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A gestão escolar no contexto das recentes reformas educacionais brasileiras School management within the context of recent brazilian educational reforms La gestión escolar en el contexto de las recientes reformas educativas brasileñas MARÍLIA FONSECA JOÃO FERREIRA DE OLIVEIRA Resumo Com base em pesquisa interinstitucional o artigo trata de repercussões de dois programas brasileiros de gestão escolar desenvolvidos com financiamento internacional o Fundescola e o PróQualidade A pesquisa apontou o fortalecimento de uma visão gerencial estratégica e a convivência de duas concepções opostas de gestão da educação pública ora privilegiando práticas gerenciais Plano de Desenvolvimento da Escola ora sinalizando para as aspirações da comunidade por uma escola mais autônoma e de qualidade Projeto Político Pedagógico Palavraschave gestão estratégica da escola ensino fundamental autonomia escolar cooperação internacional Abstract Based on interinstitutional research the article looks at the effects of two Brazilians programs in education management carried out with international financing the Fundescola and the PróQualidade Research indicates the strengthening of a strategic managerial approach and the existence of two opposing concepts of public educational management at times favoring managerial practices School Development Plan while at other times emphasizing the aspirations of the community for a more autonomous and qualitybased school Political Pedagogical Project Keywords strategic school management primary school school autonomy international cooperation Resumen Con base en investigación interinstitucional el artículo trata de los efectos de dos programas brasileños de gestión escolar implementados con financiamiento internacional el Fundescola y el PróQualidade Los resultados de la investigación señalan el fortalecimiento de una visión gerencial estratégica y la existencia de dos concepciones opuestas de gestión de la educación pública ya sea favoreciendo prácticas gerenciales Plan de Desarrollo de la Escuela o entonces enfatizando las aspiraciones de la comunidad educativa por una escuela más autónoma y de calidad Proyecto Político Pedagógico Palabras clave gestión estratégica de la escuela enseñanza primaria autonomía escolar cooperación internacional RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 233 INTRODUÇÃO O presente texto apresenta resultados de pesquisa interinstitucional destinada a compreender e analisar algumas experiências de gestão escolar no ensino fundamental brasileiro desenvolvidas a partir da década de 1990 Nessa direção foram examinados dois programas o Projeto Melhoria da Qualidade na Educação Básica PróQualidade em Minas Gerais e o Fundo de Desenvolvimento da Escola Fundescola nas regiões Nordeste Norte e CentroOeste Os dois projetos integravam a política de financiamento do Banco Mundial para o desenvolvimento da gestão da escola básica brasileira O primeiro já foi encerrado o segundo iniciouse em 1998 e encontrase em fase de conclusão prevista para 2010 O objetivo da pesquisa foi refletir sobre o impacto do PróQualidade e do Fundescola na gestão e organização do trabalho escolar Focouse sobretudo o Plano de Desenvolvimento da Escola PDE concebido como uma modalidade de planejamento estratégico e que constitui o carrochefe dos dois programas Buscouse detectar como a comunidade escolar acolhe os projetos como percebe a vinculação entre esses programas e as macropolíticas que os sustentam e como avalia seus efeitos na organização e gestão da escola bem como no trabalho e nos processos ensinoaprendizagem Participaram da pesquisa professores e estudantes de graduação e de pósgraduação das seguintes instituições Universidade de Brasília UnB Universidade Federal de Goiás UFG Universidade Estadual de Montes Claros Unimontes Universidade Federal de Tocantins UFT Universidade Federal de Uberlândia UFU e universidades Federal e Estadual do Mato Grosso do Sul UFMS e UEMS REFORMA DO ESTADO E GESTÃO EDUCACIONAL COOPERAÇÃO INTERNACIONAL DESCENTRALIZAÇÃO E EFICIÊNCIA As novas propostas voltadas para a gestão da educação básica a partir dos anos 1990 fazem parte do conjunto de mudanças que compuseram a reforma do Estado brasileiro no contexto da reestruturação produtiva capitalista e das orientações políticas econômicas e educacionais de inspiração neoliberal Havia que fazer frente à configuração do novo sistema econômico global marcadamente orientado pelos princípios do neoliberalismo e ainda adaptarse às demandas da nova estrutura produtiva e tecnológica que exigia novas perspectivas na formação dos trabalhadores A administração pública adquiriu um formato gerencial mais ágil e flexível com o objetivo de imprimir eficiência ao desempenho do Estado tornandoo mais compatível com a atual fase do capitalismo global e competitivo Uma das ações prioritárias foi a descentralização pela qual foram transferidas funções da burocracia central para estados e municípios e para as denominadas organizações sociais configuradas como entidades de direito privado públicas nãoestatais Tais organizações atenderiam a 234 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 serviços como os de saúde e educação considerados serviços fundamentais mas não exclusivos do Estado Com essa alternativa o Estado deixaria de ser o responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social garantindo para si a definição e o controle das decisões estratégicas BRASIL 1995 As mudanças que orientaram a reforma do Estado brasileiro tiveram efeitos imediatos na gestão do sistema educacional Na década de 1990 foram desenvolvidas modalidades de gestão que prometiam a melhoria dos indicadores de evasão e repetência além do rendimento dos alunos a autonomia e a participação da família da comunidade educacional e da sociedade em geral em decisões afetas à escola Compreendiase assim a gestão escolar eficiente como aquela capaz de produzir mais com menor custo inclusive buscando fontes alternativas para o financiamento da escola Enfim traduziase por um conjunto de mudanças e processos com certo grau de sistematização com vistas a modificar políticas atitudes idéias e conteúdos curriculares entre outros Essas orientações foram postas em ação por meio de iniciativas nacionais como o Programa Dinheiro Direto à Escola PDDE que como o próprio nome diz destina recursos para serem geridos pelas unidades escolares cujo controle se dá por meio de entidades de direito privado dentre eles a Associação de Apoio à Escola e o Caixa Escolar Outras iniciativas desse porte foram implementadas no âmbito de acordos de financiamento do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento Banco Mundial ou Bird com os estados ou com o Ministério da Educação MEC Na década de 1990 os organismos internacionais tiveram presença marcante no Brasil dentre eles a Unesco o Unicef o Pnud e o Banco Mundial BM Na educação básica este último projetouse como a principal agência internacional de cooperação seja pela amplitude territorial e temporal de seus projetos seja pela magnitude dos financiamentos Dois acordos foram firmados com o governo federal e outros diretamente com os governos dos estados de São Paulo Minas Gerais Bahia Ceará Espírito Santo e Paraná O Projeto Nordeste também faz parte desse processo fruto de um acordo do MEC com o BM para o desenvolvimento do ensino nas quatro primeiras séries da educação fundamental em toda a região nordeste De acordo com a expectativa gerada pela cooperação do BM as experiências dos projetos seriam repassadas para o sistema educacional como um todo produzindo eficiência maior produtividade educacional com menor custo e eficiência esta entendida como alcance de objetivos de impacto para melhorar o desempenho escolar expansão de matrículas diminuição da evasão e da repetência O PRÓQUALIDADE REFLETINDO SOBRE SEUS OBJETIVOS E IMPACTOS Buscavase com o Projeto PróQualidade melhorar o desempenho do sistema educacional do estado de Minas Gerais mediante formas construtivas para RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 235 efetivar mudanças na organização e aperfeiçoamento das escolas inclusive auxiliandoas a elaborar seu próprio planejamento a longo prazo O projeto definiu estratégias para a ajudar os diretores de escola a assumirem seus novos papéis de líderes e administradores em sistema estadual mais descentralizado b proporcionar aos administradores centrais e regionais instrumentos para as tomadas de decisão com informações adequadas c aumentar o acesso de professores a oportunidades de treinamento d distribuir um conjunto de materiais didáticos aos alunos das escolas públicas e melhorar a administração da rede física de modo a assegurar a utilização adequada do espaço escolar O PróQualidade foi executado em conjunto com o Programa Gerência da Qualidade Total na Educação GQTE¹ Com esses programas deuse início a partir de 1991 a uma profunda reforma política administrativa financeira e pedagógica na rede escolar estadual de Minas Gerais Seus resultados foram utilizados como base para a definição de próximo acordo do MEC com o BM o Fundo de Desenvolvimento da Escola Fundescola também foco de análise do presente texto Integravam o PróQualidade três programas complementares o Plano de Desenvolvimento da Escola PDE que visava a solução de problemas rotineiros e formas ultrapassadas de organização escolar mediante a adoção de planejamento com enfoque gerencial planejamento estratégico o Programa de Apoio às Inovações Educacionais Paie que desenvolvia múltiplas modalidades de formação continuada e de trabalhos participativos voltados para refletir acerca da realidade vivida na prática cotidiana da escola e completando essa tríade o Projeto de Desenvolvimento e Enriquecimento Curricular Prodec cuja especificidade era favorecer as ações incentivadoras da autonomia das práticas pedagógicas estimulando a própria comunidade escolar a solucionar problemas pedagógicos prioritários definidos pelas escolas BANCO MUNDIAL 1994 MINAS GERAIS 1997 Cabe observar que a investigação específica sobre o Programa de Apoio às Inovações Educacionais Paie em Minas Gerais foi coordenada por professores da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Montes Claros Unimontes e sua Unidade Descentralizada de Pirapora VELOSO et al 2004² ¹ O programa Gerência da Qualidade Total GQTE tinha como finalidade regulamentar o art 206 inciso VI da Constituição Federal de 1988 e o art 196 inciso VII da Constituição Federal de Minas Gerais de 1989 que dispõem sobre a gestão democrática do ensino na forma de lei O PróQualidade foi implantado em 1993 com a assessoria da Fundação Christiano Ottoni FCO que integra a Escola de Engenharia da Universidade de Minas Gerais Originalmente destinado ao setor empresarial foi estendido para setores da administração pública especificamente para educação Integrouse ao projeto PróQualidade que só foi oficializado em 1994 a partir da assinatura do acordo entre Secretaria de EducaçãoMG e o Banco Mundial MARQUES e PAIVA 2005 ² Foram investigadas quatro escolas sendo três delas localizadas no município de Montes Claros e uma em Pirapora Como sujeitos da pesquisa foram entrevistados 16 professores Implantado pela resolução n 8036 de 1º de agosto de 1997 o Paie desenvolveu uma série de ações em escolas estaduais de ensino fundamental de Minas Gerais Previa a mobilização da comunidade educativa como forma de descentralizar a gestão escolar e estimular a inovação do trabalho pedagógico num processo coletivo e de proposição de idéias meios e ações Promoviase assim a reflexão acerca da realidade escolar e a elaboração de um projeto de ação educativa para culminar com a transformação da realidade em questão Visava ainda imprimir uma nova dinâmica nas práticas educativas utilizando metodologias inovadoras e estratégias participativas promovendo parcerias com a comunidade em geral e com as famílias dos alunos na busca de soluções para problemas e questões de natureza pedagógica As escolas beneficiárias dos recursos do Paie foram selecionadas pela SEEMG mediante concurso que apontou os projetos escolares com maior possibilidade de atingirem bons resultados de aprendizagem medidos pelas taxas de reprovação de abandono e pelo rendimento escolar em Português e Matemática aferido por avaliação externa Esses indicadores determinavam o grau de risco de cada escola baixo risco escolas com índice de risco até 20 médio risco escolas com índice de risco entre 20 e 30 alto risco escolas com índice médio acima de 30 Segundo os docentes entrevistados ainda que o Paie tenha sido bem acolhido na rede as ações não lograram estabelecer um processo críticoreflexivo acerca da realidade escolar As ações inovadoras adquiriram um sentido de novidade ou quebra de rotina instalandose uma percepção de que a inovação em si garantiria a qualidade dos processos educativos produzidos pela escola Não foi possível romper com as verdadeiras causas do fracasso escolar e tampouco foram abordadas convenientemente as questões pedagógicas A inovação limitouse à introdução de uma aparência modernizante via elaboração de projetos que produzissem um movimento diferenciado no interior da instituição escolar Para muitas professoras as ações propostas pelo Paie já vinham sendo desenvolvidas pelas escolas constituindo pois uma continuidade de práticas já vividas cujas experiências significados finalidades e resultados não foram sequer discutidos Os depoimentos deixaram perceber que as professoras eram compreendidas como executoras do Paie não lhes cabendo a nem a concepção e a tomada de decisões e tampouco a avaliação das propostas do programa VELOSO et al 2004 O Projeto de Desenvolvimento e Enriquecimento Curricular Prodec foi executado no período de 1998 a 2003 Caracterizavase como uma ação inovadora complementar ao Paie pelo fato de ser elaborado pela equipe docente da escola com a participação de outros membros da comunidade escolar em escolas de primeira a oitava série sendo um professor de cada disciplina além de um supervisor e um diretor em cada escola Ao todo foram entrevistados vinte e quatro interlocutores sendo dezesseis professores quatro supervisores e quatro diretores RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 237 Foram estabelecidos como critérios de seleção para participar do Prodec o grau de sucesso da escola na execução do Paie a qualidade da proposta pedagógica da escola o nível de participação da comunidade e a própria pertinência e relevância da proposta para o Prodec À semelhança do Paie cada escola receberia os recursos de forma diferenciada de acordo com sua categoria de risco e o número de alunos Destinouse um percentual para cada categoria 50 das oportunidades estariam à disposição das escolas classificadas como de alto risco 30 das oportunidades estariam à disposição das escolas de médio risco e 20 para a categoria de baixo risco Os programas Paie e Prodec foram investigados por um grupo de professores da Universidade Federal de Uberlândia MARQUES e PAIVA 2005³ Os resultados assemelharamse àqueles obtidos na investigação realizada pelo grupo da Unimontes Segundo os dirigentes e professores entrevistados as escolas conseguiram mesmo que timidamente impor uma nova postura ao trabalho escolar permitindo maior integração da comunidade e nova forma de realizar atividades pedagógicas Um outro aspecto apontado foi a contribuição no sentido de melhorar a disciplina dos alunos Um fator a se considerar com respeito aos dados da pesquisa é que embora o Prodec fosse um projeto voltado para o desenvolvimento do currículo e das atividades pedagógicas ocorreu um descompasso entre o ideal e o real um relativo distanciamento entre o preconizado pela proposta oficial e as parcas mudanças que se efetivaram no currículo e nas práticas pedagógicas consideradas de pouca monta em face da expectativa gerada pelo projeto Os dados empíricos evidenciaram ainda que não ocorreu o êxito esperado do Prodec quanto à promoção de uma mudança cultural dos profissionais envolvidos bem como a adoção de novos valores que possam ser capazes de propiciar mudanças na prática pedagógica Nesse sentido não houve um envolvimento que pudesse causar impactos no desenvolvimento do projeto Tal mudança exigiria romper com paradigmas já estigmatizados ao longo da construção da história institucional profissional da comunidade escolar o que demandaria a vontade e o compromisso de toda a equipe responsável pela realização das ações ³ Para a seleção das escolas investigadas foram definidos os seguintes critérios ter participado do Paie pertencerem aos diferentes níveis de classificação pelo grau de complexidade baixo médio e alto risco conforme definição da SEEMG no momento de implementação do projeto terem demonstrado na execução do Paie desempenho favorável e desfavorável também conforme avaliação da SEEMG pertencer ao município de Uberlândia e localidades adjacentes Conforme tais parâmetros as escolas selecionadas foram Escola Estadual Jardim das Palmeiras de Uberlândia considerada de alto risco Escola Estadual Visconde de Ouro Preto de Araguari considerada de médio risco sendo que ambas obtiveram resultados de sucesso E também Escola Estadual do Parque São Jorge de Uberlândia considerada de alto risco Escola Estadual Honório Guimarães considerada de médio risco Como sujeitos da investigação foram entrevistados em cada escola um professor participante um professor não participante do projeto um membro da equipe pedagógica e um dos coordenadores do Prodec 238 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 Como as pesquisadoras assinalaram o sucesso de uma proposta de inovação da prática pedagógica depende do fortalecimento de múltiplas faces do funcionamento do contexto da escola tais como gestão organização do tempo e espaço da escola currículo metodologias condições de trabalho e formação continuada Há que considerar ainda que as mudanças são lentas e graduais uma vez que implicam em desestabilizar formas convencionais de trabalho que vão se cristalizando em determinadas práticas atitudes e convicções O FUNDESCOLAPDE PROPOSIÇÕES PARA MUDAR A ORGANIZAÇÃO A GESTÃO E O TRABALHO ESCOLAR O Fundescola integra a atual política de descentralização e municipalização do ensino fundamental brasileiro Foi implementado em 1998 e encontrase em fase de conclusão O Plano de Desenvolvimento da Escola PDE é o projeto principal do Fundescola Seus objetivos inspiraramse em acordos internacionais anteriores a exemplo dos projetos PróQualidade e Nordeste especialmente quanto à eficiência administrativa a ser alcançada por meio de um modelo de planejamento estratégico concebido pelo BM e da elevação do grau de compromisso de diretores professores e outros funcionários com os resultados educacionais Em sua proposta de ação o FundescolaPDE tem uma missão mais ampla do que os projetos antecedentes em razão da própria dimensão temporal com início em 1998 e execução prevista para 10 anos e extensão territorial do Programa abrangendo as regiões norte nordeste e centrooeste Segundo o Manual de Operação e Implementação do Projeto o objetivo era formar um grande número de profissionais de educação com os atributos gerenciais necessários para dirigir um sistema local mais autônomo por meio de provisão de ferramentas de gestão e do treinamento em áreas como processos de desenvolvimento da escola padrões mínimos de funcionamento planos de gestão de secretaria plano de carreira do magistério e mapeamento escolar BRASIL 2002 p 13 Para cumprir tal objetivo o Programa se propôs a desenvolver ações de fortalecimento da escola por meio de convênios com os municípios mediante adesão dos mesmos e a obrigação de adotarem a metodologia de planejamento estratégico conforme modelo do PDE A pesquisa sobre o impacto do PDEFundescola foi executada por professores do Programa de PósGraduação da Universidade de Brasília UnB e da Universidade Federal de Goiás FONSECA OLIVEIRA e TOSCHI 2004 Em Mato Grosso do Sul ficou a cargo de professores das universidades Estadual e Federal UFMS e UEMS FERNANDES et al 2004 Em Tocantins os dados foram enriquecidos por dissertação de mestrado defendida na FEUFG RIBEIRO 20024 4 Foram realizadas entrevistas e observações diretas em nove escolas situadas em três municípios goianos segundo critérios previamente fixados a pertencer ao centro e periferia b RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 239 De modo geral registrouse um bom acolhimento ao projeto PDE tanto por parte das equipes de sistematização quanto dos professores Conforme a maior parte dos agentes escolares o PDE tornou o planejamento das atividades escolares mais organizado e participativo Mesmo em escolas em que o PDE não tenha introduzido projetos novos na maioria dos casos são reordenamentos de ações preexistentes o PDE traz instrumentos como modelos de diagnóstico e de acompanhamento capazes de orientar os relatórios e de imprimir uma sistemática para as reuniões rotineiras da escola Enfim o PDE ensina técnicas de planejamento importantes para a instituição Para alguns gestores do sistema estadual esse formato é positivo pois contribui para que os estados e municípios assumam a descentralização da escola por meio do repasse de recursos diretamente para a escola Assim o PDE é visto pelos gestores como um instrumento que vai forçar os governos a colocar dinheiro direto na escola mesmo com o encerramento do financiamento internacional Embora reconhecendo alguns benefícios na organização física e material da escola o PDE não foi capaz de produzir mudanças mais qualitativas no âmbito pedagógico A maioria dos professores entrevistados o percebe como uma modalidade de intervenção voltada para a organização do sistema educativo tendo como alvo principal a contenção de gastos a eficiência operacional e objetivos orientados racionalmente para resultados ou produtos A dinâmica da mudança é garantida pela variação dos insumos ênfase nos materiais didáticos e tecnologias sendo a melhobia pedagógica decorrente dos novos procedimentos inseridos na organização São introduzidos novos projetos e programas materiais curriculares estratégias de ensinoaprendizagem modelos didáticos e outras formas de organizar e gerir o currículo a escola e a dinâmica da sala de aula As informações coletadas mostram que embora em sua concepção inicial o Fundescola enfatizasse a possibilidade de aumento do poder de decisão para as escolas na prática a própria sistemática de cofinanciamento internacional impõe instrumentos de controle sobre os projetos como manuais para acompanhamento e planejamento de ações além de normas para utilização de recursos e prestação de contas do dinheiro repassado diretamente à escola para aquisição de materiais e melhoria do espaço escolar ter sido classificada pela SEE como escola de sucesso ou insucesso na implantação e consolidação do PDE c pertencer à rede municipal ou estadual e d tempo de PDE na escola Em cada escola foram entrevistados três membros do Grupo de Sistematização do PDE coordenador do PDE diretor da escola e líder de objetivos estratégicos do PDE e dois professores não envolvidos diretamente com o projeto Nas escolas situadas no entorno de Brasília foram entrevistados ainda pais estudantes e funcionários além de um trabalho de observação direta de reuniões de conselho escolar voltadas para a discussão e avaliação das ações do PDE Foram visitadas nove escolas sendo entrevistados vinte e sete membros do grupo de sistematização dezoito professores não participantes do PDE vinte e um pais oito estudantes e quinze funcionários 240 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 Se de um lado esses instrumentos ajudam a organizar o trabalho rotineiro da escola de outro dificultam ou até mesmo impedem as decisões autônomas sobre outras questões mais pedagógicas como a realização de cursos de formação docente Segundo a análise de Rosa e Khidir 2004 os cursos oferecidos nas escolas de Goiás privilegiaram conteúdos voltados para as relações interpessoais o que confirma o veio estratégicocomportamental que caracteriza o PDE Como todas as escolas pesquisadas adquiriram recursos tecnológicos com a verba do PDE os cursos enfatizaram a formação técnica dos professores para a utilização desses aparatos Segundo alguns depoentes os cursos melhoraram a rotina escolar a articulação entre as dimensões administrativas e pedagógicas as relações com a comunidade e também a qualidade das aulas Não obstante esses ganhos o processo de formação não atendeu às reais necessidades da escola e do professor Outros depoentes afirmaram que o trabalho em sala de aula não melhorou em função do PDE mas deveuse ao Projeto PolíticoPedagógico PPP em escolas que já desenvolviam um trabalho coletivo para a construção do PPP Em primeiro lugar os cursos do PDE seguiram um cronograma apertado geralmente em finais de semana portanto em horários que extrapolaram a carga horária de trabalho do professor Segundo as normas do Fundescola a oferta dos cursos ficou a cargo de entidades privadas o que favoreceu a proliferação de empresas de consultoria que fizeram o trabalho de agenciamento planejamento e intermediação Os cursos eram escolhidos pelas escolas no entanto ficavam limitados à oferta das empresas nem sempre atendendo às demandas de professores e alunos Apesar dessa limitação os professores consideravam a oportunidade positiva uma vez que as escolas nunca tiveram recursos próprios para tais ações Aliás essa visão é recorrente em todas as escolas investigadas Não há como negar que a comunidade escolar não queria prescindir desse recurso extra que pode ser utilizado com rapidez para suprir as carências mais prementes No entanto como o dinheiro transferido não supria todas as necessidades básicas da escola esta era levada a buscar alguma forma de arrecadação de dinheiro mediante convênios acordos e contratos com entidades públicas e privadas nacionais ou internacionais ou ainda realizar campanhas e eventos capazes de prover recursos adicionais para a escola Desse modo a equipe de direção gastava grande parte de seu tempo em atividades de pouca monta que não visavam diretamente ao núcleo pedagógico A gestão financeira era feita por intermédio de uma entidade de direito privado Associação de Apoio à Escola De acordo com a proposta inicial de estimular a participação dos pais as tarefas de arrecadação utilização e fiscalização do dinheiro seriam repassadas para os pais e outros membros da comunidade Infelizmente a participação dos pais ocorreu por mero formalismo legal afastandose dos propósitos de uma prática de gestão efetivamente participativa Reduziuse à presença eventual geralmente para ouvir a transmissão de ordens avisos ou para conversar sobre o comportamento ou rendimento escolar dos filhos Ou ainda limitouse ao cumpr i RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 241 mento de atividades operacionais e colaborativas no Conselho Escolar no controle fiscal do dinheiro repassado à escola ou em eventos cívicos e festivos Isto explica a forma diferenciada como dirigentes escolares e docentes concebiam o PDE Os primeiros o consideraram um instrumento primordial para facilitar a administração física da escola uma vez que permitia concretizar soluções imediatas como reformas compras de equipamentos e materiais Já os professores embora reconhecessem esses benefícios não consideraram o PDE como incentivador de mudanças mais qualitativas no trabalho pedagógico Registrouse que o Plano imprimia uma organização que facilitava a divisão pormenorizada do trabalho escolar com nítida separação entre quem decide e quem executa as ações cada uma com sua gerência própria Além disso muitos projetos decorriam de atividades prépreexistentes ao PDE como ações ambientais festas cívicas entre outras Os professores afirmam ainda que as exigências burocráticas aumentavam a carga de trabalho dos mestres sem contribuir necessariamente para a melhoria do processo pedagógico Os documentos que expressam a concepção do Fundescola mostram que a gestão educacional incorpora um sentido peculiar que não alcança o caráter democrático outorgado pelos textos legais brasileiros A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB e o Plano Nacional de Educação PNE dispõem sobre a gestão democrática incentivando a coresponsabilidade dos diferentes níveis administrativos União estados e municípios e a colaboração entre fóruns nacionais e locais de planejamento bem como conselhos de educação em seus diferentes níveis Na área de abrangência do Fundescola a orientação internacional é a que mais se fortalece na maioria das escolas em razão da própria dinâmica promovida pelo MEC oferecendo cursos de preparação e instrumentos de planejamento e acompanhamento para o desenvolvimento do FundescolaPDE Isto explica de algum modo a submissão dos projetos políticopedagógicos PPP ao PDE nas escolas envolvidas Em Goiás os dados da pesquisa mostram que o principal componente do Fundescola ou seja o PDE estava sendo acolhido pelo governo De acordo com a análise de Fonseca Oliveira e Toschi 2004 o financiamento assumido pelo Fundescola vinha decaindo ano a ano enquanto o do estado de Goiás ia aumentando progressivamente e ao final das ações este incorpora plenamente o financiamento e a metodologia do PDE fazendo sua a concepção do programa internacional gógico a avaliação de funcionários além da aquisição de materiais e equipamentos Por outro lado a missão a visão de futuro e os objetivos estratégicos presentes nos planos das escolas emanavam do manual de elaboração do PDE na maioria das escolas estudadas Em Tocantins os professores ressentiramse de um planejamento escolar que valorizava principalmente a realização de reuniões atas preenchimento de quadros fichas formulários de funcionamento da escola de prestação de contas e questionário de avaliação do desempenho da escola Questionavam a formação continuada dos professores desenvolvida na forma de cursos curtos que não alcançam a profundidade necessária para uma atuação pedagógica de qualidade Os profissionais da escola apontaram ainda que o excesso de burocracia exige trabalhos extras uma vez que não é possível reunir as equipes em horário de aula Pelo exposto podese afirmar que se produziu a submissão da organização e da gestão do trabalho escolar aos objetivos às técnicas e às rotinas de trabalho estabelecidas pelos modelos de planejamento e gerenciamento estratégicos conforme o modelo definido no PDE Essa percepção foi corroborada em depoimentos de gestores do sistema estadual de Goiás quando informaram que havia certa convicção de que o modelo de gestão do Banco Mundial executado por meio do PDE seria altamente diretivo e não levaria à autonomia da escola conforme foi estabelecido em sua proposta inicial Os gestores municipais também realçaram esse caráter diretivo do Projeto afirmando que as escolas alcançadas pelo Fundescola eram escolhidas à revelia das secretarias municipais de educação Certamente essa prática não se coaduna com uma perspectiva de gestão democrática e de implementação de um projeto político pedagógico produzido coletivamente no interior de cada escola conforme preceitua a legislação brasileira CONSIDERAÇÕES FINAIS A análise aqui apresentada permite tecer algumas considerações sobre os programas em pauta De modo geral o estudo mostrou que a comunidade apresentava expectativas positivas em relação aos projetos internacionais Seja no caso do FundescolaPDE ou do PróQualidade os projetos mereceram o apoio dos quadros dirigentes estaduais e municipais além da participação da comunidade escolar na preparação e implementação dos projetos No caso do FundescolaPDE cujo acordo foi firmado com o MEC contouse inclusive com aporte significativo de recursos estaduais FONSECA OLIVEIRA E TOSCHI 2004 Isto significa que alguns resultados insatisfatórios aqui relatados não podem ser atribuídos à resistência dos diferentes níveis administrativos do sistema educacional nem mesmo aos profissionais da escola É importante frisar que os projetos aqui analisados são anunciados como alternativas inovadoras capazes de provocar ou mudanças estruturais ou de impacto na gestão na organização e no trabalho pedagógico da escola as quais servem de justificativa para a assinatura dos acordos internacionais Os dados empíricos não evidenciaram o efeito que se esperava dos projetos Não ocorreram profundas mudanças na gestão na cultura escolar e na prática pedagógica Apesar das promessas os resultados apontaram uma distância entre o preconizado e o que se efetivou na prática As parcas mudanças observadas no processo ou nos produtos escolares não podem ser consideradas como impactos ou efeitos dos projetos e portanto não justificam o alto custo financeiro e administrativo dos acordos internacionais As promessas embutidas nos acordos fariam dos projetos instrumentos capazes de promover em menor tempo maior produtividade escolar com diminuição de custos Como consequência exigiase o fortalecimento de um tipo de gestão sustentada pela crença de que a eficiência gerencial per se determinaria os resultados ou produtos definidos pelos projetos Ao aceitar esta crença deixase em segundo plano outros fatores internos e externos que condicionam igualmente o desempenho escolar e que compõem as múltiplas faces do contexto escolar e as relações dos meios social econômico e cultural dos alunos Um desses fatores é o descompasso entre o tempo definido para a execução de um projeto internacional e a realidade da escola Quaisquer mudanças que se operam em seu contexto são lentas e graduais uma vez que exigem romper paradigmas já estigmatizados ao longo da construção da história institucional e que se consubstanciam com a identidade própria da escola A história recente da educação brasileira mostra uma série de experiências que ilustram o esforço de comunidades e suas organizações no sentido de procurar um novo significado para a educação mostrando ser possível arriscar um caminho inovador para a escola básica sem a tutela de agências internacionais O atual cenário nacional exige o olhar atento dos educadores que investigam e pensam a política educacional brasileira Em 2007 o governo lançou o Plano de Ações Articuladas PAR como instrumento de apoio técnico e financeiro articulado para promover a melhoria do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica Ideb O PAR se apresenta como uma proposta democrática porque pressupõe a participação de gestores educadores e comunidade na sua elaboração Paralelamente o Plano de Desenvolvimento da Escola PDE concebido no âmbito do Fundescola vem sendo expandido para todas as regiões brasileiras que não tinham sido contempladas pelo projeto inicial Fica a seguinte indagação como poderão conviver dentro da mesma esfera escolar diferentes propostas de organização da escola básica Acresce ainda que a legislação educacional ainda privilegia o Projeto Político Pedagógico inc I do art 13 da LDB de 1996 A convivência de projetos oriundos de diferentes matrizes teóricas e metodológicas pode levar ao risco de se abarrotar a escola com microações que não se complementam e que portanto fragmentam a prática escolar e diluem a sua qualidade A questão fundamental é que as escolas dispõem de profissionais que podem e devem ser agentes intelectuais ativos capazes de fazer frente às propostas exógenas centradas na primazia de meros resultados e produtos e de privilegiar os projetos pedagógicos identificados com a história e a função social da escola A escola democrática participativa e de qualidade socialmente referenciada requer profissionais do magistério engajados e comprometidos com a sua transformação cotidiana mesmo considerando as condições objetivas em que se estabelece o processo ensinoaprendizagem o que implica na discussão proposição e materialização de um projeto políticopedagógico específico definindo princípios diretrizes e metas coletivamente pactuadas REFERÊNCIAS BANCO MUNDIAL State of Minas Gerais Basic Education quality improvement project Staff Appraisal Report Washington The World Bank 1994 Documento de avaliação de projeto sobre um empréstimo proposto no valor equivalente a US 20203 milhões para a República Federativa do Brasil para o Segundo Projeto de Fortalecimento da Escola FUNDESCOLA II Washington The World Bank 1999 BRASIL Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado Plano Diretor da Reforma do Estado Brasília MARE 1995 Ministério da Educação Manual de operação e implementação do Projeto Fundescola III MOIP Brasília MECFundescola 2002 BARRETO Maria S V A formação continuada de gestores escolares em dois municípios mineiros do Procad ao Progestão Dissertação de Mestrado Programa de PósGraduação da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília maio de 2007 FONSECA Marília A gestão escolar no contexto das reformas educacionais brasileiras uma articulação possível entre o global e o local In BONIN I TRAVERSINI C PERES E Org Trajetórias e processos de ensinar e aprender políticas e tecnologias Porto Alegre Edipucrs 2008 FONSECA M OLIVEIRA João F de TOSCHI Mirza S O plano de desenvolvimento da escola PDE modernização diretividade e controle da gestão e do trabalho escolar In FONSECA M TOSCHI Mirza S OLIVEIRA João F de Org Escolas gerenciadas planos de desenvolvimento e projetos políticos pedagógicos em debate Goiânia Ed da UCG 2004 p 189213 FERNANDES Maria D E et al PDE evidências do Município de Dourados In FONSECA M TOSCHI Mirza S OLIVEIRA João F de Org Escolas gerenciadas planos de desenvolvimento e projetos políticos pedagógicos em debate Goiânia Ed da UCG 2004 p 5580 MARRA Fátima BOF Alvana SOBRINHO Amaral José Plano de desenvolvimento da escola conceito estrutura e prática Brasília MECBIRDFundescola 1999 MARQUES Mara R A PAIVA Silvani A R Programas de financiamento nas escolas públicas de Minas Gerais nos anos de 1990 o PAIE e o PRODEC Programa de Apoio a Inovações Escolares e Projeto de Desenvolvimento e Enriquecimento Curricular Olhares Trilhas Uberlândia ano VI n 6 p 2530 2005 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 245 MINAS GERAIS Secretaria de Estado da Educação A escola pública de qualidade gestão patrimonial financeira e administrativa Procad 1997 RIBEIRO Benvinda R D A educação em Tocantins mudanças na lógica de gerenciamento do sistema e de organização e gestão da escola Dissertação de Mestrado Faculdade de Educação UFG Goiânia 2002 ROSA Dalva E G KHIDIR Kaled S O PDE e a formação continuada de professores In FONSECA M TOSCHI Mirza S OLIVEIRA João F de Org Escolas gerenciadas planos de desenvolvimento e projetos políticos pedagógicos em debate Goiânia Ed da UCG 2004 p 153162 SAVIANI Dermeval O Plano de Desenvolvimento da Educação análise do projeto do MEC Educação e Sociedade Campinas v 28 n 100 Especial p 12311255 out 2007 VELOSO Geisa M LOPES Helda M H R SILVA M A RAMALHO Maria N M A proposta modernizadora da gestão escolar em Minas Gerais no âmbito do Programa de Apoio às Inovações Educacionais Paie In FONSECA M TOSCHI Mirza S OLIVEIRA João F de Org Escolas gerenciadas planos de desenvolvimento e projetos políticos pedagógicos em debate Goiânia Ed da UCG 2004 p 8198 MARÍLIA FONSECA é pesquisadora colaboradora sênior da FEUnB Professora visitante da Faculdade de Educação da UFG Email fmariliaunbbr JOÃO FERREIRA DE OLIVEIRA é professor associado da Faculdade de Educação da UFG Pesquisador CNPq Email joaofoterracombr Recebido em março de 2009 Aprovado em abril de 2009 246 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 O artigo A gestão escolar no contexto das recentes reformas educacionais brasileiras de Marília Fonseca e João Ferreira de Oliveira explora as complexidades e contradições das reformas na gestão escolar brasileira implementadas nas últimas décadas especialmente com a influência de políticas de financiamento do Banco Mundial O estudo foca nos programas PróQualidade e Fundescola adotados para promover uma nova forma de administração pública marcada pelo paradigma gerencialista A pesquisa analisa os impactos desses programas tanto no âmbito organizacional das escolas quanto nas práticas pedagógicas e de governança destacando as tensões entre o enfoque gerencial e as aspirações de autonomia e participação da comunidade escolar Contexto e Base Teórica A análise de Fonseca e Oliveira situase no cenário das reformas educacionais ocorridas a partir dos anos 1990 um período de grande transformação nas políticas públicas brasileiras fortemente influenciado pelo modelo neoliberal Este modelo caracterizado por uma ênfase na eficiência controle e padronização orienta as políticas de descentralização e promove o conceito de autonomia gerenciada onde as escolas recebem responsabilidade e liberdade operacional mas dentro de diretrizes estabelecidas pelo governo e organismos internacionais como o Banco Mundial Os autores utilizam uma abordagem crítica ao neoliberalismo na educação destacando como as reformas buscam modernizar a administração escolar pela introdução de práticas de gestão estratégica e métricas de eficiência No entanto eles questionam até que ponto essas mudanças realmente ampliam a autonomia das escolas ou na realidade reforçam uma lógica de controle centralizado limitando a capacidade das instituições escolares de atuarem de maneira mais contextualizada e centrada nas necessidades da comunidade Análise dos Programas PróQualidade e Fundescola A pesquisa foca especificamente nos impactos dos programas Pró Qualidade implementado em Minas Gerais e Fundescola que abrangeu regiões Norte Nordeste e CentroOeste Ambos os programas são financiados por empréstimos do Banco Mundial e estruturados para desenvolver as condições de ensino e gestão escolar nessas áreas O objetivo central é aumentar a eficiência e qualidade do ensino incentivando o uso de planejamento estratégico e indicadores de desempenho para monitorar e avaliar os resultados educacionais A implementação do Plano de Desenvolvimento da Escola PDE é o principal mecanismo gerencial promovido pelos programas O PDE funciona como um modelo de planejamento estratégico que visa racionalizar e padronizar as práticas administrativas nas escolas enfatizando o alcance de metas e a melhoria do desempenho institucional Fonseca e Oliveira identificam o PDE como uma tentativa de alinhar as práticas escolares aos modelos de gestão do setor privado mas observam que essa abordagem pode na prática restringir a autonomia escolar e tornar o ambiente educacional excessivamente orientado a resultados quantitativos ao invés de focar na qualidade do ensino e no desenvolvimento integral dos alunos Tensão entre o PDE e o Projeto PolíticoPedagógico PPP Um dos aspectos mais críticos do artigo é a comparação entre o Plano de Desenvolvimento da Escola PDE e o Projeto PolíticoPedagógico PPP Enquanto o PDE representa a visão gerencialista com foco em eficiência e controle o PPP reflete um modelo pedagógico mais democrático e participativo onde as escolas são incentivadas a desenvolver práticas que valorizam a autonomia a participação da comunidade e a contextualização das práticas educacionais Fonseca e Oliveira apontam que essa dualidade gera uma tensão estrutural no sistema de gestão escolar brasileiro O PPP visa integrar a comunidade escolar incluindo professores alunos e familiares no processo de decisão promovendo uma educação que esteja em sintonia com as necessidades e expectativas locais Essa abordagem contrasta fortemente com a lógica do PDE que enfatiza a uniformidade e a padronização de processos e resultados Os autores questionam se o enfoque gerencialista não estaria na verdade enfraquecendo a capacidade das escolas de atuarem de forma crítica e reflexiva ao impor um modelo de gestão mais preocupado com a eficiência administrativa do que com a formação cidadã e o desenvolvimento integral dos estudantes Principais Descobertas e Limitações do Estudo O estudo de Fonseca e Oliveira revela que embora os programas tenham buscado introduzir práticas de modernização administrativa e eficiência nas escolas eles não conseguiram integrar plenamente as aspirações de autonomia e participação defendidas pelo PPP As políticas gerenciais ao impor metas e indicadores de desempenho muitas vezes limitam a flexibilidade das escolas e as obrigam a seguir um modelo de ensino menos adaptado às realidades locais e mais voltado para atender exigências externas No entanto um ponto que limita a profundidade do estudo é a ausência de uma análise comparativa mais detalhada com outros países latino americanos que passaram por reformas semelhantes Essa comparação poderia enriquecer o debate sobre se essas tensões são exclusivas do Brasil ou se fazem parte de uma tendência mais ampla nas políticas educacionais da região Além disso o artigo foca principalmente no impacto desses programas na organização e gestão escolar mas não aprofunda como essas mudanças afetam o aprendizado e o desenvolvimento acadêmico dos alunos de forma mais direta Implicações e Reflexões Críticas O artigo levanta questões importantes sobre o papel da política educacional na promoção de uma educação democrática e inclusiva Fonseca e Oliveira argumentam que ao enfatizar a lógica gerencial as reformas podem acabar instrumentalizando a educação e desvalorizando o papel da escola como espaço de formação cidadã Esse fenômeno que chamam de instrumentalização da escola leva à priorização de práticas administrativas em detrimento de uma educação que promova o pensamento crítico e a participação social A principal crítica levantada pelos autores é que embora o discurso oficial das reformas prometa maior autonomia as práticas implementadas acabam por reforçar um sistema de controle centralizado onde as escolas estão subordinadas a normas e métricas padronizadas Assim os autores defendem uma reflexão sobre alternativas que permitam um equilíbrio entre a autonomia e a responsabilidade institucional promovendo um ambiente onde as escolas possam realmente inovar e adaptarse às necessidades específicas de suas comunidades Conclusão Em resumo o artigo de Marília Fonseca e João Ferreira de Oliveira oferece uma análise crítica e profunda das reformas educacionais brasileiras expondo as contradições entre a autonomia prometida e o controle efetivamente exercido sobre as escolas A pesquisa destaca a dualidade entre o PDE e o PPP evidenciando que as práticas gerenciais ao invés de empoderar muitas vezes limitam a capacidade das escolas de responderem de forma contextualizada e participativa às demandas locais O trabalho é uma contribuição importante para o debate sobre o futuro da gestão educacional no Brasil levantando questões fundamentais sobre o papel das políticas de financiamento internacional e as reais implicações do modelo neoliberal na educação pública Fonseca e Oliveira desafiam o paradigma gerencialista ao questionarem se ele realmente promove uma educação de qualidade e inclusiva ou se na prática reforça uma lógica de controle que fragiliza a autonomia e a capacidade crítica das escolas
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A gestão escolar no contexto das recentes reformas educacionais brasileiras School management within the context of recent brazilian educational reforms La gestión escolar en el contexto de las recientes reformas educativas brasileñas MARÍLIA FONSECA JOÃO FERREIRA DE OLIVEIRA Resumo Com base em pesquisa interinstitucional o artigo trata de repercussões de dois programas brasileiros de gestão escolar desenvolvidos com financiamento internacional o Fundescola e o PróQualidade A pesquisa apontou o fortalecimento de uma visão gerencial estratégica e a convivência de duas concepções opostas de gestão da educação pública ora privilegiando práticas gerenciais Plano de Desenvolvimento da Escola ora sinalizando para as aspirações da comunidade por uma escola mais autônoma e de qualidade Projeto Político Pedagógico Palavraschave gestão estratégica da escola ensino fundamental autonomia escolar cooperação internacional Abstract Based on interinstitutional research the article looks at the effects of two Brazilians programs in education management carried out with international financing the Fundescola and the PróQualidade Research indicates the strengthening of a strategic managerial approach and the existence of two opposing concepts of public educational management at times favoring managerial practices School Development Plan while at other times emphasizing the aspirations of the community for a more autonomous and qualitybased school Political Pedagogical Project Keywords strategic school management primary school school autonomy international cooperation Resumen Con base en investigación interinstitucional el artículo trata de los efectos de dos programas brasileños de gestión escolar implementados con financiamiento internacional el Fundescola y el PróQualidade Los resultados de la investigación señalan el fortalecimiento de una visión gerencial estratégica y la existencia de dos concepciones opuestas de gestión de la educación pública ya sea favoreciendo prácticas gerenciales Plan de Desarrollo de la Escuela o entonces enfatizando las aspiraciones de la comunidad educativa por una escuela más autónoma y de calidad Proyecto Político Pedagógico Palabras clave gestión estratégica de la escuela enseñanza primaria autonomía escolar cooperación internacional RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 233 INTRODUÇÃO O presente texto apresenta resultados de pesquisa interinstitucional destinada a compreender e analisar algumas experiências de gestão escolar no ensino fundamental brasileiro desenvolvidas a partir da década de 1990 Nessa direção foram examinados dois programas o Projeto Melhoria da Qualidade na Educação Básica PróQualidade em Minas Gerais e o Fundo de Desenvolvimento da Escola Fundescola nas regiões Nordeste Norte e CentroOeste Os dois projetos integravam a política de financiamento do Banco Mundial para o desenvolvimento da gestão da escola básica brasileira O primeiro já foi encerrado o segundo iniciouse em 1998 e encontrase em fase de conclusão prevista para 2010 O objetivo da pesquisa foi refletir sobre o impacto do PróQualidade e do Fundescola na gestão e organização do trabalho escolar Focouse sobretudo o Plano de Desenvolvimento da Escola PDE concebido como uma modalidade de planejamento estratégico e que constitui o carrochefe dos dois programas Buscouse detectar como a comunidade escolar acolhe os projetos como percebe a vinculação entre esses programas e as macropolíticas que os sustentam e como avalia seus efeitos na organização e gestão da escola bem como no trabalho e nos processos ensinoaprendizagem Participaram da pesquisa professores e estudantes de graduação e de pósgraduação das seguintes instituições Universidade de Brasília UnB Universidade Federal de Goiás UFG Universidade Estadual de Montes Claros Unimontes Universidade Federal de Tocantins UFT Universidade Federal de Uberlândia UFU e universidades Federal e Estadual do Mato Grosso do Sul UFMS e UEMS REFORMA DO ESTADO E GESTÃO EDUCACIONAL COOPERAÇÃO INTERNACIONAL DESCENTRALIZAÇÃO E EFICIÊNCIA As novas propostas voltadas para a gestão da educação básica a partir dos anos 1990 fazem parte do conjunto de mudanças que compuseram a reforma do Estado brasileiro no contexto da reestruturação produtiva capitalista e das orientações políticas econômicas e educacionais de inspiração neoliberal Havia que fazer frente à configuração do novo sistema econômico global marcadamente orientado pelos princípios do neoliberalismo e ainda adaptarse às demandas da nova estrutura produtiva e tecnológica que exigia novas perspectivas na formação dos trabalhadores A administração pública adquiriu um formato gerencial mais ágil e flexível com o objetivo de imprimir eficiência ao desempenho do Estado tornandoo mais compatível com a atual fase do capitalismo global e competitivo Uma das ações prioritárias foi a descentralização pela qual foram transferidas funções da burocracia central para estados e municípios e para as denominadas organizações sociais configuradas como entidades de direito privado públicas nãoestatais Tais organizações atenderiam a 234 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 serviços como os de saúde e educação considerados serviços fundamentais mas não exclusivos do Estado Com essa alternativa o Estado deixaria de ser o responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social garantindo para si a definição e o controle das decisões estratégicas BRASIL 1995 As mudanças que orientaram a reforma do Estado brasileiro tiveram efeitos imediatos na gestão do sistema educacional Na década de 1990 foram desenvolvidas modalidades de gestão que prometiam a melhoria dos indicadores de evasão e repetência além do rendimento dos alunos a autonomia e a participação da família da comunidade educacional e da sociedade em geral em decisões afetas à escola Compreendiase assim a gestão escolar eficiente como aquela capaz de produzir mais com menor custo inclusive buscando fontes alternativas para o financiamento da escola Enfim traduziase por um conjunto de mudanças e processos com certo grau de sistematização com vistas a modificar políticas atitudes idéias e conteúdos curriculares entre outros Essas orientações foram postas em ação por meio de iniciativas nacionais como o Programa Dinheiro Direto à Escola PDDE que como o próprio nome diz destina recursos para serem geridos pelas unidades escolares cujo controle se dá por meio de entidades de direito privado dentre eles a Associação de Apoio à Escola e o Caixa Escolar Outras iniciativas desse porte foram implementadas no âmbito de acordos de financiamento do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento Banco Mundial ou Bird com os estados ou com o Ministério da Educação MEC Na década de 1990 os organismos internacionais tiveram presença marcante no Brasil dentre eles a Unesco o Unicef o Pnud e o Banco Mundial BM Na educação básica este último projetouse como a principal agência internacional de cooperação seja pela amplitude territorial e temporal de seus projetos seja pela magnitude dos financiamentos Dois acordos foram firmados com o governo federal e outros diretamente com os governos dos estados de São Paulo Minas Gerais Bahia Ceará Espírito Santo e Paraná O Projeto Nordeste também faz parte desse processo fruto de um acordo do MEC com o BM para o desenvolvimento do ensino nas quatro primeiras séries da educação fundamental em toda a região nordeste De acordo com a expectativa gerada pela cooperação do BM as experiências dos projetos seriam repassadas para o sistema educacional como um todo produzindo eficiência maior produtividade educacional com menor custo e eficiência esta entendida como alcance de objetivos de impacto para melhorar o desempenho escolar expansão de matrículas diminuição da evasão e da repetência O PRÓQUALIDADE REFLETINDO SOBRE SEUS OBJETIVOS E IMPACTOS Buscavase com o Projeto PróQualidade melhorar o desempenho do sistema educacional do estado de Minas Gerais mediante formas construtivas para RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 235 efetivar mudanças na organização e aperfeiçoamento das escolas inclusive auxiliandoas a elaborar seu próprio planejamento a longo prazo O projeto definiu estratégias para a ajudar os diretores de escola a assumirem seus novos papéis de líderes e administradores em sistema estadual mais descentralizado b proporcionar aos administradores centrais e regionais instrumentos para as tomadas de decisão com informações adequadas c aumentar o acesso de professores a oportunidades de treinamento d distribuir um conjunto de materiais didáticos aos alunos das escolas públicas e melhorar a administração da rede física de modo a assegurar a utilização adequada do espaço escolar O PróQualidade foi executado em conjunto com o Programa Gerência da Qualidade Total na Educação GQTE¹ Com esses programas deuse início a partir de 1991 a uma profunda reforma política administrativa financeira e pedagógica na rede escolar estadual de Minas Gerais Seus resultados foram utilizados como base para a definição de próximo acordo do MEC com o BM o Fundo de Desenvolvimento da Escola Fundescola também foco de análise do presente texto Integravam o PróQualidade três programas complementares o Plano de Desenvolvimento da Escola PDE que visava a solução de problemas rotineiros e formas ultrapassadas de organização escolar mediante a adoção de planejamento com enfoque gerencial planejamento estratégico o Programa de Apoio às Inovações Educacionais Paie que desenvolvia múltiplas modalidades de formação continuada e de trabalhos participativos voltados para refletir acerca da realidade vivida na prática cotidiana da escola e completando essa tríade o Projeto de Desenvolvimento e Enriquecimento Curricular Prodec cuja especificidade era favorecer as ações incentivadoras da autonomia das práticas pedagógicas estimulando a própria comunidade escolar a solucionar problemas pedagógicos prioritários definidos pelas escolas BANCO MUNDIAL 1994 MINAS GERAIS 1997 Cabe observar que a investigação específica sobre o Programa de Apoio às Inovações Educacionais Paie em Minas Gerais foi coordenada por professores da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Montes Claros Unimontes e sua Unidade Descentralizada de Pirapora VELOSO et al 2004² ¹ O programa Gerência da Qualidade Total GQTE tinha como finalidade regulamentar o art 206 inciso VI da Constituição Federal de 1988 e o art 196 inciso VII da Constituição Federal de Minas Gerais de 1989 que dispõem sobre a gestão democrática do ensino na forma de lei O PróQualidade foi implantado em 1993 com a assessoria da Fundação Christiano Ottoni FCO que integra a Escola de Engenharia da Universidade de Minas Gerais Originalmente destinado ao setor empresarial foi estendido para setores da administração pública especificamente para educação Integrouse ao projeto PróQualidade que só foi oficializado em 1994 a partir da assinatura do acordo entre Secretaria de EducaçãoMG e o Banco Mundial MARQUES e PAIVA 2005 ² Foram investigadas quatro escolas sendo três delas localizadas no município de Montes Claros e uma em Pirapora Como sujeitos da pesquisa foram entrevistados 16 professores Implantado pela resolução n 8036 de 1º de agosto de 1997 o Paie desenvolveu uma série de ações em escolas estaduais de ensino fundamental de Minas Gerais Previa a mobilização da comunidade educativa como forma de descentralizar a gestão escolar e estimular a inovação do trabalho pedagógico num processo coletivo e de proposição de idéias meios e ações Promoviase assim a reflexão acerca da realidade escolar e a elaboração de um projeto de ação educativa para culminar com a transformação da realidade em questão Visava ainda imprimir uma nova dinâmica nas práticas educativas utilizando metodologias inovadoras e estratégias participativas promovendo parcerias com a comunidade em geral e com as famílias dos alunos na busca de soluções para problemas e questões de natureza pedagógica As escolas beneficiárias dos recursos do Paie foram selecionadas pela SEEMG mediante concurso que apontou os projetos escolares com maior possibilidade de atingirem bons resultados de aprendizagem medidos pelas taxas de reprovação de abandono e pelo rendimento escolar em Português e Matemática aferido por avaliação externa Esses indicadores determinavam o grau de risco de cada escola baixo risco escolas com índice de risco até 20 médio risco escolas com índice de risco entre 20 e 30 alto risco escolas com índice médio acima de 30 Segundo os docentes entrevistados ainda que o Paie tenha sido bem acolhido na rede as ações não lograram estabelecer um processo críticoreflexivo acerca da realidade escolar As ações inovadoras adquiriram um sentido de novidade ou quebra de rotina instalandose uma percepção de que a inovação em si garantiria a qualidade dos processos educativos produzidos pela escola Não foi possível romper com as verdadeiras causas do fracasso escolar e tampouco foram abordadas convenientemente as questões pedagógicas A inovação limitouse à introdução de uma aparência modernizante via elaboração de projetos que produzissem um movimento diferenciado no interior da instituição escolar Para muitas professoras as ações propostas pelo Paie já vinham sendo desenvolvidas pelas escolas constituindo pois uma continuidade de práticas já vividas cujas experiências significados finalidades e resultados não foram sequer discutidos Os depoimentos deixaram perceber que as professoras eram compreendidas como executoras do Paie não lhes cabendo a nem a concepção e a tomada de decisões e tampouco a avaliação das propostas do programa VELOSO et al 2004 O Projeto de Desenvolvimento e Enriquecimento Curricular Prodec foi executado no período de 1998 a 2003 Caracterizavase como uma ação inovadora complementar ao Paie pelo fato de ser elaborado pela equipe docente da escola com a participação de outros membros da comunidade escolar em escolas de primeira a oitava série sendo um professor de cada disciplina além de um supervisor e um diretor em cada escola Ao todo foram entrevistados vinte e quatro interlocutores sendo dezesseis professores quatro supervisores e quatro diretores RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 237 Foram estabelecidos como critérios de seleção para participar do Prodec o grau de sucesso da escola na execução do Paie a qualidade da proposta pedagógica da escola o nível de participação da comunidade e a própria pertinência e relevância da proposta para o Prodec À semelhança do Paie cada escola receberia os recursos de forma diferenciada de acordo com sua categoria de risco e o número de alunos Destinouse um percentual para cada categoria 50 das oportunidades estariam à disposição das escolas classificadas como de alto risco 30 das oportunidades estariam à disposição das escolas de médio risco e 20 para a categoria de baixo risco Os programas Paie e Prodec foram investigados por um grupo de professores da Universidade Federal de Uberlândia MARQUES e PAIVA 2005³ Os resultados assemelharamse àqueles obtidos na investigação realizada pelo grupo da Unimontes Segundo os dirigentes e professores entrevistados as escolas conseguiram mesmo que timidamente impor uma nova postura ao trabalho escolar permitindo maior integração da comunidade e nova forma de realizar atividades pedagógicas Um outro aspecto apontado foi a contribuição no sentido de melhorar a disciplina dos alunos Um fator a se considerar com respeito aos dados da pesquisa é que embora o Prodec fosse um projeto voltado para o desenvolvimento do currículo e das atividades pedagógicas ocorreu um descompasso entre o ideal e o real um relativo distanciamento entre o preconizado pela proposta oficial e as parcas mudanças que se efetivaram no currículo e nas práticas pedagógicas consideradas de pouca monta em face da expectativa gerada pelo projeto Os dados empíricos evidenciaram ainda que não ocorreu o êxito esperado do Prodec quanto à promoção de uma mudança cultural dos profissionais envolvidos bem como a adoção de novos valores que possam ser capazes de propiciar mudanças na prática pedagógica Nesse sentido não houve um envolvimento que pudesse causar impactos no desenvolvimento do projeto Tal mudança exigiria romper com paradigmas já estigmatizados ao longo da construção da história institucional profissional da comunidade escolar o que demandaria a vontade e o compromisso de toda a equipe responsável pela realização das ações ³ Para a seleção das escolas investigadas foram definidos os seguintes critérios ter participado do Paie pertencerem aos diferentes níveis de classificação pelo grau de complexidade baixo médio e alto risco conforme definição da SEEMG no momento de implementação do projeto terem demonstrado na execução do Paie desempenho favorável e desfavorável também conforme avaliação da SEEMG pertencer ao município de Uberlândia e localidades adjacentes Conforme tais parâmetros as escolas selecionadas foram Escola Estadual Jardim das Palmeiras de Uberlândia considerada de alto risco Escola Estadual Visconde de Ouro Preto de Araguari considerada de médio risco sendo que ambas obtiveram resultados de sucesso E também Escola Estadual do Parque São Jorge de Uberlândia considerada de alto risco Escola Estadual Honório Guimarães considerada de médio risco Como sujeitos da investigação foram entrevistados em cada escola um professor participante um professor não participante do projeto um membro da equipe pedagógica e um dos coordenadores do Prodec 238 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 Como as pesquisadoras assinalaram o sucesso de uma proposta de inovação da prática pedagógica depende do fortalecimento de múltiplas faces do funcionamento do contexto da escola tais como gestão organização do tempo e espaço da escola currículo metodologias condições de trabalho e formação continuada Há que considerar ainda que as mudanças são lentas e graduais uma vez que implicam em desestabilizar formas convencionais de trabalho que vão se cristalizando em determinadas práticas atitudes e convicções O FUNDESCOLAPDE PROPOSIÇÕES PARA MUDAR A ORGANIZAÇÃO A GESTÃO E O TRABALHO ESCOLAR O Fundescola integra a atual política de descentralização e municipalização do ensino fundamental brasileiro Foi implementado em 1998 e encontrase em fase de conclusão O Plano de Desenvolvimento da Escola PDE é o projeto principal do Fundescola Seus objetivos inspiraramse em acordos internacionais anteriores a exemplo dos projetos PróQualidade e Nordeste especialmente quanto à eficiência administrativa a ser alcançada por meio de um modelo de planejamento estratégico concebido pelo BM e da elevação do grau de compromisso de diretores professores e outros funcionários com os resultados educacionais Em sua proposta de ação o FundescolaPDE tem uma missão mais ampla do que os projetos antecedentes em razão da própria dimensão temporal com início em 1998 e execução prevista para 10 anos e extensão territorial do Programa abrangendo as regiões norte nordeste e centrooeste Segundo o Manual de Operação e Implementação do Projeto o objetivo era formar um grande número de profissionais de educação com os atributos gerenciais necessários para dirigir um sistema local mais autônomo por meio de provisão de ferramentas de gestão e do treinamento em áreas como processos de desenvolvimento da escola padrões mínimos de funcionamento planos de gestão de secretaria plano de carreira do magistério e mapeamento escolar BRASIL 2002 p 13 Para cumprir tal objetivo o Programa se propôs a desenvolver ações de fortalecimento da escola por meio de convênios com os municípios mediante adesão dos mesmos e a obrigação de adotarem a metodologia de planejamento estratégico conforme modelo do PDE A pesquisa sobre o impacto do PDEFundescola foi executada por professores do Programa de PósGraduação da Universidade de Brasília UnB e da Universidade Federal de Goiás FONSECA OLIVEIRA e TOSCHI 2004 Em Mato Grosso do Sul ficou a cargo de professores das universidades Estadual e Federal UFMS e UEMS FERNANDES et al 2004 Em Tocantins os dados foram enriquecidos por dissertação de mestrado defendida na FEUFG RIBEIRO 20024 4 Foram realizadas entrevistas e observações diretas em nove escolas situadas em três municípios goianos segundo critérios previamente fixados a pertencer ao centro e periferia b RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 239 De modo geral registrouse um bom acolhimento ao projeto PDE tanto por parte das equipes de sistematização quanto dos professores Conforme a maior parte dos agentes escolares o PDE tornou o planejamento das atividades escolares mais organizado e participativo Mesmo em escolas em que o PDE não tenha introduzido projetos novos na maioria dos casos são reordenamentos de ações preexistentes o PDE traz instrumentos como modelos de diagnóstico e de acompanhamento capazes de orientar os relatórios e de imprimir uma sistemática para as reuniões rotineiras da escola Enfim o PDE ensina técnicas de planejamento importantes para a instituição Para alguns gestores do sistema estadual esse formato é positivo pois contribui para que os estados e municípios assumam a descentralização da escola por meio do repasse de recursos diretamente para a escola Assim o PDE é visto pelos gestores como um instrumento que vai forçar os governos a colocar dinheiro direto na escola mesmo com o encerramento do financiamento internacional Embora reconhecendo alguns benefícios na organização física e material da escola o PDE não foi capaz de produzir mudanças mais qualitativas no âmbito pedagógico A maioria dos professores entrevistados o percebe como uma modalidade de intervenção voltada para a organização do sistema educativo tendo como alvo principal a contenção de gastos a eficiência operacional e objetivos orientados racionalmente para resultados ou produtos A dinâmica da mudança é garantida pela variação dos insumos ênfase nos materiais didáticos e tecnologias sendo a melhobia pedagógica decorrente dos novos procedimentos inseridos na organização São introduzidos novos projetos e programas materiais curriculares estratégias de ensinoaprendizagem modelos didáticos e outras formas de organizar e gerir o currículo a escola e a dinâmica da sala de aula As informações coletadas mostram que embora em sua concepção inicial o Fundescola enfatizasse a possibilidade de aumento do poder de decisão para as escolas na prática a própria sistemática de cofinanciamento internacional impõe instrumentos de controle sobre os projetos como manuais para acompanhamento e planejamento de ações além de normas para utilização de recursos e prestação de contas do dinheiro repassado diretamente à escola para aquisição de materiais e melhoria do espaço escolar ter sido classificada pela SEE como escola de sucesso ou insucesso na implantação e consolidação do PDE c pertencer à rede municipal ou estadual e d tempo de PDE na escola Em cada escola foram entrevistados três membros do Grupo de Sistematização do PDE coordenador do PDE diretor da escola e líder de objetivos estratégicos do PDE e dois professores não envolvidos diretamente com o projeto Nas escolas situadas no entorno de Brasília foram entrevistados ainda pais estudantes e funcionários além de um trabalho de observação direta de reuniões de conselho escolar voltadas para a discussão e avaliação das ações do PDE Foram visitadas nove escolas sendo entrevistados vinte e sete membros do grupo de sistematização dezoito professores não participantes do PDE vinte e um pais oito estudantes e quinze funcionários 240 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 Se de um lado esses instrumentos ajudam a organizar o trabalho rotineiro da escola de outro dificultam ou até mesmo impedem as decisões autônomas sobre outras questões mais pedagógicas como a realização de cursos de formação docente Segundo a análise de Rosa e Khidir 2004 os cursos oferecidos nas escolas de Goiás privilegiaram conteúdos voltados para as relações interpessoais o que confirma o veio estratégicocomportamental que caracteriza o PDE Como todas as escolas pesquisadas adquiriram recursos tecnológicos com a verba do PDE os cursos enfatizaram a formação técnica dos professores para a utilização desses aparatos Segundo alguns depoentes os cursos melhoraram a rotina escolar a articulação entre as dimensões administrativas e pedagógicas as relações com a comunidade e também a qualidade das aulas Não obstante esses ganhos o processo de formação não atendeu às reais necessidades da escola e do professor Outros depoentes afirmaram que o trabalho em sala de aula não melhorou em função do PDE mas deveuse ao Projeto PolíticoPedagógico PPP em escolas que já desenvolviam um trabalho coletivo para a construção do PPP Em primeiro lugar os cursos do PDE seguiram um cronograma apertado geralmente em finais de semana portanto em horários que extrapolaram a carga horária de trabalho do professor Segundo as normas do Fundescola a oferta dos cursos ficou a cargo de entidades privadas o que favoreceu a proliferação de empresas de consultoria que fizeram o trabalho de agenciamento planejamento e intermediação Os cursos eram escolhidos pelas escolas no entanto ficavam limitados à oferta das empresas nem sempre atendendo às demandas de professores e alunos Apesar dessa limitação os professores consideravam a oportunidade positiva uma vez que as escolas nunca tiveram recursos próprios para tais ações Aliás essa visão é recorrente em todas as escolas investigadas Não há como negar que a comunidade escolar não queria prescindir desse recurso extra que pode ser utilizado com rapidez para suprir as carências mais prementes No entanto como o dinheiro transferido não supria todas as necessidades básicas da escola esta era levada a buscar alguma forma de arrecadação de dinheiro mediante convênios acordos e contratos com entidades públicas e privadas nacionais ou internacionais ou ainda realizar campanhas e eventos capazes de prover recursos adicionais para a escola Desse modo a equipe de direção gastava grande parte de seu tempo em atividades de pouca monta que não visavam diretamente ao núcleo pedagógico A gestão financeira era feita por intermédio de uma entidade de direito privado Associação de Apoio à Escola De acordo com a proposta inicial de estimular a participação dos pais as tarefas de arrecadação utilização e fiscalização do dinheiro seriam repassadas para os pais e outros membros da comunidade Infelizmente a participação dos pais ocorreu por mero formalismo legal afastandose dos propósitos de uma prática de gestão efetivamente participativa Reduziuse à presença eventual geralmente para ouvir a transmissão de ordens avisos ou para conversar sobre o comportamento ou rendimento escolar dos filhos Ou ainda limitouse ao cumpr i RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 241 mento de atividades operacionais e colaborativas no Conselho Escolar no controle fiscal do dinheiro repassado à escola ou em eventos cívicos e festivos Isto explica a forma diferenciada como dirigentes escolares e docentes concebiam o PDE Os primeiros o consideraram um instrumento primordial para facilitar a administração física da escola uma vez que permitia concretizar soluções imediatas como reformas compras de equipamentos e materiais Já os professores embora reconhecessem esses benefícios não consideraram o PDE como incentivador de mudanças mais qualitativas no trabalho pedagógico Registrouse que o Plano imprimia uma organização que facilitava a divisão pormenorizada do trabalho escolar com nítida separação entre quem decide e quem executa as ações cada uma com sua gerência própria Além disso muitos projetos decorriam de atividades prépreexistentes ao PDE como ações ambientais festas cívicas entre outras Os professores afirmam ainda que as exigências burocráticas aumentavam a carga de trabalho dos mestres sem contribuir necessariamente para a melhoria do processo pedagógico Os documentos que expressam a concepção do Fundescola mostram que a gestão educacional incorpora um sentido peculiar que não alcança o caráter democrático outorgado pelos textos legais brasileiros A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB e o Plano Nacional de Educação PNE dispõem sobre a gestão democrática incentivando a coresponsabilidade dos diferentes níveis administrativos União estados e municípios e a colaboração entre fóruns nacionais e locais de planejamento bem como conselhos de educação em seus diferentes níveis Na área de abrangência do Fundescola a orientação internacional é a que mais se fortalece na maioria das escolas em razão da própria dinâmica promovida pelo MEC oferecendo cursos de preparação e instrumentos de planejamento e acompanhamento para o desenvolvimento do FundescolaPDE Isto explica de algum modo a submissão dos projetos políticopedagógicos PPP ao PDE nas escolas envolvidas Em Goiás os dados da pesquisa mostram que o principal componente do Fundescola ou seja o PDE estava sendo acolhido pelo governo De acordo com a análise de Fonseca Oliveira e Toschi 2004 o financiamento assumido pelo Fundescola vinha decaindo ano a ano enquanto o do estado de Goiás ia aumentando progressivamente e ao final das ações este incorpora plenamente o financiamento e a metodologia do PDE fazendo sua a concepção do programa internacional gógico a avaliação de funcionários além da aquisição de materiais e equipamentos Por outro lado a missão a visão de futuro e os objetivos estratégicos presentes nos planos das escolas emanavam do manual de elaboração do PDE na maioria das escolas estudadas Em Tocantins os professores ressentiramse de um planejamento escolar que valorizava principalmente a realização de reuniões atas preenchimento de quadros fichas formulários de funcionamento da escola de prestação de contas e questionário de avaliação do desempenho da escola Questionavam a formação continuada dos professores desenvolvida na forma de cursos curtos que não alcançam a profundidade necessária para uma atuação pedagógica de qualidade Os profissionais da escola apontaram ainda que o excesso de burocracia exige trabalhos extras uma vez que não é possível reunir as equipes em horário de aula Pelo exposto podese afirmar que se produziu a submissão da organização e da gestão do trabalho escolar aos objetivos às técnicas e às rotinas de trabalho estabelecidas pelos modelos de planejamento e gerenciamento estratégicos conforme o modelo definido no PDE Essa percepção foi corroborada em depoimentos de gestores do sistema estadual de Goiás quando informaram que havia certa convicção de que o modelo de gestão do Banco Mundial executado por meio do PDE seria altamente diretivo e não levaria à autonomia da escola conforme foi estabelecido em sua proposta inicial Os gestores municipais também realçaram esse caráter diretivo do Projeto afirmando que as escolas alcançadas pelo Fundescola eram escolhidas à revelia das secretarias municipais de educação Certamente essa prática não se coaduna com uma perspectiva de gestão democrática e de implementação de um projeto político pedagógico produzido coletivamente no interior de cada escola conforme preceitua a legislação brasileira CONSIDERAÇÕES FINAIS A análise aqui apresentada permite tecer algumas considerações sobre os programas em pauta De modo geral o estudo mostrou que a comunidade apresentava expectativas positivas em relação aos projetos internacionais Seja no caso do FundescolaPDE ou do PróQualidade os projetos mereceram o apoio dos quadros dirigentes estaduais e municipais além da participação da comunidade escolar na preparação e implementação dos projetos No caso do FundescolaPDE cujo acordo foi firmado com o MEC contouse inclusive com aporte significativo de recursos estaduais FONSECA OLIVEIRA E TOSCHI 2004 Isto significa que alguns resultados insatisfatórios aqui relatados não podem ser atribuídos à resistência dos diferentes níveis administrativos do sistema educacional nem mesmo aos profissionais da escola É importante frisar que os projetos aqui analisados são anunciados como alternativas inovadoras capazes de provocar ou mudanças estruturais ou de impacto na gestão na organização e no trabalho pedagógico da escola as quais servem de justificativa para a assinatura dos acordos internacionais Os dados empíricos não evidenciaram o efeito que se esperava dos projetos Não ocorreram profundas mudanças na gestão na cultura escolar e na prática pedagógica Apesar das promessas os resultados apontaram uma distância entre o preconizado e o que se efetivou na prática As parcas mudanças observadas no processo ou nos produtos escolares não podem ser consideradas como impactos ou efeitos dos projetos e portanto não justificam o alto custo financeiro e administrativo dos acordos internacionais As promessas embutidas nos acordos fariam dos projetos instrumentos capazes de promover em menor tempo maior produtividade escolar com diminuição de custos Como consequência exigiase o fortalecimento de um tipo de gestão sustentada pela crença de que a eficiência gerencial per se determinaria os resultados ou produtos definidos pelos projetos Ao aceitar esta crença deixase em segundo plano outros fatores internos e externos que condicionam igualmente o desempenho escolar e que compõem as múltiplas faces do contexto escolar e as relações dos meios social econômico e cultural dos alunos Um desses fatores é o descompasso entre o tempo definido para a execução de um projeto internacional e a realidade da escola Quaisquer mudanças que se operam em seu contexto são lentas e graduais uma vez que exigem romper paradigmas já estigmatizados ao longo da construção da história institucional e que se consubstanciam com a identidade própria da escola A história recente da educação brasileira mostra uma série de experiências que ilustram o esforço de comunidades e suas organizações no sentido de procurar um novo significado para a educação mostrando ser possível arriscar um caminho inovador para a escola básica sem a tutela de agências internacionais O atual cenário nacional exige o olhar atento dos educadores que investigam e pensam a política educacional brasileira Em 2007 o governo lançou o Plano de Ações Articuladas PAR como instrumento de apoio técnico e financeiro articulado para promover a melhoria do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica Ideb O PAR se apresenta como uma proposta democrática porque pressupõe a participação de gestores educadores e comunidade na sua elaboração Paralelamente o Plano de Desenvolvimento da Escola PDE concebido no âmbito do Fundescola vem sendo expandido para todas as regiões brasileiras que não tinham sido contempladas pelo projeto inicial Fica a seguinte indagação como poderão conviver dentro da mesma esfera escolar diferentes propostas de organização da escola básica Acresce ainda que a legislação educacional ainda privilegia o Projeto Político Pedagógico inc I do art 13 da LDB de 1996 A convivência de projetos oriundos de diferentes matrizes teóricas e metodológicas pode levar ao risco de se abarrotar a escola com microações que não se complementam e que portanto fragmentam a prática escolar e diluem a sua qualidade A questão fundamental é que as escolas dispõem de profissionais que podem e devem ser agentes intelectuais ativos capazes de fazer frente às propostas exógenas centradas na primazia de meros resultados e produtos e de privilegiar os projetos pedagógicos identificados com a história e a função social da escola A escola democrática participativa e de qualidade socialmente referenciada requer profissionais do magistério engajados e comprometidos com a sua transformação cotidiana mesmo considerando as condições objetivas em que se estabelece o processo ensinoaprendizagem o que implica na discussão proposição e materialização de um projeto políticopedagógico específico definindo princípios diretrizes e metas coletivamente pactuadas REFERÊNCIAS BANCO MUNDIAL State of Minas Gerais Basic Education quality improvement project Staff Appraisal Report Washington The World Bank 1994 Documento de avaliação de projeto sobre um empréstimo proposto no valor equivalente a US 20203 milhões para a República Federativa do Brasil para o Segundo Projeto de Fortalecimento da Escola FUNDESCOLA II Washington The World Bank 1999 BRASIL Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado Plano Diretor da Reforma do Estado Brasília MARE 1995 Ministério da Educação Manual de operação e implementação do Projeto Fundescola III MOIP Brasília MECFundescola 2002 BARRETO Maria S V A formação continuada de gestores escolares em dois municípios mineiros do Procad ao Progestão Dissertação de Mestrado Programa de PósGraduação da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília maio de 2007 FONSECA Marília A gestão escolar no contexto das reformas educacionais brasileiras uma articulação possível entre o global e o local In BONIN I TRAVERSINI C PERES E Org Trajetórias e processos de ensinar e aprender políticas e tecnologias Porto Alegre Edipucrs 2008 FONSECA M OLIVEIRA João F de TOSCHI Mirza S O plano de desenvolvimento da escola PDE modernização diretividade e controle da gestão e do trabalho escolar In FONSECA M TOSCHI Mirza S OLIVEIRA João F de Org Escolas gerenciadas planos de desenvolvimento e projetos políticos pedagógicos em debate Goiânia Ed da UCG 2004 p 189213 FERNANDES Maria D E et al PDE evidências do Município de Dourados In FONSECA M TOSCHI Mirza S OLIVEIRA João F de Org Escolas gerenciadas planos de desenvolvimento e projetos políticos pedagógicos em debate Goiânia Ed da UCG 2004 p 5580 MARRA Fátima BOF Alvana SOBRINHO Amaral José Plano de desenvolvimento da escola conceito estrutura e prática Brasília MECBIRDFundescola 1999 MARQUES Mara R A PAIVA Silvani A R Programas de financiamento nas escolas públicas de Minas Gerais nos anos de 1990 o PAIE e o PRODEC Programa de Apoio a Inovações Escolares e Projeto de Desenvolvimento e Enriquecimento Curricular Olhares Trilhas Uberlândia ano VI n 6 p 2530 2005 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 245 MINAS GERAIS Secretaria de Estado da Educação A escola pública de qualidade gestão patrimonial financeira e administrativa Procad 1997 RIBEIRO Benvinda R D A educação em Tocantins mudanças na lógica de gerenciamento do sistema e de organização e gestão da escola Dissertação de Mestrado Faculdade de Educação UFG Goiânia 2002 ROSA Dalva E G KHIDIR Kaled S O PDE e a formação continuada de professores In FONSECA M TOSCHI Mirza S OLIVEIRA João F de Org Escolas gerenciadas planos de desenvolvimento e projetos políticos pedagógicos em debate Goiânia Ed da UCG 2004 p 153162 SAVIANI Dermeval O Plano de Desenvolvimento da Educação análise do projeto do MEC Educação e Sociedade Campinas v 28 n 100 Especial p 12311255 out 2007 VELOSO Geisa M LOPES Helda M H R SILVA M A RAMALHO Maria N M A proposta modernizadora da gestão escolar em Minas Gerais no âmbito do Programa de Apoio às Inovações Educacionais Paie In FONSECA M TOSCHI Mirza S OLIVEIRA João F de Org Escolas gerenciadas planos de desenvolvimento e projetos políticos pedagógicos em debate Goiânia Ed da UCG 2004 p 8198 MARÍLIA FONSECA é pesquisadora colaboradora sênior da FEUnB Professora visitante da Faculdade de Educação da UFG Email fmariliaunbbr JOÃO FERREIRA DE OLIVEIRA é professor associado da Faculdade de Educação da UFG Pesquisador CNPq Email joaofoterracombr Recebido em março de 2009 Aprovado em abril de 2009 246 RBPAE v25 n2 p 233246 maiago 2009 O artigo A gestão escolar no contexto das recentes reformas educacionais brasileiras de Marília Fonseca e João Ferreira de Oliveira explora as complexidades e contradições das reformas na gestão escolar brasileira implementadas nas últimas décadas especialmente com a influência de políticas de financiamento do Banco Mundial O estudo foca nos programas PróQualidade e Fundescola adotados para promover uma nova forma de administração pública marcada pelo paradigma gerencialista A pesquisa analisa os impactos desses programas tanto no âmbito organizacional das escolas quanto nas práticas pedagógicas e de governança destacando as tensões entre o enfoque gerencial e as aspirações de autonomia e participação da comunidade escolar Contexto e Base Teórica A análise de Fonseca e Oliveira situase no cenário das reformas educacionais ocorridas a partir dos anos 1990 um período de grande transformação nas políticas públicas brasileiras fortemente influenciado pelo modelo neoliberal Este modelo caracterizado por uma ênfase na eficiência controle e padronização orienta as políticas de descentralização e promove o conceito de autonomia gerenciada onde as escolas recebem responsabilidade e liberdade operacional mas dentro de diretrizes estabelecidas pelo governo e organismos internacionais como o Banco Mundial Os autores utilizam uma abordagem crítica ao neoliberalismo na educação destacando como as reformas buscam modernizar a administração escolar pela introdução de práticas de gestão estratégica e métricas de eficiência No entanto eles questionam até que ponto essas mudanças realmente ampliam a autonomia das escolas ou na realidade reforçam uma lógica de controle centralizado limitando a capacidade das instituições escolares de atuarem de maneira mais contextualizada e centrada nas necessidades da comunidade Análise dos Programas PróQualidade e Fundescola A pesquisa foca especificamente nos impactos dos programas Pró Qualidade implementado em Minas Gerais e Fundescola que abrangeu regiões Norte Nordeste e CentroOeste Ambos os programas são financiados por empréstimos do Banco Mundial e estruturados para desenvolver as condições de ensino e gestão escolar nessas áreas O objetivo central é aumentar a eficiência e qualidade do ensino incentivando o uso de planejamento estratégico e indicadores de desempenho para monitorar e avaliar os resultados educacionais A implementação do Plano de Desenvolvimento da Escola PDE é o principal mecanismo gerencial promovido pelos programas O PDE funciona como um modelo de planejamento estratégico que visa racionalizar e padronizar as práticas administrativas nas escolas enfatizando o alcance de metas e a melhoria do desempenho institucional Fonseca e Oliveira identificam o PDE como uma tentativa de alinhar as práticas escolares aos modelos de gestão do setor privado mas observam que essa abordagem pode na prática restringir a autonomia escolar e tornar o ambiente educacional excessivamente orientado a resultados quantitativos ao invés de focar na qualidade do ensino e no desenvolvimento integral dos alunos Tensão entre o PDE e o Projeto PolíticoPedagógico PPP Um dos aspectos mais críticos do artigo é a comparação entre o Plano de Desenvolvimento da Escola PDE e o Projeto PolíticoPedagógico PPP Enquanto o PDE representa a visão gerencialista com foco em eficiência e controle o PPP reflete um modelo pedagógico mais democrático e participativo onde as escolas são incentivadas a desenvolver práticas que valorizam a autonomia a participação da comunidade e a contextualização das práticas educacionais Fonseca e Oliveira apontam que essa dualidade gera uma tensão estrutural no sistema de gestão escolar brasileiro O PPP visa integrar a comunidade escolar incluindo professores alunos e familiares no processo de decisão promovendo uma educação que esteja em sintonia com as necessidades e expectativas locais Essa abordagem contrasta fortemente com a lógica do PDE que enfatiza a uniformidade e a padronização de processos e resultados Os autores questionam se o enfoque gerencialista não estaria na verdade enfraquecendo a capacidade das escolas de atuarem de forma crítica e reflexiva ao impor um modelo de gestão mais preocupado com a eficiência administrativa do que com a formação cidadã e o desenvolvimento integral dos estudantes Principais Descobertas e Limitações do Estudo O estudo de Fonseca e Oliveira revela que embora os programas tenham buscado introduzir práticas de modernização administrativa e eficiência nas escolas eles não conseguiram integrar plenamente as aspirações de autonomia e participação defendidas pelo PPP As políticas gerenciais ao impor metas e indicadores de desempenho muitas vezes limitam a flexibilidade das escolas e as obrigam a seguir um modelo de ensino menos adaptado às realidades locais e mais voltado para atender exigências externas No entanto um ponto que limita a profundidade do estudo é a ausência de uma análise comparativa mais detalhada com outros países latino americanos que passaram por reformas semelhantes Essa comparação poderia enriquecer o debate sobre se essas tensões são exclusivas do Brasil ou se fazem parte de uma tendência mais ampla nas políticas educacionais da região Além disso o artigo foca principalmente no impacto desses programas na organização e gestão escolar mas não aprofunda como essas mudanças afetam o aprendizado e o desenvolvimento acadêmico dos alunos de forma mais direta Implicações e Reflexões Críticas O artigo levanta questões importantes sobre o papel da política educacional na promoção de uma educação democrática e inclusiva Fonseca e Oliveira argumentam que ao enfatizar a lógica gerencial as reformas podem acabar instrumentalizando a educação e desvalorizando o papel da escola como espaço de formação cidadã Esse fenômeno que chamam de instrumentalização da escola leva à priorização de práticas administrativas em detrimento de uma educação que promova o pensamento crítico e a participação social A principal crítica levantada pelos autores é que embora o discurso oficial das reformas prometa maior autonomia as práticas implementadas acabam por reforçar um sistema de controle centralizado onde as escolas estão subordinadas a normas e métricas padronizadas Assim os autores defendem uma reflexão sobre alternativas que permitam um equilíbrio entre a autonomia e a responsabilidade institucional promovendo um ambiente onde as escolas possam realmente inovar e adaptarse às necessidades específicas de suas comunidades Conclusão Em resumo o artigo de Marília Fonseca e João Ferreira de Oliveira oferece uma análise crítica e profunda das reformas educacionais brasileiras expondo as contradições entre a autonomia prometida e o controle efetivamente exercido sobre as escolas A pesquisa destaca a dualidade entre o PDE e o PPP evidenciando que as práticas gerenciais ao invés de empoderar muitas vezes limitam a capacidade das escolas de responderem de forma contextualizada e participativa às demandas locais O trabalho é uma contribuição importante para o debate sobre o futuro da gestão educacional no Brasil levantando questões fundamentais sobre o papel das políticas de financiamento internacional e as reais implicações do modelo neoliberal na educação pública Fonseca e Oliveira desafiam o paradigma gerencialista ao questionarem se ele realmente promove uma educação de qualidade e inclusiva ou se na prática reforça uma lógica de controle que fragiliza a autonomia e a capacidade crítica das escolas