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httpdxdoiorg1021714pretextov20i35375 Este trabalho está licenciado sob uma Licença Creative Commons Attribution 30 MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS CHEAP LABOR THE SUFFERING IN INTERNS WORK Jéssica Syrio Callefi Departamento de Engenharia de Produção Universidade de São Paulo São Paulo SP Brasil Email jessicacallefigmailcom Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto Departamento de Psicologia Universidade Estadual de Maringá Maringá PR Brasil Email garmnetogmailcom RESUMO ABSTRACT As mudanças na forma de produção da manufatura a partir da Revolução Industrial implicaram diretamente na forma de realização do trabalho pelas pessoas Mais recentemente a adequação do homem ao trabalho começou a ser pensada para além do aspecto físico incluindose a questão psíquica verificandose que todo trabalho pode causar prazer e sofrimento DEJOURS 2008 Nesta linha de pensamento este artigo apresenta um estudo a respeito do sofrimento no trabalho de estagiários Foram entrevistadas acadêmicas de diferentes cursos de graduação objetivando estudar as percepções sobre o estágio por estas pessoas Utilizouse a teoria do sofrimento no trabalho de Dejours 2008 2011 2015 para analisar as entrevistas Concluiuse que o sofrimento no trabalho já se inicia nos primeiros contatos com a profissão almejada Nas falas das entrevistadas foram encontrados elementos relacionados a defesas humilhação trabalho sem sentido e desmerecimento da função de estagiário The changes in the form of manufacturing production based on the Industrial Revolution directly involved in the way people work More recently mans suitability to work has begun to be thought beyond the physical aspect including the psychic issue verifying that all work can cause pleasure and suffering DEJOURS 2008 In this line of thought this article presents a study about suffering in the work of interns Academic from different undergraduate courses were interviewed aiming to study perceptions about the internship by these people The theory of suffering as proposed in Dejours work 2008 2011 2015 was used to analyze the interviews It was concluded that suffering at work is already initiated in the first contacts with the desired profession In the interviewees statements elements related to defenses humiliation meaningless work and demereation of the role of intern were found Palavraschave Estagiário Sofrimento Trabalho Estratégias de defesa Dejours Keywords Intern Suffering Work Defensive Strategies Dejours Data de submissão 10 de agosto de 2017 Data de aprovação 21 de julho de 2019 Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 23 INTRODUÇÃO O tema do trabalho tem se tornado central na sociedade atual uma vez que a facilitação do acesso aos bens de produção de modo global requer a produção de bens de forma rápida e eficaz e este é o meio de produzir PINTO 2007 Ademais com a inserção dos conceitos da racionalidade do trabalho introduzidos a partir do taylorismo e seu conceito principal a divisão do trabalho a execução das tarefas para a produção de produtos se tornou mais fragmentada distanciandose da produção artesanal a qual os indivíduos estavam acostumados KANAANE 2007 consequentemente uma nova maneira de pensar o trabalho inseriuse na vida dos indivíduos Apesar do início do sistema taylorista ter ocorrido no final do século XVIII seus procedimentos ainda são atuais inclusive a forte cisão entre a questão física e psicológica do indivíduo No entanto sabese que o trabalho tem grande importância tanto nas dimensões materiais para o indivíduo o qual necessita realizar tarefas em busca de sua subsistência quanto psicológica visto que o indivíduo interage com as pessoas e a cultura da organização a qual se insere ANGELLA 2015 Dessa forma um maior entendimento acerca do trabalho e das relações que existem entre ele e o indivíduo permitem avanços teóricos e práticos dentro do assunto A temática do trabalho já foi discutido por diferentes paradigmas e autores como Marx 1849 quem discute o trabalho de maneira geral como força vital trocada por dinheiro Arendt 2011 a qual distingue o trabalho em duas vertentes o artesão homo faber e o operário animal laboran de forma que o artesão precisa realizar o trabalho como uma necessidade humana e o utiliza como caminho para a emancipação enquanto o operário produz somente por obrigação ou alguma necessidade humana imediata Dejours 2008 2012ª 2012b 2015 precursor dos estudos sobre a psicodinâmica e o sofrimento no trabalho analisa a fundo a influência que o trabalho exerce sobre o indivíduo e como o mesmo lida com esta realidade Embora exista uma gama de âmbitos para ser discutido dentro deste assunto este trabalho foca no sofrimento no trabalho Dentro das pesquisas científicas verificase a significância do tema o qual aumentou em número de publicações nas áreas da influência do trabalho sobre os indivíduos nos últimos anos MACHADO MACÊDO MACHADO 2017 Mesmo com vários estudos avançando neste tema entendese que cada profissão tem suas particularidades e possibilidades de descobertas bem como as fases da vida do indivíduo Ademais o sofrimento no trabalho pode ser compreendido de formas diferente a cada geração Isso posto uma destas áreas que foi pouco discutida até o momento é o trabalho do estagiário Os estagiários são acadêmicos que prestam um serviço para as organizações depois de adquirir conhecimento teórico sobre o assunto e são supervisionados por responsáveis pelo seu aprendizado a fim de aprender a exercer a profissão a que desejam se dedicar Além disso o estágio é uma prática obrigatória na maioria dos cursos de graduação Devido a inserção dos alunos cada vez mais cedo no ambiente acadêmico os quais passam do ensino médio para a universidade direto ou com alguns anos de cursinho muitas vezes estes indivíduos não tiveram uma experiência de trabalho de forma que o estágio se torna o a primeira experiência de trabalho deles Os estagiários iniciam seu trabalho ao menos supostamente com o desejo de aprender e de poder auxiliar nas questões que a organização necessita de acordo com sua bagagem teórica universitária visando um período de experiência na área de atuação de sua graduação Porém nem sempre isto é vivenciado por MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 24 estas pessoas Assim este estudo visa compreender quais são essas expectativas que não são supridas nos estágios entre outras questões que geram sofrimento no trabalho destes estagiários Dito de outra forma buscase como objetivo geral desta pesquisa compreender quais os fatores que mais causam o sofrimento no trabalho dos estagiários Para isso traçouse os seguintes objetivos específicos a saber quais eram as expectativas destes indivíduos em relação ao trabalho b saber como funciona a prática diária de trabalho do indivíduo e c interpretar o sofrimento do indivíduo a partir de suas expectativas e de suas práticas Justificase este trabalho primeiramente pelos escassos estudos contemplando estagiários E na vertente prática esperase que este trabalho venha a dar alguma contribuição por pequena que seja para uma melhor compreensão da realidade de trabalho dos futuros profissionais que necessitam realizar o estágio para sua formação como profissionais REFERENCIAL TEÓRICO O trabalho apresenta diversos entendimentos de acordo com a sociedade em que se insere Na sociedade grega por volta do século V o trabalho estava relacionado às necessidades básicas do ser humano como se alimentar e ter um lugar para dormir não era uma atividade valorizada pela sociedade além disso era tido por algumas sociedades como uma forma de tortura ENRIQUEZ 1999 PINTO 2007 A partir da Revolução Industrial Inglesa no século XVIII o trabalho se transformou em um símbolo da liberdade para os indivíduos por sua capacidade de transformar a natureza e a sociedade ENRIQUEZ 1999 KANAANE 2007 Depois da Revolução Industrial Inglesa a forma de produzir bens também se modificou A produção passou de artesanal para produção em massa Na produção artesanal o trabalhador conseguia imprimir a sua subjetividade ao produto que estava sendo produzido enquanto na produção em massa pela fragmentação das atividades do trabalho o trabalhador não teria mais a possibilidade de colocar algo de si em sua produção de trabalho tornando o trabalho sem sentido Isso porque Organização Científica do Trabalho proposta por Taylor 1990 buscava eliminar a subjetividade das tarefas do trabalho analisando o trabalho de maneira racional almejando maior produtividade LANCMAN UCHIDA 2003 Atualmente o emprego trabalho com vínculo empregatício tomou um lugar central no modo de produção capitalista BEATRIZ 2010 Porém este aspecto se tornou um dos grandes males da sociedade contemporânea por destituir a subjetividade do trabalhador na realização das atividades BEATRIZ 2010 e considerar os indivíduos apenas como engrenagens para o funcionamento das fábricas Ainda no século XXI a representação social do trabalho relacionase primeiramente como a subsistência para as pessoas e depois pode ser percebida como algo central da identidade das pessoas englobando a aprendizagem autonomia reconhecimento e segurança MORIN TONELLI 2007 Portanto vêse que o trabalho tem dupla importância na vida das pessoas além de prover subsídios para a manutenção da vida tornase um elemento essencial de sua identidade Para Dejours 2012b p 38 trabalhar é preencher a lacuna existente entre o prescrito e o efetivo Ou seja o indivíduo cria táticas e truques para realizar a tarefa prescrita para que o objetivo final seja alcançado conforme idealizado pelo próprio indivíduo ou por quem o prescreveu Isso porque se o executor da tarefa seguisse a prescrição ao pé da letra não conseguiria dar conta de seu encargo Este fator é Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 25 importante visto que ao produzir algo ou realiza uma tarefa o indivíduo tem a possibilidade de objetivar a sua subjetividade ou seja criar maneiras de realizar e produzir a partir do que idealizou pessoalmente Dessa forma por estar intimamente relacionado com o indivíduo o trabalho pode suscitar entusiasmo e angústia prazer e sofrimento DEJOURS 2012b Dejours 2008 também afirma que o trabalho quando é somente prescrito e não se utiliza da criatividade humana desumaniza os indivíduos Dessa forma não ter a compreensão do motivo da realização da tarefa eou acreditar que a tarefa é inútil pode gerar sofrimento ao indivíduo Ao contrário disso o trabalho criado pelo próprio indivíduo vem de encontro com a utilidade da realização da ação do trabalho Conforme aponta Tweedie 2017 o trabalho pode auxiliar os indivíduos a realizarem suas aspirações dentro a organização em que estão inseridos Pelo fato do trabalho ser uma atividade necessária para a subsistência o indivíduo muitas vezes se submete a trabalhos com riscos físicos e psíquicos A artimanha psíquica para conseguir permanecer em um trabalho com riscos e aguentar o sofrimento gerado por ele é denominada de estratégia de defesa por Dejours 2012b Dentro deste conceito entendese que de maneira inconsciente o indivíduo passa a negligenciar os riscos para que possa continuar executando seu trabalho como por exemplo os sofrimentos de tristeza frustração dificuldade de dor impotência e incapacidade a que são submetidos SANTOS CORRALMULATO BUENO ROBAZZI 2016 Dejours 2015 considera que o sofrimento relacionado ao trabalho pode ser percebido de duas maneiras insatisfação e ansiedade A insatisfação pode ser ocasionada pelos sentimentos de a indignidade do trabalho quando o indivíduo se submete a trabalhos maçantes com sujeira e despersonalizadores b inutilidade do trabalho que remete a falta de conteúdo significativo do trabalho para o indivíduo ou seja a importância da realização das atividades do trabalho para alcançar um objetivo final c desqualificação profissional do indivíduo para ocupar cargos mais honrosos e d fadiga e cansaço gerados pela alta carga de trabalho DEJOURS 2015 Quanto à ansiedade esta é apresentada em três formas por Dejours 2015 p 100 a ansiedade relativa à degradação do funcionamento mental e do equilíbrio psicoafetivo que diz respeito à despersonalização das pessoas gerada a partir de seu próprio condicionamento mental para conseguir manter os comportamentos esperados dentro da organização b ansiedade relativa à degradação do organismo gerada a partir dos riscos relacionados à saúde física do indivíduo c ansiedade gerada pela disciplina da fome no qual os indivíduos se submetem às condições que ameaçam seu equilíbrio e funcionamento mental pelo motivo da sobrevivência Outros pontos levantados por Dejours 2012a a respeito do mal estar que atinge as pessoas atualmente no mundo do trabalho são desnível entre o trabalho prescrito ao trabalhador e o trabalho efetivo realizado por esta pessoa a falta do trabalho vivo que é o acréscimo de atividades realizado pelo próprio indivíduo às atividades da prescrição do trabalho a corporificação do trabalho a falta de reconhecimento a MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 26 servidão voluntária na qual os indivíduos realizam serviços que o seu senso moral desaprova e o sofrimento ético Apesar de tantas formas possíveis de sofrimento no trabalho é perceptível que muitos indivíduos negligenciam os perigos de seus trabalhos Para Dejours 2012b essa atitude é inconsciente e funciona como uma estratégia de defesa para que o indivíduo consiga continuar trabalhando as defesas são condutas paradoxais sobre como assumir os riscos uma indisciplina em relação às medidas de prevenção e de segurança a não manifestação pública da expressão do medo ao sofrimento e a obrigação de participar de demonstrações ostentatórias de desprezo e enfrentamento quanto ao risco bem como a exibição de sinais exteriores da coragem da resistência ao sofrimento da força da invulnerabilidade e da virilidade DEJOURS 2012b p 64 O silêncio constante e não comentar os erros e problemas pode ser um efeito de medo que afeta o indivíduo e também a organização na qual está inserido DORADO SOLARTE 2016 Vale ressaltar que os indivíduos buscam suprir três necessidades básicas quando estão em grupo são elas a inclusão identidade que está relacionada às expectativas que o grupo tem do indivíduo e o que o próprio indivíduo espera contribuir com o grupo ou seja uma função útil b controle poder e influência que se apresenta na necessidade de o indivíduo controlar o entorno e sentirse seguro c aceitação e intimidade que é a necessidade de se sentir aceito e incluso pelo grupo SCHEIN 1998 Verificase que para ser aceito no grupo ou seja suprir uma necessidade básica muitas pessoas se submetem aos trabalhos dentro de grupos que podem ser maléficos para sua saúde física e psíquica Isso porque quando as necessidades de inclusão controle e aceitação não são supridas o indivíduo também pode iniciar um processo de sofrimento no trabalho Quando o estagiário encontra um lugar para trabalhar ele também se insere em uma cultura diferente da que está acostumado que contém pressupostos básicos e crenças que são compartilhadas por todos os seus membros SCHEIN 1988 A partir do momento em que esse novo membro se insere no grupo precisa aprender sobre as normas e padrões de convivência Dessa forma pela importância cultural dada ao trabalho na sociedade contemporânea BEATRIZ 2010 e no caso desta pesquisa a obrigatoriedade da realização do estágio o indivíduo tem tendência a ocultar os malefícios do próprio trabalho para poder conviver com o sofrimento ocasionando riscos para sua própria saúde psíquica MÉTODO Para obter uma análise aprofundada na percepção do indivíduo optouse pela pesquisa qualitativa neste estudo Esta se apresenta como mais abrangente e profunda para a análise de seus objetos de pesquisa quando se trata da subjetividade além de possibilitar que se utilize o contexto da realidade destes sujeitos para a observação e análise nos estudos FONTANA FREY 2005 Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 27 Para a coleta de dados optouse pela entrevista semiestruturada DENZIN LINCOLN 2006 tendendo para uma entrevista não estruturada uma vez que se deseja descobrir o que os sujeitos de pesquisa pensam sobre o seu trabalho e o sofrimento relativo ao seu trabalho com liberdade para expressar a sua percepção do assunto e revelar algo de sua subjetividade Dessa forma na entrevista semiestruturada foram elaboradas algumas questões abertas com a função de servir de guia sobre o assunto a ser abordado permitindo a fluidez da entrevista Fontana e Frey 2005 tecem algumas considerações acerca da entrevista semiestruturada e não estruturada afirmam que o entrevistador deve conhecer bem o tema que deseja estudar pois o entrevistado é mais livre para responder questões e dizer suas impressões a respeito do tema do que em entrevistas fechadas podendo fugir do tema assim o entrevistador deve guiar a entrevista para obter as informações que deseja Fontana e Frey 2005 apresentam ainda alguns passos para a realização da entrevista que foram utilizados nesta pesquisa 1 acessar o meio que está sendo estudado 2 compreender a linguagem e a cultura dos respondentes 3 decidir a melhor maneira de se apresentar 4 localizar um informante 5 ganhar a confiança do entrevistado 6 estabelecer uma relação de abertura para a entrevista 7 coletar o material através da entrevista no caso com a utilização de um gravador Decidiuse por realizar uma pesquisa com pessoas que estagiam atualmente ou estagiaram recentemente desde que o estágio fosse o primeiro contato que estas pessoas tiveram com um emprego para ser possível coletar as primeiras impressões relativas ao trabalho por esses indivíduos Para obter entrevistados para a pesquisa foram abordadas pessoas provindas de diversas áreas do conhecimento e de diferentes universidades as quais estivessem dispostas a colaborar com a pesquisa e se enquadrassem no requisito do primeiro emprego Os entrevistados foram abordados em ambiente acadêmico e convidados a participar das entrevistas e assim relatarem suas experiências para este estudo Vale ressaltar que esta pesquisa se interessa em trabalhar com a subjetividade dos entrevistados e não obter uma resposta global replicável sobre o tema do sofrimento do trabalho dos estagiários Foram obtidas três entrevistas com cerca de quarenta minutos de duração Compreendese que o número de entrevistados relativamente pequeno conseguiu trazer elementos significativos para a realização da análise de seus relatos frente à teoria e responder aos anseios desta pesquisa Os nomes atribuídos às entrevistadas são fictícios por questão de sigilo de pesquisa Alice cursou engenharia civil na Universidade Estadual de Maringá na cidade de Maringá e as informações da entrevista são relacionadas a um estágio que teve duração de seis meses Beatriz cursou farmácia na Universidade Estadual de Londrina e realizou um estágio de seis meses na cidade de Londrina Cecília cursou medicina no Centro Universitário Ingá e falou de suas experiências sobre residência em diversos hospitais durante dois anos A partir das experiências trazidas pelas estagiárias através das entrevistas semiestruturadas realizouse uma análise de conteúdo destas entrevistas categorizando os trechos das entrevistas de acordo com a teoria de sofrimento no trabalho de Dejours 2008 2012ª 2012b 2015 e os aspectos de cultura organizacional de Schein 1988 para poder analisar o sofrimento no trabalho destas pessoas Nas entrevistas primeiramente fora questionado a respeito das expectativas dos indivíduos sobre o estágio antes de iniciálo e sobre a realidade que observaram e as diferenças entre a expectativa e a realidade Questionouse também a respeito das práticas realizadas e a relação de conhecimento e MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 28 aprendizagem obtidos com a experiência do estágio Com estes dados em mãos foram categorizados os trechos da entrevista onde fora observado defesas práticas que traziam maiores sofrimentos quebras de expectativas aprendizagem realização no trabalho RESULTADO A fim de poder fazer parte de um grupo de profissionais e atuar na área da profissão escolhida em diversos cursos universitários é necessário que o estudante conclua as disciplinas de seu curso e também participe dos estágios obrigatórios relacionados à atividade profissional que irá exercer futuramente O período do estágio é um tempo no qual os estudantes conhecem a prática das atividades e a aplicação das teorias aprendidas dentro da sala de aula Também é um momento de confrontação do conhecimento teórico e prático com a comprovação da utilidade dos conhecimentos teóricos aplicados na prática Além disso o estudante se depara com diversos problemas conflitos e situações rotineiras do trabalho e tem a possibilidade de treinar e verificar a sua competência para resolver os problemas com a supervisão de profissionais mais experientes conforme ressalta a estagiária Alice Querendo ou não fazer estágio é testar se você é capaz de exercer a sua profissão ou não certo É perceptível que existe uma grande expectativa por parte dos estudantes para iniciar os estágios e aprender sobre o funcionamento prático da profissão Cecília e Alice apresentam as suas expectativas antes da realização dos estágios e durante os estágios Para elas houve uma quebra de expectativa Quando a gente entra no curso de medicina a gente não vê a hora de chegar ao internato porque passamos quatro anos extremamente difíceis e imaginando como vai ser para colocar tudo isso conhecimento teórico em prática Então a gente acha que vai entrar no quinto ano sendo o médico o melhor médico da face da Terra e que todas as pessoas serão legais que vão te ensinar tudo e que você só vai fazer o bem para as pessoas A realidade é bem diferente Porque você encontra pessoas muito diferentes de você acho que esse é o ponto que mais dificulta quando você vai para um estágio Porque você acha que todo mundo vai te tratar como você trata os outros e na verdade não é assim Cecília Quanto eu estava na graduação eu queria muito estagiar em obra eu estava no terceiro e quarto ano e estava tendo aquelas matérias de construção civil e eu achava chato ver na teoria queria ver na prática Eu queria estagiar em obra então eu esperava muito de um estágio assim Acho que no começo de todo estágio você fica animado porque está aprendendo depois vai ficando um pouco maçante Por isso tem muita gente que troca muito de estágios Alice Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 29 Um ponto apresentado por Alice foi o do trabalho maçante Quando as atividades se tornam rotineiras e não estimulam a criatividade tentem a se tornar maçantes e sem sentido Isso pode ocorrer também pela atribuição de tarefas insignificantes ou divergentes da atribuição dos estagiários o que causa também grande insatisfação nos estudantes Alice ressalta a monotonia do trabalho e a atribuição de tarefas que não eram referentes ao setor de engenharia como por exemplo tarefas de outros setores da empresa que estavam sobrecarregados organização e arquivamento de papéis antigos e atividades burocráticas Na Empresa X o que me angustiava às vezes era serviços que nem tinham a ver com a engenharia Porque até os três meses eu estava aprendendo as coisas depois ficou monótono porque ficou repetitivo Tudo repetitivo E às vezes eu era solicitada para colar papeizinhos do RH nas paredes Alice Beatriz também conta da sua insatisfação em realizar trabalhos que eram atribuição de outros profissionais do laboratório de farmácia mas que eram repassados para que os estagiários realizassem Eu tinha que fazer trabalho de técnico era tão escravo que eu tinha que fazer trabalho de técnico Muita falta de respeito Beatriz conta que não recebia nenhuma remuneração para realizar os trabalhos que eram atribuídos aos profissionais da área no caso os técnicos do laboratório apenas recebia almoço do restaurante universitário Era bem pesado também Era um estágio mas a gente fazia a rotina das pessoas do setor Eu fiquei uns seis meses Fiquei bastante Porque eu só queria almoçar de graça Sobre esse mesmo assunto Cecília conta sobre a alta carga de trabalho que estava submetida bem como a responsabilidade que lhe era designada A gente tem que ter contato com paciente só que lá no Hospital A o fluxo é grande Então assim a gente se divide uma quantidade x de alunos para uma quantidade muito grande de pacientes e a gente tem um tempo limitado são só 6h de estágio por dias a gente tem um tempo limitado para fazer nossas funções A gente tem pouco tempo para ter o contato com o paciente E poder passar as informações Então a gente estuda pouco a gente toca serviço mesmo e é normal porque alguém tem que fazer E como a gente é interno na hierarquia a gente é mais zoado a gente tem que fazer o que eles mandam a gente fazer Cecília Alice por sua vez conta que percebia que seu trabalho era considerado mais uma mãodeobra barata e que sabia que não existia um interesse por parte da Empresa X em treinar os estagiários para contratos futuros Na Empresa X eu não sentia que o trabalho era importante tanto que eu saí de lá Eu via que eles queriam alguém para arrumar as baguncinhas É diferente de uma empresa que pega os estagiários no intuito de ensinar fidelizar e ficar com eles por lá Eu via que por mais que eu fizesse um ótimo trabalho desse o melhor de mim lá eles não tinham interesse em me contratar Alice MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 30 Um fato interessante da percepção do estágio pelas entrevistadas foi a aparição dos termos escravo e escraviário um neologismo com as palavras estagiário e escravo em todas as entrevistas Remetendo a grande quantidade de trabalho atribuída sem um balanceamento da carga de trabalho e ao não recebimento de salário ou recebimento de um valor simbólico Isso é percebido na fala de Beatriz que comenta Era um trabalho meio escravo porque a gente não ganhava nada A gente só ganhava certificado e almoço mas não tinha incentivo de nada Essa percepção também aparece nas falas de Alice e Cecília Também a questão de que a supervisora não se planejava muito para me passar as atividades e passava em cima da hora Ás vezes eu passava a semana inteira sem ter uma atividade estava lá ociosa dai ela passava na quinta feira para eu entregar na sexta e não dava tempo E ela acabava me cobrando horário extra pra eu estar indo lá e eu não podia por causa das aulas Alice E no Hospital A os preceptores também não são médicos com didáticas então eles querem que você toque serviço eles não estão preocupados com seu aprendizado ou não eles tocam muito serviço você sai de lá com um estresse absurdo porque você acha que não aprendeu nada não está fazendo bem para ninguém e não está fazendo nada da sua vida Cecília Notase também no trecho da entrevista de Cecília que os principais responsáveis por orientar os estagiários nesta nova fase da profissão que no caso da medicina são os médicos preceptores nem sempre estão dispostos a ensinar e dedicar seu tempo de maneira a auxiliar os estudantes Por vezes até utilizam sua posição de poder para humilhar os recémchegados Tem muitas pessoas muitos preceptores médicos responsáveis por orientar os estagiários de medicina principalmente que acham que são melhores que você e daí eles te colocam para baixo de todas as formas possíveis Então jogaram a gente lá e a gente fica lá Então as pessoas são bem hostis na maioria do tempo Não todas mas a maioria delas são bem hostis E fica bem na cara que elas não querem você ali Cecília Em alguns casos os estagiários chegam a ser humilhados de acordo com o relato de Cecília E a preceptora que passava visita no leito do paciente ela queria que você soubesse tudo de todos assim extremamente rápido E se você não soubesse ela te humilhava no meio de todo mundo Daí gritava no corredor umas coisas assim Então a gente chegava meio tenso para trabalhar Cecília Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 31 Um ponto que chama a atenção na questão do sofrimento no trabalho são as condições precárias e hostis de trabalho onde não só os estagiários estão realizando suas atividades mas todos os trabalhadores do setor A falta de percepção da sujeira por parte dos funcionários que conviviam com o ambiente pode ser compreendida como uma estratégia de defesa a fim de conseguir realizar seus trabalhos sem se incomodarem com o ambiente Era uma condição precária O pessoal trabalhava de chinelo Os clínicos técnicos eram super porcos Eu achava assim que era uma porquísse Eu odiei esse estágio e nunca quis fazer micro estudo da microbiologia Porque era muito porco mexer com bactéria e o povo comia em lugar perto Tinha um lugar de comer que era do lado do laboratório E daí era bem ruim Beatriz Outra estratégia defensiva é encontrada no relato de Beatriz que considera que o sofrimento gerado no estágio foi necessário para sua decisão de não querer realizar atividades relacionadas à prática do trabalho Foi bom para eu saber que eu não iria querer aquilo para a minha vida nunca mais Cecília que considera que os estagiários que estão aprendendo atrapalham o setor e isso é em decorrência da falta de treinamento que despendem ao estagiário pois os mesmos ficam perdidos na realização de suas atividades por falta de um direcionamento Tem alguns profissionais de outras áreas como enfermagem técnicos que não gostam da sua presença ali acham que você atrapalha de todas as formas possíveis Atrapalhar a gente sabe que atrapalha principalmente porque você chega em um lugar desconhecido você não sabe o que você vai fazer Até você pegar o jeito claro que você tem muitas perguntas para fazer Você precisa entender como é que funciona aquilo e eles não tem paciência nenhuma para te explicar e você fica largado e perdido lá Cecília A suposição de Cecília de que o ato de estagiar atrapalha os outros funcionários do setor pode ser considerada uma estratégia de defesa De forma que não enxerga que o problema está na falta de direcionamento e não na presença dos acadêmicos no ambiente em que estão inseridos Quanto ao ambiente de trabalho e a cultura organizacional Cecília conta como a mudança do estágio do Hospital A para o Hospital B mudou a sua visão sobre uma das áreas da medicina a clínica médica na qual Cecília detestava no Hospital A e passa a gostar muito no Hospital B Na verdade tem várias rotações então tem as rotações que você gosta e as rotações que você detesta Acho que lá no Hospital A por causa desses preceptores em específico de uma rotação aí todo dia era uma tragédia ir para lá Que era a parte da clínica médica Que foi diferente no Hospital B que eu adorava fazer a parte de clínica médica No Hospital A não Mas é por causa da pressão psicológica que eles faziam na gente sabe Cecília MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 32 De acordo com Cecília a diferença entre os dois hospitais estava na área de recursos humanos do hospital ou seja na forma de tratar as pessoas Pois as rotinas de trabalho dos dois hospitais eram bastante parecidas e o que mudava era apenas a maneira de tratar os internos com mais paciência e atenção no Hospital B Verificase que as entrevistadas tinham consciência de que o estágio gerava algum sofrimento mas ao mesmo tempo se utilizavam das estratégias defensivas para justificar a sua realização como a obrigação para terminar o curso de graduação cumprindo os requisitos exigidos de currículo os benefícios de auxílio financeiro ou alimentício e a possibilidade de ter as primeiras experiências com o trabalho As estagiárias reconhecem que precisam realizar o estágio que este momento é importante para conhecer e começar a praticar a profissão que escolheram e que recebem ajuda para aprender e realizar as tarefas no novo ambiente de trabalho Conforme ressalta Alice Ainda assim para gente aprender para o seu crescimento profissional pessoal é bom Do mesmo modo Cecília também aponta alguns benefícios Em compensação tem procedimentos que os preceptores deixam a gente fazer que é o que a gente realmente quer fazer Mas é tudo supervisionado nós não fazíamos os procedimentos mais elaborados sozinhos Sabese que os hospitais escola e empresas de diversos ramos participam de um convênio com as universidades e faculdades e dessa forma é obrigação da organização que oferece o estágio promover um ambiente de aprendizado para eles Ou seja recebem os estagiários que podem auxiliar de alguma forma no trabalho mas em contrapartida devem fornecer informações para que os mesmos consigam atuar de maneira eficiente Ademais o estágio pode causar certa ansiedade nos estudantes visto que o fracasso nem sempre é compreendido como uma parte do crescimento mas como uma deficiência pessoal ou da formação do conhecimento Este tipo de fracasso pode gerar traumas ou fortalecer a vontade de permanecer na profissão quando superado DISCUSSÃO A relação de trabalho de estágio contém dois atores a empresa que contrata e o estagiário que oferece o seu serviço A empresa recebe um profissional que não tem sua formação completa ainda e oferece um campo de estudo para que o acadêmico possa experimentar como funciona o trabalho Por essa razão entendese que a empresa não precisa remunerar o estagiário da mesma forma que a um profissional formado já que recebe um serviço de um trabalhador não graduado e o auxilia nesta formação Ressaltase que a empresa gasta seus recursos de tempo e pessoal para o treinamento dos estagiários porém o que se discute é que em troca a empresa recebe a mãodeobra e o conhecimento teórico que o estagiário já tem obtendo benefícios e remunerando de maneira desconforme Pois o estagiário possui alguma carga teórica e ademais o conhecimento da vida prática que é utilizado para a realização das demandas de trabalho da empresa Assim o vínculo entre o estagiário e a empresa começa a ficar desproporcional na medida em que o estagiário avança em seu conhecimento dá bons resultados para a empresa mas não é reconhecido e frequentemente não é remunerado de acordo com o benefício que proporciona Verificase que o que ocorre é a utilização destas pessoas como mãodeobra barata simplesmente como uma maneira de economizar os recursos da empresa Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 33 Pela obrigatoriedade de cumprimento do tempo de estágio como uma disciplina curricular as estudantes se veem obrigadas a se submeterem a trabalhos que nem sempre estão relacionados ao trabalho da profissão ou ainda que lhes causem enormes desgastes Para isso recebem algum valor financeiro simbólico como a alimentação ou simplesmente uma carta de comprovação das horas cumpridas para anexar ao currículo e poder enfim finalizar o curso de graduação É interessante notar que o trabalho é uma atividade social e coletiva porém apenas uma das entrevistadas tratou sobre o assunto das equipes de trabalho e as três consideraram o estágio por um âmbito mais pessoal Verificase que as estagiárias trataram o trabalho como um desafio que deveria ser superado apenas por si e não em um coletivo de pessoas que deveriam se ajudar mutuamente Essa falta de envolvimento e a hostilidade que são tratadas e tratam a empresa tornase um conflito nocivo para o entendimento geral do trabalho Afinal entendese que uma organização é um sistema que utiliza pessoas para a realização de um fim Dessa maneira compreender qual seu papel para o resultado final da organização é de fundamental importância para o funcionamento geral da empresa e bem estar dos funcionários Nas entrevistas foi possível compreender que o estágio é entendido apenas como um meio para alcançar o diploma e não um fim já que as três entrevistadas não acreditavam que seriam efetivadas nos seus estágios Esse aspecto pode explicar a falta de envolvimento com o pessoal do trabalho de forma que as entrevistadas compreendem a realização do trabalho como uma competência pessoal primeiramente uma prova final para verificar se estão prontas como profissionais para atuarem no mercado sem o interesse em estabelecer relações Ademais verificase que as estagiarias negligenciam o sofrimento gerado pelo estágio não raro utilizando estratégias defensivas de Dejours 2012b Porém vale discutir se vale a pena esclarecer para a pessoa que algumas de suas ações são defesas Aguentariam o sofrimento psíquico gerado pela compreensão dessa nova realidade De qualquer forma acreditase que apenas o reconhecimento da realidade gera a oportunidade de escolha em permanecer ou não em um ambiente nocivo ou agradável Unindo a suposição de que o estágio bem cumprido depende da adequação do indivíduo ao trabalho com as estratégias defensivas que o próprio cria temse que o indivíduo não percebe o quanto o estágio pode estar fazendo mal para sua saúde psíquica e ainda pode ter uma impressão errada sobre a profissão que pretende exercer futuramente Dessa forma é imprescindível que se discuta e se trate os problemas de sofrimento no trabalho ainda mais tendo em conta que estes são provavelmente os primeiros contatos dos estagiários com a profissão que exercerão no futuro CONCLUSÕES Este estudo se propôs a discutir as expectativas dos estagiários frente ao tema do trabalho e os sofrimentos gerados por ele As entrevistas convergiram para alguns fatores chave que relacionaram o sofrimento no trabalho dos estagiários com insatisfação inutilidade do trabalho humilhação trabalho sem sentido desmerecimento da função DEJOURS 2015 a vontade de contribuir com o grupo e não conseguir e de não se sentir útil SCHEIN 1998 MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 34 Compreendeuse que as estagiárias tinham grandes expectativas que não se mostraram na realidade Em um primeiro momento existia a euforia da descoberta no trabalho o vislumbre da possibilidade de um emprego BEATRIZ 2010 a possibilidade de aquisição de conhecimento e a importância da realização do estágio como uma forma de trabalho na área de formação antes da obtenção do diploma Porém com o passar do tempo os trabalhos ficavam monótonos sem objetivo de aprendizagem e desgastantes Esse fator pode estar relacionado ao fato de as empresas não terem clareza a respeito das funções do trabalho do futuro profissional e nem um plano de crescimento e acompanhamento do desenvolvimento do mesmo Os entrevistados contaram sobre as suas práticas diárias e neste ponto foi possível observar não só como os entrevistados realizavam suas tarefas mas como as observaram e o trabalho e como se sentiam em relação a ele Com isso foi possível interpretar o sofrimento do indivíduo a partir de suas expectativas e de suas práticas Como contribuição teórica verificase que já nos primeiros contatos com o trabalho podem surgir as estratégias de defesa DEJOURS 2015 Estas estratégias podem estar relacionadas com o fato de se ter despendido grande energia para a conclusão de um curso universitário e ao fim do percurso quando estes formandos se deparam com o tralho de sua futura e profissão precisam negligenciar para si mesmo os sofrimentos psíquicos que o mesmo gera a fim de manteremse no trabalho sem questionar se este é ou não um ambiente saudável Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 35 REFERÊNCIAS Angella M Work recognition and subjectivity Relocating the connection between work and social pathologies European Journal of Social Theory v 19 n 3 p 340354 2015 Arentd H A condição humana Tradução Roberto Raposo Rio de Janeiro Forense Universitária 2011 Beatriz M Z O trabalho a repressão e o malestar do trabalhador algumas reflexões Rev MalEstar Subj online v 10 n 4 p 11071130 2010 Disponível em httppepsicbvsaludorgscielophpscriptsciarttextpidS1518 61482010000400003 Dejours C A loucura do trabalho estudo de psicopatologia do trabalho 6ª ed São Paulo CortezOboré 2015 Dejours C Christophe Dejours da psicopatologia à psicodinâmica do trabalho Brasília FIOCRUZ 2008 Dejours C Psicodinâmica do Trabalho e Teoria da Sedução Psicologia em Estudo v 17 n 3 p363371 2012a Doi httpdxdoiorg101590S141373722012000300002 Dejours C Trabalho Vivo Vol 1 Tradução de Franck Soudant Brasília Paralelo 15 2012b Denzin N K L Y S Introdução a disciplina e a prática da pesquisa qualitativa In Denzin N K Lincoln Y S Org O planejamento da pesquisa qualitativa teorias e abordagens 2ª ed Porto Alegre Artmed p 1541 2006 Dorado C B Solarte M G Efectos del miedo en los trabajadores y la organización Estudios Gerenciales v 32 n 1 p 6070 2016 Doi httpsdoiorg101016jestger201510002 Enriquez E Perda do trabalho Perda da identidade Caderno da Escola do Legislativo v 5 n 9 p 5373 1999 Disponível em httpsdspacealmggovbrhandle110371062localeen Fontana A Frey J H The interview from neutral stance to political involvement 3th ed In N K Denzin Y S Lincoln Org The sage handbook of qualitative research pp 695727 London England Sage 2005 Lancman S Uchida S Trabalho e subjetividade o olhar da Psicodinâmica do Trabalho Cadernos de Psicologia Social do Trabalho v 6 n1 pp 7990 2003 Machado L S Macêdo K B Machado M R R Diagnóstico de pesquisas internacionais em psicodinâmica do trabalho no Brasil PsicologiaSaúde Doenças v 18 n 1 p 6984 2017 Marx K Trabalho assalariado e capital Lisboa Avante 1849 Disponível em httpswwwmarxistsorgportuguesmarx18490405htm Morin E Tonelli M J O trabalho e seus sentidos Psicologia Sociedade v 19 n 1 p 4756 2007 Doi httpdxdoiorg101590S010271822007000400008 Santos J L D CorralMulato S Bueno S M V Robazzi M L do C C 2016 Feelings of nurses faced with death pleasure and suffering from the perspective of psychodynamics of Dejours Invest Educ Enferm v 34 n 3 p 511517 2016 Doi doi1017533udeaieev34n3a10 Schein E La cultura empresarial y el liderazgo una visión dinámica Barcelona Espanha Plaza Janes 1988 Taylor F W Princípios da administração científica Tradução Arlindo Vieira Ramos 8º ed São Paulo Atlas 1990 Tweedie D The Normativity of Work Retrieving a Critical Craft Norm Critical Horizons v 18 n 1 p 6684 2017

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httpdxdoiorg1021714pretextov20i35375 Este trabalho está licenciado sob uma Licença Creative Commons Attribution 30 MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS CHEAP LABOR THE SUFFERING IN INTERNS WORK Jéssica Syrio Callefi Departamento de Engenharia de Produção Universidade de São Paulo São Paulo SP Brasil Email jessicacallefigmailcom Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto Departamento de Psicologia Universidade Estadual de Maringá Maringá PR Brasil Email garmnetogmailcom RESUMO ABSTRACT As mudanças na forma de produção da manufatura a partir da Revolução Industrial implicaram diretamente na forma de realização do trabalho pelas pessoas Mais recentemente a adequação do homem ao trabalho começou a ser pensada para além do aspecto físico incluindose a questão psíquica verificandose que todo trabalho pode causar prazer e sofrimento DEJOURS 2008 Nesta linha de pensamento este artigo apresenta um estudo a respeito do sofrimento no trabalho de estagiários Foram entrevistadas acadêmicas de diferentes cursos de graduação objetivando estudar as percepções sobre o estágio por estas pessoas Utilizouse a teoria do sofrimento no trabalho de Dejours 2008 2011 2015 para analisar as entrevistas Concluiuse que o sofrimento no trabalho já se inicia nos primeiros contatos com a profissão almejada Nas falas das entrevistadas foram encontrados elementos relacionados a defesas humilhação trabalho sem sentido e desmerecimento da função de estagiário The changes in the form of manufacturing production based on the Industrial Revolution directly involved in the way people work More recently mans suitability to work has begun to be thought beyond the physical aspect including the psychic issue verifying that all work can cause pleasure and suffering DEJOURS 2008 In this line of thought this article presents a study about suffering in the work of interns Academic from different undergraduate courses were interviewed aiming to study perceptions about the internship by these people The theory of suffering as proposed in Dejours work 2008 2011 2015 was used to analyze the interviews It was concluded that suffering at work is already initiated in the first contacts with the desired profession In the interviewees statements elements related to defenses humiliation meaningless work and demereation of the role of intern were found Palavraschave Estagiário Sofrimento Trabalho Estratégias de defesa Dejours Keywords Intern Suffering Work Defensive Strategies Dejours Data de submissão 10 de agosto de 2017 Data de aprovação 21 de julho de 2019 Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 23 INTRODUÇÃO O tema do trabalho tem se tornado central na sociedade atual uma vez que a facilitação do acesso aos bens de produção de modo global requer a produção de bens de forma rápida e eficaz e este é o meio de produzir PINTO 2007 Ademais com a inserção dos conceitos da racionalidade do trabalho introduzidos a partir do taylorismo e seu conceito principal a divisão do trabalho a execução das tarefas para a produção de produtos se tornou mais fragmentada distanciandose da produção artesanal a qual os indivíduos estavam acostumados KANAANE 2007 consequentemente uma nova maneira de pensar o trabalho inseriuse na vida dos indivíduos Apesar do início do sistema taylorista ter ocorrido no final do século XVIII seus procedimentos ainda são atuais inclusive a forte cisão entre a questão física e psicológica do indivíduo No entanto sabese que o trabalho tem grande importância tanto nas dimensões materiais para o indivíduo o qual necessita realizar tarefas em busca de sua subsistência quanto psicológica visto que o indivíduo interage com as pessoas e a cultura da organização a qual se insere ANGELLA 2015 Dessa forma um maior entendimento acerca do trabalho e das relações que existem entre ele e o indivíduo permitem avanços teóricos e práticos dentro do assunto A temática do trabalho já foi discutido por diferentes paradigmas e autores como Marx 1849 quem discute o trabalho de maneira geral como força vital trocada por dinheiro Arendt 2011 a qual distingue o trabalho em duas vertentes o artesão homo faber e o operário animal laboran de forma que o artesão precisa realizar o trabalho como uma necessidade humana e o utiliza como caminho para a emancipação enquanto o operário produz somente por obrigação ou alguma necessidade humana imediata Dejours 2008 2012ª 2012b 2015 precursor dos estudos sobre a psicodinâmica e o sofrimento no trabalho analisa a fundo a influência que o trabalho exerce sobre o indivíduo e como o mesmo lida com esta realidade Embora exista uma gama de âmbitos para ser discutido dentro deste assunto este trabalho foca no sofrimento no trabalho Dentro das pesquisas científicas verificase a significância do tema o qual aumentou em número de publicações nas áreas da influência do trabalho sobre os indivíduos nos últimos anos MACHADO MACÊDO MACHADO 2017 Mesmo com vários estudos avançando neste tema entendese que cada profissão tem suas particularidades e possibilidades de descobertas bem como as fases da vida do indivíduo Ademais o sofrimento no trabalho pode ser compreendido de formas diferente a cada geração Isso posto uma destas áreas que foi pouco discutida até o momento é o trabalho do estagiário Os estagiários são acadêmicos que prestam um serviço para as organizações depois de adquirir conhecimento teórico sobre o assunto e são supervisionados por responsáveis pelo seu aprendizado a fim de aprender a exercer a profissão a que desejam se dedicar Além disso o estágio é uma prática obrigatória na maioria dos cursos de graduação Devido a inserção dos alunos cada vez mais cedo no ambiente acadêmico os quais passam do ensino médio para a universidade direto ou com alguns anos de cursinho muitas vezes estes indivíduos não tiveram uma experiência de trabalho de forma que o estágio se torna o a primeira experiência de trabalho deles Os estagiários iniciam seu trabalho ao menos supostamente com o desejo de aprender e de poder auxiliar nas questões que a organização necessita de acordo com sua bagagem teórica universitária visando um período de experiência na área de atuação de sua graduação Porém nem sempre isto é vivenciado por MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 24 estas pessoas Assim este estudo visa compreender quais são essas expectativas que não são supridas nos estágios entre outras questões que geram sofrimento no trabalho destes estagiários Dito de outra forma buscase como objetivo geral desta pesquisa compreender quais os fatores que mais causam o sofrimento no trabalho dos estagiários Para isso traçouse os seguintes objetivos específicos a saber quais eram as expectativas destes indivíduos em relação ao trabalho b saber como funciona a prática diária de trabalho do indivíduo e c interpretar o sofrimento do indivíduo a partir de suas expectativas e de suas práticas Justificase este trabalho primeiramente pelos escassos estudos contemplando estagiários E na vertente prática esperase que este trabalho venha a dar alguma contribuição por pequena que seja para uma melhor compreensão da realidade de trabalho dos futuros profissionais que necessitam realizar o estágio para sua formação como profissionais REFERENCIAL TEÓRICO O trabalho apresenta diversos entendimentos de acordo com a sociedade em que se insere Na sociedade grega por volta do século V o trabalho estava relacionado às necessidades básicas do ser humano como se alimentar e ter um lugar para dormir não era uma atividade valorizada pela sociedade além disso era tido por algumas sociedades como uma forma de tortura ENRIQUEZ 1999 PINTO 2007 A partir da Revolução Industrial Inglesa no século XVIII o trabalho se transformou em um símbolo da liberdade para os indivíduos por sua capacidade de transformar a natureza e a sociedade ENRIQUEZ 1999 KANAANE 2007 Depois da Revolução Industrial Inglesa a forma de produzir bens também se modificou A produção passou de artesanal para produção em massa Na produção artesanal o trabalhador conseguia imprimir a sua subjetividade ao produto que estava sendo produzido enquanto na produção em massa pela fragmentação das atividades do trabalho o trabalhador não teria mais a possibilidade de colocar algo de si em sua produção de trabalho tornando o trabalho sem sentido Isso porque Organização Científica do Trabalho proposta por Taylor 1990 buscava eliminar a subjetividade das tarefas do trabalho analisando o trabalho de maneira racional almejando maior produtividade LANCMAN UCHIDA 2003 Atualmente o emprego trabalho com vínculo empregatício tomou um lugar central no modo de produção capitalista BEATRIZ 2010 Porém este aspecto se tornou um dos grandes males da sociedade contemporânea por destituir a subjetividade do trabalhador na realização das atividades BEATRIZ 2010 e considerar os indivíduos apenas como engrenagens para o funcionamento das fábricas Ainda no século XXI a representação social do trabalho relacionase primeiramente como a subsistência para as pessoas e depois pode ser percebida como algo central da identidade das pessoas englobando a aprendizagem autonomia reconhecimento e segurança MORIN TONELLI 2007 Portanto vêse que o trabalho tem dupla importância na vida das pessoas além de prover subsídios para a manutenção da vida tornase um elemento essencial de sua identidade Para Dejours 2012b p 38 trabalhar é preencher a lacuna existente entre o prescrito e o efetivo Ou seja o indivíduo cria táticas e truques para realizar a tarefa prescrita para que o objetivo final seja alcançado conforme idealizado pelo próprio indivíduo ou por quem o prescreveu Isso porque se o executor da tarefa seguisse a prescrição ao pé da letra não conseguiria dar conta de seu encargo Este fator é Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 25 importante visto que ao produzir algo ou realiza uma tarefa o indivíduo tem a possibilidade de objetivar a sua subjetividade ou seja criar maneiras de realizar e produzir a partir do que idealizou pessoalmente Dessa forma por estar intimamente relacionado com o indivíduo o trabalho pode suscitar entusiasmo e angústia prazer e sofrimento DEJOURS 2012b Dejours 2008 também afirma que o trabalho quando é somente prescrito e não se utiliza da criatividade humana desumaniza os indivíduos Dessa forma não ter a compreensão do motivo da realização da tarefa eou acreditar que a tarefa é inútil pode gerar sofrimento ao indivíduo Ao contrário disso o trabalho criado pelo próprio indivíduo vem de encontro com a utilidade da realização da ação do trabalho Conforme aponta Tweedie 2017 o trabalho pode auxiliar os indivíduos a realizarem suas aspirações dentro a organização em que estão inseridos Pelo fato do trabalho ser uma atividade necessária para a subsistência o indivíduo muitas vezes se submete a trabalhos com riscos físicos e psíquicos A artimanha psíquica para conseguir permanecer em um trabalho com riscos e aguentar o sofrimento gerado por ele é denominada de estratégia de defesa por Dejours 2012b Dentro deste conceito entendese que de maneira inconsciente o indivíduo passa a negligenciar os riscos para que possa continuar executando seu trabalho como por exemplo os sofrimentos de tristeza frustração dificuldade de dor impotência e incapacidade a que são submetidos SANTOS CORRALMULATO BUENO ROBAZZI 2016 Dejours 2015 considera que o sofrimento relacionado ao trabalho pode ser percebido de duas maneiras insatisfação e ansiedade A insatisfação pode ser ocasionada pelos sentimentos de a indignidade do trabalho quando o indivíduo se submete a trabalhos maçantes com sujeira e despersonalizadores b inutilidade do trabalho que remete a falta de conteúdo significativo do trabalho para o indivíduo ou seja a importância da realização das atividades do trabalho para alcançar um objetivo final c desqualificação profissional do indivíduo para ocupar cargos mais honrosos e d fadiga e cansaço gerados pela alta carga de trabalho DEJOURS 2015 Quanto à ansiedade esta é apresentada em três formas por Dejours 2015 p 100 a ansiedade relativa à degradação do funcionamento mental e do equilíbrio psicoafetivo que diz respeito à despersonalização das pessoas gerada a partir de seu próprio condicionamento mental para conseguir manter os comportamentos esperados dentro da organização b ansiedade relativa à degradação do organismo gerada a partir dos riscos relacionados à saúde física do indivíduo c ansiedade gerada pela disciplina da fome no qual os indivíduos se submetem às condições que ameaçam seu equilíbrio e funcionamento mental pelo motivo da sobrevivência Outros pontos levantados por Dejours 2012a a respeito do mal estar que atinge as pessoas atualmente no mundo do trabalho são desnível entre o trabalho prescrito ao trabalhador e o trabalho efetivo realizado por esta pessoa a falta do trabalho vivo que é o acréscimo de atividades realizado pelo próprio indivíduo às atividades da prescrição do trabalho a corporificação do trabalho a falta de reconhecimento a MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 26 servidão voluntária na qual os indivíduos realizam serviços que o seu senso moral desaprova e o sofrimento ético Apesar de tantas formas possíveis de sofrimento no trabalho é perceptível que muitos indivíduos negligenciam os perigos de seus trabalhos Para Dejours 2012b essa atitude é inconsciente e funciona como uma estratégia de defesa para que o indivíduo consiga continuar trabalhando as defesas são condutas paradoxais sobre como assumir os riscos uma indisciplina em relação às medidas de prevenção e de segurança a não manifestação pública da expressão do medo ao sofrimento e a obrigação de participar de demonstrações ostentatórias de desprezo e enfrentamento quanto ao risco bem como a exibição de sinais exteriores da coragem da resistência ao sofrimento da força da invulnerabilidade e da virilidade DEJOURS 2012b p 64 O silêncio constante e não comentar os erros e problemas pode ser um efeito de medo que afeta o indivíduo e também a organização na qual está inserido DORADO SOLARTE 2016 Vale ressaltar que os indivíduos buscam suprir três necessidades básicas quando estão em grupo são elas a inclusão identidade que está relacionada às expectativas que o grupo tem do indivíduo e o que o próprio indivíduo espera contribuir com o grupo ou seja uma função útil b controle poder e influência que se apresenta na necessidade de o indivíduo controlar o entorno e sentirse seguro c aceitação e intimidade que é a necessidade de se sentir aceito e incluso pelo grupo SCHEIN 1998 Verificase que para ser aceito no grupo ou seja suprir uma necessidade básica muitas pessoas se submetem aos trabalhos dentro de grupos que podem ser maléficos para sua saúde física e psíquica Isso porque quando as necessidades de inclusão controle e aceitação não são supridas o indivíduo também pode iniciar um processo de sofrimento no trabalho Quando o estagiário encontra um lugar para trabalhar ele também se insere em uma cultura diferente da que está acostumado que contém pressupostos básicos e crenças que são compartilhadas por todos os seus membros SCHEIN 1988 A partir do momento em que esse novo membro se insere no grupo precisa aprender sobre as normas e padrões de convivência Dessa forma pela importância cultural dada ao trabalho na sociedade contemporânea BEATRIZ 2010 e no caso desta pesquisa a obrigatoriedade da realização do estágio o indivíduo tem tendência a ocultar os malefícios do próprio trabalho para poder conviver com o sofrimento ocasionando riscos para sua própria saúde psíquica MÉTODO Para obter uma análise aprofundada na percepção do indivíduo optouse pela pesquisa qualitativa neste estudo Esta se apresenta como mais abrangente e profunda para a análise de seus objetos de pesquisa quando se trata da subjetividade além de possibilitar que se utilize o contexto da realidade destes sujeitos para a observação e análise nos estudos FONTANA FREY 2005 Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 27 Para a coleta de dados optouse pela entrevista semiestruturada DENZIN LINCOLN 2006 tendendo para uma entrevista não estruturada uma vez que se deseja descobrir o que os sujeitos de pesquisa pensam sobre o seu trabalho e o sofrimento relativo ao seu trabalho com liberdade para expressar a sua percepção do assunto e revelar algo de sua subjetividade Dessa forma na entrevista semiestruturada foram elaboradas algumas questões abertas com a função de servir de guia sobre o assunto a ser abordado permitindo a fluidez da entrevista Fontana e Frey 2005 tecem algumas considerações acerca da entrevista semiestruturada e não estruturada afirmam que o entrevistador deve conhecer bem o tema que deseja estudar pois o entrevistado é mais livre para responder questões e dizer suas impressões a respeito do tema do que em entrevistas fechadas podendo fugir do tema assim o entrevistador deve guiar a entrevista para obter as informações que deseja Fontana e Frey 2005 apresentam ainda alguns passos para a realização da entrevista que foram utilizados nesta pesquisa 1 acessar o meio que está sendo estudado 2 compreender a linguagem e a cultura dos respondentes 3 decidir a melhor maneira de se apresentar 4 localizar um informante 5 ganhar a confiança do entrevistado 6 estabelecer uma relação de abertura para a entrevista 7 coletar o material através da entrevista no caso com a utilização de um gravador Decidiuse por realizar uma pesquisa com pessoas que estagiam atualmente ou estagiaram recentemente desde que o estágio fosse o primeiro contato que estas pessoas tiveram com um emprego para ser possível coletar as primeiras impressões relativas ao trabalho por esses indivíduos Para obter entrevistados para a pesquisa foram abordadas pessoas provindas de diversas áreas do conhecimento e de diferentes universidades as quais estivessem dispostas a colaborar com a pesquisa e se enquadrassem no requisito do primeiro emprego Os entrevistados foram abordados em ambiente acadêmico e convidados a participar das entrevistas e assim relatarem suas experiências para este estudo Vale ressaltar que esta pesquisa se interessa em trabalhar com a subjetividade dos entrevistados e não obter uma resposta global replicável sobre o tema do sofrimento do trabalho dos estagiários Foram obtidas três entrevistas com cerca de quarenta minutos de duração Compreendese que o número de entrevistados relativamente pequeno conseguiu trazer elementos significativos para a realização da análise de seus relatos frente à teoria e responder aos anseios desta pesquisa Os nomes atribuídos às entrevistadas são fictícios por questão de sigilo de pesquisa Alice cursou engenharia civil na Universidade Estadual de Maringá na cidade de Maringá e as informações da entrevista são relacionadas a um estágio que teve duração de seis meses Beatriz cursou farmácia na Universidade Estadual de Londrina e realizou um estágio de seis meses na cidade de Londrina Cecília cursou medicina no Centro Universitário Ingá e falou de suas experiências sobre residência em diversos hospitais durante dois anos A partir das experiências trazidas pelas estagiárias através das entrevistas semiestruturadas realizouse uma análise de conteúdo destas entrevistas categorizando os trechos das entrevistas de acordo com a teoria de sofrimento no trabalho de Dejours 2008 2012ª 2012b 2015 e os aspectos de cultura organizacional de Schein 1988 para poder analisar o sofrimento no trabalho destas pessoas Nas entrevistas primeiramente fora questionado a respeito das expectativas dos indivíduos sobre o estágio antes de iniciálo e sobre a realidade que observaram e as diferenças entre a expectativa e a realidade Questionouse também a respeito das práticas realizadas e a relação de conhecimento e MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 28 aprendizagem obtidos com a experiência do estágio Com estes dados em mãos foram categorizados os trechos da entrevista onde fora observado defesas práticas que traziam maiores sofrimentos quebras de expectativas aprendizagem realização no trabalho RESULTADO A fim de poder fazer parte de um grupo de profissionais e atuar na área da profissão escolhida em diversos cursos universitários é necessário que o estudante conclua as disciplinas de seu curso e também participe dos estágios obrigatórios relacionados à atividade profissional que irá exercer futuramente O período do estágio é um tempo no qual os estudantes conhecem a prática das atividades e a aplicação das teorias aprendidas dentro da sala de aula Também é um momento de confrontação do conhecimento teórico e prático com a comprovação da utilidade dos conhecimentos teóricos aplicados na prática Além disso o estudante se depara com diversos problemas conflitos e situações rotineiras do trabalho e tem a possibilidade de treinar e verificar a sua competência para resolver os problemas com a supervisão de profissionais mais experientes conforme ressalta a estagiária Alice Querendo ou não fazer estágio é testar se você é capaz de exercer a sua profissão ou não certo É perceptível que existe uma grande expectativa por parte dos estudantes para iniciar os estágios e aprender sobre o funcionamento prático da profissão Cecília e Alice apresentam as suas expectativas antes da realização dos estágios e durante os estágios Para elas houve uma quebra de expectativa Quando a gente entra no curso de medicina a gente não vê a hora de chegar ao internato porque passamos quatro anos extremamente difíceis e imaginando como vai ser para colocar tudo isso conhecimento teórico em prática Então a gente acha que vai entrar no quinto ano sendo o médico o melhor médico da face da Terra e que todas as pessoas serão legais que vão te ensinar tudo e que você só vai fazer o bem para as pessoas A realidade é bem diferente Porque você encontra pessoas muito diferentes de você acho que esse é o ponto que mais dificulta quando você vai para um estágio Porque você acha que todo mundo vai te tratar como você trata os outros e na verdade não é assim Cecília Quanto eu estava na graduação eu queria muito estagiar em obra eu estava no terceiro e quarto ano e estava tendo aquelas matérias de construção civil e eu achava chato ver na teoria queria ver na prática Eu queria estagiar em obra então eu esperava muito de um estágio assim Acho que no começo de todo estágio você fica animado porque está aprendendo depois vai ficando um pouco maçante Por isso tem muita gente que troca muito de estágios Alice Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 29 Um ponto apresentado por Alice foi o do trabalho maçante Quando as atividades se tornam rotineiras e não estimulam a criatividade tentem a se tornar maçantes e sem sentido Isso pode ocorrer também pela atribuição de tarefas insignificantes ou divergentes da atribuição dos estagiários o que causa também grande insatisfação nos estudantes Alice ressalta a monotonia do trabalho e a atribuição de tarefas que não eram referentes ao setor de engenharia como por exemplo tarefas de outros setores da empresa que estavam sobrecarregados organização e arquivamento de papéis antigos e atividades burocráticas Na Empresa X o que me angustiava às vezes era serviços que nem tinham a ver com a engenharia Porque até os três meses eu estava aprendendo as coisas depois ficou monótono porque ficou repetitivo Tudo repetitivo E às vezes eu era solicitada para colar papeizinhos do RH nas paredes Alice Beatriz também conta da sua insatisfação em realizar trabalhos que eram atribuição de outros profissionais do laboratório de farmácia mas que eram repassados para que os estagiários realizassem Eu tinha que fazer trabalho de técnico era tão escravo que eu tinha que fazer trabalho de técnico Muita falta de respeito Beatriz conta que não recebia nenhuma remuneração para realizar os trabalhos que eram atribuídos aos profissionais da área no caso os técnicos do laboratório apenas recebia almoço do restaurante universitário Era bem pesado também Era um estágio mas a gente fazia a rotina das pessoas do setor Eu fiquei uns seis meses Fiquei bastante Porque eu só queria almoçar de graça Sobre esse mesmo assunto Cecília conta sobre a alta carga de trabalho que estava submetida bem como a responsabilidade que lhe era designada A gente tem que ter contato com paciente só que lá no Hospital A o fluxo é grande Então assim a gente se divide uma quantidade x de alunos para uma quantidade muito grande de pacientes e a gente tem um tempo limitado são só 6h de estágio por dias a gente tem um tempo limitado para fazer nossas funções A gente tem pouco tempo para ter o contato com o paciente E poder passar as informações Então a gente estuda pouco a gente toca serviço mesmo e é normal porque alguém tem que fazer E como a gente é interno na hierarquia a gente é mais zoado a gente tem que fazer o que eles mandam a gente fazer Cecília Alice por sua vez conta que percebia que seu trabalho era considerado mais uma mãodeobra barata e que sabia que não existia um interesse por parte da Empresa X em treinar os estagiários para contratos futuros Na Empresa X eu não sentia que o trabalho era importante tanto que eu saí de lá Eu via que eles queriam alguém para arrumar as baguncinhas É diferente de uma empresa que pega os estagiários no intuito de ensinar fidelizar e ficar com eles por lá Eu via que por mais que eu fizesse um ótimo trabalho desse o melhor de mim lá eles não tinham interesse em me contratar Alice MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 30 Um fato interessante da percepção do estágio pelas entrevistadas foi a aparição dos termos escravo e escraviário um neologismo com as palavras estagiário e escravo em todas as entrevistas Remetendo a grande quantidade de trabalho atribuída sem um balanceamento da carga de trabalho e ao não recebimento de salário ou recebimento de um valor simbólico Isso é percebido na fala de Beatriz que comenta Era um trabalho meio escravo porque a gente não ganhava nada A gente só ganhava certificado e almoço mas não tinha incentivo de nada Essa percepção também aparece nas falas de Alice e Cecília Também a questão de que a supervisora não se planejava muito para me passar as atividades e passava em cima da hora Ás vezes eu passava a semana inteira sem ter uma atividade estava lá ociosa dai ela passava na quinta feira para eu entregar na sexta e não dava tempo E ela acabava me cobrando horário extra pra eu estar indo lá e eu não podia por causa das aulas Alice E no Hospital A os preceptores também não são médicos com didáticas então eles querem que você toque serviço eles não estão preocupados com seu aprendizado ou não eles tocam muito serviço você sai de lá com um estresse absurdo porque você acha que não aprendeu nada não está fazendo bem para ninguém e não está fazendo nada da sua vida Cecília Notase também no trecho da entrevista de Cecília que os principais responsáveis por orientar os estagiários nesta nova fase da profissão que no caso da medicina são os médicos preceptores nem sempre estão dispostos a ensinar e dedicar seu tempo de maneira a auxiliar os estudantes Por vezes até utilizam sua posição de poder para humilhar os recémchegados Tem muitas pessoas muitos preceptores médicos responsáveis por orientar os estagiários de medicina principalmente que acham que são melhores que você e daí eles te colocam para baixo de todas as formas possíveis Então jogaram a gente lá e a gente fica lá Então as pessoas são bem hostis na maioria do tempo Não todas mas a maioria delas são bem hostis E fica bem na cara que elas não querem você ali Cecília Em alguns casos os estagiários chegam a ser humilhados de acordo com o relato de Cecília E a preceptora que passava visita no leito do paciente ela queria que você soubesse tudo de todos assim extremamente rápido E se você não soubesse ela te humilhava no meio de todo mundo Daí gritava no corredor umas coisas assim Então a gente chegava meio tenso para trabalhar Cecília Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 31 Um ponto que chama a atenção na questão do sofrimento no trabalho são as condições precárias e hostis de trabalho onde não só os estagiários estão realizando suas atividades mas todos os trabalhadores do setor A falta de percepção da sujeira por parte dos funcionários que conviviam com o ambiente pode ser compreendida como uma estratégia de defesa a fim de conseguir realizar seus trabalhos sem se incomodarem com o ambiente Era uma condição precária O pessoal trabalhava de chinelo Os clínicos técnicos eram super porcos Eu achava assim que era uma porquísse Eu odiei esse estágio e nunca quis fazer micro estudo da microbiologia Porque era muito porco mexer com bactéria e o povo comia em lugar perto Tinha um lugar de comer que era do lado do laboratório E daí era bem ruim Beatriz Outra estratégia defensiva é encontrada no relato de Beatriz que considera que o sofrimento gerado no estágio foi necessário para sua decisão de não querer realizar atividades relacionadas à prática do trabalho Foi bom para eu saber que eu não iria querer aquilo para a minha vida nunca mais Cecília que considera que os estagiários que estão aprendendo atrapalham o setor e isso é em decorrência da falta de treinamento que despendem ao estagiário pois os mesmos ficam perdidos na realização de suas atividades por falta de um direcionamento Tem alguns profissionais de outras áreas como enfermagem técnicos que não gostam da sua presença ali acham que você atrapalha de todas as formas possíveis Atrapalhar a gente sabe que atrapalha principalmente porque você chega em um lugar desconhecido você não sabe o que você vai fazer Até você pegar o jeito claro que você tem muitas perguntas para fazer Você precisa entender como é que funciona aquilo e eles não tem paciência nenhuma para te explicar e você fica largado e perdido lá Cecília A suposição de Cecília de que o ato de estagiar atrapalha os outros funcionários do setor pode ser considerada uma estratégia de defesa De forma que não enxerga que o problema está na falta de direcionamento e não na presença dos acadêmicos no ambiente em que estão inseridos Quanto ao ambiente de trabalho e a cultura organizacional Cecília conta como a mudança do estágio do Hospital A para o Hospital B mudou a sua visão sobre uma das áreas da medicina a clínica médica na qual Cecília detestava no Hospital A e passa a gostar muito no Hospital B Na verdade tem várias rotações então tem as rotações que você gosta e as rotações que você detesta Acho que lá no Hospital A por causa desses preceptores em específico de uma rotação aí todo dia era uma tragédia ir para lá Que era a parte da clínica médica Que foi diferente no Hospital B que eu adorava fazer a parte de clínica médica No Hospital A não Mas é por causa da pressão psicológica que eles faziam na gente sabe Cecília MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 32 De acordo com Cecília a diferença entre os dois hospitais estava na área de recursos humanos do hospital ou seja na forma de tratar as pessoas Pois as rotinas de trabalho dos dois hospitais eram bastante parecidas e o que mudava era apenas a maneira de tratar os internos com mais paciência e atenção no Hospital B Verificase que as entrevistadas tinham consciência de que o estágio gerava algum sofrimento mas ao mesmo tempo se utilizavam das estratégias defensivas para justificar a sua realização como a obrigação para terminar o curso de graduação cumprindo os requisitos exigidos de currículo os benefícios de auxílio financeiro ou alimentício e a possibilidade de ter as primeiras experiências com o trabalho As estagiárias reconhecem que precisam realizar o estágio que este momento é importante para conhecer e começar a praticar a profissão que escolheram e que recebem ajuda para aprender e realizar as tarefas no novo ambiente de trabalho Conforme ressalta Alice Ainda assim para gente aprender para o seu crescimento profissional pessoal é bom Do mesmo modo Cecília também aponta alguns benefícios Em compensação tem procedimentos que os preceptores deixam a gente fazer que é o que a gente realmente quer fazer Mas é tudo supervisionado nós não fazíamos os procedimentos mais elaborados sozinhos Sabese que os hospitais escola e empresas de diversos ramos participam de um convênio com as universidades e faculdades e dessa forma é obrigação da organização que oferece o estágio promover um ambiente de aprendizado para eles Ou seja recebem os estagiários que podem auxiliar de alguma forma no trabalho mas em contrapartida devem fornecer informações para que os mesmos consigam atuar de maneira eficiente Ademais o estágio pode causar certa ansiedade nos estudantes visto que o fracasso nem sempre é compreendido como uma parte do crescimento mas como uma deficiência pessoal ou da formação do conhecimento Este tipo de fracasso pode gerar traumas ou fortalecer a vontade de permanecer na profissão quando superado DISCUSSÃO A relação de trabalho de estágio contém dois atores a empresa que contrata e o estagiário que oferece o seu serviço A empresa recebe um profissional que não tem sua formação completa ainda e oferece um campo de estudo para que o acadêmico possa experimentar como funciona o trabalho Por essa razão entendese que a empresa não precisa remunerar o estagiário da mesma forma que a um profissional formado já que recebe um serviço de um trabalhador não graduado e o auxilia nesta formação Ressaltase que a empresa gasta seus recursos de tempo e pessoal para o treinamento dos estagiários porém o que se discute é que em troca a empresa recebe a mãodeobra e o conhecimento teórico que o estagiário já tem obtendo benefícios e remunerando de maneira desconforme Pois o estagiário possui alguma carga teórica e ademais o conhecimento da vida prática que é utilizado para a realização das demandas de trabalho da empresa Assim o vínculo entre o estagiário e a empresa começa a ficar desproporcional na medida em que o estagiário avança em seu conhecimento dá bons resultados para a empresa mas não é reconhecido e frequentemente não é remunerado de acordo com o benefício que proporciona Verificase que o que ocorre é a utilização destas pessoas como mãodeobra barata simplesmente como uma maneira de economizar os recursos da empresa Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 33 Pela obrigatoriedade de cumprimento do tempo de estágio como uma disciplina curricular as estudantes se veem obrigadas a se submeterem a trabalhos que nem sempre estão relacionados ao trabalho da profissão ou ainda que lhes causem enormes desgastes Para isso recebem algum valor financeiro simbólico como a alimentação ou simplesmente uma carta de comprovação das horas cumpridas para anexar ao currículo e poder enfim finalizar o curso de graduação É interessante notar que o trabalho é uma atividade social e coletiva porém apenas uma das entrevistadas tratou sobre o assunto das equipes de trabalho e as três consideraram o estágio por um âmbito mais pessoal Verificase que as estagiárias trataram o trabalho como um desafio que deveria ser superado apenas por si e não em um coletivo de pessoas que deveriam se ajudar mutuamente Essa falta de envolvimento e a hostilidade que são tratadas e tratam a empresa tornase um conflito nocivo para o entendimento geral do trabalho Afinal entendese que uma organização é um sistema que utiliza pessoas para a realização de um fim Dessa maneira compreender qual seu papel para o resultado final da organização é de fundamental importância para o funcionamento geral da empresa e bem estar dos funcionários Nas entrevistas foi possível compreender que o estágio é entendido apenas como um meio para alcançar o diploma e não um fim já que as três entrevistadas não acreditavam que seriam efetivadas nos seus estágios Esse aspecto pode explicar a falta de envolvimento com o pessoal do trabalho de forma que as entrevistadas compreendem a realização do trabalho como uma competência pessoal primeiramente uma prova final para verificar se estão prontas como profissionais para atuarem no mercado sem o interesse em estabelecer relações Ademais verificase que as estagiarias negligenciam o sofrimento gerado pelo estágio não raro utilizando estratégias defensivas de Dejours 2012b Porém vale discutir se vale a pena esclarecer para a pessoa que algumas de suas ações são defesas Aguentariam o sofrimento psíquico gerado pela compreensão dessa nova realidade De qualquer forma acreditase que apenas o reconhecimento da realidade gera a oportunidade de escolha em permanecer ou não em um ambiente nocivo ou agradável Unindo a suposição de que o estágio bem cumprido depende da adequação do indivíduo ao trabalho com as estratégias defensivas que o próprio cria temse que o indivíduo não percebe o quanto o estágio pode estar fazendo mal para sua saúde psíquica e ainda pode ter uma impressão errada sobre a profissão que pretende exercer futuramente Dessa forma é imprescindível que se discuta e se trate os problemas de sofrimento no trabalho ainda mais tendo em conta que estes são provavelmente os primeiros contatos dos estagiários com a profissão que exercerão no futuro CONCLUSÕES Este estudo se propôs a discutir as expectativas dos estagiários frente ao tema do trabalho e os sofrimentos gerados por ele As entrevistas convergiram para alguns fatores chave que relacionaram o sofrimento no trabalho dos estagiários com insatisfação inutilidade do trabalho humilhação trabalho sem sentido desmerecimento da função DEJOURS 2015 a vontade de contribuir com o grupo e não conseguir e de não se sentir útil SCHEIN 1998 MÃODEOBRA BARATA O SOFRIMENTO NO TRABALHO DE ESTAGIÁRIOS PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 34 Compreendeuse que as estagiárias tinham grandes expectativas que não se mostraram na realidade Em um primeiro momento existia a euforia da descoberta no trabalho o vislumbre da possibilidade de um emprego BEATRIZ 2010 a possibilidade de aquisição de conhecimento e a importância da realização do estágio como uma forma de trabalho na área de formação antes da obtenção do diploma Porém com o passar do tempo os trabalhos ficavam monótonos sem objetivo de aprendizagem e desgastantes Esse fator pode estar relacionado ao fato de as empresas não terem clareza a respeito das funções do trabalho do futuro profissional e nem um plano de crescimento e acompanhamento do desenvolvimento do mesmo Os entrevistados contaram sobre as suas práticas diárias e neste ponto foi possível observar não só como os entrevistados realizavam suas tarefas mas como as observaram e o trabalho e como se sentiam em relação a ele Com isso foi possível interpretar o sofrimento do indivíduo a partir de suas expectativas e de suas práticas Como contribuição teórica verificase que já nos primeiros contatos com o trabalho podem surgir as estratégias de defesa DEJOURS 2015 Estas estratégias podem estar relacionadas com o fato de se ter despendido grande energia para a conclusão de um curso universitário e ao fim do percurso quando estes formandos se deparam com o tralho de sua futura e profissão precisam negligenciar para si mesmo os sofrimentos psíquicos que o mesmo gera a fim de manteremse no trabalho sem questionar se este é ou não um ambiente saudável Jéssica Syrio Callefi Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto PRETEXTO 2019 Belo Horizonte v 20 N 3 p 2235 JULSET ISSN 1517672 x Revista impressa ISSN 19846983 Revista online 35 REFERÊNCIAS Angella M Work recognition and subjectivity Relocating the connection between work and social pathologies European Journal of Social Theory v 19 n 3 p 340354 2015 Arentd H A condição humana Tradução Roberto Raposo Rio de Janeiro Forense Universitária 2011 Beatriz M Z O trabalho a repressão e o malestar do trabalhador algumas reflexões Rev MalEstar Subj online v 10 n 4 p 11071130 2010 Disponível em httppepsicbvsaludorgscielophpscriptsciarttextpidS1518 61482010000400003 Dejours C A loucura do trabalho estudo de psicopatologia do trabalho 6ª ed São Paulo CortezOboré 2015 Dejours C Christophe Dejours da psicopatologia à psicodinâmica do trabalho Brasília FIOCRUZ 2008 Dejours C Psicodinâmica do Trabalho e Teoria da Sedução Psicologia em Estudo v 17 n 3 p363371 2012a Doi httpdxdoiorg101590S141373722012000300002 Dejours C Trabalho Vivo Vol 1 Tradução de Franck Soudant Brasília Paralelo 15 2012b Denzin N K L Y S Introdução a disciplina e a prática da pesquisa qualitativa In Denzin N K Lincoln Y S Org O planejamento da pesquisa qualitativa teorias e abordagens 2ª ed Porto Alegre Artmed p 1541 2006 Dorado C B Solarte M G Efectos del miedo en los trabajadores y la organización Estudios Gerenciales v 32 n 1 p 6070 2016 Doi httpsdoiorg101016jestger201510002 Enriquez E Perda do trabalho Perda da identidade Caderno da Escola do Legislativo v 5 n 9 p 5373 1999 Disponível em httpsdspacealmggovbrhandle110371062localeen Fontana A Frey J H The interview from neutral stance to political involvement 3th ed In N K Denzin Y S Lincoln Org The sage handbook of qualitative research pp 695727 London England Sage 2005 Lancman S Uchida S Trabalho e subjetividade o olhar da Psicodinâmica do Trabalho Cadernos de Psicologia Social do Trabalho v 6 n1 pp 7990 2003 Machado L S Macêdo K B Machado M R R Diagnóstico de pesquisas internacionais em psicodinâmica do trabalho no Brasil PsicologiaSaúde Doenças v 18 n 1 p 6984 2017 Marx K Trabalho assalariado e capital Lisboa Avante 1849 Disponível em httpswwwmarxistsorgportuguesmarx18490405htm Morin E Tonelli M J O trabalho e seus sentidos Psicologia Sociedade v 19 n 1 p 4756 2007 Doi httpdxdoiorg101590S010271822007000400008 Santos J L D CorralMulato S Bueno S M V Robazzi M L do C C 2016 Feelings of nurses faced with death pleasure and suffering from the perspective of psychodynamics of Dejours Invest Educ Enferm v 34 n 3 p 511517 2016 Doi doi1017533udeaieev34n3a10 Schein E La cultura empresarial y el liderazgo una visión dinámica Barcelona Espanha Plaza Janes 1988 Taylor F W Princípios da administração científica Tradução Arlindo Vieira Ramos 8º ed São Paulo Atlas 1990 Tweedie D The Normativity of Work Retrieving a Critical Craft Norm Critical Horizons v 18 n 1 p 6684 2017

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