vinculandose matrimonialmente ao agressor para não ficar sozinha o resto da vida A gravidez era o outro fundamento para a autorização judicial do casamento antes da idade núbil Partia a lei do pressuposto de que o casamento seria a melhor alternativa para todos inclusive para o bebê que estava a caminho A supressão pela Lei n 1381119 do casamento antes da idade núbil mediante autorização judicial mesmo em caso de gravidez corrigiu mais uma aparente proteção jurídica que servia na verdade apenas como forma de pressão familiar e social A gravidez prematura por si só certamente irá marcar a vida dos jovens pais eles terão a adolescência abreviada poderão sofrer prejuízos na formação profissional sem falar de danos psicológicos e sociais Se forem ainda mais forçados ao casamento prematuro isso poderá agregar mais efeitos negativos que positivos ao já delicadíssimo quadro que a gravidez ocasionou Antigamente não havia mesmo muito a ponderar se engravidou o melhor era casar devendo a lei se ocupar dessa situação Nos dias de hoje entretanto é real a alternativa de os jovens se desincumbirem de suas precoces responsabilidades de pais sem necessariamente estarem casados 32 Impedimentos Não basta ser maior ou ter idade núbil para a pessoa se casar É necessário ainda que ela esteja desimpedida Com os impedimentos objetiva a lei compatibilizar o casamento com valores cultivados pela espécie humana alguns deles desde a préhistória como a proibição do incesto Outros valores da sociedade ocidental de raízes europeias como a monogamia também são prestigiados pelas normas sobre impedimentos matrimoniais Estão impedidos de se casarem CC art 1521 a Pessoas casadas Quem porta o estado civil de casado não pode casarse com mais ninguém Também o separado judicialmente sob a égide do direito vigente antes da EC n 662010 está sujeito ao mesmo impedimento porque apenas o divórcio ou o falecimento do cônjuge põe fim ao casamento válido CC art 1571 1º Para se casar assim a pessoa deve ter um de três estados civis solteiro divorciado ou viúvo Esse impedimento se enraíza no primado da monogamia Na cultura predominante no Brasil ninguém pode ligarse por vínculo de conjugalidade a mais de uma pessoa do sexo oposto A ordem jurídica espelha esse forte traço cultural o desrespeito a esse impedimento é criminalizado bigamia é crime punido com reclusão de 2 a 6 anos CP art 235 b Ascendentes com descendentes Pais e filhos avós e netos não podem casarse O direito brasileiro reproduz nesse impedimento um dos aspectos da ancestral proibição do incesto Trata se da primeira lei adotada pela espécie humana A vedação de relações sexuais entre ascendentes e descendentes era uma forma de garantir a diversidade genética fator essencial à melhor capacitação de homens e mulheres no enfrentamento da seleção natural Cedo arraigouse na cultura dos povos primitivos Hoje com ampla acessibilidade aos métodos contraceptivos o incesto na linha reta permanece vedado em vista dos enormes danos psicológicos e sociais que a relação sexual entre pais e filhos pode ocasionar nesses últimos Por essa razão inclusive é que o impedimento alcança também a hipótese de filiação não biológica Sendo natural ou civil o parentesco ascendentes e descendentes não podem casarse c Irmãos e o adotado com o filho do adotante Os irmãos estão impedidos de se casarem independentemente do vínculo de parentesco existente entre eles Irmão e irmã não se casam sejam filhos dos mesmos pais bilaterais ou tenham só o pai ou a mãe em comum unilaterais sejam filhos biológicos ou adotados d Parentes colaterais de terceiro grau Para se casarem tio e sobrinha ou tia e sobrinho precisam passar por exame de saúde prévio feito por dois médicos nomeados pelo juiz competente para a habilitação O casamento poderá acontecer se atestada a inexistência de inconvenientes sob o ponto de vista da saúde dos nubentes e dos filhos que possam ter DecLei n 320041 arts 1º a 3º Uma vez mais a preocupação da lei ecoa a incessante busca da diversidade genética da espécie humana Os parentes colaterais de terceiro grau provêm de tronco comum mas não descendem uns dos outros nem dos mesmos pais Essas circunstâncias biológicas e mais a da separação por três gerações entre os nubentes reduzem os riscos que a pequena diversidade genética representa à perpetuação da espécie Daí a admissibilidade do casamento quando não existirem óbices de ordem médica e Parentes afins em linha reta o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem foi cônjuge do adotante O casamento e o estabelecimento de união estável vinculam cada cônjuge e companheiro com os parentes do outro É o parentesco por afinidade Genro ou nora e os sogros são parentes afins assim como os cunhados Também são parentes afins o marido e os filhos exclusivos da mulher bem como a mulher e os filhos exclusivos do marido Padrasto e madrasta são portanto afins do filho de seu cônjuge ou companheiro O impedimento guarda remota relação com a proibição do incesto no plano simbólico na medida em que o matrimônio fazia dos sogros uma espécie de segundos pais na língua inglesa a tradição é evidenciada nas designações do vínculo father in law mother in law brother in law etc Padrasto e madrasta são igualmente uma espécie de segundos pais Não vai além da linha reta o impedimento no parentesco afim Quer dizer o viúvo podese casar com a irmã da falecida a divorciada com o irmão de seu exmarido e assim por diante Nas relações verticais o matrimônio é sempre impedido Quem já foi casado com a mãe não pode desposar a filha nem a neta quem já foi esposa do filho não pode se casar com o pai ou o avô o adotado não pode casarse com quem já foi cônjuge do adotante nem o adotante podese casar com quem foi cônjuge do adotado O impedimento dos parentes afins em linha reta persiste mesmo depois do fim do casamento ou da união estável de que se originou o parentesco CC art 1595 2º f Cônjuge sobrevivente com o condenado pelo homicídio ou tentativa de homicídio do consorte Por fim se um dos cônjuges ou companheiros tiver sido vítima de homicídio ou de tentativa de homicídio a condenação penal imposta ao autor faz surgir novo impedimento O cônjuge ou companheiro supérstite está impedido de se casar com o condenado Para que se constitua o impedimento é indispensável que tenha sido doloso o crime Tratase de norma visando o desencorajamento do assassinato do esposo ou esposa combinado entre o cônjuge e pessoa com quem pretende se ligar quando enviuvar A lei ao frustrar o objetivo colimado contribui para desestimular o crime São impedidos de casar a as pessoas em estado civil de casadas ou separadas b pais e filhos naturais ou adotivos c irmãos germanos ou unilaterais inclusive se um deles ou os dois forem adotados d tio e sobrinha ou tia e sobrinho salvo se não houver inconveniente do ponto de vista da saúde deles e da prole e parentes afins na linha reta bem como o adotado com quem já foi cônjuge do adotante e o adotante com quem já foi cônjuge do adotado f o cônjuge sobrevivente com o condenado pelo homicídio ou tentativa de homicídio contra o antigo consorte quando doloso o crime Os impedimentos podem ser suscitados por qualquer pessoa capaz até o momento da celebração do casamento CC art 1522 Aliás a cerimônia deve obrigatoriamente realizarse a portas abertas art 1534 para que qualquer pessoa tenha acesso ao local em que o casamento é celebrado e possa levar ao conhecimento do celebrante o impedimento de que tem notícia A legitimação para a oposição do impedimento é ampla porque interessa a toda a sociedade e não somente aos parentes mais próximos dos noivos que o casamento impedido não se realize A apresentação da oposição fundada em impedimento porém é uma faculdade das pessoas em geral que podem ou não exercêla Já o juiz ou o oficial de registro se tiverem conhecimento de uma causa impeditiva do casamento são obrigados a declarála art 1522 parágrafo único É nulo o casamento que se realizar apesar do impedimento subitem 71 33 Causas suspensivas Causas suspensivas são as que impedem a livre escolha pelos nubentes do regime de bens do casamento Nas hipóteses arroladas pela lei o casamento só pode realizarse no regime de separação de bens CC art 1641 I Não há impedimento nem obstáculo de outra natureza à celebração do matrimônio Mas os bens dos cônjuges adquiridos antes e depois do casamento não se comunicam pelo menos enquanto pender a causa suspensiva São quatro as hipóteses a o viúvo ou a viúva que tiver filhos do cônjuge falecido enquanto não for feito o inventário e partilha dos bens deste b o divorciado enquanto não homologada ou decidida a partilha dos bens relativos ao casamento anterior c o tutor ou o curador e os seus descendentes ascendentes irmãos cunhados ou sobrinhos com a pessoa tutelada ou curatelada enquanto não tiverem sido aprovadas as contas devidas ao término da tutela ou curatela d a viúva ou mulher cujo casamento se desconstituiu por nulidade ou foi anulado até 10 meses depois do começo da viuvez ou da dissolução da sociedade conjugal CC art 1523 As três primeiras causas suspensivas acima indicadas destinamse a evitar a confusão patrimonial Se o divorciado por exemplo pudesse casarse em regime de comunhão antes de partilhados os bens que tinha em comum com o excônjuge isso poderia dificultar a identificação do patrimônio deste e do novo cônjuge Daí a obrigatoriedade do regime de separação O juiz pode liberar os nubentes da restrição imposta por essas causas suspensivas diante da prova de inexistência de prejuízo para o herdeiro letra a o excônjuge letra b e a pessoa tutelada ou curatelada letra c Quer dizer se o sujeito cujos interesses a lei quer amparar claramente não está exposto ao risco de danos com o casamento sob o regime da comunhão então não há razões para obrigar o da separação Liberada a restrição os nubentes podem escolher livremente o regime do casamento A última causa suspensiva das indicadas acima letra d destinase a evitar a chamada confusão de sangue Casandose a viúva ou a mulher cujo casamento foi invalidado logo em seguida ao falecimento do cônjuge ou dissolução da sociedade conjugal e vindo a dar à luz criança nos nove meses seguintes poderiam restar dúvidas sobre a paternidade do rebento Tratase de mais uma velharia da lei Com o exame de ADN DNA a possibilidade de confusão de sangue está totalmente descartada não havendo por que a ordem positiva continuar a se preocupar com a hipótese De qualquer modo provando a nubente que antes de vencido o prazo de dez meses nasceu o filho e portanto presumese pai o seu antigo consorte ou não existe gravidez ela poderá casarse no regime da comunhão Ao contrário do impedimento que pode ser suscitado por qualquer pessoa capaz na medida em que interessa a toda a sociedade que o casamento impedido não seja realizado no tocante às causas suspensivas o bem jurídico tutelado diz respeito a interesse individual Por isso só tem legitimidade para arguir as causas suspensivas os parentes em linha reta e os colaterais em segundo grau de qualquer dos nubentes consanguíneos ou afins CC art 1524 Ou seja só podem oporse ao casamento no regime de comunhão de bens nas hipóteses delineadas pelas causas suspensivas os ascendentes descendentes de qualquer um dos noivos os ascendentes e descendentes do excônjuge deles assim como os irmãos e cunhados Suscitada a causa suspensiva se os nubentes haviam optado pelo regime de comunhão para casarem devem alterálo para o da separação Se o casamento realizarse no regime de comunhão a despeito da causa suspensiva a comunicabilidade dos bens não produzirá efeitos perante os sujeitos cujos interesses a lei pretende resguardar os mencionados no parágrafo único do art 1523 As causas suspensivas impedem que o casamento se realize em outro regime de bens que não o da separação Com a cessação da causa suspensiva o regime do casamento continua a ser o da separação Ele só se converte no de comunhão se os nubentes solicitarem ao juiz com base no art 1639 2º do CC Cap 57 item 5 4 Constituição do vínculo conjugal O casamento segundo os costumes predominantes no meio urbano brasileiro do nosso tempo tem início com a cantada No bar festa escola ponto de ônibus ou qualquer outro lugar ele ou ela toma a iniciativa de revelar ao outro o seu interesse em vivenciar um relacionamento mais íntimo A cantada pode dar certo ou não Curiosamente para que funcione não precisa ser original ou inteligente Se a pessoa a quem é endereçada se interessa também na vivência da intimidade sugerida ela o comunicará de algum modo Quer dizer a cantada pode ser a mais usual e tola algo como sonhei com você ontem sabia que o essencial da mensagem quero ficar com você de modo mais íntimo foi transmitido De outro lado a mais criativa espirituosa e sensível cantada que alguém pode engendrar não irá surtir efeito nenhum se dirigida a quem não tiver qualquer interesse no relacionamento de maior intimidade com quem cantou Por isso é tolice perscrutar novas abordagens quem faz a cantada mais estúpida e manjada que existe se a fizer para quem tem igual desejo de aproximação alcançará o objetivo quem se esmera numa cantada nova se a endereçar a quem não entusiasma a ideia da aproximação perderá seu tempo Quando a cantada funciona ele e ela vivenciarão um relacionamento mais íntimo Se esta vivência for o único interesse de pelo menos um deles logo mais o laço é desfeito e cada um procura novos parceiros ou parceiras Mas se os dois quiserem experimentar não só o aumento da intimidade mas também um relacionamento mais estável terá início um período de convivência estreita Esse período é chamado de compromisso namoro ou noivado conforme o desejo dos diretamente interessados mais ou menos atentos a certas convenções ou rituais cultivados pela sociedade Compromisso e namoro têm seus códigos que variam segundo a idade e condição social ou cultural dos compromissados ou namorados De comum notase certa publicidade do relacionamento maior frequência do convívio social e em geral fidelidade exclusividade sexual O noivado por sua vez seguese ao compromisso ou namoro e é cercado de determinados símbolos anel na mão direita festa específica organização da futura vida em comum etc destinados a tornar pública a decisão dele e dela de virem a se casar Certas obrigações do casamento já são assumidas pelos noivos como a fidelidade e amparo mútuo Dizem que esses períodos de convivência mais estreita têm o objetivo de possibilitar a cada um dos interessados conhecer melhor o seu parceiro ou parceira para que possa decidir com mais informações se o casamento vale a pena Na verdade o que se aprende nesses períodos é como conviver com quem se escolheu A decisão de casar ou não na maioria dos compromissos namoros ou noivados já havia sido adotada de antemão muitas vezes na hora de fazer ou responder à cantada Antes de se casarem no meio urbano brasileiro costumam os nubentes vivenciar relacionamento mais íntimo por algum tempo Segundo as convenções sociais esse relacionamento pode ser um compromisso namoro ou noivado e corresponde a período em que os interessados procuram aprender como conviver um com o outro O processo de casamento civil compreende duas etapas a habilitação subitem 41 e a celebração subitem 42 Essa última é gratuita por força de preceito constitucional e legal CF art 226 1º CC art 1512 Já a habilitação não o é em regra assegura porém a lei às pessoas pobres a isenção das custas correspondentes bem como do registro e da primeira certidão art 1512 parágrafo único 41 Habilitação O homem e a mulher que decidem casarse devem procurar o Cartório de Registro Civil da circunscrição do domicílio de qualquer um deles levando os seguintes documentos a certidão de nascimento ou equivalente b se um deles ou os dois forem menores a autorização por escrito dos pais ou responsáveis ou o suprimento judicial c declaração de duas pessoas maiores parentes ou não que conheçam os nubentes e possam afirmar a inexistência de impedimentos d declaração do estado civil domicílio e residência dos nubentes e de seus pais e certidão de óbito do cônjuge falecido sentença declaratória de nulidade ou anulação de casamento transitada em julgado ou de registro da sentença de divórcio CC art 1525 Os nubentes na maioria das vezes comparecem pessoalmente ao cartório mas a lei permite que um deles seja representado por procurador ou os dois Com o requerimento por escrito dos nubentes tem início o processo de habilitação para o casamento O oficial do registro confere a documentação e se nada nela indicar a existência de impedimento providenciará o edital chamado de proclamas Nos quinze dias seguintes o edital ficará afixado nos cartórios correspondentes às circunscrições dos domicílios dos dois pretendentes e será publicado pela imprensa local se houver CC art 1527 O objetivo de tais formalidades é espalhar a notícia da intenção dos noivos de se casarem de modo que possa chegar aos ouvidos de quem possa ter conhecimento de fator impeditivo do enlace Claro que isso não acontece de fato Quando alguém se apresenta ao cartório para noticiar impedimento é porque ficou sabendo da vontade dos noivos por outros meios e não porque tenha o hábito de ler proclamas A oposição é feita por escrito pelo legitimado que a instruirá com as provas do que alegar ou indicação de onde podem ser conseguidas CC art 1529 Seu fundamento será a existência de impedimento ou de causa suspensiva Apresentada a oposição o oficial dará ciência dela aos nubentes mediante a entrega da nota da oposição instrumento em que são indicados os fundamentos as provas e o nome de quem a ofereceu art 1530 Têm então os nubentes o prazo de três dias para indicarem as provas que pretendem produzir com vistas a demonstrar a inconsistência da oposição Se necessitarem de maior prazo poderão requerer a dilação Os autos da habilitação com a oposição e a indicação das provas a produzir pelos nubentes são remetidos então ao juízo Depois da dilação probatória e da oitiva do Ministério Público o juiz decidirá declarando a pertinência da oposição e a existência do impedimento arquivando a habilitação ou sua inexistência Lei n 601573 art 67 5º Se a oposição dizia respeito a causa suspensiva e tiver sido acolhida o juiz determina a adoção do regime da separação de bens O casamento compreende duas etapas sendo a primeira a da habilitação Nela após o requerimento dos noivos o oficial do registro civil providencia a publicação dos proclamas mediante a afixação do edital nos cartórios das circunscrições dos domicílios dos dois pretendentes e publicação pela imprensa se houver Também na fase de habilitação podemse processar as oposições fundadas em impedimento ou causa suspensiva Se não houve oposição ou se o processo não tiver sido arquivado em razão de impedimento ele terá prosseguimento com a manifestação do Ministério Público CC art 1526 Em seguida o oficial certifica a habilitação dos nubentes tão logo transcorrido sem oposição o prazo dos proclamas art 1531 e expede a correspondente certificação Rodrigues 20043233 Se houve impugnação a habilitação é submetida ao juiz art 1526 parágrafo único A certidão de habilitação tem eficácia por noventa dias período em que deverá ser celebrado o casamento CC art 1532 Ultrapassado esse prazo sem a celebração os noivos devem recomeçar o processo 42 Celebração Munidos da certidão de habilitação os noivos devem requerer a celebração do casamento ao oficial de registro CC art 1533 Diz a lei que a celebração ocorre na sede do cartório no dia e hora designados pelo celebrante mas isso quase nunca acontece Na expressiva maioria das vezes ele é celebrado no dia hora e lugar da conveniência dos noivos À solenidade devem estar presentes os noivos ou seus procuradores com poderes especiais as testemunhas duas se acontece na sede do cartório ou quatro se em outro lugar ou se os noivos não sabem ou não podem escrever o oficial do registro e o celebrante Esse último também chamado de presidente do ato é o juiz de paz ou de casamento O prédio em que tem lugar a cerimônia deve permanecer de portas abertas de modo a não obstar o acesso de qualquer pessoa portadora eventualmente de notícia de impedimento Note que o preceito que determina a permanência em aberto das portas do prédio ultimamente não tem sido cumprido à risca nos centros urbanos por motivos ditados pela segurança pública Se alguém provar ter sido obstado propositadamente em seu acesso ao local da cerimônia razão pela qual não pôde apresentar a tempo o impedimento será nulo o ato Não havendo porém impedimento não se declara nulo o casamento tão só pela circunstância de estarem cerradas as portas do prédio em que se realizou a celebração A cerimônia da celebração compreende algumas falas sacramentais De início o celebrante indaga aos nubentes se pretendem se casar por livre e espontânea vontade A resposta afirmativa deve ser clara e segura para que possa prosseguir a cerimônia O celebrante tem a obrigação legal de suspendêla imediatamente se qualquer dos nubentes recusarse a dizer solenemente sua vontade de casar declarar que ela não é livre e espontânea ou manifestar arrependimento Não se admite a retratação do noivo que tiver dado causa à suspensão da cerimônia no mesmo dia Quer dizer uma vez suspensa a solenidade só poderá ser reiniciada no dia seguinte Veja que não exige a lei o transcurso de prazo mínimo em horas bastando que o prosseguimento da cerimônia aconteça depois da meianoite do dia em que teve início e foi suspensa Note que mesmo tendo a inesperada atitude do contraente nítido caráter jocoso a cerimônia não poderá ter sequência para que não paire a menor dúvida sobre a liberdade e espontaneidade da vontade nela manifestada pelos noivos Diante da segura resposta afirmativa dos dois o celebrante pronunciará de acordo com a vontade que ambos acabais de afirmar perante mim de vos receberdes por marido e mulher eu em nome da lei vos declaro casados CC art 1535 Ao determinar que o celebrante se dirija aos noivos na segunda pessoa do plural enquanto pronuncia a fórmula sacramental a lei acentua a solenidade do ato A partir dessa declaração de quem preside a celebração que pressupõe a prévia afirmativa dos nubentes considerase consumado o casamento e constituído o vínculo matrimonial art 1514 A cerimônia do casamento que deve ocorrer num prédio de portas abertas é marcada por algumas falas sacramentais Depois de cada contraente manifestar de modo claro sua livre e espontânea vontade de casar o celebrante os declara solenemente casados Proferidas essas falas o ato está consumado Em seguida é lavrado o assento que deve ser assinado pelo oficial do registro celebrante testemunhas e cônjuges Dele constarão os elementos previstos em lei como a identificação e qualificação dos esposos seus pais testemunhas dos respectivos cônjuges anteriores se houver além das datas da publicação dos proclamas e da celebração do casamento e o regime de bens adotado CC art 1536 O assentamento é formalidade de natureza meramente probatória exceto quando destinado a conferir efeitos civis à cerimônia religiosa quando tem força constitutiva Gonçalves 200588 43 Ritos especiais O processo descrito nos subitens anteriores é o do casamento em sua forma ordinária usual A lei trata de algumas situações especiais em que a habilitação e celebração não se realizam por essa forma São elas a Casamento religioso com efeitos civis No Brasil monárquico as pessoas se casavam exclusivamente na Igreja Católica ou a partir de 1863 noutra religião professada pelos noivos e não existia a figura do casamento civil Um dos primeiros atos da República foi instituílo A tradição até hoje é a do casamento tanto no civil como no religioso A lei reconhece efeitos civis à celebração do casamento religioso Não dispensa no entanto a habilitação feita no âmbito do Registro Civil e homologada pelo juiz São duas as hipóteses em que a celebração do casamento religioso tem o efeito de dispensar a solenidade civil Na primeira a cerimônia religiosa acontece antes da expedição da certidão de habilitação Os nubentes declaram a vontade de se casarem perante o celebrante religioso padre pastor rabino babalorixá etc no contexto do ritual adotado pela respectiva religião Uma vez expedida a certidão de habilitação e no prazo de sua eficácia os noivos exibem ao cartório o documento expedido pela entidade religiosa atestando a realização da cerimônia CC art 1516 2º Na segunda a cerimônia religiosa realizase após a expedição da certidão de habilitação Nos noventa dias seguintes à celebração o celebrante ou qualquer interessado comunica sua realização ao Registro Civil art 1516 1º Note que é indiferente nesse caso quanto tempo medeia a conclusão do processo de habilitação e a cerimônia religiosa Esta pode ser celebrada muito tempo depois de vencido o prazo de eficácia da certidão O que interessa à lei é o tempo decorrido entre a cerimônia religiosa e a comunicação ao Registro Civil que não pode ser maior que noventa dias Se ultrapassado esse prazo os noivos devem requerer nova habilitação Nesse caso estáse diante a rigor da hipótese anterior de eficácia civil da cerimônia religiosa em que ela antecede à habilitação civil Aplicase então o art 1516 2º do CC Veja que para fins jurídicos os noivos interessados em manter eficaz a habilitação feita até poderiam optar por nova cerimônia religiosa já que à lei importa o lapso decorrido entre a data da sua realização e a da comunicação mas essa alternativa tende a agredir a consciência religiosa deles porque ela sugere a inexistência do vínculo matrimonial antes da repetição da solenidade Nas duas hipóteses em que a lei atribui efeitos civis à cerimônia religiosa do matrimônio consideramse casados os nubentes na data da celebração CC art 1515 Desse modo a menos que houvesse algum impedimento à época em que ocorreu a celebração a validade do casamento religioso equivale plenamente à do civil b Casamento em caso de moléstia grave Se um dos nubentes cai doente e fica impedido de comparecer ao local designado para a celebração ou teme não sobreviver até sua data autoriza a lei que o celebrante ou seu substituto legal vá ao encontro dele para na presença do outro contraente e de duas testemunhas que saibam ler e escrever consumar o ato Se o oficial do registro puder comparecer levará consigo o livro de assentos Colhida a livre e espontânea declaração de vontade dos noivos e pronunciada a fórmula sacramental é lavrado o assento Se o oficial de registro não estiver presente o celebrante nomeará alguém para a função de escrever o termo numa folha avulsa o qual deve ser registrado na presença de duas testemunhas nos cinco dias seguintes CC art 1539 Em princípio essa forma especial de casamento pode ser adotada apenas se já estiver homologada a habilitação A lei não faz nenhuma ressalva expressa nesse sentido mas ao dispor sobre o tema no capítulo relativo à celebração sugere que a primeira fase do casamento deve estar já concluída Se ocorrer no entanto de as circunstâncias recomendarem a urgente celebração do matrimônio antes mesmo da expedição da certidão de habilitação o juiz de direito se provocado poderá posteriormente validar o ato Imagine que tivesse sido chamada a autoridade religiosa em vez do juiz de paz Aquele poderia fazer como visto acima uma celebração inteiramente válida e eficaz a despeito da instauração ou do andamento do processo de habilitação Não é compatível com o princípio constitucional da isonomia que não se reconheçam iguais validade e eficácia ao ato presidido pela autoridade civil nas mesmas condições c Casamento nuncupativo Também conhecido como casamento in extremis ou in articulo mortis tem lugar quando um dos contraentes se encontra em iminente risco de vida Foi baleado vitimouse num acidente de trânsito acometeulhe mal súbito em suma por qualquer razão um dos noivos se encontra num estado em que é provável sua morte em poucas horas Se não houver tempo de chamar o celebrante mas estando presente o outro nubente ou procurador deste o casamento pode realizarse na presença de seis testemunhas Elas não podem ser parentes de nenhum dos nubentes na linha reta ou colateral até segundo grau para que tenha validade o casamento Os noivos então declaram em viva voz daí a designação de nuncupativo que se recebem por marido e mulher livre e espontaneamente Nos dez dias seguintes as testemunhas devem comparecer perante o juiz de direito para confirmarem que atenderam ao chamado de uma pessoa que parecia estar em perigo de vida mas em seu juízo e que presenciaram o fato de ela e o outro nubente enunciarem de forma oral a vontade de se casarem Se uma ou mais delas não comparecer espontaneamente qualquer interessado pode requerer sua intimação ao juiz Tomadas por termo as declarações o juiz depois de ouvir o Ministério Público fará as diligências destinadas a verificar a inexistência de impedimentos isto é se os contraentes podiam terse habilitado no modo ordinário Qualquer interessado pode pedir para ser ouvido trazendo novos elementos aos autos ou simplesmente reforçando os existentes Em seguida o juiz proferirá sentença declarando a validade do casamento ou a denegando No primeiro caso após o trânsito em julgado fazse o registro CC arts 1540 e 1541 Lei n 601573 art 76 Devem ser estritamente observados os requisitos legais para configurarse o casamento nuncupativo A Justiça já considerou não caracterizada essa modalidade de casamento na hipótese em que o noivo faleceu no dia anterior àquele em que ocorreria a celebração A inequívoca vontade manifestada pelo casal e mesmo o transcurso do processo de habilitação foram insuficientes para se considerar celebrado o casamento nuncupativo RT 841338 Restabelecido por qualquer razão o contraente que se encontrava em iminente risco de vida as formalidades indicadas podem ser supridas pela ratificação do casamento Note que o ato de ratificação não é obrigatório em caso de sobrevivência do nubente Mas uma vez praticado dispensamse as testemunhas Por outro lado nenhum dos nubentes nem mesmo o que se recuperou tem o direito de se retratar Estão casados para todos os fins de direito d Casamento por procuração O noivo ou noiva não precisa estar presente à cerimônia para que ela se realize quando for representado por um procurador nomeado com poderes especiais em instrumento público A eficácia do mandato é de noventa dias devendo ser renovado após esse prazo Até o momento da celebração o nubente mandante pode cassar o mandato Só pode fazêlo também por instrumento público Se a notícia da revogação não chegar a tempo de se cancelar a solenidade e esta se realizar será em princípio inválida Terá validade se malgrado a revogação houver posterior coabitação dos cônjuges Não se instalando a coabitação remanesce a invalidade e o mandante responderá pelas perdas e danos que a falta de tempestiva comunicação da revogação ocasionou A cassação dos poderes depois de realizada a cerimônia é ineficaz CC art 1542 Em algumas situações especiais o rito ordinário da habilitação e celebração do casamento não precisa ser observado É o caso do casamento religioso com efeitos civis ou do realizado quando um dos nubentes se encontra gravemente enfermo ou em iminente risco de vida e Casamento consular Quando dois brasileiros residentes no exterior desejam se casar segundo o direito brasileiro podem fazêlo perante a autoridade consular LINDB art 18 Tanto a habilitação como a celebração devem observar as normas ordinárias mas a eficácia do ato está condicionada ao registro tempestivo no Registro Civil A partir do retorno de qualquer um deles ao Brasil começa a correr o prazo de cento e oitenta dias para ser requerido o registro do casamento perante o cartório da circunscrição do domicílio dos cônjuges ou em sua falta o 1º Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir CC art 1544 44 Prova do casamento A certidão do registro é a prova do casamento Admitemse outras apenas no caso de perda do registro isto é do livro em que fora feito o assento e também de todas as cópias das certidões expedidas Nesse caso o interessado pode requerer ao juiz que declare a existência do vínculo matrimonial seu início e regime à vista da prova do estado de casado por meio de depoimento de testemunhas exibição de escritos fotografias e documentos etc CC art 1543 e parágrafo único Em qualquer processo judicial visando declarar a existência do casamento milita a presunção em favor dele se provado o estado de casados CC art 1547 Quer dizer na dúvida o juiz deve declarar a existência do vínculo matrimonial Nesse caso e em todos os outros em que a prova do casamento resulta de processo judicial o registro da sentença no Registro Civil retroage à data em que ele se realizou CC art 1546 Considere por exemplo que a pessoa em iminente risco de vida declarou junto com o outro contraente que se tomavam por marido e mulher diante de seis testemunhas e faleceu logo em seguida O processo judicial demorou cinco anos para se concluir e quando transitou em julgado a sentença validando o matrimônio o outro cônjuge também já estava morto O registro da decisão judicial no Registro Civil será post mortem e para todos os efeitos legais o casamento nuncupativo ocorreu na data da declaração convergente de vontade dos nubentes 45 Responsabilidade civil do noivo desistente A vontade de contrair núpcias pela relevância dos efeitos advindos da constituição do vínculo matrimonial deve sempre ser livre e espontânea Ninguém pode ser levado a casarse contra a vontade Por menor que seja havendo qualquer dúvida a incomodar o espírito do contraente ela é relevante para ordem jurídica Até o momento em que o celebrante pronuncia a fórmula sacramental declarando os nubentes casados qualquer um deles pode desistir e não se casar Mesmo que já tenha respondido afirmativamente à pergunta do celebrante se este ainda não concluiu a frase ditada pelo art 1535 do CC há chance para a retratação Desse modo pratica ato plenamente lícito a pessoa que mesmo depois de iniciado o processo de habilitação muda de ideia e decide não mais se casar Ocorre que a preparação do casamento normalmente pressupõe uma enormidade de gastos por parte dos dois noivos tendo em vista não apenas a celebração e festa como também a organização da vida em comum que se avizinha Não é justo que o outro contraente amargue prejuízo econômico em decorrência da retratação perpetrada quando todas as circunstâncias apontavam para a efetivação da união conjugal É certo que o contraente ao se retratar pratica ato lícito Ao outro noivo não dá a ordem jurídica meios para buscar em juízo a substituição da declaração aventada eventualmente até prometida e agora recusada Mas apesar da licitude da recusa em se casar o nubente que desistiu do casamento é civilmente responsável pelos danos materiais que sua conduta infligiu ao outro Terá que indenizar assim as despesas feitas com aluguel de bufê decoração da igreja vestido de noiva prestação de serviços músicos fotógrafos cinegrafistas etc e todas as demais relacionadas com o evento que se frustrou Também as despesas com enxoval aluguel de imóvel e outras relacionadas à perspectiva da comunhão de vida devem ser ressarcidas Não se pode recusar licitude e eficácia à retratação do nubente desde que manifestada antes de o celebrante terminar de pronunciar a fórmula sacramental da lei O nubente desistente contudo é obrigado a ressarcir a totalidade dos danos materiais suportados pelo outro contraente e se tiver agido com deslealdade ou crueldade também os danos morais E os danos morais A recusa em se casar declarada depois de iniciados os preparativos normalmente acarreta no outro nubente uma dor e humilhação extraordinárias Mas ao contrário do que recomenda a regra geral da responsabilidade civil Cap 25 subitem 31 nem sempre será o caso de se impor o ressarcimento dos danos morais Apenas se o arrependido tiver agido de forma cruel ou desleal deverá ser condenado a pagar também a indenização extrapatrimonial Se por exemplo teve clareza de que não queria mais se casar um mês antes da data designada para a cerimônia mas resolveu comunicar a retratação apenas no dia imediatamente anterior ou mesmo no transcorrer da solenidade será devedor da indenização pelos danos morais Se porém foi leal com o outro contraente e lhe comunicou a desistência tão logo se apercebera do equívoco do passo independentemente do momento e lugar em que a comunicação se dá não há motivos para condenálo ao ressarcimento dos danos morais 5 Efeitos do casamento São quatro os efeitos do casamento O primeiro deles é a constituição da família Com o casamento os cônjuges formam novo núcleo familiar que eventualmente mas não necessariamente poderá ser acrescido com a vinda dos filhos biológicos ou não Se os cônjuges já tinham filhos comuns entre cada um deles e estes já havia uma família monoparental O casamento portanto vincula familiarmente apenas os cônjuges O segundo efeito do casamento diz respeito ao nome dos consortes A lei permite que qualquer dos nubentes acresça ao seu o sobrenome do outro CC art 1565 1º O mais salutar na minha opinião é continuarem ambos com os nomes de solteiro De qualquer forma além dessa alternativa também são possíveis as seguintes o marido acrescenta ao seu sobrenome o patronímico da mulher e esta mantém o nome de solteira a mulher agrega o sobrenome do marido ao seu mas este não muda o dele marido e mulher adotam um sobrenome comum composto pelo patronímico de um deles na sequência do outro os dois pospõem ou antepõem aos respectivos sobrenomes o do outro cônjuge Malgrado essas opções todas ainda pulsa a tradição machista de alteração somente do nome da mulher A mudança do nome tem significado meramente simbólico Para fins jurídicos é indiferente se os cônjuges conservam o nome de solteiro ou se o alteram Melhor dizendo se feito o acréscimo aquele que acresceu deve após o casamento percorrer uma infinidade de repartições públicas para atualizar os cadastros Registro Geral CPF DETRAN Cartório Eleitoral Ministério do Trabalho Conselho Profissional a que estiver vinculado etc se no futuro por força do divórcio quiser voltar ao nome de solteiro terá que refazer a peregrinação Quer dizer sob o ponto de vista racional abstraídas quaisquer considerações atinentes aos aspectos psicológicos e sociais da alteração nem sempre positivos ou sadios não há nenhum motivo para os cônjuges alterarem seus sobrenomes com o casamento Em relação à alteração do nome registro que embora a lei seja claríssima no sentido de autorizar unicamente o acréscimo há jurisprudência permitindo além dele a supressão do patronímico original do cônjuge ou seja a substituição do sobrenome de um deles pelo do outro Cahali 20043032 Os efeitos do casamento são quatro a constituição da família pelo estabelecimento do vínculo de conjugalidade entre marido e mulher b eventual alteração do nome dos consortes mediante o acréscimo do sobrenome do outro c vinculação dos cônjuges aos deveres matrimoniais d eventual comunhão de bens O terceiro efeito do casamento é a vinculação dos cônjuges a certos deveres Não variam tais deveres como variavam no passado de acordo com o sexo Tanto o esposo como a esposa assumem rigorosamente as mesmas obrigações recíprocas e perante os filhos item 6 O quarto efeito diz respeito ao regime de bens O casamento pode implicar e geralmente implica efeitos significativos no patrimônio dos cônjuges de modo a unilos total ou parcialmente Cap 57 6 Deveres dos cônjuges A lei preocupase em listar os deveres dos cônjuges embora seja este um assunto do interesse exclusivo da família Como dita a lei ser defeso a qualquer pessoa de direito público ou privado interferir na comunhão de vida instituída pela família CC art 1513 as implicações da inobservância dos deveres do casamento não são juridicamente relevantes Claro se um dos cônjuges deixa de cumprilos poderá o outro pedir o desfazimento do vínculo Mas como se discute à frente Cap 58 o fim do casamento também pode ser pleiteado mesmo não havendo descumprimento de qualquer dever Hoje em dia ser condenado na ação de divórcio não traz para o inadimplente nenhuma consequência além do pagamento das verbas sucumbenciais perda do sobrenome do outro cônjuge mesmo assim se isso não lhe trouxer prejuízo e do direito aos alimentos compatíveis com a condição social No essencial isto é na relação com os filhos e na divisão dos bens é indiferente se houve ou não inadimplemento dos deveres conjugais A lei menciona os seguintes deveres CC art 1566 a Vida em comum Quem casa assume a obrigação de viver com o cônjuge Para que o casamento realmente estabeleça a comunhão plena de vida entre os cônjuges como quer a lei CC art 1511 é necessário que eles a comunguem Quer dizer o fundamental dever contraído pelos casados é o de partilhar seu cotidiano um com o outro em todos os múltiplos e ricos aspectos profissional social psicológico econômico cultural físico etc Nos casamentos em que esse dever é cumprido pelos dois cônjuges cada qual recebe o outro integralmente em sua vida e participa da mesma forma da vida dele Se um dos cônjuges enfrenta dificuldades na profissão o outro ouve com atenção opina ajuda a avaliar as alternativas e apoia a decisão tomada Quando um deles realiza trabalho importante o outro entende o significado exato da conquista e fica igualmente feliz Os inevitáveis ajustes são acompanhados pela sensação de ganho e não de perda Os dois se sentem em casa quando estão em casa Ao comungarem a vida os cônjuges passam a titular um conjunto de interesses comuns como os relacionados à definição do domicílio organização do espaço da casa divisão das tarefas domésticas A administração desses interesses é feita de comum acordo entre os cônjuges Nos termos da lei a direção da sociedade conjugal será exercida em colaboração pelo marido e pela mulher CC art 1567 No caso de divergência o juiz decidirá atento aos interesses do casal e dos filhos embora seja raríssimo o socorro ao Judiciário nessa hipótese Apenas no caso de impossibilidade da direção comum quando qualquer dos cônjuges está ausente interditado judicialmente ou inconsciente por exemplo o outro tomará as decisões sozinho CC art 1570 Ter a vida em comum significa também concorrer para o sustento da família Os encargos da entidade familiar constituída pelo casamento são da responsabilidade conjunta do marido e da mulher CC art 1565 As despesas devem ser repartidas proporcionalmente aos ganhos de cada cônjuge ainda que não haja comunhão de bens art 1568 A vida em comum por fim normalmente está associada à coabitação Os cônjuges na maioria das vezes moram sob o mesmo teto Não se trata contudo de elemento essencial Há casais que preferem manter suas próprias residências por considerarem que a coabitação não corresponde à melhor solução para eles Há igualmente os que precisam morar em lugares diferentes por pouco ou muito tempo em razão de estudos carreira profissional saúde ou outra razão qualquer Optando pela coabitação escolherão juntos o domicílio conjugal CC art 1569 Se os consortes comungam a vida sem coabitarem cada um elege seu domicílio b Respeito e consideração mútuos Outro importante dever dos cônjuges é o de respeito e consideração mútuos De certo modo está englobado no da comunhão de vida mas revela uma dimensão própria quando associada aos direitos da personalidade de cada cônjuge Em outros termos na intimidade do lar devem os cônjuges se respeitar mas não só aí Em qualquer lugar em que esteja nenhum dos cônjuges pode por suas condutas ou falas agravar a imagematributo do outro ainda que minimamente Estando ou não em companhia em eventos sociais ou profissionais entre amigos comuns ou desconhecidos a imagematributo de cada um dos cônjuges é indissociável do comportamento do outro dos conceitos e valores que externa da maior ou menor discrição na abordagem de histórias do casal Desrespeita a mulher o marido que a chama de dona encrenca assim como falta ao dever de respeito a esposa que personalizou o toque do telefone celular com a marcha nupcial para indicar a chamada do esposo e sendo indagada a respeito da escolha responde que se deve ao fato de ele se portar invariavelmente como uma noiva Por mais graça que espíritos simples possam ver nesses chistes eles revelam que o respeito mútuo não é pleno como deveria c Mútua assistência Outro importantíssimo dever do casamento é a mútua assistência Manifestase seu cumprimento por exemplo nos momentos de enfermidade de um dos cônjuges quando o outro devota todo o empenho dedicação e amparo ao seu alcance para contribuir com a rápida recuperação do seu estado de saúde No período em que pessoa casada está sem emprego ao cônjuge empregado cabe o dever de sustentar sozinho a casa Se falece parente próximo de um deles o outro deve não somente ajudar nas providências práticas a serem encaminhadas como principalmente consolar o cônjuge nesse momento doloroso Tanto nas aflições como nas dificuldades econômicas o casamento obriga o cônjuge em melhores condições a dar ao outro a assistência possível de acordo com seus recursos d Sustento guarda e educação dos filhos Para os casados com filhos esse é o dever mais importante do casamento As árduas responsabilidades atinentes ao sustento guarda e educação dos filhos biológicos ou não devem ser repartidas entre os cônjuges No tocante ao sustento a divisão é proporcional aos ganhos de cada um deles CC art 1568 mas a guarda e educação correspondem a deveres igualmente distribuídos Em relação aos filhos exclusivos do outro cônjuge a lei não menciona qualquer dever Porém quem desposa alguém com filhos deve recebêlos e tratálos como se seus fossem Quer dizer deve contribuir na educação dos pequenos com quem convive deve amálos e respeitar as necessidades sociais e psíquicas deles contribuindo para o seu crescimento sadio além disso é esperada alguma ajuda nas despesas de sustento do filho exclusivo do cônjuge em dificuldade econômica Os deveres dos cônjuges listados pela lei são os de manter vida em comum devotar respeito e consideração recíprocos dar mútua assistência sustentar guardar e educar os filhos e por fim absterse de manter relações sexuais fora do casamento O descumprimento desses deveres no entanto não tem nenhuma consequência relevante O casamento poderá ser desfeito a pedido do cônjuge inocente mas o culpado não perde seus direitos relativos aos filhos bens e necessitando ao uso do sobrenome do outro e Fidelidade O dever de fidelidade corresponde ao de exclusividade de relacionamento sexual Fiel é o cônjuge que se abstém de qualquer relação sexual fora do casamento bem como de quaisquer atos que sugiram o interesse em vivenciar a experiência O homem ou mulher casado que descumpre o dever de fidelidade fazendo sexo com pessoa diversa de seu cônjuge comete adultério Se o homem ou mulher casado não chega propriamente à conjunção carnal extraconjugal mas faz carícias libidinosas em pessoa diversa de seu cônjuge ou mesmo emitelhe sinais correspondidos ou não de que desejaria manter relacionamento sexual extraconjugal descumpre igualmente o dever de fidelidade numa prática chamada de quase adultério Monteiro 2004146150 Verificase o descumprimento do dever conjugal como se o adultério tivesse mesmo ocorrido Desse modo o chamado sexo virtual em que os parceiros trocam mensagens eróticas via internet é exemplo de infidelidade A fidelidade é o menos importante dos deveres matrimoniais Em vários casamentos os cônjuges não dão à exclusividade sexual a menor importância São chamados de casamentos abertos em que os cônjuges concordam não ser o caso de limitarem suas vivências sexuais às relações entre eles Para os que não conseguem se satisfazer sexualmente sem a variação de parceiros o dever de fidelidade pode representar pesado entrave na busca da felicidade Os bissexuais por outro lado nunca conseguem plena expressão da sexualidade quando ficam vinculados ao compromisso de serem fiéis Como de qualquer forma é em tudo absolutamente indiferente para a sociedade se os casados estão guardando a fidelidade ou não o tema deveria ser ignorado pela ordem jurídica É assunto da exclusiva alçada dos casais 7 Invalidade do casamento No tema referente à validade o casamento submetese a regras próprias e não às estabelecidas para os negócios jurídicos em geral O dolo por exemplo não o invalida Rocha 20044546 Desse modo embora haja claro paralelismo entre as disciplinas jurídicas em questão não cabe a superação de conflitos de interesses entre os cônjuges respeitante à validade do vínculo matrimonial que os une senão a partir das normas específicas da lei sobre o tema CC arts 1548 a 1564 Para se ter uma ideia das implicações dessa advertência inicial basta recordar que nem todo erro vicia a vontade do nubente mas apenas os essenciais sobre a pessoa do outro cônjuge Em outra particularidade da disciplina jurídica específica do casamento sua invalidade importa em princípio a supressão de todos os efeitos produzidos independentemente da causa da invalidação A decretação ou declaração judicial de invalidade desfaz desde a celebração as implicações jurídicas que se haviam projetado em relação à sociedade conjugal bens nomes e deveres dos cônjuges A nulidade ou anulação do casamento são causas de dissolução da sociedade conjugal CC art 1571 II A comunhão de bens acaso pretendida se desconstitui O nome volta a ser o anterior ao matrimônio quando o consorte o tinha mudado Cessam os deveres de mútua assistência e manutenção da vida em comum Entre a nulidade e a anulabilidade do casamento as diferenças principais são de cunho processual apenas subitem 72 Em função delas e da possibilidade de convalidação do casamento anulável mas não do nulo interessa extremaremse as hipóteses subitem 71 O casamento inválido apenas produz seus efeitos ou parte deles na hipótese de boafé de um ou ambos os consortes quando é chamado de putativo subitem 73 No passado a invalidação do casamento também repercutia na situação jurídica dos filhos Hoje é indiferente se o casamento dos pais vale ou não já que a relação familiar vertical se submete a regras próprias que a imunizam relativamente aos percalços da horizontal 71 Casamento nulo e anulável O casamento pode ser inválido em razão da nulidade ou da anulabilidade A nulidade do casamento tem por causa a inobservância de impedimento legal CC art 1548 II A disciplina legal do casamento procura acautelarse de todos os modos com o objetivo de evitar que os impedidos se casem Apesar de procurar dar à habilitação a mais ampla publicidade submetêla ao controle do Ministério Público e do Poder Judiciário além de garantir a qualquer pessoa o direito de suscitar os impedimentos pode acontecer e acontece a desobediência ao art 1521 do CC A hipótese mais corriqueira de infringência aos impedimentos é talvez o da bigamia ou seja o casamento de pessoa casada Verificado assim a qualquer tempo ter sido celebrado casamento de pessoa impedida será nulo o ato não importa que impedimento foi desobedecido Até 2015 a deficiência mental do nubente era também causa de nulidade do casamento assim como a enfermidade A regra atual é a de que a pessoa com deficiência mental ou intelectual pode contrair matrimônio expressando sua vontade diretamente ou por meio de seu responsável bastando que tenha idade núbil Em relação ao enfermo mental se puder exprimir a vontade a despeito da enfermidade é pessoa capaz inclusive para se casar Mas se não puder exprimir a vontade temporária ou permanentemente a incapacidade será causa de anulação mas não de nulidade do casamento As causas de anulabilidade por seu turno são seis a Não ter completado a idade núbil CC art 1550 I Como dito para se casar a pessoa precisa ter pelo menos 16 anos Antes dessa idade o casamento poderá ser realizado só mediante autorização judicial concedida apenas nos dois casos específicos da lei gravidez ou objetivo de evitar imposição ou cumprimento de pena criminal Se o menor que ainda não atingiu a idade núbil em conluio com os pais falsifica seu documento e se apresenta ao cartório do Registro Civil munido de autorização pode ocorrer de se realizar o casamento a despeito do prescrito na lei Aqui o casamento só pode ser anulado a pedido do próprio menor de seus representantes legais ou ascendentes art 1552 Ninguém mais tem legitimidade para demandar a anulação judicial do casamento inválido nessa hipótese Por outro lado a lei legitima ao pedido mesmo aquele que tenha participado da fraude se houve sem contudo exonerarlhe as responsabilidades O prazo de decadência para a ação é de cento e oitenta dias contados da data em que o menor alcança a idade núbil se ele é o autor e da data do casamento nos demais casos CC art 1560 1º Não será anulado o matrimônio de quem se casou sem idade núbil se dele tiver resultado gravidez CC art 1551 Preocupase a lei com tal ressalva em evitar que a invalidação conduza a resultado prejudicial à família Em outros termos pressupõe que a preservação do vínculo pode ser a melhor solução para os jovens pais e seu filho malgrado a causa para a anulação O casamento anulável em razão da falta de idade núbil pode ser confirmado quando o cônjuge já tiver feito 16 anos desde que se for ainda menor tenha a autorização dos pais ou responsáveis ou obtenha o suprimento dela em juízo CC art 1553 b Falta de autorização CC art 1550 II Também foi visto que o menor em idade núbil necessita de autorização dos pais ou representante legal para se casar Se por qualquer circunstância realizase o casamento sem o atendimento a essa formalidade poderá ser buscada a sua anulação em juízo Estão legitimados para a ação de anulação do casamento do menor em idade núbil não autorizado além dele próprio quando alcançar a maioridade seus representantes legais ou herdeiros necessários Decai o direito nessa hipótese de anulação no prazo de cento e oitenta dias contados a partir do fim da menoridade da data da celebração do casamento ou da morte do cônjuge que casou incapaz dependendo de quem seja o autor da demanda CC art 1555 e seu 1º Nessa hipótese não se anula o casamento se dele tiver resultado a gravidez CC art 1551 ou se os pais ou representantes legais do nubente menor tiverem assistido à celebração ou manifestado sua aprovação por outros meios quaisquer art 1555 2º c Vício de consentimento CC art 1550 III Cabe a anulação de casamento fundada no vício de consentimento de um dos cônjuges Ao contrário porém do que prescreve relativamente aos negócios jurídicos em geral a lei invalida o casamento apenas em duas hipóteses de vontade viciada o erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge e a coação arts 1556 e 1558 O erro essencial sobre a pessoa de um cônjuge caracterizase em primeiro lugar quando o conhecimento de uma informação relevante acerca dele pelo outro consorte em seguida ao casamento torna insuportável a vida em comum Essa informação pode dizer respeito à identidade honra e boa fama CC art 1557 I ou à prática de crime anterior ao casamento art 1557 II Nesses dois casos sobrevindo a insuportabilidade da vida em comum o erro dá ensejo à invalidação do casamento Desse modo se a mulher descobre depois de casada que o marido não desfrutava da honradez apregoada durante o noivado ou que havia tomado parte num crime antes de se casar ela pode pedir a anulação do casamento desde que prove não suportar mais continuar vinculada a ele a partir da ciência do fato A continuidade da coabitação mesmo após a descoberta do passado condenável do cônjuge descaracteriza a insuportabilidade da vida em comum e desconstitui a causa para a anulação CC art 1559 in fine Outra hipótese de erro essencial é a ignorância anterior ao casamento de defeito físico irremediável que não caracterize deficiência ou de moléstia grave e transmissível por contágio ou por herança capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência CC art 1557 III Se o marido desconhecia ao se casar que a mulher era portadora do vírus HIV isso é causa para a anulação do casamento enquanto não encontrada a cura para a AIDS O defeito físico irremediável ignorado pelo outro cônjuge atualmente é causa difícil de fundamentar o pedido de anulação tendo em vista que as pessoas já se conhecem nuas antes do casamento em razão das várias relações sexuais que normalmente mantêm nas fases de namoro e noivado Tendo os nubentes se resguardado da vida sexual contudo o conhecimento posterior da condição física do outro autoriza a anulação desde que o defeito não se caracterize como deficiência É o caso por exemplo da impotência de um deles para a realização do ato sexual Além do erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge também vicia o consentimento e anula o casamento a coação Ela se caracteriza pelo fundado temor de mal considerável e iminente para a vida a saúde e a honra do cônjuge vitimado pela coação ou de seus familiares CC art 1558 Se um dos contraentes está casando sob a ameaça de perda de emprego o casamento é anulável por coação Como acentua Carlos Roberto Gonçalves o preceito referese à coação moral em que a vítima tem oportunidade de escolha entre casarse ou correr o risco de sofrer as consequências objeto de ameaça Quando a coação é física e ela não tem outra opção senão casarse não há propriamente vício mas sim ausência de consentimento e nessa hipótese o casamento a rigor não é inválido mas inexistente O que invalida o matrimônio assim é a coação moral apenas 2005157 É exclusiva do cônjuge que incorreu no erro essencial ou sofreu a coação a legitimidade para o pedido de anulação do casamento CC art 1559 O prazo decadencial da ação de anulação por erro essencial é de três anos art 1560 III e no caso de coação de quatro art 1560 IV sempre contados da celebração do casamento d Incapacidade para expressar o consentimento CC art 1550 IV Se a pessoa se encontra incapacitada para expressar o consentimento em razão de doença ou acidente não poderá casar se ainda que tenha já manifestado a intenção de fazêlo inclusive pelo requerimento da habilitação Também se enquadra nesse caso de anulação o casamento em que um dos contraentes apresentouse ao local da cerimônia completamente embriagado sem condições de articular as ideias Qualquer um dos cônjuges está legitimado para a ação anulatória nessa hipótese que decai no prazo de cento e oitenta dias contados do casamento art 1560 I Se o celebrante a despeito da incapacidade do nubente de consentir ou manifestar de modo inequívoco o consentimento mesmo assim celebra o matrimônio incorre num gravíssimo erro e deve responder na esfera administrativa inclusive com a suspensão ou perda da função de juiz de paz e Revogação do mandato CC art 1550 V No casamento celebrado por procuração até o momento da celebração o mandato pode ser revogado pelo cônjuge mandante desde que observada a forma pública Pois bem chegando a notícia da revogação a tempo de se cancelar a cerimônia não restará outra questão jurídica a resolver senão a da responsabilidade civil do nubente arrependido pelos danos que causou subitem 45 Se atrasar a notícia da revogação o casamento provavelmente se realizará Abremse então duas hipóteses Na primeira os cônjuges passam a coabitar a mesma casa fato que convalida o casamento afastando a causa para a anulação Na segunda não se instala a coabitação e então remanesce a anulabilidade do matrimônio a pedido do cônjuge mandante nos cento e oitenta dias seguintes àquele em que teve ciência da celebração CC art 1560 2º A invalidade do mandato quando judicialmente decretada importa as mesmas consequências que a revogação no tocante à validade do casamento CC art 1550 parágrafo único Se o incapaz com mais de 18 anos outorga mandato sem a devida assistência do curador esse negócio é anulável Também será passível de anulação o casamento celebrado com base nessa outorga a menos que se tenha seguido a coabitação dos cônjuges f Celebrante incompetente CC art 1550 VI Se o celebrante não for autoridade investida regularmente de competência para presidir a celebração o casamento pode ser anulado Não caberá contudo a anulação se quem presidiu a solenidade exercia publicamente a função de juiz de casamento e teve o nome assentado nessa condição no Registro Civil art 1554 O prazo decadencial da ação de anulação nesse caso fixouo a lei em dois anos a partir da celebração CC art 1560 II As causas de nulidade e anulabilidade do casamento são exclusivamente as listadas pelo direito de família Não se aplicam ao casamento as regras de invalidação dos negócios jurídicos em geral Os nubentes ao requererem sua habilitação para o casamento têm direito de ser informados sobre as causas de invalidação pelo oficial do Registro Civil CC art 1528 72 Diferenças entre nulidade e anulabilidade do casamento A validade ou invalidade são atributos do casamento existente O que não chegou a existir como casamento para a ordem jurídica não pode ser tido como válido ou inválido Para existir o casamento três requisitos devem em geral estar atendidos a diversidade sexual a livre e espontânea declaração do consentimento no ato da celebração e a fórmula sacramental pronunciada pela autoridade Este último é dispensável somente no nuncupativo enquanto os dois primeiros invariavelmente são exigidos para a existência do casamento Embora difícil não é de todo impossível a hipótese de a falta da diversidade sexual dos nubentes fugir aos olhos do oficial do Registro Civil do representante do Ministério Público e do juiz bem como não ser notada pelo celebrante Nesse caso mesmo feito o assento do casamento ele não existe porque duas pessoas do mesmo sexo não podem no direito brasileiro se unir pelos laços do matrimônio Também não existirá o casamento se na solenidade um dos noivos não expressar o seu consentimento de modo livre e espontâneo Ausente qualquer requisito de existência o que se tomou por casamento não produzirá nenhum de seus efeitos A invalidade do casamento por sua vez pode derivar de sua nulidade ou anulabilidade A única diferença de direito substancial entre as hipóteses é a possibilidade de convalidação do casamento anulável pelo decurso do tempo enquanto o nulo não se convalida jamais As outras diferenças têm natureza exclusivamente processual como se verá em seguida No tocante à supressão dos efeitos do casamento inválido esta se verifica na mesma medida tanto no casamento declarado nulo como naquele cuja anulação se decretou Desde a data da celebração é como se o casamento não tivesse existido Entre marido e mulher o mínimo resquício de que um dia eles foram casados se apaga por completo Na invalidação ficam ressalvados apenas os direitos de terceiros de boafé e os resultantes de sentença transitada em julgado Em outros termos o art 1563 do CC a sentença que decretar a nulidade do casamento retroagirá à data da sua celebração sem prejudicar a aquisição de direitos a título oneroso por terceiros de boafé nem a resultante de sentença transitada em julgado aplicase a qualquer caso de invalidação do casamento apesar de se referir apenas ao nulo Tanto a declaração de nulidade como a decretação da anulação do casamento possuem iguais efeitos cf Miranda 1916 1375377 Beviláqua 1934 2207208 embora haja doutrinadores que não pensem assim Gomes 1968126128 Enquanto a invalidação por nulidade pode ser pedida por qualquer pessoa interessada e pelo Ministério Público a qualquer tempo a fundada na anulabilidade só pode ser pleiteada pelos legitimados especificamente na lei e enquanto não decair o direito Diferenciamse pois nulidade e anulabilidade em função da legitimidade ativa e da decadência ou não do direito de invalidar o casamento Em relação à legitimidade para o pedido a nulidade pode ser pedida por qualquer pessoa interessada e também pelo Ministério Público CC art 1549 Já a anulação só pode ser pleiteada pelos sujeitos legitimados especificamente por lei aos quais se fez já referência no exame das causas feito no subitem anterior arts 1552 1555 e 1559 Quanto à decadência do direito de pedir a invalidação do casamento ela se opera unicamente na hipótese de anulabilidade A nulidade do matrimônio pode ser pedida a qualquer tempo mesmo que decorridas várias décadas da celebração ao passo que a anulação só pode ser pleiteada enquanto não decaído o direito Variam os prazos de decadência para a anulação do casamento em função da causa conforme examinado também no subitem anterior CC arts 1555 e 1560 73 Casamento putativo O matrimônio inválido produzirá para o cônjuge ou cônjuges de boafé os mesmos efeitos do válido até transitar em julgado a sentença que declarar a nulidade ou decretar a anulação CC art 1561 Chamase putativo ao casamento nesse caso porque um dos cônjuges ou os dois tinha justos motivos para acreditar na validade do ato putare é a palavra latina para imaginar pensar Desse modo se um dos contraentes desconhecia que o outro já era casado para ele a nulidade do casamento não surtirá efeito algum enquanto não for reconhecida por sentença Se outro exemplo o celebrante não estava investido de competência para presidir a cerimônia estando os dois cônjuges de boafé todos os efeitos de um casamento válido se projetam nas relações entre eles até que o Poder Judiciário decrete a anulação Nas duas situações os bens adquiridos no período entre a celebração e a invalidação do matrimônio se comunicam caso o regime adotado não seja o da separação absoluta Produzemse igualmente os efeitos de presunção de paternidade e maternidade relativamente aos filhos gerados pelo casamento putativo Se um dos cônjuges não estava de boafé considerase o culpado pela invalidação do casamento Nesse caso ele perde todas as vantagens que tiver recebido do outro consorte mas continua obrigado a cumprir as obrigações que tiver contraído no pacto antenupcial CC art 1564 O bígamo assim não se torna titular de nenhuma meação dos bens se o casamento nulo se realizou em regime de comunhão Mas se tiver se obrigado por exemplo no pacto antenupcial a pagar as despesas de redecoração do apartamento em que se abrigou o domicílio conjugal a invalidade do casamento não o exonera dessa obrigação nem tem ele direito a qualquer ressarcimento Putativo é o casamento inválido em que pelo menos um dos cônjuges desconhece a existência de causa de invalidação Ele produz efeitos para o cônjuge ou cônjuges de boafé e para a prole como se fosse válido desde a data da celebração até o pronunciamento judicial de invalidação Quando os dois cônjuges estão de máfé o casamento putativo não produz nenhum efeito em relação a eles mas é plenamente eficaz relativamente aos filhos Os efeitos jurídicos do casamento putativo até 1977 só eram reconhecidos quando pelo menos um dos cônjuges estava de boafé cf Rodrigues 2003a117 Desde a Lei do Divórcio daquele ano com o objetivo de amparar os interesses da prole admitese também a figura do casamento putativo em que os dois cônjuges estão de máfé isto é a existência da invalidade do ato praticado não é desconhecida de nenhum deles Quando os dois estão de máfé o casamento putativo não produz evidentemente efeitos entre eles porque isso implicaria prestigiar conduta ilícita Mas ele é eficaz em relação aos filhos CC art 1561 2º A relevância dessa regra está relacionada às presunções de paternidade e maternidade O filho não precisa provar que o homem com quem a mãe manteve casamento putativo é seu pai a este é que cabe o ônus de provar a inexistência de vínculo biológico e socioafetivo de filiação caso pretenda liberarse das responsabilidades paternas Do mesmo modo é da mulher o ônus de promover a negatória de maternidade se o homem com quem mantinha casamento putativo apontoua como mãe de seu filho ao fazer a declaração de seu registro de nascimento 8 Natureza do casamento No direito canônico o casamento além de sacramento era tido como um contrato entre os nubentes Essa classificação contudo não era bem aceita pelos civilistas na época em que predominava o modelo da ampla liberdade de contratar Isso porque os contraentes limitavamse a aderir ao conjunto de direitos e deveres que a lei associava ao matrimônio sem liberdade nenhuma para alterálos Construiuse então a teoria do casamento como instituição A resposta à questão da natureza do casamento mais difundida atualmente situao a meio caminho entre uma e outra concepção Chamada de eclética ou mista reconhece a existência de um vínculo contratual na essência do casamento mas não de um vínculo qualquer Casamento assim é definido como um contrato de direito de família para o qual a convergência da declaração de vontade dos nubentes é indispensável mas que encontra em normas jurídicas cogentes a extensão dos direitos e obrigações dela derivados PlaniolRipert 1925 25759 Gomes 19685660 O casamento é um contrato de direito de família Quer isso significar que está disciplinado por regras próprias não se sujeitando a muitos dos preceitos reguladores dos contratos em geral Aliás não se sujeita nem mesmo a certas normas aplicáveis aos demais negócios jurídicos Por ser um contrato sui generis o casamento não se submete ao direito das obrigações Ele não é resolúvel nem resilível como os contratos em geral mas de acordo com as regras próprias do direito de família Cap 58 Nem mesmo a todos os preceitos disciplinadores do negócio jurídico em geral sujeitase o casamento Os nubentes não podem por exemplo estabelecer condições à eficácia de sua declaração de vontade Quer dizer nenhum deles poderia concordar em casar desde que o outro cumprisse uma obrigação qualquer ou coisa do gênero Alguns dos vícios de consentimento que invalidam os negócios em geral por outro lado não maculam a validade do casamento Como visto apenas o erro essencial e a coação podem dar ensejo à anulabilidade do ato desta edição 2020 2020 02 13 PÁGINA RB31 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 57 OS REGIMES DE BENS DO CASAMENTO Capítulo 57 Os regimes de bens do casamento 1 Os bens dos cônjuges A comunhão de vida que o casamento estabelece estendese em medidas variadas aos bens de propriedade dos cônjuges Dependendo em parte da vontade deles em parte de disposições cogentes os bens das pessoas casadas podemse comunicar isto é passar à titularidade também do outro consorte Pela comunicação instaurase o condomínio entre marido e mulher mas um condomínio de direito de família sujeito a regras próprias que não coincidem necessariamente com as de direito das coisas O princípio fundamental é o da ampla liberdade dos cônjuges para estipularem acerca de seus bens anteriores ou posteriores ao casamento o que bem quiserem CC art 1639 Podem por exemplo contratar que certo imóvel onde pretendem residir pertencerá aos dois em partes iguais e que os outros bens serão da propriedade exclusiva de quem já os titula ou vier a adquirir por negócio jurídico ou sucessão Ou podem contratar a incomunicabilidade de um ou alguns bens e a divisão dos demais A lei faculta aos cônjuges em suma dispor livremente sobre os efeitos patrimoniais do casamento Em razão da ampla liberdade de estipulação sobre os bens no casamento qualquer solução pode ser escolhida pelos cônjuges Entre as possíveis a lei tratou de quatro regimes com o objetivo de facilitar a disciplina da matéria Os nubentes assim não precisam antever todas as hipóteses futuras e esmiuçar seus contornos e consequências Se o que consideram adequado aos seus interesses estiver retratado num dos quatro regimes mencionados na lei bastalhes indicálo simplificandose assim a formalização da decisão Os regimes do casamento são quatro comunhão universal comunhão parcial separação absoluta e participação final nos aquestos Se os consortes nada contrataram sobre seus bens ou se o que convencionaram resultou nulo ou ineficaz será observado o regime da comunhão parcial CC art 1640 Ele é chamado por isso de regime legal enquanto os outros três são os convencionais Classificamse os regimes em simples e híbridos Na primeira classe estão os regimes em que não cabe distinguir partes no patrimônio do cônjuge São simples os regimes de comunhão universal e separação absoluta porque naquela o cônjuge só titula o patrimônio comum tudo é dos dois enquanto nesta só o particular nada é dos dois Na classe dos regimes híbridos cada cônjuge pode ter o seu patrimônio distinguido em particular e comum Nela enquadramse os regimes da comunhão parcial e da participação final nos aquestos Essa classificação contudo é um tanto imprecisa reclamando duas observações para conferirlhe maior consistência Primeira porque sempre há uma margem mínima de incomunicabilidade dos bens mesmo no regime da comunhão universal a classificação deve ser considerada como mera referência geral do assunto uma introdução que auxilia didaticamente seu enfrentamento Segunda não há propriamente segregação patrimonial no casamento a não ser em algumas hipóteses de responsabilização por dívidas anteriormente constituídas Cada cônjuge continua titulando um único patrimônio podendo no entanto nele se encontrarem bens que lhe pertencem com exclusividade e bens cuja titularidade é dividida com o outro consorte O momento apropriado para a definição do regime patrimonial é o da habilitação O oficial do Registro Civil tem inclusive a obrigação legal de esclarecer os nubentes sobre os diversos regimes de bens existentes na lei para que eles sejam alertados sobre esse importante efeito do casamento e possam sopesar seus interesses CC art 1528 Nada impede porém que se ultrapasse a fase de habilitação sem que os noivos tenham discutido o assunto e chegado a acordo Na verdade até a celebração os noivos podem declarar pela forma adequada item 4 o regime de bens que adotam Concluída a solenidade sem terem feito qualquer escolha a lei determina a comunicação parcial dos bens segundo regras que serão examinadas adiante subitem 232 Qualquer que seja a hipótese o regime começa a vigorar na data do casamento art 1639 1º Os cônjuges desfrutam da mais ampla liberdade para estabelecer o que for do interesse deles no tocante aos bens Para facilitar a formalização da escolha a lei disciplina quatro regimes comunhão universal comunhão parcial separação absoluta e participação final nos aquestos Independentemente do regime adotado pelas dívidas contraídas por um dos cônjuges para atender a necessidade da economia doméstica responde solidariamente o outro Independentemente do regime de bens adotado haverá solidariedade entre os cônjuges pela dívida contraída por qualquer um deles mesmo sem a anuência do outro quando necessária à economia doméstica CC arts 1643 e 1644 A compra no supermercado feita com o cartão de crédito de um dos cônjuges corresponde a despesa dessa natureza isto é necessária à economia doméstica Não sendo paga a fatura do cartão no vencimento poderá a administradora do cartão demandar a satisfação de seu crédito contra o cônjuge do devedor A solidariedade nesse caso deriva da lei e independe de anuência do consorte Também qualquer que seja o regime de bens do casamento se um dos cônjuges ficar impossibilitado por qualquer razão de administrar seu patrimônio particular caberá ao outro a responsabilidade pela gerência deste A lei lhe atribui também o direito de alienar os bens móveis comuns bem como o de mediante autorização do juiz alienar os imóveis comuns e os móveis ou imóveis pertencentes ao consorte impedido CC art 1651 Responderá pelos atos que praticar perante o cônjuge e seus herdeiros na condição de usufrutuário quanto à administração dos bens comuns ou depositário dos bens particulares a menos que lhe tenha sido outorgado tácita ou expressamente mandato art 1652 Assim se um dos cônjuges casado no regime da separação absoluta sofre acidente e fica inconsciente entravado numa cama de hospital ao outro competirá a administração do seu patrimônio particular Se para custear o tratamento for preciso vender bens móveis comuns o cônjuge desimpedido poderá fazêlo sem outra formalidade mas necessitando vender coisas do patrimônio particular do consorte desafortunado precisará de autorização do juiz A final em convalescendo o enfermo prestarlheá o outro cônjuge contas dos atos praticados em morrendo tais contas deverão ser prestadas aos herdeiros Se o dinheiro apurado pela venda de um imóvel do patrimônio particular do hospitalizado que o juiz autorizou para custeio do tratamento tiver sido empregado em finalidade diversa o cônjuge que incorreu na irregularidade deve indenizar o prejudicado ou seus sucessores da mesma forma que um depositário infiel responderia perante o depositante Fica ele portanto exposto inclusive à prisão civil de até um ano enquanto não repuser o alcance Cap 36 item 5 2 A comunhão de bens A comunicação de bens entre os cônjuges é muito comum nas famílias brasileiras exceção feita às mais abastadas No contexto de extrema cordialidade tolerância e entendimento que às vésperas cerca a maioria dos enlaces matrimoniais discutir a questão patrimonial de modo racional e objetivo assume ares de desambientada mesquinhez Por isso a lei se preocupa em preservar alguns dos direitos dos cônjuges estabelecendo como que uma margem mínima de incomunicabilidade Por maior que seja o grau de comunicação como no caso da comunhão universal sempre haverá no patrimônio dos cônjuges alguns bens separados Os regimes de comunhão são três universal parcial e de participação final nos aquestos Esse último embora também pudesse ser caracterizado como regime de separação relativa deve ser classificado como de comunhão porque se submete a duas regras comuns aos dessa categoria Refirome aos atos que a lei não permite que um dos cônjuges pratique sem a anuência do outro subitem 21 e aos que estão autorizados a praticar separadamente subitem 22 Essas regras são como mencionado comuns às três espécies de comunhão subitem 23 21 Atos que dependem da autorização do outro cônjuge Alguns atos ou negócios jurídicos a pessoa casada em regime de comunhão universal parcial ou de participação final nos aquestos só pode validamente praticar quando o outro cônjuge concordar São atos que podem afetar de modo acentuado o patrimônio comum comprometendo o direta ou indiretamente sendo por isso resguardados os interesses do cônjuge Se a concordância requisitada é da mulher chamase outorga uxória se do marido autorização marital A anuência do cônjuge na maioria das vezes colhese no próprio instrumento negocial Pode contudo abrigarse em instrumento público ou particular apartado desde que autenticado Nesse caso se emitido em data posterior os efeitos da autorização validam o ato ou negócio praticado pelo outro cônjuge isoladamente CC art 1649 parágrafo único Na verdade é muito raro acontecer a desobediência à norma que obriga a outorga uxória ou autorização marital CC art 1647 porque o terceiro interessado em garantir a validade do ato está sempre atento às formalidades da lei Ninguém compra imóvel de pessoa casada em regime de comunhão sem exigir a autorização do esposo ou esposa aliás sequer o tabelião lavra a escritura nessa hipótese Pois bem são os seguintes os atos listados no Código Civil como dependentes de autorização do cônjuge no regime de comunhão a Alienar ou gravar de direito real bem imóvel CC art 1647 I Pela importância econômica presumida na lei para os bens de raiz nenhum dos cônjuges os pode alienar ou onerar hipotecar ou instituir direito real em garantia sem que consinta o outro Em relação aos bens móveis mesmo que sejam mais valiosos que os da propriedade imobiliária do casal a alienação ou oneração independe de autorização conjugal A vedação alcança não somente os bens comuns mas também os que não integram a comunhão Preocupase a lei na verdade com a solvência da família Se um dos cônjuges dilapidar o patrimônio próprio os interesses do outro serão afetados tendo em vista o dever de mútua assistência característico do vínculo matrimonial Não havendo contudo qualquer prejuízo potencial no ato de disponibilização do bem particular compete exclusivamente ao cônjuge que o titula a decisão de alienálo CC art 1665 descabendo a recusa da outorga uxória ou autorização marital b Demandar em ações reais de natureza imobiliária CC art 1647 II Seja como autor ou como réu os esposos não podem litigar desacompanhados em juízo quando a ação versar sobre direito real incidente em coisa imóvel A pessoa casada não pode reivindicar a titularidade de imóvel ou mesmo a proteção possessória sem que o seu cônjuge tenha conhecimento e concorde com a medida c Prestar fiança ou aval CC art 1647 III Fiança e aval são conceituados como garantias fidejussórias A primeira corresponde a contrato gratuito em que uma das partes fiador assume perante a outra credor a obrigação de pagar o devido por terceiro afiançado caso esse não entregue a prestação a que se obrigou O aval por sua vez é o ato cambiário pelo qual uma pessoa avalista se obriga a pagar título de crédito em favor de outro obrigado avalizado Sem a outorga uxória ou autorização marital a pessoa casada não pode ser fiadora nem avalista Se faltar a anuência conjugal à fiança ou aval em princípio a prestação da garantia é inválida não podendo o credor demandar nem o cônjuge que praticou o ato nem o outro Mas em proteção à boafé do titular do crédito tem a jurisprudência admitido que a cobrança recaia exclusivamente sobre os bens componentes da meação do fiador ou avalista Esse entendimento embora atenda aos interesses dos credores acaba por frustrar os objetivos do direito de família que como visto procuram impedir que a insolvência de um dos cônjuges agrave a condição patrimonial do outro que será chamado a cumprir seu dever de assistência d Doação de bens comuns ou que possam se comunicar CC art 1647 IV Nenhum dos cônjuges pode doar bens comuns ou passíveis de comunicação O casado em regime de comunhão universal não pode fazer doação nenhuma sem autorização do outro cônjuge Se o regime é da comunhão parcial ou participação final nos aquestos os bens comunicáveis adquiridos na constância do casamento não podem ser doados Abre a lei duas exceções Primeira na doação remuneratória Quando alguém se beneficia de serviços prestados por outrem e mesmo não estando obrigado resolve remunerálos mediante a entrega de bens ou dinheiro em valor superior aos serviços recebidos chamase remuneratória essa hipótese de doação Cap 32 item 2 Sendo casado o doador dispensase a autorização do cônjuge em razão do benefício auferido Segunda na doação nupcial O cônjuge é livre para doar ao filho que se casa ou estabelece economia separada bens que o auxiliem nesse importante passo Não precisará da autorização do outro cônjuge para fazer a doação nesse caso mesmo que importe a alienação de bens comuns Nos dois casos excepcionais porém a liberalidade não poderá ser significativa devendo corresponder a parte pequena da meação do doador para que não se prejudiquem os direitos protegidos pelo regime de comunhão de bens Determinados atos ou negócios jurídicos o cônjuge casado em regime de comunhão não pode praticar sem a autorização do outro Se a recusa da outorga uxória ou autorização marital for abusiva ou não puder ser concedida o juiz poderá suprir o consentimento do esposo ou esposa Nos casos em que o cônjuge recusa a anuência sem motivo justo há abuso de direito O interessado na prática do negócio jurídico pode requerer em juízo o suprimento desse consentimento Se o cônjuge não pode por exemplo alienar imóvel integrante de seu patrimônio particular porque o outro denega a autorização injustificadamente cabe ao primeiro buscar o suprimento judicial Também ao juiz caberá suprir a concordância do consorte que se encontra impossibilitado de a conceder por qualquer razão como no caso de inconsciência decorrente de enfermidade ou acidente CC art 1648 Em qualquer hipótese dos atos listados no art 1647 do CC será anulável o que se praticou sem a devida autorização do cônjuge ou seu suprimento judicial Em dois anos contados do término da sociedade conjugal decai o direito de o cônjuge prejudicado pleitear a anulação CC art 1649 O termo a quo do prazo decadencial é o fim da sociedade conjugal não somente para que o lesado se encontre em condições de exercer plenamente seu direito mas também para protegêlo Se a invalidação é decretada ainda na constância do casamento o cônjuge lesado pode vir a sofrer consequências da imputação de responsabilidade ao outro pelos danos causados a terceiros A ação compete também aos herdeiros do cônjuge prejudicado e a ninguém mais CC arts 1645 e 1650 O prazo para a propositura decai igualmente nos dois anos seguintes ao término da sociedade conjugal Desse modo se o viúvo havia feito doação de vulto sem a autorização da falecida os filhos podem enquanto não decaído o direito à invalidação do contrato ajuizar a ação de anulação Julgada procedente a demanda proposta pelo cônjuge cujo assentimento era necessário mas não se colheu anularseá a alienação oneração ou liberalidade Obviamente isso redundará em perda a terceiros tais como o adquirente credor donatário etc A lei põe a salvo os interesses deles mediante o reconhecimento da ação regressiva contra o cônjuge que realizou o negócio invalidado ou seus herdeiros CC art 1646 Por isso a propositura da ação de anulação enquanto ainda não terminada a sociedade conjugal nem sempre é do interesse do cônjuge prejudicado já que o exercício do direito regressivo pelo terceiro poderá afetálo de modo indireto ao ser chamado a cumprir o dever de mútua assistência 22 Atos que podem ser praticados separadamente Os atos que os cônjuges podem praticar separadamente qualquer que seja o regime estão relacionados no art 1642 do CC É certo que esse dispositivo também se aplica aos casados em regime de separação absoluta Mas para eles a relação não seria necessária tendo em vista a própria definição desse regime Em outros termos é ressalva feita pela lei que interessa unicamente aos casados em regime de comunhão que nesse particular encontramse na mesma situação de quem titula patrimônio separado ou seja de quem se casou em regime de separação absoluta Daí por que prefiro examinála aqui como regra atinente aos regimes de comunhão A relação do art 1642 do CC é exemplificativa em vista do disposto no inciso VI Desse modo não existindo expressa vedação ou seja não estando o ato relacionado no art 1647 do CC ou noutra norma legal que condicione sua prática pelo casado à autorização do cônjuge cada um deles pode praticálo isoladamente Pois bem são exemplos de atos que a pessoa casada em regime de comunhão e mesmo no de separação pode praticar independentemente de anuência do consorte a Administrar e dispor dos bens necessários ao desempenho de sua profissão exceto para os não empresários se importar alienação ou oneração de imóvel CC arts 1642 I e 1647 I A liberdade de exercício profissional não pode ser tolhida ou embaraçada pelo outro cônjuge Se a mulher dentista precisa de recursos para financiar a modernização de seu consultório dentário pode contratálos junto ao banco dando em garantia fiduciária a propriedade resolúvel dos novos equipamentos sem a necessidade de autorização do marido Para alienar ou gravar de ônus real um bem imóvel no entanto a autorização do cônjuge é necessária mesmo que o assunto diga respeito exclusivamente ao exercício da profissão salvo no caso do empresário Por expressa ressalva da lei o empresário individual pode praticar esses atos quando o imóvel integrar o patrimônio da empresa melhor dizendo quando esse bem do patrimônio do empresário individual estiver sendo usado na exploração da atividade empresarial art 978 A ressalva diga se corresponde a situação raríssima já que as empresas quase nunca são exploradas individualmente mas em geral por sociedades com a forma de limitada ou anônima b Administrar os bens próprios CC art 1642 II Mesmo na comunhão um dos cônjuges pode possuir bens próprios por exemplo o recebido por doação com a cláusula de incomunicabilidade o anterior ao matrimônio no caso da comunhão parcial ou de participação final nos aquestos etc Esses bens próprios não entram para a comunhão e sua administração compete com exclusividade ao cônjuge que o titula Desse modo ele não precisará da anuência do outro cônjuge para alugar o bem ou deixálo sem fruição dálo em comodato a parente consanguíneo ou mesmo a terceiros etc Aqui também incide a vedação do art 1647 I do CC para os não empresários Desse modo mesmo os bens próprios de um dos cônjuges não pode ser alienado ou gravado de ônus real sem o consentimento do outro c Desobrigar ou reivindicar os imóveis gravados ou alienados sem o seu consentimento ou suprimento judicial CC art 1642 III Se apesar da vedação um cônjuge aliena ou onera bem imóvel sem anuência do outro este último não precisa da anuência daquele para demandar em juízo a desconstituição do gravame ou do ato de disposição patrimonial Lembre que as ações reais sobre bens imóveis só podem ser aforadas por pessoas casadas com a anuência do cônjuge CC art 1647 II exceto se o regime de bens for o da separação absoluta CPC art 73 Evidentemente essa condição não poderia ser estendida para as demandas de desconstituição da alienação ou oneração de bens imóveis pela falta da anuência do demandante Se para propôla o prejudicado precisasse da anuência do cônjuge que praticara o ilícito é provável que não pudesse defender seus direitos o que contrariaria a garantia constitucional de livre acesso ao Judiciário d Demandar a desconstituição de atos praticados sem sua concordância quando esta era necessária CC art 1642 IV Como visto se o regime de bens é o da comunhão nenhum cônjuge pode sem a autorização do outro doar bens comuns ou passíveis de se comunicar prestar fiança ou dar aval Se um desses atos é praticado com desobediência a essa condição ele pode ser anulado O cônjuge prejudicado tem direito de demandar a anulação desacompanhado Aqui a lei excedeuse em cautela Como é pessoal e não real imobiliária a demanda para obter a desconstituição de contratos de doação fiança ou aval seria por tudo dispensável a expressa previsão de desnecessidade da anuência do cônjuge Feita a ressalva expressa não restam dúvidas de que a pessoa casada pode isoladamente ir a juízo para invalidar o negócio jurídico praticado sem a sua autorização e Reivindicar bens comuns doados ou transferidos a concubino CC art 1642 V Se um dos cônjuges doa bens comuns ou os transfere a qualquer título a concubino isto é pessoa com quem mantém relacionamento não eventual mas também não característico da união estável Cap 59 item 4 e o faz sem a autorização do esposo ou esposa a doação ou transferência pode ser desconstituída por este ou esta agindo isoladamente Não haverá a desconstituição se demonstrado que o bem foi adquirido pelo esforço comum do cônjuge que fez a transferência e seu concubino quando o primeiro estiver separado de fato por mais de cinco anos Salvo os atos arrolados no art 1647 do CC as pessoas casadas podem praticar todos os demais sem autorização do cônjuge ainda que o casamento siga o regime da comunhão Desse modo podem administrar os bens próprios demandar o desfazimento de negócios jurídicos para os quais seu consentimento era indispensável e não foi colhido etc Reforçando a lista dos atos praticáveis independentemente de consentimento do cônjuge é exemplificativa Qualquer ato ou negócio jurídico não condicionado pela lei à outorga uxória ou autorização marital pode ser praticado pela pessoa casada desacompanhada de seu consorte 23 Espécies de comunhão São três os regimes de comunhão de bens Na comunhão universal a regra geral é a da comunicação de todos os bens dos cônjuges anteriores ou posteriores ao casamento Há como já referido uma margem mínima de incomunicabilidade isto é alguns bens que não se comunicam de nenhum modo para proteção dos interesses individuais dos cônjuges subitem 231 Na comunhão parcial comunicamse apenas os bens posteriores ao casamento mesmo assim desde que não tenham sido adquiridos por doação ou sucessão por um dos cônjuges somente Em relação aos bens já titulados pelos consortes antes de se casarem continuam a pertencer ao seu titular com exclusividade subitem 232 Enfim na participação final nos aquestos a comunicação dáse nos bens adquiridos pelo esforço comum do casal a título oneroso durante a constância do casamento Quanto aos demais anteriores ou posteriores ao casamento operase a incomunicabilidade subitem 233 A comunhão pode ser universal abrangendo os bens anteriores e posteriores ao casamento parcial abrangendo unicamente os posteriores ou de participação final nos aquestos abrangendo os adquiridos na constância do casamento com o esforço comum A administração dos bens comuns no regime de comunhão universal ou parcial cabe a qualquer um dos cônjuges CC arts 1663 e 1670 Para os atos de administração desses bens pode em princípio cada cônjuge agir isoladamente não necessitando consultar ou colher a autorização do outro Apenas para a cessão do uso ou gozo de bens comuns a título gratuito a concordância dos dois cônjuges é indispensável art 1663 2º De qualquer modo se um deles se mostrar pródigo no exercício desse direito praticando atos de malversação de bens integrantes da comunhão ele poderá ser privado pelo juiz a pedido do outro consorte da competência para administrálos sozinho 3º Em caso de divergência entre os cônjuges acerca das providências de administração que melhor se ajustem ao patrimônio comum a sua superação deve ser feita pelo juiz a pedido de qualquer um deles a exemplo do que se verifica relativamente a qualquer outro caso de dissenso nas questões afetas à família CC art 1567 parágrafo único Se um dos cônjuges contrair dívida ficam obrigados os bens comuns CC art 1664 e os particulares dele bem assim os do outro cônjuge na proporção do proveito que tiver art 1663 1º Desse modo se o marido por exemplo toma empréstimo no banco para a construção da casa em que a família terá domicílio por essa obrigação respondem todos os bens do patrimônio comum e os particulares dos cônjuges porque tanto o mutuante quanto o outro se beneficiam igualmente do empréstimo Mas se a dívida é contraída para sanear um dano que um dos cônjuges antes do casamento havia causado ao bem que se comunicou o patrimônio particular do outro não responde tendo em vista que nenhum proveito trouxe para ele a obrigação 231 Comunhão universal O regime da comunhão universal de bens importa a comunicação entre os patrimônios dos cônjuges de todos os bens anteriores ou posteriores ao casamento salvo algumas exceções CC art 1667 Até 1977 correspondeu ao regime legal no direito brasileiro isto é àquele que devia ser observado no caso de os consortes não optarem expressamente por nenhum outro Como já assentado sempre preserva a lei uma margem mínima de incomunicabilidade de bens em atenção à proteção dos cônjuges que normalmente estão embriagados pelo espírito de desprendimento deles exigido às vésperas do matrimônio e não têm por isso plena isenção para tratar dos assuntos patrimoniais com racionalidade Assim a lei exclui da universalidade da comunhão a Os proventos do trabalhopessoal CC arts 1668 V e 1659 VI Os direitos que cada cônjuge passa a titularizar em razão de seu trabalho não se comunicam ao outro Em razão da personalidade do trabalho que em suas diversas modalidades se traduz em desgaste de forças físicas ou mentais do trabalhador os proventos correspondentes não devem ser repartidos nem mesmo com os cônjuges A exclusão aplicase a qualquer tipo de trabalho seja o despendido sob vínculo empregatício na condição de profissional liberal autônomo administrador de companhia empreitada ou qualquer outra forma de prestação de serviços É certo que na constância do casamento quando tais direitos são exercidos o dinheiro recebido a qualquer título em contraprestação ao trabalho ingressa no patrimônio do trabalhador e também na comunhão Um exemplo ajuda a aclarar a questão Pense no saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço FGTS Ele corresponde a um provento do trabalho assalariado que o empregador é obrigado a depositar numa conta bancária todo mês Sua liberação em favor do empregado só é autorizada em determinadas hipóteses como a extinção do contrato de trabalho por dispensa sem justa causa aposentadoria desemprego após certo período etc Lei n 803690 art 20 Pois bem enquanto não liberado o saldo tratase de proventos do trabalho pessoal do empregado que não se comunicam mesmo que ele seja casado no regime da comunhão universal Se o trabalhador se separa de fato antes de ocorrer o fato jurídico autorizando o levantamento do FGTS o outro cônjuge não tem nenhum direito sobre esse saldo nem mesmo proporcional ao tempo em que estavam casados Se a separação de fato contudo é posterior ao fato jurídico que autoriza o levantamento do FGTS o dinheiro passa a integrar o patrimônio comum e metade dele pertence ao outro cônjuge no regime da comunhão universal O mesmo critério adotase por exemplo no tocante aos honorários que o médico advogado ou outro profissional liberal tem a receber Ainda que o trabalho profissional fora prestado predominantemente durante a constância do casamento se o recebimento da remuneração ocorre quando finda a sociedade conjugal o outro cônjuge nenhum direito titula sobre o dinheiro correspondente Da mesma forma os honorários recebidos após o casamento vão para a comunhão mesmo que correspondam a trabalho despendido em sua maior parte antes do enlace matrimonial b Proventos da aposentadoria CC arts 1668 V e 1659 VII As pensões meiossoldos devidos aos militares na reserva montepios e outras rendas semelhantes a exemplo dos proventos do trabalho pessoal também não se comunicam enquanto não se traduzem em dinheiro disponibilizado ao cônjuge A partir do dia em que a sociedade conjugal termina cada cônjuge não divide mais com o outro o valor das pensões que passa a receber em relação contudo ao dinheiro correspondente às pensões vencidas anteriormente que se encontrar ainda no banco tem lugar a meação c Os bens de uso pessoal livros e instrumentos de profissão CC arts 1668 V e 1659 V Não se comunicam mesmo na comunhão universal os bens de uso pessoal roupas acessórios relógio de pulso telefone celular etc livros ou qualquer outro suporte de informação como CD ou DVD e instrumentos profissionais adquiridos mesmo com o esforço comum para o exercício da profissão por um dos cônjuges Em relação aos bens de uso pessoal importa destacar que as joias não se comunicam quando adquiridas pelo casal para uso de um deles somente como o solitário de muitos quilates que o marido presenteou à mulher no aniversário de casamento Mas se a mesma joia tiver sido comprada com o objetivo de investimento então integra a comunhão porque não se considera estritamente um bem de uso pessoal mas um ativo do patrimônio comum d Bens gravados com a cláusula de inalienabilidade ou de incomunicabilidade CC arts 1668 I e IV e 1911 Os bens doados ou testados ao cônjuge podem vir gravados com a cláusula de inalienabilidade ou de incomunicabilidade É o caso em que o doador ou testador não pretendeu estender a liberalidade ao cônjuge do donatário ou do legatário Se instituída apenas a cláusula de inalienabilidade considerase implícita a de incomunicabilidade se gravado o bem apenas com esta última ele poderá ser alienado mas continua não se comunicando ao cônjuge Igualmente não compõem a comunhão universal as doações antenupciais feitas por um cônjuge ao outro com a cláusula de incomunicabilidade Claro que não gravado o bem haverá comunicação ainda que se trate de doação antenupcial Se um dos nubentes presenteou o outro com um cãozinho o animal passa com o casamento a pertencer ao casal No divórcio o cônjuge que não ficar com ele tem direito a titular outros bens em valor equivalente em vista da indivisibilidade do cão e Bens gravados com fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário CC art 1668 II Se um dos cônjuges recebeu certo bem em fideicomisso ele será transmitido ao falecer não aos seus herdeiros mas à pessoa designada pelo testador Para que isso se verifique evidentemente não se pode dar a comunicação no caso de dissolução da sociedade conjugal do fideicomisso f Dívidas anteriores ao casamento CC art 1668 III As obrigações passivas de cada cônjuge constituídas antes do casamento não integram a comunhão universal O credor não pode executá la nos bens do outro cônjuge mas somente nos que o devedor trouxe para o patrimônio comum Exceção é aberta pela lei às dívidas provenientes de despesas com a preparação do matrimônio aprestos e demais que revertam em proveito comum Se o noivo contraiu empréstimo para comprar o anel de noivado objetivando causar vivíssima impressão à noiva o patrimônio comum responderá pela dívida correspondente já que se qualifica como despesa preparatória do matrimônio Na comunhão universal todos os bens anteriores ou posteriores ao casamento passam ao patrimônio comum Excetuamse da comunicação unicamente alguns bens expressamente relacionados pela lei como os gravados com a cláusula de inalienabilidade ou de incomunicabilidade os proventos do trabalho pessoal direitos autorais e outros g Direitos autorais CF art 5º XXVII Lei n 961098 art 39 Aos autores de obra intelectual pertencem com exclusividade os direitos autorais em razão de preceito constitucional por força do qual não cabe a comunicação pelo casamento Desfeita a sociedade conjugal os direitos autorais continuam a ser titulados exclusivamente pelo cônjuge autor 232 Comunhão parcial Na comunhão parcial a comunicação acontece basicamente com os bens adquiridos após o casamento CC art 1658 Mesmo que tenha sido registrado no nome de um só dos cônjuges aos dois pertence o bem se o título de aquisição é de data posterior à do matrimônio art 1660 I Também é dos dois o bem adquirido por fato eventual como o prêmio de loteria mesmo que a aposta tenha sido feita por um deles somente antes de se casar art 1660 II Nesse regime os bens anteriores ao casamento continuam a pertencer ao cônjuge que os trazia em seu patrimônio quando se casou CC art 1659 I A diferença fundamental em relação à comunhão universal está na exclusão dos bens que cada cônjuge já titularizava antes do casamento Se a mulher havia adquirido quando solteira ainda um apartamento esse imóvel permanece em seu patrimônio particular e não se comunica Terminando a sociedade conjugal o apartamento não será partilhado Para que não integre a comunhão é suficiente que o título aquisitivo tenha causa anterior ao matrimônio CC art 1661 Não interessa por conseguinte que o domínio se tenha transferido ao cônjuge na constância do casamento se o contrato de compra e venda celebrarase anteriormente Imagine que o marido havia adquirido antes de se casar uma obra de arte mas o vendedor não lha entregou prontamente como havia sido combinado A demanda judicial arrastouse e a entrega da obra de arte ao comprador ocorreu depois do casamento A propriedade mobiliária transmite se com a tradição mas como o negócio aquisitivo neste exemplo verificouse antes do casamento o seu objeto não se inclui na comunhão parcial Essa é a regra geral do regime de comunhão parcial de bens que obviamente comporta algumas exceções Não se comunicam nesse sentido ainda que adquiridos posteriormente à constituição da sociedade conjugal os seguintes bens a Os que não se comunicam na comunhão universal É decorrência lógica do conceito dos regimes de comunhão universal e parcial que neste último as exclusões são sempre maiores e nunca menores que no primeiro Em outros termos a parcialidade da comunhão amplia mas não reduz o arco de exclusões de comunicações quando contraposta à universalidade Dessa maneira também não se comunicam na comunhão parcial os bens recebidos por qualquer dos cônjuges a título de fideicomisso os proventos do trabalho pessoal ou da aposentadoria os bens pessoais livros e equipamentos de profissão e direitos autorais Na maioria dessas hipóteses preocupouse a lei em deixar claramente estabelecida a exclusão para que não pairassem incertezas CC art 1659 V VI e VII Lei n 961098 art 39 Na do fideicomisso incorreu em omissão mas evidentemente também não há nela qualquer comunicação b Os recebidos em doação ou por sucessão CC art 1659 I Quando o cônjuge casado em comunhão parcial recebe bem em doação ou por sucessão legítima ou testamentária não se verifica a comunicação Mesmo no caso de bem doado ou testado sem cláusula de inalienabilidade ou de incomunicabilidade a comunhão não ocorre Operase a comunicação porém se ambos os cônjuges são donatários herdeiros ou legatários CC art 1660 III Em tendo o doador praticado a liberalidade em favor do casal nenhum dos cônjuges pode pretender a titularidade exclusiva do objeto doado Nem mesmo se a parte liberal da doação for parente consaguíneo de uma delas em beneficiando a doação ou o testamento aos dois cônjuges estabelecese a comunhão c Os bens subrogados CC art 1659 II Havendo subrogação de bem do patrimônio particular de um dos cônjuges o subrogado também não integra a comunhão Por isso se o bem do patrimônio particular de um dos cônjuges é vendido o dinheiro correspondente ou a parte proporcional de outro bem em cuja compra ele foi empregado continua a pertencer apenas a ele Se o apartamento ou a obra de arte dos exemplos acima são alienados na constância do casamento o dinheiro pago pelo comprador pertence ao cônjuge que titulava o bem vendido ainda que venha a ser depositado em contacorrente conjunta Se tiver sido utilizado pelo casal como um dos recursos na compra de bem comum a partilha deste deverá ser desproporcional de modo a assegurar a exclusão do valor em que se subrogou o bem estranho à comunhão À semelhança do que vigora para os bens adquiridos antes do casamento também não se comunicam aqueles em que se tiverem subrogado os recebidos por doação ou sucessão d Obrigações anteriores ao casamento CC art 1659 III Pelas obrigações constituídas antes do casamento não respondem os bens comuns nem evidentemente os particulares do outro cônjuge O credor nesse caso só pode executar seu crédito mediante a penhora de bens do patrimônio particular do devedor isto é dos excluídos da comunhão e Obrigações provenientes de ato ilícito CC art 1659 IV Se um dos cônjuges pratica ato ilícito de que não provém benefício nenhum para o outro a obrigação de indenizar não se comunica ao patrimônio comum Isto é o credor da indenização não pode pedir em juízo a penhora de bens objeto de comunicação ou pertencentes exclusivamente ao outro consorte Haverá a comunhão da obrigação passiva apenas se o ato ilícito embora praticado por um só dos cônjuges importou locuple tamento também do outro Se o marido comete latrocínio e entrega o produto do crime à mulher que dele desfruta sem enrubescer o patrimônio todo do casal é responsável pela indenização da família da vítima No regime de comunhão parcial os bens adquiridos na constância do casamento se comunicam a menos que sejam provenientes de doação ou sucessão ou mesmo da subrogação de anteriores à constituição do vínculo matrimonial A comunhão parcial alcança as benfeitorias introduzidas em bens do patrimônio particular de cada cônjuge bem assim os frutos percebidos na constância do casamento ou pendentes ao tempo do término da sociedade conjugal CC art 1660 IV e V Desse modo se o apartamento que um dos consortes trouxe em seu patrimônio ao se casar é inteiramente reformado com o emprego de recursos comuns a valorização do bem não é apropriada exclusivamente por aquele As benfeitorias correspondentes à reforma ao contrário integram o patrimônio comum do casal e devem ser partilhadas em caso de divórcio De outro lado o aluguel recebido em razão da locação de bem particular de um dos cônjuges não lhe pertence com exclusividade mas faz parte da comunhão inclusive os vencidos e não pagos à data em que a sociedade conjugal se encerrar Em suma no regime de comunhão parcial podese distinguir de um lado o patrimônio particular de cada cônjuge composto pelos bens adquiridos antes do casamento recebidos por doação os proventos do trabalho pessoal as obrigações passivas constituídas anteriormente ao matrimônio etc e o comum adquiridos após o casamento benfeitorias nos particulares obrigações passivas em proveito da família etc Aquele é administrado exclusivamente pelo cônjuge que o titula que tem inclusive o direito de dele dispor a qualquer tempo se for imóvel e o outro cônjuge recusar a autorização caberá o suprimento e apenas sobre ele recaem as dívidas contraídas para a respectiva administração CC arts 1665 e 1666 233 Participação final nos aquestos O regime de participação final nos aquestos é novo no direito brasileiro tendo sido introduzido pelo Código Reale Tal como o da comunhão parcial tratase de um regime híbrido em que o patrimônio dos cônjuges se reparte em particular e comum Ao contrário deste porém só se comunicam os adquiridos na constância do casamento mediante o esforço comum do casal Como toda novidade tem despertado algumas incertezas para cuja superação infelizmente nem sempre o texto da lei ajuda como deveria Para compreender seus contornos e disciplina o critério mais útil é extremálo dos demais regimes A interpretação das normas legais referentes à participação final nos aquestos não pode nunca igualála ao regime da comunhão parcial ou da separação absoluta A meio caminho entre um e outro poderia ter sido chamado de separação relativa a participação final nos aquestos não pode perder sua especificidade No regime da participação final nos aquestos cada cônjuge mantém seu patrimônio próprio durante a constância do casamento neste aspecto aproximase do da separação absoluta e tem ademais direito à meação dos bens adquiridos pelo casal a título oneroso aqui a aproximação dá se com o regime da comunhão parcial CC art 1672 No patrimônio próprio de cada cônjuge encontramse os bens que já lhe pertenciam à época do casamento e os que ele adquirir a qualquer título na constância deste art 1673 A administração do patrimônio particular compete exclusivamente ao cônjuge que o titula e pelas dívidas por ele contraídas respondem apenas os seus bens mesmo quando posteriores ao casamento art 1677 Essas implicações só podem ser afastadas quando adotado o regime da participação final nos aquestos mediante disposição inserida de comum acordo no pacto antenupcial art 1656 Para exemplificar imagine que duas pessoas se casam no regime de participação final dos aquestos No dia anterior ao casamento ele tem em seu patrimônio um apartamento dois terrenos e um barco e ela uma casa de praia ações de uma sociedade anônima e obras de arte Casados esses bens não se comunicam continuando a pertencer a cada cônjuge O casamento dura oito anos ao longo dos quais ele herdou fração ideal de uma mansão e comprou mais três terrenos Ela por sua vez vendeu a casa de praia e comprou outra maior além de ter adquirido também alguns conjuntos de escritório Ao término da sociedade conjugal todos os bens que foram acrescidos ao patrimônio de cada cônjuge durante sua existência gratuita ou onerosamente alguns por sucessão outros por subrogação continuam a pertencer ao respectivo titular não se comunicando Imagine agora que ele e ela no terceiro ano de casados juntaram as economias e adquiriram uma casa na cidade onde fixaram o domicílio conjugal No quarto ano com dinheiro dos dois arremataram num concorrido leilão a tela de um afamado pintor Esses bens porque foram comprados com o esforço comum pertencem aos dois ainda que o imóvel esteja registrado no nome de um dos cônjuges somente e a nota fiscal de venda da obra de arte identifique apenas um deles como o adquirente Ele e ela titulam por isso a meação desta casa e pintura A comunhão nesse regime não se estabelece na constância do casamento mas somente ao término da sociedade conjugal Por isso quando adotada a participação final nos aquestos o cônjuge não tem a titularidade da meação enquanto casado Tornase meeiro somente no caso de dissolução do vínculo matrimonial e apenas dos bens adquiridos pelo esforço comum Nesse regime a meação fica suspensa enquanto perdurar o casamento ela não é renunciável cessível nem penhorável Com o fim do vínculo conjugal a partilha de bens tanto no juízo do divórcio como no sucessório CC art 1685 depende do cômputo do valor dos aquestos feito por meio de cálculo cuja complexidade infelizmente a lei não conseguiu captar de modo adequado Em outros termos no exemplo imaginado acima não haveria dificuldades na identificação dos bens componentes da meação Mas a vida é muitíssimo mais rica de possibilidades Ao longo dos anos de convivência podese perder na bruma dos negócios realizados a dimensão exata da contribuição de cada cônjuge na aquisição dos bens que passaram a integrar seus patrimônios Para mensurar o montante dos aquestos é necessário recuperar as informações atinentes a cada aquisição bem como trazer ao valor presente isto é atualizar para a data da dissolução do regime o preço pagamento desembolso ou quantia correspondente CC art 1683 O cálculo dos aquestos compreende então três etapas Na primeira são apurados os valores correspondentes aos bens que indubitavelmente integram o patrimônio particular ou seja aos listados no art 1674 do CC bens anteriores ao casamento e os que nele se subrogaram os adquiridos por cada cônjuge em razão de sucessão ou liberalidade as dívidas correspondentes Do valor do patrimônio particular de cada cônjuge deduzse então a soma dos valores desses bens É a etapa mais simples do cômputo dos aquestos porque em termos gerais corresponderão as deduções às exclusões do regime de comunhão parcial suficientemente conhecidas dos profissionais do direito Na segunda etapa devem ser considerados os valores dos demais bens adquiridos pelos consortes na constância do casamento para distinguir os que o foram com recursos individuais dos que resultaram de esforço conjunto do casal Em relação a esta parte do cálculo os critérios legais são três no caso de bens adquiridos pelo esforço comum cada cônjuge terá direito à metade CC art 1679 os bens móveis presumemse adquiridos na constância do casamento art 1674 parágrafo único e os imóveis são em princípio da propriedade daquele em cujo nome estiver registrado art 1681 Em decorrência do primeiro critério é absolutamente irrelevante o tamanho proporcional da contribuição de cada cônjuge para o esforço comum tendo havido este dividirseá o bem em quotas iguais isto é pela metade mesmo que um dos consortes tenha contribuído mais que outro na aquisição Em razão do segundo critério o cônjuge que reivindicar a propriedade exclusiva de bem móvel deve provar que já o titulava ao tempo do casamento ou que o adquiriu com recursos próprios Pelo terceiro e último critério de definição da titularidade dos bens potencialmente comuns se um dos cônjuges tiver contribuído para a aquisição de imóvel de cujo registro consta apenas o nome do outro cabelhe impugnar a titularidade exclusiva Mas atente uma vez feita a impugnação o ônus da prova do esforço comum não é do impugnante A lei atribui ao cônjuge em cujo nome está registrado o imóvel o dever de provar têlo adquirido com recursos particulares art 1681 parágrafo único Percebese com facilidade que o cônjuge casado no regime de participação final nos aquestos devese preocupar em conservar todos os documentos e informações atinentes a cada aquisição importante que tenha feito enquanto dura o casamento Se comprou um imóvel e o registrou em seu nome mas não puder provar tempos depois no término da sociedade conjugal que o fez exclusivamente com recursos próprios sem nenhuma contribuição material do outro cônjuge terá direito unicamente à meação do bem No caso de falecimento competirá a prova aos seus herdeiros a partir das informações e documentos que lhes chegarem às mãos A terceira etapa do cálculo dos aquestos diz respeito a certos ajustes Se um dos cônjuges doou algum bem sem a autorização do outro devese considerar que praticou a liberalidade em desfavor de seu patrimônio particular e não de bens comunicados O valor atual da doação deve ser imputado ao patrimônio particular do cônjuge doador CC art 1675 Outro ajuste relacionase aos bens alienados em detrimento da meação cujos valores devem ser imputados aos dos aquestos art 1676 Nesses dois casos o cônjuge prejudicado ou seus descendentes podem preferir a reivindicação do bem doado ou alienado ao ajuste no cálculo dos aquestos O terceiro ajuste é pertinente às dívidas de um cônjuge solvidas pelo outro com bens de seu patrimônio particular O valor atualizado do pagamento imputase à meação do cônjuge devedor como se tivesse havido uma antecipação desta art 1678 O derradeiro ajuste no cálculo dos aquestos diz respeito às dívidas de um dos cônjuges que não pode comprometer a meação do outro quando seu valor superar a do devedor art 1686 Procedido ao cálculo dos aquestos atribuise a meação a cada cônjuge ou seus herdeiros Sendo conveniente e possível dividirseão os bens em espécie Caso contrário o cônjuge proprietário pagará ao não proprietário em dinheiro o valor correspondente à meação Não dispondo aquele de numerário para fazer o pagamento alguns de seus bens após avaliação e autorização judiciais serão vendidos para a liquidação da partilha CC art 1684 e parágrafo único No regime da participação final nos aquestos os cônjuges conservam seus patrimônios particulares e ao término da sociedade conjugal no falecimento de um deles ou divórcio os bens adquiridos com o esforço comum do casal são divididos Num exemplo singelo considere que no divórcio de casal casado em regime de participação final nos aquestos o patrimônio em nome dele é avaliado em 300 e o em nome dela em 500 Ultrapassada a primeira etapa dos cálculos avaliase que os bens indubitavelmente excluídos da meação correspondem no patrimônio dele a 200 e no dela a 100 Na segunda etapa resta provado que um imóvel em nome da mulher foi adquirido com dinheiro proveniente exclusivamente do trabalho dela e que seu valor é 200 Na terceira etapa apurase que o marido pagou com seus recursos uma dívida da mulher correspondente a 30 Feitas as contas os aquestos montam 300 dos quais ele terá direito a 180 e ela a 120 Quer conferir Do valor do patrimônio do marido devese deduzir o dos bens indubitavelmente excluídos da meação 300 200 100 para alcançar o dos aquestos que se encontram no nome dele Já do valor do patrimônio da mulher para apurar os aquestos nele alocados devemse deduzir o destes bens e também o do que restou provado ter sido adquirido apenas com os recursos dela 500 100 200 200 Somase então o valor dos aquestos em nome de cada um dos cônjuges 100 200 300 Ele seria simplesmente dividido pela metade não fosse a necessidade do ajuste relativo à dívida dela paga por ele Ajustado o cálculo apurase o direito do marido em 180 300 2 150 150 30 180 e o da mulher em 120 300 2 150 150 30 120 3 A separação absoluta de bens No regime da separação absoluta nenhum dos bens dos cônjuges anteriores ou posteriores ao casamento se comunicam CC art 1687 A administração e a livre disponibilidade desses bens é titulada exclusivamente pelo cônjuge a quem pertence que prescinde da anuência do outro para alienar ou onerar bens imóveis assim como para fazer doações Não há nenhuma comunicação entre os bens de cada cônjuge no regime da separação absoluta Salvo no tocante às despesas do casal que a exemplo do que se verifica nos demais regimes são custeadas por contribuições proporcionais de cada cônjuge art 1688 o casamento celebrado nesse regime não produz efeitos patrimoniais Perceba a diferença entre os direitos do cônjuge relativamente aos seus bens no regime de separação e os referentes aos de seu patrimônio particular nos regimes híbridos da comunhão parcial e da participação final nos aquestos Em qualquer desses regimes a administração de tais bens é exclusiva do cônjuge que o titula Ele pode independentemente de consulta ou anuência do consorte explorálos economicamente ou deixálos sem produzir quaisquer frutos No tocante à disponibilização também ela é titulada com exclusividade pelo cônjuge a quem pertence o bem Mas enquanto no regime da separação absoluta a outorga uxória ou autorização marital nunca é necessária para a alienação ou oneração de bens nos regimes híbridos é indispensável quando disser respeito a imóveis ou doação A diferença reside então precisamente nesse ponto o casado no regime de separação pode dispor dos seus bens livremente independentemente de eventuais efeitos indiretos que o ato ocasione na economia do casal Quem no entanto se casa num dos regimes híbridos comunhão parcial ou participação final nos aquestos apenas pode dispor dos seus bens particulares se isso não agravar indiretamente a condição econômica do outro cônjuge Noutros termos se a disponibilização não puder agravála o interessado na venda de bens particulares conseguirá o suprimento judicial da autorização mas não a obterá se houver risco de agravo Em determinadas hipóteses o regime de separação absoluta é obrigatório A lei nelas não deixa à livre escolha dos cônjuges as estipulações atinentes à eficácia patrimonial do matrimônio Por considerar que essa liberdade pode prejudicar direitos de terceiros ou que os cônjuges podem não se encontrar em condições de tomar a decisão acertada a lei neutraliza qualquer efeito do casamento no âmbito patrimonial Seriam três as hipóteses de adoção obrigatória do regime da separação absoluta de bens a casamento feito a despeito da causa suspensiva b se pelo menos um dos cônjuges tem mais de 70 anos c se o enlace dependeu de suprimento judicial como nos casos de não ter um ou ambos os consortes alcançado a idade núbil ou se havia sido denegada a autorização dos pais ou tutores CC art 1641 Mas é inconstitucional a lei quando impede a livre decisão quanto ao regime de bens aos que se casam com mais de 70 anos Tratase de uma velharia que remanesce dos tempos em que se estranhava o casamento com idade elevada sendo então legítima a preocupação da lei em evitar a possibilidade de fraudes Hoje em dia a permanência da obrigatoriedade do regime de separação afronta o princípio constitucional da dignidade humana A doutrina já tem assentado o entendimento pela inconstitucionalidade do inciso II do art 1641 do CC Chinelato 2004289291 embora a jurisprudência ainda titubeie a respeito do tema Cahali 2004167182 Desse modo são apenas dois os casos de obrigatoriedade da adoção do regime de separação de bens De um lado o do casamento celebrado a despeito da causa suspensiva de outro o que dependeu de suprimento judicial Naquele justificase a adoção do regime da separação absoluta para evitar a confusão patrimonial de que poderiam advir danos a direitos de terceiros herdeiro excônjuge ou de um dos cônjuges pessoa tutelada ou curatelada Neste último a justificativa decorre da insuficiência de discernimento dos nubentes quanto ao melhor regime a adotar Depois de cessada a circunstância que justificou a obrigatoriedade do regime de separação ele não se altera ipso facto Afinal pode ser que os cônjuges teriam optado exatamente por esse regime se lhes tivesse sido dada a oportunidade Depois de superado o motivo determinante da causa suspensiva conclusão do inventário partilha dos bens do casamento anterior aprovação das contas do tutor ou curador ou uma vez alcançada a maioridade pelos dois consortes a mudança do regime de bens do casamento para outro que não o da separação depende de processo judicial item 5 Adotado o regime de separação absoluta o casamento não projeta outros efeitos patrimoniais além da obrigação de cada cônjuge contribuir proporcionalmente às suas rendas para as despesas do casal Em duas hipóteses a separação de bens é obrigatória quando o casamento é celebrado a despeito de causa suspensiva ou por suprimento judicial É inconstitucional a previsão da lei no sentido da obrigatoriedade desse regime também no casamento de pessoa maior de 60 anos Quando estava em vigor o Código Beviláqua a jurisprudência construiu o entendimento de que os cônjuges obrigados a casar no regime da separação teriam direito à meação nos aquestos ou seja nos bens adquiridos pelo esforço comum na constância do matrimônio O Supremo Tribunal Federal inclusive editara súmula a respeito no regime de separação legal de bens comunicam se os adquiridos na constância do casamento Súmula 377 O fundamento era um dispositivo legal que previa a comunicação dos bens adquiridos na constância do casamento mesmo não sendo de comunhão o regime adotado Posteriormente a jurisprudência estendeu o critério também para as hipóteses de separação convencional isto é aquelas em que os cônjuges adotaram o regime por livre vontade Gonçalves 2005411 A partir da vigência do Código Reale duas importantíssimas alterações no direito positivo ocorreram De um lado não se reproduziu aquela previsão da comunicação dos aquestos em qualquer regime de bens de outro introduziuse o regime da participação final nos aquestos Em razão dessas duas mudanças na lei não há mais razões para continuar o mesmo entendimento jurisprudencial A Súmula 377 do STF não se coaduna mais com o direito vigente Cahali 2004187188 Ao garantir aos casados a meação dos bens adquiridos pelo esforço comum as decisões judiciais nela fundamentadas a rigor anteciparam os contornos do regime de participação final nos aquestos Pois bem com a disciplina legal deste não há mais razões para negar ao regime da separação absoluta a inteireza de suas implicações jurídicas que são as de neutralizar qualquer implicação patrimonial do vínculo nascido com o casamento Nos casamentos celebrados a partir de 2003 portanto os nubentes que declararem a opção pelo regime da separação de bens não podem ser tratados como se tivessem feito declaração diversa ou seja como se tivessem escolhido o da participação final nos aquestos A tanto equivaleria o mais completo e descabido desprezo à vontade externada Desde então somente no caso de separação obrigatória podese cogitar de aplicação das normas do regime de participação final nos aquestos mesmo assim se o juiz identificar que a solução legal não necessariamente querida pelos consortes pode levar ao enriquecimento indevido de um deles em detrimento do outro Na minha opinião o regime obrigatório no casamento a despeito da causa suspensiva ou de jovens sem idade núbil não deveria ser o da separação mas sim o da participação final nos aquestos A separação absoluta de bens penso não deveria nunca ser obrigatória mas invariavelmente o produto da opção consciente e livre dos cônjuges Concluindo sob a égide do Código Reale quando adotado o regime convencional da separação de bens o casamento não produz nenhum efeito patrimonial Cada cônjuge continua o exclusivo titular de seus bens e nenhum deles tem direito a qualquer meação sobre os do outro ainda que adquiridos na constância do casamento a qualquer título com ou sem contribuição do casal Da inexistência de direito à meação não decorre nenhum enriquecimento indevido nem mesmo quando os dois cônjuges contribuíram para a aquisição do bem registrado ou documentado somente no nome de um deles E não há enriquecimento indevido porque os cônjuges ao escolherem o regime da separação declararam a vontade compatível com a inexistência da meação Quer dizer quem se casa voluntariamente no regime da separação absoluta e concorda que um bem adquirido em conjunto fique apenas no nome do outro cônjuge e não sob a cotitularidade dos dois renuncia a qualquer participação nele Se não concordasse com isso bastaria ter condicionado sua contribuição na aquisição deste bem à formalização da propriedade condominial Já na separação obrigatória em que os cônjuges não tiveram a oportunidade de escolher o regime a adotar podese admitir alguma flexibilização na ineficácia patrimonial absoluta do casamento reconhecendoselhe efeitos próximos ao do celebrado sob o regime da participação final nos aquestos como medida destinada à coibição do enriquecimento indevido quando e se este ocorrer 4 Pacto antenupcial Varia a forma de adoção do regime de bens do casamento segundo sua classificação Quando o regime escolhido é o da comunhão parcial basta o registro da declaração feita pelos nubentes nesse sentido nos autos do processo de habilitação Se os noivos quiserem se casar em outro regime devem celebrar o pacto antenupcial CC art 1640 parágrafo único Esse instrumento formal específico também é exigido na hipótese do casamento no regime de separação obrigatória Pacto antenupcial é o instrumento de formalização da vontade convergente dos contraentes relacionada aos aspectos patrimoniais de suas relações como casados É o meio de os cônjuges acordarem sobre seus bens não se limitando necessariamente à definição do regime matrimonial mas podendo tratar também dos antifernais que são os doados por um deles ao outro por ocasião do casamento e os parafernais isto é os adquiridos pela mulher na constância do casamento por doação do marido Fachin 2003187 Não têm validade os acertos feitos entre eles em outro documento mas apenas no pacto antenupcial que adota aliás obrigatoriamente a forma pública Nulo é o contrato sobre bens celebrado pelos nubentes por instrumento particular CC art 1653 Desse modo optando os nubentes por um regime de bens diferente do da comunhão parcial devem durante o prazo de habilitação procurar um tabelião para celebrarem por escritura pública o pacto antenupcial Em outros termos se o regime de bens é convencional o pacto antenupcial é obrigatório como veículo da convenção dos nubentes Mesmo que seja apenas para declarar que escolheram o regime da comunhão universal essa formalidade é indispensável É assim mais trabalhoso e custoso casarse quando o regime escolhido não é o da comunhão parcial O pacto sobre os aspectos patrimoniais do casamento deve ser feito necessariamente antes de sua celebração Não terá validade nenhuma o ajustado entre pessoas casadas porque por lei em vista da omissão da declaração tempestiva expedida pela forma correta o regime de bens será o da comunhão parcial Pretendendo os cônjuges alterálo ainda que em parte não será suficiente a declaração de vontade de ambos mesmo abrigada em escritura pública para mudar o regime eles deverão promover o processo judicial correspondente item 5 Quando o casamento não se realiza o pacto antenupcial não terá nenhuma eficácia CC art 1653 in fine Todas as suas disposições foram contratadas sob condição suspensiva Não terá validade a cláusula ou disposição do pacto antenupcial que contrariar disposição cogente da lei CC art 1655 Os nubentes obrigados ao casamento com separação de bens não podem por hipótese contratar no pacto antenupcial a plena comunicação dos adquiridos por qualquer um deles anteriormente à sua celebração O pacto antenupcial é celebrado necessariamente por escritura pública e claro antes da cerimônia do casamento Nele os nubentes podem contratar qualquer disposição acerca dos efeitos patrimoniais do matrimônio desde que não contrariem disposição cogente da lei A celebração do pacto antenupcial é obrigatória sempre que o regime de bens adotado não for o da comunhão parcial Finalmente para que tenha efeitos perante terceiros o disposto no pacto antenupcial deve ser registrado no Registro de Imóveis do domicílio conjugal CC art 1657 5 Alteração do regime Uma vez definido o regime de bens do casamento ele deve em princípio vigorar até o fim da sociedade conjugal É o princípio da imutabilidade do regime Embora esteja o princípio relativizado na lei em vigor a imutabilidade deve ser a regra em atenção a interesses não só dos cônjuges como de terceiros credores Sob a perspectiva dos cônjuges a possibilidade de mudança do regime pode dar lugar a pressões indevidas contra o consorte com menos capacidade de gerar dinheiro Imagine que a mulher é advogada e está prestes a ganhar honorários de sucumbência de valor expressivo que não pretende compartilhar com o marido um artista plástico não afamado O regime é o da comunhão parcial em função do qual o dinheiro desses honorários se comunicará assim que ingressar no patrimônio da advogada Se a mudança de regime fosse a regra ela poderia forçála brandindo a ameaça do divórcio Nesse exemplo em querendo o esposo manter o casamento deveria submeterse à alteração do regime para o da separação Já sob a perspectiva dos credores a mudança de regimes pode importar redução da garantia patrimonial de que desfrutam Se o devedor é casado no regime da comunhão a alteração para o da separação retiraria de seu patrimônio os bens que pelo primeiro se comunicavam Mesmo operada a mudança no sentido inverso do regime da separação para o da comunhão pode haver prejuízo aos credores de um dos cônjuges se o outro estiver insolvente Considere que o patrimônio líquido de um deles é acentuadamente negativo isto é esse cônjuge deve muito mais do que tem ao passo que o outro tem bens em valor que supera as suas dívidas mas não muito O credor desse último seria prejudicado pela transformação do regime de separação em comunhão porque sua garantia seria bastante reduzida desaparecendo eventualmente Em vista da atenção devotada a tais interesses pelo princípio da imutabilidade do regime de bens do casamento a mudança deste só a admite a lei em hipóteses excepcionais que são duas A primeira diz respeito ao estrangeiro casado que se naturaliza brasileiro Havendo concordância expressa do cônjuge ele pode exibindo o decreto de naturalização requerer ao juiz que determine a averbação da adoção do regime de comunhão parcial no Registro Civil LINDB art 7º 5º Tratase de mutação do regime patrimonial sujeita a duas restrições uma de ordem subjetiva porque acessível apenas aos brasileiros naturalizados que já eram casados antes da naturalização outra de ordem objetiva porque o novo regime não pode ser outro senão o da comunhão parcial A autorização do juiz é necessária inclusive para aferir a inexistência de prejuízos a terceiros A segunda hipótese não se baliza por tais restrições subjetiva e objetiva Quaisquer casados podem dela se beneficiar assim como a migração de regimes pode ter qualquer direção da comunhão para a separação da comunhão parcial para a universal da separação para a participação final nos aquestos etc Nesse caso a mudança depende do preenchimento de quatro requisitos a concordância dos cônjuges b autorização judicial c motivação pertinente e comprovada d preservação dos direitos de terceiros CC art 1639 2º Em razão do primeiro requisito a mudança do regime não pode verificarse em nenhuma hipótese contra a vontade de um dos cônjuges Provindo o regime de um contrato apenas por convergência da declaração volitiva dos dois contratantes pode ser mudado Se um dos cônjuges desta edição 2020 for interdito e o curador for o outro não se deve em princípio admitir a alteração do regime porque esse primeiro requisito não poderia ser substancialmente atendido O segundo requisito é a autorização judicial Não permite o direito brasileiro que os cônjuges promovam extrajudicialmente a mudança do regime de bens Tendo em vista os interesses prestigiados pelo princípio da imutabilidade apenas o pronunciamento judicial pode garantir que nenhum dos cônjuges nem terceiros estariam sendo prejudicados com a adoção do novo regime Se o juiz identificar que um dos requerentes não está pleiteando a mudança por sua livre e espontânea vontade ou que credores podem ter suas garantias reduzidas ou perdidas não deve deferir o pedido O requisito da motivação pertinente e comprovada definese por exclusão Não vêm ao caso os motivos que levaram os cônjuges a buscar a mudança do regime de bens Desde que não esteja nenhum deles sendo pressionado e não haja prejuízo aos credores o juiz deve atender ao pedido De qualquer modo as hipóteses mais corriqueiras são as ligadas ao regime da separação obrigatória por força das causas suspensivas ou da insuficiência da idade Nesses casos afastada a circunstância que obrigava a adoção da separação de bens em querendo os cônjuges adotar regime diverso devem requerer ao juiz A simples vontade deles que antes não pudera manifestarse livremente será suficiente para desencadear a mudança Pelo derradeiro requisito é incabível a mudança do regime patrimonial quando puder lesar direitos de terceiros Se eventualmente for deferida em juízo a alteração sem que o conhecimento judicial tivesse alcançado em razão das provas produzidas pelos consortes a possibilidade do prejuízo a terceiros perante esses ela não produzirá efeitos Em outros termos o credor continuará a titular a mesma garantia que titulava de acordo com o regime de bens do casamento do devedor existente à data da constituição da obrigação como se não tivesse ocorrido mudança O princípio é o da imutabilidade do regime de bens do casamento para que não haja prejuízo ao cônjuge com menor capacidade de gerar dinheiro nem a terceiros credores Há duas exceções Uma de âmbito bastante particular que autoriza o naturalizado brasileiro a adotar mediante concordância do seu cônjuge o regime de comunhão parcial Outra de âmbito geral que permite aos casados a alteração de regime em qualquer direção Nos dois casos é indispensável a autorização judicial e a inexistência de prejuízos a terceiros A alteração do regime de bens no casamento independe de pacto antenupcial mesmo que o novo regime não seja o da comunhão parcial Cahali 2004101111 A segurança jurídica associada ao processo judicial de mudança de regime transcende em muito a que poderia advir da escritura pública tornando essa formalidade dispensável 2020 02 13 PÁGINA RB41 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 58 DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE E DO VÍNCULO CONJUGAL Capítulo 58 Dissolução da sociedade e do vínculo conjugal 1 O fim do casamento Os noivos seus familiares amigos e em certo sentido a sociedade nutrem no dia do casamento a esperança de que ele dure para sempre A expectativa generalizada é a de que apenas a morte separará os que se uniram pelos laços matrimoniais Dados estatísticos porém permitem estimar que um em cada quatro casamentos termina em divórcio isto é com os cônjuges ainda vivos Durante muito tempo no Brasil vigorou a regra da indissolubilidade do casamento Éramos o único país a consagrála no plano das normas fundamentais mediante dispositivo inserto na Carta de 1934 e reproduzido nas de 1937 1946 1967 e 1969 Cahali 197839 Na lei previase o desquite destinado à mera separação de corpos e bens daqueles cujo casamento era motivo de infelicidade mais que de gozo A tecnologia jurídica por vezes discutia a pertinência da regra da indissolubilidade Clóvis Beviláqua chegou a advogar por algum tempo a adoção pela lei do divórcio com a máxima parcimônia mas em função do que considerava ser condições especiais da sociedade brasileira a saber respeitabilidade da família honestidade das nossas patrícias e costumes do povo tornou se árduo defensor da indissolubilidade do vínculo postura que defendeu ardentemente durante os debates parlamentares em torno do primeiro Código Civil 1896284287 Predominava entretanto certo distanciamento costumando os autores partir do direito positivo sem problematizar em demasia a questão Eduardo Espínola por exemplo ao fim de nota de rodapé dedicada à discussão do tema na doutrina francesa simplesmente anotou o receio de que em vista das uniões irregulares a ausência do divórcio mais prejudicasse que auxiliasse a instituição do casamento 1954459477 Até 1977 o Brasil era um dos poucos países em que ainda não existia o divórcio vincular isto é dissolvente do vínculo Além dele àquela época consideravam indissolúvel o casamento apenas mais cinco Argentina Bolívia Chile Colômbia e Espanha Pereira 1972169170 Naquele ano no contexto de um amplo debate no seio da sociedade Nelson Carneiro parlamentar cuja trajetória política foi construída sobre o tema da modernização do direito de família conseguiu finalmente a aprovação de emenda constitucional de sua autoria abolindo a regra da indissolubilidade do casamento A Igreja Católica atuou como a principal força social mobilizada na tentativa de evitar a aprovação da emenda Carneiro O Brasil era como ainda é um país predominantemente católico Como desde o concílio de Trento no século XVI a doutrina católica fortemente arraigada na cultura dos brasileiros não admitia senão o divórcio quoad thorum et mensam isto é a separação de corpos dos cônjuges sem dissolução do vínculo matrimonial a aprovação da emenda divorcista não ocorreu ao largo de grandes dificuldades Importa atentar ao contexto em que o divórcio foi introduzido no direito brasileiro porque a força da Igreja Católica e de sua mobilização induziram em 1977 a solução de compromisso de que resultou uma disciplina ambígua do instituto Em outras palavras a Constituição admitiu o divórcio mas sem facilitar demasiadamente a dissolução do vínculo O desquite não deixou de existir Renomeado de separação tornouse uma etapa juridicamente indispensável à completa terminação do vínculo que só podia ser requerida por quem já estivesse separado há pelo menos dois anos Não existia o divórcio direto senão como norma constitucional transitória destinada a atender à situação dos separados de fato há pelo menos cinco anos Só se podia divorciar uma única vez na vida Se o divorciado contraísse novas núpcias o vínculo não podia ser dissolvido por sua iniciativa Essa ambiguidade que marcou a introdução do instituto no direito brasileiro refletiuse na ordem positiva em vigor por mais de trinta anos É verdade que a Constituição de 1988 minorou as dificuldades para a dissolução do vínculo matrimonial Mas não as eliminou por completo Exigia ainda quando editada a fase da separação embora tivesse reduzido para um ano o interregno necessário à conversão em divórcio e tornado por outro lado permanente a figura do divórcio direto condicionandoo à separação de fato por dois anos Manifestação dessa ambiguidade no tratamento do instituto também se encontrava até julho de 2010 no Código Civil que levado ao pé da letra não autorizava a separação e o divórcio quando simplesmente um dos cônjuges havia deixado de amar o outro Quando eu era criança ouvia os mais velhos dizerem quando um não quer dois não se separam Essa estranha visão de como devem ser tratadas as relações afetivas entre duas pessoas adultas estava incorporada na lei Se um dos cônjuges não concordasse em requerer a separação consensual ao outro o Código Civil abria unicamente as alternativas de deteriorar o relacionamento conjugal a ponto de surgir algum motivo para a ruptura litigiosa ou separarse de fato por pelo menos dois anos para ter direito ao divórcio direto Era a maneira mais estúpida que posso imaginar de tratar assunto tão delicado A vida em comum pode estar longe de ser insuportável porque há respeito e assistência mútua entre os cônjuges e cada um cumpre satisfatoriamente a sua parte na organização do cotidiano Mas mesmo sendo plenamente suportáveis a convivência e a coabitação pode ocorrer de um dos consortes não amar mais o outro e querer se desligar do vínculo para ter a oportunidade de vivenciar livre e honestamente novas relações amorosas Não ignorasse a jurisprudência a anacrônica limitação daquelas hipóteses legais de separação essa pessoa estaria obrigada a continuar casada até que a vida em comum se tornasse insuportável Isso era um completo disparate A procurar evitar a completa deterioração do relacionamento e preservar o que ele ainda tem de saudável para o bem da família e principalmente dos filhos o Código Civil parecia preferir a punição dos casados que decidem a certa altura da vida buscar novo casamento A ambiguidade então se manifestava a separação quando ainda existia tal como disciplinada na lei brasileira martirizava em vez de facilitar a vida dos que queriam terminar o casamento Em julho de 2010 o direito de família brasileiro passou por uma profunda e salutar transformação com a promulgação da EC n 66 A partir de então a dissolução do casamento pelo divórcio não ficou mais dependendo de prévia separação judicial por mais de um ano ou de separação de fato há mais de dois Na verdade desde essa emenda constitucional o casamento pode ser dissolvido por divórcio independentemente de qualquer condição Vale dizer a qualquer tempo mesmo que tenham se casado há dias semanas ou poucos meses os cônjuges podem pôr fim ao vínculo matrimonial divorciandose por mútuo acordo ou litigiosamente Não havendo consenso qualquer um deles pode pedir o divórcio ao juiz fundamentando o pedido no descumprimento de dever conjugal pelo demandado ou senão na mera vontade de pôr fim ao casamento Não se trata propriamente de nenhuma grande inovação do direito brasileiro Em outros lugares como na maioria dos estados dos Estados Unidos por exemplo o rompimento unilateral do vínculo marital independentemente de culpa do outro cônjuge sempre foi generalizadamente admitido ScottScott 1999204 O alcance desta emenda constitucional foi bastante amplo mas aparentemente ela não conseguiu eliminar por completo a ambiguidade que cerca o instituto desde 1977 Apesar de terem ficado incompatíveis com a Constituição todos os dispositivos do Código Civil referentes à separação há doutrina e julgados que não os consideram revogados Não se conseguiu ainda o total expurgo da disciplina da matéria que condiciona o desfazimento da sociedade conjugal à insuportabilidade da vida em comum revelando o quanto ainda tem força o pensamento conservador a respeito do fim do casamento Até 1977 o Brasil era o único país do mundo a adotar na Constituição a regra da indissolubilidade do vínculo matrimonial O prestígio desfrutado por esse princípio deviase em grande parte à forte penetração do Catolicismo na sociedade brasileira Naquele ano em meio a intenso debate aprovouse emenda constitucional introduzindo o divórcio A ordem jurídica ainda tentou livrarse dessa ambiguidade no trato do tema com a Emenda Constitucional n 66 de julho de 2010 Mas como não excluiu explicitamente a separação há doutrina e julgados que consideram ainda vigente essa forma de desfazimento da sociedade conjugal Como visto anteriormente o que eterniza o casamento na maioria das vezes não é o amor ou a gratificação sexual mas a adequada repartição das tarefas do cotidiano Isso não significa porém que a carência de amor ou de sexo gratificante seja sempre desconsiderada na hora de se decidir não continuar casado com determinada pessoa Não há contradição entre as afirmações uma descreve o ingrediente de preservação da maioria dos casamentos que se perpetuam outra diz acerca dos motivos que podem ser levados em conta em alguns dos que se desfazem No estudo da dissolução do casamento após examinar os aspectos particulares do divórcio item 2 e de sua repercussão nas questões da proteção da pessoa dos filhos item 3 partilha de bens item 4 e eventualmente no nome dos cônjuges item 5 faço ainda referência à antiga figura da separação item 6 Registro por fim que o divórcio não é a única via de dissolução da sociedade conjugal Ela termina também com a nulidade ou anulação do casamento Cap 56 item 7 e a morte dos cônjuges ou de um deles CC art 1571 No caso de morte presumida em vista da ausência de um dos consortes o vínculo conjugal é desfeito podendo o cônjuge sobrevivente casarse novamente como se viúvo fosse art 1571 1º 2 O divórcio O divórcio é o meio de dissolução do casamento válido enquanto vivos os dois cônjuges No passado a interferência do Estado neste assunto era significativa e a ordem jurídica em razão de valores arcaicos sobre a família impedia por meio de condições temporais e formais a livre manifestação da vontade de qualquer dos cônjuges de se desligar do vínculo matrimonial No direito brasileiro da atualidade esta interferência está limitada ao essencial vale dizer à preocupação com os filhos Se não há filhos menores ou incapazes os cônjuges podem se divorciar a qualquer tempo por mera declaração de vontade formalizada por escritura pública Mesmo no caso de divórcio litigioso não é mais necessário terse verificado qualquer motivo objetivo descumprimento de dever conjugal insuportabilidade da vida em comum doença etc bastando a mera vontade de um dos cônjuges de não continuar casado Como já se disse antes quando eu era pequeno ouvia os mais velhos dizerem quando um não quer dois não se separam Isto de certa forma estava incorporado no direito de família brasileiro até a revolucionária EC n 662010 Desde então podemos felizmente afirmar que no Brasil quando um não quer dois não continuam casados A pessoa divorciada readquire o direito de se casar novamente Se tiver sido feita a partilha dos bens no divórcio poderá adotar nas novas núpcias qualquer regime Fica porém obrigada a contraílas no regime de separação absoluta enquanto não tiver sido feita a partilha dos bens do casamento dissolvido CC art 1523 III Quanto à espécie o divórcio pode ser amigável ou litigioso item 21 quanto à forma pode ser judicial ou extrajudicial item 22 21 Espécies de divórcio São duas as espécies de divórcio amigável ou litigioso Na primeira espécie os cônjuges concordam que não é mais o caso de continuarem casados Ainda que cada um deles tenha motivos próprios e não raro atribua ao outro a culpa pelo fim da experiência conjugal partilham pelo menos uma opinião a respeito do relacionamento não convém mais insistir nele Esta é uma condição necessária mas não suficiente Para que o divórcio seja amigável os cônjuges devem ainda chegar a acordo sobre filhos e nome Sem que os dois concordem inteiramente a respeito da guarda dos filhos menores e a conservação ou mudança do nome de casados o divórcio amigável não tem lugar Em relação à partilha de bens como é possível postergála a momento ulterior o divórcio amigável pode se realizar mesmo sem acordo absoluto nesta questão mas o consenso deve ser alcançado relativamente às demais término do vínculo filhos e nome Os divorciados podem a qualquer momento contratar a partilha dos bens extrajudicialmente por instrumento privado ou escritura pública a depender da espécie de bem Não chegando a acordo qualquer um deles pode propor a ação judicial de partilha O divórcio amigável depende de dois requisitos Primeiro o mútuo consentimento vale dizer a convergência de vontade dos dois cônjuges no sentido de que o melhor para eles e para a família é o afastamento mediante a dissolução do vínculo conjugal Havendo filhos menores ou incapazes essa vontade deve ser manifestada perante o juiz que pela lei processual deve ouvir cada um dos cônjuges em separado e em seguida o casal Assim como a vontade para casar a de separar deve ser livre e espontânea O juiz deve ficar convencido de que nenhum dos consortes está sendo obrigado por ameaça física ou meios morais a se divorciar Havendo a menor dúvida a respeito da liberdade e espontaneidade da declaração a homologação judicial não pode ser concedida Se o casal não tiver filhos menores ou incapazes o mútuo consentimento pode ser expresso perante o notário que o registrará em escritura pública Também nesse caso deve ser livre e espontânea a vontade de pôr fim à sociedade conjugal devendo o escrivão recusarse a lavrar o ato se tiver razões para crer que este requisito não está atendido Segundo o atendimento à formalidade legal que pode ser a escritura pública se não houver filhos menores ou incapazes ou a sentença judicial Em qualquer caso uma ou outra formalidade é indispensável ao registro do divórcio no Registro Civil Não é requisito do divórcio nem mesmo do amigável o transcurso de qualquer prazo mínimo do casamento Mesmo sendo inevitáveis os ajustes a que estão jungidos os casados no começo de qualquer relacionamento matrimonial em função dos quais se manifestam dissentimentos e ressentimentos a disciplina constitucional da dissolução do vínculo não a condicionou a nenhum lapso temporal Transcorrido o tempo que for dias semanas meses considera a Constituição a partir de julho de 2010 que cada cônjuge é suficientemente capaz de saber se o amadurecimento de sua percepção acerca da experiência que está vivenciando lhe permite formular a vontade de nela não prosseguir O divórcio amigável processase por declaração convergente dos cônjuges manifestada perante o juiz ou se não tiverem filhos menores ou incapazes por escritura pública independentemente do tempo de duração do casamento A menos que haja no acordo de divórcio cláusula prejudicial aos interesses de um dos cônjuges ou dos filhos o juiz deve homologálo A outra espécie de divórcio é o litigioso O divórcio é litigioso em primeiro lugar quando um dos dois não quer terminar o casamento Não é necessário que o autor impute ao réu na ação de divórcio o descumprimento de qualquer dever matrimonial basta que manifeste sua vontade de se divorciar Evidentemente se houve descumprimento e o autor da ação de divórcio quer a condenação do outro cônjuge pode fundamentar o pedido neste fato mas é dispensável alegar ou provar qualquer fato além da mera vontade de pôr fim ao vínculo matrimonial Reconhecida a culpa de um dos cônjuges na ação de divórcio a ele são impostas três sanções A primeira tem natureza processual Falo da condenação nas verbas de sucumbência do processo tais como os honorários do advogado do outro cônjuge e as custas judiciais É a única punição que sempre sofrerá o cônjuge culpado independentemente de qualquer circunstância Muitas vezes o litígio se prolonga apenas em função da mesquinharia das duas partes relativamente ao pagamento dessas verbas A segunda sanção derivada do reconhecimento judicial da culpa pelo fim do vínculo conjugal aplicase apenas se o culpado tiver adotado o sobrenome do outro cônjuge ao se casar De modo geral se o consorte inocente requerer a mudança e ela não trouxer prejuízos aos interesses do culpado este último perderá o direito de conservar o nome de casado Por evidente se nenhum dos cônjuges mudou seu nome ao contrair núpcias a imputação de culpa pela separação a qualquer um deles não terá nenhuma implicação item 5 Por fim a derradeira sanção está ligada aos alimentos O cônjuge condenado pelo fim do casamento se não dispuser de recursos para se manter terá direito somente aos alimentos mínimos isto é unicamente os indispensáveis à subsistência Tendo contudo ambos os cônjuges renda suficiente para manter uma vida de bom padrão será indiferente se a dissolução da sociedade conjugal deveuse à culpa de um deles Cap 61 subitem 14 Pode ser litigioso também o divórcio no caso em que os cônjuges concordam em dissolver o vínculo matrimonial mas não conseguem alcançar acordo completo relativamente a bens filhos e nome Exemplos a mulher quer a guarda unilateral dos filhos mas o marido deseja a compartilhada ou os dois disputam quem vai ficar com a casa da praia ou ainda ele quer que ela deixe de usar o seu sobrenome mas ela resiste Aqui o processo judicial de divórcio terá por objeto a superação do conflito de interesses sobre a questão ou as questões não acordadas O divórcio é litigioso em dois casos se um dos cônjuges não tem vontade de se divorciar ou se não há acordo completo sobre as questões envolvidas no fim do casamento filhos menores nome e bens No primeiro abremse ao autor da ação duas alternativas alegar apenas sua simples vontade de se divorciar ou imputar ao outro cônjuge a culpa pelo fim do casamento Nesta última se realmente restar provado que um dos cônjuges foi culpado pelo divórcio ele expõese às seguintes sanções pagamento da sucumbência perda do direito de usar o nome de casado e direito apenas aos alimentos mínimos Na maioria das vezes o divórcio que começa litigioso termina amigável O desgaste emocional é muito grande porque mesmo se alegando a mera vontade de descasar pode vir à tona discussão sobre detalhes negativos da vida íntima do casal No meio do caminho as partes exauridas acabam se entendendo muito em função dos aconselhamentos do juiz e dos advogados Percebem ser mais saudável a todos o acordo tendo em vista que a sobrevivência do casamento depois de um deles ter entrado com a ação judicial pleiteando seu fim está irremediavelmente comprometida 22 Formas do divórcio Ainda que todo divórcio litigioso seja judicial nem todo divórcio judicial é necessariamente litigioso Por vezes os cônjuges estão de acordo sobre todas as questões pertinentes ao fim do casamento mas ainda assim só podem se divorciar em juízo por meio de ação de divórcio amigável A lei só autoriza o divórcio amigável extrajudicial feito mediante escritura pública no caso de não existirem filhos menores ou incapazes e estarem os cônjuges assistidos por advogado ou defensor público ainda que comum CPC art 733 Mesmo assim convém anotar que se trata de uma opção dos cônjuges Independentemente dos motivos mesmo podendo se divorciar extrajudicialmente eles têm o direito de pleitear a desconstituição do vínculo matrimonial em juízo O divórcio judicial pode ser proposto a pedido dos cônjuges se amigável de um deles somente se litigioso ou do curador ascendente ou irmão do cônjuge incapaz CC art 1582 Sendo obrigatório o divórcio judicial ou tendo os interessados optado por esta via o juiz se considerar que o acordo de separação não preserva suficientemente os interesses dos filhos menores ou de um dos cônjuges pode denegar a homologação Imagine que o acordo estabeleça a completa desoneração de um dos cônjuges do encargo de sustentar a prole comum Essa cláusula pode ter sido forçada pelo consorte exonerado como condição para consentir com a separação amigável Havendo elementos que indiquem o despropósito da composição os dois têm rendimentos semelhantes ou o que ganha mais é o dispensado de contribuição o juiz não só pode como até mesmo deve indeferir a homologação para evitar que do casamento um dos cônjuges saia prejudicado Ele tem contudo o dever de fundamentar especificamente a denegação consignando na sentença qual ou quais pontos do acordo de divórcio considera inapropriados Desse modo os cônjuges podem alterálo visando obter a homologação judicial No divórcio judicial amigável não pode o juiz alterar o conteúdo do acordo a que chegaram os cônjuges Ou simplesmente o homologa ou denega a homologação explicitando por que tem determinadas cláusulas por indevidas O divórcio pode ser amigável ou litigioso Será amigável se os cônjuges concordam quanto ao fim do vínculo à guarda de filhos menores e ao nome a partilha de bens pode ser postergada Se não concordarem com pelo menos um destes pontos o divórcio será litigioso De outro lado o divórcio pode ser judicial ou extrajudicial Sendo amigável só poderá ser extrajudicial se o casal não tiver filhos menores ou incapazes Havendo ou sendo o caso de litígio o divórcio deve ser feito por ação judicial Antes da ação de divórcio pode ser intentada a separação judicial de corpos normalmente com pleito de medida liminar Tratase de medida cautelar cada vez mais rara destinada a formalizar a inexistência de culpa do consorte que deixou o lar Se um dos cônjuges por exemplo é vítima de maustratos infligidos pelo outro precisa protegerse afastandose fisicamente do domicílio conjugal mas não quer correr o risco de ser considerado o culpado pela separação para não perder o direito aos alimentos compatíveis com sua condição social ou ao uso do nome de casado a medida de separação de corpos preserva seus interesses Não sendo essa a situação dispensa se a ação cautelar porque como visto o fim da coabitação não importa necessariamente o abandono do lar 3 A guarda dos filhos As relações familiares horizontal e vertical são independentes Uma não interfere ou melhor não pode interferir na outra Se deixa de existir entre o pai e a mãe a relação de conjugalidade horizontal isso em nada afeta o vínculo de ascendência e descendência que os liga aos filhos vertical O fim da sociedade ou do vínculo conjugal portanto não implica nenhuma alteração nos deveres e direitos que os pais têm em relação aos filhos A lei o afirma de modo explícito relativamente ao divórcio CC art 1579 mas também em outros casos de dissolução da sociedade conjugal assim a viuvez e a invalidação do casamento a regra é igual Tampouco o novo casamento do pai ou da mãe pode interferir nos deveres e direitos que têm em relação à filiação Ademais quem casa com alguém que tem filho deve recebêlo e tratálo como se fosse seu E quem tem filhos de casamento anterior ao contrair novas núpcias pode exigir do consorte que devote a eles a mesma atenção e cuidados esperados de um pai ou de uma mãe A maior preocupação do casal do juiz e da própria sociedade quando o vínculo conjugal se desfaz voltase para os filhos menores Eles são os emocionalmente mais vulneráveis aos percalços do processo de divórcio Envoltos pelas dificuldades inerentes à superação do complexo de Édipo meninos e meninas fantasiam muitas vezes que têm a inteira culpa pelo desfazimento do vínculo matrimonial dos pais Por instinto natural por outro lado têm a percepção de que dependem do amparo paterno e materno para o seu desenvolvimento e temem acerca de seu próprio bemestar Ficam inseguros com o divórcio e mais que nunca precisam de atenção e consideração Para bem cumprir suas obrigações de pais os que se divorciam devem ser sensíveis ao extremo com as nuanças da situação a que a dissolução da sociedade conjugal leva os seus filhos menores Mesmo se são já adolescentes a sensibilidade dos pais não pode ser menor O divórcio costuma ser estressante para toda a família Na ordem positiva a preocupação com a pessoa dos filhos menores extensiva aos maiores incapazes CC art 1590 diz respeito fundamentalmente com a guarda Tratase de um direito titulado pelos pais associado a um complexo de deveres um poderdever O titular da guarda fica com o filho sob seus cuidados diretos convive com ele acompanhalhe o crescimento ajuda nos desafios do cotidiano isso tudo não se consegue definir exatamente se é encargo ou gratificação 31 Espécies de guarda A guarda uma das manifestações do poder familiar CC art 1634 II pode ser unilateral ou compartilhada art 1583 Na guarda unilateral antigamente denominada partilhada o filho fica com um dos pais enquanto ao outro se concede o direito de visitas CC art 1589 e o dever de supervisionar os interesses do filho art 1583 5º Nessa espécie o filho mora com o ascendente titular da guarda que tem o dever de administrarlhe a vida cotidiana levandoo à escola ao médico e às atividades sociais providenciando alimentação e vestuário Ao outro cabe conviver com o filho em períodos de duração variada algumas horas ou dias previamente estabelecidos de comum acordo com o titular da guarda Nessas oportunidades chamadas legalmente de visitas o ascendente que não tem a guarda pega o filho em casa levao a passeios ou eventos familiares temno em sua convivência e o devolve no horário aprazado Durante a visita o pai ou a mãe que não titula a guarda responde pela saúde física e mental e bemestar do menor Notase que o direito de visita tem sido reconhecido também a outros parentes assim os avós e tios e até mesmo a quem a despeito da inexistência de qualquer vínculo familiar com os pais ou filhos nutre com esses uma intensa relação de afeto como os padrinhos e madrinhas Bittencourt 2003208214 No divórcio em que a guarda é unilateral cabe também definir portanto os momentos em que os demais titulares do direito de visita poderão conviver com os filhos menores dos divorciandos A hipótese usual é a de disciplina do direito de visita dos avós paternos quando a guarda fica com a mãe ou dos maternos se ela fica com o pai A atribuição da guarda a um dos genitores em nada altera a extensão do poder familiar no que diz respeito aos demais direitos e deveres Mesmo o pai ou a mãe que não titula a guarda continua a participar do poder familiar Se o filho não vai bem na escola a responsabilidade por encaminhar uma solução não cabe exclusivamente ao titular da guarda mas a ambos os pais Se o menor precisa de aconselhamento cuidados médicos diversão ou atenção e carinho não se pode omitir o pai ou a mãe que não titula a guarda sob pretexto de dela estar excluído Na guarda compartilhada ou conjunta os dois pais continuam a titularizála mesmo após o desfazimento da sociedade conjugal Nessa alternativa o filho tem duas residências uma com o pai outra com a mãe Nenhum deles tem propriamente direito de visitas mas para o bemestar do menor é indispensável que seja combinado de antemão os momentos de convivência com cada um dos ascendentes Quanto maior a criança ou adolescente mais apropriada se mostra essa espécie de guarda Sua eficiência contudo depende de elevado grau de cooperação entre os pais divorciados de sua maturidade em colocar os interesses do filho acima dos deles cf Leite 1997257286 Tepedino 2004309 A espécie de guarda a ser adotada se unilateral ou compartilhada deve ser objeto de acordo entre os pais Não alcançado acordo o juiz deve determinar o compartilhamento a menos que um dos genitores não esteja apto ao exercício do poder familiar ou declare não querer a guarda do filho A guarda dos filhos menores e dos maiores incapazes pode ser unilateral ou compartilhada Na guarda unilateral um dos pais a titula ficando o outro com o direito de visitas Na guarda compartilhada os dois genitores continuam a titularizála mesmo depois da dissolução do vínculo conjugal Deve ser adotada sempre que possível a guarda compartilhada se os genitores não chegarem a acordo sobre o tema exceto se um deles não estiver apto para o exercício do poder familiar ou declare não querer a guarda do filho Além da guarda unilateral e da compartilhada previstas em lei devese fazer menção também à guarda alternada que corresponde à atribuição periódica da guarda a cada pai Neste semestre ou ano por exemplo o filho fica com a mãe e o pai tem o direito de visita no próximo invertese e ele fica com o pai e a mãe o visita nos horários e dias previamente definidos Esta espécie de guarda nem sempre se tem revelado uma alternativa adequada para o menor cuja vida fica cercada de instabilidade Não convém seja adotada a não ser em casos excepcionais em que por exemplo os pais residem em cidades distantes ou mesmo em diferentes países No divórcio consensual a guarda dos filhos menores é uma das cláusulas do acordo a que chegam os cônjuges Neste caso como visto o divórcio é necessariamente judicial O juiz deve verificar se a composição feita pelo casal corresponde à melhor para a criança ou adolescente Se considerar que ela não é recomendável naquele caso em particular ou teria resultado de pressão indevida de um dos cônjuges sobre o outro não deve homologar o acordo Estando contudo suficientemente preservados os direitos dos filhos e cônjuges prevalecerá a vontade convergente desses últimos expressa no acordo de divórcio Se litigam os cônjuges sobre a guarda e não se mostra viável o compartilhamento o juiz deve atribuíla àquele que revelar ter melhores condições para o seu exercício CC art 1584 II Se perceber por exemplo que o pai é muito mais maduro que a mãe que ele revela estar mais preocupado com os filhos do que ela o juiz deve darlhe a guarda em disputa notando ao revés ter sido a mãe o mais presente dos cônjuges na vida dos filhos até então que os conhece muito mais do que o pai convém atribuir a guarda a ela Não havendo porém nenhuma diferença acentuada entre os pais mostrandose ambos igualmente aptos a exercer a guarda e nenhum deles a recusando deve o juiz como visto concedêla aos dois conjuntamente Em qualquer caso o juiz pode ouvir o menor para conhecer sua vontade antes de decidir sobre a questão da guarda A concepção que por muito tempo vagou pelos feitos de separação e divórcio de que a mãe estaria naturalmente inclinada a exercer melhor a guarda dos filhos do que o pai é puro machismo Não existe essa inclinação natural Sua difusão atendia mais à necessidade de explicar o confortável distanciamento dos pais como uma exigência da natureza humana do que aos interesses dos filhos Homens e mulheres estão igualmente aptos a cuidar da descendência Apenas nos primeiros meses de vida do filho enquanto é amamentado pode se cogitar da maior importância da presença materna Na espécie humana em vista do atual estágio de evolução uma vez desmamado o rebento qualquer um dos ascendentes pode cuidar dele de modo satisfatório O melhor evidentemente é que o menor tenha os cuidados tanto do pai como da mãe estejam casados ou não A necessidade psicológica de ter pai e mãe o filho atenderá como a espécie tem atendido desde tempos imemoriais substituindo o ausente por alguém próximo que lhe faça as vezes marido da mãe ou esposa do pai avô ou avó tio ou tia irmã ou irmão mais velho etc Das necessidades morais materiais físicas educacionais e sociais contudo o pai ou a mãe pode sozinho dar conta O cônjuge que ficar com a guarda unilateral ou compartilhadamente pode perdêla a qualquer momento se comprovado que a convivência é perniciosa à formação do menor Por essa mesma razão o juiz pode transformar a guarda conjunta em individual deferindoa por óbvio ao outro cônjuge Não é motivo para a perda da guarda o novo casamento do pai ou da mãe que a titula CC art 1588 Em casos excepcionalíssimos constatando o juiz que nem pai nem mãe estão em condições de titular a guarda poderá deferila a família substituta CC art 1584 5º ECA arts 28 a 32 32 Alienação parental Um dos deveres do pai ou da mãe divorciados é o de contribuir para a preservação da imagem um do outro na consciência do filho Por mais penoso que possa ser em razão das queixas justas ou não nutridas em relação ao excônjuge não pode o pai ou a mãe contaminar com os seus os sentimentos do filho relativamente aos seus genitores É imprescindível ao adequado amadurecimento psicológico da criança e do adolescente uma sadia e afetuosa relação com seus dois pais O que aconteceu na relação horizontal por mais grave ou doloroso que seja não deve contaminar a relação vertical O pai ou mãe que atua visando minar ou prejudicar a relação do filho com o outro genitor incorre na conduta qualificada juridicamente como alienação parental Definea a lei como a interferência na formação psicológica da criação ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores para que repudie o outro genitor ou que cause ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este Lei n 1231810 art 2º O ato de alienação parental pode ser praticado também por avós ou por quem tenha a criança ou o adolescente sob a sua autoridade guarda ou vigilância como tutor curador outros parentes e mesmo amigos ou empregados de um dos genitores São hipóteses de alienação parental exemplificadas pela lei a desqualificação contínua e permanente da conduta do outro genitor relativamente aos seus atos como pai ou mãe b embaraço ao exercício da autoridade parental pelo outro genitor c imposição de dificuldades ao contato entre a criança ou adolescente e o outro genitor d cerceamento do exercício de direito de convivência familiar e deliberada omissão de informações relevantes sobre o filho como as relativas ao desempenho escolar saúde ou mesmo alteração de endereço de moradia f imputar falsa afirmação denúncia ao outro genitor ou seus familiares para obstar ou dificultar a convivência deles com o filho g mudar injustificadamente o domicílio para lugar distante com o objetivo de afastar o filho da convivência com o outro genitor e os familiares destes art 2º parágrafo único A coibição à alienação parental é feita primacialmente no interesse da criança ou adolescente para garantia de seu direito fundamental à convivência saudável com seus genitores e respectivas famílias grupos familiares Cabe ao genitor alienado contudo exercer os direitos titulados por seu filho contra o alienador Alienação parental é a interferência promovida ou induzida por um dos genitores alienador na formação psicológica da criança ou do adolescente destinada prejudicar o estabelecimento ou a manutenção de vínculos com o outro genitor alienado ou mesmo o repúdio a este Caracterizase também quando o ato é praticado por tutor curador familiares de um dos genitores ou qualquer pessoa que tenha a criança ou adolescente sob sua guarda vigilância ou autoridade incluindo empregados ou amigos As sanções ao alienador são conforme a gravidade do caso i advertência ii ampliação do regime de convivência familiar em favor do genitor alienado iii multa iv acompanhamento psicológico ou biopsicossocial v alteração da guarda para compartilhada ou sua inversão vi fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente vii suspensão da autoridade parental art 6º No caso de mudança abusiva de endereço pode também ser aplicada a sanção consistente na imposição ao alienador do dever de levar ou apanhar a criança ou adolescente nas alternâncias dos períodos de convivência com o genitor alienado caso já não fosse dele o dever art 6º parágrafo único 4 Partilha de bens Termina o regime de bens do casamento qualquer que seja ele no momento da cessação da vida em comum Quando tem início a separação de fato do casal deixa de existir a conjugação de esforços que justifica a comunhão familiar Não é portanto a decretação judicial do divórcio ou a homologação da partilha que determina o fim do regime de bens Gonçalves 2005393 A jurisprudência reconhece nesse contexto que sobre os bens adquiridos por pessoa separada de fato não cabe ao outro cônjuge nenhuma meação principalmente se o adquirente contou com a contribuição do esforço do companheiro ou companheira com quem passou a conviver numa união estável ColtroTeixeiraMafra 2005418420 Em outros termos os bens que cada cônjuge adquire a partir da separação de fato do casal não se comunicam porque os efeitos do regime de comunhão universal ou parcial bem assim o da participação final nos aquestos deixam de se projetar Não há mais como pretender que separado de fato o outro cônjuge continue a colaborar de modo direto ou indireto para o acréscimo patrimonial Com a separação de fato ademais os bens comunicados passam a ser administrados em condomínio pelos cônjuges cf Cahali 1978144 Cessa assim a incidência das normas de comunhão do direito de família e passam a incidir as do condomínio geral do direito das coisas CC arts 1314 a 1326 Em geral no divórcio judicial a partilha dos bens é feita mediante proposta dos cônjuges e homologação do juiz Se os cônjuges não conseguem formular qualquer proposta por não terem chegado a completo acordo sobre o tema o juiz decide o conflito de interesses dividindo os bens ou determinando sua venda para repartição do dinheiro Assim no divórcio amigável os cônjuges normalmente submetem ao juiz junto com o pedido de dissolução do vínculo o plano de partilha dos bens comuns Tratase de uma das cláusulas do acordo de divórcio que se não contiver nenhuma estipulação contrária aos interesses dos cônjuges ou dos filhos será judicialmente homologada Já no divórcio litigioso em divergindo as partes sobre a questão patrimonial cada uma aduz suas pretensões e o juiz ao sentenciar decide como será feita a partilha dos bens Se o casal não tiver filhos menores ou incapazes e optar pelo divórcio mediante escritura pública a partilha dos bens será em princípio uma das cláusulas desse instrumento CPC art 733 Quando judicial o divórcio pode ser concedido independentemente de partilha dos bens comuns ou de alguns deles Mesmo se litigioso a pedido de ambos os litigantes podese postergar a divisão de um ou de todos os bens comuns Do mesmo modo formalizado por escritura pública o divórcio amigável pode ser feito independentemente de partilha dos bens comuns ou de parte deles se assim for interessante aos excônjuges A lei é clara ao admitir a concessão do divórcio independentemente da partilha CC art 1581 exigindo apenas como já mencionado a adoção do regime da separação absoluta em eventual novo casamento dos divorciados enquanto ela não for homologada em juízo art 1523 III A partilha que pode ser feita como se nota muitos anos depois do fim da sociedade e do vínculo conjugais deve retratar sempre a situação patrimonial dos consortes na data em que teve início a separação de fato ou seja do fim da colaboração ao aumento do patrimônio de cada cônjuge que a vida conjugal pode proporcionar Os bens comuns do casal devem ser partilhados de acordo com a situação patrimonial dos cônjuges na data em que teve fim a colaboração da vida conjugal para o incremento dos seus patrimônios isto é a da separação de fato Observarseá na partilha o regime de bens adotado para o casamento desfeito dividindose os que por força dele se comunicaram do patrimônio de qualquer um dos cônjuges para o do outro Cap 57 5 O nome dos cônjuges Como visto anteriormente um dos efeitos do casamento é a possível adoção pelos dois cônjuges ou por um deles somente do sobrenome do outro consorte Cap 56 item 5 Quando não se altera o nome com o casamento o fim da sociedade e do vínculo conjugal não acarreta nenhuma implicação relativamente à identificação dos cônjuges Eles simplesmente continuam a adotar o nome que sempre tiveram O divórcio tampouco abre a oportunidade de mudança do nome nesse caso Tendo havido porém com o casamento a alteração do nome de pelo menos um cônjuge a dissolução da sociedade conjugal pode levar a nova mudança com a volta ao nome usado anteriormente O retorno ao nome anterior pode ser obrigatório ou voluntário No primeiro modo decorre da perda do direito ao uso do sobrenome tomado do outro no segundo de livre opção do cônjuge O retorno é sempre integral Não se admite que o cônjuge divorciado conserve parte do sobrenome tomado de empréstimo A alternativa de que dispõe é apenas a de continuar usando o nome de casado ou reassumir exatamente o que tinha antes daquele casamento Ou seja se era solteiro o patronímico de família tal como composto pelos seus pais no registro de nascimento se viúvo ou divorciado o sobrenome que possuía antes de contrair as novas núpcias Retorno obrigatório ao nome anterior No divórcio litigioso são duas as condições para a condenação da perda do nome de casado por um dos cônjuges A primeira diz respeito à iniciativa do cônjuge inocente portador originário do sobrenome em disputa Sem o pedido expresso dele no sentido de o juiz impor ao outro consorte a específica sanção da perda do direito ao uso do sobrenome formulado desde logo na petição inicial da ação ou reconvenção não há como o culpado ser obrigado contra sua vontade a voltar a usar seu nome anterior A segunda condição para a aplicação da pena de perda do nome de casado relacionase com a inexistência de prejuízo para o cônjuge culpado A despeito de sua culpa conservará ele o direito de manter o nome de casado se a alteração lhe trouxer prejuízo à identificação Assim se o cônjuge culpado ficou conhecido em seu meio profissional pelo nome de casado não há base legal para imposição da pena de perdimento do direito de continuar a usálo Afamada atriz escritora consultora financeira ou qualquer outra mulher que tenha construído sua imagem de profissional competente associada ao nome composto pelo patronímico do marido titula o direito de querendo continuar a adotálo ainda que tenha sido a única culpada pelo divórcio Cabe também considerar a situação do cônjuge cujo sobrenome ficará muito diferente do dos filhos se acaso tiver de alterálo É a hipótese em que se admite a substituição do sobrenome da família originária pelo do cônjuge Se retornar aquele que alterou o nome a usar o que possuía antes do casamento claramente haverá manifesta distinção com o sobrenome dos filhos Também aqui mesmo o excônjuge culpado titula o direito de conservar o nome de casado Por fim há a hipótese de grave dano que poderia advir do retorno ao nome usado antes do casamento Imagine que pessoa com nome muito comum ao se casar e acrescer ao seu o sobrenome do cônjuge consegue finalmente livrarse dos incômodos da homonímia Obrigála a retornar ao nome anterior implicaria expôla aos percalços que os homônimos normalmente enfrentam tanto no âmbito civil na hora da obtenção de crédito locação de imóvel e prática dos atos em geral como até mesmo no criminal em que por vezes têm de provar não ser o criminoso procurado pela polícia Tanto no da homonímia como em qualquer outro caso de dano grave derivado do retorno ao nome usado antes do casamento desfeito o cônjuge titula o direito de conservar o de casado mesmo que tenha sido o único culpado pelo divórcio O cônjuge que mudou o nome com o casamento é livre para retornar ao anterior ou manter o de casado Se porém tiver sido o culpado pelo divórcio poderá perder o direito de usar o sobrenome do cônjuge inocente a pedido deste a menos que a alteração lhe traga prejuízos ou importe manifesta distinção com o sobrenome dos filhos Retorno facultativo ao nome anterior O cônjuge sempre tem o direito de retornar ao nome que adotava anteriormente ao casamento Tenha sido culpado ou inocente no divórcio tenha este sido litigioso ou amigável a alternativa de descartar o sobrenome do consorte de quem agora se está desligando ficará sempre ao alcance daquele que ao contrair o matrimônio considerou pertinente transformar o nome pelo qual se identificava Afora a hipótese de retorno obrigatório é invariavelmente da exclusiva alçada do cônjuge interessado decidir se conserva o nome de casado ou se volta a adotar o que tinha antes do casamento O titular do sobrenome tomado de empréstimo não pode oporse à decisão tomada pelo outro cônjuge qualquer que seja ela Se o marido acresceu ao seu um dos sobrenomes da mulher e no divórcio amigável manifesta a intenção de continuar a usálo são irrelevantes os motivos que a determinam A esposa não pode impedilo de permanecer com o nome de casado Do mesmo modo se a mulher havia agregado ao seu nome o patronímico do marido e tem o firme propósito de extirpálo de sua identificação não há meio de esse último forçála a continuar o uso A decisão de retorno ao nome anterior não precisa ser igual para os dois cônjuges Se ambos misturaram os respectivos sobrenomes ao se casarem pode cada um no divórcio optar pela solução de que mais goste Não é porque um decidiu voltar ao nome anterior que o outro também deverá fazêlo O cônjuge não será nunca obrigado a manter o nome de casado nem mesmo se o retorno ao anterior patronímico acarretar distinção manifesta com o sobrenome dos filhos ou puder de algum modo prejudicálo A cada qual compete sopesar e identificar livremente e segundo seus próprios e exclusivos critérios as vantagens e desvantagens das opções que tem à frente O momento apropriado para a definição quanto ao nome é em princípio o do divórcio Quando é amigável a manutenção ou retorno do nome deve constar de uma das cláusulas do acordo Omisso esse entendese que os cônjuges optaram por voltar a usar seus nomes anteriores A omissão no acordo de divórcio corresponde ao não exercício do direito de conservação do nome de casado Em outros termos presumese que os consortes decidiram retornar ao nome anterior ao do casamento porque não exerceram explicitamente a opção de conservar o de casado Gonçalves 2005236 Em se tratando do exercício da faculdade pelo cônjuge inocente no divórcio litigioso sua decisão poderá ser adotada a qualquer tempo Vindo a se casar de novo ou simplesmente querendo no futuro apagar todas as pistas da relação matrimonial desfeita poderá renunciar ao sobrenome que havia emprestado do antigo cônjuge 6 A separação Devemos considerar três situações distintas advindas da promulgação da EC n 662010 que eliminou a separação judicial ou de fato durante certo lapso de tempo como condições do divórcio Primeira a emenda suprimiu a vigência dos dispositivos do Código Civil que dispunham sobre a separação e se tornaram incompatíveis com a nova redação do 6º do art 226 da Constituição Deste modo não vigoram mais desde julho de 2010 em razão da superveniente incompatibilidade com norma hierarquicamente superior o inciso III do art 1571 e os arts 1572 a 1576 e 1578 a 1580 do Código Civil Segunda há disposições legais compatíveis com a inovação introduzida pela emenda e que se referem aos separados disciplinando certos direitos ou relações Estas normas permanecem em vigor como transitórias aplicadas enquanto houver pessoas no estado civil de separados que não se divorciaram O art 1577 é exemplo de preceito que permanece em vigor apenas como norma de transição ao permitir aos separados não divorciados a reconciliação subitem 63 Terceira continuam a vigorar os dispositivos legais que falam da figura da separação e que embora não sejam incompatíveis com a nova redação do 6º do art 226 da Constituição não são mais suscetíveis de ter aplicação desde julho de 2010 em razão de seu conteúdo sobre o término de sociedade conjugal Em relação a estes cabe se for o caso aplicarse à hipótese do divórcio É o que se verifica por exemplo com os dispositivos do Código Civil pertinentes ao valor dos alimentos cujo critério de fixação varia segundo a existência ou não de culpa do alimentado pelo rompimento Cap 61 subitem 14 Contudo não tem sido unânime o entendimento entre doutrinadores e magistrados sobre o alcance da EC n 662010 Entendem alguns que enquanto não houver a revogação expressa dos dispositivos do Código Civil sobre o instituto ou sua adequação redacional permanecem eles plenamente vigentes como regra de aplicação geral Uma das consequências deste entendimento aponta para a continuação da existência da separação como fase prévia da desconstituição do vínculo matrimonial salvo quando houver separação de fato superior a dois anos A resistência de certa doutrina e das decisões judiciais que a ecoam à afirmação da inconstitucionalidade superveniente dos dispositivos do Código Civil sobre a separação como etapa precedente ao divórcio não se justifica tecnicamente É certo que antes mesmo da Emenda n 662010 para alguns tecnólogos a sistemática constitucional e legal então existente destinavase a atender os escrúpulos das pessoas que não aceitavam o divórcio vincular que põe fim ao vínculo do casamento por motivos religiosos O estado civil de separado na lei brasileira procuraria amparar a crença dessas pessoas Cahali 197849 Mas se tivesse realmente a ordem jurídica tal desiderato a separação não seria uma etapa do processo de desfazimento de todos os efeitos do casamento mas uma alternativa ao divórcio Facultarseia aos que não creem na dissolubilidade do vínculo matrimonial o estado excepcional de separados Como não existe nem existiu na lei essa imaginada alternativa somente se pode compreender a resistência no contexto dos resquícios das ambiguidades que o direito brasileiro nutria ao tratar das questões afetas ao fim do casamento A exemplo do divórcio a separação pode ser amigável ou litigiosa No primeiro caso os dois cônjuges requerem em conjunto ao juiz que decrete o desfazimento da sociedade conjugal subitem 61 O vínculo conjugal somente se desfaz quando passado algum tempo podem os cônjuges se divorciar No segundo um deles imputa ao outro a culpa ou pelo menos a responsabilidade pelo fim do matrimônio subitem 62 Com a separação judicial cessam os deveres de coabitação e fidelidade recíproca A inexistência de coabitação não significa necessariamente abandono do lar subitem 622 Quer dizer a separação de fato rompe inevitavelmente a coabitação mas isso nem sempre corresponde ao descumprimento de dever conjugal Quanto à fidelidade o direito estaria obrigando a uma castidade antinatural no dizer da doutrina Pereira 1972184185 se continuasse a exigila dos que se separaram de fato mas ainda não de direito 61 Separação amigável Até 2007 qualquer que fosse a espécie a separação era sempre um processo judicial Mesmo quando não havia nenhum desentendimento entre os consortes acerca da oportunidade de pôr fim ao casamento e da adequada composição dos interesses relacionados a essa decisão a intervenção do Poder Judiciário era imprescindível Em outros países como no Japão a lei há tempos admitia o divórcio consensual derivado de simples declaração dos dois cônjuges perante o Registro Civil independentemente de processo judicial Lá 90 dos divórcios são consensuais Mizuno 2001854857 A judicialização do desfazimento da sociedade conjugal um pouco em razão da ambiguidade no trato do tema que caracterizou o direito brasileiro de família até julho de 2010 servia como mais um fator de desencorajamento da separação O legislador parecia continuar acreditando que o melhor para a família era invariavelmente o casamento eternizado ainda que se revelasse diminuta ou nenhuma a felicidade dos cônjuges ou de um deles A partir de 2007 a lei processual passou a admitir a separação consensual mediante simples escritura pública desde que o casal não tivesse filhos menores ou incapazes e estivesse assistido por advogados comuns ou não Assim estando os cônjuges de acordo em relação ao término da sociedade conjugal o processo judicial só não seria dispensável se houvesse filhos não capazes 62 Separação litigiosa Na separação litigiosa o cônjuge autor deve imputar ao réu a culpa ou pelo menos a responsabilidade pelo fim da sociedade conjugal Assume em decorrência o ônus de provar o grave descumprimento pelo outro de um dos deveres do casamento fidelidade respeito mútuo coabitação no domicílio conjugal etc e a decorrente insuportabilidade da vida em comum Não prevê a lei o direito de o cônjuge se separar sem fazer tal imputação por mais doloroso e por vezes injusto que isso pudesse ser A experiência de vida revela que salvo nas situações de agressão física não há vítimas no casamento A responsabilidade pela deterioração do relacionamento conjugal é em geral dos dois marido e mulher Mas isso a lei quer ver ignorado na separação litigiosa Em outros termos se o cônjuge autor fundamenta o pedido no fato de ter simplesmente deixado de amar o réu ressalvando com sinceridade que nenhum deles poderia ser considerado culpado pelo fim do casamento corre o risco em vista da estreiteza dos ditames legais de ver o pedido negado pelo juiz Como dito acima em tese teria que continuar casado e infeliz até que a degradação do relacionamento fizesse brotar um dos motivos então indicados na lei para a separação litigiosa ou pôr fim de fato ao casamento ficando um ano nessa situação de desconformidade entre o formal e o real Na separação litigiosa o cônjuge que propõe a demanda deve provar que o demandado descumpriu gravemente um dever do casamento tornando insuportável a vida em comum separaçãosanção que esta se rompeu há pelo menos um ano não havendo por que se reconstituir separaçãoruptura ou este último está acometido de doença mental grave e provavelmente incurável há dois anos separaçãoremédio A doutrina classifica a separação litigiosa em sanção ruptura ou falência e remédio Gonçalves 2005203 Tavares da Silva 20021373 Na primeira um dos cônjuges é declarado o culpado pelo término da sociedade conjugal sendolhe imputadas em decorrência algumas punições leves subitem 621 Nas demais embora não haja propriamente ninguém culpado pelo fim do interesse dos cônjuges em permanecer casados um deles resiste a anuir com a separação amigável Alguns fatos porém revelavam a impossibilidade de continuação da vida em comum como sua ruptura há mais de um ano ou manifestação de doença mental grave subitem 622 621 Separação com culpa Para obter a separação não amigável em princípio o cônjuge autor deve afirmar e provar que o réu incorreu em grave violação de dever conjugal em virtude da qual a vida em comum tornou se insuportável São pressupostos da separação nesse caso a gravidade do descumprimento de dever do casamento não bastando sua simples inobservância e a insuportabilidade da vida conjugal Dáse a lei ao trabalho de listar exemplos de fatos que podem ensejar a separaçãosanção adultério tentativa de morte sevícia ou injúria grave abandono voluntário do lar conjugal por um ano contínuo condenação por crime infamante e conduta desonrosa Nesses casos ou em qualquer outro que o juiz reputar grave violação de dever conjugal de que derive a insuportabilidade da vida em comum o cônjuge que nela incorrera considerase o culpado pela separação Tomese o exemplo da injúria grave conduta na qual se inclui o chamado quase adultério isto é a paquera beijo lascivo ou outros sinais quaisquer de interesse por relacionamento íntimo ou sexual extraconjugal Um dos cônjuges injuria gravemente o outro ao paquerar terceira pessoa Isso é suficiente para que o injuriado obtenha em juízo a declaração de culpa do injuriador pelo fim da sociedade conjugal Não é raro que o cônjuge demandado numa separação litigiosa apresente reconvenção isto é proponha no prazo da contestação sua própria ação de separação litigiosa procurando demonstrar que a culpa da falência do casamento não lhe cabe mas ao autor da demanda originária É na verdade em tudo irrelevante quem teria sido o primeiro a descumprir o dever conjugal Isso porque nenhum deles estaria autorizado a inadimplilos em razão do anterior inadimplemento pelo outro Mesmo vindo o marido a saber que sua mulher era adúltera não fica legalmente legitimado a também cometer o adultério No caso de reconvenção nenhum dos litigantes se desincumbindo do respectivo ônus de prova ou os dois o fazendo de modo igualmente satisfatório a separação deve ser decretada pelo juiz A possibilidade de sadia vida em comum de casais envolvidos em litígio de separação é visivelmente remota mormente na hipótese de recíproca imputação de culpa O cônjuge cujo comportamento caracteriza grave violação dos deveres do casamento e tornava insuportável a vida em comum é o culpado pela separação A tecnologia civilista considera anacrônica a noção de culpa de um dos cônjuges pelo fim da sociedade conjugal e questiona a pertinência de a lei continuar a tratar da hipótese por todos ColtroTeixeiraMafra 2005315320 622 Separação sem culpa Em duas hipóteses a separação litigiosa é desprovida de caráter sancionador Silva 200312931294 A primeira diz respeito à ruptura da vida comum há pelo menos um ano quando provada a impossibilidade de sua reconstituição a segunda à superveniência de doença mental a um dos cônjuges que torne impossível a vida em comum Nos dois casos como se verá exigese do cônjuge que requer a separação a prova da impossibilidade da vida em comum Também nas separações ruptura e remédio portanto se a convivência não era insuportável mas simplesmente sem graça ou infeliz a lei parece querer que os cônjuges continuem casados ou se reconciliem malgrado as circunstâncias revelem ser esta uma das piores soluções a considerar Ruptura da vida comum Não se deve confundir a separação em razão da ruptura da vida em comum há mais de um ano com a fundada no abandono voluntário do lar conjugal por igual período Este último fato é considerado pela lei exemplo de grave descumprimento de dever que torna insuportável a permanência da sociedade conjugal Entre as duas situações aqui enfocadas há aspectos semelhantes e diferentes No que se assemelham Na inexistência de coabitação Tanto no caso da ruptura da vida em comum como no do abandono os cônjuges não mais coabitam sob o mesmo teto Como se viu no entanto a coabitação não é dever conjugal prevendo a lei hipóteses em que o casamento dela prescinde No que se diferenciam então Exatamente no sentido que revestia a falta de coabitação A intenção do cônjuge que abandona o lar é a de se afastar de seus deveres conjugais em particular o relacionado à participação no sustento guarda e educação dos filhos No caso da ruptura da vida comum em nenhum momento o cônjuge deixa de cumprir suas obrigações relacionadas aos filhos Não há abandono do lar quando um dos cônjuges deixa de morar com o outro mas continua presente na família visitando os filhos com frequência provendolhes afeto atenção e recursos materiais E há abandono quando moram os cônjuges desde sempre em casas separadas como ocorre algumas vezes e um deles deixa de cumprir suas obrigações conjugais relativas aos filhos Desse modo se o cônjuge que deixou de morar no domicílio conjugal após um ano ingressa com o pedido de separação litigiosa e o outro apresenta reconvenção imputandolhe o descumprimento do dever conjugal ou viceversa as demandas são julgadas a partir do que restar provado relativamente ao comportamento do primeiro após a saída da habitação comum Se simplesmente não mandar notícias deixando ao outro cônjuge todas as responsabilidades de manutenção do lar claramente abandonouo Mas se ao longo do ano cumpriu os deveres de pai ou mãe a hipótese é de ruptura dos laços conjugais mas não de abandono do lar A distinção entre as duas formas de separação tem importância Se a final o juiz reconhece que houve abandono do lar condena o cônjuge que deixou há mais de um ano de residir no domicílio conjugal pelo fim do casamento imputandolhe as sanções cabíveis Mas acatando a tese da ruptura imputa a sucumbência ao cônjuge que tinha resistido à separação amigável independentemente de ter sido ele ou o outro quem fixara a residência em lugar diverso do domicílio conjugal Duas são as hipóteses de separação sem culpa Na primeira exigese a ruptura da vida comum há pelo menos um ano quando comprovada a impossibilidade de sua reconstrução separaçãoruptura A segunda pressupõe a superveniência de doença mental grave prolongada e provavelmente incurável que torna insuportável a vida em comum separaçãoremédio Superveniência de doença mental Para dar ensejo à separação remédio é necessário que um dos cônjuges tenha sido acometido de doença mental grave manifestada após o casamento Se antes da constituição do vínculo matrimonial a moléstia já havia dado seus sinais e mesmo assim o cônjuge são concordou em se casar não pode alegar esse motivo para pedir a separação em juízo Além de grave e superveniente a doença deve perdurar pelo prazo mínimo de dois anos Ademais a medicina deve considerar o mal provavelmente incurável Por fim é necessária a prova de que a doença mental grave superveniente prolongada e provavelmente sem cura tornou insuportável a vida em comum Apenas uma vez reunidos todos esses requisitos tem aplicação a norma legal que autoriza a separação litigiosa fundada na enfermidade mental do outro cônjuge Decretada a separação nessa hipótese aliás muitíssimo rara o cônjuge enfermo fica com os remanescentes dos bens que havia levado para o casamento sem prejuízo da meação se a ela fazia jus em razão do regime adotado Assim se o casamento havia sido celebrado em regime de comunhão universal o cônjuge são não tem direito à meação dos bens trazidos pelo enfermo ou do que tivera restado deles 63 Reconciliação Desfeita a sociedade conjugal pela separação ela pode ser restabelecida enquanto permanecer o vínculo conjugal isto é enquanto não for decretado o divórcio CC art 1577 Após a dissolução do vínculo conjugal não tem mais cabimento a reconstituição da sociedade Os divorciados se querem voltar a ser casados devemse casar como se solteiros fossem começando por requerer a habilitação no cartório do Registro Civil da circunscrição da residência de um deles A reconciliação cabe tanto na separação amigável como na litigiosa e independentemente da causa que tenha motivado esta última O restabelecimento da sociedade conjugal fazse por petição ao juiz nos autos da ação de separação em que ambos os cônjuges declaram a intenção de reconstruírem o casamento Se tiver elementos para duvidar da sinceridade da declaração o juiz poderá ouvir pessoalmente cada um dos cônjuges em separado Assim como no casamento a vontade para a reconciliação deve ser livre e espontânea Decretada pelo juiz a reconstituição da sociedade conjugal será a sentença averbada no Registro Civil Lei n 601573 art 101 A reconciliação assim formalizada importa o pleno restabelecimento do mesmo regime de bens que havia sido adotado no casamento A partilha se já tiver sido feita tornase ineficaz Se pretenderem os cônjuges alterar o regime devem promover o processo judicial específico Cap 57 item 5 Enquanto não se divorciam os separados podem restabelecer a sociedade conjugal mediante petição ao juiz nos autos da separação Não será de modo nenhum prejudicado qualquer direito de terceiros em função da reconciliação CC art 1577 parágrafo único Imagine que um dos cônjuges era solvente mas desta edição 2020 com a reconstituição da sociedade conjugal e o restabelecimento do mesmo regime de bens tornouse insolvente em vista de dívidas contraídas pelo outro e que esse mesmo cônjuge tomou dinheiro emprestado num banco enquanto estava separado Ora o credor banco mutuante não pode deixar de receber o seu crédito em razão da insolvência acarretada pela reconciliação Até a integral solução das obrigações contraídas no período em que a sociedade conjugal não existia perante os respectivos credores a partilha ainda continua a produzir seus efeitos 7 Responsabilidade civil pela dissolução Nos conflitos de interesse de que trata o direito de família também a responsabilidade civil deve seguir regras próprias De um lado o descumprimento de dever conjugal é ilícito como outro qualquer não havendo razões para exonerar quem nele incorreu de responsabilidade tão só porque a vítima era de sua família De outro por vezes a imputação de responsabilidade pode ocasionar dano emocional ou psicológico de maior gravidade do que aquele cuja composição é objetivada Entre uma e outra face dessa delicada equação procura a tecnologia jurídica identificar os fundamentos para a responsabilização civil pelos danos nas relações familiares Aguiar Jr 2004 Os cônjuges titulam o direito de se divorciarem Há tecnólogos que chegam a enraizar o direito de não permanecer casado na tutela constitucional da dignidade humana Farias 2004 No Brasil a pessoa casada pode desfazer a sociedade conjugal a qualquer tempo sempre que decidir que a vida pode ficar melhor sem aquele casamento Desse modo se quem deixa de amar o consorte propõe o divórcio amigável ele ou ela não tem nenhuma responsabilidade por indenizar eventual desapontamento ou mesmo dor que sua iniciativa traz ao outro membro da relação de conjugalidade Silva 2004539 Deixou de amar está no direito dele ou dela procurar novos rumos para a vida Se o outro cônjuge não concordar com o divórcio amigável também não pode ser responsabilizado aquele que legítima e honestamente busca readquirir a liberdade para experimentar novas vivências amorosas acaso proponha a ação de divórcio com esse fundamento De outro lado o rompimento da sociedade conjugal por culpa de um dos cônjuges acarreta ao outro em geral sentimentos negativos de dor e humilhação Não cabe no entanto a condenação do culpado pelo divórcio no pagamento de indenização moral em favor do inocente como regra Apenas quando tiver sido particularmente desleal e cruel o comportamento do cônjuge culpado terá cabimento a responsabilização Se um dos cônjuges manteve relacionamento sexual fora do casamento mas foi sempre discreto e nunca deixou transparecer a traição a amigos ou conhecidos do casal o adultério leva à sua condenação como culpado pelo fim da sociedade conjugal mas não à responsabilidade por danos morais Se ao contrário não fazia segredo de seus relacionamentos adúlteros expondo o outro cônjuge a constrangimentos e agravandolhe a honra e imagem de modo acentuado demonstra não ter o mínimo respeito e consideração com a família que integrava Nesse caso a deslealdade e crueldade reveladas justificam a condenação em perdas e danos morais Os danos morais associados ao divórcio litigioso são passíveis de indenização apenas se o cônjuge culpado tiver sido extremamente desleal ou cruel em seu comportamento Em relação aos danos materiais manifestados na acentuada redução do padrão de vida de um dos cônjuges os conflitos de interesses resolvemse por meio de alimentos compatíveis com a condição social Cap 61 subitem 14 Nenhum outro dano material nem mesmo o relacionado à normal queda do padrão de vida que acompanha a maioria dos divórcios é indenizável 2020 02 13 PÁGINA RB51 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 59 AS ENTIDADES FAMILIARES Capítulo 59 As entidades familiares 1 Famílias constitucionais e não constitucionais A Constituição Federal ao tratar da proteção que o Estado deve liberar às famílias referese a apenas três entidades familiares as fundadas no casamento as uniões estáveis entre o homem e a mulher e as famílias monoparentais art 226 1º 3º e 4º São as famílias constitucionais O dispositivo em foco desperta duas questões básicas Primeira haveria alguma primazia à família fundada no casamento relativamente às demais entidades familiares nele referidas Segunda a lei ordinária e as decisões judiciais poderiam ou não reconhecer e proteger outras entidades familiares Essas questões evidentemente despertam respostas diversas de acordo com a ideologia do tecnólogo Para os mais conservadores o casamento continua a ser uma forma privilegiada de constituição da família e nenhuma outra entidade familiar além das apontadas na Constituição deveria ser considerada Para os mais progressistas falando em termos de costumes sociais as respostas são exatamente as contrárias Duas circunstâncias têm levado os tecnólogos conservadores a insistirem na supremacia da família fundada no casamento De um lado a Constituição não usa a expressão família quando menciona a união estável e a monoparentalidade mas o estranho neologismo entidade familiar De outro determina à lei que facilite a conversão da união estável em casamento Essas circunstâncias aliadas à tradicional forma de organização do núcleo familiar confirmariam na visão conservadora das questões que o constituinte não pretendeu igualar a união estável ao casamento nem estimular as famílias monoparentais Em relação à família fundada em relação conjugal de pessoas do mesmo sexo a tecnologia conservadora alimenta enormes resistências chegando mesmo a qualificar preconceituosamente a hipótese como anormalidade As respostas acertadas às questões propostas pela norma constitucional contudo têmnas os tecnólogos progressistas Considerando a Constituição um sistema interpretam o art 226 e seus parágrafos em consonância com os princípios maiores da igualdade e dignidade da pessoa Afirmam então que entre as famílias constitucionais não há hierarquia a fundada no casamento não é merecedora de maior proteção que as outras Muito pelo contrário não pode a lei discriminar essas três entidades familiares conferindo aos membros de qualquer uma delas direitos negados aos das outras Por outro lado em relação às entidades familiares não referidas a lei ordinária pode eventualmente diferenciar alguns dos direitos de seus membros já que não gozam de igual proteção à liberada às três famílias constitucionais mas não as pode criminalizar ou por qualquer outro meio prejudicar seus membros Por exemplo a lei ordinária pode validamente vedar a adoção por casal homossexual mas não pode negar aos parceiros a comunhão dos bens adquiridos durante a parceria Nada na ordem constitucional por outro lado impede a disciplina na lei ordinária da família fundada na união civil de pessoas do mesmo sexo Quer dizer as famílias constitucionais fundadas no casamento união estável e monoparental têm assegurados iguais direitos sendo inconstitucional qualquer preceito de lei ordinária que as discrimine As não constitucionais fundadas em união livre de pessoas do mesmo sexo e demais porém são igualmente famílias e merecem ser reconhecidas e protegidas como tais pela ordem jurídica A lei ordinária não está obrigada a tratálas de forma isonômica relativamente às constitucionais essa a única consequência da omissão dos constituintes Mas em função dos princípios maiores da igualdade e dignidade a lei também não pode ignorar desprestigiar ou criminalizar qualquer outra forma de entidade familiar não mencionada pelos constituintes As entidades familiares ou famílias classificamse do ponto de vista do direito positivo brasileiro em duas espécies as constitucionais e as não constitucionais As famílias constitucionais são as referidas no art 226 da CF as fundadas no casamento na união estável entre homem e mulher e as monoparentais A lei não as pode tratar diferentemente sob pena de inconstitucionalidade Já as famílias não constitucionais são as demais como por exemplo a união livre e a parceria entre pessoas do mesmo sexo A lei ordinária pode conferirlhes direitos diferentes dos atribuídos às famílias constitucionais mas por força dos princípios superiores da igualdade e da dignidade não as pode marginalizar prejudicar ou criminalizar As diferenças entre essas categorias assim dizem respeito exclusivamente aos requisitos de constitucionalidade das leis que as disciplinam O casamento é um instituto complexo e foi por isso examinado anteriormente Caps 56 e 57 Agora trato dos fundamentos de outras entidades familiares a união estável item 2 a família monoparental item 3 a união livre item 4 e a parceria entre pessoas do mesmo sexo item 5 2 União estável Com a revolução dos costumes nos anos 1960 muitos jovens de classe média e alta passaram a constituir famílias sem se casar Não havia impedimento nenhum ao casamento deles poderiam casarse se quisessem mas não queriam O casamento era visto por eles como apenas uma simples folha de papel absolutamente dispensável quando percebida a essência da relação conjugal no afeto respeito mútuo e companheirismo O matrimônio não garantia minimamente esses fatores essenciais da comunhão de vida e podia até mesmo atrapalhálos A sociedade de início estranhou a novidade mas aos poucos a aceitou deixando de discriminar as uniões de homem e mulher que podiam casarse mas não viam sentido nisso A visão daqueles jovens de classe média ou rica que optaram por se unir sem casar estava equivocada O casamento não era apenas uma folha de papel mas ato de que derivavam consequências jurídicas precisas Quando o enlace não frutificava era muito mais difícil a justa e equilibrada composição dos interesses tanto pessoais guarda do filho visitas como patrimoniais divisão dos bens adquiridos pelo esforço comum Na separação a folha de papel mostrava sua serventia e os prejudicados lamentavam não ter atentado à importância jurídica que tinha então o casamento Hoje ele tem importância só psicológica social e emocional Quem opta por constituir família pelo matrimônio declara solenemente ao cônjuge e ao mundo também que lhe está destinando um lugar importante em seu coração e na sua vida Essa declaração tem relevância ímpar para as relações amorosas a autoestima de quem a dá e recebe além da felicidade dos cônjuges seus pais e familiares mas pouca importância tem a declaração solene ínsita ao casamento para a proteção dos direitos Para a ordem jurídica atual é absolutamente indiferente se homem e mulher desimpedidos casam ou optam por se unir sem a formalidade do casamento As consequências pessoais inclusive para os filhos e patrimoniais serão rigorosamente as mesmas Finalmente podese dizer que o casamento se tornou uma simples folha de papel Mas essa igualação no plano jurídico e cultural do casamento e da união informal é o resultado de um longo e tortuoso processo Rodrigues 2004261268 Pereira 20042438 Matos 20006376 No início do século passado a jurisprudência não tinha muita simpatia por essas uniões informais Acreditavase que reconhecer à companheira naquele tempo chamada de concubina mesmo na relação estável qualquer direito nos bens adquiridos pelo companheiro durante a vida em comum seria desprestigiar a família legítima e importaria indesejável desestímulo ao casamento Atente que estou falando de um tempo em que o matrimônio era indissolúvel no Brasil Muitas das disputas em torno das uniões informais envolviam a participação da companheira na herança do companheiro falecido o conflito se estabelecia então entre ela e seus filhos os ilegítimos de um lado e a esposa com quem o de cujus continuava juridicamente casado embora separado de fato há muito tempo e os filhos do casamento os legítimos de outro Os Tribunais não se compadeciam no início e a companheira e os filhos nascidos da relação informal chamados de adulterinos eram desconsiderados em seus interesses Para o STF em 1947 a ordem jurídica ignora a existência do concubinato Pereira 200427 Por volta dos anos 1950 a jurisprudência começou a ensaiar alguns passos na direção da tutela da concubina As primeiras formulações não reconheciam propriamente o direito de participar nos bens adquiridos na constância da união mas um crédito pelos serviços domésticos prestados ao companheiro O fundamento foi buscado na coibição ao enriquecimento indevido Algum tempo depois surgiram decisões reconhecendo na união informal uma sociedade de fato Ignoravam frontalmente a lei que exigia prova escrita para a produção dos efeitos do contrato de sociedade entre os sócios como ainda hoje exige art 987 do CC mas davam solução mais justa aos conflitos de interesses Provada a aquisição de bens pelo esforço comum cabia a divisão entre os companheiros no fim da convivência tal como numa dissolução de sociedade Em 1964 o STF sumulou sobre a questão comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos é cabível a sua dissolução judicial com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum Sum 380 Até a introdução do divórcio no direito brasileiro em 1977 a Súmula resolveu grande parte dos conflitos relacionada à união estável de pessoas que não podiam casar se porque uma delas quando não as duas era desquitada Azevedo 2003156164 Em 1988 a Constituição Federal falou pela primeira vez em família constituída pela união estável do homem e da mulher declarandoa destinatária de proteção do Estado Desde então não haveria mais fundamento para decisões judiciais que discriminassem o convivente não lhe reconhecendo os mesmos direitos do cônjuge Mas a visão conservadora do dispositivo constitucional parecia prevalecer em alguns julgados e contribuições doutrinárias Em 1994 a lei reconheceu aos companheiros o direito aos alimentos e certos direitos sucessórios desde que houvesse convivência de pelo menos cinco anos ou prole comum Dois anos depois outra lei destinada a regular o 3º do art 226 da Constituição Federal dispôs sobre o assunto Acertadamente descartou os requisitos do interregno temporal de convivência ou da descendência comum para definir a união estável a partir do objetivo dos conviventes de constituição de família subitem 21 Desde a entrada em vigor do Código Civil a matéria está regulada em seus arts 1723 a 1727 A união estável entre o homem e a mulher com o objetivo de constituir família tem a mesma proteção que o Estado libera para a família fundada no casamento A única diferença diz respeito à prova do vínculo horizontal de família que se produz muito mais facilmente no casamento A única diferença entre o casamento e a união estável diz respeito à facilidade da prova Enquanto o vínculo conjugal nascido do matrimônio provase pela exibição da certidão Cap 56 subitem 44 o da união estável depende de testemunhas juntada aos autos de fotografias de eventos familiares e sociais documentos extratos bancários ou de cartão de crédito escritos missivas bilhetes cartões etc e eventualmente perícia Abstraída porém a questão probatória não há nenhuma diferença entre os direitos dos conviventes e dos cônjuges É inconstitucional como se verá à frente subitem 22 o preceito que os trata de forma diferente na questão sucessória 21 Caracterização da união estável A união estável base de cerca de 30 das famílias brasileiras caracterizase pela convivência pública contínua duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família entre homem e mulher desimpedidos para o casamento CC art 1723 A união estável não se confunde com o namoro Cahali 2004268273 Enquanto na primeira é indispensável a vontade comum de fundar uma família relação horizontal no último esse elemento anímico não está presente Os namorados ainda não têm claramente definida a vontade de constituir família ou têm claramente a de não a constituir estão se conhecendo melhor ou simplesmente se divertindo Se homem e mulher namoram há muitos anos viajam juntos sempre que podem frequentam os eventos sociais das respectivas famílias devotam mútua exclusividade sexual e chegam até mesmo a viver sob o mesmo teto namorados que moram juntos não se configura a união estável quando inexistente a intenção de constituir família Alguns advogados aconselham os clientes a firmarem com os namorados um contrato de namoro O objetivo é documentar a declaração da falta de intenção de constituir família e com isso facilitar a prova da inexistência de união estável se vier a ser discutida a questão em juízo O contrato de namoro não prevalecerá evidentemente quando provado o preenchimento dos requisitos legais da união estável ou mesmo se demonstrado que aquela intenção originária alterouse com o tempo Assim é porque o decisivo à configuração de determinado relacionamento como namoro ou união estável são as características que o cercam e não os documentos firmados pelas partes Mesmo a exibição do instrumento escrito de contrato de convivência não prevalece diante da prova de que a união pretendida não sobreviveu aos primeiros meses faltandolhe por isso o requisito da durabilidade São assim cinco os requisitos para a caracterização da união estável a Objetivo de constituir família Esse é o requisito mais importante da união estável o ânimo de criar uma família affectio maritalis É em vista desse objetivo que a ordem jurídica confere ao relacionamento conjugal informal a proteção merecida pelas famílias Como provar o atendimento a esse requisito anímico Se os conviventes celebraram o contrato de convivência ou declararam por outro modo escrito ou oral a intenção de constituir família a exibição do instrumento daquele ou a prova da declaração criam a presunção da união estável Mas se não foi celebrado o contrato de convivência e inexistem outras declarações no sentido da constituição de família a affectio maritalis só pode ser demonstrada por indícios Nesse último caso um dos elementos mais significativos embora não determinante é a coabitação Quando homem e mulher passam a compartilhar o mesmo teto é normalmente indicação de que têm a intenção de constituir família Veja que a união estável podese configurar ainda que não exista coabitação Há conviventes que preferem manter suas respectivas casas porque consideram essa independência salutar ao relacionamento e há também aqueles que precisam morar separados por força do trabalho ou outra razão A falta de moradia comum não descaracteriza portanto necessariamente a união estável A presença desse ingrediente no relacionamento contudo é forte indício do affectio maritalis Mas não basta a prova da coabitação para se caracterizar a união estável se outros elementos demonstram que ela se relaciona a objetivos diversos dos de constituição de família Se dois universitários de sexos diferentes moram juntos num apartamento próximo à universidade com o objetivo de dividirem despesas não há união estável entre eles Mantenham ou não relações sexuais com ou sem frequência com ou sem exclusividade se o que os motivou a residirem sob o mesmo teto foi a redução dos dispêndios com moradia e não a formação de família então não existe a união estável Outro elemento útil na pesquisa da intenção dos sujeitos de um relacionamento amoroso diz respeito à prole comum Mais uma vez não é determinante Existem uniões estáveis em que os conviventes não desejam filhos formandose a família aqui tão só pela relação horizontal assim como existem pessoas com filho comum que não pretendem conviver A gravidez pode até ter sido intencional se pai e mãe não tinham o objetivo comum de constituírem entre eles uma família mas apenas o de fundarem duas famílias monoparentais não se forma a união estável b Convivência duradoura A própria designação do vínculo denota que só se caracteriza a união estável quando perdura por tempo considerável Se homem e mulher declaram inclusive mediante a assinatura de contrato de convivência ter a intenção de constituir família mas não conseguem conviver senão por alguns meses a união estável não se constituiu A lei não fixa prazo certo para considerar duradoura a convivência ficando a questão ao prudente arbítrio do juiz Poucos meses são insuficientes ao estabelecimento da união estável assim como muitos anos de convivência fazem pressupor sua configuração Mas quanto tempo exatamente deve ser adotado para que um casal seja considerado convivente não há como prefixar em termos gerais Cada relacionamento apresentará suas marcas a partir das quais o juiz decidirá se o requisito da durabilidade foi atendido Com esse requisito a lei quer apenas descartar os vínculos precários do cenário das uniões estáveis c Convivência contínua Outro requisito legal relacionado ao tempo de convivência é o da continuidade Para que se caracterize a união estável não podem ocorrer interrupções significativas no decurso do prazo do relacionamento destinado à constituição de família Uma ou outra breve interrupção motivada por desentendimentos pontuais posteriormente superados não descaracteriza a união estável O que a lei quer evitar é a quebra da estabilidade em razão de períodos mais ou menos longos em que a convivência deixou de existir d Convivência pública Para configurarse a união estável o relacionamento entre os conviventes deve ser público e não clandestino Quer dizer eles devem nos eventos sociais ou em encontros ocasionais com amigos e conhecidos apresentaremse como companheiros e não como meros namorados Se preferem esconder da família e das pessoas em geral a convivência informal que nutrem então ela não é merecedora pela lei de proteção União estável é a convivência duradoura contínua e pública de homem e mulher com o objetivo de constituição de família quando não há impedimento para o casamento Também caracteriza a união estável o vínculo com tais características quando qualquer dos conviventes ou ambos sendo casado estiver separado de fato e Desimpedimento Em princípio somente pessoas desimpedidas podem conviver em união estável Todos os impedimentos do casamento também impedem a constituição da união estável Se a exnora passa a conviver com o exsogro o relacionamento deles não é considerado união estável mas união livre porque transgride um dos impedimentos do casamento o relacionado aos parentes afins em linha reta CC art 1521 II Mas a hipótese mais relevante a considerar é a do impedimento relacionado às pessoas casadas O principal elemento para caracterizar o desimpedimento ínsito à união estável é a inexistência de outro vínculo de conjugalidade a unir um dos conviventes ou os dois a outras pessoas Alguns doutrinadores tratam esse requisito em separado acentuando a importância da preservação da monogamia nas relações de conjugalidade Gonçalves 2005548549 Em outros termos no direito brasileiro assim como ninguém pode ser casado duas vezes bígamo também não pode manter simultaneamente um casamento convivendo com o cônjuge e uma união estável nem duas uniões estáveis Para que a relação monogâmica seja preservada a pessoa casada só pode envolverse numa união estável depois de sua separação de fato ou judicial CC art 1723 1º Aquele que já se encontra vinculado a uma união estável igualmente não pode ligarse a outro convivente enquanto não desfizer a primeira Em suma quando desrespeitada a regra da monogamia o relacionamento não eventual que alguém mantém em paralelo ao seu casamento ou união estável denominase união livre se há intuito de formar família ou é mero concubinato se não há essa intenção item 4 As causas suspensivas do casamento não obstam a caracterização da união estável CC art 1723 2º Assim poderá ter início uma união estável quando o viúvo unese a outra mulher logo em seguida ao falecimento da esposa sem esperar a conclusão do inventário 22 Direitos e deveres dos companheiros Como acentuado a única diferença entre o casamento e a união estável é a relacionada à prova judicial da existência do vínculo de conjugalidade Enquanto no casamento provase o vínculo com extrema facilidade mediante a exibição da certidão do Registro Civil o da união estável demanda prova mais complexa para que se convença o juiz de que havia entre os litigantes uma convivência duradoura contínua pública e destinada à constituição de família Os mais variados documentos podem e devem ser carreados aos autos na demonstração da união estável extratos de contas bancárias conjuntas reiteradas movimentações de cartão de crédito de um deles relativas a despesas do interesse comum ou do outro designação do companheiro como segurado em seguro de vida testamento legando ao convivente bens de valor significativo aquisição em condomínio de imóvel residencial etc além dos documentos outros meios se mostram aptos a provar a união estável fotografias de viagens em comum festas e eventos familiares nas quais os litigantes aparecem como companheiros testemunhas que confirmem a convivência e suas características É certo que nenhum desses elementos isoladamente basta à prova da união estável Do conjunto probatório deve resultar a demonstração inequívoca do preenchimento dos requisitos legais dessa entidade familiar affectio maritalis durabilidade continuidade e publicidade Afora essa diferença de prova nenhuma outra pode existir entre os vinculados pela união estável ou pelo casamento Quanto às relações pessoais os companheiros têm o recíproco dever de lealdade respeito e assistência estão obrigados também à guarda sustento e educação dos filhos CC art 1724 A fidelidade não é lembrada expressamente pela lei mas há quem considere que o convivente infiel descumpre o dever de lealdade Silva 2004533 A enunciação dos deveres dos conviventes no entanto é desprovida de maior interesse já que o seu descumprimento não tem nenhuma implicação jurídica Desfeita a união estável por qualquer razão culpa ou vontade de um ou dos dois conviventes as repercussões em relação aos bens alimentos e filhos serão idênticas Em relação aos bens prevalecerá o que os conviventes tiverem convencionado no contrato de convivência CC art 1725 Se tiverem por exemplo concordado em que cada um continuaria com seu próprio patrimônio dividindose as despesas em certa proporção no fim da união estável nenhum deles pode reclamar qualquer participação nos bens adquiridos pelo outro durante a convivência A menos é claro que prove ter concorrido com seus recursos para a aquisição cabendolhe nesse caso a participação proporcional à sua contribuição Se nada contrataram a respeito dos bens aplicase às relações patrimoniais entre os companheiros o regime da separação parcial CC art 1725 in fine Em termos gerais de acordo com esse regime comunicamse os bens posteriores ao casamento exceto os adquiridos por sucessão ou doação mas não os anteriores Cap 57 subitem 232 Desse modo se os companheiros foram morar num apartamento de que já era dono um deles ao término do vínculo de conjugalidade o bem não será partilhado continua a pertencer exclusivamente àquele convivente que titulava a propriedade antes do enlace Também é apenas do companheiro herdeiro ou donatário o bem recebido na constância da união estável Já os bens adquiridos após o estabelecimento do vínculo pertencerão em partes iguais aos conviventes a menos que eles tenham estipulado de modo diverso no contrato de convivência No tocante aos alimentos a lei assegura ao companheiro que deles necessitar o direito de pedi los ao outro CC art 1694 Como será oportunamente examinado o cônjuge culpado pelo desfazimento do vínculo matrimonial não tem direito senão aos alimentos mínimos Cap 61 item 14 A mesma implicação deve verificarse no término da união estável tendo em vista a equivalência dos direitos entre ela e o casamento Finalmente quanto aos filhos devem os conviventes se acertar acerca do regime de guarda e visitas atentos ao valor de que o fim da união estável não pode importar nenhuma consequência para as relações familiares verticais que unem os pais aos seus filhos Devem os conviventes contratar a repartição entre eles das despesas com a criação alimentação lazer e educação dos filhos Não chegando a acordo decidirá o juiz Os direitos e deveres dos conviventes numa união estável não se diferenciam dos decorrentes do casamento Os bens adquiridos na constância da união são da copropriedade dos companheiros salvo se haviam estipulado de modo diverso no contrato de convivência O companheiro que necessitar de alimentos pode pedilos ao outro Acerca dos filhos devem os conviventes se acertar sobre guarda visita e sustento No encerramento desse subitem cabe examinar o art 1790 do CC que disciplina os direitos sucessórios do companheiro sobrevivente Criando uma odiosa discriminação os incisos II e III desse dispositivo estabelecem a quota a que tem direito o supérstite fazendoa variar de acordo com os demais concorrentes à herança De início convém frisar que esse dispositivo não prejudica a meação a que tem direito o companheiro por força do regime legal de bens na falta de contrato de convivência Quer dizer as quotas referidas naquele dispositivo dizem respeito apenas à parte dos bens comuns objeto de sucessão isto é à meação titulada pelo convivente falecido o autor da herança Gonçalves 2005559 Pois bem diz o indigitado preceito que o companheiro terá quota equivalente à metade da cabível aos filhos exclusivos do falecido se eles participarem do concurso CC art 1790 II e terá direito a um terço da herança quando concorrer com outros parentes sucessíveis incluindo os colaterais art 1790 III Notase a diferença em relação ao cônjuge herdeiro necessário que concorre com os descendentes sem nenhuma redução de quotas quando não são seus filhos No caso de concorrer com um só ascendente o cônjuge terá direito à metade dos bens e não a um terço E acima de tudo o cônjuge nunca concorre com outros parentes sucessíveis como os colaterais porque é sucessor com melhor vocação CC art 1829 I a III Exemplificando Imagine que o falecido deixou bens no valor de 120 em sua herança Não tinha descendentes nem ascendentes vivos mas tinha um irmão Se esse falecido era casado a esposa sobrevivente herda a totalidade dos bens 120 se contudo mantinha relação estável a companheira terá direito a apenas um terço deles 40 ficando o restante para o irmão 80 O tratamento discriminatório liberado pelo art 1790 II e III do CC fulmina a constitucionalidade e validade dos preceitos Por afrontar a Constituição Federal tanto na garantia do direito de herança art 5º XXX como na proteção da união estável como entidade familiar art 226 3º esses dispositivos do Código Civil são inconstitucionais Por conseguinte no falecimento de pessoa vinculada a união estável o companheiro sobrevivente terá os mesmos direitos sucessórios titularizados pelo cônjuge Cap 63 item 2 23 Conversão em casamento Retomo a primeira informação deste item Nos anos 1960 jovens da classe média e alta começaram a constituir famílias desprezando ostensivamente o casamento Estavam convencidos de que a formalidade atrapalhava mais do que ajudava a construção de um relacionamento fundado no amor respeito mútuo e camaradagem Nas classes menos abonadas porém a união informal já existia com bastante frequência muito antes da revolução dos costumes Era imposta pela carência de recursos e não nascia da vontade de romper velhos tabus A festa do casamento por mais modesta que fosse consumiria boa parte do pouco dinheiro do casal Mais que isso porém temiam os dois principalmente o homem não terem meios para cumprir os sérios compromissos que advêm do casamento Na incerteza preferiam não os assumir A união estável não era portanto nesse caso uma opção inteiramente livre dos conviventes Era uma necessidade Se pudessem casariam Pois bem foi tendo em vista principalmente essa situação que o constituinte de 1988 se preocupou em determinar à lei que facilitasse a conversão da união estável em casamento Não haveria por que facilitála aos que optaram por não casar de forma inteiramente livre A facilitação da conversão da união estável em casamento destinase a atender aos interesses de quem não tem realmente a opção de casar ou não De qualquer modo a conversão é igual para todos os conviventes que passem a se interessar pelo matrimônio independentemente das razões pelas quais no passado entenderam que o estabelecimento da união estável era de seu interesse É certo que os conviventes podem a qualquer tempo se casar como quaisquer outras pessoas desimpedidas Mas essa é uma alternativa diferente da conversão porque os efeitos do ato não retroagem à data da formação da união estável Quer dizer quando os conviventes optam por simplesmente se casarem em vez de buscarem a conversão os efeitos do casamento projetamse a partir da celebração Na conversão ao contrário os efeitos retroagem para a época em que os conviventes constituíram sua união Convertida esta em casamento produzemse os mesmos efeitos que existiriam como se os conviventes estivessem casados desde o início de sua convivência A diferença não é tão sutil como pode parecer à primeira impressão No casamento a posteriori ou na conversão os conviventes devem escolher o regime de bens do casamento Se optam pela comunhão parcial não haverá realmente diferenças entre as duas alternativas além das relacionadas à questão da prova Em outros termos se no casamento a posteriori os cônjuges escolhem a comunhão parcial como regime de bens a copropriedade dos adquiridos antes do matrimônio depende da prova da existência da união estável Na conversão ao contrário escolhido o mesmo regime a comunhão alcança os adquiridos desde o início da convivência mediante a simples exibição da certidão de casamento por conversão Mas se no casamento a posteriori ou na conversão os cônjuges optam por regime diverso da comunhão parcial a diferença entre uma e outra alternativa é significativa Imagine que a opção recaia sobre o regime de separação de bens Na hipótese de se casarem os conviventes continuam a titular os direitos derivados do regime da comunhão parcial em relação aos bens adquiridos durante o período da união estável já que os efeitos do casamento nesse caso não retroagem Escolhendo contudo a via da conversão também esses bens adquiridos serão alcançados pelo regime da separação Também em relação aos regimes de comunhão universal e participação final nos aquestos a mesma consequência se verifica os bens adquiridos na constância da união estável não ficariam sujeitos a esses regimes senão na hipótese de sua conversão em casamento A conversão da união estável em casamento é feita mediante processo judicial e importa a retroatividade dos efeitos da constituição do vínculo matrimonial para a época em que teve início a convivência inclusive em relação ao regime de bens escolhido pelos agora cônjuges Enquanto vigorou a lei de 1996 a conversão fezse por simples requerimento dos conviventes ao oficial do Registro Civil da circunscrição do domicílio deles O Código Civil porém parecendo ignorar a determinação da Constituição submeteua a processo judicial Os dois conviventes requerem ao juiz a conversão da união estável em casamento fazendo as declarações sobre o regime de bens e alterações even tuais no nome Em se convencendo o juiz de que a conversão corresponde à vontade real dos conviventes deferea Expedese então mandado ao Registro Civil para o assentamento da conversão CC art 1726 3 Família monoparental A família monoparental é a formada por qualquer dos pais e seus descendentes CF art 226 4º Nela as relações familiares são apenas verticais já que não existem pessoas ligadas pelo vínculo de conjugalidade O pai ou mãe fundador da família monoparental é o seu cabeça Diversas razões podem levar à constituição da família monoparental a pessoa quer ter filhos mas prefere ficar solteira a se casar ou constituir união estável após a separação ou divórcio os filhos ficam sob a guarda de um dos excônjuges tendo o outro se afastado do convívio com eles o celibatário adota uma criança a celibatária recebe em seu útero embrião fecundado in vitro o estado de viuvez se prolonga contentandose o viúvo ou viúva em permanecer familiarmente ligado apenas aos seus descendentes a mulher engravida de modo acidental mas não tem nenhuma vontade de se vincular maritalmente ao pai do nenê etc cf Leite 19973160 A monoparentalidade é classificada em paternal ou maternal No primeiro caso a comunidade familiar é integrada pelo pai e seus descendentes no segundo pela mãe e seus descendentes Estatisticamente as famílias monoparentais maternas são muito mais numerosas fato que não desdobra qualquer consequência jurídica Também se classifica em voluntária ou involuntária Naquela a monoparentalidade é resultado de uma decisão livre e consciente do pai ou da mãe como no caso do celibatário que adota um filho enquanto nessa última as circunstâncias da vida conduzem a família ao estado monoparental como na viuvez prolongada Notese que em nenhuma hipótese a opção pela monoparentalidade é inteiramente involuntária Há porém casos em que nitidamente o pai ou mãe recusa a ideia de se casar ou constituir união estável e prefere manter a família apenas com seus filhos Aqui a monoparentalidade é voluntária E há de outro lado os casos em que eles se enlaçariam num vínculo de conjugalidade se a vida lhes desse a chance caso em que a monoparentalidade devese considerar involuntária Podese distinguir ainda a monoparentalidade em natural ou civil de acordo com a natureza do vínculo entre os membros da família Quando o filho tiver recebido a herança genética do cabeça a família monoparental é natural caso contrário civil Assim se o filho foi concebido numa relação sexual de que tenha participado o pai ou mãe a monoparentalidade é natural Igualmente pertence a essa categoria a família quando o filho concebeuse in vitro com o uso de gameta fornecido pela mãe a deontologia médica não admite o emprego da técnica de fertilização assistida solicitada exclusivamente por um homem Por outro lado será civil a família monoparental em que o filho é adotado Finalmente é possível classificála de acordo com o número de gerações que separam os seus membros Há assim família monoparental de primeiro grau pai ou mãe e seus filhos segundo grau avô ou avó e seus netos etc Também devese considerar monoparental a família constituída por mais de duas gerações Quando alguém mora com a filha e o neto os três integram uma família monoparental de grau misto Essas classificações se combinam a produção independente por exemplo é uma família monoparental maternal voluntária natural e de primeiro grau A rigor contudo têm sentido meramente ilustrativo já que será idêntico o amparo liberado pela Constituição à família monoparental independentemente do sexo do seu cabeça do maior ou menor grau de intencionalidade havida na constituição da natureza do vínculo entre os membros dela ou do número de gerações que os separam A família monoparental é a constituída por homem ou mulher não vinculado conjugalmente a ninguém solteiro separado divorciado viúvo etc e seus descendentes naturais ou civis Na família monoparental em vista da inexistência de relação horizontal os conflitos de interesse giram em torno das questões próprias da relação vertical filiação e poder familiar De específico dessa categoria de entidade familiar encontrase na ordem jurídica unicamente a vedação a qualquer discriminação em seu desfavor pela ausência do vínculo de conjugalidade peculiaridade de que não se pode extrair qualquer menoscabo 4 União livre As uniões livres correspondem aos vínculos de conjugalidade destinados à formação de família estabelecidos entre sujeitos que não podem casarse nem constituir união estável Compreendem por exemplo as relações não exclusivas e as vinculantes de parentes afins em linha reta A união livre é uma espécie de concubinato Na lei concubinato vem definido como as relações não eventuais entre o homem e a mulher impedidos de casar CC art 1727 A expressão já teve uma definição tecnológica bem mais extensa Quando no passado a ordem jurídica só reconhecia como legítima a família constituída pelo casamento todas as demais formas de relacionamento entre homens e mulheres eram rotuladas como concubinárias Na vala comum do concubinato atiravamse todas as relações não matrimo niais Aos poucos porém certas distinções precisaram ser feitas A tecnologia começou a falar em concubinato puro e impuro com o objetivo de separar os relacionamentos entre pessoas que se casariam se pudessem impediaas a indissolubilidade do vínculo então estatuída e os relacionamentos extraconjugais entre amantes amásios mancebos Não se justificam mais esses esforços classificatórios Desde a entrada em vigor do Código Reale a expressão concubinato deve ser reservada exclusivamente às relações como tal conceituadas pela lei O que antes era chamado de concubinato puro hoje se chama união estável Continua a existir entretanto um certo preconceito em relação a algumas famílias Embora não cogite mais de ilegitimidade a ordem jurídica engloba grosseiramente no conceito de concubinato junto com a mancebia todas as formas de famílias não lembradas pelo art 226 da CF É tempo de fazer uma distinção destacando a união livre das demais relações concubinárias A união livre se distingue do concubinato em geral porque nela encontrase sempre o affectio maritalis isto é a vontade de constituir família ingrediente inexistente na relação concubinária Por vezes entre os concubinos o interesse no relacionamento tem em vista apenas ou principalmente a gratificação sexual nem de longe eles cogitam unirse de forma mais intensa como uma família Na união livre ao contrário o objetivo é o mesmo do casamento e da união estável ou seja a criação de vínculos familiares com ou sem filhos comuns Os compromissos por vezes são menores quando os parceiros não dão à exclusividade sexual a mesma importância que a maioria das pessoas Mesmo nesse caso todavia a união livre não pode ser considerada uma relação descompromissada Afeto cuidados atenção mútua ajuda e companheirismo estão presentes como em qualquer outra família Por ser espécie de concubinato a união livre pressupõe a diversidade de sexos Quando se unem para formar uma família pessoas do mesmo sexo a parceria tem seus contornos próprios na qual normalmente é assumido o compromisso da exclusividade sexual item 5 Bissexuais podemse vincular simultaneamente por união livre com alguém do sexo oposto e por parceria homossexual com alguém do mesmo sexo O concubinato em princípio não gera nenhum direito patrimonial aos concubinos Desfeitas as relações não pode nenhum deles exigir do outro alimentos RT 830351 ou participação no patrimônio construído durante a existência da relação concubinária Alguma doutrina afirma de modo claro que a mancebia não deve merecer o apoio nenhum do Estado nem mesmo da sociedade Azevedo 2003283 Mas quando o concubinato caracterizase como uma união livre a tendência é que cedo ou tarde a jurisprudência e a lei comecem a reconhecer alguns direitos dos parceiros tendo em vista a proteção da família que dela nasce No Rio Grande do Sul a Justiça atribuiu certa vez à concubina o direito de titular 25 do patrimônio do concubino Os dois viviam em união livre já que o de cujus era casado com outra mulher da qual não estava separado de fato Cahali 2004276284 Afinal na união livre há de um lado pessoas que assumem o compromisso da exclusividade sexual e só não se casam ou constituem união estável porque a lei não deixa e de outro as que não dão nenhuma importância a esse compromisso e adotam uma forma de família que a lei e a jurisprudência têm dificuldades de aceitar Nos dois grupos entretanto os vínculos estabelecidos criam um espaço de afetividade e companheirismo para os seus membros As duas formas de união livre assim cumprem a função afetiva das famílias em geral não havendo razões para marginalizálas Concubinato corresponde às relações não eventuais entre homem e mulher impedidos de se casarem ou constituírem união estável O que antigamente era chamado de concubinato puro com a entrada em vigor do Código Reale passou a ser referido como união estável O antigo concubinato impuro corresponde à mancebia Entre a união estável e a mancebia situase a união livre É uma espécie de concubinato quando levado em conta o conceito do art 1727 do CC mas sua particularidade é a intenção dos concubinos de constituírem família Três portanto são as características da união livre os parceiros de sexo oposto impedimento para o casamento ou constituição da união estável e objetivo comum de criação duma família Pela união livre surgem as famílias dos impedidos isto é as entidades familiares que a ordem jurídica prefere fazer de conta que não existem subitem 41 O preconceito originase em parte da noção de monogamia como elemento essencial à constituição de qualquer família e por isso o tema da união estável putativa convém ser aqui enfrentado subitem 42 41 As famílias dos impedidos A lei define que certas pessoas não podem casarse nem se envolver em união estável Isso não significa que elas não se unam com o intuito de constituir família a despeito da vedação legal O adotante não pode casarse por exemplo com quem foi cônjuge do adotado CC art 1521 III Mas e se acontecer de o adotante e o antigo cônjuge do adotado se unirem para a formação de uma nova família incluindo a geração e criação de filhos comuns O vínculo de conjugalidade entre eles não pode caracterizarse como união estável porque o mesmo obstáculo ao casamento também impediria a formação dessa outra espécie de entidade familiar art 1723 1º Em outros termos de pouco adianta a lei proclamar de forma peremptória que determinadas pessoas não podem constituir famílias se elas movidas pelos seus sentimentos e interesses acabam se unindo familiarmente Essas uniões livres não deviam ser ignoradas pelo Direito porque seus membros merecem a mesma atenção e proteção dispensadas às demais entidades familiares Talvez em torno do exemplo apresentado de início se possa obter um certo consenso quanto à necessidade de tutela das uniões livres Afinal a adoção não deriva de vínculo biológico e parece mesmo um tanto exagerada a preocupação do legislador com a proibição do incesto no caso desse impedimento em particular Eventualmente pela mesma razão também se poderia conseguir algum consenso relativamente às uniões livres em que é desobedecido o impedimento fundado no parentesco por afinidade em linha reta e o do adotado com o filho do adotante CC art 1521 II e V Mas tomemos para argumentar outra hipótese de vedação de casamento e de união estável a que impede o cônjuge sobrevivente de se casar com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio de seu consorte art 1521 VII Parece um absurdo repugnante a ideia de que o viúvo ou viúva possa amar a pessoa que atentou contra a vida do antigo cônjuge a ponto de querer constituir uma família com ela Mas a vida é plena de possibilidades e se acontecer de eles se apaixonarem e passarem a viver conjugalmente não creio seja mesmo o caso de ignorar o surgimento do novo núcleo familiar Pondo de lado em vista da extrema dificuldade de nesses casos ser construído o consenso sobre a necessidade de proteção da união livre os impedimentos diretamente ligados à proibição do incesto entre pessoas biologicamente aparentadas CC art 1521 I e IV qual resta O impedimento dos casados inciso VI Na transgressão a essa proibição de matrimônio está a principal hipótese de união livre Começo por relembrar que esse impedimento do matrimônio ao contrário dos demais não se estende à união estável quando a pessoa é separada judicialmente ou se mantém o estado civil de casada está separada de fato CC art 1723 1º Quer dizer o separado judicialmente não pode casarse enquanto não converter sua separação em divórcio Mas vindo a se ligar a pessoa de sexo oposto para constituir família caracterizarseá a união estável entidade familiar sob o amparo do Estado Por outro lado se a pessoa ostenta o estado civil de casada mas está separada de fato do cônjuge embora não possa contrair novas núpcias enquanto não obtiver o divórcio direto pode desde logo envolverse numa união estável Mas por óbvio se nenhuma dessas condições estiver preenchida o impedimento matrimonial estendese à união estável Quero dizer se a pessoa não estiver separada nem de fato nem de direito de seu cônjuge e mesmo assim unirse a outrem para constituir nova família essa união não poderá ser classificada como estável Será então uma união livre A união livre se caracteriza por três elementos diversidade de sexo dos parceiros existência de impedimento matrimonial ou para a formação de união estável e intenção de criar família A tendência do direito de família é a de aos poucos atribuir às uniões livres alguma forma de amparo tendo em vista tutelar a entidade familiar dela derivada No direito brasileiro a relação monogâmica ainda é essencial à configuração do vínculo de conjugalidade Ninguém pode manter simultaneamente dois casamentos um casamento e uma união estável nem duas uniões estáveis Essa é a lei Mas na vida há homens e mulheres pertencentes às diversas camadas sociais que não dão tanta importância assim à exclusividade sexual Essas pessoas se ligam em relações não monogâmicas simultâneas e apesar do que peremptoriamente afirma a lei formam famílias Quando nenhum dos parceiros está sendo enganado isto é todos têm pleno conhecimento da inexistência de exclusividade sexual e partilham da ideologia de questionamento da monogamia a cada núcleo familiar de que participam corresponderá uma união livre Se porém houver alguém sendo enganado estáse diante de figura bem diversa a da união estável putativa de que se cuida mais adiante subitem 42 Penso que a lei e a jurisprudência poderiam atribuir o direito aos alimentos para o parceiro que deles necessitasse quando desfeita a união livre Poderiam fixar o cabimento apenas dos alimentos mínimos mas garantir pelo menos durante algum tempo os necessários à sobrevivência Penso também que alguma participação nos bens adquiridos pelo parceiro na constância da união livre poderia ser do mesmo modo prevista em lei ou determinada pelo Judiciário Caberia aqui evidentemente algum esquema de proporcionalização da participação em vista da quantidade de uniões livres que simultânea e publicamente mantivesse o outro parceiro Claro está que provando ter sido certo bem adquirido em parte com a contribuição material dos dois parceiros a união livre deverá ser dissolvida como uma sociedade de fato para evitarse o enriquecimento indevido daquele em cujo nome foi o bem registrado Para isso aliás não há necessidade de lei ou precedentes jurisprudenciais A rigor as uniões livres têm sido amparadas nos Tribunais quando algum ingrediente de ordem religiosa ou étnica justifica a poligamia Assim muçulmanos e indígenas têm obtido em juízo a devida proteção às uniões livres em que se envolvem Continuam porém ao desabrigo aqueles que optam por essa forma de família movidos por questão ideológica ou meramente por vontade Em suma das muitas funções exercidas pela família ao longo da história a que remanesce como essencial é a afetiva que envolve criar um espaço de companheirismo e mútuo apoio em que aflorem as condições para o desenvolvimento da identidade e autoestima de seus membros Se assim é então a proteção da entidade familiar pela ordem jurídica se justifica pelo cumprimento dessa função e não de outras Na origem para cumprir outras funções a família se organizou a partir de regras como a da exclusividade sexual Atualmente se uma forma qualquer de relacionamento visando a constituição de família cumprir satisfatoriamente a função afetiva interessa a toda a sociedade sua proteção Por esse caminho seguirá a tendência de amparo à união livre 42 União estável putativa Quando alguém se envolve numa união livre em que claramente ninguém assume o compromisso da exclusividade sexual e de organização de núcleos familiares sabe o risco que está correndo de ao término do relacionamento ver não frutificarem seus pleitos de alimentos ou participação no patrimônio do parceiro Afinal a união livre como espécie de concubinato não está protegida pelo direito brasileiro Se concordou com a falta de exclusividade sexual e a simultaneidade de famílias do parceiro não pode reclamar do desamparo em que eventualmente ficar quando finalizada a união livre Mas pode acontecer de pessoa se ligar a outra a quem de boafé considera desimpedido para a união estável isto é solteira viúva divorciada separada judicialmente ou de fato sem que isso corresponda à verdade Por desconhecer que seu companheiro ou companheira mantém vínculo de casamento ou de união estável com outrem essa pessoa está legitimamente autorizada a crer na regularidade da entidade familiar a que pertence A união estável é putativa quando um dos conviventes de boafé está legitimamente autorizado a crer que não existem impedimentos para que o outro a ela se vincule quando isso não corresponde à verdade Para o companheiro induzido em erro a situação de fato produzirá todos os efeitos da união estável inclusive quanto ao direito aos alimentos e participação no patrimônio do outro convivente Há nesse caso o que a doutrina denomina união estável putativa Pereira 20044549 Azevedo 2003283 A exemplo do que se verifica no casamento putativo o convivente de boafé terá os mesmos direitos que titularizaria caso não existisse o impedimento para a formação da união estável Quer dizer pode reclamar alimentos se deles necessitar e tem direito à participação nos bens adquiridos pelo companheiro na constância da união segundo os parâmetros do regime de comunhão parcial 5 Outras entidades Certamente com a incessante mudança nos costumes novas formas de entidades familiares tendem a aparecer E o direito também certamente há de se mostrar reticente no início apegado às formas hoje admitidas casamento família monoparental e união estável Duas novas formas têm sido estudadas a união poliafetiva em que três ou mais pessoas se declaram unidas na constituição de uma nova família e a família multiespécie composta por ser ou seres humanos e um ou mais animais A primeira escritura pública de constituição de união poliafetiva de que se tem notícia foi lavrada em Tupã no Estado de São Paulo em 24 de agosto de 2012 Por meio dela duas mulheres e um homem declararam que mantinham um vínculo matrimonial outorgandose mutuamente direitos deveres e obrigações típicos do casamento A lavratura desse tipo de escritura pública foi proibida pelo CNJ em 2018 Deste modo as pessoas unidas pelo vínculo de união poliafetiva hoje deparamse com as mesmas dificuldades que no passado amarguravam a vida dos casais homoafetivos conseguem por meio do direito obrigacional resultados semelhantes aos que decorreriam da aplicação do direito patrimonial de família mas não têm como assegurarem os direitos extrapatrimoniais autorização para transplantes cremação do corpo doação de órgãos após o falecimento vocação para curadoria em caso de interdição etc Em relação à família multiespécie a figura tem sido mencionada em processos de divórcio em que os demandantes disputam com quem ficará os animais de estimação A partir da hipótese de configuração de uma entidade familiar conjugando os seres humanos e seus pets pleiteiase a aplicação de institutos próprios do vínculo de filiação como a guarda compartilhada direito de visitas etc A simples aplicação das regras sobre partilha dos bens mostrase por vezes insuficiente à adequada regulação da matéria Quando por exemplo o pet pertencia a um dos cônjuges antes do casamento e este havia sido contratado no regime da comunhão parcial caso em que pela desta edição 2020 aplicação pura e simples das regras do direito patrimonial do casamento o animal continuaria a pertencer apenas àquele cônjuge não tendo o outro nenhum direito de desfrutar da companhia dele Reconhecese contudo a especificidade da ligação que se fez durante o casamento entre o animal e a outra pessoa com a qual passou a conviver A ligação de afeto entre o ser humano e um semovente é muito diferente das que se podem ter em relação a objetos 2020 02 13 PÁGINA RB61 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 60 FILIAÇÃO Capítulo 60 Filiação 1 Espécies de filiação Ter filhos é uma experiência única e embora acompanhada de imensas dificuldades geralmente gratificante Quem passa por ela no momento certo da vida enriquecea em muito Como antes de transmitir conceitos e valores é preciso clarificálos preparar alguém para viver em sociedade importa reestruturarse internamente Acompanhar de perto o crescimento de novo ser da espécie contribuindo de modo decisivo para sua formação desperta o sentimento de responsabilidade pela preservação e renovação de uma herança cultural milenar Mostrar o mundo para o filho é redescobrilo nos seus perdidos detalhes depois de crescer a gente só se recorda que a lagarta se metamorfoseia em borboleta e tantas coisas mais ao falar disso com ele Ter filhos vivenciando intensamente a relação é rejuvenescer Ao mesmo tempo amadurecese com a paternidade ou maternidade Para dar conta de educar crianças e adolescentes como se deve é preciso estabilidade emocional e psíquica Os pais que não a têm ganham a oportunidade de conquistála A experiência da paternidade ou maternidade não pressupõe necessariamente a geração do filho Ela é tão ou mais enriquecedora mesmo que a criança ou adolescente não seja portador da herança genética dos dois pais Perceba contudo que são recentíssimos a aceitação dessa ideia pelas pessoas em geral e seu cultivo como valor da sociedade A espécie humana precisou de milhões de anos de evolução e saltar do estado da natureza para o de civilização para dissociar descendência e transmissão da herança genética Instituições fortemente enraizadas em várias culturas como o casamento monogâmico e a família patriarcal com submissão da mulher foram criadas com a finalidade precípua de garantir o quanto possível que o filho herde os genes do pai Há não muito tempo atrás consideravase filho de verdade mesmo apenas o nascido dentro do casamento Isto é havia uma hierarquia entre os filhos em que se privilegiava o portador da herança genética de homem e mulher casados ou que pelo menos se presumia a tivesse recebido do primeiro Chamavase legítima a essa filiação Eram os filhos de verdade Os havidos fora do casamento consideravamse ilegítimos e estavam divididos em naturais se os dois genitores estavam desimpedidos para o casamento eram solteiros ou viúvos ou espú rios se havia impedimento esses últimos por sua vez chamavamse adulterinos quando casado um dos genitores mas não com o outro ou os dois mas não entre eles ou incestuosos se os pais não podiam se casar em razão de certos impedimentos descendia um do outro por exemplo O privilégio dos legítimos era tamanho que sob a égide do Código Beviláqua o pai enquanto estivesse casado não podia reconhecer filhos ilegítimos Mesmo que quisesse estava proibido Como o vínculo do casamento era indissolúvel só enviuvando ele podia ver o ato de perfilhação produzir efeitos A outra alternativa de que dispunha para amparar de algum modo o ilegítimo era reconhecêlo em testamento Do lado do filho apenas o ilegítimo natural tinha o direito à ação de reconhecimento de paternidade Quando a lei em 1942 passou a não mais proibir o reconhecimento dos adulterinos pelo pai desquitado isso representou um enorme avanço para a época Outro salto deuse em 1949 com a permissão legal para o filho adulterino propor desde que o demandado não estivesse mais casado a ação de reconhecimento de paternidade Até 1977 porém os filhos adulterinos reconhecidos não tinham os mesmos direitos sucessórios que os legítimos e somente em 1989 admitiuse que o homem casado pudesse reconhecer voluntariamente o filho adulterino ou ser demandado em ação investigatória de paternidade Wald 2004177185 Mesmo os filhos adotados não eram tratados em pé de igualdade com os legítimos pois tinham direito na herança apenas à metade da quota destes últimos Apenas em 1977 aboliuse essa discriminação Nascida na Antiguidade com o objetivo de garantir para os que não tinham filhos a continuidade da celebração de culto aos deuses domésticos e antepassados a adoção manteve até meados do século XX o caráter de substituição da descendência biológica No Código Beviláqua quem já tivesse filhos legítimos ou legitimados não podia adotar se depois de iniciado o processo por um casal sobreviesse a gravidez a adoção não tinha prosseguimento Toda essa abominável discriminação entre filhos legítimos e ilegítimos biológicos ou adotados felizmente é coisa do passado Embora ainda haja doutrina considerando de vital importância a distinção entre os legítimos ilegítimos e adotivos Venosa 2001 5244 na verdade não há mais hierarquia para a sociedade ou para a ordem jurídica entre os filhos sendo todos merecedores de iguais cuidados e direitos econômicos e patrimoniais Deixaram de existir filhos de verdade de um lado erros e arremedos de outro No Brasil no fim dos anos 1980 a lei ordinária já tinha evoluído no sentido da plena igualdade quando a Constituição veio extirpar de vez por todas qualquer possibilidade de discriminação ao dispor que os filhos havidos ou não da relação do casamento ou por adoção terão os mesmos direitos e qualificações proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação art 227 6º História semelhante aconteceu em outros países ao longo do século passado Na Alemanha por exemplo a superação do tratamento diferenciado entre filhos legítimos e ilegítimos também decorreu de princípio constitucional ao qual teve que se adaptar a lei ordinária Boizel 2000823826 Classificase atualmente a filiação em quatro espécies A finalidade da classificação é ilustrativa destinase unicamente a delimitar a extensão do conceito porque independentemente do tipo de filiação os direitos e deveres associados à relação vertical são absolutamente idênticos Atento a essa advertência podese distinguir a filiação em biológica e não biológica sendo esta última subdividida em filiação por substituição socioafetiva e adotiva Na filiação não biológica ocorre a perfilhação isto é os pais declaram expressa ou implicitamente a vontade de ter certa pessoa como filha A filiação é biológica quando o filho porta a herança genética tanto do pai como da mãe subitem 11 Ela é natural se a concepção resultou de relações sexuais mantidas pelos genitores Mas esse não é o único meio de gerar filho biológico Também pertence a essa categoria a filiação quando a concepção ocorre in vitro Desde que os gametas tenham sido fornecidos por quem consta do registro de nascimento da pessoa como seu pai e mãe ainda que esta não tenha feito a gestação mas outra mulher DTU doadora temporária de útero a filiação classificase como biológica Nos demais casos isto é se o filho não porta a herança genética de seus dois pais a filiação é não biológica Nessa categoria classifico também a hipótese de filiação em que apenas os gametas de um dos pais participaram da concepção Entendo ser esta alternativa didaticamente mais elucidativa que a de considerar a filiação nesse caso uma espécie híbrida quer dizer biológica em relação ao fornecedor do gameta e não biológica relativamente ao outro pai A filiação por substituição provém do emprego de técnica de reprodução assistida heteróloga em que os pais contratam os serviços médicos de concepção in vitro sem pelo menos um deles fornecer o gameta Por vezes também ocorre a geração do filho em útero de outra mulher que não a mãe subitem 12 A filiação socioafetiva provém da relação de afeto paternal ou maternal nascida na convivência duradoura de um adulto e uma criança Não existe nessa categoria vínculo biológico entre o pai ou a mãe e seu filho Não ocorreu tampouco a contratação pelos pais de serviços médicos de fecundação assistida Lôbo 2004 O amor só ele gerou os direitos e obrigações subitem 13 Por fim a filiação adotiva é a estabelecida pela adoção resultado dum processo judicial em que um adulto ou dois adultos casados aceita outra pessoa geralmente criança ou adolescente como seu filho subitem 14 Uma das questões mais intrincadas que o direito de família enfrenta relativamente à filiação não biológica consiste em assegurar ao filho o direito à informação genética sem que disso decorra reconhecimento de paternidade ou maternidade excludente do vínculo familiar constituído em decorrência da responsabilidade pela fecundação convivência ou adoção subitem 22 Outra classificação de natureza meramente ilustrativa separa as filiações havidas dentro e fora do casamento A única diferença entre os filhos de uma ou de outra categoria diz respeito à distribuição do ônus de prova nas ações de reconhecimento ou negatória de paternidade item 4 O filho havido dentro do casamento não precisa provar que é seu pai o marido da mãe este é que tem o ônus de prova caso pretenda liberarse do vínculo de paternidade biológica Já o filho havido fora do casamento tem o ônus de prova de que o homem demandado é seu pai biológico A filiação é biológica quando o filho porta a herança genética de quem consta como pai e mãe de seu registro de nascimento Pode ser natural se a concepção derivou de relação sexual entre os genitores ou não quando feita in vitro A filiação não biológica por sua vez compreende aquela em que os gametas ou mesmo um deles não foram fornecidos pelas pessoas identificadas como pai e mãe no registro de nascimento por substituição Também não são biológicas as filiações socioafetiva e adotiva Mas essa classificação assim como a que distingue entre filiação havida dentro e fora do casamento são meramente ilustrativas Em qualquer caso os direitos e deveres associados à relação de filiação ou de paternidade ou maternidade são idênticos Em suma independentemente da espécie de filiação biológica ou não biológica havida dentro ou fora do matrimônio e do tipo de família em que ela se insere matrimonial nascida de união estável ou monoparental os direitos e deveres dos pais e filhos são idênticos Parte deles está sintetizada no instituto do poder familiar item 5 11 Filiação biológica Na filiação biológica os pais são os genitores as pessoas identificadas como pai e mãe no registro de nascimento foram os fornecedores dos gametas empregados na concepção da pessoa ocorrida in vitro ou in utero A questão jurídica normalmente despertada pela filiação biológica natural diz respeito à resistência do genitor em reconhecer a paternidade quando não está casado com a mãe Quando o relacionamento entre os dois não é estável a resistência pode ser legítima em vista das incertezas nutridas pelo indigitado pai isto é o homem apontado pela mãe como genitor Neste caso se o homem resiste apenas porque honestamente não quer assumir a paternidade de rebento que não tem certeza ser dele um simples exame em ADN resolve a questão Confirmada a paternidade biológica seguese a perfilhação Não é raro ocorrer porém que a recusa em reconhecer a paternidade derive tão só da vontade de não assumir qualquer encargo relativo ao sustento criação e educação da criança Em vista da tutela dos interesses do filho desenvolveramse os institutos da investigação oficiosa subitem 21 e de presunções de paternidade item 4 Certamente porém é na filiação biológica não natural que se enfrentam as questões mais complexas As pessoas identificadas como pai e mãe forneceram a herança genética mas a fecundação não decorre de sexo feito por elas e sim de assépticos procedimentos laboratoriais A filiação biológica não natural deriva da aplicação de técnicas de fecundação assistida homóloga Nela os gametas espermatozoide e óvulo são fornecidos pelos próprios contratantes do serviço isto é pelo homem e mulher que desejam ser pais mas não têm conseguido a gravidez por meio de relações sexuais Ao se submeterem a essas técnicas eles manifestam a vontade de ter filhos ainda que implicitamente Mas declaram também e aqui de modo expresso a vontade de que os gametas e embriões excedentários crioconservados não sejam usados no futuro sem sua autorização Não se costuma questionar a legitimidade da imputação ao genitor das graves responsabilidades de pai quando a filiação é biológica natural porque ele teria manifestado a vontade de procriar ou pelo menos assumido os riscos da procriação ao manter relações sexuais com a mãe Se deixou de usar métodos contraceptivos sob seu controle como a camisinha ou se os que adotou não foram inteiramente eficientes não pode posteriormente furtarse de todas as consequências de seu ato Mas no caso da filiação biológica não natural é questionável se o mesmo argumento fundado na assunção do risco pode conduzir igualmente à legitimidade da imputação da condição de pai Por mais qualificadas que sejam as clínicas de fecundidade assistida bancos de sêmen e laboratórios erros acontecem como em qualquer outra atividade humana Além disso não se pode descartar a hipótese de conluio entre a genitora e os profissionais e empregados que trabalham nessas empresas Por várias razões portanto contra a vontade expressa do genitor pode ocorrer a filiação biológica não natural Aliás nesse caso os dois gêneros estão expostos às mesmas situações Também o genitor pode mediante conluio com a clínica de fecundação banco de óvulos e laboratório e contando com os serviços de uma doadora temporária de útero dar ensejo a uma filiação biológica não desejada pela genitora No Código Civil normas pouco inspiradas estabeleceram a presunção de paternidade no caso de fecundação artificial homóloga em duas hipóteses Nelas as expressões mesmo que falecido o marido CC art 1597 III e a qualquer tempo inciso IV afastam qualquer questionamento da juridicidade da filiação biológica não natural post mortem Gonçalves 2005278 Pela letra desses dispositivos o homem que tiver se submetido a técnica de fertilização assistida homóloga uma vez na vida pode enquanto vivo ou depois de morto ser pai contra sua expressa declaração de vontade Esses preceitos note dizem respeito à paternidade mas como visto também a mulher que tenha passado pela experiência da fertilização assistida homóloga está exposta a igual risco de ser mãe contra sua expressa vontade mesmo depois de morta Na filiação biológica o filho porta a herança genética do pai e da mãe identificados em sua certidão de nascimento Pode ter sido concebido numa relação sexual entre eles ou em decorrência do emprego de técnica de fertilização assistida homóloga A grande dificuldade que a questão suscita diz respeito em última análise aos direitos da pessoa gerada nesse tipo de filiação A vontade do genitor ou da genitora expressa no sentido de não ter esse filho seria suficiente para descaracterizar a filiação O menino ou menina assim gerado teria só mãe ou pai dependendo de quem tivesse cometido a geração fraudulenta E se nenhum deles se envolveu na fraude de quem o rebento seria filho Do laboratório Pelos valores que atualmente a sociedade nutre os filhos da fraude ou do laboratório não poderiam ser discriminados Teriam direito ao reconhecimento da paternidade ou maternidade biológica mesmo após o falecimento dos genitores No futuro em continuando seu curso o processo de despatrimonialização do direito de família a lei talvez dê a essa questão uma solução diferente 12 Filiação por substituição Pelo estágio atual de evolução da ciência a criação de novo ser da espécie humana depende de três coisas espermatozoide microgameta óvulo macrogameta e útero Aliás só se constitui um novo sujeito de direito quando o espermatozoide fecunda o óvulo e o embrião assim formado alojase no útero de uma mulher Enquanto é só embrião in vitro não há sujeito de direito mas simples coisa cujas célulastronco podem mediante autorização dos genitores ser destinadas à pesquisa ou terapia quando inviáveis ou após três anos de congelamento Lei n 111052005 art 5º Antigamente quando duas pessoas casadas queriam ter filhos só havia uma possibilidade o esposo fornecia o espermatozoide e a esposa o óvulo e o útero numa relação sexual Mas quando qualquer um desses três elementos espermatozoide óvulo e útero por qualquer razão natural não estava apto a cumprir sua função no processo reprodutivo da espécie humana frustravase o desejo de fazer descendência Inúmeros casais amarguravam o fracasso em pouco podendo ajudar a medicina no tratamento das disfunções originárias dessa dor Hoje em dia a ciência médica permite muitas outras combinações além do fornecimento do microgameta pelo esposo e do macrogameta e útero pela esposa para que os casados possam ter filhos São elas 1ª O esposo fornece o espermatozoide a esposa o óvulo e outra mulher o útero DTU doadora temporária de útero Nesse caso a filiação não é por substituição mas biológica não natural por decorrer do emprego de técnicas de fecundação assistida homóloga As principais questões jurídicas ligadas a essa forma de reprodução assistida foram já examinadas subitem 11 Mas falta tratar da doação temporária de útero conhecida vulgarmente como barriga de aluguel o que será feito adiante subitem 122 2ª O esposo fornece o espermatozoide e outra mulher que não a esposa fornece o óvulo mãe de substituição ou doadora genética DG e o útero DTU Aqui a técnica empregada na fecundação é uma das de fertilização assistida heteróloga porque a mãe que constará do registro de nascimento não forneceu o gameta A gestação nessa possibilidade é feita também por mulher diversa 3ª O esposo fornece o espermatozoide outra mulher que não a esposa o óvulo DG e uma terceira o útero DTU Não coincidem aqui as doadoras genética e temporária do útero Tratase de esquema que contribui para a redução das sérias implicações psicológicas envolvidas na questão Como a mulher que gera não fornece o gameta e a que o fornece não responde pela geração presumese que os vínculos psicológicos entre as doadoras e o bebê tendem a ser menores contribuindo para reduzir os conflitos de interesses 4ª A esposa fornece o óvulo e o útero e outro homem que não o esposo o espermatozoide Também se trata de fecundação assistida heteróloga Da hipótese cuida de forma transversa o Código Civil ao exigir a prévia autorização daquele que figurará como pai na certidão de nascimento para presumirse a paternidade dele CC art 1597 V 5ª A esposa fornece o óvulo outra mulher o útero DTU e outro homem o espermatozoide Uma vez mais a técnica empregada é de fecundação assistida heteróloga No dispositivo mencionado acima a lei no emaranhado da complexa questão preocupouse apenas em presumir a paternidade do homem que consta como pai da certidão de nascimento se ele deu prévia autorização à inseminação da DTU com o óvulo da esposa 6ª A esposa fornece o útero o espermatozoide é fornecido por outro homem que não o esposo e o óvulo por outra mulher que não a esposa DG 7ª no casamento entre duas mulheres uma delas fornece o óvulo e a outra o útero sendo o espermatozóide fornecido por quem necessariamente não é cônjuge gestação compartilhada 8ª O espermatozoide é fornecido por outro homem que não o esposo e o óvulo e útero por outra ou outras mulheres que não a esposa Nesse caso pai e mãe não participam biologicamente da filiação Nem todas essas possibilidades teoricamente abertas à ciência são aceitáveis sob o ponto de vista da ética profissional Na última por exemplo descabe a reprodução assistida e os cônjuges são aconselhados a adotar uma criança Se não fornecerão nenhum gameta nem a mulher vivenciará a experiência da gravidez será melhor para eles e para a sociedade a adoção de criança abandonada ou desamparada A reprodução assistida nesse caso visaria unicamente atender à necessidade psicológica de ter sido do casal a iniciativa de conceber e gerar o novo ser Essa vontade não pode ser prestigiada pela ética enquanto houver gente concebida gerada e nascida precisando de pais Os médicos estão sujeitos à responsabilização profissional inclusive com a cassação do registro se adotarem procedimentos não autorizados pela Res n 21212015 do Conselho Federal de Medicina que disciplina a Reprodução Assistida RA Essa regulamentação de ética profissional limita as iniciativas e embora não vincule senão os médicos acaba tendo o sentido de norma geral porque em tese ninguém consegue ser pai ou mãe com o emprego de técnica de reprodução assistida senão com o concurso de médico atento à deontologia de seu mister Em todas as combinações acima independentemente da ascendência biológica ou do processo gestacional esposo e esposa serão os pais da criança assim concebida e gerada Em outros termos são pais para fins jurídicos os contratantes dos serviços de fertilização assistida com doação de gameta masculino feminino ou de ambos com ou sem gestação por substituição Aqueles que procuraram uma clínica de fertilização e contrataram os serviços médicos com o fim específico de ter filho são os pais do bebê que virem a gerar para todos os fins de direito O nome deles e não dos doadores genéticos ou da doadora temporária do útero é que deve figurar na certidão de nascimento Quem não consegue ter filhos por meio natural pode se submeter a técnica de reprodução assistida que se realiza pela doação de gameta ou temporária de útero O contratante dos serviços médicos será para todos os fins de direito o pai ou mãe da pessoa que vier à luz por sua iniciativa Por razões de ordem didática tratei até aqui do desejo de homem e mulher casados terem filhos Mas o que se disse a respeito deles pode ser inteiramente aplicado às demais situações jurídicas como a união estável entre pessoas de sexos diferentes ou iguais o casamento homossexual ou a família monoparental paterna ou materna 121 Autorização da fecundação heteróloga A lei brasileira como já ressaltado não disciplina sistematicamente a questão da filiação por substituição Mas tangencia o tema ao dispor sobre as presunções de paternidade em que acaba por estabelecer certas condições legais para o emprego de técnica de fertilização heteróloga O art 1597 V do CC estabelece a presunção de paternidade para os filhos havidos por inseminação artificial heteróloga se houve prévia autorização do marido Não é necessário note que a autorização seja escrita porque a lei não exige forma específica Nos Estados Unidos exigese o consentimento escrito dos dois cônjuges mas entre nós basta que o marido tenha adotado comportamento incompatível com a discordância relativamente à implantação no útero de sua mulher de embrião fecundado por espermatozoide de outro homem para que se considere autorizado por ele o procedimento médico Lobo 2004509510 Se sempre acompanhou a esposa ou convivente à clínica custeou o tratamento ou parte dele estava autorizando a filiação por substituição A autorização só é eficaz enquanto existir o vínculo de conjugalidade entre os contratantes dos serviços de reprodução assistida Vindo a falecer quem deu a autorização ou ocorrendo a ruptura do casamento ou união estável por qualquer outro motivo cessa a presunção de paternidade Se a mulher contratar a implantação do embrião em seu útero ou no de uma DTU será somente dela o filho assim gerado Como o inciso V do art 1597 do CC não menciona ao contrário dos incisos III e IV que tratam da reprodução assistida homóloga qualquer tempo ou morte do marido devese considerar que a lei legitima a procriação artificial heteróloga por substituição do gameta masculino só enquanto o marido ou companheiro cujo nome seria lançado no assento civil da pessoa assim concebida como pai for vivo e conjugalmente ligado à mãe Welter 2003101 e 212214 Não se admite em outros termos a filiação post mortem senão na hipótese de reprodução assistida homóloga Em razão do princípio constitucional da igualdade as mesmas condições devem ser observadas também no caso de filiação por substituição do gameta feminino Ela não pode ser feita sem a autorização da esposa ou convivente ou depois do falecimento dela ou desconstituição do vínculo conjugal Evidentemente se ela se submete ao implante em seu útero do embrião derivado da fecundação de óvulo de outra mulher por espermatozoide de seu marido ou convivente estará dando seu mais completo assentimento à heterologidade da filiação Claro está por outro lado que a hipótese de reprodução assistida com substituição do óvulo na falta de autorização da mulher cujo nome constará do assentamento civil como mãe ou depois de sua morte ou desligamento do pai depende necessariamente de DTU Ou seja esta hipótese tende a ser bem menos frequente do que a de utilização de microgameta substituto com o objetivo de imputar a paternidade a quem anteriormente dera embora em outras circunstâncias a autorização para a fecundação assistida heteróloga A fertilização assistida heteróloga depende de autorização do pai ou mãe dependendo de quem tenha tido o gameta substituído Essa autorização só é eficaz enquanto existir o vínculo de conjugalidade com o outro contratante dos serviços de reprodução assistida Pois bem e se ocorrer a reprodução assistida heteróloga sem a devida autorização e eventualmente com desrespeito à norma ética de quem será o filho No caso de substituição não consentida do gameta masculino em vista do princípio do anonimato da doação genética essa criança será registrada somente no nome da mãe Integrará junto com a mulher que tratou de sua concepção e eventualmente também geração artificial uma família monoparental mas não terá direito ao reconhecimento de paternidade Já na substituição não consentida do gameta feminino a questão é um tanto mais complexa porque a doadora temporária do útero não deve ser considerada a mãe da criança Sua participação na reprodução assistida limitouse a proporcionar o ambiente natural necessário à gestação Ela pode nem ser a doadora genética tendo sido o macrogameta aproveitado de banco de óvulos ao amparo do princípio do anonimato Entendo que a resposta mais adequada por mais estranha que pareça é a mesma dada à questão anterior O rebento integrará uma família monoparental constituída junto com o adulto que havia contratado os serviços de reprodução assistida Essa criança deve ser então registrada apenas com a identificação do pai e não terá direito ao reconhecimento da maternidade 122 Doação temporária de útero De acordo com o item VII da Res n 21212015CFM a doação temporária de útero aluguel de barriga só pode ocorrer em duas hipóteses i nas relações homoafetivas e ii nas relações heteroafetivas se a mãe não tiver condições por razões médicas de abrigar a gestação do embrião Neste segundo tipo de relação matrimonial somente se a contratante dos serviços de reprodução assistida tiver problema médico que impeça ou contraindique a gestação poderá ser o embrião implantado no útero de outra mulher Mesmo que não tenha sido ela a fornecedora do óvulo tendo saúde para a gravidez o implante será obrigatoriamente feito no útero da usuária isto é da mulher contratante dos serviços médicos A doadora do útero quando permitida a doação deve ter em princípio parentesco até o quarto grau de um dos contratantes dos serviços de reprodução assistida Quer dizer ela deve ser mãe avó irmã tia ou prima de qualquer um dos contratantes dos serviços de RA Não havendo esse vínculo de parentesco o médico deve antes pedir a autorização do Conselho Regional de Medicina a que estiver vinculado Outra determinação da regulamentação profissional da reprodução assistida relacionada à DTU é a proibição de a doadora ter com seu ato qualquer lucro Podem e devem os contratantes do serviço de fertilização artificial ressarcir as despesas que a gravidez trará para a doadora assim como indenizála por algum prejuízo que o estado de grávida lhe acarrete como a dificuldade de encontrar emprego Mas a regulamentação não permite qualquer remuneração pelo serviço prestado Pelas normas baixadas pelo Conselho Federal de Medicina não é admissível a doação temporária de útero DTU com finalidade lucrativa e por quem não seja em princípio parente até quarto grau de qualquer um dos contratantes dos serviços de reprodução assistida Essas limitações não se encontram na lei não vinculando por essa razão os casais Sua inobservância pode no máximo levar à responsabilização profissional do médico responsável Essas limitações de ordem ética como dito não vinculam senão os médicos Apenas eles estão sujeitos ao poder normativo do Conselho Federal de Medicina e expostos a sanções no caso de desobediência Pela ordem constitucional vigente ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei Desse modo não se pode dizer propriamente que os casais estão proibidos de contratar a DTU de modo diverso do previsto na norma deontológica do CFM Como em princípio eles terão dificuldades de encontrar alguma clínica de fertilização disposta a atendê los fora dos padrões desta regulamentação na prática é como se essa norma ética fosse legal No meu modo de entender a questão não é injurídico o contrato de prestação de serviços de gestação inclusive quando prestado de forma remunerada por mulher sem vínculo de parentesco Qualquer trabalho manual ou intelectual importa ao trabalhador dar algo de si de seu corpo de suas energias para o contratante Não há nenhuma diferença sob esse ponto de vista entre o advogado que vara a madrugada redigindo a minuta de contrato para atender ao prazo combinado com o cliente e a mulher que se propõe a gerar em seu ventre o filho da contratante Evidentemente a questão é bastante polêmica e predomina na doutrina o entendimento contrário à validade desse contrato Leite 1995401419 Tenho para mim também que a mulher saudável com plenas condições orgânicas para gerar uma criança tem também o direito de contratar a DTU Ela pode ter interesse em contratar a gestação de seu filho biológico por outra mulher porque não lhe agrada ou convém ficar grávida É irrelevante o motivo pelo qual deseja ser mãe sem parir a gravidez pode atrapalhar sua carreira profissional ou alterarlhe o corpo de maneira não querida cf Araújo 19992931 Na disciplina legal da matéria esse interesse deveria ser amplamente protegido Tratase de manifestação do direito de personalidade referente ao próprio corpo por ela titulado que a lei não pode ignorar Para a sociedade por outro lado é igualmente útil que não só a maternidade como a gravidez sejam atos conscientes das mulheres respeitandose as decisões que adotam Sob a perspectiva do filho a gravidez indesejada da mãe pode lhe acarretar problemas psicológicos que a DTU contribuiria para evitar 123 Anonimato do doador de gameta Em novembro de 2005 a revista britânica New Scientist publicou a história de um jovem de 15 anos que descobriu o nome do doador do gameta masculino empregado em sua fertilização assistida usando apenas as informações de seu próprio ADN DNA a data e local de nascimento do doador e dados genealógicos disponíveis na internet O impressionante da história é que todas as medidas de preservação do anonimato da doação haviam sido fielmente adotadas Nenhum dos trabalhadores do banco de sêmen deixou de cumprir rigorosamente com suas funções observando com perfeição todos os procedimentos e cautelas exigidos para preservar anônimo e desconhecido o doador mas isso não foi o suficiente para impedir que o filho o encontrasse E de um modo lícito e surpreendentemente simples O jovem tendo em mãos suas informações genéticas obtidas por teste de ADN em saliva disponibilizouas num site genealógico que faz o cruzamento desses dados de seus usuários Esse site é procurado por pessoas interessadas em localizar parentes ampliar os contatos dentro da família ou conhecer suas raízes A informação genética do doador não constava do banco de dados do serviço online Nove meses depois contudo o jovem foi procurado por dois outros usuários cujos cromossomos Y coincidiam com os dele Havia a probabilidade de 50 de provirem os três do mesmo pai avô ou bisavô Os sobrenomes desses outros usuários eram parecidos embora possuíssem grafia ligeiramente diversa A mãe dele para escolher o sêmen havia obtido do banco algumas informações genéricas sobre os potenciais doadores Eram dados que até então seriam insuficientes para nortearem por eles apenas qualquer investigação A data e local do nascimento do doador estavam entre as informações fornecidas O jovem então buscou em outro site a lista de todas as pessoas nascidas no mesmo lugar e data que o seu genitor Só um homem tinha o sobrenome de seus parentes biológicos conhecidos por meio do primeiro site Dez dias depois o jovem teria feito contato telefônico com o doador do espermatozoide usado em sua concepção A divulgação dessa notícia preocupou os profissionais envolvidos com a reprodução assistida A garantia do anonimato da doação de esperma e óvulo é condição indispensável para estimular as doações A mostra da cabal impotência dos bancos de gametas em preservar o anonimato do doador certamente refreou algumas iniciativas Se em 2005 um cidadão de país central do capitalismo com um pouco de sorte conseguiu chegar facilmente ao genitor em algumas décadas será impossível impedir em qualquer parte do mundo que os filhos gerados por substituição de gameta encontrem os respectivos doadores A doação de espermatozoide ou óvulo deve ser feita sem intuito lucrativo princípio da gratuidade e sem identificação do doador princípio do anonimato Mesmo que apesar das cautelas adotadas na preservação do anonimato do doador a pessoa gerada por substituição de gameta venha a encontrar o genitor ou genitora estes últimos não podem ser considerados juridicamente pai ou mãe dela A Res n 21212015CFM enuncia dois princípios fundamentais para a doação de gametas a gratuidade item IV1 e o anonimato item IV2 Pelo primeiro não se admite nenhuma remuneração ao doador de material genético Além de ser considerada contrária à ética a comercialização de partes do corpo a possibilidade de lucro com o fornecimento de esperma ou óvulo levaria pessoas necessitadas a fazerem mais doações sem proveito nenhum para o sistema em vista da limitação do emprego de material genético doado na região da clínica centro ou serviço de reprodução assistida gametas de um mesmo doador só podem ser utilizados no máximo em uma gestação numa área de um milhão de habitantes O princípio do anonimato busca impedir que os doadores conheçam a identidade dos receptores e estes a daqueles Tratase de garantia para as duas partes nenhuma delas pode ser perturbada por pleitos da outra O sigilo sobre a identidade dos doadores e receptores é absoluto autorizado o fornecimento de informações disponíveis acerca dos primeiros exclusivamente a médicos e por razões médicas Desse modo o geriatra que cuida de paciente concebido por técnica de fertilização assistida heteróloga pode necessitar para definir a estratégia do tratamento de informações genéticas do fornecedor do gameta substituto Terá acesso aos dados disponíveis no banco de gametas mas não à identidade dele O sigilo da identidade do doador só pode ser quebrado por ordem judicial O juiz no entanto só deve requisitála ao banco de gametas em situações especialíssimas Não cabe por exemplo a quebra da identidade do doador ou doadora a pedido do filho interessado em atribuirlhe a paternidade ou maternidade Ele possui pai e mãe que desde cedo o queriam com tanta intensidade que foram buscar ajuda médica Quer dizer o interessado não é ninguém desamparado e desamado Do outro lado não há alguém procurando furtarse de suas responsabilidades O doador limitouse a ajudar desinteressadamente pessoas desconhecidas não tendo em nenhum momento manifestado a menor intenção de se tornar sob o ponto de vista jurídico pai ou mãe da pessoa concebida com seu material genético cf Veloso 1997152153 A tendência da despatrimonialização do direito de família recomenda por fim que filho por substituição não tenha direito de investigar a paternidade biológica Além do desrespeito completo à vontade do doador e aos sentimentos daquele que consta como pai ou mãe da certidão de nascimento a admissão pela jurisprudência da quebra do anonimato da doação para fins de reconhecimento de paternidade ou maternidade importaria o mais absoluto descrédito de um dos princípios básicos da reprodução assistida Sem a garantia mínima do anonimato que como mostra o caso narrado na New Scientist está cada vez mais vulnerável é provável que se reduza ainda mais o já pequeno interesse em doação de gameta Por isso para a sociedade em geral não interessa o conhecimento pelo filho nascido de filiação por substituição da identidade do genitor ou genitora nem o reconhecimento judicial da paternidade ou maternidade Em que caso especialíssimo então caberia a quebra do sigilo da identidade do genitor ou genitora Ela caberá quando informações acerca do doador úteis ou necessárias ao tratamento da saúde de qualquer pessoa de sua descendência biológica não existirem nos arquivos do banco de gametas Neste caso o juiz pode determinar seja revelada a identidade do doador para que o dado auxilie encontrar o homem ou mulher que fornecera o material genético e possam ser enfim obtidas aquelas informações 13 Filiação socioafetiva A filiação socioafetiva constituise pelo relacionamento entre um adulto e uma criança ou adolescente que sob o ponto de vista das relações sociais e emocionais em tudo se assemelha à de pai ou mãe e seu filho Se um homem mesmo sabendo não ser o genitor de criança ou adolescente tratao como se fosse seu filho tornase pai dele Do mesmo modo a mulher se torna mãe daquele de quem cuida como filho durante algum tempo Nessa espécie de filiação entrecruzamse duas verdades De um lado a verdade biológica pela qual o filho sabidamente não porta a herança genética do pai ou mãe De outro a verdade socioafetiva manifestada por condutas do adulto em relação à criança ou adolescente na intimidade da família e nas relações sociais que se assemelham às de qualquer outra filiação Nessa espécie de filiação a verdade socioafetiva prepondera sobre a biológica Fachin 2003a2230 Se o marido ou companheiro da mãe sabe não ser o genitor do filho dela mas o trata como se fosse o pai do vínculo de afeto surge o da filiação Igualmente se a esposa acolhe o filho que o cônjuge teve em relacionamento extraconjugal e o cria e educa como dela vira mãe do rebento Muitas vezes nessas situações e noutras típicas de filiação socioafetiva não há discrepância entre o contido no registro de nascimento do filho e a situação de fato O marido ou companheiro da mãe declarase o pai no registro de nascimento Em outros termos o casal simula a adoção ou como se diz faz a adoção à brasileira do filho havido pelo esposo fora do casamento Quer dizer o registro normalmente confere com a realidade social embora não com a genética Veja que a preponderância da verdade socioafetiva sobre a biológica não tem sido prestigiada na solução de conflitos de interesses de natureza diversa No caso de troca de bebês na maternidade por exemplo a jurisprudência tem resolvido a questão dando à verdade biológica maior relevo que à socioafetiva ao determinar a destroca para que cada filho volte às mãos dos seus genitores Surgida a filiação do afeto a ela se ligam tanto os pais como o filho O pai deixa de ter o direito à negatória de paternidade fundada na inexistência de transmissão de herança genética Se sabendo não ser o genitor cuidou de alguém como se fosse seu filho não pode mais renegálo fundado na verdade biológica O conceito de filiação socioafetiva tem sido adotado na jurisprudência brasileira predominantemente com o objetivo de impedir que o homem depois de anos se portando como pai de alguém por razões que normalmente não dizem respeito direto ao relacionamento paternal rompimento com a mãe novo casamento ou união estável etc pretenda se exonerar de responsabilidades patrimoniais Com esse desiderato na Alemanha desde 2004 a lei dispõe sobre a paternidade socioafetiva Na Itália França e Espanha a noção de posse do estado de pai tem sido empregada para obstar ações de contestação de paternidade Frank 20058597 Por ser incomum a negatória de maternidade não se tem notícia ainda do emprego da noção de filiação socioafetiva para fins de afastar a pretensão da mulher de não cumprir suas obrigações de mãe Ela porém está igualmente vinculada ao filho por força do afeto cultivado entre os dois como estaria um homem na mesma situação A filiação socioafetiva constituise pela manifestação do afeto e cuidados próprios das demais espécies de filiação entre aquele que sabidamente não é genitor ou genitora e a pessoa tratada como se fosse seu filho Note contudo que a filiação socioafetiva também vincula o filho Se não está desamparado economicamente ele não tem o direito de invocar a verdade biológica para demandar o reconhecimento da paternidade ou maternidade em desrespeito aos cuidados e amor recebidos de seu pai ou mãe socioafetivo Entendase bem a implicação jurídica da filiação socioafetiva para o descendente Se ele precisa de alimentos porque não os pode prover o pai ou mãe socioafetivo então mediante anuência deste último poderá intentar a ação de reconhecimento de paternidade ou maternidade com o objetivo de obrigar o genitor ou genitora a pagálos Mas se tem sido satisfatoriamente alimentado cuidado e educado pelo pai ou mãe socioafetivo não poderá propor contra o genitor ou genitora a ação de reconhecimento de paternidade ou maternidade ainda que o seu padrão de vida pudesse experimentar a final sensível melhora A tendência da despatrimonialização do direito de família conduz o conceito de filiação socioafetiva para essa implicação cf Welter 20031641173 O filho vinculado à filiação socioafetiva titula o direito de conhecer sua ascendência genética para fins médicos cf Zanellato 2004 Poderá assim demandar a pessoa que provavelmente é seu genitor ou genitora para que ela se submeta a exame em ADN confirmatório ou desconfirmatório das informações de que dispõe sobre sua ancestralidade Provada em juízo a razoabilidade da suspeita de ser o demandado o genitor ou genitora do demandante o juiz poderá condenálo sob pena de multa periódica a fazer o exame com o único objetivo de uma vez confirmada a vinculação biológica proporcionar ao autor da ação o acesso a informações úteis ao tratamento da própria saúde ou de sua descendência O direito à informação genética é autônomo em relação ao do reconhecimento de paternidade ou maternidade 14 Adoção A adoção é processo judicial que importa a substituição da filiação de uma pessoa adotado tornandoa filha de outro homem mulher ou casal adotantes Ela está regida no direito positivo brasileiro pela Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente ECA quando o adotado tem até 12 anos de idade incompletos criança ou entre 12 e 18 anos de idade adolescente CC art 1618 Sendo maior de 18 anos o adotado a adoção dependerá da assistência efetiva do Poder Público e de sentença judicial aplicandose subsidiariamente o ECA CC art 1619 Quando o Código Civil entrou em vigor em 2003 contemplava disposições sobre a adoção não inteiramente compatíveis com as do ECA dando ensejo a dúvidas sobre a vigência desse estatuto A doutrina concluiu na oportunidade que o Código Civil por conter normas de caráter geral não havia revogado o ECA lei especial para a infância e adolescência Fachin 2003239 Grisard Filho 2003 Somente em 2009 espancaramse todas as dúvidas com a edição da Lei n 120102009 que revogou as disposições específicas do Código Civil sobre adoção mantendo nesse diploma apenas remissões genéricas e supletivas ao ECA A adoção é no direito brasileiro uma medida excepcional Quando a situação da criança ou adolescente reclama intervenção do Estado devese priorizar sua manutenção na família natural ou extensa Apenas quando constatada a inviabilidade dessa medida podese cogitar de adoção da criança ou do adolescente por família substituta Em princípio a adoção rompe completamente os vínculos do adotado com seus pais e parentes consanguíneos atribuindolhe a situação de filho do adotante para todos os fins Nem mesmo a morte dos adotantes restabelece a filiação biológica dissolvida pela adoção ECA art 49 O impedimento matrimonial é o único vínculo que remanesce entre de um lado o adotado e de outro seus pais e parentes biológicos ECA art 41 O adotado continua não podendo se casar com a antiga irmã por exemplo A adoção só não desfaz os vínculos de filiação e parentesco anteriores quando o adotante é cônjuge ou convivente do pai ou mãe do adotado ECA art 41 1º Nesse caso o rompimento é parcial e diz respeito apenas ao vínculo de filiação mantido com o ascendente do mesmo sexo do adotante Quer dizer se o esposo adota o filho da esposa ou o companheiro o da companheira o adotado rompe o vínculo de filiação com o pai consanguíneo mas continua filho de sua mãe biológica Do mesmo modo se a esposa adota o filho do esposo ou a companheira o do companheiro desfazse a filiação com a mãe consanguínea mas ela é preservada em relação ao pai Rompidos total ou parcialmente os vínculos com seus genitores e parentes o adotado passa a ser para todos os efeitos legais filho do adotante ou dos adotantes Isso significa que fica submetido ao poder familiar titulado por esse último mas tem direito aos alimentos e de participação na sucessão Não há como já mencionado nenhuma diferença entre o filho por adoção e o de qualquer outra espécie de filiação ou perfilhação Uma das manifestações do surgimento de novo vínculo de filiação em substituição ao consanguíneo é a troca do sobrenome dos genitores do adotado pelo do adotante bem assim a possibilidade de escolha de um novo prenome tanto pelos adotantes como pelo próprio adotado Se a mudança do prenome é iniciativa dos adotantes o adotado deve ser ouvido ECA art 47 5º A idade mínima para alguém adotar é 18 anos ECA art 42 caput Em 2017 duas importantes inovações foram introduzidas no ECA na parte relativa à adoção Uma diz respeito à licitude de a mãe ou gestante externar a vontade de encaminhar o filho para a adoção antes ou logo após o nascimento art 19A outra institui o programa do apadrinhamento destinado a proporcionar vínculos externos à instituição em que se encontram crianças e adolescentes art 19B A adoção de crianças até 12 anos incompletos e adolescentes entre 12 e 18 anos regida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é medida excepcional cabível apenas se frustrada a manutenção deles na família natural ou extensa A adoção pode ser nacional subitem 141 ou internacional subitem 142 segundo o domicílio dos adotantes se situe no Brasil ou no exterior 141 Adoção nacional Os requisitos para a adoção nacional de criança ou adolescente são cinco a inviabilidade da manutenção na família natural ou extensa b vantagens para o adotado e legitimidade dos motivos do adotante c consentimento dos pais do adotando e sendo adolescente também o dele d sentença deferindo a adoção proferida em processo judicial após o obrigatório estágio de convivência do requerente e o menor e capacidade e legitimidade do adotante Inviabilidade da manutenção na família natural ou extensa A criança e o adolescente devem crescer e se preparar para a vida adulta no seio de sua família natural É esta a melhor alternativa para sua formação psicológica por menos preparados que estejam os integrantes da família natural para a tarefa Não se mostrando viável a manutenção das crianças e adolescentes no âmbito da família natural devese priorizar a integração à família extensa ou ampliada assim considerada a constituída por parentes próximos com os quais a criança ou o adolescente conviva e mantenha vínculos de afinidade e afetividade ECA art 25 parágrafo único Somente depois de demonstrada a inviabilidade da inserção da criança ou adolescente numa família extensa pode ser deferida a sua adoção por família substituta Vantagens para o adotado e legitimidade dos motivos do adotante O requisito mais importante da adoção diz respeito às vantagens para o adotado e legitimidade dos motivos do adotante ECA art 43 A criança ou adolescente deve experimentar com a adoção uma mudança substancial de vida e para melhor A mudança pode não ser econômica e patrimonial mas desde que seja palpável justificase a medida Se o menor continuar desamparado ou piorar sua condição material a adoção não poderá ser concedida Também os motivos que levaram os adotantes a requerer a adoção devem ser investigados pelo Poder Judiciário É legítimo casais sem filhos procurarem os serviços de adoção para preencher essa grave lacuna em suas vidas Mas não há legitimidade por exemplo se o objetivo é simplesmente contar com alguém que ajude nas tarefas domésticas e venha a contribuir com parte dos ganhos de seu trabalho para a manutenção dos adotantes Ajudas e contribuições materiais podem existir quando espontâneas durante a menoridade do adotado mas nunca podem ser o objetivo da adoção Havendo dúvidas quanto à sinceridade e absoluto desinteresse material do pleito dos adotantes a adoção não pode ser concedida O requisito mais importante para a adoção é a vantagem para o adotado e a legitimidade da motivação do adotante Consentimentos Os pais biológicos da criança ou adolescente ou seus representantes legais devem consentir com a adoção Se os dois genitores estão mortos o consentimento deve ser dado pelo tutor da criança ou adolescente observada a ordem legal de nomeação Dispensase o consentimento dos pais ou representantes legais em duas hipóteses somente se forem desconhecidos ou tiverem sido destituídos do poder familiar sem a nomeação de tutor ECA art 45 Se for o adotando adolescente tiver mais de 12 anos o seu consentimento também será obrigatório ECA art 45 2º A partir da adolescência a vontade do menor passa a ser decisiva para a constituição do vínculo de filiação por adoção Na adoção de criança ou adolescente o consentimento manifestado no processo judicial é irrevogável Os prejuízos emocionais para o menor seriam enormes se os pais ou o representante legal dessem o consentimento e depois antes da sentença concessiva da adoção o retirassem Por isso o ECA não confere nenhuma eficácia à retratação dos pais ou representante legal Outro requisito diz respeito ao consentimento dos pais naturais ou do tutor do menor adotando bem assim a dele se tiver já alcançado a adolescência Processo judicial e estágio de convivência Exatamente para que seja atendido o requisito fundamental da adoção de trazer vantagens para o adotado e fundarse em motivos legítimos do adotante a Constituição Federal determina que a adoção seja assistida pelo Poder Público art 227 5º Esse preceito constitucional foi interpretado de modo tão sério pela lei que atribuiu a competência para cuidar do assunto ao Poder Judiciário ao invés de deixálo como poderia a cargo de repartições do Poder Executivo Para desincumbirse adequadamente de suas funções o Poder Judiciário deve organizar em cada comarca ou foro regional o cadastro das crianças e adolescentes em condições de serem adotadas e o de pessoas interessadas em adotar A inscrição nesses cadastros depende de prévia consulta aos órgãos técnicos do Juizado da Infância e da Juventude e ao Ministério Público ECA art 50 Quem pretende adotar certa pessoa assim deve propor a ação judicial correspondente requerendo a adoção O processo judicial é indispensável segundo o direito brasileiro para a constituição do vínculo de filiação entre adotante e adotado Nele os adotantes não poderão fazer se representar por procurador por ser vedada a adoção por mandatário ECA art 39 2º devendo praticar os atos que lhes cabe pessoalmente Feito o requerimento o juiz fixa em função das peculiaridades do caso a duração que deve ter o estágio de convivência entre as partes O objetivo dessa importante fase do processo de adoção é proporcionar uma mostra de como será a vida em família depois da adoção de modo a verificar se há a compatibilidade entre as pessoas envolvidas que mostrem a conveniência da medida O estágio de convivência pode ser dispensado pelo juiz apenas se o adotando já estiver sob a tutela ou guarda legal do adotante durante tempo suficiente para que se avalie a conveniência da adoção ECA art 42 6º Tendo em mãos o relatório do estágio de convivência e ouvindo as partes adotante adotado adolescente pais ou representantes legais do adotado o juiz se convencido de que a adoção trará benefícios ao menor e são legítimos os motivos do requerente profere a sentença constitutiva do vínculo de filiação Os efeitos da adoção dãose com o trânsito em julgado da sentença concessiva ECA art 47 7º Os nomes dos adotantes e de seus ascendentes serão lançados no registro civil do adotado como pais e avós cancelandose o registro original ECA art 47 e 1º e 2º O mandado judicial ficará arquivado em cartório mas dele não se dará certidão a não ser por determinação do juiz para salvaguarda de direitos igualmente não se fará nenhuma observação nas certidões expedidas da adoção são medidas determinadas na lei para preservar o adotado de quaisquer preconceitos art 42 3º e 4º Se o adotante depois de manifestar inequivocamente a vontade de adotar vier a falecer antes do fim do processo judicial o juiz poderá deferir a adoção Nesse caso retroagem à data do óbito os seus efeitos ECA arts 42 6º e 47 7º A ação de adoção não poderá durar mais que 120 dias prorrogáveis sob justificativa por uma única vez por igual período ECA art 47 10 A adoção depende de processo judicial em que o juiz concederá a adoção se a medida revelarse oportuna a partir do estágio de convivência entre o adotado e o adotante Capacidade e legitimidade do adotante A criança ou adolescente só pode ser adotado por pessoa maior desde que não seja seu ascendente ou irmão e tenha pelo menos 16 anos a mais que o adotando ECA art 42 1º e 3º Exigese o interregno para evitar o uso do instituto por quem evidentemente não reúne as condições naturais para se responsabilizar como pai ou mãe Qualquer pessoa natural nessas condições pode adotar individualmente a criança ou adolescente Nada obsta a adoção pelo solteiro viúvo separado ou divorciado que viva sozinho hipótese em que se constituirá uma família monoparental Aliás mesmo que o adotante seja casado ou viva em união estável admitese a adoção unilateral Precisará contudo nesse caso da anuência do outro cônjuge ou convivente ECA art 165 I O marido pode adotar individualmente com a concordância da mulher assim como essa o pode fazer se autorizada por aquele do mesmo modo que os conviventes O adotante portanto não precisa ser solteiro viúvo separado ou divorciado para habilitarse à adoção unilateral desde que apresente a expressa anuência do cônjuge ou companheiro Ocorrendo o desfazimento da sociedade conjugal como o filho não é comum não há que se falar em disciplina da guarda O adotado continuará necessariamente com o adotante O outro cônjuge terá apenas direito de visita se o requerer Em geral contudo os casados e conviventes adotam em conjunto Para tanto é necessária a comprovação da estabilidade da família Os que foram casados os divorciados ou separados ou mantinham união estável podem adotar em conjunto se o estágio de convivência iniciouse na constância da sociedade conjugal Desse modo separados ou divorciados podem ser adotantes de mesma criança ou adolescente ECA art 42 4º De fato não haveria razões para impedir a adoção nesse caso já que é em tudo semelhante ao do filho cujos pais adotivos se separam ou divorciam Exige contudo a lei a comprovação da existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele adotante não detentor da guarda para que se justifique excepcionalmente a adoção conjunta Caso não comprovada a adoção poderá ser individual Afora essas hipóteses ninguém pode ser adotado simultaneamente por duas pessoas Não titulam o direito à adoção conjunta dois adultos não ligados pelo matrimônio ou união estável Duas pessoas do mesmo sexo ao contrário do que se entendeu no passado Leite 2005 podem adotar desde que vivam em união estável ou sejam casadas Na verdade quando atendidas as mesmas condições estabelecidas para a adoção conjunta por pessoas de sexo diferentes vedála às pessoas de mesmo sexo seria hipocrisia Se o homossexual pode adotar individualmente a criança ou adolescente e trazêla para morar na mesma casa em que vive com seu parceiro ficando os dois adultos de fato exercendo o poder familiar não há motivo nenhum para impedir que essa situação seja juridicamente regular isto é nada obsta senão o preconceito a legitimidade da adoção por duas pessoas do mesmo sexo que vivem em união estável ou sejam casadas Ninguém pode ser adotado por duas pessoas simultaneamente a não ser que sejam casadas ou vivam em união estável Aos separados e divorciados podese conceder a adoção conjunta se o estágio de convivência teve início na constância do casamento Exceto nesses casos a adoção só poderá ser feita por uma pessoa individualmente A adoção conjunta pode ser feita por duas pessoas de sexos diferentes ou do mesmo sexo Argumentase que a lei deveria proibir a adoção por casal de homossexuais porque o crescimento em ambiente irrigado por posturas e padrões de ambos os sexos é essencial à adequada formação da identidade de qualquer pessoa o que é verdade Mas não basta a divergência dos sexos sob o ponto de vista jurídico para garantirse o atendimento a esse importante requisito de saúde psicológica das crianças e adolescentes Como maridos pouco masculinos e esposas não femininas podem adotar e adotam então a lei não está realmente preocupada com esse aspecto da formação da identidade dos adotados 142 Adoção internacional A adoção é considerada internacional quando o adotante tem a sua residência habitual em um dos países signatários da Convenção de Haia e quer adotar criança em outro país signatário ECA art 51 A Convenção de Haia de 29051993 foi promulgada pelo Decreto n 308799 e trata da proteção das criações e da cooperação em matéria de adoção internacional Notese que os estrangeiros domiciliados ou residentes no exterior não são pais melhores ou piores para os brasileirinhos necessitados de adoção São preconceituosas tanto as atitudes radicalmente contrárias às adoções internacionais a pretexto de uma vaga noção de nacionalismo quanto as que a apoiam incondicionalmente manifestando a arraigada falta de autoestima de muitos dos nossos compatriotas A avaliação das vantagens para o adotado e da legitimidade dos motivos do adotante deve ser tão rigorosa quanto a procedida nos processos adotivos movidos por pessoas residentes e domiciliadas no Brasil A adoção por estrangeiros desperta preocupações relacionadas ao tráfico internacional de crianças Se a intenção do adotante é levar o adotado para seu país o Estado brasileiro terá mais dificuldades para proteger o seu cidadão caso não sejam inteiramente sinceras e desinteressadas as motivações declaradas da adoção Por isso e não porque a adoção por estrangeiros poderia de algum modo atentar contra nossa soberania quando o adotante é estrangeiro residente ou domiciliado fora do país a lei a qualifica de medida excepcional ECA art 31 e a cerca de cuidados específicos A adoção internacional somente pode ser deferida após consulta aos cadastros de pessoas ou casais habilitados à adoção da comarca do Estado e nacional e não se encontrar neles nenhum interessado em adotar aquela criança ou adolescente Em outros termos a lei manifesta sua preferência pela adoção nacional Se esta for viável não terá cabimento a adoção internacional A adoção de brasileiros por pessoa residente ou domiciliada no exterior é medida excepcional e depende de cautelas visando impedir que por meio dela tenha curso o tráfico internacional de menores Ressaltese que a adoção não se considera internacional apenas quando postulada por estrangeiros Também se o brasileiro não reside no Brasil ela será internacional O que preocupa a lei é o fato de a criança ou adolescente ir morar no exterior fora da proteção imediata da nossa Justiça 2 Reconhecimento de filho Antiquíssimo brocardo sustenta que a maternidade é certa mas não a paternidade Não é bem assim contudo em vista das muitas situações a que a vida pode conduzir Também a maternidade pode ser duvidosa assim como é possível não haver incertezas quanto ao pai O reconhecimento de filhos é ato ligado essencialmente à filiação biológica Não pode ter por objeto a instituição de filiação adotiva ou socioafetiva Tem lugar quando o registro de nascimento do filho não confere com a verdade biológica de sua concepção por parte da mãe ou do pai excluída a hipótese de filiação por substituição O reconhecimento de filho pode ser voluntário ou decorrer da condenação em ação de investigação de paternidade ou maternidade A rigor ninguém pode ser levado a reconhecer descendente biológico Quando o filho no exercício de seu direito propõe a ação de investigação de paternidade ou maternidade e ela é julgada procedente a sentença produzirá os mesmos efeitos do reconhecimento voluntário CC art 1616 primeira parte Em outros termos havendo discrepância entre o registro de nascimento e a verdade biológica de certa pessoa e não tendo sido ela concebida por fecundação assistida heteróloga a filiação se estabelece entre ascendente e descendente biológicos por duas formas reconhecimento voluntário do filho havido fora do casamento ou procedência da ação investigatória Estabelecida a filiação biológica por qualquer desses meios reconhecimento voluntário ou procedência de ação investigatória o filho passa a titular os direitos aos alimentos e de participação na sucessão Reconhecimento voluntário Só se reconhecem voluntariamente os filhos havidos fora do casamento Os nascidos de mulher casada na constância do casamento têm sempre pai que é o cônjuge dela presunção pater is est Nesse caso a paternidade pode ser contestada também se não houver fundamento genético para o registro mas a iniciativa e o ônus de prova são do marido da mãe item 3 Nos quinze dias seguintes ao nascimento do filho o pai isoladamente ou em conjunto com a mãe tem a obrigação legal de fazer a declaração correspondente Lei n 601573 art 52 1º Nesse momento ao apresentarse como pai da criança faz seu reconhecimento voluntário SE tiver ido sozinho ao cartório informa no ato também o nome da mãe dispensandoa assim de também fazer o reconhecimento Se o pai não cumprir o dever de fazer a declaração de nascimento do seu filho ou estiver impedido de fazêlo caberá à mãe fazêla ampliandose o prazo então para quarenta e cinco dias art 52 2º Comparecendo a mãe sozinha para fazer o registro não poderá o cartório assentar como do pai outro nome que não seja o do marido dela Mesmo que informe ter havido o filho fora do casamento não poderá ser registrado como pai nenhum outro homem Não sendo casada a declarante será promovida a investigação oficiosa da paternidade subitem 21 Registrado o nascimento de filho havido fora do casamento sem menção ao nome do pai o reconhecimento voluntário por parte deste poderá ser feito por escritura pública ou escrito particular O Registro Civil nesse caso arquivando o instrumento lança o nome do pai no assento de nascimento CC art 1609 II Mas se a discrepância entre os dados do assentamento civil e a verdade genética da pessoa a que se refere não decorre da ausência da identificação do pai mas da falsidade dos dados relativos à paternidade ou maternidade a alteração do registro depende de ordem judicial ou seja pressupõe processo em que seja produzida a prova de que o genitor ou genitora voluntariamente reconheceu o filho Além da escritura pública ou escrito particular são meios hábeis para o reconhecimento de filhos o testamento ou manifestação direta e expressa perante o juiz mesmo em processo judicial estranho à investigação da paternidade ou maternidade art 1609 III e IV Ainda antes de nascer o filho pode ser reconhecido por escritura pública ou instrumento particular arquivado em cartório testamento ou declaração em juízo CC art 1609 parágrafo único Se tiver sido feito pelo pai a mãe já deve estar grávida ao tempo do reconhecimento feito pela mãe a doadora temporária de útero é que deve estar Ninguém pode reconhecer validamente filho ainda não concebido É irrevogável o ato de reconhecimento de filho ainda que arrependido o pai ou mãe que o praticou Pereira 19779799 Mesmo no caso de revogação do testamento a cláusula de reconhecimento de filho continuará a produzir seus efeitos CC art 1610 Claro que a qualquer momento sendo demonstrado em juízo que a declaração voluntária não superou a discrepância entre o registro da filiação e sua verdade biológica ou até mesmo a ocasionou poderá o juiz decretar a desconstituição de seus efeitos que não se confunde com a revogação ato unilateral de vontade do declarante Além de irrevogável o ato de reconhecimento não pode ficar sujeito a condição ou termo Será ineficaz a cláusula da declaração de paternidade ou maternidade que a condicionar por exemplo à gratidão do filho ou a limitar temporalmente Ou seja o reconhecimento vale e é eficaz mas a condição ou termo não produz efeito nenhum Reconhecido o filho fora do casamento ele só poderá residir no lar conjugal se o outro cônjuge concordar CC art 1611 mas em qualquer caso o genitor que o tiver reconhecido terá sua guarda Na hipótese de reconhecimento conjunto se os declarantes não chegarem a acordo relativamente à partilha ou compartilhamento da guarda o juiz a deferirá ao pai ou à mãe conforme o melhor interesse do filho art 1612 Se o filho for maior de idade só poderá ser reconhecido mediante seu consentimento Sem a convergência de vontades nesse caso não será suficiente à constituição do vínculo de filiação a declaração do genitor ou genitora Nos quatro anos seguintes à maioridade ou emancipação aquele que tiver sido reconhecido quando menor poderá impugnar o reconhecimento CC art 1614 Esse é o prazo decadencial para o filho buscar a desconstituição em juízo do ato de reconhecimento provando que não se sustenta na verdade biológica de sua concepção Claro que mesmo vencido esse prazo embora não possa mais contestar a validade e eficácia do reconhecimento praticado pelo pai ou mãe que consta de seu registro civil ainda terá direito de demandar o genitor ou genitora em ação de investigação de paternidade que é imprescritível Gonçalves 2005303 O registro de nascimento de filho havido fora de casamento pode não guardar correspondência com a verdade biológica genética de sua concepção porque falta o nome do pai ou porque são falsas as nomeações dele ou da mãe Uma das formas de superar a discrepância é o reconhecimento voluntário do filho feito por escritura pública escrito particular testamento ou declaração em juízo Ação de investigação de paternidade ou maternidade O filho pode propor contra o genitor ou genitora a ação de investigação de paternidade ou maternidade sempre que pretender ver retratada no assento civil a verdade biológica de sua concepção É irrelevante aqui se nasceu na constância de casamento ou de união estável das pessoas mencio nadas como seus pais no registro civil ou não Quer dizer mesmo aquela pessoa nascida em família matrimonial ou fundada em união estável tem o direito em princípio de demandar o genitor ou genitora com vistas a superar a distância entre o assento civil e a verdade biológica Digo em princípio porque as filiações socioafetiva e adotiva também produzem por vezes o efeito de excluir essa ação subitens 13 e 23 Com o estabelecimento da filiação biológica o autor da ação passa a ser filho do réu ou ré para todos os efeitos inclusive alimentares e sucessórios Só não tem o direito à investigação de paternidade o filho havido dentro do casamento ou de união estável por meio de fertilização assistida heteróloga Nesse caso a dissociação entre o registro de nascimento e a verdade biológica é juridicamente incontornável Quem forneceu o material genético não quis senão dar uma ajuda desinteressada a casal desconhecido que precisava de gametas alheios para fazer descendência Como já assentado seu direito se exaure no acesso às informações genéticas úteis ou necessárias a tratamento de saúde não compreendendo o do reconhecimento da paternidade ou maternidade subitem 123 A ação de investigação cabe em princípio exclusivamente ao filho Se ele preferir não demandar o genitor ou genitora está no seu direito Os descendentes e demais parentes sucessíveis do filho a despeito do interesse indireto no reconhecimento não estão legitimados para a ação judicial Apenas se o filho morrer menor ou incapaz ou seja sem ter tido condições para decidir com maturidade pelo ajuizamento da medida o herdeiro terá legitimidade para aforar a investigatória CC art 1606 Uma vez iniciada a ação judicial pelo filho em vida os herdeiros poderão continuála porque a decisão de retratar no registro civil a verdade biológica já havia sido tomada pelo titular do direito art 1606 parágrafo único A outra única hipótese de legitimação para a ação de reconhecimento de paternidade é a do Ministério Público em função dos elementos coligidos durante a investigação oficiosa subitem 21 Parte legítima para figurar como réu na ação de reconhecimento é o genitor ou genitora de quem o demandante pretende ser declarado filho Já se admitiu contudo a ação destinada ao reconhecimento da relação avoenga isto é da existência de parentesco de ascendência em segundo grau em que o autor demandou os avós paternos Gonçalves 2005307308 Birchal 2004 Enquanto é menor o filho deverá ser representado ou assistido por seu representante legal Na maioria das vezes a mãe biológica premida pelas necessidades materiais relacionadas à criação e educação do filho providencia em nome dele a demanda contra o genitor Qualquer pessoa interessada e não somente o demandado pode contestar a ação de investigação de paternidade CC art 1615 Desse modo os demais filhos do indigitado pai ou mãe cuja porção na herança será reduzida em caso de procedência da ação também estão legitimados para contestar o pleito do filho havido fora do casamento A sentença que julgar procedente a ação investigatória pode determinar se isso for do interesse do menor que seja criado e educado fora da companhia dos pais ou daquele que resistiu a reconhecerlhe a paternidade ou maternidade CC art 1616 Com certeza não reúne em princípio plenas condições para desincumbirse com amor das árduas tarefas afetas à função de pai ou mãe aquela pessoa que ostensivamente não deseja o autor da demanda como seu filho Em princípio qualquer pessoa nascida dentro ou fora do casamento ou união estável daqueles que constam como sendo seus pais do assento civil tem o direito de investigar por ação judicial a verdade biológica de sua concepção de modo a titular os direitos de filho de seu genitor ou genitora Só não tem esse direito o concebido dentro de casamento ou de união estável por meio de fertilização assistida heteróloga ou o vinculado a filiação socioafetiva ou adotiva Nas ações de investigação a questão crucial diz respeito à prova da ascendência biológica Demonstrado que o assento civil não retrata com fidelidade a matriz genética do filho desincumbese ele do ônus de demonstrar o erro ou falsidade do registro de nascimento como quer a lei CC art 1604 Não é simples no entanto produzir a prova Mesmo depois da difusão dos exames de ADN se o demandado recusase a fornecer material para sua realização a questão da prova da ascendência biológica remanesce em aberto As dificuldades relacionadas a essa prova quando pertinentes à paternidade são contornadas por meio de certas presunções que serão examinadas a seguir item 4 21 Investigação oficiosa O art 2º da Lei n 856092 introduziu no Brasil um instituto do direito português Silva 2002243 denominado investigação oficiosa de paternidade Malgrado as críticas que o instituto tem recebido Pereira 2003134140 a aplicação desse dispositivo legal tem se revelado um eficiente meio de poupar os envolvidos das dificuldades desgastes emocionais e custos relacionados à ação de reconhecimento Sempre que registrado o nascimento de menor apenas com a maternidade estabelecida o oficial deve remeter ao juiz certidão integral do registro acompanhada dos dados fornecidos pelo declarante acerca do indigitado pai isto é nome e prenome profissão identidade e residência dele Tem início então o procedimento de investigação oficiosa Recebida a certidão e os dados o suposto pai será notificado para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é atribuída É irrelevante o estado civil dele devendo a notificação judicial ser expedida mesmo que ele seja casado Não se autua um processo judicial em razão do caráter oficioso do procedimento mas a numeração deste para fins de controle pode ser feita Se entender conveniente o juiz determinará que a investigação seja feita em segredo de justiça A investigação oficiosa da paternidade deve ser feita pelo juiz sempre que menor for registrado apenas com a determinação da maternidade Se o pai comparecer perante o juiz e confirmar de modo expresso a paternidade será lavrado o termo de reconhecimento remetendose a certidão de seu teor ao oficial do registro para averbação Encerrase nesse caso a investigação oficiosa pelo resultado frutífero a que conduziu Mas não comparecendo o pai nos trinta dias seguintes ao recebimento da notificação judicial ou negando expressamente a paternidade o expediente é remetido ao Ministério Público para que seja intentada a ação de reconhecimento caso evidentemente haja elementos suficientes para isso Se o promotor de justiça considerar que não dispõe de indícios ou provas consistentes para intentar a ação mandará arquivar o expediente da infrutífera investigação oficiosa 22 Excludente da perfilhação Uma das questões mais intrincadas do direito de família diz respeito à possibilidade de o adotado ou do filho socioafetivo intentarem ação de reconhecimento de paternidade ou maternidade em face do genitor ou genitora com o objetivo de desfazerem o vínculo de filiação a que estão ligados para se tornarem filhos biológicos dos demandantes De acordo com a tendência da despatrimonialização do direito de família a resposta acertada para essa questão é a da inexistência do direito ao reconhecimento nesses casos Se o filho ligado a seus pais por vínculos de adoção ou socioafetivos não se encontra ao desamparo sob o ponto de vista emocional e material a perfilhação por outrem pode ser suscitada como matéria de defesa pelo genitor ou genitora demandados Provando o demandado que os pais adotivos ou por relação socioafetiva têm meios de prover os alimentos a ação de reconhecimento deve ser julgada improcedente E assim deve ser mesmo que o demandado por sua condição econômica e patrimonial pudesse garantir como pai ou mãe a melhoria do padrão de vida do demandante Já há precedente jurisprudencial no sentido de negar o direito ao reconhecimento da paternidade fundada exclusivamente na verdade biológica quando o filho foi criado e educado por terceiros que lhe devotaram o amor paternal e maternal Welter 2003164165 No caso a exclusão deuse por força de filiação socioafetiva que vinculava o demandante a outrem mas idênticos fundamentos justificamna no caso da adoção Assim sendo apenas quando os pais socioafetivos ou adotivos não estão em condições de prover os alimentos básicos para o filho e os biológicos podem cabe o reconhecimento da paternidade ou maternidade Somente diante desse quadro o genitor ou genitora demandados ficam inibidos de suscitar como matéria de defesa a perfilhação do demandante por outrem O adotado e o filho socioafetivo não têm direito ao reconhecimento da paternidade ou maternidade biológica a menos que seus pais não tenham meios de prover os alimentos e o genitor ou genitora os tenha Em qualquer caso entretanto poderão demandar os supostos genitores com o objetivo único de ter acesso a informações sobre sua ascendência genética quando úteis ou necessárias ao tratamento de saúde deles ou de seus descendentes Repito por derradeiro que o direito ao reconhecimento de paternidade não se confunde com o relacionado ao acesso às informações genéticas Mesmo a pessoa vinculada a filiação por adoção ou socioafetiva tem o direito de pedir ao juiz que obrigue sob pena de multa perió dica o suposto pai ou mãe biológico a submeterse a exame confirmatório de ADN com o objetivo único de possibilitar a disponibili zação de informações úteis ou necessárias ao tratamento de saúde dele ou de seus descendentes Acentuo que a Súmula 301 do STJ que faz presumir a paternidade no caso de o indigitado genitor recusarse a fornecer o material genético para exame não tem nenhuma serventia no processo destinado a franquear informações sobre a ascendência biológica do demandante A presunção jurídica de paternidade em nada auxilia na busca dos dados genéticos reclamados pelo seu tratamento médico De qualquer forma nesse caso mesmo que revelada a verdade biológica dela não decorre nenhuma mudança na filiação a que se vincula o requerente 3 Negativa de paternidade e de maternidade A ação negatória de paternidade ou maternidade a exemplo da de reconhecimento tem o objetivo de eliminar a incongruência entre os dados constantes do registro de nascimento de uma pessoa e a verdade biológica de sua concepção É mais comum a negação de paternidade mas cabe também a da maternidade provando a mãe a falsidade do termo de nascimento do filho ou das declarações nele contidas CC art 1608 Igualmente o filho pode intentála desde que o faça nos quatro anos seguintes à maioridade ou emancipação art 1614 in fine A negatória não cabe porém nos casos em que a incongruência entre a verdade biológica e o registro civil corresponde exatamente ao efeito jurídico pretendido em determinadas hipóteses de filiação Assim se o filho foi concebido por processo de fertilização assistida heteróloga autorizada pelo homem ou mulher que aparecem como pais no assentamento civil não há razões jurídicas para se desfazer a discrepância Somente no caso de falta de autorização daquele que não forneceu o gameta ou vício de consentimento na declaração correspondente poderá ser intentada a negatória de paternidade ou maternidade Também no de adoção não tem cabimento a ação negatória de paternidade ou maternidade movida pelos adotantes ou pelo adotado porque a incongruên cia referida é inerente a essa espécie de filiação Por fim é igualmente descabida a negatória se entre as partes consolidouse a filiação socioafetiva Lobo 2004520 Mesmo que provado aqui não serem os pais os genitores se eles têm cuidado do filho como se o fossem não poderão se desvincular ou serem desvinculados da filiação Em suma a ação negatória de paternidade ou maternidade não pode ser fundada apenas na verdade biológica quando o vínculo de filiação se estabelece por outros fatores Em que casos cabe então A resposta parte da discrepância entre o registro civil e a verdade genética nas hipóteses em que a imputação ou declaração de paternidade ou maternidade é juridicamente inconsistente Os únicos que podem ser registrados como pai ou mãe de uma criança sem o declararem pessoalmente perante o Registro Civil são os casados O nome do marido será lançado como pai por declaração da mãe ou de terceiros assim como o nome da esposa será mencionado como mãe por declaração do pai ou de terceiros Pode ocorrer por outro lado de o homem reconhecer no registro de nascimento por equívoco como sendo seu o filho de outrem Nos primeiros casos há imputação de paternidade ou maternidade no último declaração Pois bem a negatória cabe exclusivamente na hipótese de imputação de paternidade ou maternidade biológica ou de declaração equivocada de paternidade também biológica a certa pessoa que não estabeleceu com o filho nenhum vínculo afetivo próprio das relações de filiação Nesse caso e somente nesse a incongruência entre a verdade biológica e o registro será juridicamente inconsistente Podem aqui os que aparecem no assentamento como pai ou mãe promover a ação visando liberarse dos deveres dessa condição em relação ao filho Também nesse caso pode a pessoa registrada dentro do prazo decadencial contestar a paternidade ou maternidade A negatória de paternidade ou maternidade pode ser proposta pelo homem cujo nome consta como pai do assento civil de certa pessoa sem que tenha substrato na realidade genética a imputação ou declaração de paternidade biológica Pode ser proposta também pela mãe no caso de erro ou falsificação do termo de nascimento imputando lhe a maternidade biológica indevidamente Nesses dois casos a ação é imprescritível E pode finalmente ser ajuizada pelo filho nos quatro anos seguintes à maioridade com o objetivo de ver excluído de seu assento civil o nome de pai ou mãe com o qual não tem vínculo biológico de descendência É imprescritível a ação quando o demandante é o homem registrado como pai ou a mulher registrada como mãe A lei mencionou de forma expressa a imprescritibilidade apenas em relação ao pai CC art 1601 Mas também a mulher que vier a saber ter sido registrada em seu nome criança que não é dela terá o direito imprescritível de ajuizar a negação de maternidade em razão do princípio constitucional da igualdade Pela disciplina legal ninguém mais além desse homem ou mulher está legitimado para propor a negatória de paternidade ou maternidade Não teriam legitimidade assim os herdeiros daquele homem cujo nome consta como pai no assento civil de determinada pessoa De acordo com a lei eles apenas poderão prosseguir no feito ajuizado pelo pai enquanto vivo art 1601 parágrafo único Em função do princípio constitucional da igualdade essa regra legal deveria ser também observada no caso de negatória de maternidade Tenho para mim porém que esta limitação da legitimidade para a ação negatória ao homem figurante como pai ou à mulher referida como mãe pelo registro não é compatível com a tendência de despatrimonialização do direito de família Se não há verdade genética a dar suficiente amparo à imputação da paternidade ou maternidade biológica ou à declaração da paternidade biológica então os interesses dos herdeiros devem ser protegidos pela ordem jurídica Ademais é de constitucionalidade questionável em vista da garantia da herança como direito fundamental CF art 5º XXX a negativa de legitimidade aos herdeiros para a contestação de paternidade ou maternidade do de cujus no caso de virem a descobrir o erro ou falsificação do assentamento civil a carência de base biológica somente após a morte daquele cujo nome consta como sendo o do pai ou mãe de certa pessoa 4 As presunções de paternidade Até o fim dos anos 1980 antes de os exames de ADN Ácido Desoxirribonucleico se difundirem no meio judicial como prova de paternidade em ações de investigação esta decorria de certas presunções legais item 41 associadas à tentativa de desqualificar moralmente a mãe do demandante imputandolhe o hábito de manter relações sexuais com muitos outros homens além do demandado Os exames então disponíveis eram meramente excludentes de paternidade por incompatibilidade de tipo sanguíneo por exemplo a partir deles não se podia afirmar com certeza científica se o demandante seria o genitor do demandado O julgamento da investigação desse modo não podia prescindir das presunções legais e provas testemunhais Tornados acessíveis os exames de ADN mudaramse as presunções em vista da certeza científica da paternidade que eles podem atestar item 42 As presunções legais podem dizer respeito tanto às ações de reconhecimento de paternidade proposta pelo filho como às negatórias ajuizadas pelo homem cujo nome consta do registro de nascimento como sendo o pai Num e noutro caso porém operam de modo diverso 41 Antes dos exames de ADN DNA Antigamente eram decisivas para o julgamento das ações de investigação de paternidade cinco presunções legais A primeira presunção define que os nascidos cento e oitenta dias depois do início da convivência conjugal presumemse concebidos na constância do casamento CC art 1597 I Nesse caso compete exclusivamente ao marido a prova de que não é genitor da criança nascida nesse prazo se contra ela propuser a ação negatória de paternidade Do mesmo modo o filho nascido nos cento e oitenta dias depois da constituição de união estável não tem o ônus de provar a existência do vínculo biológico na ação investigatória porque a presunção nesse caso imputa ao demandado a prova de sua inexistência A segunda presunção estabelece que os nascidos nos trezentos dias seguintes à dissolução da sociedade conjugal por morte separação judicial nulidade ou anulação do casamento são considerados concebidos na constância deste CC art 1597 II Assim sendo o réu na ação de reconhecimento de paternidade tem o ônus de provar a inexistência do vínculo biológico se o autor exibir prova de que nasceu no prazo legal Na negatória cabe ao autor essa prova se militar a presunção em favor do réu A terceira presunção afirma que se considera fruto do primeiro casamento o filho nascido de mulher que contrai novas núpcias antes de decorridos dez meses seguintes à dissolução da sociedade conjugal que mantinha com outro homem se o nascimento ocorrer nos trezentos dias seguintes e se considera do segundo casamento o que nascer depois de cento e oitenta dias do início da respectiva convivência conjugal CC art 1598 Se o filho nasceu em data incluída nos dois prazos não há presunção legal específica e a questão se resolve em função das demais Pela quarta presunção aquele que provar sua impotência para gerar infertilidade não pode ser reputado pai de ninguém tanto na ação de reconhecimento como na negatória CC art 1599 Se o homem que consta como pai do registro do nascimento ou aquele a quem se imputa a paternidade havia feito a vasectomia antes da data provável da concepção claramente não pode ser considerado o genitor Estatui a quinta presunção que o adultério da mulher ainda que confessado não é suficiente para ilidir a paternidade CC arts 1600 e 1602 Mesmo que a esposa tenha sabidamente traído o marido e não reste a menor dúvida a respeito de sua infidelidade disso não se segue necessariamente que o genitor do filho é o coautor do adultério Antes da difusão dos exames de ADN a prova da existência do vínculo biológico nas ações de reconhecimento e da sua inexistência na negatória de paternidade guiavase por presunções legais Essas presunções hoje em dia não têm nenhuma importância Não têm mais nenhuma importância essas presunções legais desde que os exames de ADN se tornaram acessíveis aos litigantes em processos de investigação ou negatória de paternidade O Código Civil poderia até mesmo não reproduzir os preceitos que as afirmam tendo em vista o atual estágio em que a matéria se encontra 42 Depois dos exames de ADN DNA Em 1953 professores da Universidade de Cambridge descobriram a estrutura da molécula do ADN que se encontra nos cromossomos das células de organismos vivos Essa estrutura é única para cada ser em várias espécies inclusive na humana Cada um de nós recebeu de seu genitor e genitora parte dessa estrutura Desse modo a partir do exame de uma única célula do organismo de uma pessoa é possível afirmarse com certeza quase absoluta se ela é pai ou mãe de outra ou não é A única margem de dúvida diz respeito à possibilidade de o examinado ter um irmão gêmeo univitelino cuja estrutura de ADN imaginase seja idêntica à dele Em vista disso o exame em ADN é capaz de fornecer informações com a precisão científica de 999999 Como se costuma dizer numa imagem bastante feliz o exame de ADN informa a impressão genética única e exclusiva do paciente Os países centrais do capitalismo passaram a adotar os exames de ADN nos processos de reconhecimento de paternidade por volta de 1988 A reação da comunidade jurídica contudo não correspondeu prontamente ao otimismo que o elevado grau de certeza do teste apresentava Como ele simplificava de modo extraordinário as questões jurídicas mas advogados e juízes receavam simplesmente transferir suas funções ao perito médico começaram a surgir alguns questionamentos sobre a eficácia da prova Silva 2002 Veloso 2002 Superadas porém as resistências inicialmente nutridas em relação ao exame de paternidade por meio do ADN muitas delas ligadas mais aos difusos temores frente à engenharia genética do que à eficácia do teste na identificação da descendência biológica Furkel 2004 passou a ter a maioria da comunidade jurídica plena confiança nos seus resultados Mas restava uma questão a resolver Como fazer quando o demandado na ação de investigação de paternidade se recusava a fornecer o material para o exame de ADN Pareceu a toda a tecnologia jurídica uma afronta aos direitos constitucionais desse homem sua condução coercitiva à clínica médica para a obtenção de um pouco de sangue ou saliva dele indispensável à realização do exame por todos Martins 2002 A jurisprudência conciliou os dois aspectos da questão o direito do filho à paternidade biológica e os direitos constitucionais do indigitado pai por meio de uma presunção Baseada nos preceitos do Código Civil pelos quais aquele que se nega a submeterse a exame médico necessário não poderá aproveitarse de sua recusa art 231 e a recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame art 232 o Superior Tribunal de Justiça baixou súmula criando a única presunção a ser observada atualmente nas ações de investigação de paternidade Tratase da Súmula 301 Em ação investigatória a recusa do suposto pai a submeterse ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade Por meio dessa presunção se o demandando se recusa a fornecer material para o exame de ADN chama para si o ônus de provar a inexistência do vínculo biológico por outros meios tais como os antigos exames de sangue ou a prova da infertilidade Não se desincumbindo completamente desse ônus a recusa terá o mesmo efeito de prova do vínculo biológico que o exame em ADN com resultado inclusivo forneceria Em 2009 a presunção referida no entendimento sumulado do STJ tornouse direito positivo Lei n 856092 art 2ºA e parágrafo único incluídos pela Lei n 120042009 O demandado em ação de investigação ou negatória de paternidade pode se recusar a fornecer material para o exame de seu ADN Titula direito constitucional que impede sua condução coercitiva à clínica médica para colheita forçada de sangue ou saliva A recusa contudo gera a presunção de existência ou inexistência do vínculo biológico que pelo exame pretendia provar o autor respectivamente da ação de reconhecimento e negatória de paternidade Na negatória de paternidade a mesma presunção deve militar em favor do autor Se o demandado se recusa a se submeter ao exame de ADN com o qual o demandante provaria não ser o genitor dele devese presumir com base nos arts 231 e 232 do Código Civil que inexiste o vínculo biológico entre as partes 5 Poder familiar Ter filhos é como se disse ao início uma experiência única e essencialmente gratificante É também uma experiência acompanhada de sérias responsabilidades Aos pais cabe preparar o filho para a vida Consciente ou inconscientemente transmitemlhe seus valores sua visão do mundo O comportamento e atitudes deles servem de modelo que o filho tende a reproduzir Se na adolescência é inerente ao processo de crescimento psicológico o contraporse a tais modelos negálos na busca da própria identidade isso não significa que eles não estejam incorporados e que não se manifestarão mais tarde na idade adulta especialmente quando os filhos se tornarem também eles pais É certo que nem sempre pai e mãe conseguem preparar o filho para a vida Não se consegue ensinar o que não se aprendeu é uma lei física Quando nem os pais foram bem preparados terão muita dificuldade de cumprir essa função Muitas vezes ver o filho passar por uma frustração por pequena que seja é tão aflitivo aos pais que eles se desdobram para a atender o mais rápido possível ainda que isso represente um imenso sacrifício Perdem então uma oportunidade valiosa de ensinarlhe o quanto difícil é a vida para qualquer um Mesmo os pais abastados não devem atender todos os pedidos do filho porque fazendoo não o estarão preparando convenientemente para a vida Estarão na verdade iludindo a criança ou adolescente passandolhe a ideia de que as coisas podem ser conseguidas sem esforço Não darão conta de sua principal responsabilidade ao pouparem os filhos de qualquer frustração À ingente responsabilidade que os pais têm devem corresponder os meios para cumprila Por isso a família se organiza com a atribuição a eles de um poder que exercem sobre os filhos Justifica esse poder o adequado cumprimento das funções associadas à paternidade e maternidade É um simples instrumento para a realização dos objetivos de preparação dos filhos para a vida objetivos que a sociedade reserva aos pais e espera sejam atendidos na formação de seus membros Tanto assim que pode ser suspenso ou mesmo retirado esse poder daqueles que não o exercem visando cumprir a responsabilidade paterna ou materna Uma das mais claras manifestações desse poder é o de castigar os filhos Os pais podem impor aos filhos castigos como forma de preparálos para a vida No passado os castigos físicos eram mais comuns alguns deles bastante severos Atualmente a psicologia e pedagogia mostram a ineficiência da violência na formação de cidadãos seguros felizes e cônscios de seus deveres e responsabilidades na sociedade Os castigos físicos não devem ser empregados Mas os filhos desobedientes devem continuar sendo castigados aprendendo que a inobservância das regras ditadas pelos pais lhe acarretam consequências negativas Alguns teóricos adeptos do politicamente correto abominam a palavra castigo e buscam substituíla Na essência castigar é impor à criança ou adolescente a privação de algo que ele quer com o sentido de possibilitarlhe a clara percepção de que vivemos numa sociedade organizada em regras cuja obediência a todos aproveita e interessa Brinquedos que a criança deseja ter devem lhe ser explicitamente negados assim como ao adolescente programas de entretenimento ou visitas a amigos Os castigos com qualquer nome são medidas corretivas É falso imaginar que os pais poderiam de algum modo preparar os filhos para a vida evitando a aplicação de quaisquer castigos isso não existe Assim para que tenham meios de exercer sua função a lei concede ao pai e à mãe o poder de castigar o filho Contudo esse poder só lhes é concedido para que possam cumprir a tarefa educacional que pela organização da sociedade lhes cabe O pai que castiga imoderadamente o filho infringindolhe sofrimento físico ou moral desnecessário perde o poder sobre ele Esse poder instrumento da função educacional da família a lei o denomina poder familiar A ele se sujeitam os filhos menores CC art 1630 Alcançada a maioridade passam a responder por seus atos e mesmo que ainda residam com os pais e continuem obrigados a devotarlhes respeito já não estão mais sob o poder familiar De outro lado titulamno em conjunto o pai e a mãe A lei diz que assim é durante o casamento e a união estável art 1631 mas isso não está inteiramente correto Enquanto existir o poder familiar isto é enquanto não alcançada a maioridade pelo filho pai e mãe o exercem em conjunto exista ou não entre eles vínculo de conjugalidade Em qualquer hipótese são pais solteiros o filho foi havido fora do casamento de um deles estão separados divorciados integram uma união livre etc e não apenas na de casamento ou união estável o pai e a mãe titulam em conjunto o poder familiar A lei mesma contém outros dispositivos cujo conteúdo mostra claramente que o poder familiar não depende do casamento ou união estável do pai e da mãe Assim esclarece que a separação judicial o divórcio e a dissolução da união estável não alteram os direitos dos pais e filhos assegurado àqueles o de ter estes em sua companhia CC art 1632 O novo casamento ou estabelecimento de união estável pelo pai ou pela mãe do mesmo modo não traz qualquer implicação ao poder familiar sobre os filhos do relacionamento anterior não tendo o consorte ou convivente atual qualquer ingerência sobre o seu exercício art 1636 Os titulares do poder familiar podem delegálo em parte um ao outro De comum acordo assim pode pai e mãe dividir algumas das tarefas quando isso for útil à administração da família Não cabe no entanto delegação de todos os poderes porque a isso equivale o descumprimento das obrigações inerentes à paternidade ou maternidade Igualmente descabida é a delegação em favor de terceiros Embora nada impeça os pais de buscar auxílio para o exercício de seu poder de pessoas mais experientes avós irmãos mais velhos amigos etc ou de profissionais pedagogos psicólogos etc não o podem delegar Ter filhos ainda que involuntariamente importa assumir responsabilidades intransferíveis Na falta ou impedimento de um dos pais o outro exerce com exclusividade o poder familiar Na família monoparental é evidente que o cabeça titula esse poder sem o concurso de ninguém Nos demais casos vivam ou não sob o mesmo teto estejam ou não casados ou em união estável pai e mãe não podem praticar nenhum ato inerente ao poder familiar a respeito do qual não estejam os dois de pleno acordo O pai não pode escolher sozinho em que escola o filho será matriculado nem a mãe tem o direito de o representar na prática de negócio jurídico sem o concurso do pai Em caso de divergência qualquer um dos pais pode requerer ao juiz que decida como ela deve ser superada CC art 1631 parágrafo único A decisão judicial deve pautarse evidentemente no interesse do filho Para ser titular do poder familiar não basta a condição de genitor de fornecedor de gameta É necessário ser pai ou mãe Se o genitor não reconhece o filho não tem nenhum poder sobre ele CC art 1633 O poder familiar assim deriva da filiação qualquer que seja ela e não do vínculo biológico Os pais adotantes e socioafetivos assim têmno No caso de adoção provém o poder da constituição do vínculo de ascendência e descendência pela sentença judicial no da filiação socioafetiva nasce natural e paralelamente à consolidação da relação afetiva e comportamento social de pais e filho O poder familiar é titulado pelo pai e mãe em conjunto e a ele se submete o filho enquanto for menor Tratase de poder indelegável exceto parcialmente entre os que o titulam que a lei concede aos pais para que possam dispor de instrumentos para o adequado cumprimento de sua importante tarefa de preparar o filho para a vida Constituise o poder familiar com o nascimento do filho em princípio ele perdura até a maioridade deste Pode ocorrer no entanto entre um e outro marco fatos jurídicos que importam a prematura extinção desse poder como por exemplo a morte dos pais ou do filho e a emancipação do menor CC art 1635 O juiz pode determinar a suspensão ou perda do poder familiar como medidas sancionadoras ao seu indevido exercício pelos pais A suspensão tem cabimento nas hipóteses de abuso de autoridade falta de cumprimento dos deveres associados à paternidade ou maternidade condenação criminal a pena de mais de dois anos de prisão e administração ruinosa dos bens dos filhos desde que outras medidas não se mostrem suficientes à salvaguarda dos interesses deles CC art 1637 e parágrafo único Desse modo ocorrendo qualquer dessas hipóteses se o juiz tiver às mãos alguma medida eficiente de preservação dos direitos dos menores que não acarrete a suspensão do poder familiar deverá adotála A suspensão só cabe em último caso Já a perda do poder familiar deve ser decretada em hipóteses mais graves como a de imposição de castigo imoderado abandono dos filhos prática de atos contrários à moral e aos bons costumes ou reincidência em falta punível com a suspensão entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção prática contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar de homicídio feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher estupro ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão prática contra o filho filha ou outro descendente de homicídio feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher estupro estupro de vulnerável ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão CC art 1638 A suspensão é medida temporária facultativa e limitada É temporária porque o juiz ao impor essa forma de sanção deve necessariamente fixar o prazo de duração em que o pai a mãe ou os dois ficarão impedidos de exercer o poder familiar É facultativa porque ela pode deixar de ser imposta sempre que o juiz considerar que os mesmos objetivos podem ser alcançados por outras medidas que preservem o poder familiar É por fim limitada porque pode dizer respeito a um ou alguns dos filhos Por seu turno a perda é permanente imperativa e ampla Permanente no sentido de que não se prédefine o tempo em que a medida irá durar Enquanto os pais não provarem que cessaram os motivos determinantes da sanção ficam privados do poder familiar Imperativa porque o juiz não pode deixar se aplicála sempre que verificado o pressuposto legal Ampla enfim porque abrange necessariamente toda a prole do pai da mãe ou de ambos Se há motivos graves para retirar o poder familiar todos os filhos devem ser protegidos e não somente aquele em relação ao qual verificouse a causa da punição Em nenhum caso ressalto a simples falta ou carência de recursos materiais pode dar ensejo à suspensão ou perda do poder familiar ECA art 23 Por mais miseráveis que sejam os pais continuam a ter os direitos próprios da relação de filiação não podendo ser deles privados apenas porque não dispõem dos recursos materiais para sustentar os filhos Tanto a suspensão como a perda do poder familiar podem afetar os dois pais ou apenas um deles segundo o grau de responsabilidade de cada um Se o pai castiga imoderadamente o filho e a mãe se omite deixando inclusive de denunciar os maustratos às autoridades o juiz pode determinar a perda do poder familiar dele e a suspensão do dela Qualquer parente e o Ministério Público estão legitimados a requerer ao juiz a suspensão ou perda do poder familiar CC art 1637 51 Exercício do poder familiar Ao exercício do poder familiar correspondem os seguintes direitos CC art 1634 a Dirigir a criação e educação O mais importante direito associado ao poder familiar é o de dirigir a criação e educação do filho É o direito ao qual tenho me referido pela ideia de preparação para a vida Nele se incluem os de definir as regras a serem observadas em casa e de impor seu cumprimento horário de acordar e dormir de fazer as refeições responsabilidade pela arrumação do quarto uso adequado dos móveis e utensílios critérios para a utilização dos equipamentos domésticos computador por exemplo por todos os membros da família etc Também é direito dos pais escolher a escola dos filhos até o grau médio devendo levar em consideração a opinião deles quando se revelar madura b Ter os filhos em sua companhia e guarda Enquanto não alcançar a maioridade o filho não tem direito de viajar sozinho se a tanto se opuserem seus pais Tampouco pode ir a eventos sociais ou públicos frequentar a casa de conhecidos ou simplesmente ganhar as ruas sem autorização do pai e da mãe Ao contrário é inerente ao poder familiar que os filhos acompanhem os pais sempre que esses determinarem Na companhia do pai e da mãe o pequeno aprende como proceder nas mais diversas situações criadas pelo relacionamento social incorporando valores e conferindo a sinceridade dos conceitos enunciados em casa A guarda por sua vez corresponde a deveres dos pais tanto quanto a direitos Relacionase aos cuidados reclamados pela criança ou adolescente em seu processo de desenvolvimento em direção à vida adulta Os pais têm por assim dizer o direito de cuidar dos filhos nas enfermidades e acidentes de ser seus confidentes nos momentos de angústia de os amparar e aconselhar no enfrentamento de desafios A guarda é a única manifestação do poder familiar que um dos pais pode perder com o divórcio Mas em ocorrendo de o pai ou a mãe perder a guarda do filho passam a titular o direito de visitas Cap 58 item 3 c Conceder ou negar autorização para o casamento Depois de alcançada a idade núbil mas ainda não a maioridade civil a pessoa só pode se casar com a autorização dos pais CC art 1517 Integra o poder familiar o direito de conceder ou negar essa autorização Se for exercido de modo abusivo negandose o pai ou a mãe a autorizar o casamento sem justificativa plausível o juiz pode suprir o consentimento Cap 56 subitem 31 d Nomeação de tutor Quando falecem os pais antes de o filho alcançar a maioridade a lei define a qual parente caberá responsabilizarse por algumas das tarefas de preparação dele para a vida É o tutor a quem a lei não atribui o poder familiar mas apenas alguns dos direitos a ele associados Cap 61 item 2 Se os pais não acham conveniente à adequada formação do filho que a tutela seja exercida pelo parente indicado na lei cabelhes designar outra pessoa de sua confiança para a função de tutor e Representação e assistência Os pais são os representantes legais dos filhos menores impúberes e assistentes dos púberes CC art 1690 Desse modo enquanto for absolutamente incapaz o filho pai e mãe praticam os negócios jurídicos do interesse do menor em nome dele Alcançada a idade da incapacidade relativa tornamse seus assistentes devendo concordar com a prática do negócio jurídico pretendido pelo menor para que seja válido Cap 7 subitem 31 Em caso de divergência entre os pais acerca da oportunidade de ser praticado pelo menor púbere ou em nome dele se impúbere determinado negócio jurídico neste como nos demais afetos ao exercício do poder familiar cabe ao juiz decidir no interesse do filho art 1690 parágrafo único f Reclamar o filho de quem ilegalmente o detenha Se alguém retira indevidamente a criança ou adolescente da companhia do pai ou da mãe eles têm o direito de reclamarlhe a devolução Esse direito pode ser exercido inclusive por um dos titulares do poder familiar contra o outro sempre que desrespeitados os direitos do primeiro de ter o filho em sua companhia e guarda Ao poder familiar correspondem direitos titulados pelos pais em relação aos filhos tais como o de dirigirlhes a criação e educação impor obediência e respeito têlos em sua companhia e guarda g Exigir obediência e respeito A formação do filho para a vida adulta fazse mediante a transmissão de valores e incorporação de regras Por características próprias do processo de desenvolvimento do ser humano na sociedade complexa dos nossos tempos há uma resistência natural por parte do filho à aceitação de sua condição Contestar os pais é parte inexorável do processo de amadurecimento As atitudes de rebeldia começam cedo e se acentuam na puberdade Por mais desgastante que seja para os pais é função deles enfrentar essas atitudes exigindo obediência e respeito dos filhos Parecerá muitas vezes improdutivo e frustrante mas quem é pai ou mãe não tem outra alternativa muita paciência não é o suficiente a paciência há de ser infinita para bastar Devem insistir na exigência renovála reforçála repetila acentuála reproduzila tornar a ditála confirmála voltar a ela repôla reiterála repisála rememorála repetila uma vez mais até que a atitude de obediência e respeito passe a ser espontânea Em determinadas situações será imprescindível que os pais castiguem o filho pela desobediência ou falta de respeito Embora haja ainda pai ou mãe que considere pertinente o castigo físico e o aplique a verdade é que a pedagogia e a psicologia têm mostrado sua ineficiência Podese criar uma pessoa amedrontada ou violenta com os castigos físicos mas dificilmente alguém obediente e respeitoso Tampouco têm eficiência os castigos morais que não machucam o corpo mas expõem o filho ao ridículo e à humilhação Os castigos devem consistir apenas na privação de algo que a criança ou adolescente deseja devem ser ademais necessariamente antecedidos da advertência para que o filho possa decidir se insiste na rebeldia e corre o risco de não ter o que quer ou se obedece Ademais para que tenham eficiência os castigos advertidos devem ser aplicados Nada pior para a educação de uma pessoa do que os pais ameaçarem privála de certa coisa quando eles de antemão sabem que não terão coragem ou condições de efetivamente a negar Se a família programou viagem para a Disneyworld e já começou a pagar a passagem e serviços turísticos é irreal procurar obter a obediência e respeito do filho dizendo que ele em desobedecendo ou sendo desrespeitoso não irá viajar a promessa incumprível simplesmente desmoraliza o instrumento pedagógico Na medida em que se reitera a falta de aplicação dos castigos prometidos o filho deixa de acreditar neles Para os pais uma vez mais não há outra alternativa enquanto não impuserem ao filho as consequências negativas aventadas repetidas vezes não conseguirão controlar a natural rebeldia que acompanha o processo de crescimento h Exigir a prestação de serviços Como qualquer outra manifestação do poder familiar o direito de exigir a prestação de serviços próprios de sua idade e condição só existe se destinado à adequada preparação do filho para a vida adulta Quer dizer os pais não têm o direito de exigir que os filhos trabalhem fora para contribuir com a renda familiar por mais necessitados que sejam ou estejam Podem é certo estimulálos a tais atitudes que são sadias e contribuem para a formação do caráter Neste caso têm o dever de zelar pelo estrito cumprimento das restrições ao trabalho de menores previstas na Constituição art 7º XXXIII e na CLT arts 403 e 404 O filho menor nunca tem o dever de contribuir para o sustento dos pais ou seus irmãos Quando a lei menciona a exigência de prestação de serviços como direito associado ao poder familiar ela está se referindo unicamente aos que podem contribuir para a preparação do filho para a vida adulta Isto é à ajuda que todos os membros da família devem dar para as tarefas cotidianas Os pais podem exigir dos filhos por exemplo que enxuguem a louça do jantar ponham a mesa levem o cão ao passeio reguem o jardim ou outros afazeres semelhantes Não é aliás despropositado que os pais remunerem modicamente tais serviços domésticos sempre que o objetivo for o de contribuir para a formação de um adulto ciente de suas responsabilidades e não o de economizar dinheiro com empregados ou trabalhadores autônomos 52 Usufruto e administração dos bens dos filhos menores Enquanto os filhos estão sob o poder familiar isto é não alcançaram a maioridade nem foram emancipados os seus bens ficam sob a administração dos pais CC art 1689 II Competelhes providenciar o que for preciso para sua adequada conservação e fruição Enquanto perdura a incapacidade absoluta a declaração de vontade do filho é feita pelos pais sendo irrelevante eventual opinião do menor Se os pais consideram pertinente determinado negócio jurídico relacionado à administração de bem pertencente ao filho adotamno Sobrevindo a incapacidade relativa nenhum negócio jurídico pode ser mais praticado pelos pais em nome do filho Este passa a influir com sua vontade na administração do próprio patrimônio Contra a opinião do menor nenhum negócio jurídico poderá ser praticado embora ainda necessite da assistência de seus pais Os poderes de administração patrimonial deferidos aos pais no entanto não os autorizam a praticar atos que importem alienação ou oneração de imóveis Tampouco podem obrigar o filho além dos atos de simples administração Se for necessário ou do evidente interesse dele quaisquer desses atos que ultrapassam os associados ao poder familiar a prévia autorização judicial deve ser buscada CC art 1691 Desse modo se o filho possui um apartamento em seu patrimônio herdado por testamento do avô por exemplo aos pais cabe adotar as providências para o manter alugado tais como anunciar a locação negociar com o valor do aluguel com os interessados contratar corretor etc A renda locatícia integra o patrimônio do proprietário do bem isto é do filho e não o dos pais Se o imóvel reclama manutenção dos pais também é a responsabilidade por contratar os serviços correspondentes remunerandoos com recursos do menor inclusive os provenientes do aluguel Se porém está difícil alugar o apartamento por bom preço e as despesas com sua manutenção não são desprezíveis atende aos interesses do menor a alienação do bem Isso no entanto extrapola os limites da mera administração patrimonial e os pais necessitarão de prévia autorização judicial para o ato Para deferila o juiz comumente estabelece algum tipo de salvaguarda dos direitos do menor como por exemplo o depósito do valor líquido obtido pela venda em conta bancária de investimento movimentável apenas mediante ordem judicial desta edição 2020 Se os pais praticarem qualquer ato excedente dos poderes de mera administração ele é nulo Quer dizer se foi feita a alienação de imóvel sem autorização do juiz o bem retorna ao patrimônio do filho e o comprador pode reclamar a devolução do preço dos pais Estão legitimados para a ação declaratória de nulidade além dos filhos quando alcançarem a maioridade também os seus herdeiros Se os pais tiverem sido destituídos do poder familiar o tutor designado pelo juiz está igualmente legitimado como representante legal do filho CC art 1691 parágrafo único Além de terem o direito de administrar o patrimônio do filho os pais são considerados legalmente usufrutuários dos bens que o compõem CC art 1689 I Significa dizer que podem usálos e fruílos da mesma maneira que poderiam se tivesse sido instituído usufruto convencional em favor deles No exemplo acima se os pais considerarem que a família se mudar para o apartamento do filho menor é a alternativa mais interessante para todos podem fazêlo Não estão obrigados a remunerar o filho pelo uso do bem porque titulam a condição de seu usufrutuário Os bens do patrimônio do filho são administrados pelos pais enquanto não alcançada a maioridade Sobre esses bens além disso titulam os pais os direitos de usufrutuários Alguns bens dos filhos estão excluídos do poder de administrar e usufruto legal titulado pelos pais CC art 1693 São em primeiro lugar os adquiridos pelo filho havido fora do casamento antes do reconhecimento Esse caso a rigor a lei não precisaria explicitar Como o poder familiar decorre do vínculo de filiação e não da ascendência biológica o genitor não é pai enquanto se recusa a reconhecer o filho Em segundo lugar excluemse dos bens afetos ao poder familiar os valores auferidos pelo filho com mais de 16 anos em razão do exercício de atividade econômica Se o menor já ganha dinheiro com algum mister então demonstra ter maturidade para os administrar diretamente Os bens que adquirir empregando tais valores também não são administrados pelos pais nem se submetem ao usufruto legal em favor deles Claro que para praticar negócios jurídicos relacionados também a esses bens em razão da incapacidade relativa ainda dependerá da assistência de seu pai e mãe Em terceiro lugar estão os bens doados ou legados ao filho com a cláusula de exclusão da administração e usufruto dos pais O doador ou legatário pode estipular como encargo da doação ou testamento pelas razões que só lhe dizem respeito o afastamento dos pais do donatário ou legatário menor da administração e usufruto do objeto de sua liberalidade Por fim quando os pais foram excluídos da sucessão por indignidade ou deserdação ficam igualmente afastados da administração e usufruto dos bens que nela couberem ao filho 2020 02 13 PÁGINA RB71 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 61 ASSISTÊNCIA FAMILIAR Capítulo 61 Assistência familiar 1 Alimentos Nos horizontes delineáveis pelo modo de produção capitalista a família ainda deve exercer a função assistencial por muito tempo Num sistema econômico de crises periódicas e injustiças permanentes é difícil construirse um programa eficiente de Seguridade Social e por isso a família tende a não se desvencilhar tão cedo do encargo de amparo aos seus nas enfermidades e velhice Mesmo que o acúmulo social de força de trabalho permita ao Estado no futuro garantir sua recuperação fora da família os laços afetivos nela existentes tendem a reservar sempre algum espaço para a assistência aos seus membros ainda que subsidiária Além da função assistencialista a família provê o sustento educação lazer e cultura de seus membros compatíveis com a sua condição econômica Na maioria das vezes os vínculos afetivos ou não estabelecidos pela família entre seus membros são suficientes para a garantia do cumprimento dessas funções Pais se sacrificam para dar estudo aos filhos irmão ajuda a irmã desempregada com as despesas do supermercado tia custeia o tratamento dentário da sobrinha filhos se cotizam para pagar o segurosaúde dos pais essas ações acontecem em geral porque os familiares se gostam ou pelo menos se consideram responsáveis uns pelos outros no mínimo nutrem a expectativa de merecerem igual auxílio de um familiar se vierem a necessitar Quando porém os laços familiares não são suficientes para assegurar o apoio que alguém precisa da família a lei o obriga por meio do instituto dos alimentos De acordo com o art 1694 do CC podem os parentes os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social O titular do direito aos alimentos chamase alimentado e o devedor alimentante A lei dá ao alimentante a opção de pagar os alimentos ou dar diretamente hospedagem e sustento ao alimentado CC art 1701 Embora na maioria das vezes a obrigação alimentar se resolva mediante o pagamento de uma pensão mensal o alimentante pode substituíla por prestações diretas Adapta sua casa para nela receber o parente necessitado e o provê de alimento e vestuário mediante a direta entrega de bens A opção pelo sustento direto não é cabível no caso de alimentos devidos a cônjuge ou companheiro hipótese em que a lei menciona especificamente o pensionamento art 1704 Desse modo se o irmão alimentante receia que o alimentado por ser alcoólatra desperdiçará em bebidas o dinheiro da pensão alimentícia poderá cumprir sua obrigação recebendoo em casa e o sustentando diretamente com o objetivo de evitar o desvio da finalidade da prestação Tratase de opção exclusiva do alimentante contra a qual não pode o alimentado se insurgir a menos que circunstâncias especiais do caso revele buscar aquele por vias transversas a exoneração da obrigação Representaria exercício abusivo do direito de optar pelo sustento direto em sua casa a substituição pelo pai da pensão alimentícia que paga à filha residente em outro Município onde cursa faculdade Quando se revelar o abuso o juiz fixará a forma mais adequada para o cumprimento da obrigação alimentar art 1701 parágrafo único Os alimentos se destinam ao cumprimento pela família de sua função assistencialista e das relacionadas ao provimento dos recursos reclamados pelo sustento e manutenção de seus membros O direito aos alimentos é irrenunciável O credor pode deixar de exercêlo pelas razões que só a ele dizem respeito mas vindo a precisar de alimentos a qualquer tempo tem direito de reclamá los Além de irrenunciável o direito aos alimentos não pode ser objeto de cessão penhora ou compensação CC art 1707 A obrigação alimentar tem natureza personalíssima Por isso não pode ser transferido pelo alimentado a outrem por negócio jurídico ainda que mediante a anuência do alimentante Também pela mesma razão não pode ser penhorado para satisfação de dívida do alimentado perante terceiros A penhorabilidade implicaria a transmissibilidade do direito indispensável à realização do crédito exequendo Por fim para que o instituto cumpra suas finalidades assistenciais o valor dos alimentos não pode ser compensado pelo alimentante com dívida do alimentado 11 Requisitos e valor dos alimentos Para que os alimentos sejam devidos três requisitos devem estar preenchidos a alimentante e alimentado são parentes estavam casados ou conviviam em união estável b o alimentado não dispõe de patrimônio ou renda que lhe permita viver de acordo com a sua condição social c o alimentante tem patrimônio ou renda que lhe possibilita pagar os alimentos sem desfalque injustificado ao seu padrão de vida CC art 1695 Presentes os três requisitos nasce o direito do alimentado aos alimentos e a obrigação do alimentante de pagálos Os alimentos não se destinam à formação ou majoração do patrimônio do alimentado RT 830323 mas unicamente ao atendimento das necessidades que ele não pode custear com seus próprios meios Os alimentos em geral devem ser compatíveis com a condição social do alimentado Se Antonio e Benedita marido e mulher tinham três filhos Carlos Darcy e Evaristo e sempre mantiveram com o produto de seu trabalho a família com determinado padrão de vida residindo em bairros centrais dispondo de motorista particular viajando ao exterior todo ano vestindo roupas boas usufruindo de serviços médicohospitalares de alta qualidade etc os filhos estão obrigados a sustentálos se eles na velhice não conseguirem mais gerar o dinheiro suficiente para tanto Carlos Darcy e Evaristo estão obrigados a manter o mesmo padrão de vida que Antonio e Benedita lhes haviam proporcionado quando lhes competia prover o sustento da família A regra geral portanto assegura ao alimentado o direito de receber do alimentante os recursos necessários à manutenção do mesmo padrão de vida compatível com a sua condição social Essa regra contudo não tem aplicação absoluta Se a vida que o alimentante poderia ter com seu patrimônio e renda ficar injustificadamente prejudicada desconstituise o direito do alimentado à manutenção do padrão de vida Ninguém está obrigado a sustentar o luxo alheio se isso o impedir de levar a vida que seu patrimônio e renda possibilitam No exemplo anterior em princípio Carlos Darcy e Evaristo estão obrigados a manter os pais no mesmo padrão de vida em que esses mantinham a família quando aqueles viviam sob seus cuidados Estarão desobrigados contudo se a manutenção do igual padrão de vida por Antonio e Benedita acarretarlhes desfalque injustificado Imagine que Carlos fique sem dinheiro para pagar uma boa escola para sua filha Fátima se tiver de custear a viagem de luxo dos pais dele É evidente a completa falta de justificativa para o desfalque que a obrigação alimentar acarretaria ao alimentante nesse caso Mas Darcy não pode negarse a contribuir com o pagamento do segurosaúde dos pais sob o pretexto de que o dinheiro correspondente destinarseia à compra de brinquedos eletrônicos para seu filho Germano Aqui o desfalque no padrão de vida do alimentante é em tudo justificável Para serem devidos alimentos compatíveis com a condição social do alimentado assim é necessário em primeiro lugar que o alimentante não tenha que se sacrificar injustamente para pagálos A inexistência de culpa é outro requisito para se constituir o direito aos alimentos compatíveis com a condição social do alimentado Se o próprio alimentado arruinou culposamente seu patrimônio ou podendo trabalhar não se anima a fazêlo por preguiça o valor dos alimentos será fixado em patamar mínimo isto é pelo montante indispensável à subsistência dele CC art 1694 2º Aproveitando ainda o mesmo exemplo se Antonio e Benedita perderam na mesa do jogo parte substancial de seu patrimônio e renda Carlos Darcy e Evaristo não estão obrigados a sustentálos no mesmo padrão de vida que tinham anteriormente O valor dos alimentos nesse caso será fixado tendo em vista apenas evitar que Antonio e Benedita passem por privações básicas como fome ou completa falta de assistência médica Como foram os culpados pelas necessidades por que estão passando devem suportar as consequências de seu comportamento indevido experimentando a drástica redução no padrão de vida Os perdulários não têm direito senão aos alimentos mínimos Os alimentos são devidos aos parentes cônjuges ou companheiros que não dispõem de patrimônio ou renda suficientes para a sua manutenção alimentados por aqueles que dispõem de meios para custeála sem prejuízo injustificado para o próprio padrão de vida alimentantes O alimentado que não tiver sido culpado pelas suas necessidades tem o direito aos alimentos em valor que lhe permita manter o padrão de vida compatível com sua condição social desde que o alimentante possa arcar com ele sem ficar injustamente prejudicado O valor dos alimentos deve ser estabelecido a partir dessas diretrizes de um lado o padrão de vida compatível com a condição social do alimentado de outro a inexistência de culpa pelo estado de necessidade e de desfalque injustificado no patrimônio ou renda do alimentado Atendidos esses pressupostos cabe ainda considerar as necessidades do alimentado e os recursos do alimentante CC art 1694 1º Na quantificação do devido a título de alimentos as necessidades do alimentado pressionam para cima o valor enquanto os recursos do alimentante para baixo Quanto maiores as necessidades do alimentado mais elevado será o valor dos alimentos quanto menores as condições do alimentante mais reduzido será esse valor Mas a despeito do critério legal de nada adianta o alimentado ter certa necessidade se o alimentante não tem recursos para atendêla Se a neta ao ficar órfã costumava frequentar semanalmente um caro cabeleireiro mas os avôs não o podem pagar com suas minguadas aposentadorias aquela necessidade não pode ser atendida Do mesmo modo não é porque o alimentante dispõe de amplos recursos que o alimentado tem direito à elevação de seu padrão de vida O irmão de quem ganha um grande prêmio lotérico não pode pedirlhe alimentos para o atendimento de necessidades que anteriormente não possuía A obrigação alimentar pode deixar de existir ou mudar de valor para mais ou para menos em função de alterações nas condições econômicas do alimentado e alimentante A existência e extensão da obrigação fixamse sempre tendo em conta a situação patrimonial e econômica dos sujeitos ativo e passivo num determinado momento Variando essa situação varia igualmente a obrigação Assim se provar que o alimentado não tem mais certa necessidade concluiu o tratamento médico formouse na Universidade etc ou passou a ter patrimônio ou renda suficiente para se manter foi reempregado ganhou indenização em juízo etc o alimentante pode pedir a exoneração da obrigação ou a redução do encargo Por seu turno o alimentado provando ter novas necessidades piora na saúde nascimento de mais um filho etc ou a melhoria da condição do alimentante aumento salarial herança etc poderá pedir ao juiz a majoração do valor da obrigação CC art 1699 Nessas variações devemse atender rigorosamente os mesmos critérios acima indicados A redução ou majoração dos alimentos é proporcional às mudanças nas necessidades do alimentado e condições do alimentante O padrão de vida compatível com a condição social do alimentado deve ser em princípio buscado mas cabe a redução se o alimentante passou a ter ele próprio uma necessidade que antes não tinha para cujo custeio não pode ter os recursos desfalcados Não basta a prova de que o alimentante melhorou sua condição econômica ou patrimonial se a necessidade do alimentado não existia antes de serem devidos os alimentos A revisão dos alimentos em decorrência de mudança na condição econômica e patrimonial das partes não se confunde com sua atualização monetária As prestações alimentícias devem ser atualizadas pelo índice e periodicidade definidos pelas partes ou juiz para que sua expressão monetária continue ao longo do tempo compatível com o atendimento das necessidades do alimentado neutralizandose os efeitos da inflação CC art 1710 Essa correção não aumenta o valor da prestação alimentícia mas apenas o preserva e por isso não se confunde com sua revisão para cima 12 Classificação dos alimentos Há interesse em três classificações dos alimentos a Em favor de parente ou de cônjuge ou convivente Por mais que se tenha esforçado o Código Reale no sentido de disciplinar os alimentos de forma unitária independentemente do vínculo entre o credor e o devedor cabe distinguirse a hipótese de obrigação alimentar em favor de parente consanguíneo ou de pessoa com quem o alimentante esteve casado ou manteve união estável Os alimentos devidos em favor de parente têm por fundamento racional a função assistencialista da família O exemplo mais relevante está na obrigação de sustento dos filhos menores pelos pais que de certo modo é invertida quando esses últimos alcançam idade em que o trabalho tornase mais difícil ou menos rendoso Também avôs e netos assim como os irmãos devem alimentos uns aos outros quando um deles necessita e o outro pode prover subitem 13 Já os alimentos devidos a cônjuge ou convivente guardam relação com a condição de inferioridade da mulher marcante no passado e ainda hoje encontrada em algumas relações de conjugalidade Como a mulher não era estimulada a cultivar uma carreira profissional consistente não conseguia libertarse da dependência dos recursos do marido ou companheiro mesmo depois da dissolução do vínculo conjugal se tinha formação profissional era comum abdicar com o casamento de prosseguir em sua carreira defrontando então ao se divorciar com enormes dificuldades no reingresso no mercado de trabalho De uma forma ou de outra a mulher divorciada ou cuja união estável se desfizera tinha dificuldade de auferir renda compatível com o padrão de vida de que desfrutava no casamento Os alimentos em favor de cônjuge ou convivente é a rigor um anacronismo que a lei deveria continuar contemplando apenas para tratar de forma justa a situação dessas mulheres quando o esquema machista dos relacionamentos de antanho ainda fosse por decisão do casal adotado Ao contrário de tratar a matéria como hipótese excepcional justificável unicamente em favor da mulher em função da persistência de esquemas dessa natureza a lei a estendeu também ao sexo masculino O homem pelo direito vigente pode reclamar alimentos de sua antiga esposa ou companheira subitem 14 b Compatíveis com a condição social ou mínimos Em termos gerais o alimentado tem direito aos alimentos compatíveis com sua condição social quando seu patrimônio ou renda são insuficientes para a manutenção do padrão de vida correspondente Os alimentos devem ser fixados em montante que possibilite ao alimentado continuar a se vestir comer descansar e de um modo geral levar a mesma vida que levava antes do surgimento da necessidade Isso significa que exceto nas classes de menor renda o valor devido pelo alimentante ultrapassa em muito o que seria suficiente à mera subsistência do alimentado Em duas hipóteses contudo a título de sanção a lei nega ao alimentado o direito aos alimentos compatíveis com a condição social garantindolhe apenas o indispensável à sua subsistência São as hipóteses de alimentos mínimos a que têm direito o alimentado culpado pela deterioração de sua condição econômica e patrimonial CC art 1694 2º e o cônjuge ou convivente culpado pelo fim da sociedade conjugal ou da união estável art 1704 parágrafo único Classificamse os alimentos de acordo com o vínculo entre credor e devedor em favor de parente ou de cônjuge ou companheiro segundo o valor em compatíveis com a condição social ou mínimos e pelo momento processual em que são fixados em provisórios provisionais ou definitivos No caso de alimentos devidos a excônjuge ou excompanheiro a condição social do alimentando a ser considerada varia segundo este tenha ou não contribuído para a melhoria dela Explicome Alguém pode durante o tempo de duração do casamento ou da união estável melhorar sua condição social em razão de esforços pessoais como a conclusão de curso superior por exemplo Se for este o caso ou seja se a melhoria da condição social devese em parte a esforços pessoais do alimentando é a situação ao tempo do divórcio ou do desfazimento da união estável que deve ser levada em conta Se porém a melhoria na condição social durante o casamento ou a união estável deveuse exclusivamente a esforços do outro cônjuge ou companheiro a situação a considerar é a anterior ao vínculo horizontal Assim por exemplo se o casal melhorou sua condição social graças não só ao trabalho do marido como também a esforços pessoais da mulher os alimentos que aquele deve pagar a esta quando devidos pelo valor da compatibilidade com a condição social devem assegurar o mesmo padrão de vida que a alimentada estava levando ultimamente como esposa ou companheira Se porém a melhoria da condição social do casal deveuse exclusivamente ao trabalho do marido tendo a mulher se acomodado e apenas usufruído da situação econômica favorável a condição social a considerar é a anterior ao casamento ou à união estável c Provisórios provisionais ou definitivos Tão logo despache a petição inicial da ação de alimentos o juiz fixa o valor a ser pago pelo réu durante a tramitação do feito a menos que o autor declare não precisar deles Lei n 547868 art 4º Esses são os alimentos provisórios Em medidas cautelares preparatórias ou incidentais às ações de divórcio nulidade ou anulação de casamento o juiz pode fixar o valor a ser pago pelo demandado para atender à situação emergencial em que se encontra o demandante Esses são os provisionais CC art 1706 Finalmente ao sentenciar já encontrando nos autos todos os elementos para a quantificação adequada da obrigação o juiz determina o valor dos alimentos definitivos A rigor como mostra Luiz Edson Fachin todos os alimentos são provisionais e provisórios nunca definitivos 2003292294 quer dizer objetivam prover os recursos de que necessita o alimentado e sempre comportam revisão quando alterada a condição econômica e patrimonial das partes ou de uma delas Essa classificação não obstante tem serventia no campo do direito processual 13 Alimentos para parentes Tanto os filhos podem reclamar alimentos dos pais como estes daqueles O direito aos alimentos é recíproco entre pais e filhos Estendese ademais a todos os ascendentes e descendentes titulando a obrigação os parentes de grau mais próximo CC art 1696 Assim o neto órfão tem direito de reclamar alimentos dos avós assim como estes daquele dependendo de quem esteja necessitado ou tenha meios para sustentar É irrelevante para imputação da obrigação alimentar aos pais e filhos a espécie de filiação que os une Tanto na filiação biológica como não biológica é obrigação de ascendentes e descendentes alimentaremse uns aos outros Também claro o filho reconhecido voluntariamente ou por condenação em ação investigatória faz jus aos alimentos art 1705 A lei estabelece uma ordem imputando a obrigação inicialmente aos ascendentes e apenas em sua falta aos descendentes art 1697 primeira parte Desse modo se o necessitado tem pai e filhos ambos em condições de pagar os alimentos está obrigado a fazêlo o primeiro apenas só no caso de vir a falecer o pai obrigado os filhos dessa pessoa passam a deverlhe alimentos Quem não tem ascendentes ou descendentes pode reclamar os alimentos dos irmãos tanto bilaterais como unilaterais CC art 1697 in fine Cessa nesse grau contudo o parentesco gerador da obrigação alimentar Os afins e os colaterais além do segundo grau não estão obrigados a prover alimentos uns aos outros Se o parente obrigado aos alimentos não tem meios para arcar com o seu valor integral os demais serão chamados a complementar a pensão CC art 1698 primeira parte Quando o valor pago pelos pais é insuficiente e eles não têm como arcar com todo o sustento do alimentado RT 839322 este pode pleitear alimentos subsidiários dos avós RT 839228 desde que eles tenham como provêlos RT 821333 Pais e avós em condições de pagar os alimentos assumem então quotas proporcionais à responsabilidade de cada um RT 838326 Sendo várias as pessoas obrigadas a prestar os alimentos como nos casos por exemplo de dois ou mais filhos responsáveis pelo sustento da mãe viúva dos pais divorciados alimentando os filhos dos avôs que pagam pensão alimentícia complementar ao neto cada um contribuirá segundo suas condições CC art 1698 Sendo um dos alimentantes mais rico que o outro as quotas serão proporcionais de modo a imputarlhe maior responsabilidade A regra da proporção é aplicável também no caso de divórcio ou dissolução da união estável relativamente aos alimentos devidos aos filhos Se os pais são divorciados ou viviam em união estável agora desfeita cada um é responsável pelos alimentos do filho proporcionalmente aos respectivos recursos econômicos e patrimoniais art 1703 Dessa maneira se por exemplo a mãe ganha mais que o pai ela deve responder por porção maior dos alimentos de que necessita o filho Não há de outro lado solidariedade entre os coalimentantes porque a lei não a estipula expressamente A solidariedade lembrese não se presume Cap 14 item 7 Desse modo o alimentado não pode cobrar de qualquer um dos alimentantes a integralidade dos alimentos para que eles se acertem em regresso Se o alimentado deixa de receber a quota cabível a um alimentante só dele pode exigir a prestação Os filhos em princípio têm direito aos alimentos desde a concepção Pimentel Pereira 20034748 até a maioridade Com 18 anos como regra cessa o poder familiar e a obrigação de os pais proverem o sustento do descendente Maior e capaz passa a ser responsável por sua manutenção O limite de idade a partir do qual cessa a obrigação dos pais de sustentar o filho deve ser expandido no caso de ele se encontrar ainda estudando RT 840751 Mas para que não se estimule a vagabundagem a extensão do limite de idade tem sentido apenas no caso de o filho corresponder ao gasto Isto é se aos 18 anos ele ainda não concluiu o ensino médio a maioridade libera os pais de qualquer obrigação alimentar Cahali 2004219 Com toda justiça temse atribuído aos pais a obrigação de continuar a sustentar os filhos até a formatura em curso superior quando então estarão aptos a prover sua manutenção com os resultados da profissão obtida Zuliani 2006 mas desfazse qualquer sentido de justiça em tal atribuição quando o filho deixa de mostrar o empenho razoavelmente exigido nos estudos Se atrasa a conclusão do curso superior propositadamente ou por mau desempenho escolar o filho maior de 18 anos perde o direito de continuar sendo alimentado pelos pais Aqui não pode ter aplicação o critério geral de fixação dos alimentos a partir das necessidades do alimentado inclusive relacionadas à educação A sua observância implicaria despropositado estímulo ao descumprimento pelo filho de sua obrigação de estudar Outro fator que justifica a extensão do limite de idade de cessação da obrigação alimentar é a falta de capacidade física ou mental para o filho prover seu próprio sustento mesmo depois de fazer 18 anos Quando o filho é portador de doença mental a maioridade não implica exoneração da obrigação de alimentar RT 830321 Do mesmo modo se porta deficiência física que o inabilita para qualquer trabalho continua credor de alimentos Os filhos menores não têm direito de acrescer a quotaparte do irmão que perdeu o direito aos alimentos RT 821241 Desse modo se o pai paga alimentos no valor de 100 a dois filhos e um deles por força da maioridade ou da conclusão do curso superior perde o direito de recebêlos reduzse o valor da pensão alimentícia devida para 50 O filho que continua titulando o direito aos alimentos não pode acrescer à sua quota a do irmão Os parentes consanguíneos em linha reta e os colaterais até segundo grau inclusive devem uns aos outros alimentos quando qualquer um deles não tem renda ou patrimônio para se manter no padrão compatível com sua condição social e o outro pode pagálos sem desfalque injustificável para sua própria vida Os alimentos são devidos no patamar mínimo porém suficiente à sobrevivência do parente necessitado se tiver sido dele a culpa pela deterioração do patrimônio ou receita De outro lado o limite de idade para a cessação da obrigação alimentar dos pais em relação ao filho abreviase na hipótese de casamento união estável ou concubinato do alimentado CC art 1708 Quando o filho se casa ou constitui união estável entendese que passou a formar nova família e está em condições de arcar com o seu sustento contando apenas com o resultado de seu próprio trabalho e de seu consorte ou convivente Se mantém concubinato pressupõese que está maduro para cuidar de si mesmo Num ou noutro caso estão dispensados os pais e demais parentes de prover os alimentos Cessa por fim a obrigação de alimentar quando o credor portarse de modo indigno em relação ao devedor CC art 1708 parágrafo único Os alimentos malgrado sua natureza de obrigação legal correspondem a um sacrifício imposto ao alimentante em benefício do alimentado Este deve ser por isso grato àquele Se não o for e chegar a manifestar a ingratidão por gestos falas ou condutas perderá o direito que titula 14 Alimentos para cônjuges e companheiros O desfazimento da sociedade conjugal acarreta naturalmente a redução do padrão de vida da família É fácil percebêlo o mesmo dinheiro que antes bastava para viverem todos sob um único teto deverá agora ser empregado na manutenção de duas casas Isso é inevitável e independentemente de quem tomou a iniciativa de propor a separação ou foi o culpado pela dissolução da sociedade conjugal sofrerão todos os membros da família cônjuges e filhos os efeitos econômicos e patrimoniais do término da sociedade conjugal Não quer a lei no entanto que um dos cônjuges experimente uma acentuada redução em seu padrão de vida tornandoo incompatível com a condição social dele se não tiver sido o culpado pelo fim do relacionamento Por essa razão o inocente se seu patrimônio e rendas forem insuficientes para garantirlhe padrão de vida compatível com sua condição social tem direito aos alimentos que o assegurem Em qualquer caso tenha ou não rendimentos próprios o cônjuge irá experimentar como visto alguma redução no padrão que levava É incontornável O direito aos alimentos existe em consequência apenas se o cônjuge não tendo patrimônio ou renda que lhe permita viver em padrão compatível com sua condição social experimentar uma acentuada queda nesse padrão Se o cônjuge possui trabalho cuja remuneração lhe permite viver em padrão compatível com sua condição social não terá direito aos alimentos Imagine que o executivo de empresa de grande porte seja casado com uma milionária Enquanto perdura a relação conjugal os dois fazem constantes viagens ao exterior no jatinho particular de propriedade desta última Ao se separarem o executivo deixará de usufruir desse conforto sofrendo a correspondente redução no elevadíssimo padrão de vida que levava Mas não terá direito a alimentos nem mesmo com o objetivo de compensação da perda sofrida Isso porque ele dispõe de renda que possibilita manter se em padrão de vida compatível com sua condição social O Código Civil no art 1694 assegura especificamente os alimentos de que necessitem os cônjuges para viver de modo compatível com a sua condição social Se assim é então os alimentos serão indevidos quando o cônjuge com a própria renda consegue viver de modo compatível com sua condição social ainda que verificada alguma diminuição do padrão de vida que tinha durante o casamento Imagine agora que um empresário de sucesso casouse com mulher que apesar de ser filha da classe média e ter condições para fazer um curso superior contentarase apenas com o técnico de secretariado bilíngue Com o casamento deixou de trabalhar fora e passou a cuidar exclusivamente da administração doméstica Durou o casamento cerca de dez anos durante os quais a mulher não se interessou em se atualizar em sua formação ou mesmo adquirir profissão de nível superior Usufruiu nesse tempo o padrão de vida que o marido custeava sozinho Evidentemente na separação se a partilha não lhe destinou patrimônio suficiente para gerar os rendimentos para uma vida de padrão de classe média por mais que se esforce essa infeliz não conseguirá trabalho que lhe proporcione renda para tanto Só conseguirá viver de modo compatível com a sua condição social se puder contar com os alimentos do exmarido Terá direito a eles nesse caso a menos que tenha sido dela a culpa da dissolução da sociedade conjugal Em princípio com o divórcio rompido o vínculo conjugal existente entre os cônjuges deixam estes de titular um em relação ao outro o direito aos alimentos Cahali 19781122 Apenas se no acordo de divórcio ou na sentença que a decretou ficou um dos excônjuges obrigado a pagar alimentos ao outro a obrigação se prolonga além do término do vínculo conjugal Esta regra geral no entanto não tem aplicação naqueles casamentos em que parte substancial das despesas do casal corria exclusivamente por conta de um dos cônjuges se não tem o outro como prover uma vez divorciado seu próprio sustento Deste modo no divórcio o cônjuge que não dispuser de meios para se manter tem o direito de ser alimentado pelo outro na medida de suas necessidades e dos recursos do alimentante Se não tiver sido o culpado pelo divórcio o valor dos alimentos será o compatível com sua condição social mas se a culpa tiver sido do alimentado fará jus unicamente aos alimentos mínimos vale dizer os indispensáveis à sobrevivência É o previsto nos arts 1702 e 1704 e seu parágrafo único do Código Civil Notese que estes dispositivos falam em separação e não em divórcio Isto porque foram editados antes da EC n 662010 que aboliu aquela primeira fase da dissolução do vínculo matrimonial Estas disposições do Código Civil no entanto bem examinadas continuam vigentes posto não serem incompatíveis com a nova redação do art 226 6º da Constituição No divórcio e na dissolução da união estável o cônjuge ou companheiro que necessitar de alimentos para se manter pode reclamálos do outro Se tiver patrimônio ou renda para viver em padrão compatível com sua condição social não fará jus aos alimentos Quando os alimentos forem devidos seu valor será diferente de acordo com a culpa do alimentado para o divórcio ou a dissolução da sociedade conjugal Se ele não foi o culpado os alimentos serão no valor necessário à manutenção do padrão de vida compatível com a condição social do alimentado se foi corresponderá ao suficiente para a sua sobrevivência alimentos mínimos Se o vínculo de conjugalidade não era o casamento mas a união estável os critérios são rigorosamente idênticos O companheiro ou companheira que não dispõe de patrimônio ou renda para se manter após a dissolução da união estável tem o direito de cobrar alimentos do outro Se não tiver sido o culpado ou culpada pela dissolução da união o valor dos alimentos será o que sustente padrão de vida compatível com a condição social do alimentado se tiver sido dele a culpa do fim do relacionamento estável o valor será apenas o que bastar para a sobrevivência Cessa a obrigação alimentar em favor do cônjuge ou convivente em duas hipóteses novo casamento união estável ou concubinato do alimentado e se este se comportar de maneira indigna em relação ao alimentante CC art 1708 e parágrafo único Novas núpcias do alimentante porém não extinguem a obrigação de alimentar constante da sentença de divórcio art 1709 15 Alimentos gravídicos Durante a gestação a gestante incorre naturalmente em certas despesas relacionadas à sua saúde e à do bebê Necessitam ambos de exames médicos periódicos especializados e por vezes tratamento clínico ou até mesmo cirurgia Essas despesas que a lei chama de adicionais do período de gravidez devem ser repartidas entre a gestante e o pai na proporção dos recursos de cada um Quando o pai resiste a cumprir sua parte nessa obrigação podese requerer ao juiz a fixação de alimentos gravídicos consoante o previsto na Lei n 118042008 O juiz diante dos indícios de paternidade fixará os alimentos gravídicos Nascendo o filho com vida o pai continuará devedor da prestação mensal mas agora a título de alimentos em geral e até que seja requerida por ele ou pelo filho a revisão judicial 16 Falecimento do alimentante A obrigação alimentar é personalíssima e portanto intransmissível Falecendo o alimentante ela desaparece O art 1700 do Código Civil expressouse imperdoavelmente mal ao dispor que a obrigação de prestar alimentos transmitese aos herdeiros do devedor Isso porque levado esse infeliz dispositivo ao pé da letra algumas situações claramente absurdas estariam legitimadas Se a obrigação alimentar fosse realmente transmissível aos herdeiros o cônjuge sobrevivente do segundo casamento teria de sustentar o antigo consorte do falecido a filha seria devedora de alimentos em favor do homem que conviveu alguns anos com sua mãe após ela enviuvar e assim por diante A rigor quis dizer a lei no dispositivo em questão que o espólio conti nuará a pagar os alimentos devidos pelo de cujus até a partilha computandose os valores recebidos como antecipação da quota cabível ao alimentado É assim que a jurisprudência vinha decidindo antes da entrada em vigor do Código Reale RT 839317 e continuou a decidir Cahali 2004246260 Em nenhuma hipótese portanto os alimentos poderão ser pagos além das forças da herança na parte proporcional ao quinhão do alimentado cf Oliveira 2004 Interpretar de modo diverso o art 1700 do Código Civil como se o herdeiro sucedesse o autor da herança na obrigação alimentar importa clara descaracterização dos alimentos como obrigação personalíssima Pimentel Pereira 2003913 e desrespeito ao direito constitucional à herança CF art 5º XXX Considere que o falecido deixou aos dois filhos seus únicos herdeiros porções iguais de seu patrimônio Enquanto vivia pagava alimentos a um deles somente por ser menor de idade Com a morte do alimentante extinguese a obrigação alimentar assim como se extinguiria se morresse o alimentado Tratase de obrigação personalíssima lembrese Para que o herdeiro menor não sofra nenhum prejuízo o espólio continuará pagandolhe a prestação correspondente à pensão alimentícia Mas na hora da partilha os valores pagos devem ser debitados do quinhão atribuível a esse herdeiro Se não for feita a compensação desrespeitase o direito constitucional titulado pelo irmão maior que então receberia porção inferior da herança 2 Tutela Quando o menor fica órfão de pai e mãe alguém deve se responsabilizar por ele Alguém que o proteja dirijalhe o restante da criação e educação e zele por seus interesses Em razão da falta de capacidade civil o órfão continua a necessitar de representante enquanto impúbere ou assistente quando púbere para a prática de negócios jurídicos Finalmente se possui patrimônio a criança ou adolescente precisa de alguém capaz para administrálo Essa pessoa que se responsabiliza pelo menor órfão de pai e mãe é chamado tutor a criança ou adolescente sob seus cuidados chamase tutelado ou pupilo A mesma necessidade de se designar pessoa capaz como responsável pela criança ou adolescente existe no caso de os dois pais serem destituídos do poder familiar O menor nesse caso também será posto sob tutela A rigor são três os casos em que a lei determina a nomeação de tutor para a criança ou adolescente morte dos dois pais ausência de ambos decretada por sentença ou destituição deles do poder familiar CC art 1728 O tutor não substitui os pais do tutelado nem mesmo sob o ponto de vista jurídico Ele não titula os direitos associados ao poder fami liar apenas fica incumbido de algumas das funções que os pais exerciam Aquelas funções por assim dizer práticas que se relacionam à paternidade ou maternidade as que não podem aguardar a maioridade do sujeito Em certo sentido a tutela se contrapõe ao poder familiar porque ela não tem lugar enquanto ele existir recuperado o poder familiar perdido sai o menor da tutela Enquanto um dos pais viver ou titular o poder familiar concentramse nas mãos dele todos os direitos associados a esse poder e não há razões para ser dado tutor ao menor Somente falecendo os dois ou decaindo ambos do poder sobre o filho dar seá a tutela Dizse que a tutela é um múnus público um encargo que a lei imputa ao tutor Não tendo sido indicado pelos pais ninguém para o seu exercício a tutela caberá a um dos parentes do menor nomeado pelo juiz a partir de uma ordem prevista na lei Desse modo tratandose de tarefas que familiares devem assumir na falta dos pais contextualizase a tutela na função assistencial da família Diniz 20031334 O tio deve responsabilizarse pelo sobrinho órfão de pai e mãe em razão do vínculo familiar que os une Falecendo pai e mãe ou sendo ambos destituídos do poder familiar será dado tutor ao filho menor que se responsabiliza por cuidar dele e administrar seu patrimônio Nem sempre porém a tutela é vista como um pesado fardo Em primeiro lugar o afeto quando presente nos laços familiares costuma afastar qualquer ideia de descabido transtorno Os parentes não hesitam nesse caso de acolher o menor calorosamente dandolhe com amor todo o apoio necessário num momento tão doloroso morte ou afastamento de ambos os pais Mas ainda que não exista qualquer vínculo afetivo se o menor herda patrimônio valioso não faltarão interessados no exercício da tutela para os quais os encargos de tutor nunca parecerão exaustivos O menor abandonado aliás é o que não se enquadra em qualquer dessas situações Não tem parente no mundo disposto a cuidar dele desinteressadamente nem patrimônio Nesse caso o juiz poderá determinar o recolhimento da criança ou adolescente a estabelecimento público destinado a essa finalidade se não encontrar ninguém que gratuita e voluntariamente se disponha a tutelá lo CC art 1734 Cessa a tutela em primeiro lugar com a maioridade ou emancipação do pupilo CC art 1763 I Nesse caso não há mais razões para continuar alguém se responsabilizando por ele já que passou a ser sujeito de direito capaz Também é causa de cessação da tutela o restabelecimento do poder familiar inclusive pela adoção ou reconhecimento de paternidade ou maternidade art 1763 II Aqui embora o menor ainda necessite que alguém zele pelos seus interesses a função não caberá mais ao tutor mas sim ao titular ou titulares do poder familiar isto é o genitor ou genitora que o reconheceu voluntariamente ou foi condenado em ação investigatória ou os pais adotivos Não se confunde a cessação da tutela com a das funções do tutor Naquela desaparecem as razões que justificavam submeter a criança ou adolescente à tutela Na cessação das funções do tutor o menor continua sob tutela mas é substituído o sujeito a quem ela foi cometida Claro que nos dois casos de cessação da tutela também o tutor deixa suas funções Ocorrerá no entanto a cessação das funções do tutor sem que cesse a tutela em três hipóteses CC art 1764 Primeira o fim do prazo durante o qual o tutor está obrigado a exercer a tutela que é de dois anos art 1765 Por ser a tutela um múnus considera a lei que ninguém pode ser obrigado a desempenhálo por muito tempo A cada dois anos assim abrese a oportunidade de o tutor se exonerar do encargo passandoo a outro parente do menor ou mesmo a pessoa de confiança do juiz Não haverá a cessação da função depois desse prazo se o tutor tiver disposição de continuar nela e o juiz considerar a continuidade conveniente ao menor art 1765 parágrafo único Segunda a superveniência de escusa legítima Se por exemplo a tutora se casa ou ingressa no serviço militar pode escusarse legitimamente do exercício da tutela nos dez dias seguintes subitem 22 Terceira a destituição ou remoção do tutor decretada pelo juiz a qualquer tempo sempre que a medida se relevar a mais adequada aos interesses do menor tutelado No caso por exemplo de incorrer o tutor em ato negligente no exercício da função de prevaricação ou incapacidade a cessação da função deve ser determinada art 1766 21 Espécies de tutela Há três espécies de tutela testamentária legítima e dativa Na tutela testamentária o tutor é a pessoa escolhida de comum acordo pelo pai e mãe do menor Verificase essa espécie de tutela quando os pais não consideram que os seus parentes estejam aptos para cuidar dos interesses do filho e guiarlhe o restante da criação e educação ou quando pensam que um deles especificamente tem esta aptidão e desejam afastar da função os que o antecedem na ordem legal Se entendem que qualquer de seus parentes pode tutelar o filho de modo satisfatório não há razões para escolherem o tutor Compete aos pais em conjunto a nomeação do tutor CC art 1729 Inexiste o negócio jurídico se a indicação é feita por um deles somente Há tecnólogos que entendem válida a designação de tutor feita por um só dos pais mesmo enquanto vive o outro ou de tutores diferentes pelo pai e mãe em instrumentos separados cabendo nesse caso ao juiz escolher o tutor entre os dois nomeados Consideram que a escolha de qualquer dos pais é sempre melhor que a da lei Azevedo 2003325 Não deve ser adotado esse entendimento porém se ficar demonstrado que o nome preferido por um dos cônjuges era vetado pelo outro De um modo geral contra a vontade do pai ou da mãe ninguém pode ser investido na função de tutor Se cada um optou por atribuir o encargo a pessoa diversa pode ser que tivessem ambos sérias reservas em relação à pretendida pelo outro O juiz então deve nomear tutor de acordo com a ordem legal Para a validade da nomeação do tutor é indispensável que os pais estivessem ao falecerem no pleno exercício do poder familiar Não terá eficácia a lei fala imprecisamente em nulidade a designação feita se morreram decaídos desse poder CC art 1730 Mesmo que pai e mãe titulassem o poder familiar quando fizeram a declaração de vontade nomeando o tutor se não mais o titulavam ao falecerem não será eficaz a nomeação Essa espécie de tutela é denominada testamentária porque a exemplo dos testamentos refere se à declaração de vontade cujos efeitos só se projetam com a morte do declarante A nomeação do tutor assim pode ser instrumentalizada num testamento mas não necessariamente A lei autoriza que o seja também por qualquer outro documento autêntico CC art 1729 parágrafo único vale dizer uma escritura pública ou instrumento particular com firma reconhecida dos pais Não existe o compartilhamento dos encargos da tutela Cahali 2004326327 Em qualquer caso mesmo que o tutor seja casado ou viva em união estável a função é cometida a um sujeito de direito individualmente Nomeada assim mais de uma pessoa como tutora em cláusula testamentária ou do instrumento autêntico sem que os pais tenham fixado qualquer precedência o primeiro a ser referido será o tutor O outro ou outros referidos no documento de nomeação serão substitutos dele em caso de morte incapacidade escusa ou impedimento respeitada a ordem pela qual foram indicados CC art 1733 1º A nomeação do tutor na tutela testamentária pode ser feita sob condição ou a termo Miranda 1916 3325326 Os pais podem estipular que determinada pessoa será tutora de seus filhos desde que esteja casada ao tempo da tutela ou ainda resida na mesma cidade etc Nesse caso condicionam a investidura do nomeado na função de tutor ao atendimento do pressuposto de fato ou de direito por eles consignado Também lhes é facultado limitar no tempo o exercício da tutela estabelecendo por exemplo o rodízio na função entre duas ou mais pessoas a cada ano Na tutela legítima o tutor é escolhido pelo juiz entre os parentes consanguíneos do menor obedecida a ordem disposta na lei Seu pressuposto é a inexistência de nomeação pelos pais A escolha do juiz devese nortear por óbvio em função das aptidões dos parentes em zelar pelos interesses do tutelado em busca do que se mostra mais preparado A ordem da lei prioriza de início os ascendentes e entre esses os de grau mais próximo CC art 1731 I Assim o juiz deve considerar em primeiro lugar os avós da criança ou adolescente posto sob tutela Não há nenhuma hierarquia entre eles podendo a escolha recair sobre o avô ou avó paterno ou materno dependendo exclusivamente do que o juiz considerar mais apto ao exercício do múnus público Não sendo vivo nenhum deles mas vivendo bisavô ou bisavó a ordem legal de preferência aponta para o ascendente de terceiro grau Em segundo lugar na ordem da tutela legítima encontramse os parentes colaterais até terceiro grau preferindo os mais próximos aos remotos e os mais idosos aos jovens CC art 1731 II Desse modo não havendo ascendentes o juiz deve considerar os irmãos e irmãs capazes paternos ou maternos germanos ou unilaterais hierarquizandoos pela idade partindo do mais velho Não havendo nenhum irmão ou irmã em condições de assumir as funções de tutor o juiz deve enfim atentar para os tios e tias de qualquer lado da família hierarquizandoos mais uma vez de acordo com a idade O tio ou tia mais velho será então nomeado tutor Nos estritos termos da lei ao juiz não caberia fugir minimamente da ordem nela estabelecida devendo nomear o parente sempre com estrita observância do critério do legislador Em outros termos a tutela legítima recairia necessariamente no familiar já definido de antemão pela norma legal Esse rigor contudo não tem sido obedecido Entre um bisavô antiquado e sem energia e o mais jovem dos tios dinâmico e competente embora a lei prefira não se consegue atinar bem por quais razões o primeiro o juiz pode ficar com o outro Sempre que o interesse do menor justificar a ordem legal da tutela legítima pode ser esquecida cf Gonçalves 2005577579 Por fim na tutela dativa o juiz escolhe o tutor fora do círculo familiar do menor Dáse a hipótese quando falta nomeação pelos pais e não vive nenhum dos parentes arrolados na ordem legal de investidura Também é dativa a tutela quando os tutores testamentários e legítimos foram excluídos da função dela se escusaram ou a perderam por inidoneidade CC art 1732 De um modo geral se não estão em condições de exercer a função os nomeados pelos pais nem os parentes consanguíneos do menor ou se eles não existem o juiz escolherá pessoa da confiança dele para servir de tutor São dois os requisitos a serem atendidos pelo dativo idoneidade e residência no mesmo Município em que se encontra o domicílio do menor De acordo com a designação do tutor a tutela pode ser testamentária ele é nomeado pelos pais em conjunto no testamento ou outro documento autêntico legítima nomeado pelo juiz entre os parentes do menor obedecida a ordem legal ou dativa a nomeação recai sobre pessoa idônea e residente no mesmo Município do domicílio do menor da confiança do juiz Em qualquer espécie de tutela o tutor deve mostrarse idôneo e apto ao desempenho das funções que lhe são cometidas Deve estar ademais em condições de zelar pelos interesses do menor Algumas das hipóteses mais visíveis de inaptidão ou impedimento para a nomeação estão listadas na lei CC art 1735 Não podem ser tutores nesse sentido a os que não tiverem a livre administração de seus bens incapazes falido enquanto não reabilitado etc b os credores e devedores do menor por obrigação já vencida na época da investidura c os pais filhos ou cônjuges de quem litiga contra o menor d os inimigos do menor ou de seus pais e os que foram excluídos da tutela pelo pai ou mãe f os condenados por crime de roubo furto estelionato falsidade contra a família ou os costumes mesmo que tenham já cumprido a pena g pessoas de maus procedimentos com deficiência na probidade ou que foram excluídas no passado da função de tutor h os que exercem função pública incompatível com a boa administração da tutela é governador do Estado prefeito de cidade de porte etc 22 O tutor e suas responsabilidades A tutela é um múnus público Isso significa que o nomeado pelos pais ou pelo juiz em princípio não pode recusarse a exercêla Contempla a lei no entanto algumas hipóteses em que a escusa é admissível Estão relacionadas grosso modo a situações em que o nomeado por força da idade ou de outras responsabilidades presumivelmente ficaria sobrecarregado além do razoável caso tivesse de cuidar do menor órfão ou liberado do poder familiar Assim sendo podem legitimamente escusarse do encargo de tutor a mulher casada a lei num rompante machista parece considerar que o tempo dela deve estar tomado pelos cuidados devotados ao marido os maiores de 60 anos dos quais não se devem exigir mais contribuições à sociedade além das que já deram e os que têm sob sua autoridade mais de três filhos quando realmente restaria pouco tempo para os assuntos do tutelado Também os impossibilitados por enfermidade ou que residem em local distante daquele em que devem exercer a tutela e os militares em serviço podem recusar a designação Finalmente os que já têm sob os seus cuidados um menor ou incapaz isto é já são tutor ou curador estão dispensados de assumir mais um múnus público CC art 1736 O nomeado para a tutela dativa pode por seu turno legitimamente exonerarse indicando que o menor tem parente idôneo consanguíneo ou afim em condições de exercêla CC art 1737 A escusa deve ser manifestada ao juiz nos dez dias seguintes ao da designação sob pena de se entender renunciado o direito Se a causa para a escusa legítima sobrevier à investidura o prazo contase de sua verificação CC art 1738 O tutor pode desse modo nos dez dias seguintes à data em que completou 60 anos pedir ao juiz a dispensa do encargo Não o fazendo presumese ter renunciado ao direito de se escusar Ficará na função até se completar o biênio em curso Investido na função de tutela o tutor passa a ter responsabilidades em relação à pessoa e ao patrimônio do menor Em relação à pessoa do menor CC art 1740 incumbelhe dirigir a educação definindo a escola em que deverá estudar os cursos extracurriculares que convém fazer bem como controlando seu rendimento motivando e orientando o tutelado Não dispõe o tutor do poder familiar de modo que não tem o direito de aplicarlhe castigos físicos ou morais senão com autorização judicial Evidentemente as medidas de correção pedagógicas de que não possam derivar sérias consequências negativas e que se revelem necessárias no cotidiano do relacionamento com o tutelado o tutor pode aplicar sem autorização do juiz Cabe ao tutor defender o menor tendoo em sua companhia e guarda se isso for necessário à segurança dele Nessa incumbência que se deve interpretar de forma ampla incluemse os cuidados com a saúde alimentação e crescimento psicológico da criança ou adolescente Igualmente é ato de defesa do menor a cargo do tutor demandar em nome dele o pagamento de alimentos contra os parentes obrigados e em condições de provêlos O tutor só está obrigado a prestar ele próprio os alimentos ao pupilo de acordo com sua condição econômica patrimonial e social no caso de não dispor este último de patrimônio ou renda que lhe garanta a sobrevivência nem de parentes em condições de provêlos Tendo o menor bens e receita suficientes para sua manutenção não terá o tutor responsabilidade nenhuma de pagar alimentos mas apenas de administrar os recursos do pupilo de modo a atender às necessidades dele O juiz nesse caso arbitrará as quantias necessárias à educação e sustento do tutelado se os pais não as tiverem estabelecido CC art 1746 Não estará igualmente obrigado o tutor a alimentar o tutelado se este tem parentes com a obrigação de proverlhe o sustento Em síntese afora as especificidades da obrigação alimentar o tutor tem as mesmas responsabilidades em relação à pessoa do menor que os pais têm relativamente aos seus filhos Se o tutelado for adolescente tiver 12 anos ou mais o tutor deve levar em conta a opinião dele em todos os atos que praticar no exercício da tutela Já em relação aos bens cabe ao tutor administrálos no interesse e proveito da criança ou adolescente sob seus cuidados CC art 1741 Terá nesse caso a mesma responsabilidade que os demais administradores de interesses alheios como procurador diretor de sociedade empresária administrador judicial de massa falida interventor em instituição financeira nomeado pelo Banco Central etc Em síntese ele responde por má administração dos interesses do menor Se praticar algum ato que importe prejuízo ao pupilo aluguel de bem a preço inferior ao de mercado ou evidentemente o exponha a grande risco investimento em ações de empresas não consolidadas o tutor deverá indenizar os prejuízos que acarretar àquele art 1752 Pela administração dos bens do pupilo tem direito o tutor a uma remuneração proporcional ao valor deles a ser fixada pelo juiz Terá também o tutor direito ao reembolso dos adiantamentos que tiver feito em benefício do menor CC art 1752 O reembolso independe de qualquer autorização judicial bastando para efetuálo que o tutor os desconte do devido ao tutelado em sua prestação de contas art 1760 Ao investirse na função o tutor receberá os bens do menor median te a assinatura de termo que os especifique e quantifique Essa formalidade é exigida na lei não podendo dispensála nem mesmo os pais do pupilo CC art 1745 Também nessa oportunidade declarará os créditos vincendos que titula perante o menor se houver obrigação vencida o credor está impedido de ser nomeado tutor como visto sob pena de não poder cobrálos enquanto durar a tutela salvo provando que desconhecia seu direito creditório na época da investidura art 1751 Os atos de administração de maior complexidade ou que exigirem conhecimentos técnicos bem como os que devem ser praticados em local distante do domicílio do tutor poderão ser objeto de delegação Para delegar os poderes para tais atos o tutor deve escolher uma pessoa idônea e capacitada para praticálos e pedir prévia autorização judicial Será inválida a transferência de incumbências a terceiros feita diretamente pelo tutor sem essa autorização O delegado poderá ser pessoa física ou jurídica CC art 1743 Se o patrimônio do menor for substancial o juiz poderá nomear um auxiliar para fiscalizar sua administração pelo tutor Esse auxiliar chamase protutor ao qual poderá ser fixada uma remuneração módica a ser paga com recursos da renda do tutelado CC arts 1742 e 1752 1º Sendo de considerável valor o patrimônio também poderá o juiz exigir que o tutor preste caução A medida é excepcional porque impõe a quem já deve suportar o múnus público um agravo patrimonial Se a pessoa for notoriamente idônea ou por qualquer outra razão tomada pelo juiz a caução é dispensável art 1745 parágrafo único O tutor tem responsabilidades relacionadas à pessoa e aos bens do pupilo Em relação à pessoa do menor competelhe por exemplo dirigir a educação e defendêlo Deverá também sustentar a criança ou adolescente sob seus cuidados quando ele não dispuser de patrimônio ou renda suficiente para se manter Quanto aos bens o tutor é o administrador do patrimônio do menor respondendo pelos atos de má administração em que eventualmente incorrer Enquanto não nomear o tutor o juiz terá responsabilidade direta e pessoal pelo patrimônio do menor Mesmo depois de nomeálo continuará responsável subsidiariamente no caso de não ter exigido a caução do tutor ou de não o ter removido à menor suspeita CC art 1744 O protutor se houver é solidariamente responsável pelos danos causados pelo tutor ao pupilo quando tiver exercido sua função fiscal de modo negligente art 1752 2º 23 Limitação aos poderes do tutor O tutor tem a mesma responsabilidade de qualquer outro administrador de bens alheios Mas não dispõe dos mesmos poderes que em geral se lhe atribuem Ao contrário com o objetivo de dificultar malversação ao patrimônio do menor a lei limita os poderes que o tutor titula na condição de administrador Em outros termos no exercício da tutela o tutor deve praticar certos atos e não pode praticar outros Para alguns dos que pode praticar precisará de autorização do juiz A lei assim distribui os atos próprios da tutela em três categorias atos de competência do tutor CC art 1747 sujeitos à prévia autorização do juiz arts 1748 e 1750 e vedados art 1749 São atos de competência do tutor a representar o menor enquanto durar a incapacidade absoluta e assistilo durante a relativa em todos os atos e negócios da vida civil b receber as rendas e pensões a que tem direito o menor bem assim as quantias a ele relativas c providenciar o pagamento das despesas de subsistência e educação do pupilo bem como as relacionadas à administração manutenção e melhoramento de seus bens d praticar os atos de alienação dos bens do tutelado destinados à venda isto é que o juiz autorizou a vender e alugar os imóveis do menor Por sua vez são atos que a lei sujeitou à prévia autorização do juiz para que este pudesse controlar de modo mais direto a administração do tutor f pagamento de dívidas do menor não se compreendendo nesse conceito as despesas de subsistência e educação bem assim as de administração conservação e melhoria dos seus bens que como visto independem do juiz g aceitar heranças legados ou doações em nome do tutelado com ou sem encargos h transigir isto é dispor sobre direitos do menor com o objetivo de evitar ou encerrar litígio i vender bens móveis cuja conservação não atenda ao interesse do menor um barco ou carro deixado pelos pais por exemplo j vender bens imóveis quando houver manifesta vantagem para o menor na operação k demandar em juízo representando o menor ou assistindoo em caso de incapacidade relativa bem como defendêlo nas ações que contra ele forem propostas Esses atos como dito dependem de prévia autorização judicial para serem praticados pelo tutor Se por qualquer motivo forem realizados antes de solicitada a autorização a eficácia deles fica a depender da aprovação posterior pelo juiz CC art 1748 parágrafo único Por fim os atos que o tutor não pode praticar em nenhum caso nem mesmo autorizado pelo juiz sob pena de nulidade são l adquirir por si ou por interposta pessoa bens móveis ou imóveis pertencentes ao menor salvo se o fizer por escritura pública m dispor dos bens do pupilo de forma gratuita doandoos ou dandoos em comodato n receber direitos do menor em cessão inclusive créditos Certos atos o tutor pode praticar diretamente alugar os imóveis do menor pagar as despesas de administração e conservação dos bens etc Outros somente mediante prévia autorização do juiz ou posterior aprovação vender móveis ou imóveis do pupilo transigir etc Ademais há certos atos que ele não pode praticar de nenhuma maneira nem mesmo se autorizado judicialmente comprar por instrumento particular bens do menor receber em cessão direitos por ele titulados etc Além dessas limitações relativas a determinados atos a lei também estabelece certas regras atinentes aos bens do menor a serem observadas pelo tutor em sua administração Assim o tutor só pode ter sob sua disponibilidade o dinheiro do tutelado necessário às despesas ordinárias com seu sustento educação e administração dos bens CC art 1753 O que exceder deve ficar em conta de investimento bancário aberta em nome do pupilo lastreado fundamentalmente em títulos públicos O produto da venda dos objetos de ouro e prata pedras preciosas e móveis feita mediante autorização judicial após avaliação deve ser utilizado na aquisição de títulos públicos ou imóveis art 1753 1º A movimentação das contas de depósito bancário do menor depende de ordem judicial e só pode ser feita para atender finalidades específicas previstas na lei como compra de bens imóveis ou títulos públicos CC art 1754 24 Prestação de contas O tutor exerce suas funções sob a fiscalização do juiz auxiliado quando a complexidade do patrimônio do menor o exigir pelo protutor Um dos instrumentos de fiscalização do exercício da tutela é a prestação de contas Nem mesmo os pais ao nomearem o tutor testamentário podem dispensálo da obrigação de prestálas nos prazos e formas da lei CC art 1755 Anualmente o tutor deve submeter ao juiz o balanço contábil dos atos praticados relativamente aos bens e interesses do pupilo CC art 1756 A apresentação do balanço anual ainda não é a prestação de contas Destinase a transmitir ao juiz informações do período a que se refere que podem eventualmente alertálo para alguma irregularidade a tempo de se adotarem providências saneadoras A prestação de contas ordinariamente dáse a cada dois anos de exercício da tutela Esse é o prazo fixado pela lei com o objetivo de fazer coincidirem os períodos em que o tutor está obrigado a exercer o múnus público e o abrangido pela prestação As contas consistem em balanço patrimonial relativo ao biênio a que se refere no qual são consolidados os balanços anuais do último e do penúltimo período de exercício do múnus público Extraordinariamente as contas devem ser prestadas sempre que exigidas pelo juiz na cessação da tutela ou das funções do tutor CC art 1757 Em qualquer caso de terminação da tutela ou das funções exigemse as contas do tutor Elas são exigidas mesmo se o pupilo alcançou a maioridade ou foi emancipado e sendo capaz outorgou quitação ao tutor art 1758 As contas extraordinárias também são demonstrativos contábeis abrangendo o período de no máximo dois anos desde a data da última conta ordinária aprovada ou se ainda não houve nenhuma desde a investidura do tutor até a da exigência do juiz ou da cessação da tutela No caso de morte ausência ou interdição do tutor cabe aos seus herdeiros ou representantes o dever de prestar contas CC art 1759 O tutor está obrigado a prestar ao juiz contas dos atos que pratica no exercício da tutela Ordinariamente deve prestálas a cada dois anos Extraordinariamente sempre que o juiz determinar ou no fim da tutela Apresentadas as contas elas são autuadas determinando o juiz que sobre elas se manifestem o Ministério Público o protutor se houver e demais interessados Depois o juiz julga as contas aprovandoas ou rejeitandoas No caso de aprovação os saldos apurados devem ser recolhidos imediatamente pelo tutor em depósito bancário de investimento em nome do menor ou empregados na aquisição de bens imóveis ou títulos públicos CC art 1757 parágrafo único Se as contas forem rejeitadas considerase que o tutor incorreu em alcance Sem prejuízo de sua responsabilização criminal fica o tutor obrigado a repor imediatamente o valor alcançado vencendose juros desde o julgamento das contas art 1762 O balanço e demonstrativo contábil podem ser simples sem forma contábil rigorosa desde que o patrimônio e renda do pupilo sejam de valor reduzido Nesse caso o próprio tutor ou seu advogado elabora da maneira mais clara possível a planilha com os números correspondentes aos atos praticados Havendo contudo alguma complexidade na administração do patrimônio e rendas do menor convém que o balanço e a prestação de contas sejam feitos por um contador Em qualquer caso correm por conta do tutelado as despesas com a prestação de contas CC art 1761 3 Curatela A curatela a exemplo da tutela é múnus público atribuído aos familiares de uma pessoa geralmente maior quando ela não tem como praticar diretamente os atos da vida civil por insuficiente capacidade de discernimento ou mesmo impossibilidade física Contextualizase no direito de família em razão de sua natureza assistencialista em que alguém é chamado a dar apoio a um parente Os encargos associados à curatela imputamse ao curador São três as espécies de curatela Primeira que se destina a designar o representante legal ou assistente de interditos Estão sujeitos à curatela nesse caso a aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir a vontade b os ébrios habituais e os viciados em tóxicos c os pródigos CC art 1767 Deles já tratei anteriormente Cap 7 subitem 32 Tratase sem dúvida da hipótese mais relevante de curatela sob o ponto de vista jurídico embora nem sempre se revele a medida mais adequada à plena recuperação do interdito e sua integração na sociedade Pereira 2004385407 O processo judicial que define os termos da curatela chamado interdição pode ser promovido pelos pais cônjuge ou qualquer parente da pessoa que deve ser posta sob curatela ou ainda pela própria pessoa CC art 1768 I II e IV Também o tutor tem legitimidade para o pedido quando o pupilo relativamente incapaz não puder por qualquer razão exprimir a vontade É o caso de curatela de menor em que o tutor deve ser substituído pelo curador que passa a representálo Como se recorda o tutor do relativamente incapaz não o representa mas apenas o assiste nos negócios jurídicos Constatando que o pupilo apesar de já ter feito 16 anos não tem como exprimir a própria vontade o tutor deve requerer a interdição dele Finalmente o Ministério Público está legitimado para requerer a interdição desde que presentes um dos seguintes requisitos da lei deficiência mental ou intelectual inexistência de parente ou tutor legitimado a omissão menoridade ou incapacidade destes CC art 1769 No processo judicial destinado a definir os termos da curatela o juiz é obrigado a entrevistar pessoalmente o interditando Será assistido nesta entrevista por equipe multidisciplinar CC art 1771 O Ministério Público quando não for o autor da demanda atuará como defensor do interditando Sendo ele o autor o juiz nomeará outra pessoa para a função de defensor art 1770 A lei fixa os critérios para a nomeação do curador Inicialmente fixa regra geral determinando ao juiz que leve em conta a vontade e preferências do interditando a ausência de conflitos de interesse ou de influência indevida bem como a proporcionalidade e a adequação às circunstâncias da pessoa CC art 1772 parágrafo único A este parâmetro geral adiciona certos critérios específicos Assim se o interditando é casado ou vive em união estável o cônjuge ou convivente será o curador Se ele não mantém vínculo de conjugalidade com ninguém curador será o pai ou a mãe e na falta dos dois o descendente que se mostrar mais apto para o encargo preferindo os de grau mais próximo aos remotos Não havendo esses parentes o juiz escolherá para ser curador pessoa idônea de sua confiança art 1775 Se a curatela está sendo dada em razão de deficiência o juiz poderá determinar o seu compartilhamento a mais de uma pessoa art 1775A Segunda em que se dá curador ao nascituro sempre que a mãe perder o poder familiar durante a gravidez se o pai está morto ou também decaído desse poder Sendo a mãe interdita seu curador será também o do nascituro CC art 1779 Assim se a viúva grávida em razão dos atos irregulares praticados em relação a outro filho perder o poder familiar o ato se estende a toda a prole incluindo o rebento que está por vir Será nomeado tutor para os já nascidos e curador para o nascituro Terceira quando o curatelado é pessoa enferma ou portadora de deficiência física Mesmo não estando sujeita à interdição pode encontrarse numa situação em que não consegue expressar diretamente a vontade É o caso de quem sofreu grave acidente de trânsito e está internado num hospital inconsciente ou apenas imobilizado Se tiver condições para tanto o próprio interessado requererá ao juiz que nomeie o curador caso contrário parente ou órgão legitimado o fará por ele CC art 1780 Dáse curador ao interdito ao nascituro se os pais decaíram do poder familiar durante a gravidez e ao enfermo ou portador de deficiência física O exercício da curatela segue as mesmas regras estabelecidas para o da tutela feitas no entanto duas observações Primeira se o curador é casado em regime de comunhão universal de bens com o interdito estará dispensado de prestação de contas a menos que o juiz o determine CC art 1783 Sendo os dois titulares do mesmo patrimônio a hipótese de alcance está afastada não se justificando destarte a trabalheira das prestações de contas Segunda o curador deve observar os limites de suas atribuições fixadas na sentença que decretou a interdição CC art 1772 Tais limites na hipótese de a interdição se fundar na prodigalidade do interdito circunscrevem as funções do curador à de assistilo nos atos de empréstimo transigência quitação alienação instituição de hipoteca litígio judicial e os demais que excedem os de mera administração art 1782 Cap 7 subitem 321 Não se confunde por fim a curatela com a curadoria Aquela tem sentido permanente e habilita o curador a cuidar de todos os negócios bens e interesses da pessoa posta sob curatela Já a curadoria é específica de modo a habilitarse o curador apenas a determinados atos São exemplos de curadoria a instituída pelo testador com o objetivo de subtrair da administração do tutor os bens legados a menor CC art 1733 2º a relacionada à herança jacente art 1819 a atribuída ao filho quando conflitarem os interesses dele com os dos pais no exercício do poder familiar CC art 1692 a dada ao incapaz se não tiver representante legal ou seus interesses colidirem com os destes e ao réu preso revel ou ao revel citado por edital ou por hora certa enquanto não constituído o advogado CPC art 72 I e II Gonçalves 2005611 4 Tomada de decisão apoiada Com a edição da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência também chamada de Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei n 1314615 EPD criouse ao lado da tutela e da curatela mais um instrumento de assistência familiar a tomada de decisão apoiada CC art 1783 A A pessoa com deficiência de qualquer natureza se considerar que lhe pode ser útil ou necessário contar para os atos da vida civil do apoio de duas pessoas de sua confiança tem desta edição 2020 legitimidade para ingressar com o processo judicial destinado a formalizar este meio de assistência familiar Somente a própria pessoa com deficiência é parte legítima para o pedido Ela indicará ao juiz os apoiadores que devem ser pessoas idôneas com as quais o requerente mantenha vínculos Outro requisito essencial é a confiança que a pessoa com deficiência deve nutrir em relação aos apoiadores que indica Este processo judicial tem o objetivo de homologar um acordo previamente estabelecido entre a pessoa com deficiência e seus apoiadores Neste acordo são estabelecidos os limites do apoio mas para que produza efeitos jurídicos é indispensável a chancela judicial A petição inicial deve ser instruída pelo termo assinado pelo requerente e os apoiadores no qual estão as cláusulas do acordo de apoio O juiz ouvirá o Ministério Público e assistido por equipe multidisciplinar entrevistará a pessoa com deficiência requerente e as indicadas para prestarlhe apoio A partir do acolhimento do pedido a pessoa com deficiência contará com a colaboração dos apoiadores nas decisões que precisar tomar relativamente aos negócios jurídicos abrangidos no termo de apoio judicialmente homologado Os terceiros que se relacionam com a pessoa apoiada podem solicitar a assinatura dos apoiadores nos instrumentos negociais especificandose os limites da função destes O processo de tomada de decisão apoiada é requerido pela própria pessoa com deficiência interessada Mesmo que homologado judicialmente o termo de apoio porém a pessoa apoiada não se torna incapaz Por isto ela pode praticar validamente qualquer negócio jurídico mesmo sem a ajuda dos apoiadores Se uma pessoa apoiada fizer declaração de vontade sem o concurso dos apoiadores ou de um deles isto não invalida o negócio jurídico ainda que ele esteja incluído no termo de apoio judicialmente homologado Como este mecanismo de assistência familiar não torna o apoiado um incapaz que passe a necessitar de assistência ou representação legal a inobservância do termo de apoio judicialmente homologado não afeta a validade e eficácia do negócio jurídico Aliás um dos objetivos do EPD foi exatamente eliminar da ordem jurídica todos os traços da odiosa discriminação que as pessoas com deficiência sofriam em razão das restrições legais à sua plena capacidade jurídica A interpretação teleológica do EPD afasta em definitivo a hipótese de o processo de tomada de decisão apoiada significar qualquer restrição à capacidade da pessoa apoiada 2020 02 13 PÁGINA RB81 desta edição 2020 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES 2020 02 13 PÁGINA RB81 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES CAPÍTULO 62 INTRODUÇÃO AO DIREITO DAS SUCESSÕES Capítulo 62 Introdução ao Direito das Sucessões 1 Transmissão causa mortis O direito das sucessões disciplina a destinação do patrimônio da pessoa física após sua morte Melhor dizendo contempla as normas que norteiam a superação de conflitos de interesses envolvendo a destinação do patrimônio de pessoa falecida Sua matéria portanto é a transmissão causa mortis Os bens se transmitem por variados meios como negócio jurídico entre vivos partes de um contrato de compra e venda ou de doação por exemplo desapropriação incorporação ou fusão de pessoas jurídicas etc O direito das sucessões cuida de um dos meios de transmissão que é a morte da pessoa física Como o patrimônio não pode ficar sem titular morrendo esse deve ser imediatamente transferido para outras pessoas Por esse ângulo de abordagem o direito das sucessões parece aproximarse do direito das coisas Esses dois ramos do direito civil tratam de conflitos de interesses que gravitam em torno de bens Mas essa não é a única forma de abordar o direito das sucessões E talvez não seja sequer a forma mais apropriada Quando se presta atenção aos sujeitos para os quais são transmitidos os bens esse ramo jurídico aproximase de outro capítulo do direito civil o de família Como regra a morte da pessoa física importa a transferência de seus bens para familiares Destacase nessa abordagem o caráter assistencial do direito das sucessões Se para o morto não têm mais nenhuma serventia os bens que amealhou eles são ainda úteis aos seus familiares alguns dos quais eram dele dependentes ou haviam contribuído para a construção do patrimônio São complexas as regras do direito das sucessões porque a multiplicidade de relações familiares que envolvem a pessoa na hora da morte impede um tratamento simples que seja também justo para a maioria dos sucessores Se falece homem casado em regime de comunhão parcial de bens deixando além da viúva apenas filhos que teve com ela as relações familiares não apresentam a mesma complexidade das que se encontram no falecimento de homem separado de fato de sua esposa que mantinha união estável com outra e deixou apenas filhos havidos com uma terceira mulher No primeiro caso a destinação dos bens é menos complexa porque os sucessores são parentes uns dos outros no segundo por não haver nenhum vínculo de parentesco entre eles não é tão simples encontrarse a regra justa para a destinação Outro elemento que contribui para a elevada complexidade das regras de destinação do patrimônio de pessoa física falecida decorre do reconhecimento pela ordem jurídica positiva da eficácia à vontade do titular dos bens transmitidos As pessoas podem por meio de declarações volitivas dispor sobre a destinação de seus bens após o falecimento Quando o morto possui determinados familiares sucessíveis a lei restringe a liberdade para fazer tal disposição estabelecendo uma garantia mínima em favor de certos membros da sua família O direito das sucessões trata da transmissão do patrimônio da pessoa física em razão de sua morte Aproximase de um lado do direito das coisas por versar sobre a propriedade dos bens deixados de outro do direito de família porque os sucessores são normalmente familiares do morto Para enfrentar a complexidade do direito das sucessões vale a pena partir do exame dos sucessores item 2 e em seguida da herança item 3 São conceitos introdutórios cuja compreensão facilitará o exame das duas espécies de sucessão mortis causa a legítima Cap 63 e a testamentária Cap 64 2 Sucessores Os familiares de uma pessoa são classificáveis em relação à sucessão causa mortis em sucessíveis e não sucessíveis Os primeiros são os vocacionados a herdarem bens daquela pessoa enquanto os últimos não herdam a não ser que tenham sido lembrados na declaração de última vontade do autor da sucessão ou seja em seu testamento Os familiares sucessíveis estão classificados pela lei segundo regras que serão examinadas a seu tempo Cada classe de familiar sucessível posicionase numa ordem de chamada que estabelece a preferência a ser observada na destinação dos bens do patrimônio do falecido Como regra geral se na época da morte de uma pessoa estão vivos familiares sucessíveis de uma classe com preferência os das demais classes nada herdam Por enquanto basta conhecer quem são esses familiares titulares do direito de sucessão sem se preocupar com a trama de preferências que os enlaça Os familiares sucessíveis são os descendentes ascendentes cônjuge companheiro e os colaterais até o quarto grau Assim titulam o direito de sucessão quando chamada a classe a que pertencem os filhos netos bisnetos tataranetos descendentes pais avós bisavós tataravôs ascendentes irmãos sobrinhos tios primos sobrinhosnetos e tiosavós colaterais cônjuge e convivente do falecido São esses os familiares que podem suceder a pessoa morta na titularidade do patrimônio por ela deixado Os demais parentes do falecido como os afins não são sucessíveis No caso de serem não sucessíveis todos os parentes vivos do autor da sucessão e não tendo este deixado testamento destinase o seu patrimônio ao Estado 21 Classificação Interessa o exame de quatro critérios de classificação dos sucessores Em primeiro lugar cabe distinguilos em sucessores legítimos e testamentários Os legítimos são os familiares do morto indicados pela lei enquanto testamentários são os escolhidos pelo próprio falecido Se alguém falece sem deixar testamento dizse ab intestato seus bens serão destinados aos sucessores legítimos isto é aos membros de sua família apontados pela lei No passado era muito comum as pessoas fazerem uma declaração de última vontade pelo menos para encarregar alguém de rezar missas por intenção de sua alma Também era comum estabelecer quem deveria ficar com qual bem de seu patrimônio Hoje em dia a sucessão testamentária corresponde à exceção Na grande maioria das vezes herdam os sucessores legítimos A sucessão pode beneficiar exclusivamente sucessores legítimos apenas testamentários ou das duas categorias Se o morto não deixou testamento a sucessão importará a transferência de seu patrimônio somente para os familiares indicados na lei Se deixou testamento abrangendo validamente a totalidade do patrimônio terá apenas sucessores testamentários Mas se o testamento dispõe sobre uma parte dos bens a sucessão beneficiará sucessores testamentários e legítimos Uma pessoa pode ser sucessora legítima e testamentária na mesma sucessão Se o falecido tem como familiares sucessíveis apenas dois filhos e destinou a um deles por testamento porção maior de seu patrimônio o preferido será sucessor legítimo em razão da condição de filho e testamentário por força da contemplação no testamento o preterido será apenas sucessor legítimo tendo direito unicamente à porção do patrimônio assegurada em lei Como se verá adiante o pai não pode em princípio excluir inteiramente da sucessão o filho mas dentro dos limites legais ele dispõe de meios para beneficiar de modo desigual seus descendentes O que interessa por enquanto é fixar que não são exclusivas as condições de sucessor legítimo e testamentário A pessoa pode ser apenas sucessora testamentária assim como pode ser apenas legítima mas pode ocorrer de o sucessor legítimo ser agraciado por testamento com uma porção acrescida à sua parte na herança sendo assim também testamentário Esse critério de classificação não recobre todas as hipóteses de sucessão Quando o autor da sucessão morrer ab intestato e não deixar herdeiros legítimos seu patrimônio se transmitirá ao Estado isto é ao Município ou Distrito Federal em que se encontram ou à União se encontrados em Território Federal CC art 1844 É a hipótese de herança vacante subitem 35 O Estado é sucessor do falecido mas não pode ser considerado herdeiro de acordo com a ordem jurídica vigente portanto não se classifica entre os legítimos O critério classificatório exaustivo assim é o que divide os sucessores em ex lege e ex voluntate Como a sucessão darseá por lei ou por disposição de última vontade CC art 1786 os sucessores ex lege são aqueles para os quais o patrimônio do falecido é transferido por força de direta previsão legal isto é os legítimos e em caso de vacância o Estado enquanto os ex voluntate aqueles que sucedem em razão da vontade do morto os testamentários Outro critério de classificação distingue os sucessores em herdeiros e legatários Aos herdeiros transmitese o patrimônio do morto ou uma quotaparte dele enquanto aos legatários é transmitido bem específico Desse modo se a sucessão importa a transferência da titularidade do patrimônio como um todo sem especificação dos bens transferidos os sucessores são herdeiros Recebem do falecido uma herança Aqui a sucessão é universal Já se ela acarreta a transmissão da titularidade de um ou alguns bens na maioria das vezes determinados ou pelo menos determináveis são legatários os sucessores Recebem um legado e a sucessão é singular Diversas consequências advêm da natureza universal ou singular da sucessão No caso de herança transmitese o patrimônio que inclui as obrigações passivas isto é as dívidas deixadas pelo falecido Se for um único herdeiro o patrimônio é transferido como um todo Depois de pagas as obrigações com os recursos da própria herança o líquido remanescente serlheá transmitido Sendo dois ou mais os herdeiros cada qual herda uma quotaparte do patrimônio Satisfeitas as obrigações passivas deixadas pelo morto dividese o que remanesceu da herança entre os sucessores Já no caso do legado um ou alguns bens do patrimônio do falecido ou excepcionalmente de um sucessor dele devem ser destacados para entrega ao legatário Equivale o legado assim a uma obrigação dos herdeiros em favor do legatário De se observar porém que essa obrigação só existe na medida em que não comprometa o atendimento aos direitos de outros sucessores ou mesmo de credores do falecido Cap 64 item 4 Note que todo sucessor legatário é testamentário mas nem todo testamentário é legatário Se o falecido testa em favor do sucessor um determinado apartamento residencial ele é legatário desse específico bem Aliás não há como destinar certo bem a um sucessor em particular senão por meio de testamento O legado é sempre uma cláusula da declaração de última vontade do morto Por isso todo legatário é necessariamente sucessor testamentário Mas é possível também fazer se testamento deixando herança aos sucessores ou seja transferindolhes a titularidade do patrimônio como um todo ou de quotaspartes dele sem a indicação pelo testador do bem cabível a cada herdeiro Aqui o sucessor é testamentário porque foi escolhido pelo autor da sucessão mas não legatário inexiste legado Em outros termos o herdeiro pode ser sucessor legítimo ou testamentário assim como o sucessor testamentário pode ser herdeiro ou legatário mas o legatário só pode ser testamentário Quando um sucessor legítimo é aquinhoado por testamento com um legado ele o é na condição de testamentário O quarto critério de classificação dos sucessores extrema os herdeiros necessários dos facultativos Herdeiros necessários também chamados de reservatários ou obrigatórios são os que não podem ter sua porção na herança prejudicada por mera vontade do falecido É verdade que eles podem ser excluídos deserdados em testamento quando tiverem incorrido em determinadas condutas previstas na lei lesivas ao autor da herança ou seus familiares nessa hipótese porém a vontade do defunto é condição necessária mas não suficiente para a exclusão A classificação de um herdeiro como necessário implica a impossibilidade de o autor da herança afastálo da sucessão ou prejudicar sua participação por mera vontade Facultativos por sua vez são aqueles que podem ser totalmente excluídos da sucessão por simples desejo do autor da herança expresso em testamento São herdeiros necessários os descendentes ascendentes e cônjuge CC art 1845 Quem falece com qualquer um desses familiares só pode dispor em testamento sobre metade dos bens de seu patrimônio A outra metade denominada legítima deve ser transmitida obrigatoriamente aos herdeiros necessários Por sua vez os herdeiros facultativos são os familiares sucessíveis não classificados como necessários ou seja os colaterais Quem falece sem filhos ou outros descendentes sem pais ou outros ascendentes e sem vínculo de conjugalidade com qualquer outra pessoa pode testar sobre a totalidade de seus bens destinandoos a quem considerar merecedor da deixa patrimonial Ainda que essa pessoa tenha irmãos sobrinhos tios primos sobrinhosnetos ou tiosavós poderá livremente dispor sobre o destino de seu patrimônio após a morte Os sucessores se classificam em legítimos indicados pela lei ou testamentários indicados pelo autor da sucessão em herdeiros no caso de sucessão universal e legatários no de sucessão singular em herdeirosnecessários não podem ser excluídos da herança por mera vontade do falecido e facultativos o autor da herança pode excluílos totalmente da sucessão Em relação ao companheiro a lei não o classifica entre os sucessores necessários Mas em vista da proteção constitucional liberada a essa entidade familiar considero que deve ser feita a interpretação extensiva e conforme a Constituição do dispositivo do Código Civil que enumera os herdeiros necessários Em outros termos o companheiro também deve ser considerado herdeiro dessa categoria de modo a garantirlhe também a legítima Esse é porém um tema bastante controverso na tecnologia civilista Autores como Giselda Hironaka 2004107 Eduardo de Oliveira Leite 20034864 e Sílvio de Salvo Venosa 2001 7152 consideram que a Constituição protegeu a união estável mas não a equiparou ao casamento de modo que a lei pode omitir o convivente da lista dos herdeiros necessários sem incorrer em inconstitucionalidade Pelo entendimento desses civilistas o companheiro classificase como herdeiro facultativo e não é amparado pela legítima Cap 46 subitem 11 22 Capacidade Na maioria das vezes o sucessor é uma pessoa física o familiar do morto indicado na lei ou nomeado em testamento Mas embora rara há também a hipótese de sucessão causa mortis por pessoa jurídica No caso da herança vacante como já mencionado de passagem subitem 21 o patrimônio transmitese a uma pessoa jurídica de direito público Município Distrito Federal ou União A deixa testamentária pode ademais beneficiar como herdeira ou legatária uma sociedade associação ou fundação de acordo com a última vontade do autor da sucessão A capacidade para ser sucessor segue regras que variam segundo seja física ou jurídica a pessoa a quem os bens do falecido se transmitem 221 Pessoa física A primeira condição para capacitação de uma pessoa física à sucessão é ela estar viva ao tempo de sua abertura isto é do falecimento do antigo titular do patrimônio transmitido Quem faleceu antes do autor da sucessão não pode ser sucessor Imagine que Antonio deixou por testamento um apartamento para Benedito sem nada dispor sobre o caso de este último vir a morrer antes dele Falecendo Benedito primeiro o imóvel que a ele tinha sido destinado pela disposição testamentária será transmitido aos sucessores legítimos de Antonio Os descendentes e demais familiares de Benedito nada podem reclamar porque ele não tinha capacidade para suceder Antonio desatendia à primeira condição para ser sucessor a de estar vivo ao tempo do falecimento do autor da sucessão Veja que há meios válidos de contornar essa consequência Se Antonio ao testar tivesse disposto sobre a situação da prémorte do testamentário mencionando que nesse caso o apartamento caberia aos sucessores de Benedito sua vontade seria obedecida não se transmitindo o bem aos legítimos É o instituto da substituição Cap 64 subitem 51 Mas tendo o testador se omitido quanto à destinação do imóvel no caso de prémorte do testamentário o bem será dos sucessores legítimos A comoriência é outra situação em que se percebem as consequências dessa regra de capacidade da pessoa física para ser sucessor Quando duas pessoas falecem ao mesmo tempo se uma delas era familiar sucessível da outra perde a capacidade para suceder Considere que Carlos e Darcy eram casados mas não tinham descendentes nem ascendentes vivos Carlos tinha apenas um sobrinho Evaristo Pois bem na ordem de vocação hereditária Cap 63 item 1 o cônjuge tem preferência sobre os colaterais Acontece que o carro em que viajavam Carlos e Darcy envolveuse num seriíssimo acidente em razão do qual os dois faleceram Pois bem se Carlos morreu antes de Darcy o sucessor será o Estado porque Darcy estava viva ao tempo da abertura da sucessão de Carlos ainda que tenha sobrevivido por poucos minutos somente Se Darcy porém morreu antes de Carlos ou no mesmo instante comoriência ela não tinha capacidade para suceder o marido e nesse caso Evaristo é o herdeiro da totalidade dos bens Para ser sucessora assim a pessoa física deve estar viva Em outros termos ela já deve ter nascido ou pelo menos ter sido concebida no momento em que ocorreu a morte do autor da sucessão CC art 1798 O nascituro portanto tem capacidade para suceder Se falece o pai durante a gestação do filho este embora ainda não nascido participará da sucessão Para tanto exigese porém que nasça com vida art 2º Se o rebento é sadio e vinga sucede como se já tivesse nascido ao tempo da morte do pai Se só conseguiu viver fora do útero materno por alguns instantes será mesmo assim sucessor do pai recebendo a herança e a transmitindo para sua mãe Se não conseguiu viver fora do útero materno por fim não adquiriu capacidade para suceder e a transmissão dos bens do pai ocorrerá como se nunca tivesse sido concebido Note que a lei fala em capacidade sucessória da pessoa concebida no momento da abertura da sucessão Se abstrairmos os processos de fertilização assistida a interpretação do dispositivo não traria qualquer dificuldade Tratarseia de mera referência ao nascituro que como visto tem capacidade para suceder quando nasce com vida Mas e os embriões crioconservados Eles podem ser considerados uma pessoa concebida para fins de se lhe atribuir capacidade sucessória Esse tema malgrado sua enorme importância não foi disciplinado de modo claro pelo Código Civil A lei admite a fecundação artificial post mortem quando homóloga vale dizer feita com aproveitamento do microgameta do marido ou convivente CC art 1597 III e IV e do macrogameta da esposa ou companheira Assim sendo para que não ocorra discriminação da filiação devese considerar que os em briões crioconservados produzidos com o material genético fornecido por pessoas casadas ou em união estável têm capacidade para suceder se vierem um dia a ser inseminados num útero e nascerem com vida Haverá dificuldades consideráveis se a fecundação assistida ocorrer muito tempo depois da morte dos genitores na medida em que a partilha será ineficaz cabendo o afastamento parcial ou total dos sucessores anteriormente aquinhoados Volto a esse tema à frente Cap 63 subitem 32 A primeira condição portanto para a pessoa física titular capacidade sucessória é estar viva no momento da morte do autor da sucessão Quer dizer ter sido concebida numa relação sexual ou por fecundação assistida e após a gestação nascer com vida Existe porém na lei uma hipótese de capacidade sucessória de pessoa ainda não concebida quando da morte do autor da sucessão Tratase de sucessão testamentária em que o testador beneficia o filho que alguém pode vir a ter É assim juridicamente admissível que Germano deixe por testamento uma fazenda ao filho ainda não concebido de Hebe Em vista do princípio constitucional que veda a discriminação entre os filhos CF art 227 6º se não existirem instruções diversas do testador terá capacidade o havido dentro ou fora do casamento ou de união estável assim como o adotivo Os requisitos para a capacitação sucessória do testamentário ainda não concebido são vários De início deve estar viva ao tempo da abertura da sucessão a pessoa cujo eventual filho será beneficiado pelo testamento CC art 1799 I Se estiver morta nessa ocasião não será sucessor o gerado a partir de material genético fornecido pelo nomeado no testamento Desse modo no exemplo Hebe deve estar viva no momento da morte de Germano para que o filho que ela pode vir a ter seja sucessor Se morreu antes do testador o embrião crioconservado obtido do macrogameta dela pode ser implantado no útero de uma doadora temporária O novo ser assim gerado contudo não terá capacidade para suceder Germano porque sua genitora Hebe não estava viva na abertura da sucessão Outro requisito para a capacitação sucessória do filho que alguém pode vir a ter é a concepção no prazo de dois anos contados da abertura da sucessão CC art 1800 4º Ultrapassado o prazo e não concebido o rebento que o testador queria beneficiar perde eficácia a cláusula testamentária correspondente A previsão legal destinase a conferir segurança às relações jurídicas Depois de transcorridos dois anos da morte do testador se a pessoa que ele gostaria de beneficiar ainda não tiver sido concebida não convém aguardar mais porque pode até mesmo ocorrer de ela nunca vir a nascer Em princípio será irrelevante se a concepção do sucessor foi natural ou artificial homóloga ou heteróloga com ou sem doação de útero A regra é a da não discriminação da filiação Será relevante a forma como o sucessor foi concebido e gerado apenas se o testador tiver deixado instruções a respeito Sendo esse o caso claro que só o filho concebido e gerado conforme as condições do testamento terá capacidade para suceder Se Germano ao testar consignou que a fazenda deveria ser transmitida ao filho biológico de Hebe não terá capacidade sucessória o ser gerado em seu útero a partir de embrião fecundado com óvulo de outrem Se no momento da partilha o testamentário não tiver ainda nascido os bens a ele cabíveis serão confiados a um curador nomeado pelo juiz CC art 1800 A nomeação deverá recair em primeiro lugar sobre o designado pelo próprio testador para a tarefa sendo omisso o testamento o juiz nomeará como curador aquele cujo filho o testador esperava ter por sucessor art 1800 1º No meu exemplo Hebe será a curadora dos bens testados ao seu eventual filho se Germano não tiver indicado outra pessoa para o encargo Não sendo idônea a pessoa cujo eventual filho foi lembrado pelo testamento o juiz nomeará outra como curadora devendo observar a mesma ordem legal estabelecida para a nomeação de curadores de interditos art 1775 Nascendo com vida o testamentário defereselhe a sucessão com todos os frutos e rendimentos correspondentes aos bens testados art 1800 3º A primeira condição para alguém titular a capacidade sucessória isto é para ser sucessor é estar vivo quando da abertura da sucessão Só é sucessora assim a pessoa física concebida antes da morte do autor da herança ou legado Em decorrência o nascituro nascendo com vida participa da sucessão A lei admite que pessoa não concebida ao tempo da abertura da sucessão tenha capacidade sucessória se o testador beneficia o filho que alguém pode vir a ter nos dois anos seguintes à sua morte A condição para ser sucessor de estar vivo na hora da morte do autor da herança ou legado diz respeito tanto à sucessão legítima como à testamentária Em relação a esta última porém a lei prevê hipóteses de perda da capacidade sucessória que serão examinadas mais à frente Cap 64 subitem 12 222 Pessoa jurídica A pessoa jurídica só pode suceder em duas hipóteses na herança vacante e na sucessão testamentária A herança é vacante quando se constata não existirem sucessores legítimos ou testamentários Neste caso os bens são destinados ao Estado aqui entendido em seu sentido lato os Estados membros da federação brasileira não são destinatários da herança vacante em nenhuma hipótese Em regra os bens passam à titularidade do Município em que se encontram Se o falecido tinha bens em Municípios diversos cada um recebe os que forem situados imóveis e encontrados móveis no seu território Situandose ou encontrandose bens no Distrito Federal é essa a pessoa jurídica de direito público sucessora Serão por fim destinados à União os bens situados e encontrados nos limites de Território Federal A outra única hipótese de sucessão por pessoa jurídica é a testamentária CC art 1799 II O testador pode deixar bens para pessoas jurídicas de direito público ou privado Se legar em favor da Igreja Católica por exemplo estará beneficiando pessoa jurídica de direito público tendo em vista o estatuto internacional reconhecido ao Vaticano Se testar para pessoa jurídica de direito privado terão capacidade sucessória as sociedades simples ou empresária associações ou fundações Em geral a deixa beneficia associação ou fundação em razão de sua finalidade não econômica mas nada impede que o morto destine seu patrimônio ou bens para uma sociedade anônima por exemplo Para suceder a pessoa jurídica deve ser regularmente constituída Em princípio não pode ser nomeada testamentária uma associação de fato isto é sem os estatutos registrados no Registro Civil de Pessoas Jurídicas Com o objetivo de prestigiar a vontade do testador o juiz excepcionalmente poderá conferir eficácia ao testamento feito em benefício de ações sociais despersonalizadas obras de caridade fundos assistenciais etc desde que a deixa seja modesta e reconheça idoneidade em quem as administra Apenas no caso da fundação atribui a lei capacidade sucessória à pessoa jurídica ainda não regularizada A fundação recordese nasce da afetação de um patrimônio a determinadas finalidades Cap 8 item 73 O instituidor pode separar do seu patrimônio os bens a serem afetados ainda em vida ou estabelecer em testamento a vontade de que isso venha a ocorrer após seu falecimento No primeiro caso ele próprio deve adotar as providências para a regularização da fundação podendo testarlhe outros bens No caso de instituição por testamento porém a regularização da pessoa jurídica testamentária só poderá ser feita evidentemente após a morte do instituidor A fundação instituída em disposição de última vontade é a única hipótese de pessoa jurídica com capacidade sucessória não dependente de prévia regularidade CC art 1799 III A pessoa jurídica é sucessora apenas em duas hipóteses na herança vacante quando os bens do falecido transmitemse ao Município Distrito Federal ou União e na sucessão testamentária quando a pessoa jurídica regular é beneficiada em testamento ou sendo fundação nele instituída 23 Indignidade e deserdação Em duas hipóteses somente a pessoa capaz para suceder não participa da sucessão São as de indignidade e deserdação Não se verificando uma ou outra o titular da capacidade sucessória tem direito à sua parte na herança ou ao legado Será sucessor a menos que renuncie expressamente A indignidade diz respeito a qualquer tipo de sucessão enquanto a deserdação se refere especificamente à dos herdeiros necessários Na primeira a lei estabelece as hipóteses em que a pessoa é excluída da sucessão e a vontade do falecido expressa em testamento ou outro ato autêntico só tem eficácia para reinclusão do indigno Na última é a vontade do morto expressa necessariamente em testamento que importa a exclusão do herdeiro necessário da sucessão Em outros termos a indignidade alcança qualquer tipo de sucessor inclusive os facultativos ao passo que a deserdação exclui da sucessão apenas os herdeiros necessários CC art 1961 Isso é assim porque os herdeiros necessários não podem ser excluídos da sucessão por simples vontade do falecido Se praticaram algum ato que autoriza a deserdação a exclusão poderá ocorrer mas não basta a vontade do autor da sucessão Em relação aos herdeiros facultativos não se há de falar em deserdação porque eles podem ser excluídos da sucessão por simples vontade do falecido expressa em testamento Aliás basta o testador sem herdeiros necessários testar sobre todo o patrimônio beneficiando não parentes para que os colaterais não participem da sucessão As causas que configuram a indignidade são três a autoria coautoria ou participação em homicídio doloso ou tentativa praticado contra o autor da sucessão seu cônjuge companheiro ascendente ou descendente b acusação caluniosa em juízo sacada contra o autor da sucessão seu cônjuge ou companheiro bem como crime contra a honra deles c prática de atos violentos ou fraudulentos com o objetivo de obstar ou inibir o autor da herança de dispor livremente de seus bens por testamento ou outro ato de última vontade CC art 1814 Desse modo o sobrinho que atenta dolosamente contra a vida da companheira do tio difamao ou rasga o testamento particular por ele feito é indigno de sucedêlo As causas da deserdação por sua vez são mais extensas Ela cabe em primeiro lugar em qualquer das hipóteses de conduta indigna acima indicadas Sempre que um herdeiro necessário incorrer em ato indigno ele poderá ser deserdado Aliás por não existirem previsões específicas de causas para deserdação do cônjuge ou companheiro esses só podem ser deserdados nas mesmas hipóteses em que seriam reputados indignos Oliveira 200564 Assim sendo além da deserdação por motivo que autoriza a indignidade o descendente poderá ser deserdado pelo ascendente e este por aquele nos casos de ofensa física injúria grave e desamparo nas graves enfermidades ou alienação mental Assim se a mãe sofre derrame cerebral e passa a precisar do auxílio dos filhos para os mais simples atos do cotidiano e um deles falta ao dever de amparo ele poderá ser deserdado Do mesmo modo se o filho ao sofrer doença mental não for ajudado pelo pai haverá fundamento para a deserdação deste na sucessão daquele Também são causas para a deserdação as relações sexuais entre o descendente e o cônjuge do ascendente madrasta ou padrasto do primeiro assim como as do ascendente e o cônjuge do descendente quando revestidas de ilicitude isto é caracterizarem adultério CC arts 1962 e 1963 A lei cogita também de relações sexuais ilícitas com o companheiro do descendente mas essa figura não existe porque o tipo penal do adultério pressupõe o estado de casado e a fidelidade não está listada entre os deveres da união estável A deserdação como se disse fazse por testamento Mas como o deserdado é sempre um herdeiro necessário não basta a vontade do testador A exclusão por deserdação só pode ser feita se realmente tiver ocorrido uma das causas que a autorizam Por isso para ter validade a deserdação o testador deve declarar no testamento expressamente o fato que a motivou CC art 1964 Além disso deve municiar seus herdeiros dos elementos probatórios que tiver às mãos para que possam ter sucesso na ação judicial visando à declaração da exclusão Também por testamento pode o ofendido perdoar o indigno reincluindoo na sucessão Exige se em princípio cláusula expressa de reabilitação para que o indigno ou deserdado volte a participar da sucessão Mas se ao testar em favor do excluído o testador já conhecia a causa da indignidade ou deserdação e mesmo assim tomouo por merecedor do direito sucessório considerase em prestígio à vontade do testador que o reabilitou de forma implícita CC art 1818 parágrafo único O perdão pode igualmente ser dado em outro ato autêntico como um instrumento particular assinado pelo autor da sucessão ou quando for o caso pelo cônjuge ou parente vitimado pela ofensa desde que seja assinado e tenha a firma reconhecida art 1818 São três as hipóteses de exclusão da sucessão renúncia indignidade e deserdação No primeiro caso o herdeiro ou legatário por ato unilateral de vontade abre mão dos direitos sucessórios que titulariza Nos dois outros o excluído sofre uma punição pelos atos que praticou contra a pessoa do autor da sucessão ou os familiares desta Enquanto a indignidade diz respeito a qualquer tipo de sucessão a deserdação limitase à dos herdeiros necessários Tanto a indignidade como a deserdação devem ser objeto de declaração judicial Em geral a declaração provém de demanda movida por quem dela aproveita CC arts 1815 e 1965 O herdeiro deve movêla contra o indigno ou deserdado sendo do autor o ônus de provar o fato que deu ensejo à exclusão Caso não consiga fazer essa prova não se caracteriza a indignidade ou deserdação e o demandado participa da sucessão normalmente Como essas exclusões têm natureza de pena não podem ser impostas senão após o devido processo legal no qual se presume a inocência do réu O prazo decadencial para a propositura dessa ação é de quatro anos contados da abertura da sucessão no caso de indignidade art 1815 parágrafo único ou da abertura do testamento no caso de deserdação art 1965 parágrafo único Numa hipótese contudo também o Ministério Público está legitimado para promover a ação visando a exclusão do herdeiro ou legatário é a de a indignidade ou deserdação em razão da autoria coautoria ou participação em homicídio doloso ou tentativa praticado contra o autor da sucessão seu cônjuge companheiro ascendente ou descendente art 1815 2º A indignidade e a deserdação são hipóteses de exclusão da sucessão com caráter punitivo Reputase que o excluído em razão dos atos que praticou em prejuízo do falecido não merece participar da destinação dos bens deste Ao contrário da renúncia à herança ou legado que também implica exclusão da sucessão a indignidade e a deserdação são penas impostas ao indigno ou deserdado Disso decorre uma importantíssima consequência como a pena não pode ultrapassar a pessoa do agente culpado os descendentes do excluído por indignidade ou deserdação não são prejudicados com a exclusão Ao contrário participam da sucessão como se o indigno ou o deserdado estivesse morto o art 1816 do CC menciona apenas a figura da deserdação mas é aplicável por analogia à exclusão por indignidade Oliveira 200576 Imagine então que Irene tinha duas filhas Juliana e Lúcia e duas netas Maria e Natália Maria era filha de Juliana Natália de Lúcia Para simplificar são elas as únicas familiares vivas de Irene Pois bem conforme se examinará melhor à frente os descendentes de menor grau têm preferência sobre os de maior grau Quer dizer morrendo Irene seu patrimônio será destinado metade à Juliana e metade à Lúcia Maria e Natália não são sucessoras de Irene porque suas mães estavam vivas na abertura da sucessão Pois bem se Lúcia renunciar à sua parte na herança todo o patrimônio será destinado a Juliana e na morte desta a Maria Natália por assim dizer será prejudicada pela renúncia de Lúcia porque a exclusão da sucessão decorreu aqui de ato de vontade da excluída Mas se Lúcia não renunciou mas foi excluída por indignidade ou deserdada a sucessão de Irene será diferente Nesse caso metade do patrimônio será destinado a Juliana filha e a outra metade a Natália neta Como a indignidade e deserdação são penas impostas a Lúcia não podem seus efeitos ultrapassar a pessoa dela Natália sucede Irene como se Lúcia estivesse morta O excluído da sucessão por indignidade ou deserdação não pode se beneficiar de nenhuma maneira dos bens que herdaria se não tivesse incorrido em conduta condenável Desse modo não tem direito ao usufruto ou administração dos bens herdados por seus descendentes nem pode sucedêlos em tais bens CC art 1816 parágrafo único No exemplo acima se Natália vier a falecer sem outros familiares sucessíveis os bens herdados de Irene serão transmitidos a Juliana colateral e somente os seus demais bens caberão a Lúcia ascendente 24 Sucessor aparente Enquanto não é declarada por sentença a indignidade o demandado é sucessor Se não tiver sido expedida pelo juiz nenhuma ordem cautelar para sustar a partilha bens do falecido podem ser destinados ao indigno Se posteriormente a ação judicial de declaração de indignidade é julgada procedente o excluído da sucessão deve restituir os bens recebidos para que sejam objeto de nova partilha entre os sucessores legitimados Junto com os bens deve restituir também os frutos e rendimentos que houver percebido O excluído terá contudo direito à indenização pelas despesas com a conservação dos bens restituídos CC art 1817 parágrafo único Pode ocorrer no entanto de o indigno alienar alguns ou mesmo todos os bens recebidos na sucessão Esses atos de alienação serão válidos quando tiverem sido onerosos se o adquirente estava de boafé A aparência da licitude e regularidade do negócio de alienação preserva sua validade e eficácia O alienante é um sucessor aparente e quem de boafé entabula negociações com ele não pode ser prejudicado Os herdeiros legitimados não poderão reclamar do adquirente de boafé a restituição dos bens alienados pelo sucessor aparente Para eles restará apenas a alternativa de buscar do indigno as perdas e danos CC art 1817 Regras iguais às estabelecidas pela lei para o excluído por indignidade aplicamse aos demais casos de sucessor aparente Sempre que terceiro de boafé firmar negócio jurídico oneroso com quem se encontrava na condição de sucessor será válida e eficaz a alienação CC art 1827 parágrafo único Desse modo também os atos de alienação onerosa do deserdado enquanto não julgada procedente a ação de deserdação são válidos Outro exemplo se posteriormente à partilha descobrese um testamento até então ignorado devese rever a partilha para aquinhoar o novo testamentário com a parte que lhe foi destinada pelo testador São sucessores aparentes os herdeiros que até a revisão da partilha dispuseram dos bens recebidos Mais um exemplo o falecido nomeou por testamento um amigo como seu herdeiro universal por acreditar que não tinha sucessores necessários mas em seguida ao encerramento do inventário foi proposta ação de reconhecimento de paternidade contra o sucessor em razão da qual se rompeu a deixa testamentária Cap 64 subitem 24 Se antes do julgamento dessa ação o testamentário havia alienado onerosamente alguns ou todos os bens recebidos por herança ele será considerado sucessor aparente Quer dizer nesses três casos aventados assim como em qualquer outro de aparência de sucessão a alienação em favor do terceiro de boafé vale mas o sucessor aparente deve indenizar o verdadeiro titular do direito sucessório pelas perdas e danos correspondentes Sucessor aparente é aquele que durante algum tempo parecia ser o legítimo titular de direito sucessório em razão do que praticou atos de alienação onerosa de um ou mais bens recebidos na sucessão Esse ato de disposição é válido quando o adquirente era terceiro de boa fé mas o sucessor aparente deve indenizar os verdadeiros titulares do direito sucessório pelos danos decorrentes Claro está que a boafé do adquirente é condição indispensável para a validade do negócio de alienação praticado pelo sucessor aparente Se aquele tinha conhecimento da preterição na partilha de outros titulares do direito sucessórios ficará obrigado a restituir a estes o bem adquirido 3 Herança Os bens do patrimônio de pessoa falecida compõem a herança Ela é titulada pelos herdeiros legítimos e testamentários tão logo aberta a sucessão CC art 1784 Isto é no instante imediato ao da morte a herança passa a pertencer aos herdeiros Estabelecese entre eles um condomínio regido em parte por normas próprias do direito das sucessões Note que os legatários não participam desse condomínio mas apenas os herdeiros note ademais que tanto os herdeiros legítimos como os testamentários são condôminos da herança tão logo se abra a sucessão Os herdeiros devem providenciar o inventário que em regra será um processo judicial Apenas quando o falecido não deixou testamento e não há interessado incapaz CPC art 610 ele poderá ser extrajudicial celebrado mediante escritura pública Judicial ou extrajudicial o inventário é indispensável ao desfazimento do condomínio instituído entre os herdeiros pela morte do autor da herança Por vezes em função da lei processual o processo de inventário em juízo tem denominação diversa arrolamento mas aqui para simplificar farei menção à medida judicial de dissolução do condomínio sobre a herança sempre pela expressão inventário Pois bem não se confunde a abertura da sucessão com a do inventário enquanto a primeira se verifica no instante da morte do autor da herança a deste último depende do ajuizamento do processo pelos herdeiros ou quando possível da lavratura da escritura pública Enquanto a abertura da sucessão institui um condomínio entre os herdeiros sobre a herança a do inventário objetiva desconstituílo O prazo para a abertura do inventário ou celebração da escritura pública é de 2 meses seguintes ao do falecimento CPC art 611 mas a sua inobservância acarreta apenas eventuais efeitos de ordem tributária como multa sobre o valor do imposto de transmissão Ninguém deixa de ser herdeiro ou herda menos porque atrasou no ajuizamento desse processo judicial ou não providenciou podendo a escritura de inventário No transcorrer do inventário serão apuradas e pagas as dívidas deixadas pelo de cujus com recursos da herança Além disso havendo sucessor legatário os herdeiros têm a obrigação de destacar o legado da herança para lhe entregar Por fim comprovado o pagamento do imposto de transmissão igualmente com recursos da herança procedese à partilha do acervo remanescente entre os herdeiros legítimos ou testamentários desfazendose assim o condomínio Com a partilha cada herdeiro passa a titular o bem que lhe foi destinado Aberta a sucessão o patrimônio do falecido que compõe a herança transmitese de imediato à titularidade dos seus herdeiros legítimos ou testamentários Instituise entre eles um condomínio regido em parte pelas normas do direito das sucessões Nos trinta dias seguintes ao falecimento os herdeiros devem providenciar o ajuizamento da ação destinada a dissolver o condomínio entre eles que se chama inventário por vezes arrolamento a menos que prefiram proceder à sua dissolução por escritura pública quando permitida isto é se inexistir testamento ou interessado incapaz A regra adotada pelo direito brasileiro relativamente à regência da sucessão causa mortis é a do domicílio do defunto LINDB art 10 Assim morrendo brasileiro domiciliado no exterior será a lei do país em que domiciliava que definirá a quem deve ser atribuída a herança os requisitos de validade do testamento impostos incidentes etc Duas exceções a essa regra são porém estabelecidas Primeira aplicase a lei brasileira no tocante à sucessão dos bens situados no Brasil sempre que ela for mais favorável ao cônjuge ou filho brasileiro do que a lei pessoal do falecido LINDB art 10 1º CF art 5º XXXI Se por exemplo morre um cidadão espanhol com filhos espanhóis casado em segundas núpcias com uma brasileira e que tinha em seu patrimônio imóvel situado no Rio de Janeiro a transmissão desse bem seguirá a lei brasileira Isto porque ela é mais favorável à viúva do que a espanhola Enquanto entre nós o cônjuge concorre com os filhos do falecido na Espanha ele nada herda se há descendentes vivos cf Oliveira 20054243 Segunda a capacidade para suceder regese pela lei do domicílio do herdeiro ou legatário LINDB art 10 2º Desse modo qualquer que seja a localização do bem ou o domicílio do defunto o herdeiro ou legatário domiciliado no Brasil só sucede se estiverem preenchidas as condições de capacidade sucessória da nossa lei subitem 221 Aplicandose a lei brasileira considerase aberta a sucessão no lugar do último domicílio do falecido CC art 1785 O lugar da abertura da sucessão contudo tem implicações de ordem meramente processual na definição da competência jurisdicional para processamento do inventário em nada afetando os direitos sucessórios 31 Condomínio entre os herdeiros A herança transmitese como um todo unitário mesmo que haja mais de um herdeiro Enquanto não se concluir a partilha a propriedade e posse da herança serão exercidas pelos herdeiros na qualidade de cotitulares do patrimônio deixado pelo morto CC art 1791 e parágrafo único Aplicamse às relações entre os herdeiros e as destes com terceiros durante a tramitação do inventário as normas concernentes ao condomínio exceto quando há preceito próprio do direito das sucessões a tratar da matéria Desse modo por exemplo qualquer um dos herdeiros está legitimado para a ação possessória caso a posse de bem da herança seja ameaçada turbada ou esbulhada também está legitimado para reivindicar de terceiro o bem herdado pode finalmente exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão como usar os bens da herança desde que seu uso não exclua o dos demais herdeiros art 1314 Por outro lado nenhum deles pode alterar a destinação dos bens herdados sem consentimento dos demais nem ceder a posse uso ou gozo deles a terceiros estranhos à sucessão art 1314 parágrafo único O condomínio instituído entre os herdeiros sobre a herança deve ser administrado como qualquer outro conjunto de bens sujeito à copropriedade A administração segue regras específicas do direito das sucessões Ela cabe ao inventariante nomeado pelo juiz Até a assinatura do compromisso de inventariante a administração da herança é de responsabilidade do cônjuge ou companheiro Se estivessem separados de fato do falecido ou não tendo este qualquer vínculo de conjugalidade administrará a herança até a investidura do inventariante o herdeiro que se encontrar na posse e administração dos bens havendo mais de um herdeiro nessa condição o mais velho deles será o administrador provisório Não havendo herdeiros a administração caberá ao testamenteiro ou a pessoa de confiança do juiz CC art 1797 Os herdeiros não são obrigados a concorrer com as despesas de administração da herança ao contrário dos condôminos em geral relativamente à manutenção do bem condominial Como os herdeiros não têm nenhuma responsabilidade por encargos superiores às forças da herança CC art 1792 concluise que as despesas com a administração desta correm exclusivamente por conta dos seus próprios recursos Se necessário assim o juiz deve autorizar o inventariante a vender um ou mais bens do espólio para atender às despesas de administração da herança Entre a abertura da sucessão e a partilha os bens do patrimônio do falido compõem um condomínio indiviso denominado herança Os herdeiros são condôminos e as relações entre eles regemse pelos preceitos da propriedade condominial exceto quando norma do direito das sucessões dispuser sobre o assunto 32 Cessão de herança ou de quota hereditária A herança de pessoa viva não pode ser objeto de contrato CC art 426 A proibição cujas origens se enraízam no direito romano justificase por uma questão moral Em qualquer negócio quem contrata só obtém a vantagem pretendida com a execução do contrato Se a herança de pessoa viva pudesse ser objeto de negócio contratual aos contratantes passaria a interessar a morte de alguém Como uma das partes forçosamente deve ser um herdeiro potencial o contrato dessa natureza o levaria a torcer pelo falecimento do familiar cuja herança negociou Para evitar essa tentação imoral a lei fulmina com a nulidade qualquer pacto sucessório ou seja qualquer ajuste sobre herança de pessoa viva Monteiro 200313 Em alguns direitos admitese restritivamente o contrato referente a herança de quem ainda vive Em Portugal ele é válido quando feito pelos cônjuges ou por terceiros em favor deles no pacto antenupcial Fernandes 2001523533 Mas nada obsta o contrato cujo objeto seja a herança de pessoa já morta Com a abertura da sucessão o herdeiro tornase condômino do patrimônio do falecido e portanto passa a titular uma parte ideal da propriedade dos bens correspondentes Como qualquer outro proprietário pode usar fruir e dispor de sua propriedade Note porém que o coerdeiro não tem como transferir direitos sobre nenhum bem específico do patrimônio objeto de inventário Não se sabe antes da partilha a quem caberá cada bem inventariado Após a partilha já não há mais condomínio entre os herdeiros A rigor não há mais herança Cada um recebe os bens com que foi aquinhoado e pode vendêlos como a generalidade dos proprietários Mas enquanto existir o condomínio hereditário a indivisibilidade é da essência do instituto O que cada herdeiro pode ceder assim são direitos sucessórios e não bens singulares ou parte deles Por tais motivos é ineficaz a cessão feita pelo coerdeiro de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente CC art 1793 2º Apenas na hipótese de existir um único herdeiro universal caberá a cessão singular de direitos hereditários referentes a bens determinados Mas como antes da adjudicação dos bens em favor do único herdeiro devese proceder à liquidação com o pagamento de credores do falecido das despesas do processo e impostos sobre a transmissão esse negócio jurídico depende da prévia autorização do juiz da sucessão sob pena de ineficácia 3º A cessão de herança ou parte dela fazse necessariamente por escritura pública CC art 1793 porque o direito à sucessão aberta classificase como bem imóvel art 80 II Interpretamse restritivamente as cláusulas desse negócio jurídico Se alguém ceder todos os seus direitos numa determinada sucessão e posteriormente tiver sua quota hereditária aumentada em razão de substituição ou direito de acrescer Cap 64 item 5 reputase não cedida a parcela acrescida art 1793 1º Outra particularidade da cessão de quotas hereditárias diz respeito ao direito de preferência titulado pelos coerdeiros Exatamente porque entre a abertura da sucessão e a partilha existe um condomínio indiviso entre os herdeiros nenhum deles pode ceder sua quota hereditária a pessoa estranha à sucessão sem antes oferecêla aos demais em igualdade de preços e condições CC arts 504 e 1794 Se numa sucessão são herdeiros os três filhos do morto e um deles quer ceder sua quota poderá fazêlo livremente se o cessionário for um dos outros irmãos Mas se pretender cedêla a quem não participa do condomínio hereditário está obrigado antes a consultar seus irmãos informando o preço e condições oferecidas pela quota Se pelo menos um deles manifestar interesse terá o direito de adquirila pagando igual preço e nas mesmas condições O coerdeiro que não tiver o direito de preferência respeitado pode nos cento e oitenta dias após a transmissão depositar o preço em juízo e obter para si a quota cedida Rateiase proporcionalmente essa quota entre os depositantes na hipótese de mais de um coerdeiro exercer o direito de preferência CC art 1795 parágrafo único A cessão de herança ou quota hereditária é lícita após a abertura da sucessão Depende de escritura pública em vista de sua natureza de bem imóvel e havendo coerdeiros deve ser respeitado o direito de preferência quando o potencial cessionário for pessoa estranha à sucessão 33 Aceitação e renúncia da herança Em França surgiu a noção posteriormente espalhada por todos os países de tradição jurídica românica de que os herdeiros se investem na propriedade e posse dos bens da herança no momento seguinte ao do falecimento do seu autor independentemente de qualquer formalidade ou ordem judicial É o princípio da saisine plenamente incorporado ao direito brasileiro CC art 1784 Não é necessária assim nenhuma aceitação do herdeiro para que se opere sua imediata investidura na propriedade e posse da herança em condomínio com os demais sucessores hereditários Mas a lei prestigia o interesse que um ou outro herdeiro possa ter de não receber os bens deixados pelo falecimento de quem quer que seja Em outras palavras ninguém é obrigado a ser herdeiro portanto de algum modo a aceitação da herança ainda que tácita é condição para a transmissão dos bens causa mortis A saisine importa uma transmissão provisória que se convola em definitiva quando o herdeiro expressamente declara aceitar a herança ou simplesmente pratica atos que demonstram sua concordância em recebêla A aceitação expressa ou tácita do herdeiro faz definitiva a transmissão operada pela abertura da sucessão CC arts 1804 e 1805 O herdeiro é então livre para aceitar ou recusar a herança Mas enquanto a aceitação pode ser implícita a recusa só se admite expressa Para renunciar aos direitos hereditários o herdeiro deve fazer a declaração de vontade nesse sentido por meio de escritura pública ou termo nos autos do processo de inventário CC art 1806 Essa forma é da essência do ato que veiculado por outros meios não terá validade Mas o herdeiro não é livre para aceitar ou recusar a herança em parte Ou a aceita totalmente ou renuncia por completo Do mesmo modo não tem direito de sujeitar a aceitação ou recusa a condição ou termo CC art 1808 Não pode desse modo declarar que aceita desde que outro herdeiro renuncie ou que renuncia enquanto estiver casado Tratase do princípio da indivisibilidade da aceitação ou recusa No passado longínquo quando o herdeiro era responsável pelas dívidas do falecido ainda que superiores às forças da herança esse princípio tinha maior importância porque impedia a frustração dessa responsabilidade Hoje em dia serve apenas para conferir maior segurança às relações jurídicas Note contudo que a indivisibilidade da aceitação ou renúncia não impede que o herdeiro sendo também legatário ou testamentário aceite parte do que a lei e a vontade do morto lhe haviam predestinado O herdeiro que for também legatário tem a faculdade de aceitar sua quota na herança e renunciar ao legado ou o contrário renunciar à herança e aceitar o legado CC art 1808 1º E o herdeiro que o for a mais de um título legítimo e testamentário tem igualmente a faculdade de aceitar a herança por um deles e recusála pelo outro 2º Imagine que uma pessoa é numa sucessão herdeira de 14 da herança e legatária de um automóvel Não transgride o princípio da indivisibilidade da aceitação e renúncia se ela optar por receber apenas seu quarto na herança mas não o automóvel ou viceversa Imagine agora que essa pessoa seja herdeira legítima e testamentária numa mesma sucessão por ser familiar sucessível do defunto e ter sido aquinhoada por ele em testamento com uma quotaparte da herança Também aqui essa pessoa pode optar se aceita a herança pelos dois títulos se a recusa pelos dois ou se a aceita por um e recusa pelo outro A aceitação e a renúncia são irrevogáveis CC art 1812 Mesmo a aceitação tácita manifestada por conduta incompatível com a recusa não pode ser revogada pelo herdeiro Por isso a lei se preocupa em aclarar que determinados atos não exprimem a aceitação tais como o de providenciar o funeral do finado adotar providências para a conservação dos bens proverlhes a guarda provisória Também não configura aceitação a cessão gratuita e incondicional da herança a outros coerdeiros declaração que a rigor tem efeitos idênticos aos da renúncia art 1805 1º e 2º A renúncia implica exclusão do herdeiro mas ao contrário do que se verifica em relação à indignidade e deserdação os sucessores do renunciante não têm o direito de representálo na sucessão Na exclusão do indigno e do deserdado como se viu aplicase uma sanção ao excluído que tem caráter personalíssimo e não pode afetar os interesses de outras pessoas inclusive os seus sucessores Por isso eles são chamados a exercer o direito de representação sucedendo como se o excluído estivesse morto No caso da renúncia não há punição Ao contrário é o próprio excluído que por sua vontade vê interesse em se alhear da sucessão Aqui os seus sucessores são afetados pelo ato de exclusão e não terão o direito de representação Como esclarece a lei serão sucessores apenas se o renunciante era o único herdeiro ou se todos os outros também renunciaram à herança Nesse caso entretanto os sucessores herdam por direito próprio e por cabeça e não por representação CC art 1811 Confira Imagine que Nair deixou ao falecer dois filhos Orlando e Pedro o primeiro com um filho Quirino e o último com dois Rubens e Saulo Mais uma vez para simplificar não há outros familiares sucessíveis nem Nair deixou testamento Orlando e Pedro são descendentes de primeiro grau enquanto Quirino Rubens e Saulo de segundo grau Pois bem se Pedro for excluído por indignidade ou deserdado os filhos dele o representam na sucessão Nesse caso metade da herança vai para Orlando e a outra metade é dividida entre Rubens e Saulo ficando cada um deles com um quarto Mas se Pedro renuncia a totalidade da herança é de Orlando o descendente do mesmo grau CC art 1810 Em caso de exclusão por renúncia os netos de Nair só serão sucessores se os dois filhos renunciarem Nesse caso contudo Quirino Rubens e Saulo herdarão um terço da herança cada já que exercem direito sucessório próprio e não por representação quer dizer sucedem por cabeça e não por estirpe Se o herdeiro não quer a herança mas também deseja preservar os interesses de seus sucessores ele deve aceitála e após a partilha transmitirlhe os bens recebidos por meio de negócio inter vivos doação Ninguém é obrigado a ser herdeiro contra a sua vontade Por isso a aceitação é pressuposto da transmissão definitiva da herança Ela pode ser expressa ou tácita decorrendo nesse último caso de conduta incompatível com a recusa da herança A renúncia por sua vez só pode ser expressa e depende para valer de escritura pública ou termo judicial Por fim a renúncia não pode prejudicar os credores do renunciante Se o herdeiro está insolvente a herança que vier a receber propiciará o pagamento de suas dívidas Têm assim os credores todo o interesse em que o devedor aceite sua parte na sucessão Aliás eles podem requerer ao juiz do inventário que assinale prazo para o herdeiro devedor declarar se aceita ou não a herança presumindose a aceitação no caso de silêncio CC art 1807 De qualquer modo perante o credor do renunciante a renúncia não produz nenhum efeito Ele titula em decorrência o direito de aceitar a herança em nome do herdeiro que renunciou art 1813 habilitandose no inventário nos trinta dias seguintes ao conhecimento da renúncia 1º Note contudo que perante os demais coerdeiros a renúncia continua válida e plenamente eficaz Quer dizer uma vez pagos os credores do renunciante o que sobrar de sua quota hereditária não lhe será destinado mas sim aos coerdeiros 2º 34 Petição de herança A petição de herança é a ação judicial que o verdadeiro herdeiro pode mover contra o aparente ou o possuidor para ver respeitados seus direitos sucessórios A petição de herança é cabível sempre que o bem de pessoa falecida tiver sido transmitido ou estiver em vias de o ser para pessoa que não titularizava o direito de o receber ou estiver indevidamente na posse de quem não ostenta a condição de sucessor É o que prescreve o art 1824 do CC O herdeiro pode em ação de petição de herança demandar o reconhecimento de seu direito sucessório para obter a restituição da herança ou de parte dela contra quem na qualidade de herdeiro ou mesmo sem título a possua Cito três exemplos O filho havido fora do casamento que não foi reconhecido pelo genitor pode mover a ação de reconhecimento de paternidade enquanto viver CC art 1606 Se o fizer depois do falecimento do genitor de modo mais preciso depois da partilha demandará os sucessores aos quais tiver sido transmitida a herança Evidentemente esse filho não participou da sucessão porque ainda não tinha título de familiar sucessível a legitimar sua participação Vindo a ser julgada procedente a ação de reconhecimento de paternidade no entanto poderá reivindicar dos sucessores sua quota hereditária se os sucessores eram descendentes de primeiro grau ou seus representantes ou familiar concorrente ou mesmo toda a herança se os sucessores eram ascendentes ou colaterais do falecido Essa reivindicação fazse por petição de herança que pode ser cumulada com a ação de reconhecimento de paternidade ou sucedêla Notese contudo que é imprescritível a ação de reconhecimento mas não a petição de herança Súmula 149 do STF a pretensão relativamente a essa última prescreve em 10 anos contados da abertura da sucessão art 205 Também tem direito à petição de herança o herdeiro testamentário quando o testamento que o beneficia era desconhecido ao tempo da abertura da sucessão e foi descoberto após a conclusão da partilha Imaginavase que o autor da herança morrera ab intestato mas na verdade ele havia testado para uma certa pessoa quota de seu patrimônio ou quando admissível a totalidade deste Aqui o testamentário deve mover a petição de herança contra os herdeiros aparentes e deles haver a restituição do que lhe cabe por direito sucessório Evidentemente salvo no caso de o testamentário ter sido nomeado herdeiro universal será ineficaz a partilha que deve ser totalmente refeita para que não seja prejudicado apenas o herdeiro demandado Outra observação útil nesse passo é a de que o legatário não faz jus à petição de herança que sempre tem por objeto uma universalidade ainda que composta por quotaparte do patrimônio do morto Ele exerce seus direitos cobrando em juízo a entrega do legado contra o sucessor ou espólio obrigado a prestálo Por fim também cabe a petição de herança contra quem não ostentava o título de sucessor mas era mero possuidor do bem O herdeiro agindo individualmente não tem ação petitória ou possessória nesse caso as quais são manejáveis pelo espólio Se o inventariante não promove a medida judicial necessária à proteção dos interesses do condomínio hereditário o herdeiro pode demandar o possuidor da herança ou de parte dela por meio dessa ação O possuidor está obrigado à restituição dos bens do acervo e terá a responsabilidade regida pelos preceitos do direito das coisas CC art 1826 Quer dizer se estava de boafé poderá reter as benfeitorias úteis e necessárias até ser indenizado por elas terá direito aos frutos percebidos etc já o de máfé terá o direito à indenização apenas pelas benfeitorias necessárias mas não poderá retêlas respondendo pela perda ou deterioração da coisa ainda que acidentais etc arts 1214 a 1222 Note porém que a boafé quando existente cessa com a citação na petição de herança art 1826 parágrafo único A petição de herança em geral é cabível depois de concluída a partilha porque antes dela quem se considera sucessor e não foi relacionado pelo inventariante como tal deve na verdade pleitear sua admissão no inventário Não tem legitimidade para a petição de herança nesse momento porque a lei lhe confere a alternativa da admissão no inventário Pode ocorrer de o juiz diante da complexidade dos fatos determinar a sustação do pedido de admissão e remeter as partes para as vias ordinárias Somente nessa hipótese a petição de herança poderá ser ajuizada pelo herdeiro preterido anteriormente à partilha mas estará legitimado por ter tentado antes ser desta edição 2020 admitido no processo de inventário CPC art 628 Um só herdeiro pode intentar a petição de herança para buscar a restituição desta ainda que outros coerdeiros também tenham sido preteridos CC art 1826 Tratase de previsão legal consentânea com a natureza de condomínio de que se reveste a herança Como no condomínio geral qualquer condômino pode isoladamente reclamar a coisa comum de terceiro art 1314 também o coerdeiro pode ingressar com a petição de herança sem o concurso dos demais A petição de herança é a ação destinada ao reconhecimento de direito sucessório e a restituição da herança a quem o titularizava mas foi preterido na partilha Se os bens que compõem o acervo hereditário objeto de restituição não se encontram mais na titularidade e posse daquele a quem foi destinado na partilha o herdeiro poderá reivindicálos em princípio de terceiros A menos como já se mencionou subitem 24 se tiverem sido alienados por herdeiro aparente a pessoa de boafé CC art 1827 e parágrafo único Por fim não pode ser movida a petição de herança contra o herdeiro aparente que de boafé pagou um legado com o objetivo de ver o bem correspondente restituído ao acervo hereditário Nesse caso a petição de herança deve ser promovida contra o legatário CC art 1828 35 Herança jacente e herança vacante Quando não se apresentam sucessores legítimos ou testamentários o patrimônio do falecido é considerado jacente Quer dizer ficará sob a guarda e administração de um curador nomeado pelo juiz à espera de sucessores No processo de inventário expedemse editais chamandoos Decorrido um ano sem que apareçam titulares de direito sucessório declarase a herança vacante Também se declara desde logo a vacância se todos os herdeiros chamados a suceder renunciarem à herança CC arts 1819 1820 e 1823 São duas situações diferentes portanto a jacência e a vacância de herança Herança jacente é a que aguarda a habilitação de sucessores vacante a que remanesce sem titular depois de um ano dos editais convocando os sucessores à habilitação Depois de decorridos cinco anos da declaração de vacância os bens do falecido passam ao patrimônio público Nesse período mesmo declarada a vacância da herança alguns dos familiares sucessíveis ainda podem se habilitar para exercer seus direitos hereditários Somente os parentes colaterais perdem o direito sucessório se não promoveram a habilitação durante a fase de jacência CC art 1822 e parágrafo único Como já referido anteriormente os bens do acervo hereditário na hipótese de herança vacante são destinados ao Município em que se situam quando imóveis ou forem encontrados quando móveis Situados ou encontrados no Distrito Federal a ele serão destinados São por fim da União os bens situados ou encontrados em Território Federal CC art 1844 2020 02 13 PÁGINA RB91 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES CAPÍTULO 63 SUCESSÃO LEGÍTIMA Capítulo 63 Sucessão Legítima 1 Vocação hereditária Quando falece alguém sem testamento caduca o testamento deixado ou declarase sua invalidade os bens do patrimônio do falecido são destinados exclusivamente aos herdeiros legítimos isto é seus familiares indicados na lei CC art 1788 O chamamento à sucessão dos sucessores legítimos obedece a uma ordem de classificação Os familiares acomodados numa determinada classe têm preferência sobre os de ordem posterior e cedem lugar aos da classe anterior a menos obviamente que se encontrem nos extremos da classificação Estruturalmente falando são chamados a suceder os sucessores da primeira classe não existindo chamamse os da segunda classe se não existirem sucessores desta também os da terceira classe são convocados e assim por diante É bastante complexa a classificação dos familiares sucessíveis Sua compreensão demanda muita atenção e concentração do estudioso até mesmo porque a lei por vezes é mal redigida o que dificulta sua exegese Além do mais conforme se detalhará mais à frente parte dos preceitos sobre a vocação hereditária está viciada por inconstitucionalidade por desconsiderar o tratamento isonômico das famílias constitucionais o que torna ainda mais complexa a matéria subitem 25 Pois bem começo por transcrever a ordem de vocação hereditária disposta no art 1829 do CC Por esse dispositivo encontramse na primeira classe de familiares sucessíveis os descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal ou no da separação obrigatória de bens e salvo se no regime da comunhão parcial o autor da herança não houver deixado bens particulares inciso I Na segunda classe acomodamse os ascendentes em concorrência com o cônjuge inciso II O familiar sucessível de terceira classe segundo esse dispositivo é o cônjuge sobrevivente inciso III E a quarta e última classe alberga os parentes colaterais até o quarto grau inciso IV Código Civil Art 1829 A sucessão legítima deferese na ordem seguinte I aos descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal ou no da separação obrigatória de bens art 1640 parágrafo único ou se no regime da comunhão parcial o autor da herança não houver deixado bens particulares II aos ascendentes em concorrência com o cônjuge III ao cônjuge sobrevivente IV aos colaterais Mas não é suficiente considerar o disposto no art 1829 do CC para compreender em toda sua complexidade a ordem de vocação hereditária Os dispositivos que o seguem estabelecem uma série de regras que leva em conta a diversidade de grau direito de representação sucessão por cabeça ou por estirpe sucessão por linha e preferências internas à classe além de critérios para distribuição da herança entre familiares concorrentes No emaranhado da questão a melhor alternativa didática não é a de examinar como se opera a sucessão em cada classe mas sim tratar dos direitos sucessórios de cada familiar sucessível em separado começando pelo cônjuge e companheiro item 2 e na sequência tratando dos descendentes ascendentes e colaterais itens 3 a 5 2 O cônjuge ou companheiro como sucessor Quem se debruça sobre a história do direito das sucessões percebe sem dificuldade que ao longo do tempo a mudança mais significativa na vocação hereditária tem sido a da constante valorização do cônjuge Wald 200266 A cada alteração substancial na lei esse familiar ganha maior participação na sucessão No direito brasileiro a valorização do cônjuge na ordem de vocação hereditária descreve a seguinte trajetória até 1907 sucedia em quarto lugar depois dos parentes colaterais até o décimo grau isto é depois de tiosbisavôs sobrinhosbisnetos e primos longínquos naquele ano com a Lei Feliciano Pena o cônjuge passou a ter preferência sobre os colaterais o Código Beviláqua em 1916 não alterou essa ordem mantendo o cônjuge na terceira classe atrás dos filhos e não os havendo dos pais do falecido Beviláqua 1898181192 o Código Reale em 2003 promoveuo à primeira e segunda classe de familiares sucessíveis em concorrência respectivamente com os descendentes e ascendentes A valorização do cônjuge é visível também em direitos estrangeiros Ao longo do século passado na Itália Portugal Argentina e Alemanha por exemplo o cônjuge passou a participar da sucessão concorrendo com os descendentes e ascendentes É certo que em alguns direitos como no francês ele ainda está em quarto lugar na ordem de vocação depois dos irmãos do falecido Oliveira 20053839 mas isso não representa a tendência manifestada pela maioria dos direitos de filiação romanogermânica Essa tendência que em minha opinião ainda não se esgotou é inteiramente justificável Para a formação do patrimônio do defunto a contribuição do cônjuge é indiscutivelmente a mais consistente quando contraposta à dos descendentes que a rigor pouco ou nada contribuem só se beneficiam do acervo acumulado pelos pais e ascendentes vivos Se no passado a manutenção da riqueza de uma família nas mãos dos parentes de sangue era um valor corrente compatível com a organização da produção na Antiguidade e no feudalismo e também com a necessidade de acumulação econômica do início do capitalismo hoje em dia perdeu o sentido por completo tanto no plano axiológico como no racional O disposto no art 1830 do CC reforça o argumento de que o móvel do incremento da participação do cônjuge na sucessão legítima ligase à contribuição dada por ele ao patrimônio objeto de sucessão Segundo esse preceito o cônjuge sobrevivente não titula nenhum direito sucessório se ao tempo da abertura da sucessão estava separado judicialmente do falecido ou se estava separado de fato há mais de dois anos salvo nesse último caso se a convivência se tornara impossível por culpa do falecido Para ser considerado familiar sucessível portanto o cônjuge deve estar ainda numa situação jurídica em que a contribuição para a construção e manutenção do patrimônio do de cujus seja factível Se estava separado judicialmente deste nenhuma contribuição ao patrimônio dele havia como ser dada Igualmente seria uma abstração vazia a ideia de ajuda partida de cônjuge já separado de fato há dois anos ou mais Claro que no caso da separação de fato a lei paga tributo uma vez mais à vetusta noção de culpa pela insuportabilidade da vida em comum com o objetivo de preservar o cônjuge inocente de qualquer prejuízo Assim mesmo que a separação de fato perdure há mais de dois anos o cônjuge continua familiar sucessível e portanto titular de direitos sucessórios na ordem de vocação hereditária quando não tiver sido dele a culpa pela ruptura da convivência O cônjuge teve valorizada a sua participação na ordem de vocação hereditária com a entrada em vigor do Código Reale Passou a concorrer com os descendentes e ascendentes do falecido além de herdar a totalidade da herança quando inexistentes esses familiares sucessíveis Mas para ser sucessor o cônjuge deve estar convivendo com o falecido na data da abertura da sucessão Se estavam separados judicialmente o sobrevivente não tem nenhum direito sucessório Se estavam separados de fato há mais de dois anos para ser sucessor do falecido o cônjuge supérstite não pode ter sido o culpado pelo rompimento da convivência Em relação ao companheiro não se pode negar que no plano da contribuição para a construção do patrimônio do falecido encontrase em pé de absoluta igualdade com o cônjuge A mesmíssima contribuição que se presume seja dada por um cônjuge também provém daquele que convive em regime de união estável Não há diferença nenhuma sob o ponto de vista da maior ou menor importância da contribuição para a construção e manutenção do patrimônio de alguém se a relação de conjugalidade em que está envolvido fundase no matrimônio ou na convivência duradoura pública e destinada à constituição de família Cônjuge e companheiro contribuem igualmente para o implemento do patrimônio da pessoa à qual estão vinculados Desse modo se o cônjuge tem se beneficiado de uma inegável valorização em sua posição na ordem de vocação hereditária em função do reconhecimento de sua maior contribuição para a formação do patrimônio a partilhar é inconcebível que o companheiro não possa desfrutar de igual promoção Seria uma odiosa discriminação O direito das sucessões portanto não pode diferenciar o cônjuge e o companheiro na definição das preferências e quinhões sucessórios Ambos devem receber da lei tratamento idêntico porque não existem razões que possam justificar qualquer vantagem ou desvantagem para um ou outro no momento da destinação dos bens do falecido com quem mantinham relação de conjugalidade O Código Civil no entanto tratou diferentemente a família fundada no matrimônio e a constituída por união estável Discriminouas conferindo mais vantagem ora ao cônjuge ora ao convivente Ao fazêlo incorreu em inconstitucionalidades que precisam ser consertadas pela tecnologia jurídica e pela jurisprudência Mas é oportuno caminhar com vagar pelos caminhos tortuosos das normas legais sobre vocação hereditária Antes de tratar das inconstitucionalidades já reconhecidas pelo STF e seus desdobramentos subitem 25 convém abstraílos e considerar a literalidade das disposições do Código Reale 21 Concorrência com os descendentes Cônjuge e companheiro concorrem como sucessores com os descendentes na primeira classe da ordem de vocação hereditária Mas de acordo com o preceituado no plano da lei ordinária com abstração por enquanto dos preceitos constitucionais eles não concorrem segundo iguais critérios Por isso convém primeiro examinar o concurso do cônjuge com os descendentes subitem 211 e depois o do companheiro subitem 212 211 Concorrência do cônjuge com os descendentes A concorrência do cônjuge do falecido com os descendentes deste é uma das questões mais discutidas pela doutrina civilista após a entrada em vigor do Código Reale Hironaka 2003213229 200489104 Oliveira 200581186 Leite 2003209243 Não somente porque representou uma inovação significativa no direito das sucessões mas também em razão do pouco cuidado que revelou ter o redator do texto normativo relativamente à complexidade do tema dificultando sua intelecção As regras de concorrência do cônjuge e os descendentes do falecido variam segundo dois fatores De um lado o regime de bens do casamento Dependendo do regime patrimonial adotado pelos cônjuges existe ou não concorrência e mesmo quando existe pode alcançar apenas parte da herança em função ainda do regime patrimonial adotado De outro lado variam as regras da concorrência de acordo com a natureza da descendência deixada pelo falecido Porções diversas da herança são destinadas aos concorrentes quando do concurso participam apenas descendentes comuns todos são filhos do cônjuge e do falecido ou somente descendentes exclusivos todos são filhos do falecido mas nenhum é do cônjuge e no caso de descendência híbrida alguns dos descendentes são comuns e outros exclusivos Em relação ao primeiro fator a lei atribui ou nega a qualidade de concorrente ao cônjuge em função do regime de bens adotado no casamento Desse modo concorrem os cônjuges casados nos regimes de separação facultativa e participação final nos aquestos Os cônjuges casados nos regimes de comunhão universal e de separação obrigatória não concorrem com os descendentes do falecido Em relação aos casados em regime de comunhão parcial haverá concorrência sobre os bens particulares do falecido se este os tiver deixado não os tendo por consequência o concurso não se instala Veja que se está falando da herança deixada pelo falecido e não necessariamente de todo o patrimônio que se encontrava em nome dele Se havia comunhão de bens com o cônjuge antes de se definir o patrimônio objeto de sucessão devese destacar dele a meação do sobrevivente A morte recorde é causa de dissolução da sociedade conjugal CC art 1571 I e esta tem como um de seus efeitos tal como na separação a partilha dos bens dos cônjuges de acordo com o regime patrimonial adotado Para o inventário assim convergem todos os bens em nome dos cônjuges do falecido e do sobrevivente integrantes da comunhão instituída pelo matrimônio Por exemplo se Antonio é casado com Benedita no regime de comunhão universal e possui em seu nome apenas um imóvel para simplificar não deixou dívidas a herança corresponderá à metade desse bem A outra metade é de Benedita por força da meação a que tem direito em razão do regime de bens adotado Se Antonio deixou um filho Carlos este o sucederá na metade do imóvel componente da herança enquanto Benedita ficará com a parte correspondente à sua meação Quando se diz que o cônjuge casado em comunhão universal não concorre com o descendente na herança portanto isso significa que ele não terá na partilha imposta pela dissolução da sociedade conjugal em razão do falecimento do outro cônjuge nada além da sua meação Claro os direitos sucessórios desse cônjuge serão bem diversos se o falecido não tiver deixado descendentes mas disso trato em seguida subitens 22 e 23 A regra estabelecida pelo art 1829 I do CC sobre a concorrência do cônjuge com os descendentes em função do regime de bens não é difícil de se operacionalizar Definido o regime sabese se há ou não concorrência Difícil é entender o critério que teria baseado as escolhas do legislador Ao excluir da concorrência o cônjuge casado em comunhão universal de bens parece considerar que ele por ter já assegurada a meação não ficaria ao desamparo em razão do passamento de seu esposo ou esposa Se é este o valor prestigiado pelo legislador então se compreende igualmente a regra sobre a exclusão da concorrência no caso da comunhão parcial sem bens particulares Claro quando não existem bens particulares os cônjuges casados em comunhão parcial encontramse em situação patrimonial idêntica à dos unidos em regime de comunhão total Mas como entender a distinção entre os regimes de separação obrigatória e facultativa Nos dois casos os cônjuges não titulam o direito à meação e a morte do mais rico deles poderia deixar ao desamparo o outro tanto faz se a separação foi o regime obrigado pela lei ou escolhido pelos nubentes Simplesmente não se conseguem perscrutar as intenções do legislador nalgumas exceções estabelecidas à concorrência O Superior Tribunal de Justiça em vista provavelmente da pouca clareza do critério legal presumindose que exista por vezes tem decidido que nas duas hipóteses de separação inclusive na facultativa não haveria concorrência com os descendentes A insegurança jurídica é patente se não será facilmente compreensível porque o cônjuge na separação obrigatória estava excluído da concorrência menos facilidade há em compreenderse a razão de se estender a exclusão também ao caso de separação facultativa A propósito veja que a remissão do art 1829 I ao parágrafo único do art 1640 não tem nenhum sentido já que a separação obrigatória é tratada no art 1641 todos do CC É um erro material que deve ser desconsiderado na interpretação do preceito Veloso 2002a1648 Na concorrência entre o cônjuge e descendentes do falecido importa considerar em primeiro lugar o regime de bens do casamento Não concorre com os descendentes o cônjuge sobrevivente casado com o falecido em regime de comunhão universal de bens ou separação obrigatória Se o casamento submetiase aos regimes de separação facultativa ou participação final nos aquestos o cônjuge sobrevivente participa da primeira classe de sucessão legítima concorrendo com os descendentes Finalmente se o regime do casamento era o da separação parcial o cônjuge concorrerá apenas na herança representada pelos bens particulares do falecido Se não existiam não haverá concorrência O segundo fator que interfere na extensão do direito sucessório do cônjuge quando concorre com os descendentes diz respeito à natureza da descendência Aqui há quatro hipóteses a considerar para simplificar cuido por enquanto apenas de descendentes do mesmo grau 1ª Quando o falecido deixa até três descendentes o cônjuge concorre por cabeça CC art 1832 primeira parte Isso significa que receberá porção igual às dos descendentes Se o falecido deixou um filho apenas o cônjuge herda metade se deixou dois herda um terço quando são três os descendentes o percentual da herança do cônjuge é um quarto Sendo o número de descendentes igual ou inferior a três é irrelevante se a descendência é comum exclusiva ou híbrida Em qualquer caso a concorrência será por cabeça 2ª Se a descendência do falecido é integrada apenas por filhos exclusivos dele o cônjuge continua herdando por cabeça qualquer que seja o número de descendentes Isto é se o cônjuge não é ascendente de nenhum dos descendentes do de cujus receberá invariavelmente porção igual à deles Se forem quatro os filhos o cônjuge herdará um quinto se forem cinco sua parte na herança será de um sexto e assim por diante 3ª Na situação em que o cônjuge concorre apenas com filhos comuns ou seja descendentes dele e do falecido a lei lhe assegura o direito a uma porção mínima da herança correspondente a um quarto CC art 1832 in fine Desse modo sendo quatro ou mais os filhos comuns ao cônjuge é destinada a quarta parte da herança e os três quartos restantes são divididos entre os descendentes em porções iguais Assim se eram cinco os filhos do casal 25 da herança cabe ao cônjuge e 15 a cada descendente 4ª Finalmente se a concorrência se estabelece entre o cônjuge e descendentes comuns e exclusivos do falecido a inexistência de preceito legal específico desperta na tecnologia jurídica a dúvida acerca do critério a adotar Se incidir a primeira parte do art 1832 do CC a repartição da herança fazse por cabeça sem reserva da quarta parte ao cônjuge mas se aplicada a parte final do mesmo dispositivo a destinação dos bens deve atender inicialmente à porção mínima do cônjuge A solução para a dúvida suscitada pela inexistência de previsão específica da concorrência no caso de descendência híbrida aponta para a regência do tema pela primeira parte do art 1832 do CC Isto é o cônjuge só tem a garantia da porção mínima de um quarto da herança ao concorrer exclusivamente com seus próprios descendentes Quando ele não for ascendente da totalidade dos seus concorrentes não tem aplicação a parte final do dispositivo Hironaka 200496 Oliveira 2005111123 Ao concorrer exclusivamente com descendentes do falecido dos quais também é ascendente o cônjuge tem assegurada a porção mínima da herança correspondente a um quarto Nos casos porém de descendência exclusiva do falecido ou híbrida o cônjuge herda parte idêntica à destinada aos descendentes 212 Concorrência do companheiro com os descendentes A regra atinente à concorrência do companheiro com descendentes do falecido é bem mais simples que a do cônjuge Se concorrer com descendentes comuns terá o direito à parte da herança igual à cabível a cada um deles Assim se da união estável resultaram dois filhos o companheiro herda um terço se resultaram três um quarto etc CC art 1790 I Se a concorrência se estabelece entre o companheiro e descendência exclusiva do falecido a parte da herança que lhe é destinada corresponderá à metade da porção de cada descendente Quer dizer se o companheiro concorre com um filho exclusivo do falecido fará jus a um terço da herança se entra em concurso com dois filhos exclusivos terá direito a um quinto se concorre com três sua quota hereditária será de um sétimo e assim por diante CC art 1790 II Em se estabelecendo o concurso entre o companheiro e a descendência híbrida do falecido filhos comuns e exclusivos novamente não há disposição legal que defina o direito sucessório E mais uma vez devese considerar que a participação mais vantajosa só tem cabimento quando todos os descendentes do companheiro falecido o forem também do sobrevivente isto é quando o convivente concorrer somente com descendentes dos quais for também ascendente terá direito a quota igual à deles se concorrer com descendentes comuns e exclusivos porém receberá apenas a metade do destinado a cada um deles inclusive aos seus Qualquer outra solução levaria à discriminação dos filhos do falecido Oliveira 2005162172 que devem ser tratados de forma isonômica na sucessão para obediência do art 1834 do CC Lembre que se está considerando aqui exclusivamente a parte do patrimônio comum dos conviventes que corresponde à meação do falecido ou aos seus bens particulares A meação correspondente ao direito do companheiro supérstite evidentemente não integra o patrimônio a ser transmitido aos sucessores do falecido e não integra a herança De acordo com o Código Civil o companheiro sobrevivente tem direito à porção idêntica à dos descendentes quando deles for também ascendente e não houver descendência exclusiva do falecido Mas terá direito apenas à metade da parte de cada descendente quando eles forem todos ou em parte exclusivos do companheiro falecido Comparando os direitos de sucessor titulados pelo companheiro com os do cônjuge podese verificar que a lei os tratou de forma discriminatória É certo que não prejudicou um deles somente tendo distribuído entre os dois as desvantagens engendradas ora privilegiando um ora o outro Com ênfase quando se considera a hipótese do companheiro concorrendo com descendentes comuns notase que ele em princípio se encontra numa situação mais vantajosa que o cônjuge Enquanto esse nem sempre concorre porque dependendo do regime do casamento estará excluído da primeira classe dos herdeiros legítimos o convivente terá sempre o direito de concorrer Na união estável salvo convenção entre os conviventes em sentido diverso o regime de bens é invariavelmente o da comunhão parcial CC art 1725 Mas tenha o falecido deixado ou não bens particulares o companheiro concorrerá à herança com os descendentes dele Diferentemente o cônjuge casado no regime de comunhão parcial apenas concorre com os descendentes na repartição da herança correspondente aos bens particulares quando houver O tratamento dispensado ao companheiro portanto nesse caso é mais benéfico Ao se comparar o direito sucessório do companheiro com o do cônjuge casado em regime de comunhão universal ou separação obrigatória a discriminação em favor do primeiro é ainda mais acentuada Enquanto o cônjuge nesses casos nunca concorre com os descendentes do de cujus o companheiro irá sempre concorrer O desequilíbrio no tratamento dos direitos sucessórios se inverte porém quando o falecido deixa descendentes exclusivos se comparada a hipótese à do cônjuge com direito à concorrência isto é o casado segundo os regimes de separação facultativa ou de participação final nos aquestos Nesse caso o companheiro recebe a metade do que receberia o cônjuge na mesma situação Também se desequilibra a equação em desfavor do companheiro no caso de o cônjuge com direito à concorrência ter descendentes comuns em número igual ou superior a quatro Aqui como visto assegurase ao cônjuge a quarta parte da herança como a quota correspondente ao seu direito sucessório Mas o companheiro na mesma situação não teria direito a uma porção mínima do patrimônio objeto de sucessão concorrendo sempre por cabeça O cônjuge casado em regime de separação facultativa está em situação mais vantajosa do que o companheiro Aquele concorre com os descendentes na totalidade da herança enquanto este último somente titula direito sucessório concorrente relativamente aos bens adquiridos de modo oneroso na constância da união estável 22 Concorrência com os ascendentes Na concorrência do cônjuge com os ascendentes do falecido é irrelevante o regime de bens do casamento Qualquer que tenha sido o adotado é idêntico o direito sucessório do viúvo ou viúva Distinguemse nessa concorrência apenas duas situações De um lado se o concurso se verifica entre o cônjuge sobrevivente e dois ascendentes de primeiro grau do falecido isto é seu pai e sua mãe o cônjuge terá direito a um terço da herança De outro lado se a concorrência ocorre com um só ascendente de primeiro grau o pai ou a mãe do falecido ou com ascendentes de grau superior um dois três ou quatro avós um bisavô etc o cônjuge terá sempre direito à metade da herança CC art 1837 Em relação ao companheiro a lei lhe atribui o direito a um terço da herança independentemente do número de ascendentes ou dos respectivos graus CC art 1790 III Assim se o falecido mantinha união estável com alguém e sua mãe vivia na época da abertura da sucessão a ascendente fica com dois terços da herança e o companheiro com o terço restante Se tinha uma avó serão dela os dois terços do patrimônio objeto de sucessão e assim por diante Havendo mais de um ascendente eles dividem os dois terços da herança que lhes cabe segundo as regras próprias da vocação hereditária dessa classe item 4 Concorrendo com ascendentes o cônjuge terá direito a um terço da herança quando forem vivos pai e mãe do de cujus e à metade da herança quando for vivo apenas um deles ou o concurso se estabelecer com avós ou bisavós Nesse caso é irrelevante o regime de bens adotado no casamento Já o companheiro sobrevivente herda sempre um terço ao concorrer com os ascendentes do falecido A comparação do tratamento dado ao cônjuge e ao companheiro na concorrência com ascendentes do falecido permite uma vez mais constatar a discriminação da família nascida do matrimônio e da derivada de união estável em matéria de direito sucessório Quando o cônjuge concorre com pai e mãe do falecido não lhe reservou a lei nenhuma vantagem relativamente ao companheiro nessa mesma situação Tanto um como o outro herdam um terço da herança Nas demais hipóteses porém sempre gozará de tratamento mais benéfico o cônjuge Se for vivo apenas um dos ascendentes de primeiro grau ou se o concurso se estabelece com parentes de grau maior o cônjuge herda a metade enquanto o companheiro continua tendo direito somente a um terço da herança 23 Cônjuge ou companheiro como único sucessor Além de concorrer com outros familiares sucessíveis do morto o cônjuge ou o companheiro também é considerado em determinada hipótese o único sucessor na ordem de vocação hereditária Evidentemente quando chamados a herdar nesse caso sucedem o falecido na totalidade da herança Uma vez mais contudo foram tratados de modo diverso pela lei O cônjuge é o sucessor único sempre que o falecido não tiver deixado descendentes ou ascendentes CC art 1838 Irmãos sobrinhos tios e primos do defunto se houver não serão chamados à sucessão porque a classe do cônjuge como herdeiro único tem preferência sobre a dos colaterais art 1829 III e IV Não há concurso tampouco entre o cônjuge e seus cunhados os filhos ou pais destes Se os únicos parentes vivos do de cujus são colaterais a herança transmitese integralmente ao cônjuge qualquer que seja o regime de bens do casamento Já o companheiro só é convocado como sucessor único quando não houver nenhum parente sucessível do falecido CC art 1790 IV Quer dizer se o convivente morto possuía irmão sobrinho tio primo sobrinhoneto ou tioavô o sobrevivente herdará apenas um terço do patrimônio objeto de sucessão art 1790 III A lei não reconhece preferência ao companheiro em relação aos colaterais até quarto grau Somente na falta destes a herança será transmitida por inteiro ao parceiro da união estável O cônjuge é o único sucessor herdeiro portanto da totalidade da herança quando o falecido não deixou descendente nem ascendente Já o companheiro será o sucessor único apenas se o falecido não possuía nenhum parente sucessível incluindo os colaterais até o quarto grau 24 Participação do cônjuge e companheiro na mesma sucessão O cônjuge e o companheiro podem participar da mesma sucessão Para divisar as hipóteses em que essa participação comum tem lugar convém partir das situações em que o cônjuge é sucessor para identificar em quais delas pode também ocorrer a constituição de uma união estável legitimando o companheiro a suceder o falecido Em três casos o cônjuge sobrevivente participa da sucessão do falecido a quando na abertura da sucessão havia convivência entre eles b se estavam naquela época separados de fato há menos de dois anos c se a separação de fato perdurava há mais tempo mas não tinha sido motivada por culpa do sobrevivente Pois bem na hipótese a o cônjuge pode eventualmente concorrer com descendentes e ascendentes do falecido nas situações já assinaladas com ninguém mais contudo Se o falecido mantinha em paralelo ao casamento relações com outra pessoa elas não configuram união estável ainda que caracterizadas pela affectio maritalis Com efeito se o relacionamento paralelo ao casamento tinha o objetivo também de constituição de família ele é uma união livre espécie de concubinato E como assentado anteriormente o direito ainda resiste a atribuir efeitos a essa entidade familiar para fins sucessórios Cap 59 item 4 O concubinato não gera nenhum direito de sucessão seja o concubino um simples amante com quem a pessoa casada convivia com o único objetivo de obter satisfação sexual ou parceiro dum relacionamento não exclusivo mas destinado a constituir família Para que se caracterize juridicamente a união estável é indispensável que os conviventes estejam desimpedidos para o casamento ou quando há impedimento esteja o impedido separado de fato de seu cônjuge Não se admite a união estável simultânea ao relacionamento matrimonial Desse modo a participação do cônjuge e companheiro numa mesma sucessão só pode ocorrer nas hipóteses b e c acima indicadas Quer dizer quando o falecido ainda estava no estado civil de casado mas havia se separado de fato há menos de dois anos o cônjuge é familiar sucessível Se nesse período o separado de fato construiu uma união estável o companheiro também é sucessor Ambos participarão em decorrência da mesma sucessão Igualmente se a separação de fato perdurava há mais de dois anos mas o cônjuge sobrevivente não tinha sido o culpado pela impossibilidade da preservação da vida em comum tendo o falecido nesse período se envolvido numa união estável participam de sua sucessão tanto o esposo ou esposa como o companheiro Não há na lei nenhuma disposição específica sobre a participação concomitante de cônjuge e convivente numa única sucessão A destinação dos bens da herança então deve seguir as regras gerais Para tanto cabe separar dois montes No primeiro os bens que o defunto adquirira onerosamente na constância da união estável no segundo os seus demais bens Da destinação dos bens do primeiro monte não participa o cônjuge sobrevivente assim como o companheiro não participa da do segundo Isso porque o art 1790 caput do CC define os bens objeto do direito sucessório do companheiro circunscrevendoos aos adquiridos onerosamente na vigência da união estável Em relação a esses bens o companheiro só concorre com parentes do falecido conforme se percebe dos incisos I a III do mesmo dispositivo Ora como o cônjuge não se enquadra nesse conceito legal seguese que não terá participação na destinação dos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável do falecido Desse modo se não existirem outros familiares sucessíveis o companheiro herda a totalidade dos bens do falecido adquiridos onerosamente na constância da união estável e o cônjuge todos os demais Podem participar da mesma sucessão o cônjuge e o companheiro do falecido Isso é possível apenas se este último estava separado de fato há menos de dois anos ou se não tinha sido do cônjuge sobrevivente a culpa da separação Imagine para ilustrar que Darcy e Evaristo eram casados no regime de separação de bens facultativa e tinham um filho Fabrício Imagine também que estavam separados de fato e que a culpada pela separação era inegavelmente Darcy que abandonara o lar e o filho para viver com Germano O patrimônio adquirido por Darcy antes da separação de fato tinha o valor de 1000 Por fim imagine que da união estável de Darcy e Germano nasceu uma filha Hebe e que na constância dessa união os conviventes adquiriram de forma onerosa bens no valor de 3000 e Darcy recebeu herança do pai no valor de 2000 Falecendo Darcy ela deixa quatro sucessores os filhos Fabrício e Hebe o cônjuge Evaristo e o companheiro Germano Procederseá então à seguinte destinação de seus bens i em primeiro lugar eles devem ser separados em dois montes sendo o primeiro constituído pelos adquiridos onerosamente na constância da união estável 3000 e o segundo pelos demais 3000 ii do primeiro monte devese separar a meação de Germano 1500 que não integra o objeto da sucessão iii da herança de Darcy no primeiro monte Germano recebe 15 300 enquanto Fabrício e Hebe recebem 25 cada 600 em razão do disposto no art 1790 II do CC iv da herança de Darcy no segundo monte Evaristo Fabrício e Hebe recebem 13 cada 1000 em vista do prescrito pelo art 1829 I do CC A final da herança de Darcy o companheiro Germano herda 300 o marido Evaristo recebe 1000 e os filhos Fabrício e Hebe 1600 cada 25 Inconstitucionalidades no Código Civil Um dos critérios de classificação das famílias é o que as distingue em constitucionais e não constitucionais Cap 55 item 4 Na primeira categoria estão as famílias mencionadas na Constituição Federal que são as constituídas pelo matrimônio ou união estável e as monoparentais art 226 e 3º e 4º as demais são famílias não constitucionais A diferença entre essas duas categorias de família diz respeito ao regime que a lei pode adotar ao estabelecer os direitos e obrigações dos seus membros Quando é constitucional a família a lei ordinária não pode diferenciar esses direitos e obrigações Já se vier a disciplinar alguma família não constitucional como por exemplo a constituída pela parceria entre pessoas do mesmo sexo a lei ordinária poderá validamente atribuir aos seus membros direitos e obrigações diversos dos reconhecidos aos de uma família constitucional Em outros termos nenhum membro de família constitucional pode ser tratado pela lei de modo menos vantajoso que o equivalente em outra família dessa categoria Para os fins que interessam a este subitem o cônjuge e o companheiro não podem receber na lei tratamentos diversos em matéria de direitos sucessórios É inconstitucional o preceito normativo de lei ordinária que discrimine qualquer um deles Antes de 2017 não era largamente aceito pela tecnologia civilista que o direito constitucional do companheiro ao tratamento isonômico em relação ao cônjuge Na verdade predominava o entendimento de que a família constituída pelo casamento podia e devia gozar de tratamento mais vantajoso na lei que a formada pela união estável poderia conferir aos seus membros direitos e obrigações diferenciados Para a maioria da doutrina a Constituição não havia equiparado as duas formas de família tendo ao contrário manifestado preferência pela matrimonial em detrimento da união estável cf Queiroga 20056366 Abstraídos os inspirados na ideologia conservadora referente à organização familiar dos argumentos contrários à isonomia constitucional entre a família matrimonial e a da união estável havia um só digno de consideração Por meio dele os autores costumavam apontar para a parte final do 3º do art 226 da CF que determina à lei a facilitação da conversão da união estável em casamento de modo a concluir pela existência de uma hierarquia entre essas famílias Se o constituinte quer que a lei facilite a conversão de uma espécie em outra argumentase então ele não dá igual importância a todas as famílias que menciona O argumento podia impressionar à primeira vista e era empregado por muitos dos mais importantes civilistas para considerar válida a discriminação feita pelo Código Civil em matéria sucessória entre o cônjuge e o companheiro A Constituição não estabeleceu nenhuma hierarquia entre o casamento e a união estável A rigor se a facilitação da conversão da união estável em casamento indica alguma preferência do constituinte ela deve ser entendida no modo inverso ao que tem afirmado a doutrina tradicional isto é no sentido da primazia da união estável sobre o casamento Como visto os conviventes quando são desimpedidos podem simplesmente se casar ao invés de optarem pela conversão em casamento Quando buscam a conversão têm como objetivo preservar os efeitos de sua união estável Se a Constituição manda que a lei facilite a conversão desta em casamento é porque está atenta à importância desses efeitos e considera que os conviventes não podem ter por única alternativa simplesmente se casarem Isso significaria a desconsideração da importância da união estável Se há preocupação em preservar algo numa certa mudança é porque sua relevância transcende à desta Assim se a norma constitucional determinando a facilitação da conversão significa hierarquização entre as espécies de família indicar a matrimonial como superior é tão lógico quanto considerála inferior à proveniente da união estável Na verdade essa parte final do preceito constitucional deve ser interpretada com os olhos voltados à realidade Existem dois tipos de união estável a dos que têm recursos econômicos para se casar mas simplesmente não querem e a dos que não se casam somente porque não têm recursos econômicos para tanto A facilitação da conversão da união estável em casamento é uma previsão de alcance social destinada a atender aos interesses desse segundo grupo de conviventes Não tem outro significado além desse O cônjuge e o companheiro não podem ser tratados de forma diferenciada pelo direito das sucessões porque integram famílias constitucionais Na superação das inconstitucionalidades em que incorreu o Código Civil devese adotar o princípio da prevalência da norma que dispensa seja ao cônjuge ou ao companheiro o melhor tratamento Assim o cônjuge titula os direitos sucessórios que a lei reconheceu ao companheiro quando privilegiou este último e o companheiro titula os direitos sucessórios atribuídos pela lei ao cônjuge quando forem mais vantajosos Em 2017 o STF julgou recurso com repercussão geral fixando a seguinte tese no sistema constitucional vigente é inconstitucional a distinção de regime sucessório entre cônjuges e companheiros devendo ser aplicado em ambos os casos o regime do artigo 1829 do Código Civil de 2002 A tese aplicase tanto à união estável entre pessoas de sexos diferentes como à homoafetiva Mas apesar da inegável pertinência dessa tese ela não adotou o critério correto de invalidar todas as hipóteses de inconstitucionalidades do Código Civil O critério correto é a prevalência da norma que dispensa seja ao cônjuge ou ao companheiro o melhor tratamento Assim o cônjuge titula os direitos sucessórios que a lei reconheceu ao companheiro quando privilegiou este último e o companheiro titula os direitos sucessórios atribuídos pela lei ao cônjuge quando forem mais vantajosos Assentada portanto a premissa de que cônjuge e companheiro têm direito ao mesmo tratamento na ordem de vocação hereditária cabe retomar as inúmeras desigualdades estabelecidas pelo Código Civil com o objetivo de destacar a constitucionalidade do respectivo preceito De início cabe reforçar a ideia de que estas desigualdades se resolveriam pela simples declaração de inconstitucionalidade do preceito que regula os direitos sucessórios do companheiro ou seja do art 1790 do CC como um todo Essa alternativa pressupõe o oposto do que se pretende afirmar Se o objetivo é eliminar as desigualdades de tratamento entre cônjuge e companheiro simplesmente tomar por inconstitucional o dispositivo que regula os direitos sucessórios deste último é reintroduzir de modo subreptício a hierarquização entre as espécies de família com priorização da matrimonial Por que razão o legislador a priori teria baixado norma válida ao tratar do cônjuge e incorrido em inconstitucionalidade ao disciplinar os direitos do companheiro Para se respeitar de modo cabal a isonomia entre o cônjuge e o companheiro é necessário verificar cada uma das hipóteses em que o tratamento dispensado pela lei foi discriminatório Em algumas delas como se viu a lei conferiu ao companheiro uma vantagem negada ao cônjuge noutras fez o inverso Descartar como inconstitucional a norma referente aos direitos sucessórios do companheiro para que ele possa gozar dos conferidos ao cônjuge nem sempre portanto lhe será vantajoso Novamente a hierarquização das espécies de família acabaria se fazendo sentir em detrimento da união estável Em outros termos sempre que o Código Civil tiver tratado o companheiro de forma mais vantajosa que o cônjuge será inconstitucional a norma que discriminou a família matrimonial e quando tiver dispensado ao cônjuge tratamento mais benéfico que ao companheiro a inconstitucionalidade atingirá a discriminação à família fundada na união estável Assim cabe afirmar em primeiro lugar a inconstitucionalidade do art 1829 I do CC porque libera ao cônjuge tratamento menos benéfico do que o do companheiro Em consequência quando concorrer com descendentes do falecido o cônjuge terá seu direito sucessório regido pelo art 1790 I do CC Em outros termos quando se consideram os preceitos constitucionais sobre a proteção da família ao cônjuge deve ser destinada porção na herança igual à de cada descendente independentemente do regime de bens do casamento É inconstitucional reconhecer o direito à concorrência com os descendentes aos casados em certos regimes de bens e negálo aos que adotaram outros regimes A fragilidade dos critérios para distinguir quem concorre e quem não concorre seria já suficiente para questionarse a constitucionalidade da norma frente ao princípio constitucional da igualdade CF art 5º caput Mas além disso é inconstitucional discriminar o cônjuge na concorrência na primeira classe de familiares sucessíveis em função do regime de bens porque o companheiro não foi assim discriminado Ao se levar em conta o disposto no plano constitucional sobre a proteção às famílias fica até mais simples identificar os familiares sucessíveis integrantes da primeira classe na vocação hereditária são os descendentes do falecido em concorrência com o seu cônjuge qualquer que seja o regime de bens do casamento ou companheiro Em segundo lugar é cabível a aplicação em favor do companheiro do direito à quota hereditária mínima de um quarto quando a concorrência se estabelece entre ele e descendentes do falecido dos quais é também ascendente Em outros termos o art 1790 I deve ser interpretado em conjugação com o art 1832 do CC quando se cuidar dos direitos sucessórios do companheiro Em terceiro lugar afirmase a inconstitucionalidade do art 1790 II do CC na parte em que reduz pela metade a porção hereditária do companheiro quando concorre com herdeiros exclusivos do falecido ou na hipótese de descendência híbrida Como o cônjuge nesse caso tem direito a quota igual à atribuída aos descendentes apenas a lei não lhe reconhece o direito à fração mínima o companheiro também deve ter idêntico tratamento Em quarto lugar é inconstitucional o art 1790 III do CC Quando concorre com os ascendentes do falecido o companheiro deve ter o mesmo tratamento do cônjuge com direito à metade da herança exceto no caso de concurso com o pai e a mãe do falecido Ademais não precisa concorrer com os colaterais Se o autor da herança não tinha descendentes nem ascendentes o companheiro deve a exemplo do cônjuge herdar a totalidade da herança Claro que em se adotando esse critério para a solução das inconstitucionalidades prevalece sempre o preceito que liberar melhor tratamento ao cônjuge ou ao companheiro os familiares sucessíveis concorrentes acabarão tendo menor participação na herança do que teriam se não se reconhecesse a inconstitucionalidade das normas discriminatórias ou se ela fosse superada pela aplicação do preceito menos vantajoso Aqui no entanto tem importância recuperarse o sentido da evolução do direito das sucessões na matéria atinente à vocação hereditária Como visto de início a tendência tem sido a de constante valorização da posição do cônjuge no quadro dos sucessores Se assim é a superação das inconstitucionalidades em que incorreu o Código Civil deve mesmo ser buscada à luz desse princípio o cônjuge ou companheiro deve ter sua situação melhorada em detrimento dos familiares sucessíveis do falecido porque comparativamente com estes deu maior contribuição para a formação e incremento do patrimônio objeto de sucessão 26 Direito real de habitação Independentemente do regime de bens do casamento o cônjuge sobrevivente tem direito real de habitação incidente sobre o imóvel destinado à residência da família CC art 1831 O objetivo da norma é garantir ao cônjuge o direito de continuar vivendo no mesmo local em que residia antes do passamento de seu marido ou mulher mesmo que não seja mais o proprietário de todo o imóvel O direito real de habitação impede por exemplo que os descendentes ou ascendentes do falecido para os quais parte do imóvel é transferida possam cobrar do cônjuge aluguel pelo respectivo uso A lei não é expressa a respeito mas devese reconhecer ao cônjuge sobrevivo o direito de usar todo o imóvel com exclusividade O ascendente ou descendente coproprietário do bem não pode vir morar com o cônjuge se antes não habitava o mesmo local Assim deve ser porque caso contrário o art 1831 do CC não teria qualquer implicação Veja é direito do condômino usar o bem em condomínio desde que não exclua nenhum dos outros coproprietários O cônjuge portanto na condição de condômino do imóvel herdado já titula o direito de usálo Para que o gravame da habitação que a lei determina recair sobre esse bem tenha algum significado é necessário reconhecer ao seu titular mais direitos do que os derivados do condomínio O companheiro também é titular de igual direito real de habitação não somente por força da isonomia de tratamento em relação ao cônjuge constitucionalmente assegurada como também em razão da expressa previsão do art 7º parágrafo único da Lei n 927896 que continua em vigor por versar sobre tema não disciplinado no Código Civil Por fim observo que o art 1831 do CC estabelece como condição para a instituição do direito real de habitação que o imóvel onde reside o cônjuge sobrevivente seja o único dessa natureza a inventariar Pelo texto da lei portanto se na herança houvesse qualquer outro bem imóvel o cônjuge sobrevivente não seria titular do direito real de habitação Aqui estamos diante de mais uma inconstitucionalidade do Código Civil que trata o cônjuge de forma menos vantajosa que o companheiro O art 7º parágrafo único da Lei n 927896 assegura a este último o direito real de habitação sem o condicionar à inexistência de outros imóveis na herança Uma vez mais não há motivos para discriminar o cônjuge na extensão desse direito sucessório O cônjuge e o companheiro têm direito real de habitação referente ao imóvel em que residia ao tempo da abertura da sucessão podendo excluir do uso do bem os descendentes e ascendentes do falecido que porventura se tornarem seus condôminos a menos que também já morassem no local Desse modo independentemente de existirem ou não outros imóveis na herança o cônjuge ou companheiro do falecido tem o direito de usar aquele em que residia ao tempo da abertura da sucessão podendo ademais excluir desse uso os descendentes e ascendentes que se tornaram seus condôminos a menos que também já residissem no local 3 Os descendentes como sucessores Na primeira classe da vocação hereditária além do cônjuge também estão os descendentes do falecido isto é seus filhos netos bisnetos tataranetos etc Na linha reta de parentesco tanto para cima como para baixo o direito sucessório não se limita pelo grau ao contrário do que ocorre com a colateral em que os parentes sucedem apenas até o quarto A regra geral de preferência entre os descendentes dita que os em grau mais próximo excluem os mais remotos CC art 1833 O chamamento fazse por ordem do grau convocandose primeiro os filhos depois os netos em seguida os bisnetos etc Desse modo se estiverem vivos todos os filhos do autor da herança nenhum dos netos ou bisnetos herda se prémorreram todos os filhos e vivem todos os netos nenhum dos bisnetos ou tataranetos será convocado para suceder e assim por diante Quando todos os descendentes chamados à sucessão são do mesmo grau eles herdam por cabeça sendo vedado qualquer tratamento diferenciado CC art 1834 Desse modo se o falecido deixou oito filhos cada um terá um oitavo da herança destinada aos descendentes independentemente de serem irmãos bilaterais ou unilaterais havidos dentro ou fora de casamento adotivos ou socioafetivos Se é filho terá direito sucessório idêntico aos demais descendentes de primeiro grau Do mesmo modo se todos os descendentes convocados para sucederem são netos do falecido a cada qual caberá idêntica porção da herança Nenhuma distinção será feita entre eles seja a que título for Se entre os netos um deles foi havido fora do casamento ou era adotivo terá direito de suceder em pé de igualdade com os outros Também não tem importância nesse caso em que todos os descendentes em condições de suceder são netos quem eram seus pais Considere que Irene faleceu com duas filhas sendo que uma delas Juliana lhe dera um neto Luiz e a outra Maria dois Nair e Orlando Para simplificar não há outros familiares sucessíveis Nesse caso sendo três os netos será de um terço a quota hereditária de cada um dos descendentes de segundo grau Isso reforço se Juliana e Maria as duas filhas da autora da herança já estavam mortas ao abrirse a sucessão de Irene Se uma delas vivia a destinação dos bens deixados pelo falecido seguirá regra diversa pertinente ao direito de representação subitem 31 O mesmo critério seguese pelos demais graus Se o defunto deixou apenas bisnetos todos os filhos e netos eram prémortos a cada um desses descendentes de terceiro grau será destinada uma parte igual da herança Se são dez bisnetos 110 para cada um se vinte 120 etc Entre os descendentes sucedem primeiro os de grau mais próximo filhos e na falta deles os dos graus subsequentes netos bisnetos etc Cada um herda dentro do mesmo grau por cabeça Isso significa que a parte da herança destinada aos descendentes será distribuída entre os do grau chamado a suceder em porções idênticas Os descendentes concorrem com o cônjuge ou o companheiro do falecido conforme as regras já examinadas anteriormente item 2 Em decorrência se o falecido era casado ou vivia em união estável os descendentes não terão direito à totalidade da herança porque uma parte dela será destinada à pessoa com quem o seu autor mantinha relação de conjugalidade 31 Direito de representação O descendente a partir do segundo grau pode herdar por direito próprio ou por representação variando substancialmente o cômputo de sua quota hereditária em cada caso Ele herda por direito próprio quando chamado para suceder o falecido o grau de descendência a que pertence Assim se os bens estão sendo transmitidos aos descendentes de primeiro grau do autor da herança quem é filho herda por direito próprio Mas numa circunstância o descendente herda por representação Nela é convocado a exercer os direitos sucessórios que seu ascendente exerceria caso estivesse vivo ao tempo da abertura da sucessão CC art 1851 O direito de representação só existe na linha reta descendente CC art 1852 isto é apenas filhos podem representar pais ou netos representar os avós etc Na linha reta ascendente não há direito de representação no sentido de que o pai nunca representa o filho Na colateral também não há direito de representação no sentido de que ninguém pode representar um irmão pré morto A lei menciona como única hipótese admissível de representação na sucessão por colaterais a dos filhos de irmão do falecido representando o pai prémorto se concorrem com outros irmãos do falecido art 1853 item 5 Sempre que o representado for chamado a suceder e estando vivo ao tempo da abertura da sucessão seu direito sucessório se transmitirá ao representante É essa a implicação do direito de representação Desse modo no exemplo acima do falecimento de Irene se Juliana já estivesse morta o seu filho Luiz a representaria Nesse caso então metade da herança seria destinada para Luiz e a outra metade para Maria No mesmo exemplo se Maria já fosse falecida ao tempo da abertura da sucessão ela seria representada por seus filhos Nair e Orlando Agora metade da herança caberia a Juliana um quarto para Nair e um quarto para Orlando O representante herda a título de representação a mesma quota hereditária que o representado herdaria se estivesse vivo na abertura da sucessão CC art 1854 Havendo dois ou mais representantes dividese por igual a quota do representado entre eles art 1855 Em decorrência pode variar o tamanho da quota hereditária do descendente dependendo do título da sucessão Ao herdar exercendo direito próprio o descendente pode receber mais ou menos do que receberia se herdasse por representação No mesmo exemplo Nair e Orlando ao sucederem Irene por direito próprio isto aconteceu quando tanto Juliana como Maria eram prémortas receberam um terço da herança cada um No entanto ao sucederem por representação quando Juliana era viva e Maria prémorta suas quotas reduziramse a um quarto para cada Luiz por sua vez quando sucedeu por direito próprio também mereceu um terço da herança Mas a participação dele aumentou para a metade quando sucedeu representando a mãe já falecida Juliana Fica agora fácil de entender o ditado da lei Na linha descendente os filhos sucedem por cabeça e os outros descendentes por cabeça ou por estirpe conforme se achem ou não no mesmo grau CC art 1835 Se todos os descendentes são filhos do falecido a cada um será destinada uma porção idêntica da herança Eles herdam por cabeça se são três filhos um terço para cada um se quatro um quarto e assim por diante Quer dizer os filhos descendentes de primeiro grau sempre são herdeiros por direito próprio Já os outros descendentes netos bisnetos etc podem herdar por cabeça exercendo direito próprio tal como os filhos do autor da herança ou por estirpe Herdam por cabeça quando estão todos os descendentes no mesmo grau só foram chamados a suceder netos ou só bisnetos etc Sucedem por outro lado por estirpe quando estão sendo convocados descendentes de graus diferentes caso em que os em grau mais remoto exercem o direito sucessório por representação Nessa última hipótese os bens são destinados a sucessores que em geral são tios filhos do autor da herança e sobrinhos netos do autor da herança uns dos outros Os descendentes a partir do segundo grau podem herdar por direito próprio ou por representação No primeiro caso cada descendente sucede por cabeça recebendo quinhão igual aos dos demais do seu grau No segundo sucede por estirpe e recebe a quota hereditária que o representado herdaria se vivo fosse ou uma parte dela quando houver mais descendentes representando o mesmo ascendente prémorto Nos casos de exclusão da sucessão por indignidade ou deserdação o excluído é tratado como se morto fosse Isso significa que os descendentes dele o representarão herdando a quota que lhe teria sido destinada não fosse a indignidade ou deserdação Mas no caso de renúncia relembrando descabe a representação Os sucessores do renunciante não têm nenhum direito sucessório a exercer nem próprio nem como representante Por fim enuncia a lei que o renunciante à herança de uma pessoa poderá representála na sucessão de outra CC art 1856 Desse modo se o filho renuncia à herança do pai não está impedido de representálo quando do falecimento do avô No exemplo acima se Luiz renunciou à herança deixada por Juliana a renúncia não o exclui da sucessão de Irene da qual participa representando a mãe prémorta 32 Embriões e material genético crioconservados Têm capacidade para suceder além dos nascidos também os concebidos à data da abertura da sucessão CC art 1798 A lei não distingue no tocante à concepção se ela é natural proveniente de relações sexuais ou artificial fecundação in vitro ou inseminação Desse modo não há como discriminar as hipóteses Tanto a pessoa que na data do falecimento do autor da herança já se encontrava concebida naturalmente como a que se concebera por processo de fertilização assistida têm capacidade para suceder No tocante à concepção artificial é necessário atentar para duas diferentes situações Primeira quando morreu o autor da herança já existia mantido sob crioconservação o embrião concebido com o material genético fornecido por ele Sendo essa a hipótese ainda que transcorra muito tempo vindo esse embrião a ser implantado num útero o nascimento com vida do ser assim gerado lhe conferirá capacidade sucessória Poderá por meio da ação de petição de herança demandar os demais sucessores para receber sua parte Terá muito tempo para isso porque essa ação prescreve em dez anos após a maioridade do seu titular ou seja até ele completar 28 anos Lembro a propósito que a fecundação assistida post mortem só gera o vínculo de filiação sendo homóloga quer dizer quando o microgameta de que proveio o embrião tiver sido fornecido por quem era casado ou mantinha união estável com a fornecedora do macrogameta CC art 1597 III e IV O útero em que esse ser será gerado não precisa ser necessariamente o da fornecedora do óvulo Ela aliás pode estar bastante velha ou até mesmo morta na época em que se fizer o implante do embrião em ambiente uterino Nada disso interfere com os direitos sucessórios da pessoa assim concebida e gerada relativamente à sucessão dos contratantes do serviço médico de fertilização assistida e fornecedores do material genético Se o embrião já existia na data da abertura da sucessão mesmo que estivesse crioconservado o ser dele resultante terá capacidade sucessória se um dia vier a ser implantado num útero e depois da gestação nascer com vida Esse ser terá até os 28 anos para exercer contra os demais sucessores seu direito à petição de herança Segunda na data da abertura da sucessão ainda não há embrião mas simplesmente gametas crioconservados provenientes do autor da herança São espermatozóides do homem falecido ou óvulos da mulher falecida que se encontram armazenados Esse material genético pode vir a ser empregado na concepção de uma nova pessoa Ela porém não terá nenhum direito sucessório relativamente ao patrimônio do fornecedor do gameta crioconservado porque não estava ainda concebida ao tempo de seu falecimento 4 Os ascendentes como sucessores Na segunda classe da vocação hereditária concorrendo com o cônjuge ou companheiro do falecido encontramse os ascendentes deste Eles são chamados a suceder no caso de não ter o falecido deixado descendentes A preferência dos descendentes sobre os ascendentes por vezes é explicada em função do valor embutido no primado amor primum descendit deinde ascendit que cultivou o direito romano o amor aos descendentes dizse supera o devotado aos ascendentes Monteiro 200389 Independe contudo da questão afetiva é inegavelmente mais racional sob o ponto de vista econômico que os descendentes tenham preferência sobre os ascendentes Como a tendência é a de filhos de uma pessoa morrerem depois dos pais dela a inversão da preferência acarretaria menor aproveitamento dos bens objeto de sucessão A cada duas gerações uma tenderia a herdar dos ascendentes e a outra dos descendentes num mecanismo que estimularia a imobilidade e dispersão de riquezas O mais conveniente para a economia é que a herança seja atribuída a quem na data da abertura da sucessão tem maior perspectiva de vida Os recursos assim destinados tendem a ser mais bem aproveitados em benefício da sociedade porque seus titulares terão mais motivação e meios para mobilizálos de forma produtiva Os mais velhos além de terem menos energia que os mais jovens já deram sua parcela de contribuição e merecem sossego tendem a ter de um modo ou de outro menos interesse em se envolver em novas empreitadas econômicas Por essa razão os ascendentes só herdam quando o autor da herança não deixa descendentes Entre os ascendentes a preferência também decorre da proximidade do grau mas os critérios são diversos dos aplicados em relação aos filhos e netos Na linha reta ascendente o grau mais próximo exclui o mais remoto sempre sem distinção de linhas CC art 1836 1º Quer dizer se um dos ascendentes de primeiro grau já estava morto mas não o outro este último herda a totalidade da herança destinada aos ascendentes Mesmo que na linha do ascendente de primeiro grau prémorto estivesse vivo algum outro ascendente não lhe seria destinado nada da herança Desse modo se o falecido ao morrer tinha como únicos familiares sucessíveis vivos o pai e os avós maternos a totalidade de sua herança vai para o antecedente de primeiro grau Assim é também por conta da racionalidade econômica que indica ser mais conveniente atribuir a herança a quem na data da abertura da sucessão tem maior perspectiva de vida Os ascendentes de grau mais remoto mesmo que não integrem a mesma linha dos de grau mais próximo não são chamados a suceder Havendo porém identidade de grau e diversidade de linha esta será considerada para se atribuir aos da linha paterna metade da herança destinada aos ascendentes e aos da materna a outra metade CC art 1836 2º Suponha que o falecido deixou vivos como parentes sucessíveis apenas o seu avô paterno e os dois avós maternos Nesse caso a herança será destinada metade ao avô paterno um quarto ao avô materno e um quarto à avó materna Entre os ascendentes os em grau mais próximos excluem sempre os em grau mais remoto não existindo representação nem tendo importância nesse caso a linha de ascendência Quando são idênticos os graus mas diversas as linhas metade da porção hereditária a repartir entre os ascendentes é destinada à linha paterna e a outra metade à materna Na concorrência com os ascendentes o cônjuge pode titular direito a um terço da herança quando vivos pai e mãe do falecido ou à metade se vive um deles somente ou nenhum dos dois Desse modo quando a pessoa sem descendente deixa ao passar cônjuge pai e mãe vivos cada um destes familiares sucessíveis herdará um terço da herança Se deixa cônjuge e pai destinase metade a cada um A mesma destinação se faz quando os familiares sucessíveis são o cônjuge e a mãe do falecido Quando nem pai nem mãe viviam ao tempo da abertura da sucessão o cônjuge fica com metade da herança e a outra metade é destinada aos ascendentes de segundo grau observandose a linha na repartição dessa quota em havendo identidade de grau Quer dizer se a concorrência se estabelece entre o cônjuge o avô materno e os dois avós paternos do falecido metade da herança será destinada ao primeiro um quarto ao segundo e um oitavo a cada um dos dois outros herdeiros 5 Os colaterais como sucessores Quando o falecido não tiver herdeiros necessários descendentes ascendentes ou cônjuge seus bens serão destinados aos colaterais até o quarto grau CC art 1839 Relembrando na linha colateral os graus de parentesco contamse por geração subindo até o ascendente comum e depois descendo até onde se quer chegar CC art 1594 Desse modo dois irmãos são colaterais em segundo grau uma geração separa um deles do pai ou mãe de ambos e mais uma separa estes do outro irmão Tio e sobrinhos são colaterais em terceiro grau uma geração até o pai que é o avô do sobrinho e mais duas daquele a este Tioavô e sobrinhoneto são colaterais em quarto grau uma geração até o pai que é o bisavô do sobrinho neto mais três daquele a este assim como os primosirmãos duas gerações para cima até os avós comuns e mais duas desses para baixo Para ser sucessor o colateral deve ter com o falecido uma dessas relações de parentesco Os primos mais distantes e os parentes de parentes colaterais ainda que provenham de um tronco comum não fazem parte da ordem de vocação hereditária Entre os colaterais sucessíveis também têm preferência os de grau mais próximo CC art 1840 Assim tios sobrinhos e primos não são chamados se todos os irmãos do falecido estavam vivos na data da abertura da sucessão Se os únicos parentes vivos do autor da herança são um sobrinho e um sobrinhoneto sendo este filho daquele então será chamado a suceder apenas o primeiro em vista da maior proximidade de grau Na sucessão por parente colateral só há uma hipótese de representação Diz respeito à de irmão do falecido pelo respectivo filho CC arts 1840 in fine e 1853 Assim se o morto tinha dois irmãos mas apenas um deles ainda estava vivo na abertura da sucessão o outro será representado por sua descendência isto é pelos sobrinhos do autor da herança Nos demais casos todos os colaterais herdam exercendo direito próprio isto é por cabeça e não por estirpe Se os herdeiros do falecido são um primo e dois sobrinhosnetos cada um deles terá direito a um terço da herança independentemente das linhas a que pertencem ou de quem sejam seus pais ou avós Concorrendo na sucessão irmãos bilaterais e unilaterais estes últimos têm direito a quota hereditária correspondente à metade da destinada aos primeiros CC art 1841 Os irmãos bilaterais são os que têm o mesmo pai e mãe os unilaterais os que têm o mesmo pai ou mãe Se alguém falece deixando como únicos familiares sucessíveis três irmãos sendo um deles bilateral e os outros dois unilaterais caberá ao primeiro metade da herança e a cada um dos demais um quarto Claro se houver somente irmãos unilaterais concorrendo a porção deles será igual pouco importando a linha a que pertencem art 1842 Na quarta classe da vocação hereditária considerou a lei os parentes colaterais até o quarto grau irmãos sobrinhos tios sobrinhosnetos tiosavós e primosirmãos do falecido Morrendo alguém sem cônjuge descendente ascendente ou irmãos os sobrinhos serão os herdeiros Se os pais deles eram todos irmãos bilaterais ou unilaterais do falecido a cada sobrinho será destinada uma porção igual da herança Quer dizer se eram cinco cada um herda um quinto Mas se entre os pais dos herdeiros havia irmãos bilaterais e unilaterais do falecido os sobrinhos filhos dos unilaterais herdarão a metade da quota atribuída aos sobrinhos descendentes dos bilaterais CC art 1843 1º a 3º Ou seja se eram cinco os sobrinhos três deles filhos de irmãos bilaterais do falecido e dois de unilaterais os primeiros herdam um quarto da herança cada um ao passo que a cada um desses últimos destinase um oitavo Os tios do falecido só são chamados a sucedêlo quando não houver sobrinhos CC art 1843 in fine Uma vez mais a lei atribui a herança a quem tem maior perspectiva de vida atendendo à alternativa de melhor racionalidade econômica Em outros termos não há concorrência entre tios e sobrinhos Havendo um único sobrinho sucessor serlheá deferida a totalidade da herança mesmo que estejam vivos também vários tios do falecido ou primos Se concorrem à herança somente tios não titulam direito de representação os descendentes de algum tio prémorto do falecido Simplesmente consideramse quais eram os tios vivos na data da abertura da sucessão e se destina a cada um deles a parte correspondente da herança É irrelevante em tal destinação a linha a que pertence cada tio sucessor Antes do Código Beviláqua o direito sucessório era atribuído aos colaterais até o décimo grau o filho de primo de mesmo tataravô do falecido era herdeiro Em 1916 limitouse aos de sexto grau e em 1946 aos de quarto A tendência no trato dessa matéria parece ser a de restringir ainda mais a vocação hereditária dos parentes transversais de modo que no futuro só titule direito sucessório o colateral com direito a alimentos ou seja os irmãos Monteiro 2003101 desta edição 2020 6 O VGBL VGBL é a sigla de um produto financeiro denominado Vida Gerador de Benefício Livre Tratase de investimento feito junto a sociedades seguradoras em que o investidor pode optar depois de decorrido o prazo previsto em contrato pelo resgate total do capital investido ou pelo direito de receber valores mensais Neste último caso como a situação econômica do investidor se assemelha ao de um aposentado considerase o VGBL uma espécie de plano de aposentadoria Temse difundido a noção equivocada de que o VGBL seria uma modalidade de seguro de vida de modo que o investidor poderia indicar livremente a quem deveria ser pago o capital no caso de seu falecimento Os próprios agentes das seguradoras incumbidos de oferecer o produto ao mercado costumam realçar este diferencial do VGBL para compensar a baixa remuneração oferecida Por isso o produto tem servido para tentativas de fraude contra o direito das sucessões Entendendo o VGBL como uma modalidade de seguro de vida e não como investimento a seguradora no caso de falecimento do investidor age como na liquidação de um seguro de vida e entrega o capital diretamente às pessoas indicadas no contrato e não aos legítimos sucessores Tentase fraudar deste modo também o fisco com a sonegação do imposto de transmissão causa mortis Contudo bem examinado o VGBL não pode ser classificado sequer como contrato de seguro quanto mais de seguro de vida Para que este negócio jurídico se caracterize não basta que do contrato participe uma seguradora é indispensável também a socialização dos riscos mediante o pagamento de prêmios fixados a partir de cálculos atuariais Cap 35 subitem 11 Nenhum desses dois outros elementos essenciais do seguro se mostra presente no VGBL O investidor entrega à seguradora um capital mediante aporte único ou em prestações Esse capital é chamado de prêmio mas não resulta de nenhum cálculo atuarial vinculado à socialização de riscos Ele é simplesmente administrado durante algum tempo pela seguradora período de investimento para que após o prazo contratado seja restituído ao mesmo investidor período de benefício de uma única vez com os acréscimos decorrentes da valorização experimentada ou em prestações mensais No seguro de vida o capital pago em razão do falecimento não é nunca a mera restituição do prêmio valorizado Tratase portanto de um investimento entre os muitos oferecidos no mercado poupança fundo de investimento CDB etc e como tal integra o patrimônio do investidor No caso de falecimento deste o VGBL deve receber rigorosamente o mesmo tratamento dispensado aos seus demais investimentos O VGBL Vida Gerador de Benefício Livre embora oferecido no mercado como modalidade de seguro de vida tem inequívoca natureza de investimento No caso de falecimento do investidor os recursos do VGBL pertencem ao espólio e devem ser com a partilha destinados aos sucessores legítimos e não aos beneficiários contratualmente indicados Desse modo alertemse sucessores e fisco Se o de cujus tinha qualquer quantia aportada em VGBL os recursos correspondentes pertencem inequivocamente ao espólio e não aos beneficiários contratualmente designados e devem ser com a partilha destinados aos sucessores atendendose às regras da sucessão legítima após o pagamento do imposto devido 2020 02 13 PÁGINA RB101 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES CAPÍTULO 64 SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA Capítulo 64 Sucessão Testamentária 1 Direito de testar A ordem jurídica reconhece dentro de certos limites o direito de a pessoa física definir por sua própria vontade a destinação de seus bens após a morte É o direito de testar atribuído a todas as pessoas capazes CC art 1857 e aos relativamente incapazes art 1860 parágrafo único que no momento do ato gozem de pleno discernimento O testamento é um ato personalíssimo Isso significa que ninguém pode testar por procurador ou tendo sua vontade fortemente influenciada por outra pessoa Admitese apenas que o testador possa ser auxiliado no aclaramento de sua vontade e compreensão dos respectivos efeitos por alguém de sua confiança ou um advogado Da circunstância de ser o testamento ato personalíssimo decorre também a sua alterabilidade e revogabilidade a qualquer tempo pelo testador A pessoa pode mudar quantas vezes quiser sua vontade relativamente à destinação dos bens após a morte como também simplesmente desistir de interferir no assunto prevalecendo sempre a última disposição manifestada em vida subitem 24 Exigese para a validade da declaração mortuária que o testador esteja em seu pleno discernimento isto é no domínio das faculdades mentais Não basta ser capaz para validamente dispor sobre a destinação post mortem dos próprios bens é indispensável que ademais não esteja o testador sem consciente controle de sua vontade CC art 1860 Subtrai a capacidade específica do testador qualquer fator que implique ausência de entendimento ou vontade como por exemplo enfermidade obnubilação passageira da mente embriaguez torpor em razão de medicamento ou entorpecente hipnose Pereira 1974137 Interessa na aferição da capacidade do testador levar em conta sua condição mental no momento em que faz a declaração nada interessando se antes ou depois o estado era diverso Assim se o testador é incapaz para o ato este não vale ainda que posteriormente aquele venha a se tornar capaz do mesmo modo se ao testar era capaz não invalida o testamento a superveniência de incapacidade Se alguém testou com 15 anos o ato é inválido ainda que o testador viva mais 80 sem nunca revogar o testamento ou fazer outro Da mesma forma se testou enquanto estava plenamente lúcido o fato de vir anos após a enlouquecer não invalida o ato art 1861 A validade do testamento pode ser questionada em razão de dois fundamentos incapacidade do testador no momento da declaração ou inobservância de forma ou formalidade legal item 2 Decai o direito de pleitear a invalidação do testamento em cinco anos após seu registro Ademais o testamento pode ser ineficaz se o testador dispôs sobre parte indisponível de seu patrimônio vale dizer insuscetível de ser destinada pelo titular O direito de dispor sobre os próprios bens depois da morte é reconhecido a toda pessoa capaz e aos relativamente incapazes desde que se encontrem em pleno discernimento 11 Herdeiros necessários Quem tem herdeiros necessários não pode dispor senão sobre a metade de seus bens Essa é a única limitação do direito de testar que a lei se preocupou em reforçar em mais de um dispositivo CC arts 1789 1846 1857 1º e 1967 Desse modo o patrimônio do testador com herdeiros necessários dividese em parte disponível e indisponível equivalendo cada uma à metade A parte indisponível chamada também de legítima não pode ser objeto de testamento Será ineficaz no todo ou em parte a disposição mortuária que alcançar a parte indisponível do patrimônio do testador Quando o testador não tem herdeiros necessários todo o seu patrimônio é disponível e terá a destinação que ele desejar desde que expressa em testamento Da parte disponível o testador é inteiramente livre para decidir acerca da destinação que terão com seu passamento os bens que tinha Pode transmitilos a quem não seja herdeiro como um amigo uma fundação parente distante Pode também testálos para quem já é herdeiro com o objetivo de lhe destinar porção maior de seus bens Nesse caso o beneficiado pelo testamento participa da sucessão com dois títulos o de herdeiro legítimo e o de sucessor testamentário herdeiro ou legatário Pode ser privilegiado por esse meio inclusive o herdeiro necessário que não perde em razão da qualidade de testamentário seu direito à legítima CC art 1849 Mesmo que isso implique um enorme desequilíbrio entre os familiares sucessíveis da mesma classe ou de classe anterior se a porção dada a mais ao testamentário proveio da parte disponível do patrimônio do testador não há fundamentos para questionar a validade ou eficácia do testamento São herdeiros necessários listados na lei o cônjuge ascendentes e descendentes CC art 1845 Assim está limitada no seu direito de testar a pessoa casada ou que tenha descendência ou ascendência viva Só pode dispor da totalidade de seus bens quem não tiver cônjuge filhos netos pais avós etc Os que não possuem senão parentes colaterais vivos não encontram limites em seu direito de testar Se quiser afastálos da sucessão basta dispor do seu patrimônio sem os contemplar CC art 1850 A respeito da classificação do cônjuge como herdeiro necessário inovação trazida ao direito positivo brasileiro pelo Código Reale cabem duas observações Primeira o art 1845 deve ser interpretado em consonância com o art 1830 Este último estabelece que o cônjuge só é sucessor quando na data da abertura da sucessão estava convivendo com o defunto ou dele separado de fato há menos de dois anos ou quando não tinha sido o culpado pela ruptura da convivência conjugal Essas condições também são indispensáveis para que o cônjuge seja considerado herdeiro necessário Claro porque desatendido o art 1830 nem mesmo sucessor o cônjuge pode ser considerado quanto mais herdeiro necessário Desse modo o separado de fato há mais de dois anos que não tiver sido o único culpado pela separação não terá herdeiros necessários ainda que ostente o estado civil de casado se lhe faltar também descendência e ascendência Segunda em vista da isonomia constitucional da família matrimonial e da constituída por união estável também o companheiro deve ser considerado herdeiro necessário limitandose igualmente o direito de testar A classificação do companheiro como herdeiro necessário contudo está longe de granjear a aceitação da maioria da doutrina Para o cálculo da legítima interessa considerar o valor dos bens ao tempo da abertura da sucessão CC art 1847 Pouco importa se quando foi feito o testamento os bens destinados aos testamentários correspondiam a mais ou a menos da metade do patrimônio do testador O que interessa é a situação patrimonial no momento de sua morte que pode claro terse alterado muito desde a data do testamento O cômputo da legítima toma por base o valor do acervo líquido vale dizer com desconto das dívidas deixadas pelo de cujus e acréscimo do correspondente aos bens conferidos em antecipação de legítima e sujeitos à colação Cap 65 item 2 Desse modo se o falecido tinha na abertura da sucessão patrimônio de 1000 havia doado para um dos filhos bens avaliados também nessa oportunidade em 200 e devia a credores em valores atualizados o equivalente a 300 então a legítima nesse caso corresponde a 450 isto é metade do acervo líquido 1000 200 2 300 900 900 2 450 Se o bem testado pelo valor ao tempo da abertura da sucessão encaixase na parte disponível do testador a legítima foi respeitada ainda que na oportunidade do testamento a ultrapassasse Quem tem descendente ascendente ou cônjuge ou segundo parte da doutrina companheiro não pode testar senão a metade de seus bens A outra metade designada de legítima corresponde à parte indisponível do patrimônio do testador Os bens da legítima portanto não podem ser destinados por disposição de última vontade do testador a quem não seja seu herdeiro necessário Isso não significa contudo que o testador nada possa dispor em testamento acerca deles Na verdade ele tem o direito de os partilhar entre os herdeiros necessários desde que respeite as quotas hereditárias definindo o bem a ser destinado a cada sucessor CC art 2014 E pode também gravar os bens da legítima com a cláusula de inalienabilidade impenhorabilidade e incomunicabilidade art 1848 Para tanto contudo deve externar as razões pelas quais está fazendo o gravame indicando por exemplo que considera o cônjuge da filha um perdulário ou receia que a mãe perca na mesa de jogo o que receber de herança Se o motivo alegado não tiver fundamento e se mostrar mera vingança do testador o juiz pode liberar o bem do gravame Também é cabível havendo justa causa a autorização judicial para a alienação dos bens gravados com subrogação do ônus naqueles em que se converter o produto da venda art 1848 2º 12 Sucessores testamentários Qualquer pessoa física ou jurídica em princípio pode ser nomeada testamentária não se exigindo que seja capaz Os menores e os incapazes assim como as fundações por organizar podem ser testamentários Aliás como já visto até mesmo quem ainda não foi concebido está legitimado também a receber bens do testador se a concepção ocorrer nos dois anos seguintes ao falecimento deste e vier a nascer com vida CC arts 1799 I e 1800 Algumas pessoas contudo pela participação que tiveram na elaboração da cédula mortuária ficam impedidas de receber bens em decorrência dela Aquele que a rogo do testador escreveu o testamento por exemplo não pode ser contemplado por nenhuma deixa Igualmente o cônjuge ou companheiro ascendentes e irmãos da pessoa incumbida de escrever a carta de últimas vontades não têm legitimidade para suceder o testador como testamentário CC art 1801 I A razão da vedação é fácil de perceber O testador se pediu a alguém para escrever a seu rogo o testamento provavelmente tinha dificuldades insuperáveis para fazêlo por si mesmo Podia ser que fosse analfabeto por exemplo Nesse caso o que escreve a carta mortuária a rogo poderia faltar à confiança nele depositada e beneficiarse ou a familiar seu com uma deixa não querida pelo testador Por razão semelhante o tabelião civil ou militar o comandante e o escrivão que colheu a manifestação de vontade do testador ou aprovou o testamento ficam igualmente excluídos da possibilidade de o sucederem como testamentários CC art 1801 IV Se eventualmente pudessem ser beneficiados pela disposição de última vontade faltarlhesia independência suficiente para a prática dos atos que por lei lhes competem Também as testemunhas do ato estão impedidas de receber por testamento CC art 1801 II Embora a participação delas não seja tão crucial como a de quem redige a disposição de última vontade ou a aprova as testemunhas poderão ser chamadas a juízo para relatar as circunstâncias em que o testador praticou o ato dependendo da modalidade de testamento elas serão chamadas inevitavelmente Ora para que possam depor livre e desinteressadamente convém que não sejam beneficiárias de nenhuma deixa Além dessas pessoas que de um modo ou de outro participam da confecção do testamento também não pode ser nomeado herdeiro ou legatário o concubino do testador casado a menos que o testador estivesse separado de fato do cônjuge sem culpa sua há mais de cinco anos CC art 1801 III Note que o sentido para a expressão concubino nesse dispositivo só pode ser o decorrente do art 1727 do CC isto é a pessoa com quem o testador mantinha relações não eventuais se havia impedimento para o casamento deles Qualquer disposição testamentária feita em favor dessas pessoas não legitimadas a receber herança ou legado por testamento é nula assim como são nulos os negócios indiretos feitos com o mesmo objetivo o contrato oneroso simulado compra e venda destinada apenas a acobertar uma doação e a interposição testar em favor de ascendente descendente irmão cônjuge ou companheiro do impedido Apenas a deixa feita em favor do filho do concubino que o seja também do testador é válida CC arts 1802 e 1803 Qualquer pessoa física ou jurídica pode ser em princípio nomeada herdeira ou legatária em testamento Estão porém impedidas de ser testamentárias as pessoas que participam do ato de testar como por exemplo as testemunhas escrivão ou quem escreveu o testamento a rogo do testador Também não pode ser testamentário o concubino do testador casado a menos que separado de fato há cinco anos ou mais Quem institui um menor seu herdeiro testamentário tem a faculdade de designar um curador de confiança para administrar os bens deixados CC art 1733 2º Pode ocorrer de o testador não confiar nos titulares do poder familiar pai ou mãe ou mesmo no tutor do menor a quem pretende beneficiar com o testamento Por considerálos perdulários ou desonestos pode recear que seus bens não sejam adequadamente administrados entre sua morte e a maioridade do testamentário trazendo a este prejuízos 2 O testamento O testamento é negócio jurídico solene unilateral e não receptício pelo qual o declarante manifesta a vontade acerca da destinação de seus bens após a morte podendo também dispor sobre alguns temas desprovidos de caráter patrimonial Em razão da classificação como negócio solene o testamento só é válido quando observadas estritamente as regras atinentes à forma e formalidades de sua elaboração Essas regras variam de acordo com a espécie de testamento subitem 21 Por ser unilateral e não receptício o testamento não depende para a sua constituição de outra vontade a não ser a do testador A vontade do testamentário não precisa com ela convergir para que o negócio jurídico exista validamente Tampouco é indispensável seu conhecimento do ato praticado Se ocorrer de o beneficiado pela deixa testamentária a recusar comprometese a plena eficácia do testamento que continua não obstante existente e válido No testamento em geral o testador cuida exclusivamente de questões patrimoniais definindo a destinação que pretende seja dada após sua morte aos bens Secundariamente o testamento pode ser o veículo de outras disposições de vontade de caráter não patrimonial como por exemplo a destinação do corpo para fins científicos ou altruísticos CC art 14 reconhecimento de filhos art 1609 III escolha de tutor art 1634 VI e reabilitação de sucessor indigno art 1818 Testamento é negócio jurídico solene unilateral e não receptício Assim só vale se observadas as formas e formalidades legais e independe para se constituir da convergência da vontade do testamentário ou da ciência deste O testamento é sempre o ato isolado do testador Na Alemanha admitese que os cônjuges testem em conjunto Veloso 2004125 mas na generalidade dos países de cultura jurídica enraizada no direito romano a pessoa só pode dispor para depois de sua morte por meio de instrumento no qual é a única testadora A proibição é decorrência da imoralidade dos contratos sobre herança de pessoa viva A conjugalidade confere ao testamento a natureza de um contrato A lei então proíbe o testamento conjuntivo ou em mão comum em suas três modalidades simultâneo em que os testadores dispõem no mesmo ato em favor de um mesmo beneficiário recíproco em que os testadores nomeiam um ao outro como testamentário ficando os bens do que falecer primeiro ao sobrevivente ou correspectivo em que cada testador faz suas deixas em contrapartida às do outro CC art 1863 21 Espécies de testamento As formas e formalidades do testamento correspondem à matéria jurídica de extrema importância Negócio jurídico solene terá a validade irremediavelmente comprometida ao menor descuido do testador e demais participantes do ato Os objetivos desse rigorismo extremado são os de conferir o maior grau de segurança possível à vontade do testador já que no momento de sua execução não terá mais como esclarecêla e chamarlhe a atenção para a importância do negócio jurídico que está praticando A lei classifica as formas do testamento em ordinárias e especiais As ordinárias compreendem o testamento público o cerrado e o particular as especiais o testamento marítimo aeronáutico e militar A relação é exaustiva já que não se admitem outros testamentos a não ser esses CC art 1887 As formas e formalidades variam de acordo com a espécie As formas ordinárias de testamento estão à disposição das pessoas em geral que não se encontram em situações que dificultem a manifestação da última vontade Já as formas especiais se destinam a atender os testadores surpreendidos em local que os impossibilita de formalizar seu testamento de modo ordinário Tanto assim que o testamento especial não terá eficácia se uma vez superada a circunstância que dificultava a elaboração do ordinário não se preocupou o testador em providenciálo Testamento público Este é a espécie mais utilizada de testamento O testador comparece a um Cartório de Notas e faz suas declarações perante o tabelião ou seu substituto legal O serviço notarial é da livre escolha do interessado independentemente da localização dos bens a testar ou de seu domicílio Lei n 893594 art 8º O tabelião assenta a declaração feita no livro de notas e lavra o instrumento que em seguida lerá em voz alta ao testador na presença de duas testemunhas Se o testador preferir ler o instrumento diretamente dispensase a leitura em voz alta pelo tabelião A leitura pelo testador contudo deve ser assistida pelas testemunhas e pelo oficial Finalmente o testador as testemunhas e o tabelião devem assinar o instrumento CC art 1864 III Se o testador não souber ou não puder assinar essa circunstância será declarada no instrumento pelo tabelião ou seu substituto legal e uma das testemunhas assinará o testamento a rogo do testador CC art 1865 Se o testador for inteiramente surdo lerá o instrumento a menos que seja também analfabeto hipótese em que designará alguém de sua confiança para o ler por ele na presença das testemunhas art 1866 O cego só pode testar por testamento público cuja leitura será feita em voz alta por duas vezes sendo uma delas pelo tabelião e a outra por pessoa de sua designação mencionandose o fato no instrumento art 1867 Testamento cerrado ou fechado Nessa espécie o testador redige o testamento de próprio punho ou por meio de outra pessoa a seu rogo e o assina Se preferir confeccionálo por processo mecânico datilografia ou processamento por microcomputador poderá fazêlo desde que autentique todas as folhas com sua rubrica ou assinatura Em seguida leva o documento pessoalmente ao Cartório de Notas para submetêlo à aprovação do tabelião A entrega do testamento ao tabelião deve ser feita na presença de duas testemunhas oportunidade em que o testador declarará que aquele documento contém suas disposições de última vontade e que deseja sua aprovação Diante disso o tabelião deve lavrar o auto de aprovação na presença de duas testemunhas lendoo em seguida em voz alta O auto de aprovação é redigido no instrumento apresentado ao tabelião imediatamente em seguida à última palavra escrita pelo testador Assinado o auto de aprovação pelos presentes o tabelião passa de imediato a cerrar e coser o instrumento aprovado Isto mesmo ele dobra as folhas do testamento ou as envelopa e as costura Aprovado e cerrado o testamento é entregue ao testador devendo o tabelião lançar em seu livro de notas o dia mês e ano em que ocorreu a aprovação e entrega do instrumento CC art 1874 Ao contrário do testamento público o conteúdo do cerrado somente será conhecido após o falecimento do testador Quem não quer que o conteúdo de seu testamento seja de conhecimento geral por temer a reação adversa dos familiares preteridos ou mesmo o desleixo dos lembrados deve obrigatoriamente se valer dessa espécie de testamento Só pode utilizar o testamento cerrado a pessoa alfabetizada CC art 1872 admitindose que o faça em qualquer língua e não somente em português art 1871 O surdomudo pode fazer testamento cerrado mas ao entregar o documento ao tabelião como não pode declarar em voz alta que nele se contém sua disposição de última vontade cuja aprovação requer deve escrever essa declaração de próprio punho na face externa do papel ou envelope art 1873 Testamento particular O testamento particular é escrito pelo testador de próprio punho ou por processo mecânico Em seguida ele deve ser lido por ele na presença de pelo menos três testemunhas Após a morte do testador é feito o registro do testamento em juízo com a citação dos herdeiros legítimos e ouvidas as testemunhas CC arts 1876 e 1877 Qualquer língua nacional ou estrangeira pode ser empregada na redação do testamento particular art 1880 Excepcionalmente o juiz poderá conferir validade ao testamento particular cujo instrumento não conta com a assinatura de testemunhas Imagine que alguém já havia contratado advogado para auxiliálo na celebração de testamento público ao qual já transmitira suas intenções mas estando sozinho começou a se sentir mal Redige então às pressas o testamento e vem de fato a morrer em seguida sem que ninguém testemunhasse a elaboração do documento São situações como estas que configuram a hipótese excepcional em que o juiz está autorizado a validar o papel assim assinado como sendo testamento particular válido CC art 1879 Testamento marítimo Se o testador está em viagem marítima em embarcação nacional poderá testar na presença do comandante e duas testemunhas O testamento que deverá atender aos requisitos do público ou do cerrado será registrado no diário de bordo e ficará em poder do comandante No primeiro porto nacional a que chegar deverá entregálo às autoridades administrativas CC arts 1888 e 1890 Não é admissível a adoção dessa espécie de testamento se o navio se encontrava em porto onde o testador pudesse desembarcar para testar por uma das maneiras ordinárias art 1892 Se o testador não morrer durante a viagem nem nos noventa dias seguintes ao desembarque em terra caduca o testamento Considerase que nesse caso por não ter aproveitado a oportunidade de formalizar sua disposição de última vontade por meio de testamento ordinário o testador não deseja mais que prevaleça o contido no documento lavrado na embarcação CC art 1891 Testamento aeronáutico À semelhança do marítimo o testamento aeronáutico é feito por quem se encontra em viagem Aqui o meio de transporte não é o navio mas o avião militar ou comercial CC art 1889 O comandante pode designar alguém tripulante ou passageiro para ouvir a declaração de última vontade já que não pode se desconcentrar de suas tarefas na condução do aparelho Também caduca o testamento se o testador não morrer na viagem e sobreviver ainda por mais noventa dias sem se interessar em ratificar seus termos por uma das formas ordinárias Os testamentos podem ser de forma ordinária ou especial São de forma ordinária o testamento público o cerrado e o particular e de forma especial o marítimo o aeronáutico e o militar Testamento militar Destinase esta espécie aos militares e demais pessoas a serviço das Forças Armadas quando se encontrem em campanha dentro ou fora do Brasil Se o testador souber e puder assinar sua declaração mortuária deve ser feita na presença de duas testemunhas caso contrário na de três devendo uma delas assinar o documento a rogo do testador CC art 1893 Se estiver empenhada em combate ou ferida poderá testar oralmente na presença de duas testemunhas mas o testamento assim feito não terá nenhum efeito se o declarante não morrer na guerra ou curarse do ferimento art 1896 e parágrafo único Se o oficial ou auditor a quem o testamento é entregue apuser nota em qualquer lugar do documento com a indicação do lugar dia mês e ano da apresentação assinandoa e colhendo a assinatura das testemunhas o testamento militar terá a mesma eficácia dos ordinários Se não se cumprir essa formalidade caducará o testamento se o testador vier a permanecer por pelo menos noventa dias seguidos em lugar em que possa testar de forma ordinária CC art 1895 22 Codicilos Codicilos são instrumentos de disposição de última vontade referente a assuntos de menor repercussão econômica Quando a pessoa deseja fixar instruções sobre seu enterro destinar esmolas ou legar bens móveis roupas ou joias de pouco valor não é necessário que o faça por testamento Basta que escreva suas instruções em documento datado e assinado para testar acerca desses assuntos CC art 1881 Uma cláusula de codicilo pode ser revogada também por codicilo isto é independentemente das formalidades do testamento Este também revogará o codicilo se for posterior e contiver disposição incompatível com as instruções anteriormente dadas art 1884 Se o testador quiser deixar em segredo enquanto viver as instruções feitas em codicilo poderá lacrálo Nesse caso ele deve ser aberto em juízo do mesmo modo que o testamento cerrado art 1885 23 Execução do testamento É condição para a execução do testamento o seu registro em juízo após a morte do testador A medida pode ser determinada pelo juiz de ofício ou a requerimento do testamenteiro de quem falo mais à frente ou de outro interessado como o herdeiro inventariante ou credor CC art 1979 O registro fazse por meio de procedimento de jurisdição voluntária cujo objetivo é a conferência pelo Poder Judiciário do atendimento dos requisitos formais do ato Outra finalidade do registro é o de deflagrar o prazo decadencial para a sua invalidação art 1859 Quando cerrado o testamento o registro também visa tornar conhecida a disposição de última vontade do testador até então recoberta pelo sigilo que ele entendeu conveniente conferirlhe O juiz ao receber o testamento cerrado e verificar que está intacto procede à sua abertura e manda que o escrivão o leia na presença de quem o levou lavrandose em seguida o termo correspondente Ouvido o representante do Ministério Público o juiz determinará o registro e cumprimento do testamento a menos que haja vício externo ou indício de nulidade ou falsidade CPC art 735 Se o testamento cerrado for aberto sem a observância dessas formalidades ele perde a validade e eficácia a menos óbvio que o rompimento da costura tenha ocorrido contra a vontade do testador por quem tinha o objetivo de frustrar a execução de suas disposições O registro do testamento público é o mais singelo porque se limita a conferir se o instrumento atende no plano formal aos requisitos da lei Pouca ou nenhuma dificuldade surge nessa conferência Sendo particular o testamento o juiz deve ouvir as testemunhas para que confirmem na sua presença a assinatura lançada no instrumento assim como a do testador Pelo menos uma das testemunhas deve estar viva ao tempo do registro e em condições para reconhecer a própria assinatura e a do testador para que o juiz determine o cumprimento do testamento CC art 1878 e parágrafo único Se todas estiverem mortas ou ausentes apenas em condições excepcionais poderá o juiz confirmar o instrumento que lhe for exibido art 1879 Os testamentos de forma especial que não puderem ser ratificados pelo testador por forma ordinária devem ser registrados como os particulares As testemunhas serão intimadas a comparecer em juízo para reconhecimento de suas firmas e da do testador Se o testamento é militar e tiver sido oral não haverá por óbvio instrumento a ser registrado mas o juiz tomará a oitiva das duas testemunhas que presenciaram a declaração do morto em combate Convencido da veracidade do depoimento determinará que se cumpra a disposição de última vontade do caído pela Pátria Registrado o testamento será intimado o testamenteiro a aceitar a testamentaria Se o testador não o houver nomeado ou se a pessoa por ele escolhida não puder ou não quiser assumir o encargo o juiz designará testamenteiro dativo CPC art 735 4º incumbindo então a testamentaria ao cônjuge supérstite e em sua falta a qualquer herdeiro legítimo ou testamentário CC art 1984 Depois da assinatura do termo de testamentaria pelo investido na função de testamenteiro cópia do testamento registrado é trasladada para os autos do inventário se já estiver tramitando O testamenteiro é a pessoa encarregada de dar cumprimento à disposição de última vontade contida no testamento a que serve No mais das vezes ele é escolhido pelo próprio testador que indicará o seu nome no testamento A substituição de testamenteiro pode ser feita por codicilo ainda que a nomeação tenha se dado em testamento CC art 1883 Ao testamenteiro incumbe de modo geral zelar para que a vontade do testador seja respeitada e que da execução do testamento resulte exatamente o pretendido pelo autor da sucessão Ele tem a obrigação não só de defender a validade do testamento se e quando questionada CC art 1981 como também a de cumprir as disposições testamentárias no prazo assinalado pelo testador ou em caso de omissão nos cento e oitenta dias seguintes à aceitação da testamentaria ou na prorrogação concedida pelo juiz arts 1980 e 1983 Deverá dar conta enfim de atribuições especificamente conferidas pelo testador como transmitir certa notícia a um familiar sobrevivo procurar reunir determinadas pessoas para assistirem à exibição de um filme gravado pelo autor do testamento etc art 1982 A posse e administração dos bens da herança podem ser da responsabilidade do testamenteiro se assim tiver determinado o testador sem herdeiro necessário CC art 1977 Se toda a herança tiver sido distribuída pelo testador em legados o testamenteiro será também o inventariante art 1990 a menos que haja herdeiros necessários Leite 2005709 O registro em juízo do testamento é condição para a sua válida execução que incumbe ao testamenteiro nomeado pelo testador ou dado pelo juiz Se o testamenteiro não for herdeiro nem legatário terá direito ao recebimento de um prêmio em contrapartida às funções que lhe foram cometidas chamado também de vintena O valor do prêmio será fixado pelo testador Em caso de omissão o juiz o determinará entre 1 e 5 da herança líquida CC art 1987 Havendo herdeiros necessários o prêmio será pago com a parte disponível da herança e sobre o seu valor apenas incidirá o percentual correspondente Diniz 2005 6287 O objetivo da restrição é proteger a legítima que poderia ser facilmente fraudada por meio da atribuição de elevado prêmio a quem se querendo por testamentário foi nomeado testamenteiro 24 Revogação e rompimento do testamento O testamento é um ato personalíssimo e pode ser alterado no todo ou em parte a qualquer momento pelo testador Ninguém titula nenhum direito sucessório por ter sido uma vez nomeado testamentário se o testador posteriormente mudou de opinião e resolveu dar destino diverso a seus bens Qualquer cláusula de um testamento pode ser revogada pelo testador exceto aquela em que se declarar pai de alguém O reconhecimento de paternidade é irrevogável e prevalece produzindo seus efeitos mesmo sendo revogado o testamento em que se abrigara CC art 1610 À exceção do reconhecimento de paternidade portanto qualquer outra disposição de vontade de conteúdo patrimonial por exemplo tornar inalienável bem da legítima ou extrapatrimonial nomeação de tutor pode ser revista alterada aprimorada limitada estendida desfeita suprimida etc A revogação compreende não só o ato de completa alteração da disposição de última vontade contida no testamento anterior como simples mudanças pontuais Em geral para que não restem dúvidas acerca de sua exata vontade quando não estiver mais aqui para esclarecêla o testador tem todo o interesse em refazer o testamento a cada vez que resolve modificálo por menor que seja a mudança pretendida Desse modo facilitase a compreensão de sua última vontade por estar ela toda contida no testamento de data mais recente De qualquer modo se o testador não fizer nenhuma referência expressa da vontade de alterar total ou parcialmente os testamentos anteriores consideramse vigentes as disposições neles contidas que não sejam incompatíveis com os posteriores CC art 1970 e parágrafo único Para que continuem valendo e tendo eficácia essas disposições o testador não precisa repetilas ou ratificálas expressamente no novo testamento bastando que sejam conciliáveis com as previstas neste documento Suponha que uma pessoa sem herdeiros necessários tinha uma casa e uma fazenda e que por seu primeiro testamento deixou a casa ao filho de um amigo Se posteriormente essa pessoa faz outro testamento apenas legando a fazenda a uma prima distante ele não revoga o anterior porque são compatíveis Claro está por outro lado que se o testador na segunda carta mortuária consigna a vontade de deixar a casa a essa prima operase a revogação do testamento anterior mesmo não havendo cláusula expressa nesse sentido A revogação do testamento veiculase por qualquer uma das formas pelas quais o ato pode ser praticado CC art 1969 Um testamento público pode ser revogado por um cerrado ou viceversa Para ter o efeito revogatório contudo o documento deve ser elaborado com a forma e formalidades da lei Caso contrário será inválido e portanto não terá o efeito desconstitutivo pretendido pelo testador Existe uma só exceção a essa regra em que é admissível a revogação de um testamento sem a elaboração de novo Tratase da inutilização do testamento cerrado Se o próprio testador abre os lacres ou rasga o documento ou ainda se consente que alguém o faça então se considera que a vontade dele era a de revogar o testamento cerrado CC art 1972 A invalidação da revogação pode estar relacionada à capacidade do testador de externar sua livre vontade a obediência à forma e formalidades do testamento revogador ou a vício de consentimento Se o testador não estava na plenitude de seu discernimento ao declarar a revogação da disposição anterior fora coagido a revogar ou se o fez por forma inadequada ou sem atendimento às formalidades exigidas pela lei a revogação não acontece Continua a prevalecer o último dos testamentos outorgados enquanto estava lúcido livre e declarou a vontade de modo formalmente impecável Qualquer outra causa que torne inválido ou ineficaz o testamento revogador não será suficiente para suprimir seus efeitos revogatórios Em outros termos se o testamentário indicado nele não era capaz para receber a deixa servira por exemplo de testemunha no ato a revogação remanesce íntegra se o novo beneficiado renunciar à herança ou legado que o testador lhe destinara nem por isso revigorase o testamento anterior se ocorrer qualquer outra hipótese de caducidade da nova disposição mortuária ela não terá o efeito de repristinar o testamento anterior Nessas situações privilegiase o atendimento à vontade do testador Mesmo tendo caducado o testamento revogador havia nele expressa a vontade de mudar a disposição mortuária pretérita não havendo motivos para desprezála É o que prevê a lei A revogação produzirá seus efeitos ainda quando o testamento que a encerra vier a caducar por exclusão incapacidade ou renúncia do herdeiro nele nomeado não valerá se o testamento revogatório for anulado por omissão ou infração de solenidades essenciais ou por vícios intrínsecos CC art 1971 O testador tem sempre a faculdade de revogar no todo ou em parte o testamento anteriormente outorgado desde que o faça atendendo às formas e formalidades da lei Apenas o reconhecimento de paternidade feito em testamento é insuscetível de revogação Diferese a revogação do rompimento do testamento aquela decorre da vontade expressa do testador e este diretamente da lei O rompimento se verifica com a superveniência de descendência ou em razão do desconhecimento da existência de herdeiros necessários CC arts 1973 e 1974 Revogação e rompimento têm os mesmos efeitos desconstitutivos da disposição de vontade outorgada pelo testador O testador sem descendentes nem outros herdeiros necessários provavelmente teria disposto sobre a destinação de seus bens de modo diverso se a situação fosse outra Eventualmente até mesmo não teria se preocupado em fazer testamento já que morrendo seus bens seriam destinados a familiares próximos Atenta a essa circunstância a lei determina o rompimento do testamento quando feito por quem não tinha descendência mas veio posteriormente a ter assim como por quem desconhecia a existência de herdeiros necessários Imagine que o testador desconhecia que era o genitor de um rapaz Engravidara na juventude uma moça que preferiu nunca lhe contar sobre o filho Não tinha outros herdeiros necessários e por isso testou a totalidade de seus bens para uma instituição de caridade Morreu sem saber que havia feito descendência Esse rapaz pode provando a relação biológica de filiação ingressar com a petição de herança na qual será declarado o rompimento do testamento Ainda nesse caso a lei está preocupada com o atendimento estrito à vontade do testador Presume que ele não deixaria ao desamparo o filho se soubesse de sua existência Veja que não é condição do rompimento do testamento o desconhecimento pelo testador da existência do descendente Em relação aos demais herdeiros necessários ascendentes e cônjuge ou companheiro o desconhecimento é requisito para que se rompa a carta mortuária Quer dizer o testador quando testou considerava que seu pai desaparecido num acidente no mar há alguns anos já estaria morto ignorando que ainda vivia ou que a esposa ausente não mais vivesse em razão de notícias recebidas nesse sentido Em relação à descendência contudo pode ocorrer o rompimento ainda que o testador em vida soubesse dela É o caso de quem ao testar não tinha filhos mas vem a têlos algum tempo depois Ainda não providenciou a revogação do testamento ou até mesmo dele se esqueceu A superveniência de descendente antes ou depois da morte do testador leva sempre ao rompimento do testamento Se o testador ainda quiser beneficiar o testamentário após a vinda da descendência até então inexistente deve renovar a declaração em nova cédula mortuária Rompese o testamento desconstituindose seus efeitos quando sobrevém ao testador descendência ou se existiam herdeiros necessários que ele desconhecia O art 1975 do CC é regra despicienda Ao afirmar que não se rompe o testamento quando o testador sabia da existência dos herdeiros necessários afirma o óbvio já que o rompimento tem por pressuposto a inexistência de descendentes ao tempo do testamento ou o desconhecimento da existência de herdeiros necessários Se eles existem e o testador ao testar sabe disso não é mesmo caso de rompimento Como acentuado pela tecnologia civilista o dispositivo apenas auxilia a discriminar as hipóteses de rompimento do testamento ou redução da disposição testamentária Se os herdeiros necessários eram desconhecidos do testador rompese o testamento se conhecidos reduzse eventual excesso à parte disponível da herança Veloso 2003385386 3 Disposições testamentárias No capítulo sobre as disposições testamentárias o Código Civil disciplina dois temas de direito das sucessões De um lado dedicase com afinco às normas destinadas à interpretação da última vontade do defunto subitem 31 de outro trata das condições de validade das cláusulas contidas no testamento subitem 32 Também nesse capítulo o Código entendeu oportuno tratar de assunto não exclusivo da sucessão testamentária que transcende as fronteiras do direito das sucessões para alcançar também o contratual e o real Refirome às limitaçõesencargos ao direito de propriedade isto é das cláusulas de inalienabilidade incomunicabilidade e impenhorabilidade que podem ser instituídas não só por testamento como por contratos gratuitos CC art 1911 e parágrafo único Delas tratei anteriormente razão pela qual não são aqui mencionadas Cap 43 subitem 32 31 Interpretação do testamento Cuidou o legislador de esmiuçar as normas de interpretação dos testamentos porque se trata de negócio jurídico unilateral cuja execução pressupõe a morte do declarante Não haverá portanto como se buscar a real intenção do sujeito de direito quando se procurar dar cumprimento à vontade dele Classifico para fins didáticos as regras de interpretação da lei em três categorias Regras gerais de interpretação A mais importante regra de interpretação do testamento está abrigada no art 1899 do CC e estabelece que em caso de divergência prevalecerá aquela que melhor assegure a observância da vontade do testador Desse modo comportando qualquer cláusula do testamento mais de uma interpretação o juiz deve procurar entender qual teria sido a vontade do testador Para tanto podese valer dos mesmos métodos de interpretação da lei tais como o lógico e o sistemático mas qualquer outro dado psicológico informação relevante ou fato da vida do testador que possibilite crer que sua vontade teria sido diversa deverá servir de elemento preponderante na interpretação do testamento Quer dizer se interpretado o documento de forma lógica chegarse a resultado inteiramente incompatível com traços de caráter do testador o dever de busca da verdadeira vontade deste cumprese privilegiando a interpretação compatível com as características pessoais do declarante e não com o raciocínio lógico Regras referentes à pessoa do testamentário O herdeiro ou legatário a quem o testador pretende beneficiar deve ser nomeado pelo testamento de forma precisa de modo que não gere dúvidas em relação à sua identidade Não se exige a qualificação civil do testamentário embora mencionála seja uma maneira segura de identificálo Admitese a referência apenas ao prenome do beneficiário desde que acompanhado de informações outras que assegurem a identificação por exemplo meu filho Antonio se só um dos filhos chamase assim ou os pais do meu esposo Benedito etc Em geral não é válida como se verá a disposição testamentária em favor de pessoa incerta cuja identidade não se pode averiguar O erro na designação da pessoa do herdeiro ou legatário importa a invalidação da deixa Se o testador pretendia beneficiar alguém mas se enganou ao identificálo indicando pessoa não existente ou que pode ser mais de uma não há como emprestar à declaração qualquer validade Contudo todo esforço deve ser feito para que a vontade do morto se concretize Assim o contexto do testamento outros documentos ou fatos inequívocos podem servir à identificação do testamentário que o testador tinha em mente ajudar CC art 1903 Se feita disposição genericamente em favor dos pobres dos estabelecimentos particulares de caridade ou os de assistência pública considerase que o testador pretendeu beneficiar os de seu último domicílio salvo se tiver indicado expressamente localidade diversa CC art 1902 Se o testamento não especificar a quem pretende beneficiar entre os estabelecimentos particulares ou públicos aqueles terão preferência sobre estes parágrafo único Regras referentes à quota testada ou ao legado Esperase que o testamento seja claro e indubitável na menção da deixa isto é na identificação da quota hereditária ou do legado que o testador pretende seja transmitido com sua morte respectivamente ao herdeiro ou legatário nomeado Em relação à quota hereditária se o testador tiver nomeado dois ou mais herdeiros sem especificar a parte cabível a cada um a partilha será feita entre eles de modo igual CC art 1904 Se testou 30 de sua herança a dois sobrinhos sem discriminar as quotas cada um terá direito a 15 Se a nomeação de alguns dos herdeiros tiver sido feita individualmente e de outros de forma coletiva estes últimos serão considerados um grupo com direito a quota igual à dos primeiros CC art 1905 Se o testamento destina toda a parte disponível a Carlos Darcy e aos filhos de Evaristo os dois primeiros ficam com um terço cada e os últimos dividem o terço restante Tendo sido destinados quinhões para alguns dos herdeiros mas não para todos o que remanescer da parte disponível depois da destinação das quotas especificadas será dividido igualmente entre os não aquinhoados com percentual específico CC art 1907 Desse modo constando do testamento a nomeação como herdeiros de Fabrício Germano e Hebe mas com a especificação apenas da quota do primeiro fixada em 40 da parte disponível os últimos ficam com 30 cada Caso a soma das quotas hereditárias dos testamentários não absorva toda a parte disponível da herança entendese que sobre o remanescente não quis o testador dispor Pertence então aos herdeiros legítimos a quota não destinada aos testamentários CC art 1906 O testamento deve identificar com clareza a pessoa do sucessor testamentário bem como sua quota hereditária ou legado Não tendo sido claro o testador normas legais de interpretação do documento auxiliam na observância de sua última vontade Quanto ao legado também invalida a disposição testamentária o erro na sua identificação desde que não existam outros elementos contexto do testamento outro documento ou fato inequívoco que permitam sua correção CC art 1903 Imagine que o testamento mencione como legado simplesmente meu apartamento quando o testador ao morrer deixara mais de um Em princípio a cláusula é inválida não tendo o legatário direito a qualquer um dos imóveis do falecido Mas se provar que na data do testamento o testador já era dono somente de um dos apartamentos deixados então será possível determinarse o legado Se o testador identificar o legado mas dele excluir expressamente um ou alguns objetos evidentemente o legatário não terá direito a eles CC art 1908 Ao legar uma casa o testador pode ressalvar que as obras de arte nela existentes não compõem o legado Essas obras de arte se não tiverem sido legadas a outro testamentário serão destinadas aos herdeiros do testador 32 Validade das cláusulas testamentárias São duas questões diferentes a validade do testamento e a de suas cláusulas Para ser válido o testamento deve ser feito por pessoa capaz que se encontre em seu pleno discernimento e observar as formas e formalidades legais Atendidos esses requisitos o primeiro subjetivo e o segundo objetivo o testamento é válido enquanto negócio jurídico Contudo um testamento válido pode conter cláusulas inválidas isto é de conteúdo contrário ao direito positivo O testador era capaz estava no seu pleno discernimento e foram observadas a forma e formalidades da lei mas em uma ou mais cláusulas ou até mesmo nelas todas ao dispor sobre seus bens ou matéria extrapatrimonial externou vontade incompatível com as prescrições da ordem jurídica Assim como o testamento válido pode abrigar disposições inválidas o inverso também se verifica Um testamento inválido pode ter cláusulas válidas e plenamente eficazes quando a invalidade decorrer de desatendimento de forma ou formalidade A nomeação de tutor por exemplo pode ser veiculada por qualquer instrumento autêntico e não só por testamento CC art 1729 parágrafo único Se marido e mulher num único instrumento nomeiam tutor para seus filhos dando instruções sobre a administração de alguns bens a declaração não pode ser considerada a de um testamento válido ainda que tenha sido este o nome dado ao documento A nomeação do tutor porém remanesce inteiramente válida porque poderia ter sido feita mesmo sem a observância da forma e formalidades do ato testamentário Também o reconhecimento de paternidade feito por meio de testamento inválido tem inteira validade e eficácia Já cláusulas como a de reabilitação do indigno ou deserdação têm sua validade comprometida sempre que inválido for o testamento porque só por este negócio jurídico podem ser veiculadas Veja que o testamento só pode ser invalidado no caso de incapacidade do testador carência de discernimento pleno ou inobservância de forma ou formalidade Quando o testador teve ao testar a vontade deturpada por erro dolo ou coação o testamento será válido na medida em que preenchidos esses requisitos Já a disposição testamentária maculada por qualquer um desses vícios será anulável A distinção é relevante porque variam os prazos de decadência do direito de pleitear a invalidação do testamento ou da disposição testamentária Enquanto no primeiro caso ele é de cinco anos contados do registro CC art 1859 no último é de quatro anos a partir do conhecimento do vício art 1909 e parágrafo único Quando o testamento é inválido todas as suas disposições também serão exceto as que podiam ser veiculadas por outro tipo de instrumento como a nomeação de tutor e o reconhecimento de paternidade Por outro lado o testamento pode ser válido mas conter disposições inválidas porque viciadas por erro dolo ou coação ou por contrariar o direito positivo Afora a hipótese de vício de consentimento por erro dolo ou coação a lei invalida as seguintes disposições testamentárias a delimitação no tempo do direito hereditário objeto de testamento considerandose não escrita qualquer cláusula que especifique termo inicial ou final o testador só pode fixálos para o caso de legados salvo no caso de substituição fideicomissária subitem 52 CC art 1898 b nomeação de herdeiro ou legatário sujeita à condição de que o nomeado também faça testamento em favor do testador ou de terceiro considerase imoral essa atitude captatória que a rigor corresponde a negócio sobre herança de pessoa viva art 1900 I c favorecimento de pessoa incerta a ser determinada por terceiro art 1900 III a menos que o testador indique duas ou mais para alguém por ele designado escolher como testamentário art 1901 I d atribuição ao próprio legatário ou a terceiro do direito de especificar o legado art 1900 IV exceto no caso de remuneração por serviços prestados ao testador em razão da moléstia da qual faleceu cujo valor poderá ser arbitrado por herdeiro ou outra pessoa art 1901 II e nomeação como testamentário de pessoa impedida como quem testemunhou o ato ou o concubino de testador casado art 1801 II e III 4 Legados Respeitados os direitos de herdeiros necessários se houver o testador pode destinar ao sucessor testamentário todo o seu patrimônio uma quota deste ou bens singulares Nos dois primeiros casos o testamentário é herdeiro e participa juntamente com os demais do condomínio hereditário instituído pela abertura da sucessão enquanto não ultimada a partilha No último caso ele é legatário Terá a propriedade dos bens legados desde a morte do testador mas não a sua posse CC art 1923 O legado continuará na posse do espólio para que se verifique se a sua destinação ao testamentário não prejudica os direitos de herdeiros necessários ou credores Constatada a inexistência de prejuízos dessa ordem os herdeiros entregam a coisa legada ao legatário Percebese portanto que o testamentário a quem se atribui um legado não é condômino da herança Sua posição na verdade é a de credor de uma obrigação de fazer imposta pelo testador aos seus herdeiros Uma obrigação que por estar condicionada à compatibilidade com os direitos de herdeiros necessários e credores não pode ser cumprida tão logo aberta a sucessão O pagamento do legado em suma é feito no transcorrer do inventário Se não houver herdeiros o cumprimento do legado cabe aos legatários na proporção do que recebem na sucessão salvo se o testador houver atribuído a incumbência ao testamenteiro ou a outra pessoa de sua escolha CC art 1934 Não é devido o pagamento do legado enquanto as partes litigam sobre a validade do testamento se pende condição ou ainda não venceu o termo inicial fixado pelo testador CC art 1924 Desse modo se a validade da cédula mortuária é questionada judicialmente o espólio só estará em mora se uma vez julgado válido o legado deixar de entregálo após o fim da ação Igualmente não há mora se o legatário deve cumprir um encargo para que surja o direito sucessório por exemplo formarse em curso superior até certa idade transigir numa demanda contra familiar do testador etc enquanto não o fizer ou se certa condição ainda não ocorreu Finalmente enquanto não transcorrer o prazo fixado pelo testamento como termo inicial do direito ao legado igualmente não estará em mora o espólio O legado em geral alcança bem que na data da abertura da sucessão era da propriedade do testador a exceção diz respeito ao legado de coisa alheia subitem 42 Se o objeto do legado existira mas se perdera é impossível sua entrega se havia sido alienado não pode mais ser entregue porque nesse caso ocorreria transmissão a non domino Se o proprietário de uma casa por meio de testamento deixoua por legado a um sobrinho mas no ano seguinte precisando de dinheiro para custear seu tratamento de saúde precisou vendêla é ineficaz essa disposição de última vontade Os herdeiros não têm como entregar ao legatário um bem que não mais integra a herança mas o patrimônio alheio Se o bem na abertura da sucessão pertencia apenas em parte ao testador a ineficácia será parcial Se aquele proprietário necessitado vendera a metade ideal da casa ao irmão remanesce eficaz o legado feito ao sobrinho relativamente à outra metade Em geral o legado consiste no direito sucessório singular sobre coisa de propriedade do testador O espólio é obrigado a entregála ao legatário a menos que isso implique prejuízo aos direitos dos herdeiros necessários ou de credores Correm por conta exclusiva do legatário todos os riscos sobre o legado a partir da abertura da sucessão Como é dele já a propriedade da coisa desde então vindo a perecer ou se deteriorar cabelhe suportar as consequências Também são do legatário as despesas com o pagamento do legado Apenas estará livre dos riscos e despesas se o testamento expressamente estipular nesse sentido CC art 1936 Notese porém que a propriedade do legatário é resolúvel Se o pagamento do legado prejudicar a legítima ou privar o espólio de recursos para o atendimento a direito de credor o legatário terá o direito de propriedade resolvido Nesse caso não será responsável pelos riscos da coisa nem por despesas a ela correspondentes tendo o direito ao ressarcimento daquelas em que incorreu na expectativa de vir a adquirila 41 Regras sobre determinadas hipóteses de legado Legado de coisa incerta O legado a rigor definese por exclusão como o direito sucessório não universal isto é não referente a patrimônio ou quota dele Na maioria das vezes recai sobre coisa certa mas isso não significa a impossibilidade de se destinar ao legatário coisa incerta definida apenas pelo gênero qualidade e quantidade O testador pode deixar ao testamentário cem cabeças de gado nelore por exemplo Apesar da deixa de coisa incerta será a transmissão singular também nesse caso e portanto legado No legado de coisa incerta mesmo que ela não se encontre no patrimônio do testador ao tempo de sua morte os herdeiros terão a obrigação de entregála ao legatário Com recursos da herança devem adquirir a coisa no mercado para transmitila ao testamentário Quando o legado diz respeito a coisa certa se ela não existe mais ou não chegou a existir nunca existiu no patrimônio do testador dáse como visto a ineficácia da disposição de última vontade Mas como o gênero não perece uma vez legada coisa incerta o legatário terá direito de recebêla mesmo que o testador não a tivesse em seu patrimônio CC art 1915 A concentração isto é a individualização da coisa a ser entregue ao legatário Cap 14 subitem 24 caberá ao herdeiro que é o devedor da obrigação Ele não poderá escolher contudo a pior nem estará obrigado a entregar a melhor devendo guardar o meiotermo CC arts 244 e 1929 Esses mesmos critérios devem ser utilizados pelo juiz ou terceiro a quem couber proceder à concentração art 1930 Se o testador expressamente atribuiu ao testamentário o direito de escolha ele poderá exigir a coisa melhor dentre as contidas na herança art 1931 Não tendo o autor da sucessão deixado em seu patrimônio nenhuma coisa das indicadas pelo gênero qualidade e quantidade no legado o legatário terá que se contentar com a mediana Se o herdeiro ou legatário a quem couber o direito de escolha falecer antes da concentração seus sucessores passam a titularizálo CC art 1933 Legado alternativo Querendo o testador legar a alguém uma de duas ou mais coisas certas a concentração será feita após o seu falecimento Não se confunde com o legado de coisa incerta porque no alternativo os bens estão sempre determinados individuados Consistindo por exemplo a deixa num apartamento ou numa casa do patrimônio do testador o legatário receberá um dos imóveis A escolha será feita por quem o próprio testador indicar Em caso de omissão cabe ao herdeiro escolher o bem a ser legado CC art 1932 Perecendo uma das coisas legadas alternativamente subsiste o direito quanto à outra e se for o caso à parte preservada da perdida art 1940 No legado alternativo também se transmite aos herdeiros o direito de escolha não exercido em vida pelo legatário Legado de coisa a ser retirada em determinado lugar Se o testador destinou ao testamentário uma coisa certa mencionando em testamento que ela se encontrava num determinado lugar será ineficaz a deixa se após a morte do testador ela não mais estiver lá Imagine que o testamento legava a uma pessoa todo o dinheiro de um cofre bancário chegando até mesmo a estimarlhe o valor Se aberto o cofre não se encontra nele guardado nenhum dinheiro o legado não será eficaz CC art 1917 A norma de ineficácia porém não incide se a remoção do bem legado tiver sido transitória Se o testador legou todo o mobiliário de uma casa ao testamentário mas na data da abertura da sucessão ele não se encontrava no imóvel porque estavam sendo realizadas reformas no local em função das quais a mobília havia sido guardada num depósito a transitoriedade da remoção confere eficácia ao legado O legatário tem direito à mobília O que interessa aferir nesse caso é o ânimo do testador ao remover o bem do local indicado no testamento Se o fez com ânimo definitivo revogou o legado se provisório manteve a vontade de beneficiar o legatário Rodrigues 2003 7203205 Legado de crédito O testador pode destinar ao legatário um crédito por ele titularizado perante terceiros Neste caso os herdeiros devem transferir ao testamentário os títulos de dívida correspondentes CC art 1918 1º Se os créditos legados estavam documentados em contratos os instrumentos contratuais devem ser entregues ao testamentário Documentados os créditos em nota promissória letra de câmbio ou outros títulos cambiais a entrega da cártula deve também ser feita mas se o testador não a houvera endossado em vida o legatário não terá acesso à execução por força do princípio da literalidade dos direitos cambiários Para haver seu crédito nesse caso o legatário deverá mover contra o devedor do título a ação de conhecimento provando o seu direito com a exibição do título de crédito e do testamento A eficácia do legado de crédito limitase ao direito creditório do testador titulado na data da abertura da sucessão Se o devedor já havia pago parte da obrigação o legatário só terá direito ao crédito correspondente ao saldo em aberto CC art 1918 Legado de quitação de dívida O legado pode consistir na quitação de dívida do legatário perante o testador Também a sua eficácia está limitada ao valor da obrigação na época da morte deste CC art 1918 Se entre a data do testamento e a do falecimento foi paga a dívida ou parte dela o legatário não terá direito de reclamar do espólio a restituição do que pagou As dívidas posteriores ao falecimento também não são alcançadas pelo legado Legado em favor de credor Quando o testador beneficia com legado alguém a quem deve não se considera que esteja com isso pagando a dívida Para que tenha o efeito de quitar a obrigação o legado deve ser deixado sob essa condição expressa Se o legatário achar que lhe convém aceita o legado no lugar do pagamento mas se considerar desinteressante essa alternativa renuncia ao legado e cobra o espólio A natureza compensatória do legado em outros termos depende de expressa previsão no testamento CC art 1919 Em sua falta considerase que o testador quis beneficiar o testamentário com a deixa sem prejuízo do pagamento do crédito a que fazia jus Legado de alimentos Se o legado consistia em alimentos os herdeiros devem prover o legatário do necessário ao sustento saúde vestuário e moradia deste durante toda sua vida bem como à sua educação enquanto for menor CC art 1920 Evidentemente esse legado não pode ultrapassar as forças da herança ou se existirem herdeiros necessários as da parte disponível dela Se os alimentos devem ser pagos periodicamente os herdeiros são obrigados a entregar o legado no termo inicial do período a menos que o testador tenha estabelecido de outro modo CC art 1928 parágrafo único Legado de usufruto Pode o legado atribuir ao legatário não a propriedade de um bem mas o seu usufruto Cap 48 item 3 Nesse caso o direito real sobre a coisa alheia perdurará por toda a vida do legatário a menos que o testamento estabeleça outro limite temporal CC art 1921 Legado de imóvel Quem deixa legado de imóvel e depois adquire novas áreas contíguas deve esclarecer no testamento se ao falecer também as estará destinando ao legatário ou não Em caso de omissão a lei considera que o aumento do bem não está abrangido no legado CC art 1922 Em relação às benfeitorias necessárias úteis ou voluptuárias a presunção se inverte incorporam se ao legado a menos que o testador tenha disposto de modo diverso Legado de dinheiro Se o objeto do legado é dinheiro os juros só vencem a partir da constituição em mora do espólio CC art 1925 Esta não se verifica como já acentuado enquanto se litiga sobre a validade do testamento na pendência de condição ou termo Mas se o dinheiro deve ser entregue ao legatário a título de renda vitalícia ou pensão periódica considerase o termo inicial da obrigação a data da morte do testador art 1926 a menos que ele tenha disposto de outra maneira Legado em prestações periódicas Se o legado consistir na entrega periódica de dinheiro ou outra coisa o período definido pelo testador se inicia com sua morte O legatário fará jus ao recebimento da prestação no termo final do período não podendo exigila antes Mas se falecer no transcurso de um período os herdeiros do testador ficam obrigados a pagálo por inteiro aos sucessores do testamentário CC arts 1927 e 1928 Assim se o legado consistia no pagamento de certa quantia de dinheiro a cada ano em favor do legatário enquanto este viver os herdeiros do testador estão obrigados ao pagamento no mesmo dia da morte deste que recair nos anos seguintes até o daquele em que falecer o credor Essas regras claro aplicamse no caso de o testador não ter estabelecido critério diverso Legado com encargo Se o testador limitar sua liberalidade sujeitando o legado a encargo o direito sucessório do legatário depende para se constituir do cumprimento deste Se por exemplo fixou que o testamentário deveria parar de fumar ou mudarse para determinada cidade enquanto nela residissem seus pais o legado só será devido na medida em que o encargo se cumpra Aos legados com encargo aplicamse as normas da doação gravada CC art 1938 Cap 32 item 2 42 Legado de coisa alheia Em geral o legado consiste em direito sucessório que tem por objeto bem da propriedade do testador Contempla a lei contudo a hipótese em que ele estabelece como legado a entrega ao legatário de um bem da propriedade de herdeiro ou outro legatário Tratase de um anacronismo inimaginável que o direito brasileiro continua a contemplar como se o modelo predominante de organização familiar fosse a tradicional em que o pai tinha amplos poderes sobre os filhos Na aplicação das normas sobre legado de coisa alheia portanto cabe ao juiz sempre verificar a razoabilidade da disposição testamentária Se não houver racionalidade econômica na vontade externada pelo defunto no sentido de assegurar efetiva vantagem para o herdeiro ou legatário ao qual imputou a obrigação de pagar o legado a disposição deve ser considerada inválida em vista da forma contemporânea de organização da família Ao legar coisa alheia a rigor o testador fixa as condições para o exercício dos direitos sucessórios do devedor do legado Tanto assim que se o obrigado não fizer a entrega considerase que renunciou à herança ou legado a que faria jus na condição de herdeiro legítimo ou testamentário ou de legatário CC art 1913 Suponha que Irene tem um filho João que é seu único familiar sucessível Ela possui vasto patrimônio enquanto João é dono de um apartamento somente Ao testar Irene dispõe que João deve entregar a Luiz seu apartamento a título de legado Nesse caso João tem o seu direito sucessório de herdeiro condicionado ao pagamento do legado em favor de Luiz Se faz esse pagamento sucede Irene na totalidade do patrimônio da mãe se opta por continuar mantendo o apartamento renuncia à herança que se torna no meu exemplo jacente No caso de o legado consistir na entrega de bem de propriedade de herdeiro o obrigado a cumprilo poderá regredir contra os demais para que as quotas hereditárias correspondam ao direito sucessório de cada um deles CC art 1935 Se no exemplo acima Irene tivesse deixado também um cônjuge Marco com quem era casada em regime de participação final nos aquestos na divisão da herança entre ela e João o valor do apartamento entregue a Luiz deve ser computado para que no final o obrigado ao legado não fique prejudicado João em suma pode cobrar de Marco metade do valor do apartamento já que a quota hereditária dela corresponde a esse percentual O testador pode estabelecer que o legado será pago por um de seus sucessores herdeiro ou legatário mediante a entrega ao beneficiário da deixa testamentária de bem da propriedade deles e não do autor da sucessão Nesse caso se o sucessor ao qual foi imputada a obrigação de pagar o legado não o fizer considerase que renunciou ao seu direito na sucessão do testador No legado de coisa alheia o devedor não é o espólio mas o herdeiro ou legatário ou herdeiros ou legatários a quem o testador incumbiu de dispor de bem de sua propriedade Pode se referir a qualquer objeto suscetível de transmissão via legado como crédito quitação de dívida usufruto etc 43 Caducidade do legado O direito sucessório ao legado não se constitui ou é resolvido nas hipóteses de caducidade Lista a lei as seguintes a a modificação pelo testador da coisa legada a ponto de subtrairlhe a forma original por exemplo se o testamento menciona joias em ouro mas o testador as derreteu para empregar o material em restaurações dentárias b a alienação do bem legado a qualquer título no todo ou em parte limitandose a caducidade nesse último caso à porção alienada c por perecimento ou evicção da coisa ocorrida antes ou depois do falecimento do testador a menos que a culpa tenha sido do herdeiro obrigado a entregar o legado d exclusão do legatário por indignidade e falecimento do legatário antes do testador ressalvada a hipótese de substituição testamentária CC art 1939 5 Substituições A liberdade para alguém dispor sobre seus bens após a morte é bastante larga no direito brasileiro Esbarra apenas em algumas limitações como o direito à legítima dos herdeiros necessários Em decorrência da ampla liberdade que titula o testador pode dispor inclusive sobre a destinação de seus bens para o caso do falecimento do testamentário Corresponde a essa prerrogativa o instituto das substituições que pode ser vulgar recíproca subitem 51 ou fideicomissária subitem 52 Se não for dado substituto ao herdeiro ou legatário nomeado em testamento a porção correspondente acrescerá à quota de outro sucessor subitem 53 51 Substituição vulgar e recíproca Na substituição vulgar e recíproca o testador disciplina a destinação de seus bens no caso de o testamentário vir a falecer antes dele Relembrese que estar vivo ao tempo da abertura da sucessão é condição essencial para a titularidade do direito sucessório Desse modo se o testamentário falece antes do testador ele nada recebe e consequentemente nada transmite aos seus sucessores A parte a ele destinada em testamento será acrescida à quota hereditária dos demais Considere que Nair que tem seu irmão Orlando como único familiar sucessível declara em testamento Nomeio meu herdeiro universal Quirino Nair nada dispôs sobre a eventual substituição de Quirino Em ocorrendo de o herdeiro testamentário falecer antes do testador como não há substituto nomeado a herança será toda do legítimo no caso Orlando Se Nair quisesse evitar essa consequência poderia indicar como substitutos de Quirino por exemplo os sucessores dele mediante cláusula aliás bastante comum nos instrumentos testamentários de substituição redigida como a seguinte Nomeio meu herdeiro universal Quirino ou se falecido for seus sucessores A substituição terá lugar tanto na hipótese de o testamentário não poder aceitar a herança ou legado porque morreu ou foi declarado indigno como na de ele renunciar As duas alternativas induzem à substituição indicada pelo testador ainda que ele se refira a uma delas somente CC art 1947 in fine No exemplo acima malgrado o testamento diga respeito unicamente à pré morte do testamentário também os sucessores deste entrarão como seu substituto nas hipóteses de indignidade ou renúncia Salvo claro se a testadora expressamente excluiu uma delas da substituição que pretendia fazer A substituição pode ser recíproca vale dizer mediante a indicação pelo testador de dois ou mais cotestamentários que se substituem no caso de qualquer um deles não puder ou não quiser a herança ou legado Sendo igual a porção reservada pelo testador a cada substituto não há maiores dificuldades na mensuração das respectivas quotas Sendo desiguais contudo considera se que a proporção fixada na primeira disposição mantémse no caso de substituição Se um dos herdeiros tinha sido contemplado com metade da herança e os outros dois com um quarto cada vindo um desses últimos a ser excluído ou renunciar à sucessão a quota dele é distribuída desigualmente entre os substitutos o primeiro recebe dois terços e o outro o terço restante Assim é feito para que se mantenha a proporção inicialmente querida pelo testador Se for desejo dele que a substituição se faça nessa hipótese de modo diverso deverá prever expressamente a nova proporção entre as porções hereditárias Na substituição vulgar o testador indica quem ele deseja beneficiar no caso de o testamentário vir a falecer antes dele ou por qualquer outra razão não puder ou não quiser receber a herança ou legado Na substituição recíproca os testamentários são substitutos uns dos outros Na substituição vulgar ou recíproca não há limites à designação de substitutos O testador pode nomear quantos quiser fixando as regras em que um sucede no lugar de outro bem como as situações em que terá lugar a reciprocidade Mas independentemente da quantidade de substitutos indicados nenhum deles titula qualquer direito sucessório se o herdeiro ou legatário a quem caberia substituir tem capacidade para suceder ou seja está vivo ao tempo da abertura da sucessão e não foi dela excluído por indignidade ou deserdação Pereira 1974198200 52 Substituição fideicomissária Na substituição fideicomissária o testador define a destinação de seu bens no caso de o testamentário falecer depois dele Em outros termos ele escolhe dois testamentários um para sucedêlo logo em seguida denominado fiduciário e outro fideicomissário para suceder ao primeiro A doutrina se preocupa em acentuar a simultaneidade dos direitos sucessórios do fiduciário e do fideicomissário malgrado eles sejam chamados sucessivamente a titular o bem ou bens testados isto porque o fiduciário titula a propriedade sujeita a condição resolutiva ao falecer o bem testado deixa de integrar seu patrimônio transmissível e o fideicomissário a condição suspensiva só adquire a propriedade do bem testado após a morte do testamentário substituível Gomes 1970213214 Diversas limitações foram estabelecidas nessa específica hipótese do direito de testar O testador não pode dispor sobre a destinação de seus bens para o caso da morte do fideicomissário isto é a lei reputa nulo o fideicomisso além do segundo grau CC art 1959 porque não pode a vontade do proprietário perdurar por muito tempo além da sua morte Não tem por outro lado liberdade total para escolher qualquer pessoa para ser fideicomissária Ao contrário para que tenha plena eficácia a substituição fiduciária somente as pessoas ainda não concebidas ao tempo da morte do testador podem ser nomeadas substitutas Isto porque se o fideicomissário já havia nascido quando aberta a sucessão do testador ele passa a titular a propriedade do bem testado enquanto ao fiduciário é atribuído o seu usufruto vitalício art 1952 parágrafo único Quando no passamento do testador é vivo o fiduciário e ainda não nasceu o fideicomissário o primeiro passa a titular a propriedade resolúvel da herança ou legado CC art 1953 Na morte do fiduciário os bens correspondentes à substituição fideicomissária são transmitidos não aos sucessores dele mas sim ao fideicomissário se ainda está vivo Se o fideicomissário não chegou a nascer com vida ou faleceu antes do fiduciário a propriedade dos bens testados consolidase em mãos deste último em razão da caducidade do fideicomisso CC art 1958 aqui morrendo o fiduciário os bens se transmitem aos sucessores dele e não aos do fideicomissário Também caduca o fideicomisso consolidandose a propriedade dos bens testados no patrimônio do fiduciário na hipótese de o fideicomissário renunciar à herança ou legado CC art 1955 Somente não se dará a consolidação da propriedade nesse caso se o testador houver disciplinado a hipótese de modo diferente no testamento prevendo por exemplo outra regra de substituição Na substituição fideicomissária o testador estabelece que na morte do primeiro testamentário fiduciário os bens não serão destinados aos respectivos sucessores mas sim a outra pessoa fideicomissário Enquanto tem a propriedade resolúvel dos bens testados o fiduciário responde por sua integridade Se o fideicomissário exigir a qualquer tempo o fiduciário é obrigado a prestar caução que garanta o exercício pelo primeiro do direito sucessório que titulariza Se no final for transmitido ao fideicomissário bem deteriorado ele terá direito de cobrar indenização dos sucessores do fiduciário 53 Direito de acrescer Se o testamentário não puder ou não quiser receber a herança ou legado que o testador lhe conferiu e não houver substituto nomeado sobre a porção correspondente passam a titular direito sucessório os herdeiros legítimos É o direito de acrescer Claro que havendo substituto designado pelo testador o bem ou bens anteriormente destinados ao testamentário substituído não se acrescem à quota hereditária dos legítimos mas são transmitidos ao nomeado em substituição Também têm direito de acrescer os herdeiros testamentários quando tiverem sido nomeados no mesmo testamento mas sem atribuição de quotas determinadas CC arts 1941 e 1943 O testador pode por exemplo ter declarado apenas que deixava toda a parte disponível da herança para Rubens Sofia e Teresa sem nada mais especificar Nesse caso considerase que caberá um terço do testado a cada um deles Vindo porém Rubens a não aceitar a herança ou ser dela excluído por prémorte indignidade ou deserdação seu terço será dividido entre Sofia e Teresa Aqui o direito de acrescer é dos testamentários porque o testamento não determinou que quota caberia a cada um deles Note que se tivesse o testador declarado que deixava metade da parte disponível da herança para Rubens três oitavos para Sofia e um oitavo para Teresa os titulares do direito de acrescer seriam diversos na exclusão ou renúncia de qualquer um deles Nesses casos passariam a titularizálo os herdeiros legítimos do testador CC art 1944 Quer dizer a porção de Rubens não seria acrescida à de Sofia e Teresa mas sim à dos herdeiros legítimos a menos que o testador tivesse nomeado algum substituto Também têm direito de acrescer os colegatários nomeados conjuntamente a respeito de uma única coisa Se no exemplo anterior ao invés de herdarem um terço da parte disponível da herança Rubens Sofia e Teresa tivessem sido nomeados legatários de uma fazenda agrícola a exclusão ou renúncia de qualquer um deles importaria o acréscimo da porção correspondente aos demais Igual acréscimo ocorreria no caso de os colegatários não terem sido nomeados conjuntamente mas o bem a eles destinado em condomínio não puder ser repartido sem risco de desvalorização CC arts 1942 e 1943 Quando o colegatário não tiver direito de acrescer titularizáloão os herdeiros legítimos no legado de coisa própria no de coisa alheia o direito de acrescer cabe ao sucessor ao qual tinha sido imputada a obrigação de prestar o legado CC art 1944 parágrafo único No legado de usufruto as regras são semelhantes Se o testador legou aos testamentários o usufruto de certo bem sem fixar a quota cabível a cada um é deles o direito de acrescer inclusive no falecimento do cousufrutuário Mas tendo sido estabelecida pelo testamento a quota de cada legatário no usufruto o direito de acrescer é dos herdeiros legítimos em cujas mãos consolidase sucessivamente a propriedade do bem gravado de acordo com a quota do excluído renunciante ou falecido CC art 1946 e parágrafo único desta edição 2020 O direito de acrescer beneficia o herdeiro legítimo sempre que o testamentário não puder ou não quiser aceitar sua herança ou legado e o testador não tiver nomeado substituto Beneficia o cotestamentário no entanto se não foi discriminada no testamento a quota cabível a cada um na herança ou legado O titular do direito de acrescer não pode renunciar exclusivamente ao acréscimo exceto se for testamentário e não lhe convier cumprir o encargo correspondente estabelecido pelo testador Ocorrendo a renúncia ao acréscimo nesse caso ele se transmite à pessoa em favor de quem o encargo tiver sido instituído CC art 1945 Não havendo ninguém nessa situação o direito de acrescer é dos herdeiros legítimos 6 Redução das disposições testamentárias Como reiterado o testador com herdeiros necessários só pode dispor em testamento da parte disponível da herança isto é metade de seu patrimônio Se na data da abertura da sucessão ocorrer de o valor do bem ou bens testados ultrapassar a parte disponível é necessário procederse à redução das disposições testamentárias para que a legítima seja preservada A razão pela qual deuse o excesso é irrelevante o testador descuidouse ou testou conscientemente além do permitido teve seu patrimônio reduzido depois do testamento com perda ou alienação de bens indisponíveis valorizouse em demasia a parte testada etc Em nada importa o motivo pelo qual o cumprimento do testamento tal como contido em suas disposições levaria ao comprometimento total ou parcial da legítima Se isso acontece as disposições devem ser revistas reduzidas para preservação dos direitos dos herdeiros necessários Para fins de redução estabeleceu a lei uma hierarquia entre os sucessores testamentários Em primeiro lugar reduzemse as quotas dos herdeiros nomeados em testamento Se essa redução for insuficiente para preservação da legítima reduzemse os legados CC art 1967 1º A redução dos direitos sucessórios dos herdeiros e legatários é feita sempre de modo proporcional Se o legado sujeito à redução consistir num prédio será feita sua divisão para atribuição da quota cabível ao herdeiro necessário Se o bem não comportar divisão cômoda e o excesso for de até um quarto do valor do bem o legatário ficará com o prédio todo pagando aos herdeiros necessários o excedente se o excesso for maior de um quarto o legatário perderá o prédio inteiro aos herdeiros mas poderá cobrar deles o valor que lhe cabia na sucessão CC art 1968 1º Se o legatário for também herdeiro necessário terá a preferência para inteirar sua parte na legítima no mesmo imóvel se essa for uma solução matematicamente adequada para redução 2º 2020 02 13 PÁGINA RB111 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES CAPÍTULO 65 INVENTÁRIO E PARTILHA Capítulo 65 Inventário e Partilha 1 Dissolução do condomínio hereditário Em razão do princípio da saisine tão logo ocorra o passamento de alguém os seus herdeiros passam a titular a propriedade e a posse dos bens deixados em regime de condomínio Tratase de um condomínio especial regido também por regras do direito das sucessões uma das quais estabelece que sua dissolução deve ser feita necessariamente e o quanto antes Ainda que seja um só o herdeiro a se apresentar deve ser instaurado o processo judicial ou feita a escritura pública de inventário O objetivo do processo judicial é possibilitar que outros interessados fora os herdeiros possam exercer seus direitos tais como os credores do falecido ou mesmo sucessores desconhecidos No direito brasileiro a transmissão causa mortis extrajudicial quer dizer que prescinda de ação judicial introduzida em 2007 é possível apenas quando o autor da herança não deixou testamento e não há interessados incapazes Ela é admissível por opção dos interessados mesmo que o espólio tenha dívidas devendo nesse caso os herdeiros honrálas no limite do valor dos bens herdados O processo judicial de dissolução do condomínio hereditário denominase inventário e em alguns casos arrolamento Sua tramitação é objeto de estudo do direito processual civil interessando por isso aqui apenas os aspectos gerais da matéria Os objetivos do inventário são quatro a definir a herança estabelecendo quais são os bens deixados pelo de cujus e quais os que devem ser assim considerados itens 2 e 3 b proceder à satisfação das dívidas deixadas pelo falecido item 4 bem como ao pagamento do imposto incidente sobre a transmissão causa mortis c fazer o pagamento dos legados se o falecido instituiu legatário bem como cumpriremse as demais disposições de última vontade d partilhar o acervo remanescente entre os herdeiros item 5 O condomínio que a sucessão instala entre os herdeiros denominase espólio Tratase de um sujeito de direito despersonalizado cuja principal função é a de aglutinar os interesses convergentes dos herdeiros enquanto persiste a copropriedade sobre os bens objeto de herança No processo de inventário será nomeada pelo juiz uma pessoa encarregada de administrar esses bens e representar o espólio É o inventariante cujas funções se iniciam com a assinatura do termo de compromisso e perduram até a homologação da partilha CC art 1991 salvo se antes disso falecer for substituído ou removido No mais das vezes a inventariança é atribuída ao cônjuge ou companheiro sobrevivente este último se estivesse convivendo com o falecido ou na falta destes ao herdeiro do de cujus que se encontra na posse e administração dos bens a inventariar Na falta deles seguese a ordem de preferência legalmente estabelecida CPC art 617 Depois da partilha judicial ou extrajudicial desaparece o condomínio entre os herdeiros Cada um passa a ser o proprietário dos bens que lhe foram destinados na sucessão por força da lei ou da vontade do falecido O direito de cada herdeiro como dita a lei fica circunscrito aos bens do respectivo quinhão CC art 2023 Mas em caso de evicção que venha a atingir os interesses de um dos herdeiros mesmo depois da partilha os demais são obrigados a indenizálo proporcionalmente aos respectivos quinhões arts 2024 e 2026 Deste modo se anos após a partilha descobrese que o falecido havia por testamento deixado um certo bem como legado o testamentário poderá reivindicálo do herdeiro para quem o bem foi destinado Este porém perdendo seu quinhão ou parte dele terá direito de repartir o prejuízo entre os demais sucessores hereditários reclamando deles a indenização correspondente A perda do bem herdado em razão de evicção não será ressarcível pelos demais herdeiros se havia convenção entre eles dispondo em sentido diverso se o próprio evicto tinha sido o culpado da evicção ou no caso de derivar esta de fato posterior à partilha CC art 2025 O condomínio instituído entre os herdeiros com a abertura da sucessão é denominado espólio e deve ser dissolvido necessariamente A dissolução fazse em regra por meio judicial ou seja pelo processo de inventário A transmissão mortis causa extrajudicial fazse mediante escritura pública mas só é admissível se o autor da herança não deixou testamento e não há herdeiros incapazes 2 Colação Os descendentes devem ser tratados de forma isonômica pelos ascendentes quando se trata de questão patrimonial Nenhum filho pode ser privilegiado em detrimento de outro tampouco um dos netos prejudicandose os demais descendentes de segundo grau Se enquanto ainda vivia o autor da herança qualquer descendente recebeu deste bens por doação um dos objetivos do inventário será o de neutralizar a vantagem que esse negócio gratuito trouxe ao donatário em detrimento dos demais descendentes do mesmo grau O inventário em outras palavras é a oportunidade para igualaremse as legítimas que eventualmente tenham se desigualado em vida do autor da sucessão Para atender a esse objetivo determina a lei que os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente comum são obrigados para igualar as legítimas a conferir o valor das doações que dele em vida receberam CC art 2002 Essa conferência é chamada de colação Os descendentes donatários devem dar à colação os bens recebidos para que sejam considerados no cômputo das quotas hereditárias Mesmo os herdeiros excluídos da sucessão por indignidade deserdação ou renúncia estão obrigados a dar à colação os bens recebidos por doação a título de antecipação de legítima CC art 2008 Suponhase então que Antonio tinha dois filhos Benedito e Carlos e que em vida doara para Benedito um apartamento no valor de 1000 Ao falecer deixou bens no valor de 2000 Para simplificar considerese que ele não tinha dívidas nem outro sucessor além desses filhos Pois bem Benedito está obrigado a dar à colação o apartamento recebido de modo que no final as legítimas sejam igualadas Quer dizer Carlos terá direito a receber um quinhão no valor de 1500 enquanto Benedito continua com o apartamento e recebe mais 500 Se após computar o valor da doação feita a título de adiantamento de legítima não houver no acervo bens suficientes para igualar as quotas hereditárias dos descendentes o obrigado à colação deve entregar o próprio bem ou se já não dispuser dele o valor correspondente CC art 2003 parágrafo único Na verdade embora a lei fale em entrega do valor correspondente apenas no caso de não ter mais o donatário meios de proceder à colação em espécie os juízes não devem excluir a hipótese no caso de conveniência das partes Será sempre mais racional sob o ponto de vista econômico que o donatário indenize os demais descendentes do prejuízo desde que o faça pelo valor de mercado do bem e não pelo da liberalidade Desse modo se Antonio do exemplo acima tivesse deixado ao falecer bens no valor de 400 Benedito para ficar com o apartamento que vale 1000 além de nada receber desses outros bens ainda deve ressarcir Carlos no montante equivalente a 300 Dessa forma as legítimas se igualariam em 700 não se prejudicando nenhum dos descendentes Determina a lei que na colação os bens doados sejam computados pelo valor da liberalidade isto é por quanto valiam ao tempo em que foram doados CC art 2004 Não é a regra mais justa nem a mais adequada sob o ponto de vista econômico O mais equânime é o bem ser dado à colação pelo seu valor atual de mercado Somente assim podemse igualar de verdade as legítimas Claro não se computa no valor da colação o das benfeitorias acrescidas pelo descendente donatário Haveria enriquecimento indevido dos demais descendentes que se apropriariam do valor agregado ao bem exclusivamente por recursos do donatário Pela mesma razão correm apenas por conta deste as perdas e danos referentes ao bem doado e são exclusivos dele os frutos art 2004 2º Para que o donatário seja dispensado de dar à colação o bem doado é indispensável que o ascendente doador consigne de modo expresso no contrato de doação que está praticando a liberalidade à conta da parte disponível de seu patrimônio CC art 2005 Nesse caso a doação não prejudica a legítima de nenhum dos outros descendentes porque o seu objeto poderia ser licitamente testado e portanto subtraído da herança a que fazem jus A dispensa de colação quando não tiver sido feita no próprio instrumento de doação deve constar de testamento do doador art 2006 Se a doação tiver sido feita à conta da parte disponível do patrimônio do doador mas seu valor excedeu a metade deste o excesso deverá ser dado à colação Para verificar se houve excesso consideramse os valores do bem doado e do patrimônio do doador da época da liberalidade Mas o cálculo do excesso para fins de definir o valor da restituição a que se obriga o donatário fazse de acordo com o valor do bem ao tempo da abertura da sucessão CC art 2007 Quer dizer se no momento da liberalidade o bem doado valia 60 do patrimônio do doador o excesso foi de 10 que equivale a um sexto do seu valor Desse modo o descendente obrigado à colação deve entregar ao espólio o correspondente a um sexto do valor do mesmo bem considerado na época da abertura da sucessão Uma vez mais a lei fala em ressarcimento do excesso unicamente no caso de não ser possível a colação do bem em espécie mas não tem sentido afastarse quando conveniente para as partes a igualação das legítimas por pagamento em dinheiro da diferença Os descendentes beneficiados por liberalidade do ascendente estão obrigados à colação dos bens recebidos com o objetivo de igualar as legítimas Por vezes a liberalidade não prejudica somente os direitos dos descendentes mas também os do cônjuge ou companheiro do doador falecido Isso em nada altera a obrigação de dar à colação o que se recebeu como antecipação de legítima bem como procederse às igualações das quotas hereditárias dos sucessores considerandose nos cálculos contudo os direitos sucessórios do cônjuge ou companheiro Divergindo os herdeiros sobre a obrigação de dar à colação o desfazimento do condomínio não poderá ser feito evidentemente por escritura pública Nessa hipótese mesmo não havendo testamento ou interessados incapazes será necessário o processo judicial de inventário 3 Sonegados Aberto o inventário incumbe ao inventariante nos vinte dias seguintes ao de sua investidura apresentar em juízo a declaração dos bens deixados do inventariado Em seguida o juiz mandará citar os herdeiros para que em dez dias se manifestem sobre essa declaração incumbindolhes nessa oportunidade indicar os erros e omissões do inventariante de que tenham notícia Se um dos herdeiros por exemplo estava na posse de um bem do falecido que não constou da declaração do inventariante é seu dever declararlhe a existência ao juízo de inventário É bastante grave a consequência para o inventariante ou herdeiro que não levar a inventário qualquer bem do falecido que se encontre em sua posse Impõelhe a lei a pena de sonegados em razão da qual o sonegador perde o direito sucessório sobre o bem omitido Igual punição sofre o herdeiro que deixar de dar à colação algum bem recebido por doação a título de antecipação de legítima ou que não o restituir quando a tanto obrigado CC art 1992 A sonegação só se caracteriza por um ato formal do inventariante ou herdeiro isto é apenas quando o indigitado sonegador faz no inventário uma declaração expressa da inexistência do bem sonegado Especificamente após o inventariante consignar na declaração de bens que não há outros a inventariar ou o herdeiro indagado responder que não tem em seu poder um determinado bem do falecido CC art 1996 Aplicada a pena de sonegados a um certo herdeiro o bem ocultado do inventário será transmitido aos demais como se o sonegador não fosse sucessor do falecido Quando o apenado for o inventariante além da perda do direito sucessório que titula sobre o bem será também removido da função CC art 1993 A aplicação da pena de sonegados fazse mediante ação judicial na qual se garante ao demandado o amplo direito de defesa Têm legitimidade para essa ação não só os herdeiros como também os credores Aqueles porque seriam prejudicados em seus direitos sucessórios com a subtração de bem da herança estes na medida em que os bens declarados não sejam suficientes à satisfação das obrigações passivas do defunto Se a ação for julgada procedente o bem omitido é incorporado ao inventário em benefício de todos os demais herdeiros e credores inclusive dos que não a patrocinaram CC art 1994 e parágrafo único O inventariante e o herdeiro que ocultarem bem do falecido declarando o primeiro formalmente no inventário que ele não existe e o segundo que não está em seu poder expõemse à pena de sonegados Aplicada a pena o sonegador perde os direitos sucessórios que titulava relativamente ao bem omitido Se condenado a restituir os bens sonegados o sonegador não os tiver mais em sua posse ficará obrigado a pagar ao espólio o respectivo valor e perdas e danos Não interessa o motivo Se o bem foi vendido subtraído ou se perdeu com ou sem culpa do sonegador a indenização é devida CC art 1995 4 Pagamento das dívidas As dívidas deixadas pelo morto devem ser pagas com os recursos da herança Não sendo líquida ou exigível o credor deve habilitarse no inventário Se eram líquidas e exigíveis deve requer ao juiz que seja feito o pagamento Não havendo impugnação por parte de nenhum dos herdeiros ou do inventariante a este será determinado pelo juiz que solva a obrigação passiva de imediato ou quando do vencimento Em caso de impugnação que não seja fundada exclusivamente na alegação de pagamento o juiz pode determinar ao inventariante que reserve bens suficientes para a solução da dívida se o credor possuir documento comprobatório de seu crédito revestido das formalidades legais Os bens reservados só serão partilhados após o trânsito em julgado da decisão que acolher a impugnação ao crédito habilitado ou cujo pagamento tinha sido solicitado A partilha dos bens inventariados não precisa aguardar o julgamento das impugnações apresentadas Os herdeiros nesse caso recebem seus quinhões e vindo a ser decidido no futuro que a impugnação não tem procedência respondem pelo crédito no limite do que tiverem herdado Como dita a lei a herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido mas feita a partilha só respondem os herdeiros cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube CC art 1997 O herdeiro demandado a satisfazer obrigação do falecido nos limites do quinhão recebido na partilha tem o direito de regresso contra os demais para não ficar prejudicado Se entre os demais coerdeiros houver alguém insolvente os solventes arcarão proporcionalmente com a parte dele CC art 1999 Quando os bens deixados pelo falecimento do devedor forem insuficientes para a integral quitação de todas as dívidas o inventariante terá legitimidade para requerer a instauração da execução concursal CPC art 618 VIII Na verdade deve requerêla para que os credores possam merecer tratamento paritário com observância das preferências e privilégios que titulam CC arts 955 a 965 As dívidas do falecido correm por conta dos bens da herança respondendo o herdeiro apenas no limite de seu quinhão Entrando o herdeiro em insolvência após a partilha os credores do falecido e os legatários ainda não pagos podem requerer que se discriminem no patrimônio do insolvente a parte correspondente à quota hereditária Feita a discriminação sobre os bens correspondentes gozarão de preferência relativamente aos credores do herdeiro CC art 2000 Se o inventário foi feito por escritura pública sem que um ou mais dos credores do falecido tivessem seus créditos satisfeitos por iniciativa dos próprios herdeiros o ato pode ser anulado a pedido de qualquer um dos prejudicados Se preferir o credor indevidamente preterido tem também a opção de promover a cobrança judicial contra um ou mais herdeiros que responderão no limite da porção hereditária recebida 5 Partilha A partilha é o ato que uma vez homologado pelo juiz do inventário ou quando admitido por lei formalizado por escritura pública desfaz o condomínio hereditário que a abertura da sucessão instituíra entre os herdeiros Tratase da definição dos bens da herança que passam à propriedade individual de cada um deles Dividese com a partilha entre os herdeiros o que remanesceu do pagamento dos legados e dos credores do falecido O próprio autor da sucessão pode por testamento estabelecer como se processará a divisão dos seus bens determinando por exemplo que um certo apartamento fique com seu filho e o outro com a filha Se tiver sido respeitada a legítima e os bens atribuídos a cada herdeiro corresponderem ao valor das respectivas quotas hereditárias essa disposição de última vontade será válida e homologada pelo juiz prevalecerá CC art 2014 O ascendente pode partilhar seus bens entre os descendentes ainda em vida desde que não prejudique a legítima dos herdeiros necessários art 2018 Quando todos os herdeiros são maiores e capazes e entraram em acordo sobre a partilha ela é amigável Pode ser documentado o acerto em escritura pública termo judicial ou escrito particular Nestes dois últimos casos será indispensável a homologação pelo juiz CC art 2015 Se estiver em curso o processo judicial de inventário os herdeiros exibem o plano consensual celebrado por instrumento particular e requerem a prolação do ato homologatório Se não havia testamento e a partilha foi acertada por escritura pública podem querendo em vez de pleitear a homologação judicial simplesmente pedir o arquivamento do processo Quando o acordo é obtido antes da instauração da medida judicial e sendo esta necessária ou optando por ela os interessados a dissolução do condomínio hereditário fazse por meio de arrolamento que segue rito procedimental mais simples CPC arts 659 a 663 Havendo entre os herdeiros um incapaz ou divergindo os sucessores sobre a destinação dos bens do falecido a partilha há de ser forçosamente judicial vale dizer o juiz definirá que bem ou bens do acervo hereditário serão destinados a cada herdeiro CC art 2016 Prevê a lei que se observe na partilha não só o valor mas também a natureza e qualidade dos bens com o objetivo de se alcançar a mais justa divisão entre os herdeiros CC art 2017 Se um deles recebe vários imóveis em bairro decadente enquanto outro recebe um só mas numa região valorizada da cidade ainda que as quotas tenham o mesmo valor não se terá dado um tratamento justo à divisão Quando não for possível uma repartição cômoda um ou mais bens serão vendidos judicialmente transmitindose aos herdeiros o dinheiro correspondente essa venda judicial não tem cabimento porém se houver acordo entre os herdeiros no sentido de se adjudicarem os bens a alguns deles os quais ficam obrigados ao pagamento da diferença em pecúnia aos demais art 2019 e 1º Mais de um herdeiro se interessando pela adjudicação farseá licitação entre os interessados 2º desta edição 2020 Devendo um dos herdeiros ao espólio a dívida poderá ser partilhada igualmente entre todos ou se a maioria deles concordar imputada à quota do devedor CC art 2001 Nesse último caso ao herdeiro devedor são destinados bens de menor valor dispensandoo do pagamento a soma do valor da dívida e dos bens aquinhoados deve equivaler à quota hereditária a que o devedor tinha direito Pertencem ao espólio e devem lhe ser entregues pelos herdeiros que se encontram na posse dos bens os frutos posteriores à abertura da sucessão CC art 2020 Se um dos filhos por exemplo administrava a fazenda agrícola do pai e por acordo entre eles ficava com toda a renda da produção esse acerto deixa de vigorar a partir da abertura da sucessão porque os herdeiros em condomínio passam a ser os novos titulares dos frutos apenas mediante a anuência de todos eles poderia aquele filho continuar ficando com a totalidade da renda Com a homologação judicial da partilha desfazse o condomínio hereditário entre os herdeiros instituído com a abertura da sucessão A partilha será amigável quando forem todos os herdeiros capazes e entrarem em acordo mas divergindo ou havendo pelo menos um incapaz será judicial Com a homologação da partilha pelo juiz encerrase o inventário judicial Pode ocorrer no entanto posteriormente ao fim do processo a descoberta de novos bens do de cujus sonegados ou não Nesse caso os herdeiros podem requerer a sobrepartilha CC art 2022 Também é o caso de sobrepartilha quando houver na herança bens situados longe do lugar do inventário objeto de litígio ou mesmo de liquidação demorada ou difícil Aqui enquanto não sobrepartilhados esses bens permanecem sob a guarda e administração do inventariante art 2021 A sobrepartilha pode ser feita por escritura pública se ao seu tempo todos os interessados forem capazes Por qualquer dos vícios e defeitos que invalidam o negócio jurídico pode ser anulada a partilha homologada mas o direito de se pleitear a anulação nesse caso decai em um ano CC art 2027 e parágrafo único 2020 02 13 PÁGINA V Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 ÍNDICE ALFABÉTICOREMISSIVO ÍNDICE ALFABÉTICOREMISSIVO ADN DNA exame de 6041 e 42 Adoção de adolescente 60141 de criança 60141 definição 6014 de maior de 18 anos 60142 estágio de convivência 60141 e 143 internacional 60143 Alimentante falecimento 6116 Alimentos classificação 6012 definição 611 definitivos 6012 gravídicos 6115 mínimos 5821 6011 12 14 para companheiros 6014 para cônjuges 6014 para parentes 6013 provisionais 6012 provisórios 6012 requisitos 6111 valor 6111 Barriga de aluguel noção 60122 Bemns antifernalis 574 de família 556 dos filhos menores 6052 parafernalis 574 partilha dos 584 Casamento aberto 566e anulável 5671 capacidade para o 5631 causas suspensivas 5633 celebração 5642 condição da mulher 562 consular 5643e efeitos 565 em caso de moléstia grave 5643b habilitação 5641 impedimentos 5632 in articulo mortis 5643c in extremis 4643c invalidade 567 natureza 568 nulo 5671 nuncupativo 5643c objetivos 561 por procuração 5643d prova 5644 putativo 5673 religioso 5643a Cláusulas testamentárias interpretação 6431 validade 6432 Coabitação e casamento 566a e divórcio 5822 e separação 58622 e união estável 5921 Codicilo definição 6422 referência 6423 Comunhão de bens espécies 572 e 23 parcial 57232 universal 57231 Cônjuges autorização marital 5721 bens dos 571 como sucessor 632 deveres 566 nome 585 outorga uxória 5721 Curatela definição 613 e curadoria 613 espécies 613 Deserdação definição 6223 Desquite noção 581 Direito de representação definição 6331 referência 6233 Direito de visita e guarda 583 Direito real de habitação 6326 Direitos autorais e comunhão de bens 57231 Divórcio definição 582 espécies 5821 formas 5822 partilha de bens 584 Embriões crioconservados 62221 6332 material genético crioconservado 6332 Famílias constitucionais 554 591 6325 monoparental 593 não constitucionais 554 591 6325 Fecundação fertilização ou inseminação assistida anonimato do doador 60123 doação temporária de útero 60122 heteróloga 60121 2 3 homóloga 6011 Fideicomisso e comunhão de bens 57231 instituição 6452 Filhos guarda 583 reconhecimento 602 Filiação biológica 6011 espécies 601 investigação oficiosa 6021 por substituição 6012 socioafetiva 6013 Guarda alternada 583 compartilhada 583 conjunta 583 e poder familiar 6051 partilhada 583 Herança aceitação 6233 cessão 6232 definição 623 jacente 6235 petição de 6234 renúncia 6233 vacante 6235 vocação hereditária 631 Herdeiros facultativos 6221 necessários 6221 6411 noção 6221 obrigatórios 6221 reservatários 6221 vocação 631 Homossexuais união 595 Impenhorabilidade cláusula de 6411 Inalienabilidade cláusula de 57231 em testamento 641 Incomunicabilidade cláusula de 57231 em testamento 641 Indignidade definição 6223 Inventário arrolamento 623 651 5 colação 652 definição 651 espólio 651 noção 623 partilha 655 sobrepartilha 655 sonegados 653 Legado alternativo 6441 caducidade 6443 coisa incerta 6441 com encargos 6441 concentração 6441 de alimentos 6441 de coisa alheia 6442 de crédito 6441 de dinheiro 6441 definição 644 de imóvel 6441 de usufruto 6441 em favor de credor 6441 em prestações 6441 quitação de dívida 6441 Legatários noção 6221 Legítima antecipação de 653 redução das disposições testamentárias 646 referência 6221 Maternidade negativa de 603 Pacto antenupcial definição 574 Pacto sucessório noção 6232 Parentesco em linha colateral 555 em linha reta 555 em linha transversal 555 por afinidade 555 relações de 555 Participação final nos aquestos cálculo dos aquestos 57233 definição 57233 Paternidade negativa de 603 presunções de 604 Perfilhação excludente de 6022 Poder familiar administração dos bens dos filhos 6052 conceito 605 e direito de visita 6051 exercício 6051 perda 605 suspensão 605 Protutor noção 6122 prestação de contas 6124 Reconciliação efeitos 5863 Regime de bens alteração do 575 Responsabilidade civil do noivo desistente 5645 pela separação 587 Separação amigável 5861 com culpa 58621 litigiosa 5862 remédio 58622 ruptura 58622 sanção 58621 sem culpa 58622 Separação de bens absoluta 573 obrigatória 573 Substituições direito de acrescer 6453 fideicomissária 6452 recíproca 6451 vulgar 6451 Sucessão legítima 63 testamentária 64 vocação hereditária 631 Sucessores aparente 6224 34 ascendentes 634 capacidade para ser 6222 classificação 622 21 colaterais 635 companheiro 632 212 22 23 24 25 cônjuge 632 211 22 23 24 25 descendentes 633 legítimos 6221 pessoa jurídica 62222 testamentários 6221 6412 Testamenteiro referência 6423 Testamento aeronáutico 6421 cerrado 6421 conjuntivo 642 correspectivo 642 definição 642 direito de testar 641 em mão comum 642 espécies 6421 execução 6423 interpretação 6431 marítimo 6421 militar 6421 particular 6421 público 6421 recíproco 642 redução 646 registro 6423 revogação 6424 rompimento 6424 simultâneo 642 Tutela dativa 6121 definição 612 espécies 6121 legítima 6121 testamentária 6121 Tutor delegação 6122 nomeação 6432 poderes 6123 prestação de contas 6124 remuneração 6122 responsabilidades 6122 União estável definição 592 caracterização 5921 direitos dos companheiros 5922 deveres dos companheiros 5922 conversão em casamento 5923 6325 putativa 5942 falecimento do companheiro 632 União livre definição 594 desta edição 2020 Vínculo conjugal constituição 564 2020 02 13 PÁGINA VI Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 BIBLIOGRAFIA BIBLIOGRAFIA AGUIAR Jr Ruy Rosado de 2004Responsabilidade civil no direito de família In XIII Jornada de Direito de Família Edição especial de Seleções Jurídicas COAD fevereiro de 2005 p 3943 ARAÚJO Fernando 1999 A procriação assistida e o problema da santidade da vida Coimbra Almedina 1999 AZEVEDO Álvaro Vilaça 1974 Bem de família 4ª ed São Paulo RT 1999 2002 Estatuto da família de fato 2ª ed São Paulo Atlas 2002 Sem data da 1ª ed 2003 Comentários ao Código Civil Coordenador Antônio Junqueira de Azevedo São Paulo Saraiva 2003 v 19 BEVILÁQUA Clóvis 1896 Direito de família Edição histórica reproduzindo a 7ª ed Rio de Janeiro Ed Rio 1976 1898 Direito das sucessões Sem número da edição Rio de Janeiro Red Livros 2000 1934 Código Civil dos Estados Unidos do Brasil commentado 4ª ed Rio de Janeiro Livr Francisco Alves 1934 Sem data da 1ª ed BIRCHAL Alice de Souza 2004A relação processual dos avós no direito de família direito à busca da ancestralidade convivência familiar e alimentos In Afeto ética família e o novo Código Civil Coordenação de Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 p 4160 BITTENCOURT Edgard de Moura 2003 Família 5ª ed Atualização de Joaquim Macedo Bittencourt Netto e Antônio Carlos Mathias Coltro Campinas Millennium 2003 Sem data da 1ª ed BOIZEL Roger 2000Le divorce et la faute perspectives de rapprochement des droits français et allemand Revue Internationale de Droit Comparé Paris Société de Législation Comparée v 524 p 891912 2000 BRODY David Eliot BRODY Arnold R 1999 The seven greatest scientific discoveries in history and the people who made them Edição brasileira Tradução de Laura Teixeira Motta 2ª reimpr São Paulo Companhia das Letras 2000 CAHALI Francisco José 2004 Família e sucessões no Código Civil de 2002 São Paulo RT 2004 CAHALI Yussef Said 1978 Divórcio e separação 11ª ed São Paulo RT 2005 CHINELATO Silmara Juny 2004 Comentários ao Código Civil Coordenador Antônio Junqueira de Azevedo São Paulo Saraiva 2004 v 18 COELHO Fábio Ulhoa 1992 Direito e poder São Paulo Saraiva 1992 COLTRO Antonio Carlos Mathias TEIXEIRA Sálvio de Figueiredo MAFRA Tereza Cristina Monteiro 2005 Comentários ao novo Código Civil Coordenado por Sálvio de Figueiredo Teixeira Rio de Janeiro Forense 2005 v XVII DINIZ Maria Helena 2003Coordenadas fundamentais da tutela e curatela no novo Código Civil In O Novo Código Civil Estudos em Homenagem ao Prof Miguel Reale Coordenação de Domingos Granciulli Netto Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins Filho São Paulo LTr 2003 p 13341367 2005 Direito civil brasileiro 20ª ed do 5º v e 19ª ed do 6º v São Paulo Saraiva 2005 Sem data da 1ª ed ENGELS Friedrich 1884 Der Ursprung der Familie des Privateigentaums und des Staats Tradução brasileira de Leandro Konder 4ª ed Rio de Janeiro Civilização Brasileira 1978 ESPÍNOLA 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Silva 2002O exame de DNA como meio de prova aspectos constitucionais In DNA como meio de prova da filiação Coordenado por Eduardo de Oliveira Leite Rio de Janeiro Forense 2002 p 125132 MATOS Ana Carla Harmatiuk 2000 As famílias não fundadas no casamento e a condição feminina Rio de Janeiro Renovar 2000 MIRANDA Pontes 1916 Tratado de direito de família Edição atualizada por Vilson Rodrigues Alves Campinas Bookseller 2001 MIZUNO Noriko 2001La famille au Japon la notion de famille Revue Internationale de Droit Comparé Paris Société de Législation Comparée v 534 p 831852 2001 MONTEIRO Washington de Barros 2003 Curso de direito civil direito das sucessões 35ª ed Atualizada por Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto São Paulo Saraiva 2003 Sem data da 1ª ed 2004 Curso de direito civil direito de família 37ª ed Atualizada por Regina Beatriz Tavares da Silva São Paulo Saraiva 2004 Sem data da 1ª ed OLIVEIRA Euclides de 2004Alimentos transmissão da obrigação aos herdeiros In Afeto ética família e o novo Código Civil Coordenação de Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 p 141159 2005 Direito de herança São Paulo Saraiva 2005 PEREIRA Caio Mário da Silva 1972 Instituições de direito civil 3ª ed Rio de Janeiro Forense 1979 v V 1974 Instituições de direito civil 3ª ed Rio de Janeiro Forense 1980 v VI 1977 Reconhecimento de paternidade e seus efeitos 6ª ed atualizada por Lucia Maria Teixeira Ferreira Rio de Janeiro Forense 2006 PEREIRA Rodrigo da Cunha 2003 Direito de família uma abordagem psicanalítica 3ª ed Belo Horizonte Del Rey 2003 Sem data da 1ª ed 2004 Comentários ao novo Código Civil Coordenado por Sálvio de Figueiredo Teixeira Rio de Janeiro Forense 2004 v XX PIMENTEL PEREIRA Áurea 2003 Alimentos no direito de família e no direito dos companheiros à luz do novo Código Civil Rio de Janeiro Renovar 2003 PLANIOL Marcel RIPERT Georges 1925 Traité pratique de droit civil français 2ª ed Paris LGDJ 1952 QUEIROGA Antônio Elias de 2005 Curso de direito 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investigação de paternidade In DNA como meio de prova da filiação Coordenado por Eduardo de Oliveira Leite Rio de Janeiro Forense 2002 p 379390 2002a Novo Código Civil comentado Obra coletiva coordenada por Ricardo Fiuza 2ª ed 2ª tir São Paulo Saraiva 2002 Sem data da 1ª edição 2003 Comentários ao Código Civil Coordenador Antônio Junqueira de Azevedo São Paulo Saraiva 2003 v 21 2004Testamentos noções gerais formas ordinárias codicilo formas especiais In Direito das sucessões e o novo Código Civil Coordenado por Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka e Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 VENOSA Sílvio de Salvo 2001 Direito civil 5ª ed São Paulo Atlas 2005 WALD Arnoldo 2002 Direito das sucessões 12ª ed São Paulo Saraiva 2002 Sem data da 1ª ed 2004 O novo direito de família São Paulo Saraiva 2004 WELTER Belmiro Pedro 2003 Igualdade entre as filiações biológica e socioafetiva São Paulo RT 2003 ZANELLATO Marco Antonio 2004 O Código Civil e sua interdisciplinaridade Coordenação de José Geraldo Brito Filomeno Luiz Guilherme da Costa Wagner Jr e Renato Afonso Gonçalves Belo Horizonte Del Rey 2004 ZULIANI Ênio Santarelli 2006Alimentos para filhos maiores In Grandes temas da atualidade Alimentos no novo Código Civil Coordenador Eduardo de Oliveira Leite Rio de Janeiro Forense 2006 p 91121
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2020 02 13 PÁGINA I Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 CAPA THOMSON REUTERS REVISTA DOS TRIBUNAIS desta edição 2020 2020 02 13 PÁGINA 1 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 PRIMEIRAS PÁGINAS CURSO DE DIREITO CIVIL VOL 5 ED 2020 FAMÍLIA SUCESSÕES VOLUME 5 Autor Fábio Ulhoa Coelho desta edição 2020 Thomson Reuters Brasil Juliana Mayumi Ono Diretora responsável Av Dr Cardoso de Melo 1855 13º andar Vila Olímpia Tel 11 36138400 Fax 11 36138450 CEP 04548005 São Paulo SP Brasil Todos os direitos reservados Proibida a reprodução total ou parcial por qualquer meio ou processo especialmente por sistemas gráficos microfílmicos fotográficos reprográficos fonográficos videográficos Vedada a memorização eou a recuperação total ou parcial bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados Essas proibições aplicamse também às características gráficas da obra e à sua editoração A violação dos direitos autorais é punível como crime art 184 e parágrafos do Código Penal com pena de prisão e multa busca eapreensão e indenizações diversas arts 101 a 110 da Lei 9610 de 19021998 Lei dos DireitosAutorais O autor goza da mais ampla liberdade de opinião e de crítica cabendolhe a responsabilidade das ideias e dos conceitos emitidos em seu trabalho desta edição 2020 Central de Relacionamento Thomson Reuters Selo Revista dos Tribunais atendimento em dias úteis das 09h às 18h Tel 08007022433 email de atendimento ao consumidor sacrtthomsonreuterscom email para submissão dos originais avallivrothomsonreuterscom Conheça mais sobre Thomson Reuters wwwthomsonreuterscombr Acesse o nosso eComm wwwlivrariartcombr Fechamento desta edição 18112019 ISBN 9786550650759 2020 02 13 PÁGINA II Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 EXPEDIENTE Expediente Diretora de Conteúdo e Operações Editoriais Juliana Mayumi Ono Gerente de Conteúdo Milisa Cristine Romera Editorial Aline Marchesi da Silva Diego Garcia Mendonça Karolina de Albuquerque Araújo e Quenia Becker Gerente de Conteúdo Tax Vanessa Miranda de M Pereira Direitos Autorais Viviane M C Carmezim Assistente de Conteúdo Editorial Juliana Menezes Drumond Analista de Projetos Camilla Dantara Ventura Estagiários Alan H S Moreira e Bárbara Baraldi Sabino Produção Editorial Coordenação Andréia R Schneider Nunes Carvalhaes Especialistas Editoriais Gabriele Lais SantAnna dos Santos e Maria Angélica Leite Analista de Projetos Larissa Gonçalves de Moura Analistas de Operações Editoriais Caroline Vieira Damares Regina Felício Danielle Castro de Morais Mariana Plastino Andrade Mayara Macioni Pinto e Patrícia Melhado Navarra Analistas de Qualidade Editorial Ana Paula Cavalcanti Fernanda Lessa Rafael Ribeiro e Thaís Pereira Estagiárias Beatriz Fialho Tainá Luz Carvalho e Victória Menezes Pereira Capa Carla Lemos Controle de Qualidade da Diagramação Carla Lemos Equipe de Conteúdo Digital Coordenação Marcello Antonio Mastrorosa Pedro desta edição 2020 Analistas Jonatan Souza Luciano Guimarães Maria Cristina Lopes Araujo e Rodrigo Araujo Gerente de Operações e Produção Gráfica Mauricio Alves Monte Analistas de Produção Gráfica Aline Ferrarezi Regis e Jéssica Maria Ferreira Bueno Estagiária de Produção Gráfica Ana Paula Evangelista 2020 02 13 PÁGINA III desta edição 2020 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 FICHA CATALOGRÁFICA Ficha catalográfica Dados Internacionais de Catalogação na Publicação CIP Câmara Brasileira do Livro SP Brasil Coelho Fábio Ulhoa Curso de direito civil família sucessõesvolume 5 livro eletrônico Fábio Ulhoa Coelho 2 ed São Paulo Thomson Reuters Brasil 2020 6 Mb ePUB 2 ed em ebook baseada na 9 ed impressa Bibliografia ISBN 9786550650759 1 Direito civil 2 Direito civil BrasilI Título 1931928 CDU347 Índices para catálogo sistemático 1 Direito civil 347 Cibele Maria Dias Bibliotecária CRB89427 2020 02 13 PÁGINA IV desta edição 2020 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 DEDICATÓRIA Dedicatória Para Bachir Haidar Jorge 2020 02 13 PÁGINA RB11 desta edição 2020 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA 2020 02 13 PÁGINA RB11 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 55 INTRODUÇÃO AO DIREITO DE FAMÍLIA Capítulo 55 INTRODUÇÃO AO DIREITO DE FAMÍLIA I As Famílias Ninguém sabe com segurança como quando e em que circunstâncias ocorreu mas é certo que o Homo sapiens em determinado momento de sua trajetória evolutiva deixou de praticar relações sexuais quando o homem e a mulher descendiam do mesmo tronco Segundo uma teoria no início da sociedade humana a espécie vivia na mais completa promiscuidade Todos se guiavam exclusivamente pelos desejos e faziam sexo sem observar qualquer interdição Engels 18843133 Essa teoria não foi ainda confirmada nem rejeitada por estudos arqueológicos definitivos Se ela estiver certa a proibição do incesto foi a nossa primeira lei cf Pereira 20031622 caso errada a vedação de relações incestuosas seria uma característica biológica da espécie humana anterior mesmo à organização da sociedade A proibição do incesto provavelmente foi impulsionada pelo instinto de preservação da espécie A diversidade genética propicia combinações que tornam os seres mais aptos a enfrentar a seleção natural Por óbvio à época em que começou a praticar a proibição do incesto o Homo sapiens não tinha a menor ideia da importância disso para seu desenvolvimento Foi o puro instinto animal que o fez dividir as tribos em agrupamentos menores clãs segundo regras de quem podia e quem não podia manter relações sexuais Essa divisão está na origem da família A antropologia considera que na maioria das comunidades primitivas a segregação teve por referência um totem isto é um símbolo em geral de animal ou planta que marcava cada clã Homens e mulheres do totem do boi não podiam copular uns com os outros por exemplo mas somente com pessoas de outro totem O totemismo generalizouse nos fins do século XIX com a tentativa de alguma etnologia conferirlhe caráter universal todas as sociedades humanas primitivas teriam se organizado basicamente em clãs totêmicos e místico os povos primitivos cultivariam a crença de que cada um descendia realmente do animal ou da planta do totem mas nos anos 1960 demonstrouse que o clã totêmico se encontra na maioria mas não na totalidade das organizações sociais ditas primitivas A única característica universal de todas as comunidades humanas que serve de elo entre a condição natural e cultural da espécie é a proibição do incesto a primeira lei da nossa organização social cf LéviStrauss 1962 A explicação da origem da família como se vê está envolta em grandes incertezas Associase o seu surgimento porque conceitualmente não há outra alternativa ao da prática da proibição do incesto isto é à regulação das relações sexuais permitidas e proibidas Mas pouco se consegue avançar pela trilha da certeza científica no conhecimento de sua origem porque nunca houve como não há hoje em dia uma forma única de família Podemse estudar as famílias mas não a família Numa determinada sociedade definida por vetores de tempo e lugar é possível descrever uma ou duas estruturas predominantes de organização familiar Mas não tem sentido buscar uma única trajetória evolutiva que explique satisfatoriamente como se estruturam e quais são as funções de todas as famílias Logo mais farei referência a certos modelos família tradicional romântica e contemporânea que auxiliam o entendimento das transformações fundamentais pelas quais tem passado a família na civilização ocidental de origem europeia Eles não têm serventia por exemplo na compreensão da família muçulmana hindu ou em parte da oriental Das origens nebulosas façase então um enorme salto para a Antiguidade em que as incertezas no trato do assunto podem ser menores Em Roma é possível conhecer pelos registros o essencial senão tudo da família chefiada pelo cidadão romano Note que a sociedade romana já era muito complexa naquele tempo para abrigar uma única forma de família Pequenos comerciantes escravos libertos e o estrangeiro viviam em estruturas bem diferentes da descrita nos manuais de direito romano como característica da família de então Referese a descrição a rigor à família chefiada pelo cidadão romano o pater As funções da família nesse contexto eram muito diferentes e significativamente maio res que as da do nosso tempo Em primeiro lugar ela era também a principal unidade de produção de bens Comidas roupas móveis e tudo de que se necessitava para viver eram produzidos em princípio pela família O trabalho acontecia dentro da família nela incluíamse os escravos Além disso era também o núcleo religioso Cada família adorava seus próprios deuses e o pater era o sacerdote dos rituais A cura das enfermidades e amparo na velhice eram atribuições exclusivas da estrutura familiar Era na família igualmente que se desenvolvia do início ao fim a educação dos pequenos e a preparação do filho primogênito para a vida pública não havia escolas ou universidades naquele tempo Esposa e concubinas assim como os filhos irmãs solteiras e a mãe do pater moravam todos na mesma casa e estavam a exemplo dos escravos sob o pleno domínio dele Os filhos podiam ser vendidos como escravos ou mortos se assim o pater quisesse Nenhum deles tinha patrimônio próprio apenas com o objetivo de arregimentar melhores quadros para o exército atribuíase aos filhos a propriedade dos soldos e despojos Em termos esquemáticos podemse apontar as seguintes funções da família romana a função biológica relacionada à preservação e ao aprimoramento da espécie com a proibição do incesto a família romana garantia os benefícios da diversidade genética para as gerações subsequentes b função educacional pertinente à preparação dos filhos menores para a vida em sociedade mediante a introjeção dos valores que possibilitavam a organização da estrutura social nos moldes então existentes a mulher por exemplo submetiase ao domínio do pai e depois do marido porque a família lhe ensinava que assim devia ser c função econômica que compreende a produção dos bens necessários à vida humana como alimentos e mobília o excedente era trocado no comércio pelos bens que a família não produzia e de que necessitava d função assistencial pela qual a família amparava os seus principais membros nas enfermidades e velhice após a morte do marido a mãe e tios ficavam sob os cuidados do primogênito e função espiritual sendo a família o local privilegiado das práticas religiosas f função afetiva indispensável à estruturação psíquica do ser humano construção de sua identidade e autoestima a família é condição essencial para a felicidade Se adotarmos essa organização familiar da classe dominante romana como ponto de partida a história da família é uma história de perdas À medida que se torna mais complexa a sociedade subtrai funções da família A difusão do cristianismo retirou da família a função religiosa Algumas características dessa religião podem ser apontadas como causa A primeira é o monoteísmo à profusão de deuses familiares contrapôs a crença num único Deus pai de toda a humanidade A segunda a evangelização pela primeira vez na história uma religião atribuiuse a tarefa de converter todos para sua crença espalhando a Boa Nova A terceira característica do Cristianismo decisiva para tirar a religião do recesso doméstico e tornála pública é a apostólica só os escolhidos por Cristo direta os Apóstolos ou indiretamente os sacerdotes da Igreja fundada por Pedro podem presidir os rituais religiosos Nenhuma religião sem estas três características poderia ter desencadeado a desfuncionalização da família como centro religioso Ainda hoje é certo apelase para a espiritualização da vida familiar dizem os católicos que a família que reza unida permanece unida mas as religiões se praticam principalmente em templos públicos seguindose rituais presididos por sacerdotes Ligar os homens a Deus é sob o ponto de vista da corrente estrutura social uma profissão como outra qualquer As revoluções industriais por sua vez tiraram da família por completo a função econômica Antes delas outros fatos históricos contribuíram para a constituição de um espaço de trabalho estranho ao lar como a revitalização do comércio invenção dos bancos e seguradoras e formação das cidades ocorridas na Idade Média Foram as revoluções industriais no entanto que encerraram o processo Desde meados do século XIX a tendência é a de reunir a população em cidades onde cada pessoa mora num lugar dorme encontra os filhos faz algumas refeições repousa quando enfermo etc e trabalha noutro A desfuncionalização econômica da família terá um efeito claro no modelo de sua estruturação O chefe da família perde um poder significativo o de escolher com quem vão casar seus filhos A organização da economia já prescinde de um poderoso tirano à frente da unidade produtiva como forma de garantir seu funcionamento a empresa capitalista substitui a família na função econômica Outra importante função perdida pela família foi a educacional Ainda na Idade Média a Igreja Católica encarregouse de educar seus sacerdotes criando instituições que estão na origem das escolas As corporações de ofício cuidavam do treinamento de seus membros Também naquele tempo surgiram as primeiras universidades A família ficou encarregada então das primeiras letras e introjeção dos valores fundamentais A formação técnica e superior contudo por sua complexidade só podia ser alcançada fora de casa Com o desenvolvimento da ciência também a educação fundamental deixou de ser tarefa ao alcance da família Hoje em dia a criança já ingressa na escola em creches ou maternais tão logo abandona as fraldas em alguns casos antes mesmo disso A família ainda exerce certa função educacional mas nela aprendese menos que na escola tanto em relação às aptidões como também em medida crescente aos valores A função assistencialista a família vem perdendo a partir de meados do século XX mas o processo ainda está em curso Ainda não há acúmulo de trabalho suficiente para dispensála dos cuidados relacionados aos seus membros na doença e velhice Veja que na préhistória tribos inteiras podiam perecer de fome no inverno por não saber conservar os alimentos Foi necessário um certo grau de acumulação social para o ser humano dominar técnicas que garantissem a reprodução de sua força de trabalho A civilização que criamos pode deixar de existir por muitos fatores inclusive uma hecatombe nuclear mas não por causa de fome no inverno Garantimos já a reprodução da força de trabalho Mas ainda não temos suficiente acumulação social para garantir a recuperação dessa força Quando o ser humano adoece e não pode trabalhar a família tem cuidado dele assim como na velhice em que a força de trabalho do indivíduo muitas vezes desaparece e ele precisa contar com o amparo dos filhos A Seguridade Social está substituindo a família nessa função num lento processo histórico de avanços e recuos em que os países centrais do sistema capitalista naturalmente têmse saído melhor que os periféricos Coelho 199256 A função biológica a família está começando a perder O conhecimento humano já tem outros meios de garantir a diversidade genética além do limitado recurso da proibição do incesto Mas é cedo para dizer de que modo exatamente as clínicas médicas poderiam substituir a família nessa tarefa e quais seriam todas as implicações morais e jurídicas dessa desfuncionalização Dá para afirmar com certeza apenas que o processo já teve início Consideradas as funções da chefiada pelo cidadão romano como ponto de partida a família tem percorrido uma trajetória histórica de perdas No início desempenhava funções religiosas não havia religião fora de casa e econômicas na família se produziam os principais bens para subsistência de seus membros que perdeu totalmente Desempenhava também funções educacionais e assistenciais que em parte não tem mais As funções biológicas e afetivas são as que por enquanto mantêm as famílias E quanto à função afetiva Esta a família tem conservado Mais ainda dispensada das funções econômica religiosa e em parte da educacional e assistencial a família tende a ser cada vez mais o espaço para aflorar a afetividade contribuindo para que homens e mulheres cresçam psicologicamente sadios com autoestima e identidade É claro que muitas e muitas famílias não cumprem essa função a contento gerando para a sociedade pessoas perturbadas sexualmente reprimidas inseguras e infelizes Mas é provável que possa cada vez mais se dedicar à importante tarefa de estruturação psicológica de homens e mulheres pelo afeto na medida em que se fortaleçam os sistemas públicos de saúde e de seguridade social A família no ponto de chegada dessa história de perdas parece finalmente direcionarse para sua vocação de espaço da afetividade Nessa função ela representa uma organização social insubstituível Por enquanto 2 Modelos de família Não existiu como acentuado uma estrutura única de família A família extensa predominante no meio rural pernambucano do período colonial tem pouco em comum com a família nuclear que predominava na São Paulo do século XVIII Samara 1983 Nenhuma delas poderia ser chamada propriamente de modelo da família brasileira por exemplo E ainda é assim hoje em dia Não se consegue identificar uma estrutura única de família Centrada a atenção apenas no ambiente urbano podemse divisar os mais variados tipos há os núcleos compostos pelo esposo esposa e seus filhos biológicos o viúvo ou viúva e seus filhos biológicos ou adotivos pai ou mãe divorciados e seus filhos biológicos ou adotivos esposo esposa e os filhos deles de casamentos anteriores esposo esposa e o filho biológico de um deles havido fora do casamento esposo esposa e filho adotivo casais não casados com ou sem filhos pessoas do mesmo sexo com ou sem filhos biológicos ou adotivos de um deles ou de cada um deles a homossexual e o filho da companheira falecida avó e neto irmãs solteiras que vivem juntas etc A partir dessa enorme diversidade de tipos de família é possível porém a construção de alguns modelos teóricos que auxiliem a compreensão de sua trajetória evolutiva Correspondem esses modelos não somente ao tipo predominante em cada época mas principalmente à ideologia nela cultivada acerca de como se estrutura a família normal São modelos por outro lado aptos a auxiliarem na compreensão da família na civilização ocidental de raízes europeias não servindo necessariamente ao estudo de outras culturas São nesse sentido três os modelos de família tradicional romântica e contemporânea Na família tradicional que existiu até meados do século XIX o pai era o poderoso chefe em torno do qual gravitavam os demais membros A ele competiam todas as decisões escolher a profissão dos filhos homens definir as amizades que a mulher e filhas podiam cultivar determinar os horários em que elas podiam sair de casa e a companhia que estavam autorizadas a ter De todas as decisões que unilateralmente tinha o poder de tomar a mais importante era a escolha da pessoa com quem seus filhos iriam se casar Independentemente do sexo o filho casava com quem o pai determinava Na família romântica que existiu entre meados do século XIX até os anos 1960 o pai perde boa parte de seu poder tirânico mas continua ainda centralizando a vida da família As pessoas passam a gozar de certa liberdade na escolha do futuro cônjuge O casamento deixa de ser um contrato entre famílias quase sempre norteado pelos interesses econômicos dos pais tornase o encontro de seres que se identificam de algum modo Chamase romântica essa estrutura familiar porque com ela tem início o processo de despatrimonialização do direito de família Mas é apenas o início atente O jovem só se arriscava a pedir a mão em casamento da mulher amada se tivesse alguma esperança de não ser recusado pelo pai dela isto é se podia se apresentar como alguém em condições de proporcionarlhe um padrão de vida semelhante ao que tinha na casa do pai Na família do noivo em princípio o pai era apenas informado da decisão do filho mas este também se preocupava em tomar decisão que o agradasse para não correr o risco de sofrer algum prejuízo material deserção ou simples negativa de recursos A família contemporânea é resultado da mudança significativa na condição da mulher na sociedade ocorrida na segunda metade do século passado Podendo exercer sua sexualidade com mais liberdade graças à pílula anticoncepcional e ocupando no mercado de trabalho lugar de importância equivalente ao do homem a mulher pode ser independente não tem mais que aceitar minimamente a ideia de casar ou deixar de casar em função da vontade do pai A chefia da família contemporânea não é mais do homem e as decisões importantes domicílio local das férias redecoração da casa etc surgem de intensa negociação com a mulher e os filhos Quanto ao casamento destes os pais são meramente informados com mais ou menos solenidade acerca da decisão adotada diretamente pelos noivos Em termos esquemáticos o decisivo é a variância em cada modelo da competência para a decisão sobre o casamento dos filhos Na família tradicional os pais da noiva e do noivo contratavam o enlace Na romântica o noivo pedia a mão da noiva ao pai dela que podia impedir o casamento caso não o agradasse o pretendente já o pai do noivo era comunicado da decisão do filho Na família contemporânea a decisão é exclusiva dos diretamente interessados e tanto o pai da noiva como o do noivo são apenas informados Na civilização ocidental de raízes europeias são três os modelos de família tradicional em que os pais contratam o casamento dos filhos até meados do século XIX romântica em que o pai da noiva tem o direito de não autorizar o casamento de meados do século XIX até os anos 1960 contemporânea em que as pessoas casam com quem querem independentemente da vontade dos pais desde os anos 1960 Encontramse hoje famílias mais ou menos tradicionais ou românticas em que a figura do pai ainda tem proeminência Por meio de chantagens emocionais ou ameaça de redução de meios materiais de subsistência alguns homens conservadores procuram dar sobrevida a essas estruturas familiares arcaicas Quando o conseguem pagam e impõem aos filhos um altíssimo custo psicológico e acabam formando pessoas dessintonizadas com o seu tempo em prejuízo para toda a sociedade 3 O direito de família Cada ramo de saber adota conceito próprio de família Para a história e sociologia ela é o conjunto de pessoas que habitam a mesma casa A antropologia já a define em função da interdição de relações sexuais incestuosas Na psicanálise a definição parte dos papéis psicológicos desempenhados pelas pessoas O pai e a mãe não são necessariamente os fornecedores dos gametas mas aqueles que cumpriram determinadas funções na estruturação da psique da pessoa O direito por sua vez adota a definição de família tendo em vista certas relações jurídicas entre os sujeitos Na família as principais relações jurídicas são de um lado as horizontais e de outro as verticais As relações horizontais são as de conjugalidade empregada a expressão aqui num sentido muito amplo que abarca todos os enlaces entre duas pessoas adultas não irmãs voltadas à organização da vida em comum Mantêm relações horizontais de família os casados os que convivem em união estável em união livre e as pessoas de mesmo sexo em comunhão de vida As relações verticais são as de ascendência e descendência como as que unem pais aos filhos avós aos netos etc As relações horizontais dizem respeito em geral aos vínculos fundadores de novo núcleo familiar incluindo os estabelecidos pelo casamento de duas pessoas de sexo oposto mas não se limitando a essa hipótese Mas não são os únicos vínculos fundadores de nova família porque também ela se forma por relações verticais como no caso da adoção de filho por pessoa solteira divorciada ou viúva a geração e educação de criança por mulher não casada chamada produção independente o acolhimento do neto em sua casa pelos avós etc Enquanto as relações horizontais são atualmente voluntárias porque se estabelecem e se mantêm apenas se os dois sujeitos de direito querem ficar juntos as verticais são obrigatórias pelo menos pelo lado dos descendentes Os pais podem escolher ter ou não filhos quando adotam podem inclusive escolher o filho que querem Há assim uma certa liberdade mas uma vez feita a opção pela paternidade ou maternidade o vínculo durará a vida toda Os descendentes também se envolvem forçosamente numa relação vertical que dura a vida toda ou pelo menos até a morte dos ascendentes A explicação para isso é natural quando éramos nômades caçadores a família garantia aos pequenos alimento calor segurança e conhecimentos até a conquista da plena autonomia característica da vida adulta Na civilização a família exerce função semelhante cabendolhe preparar os filhos para a vida em sociedade preparo psicológico e obediência às principais regras morais jurídicas de etiqueta etc A relação vertical quando existente é imposta aos pais e filhos que dela não podem desligar se Enquanto não alcança sua independência material e psicológica o filho tem direito de ser educado criado e assistido pelos pais Depois de tornarse um ser independente continua preso à relação vertical que o enlaça por toda a vida dos pais porque é seu dever cuidar deles na velhice Se sempre existiram meios de desfazimento do vínculo de conjugalidade Cahali 19783033 por enquanto o direito não os conhece para os de ascendência e descendência pais e filhos não se separam Como dita a Constituição Federal os pais têm o dever de assistir criar e educar os filhos menores e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice carência ou enfermidade art 229 A natureza das relações familiares horizontais e verticais mudou significativamente na família contemporânea quando comparada à tradicional e romântica As relações horizontais deixaram de se fundar exclusivamente na monogamia vitalícia e passaram a admitir também a monogamia sucessiva como padrão A autoridade do pai foi substituída pela igualdade dos sujeitos em relação matrimonial Não há mais a necessidade da celebração do ritual do casamento para constituição do vínculo horizontal e formação da família Em alguns países não é mais imprescindível que os sujeitos da relação sejam de sexos opostos Tempo houve por outro lado em que as relações verticais provinham de fundo biológico Ascendentes e descendentes se definiam unicamente em função dos chamados laços de sangue O filho adotivo não participava da herança em igualdade de condições com os biológicos por exemplo Atualmente não há mais distinção jurídica nenhuma entre a filiação biológica e não biológica Aliás com a paternidade ou maternidade socioafetiva quem cuida duma criança como seu filho passa a ser pai ou mãe dela para o direito rompeuse de vez o fundamento biológico para as relações verticais Outra mudança importante foi a superação da abominável distinção entre filhos legítimos nascidos dentro do casamento e ilegítimos nascidos fora do casamento Há não muito tempo atrás esses últimos tinham na partilha menos direitos que aqueles Por fim os filhos não estão mais submetidos inteiramente à autoridade dos pais tendo voz ativa em muitos dos assuntos de seu interesse e da própria família em 1989 a ONU proclamou na Convenção sobre os Direitos da Criança o princípio do melhor interesse do filho nas relações com os pais Alterou por completo a base jurídica dessas relações tradicionalmente lastreadas nos interesses dos genitores Essas são como dito as principais relações familiares Há além das horizontais e verticais duas outras espécies de relação que para o direito também podem caracterizar a família São vínculos regidos pelo direito de família Tratase das relações colaterais que incluem as de fraternidade entre irmãos bilaterais ou unilaterais e as existentes entre tios e sobrinhos e as relações de afinidade estabelecidas pelo casamento entre cada cônjuge e os parentes consanguíneos do outro Um estatístico dificilmente consideraria existir família no vínculo de dois irmãos adultos moradores de cidades diferentes ou no existente entre exgenro e exsogra que não se encontram há anos Para o direito no entanto tais relações são familiares serão devidos alimentos se um irmão precisar e o outro tiver meios para os prover à falta de cônjuge convivente e outros parentes sucessíveis o sobrinho herda do tio exgenro e exsogra não podem casarse mesmo após decurso de longo tempo após o fim do casamento que estabeleceu a relação jurídica entre eles Essas duas relações jurídicas colateralidade e afinidade correspondem a situações de fato de menor relevância porque os conflitos de interesses em torno delas são bem mais raros que os atinentes às relações horizontais e verticais Há famílias sem relações horizontais a família monoparental por exemplo como há as desprovidas de relações verticais a constituída por casal sem filhos mas faltando essas relações e as demais juridicamente características do vínculo familiar como as de fraternidade ou afinidade não há família Para o direito assim família é o conjunto de dois ou mais sujeitos ligados por essas específicas relações jurídicas Portanto a família é fenômeno plural o filho havido fora do casamento e seu pai casado mantêm uma relação juridicamente regulada pelo direito de família Apesar de morarem em casas separadas e não conviverem integram uma família jurídica De fato pela ausência de coabitação e vínculos afetivos não se poderia falar aqui estritamente em família sob o ponto de vista sociológico e psicológico No censo por exemplo não aparecerão como membros da mesma unidade fami liar Mas juridicamente falando não é despropositado falarse numa espécie de família monoparental cujos membros têm direitos e deveres um para com o outro Por outro lado a pessoa pode ter mais de uma família O filho de pais divorciados por exemplo integra duas famílias monoparentais caso nenhum dos genitores tenha se casado novamente ou faça parte de união estável Assim o conceito dos velhos manuais jurídicos que identificavam a família a partir da existência de tronco ancestral comum Beviláqua 189615 Rodrigues 20044 não atende mais à complexa realidade dos nossos dias Além da superação do fundamento biológico dos vínculos familia res outra forte tendência do direito de família aponta para a primazia da afeição A família dispensada das pesadas funções que vinha e em certa medida vem exercendo tem meios para ser enfim o espaço da afetividade Essa tendência tem sido chamada de despatrimonialização do direito de família Esse ramo jurídico realmente se dedica cada vez mais a questões como direito de visita guarda conjunta primazia dos interesses dos filhos e outros que transcendem os aspectos meramente patrimoniais Não significa atente que tenha já ou venha num dia próximo a descuidar desses aspectos Só se e quando houver no futuro sistemas sociais consolidados de recuperação da força de trabalho e assistência à velhice a família poderá dedicarse exclusivamente à promoção da afetividade e liberarse por completo de funções patrimoniais Até lá institutos como alimentos e regime de bens do casamento continuarão o centro das atenções desse ramo jurídico Mas a despatrimonialização do direito de família é irrefreável Somente levando às últimas consequências o fundamento afetivo de constituição dos laços familiares poderá o direito de família por exemplo dar solução satisfatória aos inúmeros conflitos que surgirão das técnicas de fertilização assistida como o uso indevido dos gametas ou embriões a descoberta da identidade do doador do sêmen a deficiência na prestação dos serviços de guarda de material genético etc Quem já tem um pai numa relação socioafetiva não terá assim direito nenhum oponível ao fornecedor do sêmen ou seus sucessores Para o direito família é o conjunto de duas ou mais pessoas vinculadas por relações específicas tais as de conjugalidade ascendência e descendência fraternidade e outras No passado definiase em função de fatores biológicos que aos poucos foram substituídos por vínculos de afeição Em paralelo o direito de família apresenta a irrefreável tendência à despatrimonialização das relações familiares As principais normas legais de direito de família estão no Livro IV da Parte Especial do Código Civil arts 1511 a 1783 e disciplinam não só as relações típicas da família acima referidas conjugalidade descendência afinidade etc em seus aspectos pessoais e patrimoniais como também alguns outros institutos afins assim a tutela e curatela 4 Classificação das famílias No direito classificamse as famílias inicialmente em duas categorias as constitucionais e as não constitucionais As famílias constitucionais são as mencionadas na Constituição Federal art 226 São três a instituída pelo casamento pela união estável do homem e da mulher e a família monoparental isto é a formada por qualquer dos pais e seus descendentes Já as famílias não constitucionais são as demais vale dizer as não lembradas pelo constituinte Nessa ampla categoria incluemse por exemplo as derivadas de parcerias entre pessoas do mesmo sexo e as famílias não monogâmicas Entre as famílias constitucionais e as não constitucionais a diferença diz respeito unicamente à possibilidade de a lei ordinária estabelecer restrições específicas Se for um dia disciplinar a parceria de pessoas de mesmo sexo por exemplo a lei pode dispor validamente sobre a participação do parceiro sobrevivente na herança do falecido instituindo quotas inferiores à que atribui ao cônjuge na sucessão da pessoa casada Não haverá nenhuma inconstitucionalidade nessa diferenciação porque a parceria entre pessoas do mesmo sexo é uma família não constitucional Já ao disciplinar as uniões estáveis por exemplo o legislador não pode deixar de atribuir ao companheiro nenhum direito que tenha reconhecido ao cônjuge Como a união estável é família constitucional essa discriminação não é aceita pela ordem jurídica vigente O casamento será examinado com mais vagar apenas em função de sua maior complexidade Caps 56 e 57 As demais famílias ou entidades familiares as expressões são sinônimas examinamse na sequência Cap 59 5 Relações de Parentesco Por muito tempo a ciência considerou que a hereditariedade biológica era transmitida pelo sangue Expressões como laços de sangue sangue ruim ou sangue azul foram cunhadas em função dessa concepção que o conhecimento científico sustentou desde Aristóteles até o fim do século XIX Sabese atualmente porém que a hereditariedade biológica transmitese pelos genes encontrados na quase totalidade das células de nosso organismo Por incrível que pareça as únicas células do corpo humano que não possuem gene e portanto não transmitem nenhum traço hereditário são exatamente os glóbulos vermelhos do sangue BrodyBrody 1999334 Quando se chama consanguíneo ou natural certo parentesco pretendese destacar que a relação tem por pressuposto fático a transmissão da herança genética Distinguese assim do parentesco civil em que não se verifica tal transmissão CC art 1593 O filho biológico tem com o pai um vínculo de parentesco natural ao passo que o adotivo e o gerado por fecundação assistida heteróloga feita com espermatozoide fornecido por outro homem vinculase ao pai por parentesco civil A diferença hoje entre uma e outra categoria de parentesco é nenhuma tendo em vista a plena igualdade entre as espécies de filiação Os ascendentes e descendentes são parentes em linha reta assim os pais e filhos avós e netos bisavós e bisnetos etc CC art 1591 Os graus desse tipo de parentesco contamse pelo número de gerações Pai e filho são parentes em linha reta de primeiro grau avô e neto de segundo grau bisavô e bisneto terceiro e assim por diante art 1594 primeira parte Não há grau máximo no parentesco em linha reta de modo que a pessoa está ligada por vínculo de parentesco a todos os seus ascendentes e descendentes independentemente do número de gerações que os separam As pessoas que provêm de tronco comum mas não são parentes em linha reta estão ligadas por parentesco em linha colateral ou transversal CC art 1592 Irmãos são parentes colaterais porque têm ascendência comum mesmos pais quando bilaterais ou germanos mesmo pai ou mesma mãe quando unilaterais mas não descendem um do outro Também primos assim como tios e sobrinhos são parentes colaterais Os graus de parentesco na linha transversal contamse também por número de gerações mas subindo de um dos parentes até ao ascendente comum e descendo até encontrar o outro parente art 1594 in fine Desse modo irmãos são parentes colaterais de segundo grau Confirase tomando o exemplo dos germanos uma geração separa um dos irmãos dos pais que são os ascendentes comuns e mais uma geração separa estes do outro irmão no total duas gerações e portanto dois graus No caso de irmãos unilaterais o cálculo é o mesmo porque entre o ascendente comum o pai ou a mãe e cada um deles há igualmente uma geração Tio e sobrinho são parentes colaterais de terceiro grau O ascendente comum é o pai do tio que é também avô do sobrinho Entre o tio e o ascendente comum há uma geração entre o ascendente comum e o sobrinho duas No total são três gerações separando o tio do sobrinho e por isso o parentesco é de terceiro grau Entre primos com os mesmos avós os vulgarmente chamados de primosirmãos ou primos de primeiro grau há parentesco colateral de quarto grau Na subida até o ascendente comum são duas gerações e na descida mais duas Também é esse o parentesco existente entre tioavô e sobrinhoneto filho do sobrinho Na subida até o ascendente comum há uma geração e na descida mais três O parentesco transversal não vai além do quarto grau Os vulgarmente chamados primos de segundo grau por exemplo não são parentes O parentesco pode ser em linha reta em linha colateral ou por afinidade Parentes em linha reta são os ascendentes e descendentes como pais e filhos avós e netos etc Em linha colateral ou transversal são aqueles que provêm do mesmo tronco mas não em linha reta como irmãos tio e sobrinho etc O parentesco afim por sua vez é estabelecido pelo casamento ou pela união estável entre cada um dos cônjuges ou companheiros e os parentes do outro Nora e sogro são parentes por afinidade assim como um companheiro e os filhos do outro Por fim há parentesco por afinidade entre uma pessoa casada e os parentes do cônjuge dela Nesse caso é o matrimônio que gera o parentesco O esposo é parente por afinidade dos ascendentes pais avós etc descendentes filhos netos etc e irmãos da esposa Também a união estável gera o parentesco por afinidade entre cada companheiro e os parentes do outro CC art 1595 e 1º O término da sociedade conjugal ou da união estável extingue o parentesco afim exceto os de afinidade em linha reta que perduram por toda a vida dos parentes 2º A única consequência disso porém é o impedimento para o casamento de exgenro com exsogra de um dos excônjuges com filho do outro de mulher com o avô do antigo companheiro e assim por diante Cônjuges e companheiros não são parentes uns dos outros Integram uma mesma família constituída apenas pela relação de conjugalidade mas não mantêm entre eles nenhum vínculo de parentesco 6 Bem de família A garantia dos credores é o patrimônio do devedor Em outros termos quando alguém não cumpre determinada obrigação de fundo contratual ou legal o credor pode executar seu crédito requerendo em juízo a penhora de tantos bens do devedor quantos bastem à satisfação do devido O bem ou bens penhorados são então expropriados judicialmente para que seja pago o credor O objetivo do instituto do bem de família que nasceu no direito norteamericano em meados do século XIX e se espalhou por diversas legislações Azevedo 19742680 inclusive a brasileira é impedir que o devedor seja privado de moradia Considerase que por mais errado que tenha sido a atitude dele no descumprimento da obrigação exequenda não é justo senão em hipóteses excepcionais que fique numa situação patrimonial tão precária a ponto de perder inclusive a casa ou apartamento em que mora São duas as espécies de bem de família legal e convencional O bem de família legal está disciplinado na Lei n 800990 que estabelece a impenhorabilidade do imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar na cobrança de dívidas de qualquer natureza art 1º Dizse legal essa hipótese de bem de família porque sua instituição independe de qualquer declaração de vontade específica do devedor no sentido de subtraílo da garantia geral de seus credores Desse modo todo aquele que abre crédito a certa pessoa sabe que em caso de inadimplemento poderá buscar em juízo a penhora de qualquer bem do patrimônio dessa última menos o imóvel em que ela reside Quando a família possui mais de uma residência dos imóveis em que reside será impenhorável apenas o de menor valor Lei n 800990 art 5º parágrafo único A lei abre algumas exceções à impenhorabilidade do bem de família como por exemplo na execução de crédito decorrente do não pagamento de impostos incidentes sobre ele ou da hipoteca que o grava Lei n 800990 art 3º Nesses casos e nos demais excepcionados pela lei o bem de família responde pela obrigação do devedor tal como os demais de seu patrimônio A despeito do nome do instituto a impenhorabilidade do bem de família legal não se destina apenas a proteger os interesses de membros de entidades familiares Predomina na jurisprudência o entendimento de ser escopo do instituto a proteção do direito à moradia STJ Súmula 364 Desse modo é impenhorável também na forma da Lei n 800990 o imóvel em que vive pessoa solteira e solitária Gonçalves 2004519520 Por sua vez o bem de família convencional é instituído por declaração de vontade do titular da propriedade do bem clausulado Podem instituíla não somente os cônjuges companheiros ou o cabeça da família monoparental interessados em preservar determinados bens de seus patrimônios do risco da penhora como também terceiros que doam ou testam imóvel residencial para moradia do donatário ou legatário e sua família A declaração de instituição do bem de família deve ser feita por escritura pública ou testamento mas a impenhorabilidade somente passa a clausular o imóvel após o registro do título no Registro de Imóveis CC art 1714 No bem de família convencional fixou a lei um valor máximo A declaração de impenhorabilidade não pode recair sobre bens cujo valor ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição sem prejuízo do bem de família legal CC art 1711 Desse modo imagine que uma pessoa seja titular de bens no valor de 1000 entre os quais há quatro imóveis A B C e D no valor de 200 cada e bens móveis que juntos valem também 200 Presuma que essa pessoa mora num de seus imóveis com a família imóvel A Considere ademais que ela deve 400 Pois bem o valor do patrimônio líquido dessa pessoa é 600 1000 400 600 significa dizer que ela pode instituir como bem de família qualquer um dos imóveis em que não reside já que o valor dele corresponde a 13 do patrimônio líquido 600 3 200 Note que não compensa clausular o imóvel em que reside porque este já está a salvo de penhoras em razão da Lei n 800990 Pense então que essa pessoa declarou o imóvel B como bem de família Os credores se precisarem executar seus créditos só podem requerer a constrição judicial incidente sobre os outros dois imóveis C e D ou sobre bens do patrimônio mobiliário do devedor Ao instituir o bem de família sobre um imóvel residencial urbano ou rural o instituidor pode estender a cláusula de impenhorabilidade a valores mobiliários como ações emitidas por sociedades anônimas por exemplo cuja renda deve ser gasta na conservação do bem clausulado e sustento da família CC art 1712 Os valores mobiliários alcançados pela declaração instituinte do bem de família não podem ser mais valiosos que o prédio residencial à época da instituição e podem permanecer custodiados numa instituição financeira art 1713 Uma vez instituído o bem de família convencional o imóvel clausulado não poderá ser penhorado por dívidas posteriores ao registro do título no Registro de Imóveis salvo se pertinentes aos tributos incidentes sobre o prédio ou despesas de condomínio CC art 1715 De qualquer modo vendido o bem de família em execução de dívida constituída anteriormente ao registro da declaração instituinte ou na cobrança de tributos incidentes sobre ele o saldo se houver será utilizado na aquisição de outro prédio destinado igualmente à garantia do devedor e sua família Não sendo o saldo da venda judicial do bem de família suficiente para tanto deve ser investido em títulos da dívida pública para que a renda atenda ao sustento da entidade familiar a menos que o juiz considere mais conveniente outra solução art 1715 parágrafo único Cessam os efeitos da instituição do bem de família quando falecerem ambos os cônjuges ou companheiros ou alcançarem os filhos a maioridade salvo se sujeitos à curatela o que se verificar por último CC arts 1716 e 1722 A partir de então volta o bem a ser penhorável inclusive pelas dívidas posteriores à sua instituição que ainda não estiverem prescritas A dissolução da sociedade conjugal ou o fim da união estável não extingue o bem de família art 1721 O bem de família convencional clausula o bem também com a inalienabilidade Para sua alienação é necessária a concordância de todos os membros da entidade familiar e seus representantes legais quando incapazes A lei condiciona a alienação do bem de família também à oitiva do Ministério Público o que faz pressupor que depende o ato de autorização judicial CC desta edição 2020 art 1717 Também depende de o juiz autorizar a subrogação do bem de família em outro ou a extinção do gravame art 1719 O bem de família é o imóvel que não pode ser penhorado pela generalidade das dívidas de seu proprietário Há duas espécies de bem de família o legal disciplinado na Lei n 800990 e o convencional de que tratam os arts 1711 a 1722 do Código Civil Já há muito tempo é extremamente rara a instituição de bem de família convencional Em primeiro lugar porque o instituto do bem de família legal tem atendido satisfatoriamente os interesses dos devedores em conservar em caso de insolvência pelo menos a titularidade do imóvel residencial para seu abrigo e dos familiares Em segundo porque o Código Civil cercou o instituto do bem de família convencional de tantas formalidades que tornou cara sua instituição e praticamente incompatível sua disciplina jurídica com a dinâmica da economia dos nossos tempos 2020 02 13 PÁGINA RB21 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 56 CASAMENTO Capítulo 56 Casamento 1 Introdução Desde as primeiras lições ao estudante de direito é apresentada a noção de que o conhecimento jurídico não tem por objeto o plano do ser mas do deverser A partir de elaborações filosóficas mais ou menos sofisticadas como as da Teoria Pura do Direito de Kelsen o corte metodológico fndamental ou de meros e confortáveis recortes nos temas das aulas essa lei não é aplicada Isso é um outro problema transmitese a ideia de que o profissional da área tem de se preocupar apenas com a compreensão do padrão de comportamento preceituado pela norma jurídica Pretendese que o conhecimento jurídico sabe do mundo como ele deveria ser isto é o que ditam as leis e normas cuja obediência generalizada faria plenamente harmoniosa a convivência em sociedade Nada mais equivocado O tecnólogo e o profissional do direito como o estudioso de qualquer outra área do conhecimento humano têm por objeto de estudo o que existe e não o que deveria existir Não é o mundo como ele deveria ser de acordo com o molde da ordem jurídica o campo de saber da doutrina mas as relações sociais tais como realmente são Quer dizer não estudamos as normas postas mas os conflitos de interesses manifestados nas relações sociais e as formas de sua superação Leis e normas não são o modelo de como o mundo deveria ser mas parâmetros que norteiam a superação institucional dos conflitos de interesses Essa maneira equivocada de entender o objeto do conhecimento jurídico muitas vezes transparece no exame do casamento É comum apresentarse o instituto pela perspectiva de um padrão ideal e irreal mais ou menos definido pela ideologia corrente Ele é tido nesse contexto como o ato que institui plena comunhão de vida de duas pessoas pacifica a concupiscência legaliza as relações sexuais e as une em compromissos recíprocos de fidelidade respeito e assistência mútua bem como nos relativos à criação e educação dos filhos Não faltam também nesse modelo de enfoque do casamento sugestões mais ou menos veladas do caráter sacro da união Não é assim que quero tratar o assunto Ao contrário quero examinar o casamento como ele é para entender os conflitos reais que giram em torno dele e as vias de superação construídas pela ordem jurídica Não basta a norma legal ditar que o casamento estabelece comunhão plena de vida CC art 1511 para que assim seja Não interessa de verdade o que as pessoas imaginam corresponder ao relacionamento conjugal perfeito atrás do qual gastam a vida ou boa parte dela correndo mas a realidade cujo tecido nem sempre pulcro nos cerca por todos os lados 11 Casamento entre pessoas de sexos diferentes e de mesmo sexo Para outras áreas do conhecimento humano a questão não é tão simples assim mas para o direito existem apenas dois sexos o masculino e o feminino O sexo jurídico de uma pessoa é o constante dos assentamentos do Registro Civil que por sua vez espelham o conteúdo do atestado expedido pelo hospital ou maternidade em que ocorreu o parto ou a declaração do pai mãe ou de quem comunicou o nascimento Nos dois casos o sexo é definido pelo mero exame visual dos órgãos externos do bebê Se visível o pênis atribuise à pessoa o sexo masculino se a vagina o feminino Até maio de 2011 só podiam casarse no Brasil pessoas de sexos diferentes quer dizer um homem e uma mulher uma pessoa cujo assentamento civil lhe atribui o sexo masculino com outra registrada com o feminino Naquele mês o STF reconheceu por unanimidade que o direito brasileiro não tolera qualquer discriminação entre as uniões estáveis constituídas de um lado por pessoas de sexos diferentes e de outro por pessoas de mesmo sexo por força de seus princípios constitucionais que instituem os direitos à igualdade liberdade dignidade privacidade e não discriminação Ora como a Constituição Federal também estimula a conversão das uniões estáveis de homens e mulheres em casamento art 226 3º às uniões de pessoas do mesmo sexo não se pode negar igual tratamento O casamento pode ser assim no direito brasileiro tanto entre pessoas de sexos diferentes heteroafetivo ou heterossexual como entre pessoas do mesmo sexo homoafetivo ou homossexual A admissibilidade pelo direito brasileiro do casamento entre pessoas do mesmo sexo não decorreu de nenhuma alteração legislativa mas sim da evolução da jurisprudência e de norma do Conselho Nacional de Justiça Até a admissibilidade do casamento homoafetivo não havia nada mais desrespeitoso ao postulado normativo constitucional da dignidade humana que o desconhecimento da família constituída pela união de pessoas do mesmo sexo Os homossexuais se sentiam agredidos e injustiçados e com razão porque não podiam ter os mesmos direitos que os heterossexuais em relação aos seus parceiros no vínculo de conjugalidade Note que não se está falando de inacessibilidade aos direitos de conteúdo patrimonial Em relação a estes os institutos do direito contratual e real permitiam aos casais homossexuais alcançarem idêntica proteção à concedida por meio do direito de família aos heterossexuais A instituição de condomínio sobre os bens adquiridos durante a constância da parceria testamento cuidadosamente elaborado bem como a contratação sobre a obrigação pelas despesas comuns e previsão de ajuda pecuniária devida pelo mais abonado ao menos nos primeiros anos seguintes ao eventual término do relacionamento eram medidas por meio das quais os interesses econômicos dos casais homossexuais ficavam de modo geral satisfatoriamente atendidos O desrespeito ao postulado normativo da dignidade humana a que levava o desconhecimento pelo direito dessa espécie de entidade familiar encontravase na verdade no exercício dos direitos extrapatrimoniais titulados pelos cônjuges e companheiros No enfrentamento de questões sensíveis como por exemplo autorização para transplantes cremação do corpo ou doação de órgãos após o falecimento e vocação para curadoria em caso de interdição nenhum negócio jurídico praticado pelos homossexuais podia garantir a equiparação aos heterossexuais Em outros termos o desconhecimento pelo direito dos direitos patrimoniais titulados pelos membros da união familiar homossexual representava uma séria dificuldade mas que podia ser contornada A dos direitos extrapatrimoniais não havia como superar por negócios jurídicos celebrados pelas partes diretamente interessadas Em várias partes do mundo adotouse solução intermediária a meio passo entre de um lado a admissibilidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo e de outro a desconsideração da realidade dos enlaces homossexuais Falo da união civil incorporada a diversos ordenamentos jurídicos Em França em 1999 a lei introduziu a figura do pacte civil de solidarité PACS um contrato entre pessoas físicas maiores de sexos diferentes ou do mesmo sexo destinado à organização da vida em comum dos contratantes Por meio do PACS alguns dos direitos e obrigações derivados do casamento podem ser titulados pelos parceiros homossexuais mas não todos Ele não proporciona por exemplo o direito à adoção comum de filhos Outros ordenamentos jurídicos têm incorporado a união civil como Portugal que aboliu a diversidade sexual como requisito da união estável Inglaterra onde se admite o civil partnership e Alemanha Eingetrangene Lebenspartnerschaft Nos Estados Unidos podese encontrar a figura jurídica de maior envergadura no arco dessas soluções intermediárias No Estado de Vermont no fim de 1999 a Corte Suprema declarou inconstitucional uma lei estadual que expressamente negava aos casais do mesmo sexo direitos e obrigações iguais aos derivados do casamento Nessa decisão o Judiciário deu duas alternativas ao Legislativo equiparar por completo as duas hipóteses ou estatuir um regime específico para as uniões de homossexuais Optando pela última o Legislativo do Estado de Vermont baixou em meados de 2000 a lei instituindo a civil union A adoção de filhos comuns pelo casal do mesmo sexo é aceita assim como todos os demais direitos extrapatrimoniais próprios do casamento de heterossexuais Quaisquer cidadãos norteamericanos e mesmo os estrangeiros podemse vincular em união civil pelas leis de Vermont mesmo que não residam nesse Estado Roy 2002 Connecticut também incorporou ao seu direito a figura em 2005 mas os efeitos da união civil não se projetam naqueles estados da Federação em que não houver compatibilidade com a Constituição ou a legislação estaduais Jaluzot 2008376377 A união civil não significa juridicamente falando o mesmo que casamento Este continua a representar nas ordens jurídicas que optam pela união civil uma das hipóteses de conjugalidade exclusivamente entre pessoas de sexos diferentes Os únicos ordenamentos jurídicos que em meados de 2010 admitiam o casamento independentemente da diversidade ou identidade de sexo dos nubentes eram os da Holanda desde 2001 Bélgica 2003 Espanha Canadá 2005 e Argentina 2010 Nos Estados Unidos apenas em Massachusetts considerase existir o casamento entre pessoas do mesmo sexo em razão do transcurso do prazo concedido pela Corte Suprema daquele estado para que a matéria fosse objeto de disciplina legislativa sem que o Poder Legislativo tivesse se manifestado regularmente Jaluzot 2008 No Brasil o casamento pode ser entre pessoas de sexos diferentes heterossexual ou de mesmo sexo homossexual não em razão de expressa previsão legal mas por força da interpretação do Poder Judiciário à Constituição e normativa do Conselho Nacional de Justiça A admissibilidade do casamento homossexual no Brasil seguiu rumo próprio porque não decorreu de nenhuma previsão legal específica mas de construção jurisprudencial e normativas de órgãos correicionais Corregedorias de Justiça dos Estados e Conselho Nacional de Justiça A História é a seguinte No passado quando a ordem positiva nacional proclamava indissolúvel o casamento os Tribunais atentos aos clamores da realidade social construíram os instrumentos de proteção da união estável Não foi um processo célere nem indolor mas os membros do Poder Judiciário que se sensibilizaram com a situação das inúmeras famílias fundadas pelos desquitados então marginalizadas pela lei estiveram à altura dos desafios daquele tempo Deitando ao largo preconceitos foram gradativamente amparando os direitos da concubina e de seus filhos Os desafios do tempo atual são semelhantes e o Poder Judiciário respondeu a eles aplicando o regime jurídico da união estável às uniões nascidas de relacionamento entre pessoas do mesmo sexo Em 2011 depois de alguns precedentes nesse sentido Cahali 2004294320 Pereira 20046971 RT 849165 o Supremo Tribunal Federal reconheceu a admissibilidade no direito brasileiro da união estável entre pessoas do mesmo sexo Argumentando com os princípios constitucionais o Poder Judiciário adiantouse ao legislador ordinário e esclareceu a questão Reconheceuse que por meio de instrumento particular ou escritura pública pessoas do mesmo sexo podem contratar validamente a união estável que será equiparada para todos os efeitos jurídicos à de pessoas de sexos diferentes Em seguida à decisão do STF juízes de primeiro grau começaram a converter uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo em casamento Como a Constituição Federal estimula a conversão em casamento das uniões estáveis entre homem e mulher art 226 3º e a estas se equiparam por força de princípios constitucionais as uniões entre pessoas do mesmo sexo era decorrência lógica e jurídica necessária da decisão do STF que o direito brasileiro também não condicionasse o casamento à diferença de sexo dos cônjuges Não houve recurso do Ministério Público e essas decisões transitaram em julgado As Corregedorias Estaduais foram em seguida uniformizando a orientação aos cartórios de registro civil de pessoas naturais No Estado de São Paulo a Corregedoria da Justiça normatizou o assunto em dezembro de 2012 Em maio de 2013 em treze Estados da Federação normativas correicionais já orientavam os cartórios a não recusarem a habilitação de casamento apresentada por pessoas do mesmo sexo mas faltava uma norma geral de âmbito nacional Naquele mês o Conselho Nacional de Justiça baixou a Resolução 17513 vedando a recusa de habilitação e celebração do casamento ou conversão de união estável neste a pessoas do mesmo sexo Hoje de fato e de direito pessoas do mesmo sexo podem se casar no Brasil e titularem na plenitude os mesmos direitos dos casados com pessoas de sexos diferentes 12 Objetivos do casamento O que leva um homem e uma mulher a se casarem Sob o ponto de vista psicológico as respostas são diversas Para algumas formulações de inspiração freudiana o homem que não supera convenientemente o complexo de Édipo acaba casando com a mãe quer dizer com uma mulher com os mesmos traços psicológicos essenciais dela uma pessoa familiar a mulher por sua vez também casa com um homem que apresenta os traços psicológicos mais importantes da mãe mas dependendo da ligação que tem com o pai procura um marido com as características opostas das dele a filha do filósofo casase com o comerciante para que seu pai tenha preservado o lugar no coração dela Abstraindo contudo a complexa questão psicológica o que leva um homem e uma mulher ao casamento Começo a dar minha resposta destacando três motivações amor gratificação sexual e organização da vida O amor é um sentimento complexo talvez o mais complexo de todos Alguns de seus ingredientes são conhecidos a admiração e o respeito a vontade de partilhar tudo desde coisas miúdas até grandes projetos e conquistas a saudade constante mesmo quando pouca a distância e pouco o tempo da separação a mais ampla intimidade que conduz ao pleno relaxamento físico e mental que desarma completamente que permite explodir a autenticidade em mil direções Tudo isso é o amor mas ele seguramente é mais que isso O amor não é como a paixão que irrompe arrebatanos e de repente se esvai subitamente nos perguntamos onde ela está ele é resultado do convívio dos ajustes sutis de uma demorada e caprichada construção a dois Não existe o chamado amor platônico porque onde não houver correspondência não haverá espaço para o amor se brotar ou restar algum sentimento será doentio e egoísta o oposto do amor Quanto à gratificação sexual note que homens e mulheres não se comunicam com facilidade nesse terreno Os processos de excitamento e satisfação não são iguais para os dois sexos Enquanto os homens costumam ter o desejo despertado por simples estímulos visuais a maioria das mulheres depende de carícias físicas para se interessar pelo ato sexual Os homens em geral estimulamse para o sexo mesmo após um estafante dia de trabalho e ainda que a ligação afetiva com a parceira não seja intensa As mulheres ao contrário não se sentem normalmente dispostas quando cansadas ou caso não exista ou tenha esfriado o afeto em relação ao parceiro Após o orgasmo os homens desinteressamse com maior rapidez que as mulheres também como regra geral Essas diferenças provavelmente se explicam pelas necessidades de sobrevivência da espécie humana O macho precisa estar pronto para espalhar sua herança genética sempre que a oportunidade se apresenta e uma vez inseminada a fêmea acabou sua participação na reprodução da espécie A fêmea por sua vez deve ser seletiva procurando receber apenas material genético de primeira ordem para garantir o aprimoramento da espécie e simplesmente todo o processo natural de gestação do novo ser iniciado com o ato sexual é tarefa exclusiva dela intransferível Claro que no atual estágio de evolução cultural do ser humano tais diferenças arquetípicas na comunicação sexual não são mais imprescindíveis à preservação da espécie E apesar delas ou mesmo em razão delas muitos casais alcançam a gratificação sexual Por fim a organização da vida Como o aumento da complexidade do cotidiano tem sido crescente encontrar alguém disposto a repartir as tarefas cada vez mais complicadas de organização da vida representa um enorme passo rumo ao tratamento racional dessa questão Casar é também dividir tarefas Antes da revolução dos costumes da segunda metade do século XX as incumbências de cada cônjuge na organização da vida estavam predefinidas segundo o sexo Ao homem cabiam tarefas como trabalhar fora e trazer o dinheiro para a casa defender a mulher e filhos nos conflitos mais sérios com estranhos bem como administrar os interesses gerais da família definindo o local da residência a marca do automóvel destino de viagem de férias orçamento para a redecoração da sala etc À mulher por sua vez cabia o trabalho doméstico incluindo cozinhar limpar a casa lavar passar guardar e costurar as roupas além do cuidado e educação dos filhos Cada um sabia assim de antemão na verdade desde pequeno quais eram suas responsabilidades no casamento Após a revolução dos costumes não há mais nada definido a priori Cada casal deve contratar a divisão das tarefas de organização da vida na medida em que lhes convier Se agirem de modo racional procurarão distribuílas segundo a melhor aptidão de cada um em proveito dos dois Se um dos cônjuges é mais competente que o outro para fazer compras de supermercado por exemplo ganham ambos se essa tarefa lhe for atribuída em contrapartida o outro cônjuge assumirá afazer diverso compatível com suas habilidades A repartição das tarefas de organização da vida hoje em dia tem sido feita de comum acordo dos cônjuges independentemente do gênero afastandose de maneira progressiva os antigos esquemas item 2 As três motivações para o casamento aqui apresentadas são autônomas Amar ter gratificação sexual e organizar a vida podem combinarse ou não Alguém pode amar uma pessoa mesmo sem ter por ela qualquer atração sexual Pode amar também ainda que não consiga conviver com a pessoa amada na mesma casa Por outro lado duas pessoas que se satisfazem sexualmente de forma intensa e completa não precisam necessariamente se amar Igualmente o entrosamento sexual não é garantia nenhuma de que poderiam organizar racional e eficientemente a vida em comum Por fim homem e mulher podem dividir e executar as tarefas do cotidiano de modo altamente satisfatório sem que se amem ou tenham o mínimo interesse sexual um pelo outro Não há receita ou fórmula de felicidade mas como é grande a busca por parceiro ou parceira em que convirjam as três motivações amar ter gratificação sexual e poder organizar adequadamente a vida com uma só e mesma pessoa é provável que nela esteja um dos seus segredos Pois bem afinal o que leva um homem e uma mulher a se casarem É a organização da vida Não o amor nem a gratificação sexual Olhando à volta as experiências concretas de casamento que conhece o estudioso dos conflitos de interesses e de sua superação suficientemente distanciado chega a essa conclusão Tanto assim que sobrevivem muitos casamentos mesmo depois do fim de qualquer admiração ou respeito entre os cônjuges e do menor resquício de atração sexual desde que a vida continue estruturada os dois continuem trabalhando e repartindo boa parte do salário e cada um deles cuidando de suas tarefas levar o automóvel ao conserto gerenciar os serviços domésticos fazer supermercado fazer a declaração do imposto de renda discutir com o vizinho contratar e fiscalizar a manutenção dos equipamentos eletrodomésticos levar e buscar os filhos na escola etc De outro lado quando o matrimônio não facilita o gerenciamento do cotidiano o amor e a libido não têm sido suficientes para manter unidos os cônjuges Se o marido desempregase deixa de trazer dinheiro para casa acovardase nos desentendimentos com a vizinhança não troca as lâmpadas queimadas ou a mulher não mais capricha na comidinha deixa de empilhar a roupa suja executa mal e porcamente a limpeza da casa é difícil que tudo fique bem só porque os dois se amam ou se entendem maravilhosamente na cama Amor e sexo são motivações insuficientes para o casamento Conheço histórias de casamentos desfeitos porque terminou o amor mas conheço muito mais histórias de casamentos que persistiram apesar do fim do amor porque cada esposo continuou a cumprir sua parte na divisão das tarefas São três as motivações associadas ao casamento amor gratificação sexual e organização da vida Essa última é a decisiva Inúmeros casamentos sobrevivem sem amor e sexo mas dificilmente se mantêm se os cônjuges não executam satisfatoriamente as tarefas cotidianas que lhes incumbem Por fim pode alguém objetar que a maternidade ou paternidade seria uma das fortes motivações do matrimônio No passado sem dúvida hoje não mais Atualmente ninguém precisa casar para engravidar ou criar filhos a medicina sabe como fazer e a sociedade não rejeita a família monoparental voluntária Assim sendo quem se casa com o objetivo de ter filho a rigor está preocupado com a organização da própria vida Sabe ou intui que a gratificante experiência de ser mãe ou pai não virá desacompanhada de acentuado aumento nas tarefas do cotidiano Casado terá com quem as dividir 2 A condição da mulher no casamento heterossexual Homens e mulheres são diferentes em vários aspectos Sob o ponto de vista biológico as diferenças são muitas Além das diferenças biológicas há outras de ordem psicológica e cultural Dessas diferenças resultam variadas habilidades normalmente associadas a cada gênero da espécie humana As mulheres executam com mais eficiência determinadas tarefas do que os homens e viceversa Mas tome cuidado o discurso politicamente correto do nosso tempo condena a mínima menção às diferenças naturais na identificação das habilidades de cada gênero Procura esse discurso atribuir a maior ou menor eficiência na execução de certa tarefa a exclusivos fatores culturais em uma palavra à repugnante ideologia machista Mas deitandoo ao largo podemse apontar habilidades normalmente associadas a cada um dos sexos Em geral os homens saemse melhor que as mulheres ao levar o carro ao conserto e as mulheres são mais eficientes que os homens na organização de malas de viagem Claro qualquer mulher pode ser muito eficiente no trato com o mecânico assim como qualquer homem consegue arrumar uma mala de modo satisfatório Não há nenhuma tarefa da qual um determinado gênero por definição esteja afastado Pelo contrário todos podem fazer tudo com eficiência Determinadas tarefas contudo costumam ser mais fáceis para o homem e outras para a mulher Machismo nenhum existe na identificação de diferentes habilidades entre os gêneros Existe na verdade na hierarquização delas A ideologia machista se manifesta na afirmação de que as tarefas normalmente associadas ao homem são de importância superior às da mulher Dizer que os homens em geral têm mais facilidade com a instalação de programas no computador caseiro que as mulheres e que essas se viram melhor no gerenciamento da despensa doméstica não tem nada de preconceituoso O preconceito existe na afirmação de que instalar programas em computadores seria mais importante que gerenciar a despensa ou viceversa A preocupação do discurso politicamente correto é plenamente compreensível A ideologia da supremacia do homem é das mais antigas e só recentemente tem cedido aos valores da igualdade de gêneros mesmo assim a muito custo Um dos indicadores da forte presença dessa ideologia mas também de como ela temse enfraquecido nos últimos anos podese encontrar nos desenhos animados Quando eu era criança dois cartoons da HannaBarbera faziam enorme sucesso na televisão os Flintstones e os Jetsons Os Flintstones era ambientado na Idade da Pedra e os Jetsons no futuro Apesar do extraordinário distanciamento no tempo em que estavam ambientados os cartoons a estrutura familiar nos dois era a mesma o homem trabalhando fora e a mulher se desincumbindo das tarefas domésticas Tanto Fred Flintstones como George Jetson eram empregados descontentes com seu trabalho mas plenamente confortáveis na distribuição das tarefas de organização da vida com suas mulheres Vilma e Jane A eles cabia cuidar do animal da casa Fred toda noite tentava levar Dino ao quintal e George passeava com Astor na esteira rolante do prédio em que morava O resto era da exclusiva responsabilidade das mulheres Jane costumava reclamar de ter que apertar tantos botões para pôr em funcionamento máquinas fabulosas de lavar passar guardar limpar e cozinhar Não me lembro de Vilma reclamando de nada mas os pequenos dinossauros e outros animais que faziam as vezes de utilidades domésticas eram bastante reclamões Penso que a queixa de Jane só servia para ridicularizar a das mulheres reais daquele tempo que em sua maioria ao contrário das mães e avós delas podiam já contar com muitos aparelhos elétricos a facilitar o dia a dia e que o queixume dos animais usados como utilidades domésticas por Vilma sugeriam algo semelhante as mulheres tinham menos direito de reclamar que os eletrodomésticos De qualquer forma a mensagem tinha clareza solar a estrutura da família predominante na sociedade norteamericana até os anos 1960 era imutável existia desde o início e existiria para sempre A ideologia machista começou a declinar com o considerável aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho e a revolução dos costumes que o acompanhou A indesculpável diferença de salários pagos pelo mesmo trabalho a homens e mulheres ainda persiste em muitas economias capitalistas inclusive algumas das centrais mas é inegável que os valores de igualdade de gênero vêm penetrando a cultura e encurralando o machismo A mudança é notável mais uma vez nos desenhos animados Quem compara a produção de longasmetragens animados dos estúdios Disney o percebe com facilidade Enquanto Branca de Neve 1937 Cinderela 1950 e a bela adormecida Aurora 1959 são mulheres passivas totalmente dependentes do homem que amam Ariel 1989 Bela 1991 e Mulan 1998 são decididas sabem muito bem o que querem da vida e perseguem seus objetivos com as próprias forças conquistando na passagem o coração de seu bemamado A mudança na condição da mulher em relação ao casamento foi significativa com o surgimento da família contemporânea Compare a história de duas entertainers Carmem Miranda que viveu de 1909 a 1955 antes portanto da revolução dos costumes e Maria da Graça Meneghel a Xuxa nascida em 1963 em plena revolução Os biógrafos dizem que Carmem queria muito ser mãe mas não poderia realizar esse sonho se não fosse casada No tempo em que viveu certamente sofreria prejuízos irrecuperáveis em sua carreira artística se acaso engravidasse solteira Submeteuse então a um casamento estranho e infeliz para poder ser mãe mas não conseguiu ter filho Xuxa por sua vez é mãe solteira fato que em absolutamente nada atrapalha sua profissão Pelo contrário a gravidez e maternidade até ajudaram a atrair legitimamente mais a atenção da imprensa e dos fãs para o seu trabalho Um dos objetivos do casamento é a repartição das tarefas afetas à organização da vida cada vez mais complexas Até a revolução dos costumes dos anos 1960 a repartição era feita de acordo com a ideologia machista que reservava às mulheres todas as tarefas afetas à casa incumbindo ao marido a de prover o dinheiro Atualmente cada vez mais a repartição tem sido feita levando em consideração as aptidões de cada cônjuge Homens e mulheres se casam como visto para organizar suas vidas Dividir as tarefas domésticas de modo eficiente é a principal razão do casamento A eficiência pressupõe a divisão segundo as capacitações de cada um No passado quando a estrutura familiar era mais simples as tarefas estavam divididas de antemão cabendo ao homem prover dinheiro definir o domicílio da família e impor os castigos mais severos aos filhos desobedientes e à mulher cozinhar lavar passar costurar limpar a casa cuidar dos filhos e educálos Hoje em dia a divisão atende às conveniências de cada casal Se é mais fácil que o homem vá levar e buscar os filhos na escola cozinhar ou fazer o supermercado são dele essas tarefas se uma mulher tem mais facilidade que o seu marido para negociar o contrato de locação levar o carro ao conserto e fazer a declaração do imposto de renda cabe a ela cuidar desses assuntos Se afinal o que se busca é a eficiência no trato das coisas do dia a dia em proveito dos dois e dos filhos de nada valem os parâmetros de antanho na divisão de tarefas entre marido e mulher O que interessa é respeitar as habilidades que cada cônjuge revela possuir Esqueça o amor e a gratificação sexual o segredo dos casamentos duradouros não necessariamente felizes é a divisão racional das tarefas domésticas com respeito à individualidade dos cônjuges 3 Premissas fundamentais do casamento Para casarse a pessoa precisa ser capaz e estar desimpedida Essas são as premissas fundamentais A capacidade e o desimpedimento não se confundem Na primeira tem relevância o fator da idade dos nubentes As condições em que o casamento pode ocorrer variam segundo tenham já alcançado a idade núbil e a maioridade subitem 31 Os impedimentos por sua vez estão relacionados a fatores diversos alguns biológicos outros jurídicos Visam impedir o casamento conflitante com valores que o ser humano cultiva desde tempos imemoriais subitem 32 Ao lado das premissas fundamentais da capacidade e dos impedimentos situamse as causas suspensivas que obrigam aos nubentes a adoção do regime de separação de bens subitem 33 31 Capacidade A capacidade para o casamento é regida por normas específicas Relembrando a capacidade civil se inicia aos 18 anos Até fazer 16 a pessoa é absolutamente incapaz e sua vontade é em tudo irrelevante para a prática em nome dela de negócios jurídicos Basta a dos pais que no exercício do poder familiar a representa A partir do 16º aniversário a incapacidade é relativizada Embora a pessoa necessite ainda da assistência dos pais contra sua vontade já não se podem mais praticar negócios jurídicos em nome dela CC art 1634 V Em síntese para a prática de negócio jurídico em nome de menor absolutamente incapaz basta a vontade dos pais se o menor é relativamente incapaz é necessária a convergência das vontades dele e dos pais E a capacidade para o casamento Ela vem definida assim o homem e a mulher com dezesseis anos podem casar exigindose autorização de ambos os pais ou de seus representantes legais enquanto não atingida a maioridade civil CC art 1517 e não será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil art 1520 Em outros termos até completar 16 anos ninguém pode se casar nem mesmo com autorização do juiz Entre os 16 e 18 anos é necessária a convergência de vontade da pessoa que pretende se casar e de seus pais A diferença nesse último caso em relação à regra geral é meramente de forma os pais não assistem mas autorizam o ato Em termos substanciais não há diferença já que contra a vontade do menor relativamente incapaz ou de seus pais não haverá casamento como não pode haver qualquer outro negócio jurídico A autorização deve ser dada pelo titular ou titulares do poder familiar CC art 1634 III Se vivos os dois pais devem ambos concordar em expedila Havendo divergência qualquer um deles pode requerer ao juiz que a resolva CC art 1631 parágrafo único Tratase em princípio de ato discricionário O pai ou mãe pode conceder ou recusar a autorização em função exclusivamente do que pensam ser melhor ao filho Não há necessidade de motivação Denegada a autorização pelos pais ou por um deles o menor pode requerer ao juiz o suprimento Fala a lei em injustiça da denegação como fundamento para o juiz suprir o consentimento CC art 1519 o que confere ao Poder Judiciário ampla margem para atuação Se o juiz a quem couber julgar a demanda autorizasse o casamento de seu próprio filho se ele estivesse na mesma situação do requerente então terá sido injusta a recusa de autorização dos pais Caso contrário se o juiz colocandose na mesma situação daqueles pais também não autorizasse o filho a casarse então foi justa a denegação Até a celebração do casamento a autorização é revogável A revogação é também ato discricionário O pai ou mãe pode retirar sua concordância com o casamento se o fizer até a celebração sempre que entender que o passo não corresponde ao melhor para seu filho Como a motivação não é exigível na concessão também não se a exige para revogar Sendo injusta a revogação porém pode o menor requerer o suprimento da autorização Obtido poderá inclusive demandar perdas e danos contra aquele que havia dado o consentimento e posteriormente o retirou indevidamente Quando vivo um dos pais somente ele exerce sozinho o poder familiar Também no caso de ter sido um deles destituído desse poder cabe ao outro com exclusividade seu exercício A autorização para o casamento nesses casos é evidentemente do único titular do poder familiar É irrelevante se o destituído concorda ou discorda do casamento do filho sendo suficiente a aquiescência do outro Quando mortos os dois pais cabe ao tutor decidir se autoriza o matrimônio do menor Eventualmente a faculdade é titulada pelo curador se for um dos pais interdito e o juiz lhe tiver dado esse poder Nessas hipóteses todas o consentimento é suprível pelo juiz quando injusto e se tiver sido dado pode ser revogado até a celebração Até os 16 anos ninguém pode se casar nem mesmo com autorização judicial A partir dos 16 anos a pessoa tem capacidade para se casar mas enquanto não alcançar a maioridade 18 anos necessita da autorização do titular do poder familiar tutor ou curador Enquanto não alcançada a idade núbil quer dizer até os 16 anos o casamento simplesmente não pode ocorrer Os adolescentes não possuem maturidade psicológica suficiente para tomar o sério passo da união matrimonial Não raras vezes faltamlhes igualmente recursos materiais para os compromissos correspondentes Até 2019 o direito positivo admitia a autorização judicial para o casamento de pessoas sem idade núbil que só podia ser concedida em duas únicas hipóteses delineadas pela norma legal para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez O casamento no passado era causa de extinção de punibilidade de crimes contra os costumes como o de estupro corrupção de menores e outros CP arts 213 a 218 Se o rapaz de 18 estupra a menina de 14 anos comete crime punível com reclusão de 6 a 10 anos O casamento deles no entanto até 2005 extinguia a punibilidade do ilícito livrando o estuprador da pena Ao invés de proteger a vítima a regra penal protegia o criminoso Isso porque a menina era pressionada com a indispensável conivência dos pais a se casar antes da idade núbil só para poupar seu algoz da pena A extinção da punibilidade nesses casos era um resquício odioso de um tempo em que o defloramento da mulher antes do casamento causavalhe negativas consequências sociais entre as quais a extrema dificuldade de encontrar esposo A menina estuprada então era coagida a se casar com o próprio estuprador vinculandose matrimonialmente ao agressor para não ficar sozinha o resto da vida A gravidez era o outro fundamento para a autorização judicial do casamento antes da idade núbil Partia a lei do pressuposto de que o casamento seria a melhor alternativa para todos inclusive para o bebê que estava a caminho A supressão pela Lei n 1381119 do casamento antes da idade núbil mediante autorização judicial mesmo em caso de gravidez corrigiu mais uma aparente proteção jurídica que servia na verdade apenas como forma de pressão familiar e social A gravidez prematura por si só certamente irá marcar a vida dos jovens pais eles terão a adolescência abreviada poderão sofrer prejuízos na formação profissional sem falar de danos psicológicos e sociais Se forem ainda mais forçados ao casamento prematuro isso poderá agregar mais efeitos negativos que positivos ao já delicadíssimo quadro que a gravidez ocasionou Antigamente não havia mesmo muito a ponderar se engravidou o melhor era casar devendo a lei se ocupar dessa situação Nos dias de hoje entretanto é real a alternativa de os jovens se desincumbirem de suas precoces responsabilidades de pais sem necessariamente estarem casados 32 Impedimentos Não basta ser maior ou ter idade núbil para a pessoa se casar É necessário ainda que ela esteja desimpedida Com os impedimentos objetiva a lei compatibilizar o casamento com valores cultivados pela espécie humana alguns deles desde a préhistória como a proibição do incesto Outros valores da sociedade ocidental de raízes europeias como a monogamia também são prestigiados pelas normas sobre impedimentos matrimoniais Estão impedidos de se casarem CC art 1521 a Pessoas casadas Quem porta o estado civil de casado não pode casarse com mais ninguém Também o separado judicialmente sob a égide do direito vigente antes da EC n 662010 está sujeito ao mesmo impedimento porque apenas o divórcio ou o falecimento do cônjuge põe fim ao casamento válido CC art 1571 1º Para se casar assim a pessoa deve ter um de três estados civis solteiro divorciado ou viúvo Esse impedimento se enraíza no primado da monogamia Na cultura predominante no Brasil ninguém pode ligarse por vínculo de conjugalidade a mais de uma pessoa do sexo oposto A ordem jurídica espelha esse forte traço cultural o desrespeito a esse impedimento é criminalizado bigamia é crime punido com reclusão de 2 a 6 anos CP art 235 b Ascendentes com descendentes Pais e filhos avós e netos não podem casarse O direito brasileiro reproduz nesse impedimento um dos aspectos da ancestral proibição do incesto Trata se da primeira lei adotada pela espécie humana A vedação de relações sexuais entre ascendentes e descendentes era uma forma de garantir a diversidade genética fator essencial à melhor capacitação de homens e mulheres no enfrentamento da seleção natural Cedo arraigouse na cultura dos povos primitivos Hoje com ampla acessibilidade aos métodos contraceptivos o incesto na linha reta permanece vedado em vista dos enormes danos psicológicos e sociais que a relação sexual entre pais e filhos pode ocasionar nesses últimos Por essa razão inclusive é que o impedimento alcança também a hipótese de filiação não biológica Sendo natural ou civil o parentesco ascendentes e descendentes não podem casarse c Irmãos e o adotado com o filho do adotante Os irmãos estão impedidos de se casarem independentemente do vínculo de parentesco existente entre eles Irmão e irmã não se casam sejam filhos dos mesmos pais bilaterais ou tenham só o pai ou a mãe em comum unilaterais sejam filhos biológicos ou adotados d Parentes colaterais de terceiro grau Para se casarem tio e sobrinha ou tia e sobrinho precisam passar por exame de saúde prévio feito por dois médicos nomeados pelo juiz competente para a habilitação O casamento poderá acontecer se atestada a inexistência de inconvenientes sob o ponto de vista da saúde dos nubentes e dos filhos que possam ter DecLei n 320041 arts 1º a 3º Uma vez mais a preocupação da lei ecoa a incessante busca da diversidade genética da espécie humana Os parentes colaterais de terceiro grau provêm de tronco comum mas não descendem uns dos outros nem dos mesmos pais Essas circunstâncias biológicas e mais a da separação por três gerações entre os nubentes reduzem os riscos que a pequena diversidade genética representa à perpetuação da espécie Daí a admissibilidade do casamento quando não existirem óbices de ordem médica e Parentes afins em linha reta o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem foi cônjuge do adotante O casamento e o estabelecimento de união estável vinculam cada cônjuge e companheiro com os parentes do outro É o parentesco por afinidade Genro ou nora e os sogros são parentes afins assim como os cunhados Também são parentes afins o marido e os filhos exclusivos da mulher bem como a mulher e os filhos exclusivos do marido Padrasto e madrasta são portanto afins do filho de seu cônjuge ou companheiro O impedimento guarda remota relação com a proibição do incesto no plano simbólico na medida em que o matrimônio fazia dos sogros uma espécie de segundos pais na língua inglesa a tradição é evidenciada nas designações do vínculo father in law mother in law brother in law etc Padrasto e madrasta são igualmente uma espécie de segundos pais Não vai além da linha reta o impedimento no parentesco afim Quer dizer o viúvo podese casar com a irmã da falecida a divorciada com o irmão de seu exmarido e assim por diante Nas relações verticais o matrimônio é sempre impedido Quem já foi casado com a mãe não pode desposar a filha nem a neta quem já foi esposa do filho não pode se casar com o pai ou o avô o adotado não pode casarse com quem já foi cônjuge do adotante nem o adotante podese casar com quem foi cônjuge do adotado O impedimento dos parentes afins em linha reta persiste mesmo depois do fim do casamento ou da união estável de que se originou o parentesco CC art 1595 2º f Cônjuge sobrevivente com o condenado pelo homicídio ou tentativa de homicídio do consorte Por fim se um dos cônjuges ou companheiros tiver sido vítima de homicídio ou de tentativa de homicídio a condenação penal imposta ao autor faz surgir novo impedimento O cônjuge ou companheiro supérstite está impedido de se casar com o condenado Para que se constitua o impedimento é indispensável que tenha sido doloso o crime Tratase de norma visando o desencorajamento do assassinato do esposo ou esposa combinado entre o cônjuge e pessoa com quem pretende se ligar quando enviuvar A lei ao frustrar o objetivo colimado contribui para desestimular o crime São impedidos de casar a as pessoas em estado civil de casadas ou separadas b pais e filhos naturais ou adotivos c irmãos germanos ou unilaterais inclusive se um deles ou os dois forem adotados d tio e sobrinha ou tia e sobrinho salvo se não houver inconveniente do ponto de vista da saúde deles e da prole e parentes afins na linha reta bem como o adotado com quem já foi cônjuge do adotante e o adotante com quem já foi cônjuge do adotado f o cônjuge sobrevivente com o condenado pelo homicídio ou tentativa de homicídio contra o antigo consorte quando doloso o crime Os impedimentos podem ser suscitados por qualquer pessoa capaz até o momento da celebração do casamento CC art 1522 Aliás a cerimônia deve obrigatoriamente realizarse a portas abertas art 1534 para que qualquer pessoa tenha acesso ao local em que o casamento é celebrado e possa levar ao conhecimento do celebrante o impedimento de que tem notícia A legitimação para a oposição do impedimento é ampla porque interessa a toda a sociedade e não somente aos parentes mais próximos dos noivos que o casamento impedido não se realize A apresentação da oposição fundada em impedimento porém é uma faculdade das pessoas em geral que podem ou não exercêla Já o juiz ou o oficial de registro se tiverem conhecimento de uma causa impeditiva do casamento são obrigados a declarála art 1522 parágrafo único É nulo o casamento que se realizar apesar do impedimento subitem 71 33 Causas suspensivas Causas suspensivas são as que impedem a livre escolha pelos nubentes do regime de bens do casamento Nas hipóteses arroladas pela lei o casamento só pode realizarse no regime de separação de bens CC art 1641 I Não há impedimento nem obstáculo de outra natureza à celebração do matrimônio Mas os bens dos cônjuges adquiridos antes e depois do casamento não se comunicam pelo menos enquanto pender a causa suspensiva São quatro as hipóteses a o viúvo ou a viúva que tiver filhos do cônjuge falecido enquanto não for feito o inventário e partilha dos bens deste b o divorciado enquanto não homologada ou decidida a partilha dos bens relativos ao casamento anterior c o tutor ou o curador e os seus descendentes ascendentes irmãos cunhados ou sobrinhos com a pessoa tutelada ou curatelada enquanto não tiverem sido aprovadas as contas devidas ao término da tutela ou curatela d a viúva ou mulher cujo casamento se desconstituiu por nulidade ou foi anulado até 10 meses depois do começo da viuvez ou da dissolução da sociedade conjugal CC art 1523 As três primeiras causas suspensivas acima indicadas destinamse a evitar a confusão patrimonial Se o divorciado por exemplo pudesse casarse em regime de comunhão antes de partilhados os bens que tinha em comum com o excônjuge isso poderia dificultar a identificação do patrimônio deste e do novo cônjuge Daí a obrigatoriedade do regime de separação O juiz pode liberar os nubentes da restrição imposta por essas causas suspensivas diante da prova de inexistência de prejuízo para o herdeiro letra a o excônjuge letra b e a pessoa tutelada ou curatelada letra c Quer dizer se o sujeito cujos interesses a lei quer amparar claramente não está exposto ao risco de danos com o casamento sob o regime da comunhão então não há razões para obrigar o da separação Liberada a restrição os nubentes podem escolher livremente o regime do casamento A última causa suspensiva das indicadas acima letra d destinase a evitar a chamada confusão de sangue Casandose a viúva ou a mulher cujo casamento foi invalidado logo em seguida ao falecimento do cônjuge ou dissolução da sociedade conjugal e vindo a dar à luz criança nos nove meses seguintes poderiam restar dúvidas sobre a paternidade do rebento Tratase de mais uma velharia da lei Com o exame de ADN DNA a possibilidade de confusão de sangue está totalmente descartada não havendo por que a ordem positiva continuar a se preocupar com a hipótese De qualquer modo provando a nubente que antes de vencido o prazo de dez meses nasceu o filho e portanto presumese pai o seu antigo consorte ou não existe gravidez ela poderá casarse no regime da comunhão Ao contrário do impedimento que pode ser suscitado por qualquer pessoa capaz na medida em que interessa a toda a sociedade que o casamento impedido não seja realizado no tocante às causas suspensivas o bem jurídico tutelado diz respeito a interesse individual Por isso só tem legitimidade para arguir as causas suspensivas os parentes em linha reta e os colaterais em segundo grau de qualquer dos nubentes consanguíneos ou afins CC art 1524 Ou seja só podem oporse ao casamento no regime de comunhão de bens nas hipóteses delineadas pelas causas suspensivas os ascendentes descendentes de qualquer um dos noivos os ascendentes e descendentes do excônjuge deles assim como os irmãos e cunhados Suscitada a causa suspensiva se os nubentes haviam optado pelo regime de comunhão para casarem devem alterálo para o da separação Se o casamento realizarse no regime de comunhão a despeito da causa suspensiva a comunicabilidade dos bens não produzirá efeitos perante os sujeitos cujos interesses a lei pretende resguardar os mencionados no parágrafo único do art 1523 As causas suspensivas impedem que o casamento se realize em outro regime de bens que não o da separação Com a cessação da causa suspensiva o regime do casamento continua a ser o da separação Ele só se converte no de comunhão se os nubentes solicitarem ao juiz com base no art 1639 2º do CC Cap 57 item 5 4 Constituição do vínculo conjugal O casamento segundo os costumes predominantes no meio urbano brasileiro do nosso tempo tem início com a cantada No bar festa escola ponto de ônibus ou qualquer outro lugar ele ou ela toma a iniciativa de revelar ao outro o seu interesse em vivenciar um relacionamento mais íntimo A cantada pode dar certo ou não Curiosamente para que funcione não precisa ser original ou inteligente Se a pessoa a quem é endereçada se interessa também na vivência da intimidade sugerida ela o comunicará de algum modo Quer dizer a cantada pode ser a mais usual e tola algo como sonhei com você ontem sabia que o essencial da mensagem quero ficar com você de modo mais íntimo foi transmitido De outro lado a mais criativa espirituosa e sensível cantada que alguém pode engendrar não irá surtir efeito nenhum se dirigida a quem não tiver qualquer interesse no relacionamento de maior intimidade com quem cantou Por isso é tolice perscrutar novas abordagens quem faz a cantada mais estúpida e manjada que existe se a fizer para quem tem igual desejo de aproximação alcançará o objetivo quem se esmera numa cantada nova se a endereçar a quem não entusiasma a ideia da aproximação perderá seu tempo Quando a cantada funciona ele e ela vivenciarão um relacionamento mais íntimo Se esta vivência for o único interesse de pelo menos um deles logo mais o laço é desfeito e cada um procura novos parceiros ou parceiras Mas se os dois quiserem experimentar não só o aumento da intimidade mas também um relacionamento mais estável terá início um período de convivência estreita Esse período é chamado de compromisso namoro ou noivado conforme o desejo dos diretamente interessados mais ou menos atentos a certas convenções ou rituais cultivados pela sociedade Compromisso e namoro têm seus códigos que variam segundo a idade e condição social ou cultural dos compromissados ou namorados De comum notase certa publicidade do relacionamento maior frequência do convívio social e em geral fidelidade exclusividade sexual O noivado por sua vez seguese ao compromisso ou namoro e é cercado de determinados símbolos anel na mão direita festa específica organização da futura vida em comum etc destinados a tornar pública a decisão dele e dela de virem a se casar Certas obrigações do casamento já são assumidas pelos noivos como a fidelidade e amparo mútuo Dizem que esses períodos de convivência mais estreita têm o objetivo de possibilitar a cada um dos interessados conhecer melhor o seu parceiro ou parceira para que possa decidir com mais informações se o casamento vale a pena Na verdade o que se aprende nesses períodos é como conviver com quem se escolheu A decisão de casar ou não na maioria dos compromissos namoros ou noivados já havia sido adotada de antemão muitas vezes na hora de fazer ou responder à cantada Antes de se casarem no meio urbano brasileiro costumam os nubentes vivenciar relacionamento mais íntimo por algum tempo Segundo as convenções sociais esse relacionamento pode ser um compromisso namoro ou noivado e corresponde a período em que os interessados procuram aprender como conviver um com o outro O processo de casamento civil compreende duas etapas a habilitação subitem 41 e a celebração subitem 42 Essa última é gratuita por força de preceito constitucional e legal CF art 226 1º CC art 1512 Já a habilitação não o é em regra assegura porém a lei às pessoas pobres a isenção das custas correspondentes bem como do registro e da primeira certidão art 1512 parágrafo único 41 Habilitação O homem e a mulher que decidem casarse devem procurar o Cartório de Registro Civil da circunscrição do domicílio de qualquer um deles levando os seguintes documentos a certidão de nascimento ou equivalente b se um deles ou os dois forem menores a autorização por escrito dos pais ou responsáveis ou o suprimento judicial c declaração de duas pessoas maiores parentes ou não que conheçam os nubentes e possam afirmar a inexistência de impedimentos d declaração do estado civil domicílio e residência dos nubentes e de seus pais e certidão de óbito do cônjuge falecido sentença declaratória de nulidade ou anulação de casamento transitada em julgado ou de registro da sentença de divórcio CC art 1525 Os nubentes na maioria das vezes comparecem pessoalmente ao cartório mas a lei permite que um deles seja representado por procurador ou os dois Com o requerimento por escrito dos nubentes tem início o processo de habilitação para o casamento O oficial do registro confere a documentação e se nada nela indicar a existência de impedimento providenciará o edital chamado de proclamas Nos quinze dias seguintes o edital ficará afixado nos cartórios correspondentes às circunscrições dos domicílios dos dois pretendentes e será publicado pela imprensa local se houver CC art 1527 O objetivo de tais formalidades é espalhar a notícia da intenção dos noivos de se casarem de modo que possa chegar aos ouvidos de quem possa ter conhecimento de fator impeditivo do enlace Claro que isso não acontece de fato Quando alguém se apresenta ao cartório para noticiar impedimento é porque ficou sabendo da vontade dos noivos por outros meios e não porque tenha o hábito de ler proclamas A oposição é feita por escrito pelo legitimado que a instruirá com as provas do que alegar ou indicação de onde podem ser conseguidas CC art 1529 Seu fundamento será a existência de impedimento ou de causa suspensiva Apresentada a oposição o oficial dará ciência dela aos nubentes mediante a entrega da nota da oposição instrumento em que são indicados os fundamentos as provas e o nome de quem a ofereceu art 1530 Têm então os nubentes o prazo de três dias para indicarem as provas que pretendem produzir com vistas a demonstrar a inconsistência da oposição Se necessitarem de maior prazo poderão requerer a dilação Os autos da habilitação com a oposição e a indicação das provas a produzir pelos nubentes são remetidos então ao juízo Depois da dilação probatória e da oitiva do Ministério Público o juiz decidirá declarando a pertinência da oposição e a existência do impedimento arquivando a habilitação ou sua inexistência Lei n 601573 art 67 5º Se a oposição dizia respeito a causa suspensiva e tiver sido acolhida o juiz determina a adoção do regime da separação de bens O casamento compreende duas etapas sendo a primeira a da habilitação Nela após o requerimento dos noivos o oficial do registro civil providencia a publicação dos proclamas mediante a afixação do edital nos cartórios das circunscrições dos domicílios dos dois pretendentes e publicação pela imprensa se houver Também na fase de habilitação podemse processar as oposições fundadas em impedimento ou causa suspensiva Se não houve oposição ou se o processo não tiver sido arquivado em razão de impedimento ele terá prosseguimento com a manifestação do Ministério Público CC art 1526 Em seguida o oficial certifica a habilitação dos nubentes tão logo transcorrido sem oposição o prazo dos proclamas art 1531 e expede a correspondente certificação Rodrigues 20043233 Se houve impugnação a habilitação é submetida ao juiz art 1526 parágrafo único A certidão de habilitação tem eficácia por noventa dias período em que deverá ser celebrado o casamento CC art 1532 Ultrapassado esse prazo sem a celebração os noivos devem recomeçar o processo 42 Celebração Munidos da certidão de habilitação os noivos devem requerer a celebração do casamento ao oficial de registro CC art 1533 Diz a lei que a celebração ocorre na sede do cartório no dia e hora designados pelo celebrante mas isso quase nunca acontece Na expressiva maioria das vezes ele é celebrado no dia hora e lugar da conveniência dos noivos À solenidade devem estar presentes os noivos ou seus procuradores com poderes especiais as testemunhas duas se acontece na sede do cartório ou quatro se em outro lugar ou se os noivos não sabem ou não podem escrever o oficial do registro e o celebrante Esse último também chamado de presidente do ato é o juiz de paz ou de casamento O prédio em que tem lugar a cerimônia deve permanecer de portas abertas de modo a não obstar o acesso de qualquer pessoa portadora eventualmente de notícia de impedimento Note que o preceito que determina a permanência em aberto das portas do prédio ultimamente não tem sido cumprido à risca nos centros urbanos por motivos ditados pela segurança pública Se alguém provar ter sido obstado propositadamente em seu acesso ao local da cerimônia razão pela qual não pôde apresentar a tempo o impedimento será nulo o ato Não havendo porém impedimento não se declara nulo o casamento tão só pela circunstância de estarem cerradas as portas do prédio em que se realizou a celebração A cerimônia da celebração compreende algumas falas sacramentais De início o celebrante indaga aos nubentes se pretendem se casar por livre e espontânea vontade A resposta afirmativa deve ser clara e segura para que possa prosseguir a cerimônia O celebrante tem a obrigação legal de suspendêla imediatamente se qualquer dos nubentes recusarse a dizer solenemente sua vontade de casar declarar que ela não é livre e espontânea ou manifestar arrependimento Não se admite a retratação do noivo que tiver dado causa à suspensão da cerimônia no mesmo dia Quer dizer uma vez suspensa a solenidade só poderá ser reiniciada no dia seguinte Veja que não exige a lei o transcurso de prazo mínimo em horas bastando que o prosseguimento da cerimônia aconteça depois da meianoite do dia em que teve início e foi suspensa Note que mesmo tendo a inesperada atitude do contraente nítido caráter jocoso a cerimônia não poderá ter sequência para que não paire a menor dúvida sobre a liberdade e espontaneidade da vontade nela manifestada pelos noivos Diante da segura resposta afirmativa dos dois o celebrante pronunciará de acordo com a vontade que ambos acabais de afirmar perante mim de vos receberdes por marido e mulher eu em nome da lei vos declaro casados CC art 1535 Ao determinar que o celebrante se dirija aos noivos na segunda pessoa do plural enquanto pronuncia a fórmula sacramental a lei acentua a solenidade do ato A partir dessa declaração de quem preside a celebração que pressupõe a prévia afirmativa dos nubentes considerase consumado o casamento e constituído o vínculo matrimonial art 1514 A cerimônia do casamento que deve ocorrer num prédio de portas abertas é marcada por algumas falas sacramentais Depois de cada contraente manifestar de modo claro sua livre e espontânea vontade de casar o celebrante os declara solenemente casados Proferidas essas falas o ato está consumado Em seguida é lavrado o assento que deve ser assinado pelo oficial do registro celebrante testemunhas e cônjuges Dele constarão os elementos previstos em lei como a identificação e qualificação dos esposos seus pais testemunhas dos respectivos cônjuges anteriores se houver além das datas da publicação dos proclamas e da celebração do casamento e o regime de bens adotado CC art 1536 O assentamento é formalidade de natureza meramente probatória exceto quando destinado a conferir efeitos civis à cerimônia religiosa quando tem força constitutiva Gonçalves 200588 43 Ritos especiais O processo descrito nos subitens anteriores é o do casamento em sua forma ordinária usual A lei trata de algumas situações especiais em que a habilitação e celebração não se realizam por essa forma São elas a Casamento religioso com efeitos civis No Brasil monárquico as pessoas se casavam exclusivamente na Igreja Católica ou a partir de 1863 noutra religião professada pelos noivos e não existia a figura do casamento civil Um dos primeiros atos da República foi instituílo A tradição até hoje é a do casamento tanto no civil como no religioso A lei reconhece efeitos civis à celebração do casamento religioso Não dispensa no entanto a habilitação feita no âmbito do Registro Civil e homologada pelo juiz São duas as hipóteses em que a celebração do casamento religioso tem o efeito de dispensar a solenidade civil Na primeira a cerimônia religiosa acontece antes da expedição da certidão de habilitação Os nubentes declaram a vontade de se casarem perante o celebrante religioso padre pastor rabino babalorixá etc no contexto do ritual adotado pela respectiva religião Uma vez expedida a certidão de habilitação e no prazo de sua eficácia os noivos exibem ao cartório o documento expedido pela entidade religiosa atestando a realização da cerimônia CC art 1516 2º Na segunda a cerimônia religiosa realizase após a expedição da certidão de habilitação Nos noventa dias seguintes à celebração o celebrante ou qualquer interessado comunica sua realização ao Registro Civil art 1516 1º Note que é indiferente nesse caso quanto tempo medeia a conclusão do processo de habilitação e a cerimônia religiosa Esta pode ser celebrada muito tempo depois de vencido o prazo de eficácia da certidão O que interessa à lei é o tempo decorrido entre a cerimônia religiosa e a comunicação ao Registro Civil que não pode ser maior que noventa dias Se ultrapassado esse prazo os noivos devem requerer nova habilitação Nesse caso estáse diante a rigor da hipótese anterior de eficácia civil da cerimônia religiosa em que ela antecede à habilitação civil Aplicase então o art 1516 2º do CC Veja que para fins jurídicos os noivos interessados em manter eficaz a habilitação feita até poderiam optar por nova cerimônia religiosa já que à lei importa o lapso decorrido entre a data da sua realização e a da comunicação mas essa alternativa tende a agredir a consciência religiosa deles porque ela sugere a inexistência do vínculo matrimonial antes da repetição da solenidade Nas duas hipóteses em que a lei atribui efeitos civis à cerimônia religiosa do matrimônio consideramse casados os nubentes na data da celebração CC art 1515 Desse modo a menos que houvesse algum impedimento à época em que ocorreu a celebração a validade do casamento religioso equivale plenamente à do civil b Casamento em caso de moléstia grave Se um dos nubentes cai doente e fica impedido de comparecer ao local designado para a celebração ou teme não sobreviver até sua data autoriza a lei que o celebrante ou seu substituto legal vá ao encontro dele para na presença do outro contraente e de duas testemunhas que saibam ler e escrever consumar o ato Se o oficial do registro puder comparecer levará consigo o livro de assentos Colhida a livre e espontânea declaração de vontade dos noivos e pronunciada a fórmula sacramental é lavrado o assento Se o oficial de registro não estiver presente o celebrante nomeará alguém para a função de escrever o termo numa folha avulsa o qual deve ser registrado na presença de duas testemunhas nos cinco dias seguintes CC art 1539 Em princípio essa forma especial de casamento pode ser adotada apenas se já estiver homologada a habilitação A lei não faz nenhuma ressalva expressa nesse sentido mas ao dispor sobre o tema no capítulo relativo à celebração sugere que a primeira fase do casamento deve estar já concluída Se ocorrer no entanto de as circunstâncias recomendarem a urgente celebração do matrimônio antes mesmo da expedição da certidão de habilitação o juiz de direito se provocado poderá posteriormente validar o ato Imagine que tivesse sido chamada a autoridade religiosa em vez do juiz de paz Aquele poderia fazer como visto acima uma celebração inteiramente válida e eficaz a despeito da instauração ou do andamento do processo de habilitação Não é compatível com o princípio constitucional da isonomia que não se reconheçam iguais validade e eficácia ao ato presidido pela autoridade civil nas mesmas condições c Casamento nuncupativo Também conhecido como casamento in extremis ou in articulo mortis tem lugar quando um dos contraentes se encontra em iminente risco de vida Foi baleado vitimouse num acidente de trânsito acometeulhe mal súbito em suma por qualquer razão um dos noivos se encontra num estado em que é provável sua morte em poucas horas Se não houver tempo de chamar o celebrante mas estando presente o outro nubente ou procurador deste o casamento pode realizarse na presença de seis testemunhas Elas não podem ser parentes de nenhum dos nubentes na linha reta ou colateral até segundo grau para que tenha validade o casamento Os noivos então declaram em viva voz daí a designação de nuncupativo que se recebem por marido e mulher livre e espontaneamente Nos dez dias seguintes as testemunhas devem comparecer perante o juiz de direito para confirmarem que atenderam ao chamado de uma pessoa que parecia estar em perigo de vida mas em seu juízo e que presenciaram o fato de ela e o outro nubente enunciarem de forma oral a vontade de se casarem Se uma ou mais delas não comparecer espontaneamente qualquer interessado pode requerer sua intimação ao juiz Tomadas por termo as declarações o juiz depois de ouvir o Ministério Público fará as diligências destinadas a verificar a inexistência de impedimentos isto é se os contraentes podiam terse habilitado no modo ordinário Qualquer interessado pode pedir para ser ouvido trazendo novos elementos aos autos ou simplesmente reforçando os existentes Em seguida o juiz proferirá sentença declarando a validade do casamento ou a denegando No primeiro caso após o trânsito em julgado fazse o registro CC arts 1540 e 1541 Lei n 601573 art 76 Devem ser estritamente observados os requisitos legais para configurarse o casamento nuncupativo A Justiça já considerou não caracterizada essa modalidade de casamento na hipótese em que o noivo faleceu no dia anterior àquele em que ocorreria a celebração A inequívoca vontade manifestada pelo casal e mesmo o transcurso do processo de habilitação foram insuficientes para se considerar celebrado o casamento nuncupativo RT 841338 Restabelecido por qualquer razão o contraente que se encontrava em iminente risco de vida as formalidades indicadas podem ser supridas pela ratificação do casamento Note que o ato de ratificação não é obrigatório em caso de sobrevivência do nubente Mas uma vez praticado dispensamse as testemunhas Por outro lado nenhum dos nubentes nem mesmo o que se recuperou tem o direito de se retratar Estão casados para todos os fins de direito d Casamento por procuração O noivo ou noiva não precisa estar presente à cerimônia para que ela se realize quando for representado por um procurador nomeado com poderes especiais em instrumento público A eficácia do mandato é de noventa dias devendo ser renovado após esse prazo Até o momento da celebração o nubente mandante pode cassar o mandato Só pode fazêlo também por instrumento público Se a notícia da revogação não chegar a tempo de se cancelar a solenidade e esta se realizar será em princípio inválida Terá validade se malgrado a revogação houver posterior coabitação dos cônjuges Não se instalando a coabitação remanesce a invalidade e o mandante responderá pelas perdas e danos que a falta de tempestiva comunicação da revogação ocasionou A cassação dos poderes depois de realizada a cerimônia é ineficaz CC art 1542 Em algumas situações especiais o rito ordinário da habilitação e celebração do casamento não precisa ser observado É o caso do casamento religioso com efeitos civis ou do realizado quando um dos nubentes se encontra gravemente enfermo ou em iminente risco de vida e Casamento consular Quando dois brasileiros residentes no exterior desejam se casar segundo o direito brasileiro podem fazêlo perante a autoridade consular LINDB art 18 Tanto a habilitação como a celebração devem observar as normas ordinárias mas a eficácia do ato está condicionada ao registro tempestivo no Registro Civil A partir do retorno de qualquer um deles ao Brasil começa a correr o prazo de cento e oitenta dias para ser requerido o registro do casamento perante o cartório da circunscrição do domicílio dos cônjuges ou em sua falta o 1º Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir CC art 1544 44 Prova do casamento A certidão do registro é a prova do casamento Admitemse outras apenas no caso de perda do registro isto é do livro em que fora feito o assento e também de todas as cópias das certidões expedidas Nesse caso o interessado pode requerer ao juiz que declare a existência do vínculo matrimonial seu início e regime à vista da prova do estado de casado por meio de depoimento de testemunhas exibição de escritos fotografias e documentos etc CC art 1543 e parágrafo único Em qualquer processo judicial visando declarar a existência do casamento milita a presunção em favor dele se provado o estado de casados CC art 1547 Quer dizer na dúvida o juiz deve declarar a existência do vínculo matrimonial Nesse caso e em todos os outros em que a prova do casamento resulta de processo judicial o registro da sentença no Registro Civil retroage à data em que ele se realizou CC art 1546 Considere por exemplo que a pessoa em iminente risco de vida declarou junto com o outro contraente que se tomavam por marido e mulher diante de seis testemunhas e faleceu logo em seguida O processo judicial demorou cinco anos para se concluir e quando transitou em julgado a sentença validando o matrimônio o outro cônjuge também já estava morto O registro da decisão judicial no Registro Civil será post mortem e para todos os efeitos legais o casamento nuncupativo ocorreu na data da declaração convergente de vontade dos nubentes 45 Responsabilidade civil do noivo desistente A vontade de contrair núpcias pela relevância dos efeitos advindos da constituição do vínculo matrimonial deve sempre ser livre e espontânea Ninguém pode ser levado a casarse contra a vontade Por menor que seja havendo qualquer dúvida a incomodar o espírito do contraente ela é relevante para ordem jurídica Até o momento em que o celebrante pronuncia a fórmula sacramental declarando os nubentes casados qualquer um deles pode desistir e não se casar Mesmo que já tenha respondido afirmativamente à pergunta do celebrante se este ainda não concluiu a frase ditada pelo art 1535 do CC há chance para a retratação Desse modo pratica ato plenamente lícito a pessoa que mesmo depois de iniciado o processo de habilitação muda de ideia e decide não mais se casar Ocorre que a preparação do casamento normalmente pressupõe uma enormidade de gastos por parte dos dois noivos tendo em vista não apenas a celebração e festa como também a organização da vida em comum que se avizinha Não é justo que o outro contraente amargue prejuízo econômico em decorrência da retratação perpetrada quando todas as circunstâncias apontavam para a efetivação da união conjugal É certo que o contraente ao se retratar pratica ato lícito Ao outro noivo não dá a ordem jurídica meios para buscar em juízo a substituição da declaração aventada eventualmente até prometida e agora recusada Mas apesar da licitude da recusa em se casar o nubente que desistiu do casamento é civilmente responsável pelos danos materiais que sua conduta infligiu ao outro Terá que indenizar assim as despesas feitas com aluguel de bufê decoração da igreja vestido de noiva prestação de serviços músicos fotógrafos cinegrafistas etc e todas as demais relacionadas com o evento que se frustrou Também as despesas com enxoval aluguel de imóvel e outras relacionadas à perspectiva da comunhão de vida devem ser ressarcidas Não se pode recusar licitude e eficácia à retratação do nubente desde que manifestada antes de o celebrante terminar de pronunciar a fórmula sacramental da lei O nubente desistente contudo é obrigado a ressarcir a totalidade dos danos materiais suportados pelo outro contraente e se tiver agido com deslealdade ou crueldade também os danos morais E os danos morais A recusa em se casar declarada depois de iniciados os preparativos normalmente acarreta no outro nubente uma dor e humilhação extraordinárias Mas ao contrário do que recomenda a regra geral da responsabilidade civil Cap 25 subitem 31 nem sempre será o caso de se impor o ressarcimento dos danos morais Apenas se o arrependido tiver agido de forma cruel ou desleal deverá ser condenado a pagar também a indenização extrapatrimonial Se por exemplo teve clareza de que não queria mais se casar um mês antes da data designada para a cerimônia mas resolveu comunicar a retratação apenas no dia imediatamente anterior ou mesmo no transcorrer da solenidade será devedor da indenização pelos danos morais Se porém foi leal com o outro contraente e lhe comunicou a desistência tão logo se apercebera do equívoco do passo independentemente do momento e lugar em que a comunicação se dá não há motivos para condenálo ao ressarcimento dos danos morais 5 Efeitos do casamento São quatro os efeitos do casamento O primeiro deles é a constituição da família Com o casamento os cônjuges formam novo núcleo familiar que eventualmente mas não necessariamente poderá ser acrescido com a vinda dos filhos biológicos ou não Se os cônjuges já tinham filhos comuns entre cada um deles e estes já havia uma família monoparental O casamento portanto vincula familiarmente apenas os cônjuges O segundo efeito do casamento diz respeito ao nome dos consortes A lei permite que qualquer dos nubentes acresça ao seu o sobrenome do outro CC art 1565 1º O mais salutar na minha opinião é continuarem ambos com os nomes de solteiro De qualquer forma além dessa alternativa também são possíveis as seguintes o marido acrescenta ao seu sobrenome o patronímico da mulher e esta mantém o nome de solteira a mulher agrega o sobrenome do marido ao seu mas este não muda o dele marido e mulher adotam um sobrenome comum composto pelo patronímico de um deles na sequência do outro os dois pospõem ou antepõem aos respectivos sobrenomes o do outro cônjuge Malgrado essas opções todas ainda pulsa a tradição machista de alteração somente do nome da mulher A mudança do nome tem significado meramente simbólico Para fins jurídicos é indiferente se os cônjuges conservam o nome de solteiro ou se o alteram Melhor dizendo se feito o acréscimo aquele que acresceu deve após o casamento percorrer uma infinidade de repartições públicas para atualizar os cadastros Registro Geral CPF DETRAN Cartório Eleitoral Ministério do Trabalho Conselho Profissional a que estiver vinculado etc se no futuro por força do divórcio quiser voltar ao nome de solteiro terá que refazer a peregrinação Quer dizer sob o ponto de vista racional abstraídas quaisquer considerações atinentes aos aspectos psicológicos e sociais da alteração nem sempre positivos ou sadios não há nenhum motivo para os cônjuges alterarem seus sobrenomes com o casamento Em relação à alteração do nome registro que embora a lei seja claríssima no sentido de autorizar unicamente o acréscimo há jurisprudência permitindo além dele a supressão do patronímico original do cônjuge ou seja a substituição do sobrenome de um deles pelo do outro Cahali 20043032 Os efeitos do casamento são quatro a constituição da família pelo estabelecimento do vínculo de conjugalidade entre marido e mulher b eventual alteração do nome dos consortes mediante o acréscimo do sobrenome do outro c vinculação dos cônjuges aos deveres matrimoniais d eventual comunhão de bens O terceiro efeito do casamento é a vinculação dos cônjuges a certos deveres Não variam tais deveres como variavam no passado de acordo com o sexo Tanto o esposo como a esposa assumem rigorosamente as mesmas obrigações recíprocas e perante os filhos item 6 O quarto efeito diz respeito ao regime de bens O casamento pode implicar e geralmente implica efeitos significativos no patrimônio dos cônjuges de modo a unilos total ou parcialmente Cap 57 6 Deveres dos cônjuges A lei preocupase em listar os deveres dos cônjuges embora seja este um assunto do interesse exclusivo da família Como dita a lei ser defeso a qualquer pessoa de direito público ou privado interferir na comunhão de vida instituída pela família CC art 1513 as implicações da inobservância dos deveres do casamento não são juridicamente relevantes Claro se um dos cônjuges deixa de cumprilos poderá o outro pedir o desfazimento do vínculo Mas como se discute à frente Cap 58 o fim do casamento também pode ser pleiteado mesmo não havendo descumprimento de qualquer dever Hoje em dia ser condenado na ação de divórcio não traz para o inadimplente nenhuma consequência além do pagamento das verbas sucumbenciais perda do sobrenome do outro cônjuge mesmo assim se isso não lhe trouxer prejuízo e do direito aos alimentos compatíveis com a condição social No essencial isto é na relação com os filhos e na divisão dos bens é indiferente se houve ou não inadimplemento dos deveres conjugais A lei menciona os seguintes deveres CC art 1566 a Vida em comum Quem casa assume a obrigação de viver com o cônjuge Para que o casamento realmente estabeleça a comunhão plena de vida entre os cônjuges como quer a lei CC art 1511 é necessário que eles a comunguem Quer dizer o fundamental dever contraído pelos casados é o de partilhar seu cotidiano um com o outro em todos os múltiplos e ricos aspectos profissional social psicológico econômico cultural físico etc Nos casamentos em que esse dever é cumprido pelos dois cônjuges cada qual recebe o outro integralmente em sua vida e participa da mesma forma da vida dele Se um dos cônjuges enfrenta dificuldades na profissão o outro ouve com atenção opina ajuda a avaliar as alternativas e apoia a decisão tomada Quando um deles realiza trabalho importante o outro entende o significado exato da conquista e fica igualmente feliz Os inevitáveis ajustes são acompanhados pela sensação de ganho e não de perda Os dois se sentem em casa quando estão em casa Ao comungarem a vida os cônjuges passam a titular um conjunto de interesses comuns como os relacionados à definição do domicílio organização do espaço da casa divisão das tarefas domésticas A administração desses interesses é feita de comum acordo entre os cônjuges Nos termos da lei a direção da sociedade conjugal será exercida em colaboração pelo marido e pela mulher CC art 1567 No caso de divergência o juiz decidirá atento aos interesses do casal e dos filhos embora seja raríssimo o socorro ao Judiciário nessa hipótese Apenas no caso de impossibilidade da direção comum quando qualquer dos cônjuges está ausente interditado judicialmente ou inconsciente por exemplo o outro tomará as decisões sozinho CC art 1570 Ter a vida em comum significa também concorrer para o sustento da família Os encargos da entidade familiar constituída pelo casamento são da responsabilidade conjunta do marido e da mulher CC art 1565 As despesas devem ser repartidas proporcionalmente aos ganhos de cada cônjuge ainda que não haja comunhão de bens art 1568 A vida em comum por fim normalmente está associada à coabitação Os cônjuges na maioria das vezes moram sob o mesmo teto Não se trata contudo de elemento essencial Há casais que preferem manter suas próprias residências por considerarem que a coabitação não corresponde à melhor solução para eles Há igualmente os que precisam morar em lugares diferentes por pouco ou muito tempo em razão de estudos carreira profissional saúde ou outra razão qualquer Optando pela coabitação escolherão juntos o domicílio conjugal CC art 1569 Se os consortes comungam a vida sem coabitarem cada um elege seu domicílio b Respeito e consideração mútuos Outro importante dever dos cônjuges é o de respeito e consideração mútuos De certo modo está englobado no da comunhão de vida mas revela uma dimensão própria quando associada aos direitos da personalidade de cada cônjuge Em outros termos na intimidade do lar devem os cônjuges se respeitar mas não só aí Em qualquer lugar em que esteja nenhum dos cônjuges pode por suas condutas ou falas agravar a imagematributo do outro ainda que minimamente Estando ou não em companhia em eventos sociais ou profissionais entre amigos comuns ou desconhecidos a imagematributo de cada um dos cônjuges é indissociável do comportamento do outro dos conceitos e valores que externa da maior ou menor discrição na abordagem de histórias do casal Desrespeita a mulher o marido que a chama de dona encrenca assim como falta ao dever de respeito a esposa que personalizou o toque do telefone celular com a marcha nupcial para indicar a chamada do esposo e sendo indagada a respeito da escolha responde que se deve ao fato de ele se portar invariavelmente como uma noiva Por mais graça que espíritos simples possam ver nesses chistes eles revelam que o respeito mútuo não é pleno como deveria c Mútua assistência Outro importantíssimo dever do casamento é a mútua assistência Manifestase seu cumprimento por exemplo nos momentos de enfermidade de um dos cônjuges quando o outro devota todo o empenho dedicação e amparo ao seu alcance para contribuir com a rápida recuperação do seu estado de saúde No período em que pessoa casada está sem emprego ao cônjuge empregado cabe o dever de sustentar sozinho a casa Se falece parente próximo de um deles o outro deve não somente ajudar nas providências práticas a serem encaminhadas como principalmente consolar o cônjuge nesse momento doloroso Tanto nas aflições como nas dificuldades econômicas o casamento obriga o cônjuge em melhores condições a dar ao outro a assistência possível de acordo com seus recursos d Sustento guarda e educação dos filhos Para os casados com filhos esse é o dever mais importante do casamento As árduas responsabilidades atinentes ao sustento guarda e educação dos filhos biológicos ou não devem ser repartidas entre os cônjuges No tocante ao sustento a divisão é proporcional aos ganhos de cada um deles CC art 1568 mas a guarda e educação correspondem a deveres igualmente distribuídos Em relação aos filhos exclusivos do outro cônjuge a lei não menciona qualquer dever Porém quem desposa alguém com filhos deve recebêlos e tratálos como se seus fossem Quer dizer deve contribuir na educação dos pequenos com quem convive deve amálos e respeitar as necessidades sociais e psíquicas deles contribuindo para o seu crescimento sadio além disso é esperada alguma ajuda nas despesas de sustento do filho exclusivo do cônjuge em dificuldade econômica Os deveres dos cônjuges listados pela lei são os de manter vida em comum devotar respeito e consideração recíprocos dar mútua assistência sustentar guardar e educar os filhos e por fim absterse de manter relações sexuais fora do casamento O descumprimento desses deveres no entanto não tem nenhuma consequência relevante O casamento poderá ser desfeito a pedido do cônjuge inocente mas o culpado não perde seus direitos relativos aos filhos bens e necessitando ao uso do sobrenome do outro e Fidelidade O dever de fidelidade corresponde ao de exclusividade de relacionamento sexual Fiel é o cônjuge que se abstém de qualquer relação sexual fora do casamento bem como de quaisquer atos que sugiram o interesse em vivenciar a experiência O homem ou mulher casado que descumpre o dever de fidelidade fazendo sexo com pessoa diversa de seu cônjuge comete adultério Se o homem ou mulher casado não chega propriamente à conjunção carnal extraconjugal mas faz carícias libidinosas em pessoa diversa de seu cônjuge ou mesmo emitelhe sinais correspondidos ou não de que desejaria manter relacionamento sexual extraconjugal descumpre igualmente o dever de fidelidade numa prática chamada de quase adultério Monteiro 2004146150 Verificase o descumprimento do dever conjugal como se o adultério tivesse mesmo ocorrido Desse modo o chamado sexo virtual em que os parceiros trocam mensagens eróticas via internet é exemplo de infidelidade A fidelidade é o menos importante dos deveres matrimoniais Em vários casamentos os cônjuges não dão à exclusividade sexual a menor importância São chamados de casamentos abertos em que os cônjuges concordam não ser o caso de limitarem suas vivências sexuais às relações entre eles Para os que não conseguem se satisfazer sexualmente sem a variação de parceiros o dever de fidelidade pode representar pesado entrave na busca da felicidade Os bissexuais por outro lado nunca conseguem plena expressão da sexualidade quando ficam vinculados ao compromisso de serem fiéis Como de qualquer forma é em tudo absolutamente indiferente para a sociedade se os casados estão guardando a fidelidade ou não o tema deveria ser ignorado pela ordem jurídica É assunto da exclusiva alçada dos casais 7 Invalidade do casamento No tema referente à validade o casamento submetese a regras próprias e não às estabelecidas para os negócios jurídicos em geral O dolo por exemplo não o invalida Rocha 20044546 Desse modo embora haja claro paralelismo entre as disciplinas jurídicas em questão não cabe a superação de conflitos de interesses entre os cônjuges respeitante à validade do vínculo matrimonial que os une senão a partir das normas específicas da lei sobre o tema CC arts 1548 a 1564 Para se ter uma ideia das implicações dessa advertência inicial basta recordar que nem todo erro vicia a vontade do nubente mas apenas os essenciais sobre a pessoa do outro cônjuge Em outra particularidade da disciplina jurídica específica do casamento sua invalidade importa em princípio a supressão de todos os efeitos produzidos independentemente da causa da invalidação A decretação ou declaração judicial de invalidade desfaz desde a celebração as implicações jurídicas que se haviam projetado em relação à sociedade conjugal bens nomes e deveres dos cônjuges A nulidade ou anulação do casamento são causas de dissolução da sociedade conjugal CC art 1571 II A comunhão de bens acaso pretendida se desconstitui O nome volta a ser o anterior ao matrimônio quando o consorte o tinha mudado Cessam os deveres de mútua assistência e manutenção da vida em comum Entre a nulidade e a anulabilidade do casamento as diferenças principais são de cunho processual apenas subitem 72 Em função delas e da possibilidade de convalidação do casamento anulável mas não do nulo interessa extremaremse as hipóteses subitem 71 O casamento inválido apenas produz seus efeitos ou parte deles na hipótese de boafé de um ou ambos os consortes quando é chamado de putativo subitem 73 No passado a invalidação do casamento também repercutia na situação jurídica dos filhos Hoje é indiferente se o casamento dos pais vale ou não já que a relação familiar vertical se submete a regras próprias que a imunizam relativamente aos percalços da horizontal 71 Casamento nulo e anulável O casamento pode ser inválido em razão da nulidade ou da anulabilidade A nulidade do casamento tem por causa a inobservância de impedimento legal CC art 1548 II A disciplina legal do casamento procura acautelarse de todos os modos com o objetivo de evitar que os impedidos se casem Apesar de procurar dar à habilitação a mais ampla publicidade submetêla ao controle do Ministério Público e do Poder Judiciário além de garantir a qualquer pessoa o direito de suscitar os impedimentos pode acontecer e acontece a desobediência ao art 1521 do CC A hipótese mais corriqueira de infringência aos impedimentos é talvez o da bigamia ou seja o casamento de pessoa casada Verificado assim a qualquer tempo ter sido celebrado casamento de pessoa impedida será nulo o ato não importa que impedimento foi desobedecido Até 2015 a deficiência mental do nubente era também causa de nulidade do casamento assim como a enfermidade A regra atual é a de que a pessoa com deficiência mental ou intelectual pode contrair matrimônio expressando sua vontade diretamente ou por meio de seu responsável bastando que tenha idade núbil Em relação ao enfermo mental se puder exprimir a vontade a despeito da enfermidade é pessoa capaz inclusive para se casar Mas se não puder exprimir a vontade temporária ou permanentemente a incapacidade será causa de anulação mas não de nulidade do casamento As causas de anulabilidade por seu turno são seis a Não ter completado a idade núbil CC art 1550 I Como dito para se casar a pessoa precisa ter pelo menos 16 anos Antes dessa idade o casamento poderá ser realizado só mediante autorização judicial concedida apenas nos dois casos específicos da lei gravidez ou objetivo de evitar imposição ou cumprimento de pena criminal Se o menor que ainda não atingiu a idade núbil em conluio com os pais falsifica seu documento e se apresenta ao cartório do Registro Civil munido de autorização pode ocorrer de se realizar o casamento a despeito do prescrito na lei Aqui o casamento só pode ser anulado a pedido do próprio menor de seus representantes legais ou ascendentes art 1552 Ninguém mais tem legitimidade para demandar a anulação judicial do casamento inválido nessa hipótese Por outro lado a lei legitima ao pedido mesmo aquele que tenha participado da fraude se houve sem contudo exonerarlhe as responsabilidades O prazo de decadência para a ação é de cento e oitenta dias contados da data em que o menor alcança a idade núbil se ele é o autor e da data do casamento nos demais casos CC art 1560 1º Não será anulado o matrimônio de quem se casou sem idade núbil se dele tiver resultado gravidez CC art 1551 Preocupase a lei com tal ressalva em evitar que a invalidação conduza a resultado prejudicial à família Em outros termos pressupõe que a preservação do vínculo pode ser a melhor solução para os jovens pais e seu filho malgrado a causa para a anulação O casamento anulável em razão da falta de idade núbil pode ser confirmado quando o cônjuge já tiver feito 16 anos desde que se for ainda menor tenha a autorização dos pais ou responsáveis ou obtenha o suprimento dela em juízo CC art 1553 b Falta de autorização CC art 1550 II Também foi visto que o menor em idade núbil necessita de autorização dos pais ou representante legal para se casar Se por qualquer circunstância realizase o casamento sem o atendimento a essa formalidade poderá ser buscada a sua anulação em juízo Estão legitimados para a ação de anulação do casamento do menor em idade núbil não autorizado além dele próprio quando alcançar a maioridade seus representantes legais ou herdeiros necessários Decai o direito nessa hipótese de anulação no prazo de cento e oitenta dias contados a partir do fim da menoridade da data da celebração do casamento ou da morte do cônjuge que casou incapaz dependendo de quem seja o autor da demanda CC art 1555 e seu 1º Nessa hipótese não se anula o casamento se dele tiver resultado a gravidez CC art 1551 ou se os pais ou representantes legais do nubente menor tiverem assistido à celebração ou manifestado sua aprovação por outros meios quaisquer art 1555 2º c Vício de consentimento CC art 1550 III Cabe a anulação de casamento fundada no vício de consentimento de um dos cônjuges Ao contrário porém do que prescreve relativamente aos negócios jurídicos em geral a lei invalida o casamento apenas em duas hipóteses de vontade viciada o erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge e a coação arts 1556 e 1558 O erro essencial sobre a pessoa de um cônjuge caracterizase em primeiro lugar quando o conhecimento de uma informação relevante acerca dele pelo outro consorte em seguida ao casamento torna insuportável a vida em comum Essa informação pode dizer respeito à identidade honra e boa fama CC art 1557 I ou à prática de crime anterior ao casamento art 1557 II Nesses dois casos sobrevindo a insuportabilidade da vida em comum o erro dá ensejo à invalidação do casamento Desse modo se a mulher descobre depois de casada que o marido não desfrutava da honradez apregoada durante o noivado ou que havia tomado parte num crime antes de se casar ela pode pedir a anulação do casamento desde que prove não suportar mais continuar vinculada a ele a partir da ciência do fato A continuidade da coabitação mesmo após a descoberta do passado condenável do cônjuge descaracteriza a insuportabilidade da vida em comum e desconstitui a causa para a anulação CC art 1559 in fine Outra hipótese de erro essencial é a ignorância anterior ao casamento de defeito físico irremediável que não caracterize deficiência ou de moléstia grave e transmissível por contágio ou por herança capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência CC art 1557 III Se o marido desconhecia ao se casar que a mulher era portadora do vírus HIV isso é causa para a anulação do casamento enquanto não encontrada a cura para a AIDS O defeito físico irremediável ignorado pelo outro cônjuge atualmente é causa difícil de fundamentar o pedido de anulação tendo em vista que as pessoas já se conhecem nuas antes do casamento em razão das várias relações sexuais que normalmente mantêm nas fases de namoro e noivado Tendo os nubentes se resguardado da vida sexual contudo o conhecimento posterior da condição física do outro autoriza a anulação desde que o defeito não se caracterize como deficiência É o caso por exemplo da impotência de um deles para a realização do ato sexual Além do erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge também vicia o consentimento e anula o casamento a coação Ela se caracteriza pelo fundado temor de mal considerável e iminente para a vida a saúde e a honra do cônjuge vitimado pela coação ou de seus familiares CC art 1558 Se um dos contraentes está casando sob a ameaça de perda de emprego o casamento é anulável por coação Como acentua Carlos Roberto Gonçalves o preceito referese à coação moral em que a vítima tem oportunidade de escolha entre casarse ou correr o risco de sofrer as consequências objeto de ameaça Quando a coação é física e ela não tem outra opção senão casarse não há propriamente vício mas sim ausência de consentimento e nessa hipótese o casamento a rigor não é inválido mas inexistente O que invalida o matrimônio assim é a coação moral apenas 2005157 É exclusiva do cônjuge que incorreu no erro essencial ou sofreu a coação a legitimidade para o pedido de anulação do casamento CC art 1559 O prazo decadencial da ação de anulação por erro essencial é de três anos art 1560 III e no caso de coação de quatro art 1560 IV sempre contados da celebração do casamento d Incapacidade para expressar o consentimento CC art 1550 IV Se a pessoa se encontra incapacitada para expressar o consentimento em razão de doença ou acidente não poderá casar se ainda que tenha já manifestado a intenção de fazêlo inclusive pelo requerimento da habilitação Também se enquadra nesse caso de anulação o casamento em que um dos contraentes apresentouse ao local da cerimônia completamente embriagado sem condições de articular as ideias Qualquer um dos cônjuges está legitimado para a ação anulatória nessa hipótese que decai no prazo de cento e oitenta dias contados do casamento art 1560 I Se o celebrante a despeito da incapacidade do nubente de consentir ou manifestar de modo inequívoco o consentimento mesmo assim celebra o matrimônio incorre num gravíssimo erro e deve responder na esfera administrativa inclusive com a suspensão ou perda da função de juiz de paz e Revogação do mandato CC art 1550 V No casamento celebrado por procuração até o momento da celebração o mandato pode ser revogado pelo cônjuge mandante desde que observada a forma pública Pois bem chegando a notícia da revogação a tempo de se cancelar a cerimônia não restará outra questão jurídica a resolver senão a da responsabilidade civil do nubente arrependido pelos danos que causou subitem 45 Se atrasar a notícia da revogação o casamento provavelmente se realizará Abremse então duas hipóteses Na primeira os cônjuges passam a coabitar a mesma casa fato que convalida o casamento afastando a causa para a anulação Na segunda não se instala a coabitação e então remanesce a anulabilidade do matrimônio a pedido do cônjuge mandante nos cento e oitenta dias seguintes àquele em que teve ciência da celebração CC art 1560 2º A invalidade do mandato quando judicialmente decretada importa as mesmas consequências que a revogação no tocante à validade do casamento CC art 1550 parágrafo único Se o incapaz com mais de 18 anos outorga mandato sem a devida assistência do curador esse negócio é anulável Também será passível de anulação o casamento celebrado com base nessa outorga a menos que se tenha seguido a coabitação dos cônjuges f Celebrante incompetente CC art 1550 VI Se o celebrante não for autoridade investida regularmente de competência para presidir a celebração o casamento pode ser anulado Não caberá contudo a anulação se quem presidiu a solenidade exercia publicamente a função de juiz de casamento e teve o nome assentado nessa condição no Registro Civil art 1554 O prazo decadencial da ação de anulação nesse caso fixouo a lei em dois anos a partir da celebração CC art 1560 II As causas de nulidade e anulabilidade do casamento são exclusivamente as listadas pelo direito de família Não se aplicam ao casamento as regras de invalidação dos negócios jurídicos em geral Os nubentes ao requererem sua habilitação para o casamento têm direito de ser informados sobre as causas de invalidação pelo oficial do Registro Civil CC art 1528 72 Diferenças entre nulidade e anulabilidade do casamento A validade ou invalidade são atributos do casamento existente O que não chegou a existir como casamento para a ordem jurídica não pode ser tido como válido ou inválido Para existir o casamento três requisitos devem em geral estar atendidos a diversidade sexual a livre e espontânea declaração do consentimento no ato da celebração e a fórmula sacramental pronunciada pela autoridade Este último é dispensável somente no nuncupativo enquanto os dois primeiros invariavelmente são exigidos para a existência do casamento Embora difícil não é de todo impossível a hipótese de a falta da diversidade sexual dos nubentes fugir aos olhos do oficial do Registro Civil do representante do Ministério Público e do juiz bem como não ser notada pelo celebrante Nesse caso mesmo feito o assento do casamento ele não existe porque duas pessoas do mesmo sexo não podem no direito brasileiro se unir pelos laços do matrimônio Também não existirá o casamento se na solenidade um dos noivos não expressar o seu consentimento de modo livre e espontâneo Ausente qualquer requisito de existência o que se tomou por casamento não produzirá nenhum de seus efeitos A invalidade do casamento por sua vez pode derivar de sua nulidade ou anulabilidade A única diferença de direito substancial entre as hipóteses é a possibilidade de convalidação do casamento anulável pelo decurso do tempo enquanto o nulo não se convalida jamais As outras diferenças têm natureza exclusivamente processual como se verá em seguida No tocante à supressão dos efeitos do casamento inválido esta se verifica na mesma medida tanto no casamento declarado nulo como naquele cuja anulação se decretou Desde a data da celebração é como se o casamento não tivesse existido Entre marido e mulher o mínimo resquício de que um dia eles foram casados se apaga por completo Na invalidação ficam ressalvados apenas os direitos de terceiros de boafé e os resultantes de sentença transitada em julgado Em outros termos o art 1563 do CC a sentença que decretar a nulidade do casamento retroagirá à data da sua celebração sem prejudicar a aquisição de direitos a título oneroso por terceiros de boafé nem a resultante de sentença transitada em julgado aplicase a qualquer caso de invalidação do casamento apesar de se referir apenas ao nulo Tanto a declaração de nulidade como a decretação da anulação do casamento possuem iguais efeitos cf Miranda 1916 1375377 Beviláqua 1934 2207208 embora haja doutrinadores que não pensem assim Gomes 1968126128 Enquanto a invalidação por nulidade pode ser pedida por qualquer pessoa interessada e pelo Ministério Público a qualquer tempo a fundada na anulabilidade só pode ser pleiteada pelos legitimados especificamente na lei e enquanto não decair o direito Diferenciamse pois nulidade e anulabilidade em função da legitimidade ativa e da decadência ou não do direito de invalidar o casamento Em relação à legitimidade para o pedido a nulidade pode ser pedida por qualquer pessoa interessada e também pelo Ministério Público CC art 1549 Já a anulação só pode ser pleiteada pelos sujeitos legitimados especificamente por lei aos quais se fez já referência no exame das causas feito no subitem anterior arts 1552 1555 e 1559 Quanto à decadência do direito de pedir a invalidação do casamento ela se opera unicamente na hipótese de anulabilidade A nulidade do matrimônio pode ser pedida a qualquer tempo mesmo que decorridas várias décadas da celebração ao passo que a anulação só pode ser pleiteada enquanto não decaído o direito Variam os prazos de decadência para a anulação do casamento em função da causa conforme examinado também no subitem anterior CC arts 1555 e 1560 73 Casamento putativo O matrimônio inválido produzirá para o cônjuge ou cônjuges de boafé os mesmos efeitos do válido até transitar em julgado a sentença que declarar a nulidade ou decretar a anulação CC art 1561 Chamase putativo ao casamento nesse caso porque um dos cônjuges ou os dois tinha justos motivos para acreditar na validade do ato putare é a palavra latina para imaginar pensar Desse modo se um dos contraentes desconhecia que o outro já era casado para ele a nulidade do casamento não surtirá efeito algum enquanto não for reconhecida por sentença Se outro exemplo o celebrante não estava investido de competência para presidir a cerimônia estando os dois cônjuges de boafé todos os efeitos de um casamento válido se projetam nas relações entre eles até que o Poder Judiciário decrete a anulação Nas duas situações os bens adquiridos no período entre a celebração e a invalidação do matrimônio se comunicam caso o regime adotado não seja o da separação absoluta Produzemse igualmente os efeitos de presunção de paternidade e maternidade relativamente aos filhos gerados pelo casamento putativo Se um dos cônjuges não estava de boafé considerase o culpado pela invalidação do casamento Nesse caso ele perde todas as vantagens que tiver recebido do outro consorte mas continua obrigado a cumprir as obrigações que tiver contraído no pacto antenupcial CC art 1564 O bígamo assim não se torna titular de nenhuma meação dos bens se o casamento nulo se realizou em regime de comunhão Mas se tiver se obrigado por exemplo no pacto antenupcial a pagar as despesas de redecoração do apartamento em que se abrigou o domicílio conjugal a invalidade do casamento não o exonera dessa obrigação nem tem ele direito a qualquer ressarcimento Putativo é o casamento inválido em que pelo menos um dos cônjuges desconhece a existência de causa de invalidação Ele produz efeitos para o cônjuge ou cônjuges de boafé e para a prole como se fosse válido desde a data da celebração até o pronunciamento judicial de invalidação Quando os dois cônjuges estão de máfé o casamento putativo não produz nenhum efeito em relação a eles mas é plenamente eficaz relativamente aos filhos Os efeitos jurídicos do casamento putativo até 1977 só eram reconhecidos quando pelo menos um dos cônjuges estava de boafé cf Rodrigues 2003a117 Desde a Lei do Divórcio daquele ano com o objetivo de amparar os interesses da prole admitese também a figura do casamento putativo em que os dois cônjuges estão de máfé isto é a existência da invalidade do ato praticado não é desconhecida de nenhum deles Quando os dois estão de máfé o casamento putativo não produz evidentemente efeitos entre eles porque isso implicaria prestigiar conduta ilícita Mas ele é eficaz em relação aos filhos CC art 1561 2º A relevância dessa regra está relacionada às presunções de paternidade e maternidade O filho não precisa provar que o homem com quem a mãe manteve casamento putativo é seu pai a este é que cabe o ônus de provar a inexistência de vínculo biológico e socioafetivo de filiação caso pretenda liberarse das responsabilidades paternas Do mesmo modo é da mulher o ônus de promover a negatória de maternidade se o homem com quem mantinha casamento putativo apontoua como mãe de seu filho ao fazer a declaração de seu registro de nascimento 8 Natureza do casamento No direito canônico o casamento além de sacramento era tido como um contrato entre os nubentes Essa classificação contudo não era bem aceita pelos civilistas na época em que predominava o modelo da ampla liberdade de contratar Isso porque os contraentes limitavamse a aderir ao conjunto de direitos e deveres que a lei associava ao matrimônio sem liberdade nenhuma para alterálos Construiuse então a teoria do casamento como instituição A resposta à questão da natureza do casamento mais difundida atualmente situao a meio caminho entre uma e outra concepção Chamada de eclética ou mista reconhece a existência de um vínculo contratual na essência do casamento mas não de um vínculo qualquer Casamento assim é definido como um contrato de direito de família para o qual a convergência da declaração de vontade dos nubentes é indispensável mas que encontra em normas jurídicas cogentes a extensão dos direitos e obrigações dela derivados PlaniolRipert 1925 25759 Gomes 19685660 O casamento é um contrato de direito de família Quer isso significar que está disciplinado por regras próprias não se sujeitando a muitos dos preceitos reguladores dos contratos em geral Aliás não se sujeita nem mesmo a certas normas aplicáveis aos demais negócios jurídicos Por ser um contrato sui generis o casamento não se submete ao direito das obrigações Ele não é resolúvel nem resilível como os contratos em geral mas de acordo com as regras próprias do direito de família Cap 58 Nem mesmo a todos os preceitos disciplinadores do negócio jurídico em geral sujeitase o casamento Os nubentes não podem por exemplo estabelecer condições à eficácia de sua declaração de vontade Quer dizer nenhum deles poderia concordar em casar desde que o outro cumprisse uma obrigação qualquer ou coisa do gênero Alguns dos vícios de consentimento que invalidam os negócios em geral por outro lado não maculam a validade do casamento Como visto apenas o erro essencial e a coação podem dar ensejo à anulabilidade do ato desta edição 2020 2020 02 13 PÁGINA RB31 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 57 OS REGIMES DE BENS DO CASAMENTO Capítulo 57 Os regimes de bens do casamento 1 Os bens dos cônjuges A comunhão de vida que o casamento estabelece estendese em medidas variadas aos bens de propriedade dos cônjuges Dependendo em parte da vontade deles em parte de disposições cogentes os bens das pessoas casadas podemse comunicar isto é passar à titularidade também do outro consorte Pela comunicação instaurase o condomínio entre marido e mulher mas um condomínio de direito de família sujeito a regras próprias que não coincidem necessariamente com as de direito das coisas O princípio fundamental é o da ampla liberdade dos cônjuges para estipularem acerca de seus bens anteriores ou posteriores ao casamento o que bem quiserem CC art 1639 Podem por exemplo contratar que certo imóvel onde pretendem residir pertencerá aos dois em partes iguais e que os outros bens serão da propriedade exclusiva de quem já os titula ou vier a adquirir por negócio jurídico ou sucessão Ou podem contratar a incomunicabilidade de um ou alguns bens e a divisão dos demais A lei faculta aos cônjuges em suma dispor livremente sobre os efeitos patrimoniais do casamento Em razão da ampla liberdade de estipulação sobre os bens no casamento qualquer solução pode ser escolhida pelos cônjuges Entre as possíveis a lei tratou de quatro regimes com o objetivo de facilitar a disciplina da matéria Os nubentes assim não precisam antever todas as hipóteses futuras e esmiuçar seus contornos e consequências Se o que consideram adequado aos seus interesses estiver retratado num dos quatro regimes mencionados na lei bastalhes indicálo simplificandose assim a formalização da decisão Os regimes do casamento são quatro comunhão universal comunhão parcial separação absoluta e participação final nos aquestos Se os consortes nada contrataram sobre seus bens ou se o que convencionaram resultou nulo ou ineficaz será observado o regime da comunhão parcial CC art 1640 Ele é chamado por isso de regime legal enquanto os outros três são os convencionais Classificamse os regimes em simples e híbridos Na primeira classe estão os regimes em que não cabe distinguir partes no patrimônio do cônjuge São simples os regimes de comunhão universal e separação absoluta porque naquela o cônjuge só titula o patrimônio comum tudo é dos dois enquanto nesta só o particular nada é dos dois Na classe dos regimes híbridos cada cônjuge pode ter o seu patrimônio distinguido em particular e comum Nela enquadramse os regimes da comunhão parcial e da participação final nos aquestos Essa classificação contudo é um tanto imprecisa reclamando duas observações para conferirlhe maior consistência Primeira porque sempre há uma margem mínima de incomunicabilidade dos bens mesmo no regime da comunhão universal a classificação deve ser considerada como mera referência geral do assunto uma introdução que auxilia didaticamente seu enfrentamento Segunda não há propriamente segregação patrimonial no casamento a não ser em algumas hipóteses de responsabilização por dívidas anteriormente constituídas Cada cônjuge continua titulando um único patrimônio podendo no entanto nele se encontrarem bens que lhe pertencem com exclusividade e bens cuja titularidade é dividida com o outro consorte O momento apropriado para a definição do regime patrimonial é o da habilitação O oficial do Registro Civil tem inclusive a obrigação legal de esclarecer os nubentes sobre os diversos regimes de bens existentes na lei para que eles sejam alertados sobre esse importante efeito do casamento e possam sopesar seus interesses CC art 1528 Nada impede porém que se ultrapasse a fase de habilitação sem que os noivos tenham discutido o assunto e chegado a acordo Na verdade até a celebração os noivos podem declarar pela forma adequada item 4 o regime de bens que adotam Concluída a solenidade sem terem feito qualquer escolha a lei determina a comunicação parcial dos bens segundo regras que serão examinadas adiante subitem 232 Qualquer que seja a hipótese o regime começa a vigorar na data do casamento art 1639 1º Os cônjuges desfrutam da mais ampla liberdade para estabelecer o que for do interesse deles no tocante aos bens Para facilitar a formalização da escolha a lei disciplina quatro regimes comunhão universal comunhão parcial separação absoluta e participação final nos aquestos Independentemente do regime adotado pelas dívidas contraídas por um dos cônjuges para atender a necessidade da economia doméstica responde solidariamente o outro Independentemente do regime de bens adotado haverá solidariedade entre os cônjuges pela dívida contraída por qualquer um deles mesmo sem a anuência do outro quando necessária à economia doméstica CC arts 1643 e 1644 A compra no supermercado feita com o cartão de crédito de um dos cônjuges corresponde a despesa dessa natureza isto é necessária à economia doméstica Não sendo paga a fatura do cartão no vencimento poderá a administradora do cartão demandar a satisfação de seu crédito contra o cônjuge do devedor A solidariedade nesse caso deriva da lei e independe de anuência do consorte Também qualquer que seja o regime de bens do casamento se um dos cônjuges ficar impossibilitado por qualquer razão de administrar seu patrimônio particular caberá ao outro a responsabilidade pela gerência deste A lei lhe atribui também o direito de alienar os bens móveis comuns bem como o de mediante autorização do juiz alienar os imóveis comuns e os móveis ou imóveis pertencentes ao consorte impedido CC art 1651 Responderá pelos atos que praticar perante o cônjuge e seus herdeiros na condição de usufrutuário quanto à administração dos bens comuns ou depositário dos bens particulares a menos que lhe tenha sido outorgado tácita ou expressamente mandato art 1652 Assim se um dos cônjuges casado no regime da separação absoluta sofre acidente e fica inconsciente entravado numa cama de hospital ao outro competirá a administração do seu patrimônio particular Se para custear o tratamento for preciso vender bens móveis comuns o cônjuge desimpedido poderá fazêlo sem outra formalidade mas necessitando vender coisas do patrimônio particular do consorte desafortunado precisará de autorização do juiz A final em convalescendo o enfermo prestarlheá o outro cônjuge contas dos atos praticados em morrendo tais contas deverão ser prestadas aos herdeiros Se o dinheiro apurado pela venda de um imóvel do patrimônio particular do hospitalizado que o juiz autorizou para custeio do tratamento tiver sido empregado em finalidade diversa o cônjuge que incorreu na irregularidade deve indenizar o prejudicado ou seus sucessores da mesma forma que um depositário infiel responderia perante o depositante Fica ele portanto exposto inclusive à prisão civil de até um ano enquanto não repuser o alcance Cap 36 item 5 2 A comunhão de bens A comunicação de bens entre os cônjuges é muito comum nas famílias brasileiras exceção feita às mais abastadas No contexto de extrema cordialidade tolerância e entendimento que às vésperas cerca a maioria dos enlaces matrimoniais discutir a questão patrimonial de modo racional e objetivo assume ares de desambientada mesquinhez Por isso a lei se preocupa em preservar alguns dos direitos dos cônjuges estabelecendo como que uma margem mínima de incomunicabilidade Por maior que seja o grau de comunicação como no caso da comunhão universal sempre haverá no patrimônio dos cônjuges alguns bens separados Os regimes de comunhão são três universal parcial e de participação final nos aquestos Esse último embora também pudesse ser caracterizado como regime de separação relativa deve ser classificado como de comunhão porque se submete a duas regras comuns aos dessa categoria Refirome aos atos que a lei não permite que um dos cônjuges pratique sem a anuência do outro subitem 21 e aos que estão autorizados a praticar separadamente subitem 22 Essas regras são como mencionado comuns às três espécies de comunhão subitem 23 21 Atos que dependem da autorização do outro cônjuge Alguns atos ou negócios jurídicos a pessoa casada em regime de comunhão universal parcial ou de participação final nos aquestos só pode validamente praticar quando o outro cônjuge concordar São atos que podem afetar de modo acentuado o patrimônio comum comprometendo o direta ou indiretamente sendo por isso resguardados os interesses do cônjuge Se a concordância requisitada é da mulher chamase outorga uxória se do marido autorização marital A anuência do cônjuge na maioria das vezes colhese no próprio instrumento negocial Pode contudo abrigarse em instrumento público ou particular apartado desde que autenticado Nesse caso se emitido em data posterior os efeitos da autorização validam o ato ou negócio praticado pelo outro cônjuge isoladamente CC art 1649 parágrafo único Na verdade é muito raro acontecer a desobediência à norma que obriga a outorga uxória ou autorização marital CC art 1647 porque o terceiro interessado em garantir a validade do ato está sempre atento às formalidades da lei Ninguém compra imóvel de pessoa casada em regime de comunhão sem exigir a autorização do esposo ou esposa aliás sequer o tabelião lavra a escritura nessa hipótese Pois bem são os seguintes os atos listados no Código Civil como dependentes de autorização do cônjuge no regime de comunhão a Alienar ou gravar de direito real bem imóvel CC art 1647 I Pela importância econômica presumida na lei para os bens de raiz nenhum dos cônjuges os pode alienar ou onerar hipotecar ou instituir direito real em garantia sem que consinta o outro Em relação aos bens móveis mesmo que sejam mais valiosos que os da propriedade imobiliária do casal a alienação ou oneração independe de autorização conjugal A vedação alcança não somente os bens comuns mas também os que não integram a comunhão Preocupase a lei na verdade com a solvência da família Se um dos cônjuges dilapidar o patrimônio próprio os interesses do outro serão afetados tendo em vista o dever de mútua assistência característico do vínculo matrimonial Não havendo contudo qualquer prejuízo potencial no ato de disponibilização do bem particular compete exclusivamente ao cônjuge que o titula a decisão de alienálo CC art 1665 descabendo a recusa da outorga uxória ou autorização marital b Demandar em ações reais de natureza imobiliária CC art 1647 II Seja como autor ou como réu os esposos não podem litigar desacompanhados em juízo quando a ação versar sobre direito real incidente em coisa imóvel A pessoa casada não pode reivindicar a titularidade de imóvel ou mesmo a proteção possessória sem que o seu cônjuge tenha conhecimento e concorde com a medida c Prestar fiança ou aval CC art 1647 III Fiança e aval são conceituados como garantias fidejussórias A primeira corresponde a contrato gratuito em que uma das partes fiador assume perante a outra credor a obrigação de pagar o devido por terceiro afiançado caso esse não entregue a prestação a que se obrigou O aval por sua vez é o ato cambiário pelo qual uma pessoa avalista se obriga a pagar título de crédito em favor de outro obrigado avalizado Sem a outorga uxória ou autorização marital a pessoa casada não pode ser fiadora nem avalista Se faltar a anuência conjugal à fiança ou aval em princípio a prestação da garantia é inválida não podendo o credor demandar nem o cônjuge que praticou o ato nem o outro Mas em proteção à boafé do titular do crédito tem a jurisprudência admitido que a cobrança recaia exclusivamente sobre os bens componentes da meação do fiador ou avalista Esse entendimento embora atenda aos interesses dos credores acaba por frustrar os objetivos do direito de família que como visto procuram impedir que a insolvência de um dos cônjuges agrave a condição patrimonial do outro que será chamado a cumprir seu dever de assistência d Doação de bens comuns ou que possam se comunicar CC art 1647 IV Nenhum dos cônjuges pode doar bens comuns ou passíveis de comunicação O casado em regime de comunhão universal não pode fazer doação nenhuma sem autorização do outro cônjuge Se o regime é da comunhão parcial ou participação final nos aquestos os bens comunicáveis adquiridos na constância do casamento não podem ser doados Abre a lei duas exceções Primeira na doação remuneratória Quando alguém se beneficia de serviços prestados por outrem e mesmo não estando obrigado resolve remunerálos mediante a entrega de bens ou dinheiro em valor superior aos serviços recebidos chamase remuneratória essa hipótese de doação Cap 32 item 2 Sendo casado o doador dispensase a autorização do cônjuge em razão do benefício auferido Segunda na doação nupcial O cônjuge é livre para doar ao filho que se casa ou estabelece economia separada bens que o auxiliem nesse importante passo Não precisará da autorização do outro cônjuge para fazer a doação nesse caso mesmo que importe a alienação de bens comuns Nos dois casos excepcionais porém a liberalidade não poderá ser significativa devendo corresponder a parte pequena da meação do doador para que não se prejudiquem os direitos protegidos pelo regime de comunhão de bens Determinados atos ou negócios jurídicos o cônjuge casado em regime de comunhão não pode praticar sem a autorização do outro Se a recusa da outorga uxória ou autorização marital for abusiva ou não puder ser concedida o juiz poderá suprir o consentimento do esposo ou esposa Nos casos em que o cônjuge recusa a anuência sem motivo justo há abuso de direito O interessado na prática do negócio jurídico pode requerer em juízo o suprimento desse consentimento Se o cônjuge não pode por exemplo alienar imóvel integrante de seu patrimônio particular porque o outro denega a autorização injustificadamente cabe ao primeiro buscar o suprimento judicial Também ao juiz caberá suprir a concordância do consorte que se encontra impossibilitado de a conceder por qualquer razão como no caso de inconsciência decorrente de enfermidade ou acidente CC art 1648 Em qualquer hipótese dos atos listados no art 1647 do CC será anulável o que se praticou sem a devida autorização do cônjuge ou seu suprimento judicial Em dois anos contados do término da sociedade conjugal decai o direito de o cônjuge prejudicado pleitear a anulação CC art 1649 O termo a quo do prazo decadencial é o fim da sociedade conjugal não somente para que o lesado se encontre em condições de exercer plenamente seu direito mas também para protegêlo Se a invalidação é decretada ainda na constância do casamento o cônjuge lesado pode vir a sofrer consequências da imputação de responsabilidade ao outro pelos danos causados a terceiros A ação compete também aos herdeiros do cônjuge prejudicado e a ninguém mais CC arts 1645 e 1650 O prazo para a propositura decai igualmente nos dois anos seguintes ao término da sociedade conjugal Desse modo se o viúvo havia feito doação de vulto sem a autorização da falecida os filhos podem enquanto não decaído o direito à invalidação do contrato ajuizar a ação de anulação Julgada procedente a demanda proposta pelo cônjuge cujo assentimento era necessário mas não se colheu anularseá a alienação oneração ou liberalidade Obviamente isso redundará em perda a terceiros tais como o adquirente credor donatário etc A lei põe a salvo os interesses deles mediante o reconhecimento da ação regressiva contra o cônjuge que realizou o negócio invalidado ou seus herdeiros CC art 1646 Por isso a propositura da ação de anulação enquanto ainda não terminada a sociedade conjugal nem sempre é do interesse do cônjuge prejudicado já que o exercício do direito regressivo pelo terceiro poderá afetálo de modo indireto ao ser chamado a cumprir o dever de mútua assistência 22 Atos que podem ser praticados separadamente Os atos que os cônjuges podem praticar separadamente qualquer que seja o regime estão relacionados no art 1642 do CC É certo que esse dispositivo também se aplica aos casados em regime de separação absoluta Mas para eles a relação não seria necessária tendo em vista a própria definição desse regime Em outros termos é ressalva feita pela lei que interessa unicamente aos casados em regime de comunhão que nesse particular encontramse na mesma situação de quem titula patrimônio separado ou seja de quem se casou em regime de separação absoluta Daí por que prefiro examinála aqui como regra atinente aos regimes de comunhão A relação do art 1642 do CC é exemplificativa em vista do disposto no inciso VI Desse modo não existindo expressa vedação ou seja não estando o ato relacionado no art 1647 do CC ou noutra norma legal que condicione sua prática pelo casado à autorização do cônjuge cada um deles pode praticálo isoladamente Pois bem são exemplos de atos que a pessoa casada em regime de comunhão e mesmo no de separação pode praticar independentemente de anuência do consorte a Administrar e dispor dos bens necessários ao desempenho de sua profissão exceto para os não empresários se importar alienação ou oneração de imóvel CC arts 1642 I e 1647 I A liberdade de exercício profissional não pode ser tolhida ou embaraçada pelo outro cônjuge Se a mulher dentista precisa de recursos para financiar a modernização de seu consultório dentário pode contratálos junto ao banco dando em garantia fiduciária a propriedade resolúvel dos novos equipamentos sem a necessidade de autorização do marido Para alienar ou gravar de ônus real um bem imóvel no entanto a autorização do cônjuge é necessária mesmo que o assunto diga respeito exclusivamente ao exercício da profissão salvo no caso do empresário Por expressa ressalva da lei o empresário individual pode praticar esses atos quando o imóvel integrar o patrimônio da empresa melhor dizendo quando esse bem do patrimônio do empresário individual estiver sendo usado na exploração da atividade empresarial art 978 A ressalva diga se corresponde a situação raríssima já que as empresas quase nunca são exploradas individualmente mas em geral por sociedades com a forma de limitada ou anônima b Administrar os bens próprios CC art 1642 II Mesmo na comunhão um dos cônjuges pode possuir bens próprios por exemplo o recebido por doação com a cláusula de incomunicabilidade o anterior ao matrimônio no caso da comunhão parcial ou de participação final nos aquestos etc Esses bens próprios não entram para a comunhão e sua administração compete com exclusividade ao cônjuge que o titula Desse modo ele não precisará da anuência do outro cônjuge para alugar o bem ou deixálo sem fruição dálo em comodato a parente consanguíneo ou mesmo a terceiros etc Aqui também incide a vedação do art 1647 I do CC para os não empresários Desse modo mesmo os bens próprios de um dos cônjuges não pode ser alienado ou gravado de ônus real sem o consentimento do outro c Desobrigar ou reivindicar os imóveis gravados ou alienados sem o seu consentimento ou suprimento judicial CC art 1642 III Se apesar da vedação um cônjuge aliena ou onera bem imóvel sem anuência do outro este último não precisa da anuência daquele para demandar em juízo a desconstituição do gravame ou do ato de disposição patrimonial Lembre que as ações reais sobre bens imóveis só podem ser aforadas por pessoas casadas com a anuência do cônjuge CC art 1647 II exceto se o regime de bens for o da separação absoluta CPC art 73 Evidentemente essa condição não poderia ser estendida para as demandas de desconstituição da alienação ou oneração de bens imóveis pela falta da anuência do demandante Se para propôla o prejudicado precisasse da anuência do cônjuge que praticara o ilícito é provável que não pudesse defender seus direitos o que contrariaria a garantia constitucional de livre acesso ao Judiciário d Demandar a desconstituição de atos praticados sem sua concordância quando esta era necessária CC art 1642 IV Como visto se o regime de bens é o da comunhão nenhum cônjuge pode sem a autorização do outro doar bens comuns ou passíveis de se comunicar prestar fiança ou dar aval Se um desses atos é praticado com desobediência a essa condição ele pode ser anulado O cônjuge prejudicado tem direito de demandar a anulação desacompanhado Aqui a lei excedeuse em cautela Como é pessoal e não real imobiliária a demanda para obter a desconstituição de contratos de doação fiança ou aval seria por tudo dispensável a expressa previsão de desnecessidade da anuência do cônjuge Feita a ressalva expressa não restam dúvidas de que a pessoa casada pode isoladamente ir a juízo para invalidar o negócio jurídico praticado sem a sua autorização e Reivindicar bens comuns doados ou transferidos a concubino CC art 1642 V Se um dos cônjuges doa bens comuns ou os transfere a qualquer título a concubino isto é pessoa com quem mantém relacionamento não eventual mas também não característico da união estável Cap 59 item 4 e o faz sem a autorização do esposo ou esposa a doação ou transferência pode ser desconstituída por este ou esta agindo isoladamente Não haverá a desconstituição se demonstrado que o bem foi adquirido pelo esforço comum do cônjuge que fez a transferência e seu concubino quando o primeiro estiver separado de fato por mais de cinco anos Salvo os atos arrolados no art 1647 do CC as pessoas casadas podem praticar todos os demais sem autorização do cônjuge ainda que o casamento siga o regime da comunhão Desse modo podem administrar os bens próprios demandar o desfazimento de negócios jurídicos para os quais seu consentimento era indispensável e não foi colhido etc Reforçando a lista dos atos praticáveis independentemente de consentimento do cônjuge é exemplificativa Qualquer ato ou negócio jurídico não condicionado pela lei à outorga uxória ou autorização marital pode ser praticado pela pessoa casada desacompanhada de seu consorte 23 Espécies de comunhão São três os regimes de comunhão de bens Na comunhão universal a regra geral é a da comunicação de todos os bens dos cônjuges anteriores ou posteriores ao casamento Há como já referido uma margem mínima de incomunicabilidade isto é alguns bens que não se comunicam de nenhum modo para proteção dos interesses individuais dos cônjuges subitem 231 Na comunhão parcial comunicamse apenas os bens posteriores ao casamento mesmo assim desde que não tenham sido adquiridos por doação ou sucessão por um dos cônjuges somente Em relação aos bens já titulados pelos consortes antes de se casarem continuam a pertencer ao seu titular com exclusividade subitem 232 Enfim na participação final nos aquestos a comunicação dáse nos bens adquiridos pelo esforço comum do casal a título oneroso durante a constância do casamento Quanto aos demais anteriores ou posteriores ao casamento operase a incomunicabilidade subitem 233 A comunhão pode ser universal abrangendo os bens anteriores e posteriores ao casamento parcial abrangendo unicamente os posteriores ou de participação final nos aquestos abrangendo os adquiridos na constância do casamento com o esforço comum A administração dos bens comuns no regime de comunhão universal ou parcial cabe a qualquer um dos cônjuges CC arts 1663 e 1670 Para os atos de administração desses bens pode em princípio cada cônjuge agir isoladamente não necessitando consultar ou colher a autorização do outro Apenas para a cessão do uso ou gozo de bens comuns a título gratuito a concordância dos dois cônjuges é indispensável art 1663 2º De qualquer modo se um deles se mostrar pródigo no exercício desse direito praticando atos de malversação de bens integrantes da comunhão ele poderá ser privado pelo juiz a pedido do outro consorte da competência para administrálos sozinho 3º Em caso de divergência entre os cônjuges acerca das providências de administração que melhor se ajustem ao patrimônio comum a sua superação deve ser feita pelo juiz a pedido de qualquer um deles a exemplo do que se verifica relativamente a qualquer outro caso de dissenso nas questões afetas à família CC art 1567 parágrafo único Se um dos cônjuges contrair dívida ficam obrigados os bens comuns CC art 1664 e os particulares dele bem assim os do outro cônjuge na proporção do proveito que tiver art 1663 1º Desse modo se o marido por exemplo toma empréstimo no banco para a construção da casa em que a família terá domicílio por essa obrigação respondem todos os bens do patrimônio comum e os particulares dos cônjuges porque tanto o mutuante quanto o outro se beneficiam igualmente do empréstimo Mas se a dívida é contraída para sanear um dano que um dos cônjuges antes do casamento havia causado ao bem que se comunicou o patrimônio particular do outro não responde tendo em vista que nenhum proveito trouxe para ele a obrigação 231 Comunhão universal O regime da comunhão universal de bens importa a comunicação entre os patrimônios dos cônjuges de todos os bens anteriores ou posteriores ao casamento salvo algumas exceções CC art 1667 Até 1977 correspondeu ao regime legal no direito brasileiro isto é àquele que devia ser observado no caso de os consortes não optarem expressamente por nenhum outro Como já assentado sempre preserva a lei uma margem mínima de incomunicabilidade de bens em atenção à proteção dos cônjuges que normalmente estão embriagados pelo espírito de desprendimento deles exigido às vésperas do matrimônio e não têm por isso plena isenção para tratar dos assuntos patrimoniais com racionalidade Assim a lei exclui da universalidade da comunhão a Os proventos do trabalhopessoal CC arts 1668 V e 1659 VI Os direitos que cada cônjuge passa a titularizar em razão de seu trabalho não se comunicam ao outro Em razão da personalidade do trabalho que em suas diversas modalidades se traduz em desgaste de forças físicas ou mentais do trabalhador os proventos correspondentes não devem ser repartidos nem mesmo com os cônjuges A exclusão aplicase a qualquer tipo de trabalho seja o despendido sob vínculo empregatício na condição de profissional liberal autônomo administrador de companhia empreitada ou qualquer outra forma de prestação de serviços É certo que na constância do casamento quando tais direitos são exercidos o dinheiro recebido a qualquer título em contraprestação ao trabalho ingressa no patrimônio do trabalhador e também na comunhão Um exemplo ajuda a aclarar a questão Pense no saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço FGTS Ele corresponde a um provento do trabalho assalariado que o empregador é obrigado a depositar numa conta bancária todo mês Sua liberação em favor do empregado só é autorizada em determinadas hipóteses como a extinção do contrato de trabalho por dispensa sem justa causa aposentadoria desemprego após certo período etc Lei n 803690 art 20 Pois bem enquanto não liberado o saldo tratase de proventos do trabalho pessoal do empregado que não se comunicam mesmo que ele seja casado no regime da comunhão universal Se o trabalhador se separa de fato antes de ocorrer o fato jurídico autorizando o levantamento do FGTS o outro cônjuge não tem nenhum direito sobre esse saldo nem mesmo proporcional ao tempo em que estavam casados Se a separação de fato contudo é posterior ao fato jurídico que autoriza o levantamento do FGTS o dinheiro passa a integrar o patrimônio comum e metade dele pertence ao outro cônjuge no regime da comunhão universal O mesmo critério adotase por exemplo no tocante aos honorários que o médico advogado ou outro profissional liberal tem a receber Ainda que o trabalho profissional fora prestado predominantemente durante a constância do casamento se o recebimento da remuneração ocorre quando finda a sociedade conjugal o outro cônjuge nenhum direito titula sobre o dinheiro correspondente Da mesma forma os honorários recebidos após o casamento vão para a comunhão mesmo que correspondam a trabalho despendido em sua maior parte antes do enlace matrimonial b Proventos da aposentadoria CC arts 1668 V e 1659 VII As pensões meiossoldos devidos aos militares na reserva montepios e outras rendas semelhantes a exemplo dos proventos do trabalho pessoal também não se comunicam enquanto não se traduzem em dinheiro disponibilizado ao cônjuge A partir do dia em que a sociedade conjugal termina cada cônjuge não divide mais com o outro o valor das pensões que passa a receber em relação contudo ao dinheiro correspondente às pensões vencidas anteriormente que se encontrar ainda no banco tem lugar a meação c Os bens de uso pessoal livros e instrumentos de profissão CC arts 1668 V e 1659 V Não se comunicam mesmo na comunhão universal os bens de uso pessoal roupas acessórios relógio de pulso telefone celular etc livros ou qualquer outro suporte de informação como CD ou DVD e instrumentos profissionais adquiridos mesmo com o esforço comum para o exercício da profissão por um dos cônjuges Em relação aos bens de uso pessoal importa destacar que as joias não se comunicam quando adquiridas pelo casal para uso de um deles somente como o solitário de muitos quilates que o marido presenteou à mulher no aniversário de casamento Mas se a mesma joia tiver sido comprada com o objetivo de investimento então integra a comunhão porque não se considera estritamente um bem de uso pessoal mas um ativo do patrimônio comum d Bens gravados com a cláusula de inalienabilidade ou de incomunicabilidade CC arts 1668 I e IV e 1911 Os bens doados ou testados ao cônjuge podem vir gravados com a cláusula de inalienabilidade ou de incomunicabilidade É o caso em que o doador ou testador não pretendeu estender a liberalidade ao cônjuge do donatário ou do legatário Se instituída apenas a cláusula de inalienabilidade considerase implícita a de incomunicabilidade se gravado o bem apenas com esta última ele poderá ser alienado mas continua não se comunicando ao cônjuge Igualmente não compõem a comunhão universal as doações antenupciais feitas por um cônjuge ao outro com a cláusula de incomunicabilidade Claro que não gravado o bem haverá comunicação ainda que se trate de doação antenupcial Se um dos nubentes presenteou o outro com um cãozinho o animal passa com o casamento a pertencer ao casal No divórcio o cônjuge que não ficar com ele tem direito a titular outros bens em valor equivalente em vista da indivisibilidade do cão e Bens gravados com fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário CC art 1668 II Se um dos cônjuges recebeu certo bem em fideicomisso ele será transmitido ao falecer não aos seus herdeiros mas à pessoa designada pelo testador Para que isso se verifique evidentemente não se pode dar a comunicação no caso de dissolução da sociedade conjugal do fideicomisso f Dívidas anteriores ao casamento CC art 1668 III As obrigações passivas de cada cônjuge constituídas antes do casamento não integram a comunhão universal O credor não pode executá la nos bens do outro cônjuge mas somente nos que o devedor trouxe para o patrimônio comum Exceção é aberta pela lei às dívidas provenientes de despesas com a preparação do matrimônio aprestos e demais que revertam em proveito comum Se o noivo contraiu empréstimo para comprar o anel de noivado objetivando causar vivíssima impressão à noiva o patrimônio comum responderá pela dívida correspondente já que se qualifica como despesa preparatória do matrimônio Na comunhão universal todos os bens anteriores ou posteriores ao casamento passam ao patrimônio comum Excetuamse da comunicação unicamente alguns bens expressamente relacionados pela lei como os gravados com a cláusula de inalienabilidade ou de incomunicabilidade os proventos do trabalho pessoal direitos autorais e outros g Direitos autorais CF art 5º XXVII Lei n 961098 art 39 Aos autores de obra intelectual pertencem com exclusividade os direitos autorais em razão de preceito constitucional por força do qual não cabe a comunicação pelo casamento Desfeita a sociedade conjugal os direitos autorais continuam a ser titulados exclusivamente pelo cônjuge autor 232 Comunhão parcial Na comunhão parcial a comunicação acontece basicamente com os bens adquiridos após o casamento CC art 1658 Mesmo que tenha sido registrado no nome de um só dos cônjuges aos dois pertence o bem se o título de aquisição é de data posterior à do matrimônio art 1660 I Também é dos dois o bem adquirido por fato eventual como o prêmio de loteria mesmo que a aposta tenha sido feita por um deles somente antes de se casar art 1660 II Nesse regime os bens anteriores ao casamento continuam a pertencer ao cônjuge que os trazia em seu patrimônio quando se casou CC art 1659 I A diferença fundamental em relação à comunhão universal está na exclusão dos bens que cada cônjuge já titularizava antes do casamento Se a mulher havia adquirido quando solteira ainda um apartamento esse imóvel permanece em seu patrimônio particular e não se comunica Terminando a sociedade conjugal o apartamento não será partilhado Para que não integre a comunhão é suficiente que o título aquisitivo tenha causa anterior ao matrimônio CC art 1661 Não interessa por conseguinte que o domínio se tenha transferido ao cônjuge na constância do casamento se o contrato de compra e venda celebrarase anteriormente Imagine que o marido havia adquirido antes de se casar uma obra de arte mas o vendedor não lha entregou prontamente como havia sido combinado A demanda judicial arrastouse e a entrega da obra de arte ao comprador ocorreu depois do casamento A propriedade mobiliária transmite se com a tradição mas como o negócio aquisitivo neste exemplo verificouse antes do casamento o seu objeto não se inclui na comunhão parcial Essa é a regra geral do regime de comunhão parcial de bens que obviamente comporta algumas exceções Não se comunicam nesse sentido ainda que adquiridos posteriormente à constituição da sociedade conjugal os seguintes bens a Os que não se comunicam na comunhão universal É decorrência lógica do conceito dos regimes de comunhão universal e parcial que neste último as exclusões são sempre maiores e nunca menores que no primeiro Em outros termos a parcialidade da comunhão amplia mas não reduz o arco de exclusões de comunicações quando contraposta à universalidade Dessa maneira também não se comunicam na comunhão parcial os bens recebidos por qualquer dos cônjuges a título de fideicomisso os proventos do trabalho pessoal ou da aposentadoria os bens pessoais livros e equipamentos de profissão e direitos autorais Na maioria dessas hipóteses preocupouse a lei em deixar claramente estabelecida a exclusão para que não pairassem incertezas CC art 1659 V VI e VII Lei n 961098 art 39 Na do fideicomisso incorreu em omissão mas evidentemente também não há nela qualquer comunicação b Os recebidos em doação ou por sucessão CC art 1659 I Quando o cônjuge casado em comunhão parcial recebe bem em doação ou por sucessão legítima ou testamentária não se verifica a comunicação Mesmo no caso de bem doado ou testado sem cláusula de inalienabilidade ou de incomunicabilidade a comunhão não ocorre Operase a comunicação porém se ambos os cônjuges são donatários herdeiros ou legatários CC art 1660 III Em tendo o doador praticado a liberalidade em favor do casal nenhum dos cônjuges pode pretender a titularidade exclusiva do objeto doado Nem mesmo se a parte liberal da doação for parente consaguíneo de uma delas em beneficiando a doação ou o testamento aos dois cônjuges estabelecese a comunhão c Os bens subrogados CC art 1659 II Havendo subrogação de bem do patrimônio particular de um dos cônjuges o subrogado também não integra a comunhão Por isso se o bem do patrimônio particular de um dos cônjuges é vendido o dinheiro correspondente ou a parte proporcional de outro bem em cuja compra ele foi empregado continua a pertencer apenas a ele Se o apartamento ou a obra de arte dos exemplos acima são alienados na constância do casamento o dinheiro pago pelo comprador pertence ao cônjuge que titulava o bem vendido ainda que venha a ser depositado em contacorrente conjunta Se tiver sido utilizado pelo casal como um dos recursos na compra de bem comum a partilha deste deverá ser desproporcional de modo a assegurar a exclusão do valor em que se subrogou o bem estranho à comunhão À semelhança do que vigora para os bens adquiridos antes do casamento também não se comunicam aqueles em que se tiverem subrogado os recebidos por doação ou sucessão d Obrigações anteriores ao casamento CC art 1659 III Pelas obrigações constituídas antes do casamento não respondem os bens comuns nem evidentemente os particulares do outro cônjuge O credor nesse caso só pode executar seu crédito mediante a penhora de bens do patrimônio particular do devedor isto é dos excluídos da comunhão e Obrigações provenientes de ato ilícito CC art 1659 IV Se um dos cônjuges pratica ato ilícito de que não provém benefício nenhum para o outro a obrigação de indenizar não se comunica ao patrimônio comum Isto é o credor da indenização não pode pedir em juízo a penhora de bens objeto de comunicação ou pertencentes exclusivamente ao outro consorte Haverá a comunhão da obrigação passiva apenas se o ato ilícito embora praticado por um só dos cônjuges importou locuple tamento também do outro Se o marido comete latrocínio e entrega o produto do crime à mulher que dele desfruta sem enrubescer o patrimônio todo do casal é responsável pela indenização da família da vítima No regime de comunhão parcial os bens adquiridos na constância do casamento se comunicam a menos que sejam provenientes de doação ou sucessão ou mesmo da subrogação de anteriores à constituição do vínculo matrimonial A comunhão parcial alcança as benfeitorias introduzidas em bens do patrimônio particular de cada cônjuge bem assim os frutos percebidos na constância do casamento ou pendentes ao tempo do término da sociedade conjugal CC art 1660 IV e V Desse modo se o apartamento que um dos consortes trouxe em seu patrimônio ao se casar é inteiramente reformado com o emprego de recursos comuns a valorização do bem não é apropriada exclusivamente por aquele As benfeitorias correspondentes à reforma ao contrário integram o patrimônio comum do casal e devem ser partilhadas em caso de divórcio De outro lado o aluguel recebido em razão da locação de bem particular de um dos cônjuges não lhe pertence com exclusividade mas faz parte da comunhão inclusive os vencidos e não pagos à data em que a sociedade conjugal se encerrar Em suma no regime de comunhão parcial podese distinguir de um lado o patrimônio particular de cada cônjuge composto pelos bens adquiridos antes do casamento recebidos por doação os proventos do trabalho pessoal as obrigações passivas constituídas anteriormente ao matrimônio etc e o comum adquiridos após o casamento benfeitorias nos particulares obrigações passivas em proveito da família etc Aquele é administrado exclusivamente pelo cônjuge que o titula que tem inclusive o direito de dele dispor a qualquer tempo se for imóvel e o outro cônjuge recusar a autorização caberá o suprimento e apenas sobre ele recaem as dívidas contraídas para a respectiva administração CC arts 1665 e 1666 233 Participação final nos aquestos O regime de participação final nos aquestos é novo no direito brasileiro tendo sido introduzido pelo Código Reale Tal como o da comunhão parcial tratase de um regime híbrido em que o patrimônio dos cônjuges se reparte em particular e comum Ao contrário deste porém só se comunicam os adquiridos na constância do casamento mediante o esforço comum do casal Como toda novidade tem despertado algumas incertezas para cuja superação infelizmente nem sempre o texto da lei ajuda como deveria Para compreender seus contornos e disciplina o critério mais útil é extremálo dos demais regimes A interpretação das normas legais referentes à participação final nos aquestos não pode nunca igualála ao regime da comunhão parcial ou da separação absoluta A meio caminho entre um e outro poderia ter sido chamado de separação relativa a participação final nos aquestos não pode perder sua especificidade No regime da participação final nos aquestos cada cônjuge mantém seu patrimônio próprio durante a constância do casamento neste aspecto aproximase do da separação absoluta e tem ademais direito à meação dos bens adquiridos pelo casal a título oneroso aqui a aproximação dá se com o regime da comunhão parcial CC art 1672 No patrimônio próprio de cada cônjuge encontramse os bens que já lhe pertenciam à época do casamento e os que ele adquirir a qualquer título na constância deste art 1673 A administração do patrimônio particular compete exclusivamente ao cônjuge que o titula e pelas dívidas por ele contraídas respondem apenas os seus bens mesmo quando posteriores ao casamento art 1677 Essas implicações só podem ser afastadas quando adotado o regime da participação final nos aquestos mediante disposição inserida de comum acordo no pacto antenupcial art 1656 Para exemplificar imagine que duas pessoas se casam no regime de participação final dos aquestos No dia anterior ao casamento ele tem em seu patrimônio um apartamento dois terrenos e um barco e ela uma casa de praia ações de uma sociedade anônima e obras de arte Casados esses bens não se comunicam continuando a pertencer a cada cônjuge O casamento dura oito anos ao longo dos quais ele herdou fração ideal de uma mansão e comprou mais três terrenos Ela por sua vez vendeu a casa de praia e comprou outra maior além de ter adquirido também alguns conjuntos de escritório Ao término da sociedade conjugal todos os bens que foram acrescidos ao patrimônio de cada cônjuge durante sua existência gratuita ou onerosamente alguns por sucessão outros por subrogação continuam a pertencer ao respectivo titular não se comunicando Imagine agora que ele e ela no terceiro ano de casados juntaram as economias e adquiriram uma casa na cidade onde fixaram o domicílio conjugal No quarto ano com dinheiro dos dois arremataram num concorrido leilão a tela de um afamado pintor Esses bens porque foram comprados com o esforço comum pertencem aos dois ainda que o imóvel esteja registrado no nome de um dos cônjuges somente e a nota fiscal de venda da obra de arte identifique apenas um deles como o adquirente Ele e ela titulam por isso a meação desta casa e pintura A comunhão nesse regime não se estabelece na constância do casamento mas somente ao término da sociedade conjugal Por isso quando adotada a participação final nos aquestos o cônjuge não tem a titularidade da meação enquanto casado Tornase meeiro somente no caso de dissolução do vínculo matrimonial e apenas dos bens adquiridos pelo esforço comum Nesse regime a meação fica suspensa enquanto perdurar o casamento ela não é renunciável cessível nem penhorável Com o fim do vínculo conjugal a partilha de bens tanto no juízo do divórcio como no sucessório CC art 1685 depende do cômputo do valor dos aquestos feito por meio de cálculo cuja complexidade infelizmente a lei não conseguiu captar de modo adequado Em outros termos no exemplo imaginado acima não haveria dificuldades na identificação dos bens componentes da meação Mas a vida é muitíssimo mais rica de possibilidades Ao longo dos anos de convivência podese perder na bruma dos negócios realizados a dimensão exata da contribuição de cada cônjuge na aquisição dos bens que passaram a integrar seus patrimônios Para mensurar o montante dos aquestos é necessário recuperar as informações atinentes a cada aquisição bem como trazer ao valor presente isto é atualizar para a data da dissolução do regime o preço pagamento desembolso ou quantia correspondente CC art 1683 O cálculo dos aquestos compreende então três etapas Na primeira são apurados os valores correspondentes aos bens que indubitavelmente integram o patrimônio particular ou seja aos listados no art 1674 do CC bens anteriores ao casamento e os que nele se subrogaram os adquiridos por cada cônjuge em razão de sucessão ou liberalidade as dívidas correspondentes Do valor do patrimônio particular de cada cônjuge deduzse então a soma dos valores desses bens É a etapa mais simples do cômputo dos aquestos porque em termos gerais corresponderão as deduções às exclusões do regime de comunhão parcial suficientemente conhecidas dos profissionais do direito Na segunda etapa devem ser considerados os valores dos demais bens adquiridos pelos consortes na constância do casamento para distinguir os que o foram com recursos individuais dos que resultaram de esforço conjunto do casal Em relação a esta parte do cálculo os critérios legais são três no caso de bens adquiridos pelo esforço comum cada cônjuge terá direito à metade CC art 1679 os bens móveis presumemse adquiridos na constância do casamento art 1674 parágrafo único e os imóveis são em princípio da propriedade daquele em cujo nome estiver registrado art 1681 Em decorrência do primeiro critério é absolutamente irrelevante o tamanho proporcional da contribuição de cada cônjuge para o esforço comum tendo havido este dividirseá o bem em quotas iguais isto é pela metade mesmo que um dos consortes tenha contribuído mais que outro na aquisição Em razão do segundo critério o cônjuge que reivindicar a propriedade exclusiva de bem móvel deve provar que já o titulava ao tempo do casamento ou que o adquiriu com recursos próprios Pelo terceiro e último critério de definição da titularidade dos bens potencialmente comuns se um dos cônjuges tiver contribuído para a aquisição de imóvel de cujo registro consta apenas o nome do outro cabelhe impugnar a titularidade exclusiva Mas atente uma vez feita a impugnação o ônus da prova do esforço comum não é do impugnante A lei atribui ao cônjuge em cujo nome está registrado o imóvel o dever de provar têlo adquirido com recursos particulares art 1681 parágrafo único Percebese com facilidade que o cônjuge casado no regime de participação final nos aquestos devese preocupar em conservar todos os documentos e informações atinentes a cada aquisição importante que tenha feito enquanto dura o casamento Se comprou um imóvel e o registrou em seu nome mas não puder provar tempos depois no término da sociedade conjugal que o fez exclusivamente com recursos próprios sem nenhuma contribuição material do outro cônjuge terá direito unicamente à meação do bem No caso de falecimento competirá a prova aos seus herdeiros a partir das informações e documentos que lhes chegarem às mãos A terceira etapa do cálculo dos aquestos diz respeito a certos ajustes Se um dos cônjuges doou algum bem sem a autorização do outro devese considerar que praticou a liberalidade em desfavor de seu patrimônio particular e não de bens comunicados O valor atual da doação deve ser imputado ao patrimônio particular do cônjuge doador CC art 1675 Outro ajuste relacionase aos bens alienados em detrimento da meação cujos valores devem ser imputados aos dos aquestos art 1676 Nesses dois casos o cônjuge prejudicado ou seus descendentes podem preferir a reivindicação do bem doado ou alienado ao ajuste no cálculo dos aquestos O terceiro ajuste é pertinente às dívidas de um cônjuge solvidas pelo outro com bens de seu patrimônio particular O valor atualizado do pagamento imputase à meação do cônjuge devedor como se tivesse havido uma antecipação desta art 1678 O derradeiro ajuste no cálculo dos aquestos diz respeito às dívidas de um dos cônjuges que não pode comprometer a meação do outro quando seu valor superar a do devedor art 1686 Procedido ao cálculo dos aquestos atribuise a meação a cada cônjuge ou seus herdeiros Sendo conveniente e possível dividirseão os bens em espécie Caso contrário o cônjuge proprietário pagará ao não proprietário em dinheiro o valor correspondente à meação Não dispondo aquele de numerário para fazer o pagamento alguns de seus bens após avaliação e autorização judiciais serão vendidos para a liquidação da partilha CC art 1684 e parágrafo único No regime da participação final nos aquestos os cônjuges conservam seus patrimônios particulares e ao término da sociedade conjugal no falecimento de um deles ou divórcio os bens adquiridos com o esforço comum do casal são divididos Num exemplo singelo considere que no divórcio de casal casado em regime de participação final nos aquestos o patrimônio em nome dele é avaliado em 300 e o em nome dela em 500 Ultrapassada a primeira etapa dos cálculos avaliase que os bens indubitavelmente excluídos da meação correspondem no patrimônio dele a 200 e no dela a 100 Na segunda etapa resta provado que um imóvel em nome da mulher foi adquirido com dinheiro proveniente exclusivamente do trabalho dela e que seu valor é 200 Na terceira etapa apurase que o marido pagou com seus recursos uma dívida da mulher correspondente a 30 Feitas as contas os aquestos montam 300 dos quais ele terá direito a 180 e ela a 120 Quer conferir Do valor do patrimônio do marido devese deduzir o dos bens indubitavelmente excluídos da meação 300 200 100 para alcançar o dos aquestos que se encontram no nome dele Já do valor do patrimônio da mulher para apurar os aquestos nele alocados devemse deduzir o destes bens e também o do que restou provado ter sido adquirido apenas com os recursos dela 500 100 200 200 Somase então o valor dos aquestos em nome de cada um dos cônjuges 100 200 300 Ele seria simplesmente dividido pela metade não fosse a necessidade do ajuste relativo à dívida dela paga por ele Ajustado o cálculo apurase o direito do marido em 180 300 2 150 150 30 180 e o da mulher em 120 300 2 150 150 30 120 3 A separação absoluta de bens No regime da separação absoluta nenhum dos bens dos cônjuges anteriores ou posteriores ao casamento se comunicam CC art 1687 A administração e a livre disponibilidade desses bens é titulada exclusivamente pelo cônjuge a quem pertence que prescinde da anuência do outro para alienar ou onerar bens imóveis assim como para fazer doações Não há nenhuma comunicação entre os bens de cada cônjuge no regime da separação absoluta Salvo no tocante às despesas do casal que a exemplo do que se verifica nos demais regimes são custeadas por contribuições proporcionais de cada cônjuge art 1688 o casamento celebrado nesse regime não produz efeitos patrimoniais Perceba a diferença entre os direitos do cônjuge relativamente aos seus bens no regime de separação e os referentes aos de seu patrimônio particular nos regimes híbridos da comunhão parcial e da participação final nos aquestos Em qualquer desses regimes a administração de tais bens é exclusiva do cônjuge que o titula Ele pode independentemente de consulta ou anuência do consorte explorálos economicamente ou deixálos sem produzir quaisquer frutos No tocante à disponibilização também ela é titulada com exclusividade pelo cônjuge a quem pertence o bem Mas enquanto no regime da separação absoluta a outorga uxória ou autorização marital nunca é necessária para a alienação ou oneração de bens nos regimes híbridos é indispensável quando disser respeito a imóveis ou doação A diferença reside então precisamente nesse ponto o casado no regime de separação pode dispor dos seus bens livremente independentemente de eventuais efeitos indiretos que o ato ocasione na economia do casal Quem no entanto se casa num dos regimes híbridos comunhão parcial ou participação final nos aquestos apenas pode dispor dos seus bens particulares se isso não agravar indiretamente a condição econômica do outro cônjuge Noutros termos se a disponibilização não puder agravála o interessado na venda de bens particulares conseguirá o suprimento judicial da autorização mas não a obterá se houver risco de agravo Em determinadas hipóteses o regime de separação absoluta é obrigatório A lei nelas não deixa à livre escolha dos cônjuges as estipulações atinentes à eficácia patrimonial do matrimônio Por considerar que essa liberdade pode prejudicar direitos de terceiros ou que os cônjuges podem não se encontrar em condições de tomar a decisão acertada a lei neutraliza qualquer efeito do casamento no âmbito patrimonial Seriam três as hipóteses de adoção obrigatória do regime da separação absoluta de bens a casamento feito a despeito da causa suspensiva b se pelo menos um dos cônjuges tem mais de 70 anos c se o enlace dependeu de suprimento judicial como nos casos de não ter um ou ambos os consortes alcançado a idade núbil ou se havia sido denegada a autorização dos pais ou tutores CC art 1641 Mas é inconstitucional a lei quando impede a livre decisão quanto ao regime de bens aos que se casam com mais de 70 anos Tratase de uma velharia que remanesce dos tempos em que se estranhava o casamento com idade elevada sendo então legítima a preocupação da lei em evitar a possibilidade de fraudes Hoje em dia a permanência da obrigatoriedade do regime de separação afronta o princípio constitucional da dignidade humana A doutrina já tem assentado o entendimento pela inconstitucionalidade do inciso II do art 1641 do CC Chinelato 2004289291 embora a jurisprudência ainda titubeie a respeito do tema Cahali 2004167182 Desse modo são apenas dois os casos de obrigatoriedade da adoção do regime de separação de bens De um lado o do casamento celebrado a despeito da causa suspensiva de outro o que dependeu de suprimento judicial Naquele justificase a adoção do regime da separação absoluta para evitar a confusão patrimonial de que poderiam advir danos a direitos de terceiros herdeiro excônjuge ou de um dos cônjuges pessoa tutelada ou curatelada Neste último a justificativa decorre da insuficiência de discernimento dos nubentes quanto ao melhor regime a adotar Depois de cessada a circunstância que justificou a obrigatoriedade do regime de separação ele não se altera ipso facto Afinal pode ser que os cônjuges teriam optado exatamente por esse regime se lhes tivesse sido dada a oportunidade Depois de superado o motivo determinante da causa suspensiva conclusão do inventário partilha dos bens do casamento anterior aprovação das contas do tutor ou curador ou uma vez alcançada a maioridade pelos dois consortes a mudança do regime de bens do casamento para outro que não o da separação depende de processo judicial item 5 Adotado o regime de separação absoluta o casamento não projeta outros efeitos patrimoniais além da obrigação de cada cônjuge contribuir proporcionalmente às suas rendas para as despesas do casal Em duas hipóteses a separação de bens é obrigatória quando o casamento é celebrado a despeito de causa suspensiva ou por suprimento judicial É inconstitucional a previsão da lei no sentido da obrigatoriedade desse regime também no casamento de pessoa maior de 60 anos Quando estava em vigor o Código Beviláqua a jurisprudência construiu o entendimento de que os cônjuges obrigados a casar no regime da separação teriam direito à meação nos aquestos ou seja nos bens adquiridos pelo esforço comum na constância do matrimônio O Supremo Tribunal Federal inclusive editara súmula a respeito no regime de separação legal de bens comunicam se os adquiridos na constância do casamento Súmula 377 O fundamento era um dispositivo legal que previa a comunicação dos bens adquiridos na constância do casamento mesmo não sendo de comunhão o regime adotado Posteriormente a jurisprudência estendeu o critério também para as hipóteses de separação convencional isto é aquelas em que os cônjuges adotaram o regime por livre vontade Gonçalves 2005411 A partir da vigência do Código Reale duas importantíssimas alterações no direito positivo ocorreram De um lado não se reproduziu aquela previsão da comunicação dos aquestos em qualquer regime de bens de outro introduziuse o regime da participação final nos aquestos Em razão dessas duas mudanças na lei não há mais razões para continuar o mesmo entendimento jurisprudencial A Súmula 377 do STF não se coaduna mais com o direito vigente Cahali 2004187188 Ao garantir aos casados a meação dos bens adquiridos pelo esforço comum as decisões judiciais nela fundamentadas a rigor anteciparam os contornos do regime de participação final nos aquestos Pois bem com a disciplina legal deste não há mais razões para negar ao regime da separação absoluta a inteireza de suas implicações jurídicas que são as de neutralizar qualquer implicação patrimonial do vínculo nascido com o casamento Nos casamentos celebrados a partir de 2003 portanto os nubentes que declararem a opção pelo regime da separação de bens não podem ser tratados como se tivessem feito declaração diversa ou seja como se tivessem escolhido o da participação final nos aquestos A tanto equivaleria o mais completo e descabido desprezo à vontade externada Desde então somente no caso de separação obrigatória podese cogitar de aplicação das normas do regime de participação final nos aquestos mesmo assim se o juiz identificar que a solução legal não necessariamente querida pelos consortes pode levar ao enriquecimento indevido de um deles em detrimento do outro Na minha opinião o regime obrigatório no casamento a despeito da causa suspensiva ou de jovens sem idade núbil não deveria ser o da separação mas sim o da participação final nos aquestos A separação absoluta de bens penso não deveria nunca ser obrigatória mas invariavelmente o produto da opção consciente e livre dos cônjuges Concluindo sob a égide do Código Reale quando adotado o regime convencional da separação de bens o casamento não produz nenhum efeito patrimonial Cada cônjuge continua o exclusivo titular de seus bens e nenhum deles tem direito a qualquer meação sobre os do outro ainda que adquiridos na constância do casamento a qualquer título com ou sem contribuição do casal Da inexistência de direito à meação não decorre nenhum enriquecimento indevido nem mesmo quando os dois cônjuges contribuíram para a aquisição do bem registrado ou documentado somente no nome de um deles E não há enriquecimento indevido porque os cônjuges ao escolherem o regime da separação declararam a vontade compatível com a inexistência da meação Quer dizer quem se casa voluntariamente no regime da separação absoluta e concorda que um bem adquirido em conjunto fique apenas no nome do outro cônjuge e não sob a cotitularidade dos dois renuncia a qualquer participação nele Se não concordasse com isso bastaria ter condicionado sua contribuição na aquisição deste bem à formalização da propriedade condominial Já na separação obrigatória em que os cônjuges não tiveram a oportunidade de escolher o regime a adotar podese admitir alguma flexibilização na ineficácia patrimonial absoluta do casamento reconhecendoselhe efeitos próximos ao do celebrado sob o regime da participação final nos aquestos como medida destinada à coibição do enriquecimento indevido quando e se este ocorrer 4 Pacto antenupcial Varia a forma de adoção do regime de bens do casamento segundo sua classificação Quando o regime escolhido é o da comunhão parcial basta o registro da declaração feita pelos nubentes nesse sentido nos autos do processo de habilitação Se os noivos quiserem se casar em outro regime devem celebrar o pacto antenupcial CC art 1640 parágrafo único Esse instrumento formal específico também é exigido na hipótese do casamento no regime de separação obrigatória Pacto antenupcial é o instrumento de formalização da vontade convergente dos contraentes relacionada aos aspectos patrimoniais de suas relações como casados É o meio de os cônjuges acordarem sobre seus bens não se limitando necessariamente à definição do regime matrimonial mas podendo tratar também dos antifernais que são os doados por um deles ao outro por ocasião do casamento e os parafernais isto é os adquiridos pela mulher na constância do casamento por doação do marido Fachin 2003187 Não têm validade os acertos feitos entre eles em outro documento mas apenas no pacto antenupcial que adota aliás obrigatoriamente a forma pública Nulo é o contrato sobre bens celebrado pelos nubentes por instrumento particular CC art 1653 Desse modo optando os nubentes por um regime de bens diferente do da comunhão parcial devem durante o prazo de habilitação procurar um tabelião para celebrarem por escritura pública o pacto antenupcial Em outros termos se o regime de bens é convencional o pacto antenupcial é obrigatório como veículo da convenção dos nubentes Mesmo que seja apenas para declarar que escolheram o regime da comunhão universal essa formalidade é indispensável É assim mais trabalhoso e custoso casarse quando o regime escolhido não é o da comunhão parcial O pacto sobre os aspectos patrimoniais do casamento deve ser feito necessariamente antes de sua celebração Não terá validade nenhuma o ajustado entre pessoas casadas porque por lei em vista da omissão da declaração tempestiva expedida pela forma correta o regime de bens será o da comunhão parcial Pretendendo os cônjuges alterálo ainda que em parte não será suficiente a declaração de vontade de ambos mesmo abrigada em escritura pública para mudar o regime eles deverão promover o processo judicial correspondente item 5 Quando o casamento não se realiza o pacto antenupcial não terá nenhuma eficácia CC art 1653 in fine Todas as suas disposições foram contratadas sob condição suspensiva Não terá validade a cláusula ou disposição do pacto antenupcial que contrariar disposição cogente da lei CC art 1655 Os nubentes obrigados ao casamento com separação de bens não podem por hipótese contratar no pacto antenupcial a plena comunicação dos adquiridos por qualquer um deles anteriormente à sua celebração O pacto antenupcial é celebrado necessariamente por escritura pública e claro antes da cerimônia do casamento Nele os nubentes podem contratar qualquer disposição acerca dos efeitos patrimoniais do matrimônio desde que não contrariem disposição cogente da lei A celebração do pacto antenupcial é obrigatória sempre que o regime de bens adotado não for o da comunhão parcial Finalmente para que tenha efeitos perante terceiros o disposto no pacto antenupcial deve ser registrado no Registro de Imóveis do domicílio conjugal CC art 1657 5 Alteração do regime Uma vez definido o regime de bens do casamento ele deve em princípio vigorar até o fim da sociedade conjugal É o princípio da imutabilidade do regime Embora esteja o princípio relativizado na lei em vigor a imutabilidade deve ser a regra em atenção a interesses não só dos cônjuges como de terceiros credores Sob a perspectiva dos cônjuges a possibilidade de mudança do regime pode dar lugar a pressões indevidas contra o consorte com menos capacidade de gerar dinheiro Imagine que a mulher é advogada e está prestes a ganhar honorários de sucumbência de valor expressivo que não pretende compartilhar com o marido um artista plástico não afamado O regime é o da comunhão parcial em função do qual o dinheiro desses honorários se comunicará assim que ingressar no patrimônio da advogada Se a mudança de regime fosse a regra ela poderia forçála brandindo a ameaça do divórcio Nesse exemplo em querendo o esposo manter o casamento deveria submeterse à alteração do regime para o da separação Já sob a perspectiva dos credores a mudança de regimes pode importar redução da garantia patrimonial de que desfrutam Se o devedor é casado no regime da comunhão a alteração para o da separação retiraria de seu patrimônio os bens que pelo primeiro se comunicavam Mesmo operada a mudança no sentido inverso do regime da separação para o da comunhão pode haver prejuízo aos credores de um dos cônjuges se o outro estiver insolvente Considere que o patrimônio líquido de um deles é acentuadamente negativo isto é esse cônjuge deve muito mais do que tem ao passo que o outro tem bens em valor que supera as suas dívidas mas não muito O credor desse último seria prejudicado pela transformação do regime de separação em comunhão porque sua garantia seria bastante reduzida desaparecendo eventualmente Em vista da atenção devotada a tais interesses pelo princípio da imutabilidade do regime de bens do casamento a mudança deste só a admite a lei em hipóteses excepcionais que são duas A primeira diz respeito ao estrangeiro casado que se naturaliza brasileiro Havendo concordância expressa do cônjuge ele pode exibindo o decreto de naturalização requerer ao juiz que determine a averbação da adoção do regime de comunhão parcial no Registro Civil LINDB art 7º 5º Tratase de mutação do regime patrimonial sujeita a duas restrições uma de ordem subjetiva porque acessível apenas aos brasileiros naturalizados que já eram casados antes da naturalização outra de ordem objetiva porque o novo regime não pode ser outro senão o da comunhão parcial A autorização do juiz é necessária inclusive para aferir a inexistência de prejuízos a terceiros A segunda hipótese não se baliza por tais restrições subjetiva e objetiva Quaisquer casados podem dela se beneficiar assim como a migração de regimes pode ter qualquer direção da comunhão para a separação da comunhão parcial para a universal da separação para a participação final nos aquestos etc Nesse caso a mudança depende do preenchimento de quatro requisitos a concordância dos cônjuges b autorização judicial c motivação pertinente e comprovada d preservação dos direitos de terceiros CC art 1639 2º Em razão do primeiro requisito a mudança do regime não pode verificarse em nenhuma hipótese contra a vontade de um dos cônjuges Provindo o regime de um contrato apenas por convergência da declaração volitiva dos dois contratantes pode ser mudado Se um dos cônjuges desta edição 2020 for interdito e o curador for o outro não se deve em princípio admitir a alteração do regime porque esse primeiro requisito não poderia ser substancialmente atendido O segundo requisito é a autorização judicial Não permite o direito brasileiro que os cônjuges promovam extrajudicialmente a mudança do regime de bens Tendo em vista os interesses prestigiados pelo princípio da imutabilidade apenas o pronunciamento judicial pode garantir que nenhum dos cônjuges nem terceiros estariam sendo prejudicados com a adoção do novo regime Se o juiz identificar que um dos requerentes não está pleiteando a mudança por sua livre e espontânea vontade ou que credores podem ter suas garantias reduzidas ou perdidas não deve deferir o pedido O requisito da motivação pertinente e comprovada definese por exclusão Não vêm ao caso os motivos que levaram os cônjuges a buscar a mudança do regime de bens Desde que não esteja nenhum deles sendo pressionado e não haja prejuízo aos credores o juiz deve atender ao pedido De qualquer modo as hipóteses mais corriqueiras são as ligadas ao regime da separação obrigatória por força das causas suspensivas ou da insuficiência da idade Nesses casos afastada a circunstância que obrigava a adoção da separação de bens em querendo os cônjuges adotar regime diverso devem requerer ao juiz A simples vontade deles que antes não pudera manifestarse livremente será suficiente para desencadear a mudança Pelo derradeiro requisito é incabível a mudança do regime patrimonial quando puder lesar direitos de terceiros Se eventualmente for deferida em juízo a alteração sem que o conhecimento judicial tivesse alcançado em razão das provas produzidas pelos consortes a possibilidade do prejuízo a terceiros perante esses ela não produzirá efeitos Em outros termos o credor continuará a titular a mesma garantia que titulava de acordo com o regime de bens do casamento do devedor existente à data da constituição da obrigação como se não tivesse ocorrido mudança O princípio é o da imutabilidade do regime de bens do casamento para que não haja prejuízo ao cônjuge com menor capacidade de gerar dinheiro nem a terceiros credores Há duas exceções Uma de âmbito bastante particular que autoriza o naturalizado brasileiro a adotar mediante concordância do seu cônjuge o regime de comunhão parcial Outra de âmbito geral que permite aos casados a alteração de regime em qualquer direção Nos dois casos é indispensável a autorização judicial e a inexistência de prejuízos a terceiros A alteração do regime de bens no casamento independe de pacto antenupcial mesmo que o novo regime não seja o da comunhão parcial Cahali 2004101111 A segurança jurídica associada ao processo judicial de mudança de regime transcende em muito a que poderia advir da escritura pública tornando essa formalidade dispensável 2020 02 13 PÁGINA RB41 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 58 DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE E DO VÍNCULO CONJUGAL Capítulo 58 Dissolução da sociedade e do vínculo conjugal 1 O fim do casamento Os noivos seus familiares amigos e em certo sentido a sociedade nutrem no dia do casamento a esperança de que ele dure para sempre A expectativa generalizada é a de que apenas a morte separará os que se uniram pelos laços matrimoniais Dados estatísticos porém permitem estimar que um em cada quatro casamentos termina em divórcio isto é com os cônjuges ainda vivos Durante muito tempo no Brasil vigorou a regra da indissolubilidade do casamento Éramos o único país a consagrála no plano das normas fundamentais mediante dispositivo inserto na Carta de 1934 e reproduzido nas de 1937 1946 1967 e 1969 Cahali 197839 Na lei previase o desquite destinado à mera separação de corpos e bens daqueles cujo casamento era motivo de infelicidade mais que de gozo A tecnologia jurídica por vezes discutia a pertinência da regra da indissolubilidade Clóvis Beviláqua chegou a advogar por algum tempo a adoção pela lei do divórcio com a máxima parcimônia mas em função do que considerava ser condições especiais da sociedade brasileira a saber respeitabilidade da família honestidade das nossas patrícias e costumes do povo tornou se árduo defensor da indissolubilidade do vínculo postura que defendeu ardentemente durante os debates parlamentares em torno do primeiro Código Civil 1896284287 Predominava entretanto certo distanciamento costumando os autores partir do direito positivo sem problematizar em demasia a questão Eduardo Espínola por exemplo ao fim de nota de rodapé dedicada à discussão do tema na doutrina francesa simplesmente anotou o receio de que em vista das uniões irregulares a ausência do divórcio mais prejudicasse que auxiliasse a instituição do casamento 1954459477 Até 1977 o Brasil era um dos poucos países em que ainda não existia o divórcio vincular isto é dissolvente do vínculo Além dele àquela época consideravam indissolúvel o casamento apenas mais cinco Argentina Bolívia Chile Colômbia e Espanha Pereira 1972169170 Naquele ano no contexto de um amplo debate no seio da sociedade Nelson Carneiro parlamentar cuja trajetória política foi construída sobre o tema da modernização do direito de família conseguiu finalmente a aprovação de emenda constitucional de sua autoria abolindo a regra da indissolubilidade do casamento A Igreja Católica atuou como a principal força social mobilizada na tentativa de evitar a aprovação da emenda Carneiro O Brasil era como ainda é um país predominantemente católico Como desde o concílio de Trento no século XVI a doutrina católica fortemente arraigada na cultura dos brasileiros não admitia senão o divórcio quoad thorum et mensam isto é a separação de corpos dos cônjuges sem dissolução do vínculo matrimonial a aprovação da emenda divorcista não ocorreu ao largo de grandes dificuldades Importa atentar ao contexto em que o divórcio foi introduzido no direito brasileiro porque a força da Igreja Católica e de sua mobilização induziram em 1977 a solução de compromisso de que resultou uma disciplina ambígua do instituto Em outras palavras a Constituição admitiu o divórcio mas sem facilitar demasiadamente a dissolução do vínculo O desquite não deixou de existir Renomeado de separação tornouse uma etapa juridicamente indispensável à completa terminação do vínculo que só podia ser requerida por quem já estivesse separado há pelo menos dois anos Não existia o divórcio direto senão como norma constitucional transitória destinada a atender à situação dos separados de fato há pelo menos cinco anos Só se podia divorciar uma única vez na vida Se o divorciado contraísse novas núpcias o vínculo não podia ser dissolvido por sua iniciativa Essa ambiguidade que marcou a introdução do instituto no direito brasileiro refletiuse na ordem positiva em vigor por mais de trinta anos É verdade que a Constituição de 1988 minorou as dificuldades para a dissolução do vínculo matrimonial Mas não as eliminou por completo Exigia ainda quando editada a fase da separação embora tivesse reduzido para um ano o interregno necessário à conversão em divórcio e tornado por outro lado permanente a figura do divórcio direto condicionandoo à separação de fato por dois anos Manifestação dessa ambiguidade no tratamento do instituto também se encontrava até julho de 2010 no Código Civil que levado ao pé da letra não autorizava a separação e o divórcio quando simplesmente um dos cônjuges havia deixado de amar o outro Quando eu era criança ouvia os mais velhos dizerem quando um não quer dois não se separam Essa estranha visão de como devem ser tratadas as relações afetivas entre duas pessoas adultas estava incorporada na lei Se um dos cônjuges não concordasse em requerer a separação consensual ao outro o Código Civil abria unicamente as alternativas de deteriorar o relacionamento conjugal a ponto de surgir algum motivo para a ruptura litigiosa ou separarse de fato por pelo menos dois anos para ter direito ao divórcio direto Era a maneira mais estúpida que posso imaginar de tratar assunto tão delicado A vida em comum pode estar longe de ser insuportável porque há respeito e assistência mútua entre os cônjuges e cada um cumpre satisfatoriamente a sua parte na organização do cotidiano Mas mesmo sendo plenamente suportáveis a convivência e a coabitação pode ocorrer de um dos consortes não amar mais o outro e querer se desligar do vínculo para ter a oportunidade de vivenciar livre e honestamente novas relações amorosas Não ignorasse a jurisprudência a anacrônica limitação daquelas hipóteses legais de separação essa pessoa estaria obrigada a continuar casada até que a vida em comum se tornasse insuportável Isso era um completo disparate A procurar evitar a completa deterioração do relacionamento e preservar o que ele ainda tem de saudável para o bem da família e principalmente dos filhos o Código Civil parecia preferir a punição dos casados que decidem a certa altura da vida buscar novo casamento A ambiguidade então se manifestava a separação quando ainda existia tal como disciplinada na lei brasileira martirizava em vez de facilitar a vida dos que queriam terminar o casamento Em julho de 2010 o direito de família brasileiro passou por uma profunda e salutar transformação com a promulgação da EC n 66 A partir de então a dissolução do casamento pelo divórcio não ficou mais dependendo de prévia separação judicial por mais de um ano ou de separação de fato há mais de dois Na verdade desde essa emenda constitucional o casamento pode ser dissolvido por divórcio independentemente de qualquer condição Vale dizer a qualquer tempo mesmo que tenham se casado há dias semanas ou poucos meses os cônjuges podem pôr fim ao vínculo matrimonial divorciandose por mútuo acordo ou litigiosamente Não havendo consenso qualquer um deles pode pedir o divórcio ao juiz fundamentando o pedido no descumprimento de dever conjugal pelo demandado ou senão na mera vontade de pôr fim ao casamento Não se trata propriamente de nenhuma grande inovação do direito brasileiro Em outros lugares como na maioria dos estados dos Estados Unidos por exemplo o rompimento unilateral do vínculo marital independentemente de culpa do outro cônjuge sempre foi generalizadamente admitido ScottScott 1999204 O alcance desta emenda constitucional foi bastante amplo mas aparentemente ela não conseguiu eliminar por completo a ambiguidade que cerca o instituto desde 1977 Apesar de terem ficado incompatíveis com a Constituição todos os dispositivos do Código Civil referentes à separação há doutrina e julgados que não os consideram revogados Não se conseguiu ainda o total expurgo da disciplina da matéria que condiciona o desfazimento da sociedade conjugal à insuportabilidade da vida em comum revelando o quanto ainda tem força o pensamento conservador a respeito do fim do casamento Até 1977 o Brasil era o único país do mundo a adotar na Constituição a regra da indissolubilidade do vínculo matrimonial O prestígio desfrutado por esse princípio deviase em grande parte à forte penetração do Catolicismo na sociedade brasileira Naquele ano em meio a intenso debate aprovouse emenda constitucional introduzindo o divórcio A ordem jurídica ainda tentou livrarse dessa ambiguidade no trato do tema com a Emenda Constitucional n 66 de julho de 2010 Mas como não excluiu explicitamente a separação há doutrina e julgados que consideram ainda vigente essa forma de desfazimento da sociedade conjugal Como visto anteriormente o que eterniza o casamento na maioria das vezes não é o amor ou a gratificação sexual mas a adequada repartição das tarefas do cotidiano Isso não significa porém que a carência de amor ou de sexo gratificante seja sempre desconsiderada na hora de se decidir não continuar casado com determinada pessoa Não há contradição entre as afirmações uma descreve o ingrediente de preservação da maioria dos casamentos que se perpetuam outra diz acerca dos motivos que podem ser levados em conta em alguns dos que se desfazem No estudo da dissolução do casamento após examinar os aspectos particulares do divórcio item 2 e de sua repercussão nas questões da proteção da pessoa dos filhos item 3 partilha de bens item 4 e eventualmente no nome dos cônjuges item 5 faço ainda referência à antiga figura da separação item 6 Registro por fim que o divórcio não é a única via de dissolução da sociedade conjugal Ela termina também com a nulidade ou anulação do casamento Cap 56 item 7 e a morte dos cônjuges ou de um deles CC art 1571 No caso de morte presumida em vista da ausência de um dos consortes o vínculo conjugal é desfeito podendo o cônjuge sobrevivente casarse novamente como se viúvo fosse art 1571 1º 2 O divórcio O divórcio é o meio de dissolução do casamento válido enquanto vivos os dois cônjuges No passado a interferência do Estado neste assunto era significativa e a ordem jurídica em razão de valores arcaicos sobre a família impedia por meio de condições temporais e formais a livre manifestação da vontade de qualquer dos cônjuges de se desligar do vínculo matrimonial No direito brasileiro da atualidade esta interferência está limitada ao essencial vale dizer à preocupação com os filhos Se não há filhos menores ou incapazes os cônjuges podem se divorciar a qualquer tempo por mera declaração de vontade formalizada por escritura pública Mesmo no caso de divórcio litigioso não é mais necessário terse verificado qualquer motivo objetivo descumprimento de dever conjugal insuportabilidade da vida em comum doença etc bastando a mera vontade de um dos cônjuges de não continuar casado Como já se disse antes quando eu era pequeno ouvia os mais velhos dizerem quando um não quer dois não se separam Isto de certa forma estava incorporado no direito de família brasileiro até a revolucionária EC n 662010 Desde então podemos felizmente afirmar que no Brasil quando um não quer dois não continuam casados A pessoa divorciada readquire o direito de se casar novamente Se tiver sido feita a partilha dos bens no divórcio poderá adotar nas novas núpcias qualquer regime Fica porém obrigada a contraílas no regime de separação absoluta enquanto não tiver sido feita a partilha dos bens do casamento dissolvido CC art 1523 III Quanto à espécie o divórcio pode ser amigável ou litigioso item 21 quanto à forma pode ser judicial ou extrajudicial item 22 21 Espécies de divórcio São duas as espécies de divórcio amigável ou litigioso Na primeira espécie os cônjuges concordam que não é mais o caso de continuarem casados Ainda que cada um deles tenha motivos próprios e não raro atribua ao outro a culpa pelo fim da experiência conjugal partilham pelo menos uma opinião a respeito do relacionamento não convém mais insistir nele Esta é uma condição necessária mas não suficiente Para que o divórcio seja amigável os cônjuges devem ainda chegar a acordo sobre filhos e nome Sem que os dois concordem inteiramente a respeito da guarda dos filhos menores e a conservação ou mudança do nome de casados o divórcio amigável não tem lugar Em relação à partilha de bens como é possível postergála a momento ulterior o divórcio amigável pode se realizar mesmo sem acordo absoluto nesta questão mas o consenso deve ser alcançado relativamente às demais término do vínculo filhos e nome Os divorciados podem a qualquer momento contratar a partilha dos bens extrajudicialmente por instrumento privado ou escritura pública a depender da espécie de bem Não chegando a acordo qualquer um deles pode propor a ação judicial de partilha O divórcio amigável depende de dois requisitos Primeiro o mútuo consentimento vale dizer a convergência de vontade dos dois cônjuges no sentido de que o melhor para eles e para a família é o afastamento mediante a dissolução do vínculo conjugal Havendo filhos menores ou incapazes essa vontade deve ser manifestada perante o juiz que pela lei processual deve ouvir cada um dos cônjuges em separado e em seguida o casal Assim como a vontade para casar a de separar deve ser livre e espontânea O juiz deve ficar convencido de que nenhum dos consortes está sendo obrigado por ameaça física ou meios morais a se divorciar Havendo a menor dúvida a respeito da liberdade e espontaneidade da declaração a homologação judicial não pode ser concedida Se o casal não tiver filhos menores ou incapazes o mútuo consentimento pode ser expresso perante o notário que o registrará em escritura pública Também nesse caso deve ser livre e espontânea a vontade de pôr fim à sociedade conjugal devendo o escrivão recusarse a lavrar o ato se tiver razões para crer que este requisito não está atendido Segundo o atendimento à formalidade legal que pode ser a escritura pública se não houver filhos menores ou incapazes ou a sentença judicial Em qualquer caso uma ou outra formalidade é indispensável ao registro do divórcio no Registro Civil Não é requisito do divórcio nem mesmo do amigável o transcurso de qualquer prazo mínimo do casamento Mesmo sendo inevitáveis os ajustes a que estão jungidos os casados no começo de qualquer relacionamento matrimonial em função dos quais se manifestam dissentimentos e ressentimentos a disciplina constitucional da dissolução do vínculo não a condicionou a nenhum lapso temporal Transcorrido o tempo que for dias semanas meses considera a Constituição a partir de julho de 2010 que cada cônjuge é suficientemente capaz de saber se o amadurecimento de sua percepção acerca da experiência que está vivenciando lhe permite formular a vontade de nela não prosseguir O divórcio amigável processase por declaração convergente dos cônjuges manifestada perante o juiz ou se não tiverem filhos menores ou incapazes por escritura pública independentemente do tempo de duração do casamento A menos que haja no acordo de divórcio cláusula prejudicial aos interesses de um dos cônjuges ou dos filhos o juiz deve homologálo A outra espécie de divórcio é o litigioso O divórcio é litigioso em primeiro lugar quando um dos dois não quer terminar o casamento Não é necessário que o autor impute ao réu na ação de divórcio o descumprimento de qualquer dever matrimonial basta que manifeste sua vontade de se divorciar Evidentemente se houve descumprimento e o autor da ação de divórcio quer a condenação do outro cônjuge pode fundamentar o pedido neste fato mas é dispensável alegar ou provar qualquer fato além da mera vontade de pôr fim ao vínculo matrimonial Reconhecida a culpa de um dos cônjuges na ação de divórcio a ele são impostas três sanções A primeira tem natureza processual Falo da condenação nas verbas de sucumbência do processo tais como os honorários do advogado do outro cônjuge e as custas judiciais É a única punição que sempre sofrerá o cônjuge culpado independentemente de qualquer circunstância Muitas vezes o litígio se prolonga apenas em função da mesquinharia das duas partes relativamente ao pagamento dessas verbas A segunda sanção derivada do reconhecimento judicial da culpa pelo fim do vínculo conjugal aplicase apenas se o culpado tiver adotado o sobrenome do outro cônjuge ao se casar De modo geral se o consorte inocente requerer a mudança e ela não trouxer prejuízos aos interesses do culpado este último perderá o direito de conservar o nome de casado Por evidente se nenhum dos cônjuges mudou seu nome ao contrair núpcias a imputação de culpa pela separação a qualquer um deles não terá nenhuma implicação item 5 Por fim a derradeira sanção está ligada aos alimentos O cônjuge condenado pelo fim do casamento se não dispuser de recursos para se manter terá direito somente aos alimentos mínimos isto é unicamente os indispensáveis à subsistência Tendo contudo ambos os cônjuges renda suficiente para manter uma vida de bom padrão será indiferente se a dissolução da sociedade conjugal deveuse à culpa de um deles Cap 61 subitem 14 Pode ser litigioso também o divórcio no caso em que os cônjuges concordam em dissolver o vínculo matrimonial mas não conseguem alcançar acordo completo relativamente a bens filhos e nome Exemplos a mulher quer a guarda unilateral dos filhos mas o marido deseja a compartilhada ou os dois disputam quem vai ficar com a casa da praia ou ainda ele quer que ela deixe de usar o seu sobrenome mas ela resiste Aqui o processo judicial de divórcio terá por objeto a superação do conflito de interesses sobre a questão ou as questões não acordadas O divórcio é litigioso em dois casos se um dos cônjuges não tem vontade de se divorciar ou se não há acordo completo sobre as questões envolvidas no fim do casamento filhos menores nome e bens No primeiro abremse ao autor da ação duas alternativas alegar apenas sua simples vontade de se divorciar ou imputar ao outro cônjuge a culpa pelo fim do casamento Nesta última se realmente restar provado que um dos cônjuges foi culpado pelo divórcio ele expõese às seguintes sanções pagamento da sucumbência perda do direito de usar o nome de casado e direito apenas aos alimentos mínimos Na maioria das vezes o divórcio que começa litigioso termina amigável O desgaste emocional é muito grande porque mesmo se alegando a mera vontade de descasar pode vir à tona discussão sobre detalhes negativos da vida íntima do casal No meio do caminho as partes exauridas acabam se entendendo muito em função dos aconselhamentos do juiz e dos advogados Percebem ser mais saudável a todos o acordo tendo em vista que a sobrevivência do casamento depois de um deles ter entrado com a ação judicial pleiteando seu fim está irremediavelmente comprometida 22 Formas do divórcio Ainda que todo divórcio litigioso seja judicial nem todo divórcio judicial é necessariamente litigioso Por vezes os cônjuges estão de acordo sobre todas as questões pertinentes ao fim do casamento mas ainda assim só podem se divorciar em juízo por meio de ação de divórcio amigável A lei só autoriza o divórcio amigável extrajudicial feito mediante escritura pública no caso de não existirem filhos menores ou incapazes e estarem os cônjuges assistidos por advogado ou defensor público ainda que comum CPC art 733 Mesmo assim convém anotar que se trata de uma opção dos cônjuges Independentemente dos motivos mesmo podendo se divorciar extrajudicialmente eles têm o direito de pleitear a desconstituição do vínculo matrimonial em juízo O divórcio judicial pode ser proposto a pedido dos cônjuges se amigável de um deles somente se litigioso ou do curador ascendente ou irmão do cônjuge incapaz CC art 1582 Sendo obrigatório o divórcio judicial ou tendo os interessados optado por esta via o juiz se considerar que o acordo de separação não preserva suficientemente os interesses dos filhos menores ou de um dos cônjuges pode denegar a homologação Imagine que o acordo estabeleça a completa desoneração de um dos cônjuges do encargo de sustentar a prole comum Essa cláusula pode ter sido forçada pelo consorte exonerado como condição para consentir com a separação amigável Havendo elementos que indiquem o despropósito da composição os dois têm rendimentos semelhantes ou o que ganha mais é o dispensado de contribuição o juiz não só pode como até mesmo deve indeferir a homologação para evitar que do casamento um dos cônjuges saia prejudicado Ele tem contudo o dever de fundamentar especificamente a denegação consignando na sentença qual ou quais pontos do acordo de divórcio considera inapropriados Desse modo os cônjuges podem alterálo visando obter a homologação judicial No divórcio judicial amigável não pode o juiz alterar o conteúdo do acordo a que chegaram os cônjuges Ou simplesmente o homologa ou denega a homologação explicitando por que tem determinadas cláusulas por indevidas O divórcio pode ser amigável ou litigioso Será amigável se os cônjuges concordam quanto ao fim do vínculo à guarda de filhos menores e ao nome a partilha de bens pode ser postergada Se não concordarem com pelo menos um destes pontos o divórcio será litigioso De outro lado o divórcio pode ser judicial ou extrajudicial Sendo amigável só poderá ser extrajudicial se o casal não tiver filhos menores ou incapazes Havendo ou sendo o caso de litígio o divórcio deve ser feito por ação judicial Antes da ação de divórcio pode ser intentada a separação judicial de corpos normalmente com pleito de medida liminar Tratase de medida cautelar cada vez mais rara destinada a formalizar a inexistência de culpa do consorte que deixou o lar Se um dos cônjuges por exemplo é vítima de maustratos infligidos pelo outro precisa protegerse afastandose fisicamente do domicílio conjugal mas não quer correr o risco de ser considerado o culpado pela separação para não perder o direito aos alimentos compatíveis com sua condição social ou ao uso do nome de casado a medida de separação de corpos preserva seus interesses Não sendo essa a situação dispensa se a ação cautelar porque como visto o fim da coabitação não importa necessariamente o abandono do lar 3 A guarda dos filhos As relações familiares horizontal e vertical são independentes Uma não interfere ou melhor não pode interferir na outra Se deixa de existir entre o pai e a mãe a relação de conjugalidade horizontal isso em nada afeta o vínculo de ascendência e descendência que os liga aos filhos vertical O fim da sociedade ou do vínculo conjugal portanto não implica nenhuma alteração nos deveres e direitos que os pais têm em relação aos filhos A lei o afirma de modo explícito relativamente ao divórcio CC art 1579 mas também em outros casos de dissolução da sociedade conjugal assim a viuvez e a invalidação do casamento a regra é igual Tampouco o novo casamento do pai ou da mãe pode interferir nos deveres e direitos que têm em relação à filiação Ademais quem casa com alguém que tem filho deve recebêlo e tratálo como se fosse seu E quem tem filhos de casamento anterior ao contrair novas núpcias pode exigir do consorte que devote a eles a mesma atenção e cuidados esperados de um pai ou de uma mãe A maior preocupação do casal do juiz e da própria sociedade quando o vínculo conjugal se desfaz voltase para os filhos menores Eles são os emocionalmente mais vulneráveis aos percalços do processo de divórcio Envoltos pelas dificuldades inerentes à superação do complexo de Édipo meninos e meninas fantasiam muitas vezes que têm a inteira culpa pelo desfazimento do vínculo matrimonial dos pais Por instinto natural por outro lado têm a percepção de que dependem do amparo paterno e materno para o seu desenvolvimento e temem acerca de seu próprio bemestar Ficam inseguros com o divórcio e mais que nunca precisam de atenção e consideração Para bem cumprir suas obrigações de pais os que se divorciam devem ser sensíveis ao extremo com as nuanças da situação a que a dissolução da sociedade conjugal leva os seus filhos menores Mesmo se são já adolescentes a sensibilidade dos pais não pode ser menor O divórcio costuma ser estressante para toda a família Na ordem positiva a preocupação com a pessoa dos filhos menores extensiva aos maiores incapazes CC art 1590 diz respeito fundamentalmente com a guarda Tratase de um direito titulado pelos pais associado a um complexo de deveres um poderdever O titular da guarda fica com o filho sob seus cuidados diretos convive com ele acompanhalhe o crescimento ajuda nos desafios do cotidiano isso tudo não se consegue definir exatamente se é encargo ou gratificação 31 Espécies de guarda A guarda uma das manifestações do poder familiar CC art 1634 II pode ser unilateral ou compartilhada art 1583 Na guarda unilateral antigamente denominada partilhada o filho fica com um dos pais enquanto ao outro se concede o direito de visitas CC art 1589 e o dever de supervisionar os interesses do filho art 1583 5º Nessa espécie o filho mora com o ascendente titular da guarda que tem o dever de administrarlhe a vida cotidiana levandoo à escola ao médico e às atividades sociais providenciando alimentação e vestuário Ao outro cabe conviver com o filho em períodos de duração variada algumas horas ou dias previamente estabelecidos de comum acordo com o titular da guarda Nessas oportunidades chamadas legalmente de visitas o ascendente que não tem a guarda pega o filho em casa levao a passeios ou eventos familiares temno em sua convivência e o devolve no horário aprazado Durante a visita o pai ou a mãe que não titula a guarda responde pela saúde física e mental e bemestar do menor Notase que o direito de visita tem sido reconhecido também a outros parentes assim os avós e tios e até mesmo a quem a despeito da inexistência de qualquer vínculo familiar com os pais ou filhos nutre com esses uma intensa relação de afeto como os padrinhos e madrinhas Bittencourt 2003208214 No divórcio em que a guarda é unilateral cabe também definir portanto os momentos em que os demais titulares do direito de visita poderão conviver com os filhos menores dos divorciandos A hipótese usual é a de disciplina do direito de visita dos avós paternos quando a guarda fica com a mãe ou dos maternos se ela fica com o pai A atribuição da guarda a um dos genitores em nada altera a extensão do poder familiar no que diz respeito aos demais direitos e deveres Mesmo o pai ou a mãe que não titula a guarda continua a participar do poder familiar Se o filho não vai bem na escola a responsabilidade por encaminhar uma solução não cabe exclusivamente ao titular da guarda mas a ambos os pais Se o menor precisa de aconselhamento cuidados médicos diversão ou atenção e carinho não se pode omitir o pai ou a mãe que não titula a guarda sob pretexto de dela estar excluído Na guarda compartilhada ou conjunta os dois pais continuam a titularizála mesmo após o desfazimento da sociedade conjugal Nessa alternativa o filho tem duas residências uma com o pai outra com a mãe Nenhum deles tem propriamente direito de visitas mas para o bemestar do menor é indispensável que seja combinado de antemão os momentos de convivência com cada um dos ascendentes Quanto maior a criança ou adolescente mais apropriada se mostra essa espécie de guarda Sua eficiência contudo depende de elevado grau de cooperação entre os pais divorciados de sua maturidade em colocar os interesses do filho acima dos deles cf Leite 1997257286 Tepedino 2004309 A espécie de guarda a ser adotada se unilateral ou compartilhada deve ser objeto de acordo entre os pais Não alcançado acordo o juiz deve determinar o compartilhamento a menos que um dos genitores não esteja apto ao exercício do poder familiar ou declare não querer a guarda do filho A guarda dos filhos menores e dos maiores incapazes pode ser unilateral ou compartilhada Na guarda unilateral um dos pais a titula ficando o outro com o direito de visitas Na guarda compartilhada os dois genitores continuam a titularizála mesmo depois da dissolução do vínculo conjugal Deve ser adotada sempre que possível a guarda compartilhada se os genitores não chegarem a acordo sobre o tema exceto se um deles não estiver apto para o exercício do poder familiar ou declare não querer a guarda do filho Além da guarda unilateral e da compartilhada previstas em lei devese fazer menção também à guarda alternada que corresponde à atribuição periódica da guarda a cada pai Neste semestre ou ano por exemplo o filho fica com a mãe e o pai tem o direito de visita no próximo invertese e ele fica com o pai e a mãe o visita nos horários e dias previamente definidos Esta espécie de guarda nem sempre se tem revelado uma alternativa adequada para o menor cuja vida fica cercada de instabilidade Não convém seja adotada a não ser em casos excepcionais em que por exemplo os pais residem em cidades distantes ou mesmo em diferentes países No divórcio consensual a guarda dos filhos menores é uma das cláusulas do acordo a que chegam os cônjuges Neste caso como visto o divórcio é necessariamente judicial O juiz deve verificar se a composição feita pelo casal corresponde à melhor para a criança ou adolescente Se considerar que ela não é recomendável naquele caso em particular ou teria resultado de pressão indevida de um dos cônjuges sobre o outro não deve homologar o acordo Estando contudo suficientemente preservados os direitos dos filhos e cônjuges prevalecerá a vontade convergente desses últimos expressa no acordo de divórcio Se litigam os cônjuges sobre a guarda e não se mostra viável o compartilhamento o juiz deve atribuíla àquele que revelar ter melhores condições para o seu exercício CC art 1584 II Se perceber por exemplo que o pai é muito mais maduro que a mãe que ele revela estar mais preocupado com os filhos do que ela o juiz deve darlhe a guarda em disputa notando ao revés ter sido a mãe o mais presente dos cônjuges na vida dos filhos até então que os conhece muito mais do que o pai convém atribuir a guarda a ela Não havendo porém nenhuma diferença acentuada entre os pais mostrandose ambos igualmente aptos a exercer a guarda e nenhum deles a recusando deve o juiz como visto concedêla aos dois conjuntamente Em qualquer caso o juiz pode ouvir o menor para conhecer sua vontade antes de decidir sobre a questão da guarda A concepção que por muito tempo vagou pelos feitos de separação e divórcio de que a mãe estaria naturalmente inclinada a exercer melhor a guarda dos filhos do que o pai é puro machismo Não existe essa inclinação natural Sua difusão atendia mais à necessidade de explicar o confortável distanciamento dos pais como uma exigência da natureza humana do que aos interesses dos filhos Homens e mulheres estão igualmente aptos a cuidar da descendência Apenas nos primeiros meses de vida do filho enquanto é amamentado pode se cogitar da maior importância da presença materna Na espécie humana em vista do atual estágio de evolução uma vez desmamado o rebento qualquer um dos ascendentes pode cuidar dele de modo satisfatório O melhor evidentemente é que o menor tenha os cuidados tanto do pai como da mãe estejam casados ou não A necessidade psicológica de ter pai e mãe o filho atenderá como a espécie tem atendido desde tempos imemoriais substituindo o ausente por alguém próximo que lhe faça as vezes marido da mãe ou esposa do pai avô ou avó tio ou tia irmã ou irmão mais velho etc Das necessidades morais materiais físicas educacionais e sociais contudo o pai ou a mãe pode sozinho dar conta O cônjuge que ficar com a guarda unilateral ou compartilhadamente pode perdêla a qualquer momento se comprovado que a convivência é perniciosa à formação do menor Por essa mesma razão o juiz pode transformar a guarda conjunta em individual deferindoa por óbvio ao outro cônjuge Não é motivo para a perda da guarda o novo casamento do pai ou da mãe que a titula CC art 1588 Em casos excepcionalíssimos constatando o juiz que nem pai nem mãe estão em condições de titular a guarda poderá deferila a família substituta CC art 1584 5º ECA arts 28 a 32 32 Alienação parental Um dos deveres do pai ou da mãe divorciados é o de contribuir para a preservação da imagem um do outro na consciência do filho Por mais penoso que possa ser em razão das queixas justas ou não nutridas em relação ao excônjuge não pode o pai ou a mãe contaminar com os seus os sentimentos do filho relativamente aos seus genitores É imprescindível ao adequado amadurecimento psicológico da criança e do adolescente uma sadia e afetuosa relação com seus dois pais O que aconteceu na relação horizontal por mais grave ou doloroso que seja não deve contaminar a relação vertical O pai ou mãe que atua visando minar ou prejudicar a relação do filho com o outro genitor incorre na conduta qualificada juridicamente como alienação parental Definea a lei como a interferência na formação psicológica da criação ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores para que repudie o outro genitor ou que cause ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este Lei n 1231810 art 2º O ato de alienação parental pode ser praticado também por avós ou por quem tenha a criança ou o adolescente sob a sua autoridade guarda ou vigilância como tutor curador outros parentes e mesmo amigos ou empregados de um dos genitores São hipóteses de alienação parental exemplificadas pela lei a desqualificação contínua e permanente da conduta do outro genitor relativamente aos seus atos como pai ou mãe b embaraço ao exercício da autoridade parental pelo outro genitor c imposição de dificuldades ao contato entre a criança ou adolescente e o outro genitor d cerceamento do exercício de direito de convivência familiar e deliberada omissão de informações relevantes sobre o filho como as relativas ao desempenho escolar saúde ou mesmo alteração de endereço de moradia f imputar falsa afirmação denúncia ao outro genitor ou seus familiares para obstar ou dificultar a convivência deles com o filho g mudar injustificadamente o domicílio para lugar distante com o objetivo de afastar o filho da convivência com o outro genitor e os familiares destes art 2º parágrafo único A coibição à alienação parental é feita primacialmente no interesse da criança ou adolescente para garantia de seu direito fundamental à convivência saudável com seus genitores e respectivas famílias grupos familiares Cabe ao genitor alienado contudo exercer os direitos titulados por seu filho contra o alienador Alienação parental é a interferência promovida ou induzida por um dos genitores alienador na formação psicológica da criança ou do adolescente destinada prejudicar o estabelecimento ou a manutenção de vínculos com o outro genitor alienado ou mesmo o repúdio a este Caracterizase também quando o ato é praticado por tutor curador familiares de um dos genitores ou qualquer pessoa que tenha a criança ou adolescente sob sua guarda vigilância ou autoridade incluindo empregados ou amigos As sanções ao alienador são conforme a gravidade do caso i advertência ii ampliação do regime de convivência familiar em favor do genitor alienado iii multa iv acompanhamento psicológico ou biopsicossocial v alteração da guarda para compartilhada ou sua inversão vi fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente vii suspensão da autoridade parental art 6º No caso de mudança abusiva de endereço pode também ser aplicada a sanção consistente na imposição ao alienador do dever de levar ou apanhar a criança ou adolescente nas alternâncias dos períodos de convivência com o genitor alienado caso já não fosse dele o dever art 6º parágrafo único 4 Partilha de bens Termina o regime de bens do casamento qualquer que seja ele no momento da cessação da vida em comum Quando tem início a separação de fato do casal deixa de existir a conjugação de esforços que justifica a comunhão familiar Não é portanto a decretação judicial do divórcio ou a homologação da partilha que determina o fim do regime de bens Gonçalves 2005393 A jurisprudência reconhece nesse contexto que sobre os bens adquiridos por pessoa separada de fato não cabe ao outro cônjuge nenhuma meação principalmente se o adquirente contou com a contribuição do esforço do companheiro ou companheira com quem passou a conviver numa união estável ColtroTeixeiraMafra 2005418420 Em outros termos os bens que cada cônjuge adquire a partir da separação de fato do casal não se comunicam porque os efeitos do regime de comunhão universal ou parcial bem assim o da participação final nos aquestos deixam de se projetar Não há mais como pretender que separado de fato o outro cônjuge continue a colaborar de modo direto ou indireto para o acréscimo patrimonial Com a separação de fato ademais os bens comunicados passam a ser administrados em condomínio pelos cônjuges cf Cahali 1978144 Cessa assim a incidência das normas de comunhão do direito de família e passam a incidir as do condomínio geral do direito das coisas CC arts 1314 a 1326 Em geral no divórcio judicial a partilha dos bens é feita mediante proposta dos cônjuges e homologação do juiz Se os cônjuges não conseguem formular qualquer proposta por não terem chegado a completo acordo sobre o tema o juiz decide o conflito de interesses dividindo os bens ou determinando sua venda para repartição do dinheiro Assim no divórcio amigável os cônjuges normalmente submetem ao juiz junto com o pedido de dissolução do vínculo o plano de partilha dos bens comuns Tratase de uma das cláusulas do acordo de divórcio que se não contiver nenhuma estipulação contrária aos interesses dos cônjuges ou dos filhos será judicialmente homologada Já no divórcio litigioso em divergindo as partes sobre a questão patrimonial cada uma aduz suas pretensões e o juiz ao sentenciar decide como será feita a partilha dos bens Se o casal não tiver filhos menores ou incapazes e optar pelo divórcio mediante escritura pública a partilha dos bens será em princípio uma das cláusulas desse instrumento CPC art 733 Quando judicial o divórcio pode ser concedido independentemente de partilha dos bens comuns ou de alguns deles Mesmo se litigioso a pedido de ambos os litigantes podese postergar a divisão de um ou de todos os bens comuns Do mesmo modo formalizado por escritura pública o divórcio amigável pode ser feito independentemente de partilha dos bens comuns ou de parte deles se assim for interessante aos excônjuges A lei é clara ao admitir a concessão do divórcio independentemente da partilha CC art 1581 exigindo apenas como já mencionado a adoção do regime da separação absoluta em eventual novo casamento dos divorciados enquanto ela não for homologada em juízo art 1523 III A partilha que pode ser feita como se nota muitos anos depois do fim da sociedade e do vínculo conjugais deve retratar sempre a situação patrimonial dos consortes na data em que teve início a separação de fato ou seja do fim da colaboração ao aumento do patrimônio de cada cônjuge que a vida conjugal pode proporcionar Os bens comuns do casal devem ser partilhados de acordo com a situação patrimonial dos cônjuges na data em que teve fim a colaboração da vida conjugal para o incremento dos seus patrimônios isto é a da separação de fato Observarseá na partilha o regime de bens adotado para o casamento desfeito dividindose os que por força dele se comunicaram do patrimônio de qualquer um dos cônjuges para o do outro Cap 57 5 O nome dos cônjuges Como visto anteriormente um dos efeitos do casamento é a possível adoção pelos dois cônjuges ou por um deles somente do sobrenome do outro consorte Cap 56 item 5 Quando não se altera o nome com o casamento o fim da sociedade e do vínculo conjugal não acarreta nenhuma implicação relativamente à identificação dos cônjuges Eles simplesmente continuam a adotar o nome que sempre tiveram O divórcio tampouco abre a oportunidade de mudança do nome nesse caso Tendo havido porém com o casamento a alteração do nome de pelo menos um cônjuge a dissolução da sociedade conjugal pode levar a nova mudança com a volta ao nome usado anteriormente O retorno ao nome anterior pode ser obrigatório ou voluntário No primeiro modo decorre da perda do direito ao uso do sobrenome tomado do outro no segundo de livre opção do cônjuge O retorno é sempre integral Não se admite que o cônjuge divorciado conserve parte do sobrenome tomado de empréstimo A alternativa de que dispõe é apenas a de continuar usando o nome de casado ou reassumir exatamente o que tinha antes daquele casamento Ou seja se era solteiro o patronímico de família tal como composto pelos seus pais no registro de nascimento se viúvo ou divorciado o sobrenome que possuía antes de contrair as novas núpcias Retorno obrigatório ao nome anterior No divórcio litigioso são duas as condições para a condenação da perda do nome de casado por um dos cônjuges A primeira diz respeito à iniciativa do cônjuge inocente portador originário do sobrenome em disputa Sem o pedido expresso dele no sentido de o juiz impor ao outro consorte a específica sanção da perda do direito ao uso do sobrenome formulado desde logo na petição inicial da ação ou reconvenção não há como o culpado ser obrigado contra sua vontade a voltar a usar seu nome anterior A segunda condição para a aplicação da pena de perda do nome de casado relacionase com a inexistência de prejuízo para o cônjuge culpado A despeito de sua culpa conservará ele o direito de manter o nome de casado se a alteração lhe trouxer prejuízo à identificação Assim se o cônjuge culpado ficou conhecido em seu meio profissional pelo nome de casado não há base legal para imposição da pena de perdimento do direito de continuar a usálo Afamada atriz escritora consultora financeira ou qualquer outra mulher que tenha construído sua imagem de profissional competente associada ao nome composto pelo patronímico do marido titula o direito de querendo continuar a adotálo ainda que tenha sido a única culpada pelo divórcio Cabe também considerar a situação do cônjuge cujo sobrenome ficará muito diferente do dos filhos se acaso tiver de alterálo É a hipótese em que se admite a substituição do sobrenome da família originária pelo do cônjuge Se retornar aquele que alterou o nome a usar o que possuía antes do casamento claramente haverá manifesta distinção com o sobrenome dos filhos Também aqui mesmo o excônjuge culpado titula o direito de conservar o nome de casado Por fim há a hipótese de grave dano que poderia advir do retorno ao nome usado antes do casamento Imagine que pessoa com nome muito comum ao se casar e acrescer ao seu o sobrenome do cônjuge consegue finalmente livrarse dos incômodos da homonímia Obrigála a retornar ao nome anterior implicaria expôla aos percalços que os homônimos normalmente enfrentam tanto no âmbito civil na hora da obtenção de crédito locação de imóvel e prática dos atos em geral como até mesmo no criminal em que por vezes têm de provar não ser o criminoso procurado pela polícia Tanto no da homonímia como em qualquer outro caso de dano grave derivado do retorno ao nome usado antes do casamento desfeito o cônjuge titula o direito de conservar o de casado mesmo que tenha sido o único culpado pelo divórcio O cônjuge que mudou o nome com o casamento é livre para retornar ao anterior ou manter o de casado Se porém tiver sido o culpado pelo divórcio poderá perder o direito de usar o sobrenome do cônjuge inocente a pedido deste a menos que a alteração lhe traga prejuízos ou importe manifesta distinção com o sobrenome dos filhos Retorno facultativo ao nome anterior O cônjuge sempre tem o direito de retornar ao nome que adotava anteriormente ao casamento Tenha sido culpado ou inocente no divórcio tenha este sido litigioso ou amigável a alternativa de descartar o sobrenome do consorte de quem agora se está desligando ficará sempre ao alcance daquele que ao contrair o matrimônio considerou pertinente transformar o nome pelo qual se identificava Afora a hipótese de retorno obrigatório é invariavelmente da exclusiva alçada do cônjuge interessado decidir se conserva o nome de casado ou se volta a adotar o que tinha antes do casamento O titular do sobrenome tomado de empréstimo não pode oporse à decisão tomada pelo outro cônjuge qualquer que seja ela Se o marido acresceu ao seu um dos sobrenomes da mulher e no divórcio amigável manifesta a intenção de continuar a usálo são irrelevantes os motivos que a determinam A esposa não pode impedilo de permanecer com o nome de casado Do mesmo modo se a mulher havia agregado ao seu nome o patronímico do marido e tem o firme propósito de extirpálo de sua identificação não há meio de esse último forçála a continuar o uso A decisão de retorno ao nome anterior não precisa ser igual para os dois cônjuges Se ambos misturaram os respectivos sobrenomes ao se casarem pode cada um no divórcio optar pela solução de que mais goste Não é porque um decidiu voltar ao nome anterior que o outro também deverá fazêlo O cônjuge não será nunca obrigado a manter o nome de casado nem mesmo se o retorno ao anterior patronímico acarretar distinção manifesta com o sobrenome dos filhos ou puder de algum modo prejudicálo A cada qual compete sopesar e identificar livremente e segundo seus próprios e exclusivos critérios as vantagens e desvantagens das opções que tem à frente O momento apropriado para a definição quanto ao nome é em princípio o do divórcio Quando é amigável a manutenção ou retorno do nome deve constar de uma das cláusulas do acordo Omisso esse entendese que os cônjuges optaram por voltar a usar seus nomes anteriores A omissão no acordo de divórcio corresponde ao não exercício do direito de conservação do nome de casado Em outros termos presumese que os consortes decidiram retornar ao nome anterior ao do casamento porque não exerceram explicitamente a opção de conservar o de casado Gonçalves 2005236 Em se tratando do exercício da faculdade pelo cônjuge inocente no divórcio litigioso sua decisão poderá ser adotada a qualquer tempo Vindo a se casar de novo ou simplesmente querendo no futuro apagar todas as pistas da relação matrimonial desfeita poderá renunciar ao sobrenome que havia emprestado do antigo cônjuge 6 A separação Devemos considerar três situações distintas advindas da promulgação da EC n 662010 que eliminou a separação judicial ou de fato durante certo lapso de tempo como condições do divórcio Primeira a emenda suprimiu a vigência dos dispositivos do Código Civil que dispunham sobre a separação e se tornaram incompatíveis com a nova redação do 6º do art 226 da Constituição Deste modo não vigoram mais desde julho de 2010 em razão da superveniente incompatibilidade com norma hierarquicamente superior o inciso III do art 1571 e os arts 1572 a 1576 e 1578 a 1580 do Código Civil Segunda há disposições legais compatíveis com a inovação introduzida pela emenda e que se referem aos separados disciplinando certos direitos ou relações Estas normas permanecem em vigor como transitórias aplicadas enquanto houver pessoas no estado civil de separados que não se divorciaram O art 1577 é exemplo de preceito que permanece em vigor apenas como norma de transição ao permitir aos separados não divorciados a reconciliação subitem 63 Terceira continuam a vigorar os dispositivos legais que falam da figura da separação e que embora não sejam incompatíveis com a nova redação do 6º do art 226 da Constituição não são mais suscetíveis de ter aplicação desde julho de 2010 em razão de seu conteúdo sobre o término de sociedade conjugal Em relação a estes cabe se for o caso aplicarse à hipótese do divórcio É o que se verifica por exemplo com os dispositivos do Código Civil pertinentes ao valor dos alimentos cujo critério de fixação varia segundo a existência ou não de culpa do alimentado pelo rompimento Cap 61 subitem 14 Contudo não tem sido unânime o entendimento entre doutrinadores e magistrados sobre o alcance da EC n 662010 Entendem alguns que enquanto não houver a revogação expressa dos dispositivos do Código Civil sobre o instituto ou sua adequação redacional permanecem eles plenamente vigentes como regra de aplicação geral Uma das consequências deste entendimento aponta para a continuação da existência da separação como fase prévia da desconstituição do vínculo matrimonial salvo quando houver separação de fato superior a dois anos A resistência de certa doutrina e das decisões judiciais que a ecoam à afirmação da inconstitucionalidade superveniente dos dispositivos do Código Civil sobre a separação como etapa precedente ao divórcio não se justifica tecnicamente É certo que antes mesmo da Emenda n 662010 para alguns tecnólogos a sistemática constitucional e legal então existente destinavase a atender os escrúpulos das pessoas que não aceitavam o divórcio vincular que põe fim ao vínculo do casamento por motivos religiosos O estado civil de separado na lei brasileira procuraria amparar a crença dessas pessoas Cahali 197849 Mas se tivesse realmente a ordem jurídica tal desiderato a separação não seria uma etapa do processo de desfazimento de todos os efeitos do casamento mas uma alternativa ao divórcio Facultarseia aos que não creem na dissolubilidade do vínculo matrimonial o estado excepcional de separados Como não existe nem existiu na lei essa imaginada alternativa somente se pode compreender a resistência no contexto dos resquícios das ambiguidades que o direito brasileiro nutria ao tratar das questões afetas ao fim do casamento A exemplo do divórcio a separação pode ser amigável ou litigiosa No primeiro caso os dois cônjuges requerem em conjunto ao juiz que decrete o desfazimento da sociedade conjugal subitem 61 O vínculo conjugal somente se desfaz quando passado algum tempo podem os cônjuges se divorciar No segundo um deles imputa ao outro a culpa ou pelo menos a responsabilidade pelo fim do matrimônio subitem 62 Com a separação judicial cessam os deveres de coabitação e fidelidade recíproca A inexistência de coabitação não significa necessariamente abandono do lar subitem 622 Quer dizer a separação de fato rompe inevitavelmente a coabitação mas isso nem sempre corresponde ao descumprimento de dever conjugal Quanto à fidelidade o direito estaria obrigando a uma castidade antinatural no dizer da doutrina Pereira 1972184185 se continuasse a exigila dos que se separaram de fato mas ainda não de direito 61 Separação amigável Até 2007 qualquer que fosse a espécie a separação era sempre um processo judicial Mesmo quando não havia nenhum desentendimento entre os consortes acerca da oportunidade de pôr fim ao casamento e da adequada composição dos interesses relacionados a essa decisão a intervenção do Poder Judiciário era imprescindível Em outros países como no Japão a lei há tempos admitia o divórcio consensual derivado de simples declaração dos dois cônjuges perante o Registro Civil independentemente de processo judicial Lá 90 dos divórcios são consensuais Mizuno 2001854857 A judicialização do desfazimento da sociedade conjugal um pouco em razão da ambiguidade no trato do tema que caracterizou o direito brasileiro de família até julho de 2010 servia como mais um fator de desencorajamento da separação O legislador parecia continuar acreditando que o melhor para a família era invariavelmente o casamento eternizado ainda que se revelasse diminuta ou nenhuma a felicidade dos cônjuges ou de um deles A partir de 2007 a lei processual passou a admitir a separação consensual mediante simples escritura pública desde que o casal não tivesse filhos menores ou incapazes e estivesse assistido por advogados comuns ou não Assim estando os cônjuges de acordo em relação ao término da sociedade conjugal o processo judicial só não seria dispensável se houvesse filhos não capazes 62 Separação litigiosa Na separação litigiosa o cônjuge autor deve imputar ao réu a culpa ou pelo menos a responsabilidade pelo fim da sociedade conjugal Assume em decorrência o ônus de provar o grave descumprimento pelo outro de um dos deveres do casamento fidelidade respeito mútuo coabitação no domicílio conjugal etc e a decorrente insuportabilidade da vida em comum Não prevê a lei o direito de o cônjuge se separar sem fazer tal imputação por mais doloroso e por vezes injusto que isso pudesse ser A experiência de vida revela que salvo nas situações de agressão física não há vítimas no casamento A responsabilidade pela deterioração do relacionamento conjugal é em geral dos dois marido e mulher Mas isso a lei quer ver ignorado na separação litigiosa Em outros termos se o cônjuge autor fundamenta o pedido no fato de ter simplesmente deixado de amar o réu ressalvando com sinceridade que nenhum deles poderia ser considerado culpado pelo fim do casamento corre o risco em vista da estreiteza dos ditames legais de ver o pedido negado pelo juiz Como dito acima em tese teria que continuar casado e infeliz até que a degradação do relacionamento fizesse brotar um dos motivos então indicados na lei para a separação litigiosa ou pôr fim de fato ao casamento ficando um ano nessa situação de desconformidade entre o formal e o real Na separação litigiosa o cônjuge que propõe a demanda deve provar que o demandado descumpriu gravemente um dever do casamento tornando insuportável a vida em comum separaçãosanção que esta se rompeu há pelo menos um ano não havendo por que se reconstituir separaçãoruptura ou este último está acometido de doença mental grave e provavelmente incurável há dois anos separaçãoremédio A doutrina classifica a separação litigiosa em sanção ruptura ou falência e remédio Gonçalves 2005203 Tavares da Silva 20021373 Na primeira um dos cônjuges é declarado o culpado pelo término da sociedade conjugal sendolhe imputadas em decorrência algumas punições leves subitem 621 Nas demais embora não haja propriamente ninguém culpado pelo fim do interesse dos cônjuges em permanecer casados um deles resiste a anuir com a separação amigável Alguns fatos porém revelavam a impossibilidade de continuação da vida em comum como sua ruptura há mais de um ano ou manifestação de doença mental grave subitem 622 621 Separação com culpa Para obter a separação não amigável em princípio o cônjuge autor deve afirmar e provar que o réu incorreu em grave violação de dever conjugal em virtude da qual a vida em comum tornou se insuportável São pressupostos da separação nesse caso a gravidade do descumprimento de dever do casamento não bastando sua simples inobservância e a insuportabilidade da vida conjugal Dáse a lei ao trabalho de listar exemplos de fatos que podem ensejar a separaçãosanção adultério tentativa de morte sevícia ou injúria grave abandono voluntário do lar conjugal por um ano contínuo condenação por crime infamante e conduta desonrosa Nesses casos ou em qualquer outro que o juiz reputar grave violação de dever conjugal de que derive a insuportabilidade da vida em comum o cônjuge que nela incorrera considerase o culpado pela separação Tomese o exemplo da injúria grave conduta na qual se inclui o chamado quase adultério isto é a paquera beijo lascivo ou outros sinais quaisquer de interesse por relacionamento íntimo ou sexual extraconjugal Um dos cônjuges injuria gravemente o outro ao paquerar terceira pessoa Isso é suficiente para que o injuriado obtenha em juízo a declaração de culpa do injuriador pelo fim da sociedade conjugal Não é raro que o cônjuge demandado numa separação litigiosa apresente reconvenção isto é proponha no prazo da contestação sua própria ação de separação litigiosa procurando demonstrar que a culpa da falência do casamento não lhe cabe mas ao autor da demanda originária É na verdade em tudo irrelevante quem teria sido o primeiro a descumprir o dever conjugal Isso porque nenhum deles estaria autorizado a inadimplilos em razão do anterior inadimplemento pelo outro Mesmo vindo o marido a saber que sua mulher era adúltera não fica legalmente legitimado a também cometer o adultério No caso de reconvenção nenhum dos litigantes se desincumbindo do respectivo ônus de prova ou os dois o fazendo de modo igualmente satisfatório a separação deve ser decretada pelo juiz A possibilidade de sadia vida em comum de casais envolvidos em litígio de separação é visivelmente remota mormente na hipótese de recíproca imputação de culpa O cônjuge cujo comportamento caracteriza grave violação dos deveres do casamento e tornava insuportável a vida em comum é o culpado pela separação A tecnologia civilista considera anacrônica a noção de culpa de um dos cônjuges pelo fim da sociedade conjugal e questiona a pertinência de a lei continuar a tratar da hipótese por todos ColtroTeixeiraMafra 2005315320 622 Separação sem culpa Em duas hipóteses a separação litigiosa é desprovida de caráter sancionador Silva 200312931294 A primeira diz respeito à ruptura da vida comum há pelo menos um ano quando provada a impossibilidade de sua reconstituição a segunda à superveniência de doença mental a um dos cônjuges que torne impossível a vida em comum Nos dois casos como se verá exigese do cônjuge que requer a separação a prova da impossibilidade da vida em comum Também nas separações ruptura e remédio portanto se a convivência não era insuportável mas simplesmente sem graça ou infeliz a lei parece querer que os cônjuges continuem casados ou se reconciliem malgrado as circunstâncias revelem ser esta uma das piores soluções a considerar Ruptura da vida comum Não se deve confundir a separação em razão da ruptura da vida em comum há mais de um ano com a fundada no abandono voluntário do lar conjugal por igual período Este último fato é considerado pela lei exemplo de grave descumprimento de dever que torna insuportável a permanência da sociedade conjugal Entre as duas situações aqui enfocadas há aspectos semelhantes e diferentes No que se assemelham Na inexistência de coabitação Tanto no caso da ruptura da vida em comum como no do abandono os cônjuges não mais coabitam sob o mesmo teto Como se viu no entanto a coabitação não é dever conjugal prevendo a lei hipóteses em que o casamento dela prescinde No que se diferenciam então Exatamente no sentido que revestia a falta de coabitação A intenção do cônjuge que abandona o lar é a de se afastar de seus deveres conjugais em particular o relacionado à participação no sustento guarda e educação dos filhos No caso da ruptura da vida comum em nenhum momento o cônjuge deixa de cumprir suas obrigações relacionadas aos filhos Não há abandono do lar quando um dos cônjuges deixa de morar com o outro mas continua presente na família visitando os filhos com frequência provendolhes afeto atenção e recursos materiais E há abandono quando moram os cônjuges desde sempre em casas separadas como ocorre algumas vezes e um deles deixa de cumprir suas obrigações conjugais relativas aos filhos Desse modo se o cônjuge que deixou de morar no domicílio conjugal após um ano ingressa com o pedido de separação litigiosa e o outro apresenta reconvenção imputandolhe o descumprimento do dever conjugal ou viceversa as demandas são julgadas a partir do que restar provado relativamente ao comportamento do primeiro após a saída da habitação comum Se simplesmente não mandar notícias deixando ao outro cônjuge todas as responsabilidades de manutenção do lar claramente abandonouo Mas se ao longo do ano cumpriu os deveres de pai ou mãe a hipótese é de ruptura dos laços conjugais mas não de abandono do lar A distinção entre as duas formas de separação tem importância Se a final o juiz reconhece que houve abandono do lar condena o cônjuge que deixou há mais de um ano de residir no domicílio conjugal pelo fim do casamento imputandolhe as sanções cabíveis Mas acatando a tese da ruptura imputa a sucumbência ao cônjuge que tinha resistido à separação amigável independentemente de ter sido ele ou o outro quem fixara a residência em lugar diverso do domicílio conjugal Duas são as hipóteses de separação sem culpa Na primeira exigese a ruptura da vida comum há pelo menos um ano quando comprovada a impossibilidade de sua reconstrução separaçãoruptura A segunda pressupõe a superveniência de doença mental grave prolongada e provavelmente incurável que torna insuportável a vida em comum separaçãoremédio Superveniência de doença mental Para dar ensejo à separação remédio é necessário que um dos cônjuges tenha sido acometido de doença mental grave manifestada após o casamento Se antes da constituição do vínculo matrimonial a moléstia já havia dado seus sinais e mesmo assim o cônjuge são concordou em se casar não pode alegar esse motivo para pedir a separação em juízo Além de grave e superveniente a doença deve perdurar pelo prazo mínimo de dois anos Ademais a medicina deve considerar o mal provavelmente incurável Por fim é necessária a prova de que a doença mental grave superveniente prolongada e provavelmente sem cura tornou insuportável a vida em comum Apenas uma vez reunidos todos esses requisitos tem aplicação a norma legal que autoriza a separação litigiosa fundada na enfermidade mental do outro cônjuge Decretada a separação nessa hipótese aliás muitíssimo rara o cônjuge enfermo fica com os remanescentes dos bens que havia levado para o casamento sem prejuízo da meação se a ela fazia jus em razão do regime adotado Assim se o casamento havia sido celebrado em regime de comunhão universal o cônjuge são não tem direito à meação dos bens trazidos pelo enfermo ou do que tivera restado deles 63 Reconciliação Desfeita a sociedade conjugal pela separação ela pode ser restabelecida enquanto permanecer o vínculo conjugal isto é enquanto não for decretado o divórcio CC art 1577 Após a dissolução do vínculo conjugal não tem mais cabimento a reconstituição da sociedade Os divorciados se querem voltar a ser casados devemse casar como se solteiros fossem começando por requerer a habilitação no cartório do Registro Civil da circunscrição da residência de um deles A reconciliação cabe tanto na separação amigável como na litigiosa e independentemente da causa que tenha motivado esta última O restabelecimento da sociedade conjugal fazse por petição ao juiz nos autos da ação de separação em que ambos os cônjuges declaram a intenção de reconstruírem o casamento Se tiver elementos para duvidar da sinceridade da declaração o juiz poderá ouvir pessoalmente cada um dos cônjuges em separado Assim como no casamento a vontade para a reconciliação deve ser livre e espontânea Decretada pelo juiz a reconstituição da sociedade conjugal será a sentença averbada no Registro Civil Lei n 601573 art 101 A reconciliação assim formalizada importa o pleno restabelecimento do mesmo regime de bens que havia sido adotado no casamento A partilha se já tiver sido feita tornase ineficaz Se pretenderem os cônjuges alterar o regime devem promover o processo judicial específico Cap 57 item 5 Enquanto não se divorciam os separados podem restabelecer a sociedade conjugal mediante petição ao juiz nos autos da separação Não será de modo nenhum prejudicado qualquer direito de terceiros em função da reconciliação CC art 1577 parágrafo único Imagine que um dos cônjuges era solvente mas desta edição 2020 com a reconstituição da sociedade conjugal e o restabelecimento do mesmo regime de bens tornouse insolvente em vista de dívidas contraídas pelo outro e que esse mesmo cônjuge tomou dinheiro emprestado num banco enquanto estava separado Ora o credor banco mutuante não pode deixar de receber o seu crédito em razão da insolvência acarretada pela reconciliação Até a integral solução das obrigações contraídas no período em que a sociedade conjugal não existia perante os respectivos credores a partilha ainda continua a produzir seus efeitos 7 Responsabilidade civil pela dissolução Nos conflitos de interesse de que trata o direito de família também a responsabilidade civil deve seguir regras próprias De um lado o descumprimento de dever conjugal é ilícito como outro qualquer não havendo razões para exonerar quem nele incorreu de responsabilidade tão só porque a vítima era de sua família De outro por vezes a imputação de responsabilidade pode ocasionar dano emocional ou psicológico de maior gravidade do que aquele cuja composição é objetivada Entre uma e outra face dessa delicada equação procura a tecnologia jurídica identificar os fundamentos para a responsabilização civil pelos danos nas relações familiares Aguiar Jr 2004 Os cônjuges titulam o direito de se divorciarem Há tecnólogos que chegam a enraizar o direito de não permanecer casado na tutela constitucional da dignidade humana Farias 2004 No Brasil a pessoa casada pode desfazer a sociedade conjugal a qualquer tempo sempre que decidir que a vida pode ficar melhor sem aquele casamento Desse modo se quem deixa de amar o consorte propõe o divórcio amigável ele ou ela não tem nenhuma responsabilidade por indenizar eventual desapontamento ou mesmo dor que sua iniciativa traz ao outro membro da relação de conjugalidade Silva 2004539 Deixou de amar está no direito dele ou dela procurar novos rumos para a vida Se o outro cônjuge não concordar com o divórcio amigável também não pode ser responsabilizado aquele que legítima e honestamente busca readquirir a liberdade para experimentar novas vivências amorosas acaso proponha a ação de divórcio com esse fundamento De outro lado o rompimento da sociedade conjugal por culpa de um dos cônjuges acarreta ao outro em geral sentimentos negativos de dor e humilhação Não cabe no entanto a condenação do culpado pelo divórcio no pagamento de indenização moral em favor do inocente como regra Apenas quando tiver sido particularmente desleal e cruel o comportamento do cônjuge culpado terá cabimento a responsabilização Se um dos cônjuges manteve relacionamento sexual fora do casamento mas foi sempre discreto e nunca deixou transparecer a traição a amigos ou conhecidos do casal o adultério leva à sua condenação como culpado pelo fim da sociedade conjugal mas não à responsabilidade por danos morais Se ao contrário não fazia segredo de seus relacionamentos adúlteros expondo o outro cônjuge a constrangimentos e agravandolhe a honra e imagem de modo acentuado demonstra não ter o mínimo respeito e consideração com a família que integrava Nesse caso a deslealdade e crueldade reveladas justificam a condenação em perdas e danos morais Os danos morais associados ao divórcio litigioso são passíveis de indenização apenas se o cônjuge culpado tiver sido extremamente desleal ou cruel em seu comportamento Em relação aos danos materiais manifestados na acentuada redução do padrão de vida de um dos cônjuges os conflitos de interesses resolvemse por meio de alimentos compatíveis com a condição social Cap 61 subitem 14 Nenhum outro dano material nem mesmo o relacionado à normal queda do padrão de vida que acompanha a maioria dos divórcios é indenizável 2020 02 13 PÁGINA RB51 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 59 AS ENTIDADES FAMILIARES Capítulo 59 As entidades familiares 1 Famílias constitucionais e não constitucionais A Constituição Federal ao tratar da proteção que o Estado deve liberar às famílias referese a apenas três entidades familiares as fundadas no casamento as uniões estáveis entre o homem e a mulher e as famílias monoparentais art 226 1º 3º e 4º São as famílias constitucionais O dispositivo em foco desperta duas questões básicas Primeira haveria alguma primazia à família fundada no casamento relativamente às demais entidades familiares nele referidas Segunda a lei ordinária e as decisões judiciais poderiam ou não reconhecer e proteger outras entidades familiares Essas questões evidentemente despertam respostas diversas de acordo com a ideologia do tecnólogo Para os mais conservadores o casamento continua a ser uma forma privilegiada de constituição da família e nenhuma outra entidade familiar além das apontadas na Constituição deveria ser considerada Para os mais progressistas falando em termos de costumes sociais as respostas são exatamente as contrárias Duas circunstâncias têm levado os tecnólogos conservadores a insistirem na supremacia da família fundada no casamento De um lado a Constituição não usa a expressão família quando menciona a união estável e a monoparentalidade mas o estranho neologismo entidade familiar De outro determina à lei que facilite a conversão da união estável em casamento Essas circunstâncias aliadas à tradicional forma de organização do núcleo familiar confirmariam na visão conservadora das questões que o constituinte não pretendeu igualar a união estável ao casamento nem estimular as famílias monoparentais Em relação à família fundada em relação conjugal de pessoas do mesmo sexo a tecnologia conservadora alimenta enormes resistências chegando mesmo a qualificar preconceituosamente a hipótese como anormalidade As respostas acertadas às questões propostas pela norma constitucional contudo têmnas os tecnólogos progressistas Considerando a Constituição um sistema interpretam o art 226 e seus parágrafos em consonância com os princípios maiores da igualdade e dignidade da pessoa Afirmam então que entre as famílias constitucionais não há hierarquia a fundada no casamento não é merecedora de maior proteção que as outras Muito pelo contrário não pode a lei discriminar essas três entidades familiares conferindo aos membros de qualquer uma delas direitos negados aos das outras Por outro lado em relação às entidades familiares não referidas a lei ordinária pode eventualmente diferenciar alguns dos direitos de seus membros já que não gozam de igual proteção à liberada às três famílias constitucionais mas não as pode criminalizar ou por qualquer outro meio prejudicar seus membros Por exemplo a lei ordinária pode validamente vedar a adoção por casal homossexual mas não pode negar aos parceiros a comunhão dos bens adquiridos durante a parceria Nada na ordem constitucional por outro lado impede a disciplina na lei ordinária da família fundada na união civil de pessoas do mesmo sexo Quer dizer as famílias constitucionais fundadas no casamento união estável e monoparental têm assegurados iguais direitos sendo inconstitucional qualquer preceito de lei ordinária que as discrimine As não constitucionais fundadas em união livre de pessoas do mesmo sexo e demais porém são igualmente famílias e merecem ser reconhecidas e protegidas como tais pela ordem jurídica A lei ordinária não está obrigada a tratálas de forma isonômica relativamente às constitucionais essa a única consequência da omissão dos constituintes Mas em função dos princípios maiores da igualdade e dignidade a lei também não pode ignorar desprestigiar ou criminalizar qualquer outra forma de entidade familiar não mencionada pelos constituintes As entidades familiares ou famílias classificamse do ponto de vista do direito positivo brasileiro em duas espécies as constitucionais e as não constitucionais As famílias constitucionais são as referidas no art 226 da CF as fundadas no casamento na união estável entre homem e mulher e as monoparentais A lei não as pode tratar diferentemente sob pena de inconstitucionalidade Já as famílias não constitucionais são as demais como por exemplo a união livre e a parceria entre pessoas do mesmo sexo A lei ordinária pode conferirlhes direitos diferentes dos atribuídos às famílias constitucionais mas por força dos princípios superiores da igualdade e da dignidade não as pode marginalizar prejudicar ou criminalizar As diferenças entre essas categorias assim dizem respeito exclusivamente aos requisitos de constitucionalidade das leis que as disciplinam O casamento é um instituto complexo e foi por isso examinado anteriormente Caps 56 e 57 Agora trato dos fundamentos de outras entidades familiares a união estável item 2 a família monoparental item 3 a união livre item 4 e a parceria entre pessoas do mesmo sexo item 5 2 União estável Com a revolução dos costumes nos anos 1960 muitos jovens de classe média e alta passaram a constituir famílias sem se casar Não havia impedimento nenhum ao casamento deles poderiam casarse se quisessem mas não queriam O casamento era visto por eles como apenas uma simples folha de papel absolutamente dispensável quando percebida a essência da relação conjugal no afeto respeito mútuo e companheirismo O matrimônio não garantia minimamente esses fatores essenciais da comunhão de vida e podia até mesmo atrapalhálos A sociedade de início estranhou a novidade mas aos poucos a aceitou deixando de discriminar as uniões de homem e mulher que podiam casarse mas não viam sentido nisso A visão daqueles jovens de classe média ou rica que optaram por se unir sem casar estava equivocada O casamento não era apenas uma folha de papel mas ato de que derivavam consequências jurídicas precisas Quando o enlace não frutificava era muito mais difícil a justa e equilibrada composição dos interesses tanto pessoais guarda do filho visitas como patrimoniais divisão dos bens adquiridos pelo esforço comum Na separação a folha de papel mostrava sua serventia e os prejudicados lamentavam não ter atentado à importância jurídica que tinha então o casamento Hoje ele tem importância só psicológica social e emocional Quem opta por constituir família pelo matrimônio declara solenemente ao cônjuge e ao mundo também que lhe está destinando um lugar importante em seu coração e na sua vida Essa declaração tem relevância ímpar para as relações amorosas a autoestima de quem a dá e recebe além da felicidade dos cônjuges seus pais e familiares mas pouca importância tem a declaração solene ínsita ao casamento para a proteção dos direitos Para a ordem jurídica atual é absolutamente indiferente se homem e mulher desimpedidos casam ou optam por se unir sem a formalidade do casamento As consequências pessoais inclusive para os filhos e patrimoniais serão rigorosamente as mesmas Finalmente podese dizer que o casamento se tornou uma simples folha de papel Mas essa igualação no plano jurídico e cultural do casamento e da união informal é o resultado de um longo e tortuoso processo Rodrigues 2004261268 Pereira 20042438 Matos 20006376 No início do século passado a jurisprudência não tinha muita simpatia por essas uniões informais Acreditavase que reconhecer à companheira naquele tempo chamada de concubina mesmo na relação estável qualquer direito nos bens adquiridos pelo companheiro durante a vida em comum seria desprestigiar a família legítima e importaria indesejável desestímulo ao casamento Atente que estou falando de um tempo em que o matrimônio era indissolúvel no Brasil Muitas das disputas em torno das uniões informais envolviam a participação da companheira na herança do companheiro falecido o conflito se estabelecia então entre ela e seus filhos os ilegítimos de um lado e a esposa com quem o de cujus continuava juridicamente casado embora separado de fato há muito tempo e os filhos do casamento os legítimos de outro Os Tribunais não se compadeciam no início e a companheira e os filhos nascidos da relação informal chamados de adulterinos eram desconsiderados em seus interesses Para o STF em 1947 a ordem jurídica ignora a existência do concubinato Pereira 200427 Por volta dos anos 1950 a jurisprudência começou a ensaiar alguns passos na direção da tutela da concubina As primeiras formulações não reconheciam propriamente o direito de participar nos bens adquiridos na constância da união mas um crédito pelos serviços domésticos prestados ao companheiro O fundamento foi buscado na coibição ao enriquecimento indevido Algum tempo depois surgiram decisões reconhecendo na união informal uma sociedade de fato Ignoravam frontalmente a lei que exigia prova escrita para a produção dos efeitos do contrato de sociedade entre os sócios como ainda hoje exige art 987 do CC mas davam solução mais justa aos conflitos de interesses Provada a aquisição de bens pelo esforço comum cabia a divisão entre os companheiros no fim da convivência tal como numa dissolução de sociedade Em 1964 o STF sumulou sobre a questão comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos é cabível a sua dissolução judicial com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum Sum 380 Até a introdução do divórcio no direito brasileiro em 1977 a Súmula resolveu grande parte dos conflitos relacionada à união estável de pessoas que não podiam casar se porque uma delas quando não as duas era desquitada Azevedo 2003156164 Em 1988 a Constituição Federal falou pela primeira vez em família constituída pela união estável do homem e da mulher declarandoa destinatária de proteção do Estado Desde então não haveria mais fundamento para decisões judiciais que discriminassem o convivente não lhe reconhecendo os mesmos direitos do cônjuge Mas a visão conservadora do dispositivo constitucional parecia prevalecer em alguns julgados e contribuições doutrinárias Em 1994 a lei reconheceu aos companheiros o direito aos alimentos e certos direitos sucessórios desde que houvesse convivência de pelo menos cinco anos ou prole comum Dois anos depois outra lei destinada a regular o 3º do art 226 da Constituição Federal dispôs sobre o assunto Acertadamente descartou os requisitos do interregno temporal de convivência ou da descendência comum para definir a união estável a partir do objetivo dos conviventes de constituição de família subitem 21 Desde a entrada em vigor do Código Civil a matéria está regulada em seus arts 1723 a 1727 A união estável entre o homem e a mulher com o objetivo de constituir família tem a mesma proteção que o Estado libera para a família fundada no casamento A única diferença diz respeito à prova do vínculo horizontal de família que se produz muito mais facilmente no casamento A única diferença entre o casamento e a união estável diz respeito à facilidade da prova Enquanto o vínculo conjugal nascido do matrimônio provase pela exibição da certidão Cap 56 subitem 44 o da união estável depende de testemunhas juntada aos autos de fotografias de eventos familiares e sociais documentos extratos bancários ou de cartão de crédito escritos missivas bilhetes cartões etc e eventualmente perícia Abstraída porém a questão probatória não há nenhuma diferença entre os direitos dos conviventes e dos cônjuges É inconstitucional como se verá à frente subitem 22 o preceito que os trata de forma diferente na questão sucessória 21 Caracterização da união estável A união estável base de cerca de 30 das famílias brasileiras caracterizase pela convivência pública contínua duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família entre homem e mulher desimpedidos para o casamento CC art 1723 A união estável não se confunde com o namoro Cahali 2004268273 Enquanto na primeira é indispensável a vontade comum de fundar uma família relação horizontal no último esse elemento anímico não está presente Os namorados ainda não têm claramente definida a vontade de constituir família ou têm claramente a de não a constituir estão se conhecendo melhor ou simplesmente se divertindo Se homem e mulher namoram há muitos anos viajam juntos sempre que podem frequentam os eventos sociais das respectivas famílias devotam mútua exclusividade sexual e chegam até mesmo a viver sob o mesmo teto namorados que moram juntos não se configura a união estável quando inexistente a intenção de constituir família Alguns advogados aconselham os clientes a firmarem com os namorados um contrato de namoro O objetivo é documentar a declaração da falta de intenção de constituir família e com isso facilitar a prova da inexistência de união estável se vier a ser discutida a questão em juízo O contrato de namoro não prevalecerá evidentemente quando provado o preenchimento dos requisitos legais da união estável ou mesmo se demonstrado que aquela intenção originária alterouse com o tempo Assim é porque o decisivo à configuração de determinado relacionamento como namoro ou união estável são as características que o cercam e não os documentos firmados pelas partes Mesmo a exibição do instrumento escrito de contrato de convivência não prevalece diante da prova de que a união pretendida não sobreviveu aos primeiros meses faltandolhe por isso o requisito da durabilidade São assim cinco os requisitos para a caracterização da união estável a Objetivo de constituir família Esse é o requisito mais importante da união estável o ânimo de criar uma família affectio maritalis É em vista desse objetivo que a ordem jurídica confere ao relacionamento conjugal informal a proteção merecida pelas famílias Como provar o atendimento a esse requisito anímico Se os conviventes celebraram o contrato de convivência ou declararam por outro modo escrito ou oral a intenção de constituir família a exibição do instrumento daquele ou a prova da declaração criam a presunção da união estável Mas se não foi celebrado o contrato de convivência e inexistem outras declarações no sentido da constituição de família a affectio maritalis só pode ser demonstrada por indícios Nesse último caso um dos elementos mais significativos embora não determinante é a coabitação Quando homem e mulher passam a compartilhar o mesmo teto é normalmente indicação de que têm a intenção de constituir família Veja que a união estável podese configurar ainda que não exista coabitação Há conviventes que preferem manter suas respectivas casas porque consideram essa independência salutar ao relacionamento e há também aqueles que precisam morar separados por força do trabalho ou outra razão A falta de moradia comum não descaracteriza portanto necessariamente a união estável A presença desse ingrediente no relacionamento contudo é forte indício do affectio maritalis Mas não basta a prova da coabitação para se caracterizar a união estável se outros elementos demonstram que ela se relaciona a objetivos diversos dos de constituição de família Se dois universitários de sexos diferentes moram juntos num apartamento próximo à universidade com o objetivo de dividirem despesas não há união estável entre eles Mantenham ou não relações sexuais com ou sem frequência com ou sem exclusividade se o que os motivou a residirem sob o mesmo teto foi a redução dos dispêndios com moradia e não a formação de família então não existe a união estável Outro elemento útil na pesquisa da intenção dos sujeitos de um relacionamento amoroso diz respeito à prole comum Mais uma vez não é determinante Existem uniões estáveis em que os conviventes não desejam filhos formandose a família aqui tão só pela relação horizontal assim como existem pessoas com filho comum que não pretendem conviver A gravidez pode até ter sido intencional se pai e mãe não tinham o objetivo comum de constituírem entre eles uma família mas apenas o de fundarem duas famílias monoparentais não se forma a união estável b Convivência duradoura A própria designação do vínculo denota que só se caracteriza a união estável quando perdura por tempo considerável Se homem e mulher declaram inclusive mediante a assinatura de contrato de convivência ter a intenção de constituir família mas não conseguem conviver senão por alguns meses a união estável não se constituiu A lei não fixa prazo certo para considerar duradoura a convivência ficando a questão ao prudente arbítrio do juiz Poucos meses são insuficientes ao estabelecimento da união estável assim como muitos anos de convivência fazem pressupor sua configuração Mas quanto tempo exatamente deve ser adotado para que um casal seja considerado convivente não há como prefixar em termos gerais Cada relacionamento apresentará suas marcas a partir das quais o juiz decidirá se o requisito da durabilidade foi atendido Com esse requisito a lei quer apenas descartar os vínculos precários do cenário das uniões estáveis c Convivência contínua Outro requisito legal relacionado ao tempo de convivência é o da continuidade Para que se caracterize a união estável não podem ocorrer interrupções significativas no decurso do prazo do relacionamento destinado à constituição de família Uma ou outra breve interrupção motivada por desentendimentos pontuais posteriormente superados não descaracteriza a união estável O que a lei quer evitar é a quebra da estabilidade em razão de períodos mais ou menos longos em que a convivência deixou de existir d Convivência pública Para configurarse a união estável o relacionamento entre os conviventes deve ser público e não clandestino Quer dizer eles devem nos eventos sociais ou em encontros ocasionais com amigos e conhecidos apresentaremse como companheiros e não como meros namorados Se preferem esconder da família e das pessoas em geral a convivência informal que nutrem então ela não é merecedora pela lei de proteção União estável é a convivência duradoura contínua e pública de homem e mulher com o objetivo de constituição de família quando não há impedimento para o casamento Também caracteriza a união estável o vínculo com tais características quando qualquer dos conviventes ou ambos sendo casado estiver separado de fato e Desimpedimento Em princípio somente pessoas desimpedidas podem conviver em união estável Todos os impedimentos do casamento também impedem a constituição da união estável Se a exnora passa a conviver com o exsogro o relacionamento deles não é considerado união estável mas união livre porque transgride um dos impedimentos do casamento o relacionado aos parentes afins em linha reta CC art 1521 II Mas a hipótese mais relevante a considerar é a do impedimento relacionado às pessoas casadas O principal elemento para caracterizar o desimpedimento ínsito à união estável é a inexistência de outro vínculo de conjugalidade a unir um dos conviventes ou os dois a outras pessoas Alguns doutrinadores tratam esse requisito em separado acentuando a importância da preservação da monogamia nas relações de conjugalidade Gonçalves 2005548549 Em outros termos no direito brasileiro assim como ninguém pode ser casado duas vezes bígamo também não pode manter simultaneamente um casamento convivendo com o cônjuge e uma união estável nem duas uniões estáveis Para que a relação monogâmica seja preservada a pessoa casada só pode envolverse numa união estável depois de sua separação de fato ou judicial CC art 1723 1º Aquele que já se encontra vinculado a uma união estável igualmente não pode ligarse a outro convivente enquanto não desfizer a primeira Em suma quando desrespeitada a regra da monogamia o relacionamento não eventual que alguém mantém em paralelo ao seu casamento ou união estável denominase união livre se há intuito de formar família ou é mero concubinato se não há essa intenção item 4 As causas suspensivas do casamento não obstam a caracterização da união estável CC art 1723 2º Assim poderá ter início uma união estável quando o viúvo unese a outra mulher logo em seguida ao falecimento da esposa sem esperar a conclusão do inventário 22 Direitos e deveres dos companheiros Como acentuado a única diferença entre o casamento e a união estável é a relacionada à prova judicial da existência do vínculo de conjugalidade Enquanto no casamento provase o vínculo com extrema facilidade mediante a exibição da certidão do Registro Civil o da união estável demanda prova mais complexa para que se convença o juiz de que havia entre os litigantes uma convivência duradoura contínua pública e destinada à constituição de família Os mais variados documentos podem e devem ser carreados aos autos na demonstração da união estável extratos de contas bancárias conjuntas reiteradas movimentações de cartão de crédito de um deles relativas a despesas do interesse comum ou do outro designação do companheiro como segurado em seguro de vida testamento legando ao convivente bens de valor significativo aquisição em condomínio de imóvel residencial etc além dos documentos outros meios se mostram aptos a provar a união estável fotografias de viagens em comum festas e eventos familiares nas quais os litigantes aparecem como companheiros testemunhas que confirmem a convivência e suas características É certo que nenhum desses elementos isoladamente basta à prova da união estável Do conjunto probatório deve resultar a demonstração inequívoca do preenchimento dos requisitos legais dessa entidade familiar affectio maritalis durabilidade continuidade e publicidade Afora essa diferença de prova nenhuma outra pode existir entre os vinculados pela união estável ou pelo casamento Quanto às relações pessoais os companheiros têm o recíproco dever de lealdade respeito e assistência estão obrigados também à guarda sustento e educação dos filhos CC art 1724 A fidelidade não é lembrada expressamente pela lei mas há quem considere que o convivente infiel descumpre o dever de lealdade Silva 2004533 A enunciação dos deveres dos conviventes no entanto é desprovida de maior interesse já que o seu descumprimento não tem nenhuma implicação jurídica Desfeita a união estável por qualquer razão culpa ou vontade de um ou dos dois conviventes as repercussões em relação aos bens alimentos e filhos serão idênticas Em relação aos bens prevalecerá o que os conviventes tiverem convencionado no contrato de convivência CC art 1725 Se tiverem por exemplo concordado em que cada um continuaria com seu próprio patrimônio dividindose as despesas em certa proporção no fim da união estável nenhum deles pode reclamar qualquer participação nos bens adquiridos pelo outro durante a convivência A menos é claro que prove ter concorrido com seus recursos para a aquisição cabendolhe nesse caso a participação proporcional à sua contribuição Se nada contrataram a respeito dos bens aplicase às relações patrimoniais entre os companheiros o regime da separação parcial CC art 1725 in fine Em termos gerais de acordo com esse regime comunicamse os bens posteriores ao casamento exceto os adquiridos por sucessão ou doação mas não os anteriores Cap 57 subitem 232 Desse modo se os companheiros foram morar num apartamento de que já era dono um deles ao término do vínculo de conjugalidade o bem não será partilhado continua a pertencer exclusivamente àquele convivente que titulava a propriedade antes do enlace Também é apenas do companheiro herdeiro ou donatário o bem recebido na constância da união estável Já os bens adquiridos após o estabelecimento do vínculo pertencerão em partes iguais aos conviventes a menos que eles tenham estipulado de modo diverso no contrato de convivência No tocante aos alimentos a lei assegura ao companheiro que deles necessitar o direito de pedi los ao outro CC art 1694 Como será oportunamente examinado o cônjuge culpado pelo desfazimento do vínculo matrimonial não tem direito senão aos alimentos mínimos Cap 61 item 14 A mesma implicação deve verificarse no término da união estável tendo em vista a equivalência dos direitos entre ela e o casamento Finalmente quanto aos filhos devem os conviventes se acertar acerca do regime de guarda e visitas atentos ao valor de que o fim da união estável não pode importar nenhuma consequência para as relações familiares verticais que unem os pais aos seus filhos Devem os conviventes contratar a repartição entre eles das despesas com a criação alimentação lazer e educação dos filhos Não chegando a acordo decidirá o juiz Os direitos e deveres dos conviventes numa união estável não se diferenciam dos decorrentes do casamento Os bens adquiridos na constância da união são da copropriedade dos companheiros salvo se haviam estipulado de modo diverso no contrato de convivência O companheiro que necessitar de alimentos pode pedilos ao outro Acerca dos filhos devem os conviventes se acertar sobre guarda visita e sustento No encerramento desse subitem cabe examinar o art 1790 do CC que disciplina os direitos sucessórios do companheiro sobrevivente Criando uma odiosa discriminação os incisos II e III desse dispositivo estabelecem a quota a que tem direito o supérstite fazendoa variar de acordo com os demais concorrentes à herança De início convém frisar que esse dispositivo não prejudica a meação a que tem direito o companheiro por força do regime legal de bens na falta de contrato de convivência Quer dizer as quotas referidas naquele dispositivo dizem respeito apenas à parte dos bens comuns objeto de sucessão isto é à meação titulada pelo convivente falecido o autor da herança Gonçalves 2005559 Pois bem diz o indigitado preceito que o companheiro terá quota equivalente à metade da cabível aos filhos exclusivos do falecido se eles participarem do concurso CC art 1790 II e terá direito a um terço da herança quando concorrer com outros parentes sucessíveis incluindo os colaterais art 1790 III Notase a diferença em relação ao cônjuge herdeiro necessário que concorre com os descendentes sem nenhuma redução de quotas quando não são seus filhos No caso de concorrer com um só ascendente o cônjuge terá direito à metade dos bens e não a um terço E acima de tudo o cônjuge nunca concorre com outros parentes sucessíveis como os colaterais porque é sucessor com melhor vocação CC art 1829 I a III Exemplificando Imagine que o falecido deixou bens no valor de 120 em sua herança Não tinha descendentes nem ascendentes vivos mas tinha um irmão Se esse falecido era casado a esposa sobrevivente herda a totalidade dos bens 120 se contudo mantinha relação estável a companheira terá direito a apenas um terço deles 40 ficando o restante para o irmão 80 O tratamento discriminatório liberado pelo art 1790 II e III do CC fulmina a constitucionalidade e validade dos preceitos Por afrontar a Constituição Federal tanto na garantia do direito de herança art 5º XXX como na proteção da união estável como entidade familiar art 226 3º esses dispositivos do Código Civil são inconstitucionais Por conseguinte no falecimento de pessoa vinculada a união estável o companheiro sobrevivente terá os mesmos direitos sucessórios titularizados pelo cônjuge Cap 63 item 2 23 Conversão em casamento Retomo a primeira informação deste item Nos anos 1960 jovens da classe média e alta começaram a constituir famílias desprezando ostensivamente o casamento Estavam convencidos de que a formalidade atrapalhava mais do que ajudava a construção de um relacionamento fundado no amor respeito mútuo e camaradagem Nas classes menos abonadas porém a união informal já existia com bastante frequência muito antes da revolução dos costumes Era imposta pela carência de recursos e não nascia da vontade de romper velhos tabus A festa do casamento por mais modesta que fosse consumiria boa parte do pouco dinheiro do casal Mais que isso porém temiam os dois principalmente o homem não terem meios para cumprir os sérios compromissos que advêm do casamento Na incerteza preferiam não os assumir A união estável não era portanto nesse caso uma opção inteiramente livre dos conviventes Era uma necessidade Se pudessem casariam Pois bem foi tendo em vista principalmente essa situação que o constituinte de 1988 se preocupou em determinar à lei que facilitasse a conversão da união estável em casamento Não haveria por que facilitála aos que optaram por não casar de forma inteiramente livre A facilitação da conversão da união estável em casamento destinase a atender aos interesses de quem não tem realmente a opção de casar ou não De qualquer modo a conversão é igual para todos os conviventes que passem a se interessar pelo matrimônio independentemente das razões pelas quais no passado entenderam que o estabelecimento da união estável era de seu interesse É certo que os conviventes podem a qualquer tempo se casar como quaisquer outras pessoas desimpedidas Mas essa é uma alternativa diferente da conversão porque os efeitos do ato não retroagem à data da formação da união estável Quer dizer quando os conviventes optam por simplesmente se casarem em vez de buscarem a conversão os efeitos do casamento projetamse a partir da celebração Na conversão ao contrário os efeitos retroagem para a época em que os conviventes constituíram sua união Convertida esta em casamento produzemse os mesmos efeitos que existiriam como se os conviventes estivessem casados desde o início de sua convivência A diferença não é tão sutil como pode parecer à primeira impressão No casamento a posteriori ou na conversão os conviventes devem escolher o regime de bens do casamento Se optam pela comunhão parcial não haverá realmente diferenças entre as duas alternativas além das relacionadas à questão da prova Em outros termos se no casamento a posteriori os cônjuges escolhem a comunhão parcial como regime de bens a copropriedade dos adquiridos antes do matrimônio depende da prova da existência da união estável Na conversão ao contrário escolhido o mesmo regime a comunhão alcança os adquiridos desde o início da convivência mediante a simples exibição da certidão de casamento por conversão Mas se no casamento a posteriori ou na conversão os cônjuges optam por regime diverso da comunhão parcial a diferença entre uma e outra alternativa é significativa Imagine que a opção recaia sobre o regime de separação de bens Na hipótese de se casarem os conviventes continuam a titular os direitos derivados do regime da comunhão parcial em relação aos bens adquiridos durante o período da união estável já que os efeitos do casamento nesse caso não retroagem Escolhendo contudo a via da conversão também esses bens adquiridos serão alcançados pelo regime da separação Também em relação aos regimes de comunhão universal e participação final nos aquestos a mesma consequência se verifica os bens adquiridos na constância da união estável não ficariam sujeitos a esses regimes senão na hipótese de sua conversão em casamento A conversão da união estável em casamento é feita mediante processo judicial e importa a retroatividade dos efeitos da constituição do vínculo matrimonial para a época em que teve início a convivência inclusive em relação ao regime de bens escolhido pelos agora cônjuges Enquanto vigorou a lei de 1996 a conversão fezse por simples requerimento dos conviventes ao oficial do Registro Civil da circunscrição do domicílio deles O Código Civil porém parecendo ignorar a determinação da Constituição submeteua a processo judicial Os dois conviventes requerem ao juiz a conversão da união estável em casamento fazendo as declarações sobre o regime de bens e alterações even tuais no nome Em se convencendo o juiz de que a conversão corresponde à vontade real dos conviventes deferea Expedese então mandado ao Registro Civil para o assentamento da conversão CC art 1726 3 Família monoparental A família monoparental é a formada por qualquer dos pais e seus descendentes CF art 226 4º Nela as relações familiares são apenas verticais já que não existem pessoas ligadas pelo vínculo de conjugalidade O pai ou mãe fundador da família monoparental é o seu cabeça Diversas razões podem levar à constituição da família monoparental a pessoa quer ter filhos mas prefere ficar solteira a se casar ou constituir união estável após a separação ou divórcio os filhos ficam sob a guarda de um dos excônjuges tendo o outro se afastado do convívio com eles o celibatário adota uma criança a celibatária recebe em seu útero embrião fecundado in vitro o estado de viuvez se prolonga contentandose o viúvo ou viúva em permanecer familiarmente ligado apenas aos seus descendentes a mulher engravida de modo acidental mas não tem nenhuma vontade de se vincular maritalmente ao pai do nenê etc cf Leite 19973160 A monoparentalidade é classificada em paternal ou maternal No primeiro caso a comunidade familiar é integrada pelo pai e seus descendentes no segundo pela mãe e seus descendentes Estatisticamente as famílias monoparentais maternas são muito mais numerosas fato que não desdobra qualquer consequência jurídica Também se classifica em voluntária ou involuntária Naquela a monoparentalidade é resultado de uma decisão livre e consciente do pai ou da mãe como no caso do celibatário que adota um filho enquanto nessa última as circunstâncias da vida conduzem a família ao estado monoparental como na viuvez prolongada Notese que em nenhuma hipótese a opção pela monoparentalidade é inteiramente involuntária Há porém casos em que nitidamente o pai ou mãe recusa a ideia de se casar ou constituir união estável e prefere manter a família apenas com seus filhos Aqui a monoparentalidade é voluntária E há de outro lado os casos em que eles se enlaçariam num vínculo de conjugalidade se a vida lhes desse a chance caso em que a monoparentalidade devese considerar involuntária Podese distinguir ainda a monoparentalidade em natural ou civil de acordo com a natureza do vínculo entre os membros da família Quando o filho tiver recebido a herança genética do cabeça a família monoparental é natural caso contrário civil Assim se o filho foi concebido numa relação sexual de que tenha participado o pai ou mãe a monoparentalidade é natural Igualmente pertence a essa categoria a família quando o filho concebeuse in vitro com o uso de gameta fornecido pela mãe a deontologia médica não admite o emprego da técnica de fertilização assistida solicitada exclusivamente por um homem Por outro lado será civil a família monoparental em que o filho é adotado Finalmente é possível classificála de acordo com o número de gerações que separam os seus membros Há assim família monoparental de primeiro grau pai ou mãe e seus filhos segundo grau avô ou avó e seus netos etc Também devese considerar monoparental a família constituída por mais de duas gerações Quando alguém mora com a filha e o neto os três integram uma família monoparental de grau misto Essas classificações se combinam a produção independente por exemplo é uma família monoparental maternal voluntária natural e de primeiro grau A rigor contudo têm sentido meramente ilustrativo já que será idêntico o amparo liberado pela Constituição à família monoparental independentemente do sexo do seu cabeça do maior ou menor grau de intencionalidade havida na constituição da natureza do vínculo entre os membros dela ou do número de gerações que os separam A família monoparental é a constituída por homem ou mulher não vinculado conjugalmente a ninguém solteiro separado divorciado viúvo etc e seus descendentes naturais ou civis Na família monoparental em vista da inexistência de relação horizontal os conflitos de interesse giram em torno das questões próprias da relação vertical filiação e poder familiar De específico dessa categoria de entidade familiar encontrase na ordem jurídica unicamente a vedação a qualquer discriminação em seu desfavor pela ausência do vínculo de conjugalidade peculiaridade de que não se pode extrair qualquer menoscabo 4 União livre As uniões livres correspondem aos vínculos de conjugalidade destinados à formação de família estabelecidos entre sujeitos que não podem casarse nem constituir união estável Compreendem por exemplo as relações não exclusivas e as vinculantes de parentes afins em linha reta A união livre é uma espécie de concubinato Na lei concubinato vem definido como as relações não eventuais entre o homem e a mulher impedidos de casar CC art 1727 A expressão já teve uma definição tecnológica bem mais extensa Quando no passado a ordem jurídica só reconhecia como legítima a família constituída pelo casamento todas as demais formas de relacionamento entre homens e mulheres eram rotuladas como concubinárias Na vala comum do concubinato atiravamse todas as relações não matrimo niais Aos poucos porém certas distinções precisaram ser feitas A tecnologia começou a falar em concubinato puro e impuro com o objetivo de separar os relacionamentos entre pessoas que se casariam se pudessem impediaas a indissolubilidade do vínculo então estatuída e os relacionamentos extraconjugais entre amantes amásios mancebos Não se justificam mais esses esforços classificatórios Desde a entrada em vigor do Código Reale a expressão concubinato deve ser reservada exclusivamente às relações como tal conceituadas pela lei O que antes era chamado de concubinato puro hoje se chama união estável Continua a existir entretanto um certo preconceito em relação a algumas famílias Embora não cogite mais de ilegitimidade a ordem jurídica engloba grosseiramente no conceito de concubinato junto com a mancebia todas as formas de famílias não lembradas pelo art 226 da CF É tempo de fazer uma distinção destacando a união livre das demais relações concubinárias A união livre se distingue do concubinato em geral porque nela encontrase sempre o affectio maritalis isto é a vontade de constituir família ingrediente inexistente na relação concubinária Por vezes entre os concubinos o interesse no relacionamento tem em vista apenas ou principalmente a gratificação sexual nem de longe eles cogitam unirse de forma mais intensa como uma família Na união livre ao contrário o objetivo é o mesmo do casamento e da união estável ou seja a criação de vínculos familiares com ou sem filhos comuns Os compromissos por vezes são menores quando os parceiros não dão à exclusividade sexual a mesma importância que a maioria das pessoas Mesmo nesse caso todavia a união livre não pode ser considerada uma relação descompromissada Afeto cuidados atenção mútua ajuda e companheirismo estão presentes como em qualquer outra família Por ser espécie de concubinato a união livre pressupõe a diversidade de sexos Quando se unem para formar uma família pessoas do mesmo sexo a parceria tem seus contornos próprios na qual normalmente é assumido o compromisso da exclusividade sexual item 5 Bissexuais podemse vincular simultaneamente por união livre com alguém do sexo oposto e por parceria homossexual com alguém do mesmo sexo O concubinato em princípio não gera nenhum direito patrimonial aos concubinos Desfeitas as relações não pode nenhum deles exigir do outro alimentos RT 830351 ou participação no patrimônio construído durante a existência da relação concubinária Alguma doutrina afirma de modo claro que a mancebia não deve merecer o apoio nenhum do Estado nem mesmo da sociedade Azevedo 2003283 Mas quando o concubinato caracterizase como uma união livre a tendência é que cedo ou tarde a jurisprudência e a lei comecem a reconhecer alguns direitos dos parceiros tendo em vista a proteção da família que dela nasce No Rio Grande do Sul a Justiça atribuiu certa vez à concubina o direito de titular 25 do patrimônio do concubino Os dois viviam em união livre já que o de cujus era casado com outra mulher da qual não estava separado de fato Cahali 2004276284 Afinal na união livre há de um lado pessoas que assumem o compromisso da exclusividade sexual e só não se casam ou constituem união estável porque a lei não deixa e de outro as que não dão nenhuma importância a esse compromisso e adotam uma forma de família que a lei e a jurisprudência têm dificuldades de aceitar Nos dois grupos entretanto os vínculos estabelecidos criam um espaço de afetividade e companheirismo para os seus membros As duas formas de união livre assim cumprem a função afetiva das famílias em geral não havendo razões para marginalizálas Concubinato corresponde às relações não eventuais entre homem e mulher impedidos de se casarem ou constituírem união estável O que antigamente era chamado de concubinato puro com a entrada em vigor do Código Reale passou a ser referido como união estável O antigo concubinato impuro corresponde à mancebia Entre a união estável e a mancebia situase a união livre É uma espécie de concubinato quando levado em conta o conceito do art 1727 do CC mas sua particularidade é a intenção dos concubinos de constituírem família Três portanto são as características da união livre os parceiros de sexo oposto impedimento para o casamento ou constituição da união estável e objetivo comum de criação duma família Pela união livre surgem as famílias dos impedidos isto é as entidades familiares que a ordem jurídica prefere fazer de conta que não existem subitem 41 O preconceito originase em parte da noção de monogamia como elemento essencial à constituição de qualquer família e por isso o tema da união estável putativa convém ser aqui enfrentado subitem 42 41 As famílias dos impedidos A lei define que certas pessoas não podem casarse nem se envolver em união estável Isso não significa que elas não se unam com o intuito de constituir família a despeito da vedação legal O adotante não pode casarse por exemplo com quem foi cônjuge do adotado CC art 1521 III Mas e se acontecer de o adotante e o antigo cônjuge do adotado se unirem para a formação de uma nova família incluindo a geração e criação de filhos comuns O vínculo de conjugalidade entre eles não pode caracterizarse como união estável porque o mesmo obstáculo ao casamento também impediria a formação dessa outra espécie de entidade familiar art 1723 1º Em outros termos de pouco adianta a lei proclamar de forma peremptória que determinadas pessoas não podem constituir famílias se elas movidas pelos seus sentimentos e interesses acabam se unindo familiarmente Essas uniões livres não deviam ser ignoradas pelo Direito porque seus membros merecem a mesma atenção e proteção dispensadas às demais entidades familiares Talvez em torno do exemplo apresentado de início se possa obter um certo consenso quanto à necessidade de tutela das uniões livres Afinal a adoção não deriva de vínculo biológico e parece mesmo um tanto exagerada a preocupação do legislador com a proibição do incesto no caso desse impedimento em particular Eventualmente pela mesma razão também se poderia conseguir algum consenso relativamente às uniões livres em que é desobedecido o impedimento fundado no parentesco por afinidade em linha reta e o do adotado com o filho do adotante CC art 1521 II e V Mas tomemos para argumentar outra hipótese de vedação de casamento e de união estável a que impede o cônjuge sobrevivente de se casar com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio de seu consorte art 1521 VII Parece um absurdo repugnante a ideia de que o viúvo ou viúva possa amar a pessoa que atentou contra a vida do antigo cônjuge a ponto de querer constituir uma família com ela Mas a vida é plena de possibilidades e se acontecer de eles se apaixonarem e passarem a viver conjugalmente não creio seja mesmo o caso de ignorar o surgimento do novo núcleo familiar Pondo de lado em vista da extrema dificuldade de nesses casos ser construído o consenso sobre a necessidade de proteção da união livre os impedimentos diretamente ligados à proibição do incesto entre pessoas biologicamente aparentadas CC art 1521 I e IV qual resta O impedimento dos casados inciso VI Na transgressão a essa proibição de matrimônio está a principal hipótese de união livre Começo por relembrar que esse impedimento do matrimônio ao contrário dos demais não se estende à união estável quando a pessoa é separada judicialmente ou se mantém o estado civil de casada está separada de fato CC art 1723 1º Quer dizer o separado judicialmente não pode casarse enquanto não converter sua separação em divórcio Mas vindo a se ligar a pessoa de sexo oposto para constituir família caracterizarseá a união estável entidade familiar sob o amparo do Estado Por outro lado se a pessoa ostenta o estado civil de casada mas está separada de fato do cônjuge embora não possa contrair novas núpcias enquanto não obtiver o divórcio direto pode desde logo envolverse numa união estável Mas por óbvio se nenhuma dessas condições estiver preenchida o impedimento matrimonial estendese à união estável Quero dizer se a pessoa não estiver separada nem de fato nem de direito de seu cônjuge e mesmo assim unirse a outrem para constituir nova família essa união não poderá ser classificada como estável Será então uma união livre A união livre se caracteriza por três elementos diversidade de sexo dos parceiros existência de impedimento matrimonial ou para a formação de união estável e intenção de criar família A tendência do direito de família é a de aos poucos atribuir às uniões livres alguma forma de amparo tendo em vista tutelar a entidade familiar dela derivada No direito brasileiro a relação monogâmica ainda é essencial à configuração do vínculo de conjugalidade Ninguém pode manter simultaneamente dois casamentos um casamento e uma união estável nem duas uniões estáveis Essa é a lei Mas na vida há homens e mulheres pertencentes às diversas camadas sociais que não dão tanta importância assim à exclusividade sexual Essas pessoas se ligam em relações não monogâmicas simultâneas e apesar do que peremptoriamente afirma a lei formam famílias Quando nenhum dos parceiros está sendo enganado isto é todos têm pleno conhecimento da inexistência de exclusividade sexual e partilham da ideologia de questionamento da monogamia a cada núcleo familiar de que participam corresponderá uma união livre Se porém houver alguém sendo enganado estáse diante de figura bem diversa a da união estável putativa de que se cuida mais adiante subitem 42 Penso que a lei e a jurisprudência poderiam atribuir o direito aos alimentos para o parceiro que deles necessitasse quando desfeita a união livre Poderiam fixar o cabimento apenas dos alimentos mínimos mas garantir pelo menos durante algum tempo os necessários à sobrevivência Penso também que alguma participação nos bens adquiridos pelo parceiro na constância da união livre poderia ser do mesmo modo prevista em lei ou determinada pelo Judiciário Caberia aqui evidentemente algum esquema de proporcionalização da participação em vista da quantidade de uniões livres que simultânea e publicamente mantivesse o outro parceiro Claro está que provando ter sido certo bem adquirido em parte com a contribuição material dos dois parceiros a união livre deverá ser dissolvida como uma sociedade de fato para evitarse o enriquecimento indevido daquele em cujo nome foi o bem registrado Para isso aliás não há necessidade de lei ou precedentes jurisprudenciais A rigor as uniões livres têm sido amparadas nos Tribunais quando algum ingrediente de ordem religiosa ou étnica justifica a poligamia Assim muçulmanos e indígenas têm obtido em juízo a devida proteção às uniões livres em que se envolvem Continuam porém ao desabrigo aqueles que optam por essa forma de família movidos por questão ideológica ou meramente por vontade Em suma das muitas funções exercidas pela família ao longo da história a que remanesce como essencial é a afetiva que envolve criar um espaço de companheirismo e mútuo apoio em que aflorem as condições para o desenvolvimento da identidade e autoestima de seus membros Se assim é então a proteção da entidade familiar pela ordem jurídica se justifica pelo cumprimento dessa função e não de outras Na origem para cumprir outras funções a família se organizou a partir de regras como a da exclusividade sexual Atualmente se uma forma qualquer de relacionamento visando a constituição de família cumprir satisfatoriamente a função afetiva interessa a toda a sociedade sua proteção Por esse caminho seguirá a tendência de amparo à união livre 42 União estável putativa Quando alguém se envolve numa união livre em que claramente ninguém assume o compromisso da exclusividade sexual e de organização de núcleos familiares sabe o risco que está correndo de ao término do relacionamento ver não frutificarem seus pleitos de alimentos ou participação no patrimônio do parceiro Afinal a união livre como espécie de concubinato não está protegida pelo direito brasileiro Se concordou com a falta de exclusividade sexual e a simultaneidade de famílias do parceiro não pode reclamar do desamparo em que eventualmente ficar quando finalizada a união livre Mas pode acontecer de pessoa se ligar a outra a quem de boafé considera desimpedido para a união estável isto é solteira viúva divorciada separada judicialmente ou de fato sem que isso corresponda à verdade Por desconhecer que seu companheiro ou companheira mantém vínculo de casamento ou de união estável com outrem essa pessoa está legitimamente autorizada a crer na regularidade da entidade familiar a que pertence A união estável é putativa quando um dos conviventes de boafé está legitimamente autorizado a crer que não existem impedimentos para que o outro a ela se vincule quando isso não corresponde à verdade Para o companheiro induzido em erro a situação de fato produzirá todos os efeitos da união estável inclusive quanto ao direito aos alimentos e participação no patrimônio do outro convivente Há nesse caso o que a doutrina denomina união estável putativa Pereira 20044549 Azevedo 2003283 A exemplo do que se verifica no casamento putativo o convivente de boafé terá os mesmos direitos que titularizaria caso não existisse o impedimento para a formação da união estável Quer dizer pode reclamar alimentos se deles necessitar e tem direito à participação nos bens adquiridos pelo companheiro na constância da união segundo os parâmetros do regime de comunhão parcial 5 Outras entidades Certamente com a incessante mudança nos costumes novas formas de entidades familiares tendem a aparecer E o direito também certamente há de se mostrar reticente no início apegado às formas hoje admitidas casamento família monoparental e união estável Duas novas formas têm sido estudadas a união poliafetiva em que três ou mais pessoas se declaram unidas na constituição de uma nova família e a família multiespécie composta por ser ou seres humanos e um ou mais animais A primeira escritura pública de constituição de união poliafetiva de que se tem notícia foi lavrada em Tupã no Estado de São Paulo em 24 de agosto de 2012 Por meio dela duas mulheres e um homem declararam que mantinham um vínculo matrimonial outorgandose mutuamente direitos deveres e obrigações típicos do casamento A lavratura desse tipo de escritura pública foi proibida pelo CNJ em 2018 Deste modo as pessoas unidas pelo vínculo de união poliafetiva hoje deparamse com as mesmas dificuldades que no passado amarguravam a vida dos casais homoafetivos conseguem por meio do direito obrigacional resultados semelhantes aos que decorreriam da aplicação do direito patrimonial de família mas não têm como assegurarem os direitos extrapatrimoniais autorização para transplantes cremação do corpo doação de órgãos após o falecimento vocação para curadoria em caso de interdição etc Em relação à família multiespécie a figura tem sido mencionada em processos de divórcio em que os demandantes disputam com quem ficará os animais de estimação A partir da hipótese de configuração de uma entidade familiar conjugando os seres humanos e seus pets pleiteiase a aplicação de institutos próprios do vínculo de filiação como a guarda compartilhada direito de visitas etc A simples aplicação das regras sobre partilha dos bens mostrase por vezes insuficiente à adequada regulação da matéria Quando por exemplo o pet pertencia a um dos cônjuges antes do casamento e este havia sido contratado no regime da comunhão parcial caso em que pela desta edição 2020 aplicação pura e simples das regras do direito patrimonial do casamento o animal continuaria a pertencer apenas àquele cônjuge não tendo o outro nenhum direito de desfrutar da companhia dele Reconhecese contudo a especificidade da ligação que se fez durante o casamento entre o animal e a outra pessoa com a qual passou a conviver A ligação de afeto entre o ser humano e um semovente é muito diferente das que se podem ter em relação a objetos 2020 02 13 PÁGINA RB61 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 60 FILIAÇÃO Capítulo 60 Filiação 1 Espécies de filiação Ter filhos é uma experiência única e embora acompanhada de imensas dificuldades geralmente gratificante Quem passa por ela no momento certo da vida enriquecea em muito Como antes de transmitir conceitos e valores é preciso clarificálos preparar alguém para viver em sociedade importa reestruturarse internamente Acompanhar de perto o crescimento de novo ser da espécie contribuindo de modo decisivo para sua formação desperta o sentimento de responsabilidade pela preservação e renovação de uma herança cultural milenar Mostrar o mundo para o filho é redescobrilo nos seus perdidos detalhes depois de crescer a gente só se recorda que a lagarta se metamorfoseia em borboleta e tantas coisas mais ao falar disso com ele Ter filhos vivenciando intensamente a relação é rejuvenescer Ao mesmo tempo amadurecese com a paternidade ou maternidade Para dar conta de educar crianças e adolescentes como se deve é preciso estabilidade emocional e psíquica Os pais que não a têm ganham a oportunidade de conquistála A experiência da paternidade ou maternidade não pressupõe necessariamente a geração do filho Ela é tão ou mais enriquecedora mesmo que a criança ou adolescente não seja portador da herança genética dos dois pais Perceba contudo que são recentíssimos a aceitação dessa ideia pelas pessoas em geral e seu cultivo como valor da sociedade A espécie humana precisou de milhões de anos de evolução e saltar do estado da natureza para o de civilização para dissociar descendência e transmissão da herança genética Instituições fortemente enraizadas em várias culturas como o casamento monogâmico e a família patriarcal com submissão da mulher foram criadas com a finalidade precípua de garantir o quanto possível que o filho herde os genes do pai Há não muito tempo atrás consideravase filho de verdade mesmo apenas o nascido dentro do casamento Isto é havia uma hierarquia entre os filhos em que se privilegiava o portador da herança genética de homem e mulher casados ou que pelo menos se presumia a tivesse recebido do primeiro Chamavase legítima a essa filiação Eram os filhos de verdade Os havidos fora do casamento consideravamse ilegítimos e estavam divididos em naturais se os dois genitores estavam desimpedidos para o casamento eram solteiros ou viúvos ou espú rios se havia impedimento esses últimos por sua vez chamavamse adulterinos quando casado um dos genitores mas não com o outro ou os dois mas não entre eles ou incestuosos se os pais não podiam se casar em razão de certos impedimentos descendia um do outro por exemplo O privilégio dos legítimos era tamanho que sob a égide do Código Beviláqua o pai enquanto estivesse casado não podia reconhecer filhos ilegítimos Mesmo que quisesse estava proibido Como o vínculo do casamento era indissolúvel só enviuvando ele podia ver o ato de perfilhação produzir efeitos A outra alternativa de que dispunha para amparar de algum modo o ilegítimo era reconhecêlo em testamento Do lado do filho apenas o ilegítimo natural tinha o direito à ação de reconhecimento de paternidade Quando a lei em 1942 passou a não mais proibir o reconhecimento dos adulterinos pelo pai desquitado isso representou um enorme avanço para a época Outro salto deuse em 1949 com a permissão legal para o filho adulterino propor desde que o demandado não estivesse mais casado a ação de reconhecimento de paternidade Até 1977 porém os filhos adulterinos reconhecidos não tinham os mesmos direitos sucessórios que os legítimos e somente em 1989 admitiuse que o homem casado pudesse reconhecer voluntariamente o filho adulterino ou ser demandado em ação investigatória de paternidade Wald 2004177185 Mesmo os filhos adotados não eram tratados em pé de igualdade com os legítimos pois tinham direito na herança apenas à metade da quota destes últimos Apenas em 1977 aboliuse essa discriminação Nascida na Antiguidade com o objetivo de garantir para os que não tinham filhos a continuidade da celebração de culto aos deuses domésticos e antepassados a adoção manteve até meados do século XX o caráter de substituição da descendência biológica No Código Beviláqua quem já tivesse filhos legítimos ou legitimados não podia adotar se depois de iniciado o processo por um casal sobreviesse a gravidez a adoção não tinha prosseguimento Toda essa abominável discriminação entre filhos legítimos e ilegítimos biológicos ou adotados felizmente é coisa do passado Embora ainda haja doutrina considerando de vital importância a distinção entre os legítimos ilegítimos e adotivos Venosa 2001 5244 na verdade não há mais hierarquia para a sociedade ou para a ordem jurídica entre os filhos sendo todos merecedores de iguais cuidados e direitos econômicos e patrimoniais Deixaram de existir filhos de verdade de um lado erros e arremedos de outro No Brasil no fim dos anos 1980 a lei ordinária já tinha evoluído no sentido da plena igualdade quando a Constituição veio extirpar de vez por todas qualquer possibilidade de discriminação ao dispor que os filhos havidos ou não da relação do casamento ou por adoção terão os mesmos direitos e qualificações proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação art 227 6º História semelhante aconteceu em outros países ao longo do século passado Na Alemanha por exemplo a superação do tratamento diferenciado entre filhos legítimos e ilegítimos também decorreu de princípio constitucional ao qual teve que se adaptar a lei ordinária Boizel 2000823826 Classificase atualmente a filiação em quatro espécies A finalidade da classificação é ilustrativa destinase unicamente a delimitar a extensão do conceito porque independentemente do tipo de filiação os direitos e deveres associados à relação vertical são absolutamente idênticos Atento a essa advertência podese distinguir a filiação em biológica e não biológica sendo esta última subdividida em filiação por substituição socioafetiva e adotiva Na filiação não biológica ocorre a perfilhação isto é os pais declaram expressa ou implicitamente a vontade de ter certa pessoa como filha A filiação é biológica quando o filho porta a herança genética tanto do pai como da mãe subitem 11 Ela é natural se a concepção resultou de relações sexuais mantidas pelos genitores Mas esse não é o único meio de gerar filho biológico Também pertence a essa categoria a filiação quando a concepção ocorre in vitro Desde que os gametas tenham sido fornecidos por quem consta do registro de nascimento da pessoa como seu pai e mãe ainda que esta não tenha feito a gestação mas outra mulher DTU doadora temporária de útero a filiação classificase como biológica Nos demais casos isto é se o filho não porta a herança genética de seus dois pais a filiação é não biológica Nessa categoria classifico também a hipótese de filiação em que apenas os gametas de um dos pais participaram da concepção Entendo ser esta alternativa didaticamente mais elucidativa que a de considerar a filiação nesse caso uma espécie híbrida quer dizer biológica em relação ao fornecedor do gameta e não biológica relativamente ao outro pai A filiação por substituição provém do emprego de técnica de reprodução assistida heteróloga em que os pais contratam os serviços médicos de concepção in vitro sem pelo menos um deles fornecer o gameta Por vezes também ocorre a geração do filho em útero de outra mulher que não a mãe subitem 12 A filiação socioafetiva provém da relação de afeto paternal ou maternal nascida na convivência duradoura de um adulto e uma criança Não existe nessa categoria vínculo biológico entre o pai ou a mãe e seu filho Não ocorreu tampouco a contratação pelos pais de serviços médicos de fecundação assistida Lôbo 2004 O amor só ele gerou os direitos e obrigações subitem 13 Por fim a filiação adotiva é a estabelecida pela adoção resultado dum processo judicial em que um adulto ou dois adultos casados aceita outra pessoa geralmente criança ou adolescente como seu filho subitem 14 Uma das questões mais intrincadas que o direito de família enfrenta relativamente à filiação não biológica consiste em assegurar ao filho o direito à informação genética sem que disso decorra reconhecimento de paternidade ou maternidade excludente do vínculo familiar constituído em decorrência da responsabilidade pela fecundação convivência ou adoção subitem 22 Outra classificação de natureza meramente ilustrativa separa as filiações havidas dentro e fora do casamento A única diferença entre os filhos de uma ou de outra categoria diz respeito à distribuição do ônus de prova nas ações de reconhecimento ou negatória de paternidade item 4 O filho havido dentro do casamento não precisa provar que é seu pai o marido da mãe este é que tem o ônus de prova caso pretenda liberarse do vínculo de paternidade biológica Já o filho havido fora do casamento tem o ônus de prova de que o homem demandado é seu pai biológico A filiação é biológica quando o filho porta a herança genética de quem consta como pai e mãe de seu registro de nascimento Pode ser natural se a concepção derivou de relação sexual entre os genitores ou não quando feita in vitro A filiação não biológica por sua vez compreende aquela em que os gametas ou mesmo um deles não foram fornecidos pelas pessoas identificadas como pai e mãe no registro de nascimento por substituição Também não são biológicas as filiações socioafetiva e adotiva Mas essa classificação assim como a que distingue entre filiação havida dentro e fora do casamento são meramente ilustrativas Em qualquer caso os direitos e deveres associados à relação de filiação ou de paternidade ou maternidade são idênticos Em suma independentemente da espécie de filiação biológica ou não biológica havida dentro ou fora do matrimônio e do tipo de família em que ela se insere matrimonial nascida de união estável ou monoparental os direitos e deveres dos pais e filhos são idênticos Parte deles está sintetizada no instituto do poder familiar item 5 11 Filiação biológica Na filiação biológica os pais são os genitores as pessoas identificadas como pai e mãe no registro de nascimento foram os fornecedores dos gametas empregados na concepção da pessoa ocorrida in vitro ou in utero A questão jurídica normalmente despertada pela filiação biológica natural diz respeito à resistência do genitor em reconhecer a paternidade quando não está casado com a mãe Quando o relacionamento entre os dois não é estável a resistência pode ser legítima em vista das incertezas nutridas pelo indigitado pai isto é o homem apontado pela mãe como genitor Neste caso se o homem resiste apenas porque honestamente não quer assumir a paternidade de rebento que não tem certeza ser dele um simples exame em ADN resolve a questão Confirmada a paternidade biológica seguese a perfilhação Não é raro ocorrer porém que a recusa em reconhecer a paternidade derive tão só da vontade de não assumir qualquer encargo relativo ao sustento criação e educação da criança Em vista da tutela dos interesses do filho desenvolveramse os institutos da investigação oficiosa subitem 21 e de presunções de paternidade item 4 Certamente porém é na filiação biológica não natural que se enfrentam as questões mais complexas As pessoas identificadas como pai e mãe forneceram a herança genética mas a fecundação não decorre de sexo feito por elas e sim de assépticos procedimentos laboratoriais A filiação biológica não natural deriva da aplicação de técnicas de fecundação assistida homóloga Nela os gametas espermatozoide e óvulo são fornecidos pelos próprios contratantes do serviço isto é pelo homem e mulher que desejam ser pais mas não têm conseguido a gravidez por meio de relações sexuais Ao se submeterem a essas técnicas eles manifestam a vontade de ter filhos ainda que implicitamente Mas declaram também e aqui de modo expresso a vontade de que os gametas e embriões excedentários crioconservados não sejam usados no futuro sem sua autorização Não se costuma questionar a legitimidade da imputação ao genitor das graves responsabilidades de pai quando a filiação é biológica natural porque ele teria manifestado a vontade de procriar ou pelo menos assumido os riscos da procriação ao manter relações sexuais com a mãe Se deixou de usar métodos contraceptivos sob seu controle como a camisinha ou se os que adotou não foram inteiramente eficientes não pode posteriormente furtarse de todas as consequências de seu ato Mas no caso da filiação biológica não natural é questionável se o mesmo argumento fundado na assunção do risco pode conduzir igualmente à legitimidade da imputação da condição de pai Por mais qualificadas que sejam as clínicas de fecundidade assistida bancos de sêmen e laboratórios erros acontecem como em qualquer outra atividade humana Além disso não se pode descartar a hipótese de conluio entre a genitora e os profissionais e empregados que trabalham nessas empresas Por várias razões portanto contra a vontade expressa do genitor pode ocorrer a filiação biológica não natural Aliás nesse caso os dois gêneros estão expostos às mesmas situações Também o genitor pode mediante conluio com a clínica de fecundação banco de óvulos e laboratório e contando com os serviços de uma doadora temporária de útero dar ensejo a uma filiação biológica não desejada pela genitora No Código Civil normas pouco inspiradas estabeleceram a presunção de paternidade no caso de fecundação artificial homóloga em duas hipóteses Nelas as expressões mesmo que falecido o marido CC art 1597 III e a qualquer tempo inciso IV afastam qualquer questionamento da juridicidade da filiação biológica não natural post mortem Gonçalves 2005278 Pela letra desses dispositivos o homem que tiver se submetido a técnica de fertilização assistida homóloga uma vez na vida pode enquanto vivo ou depois de morto ser pai contra sua expressa declaração de vontade Esses preceitos note dizem respeito à paternidade mas como visto também a mulher que tenha passado pela experiência da fertilização assistida homóloga está exposta a igual risco de ser mãe contra sua expressa vontade mesmo depois de morta Na filiação biológica o filho porta a herança genética do pai e da mãe identificados em sua certidão de nascimento Pode ter sido concebido numa relação sexual entre eles ou em decorrência do emprego de técnica de fertilização assistida homóloga A grande dificuldade que a questão suscita diz respeito em última análise aos direitos da pessoa gerada nesse tipo de filiação A vontade do genitor ou da genitora expressa no sentido de não ter esse filho seria suficiente para descaracterizar a filiação O menino ou menina assim gerado teria só mãe ou pai dependendo de quem tivesse cometido a geração fraudulenta E se nenhum deles se envolveu na fraude de quem o rebento seria filho Do laboratório Pelos valores que atualmente a sociedade nutre os filhos da fraude ou do laboratório não poderiam ser discriminados Teriam direito ao reconhecimento da paternidade ou maternidade biológica mesmo após o falecimento dos genitores No futuro em continuando seu curso o processo de despatrimonialização do direito de família a lei talvez dê a essa questão uma solução diferente 12 Filiação por substituição Pelo estágio atual de evolução da ciência a criação de novo ser da espécie humana depende de três coisas espermatozoide microgameta óvulo macrogameta e útero Aliás só se constitui um novo sujeito de direito quando o espermatozoide fecunda o óvulo e o embrião assim formado alojase no útero de uma mulher Enquanto é só embrião in vitro não há sujeito de direito mas simples coisa cujas célulastronco podem mediante autorização dos genitores ser destinadas à pesquisa ou terapia quando inviáveis ou após três anos de congelamento Lei n 111052005 art 5º Antigamente quando duas pessoas casadas queriam ter filhos só havia uma possibilidade o esposo fornecia o espermatozoide e a esposa o óvulo e o útero numa relação sexual Mas quando qualquer um desses três elementos espermatozoide óvulo e útero por qualquer razão natural não estava apto a cumprir sua função no processo reprodutivo da espécie humana frustravase o desejo de fazer descendência Inúmeros casais amarguravam o fracasso em pouco podendo ajudar a medicina no tratamento das disfunções originárias dessa dor Hoje em dia a ciência médica permite muitas outras combinações além do fornecimento do microgameta pelo esposo e do macrogameta e útero pela esposa para que os casados possam ter filhos São elas 1ª O esposo fornece o espermatozoide a esposa o óvulo e outra mulher o útero DTU doadora temporária de útero Nesse caso a filiação não é por substituição mas biológica não natural por decorrer do emprego de técnicas de fecundação assistida homóloga As principais questões jurídicas ligadas a essa forma de reprodução assistida foram já examinadas subitem 11 Mas falta tratar da doação temporária de útero conhecida vulgarmente como barriga de aluguel o que será feito adiante subitem 122 2ª O esposo fornece o espermatozoide e outra mulher que não a esposa fornece o óvulo mãe de substituição ou doadora genética DG e o útero DTU Aqui a técnica empregada na fecundação é uma das de fertilização assistida heteróloga porque a mãe que constará do registro de nascimento não forneceu o gameta A gestação nessa possibilidade é feita também por mulher diversa 3ª O esposo fornece o espermatozoide outra mulher que não a esposa o óvulo DG e uma terceira o útero DTU Não coincidem aqui as doadoras genética e temporária do útero Tratase de esquema que contribui para a redução das sérias implicações psicológicas envolvidas na questão Como a mulher que gera não fornece o gameta e a que o fornece não responde pela geração presumese que os vínculos psicológicos entre as doadoras e o bebê tendem a ser menores contribuindo para reduzir os conflitos de interesses 4ª A esposa fornece o óvulo e o útero e outro homem que não o esposo o espermatozoide Também se trata de fecundação assistida heteróloga Da hipótese cuida de forma transversa o Código Civil ao exigir a prévia autorização daquele que figurará como pai na certidão de nascimento para presumirse a paternidade dele CC art 1597 V 5ª A esposa fornece o óvulo outra mulher o útero DTU e outro homem o espermatozoide Uma vez mais a técnica empregada é de fecundação assistida heteróloga No dispositivo mencionado acima a lei no emaranhado da complexa questão preocupouse apenas em presumir a paternidade do homem que consta como pai da certidão de nascimento se ele deu prévia autorização à inseminação da DTU com o óvulo da esposa 6ª A esposa fornece o útero o espermatozoide é fornecido por outro homem que não o esposo e o óvulo por outra mulher que não a esposa DG 7ª no casamento entre duas mulheres uma delas fornece o óvulo e a outra o útero sendo o espermatozóide fornecido por quem necessariamente não é cônjuge gestação compartilhada 8ª O espermatozoide é fornecido por outro homem que não o esposo e o óvulo e útero por outra ou outras mulheres que não a esposa Nesse caso pai e mãe não participam biologicamente da filiação Nem todas essas possibilidades teoricamente abertas à ciência são aceitáveis sob o ponto de vista da ética profissional Na última por exemplo descabe a reprodução assistida e os cônjuges são aconselhados a adotar uma criança Se não fornecerão nenhum gameta nem a mulher vivenciará a experiência da gravidez será melhor para eles e para a sociedade a adoção de criança abandonada ou desamparada A reprodução assistida nesse caso visaria unicamente atender à necessidade psicológica de ter sido do casal a iniciativa de conceber e gerar o novo ser Essa vontade não pode ser prestigiada pela ética enquanto houver gente concebida gerada e nascida precisando de pais Os médicos estão sujeitos à responsabilização profissional inclusive com a cassação do registro se adotarem procedimentos não autorizados pela Res n 21212015 do Conselho Federal de Medicina que disciplina a Reprodução Assistida RA Essa regulamentação de ética profissional limita as iniciativas e embora não vincule senão os médicos acaba tendo o sentido de norma geral porque em tese ninguém consegue ser pai ou mãe com o emprego de técnica de reprodução assistida senão com o concurso de médico atento à deontologia de seu mister Em todas as combinações acima independentemente da ascendência biológica ou do processo gestacional esposo e esposa serão os pais da criança assim concebida e gerada Em outros termos são pais para fins jurídicos os contratantes dos serviços de fertilização assistida com doação de gameta masculino feminino ou de ambos com ou sem gestação por substituição Aqueles que procuraram uma clínica de fertilização e contrataram os serviços médicos com o fim específico de ter filho são os pais do bebê que virem a gerar para todos os fins de direito O nome deles e não dos doadores genéticos ou da doadora temporária do útero é que deve figurar na certidão de nascimento Quem não consegue ter filhos por meio natural pode se submeter a técnica de reprodução assistida que se realiza pela doação de gameta ou temporária de útero O contratante dos serviços médicos será para todos os fins de direito o pai ou mãe da pessoa que vier à luz por sua iniciativa Por razões de ordem didática tratei até aqui do desejo de homem e mulher casados terem filhos Mas o que se disse a respeito deles pode ser inteiramente aplicado às demais situações jurídicas como a união estável entre pessoas de sexos diferentes ou iguais o casamento homossexual ou a família monoparental paterna ou materna 121 Autorização da fecundação heteróloga A lei brasileira como já ressaltado não disciplina sistematicamente a questão da filiação por substituição Mas tangencia o tema ao dispor sobre as presunções de paternidade em que acaba por estabelecer certas condições legais para o emprego de técnica de fertilização heteróloga O art 1597 V do CC estabelece a presunção de paternidade para os filhos havidos por inseminação artificial heteróloga se houve prévia autorização do marido Não é necessário note que a autorização seja escrita porque a lei não exige forma específica Nos Estados Unidos exigese o consentimento escrito dos dois cônjuges mas entre nós basta que o marido tenha adotado comportamento incompatível com a discordância relativamente à implantação no útero de sua mulher de embrião fecundado por espermatozoide de outro homem para que se considere autorizado por ele o procedimento médico Lobo 2004509510 Se sempre acompanhou a esposa ou convivente à clínica custeou o tratamento ou parte dele estava autorizando a filiação por substituição A autorização só é eficaz enquanto existir o vínculo de conjugalidade entre os contratantes dos serviços de reprodução assistida Vindo a falecer quem deu a autorização ou ocorrendo a ruptura do casamento ou união estável por qualquer outro motivo cessa a presunção de paternidade Se a mulher contratar a implantação do embrião em seu útero ou no de uma DTU será somente dela o filho assim gerado Como o inciso V do art 1597 do CC não menciona ao contrário dos incisos III e IV que tratam da reprodução assistida homóloga qualquer tempo ou morte do marido devese considerar que a lei legitima a procriação artificial heteróloga por substituição do gameta masculino só enquanto o marido ou companheiro cujo nome seria lançado no assento civil da pessoa assim concebida como pai for vivo e conjugalmente ligado à mãe Welter 2003101 e 212214 Não se admite em outros termos a filiação post mortem senão na hipótese de reprodução assistida homóloga Em razão do princípio constitucional da igualdade as mesmas condições devem ser observadas também no caso de filiação por substituição do gameta feminino Ela não pode ser feita sem a autorização da esposa ou convivente ou depois do falecimento dela ou desconstituição do vínculo conjugal Evidentemente se ela se submete ao implante em seu útero do embrião derivado da fecundação de óvulo de outra mulher por espermatozoide de seu marido ou convivente estará dando seu mais completo assentimento à heterologidade da filiação Claro está por outro lado que a hipótese de reprodução assistida com substituição do óvulo na falta de autorização da mulher cujo nome constará do assentamento civil como mãe ou depois de sua morte ou desligamento do pai depende necessariamente de DTU Ou seja esta hipótese tende a ser bem menos frequente do que a de utilização de microgameta substituto com o objetivo de imputar a paternidade a quem anteriormente dera embora em outras circunstâncias a autorização para a fecundação assistida heteróloga A fertilização assistida heteróloga depende de autorização do pai ou mãe dependendo de quem tenha tido o gameta substituído Essa autorização só é eficaz enquanto existir o vínculo de conjugalidade com o outro contratante dos serviços de reprodução assistida Pois bem e se ocorrer a reprodução assistida heteróloga sem a devida autorização e eventualmente com desrespeito à norma ética de quem será o filho No caso de substituição não consentida do gameta masculino em vista do princípio do anonimato da doação genética essa criança será registrada somente no nome da mãe Integrará junto com a mulher que tratou de sua concepção e eventualmente também geração artificial uma família monoparental mas não terá direito ao reconhecimento de paternidade Já na substituição não consentida do gameta feminino a questão é um tanto mais complexa porque a doadora temporária do útero não deve ser considerada a mãe da criança Sua participação na reprodução assistida limitouse a proporcionar o ambiente natural necessário à gestação Ela pode nem ser a doadora genética tendo sido o macrogameta aproveitado de banco de óvulos ao amparo do princípio do anonimato Entendo que a resposta mais adequada por mais estranha que pareça é a mesma dada à questão anterior O rebento integrará uma família monoparental constituída junto com o adulto que havia contratado os serviços de reprodução assistida Essa criança deve ser então registrada apenas com a identificação do pai e não terá direito ao reconhecimento da maternidade 122 Doação temporária de útero De acordo com o item VII da Res n 21212015CFM a doação temporária de útero aluguel de barriga só pode ocorrer em duas hipóteses i nas relações homoafetivas e ii nas relações heteroafetivas se a mãe não tiver condições por razões médicas de abrigar a gestação do embrião Neste segundo tipo de relação matrimonial somente se a contratante dos serviços de reprodução assistida tiver problema médico que impeça ou contraindique a gestação poderá ser o embrião implantado no útero de outra mulher Mesmo que não tenha sido ela a fornecedora do óvulo tendo saúde para a gravidez o implante será obrigatoriamente feito no útero da usuária isto é da mulher contratante dos serviços médicos A doadora do útero quando permitida a doação deve ter em princípio parentesco até o quarto grau de um dos contratantes dos serviços de reprodução assistida Quer dizer ela deve ser mãe avó irmã tia ou prima de qualquer um dos contratantes dos serviços de RA Não havendo esse vínculo de parentesco o médico deve antes pedir a autorização do Conselho Regional de Medicina a que estiver vinculado Outra determinação da regulamentação profissional da reprodução assistida relacionada à DTU é a proibição de a doadora ter com seu ato qualquer lucro Podem e devem os contratantes do serviço de fertilização artificial ressarcir as despesas que a gravidez trará para a doadora assim como indenizála por algum prejuízo que o estado de grávida lhe acarrete como a dificuldade de encontrar emprego Mas a regulamentação não permite qualquer remuneração pelo serviço prestado Pelas normas baixadas pelo Conselho Federal de Medicina não é admissível a doação temporária de útero DTU com finalidade lucrativa e por quem não seja em princípio parente até quarto grau de qualquer um dos contratantes dos serviços de reprodução assistida Essas limitações não se encontram na lei não vinculando por essa razão os casais Sua inobservância pode no máximo levar à responsabilização profissional do médico responsável Essas limitações de ordem ética como dito não vinculam senão os médicos Apenas eles estão sujeitos ao poder normativo do Conselho Federal de Medicina e expostos a sanções no caso de desobediência Pela ordem constitucional vigente ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei Desse modo não se pode dizer propriamente que os casais estão proibidos de contratar a DTU de modo diverso do previsto na norma deontológica do CFM Como em princípio eles terão dificuldades de encontrar alguma clínica de fertilização disposta a atendê los fora dos padrões desta regulamentação na prática é como se essa norma ética fosse legal No meu modo de entender a questão não é injurídico o contrato de prestação de serviços de gestação inclusive quando prestado de forma remunerada por mulher sem vínculo de parentesco Qualquer trabalho manual ou intelectual importa ao trabalhador dar algo de si de seu corpo de suas energias para o contratante Não há nenhuma diferença sob esse ponto de vista entre o advogado que vara a madrugada redigindo a minuta de contrato para atender ao prazo combinado com o cliente e a mulher que se propõe a gerar em seu ventre o filho da contratante Evidentemente a questão é bastante polêmica e predomina na doutrina o entendimento contrário à validade desse contrato Leite 1995401419 Tenho para mim também que a mulher saudável com plenas condições orgânicas para gerar uma criança tem também o direito de contratar a DTU Ela pode ter interesse em contratar a gestação de seu filho biológico por outra mulher porque não lhe agrada ou convém ficar grávida É irrelevante o motivo pelo qual deseja ser mãe sem parir a gravidez pode atrapalhar sua carreira profissional ou alterarlhe o corpo de maneira não querida cf Araújo 19992931 Na disciplina legal da matéria esse interesse deveria ser amplamente protegido Tratase de manifestação do direito de personalidade referente ao próprio corpo por ela titulado que a lei não pode ignorar Para a sociedade por outro lado é igualmente útil que não só a maternidade como a gravidez sejam atos conscientes das mulheres respeitandose as decisões que adotam Sob a perspectiva do filho a gravidez indesejada da mãe pode lhe acarretar problemas psicológicos que a DTU contribuiria para evitar 123 Anonimato do doador de gameta Em novembro de 2005 a revista britânica New Scientist publicou a história de um jovem de 15 anos que descobriu o nome do doador do gameta masculino empregado em sua fertilização assistida usando apenas as informações de seu próprio ADN DNA a data e local de nascimento do doador e dados genealógicos disponíveis na internet O impressionante da história é que todas as medidas de preservação do anonimato da doação haviam sido fielmente adotadas Nenhum dos trabalhadores do banco de sêmen deixou de cumprir rigorosamente com suas funções observando com perfeição todos os procedimentos e cautelas exigidos para preservar anônimo e desconhecido o doador mas isso não foi o suficiente para impedir que o filho o encontrasse E de um modo lícito e surpreendentemente simples O jovem tendo em mãos suas informações genéticas obtidas por teste de ADN em saliva disponibilizouas num site genealógico que faz o cruzamento desses dados de seus usuários Esse site é procurado por pessoas interessadas em localizar parentes ampliar os contatos dentro da família ou conhecer suas raízes A informação genética do doador não constava do banco de dados do serviço online Nove meses depois contudo o jovem foi procurado por dois outros usuários cujos cromossomos Y coincidiam com os dele Havia a probabilidade de 50 de provirem os três do mesmo pai avô ou bisavô Os sobrenomes desses outros usuários eram parecidos embora possuíssem grafia ligeiramente diversa A mãe dele para escolher o sêmen havia obtido do banco algumas informações genéricas sobre os potenciais doadores Eram dados que até então seriam insuficientes para nortearem por eles apenas qualquer investigação A data e local do nascimento do doador estavam entre as informações fornecidas O jovem então buscou em outro site a lista de todas as pessoas nascidas no mesmo lugar e data que o seu genitor Só um homem tinha o sobrenome de seus parentes biológicos conhecidos por meio do primeiro site Dez dias depois o jovem teria feito contato telefônico com o doador do espermatozoide usado em sua concepção A divulgação dessa notícia preocupou os profissionais envolvidos com a reprodução assistida A garantia do anonimato da doação de esperma e óvulo é condição indispensável para estimular as doações A mostra da cabal impotência dos bancos de gametas em preservar o anonimato do doador certamente refreou algumas iniciativas Se em 2005 um cidadão de país central do capitalismo com um pouco de sorte conseguiu chegar facilmente ao genitor em algumas décadas será impossível impedir em qualquer parte do mundo que os filhos gerados por substituição de gameta encontrem os respectivos doadores A doação de espermatozoide ou óvulo deve ser feita sem intuito lucrativo princípio da gratuidade e sem identificação do doador princípio do anonimato Mesmo que apesar das cautelas adotadas na preservação do anonimato do doador a pessoa gerada por substituição de gameta venha a encontrar o genitor ou genitora estes últimos não podem ser considerados juridicamente pai ou mãe dela A Res n 21212015CFM enuncia dois princípios fundamentais para a doação de gametas a gratuidade item IV1 e o anonimato item IV2 Pelo primeiro não se admite nenhuma remuneração ao doador de material genético Além de ser considerada contrária à ética a comercialização de partes do corpo a possibilidade de lucro com o fornecimento de esperma ou óvulo levaria pessoas necessitadas a fazerem mais doações sem proveito nenhum para o sistema em vista da limitação do emprego de material genético doado na região da clínica centro ou serviço de reprodução assistida gametas de um mesmo doador só podem ser utilizados no máximo em uma gestação numa área de um milhão de habitantes O princípio do anonimato busca impedir que os doadores conheçam a identidade dos receptores e estes a daqueles Tratase de garantia para as duas partes nenhuma delas pode ser perturbada por pleitos da outra O sigilo sobre a identidade dos doadores e receptores é absoluto autorizado o fornecimento de informações disponíveis acerca dos primeiros exclusivamente a médicos e por razões médicas Desse modo o geriatra que cuida de paciente concebido por técnica de fertilização assistida heteróloga pode necessitar para definir a estratégia do tratamento de informações genéticas do fornecedor do gameta substituto Terá acesso aos dados disponíveis no banco de gametas mas não à identidade dele O sigilo da identidade do doador só pode ser quebrado por ordem judicial O juiz no entanto só deve requisitála ao banco de gametas em situações especialíssimas Não cabe por exemplo a quebra da identidade do doador ou doadora a pedido do filho interessado em atribuirlhe a paternidade ou maternidade Ele possui pai e mãe que desde cedo o queriam com tanta intensidade que foram buscar ajuda médica Quer dizer o interessado não é ninguém desamparado e desamado Do outro lado não há alguém procurando furtarse de suas responsabilidades O doador limitouse a ajudar desinteressadamente pessoas desconhecidas não tendo em nenhum momento manifestado a menor intenção de se tornar sob o ponto de vista jurídico pai ou mãe da pessoa concebida com seu material genético cf Veloso 1997152153 A tendência da despatrimonialização do direito de família recomenda por fim que filho por substituição não tenha direito de investigar a paternidade biológica Além do desrespeito completo à vontade do doador e aos sentimentos daquele que consta como pai ou mãe da certidão de nascimento a admissão pela jurisprudência da quebra do anonimato da doação para fins de reconhecimento de paternidade ou maternidade importaria o mais absoluto descrédito de um dos princípios básicos da reprodução assistida Sem a garantia mínima do anonimato que como mostra o caso narrado na New Scientist está cada vez mais vulnerável é provável que se reduza ainda mais o já pequeno interesse em doação de gameta Por isso para a sociedade em geral não interessa o conhecimento pelo filho nascido de filiação por substituição da identidade do genitor ou genitora nem o reconhecimento judicial da paternidade ou maternidade Em que caso especialíssimo então caberia a quebra do sigilo da identidade do genitor ou genitora Ela caberá quando informações acerca do doador úteis ou necessárias ao tratamento da saúde de qualquer pessoa de sua descendência biológica não existirem nos arquivos do banco de gametas Neste caso o juiz pode determinar seja revelada a identidade do doador para que o dado auxilie encontrar o homem ou mulher que fornecera o material genético e possam ser enfim obtidas aquelas informações 13 Filiação socioafetiva A filiação socioafetiva constituise pelo relacionamento entre um adulto e uma criança ou adolescente que sob o ponto de vista das relações sociais e emocionais em tudo se assemelha à de pai ou mãe e seu filho Se um homem mesmo sabendo não ser o genitor de criança ou adolescente tratao como se fosse seu filho tornase pai dele Do mesmo modo a mulher se torna mãe daquele de quem cuida como filho durante algum tempo Nessa espécie de filiação entrecruzamse duas verdades De um lado a verdade biológica pela qual o filho sabidamente não porta a herança genética do pai ou mãe De outro a verdade socioafetiva manifestada por condutas do adulto em relação à criança ou adolescente na intimidade da família e nas relações sociais que se assemelham às de qualquer outra filiação Nessa espécie de filiação a verdade socioafetiva prepondera sobre a biológica Fachin 2003a2230 Se o marido ou companheiro da mãe sabe não ser o genitor do filho dela mas o trata como se fosse o pai do vínculo de afeto surge o da filiação Igualmente se a esposa acolhe o filho que o cônjuge teve em relacionamento extraconjugal e o cria e educa como dela vira mãe do rebento Muitas vezes nessas situações e noutras típicas de filiação socioafetiva não há discrepância entre o contido no registro de nascimento do filho e a situação de fato O marido ou companheiro da mãe declarase o pai no registro de nascimento Em outros termos o casal simula a adoção ou como se diz faz a adoção à brasileira do filho havido pelo esposo fora do casamento Quer dizer o registro normalmente confere com a realidade social embora não com a genética Veja que a preponderância da verdade socioafetiva sobre a biológica não tem sido prestigiada na solução de conflitos de interesses de natureza diversa No caso de troca de bebês na maternidade por exemplo a jurisprudência tem resolvido a questão dando à verdade biológica maior relevo que à socioafetiva ao determinar a destroca para que cada filho volte às mãos dos seus genitores Surgida a filiação do afeto a ela se ligam tanto os pais como o filho O pai deixa de ter o direito à negatória de paternidade fundada na inexistência de transmissão de herança genética Se sabendo não ser o genitor cuidou de alguém como se fosse seu filho não pode mais renegálo fundado na verdade biológica O conceito de filiação socioafetiva tem sido adotado na jurisprudência brasileira predominantemente com o objetivo de impedir que o homem depois de anos se portando como pai de alguém por razões que normalmente não dizem respeito direto ao relacionamento paternal rompimento com a mãe novo casamento ou união estável etc pretenda se exonerar de responsabilidades patrimoniais Com esse desiderato na Alemanha desde 2004 a lei dispõe sobre a paternidade socioafetiva Na Itália França e Espanha a noção de posse do estado de pai tem sido empregada para obstar ações de contestação de paternidade Frank 20058597 Por ser incomum a negatória de maternidade não se tem notícia ainda do emprego da noção de filiação socioafetiva para fins de afastar a pretensão da mulher de não cumprir suas obrigações de mãe Ela porém está igualmente vinculada ao filho por força do afeto cultivado entre os dois como estaria um homem na mesma situação A filiação socioafetiva constituise pela manifestação do afeto e cuidados próprios das demais espécies de filiação entre aquele que sabidamente não é genitor ou genitora e a pessoa tratada como se fosse seu filho Note contudo que a filiação socioafetiva também vincula o filho Se não está desamparado economicamente ele não tem o direito de invocar a verdade biológica para demandar o reconhecimento da paternidade ou maternidade em desrespeito aos cuidados e amor recebidos de seu pai ou mãe socioafetivo Entendase bem a implicação jurídica da filiação socioafetiva para o descendente Se ele precisa de alimentos porque não os pode prover o pai ou mãe socioafetivo então mediante anuência deste último poderá intentar a ação de reconhecimento de paternidade ou maternidade com o objetivo de obrigar o genitor ou genitora a pagálos Mas se tem sido satisfatoriamente alimentado cuidado e educado pelo pai ou mãe socioafetivo não poderá propor contra o genitor ou genitora a ação de reconhecimento de paternidade ou maternidade ainda que o seu padrão de vida pudesse experimentar a final sensível melhora A tendência da despatrimonialização do direito de família conduz o conceito de filiação socioafetiva para essa implicação cf Welter 20031641173 O filho vinculado à filiação socioafetiva titula o direito de conhecer sua ascendência genética para fins médicos cf Zanellato 2004 Poderá assim demandar a pessoa que provavelmente é seu genitor ou genitora para que ela se submeta a exame em ADN confirmatório ou desconfirmatório das informações de que dispõe sobre sua ancestralidade Provada em juízo a razoabilidade da suspeita de ser o demandado o genitor ou genitora do demandante o juiz poderá condenálo sob pena de multa periódica a fazer o exame com o único objetivo de uma vez confirmada a vinculação biológica proporcionar ao autor da ação o acesso a informações úteis ao tratamento da própria saúde ou de sua descendência O direito à informação genética é autônomo em relação ao do reconhecimento de paternidade ou maternidade 14 Adoção A adoção é processo judicial que importa a substituição da filiação de uma pessoa adotado tornandoa filha de outro homem mulher ou casal adotantes Ela está regida no direito positivo brasileiro pela Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente ECA quando o adotado tem até 12 anos de idade incompletos criança ou entre 12 e 18 anos de idade adolescente CC art 1618 Sendo maior de 18 anos o adotado a adoção dependerá da assistência efetiva do Poder Público e de sentença judicial aplicandose subsidiariamente o ECA CC art 1619 Quando o Código Civil entrou em vigor em 2003 contemplava disposições sobre a adoção não inteiramente compatíveis com as do ECA dando ensejo a dúvidas sobre a vigência desse estatuto A doutrina concluiu na oportunidade que o Código Civil por conter normas de caráter geral não havia revogado o ECA lei especial para a infância e adolescência Fachin 2003239 Grisard Filho 2003 Somente em 2009 espancaramse todas as dúvidas com a edição da Lei n 120102009 que revogou as disposições específicas do Código Civil sobre adoção mantendo nesse diploma apenas remissões genéricas e supletivas ao ECA A adoção é no direito brasileiro uma medida excepcional Quando a situação da criança ou adolescente reclama intervenção do Estado devese priorizar sua manutenção na família natural ou extensa Apenas quando constatada a inviabilidade dessa medida podese cogitar de adoção da criança ou do adolescente por família substituta Em princípio a adoção rompe completamente os vínculos do adotado com seus pais e parentes consanguíneos atribuindolhe a situação de filho do adotante para todos os fins Nem mesmo a morte dos adotantes restabelece a filiação biológica dissolvida pela adoção ECA art 49 O impedimento matrimonial é o único vínculo que remanesce entre de um lado o adotado e de outro seus pais e parentes biológicos ECA art 41 O adotado continua não podendo se casar com a antiga irmã por exemplo A adoção só não desfaz os vínculos de filiação e parentesco anteriores quando o adotante é cônjuge ou convivente do pai ou mãe do adotado ECA art 41 1º Nesse caso o rompimento é parcial e diz respeito apenas ao vínculo de filiação mantido com o ascendente do mesmo sexo do adotante Quer dizer se o esposo adota o filho da esposa ou o companheiro o da companheira o adotado rompe o vínculo de filiação com o pai consanguíneo mas continua filho de sua mãe biológica Do mesmo modo se a esposa adota o filho do esposo ou a companheira o do companheiro desfazse a filiação com a mãe consanguínea mas ela é preservada em relação ao pai Rompidos total ou parcialmente os vínculos com seus genitores e parentes o adotado passa a ser para todos os efeitos legais filho do adotante ou dos adotantes Isso significa que fica submetido ao poder familiar titulado por esse último mas tem direito aos alimentos e de participação na sucessão Não há como já mencionado nenhuma diferença entre o filho por adoção e o de qualquer outra espécie de filiação ou perfilhação Uma das manifestações do surgimento de novo vínculo de filiação em substituição ao consanguíneo é a troca do sobrenome dos genitores do adotado pelo do adotante bem assim a possibilidade de escolha de um novo prenome tanto pelos adotantes como pelo próprio adotado Se a mudança do prenome é iniciativa dos adotantes o adotado deve ser ouvido ECA art 47 5º A idade mínima para alguém adotar é 18 anos ECA art 42 caput Em 2017 duas importantes inovações foram introduzidas no ECA na parte relativa à adoção Uma diz respeito à licitude de a mãe ou gestante externar a vontade de encaminhar o filho para a adoção antes ou logo após o nascimento art 19A outra institui o programa do apadrinhamento destinado a proporcionar vínculos externos à instituição em que se encontram crianças e adolescentes art 19B A adoção de crianças até 12 anos incompletos e adolescentes entre 12 e 18 anos regida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é medida excepcional cabível apenas se frustrada a manutenção deles na família natural ou extensa A adoção pode ser nacional subitem 141 ou internacional subitem 142 segundo o domicílio dos adotantes se situe no Brasil ou no exterior 141 Adoção nacional Os requisitos para a adoção nacional de criança ou adolescente são cinco a inviabilidade da manutenção na família natural ou extensa b vantagens para o adotado e legitimidade dos motivos do adotante c consentimento dos pais do adotando e sendo adolescente também o dele d sentença deferindo a adoção proferida em processo judicial após o obrigatório estágio de convivência do requerente e o menor e capacidade e legitimidade do adotante Inviabilidade da manutenção na família natural ou extensa A criança e o adolescente devem crescer e se preparar para a vida adulta no seio de sua família natural É esta a melhor alternativa para sua formação psicológica por menos preparados que estejam os integrantes da família natural para a tarefa Não se mostrando viável a manutenção das crianças e adolescentes no âmbito da família natural devese priorizar a integração à família extensa ou ampliada assim considerada a constituída por parentes próximos com os quais a criança ou o adolescente conviva e mantenha vínculos de afinidade e afetividade ECA art 25 parágrafo único Somente depois de demonstrada a inviabilidade da inserção da criança ou adolescente numa família extensa pode ser deferida a sua adoção por família substituta Vantagens para o adotado e legitimidade dos motivos do adotante O requisito mais importante da adoção diz respeito às vantagens para o adotado e legitimidade dos motivos do adotante ECA art 43 A criança ou adolescente deve experimentar com a adoção uma mudança substancial de vida e para melhor A mudança pode não ser econômica e patrimonial mas desde que seja palpável justificase a medida Se o menor continuar desamparado ou piorar sua condição material a adoção não poderá ser concedida Também os motivos que levaram os adotantes a requerer a adoção devem ser investigados pelo Poder Judiciário É legítimo casais sem filhos procurarem os serviços de adoção para preencher essa grave lacuna em suas vidas Mas não há legitimidade por exemplo se o objetivo é simplesmente contar com alguém que ajude nas tarefas domésticas e venha a contribuir com parte dos ganhos de seu trabalho para a manutenção dos adotantes Ajudas e contribuições materiais podem existir quando espontâneas durante a menoridade do adotado mas nunca podem ser o objetivo da adoção Havendo dúvidas quanto à sinceridade e absoluto desinteresse material do pleito dos adotantes a adoção não pode ser concedida O requisito mais importante para a adoção é a vantagem para o adotado e a legitimidade da motivação do adotante Consentimentos Os pais biológicos da criança ou adolescente ou seus representantes legais devem consentir com a adoção Se os dois genitores estão mortos o consentimento deve ser dado pelo tutor da criança ou adolescente observada a ordem legal de nomeação Dispensase o consentimento dos pais ou representantes legais em duas hipóteses somente se forem desconhecidos ou tiverem sido destituídos do poder familiar sem a nomeação de tutor ECA art 45 Se for o adotando adolescente tiver mais de 12 anos o seu consentimento também será obrigatório ECA art 45 2º A partir da adolescência a vontade do menor passa a ser decisiva para a constituição do vínculo de filiação por adoção Na adoção de criança ou adolescente o consentimento manifestado no processo judicial é irrevogável Os prejuízos emocionais para o menor seriam enormes se os pais ou o representante legal dessem o consentimento e depois antes da sentença concessiva da adoção o retirassem Por isso o ECA não confere nenhuma eficácia à retratação dos pais ou representante legal Outro requisito diz respeito ao consentimento dos pais naturais ou do tutor do menor adotando bem assim a dele se tiver já alcançado a adolescência Processo judicial e estágio de convivência Exatamente para que seja atendido o requisito fundamental da adoção de trazer vantagens para o adotado e fundarse em motivos legítimos do adotante a Constituição Federal determina que a adoção seja assistida pelo Poder Público art 227 5º Esse preceito constitucional foi interpretado de modo tão sério pela lei que atribuiu a competência para cuidar do assunto ao Poder Judiciário ao invés de deixálo como poderia a cargo de repartições do Poder Executivo Para desincumbirse adequadamente de suas funções o Poder Judiciário deve organizar em cada comarca ou foro regional o cadastro das crianças e adolescentes em condições de serem adotadas e o de pessoas interessadas em adotar A inscrição nesses cadastros depende de prévia consulta aos órgãos técnicos do Juizado da Infância e da Juventude e ao Ministério Público ECA art 50 Quem pretende adotar certa pessoa assim deve propor a ação judicial correspondente requerendo a adoção O processo judicial é indispensável segundo o direito brasileiro para a constituição do vínculo de filiação entre adotante e adotado Nele os adotantes não poderão fazer se representar por procurador por ser vedada a adoção por mandatário ECA art 39 2º devendo praticar os atos que lhes cabe pessoalmente Feito o requerimento o juiz fixa em função das peculiaridades do caso a duração que deve ter o estágio de convivência entre as partes O objetivo dessa importante fase do processo de adoção é proporcionar uma mostra de como será a vida em família depois da adoção de modo a verificar se há a compatibilidade entre as pessoas envolvidas que mostrem a conveniência da medida O estágio de convivência pode ser dispensado pelo juiz apenas se o adotando já estiver sob a tutela ou guarda legal do adotante durante tempo suficiente para que se avalie a conveniência da adoção ECA art 42 6º Tendo em mãos o relatório do estágio de convivência e ouvindo as partes adotante adotado adolescente pais ou representantes legais do adotado o juiz se convencido de que a adoção trará benefícios ao menor e são legítimos os motivos do requerente profere a sentença constitutiva do vínculo de filiação Os efeitos da adoção dãose com o trânsito em julgado da sentença concessiva ECA art 47 7º Os nomes dos adotantes e de seus ascendentes serão lançados no registro civil do adotado como pais e avós cancelandose o registro original ECA art 47 e 1º e 2º O mandado judicial ficará arquivado em cartório mas dele não se dará certidão a não ser por determinação do juiz para salvaguarda de direitos igualmente não se fará nenhuma observação nas certidões expedidas da adoção são medidas determinadas na lei para preservar o adotado de quaisquer preconceitos art 42 3º e 4º Se o adotante depois de manifestar inequivocamente a vontade de adotar vier a falecer antes do fim do processo judicial o juiz poderá deferir a adoção Nesse caso retroagem à data do óbito os seus efeitos ECA arts 42 6º e 47 7º A ação de adoção não poderá durar mais que 120 dias prorrogáveis sob justificativa por uma única vez por igual período ECA art 47 10 A adoção depende de processo judicial em que o juiz concederá a adoção se a medida revelarse oportuna a partir do estágio de convivência entre o adotado e o adotante Capacidade e legitimidade do adotante A criança ou adolescente só pode ser adotado por pessoa maior desde que não seja seu ascendente ou irmão e tenha pelo menos 16 anos a mais que o adotando ECA art 42 1º e 3º Exigese o interregno para evitar o uso do instituto por quem evidentemente não reúne as condições naturais para se responsabilizar como pai ou mãe Qualquer pessoa natural nessas condições pode adotar individualmente a criança ou adolescente Nada obsta a adoção pelo solteiro viúvo separado ou divorciado que viva sozinho hipótese em que se constituirá uma família monoparental Aliás mesmo que o adotante seja casado ou viva em união estável admitese a adoção unilateral Precisará contudo nesse caso da anuência do outro cônjuge ou convivente ECA art 165 I O marido pode adotar individualmente com a concordância da mulher assim como essa o pode fazer se autorizada por aquele do mesmo modo que os conviventes O adotante portanto não precisa ser solteiro viúvo separado ou divorciado para habilitarse à adoção unilateral desde que apresente a expressa anuência do cônjuge ou companheiro Ocorrendo o desfazimento da sociedade conjugal como o filho não é comum não há que se falar em disciplina da guarda O adotado continuará necessariamente com o adotante O outro cônjuge terá apenas direito de visita se o requerer Em geral contudo os casados e conviventes adotam em conjunto Para tanto é necessária a comprovação da estabilidade da família Os que foram casados os divorciados ou separados ou mantinham união estável podem adotar em conjunto se o estágio de convivência iniciouse na constância da sociedade conjugal Desse modo separados ou divorciados podem ser adotantes de mesma criança ou adolescente ECA art 42 4º De fato não haveria razões para impedir a adoção nesse caso já que é em tudo semelhante ao do filho cujos pais adotivos se separam ou divorciam Exige contudo a lei a comprovação da existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele adotante não detentor da guarda para que se justifique excepcionalmente a adoção conjunta Caso não comprovada a adoção poderá ser individual Afora essas hipóteses ninguém pode ser adotado simultaneamente por duas pessoas Não titulam o direito à adoção conjunta dois adultos não ligados pelo matrimônio ou união estável Duas pessoas do mesmo sexo ao contrário do que se entendeu no passado Leite 2005 podem adotar desde que vivam em união estável ou sejam casadas Na verdade quando atendidas as mesmas condições estabelecidas para a adoção conjunta por pessoas de sexo diferentes vedála às pessoas de mesmo sexo seria hipocrisia Se o homossexual pode adotar individualmente a criança ou adolescente e trazêla para morar na mesma casa em que vive com seu parceiro ficando os dois adultos de fato exercendo o poder familiar não há motivo nenhum para impedir que essa situação seja juridicamente regular isto é nada obsta senão o preconceito a legitimidade da adoção por duas pessoas do mesmo sexo que vivem em união estável ou sejam casadas Ninguém pode ser adotado por duas pessoas simultaneamente a não ser que sejam casadas ou vivam em união estável Aos separados e divorciados podese conceder a adoção conjunta se o estágio de convivência teve início na constância do casamento Exceto nesses casos a adoção só poderá ser feita por uma pessoa individualmente A adoção conjunta pode ser feita por duas pessoas de sexos diferentes ou do mesmo sexo Argumentase que a lei deveria proibir a adoção por casal de homossexuais porque o crescimento em ambiente irrigado por posturas e padrões de ambos os sexos é essencial à adequada formação da identidade de qualquer pessoa o que é verdade Mas não basta a divergência dos sexos sob o ponto de vista jurídico para garantirse o atendimento a esse importante requisito de saúde psicológica das crianças e adolescentes Como maridos pouco masculinos e esposas não femininas podem adotar e adotam então a lei não está realmente preocupada com esse aspecto da formação da identidade dos adotados 142 Adoção internacional A adoção é considerada internacional quando o adotante tem a sua residência habitual em um dos países signatários da Convenção de Haia e quer adotar criança em outro país signatário ECA art 51 A Convenção de Haia de 29051993 foi promulgada pelo Decreto n 308799 e trata da proteção das criações e da cooperação em matéria de adoção internacional Notese que os estrangeiros domiciliados ou residentes no exterior não são pais melhores ou piores para os brasileirinhos necessitados de adoção São preconceituosas tanto as atitudes radicalmente contrárias às adoções internacionais a pretexto de uma vaga noção de nacionalismo quanto as que a apoiam incondicionalmente manifestando a arraigada falta de autoestima de muitos dos nossos compatriotas A avaliação das vantagens para o adotado e da legitimidade dos motivos do adotante deve ser tão rigorosa quanto a procedida nos processos adotivos movidos por pessoas residentes e domiciliadas no Brasil A adoção por estrangeiros desperta preocupações relacionadas ao tráfico internacional de crianças Se a intenção do adotante é levar o adotado para seu país o Estado brasileiro terá mais dificuldades para proteger o seu cidadão caso não sejam inteiramente sinceras e desinteressadas as motivações declaradas da adoção Por isso e não porque a adoção por estrangeiros poderia de algum modo atentar contra nossa soberania quando o adotante é estrangeiro residente ou domiciliado fora do país a lei a qualifica de medida excepcional ECA art 31 e a cerca de cuidados específicos A adoção internacional somente pode ser deferida após consulta aos cadastros de pessoas ou casais habilitados à adoção da comarca do Estado e nacional e não se encontrar neles nenhum interessado em adotar aquela criança ou adolescente Em outros termos a lei manifesta sua preferência pela adoção nacional Se esta for viável não terá cabimento a adoção internacional A adoção de brasileiros por pessoa residente ou domiciliada no exterior é medida excepcional e depende de cautelas visando impedir que por meio dela tenha curso o tráfico internacional de menores Ressaltese que a adoção não se considera internacional apenas quando postulada por estrangeiros Também se o brasileiro não reside no Brasil ela será internacional O que preocupa a lei é o fato de a criança ou adolescente ir morar no exterior fora da proteção imediata da nossa Justiça 2 Reconhecimento de filho Antiquíssimo brocardo sustenta que a maternidade é certa mas não a paternidade Não é bem assim contudo em vista das muitas situações a que a vida pode conduzir Também a maternidade pode ser duvidosa assim como é possível não haver incertezas quanto ao pai O reconhecimento de filhos é ato ligado essencialmente à filiação biológica Não pode ter por objeto a instituição de filiação adotiva ou socioafetiva Tem lugar quando o registro de nascimento do filho não confere com a verdade biológica de sua concepção por parte da mãe ou do pai excluída a hipótese de filiação por substituição O reconhecimento de filho pode ser voluntário ou decorrer da condenação em ação de investigação de paternidade ou maternidade A rigor ninguém pode ser levado a reconhecer descendente biológico Quando o filho no exercício de seu direito propõe a ação de investigação de paternidade ou maternidade e ela é julgada procedente a sentença produzirá os mesmos efeitos do reconhecimento voluntário CC art 1616 primeira parte Em outros termos havendo discrepância entre o registro de nascimento e a verdade biológica de certa pessoa e não tendo sido ela concebida por fecundação assistida heteróloga a filiação se estabelece entre ascendente e descendente biológicos por duas formas reconhecimento voluntário do filho havido fora do casamento ou procedência da ação investigatória Estabelecida a filiação biológica por qualquer desses meios reconhecimento voluntário ou procedência de ação investigatória o filho passa a titular os direitos aos alimentos e de participação na sucessão Reconhecimento voluntário Só se reconhecem voluntariamente os filhos havidos fora do casamento Os nascidos de mulher casada na constância do casamento têm sempre pai que é o cônjuge dela presunção pater is est Nesse caso a paternidade pode ser contestada também se não houver fundamento genético para o registro mas a iniciativa e o ônus de prova são do marido da mãe item 3 Nos quinze dias seguintes ao nascimento do filho o pai isoladamente ou em conjunto com a mãe tem a obrigação legal de fazer a declaração correspondente Lei n 601573 art 52 1º Nesse momento ao apresentarse como pai da criança faz seu reconhecimento voluntário SE tiver ido sozinho ao cartório informa no ato também o nome da mãe dispensandoa assim de também fazer o reconhecimento Se o pai não cumprir o dever de fazer a declaração de nascimento do seu filho ou estiver impedido de fazêlo caberá à mãe fazêla ampliandose o prazo então para quarenta e cinco dias art 52 2º Comparecendo a mãe sozinha para fazer o registro não poderá o cartório assentar como do pai outro nome que não seja o do marido dela Mesmo que informe ter havido o filho fora do casamento não poderá ser registrado como pai nenhum outro homem Não sendo casada a declarante será promovida a investigação oficiosa da paternidade subitem 21 Registrado o nascimento de filho havido fora do casamento sem menção ao nome do pai o reconhecimento voluntário por parte deste poderá ser feito por escritura pública ou escrito particular O Registro Civil nesse caso arquivando o instrumento lança o nome do pai no assento de nascimento CC art 1609 II Mas se a discrepância entre os dados do assentamento civil e a verdade genética da pessoa a que se refere não decorre da ausência da identificação do pai mas da falsidade dos dados relativos à paternidade ou maternidade a alteração do registro depende de ordem judicial ou seja pressupõe processo em que seja produzida a prova de que o genitor ou genitora voluntariamente reconheceu o filho Além da escritura pública ou escrito particular são meios hábeis para o reconhecimento de filhos o testamento ou manifestação direta e expressa perante o juiz mesmo em processo judicial estranho à investigação da paternidade ou maternidade art 1609 III e IV Ainda antes de nascer o filho pode ser reconhecido por escritura pública ou instrumento particular arquivado em cartório testamento ou declaração em juízo CC art 1609 parágrafo único Se tiver sido feito pelo pai a mãe já deve estar grávida ao tempo do reconhecimento feito pela mãe a doadora temporária de útero é que deve estar Ninguém pode reconhecer validamente filho ainda não concebido É irrevogável o ato de reconhecimento de filho ainda que arrependido o pai ou mãe que o praticou Pereira 19779799 Mesmo no caso de revogação do testamento a cláusula de reconhecimento de filho continuará a produzir seus efeitos CC art 1610 Claro que a qualquer momento sendo demonstrado em juízo que a declaração voluntária não superou a discrepância entre o registro da filiação e sua verdade biológica ou até mesmo a ocasionou poderá o juiz decretar a desconstituição de seus efeitos que não se confunde com a revogação ato unilateral de vontade do declarante Além de irrevogável o ato de reconhecimento não pode ficar sujeito a condição ou termo Será ineficaz a cláusula da declaração de paternidade ou maternidade que a condicionar por exemplo à gratidão do filho ou a limitar temporalmente Ou seja o reconhecimento vale e é eficaz mas a condição ou termo não produz efeito nenhum Reconhecido o filho fora do casamento ele só poderá residir no lar conjugal se o outro cônjuge concordar CC art 1611 mas em qualquer caso o genitor que o tiver reconhecido terá sua guarda Na hipótese de reconhecimento conjunto se os declarantes não chegarem a acordo relativamente à partilha ou compartilhamento da guarda o juiz a deferirá ao pai ou à mãe conforme o melhor interesse do filho art 1612 Se o filho for maior de idade só poderá ser reconhecido mediante seu consentimento Sem a convergência de vontades nesse caso não será suficiente à constituição do vínculo de filiação a declaração do genitor ou genitora Nos quatro anos seguintes à maioridade ou emancipação aquele que tiver sido reconhecido quando menor poderá impugnar o reconhecimento CC art 1614 Esse é o prazo decadencial para o filho buscar a desconstituição em juízo do ato de reconhecimento provando que não se sustenta na verdade biológica de sua concepção Claro que mesmo vencido esse prazo embora não possa mais contestar a validade e eficácia do reconhecimento praticado pelo pai ou mãe que consta de seu registro civil ainda terá direito de demandar o genitor ou genitora em ação de investigação de paternidade que é imprescritível Gonçalves 2005303 O registro de nascimento de filho havido fora de casamento pode não guardar correspondência com a verdade biológica genética de sua concepção porque falta o nome do pai ou porque são falsas as nomeações dele ou da mãe Uma das formas de superar a discrepância é o reconhecimento voluntário do filho feito por escritura pública escrito particular testamento ou declaração em juízo Ação de investigação de paternidade ou maternidade O filho pode propor contra o genitor ou genitora a ação de investigação de paternidade ou maternidade sempre que pretender ver retratada no assento civil a verdade biológica de sua concepção É irrelevante aqui se nasceu na constância de casamento ou de união estável das pessoas mencio nadas como seus pais no registro civil ou não Quer dizer mesmo aquela pessoa nascida em família matrimonial ou fundada em união estável tem o direito em princípio de demandar o genitor ou genitora com vistas a superar a distância entre o assento civil e a verdade biológica Digo em princípio porque as filiações socioafetiva e adotiva também produzem por vezes o efeito de excluir essa ação subitens 13 e 23 Com o estabelecimento da filiação biológica o autor da ação passa a ser filho do réu ou ré para todos os efeitos inclusive alimentares e sucessórios Só não tem o direito à investigação de paternidade o filho havido dentro do casamento ou de união estável por meio de fertilização assistida heteróloga Nesse caso a dissociação entre o registro de nascimento e a verdade biológica é juridicamente incontornável Quem forneceu o material genético não quis senão dar uma ajuda desinteressada a casal desconhecido que precisava de gametas alheios para fazer descendência Como já assentado seu direito se exaure no acesso às informações genéticas úteis ou necessárias a tratamento de saúde não compreendendo o do reconhecimento da paternidade ou maternidade subitem 123 A ação de investigação cabe em princípio exclusivamente ao filho Se ele preferir não demandar o genitor ou genitora está no seu direito Os descendentes e demais parentes sucessíveis do filho a despeito do interesse indireto no reconhecimento não estão legitimados para a ação judicial Apenas se o filho morrer menor ou incapaz ou seja sem ter tido condições para decidir com maturidade pelo ajuizamento da medida o herdeiro terá legitimidade para aforar a investigatória CC art 1606 Uma vez iniciada a ação judicial pelo filho em vida os herdeiros poderão continuála porque a decisão de retratar no registro civil a verdade biológica já havia sido tomada pelo titular do direito art 1606 parágrafo único A outra única hipótese de legitimação para a ação de reconhecimento de paternidade é a do Ministério Público em função dos elementos coligidos durante a investigação oficiosa subitem 21 Parte legítima para figurar como réu na ação de reconhecimento é o genitor ou genitora de quem o demandante pretende ser declarado filho Já se admitiu contudo a ação destinada ao reconhecimento da relação avoenga isto é da existência de parentesco de ascendência em segundo grau em que o autor demandou os avós paternos Gonçalves 2005307308 Birchal 2004 Enquanto é menor o filho deverá ser representado ou assistido por seu representante legal Na maioria das vezes a mãe biológica premida pelas necessidades materiais relacionadas à criação e educação do filho providencia em nome dele a demanda contra o genitor Qualquer pessoa interessada e não somente o demandado pode contestar a ação de investigação de paternidade CC art 1615 Desse modo os demais filhos do indigitado pai ou mãe cuja porção na herança será reduzida em caso de procedência da ação também estão legitimados para contestar o pleito do filho havido fora do casamento A sentença que julgar procedente a ação investigatória pode determinar se isso for do interesse do menor que seja criado e educado fora da companhia dos pais ou daquele que resistiu a reconhecerlhe a paternidade ou maternidade CC art 1616 Com certeza não reúne em princípio plenas condições para desincumbirse com amor das árduas tarefas afetas à função de pai ou mãe aquela pessoa que ostensivamente não deseja o autor da demanda como seu filho Em princípio qualquer pessoa nascida dentro ou fora do casamento ou união estável daqueles que constam como sendo seus pais do assento civil tem o direito de investigar por ação judicial a verdade biológica de sua concepção de modo a titular os direitos de filho de seu genitor ou genitora Só não tem esse direito o concebido dentro de casamento ou de união estável por meio de fertilização assistida heteróloga ou o vinculado a filiação socioafetiva ou adotiva Nas ações de investigação a questão crucial diz respeito à prova da ascendência biológica Demonstrado que o assento civil não retrata com fidelidade a matriz genética do filho desincumbese ele do ônus de demonstrar o erro ou falsidade do registro de nascimento como quer a lei CC art 1604 Não é simples no entanto produzir a prova Mesmo depois da difusão dos exames de ADN se o demandado recusase a fornecer material para sua realização a questão da prova da ascendência biológica remanesce em aberto As dificuldades relacionadas a essa prova quando pertinentes à paternidade são contornadas por meio de certas presunções que serão examinadas a seguir item 4 21 Investigação oficiosa O art 2º da Lei n 856092 introduziu no Brasil um instituto do direito português Silva 2002243 denominado investigação oficiosa de paternidade Malgrado as críticas que o instituto tem recebido Pereira 2003134140 a aplicação desse dispositivo legal tem se revelado um eficiente meio de poupar os envolvidos das dificuldades desgastes emocionais e custos relacionados à ação de reconhecimento Sempre que registrado o nascimento de menor apenas com a maternidade estabelecida o oficial deve remeter ao juiz certidão integral do registro acompanhada dos dados fornecidos pelo declarante acerca do indigitado pai isto é nome e prenome profissão identidade e residência dele Tem início então o procedimento de investigação oficiosa Recebida a certidão e os dados o suposto pai será notificado para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é atribuída É irrelevante o estado civil dele devendo a notificação judicial ser expedida mesmo que ele seja casado Não se autua um processo judicial em razão do caráter oficioso do procedimento mas a numeração deste para fins de controle pode ser feita Se entender conveniente o juiz determinará que a investigação seja feita em segredo de justiça A investigação oficiosa da paternidade deve ser feita pelo juiz sempre que menor for registrado apenas com a determinação da maternidade Se o pai comparecer perante o juiz e confirmar de modo expresso a paternidade será lavrado o termo de reconhecimento remetendose a certidão de seu teor ao oficial do registro para averbação Encerrase nesse caso a investigação oficiosa pelo resultado frutífero a que conduziu Mas não comparecendo o pai nos trinta dias seguintes ao recebimento da notificação judicial ou negando expressamente a paternidade o expediente é remetido ao Ministério Público para que seja intentada a ação de reconhecimento caso evidentemente haja elementos suficientes para isso Se o promotor de justiça considerar que não dispõe de indícios ou provas consistentes para intentar a ação mandará arquivar o expediente da infrutífera investigação oficiosa 22 Excludente da perfilhação Uma das questões mais intrincadas do direito de família diz respeito à possibilidade de o adotado ou do filho socioafetivo intentarem ação de reconhecimento de paternidade ou maternidade em face do genitor ou genitora com o objetivo de desfazerem o vínculo de filiação a que estão ligados para se tornarem filhos biológicos dos demandantes De acordo com a tendência da despatrimonialização do direito de família a resposta acertada para essa questão é a da inexistência do direito ao reconhecimento nesses casos Se o filho ligado a seus pais por vínculos de adoção ou socioafetivos não se encontra ao desamparo sob o ponto de vista emocional e material a perfilhação por outrem pode ser suscitada como matéria de defesa pelo genitor ou genitora demandados Provando o demandado que os pais adotivos ou por relação socioafetiva têm meios de prover os alimentos a ação de reconhecimento deve ser julgada improcedente E assim deve ser mesmo que o demandado por sua condição econômica e patrimonial pudesse garantir como pai ou mãe a melhoria do padrão de vida do demandante Já há precedente jurisprudencial no sentido de negar o direito ao reconhecimento da paternidade fundada exclusivamente na verdade biológica quando o filho foi criado e educado por terceiros que lhe devotaram o amor paternal e maternal Welter 2003164165 No caso a exclusão deuse por força de filiação socioafetiva que vinculava o demandante a outrem mas idênticos fundamentos justificamna no caso da adoção Assim sendo apenas quando os pais socioafetivos ou adotivos não estão em condições de prover os alimentos básicos para o filho e os biológicos podem cabe o reconhecimento da paternidade ou maternidade Somente diante desse quadro o genitor ou genitora demandados ficam inibidos de suscitar como matéria de defesa a perfilhação do demandante por outrem O adotado e o filho socioafetivo não têm direito ao reconhecimento da paternidade ou maternidade biológica a menos que seus pais não tenham meios de prover os alimentos e o genitor ou genitora os tenha Em qualquer caso entretanto poderão demandar os supostos genitores com o objetivo único de ter acesso a informações sobre sua ascendência genética quando úteis ou necessárias ao tratamento de saúde deles ou de seus descendentes Repito por derradeiro que o direito ao reconhecimento de paternidade não se confunde com o relacionado ao acesso às informações genéticas Mesmo a pessoa vinculada a filiação por adoção ou socioafetiva tem o direito de pedir ao juiz que obrigue sob pena de multa perió dica o suposto pai ou mãe biológico a submeterse a exame confirmatório de ADN com o objetivo único de possibilitar a disponibili zação de informações úteis ou necessárias ao tratamento de saúde dele ou de seus descendentes Acentuo que a Súmula 301 do STJ que faz presumir a paternidade no caso de o indigitado genitor recusarse a fornecer o material genético para exame não tem nenhuma serventia no processo destinado a franquear informações sobre a ascendência biológica do demandante A presunção jurídica de paternidade em nada auxilia na busca dos dados genéticos reclamados pelo seu tratamento médico De qualquer forma nesse caso mesmo que revelada a verdade biológica dela não decorre nenhuma mudança na filiação a que se vincula o requerente 3 Negativa de paternidade e de maternidade A ação negatória de paternidade ou maternidade a exemplo da de reconhecimento tem o objetivo de eliminar a incongruência entre os dados constantes do registro de nascimento de uma pessoa e a verdade biológica de sua concepção É mais comum a negação de paternidade mas cabe também a da maternidade provando a mãe a falsidade do termo de nascimento do filho ou das declarações nele contidas CC art 1608 Igualmente o filho pode intentála desde que o faça nos quatro anos seguintes à maioridade ou emancipação art 1614 in fine A negatória não cabe porém nos casos em que a incongruência entre a verdade biológica e o registro civil corresponde exatamente ao efeito jurídico pretendido em determinadas hipóteses de filiação Assim se o filho foi concebido por processo de fertilização assistida heteróloga autorizada pelo homem ou mulher que aparecem como pais no assentamento civil não há razões jurídicas para se desfazer a discrepância Somente no caso de falta de autorização daquele que não forneceu o gameta ou vício de consentimento na declaração correspondente poderá ser intentada a negatória de paternidade ou maternidade Também no de adoção não tem cabimento a ação negatória de paternidade ou maternidade movida pelos adotantes ou pelo adotado porque a incongruên cia referida é inerente a essa espécie de filiação Por fim é igualmente descabida a negatória se entre as partes consolidouse a filiação socioafetiva Lobo 2004520 Mesmo que provado aqui não serem os pais os genitores se eles têm cuidado do filho como se o fossem não poderão se desvincular ou serem desvinculados da filiação Em suma a ação negatória de paternidade ou maternidade não pode ser fundada apenas na verdade biológica quando o vínculo de filiação se estabelece por outros fatores Em que casos cabe então A resposta parte da discrepância entre o registro civil e a verdade genética nas hipóteses em que a imputação ou declaração de paternidade ou maternidade é juridicamente inconsistente Os únicos que podem ser registrados como pai ou mãe de uma criança sem o declararem pessoalmente perante o Registro Civil são os casados O nome do marido será lançado como pai por declaração da mãe ou de terceiros assim como o nome da esposa será mencionado como mãe por declaração do pai ou de terceiros Pode ocorrer por outro lado de o homem reconhecer no registro de nascimento por equívoco como sendo seu o filho de outrem Nos primeiros casos há imputação de paternidade ou maternidade no último declaração Pois bem a negatória cabe exclusivamente na hipótese de imputação de paternidade ou maternidade biológica ou de declaração equivocada de paternidade também biológica a certa pessoa que não estabeleceu com o filho nenhum vínculo afetivo próprio das relações de filiação Nesse caso e somente nesse a incongruência entre a verdade biológica e o registro será juridicamente inconsistente Podem aqui os que aparecem no assentamento como pai ou mãe promover a ação visando liberarse dos deveres dessa condição em relação ao filho Também nesse caso pode a pessoa registrada dentro do prazo decadencial contestar a paternidade ou maternidade A negatória de paternidade ou maternidade pode ser proposta pelo homem cujo nome consta como pai do assento civil de certa pessoa sem que tenha substrato na realidade genética a imputação ou declaração de paternidade biológica Pode ser proposta também pela mãe no caso de erro ou falsificação do termo de nascimento imputando lhe a maternidade biológica indevidamente Nesses dois casos a ação é imprescritível E pode finalmente ser ajuizada pelo filho nos quatro anos seguintes à maioridade com o objetivo de ver excluído de seu assento civil o nome de pai ou mãe com o qual não tem vínculo biológico de descendência É imprescritível a ação quando o demandante é o homem registrado como pai ou a mulher registrada como mãe A lei mencionou de forma expressa a imprescritibilidade apenas em relação ao pai CC art 1601 Mas também a mulher que vier a saber ter sido registrada em seu nome criança que não é dela terá o direito imprescritível de ajuizar a negação de maternidade em razão do princípio constitucional da igualdade Pela disciplina legal ninguém mais além desse homem ou mulher está legitimado para propor a negatória de paternidade ou maternidade Não teriam legitimidade assim os herdeiros daquele homem cujo nome consta como pai no assento civil de determinada pessoa De acordo com a lei eles apenas poderão prosseguir no feito ajuizado pelo pai enquanto vivo art 1601 parágrafo único Em função do princípio constitucional da igualdade essa regra legal deveria ser também observada no caso de negatória de maternidade Tenho para mim porém que esta limitação da legitimidade para a ação negatória ao homem figurante como pai ou à mulher referida como mãe pelo registro não é compatível com a tendência de despatrimonialização do direito de família Se não há verdade genética a dar suficiente amparo à imputação da paternidade ou maternidade biológica ou à declaração da paternidade biológica então os interesses dos herdeiros devem ser protegidos pela ordem jurídica Ademais é de constitucionalidade questionável em vista da garantia da herança como direito fundamental CF art 5º XXX a negativa de legitimidade aos herdeiros para a contestação de paternidade ou maternidade do de cujus no caso de virem a descobrir o erro ou falsificação do assentamento civil a carência de base biológica somente após a morte daquele cujo nome consta como sendo o do pai ou mãe de certa pessoa 4 As presunções de paternidade Até o fim dos anos 1980 antes de os exames de ADN Ácido Desoxirribonucleico se difundirem no meio judicial como prova de paternidade em ações de investigação esta decorria de certas presunções legais item 41 associadas à tentativa de desqualificar moralmente a mãe do demandante imputandolhe o hábito de manter relações sexuais com muitos outros homens além do demandado Os exames então disponíveis eram meramente excludentes de paternidade por incompatibilidade de tipo sanguíneo por exemplo a partir deles não se podia afirmar com certeza científica se o demandante seria o genitor do demandado O julgamento da investigação desse modo não podia prescindir das presunções legais e provas testemunhais Tornados acessíveis os exames de ADN mudaramse as presunções em vista da certeza científica da paternidade que eles podem atestar item 42 As presunções legais podem dizer respeito tanto às ações de reconhecimento de paternidade proposta pelo filho como às negatórias ajuizadas pelo homem cujo nome consta do registro de nascimento como sendo o pai Num e noutro caso porém operam de modo diverso 41 Antes dos exames de ADN DNA Antigamente eram decisivas para o julgamento das ações de investigação de paternidade cinco presunções legais A primeira presunção define que os nascidos cento e oitenta dias depois do início da convivência conjugal presumemse concebidos na constância do casamento CC art 1597 I Nesse caso compete exclusivamente ao marido a prova de que não é genitor da criança nascida nesse prazo se contra ela propuser a ação negatória de paternidade Do mesmo modo o filho nascido nos cento e oitenta dias depois da constituição de união estável não tem o ônus de provar a existência do vínculo biológico na ação investigatória porque a presunção nesse caso imputa ao demandado a prova de sua inexistência A segunda presunção estabelece que os nascidos nos trezentos dias seguintes à dissolução da sociedade conjugal por morte separação judicial nulidade ou anulação do casamento são considerados concebidos na constância deste CC art 1597 II Assim sendo o réu na ação de reconhecimento de paternidade tem o ônus de provar a inexistência do vínculo biológico se o autor exibir prova de que nasceu no prazo legal Na negatória cabe ao autor essa prova se militar a presunção em favor do réu A terceira presunção afirma que se considera fruto do primeiro casamento o filho nascido de mulher que contrai novas núpcias antes de decorridos dez meses seguintes à dissolução da sociedade conjugal que mantinha com outro homem se o nascimento ocorrer nos trezentos dias seguintes e se considera do segundo casamento o que nascer depois de cento e oitenta dias do início da respectiva convivência conjugal CC art 1598 Se o filho nasceu em data incluída nos dois prazos não há presunção legal específica e a questão se resolve em função das demais Pela quarta presunção aquele que provar sua impotência para gerar infertilidade não pode ser reputado pai de ninguém tanto na ação de reconhecimento como na negatória CC art 1599 Se o homem que consta como pai do registro do nascimento ou aquele a quem se imputa a paternidade havia feito a vasectomia antes da data provável da concepção claramente não pode ser considerado o genitor Estatui a quinta presunção que o adultério da mulher ainda que confessado não é suficiente para ilidir a paternidade CC arts 1600 e 1602 Mesmo que a esposa tenha sabidamente traído o marido e não reste a menor dúvida a respeito de sua infidelidade disso não se segue necessariamente que o genitor do filho é o coautor do adultério Antes da difusão dos exames de ADN a prova da existência do vínculo biológico nas ações de reconhecimento e da sua inexistência na negatória de paternidade guiavase por presunções legais Essas presunções hoje em dia não têm nenhuma importância Não têm mais nenhuma importância essas presunções legais desde que os exames de ADN se tornaram acessíveis aos litigantes em processos de investigação ou negatória de paternidade O Código Civil poderia até mesmo não reproduzir os preceitos que as afirmam tendo em vista o atual estágio em que a matéria se encontra 42 Depois dos exames de ADN DNA Em 1953 professores da Universidade de Cambridge descobriram a estrutura da molécula do ADN que se encontra nos cromossomos das células de organismos vivos Essa estrutura é única para cada ser em várias espécies inclusive na humana Cada um de nós recebeu de seu genitor e genitora parte dessa estrutura Desse modo a partir do exame de uma única célula do organismo de uma pessoa é possível afirmarse com certeza quase absoluta se ela é pai ou mãe de outra ou não é A única margem de dúvida diz respeito à possibilidade de o examinado ter um irmão gêmeo univitelino cuja estrutura de ADN imaginase seja idêntica à dele Em vista disso o exame em ADN é capaz de fornecer informações com a precisão científica de 999999 Como se costuma dizer numa imagem bastante feliz o exame de ADN informa a impressão genética única e exclusiva do paciente Os países centrais do capitalismo passaram a adotar os exames de ADN nos processos de reconhecimento de paternidade por volta de 1988 A reação da comunidade jurídica contudo não correspondeu prontamente ao otimismo que o elevado grau de certeza do teste apresentava Como ele simplificava de modo extraordinário as questões jurídicas mas advogados e juízes receavam simplesmente transferir suas funções ao perito médico começaram a surgir alguns questionamentos sobre a eficácia da prova Silva 2002 Veloso 2002 Superadas porém as resistências inicialmente nutridas em relação ao exame de paternidade por meio do ADN muitas delas ligadas mais aos difusos temores frente à engenharia genética do que à eficácia do teste na identificação da descendência biológica Furkel 2004 passou a ter a maioria da comunidade jurídica plena confiança nos seus resultados Mas restava uma questão a resolver Como fazer quando o demandado na ação de investigação de paternidade se recusava a fornecer o material para o exame de ADN Pareceu a toda a tecnologia jurídica uma afronta aos direitos constitucionais desse homem sua condução coercitiva à clínica médica para a obtenção de um pouco de sangue ou saliva dele indispensável à realização do exame por todos Martins 2002 A jurisprudência conciliou os dois aspectos da questão o direito do filho à paternidade biológica e os direitos constitucionais do indigitado pai por meio de uma presunção Baseada nos preceitos do Código Civil pelos quais aquele que se nega a submeterse a exame médico necessário não poderá aproveitarse de sua recusa art 231 e a recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame art 232 o Superior Tribunal de Justiça baixou súmula criando a única presunção a ser observada atualmente nas ações de investigação de paternidade Tratase da Súmula 301 Em ação investigatória a recusa do suposto pai a submeterse ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade Por meio dessa presunção se o demandando se recusa a fornecer material para o exame de ADN chama para si o ônus de provar a inexistência do vínculo biológico por outros meios tais como os antigos exames de sangue ou a prova da infertilidade Não se desincumbindo completamente desse ônus a recusa terá o mesmo efeito de prova do vínculo biológico que o exame em ADN com resultado inclusivo forneceria Em 2009 a presunção referida no entendimento sumulado do STJ tornouse direito positivo Lei n 856092 art 2ºA e parágrafo único incluídos pela Lei n 120042009 O demandado em ação de investigação ou negatória de paternidade pode se recusar a fornecer material para o exame de seu ADN Titula direito constitucional que impede sua condução coercitiva à clínica médica para colheita forçada de sangue ou saliva A recusa contudo gera a presunção de existência ou inexistência do vínculo biológico que pelo exame pretendia provar o autor respectivamente da ação de reconhecimento e negatória de paternidade Na negatória de paternidade a mesma presunção deve militar em favor do autor Se o demandado se recusa a se submeter ao exame de ADN com o qual o demandante provaria não ser o genitor dele devese presumir com base nos arts 231 e 232 do Código Civil que inexiste o vínculo biológico entre as partes 5 Poder familiar Ter filhos é como se disse ao início uma experiência única e essencialmente gratificante É também uma experiência acompanhada de sérias responsabilidades Aos pais cabe preparar o filho para a vida Consciente ou inconscientemente transmitemlhe seus valores sua visão do mundo O comportamento e atitudes deles servem de modelo que o filho tende a reproduzir Se na adolescência é inerente ao processo de crescimento psicológico o contraporse a tais modelos negálos na busca da própria identidade isso não significa que eles não estejam incorporados e que não se manifestarão mais tarde na idade adulta especialmente quando os filhos se tornarem também eles pais É certo que nem sempre pai e mãe conseguem preparar o filho para a vida Não se consegue ensinar o que não se aprendeu é uma lei física Quando nem os pais foram bem preparados terão muita dificuldade de cumprir essa função Muitas vezes ver o filho passar por uma frustração por pequena que seja é tão aflitivo aos pais que eles se desdobram para a atender o mais rápido possível ainda que isso represente um imenso sacrifício Perdem então uma oportunidade valiosa de ensinarlhe o quanto difícil é a vida para qualquer um Mesmo os pais abastados não devem atender todos os pedidos do filho porque fazendoo não o estarão preparando convenientemente para a vida Estarão na verdade iludindo a criança ou adolescente passandolhe a ideia de que as coisas podem ser conseguidas sem esforço Não darão conta de sua principal responsabilidade ao pouparem os filhos de qualquer frustração À ingente responsabilidade que os pais têm devem corresponder os meios para cumprila Por isso a família se organiza com a atribuição a eles de um poder que exercem sobre os filhos Justifica esse poder o adequado cumprimento das funções associadas à paternidade e maternidade É um simples instrumento para a realização dos objetivos de preparação dos filhos para a vida objetivos que a sociedade reserva aos pais e espera sejam atendidos na formação de seus membros Tanto assim que pode ser suspenso ou mesmo retirado esse poder daqueles que não o exercem visando cumprir a responsabilidade paterna ou materna Uma das mais claras manifestações desse poder é o de castigar os filhos Os pais podem impor aos filhos castigos como forma de preparálos para a vida No passado os castigos físicos eram mais comuns alguns deles bastante severos Atualmente a psicologia e pedagogia mostram a ineficiência da violência na formação de cidadãos seguros felizes e cônscios de seus deveres e responsabilidades na sociedade Os castigos físicos não devem ser empregados Mas os filhos desobedientes devem continuar sendo castigados aprendendo que a inobservância das regras ditadas pelos pais lhe acarretam consequências negativas Alguns teóricos adeptos do politicamente correto abominam a palavra castigo e buscam substituíla Na essência castigar é impor à criança ou adolescente a privação de algo que ele quer com o sentido de possibilitarlhe a clara percepção de que vivemos numa sociedade organizada em regras cuja obediência a todos aproveita e interessa Brinquedos que a criança deseja ter devem lhe ser explicitamente negados assim como ao adolescente programas de entretenimento ou visitas a amigos Os castigos com qualquer nome são medidas corretivas É falso imaginar que os pais poderiam de algum modo preparar os filhos para a vida evitando a aplicação de quaisquer castigos isso não existe Assim para que tenham meios de exercer sua função a lei concede ao pai e à mãe o poder de castigar o filho Contudo esse poder só lhes é concedido para que possam cumprir a tarefa educacional que pela organização da sociedade lhes cabe O pai que castiga imoderadamente o filho infringindolhe sofrimento físico ou moral desnecessário perde o poder sobre ele Esse poder instrumento da função educacional da família a lei o denomina poder familiar A ele se sujeitam os filhos menores CC art 1630 Alcançada a maioridade passam a responder por seus atos e mesmo que ainda residam com os pais e continuem obrigados a devotarlhes respeito já não estão mais sob o poder familiar De outro lado titulamno em conjunto o pai e a mãe A lei diz que assim é durante o casamento e a união estável art 1631 mas isso não está inteiramente correto Enquanto existir o poder familiar isto é enquanto não alcançada a maioridade pelo filho pai e mãe o exercem em conjunto exista ou não entre eles vínculo de conjugalidade Em qualquer hipótese são pais solteiros o filho foi havido fora do casamento de um deles estão separados divorciados integram uma união livre etc e não apenas na de casamento ou união estável o pai e a mãe titulam em conjunto o poder familiar A lei mesma contém outros dispositivos cujo conteúdo mostra claramente que o poder familiar não depende do casamento ou união estável do pai e da mãe Assim esclarece que a separação judicial o divórcio e a dissolução da união estável não alteram os direitos dos pais e filhos assegurado àqueles o de ter estes em sua companhia CC art 1632 O novo casamento ou estabelecimento de união estável pelo pai ou pela mãe do mesmo modo não traz qualquer implicação ao poder familiar sobre os filhos do relacionamento anterior não tendo o consorte ou convivente atual qualquer ingerência sobre o seu exercício art 1636 Os titulares do poder familiar podem delegálo em parte um ao outro De comum acordo assim pode pai e mãe dividir algumas das tarefas quando isso for útil à administração da família Não cabe no entanto delegação de todos os poderes porque a isso equivale o descumprimento das obrigações inerentes à paternidade ou maternidade Igualmente descabida é a delegação em favor de terceiros Embora nada impeça os pais de buscar auxílio para o exercício de seu poder de pessoas mais experientes avós irmãos mais velhos amigos etc ou de profissionais pedagogos psicólogos etc não o podem delegar Ter filhos ainda que involuntariamente importa assumir responsabilidades intransferíveis Na falta ou impedimento de um dos pais o outro exerce com exclusividade o poder familiar Na família monoparental é evidente que o cabeça titula esse poder sem o concurso de ninguém Nos demais casos vivam ou não sob o mesmo teto estejam ou não casados ou em união estável pai e mãe não podem praticar nenhum ato inerente ao poder familiar a respeito do qual não estejam os dois de pleno acordo O pai não pode escolher sozinho em que escola o filho será matriculado nem a mãe tem o direito de o representar na prática de negócio jurídico sem o concurso do pai Em caso de divergência qualquer um dos pais pode requerer ao juiz que decida como ela deve ser superada CC art 1631 parágrafo único A decisão judicial deve pautarse evidentemente no interesse do filho Para ser titular do poder familiar não basta a condição de genitor de fornecedor de gameta É necessário ser pai ou mãe Se o genitor não reconhece o filho não tem nenhum poder sobre ele CC art 1633 O poder familiar assim deriva da filiação qualquer que seja ela e não do vínculo biológico Os pais adotantes e socioafetivos assim têmno No caso de adoção provém o poder da constituição do vínculo de ascendência e descendência pela sentença judicial no da filiação socioafetiva nasce natural e paralelamente à consolidação da relação afetiva e comportamento social de pais e filho O poder familiar é titulado pelo pai e mãe em conjunto e a ele se submete o filho enquanto for menor Tratase de poder indelegável exceto parcialmente entre os que o titulam que a lei concede aos pais para que possam dispor de instrumentos para o adequado cumprimento de sua importante tarefa de preparar o filho para a vida Constituise o poder familiar com o nascimento do filho em princípio ele perdura até a maioridade deste Pode ocorrer no entanto entre um e outro marco fatos jurídicos que importam a prematura extinção desse poder como por exemplo a morte dos pais ou do filho e a emancipação do menor CC art 1635 O juiz pode determinar a suspensão ou perda do poder familiar como medidas sancionadoras ao seu indevido exercício pelos pais A suspensão tem cabimento nas hipóteses de abuso de autoridade falta de cumprimento dos deveres associados à paternidade ou maternidade condenação criminal a pena de mais de dois anos de prisão e administração ruinosa dos bens dos filhos desde que outras medidas não se mostrem suficientes à salvaguarda dos interesses deles CC art 1637 e parágrafo único Desse modo ocorrendo qualquer dessas hipóteses se o juiz tiver às mãos alguma medida eficiente de preservação dos direitos dos menores que não acarrete a suspensão do poder familiar deverá adotála A suspensão só cabe em último caso Já a perda do poder familiar deve ser decretada em hipóteses mais graves como a de imposição de castigo imoderado abandono dos filhos prática de atos contrários à moral e aos bons costumes ou reincidência em falta punível com a suspensão entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção prática contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar de homicídio feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher estupro ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão prática contra o filho filha ou outro descendente de homicídio feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher estupro estupro de vulnerável ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão CC art 1638 A suspensão é medida temporária facultativa e limitada É temporária porque o juiz ao impor essa forma de sanção deve necessariamente fixar o prazo de duração em que o pai a mãe ou os dois ficarão impedidos de exercer o poder familiar É facultativa porque ela pode deixar de ser imposta sempre que o juiz considerar que os mesmos objetivos podem ser alcançados por outras medidas que preservem o poder familiar É por fim limitada porque pode dizer respeito a um ou alguns dos filhos Por seu turno a perda é permanente imperativa e ampla Permanente no sentido de que não se prédefine o tempo em que a medida irá durar Enquanto os pais não provarem que cessaram os motivos determinantes da sanção ficam privados do poder familiar Imperativa porque o juiz não pode deixar se aplicála sempre que verificado o pressuposto legal Ampla enfim porque abrange necessariamente toda a prole do pai da mãe ou de ambos Se há motivos graves para retirar o poder familiar todos os filhos devem ser protegidos e não somente aquele em relação ao qual verificouse a causa da punição Em nenhum caso ressalto a simples falta ou carência de recursos materiais pode dar ensejo à suspensão ou perda do poder familiar ECA art 23 Por mais miseráveis que sejam os pais continuam a ter os direitos próprios da relação de filiação não podendo ser deles privados apenas porque não dispõem dos recursos materiais para sustentar os filhos Tanto a suspensão como a perda do poder familiar podem afetar os dois pais ou apenas um deles segundo o grau de responsabilidade de cada um Se o pai castiga imoderadamente o filho e a mãe se omite deixando inclusive de denunciar os maustratos às autoridades o juiz pode determinar a perda do poder familiar dele e a suspensão do dela Qualquer parente e o Ministério Público estão legitimados a requerer ao juiz a suspensão ou perda do poder familiar CC art 1637 51 Exercício do poder familiar Ao exercício do poder familiar correspondem os seguintes direitos CC art 1634 a Dirigir a criação e educação O mais importante direito associado ao poder familiar é o de dirigir a criação e educação do filho É o direito ao qual tenho me referido pela ideia de preparação para a vida Nele se incluem os de definir as regras a serem observadas em casa e de impor seu cumprimento horário de acordar e dormir de fazer as refeições responsabilidade pela arrumação do quarto uso adequado dos móveis e utensílios critérios para a utilização dos equipamentos domésticos computador por exemplo por todos os membros da família etc Também é direito dos pais escolher a escola dos filhos até o grau médio devendo levar em consideração a opinião deles quando se revelar madura b Ter os filhos em sua companhia e guarda Enquanto não alcançar a maioridade o filho não tem direito de viajar sozinho se a tanto se opuserem seus pais Tampouco pode ir a eventos sociais ou públicos frequentar a casa de conhecidos ou simplesmente ganhar as ruas sem autorização do pai e da mãe Ao contrário é inerente ao poder familiar que os filhos acompanhem os pais sempre que esses determinarem Na companhia do pai e da mãe o pequeno aprende como proceder nas mais diversas situações criadas pelo relacionamento social incorporando valores e conferindo a sinceridade dos conceitos enunciados em casa A guarda por sua vez corresponde a deveres dos pais tanto quanto a direitos Relacionase aos cuidados reclamados pela criança ou adolescente em seu processo de desenvolvimento em direção à vida adulta Os pais têm por assim dizer o direito de cuidar dos filhos nas enfermidades e acidentes de ser seus confidentes nos momentos de angústia de os amparar e aconselhar no enfrentamento de desafios A guarda é a única manifestação do poder familiar que um dos pais pode perder com o divórcio Mas em ocorrendo de o pai ou a mãe perder a guarda do filho passam a titular o direito de visitas Cap 58 item 3 c Conceder ou negar autorização para o casamento Depois de alcançada a idade núbil mas ainda não a maioridade civil a pessoa só pode se casar com a autorização dos pais CC art 1517 Integra o poder familiar o direito de conceder ou negar essa autorização Se for exercido de modo abusivo negandose o pai ou a mãe a autorizar o casamento sem justificativa plausível o juiz pode suprir o consentimento Cap 56 subitem 31 d Nomeação de tutor Quando falecem os pais antes de o filho alcançar a maioridade a lei define a qual parente caberá responsabilizarse por algumas das tarefas de preparação dele para a vida É o tutor a quem a lei não atribui o poder familiar mas apenas alguns dos direitos a ele associados Cap 61 item 2 Se os pais não acham conveniente à adequada formação do filho que a tutela seja exercida pelo parente indicado na lei cabelhes designar outra pessoa de sua confiança para a função de tutor e Representação e assistência Os pais são os representantes legais dos filhos menores impúberes e assistentes dos púberes CC art 1690 Desse modo enquanto for absolutamente incapaz o filho pai e mãe praticam os negócios jurídicos do interesse do menor em nome dele Alcançada a idade da incapacidade relativa tornamse seus assistentes devendo concordar com a prática do negócio jurídico pretendido pelo menor para que seja válido Cap 7 subitem 31 Em caso de divergência entre os pais acerca da oportunidade de ser praticado pelo menor púbere ou em nome dele se impúbere determinado negócio jurídico neste como nos demais afetos ao exercício do poder familiar cabe ao juiz decidir no interesse do filho art 1690 parágrafo único f Reclamar o filho de quem ilegalmente o detenha Se alguém retira indevidamente a criança ou adolescente da companhia do pai ou da mãe eles têm o direito de reclamarlhe a devolução Esse direito pode ser exercido inclusive por um dos titulares do poder familiar contra o outro sempre que desrespeitados os direitos do primeiro de ter o filho em sua companhia e guarda Ao poder familiar correspondem direitos titulados pelos pais em relação aos filhos tais como o de dirigirlhes a criação e educação impor obediência e respeito têlos em sua companhia e guarda g Exigir obediência e respeito A formação do filho para a vida adulta fazse mediante a transmissão de valores e incorporação de regras Por características próprias do processo de desenvolvimento do ser humano na sociedade complexa dos nossos tempos há uma resistência natural por parte do filho à aceitação de sua condição Contestar os pais é parte inexorável do processo de amadurecimento As atitudes de rebeldia começam cedo e se acentuam na puberdade Por mais desgastante que seja para os pais é função deles enfrentar essas atitudes exigindo obediência e respeito dos filhos Parecerá muitas vezes improdutivo e frustrante mas quem é pai ou mãe não tem outra alternativa muita paciência não é o suficiente a paciência há de ser infinita para bastar Devem insistir na exigência renovála reforçála repetila acentuála reproduzila tornar a ditála confirmála voltar a ela repôla reiterála repisála rememorála repetila uma vez mais até que a atitude de obediência e respeito passe a ser espontânea Em determinadas situações será imprescindível que os pais castiguem o filho pela desobediência ou falta de respeito Embora haja ainda pai ou mãe que considere pertinente o castigo físico e o aplique a verdade é que a pedagogia e a psicologia têm mostrado sua ineficiência Podese criar uma pessoa amedrontada ou violenta com os castigos físicos mas dificilmente alguém obediente e respeitoso Tampouco têm eficiência os castigos morais que não machucam o corpo mas expõem o filho ao ridículo e à humilhação Os castigos devem consistir apenas na privação de algo que a criança ou adolescente deseja devem ser ademais necessariamente antecedidos da advertência para que o filho possa decidir se insiste na rebeldia e corre o risco de não ter o que quer ou se obedece Ademais para que tenham eficiência os castigos advertidos devem ser aplicados Nada pior para a educação de uma pessoa do que os pais ameaçarem privála de certa coisa quando eles de antemão sabem que não terão coragem ou condições de efetivamente a negar Se a família programou viagem para a Disneyworld e já começou a pagar a passagem e serviços turísticos é irreal procurar obter a obediência e respeito do filho dizendo que ele em desobedecendo ou sendo desrespeitoso não irá viajar a promessa incumprível simplesmente desmoraliza o instrumento pedagógico Na medida em que se reitera a falta de aplicação dos castigos prometidos o filho deixa de acreditar neles Para os pais uma vez mais não há outra alternativa enquanto não impuserem ao filho as consequências negativas aventadas repetidas vezes não conseguirão controlar a natural rebeldia que acompanha o processo de crescimento h Exigir a prestação de serviços Como qualquer outra manifestação do poder familiar o direito de exigir a prestação de serviços próprios de sua idade e condição só existe se destinado à adequada preparação do filho para a vida adulta Quer dizer os pais não têm o direito de exigir que os filhos trabalhem fora para contribuir com a renda familiar por mais necessitados que sejam ou estejam Podem é certo estimulálos a tais atitudes que são sadias e contribuem para a formação do caráter Neste caso têm o dever de zelar pelo estrito cumprimento das restrições ao trabalho de menores previstas na Constituição art 7º XXXIII e na CLT arts 403 e 404 O filho menor nunca tem o dever de contribuir para o sustento dos pais ou seus irmãos Quando a lei menciona a exigência de prestação de serviços como direito associado ao poder familiar ela está se referindo unicamente aos que podem contribuir para a preparação do filho para a vida adulta Isto é à ajuda que todos os membros da família devem dar para as tarefas cotidianas Os pais podem exigir dos filhos por exemplo que enxuguem a louça do jantar ponham a mesa levem o cão ao passeio reguem o jardim ou outros afazeres semelhantes Não é aliás despropositado que os pais remunerem modicamente tais serviços domésticos sempre que o objetivo for o de contribuir para a formação de um adulto ciente de suas responsabilidades e não o de economizar dinheiro com empregados ou trabalhadores autônomos 52 Usufruto e administração dos bens dos filhos menores Enquanto os filhos estão sob o poder familiar isto é não alcançaram a maioridade nem foram emancipados os seus bens ficam sob a administração dos pais CC art 1689 II Competelhes providenciar o que for preciso para sua adequada conservação e fruição Enquanto perdura a incapacidade absoluta a declaração de vontade do filho é feita pelos pais sendo irrelevante eventual opinião do menor Se os pais consideram pertinente determinado negócio jurídico relacionado à administração de bem pertencente ao filho adotamno Sobrevindo a incapacidade relativa nenhum negócio jurídico pode ser mais praticado pelos pais em nome do filho Este passa a influir com sua vontade na administração do próprio patrimônio Contra a opinião do menor nenhum negócio jurídico poderá ser praticado embora ainda necessite da assistência de seus pais Os poderes de administração patrimonial deferidos aos pais no entanto não os autorizam a praticar atos que importem alienação ou oneração de imóveis Tampouco podem obrigar o filho além dos atos de simples administração Se for necessário ou do evidente interesse dele quaisquer desses atos que ultrapassam os associados ao poder familiar a prévia autorização judicial deve ser buscada CC art 1691 Desse modo se o filho possui um apartamento em seu patrimônio herdado por testamento do avô por exemplo aos pais cabe adotar as providências para o manter alugado tais como anunciar a locação negociar com o valor do aluguel com os interessados contratar corretor etc A renda locatícia integra o patrimônio do proprietário do bem isto é do filho e não o dos pais Se o imóvel reclama manutenção dos pais também é a responsabilidade por contratar os serviços correspondentes remunerandoos com recursos do menor inclusive os provenientes do aluguel Se porém está difícil alugar o apartamento por bom preço e as despesas com sua manutenção não são desprezíveis atende aos interesses do menor a alienação do bem Isso no entanto extrapola os limites da mera administração patrimonial e os pais necessitarão de prévia autorização judicial para o ato Para deferila o juiz comumente estabelece algum tipo de salvaguarda dos direitos do menor como por exemplo o depósito do valor líquido obtido pela venda em conta bancária de investimento movimentável apenas mediante ordem judicial desta edição 2020 Se os pais praticarem qualquer ato excedente dos poderes de mera administração ele é nulo Quer dizer se foi feita a alienação de imóvel sem autorização do juiz o bem retorna ao patrimônio do filho e o comprador pode reclamar a devolução do preço dos pais Estão legitimados para a ação declaratória de nulidade além dos filhos quando alcançarem a maioridade também os seus herdeiros Se os pais tiverem sido destituídos do poder familiar o tutor designado pelo juiz está igualmente legitimado como representante legal do filho CC art 1691 parágrafo único Além de terem o direito de administrar o patrimônio do filho os pais são considerados legalmente usufrutuários dos bens que o compõem CC art 1689 I Significa dizer que podem usálos e fruílos da mesma maneira que poderiam se tivesse sido instituído usufruto convencional em favor deles No exemplo acima se os pais considerarem que a família se mudar para o apartamento do filho menor é a alternativa mais interessante para todos podem fazêlo Não estão obrigados a remunerar o filho pelo uso do bem porque titulam a condição de seu usufrutuário Os bens do patrimônio do filho são administrados pelos pais enquanto não alcançada a maioridade Sobre esses bens além disso titulam os pais os direitos de usufrutuários Alguns bens dos filhos estão excluídos do poder de administrar e usufruto legal titulado pelos pais CC art 1693 São em primeiro lugar os adquiridos pelo filho havido fora do casamento antes do reconhecimento Esse caso a rigor a lei não precisaria explicitar Como o poder familiar decorre do vínculo de filiação e não da ascendência biológica o genitor não é pai enquanto se recusa a reconhecer o filho Em segundo lugar excluemse dos bens afetos ao poder familiar os valores auferidos pelo filho com mais de 16 anos em razão do exercício de atividade econômica Se o menor já ganha dinheiro com algum mister então demonstra ter maturidade para os administrar diretamente Os bens que adquirir empregando tais valores também não são administrados pelos pais nem se submetem ao usufruto legal em favor deles Claro que para praticar negócios jurídicos relacionados também a esses bens em razão da incapacidade relativa ainda dependerá da assistência de seu pai e mãe Em terceiro lugar estão os bens doados ou legados ao filho com a cláusula de exclusão da administração e usufruto dos pais O doador ou legatário pode estipular como encargo da doação ou testamento pelas razões que só lhe dizem respeito o afastamento dos pais do donatário ou legatário menor da administração e usufruto do objeto de sua liberalidade Por fim quando os pais foram excluídos da sucessão por indignidade ou deserdação ficam igualmente afastados da administração e usufruto dos bens que nela couberem ao filho 2020 02 13 PÁGINA RB71 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 SÉTIMA PARTE DIREITO DE FAMÍLIA CAPÍTULO 61 ASSISTÊNCIA FAMILIAR Capítulo 61 Assistência familiar 1 Alimentos Nos horizontes delineáveis pelo modo de produção capitalista a família ainda deve exercer a função assistencial por muito tempo Num sistema econômico de crises periódicas e injustiças permanentes é difícil construirse um programa eficiente de Seguridade Social e por isso a família tende a não se desvencilhar tão cedo do encargo de amparo aos seus nas enfermidades e velhice Mesmo que o acúmulo social de força de trabalho permita ao Estado no futuro garantir sua recuperação fora da família os laços afetivos nela existentes tendem a reservar sempre algum espaço para a assistência aos seus membros ainda que subsidiária Além da função assistencialista a família provê o sustento educação lazer e cultura de seus membros compatíveis com a sua condição econômica Na maioria das vezes os vínculos afetivos ou não estabelecidos pela família entre seus membros são suficientes para a garantia do cumprimento dessas funções Pais se sacrificam para dar estudo aos filhos irmão ajuda a irmã desempregada com as despesas do supermercado tia custeia o tratamento dentário da sobrinha filhos se cotizam para pagar o segurosaúde dos pais essas ações acontecem em geral porque os familiares se gostam ou pelo menos se consideram responsáveis uns pelos outros no mínimo nutrem a expectativa de merecerem igual auxílio de um familiar se vierem a necessitar Quando porém os laços familiares não são suficientes para assegurar o apoio que alguém precisa da família a lei o obriga por meio do instituto dos alimentos De acordo com o art 1694 do CC podem os parentes os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social O titular do direito aos alimentos chamase alimentado e o devedor alimentante A lei dá ao alimentante a opção de pagar os alimentos ou dar diretamente hospedagem e sustento ao alimentado CC art 1701 Embora na maioria das vezes a obrigação alimentar se resolva mediante o pagamento de uma pensão mensal o alimentante pode substituíla por prestações diretas Adapta sua casa para nela receber o parente necessitado e o provê de alimento e vestuário mediante a direta entrega de bens A opção pelo sustento direto não é cabível no caso de alimentos devidos a cônjuge ou companheiro hipótese em que a lei menciona especificamente o pensionamento art 1704 Desse modo se o irmão alimentante receia que o alimentado por ser alcoólatra desperdiçará em bebidas o dinheiro da pensão alimentícia poderá cumprir sua obrigação recebendoo em casa e o sustentando diretamente com o objetivo de evitar o desvio da finalidade da prestação Tratase de opção exclusiva do alimentante contra a qual não pode o alimentado se insurgir a menos que circunstâncias especiais do caso revele buscar aquele por vias transversas a exoneração da obrigação Representaria exercício abusivo do direito de optar pelo sustento direto em sua casa a substituição pelo pai da pensão alimentícia que paga à filha residente em outro Município onde cursa faculdade Quando se revelar o abuso o juiz fixará a forma mais adequada para o cumprimento da obrigação alimentar art 1701 parágrafo único Os alimentos se destinam ao cumprimento pela família de sua função assistencialista e das relacionadas ao provimento dos recursos reclamados pelo sustento e manutenção de seus membros O direito aos alimentos é irrenunciável O credor pode deixar de exercêlo pelas razões que só a ele dizem respeito mas vindo a precisar de alimentos a qualquer tempo tem direito de reclamá los Além de irrenunciável o direito aos alimentos não pode ser objeto de cessão penhora ou compensação CC art 1707 A obrigação alimentar tem natureza personalíssima Por isso não pode ser transferido pelo alimentado a outrem por negócio jurídico ainda que mediante a anuência do alimentante Também pela mesma razão não pode ser penhorado para satisfação de dívida do alimentado perante terceiros A penhorabilidade implicaria a transmissibilidade do direito indispensável à realização do crédito exequendo Por fim para que o instituto cumpra suas finalidades assistenciais o valor dos alimentos não pode ser compensado pelo alimentante com dívida do alimentado 11 Requisitos e valor dos alimentos Para que os alimentos sejam devidos três requisitos devem estar preenchidos a alimentante e alimentado são parentes estavam casados ou conviviam em união estável b o alimentado não dispõe de patrimônio ou renda que lhe permita viver de acordo com a sua condição social c o alimentante tem patrimônio ou renda que lhe possibilita pagar os alimentos sem desfalque injustificado ao seu padrão de vida CC art 1695 Presentes os três requisitos nasce o direito do alimentado aos alimentos e a obrigação do alimentante de pagálos Os alimentos não se destinam à formação ou majoração do patrimônio do alimentado RT 830323 mas unicamente ao atendimento das necessidades que ele não pode custear com seus próprios meios Os alimentos em geral devem ser compatíveis com a condição social do alimentado Se Antonio e Benedita marido e mulher tinham três filhos Carlos Darcy e Evaristo e sempre mantiveram com o produto de seu trabalho a família com determinado padrão de vida residindo em bairros centrais dispondo de motorista particular viajando ao exterior todo ano vestindo roupas boas usufruindo de serviços médicohospitalares de alta qualidade etc os filhos estão obrigados a sustentálos se eles na velhice não conseguirem mais gerar o dinheiro suficiente para tanto Carlos Darcy e Evaristo estão obrigados a manter o mesmo padrão de vida que Antonio e Benedita lhes haviam proporcionado quando lhes competia prover o sustento da família A regra geral portanto assegura ao alimentado o direito de receber do alimentante os recursos necessários à manutenção do mesmo padrão de vida compatível com a sua condição social Essa regra contudo não tem aplicação absoluta Se a vida que o alimentante poderia ter com seu patrimônio e renda ficar injustificadamente prejudicada desconstituise o direito do alimentado à manutenção do padrão de vida Ninguém está obrigado a sustentar o luxo alheio se isso o impedir de levar a vida que seu patrimônio e renda possibilitam No exemplo anterior em princípio Carlos Darcy e Evaristo estão obrigados a manter os pais no mesmo padrão de vida em que esses mantinham a família quando aqueles viviam sob seus cuidados Estarão desobrigados contudo se a manutenção do igual padrão de vida por Antonio e Benedita acarretarlhes desfalque injustificado Imagine que Carlos fique sem dinheiro para pagar uma boa escola para sua filha Fátima se tiver de custear a viagem de luxo dos pais dele É evidente a completa falta de justificativa para o desfalque que a obrigação alimentar acarretaria ao alimentante nesse caso Mas Darcy não pode negarse a contribuir com o pagamento do segurosaúde dos pais sob o pretexto de que o dinheiro correspondente destinarseia à compra de brinquedos eletrônicos para seu filho Germano Aqui o desfalque no padrão de vida do alimentante é em tudo justificável Para serem devidos alimentos compatíveis com a condição social do alimentado assim é necessário em primeiro lugar que o alimentante não tenha que se sacrificar injustamente para pagálos A inexistência de culpa é outro requisito para se constituir o direito aos alimentos compatíveis com a condição social do alimentado Se o próprio alimentado arruinou culposamente seu patrimônio ou podendo trabalhar não se anima a fazêlo por preguiça o valor dos alimentos será fixado em patamar mínimo isto é pelo montante indispensável à subsistência dele CC art 1694 2º Aproveitando ainda o mesmo exemplo se Antonio e Benedita perderam na mesa do jogo parte substancial de seu patrimônio e renda Carlos Darcy e Evaristo não estão obrigados a sustentálos no mesmo padrão de vida que tinham anteriormente O valor dos alimentos nesse caso será fixado tendo em vista apenas evitar que Antonio e Benedita passem por privações básicas como fome ou completa falta de assistência médica Como foram os culpados pelas necessidades por que estão passando devem suportar as consequências de seu comportamento indevido experimentando a drástica redução no padrão de vida Os perdulários não têm direito senão aos alimentos mínimos Os alimentos são devidos aos parentes cônjuges ou companheiros que não dispõem de patrimônio ou renda suficientes para a sua manutenção alimentados por aqueles que dispõem de meios para custeála sem prejuízo injustificado para o próprio padrão de vida alimentantes O alimentado que não tiver sido culpado pelas suas necessidades tem o direito aos alimentos em valor que lhe permita manter o padrão de vida compatível com sua condição social desde que o alimentante possa arcar com ele sem ficar injustamente prejudicado O valor dos alimentos deve ser estabelecido a partir dessas diretrizes de um lado o padrão de vida compatível com a condição social do alimentado de outro a inexistência de culpa pelo estado de necessidade e de desfalque injustificado no patrimônio ou renda do alimentado Atendidos esses pressupostos cabe ainda considerar as necessidades do alimentado e os recursos do alimentante CC art 1694 1º Na quantificação do devido a título de alimentos as necessidades do alimentado pressionam para cima o valor enquanto os recursos do alimentante para baixo Quanto maiores as necessidades do alimentado mais elevado será o valor dos alimentos quanto menores as condições do alimentante mais reduzido será esse valor Mas a despeito do critério legal de nada adianta o alimentado ter certa necessidade se o alimentante não tem recursos para atendêla Se a neta ao ficar órfã costumava frequentar semanalmente um caro cabeleireiro mas os avôs não o podem pagar com suas minguadas aposentadorias aquela necessidade não pode ser atendida Do mesmo modo não é porque o alimentante dispõe de amplos recursos que o alimentado tem direito à elevação de seu padrão de vida O irmão de quem ganha um grande prêmio lotérico não pode pedirlhe alimentos para o atendimento de necessidades que anteriormente não possuía A obrigação alimentar pode deixar de existir ou mudar de valor para mais ou para menos em função de alterações nas condições econômicas do alimentado e alimentante A existência e extensão da obrigação fixamse sempre tendo em conta a situação patrimonial e econômica dos sujeitos ativo e passivo num determinado momento Variando essa situação varia igualmente a obrigação Assim se provar que o alimentado não tem mais certa necessidade concluiu o tratamento médico formouse na Universidade etc ou passou a ter patrimônio ou renda suficiente para se manter foi reempregado ganhou indenização em juízo etc o alimentante pode pedir a exoneração da obrigação ou a redução do encargo Por seu turno o alimentado provando ter novas necessidades piora na saúde nascimento de mais um filho etc ou a melhoria da condição do alimentante aumento salarial herança etc poderá pedir ao juiz a majoração do valor da obrigação CC art 1699 Nessas variações devemse atender rigorosamente os mesmos critérios acima indicados A redução ou majoração dos alimentos é proporcional às mudanças nas necessidades do alimentado e condições do alimentante O padrão de vida compatível com a condição social do alimentado deve ser em princípio buscado mas cabe a redução se o alimentante passou a ter ele próprio uma necessidade que antes não tinha para cujo custeio não pode ter os recursos desfalcados Não basta a prova de que o alimentante melhorou sua condição econômica ou patrimonial se a necessidade do alimentado não existia antes de serem devidos os alimentos A revisão dos alimentos em decorrência de mudança na condição econômica e patrimonial das partes não se confunde com sua atualização monetária As prestações alimentícias devem ser atualizadas pelo índice e periodicidade definidos pelas partes ou juiz para que sua expressão monetária continue ao longo do tempo compatível com o atendimento das necessidades do alimentado neutralizandose os efeitos da inflação CC art 1710 Essa correção não aumenta o valor da prestação alimentícia mas apenas o preserva e por isso não se confunde com sua revisão para cima 12 Classificação dos alimentos Há interesse em três classificações dos alimentos a Em favor de parente ou de cônjuge ou convivente Por mais que se tenha esforçado o Código Reale no sentido de disciplinar os alimentos de forma unitária independentemente do vínculo entre o credor e o devedor cabe distinguirse a hipótese de obrigação alimentar em favor de parente consanguíneo ou de pessoa com quem o alimentante esteve casado ou manteve união estável Os alimentos devidos em favor de parente têm por fundamento racional a função assistencialista da família O exemplo mais relevante está na obrigação de sustento dos filhos menores pelos pais que de certo modo é invertida quando esses últimos alcançam idade em que o trabalho tornase mais difícil ou menos rendoso Também avôs e netos assim como os irmãos devem alimentos uns aos outros quando um deles necessita e o outro pode prover subitem 13 Já os alimentos devidos a cônjuge ou convivente guardam relação com a condição de inferioridade da mulher marcante no passado e ainda hoje encontrada em algumas relações de conjugalidade Como a mulher não era estimulada a cultivar uma carreira profissional consistente não conseguia libertarse da dependência dos recursos do marido ou companheiro mesmo depois da dissolução do vínculo conjugal se tinha formação profissional era comum abdicar com o casamento de prosseguir em sua carreira defrontando então ao se divorciar com enormes dificuldades no reingresso no mercado de trabalho De uma forma ou de outra a mulher divorciada ou cuja união estável se desfizera tinha dificuldade de auferir renda compatível com o padrão de vida de que desfrutava no casamento Os alimentos em favor de cônjuge ou convivente é a rigor um anacronismo que a lei deveria continuar contemplando apenas para tratar de forma justa a situação dessas mulheres quando o esquema machista dos relacionamentos de antanho ainda fosse por decisão do casal adotado Ao contrário de tratar a matéria como hipótese excepcional justificável unicamente em favor da mulher em função da persistência de esquemas dessa natureza a lei a estendeu também ao sexo masculino O homem pelo direito vigente pode reclamar alimentos de sua antiga esposa ou companheira subitem 14 b Compatíveis com a condição social ou mínimos Em termos gerais o alimentado tem direito aos alimentos compatíveis com sua condição social quando seu patrimônio ou renda são insuficientes para a manutenção do padrão de vida correspondente Os alimentos devem ser fixados em montante que possibilite ao alimentado continuar a se vestir comer descansar e de um modo geral levar a mesma vida que levava antes do surgimento da necessidade Isso significa que exceto nas classes de menor renda o valor devido pelo alimentante ultrapassa em muito o que seria suficiente à mera subsistência do alimentado Em duas hipóteses contudo a título de sanção a lei nega ao alimentado o direito aos alimentos compatíveis com a condição social garantindolhe apenas o indispensável à sua subsistência São as hipóteses de alimentos mínimos a que têm direito o alimentado culpado pela deterioração de sua condição econômica e patrimonial CC art 1694 2º e o cônjuge ou convivente culpado pelo fim da sociedade conjugal ou da união estável art 1704 parágrafo único Classificamse os alimentos de acordo com o vínculo entre credor e devedor em favor de parente ou de cônjuge ou companheiro segundo o valor em compatíveis com a condição social ou mínimos e pelo momento processual em que são fixados em provisórios provisionais ou definitivos No caso de alimentos devidos a excônjuge ou excompanheiro a condição social do alimentando a ser considerada varia segundo este tenha ou não contribuído para a melhoria dela Explicome Alguém pode durante o tempo de duração do casamento ou da união estável melhorar sua condição social em razão de esforços pessoais como a conclusão de curso superior por exemplo Se for este o caso ou seja se a melhoria da condição social devese em parte a esforços pessoais do alimentando é a situação ao tempo do divórcio ou do desfazimento da união estável que deve ser levada em conta Se porém a melhoria na condição social durante o casamento ou a união estável deveuse exclusivamente a esforços do outro cônjuge ou companheiro a situação a considerar é a anterior ao vínculo horizontal Assim por exemplo se o casal melhorou sua condição social graças não só ao trabalho do marido como também a esforços pessoais da mulher os alimentos que aquele deve pagar a esta quando devidos pelo valor da compatibilidade com a condição social devem assegurar o mesmo padrão de vida que a alimentada estava levando ultimamente como esposa ou companheira Se porém a melhoria da condição social do casal deveuse exclusivamente ao trabalho do marido tendo a mulher se acomodado e apenas usufruído da situação econômica favorável a condição social a considerar é a anterior ao casamento ou à união estável c Provisórios provisionais ou definitivos Tão logo despache a petição inicial da ação de alimentos o juiz fixa o valor a ser pago pelo réu durante a tramitação do feito a menos que o autor declare não precisar deles Lei n 547868 art 4º Esses são os alimentos provisórios Em medidas cautelares preparatórias ou incidentais às ações de divórcio nulidade ou anulação de casamento o juiz pode fixar o valor a ser pago pelo demandado para atender à situação emergencial em que se encontra o demandante Esses são os provisionais CC art 1706 Finalmente ao sentenciar já encontrando nos autos todos os elementos para a quantificação adequada da obrigação o juiz determina o valor dos alimentos definitivos A rigor como mostra Luiz Edson Fachin todos os alimentos são provisionais e provisórios nunca definitivos 2003292294 quer dizer objetivam prover os recursos de que necessita o alimentado e sempre comportam revisão quando alterada a condição econômica e patrimonial das partes ou de uma delas Essa classificação não obstante tem serventia no campo do direito processual 13 Alimentos para parentes Tanto os filhos podem reclamar alimentos dos pais como estes daqueles O direito aos alimentos é recíproco entre pais e filhos Estendese ademais a todos os ascendentes e descendentes titulando a obrigação os parentes de grau mais próximo CC art 1696 Assim o neto órfão tem direito de reclamar alimentos dos avós assim como estes daquele dependendo de quem esteja necessitado ou tenha meios para sustentar É irrelevante para imputação da obrigação alimentar aos pais e filhos a espécie de filiação que os une Tanto na filiação biológica como não biológica é obrigação de ascendentes e descendentes alimentaremse uns aos outros Também claro o filho reconhecido voluntariamente ou por condenação em ação investigatória faz jus aos alimentos art 1705 A lei estabelece uma ordem imputando a obrigação inicialmente aos ascendentes e apenas em sua falta aos descendentes art 1697 primeira parte Desse modo se o necessitado tem pai e filhos ambos em condições de pagar os alimentos está obrigado a fazêlo o primeiro apenas só no caso de vir a falecer o pai obrigado os filhos dessa pessoa passam a deverlhe alimentos Quem não tem ascendentes ou descendentes pode reclamar os alimentos dos irmãos tanto bilaterais como unilaterais CC art 1697 in fine Cessa nesse grau contudo o parentesco gerador da obrigação alimentar Os afins e os colaterais além do segundo grau não estão obrigados a prover alimentos uns aos outros Se o parente obrigado aos alimentos não tem meios para arcar com o seu valor integral os demais serão chamados a complementar a pensão CC art 1698 primeira parte Quando o valor pago pelos pais é insuficiente e eles não têm como arcar com todo o sustento do alimentado RT 839322 este pode pleitear alimentos subsidiários dos avós RT 839228 desde que eles tenham como provêlos RT 821333 Pais e avós em condições de pagar os alimentos assumem então quotas proporcionais à responsabilidade de cada um RT 838326 Sendo várias as pessoas obrigadas a prestar os alimentos como nos casos por exemplo de dois ou mais filhos responsáveis pelo sustento da mãe viúva dos pais divorciados alimentando os filhos dos avôs que pagam pensão alimentícia complementar ao neto cada um contribuirá segundo suas condições CC art 1698 Sendo um dos alimentantes mais rico que o outro as quotas serão proporcionais de modo a imputarlhe maior responsabilidade A regra da proporção é aplicável também no caso de divórcio ou dissolução da união estável relativamente aos alimentos devidos aos filhos Se os pais são divorciados ou viviam em união estável agora desfeita cada um é responsável pelos alimentos do filho proporcionalmente aos respectivos recursos econômicos e patrimoniais art 1703 Dessa maneira se por exemplo a mãe ganha mais que o pai ela deve responder por porção maior dos alimentos de que necessita o filho Não há de outro lado solidariedade entre os coalimentantes porque a lei não a estipula expressamente A solidariedade lembrese não se presume Cap 14 item 7 Desse modo o alimentado não pode cobrar de qualquer um dos alimentantes a integralidade dos alimentos para que eles se acertem em regresso Se o alimentado deixa de receber a quota cabível a um alimentante só dele pode exigir a prestação Os filhos em princípio têm direito aos alimentos desde a concepção Pimentel Pereira 20034748 até a maioridade Com 18 anos como regra cessa o poder familiar e a obrigação de os pais proverem o sustento do descendente Maior e capaz passa a ser responsável por sua manutenção O limite de idade a partir do qual cessa a obrigação dos pais de sustentar o filho deve ser expandido no caso de ele se encontrar ainda estudando RT 840751 Mas para que não se estimule a vagabundagem a extensão do limite de idade tem sentido apenas no caso de o filho corresponder ao gasto Isto é se aos 18 anos ele ainda não concluiu o ensino médio a maioridade libera os pais de qualquer obrigação alimentar Cahali 2004219 Com toda justiça temse atribuído aos pais a obrigação de continuar a sustentar os filhos até a formatura em curso superior quando então estarão aptos a prover sua manutenção com os resultados da profissão obtida Zuliani 2006 mas desfazse qualquer sentido de justiça em tal atribuição quando o filho deixa de mostrar o empenho razoavelmente exigido nos estudos Se atrasa a conclusão do curso superior propositadamente ou por mau desempenho escolar o filho maior de 18 anos perde o direito de continuar sendo alimentado pelos pais Aqui não pode ter aplicação o critério geral de fixação dos alimentos a partir das necessidades do alimentado inclusive relacionadas à educação A sua observância implicaria despropositado estímulo ao descumprimento pelo filho de sua obrigação de estudar Outro fator que justifica a extensão do limite de idade de cessação da obrigação alimentar é a falta de capacidade física ou mental para o filho prover seu próprio sustento mesmo depois de fazer 18 anos Quando o filho é portador de doença mental a maioridade não implica exoneração da obrigação de alimentar RT 830321 Do mesmo modo se porta deficiência física que o inabilita para qualquer trabalho continua credor de alimentos Os filhos menores não têm direito de acrescer a quotaparte do irmão que perdeu o direito aos alimentos RT 821241 Desse modo se o pai paga alimentos no valor de 100 a dois filhos e um deles por força da maioridade ou da conclusão do curso superior perde o direito de recebêlos reduzse o valor da pensão alimentícia devida para 50 O filho que continua titulando o direito aos alimentos não pode acrescer à sua quota a do irmão Os parentes consanguíneos em linha reta e os colaterais até segundo grau inclusive devem uns aos outros alimentos quando qualquer um deles não tem renda ou patrimônio para se manter no padrão compatível com sua condição social e o outro pode pagálos sem desfalque injustificável para sua própria vida Os alimentos são devidos no patamar mínimo porém suficiente à sobrevivência do parente necessitado se tiver sido dele a culpa pela deterioração do patrimônio ou receita De outro lado o limite de idade para a cessação da obrigação alimentar dos pais em relação ao filho abreviase na hipótese de casamento união estável ou concubinato do alimentado CC art 1708 Quando o filho se casa ou constitui união estável entendese que passou a formar nova família e está em condições de arcar com o seu sustento contando apenas com o resultado de seu próprio trabalho e de seu consorte ou convivente Se mantém concubinato pressupõese que está maduro para cuidar de si mesmo Num ou noutro caso estão dispensados os pais e demais parentes de prover os alimentos Cessa por fim a obrigação de alimentar quando o credor portarse de modo indigno em relação ao devedor CC art 1708 parágrafo único Os alimentos malgrado sua natureza de obrigação legal correspondem a um sacrifício imposto ao alimentante em benefício do alimentado Este deve ser por isso grato àquele Se não o for e chegar a manifestar a ingratidão por gestos falas ou condutas perderá o direito que titula 14 Alimentos para cônjuges e companheiros O desfazimento da sociedade conjugal acarreta naturalmente a redução do padrão de vida da família É fácil percebêlo o mesmo dinheiro que antes bastava para viverem todos sob um único teto deverá agora ser empregado na manutenção de duas casas Isso é inevitável e independentemente de quem tomou a iniciativa de propor a separação ou foi o culpado pela dissolução da sociedade conjugal sofrerão todos os membros da família cônjuges e filhos os efeitos econômicos e patrimoniais do término da sociedade conjugal Não quer a lei no entanto que um dos cônjuges experimente uma acentuada redução em seu padrão de vida tornandoo incompatível com a condição social dele se não tiver sido o culpado pelo fim do relacionamento Por essa razão o inocente se seu patrimônio e rendas forem insuficientes para garantirlhe padrão de vida compatível com sua condição social tem direito aos alimentos que o assegurem Em qualquer caso tenha ou não rendimentos próprios o cônjuge irá experimentar como visto alguma redução no padrão que levava É incontornável O direito aos alimentos existe em consequência apenas se o cônjuge não tendo patrimônio ou renda que lhe permita viver em padrão compatível com sua condição social experimentar uma acentuada queda nesse padrão Se o cônjuge possui trabalho cuja remuneração lhe permite viver em padrão compatível com sua condição social não terá direito aos alimentos Imagine que o executivo de empresa de grande porte seja casado com uma milionária Enquanto perdura a relação conjugal os dois fazem constantes viagens ao exterior no jatinho particular de propriedade desta última Ao se separarem o executivo deixará de usufruir desse conforto sofrendo a correspondente redução no elevadíssimo padrão de vida que levava Mas não terá direito a alimentos nem mesmo com o objetivo de compensação da perda sofrida Isso porque ele dispõe de renda que possibilita manter se em padrão de vida compatível com sua condição social O Código Civil no art 1694 assegura especificamente os alimentos de que necessitem os cônjuges para viver de modo compatível com a sua condição social Se assim é então os alimentos serão indevidos quando o cônjuge com a própria renda consegue viver de modo compatível com sua condição social ainda que verificada alguma diminuição do padrão de vida que tinha durante o casamento Imagine agora que um empresário de sucesso casouse com mulher que apesar de ser filha da classe média e ter condições para fazer um curso superior contentarase apenas com o técnico de secretariado bilíngue Com o casamento deixou de trabalhar fora e passou a cuidar exclusivamente da administração doméstica Durou o casamento cerca de dez anos durante os quais a mulher não se interessou em se atualizar em sua formação ou mesmo adquirir profissão de nível superior Usufruiu nesse tempo o padrão de vida que o marido custeava sozinho Evidentemente na separação se a partilha não lhe destinou patrimônio suficiente para gerar os rendimentos para uma vida de padrão de classe média por mais que se esforce essa infeliz não conseguirá trabalho que lhe proporcione renda para tanto Só conseguirá viver de modo compatível com a sua condição social se puder contar com os alimentos do exmarido Terá direito a eles nesse caso a menos que tenha sido dela a culpa da dissolução da sociedade conjugal Em princípio com o divórcio rompido o vínculo conjugal existente entre os cônjuges deixam estes de titular um em relação ao outro o direito aos alimentos Cahali 19781122 Apenas se no acordo de divórcio ou na sentença que a decretou ficou um dos excônjuges obrigado a pagar alimentos ao outro a obrigação se prolonga além do término do vínculo conjugal Esta regra geral no entanto não tem aplicação naqueles casamentos em que parte substancial das despesas do casal corria exclusivamente por conta de um dos cônjuges se não tem o outro como prover uma vez divorciado seu próprio sustento Deste modo no divórcio o cônjuge que não dispuser de meios para se manter tem o direito de ser alimentado pelo outro na medida de suas necessidades e dos recursos do alimentante Se não tiver sido o culpado pelo divórcio o valor dos alimentos será o compatível com sua condição social mas se a culpa tiver sido do alimentado fará jus unicamente aos alimentos mínimos vale dizer os indispensáveis à sobrevivência É o previsto nos arts 1702 e 1704 e seu parágrafo único do Código Civil Notese que estes dispositivos falam em separação e não em divórcio Isto porque foram editados antes da EC n 662010 que aboliu aquela primeira fase da dissolução do vínculo matrimonial Estas disposições do Código Civil no entanto bem examinadas continuam vigentes posto não serem incompatíveis com a nova redação do art 226 6º da Constituição No divórcio e na dissolução da união estável o cônjuge ou companheiro que necessitar de alimentos para se manter pode reclamálos do outro Se tiver patrimônio ou renda para viver em padrão compatível com sua condição social não fará jus aos alimentos Quando os alimentos forem devidos seu valor será diferente de acordo com a culpa do alimentado para o divórcio ou a dissolução da sociedade conjugal Se ele não foi o culpado os alimentos serão no valor necessário à manutenção do padrão de vida compatível com a condição social do alimentado se foi corresponderá ao suficiente para a sua sobrevivência alimentos mínimos Se o vínculo de conjugalidade não era o casamento mas a união estável os critérios são rigorosamente idênticos O companheiro ou companheira que não dispõe de patrimônio ou renda para se manter após a dissolução da união estável tem o direito de cobrar alimentos do outro Se não tiver sido o culpado ou culpada pela dissolução da união o valor dos alimentos será o que sustente padrão de vida compatível com a condição social do alimentado se tiver sido dele a culpa do fim do relacionamento estável o valor será apenas o que bastar para a sobrevivência Cessa a obrigação alimentar em favor do cônjuge ou convivente em duas hipóteses novo casamento união estável ou concubinato do alimentado e se este se comportar de maneira indigna em relação ao alimentante CC art 1708 e parágrafo único Novas núpcias do alimentante porém não extinguem a obrigação de alimentar constante da sentença de divórcio art 1709 15 Alimentos gravídicos Durante a gestação a gestante incorre naturalmente em certas despesas relacionadas à sua saúde e à do bebê Necessitam ambos de exames médicos periódicos especializados e por vezes tratamento clínico ou até mesmo cirurgia Essas despesas que a lei chama de adicionais do período de gravidez devem ser repartidas entre a gestante e o pai na proporção dos recursos de cada um Quando o pai resiste a cumprir sua parte nessa obrigação podese requerer ao juiz a fixação de alimentos gravídicos consoante o previsto na Lei n 118042008 O juiz diante dos indícios de paternidade fixará os alimentos gravídicos Nascendo o filho com vida o pai continuará devedor da prestação mensal mas agora a título de alimentos em geral e até que seja requerida por ele ou pelo filho a revisão judicial 16 Falecimento do alimentante A obrigação alimentar é personalíssima e portanto intransmissível Falecendo o alimentante ela desaparece O art 1700 do Código Civil expressouse imperdoavelmente mal ao dispor que a obrigação de prestar alimentos transmitese aos herdeiros do devedor Isso porque levado esse infeliz dispositivo ao pé da letra algumas situações claramente absurdas estariam legitimadas Se a obrigação alimentar fosse realmente transmissível aos herdeiros o cônjuge sobrevivente do segundo casamento teria de sustentar o antigo consorte do falecido a filha seria devedora de alimentos em favor do homem que conviveu alguns anos com sua mãe após ela enviuvar e assim por diante A rigor quis dizer a lei no dispositivo em questão que o espólio conti nuará a pagar os alimentos devidos pelo de cujus até a partilha computandose os valores recebidos como antecipação da quota cabível ao alimentado É assim que a jurisprudência vinha decidindo antes da entrada em vigor do Código Reale RT 839317 e continuou a decidir Cahali 2004246260 Em nenhuma hipótese portanto os alimentos poderão ser pagos além das forças da herança na parte proporcional ao quinhão do alimentado cf Oliveira 2004 Interpretar de modo diverso o art 1700 do Código Civil como se o herdeiro sucedesse o autor da herança na obrigação alimentar importa clara descaracterização dos alimentos como obrigação personalíssima Pimentel Pereira 2003913 e desrespeito ao direito constitucional à herança CF art 5º XXX Considere que o falecido deixou aos dois filhos seus únicos herdeiros porções iguais de seu patrimônio Enquanto vivia pagava alimentos a um deles somente por ser menor de idade Com a morte do alimentante extinguese a obrigação alimentar assim como se extinguiria se morresse o alimentado Tratase de obrigação personalíssima lembrese Para que o herdeiro menor não sofra nenhum prejuízo o espólio continuará pagandolhe a prestação correspondente à pensão alimentícia Mas na hora da partilha os valores pagos devem ser debitados do quinhão atribuível a esse herdeiro Se não for feita a compensação desrespeitase o direito constitucional titulado pelo irmão maior que então receberia porção inferior da herança 2 Tutela Quando o menor fica órfão de pai e mãe alguém deve se responsabilizar por ele Alguém que o proteja dirijalhe o restante da criação e educação e zele por seus interesses Em razão da falta de capacidade civil o órfão continua a necessitar de representante enquanto impúbere ou assistente quando púbere para a prática de negócios jurídicos Finalmente se possui patrimônio a criança ou adolescente precisa de alguém capaz para administrálo Essa pessoa que se responsabiliza pelo menor órfão de pai e mãe é chamado tutor a criança ou adolescente sob seus cuidados chamase tutelado ou pupilo A mesma necessidade de se designar pessoa capaz como responsável pela criança ou adolescente existe no caso de os dois pais serem destituídos do poder familiar O menor nesse caso também será posto sob tutela A rigor são três os casos em que a lei determina a nomeação de tutor para a criança ou adolescente morte dos dois pais ausência de ambos decretada por sentença ou destituição deles do poder familiar CC art 1728 O tutor não substitui os pais do tutelado nem mesmo sob o ponto de vista jurídico Ele não titula os direitos associados ao poder fami liar apenas fica incumbido de algumas das funções que os pais exerciam Aquelas funções por assim dizer práticas que se relacionam à paternidade ou maternidade as que não podem aguardar a maioridade do sujeito Em certo sentido a tutela se contrapõe ao poder familiar porque ela não tem lugar enquanto ele existir recuperado o poder familiar perdido sai o menor da tutela Enquanto um dos pais viver ou titular o poder familiar concentramse nas mãos dele todos os direitos associados a esse poder e não há razões para ser dado tutor ao menor Somente falecendo os dois ou decaindo ambos do poder sobre o filho dar seá a tutela Dizse que a tutela é um múnus público um encargo que a lei imputa ao tutor Não tendo sido indicado pelos pais ninguém para o seu exercício a tutela caberá a um dos parentes do menor nomeado pelo juiz a partir de uma ordem prevista na lei Desse modo tratandose de tarefas que familiares devem assumir na falta dos pais contextualizase a tutela na função assistencial da família Diniz 20031334 O tio deve responsabilizarse pelo sobrinho órfão de pai e mãe em razão do vínculo familiar que os une Falecendo pai e mãe ou sendo ambos destituídos do poder familiar será dado tutor ao filho menor que se responsabiliza por cuidar dele e administrar seu patrimônio Nem sempre porém a tutela é vista como um pesado fardo Em primeiro lugar o afeto quando presente nos laços familiares costuma afastar qualquer ideia de descabido transtorno Os parentes não hesitam nesse caso de acolher o menor calorosamente dandolhe com amor todo o apoio necessário num momento tão doloroso morte ou afastamento de ambos os pais Mas ainda que não exista qualquer vínculo afetivo se o menor herda patrimônio valioso não faltarão interessados no exercício da tutela para os quais os encargos de tutor nunca parecerão exaustivos O menor abandonado aliás é o que não se enquadra em qualquer dessas situações Não tem parente no mundo disposto a cuidar dele desinteressadamente nem patrimônio Nesse caso o juiz poderá determinar o recolhimento da criança ou adolescente a estabelecimento público destinado a essa finalidade se não encontrar ninguém que gratuita e voluntariamente se disponha a tutelá lo CC art 1734 Cessa a tutela em primeiro lugar com a maioridade ou emancipação do pupilo CC art 1763 I Nesse caso não há mais razões para continuar alguém se responsabilizando por ele já que passou a ser sujeito de direito capaz Também é causa de cessação da tutela o restabelecimento do poder familiar inclusive pela adoção ou reconhecimento de paternidade ou maternidade art 1763 II Aqui embora o menor ainda necessite que alguém zele pelos seus interesses a função não caberá mais ao tutor mas sim ao titular ou titulares do poder familiar isto é o genitor ou genitora que o reconheceu voluntariamente ou foi condenado em ação investigatória ou os pais adotivos Não se confunde a cessação da tutela com a das funções do tutor Naquela desaparecem as razões que justificavam submeter a criança ou adolescente à tutela Na cessação das funções do tutor o menor continua sob tutela mas é substituído o sujeito a quem ela foi cometida Claro que nos dois casos de cessação da tutela também o tutor deixa suas funções Ocorrerá no entanto a cessação das funções do tutor sem que cesse a tutela em três hipóteses CC art 1764 Primeira o fim do prazo durante o qual o tutor está obrigado a exercer a tutela que é de dois anos art 1765 Por ser a tutela um múnus considera a lei que ninguém pode ser obrigado a desempenhálo por muito tempo A cada dois anos assim abrese a oportunidade de o tutor se exonerar do encargo passandoo a outro parente do menor ou mesmo a pessoa de confiança do juiz Não haverá a cessação da função depois desse prazo se o tutor tiver disposição de continuar nela e o juiz considerar a continuidade conveniente ao menor art 1765 parágrafo único Segunda a superveniência de escusa legítima Se por exemplo a tutora se casa ou ingressa no serviço militar pode escusarse legitimamente do exercício da tutela nos dez dias seguintes subitem 22 Terceira a destituição ou remoção do tutor decretada pelo juiz a qualquer tempo sempre que a medida se relevar a mais adequada aos interesses do menor tutelado No caso por exemplo de incorrer o tutor em ato negligente no exercício da função de prevaricação ou incapacidade a cessação da função deve ser determinada art 1766 21 Espécies de tutela Há três espécies de tutela testamentária legítima e dativa Na tutela testamentária o tutor é a pessoa escolhida de comum acordo pelo pai e mãe do menor Verificase essa espécie de tutela quando os pais não consideram que os seus parentes estejam aptos para cuidar dos interesses do filho e guiarlhe o restante da criação e educação ou quando pensam que um deles especificamente tem esta aptidão e desejam afastar da função os que o antecedem na ordem legal Se entendem que qualquer de seus parentes pode tutelar o filho de modo satisfatório não há razões para escolherem o tutor Compete aos pais em conjunto a nomeação do tutor CC art 1729 Inexiste o negócio jurídico se a indicação é feita por um deles somente Há tecnólogos que entendem válida a designação de tutor feita por um só dos pais mesmo enquanto vive o outro ou de tutores diferentes pelo pai e mãe em instrumentos separados cabendo nesse caso ao juiz escolher o tutor entre os dois nomeados Consideram que a escolha de qualquer dos pais é sempre melhor que a da lei Azevedo 2003325 Não deve ser adotado esse entendimento porém se ficar demonstrado que o nome preferido por um dos cônjuges era vetado pelo outro De um modo geral contra a vontade do pai ou da mãe ninguém pode ser investido na função de tutor Se cada um optou por atribuir o encargo a pessoa diversa pode ser que tivessem ambos sérias reservas em relação à pretendida pelo outro O juiz então deve nomear tutor de acordo com a ordem legal Para a validade da nomeação do tutor é indispensável que os pais estivessem ao falecerem no pleno exercício do poder familiar Não terá eficácia a lei fala imprecisamente em nulidade a designação feita se morreram decaídos desse poder CC art 1730 Mesmo que pai e mãe titulassem o poder familiar quando fizeram a declaração de vontade nomeando o tutor se não mais o titulavam ao falecerem não será eficaz a nomeação Essa espécie de tutela é denominada testamentária porque a exemplo dos testamentos refere se à declaração de vontade cujos efeitos só se projetam com a morte do declarante A nomeação do tutor assim pode ser instrumentalizada num testamento mas não necessariamente A lei autoriza que o seja também por qualquer outro documento autêntico CC art 1729 parágrafo único vale dizer uma escritura pública ou instrumento particular com firma reconhecida dos pais Não existe o compartilhamento dos encargos da tutela Cahali 2004326327 Em qualquer caso mesmo que o tutor seja casado ou viva em união estável a função é cometida a um sujeito de direito individualmente Nomeada assim mais de uma pessoa como tutora em cláusula testamentária ou do instrumento autêntico sem que os pais tenham fixado qualquer precedência o primeiro a ser referido será o tutor O outro ou outros referidos no documento de nomeação serão substitutos dele em caso de morte incapacidade escusa ou impedimento respeitada a ordem pela qual foram indicados CC art 1733 1º A nomeação do tutor na tutela testamentária pode ser feita sob condição ou a termo Miranda 1916 3325326 Os pais podem estipular que determinada pessoa será tutora de seus filhos desde que esteja casada ao tempo da tutela ou ainda resida na mesma cidade etc Nesse caso condicionam a investidura do nomeado na função de tutor ao atendimento do pressuposto de fato ou de direito por eles consignado Também lhes é facultado limitar no tempo o exercício da tutela estabelecendo por exemplo o rodízio na função entre duas ou mais pessoas a cada ano Na tutela legítima o tutor é escolhido pelo juiz entre os parentes consanguíneos do menor obedecida a ordem disposta na lei Seu pressuposto é a inexistência de nomeação pelos pais A escolha do juiz devese nortear por óbvio em função das aptidões dos parentes em zelar pelos interesses do tutelado em busca do que se mostra mais preparado A ordem da lei prioriza de início os ascendentes e entre esses os de grau mais próximo CC art 1731 I Assim o juiz deve considerar em primeiro lugar os avós da criança ou adolescente posto sob tutela Não há nenhuma hierarquia entre eles podendo a escolha recair sobre o avô ou avó paterno ou materno dependendo exclusivamente do que o juiz considerar mais apto ao exercício do múnus público Não sendo vivo nenhum deles mas vivendo bisavô ou bisavó a ordem legal de preferência aponta para o ascendente de terceiro grau Em segundo lugar na ordem da tutela legítima encontramse os parentes colaterais até terceiro grau preferindo os mais próximos aos remotos e os mais idosos aos jovens CC art 1731 II Desse modo não havendo ascendentes o juiz deve considerar os irmãos e irmãs capazes paternos ou maternos germanos ou unilaterais hierarquizandoos pela idade partindo do mais velho Não havendo nenhum irmão ou irmã em condições de assumir as funções de tutor o juiz deve enfim atentar para os tios e tias de qualquer lado da família hierarquizandoos mais uma vez de acordo com a idade O tio ou tia mais velho será então nomeado tutor Nos estritos termos da lei ao juiz não caberia fugir minimamente da ordem nela estabelecida devendo nomear o parente sempre com estrita observância do critério do legislador Em outros termos a tutela legítima recairia necessariamente no familiar já definido de antemão pela norma legal Esse rigor contudo não tem sido obedecido Entre um bisavô antiquado e sem energia e o mais jovem dos tios dinâmico e competente embora a lei prefira não se consegue atinar bem por quais razões o primeiro o juiz pode ficar com o outro Sempre que o interesse do menor justificar a ordem legal da tutela legítima pode ser esquecida cf Gonçalves 2005577579 Por fim na tutela dativa o juiz escolhe o tutor fora do círculo familiar do menor Dáse a hipótese quando falta nomeação pelos pais e não vive nenhum dos parentes arrolados na ordem legal de investidura Também é dativa a tutela quando os tutores testamentários e legítimos foram excluídos da função dela se escusaram ou a perderam por inidoneidade CC art 1732 De um modo geral se não estão em condições de exercer a função os nomeados pelos pais nem os parentes consanguíneos do menor ou se eles não existem o juiz escolherá pessoa da confiança dele para servir de tutor São dois os requisitos a serem atendidos pelo dativo idoneidade e residência no mesmo Município em que se encontra o domicílio do menor De acordo com a designação do tutor a tutela pode ser testamentária ele é nomeado pelos pais em conjunto no testamento ou outro documento autêntico legítima nomeado pelo juiz entre os parentes do menor obedecida a ordem legal ou dativa a nomeação recai sobre pessoa idônea e residente no mesmo Município do domicílio do menor da confiança do juiz Em qualquer espécie de tutela o tutor deve mostrarse idôneo e apto ao desempenho das funções que lhe são cometidas Deve estar ademais em condições de zelar pelos interesses do menor Algumas das hipóteses mais visíveis de inaptidão ou impedimento para a nomeação estão listadas na lei CC art 1735 Não podem ser tutores nesse sentido a os que não tiverem a livre administração de seus bens incapazes falido enquanto não reabilitado etc b os credores e devedores do menor por obrigação já vencida na época da investidura c os pais filhos ou cônjuges de quem litiga contra o menor d os inimigos do menor ou de seus pais e os que foram excluídos da tutela pelo pai ou mãe f os condenados por crime de roubo furto estelionato falsidade contra a família ou os costumes mesmo que tenham já cumprido a pena g pessoas de maus procedimentos com deficiência na probidade ou que foram excluídas no passado da função de tutor h os que exercem função pública incompatível com a boa administração da tutela é governador do Estado prefeito de cidade de porte etc 22 O tutor e suas responsabilidades A tutela é um múnus público Isso significa que o nomeado pelos pais ou pelo juiz em princípio não pode recusarse a exercêla Contempla a lei no entanto algumas hipóteses em que a escusa é admissível Estão relacionadas grosso modo a situações em que o nomeado por força da idade ou de outras responsabilidades presumivelmente ficaria sobrecarregado além do razoável caso tivesse de cuidar do menor órfão ou liberado do poder familiar Assim sendo podem legitimamente escusarse do encargo de tutor a mulher casada a lei num rompante machista parece considerar que o tempo dela deve estar tomado pelos cuidados devotados ao marido os maiores de 60 anos dos quais não se devem exigir mais contribuições à sociedade além das que já deram e os que têm sob sua autoridade mais de três filhos quando realmente restaria pouco tempo para os assuntos do tutelado Também os impossibilitados por enfermidade ou que residem em local distante daquele em que devem exercer a tutela e os militares em serviço podem recusar a designação Finalmente os que já têm sob os seus cuidados um menor ou incapaz isto é já são tutor ou curador estão dispensados de assumir mais um múnus público CC art 1736 O nomeado para a tutela dativa pode por seu turno legitimamente exonerarse indicando que o menor tem parente idôneo consanguíneo ou afim em condições de exercêla CC art 1737 A escusa deve ser manifestada ao juiz nos dez dias seguintes ao da designação sob pena de se entender renunciado o direito Se a causa para a escusa legítima sobrevier à investidura o prazo contase de sua verificação CC art 1738 O tutor pode desse modo nos dez dias seguintes à data em que completou 60 anos pedir ao juiz a dispensa do encargo Não o fazendo presumese ter renunciado ao direito de se escusar Ficará na função até se completar o biênio em curso Investido na função de tutela o tutor passa a ter responsabilidades em relação à pessoa e ao patrimônio do menor Em relação à pessoa do menor CC art 1740 incumbelhe dirigir a educação definindo a escola em que deverá estudar os cursos extracurriculares que convém fazer bem como controlando seu rendimento motivando e orientando o tutelado Não dispõe o tutor do poder familiar de modo que não tem o direito de aplicarlhe castigos físicos ou morais senão com autorização judicial Evidentemente as medidas de correção pedagógicas de que não possam derivar sérias consequências negativas e que se revelem necessárias no cotidiano do relacionamento com o tutelado o tutor pode aplicar sem autorização do juiz Cabe ao tutor defender o menor tendoo em sua companhia e guarda se isso for necessário à segurança dele Nessa incumbência que se deve interpretar de forma ampla incluemse os cuidados com a saúde alimentação e crescimento psicológico da criança ou adolescente Igualmente é ato de defesa do menor a cargo do tutor demandar em nome dele o pagamento de alimentos contra os parentes obrigados e em condições de provêlos O tutor só está obrigado a prestar ele próprio os alimentos ao pupilo de acordo com sua condição econômica patrimonial e social no caso de não dispor este último de patrimônio ou renda que lhe garanta a sobrevivência nem de parentes em condições de provêlos Tendo o menor bens e receita suficientes para sua manutenção não terá o tutor responsabilidade nenhuma de pagar alimentos mas apenas de administrar os recursos do pupilo de modo a atender às necessidades dele O juiz nesse caso arbitrará as quantias necessárias à educação e sustento do tutelado se os pais não as tiverem estabelecido CC art 1746 Não estará igualmente obrigado o tutor a alimentar o tutelado se este tem parentes com a obrigação de proverlhe o sustento Em síntese afora as especificidades da obrigação alimentar o tutor tem as mesmas responsabilidades em relação à pessoa do menor que os pais têm relativamente aos seus filhos Se o tutelado for adolescente tiver 12 anos ou mais o tutor deve levar em conta a opinião dele em todos os atos que praticar no exercício da tutela Já em relação aos bens cabe ao tutor administrálos no interesse e proveito da criança ou adolescente sob seus cuidados CC art 1741 Terá nesse caso a mesma responsabilidade que os demais administradores de interesses alheios como procurador diretor de sociedade empresária administrador judicial de massa falida interventor em instituição financeira nomeado pelo Banco Central etc Em síntese ele responde por má administração dos interesses do menor Se praticar algum ato que importe prejuízo ao pupilo aluguel de bem a preço inferior ao de mercado ou evidentemente o exponha a grande risco investimento em ações de empresas não consolidadas o tutor deverá indenizar os prejuízos que acarretar àquele art 1752 Pela administração dos bens do pupilo tem direito o tutor a uma remuneração proporcional ao valor deles a ser fixada pelo juiz Terá também o tutor direito ao reembolso dos adiantamentos que tiver feito em benefício do menor CC art 1752 O reembolso independe de qualquer autorização judicial bastando para efetuálo que o tutor os desconte do devido ao tutelado em sua prestação de contas art 1760 Ao investirse na função o tutor receberá os bens do menor median te a assinatura de termo que os especifique e quantifique Essa formalidade é exigida na lei não podendo dispensála nem mesmo os pais do pupilo CC art 1745 Também nessa oportunidade declarará os créditos vincendos que titula perante o menor se houver obrigação vencida o credor está impedido de ser nomeado tutor como visto sob pena de não poder cobrálos enquanto durar a tutela salvo provando que desconhecia seu direito creditório na época da investidura art 1751 Os atos de administração de maior complexidade ou que exigirem conhecimentos técnicos bem como os que devem ser praticados em local distante do domicílio do tutor poderão ser objeto de delegação Para delegar os poderes para tais atos o tutor deve escolher uma pessoa idônea e capacitada para praticálos e pedir prévia autorização judicial Será inválida a transferência de incumbências a terceiros feita diretamente pelo tutor sem essa autorização O delegado poderá ser pessoa física ou jurídica CC art 1743 Se o patrimônio do menor for substancial o juiz poderá nomear um auxiliar para fiscalizar sua administração pelo tutor Esse auxiliar chamase protutor ao qual poderá ser fixada uma remuneração módica a ser paga com recursos da renda do tutelado CC arts 1742 e 1752 1º Sendo de considerável valor o patrimônio também poderá o juiz exigir que o tutor preste caução A medida é excepcional porque impõe a quem já deve suportar o múnus público um agravo patrimonial Se a pessoa for notoriamente idônea ou por qualquer outra razão tomada pelo juiz a caução é dispensável art 1745 parágrafo único O tutor tem responsabilidades relacionadas à pessoa e aos bens do pupilo Em relação à pessoa do menor competelhe por exemplo dirigir a educação e defendêlo Deverá também sustentar a criança ou adolescente sob seus cuidados quando ele não dispuser de patrimônio ou renda suficiente para se manter Quanto aos bens o tutor é o administrador do patrimônio do menor respondendo pelos atos de má administração em que eventualmente incorrer Enquanto não nomear o tutor o juiz terá responsabilidade direta e pessoal pelo patrimônio do menor Mesmo depois de nomeálo continuará responsável subsidiariamente no caso de não ter exigido a caução do tutor ou de não o ter removido à menor suspeita CC art 1744 O protutor se houver é solidariamente responsável pelos danos causados pelo tutor ao pupilo quando tiver exercido sua função fiscal de modo negligente art 1752 2º 23 Limitação aos poderes do tutor O tutor tem a mesma responsabilidade de qualquer outro administrador de bens alheios Mas não dispõe dos mesmos poderes que em geral se lhe atribuem Ao contrário com o objetivo de dificultar malversação ao patrimônio do menor a lei limita os poderes que o tutor titula na condição de administrador Em outros termos no exercício da tutela o tutor deve praticar certos atos e não pode praticar outros Para alguns dos que pode praticar precisará de autorização do juiz A lei assim distribui os atos próprios da tutela em três categorias atos de competência do tutor CC art 1747 sujeitos à prévia autorização do juiz arts 1748 e 1750 e vedados art 1749 São atos de competência do tutor a representar o menor enquanto durar a incapacidade absoluta e assistilo durante a relativa em todos os atos e negócios da vida civil b receber as rendas e pensões a que tem direito o menor bem assim as quantias a ele relativas c providenciar o pagamento das despesas de subsistência e educação do pupilo bem como as relacionadas à administração manutenção e melhoramento de seus bens d praticar os atos de alienação dos bens do tutelado destinados à venda isto é que o juiz autorizou a vender e alugar os imóveis do menor Por sua vez são atos que a lei sujeitou à prévia autorização do juiz para que este pudesse controlar de modo mais direto a administração do tutor f pagamento de dívidas do menor não se compreendendo nesse conceito as despesas de subsistência e educação bem assim as de administração conservação e melhoria dos seus bens que como visto independem do juiz g aceitar heranças legados ou doações em nome do tutelado com ou sem encargos h transigir isto é dispor sobre direitos do menor com o objetivo de evitar ou encerrar litígio i vender bens móveis cuja conservação não atenda ao interesse do menor um barco ou carro deixado pelos pais por exemplo j vender bens imóveis quando houver manifesta vantagem para o menor na operação k demandar em juízo representando o menor ou assistindoo em caso de incapacidade relativa bem como defendêlo nas ações que contra ele forem propostas Esses atos como dito dependem de prévia autorização judicial para serem praticados pelo tutor Se por qualquer motivo forem realizados antes de solicitada a autorização a eficácia deles fica a depender da aprovação posterior pelo juiz CC art 1748 parágrafo único Por fim os atos que o tutor não pode praticar em nenhum caso nem mesmo autorizado pelo juiz sob pena de nulidade são l adquirir por si ou por interposta pessoa bens móveis ou imóveis pertencentes ao menor salvo se o fizer por escritura pública m dispor dos bens do pupilo de forma gratuita doandoos ou dandoos em comodato n receber direitos do menor em cessão inclusive créditos Certos atos o tutor pode praticar diretamente alugar os imóveis do menor pagar as despesas de administração e conservação dos bens etc Outros somente mediante prévia autorização do juiz ou posterior aprovação vender móveis ou imóveis do pupilo transigir etc Ademais há certos atos que ele não pode praticar de nenhuma maneira nem mesmo se autorizado judicialmente comprar por instrumento particular bens do menor receber em cessão direitos por ele titulados etc Além dessas limitações relativas a determinados atos a lei também estabelece certas regras atinentes aos bens do menor a serem observadas pelo tutor em sua administração Assim o tutor só pode ter sob sua disponibilidade o dinheiro do tutelado necessário às despesas ordinárias com seu sustento educação e administração dos bens CC art 1753 O que exceder deve ficar em conta de investimento bancário aberta em nome do pupilo lastreado fundamentalmente em títulos públicos O produto da venda dos objetos de ouro e prata pedras preciosas e móveis feita mediante autorização judicial após avaliação deve ser utilizado na aquisição de títulos públicos ou imóveis art 1753 1º A movimentação das contas de depósito bancário do menor depende de ordem judicial e só pode ser feita para atender finalidades específicas previstas na lei como compra de bens imóveis ou títulos públicos CC art 1754 24 Prestação de contas O tutor exerce suas funções sob a fiscalização do juiz auxiliado quando a complexidade do patrimônio do menor o exigir pelo protutor Um dos instrumentos de fiscalização do exercício da tutela é a prestação de contas Nem mesmo os pais ao nomearem o tutor testamentário podem dispensálo da obrigação de prestálas nos prazos e formas da lei CC art 1755 Anualmente o tutor deve submeter ao juiz o balanço contábil dos atos praticados relativamente aos bens e interesses do pupilo CC art 1756 A apresentação do balanço anual ainda não é a prestação de contas Destinase a transmitir ao juiz informações do período a que se refere que podem eventualmente alertálo para alguma irregularidade a tempo de se adotarem providências saneadoras A prestação de contas ordinariamente dáse a cada dois anos de exercício da tutela Esse é o prazo fixado pela lei com o objetivo de fazer coincidirem os períodos em que o tutor está obrigado a exercer o múnus público e o abrangido pela prestação As contas consistem em balanço patrimonial relativo ao biênio a que se refere no qual são consolidados os balanços anuais do último e do penúltimo período de exercício do múnus público Extraordinariamente as contas devem ser prestadas sempre que exigidas pelo juiz na cessação da tutela ou das funções do tutor CC art 1757 Em qualquer caso de terminação da tutela ou das funções exigemse as contas do tutor Elas são exigidas mesmo se o pupilo alcançou a maioridade ou foi emancipado e sendo capaz outorgou quitação ao tutor art 1758 As contas extraordinárias também são demonstrativos contábeis abrangendo o período de no máximo dois anos desde a data da última conta ordinária aprovada ou se ainda não houve nenhuma desde a investidura do tutor até a da exigência do juiz ou da cessação da tutela No caso de morte ausência ou interdição do tutor cabe aos seus herdeiros ou representantes o dever de prestar contas CC art 1759 O tutor está obrigado a prestar ao juiz contas dos atos que pratica no exercício da tutela Ordinariamente deve prestálas a cada dois anos Extraordinariamente sempre que o juiz determinar ou no fim da tutela Apresentadas as contas elas são autuadas determinando o juiz que sobre elas se manifestem o Ministério Público o protutor se houver e demais interessados Depois o juiz julga as contas aprovandoas ou rejeitandoas No caso de aprovação os saldos apurados devem ser recolhidos imediatamente pelo tutor em depósito bancário de investimento em nome do menor ou empregados na aquisição de bens imóveis ou títulos públicos CC art 1757 parágrafo único Se as contas forem rejeitadas considerase que o tutor incorreu em alcance Sem prejuízo de sua responsabilização criminal fica o tutor obrigado a repor imediatamente o valor alcançado vencendose juros desde o julgamento das contas art 1762 O balanço e demonstrativo contábil podem ser simples sem forma contábil rigorosa desde que o patrimônio e renda do pupilo sejam de valor reduzido Nesse caso o próprio tutor ou seu advogado elabora da maneira mais clara possível a planilha com os números correspondentes aos atos praticados Havendo contudo alguma complexidade na administração do patrimônio e rendas do menor convém que o balanço e a prestação de contas sejam feitos por um contador Em qualquer caso correm por conta do tutelado as despesas com a prestação de contas CC art 1761 3 Curatela A curatela a exemplo da tutela é múnus público atribuído aos familiares de uma pessoa geralmente maior quando ela não tem como praticar diretamente os atos da vida civil por insuficiente capacidade de discernimento ou mesmo impossibilidade física Contextualizase no direito de família em razão de sua natureza assistencialista em que alguém é chamado a dar apoio a um parente Os encargos associados à curatela imputamse ao curador São três as espécies de curatela Primeira que se destina a designar o representante legal ou assistente de interditos Estão sujeitos à curatela nesse caso a aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir a vontade b os ébrios habituais e os viciados em tóxicos c os pródigos CC art 1767 Deles já tratei anteriormente Cap 7 subitem 32 Tratase sem dúvida da hipótese mais relevante de curatela sob o ponto de vista jurídico embora nem sempre se revele a medida mais adequada à plena recuperação do interdito e sua integração na sociedade Pereira 2004385407 O processo judicial que define os termos da curatela chamado interdição pode ser promovido pelos pais cônjuge ou qualquer parente da pessoa que deve ser posta sob curatela ou ainda pela própria pessoa CC art 1768 I II e IV Também o tutor tem legitimidade para o pedido quando o pupilo relativamente incapaz não puder por qualquer razão exprimir a vontade É o caso de curatela de menor em que o tutor deve ser substituído pelo curador que passa a representálo Como se recorda o tutor do relativamente incapaz não o representa mas apenas o assiste nos negócios jurídicos Constatando que o pupilo apesar de já ter feito 16 anos não tem como exprimir a própria vontade o tutor deve requerer a interdição dele Finalmente o Ministério Público está legitimado para requerer a interdição desde que presentes um dos seguintes requisitos da lei deficiência mental ou intelectual inexistência de parente ou tutor legitimado a omissão menoridade ou incapacidade destes CC art 1769 No processo judicial destinado a definir os termos da curatela o juiz é obrigado a entrevistar pessoalmente o interditando Será assistido nesta entrevista por equipe multidisciplinar CC art 1771 O Ministério Público quando não for o autor da demanda atuará como defensor do interditando Sendo ele o autor o juiz nomeará outra pessoa para a função de defensor art 1770 A lei fixa os critérios para a nomeação do curador Inicialmente fixa regra geral determinando ao juiz que leve em conta a vontade e preferências do interditando a ausência de conflitos de interesse ou de influência indevida bem como a proporcionalidade e a adequação às circunstâncias da pessoa CC art 1772 parágrafo único A este parâmetro geral adiciona certos critérios específicos Assim se o interditando é casado ou vive em união estável o cônjuge ou convivente será o curador Se ele não mantém vínculo de conjugalidade com ninguém curador será o pai ou a mãe e na falta dos dois o descendente que se mostrar mais apto para o encargo preferindo os de grau mais próximo aos remotos Não havendo esses parentes o juiz escolherá para ser curador pessoa idônea de sua confiança art 1775 Se a curatela está sendo dada em razão de deficiência o juiz poderá determinar o seu compartilhamento a mais de uma pessoa art 1775A Segunda em que se dá curador ao nascituro sempre que a mãe perder o poder familiar durante a gravidez se o pai está morto ou também decaído desse poder Sendo a mãe interdita seu curador será também o do nascituro CC art 1779 Assim se a viúva grávida em razão dos atos irregulares praticados em relação a outro filho perder o poder familiar o ato se estende a toda a prole incluindo o rebento que está por vir Será nomeado tutor para os já nascidos e curador para o nascituro Terceira quando o curatelado é pessoa enferma ou portadora de deficiência física Mesmo não estando sujeita à interdição pode encontrarse numa situação em que não consegue expressar diretamente a vontade É o caso de quem sofreu grave acidente de trânsito e está internado num hospital inconsciente ou apenas imobilizado Se tiver condições para tanto o próprio interessado requererá ao juiz que nomeie o curador caso contrário parente ou órgão legitimado o fará por ele CC art 1780 Dáse curador ao interdito ao nascituro se os pais decaíram do poder familiar durante a gravidez e ao enfermo ou portador de deficiência física O exercício da curatela segue as mesmas regras estabelecidas para o da tutela feitas no entanto duas observações Primeira se o curador é casado em regime de comunhão universal de bens com o interdito estará dispensado de prestação de contas a menos que o juiz o determine CC art 1783 Sendo os dois titulares do mesmo patrimônio a hipótese de alcance está afastada não se justificando destarte a trabalheira das prestações de contas Segunda o curador deve observar os limites de suas atribuições fixadas na sentença que decretou a interdição CC art 1772 Tais limites na hipótese de a interdição se fundar na prodigalidade do interdito circunscrevem as funções do curador à de assistilo nos atos de empréstimo transigência quitação alienação instituição de hipoteca litígio judicial e os demais que excedem os de mera administração art 1782 Cap 7 subitem 321 Não se confunde por fim a curatela com a curadoria Aquela tem sentido permanente e habilita o curador a cuidar de todos os negócios bens e interesses da pessoa posta sob curatela Já a curadoria é específica de modo a habilitarse o curador apenas a determinados atos São exemplos de curadoria a instituída pelo testador com o objetivo de subtrair da administração do tutor os bens legados a menor CC art 1733 2º a relacionada à herança jacente art 1819 a atribuída ao filho quando conflitarem os interesses dele com os dos pais no exercício do poder familiar CC art 1692 a dada ao incapaz se não tiver representante legal ou seus interesses colidirem com os destes e ao réu preso revel ou ao revel citado por edital ou por hora certa enquanto não constituído o advogado CPC art 72 I e II Gonçalves 2005611 4 Tomada de decisão apoiada Com a edição da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência também chamada de Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei n 1314615 EPD criouse ao lado da tutela e da curatela mais um instrumento de assistência familiar a tomada de decisão apoiada CC art 1783 A A pessoa com deficiência de qualquer natureza se considerar que lhe pode ser útil ou necessário contar para os atos da vida civil do apoio de duas pessoas de sua confiança tem desta edição 2020 legitimidade para ingressar com o processo judicial destinado a formalizar este meio de assistência familiar Somente a própria pessoa com deficiência é parte legítima para o pedido Ela indicará ao juiz os apoiadores que devem ser pessoas idôneas com as quais o requerente mantenha vínculos Outro requisito essencial é a confiança que a pessoa com deficiência deve nutrir em relação aos apoiadores que indica Este processo judicial tem o objetivo de homologar um acordo previamente estabelecido entre a pessoa com deficiência e seus apoiadores Neste acordo são estabelecidos os limites do apoio mas para que produza efeitos jurídicos é indispensável a chancela judicial A petição inicial deve ser instruída pelo termo assinado pelo requerente e os apoiadores no qual estão as cláusulas do acordo de apoio O juiz ouvirá o Ministério Público e assistido por equipe multidisciplinar entrevistará a pessoa com deficiência requerente e as indicadas para prestarlhe apoio A partir do acolhimento do pedido a pessoa com deficiência contará com a colaboração dos apoiadores nas decisões que precisar tomar relativamente aos negócios jurídicos abrangidos no termo de apoio judicialmente homologado Os terceiros que se relacionam com a pessoa apoiada podem solicitar a assinatura dos apoiadores nos instrumentos negociais especificandose os limites da função destes O processo de tomada de decisão apoiada é requerido pela própria pessoa com deficiência interessada Mesmo que homologado judicialmente o termo de apoio porém a pessoa apoiada não se torna incapaz Por isto ela pode praticar validamente qualquer negócio jurídico mesmo sem a ajuda dos apoiadores Se uma pessoa apoiada fizer declaração de vontade sem o concurso dos apoiadores ou de um deles isto não invalida o negócio jurídico ainda que ele esteja incluído no termo de apoio judicialmente homologado Como este mecanismo de assistência familiar não torna o apoiado um incapaz que passe a necessitar de assistência ou representação legal a inobservância do termo de apoio judicialmente homologado não afeta a validade e eficácia do negócio jurídico Aliás um dos objetivos do EPD foi exatamente eliminar da ordem jurídica todos os traços da odiosa discriminação que as pessoas com deficiência sofriam em razão das restrições legais à sua plena capacidade jurídica A interpretação teleológica do EPD afasta em definitivo a hipótese de o processo de tomada de decisão apoiada significar qualquer restrição à capacidade da pessoa apoiada 2020 02 13 PÁGINA RB81 desta edição 2020 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES 2020 02 13 PÁGINA RB81 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES CAPÍTULO 62 INTRODUÇÃO AO DIREITO DAS SUCESSÕES Capítulo 62 Introdução ao Direito das Sucessões 1 Transmissão causa mortis O direito das sucessões disciplina a destinação do patrimônio da pessoa física após sua morte Melhor dizendo contempla as normas que norteiam a superação de conflitos de interesses envolvendo a destinação do patrimônio de pessoa falecida Sua matéria portanto é a transmissão causa mortis Os bens se transmitem por variados meios como negócio jurídico entre vivos partes de um contrato de compra e venda ou de doação por exemplo desapropriação incorporação ou fusão de pessoas jurídicas etc O direito das sucessões cuida de um dos meios de transmissão que é a morte da pessoa física Como o patrimônio não pode ficar sem titular morrendo esse deve ser imediatamente transferido para outras pessoas Por esse ângulo de abordagem o direito das sucessões parece aproximarse do direito das coisas Esses dois ramos do direito civil tratam de conflitos de interesses que gravitam em torno de bens Mas essa não é a única forma de abordar o direito das sucessões E talvez não seja sequer a forma mais apropriada Quando se presta atenção aos sujeitos para os quais são transmitidos os bens esse ramo jurídico aproximase de outro capítulo do direito civil o de família Como regra a morte da pessoa física importa a transferência de seus bens para familiares Destacase nessa abordagem o caráter assistencial do direito das sucessões Se para o morto não têm mais nenhuma serventia os bens que amealhou eles são ainda úteis aos seus familiares alguns dos quais eram dele dependentes ou haviam contribuído para a construção do patrimônio São complexas as regras do direito das sucessões porque a multiplicidade de relações familiares que envolvem a pessoa na hora da morte impede um tratamento simples que seja também justo para a maioria dos sucessores Se falece homem casado em regime de comunhão parcial de bens deixando além da viúva apenas filhos que teve com ela as relações familiares não apresentam a mesma complexidade das que se encontram no falecimento de homem separado de fato de sua esposa que mantinha união estável com outra e deixou apenas filhos havidos com uma terceira mulher No primeiro caso a destinação dos bens é menos complexa porque os sucessores são parentes uns dos outros no segundo por não haver nenhum vínculo de parentesco entre eles não é tão simples encontrarse a regra justa para a destinação Outro elemento que contribui para a elevada complexidade das regras de destinação do patrimônio de pessoa física falecida decorre do reconhecimento pela ordem jurídica positiva da eficácia à vontade do titular dos bens transmitidos As pessoas podem por meio de declarações volitivas dispor sobre a destinação de seus bens após o falecimento Quando o morto possui determinados familiares sucessíveis a lei restringe a liberdade para fazer tal disposição estabelecendo uma garantia mínima em favor de certos membros da sua família O direito das sucessões trata da transmissão do patrimônio da pessoa física em razão de sua morte Aproximase de um lado do direito das coisas por versar sobre a propriedade dos bens deixados de outro do direito de família porque os sucessores são normalmente familiares do morto Para enfrentar a complexidade do direito das sucessões vale a pena partir do exame dos sucessores item 2 e em seguida da herança item 3 São conceitos introdutórios cuja compreensão facilitará o exame das duas espécies de sucessão mortis causa a legítima Cap 63 e a testamentária Cap 64 2 Sucessores Os familiares de uma pessoa são classificáveis em relação à sucessão causa mortis em sucessíveis e não sucessíveis Os primeiros são os vocacionados a herdarem bens daquela pessoa enquanto os últimos não herdam a não ser que tenham sido lembrados na declaração de última vontade do autor da sucessão ou seja em seu testamento Os familiares sucessíveis estão classificados pela lei segundo regras que serão examinadas a seu tempo Cada classe de familiar sucessível posicionase numa ordem de chamada que estabelece a preferência a ser observada na destinação dos bens do patrimônio do falecido Como regra geral se na época da morte de uma pessoa estão vivos familiares sucessíveis de uma classe com preferência os das demais classes nada herdam Por enquanto basta conhecer quem são esses familiares titulares do direito de sucessão sem se preocupar com a trama de preferências que os enlaça Os familiares sucessíveis são os descendentes ascendentes cônjuge companheiro e os colaterais até o quarto grau Assim titulam o direito de sucessão quando chamada a classe a que pertencem os filhos netos bisnetos tataranetos descendentes pais avós bisavós tataravôs ascendentes irmãos sobrinhos tios primos sobrinhosnetos e tiosavós colaterais cônjuge e convivente do falecido São esses os familiares que podem suceder a pessoa morta na titularidade do patrimônio por ela deixado Os demais parentes do falecido como os afins não são sucessíveis No caso de serem não sucessíveis todos os parentes vivos do autor da sucessão e não tendo este deixado testamento destinase o seu patrimônio ao Estado 21 Classificação Interessa o exame de quatro critérios de classificação dos sucessores Em primeiro lugar cabe distinguilos em sucessores legítimos e testamentários Os legítimos são os familiares do morto indicados pela lei enquanto testamentários são os escolhidos pelo próprio falecido Se alguém falece sem deixar testamento dizse ab intestato seus bens serão destinados aos sucessores legítimos isto é aos membros de sua família apontados pela lei No passado era muito comum as pessoas fazerem uma declaração de última vontade pelo menos para encarregar alguém de rezar missas por intenção de sua alma Também era comum estabelecer quem deveria ficar com qual bem de seu patrimônio Hoje em dia a sucessão testamentária corresponde à exceção Na grande maioria das vezes herdam os sucessores legítimos A sucessão pode beneficiar exclusivamente sucessores legítimos apenas testamentários ou das duas categorias Se o morto não deixou testamento a sucessão importará a transferência de seu patrimônio somente para os familiares indicados na lei Se deixou testamento abrangendo validamente a totalidade do patrimônio terá apenas sucessores testamentários Mas se o testamento dispõe sobre uma parte dos bens a sucessão beneficiará sucessores testamentários e legítimos Uma pessoa pode ser sucessora legítima e testamentária na mesma sucessão Se o falecido tem como familiares sucessíveis apenas dois filhos e destinou a um deles por testamento porção maior de seu patrimônio o preferido será sucessor legítimo em razão da condição de filho e testamentário por força da contemplação no testamento o preterido será apenas sucessor legítimo tendo direito unicamente à porção do patrimônio assegurada em lei Como se verá adiante o pai não pode em princípio excluir inteiramente da sucessão o filho mas dentro dos limites legais ele dispõe de meios para beneficiar de modo desigual seus descendentes O que interessa por enquanto é fixar que não são exclusivas as condições de sucessor legítimo e testamentário A pessoa pode ser apenas sucessora testamentária assim como pode ser apenas legítima mas pode ocorrer de o sucessor legítimo ser agraciado por testamento com uma porção acrescida à sua parte na herança sendo assim também testamentário Esse critério de classificação não recobre todas as hipóteses de sucessão Quando o autor da sucessão morrer ab intestato e não deixar herdeiros legítimos seu patrimônio se transmitirá ao Estado isto é ao Município ou Distrito Federal em que se encontram ou à União se encontrados em Território Federal CC art 1844 É a hipótese de herança vacante subitem 35 O Estado é sucessor do falecido mas não pode ser considerado herdeiro de acordo com a ordem jurídica vigente portanto não se classifica entre os legítimos O critério classificatório exaustivo assim é o que divide os sucessores em ex lege e ex voluntate Como a sucessão darseá por lei ou por disposição de última vontade CC art 1786 os sucessores ex lege são aqueles para os quais o patrimônio do falecido é transferido por força de direta previsão legal isto é os legítimos e em caso de vacância o Estado enquanto os ex voluntate aqueles que sucedem em razão da vontade do morto os testamentários Outro critério de classificação distingue os sucessores em herdeiros e legatários Aos herdeiros transmitese o patrimônio do morto ou uma quotaparte dele enquanto aos legatários é transmitido bem específico Desse modo se a sucessão importa a transferência da titularidade do patrimônio como um todo sem especificação dos bens transferidos os sucessores são herdeiros Recebem do falecido uma herança Aqui a sucessão é universal Já se ela acarreta a transmissão da titularidade de um ou alguns bens na maioria das vezes determinados ou pelo menos determináveis são legatários os sucessores Recebem um legado e a sucessão é singular Diversas consequências advêm da natureza universal ou singular da sucessão No caso de herança transmitese o patrimônio que inclui as obrigações passivas isto é as dívidas deixadas pelo falecido Se for um único herdeiro o patrimônio é transferido como um todo Depois de pagas as obrigações com os recursos da própria herança o líquido remanescente serlheá transmitido Sendo dois ou mais os herdeiros cada qual herda uma quotaparte do patrimônio Satisfeitas as obrigações passivas deixadas pelo morto dividese o que remanesceu da herança entre os sucessores Já no caso do legado um ou alguns bens do patrimônio do falecido ou excepcionalmente de um sucessor dele devem ser destacados para entrega ao legatário Equivale o legado assim a uma obrigação dos herdeiros em favor do legatário De se observar porém que essa obrigação só existe na medida em que não comprometa o atendimento aos direitos de outros sucessores ou mesmo de credores do falecido Cap 64 item 4 Note que todo sucessor legatário é testamentário mas nem todo testamentário é legatário Se o falecido testa em favor do sucessor um determinado apartamento residencial ele é legatário desse específico bem Aliás não há como destinar certo bem a um sucessor em particular senão por meio de testamento O legado é sempre uma cláusula da declaração de última vontade do morto Por isso todo legatário é necessariamente sucessor testamentário Mas é possível também fazer se testamento deixando herança aos sucessores ou seja transferindolhes a titularidade do patrimônio como um todo ou de quotaspartes dele sem a indicação pelo testador do bem cabível a cada herdeiro Aqui o sucessor é testamentário porque foi escolhido pelo autor da sucessão mas não legatário inexiste legado Em outros termos o herdeiro pode ser sucessor legítimo ou testamentário assim como o sucessor testamentário pode ser herdeiro ou legatário mas o legatário só pode ser testamentário Quando um sucessor legítimo é aquinhoado por testamento com um legado ele o é na condição de testamentário O quarto critério de classificação dos sucessores extrema os herdeiros necessários dos facultativos Herdeiros necessários também chamados de reservatários ou obrigatórios são os que não podem ter sua porção na herança prejudicada por mera vontade do falecido É verdade que eles podem ser excluídos deserdados em testamento quando tiverem incorrido em determinadas condutas previstas na lei lesivas ao autor da herança ou seus familiares nessa hipótese porém a vontade do defunto é condição necessária mas não suficiente para a exclusão A classificação de um herdeiro como necessário implica a impossibilidade de o autor da herança afastálo da sucessão ou prejudicar sua participação por mera vontade Facultativos por sua vez são aqueles que podem ser totalmente excluídos da sucessão por simples desejo do autor da herança expresso em testamento São herdeiros necessários os descendentes ascendentes e cônjuge CC art 1845 Quem falece com qualquer um desses familiares só pode dispor em testamento sobre metade dos bens de seu patrimônio A outra metade denominada legítima deve ser transmitida obrigatoriamente aos herdeiros necessários Por sua vez os herdeiros facultativos são os familiares sucessíveis não classificados como necessários ou seja os colaterais Quem falece sem filhos ou outros descendentes sem pais ou outros ascendentes e sem vínculo de conjugalidade com qualquer outra pessoa pode testar sobre a totalidade de seus bens destinandoos a quem considerar merecedor da deixa patrimonial Ainda que essa pessoa tenha irmãos sobrinhos tios primos sobrinhosnetos ou tiosavós poderá livremente dispor sobre o destino de seu patrimônio após a morte Os sucessores se classificam em legítimos indicados pela lei ou testamentários indicados pelo autor da sucessão em herdeiros no caso de sucessão universal e legatários no de sucessão singular em herdeirosnecessários não podem ser excluídos da herança por mera vontade do falecido e facultativos o autor da herança pode excluílos totalmente da sucessão Em relação ao companheiro a lei não o classifica entre os sucessores necessários Mas em vista da proteção constitucional liberada a essa entidade familiar considero que deve ser feita a interpretação extensiva e conforme a Constituição do dispositivo do Código Civil que enumera os herdeiros necessários Em outros termos o companheiro também deve ser considerado herdeiro dessa categoria de modo a garantirlhe também a legítima Esse é porém um tema bastante controverso na tecnologia civilista Autores como Giselda Hironaka 2004107 Eduardo de Oliveira Leite 20034864 e Sílvio de Salvo Venosa 2001 7152 consideram que a Constituição protegeu a união estável mas não a equiparou ao casamento de modo que a lei pode omitir o convivente da lista dos herdeiros necessários sem incorrer em inconstitucionalidade Pelo entendimento desses civilistas o companheiro classificase como herdeiro facultativo e não é amparado pela legítima Cap 46 subitem 11 22 Capacidade Na maioria das vezes o sucessor é uma pessoa física o familiar do morto indicado na lei ou nomeado em testamento Mas embora rara há também a hipótese de sucessão causa mortis por pessoa jurídica No caso da herança vacante como já mencionado de passagem subitem 21 o patrimônio transmitese a uma pessoa jurídica de direito público Município Distrito Federal ou União A deixa testamentária pode ademais beneficiar como herdeira ou legatária uma sociedade associação ou fundação de acordo com a última vontade do autor da sucessão A capacidade para ser sucessor segue regras que variam segundo seja física ou jurídica a pessoa a quem os bens do falecido se transmitem 221 Pessoa física A primeira condição para capacitação de uma pessoa física à sucessão é ela estar viva ao tempo de sua abertura isto é do falecimento do antigo titular do patrimônio transmitido Quem faleceu antes do autor da sucessão não pode ser sucessor Imagine que Antonio deixou por testamento um apartamento para Benedito sem nada dispor sobre o caso de este último vir a morrer antes dele Falecendo Benedito primeiro o imóvel que a ele tinha sido destinado pela disposição testamentária será transmitido aos sucessores legítimos de Antonio Os descendentes e demais familiares de Benedito nada podem reclamar porque ele não tinha capacidade para suceder Antonio desatendia à primeira condição para ser sucessor a de estar vivo ao tempo do falecimento do autor da sucessão Veja que há meios válidos de contornar essa consequência Se Antonio ao testar tivesse disposto sobre a situação da prémorte do testamentário mencionando que nesse caso o apartamento caberia aos sucessores de Benedito sua vontade seria obedecida não se transmitindo o bem aos legítimos É o instituto da substituição Cap 64 subitem 51 Mas tendo o testador se omitido quanto à destinação do imóvel no caso de prémorte do testamentário o bem será dos sucessores legítimos A comoriência é outra situação em que se percebem as consequências dessa regra de capacidade da pessoa física para ser sucessor Quando duas pessoas falecem ao mesmo tempo se uma delas era familiar sucessível da outra perde a capacidade para suceder Considere que Carlos e Darcy eram casados mas não tinham descendentes nem ascendentes vivos Carlos tinha apenas um sobrinho Evaristo Pois bem na ordem de vocação hereditária Cap 63 item 1 o cônjuge tem preferência sobre os colaterais Acontece que o carro em que viajavam Carlos e Darcy envolveuse num seriíssimo acidente em razão do qual os dois faleceram Pois bem se Carlos morreu antes de Darcy o sucessor será o Estado porque Darcy estava viva ao tempo da abertura da sucessão de Carlos ainda que tenha sobrevivido por poucos minutos somente Se Darcy porém morreu antes de Carlos ou no mesmo instante comoriência ela não tinha capacidade para suceder o marido e nesse caso Evaristo é o herdeiro da totalidade dos bens Para ser sucessora assim a pessoa física deve estar viva Em outros termos ela já deve ter nascido ou pelo menos ter sido concebida no momento em que ocorreu a morte do autor da sucessão CC art 1798 O nascituro portanto tem capacidade para suceder Se falece o pai durante a gestação do filho este embora ainda não nascido participará da sucessão Para tanto exigese porém que nasça com vida art 2º Se o rebento é sadio e vinga sucede como se já tivesse nascido ao tempo da morte do pai Se só conseguiu viver fora do útero materno por alguns instantes será mesmo assim sucessor do pai recebendo a herança e a transmitindo para sua mãe Se não conseguiu viver fora do útero materno por fim não adquiriu capacidade para suceder e a transmissão dos bens do pai ocorrerá como se nunca tivesse sido concebido Note que a lei fala em capacidade sucessória da pessoa concebida no momento da abertura da sucessão Se abstrairmos os processos de fertilização assistida a interpretação do dispositivo não traria qualquer dificuldade Tratarseia de mera referência ao nascituro que como visto tem capacidade para suceder quando nasce com vida Mas e os embriões crioconservados Eles podem ser considerados uma pessoa concebida para fins de se lhe atribuir capacidade sucessória Esse tema malgrado sua enorme importância não foi disciplinado de modo claro pelo Código Civil A lei admite a fecundação artificial post mortem quando homóloga vale dizer feita com aproveitamento do microgameta do marido ou convivente CC art 1597 III e IV e do macrogameta da esposa ou companheira Assim sendo para que não ocorra discriminação da filiação devese considerar que os em briões crioconservados produzidos com o material genético fornecido por pessoas casadas ou em união estável têm capacidade para suceder se vierem um dia a ser inseminados num útero e nascerem com vida Haverá dificuldades consideráveis se a fecundação assistida ocorrer muito tempo depois da morte dos genitores na medida em que a partilha será ineficaz cabendo o afastamento parcial ou total dos sucessores anteriormente aquinhoados Volto a esse tema à frente Cap 63 subitem 32 A primeira condição portanto para a pessoa física titular capacidade sucessória é estar viva no momento da morte do autor da sucessão Quer dizer ter sido concebida numa relação sexual ou por fecundação assistida e após a gestação nascer com vida Existe porém na lei uma hipótese de capacidade sucessória de pessoa ainda não concebida quando da morte do autor da sucessão Tratase de sucessão testamentária em que o testador beneficia o filho que alguém pode vir a ter É assim juridicamente admissível que Germano deixe por testamento uma fazenda ao filho ainda não concebido de Hebe Em vista do princípio constitucional que veda a discriminação entre os filhos CF art 227 6º se não existirem instruções diversas do testador terá capacidade o havido dentro ou fora do casamento ou de união estável assim como o adotivo Os requisitos para a capacitação sucessória do testamentário ainda não concebido são vários De início deve estar viva ao tempo da abertura da sucessão a pessoa cujo eventual filho será beneficiado pelo testamento CC art 1799 I Se estiver morta nessa ocasião não será sucessor o gerado a partir de material genético fornecido pelo nomeado no testamento Desse modo no exemplo Hebe deve estar viva no momento da morte de Germano para que o filho que ela pode vir a ter seja sucessor Se morreu antes do testador o embrião crioconservado obtido do macrogameta dela pode ser implantado no útero de uma doadora temporária O novo ser assim gerado contudo não terá capacidade para suceder Germano porque sua genitora Hebe não estava viva na abertura da sucessão Outro requisito para a capacitação sucessória do filho que alguém pode vir a ter é a concepção no prazo de dois anos contados da abertura da sucessão CC art 1800 4º Ultrapassado o prazo e não concebido o rebento que o testador queria beneficiar perde eficácia a cláusula testamentária correspondente A previsão legal destinase a conferir segurança às relações jurídicas Depois de transcorridos dois anos da morte do testador se a pessoa que ele gostaria de beneficiar ainda não tiver sido concebida não convém aguardar mais porque pode até mesmo ocorrer de ela nunca vir a nascer Em princípio será irrelevante se a concepção do sucessor foi natural ou artificial homóloga ou heteróloga com ou sem doação de útero A regra é a da não discriminação da filiação Será relevante a forma como o sucessor foi concebido e gerado apenas se o testador tiver deixado instruções a respeito Sendo esse o caso claro que só o filho concebido e gerado conforme as condições do testamento terá capacidade para suceder Se Germano ao testar consignou que a fazenda deveria ser transmitida ao filho biológico de Hebe não terá capacidade sucessória o ser gerado em seu útero a partir de embrião fecundado com óvulo de outrem Se no momento da partilha o testamentário não tiver ainda nascido os bens a ele cabíveis serão confiados a um curador nomeado pelo juiz CC art 1800 A nomeação deverá recair em primeiro lugar sobre o designado pelo próprio testador para a tarefa sendo omisso o testamento o juiz nomeará como curador aquele cujo filho o testador esperava ter por sucessor art 1800 1º No meu exemplo Hebe será a curadora dos bens testados ao seu eventual filho se Germano não tiver indicado outra pessoa para o encargo Não sendo idônea a pessoa cujo eventual filho foi lembrado pelo testamento o juiz nomeará outra como curadora devendo observar a mesma ordem legal estabelecida para a nomeação de curadores de interditos art 1775 Nascendo com vida o testamentário defereselhe a sucessão com todos os frutos e rendimentos correspondentes aos bens testados art 1800 3º A primeira condição para alguém titular a capacidade sucessória isto é para ser sucessor é estar vivo quando da abertura da sucessão Só é sucessora assim a pessoa física concebida antes da morte do autor da herança ou legado Em decorrência o nascituro nascendo com vida participa da sucessão A lei admite que pessoa não concebida ao tempo da abertura da sucessão tenha capacidade sucessória se o testador beneficia o filho que alguém pode vir a ter nos dois anos seguintes à sua morte A condição para ser sucessor de estar vivo na hora da morte do autor da herança ou legado diz respeito tanto à sucessão legítima como à testamentária Em relação a esta última porém a lei prevê hipóteses de perda da capacidade sucessória que serão examinadas mais à frente Cap 64 subitem 12 222 Pessoa jurídica A pessoa jurídica só pode suceder em duas hipóteses na herança vacante e na sucessão testamentária A herança é vacante quando se constata não existirem sucessores legítimos ou testamentários Neste caso os bens são destinados ao Estado aqui entendido em seu sentido lato os Estados membros da federação brasileira não são destinatários da herança vacante em nenhuma hipótese Em regra os bens passam à titularidade do Município em que se encontram Se o falecido tinha bens em Municípios diversos cada um recebe os que forem situados imóveis e encontrados móveis no seu território Situandose ou encontrandose bens no Distrito Federal é essa a pessoa jurídica de direito público sucessora Serão por fim destinados à União os bens situados e encontrados nos limites de Território Federal A outra única hipótese de sucessão por pessoa jurídica é a testamentária CC art 1799 II O testador pode deixar bens para pessoas jurídicas de direito público ou privado Se legar em favor da Igreja Católica por exemplo estará beneficiando pessoa jurídica de direito público tendo em vista o estatuto internacional reconhecido ao Vaticano Se testar para pessoa jurídica de direito privado terão capacidade sucessória as sociedades simples ou empresária associações ou fundações Em geral a deixa beneficia associação ou fundação em razão de sua finalidade não econômica mas nada impede que o morto destine seu patrimônio ou bens para uma sociedade anônima por exemplo Para suceder a pessoa jurídica deve ser regularmente constituída Em princípio não pode ser nomeada testamentária uma associação de fato isto é sem os estatutos registrados no Registro Civil de Pessoas Jurídicas Com o objetivo de prestigiar a vontade do testador o juiz excepcionalmente poderá conferir eficácia ao testamento feito em benefício de ações sociais despersonalizadas obras de caridade fundos assistenciais etc desde que a deixa seja modesta e reconheça idoneidade em quem as administra Apenas no caso da fundação atribui a lei capacidade sucessória à pessoa jurídica ainda não regularizada A fundação recordese nasce da afetação de um patrimônio a determinadas finalidades Cap 8 item 73 O instituidor pode separar do seu patrimônio os bens a serem afetados ainda em vida ou estabelecer em testamento a vontade de que isso venha a ocorrer após seu falecimento No primeiro caso ele próprio deve adotar as providências para a regularização da fundação podendo testarlhe outros bens No caso de instituição por testamento porém a regularização da pessoa jurídica testamentária só poderá ser feita evidentemente após a morte do instituidor A fundação instituída em disposição de última vontade é a única hipótese de pessoa jurídica com capacidade sucessória não dependente de prévia regularidade CC art 1799 III A pessoa jurídica é sucessora apenas em duas hipóteses na herança vacante quando os bens do falecido transmitemse ao Município Distrito Federal ou União e na sucessão testamentária quando a pessoa jurídica regular é beneficiada em testamento ou sendo fundação nele instituída 23 Indignidade e deserdação Em duas hipóteses somente a pessoa capaz para suceder não participa da sucessão São as de indignidade e deserdação Não se verificando uma ou outra o titular da capacidade sucessória tem direito à sua parte na herança ou ao legado Será sucessor a menos que renuncie expressamente A indignidade diz respeito a qualquer tipo de sucessão enquanto a deserdação se refere especificamente à dos herdeiros necessários Na primeira a lei estabelece as hipóteses em que a pessoa é excluída da sucessão e a vontade do falecido expressa em testamento ou outro ato autêntico só tem eficácia para reinclusão do indigno Na última é a vontade do morto expressa necessariamente em testamento que importa a exclusão do herdeiro necessário da sucessão Em outros termos a indignidade alcança qualquer tipo de sucessor inclusive os facultativos ao passo que a deserdação exclui da sucessão apenas os herdeiros necessários CC art 1961 Isso é assim porque os herdeiros necessários não podem ser excluídos da sucessão por simples vontade do falecido Se praticaram algum ato que autoriza a deserdação a exclusão poderá ocorrer mas não basta a vontade do autor da sucessão Em relação aos herdeiros facultativos não se há de falar em deserdação porque eles podem ser excluídos da sucessão por simples vontade do falecido expressa em testamento Aliás basta o testador sem herdeiros necessários testar sobre todo o patrimônio beneficiando não parentes para que os colaterais não participem da sucessão As causas que configuram a indignidade são três a autoria coautoria ou participação em homicídio doloso ou tentativa praticado contra o autor da sucessão seu cônjuge companheiro ascendente ou descendente b acusação caluniosa em juízo sacada contra o autor da sucessão seu cônjuge ou companheiro bem como crime contra a honra deles c prática de atos violentos ou fraudulentos com o objetivo de obstar ou inibir o autor da herança de dispor livremente de seus bens por testamento ou outro ato de última vontade CC art 1814 Desse modo o sobrinho que atenta dolosamente contra a vida da companheira do tio difamao ou rasga o testamento particular por ele feito é indigno de sucedêlo As causas da deserdação por sua vez são mais extensas Ela cabe em primeiro lugar em qualquer das hipóteses de conduta indigna acima indicadas Sempre que um herdeiro necessário incorrer em ato indigno ele poderá ser deserdado Aliás por não existirem previsões específicas de causas para deserdação do cônjuge ou companheiro esses só podem ser deserdados nas mesmas hipóteses em que seriam reputados indignos Oliveira 200564 Assim sendo além da deserdação por motivo que autoriza a indignidade o descendente poderá ser deserdado pelo ascendente e este por aquele nos casos de ofensa física injúria grave e desamparo nas graves enfermidades ou alienação mental Assim se a mãe sofre derrame cerebral e passa a precisar do auxílio dos filhos para os mais simples atos do cotidiano e um deles falta ao dever de amparo ele poderá ser deserdado Do mesmo modo se o filho ao sofrer doença mental não for ajudado pelo pai haverá fundamento para a deserdação deste na sucessão daquele Também são causas para a deserdação as relações sexuais entre o descendente e o cônjuge do ascendente madrasta ou padrasto do primeiro assim como as do ascendente e o cônjuge do descendente quando revestidas de ilicitude isto é caracterizarem adultério CC arts 1962 e 1963 A lei cogita também de relações sexuais ilícitas com o companheiro do descendente mas essa figura não existe porque o tipo penal do adultério pressupõe o estado de casado e a fidelidade não está listada entre os deveres da união estável A deserdação como se disse fazse por testamento Mas como o deserdado é sempre um herdeiro necessário não basta a vontade do testador A exclusão por deserdação só pode ser feita se realmente tiver ocorrido uma das causas que a autorizam Por isso para ter validade a deserdação o testador deve declarar no testamento expressamente o fato que a motivou CC art 1964 Além disso deve municiar seus herdeiros dos elementos probatórios que tiver às mãos para que possam ter sucesso na ação judicial visando à declaração da exclusão Também por testamento pode o ofendido perdoar o indigno reincluindoo na sucessão Exige se em princípio cláusula expressa de reabilitação para que o indigno ou deserdado volte a participar da sucessão Mas se ao testar em favor do excluído o testador já conhecia a causa da indignidade ou deserdação e mesmo assim tomouo por merecedor do direito sucessório considerase em prestígio à vontade do testador que o reabilitou de forma implícita CC art 1818 parágrafo único O perdão pode igualmente ser dado em outro ato autêntico como um instrumento particular assinado pelo autor da sucessão ou quando for o caso pelo cônjuge ou parente vitimado pela ofensa desde que seja assinado e tenha a firma reconhecida art 1818 São três as hipóteses de exclusão da sucessão renúncia indignidade e deserdação No primeiro caso o herdeiro ou legatário por ato unilateral de vontade abre mão dos direitos sucessórios que titulariza Nos dois outros o excluído sofre uma punição pelos atos que praticou contra a pessoa do autor da sucessão ou os familiares desta Enquanto a indignidade diz respeito a qualquer tipo de sucessão a deserdação limitase à dos herdeiros necessários Tanto a indignidade como a deserdação devem ser objeto de declaração judicial Em geral a declaração provém de demanda movida por quem dela aproveita CC arts 1815 e 1965 O herdeiro deve movêla contra o indigno ou deserdado sendo do autor o ônus de provar o fato que deu ensejo à exclusão Caso não consiga fazer essa prova não se caracteriza a indignidade ou deserdação e o demandado participa da sucessão normalmente Como essas exclusões têm natureza de pena não podem ser impostas senão após o devido processo legal no qual se presume a inocência do réu O prazo decadencial para a propositura dessa ação é de quatro anos contados da abertura da sucessão no caso de indignidade art 1815 parágrafo único ou da abertura do testamento no caso de deserdação art 1965 parágrafo único Numa hipótese contudo também o Ministério Público está legitimado para promover a ação visando a exclusão do herdeiro ou legatário é a de a indignidade ou deserdação em razão da autoria coautoria ou participação em homicídio doloso ou tentativa praticado contra o autor da sucessão seu cônjuge companheiro ascendente ou descendente art 1815 2º A indignidade e a deserdação são hipóteses de exclusão da sucessão com caráter punitivo Reputase que o excluído em razão dos atos que praticou em prejuízo do falecido não merece participar da destinação dos bens deste Ao contrário da renúncia à herança ou legado que também implica exclusão da sucessão a indignidade e a deserdação são penas impostas ao indigno ou deserdado Disso decorre uma importantíssima consequência como a pena não pode ultrapassar a pessoa do agente culpado os descendentes do excluído por indignidade ou deserdação não são prejudicados com a exclusão Ao contrário participam da sucessão como se o indigno ou o deserdado estivesse morto o art 1816 do CC menciona apenas a figura da deserdação mas é aplicável por analogia à exclusão por indignidade Oliveira 200576 Imagine então que Irene tinha duas filhas Juliana e Lúcia e duas netas Maria e Natália Maria era filha de Juliana Natália de Lúcia Para simplificar são elas as únicas familiares vivas de Irene Pois bem conforme se examinará melhor à frente os descendentes de menor grau têm preferência sobre os de maior grau Quer dizer morrendo Irene seu patrimônio será destinado metade à Juliana e metade à Lúcia Maria e Natália não são sucessoras de Irene porque suas mães estavam vivas na abertura da sucessão Pois bem se Lúcia renunciar à sua parte na herança todo o patrimônio será destinado a Juliana e na morte desta a Maria Natália por assim dizer será prejudicada pela renúncia de Lúcia porque a exclusão da sucessão decorreu aqui de ato de vontade da excluída Mas se Lúcia não renunciou mas foi excluída por indignidade ou deserdada a sucessão de Irene será diferente Nesse caso metade do patrimônio será destinado a Juliana filha e a outra metade a Natália neta Como a indignidade e deserdação são penas impostas a Lúcia não podem seus efeitos ultrapassar a pessoa dela Natália sucede Irene como se Lúcia estivesse morta O excluído da sucessão por indignidade ou deserdação não pode se beneficiar de nenhuma maneira dos bens que herdaria se não tivesse incorrido em conduta condenável Desse modo não tem direito ao usufruto ou administração dos bens herdados por seus descendentes nem pode sucedêlos em tais bens CC art 1816 parágrafo único No exemplo acima se Natália vier a falecer sem outros familiares sucessíveis os bens herdados de Irene serão transmitidos a Juliana colateral e somente os seus demais bens caberão a Lúcia ascendente 24 Sucessor aparente Enquanto não é declarada por sentença a indignidade o demandado é sucessor Se não tiver sido expedida pelo juiz nenhuma ordem cautelar para sustar a partilha bens do falecido podem ser destinados ao indigno Se posteriormente a ação judicial de declaração de indignidade é julgada procedente o excluído da sucessão deve restituir os bens recebidos para que sejam objeto de nova partilha entre os sucessores legitimados Junto com os bens deve restituir também os frutos e rendimentos que houver percebido O excluído terá contudo direito à indenização pelas despesas com a conservação dos bens restituídos CC art 1817 parágrafo único Pode ocorrer no entanto de o indigno alienar alguns ou mesmo todos os bens recebidos na sucessão Esses atos de alienação serão válidos quando tiverem sido onerosos se o adquirente estava de boafé A aparência da licitude e regularidade do negócio de alienação preserva sua validade e eficácia O alienante é um sucessor aparente e quem de boafé entabula negociações com ele não pode ser prejudicado Os herdeiros legitimados não poderão reclamar do adquirente de boafé a restituição dos bens alienados pelo sucessor aparente Para eles restará apenas a alternativa de buscar do indigno as perdas e danos CC art 1817 Regras iguais às estabelecidas pela lei para o excluído por indignidade aplicamse aos demais casos de sucessor aparente Sempre que terceiro de boafé firmar negócio jurídico oneroso com quem se encontrava na condição de sucessor será válida e eficaz a alienação CC art 1827 parágrafo único Desse modo também os atos de alienação onerosa do deserdado enquanto não julgada procedente a ação de deserdação são válidos Outro exemplo se posteriormente à partilha descobrese um testamento até então ignorado devese rever a partilha para aquinhoar o novo testamentário com a parte que lhe foi destinada pelo testador São sucessores aparentes os herdeiros que até a revisão da partilha dispuseram dos bens recebidos Mais um exemplo o falecido nomeou por testamento um amigo como seu herdeiro universal por acreditar que não tinha sucessores necessários mas em seguida ao encerramento do inventário foi proposta ação de reconhecimento de paternidade contra o sucessor em razão da qual se rompeu a deixa testamentária Cap 64 subitem 24 Se antes do julgamento dessa ação o testamentário havia alienado onerosamente alguns ou todos os bens recebidos por herança ele será considerado sucessor aparente Quer dizer nesses três casos aventados assim como em qualquer outro de aparência de sucessão a alienação em favor do terceiro de boafé vale mas o sucessor aparente deve indenizar o verdadeiro titular do direito sucessório pelas perdas e danos correspondentes Sucessor aparente é aquele que durante algum tempo parecia ser o legítimo titular de direito sucessório em razão do que praticou atos de alienação onerosa de um ou mais bens recebidos na sucessão Esse ato de disposição é válido quando o adquirente era terceiro de boa fé mas o sucessor aparente deve indenizar os verdadeiros titulares do direito sucessório pelos danos decorrentes Claro está que a boafé do adquirente é condição indispensável para a validade do negócio de alienação praticado pelo sucessor aparente Se aquele tinha conhecimento da preterição na partilha de outros titulares do direito sucessórios ficará obrigado a restituir a estes o bem adquirido 3 Herança Os bens do patrimônio de pessoa falecida compõem a herança Ela é titulada pelos herdeiros legítimos e testamentários tão logo aberta a sucessão CC art 1784 Isto é no instante imediato ao da morte a herança passa a pertencer aos herdeiros Estabelecese entre eles um condomínio regido em parte por normas próprias do direito das sucessões Note que os legatários não participam desse condomínio mas apenas os herdeiros note ademais que tanto os herdeiros legítimos como os testamentários são condôminos da herança tão logo se abra a sucessão Os herdeiros devem providenciar o inventário que em regra será um processo judicial Apenas quando o falecido não deixou testamento e não há interessado incapaz CPC art 610 ele poderá ser extrajudicial celebrado mediante escritura pública Judicial ou extrajudicial o inventário é indispensável ao desfazimento do condomínio instituído entre os herdeiros pela morte do autor da herança Por vezes em função da lei processual o processo de inventário em juízo tem denominação diversa arrolamento mas aqui para simplificar farei menção à medida judicial de dissolução do condomínio sobre a herança sempre pela expressão inventário Pois bem não se confunde a abertura da sucessão com a do inventário enquanto a primeira se verifica no instante da morte do autor da herança a deste último depende do ajuizamento do processo pelos herdeiros ou quando possível da lavratura da escritura pública Enquanto a abertura da sucessão institui um condomínio entre os herdeiros sobre a herança a do inventário objetiva desconstituílo O prazo para a abertura do inventário ou celebração da escritura pública é de 2 meses seguintes ao do falecimento CPC art 611 mas a sua inobservância acarreta apenas eventuais efeitos de ordem tributária como multa sobre o valor do imposto de transmissão Ninguém deixa de ser herdeiro ou herda menos porque atrasou no ajuizamento desse processo judicial ou não providenciou podendo a escritura de inventário No transcorrer do inventário serão apuradas e pagas as dívidas deixadas pelo de cujus com recursos da herança Além disso havendo sucessor legatário os herdeiros têm a obrigação de destacar o legado da herança para lhe entregar Por fim comprovado o pagamento do imposto de transmissão igualmente com recursos da herança procedese à partilha do acervo remanescente entre os herdeiros legítimos ou testamentários desfazendose assim o condomínio Com a partilha cada herdeiro passa a titular o bem que lhe foi destinado Aberta a sucessão o patrimônio do falecido que compõe a herança transmitese de imediato à titularidade dos seus herdeiros legítimos ou testamentários Instituise entre eles um condomínio regido em parte pelas normas do direito das sucessões Nos trinta dias seguintes ao falecimento os herdeiros devem providenciar o ajuizamento da ação destinada a dissolver o condomínio entre eles que se chama inventário por vezes arrolamento a menos que prefiram proceder à sua dissolução por escritura pública quando permitida isto é se inexistir testamento ou interessado incapaz A regra adotada pelo direito brasileiro relativamente à regência da sucessão causa mortis é a do domicílio do defunto LINDB art 10 Assim morrendo brasileiro domiciliado no exterior será a lei do país em que domiciliava que definirá a quem deve ser atribuída a herança os requisitos de validade do testamento impostos incidentes etc Duas exceções a essa regra são porém estabelecidas Primeira aplicase a lei brasileira no tocante à sucessão dos bens situados no Brasil sempre que ela for mais favorável ao cônjuge ou filho brasileiro do que a lei pessoal do falecido LINDB art 10 1º CF art 5º XXXI Se por exemplo morre um cidadão espanhol com filhos espanhóis casado em segundas núpcias com uma brasileira e que tinha em seu patrimônio imóvel situado no Rio de Janeiro a transmissão desse bem seguirá a lei brasileira Isto porque ela é mais favorável à viúva do que a espanhola Enquanto entre nós o cônjuge concorre com os filhos do falecido na Espanha ele nada herda se há descendentes vivos cf Oliveira 20054243 Segunda a capacidade para suceder regese pela lei do domicílio do herdeiro ou legatário LINDB art 10 2º Desse modo qualquer que seja a localização do bem ou o domicílio do defunto o herdeiro ou legatário domiciliado no Brasil só sucede se estiverem preenchidas as condições de capacidade sucessória da nossa lei subitem 221 Aplicandose a lei brasileira considerase aberta a sucessão no lugar do último domicílio do falecido CC art 1785 O lugar da abertura da sucessão contudo tem implicações de ordem meramente processual na definição da competência jurisdicional para processamento do inventário em nada afetando os direitos sucessórios 31 Condomínio entre os herdeiros A herança transmitese como um todo unitário mesmo que haja mais de um herdeiro Enquanto não se concluir a partilha a propriedade e posse da herança serão exercidas pelos herdeiros na qualidade de cotitulares do patrimônio deixado pelo morto CC art 1791 e parágrafo único Aplicamse às relações entre os herdeiros e as destes com terceiros durante a tramitação do inventário as normas concernentes ao condomínio exceto quando há preceito próprio do direito das sucessões a tratar da matéria Desse modo por exemplo qualquer um dos herdeiros está legitimado para a ação possessória caso a posse de bem da herança seja ameaçada turbada ou esbulhada também está legitimado para reivindicar de terceiro o bem herdado pode finalmente exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão como usar os bens da herança desde que seu uso não exclua o dos demais herdeiros art 1314 Por outro lado nenhum deles pode alterar a destinação dos bens herdados sem consentimento dos demais nem ceder a posse uso ou gozo deles a terceiros estranhos à sucessão art 1314 parágrafo único O condomínio instituído entre os herdeiros sobre a herança deve ser administrado como qualquer outro conjunto de bens sujeito à copropriedade A administração segue regras específicas do direito das sucessões Ela cabe ao inventariante nomeado pelo juiz Até a assinatura do compromisso de inventariante a administração da herança é de responsabilidade do cônjuge ou companheiro Se estivessem separados de fato do falecido ou não tendo este qualquer vínculo de conjugalidade administrará a herança até a investidura do inventariante o herdeiro que se encontrar na posse e administração dos bens havendo mais de um herdeiro nessa condição o mais velho deles será o administrador provisório Não havendo herdeiros a administração caberá ao testamenteiro ou a pessoa de confiança do juiz CC art 1797 Os herdeiros não são obrigados a concorrer com as despesas de administração da herança ao contrário dos condôminos em geral relativamente à manutenção do bem condominial Como os herdeiros não têm nenhuma responsabilidade por encargos superiores às forças da herança CC art 1792 concluise que as despesas com a administração desta correm exclusivamente por conta dos seus próprios recursos Se necessário assim o juiz deve autorizar o inventariante a vender um ou mais bens do espólio para atender às despesas de administração da herança Entre a abertura da sucessão e a partilha os bens do patrimônio do falido compõem um condomínio indiviso denominado herança Os herdeiros são condôminos e as relações entre eles regemse pelos preceitos da propriedade condominial exceto quando norma do direito das sucessões dispuser sobre o assunto 32 Cessão de herança ou de quota hereditária A herança de pessoa viva não pode ser objeto de contrato CC art 426 A proibição cujas origens se enraízam no direito romano justificase por uma questão moral Em qualquer negócio quem contrata só obtém a vantagem pretendida com a execução do contrato Se a herança de pessoa viva pudesse ser objeto de negócio contratual aos contratantes passaria a interessar a morte de alguém Como uma das partes forçosamente deve ser um herdeiro potencial o contrato dessa natureza o levaria a torcer pelo falecimento do familiar cuja herança negociou Para evitar essa tentação imoral a lei fulmina com a nulidade qualquer pacto sucessório ou seja qualquer ajuste sobre herança de pessoa viva Monteiro 200313 Em alguns direitos admitese restritivamente o contrato referente a herança de quem ainda vive Em Portugal ele é válido quando feito pelos cônjuges ou por terceiros em favor deles no pacto antenupcial Fernandes 2001523533 Mas nada obsta o contrato cujo objeto seja a herança de pessoa já morta Com a abertura da sucessão o herdeiro tornase condômino do patrimônio do falecido e portanto passa a titular uma parte ideal da propriedade dos bens correspondentes Como qualquer outro proprietário pode usar fruir e dispor de sua propriedade Note porém que o coerdeiro não tem como transferir direitos sobre nenhum bem específico do patrimônio objeto de inventário Não se sabe antes da partilha a quem caberá cada bem inventariado Após a partilha já não há mais condomínio entre os herdeiros A rigor não há mais herança Cada um recebe os bens com que foi aquinhoado e pode vendêlos como a generalidade dos proprietários Mas enquanto existir o condomínio hereditário a indivisibilidade é da essência do instituto O que cada herdeiro pode ceder assim são direitos sucessórios e não bens singulares ou parte deles Por tais motivos é ineficaz a cessão feita pelo coerdeiro de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente CC art 1793 2º Apenas na hipótese de existir um único herdeiro universal caberá a cessão singular de direitos hereditários referentes a bens determinados Mas como antes da adjudicação dos bens em favor do único herdeiro devese proceder à liquidação com o pagamento de credores do falecido das despesas do processo e impostos sobre a transmissão esse negócio jurídico depende da prévia autorização do juiz da sucessão sob pena de ineficácia 3º A cessão de herança ou parte dela fazse necessariamente por escritura pública CC art 1793 porque o direito à sucessão aberta classificase como bem imóvel art 80 II Interpretamse restritivamente as cláusulas desse negócio jurídico Se alguém ceder todos os seus direitos numa determinada sucessão e posteriormente tiver sua quota hereditária aumentada em razão de substituição ou direito de acrescer Cap 64 item 5 reputase não cedida a parcela acrescida art 1793 1º Outra particularidade da cessão de quotas hereditárias diz respeito ao direito de preferência titulado pelos coerdeiros Exatamente porque entre a abertura da sucessão e a partilha existe um condomínio indiviso entre os herdeiros nenhum deles pode ceder sua quota hereditária a pessoa estranha à sucessão sem antes oferecêla aos demais em igualdade de preços e condições CC arts 504 e 1794 Se numa sucessão são herdeiros os três filhos do morto e um deles quer ceder sua quota poderá fazêlo livremente se o cessionário for um dos outros irmãos Mas se pretender cedêla a quem não participa do condomínio hereditário está obrigado antes a consultar seus irmãos informando o preço e condições oferecidas pela quota Se pelo menos um deles manifestar interesse terá o direito de adquirila pagando igual preço e nas mesmas condições O coerdeiro que não tiver o direito de preferência respeitado pode nos cento e oitenta dias após a transmissão depositar o preço em juízo e obter para si a quota cedida Rateiase proporcionalmente essa quota entre os depositantes na hipótese de mais de um coerdeiro exercer o direito de preferência CC art 1795 parágrafo único A cessão de herança ou quota hereditária é lícita após a abertura da sucessão Depende de escritura pública em vista de sua natureza de bem imóvel e havendo coerdeiros deve ser respeitado o direito de preferência quando o potencial cessionário for pessoa estranha à sucessão 33 Aceitação e renúncia da herança Em França surgiu a noção posteriormente espalhada por todos os países de tradição jurídica românica de que os herdeiros se investem na propriedade e posse dos bens da herança no momento seguinte ao do falecimento do seu autor independentemente de qualquer formalidade ou ordem judicial É o princípio da saisine plenamente incorporado ao direito brasileiro CC art 1784 Não é necessária assim nenhuma aceitação do herdeiro para que se opere sua imediata investidura na propriedade e posse da herança em condomínio com os demais sucessores hereditários Mas a lei prestigia o interesse que um ou outro herdeiro possa ter de não receber os bens deixados pelo falecimento de quem quer que seja Em outras palavras ninguém é obrigado a ser herdeiro portanto de algum modo a aceitação da herança ainda que tácita é condição para a transmissão dos bens causa mortis A saisine importa uma transmissão provisória que se convola em definitiva quando o herdeiro expressamente declara aceitar a herança ou simplesmente pratica atos que demonstram sua concordância em recebêla A aceitação expressa ou tácita do herdeiro faz definitiva a transmissão operada pela abertura da sucessão CC arts 1804 e 1805 O herdeiro é então livre para aceitar ou recusar a herança Mas enquanto a aceitação pode ser implícita a recusa só se admite expressa Para renunciar aos direitos hereditários o herdeiro deve fazer a declaração de vontade nesse sentido por meio de escritura pública ou termo nos autos do processo de inventário CC art 1806 Essa forma é da essência do ato que veiculado por outros meios não terá validade Mas o herdeiro não é livre para aceitar ou recusar a herança em parte Ou a aceita totalmente ou renuncia por completo Do mesmo modo não tem direito de sujeitar a aceitação ou recusa a condição ou termo CC art 1808 Não pode desse modo declarar que aceita desde que outro herdeiro renuncie ou que renuncia enquanto estiver casado Tratase do princípio da indivisibilidade da aceitação ou recusa No passado longínquo quando o herdeiro era responsável pelas dívidas do falecido ainda que superiores às forças da herança esse princípio tinha maior importância porque impedia a frustração dessa responsabilidade Hoje em dia serve apenas para conferir maior segurança às relações jurídicas Note contudo que a indivisibilidade da aceitação ou renúncia não impede que o herdeiro sendo também legatário ou testamentário aceite parte do que a lei e a vontade do morto lhe haviam predestinado O herdeiro que for também legatário tem a faculdade de aceitar sua quota na herança e renunciar ao legado ou o contrário renunciar à herança e aceitar o legado CC art 1808 1º E o herdeiro que o for a mais de um título legítimo e testamentário tem igualmente a faculdade de aceitar a herança por um deles e recusála pelo outro 2º Imagine que uma pessoa é numa sucessão herdeira de 14 da herança e legatária de um automóvel Não transgride o princípio da indivisibilidade da aceitação e renúncia se ela optar por receber apenas seu quarto na herança mas não o automóvel ou viceversa Imagine agora que essa pessoa seja herdeira legítima e testamentária numa mesma sucessão por ser familiar sucessível do defunto e ter sido aquinhoada por ele em testamento com uma quotaparte da herança Também aqui essa pessoa pode optar se aceita a herança pelos dois títulos se a recusa pelos dois ou se a aceita por um e recusa pelo outro A aceitação e a renúncia são irrevogáveis CC art 1812 Mesmo a aceitação tácita manifestada por conduta incompatível com a recusa não pode ser revogada pelo herdeiro Por isso a lei se preocupa em aclarar que determinados atos não exprimem a aceitação tais como o de providenciar o funeral do finado adotar providências para a conservação dos bens proverlhes a guarda provisória Também não configura aceitação a cessão gratuita e incondicional da herança a outros coerdeiros declaração que a rigor tem efeitos idênticos aos da renúncia art 1805 1º e 2º A renúncia implica exclusão do herdeiro mas ao contrário do que se verifica em relação à indignidade e deserdação os sucessores do renunciante não têm o direito de representálo na sucessão Na exclusão do indigno e do deserdado como se viu aplicase uma sanção ao excluído que tem caráter personalíssimo e não pode afetar os interesses de outras pessoas inclusive os seus sucessores Por isso eles são chamados a exercer o direito de representação sucedendo como se o excluído estivesse morto No caso da renúncia não há punição Ao contrário é o próprio excluído que por sua vontade vê interesse em se alhear da sucessão Aqui os seus sucessores são afetados pelo ato de exclusão e não terão o direito de representação Como esclarece a lei serão sucessores apenas se o renunciante era o único herdeiro ou se todos os outros também renunciaram à herança Nesse caso entretanto os sucessores herdam por direito próprio e por cabeça e não por representação CC art 1811 Confira Imagine que Nair deixou ao falecer dois filhos Orlando e Pedro o primeiro com um filho Quirino e o último com dois Rubens e Saulo Mais uma vez para simplificar não há outros familiares sucessíveis nem Nair deixou testamento Orlando e Pedro são descendentes de primeiro grau enquanto Quirino Rubens e Saulo de segundo grau Pois bem se Pedro for excluído por indignidade ou deserdado os filhos dele o representam na sucessão Nesse caso metade da herança vai para Orlando e a outra metade é dividida entre Rubens e Saulo ficando cada um deles com um quarto Mas se Pedro renuncia a totalidade da herança é de Orlando o descendente do mesmo grau CC art 1810 Em caso de exclusão por renúncia os netos de Nair só serão sucessores se os dois filhos renunciarem Nesse caso contudo Quirino Rubens e Saulo herdarão um terço da herança cada já que exercem direito sucessório próprio e não por representação quer dizer sucedem por cabeça e não por estirpe Se o herdeiro não quer a herança mas também deseja preservar os interesses de seus sucessores ele deve aceitála e após a partilha transmitirlhe os bens recebidos por meio de negócio inter vivos doação Ninguém é obrigado a ser herdeiro contra a sua vontade Por isso a aceitação é pressuposto da transmissão definitiva da herança Ela pode ser expressa ou tácita decorrendo nesse último caso de conduta incompatível com a recusa da herança A renúncia por sua vez só pode ser expressa e depende para valer de escritura pública ou termo judicial Por fim a renúncia não pode prejudicar os credores do renunciante Se o herdeiro está insolvente a herança que vier a receber propiciará o pagamento de suas dívidas Têm assim os credores todo o interesse em que o devedor aceite sua parte na sucessão Aliás eles podem requerer ao juiz do inventário que assinale prazo para o herdeiro devedor declarar se aceita ou não a herança presumindose a aceitação no caso de silêncio CC art 1807 De qualquer modo perante o credor do renunciante a renúncia não produz nenhum efeito Ele titula em decorrência o direito de aceitar a herança em nome do herdeiro que renunciou art 1813 habilitandose no inventário nos trinta dias seguintes ao conhecimento da renúncia 1º Note contudo que perante os demais coerdeiros a renúncia continua válida e plenamente eficaz Quer dizer uma vez pagos os credores do renunciante o que sobrar de sua quota hereditária não lhe será destinado mas sim aos coerdeiros 2º 34 Petição de herança A petição de herança é a ação judicial que o verdadeiro herdeiro pode mover contra o aparente ou o possuidor para ver respeitados seus direitos sucessórios A petição de herança é cabível sempre que o bem de pessoa falecida tiver sido transmitido ou estiver em vias de o ser para pessoa que não titularizava o direito de o receber ou estiver indevidamente na posse de quem não ostenta a condição de sucessor É o que prescreve o art 1824 do CC O herdeiro pode em ação de petição de herança demandar o reconhecimento de seu direito sucessório para obter a restituição da herança ou de parte dela contra quem na qualidade de herdeiro ou mesmo sem título a possua Cito três exemplos O filho havido fora do casamento que não foi reconhecido pelo genitor pode mover a ação de reconhecimento de paternidade enquanto viver CC art 1606 Se o fizer depois do falecimento do genitor de modo mais preciso depois da partilha demandará os sucessores aos quais tiver sido transmitida a herança Evidentemente esse filho não participou da sucessão porque ainda não tinha título de familiar sucessível a legitimar sua participação Vindo a ser julgada procedente a ação de reconhecimento de paternidade no entanto poderá reivindicar dos sucessores sua quota hereditária se os sucessores eram descendentes de primeiro grau ou seus representantes ou familiar concorrente ou mesmo toda a herança se os sucessores eram ascendentes ou colaterais do falecido Essa reivindicação fazse por petição de herança que pode ser cumulada com a ação de reconhecimento de paternidade ou sucedêla Notese contudo que é imprescritível a ação de reconhecimento mas não a petição de herança Súmula 149 do STF a pretensão relativamente a essa última prescreve em 10 anos contados da abertura da sucessão art 205 Também tem direito à petição de herança o herdeiro testamentário quando o testamento que o beneficia era desconhecido ao tempo da abertura da sucessão e foi descoberto após a conclusão da partilha Imaginavase que o autor da herança morrera ab intestato mas na verdade ele havia testado para uma certa pessoa quota de seu patrimônio ou quando admissível a totalidade deste Aqui o testamentário deve mover a petição de herança contra os herdeiros aparentes e deles haver a restituição do que lhe cabe por direito sucessório Evidentemente salvo no caso de o testamentário ter sido nomeado herdeiro universal será ineficaz a partilha que deve ser totalmente refeita para que não seja prejudicado apenas o herdeiro demandado Outra observação útil nesse passo é a de que o legatário não faz jus à petição de herança que sempre tem por objeto uma universalidade ainda que composta por quotaparte do patrimônio do morto Ele exerce seus direitos cobrando em juízo a entrega do legado contra o sucessor ou espólio obrigado a prestálo Por fim também cabe a petição de herança contra quem não ostentava o título de sucessor mas era mero possuidor do bem O herdeiro agindo individualmente não tem ação petitória ou possessória nesse caso as quais são manejáveis pelo espólio Se o inventariante não promove a medida judicial necessária à proteção dos interesses do condomínio hereditário o herdeiro pode demandar o possuidor da herança ou de parte dela por meio dessa ação O possuidor está obrigado à restituição dos bens do acervo e terá a responsabilidade regida pelos preceitos do direito das coisas CC art 1826 Quer dizer se estava de boafé poderá reter as benfeitorias úteis e necessárias até ser indenizado por elas terá direito aos frutos percebidos etc já o de máfé terá o direito à indenização apenas pelas benfeitorias necessárias mas não poderá retêlas respondendo pela perda ou deterioração da coisa ainda que acidentais etc arts 1214 a 1222 Note porém que a boafé quando existente cessa com a citação na petição de herança art 1826 parágrafo único A petição de herança em geral é cabível depois de concluída a partilha porque antes dela quem se considera sucessor e não foi relacionado pelo inventariante como tal deve na verdade pleitear sua admissão no inventário Não tem legitimidade para a petição de herança nesse momento porque a lei lhe confere a alternativa da admissão no inventário Pode ocorrer de o juiz diante da complexidade dos fatos determinar a sustação do pedido de admissão e remeter as partes para as vias ordinárias Somente nessa hipótese a petição de herança poderá ser ajuizada pelo herdeiro preterido anteriormente à partilha mas estará legitimado por ter tentado antes ser desta edição 2020 admitido no processo de inventário CPC art 628 Um só herdeiro pode intentar a petição de herança para buscar a restituição desta ainda que outros coerdeiros também tenham sido preteridos CC art 1826 Tratase de previsão legal consentânea com a natureza de condomínio de que se reveste a herança Como no condomínio geral qualquer condômino pode isoladamente reclamar a coisa comum de terceiro art 1314 também o coerdeiro pode ingressar com a petição de herança sem o concurso dos demais A petição de herança é a ação destinada ao reconhecimento de direito sucessório e a restituição da herança a quem o titularizava mas foi preterido na partilha Se os bens que compõem o acervo hereditário objeto de restituição não se encontram mais na titularidade e posse daquele a quem foi destinado na partilha o herdeiro poderá reivindicálos em princípio de terceiros A menos como já se mencionou subitem 24 se tiverem sido alienados por herdeiro aparente a pessoa de boafé CC art 1827 e parágrafo único Por fim não pode ser movida a petição de herança contra o herdeiro aparente que de boafé pagou um legado com o objetivo de ver o bem correspondente restituído ao acervo hereditário Nesse caso a petição de herança deve ser promovida contra o legatário CC art 1828 35 Herança jacente e herança vacante Quando não se apresentam sucessores legítimos ou testamentários o patrimônio do falecido é considerado jacente Quer dizer ficará sob a guarda e administração de um curador nomeado pelo juiz à espera de sucessores No processo de inventário expedemse editais chamandoos Decorrido um ano sem que apareçam titulares de direito sucessório declarase a herança vacante Também se declara desde logo a vacância se todos os herdeiros chamados a suceder renunciarem à herança CC arts 1819 1820 e 1823 São duas situações diferentes portanto a jacência e a vacância de herança Herança jacente é a que aguarda a habilitação de sucessores vacante a que remanesce sem titular depois de um ano dos editais convocando os sucessores à habilitação Depois de decorridos cinco anos da declaração de vacância os bens do falecido passam ao patrimônio público Nesse período mesmo declarada a vacância da herança alguns dos familiares sucessíveis ainda podem se habilitar para exercer seus direitos hereditários Somente os parentes colaterais perdem o direito sucessório se não promoveram a habilitação durante a fase de jacência CC art 1822 e parágrafo único Como já referido anteriormente os bens do acervo hereditário na hipótese de herança vacante são destinados ao Município em que se situam quando imóveis ou forem encontrados quando móveis Situados ou encontrados no Distrito Federal a ele serão destinados São por fim da União os bens situados ou encontrados em Território Federal CC art 1844 2020 02 13 PÁGINA RB91 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES CAPÍTULO 63 SUCESSÃO LEGÍTIMA Capítulo 63 Sucessão Legítima 1 Vocação hereditária Quando falece alguém sem testamento caduca o testamento deixado ou declarase sua invalidade os bens do patrimônio do falecido são destinados exclusivamente aos herdeiros legítimos isto é seus familiares indicados na lei CC art 1788 O chamamento à sucessão dos sucessores legítimos obedece a uma ordem de classificação Os familiares acomodados numa determinada classe têm preferência sobre os de ordem posterior e cedem lugar aos da classe anterior a menos obviamente que se encontrem nos extremos da classificação Estruturalmente falando são chamados a suceder os sucessores da primeira classe não existindo chamamse os da segunda classe se não existirem sucessores desta também os da terceira classe são convocados e assim por diante É bastante complexa a classificação dos familiares sucessíveis Sua compreensão demanda muita atenção e concentração do estudioso até mesmo porque a lei por vezes é mal redigida o que dificulta sua exegese Além do mais conforme se detalhará mais à frente parte dos preceitos sobre a vocação hereditária está viciada por inconstitucionalidade por desconsiderar o tratamento isonômico das famílias constitucionais o que torna ainda mais complexa a matéria subitem 25 Pois bem começo por transcrever a ordem de vocação hereditária disposta no art 1829 do CC Por esse dispositivo encontramse na primeira classe de familiares sucessíveis os descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal ou no da separação obrigatória de bens e salvo se no regime da comunhão parcial o autor da herança não houver deixado bens particulares inciso I Na segunda classe acomodamse os ascendentes em concorrência com o cônjuge inciso II O familiar sucessível de terceira classe segundo esse dispositivo é o cônjuge sobrevivente inciso III E a quarta e última classe alberga os parentes colaterais até o quarto grau inciso IV Código Civil Art 1829 A sucessão legítima deferese na ordem seguinte I aos descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal ou no da separação obrigatória de bens art 1640 parágrafo único ou se no regime da comunhão parcial o autor da herança não houver deixado bens particulares II aos ascendentes em concorrência com o cônjuge III ao cônjuge sobrevivente IV aos colaterais Mas não é suficiente considerar o disposto no art 1829 do CC para compreender em toda sua complexidade a ordem de vocação hereditária Os dispositivos que o seguem estabelecem uma série de regras que leva em conta a diversidade de grau direito de representação sucessão por cabeça ou por estirpe sucessão por linha e preferências internas à classe além de critérios para distribuição da herança entre familiares concorrentes No emaranhado da questão a melhor alternativa didática não é a de examinar como se opera a sucessão em cada classe mas sim tratar dos direitos sucessórios de cada familiar sucessível em separado começando pelo cônjuge e companheiro item 2 e na sequência tratando dos descendentes ascendentes e colaterais itens 3 a 5 2 O cônjuge ou companheiro como sucessor Quem se debruça sobre a história do direito das sucessões percebe sem dificuldade que ao longo do tempo a mudança mais significativa na vocação hereditária tem sido a da constante valorização do cônjuge Wald 200266 A cada alteração substancial na lei esse familiar ganha maior participação na sucessão No direito brasileiro a valorização do cônjuge na ordem de vocação hereditária descreve a seguinte trajetória até 1907 sucedia em quarto lugar depois dos parentes colaterais até o décimo grau isto é depois de tiosbisavôs sobrinhosbisnetos e primos longínquos naquele ano com a Lei Feliciano Pena o cônjuge passou a ter preferência sobre os colaterais o Código Beviláqua em 1916 não alterou essa ordem mantendo o cônjuge na terceira classe atrás dos filhos e não os havendo dos pais do falecido Beviláqua 1898181192 o Código Reale em 2003 promoveuo à primeira e segunda classe de familiares sucessíveis em concorrência respectivamente com os descendentes e ascendentes A valorização do cônjuge é visível também em direitos estrangeiros Ao longo do século passado na Itália Portugal Argentina e Alemanha por exemplo o cônjuge passou a participar da sucessão concorrendo com os descendentes e ascendentes É certo que em alguns direitos como no francês ele ainda está em quarto lugar na ordem de vocação depois dos irmãos do falecido Oliveira 20053839 mas isso não representa a tendência manifestada pela maioria dos direitos de filiação romanogermânica Essa tendência que em minha opinião ainda não se esgotou é inteiramente justificável Para a formação do patrimônio do defunto a contribuição do cônjuge é indiscutivelmente a mais consistente quando contraposta à dos descendentes que a rigor pouco ou nada contribuem só se beneficiam do acervo acumulado pelos pais e ascendentes vivos Se no passado a manutenção da riqueza de uma família nas mãos dos parentes de sangue era um valor corrente compatível com a organização da produção na Antiguidade e no feudalismo e também com a necessidade de acumulação econômica do início do capitalismo hoje em dia perdeu o sentido por completo tanto no plano axiológico como no racional O disposto no art 1830 do CC reforça o argumento de que o móvel do incremento da participação do cônjuge na sucessão legítima ligase à contribuição dada por ele ao patrimônio objeto de sucessão Segundo esse preceito o cônjuge sobrevivente não titula nenhum direito sucessório se ao tempo da abertura da sucessão estava separado judicialmente do falecido ou se estava separado de fato há mais de dois anos salvo nesse último caso se a convivência se tornara impossível por culpa do falecido Para ser considerado familiar sucessível portanto o cônjuge deve estar ainda numa situação jurídica em que a contribuição para a construção e manutenção do patrimônio do de cujus seja factível Se estava separado judicialmente deste nenhuma contribuição ao patrimônio dele havia como ser dada Igualmente seria uma abstração vazia a ideia de ajuda partida de cônjuge já separado de fato há dois anos ou mais Claro que no caso da separação de fato a lei paga tributo uma vez mais à vetusta noção de culpa pela insuportabilidade da vida em comum com o objetivo de preservar o cônjuge inocente de qualquer prejuízo Assim mesmo que a separação de fato perdure há mais de dois anos o cônjuge continua familiar sucessível e portanto titular de direitos sucessórios na ordem de vocação hereditária quando não tiver sido dele a culpa pela ruptura da convivência O cônjuge teve valorizada a sua participação na ordem de vocação hereditária com a entrada em vigor do Código Reale Passou a concorrer com os descendentes e ascendentes do falecido além de herdar a totalidade da herança quando inexistentes esses familiares sucessíveis Mas para ser sucessor o cônjuge deve estar convivendo com o falecido na data da abertura da sucessão Se estavam separados judicialmente o sobrevivente não tem nenhum direito sucessório Se estavam separados de fato há mais de dois anos para ser sucessor do falecido o cônjuge supérstite não pode ter sido o culpado pelo rompimento da convivência Em relação ao companheiro não se pode negar que no plano da contribuição para a construção do patrimônio do falecido encontrase em pé de absoluta igualdade com o cônjuge A mesmíssima contribuição que se presume seja dada por um cônjuge também provém daquele que convive em regime de união estável Não há diferença nenhuma sob o ponto de vista da maior ou menor importância da contribuição para a construção e manutenção do patrimônio de alguém se a relação de conjugalidade em que está envolvido fundase no matrimônio ou na convivência duradoura pública e destinada à constituição de família Cônjuge e companheiro contribuem igualmente para o implemento do patrimônio da pessoa à qual estão vinculados Desse modo se o cônjuge tem se beneficiado de uma inegável valorização em sua posição na ordem de vocação hereditária em função do reconhecimento de sua maior contribuição para a formação do patrimônio a partilhar é inconcebível que o companheiro não possa desfrutar de igual promoção Seria uma odiosa discriminação O direito das sucessões portanto não pode diferenciar o cônjuge e o companheiro na definição das preferências e quinhões sucessórios Ambos devem receber da lei tratamento idêntico porque não existem razões que possam justificar qualquer vantagem ou desvantagem para um ou outro no momento da destinação dos bens do falecido com quem mantinham relação de conjugalidade O Código Civil no entanto tratou diferentemente a família fundada no matrimônio e a constituída por união estável Discriminouas conferindo mais vantagem ora ao cônjuge ora ao convivente Ao fazêlo incorreu em inconstitucionalidades que precisam ser consertadas pela tecnologia jurídica e pela jurisprudência Mas é oportuno caminhar com vagar pelos caminhos tortuosos das normas legais sobre vocação hereditária Antes de tratar das inconstitucionalidades já reconhecidas pelo STF e seus desdobramentos subitem 25 convém abstraílos e considerar a literalidade das disposições do Código Reale 21 Concorrência com os descendentes Cônjuge e companheiro concorrem como sucessores com os descendentes na primeira classe da ordem de vocação hereditária Mas de acordo com o preceituado no plano da lei ordinária com abstração por enquanto dos preceitos constitucionais eles não concorrem segundo iguais critérios Por isso convém primeiro examinar o concurso do cônjuge com os descendentes subitem 211 e depois o do companheiro subitem 212 211 Concorrência do cônjuge com os descendentes A concorrência do cônjuge do falecido com os descendentes deste é uma das questões mais discutidas pela doutrina civilista após a entrada em vigor do Código Reale Hironaka 2003213229 200489104 Oliveira 200581186 Leite 2003209243 Não somente porque representou uma inovação significativa no direito das sucessões mas também em razão do pouco cuidado que revelou ter o redator do texto normativo relativamente à complexidade do tema dificultando sua intelecção As regras de concorrência do cônjuge e os descendentes do falecido variam segundo dois fatores De um lado o regime de bens do casamento Dependendo do regime patrimonial adotado pelos cônjuges existe ou não concorrência e mesmo quando existe pode alcançar apenas parte da herança em função ainda do regime patrimonial adotado De outro lado variam as regras da concorrência de acordo com a natureza da descendência deixada pelo falecido Porções diversas da herança são destinadas aos concorrentes quando do concurso participam apenas descendentes comuns todos são filhos do cônjuge e do falecido ou somente descendentes exclusivos todos são filhos do falecido mas nenhum é do cônjuge e no caso de descendência híbrida alguns dos descendentes são comuns e outros exclusivos Em relação ao primeiro fator a lei atribui ou nega a qualidade de concorrente ao cônjuge em função do regime de bens adotado no casamento Desse modo concorrem os cônjuges casados nos regimes de separação facultativa e participação final nos aquestos Os cônjuges casados nos regimes de comunhão universal e de separação obrigatória não concorrem com os descendentes do falecido Em relação aos casados em regime de comunhão parcial haverá concorrência sobre os bens particulares do falecido se este os tiver deixado não os tendo por consequência o concurso não se instala Veja que se está falando da herança deixada pelo falecido e não necessariamente de todo o patrimônio que se encontrava em nome dele Se havia comunhão de bens com o cônjuge antes de se definir o patrimônio objeto de sucessão devese destacar dele a meação do sobrevivente A morte recorde é causa de dissolução da sociedade conjugal CC art 1571 I e esta tem como um de seus efeitos tal como na separação a partilha dos bens dos cônjuges de acordo com o regime patrimonial adotado Para o inventário assim convergem todos os bens em nome dos cônjuges do falecido e do sobrevivente integrantes da comunhão instituída pelo matrimônio Por exemplo se Antonio é casado com Benedita no regime de comunhão universal e possui em seu nome apenas um imóvel para simplificar não deixou dívidas a herança corresponderá à metade desse bem A outra metade é de Benedita por força da meação a que tem direito em razão do regime de bens adotado Se Antonio deixou um filho Carlos este o sucederá na metade do imóvel componente da herança enquanto Benedita ficará com a parte correspondente à sua meação Quando se diz que o cônjuge casado em comunhão universal não concorre com o descendente na herança portanto isso significa que ele não terá na partilha imposta pela dissolução da sociedade conjugal em razão do falecimento do outro cônjuge nada além da sua meação Claro os direitos sucessórios desse cônjuge serão bem diversos se o falecido não tiver deixado descendentes mas disso trato em seguida subitens 22 e 23 A regra estabelecida pelo art 1829 I do CC sobre a concorrência do cônjuge com os descendentes em função do regime de bens não é difícil de se operacionalizar Definido o regime sabese se há ou não concorrência Difícil é entender o critério que teria baseado as escolhas do legislador Ao excluir da concorrência o cônjuge casado em comunhão universal de bens parece considerar que ele por ter já assegurada a meação não ficaria ao desamparo em razão do passamento de seu esposo ou esposa Se é este o valor prestigiado pelo legislador então se compreende igualmente a regra sobre a exclusão da concorrência no caso da comunhão parcial sem bens particulares Claro quando não existem bens particulares os cônjuges casados em comunhão parcial encontramse em situação patrimonial idêntica à dos unidos em regime de comunhão total Mas como entender a distinção entre os regimes de separação obrigatória e facultativa Nos dois casos os cônjuges não titulam o direito à meação e a morte do mais rico deles poderia deixar ao desamparo o outro tanto faz se a separação foi o regime obrigado pela lei ou escolhido pelos nubentes Simplesmente não se conseguem perscrutar as intenções do legislador nalgumas exceções estabelecidas à concorrência O Superior Tribunal de Justiça em vista provavelmente da pouca clareza do critério legal presumindose que exista por vezes tem decidido que nas duas hipóteses de separação inclusive na facultativa não haveria concorrência com os descendentes A insegurança jurídica é patente se não será facilmente compreensível porque o cônjuge na separação obrigatória estava excluído da concorrência menos facilidade há em compreenderse a razão de se estender a exclusão também ao caso de separação facultativa A propósito veja que a remissão do art 1829 I ao parágrafo único do art 1640 não tem nenhum sentido já que a separação obrigatória é tratada no art 1641 todos do CC É um erro material que deve ser desconsiderado na interpretação do preceito Veloso 2002a1648 Na concorrência entre o cônjuge e descendentes do falecido importa considerar em primeiro lugar o regime de bens do casamento Não concorre com os descendentes o cônjuge sobrevivente casado com o falecido em regime de comunhão universal de bens ou separação obrigatória Se o casamento submetiase aos regimes de separação facultativa ou participação final nos aquestos o cônjuge sobrevivente participa da primeira classe de sucessão legítima concorrendo com os descendentes Finalmente se o regime do casamento era o da separação parcial o cônjuge concorrerá apenas na herança representada pelos bens particulares do falecido Se não existiam não haverá concorrência O segundo fator que interfere na extensão do direito sucessório do cônjuge quando concorre com os descendentes diz respeito à natureza da descendência Aqui há quatro hipóteses a considerar para simplificar cuido por enquanto apenas de descendentes do mesmo grau 1ª Quando o falecido deixa até três descendentes o cônjuge concorre por cabeça CC art 1832 primeira parte Isso significa que receberá porção igual às dos descendentes Se o falecido deixou um filho apenas o cônjuge herda metade se deixou dois herda um terço quando são três os descendentes o percentual da herança do cônjuge é um quarto Sendo o número de descendentes igual ou inferior a três é irrelevante se a descendência é comum exclusiva ou híbrida Em qualquer caso a concorrência será por cabeça 2ª Se a descendência do falecido é integrada apenas por filhos exclusivos dele o cônjuge continua herdando por cabeça qualquer que seja o número de descendentes Isto é se o cônjuge não é ascendente de nenhum dos descendentes do de cujus receberá invariavelmente porção igual à deles Se forem quatro os filhos o cônjuge herdará um quinto se forem cinco sua parte na herança será de um sexto e assim por diante 3ª Na situação em que o cônjuge concorre apenas com filhos comuns ou seja descendentes dele e do falecido a lei lhe assegura o direito a uma porção mínima da herança correspondente a um quarto CC art 1832 in fine Desse modo sendo quatro ou mais os filhos comuns ao cônjuge é destinada a quarta parte da herança e os três quartos restantes são divididos entre os descendentes em porções iguais Assim se eram cinco os filhos do casal 25 da herança cabe ao cônjuge e 15 a cada descendente 4ª Finalmente se a concorrência se estabelece entre o cônjuge e descendentes comuns e exclusivos do falecido a inexistência de preceito legal específico desperta na tecnologia jurídica a dúvida acerca do critério a adotar Se incidir a primeira parte do art 1832 do CC a repartição da herança fazse por cabeça sem reserva da quarta parte ao cônjuge mas se aplicada a parte final do mesmo dispositivo a destinação dos bens deve atender inicialmente à porção mínima do cônjuge A solução para a dúvida suscitada pela inexistência de previsão específica da concorrência no caso de descendência híbrida aponta para a regência do tema pela primeira parte do art 1832 do CC Isto é o cônjuge só tem a garantia da porção mínima de um quarto da herança ao concorrer exclusivamente com seus próprios descendentes Quando ele não for ascendente da totalidade dos seus concorrentes não tem aplicação a parte final do dispositivo Hironaka 200496 Oliveira 2005111123 Ao concorrer exclusivamente com descendentes do falecido dos quais também é ascendente o cônjuge tem assegurada a porção mínima da herança correspondente a um quarto Nos casos porém de descendência exclusiva do falecido ou híbrida o cônjuge herda parte idêntica à destinada aos descendentes 212 Concorrência do companheiro com os descendentes A regra atinente à concorrência do companheiro com descendentes do falecido é bem mais simples que a do cônjuge Se concorrer com descendentes comuns terá o direito à parte da herança igual à cabível a cada um deles Assim se da união estável resultaram dois filhos o companheiro herda um terço se resultaram três um quarto etc CC art 1790 I Se a concorrência se estabelece entre o companheiro e descendência exclusiva do falecido a parte da herança que lhe é destinada corresponderá à metade da porção de cada descendente Quer dizer se o companheiro concorre com um filho exclusivo do falecido fará jus a um terço da herança se entra em concurso com dois filhos exclusivos terá direito a um quinto se concorre com três sua quota hereditária será de um sétimo e assim por diante CC art 1790 II Em se estabelecendo o concurso entre o companheiro e a descendência híbrida do falecido filhos comuns e exclusivos novamente não há disposição legal que defina o direito sucessório E mais uma vez devese considerar que a participação mais vantajosa só tem cabimento quando todos os descendentes do companheiro falecido o forem também do sobrevivente isto é quando o convivente concorrer somente com descendentes dos quais for também ascendente terá direito a quota igual à deles se concorrer com descendentes comuns e exclusivos porém receberá apenas a metade do destinado a cada um deles inclusive aos seus Qualquer outra solução levaria à discriminação dos filhos do falecido Oliveira 2005162172 que devem ser tratados de forma isonômica na sucessão para obediência do art 1834 do CC Lembre que se está considerando aqui exclusivamente a parte do patrimônio comum dos conviventes que corresponde à meação do falecido ou aos seus bens particulares A meação correspondente ao direito do companheiro supérstite evidentemente não integra o patrimônio a ser transmitido aos sucessores do falecido e não integra a herança De acordo com o Código Civil o companheiro sobrevivente tem direito à porção idêntica à dos descendentes quando deles for também ascendente e não houver descendência exclusiva do falecido Mas terá direito apenas à metade da parte de cada descendente quando eles forem todos ou em parte exclusivos do companheiro falecido Comparando os direitos de sucessor titulados pelo companheiro com os do cônjuge podese verificar que a lei os tratou de forma discriminatória É certo que não prejudicou um deles somente tendo distribuído entre os dois as desvantagens engendradas ora privilegiando um ora o outro Com ênfase quando se considera a hipótese do companheiro concorrendo com descendentes comuns notase que ele em princípio se encontra numa situação mais vantajosa que o cônjuge Enquanto esse nem sempre concorre porque dependendo do regime do casamento estará excluído da primeira classe dos herdeiros legítimos o convivente terá sempre o direito de concorrer Na união estável salvo convenção entre os conviventes em sentido diverso o regime de bens é invariavelmente o da comunhão parcial CC art 1725 Mas tenha o falecido deixado ou não bens particulares o companheiro concorrerá à herança com os descendentes dele Diferentemente o cônjuge casado no regime de comunhão parcial apenas concorre com os descendentes na repartição da herança correspondente aos bens particulares quando houver O tratamento dispensado ao companheiro portanto nesse caso é mais benéfico Ao se comparar o direito sucessório do companheiro com o do cônjuge casado em regime de comunhão universal ou separação obrigatória a discriminação em favor do primeiro é ainda mais acentuada Enquanto o cônjuge nesses casos nunca concorre com os descendentes do de cujus o companheiro irá sempre concorrer O desequilíbrio no tratamento dos direitos sucessórios se inverte porém quando o falecido deixa descendentes exclusivos se comparada a hipótese à do cônjuge com direito à concorrência isto é o casado segundo os regimes de separação facultativa ou de participação final nos aquestos Nesse caso o companheiro recebe a metade do que receberia o cônjuge na mesma situação Também se desequilibra a equação em desfavor do companheiro no caso de o cônjuge com direito à concorrência ter descendentes comuns em número igual ou superior a quatro Aqui como visto assegurase ao cônjuge a quarta parte da herança como a quota correspondente ao seu direito sucessório Mas o companheiro na mesma situação não teria direito a uma porção mínima do patrimônio objeto de sucessão concorrendo sempre por cabeça O cônjuge casado em regime de separação facultativa está em situação mais vantajosa do que o companheiro Aquele concorre com os descendentes na totalidade da herança enquanto este último somente titula direito sucessório concorrente relativamente aos bens adquiridos de modo oneroso na constância da união estável 22 Concorrência com os ascendentes Na concorrência do cônjuge com os ascendentes do falecido é irrelevante o regime de bens do casamento Qualquer que tenha sido o adotado é idêntico o direito sucessório do viúvo ou viúva Distinguemse nessa concorrência apenas duas situações De um lado se o concurso se verifica entre o cônjuge sobrevivente e dois ascendentes de primeiro grau do falecido isto é seu pai e sua mãe o cônjuge terá direito a um terço da herança De outro lado se a concorrência ocorre com um só ascendente de primeiro grau o pai ou a mãe do falecido ou com ascendentes de grau superior um dois três ou quatro avós um bisavô etc o cônjuge terá sempre direito à metade da herança CC art 1837 Em relação ao companheiro a lei lhe atribui o direito a um terço da herança independentemente do número de ascendentes ou dos respectivos graus CC art 1790 III Assim se o falecido mantinha união estável com alguém e sua mãe vivia na época da abertura da sucessão a ascendente fica com dois terços da herança e o companheiro com o terço restante Se tinha uma avó serão dela os dois terços do patrimônio objeto de sucessão e assim por diante Havendo mais de um ascendente eles dividem os dois terços da herança que lhes cabe segundo as regras próprias da vocação hereditária dessa classe item 4 Concorrendo com ascendentes o cônjuge terá direito a um terço da herança quando forem vivos pai e mãe do de cujus e à metade da herança quando for vivo apenas um deles ou o concurso se estabelecer com avós ou bisavós Nesse caso é irrelevante o regime de bens adotado no casamento Já o companheiro sobrevivente herda sempre um terço ao concorrer com os ascendentes do falecido A comparação do tratamento dado ao cônjuge e ao companheiro na concorrência com ascendentes do falecido permite uma vez mais constatar a discriminação da família nascida do matrimônio e da derivada de união estável em matéria de direito sucessório Quando o cônjuge concorre com pai e mãe do falecido não lhe reservou a lei nenhuma vantagem relativamente ao companheiro nessa mesma situação Tanto um como o outro herdam um terço da herança Nas demais hipóteses porém sempre gozará de tratamento mais benéfico o cônjuge Se for vivo apenas um dos ascendentes de primeiro grau ou se o concurso se estabelece com parentes de grau maior o cônjuge herda a metade enquanto o companheiro continua tendo direito somente a um terço da herança 23 Cônjuge ou companheiro como único sucessor Além de concorrer com outros familiares sucessíveis do morto o cônjuge ou o companheiro também é considerado em determinada hipótese o único sucessor na ordem de vocação hereditária Evidentemente quando chamados a herdar nesse caso sucedem o falecido na totalidade da herança Uma vez mais contudo foram tratados de modo diverso pela lei O cônjuge é o sucessor único sempre que o falecido não tiver deixado descendentes ou ascendentes CC art 1838 Irmãos sobrinhos tios e primos do defunto se houver não serão chamados à sucessão porque a classe do cônjuge como herdeiro único tem preferência sobre a dos colaterais art 1829 III e IV Não há concurso tampouco entre o cônjuge e seus cunhados os filhos ou pais destes Se os únicos parentes vivos do de cujus são colaterais a herança transmitese integralmente ao cônjuge qualquer que seja o regime de bens do casamento Já o companheiro só é convocado como sucessor único quando não houver nenhum parente sucessível do falecido CC art 1790 IV Quer dizer se o convivente morto possuía irmão sobrinho tio primo sobrinhoneto ou tioavô o sobrevivente herdará apenas um terço do patrimônio objeto de sucessão art 1790 III A lei não reconhece preferência ao companheiro em relação aos colaterais até quarto grau Somente na falta destes a herança será transmitida por inteiro ao parceiro da união estável O cônjuge é o único sucessor herdeiro portanto da totalidade da herança quando o falecido não deixou descendente nem ascendente Já o companheiro será o sucessor único apenas se o falecido não possuía nenhum parente sucessível incluindo os colaterais até o quarto grau 24 Participação do cônjuge e companheiro na mesma sucessão O cônjuge e o companheiro podem participar da mesma sucessão Para divisar as hipóteses em que essa participação comum tem lugar convém partir das situações em que o cônjuge é sucessor para identificar em quais delas pode também ocorrer a constituição de uma união estável legitimando o companheiro a suceder o falecido Em três casos o cônjuge sobrevivente participa da sucessão do falecido a quando na abertura da sucessão havia convivência entre eles b se estavam naquela época separados de fato há menos de dois anos c se a separação de fato perdurava há mais tempo mas não tinha sido motivada por culpa do sobrevivente Pois bem na hipótese a o cônjuge pode eventualmente concorrer com descendentes e ascendentes do falecido nas situações já assinaladas com ninguém mais contudo Se o falecido mantinha em paralelo ao casamento relações com outra pessoa elas não configuram união estável ainda que caracterizadas pela affectio maritalis Com efeito se o relacionamento paralelo ao casamento tinha o objetivo também de constituição de família ele é uma união livre espécie de concubinato E como assentado anteriormente o direito ainda resiste a atribuir efeitos a essa entidade familiar para fins sucessórios Cap 59 item 4 O concubinato não gera nenhum direito de sucessão seja o concubino um simples amante com quem a pessoa casada convivia com o único objetivo de obter satisfação sexual ou parceiro dum relacionamento não exclusivo mas destinado a constituir família Para que se caracterize juridicamente a união estável é indispensável que os conviventes estejam desimpedidos para o casamento ou quando há impedimento esteja o impedido separado de fato de seu cônjuge Não se admite a união estável simultânea ao relacionamento matrimonial Desse modo a participação do cônjuge e companheiro numa mesma sucessão só pode ocorrer nas hipóteses b e c acima indicadas Quer dizer quando o falecido ainda estava no estado civil de casado mas havia se separado de fato há menos de dois anos o cônjuge é familiar sucessível Se nesse período o separado de fato construiu uma união estável o companheiro também é sucessor Ambos participarão em decorrência da mesma sucessão Igualmente se a separação de fato perdurava há mais de dois anos mas o cônjuge sobrevivente não tinha sido o culpado pela impossibilidade da preservação da vida em comum tendo o falecido nesse período se envolvido numa união estável participam de sua sucessão tanto o esposo ou esposa como o companheiro Não há na lei nenhuma disposição específica sobre a participação concomitante de cônjuge e convivente numa única sucessão A destinação dos bens da herança então deve seguir as regras gerais Para tanto cabe separar dois montes No primeiro os bens que o defunto adquirira onerosamente na constância da união estável no segundo os seus demais bens Da destinação dos bens do primeiro monte não participa o cônjuge sobrevivente assim como o companheiro não participa da do segundo Isso porque o art 1790 caput do CC define os bens objeto do direito sucessório do companheiro circunscrevendoos aos adquiridos onerosamente na vigência da união estável Em relação a esses bens o companheiro só concorre com parentes do falecido conforme se percebe dos incisos I a III do mesmo dispositivo Ora como o cônjuge não se enquadra nesse conceito legal seguese que não terá participação na destinação dos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável do falecido Desse modo se não existirem outros familiares sucessíveis o companheiro herda a totalidade dos bens do falecido adquiridos onerosamente na constância da união estável e o cônjuge todos os demais Podem participar da mesma sucessão o cônjuge e o companheiro do falecido Isso é possível apenas se este último estava separado de fato há menos de dois anos ou se não tinha sido do cônjuge sobrevivente a culpa da separação Imagine para ilustrar que Darcy e Evaristo eram casados no regime de separação de bens facultativa e tinham um filho Fabrício Imagine também que estavam separados de fato e que a culpada pela separação era inegavelmente Darcy que abandonara o lar e o filho para viver com Germano O patrimônio adquirido por Darcy antes da separação de fato tinha o valor de 1000 Por fim imagine que da união estável de Darcy e Germano nasceu uma filha Hebe e que na constância dessa união os conviventes adquiriram de forma onerosa bens no valor de 3000 e Darcy recebeu herança do pai no valor de 2000 Falecendo Darcy ela deixa quatro sucessores os filhos Fabrício e Hebe o cônjuge Evaristo e o companheiro Germano Procederseá então à seguinte destinação de seus bens i em primeiro lugar eles devem ser separados em dois montes sendo o primeiro constituído pelos adquiridos onerosamente na constância da união estável 3000 e o segundo pelos demais 3000 ii do primeiro monte devese separar a meação de Germano 1500 que não integra o objeto da sucessão iii da herança de Darcy no primeiro monte Germano recebe 15 300 enquanto Fabrício e Hebe recebem 25 cada 600 em razão do disposto no art 1790 II do CC iv da herança de Darcy no segundo monte Evaristo Fabrício e Hebe recebem 13 cada 1000 em vista do prescrito pelo art 1829 I do CC A final da herança de Darcy o companheiro Germano herda 300 o marido Evaristo recebe 1000 e os filhos Fabrício e Hebe 1600 cada 25 Inconstitucionalidades no Código Civil Um dos critérios de classificação das famílias é o que as distingue em constitucionais e não constitucionais Cap 55 item 4 Na primeira categoria estão as famílias mencionadas na Constituição Federal que são as constituídas pelo matrimônio ou união estável e as monoparentais art 226 e 3º e 4º as demais são famílias não constitucionais A diferença entre essas duas categorias de família diz respeito ao regime que a lei pode adotar ao estabelecer os direitos e obrigações dos seus membros Quando é constitucional a família a lei ordinária não pode diferenciar esses direitos e obrigações Já se vier a disciplinar alguma família não constitucional como por exemplo a constituída pela parceria entre pessoas do mesmo sexo a lei ordinária poderá validamente atribuir aos seus membros direitos e obrigações diversos dos reconhecidos aos de uma família constitucional Em outros termos nenhum membro de família constitucional pode ser tratado pela lei de modo menos vantajoso que o equivalente em outra família dessa categoria Para os fins que interessam a este subitem o cônjuge e o companheiro não podem receber na lei tratamentos diversos em matéria de direitos sucessórios É inconstitucional o preceito normativo de lei ordinária que discrimine qualquer um deles Antes de 2017 não era largamente aceito pela tecnologia civilista que o direito constitucional do companheiro ao tratamento isonômico em relação ao cônjuge Na verdade predominava o entendimento de que a família constituída pelo casamento podia e devia gozar de tratamento mais vantajoso na lei que a formada pela união estável poderia conferir aos seus membros direitos e obrigações diferenciados Para a maioria da doutrina a Constituição não havia equiparado as duas formas de família tendo ao contrário manifestado preferência pela matrimonial em detrimento da união estável cf Queiroga 20056366 Abstraídos os inspirados na ideologia conservadora referente à organização familiar dos argumentos contrários à isonomia constitucional entre a família matrimonial e a da união estável havia um só digno de consideração Por meio dele os autores costumavam apontar para a parte final do 3º do art 226 da CF que determina à lei a facilitação da conversão da união estável em casamento de modo a concluir pela existência de uma hierarquia entre essas famílias Se o constituinte quer que a lei facilite a conversão de uma espécie em outra argumentase então ele não dá igual importância a todas as famílias que menciona O argumento podia impressionar à primeira vista e era empregado por muitos dos mais importantes civilistas para considerar válida a discriminação feita pelo Código Civil em matéria sucessória entre o cônjuge e o companheiro A Constituição não estabeleceu nenhuma hierarquia entre o casamento e a união estável A rigor se a facilitação da conversão da união estável em casamento indica alguma preferência do constituinte ela deve ser entendida no modo inverso ao que tem afirmado a doutrina tradicional isto é no sentido da primazia da união estável sobre o casamento Como visto os conviventes quando são desimpedidos podem simplesmente se casar ao invés de optarem pela conversão em casamento Quando buscam a conversão têm como objetivo preservar os efeitos de sua união estável Se a Constituição manda que a lei facilite a conversão desta em casamento é porque está atenta à importância desses efeitos e considera que os conviventes não podem ter por única alternativa simplesmente se casarem Isso significaria a desconsideração da importância da união estável Se há preocupação em preservar algo numa certa mudança é porque sua relevância transcende à desta Assim se a norma constitucional determinando a facilitação da conversão significa hierarquização entre as espécies de família indicar a matrimonial como superior é tão lógico quanto considerála inferior à proveniente da união estável Na verdade essa parte final do preceito constitucional deve ser interpretada com os olhos voltados à realidade Existem dois tipos de união estável a dos que têm recursos econômicos para se casar mas simplesmente não querem e a dos que não se casam somente porque não têm recursos econômicos para tanto A facilitação da conversão da união estável em casamento é uma previsão de alcance social destinada a atender aos interesses desse segundo grupo de conviventes Não tem outro significado além desse O cônjuge e o companheiro não podem ser tratados de forma diferenciada pelo direito das sucessões porque integram famílias constitucionais Na superação das inconstitucionalidades em que incorreu o Código Civil devese adotar o princípio da prevalência da norma que dispensa seja ao cônjuge ou ao companheiro o melhor tratamento Assim o cônjuge titula os direitos sucessórios que a lei reconheceu ao companheiro quando privilegiou este último e o companheiro titula os direitos sucessórios atribuídos pela lei ao cônjuge quando forem mais vantajosos Em 2017 o STF julgou recurso com repercussão geral fixando a seguinte tese no sistema constitucional vigente é inconstitucional a distinção de regime sucessório entre cônjuges e companheiros devendo ser aplicado em ambos os casos o regime do artigo 1829 do Código Civil de 2002 A tese aplicase tanto à união estável entre pessoas de sexos diferentes como à homoafetiva Mas apesar da inegável pertinência dessa tese ela não adotou o critério correto de invalidar todas as hipóteses de inconstitucionalidades do Código Civil O critério correto é a prevalência da norma que dispensa seja ao cônjuge ou ao companheiro o melhor tratamento Assim o cônjuge titula os direitos sucessórios que a lei reconheceu ao companheiro quando privilegiou este último e o companheiro titula os direitos sucessórios atribuídos pela lei ao cônjuge quando forem mais vantajosos Assentada portanto a premissa de que cônjuge e companheiro têm direito ao mesmo tratamento na ordem de vocação hereditária cabe retomar as inúmeras desigualdades estabelecidas pelo Código Civil com o objetivo de destacar a constitucionalidade do respectivo preceito De início cabe reforçar a ideia de que estas desigualdades se resolveriam pela simples declaração de inconstitucionalidade do preceito que regula os direitos sucessórios do companheiro ou seja do art 1790 do CC como um todo Essa alternativa pressupõe o oposto do que se pretende afirmar Se o objetivo é eliminar as desigualdades de tratamento entre cônjuge e companheiro simplesmente tomar por inconstitucional o dispositivo que regula os direitos sucessórios deste último é reintroduzir de modo subreptício a hierarquização entre as espécies de família com priorização da matrimonial Por que razão o legislador a priori teria baixado norma válida ao tratar do cônjuge e incorrido em inconstitucionalidade ao disciplinar os direitos do companheiro Para se respeitar de modo cabal a isonomia entre o cônjuge e o companheiro é necessário verificar cada uma das hipóteses em que o tratamento dispensado pela lei foi discriminatório Em algumas delas como se viu a lei conferiu ao companheiro uma vantagem negada ao cônjuge noutras fez o inverso Descartar como inconstitucional a norma referente aos direitos sucessórios do companheiro para que ele possa gozar dos conferidos ao cônjuge nem sempre portanto lhe será vantajoso Novamente a hierarquização das espécies de família acabaria se fazendo sentir em detrimento da união estável Em outros termos sempre que o Código Civil tiver tratado o companheiro de forma mais vantajosa que o cônjuge será inconstitucional a norma que discriminou a família matrimonial e quando tiver dispensado ao cônjuge tratamento mais benéfico que ao companheiro a inconstitucionalidade atingirá a discriminação à família fundada na união estável Assim cabe afirmar em primeiro lugar a inconstitucionalidade do art 1829 I do CC porque libera ao cônjuge tratamento menos benéfico do que o do companheiro Em consequência quando concorrer com descendentes do falecido o cônjuge terá seu direito sucessório regido pelo art 1790 I do CC Em outros termos quando se consideram os preceitos constitucionais sobre a proteção da família ao cônjuge deve ser destinada porção na herança igual à de cada descendente independentemente do regime de bens do casamento É inconstitucional reconhecer o direito à concorrência com os descendentes aos casados em certos regimes de bens e negálo aos que adotaram outros regimes A fragilidade dos critérios para distinguir quem concorre e quem não concorre seria já suficiente para questionarse a constitucionalidade da norma frente ao princípio constitucional da igualdade CF art 5º caput Mas além disso é inconstitucional discriminar o cônjuge na concorrência na primeira classe de familiares sucessíveis em função do regime de bens porque o companheiro não foi assim discriminado Ao se levar em conta o disposto no plano constitucional sobre a proteção às famílias fica até mais simples identificar os familiares sucessíveis integrantes da primeira classe na vocação hereditária são os descendentes do falecido em concorrência com o seu cônjuge qualquer que seja o regime de bens do casamento ou companheiro Em segundo lugar é cabível a aplicação em favor do companheiro do direito à quota hereditária mínima de um quarto quando a concorrência se estabelece entre ele e descendentes do falecido dos quais é também ascendente Em outros termos o art 1790 I deve ser interpretado em conjugação com o art 1832 do CC quando se cuidar dos direitos sucessórios do companheiro Em terceiro lugar afirmase a inconstitucionalidade do art 1790 II do CC na parte em que reduz pela metade a porção hereditária do companheiro quando concorre com herdeiros exclusivos do falecido ou na hipótese de descendência híbrida Como o cônjuge nesse caso tem direito a quota igual à atribuída aos descendentes apenas a lei não lhe reconhece o direito à fração mínima o companheiro também deve ter idêntico tratamento Em quarto lugar é inconstitucional o art 1790 III do CC Quando concorre com os ascendentes do falecido o companheiro deve ter o mesmo tratamento do cônjuge com direito à metade da herança exceto no caso de concurso com o pai e a mãe do falecido Ademais não precisa concorrer com os colaterais Se o autor da herança não tinha descendentes nem ascendentes o companheiro deve a exemplo do cônjuge herdar a totalidade da herança Claro que em se adotando esse critério para a solução das inconstitucionalidades prevalece sempre o preceito que liberar melhor tratamento ao cônjuge ou ao companheiro os familiares sucessíveis concorrentes acabarão tendo menor participação na herança do que teriam se não se reconhecesse a inconstitucionalidade das normas discriminatórias ou se ela fosse superada pela aplicação do preceito menos vantajoso Aqui no entanto tem importância recuperarse o sentido da evolução do direito das sucessões na matéria atinente à vocação hereditária Como visto de início a tendência tem sido a de constante valorização da posição do cônjuge no quadro dos sucessores Se assim é a superação das inconstitucionalidades em que incorreu o Código Civil deve mesmo ser buscada à luz desse princípio o cônjuge ou companheiro deve ter sua situação melhorada em detrimento dos familiares sucessíveis do falecido porque comparativamente com estes deu maior contribuição para a formação e incremento do patrimônio objeto de sucessão 26 Direito real de habitação Independentemente do regime de bens do casamento o cônjuge sobrevivente tem direito real de habitação incidente sobre o imóvel destinado à residência da família CC art 1831 O objetivo da norma é garantir ao cônjuge o direito de continuar vivendo no mesmo local em que residia antes do passamento de seu marido ou mulher mesmo que não seja mais o proprietário de todo o imóvel O direito real de habitação impede por exemplo que os descendentes ou ascendentes do falecido para os quais parte do imóvel é transferida possam cobrar do cônjuge aluguel pelo respectivo uso A lei não é expressa a respeito mas devese reconhecer ao cônjuge sobrevivo o direito de usar todo o imóvel com exclusividade O ascendente ou descendente coproprietário do bem não pode vir morar com o cônjuge se antes não habitava o mesmo local Assim deve ser porque caso contrário o art 1831 do CC não teria qualquer implicação Veja é direito do condômino usar o bem em condomínio desde que não exclua nenhum dos outros coproprietários O cônjuge portanto na condição de condômino do imóvel herdado já titula o direito de usálo Para que o gravame da habitação que a lei determina recair sobre esse bem tenha algum significado é necessário reconhecer ao seu titular mais direitos do que os derivados do condomínio O companheiro também é titular de igual direito real de habitação não somente por força da isonomia de tratamento em relação ao cônjuge constitucionalmente assegurada como também em razão da expressa previsão do art 7º parágrafo único da Lei n 927896 que continua em vigor por versar sobre tema não disciplinado no Código Civil Por fim observo que o art 1831 do CC estabelece como condição para a instituição do direito real de habitação que o imóvel onde reside o cônjuge sobrevivente seja o único dessa natureza a inventariar Pelo texto da lei portanto se na herança houvesse qualquer outro bem imóvel o cônjuge sobrevivente não seria titular do direito real de habitação Aqui estamos diante de mais uma inconstitucionalidade do Código Civil que trata o cônjuge de forma menos vantajosa que o companheiro O art 7º parágrafo único da Lei n 927896 assegura a este último o direito real de habitação sem o condicionar à inexistência de outros imóveis na herança Uma vez mais não há motivos para discriminar o cônjuge na extensão desse direito sucessório O cônjuge e o companheiro têm direito real de habitação referente ao imóvel em que residia ao tempo da abertura da sucessão podendo excluir do uso do bem os descendentes e ascendentes do falecido que porventura se tornarem seus condôminos a menos que também já morassem no local Desse modo independentemente de existirem ou não outros imóveis na herança o cônjuge ou companheiro do falecido tem o direito de usar aquele em que residia ao tempo da abertura da sucessão podendo ademais excluir desse uso os descendentes e ascendentes que se tornaram seus condôminos a menos que também já residissem no local 3 Os descendentes como sucessores Na primeira classe da vocação hereditária além do cônjuge também estão os descendentes do falecido isto é seus filhos netos bisnetos tataranetos etc Na linha reta de parentesco tanto para cima como para baixo o direito sucessório não se limita pelo grau ao contrário do que ocorre com a colateral em que os parentes sucedem apenas até o quarto A regra geral de preferência entre os descendentes dita que os em grau mais próximo excluem os mais remotos CC art 1833 O chamamento fazse por ordem do grau convocandose primeiro os filhos depois os netos em seguida os bisnetos etc Desse modo se estiverem vivos todos os filhos do autor da herança nenhum dos netos ou bisnetos herda se prémorreram todos os filhos e vivem todos os netos nenhum dos bisnetos ou tataranetos será convocado para suceder e assim por diante Quando todos os descendentes chamados à sucessão são do mesmo grau eles herdam por cabeça sendo vedado qualquer tratamento diferenciado CC art 1834 Desse modo se o falecido deixou oito filhos cada um terá um oitavo da herança destinada aos descendentes independentemente de serem irmãos bilaterais ou unilaterais havidos dentro ou fora de casamento adotivos ou socioafetivos Se é filho terá direito sucessório idêntico aos demais descendentes de primeiro grau Do mesmo modo se todos os descendentes convocados para sucederem são netos do falecido a cada qual caberá idêntica porção da herança Nenhuma distinção será feita entre eles seja a que título for Se entre os netos um deles foi havido fora do casamento ou era adotivo terá direito de suceder em pé de igualdade com os outros Também não tem importância nesse caso em que todos os descendentes em condições de suceder são netos quem eram seus pais Considere que Irene faleceu com duas filhas sendo que uma delas Juliana lhe dera um neto Luiz e a outra Maria dois Nair e Orlando Para simplificar não há outros familiares sucessíveis Nesse caso sendo três os netos será de um terço a quota hereditária de cada um dos descendentes de segundo grau Isso reforço se Juliana e Maria as duas filhas da autora da herança já estavam mortas ao abrirse a sucessão de Irene Se uma delas vivia a destinação dos bens deixados pelo falecido seguirá regra diversa pertinente ao direito de representação subitem 31 O mesmo critério seguese pelos demais graus Se o defunto deixou apenas bisnetos todos os filhos e netos eram prémortos a cada um desses descendentes de terceiro grau será destinada uma parte igual da herança Se são dez bisnetos 110 para cada um se vinte 120 etc Entre os descendentes sucedem primeiro os de grau mais próximo filhos e na falta deles os dos graus subsequentes netos bisnetos etc Cada um herda dentro do mesmo grau por cabeça Isso significa que a parte da herança destinada aos descendentes será distribuída entre os do grau chamado a suceder em porções idênticas Os descendentes concorrem com o cônjuge ou o companheiro do falecido conforme as regras já examinadas anteriormente item 2 Em decorrência se o falecido era casado ou vivia em união estável os descendentes não terão direito à totalidade da herança porque uma parte dela será destinada à pessoa com quem o seu autor mantinha relação de conjugalidade 31 Direito de representação O descendente a partir do segundo grau pode herdar por direito próprio ou por representação variando substancialmente o cômputo de sua quota hereditária em cada caso Ele herda por direito próprio quando chamado para suceder o falecido o grau de descendência a que pertence Assim se os bens estão sendo transmitidos aos descendentes de primeiro grau do autor da herança quem é filho herda por direito próprio Mas numa circunstância o descendente herda por representação Nela é convocado a exercer os direitos sucessórios que seu ascendente exerceria caso estivesse vivo ao tempo da abertura da sucessão CC art 1851 O direito de representação só existe na linha reta descendente CC art 1852 isto é apenas filhos podem representar pais ou netos representar os avós etc Na linha reta ascendente não há direito de representação no sentido de que o pai nunca representa o filho Na colateral também não há direito de representação no sentido de que ninguém pode representar um irmão pré morto A lei menciona como única hipótese admissível de representação na sucessão por colaterais a dos filhos de irmão do falecido representando o pai prémorto se concorrem com outros irmãos do falecido art 1853 item 5 Sempre que o representado for chamado a suceder e estando vivo ao tempo da abertura da sucessão seu direito sucessório se transmitirá ao representante É essa a implicação do direito de representação Desse modo no exemplo acima do falecimento de Irene se Juliana já estivesse morta o seu filho Luiz a representaria Nesse caso então metade da herança seria destinada para Luiz e a outra metade para Maria No mesmo exemplo se Maria já fosse falecida ao tempo da abertura da sucessão ela seria representada por seus filhos Nair e Orlando Agora metade da herança caberia a Juliana um quarto para Nair e um quarto para Orlando O representante herda a título de representação a mesma quota hereditária que o representado herdaria se estivesse vivo na abertura da sucessão CC art 1854 Havendo dois ou mais representantes dividese por igual a quota do representado entre eles art 1855 Em decorrência pode variar o tamanho da quota hereditária do descendente dependendo do título da sucessão Ao herdar exercendo direito próprio o descendente pode receber mais ou menos do que receberia se herdasse por representação No mesmo exemplo Nair e Orlando ao sucederem Irene por direito próprio isto aconteceu quando tanto Juliana como Maria eram prémortas receberam um terço da herança cada um No entanto ao sucederem por representação quando Juliana era viva e Maria prémorta suas quotas reduziramse a um quarto para cada Luiz por sua vez quando sucedeu por direito próprio também mereceu um terço da herança Mas a participação dele aumentou para a metade quando sucedeu representando a mãe já falecida Juliana Fica agora fácil de entender o ditado da lei Na linha descendente os filhos sucedem por cabeça e os outros descendentes por cabeça ou por estirpe conforme se achem ou não no mesmo grau CC art 1835 Se todos os descendentes são filhos do falecido a cada um será destinada uma porção idêntica da herança Eles herdam por cabeça se são três filhos um terço para cada um se quatro um quarto e assim por diante Quer dizer os filhos descendentes de primeiro grau sempre são herdeiros por direito próprio Já os outros descendentes netos bisnetos etc podem herdar por cabeça exercendo direito próprio tal como os filhos do autor da herança ou por estirpe Herdam por cabeça quando estão todos os descendentes no mesmo grau só foram chamados a suceder netos ou só bisnetos etc Sucedem por outro lado por estirpe quando estão sendo convocados descendentes de graus diferentes caso em que os em grau mais remoto exercem o direito sucessório por representação Nessa última hipótese os bens são destinados a sucessores que em geral são tios filhos do autor da herança e sobrinhos netos do autor da herança uns dos outros Os descendentes a partir do segundo grau podem herdar por direito próprio ou por representação No primeiro caso cada descendente sucede por cabeça recebendo quinhão igual aos dos demais do seu grau No segundo sucede por estirpe e recebe a quota hereditária que o representado herdaria se vivo fosse ou uma parte dela quando houver mais descendentes representando o mesmo ascendente prémorto Nos casos de exclusão da sucessão por indignidade ou deserdação o excluído é tratado como se morto fosse Isso significa que os descendentes dele o representarão herdando a quota que lhe teria sido destinada não fosse a indignidade ou deserdação Mas no caso de renúncia relembrando descabe a representação Os sucessores do renunciante não têm nenhum direito sucessório a exercer nem próprio nem como representante Por fim enuncia a lei que o renunciante à herança de uma pessoa poderá representála na sucessão de outra CC art 1856 Desse modo se o filho renuncia à herança do pai não está impedido de representálo quando do falecimento do avô No exemplo acima se Luiz renunciou à herança deixada por Juliana a renúncia não o exclui da sucessão de Irene da qual participa representando a mãe prémorta 32 Embriões e material genético crioconservados Têm capacidade para suceder além dos nascidos também os concebidos à data da abertura da sucessão CC art 1798 A lei não distingue no tocante à concepção se ela é natural proveniente de relações sexuais ou artificial fecundação in vitro ou inseminação Desse modo não há como discriminar as hipóteses Tanto a pessoa que na data do falecimento do autor da herança já se encontrava concebida naturalmente como a que se concebera por processo de fertilização assistida têm capacidade para suceder No tocante à concepção artificial é necessário atentar para duas diferentes situações Primeira quando morreu o autor da herança já existia mantido sob crioconservação o embrião concebido com o material genético fornecido por ele Sendo essa a hipótese ainda que transcorra muito tempo vindo esse embrião a ser implantado num útero o nascimento com vida do ser assim gerado lhe conferirá capacidade sucessória Poderá por meio da ação de petição de herança demandar os demais sucessores para receber sua parte Terá muito tempo para isso porque essa ação prescreve em dez anos após a maioridade do seu titular ou seja até ele completar 28 anos Lembro a propósito que a fecundação assistida post mortem só gera o vínculo de filiação sendo homóloga quer dizer quando o microgameta de que proveio o embrião tiver sido fornecido por quem era casado ou mantinha união estável com a fornecedora do macrogameta CC art 1597 III e IV O útero em que esse ser será gerado não precisa ser necessariamente o da fornecedora do óvulo Ela aliás pode estar bastante velha ou até mesmo morta na época em que se fizer o implante do embrião em ambiente uterino Nada disso interfere com os direitos sucessórios da pessoa assim concebida e gerada relativamente à sucessão dos contratantes do serviço médico de fertilização assistida e fornecedores do material genético Se o embrião já existia na data da abertura da sucessão mesmo que estivesse crioconservado o ser dele resultante terá capacidade sucessória se um dia vier a ser implantado num útero e depois da gestação nascer com vida Esse ser terá até os 28 anos para exercer contra os demais sucessores seu direito à petição de herança Segunda na data da abertura da sucessão ainda não há embrião mas simplesmente gametas crioconservados provenientes do autor da herança São espermatozóides do homem falecido ou óvulos da mulher falecida que se encontram armazenados Esse material genético pode vir a ser empregado na concepção de uma nova pessoa Ela porém não terá nenhum direito sucessório relativamente ao patrimônio do fornecedor do gameta crioconservado porque não estava ainda concebida ao tempo de seu falecimento 4 Os ascendentes como sucessores Na segunda classe da vocação hereditária concorrendo com o cônjuge ou companheiro do falecido encontramse os ascendentes deste Eles são chamados a suceder no caso de não ter o falecido deixado descendentes A preferência dos descendentes sobre os ascendentes por vezes é explicada em função do valor embutido no primado amor primum descendit deinde ascendit que cultivou o direito romano o amor aos descendentes dizse supera o devotado aos ascendentes Monteiro 200389 Independe contudo da questão afetiva é inegavelmente mais racional sob o ponto de vista econômico que os descendentes tenham preferência sobre os ascendentes Como a tendência é a de filhos de uma pessoa morrerem depois dos pais dela a inversão da preferência acarretaria menor aproveitamento dos bens objeto de sucessão A cada duas gerações uma tenderia a herdar dos ascendentes e a outra dos descendentes num mecanismo que estimularia a imobilidade e dispersão de riquezas O mais conveniente para a economia é que a herança seja atribuída a quem na data da abertura da sucessão tem maior perspectiva de vida Os recursos assim destinados tendem a ser mais bem aproveitados em benefício da sociedade porque seus titulares terão mais motivação e meios para mobilizálos de forma produtiva Os mais velhos além de terem menos energia que os mais jovens já deram sua parcela de contribuição e merecem sossego tendem a ter de um modo ou de outro menos interesse em se envolver em novas empreitadas econômicas Por essa razão os ascendentes só herdam quando o autor da herança não deixa descendentes Entre os ascendentes a preferência também decorre da proximidade do grau mas os critérios são diversos dos aplicados em relação aos filhos e netos Na linha reta ascendente o grau mais próximo exclui o mais remoto sempre sem distinção de linhas CC art 1836 1º Quer dizer se um dos ascendentes de primeiro grau já estava morto mas não o outro este último herda a totalidade da herança destinada aos ascendentes Mesmo que na linha do ascendente de primeiro grau prémorto estivesse vivo algum outro ascendente não lhe seria destinado nada da herança Desse modo se o falecido ao morrer tinha como únicos familiares sucessíveis vivos o pai e os avós maternos a totalidade de sua herança vai para o antecedente de primeiro grau Assim é também por conta da racionalidade econômica que indica ser mais conveniente atribuir a herança a quem na data da abertura da sucessão tem maior perspectiva de vida Os ascendentes de grau mais remoto mesmo que não integrem a mesma linha dos de grau mais próximo não são chamados a suceder Havendo porém identidade de grau e diversidade de linha esta será considerada para se atribuir aos da linha paterna metade da herança destinada aos ascendentes e aos da materna a outra metade CC art 1836 2º Suponha que o falecido deixou vivos como parentes sucessíveis apenas o seu avô paterno e os dois avós maternos Nesse caso a herança será destinada metade ao avô paterno um quarto ao avô materno e um quarto à avó materna Entre os ascendentes os em grau mais próximos excluem sempre os em grau mais remoto não existindo representação nem tendo importância nesse caso a linha de ascendência Quando são idênticos os graus mas diversas as linhas metade da porção hereditária a repartir entre os ascendentes é destinada à linha paterna e a outra metade à materna Na concorrência com os ascendentes o cônjuge pode titular direito a um terço da herança quando vivos pai e mãe do falecido ou à metade se vive um deles somente ou nenhum dos dois Desse modo quando a pessoa sem descendente deixa ao passar cônjuge pai e mãe vivos cada um destes familiares sucessíveis herdará um terço da herança Se deixa cônjuge e pai destinase metade a cada um A mesma destinação se faz quando os familiares sucessíveis são o cônjuge e a mãe do falecido Quando nem pai nem mãe viviam ao tempo da abertura da sucessão o cônjuge fica com metade da herança e a outra metade é destinada aos ascendentes de segundo grau observandose a linha na repartição dessa quota em havendo identidade de grau Quer dizer se a concorrência se estabelece entre o cônjuge o avô materno e os dois avós paternos do falecido metade da herança será destinada ao primeiro um quarto ao segundo e um oitavo a cada um dos dois outros herdeiros 5 Os colaterais como sucessores Quando o falecido não tiver herdeiros necessários descendentes ascendentes ou cônjuge seus bens serão destinados aos colaterais até o quarto grau CC art 1839 Relembrando na linha colateral os graus de parentesco contamse por geração subindo até o ascendente comum e depois descendo até onde se quer chegar CC art 1594 Desse modo dois irmãos são colaterais em segundo grau uma geração separa um deles do pai ou mãe de ambos e mais uma separa estes do outro irmão Tio e sobrinhos são colaterais em terceiro grau uma geração até o pai que é o avô do sobrinho e mais duas daquele a este Tioavô e sobrinhoneto são colaterais em quarto grau uma geração até o pai que é o bisavô do sobrinho neto mais três daquele a este assim como os primosirmãos duas gerações para cima até os avós comuns e mais duas desses para baixo Para ser sucessor o colateral deve ter com o falecido uma dessas relações de parentesco Os primos mais distantes e os parentes de parentes colaterais ainda que provenham de um tronco comum não fazem parte da ordem de vocação hereditária Entre os colaterais sucessíveis também têm preferência os de grau mais próximo CC art 1840 Assim tios sobrinhos e primos não são chamados se todos os irmãos do falecido estavam vivos na data da abertura da sucessão Se os únicos parentes vivos do autor da herança são um sobrinho e um sobrinhoneto sendo este filho daquele então será chamado a suceder apenas o primeiro em vista da maior proximidade de grau Na sucessão por parente colateral só há uma hipótese de representação Diz respeito à de irmão do falecido pelo respectivo filho CC arts 1840 in fine e 1853 Assim se o morto tinha dois irmãos mas apenas um deles ainda estava vivo na abertura da sucessão o outro será representado por sua descendência isto é pelos sobrinhos do autor da herança Nos demais casos todos os colaterais herdam exercendo direito próprio isto é por cabeça e não por estirpe Se os herdeiros do falecido são um primo e dois sobrinhosnetos cada um deles terá direito a um terço da herança independentemente das linhas a que pertencem ou de quem sejam seus pais ou avós Concorrendo na sucessão irmãos bilaterais e unilaterais estes últimos têm direito a quota hereditária correspondente à metade da destinada aos primeiros CC art 1841 Os irmãos bilaterais são os que têm o mesmo pai e mãe os unilaterais os que têm o mesmo pai ou mãe Se alguém falece deixando como únicos familiares sucessíveis três irmãos sendo um deles bilateral e os outros dois unilaterais caberá ao primeiro metade da herança e a cada um dos demais um quarto Claro se houver somente irmãos unilaterais concorrendo a porção deles será igual pouco importando a linha a que pertencem art 1842 Na quarta classe da vocação hereditária considerou a lei os parentes colaterais até o quarto grau irmãos sobrinhos tios sobrinhosnetos tiosavós e primosirmãos do falecido Morrendo alguém sem cônjuge descendente ascendente ou irmãos os sobrinhos serão os herdeiros Se os pais deles eram todos irmãos bilaterais ou unilaterais do falecido a cada sobrinho será destinada uma porção igual da herança Quer dizer se eram cinco cada um herda um quinto Mas se entre os pais dos herdeiros havia irmãos bilaterais e unilaterais do falecido os sobrinhos filhos dos unilaterais herdarão a metade da quota atribuída aos sobrinhos descendentes dos bilaterais CC art 1843 1º a 3º Ou seja se eram cinco os sobrinhos três deles filhos de irmãos bilaterais do falecido e dois de unilaterais os primeiros herdam um quarto da herança cada um ao passo que a cada um desses últimos destinase um oitavo Os tios do falecido só são chamados a sucedêlo quando não houver sobrinhos CC art 1843 in fine Uma vez mais a lei atribui a herança a quem tem maior perspectiva de vida atendendo à alternativa de melhor racionalidade econômica Em outros termos não há concorrência entre tios e sobrinhos Havendo um único sobrinho sucessor serlheá deferida a totalidade da herança mesmo que estejam vivos também vários tios do falecido ou primos Se concorrem à herança somente tios não titulam direito de representação os descendentes de algum tio prémorto do falecido Simplesmente consideramse quais eram os tios vivos na data da abertura da sucessão e se destina a cada um deles a parte correspondente da herança É irrelevante em tal destinação a linha a que pertence cada tio sucessor Antes do Código Beviláqua o direito sucessório era atribuído aos colaterais até o décimo grau o filho de primo de mesmo tataravô do falecido era herdeiro Em 1916 limitouse aos de sexto grau e em 1946 aos de quarto A tendência no trato dessa matéria parece ser a de restringir ainda mais a vocação hereditária dos parentes transversais de modo que no futuro só titule direito sucessório o colateral com direito a alimentos ou seja os irmãos Monteiro 2003101 desta edição 2020 6 O VGBL VGBL é a sigla de um produto financeiro denominado Vida Gerador de Benefício Livre Tratase de investimento feito junto a sociedades seguradoras em que o investidor pode optar depois de decorrido o prazo previsto em contrato pelo resgate total do capital investido ou pelo direito de receber valores mensais Neste último caso como a situação econômica do investidor se assemelha ao de um aposentado considerase o VGBL uma espécie de plano de aposentadoria Temse difundido a noção equivocada de que o VGBL seria uma modalidade de seguro de vida de modo que o investidor poderia indicar livremente a quem deveria ser pago o capital no caso de seu falecimento Os próprios agentes das seguradoras incumbidos de oferecer o produto ao mercado costumam realçar este diferencial do VGBL para compensar a baixa remuneração oferecida Por isso o produto tem servido para tentativas de fraude contra o direito das sucessões Entendendo o VGBL como uma modalidade de seguro de vida e não como investimento a seguradora no caso de falecimento do investidor age como na liquidação de um seguro de vida e entrega o capital diretamente às pessoas indicadas no contrato e não aos legítimos sucessores Tentase fraudar deste modo também o fisco com a sonegação do imposto de transmissão causa mortis Contudo bem examinado o VGBL não pode ser classificado sequer como contrato de seguro quanto mais de seguro de vida Para que este negócio jurídico se caracterize não basta que do contrato participe uma seguradora é indispensável também a socialização dos riscos mediante o pagamento de prêmios fixados a partir de cálculos atuariais Cap 35 subitem 11 Nenhum desses dois outros elementos essenciais do seguro se mostra presente no VGBL O investidor entrega à seguradora um capital mediante aporte único ou em prestações Esse capital é chamado de prêmio mas não resulta de nenhum cálculo atuarial vinculado à socialização de riscos Ele é simplesmente administrado durante algum tempo pela seguradora período de investimento para que após o prazo contratado seja restituído ao mesmo investidor período de benefício de uma única vez com os acréscimos decorrentes da valorização experimentada ou em prestações mensais No seguro de vida o capital pago em razão do falecimento não é nunca a mera restituição do prêmio valorizado Tratase portanto de um investimento entre os muitos oferecidos no mercado poupança fundo de investimento CDB etc e como tal integra o patrimônio do investidor No caso de falecimento deste o VGBL deve receber rigorosamente o mesmo tratamento dispensado aos seus demais investimentos O VGBL Vida Gerador de Benefício Livre embora oferecido no mercado como modalidade de seguro de vida tem inequívoca natureza de investimento No caso de falecimento do investidor os recursos do VGBL pertencem ao espólio e devem ser com a partilha destinados aos sucessores legítimos e não aos beneficiários contratualmente indicados Desse modo alertemse sucessores e fisco Se o de cujus tinha qualquer quantia aportada em VGBL os recursos correspondentes pertencem inequivocamente ao espólio e não aos beneficiários contratualmente designados e devem ser com a partilha destinados aos sucessores atendendose às regras da sucessão legítima após o pagamento do imposto devido 2020 02 13 PÁGINA RB101 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES CAPÍTULO 64 SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA Capítulo 64 Sucessão Testamentária 1 Direito de testar A ordem jurídica reconhece dentro de certos limites o direito de a pessoa física definir por sua própria vontade a destinação de seus bens após a morte É o direito de testar atribuído a todas as pessoas capazes CC art 1857 e aos relativamente incapazes art 1860 parágrafo único que no momento do ato gozem de pleno discernimento O testamento é um ato personalíssimo Isso significa que ninguém pode testar por procurador ou tendo sua vontade fortemente influenciada por outra pessoa Admitese apenas que o testador possa ser auxiliado no aclaramento de sua vontade e compreensão dos respectivos efeitos por alguém de sua confiança ou um advogado Da circunstância de ser o testamento ato personalíssimo decorre também a sua alterabilidade e revogabilidade a qualquer tempo pelo testador A pessoa pode mudar quantas vezes quiser sua vontade relativamente à destinação dos bens após a morte como também simplesmente desistir de interferir no assunto prevalecendo sempre a última disposição manifestada em vida subitem 24 Exigese para a validade da declaração mortuária que o testador esteja em seu pleno discernimento isto é no domínio das faculdades mentais Não basta ser capaz para validamente dispor sobre a destinação post mortem dos próprios bens é indispensável que ademais não esteja o testador sem consciente controle de sua vontade CC art 1860 Subtrai a capacidade específica do testador qualquer fator que implique ausência de entendimento ou vontade como por exemplo enfermidade obnubilação passageira da mente embriaguez torpor em razão de medicamento ou entorpecente hipnose Pereira 1974137 Interessa na aferição da capacidade do testador levar em conta sua condição mental no momento em que faz a declaração nada interessando se antes ou depois o estado era diverso Assim se o testador é incapaz para o ato este não vale ainda que posteriormente aquele venha a se tornar capaz do mesmo modo se ao testar era capaz não invalida o testamento a superveniência de incapacidade Se alguém testou com 15 anos o ato é inválido ainda que o testador viva mais 80 sem nunca revogar o testamento ou fazer outro Da mesma forma se testou enquanto estava plenamente lúcido o fato de vir anos após a enlouquecer não invalida o ato art 1861 A validade do testamento pode ser questionada em razão de dois fundamentos incapacidade do testador no momento da declaração ou inobservância de forma ou formalidade legal item 2 Decai o direito de pleitear a invalidação do testamento em cinco anos após seu registro Ademais o testamento pode ser ineficaz se o testador dispôs sobre parte indisponível de seu patrimônio vale dizer insuscetível de ser destinada pelo titular O direito de dispor sobre os próprios bens depois da morte é reconhecido a toda pessoa capaz e aos relativamente incapazes desde que se encontrem em pleno discernimento 11 Herdeiros necessários Quem tem herdeiros necessários não pode dispor senão sobre a metade de seus bens Essa é a única limitação do direito de testar que a lei se preocupou em reforçar em mais de um dispositivo CC arts 1789 1846 1857 1º e 1967 Desse modo o patrimônio do testador com herdeiros necessários dividese em parte disponível e indisponível equivalendo cada uma à metade A parte indisponível chamada também de legítima não pode ser objeto de testamento Será ineficaz no todo ou em parte a disposição mortuária que alcançar a parte indisponível do patrimônio do testador Quando o testador não tem herdeiros necessários todo o seu patrimônio é disponível e terá a destinação que ele desejar desde que expressa em testamento Da parte disponível o testador é inteiramente livre para decidir acerca da destinação que terão com seu passamento os bens que tinha Pode transmitilos a quem não seja herdeiro como um amigo uma fundação parente distante Pode também testálos para quem já é herdeiro com o objetivo de lhe destinar porção maior de seus bens Nesse caso o beneficiado pelo testamento participa da sucessão com dois títulos o de herdeiro legítimo e o de sucessor testamentário herdeiro ou legatário Pode ser privilegiado por esse meio inclusive o herdeiro necessário que não perde em razão da qualidade de testamentário seu direito à legítima CC art 1849 Mesmo que isso implique um enorme desequilíbrio entre os familiares sucessíveis da mesma classe ou de classe anterior se a porção dada a mais ao testamentário proveio da parte disponível do patrimônio do testador não há fundamentos para questionar a validade ou eficácia do testamento São herdeiros necessários listados na lei o cônjuge ascendentes e descendentes CC art 1845 Assim está limitada no seu direito de testar a pessoa casada ou que tenha descendência ou ascendência viva Só pode dispor da totalidade de seus bens quem não tiver cônjuge filhos netos pais avós etc Os que não possuem senão parentes colaterais vivos não encontram limites em seu direito de testar Se quiser afastálos da sucessão basta dispor do seu patrimônio sem os contemplar CC art 1850 A respeito da classificação do cônjuge como herdeiro necessário inovação trazida ao direito positivo brasileiro pelo Código Reale cabem duas observações Primeira o art 1845 deve ser interpretado em consonância com o art 1830 Este último estabelece que o cônjuge só é sucessor quando na data da abertura da sucessão estava convivendo com o defunto ou dele separado de fato há menos de dois anos ou quando não tinha sido o culpado pela ruptura da convivência conjugal Essas condições também são indispensáveis para que o cônjuge seja considerado herdeiro necessário Claro porque desatendido o art 1830 nem mesmo sucessor o cônjuge pode ser considerado quanto mais herdeiro necessário Desse modo o separado de fato há mais de dois anos que não tiver sido o único culpado pela separação não terá herdeiros necessários ainda que ostente o estado civil de casado se lhe faltar também descendência e ascendência Segunda em vista da isonomia constitucional da família matrimonial e da constituída por união estável também o companheiro deve ser considerado herdeiro necessário limitandose igualmente o direito de testar A classificação do companheiro como herdeiro necessário contudo está longe de granjear a aceitação da maioria da doutrina Para o cálculo da legítima interessa considerar o valor dos bens ao tempo da abertura da sucessão CC art 1847 Pouco importa se quando foi feito o testamento os bens destinados aos testamentários correspondiam a mais ou a menos da metade do patrimônio do testador O que interessa é a situação patrimonial no momento de sua morte que pode claro terse alterado muito desde a data do testamento O cômputo da legítima toma por base o valor do acervo líquido vale dizer com desconto das dívidas deixadas pelo de cujus e acréscimo do correspondente aos bens conferidos em antecipação de legítima e sujeitos à colação Cap 65 item 2 Desse modo se o falecido tinha na abertura da sucessão patrimônio de 1000 havia doado para um dos filhos bens avaliados também nessa oportunidade em 200 e devia a credores em valores atualizados o equivalente a 300 então a legítima nesse caso corresponde a 450 isto é metade do acervo líquido 1000 200 2 300 900 900 2 450 Se o bem testado pelo valor ao tempo da abertura da sucessão encaixase na parte disponível do testador a legítima foi respeitada ainda que na oportunidade do testamento a ultrapassasse Quem tem descendente ascendente ou cônjuge ou segundo parte da doutrina companheiro não pode testar senão a metade de seus bens A outra metade designada de legítima corresponde à parte indisponível do patrimônio do testador Os bens da legítima portanto não podem ser destinados por disposição de última vontade do testador a quem não seja seu herdeiro necessário Isso não significa contudo que o testador nada possa dispor em testamento acerca deles Na verdade ele tem o direito de os partilhar entre os herdeiros necessários desde que respeite as quotas hereditárias definindo o bem a ser destinado a cada sucessor CC art 2014 E pode também gravar os bens da legítima com a cláusula de inalienabilidade impenhorabilidade e incomunicabilidade art 1848 Para tanto contudo deve externar as razões pelas quais está fazendo o gravame indicando por exemplo que considera o cônjuge da filha um perdulário ou receia que a mãe perca na mesa de jogo o que receber de herança Se o motivo alegado não tiver fundamento e se mostrar mera vingança do testador o juiz pode liberar o bem do gravame Também é cabível havendo justa causa a autorização judicial para a alienação dos bens gravados com subrogação do ônus naqueles em que se converter o produto da venda art 1848 2º 12 Sucessores testamentários Qualquer pessoa física ou jurídica em princípio pode ser nomeada testamentária não se exigindo que seja capaz Os menores e os incapazes assim como as fundações por organizar podem ser testamentários Aliás como já visto até mesmo quem ainda não foi concebido está legitimado também a receber bens do testador se a concepção ocorrer nos dois anos seguintes ao falecimento deste e vier a nascer com vida CC arts 1799 I e 1800 Algumas pessoas contudo pela participação que tiveram na elaboração da cédula mortuária ficam impedidas de receber bens em decorrência dela Aquele que a rogo do testador escreveu o testamento por exemplo não pode ser contemplado por nenhuma deixa Igualmente o cônjuge ou companheiro ascendentes e irmãos da pessoa incumbida de escrever a carta de últimas vontades não têm legitimidade para suceder o testador como testamentário CC art 1801 I A razão da vedação é fácil de perceber O testador se pediu a alguém para escrever a seu rogo o testamento provavelmente tinha dificuldades insuperáveis para fazêlo por si mesmo Podia ser que fosse analfabeto por exemplo Nesse caso o que escreve a carta mortuária a rogo poderia faltar à confiança nele depositada e beneficiarse ou a familiar seu com uma deixa não querida pelo testador Por razão semelhante o tabelião civil ou militar o comandante e o escrivão que colheu a manifestação de vontade do testador ou aprovou o testamento ficam igualmente excluídos da possibilidade de o sucederem como testamentários CC art 1801 IV Se eventualmente pudessem ser beneficiados pela disposição de última vontade faltarlhesia independência suficiente para a prática dos atos que por lei lhes competem Também as testemunhas do ato estão impedidas de receber por testamento CC art 1801 II Embora a participação delas não seja tão crucial como a de quem redige a disposição de última vontade ou a aprova as testemunhas poderão ser chamadas a juízo para relatar as circunstâncias em que o testador praticou o ato dependendo da modalidade de testamento elas serão chamadas inevitavelmente Ora para que possam depor livre e desinteressadamente convém que não sejam beneficiárias de nenhuma deixa Além dessas pessoas que de um modo ou de outro participam da confecção do testamento também não pode ser nomeado herdeiro ou legatário o concubino do testador casado a menos que o testador estivesse separado de fato do cônjuge sem culpa sua há mais de cinco anos CC art 1801 III Note que o sentido para a expressão concubino nesse dispositivo só pode ser o decorrente do art 1727 do CC isto é a pessoa com quem o testador mantinha relações não eventuais se havia impedimento para o casamento deles Qualquer disposição testamentária feita em favor dessas pessoas não legitimadas a receber herança ou legado por testamento é nula assim como são nulos os negócios indiretos feitos com o mesmo objetivo o contrato oneroso simulado compra e venda destinada apenas a acobertar uma doação e a interposição testar em favor de ascendente descendente irmão cônjuge ou companheiro do impedido Apenas a deixa feita em favor do filho do concubino que o seja também do testador é válida CC arts 1802 e 1803 Qualquer pessoa física ou jurídica pode ser em princípio nomeada herdeira ou legatária em testamento Estão porém impedidas de ser testamentárias as pessoas que participam do ato de testar como por exemplo as testemunhas escrivão ou quem escreveu o testamento a rogo do testador Também não pode ser testamentário o concubino do testador casado a menos que separado de fato há cinco anos ou mais Quem institui um menor seu herdeiro testamentário tem a faculdade de designar um curador de confiança para administrar os bens deixados CC art 1733 2º Pode ocorrer de o testador não confiar nos titulares do poder familiar pai ou mãe ou mesmo no tutor do menor a quem pretende beneficiar com o testamento Por considerálos perdulários ou desonestos pode recear que seus bens não sejam adequadamente administrados entre sua morte e a maioridade do testamentário trazendo a este prejuízos 2 O testamento O testamento é negócio jurídico solene unilateral e não receptício pelo qual o declarante manifesta a vontade acerca da destinação de seus bens após a morte podendo também dispor sobre alguns temas desprovidos de caráter patrimonial Em razão da classificação como negócio solene o testamento só é válido quando observadas estritamente as regras atinentes à forma e formalidades de sua elaboração Essas regras variam de acordo com a espécie de testamento subitem 21 Por ser unilateral e não receptício o testamento não depende para a sua constituição de outra vontade a não ser a do testador A vontade do testamentário não precisa com ela convergir para que o negócio jurídico exista validamente Tampouco é indispensável seu conhecimento do ato praticado Se ocorrer de o beneficiado pela deixa testamentária a recusar comprometese a plena eficácia do testamento que continua não obstante existente e válido No testamento em geral o testador cuida exclusivamente de questões patrimoniais definindo a destinação que pretende seja dada após sua morte aos bens Secundariamente o testamento pode ser o veículo de outras disposições de vontade de caráter não patrimonial como por exemplo a destinação do corpo para fins científicos ou altruísticos CC art 14 reconhecimento de filhos art 1609 III escolha de tutor art 1634 VI e reabilitação de sucessor indigno art 1818 Testamento é negócio jurídico solene unilateral e não receptício Assim só vale se observadas as formas e formalidades legais e independe para se constituir da convergência da vontade do testamentário ou da ciência deste O testamento é sempre o ato isolado do testador Na Alemanha admitese que os cônjuges testem em conjunto Veloso 2004125 mas na generalidade dos países de cultura jurídica enraizada no direito romano a pessoa só pode dispor para depois de sua morte por meio de instrumento no qual é a única testadora A proibição é decorrência da imoralidade dos contratos sobre herança de pessoa viva A conjugalidade confere ao testamento a natureza de um contrato A lei então proíbe o testamento conjuntivo ou em mão comum em suas três modalidades simultâneo em que os testadores dispõem no mesmo ato em favor de um mesmo beneficiário recíproco em que os testadores nomeiam um ao outro como testamentário ficando os bens do que falecer primeiro ao sobrevivente ou correspectivo em que cada testador faz suas deixas em contrapartida às do outro CC art 1863 21 Espécies de testamento As formas e formalidades do testamento correspondem à matéria jurídica de extrema importância Negócio jurídico solene terá a validade irremediavelmente comprometida ao menor descuido do testador e demais participantes do ato Os objetivos desse rigorismo extremado são os de conferir o maior grau de segurança possível à vontade do testador já que no momento de sua execução não terá mais como esclarecêla e chamarlhe a atenção para a importância do negócio jurídico que está praticando A lei classifica as formas do testamento em ordinárias e especiais As ordinárias compreendem o testamento público o cerrado e o particular as especiais o testamento marítimo aeronáutico e militar A relação é exaustiva já que não se admitem outros testamentos a não ser esses CC art 1887 As formas e formalidades variam de acordo com a espécie As formas ordinárias de testamento estão à disposição das pessoas em geral que não se encontram em situações que dificultem a manifestação da última vontade Já as formas especiais se destinam a atender os testadores surpreendidos em local que os impossibilita de formalizar seu testamento de modo ordinário Tanto assim que o testamento especial não terá eficácia se uma vez superada a circunstância que dificultava a elaboração do ordinário não se preocupou o testador em providenciálo Testamento público Este é a espécie mais utilizada de testamento O testador comparece a um Cartório de Notas e faz suas declarações perante o tabelião ou seu substituto legal O serviço notarial é da livre escolha do interessado independentemente da localização dos bens a testar ou de seu domicílio Lei n 893594 art 8º O tabelião assenta a declaração feita no livro de notas e lavra o instrumento que em seguida lerá em voz alta ao testador na presença de duas testemunhas Se o testador preferir ler o instrumento diretamente dispensase a leitura em voz alta pelo tabelião A leitura pelo testador contudo deve ser assistida pelas testemunhas e pelo oficial Finalmente o testador as testemunhas e o tabelião devem assinar o instrumento CC art 1864 III Se o testador não souber ou não puder assinar essa circunstância será declarada no instrumento pelo tabelião ou seu substituto legal e uma das testemunhas assinará o testamento a rogo do testador CC art 1865 Se o testador for inteiramente surdo lerá o instrumento a menos que seja também analfabeto hipótese em que designará alguém de sua confiança para o ler por ele na presença das testemunhas art 1866 O cego só pode testar por testamento público cuja leitura será feita em voz alta por duas vezes sendo uma delas pelo tabelião e a outra por pessoa de sua designação mencionandose o fato no instrumento art 1867 Testamento cerrado ou fechado Nessa espécie o testador redige o testamento de próprio punho ou por meio de outra pessoa a seu rogo e o assina Se preferir confeccionálo por processo mecânico datilografia ou processamento por microcomputador poderá fazêlo desde que autentique todas as folhas com sua rubrica ou assinatura Em seguida leva o documento pessoalmente ao Cartório de Notas para submetêlo à aprovação do tabelião A entrega do testamento ao tabelião deve ser feita na presença de duas testemunhas oportunidade em que o testador declarará que aquele documento contém suas disposições de última vontade e que deseja sua aprovação Diante disso o tabelião deve lavrar o auto de aprovação na presença de duas testemunhas lendoo em seguida em voz alta O auto de aprovação é redigido no instrumento apresentado ao tabelião imediatamente em seguida à última palavra escrita pelo testador Assinado o auto de aprovação pelos presentes o tabelião passa de imediato a cerrar e coser o instrumento aprovado Isto mesmo ele dobra as folhas do testamento ou as envelopa e as costura Aprovado e cerrado o testamento é entregue ao testador devendo o tabelião lançar em seu livro de notas o dia mês e ano em que ocorreu a aprovação e entrega do instrumento CC art 1874 Ao contrário do testamento público o conteúdo do cerrado somente será conhecido após o falecimento do testador Quem não quer que o conteúdo de seu testamento seja de conhecimento geral por temer a reação adversa dos familiares preteridos ou mesmo o desleixo dos lembrados deve obrigatoriamente se valer dessa espécie de testamento Só pode utilizar o testamento cerrado a pessoa alfabetizada CC art 1872 admitindose que o faça em qualquer língua e não somente em português art 1871 O surdomudo pode fazer testamento cerrado mas ao entregar o documento ao tabelião como não pode declarar em voz alta que nele se contém sua disposição de última vontade cuja aprovação requer deve escrever essa declaração de próprio punho na face externa do papel ou envelope art 1873 Testamento particular O testamento particular é escrito pelo testador de próprio punho ou por processo mecânico Em seguida ele deve ser lido por ele na presença de pelo menos três testemunhas Após a morte do testador é feito o registro do testamento em juízo com a citação dos herdeiros legítimos e ouvidas as testemunhas CC arts 1876 e 1877 Qualquer língua nacional ou estrangeira pode ser empregada na redação do testamento particular art 1880 Excepcionalmente o juiz poderá conferir validade ao testamento particular cujo instrumento não conta com a assinatura de testemunhas Imagine que alguém já havia contratado advogado para auxiliálo na celebração de testamento público ao qual já transmitira suas intenções mas estando sozinho começou a se sentir mal Redige então às pressas o testamento e vem de fato a morrer em seguida sem que ninguém testemunhasse a elaboração do documento São situações como estas que configuram a hipótese excepcional em que o juiz está autorizado a validar o papel assim assinado como sendo testamento particular válido CC art 1879 Testamento marítimo Se o testador está em viagem marítima em embarcação nacional poderá testar na presença do comandante e duas testemunhas O testamento que deverá atender aos requisitos do público ou do cerrado será registrado no diário de bordo e ficará em poder do comandante No primeiro porto nacional a que chegar deverá entregálo às autoridades administrativas CC arts 1888 e 1890 Não é admissível a adoção dessa espécie de testamento se o navio se encontrava em porto onde o testador pudesse desembarcar para testar por uma das maneiras ordinárias art 1892 Se o testador não morrer durante a viagem nem nos noventa dias seguintes ao desembarque em terra caduca o testamento Considerase que nesse caso por não ter aproveitado a oportunidade de formalizar sua disposição de última vontade por meio de testamento ordinário o testador não deseja mais que prevaleça o contido no documento lavrado na embarcação CC art 1891 Testamento aeronáutico À semelhança do marítimo o testamento aeronáutico é feito por quem se encontra em viagem Aqui o meio de transporte não é o navio mas o avião militar ou comercial CC art 1889 O comandante pode designar alguém tripulante ou passageiro para ouvir a declaração de última vontade já que não pode se desconcentrar de suas tarefas na condução do aparelho Também caduca o testamento se o testador não morrer na viagem e sobreviver ainda por mais noventa dias sem se interessar em ratificar seus termos por uma das formas ordinárias Os testamentos podem ser de forma ordinária ou especial São de forma ordinária o testamento público o cerrado e o particular e de forma especial o marítimo o aeronáutico e o militar Testamento militar Destinase esta espécie aos militares e demais pessoas a serviço das Forças Armadas quando se encontrem em campanha dentro ou fora do Brasil Se o testador souber e puder assinar sua declaração mortuária deve ser feita na presença de duas testemunhas caso contrário na de três devendo uma delas assinar o documento a rogo do testador CC art 1893 Se estiver empenhada em combate ou ferida poderá testar oralmente na presença de duas testemunhas mas o testamento assim feito não terá nenhum efeito se o declarante não morrer na guerra ou curarse do ferimento art 1896 e parágrafo único Se o oficial ou auditor a quem o testamento é entregue apuser nota em qualquer lugar do documento com a indicação do lugar dia mês e ano da apresentação assinandoa e colhendo a assinatura das testemunhas o testamento militar terá a mesma eficácia dos ordinários Se não se cumprir essa formalidade caducará o testamento se o testador vier a permanecer por pelo menos noventa dias seguidos em lugar em que possa testar de forma ordinária CC art 1895 22 Codicilos Codicilos são instrumentos de disposição de última vontade referente a assuntos de menor repercussão econômica Quando a pessoa deseja fixar instruções sobre seu enterro destinar esmolas ou legar bens móveis roupas ou joias de pouco valor não é necessário que o faça por testamento Basta que escreva suas instruções em documento datado e assinado para testar acerca desses assuntos CC art 1881 Uma cláusula de codicilo pode ser revogada também por codicilo isto é independentemente das formalidades do testamento Este também revogará o codicilo se for posterior e contiver disposição incompatível com as instruções anteriormente dadas art 1884 Se o testador quiser deixar em segredo enquanto viver as instruções feitas em codicilo poderá lacrálo Nesse caso ele deve ser aberto em juízo do mesmo modo que o testamento cerrado art 1885 23 Execução do testamento É condição para a execução do testamento o seu registro em juízo após a morte do testador A medida pode ser determinada pelo juiz de ofício ou a requerimento do testamenteiro de quem falo mais à frente ou de outro interessado como o herdeiro inventariante ou credor CC art 1979 O registro fazse por meio de procedimento de jurisdição voluntária cujo objetivo é a conferência pelo Poder Judiciário do atendimento dos requisitos formais do ato Outra finalidade do registro é o de deflagrar o prazo decadencial para a sua invalidação art 1859 Quando cerrado o testamento o registro também visa tornar conhecida a disposição de última vontade do testador até então recoberta pelo sigilo que ele entendeu conveniente conferirlhe O juiz ao receber o testamento cerrado e verificar que está intacto procede à sua abertura e manda que o escrivão o leia na presença de quem o levou lavrandose em seguida o termo correspondente Ouvido o representante do Ministério Público o juiz determinará o registro e cumprimento do testamento a menos que haja vício externo ou indício de nulidade ou falsidade CPC art 735 Se o testamento cerrado for aberto sem a observância dessas formalidades ele perde a validade e eficácia a menos óbvio que o rompimento da costura tenha ocorrido contra a vontade do testador por quem tinha o objetivo de frustrar a execução de suas disposições O registro do testamento público é o mais singelo porque se limita a conferir se o instrumento atende no plano formal aos requisitos da lei Pouca ou nenhuma dificuldade surge nessa conferência Sendo particular o testamento o juiz deve ouvir as testemunhas para que confirmem na sua presença a assinatura lançada no instrumento assim como a do testador Pelo menos uma das testemunhas deve estar viva ao tempo do registro e em condições para reconhecer a própria assinatura e a do testador para que o juiz determine o cumprimento do testamento CC art 1878 e parágrafo único Se todas estiverem mortas ou ausentes apenas em condições excepcionais poderá o juiz confirmar o instrumento que lhe for exibido art 1879 Os testamentos de forma especial que não puderem ser ratificados pelo testador por forma ordinária devem ser registrados como os particulares As testemunhas serão intimadas a comparecer em juízo para reconhecimento de suas firmas e da do testador Se o testamento é militar e tiver sido oral não haverá por óbvio instrumento a ser registrado mas o juiz tomará a oitiva das duas testemunhas que presenciaram a declaração do morto em combate Convencido da veracidade do depoimento determinará que se cumpra a disposição de última vontade do caído pela Pátria Registrado o testamento será intimado o testamenteiro a aceitar a testamentaria Se o testador não o houver nomeado ou se a pessoa por ele escolhida não puder ou não quiser assumir o encargo o juiz designará testamenteiro dativo CPC art 735 4º incumbindo então a testamentaria ao cônjuge supérstite e em sua falta a qualquer herdeiro legítimo ou testamentário CC art 1984 Depois da assinatura do termo de testamentaria pelo investido na função de testamenteiro cópia do testamento registrado é trasladada para os autos do inventário se já estiver tramitando O testamenteiro é a pessoa encarregada de dar cumprimento à disposição de última vontade contida no testamento a que serve No mais das vezes ele é escolhido pelo próprio testador que indicará o seu nome no testamento A substituição de testamenteiro pode ser feita por codicilo ainda que a nomeação tenha se dado em testamento CC art 1883 Ao testamenteiro incumbe de modo geral zelar para que a vontade do testador seja respeitada e que da execução do testamento resulte exatamente o pretendido pelo autor da sucessão Ele tem a obrigação não só de defender a validade do testamento se e quando questionada CC art 1981 como também a de cumprir as disposições testamentárias no prazo assinalado pelo testador ou em caso de omissão nos cento e oitenta dias seguintes à aceitação da testamentaria ou na prorrogação concedida pelo juiz arts 1980 e 1983 Deverá dar conta enfim de atribuições especificamente conferidas pelo testador como transmitir certa notícia a um familiar sobrevivo procurar reunir determinadas pessoas para assistirem à exibição de um filme gravado pelo autor do testamento etc art 1982 A posse e administração dos bens da herança podem ser da responsabilidade do testamenteiro se assim tiver determinado o testador sem herdeiro necessário CC art 1977 Se toda a herança tiver sido distribuída pelo testador em legados o testamenteiro será também o inventariante art 1990 a menos que haja herdeiros necessários Leite 2005709 O registro em juízo do testamento é condição para a sua válida execução que incumbe ao testamenteiro nomeado pelo testador ou dado pelo juiz Se o testamenteiro não for herdeiro nem legatário terá direito ao recebimento de um prêmio em contrapartida às funções que lhe foram cometidas chamado também de vintena O valor do prêmio será fixado pelo testador Em caso de omissão o juiz o determinará entre 1 e 5 da herança líquida CC art 1987 Havendo herdeiros necessários o prêmio será pago com a parte disponível da herança e sobre o seu valor apenas incidirá o percentual correspondente Diniz 2005 6287 O objetivo da restrição é proteger a legítima que poderia ser facilmente fraudada por meio da atribuição de elevado prêmio a quem se querendo por testamentário foi nomeado testamenteiro 24 Revogação e rompimento do testamento O testamento é um ato personalíssimo e pode ser alterado no todo ou em parte a qualquer momento pelo testador Ninguém titula nenhum direito sucessório por ter sido uma vez nomeado testamentário se o testador posteriormente mudou de opinião e resolveu dar destino diverso a seus bens Qualquer cláusula de um testamento pode ser revogada pelo testador exceto aquela em que se declarar pai de alguém O reconhecimento de paternidade é irrevogável e prevalece produzindo seus efeitos mesmo sendo revogado o testamento em que se abrigara CC art 1610 À exceção do reconhecimento de paternidade portanto qualquer outra disposição de vontade de conteúdo patrimonial por exemplo tornar inalienável bem da legítima ou extrapatrimonial nomeação de tutor pode ser revista alterada aprimorada limitada estendida desfeita suprimida etc A revogação compreende não só o ato de completa alteração da disposição de última vontade contida no testamento anterior como simples mudanças pontuais Em geral para que não restem dúvidas acerca de sua exata vontade quando não estiver mais aqui para esclarecêla o testador tem todo o interesse em refazer o testamento a cada vez que resolve modificálo por menor que seja a mudança pretendida Desse modo facilitase a compreensão de sua última vontade por estar ela toda contida no testamento de data mais recente De qualquer modo se o testador não fizer nenhuma referência expressa da vontade de alterar total ou parcialmente os testamentos anteriores consideramse vigentes as disposições neles contidas que não sejam incompatíveis com os posteriores CC art 1970 e parágrafo único Para que continuem valendo e tendo eficácia essas disposições o testador não precisa repetilas ou ratificálas expressamente no novo testamento bastando que sejam conciliáveis com as previstas neste documento Suponha que uma pessoa sem herdeiros necessários tinha uma casa e uma fazenda e que por seu primeiro testamento deixou a casa ao filho de um amigo Se posteriormente essa pessoa faz outro testamento apenas legando a fazenda a uma prima distante ele não revoga o anterior porque são compatíveis Claro está por outro lado que se o testador na segunda carta mortuária consigna a vontade de deixar a casa a essa prima operase a revogação do testamento anterior mesmo não havendo cláusula expressa nesse sentido A revogação do testamento veiculase por qualquer uma das formas pelas quais o ato pode ser praticado CC art 1969 Um testamento público pode ser revogado por um cerrado ou viceversa Para ter o efeito revogatório contudo o documento deve ser elaborado com a forma e formalidades da lei Caso contrário será inválido e portanto não terá o efeito desconstitutivo pretendido pelo testador Existe uma só exceção a essa regra em que é admissível a revogação de um testamento sem a elaboração de novo Tratase da inutilização do testamento cerrado Se o próprio testador abre os lacres ou rasga o documento ou ainda se consente que alguém o faça então se considera que a vontade dele era a de revogar o testamento cerrado CC art 1972 A invalidação da revogação pode estar relacionada à capacidade do testador de externar sua livre vontade a obediência à forma e formalidades do testamento revogador ou a vício de consentimento Se o testador não estava na plenitude de seu discernimento ao declarar a revogação da disposição anterior fora coagido a revogar ou se o fez por forma inadequada ou sem atendimento às formalidades exigidas pela lei a revogação não acontece Continua a prevalecer o último dos testamentos outorgados enquanto estava lúcido livre e declarou a vontade de modo formalmente impecável Qualquer outra causa que torne inválido ou ineficaz o testamento revogador não será suficiente para suprimir seus efeitos revogatórios Em outros termos se o testamentário indicado nele não era capaz para receber a deixa servira por exemplo de testemunha no ato a revogação remanesce íntegra se o novo beneficiado renunciar à herança ou legado que o testador lhe destinara nem por isso revigorase o testamento anterior se ocorrer qualquer outra hipótese de caducidade da nova disposição mortuária ela não terá o efeito de repristinar o testamento anterior Nessas situações privilegiase o atendimento à vontade do testador Mesmo tendo caducado o testamento revogador havia nele expressa a vontade de mudar a disposição mortuária pretérita não havendo motivos para desprezála É o que prevê a lei A revogação produzirá seus efeitos ainda quando o testamento que a encerra vier a caducar por exclusão incapacidade ou renúncia do herdeiro nele nomeado não valerá se o testamento revogatório for anulado por omissão ou infração de solenidades essenciais ou por vícios intrínsecos CC art 1971 O testador tem sempre a faculdade de revogar no todo ou em parte o testamento anteriormente outorgado desde que o faça atendendo às formas e formalidades da lei Apenas o reconhecimento de paternidade feito em testamento é insuscetível de revogação Diferese a revogação do rompimento do testamento aquela decorre da vontade expressa do testador e este diretamente da lei O rompimento se verifica com a superveniência de descendência ou em razão do desconhecimento da existência de herdeiros necessários CC arts 1973 e 1974 Revogação e rompimento têm os mesmos efeitos desconstitutivos da disposição de vontade outorgada pelo testador O testador sem descendentes nem outros herdeiros necessários provavelmente teria disposto sobre a destinação de seus bens de modo diverso se a situação fosse outra Eventualmente até mesmo não teria se preocupado em fazer testamento já que morrendo seus bens seriam destinados a familiares próximos Atenta a essa circunstância a lei determina o rompimento do testamento quando feito por quem não tinha descendência mas veio posteriormente a ter assim como por quem desconhecia a existência de herdeiros necessários Imagine que o testador desconhecia que era o genitor de um rapaz Engravidara na juventude uma moça que preferiu nunca lhe contar sobre o filho Não tinha outros herdeiros necessários e por isso testou a totalidade de seus bens para uma instituição de caridade Morreu sem saber que havia feito descendência Esse rapaz pode provando a relação biológica de filiação ingressar com a petição de herança na qual será declarado o rompimento do testamento Ainda nesse caso a lei está preocupada com o atendimento estrito à vontade do testador Presume que ele não deixaria ao desamparo o filho se soubesse de sua existência Veja que não é condição do rompimento do testamento o desconhecimento pelo testador da existência do descendente Em relação aos demais herdeiros necessários ascendentes e cônjuge ou companheiro o desconhecimento é requisito para que se rompa a carta mortuária Quer dizer o testador quando testou considerava que seu pai desaparecido num acidente no mar há alguns anos já estaria morto ignorando que ainda vivia ou que a esposa ausente não mais vivesse em razão de notícias recebidas nesse sentido Em relação à descendência contudo pode ocorrer o rompimento ainda que o testador em vida soubesse dela É o caso de quem ao testar não tinha filhos mas vem a têlos algum tempo depois Ainda não providenciou a revogação do testamento ou até mesmo dele se esqueceu A superveniência de descendente antes ou depois da morte do testador leva sempre ao rompimento do testamento Se o testador ainda quiser beneficiar o testamentário após a vinda da descendência até então inexistente deve renovar a declaração em nova cédula mortuária Rompese o testamento desconstituindose seus efeitos quando sobrevém ao testador descendência ou se existiam herdeiros necessários que ele desconhecia O art 1975 do CC é regra despicienda Ao afirmar que não se rompe o testamento quando o testador sabia da existência dos herdeiros necessários afirma o óbvio já que o rompimento tem por pressuposto a inexistência de descendentes ao tempo do testamento ou o desconhecimento da existência de herdeiros necessários Se eles existem e o testador ao testar sabe disso não é mesmo caso de rompimento Como acentuado pela tecnologia civilista o dispositivo apenas auxilia a discriminar as hipóteses de rompimento do testamento ou redução da disposição testamentária Se os herdeiros necessários eram desconhecidos do testador rompese o testamento se conhecidos reduzse eventual excesso à parte disponível da herança Veloso 2003385386 3 Disposições testamentárias No capítulo sobre as disposições testamentárias o Código Civil disciplina dois temas de direito das sucessões De um lado dedicase com afinco às normas destinadas à interpretação da última vontade do defunto subitem 31 de outro trata das condições de validade das cláusulas contidas no testamento subitem 32 Também nesse capítulo o Código entendeu oportuno tratar de assunto não exclusivo da sucessão testamentária que transcende as fronteiras do direito das sucessões para alcançar também o contratual e o real Refirome às limitaçõesencargos ao direito de propriedade isto é das cláusulas de inalienabilidade incomunicabilidade e impenhorabilidade que podem ser instituídas não só por testamento como por contratos gratuitos CC art 1911 e parágrafo único Delas tratei anteriormente razão pela qual não são aqui mencionadas Cap 43 subitem 32 31 Interpretação do testamento Cuidou o legislador de esmiuçar as normas de interpretação dos testamentos porque se trata de negócio jurídico unilateral cuja execução pressupõe a morte do declarante Não haverá portanto como se buscar a real intenção do sujeito de direito quando se procurar dar cumprimento à vontade dele Classifico para fins didáticos as regras de interpretação da lei em três categorias Regras gerais de interpretação A mais importante regra de interpretação do testamento está abrigada no art 1899 do CC e estabelece que em caso de divergência prevalecerá aquela que melhor assegure a observância da vontade do testador Desse modo comportando qualquer cláusula do testamento mais de uma interpretação o juiz deve procurar entender qual teria sido a vontade do testador Para tanto podese valer dos mesmos métodos de interpretação da lei tais como o lógico e o sistemático mas qualquer outro dado psicológico informação relevante ou fato da vida do testador que possibilite crer que sua vontade teria sido diversa deverá servir de elemento preponderante na interpretação do testamento Quer dizer se interpretado o documento de forma lógica chegarse a resultado inteiramente incompatível com traços de caráter do testador o dever de busca da verdadeira vontade deste cumprese privilegiando a interpretação compatível com as características pessoais do declarante e não com o raciocínio lógico Regras referentes à pessoa do testamentário O herdeiro ou legatário a quem o testador pretende beneficiar deve ser nomeado pelo testamento de forma precisa de modo que não gere dúvidas em relação à sua identidade Não se exige a qualificação civil do testamentário embora mencionála seja uma maneira segura de identificálo Admitese a referência apenas ao prenome do beneficiário desde que acompanhado de informações outras que assegurem a identificação por exemplo meu filho Antonio se só um dos filhos chamase assim ou os pais do meu esposo Benedito etc Em geral não é válida como se verá a disposição testamentária em favor de pessoa incerta cuja identidade não se pode averiguar O erro na designação da pessoa do herdeiro ou legatário importa a invalidação da deixa Se o testador pretendia beneficiar alguém mas se enganou ao identificálo indicando pessoa não existente ou que pode ser mais de uma não há como emprestar à declaração qualquer validade Contudo todo esforço deve ser feito para que a vontade do morto se concretize Assim o contexto do testamento outros documentos ou fatos inequívocos podem servir à identificação do testamentário que o testador tinha em mente ajudar CC art 1903 Se feita disposição genericamente em favor dos pobres dos estabelecimentos particulares de caridade ou os de assistência pública considerase que o testador pretendeu beneficiar os de seu último domicílio salvo se tiver indicado expressamente localidade diversa CC art 1902 Se o testamento não especificar a quem pretende beneficiar entre os estabelecimentos particulares ou públicos aqueles terão preferência sobre estes parágrafo único Regras referentes à quota testada ou ao legado Esperase que o testamento seja claro e indubitável na menção da deixa isto é na identificação da quota hereditária ou do legado que o testador pretende seja transmitido com sua morte respectivamente ao herdeiro ou legatário nomeado Em relação à quota hereditária se o testador tiver nomeado dois ou mais herdeiros sem especificar a parte cabível a cada um a partilha será feita entre eles de modo igual CC art 1904 Se testou 30 de sua herança a dois sobrinhos sem discriminar as quotas cada um terá direito a 15 Se a nomeação de alguns dos herdeiros tiver sido feita individualmente e de outros de forma coletiva estes últimos serão considerados um grupo com direito a quota igual à dos primeiros CC art 1905 Se o testamento destina toda a parte disponível a Carlos Darcy e aos filhos de Evaristo os dois primeiros ficam com um terço cada e os últimos dividem o terço restante Tendo sido destinados quinhões para alguns dos herdeiros mas não para todos o que remanescer da parte disponível depois da destinação das quotas especificadas será dividido igualmente entre os não aquinhoados com percentual específico CC art 1907 Desse modo constando do testamento a nomeação como herdeiros de Fabrício Germano e Hebe mas com a especificação apenas da quota do primeiro fixada em 40 da parte disponível os últimos ficam com 30 cada Caso a soma das quotas hereditárias dos testamentários não absorva toda a parte disponível da herança entendese que sobre o remanescente não quis o testador dispor Pertence então aos herdeiros legítimos a quota não destinada aos testamentários CC art 1906 O testamento deve identificar com clareza a pessoa do sucessor testamentário bem como sua quota hereditária ou legado Não tendo sido claro o testador normas legais de interpretação do documento auxiliam na observância de sua última vontade Quanto ao legado também invalida a disposição testamentária o erro na sua identificação desde que não existam outros elementos contexto do testamento outro documento ou fato inequívoco que permitam sua correção CC art 1903 Imagine que o testamento mencione como legado simplesmente meu apartamento quando o testador ao morrer deixara mais de um Em princípio a cláusula é inválida não tendo o legatário direito a qualquer um dos imóveis do falecido Mas se provar que na data do testamento o testador já era dono somente de um dos apartamentos deixados então será possível determinarse o legado Se o testador identificar o legado mas dele excluir expressamente um ou alguns objetos evidentemente o legatário não terá direito a eles CC art 1908 Ao legar uma casa o testador pode ressalvar que as obras de arte nela existentes não compõem o legado Essas obras de arte se não tiverem sido legadas a outro testamentário serão destinadas aos herdeiros do testador 32 Validade das cláusulas testamentárias São duas questões diferentes a validade do testamento e a de suas cláusulas Para ser válido o testamento deve ser feito por pessoa capaz que se encontre em seu pleno discernimento e observar as formas e formalidades legais Atendidos esses requisitos o primeiro subjetivo e o segundo objetivo o testamento é válido enquanto negócio jurídico Contudo um testamento válido pode conter cláusulas inválidas isto é de conteúdo contrário ao direito positivo O testador era capaz estava no seu pleno discernimento e foram observadas a forma e formalidades da lei mas em uma ou mais cláusulas ou até mesmo nelas todas ao dispor sobre seus bens ou matéria extrapatrimonial externou vontade incompatível com as prescrições da ordem jurídica Assim como o testamento válido pode abrigar disposições inválidas o inverso também se verifica Um testamento inválido pode ter cláusulas válidas e plenamente eficazes quando a invalidade decorrer de desatendimento de forma ou formalidade A nomeação de tutor por exemplo pode ser veiculada por qualquer instrumento autêntico e não só por testamento CC art 1729 parágrafo único Se marido e mulher num único instrumento nomeiam tutor para seus filhos dando instruções sobre a administração de alguns bens a declaração não pode ser considerada a de um testamento válido ainda que tenha sido este o nome dado ao documento A nomeação do tutor porém remanesce inteiramente válida porque poderia ter sido feita mesmo sem a observância da forma e formalidades do ato testamentário Também o reconhecimento de paternidade feito por meio de testamento inválido tem inteira validade e eficácia Já cláusulas como a de reabilitação do indigno ou deserdação têm sua validade comprometida sempre que inválido for o testamento porque só por este negócio jurídico podem ser veiculadas Veja que o testamento só pode ser invalidado no caso de incapacidade do testador carência de discernimento pleno ou inobservância de forma ou formalidade Quando o testador teve ao testar a vontade deturpada por erro dolo ou coação o testamento será válido na medida em que preenchidos esses requisitos Já a disposição testamentária maculada por qualquer um desses vícios será anulável A distinção é relevante porque variam os prazos de decadência do direito de pleitear a invalidação do testamento ou da disposição testamentária Enquanto no primeiro caso ele é de cinco anos contados do registro CC art 1859 no último é de quatro anos a partir do conhecimento do vício art 1909 e parágrafo único Quando o testamento é inválido todas as suas disposições também serão exceto as que podiam ser veiculadas por outro tipo de instrumento como a nomeação de tutor e o reconhecimento de paternidade Por outro lado o testamento pode ser válido mas conter disposições inválidas porque viciadas por erro dolo ou coação ou por contrariar o direito positivo Afora a hipótese de vício de consentimento por erro dolo ou coação a lei invalida as seguintes disposições testamentárias a delimitação no tempo do direito hereditário objeto de testamento considerandose não escrita qualquer cláusula que especifique termo inicial ou final o testador só pode fixálos para o caso de legados salvo no caso de substituição fideicomissária subitem 52 CC art 1898 b nomeação de herdeiro ou legatário sujeita à condição de que o nomeado também faça testamento em favor do testador ou de terceiro considerase imoral essa atitude captatória que a rigor corresponde a negócio sobre herança de pessoa viva art 1900 I c favorecimento de pessoa incerta a ser determinada por terceiro art 1900 III a menos que o testador indique duas ou mais para alguém por ele designado escolher como testamentário art 1901 I d atribuição ao próprio legatário ou a terceiro do direito de especificar o legado art 1900 IV exceto no caso de remuneração por serviços prestados ao testador em razão da moléstia da qual faleceu cujo valor poderá ser arbitrado por herdeiro ou outra pessoa art 1901 II e nomeação como testamentário de pessoa impedida como quem testemunhou o ato ou o concubino de testador casado art 1801 II e III 4 Legados Respeitados os direitos de herdeiros necessários se houver o testador pode destinar ao sucessor testamentário todo o seu patrimônio uma quota deste ou bens singulares Nos dois primeiros casos o testamentário é herdeiro e participa juntamente com os demais do condomínio hereditário instituído pela abertura da sucessão enquanto não ultimada a partilha No último caso ele é legatário Terá a propriedade dos bens legados desde a morte do testador mas não a sua posse CC art 1923 O legado continuará na posse do espólio para que se verifique se a sua destinação ao testamentário não prejudica os direitos de herdeiros necessários ou credores Constatada a inexistência de prejuízos dessa ordem os herdeiros entregam a coisa legada ao legatário Percebese portanto que o testamentário a quem se atribui um legado não é condômino da herança Sua posição na verdade é a de credor de uma obrigação de fazer imposta pelo testador aos seus herdeiros Uma obrigação que por estar condicionada à compatibilidade com os direitos de herdeiros necessários e credores não pode ser cumprida tão logo aberta a sucessão O pagamento do legado em suma é feito no transcorrer do inventário Se não houver herdeiros o cumprimento do legado cabe aos legatários na proporção do que recebem na sucessão salvo se o testador houver atribuído a incumbência ao testamenteiro ou a outra pessoa de sua escolha CC art 1934 Não é devido o pagamento do legado enquanto as partes litigam sobre a validade do testamento se pende condição ou ainda não venceu o termo inicial fixado pelo testador CC art 1924 Desse modo se a validade da cédula mortuária é questionada judicialmente o espólio só estará em mora se uma vez julgado válido o legado deixar de entregálo após o fim da ação Igualmente não há mora se o legatário deve cumprir um encargo para que surja o direito sucessório por exemplo formarse em curso superior até certa idade transigir numa demanda contra familiar do testador etc enquanto não o fizer ou se certa condição ainda não ocorreu Finalmente enquanto não transcorrer o prazo fixado pelo testamento como termo inicial do direito ao legado igualmente não estará em mora o espólio O legado em geral alcança bem que na data da abertura da sucessão era da propriedade do testador a exceção diz respeito ao legado de coisa alheia subitem 42 Se o objeto do legado existira mas se perdera é impossível sua entrega se havia sido alienado não pode mais ser entregue porque nesse caso ocorreria transmissão a non domino Se o proprietário de uma casa por meio de testamento deixoua por legado a um sobrinho mas no ano seguinte precisando de dinheiro para custear seu tratamento de saúde precisou vendêla é ineficaz essa disposição de última vontade Os herdeiros não têm como entregar ao legatário um bem que não mais integra a herança mas o patrimônio alheio Se o bem na abertura da sucessão pertencia apenas em parte ao testador a ineficácia será parcial Se aquele proprietário necessitado vendera a metade ideal da casa ao irmão remanesce eficaz o legado feito ao sobrinho relativamente à outra metade Em geral o legado consiste no direito sucessório singular sobre coisa de propriedade do testador O espólio é obrigado a entregála ao legatário a menos que isso implique prejuízo aos direitos dos herdeiros necessários ou de credores Correm por conta exclusiva do legatário todos os riscos sobre o legado a partir da abertura da sucessão Como é dele já a propriedade da coisa desde então vindo a perecer ou se deteriorar cabelhe suportar as consequências Também são do legatário as despesas com o pagamento do legado Apenas estará livre dos riscos e despesas se o testamento expressamente estipular nesse sentido CC art 1936 Notese porém que a propriedade do legatário é resolúvel Se o pagamento do legado prejudicar a legítima ou privar o espólio de recursos para o atendimento a direito de credor o legatário terá o direito de propriedade resolvido Nesse caso não será responsável pelos riscos da coisa nem por despesas a ela correspondentes tendo o direito ao ressarcimento daquelas em que incorreu na expectativa de vir a adquirila 41 Regras sobre determinadas hipóteses de legado Legado de coisa incerta O legado a rigor definese por exclusão como o direito sucessório não universal isto é não referente a patrimônio ou quota dele Na maioria das vezes recai sobre coisa certa mas isso não significa a impossibilidade de se destinar ao legatário coisa incerta definida apenas pelo gênero qualidade e quantidade O testador pode deixar ao testamentário cem cabeças de gado nelore por exemplo Apesar da deixa de coisa incerta será a transmissão singular também nesse caso e portanto legado No legado de coisa incerta mesmo que ela não se encontre no patrimônio do testador ao tempo de sua morte os herdeiros terão a obrigação de entregála ao legatário Com recursos da herança devem adquirir a coisa no mercado para transmitila ao testamentário Quando o legado diz respeito a coisa certa se ela não existe mais ou não chegou a existir nunca existiu no patrimônio do testador dáse como visto a ineficácia da disposição de última vontade Mas como o gênero não perece uma vez legada coisa incerta o legatário terá direito de recebêla mesmo que o testador não a tivesse em seu patrimônio CC art 1915 A concentração isto é a individualização da coisa a ser entregue ao legatário Cap 14 subitem 24 caberá ao herdeiro que é o devedor da obrigação Ele não poderá escolher contudo a pior nem estará obrigado a entregar a melhor devendo guardar o meiotermo CC arts 244 e 1929 Esses mesmos critérios devem ser utilizados pelo juiz ou terceiro a quem couber proceder à concentração art 1930 Se o testador expressamente atribuiu ao testamentário o direito de escolha ele poderá exigir a coisa melhor dentre as contidas na herança art 1931 Não tendo o autor da sucessão deixado em seu patrimônio nenhuma coisa das indicadas pelo gênero qualidade e quantidade no legado o legatário terá que se contentar com a mediana Se o herdeiro ou legatário a quem couber o direito de escolha falecer antes da concentração seus sucessores passam a titularizálo CC art 1933 Legado alternativo Querendo o testador legar a alguém uma de duas ou mais coisas certas a concentração será feita após o seu falecimento Não se confunde com o legado de coisa incerta porque no alternativo os bens estão sempre determinados individuados Consistindo por exemplo a deixa num apartamento ou numa casa do patrimônio do testador o legatário receberá um dos imóveis A escolha será feita por quem o próprio testador indicar Em caso de omissão cabe ao herdeiro escolher o bem a ser legado CC art 1932 Perecendo uma das coisas legadas alternativamente subsiste o direito quanto à outra e se for o caso à parte preservada da perdida art 1940 No legado alternativo também se transmite aos herdeiros o direito de escolha não exercido em vida pelo legatário Legado de coisa a ser retirada em determinado lugar Se o testador destinou ao testamentário uma coisa certa mencionando em testamento que ela se encontrava num determinado lugar será ineficaz a deixa se após a morte do testador ela não mais estiver lá Imagine que o testamento legava a uma pessoa todo o dinheiro de um cofre bancário chegando até mesmo a estimarlhe o valor Se aberto o cofre não se encontra nele guardado nenhum dinheiro o legado não será eficaz CC art 1917 A norma de ineficácia porém não incide se a remoção do bem legado tiver sido transitória Se o testador legou todo o mobiliário de uma casa ao testamentário mas na data da abertura da sucessão ele não se encontrava no imóvel porque estavam sendo realizadas reformas no local em função das quais a mobília havia sido guardada num depósito a transitoriedade da remoção confere eficácia ao legado O legatário tem direito à mobília O que interessa aferir nesse caso é o ânimo do testador ao remover o bem do local indicado no testamento Se o fez com ânimo definitivo revogou o legado se provisório manteve a vontade de beneficiar o legatário Rodrigues 2003 7203205 Legado de crédito O testador pode destinar ao legatário um crédito por ele titularizado perante terceiros Neste caso os herdeiros devem transferir ao testamentário os títulos de dívida correspondentes CC art 1918 1º Se os créditos legados estavam documentados em contratos os instrumentos contratuais devem ser entregues ao testamentário Documentados os créditos em nota promissória letra de câmbio ou outros títulos cambiais a entrega da cártula deve também ser feita mas se o testador não a houvera endossado em vida o legatário não terá acesso à execução por força do princípio da literalidade dos direitos cambiários Para haver seu crédito nesse caso o legatário deverá mover contra o devedor do título a ação de conhecimento provando o seu direito com a exibição do título de crédito e do testamento A eficácia do legado de crédito limitase ao direito creditório do testador titulado na data da abertura da sucessão Se o devedor já havia pago parte da obrigação o legatário só terá direito ao crédito correspondente ao saldo em aberto CC art 1918 Legado de quitação de dívida O legado pode consistir na quitação de dívida do legatário perante o testador Também a sua eficácia está limitada ao valor da obrigação na época da morte deste CC art 1918 Se entre a data do testamento e a do falecimento foi paga a dívida ou parte dela o legatário não terá direito de reclamar do espólio a restituição do que pagou As dívidas posteriores ao falecimento também não são alcançadas pelo legado Legado em favor de credor Quando o testador beneficia com legado alguém a quem deve não se considera que esteja com isso pagando a dívida Para que tenha o efeito de quitar a obrigação o legado deve ser deixado sob essa condição expressa Se o legatário achar que lhe convém aceita o legado no lugar do pagamento mas se considerar desinteressante essa alternativa renuncia ao legado e cobra o espólio A natureza compensatória do legado em outros termos depende de expressa previsão no testamento CC art 1919 Em sua falta considerase que o testador quis beneficiar o testamentário com a deixa sem prejuízo do pagamento do crédito a que fazia jus Legado de alimentos Se o legado consistia em alimentos os herdeiros devem prover o legatário do necessário ao sustento saúde vestuário e moradia deste durante toda sua vida bem como à sua educação enquanto for menor CC art 1920 Evidentemente esse legado não pode ultrapassar as forças da herança ou se existirem herdeiros necessários as da parte disponível dela Se os alimentos devem ser pagos periodicamente os herdeiros são obrigados a entregar o legado no termo inicial do período a menos que o testador tenha estabelecido de outro modo CC art 1928 parágrafo único Legado de usufruto Pode o legado atribuir ao legatário não a propriedade de um bem mas o seu usufruto Cap 48 item 3 Nesse caso o direito real sobre a coisa alheia perdurará por toda a vida do legatário a menos que o testamento estabeleça outro limite temporal CC art 1921 Legado de imóvel Quem deixa legado de imóvel e depois adquire novas áreas contíguas deve esclarecer no testamento se ao falecer também as estará destinando ao legatário ou não Em caso de omissão a lei considera que o aumento do bem não está abrangido no legado CC art 1922 Em relação às benfeitorias necessárias úteis ou voluptuárias a presunção se inverte incorporam se ao legado a menos que o testador tenha disposto de modo diverso Legado de dinheiro Se o objeto do legado é dinheiro os juros só vencem a partir da constituição em mora do espólio CC art 1925 Esta não se verifica como já acentuado enquanto se litiga sobre a validade do testamento na pendência de condição ou termo Mas se o dinheiro deve ser entregue ao legatário a título de renda vitalícia ou pensão periódica considerase o termo inicial da obrigação a data da morte do testador art 1926 a menos que ele tenha disposto de outra maneira Legado em prestações periódicas Se o legado consistir na entrega periódica de dinheiro ou outra coisa o período definido pelo testador se inicia com sua morte O legatário fará jus ao recebimento da prestação no termo final do período não podendo exigila antes Mas se falecer no transcurso de um período os herdeiros do testador ficam obrigados a pagálo por inteiro aos sucessores do testamentário CC arts 1927 e 1928 Assim se o legado consistia no pagamento de certa quantia de dinheiro a cada ano em favor do legatário enquanto este viver os herdeiros do testador estão obrigados ao pagamento no mesmo dia da morte deste que recair nos anos seguintes até o daquele em que falecer o credor Essas regras claro aplicamse no caso de o testador não ter estabelecido critério diverso Legado com encargo Se o testador limitar sua liberalidade sujeitando o legado a encargo o direito sucessório do legatário depende para se constituir do cumprimento deste Se por exemplo fixou que o testamentário deveria parar de fumar ou mudarse para determinada cidade enquanto nela residissem seus pais o legado só será devido na medida em que o encargo se cumpra Aos legados com encargo aplicamse as normas da doação gravada CC art 1938 Cap 32 item 2 42 Legado de coisa alheia Em geral o legado consiste em direito sucessório que tem por objeto bem da propriedade do testador Contempla a lei contudo a hipótese em que ele estabelece como legado a entrega ao legatário de um bem da propriedade de herdeiro ou outro legatário Tratase de um anacronismo inimaginável que o direito brasileiro continua a contemplar como se o modelo predominante de organização familiar fosse a tradicional em que o pai tinha amplos poderes sobre os filhos Na aplicação das normas sobre legado de coisa alheia portanto cabe ao juiz sempre verificar a razoabilidade da disposição testamentária Se não houver racionalidade econômica na vontade externada pelo defunto no sentido de assegurar efetiva vantagem para o herdeiro ou legatário ao qual imputou a obrigação de pagar o legado a disposição deve ser considerada inválida em vista da forma contemporânea de organização da família Ao legar coisa alheia a rigor o testador fixa as condições para o exercício dos direitos sucessórios do devedor do legado Tanto assim que se o obrigado não fizer a entrega considerase que renunciou à herança ou legado a que faria jus na condição de herdeiro legítimo ou testamentário ou de legatário CC art 1913 Suponha que Irene tem um filho João que é seu único familiar sucessível Ela possui vasto patrimônio enquanto João é dono de um apartamento somente Ao testar Irene dispõe que João deve entregar a Luiz seu apartamento a título de legado Nesse caso João tem o seu direito sucessório de herdeiro condicionado ao pagamento do legado em favor de Luiz Se faz esse pagamento sucede Irene na totalidade do patrimônio da mãe se opta por continuar mantendo o apartamento renuncia à herança que se torna no meu exemplo jacente No caso de o legado consistir na entrega de bem de propriedade de herdeiro o obrigado a cumprilo poderá regredir contra os demais para que as quotas hereditárias correspondam ao direito sucessório de cada um deles CC art 1935 Se no exemplo acima Irene tivesse deixado também um cônjuge Marco com quem era casada em regime de participação final nos aquestos na divisão da herança entre ela e João o valor do apartamento entregue a Luiz deve ser computado para que no final o obrigado ao legado não fique prejudicado João em suma pode cobrar de Marco metade do valor do apartamento já que a quota hereditária dela corresponde a esse percentual O testador pode estabelecer que o legado será pago por um de seus sucessores herdeiro ou legatário mediante a entrega ao beneficiário da deixa testamentária de bem da propriedade deles e não do autor da sucessão Nesse caso se o sucessor ao qual foi imputada a obrigação de pagar o legado não o fizer considerase que renunciou ao seu direito na sucessão do testador No legado de coisa alheia o devedor não é o espólio mas o herdeiro ou legatário ou herdeiros ou legatários a quem o testador incumbiu de dispor de bem de sua propriedade Pode se referir a qualquer objeto suscetível de transmissão via legado como crédito quitação de dívida usufruto etc 43 Caducidade do legado O direito sucessório ao legado não se constitui ou é resolvido nas hipóteses de caducidade Lista a lei as seguintes a a modificação pelo testador da coisa legada a ponto de subtrairlhe a forma original por exemplo se o testamento menciona joias em ouro mas o testador as derreteu para empregar o material em restaurações dentárias b a alienação do bem legado a qualquer título no todo ou em parte limitandose a caducidade nesse último caso à porção alienada c por perecimento ou evicção da coisa ocorrida antes ou depois do falecimento do testador a menos que a culpa tenha sido do herdeiro obrigado a entregar o legado d exclusão do legatário por indignidade e falecimento do legatário antes do testador ressalvada a hipótese de substituição testamentária CC art 1939 5 Substituições A liberdade para alguém dispor sobre seus bens após a morte é bastante larga no direito brasileiro Esbarra apenas em algumas limitações como o direito à legítima dos herdeiros necessários Em decorrência da ampla liberdade que titula o testador pode dispor inclusive sobre a destinação de seus bens para o caso do falecimento do testamentário Corresponde a essa prerrogativa o instituto das substituições que pode ser vulgar recíproca subitem 51 ou fideicomissária subitem 52 Se não for dado substituto ao herdeiro ou legatário nomeado em testamento a porção correspondente acrescerá à quota de outro sucessor subitem 53 51 Substituição vulgar e recíproca Na substituição vulgar e recíproca o testador disciplina a destinação de seus bens no caso de o testamentário vir a falecer antes dele Relembrese que estar vivo ao tempo da abertura da sucessão é condição essencial para a titularidade do direito sucessório Desse modo se o testamentário falece antes do testador ele nada recebe e consequentemente nada transmite aos seus sucessores A parte a ele destinada em testamento será acrescida à quota hereditária dos demais Considere que Nair que tem seu irmão Orlando como único familiar sucessível declara em testamento Nomeio meu herdeiro universal Quirino Nair nada dispôs sobre a eventual substituição de Quirino Em ocorrendo de o herdeiro testamentário falecer antes do testador como não há substituto nomeado a herança será toda do legítimo no caso Orlando Se Nair quisesse evitar essa consequência poderia indicar como substitutos de Quirino por exemplo os sucessores dele mediante cláusula aliás bastante comum nos instrumentos testamentários de substituição redigida como a seguinte Nomeio meu herdeiro universal Quirino ou se falecido for seus sucessores A substituição terá lugar tanto na hipótese de o testamentário não poder aceitar a herança ou legado porque morreu ou foi declarado indigno como na de ele renunciar As duas alternativas induzem à substituição indicada pelo testador ainda que ele se refira a uma delas somente CC art 1947 in fine No exemplo acima malgrado o testamento diga respeito unicamente à pré morte do testamentário também os sucessores deste entrarão como seu substituto nas hipóteses de indignidade ou renúncia Salvo claro se a testadora expressamente excluiu uma delas da substituição que pretendia fazer A substituição pode ser recíproca vale dizer mediante a indicação pelo testador de dois ou mais cotestamentários que se substituem no caso de qualquer um deles não puder ou não quiser a herança ou legado Sendo igual a porção reservada pelo testador a cada substituto não há maiores dificuldades na mensuração das respectivas quotas Sendo desiguais contudo considera se que a proporção fixada na primeira disposição mantémse no caso de substituição Se um dos herdeiros tinha sido contemplado com metade da herança e os outros dois com um quarto cada vindo um desses últimos a ser excluído ou renunciar à sucessão a quota dele é distribuída desigualmente entre os substitutos o primeiro recebe dois terços e o outro o terço restante Assim é feito para que se mantenha a proporção inicialmente querida pelo testador Se for desejo dele que a substituição se faça nessa hipótese de modo diverso deverá prever expressamente a nova proporção entre as porções hereditárias Na substituição vulgar o testador indica quem ele deseja beneficiar no caso de o testamentário vir a falecer antes dele ou por qualquer outra razão não puder ou não quiser receber a herança ou legado Na substituição recíproca os testamentários são substitutos uns dos outros Na substituição vulgar ou recíproca não há limites à designação de substitutos O testador pode nomear quantos quiser fixando as regras em que um sucede no lugar de outro bem como as situações em que terá lugar a reciprocidade Mas independentemente da quantidade de substitutos indicados nenhum deles titula qualquer direito sucessório se o herdeiro ou legatário a quem caberia substituir tem capacidade para suceder ou seja está vivo ao tempo da abertura da sucessão e não foi dela excluído por indignidade ou deserdação Pereira 1974198200 52 Substituição fideicomissária Na substituição fideicomissária o testador define a destinação de seu bens no caso de o testamentário falecer depois dele Em outros termos ele escolhe dois testamentários um para sucedêlo logo em seguida denominado fiduciário e outro fideicomissário para suceder ao primeiro A doutrina se preocupa em acentuar a simultaneidade dos direitos sucessórios do fiduciário e do fideicomissário malgrado eles sejam chamados sucessivamente a titular o bem ou bens testados isto porque o fiduciário titula a propriedade sujeita a condição resolutiva ao falecer o bem testado deixa de integrar seu patrimônio transmissível e o fideicomissário a condição suspensiva só adquire a propriedade do bem testado após a morte do testamentário substituível Gomes 1970213214 Diversas limitações foram estabelecidas nessa específica hipótese do direito de testar O testador não pode dispor sobre a destinação de seus bens para o caso da morte do fideicomissário isto é a lei reputa nulo o fideicomisso além do segundo grau CC art 1959 porque não pode a vontade do proprietário perdurar por muito tempo além da sua morte Não tem por outro lado liberdade total para escolher qualquer pessoa para ser fideicomissária Ao contrário para que tenha plena eficácia a substituição fiduciária somente as pessoas ainda não concebidas ao tempo da morte do testador podem ser nomeadas substitutas Isto porque se o fideicomissário já havia nascido quando aberta a sucessão do testador ele passa a titular a propriedade do bem testado enquanto ao fiduciário é atribuído o seu usufruto vitalício art 1952 parágrafo único Quando no passamento do testador é vivo o fiduciário e ainda não nasceu o fideicomissário o primeiro passa a titular a propriedade resolúvel da herança ou legado CC art 1953 Na morte do fiduciário os bens correspondentes à substituição fideicomissária são transmitidos não aos sucessores dele mas sim ao fideicomissário se ainda está vivo Se o fideicomissário não chegou a nascer com vida ou faleceu antes do fiduciário a propriedade dos bens testados consolidase em mãos deste último em razão da caducidade do fideicomisso CC art 1958 aqui morrendo o fiduciário os bens se transmitem aos sucessores dele e não aos do fideicomissário Também caduca o fideicomisso consolidandose a propriedade dos bens testados no patrimônio do fiduciário na hipótese de o fideicomissário renunciar à herança ou legado CC art 1955 Somente não se dará a consolidação da propriedade nesse caso se o testador houver disciplinado a hipótese de modo diferente no testamento prevendo por exemplo outra regra de substituição Na substituição fideicomissária o testador estabelece que na morte do primeiro testamentário fiduciário os bens não serão destinados aos respectivos sucessores mas sim a outra pessoa fideicomissário Enquanto tem a propriedade resolúvel dos bens testados o fiduciário responde por sua integridade Se o fideicomissário exigir a qualquer tempo o fiduciário é obrigado a prestar caução que garanta o exercício pelo primeiro do direito sucessório que titulariza Se no final for transmitido ao fideicomissário bem deteriorado ele terá direito de cobrar indenização dos sucessores do fiduciário 53 Direito de acrescer Se o testamentário não puder ou não quiser receber a herança ou legado que o testador lhe conferiu e não houver substituto nomeado sobre a porção correspondente passam a titular direito sucessório os herdeiros legítimos É o direito de acrescer Claro que havendo substituto designado pelo testador o bem ou bens anteriormente destinados ao testamentário substituído não se acrescem à quota hereditária dos legítimos mas são transmitidos ao nomeado em substituição Também têm direito de acrescer os herdeiros testamentários quando tiverem sido nomeados no mesmo testamento mas sem atribuição de quotas determinadas CC arts 1941 e 1943 O testador pode por exemplo ter declarado apenas que deixava toda a parte disponível da herança para Rubens Sofia e Teresa sem nada mais especificar Nesse caso considerase que caberá um terço do testado a cada um deles Vindo porém Rubens a não aceitar a herança ou ser dela excluído por prémorte indignidade ou deserdação seu terço será dividido entre Sofia e Teresa Aqui o direito de acrescer é dos testamentários porque o testamento não determinou que quota caberia a cada um deles Note que se tivesse o testador declarado que deixava metade da parte disponível da herança para Rubens três oitavos para Sofia e um oitavo para Teresa os titulares do direito de acrescer seriam diversos na exclusão ou renúncia de qualquer um deles Nesses casos passariam a titularizálo os herdeiros legítimos do testador CC art 1944 Quer dizer a porção de Rubens não seria acrescida à de Sofia e Teresa mas sim à dos herdeiros legítimos a menos que o testador tivesse nomeado algum substituto Também têm direito de acrescer os colegatários nomeados conjuntamente a respeito de uma única coisa Se no exemplo anterior ao invés de herdarem um terço da parte disponível da herança Rubens Sofia e Teresa tivessem sido nomeados legatários de uma fazenda agrícola a exclusão ou renúncia de qualquer um deles importaria o acréscimo da porção correspondente aos demais Igual acréscimo ocorreria no caso de os colegatários não terem sido nomeados conjuntamente mas o bem a eles destinado em condomínio não puder ser repartido sem risco de desvalorização CC arts 1942 e 1943 Quando o colegatário não tiver direito de acrescer titularizáloão os herdeiros legítimos no legado de coisa própria no de coisa alheia o direito de acrescer cabe ao sucessor ao qual tinha sido imputada a obrigação de prestar o legado CC art 1944 parágrafo único No legado de usufruto as regras são semelhantes Se o testador legou aos testamentários o usufruto de certo bem sem fixar a quota cabível a cada um é deles o direito de acrescer inclusive no falecimento do cousufrutuário Mas tendo sido estabelecida pelo testamento a quota de cada legatário no usufruto o direito de acrescer é dos herdeiros legítimos em cujas mãos consolidase sucessivamente a propriedade do bem gravado de acordo com a quota do excluído renunciante ou falecido CC art 1946 e parágrafo único desta edição 2020 O direito de acrescer beneficia o herdeiro legítimo sempre que o testamentário não puder ou não quiser aceitar sua herança ou legado e o testador não tiver nomeado substituto Beneficia o cotestamentário no entanto se não foi discriminada no testamento a quota cabível a cada um na herança ou legado O titular do direito de acrescer não pode renunciar exclusivamente ao acréscimo exceto se for testamentário e não lhe convier cumprir o encargo correspondente estabelecido pelo testador Ocorrendo a renúncia ao acréscimo nesse caso ele se transmite à pessoa em favor de quem o encargo tiver sido instituído CC art 1945 Não havendo ninguém nessa situação o direito de acrescer é dos herdeiros legítimos 6 Redução das disposições testamentárias Como reiterado o testador com herdeiros necessários só pode dispor em testamento da parte disponível da herança isto é metade de seu patrimônio Se na data da abertura da sucessão ocorrer de o valor do bem ou bens testados ultrapassar a parte disponível é necessário procederse à redução das disposições testamentárias para que a legítima seja preservada A razão pela qual deuse o excesso é irrelevante o testador descuidouse ou testou conscientemente além do permitido teve seu patrimônio reduzido depois do testamento com perda ou alienação de bens indisponíveis valorizouse em demasia a parte testada etc Em nada importa o motivo pelo qual o cumprimento do testamento tal como contido em suas disposições levaria ao comprometimento total ou parcial da legítima Se isso acontece as disposições devem ser revistas reduzidas para preservação dos direitos dos herdeiros necessários Para fins de redução estabeleceu a lei uma hierarquia entre os sucessores testamentários Em primeiro lugar reduzemse as quotas dos herdeiros nomeados em testamento Se essa redução for insuficiente para preservação da legítima reduzemse os legados CC art 1967 1º A redução dos direitos sucessórios dos herdeiros e legatários é feita sempre de modo proporcional Se o legado sujeito à redução consistir num prédio será feita sua divisão para atribuição da quota cabível ao herdeiro necessário Se o bem não comportar divisão cômoda e o excesso for de até um quarto do valor do bem o legatário ficará com o prédio todo pagando aos herdeiros necessários o excedente se o excesso for maior de um quarto o legatário perderá o prédio inteiro aos herdeiros mas poderá cobrar deles o valor que lhe cabia na sucessão CC art 1968 1º Se o legatário for também herdeiro necessário terá a preferência para inteirar sua parte na legítima no mesmo imóvel se essa for uma solução matematicamente adequada para redução 2º 2020 02 13 PÁGINA RB111 Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 OITAVA PARTE DIREITO DAS SUCESSÕES CAPÍTULO 65 INVENTÁRIO E PARTILHA Capítulo 65 Inventário e Partilha 1 Dissolução do condomínio hereditário Em razão do princípio da saisine tão logo ocorra o passamento de alguém os seus herdeiros passam a titular a propriedade e a posse dos bens deixados em regime de condomínio Tratase de um condomínio especial regido também por regras do direito das sucessões uma das quais estabelece que sua dissolução deve ser feita necessariamente e o quanto antes Ainda que seja um só o herdeiro a se apresentar deve ser instaurado o processo judicial ou feita a escritura pública de inventário O objetivo do processo judicial é possibilitar que outros interessados fora os herdeiros possam exercer seus direitos tais como os credores do falecido ou mesmo sucessores desconhecidos No direito brasileiro a transmissão causa mortis extrajudicial quer dizer que prescinda de ação judicial introduzida em 2007 é possível apenas quando o autor da herança não deixou testamento e não há interessados incapazes Ela é admissível por opção dos interessados mesmo que o espólio tenha dívidas devendo nesse caso os herdeiros honrálas no limite do valor dos bens herdados O processo judicial de dissolução do condomínio hereditário denominase inventário e em alguns casos arrolamento Sua tramitação é objeto de estudo do direito processual civil interessando por isso aqui apenas os aspectos gerais da matéria Os objetivos do inventário são quatro a definir a herança estabelecendo quais são os bens deixados pelo de cujus e quais os que devem ser assim considerados itens 2 e 3 b proceder à satisfação das dívidas deixadas pelo falecido item 4 bem como ao pagamento do imposto incidente sobre a transmissão causa mortis c fazer o pagamento dos legados se o falecido instituiu legatário bem como cumpriremse as demais disposições de última vontade d partilhar o acervo remanescente entre os herdeiros item 5 O condomínio que a sucessão instala entre os herdeiros denominase espólio Tratase de um sujeito de direito despersonalizado cuja principal função é a de aglutinar os interesses convergentes dos herdeiros enquanto persiste a copropriedade sobre os bens objeto de herança No processo de inventário será nomeada pelo juiz uma pessoa encarregada de administrar esses bens e representar o espólio É o inventariante cujas funções se iniciam com a assinatura do termo de compromisso e perduram até a homologação da partilha CC art 1991 salvo se antes disso falecer for substituído ou removido No mais das vezes a inventariança é atribuída ao cônjuge ou companheiro sobrevivente este último se estivesse convivendo com o falecido ou na falta destes ao herdeiro do de cujus que se encontra na posse e administração dos bens a inventariar Na falta deles seguese a ordem de preferência legalmente estabelecida CPC art 617 Depois da partilha judicial ou extrajudicial desaparece o condomínio entre os herdeiros Cada um passa a ser o proprietário dos bens que lhe foram destinados na sucessão por força da lei ou da vontade do falecido O direito de cada herdeiro como dita a lei fica circunscrito aos bens do respectivo quinhão CC art 2023 Mas em caso de evicção que venha a atingir os interesses de um dos herdeiros mesmo depois da partilha os demais são obrigados a indenizálo proporcionalmente aos respectivos quinhões arts 2024 e 2026 Deste modo se anos após a partilha descobrese que o falecido havia por testamento deixado um certo bem como legado o testamentário poderá reivindicálo do herdeiro para quem o bem foi destinado Este porém perdendo seu quinhão ou parte dele terá direito de repartir o prejuízo entre os demais sucessores hereditários reclamando deles a indenização correspondente A perda do bem herdado em razão de evicção não será ressarcível pelos demais herdeiros se havia convenção entre eles dispondo em sentido diverso se o próprio evicto tinha sido o culpado da evicção ou no caso de derivar esta de fato posterior à partilha CC art 2025 O condomínio instituído entre os herdeiros com a abertura da sucessão é denominado espólio e deve ser dissolvido necessariamente A dissolução fazse em regra por meio judicial ou seja pelo processo de inventário A transmissão mortis causa extrajudicial fazse mediante escritura pública mas só é admissível se o autor da herança não deixou testamento e não há herdeiros incapazes 2 Colação Os descendentes devem ser tratados de forma isonômica pelos ascendentes quando se trata de questão patrimonial Nenhum filho pode ser privilegiado em detrimento de outro tampouco um dos netos prejudicandose os demais descendentes de segundo grau Se enquanto ainda vivia o autor da herança qualquer descendente recebeu deste bens por doação um dos objetivos do inventário será o de neutralizar a vantagem que esse negócio gratuito trouxe ao donatário em detrimento dos demais descendentes do mesmo grau O inventário em outras palavras é a oportunidade para igualaremse as legítimas que eventualmente tenham se desigualado em vida do autor da sucessão Para atender a esse objetivo determina a lei que os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente comum são obrigados para igualar as legítimas a conferir o valor das doações que dele em vida receberam CC art 2002 Essa conferência é chamada de colação Os descendentes donatários devem dar à colação os bens recebidos para que sejam considerados no cômputo das quotas hereditárias Mesmo os herdeiros excluídos da sucessão por indignidade deserdação ou renúncia estão obrigados a dar à colação os bens recebidos por doação a título de antecipação de legítima CC art 2008 Suponhase então que Antonio tinha dois filhos Benedito e Carlos e que em vida doara para Benedito um apartamento no valor de 1000 Ao falecer deixou bens no valor de 2000 Para simplificar considerese que ele não tinha dívidas nem outro sucessor além desses filhos Pois bem Benedito está obrigado a dar à colação o apartamento recebido de modo que no final as legítimas sejam igualadas Quer dizer Carlos terá direito a receber um quinhão no valor de 1500 enquanto Benedito continua com o apartamento e recebe mais 500 Se após computar o valor da doação feita a título de adiantamento de legítima não houver no acervo bens suficientes para igualar as quotas hereditárias dos descendentes o obrigado à colação deve entregar o próprio bem ou se já não dispuser dele o valor correspondente CC art 2003 parágrafo único Na verdade embora a lei fale em entrega do valor correspondente apenas no caso de não ter mais o donatário meios de proceder à colação em espécie os juízes não devem excluir a hipótese no caso de conveniência das partes Será sempre mais racional sob o ponto de vista econômico que o donatário indenize os demais descendentes do prejuízo desde que o faça pelo valor de mercado do bem e não pelo da liberalidade Desse modo se Antonio do exemplo acima tivesse deixado ao falecer bens no valor de 400 Benedito para ficar com o apartamento que vale 1000 além de nada receber desses outros bens ainda deve ressarcir Carlos no montante equivalente a 300 Dessa forma as legítimas se igualariam em 700 não se prejudicando nenhum dos descendentes Determina a lei que na colação os bens doados sejam computados pelo valor da liberalidade isto é por quanto valiam ao tempo em que foram doados CC art 2004 Não é a regra mais justa nem a mais adequada sob o ponto de vista econômico O mais equânime é o bem ser dado à colação pelo seu valor atual de mercado Somente assim podemse igualar de verdade as legítimas Claro não se computa no valor da colação o das benfeitorias acrescidas pelo descendente donatário Haveria enriquecimento indevido dos demais descendentes que se apropriariam do valor agregado ao bem exclusivamente por recursos do donatário Pela mesma razão correm apenas por conta deste as perdas e danos referentes ao bem doado e são exclusivos dele os frutos art 2004 2º Para que o donatário seja dispensado de dar à colação o bem doado é indispensável que o ascendente doador consigne de modo expresso no contrato de doação que está praticando a liberalidade à conta da parte disponível de seu patrimônio CC art 2005 Nesse caso a doação não prejudica a legítima de nenhum dos outros descendentes porque o seu objeto poderia ser licitamente testado e portanto subtraído da herança a que fazem jus A dispensa de colação quando não tiver sido feita no próprio instrumento de doação deve constar de testamento do doador art 2006 Se a doação tiver sido feita à conta da parte disponível do patrimônio do doador mas seu valor excedeu a metade deste o excesso deverá ser dado à colação Para verificar se houve excesso consideramse os valores do bem doado e do patrimônio do doador da época da liberalidade Mas o cálculo do excesso para fins de definir o valor da restituição a que se obriga o donatário fazse de acordo com o valor do bem ao tempo da abertura da sucessão CC art 2007 Quer dizer se no momento da liberalidade o bem doado valia 60 do patrimônio do doador o excesso foi de 10 que equivale a um sexto do seu valor Desse modo o descendente obrigado à colação deve entregar ao espólio o correspondente a um sexto do valor do mesmo bem considerado na época da abertura da sucessão Uma vez mais a lei fala em ressarcimento do excesso unicamente no caso de não ser possível a colação do bem em espécie mas não tem sentido afastarse quando conveniente para as partes a igualação das legítimas por pagamento em dinheiro da diferença Os descendentes beneficiados por liberalidade do ascendente estão obrigados à colação dos bens recebidos com o objetivo de igualar as legítimas Por vezes a liberalidade não prejudica somente os direitos dos descendentes mas também os do cônjuge ou companheiro do doador falecido Isso em nada altera a obrigação de dar à colação o que se recebeu como antecipação de legítima bem como procederse às igualações das quotas hereditárias dos sucessores considerandose nos cálculos contudo os direitos sucessórios do cônjuge ou companheiro Divergindo os herdeiros sobre a obrigação de dar à colação o desfazimento do condomínio não poderá ser feito evidentemente por escritura pública Nessa hipótese mesmo não havendo testamento ou interessados incapazes será necessário o processo judicial de inventário 3 Sonegados Aberto o inventário incumbe ao inventariante nos vinte dias seguintes ao de sua investidura apresentar em juízo a declaração dos bens deixados do inventariado Em seguida o juiz mandará citar os herdeiros para que em dez dias se manifestem sobre essa declaração incumbindolhes nessa oportunidade indicar os erros e omissões do inventariante de que tenham notícia Se um dos herdeiros por exemplo estava na posse de um bem do falecido que não constou da declaração do inventariante é seu dever declararlhe a existência ao juízo de inventário É bastante grave a consequência para o inventariante ou herdeiro que não levar a inventário qualquer bem do falecido que se encontre em sua posse Impõelhe a lei a pena de sonegados em razão da qual o sonegador perde o direito sucessório sobre o bem omitido Igual punição sofre o herdeiro que deixar de dar à colação algum bem recebido por doação a título de antecipação de legítima ou que não o restituir quando a tanto obrigado CC art 1992 A sonegação só se caracteriza por um ato formal do inventariante ou herdeiro isto é apenas quando o indigitado sonegador faz no inventário uma declaração expressa da inexistência do bem sonegado Especificamente após o inventariante consignar na declaração de bens que não há outros a inventariar ou o herdeiro indagado responder que não tem em seu poder um determinado bem do falecido CC art 1996 Aplicada a pena de sonegados a um certo herdeiro o bem ocultado do inventário será transmitido aos demais como se o sonegador não fosse sucessor do falecido Quando o apenado for o inventariante além da perda do direito sucessório que titula sobre o bem será também removido da função CC art 1993 A aplicação da pena de sonegados fazse mediante ação judicial na qual se garante ao demandado o amplo direito de defesa Têm legitimidade para essa ação não só os herdeiros como também os credores Aqueles porque seriam prejudicados em seus direitos sucessórios com a subtração de bem da herança estes na medida em que os bens declarados não sejam suficientes à satisfação das obrigações passivas do defunto Se a ação for julgada procedente o bem omitido é incorporado ao inventário em benefício de todos os demais herdeiros e credores inclusive dos que não a patrocinaram CC art 1994 e parágrafo único O inventariante e o herdeiro que ocultarem bem do falecido declarando o primeiro formalmente no inventário que ele não existe e o segundo que não está em seu poder expõemse à pena de sonegados Aplicada a pena o sonegador perde os direitos sucessórios que titulava relativamente ao bem omitido Se condenado a restituir os bens sonegados o sonegador não os tiver mais em sua posse ficará obrigado a pagar ao espólio o respectivo valor e perdas e danos Não interessa o motivo Se o bem foi vendido subtraído ou se perdeu com ou sem culpa do sonegador a indenização é devida CC art 1995 4 Pagamento das dívidas As dívidas deixadas pelo morto devem ser pagas com os recursos da herança Não sendo líquida ou exigível o credor deve habilitarse no inventário Se eram líquidas e exigíveis deve requer ao juiz que seja feito o pagamento Não havendo impugnação por parte de nenhum dos herdeiros ou do inventariante a este será determinado pelo juiz que solva a obrigação passiva de imediato ou quando do vencimento Em caso de impugnação que não seja fundada exclusivamente na alegação de pagamento o juiz pode determinar ao inventariante que reserve bens suficientes para a solução da dívida se o credor possuir documento comprobatório de seu crédito revestido das formalidades legais Os bens reservados só serão partilhados após o trânsito em julgado da decisão que acolher a impugnação ao crédito habilitado ou cujo pagamento tinha sido solicitado A partilha dos bens inventariados não precisa aguardar o julgamento das impugnações apresentadas Os herdeiros nesse caso recebem seus quinhões e vindo a ser decidido no futuro que a impugnação não tem procedência respondem pelo crédito no limite do que tiverem herdado Como dita a lei a herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido mas feita a partilha só respondem os herdeiros cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube CC art 1997 O herdeiro demandado a satisfazer obrigação do falecido nos limites do quinhão recebido na partilha tem o direito de regresso contra os demais para não ficar prejudicado Se entre os demais coerdeiros houver alguém insolvente os solventes arcarão proporcionalmente com a parte dele CC art 1999 Quando os bens deixados pelo falecimento do devedor forem insuficientes para a integral quitação de todas as dívidas o inventariante terá legitimidade para requerer a instauração da execução concursal CPC art 618 VIII Na verdade deve requerêla para que os credores possam merecer tratamento paritário com observância das preferências e privilégios que titulam CC arts 955 a 965 As dívidas do falecido correm por conta dos bens da herança respondendo o herdeiro apenas no limite de seu quinhão Entrando o herdeiro em insolvência após a partilha os credores do falecido e os legatários ainda não pagos podem requerer que se discriminem no patrimônio do insolvente a parte correspondente à quota hereditária Feita a discriminação sobre os bens correspondentes gozarão de preferência relativamente aos credores do herdeiro CC art 2000 Se o inventário foi feito por escritura pública sem que um ou mais dos credores do falecido tivessem seus créditos satisfeitos por iniciativa dos próprios herdeiros o ato pode ser anulado a pedido de qualquer um dos prejudicados Se preferir o credor indevidamente preterido tem também a opção de promover a cobrança judicial contra um ou mais herdeiros que responderão no limite da porção hereditária recebida 5 Partilha A partilha é o ato que uma vez homologado pelo juiz do inventário ou quando admitido por lei formalizado por escritura pública desfaz o condomínio hereditário que a abertura da sucessão instituíra entre os herdeiros Tratase da definição dos bens da herança que passam à propriedade individual de cada um deles Dividese com a partilha entre os herdeiros o que remanesceu do pagamento dos legados e dos credores do falecido O próprio autor da sucessão pode por testamento estabelecer como se processará a divisão dos seus bens determinando por exemplo que um certo apartamento fique com seu filho e o outro com a filha Se tiver sido respeitada a legítima e os bens atribuídos a cada herdeiro corresponderem ao valor das respectivas quotas hereditárias essa disposição de última vontade será válida e homologada pelo juiz prevalecerá CC art 2014 O ascendente pode partilhar seus bens entre os descendentes ainda em vida desde que não prejudique a legítima dos herdeiros necessários art 2018 Quando todos os herdeiros são maiores e capazes e entraram em acordo sobre a partilha ela é amigável Pode ser documentado o acerto em escritura pública termo judicial ou escrito particular Nestes dois últimos casos será indispensável a homologação pelo juiz CC art 2015 Se estiver em curso o processo judicial de inventário os herdeiros exibem o plano consensual celebrado por instrumento particular e requerem a prolação do ato homologatório Se não havia testamento e a partilha foi acertada por escritura pública podem querendo em vez de pleitear a homologação judicial simplesmente pedir o arquivamento do processo Quando o acordo é obtido antes da instauração da medida judicial e sendo esta necessária ou optando por ela os interessados a dissolução do condomínio hereditário fazse por meio de arrolamento que segue rito procedimental mais simples CPC arts 659 a 663 Havendo entre os herdeiros um incapaz ou divergindo os sucessores sobre a destinação dos bens do falecido a partilha há de ser forçosamente judicial vale dizer o juiz definirá que bem ou bens do acervo hereditário serão destinados a cada herdeiro CC art 2016 Prevê a lei que se observe na partilha não só o valor mas também a natureza e qualidade dos bens com o objetivo de se alcançar a mais justa divisão entre os herdeiros CC art 2017 Se um deles recebe vários imóveis em bairro decadente enquanto outro recebe um só mas numa região valorizada da cidade ainda que as quotas tenham o mesmo valor não se terá dado um tratamento justo à divisão Quando não for possível uma repartição cômoda um ou mais bens serão vendidos judicialmente transmitindose aos herdeiros o dinheiro correspondente essa venda judicial não tem cabimento porém se houver acordo entre os herdeiros no sentido de se adjudicarem os bens a alguns deles os quais ficam obrigados ao pagamento da diferença em pecúnia aos demais art 2019 e 1º Mais de um herdeiro se interessando pela adjudicação farseá licitação entre os interessados 2º desta edição 2020 Devendo um dos herdeiros ao espólio a dívida poderá ser partilhada igualmente entre todos ou se a maioria deles concordar imputada à quota do devedor CC art 2001 Nesse último caso ao herdeiro devedor são destinados bens de menor valor dispensandoo do pagamento a soma do valor da dívida e dos bens aquinhoados deve equivaler à quota hereditária a que o devedor tinha direito Pertencem ao espólio e devem lhe ser entregues pelos herdeiros que se encontram na posse dos bens os frutos posteriores à abertura da sucessão CC art 2020 Se um dos filhos por exemplo administrava a fazenda agrícola do pai e por acordo entre eles ficava com toda a renda da produção esse acerto deixa de vigorar a partir da abertura da sucessão porque os herdeiros em condomínio passam a ser os novos titulares dos frutos apenas mediante a anuência de todos eles poderia aquele filho continuar ficando com a totalidade da renda Com a homologação judicial da partilha desfazse o condomínio hereditário entre os herdeiros instituído com a abertura da sucessão A partilha será amigável quando forem todos os herdeiros capazes e entrarem em acordo mas divergindo ou havendo pelo menos um incapaz será judicial Com a homologação da partilha pelo juiz encerrase o inventário judicial Pode ocorrer no entanto posteriormente ao fim do processo a descoberta de novos bens do de cujus sonegados ou não Nesse caso os herdeiros podem requerer a sobrepartilha CC art 2022 Também é o caso de sobrepartilha quando houver na herança bens situados longe do lugar do inventário objeto de litígio ou mesmo de liquidação demorada ou difícil Aqui enquanto não sobrepartilhados esses bens permanecem sob a guarda e administração do inventariante art 2021 A sobrepartilha pode ser feita por escritura pública se ao seu tempo todos os interessados forem capazes Por qualquer dos vícios e defeitos que invalidam o negócio jurídico pode ser anulada a partilha homologada mas o direito de se pleitear a anulação nesse caso decai em um ano CC art 2027 e parágrafo único 2020 02 13 PÁGINA V Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 ÍNDICE ALFABÉTICOREMISSIVO ÍNDICE ALFABÉTICOREMISSIVO ADN DNA exame de 6041 e 42 Adoção de adolescente 60141 de criança 60141 definição 6014 de maior de 18 anos 60142 estágio de convivência 60141 e 143 internacional 60143 Alimentante falecimento 6116 Alimentos classificação 6012 definição 611 definitivos 6012 gravídicos 6115 mínimos 5821 6011 12 14 para companheiros 6014 para cônjuges 6014 para parentes 6013 provisionais 6012 provisórios 6012 requisitos 6111 valor 6111 Barriga de aluguel noção 60122 Bemns antifernalis 574 de família 556 dos filhos menores 6052 parafernalis 574 partilha dos 584 Casamento aberto 566e anulável 5671 capacidade para o 5631 causas suspensivas 5633 celebração 5642 condição da mulher 562 consular 5643e efeitos 565 em caso de moléstia grave 5643b habilitação 5641 impedimentos 5632 in articulo mortis 5643c in extremis 4643c invalidade 567 natureza 568 nulo 5671 nuncupativo 5643c objetivos 561 por procuração 5643d prova 5644 putativo 5673 religioso 5643a Cláusulas testamentárias interpretação 6431 validade 6432 Coabitação e casamento 566a e divórcio 5822 e separação 58622 e união estável 5921 Codicilo definição 6422 referência 6423 Comunhão de bens espécies 572 e 23 parcial 57232 universal 57231 Cônjuges autorização marital 5721 bens dos 571 como sucessor 632 deveres 566 nome 585 outorga uxória 5721 Curatela definição 613 e curadoria 613 espécies 613 Deserdação definição 6223 Desquite noção 581 Direito de representação definição 6331 referência 6233 Direito de visita e guarda 583 Direito real de habitação 6326 Direitos autorais e comunhão de bens 57231 Divórcio definição 582 espécies 5821 formas 5822 partilha de bens 584 Embriões crioconservados 62221 6332 material genético crioconservado 6332 Famílias constitucionais 554 591 6325 monoparental 593 não constitucionais 554 591 6325 Fecundação fertilização ou inseminação assistida anonimato do doador 60123 doação temporária de útero 60122 heteróloga 60121 2 3 homóloga 6011 Fideicomisso e comunhão de bens 57231 instituição 6452 Filhos guarda 583 reconhecimento 602 Filiação biológica 6011 espécies 601 investigação oficiosa 6021 por substituição 6012 socioafetiva 6013 Guarda alternada 583 compartilhada 583 conjunta 583 e poder familiar 6051 partilhada 583 Herança aceitação 6233 cessão 6232 definição 623 jacente 6235 petição de 6234 renúncia 6233 vacante 6235 vocação hereditária 631 Herdeiros facultativos 6221 necessários 6221 6411 noção 6221 obrigatórios 6221 reservatários 6221 vocação 631 Homossexuais união 595 Impenhorabilidade cláusula de 6411 Inalienabilidade cláusula de 57231 em testamento 641 Incomunicabilidade cláusula de 57231 em testamento 641 Indignidade definição 6223 Inventário arrolamento 623 651 5 colação 652 definição 651 espólio 651 noção 623 partilha 655 sobrepartilha 655 sonegados 653 Legado alternativo 6441 caducidade 6443 coisa incerta 6441 com encargos 6441 concentração 6441 de alimentos 6441 de coisa alheia 6442 de crédito 6441 de dinheiro 6441 definição 644 de imóvel 6441 de usufruto 6441 em favor de credor 6441 em prestações 6441 quitação de dívida 6441 Legatários noção 6221 Legítima antecipação de 653 redução das disposições testamentárias 646 referência 6221 Maternidade negativa de 603 Pacto antenupcial definição 574 Pacto sucessório noção 6232 Parentesco em linha colateral 555 em linha reta 555 em linha transversal 555 por afinidade 555 relações de 555 Participação final nos aquestos cálculo dos aquestos 57233 definição 57233 Paternidade negativa de 603 presunções de 604 Perfilhação excludente de 6022 Poder familiar administração dos bens dos filhos 6052 conceito 605 e direito de visita 6051 exercício 6051 perda 605 suspensão 605 Protutor noção 6122 prestação de contas 6124 Reconciliação efeitos 5863 Regime de bens alteração do 575 Responsabilidade civil do noivo desistente 5645 pela separação 587 Separação amigável 5861 com culpa 58621 litigiosa 5862 remédio 58622 ruptura 58622 sanção 58621 sem culpa 58622 Separação de bens absoluta 573 obrigatória 573 Substituições direito de acrescer 6453 fideicomissária 6452 recíproca 6451 vulgar 6451 Sucessão legítima 63 testamentária 64 vocação hereditária 631 Sucessores aparente 6224 34 ascendentes 634 capacidade para ser 6222 classificação 622 21 colaterais 635 companheiro 632 212 22 23 24 25 cônjuge 632 211 22 23 24 25 descendentes 633 legítimos 6221 pessoa jurídica 62222 testamentários 6221 6412 Testamenteiro referência 6423 Testamento aeronáutico 6421 cerrado 6421 conjuntivo 642 correspectivo 642 definição 642 direito de testar 641 em mão comum 642 espécies 6421 execução 6423 interpretação 6431 marítimo 6421 militar 6421 particular 6421 público 6421 recíproco 642 redução 646 registro 6423 revogação 6424 rompimento 6424 simultâneo 642 Tutela dativa 6121 definição 612 espécies 6121 legítima 6121 testamentária 6121 Tutor delegação 6122 nomeação 6432 poderes 6123 prestação de contas 6124 remuneração 6122 responsabilidades 6122 União estável definição 592 caracterização 5921 direitos dos companheiros 5922 deveres dos companheiros 5922 conversão em casamento 5923 6325 putativa 5942 falecimento do companheiro 632 União livre definição 594 desta edição 2020 Vínculo conjugal constituição 564 2020 02 13 PÁGINA VI Curso de Direito Civil Vol 5 Ed 2020 BIBLIOGRAFIA BIBLIOGRAFIA AGUIAR Jr Ruy Rosado de 2004Responsabilidade civil no direito de família In XIII Jornada de Direito de Família Edição especial de Seleções Jurídicas COAD fevereiro de 2005 p 3943 ARAÚJO Fernando 1999 A procriação assistida e o problema da santidade da vida Coimbra Almedina 1999 AZEVEDO Álvaro Vilaça 1974 Bem de família 4ª ed São Paulo RT 1999 2002 Estatuto da família de fato 2ª ed São Paulo Atlas 2002 Sem data da 1ª ed 2003 Comentários ao Código Civil Coordenador Antônio Junqueira de Azevedo São Paulo Saraiva 2003 v 19 BEVILÁQUA Clóvis 1896 Direito de família Edição histórica reproduzindo a 7ª ed Rio de Janeiro Ed Rio 1976 1898 Direito das sucessões Sem número da edição Rio de Janeiro Red Livros 2000 1934 Código Civil dos Estados Unidos do Brasil commentado 4ª ed Rio de Janeiro Livr Francisco Alves 1934 Sem data da 1ª ed BIRCHAL Alice de Souza 2004A relação processual dos avós no direito de família direito à busca da ancestralidade convivência familiar e alimentos In Afeto ética família e o novo Código Civil Coordenação de Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 p 4160 BITTENCOURT Edgard de Moura 2003 Família 5ª ed Atualização de Joaquim Macedo Bittencourt Netto e Antônio Carlos Mathias Coltro Campinas Millennium 2003 Sem data da 1ª ed BOIZEL Roger 2000Le divorce et la faute perspectives de rapprochement des droits français et allemand Revue Internationale de Droit Comparé Paris Société de Législation Comparée v 524 p 891912 2000 BRODY David Eliot BRODY Arnold R 1999 The seven greatest scientific discoveries in history and the people who made them Edição brasileira Tradução de Laura Teixeira Motta 2ª reimpr São Paulo Companhia das Letras 2000 CAHALI Francisco José 2004 Família e sucessões no Código Civil de 2002 São Paulo RT 2004 CAHALI Yussef Said 1978 Divórcio e separação 11ª ed São Paulo RT 2005 CHINELATO Silmara Juny 2004 Comentários ao Código Civil Coordenador Antônio Junqueira de Azevedo São Paulo Saraiva 2004 v 18 COELHO Fábio Ulhoa 1992 Direito e poder São Paulo Saraiva 1992 COLTRO Antonio Carlos Mathias TEIXEIRA Sálvio de Figueiredo MAFRA Tereza Cristina Monteiro 2005 Comentários ao novo Código Civil Coordenado por Sálvio de Figueiredo Teixeira Rio de Janeiro Forense 2005 v XVII DINIZ Maria Helena 2003Coordenadas fundamentais da tutela e curatela no novo Código Civil In O Novo Código Civil Estudos em Homenagem ao Prof Miguel Reale Coordenação de Domingos Granciulli Netto Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins Filho São Paulo LTr 2003 p 13341367 2005 Direito civil brasileiro 20ª ed do 5º v e 19ª ed do 6º v São Paulo Saraiva 2005 Sem data da 1ª ed ENGELS Friedrich 1884 Der Ursprung der Familie des Privateigentaums und des Staats Tradução brasileira de Leandro Konder 4ª ed Rio de Janeiro Civilização Brasileira 1978 ESPÍNOLA Eduardo 1954 A família no direito civil brasileiro Edição atualizada por Ricardo Rodrigues Gama Campinas Bookseller 2001 FACHIN Luiz Edson 2003 Direito de família Rio de Janeiro Renovar 2003 Sem data da 1ª ed 2003a Comentários ao novo Código Civil Coordenado por Sálvio de Figueiredo Teixeira Rio de Janeiro Forense 2004 v XVIII FARIAS Cristiano Chaves de 2004Redesenhando os contornos da dissolução do casamento casar e permanecer casado eis a questão In Afeto ética família e o novo Código Civil Coordenação de Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 p 105126 FERNANDES Luís A Carvalho 2001 Lições de direito das sucessões 2ª ed Lisboa Quid juris editora 2001 Sem data da 1ª ed FRANK Rainer 2005La contestation de paternité Revue Internationale de Droit Comparé Paris Société de Législation Comparée v 574 p 85102 2000 FURKEL Françoise 2004Lidentification par empreites génétiques em matière civile en République fédérale dAllemagne Revue Internationale de Droit Comparé Paris Société de Législation Comparée v 562 p 389416 2004 GOMES Orlando 1968 Direito de família 13ª ed Revista e atualizada por Humberto Theodoro Júnior Rio de Janeiro Forense 2000 1970 Sucessões 14ª ed Revista atualizada e aumentada por Mario Roberto Carvalho de Faria Coordenador Edvaldo Brito Rio de Janeiro Forense 2004 GONÇALVES Carlos Roberto 2005 Direito civil brasileiro São Paulo Saraiva 2005 v VI GRISARD FILHO Waldyr 2003A adoção depois do novo Código Civil RT São Paulo RT v 816 p 2638 2003 HIRONAKA Giselda Maria Fernandes Novaes 2003 Comentários ao Código Civil Coordenador Antônio Junqueira de Azevedo São Paulo Saraiva 2003 v 20 2004Direito das sucessões introdução Ordem de vocação hereditária Herdeiros necessários e direito de representação Deserdação e exclusão da sucessão In Direito das sucessões e o novo Código Civil Coordenado por Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka e Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 JALUZOT Béatrice CANNARSA Michel FAVIER Yann et al 2008Le mariage entre personnes de même sexe Étude pour la Cour de cassation Revue Internationale de Droit Comparé Paris Société de Législation Comparée v 602 p 375443 2008 LEITE Eduardo de Oliveira 1995 Procriações artificiais e o direito São Paulo RT 1995 1997 Famílias monoparentais 2ª ed São Paulo RT 2003 2003 Comentários ao novo Código Civil Coordenação de Sálvio de Figueiredo Teixeira 4ª ed Rio de Janeiro Forense 2005 v XXI 2005Adoção por homossexuais e o interesse das crianças In Adoção aspectos jurídicos e metajurídicos Coordenado por Eduardo de Oliveira Leite Rio de Janeiro Forense p 101143 LÉVISTRAUSS Claude 1962 Le totélisme aujourdhui Tradução portuguesa de José Antonio Braga Fernandes Dias Lisboa Edições 70 sem data LÔBO Paulo Luiz Netto 2004Direito ao estado de filiação e direito à origem genética uma distinção necessária In Afeto ética família e o novo Código Civil Coordenação de Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 p 505530 MARTINS Ives Gandra da Silva 2002O exame de DNA como meio de prova aspectos constitucionais In DNA como meio de prova da filiação Coordenado por Eduardo de Oliveira Leite Rio de Janeiro Forense 2002 p 125132 MATOS Ana Carla Harmatiuk 2000 As famílias não fundadas no casamento e a condição feminina Rio de Janeiro Renovar 2000 MIRANDA Pontes 1916 Tratado de direito de família Edição atualizada por Vilson Rodrigues Alves Campinas Bookseller 2001 MIZUNO Noriko 2001La famille au Japon la notion de famille Revue Internationale de Droit Comparé Paris Société de Législation Comparée v 534 p 831852 2001 MONTEIRO Washington de Barros 2003 Curso de direito civil direito das sucessões 35ª ed Atualizada por Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto São Paulo Saraiva 2003 Sem data da 1ª ed 2004 Curso de direito civil direito de família 37ª ed Atualizada por Regina Beatriz Tavares da Silva São Paulo Saraiva 2004 Sem data da 1ª ed OLIVEIRA Euclides de 2004Alimentos transmissão da obrigação aos herdeiros In Afeto ética família e o novo Código Civil Coordenação de Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 p 141159 2005 Direito de herança São Paulo Saraiva 2005 PEREIRA Caio Mário da Silva 1972 Instituições de direito civil 3ª ed Rio de Janeiro Forense 1979 v V 1974 Instituições de direito civil 3ª ed Rio de Janeiro Forense 1980 v VI 1977 Reconhecimento de paternidade e seus efeitos 6ª ed atualizada por Lucia Maria Teixeira Ferreira Rio de Janeiro Forense 2006 PEREIRA Rodrigo da Cunha 2003 Direito de família uma abordagem psicanalítica 3ª ed Belo Horizonte Del Rey 2003 Sem data da 1ª ed 2004 Comentários ao novo Código Civil Coordenado por Sálvio de Figueiredo Teixeira Rio de Janeiro Forense 2004 v XX PIMENTEL PEREIRA Áurea 2003 Alimentos no direito de família e no direito dos companheiros à luz do novo Código Civil Rio de Janeiro Renovar 2003 PLANIOL Marcel RIPERT Georges 1925 Traité pratique de droit civil français 2ª ed Paris LGDJ 1952 QUEIROGA Antônio Elias de 2005 Curso de direito civil direito das sucessões Rio de Janeiro Renovar 2005 ROCHA Silvio Luís Ferreira da 2004 Introdução ao direito de família São Paulo RT 2004 RODRIGUES Silvio 2003 Direito civil direito das sucessões 27ª ed Atualizada por Zeno Veloso São Paulo Saraiva 2003 Sem data da 1ª ed 2003a Comentários ao Código Civil Coordenador Antônio Junqueira de Azevedo São Paulo Saraiva 2003 v 17 2004 Direito civil direito de família 28ª ed Atualizada por Francisco José Cahali São Paulo Saraiva 2004 Sem data da 1ª ed ROY Alain 2002Le partenariat civil dun continent à lautre Revue Internationale de Droit Comparé Paris Société de Législation Comparée v 544 p 759786 2002 SAMARA Eni de Mesquita 1983 A família brasileira 4ª ed 2ª reimp São Paulo Brasiliense 2004 SCOTT Elizabeth S SCOTT Robert E 1999A contract theory of marriage In The fall and rise of freedom of contract Editado por F H Buckley Durham e London Duke University 1999 p 201244 SILVA Reinaldo Pereira e 2002Acertos e desacertos em torno da verdade biológica In DNA como meio de prova da filiação Coordenado por Eduardo de Oliveira Leite Rio de Janeiro Forense 2002 p 235260 TAVARES DA SILVA Regina Beatriz 2002 Novo Código Civil anotado 2ª tir Coordenação de Ricardo Fiuza São Paulo Saraiva 2002 2003Dissolução da sociedade e do vínculo conjugal In O Novo Código Civil Estudos em Homenagem ao Prof Miguel Reale Coordenação de Domingos Granciulli Netto Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins Filho São Paulo LTr 2003 p 12861318 2004Débito conjugal In Afeto ética família e o novo Código Civil Coordenação de Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 p 531541 TEPEDINO Gustavo 2004A disciplina da guarda e a autoridade parental na ordem civilconstitucional In Afeto ética família e o novo Código Civil Coordenação de Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 p 305324 VELOSO Zeno desta edição 2020 1997 Direito brasileiro da filiação e paternidade São Paulo Malheiros 1997 2002A sacralização do DNA na investigação de paternidade In DNA como meio de prova da filiação Coordenado por Eduardo de Oliveira Leite Rio de Janeiro Forense 2002 p 379390 2002a Novo Código Civil comentado Obra coletiva coordenada por Ricardo Fiuza 2ª ed 2ª tir São Paulo Saraiva 2002 Sem data da 1ª edição 2003 Comentários ao Código Civil Coordenador Antônio Junqueira de Azevedo São Paulo Saraiva 2003 v 21 2004Testamentos noções gerais formas ordinárias codicilo formas especiais In Direito das sucessões e o novo Código Civil Coordenado por Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka e Rodrigo da Cunha Pereira Belo Horizonte IBDFAMDel Rey 2004 VENOSA Sílvio de Salvo 2001 Direito civil 5ª ed São Paulo Atlas 2005 WALD Arnoldo 2002 Direito das sucessões 12ª ed São Paulo Saraiva 2002 Sem data da 1ª ed 2004 O novo direito de família São Paulo Saraiva 2004 WELTER Belmiro Pedro 2003 Igualdade entre as filiações biológica e socioafetiva São Paulo RT 2003 ZANELLATO Marco Antonio 2004 O Código Civil e sua interdisciplinaridade Coordenação de José Geraldo Brito Filomeno Luiz Guilherme da Costa Wagner Jr e Renato Afonso Gonçalves Belo Horizonte Del Rey 2004 ZULIANI Ênio Santarelli 2006Alimentos para filhos maiores In Grandes temas da atualidade Alimentos no novo Código Civil Coordenador Eduardo de Oliveira Leite Rio de Janeiro Forense 2006 p 91121