·
História ·
História
Envie sua pergunta para a IA e receba a resposta na hora

Prefere sua atividade resolvida por um tutor especialista?
- Receba resolvida até o seu prazo
- Converse com o tutor pelo chat
- Garantia de 7 dias contra erros
Recomendado para você
48
Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996: Diretrizes e Bases da Educação Nacional
História
UFS
42
Índios: Uma Análise Antropológica
História
UFS
347
Colapso: Como as Sociedades Escolhem o Fracasso ou o Sucesso
História
UFS
24
Análise dos Discursos de Celebração da Revolução de 64
História
UFS
59
A Importância de Roque Laraia na Antropologia Cultural Brasileira
História
UFS
1
Análise da Trajetória Profissional de Terezinha na Educação e Museologia
História
UFS
Texto de pré-visualização
A CONSTITUIÇÃO DO SENHORIO E A RELAÇÃO DE DOMINIUM Uma vez que a vassalidade restrita aos grupos dominantes concerne apenas a uma ínfima proporção dos homens e menos ainda das mulheres ela não poderia constituir a principal relação social no seio do sistema feudal Esta deve engajar o essencial da população e definir o quadro fundamental no qual se realizam a produção e a reprodução social assim só pode tratarse da relação entre os senhores e os produtores que dependem deles notarseá aqui que o termo senhor designa aquele que controla um senhorio na relação com seus dependentes e não tem o mesmo sentido que na relação feudovassálica de resto aquele que tem um senhorio recebeuo geralmente como vassalo de um senhor mais poderoso Serão seguidas aqui as análises de Alain Guerreau que dá a esta relação entre senhores e dependentes o nome de dominium ou dominação feudal pois ela engaja segundo os termos da época de um lado um dominus mestre senhor e de outro produtores postos em posição de dependência Estes últimos são qualificados de homines proprii homens do senhor ou de vilãos villani quer dizer os habitantes do lugar originalmente e villa O termo vilão que de início não é pejorativo é sem dúvida o mais adequado em primeiro lugar porque a noção moderna de camponês não tem equivalentes nas concepções medievais Nelas os homens rurais não eram definidos por suas atividades o trabalho da terra mas pelo termo vilão que abrange todos os aldeãos seja qual for sua atividade aí incluídos os artesãos e que indica essencialmente residência local Ele também não designa um estatuto jurídico livrenão livre questão que parece relativamente secundária A base fundamental dessa relação social é antes de ordem espacial ela designa todos os habitantes de um senhorio os vilãos ou se quisermos aldeãos que sofrem a dominação do senhor do lugar Além disso assim como o laço vassálico essa relação enunciase nos mesmos termos que a relação do fiel com Deus homodominus Perante o senhor feudal os vilãos estão então na mesma posição que os homens diante de Deus de modo que as duas relações se reforçam mutuamente como em um jogo de espelhos Antes de precisar a natureza da relação de dominium é indispensável definir o quadro espacial no qual ela se estabelece e que pela razão já dita é aspecto decisivo 128 Jérôme Baschet O NASCIMENTO DA ALDEIA E O ENCECULAMENTO DOS HOMENS Seja resultante da vinculação dos escravos aos manso seja relacionado aos detentores dos aldeóis o habitat rural do fim da Alta Idade Média é disperso e instável Ele consiste de construções leves cuja armação é em madeira e que deixam aos arqueólogos apenas traços superficiais ou inexistentes Fora alguns edifícios mais importantes que exercem o papel de pontos fixos estas frágeis moradias são periodicamente abandonadas Se lembramos aliás que a agricultura de então é extensa e parcialmente itinerante podemos concluir que ainda por volta de 900 as populações rurais do Ocidente estão perfeitamente fixadas Depois em momentos diferentes segundo as regiões no essencial na segunda metade do século X e no decorrer do século XI mas por vezes mais tardiamente como no Império operase um amplo remanejamento da zona rural Ao lado da transformação das terras em terrenos cultiváveis e da conquista de novos solos devese mencionar a reestruturação dos patrimônios eclesiásticos que além do crescimento das doações piedosas de que eles se beneficiam ensinam uma intensa prática de cessões vendas ou troca o que permite aos domínios da Igreja uma maior coesão espacial Isso contribui junto com outros fenômenos que afetam as terras laicas como o declínio dos aldeóis obrigados a per se por dependência de um poderoso para uma fixação mais clara do loteamento bem como para uma estabilização da rede de caminhos Mas o essencial é sem dúvida o reagrupamento dos homens congregatio hominum e a fixação do habitat rural cada vez mais feito em pedra O resultado é o nascimento da aldeia no Ocidente desde que se admite segundo Robert Fossier que uma aldeia supõe um agrupamento compacto de casas fixas mas também uma organização coerente do território em torno e sobretudo o aparecimento de uma tomada de consciência comunitária sem a qual não há aldeãos mas apenas habitantes Por volta de 900 não existem aldeias conforme essa definição por volta de 1100 o essencial dos campos ocidentais é organizado dessa maneira Entre os dois momentos organizouse o essencial da rede de habitações rurais que com o acréscimo das novas aldeias implantadas ao longo dos séculos XII e XIII nas zonas de colonização e levando em conta o abandono de certos lugares vai perdurar até o século XIX Evidentemente não é uma revolução como tentou dizer Robert Fossier é ao menos uma mutação considerável pois ela desenha a fisionomia dos campos por cerca de oito séculos EM ALDEIAS ELEVADAS CERRADAMENTE POSTADAS EM TORNO DO CASTELO SENHORIAL E CERCADAS DE UMA MURALLA FORTIFICADA Isso não quer dizer que essa opção tenha uma causa essencialmente militar ela é antes social e ideológica nem que a força seja seu único vetor ele é muitas vezes acompanhada de contratos relativamente favoráveis aos produtores e de certas vantagens jurídicas Permanece o fato de que ela mostra o exemplo de um processo fortemente marcado pela vontade dos dominantes e por vezes também pela intervenção da Igreja Essas aldeias fortificadas ganham o nome de castrum de onde a expressão incastellamento aplicada por Pierre Toubert a esta variante mais dirigida e a mais autoritária do reagrupamento dos homens que no entanto não é tão geral como se acreditou a princípio se o castrum é seu elemento principal o reagrupamento do habitat não se faz sempre em torno de um castelo e pode tomar a forma de aldeias abertas enquanto a maior parte dos castelos não é construída com a finalidade imediata de regrupar a população e só adquire essa função em um segundo momento Em outras regiões do Sul mediterrâneas e pirenaicas as aldeias castrenses coexistem como as aldeias eclesiais igualmente fortificadas mas centradas em um edifício de culto ao mesmo tempo convém sublinhar que se o reagrupamento do habitat é precoce a estruturação dos limites da comunidade e sobretudo da territorialização das zonas incultas pode ser retardada até o século XIV Na Europa do Norte o reagrupamento dos homens começa mais tarde e podese notar em nível importante das comunidades aldeãs em formação Ao menos o reagrupamento das casas campenses com frequência no interior de uma muralha de madeira parece ser ali menos forçado e mais voluntário e a associação das habitações com um castelo pode se produzir em um segundo tempo depois do reagrupamento já estar realizado Finalmente nas zonas de colonização especialmente na Península Ibérica e no Leste da Alemanha tratase tanto de regrupar um habitat antigo como de dar desde o início a forma de aldeias densas a uma implantação nova Em suas formas mais variadas esse fenômeno pode ser definido como um processo de enceculamento expressão forjada por Robert Fossier para designar o reagrupamento dos homens no interior de entidades sociais localizadas definidos por um centro a aldeia o castelo por uma delimitação estruturada pela rede de lotes e de caminhose pelos limites que definem sua extensão Retornaremos na segunda parte capítulo II ao enceculamento e em particular ao reagrupamento dos hombres e a igreja e o cemitério têm nele Mas o resultado é de logo claro dali em diante os homens serão enceculados a um só tempo reagrupados em aldeias mais estáveis e fixados no interior dessas unidades de base que se chamam senhores O enceculamento supõe então a formação de uma rede de senhórios que cobre mais ou menos todo o território ocidental Por 130 Jérôme Baschet volta de 1100 todos os homens estão presos nas malhas de um tecido de senhores dos quais cada célula é o quadro normal de vida Robert Fossier O encadeamento associa portanto vários processos o nascimento da aldeia a geração do senhorio mas também o enquadramento paroquial sobre o qual retornaremos na segunda parte capítulo II Embora sejam paralelos e contribuam para o mesmo resultado esses três processos não são estritamente sobrepostos as aldeias o senhorio e a paróquia raramente coincidem Enquanto no século XI um senhorio reagrupa geralmente várias aldeias a partir do século XII e sobretudo do XIII constatase ao contrário que vários senhores exercem sua dominância no interior de uma mesma aldeia Além dos cossenhorios que associam uma instituição clerical e um laico ou dos consorzi italianos que associam por vezes uma dezena de senhores para um mesmo senhorio acontece cada vez com mais frequência que no interior da aldeia terras e direitos específicos remetem a senhores distintos a tal ponto que um mesmo aldeão pode depender de vários senhores para bens diferentes O encelulamento não significa a formação de uma rede uniforme de células homogêneas e únicas e toda a dificuldade consiste então em delimitar como se articulam os diferentes fenômenos mencionados Podese assim ressaltar que o senhorio que de resto é menos uma entidade territorial do que um poder específico se revela bastante móvel diferentemente da rigidez do quadro paroquial assim a estabelecimentos dos lugares de culto contrasta com as frequentes mudanças dos sítios castrenses No mais em certas regiões como a França do Oeste o habitat permanece parcialmente disperso sem que isso contradiga a lógica do encelulamento É então que a igreja e o quadro paroquial exercem um papel maior na formação de aldeias dispersas A expressão sugere de forma judiciosa que o que faz a aldeia é menos o reagrupamento de suas casas do que a coesão da comunidade dos aldeãos Daniel Pichot No geral os fenômenos que contribuem para o encelulamento podem se combinar de maneiras diversas ora mais firmes ora mais tênues mas o fato de que eles se sobrepõem e se imbricam sem coincidirem completamente tece parece fazer parte da dinâmica de conjunto do processo Podese então delimitar melhor as implicações do debate sobre o ano mil Para os defensores da mutação o que se passa no século que circunda esta data é nada menos que uma fase aguda do processo de encelulamento dos homens e de formação do quadro senhorial O que se nomeia mutação ou mesmo revolução é um momento particularmente intenso de ancoragem da dominância senhorial em relação à multiplicação dos castelos e dos montes castrenses Alguns procuraram identificar as reações suscitadas por essas transformações principalmente a paz de Deus proclamação lançada pelos bispos e pelas assembleias conciliares a partir dos anos 97590 que condena os maus costumes dos senhores laicos exor tandoos a respeitarem os clérigos e os pobres chamando à restauração da ordem pública e da paz Assim eles se apropriam de uma preocupação abandonada pelo poder real e atraem o apoio popular Entretanto Dominique Barthélemy fez observar que este movimento não é nem de origem popular nem antissenhorial pois a Igreja denuncia a violência da aristocracia laica na medida em que ela própria é sua vítima e de fato defende seus próprios senhores em face de uma pressão aristrocrática que ameaça incomodála Em sua luta contra a nobreza por vezes ela faz apelo ao povo afetado pelas mesmas causas o que não é isento de perigo e arrisca a transbordar seus próprios objetivos Os movimentos da paz de Deus fazem então intervir grupos populares mas seu objetivo fundamental é a manutenção de uma ordem senhorial que a Igreja pretende dominar Os críticos das teses mutacionistas também enfatizaram que nesse movimento não se opera nenhuma mudança de classe dominante Seja antes seja depois do ano mil são sempre a aristocracia e a Igreja que dominam a sociedade mas ambas conhecem uma vigorosa reorganização Como dissemos a partir de então a dominação aristocrática ancorase localmente e tornase mais eficaz graças a remodelagem especial dos campos Mas a questão cronológica levantada pelo debate sobre o ano mil permanece insolúvel é evidente que o encelulamento não poderia ser reduzido aos decênios próximos do ano mil suas raízes remontam ao início do século IX e ele se completa lentamente até pleno século XII A progressividade dos fenômenos e suas discrepâncias assim como a ausência de uma cronologia uniforme na escala do Ocidente impõem que se prevaleça essa dinâmica plurisecsular Ou então seria possível identificar por volta de 9801060 uma aceleração do processo castelanização senhoralização edificação de igrejas sem falar das transformações de ordem eclesial de que se falará no capítulo seguinte em um número significativo de regiões A polêmica sobre o ano mil esgotase e essas duas opções são talvez menos incompatíveis do que parece Enfim o essencial consiste em reconhecer a natureza dos processos em andamento quer se recorra à noção de encelulamento quer sejam preferidos outros termos a reconfiguração socioespacial da qual o castelo e o senhorio a igreja e a paróquia a aldeia e a comunidade são as facetas diversamente combináveis leva à formação de um sistema dotado de uma coerência nova e que é o quadro de um desenvolvimento de amplitude inédita A relação de dominium Hoje não se crê mais como queria a historiografia tradicional que todos os produtores dependentes do senhor feudal fossem servos Uma das contribuições mais marcantes da obra de Georges Duby é a de ter mostrado que a servidão não era a forma central de exploração do feudalismo É verdade que esta existiu e pode ser considerada o resultado da evolução da Alta Idade Média quan do paralelamente ao eclipse da escravidão a distinção entre livres e não livres perde sua clareza e não consegue mais dar conta das situações intermediárias que se multiplicam A servidão é finalmente a forma estabilizada de uma posição intermediária entre a escravidão e a liberdade o servo não é mais uma propriedade do senhor assimilado ao gado mas sua liberdade é marcada por importantes limitações Se a escravidão é um cativeiro definitivo o ritual de servidão utilizado em certas regiões e durante o qual o servo traz uma corda no pescoço parece indicar um cativeiro de que se é imperfeitamente resgatado pelo pagamento de uma obrigação Três marcas principais exprimem a limitação da liberdade do servo o cheviage ou captação tributo pelo qual alguém se resgata do cativeiro a maimorte que significa a incapacidade da propriedade plena de um patrimônio e que impõe o confisco pelo senhor de parte da herança transmitida pelo servo e enfim o formariage taxa paga quando do casamento e que manifesta a limitação da liberdade matrimonial Finalmente seria necessário acrescentar a importância das corveias trabalho devido ao senhor que não são exclusivas dos servos mas que no caso destes são deixadas em maior grau ao arbítrio do senhor Este quadro deveria se tornar muito mais complicado para dar conta da diversidade regional e sobretudo pelo fato de que essas obrigações pesam por vezes sobre camponeses livres De resto não é certo que a situação material dos servos seja sempre mais dramática que a de seus vizinhos livres e podese perguntar se o peso específico de sua condição não se refere sobretudo a mancha humilhante que uma servidão que dá lugar a múltiplas situações de exclusão ou de discriminação Mas o essencial é sublinhar que a servidão é apenas uma forma de exploração dentre outras Se por vezes segundo o caminho aberto por Georges Duby tenhase talvez minimizado excessivamente o seu papel podese sem dúvida concluir atualmente que a escravidão medieval não é nem dominante nem marginal Ela não é o coração do sistema mas uma de suas chaves manuseada dentre outras formas de exploração agora abandonada outra retomada Dominique Barthélemy Se a tendência do conjunto é sobretudo de declínio a servidão pode segundo as regiões e as épocas abranger a metade dos aldeãos ou desaparecer completamente Podese admitir que na média ela afete entre 10 e 20 da população rural É preciso então analisar a forma mais geral da dominação feudal aquela que se instaura entre um senhor e os vassalos que de maneira completa ou parcial dependem dele A relação de dominium estabelecida entre eles manifestase por um feixe emaranhado e extraordinariamente variado de obrigações às quais é comum atribuir dupla origem A primeira seria fundiária e se assentaria Jog o ritual que consiste em capturar e eventualmente decapitar a ave não deve ser confundido com a caça com auxílio de pássaros em geral o falcão N T aldeãos por vezes o estabelecimento e a vigilância de uma rede de irrigação a reivindicação dos bens comunais e de sua gestão caminhos riachos e zonas incultas e a defesa dos direitos coletivos particularmente a livre pastagem nas terras em que a colheita acaba de ser realizada Finalmente essa organização reforça a consciência comunitária que se manifesta notadamente pelas procissões nas quais se exibe a ordem aldeã e pelos rituais apropriados como a plantação das árvores de maio ou a eleição anual de um rei da juventude na sequência de uma prova tal como um combate de galos ou uma caça ao pássaro 12 Nessa práticas e representações exprimemse ao mesmo tempo uma busca da unidade comunitária a consciência de formar uma entidade específica e o reconhecimento das diferenças e das hierarquias internas que caracterizam essa coletividade Uma dominação total Salvo exceção os senhores intervêm cada vez menos na atividade produtiva em si mesma No essencial está organizada no quadro da comunidade aldeã de maneira autônoma em relação aos senhores No entanto se a dominação senhorial permanece largamente exterior ao núcleo da atividade produtiva o cultivo das terras ela é exercida ainda mais vigorosamente acima e abaixo desta Acima porque e aí está o papel do enclose ment os dominantes ordenam o próprio quadro da vida social e da atividade produtiva através do reagrupamento do habitat o estabelecimento de senhores e do quadro paroquial e mesmo de certa maneira através do reforço da comunidade aldeã Abaixo pelo feixe de obrigações e pagamentos que compõem a renda senhorial inclusive as vantagens tiradas do dividimento e do controle diferenciado dos estoques cerealíferos Exercendose quer anteriormente quer posteriormente a dominação senhorial enquadra fortemente a atividade produtiva embora esta seja livremente realizada pelos dependentes no quadro da comunidade aldeã Do mesmo modo mesmo se os habitantes de uma mesma aldeia podem depender de vários senhores diferentes para direitos e terras diferentes o dominium aparece como uma forma de dominação total no sentido de que concentra nas mãos de um ou vários senhores um poder localizado é verdade mas em que eles não se encontram estreitamente imbricados militares económicos
Envie sua pergunta para a IA e receba a resposta na hora
Recomendado para você
48
Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996: Diretrizes e Bases da Educação Nacional
História
UFS
42
Índios: Uma Análise Antropológica
História
UFS
347
Colapso: Como as Sociedades Escolhem o Fracasso ou o Sucesso
História
UFS
24
Análise dos Discursos de Celebração da Revolução de 64
História
UFS
59
A Importância de Roque Laraia na Antropologia Cultural Brasileira
História
UFS
1
Análise da Trajetória Profissional de Terezinha na Educação e Museologia
História
UFS
Texto de pré-visualização
A CONSTITUIÇÃO DO SENHORIO E A RELAÇÃO DE DOMINIUM Uma vez que a vassalidade restrita aos grupos dominantes concerne apenas a uma ínfima proporção dos homens e menos ainda das mulheres ela não poderia constituir a principal relação social no seio do sistema feudal Esta deve engajar o essencial da população e definir o quadro fundamental no qual se realizam a produção e a reprodução social assim só pode tratarse da relação entre os senhores e os produtores que dependem deles notarseá aqui que o termo senhor designa aquele que controla um senhorio na relação com seus dependentes e não tem o mesmo sentido que na relação feudovassálica de resto aquele que tem um senhorio recebeuo geralmente como vassalo de um senhor mais poderoso Serão seguidas aqui as análises de Alain Guerreau que dá a esta relação entre senhores e dependentes o nome de dominium ou dominação feudal pois ela engaja segundo os termos da época de um lado um dominus mestre senhor e de outro produtores postos em posição de dependência Estes últimos são qualificados de homines proprii homens do senhor ou de vilãos villani quer dizer os habitantes do lugar originalmente e villa O termo vilão que de início não é pejorativo é sem dúvida o mais adequado em primeiro lugar porque a noção moderna de camponês não tem equivalentes nas concepções medievais Nelas os homens rurais não eram definidos por suas atividades o trabalho da terra mas pelo termo vilão que abrange todos os aldeãos seja qual for sua atividade aí incluídos os artesãos e que indica essencialmente residência local Ele também não designa um estatuto jurídico livrenão livre questão que parece relativamente secundária A base fundamental dessa relação social é antes de ordem espacial ela designa todos os habitantes de um senhorio os vilãos ou se quisermos aldeãos que sofrem a dominação do senhor do lugar Além disso assim como o laço vassálico essa relação enunciase nos mesmos termos que a relação do fiel com Deus homodominus Perante o senhor feudal os vilãos estão então na mesma posição que os homens diante de Deus de modo que as duas relações se reforçam mutuamente como em um jogo de espelhos Antes de precisar a natureza da relação de dominium é indispensável definir o quadro espacial no qual ela se estabelece e que pela razão já dita é aspecto decisivo 128 Jérôme Baschet O NASCIMENTO DA ALDEIA E O ENCECULAMENTO DOS HOMENS Seja resultante da vinculação dos escravos aos manso seja relacionado aos detentores dos aldeóis o habitat rural do fim da Alta Idade Média é disperso e instável Ele consiste de construções leves cuja armação é em madeira e que deixam aos arqueólogos apenas traços superficiais ou inexistentes Fora alguns edifícios mais importantes que exercem o papel de pontos fixos estas frágeis moradias são periodicamente abandonadas Se lembramos aliás que a agricultura de então é extensa e parcialmente itinerante podemos concluir que ainda por volta de 900 as populações rurais do Ocidente estão perfeitamente fixadas Depois em momentos diferentes segundo as regiões no essencial na segunda metade do século X e no decorrer do século XI mas por vezes mais tardiamente como no Império operase um amplo remanejamento da zona rural Ao lado da transformação das terras em terrenos cultiváveis e da conquista de novos solos devese mencionar a reestruturação dos patrimônios eclesiásticos que além do crescimento das doações piedosas de que eles se beneficiam ensinam uma intensa prática de cessões vendas ou troca o que permite aos domínios da Igreja uma maior coesão espacial Isso contribui junto com outros fenômenos que afetam as terras laicas como o declínio dos aldeóis obrigados a per se por dependência de um poderoso para uma fixação mais clara do loteamento bem como para uma estabilização da rede de caminhos Mas o essencial é sem dúvida o reagrupamento dos homens congregatio hominum e a fixação do habitat rural cada vez mais feito em pedra O resultado é o nascimento da aldeia no Ocidente desde que se admite segundo Robert Fossier que uma aldeia supõe um agrupamento compacto de casas fixas mas também uma organização coerente do território em torno e sobretudo o aparecimento de uma tomada de consciência comunitária sem a qual não há aldeãos mas apenas habitantes Por volta de 900 não existem aldeias conforme essa definição por volta de 1100 o essencial dos campos ocidentais é organizado dessa maneira Entre os dois momentos organizouse o essencial da rede de habitações rurais que com o acréscimo das novas aldeias implantadas ao longo dos séculos XII e XIII nas zonas de colonização e levando em conta o abandono de certos lugares vai perdurar até o século XIX Evidentemente não é uma revolução como tentou dizer Robert Fossier é ao menos uma mutação considerável pois ela desenha a fisionomia dos campos por cerca de oito séculos EM ALDEIAS ELEVADAS CERRADAMENTE POSTADAS EM TORNO DO CASTELO SENHORIAL E CERCADAS DE UMA MURALLA FORTIFICADA Isso não quer dizer que essa opção tenha uma causa essencialmente militar ela é antes social e ideológica nem que a força seja seu único vetor ele é muitas vezes acompanhada de contratos relativamente favoráveis aos produtores e de certas vantagens jurídicas Permanece o fato de que ela mostra o exemplo de um processo fortemente marcado pela vontade dos dominantes e por vezes também pela intervenção da Igreja Essas aldeias fortificadas ganham o nome de castrum de onde a expressão incastellamento aplicada por Pierre Toubert a esta variante mais dirigida e a mais autoritária do reagrupamento dos homens que no entanto não é tão geral como se acreditou a princípio se o castrum é seu elemento principal o reagrupamento do habitat não se faz sempre em torno de um castelo e pode tomar a forma de aldeias abertas enquanto a maior parte dos castelos não é construída com a finalidade imediata de regrupar a população e só adquire essa função em um segundo momento Em outras regiões do Sul mediterrâneas e pirenaicas as aldeias castrenses coexistem como as aldeias eclesiais igualmente fortificadas mas centradas em um edifício de culto ao mesmo tempo convém sublinhar que se o reagrupamento do habitat é precoce a estruturação dos limites da comunidade e sobretudo da territorialização das zonas incultas pode ser retardada até o século XIV Na Europa do Norte o reagrupamento dos homens começa mais tarde e podese notar em nível importante das comunidades aldeãs em formação Ao menos o reagrupamento das casas campenses com frequência no interior de uma muralha de madeira parece ser ali menos forçado e mais voluntário e a associação das habitações com um castelo pode se produzir em um segundo tempo depois do reagrupamento já estar realizado Finalmente nas zonas de colonização especialmente na Península Ibérica e no Leste da Alemanha tratase tanto de regrupar um habitat antigo como de dar desde o início a forma de aldeias densas a uma implantação nova Em suas formas mais variadas esse fenômeno pode ser definido como um processo de enceculamento expressão forjada por Robert Fossier para designar o reagrupamento dos homens no interior de entidades sociais localizadas definidos por um centro a aldeia o castelo por uma delimitação estruturada pela rede de lotes e de caminhose pelos limites que definem sua extensão Retornaremos na segunda parte capítulo II ao enceculamento e em particular ao reagrupamento dos hombres e a igreja e o cemitério têm nele Mas o resultado é de logo claro dali em diante os homens serão enceculados a um só tempo reagrupados em aldeias mais estáveis e fixados no interior dessas unidades de base que se chamam senhores O enceculamento supõe então a formação de uma rede de senhórios que cobre mais ou menos todo o território ocidental Por 130 Jérôme Baschet volta de 1100 todos os homens estão presos nas malhas de um tecido de senhores dos quais cada célula é o quadro normal de vida Robert Fossier O encadeamento associa portanto vários processos o nascimento da aldeia a geração do senhorio mas também o enquadramento paroquial sobre o qual retornaremos na segunda parte capítulo II Embora sejam paralelos e contribuam para o mesmo resultado esses três processos não são estritamente sobrepostos as aldeias o senhorio e a paróquia raramente coincidem Enquanto no século XI um senhorio reagrupa geralmente várias aldeias a partir do século XII e sobretudo do XIII constatase ao contrário que vários senhores exercem sua dominância no interior de uma mesma aldeia Além dos cossenhorios que associam uma instituição clerical e um laico ou dos consorzi italianos que associam por vezes uma dezena de senhores para um mesmo senhorio acontece cada vez com mais frequência que no interior da aldeia terras e direitos específicos remetem a senhores distintos a tal ponto que um mesmo aldeão pode depender de vários senhores para bens diferentes O encelulamento não significa a formação de uma rede uniforme de células homogêneas e únicas e toda a dificuldade consiste então em delimitar como se articulam os diferentes fenômenos mencionados Podese assim ressaltar que o senhorio que de resto é menos uma entidade territorial do que um poder específico se revela bastante móvel diferentemente da rigidez do quadro paroquial assim a estabelecimentos dos lugares de culto contrasta com as frequentes mudanças dos sítios castrenses No mais em certas regiões como a França do Oeste o habitat permanece parcialmente disperso sem que isso contradiga a lógica do encelulamento É então que a igreja e o quadro paroquial exercem um papel maior na formação de aldeias dispersas A expressão sugere de forma judiciosa que o que faz a aldeia é menos o reagrupamento de suas casas do que a coesão da comunidade dos aldeãos Daniel Pichot No geral os fenômenos que contribuem para o encelulamento podem se combinar de maneiras diversas ora mais firmes ora mais tênues mas o fato de que eles se sobrepõem e se imbricam sem coincidirem completamente tece parece fazer parte da dinâmica de conjunto do processo Podese então delimitar melhor as implicações do debate sobre o ano mil Para os defensores da mutação o que se passa no século que circunda esta data é nada menos que uma fase aguda do processo de encelulamento dos homens e de formação do quadro senhorial O que se nomeia mutação ou mesmo revolução é um momento particularmente intenso de ancoragem da dominância senhorial em relação à multiplicação dos castelos e dos montes castrenses Alguns procuraram identificar as reações suscitadas por essas transformações principalmente a paz de Deus proclamação lançada pelos bispos e pelas assembleias conciliares a partir dos anos 97590 que condena os maus costumes dos senhores laicos exor tandoos a respeitarem os clérigos e os pobres chamando à restauração da ordem pública e da paz Assim eles se apropriam de uma preocupação abandonada pelo poder real e atraem o apoio popular Entretanto Dominique Barthélemy fez observar que este movimento não é nem de origem popular nem antissenhorial pois a Igreja denuncia a violência da aristocracia laica na medida em que ela própria é sua vítima e de fato defende seus próprios senhores em face de uma pressão aristrocrática que ameaça incomodála Em sua luta contra a nobreza por vezes ela faz apelo ao povo afetado pelas mesmas causas o que não é isento de perigo e arrisca a transbordar seus próprios objetivos Os movimentos da paz de Deus fazem então intervir grupos populares mas seu objetivo fundamental é a manutenção de uma ordem senhorial que a Igreja pretende dominar Os críticos das teses mutacionistas também enfatizaram que nesse movimento não se opera nenhuma mudança de classe dominante Seja antes seja depois do ano mil são sempre a aristocracia e a Igreja que dominam a sociedade mas ambas conhecem uma vigorosa reorganização Como dissemos a partir de então a dominação aristocrática ancorase localmente e tornase mais eficaz graças a remodelagem especial dos campos Mas a questão cronológica levantada pelo debate sobre o ano mil permanece insolúvel é evidente que o encelulamento não poderia ser reduzido aos decênios próximos do ano mil suas raízes remontam ao início do século IX e ele se completa lentamente até pleno século XII A progressividade dos fenômenos e suas discrepâncias assim como a ausência de uma cronologia uniforme na escala do Ocidente impõem que se prevaleça essa dinâmica plurisecsular Ou então seria possível identificar por volta de 9801060 uma aceleração do processo castelanização senhoralização edificação de igrejas sem falar das transformações de ordem eclesial de que se falará no capítulo seguinte em um número significativo de regiões A polêmica sobre o ano mil esgotase e essas duas opções são talvez menos incompatíveis do que parece Enfim o essencial consiste em reconhecer a natureza dos processos em andamento quer se recorra à noção de encelulamento quer sejam preferidos outros termos a reconfiguração socioespacial da qual o castelo e o senhorio a igreja e a paróquia a aldeia e a comunidade são as facetas diversamente combináveis leva à formação de um sistema dotado de uma coerência nova e que é o quadro de um desenvolvimento de amplitude inédita A relação de dominium Hoje não se crê mais como queria a historiografia tradicional que todos os produtores dependentes do senhor feudal fossem servos Uma das contribuições mais marcantes da obra de Georges Duby é a de ter mostrado que a servidão não era a forma central de exploração do feudalismo É verdade que esta existiu e pode ser considerada o resultado da evolução da Alta Idade Média quan do paralelamente ao eclipse da escravidão a distinção entre livres e não livres perde sua clareza e não consegue mais dar conta das situações intermediárias que se multiplicam A servidão é finalmente a forma estabilizada de uma posição intermediária entre a escravidão e a liberdade o servo não é mais uma propriedade do senhor assimilado ao gado mas sua liberdade é marcada por importantes limitações Se a escravidão é um cativeiro definitivo o ritual de servidão utilizado em certas regiões e durante o qual o servo traz uma corda no pescoço parece indicar um cativeiro de que se é imperfeitamente resgatado pelo pagamento de uma obrigação Três marcas principais exprimem a limitação da liberdade do servo o cheviage ou captação tributo pelo qual alguém se resgata do cativeiro a maimorte que significa a incapacidade da propriedade plena de um patrimônio e que impõe o confisco pelo senhor de parte da herança transmitida pelo servo e enfim o formariage taxa paga quando do casamento e que manifesta a limitação da liberdade matrimonial Finalmente seria necessário acrescentar a importância das corveias trabalho devido ao senhor que não são exclusivas dos servos mas que no caso destes são deixadas em maior grau ao arbítrio do senhor Este quadro deveria se tornar muito mais complicado para dar conta da diversidade regional e sobretudo pelo fato de que essas obrigações pesam por vezes sobre camponeses livres De resto não é certo que a situação material dos servos seja sempre mais dramática que a de seus vizinhos livres e podese perguntar se o peso específico de sua condição não se refere sobretudo a mancha humilhante que uma servidão que dá lugar a múltiplas situações de exclusão ou de discriminação Mas o essencial é sublinhar que a servidão é apenas uma forma de exploração dentre outras Se por vezes segundo o caminho aberto por Georges Duby tenhase talvez minimizado excessivamente o seu papel podese sem dúvida concluir atualmente que a escravidão medieval não é nem dominante nem marginal Ela não é o coração do sistema mas uma de suas chaves manuseada dentre outras formas de exploração agora abandonada outra retomada Dominique Barthélemy Se a tendência do conjunto é sobretudo de declínio a servidão pode segundo as regiões e as épocas abranger a metade dos aldeãos ou desaparecer completamente Podese admitir que na média ela afete entre 10 e 20 da população rural É preciso então analisar a forma mais geral da dominação feudal aquela que se instaura entre um senhor e os vassalos que de maneira completa ou parcial dependem dele A relação de dominium estabelecida entre eles manifestase por um feixe emaranhado e extraordinariamente variado de obrigações às quais é comum atribuir dupla origem A primeira seria fundiária e se assentaria Jog o ritual que consiste em capturar e eventualmente decapitar a ave não deve ser confundido com a caça com auxílio de pássaros em geral o falcão N T aldeãos por vezes o estabelecimento e a vigilância de uma rede de irrigação a reivindicação dos bens comunais e de sua gestão caminhos riachos e zonas incultas e a defesa dos direitos coletivos particularmente a livre pastagem nas terras em que a colheita acaba de ser realizada Finalmente essa organização reforça a consciência comunitária que se manifesta notadamente pelas procissões nas quais se exibe a ordem aldeã e pelos rituais apropriados como a plantação das árvores de maio ou a eleição anual de um rei da juventude na sequência de uma prova tal como um combate de galos ou uma caça ao pássaro 12 Nessa práticas e representações exprimemse ao mesmo tempo uma busca da unidade comunitária a consciência de formar uma entidade específica e o reconhecimento das diferenças e das hierarquias internas que caracterizam essa coletividade Uma dominação total Salvo exceção os senhores intervêm cada vez menos na atividade produtiva em si mesma No essencial está organizada no quadro da comunidade aldeã de maneira autônoma em relação aos senhores No entanto se a dominação senhorial permanece largamente exterior ao núcleo da atividade produtiva o cultivo das terras ela é exercida ainda mais vigorosamente acima e abaixo desta Acima porque e aí está o papel do enclose ment os dominantes ordenam o próprio quadro da vida social e da atividade produtiva através do reagrupamento do habitat o estabelecimento de senhores e do quadro paroquial e mesmo de certa maneira através do reforço da comunidade aldeã Abaixo pelo feixe de obrigações e pagamentos que compõem a renda senhorial inclusive as vantagens tiradas do dividimento e do controle diferenciado dos estoques cerealíferos Exercendose quer anteriormente quer posteriormente a dominação senhorial enquadra fortemente a atividade produtiva embora esta seja livremente realizada pelos dependentes no quadro da comunidade aldeã Do mesmo modo mesmo se os habitantes de uma mesma aldeia podem depender de vários senhores diferentes para direitos e terras diferentes o dominium aparece como uma forma de dominação total no sentido de que concentra nas mãos de um ou vários senhores um poder localizado é verdade mas em que eles não se encontram estreitamente imbricados militares económicos