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Ciências Biológicas ·
Parasitologia Humana
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222 RESUMO A doença de Chagas aguda apresenta mudanças no quadro epidemiológico res surgindo em um cenário não habitual relacionado com a forma de transmissão Atual mente a transmissão por via oral envolvendo alimentos contaminados é a principal via de infecção humana com surtos em toda a América Latina Entre os sintomas da fase aguda destacamse febre prolongada quase sempre acompanhada de malestar adinamia cefaleia e perda do apetite acompanhados de manifestações sistêmicas tais como adenomegalias e hepatoesplenomegalias As manifestações cardíacas variam desde quadros assintomáticos até graus variáveis de insuficiência cardíaca aguda ou choque cardiogênico e morte O tratamento da fase aguda com antiparasitários deve sempre ser instituído pois existem algumas evidencias de melhor evolução clínica em relatos de casos Descritores Doença de Chagas Trypanosoma cruzi Epidemiologia ABSTRACT Acute Chagas disease shows changes in the epidemiological situation reappearing in an unusual scenario related to the mode of transmission Currently the oral transmission involving contaminated food is the main route of human infection with outbreaks through out Latin America Among the symptoms of the acute phase stand out prolonged fever often accompanied by malaise asthenia headache and loss of appetite accompanied by systemic manifestations such as lymphadenopathy and hepatosplenomegaly Cardiac manifestations range from asymptomatic clinical statuses to varying degrees of acute heart failure or cardiogenic shock and death Treatment of acute phase with antiparasitic agents should always be provided as there is some evidence of better clinical outcome in case reports Descriptors Chagas Disease Trypanosoma cruzi Epidemiology REVISÃOREVIEW Dilma do Socorro Moraes de Souza1 2 Rui Manuel dos Santos Povoa3 1 Universidade Federal do Pará Disciplina de Cardiologia da Faculdade de Medicina Pará Brasil 2 Ambulatório de Doença de Chagas Aguda do Hospital Universitário João de Barros Barreto 3 Universidade Federal de São Paulo Disciplina de Cardiologia São Paulo SP Brasil Correspondência Rua Veiga Cabral 199 Cidade Velha Belém PA Brasil CEP 66023630 rmspovoacardialbr ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA EPIDEMIOLOGICAL AND CLINICAL ASPECTS OF ACUTE CHAGAS DISEASE IN BRAZIL AND LATIN AMERICA Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 INTRODUÇÃO A doença de Chagas DC vem adquirindo cada vez mais um grau de importância crescente devido a mudanças no quadro epidemiológico Após um século de descobertas da doença ressurge em um cenário não habitual especialmente no aspecto relacionado à forma de transmissão É uma antropozoonose causada pelo protozoário fla gelado Trypanosoma cruzi T cruzi com evolução clínica bifásica A forma aguda da doença de Chagas muitas vezes não é identificada e evolui na maioria das vezes para a fase crônica com apresentação em formas indetermina das digestiva cardíaca ou cardiodigestiva A doença de Chagas aguda DCA é um estágio dinâ mico de evolução da doença que pode ser diagnosticada quando ocorre a demonstração da presença do parasita no sangue periférico por exames de identificação que en volvem a análise direta do sangue Figura 1 HISTÓRICO DA DOENÇA DE CHAGAS A infecção pelo T cruzi já é muito antiga e remonta da época précolombiana pois o ciclo silvestre da DC surgiu focalmente em diferentes áreas do continente americano e disseminada por migrações internas Existem evidências que logo nos primórdios da habitação humana da América do Sul ocorria infecção pelo T cruzi1 Em análises de múmias de Chinchorros há 9000 anos encontradas no deserto do Atacama no Chile e utilizando técnicas de análise de DNA do parasita encon traram evidências de que a infecção em seres humanos já ocorria nestas populações nômades com rotas entre o mar e as montanhas23 223 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA Estes povos conheciam os triatomíneos que habitavam as redondezas peridomiciliares e alguns deles ainda ser viam de alimento O assentamento no altiplano de alguns povos principalmente os quéchuas bolivianos com o hábito de criar alguns roedores domésticos para alimentação e habitando em casas muito primitivas trouxeram o T cruzi para o domicílio humano45 Os chinchorros foram os primeiros povos onde foi iden tificada a infecção pelo parasita que se espalhou ao longo da costa sul americana do deserto do Atacama para a região sul do Peru e norte do Chile Em escavações arqueológicas utilizando a análise do DNA o T cruzi foi identificado em di versos locais da América do Sul No Brasil durante a análise de uma múmia de 560 anos e de um fragmento de osso datado de 45007000 anos no vale do Peruaçu no Estado de Minas Gerais foram encontrados vestígios do T cruzi67 O processo de disseminação foi tão intenso que até no Texas EUA foram encontrados traços do DNA do parasita em múmias de 1150 anos do deserto Chihuahuan5 Além da detecção do T cruzi no processo de exumação destas múmias também foram encontradas lesões sugestivas da doença de Chagas8 Outro aspecto curioso são algumas cerâmicas préco lombianas datadas dos séculos 13 a 16 onde as figuras hu manas representadas mostram uma possível contaminação pela doença Algumas apresentam um inchaço unilateral na pálpebra muito sugestivo do sinal de Romanã1 Com bases nestes dados de distribuição paleontológica a hipótese da origem andina da doença é bem sólida sendo que os chinchorros foram os primeiros povos a abandonar a vida nômade se estabelecendo na região com desen volvimento da agricultura e da pecuária Com isso houve modificações do meio ambiente com desmatamento para esta ocupação Os triatomíneos em particular o T infestans se adaptaram rapidamente à vegetação mais aberta de senvolvendo uma preferência por habitações humanas ao longo do tempo9 O desmatamento está muito relacionado com o aumento da prevalência da DC e esta relação está fundamentada pelo fato de que as populações indígenas da Amazônia foram isentas da tripanossomíase americana devido ao uso de diferentes padrões tanto socioambien tais de manuseio do solo quanto de estruturas habitacio nais com cabanas de dimensões amplas e abertas que são desfavoráveis à colonização dos vetores Além disso a constante mudança de local e a ausência de animais domésticos dificultou a transmissão vetorial da doença10 A partir do século 16 surgiram diversos relatos de via jantes e médicos descrevendo sinais e sintomas de doen ças que lembram a tripanossomíase americana no Brasil11 Em 1735 um médico português descreveu uma síndrome digestiva muito parecida com a síndrome megavisceral da DC relatando a relação dos sintomas com a ampliação e distensão do reto12 Outros registros descreveram a disfagia do megaesôfago com toda a áurea clínica da desnutrição desencadeada pela anormalidade digestiva12 Diversos acontecimentos históricos indicam que a DC está presente de forma bem evidente na América Latina desde o século 16 afetando toda a população desde os in dígenas até os conquistadores Além disso existem relatos de domiciliação dos triatomíneos antes do conceito de vetor da doença Charles Darwin em 1835 anotou em seu diário um ataque do triatomíneo durante a noite Descreveu com detalhes a picada do inseto e as transformações durante a sucção do sangue Pontuou o encontro desta espécie Reduvius além dos pampas no norte do Chile e Peru11 A história moderna da doença começa em 1908 quan do o higienista e bacteriologista brasileiro Carlos Chagas durante uma campanha antimalária na construção de linha férrea no estado de Minas Gerais encontrou insetos de grandes dimensões que sugavam sangue Estes insetos viviam em grande quantidade nas habitações humanas e picavam as pessoas durante a noite preferencialmente no rosto enquanto dormiam13 Carlos Chagas dissecou diver sos destes insetos e encontrou inúmeros tripanossomas no intestino grosso que chamou de Trypanosoma Cruzi em homenagem a Oswaldo Cruz Provocou a infecção em animais de laboratório saguis sem ainda saber o tipo de doença e somente dois anos após o exame de uma menina de dois anos com quadro febril hepatoesplenomegalia e adenomegalias chegou à conclusão final Os parasitas semelhantes aos encontrados na infecção experimental em saguis foram encontrados na corrente sanguínea desta pa ciente descrevendo então com detalhes a doença que levou em homenagem o seu nome1315 FORMAS DE TRANSMISSÃO Na forma clássica de transmissão o T cruzi é eliminado pelas fezes de triatomíneos após a picada para a sucção de sangue O parasita penetra pela escarificação da pele ou mucosas e tem acesso à corrente sanguínea Dentro das células hospedeiras se reproduz em grande quantidade provocando a lise celular e disseminação hematogênica momento em que o parasita está evidente no sangue peri férico O ciclo se completa quando o triatomíneo se alimenta do sangue humano contaminado16 A DC também pode ser transmitida por transfusões de sangue contaminado ou de forma vertical da mãe para o filho situações comuns no passado em zonas urbanas não endêmicas17 Estas vias clássicas de contaminação tanto a vetorial quanto a transfusional vêm diminuindo progressiva mente devido a campanhas organizadas para o controle do vetor triatomíneo e um maior rigor nos bancos de sangue Tanto que em 2006 apesar de surtos isolados pelo país Figura 1 Presença do Trypanossoma cruzi no sangue periférico Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 224 o Brasil recebeu da OMS o certificado de eliminação da transmissão da DC pelo vetor Triatoma infestans18 Com este maior controle das formas vetoriais e transfu sionais reduzindo assim este meio de transmissão a for ma de contaminação oral tem se destacado Atualmente a transmissão por via oral envolvendo alimentos representa a principal via de infecção humana Há registros de surtos atribuídos a contaminação oral em todas as áreas rurais e periurbanas da América Latina19 Em algumas áreas rurais a contaminação pode ocorrer por alimentos sólidos ou líqui dos e ocorre devido à domiciliação dos vetores Em áreas urbanas pode ocorrer por mudanças do habitat do vetor mas o mais comum são os alimentos contaminados em áreas de extração Exemplo disso é a extração do suco do fruto do açaí Euterpe oleracea onde os triatomíneos são esmagados contaminando o alimento2024 Em regiões do estado do Pará no Brasil o açaí repre senta um dos principais alimentos que aquecem a econo mia do Estado Faz parte da cultura alimentar da região e por isso a grande associação do consumo deste suco e as microepidemias de DCA Entretanto outros alimentos podem facilmente se contaminar Há relatos de contamina ção no suco de canadeaçúcar na bacaba Oenocarpus bacaba e outras frutas regionais25 Na Venezuela foram descritos casos de contaminação no suco de goiaba la ranja e tangerina26 A transmissão por via oral costuma estar associada em surtos com dois tipos de características relacionadas ao local Em áreas urbanas decorre principalmente do con sumo de alimentos semiindustrializados como no caso de açaí refletindo práticas ruins de manipulação do alimento Nos surtos de áreas rurais encontramos diversos tipos de alimentos que são elaborados de forma artesanal por mem bros da família ou por comerciários A contaminação dos alimentos representa hoje uma das preocupações principais de todos os profissionais da área da saúde e da tecnologia dos alimentos Em recente pesqui sa de Ferreira et al utilizando técnicas de detecção de DNA do T cruzi verificaram que a metodologia era sensível em detectar a contaminação do parasita no suco do açaí Esta metodologia não permite dizer se existe ou não potencial de contaminação do T cruzi e sim fragmentos celulares do parasita nos alimentos27 Além da transmissão vetorial classicamente descrita desde os primórdios da descoberta da doença a infec ção humana pode ocorrer por outras formas quando na ocasião de transplante de órgãos de indivíduos infectados para receptores sadios transfusão sanguínea ou de he moderivados transmissão vertical quando a mãe infectada com o parasita transfere para o concepto durante a gesta ção e acidentes de laboratório durante a manipulação de material infectado com T cruzi28 O controle das ações de políticas públicas nos bancos de sangue tem possibilitado redução da transmissão vetorial no Brasil assim como da transmissão por sangue e derivados29 A infecção congênita no Brasil assume baixa prevalência na ordem de 002 sendo maior no Rio Grande do Sul o que pode ser atribuída a proximidades com países da América do Sul onde esta forma de infecção é prevalente como Uruguai Argentina Chile Paraguai e Bolívia30 EPIDEMIOLOGIA DA DCA NO BRASIL E AMÉRICA LATINA A DC ainda é considerada como um grande problema de saúde pública tanto no Brasil como na América Latina Nos anos de 1990 Dias e Coura estimaram que 2 a 3 mi lhões de pessoas estivessem contaminadas e a incidên cia anual de casos relatados era de 100 casos novos por ano31 Entretanto com os maiores cuidados na prevenção da transmissão vetorial com uma vigilância e controle mais sistematizado esta forma se reduziu substancialmente Entre as diversas formas de transmissão a via oral tem se destacado nos últimos anos como a principal via ficando a via vetorial como uma causa pouco prevalente Há relatos da forma aguda em todo o Brasil e diversos países da América tais como Venezuela Peru Colômbia che gando ao México e sul dos Estados Unidos Segundo o Minis tério da Saúde no período de 2000 a 2013 ocorreram o registro de 1570 casos no Brasil sendo 1081 contaminados por via oral 100 pela forma vetorial 6 pela vertical 372 ignoradas e 11 por outras formas A região norte foi a com maior número 1430 casos sendo em 1023 por contaminação oral32 A Região Norte do Brasil que contribui com a maioria dos casos no país têm a incidência relacionada com os meses da safra do açaí entre agosto e novembro Figura 2 Em geral nesta forma de transmissão oral os surtos ocorrem em microepidemias muitas delas familiares Entre 2005 e 2013 ocorreram 112 surtos envolvendo 35 municípios da região Amazônica e na maioria deles a contaminação foi por via oral com ingesta de alimentos contaminados principalmente o açaí a bacaba coquinhos caldo de cana e outros sucos A maioria destes surtos ocorreu nos estados do Pará 759 e Amapá 125 havendo alguns surtos esporádicos em Tocantins e Bahia32 Há relatos em pratica mente todos os estados brasileiros Em 2005 foram identifi cados diversos casos suspeitos de DCA relacionados com a ingestão de caldo de cana em Santa Catarina Destes 25 casos tiveram confirmação laboratorial e cinco evoluíram para o óbito Dez vetores infectados foram encontrados em uma palmeira próxima ao quiosque de venda de caldo de cana e um vetor contaminado no quiosque Também foi encontrado uma gambá com quatro filhotes contaminados33 Na captura ativa ou passiva das espécies de triatomíne os foram relatadas mais de 60 espécies distribuídas tanto no intradomicílio quanto no peridomicílio em toda a exten são territorial do Brasil Em amostras destes triatomíneos Figura 2 Distribuição mensal dos casos acumulados de DCA no município Abaetetuba PA 20052012 60 50 40 30 20 10 0 Casos Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 225 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA capturados a prevalência de infecção pelo T cruzi foi de 27 sendo as espécies mais contaminadas o T vitticeps 52 R robustus 33 e P lutzi 2932 ASPECTOS CLÍNICOS As manifestações clínicas são muito variáveis desde ca sos absolutamente assintomáticos à insuficiência cardíaca grave e choque cardiogênico podendo evoluir para o óbito Esta variação sintomatológica é dependente não só da res posta imune mas também na intensidade da infeção A fase aguda da DC pode apresentar diversas manifes tações clínicas que podem ser inespecíficas e confundidas com infecções virais Por esta razão muitos indivíduos não são identificados Na forma clássica de transmissão quando o T cruzi penetra pela pele podemos encontrar o chagoma de ino culação sinal de Romanã que é uma pequena formação maculonodular eritematosa consistente pouco dolorosa circundada por halo de edema elástico com adenomega lias regionais com lenta regressão podendo persistir por até dois meses Se a entrada ocorrer pela membrana da mucosa ocular podemos encontrar edema periorbital acom panhados de conjuntivite Entretanto o local de entrada pode ocorrer em qualquer parte do corpo susceptível a picada do barbeiro Na Figura 3 observamos o processo inflamatório da porta de entrada por picada de triatomíneo Dentre os diversos sintomas se destaca a febre prolongada sem causa etiológica comum quase sempre acompanhada de mal estar adinamia cefaleia e perda do apetite Podem ocorrer manifestações sistêmicas tais como adenomegalias e hepa toesplenomegalias de intensidades variáveis sendo o mais comum de grau leve Geralmente os linfonodos apresentam pequeno aumento não aderentes indolores e não fistulizam Costa et al em avaliação clínica de 977 casos no período de 2006 a 2012 encontraram a febre persistente como o principal sintoma da fase aguda da doença34 Na Tabela 1 encontramos os principais sinais e sintomas dos pacientes com DCA por via oral MANIFESTAÇÕES CARDÍACAS DA FASE AGUDA As manifestações cardíacas da fase aguda são muito variáveis A maioria dos pacientes é assintomática do ponto de vista cardíaco entretanto já apresentam algum tipo de al teração no eletrocardiograma ECG Souza et al avaliando as alterações eletrocardiográficas em uma série de casos verificaram que haviam as alterações no ECG mesmo em indivíduos assintomáticos35 Tabela 1 Principais manifestações clínicas da DCA em 977 pacientes34 Sintomatologia N Febre persistente 847 866 Astenia 701 717 Edema de facemembros 352 360 Cefaleia 188 192 Taquicardiaarritmias 183 187 Hepatomegalia 173 177 Esplenomegalia 131 134 Outros 430 440 Assintomáticos 11 11 Alguns casos podem apresentar quadros variáveis de insuficiência cardíaca e até evoluirem para choque cardio gênico e morte O aspecto clínico da miocardite chagásica aguda é muito similar à miocardite viral O paciente pode apresentar em graus variáveis dispneia taquicardia pre sença de terceira bulha sopros e arritmias A congestão pulmonar em geral é discreta pelo comprometimento con comitante do ventrículo direito O ECG é uma ferramenta muito útil principalmente nos casos de comprometimento leve do coração onde a hipó tese diagnóstica está fundamentada pelo quadro febril e epidemiológico Em avaliação de 161 pacientes consecuti vos em atendimento ambulatorial com DCA foram encon tradas alterações na maioria dos pacientes Na Tabela 2 encontramse as principais alterações35 Estas alterações do ECG são muito comuns e apesar de inespecíficas podem em muito ajudar na triagem diag nóstica de um caso febril em área endêmica podendo ser o primeiro indicador da doença De características diferentes da fase crônica onde prevalece o bloqueio de ramo direito na fase aguda as alterações da repolarização ventricular predominam em 726 dos pacientes Figura 4 Em casos mais graves principalmente onde a agressão miocárdica é mais intensa pode ocorrer supradesnivela mento do segmento ST em muito parecido com os das síndromes coronárias aguda Figura 5 A forma de transmissão oral é considerada de maior gra vidade Fato já observado em animais de experimentação correlacionando a agressividade das manifestações clínicas Tabela 2 Alterações eletrocardiográficas em pacientes na fase aguda da DC por transmissão oral35 Alterações eletrocardiográficas N 161 Alterações da repolarização ventricular 117 726 Sobrecarga atrial esquerda 49 304 Intervalo QT prolongado 36 223 Taquicardia sinusal 30 186 Bloqueios de ramo direito 1º e 2º graus 23 142 Baixa voltagem do QRS 22 136 Sobrecarga ventricular direita 10 62 QRS alargado 12ms 8 49 Fibrilação atrial 6 37 Bloqueio atrioventricular 1º grau 5 31 Zonas eletricamente inativas 4 24 Bloqueio de ramo direito 3º grau 3 18 Flutter atrial 2 12 Dissociação atrioventricular 1 06 Figura 3 Chagoma de inoculação em face e perna em moradores da região urbana de Belém Umarizal arquivo pessoal Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 226 devido a alta carga parasitária A miocardite pelo T cruzi pode ser fatal em 35 dos casos e junto com a meningo encefalite representa a principal causa do óbito36 As arritmias são comuns e aparecem em mais de 30 dos pacientes Marques et al em avaliação de um surto por ingesta de suco de goiaba em uma escola na Venezuela encontraram que as arritmias mais comuns foram as supra ventriculares que ocorreram em 22 dos casos as ventricu lares em 58 e o bloqueio atrioventricular total em 2926 O ecocardiograma pode revelar disfunção sistólica glo bal de graus variáveis e derrame pericárdico nos casos mais graves entretanto na maioria dos pacientes costuma ser normal Na microepidemia descrita por Marques et al onde o exame só foi realizado nos pacientes com alterações eletrocardiográficas encontraram em 68 dos pacientes exame absolutamente normal sendo que os restantes 32 apresentavam derrame pericárdico leve a moderado Não descreveram alterações na contratilidade26 Souza et al em um relato anatomopatológico de DCA que foi a óbito por intensa disfunção cardíaca evidenciaram nódulos inflamatórios no trajeto das coronárias sugestivos da epicardite moliniforme ou em rosário No estudo histológico do miocárdio encontraram intensa destruição de miócitos Figura 6 além de cistos rotos de amastigotas Figura 7 porém com preservação do endocárdio38 Figura 8 Na fase aguda já podem existir anormalidades do trato digestivo Rassi Rezende avaliando o esôfago e os cólons de 94 pacientes na fase aguda encontraram aperistalse em cinco e disfagia incipiente em oito pacientes que geralmen te voltaram ao normal após a fase aguda As alterações em cólons foram mínimas39 As manifestações neurológicas são incomuns nos pa cientes imunocompetentes porém naqueles com algum tipo de imunodepressão a encefalite pode comprometer muito a evolução clínica Estes pacientes podem ter abscessos granulomatosos no cérebro com comprometimento da fun ção neurológica40 A meningoencefalite foi muito bem descrita por Carlos Chagas geralmente em casos muito graves e indivíduos jovens e deve ser suspeitada nos pacientes com quadro de cefaleia vômitos rigidez de nuca eou convulsões41 A fase aguda é usualmente seguida por um período Figura 4 Eletrocardiograma de paciente com doença de Chagas aguda Observar os complexos QRS de baixa voltagem e as alte rações da repolarização ventricular Figura 5 Eletrocardiograma de paciente com doença de Chagas aguda e importante comprometimento miocárdio Observar o supra desnivelamento do segmento ST Figura 6 Miocardite chagásica aguda Observar extensa destruição de fibras cardíacas edema e áreas de fibrose Figura 7 Ninho de amastigota no miocárdio em paciente com doença de Chagas aguda Figura 8 Miocardite chagásica Observar intensa lesão miocárdica com preservação do endocárdio Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 227 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA assintomático de tempo muito variável denominado fase indeterminada Durante esta fase os parasitas desaparecem da corrente sanguínea e 70 a 90 dos pacientes nunca ficam sintomáticos Alguns pacientes entram na fase crônica por volta de 5 a 15 anos Porém acreditase que na forma de contaminação oral devido a carga parasitária ser maior a forma crônica aparece mais precocemente HISTÓRIA NATURAL A história natural da fase aguda ainda é desconheci da Uma quantidade expressiva dos indivíduos infectados sequer procura atendimento especializado e em muitos pacientes não é feito o diagnóstico Além destes fatores epidemiológicos que são pontos de confusão ainda não temos estudos sistematizados que possam trazer conclu sões corretas da história natural Gus et al apresentaram a evolução de oito indivíduos de um grupo de 17 pessoas acometidas por infecção chagásica aguda após 25 anos da microepidemia por contaminação oral Oito pacientes permaneceram fiéis às avaliações e após este período nenhum apresentou sinal ou manifestação orgânica da doença42 Apesar do viés no acompanhamento de menos da metade dos indivíduos neste grupo de oito indivíduos somente um apresentava a sorologia positiva para a doença A descrição da história natural é muito variável e os registros da literatura chamam atenção para as diferentes cepas do T cruzi carga parasitária aspectos imunológicos e porta de entrada do parasita como determinantes da evo lução clínica inicial da DC Com esta mudança no cenário epidemiológico e a transmissão oral mais frequente e mais grave ainda pouco se sabe sobre os preditores clínicos de mortalidade na fase aguda4344 Alguns autores referem maior mortalidade com a trans missão oral em comparação com a via clássica de transmis são vetorial atingindo de 8 a 35 sendo descrito que 5 a 10 dos casos sintomáticos evoluem para óbito relaciona dos com miocardite grave ou meningocefalite porém sem relacionar com a forma de transmissão17 A real dimensão dessa lacuna literária precisa ainda avançar no que tange à evolução clínica do acometimento cardíaco em populações atingidas por surtos de microepidemia familiar especialmen te em regiões com predomínio desta forma de transmissão Em estudos experimentais as vias de transmissão apre sentam gravidades distintas influenciando na mortalidade Neste modelo o aspecto inicial foi de uma infestação sis têmica grave alta parasitemia níveis elevados de fator de necrose tumoral TNF alfa com miocardite leve e alta taxa de mortalidade quando a porta de entrada era pela mucosa da cavidade bucal contrariamente quando a infecção foi direta mente pela via gástrica na qual a miocardite foi mais grave44 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DA ETIOLOGIA Para o diagnóstico da fase aguda o padrão ouro é o encontro do T cruzi no exame parasitológico direto A pes quisa a fresco é a primeira alternativa pois o procedimento é rápido e simples O momento ideal da coleta do sangue deve ser com o paciente febril e dentro de 30 dias do início dos sintomas Quando esta pesquisa a fresco for negativa e o paciente com sintomas há mais de 30 dias deve ser reali zada a pesquisa por métodos de concentração pelo Strout microhematócrito ou creme leucocitário que possuem maior sensibilidade A técnica da lâmina corada de gota espessa ou esfregaço é indicada em localizações onde existe a con comitância da malária Amazônia Legal apesar da menor sensibilidade4546 Caso não se encontre positividade na pri meira coleta e seja alta a suspeição novas coletas devem ser realizadas até a confirmação eou desaparecimento da sintomatologia ou feito o diagnóstico da doença febril Os exames sorológicos não são os melhores para o diagnóstico da fase aguda Estão indicados quando a pes quisa do T cruzi pelo método direto for negativa e ainda houver suspeita clínica A detecção de anticorpos antiT cruzi da classe IgG se fazem por métodos da imunofluores cência indireta IFI hemaglutinação indireta HAI e ensaio imunoenzimático ELISA4748 A detecção de anticorpos antiTcruzi da classe IgM não se aplica unicamente para o diagnóstico da DCA além de ser uma técnica complexa apresenta muitos resultados falsopositivos em diversas doenças que evoluem com febre Geralmente após 12 semanas o parasita só é de tectado por métodos mais complicados que melhoram o achado parasitológico O xenodiagnóstico e a hemocultura que apresentam positividade de 3050 ou métodos mo leculares que analisam a reação da cadeia de polimerase PCR com positividade de 459549 Em áreas endêmicas da doença onde prevalece a trans missão oral é também importante o diagnóstico diferencial com outras endemias febris que podem apresentar carac terísticas clínicas similares à infecção pelo T cruzi principal mente a febre tifoide calazar e diversas viroses50 A infecção pelo T cruzi apresenta febre prolongada de até 18 dias em geral vespertina sendo o sinal clínico mais expressivo51 DOENÇA DE CHAGAS EM IMUNODEPRIMIDOS Os pacientes com algum tipo de imunodepressão prin cipalmente aqueles portadores de neoplasias usuários de fármacos imunodepressores ou infectados pelo vírus da imunodeficiência humana podem ter um quadro agudo mais grave e exuberante com comprometimento infeccioso inten so e lesões cardíacas mais graves Em casos de DC crônica podem ocorrer reativação da doença com a sintomatologia de um caso agudo A exteriorização dos sinais clínicos de maior gravi dade é evidenciada por miocardite com significante dis função cardíaca que em geral evolui com episódios de arritmias muitas vezes complexas insuficiência cardíaca refratária podendo evoluir para choque cardiogênico O comprometimento cerebral com meningoencefalite e ou acidente vascular cerebral podem acompanhar os sintomas da infecção52 TRATAMENTO O tratamento da fase aguda com antiparasitários deve sempre ser instituído pois existem algumas evidências de melhor evolução clínica em relato de casos devido a Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 228 supressão da parasitemia5354 O resultado depende de al guns fatores principalmente a duração da infecção da fase aguda a idade do paciente condições clínicas e principal mente à susceptibilidade da cepa do T cruzi Existem apenas dois medicamentos antiparasitá rios que podemos utilizar no tratamento específico o benznidazol agente derivado nitroimidazólico e o nifurtimox composto nitrofurânico sendo o agente de primeira escolha o benznidazol5556 Apesar destes fármacos serem largamente preconiza dos no tratamento da DCA o nível de evidência é muito frágil Não existe estudo randomizado duplo cego e contro lado com placebo mostrando a real eficácia com mudança na história natural da fase aguda Pinto et al acompanharam 179 pacientes com DCA que receberam o tratamento antiparasitário e no acompanha mento de 56 anos houve cura sorológica em 26357 An drade et al avaliaram crianças de 7 a 12 anos identificadas em um censo com anticorpos positivos para a doença de Chagas tipificadas como tendo infecção recente e tratadas com benznidazol Verificaram que o tratamento era segu ro e a negativação pela soroconversão para os anticorpos específicos foi de 55858 Nestes dois trabalhos pioneiros em tratamento da fase aguda não podemos concluir pela eficácia visto que a metodologia não contemplou um grupo placebo podendo estas alterações da melhora sorológica ser simplesmente uma evolução natural em alguns pacientes Além disso a definição de fase aguda nestes dois estudos envolveu vieses de conceituação O benznidazol é bastante utilizado com poucos efeitos adversos principalmente em crianças59 É muito discutível o uso em gestantes não havendo uma regulamentação na fase aguda Parece haver uma redução do risco de transmissão vertical e menor chance de evoluir a gravidez para o aborto No Brasil a dosagem dos comprimidos é 100 mg e recomendase para os adultos a dosagem de 5 mgkgdia por via oral em duas ou três tomadas diárias durante 60 dias sendo a dose máxima de 300 mgdia Em crianças a dosagem de 5 10 mgkgdia e em lactentes 10 mgkgdia Nos casos de intolerância ao benznidazol podese utili zar o nifurtimox que pode ser encontrado em comprimidos de 120 mg e deve ser utilizado em duas ou três tomadas diárias Em adultos a dose é de 810 mgkgdia e em crian ças de 15 mgkgdia A intolerância ao benznidazol é infrequente na fase agu da e os efeitos adversos mais frequentes são a neuropatia e as lesões cutâneas Podem ocorrer manifestações gastroin testinais tais como anorexia perda de peso e principalmente vômitos A neuropatia periférica é geralmente dose depen dente e aparecendo por volta da quinta semana e costuma responder aos anticonvulsivantes Quando ocorrem lesões cutâneas é recomendada a retirada do benznidazol e a utilização de antihistamínicos ou corticoides Os efeitos colaterais do nifurtimox são muito semelhantes aos do benznidazol porém com menos efeitos digestivos60 CONFLITOS DE INTERESSE Os autores declaram não possuir conflitos de inte resse na realização deste trabalho REFERÊNCIAS 1 Steverding D The history of Chagas disease Parasit Vectors 20147317 2 Carlier Y Dias JCP Luquetti AO Hontebeiryer M Torrico F Truyens C Trypanosomiase américaine ou maladie de Chagas In Encyclo pedie Médico Chirurgicale Paris Elsevier 2002 p 8505A20 21 3 Barrett MP Bruchmore RJ Stich A Lazzari JO Frasch AC Cazzulo JJ et al The trypanosomiasis Lancet 2003 3629394146980 4 Aufderheide AC Salo W Madden M Streitz J Guhl F Arriaza B et al A 9000year record of Chagas disease Proc Natl Acad Sci USA 2004101720349 5 Araújo A Jansen AM Reinhard K Ferreira LF Paleoparasitology of Chagas disease a review Mem Inst Oswaldo Cruz 2009 104Suppl 1916 6 Fernandes A Iñiguez AM Lima VS Souza SM Ferreira LF Vicente AC et al PreColumbian Chagas disease in Brazil Trypanosoma cruzi in the archaeological remains of a human in Peruaçu Valley Minas Gerais Brazil Mem Inst Oswaldo Cruz 200810355146 7 Lima VS Iniguez AM Otsuki K Fernando Ferreira L Araújo A Vicente ACet al Chagas disease in ancient huntergatherer po pulation Brazil Emerg Infect Dis 200814610012 8 Rothhammer F Allison MJ Núñez L Standen V Arriaza B Chagas disease in preColumbian South America Am J Phys Anthropol 19856844958 9 Walsh JF Molyneux DH Birley MH Deforestation effects on vectorborne disease Parasitology 1993106SupplS55S75 10 BriceñoLeón R Chagas disease and globalization of the Amazon Cad Saude Publica 200723Suppl 1S33S40 11 Miles MA The discovery of Chagas disease progress and pre judice Infect Dis Clin North Am 200418224760 12 Meneghelli UG Miguel Dias Pimenta 16611715 e a história do megaesôfago e do megacólon chagásicos Arg Gastroenterol 199633311521 13 Chagas C Nova tripanozomiaze humana Estudos sobre a mor folojia e o ciclo evolutivo de Schizotrypanum cruzi n gen n sp ajente etiológico de nova entidade morbida do homem Mem Inst Oswaldo Cruz 19091159218 14 Prata A Evolution of the clinical and epidemiological knowledge about Chagas disease 90 years after its discovery Mem Inst Oswaldo Cruz 199994Suppl 1818 15 de Lana M Chiari CA Chiari E Morel CM Gonçalves AM Ro manha AJ Characterization of two isolates of Trypanosoma cruzi obtained from the patient Berenice the first human case of Cha gas disease described by Carlos Chagas in 1909 Parasitol Res 199682325760 16 Malik LH Singh GD Amsterdan EA The epidemiology clinical manifestations and management of Chagas heart disease Clin Cardiol 20153895659 17 Rassi A Jr Rassi A MarinNeto JA Chagas disease Lancet 201037597231388402 18 Andrade JP MarinNeto JAPaola AA VilasBoas F Oliveira GM Bacal F et al I Diretriz LatinoAmericana para o Diagnóstico e Tratamento da Cardiopatia Chagásica Arq Bras Cardiol 2011 972 supl 3148 19 ShikanaiYasuda MA Carvalho NB Oral transmission of Chagas disease Clin Infect Dis 201254684552 20 Shaw J Lainson R Fraiha H Considerações sobre a epidemiologia dos primeiros casos autoctones de doença de Chagas registrados em Belém Pará Brasil Rev Saude Publica 1969321537 21 ShikanaiYasuda MA Marcondes CB Guedes LA Siqueira GS Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 229 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA Barone AA Dias JC et al Possible oral transmission of acute Chagas disease in Brazil Rev Inst Med Trop Sao Paulo 19913353517 22 Beltrão HB Cerroni MP Freitas DR Pinto AY Valente VC Valente AS et al Investigation of two outbreaks of suspected oral trans mission of acute Chagas disease in the Amazon region Para State Brazil in 2007 Trop Doct 20093942312 23 Dias JP Bastos C Araújo EMascarenhas AV Martins Netto E Grassi F et al Acute Chagas disease outbreak associated with oral transmission Rev Soc Bras Med Trop 200841296300 24 Cavalcanti LPG Rolim DB Pires Neto RJ et al Microepidemics of acute Chagas disease by oral transmission in Ceara Cad Saude Colet 20091791121 25 Alarcón de Noya B Diaz Bello Z Colmenares C RuizGuevara R Mauriello L ZavalaJaspe R et al Large urban outbreak of orally acquired acute Chagas disease at a school in Caracas Venezuela J Infect Dis 20102019130815 26 Marques J Mendoza I Noya B Acquatella H Palacius I Marques Mejias M ECG manifestations of the biggest outbreak of Chagas disease due to oral infection in LatinaAmerica Arq Bras Cardiol 2013101324954 27 Ferreira RT Melandre AM Cabral ML Branquinho MR Cardarelli Leite P Extraction of Trypanossoma cruzi DNA from food a con tribution to the elucidation of acute Chagas disease outbreaks Rev Soc Bras Med Trop 20164921905 28 Brasil Ministério da Saúde Secretaria de Vigilância em Saúde Doença de Chagas aguda no Brasil série histórica de 2000 a 2013 Boletim Epidemiológico 20154621 29 Silveira AC Os novos desafios e perspectivas futuras do controle Rev Soc Bras Med Trop 201144supp21224 30 Villela MM Souza JM Melo Vde P Dias JC Avaliação do Programa de Controle da Doença de Chagas em relação à presença de Panstrongylus megistus na região centrooeste do Estado de Minas Gerais Brasil Cad Saúde Publica 200925490717 31 Dias JCP Coura JR Epidemiologia In Eds Clínica e tera pêutica da doença de Chagas uma abordagem prática para o clínico geral Rio de JaneiroFIOCRUZ 1997 p 3366 32 Boletim Epidemiológico Secretaria de Vigilância em Saúde Mi nistério da Saude20154621 33 Ianni BM Mady C Como era gostoso o meu caldo de cana Arq Bras Cardiol 200585637981 34 Costa EDG Santos SOD SoyoMilano M et al Chagas disease surveillance is possible in the Brazilian Amazon The Para state experience Trop Med Int Health 201520sup 1338 35 Souza DSM Almeida AJB Costa FA et al O eletrocardiograma na fase aguda da Doença de Chagas por transmissão oral Rev Bras Cardiol 201326212730 36 Vazquez BP Vazquez TP Miguel CB Rodrigues WF Mendes MT de Oliveira CJ et al Inflammatory responses and intestinal injury development during acute Trypanosoma cruzi infection are associated with the parasite load Parasit Vectors 20158206 37 Rossi MA Tanowitz HB Malvestio LM Celes MR Campos EC Blefari V et al Coronary microvascular disease in chronic Chagas cardiomyopathy including an overview on history pathology and other proposed pathogenic mechanisms PLoS Negl Trop Dis 201048piiie674 38 Souz Ddo S Araujo MT Garcez PdaS Furtado JC Fiqueiredo MT Povoa RM Aspectos anatomopatológicos da miocardite chagásica agudo por transmissão oral Arq Bras Cardiol 201610717780 39 Rassi A Rezende JM Estudo clínicoradiológico do esôfago e dos cólons na fase aguda da doença de Chagas com relato de três casos de remissão espontânea de aperistalse do esôfago do grupo I Rev Soc Bras Med Trop 2011441705 40 Py MO Neurologic manifestations of Chagas disease Curr Neurol Neurosci Rep 201111653642 41 Chagas C Tripanosomiase americana forma aguda da moléstia Memorias do Instituto Oswaldo Cruz 191683760 42 Gus I Molon ME Bueno AP Doença de Chagas Revisão de 8 casos de miocardite chagasica 25 anos após Arq Bras Cardiol 199360299101 43 Dias GB Gruendling AP Araujo SM Gomes ML Toledo MJ Evolu tion of infection in mice inoculated by the oral route with different developmental forms of Trypanosoma cruzi I and II Exp Parasitol 201313535117 44 BarretodeAlbuquerque J SilvadosSantos D Pérez AR Berbert LR de SantanavanVliet E FariasdeOliveira DA et al Trypano soma cruzi Infection through the Oral Route Promotes a Severe Infection in Mice New Disease Form from an Old Infection PLoS Negl Trop Dis 201596e0003849 45 Luquetti AO Rassi A Diagnóstico laboratorial da infecção pelo Trypanosoma cruzi In Brener Z Andrade Z BarralNetto M orgTrypanosoma cruzi e Doença de Chagas Editora Guana bara Koogan Rio de Janeiro pp 344348 2000 46 Ministério da Saúde BR Secretaria de Vigilância em Saúde Guia de Vigilância em Saúde Brasília Ministério da Saúde 2014 47 Cerisola JA Fatala Chaben M Lazari JO Test de hemaglutinación para el diagnóstico de la enfermedad de Chagas Prensa Med Argent 19624917617 48 Voller A Draper C Bidwell DE Bartlett A Microplate enzyme linked immunosorbent assay for Chagas disease Lancet 1975 30579044268 49 PortelaLindoso A ShikanaiYasuda MA Chronic Chagas dise ase from xenodiagnosis and hemoculture to polymerase chain reaction Rev Saude Publica 20033710715 50 Organização Panamericana de Saúde Organização Mundial de Saúde PANAFTOSAVP Guia para vigilância prevenção controle e manejo clínico da doença de Chagas aguda transmitida por alimentos Rio de Janeiro PANAFTOSAVPOPASOMS 2009 51 DIAS JCP et al II Consenso Brasileiro em Doença de Chagas 2016 Epidemiol Serv Saúde v 24 n 1 52 Brasil Ministério da Saúde Secretaria de Vigilância em Saúde Manual Técnico Recomendações para Diagnóstico Tratamento e Acompanhamento da CoInfecção Trypanosoma cruziVírus da Imunodeficiência Humana HIV Brasília Ministério da Saúde 2006 53 Coura JR BorgesPereira J Chronic phase of Chagas disease why should it be treated A comprehensive review Mem Inst Oswaldo Cruz 201110666415 54 Molina I Gómez i Prat J Salvador F Treviño B Sulleiro E Serre N et al Randomized trial of posaconazole and benznidazole for chronic Chagas disease N Engl J Med 2014 3701899908 55 Andrade AL Zicker F de Oliveira RM Almeida Silva S Luquetti A Travassos LR et al Randomised trial of efficacy of benznidazole in treatment of early Trypanosoma cruzi infection Lancet 1996 3489039140713 56 Yun O Lima MA Ellman T Chambi W Castillo S Flevaud L et al Feasibility drug safety and effectiveness of etiological treatment programs for Chagas disease in Honduras Guatemala and Bolivia 10year experience of Médecins Sans Frontières PLoS Negl Trop Dis 200937e488 57 Pinto AY Valente Vda C Coura JR Valente SA Junqueira AC et al Clinical FollowUp of Responses to Treatment with Benznidazol in Amazon A Cohort Study of Acute Chagas Disease PLoS One 201385e64450 58 de Andrade AL ZickerF Oliveira RM Almeida Silva S Luquetti A Travassos LR et al Randomised trial of efficacy of benznidazole in treatment of early Trypanosoma cruzi infection Lancet 1996 3489039140713 59 Pinazo MJ Muñoz J Posada E López Chejade P Gállego M Ayala E et al Tolerance of benznidazole in treatment of Chagas disease in adults Antimicrob Agents Chemother 2010541148969 60 Fragata Filho AA da Silva MA Boainain E Ethiological treatment of acute and chronic Chagas heart disease São Paulo Med J 1995113286772 Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229
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222 RESUMO A doença de Chagas aguda apresenta mudanças no quadro epidemiológico res surgindo em um cenário não habitual relacionado com a forma de transmissão Atual mente a transmissão por via oral envolvendo alimentos contaminados é a principal via de infecção humana com surtos em toda a América Latina Entre os sintomas da fase aguda destacamse febre prolongada quase sempre acompanhada de malestar adinamia cefaleia e perda do apetite acompanhados de manifestações sistêmicas tais como adenomegalias e hepatoesplenomegalias As manifestações cardíacas variam desde quadros assintomáticos até graus variáveis de insuficiência cardíaca aguda ou choque cardiogênico e morte O tratamento da fase aguda com antiparasitários deve sempre ser instituído pois existem algumas evidencias de melhor evolução clínica em relatos de casos Descritores Doença de Chagas Trypanosoma cruzi Epidemiologia ABSTRACT Acute Chagas disease shows changes in the epidemiological situation reappearing in an unusual scenario related to the mode of transmission Currently the oral transmission involving contaminated food is the main route of human infection with outbreaks through out Latin America Among the symptoms of the acute phase stand out prolonged fever often accompanied by malaise asthenia headache and loss of appetite accompanied by systemic manifestations such as lymphadenopathy and hepatosplenomegaly Cardiac manifestations range from asymptomatic clinical statuses to varying degrees of acute heart failure or cardiogenic shock and death Treatment of acute phase with antiparasitic agents should always be provided as there is some evidence of better clinical outcome in case reports Descriptors Chagas Disease Trypanosoma cruzi Epidemiology REVISÃOREVIEW Dilma do Socorro Moraes de Souza1 2 Rui Manuel dos Santos Povoa3 1 Universidade Federal do Pará Disciplina de Cardiologia da Faculdade de Medicina Pará Brasil 2 Ambulatório de Doença de Chagas Aguda do Hospital Universitário João de Barros Barreto 3 Universidade Federal de São Paulo Disciplina de Cardiologia São Paulo SP Brasil Correspondência Rua Veiga Cabral 199 Cidade Velha Belém PA Brasil CEP 66023630 rmspovoacardialbr ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA EPIDEMIOLOGICAL AND CLINICAL ASPECTS OF ACUTE CHAGAS DISEASE IN BRAZIL AND LATIN AMERICA Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 INTRODUÇÃO A doença de Chagas DC vem adquirindo cada vez mais um grau de importância crescente devido a mudanças no quadro epidemiológico Após um século de descobertas da doença ressurge em um cenário não habitual especialmente no aspecto relacionado à forma de transmissão É uma antropozoonose causada pelo protozoário fla gelado Trypanosoma cruzi T cruzi com evolução clínica bifásica A forma aguda da doença de Chagas muitas vezes não é identificada e evolui na maioria das vezes para a fase crônica com apresentação em formas indetermina das digestiva cardíaca ou cardiodigestiva A doença de Chagas aguda DCA é um estágio dinâ mico de evolução da doença que pode ser diagnosticada quando ocorre a demonstração da presença do parasita no sangue periférico por exames de identificação que en volvem a análise direta do sangue Figura 1 HISTÓRICO DA DOENÇA DE CHAGAS A infecção pelo T cruzi já é muito antiga e remonta da época précolombiana pois o ciclo silvestre da DC surgiu focalmente em diferentes áreas do continente americano e disseminada por migrações internas Existem evidências que logo nos primórdios da habitação humana da América do Sul ocorria infecção pelo T cruzi1 Em análises de múmias de Chinchorros há 9000 anos encontradas no deserto do Atacama no Chile e utilizando técnicas de análise de DNA do parasita encon traram evidências de que a infecção em seres humanos já ocorria nestas populações nômades com rotas entre o mar e as montanhas23 223 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA Estes povos conheciam os triatomíneos que habitavam as redondezas peridomiciliares e alguns deles ainda ser viam de alimento O assentamento no altiplano de alguns povos principalmente os quéchuas bolivianos com o hábito de criar alguns roedores domésticos para alimentação e habitando em casas muito primitivas trouxeram o T cruzi para o domicílio humano45 Os chinchorros foram os primeiros povos onde foi iden tificada a infecção pelo parasita que se espalhou ao longo da costa sul americana do deserto do Atacama para a região sul do Peru e norte do Chile Em escavações arqueológicas utilizando a análise do DNA o T cruzi foi identificado em di versos locais da América do Sul No Brasil durante a análise de uma múmia de 560 anos e de um fragmento de osso datado de 45007000 anos no vale do Peruaçu no Estado de Minas Gerais foram encontrados vestígios do T cruzi67 O processo de disseminação foi tão intenso que até no Texas EUA foram encontrados traços do DNA do parasita em múmias de 1150 anos do deserto Chihuahuan5 Além da detecção do T cruzi no processo de exumação destas múmias também foram encontradas lesões sugestivas da doença de Chagas8 Outro aspecto curioso são algumas cerâmicas préco lombianas datadas dos séculos 13 a 16 onde as figuras hu manas representadas mostram uma possível contaminação pela doença Algumas apresentam um inchaço unilateral na pálpebra muito sugestivo do sinal de Romanã1 Com bases nestes dados de distribuição paleontológica a hipótese da origem andina da doença é bem sólida sendo que os chinchorros foram os primeiros povos a abandonar a vida nômade se estabelecendo na região com desen volvimento da agricultura e da pecuária Com isso houve modificações do meio ambiente com desmatamento para esta ocupação Os triatomíneos em particular o T infestans se adaptaram rapidamente à vegetação mais aberta de senvolvendo uma preferência por habitações humanas ao longo do tempo9 O desmatamento está muito relacionado com o aumento da prevalência da DC e esta relação está fundamentada pelo fato de que as populações indígenas da Amazônia foram isentas da tripanossomíase americana devido ao uso de diferentes padrões tanto socioambien tais de manuseio do solo quanto de estruturas habitacio nais com cabanas de dimensões amplas e abertas que são desfavoráveis à colonização dos vetores Além disso a constante mudança de local e a ausência de animais domésticos dificultou a transmissão vetorial da doença10 A partir do século 16 surgiram diversos relatos de via jantes e médicos descrevendo sinais e sintomas de doen ças que lembram a tripanossomíase americana no Brasil11 Em 1735 um médico português descreveu uma síndrome digestiva muito parecida com a síndrome megavisceral da DC relatando a relação dos sintomas com a ampliação e distensão do reto12 Outros registros descreveram a disfagia do megaesôfago com toda a áurea clínica da desnutrição desencadeada pela anormalidade digestiva12 Diversos acontecimentos históricos indicam que a DC está presente de forma bem evidente na América Latina desde o século 16 afetando toda a população desde os in dígenas até os conquistadores Além disso existem relatos de domiciliação dos triatomíneos antes do conceito de vetor da doença Charles Darwin em 1835 anotou em seu diário um ataque do triatomíneo durante a noite Descreveu com detalhes a picada do inseto e as transformações durante a sucção do sangue Pontuou o encontro desta espécie Reduvius além dos pampas no norte do Chile e Peru11 A história moderna da doença começa em 1908 quan do o higienista e bacteriologista brasileiro Carlos Chagas durante uma campanha antimalária na construção de linha férrea no estado de Minas Gerais encontrou insetos de grandes dimensões que sugavam sangue Estes insetos viviam em grande quantidade nas habitações humanas e picavam as pessoas durante a noite preferencialmente no rosto enquanto dormiam13 Carlos Chagas dissecou diver sos destes insetos e encontrou inúmeros tripanossomas no intestino grosso que chamou de Trypanosoma Cruzi em homenagem a Oswaldo Cruz Provocou a infecção em animais de laboratório saguis sem ainda saber o tipo de doença e somente dois anos após o exame de uma menina de dois anos com quadro febril hepatoesplenomegalia e adenomegalias chegou à conclusão final Os parasitas semelhantes aos encontrados na infecção experimental em saguis foram encontrados na corrente sanguínea desta pa ciente descrevendo então com detalhes a doença que levou em homenagem o seu nome1315 FORMAS DE TRANSMISSÃO Na forma clássica de transmissão o T cruzi é eliminado pelas fezes de triatomíneos após a picada para a sucção de sangue O parasita penetra pela escarificação da pele ou mucosas e tem acesso à corrente sanguínea Dentro das células hospedeiras se reproduz em grande quantidade provocando a lise celular e disseminação hematogênica momento em que o parasita está evidente no sangue peri férico O ciclo se completa quando o triatomíneo se alimenta do sangue humano contaminado16 A DC também pode ser transmitida por transfusões de sangue contaminado ou de forma vertical da mãe para o filho situações comuns no passado em zonas urbanas não endêmicas17 Estas vias clássicas de contaminação tanto a vetorial quanto a transfusional vêm diminuindo progressiva mente devido a campanhas organizadas para o controle do vetor triatomíneo e um maior rigor nos bancos de sangue Tanto que em 2006 apesar de surtos isolados pelo país Figura 1 Presença do Trypanossoma cruzi no sangue periférico Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 224 o Brasil recebeu da OMS o certificado de eliminação da transmissão da DC pelo vetor Triatoma infestans18 Com este maior controle das formas vetoriais e transfu sionais reduzindo assim este meio de transmissão a for ma de contaminação oral tem se destacado Atualmente a transmissão por via oral envolvendo alimentos representa a principal via de infecção humana Há registros de surtos atribuídos a contaminação oral em todas as áreas rurais e periurbanas da América Latina19 Em algumas áreas rurais a contaminação pode ocorrer por alimentos sólidos ou líqui dos e ocorre devido à domiciliação dos vetores Em áreas urbanas pode ocorrer por mudanças do habitat do vetor mas o mais comum são os alimentos contaminados em áreas de extração Exemplo disso é a extração do suco do fruto do açaí Euterpe oleracea onde os triatomíneos são esmagados contaminando o alimento2024 Em regiões do estado do Pará no Brasil o açaí repre senta um dos principais alimentos que aquecem a econo mia do Estado Faz parte da cultura alimentar da região e por isso a grande associação do consumo deste suco e as microepidemias de DCA Entretanto outros alimentos podem facilmente se contaminar Há relatos de contamina ção no suco de canadeaçúcar na bacaba Oenocarpus bacaba e outras frutas regionais25 Na Venezuela foram descritos casos de contaminação no suco de goiaba la ranja e tangerina26 A transmissão por via oral costuma estar associada em surtos com dois tipos de características relacionadas ao local Em áreas urbanas decorre principalmente do con sumo de alimentos semiindustrializados como no caso de açaí refletindo práticas ruins de manipulação do alimento Nos surtos de áreas rurais encontramos diversos tipos de alimentos que são elaborados de forma artesanal por mem bros da família ou por comerciários A contaminação dos alimentos representa hoje uma das preocupações principais de todos os profissionais da área da saúde e da tecnologia dos alimentos Em recente pesqui sa de Ferreira et al utilizando técnicas de detecção de DNA do T cruzi verificaram que a metodologia era sensível em detectar a contaminação do parasita no suco do açaí Esta metodologia não permite dizer se existe ou não potencial de contaminação do T cruzi e sim fragmentos celulares do parasita nos alimentos27 Além da transmissão vetorial classicamente descrita desde os primórdios da descoberta da doença a infec ção humana pode ocorrer por outras formas quando na ocasião de transplante de órgãos de indivíduos infectados para receptores sadios transfusão sanguínea ou de he moderivados transmissão vertical quando a mãe infectada com o parasita transfere para o concepto durante a gesta ção e acidentes de laboratório durante a manipulação de material infectado com T cruzi28 O controle das ações de políticas públicas nos bancos de sangue tem possibilitado redução da transmissão vetorial no Brasil assim como da transmissão por sangue e derivados29 A infecção congênita no Brasil assume baixa prevalência na ordem de 002 sendo maior no Rio Grande do Sul o que pode ser atribuída a proximidades com países da América do Sul onde esta forma de infecção é prevalente como Uruguai Argentina Chile Paraguai e Bolívia30 EPIDEMIOLOGIA DA DCA NO BRASIL E AMÉRICA LATINA A DC ainda é considerada como um grande problema de saúde pública tanto no Brasil como na América Latina Nos anos de 1990 Dias e Coura estimaram que 2 a 3 mi lhões de pessoas estivessem contaminadas e a incidên cia anual de casos relatados era de 100 casos novos por ano31 Entretanto com os maiores cuidados na prevenção da transmissão vetorial com uma vigilância e controle mais sistematizado esta forma se reduziu substancialmente Entre as diversas formas de transmissão a via oral tem se destacado nos últimos anos como a principal via ficando a via vetorial como uma causa pouco prevalente Há relatos da forma aguda em todo o Brasil e diversos países da América tais como Venezuela Peru Colômbia che gando ao México e sul dos Estados Unidos Segundo o Minis tério da Saúde no período de 2000 a 2013 ocorreram o registro de 1570 casos no Brasil sendo 1081 contaminados por via oral 100 pela forma vetorial 6 pela vertical 372 ignoradas e 11 por outras formas A região norte foi a com maior número 1430 casos sendo em 1023 por contaminação oral32 A Região Norte do Brasil que contribui com a maioria dos casos no país têm a incidência relacionada com os meses da safra do açaí entre agosto e novembro Figura 2 Em geral nesta forma de transmissão oral os surtos ocorrem em microepidemias muitas delas familiares Entre 2005 e 2013 ocorreram 112 surtos envolvendo 35 municípios da região Amazônica e na maioria deles a contaminação foi por via oral com ingesta de alimentos contaminados principalmente o açaí a bacaba coquinhos caldo de cana e outros sucos A maioria destes surtos ocorreu nos estados do Pará 759 e Amapá 125 havendo alguns surtos esporádicos em Tocantins e Bahia32 Há relatos em pratica mente todos os estados brasileiros Em 2005 foram identifi cados diversos casos suspeitos de DCA relacionados com a ingestão de caldo de cana em Santa Catarina Destes 25 casos tiveram confirmação laboratorial e cinco evoluíram para o óbito Dez vetores infectados foram encontrados em uma palmeira próxima ao quiosque de venda de caldo de cana e um vetor contaminado no quiosque Também foi encontrado uma gambá com quatro filhotes contaminados33 Na captura ativa ou passiva das espécies de triatomíne os foram relatadas mais de 60 espécies distribuídas tanto no intradomicílio quanto no peridomicílio em toda a exten são territorial do Brasil Em amostras destes triatomíneos Figura 2 Distribuição mensal dos casos acumulados de DCA no município Abaetetuba PA 20052012 60 50 40 30 20 10 0 Casos Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 225 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA capturados a prevalência de infecção pelo T cruzi foi de 27 sendo as espécies mais contaminadas o T vitticeps 52 R robustus 33 e P lutzi 2932 ASPECTOS CLÍNICOS As manifestações clínicas são muito variáveis desde ca sos absolutamente assintomáticos à insuficiência cardíaca grave e choque cardiogênico podendo evoluir para o óbito Esta variação sintomatológica é dependente não só da res posta imune mas também na intensidade da infeção A fase aguda da DC pode apresentar diversas manifes tações clínicas que podem ser inespecíficas e confundidas com infecções virais Por esta razão muitos indivíduos não são identificados Na forma clássica de transmissão quando o T cruzi penetra pela pele podemos encontrar o chagoma de ino culação sinal de Romanã que é uma pequena formação maculonodular eritematosa consistente pouco dolorosa circundada por halo de edema elástico com adenomega lias regionais com lenta regressão podendo persistir por até dois meses Se a entrada ocorrer pela membrana da mucosa ocular podemos encontrar edema periorbital acom panhados de conjuntivite Entretanto o local de entrada pode ocorrer em qualquer parte do corpo susceptível a picada do barbeiro Na Figura 3 observamos o processo inflamatório da porta de entrada por picada de triatomíneo Dentre os diversos sintomas se destaca a febre prolongada sem causa etiológica comum quase sempre acompanhada de mal estar adinamia cefaleia e perda do apetite Podem ocorrer manifestações sistêmicas tais como adenomegalias e hepa toesplenomegalias de intensidades variáveis sendo o mais comum de grau leve Geralmente os linfonodos apresentam pequeno aumento não aderentes indolores e não fistulizam Costa et al em avaliação clínica de 977 casos no período de 2006 a 2012 encontraram a febre persistente como o principal sintoma da fase aguda da doença34 Na Tabela 1 encontramos os principais sinais e sintomas dos pacientes com DCA por via oral MANIFESTAÇÕES CARDÍACAS DA FASE AGUDA As manifestações cardíacas da fase aguda são muito variáveis A maioria dos pacientes é assintomática do ponto de vista cardíaco entretanto já apresentam algum tipo de al teração no eletrocardiograma ECG Souza et al avaliando as alterações eletrocardiográficas em uma série de casos verificaram que haviam as alterações no ECG mesmo em indivíduos assintomáticos35 Tabela 1 Principais manifestações clínicas da DCA em 977 pacientes34 Sintomatologia N Febre persistente 847 866 Astenia 701 717 Edema de facemembros 352 360 Cefaleia 188 192 Taquicardiaarritmias 183 187 Hepatomegalia 173 177 Esplenomegalia 131 134 Outros 430 440 Assintomáticos 11 11 Alguns casos podem apresentar quadros variáveis de insuficiência cardíaca e até evoluirem para choque cardio gênico e morte O aspecto clínico da miocardite chagásica aguda é muito similar à miocardite viral O paciente pode apresentar em graus variáveis dispneia taquicardia pre sença de terceira bulha sopros e arritmias A congestão pulmonar em geral é discreta pelo comprometimento con comitante do ventrículo direito O ECG é uma ferramenta muito útil principalmente nos casos de comprometimento leve do coração onde a hipó tese diagnóstica está fundamentada pelo quadro febril e epidemiológico Em avaliação de 161 pacientes consecuti vos em atendimento ambulatorial com DCA foram encon tradas alterações na maioria dos pacientes Na Tabela 2 encontramse as principais alterações35 Estas alterações do ECG são muito comuns e apesar de inespecíficas podem em muito ajudar na triagem diag nóstica de um caso febril em área endêmica podendo ser o primeiro indicador da doença De características diferentes da fase crônica onde prevalece o bloqueio de ramo direito na fase aguda as alterações da repolarização ventricular predominam em 726 dos pacientes Figura 4 Em casos mais graves principalmente onde a agressão miocárdica é mais intensa pode ocorrer supradesnivela mento do segmento ST em muito parecido com os das síndromes coronárias aguda Figura 5 A forma de transmissão oral é considerada de maior gra vidade Fato já observado em animais de experimentação correlacionando a agressividade das manifestações clínicas Tabela 2 Alterações eletrocardiográficas em pacientes na fase aguda da DC por transmissão oral35 Alterações eletrocardiográficas N 161 Alterações da repolarização ventricular 117 726 Sobrecarga atrial esquerda 49 304 Intervalo QT prolongado 36 223 Taquicardia sinusal 30 186 Bloqueios de ramo direito 1º e 2º graus 23 142 Baixa voltagem do QRS 22 136 Sobrecarga ventricular direita 10 62 QRS alargado 12ms 8 49 Fibrilação atrial 6 37 Bloqueio atrioventricular 1º grau 5 31 Zonas eletricamente inativas 4 24 Bloqueio de ramo direito 3º grau 3 18 Flutter atrial 2 12 Dissociação atrioventricular 1 06 Figura 3 Chagoma de inoculação em face e perna em moradores da região urbana de Belém Umarizal arquivo pessoal Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 226 devido a alta carga parasitária A miocardite pelo T cruzi pode ser fatal em 35 dos casos e junto com a meningo encefalite representa a principal causa do óbito36 As arritmias são comuns e aparecem em mais de 30 dos pacientes Marques et al em avaliação de um surto por ingesta de suco de goiaba em uma escola na Venezuela encontraram que as arritmias mais comuns foram as supra ventriculares que ocorreram em 22 dos casos as ventricu lares em 58 e o bloqueio atrioventricular total em 2926 O ecocardiograma pode revelar disfunção sistólica glo bal de graus variáveis e derrame pericárdico nos casos mais graves entretanto na maioria dos pacientes costuma ser normal Na microepidemia descrita por Marques et al onde o exame só foi realizado nos pacientes com alterações eletrocardiográficas encontraram em 68 dos pacientes exame absolutamente normal sendo que os restantes 32 apresentavam derrame pericárdico leve a moderado Não descreveram alterações na contratilidade26 Souza et al em um relato anatomopatológico de DCA que foi a óbito por intensa disfunção cardíaca evidenciaram nódulos inflamatórios no trajeto das coronárias sugestivos da epicardite moliniforme ou em rosário No estudo histológico do miocárdio encontraram intensa destruição de miócitos Figura 6 além de cistos rotos de amastigotas Figura 7 porém com preservação do endocárdio38 Figura 8 Na fase aguda já podem existir anormalidades do trato digestivo Rassi Rezende avaliando o esôfago e os cólons de 94 pacientes na fase aguda encontraram aperistalse em cinco e disfagia incipiente em oito pacientes que geralmen te voltaram ao normal após a fase aguda As alterações em cólons foram mínimas39 As manifestações neurológicas são incomuns nos pa cientes imunocompetentes porém naqueles com algum tipo de imunodepressão a encefalite pode comprometer muito a evolução clínica Estes pacientes podem ter abscessos granulomatosos no cérebro com comprometimento da fun ção neurológica40 A meningoencefalite foi muito bem descrita por Carlos Chagas geralmente em casos muito graves e indivíduos jovens e deve ser suspeitada nos pacientes com quadro de cefaleia vômitos rigidez de nuca eou convulsões41 A fase aguda é usualmente seguida por um período Figura 4 Eletrocardiograma de paciente com doença de Chagas aguda Observar os complexos QRS de baixa voltagem e as alte rações da repolarização ventricular Figura 5 Eletrocardiograma de paciente com doença de Chagas aguda e importante comprometimento miocárdio Observar o supra desnivelamento do segmento ST Figura 6 Miocardite chagásica aguda Observar extensa destruição de fibras cardíacas edema e áreas de fibrose Figura 7 Ninho de amastigota no miocárdio em paciente com doença de Chagas aguda Figura 8 Miocardite chagásica Observar intensa lesão miocárdica com preservação do endocárdio Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 227 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA assintomático de tempo muito variável denominado fase indeterminada Durante esta fase os parasitas desaparecem da corrente sanguínea e 70 a 90 dos pacientes nunca ficam sintomáticos Alguns pacientes entram na fase crônica por volta de 5 a 15 anos Porém acreditase que na forma de contaminação oral devido a carga parasitária ser maior a forma crônica aparece mais precocemente HISTÓRIA NATURAL A história natural da fase aguda ainda é desconheci da Uma quantidade expressiva dos indivíduos infectados sequer procura atendimento especializado e em muitos pacientes não é feito o diagnóstico Além destes fatores epidemiológicos que são pontos de confusão ainda não temos estudos sistematizados que possam trazer conclu sões corretas da história natural Gus et al apresentaram a evolução de oito indivíduos de um grupo de 17 pessoas acometidas por infecção chagásica aguda após 25 anos da microepidemia por contaminação oral Oito pacientes permaneceram fiéis às avaliações e após este período nenhum apresentou sinal ou manifestação orgânica da doença42 Apesar do viés no acompanhamento de menos da metade dos indivíduos neste grupo de oito indivíduos somente um apresentava a sorologia positiva para a doença A descrição da história natural é muito variável e os registros da literatura chamam atenção para as diferentes cepas do T cruzi carga parasitária aspectos imunológicos e porta de entrada do parasita como determinantes da evo lução clínica inicial da DC Com esta mudança no cenário epidemiológico e a transmissão oral mais frequente e mais grave ainda pouco se sabe sobre os preditores clínicos de mortalidade na fase aguda4344 Alguns autores referem maior mortalidade com a trans missão oral em comparação com a via clássica de transmis são vetorial atingindo de 8 a 35 sendo descrito que 5 a 10 dos casos sintomáticos evoluem para óbito relaciona dos com miocardite grave ou meningocefalite porém sem relacionar com a forma de transmissão17 A real dimensão dessa lacuna literária precisa ainda avançar no que tange à evolução clínica do acometimento cardíaco em populações atingidas por surtos de microepidemia familiar especialmen te em regiões com predomínio desta forma de transmissão Em estudos experimentais as vias de transmissão apre sentam gravidades distintas influenciando na mortalidade Neste modelo o aspecto inicial foi de uma infestação sis têmica grave alta parasitemia níveis elevados de fator de necrose tumoral TNF alfa com miocardite leve e alta taxa de mortalidade quando a porta de entrada era pela mucosa da cavidade bucal contrariamente quando a infecção foi direta mente pela via gástrica na qual a miocardite foi mais grave44 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DA ETIOLOGIA Para o diagnóstico da fase aguda o padrão ouro é o encontro do T cruzi no exame parasitológico direto A pes quisa a fresco é a primeira alternativa pois o procedimento é rápido e simples O momento ideal da coleta do sangue deve ser com o paciente febril e dentro de 30 dias do início dos sintomas Quando esta pesquisa a fresco for negativa e o paciente com sintomas há mais de 30 dias deve ser reali zada a pesquisa por métodos de concentração pelo Strout microhematócrito ou creme leucocitário que possuem maior sensibilidade A técnica da lâmina corada de gota espessa ou esfregaço é indicada em localizações onde existe a con comitância da malária Amazônia Legal apesar da menor sensibilidade4546 Caso não se encontre positividade na pri meira coleta e seja alta a suspeição novas coletas devem ser realizadas até a confirmação eou desaparecimento da sintomatologia ou feito o diagnóstico da doença febril Os exames sorológicos não são os melhores para o diagnóstico da fase aguda Estão indicados quando a pes quisa do T cruzi pelo método direto for negativa e ainda houver suspeita clínica A detecção de anticorpos antiT cruzi da classe IgG se fazem por métodos da imunofluores cência indireta IFI hemaglutinação indireta HAI e ensaio imunoenzimático ELISA4748 A detecção de anticorpos antiTcruzi da classe IgM não se aplica unicamente para o diagnóstico da DCA além de ser uma técnica complexa apresenta muitos resultados falsopositivos em diversas doenças que evoluem com febre Geralmente após 12 semanas o parasita só é de tectado por métodos mais complicados que melhoram o achado parasitológico O xenodiagnóstico e a hemocultura que apresentam positividade de 3050 ou métodos mo leculares que analisam a reação da cadeia de polimerase PCR com positividade de 459549 Em áreas endêmicas da doença onde prevalece a trans missão oral é também importante o diagnóstico diferencial com outras endemias febris que podem apresentar carac terísticas clínicas similares à infecção pelo T cruzi principal mente a febre tifoide calazar e diversas viroses50 A infecção pelo T cruzi apresenta febre prolongada de até 18 dias em geral vespertina sendo o sinal clínico mais expressivo51 DOENÇA DE CHAGAS EM IMUNODEPRIMIDOS Os pacientes com algum tipo de imunodepressão prin cipalmente aqueles portadores de neoplasias usuários de fármacos imunodepressores ou infectados pelo vírus da imunodeficiência humana podem ter um quadro agudo mais grave e exuberante com comprometimento infeccioso inten so e lesões cardíacas mais graves Em casos de DC crônica podem ocorrer reativação da doença com a sintomatologia de um caso agudo A exteriorização dos sinais clínicos de maior gravi dade é evidenciada por miocardite com significante dis função cardíaca que em geral evolui com episódios de arritmias muitas vezes complexas insuficiência cardíaca refratária podendo evoluir para choque cardiogênico O comprometimento cerebral com meningoencefalite e ou acidente vascular cerebral podem acompanhar os sintomas da infecção52 TRATAMENTO O tratamento da fase aguda com antiparasitários deve sempre ser instituído pois existem algumas evidências de melhor evolução clínica em relato de casos devido a Rev Soc Cardiol Estado de São Paulo 20162642229 228 supressão da parasitemia5354 O resultado depende de al guns fatores principalmente a duração da infecção da fase aguda a idade do paciente condições clínicas e principal mente à susceptibilidade da cepa do T cruzi Existem apenas dois medicamentos antiparasitá rios que podemos utilizar no tratamento específico o benznidazol agente derivado nitroimidazólico e o nifurtimox composto nitrofurânico sendo o agente de primeira escolha o benznidazol5556 Apesar destes fármacos serem largamente preconiza dos no tratamento da DCA o nível de evidência é muito frágil Não existe estudo randomizado duplo cego e contro lado com placebo mostrando a real eficácia com mudança na história natural da fase aguda Pinto et al acompanharam 179 pacientes com DCA que receberam o tratamento antiparasitário e no acompanha mento de 56 anos houve cura sorológica em 26357 An drade et al avaliaram crianças de 7 a 12 anos identificadas em um censo com anticorpos positivos para a doença de Chagas tipificadas como tendo infecção recente e tratadas com benznidazol Verificaram que o tratamento era segu ro e a negativação pela soroconversão para os anticorpos específicos foi de 55858 Nestes dois trabalhos pioneiros em tratamento da fase aguda não podemos concluir pela eficácia visto que a metodologia não contemplou um grupo placebo podendo estas alterações da melhora sorológica ser simplesmente uma evolução natural em alguns pacientes Além disso a definição de fase aguda nestes dois estudos envolveu vieses de conceituação O benznidazol é bastante utilizado com poucos efeitos adversos principalmente em crianças59 É muito discutível o uso em gestantes não havendo uma regulamentação na fase aguda Parece haver uma redução do risco de transmissão vertical e menor chance de evoluir a gravidez para o aborto No Brasil a dosagem dos comprimidos é 100 mg e recomendase para os adultos a dosagem de 5 mgkgdia por via oral em duas ou três tomadas diárias durante 60 dias sendo a dose máxima de 300 mgdia Em crianças a dosagem de 5 10 mgkgdia e em lactentes 10 mgkgdia Nos casos de intolerância ao benznidazol podese utili zar o nifurtimox que pode ser encontrado em comprimidos de 120 mg e deve ser utilizado em duas ou três tomadas diárias Em adultos a dose é de 810 mgkgdia e em crian ças de 15 mgkgdia A intolerância ao benznidazol é infrequente na fase agu da e os efeitos adversos mais frequentes são a neuropatia e as lesões cutâneas Podem ocorrer manifestações gastroin testinais tais como anorexia perda de peso e principalmente vômitos A neuropatia periférica é geralmente dose depen dente e aparecendo por volta da quinta semana e costuma responder aos anticonvulsivantes Quando ocorrem lesões cutâneas é recomendada a retirada do benznidazol e a utilização de antihistamínicos ou corticoides Os efeitos colaterais do nifurtimox são muito semelhantes aos do benznidazol porém com menos efeitos digestivos60 CONFLITOS DE INTERESSE Os autores declaram não possuir conflitos de inte resse na realização deste trabalho REFERÊNCIAS 1 Steverding D The history of Chagas disease Parasit Vectors 20147317 2 Carlier Y Dias JCP Luquetti AO Hontebeiryer M Torrico F Truyens C Trypanosomiase américaine ou maladie de Chagas In Encyclo pedie Médico Chirurgicale Paris Elsevier 2002 p 8505A20 21 3 Barrett MP Bruchmore RJ Stich A Lazzari JO Frasch AC Cazzulo JJ et al The trypanosomiasis Lancet 2003 3629394146980 4 Aufderheide AC Salo W Madden M Streitz J Guhl F Arriaza B et al A 9000year record of Chagas disease Proc Natl Acad Sci USA 2004101720349 5 Araújo A Jansen AM Reinhard K Ferreira LF Paleoparasitology of Chagas disease a review Mem Inst Oswaldo Cruz 2009 104Suppl 1916 6 Fernandes A Iñiguez AM Lima VS Souza SM Ferreira LF Vicente AC et al PreColumbian Chagas disease in Brazil Trypanosoma cruzi in the archaeological remains of a human in Peruaçu Valley Minas Gerais Brazil Mem Inst Oswaldo Cruz 200810355146 7 Lima VS Iniguez AM Otsuki K Fernando Ferreira L Araújo A Vicente ACet al Chagas disease in ancient huntergatherer po pulation Brazil Emerg Infect Dis 200814610012 8 Rothhammer F Allison MJ Núñez L Standen V Arriaza B Chagas disease in preColumbian South America Am J Phys Anthropol 19856844958 9 Walsh JF Molyneux DH Birley MH Deforestation effects on vectorborne disease Parasitology 1993106SupplS55S75 10 BriceñoLeón R Chagas disease and globalization of the Amazon Cad Saude Publica 200723Suppl 1S33S40 11 Miles MA The discovery of Chagas disease progress and pre judice Infect Dis Clin North Am 200418224760 12 Meneghelli UG Miguel Dias Pimenta 16611715 e a história do megaesôfago e do megacólon chagásicos Arg Gastroenterol 199633311521 13 Chagas C Nova tripanozomiaze humana Estudos sobre a mor folojia e o ciclo evolutivo de 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30 Villela MM Souza JM Melo Vde P Dias JC Avaliação do Programa de Controle da Doença de Chagas em relação à presença de Panstrongylus megistus na região centrooeste do Estado de Minas Gerais Brasil Cad Saúde Publica 200925490717 31 Dias JCP Coura JR Epidemiologia In Eds Clínica e tera pêutica da doença de Chagas uma abordagem prática para o clínico geral Rio de JaneiroFIOCRUZ 1997 p 3366 32 Boletim Epidemiológico Secretaria de Vigilância em Saúde Mi nistério da Saude20154621 33 Ianni BM Mady C Como era gostoso o meu caldo de cana Arq Bras Cardiol 200585637981 34 Costa EDG Santos SOD SoyoMilano M et al Chagas disease surveillance is possible in the Brazilian Amazon The Para state experience Trop Med Int Health 201520sup 1338 35 Souza DSM Almeida AJB Costa FA et al O eletrocardiograma na fase aguda da Doença de Chagas por transmissão oral Rev Bras Cardiol 201326212730 36 Vazquez BP Vazquez TP Miguel CB Rodrigues WF Mendes MT de Oliveira CJ et al Inflammatory responses and intestinal 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