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Economia VErdE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 POLÍTICA AMBIENTAL ISSN 18098185 2 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 A Conservação Internacional é uma organização privada sem fins lucrativos fundada em 1987 com o objetivo de promover o bemestar humano fortalecendo a sociedade no cuidado responsável e sustentável para com a natureza nossa biodiversidade global amparada em uma base sólida de ciência parcerias e experiências de campo Presidente José Alexandre Felizola DinizFilho Diretor Executivo Fábio Scarano Diretor de Política Ambiental Paulo Gustavo Prado Diretora de Comunicação Isabela de Lima Santos Conservação Internacional Av Getúlio Vargas 1300 7º andar 30112021 Belo Horizonte MG tel 55 31 32613889 email infoconservacaoorg wwwconservacaoorg Política ambieNtal economia verde desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Coordenação Camila L Gramkow Paulo Gustavo Prado Coordenação editorial Gabriela Michelotti Fotos da capa CI Projeto e edição gráfica Grupo de Design Gráfico Ltda Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Nina C Mendonça CRB61288 P769 Política Ambiental Conservação Internacional n 8 jun 2011 Belo Horizonte Conservação Internacional 2011 n 1 maio 2006 ISSN 18098185 1 Política ambiental Periódicos I Conservação Internacional Brasil 3 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 SUMÁRIO Siglário 4 Prefácio 6 Resumo executivo 8 Delineamentos de uma economia verde Helena Pavese 15 o caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre DAvignon e Luiz Antônio Cruz Caruso 24 economia verde eou desenvolvimento sustentável Donald Sawyer 36 Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 43 economia verde na américa latina as origens do debate nos trabalhos da cePal Márcia Tavares 58 o papel do crescimento inclusivo para a economia verde nos países em desenvolvimento Clóvis Zapata 71 o brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn e Renato Rosenberg 78 Potencial de crescimento da economia verde no brasil Carlos Eduardo F Young 88 o brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio Frischtak 98 inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília J Lustosa 111 agricultura para uma economia verde Ademar R Romeiro 123 economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 131 o desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan P Reydon 143 a transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro Irigaray 156 mecanismos de mercado para uma economia verde Peter H May 170 Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 179 o papel das instituições financeiras na transição para uma economia verde Mário Sérgio Vasconcelos 191 mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Motta e Carolina Dubeux 197 4 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 SigláRio ANA Agência Nacional de Águas APP Área de Preservação Permanente BASIC Brasil África do Sul Índia e China BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social BRIC Brasil Rússia Índia e China CAR Cadastro Ambiental Rural CEPAL Comissão Econômica para a America Latina e o Caribe CNI Confederação Nacional da Indústria EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EV Economia verde FAO Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura FEBRABAN Federação Brasileira de Bancos FINAM Fundo de Investimento da Amazônia FNO Fundo Constitucional de Financiamento do Norte FNE Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste FCO Fundo Constitucional de Financiamento do CentroOeste GEE Gases do efeito estufa IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBAS Índia Brasil e África do Sul IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICMBio Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade ICMS Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação Imazon Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais IPCC Intergovernamental Panel on Climate Change IPCIG International Policy Centre for Inclusive Growth IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano ITR Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural MCT Ministério de Ciência e Tecnologia MDA Ministério do Desenvolvimento Agrário 5 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Mercosul Mercado Comum do Sul MMA Ministério do Meio Ambiente MME Ministério de Minas e Energia OCDE Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico OGM Organismo geneticamente modificado ONG Organização não governamental ONU Organização das Nações Unidas ONUDI Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial OTCA Organização do Tratado de Cooperação Amazônica PD Pesquisa e desenvolvimento PAC Programa de Aceleração do Crescimento PIB Produto Interno Bruto PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente PSA Pagamento por serviços ambientais REDD Redução de Emissões oriundas do Desmatamento e da Degradação de Florestas REDD Redução de Emissões oriundas do Desmatamento e da Degradação de Florestas inclusive conservação manejo florestal sustentável arborização e reflorestamento Rio 92 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Rio10 Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável que ocorreu em 2002 em Johanesburgo Rio20 Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável que ocorrerá em 2012 no Rio de Janeiro SUDAM Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia TEEB The Economics of Ecosystems and Biodiversity UNASUL União de Nações SulAmericanas UC Unidade de Conservação UNEP United Nations Environmental Program ZEE Zoneamento ecológicoeconômico Siglário 6 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 PRefácio As questões ambientais têm sido crescentemente incorporadas à agenda científica dos mais diversos campos do conhecimento e às agendas políticas locais nacionais regionais e globais Sua ascendente relevância tem origem na compreensão cada vez mais difundida de que a sustentabilidade ambiental é imprescindível para o desenvolvimento de longo prazo das sociedades Por um lado sob uma perspectiva alarmista tratase de uma temática cuja negligência muito provavelmente resultará em efeitos perversos para o ser humano e para o desenvolvimento conforme apontam hoje numerosos estudos1 Do ponto de vista estratégico vêm sendo identificadas as potencialidades e oportunidades que sua incorporação efetiva envolve pois ela pode contribuir para alcançar processos mais sustentáveis de desenvolvimento em suas diversas dimensões econômica social e ambiental2 O desafio de caminhar na direção de uma sociedade mais igualitária e mais sustentável está mais do que nunca em pauta É nesse contexto que surge o conceito de economia verde Definida pelo PNUMA como aquela que resulta na melhoria do bemestar humano e da igualdade social ao mesmo tempo em que reduz significativamente os riscos ambientais e as escassezes ecológicas3 a economia verde será um dos temaschave4 da Rio20 a Con ferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável que ocorrerá em 2012 no Rio de Janeiro O desafio não é simples e as discussões estão somente no início Apesar de haver uma conceituação formal seus delineamentos precisos ainda estão por formular Afinal o que é uma economia verde Quais economias estão mais perto de atingila Como medir o grau de esverdeamento de uma economia O que significa concretamente realizar a transição para uma economia verde Qual é o papel do Estado nessa transição Como financiar essa transição Quais setores serão mais impactados Quais serão mais beneficiados Como a transição afetará o diaadia dos cidadãos Quais são os riscos de não se ingressar em uma economia verde E no caso do Brasil o que o país tem feito e ainda terá de fazer para avançar rumo a uma economia verde Como o país está frente aos demais Quais são os principais gargalos e desafios Como enfrentálos O que essa transição acarretaria para a sociedade para os setores produtivos para o governo para os consumidores A economia verde suscita muitas questões que não têm de forma alguma respostas simples e diretas Sabese contudo que a transição requererá esforços substanciais e o engajamento de todos os segmentos da sociedade em particular dos governos e do setor privado Demandará da parte dos go vernos que se nivele o campo de atuação para produtos mais verdes através da remoção de incentivos perversos revisão de políticas e de incentivos for 1 Em termos globais ver Stern 2007 e IPCC 2007 Para uma análise do caso brasileiro ver Banco Mundial 2010 Marcovitch coord 2010 e NAE 2005 2 TEEB 2011 e UNEP 2011 3 UNEP 2011 4 Os dois temaschave definidos para nortear a Conferência são i economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza e ii arcabouço institucional para o desenvolvimento sustentável 7 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 talecimento da infraestrutura de mercado introdução de novos mecanismos de mercado redirecionamento dos investimentos públicos e esverdeamento da demanda pública Da parte do setor privado será preciso responder a essas reformas de políticas por meio de crescentes financiamentos e investimentos assim como de construção de habilidades e capacidades de inovação para tirar proveito das oportunidades de uma economia verde O momento para discutir um paradigma alternativo onde a geração de ri queza não aumenta as disparidades sociais e não gera riscos ambientais nem escassezes ecológicas não poderia ser mais oportuno A crise de 2008 da qual a economia mundial ainda tenta se recuperar pode ser uma oportunidade para se pensar e formular o modelo econômico que desejamos seguir A transição para uma economia verde poderia beneficiar o Brasil em diver sos sentidos A economia verde requer uma maior igualdade social o que é algo especialmente necessário no país que está entre os dez países com pior distribuição de renda do planeta5 A transição poderia portanto servir como plataforma para erradicação da pobreza Além disso o país possui condições naturais bastante favoráveis a biodiversidade mais rica do planeta fartos recursos hídricos grandes áreas continentais e costeiras recursos oceânicos ainda desconhecidos enfim um patrimônio natural que apesar de ameaçado ainda é abundante Na economia verde o capital natural passa a ser um ativo que gera dividendos e produz um diferencial competitivo Estão colocados portanto os prérequisitos para que mais do que beneficiário o Brasil seja capaz de liderar na transição rumo a uma economia verde assumindo seu papel de agente global de mudança Esta edição especial apresenta subsídios para avanços em direção a uma economia verde Traz as reflexões de alguns dos principais especialistas brasileiros e brasilianistas no assunto em uma busca por responder às questõeschave que a economia verde suscita em geral e em um país como o Brasil Dezoito artigos reúnem as contribuições de experts das mais diversas filiações e origens Estão lançados os elementos que podem formar a base para a discussão sobre economia verde no país Boa leitura REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Banco Mundial 2010 Estudo de baixo carbono para o Brasil Disponível em httpgoworldbankorg U6KDQAWYI0 IPCC 2007 IPCC fourth assessment report climate change 2007 Disponível em httpwwwipccch Marcovitch Jacques coord 2010 Economia da mudança do clima no Brasil custos e oportunidades São Paulo IBEP Gráfica NAE Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República 2005 Cadernos NAE série mudança do clima n 3 fevereiro Brasília Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica PNUD 2010 Actuar sobre el futuro romper la transmisión intergeneracional de la desigualdad Informe regional sobre desarrollo humano para América Latina y el Caribe 2010 Nova Iorque PNUD Stern Nicholas 2007 The Economics of Climate Change the Stern review Cambridge Cambridge University Press TEEB 2011 The economics of ecosystems and biodiversity mainstreaming the economics of nature a synthesis of the approach conclusions and recommendations of TEEB Disponível em wwwteebweborg UNEP 2011 Towards a Green Economy Pathways to Sustainable Development and Poverty Eradication A Synthesis for Policy Makers Disponível em wwwuneporggreeneconomy 5 PNUD 2010 Prefácio 8 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 ReSumo executiVo O primeiro artigo assinado por Helena Pavese expõe o conceito de eco nomia verde e os principais resultados do relatório Rumo à economia verde caminhos para o desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza lançado em fevereiro de 2011 Partindo da constatação do elevado grau de degradação dos serviços ecossistêmicos e portanto do capital natural a au tora apresenta a Iniciativa Economia Verde lançada com vistas a identificar os riscos e custos sociais e econômicos gerados pelos atuais padrões de uso excessivo dos recursos naturais bem como as oportunidades de uma transição para práticas mais sustentáveis Dessa iniciativa surgiu o relatório sobre eco nomia verde cujos principais resultados Pavese expõe sucintamente Conclui que a economia verde é possível e desejável pois é capaz de aliar a geração de renda e de empregos com a erradicação da pobreza e conservação do capital natural Alexandre DAvignon e Luiz Antônio Cruz Caruso analisam o relatório do PNUMA desde uma perspectiva crítica Afirmam que o relatório representa um salto qualitativo no sentido de introduzir valores que vão além da maxi mização da utilidade Expõem a necessidade de se pensar a transição para uma economia verde de forma sistêmica na qual as atividades humanas são meramente um subsistema da sociedade civil que por sua vez é um sub sistema do universo ou a biosfera e seu conjunto de matérias vivas e inani madas Argumentam que outras linhas teóricas além da teoria neoclássica podem fornecer importantes insights sobre os temas em questão A economia ecológica traria uma abordagem mais sistêmica e as teorias schumpeteriana e neoschumpeteriana poderiam auxiliar a repensar a economia do ponto de vista das tecnologias como vetor de transformação das sociedades humanas Essas abordagens proporcionariam a consideração de diretrizes alternativas de soluções que sejam flexíveis e de caráter local conducentes a uma transição efetiva para economia verde Donald Sawyer faz uma análise da relação entre os conceitos de economia verde e de desenvolvimento sustentável Sawyer alerta para os riscos de a economia verde adquirir contornos exclusivamente econômicos ou economi cistas onde os instrumentos de mercado e precificação dos recursos naturais prevaleceriam em detrimento de medidas de outra natureza Entretanto afirma outras dimensões são relevantes para a economia verde entre elas a social ética cultural política jurídica etc O autor sustenta que a economia verde deve ser necessariamente pública no sentido amplo implementada por meio de políticas que garantam direitos a todos e mantenham as funções ecossistê micas interligadas de modo que se torne um conceito concreto instrumental e popular em complementaridade e conexão com o conceito de desenvolvimento sustentável mais abstrato diplomático e governamental 9 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Eduardo Viola apresenta um panorama das atuais circunstâncias interna cionais em termos de transição para uma economia verde com foco em seu caráter de baixo carbono A partir de dados recentes das emissões de GEE das grandes e médias potências Viola expõe as principais políticas e medidas que esses grupos de países têm praticado apontando perspectivas de futuro com base na atual conjuntura As grandes potências Estados Unidos China e União Europeia reúnem os países que possuem elevada participação nas emissões mundiais detêm forte capital tecnológico e humano para a descar bonização da economia e têm poder de veto nos acordos internacionais As médias potências entre elas Índia e Brasil possuem atuação limitada nos aspectos considerados Um exercício semelhante é feito para a América do Sul em particular onde é destacado o triplo efeito negativo do desmatamento na região perda de patrimônio natural informalidade e desmoralização pública e posição favorável da região cujas economias não são tão extensamente baseadas em combustíveis fósseis com algumas exceções O autor ainda faz um levantamento dos principais vetores tecnoeconômicos da transição para o baixo carbono Conclui com uma reflexão sobre perspectivas futuras Márcia Tavares faz um levantamento das principais contribuições da CEPAL no âmbito da economia verde tanto pelo seu papel na elaboração de documentos e condução de pesquisas quanto pela sua função de articular politicamente os países da América Latina e do Caribe nas discussões interna cionais A autora descreve em ordem cronológica os documentos produzidos contextualizandoos política e historicamente Tavares argumenta que esses documentos permitem avaliar a complexidade dos problemas ambientais da região e sua estreita ligação com estruturas e processos econômicos e sociais passo imprescindível para avançar na solução dos problemas ambientais econômicos e sociais da região Conclui que para uma transição efetiva para uma economia verde na América Latina são necessárias a articulação entre atores e instituições em diferentes esferas a remoção das barreiras à mudança e instituições fortes e permanentes que privilegiem o sustentável Clóvis Zapata destaca o papel do crescimento inclusivo para a transição para uma economia verde nos países em desenvolvimento O autor parte da constatação de que há convergências entre o conceito de economia verde do PNUMA e o conceito de crescimento inclusivo Defende uma abordagem holística na qual a transição para uma economia verde deve ser pensada e planejada de acordo com suas várias dimensões ambiental social econômi ca política etc as quais têm tempos e janelas de oportunidade diferentes o que deve ser apropriadamente levado em consideração Argumenta que as políticas de cunho social e as políticas de cunho ambiental não têm se articu lado suficientemente quando deveriam agir em complementaridade Afirma que são necessárias políticas estruturadas de fomento o que é exemplificado pela análise do caso do Programa Brasileiro de Biodiesel Sinaliza para a Resumo executivo 10 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 importância do debate SulSul Conclui com uma reflexão acerca da impor tância do crescimento inclusivo e da atuação de organismos internacionais e do setor privado para a transição para uma economia verde nos países em desenvolvimento Francisco Gaetani Ernani Kuhn e Renato Rosenberg trazem um panorama da situação do Brasil rumo a uma economia verde Argumentam que o Brasil é uma potência energética ambiental devido a sua ampla disponibilidade de recursos naturais e a políticas e medidas voltadas para a conservação ambien tal No cenário internacional afirmam o país é um dos maiores emissores de GEE do mundo mas vem alterando esse quadro particularmente por assumir metas voluntárias de redução de emissões Expõem as principais ações que o Brasil vem realizando rumo a uma economia verde em setores como florestas tratamento de resíduos sólidos recursos hídricos entre outros Apresentam os principais desafios para a transição Concluem que o Brasil parte de uma posição privilegiada na direção de uma economia verde sob vários aspectos mas boa parte das ações existentes pode ser considerada como um começo da estruturação institucional e da criação de mecanismos econômicos que compõem a agenda de um país cada vez mais voltado para a evolução de mercados relacionados à economia verde Carlos Eduardo F Young realiza exercícios analíticos que visam a estudar o impacto de um esverdeamento da economia brasileira isto é de uma tran sição para um modelo de crescimento liderado por setores de baixo impacto ambiental sobre o desempenho econômico e social do país A partir da cons tatação de que tem havido nos últimos dez anos uma reespecialização da pauta exportadora da América Latina e do Brasil em produtos primários Young também traz evidências de que tem havido uma especialização poluidora de forma que os setores potencialmente mais poluidores têm crescido mais que a média A partir dos resultados de um modelo de matriz insumoproduto o autor chega à conclusão de que o esverdeamento da economia brasileira pode trazer resultados melhores para a geração de emprego e renda do que o atual modelo de especialização em exportações de recursos naturais explorados predatoriamente ou de bens industriais com elevado grau de poluição em seus processos produtivos O autor conclui a partir dos resultados obtidos que é falsa a dicotomia entre crescimento econômico e conservação ambiental Cláudio Frischtak analisa os fundamentos e as estratégias de transição para uma economia verde no Brasil O autor parte da proposição de que essa transição requer inverter a lógica dominante de que bemestar e uso intensivo e insustentável dos recursos naturais são questões indissociáveis e adotar a ideia de que maior crescimento passaria a depender e ser necessariamente acompanhado por maior conservação ou uso sustentável dos recursos Fris chtak desenvolve uma estrutura analítica composta por oferta de mercado ou estruturada e demanda induzida ou espontânea que resulta em uma Resumo executivo 11 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 matriz 2x2 Sob tal estrutura analítica a transição ruma a uma economia ver de é analisada com foco em certos temas conservação dos ecossistemas transportes e saneamento energia e ciclo de vida dos produtos O autor ainda propõe estratégias de transição baseadas no estabelecimento de um grupo de trabalho de um marco de referência e de um conjunto de normas e na recomposição do capital natural Conclui que um novo paradigma está emergindo e que com o apoio de políticas de governo adequadas o Brasil tem plenas condições de ser um dos primeiros países a ingressar em uma economia verde Maria Cecília J Lustosa analisa a importância das inovações ambientais como via de mudança do padrão tecnológico vigente intensivo em matérias primas e energia de origem fóssil numa direção mais ecologicamente correta Lustosa apresenta o surgimento historicamente das questões ambientais e sua relação com a produção econômica Em seguida a autora expõe a im portância do processo inovativo para a mudança tecnológica e de paradigma tecnológico apresentando as circunstâncias em que tais mudanças podem ocorrer e em quais direções com foco nas TAS tecnologias ambientalmente saudáveis Apresenta os condicionantes internos e externos das capacitações das empresas para se tornarem inovadoras Lustosa faz ainda uma análise da inovação ligada à questão ambiental nas empresas brasileiras identifican do suas principais características Por fim a autora conclui que as inovações ambientais são necessárias para se ingressar em uma economia verde e que a capacitação das empresas é fundamental associada quando apropriado por incentivos promovidos pelo Estado No caso brasileiro o baixo investimento em inovação do setor produtivo é certamente um fator que inibe ainda mais a busca por inovações ambientais Ademar R Romeiro investiga o tema da agricultura para uma economia verde O trabalho descreve como deveria ser a agricultura em uma economia verde Romeiro começa pela definição do que se entende por economia verde do ponto de vista de um dado conceito de sustentabilidade de longo prazo para então apresentar as condições para que a agricultura seja compatível com uma economia verde dessa forma entendida Procura mostrar que é científica e tecnologicamente possível uma forma de agricultura suficientemente produtiva para atender aos requerimentos atuais de produtividade agrícola mas baseada principalmente no manejo pelo agricultor das próprias forças da natureza de modo a obter serviços ecossistêmicos A recomendação principal de política agrícola que decorre da análise é aquela de ampliar os esforços da pesquisa agroecológica pelas grandes instituições públicas de pesquisa Arilson Favareto traz para a discussão o tema do novo ciclo de desenvol vimento rural analisando como ele se alinha com a economia verde O novo ciclo de desenvolvimento rural em andamento sob diferentes intensidades no mundo e cujo traço distintivo é a transição de um paradigma agrário e agrícola Resumo executivo 12 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 para um paradigma organizado em torno do enraizamento ambiental do de senvolvimento rural está em consonância com a transição para uma economia verde A agricultura moderna intensiva no uso de recursos naturais gera muita renda porém poucos empregos Favareto apresenta as principais caracterís ticas da nova ruralidade e faz uma análise da situação no Brasil identificando que aqui como no resto do mundo a agricultura tem uma tendência declinante em relação às demais atividades e que as regiões rurais não experimentam mais um movimento generalizado de êxodo mas uma heterogeneização do seu perfil demográfico com elevação da escolarização e maior diferenciação social Conclui com ideias para uma agenda de alinhamento desse novo ciclo com a transição para uma economia verde Bastiaan P Reydon faz uma análise das causas e soluções do desmatamento na Amazônia Reydon parte da apresentação de dados sobre o desmatamento na Amazônia O autor levanta as principais causas atribuídas a esse desmata mento Reydon argumenta que o desmatamento decorre da continuidade da tradicional forma de expansão da fronteira agrícola brasileira que em geral segue as seguintes etapas ocupação de terras virgens privadas ou públicas extração da madeira de lei instalação da pecuária e por fim desenvolvimento de agropecuária moderna Reydon propõe que a especulação com a terra é o principal motor do desmatamento da floresta amazônica apresentando dados empíricos de que o desmatamento está associado à valorização da terra O autor faz uma análise da situação fundiária na Amazônia em suas diversas categorias apontando para a incapacidade da governança do Estado brasileiro sobre as terras da região Avalia as razões pelas quais a questão fundiária não é apropriadamente tratada no país recuperando a evolução histórica do quadro institucional brasileiro relacionado Reydon conclui que uma governança adequada participativa e efetiva é condição necessária porém insuficiente para conter o desmatamento na região Carlos Teodoro Irigaray traz uma análise das perspectivas e desafios do direito brasileiro na transição para uma economia verde Irigaray parte de uma contextualização da economia verde no âmbito do desenvolvimento sustentável O autor argumenta que sob a perspectiva jurídica a transição para uma economia verde requer medidas que envolvem a estruturação de um sistema que possa efetivamente orientar as políticas públicas combinando o emprego de instrumentos econômicos e mecanismos de comandoecontrole que necessariamente devem estar informados por alguns princípios éticos entre os quais destaca a justiça ambiental e a equidade intra e intergeracional Identifica no contexto brasileiro três principais desafios para a transição po breza desmatamento e agropecuária Afirma que o Brasil já detém um marco regulatório sólido destacando o reconhecimento do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado associado ao dever do poder público e da coletividade de defender e preservar esse direito Todavia alguns ajustes Resumo executivo 13 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 fazemse necessários como por exemplo a institucionalização do REDD Além disso na prática o avanço legislativo ainda repercute timidamente Nesse sentido as contradições entre as políticas do governo brasileiro são especialmente relevantes Peter H May levanta a questão dos mecanismos de mercado para uma economia verde May afirma que desde a perspectiva da economia ecoló gica os instrumentos de gestão dos recursos naturais baseiamse em duas variáveis a insubstituibilidade relativa do recurso em questão e sua resiliência capacidade de recuperarse do estresse ou da degradação O autor afirma sem desconhecer a dificuldade de conhecêlas com precisão que essas duas variáveis revelam sem lançar mão de artifícios de valoração pelo mercado os condicionantes biofísicos da intervenção humana Argumenta que mecanis mos de comando e controle podem conduzir a regulação direta dos recursos estabelecendo tetos para seu nível de uso apropriado que pode ser nulo Estabelecidos os caps o mercado pode agir de maneira a atingir a alocação eficiente trade O autor analisa especificamente os instrumentos de PSA e de REDD Conclui que mecanismos de mercado devem assumir um papel importante na transição para uma economia verde de forma que esse papel seja mediado por uma regulação definidora dos critérios de acesso e controle sobre os recursos naturais refletindose em limites biofísicos amparados nas ciências e em ampla e prévia consulta às populações que dependem de tais recursos para seu sustento Ronaldo Seroa da Motta apresenta o tema da valoração e da precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Argumenta que devido à falta de segurança nos direitos de propriedade e de uso dos recursos natu rais as externalidades não são totalmente captadas pelo sistema de preços que acaba tornandose imperfeito o que conduz a alocações ineficientes desses recursos Seroa da Motta expõe os componentes do Valor Econô mico do Recurso Ambiental VERA o valor de uso uso direto uso indireto e de opção e o valor de nãouso ou de existência Também apresenta as categorias de serviços ambientais de provisão de regulação de suporte e culturais relacionandoas com os componentes do VERA O autor expõe os métodos de valoração econômica do meio ambiente que podem ser agrupa dos em métodos da função de produção ou métodos da função de demanda apresentando a complexidade que tais exercícios envolvem Seroa da Motta analisa as possibilidades de internalização das externalidades ambientais através de cobrança e da criação de mercados Conclui com uma avaliação dos limites e das potencialidades da valoração e da precificação econômica do meio ambiente Mário Sérgio Vasconcelos analisa o papel das instituições financeiras na transição para uma economia verde O autor argumenta que a partir dos anos 1990 uma série de compromissos voluntários e autoregulações têm sido imple Resumo executivo 14 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 mentadas no setor Afirma que o Brasil possui uma atuação de destaque entre os países emergentes O autor faz um levantamento dos principais pactos e compromissos assumidos pelos bancos no país Destaca o Protocolo Verde um esforço para adotar políticas socioambientais que sejam precursoras multiplicadoras demonstrativas ou exemplares de práticas bancárias e que estejam em harmonia com o objetivo de promover o desenvolvimento susten tável Apresenta algumas das medidas que os bancos brasileiros têm feito para promover a sustentabilidade no país Argumenta que essa atuação decorre do fato de que o risco ambiental tem gerado impacto efetivo e crescente sobre os quatro grandes riscos enfrentados pelas instituições bancárias Identifica os principais desafios do setor Conclui que não cabe mais aos bancos um papel passivo e de monitoramento e sim um papel ativo identificando empreende dores tecnologias e novos modelos de negócios Por fim Ronaldo Seroa da Motta e Carolina Dubeux fazem uma análise da mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Os autores argumentam que é possível entender a sustentabilidade como aquela que possibilita manter o estoque de capital que define o fluxo de bens e serviços futuros ao menos constante Defendem que a capacidade dos ecossistemas de gerar serviços possui limites os quais quando ultrapassados provocam uma situação de colapso A definição desses limites ou seja do nível crítico de capital natural determina a trajetória de sustentabilidade de uma economia A economia verde seria aquela que produz um aumento contínuo no estoque de capital natural Analisam a criação de capacidade institucional para a in tegração das políticas ambientais às políticas econômicas e um sistema de indicadores ambientais que seja capaz de mensurar e monitorar os benefícios dos investimentos em capital natural Propõem nesse sentido a sistematiza ção dos indicadores ambientais a ampliação dos instrumentos econômicos e a remoção dos incentivos perversos Concluem com a hipótese de que a regulação ambiental não deve ser compreendida como um problema e que além de uma solução pode representar uma fonte de benefícios econômicos e sociais para o Brasil Resumo executivo 15 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Delineamentos de uma economia verde HELENA BONIATTI PAVESE1 IntROdUçãO Ao longo dos últimos 50 anos os seres humanos vêm alterando os ecossis temas em um ritmo mais acelerado e intenso do que em qualquer outro período da história humana principalmente devido à crescente demanda por recursos naturais tais como alimentos água madeira fibras e combustíveis2 Apesar da significativa contribuição para o crescimento da economia e para a promoção do bemestar social a exploração excessiva desses recur sos acarretou perdas irreversíveis da biodiversidade global e dos serviços prestados pelos ecossistemas muitos deles considerados essenciais para a sobrevivência humana O qUe SãO SeRvIçOS aMbIentaIS De acordo com o Relatório de Avaliação Ecossistêmica do Milênio MEA da sigla em inglês3 serviços ambientais ou ecossistêmicos são definidos como os benefícios que as pessoas obtêm dos ecossistemas Eles podem ser divididos em quatro categorias i serviços de provisão como comida água madeira etc ii serviços de regulação tais como aqueles que afetam o clima as enchentes as doenças a qualidade da água entre outros iii serviços culturais ligados a benefícios recreacionais estéticos e espirituais e iv serviços de suporte que incluem formação de solo fotossíntese e reciclagem de nutrientes Ainda segundo o relatório cerca de 60 desses serviços foram degradados ou utilizados de forma insustentável incluindo água pura purificação do ar e da água regulação climática local e regional4 Essas alterações aumentam a probabilidade de mudanças aceleradas abruptas e irreversíveis com conse quências significativas para o bemestar humano e ameaçam a sobrevivência de muitas comunidades em especial de países em desenvolvimento nos 1Gerente de Política Ambiental da Conservação Internacional e excoordenadora regional para América Latina e o Caribe do Centro de Monitoramento da Conservação Mundial do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente WCMCUNEP 2Millenium Ecosystem Assessment 2005 3 Millenium Ecosystem Assessment 2005 p V 4 Millenium Ecosystem Assessment 2005 p1 16 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Delineamentos de uma economia verde Helena Boniatti Pavese quais em alguns casos cerca de 90 do PIB está ligado à natureza ou a recursos naturais5 Apesar de comprovada a relação intrínseca entre o bemestar humano e os recursos naturais atividades econômicas insustentáveis ainda prevalecem Atualmente cerca de 1 a 2 do PIB mundial são destinados para subsidiar práticas que em muitas ocasiões levam à degradação dos recursos naturais como pesca e agricultura6 Esses investimentos são motivados pela acumulação rápida do capital físi co financeiro e humano desconsiderando o capital natural gerando um ciclo vicioso através do qual os impactos negativos exercidos sobre os recursos naturais levam consequentemente a impactos negativos no bemestar humano e ao agravamento da pobreza Este artigo visa a destacar os principais avanços nos delineamentos de uma economia verde Além desta introdução o artigo compõese de três se ções A primeira discorre sobre a Iniciativa Economia Verde da qual resultou o relatório sobre economia verde lançado em fevereiro de 2011 A segunda apresenta alguns dos principais resultados levantados por esse relatório Por fim seguem considerações finais a InIcIatIva ecOnOMIa veRde Buscando levantar evidências sobre os riscos e custos sociais e econô micos gerados pelos atuais padrões de uso excessivo dos recursos naturais bem como destacar as oportunidades de uma transição para práticas mais sustentáveis o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente PNUMA lançou em 2008 a Iniciativa Economia Verde GEI da sigla em inglês O ob jetivo central da iniciativa é apoiar o desenvolvimento de um plano global de transição para uma economia verde que fosse dominada por investimentos e consumo de bens e serviços de promoção ambiental O qUe é UMa ecOnOMIa veRde Entendese por economia verde aquela que resulta na melhoria do bemestar humano e da igualdade social ao mesmo tempo em que reduz significativamente os riscos ambientais e as escassezes ecológicas7 Uma economia verde é aquela apoiada em três estratégias principais 1 a redução das emissões de carbono 2 uma maior eficiência energética e no uso de recursos e 3 a prevenção da perda da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos 5 UNEP 2011a 6 UNEP 2011a p1 7 How is a Green Economy Defined nd Disponível em httpwwwuneporg greeneconomyAboutGEIFrequentlyAskedQuestionstabid29786Defaultaspx 17 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Delineamentos de uma economia verde Helena Boniatti Pavese Para se tornarem viáveis essas estratégias precisam ser catalisadas e apoiadas por investimentos públicos e privados bem como por reformas políticas e mudanças regulatórias Devese ainda buscar preservar for talecer e quando necessário reconstruir o capital natural como um ativo econômico crítico e fonte de benefícios públicos especialmente para aqueles cujas vidas dependem intrinsecamente dos serviços advindos da natureza O carro chefe da GEI é o desenvolvimento do relatório sobre economia ver de lançado em fevereiro de 2011 Rumo à economia verde caminhos para o desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza O documento analisa aspectos macroeconômicos e questões ligadas à sustentabilidade e redução da pobreza relacionadas a investimentos em uma gama de setores desde energia renovável até agricultura sustentável Esperase que tais análises venham subsidiar a formulação de políticas que possam catalisar o aumento de investimentos nesses setores verdes Além da produção de análises desse teor a GEI fornece ainda serviços de consultoria para países e regiões produzindo produtos de pesquisa bem como promovendo o estabelecimento de parcerias com uma ampla gama de atores incluindo a academia organizações não governamentais setor priva do entre outros para a promoção e implementação efetiva de estratégias de economia verde RUMO à ecOnOMIa veRde caMInhOS paRa O deSenvOlvIMentO SUStentÁvel e a eRRadIcaçãO da pObReza Elaborado pelo PNUMA em parceria com economistas e especialistas mun diais o relatório Rumo à economia verde caminhos para o desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza busca defender a proposição de que tornar economias verdes não implica necessariamente a redução do cresci mento econômico e do nível de emprego Ao contrário tal transição permitiria fortalecer o crescimento através da geração de empregos decentes8 e con sistiria em uma estratégia vital para a eliminação da pobreza Esperase que as evidências levantadas por esse estudo encorajam tomadores de decisão a desenvolver condições favoráveis para um aumento nos investimentos rumo a uma economia verde com base em três estratégias principais 1 Estimular uma mudança nos investimentos tanto públicos como privados buscando incentivar setores críticos à transição para uma economia verde 8 Empregos que proporcionem rendimentos adequados proteção social e respeito aos direitos dos trabalhadores e que permitam a esses trabalhadores expressar sua opinião nas decisões que afetarão suas vidas Fonte OIT 2009 18 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Delineamentos de uma economia verde Helena Boniatti Pavese 2 Demonstrar como a economia verde pode reduzir a pobreza persistente através de uma ampla gama de setores importantes incluindo agricultura florestas pesca água e energia e 3 Fornecer orientações sobre políticas que permitam essa mudança através da eliminação de subsídios perversos identificação de falhas de mercados estabelecimento de marcos regulatórios ou estímulos a investimentos sus tentáveis O relatório busca desmistificar a ideia de que existe uma permuta inevitável entre o desenvolvimento social crescimento econômico e a sustentabilidade ambiental e desfazer a concepção equivocada de que economia verde é um luxo com cujos custos apenas os países desenvolvidos podem arcar A principal mensagem destacada pelo relatório é a de que um investimento de 2 do Pib global em dez setores chave pode combater a pobreza e gerar um crescimento mais verde e eficiente De acordo com o relatório tal investimento pode ser o pontapé inicial para a transição rumo à uma economia verde de baixo carbono e de uso eficiente dos recursos Segundo os autores esse valor corresponde a apenas US 13 trilhão ao ano e fomentaria o crescimento da economia global a níveis prova velmente superiores em relação aos dos atuais modelos econômicos9 Agricultura construção pesca silvicultura abastecimento de energia indústria turismo transportes manejo de resíduos e água foram os dez se tores avaliados pelo estudo e identificados como fundamentais para tornar a economia global mais verde Para a transição desses setores para uma economia mais verde em termos gerais o estudo propõe a seguinte alocação de recursos10 agricultura US 108 bilhões incluindo as pequenas explorações imobiliário US 134 bilhões a serem destinados a programas de eficiência energética energético mais de US 360 bilhões Pesca US 110 bilhões incluindo a redução de capacidade das frotas mundiais Silvicultura US 15 bilhões para o combate às mudanças climáticas indústria US 75 bilhões turismo US 135 bilhões transportes US 190 bilhões gestão de resíduos US 110 bilhões incluindo reciclagem água um montante semelhante incluindo saneamento básico 9 UNEP 2011b p4 10 UNEP 2011a 19 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Delineamentos de uma economia verde Helena Boniatti Pavese O relatório apresenta ainda resultados e recomendações por setores es pecíficos apontando as oportunidades setoriais geradas pela transição para a economia verde incluindo a redução da pobreza criação de empregos e fortalecimento da equidade social e manutenção e restauração do capital natural Dentre eles cabese destacar agricultura a redução do desmatamento e o aumento no reflorestamento geram benefícios à agricultura e às comunidades rurais através do uso de meca nismos econômicos e de mercado existentes como por exemplo certificação da madeira pagamento por serviços ecossistêmicos e potenciais benefícios advindos de mecanismos REDD estratégias essas que atualmente se en contram em discussão em foro nacional e internacional11 uma agricultura mais verde assegurará alimento para a crescente população mundial sem prejuízos aos recursosbase desse setor Isso se dará através de uma transição de práticas de agricultura industriais e de subsistência para padrões mais sustentáveis com maior eficiência no uso da água uso extensivo de nutrientes orgânicos ou naturais do solo e controle integrado de pestes12 A transição para uma economia verde também requer fortalecimento de instituições e o desenvolvimento de infraestrutura em áreas rurais de países em desenvolvimento Esse aspecto inclui a remoção de subsídios ecologicamente perversos e a promoção de reformas regulatórias que incluam nos preços dos alimentos e commodities os custos da degradação13 Esverdear a agricultura em países em desenvolvimento concentrandoa em pequenas propriedades pode reduzir a pobreza ao mesmo tempo em que permite investir no capital natural do qual os mais pobres dependem A adoção de práticas sustentáveis como agroflorestas gestão integrada de nutrientes e de pragas é uma das maneiras mais eficientes para aumentar a disponibilidade de alimentos e facilitar o acesso aos mercados internacionais emergentes para produtos verdes A adoção de tais práticas poderá mover a agricultura da posição de um dos maiores emissores de gases do efeito estufa para uma de neutralidade contribuindo ainda para reduzir o desmatamento e o uso de água em 55 e 35 respectivamente14 11 UNEP 2011b p6 12 UNEP 2011b p7 13 UNEP 2011b p7 14 UNEP 2011b p9 20 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Delineamentos de uma economia verde Helena Boniatti Pavese água a escassez crescente de água poderá ser mitigada através de políticas de fomento a investimentos voltados à melhoria no fornecimento e à eficiência do uso da água15 investimentos na provisão de água potável e serviços de saneamento para os pobres representam uma grande oportunidade para acelerar a transição para a economia verde em muitos países em desenvolvimento Investimentos anuais de 015 do PIB mundial permitirão a manutenção do uso global da água em níveis sustentáveis bem como o alcance dos objetivos do milênio relacionados à água em 201516 a oferta de empregos no setor de água sofrerá ajustes temporários devido à necessidade de recuperação dos recursos hídricos Melhorias na eficiência e uma redução no consumo total de água reduzirão em 20 e 25 a oferta de empregos até 2050 em comparação com as taxas atuais Entretanto tais projeções não capturam as oportunidades de novos empregos gerados pelo desenvolvimento da infraestrutura voltada à eficiência do uso da água17 Setor energético energias renováveis apresentam grandes oportunidades econômicas Esverdear o setor energético requer uma substituição nos investimentos em fontes de energia de carbono intensivas para investimentos em energia limpa bem como incrementos na eficiência energética Muitos desses investimen tos serão recompensados no futuro haja vista o crescimento no mercado de tecnologias renováveis e a crescente preocupação sobre os custos sociais gerados por tecnologias baseadas em combustíveis fósseis18 Políticas governamentais desempenham um papel essencial no fortale cimento de incentivos para investimentos em energias renováveis incluin do incentivos com calendário definido feedin tariffs pagamentos pela energia renovável que o usuário produz subsídios diretos e créditos fiscais19 a alocação de no mínimo 1 do Pib global para aumentar a eficiência energética e expandir o uso de energias renováveis criará empregos adicionais e produzirá uma energia mais competitiva20 um investimento anual de cerca de 125 do Pib mundial em eficiência energética e energias renováveis poderia reduzir a demanda global por energia primária em 9 em 2020 e em 40 até 205021 15 UNEP 2011b p8 16 UNEP 2011b p10 17 UNEP 2011b p13 18 UNEP 2011b p14 19 UNEP 2011b p15 20 UNEP 2011b p12 21 UNEP 2011a 21 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 turismo o desenvolvimento do turismo quando bem desenhado poderá for talecer economias locais e reduzir a pobreza22 Pesca investimentos na gestão dos recursos pesqueiros o que inclui a criação de áreas marinhas protegidas e desativação e redução da capa cidade das frotas podem recuperar os recursos pesqueiros do planeta Tal recuperação acarretará um aumento das capturas das atuais 80 milhões de toneladas para 90 milhões bem como um significativo aumento no número de empregos no setor em 205023 os benefícios oriundos de uma transição da indústria pesqueira ultrapassam de 3 a 5 vezes o investimento necessário para essa transi ção24 a oferta de empregos no setor pesqueiro sofrerá ajustes temporários devido à necessidade de recuperação dos recursos pesqueiros Esver dear o setor pesqueiro levará à perda de empregos a curto e médio prazos mas em longo prazo a oferta crescerá novamente devido à recuperação dos estoques pesqueiros25 Gestão de resíduos com investimentos de uS 108 bilhões por ano no esverdeamento do setor de resíduos a reciclagem global de resíduos poderá ser triplicada até 2050 Isso levará ainda a uma redução de mais de 85 nos montantes destinados a aterros sanitários quando comparado aos níveis atuais26 tais investimentos poderão levar a uma reciclagem plena dos resíduos eletrônicos em comparação com níveis atuais de 1527 Uma ampliação em 10 na vida útil de todos os produtos fabricados levaria a uma redução semelhante no volume dos recursos extraídos A oferta de empregos no setor de gestão de resíduos e reciclagem crescerá em virtude do aumento nos resíduos resultantes do crescimento populacional e de renda mas os desafios relacionados à geração de empregos decentes nesse setor ainda são consideráveis Atualmente a reciclagem gera em torno 22 UNEP 2011b p11 23 UNEP 2011a 24 UNEP 2011b p11 25 UNEP 2011b p13 26 UNEP 2011a 27 UNEP 2011a p1 Delineamentos de uma economia verde Helena Boniatti Pavese 22 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 de 12 milhões de empregos em apenas três países Brasil China e Estados Unidos28 Em cenários de investimento verde o crescimento projetado da oferta de empregos no setor de resíduos será de 10 se comparado com as tendências atuais transportes investimentos anuais de 034 do Pib mundial até 2050 podem reduzir a utilização de petróleo em 80 comparada aos padrões atuais podendo elevar as taxas de empregos em 629 os custos ambientais e sociais gerados pelo setor de transportes atualmente estão em torno de 10 do Pib de um país ou região um esverdeamento do setor de transporte requer a criação de po líticas de fomento à utilização de transportes públicos e não motoriza dos eficiência de combustíveis e desenvolvimento de veículos menos poluentes ecOnOMIa veRde pOSSível e deSejÁvel A mensagem final transmitida pelo relatório é a de que uma economia verde é sim desejável e possível Essa possui um potencial para promover o tão almejado desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza com rapidez e efetividade Uma economia verde favorece o crescimento com a geração de renda e de empregos Entretanto tal transformação está condicionada a duas grandes mudanças na maneira como nossa economia está estruturada e no reconhecimento de que o meio ambiente forma a base de nossos bens físicos que deverão ser gerenciados como fonte de crescimento prosperidade e bemestar30 Investimentos verdes têm grande potencial de fortalecer setores e tecno logias que serão os principais promotores do desenvolvimento econômico e social no futuro incluindo tecnologias para energias renováveis construções com eficiência energética e de recursos e sistemas de transporte de baixo carbono31 Para tanto além de tecnologias investimentos complementares no capital humano também serão necessários incluindo geração e compartilhamento de estratégias mecanismos e políticas que promovam uma transição rumo a uma economia verde32 28 UNEPILOIOEITUC 2008 29 UNEP 2011b p23 30 UNEP 2011b p 37 31 UNEP 2011b p 37 32 UNEP 2011b p 37 Delineamentos de uma economia verde Helena Boniatti Pavese 23 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Portanto a transição rumo a uma economia verde desencadeia de acordo com o relatório uma série de resultados desejáveis no longo prazo seja em termos econômicos sociais ou ambientais O relatório traz para tanto diretrizes claras do que poderia ser feito em cada um dos dez setores analisados para levar a cabo tal transição Logo o documento traz subsídios para a proposi ção de que a transição rumo a uma economia verde trará benefícios no longo prazo que compensarão possíveis perdas de curto prazo REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Millenium Ecosystem Assessment 2005 Ecosystems and Human WellBeing Syn thesis Washington DC Island Press p1 OIT 2009 Programa Empregos Verdes Brasília OIT UNEP 2011a Rumo a uma economia verde caminhos para o desenvolvimento sus tentável e a erradicação da pobreza Press Release United Nations Environment Programme Disponível em httpwwwuneporggreeneconomyPortals88docu mentsgerGERpressptpdf UNEP 2011b Towards a green economy pathways to sustainable development and poverty eradication United Nations Environment Programme p4 UNEPILOIOEITUC 2008 Green jobs towards decent work in a sustainable low carbon world Nairobi UNEP Delineamentos de uma economia verde Helena Boniatti Pavese 24 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 o caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde ALExANDRE DAVIGNON1 LUIZ ANTôNIO CRUZ CARUSO2 A economia verde como definida no PNUMA na publicação Rumo a uma economia verde caminhos para o desenvolvimento sustentável e a erradica ção da pobreza traz consigo uma série de desafios Ela seria voltada para o bemestar humano e a equidade social reduzindo os riscos ambientais e a escassez de recursos além de ser caracterizada por baixa intensidade em carbono Certamente essa não foi a primeira vez em que se formulou uma expressão que reproduz as aspirações daqueles que procuram modificações estruturais na economia capitalista voltada para outros valores que não a maximização das utilidades em um mercado hipoteticamente perfeitamente competitivo e tendendo ao equilíbrio O salto qualitativo dessa óptica está essencialmente na superação da visão antropocêntrica da natureza e do planeta na qual estes estariam a serviço do homem e voltados para suas necessidades Como assinalou René Passet 1991 a ordem e os ciclos da natureza devem ser respeitados para não se esgotarem suas potencialidades e fontes de energia A biosfera e as interações de seus subsistemas atmosfera litosfera hi drosfera e meio biótico determinam as condições sob as quais as atividades humanas podem realizarse sejam sociais ou econômicas Em última análise será a biosfera que determinará os limites e possibilidade da influência mútua entre os seres vivos e o planeta O homem faz parte de um todo no qual é uma parte importante em razão de sua capacidade de intervenção no meio ambiente mas não existe uma hierarquia na qual cabe ao homem ocupar o topo As relações entre as sociedades humanas e a biosfera não podem ser reduzidas à sua dimensão econômica ou mesmo social As atividades humanas tal como analisadas pela economia nas relações de produção troca consumo etc não constituem senão uma primeira esfera das práticas humanas em um ordenamento com regras específicas estabelecidas incluída em uma esfera 1 Professor do Programa de Políticas Públicas Estratégias e Desenvolvimento do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro PPEDIEUFRJ e pesquisador do Programa do Instituto Alberto Luiz Coimbra de PósGraduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro COPPEUFRJ 2 Doutorando do Programa de Políticas Públicas Estratégias e Desenvolvimento do Instituto de Economia da UFRJ 25 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 social mais ampla a sociedade civil o Estado as ideologias etc Esta última entretanto está circunscrita por sua vez sobre o universo ainda mais amplo da matéria inanimada e da matéria viva que a envolve e a ultrapassa Essas três esferas a dos modos de produção a da formação social e a da biosfera representam aí sim o conjunto no qual se inserem as atividades humanas A reprodução e os condicionantes de cada uma das três esferas passam pela regulação das outras duas Sendo a relação entre essas três esferas de inclusão podese afirmar que os elementos da esfera econômica pertencem à biosfera e obedecem às suas leis mas que todos os elementos da biosfera não pertencem necessariamente à esfera da economia e não se submetem a seu ordenamento Como disse James Lovelock 2001 a Terra tornouse o que é por meio de sua habitação por seres vivos e estes têm sido o meio e não a finalidade do desenvolvimento do planeta É interessante observar no entanto que atualmente associado ao título do PNUMA em sua página internacional na Internet existe outro menor dizendo meio ambiente para o desenvolvimento Esta não seria uma contradição de percepção no Programa do que seria a proposta do documento publicado definindo uma economia verde Pintar a economia neoclássica de verde não será a solução É necessária uma mudança estrutural da administração da casa oikos casa nomia administração estudo ou leis Houaiss 2001 referindose ao planeta como a casa de todos os seres vivos e como tal necessitando ser conservado e respeitado Tornar a economia convencional verde segundo a óptica do PNUMA é priorizar o crescimento da renda e do emprego Estes últimos sendo estimulados por investimentos públicos e privados que reduzam as emissões de carbono e poluição e promovam a eficiência do uso da energia e dos recursos naturais prevenindo a perda de serviços dos ecossistemas e biodiversidade Os investimentos seriam catalisados e apoiados por reformas da política pública e modificações regulatórias A rota proposta de desenvolvi mento deveria manter realçar e onde necessário recuperar o capital natural visualizandoo como um bem econômico crítico para gerar benefícios públicos especialmente para populações pobres cujos sustento e segurança dependem essencialmente da natureza O estímulo ao envolvimento prioritário dos entes públicos e privados no qual a ação dos agentes externos privados ou públicos aparece como a solução é justamente a óptica criticada por Elinor Ostrom 2008 De acordo com a autora essa opção decorre de uma visão metafórica e específica contida na Tragédia dos Comuns de Garrett Hardin de 1968 e no Dilema do Prisioneiro proposto por modelo do mesmo autor além da Lógica da Ação Coletiva desenvolvida por Mancur Olson com a ideia do carona nas atividades conjuntas em uma comunidade em prol do bem público Elinor contesta a solução hoje de inter venção pela ação de um Estado coercitivo ou regulador ou pela definição da O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 26 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 propriedade por meio da privatização Empiricamente haveria uma lista enorme de insucessos nessas opções e as soluções deveriam ser sempre definidas caso a caso por meio de acordos entre os envolvidos para administrar o que ela chama os recursos de uso comum ou seja os bens públicos A autora descreve uma série de soluções reais alternativas à intervenção externa No documento do PNUMA a biodiversidade como exemplo de um bem público não seria valorada na economia neoclássica corretamente assim como os serviços ambientais os quais contribuiriam para o bemestar humano e o sustento de famílias e seriam fonte de novos empregos qualificados em razão da definição da propriedade Estimar adequadamente o valor econômi co desses serviços ambientais é fundamental para a identificação do capital natural Essa é uma das dimensões que sustentaria a transição para uma economia verde estimulando a mudança dos antigos indicadores econômicos e levandoos a estimar a perda de capital natural como componente negativo e não positivo das contas nacionais Será que somente a correta valoração desses elementos associada às condições propícias seriam condições sufi cientes para essa transição Como atribuir então novos parâmetros a uma economia verde se a discus são essencial da equidade e da participação local fica à margem A voracidade de consumo de recursos naturais e energéticos de países industrializados mostra que este não é um modelo de desenvolvimento que respeita a biosfe ra seus princípios e ritmo de regeneração O legado deixado pela opção do desenvolvimento baseado em combustíveis fósseis trouxe à tona questões globais como as mudanças climáticas e a destruição da camada de ozônio descortinando opções econômicas que se impuseram causando o abandono de inovações que poderiam ter sido estimuladas por sistemas nacionais de inovação que envolveriam PD aparato legal de estímulo e sistema paten tário como o foram os combustíveis fósseis Um exemplo importante seria o uso intensivo da biomassa por meio do BTL Biomass to Liquid ou BTG Biomass to Gas em um ritmo de crescimento apropriado à capacidade de regeneração dos recursos naturais A energia solar térmica e fotovoltaica eóli ca hidrogênio acumuladores mais eficientes etc seriam outros exemplos que não foram explorados adequadamente em detrimento de uma rota tecnológica predominante abandonando no passado outras opções Vale lembrar que Rudolf Diesel patenteou seu motor para trabalhar com óleos vegetais no caso de amendoim e mesmo antes de sua apresenta ção na Feira Mundial de Paris França em 1898 já existiam manufaturas de veículos com motores elétricos Estes últimos se proliferaram no transporte público com os bondes que posteriormente foram substituídos por veículos de combustão interna em várias cidades Caso não houvesse uma imposição de setores econômicos específicos essas tecnologias poderiam ter convivido e possibilitado uma partilha de todos os investimentos de sistemas nacionais O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 27 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 de inovação Nesse caso as opções hoje em termos de desenvolvimento das tecnologias consideradas como alternativas teriam sido muito mais promisso ras abrangentes e generalizadas Esse pequeno relato histórico traz outras questões relacionadas à economia verde atualidade e temporalidade Será que os problemas gerados pela economia praticada até hoje poderão ser superados com a adoção da opção econômica proposta pelo PNUMA nos próximos 20 anos como indicam as opções de cenário expostas em Rumo a uma economia verde caminhos para o desenvolvimento sustentável e a er radicação da pobreza O modelo de economia proposto não deveria ter sido adotado há mais tempo em razão das questões globais que hoje enfrentamos como o aquecimento global O momento já não é tardio Além portanto do acesso equilibrado aos recursos naturais e energéticos pela população do planeta seriam necessários o desenvolvimento de tecnolo gias com características das vocações regionais e a não imposição de uma rota tecnológica derivada de ganho de escala e lucro no curto prazo As tecnologias relacionadas à queima de combustíveis fósseis líquidos ou sólidos em ciclos termodinâmicos capazes de aproveitar de forma geral no máximo 30 da energia fornecida ao invés de alternativas mais elegantes como por exem plo a fabricação de polímeros tornamse exemplo da imposição de caminhos únicos dominados por grandes organizações globalizadas A cogeração de energia e sistemas fixos integrados de geração de energia elétrica e calor por exemplo são muito mais eficientes e proporcionariam rendimentos superiores em até 50 àqueles motores que equipam os automóveis A equidade temporal também seria um elemento bastante importante para ser levada em conta já que nos remete a uma das concepções do conceito de desenvolvimento sustentável contidas no Nosso futuro comum publicação resultante do Relatório Brundtland de 1987 O livro tem como uma das defini ções do conceito O desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração atual sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades Isso significa possibilitar que as pessoas agora e no futuro atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização humana e cultural fazendo ao mesmo tempo um uso razoável dos recursos da terra e preservando as espécies e o hábitat Este último elemento não aparece explicitamente no conceito de economia verde proposto pelo PNUMA mas aparece quando se previne a perda ou esgotamento de serviços ambientais e de biodiversidade A Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas além de acolher conceitos como o princípio da precaução e o das responsabilidades comuns porém diferenciadas traz também outro relacionado a uma economia internacional favorável e conducente ao crescimento e ao desenvolvimento sustentável em especial nas Partes países em desenvolvimento Essa per cepção de cooperação internacional é fundamental para que se tenha uma O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 28 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 transformação estrutural na economia A criação de sistemas nacionais de inovação integrados em sistemas internacionais promovendo tecnologias har mônicas com o meio ambiente voltadas para a conservação da biodiversidade e dos serviços ambientais livres de patentes e que revertem o processo de degradação do planeta tornase imprescindível Mecanismos de mercado ou de regulação de Estado estão longe de terem a vitalidade para uma mudança radical da relação com uma administração da casa planeta que harmonize a interação das atividades humanas com o meio ambiente biótico e abiótico Esses mecanismos ou não fornecem informações adequadas como é o caso do preço nos mercados ou não têm informações suficientes no caso do Estado Além disso esses mecanismos não parecem viabilizar o ritmo compatível com as necessidades de reversão do processo de degradação e de supressão da pobreza e fornecer qualidade de vida aos habitantes da biosfera Um sistema nacional de informação com objetivo específico na criação de alternativas pactuadas associando as partes interessadas poderia pesquisar e desenvolver tecnologias com viés sustentável e ambientalmente harmônico As ópticas Schumpeteriana e Neoschumpeterina fornecem alguns elementos importantes para repensar a economia Elas focam na tecnologia como vetor de transformação das sociedades humanas e trazem o conceito de destruição criativa que corrobora a ideia de utilizar a crise como elemento de alavanca além de visualizar não uma economia tendente ao equilíbrio mas sim um sis tema sempre em mutação se redesenhando a cada momento em que surgem novas opções ou seja outros paradigmas tecnológicos No caso da economia evolucionária poderia haver rupturas com os paradigmas convencionais para que se impusessem novas tecnologias que substituíssem as antigas No caso ambiental o que nortearia as rupturas seriam as opções tecnológicas cada vez mais limpas substituindo aquelas que se tornaram obsoletas climática e ambientalmente Esse caminho certamente não traria lucros extraordinários para os empreendedores pois ainda não teriam escala e competitividade mas levariam em conta as externalidades negativas causadas pelas tecnologias convencionais ambientalmente obsoletas Seriam necessários mecanismos de incentivo transitórios para que elas ganhassem escala e pudessem ganhar autonomia Esses incentivos seriam extraídos dos impactos negativos ou seja externalidades negativas das tecnologias convencionais Por exemplo o valor de internações hospitalares causadas pelo uso de transporte individual em grandes cidades que deixaria de ser pago pelo poder público caso se substituísse esse tipo de transporte no centro das mesmas por opções cole tivas sem emissão Nas reflexões contidas no documento do PNUMA na transição para uma economia verde estariam presentes dois tipos de mitos O primeiro referese a não coexistência simultânea de crescimento econômico e sustentabilidade ambiental O segundo diz respeito a uma interpretação de que a transição re O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 29 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 presentaria uma forma de os países ricos perpetuarem a pobreza dos países em desenvolvimento Para derrubar esses mitos os autores do documento utili zaram o modelo de projeção T21 Threshold 21 e simularam o comportamento de algumas variáveis gerando cenários para uma economia verde Além disso compararam esses resultados com os resultados de um modelo tendencial BAU business as usual e concluíram que existem inúmeras vantagens em se investir em capital natural A utilização de cenários para desdobramentos das condições atuais é uma ferramenta útil mas bastante frágil quando se trata de uma perspectiva de 20 anos como no caso proposto O modelo T21 foi concebido segundo os autores para apoiar um proces so de planejamento global e integrado de países Ele é composto por três pilares econômico social e governo sendo importante destacar que o pilar econômico é integrado pelos setores da agricultura indústria e serviços que são caracterizados por funções de produção CobbDouglas com entradas de trabalho capital e tecnologia Mahmoud e El Sebaei 2005 Nesse modelo de equilíbrio geral foram introduzidas variações na dinâmica de alguns seto res para verificar qual seria o impacto futuro no PIB emprego intensidade de recursos utilizados emissões e impactos no meio ambiente Oito setores principais foram escolhidos como aqueles com capacidade de definir tendên cias de transição para uma economia com alívio da pobreza investimento em capital natural e sua recuperação criação de empregos e melhoria da equidade social incentivos às energias renováveis e eficiência energética mobilidade e sustentabilidade urbana No primeiro deles o de florestas seriam necessários redução do desflo restamento e ampliação do reflorestamento certificação de produtos oriundos das florestas pagamento por serviços ambientais e REDD pressupondo mudanças legais e na governança local Certamente esse seria um caminho promissor mas vale lembrar que ainda não houve a regulamentação do REDD e que as atividades convencionais como pecuária e monoculturas exportado ras são grandes vetores contrários a essa perspectiva Seriam necessárias outras medidas relacionadas ao estímulo à prática de semiconfinamento ou confinamento pleno do rebanho para liberar áreas ao estímulo de uso de resíduos para geração de energia etc O segundo setor precisaria de mudanças na agricultura familiar e no agrone gócio em direção a práticas de gerenciamento da fertilidade do solo uso sus tentável e mais eficiente da água diversificação de sementes gerenciamento da saúde animal e vegetal nível apropriado de mecanização gerenciamento integrado de pesticidas e gerenciamento integrado de nutrientes Pressupõe também a redução ou eliminação de subsídios que distorcem o custo real de insumos agrícolas É interessante reforçar que as atividades integradas agrossilvopastoris são soluções não convencionais que como biodigestores que produzem o biogás e o biofertilizante merecem o devido destaque Vale O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 30 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 lembrar que sistemas integrados podem suprir grande parte das necessidades de energia e de matériasprimas de uma atividade rural tanto familiar como empresarial O resíduo quando bem utilizado nas atividades rurais tornase fonte de energia e biofertilizante O terceiro setor relacionase à escassez de água e pressupõe uma melhoria do gerenciamento da oferta e do uso eficiente das águas reservatórios de água e saneamento nos países em desenvolvimento associados às mudanças em arranjos institucionais Nesse caso o foco principal seriam os cuidados com os corpos hídricos hoje ameaçados pela poluição causada pela falta de sane amento Esse certamente seria o vetor principal para diminuição de doenças de veiculação hídrica e geração de condições de qualidade de vida para a população pobre na maioria dos países em desenvolvimento Na pesca o quarto setor indicase o manejo sustentável da pesca Pressupõese reforçar o gerenciamento da atividade e financiar a redução do excesso da capacidade mundial de pesca Nesse caso a óptica é claramente de intervenção externa o que pode dificultar soluções inovadoras relaciona das à marinocultura e outras práticas de repovoamento dos oceanos rios e lagoas Quanto ao quinto o ecoturismo este conduziria ao desenvolvimento da economia local e à redução da pobreza O esverdeamento do setor aumentaria a participação da comunidade local especialmente dos pobres na cadeia de valor do turismo reduzindo a pobreza As atividades turísticas muitas vezes não têm nenhum compromisso com as atividades locais e ao contrário degradam o local pois passam a se tornar destino de vários tipos de turistas que não têm compromisso de interação local mas sim lhes interessa usufruir unicamente do bem ambiental Será preciso uma mudança bastante acentuada de cultura no setor para que o turismo se torne um vetor de alívio de pobreza No que se refere às energias renováveis e eficiência energética sexto setor indicase o aumento da oferta de energia proveniente de fontes renováveis reduzindo os riscos de aumento dos preços voláteis dos combustíveis fós seis além de proporcionar benefícios de mitigação Haveria um considerável potencial para crescer nesse setor por meio de investimentos em energias renováveis incluindo biocombustíveis de segunda geração O esverdeamento nesse caso requereria investimentos em energia limpa em substituição a in vestimentos carbonointensivos bem como melhorias de eficiência energética Os investimentos em energias renováveis e políticas energéticas poderiam melhorar os padrões de vida e a saúde das populações Até a eclosão da crise econômica os investimentos em energias de fontes alternativas renováveis e eficiência energética vinham crescendo excluindo se fontes nucleares e grandes centrais hidrelétricas Em 2004 atingiram US 46 bilhões e foram multiplicados quase por cinco vezes em 2008 chegando O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 31 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 a US 173 bilhões praticamente 10 dos investimentos em infraestrutura energética no mundo conforme documento do PNUMA Somente em geração de energia elétrica atingiuse 42GW de potência instalada praticamente um quarto do total daquele ano 190GW As taxas percentuais de aumento dos investimentos que envolvem desde PD privado e de governos até progra mas de empresas privadas e agências de governo foram muito associadas à geração distribuída na qual a pequena produção descentralizada é priorizada ao invés da centralizada De acordo como o IPCC para se estabilizar a concentração de CO2 e em um patamar de 450 ppm em 2030 será necessária uma redução da ordem de 60 nas emissões de CO2 e em relação às emissões de 1990 Esse desafio significa que em poucas décadas será necessária uma completa reestruturação da infraestrutura energética no planeta Essas mudanças ainda não precisa mente estimadas giram em torno segundo o Relatório Stern de 1 do PIB mundial Isso significaria se levarmos em conta o PIB global de 2007 de US 54 trilhões que os valores necessários seriam de US 540 bilhões por ano Já a Agência Internacional de Energia sinaliza nas perspectivas de 2008 que será necessário um investimento de US 550 bilhões em energias de fontes alternativas renováveis por ano de hoje até 2030 para que se estabilizem as concentrações em 450 ppm de CO2 e No caso da New Energy Finances Global Futures estimase uma média anual de investimentos de US 515 bilhões Certamente esses valores são muito maiores hoje do que aqueles verificados nos anos antes da crise e seriam necessários pelo menos três anos de crescimento a 50 aa para que se atingissem os patamares necessários somente no setor de energia levandose em conta o patamar de 2009 de US 162 bilhões Formas de geração de energia distribuídas e associadas a outras atividades econômicas seriam fundamentais para essa transição Isto significa deixar os parâmetros de geração distribuída com tributação facilitada para a descentralização e o estímulo à autoprodução Nos transportes sétimo setor a melhoria da eficiência energética dos modais seria a mudança na lógica de transporte privado para transporte público ou para transporte não motorizado A mobilidade urbana está intimamente ligada à ocupação do território pelo homem A concentração que se observa nas últi mas décadas nos países em desenvolvimento compromete a sustentabilidade das cidades e estas acabam dominando um espaço muito além das suas fronteiras O ordenamento da ocupação do território urbano e o incentivo para reverter o fluxo migratório parecem elementos fundamentais para que o fluxo de veículos não continue a crescer nestes centros e comprometa ainda mais a saúde da população O uso de transporte público eletrificado e de qualidade e de outros alternativos é fator fundamental para que haja a transição E finalmente na indústria manufatureira proporseia prolongar a vida útil dos produtos fabricados por meio de maior ênfase no redesign remanufatura O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 32 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 e reciclagem os quais constituem o núcleo de produção em circuito fechado Este oitavo setor seria de vital importância Mas como diminuir o ritmo de crescimento da produção para uma população que também cresce Respeitar os ciclos da natureza e gerar resíduos em ritmo que esta possa absorvêlos parece o caminho mais correto É necessário no entanto lançar mão de instrumentos mais sofisticados como a análise do ciclo de vida para que se aumente a eficiência do uso dos recursos naturais e consequentemente dos energéticos diminuindo abruptamente a quantidade de matériasprimas nos bens de consumo e duráveis A União Europeia já adota o fator 4 de redução ou seja um quarto da quantidade de matériasprimas utilizadas para os novos produtos Já há países que sinalizam esta redução com um fator 10 Mudar a cultura do uso das commodities virgens para o uso em recicláveis gera conflitos setoriais bastante significativos Alterar o ritmo estabelecido do crescimento da produção de minério de ferro soja e carne é uma tarefa hercúlea Desma terializar a sociedade contemporânea parece ainda um sonho distante Usandose as mudanças nas variáveis propostas pelo documento e apli candoas ao modelo T21 os cenários de economia verde apontam para um crescimento mais rápido que aquele tendencial mantendo e restaurando o capital natural além de promover a redução da pobreza UNEP 2011 Essa aplicação guarda semelhança com o programa World 391 rodado para for mulação dos Limites do crescimento publicado pela primeira vez em 1972 depois reeditado como Além dos Limites em 1992 e finalmente republicado em 2004 com o título Limites de crescimento a atualização de 30 anos mos trando que ainda havia esperanças pois ainda não havíamos ultrapassado os limites sem retorno O modelo dos limites baseado na dinâmica dos sistemas de Jay Forrester funcionava de forma muito agregada e não levava em conta qualquer mudança política guerra ou escassez generalizada O segundo mito discutido no documento de que a transição representaria uma forma de os países ricos perpetuarem a pobreza dos países em desen volvimento encontra maiores problemas para ser derrubado De acordo com Kemp e Soete 1992 já estaríamos em uma transição da economia baseada nos combustíveis fósseis para uma economia de baixo carbono Nessa fase as atividades econômicas mais verdes utilizariam de forma predominante tecnologias endofpipe e algumas tecnologias mais limpas Para avançarmos na direção de uma economia de baixo carbono deveriam ser realizados inves timentos para a geração e difusão de tecnologias mais limpas A difusão de um conjunto de tecnologias mais limpas está condicionada a uma mudança na qual se fazem necessárias mudanças no marco institucional que dêem sustentação às atividades econômicas Uma reorientação das políticas edu cacionais e de ciência e tecnologia e uma integração das políticas ambientais com as de outras áreas também seriam necessárias O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 33 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 No longo prazo muitas atividades econômicas verdes serão decorrentes da convergência de tecnologias como a nanotecnologia biotecnologia e tecnolo gias de informação e de comunicação O documento do PNUMA chama atenção para o fato de que o modelo de transição da atual economia para a economia verde necessita de um marco regulatório bem planejado que gere incentivos para direcionar atividades econômicas verdes assim como remover barreiras a investimentos verdes No entanto a transição depende não só de inovações institucionais mas de inovações tecnológicas Algumas dessas inovações são complexas de natureza multidisciplinar requerem complementaridades entre empresas e institutos de pesquisa Miles e Leite 2010 ao citarem Roco 2007 identificam quatro gerações no processo de desenvolvimento de na notecnologias nanoestruturas passivas nanoestruturas ativas sistemas de nanossistemas tridimensionais e nanossistemas moleculares heterogêneos Apenas na primeira geração encontramos algumas evidências de esforços de pesquisa e geração de inovações em países em desenvolvimento Segundo Fonseca Bianchi e Stallivieri 2010 o cerne da biotecnologia mo derna se articula em torno dos conhecimentos básicos da engenharia genética ou seja biologia molecular genômica e proteômica Em 2009 no entanto do total de projetos em genomas 91 estavam concentrados nos Estados Unidos Inglaterra Japão França e Alemanha Se existe uma tendência das novas tecnologias serem dominadas pelos países desenvolvidos convém acrescentar uma reflexão adicional sobre transição sociotécnica Segundo Geels e Schot 2007 o regime sóciotécnico é uma versão estendida do regime tecnológico de Nelson e Winter 1982 que se refere a rotinas cognitivas compartilhadas em uma comunidade de engenharia que explicam padrões de desenvolvimento ao longo de trajetórias tecnológicas Os sociólogos da tecnologia ampliaram essa explicação argumentando que os cientistas tomadores de decisões políticas usuários e grupos de interesses especiais também contribuem para a padronização do desenvolvimento tecnológico Se existe um regime tecnológico dominado pelos países desenvolvidos que condiciona fortemente o desenvolvimento tecnológico dos países em desen volvimento é possível que sejam construídas janelas de oportunidade o que poderia ser particularmente favorável ao desenvolvimento de tecnologias mais limpas baseadas em nanotecnologia e em biotecnologia Certamente não existe nenhuma garantia de que isto seja feito já que a posse da tecnologia e das rotas de desenvolvimento agrega valor ao produto dos países desenvolvidos Quanto à formação profissional e às qualificações o documento enfatiza a necessidade de se requalificar a força de trabalho tendo em vista a rees truturação produtiva necessária à transição para uma economia verde Essa ênfase é particularmente importante para a mudança na matriz energética que os países desenvolvidos estão realizando Também é destacado no documento que o recuo dos investimentos em ativos pesqueiros gerará uma O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 34 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 necessidade de requalificação dos trabalhadores desse setor Além disso vale a pena assinalar que de acordo com a OCDE 2011 pessoas qualificadas desempenham um papel crucial na inovação através de novos conhecimentos que elas geram do modo como adotam e adaptam ideias existentes e de sua capacidade de aprender novas competências e de se adaptarem a um ambiente em mudança A OCDE destaca ainda a importância de se conhecerem os diferentes tipos de qualificação que contribuem para a inovação e as melhores formas de construílas de modo a desenhar políticas que contribuam para um desenvolvimento duradouro de tais qualificações Nesse sentido a OCDE aponta também que as qualificações para a inova ção poderiam ser qualquer habilidade proficiência competência ou atributo que contribua para a implantação de novos produtos processos métodos de comercialização ou de métodos de organização no local de trabalho Quando se trata de estabelecer algum tipo de medição o foco recai sobre o grupo de signado por recursos humanos em ciência e tecnologia RHCT Os RHCT são as pessoas envolvidas ou que tenham a formação adequada para serem en volvidas na produção desenvolvimento divulgação e aplicação da sistemática científica e tecnológica do conhecimento Dentro de RHCT os pesquisadores constituem um grupo importante pois a eficácia dos gastos em PD depende criticamente da alocação eficiente dos trabalhadores diretamente envolvidos na execução de PD A quantidade desses trabalhadores é portanto um importante indicador da capacidade científica e tecnológica de uma nação Em 2006 existiam cerca de quatro milhões de pesquisadores trabalhando em PD nos países da OCDE ou seja uma proporção de 74 pesquisadores por 10000 empregados OCDE 2011 Embora não se tenha um indicador equivalente para os países em desenvol vimento e como os índices de conclusão de cursos superiores são mais baixos podemos inferir que tais países apresentam uma expressiva diferença em sua capacidade de gerar inovações em relação aos países desenvolvidos Desse modo se os países em desenvolvimento não tiverem políticas claras e se não forem adotadas regulações internacionais que favoreçam a transferência de tecnologias dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento o segundo mito pode se tornar realidade O documento do PNUMA traz outro ponto delicado ao discutir o conceito e associálo a setores que mais geram emissões de gases do efeito estufa antrópicas nos países em desenvolvimento como agricultura e florestas re lacionados ao uso da terra Os países desenvolvidos são ainda os que mais emitem em conjunto e os setores responsáveis por grande parte das emissões nesses países como a geração de energia convencional a carvão transpor te e edificações ficaram praticamente de fora da discussão à exceção de transporte e energias renováveis Seria preciso explicitar a parte que cabe aos desenvolvidos e sugerir soluções para descarbonizar as suas economias e O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 35 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 mecanismos para que contribuam efetivamente para esverdear as economias daqueles em desenvolvimento Assim sendo o documento parece apresentar uma visão excessivamen te otimista em relação aos efeitos da transição Uma efetiva transição para uma economia verde ocorreria se houvesse uma alteração na óptica sobre as soluções preponderantes contidas no relatório do PNUMA como aquelas associadas à intervenção do Estado regulador ou à definição dos direitos de propriedade por meio da privatização proposta pelos neoliberais As soluções locais parecem dar uma pista e podem se tornar importante elemento indutor de inovações vocacionais associadas às partes interessa das A busca de soluções flexíveis nas quais haja uma maior participação das comunidades afetadas parece ser um fator decisivo para uma transição dese jada O questionamento da voracidade por recursos naturais e energéticos por parte dos países desenvolvidos em detrimento dos países em desenvolvimento parece um elemento fundamental A equidade no uso destes recursos sem dúvida tornaria o mundo mais solidário e fraterno rumo a uma economia mais harmônica com o meio ambiente lançandose mão de outras linhas teóricas além da neoclássica para busca de alternativas à rota degradadora que se assiste atualmente REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Debier J C Deléage J P e Hermery D 2002 Uma história da energia Brasília Edunb Fonseca M G D Bianchi C e Stallivieri F 2010 Biotecnologia no Brasil uma avaliação do seu potencial empresarial e industrial Brasília SENAI Geels F W Schot J 2007 Typology of sociotechnical transition pathways Research Policy Amsterdam 36 399417 Houaiss A 2001 Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa Rio de Janeiro Ed Objetiva Kemp R e Soete L 1992 The greening of technological progress an evolutionary perspective Futures 245 437457 Lovelock J 2001 Gaia um modelo para dinâmica planetária e celular In W I Thompson org Gaia uma teoria do conhecimento 3ª ed São Paulo editora Gaia Mahmoud A S e El Sebaei N M Ed 2005 Procedimentos do Workshop T21 Model as a tool for studying the future of development in developing countries Cairo Center for Future Studies Meadows D e Randers J 2007 Limites do crescimento a atualização de 30 Anos Rio de Janeiro Qualitymark Miles I e Leite E 2010 Nanotecnologia oportunidades para a indústria e novas qualificações profissionais Brasília SENAI Nelson R R e Winter S G 1982 An evolutionary theory of economic change Belknap Press Cambridge Mass and London Nobre M e Amazonas M C 2002 Desenvolvimento sustentável a institucionalização de um conceito Brasília IBAMA OCDE 2011 Skills for innovation and research Paris OECD ONU 1994 CQNUMC Ostrom E 2008 Governing de commons the evolution of institutions for collective action 22nd printing Cambridge University Press Passet R 1979 Léconomique et le vivant Paris Payot UNEP 2011 Towards a green economy pathways to sustainable development and poverty eradication A synthesis for policy makers Disponível em wwwuneporggreeneconomy O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia verde Alexandre dAvignon Luiz Antônio Cruz Caruso 36 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 economia verde eou desenvolvimento sustentável DONALD SAWYER1 Além de governança internacional e redução da pobreza a conferência Rio20 em 2012 terá como tema central a economia verde ONU 2011 Esse termo que surgiu no contexto da Rio92 Adams 1997 foi recentemente elaborado e divulgado mundo afora em relatório do PNUMA UNEP 2011 Em pouco tempo tornouse praticamente consensual Belinky 2011 Parece apresentarse como alternativa ao desenvolvimento sustentável que havia sido consagrado no Rio de Janeiro em 1992 A economia verde está relacionada diretamente a mudanças climáticas baixo carbono eficiência energética energia renovável etc Gouvello 2010 ESMAP 2010 No intuito de relativizar a fortíssima ênfase em clima depois de 2007 a biodiversidade e os ecossistemas foram reincorporados no dis curso por meio da iniciativa TEEB organizada pelo PNUMA e financiada pela Comissão Europeia e governos europeus2 Sukhdev 2010 2011 Por outro lado os impactos ambientais referentes à poluição industrial e aos resíduos urbanos a agenda marrom e à água superficial e subterrânea a agenda azul continuam sem a mesma atenção Os fluxos de água atmosférica rios aéreos que poderiam ser uma agenda branca continuam invisíveis nas esferas políticas Salati 2009 Arraut et al 2011 O tratamento que será dado à economia verde fará muita diferença para as políticas públicas o papel do Estado a governança que temos atualmente os padrões de produção e consumo e os rebatimentos nos diversos territórios no Brasil e no mundo Os efeitos positivos esperados poderão não se verificar como também poderão surgir efeitos negativos inesperados ao menos se não houver uma análise adequada de todos os aspectos em jogo O uso do termo economia verde aparentemente no lugar de desenvolvi mento sustentável termo considerado desgastado ou esvaziado FASE 2011 merece uma série de cuidados Urge evitar que os efeitos acabem sendo 1 Professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília CDS UnB e pesquisador associado ao Instituto Sociedade População e Natureza ISPN Este trabalho foi realizado com apoio da União Europeia por meio dos projetos Elos Ecossociais entre as Florestas Brasileiras Meios de Vida Sustentáveis em Paisagens Produtivas FLORELOS e Environmental Governance in Latin America and the Caribbean ENGOV entre outras fontes mas não representa necessariamente os pontos de vista das instituições ou fontes sendo de responsabilidade exclusiva do autor 2 Alemanha Países Baixos Noruega Suécia e Reino Unido 37 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 insignificantes ou mesmo perversos especialmente na medida em que o foco fica desviado para assuntos e espaços geográficos menos importantes sem manter os diversos ecossistemas funcionando e sem atender às necessidades humanas atuais e futuras Apesar das semelhanças e do apelo mercadológico economia verde implica grande risco de se transformar em algo muito diferente de desenvolvimento sustentável Ainda que limitado e vago o termo desenvolvimento sustentável Brundtland 1987 e seu significado explícito atendimento às necessidades do presente sem prejudicar o atendimento às necessidades das futuras gerações foram consagrados por todos os países do mundo em 1992 Há que se levar em conta que qualquer linguagem diplomática consensual ainda mais quan do acordada globalmente é necessariamente vaga Acontece que economia verde além da falta de respaldo político pode ser pior que desenvolvimento sustentável em termos de seu significado implícito e seus possíveis usos e abusos Por tratar do atendimento às necessidades da presente e futuras gerações ou seja no fundo por compreender a equidade intra e intergeracional o de senvolvimento sustentável é necessariamente sistêmico A economia verde por outro lado poderá não passar do acréscimo superficial de alguns setores ou camadas adicionais Pode se resumir a atividades ou projetos verdes atu almente na moda tais como painéis fotovoltaicos moinhos eólicos parques nacionais remotos pontos de reciclagem de lixo hortas orgânicas e pousadas ecoturísticas na selva sem mudar o principal que são os padrões de produção e consumo insustentáveis A economia verde facilmente acaba se tornado lavagem verde cosmética greenwashing Economia verde por meio de valoração monetária e instrumentos eco nômicos tende a reduzir tudo a dinheiro a valores monetários prevendo pagamentos feitos por poluidores e recebidos por prestadores de serviços ambientais World Bank 2010 Não se trata necessariamente de ambienta lismo de mercado FASE 2011 mas não é verdade que tudo é ou deve ser mercadoria Não há como evitar o cálculo de custos e benefícios e a realidade do mundo financeiro mas também nem tudo na sociedade na população e na natureza são bens ou serviços Não há mercado de seres humanos culturas direitos saúde flora fauna ou funções ecológicas Pior ainda dificilmente haverá dinheiro suficiente no Brasil ou no mundo para pagar por todos os serviços ambientais existentes Por exemplo para fins de raciocínio se as Reservas Legais e APPs previstas no Código Florestal brasileiro tiverem uma área total de 100 milhões de hectares e os donos rece berem apenas R 200 por hectare por ano para não desmatar essas áreas valores conservadores o total anual seria R 20 bilhões O Programa Bolsa Família custa R 15 bilhões por ano Seria possível o governo gastar mais com pagamentos por serviços ambientais do que com Bolsa Família O Banco Economia verde e ou desenvolvimento sustentável Donald Sawer 38 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Mundial estima que o Brasil precisaria de R 342 bilhões por ano para reduzir as emissões de carbono Agência Brasil 2010 World Bank 2010 Outros estimam R 20 bilhões EFE 2010 Enquanto isso o governo está tentando com dificuldade cortar R 50 bilhões do seu orçamento O PSA tem amplo apelo mas merece questionamentos Amazonas 2010 Pirard et al 2010 Um dos riscos de pagar alguns produtores por seus ser viços prestados é que sugere que os outros todos que não receberem esses pagamentos não são obrigados a se comportar corretamente Outro risco é a sugestão de que quem começa com PSA mas depois deixa de receber a qualquer momento tem direito de destruir Existe ademais o problema do carona Nesse caso produtores rurais que não protegem a natureza beneficiamse gratuitamente dos serviços prestados pelos produtores que sacrificam a produção em benefício da natureza Existem também questões éticas fundamentais Seria correto pagar alguém para não fazer mal aos outros As externalidades negativas não devem ser incorporadas pelos produtores em vez de serem simplesmente repassadas aos contribuintes ou consumidores Por outro lado as externalidades positivas exigem remuneração Se houver compensação como pode ocorrer no caso de pagamentos internacionais não há uma espécie de indulgência pagandose para poder continuar pecando poluindo Quanto às transferências internacionais de novos e adicionais recursos financeiros de países desenvolvidos para países em desenvolvimento pode se insistir na cobrança sem dúvida mas também não se deve esperar muito especialmente no caso de países relativamente desenvolvidos como o Brasil que ainda pretende ocupar um lugar de liderança mundial Está claro que as prioridades dos doadores serão as pequenas ilhas e a África É importante perceber que existem interesses econômicos por trás das novas propostas De um lado mudar o substantivo de desenvolvimento com diversas dimensões ao menos social e ambiental se não outras para eco nomia pinça apenas uma das dimensões Tende a empoderar os economistas e seus instrumentos econômicos no lugar de regulação estatal que é taxada de comando e controle Natureza tornase capital natural Essa abordagem teria um fundo corporativista profissional De outro lado muitos governos empresários e ONGs estão buscando oportunidades de negócios verdes e de administração dos fundos a serem estabelecidos Governança internacional ou global por sua vez tende a empoderar o PNUMA ou uma agência sucessora para ganhar recursos financeiros e subir de status para se transformar em uma superagência internacional especia lizada eventualmente com poder de polícia internacional Se isso ocorrer sua atuação seria em grande medida controlada pelos doadores os países desenvolvidos Economia verde e ou desenvolvimento sustentável Donald Sawer 39 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Ao mesmo tempo a governança internacional ou global contradiz a sobera nia que continua sendo um princípio fundamental praticamente sagrado Ainda que problemática em termos práticos a soberania só deve ser relativizada em casos extremos de violações graves não na gestão de rotina no diaadia Seria mais coerente e defensável se esses casos fossem aprovados pelas Nações Unidas não apenas por uma agência especializada O apelo do adjetivo verde parece ter sido apropriado indevidamente de movimentos políticos como os partidos verdes e também de movimentos ambientalistas como Greenpeace Paz Verde os quais pouco ou nada compartilham dos princípios em que se baseia a economia verde À primeira vista verde teria mais a ver com meio ambiente que sustentabilidade mas na realidade fecha o leque em diversos sentidos Sustentabilidade não é apenas verde mas abrange todas as cores situandose além do arcoíris O discurso de economia verde está bem elaborado em termos de capital natural redução de pobreza baixo carbono eficiência energética inovação agenda verde e governança global características aparentemente interes santes No entanto devese levar em conta que todos esses conceitos ou terminologias também podem ser jeitinhos engenhosos para substituir ou relegar a soberania a equidade a natureza as funções ecológicas o uso sustentável os direitos fundamentais humanos e de cidadania e a redução de emissões inclusive usando e sequestrando carbono entre outros valores importantes Na prática há que se lembrar que mudanças verdes tópicas e pontuais podem servir para evitar a mudança sistêmica A economia verde corre o risco de se limitar a gestos simbólicos ou seja tokenism que serve para manter o status quo para a maior parte do meio ambiente da sociedade e da economia Pode perpetuar o foco quase exclusivo na floresta amazônica em detrimento de outros biomas e das áreas urbanas onde vive a maioria da população Enfim serve para não dizer que os governos não estão fazendo o que deviam ou se comprometeram a fazer Assim existem diversos possíveis efeitos perversos inesperados da econo mia verde que devem ser levados em conta As propostas existentes parecem ignorar os efeitos bumerangue rebound e de culatra backfire decorrentes do aumento de eficiência Não consideram que alguns poucos empregos verdes embora por si só positivos podem eliminar muitos empregos convencionais na medida em que implicam a substituição de força de trabalho por tecnologia moderna capital Mais do que promover inovação e patentes um discurso utilizado por alguns cientistas para justificar investimentos em pesquisa MCT 2010a 2010b pa íses como o Brasil precisam de aplicação de tecnologia básica já conhecida Precisam mais de competência do que inovação O Brasil tem carência de Economia verde e ou desenvolvimento sustentável Donald Sawer 40 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 engenheiros mãodeobra qualificada para a construção civil motoristas de caminhões e tratores eletricistas capacitados e professores em todos os níveis As estradas e pontes caem ou são obstruídas a energia elétrica falta cons tantemente o desempenho educacional deixa muito a desejar Melhorar essa situação não exige tecnologia nova transferida de países desenvolvidos No final das contas a economia verde pode favorecer os ricos e os países centrais Embora não confunda crescimento sustentado com desenvolvimento sustentável que é um erro comum permite manter a prioridade para o cresci mento do PIB qualificado de verde de forma pouco crítica Latouche 2005 deixar de lado a vulnerabilidade e a adaptação às mudanças climáticas Lahsen 2010 e justificar os incentivos ou subsídios para diversos lobbies verdes Enfim para equivaler ao desenvolvimento sustentável a economia verde não pode ser pontual e empresarial com políticas voltadas somente para isso Teria que ser necessariamente pública no sentido amplo implementada por meio de políticas que garantam direitos a todos e mantenham as funções ecossistêmicas interligadas Ou seja teria que seguir um enfoque socioecos sistêmico assumido pelo Estado considerando todos os territórios Alguns dos participantes do processo estão conscientes e atentos a essas questões O diplomata chinês responsável pela coordenação da organização da Rio20 Sha Zukang insiste em que se trata de economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da redução de pobreza Para ele que tem forte respaldo político não se trata de economia verde isoladamente mas apenas no contexto econômico e social mais amplo Diversas outras visões de futuro são possíveis Bursztyn 2008 Sachs 2010 Machado 2010 Sanwal 2011 Abramovay 2009 Lesbaupin 2010 Prins 2010 Martins 2010 Também surgiram recentemente novas propostas anti capitalistas latinoamericanas como os direitos da natureza Pacha Mama contra a mercantilização da natureza Bacarji 2010 UNDP 2010 O diálogo seria desejável e no âmbito das Nações Unidas necessário O mais importante de tudo seria ver o que pode ser feito aqui e agora sem tratados ambiciosos agências de governança global novos recursos financei ros e novas tecnologias Sawyer 2011 Caberia muita ação nacional bilateral regional e entre países emergentes Se não as boas intenções podem gerar resultados inócuos ou negativos De imediato o desenvolvimento sustentável poderia ser operacionalizado em termos de direitos fundamentais já existentes tanto humanos que são universais quanto de cidadania que são nacionais ESCRNet et al 2010 IISD 2010 Lusiani 2010 Santilli 2005 Sousa 2010 Varella Leuzinger 2008 Direitos referemse a valores éticos Grasso 2010 Também implicam deveres Os direitos de alguns acabam onde começam os direitos dos outros Os direitos das futuras gerações de atendimento a suas necessidades depen Economia verde e ou desenvolvimento sustentável Donald Sawer 41 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 dem de deveres das presentes gerações Essa abordagem realista com base jurídica é possível Enfim tanto a economia verde quanto o desenvolvimento sustentável podem e devem ser promovidos O primeiro seria mais concreto instrumental e po pular e o segundo mais abstrato diplomático e governamental A abordagem econômica adjetivada de verde pode sensibilizar tomadores de decisão e aplacar desenvolvimentistas especialmente nos países em desenvolvimento No entanto não se deve perder de vista os avanços de 1992 que foi um marco na história da humanidade ou da Carta da Terra e todo o caminho percorrido nos últimos vinte anos O que importa são as necessidades do planeta e das futuras gerações que dependem da manutenção de funções ecossistêmicas com ou sem recursos adicionais novas tecnologias e novas formas de go vernança global REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Abramovay R 2009 Dezembro 10 Muito mais que o clima discutese o capitalismo Valor Econômico p D10 Adams W M 1997 Green development environment and sustainability in the Third World Londres Routledge Agência Brasil 2010 Novembro 11 Banco Mundial diz que Brasil precisa de R342 bi por ano para reduzir emissões de carbono Amazonas M C 2010 Pagamento por serviços ambientais dilemas conceituais e normativos Brasília Instituto Sociedade População e Natureza ISPN Arraut J Nobre C Barbosa H M J Obregon G e Marengo J 2011 Southward moisture flow from Amazonia seasonal aerial rivers and subtropical rainfall in South America São José dos Campos INPE No prelo Bacarji C D 2010 Direitos da Mãe Terra projeto de declaração gera polêmica Envolverde 22 abr Belinky A 2011 Rumo à Rio 2012 considerações sobre a 1ª reunião intersessional preparatória São Paulo Instituto Vitae Civilis Brundtland G H et al 1987 Nosso futuro comum Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Nova York ONU Bursztyn M 2008 Think locally act globally new challenges to environmental governance Cambridge Sustainability Science Program Kennedy School of Government Harvard University EFE 2010 Novembro 11 Brasil precisa de US 20 bilhões por ano para reduzir emissões de gases Folha de São Paulo Ambiente ESCRNet International Network for Economic Social and Cultural Rights and Center of Concern et al 2010 Guidelines for a human rights approach to economic policy in agriculture Nova York Kuala Lumpur ESMAP Energy Sector Management Assistance Program 2010 Low carbon development for Brazil Washington World Bank Low Carbon Growth Country Studies Program Mitigating Climate Change through Development FASE 2011 Rio20 resistir ao ambientalismo de mercado e fortalecer os direitos e a justiça 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Informação Legislativa v45 no179 julset p397402 World Bank 2010 Economics of adaptation to climate change synthesis report Washington World Bank 136p Economia verde e ou desenvolvimento sustentável Donald Sawer 43 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono1 EDUARDO VIOLA2 cOnSIdeRaçõeS InIcIaIS Uma dimensão fundamental de uma economia internacional verde é a baixa intensidade de carbono e esse será o foco deste artigo A transição consistente para uma economia verde supõe a redução contínua das emissões de carbono nos países desenvolvidos a diminuição acelerada da curva de crescimento de emissões com início anterior a 2020 e o estabelecimento de ano de estabiliza ção nos países emergentes de renda média além da diminuição acelerada da intensidade de carbono do PIB globalmente No caso dos países ricos deveria haver uma acelerada diminuição das emissões per capita e no caso dos países de renda média uma acelerada redução da intensidade de carbono do PIB e uma leve e continuada queda das emissões per capita Os países pobres teriam ainda espaço para um crescimento das emissões per capita As emissões de gases estufa cresceram 3 durante a primeira década do século 21 segundo informações da Netherlands Environmental Assessment Agency3 Incluindo os dados de desmatamento de diversas fontes parciais para Brasil e Indonésia os principais países emissores em 2009 foram China responsável por 24 do total mundial e crescimento anual durante a última década de 5 EUA com 19 das emissões totais e crescimento anual de 08 União Europeia 27 países com 15 do total crescendo 03 ao ano Índia com 7 do total crescendo 6 ao ano Rússia com 5 do total e crescimento anual de 5 Brasil com 4 do total crescendo 4 ao ano até 2004 e com drástica redução entre 2005 e 2009 Indonésia com 4 crescendo 4 ao ano Japão com 35 crescendo 04 ano México com 25 do total crescendo 2 ao ano Canadá com 2 do total crescendo 15 ao ano África do Sul com 15 do total crescendo 2 ao ano Coreia 1 Artigo preparado para ser publicado pela Conservação Internacional em volume especial sobre economia verde 2 Professor titular do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília coordenador da Rede de Mudança Climática e Relações Internacionais e pesquisador sênior do CNPq 3 O mais importante instituto produtor de dados sobre emissões de gases do efeito estufa do mundo 44 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 do Sul com 15 do total crescendo 07 ao ano e Arábia Saudita com 15 do total crescendo 6 ao ano Esses 13 países considerando a União Europeia como uma unidade são responsáveis por mais de 80 das emissões globais e constituem os dois grupos cruciais das grandes potências e das potências médias As grandes potências compartilham três caraterísticas muito relevantes primeiro e fun damental cada uma é responsável por uma alta proporção das emissões globais de carbono no mínimo 15 e do PIB global segundo elas detêm um forte capital tecnológico e humano para a descarbonização da economia e terceiro elas detêm poder de veto sobre qualquer acordo intenacional glo bal que seja efetivo As potências médias têm relevância limitada em termos de participação nas emissões e na economia global e nenhuma delas por si mesma tem capacidade de veto sobre um acordo internacional global As grandes potências são três EUA China e União Europeia e somam 54 do PIB global e 58 das emissões globais de carbono A União Europeia está isolada na defesa de uma arquitetura global efetiva para a transição rápida para uma economia de baixo carbono EUA e China resistem a um acordo global sobre a transição para o baixo carbono As potências médias são dez Índia Rússia Brasil Indonésia Japão México Canadá África do Sul Coreia do Sul e Arábia Saudita A severidade da crise econômica de 2008 abriu uma limitada janela de oportunidade para uma transformação parcial de valores nos países desen volvidos e emergentes na direção da diminuição da importância atribuída ao imediatismo o que favoreceu a percepção da gravidade da questão climática Como a crise econômica é sistêmica o processo de recuperação em curso atualmente não significa a volta a uma situação similar à existente antes de setembro de 2008 Diferentemente do que teriam imaginado em meados de 2008 a grande maioria dos economistas e analistas internacionais uma parte substancial dos pacotes de estímulo econômico iniciados em novembro de 2008 em vários países chave destinouse a impulsionar a transição para uma economia de baixo carbono 65 do aumento dos gastos na Coreia do Sul 35 na China 20 no Reino Unido 20 na Alemanha e 15 nos EUA Stern 2009 Já Brasil Índia África do Sul Indonésia e Rússia tiveram desempenho muito pobre nessa questão Este artigo está organizado em quatro partes Na primeira analizamse a situação atual e principais políticas das grandes e médias potências na transi ção para uma economia verde de baixo carbono Na segunda parte resume se a situação específica da América do Sul na transição Na terceira parte são descritos os principais vetores tecnoeconômicos na transição global para a economia verde de baixo carbono Por último na quarta parte fazse uma reflexão sobre as perspectivas futuras da transição em nível mundial Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 45 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 1 aS gRandeS pOtêncIaS e aS pOtêncIaS MédIaS na tRanSIçãO paRa UMa ecOnOMIa de baIxO caRbOnO Os EUA continuam sendo o país mais importante nas negociações inter nacionais sobre o clima por ser o segundo grande emissor e por continuar tendo o maior potencial de inovação tecnológica de impacto mundial na di reção do baixo carbono Giddens 2009 Os EUA emitem anualmente 58 bilhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente correspondentes a 19 do total de emissões mundiais 19 toneladas per capita e 04 toneladas de carbono por cada US 1000 de PIB É um dos países com maior taxa de emissões per capita do mundo É uma economia que opera com relativa alta eficiência energética e baixa intensidade de carbono em termos globais mas que apresenta uma das mais altas intensidades entre os países desenvolvidos superada apenas por Canadá e Austrália devido à combinação de matriz energética baseada no carvão e petróleo com a alta utilização do avião e do automóvel individual no transporte As emissões dos EUA crescem 08 ao ano neste século Existe uma forte diferença entre os primeiros seis meses do governo Oba ma e o período posterior No início houve sinais de que a nova administração enfocaria as crises econômica e climática como processos interligados e que deveriam ser resolvidos simultaneamente dando um impulso decisivo para a descarbonização da economia O programa econômico de emergência para a recuperação de curto prazo da economia era compatível com as metas de médio e longo prazo da plataforma Obama expansão das energias renováveis upgrade da rede de transmissão elétrica nacional promoção do transporte coletivo particularmente trens de alta velocidade nas regiões metropolitanas e incentivos a todos os setores econômicos que criassem novos empregos verdes em geral O programa de emergência era diferente de um programa clássico de expansão do gasto público e era sinérgico com o objetivo estraté gico de aumentar a segurança energética Friedman 2009 A lei Waxman de energia e clima que impunha um sistema de tetos e cotas de emissão de carbono foi aprovada pela Câmara de Deputados em junho de 2009 e ficou paralisada no Senado no segundo semestre em função da prioridade dada pela administração Obama à reforma da saúde até ser abandonada oficialmente pelos democratas em julho de 2010 Em início de 2011 o quadro era muito diferente dos primeiros meses de governo Obama com um fracasso de suas principais iniciativas Vários fatores explicam esse fracasso polarização bipartidária extrema no Congresso norteamericano com consequente paralisia legislativa e crise de governabilidade alta taxa de desemprego erodindo a popularidade de Obama derrota do Partido De mocrata nas eleições legislativas de 2010 ofensiva do Partido Republicano contra o IPCC em função de alguns erros cometidos no relatório de 2007 e de procedimentos duvidosos de formação de consenso onda de frio extrema no Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 46 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 inverno de 2010 na Costa Leste americana que foi utilizada demagogicamente pelo Partido Republicano como demonstração de exageros cometidos na avaliação do perigo do aquecimento global ofensiva agressiva do lobby de empresas de petróleo carvão cimento aço e eletricidade contra a aprovação da lei climática porque supostamente implicaria perda de competitividade para a indústria norteamericana limites à promoção dos investimentos verdes em função dos graves déficits fiscais e crescimento da dívida pública e diversos surveys mostrando um forte crescimento da proporção da população norte americana que acredita que estaria sendo exagerado o risco do aquecimento global Viola 2010 Expressamse no Congresso norteamericano importantes resistências com respeito a compromissos de redução de emissões A maior parte delas é derivada da inexistência de compromissos de redução por parte dos grandes países emergentes particularmente da China Também existem resistências mais estruturais capitaneadas pelos setores econômicos fortemente asso ciados à matriz energética fóssil estados produtores de carvão petróleo aço e empresas de energia elétrica baseadas na produção de termoelétricas a carvão De outro lado quase todas as grandes empresas dos setores de menor intensidade de carbono têm posições favoráveis à significativa redução de emissões No setor de informação e comunicação temse Google Apple Microsoft Oracle e CNN em biotecnologia energias renováveis e nuclear há a General Electric entre as grandes cadeias varejistas está o Wall Mart produtores de insumos de construção verde também figuram entre aqueles que apoiam a redução de emissões entre outros atores Os EUA têm uma margem importante para redução de emissões através de mudança de tecnologia de termoelétricas para carvão limpo tecnologias mais limpas e utilização de captura e estocagem de carbono expansão das energias eólica solar biocombustíveis e nuclear diminuição de tamanho e aumento dos padrões de eficiência dos automóveis modernização da rede de transmissão elétrica e estabelecimento de novos padrões verdes de construção prédios e casas desenhados ou reformados para reduzir emissões A União Europeia composta por 27 países emite 45 bilhões de toneladas de carbono equivalente correspondentes a 15 do total mundial 10 tonela das per capita e 03 tonelada de carbono por cada US 1000 de PIB A União Europeia é muito heterogênea tanto em termos de emissões per capita indo das 22 toneladas de Luxemburgo até as 4 toneladas da França e de Portugal quanto de intensidade de carbono baixa nos países nórdicos Alemanha Reino Unido e França média na Espanha Bélgica e Itália e alta na Polônia República Checa Romênia Bulgária e países bálticos As emissões da União Europeia crescem 05 ao ano como resultado da quase estabilidade das emissões de Alemanha Reino Unido e Suécia e do crescimento acelerado das Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 47 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 emissões de Espanha Portugal Grécia e dos países do Leste Europeu ainda que estes últimos estejam abaixo de sua linha de base de 1990 As principais lideranças políticas da União Europeia dos últimos anos têm estado a favor de uma ação incisiva para mitigar o aquecimento global destacandose os governos e opiniões públicas do Reino Unido Alemanha Suécia França e Dinamarca acompanhados embora com menos ênfase pela Holanda Bélgica e Finlândia Contudo a crise econômica de 20089 e a consequente instabilidade na eurozona erodiram fortemente a capacidade europeia de liderar a transição para uma economia verde A China emite 65 bilhões de toneladas de carbono equivalente por ano correspondente a 24 das emissões globais 6 toneladas per capita e 15 toneladas de carbono por cada US 1000 do PIB Tratase de uma economia muito intensiva em carbono devido à sua matriz energética fortemente base ada em carvão e petróleo e notadamente à sua baixa eficiência energética Mesmo que a intensidade de carbono do seu PIB esteja caindo 5 ao ano na última década o país ainda detém uma intensidade de carbono 9 vezes superior à do Japão e 4 vezes superior à dos EUA Contrariando o senso co mum as emissões per capita da China são médias e não baixas O custo de redução de emissões da China é alto no caso de se continuar com o modelo atual de industrialização mas seria viável com reorientação para um modelo mais baseado no mercado interno com crescimento da produtividade em lugar do modelo baseado na expansão exportadora No ano de 2007 as emissões mundiais de gases estufa cresceram 33 em relação a 2006 e 50 desse crescimento ocorreram na China sendo que por sua vez 23 do crescimento na China ocorrem por causa da queima de carvão Mais importante ainda que reduzir o consumo de petróleo para o mundo é a redução da queima de carvão e para isso é decisiva uma drástica mudança na forma como o carvão chinês e também o indiano é consumido As tecnologias de captura e sequestro de carbono de carvão limpo e a energia nuclear são muito importantes para a China A posição do governo chinês nas políticas energéticas e climáticas nacio nais bem como nas negociações internacionais foi negligente até 2006 mas a partir de então houve mudanças baseadas na avaliação da vulnerabilidade da China à mudança climática O governo incentivou fortemente o cresci mento da energia eólica e solar e anunciou seu objetivo de reduzir o ritmo do crescimento das emissões Esse objetivo refletiuse no Plano Nacional de Mudanças Climáticas e no pacote de estímulo econômico anticrise aprovado em novembro de 2008 com uma proporção de 35 do gasto público orientado para a transição para uma economia de baixo carbono Existe na China uma clivagem entre forças globalistas e forças nacionalistas sendo que o poder das primeiras cresce continuamente e elas mostramse crescentemente orientadas a mudar a posição chinesa no sentido da responsabilidade global Contudo Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 48 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 a posição chinesa de negociação internacional mantevese atrasada compa rada à sua nova política energética A China continua negandose a assumir compromissos relacionados ao estabelecimento de um pico de emissões e de um ano de estabilização anterior a 2020 como demandado pela comunidade científica internacional e pela União Europeia EUA e Japão sendo esse um dos fatores que aumenta o poder de fogo dos conservadores no Congresso americano No campo tecnológico destacase em 2009 o grande avanço tec nológico de eficiência e de produtividade das empresas taiwanesas de energia solar fotovoltaica e a formação de joint ventures para investimento maciço na China num amplo programa denominado cidades de baixo carbono A partir de 2009 tornase possível afirmar que existem duas Chinas em termos de carbono de um lado uma China tradicional fortemente predominante e que é uma máquina produtora e exportadora de emissões de carbono de outro lado uma nova China de baixo carbono minoritária mas que cresce a uma extraordinária velocidade devido à altíssima capacidade de poupança e investimento do país e que criará um novo empresariado do baixo carbono com interesses contraditórios com a China tradicional Partese a seguir para uma análise das potências médias A Índia emite anualmente 22 bilhões de toneladas de carbono equivalente correspondentes a 6 do total de emissões globais 17 toneladas de carbono per capita e 14 toneladas por cada US 1000 de PIB Entretanto apresenta baixa taxa de emissões per capita e elevada intensidade de carbono devido à baixa eficiência energética e ao alto peso do carvão e petróleo em sua matriz energética Contudo tem desenvolvido a energia solar fotovoltaica e a eólica em proporções bem superiores às do Brasil embora inferiores às da China A Índia tem desenvolvido parcialmente a produção de etanol por ser o maior produtor de açúcar do mundo embora a maior parte dessa produção destine se à alimentação humana As emissões da Índia crescem 6 ao ano sendo que este país na década de 2010 substituirá a China como país que mais emite gases do efeito estufa no mundo A posição do governo indiano tem sido historicamente negligente como a do chinês e não tem mudado até hoje Algumas comparações devem ser feitas entre a Índia e a China já que o comportamento de suas sociedades são cruciais para o presente e para o futuro em função do crescimento dramático de suas contribuições ao aque cimento global A Índia é muito mais vulnerável à mudança climática do que a China considerando que uma parte fundamental de sua população depende das águas que nascem no Himalaia sob soberania chinesa país que tem ten tações crescentes de desviar os rios para consumo de sua imensa população e cujos glaciais estão em retração por causa do aquecimento global Além disso a Índia tem uma parte importante de sua população vivendo em terras baixas sujeitas a monções e choques devastadores entre a circulação atmos férica terrestre e oceânica A Índia é um regime democrático mesmo que de Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 49 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 baixa qualidade pela herança das castas com a presença de um importante movimento ambientalista que contesta com ambivalência até hoje a posição oficial A população média indiana tem uma orientação menos materialista que a chinesa por causa da religião e por isso é mais sensível ao estado do pla neta O governo da Índia é muito fragmentado e ineficiente o que torna muito mais difícil que ocorra lá uma mudança na direção de menor intensidade de carbono do que na China A Índia com 17 toneladas de carbono per capita não poderia ser demandada internacionalmente na mesma medida que a China 6 toneladas per capita e o Brasil 10 toneladas per capita e teria portanto ainda significativo espaço de carbono a ser ocupado em detrimento de países desenvolvidos e de países de renda média A Rússia emite 2 bilhões de toneladas de carbono equivalente por ano correspondente a 5 das emissões globais 14 toneladas por habitante e 13 tonelada de carbono por cada US 1000 de PIB A Rússia é uma economia com altas emissões per capita e alta intensidade de carbono constituindo um perfil único entre as grandes economias do mundo É uma sociedade que enriqueceu bastante na última década mas tem baixa eficiência energética e matriz energética fortemente baseada em combustíveis fósseis sendo grande exportador de petróleo e gás A Rússia ocupa uma posição extremamente singular no quadro mundial Por ser uma economia cujo principal patrimônio é a superabundância de combustíveis fósseis percebese como potencial perdedora na transição para uma economia de baixa intensidade de carbono Contudo uma parte importante das elites e formadores de opinião percebe ao menos até o verão extremadamente quente de 2010 que o aquecimento global poderia lhes ser favorável porque aumentaria extraordinariamente as terras agricultáveis O Japão emite anualmente 16 bilhão de toneladas de carbono equivalente correspondentes a 35 do total mundial 12 toneladas por habitante e 015 toneladas de carbono por cada US 1000 de PIB O Japão é junto com países da União Europeia como França Suécia e Dinamarca a economia com menor intensidade de carbono do mundo devido à altíssima eficiência energética e ao grande peso da energia nuclear na sua geração elétrica O Japão tem uma opinião pública e uma parte importante do seu empresariado Honda e Toyota são emblemáticos favoráveis a uma rápida transição para uma economia de baixo carbono mas seu papel de liderança na arena internacional está aquém das suas potencialidades devido à sua política externa de perfil baixo e mais recentemente aos efeitos negativos do acidente nuclear de Fukushima A Indonésia aumentou suas emissões durante a primeira década do século em função de amplo desmatamento de florestas de turfa com grande estoque de carbono O Canadá tem o pior desempenho entre os países desenvolvidos O grande crescimento da produção de petróleo na província de Alberta e o fato de que a exploração dos recursos naturais está regulada no nível provincial Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 50 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 e não federal são os principais fatores explicativos do atraso canadense O México adotou em 2007 sob a presidência de Calderón um plano nacional de mudanças climáticas avançado e assumiu uma posição internacional de vanguarda mas a nova retórica não tem correspondência forte no comporta mento dos agentes econômicos Em 2008 a África do Sul anunciou metas de estabilização e pico de emissões colocandose à frente dos grandes países emergentes pertencentes ao G77 A Coreia do Sul manteve nos últimos anos um perfil que a situa na vanguarda na transição para uma economia de baixo carbono Arábia Saudita tem mantido historicamente uma posição muito con servadora nas negociações internacionais e tem exercido um papel decisivo na regulação do preço de petróleo devido à sua capacidade de exploração e refino ser muito superior à produção média o que lhe permite aumentar rapi damente a produção em função de choques de demanda ou de oferta Isso é de fundamental importância porque o nível do preço internacional do petróleo é essencial para o desenvolvimento amplo de investimentos em energias limpas Poderiase dizer que a Arábia Saudita tenderá sempre na defesa de seu estreito interesse nacional a evitar uma subida excessiva do preço do petróleo por um período prolongado o que aceleraria extraordinariamente os investimentos em energias renováveis Em síntese à luz da conjuntura de maio de 2011 a formação de uma aliança descarbonizante vitoriosa no mundo depende em primeiro lugar de mudanças positivas nos EUA e depois de uma aceleração da nova política energética chinesa iniciada em 2008 As mudanças nos EUA afetariam positivamente a China num timing relativamente rápido Uma vez produzidas essas mudan ças nos EUA e China uma coalizão de EUA União Europeia Japão China Brasil Coreia do Sul México e África do Sul poderia constranger a Rússia Índia Arábia Saudita e Indonésia a acelerar medidas descarbonizantes nas suas respetivas economias As negociações substanciais desse processo aconteceriam em múltiplas arenas bilaterais EUAChina ChinaUE e EUAUE trilaterais EUA China UE e plurilaterais G20 no qual Coreia do Sul e Brasil poderiam ter um ativo e crucial papel reformista frente a outras potências médias conservadoras e finalmente seriam legitimadas no âmbito multilateral da ONU 2 aMéRIca dO SUl na tRanSIçãO paRa UMa ecOnOMIa de baIxO caRbOnO A América do Sul emite anualmente aproximadamente 3 bilhões de tonela das de dióxido de carbono equivalentes As emissões de dióxido de carbono indústria energia transporte desmatamento e mudança do uso da terra metano pecuária lixo reservatórios hidrelétricos e óxido nitroso fertilizantes na agricultura somadas da região totalizaram em 2009 aproximadamente 7 das emissões globais de carbono Uma singularidade da América do Sul Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 51 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 é que as emissões de dióxido de carbono derivadas do desmatamento e mu dança de uso da terra eram proporcionalmente muito altas até 2005 A taxa de desmatamento nos últimos 5 anos cresceu muito na Bolívia Equador e Paraguai aumentou moderadamente em Peru e Colômbia mantevese estável na Venezuela e caiu levemente na Argentina e fortemente no Brasil As taxas de desmatamento como proporção da cobertura florestal total oscilam desde 1 ao ano na Bolívia até 01 ao ano na Argentina sendo de 02 ao ano no Brasil nos últimos anos O Uruguai é o único país com saldo positivo já que está aumentando sua cobertura florestal via reflorestamento e florestamento A Venezuela e a Argentina respondem cada uma por aproximadamente 1 das emissões globais As emissões per capita da Venezuela são de 7 toneladas e as da Argentina de 5 toneladas A Venezuela emite 13 toneladas de carbono por US 1000 de PIB e a Argentina 1 tonelada A Colômbia o Peru e o Chile são responsáveis aproximadamente por 05 das emissões globais cada um O desmatamento na América do Sul tem um triplo efeito negativo sobre as sociedades Em primeiro lugar implica uma grande destruição de recursos naturais e uma conversão muito ineficiente da floresta Em segundo lugar faz com que a proporção de economia informal seja alta no conjunto da economia com grande ineficiência sistêmica devido ao fato de que a economia associada ao desmatamento é em geral de pequena escala e ilegal ou semilegal Em terceiro lugar o desmatamento desmoraliza a autoridade pública e o império da lei gerando assim um ambiente propício para o crescimento de outras atividades ilícitas como corrupção contrabando narcotráfico prostituição tráfico de armas e de animais silvestres e inclusive assassinatos Embora a América do Sul seja muito vulnerável à mudança climática o conjunto da região encontrase numa posição muito favorável para a transição para uma economia de baixo carbono Muito diferente é a situação de grandes países emergentes em outras regiões do mundo China Índia Rússia África do Sul México que produzem grande parte de sua eletricidade a partir de combustíveis fósseis A eletricidade da América do Sul é a mais intensivamente hídrica do mundo 85 do total no caso do Brasil 37 na Argentina 67 na Venezuela 75 na Colômbia 53 no Chile 80 no Peru 62 no Equador 64 na Bolívia 99 no Uruguai e 100 no Paraguai Inclusive a Venezuela que tem uma economia mais intensiva em carbono pela ineficiência do trans porte derivada do baixo preço da gasolina tem um grande peso hídrico na geração de eletricidade O Brasil emitiu em 2009 aproximadamente 18 bilhão de toneladas de carbono equivalente correspondente a aproximadamente 4 das emissões globais 10 toneladas per capita e 09 tonelada de carbono por cada US 1000 de PIB As emissões do Brasil nos anos 20052010 sofreram uma forte redução com referência ao período 20012004 devido à dramática queda da taxa de Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 52 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 desmatamento na Amazônia de uma média anual de 20000 km2 para uma média anual de 11000 km2 entre 2005 e 2010 chegando a uma cifra muito baixa em 2010 6200 km2 Assim como o Brasil a maioria dos países da América do Sul Colômbia Equador Peru Bolívia e Paraguai poderia diminuir significativamente suas emissões de carbono através da redução do desmatamento A Argentina e Uruguai têm muito a ganhar em termos de conservação da energia e com isso poderiam crescer economicamente com emissões estabilizadas A estrutura de preços de energia na Argentina é irracional tanto do ponto de vista econômico quanto das emissões de carbono O Chile que é o país mais rico da América do Sul tem muita margem para aumentar a eficiência energética e padrões de emissões dos seus veículos Já é mais eficiente energeticamente e tem uma economia de maior produtividade média que lhe permitiria incorporar mais rapidamente novas tecnologias climáticas que estão emergindo nos países desenvolvidos A Venezuela tem também uma boa margem para diminuir a intensidade de carbono através de três vetores eliminação dos subsídios diretos e indiretos ao consumo de petróleo que tornam a frota de automóveis desse país uma das mais irracionais do mundo aumento da conservação de energia elétrica onde há bastante espaço para ganhos e redução do desma tamento Até agora as estruturas de integração regional na América do Sul Mercosul Comunidade Andina UNASUL e OTCA não têm se dedicado à problemática da transição para uma economia de baixo carbono A OTCA institucionalizada em 2004 funcionou até 2009 num nível apenas formal particularmente devido ao baixo interesse do governo brasileiro Esse é mais um dos paradoxos da política sulamericana do Brasil já que a produtividade de recursos financeiros e institucionais alocados nessa estrutura de cooperação poderia ser muito alta combinando combate ao ilícito transnacional e ao desmatamento ilegal e promovendo o estado de direito A partir de 2010 os governos do Brasil Colômbia e Equador passaram a dar mais importância a OTCA o que tende a fortalecer a organização Brasil deveria assumir o custo da liderança através de políticas e recursos financeiros brasileiros em várias dimensões promoção da segurança pública nas zonas fronteiriças e combate ao ilícito transnacional promoção da infraestrutura de transportes em todas as modalidades mas particularmente hidroviária ferroviária e aérea promoção do desenvolvimento energético integrado particularmente no setor hidrelétrico no qual o Brasil e a região têm vantagens competitivas em escala mundial e promoção de uma rede regional de laboratórios de biodiversidadebiotecnologia com forte aporte de capital americano europeu e japonês Uma tarefa decisiva de cooperação internacional na Amazônia é o estabelecimento de um Painel Amazônico de Mudança Climática e Biodiversidade nos moldes do IPCC Essa instituciona lidade é fundamental para desenvolver a governança regional na Amazônia Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 53 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 3 vetOReS tecnOecOnôMIcOS glObaIS paRa a tRanSIçãO paRa UMa ecOnOMIa veRde de baIxO caRbOnO Para a transição consistente e rápida para uma economia internacional de baixo carbono seria necessário um grande acordo internacional em uma escala muito superior à do Protocolo de Quioto que deveria ser apoiado por uma série de mudanças comportamentais bem como por desenvolvimentos tecnológicos e econômicos simultâneos e complementares A literatura dos últimos anos assinala uma série de vetores para essa transição A lista de vetores abaixo foi sintetizada pelo autor 1 Acelerar o ritmo de crescimento da eficiência energética esse crescimento acontece normalmente na história do capitalismo mas seu ritmo precisa ser incrementado no uso residencial e industrial nos transportes e no planeja mento urbano Aumentar a reciclagem em todos os níveis da cadeia produtiva e no consumo 2 Aumentar a proporção das energias nãofósseis renováveis eólica solar biocombustíveis e hidrelétrica na matriz energética mundial A energia hidre létrica tem sido plenamente competitiva durante todo o século passado e a competitividade das energias eólica solar e dos biocombustíveis desenvolveu se extraordinariamente na última década em função de avanços em grandes e médias potências faltando apenas na maioria dos países marcos regulatórios apropriados que criem os incentivos para que seu crescimento seja mais vi goroso A experiência recente com os biocombustíveis mostra que apenas o etanol de cana é muito efetivo em termos de redução de emissões o etanol de milho e beterraba e todo o biodiesel mostraram importantes limitações até o presente Já o etanol de segunda geração de celulose aparece como uma alternativa fundamental a dúvida nesse caso diz respeito à rapidez com que essa tecnologia estará disponível em grande escala 3 Aumentar a proporção de energia nuclear na matriz energética mundial aproveitando a significativa melhoria na tecnologia dos reatores do ponto de vista da segurança na operação mesmo que permaneça sem solução o proble ma do depósito definitivo do lixo atômico e a vida útil de reatores antigos pouco seguros além disso existem perspectivas de desenvolvimento de reatores nucleares de quarta geração A expansão da energia nuclear é fundamental para acelerar a descarbonização em várias potências como EUA China Índia Rússia Indonésia e México 4 Desenvolver arquiteturas reguladoras que promovam o uso de carros híbri dos gasolinaelétrico e gasolinaetanol que já atingiram plena maturidade em termos de competição com carros convencionais Aumentar o uso do transporte coletivo e diminuir o uso do carro Utilizar carros menores e mais leves Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 54 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 5 Diminuir drasticamente o desmatamento hoje responsável por 14 das emissões globais reflorestar áreas desmatadas e tornar florestadas as áre as que nunca tiveram florestas mas que são hoje apropriadas para florestas homogêneas de rápido crescimento 6 Incrementar a utilização de técnicas agropecuárias que são virtuosas no ciclo do carbono como plantio direto irrigação de precisão e rações de gado que gerem menos metano Diminuir o consumo de carne bovina nos países de renda alta e média possibilitando que o aumento do consumo desse alimento por parte das populações pobres não imponha uma pressão excessiva sobre as emissões de metano 7 Usar eficientemente a água no consumo doméstico agrícola e industrial e expandir o saneamento básico em todo o planeta Apropriada disposição do lixo e esgotos com eixo em usinas de metano 8 Promover uma rápida estabilização da população do planeta entre 2020 e 2025 e regimes de aposentadoria correspondentes com os incrementos de expectativa de vida aproximadamente 68 anos para homens e mulheres nos países de renda alta e média e sistemas de saúde que promovam o estilo de vida saudável a longevidade com qualidade de vida e que minimizem gastos gigantescos para prolongar a vida com péssima qualidade no último ano de vida como tem ocorrido nos dias atuais 9 Acelerar o desenvolvimento das tecnologias de captura e sequestro de carbono separando o dióxido de carbono tanto do carvão quanto do petróleo e injetandoo novamente nas jazidas já exploradas que sejam de alta estabi lidade do ponto de vista geológico 10 Diminuir a proporção de reuniões presenciais particularmente as que envolvam viagens aéreas e aumentar as reuniões via teleconferência Frear o crescimento do transporte aéreo Desenvolver aviões com materiais mais leves desenho mais aerodinâmico e maior eficiência energética 11 Acelerar o desenvolvimento da célula de hidrogênio que será certamente a energia do futuro Ela provavelmente não terá um papel significativo antes de 2050 mas seu desenvolvimento dará um sinal claro de que a transição para uma economia de baixo carbono é profunda e irreversível 12 Estabelecer acordos internacionais que promovam pesquisas integradas interinstitucionais para o desenvolvimento de novas tecnologias de ponta para descarbonizar a matriz energética Algumas delas já se encontram em estágio inicial como o aproveitamento da energia das marés e ondas turbinas eólicas de altitude elevada e nanobaterias solares Criar um ambiente cultural e ins titucional global favorável à imbricação e sinergia entre as novas tecnologias energéticas e as revoluções na tecnologia da informação e comunicação e a da nanotecnologia Promover o desenvolvimento de pesquisas de geoenge Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 55 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 nharia climática com o objetivo de ter um plano B alternativo no caso de uma aceleração exponencial do aquecimento global 13 A transição para uma economia verde de baixo carbono supõe uma profunda transformação dos valores dominantes na sociedade internacional hipermaterialismo consumismo imediatismo e desconsideração do longo prazo e para isso sempre cumprirão um papel importante as transformações em todos os níveis da educação formal e da atuação da mídia classicamente chamada de educação ambiental mas que hoje deveria chamarse educação para uma sociedade sustentável de baixo carbono que conscientizem as populações sobre a importância dessa mudança de valores e sobre os ex traordinários ganhos em qualidade de vida e felicidade que seriam derivados dela muito mais importantes que algumas perdas de curto prazo em consumo irracional que serão uma consequência da transição para uma sociedade descarbonizada temida por vastos setores das populações do mundo 4 peRSpectIvaS fUtURaS O ano de 2009 mudou profundamente a economia política internacional da mudança climática A herança de Quioto que deixava os EUA e os gran des países emergentes fora do constrangimento de carbono desintegrouse Ladislaw 2010 Barret 2010 O Acordo de Copenhaguen é extremamente débil do ponto de vista jurídico mas é quase universal do ponto de vista do constrangimento das emissões de carbono É praticamente impossível que se avance no sentido de um novo tratado abrangente e juridicamente vincu lante antes que os EUA aprovem uma lei climática que obrigue a reduções quantificadas de emissões Dada a dinâmica política atual isso dificilmente acontecerá na melhor das hipóteses antes de 201314 num cenário otimista supondo a reeleição do presidente Obama em novembro de 2012 uma vitó ria democrata em ambas câmaras do Congresso e uma decisão de Obama de priorizar a lei climática no inicio do segundo termo Outro fator que incide sobre as perspectivas de um acordo global muito importante é a tensão entre EUA e a União Europeia de um lado e China do outro lado devido à negativa da China em relação à uma revalorização significativa do Yuan A questão da revalorização do Yuan pode estar gerando uma coligação antichinesa por parte dos países que se vêem invadidos por mercadorias chinesas em função da manutenção ou aumento de sua capacidade exportadora Os países amea çados pela máquina exportadora chinesa incluem a maioria dos membros do G20 O Brasil como forte exportador de commodities para a China está numa posição intermediária seu setor produtor de minérios e alimentos é favorecido pela dinâmica chinesa e seu setor manufatureiro é prejudicado As dimensões econômica e de segurança do sistema internacional têm impacto decisivo sobre a dimensão climática e é necessário leválas em conta prioritariamente em qualquer análise realista sobre o futuro da negociação Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 56 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 climática As tensões entre países superavitários e deficitários no comércio internacional particularmente em relação à China podem limitar ou mesmo parar os avanços de governança econômica global no G20 acontecidos du rante 2009 O sistema internacional pode estar em reversão da dinâmica de despolarização cooperativa acontecida em 2008 e 2009 Caso predomine uma dinâmica de aumento moderado de conflito no sistema internacional nos próximos anos isso será suficiente para que não exista avanço para um novo tratado internacional de clima mesmo que seja aprovada uma lei climática consistente nos EUA em 2013 Nesse contexto a transição mundial para uma economia de baixo carbono será muito lenta e um dos seus principais instrumentos internacionais será o estabelecimento de barreiras ao comércio de produtos intensivos em carbono No caso da Rússia e da Índia a grande maioria dos setores estariam ameaça dos No caso da China o cenário seria mais complexo já que em função dos grandes avanços em energia eólica e solar a proporção de produtos de baixa intensidade de carbono hoje muito baixa tenderia a aumentar rapidamente na pauta de exportações chinesas Caso predomine uma tendência de cooperação e continuidade da despo larização no sistema internacional nos próximos anos e Obama seja reeleito em 2012 é provável que a posição norteamericana mude de grande potên cia conservadora para grande potência reformista na questão de um acordo global constrangendo o carbono Também é provável que em aliança com União Europeia Japão Canadá Coreia do Sul Brasil México e África do Sul os EUA consigam persuadir China Rússia e Índia a estabelecer picos de emissão e anos diferenciados de estabilização anteriores a 2020 para China e Rússia e entre 2025 e 2030 para Índia considerando que as emissões per capita da Rússia são quase o dobro das chinesas e cinco vezes maiores que as indianas e as emissões chinesas são três vezes maiores que as indianas Viola e Machado Filho 2010 Num sistema internacional onde predominam forças de convergência são favorecidas as forças mais globalistas e descarbonizantes da China Do ponto de vista da tecnologia do baixo carbono existem alguns pequenos países que terão impacto mundial por serem muito avançados tecnologicamente Israel Taiwan Singapura Suíça e Noruega A variável principal para aumentar a cooperação e produzir acordo descarbonizante no sistema internacional é a flexibilização do direito de propriedade intelectual na área de tecnologias de baixo carbono O mapa não é simples nessa questão já que alguns países emergentes estarão na ponta da tecnologia de baixo carbono em algumas áreas Por exemplo a China precisaria de flexibilização na área de energia nuclear e etanol de segunda geração mas não em eólica e solar onde vários países de renda média e baixa precisariam de transferência de tecnologia chinesataiwanesa O Brasil precisaria de flexibilização da propriedade inte Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 57 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 lectual nas áreas de energia eólica e solar fotovoltaica mas estaria na ponta e deveria transferir a países de renda média e baixa nas áreas de hidreletricidade e etanol de primeira geração Um novo e grande interrogante é por quanto tempo se manterá no Brasil a defasagem entre a política climática com metas de redução de emissões e a posição de negociação que mantém o país atrelado à China e Índia que têm políticas climáticas muito mais conservadoras Em função dos interesses do poder relativo dos diversos setores econômicos brasileiros e da dinâmica da opinião pública é provável que essa defasagem não se mantenha por muito tempo e que a posição de negociação brasileira convirja com as da União Europeia do Japão e da Coreia do Sul REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Barret S 2010 Contrasting future path for an evolving climate regime Global Policy 1 Friedman T 2009 Hot flat and crowded Why we need a green revolution and how it can renew America New York Farrar Strauss and Giroux Giddens A 2009 The politics of climate change Londres Polity Press La Viña A 2010 Ways forward after Copenhagen reflections on the climate change negotiations process by the REDDplus facilitator Manila Foundation for International Environmental Law and Development Ladislaw S 2010 A postCopenhagen pathway Washington Center for Strategic and Interntional Studies Stern N 2009 The global deal Climate change and the creation of a new era of progress and prosperity Nova York Public Affairs Viola E 2010 A política climática global e o Brasil 20052010 Tempo do Mundo vol 1 n 2 Brasília IPEA Viola E e Machado Filho H 2010 Os BICs Brasil Índia e China e as negociações de mudança climática Rio de Janeiro Centro de Estudos de Integração e Desen volvimento Breves 35 Perspectivas internacionais para a transição para uma economia verde de baixo carbono Eduardo Viola 58 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 economia verde na américa latina as origens do debate nos trabalhos da cePal MÁRCIA TAVARES1 O significado preciso do termo economia verde ainda é objeto de um debate ao qual certamente contribuirão outros artigos neste volume É provável que o termo venha a adquirir significados diferentes em países e contextos diferentes No contexto da preparação para a Rio20 a Resolução 64236 da Assem bleia Geral 2010 especifica que o termo a ser usado é economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza grifo nosso Essa qualificação reflete quatro décadas de diálogo entre governos de países desenvolvidos e em desenvolvimento sobre meio ambiente economia e desenvolvimento marcadas pela sequência de conferências globais sobre o assunto a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano em Estocolmo em 1972 a Rio 92 e a Rio10 em 2002 às quais se soma o processo preparatório para a Rio20 Havia em 1972 em 1992 e em 2002 e continua havendo hoje resistência à imposição por uns aos outros da maneira em que devem ser tratadas essas relações de como devem ser definidas as prioridades nas políticas nacionais e a importância relativa atribuída aos dife rentes desafios do desenvolvimento e da preservação do meio ambiente Essa tensão junto com visões diferentes do papel da cooperação internacional e da importância das responsabilidades históricas é visível na definição de desen volvimento sustentável da Comissão Brundtland em vários dos princípios da Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento nas dificuldades em se chegar a um acordo sobre mudanças climáticas e agora nos debates entre governos sobre economia verde Desde o começo dos anos 70 a CEPAL exerce duas funções no que se refere às relações entre economia e meio ambiente e a partir do final dos anos 80 à promoção do desenvolvimento sustentável Em primeiro lugar apoia a articulação entre os governos da região em processos políticos internacionais Esse papel foi reforçado no contexto dos processos internacionais relaciona dos ao desenvolvimento sustentável a partir da Agenda 21 em 1992 do plano 1 Márcia Tavares é oficial de Assuntos Econômicos da Divisão de Desenvolvimento Sustentável e Assentamentos Humanos da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe CEPAL As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade da autora e não coincidem necessariamente com as da CEPAL 59 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 de implementação de Johanesburgo de 2002 e da reformulação da forma de operar da Comissão de Desenvolvimento Sustentável CDS em 2003 Hoje a CEPAL é o órgão das Nações Unidas encarregado de levar adiante o processo regional preparatório para a Rio20 na America Latina e Caribe Em segundo lugar desde sua fundação em 1948 a CEPAL é um centro de pensamento sobre a economia latinoamericana e a partir de 1984 caribenha e sobre sua inserção no contexto internacional2 No exercício de ambas as funções foram realizados ao longo do tempo trabalhos institucionais ou de autores vinculados à CEPAL que abordaram especificamente as relações entre meio ambiente e economia e outros que abordaram o assunto indiretamente ao tratar de outros aspectos do desenvolvimento da região Este artigo extrai algumas das ideias principais de trabalhos realizados no âmbito da CEPAL entre o começo dos anos 70 e o começo dos anos 90 em momentos chave do debate sobre as relações entre economia e meio ambiente ou sobre desenvolvimento sustentável Algumas das questões tratadas dos enfoques adotados ou até da linguagem nesses documentos podem ter perdido relevância ou atualidade mas seus argumentos centrais continuam importantes para informar o debate sobre economia verde e a forma que tomará o conceito na América Latina Permitem avaliar a complexidade dos problemas ambientais da região e sua estreita ligação com estruturas e processos econômicos e sociais As referências abaixo não fazem jus à riqueza dos textos Esperase suscitar o interesse pelos textos originais como referências históricas 1 eM pRepaRaçãO paRa a cOnfeRêncIa de eStOcOlMO MeIO aMbIente hUManO e O deSenvOlvIMentO ecOnôMIcO na aMéRIca latIna 1971 Uma das primeiras aproximações da CEPAL ao tema ambiental foi por meio da organização em 1971 de uma reunião preparatória para a Conferência de Estocolmo 1972 Para essa reunião a CEPAL publicou um estudo em colaboração com o Instituto LatinoAmericano de Planejamento Econômico e Social ILPES e o escritório regional da FAO CEPAL 1971 O documento identificava como fonte principal das más condições ambientais da região seu escasso nível de desenvolvimento e a deficiente distribuição da renda A industrialização necessária para o desenvolvimento teria gerado novos problemas Assim argumentavase coexistiam na América Latina em maior grau do que em outras regiões os problemas ambientais característicos do subdesenvolvimento e aqueles relacionados ao progresso tecnológico Não falta nesse documento a perspectiva das relações de dependência do caráter Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 2 Para um panorama do pensamento da CEPAL até os anos 90 ver Bielschowsky 1998 e 2009 60 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 periférico da região e da heterogeneidade estrutural que dominaram o pensa mento da CEPAL na década imediatamente anterior Bielschowsky 1998 Influenciado pelo relatório de Founex escrito alguns meses antes3 o argu mento dominante é o de que o desenvolvimento é condição para assegurar condições ambientais desejáveis Implicitamente o documento reagia a teses que contrapunham crescimento e qualidade ambiental como a dos limites do crescimento Ressaltava por outro lado o dilema da alocação de recursos entre os objetivos de melhorar as condições ambientais e avançar no desenvolvimento O dilema estava presente tanto no que se refere à alo cação de recursos públicos quanto nas decisões empresariais Em relação a essas últimas ilustravase a dificuldade das empresas de desenvolver e adotar técnicas mais modernas e menos poluentes devido à escassa capaci dade tecnológica e à necessidade de manter competitividade baixos custos e preços no mercado internacional O documento de 1971 identificava os principais problemas ambientais nas áreas urbanas e rurais as dificuldades em assegurar uma expansão de ser viços públicos urbanos compatível com o ritmo de crescimento da população urbana e os problemas da contaminação industrial Mostrava a relação entre a estrutura de produção agrícola e a geração de grandes contingentes de pessoas desempregadas ou subempregadas que passam a usar terras mar ginais com pouca capacidade de gerar excedentes ou a compor a crescente população urbana marginalizada Trata de outros problemas que continuam a dominar as agendas regional e internacional como os desafios de assegurar recursos energéticos para populações e economias crescentes os efeitos da mineração sobre o meio ambiente e sobre a saúde dos trabalhadores e o uso ineficiente da água Também trata da dificuldade de desenvolver tecnologia própria compatível com a realidade e o meio ambiente locais Tal como seria posteriormente consolidado tanto nos acordos de 1992 quanto no 7o Objetivo do Milênio sustentabilidade ambiental o documento sustenta a necessidade de integrar a problemática ambiental às políticas públicas Já enuncia a lógica do ciclo de vida na produção e no consumo mostrando como materiais como o algodão seriam mais competitivos do que materiais sintéticos se se conside rassem os custos de uma disposição adequada depois do uso um assunto que ainda em 2011 buscase promover no contexto da CDS Comissão de Desenvolvimento Sustentável da CEPAL As conclusões levam ao debate sobre meios de implementação dos compro missos internacionais sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável que hoje se trava no âmbito da preparação para a Rio20 inclusive na discussão sobre economia verde a preocupação com restrições comerciais e com a Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 3 Relatório de Founex sobre desenvolvimento e meio ambiente apresentado pelo grupo de especialistas convocado pelo secretáriogeral da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano 4 a 12 de junho Founex Suíça 61 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 adaptação da indústria a necessidade de transferência tecnológica e apoio financeiro e a indissociabilidade entre economia desenvolvimento social e meio ambiente fundamento do conceito de desenvolvimento sustentável 2 eStIlOS de deSenvOlvIMentO e MeIO aMbIente 1980 Durante grande parte dos anos 1970 o trabalho da CEPAL esteve centrado no que veio a chamarse de estilos de desenvolvimento4 A origem dessa linha de trabalho estava na percepção de que apesar de que a região tivesse conseguido bons resultados em termos de crescimento e industrialização esse processo tinha acontecido com a exclusão de amplos setores da sociedade agravando o desemprego o subemprego e a pobreza e acumulando tensões políticas Buscavase entender e responder aos estilos de desenvolvimento dos países da região vistos no contexto dos estilos preponderantes internacional mente O diagnóstico revelava que um estilo de desenvolvimento ascendente de caráter transnacional impunhase sobre os estilos de desenvolvimento dominantes em cada país Esse enfrentamento de estilos juntamente com as forças sociais existentes contribuiu para a heterogeneidade estrutural5 que caracteriza os países periféricos dentro do sistema capitalista outro concei to chave da literatura econômica produzida no seio da CEPAL nos anos 70 Bielschowsky 1998 Sunkel 1980 Os trabalhos sobre estilos de desenvolvimento não consideravam a dimensão ambiental de maneira explícita Respondendo a essa deficiência entre 1978 e 1980 CEPAL e PNUMA desenvolveram um projeto intitulado Estilos de Desen volvimento e Meio Ambiente Essa foi a base para o trabalho da CEPAL na área de meio ambiente ao longo dos 20 anos seguintes Gligo 2006 Os resultados do projeto inicial foram reunidos em dois volumes publicados em 19806 e resu midos num artigo introdutório de Osvaldo Sunkel 1980 Este último relaciona os problemas ambientais da região com o processo de desenvolvimento da América Latina entre o período colonial e o final dos anos 1970 e principalmente com a ascendência do estilo transnacional a partir do pósguerra De acordo com Sunkel 1980 os estilos de desenvolvimento dos países que hoje são desenvolvidos incluindo as opções de consumo infraestrutura Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 4 Foram várias ao longo do tempo as definições de estilos de desenvolvimento Sunkel 1980 cita definições complementares às de Aníbal Pinto e Jorge Graciarena tradução livre a maneira em que dentro de um determinado sistema se organizam e assignam os recursos humanos e materiais com o objetivo de resolver as perguntas sobre que para quem e como produzir bens e serviços e a modalidade concreta e dinâmica adotada por um sistema num âmbito definido e num momento histórico determinado 5 Referese às assimetrias intra e intersetoriais em termos de produtividade Pinto 1970 Essas assimetrias são o núcleo duro a partir do qual outras desigualdades são transmitidas por toda a sociedade CEPAL 2010 6 Sunkel Osvaldo e Gligo Nicolo compiladores 1980 Estilos de desarrollo y medio ambiente en la América Latina Fondo de Cultura Económica México Os dois volumes dessa compilação contêm 37 artigos sobre estilos de desenvolvimento e meio ambiente de maneira geral o desenvolvimento do setor silvoagropecuário urbanização e marginalidade energia e industrialização e políticas estratégias e planejamento Uma edição especial da Revista da CEPAL no 12 dezembro de 1980 reuniu alguns desses artigos 62 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 trajetórias tecnológicas teriam sido gestados ao longo do tempo com base numa visão de mundo em que os recursos naturais eram vistos como ilimita dos Nas potências coloniais o que não havia ou o que escasseava dentro das fronteiras era buscado entre os recursos aparentemente infinitos das co lônias No caso dos Estados Unidos a amplidão do território havia gerado a mesma percepção O esgotamento dos melhores recursos naturais mais alta lei melhor localização e a degradação dos renováveis não eram vistos como problemas para esses países na medida em que o progresso tecnológico e a expansão a novos territórios sempre colocava à disposição novas fontes de recursos Ao conquistarem sua independência as excolônias teriam repro duzido padrões de desenvolvimento baseados numa percepção de recursos naturais ilimitados não necessariamente compatíveis com sua dotação de fatores e suas condições estruturais e sem conseguir gerar processos de progresso tecnológico autônomos Até os anos 40 os problemas ambientais da América Latina estavam se gundo o estudo principalmente relacionados a práticas agrícolas relacionadas a uma estrutura que combinava latifúndios mal aproveitados com minifúndios sobreexplorados Havia um processo de expansão da fronteira agrícola Também a exploração de recursos naturais fundamento das economias da região tinha seus próprios problemas ambientais sem que a renda gerada nessa atividade fosse reinvestida no desenvolvimento local Era pelo contrá rio em grande parte remetida ao exterior Já nos anos 40 havia problemas ambientais relacionados à marginalização de setores da sociedade tanto nas áreas rurais quanto nas urbanas embora a poluição industrial fosse pouco significativa e dispersa A partir do final da segunda guerra mundial a hegemonia dos Estados Unidos teria levado o estilo norteamericano denominado transnacional de desen volvimento ao resto do mundo A ascendência desse estilo na América Latina teria gerado novos problemas ambientais O estilo transnacional caracterizava se entre outros fatores pelo papel dominante das empresas transnacionais por gerar transformações irreversíveis nas economias e sociedades nacionais que reduziam as opções dos governos para estabelecer processos autôno mos de desenvolvimento pela homogeneização dos padrões de produção comercialização e consumo pela internacionalização da produção industrial e pela intensificação da exploração dos recursos naturais e a dependência crescente do petróleo A expansão do uso do automóvel influenciou a dinâmica de expansão das cidades gerando um crescimento da demanda por espaço para zonas residenciais e infraestrutura de transporte No contexto desse estilo ascendente foram adotadas no pósguerra políticas de uma força vista poucas vezes desde então para fomentar as indústrias de base a indústria do petróleo a indústria automotriz e a infraestrutura neces sária para apoiar esses novos setores O excedente financeiro derivado da Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 63 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 exploração dos recursos naturais que continuava predominante nas estruturas econômicas era remetido ao exterior ou usado para financiar a importação de bens de consumo Uma das características principais do desenvolvimento baseado na ascen dência do estilo transnacional teria sido a intensidade energética e a depen dência do petróleo A importância desse fator vai além da questão da conta minação atmosférica A contribuição de Raul Prebisch à coletânea do projeto CEPALPNUMA Prebisch 1980 mostra entre outras coisas como a era do petróleo barato influenciou a direção da pesquisa tecnológica Aumentouse a produtividade mas não se investiu em economia de energia A expansão do uso do petróleo como matériaprima para materiais que levou à substituição de fibras naturais e madeira por materiais sintéticos ocorreu em detrimento do emprego Na agricultura a mecanização gerou desemprego e migração para as cidades contribuindo para o processo de urbanização massiva e precária O uso de fertilizantes e pesticidas de origem petroquímica contribuía para a contaminação do solo Também teria sido inerente à ascendência do estilo transnacional a concen tração de núcleos empresariais políticos e burocráticoadministrativos Isso explica em parte o fracasso repetido de políticas de desconcentração regio nal entre 1960 e 1980 Da mesma forma a dinâmica da migração massiva e precária tornava sempre insuficientes as políticas destinadas a sanar o déficit habitacional ou estender os serviços básicos aos mais pobres Enquanto os segmentos favorecidos recorrem aos bairros suburbanos que tira espaço da agricultura e encarece a infraestrutura os demais passam a ocupar terras marginais nas zonas urbanas No começo dos anos 70 com a crise do petróleo o estilo transnacional entra em crise No entanto já estavam estabelecidos padrões de consumo produ ção infraestrutura e desenvolvimento urbano bem como estruturas sociais que perduram em grande medida até hoje Havia poucas alternativas para mudanças de rumo O efeito da crise do petróleo do início dos anos 70 não foi o de direcionar as economias a outras fontes de petróleo apesar de iniciativas significativas como o PróÁlcool mas de gerar ainda maior pressão sobre os setores exportadores para poder financiar a importação de petróleo Para um estilo alternativo de desenvolvimento compatível com a satisfação das necessidades fundamentais da maioria da população e com a preservação e valorização da base de recursos naturais e do meio ambiente sugeriase menor dependência de combustíveis fósseis e maior uso de fontes de ener gia renováveis e menos contaminantes desenvolvimento de tecnologias de uso mais intensivo da mãodeobra e ajustada à base de recursos naturais reciclagem e reaproveitamento do lixo administrar os recursos naturais com conhecimentos e tecnologias sustentados em bases ecológicas instituir formas administrativas e políticas descentralizadas que se apoiem nas comunidades Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 64 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 locais e deter a contínua expansão das cidades grandes e os excessos do consumismo Além disso nenhum esforço de desenvolvimento deveria deixar de considerar plenamente a dimensão ambiental O planejamento e as políticas de ciência e tecnologia deveriam ter como preocupações centrais o conheci mento e a avaliação dos recursos naturais e dos ecossistemas a necessidade de vigilância permanente o desenvolvimento de alternativas tecnológicas e a diversificação da produção com base em técnicas ecologicamente adequadas O documento recomendava finalmente o estabelecimento de mecanismos que permitam a participação social nas decisões o que veio a consolidarse como o Princípio 10 da Declaração do Rio de Janeiro Chama a atenção a proximidade da seguinte citação com algumas defini ções do conceito de economia verde ou de crescimento verde adotado pela OCDE7 Nos termos de Sunkel 1980 tradução livre As políticas destinadas a conservar melhorar e expandir os recursos naturais e sua produtividade assim como aquelas que visam a conservar melhorar e expandir o meio ambiente artificial e sua produtividade constituem parte da política de desenvolvimento já que o fazem sustentável a longo prazo Mas também podem fazer contribuições positivas para resolver os problemas característicos do estilo atual de desenvolvimento Os projetos de conservação de solos e florestas reflorestamento dragado e conservação de canais de irrigação de manutenção e construção de estradas de pene tração nas zonas rurais e de autoconstrução de moradias e equipamento comunitário nas zonas urbanas se adequadamente desenhados podem contribuir para aliviar os problemas do desemprego e do subemprego ao mesmo tempo em que promovem a organização social de base aumentam a produtividade e melhoram as condições de vida 3 cRISe da dívIda e a cOMISSãO bRUndtland ReflexõeS entRe 1985 e 1990 Em 1983 criouse a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvi mento também conhecida como Comissão Brundtland Em 1987 a Comissão publicou seu relatório no qual definia o desenvolvimento sustentável como aquele que supre as necessidades presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades Ao longo desse período e nos anos que o sucederam as relações econômi cas internacionais da América Latina e portanto o pensamento da CEPAL estavam dominadas pela asfixia financeira em função do endividamento Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 7 Uma maneira de buscar o crescimento econômico e o desenvolvimento e ao mesmo tempo evitar a degradação ambiental a perda de biodiversidade e o uso insustentável de recursos naturais Referese a estratégias que surgiram como resposta à crise global que buscavam encontrar fontes de crescimento que contribuíssem à eficiência econômica integridade ambiental e igualdade social OCDE 2010 65 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Bielschowsky 1998 Dois artigos de Osvaldo Sunkel um antes e um depois do relatório Brundtland referemse à relação entre crise da dívida e desen volvimento sustentável Fazem um chamado para que o debate global sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável não ignore os grandes desafios do contexto econômico dos países da América Latina e sua forma de inserção no sistema econômico internacional Por outro lado assim como os conceitos de economia verde no contexto das Nações Unidas e de crescimento verde no contexto da OCDE surgiram em grande medida como uma reação à crise que tem seu ápice em 2008 Sunkel voltava a sugerir que a crise era uma oportunidade para melhorar a relação entre economia e ambiente O artigo de 1985 descreve os efeitos da crise sobre o meio ambiente e as instituições ambientais aspecto que teria sido em grande medida negligenciado pela Comissão Brundtland até aquele momento Sunkel 1985 A crise teria atingido as instituições ambientais em uma situação de indefinição e debilidade As restrições orçamentárias derivadas da crise e um enfoque econômico e financeiro de curto prazo geravam um enfraquecimento das já poucas e fracas instituições ambientais que haviam surgido desde a Conferência de Estocolmo Além disso a pressão por gerar divisas para cobrir o serviço da dívida e as consequentes políticas de ajustamento aumentavam os níveis de pobreza e contribuíam assim para agravar problemas de sobreexploração das terras e recursos naturais assim como migração das áreas rurais para a cidade e um aumento da pobreza urbana Nas cidades expandiamse as moradias e atividades informais Na contramão do desenvolvimento sustentável a pres são por gerar divisas privilegiava as atividades cujos resultados eram visíveis a curto prazo em detrimento de investimentos de longo prazo na proteção ambiental entre outros Da mesma forma numa compilação sobre perspectivas latinoamericanas sobre o relatório Brundtland Sunkel 1990 volta a mostrar como a crise da dívida a deterioração dos termos de troca e as condicionalidades do finan ciamento internacional induziram ou melhor ajudaram a perpetuar a despeito do que se promovia internacionalmente a primazia do curto prazo A crise reduziu a capacidade do Estado de investir e atender às necessidades básicas da população saúde educação Eram privilegiados os investimentos que conduziriam a maiores exportações que por sua vez gerariam recursos que seriam canalizados para o pagamento da dívida Os recursos alocados à proteção ambiental cujos resultados não eram tangíveis ou se materializariam apenas no longo prazo escasseavam No entanto assim como a crise do petróleo no início dos anos 70 a crise da dívida também se apresentava como uma oportunidade de mudar o estilo de crescimento econômico e compatibilizar desenvolvimento e meio ambiente De forma parecida aos primeiros documentos sobre economia verde durante os esforços de reativação da economia mundial em 2008 Sunkel em 1985 Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 66 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 voltava a propor uma visão da crise uma nova crise como oportunidade de mudança de rumos É possível encarar o assunto dos recursos ambientais os recursos dados pela natureza e os construídos como uma maneira de estabelecer a ligação entre as políticas econômicas a curto prazo e a necessidade de políticas de desenvolvimento a médio e longo prazo Ou seja o que eu estou sugerindo é que encaremos a crise como uma oportunidade Uma oportunidade para a mobilização de recursos de tal forma que propicie uma mudança no estilo de crescimento tendo em vista a satisfação das necessidades essenciais da população e a instauração de um processo de desenvolvimento susten tável ou consciente O artigo defendia a necessidade de uma política que contrariamente ao reajuste recessivo fosse expansionista embora seletiva relacionasse políticas macroeconômicas com meio ambiente e incluísse políticas específicas para temas sociais para pequenas e médias empresas e para o desenvolvimento industrial Advoga também por uma maior valorização dos recursos ambien tais e naturais para a satisfação das necessidades presentes e futuras o que permitiria influir em como os setores produtivos determinantes na definição dos padrões de desenvolvimento vêem o meio ambiente Os rumos tomados nos anos 90 foram outros 4 tRanSfORMaçãO pROdUtIva eqUIdade e MeIO aMbIente 1991 A questão da transformação produtiva foi um eixo central do trabalho da CEPAL durante boa parte dos anos 1990 Construindo sobre a base teórica desenvolvida desde o final dos anos 40 em 1990 a CEPAL propôs a trans formação produtiva com equidade como prioridade regional para a década que começava CEPAL 1990 2008 Bielschowsky 1998 Propunha a trans formação produtiva sustentada em uma incorporação deliberada e sistemática do progresso técnico e aumento da produtividade como fatores da necessária competitividade internacional autêntica8 Enfatizava o caráter sistêmico da competitividade e os vínculos entre empresas sistema educativo infraestru tura tecnológica energética e de transportes relações entre empregados e empregadores o aparato institucional público e privado e o sistema financei ro Argumentava que um clima macroeconômico apropriado e estável e uma política de preços corretos embora necessários não eram suficientes para deflagrar a transformação produtiva A gestão macroeconômica deveria ser combinada com políticas setoriais que pudessem induzir à transformação produtiva Era necessário assegurar vínculos entre diferentes setores explo 8 Conceito construído em oposição à competitividade espúria baseada em degradação dos recursos naturais e baixa valorização dos recursos humanos Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 67 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 ração de matériasprimas indústria serviços de maneira a gerar uma homo geneização progressiva dos níveis de produtividade Equidade democracia e sustentabilidade ambiental eram vistos como fatores chave de um processo de transformação produtiva É nesse contexto que se prepara o documento da CEPAL para apoiar a preparação regional para a Rio 92 O desenvolvimento sustentável transfor mação produtiva equidade e meio ambiente CEPAL 1991 O documento trata de vários temas relacionados ao desenvolvimento sustentável na região e em relação à transformação produtiva com base nos resultados de um estudo dedicado especificamente ao tema CEPALONUDI 1991 Este último mostra que os enfoques tradicionais sobre desenvolvimento produtivo por um lado e ecologia por outro privilegiam objetivos diferentes e aparentemente irreconciliáveis crescimento e competitividade internacional em contraposição à equidade e à sustentabilidade ambiental O vínculo que faria convergir os objetivos seria a incorporação e a difusão do progresso técnico CEPALONUDI 1991 A dependência das economias da América Latina das atividades de extração de recursos naturais era vista como preocupante não só por causa dos problemas ambientais relacionados mas também por que a maneira em que se organizavam essas indústrias não conduzia a sair do en capsulamento setorial isto é da falta de vínculos entre os diferentes setores primário secundário terciário A experiência latinoamericana contrastava com a de países da OCDE cujas economias estavam também baseadas em recursos naturais mas cujo desenvolvimento industrial tinha ocorrido em grande parte por meio da transformação desses recursos em um contexto que tornou possível uma ampla gama de inovações tecnológicas Superar o encapsulamento setorial requeria políticas fortes e articuladas que no entanto não foram colocadas em prática na medida necessária ao longo dos anos 90 Numa avaliação em 2008 mostrouse que apesar de uma maior diversificação exportadora e de suas economias terem se beneficiado do aumento dos preços das matériasprimas a região não tinha conseguido reduzir a dependência de exportações tradicionais nem incorporar maior co nhecimento e valor agregado às atividades e cadeias produtivas O aumento das exportações manufatureiras não havia se traduzido em um processo de ascensão a atividades de maior valor agregado difusoras de tecnologia ou geradoras de capacidades tecnológicas A região tampouco havia conseguido estabelecerse de maneira competitiva nos mercados de serviços de expor tação Os esforços de inovação continuavam escassos especialmente se comparados a competidores asiáticos CEPAL 2008 Nos debates sobre economia verde falase no desenvolvimento de novos setores verdes como forma de dar impulso às economias como novo para digma tecnológico É importante ao se definir que instrumentos serão adotados nacional e internacionalmente considerar que o desafio da transformação Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 68 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 produtiva está presente na região há décadas Conseguir aproveitar a econo mia verde como motor de expansão econômica requererá esforços de grande magnitude em termos de políticas de educação inovação e desenvolvimento produtivo que não podem ser gestados nem implementados unicamente pelos órgãos governamentais relacionados ao meio ambiente 5 pOntOS paRa ReflexãO Entre as questões que esse conjunto de documentos levanta para o debate sobre economia verde as seguintes merecem destaque por sua importância e seu vínculo com o segundo tema da Rio20 o marco institucional para o desenvolvimento sustentável Em seu conjunto os trabalhos mencionados recordam que é profunda e complexa a relação entre os problemas ambientais sociais e econômicos da América Latina A reflexão sobre como mudar essas relações e solucionar os grandes problemas ambientais da região que afetam desproporcionalmente os mais pobres precisa considerar essas raízes Nesse sentido estratégias de economia verde tenderão a ser insuficientes se forem gestadas e imple mentadas unicamente pelas entidades nos governos na sociedade civil nas empresas e suas entidades representativas que lidam com meio ambiente como área de especialização Em segundo lugar lidos com o benefício da retrospectiva os documentos ressaltam a importância de identificar e remover as barreiras à mudança Já em 1971 eram sugeridas soluções que continuam nos debates internacionais mas que são implementadas apenas marginalmente como por exemplo a adoção da lógica do ciclo de vida para os produtos9 Duas ideias que se encontram na origem da projeção internacional do conceito de economia verde a de trans formar crise em oportunidade para redirecionar o desenvolvimento no sentido de uma maior sustentabilidade e a de fazer com que o cuidado ambiental seja fonte de oportunidades econômicas também já haviam surgido em 1980 Sunkel 1980 se não antes Por que essas ideias das quais a CEPAL era apenas um pequeno expoente não tiveram consequências práticas Sabe se que há barreiras tecnológicas empresariais jurídicas de informação de valoração do capital natural institucionais entre outras Existe uma inércia derivada de investimentos feitos sob um paradigma que não atribuía valor ao meio ambiente investimentos em tecnologia em fontes de energia sistemas fiscais plantas industriais modelos empresariais métodos de calcular o custo benefício de projetos mandatos de instituições públicas Para assegurarse de que a economia verde qualquer que venha a ser o conceito preciso adotado internacionalmente ou por cada país vá além de um conjunto de declarações Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 9 Além dos debates sobre economia verde vejamse os relatórios da 18ª e 19ª sessões da Comissão de Desenvolvimento Sustentável particularmente no que se refere ao tema do consumo e da produção sustentáveis 69 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 bem intencionadas será necessário superar essas barreiras de forma articulada entre instituições e atores em diferentes esferas Por outro lado como mostra a experiência dos anos 80 se não houver ins tituições fortes e permanentes que assegurem que entre uma opção e outra se privilegie o sustentável os avanços se anularão em momentos de crise nos quais se tenha que optar entre objetivos Finalmente a economia verde tem sido mencionada como uma oportunidade para um novo ciclo tecnológico e de inovação Poderia significar para os países da América Latina a entrada em novos mercados e uma nova oportunidade de participar em setores de mais alto valor agregado difusores de tecnologia em alguns casos vinculados aos setores de recursos naturais que predominam nas economias da região Ao considerar esse argumento é importante ter em conta a experiência da região com a transformação produtiva tratada acima em relação aos documentos do início dos anos 90 e a lição que dela se extrai para aproveitar oportunidades como essa são necessárias políticas ativas com claros objetivos estratégicos Isso inclui uma combinação articulada de política educacional industrial de ciência e tecnologia entre outras Requer uma opção clara por essa via por parte de um conjunto relevante e articulado de instituições públicas REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bielschowsky R 1998 Cincuenta años del pensamiento de La CEPAL una reseña In CEPAL Cincuenta años de pensamiento en la CEPAL Texto Seleccionados México CEPALFondo de Cultura Económica Bielschowsky R 2009 Sesenta años de la CEPAL estructuralismo y neoestructur alismo In Revista de la CEPAL n 97 Abril 173194 CEPAL 1971 El medio ambiente humano y el desarrollo económico en América Latina Seminário Regional Latinoamericano sobre los Problemas del Medio Ambiente Hu mano y Desarrollo STECLAConf40L2 25 de agosto Santiago do Chile CEPAL 1990 Transformación productiva com equidad la tarea prioritaria del desar rollo em América Latina y el Caribe em los años noventa LCG1601P Santiago do Chile Publicação das Nações Unidas CEPAL 1991 El desarrollo sustentable transformación productiva equidad y médio ambiente LCG1648CONF802Rev1 Santiago do Chile Publicação das Nações Unidas CEPAL 2008 La transformación productiva 20 años después viejos problemas nuevas oportunidades LCG2367SES323 Santiago do Chile CEPAL 2010 La hora de la igualdad brechas por cerrar caminos por abrir LC G2432SES333 Santiago do Chile Publicação das Nações Unidas CEPALONUDI 1991 Tecnología competitividad y sustentabilidad LCL608 San tiago do Chile Publicação das Nações Unidas Gligo N 2006 Estilos de desarrollo y medio ambiente en América Latina un cuarto de siglo después Serie Medio Ambiente y Desarrollo n 126 maio CEPAL OCDE 2010 Interim report of the green growth strategy implementing our commit ment for a sustainable future Paris OCDE Pinto A 19702000 Natureza e implicações da heterogeneidade estrutural da América Latina In Bielschowsky R org Cinquenta anos de pensamento da CEPAL Rio de Janeiro e São Paulo ed Record CEPAL Cofecon vol2 Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 70 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Prebisch R 1980 Biósfera y desarrollo In Sunkel O e Gligo N compiladores Estilos de desarrollo y medio ambiente en la América Latina México Fondo de Cultura Económica Sunkel O 1980 Introducción la interacción entre los estilos de desarrollo y el medio ambiente en la América Latina In Sunkel O e Gligo N compiladores Estilos de desarrollo y medio ambiente en la América Latina México Fondo de Cultura Económica Sunkel O 1985 Dívida desenvolvimento e meioambiente Espaços Debates Revista de Estudos Regionais e Urbanos ano V no 16 Sunkel O 1990 El difícil contexto internacional para un desarrollo sustentable In Maihold Günther e Victor L Urquidi compiladores Dialogo con nuestro futuro comun perspectivas latinoamericanas del Informe Brundtland México Fundación Friedrich Ebert Editorial Nueva Sociedad Economia verde na América Latina as origens do debate nos trabalhos da CEPAL Márcia Tavares 71 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 o papel do crescimento inclusivo para a economia verde nos países em desenvolvimento CLÓVIS ZAPATA1 IntROdUçãO A proposição de que caminhamos rapidamente para um mundo onde emissões antrópicas de gases causadores do efeito estufa modificarão peri gosamente o clima global já é consensualmente aceita Podese perguntar no entanto qual o impacto econômico de medidas necessárias para atingir reduções no nível de emissões e de degradação ambiental capazes de mini mizar tais efeitos Economistas ambientais concordam que políticas públicas baseadas em instrumentos de incentivo econômico podem aliviar os efeitos causados pelas mudanças climáticas a um custo aceitável De acordo com o relatório Rumo a uma economia verde caminhos para o desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza divulgado pelo PNUMA em 2011 uma economia verde é em termos práticos aquela cujo crescimento em renda e em emprego é incitado por investimentos públicos e privados que reduzem emissões de carbono e poluição melhoram a eficiência no uso de recursos naturais e energéticos e evitam perda de biodiversidade e de serviços ecossistêmicos Esses investimentos devem ser catalizados e apoiados por gasto público direcionado reformas das políticas e mudanças na regulação Esse caminho de desenvolvimento deve manter melhorar e quando necessário reconstruir o capital natural como um ativo econômico crítico e uma fonte de benefícios públicos especialmente para pessoas pobres cujas sobrevivência e segurança dependem fortemente da natureza A ideia que permeia o conceito de economia verde baseiase na premissa de que políticas públicas aliadas a modificações em setores chave podem conduzir economias nacionais sem mudanças drásticas nos padrões de consumo a níveis admissíveis de degradação ambiental Apesar da possibilidade teórica o desafio é tremendo no campo prático para economias em desenvolvimento já que os planejadores de políticas públicas 1 Pesquisador sênior do International Policy Centre for Inclusive Growth do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento IPCIGUNDP e professor da Universidade de Brasília 72 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 devem associar o desenvolvimento econômico a outras áreas como a elevação do padrão de consumo das camadas mais pobres da população Gunningham et al 2003 aponta nesse sentido para a necessidade da combinação de dimensões econômicas sociais ambientais e políticas no desenho tanto de instrumento de incentivo econômico como de medidas de comando e controle de cunho ambiental fundamentais para que economias em desenvolvimento possam ingressar na economia verde a ecOnOMIa veRde A economia verde pode ser definida como um paradigma que proporciona a redução dos atuais riscos ambientais e das limitações ecológicas aliada a um aumento do bemestar humano e da equidade social UNEP 2011 Nesse sentido a premissa está intimamente relacionada ao conceito de crescimento inclusivo que propõe a melhoria da qualidade de vida de todos aqueles que vivem em uma economia e tem importância fundamental para países em desenvolvimento Para que uma economia possa passar do modelo atual para o desejável verde investimentos em áreas estratégicas de capital natural que minimizem riscos ambientais são fundamentais Apesar de o tema ter sido apresentado por diversas literaturas acadêmicas recentemente os governos começam a tomar medidas mais contundentes na direção da tradução do conceito de economia verde em ações práticas que efetivamente possam modificar o sistema econômico Vale ressaltar o papel desempenhado por organismos internacionais como as Nações Unidas que proporcionam um fórum de debate permanente sobre o tema disseminando casos exitosos de países desenvolvidos e em desen volvimento e apresentando propostas inovadoras de política Por intermédio do PNUMA a Iniciativa Verde foi lançada em 2009 dentro das nove UNWide Joint Crisis Initiatives que contam com a participação de 21 agências da ONU incluindo as instituições de Bretton Woods A contribuição também é realizada no campo de propostas de políticas públicas Recentemente o PNUMA lançou um relatório no qual defende de forma geral que investimentos equivalentes a 2 do PIB global por ano cerca de US 13 trilhão até 2050 fomentariam o desenvolvimento e a transição de 11 setores chaves para uma economia verde UNEP 2011 São eles 1 agricultura 2 construções 3 energia renovável 4 silvicultura 5 indústria de manufatura 6 recursos pesqueiros 7 turismo 8 transporte 9 recursos hídricos 10 manejo de resíduos sólidos e 11 cidades De acordo com a tese defendida investimentos aliados a reformas políticas devem fomentar a transformação nesses setores que estariam em melhor posição competitiva no longo prazo A reconfiguração da economia de forma O papel do crescimento inclusivo para a economia verde nos países em desenvolvimento Clóvis Zapata 73 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 sustentável pode conduzir à ecoeficiência que propõe utilizar de forma mais eficiente os recursos naturais escassos e apresenta inúmeros benefícios no campo social como a geração de empregos nesses setores também denominados empregos verdes Do ponto de vista social tal processo pode levar países em especial os emergentes a situações onde o crescimento da economia verde fomente o desejável crescimento inclusivo O fomento e o desenvolvimento desses setores chaves podem auxiliar na redução da pobreza e na minimização de discrepâncias de renda Para tanto o catálogo de opções é bastante diverso incluindo a geração direta de empregos verdes aumento do acesso a produtos e serviços ambientais em comunidades carentes a estruturação de estratégias específicas de transferências de renda condicio nais subsídios diretos a setores industriais determinados e a reestruturação da política nacional de compras públicas Muitos países em desenvolvimento já incorporaram pelo menos em deter minados setores conceitos de desenvolvimento sustentável aliando várias áreas de interesse como crescimento econômico própobre e próemprego Nesse sentido um aspecto fundamental para países em desenvolvimento é que a inserção na economia verde pode ser realizada aliandose dimensões que antes eram percebidas como antagônicas De acordo com Gunningham et al 2003 as dimensões ambiental social econômica e política devem ser levadas em conta no desenho de políticas públicas capazes de modificar o desempenho ambiental de setores industriais A análise do modelo de licenças de operação indica a relevância da interação entre essas dimensões como ponto primordial de influência sobre o desem penho ambiental agregado de setores industriais da economia Sendo assim as diversas dimensões devem ser levadas em conta por países interessados em fomentar setores específicos da economia Esse entendimento holístico vai além das interpretações fornecidas por autores de estratégia corporativa como Porter e Van der Lind 1995 e Hart 1997 que foram pioneiros na ideia de que o setor privado pode se beneficiar em termos competitivos da regulamentação ambiental Tais conceitos foram posteriormente modificados por Reinhardt 2000 e Orsato 2009 que indicam as condições pelas quais tais ganhos seriam realizados Apesar da grande utilidade de tal literatura poucos setores industriais despertaram efetivamen te para os novos campos da economia verde especialmente em países em desenvolvimento Nesse sentido o papel que governos e organismos inter nacionais devem desempenhar na promoção da agenda de desenvolvimento da economia verde é primordial já que a combinação de incentivos fiscais e regulamentações pode acelerar o processo de mudanças por meio de inova ções tecnológicas e criação de mercados verdes Caso deixadas ao sabor exclusivo do setor privado como tem ocorrido as economias mostrarseiam incapazes de ingressar efetivamente em uma economia verde O papel do crescimento inclusivo para a economia verde nos países em desenvolvimento Clóvis Zapata 74 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 É importante notar que as dimensões social econômica política e ambiental têm tempos e janelas de oportunidade diferentes e devem ser apropriadamente levadas em consideração para compreender as soluções possíveis em eco nomias em desenvolvimento Apesar de haver potenciais sinergias e fortes interações entre essas dimensões não se pode supor que as dinâmicas e as respostas de cada uma delas serão idênticas Cada país enfrenta o desafio de encontrar soluções que fomentem o crescimento econômico de forma ambientalmente sustentável socialmente inclusiva e politicamente factível em contextos únicos a cOMpleMentaRIdade entRe aS dIMenSõeS SOcIal e aMbIental Em termos de política pública as dimensões econômicas e sociais têm tido a maior atenção de países em desenvolvimento Apesar de que o desenvolvi mento de políticas sociais deve estar aliado ao desenvolvimento da economia verde a evolução verificada no campo do desenho de programas de cunho social não foi acompanhada de preocupações ambientais No campo social o Brasil e outros países em desenvolvimento recentemente adotaram uma série de estratégias de proteção social inovadoras para elevar o padrão de vida dos mais pobres O Brasil por exemplo implantou o programa Bolsa Família e o México o Oportunidades Tais programas têm gerado benefícios significativos no combate à pobreza elevando o padrão de vida da população em determi nadas áreas e garantindo benefícios no campo da educação e da saúde Entretanto a interação entre políticas de cunho social e ambiental ainda carece de um debate mais robusto Uma das opções apresentadas por alguns países é o pagamento por serviços ambientais que utiliza instrumentos de transferência de renda condicional para proprietários rurais que preservam parte de sua área como o fez a Costa Rica Tais programas têm gerado efeitos positivos mas ainda não foram amplamente adotados em outros países No Brasil por exemplo apesar do sucesso do programa Bolsa Família o país não foi capaz de introduzir um programa de pagamento por serviços ambientais É importante ressaltar que a geração de empregos verdes por meio dos setores apontados pelo UNEP 2011 é essencialmente distinta pois se baseia na crença de que o próprio mercado com apoio do setor público seria capaz de gerar tais vagas Os programas de transferência de renda condicional tratam de uma questão distinta pois são mais bem talhados para eliminar distorções relativas à pobreza extrema e para famílias em áreas onde exista grande ne cessidade de recursos financeiros Empregos verdes encontramse em elos superiores e substituiriam os empregos existentes nos moldes atuais Utilizando o modelo de licença de operação de Gunningham et al2003 podese notar que a interação entre as licenças social ambiental econômica e O papel do crescimento inclusivo para a economia verde nos países em desenvolvimento Clóvis Zapata 75 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 política é complexa e deve ser compreendida caso a caso De forma bastante simples os programas de transferência de renda condicional podem ser vistos como indutores de uma resposta não trivial e nos remetem a questões relacio nadas às dimensões da política pública citadas anteriormente Tais programas servem para solucionar questões de pobreza mas ainda não materializaram estratégias de saída e muito menos questões ambientais Existem no entanto políticas de produção inclusiva que podem ser dese nhadas para atender às necessidades ambientais e fomentar setores chaves da economia verde O deSenvOlvIMentO IndUStRIal e a InclUSãO pROdUtIva O caSO dO pROgRaMa bRaSIleIRO de bIOdIeSel Além de estratégias de cunho social o desenvolvimento da economia verde necessita de políticas estruturadas de fomento que gerem empregos e insi ram populações marginais em cadeias produtivas de alto valor agregado As estratégias sociais podem servir como complemento para tratar de aspectos sociais pontuais de redução da pobreza mas como fontes de desenvolvimento e inovação verde Sendo assim a combinação de políticas macroeconômi cas expansionistas capazes de gerar emprego e renda aliadas a estruturas nacionais fomentadoras do desenvolvimento industrial é fundamental Esta seção fará uma breve análise dessas questões a partir do caso do Programa Brasileiro de Biodiesel Uma área de grande interesse é o desenvolvimento de energia renovável aplicada a transporte O Brasil é internacionalmente reconhecido como um dos líderes na área de pesquisa e desenvolvimento de biocombustíveis para a indústria automobilística Nesse contexto o Programa Brasileiro de Biodie sel fornece elementos importantes para o debate já que trata de áreas de transporte sustentável e energia renovável além de apresentar estrutura de política para lidar com a dimensão social O Programa Brasileiro de Biodiesel visa a estruturar a cadeia produtiva do produto e incorporar pequenos agricultores familiares na produção de matérias primas para a produção de biodiesel O programa foi desenhado para que pequenos agricultores pudessem contribuir com uma série de fontes vegetais como soja mamona girassol dendê e algodão Apesar do grande conhecimen to que o Brasil detém na área a inserção de pequenos agricultores familiares na cadeia produtiva do biodiesel foi decepcionante por inúmeros problemas relativos ao desenho e implementação do programa Zapata et al 2010 Em 2010 o governo percebendo a necessidade de redirecionar o programa para aumentar a participação de pequenos agricultores remodelou a estrutura do programa colocando a Petrobrás Biocombustíveis como principal ator Os O papel do crescimento inclusivo para a economia verde nos países em desenvolvimento Clóvis Zapata 76 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 resultados positivos já começam a ser notados mas não existem estatísticas consolidadas para verificar a efetiva inserção de pequenos agricultores na cadeia produtiva do biodiesel O Programa Brasileiro de Biodiesel demonstra como a implementação de programas que procuram reduzir a pobreza por meio da inserção produtiva de pequenos agricultores familiares é complexa mas factível Lições podem ser extraídas e aplicadas em outros países que desejam seguir caminhos semelhantes Apesar do esforço empregado em aliar as dimensões ambien tais e sociais o Brasil dá passos tímidos no desenvolvimento de tecnologias e estratégias de inovação radical como o hidrogênio e veículos elétricos ou híbridos A estratégia de transporte baseiase em modificações incrementais em motores de combustão interna e tem efeitos ambientais marginais Zapata e Nieuwenhuis 2010 O debate SUlSUl Além da importância central das dimensões social e ambiental no desen volvimento da economia verde para países em desenvolvimento a dimensão política também é muito importante Grupos de interesse podem influenciar governos e a sociedade a tomar medidas que geram mudanças profundas em determinados campos da economia e que vão ao encontro do fortalecimento de elementos constituintes da economia verde Sendo assim a inserção de organismos internacionais tem um papel que vai além da sugestão direta de caminhos mas apresenta oportunidades factíveis para que a dimensão política possa ser moldada de acordo com os interesses da sociedade geral e não somente de grupos de interesse específicos O sistema Nações Unidas por exemplo tem conseguido resultados bastante significativos na esfera política por meio da promoção de fóruns internacionais de discussão As experiências de produção inclusiva rural e urbana que fomentam o de senvolvimento de setores específicos para o desenvolvimento da economia verde devem ser mais bem estudadas e compartilhadas entre países com características semelhantes No campo de políticas de inclusão produtiva ou transferências de renda condicional é fundamental a troca de experiências entre países do Sul Nesse contexto é importante ressaltar o esforço realizado no âmbito dos países do IBSA Índia Brasil e África do Sul e dos BRICs Brasil Rússia Índia e China pelo IPCIG que tem atuado como indutor do debate e troca de experiências em fóruns específicos desses dois grupos cOnclUSãO A economia verde ainda é um conceito bastante amplo e que deve ser melhor traduzido por medidas que modifiquem a atual estrutura de economias nacio nais A discussão do desenvolvimento de setores chaves conforme propostos O papel do crescimento inclusivo para a economia verde nos países em desenvolvimento Clóvis Zapata 77 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 pelo PNUMA baseiase na premissa de que modificações incrementais em alguns setores seriam suficientes para conduzir a humanidade em direção à sustentabilidade As demandas dos países em desenvolvimento são prementes pois além da dimensão ambiental existe a necessidade de atender à dimen são social Nesse sentido o conceito de crescimento inclusivo é fundamental no desenvolvimento de políticas públicas que fomentem a transição para uma economia verde Em termos gerais o discurso de organismos internacionais e de muitos países é substancialmente otimista pois dissemina casos exitosos em deter minadas áreas Entretanto é importante notar que a replicabilidade de tais experiências é bastante limitada já que cada setor estratégico está inserido em condicionalidades locais particulares como dimensões sociais ambientais econômicas e políticas específicas O esforço empregado pelas Nações Unidas e outros organismos internacio nais é primordial mas é ainda incipiente na área da economia verde O setor privado deve desempenhar um papel preponderante nesse contexto Devese lembrar no entanto que o consenso entre economistas ambientais se desfaz no que se refere ao tempo necessário para que tais transformações sejam materializadas Um processo de mudança profunda na produção e consumo baseado em inovações radicais não está em pauta já que seriam necessá rios investimentos muito mais contundentes do que aqueles defendidos em diversos cenários analisados Nesse sentido questionase se o atual debate carrega o senso de urgência para que os resultados possam ser atingidos no tempo necessário REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Gunningham N Kagan R e Thornton D 2003 Shades of green business regula tion and environment Palo Alto Stanford University Press Hart S 1997 Beyond greening strategies for a sustainable world Harvard Business Review 751 6676 Orsato R 2009 Sustainability strategies Nova York Palgrave MacMillan e INSEAD Business Press Porter M e Van der Linde C 1995 Towards a new conception of the environment competitiveness relationship Journal of Economic Perspectives 94 97118 Reinhardt F 2000 Down to earth applying business principles to environmental management Cambridge Harvard Business School Press UNEP 2011 Towards a green economy pathways to sustainable development and poverty eradication Disponível em wwwuneporggreeneconomy Zapata C e Nieuwenhuis P 2010 Exploring innovation in the automotive industry new technologies for cleaner cars Journal of Cleaner Production 181 1420 Zapata C VazquezBrust D e PlazaÚbeda J 2010 Productive inclusion of small holder farmers in Brazils biodiesel value chain programme design institutional incentives and stakeholder constraints International Policy Centre for Inclusive Growth Working paper 73 O papel do crescimento inclusivo para a economia verde nos países em desenvolvimento Clóvis Zapata 78 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 o brasil e a economia verde um panorama FRANCISCO GAETANI1 ERNANI KUHN2 RENATO ROSENBERG3 1 IntROdUçãO Quando se procura conhecer a situação do Brasil rumo a uma economia verde EV e suas perspectivas surgem algumas questões cruciais Quais os principais avanços já realizados em relação à EV Como o Brasil se situa em relação aos outros países Quais os principais desafios a enfrentar Essas são questões amplas contemporâneas e estreitamente relacionadas às dis cussões sobre os impactos das mudanças climáticas e a novas formulações na esfera da teoria econômica Segundo o documento Green Economy synthesis for policy makers ela borado pelo PNUMA em 2011 economia verde pode ser definida como aquela que resulta na melhoria do bemestar humano e na equidade social enquanto reduz significativamente os riscos ambientais e as escassezes ecológicas Em outras palavras EV pode ser pensada como aquela que é de baixo carbono eficiente na utilização de recursos e socialmente inclusiva O esforço de reestruturação produtiva rumo a uma economia mais verde faz parte do programa de governo tanto dos países desenvolvidos como dos emergentes O desenvolvimento de novos mercados pautados por fontes de energia mais limpa arranjos sustentáveis de atividade econômica e inclusão social econômica é o debate dominante da segunda metade do século 20 embora a crise financeira de 2008 e a efervescência democrática no mundo árabe tenham recolocado em pauta o regressivo cenário do crescimento predatório 2 O bRaSIl cOMO pOtêncIa eneRgétIca aMbIental Para analisar as potencialidades da EV no Brasil é fundamental também compreender o papel de destaque do país em relação às suas privilegiadas condições ambientais com vasta disponibilidade de recursos naturais Seu território apresenta a segunda maior área de floresta do planeta a qual ocupa cerca de 48 milhões de quilômetros quadrados o que representa 56 de seu 1 Secretárioexecutivo do Ministério do Meio Ambiente 2 Diretor de Programa do Ministério do Meio Ambiente 3 Assessor Técnico do Ministério do Meio Ambiente 79 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 território e 10 da área mundial de florestas Governo Federal 2008 Além dessa grande dimensão suas matas são bastante diversificadas pois o país detém a floresta amazônica as florestas de araucárias as florestas estacionais as florestas tropicais atlânticas a Caatinga as campinaranas e o Cerrado que o tornam o país com a maior biodiversidade do globo os outros dois com características próximas são a Indonésia e o Congo Em termos de recursos hídricos o Brasil também apresenta indicadores de relevância global dispõe de aproximadamente 12 da disponibilidade hídrica superficial do planeta conforme a ANA para o que a região amazônica contribui com quase 75 MMA 2010 Além da riqueza genética derivada da biodiver sidade do país cabe o registro também de um invejável patrimônio de recursos naturais em volume de jazidas e heterogeneidade de recursos comparável apenas ao da Rússia dos Estados Unidos do Canadá e da Austrália O Brasil vem desenvolvendo uma série de instrumentos institucionais econômicos e tecnológicos destinados a preservar e a utilizar de maneira mais racional e sustentável esses recursos Esse esforço é recente embora tenha ganhado impulso nos últimos 25 anos O desafio hoje é tirar proveito do esforço acumulado em prol da preservação ambiental e do desenvolvimento socioeconômico de modo a se aproveitar a janela de oportunidade global que está se abrindo pelo e para o Brasil Um exemplo de iniciativa de destaque é o histórico brasileiro de utilização do álcool combustível agora comumente conhecido também como etanol As pesquisas para utilizar o álcool derivado da canadeaçúcar em motores de automóveis se iniciaram na década de 1920 Magalhães e Schartzman 1981 Já na década de 1930 foi promulgado o Decreto nº 19717 de 20 de fevereiro de 1931 tornando obrigatória a adição do álcool à gasolina A primeira crise do petróleo em 1973 levou a um estrangulamento energético no país Por meio do Programa Nacional do Álcool PróÁlcool o Brasil foi mobilizado para produzir o álcool destinado à mistura com a gasolina em um primeiro momento e pos teriormente para ser utilizado diretamente como combustível em larga escala colocando o Brasil em uma posição distinta em relação ao mundo Nos últimos anos os chamados carros flex bicombustíveis já alcançaram participação relevante na frota de veículos vendidos no país mudando significativamente o perfil do consumo de combustíveis ao consolidar a possibilidade do uso de etanol em substituição à gasolina e ao afetar as características de demanda desse mercado onde consumidores passaram a ter opção de escolha Tais iniciativas não tiveram como objetivo a proteção do meio ambiente Hoje por outro lado têm importância significativa na estratégia brasileira de realizar uma transição para uma economia verde No caso do álcool esse combustível tem um balanço de emissões de gases do efeito estufa muito menor que seu principal concorrente a gasolina O Brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn Renato Rosenberg 80 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Segundo o MME em função de seu uso entre 1970 e 2007 deixouse de consumir 854 milhões de barris equivalentes de petróleo evitando dessa forma a descarga de 800 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera MME 2008 Agregamse a isso os benefícios para a saúde pública devido à redução de emissões de poluentes atmosféricos O aumento da produtividade agrí cola e industrial do setor alcooleiro fruto de intensos trabalhos de pesquisa e desenvolvimento em determinada medida colaborou para a redução da pressão sobre as florestas a serem convertidas para a agricultura A despeito do aumento da produtividade com a elevação recente da demanda a adoção de medidas mitigadoras tornouse imprescindível para preservar áreas com importante capital ambiental Além do progresso tecnológico houve uma série de medidas de caráter institucional para que o Brasil pudesse tornar concreto seu enorme potencial de gerar benefícios ambientais Dentre eles destacamse historicamente a criação do Código Florestal 1965 e da Política Nacional de Meio Ambiente 1981 Mais recentemente foi promulgado um decreto presidencial aprovan do o Zoneamento Agroecológico da CanadeAçúcar ZAE Cana no qual foi proibido o plantio da espécie em áreas ambientalmente sensíveis como remanescentes florestais dunas mangues e em biomas e bacias hidrográfi cas estratégicos mais especificamente a Amazônia o Pantanal e a bacia do Alto Paraguai Foram estabelecidas também normas de incentivo à colheita mecânica de forma a inibir a queima da palha da canadeaçúcar Estes são alguns exemplos da EV no Brasil desenvolver instrumentos econômicos tecnológicos e institucionais para aproveitar de forma eficiente as excelentes condições naturais de que o país dispõe e fazer com que os benefícios trazidos por essas atividades sejam incorporados de maneira in clusiva pela sociedade brasileira 3 bRaSIl nO cenÁRIO InteRnacIOnal3 Porém em que pesem as condições naturais e geográficas favoráveis o Brasil é um grande emissor de CO2 As emissões globais totais de gases do efeito estufa alcançaram em 2005 os 44130 bilhões de toneladas métricas de carbono equivalente MtCO2eq e aumentaram a uma taxa anual de 124 entre 1990 e 2005 CEPAL 2010 Nesse contexto a América Latina e o Cari be contribuem com 12 do total mundial de emissões com um montante de 5390 MtCO2eq e mostraram um ritmo de crescimento similar à média mundial com 119 entre 1990 e 2005 Também observase que as emissões por país na região são muito heterogêneas destacandose uma forte concentração relativa em alguns países Além disso existem comportamentos diferenciados por fontes de emissões salientandose o crescimento das fontes energéticas 3 A fonte adotada para as ações mencionadas foi Presidência da República do Brasil 2011 O Brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn Renato Rosenberg 81 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 e o relativo controle das emissões provenientes da mudança do uso do solo desflorestamento CEPAL 2010 O Brasil no período 19902005 apresentou um crescimento percentual de emissões abaixo da média da região Ainda assim o Brasil é o maior emissor de gases do efeito estufa na região correspondendo a mais de 50 das suas emissões no período mencionado CEPAL 2010 Considerandose o total de emissões de CO2 equivalente no mesmo período excluídas as emissões decorrentes de uso da terra Barbier 2009 o país está em 7º lugar no mundo 26 atrás de China 186 Estados Unidos 18 União Europeia 13 Rússia 51 Índia 48 e Japão 35 Cabe ressaltar que no Brasil a maior parcela de emissão de GEE advém da mudança do uso da terra que caso fosse considerado nesse cálculo elevaria o país certamente a um dos maiores emissores mundiais As principais fontes de emissão em nível mundial concentramse no setor energético 65 seguido pelo setor agropecuário 14 e pelas emissões causadas pela mudança do uso do solo 12 As fontes de emissão para América Latina e Caribe têm uma estrutura distinta de modo que as originadas pela mudança do uso do solo representam quase metade do total regional enquanto o setor energético participa com 28 e a agricultura com 20 CE PAL 2010 Isso mostra que as estratégias de mitigação na América Latina devem considerar tanto as emissões relativas ao consumo de energia como prioritariamente o nível de desflorestamento e degradação do solo Ao se considerarem as emissões de GEE per capita em 1990 e em 2005 o Brasil vem ocupando a posição de 4º maior emissor da região atrás somente da Bolívia da Venezuela e de Trinidad e Tobago Considerando as emissões de CO2 por consumo de energia e produção de cimento 2005 o Brasil está abaixo dos níveis dos países da América Latina e do Caribe CEPAL 2010 Quando falamos em mudanças climáticas no Brasil na condição de grande emissor de GEE o país já adotou postura próativa ao assumir metas volun tárias no âmbito da ConvençãoQuadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima e do Protocolo de Quioto O país se responsabilizou por meio da sua Política Nacional sobre Mudança do Clima Governo Federal 2008 a reduzir entre 361 e 389 as suas emissões projetadas para o ano de 2020 Em termos concretos isso significa reduzir cerca de 6 suas emissões relativas ao ano base de 2005 até o ano de 2020 o que é equivalente a cerca de 132 milhões de toneladas de carbono equivalente Essa postura deverá ter impacto positivo se não fundamental em futuras negociações do Protocolo de Quioto O Brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn Renato Rosenberg 82 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 4 pRIncIpaIS açõeS 41 florestas Com relação à Política Nacional sobre Mudança do Clima no ano de 2010 foram contabilizados importantes avanços para a sua implementação destacandose a regulamentação do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima FNMC na qual se estabeleceu que parte de seus recursos virão da participa ção especial dos lucros da cadeia de petróleo Dentre os objetivos do FNMC constam o combate à desertificação os projetos de educação e capacitação com desenvolvimento e difusão de tecnologias o apoio às cadeias produtivas sustentáveis e o pagamento por serviços ambientais Outro ponto sensível é a prevenção e controle de desmatamento e de quei madas No caso do importantíssimo bioma Amazônia entre os dias 1º de agosto de 2009 a 31 de julho de 2010 a área desmatada nesse bioma foi de 6451 km² de acordo com o INPE O índice representa uma redução de 136 em relação ao período anterior e cerca de 75 em relação aos dados de 2003 O chamado Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia PPCDAm centralizou seus esforços em 43 municípios res ponsáveis pelos maiores índices de desmatamento Cerca de 90 lograram reduzir esse processo Além disso na Amazônia com o intuito de acelerar o processo de regularização ambiental das propriedades rurais 94 municípios iniciaram ações do Cadastro Ambiental Rural CAR Somente no Mato Grosso e no Pará o CAR já foi efetivado em mais de 40 mil propriedades Os mecanismos de comando e controle em especial os instrumentos de fiscalização também têm sido utilizados na região No período analisado o IBAMA com o apoio da Força Nacional da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal aplicou cerca de 5400 multas totalizando R 18 bilhão Cerca de 86 mil m³ de madeira foram apreendidos e 170 mil hectares foram embargados Para o bioma Cerrado estão também previstas medidas para a redução da taxa do desmatamento das queimadas e dos incêndios florestais no Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Cerrado PPCerrado Destacamse o sistema de monitoramento sistemático da cobertura florestal do Cerrado a capacitação de 45 mil brigadistas a ela boração do Macrozoneamento Ecológico e Econômico das regiões do Cerrado a criação de UCs totalizando 25 milhões de hectares a inserção de mais sete produtos da sociobiodiversidade na Política de Garantia de Preços Mínimos a disponibilização de linhas de crédito para a recuperação de pastagens de gradadas e a ampliação de florestas plantadas em áreas já abertas Para os biomas Caatinga Pantanal e Mata Atlântica em 2011 será concluído o Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento no Bioma Caatinga já O Brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn Renato Rosenberg 83 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 em fase de elaboração pelo Governo Federal e com a ampliação do monito ramento no território nacional em continuidade ao Projeto de Monitoramento do Desmatamento dos Biomas Brasileiros por Satélite também serão divul gados mais dados recentes do desmatamento nesses biomas Os desafios são grandes mas as mudanças estão ocorrendo 42 macrozoneamento O macrozoneamento ecológicoeconômico da Amazônia Legal que compre ende o território de nove estados brasileiros foi institucionalizado por decreto em dezembro de 2010 No mesmo ano foram publicados os diagnósticos do meio físico do meio biótico e socioeconômico da bacia hidrográfica do rio São Francisco Atualmente cerca de 50 do território já conta com alguma diretriz de uso e ocupação do solo na escala 1250000 Mais de 23 da área nacional estão com projetos de ZEE Tais zoneamentos são importantes para compatibilizar a produção agrícola com questões socioambientais almejando evitar a expansão desordenada e os danos ambientais decorrentes Os macrozoneamentos são instrumentos fundamentais para a implemen tação de uma política ambiental necessariamente aderente ao território A migração de parcelas da economia brasileira para uma economia verde possui dimensões e tem implicações para o desenvolvimento regional que precisam ser antecipadas de forma a se incorporarem preocupações com a dimensão da sustentabilidade para além de ópticas microempresariais As macrorregionali zações que pautam a política ambiental os seis biomas Amazônia Caatinga Cerrado Mata Atlântica Pantanal e Pampa precisam de análises que as sobreponham a outros vetores de desenvolvimento econômico e social como o PAC e seus investimentos de infraestrutura os arranjos produtivos locais os assentamentos e outros de modo a permitir o planejamento de respostas ambientais econômicas e sociais a cada contexto específico 43 tratamento de resíduos sólidos Uma outra área temática que figura como importante agente catalizador e desenvolvedor de uma economia verde no país é a de tratamento de resíduos sólidos urbanos A Política Nacional de Resíduos Sólidos PNRS foi sancio nada em 2 de agosto de 2010 e sua regulamentação decretada em 23 de dezembro do mesmo ano Com a elaboração em 2011 do Plano Nacional de Resíduos Sólidos a implementação do Sistema Nacional sobre Informações sobre Gestão de Resíduos Sinir e a efetivação dos acordos setoriais que deverão contemplar os mecanismos de implementação da logística reversa dos principais produtos e embalagens de cada atividade o contexto é de grandes perspectivas e de muita atividade para o governo e para os diversos atores envolvidos O Brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn Renato Rosenberg 84 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 O desenvolvimento desses mercados e a mudança dos seus patamares de operacionalização sinalizam uma nova escala no processo de esverdeamento da economia com implicações para áreas de negócio tradicionalmente influen ciadas pelos governos locais e estaduais Saneamento básico resíduos sólidos e logística reversa constituem importantes pilares da nova economia verde São mercados cujas taxas de crescimento serão substantivamente maiores do que a média da economia 44 Recursos hídricos O ano de 2010 foi marcado pelo fortalecimento da Política Nacional de Recursos Hídricos e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos Singreh Ocorreram eventos relevantes tais como a 1º Conferência Nacional de Águas e a primeira revisão do Plano Nacional de Recursos Hí dricos Outras ações se destacaram entre elas o desenvolvimento da matriz de coeficientes técnicos de consumo de água nos processos produtivos e de um modelo de equilíbrio geral o planejamento estratégico do Singreh e o de senvolvimento de estratégias para o fortalecimento do Conselho Nacional de Recursos Hídricos CNRH e o desenvolvimento do Sistema de Informações do Plano Nacional de Recursos Hídricos que funcionará integrado ao Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos SNIRH Outras iniciativas merecem menção O Programa de Revitalização de Ba cias Hidrográficas tem como objetivo contribuir para minimizar a degradação ambiental e recuperar o regime natural dos recursos hídricos Atua de maneira descentralizada em parceria com os estados e municípios No ano de 2010 foram privilegiadas ações na bacia do rio São Francisco destacandose a implementação de sistema de abastecimento de água em comunidades ribei rinhas em 106 municípios obras de esgotamento sanitário em 194 municípios e obras de sistemas de tratamento de resíduos sólidos em 13 consórcios intermunicipais A cobrança pelo uso da água vem sendo implementada no Brasil desde 2001 Em rios de domínio da União a cobrança já foi estabelecida nas bacias do rio Paraíba do Sul MG RJ e SP desde 2003 dos rios Piracicaba Capi vari e Jundiaí MG e SP desde 2006 e no rio São Francisco desde 2010 Os recursos arrecadados retornam integralmente para as agências de águas ou entidades delegatárias 45 gestão de florestas No âmbito da gestão de florestas públicas a concessão de florestas começou a ser adotada dentre outros como uma forma de proteger o patrimônio público e estruturar uma economia sustentável de base florestal O Serviço Florestal O Brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn Renato Rosenberg 85 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Brasileiro já disponibilizou mais de um milhão de hectares para manejo florestal atividade que pode gerar postos de trabalho e fazer movimentar a economia em lugares que necessitam de desenvolvimento sustentável É o começo do processo de exploração de uma área de negócios com grande potencial O manejo florestal é percebido simultaneamente como alternativa de ação para exploração econômica preservação ambiental e inclusão socioprodutiva A disseminação de boas práticas nessa esfera está condicionada por fatores como a o desenvolvimento de pesquisa florestal que indique alternativas de exploração viáveis e economicamente factíveis b a modelagem de negócios de forma a que o Serviço Florestal Brasileiro o IBAMA e o ICMBio funcionem em sintonia na condução da construção de parcerias com o setor privado e c a demonstração de viabilidade econômica desse tipo de empreendimento sem que a mesma seja demonstrada às expensas de cuidados ambientais e preocupações sociais 46 a gestão das unidades de conservação O ICMBio responde pela administração de UCs que ocupam 85 do terri tório nacional São 12 categorias de unidades parques nacionais estações ecológicas reservas biológicas refúgios de vida silvestre monumentos natu rais UCs de proteção integral áreas de relevante interesse ecológico áreas de preservação ambiental áreas de florestas nacionais reservas extrativistas áreas de desenvolvimento sustentável e UCs de uso sustentável das quais 32 já possuem planos de manejo e mais 27 estão com seus processos de elaboração em curso No contexto de disseminação de práticas associadas à EV discutese hoje o cardápio de arranjos institucionais passíveis de serem adotados nessas UCs de modo a identificaremse modelos de negócios capazes de compatibilizar tanto a premissa da preservação quanto do desenvolvimento de outras ativi dades como a pesquisa básica e aplicada o turismo o manejo sustentável de florestas o extrativismo a exploração econômica sustentável e outras A preservação depende em grande parte da sociedade perceber que é o uso consciente planejado e cuidadoso do patrimônio natural do país que garante a sua conservação e ampliação 5 deSafIOS Os desafios do Brasil na área ambiental são proporcionais às suas potencia lidades Envolvem repensar as estratégias de desenvolvimento econômico do país levandose em conta crescentes imperativos de natureza socioambiental Desenvolver uma economia verde forte e estruturada com aumento da geração dos empregos verdes é fundamental É uma questão nacional que transcende O Brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn Renato Rosenberg 86 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 a jurisdição do MMA e pela qual a sociedade e os diversos níveis de governo são responsáveis Há questões prementes como a compatibilização da necessidade de se aprimorar o combate ao desmatamento com a forte pressão por expansão agropecuária Mesmo a gestão da matriz energética nacional coloca dilemas importantes como aqueles associados à mudança do equilíbrio entre as fontes renováveis e não renováveis questão esta que não tem como ser tratada sem a análise dos custos e vantagens competitivas associados a cada alternativa A coordenação das políticas ambientais no âmbito da administração pública federal e a pactuação de um federalismo cooperativo relacionado ao processo de implementação dessas políticas são desafios permanentes O MMA possui interfaces com quase todos os outros ministérios da administração pública federal e pautas bilaterais estão sendo pactuadas com cada um No âmbito das relações intergovernamentais cabe o registro de que a problemática ambiental brasileira é nacional não federal Mas o capital de coordenação é sem dúvida recurso dos mais escassos de qualquer governo Diálogos com o setor empresarial com os movimentos sociais e com ONGs encontramse no DNA da agenda ambiental e não é de se surpreender o fato de que todos estejam se movendo com rapidez na direção de uma sociedade e de uma economia mais verdes A história do MMA é fruto em grande parte desses diálogos O desafio é aprofundálos de modo a que sejam cada vez mais qualificados e produtores de desdobramentos na esfera das políticas públicas de corte ambiental em especial as inclusivas Finalmente é preciso mencionar que o Brasil é hoje reconhecido internacio nalmente como uma potência ambiental global e que dialoga com países ricos em desenvolvimento emergentes e pobres em relação à agenda ambiental mundial No âmbito das grandes conferências mundiais na esfera da coope ração técnica internacional e no âmbito das plataformas SulSul Ibas Basic Brics Unasul etc esperase cada vez mais uma posição de protagonismo e vanguarda do país Mas liderança requer exemplo daí a importância do con junto da nação engajarse no enfrentamento desses desafios simultâneos de forma massiva mas coordenada 6 cOnclUSãO Sob vários aspectos geopolíticos o Brasil já partiu de uma situação privile giada na direção de uma economia verde As características naturais e o seu aproveitamento realizado em épocas passadas já nos conduziram a uma matriz energética das mais limpas do mundo As iniciativas recentes focadas aqui no escopo de atuação do governo consistem em sua maioria no início de um trabalho de consolidação e de desenvolvimento nas diferentes áreas O Brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn Renato Rosenberg 87 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Em boa parte dos casos tratase do começo da estruturação institucional e da criação de mecanismos econômicos que compõem a agenda de um país cada vez mais voltado para a evolução de mercados relacionados à economia verde Algumas iniciativas vêm apresentando desde já bom desempenho tais como a redução do desmatamento no caso do bioma Amazônia o que não significa dizer que não haja uma longa estrada pela frente tanto para este como especialmente para os demais biomas Devese conjugar a melhor proteção com o devido aproveitamento de sua biodiversidade de forma integrada ao processo de desenvolvimento nacional A EV inserese no contexto de um projeto nacional de desenvolvimento sustentável e inclusivo que não aceita do ponto de vista da proposta política do governo tradeoffs artificiais e que não servem ao interesse nacional como crescimento versus sustentabilidade ou inclusão social versus preservação ambiental O MMA integrante da administração pública federal é hoje ator estratégico na agenda econômica do país porque o governo entende que não há desen volvimento que não busque a sustentabilidade e a biodiversidade REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Barbier E B 2009 Rethinking the economic recovery a global green new deal Relatório preparado para o departamento de Economia e Mercado da Divisão de Tecnologia Indústria e Economia do PNUMA EUA Departamento de Economia e Finanças Universidade de Wyoming CEPAL 2010 La economía del cambio climático en América Latina y el Caribe Síntesis 2010 Santiago do Chile Publicação das Nações Unidas Decreto Federal nº 19717 de 20 de fevereiro de 1931 Governo Federal 2008 Plano Nacional sobre Mudança Global do Clima PNMC Brasil Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima Magalhães Castro M H e Schwartzman S 1981 Tecnologia para a indústria a história do Instituto Nacional de Tecnologia Disponível em httpwwwschwartzmanorg brsimonintint1htm Acesso em 19 de setembro de 2007 MMA 2010 Tabela de Indicadores do MMA Disponível em httpwwwmmagov brestruturas219arquivostextoindicador1relaoentredemandaeofertade gua2010219pdf Acesso em 08 de abril de 2011 MME 2008 Biocombustíveis instrumento para inclusão social e fator de desenvol vimento econômico com respeito ao meio ambiente Disponível em httpwww mmegovbrmmegaleriasarquivosArtigosBiocombustxveisinstrumentopara inclusxosocialpdf Acesso em 08 de abril de 2011 Presidência da República do Brasil 2011 Mensagem ao Congresso Nacional 2011 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 54ª legislatura Brasília UNEP 2011 Towards a green economy Pathways to sustainable development and poverty eradication A synthesis for policy makers StMartinBelleveu França UNEP O Brasil e a economia verde um panorama Francisco Gaetani Ernani Kuhn Renato Rosenberg 88 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Potencial de crescimento da economia verde no brasil1 CARLOS EDUARDO FRICKMANN YOUNG2 1 ecOnOMIa veRde cOMO nOvO padRãO de deSenvOlvIMentO O conceito de economia verde propõe que a dinamização da economia deve se dar pela expansão de setores de baixo impacto ambiental através do incentivo de ações como tecnologias limpas energias renováveis transportes verdes gestão de resíduos prédios verdes agricultura sustentável manejo florestal e pagamento por serviços ambientais O argumento é de que esse processo de reconfiguração das atividades econômicas oferece melhor retorno sobre os investimentos em capital natural humano e econômico enquanto ao mesmo tempo reduz a pressão sobre o meio ambiente e contribui para maior equidade social3 Assim a economia verde oferece a oportunidade de conciliar as metas tradicionais da política econômica particularmente crescimento da renda e do emprego com os objetivos sociais e ambientais do desenvolvimento sustentável uma estratégia para inserirse em um processo de desenvolvimen to baseado na capacidade endógena de geração e incorporação de progresso técnico ao mesmo tempo em que as questões sociais incluindo a proteção ambiental recebem a mesma importância que os objetivos econômicos O objetivo deste artigo é mostrar que o esverdeamento da economia brasileira através da expansão de atividades econômicas de baixo impacto ambiental pode trazer resultados melhores para a geração de emprego e renda do que o atual modelo de especialização em exportações de recursos naturais explorados predatoriamente ou de bens industriais com elevado grau de poluição em seus processos produtivos Ou seja um modelo alternativo baseado na expansão de setores limpos pode trazer mais benefícios so ciais e econômicos do que o caminho atual de especialização em atividades sujas A fim de demonstrar essa afirmação são apresentados os resultados de um modelo de matriz de insumoproduto que permite comparar opções alternativas de crescimento econômico verde ou marrom em termos da capacidade 1 Este artigo é resultado do projeto de pesquisa Transición de América Latina y el Caribe hacia un modelo de crecimiento verde e inclusivo apoiado pelo PNUMA e CEPAL Agradeço a Leonardo Barcellos de Bakker e André Falkenbach Santoro pelos comentários e auxílio na elaboração deste texto 2 Professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro IEUFRJ Email youngieufrjbr 3 UNEP 2011 89 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 de gerar emprego e renda Young 2010 Os cenários de crescimento espúrio com base na depleção ou degradação de recursos naturais trazem resultados piores do que os cenários onde o dinamismo da produção é concentrado em setores menos prejudiciais ao meio ambiente a criação de emprego e salário é maior nos cenários em que a dependência dos recursos naturais e a degra dação são reduzidas provando que é falsa a dicotomia entre conservação ambiental e melhoria das condições econômicas 2 a ReeSpecIalIzaçãO da aMéRIca latIna na expORtaçãO de RecURSOS natURaIS A crescente dependência das exportações baseadas em recursos naturais ou bens intensivos em poluição é um problema estrutural nos países latino americanos que têm suas exportações cada vez mais concentradas em re cursos naturais ou bens industriais caracterizados por um grau relativamente elevado de poluição em seus processos de produção Young 1998 Young e Lustosa 2001 2002 Malavasi et al 2005 Essa tendência foi acentuada nos últimos anos tanto em termos da participação relativa de recursos naturais na pauta de exportação quanto da especialização em bens industriais inten sivos em poluição Os resultados obtidos por Young 2010 usando a base de dados de comércio internacional TradeCan e os coeficientes de emissão potencial de poluentes industriais ILITHA do Industrial Pollution Projection System IPPS Hettige et al 1994 mostram que há uma clara tendência de aumento da dependência da pauta exportadora de bens primários que tem acelerado rapidamente nos anos 2000 As figuras 1 e 2 apresentam os resultados para o Brasil Potencial de crescimento da economia verde no Brasil Carlos Eduardo Frickmann Young Fonte Young 2010 com base em dados do TradeCan figura 1 Participação dos produtos primários nas exportações brasil e américa latina 90 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Esses resultados estão associados à hipótese de desindustrialização mos trando que o processo de liberalização iniciado nos anos 1990 juntamente com o boom dos preços das commodities nos anos 2000 deixaram uma mu dança estrutural na região retornando a uma posição na qual o dinamismo dos mercados externos é baseado em vendas diretas de recursos naturais ou de bens cuja produção é intensiva em emissão de poluentes Combinando ambos resultados nos anos 2000 as exportações do Brasil e da América Latina ficaram cada vez mais dependentes da competitividade espúria baseada em esgotamento da base de recursos naturais ao invés de um ciclo virtuoso em que os ganhos comerciais seriam obtidos a partir do progresso técnico e da inovação Esta questão é particularmente problemática porque os consumidores nos países desenvolvidos estão cada vez mais conscientes das pegadas ambientais dos produtos que compram e a posição da América Latina pode ser vista como frágil se essa consciência refletirse em restrições comerciais contra produtos danosos ao meio ambiente Apesar desses problemas é comum encontrar defensores da atual ten dência de crescimento calcado em recursos naturais ou produtos intensivos em emissão sob o argumento de que as perdas ambientais são um custo necessário para o desenvolvimento econômico Essa hipótese usualmente chamada de curva ambiental de Kuznets justificaria que em determinadas etapas do desenvolvimento o sacrifício da base de recursos naturais é um preço inevitável para a melhoria das condições materiais de vida da popula ção A próxima seção apresenta um modelo visando testar a validade dessa hipótese no contexto brasileiro figura 2 intensidade média de poluição potencial das exportações industriais ilitHaiPPS brasil e américa latina Fonte Young 2010 com base em dados do TradeCan e IPPS Hettige et al 1994 Potencial de crescimento da economia verde no Brasil Carlos Eduardo Frickmann Young 91 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 3 pOlUIçãO IndUStRIal e InclUSãO SOcIal cenÁRIOS paRa O fUtURO Na sessão anterior demonstrouse que o Brasil e o resto da América Latina aumentaram sua dependência estrutural de bens primários e bens intensivos em poluição na sua cesta de produtos para exportação Obviamente isso traz consequências negativas para o meio ambiente Mesmo assim as expor tações têm sido um dos grandes motores do crescimento econômico e por isso argumentase que é necessário aceitar alguns danos ambientais para aumentar o ritmo da atividade econômica A hipótese implícita nesse argumento é a de que atividade econômica e conservação ambiental estão necessariamente em oposição e que conse guintemente os formuladores de políticas públicas têm que decidir entre i aumentar o nível de emprego e renda ou ii debilitar o crescimento econômico em busca da preservação ambiental O objetivo dessa sessão é mostrar que um caminho alternativo de crescimento econômico é possível exemplificando como a prioridade à economia verde além de conservar o meio ambiente trará efeitos benéficos para os níveis de emprego e renda Essa sessão examina o problema testando se um crescimento baseado em degradação dos recursos naturais traria resultados melhores ou piores do que a alternativa econômica de concentrar o produto em atividades de maior valor agregado que trazem menos danos ao meio ambiente Para ilustrar esse argumento foram construídos cenários usando a matriz insumo produto de 2005 que é a mais recente do Brasil comparando diferentes possibili dades de crescimento econômico usando a geração de empregos e salários como medida de crescimento da economia Entre outras razões emprego e salários são bons indicadores de crescimento com inclusão social já que eles expressam melhor a evolução do bemestar do que o crescimento do PIB Além disso considerando a altíssima concentração de renda da América Latina é mais importante evitar medidas de crescimento que não considerem a redistribuição da renda Os exercícios efetuados buscaram responder às seguintes questões O que gera crescimento maior a expansão de atividades intensivas em recursos naturais ou aquelas baseadas em bens manufaturados ou em serviços Dentro do setor manufatureiro o que gera crescimento maior a expansão de atividades mais ou menos intensivas em poluição A vantagem de usar a matriz insumoproduto é que ela permite a percepção da cadeia inteira de produção Para fazer com que os cenários sejam com paráveis todos eles devem se basear em expansões similares da demanda final através de um crescimento exógeno das exportações Potencial de crescimento da economia verde no Brasil Carlos Eduardo Frickmann Young 92 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Existe uma série de limitações quanto ao uso de uma matriz insumoproduto Coeficientes técnicos e preços relativos são assumidos como constantes como se a economia se mantivesse estática durante o período de análise Além disso não existem coeficientes de emissões observadas apenas po tenciais estimativas baseadas em modelos mais antigos como o Sistema de Projeção da Poluição Industrial IPPS elaborado pelo Banco Mundial e que baseia esta análise Apesar de todos os problemas relatados acima o exercício de insumo produto baseado em uma economia real provê resultados importantes já que permitem a consideração de cadeias intersetoriais e são uma maneira muito mais efetiva para simular um crescimento alternativo de possibilidades que pressupostos sem base ou teste sobre a consistência de seus resultados a metodologia O exercício simulou uma expansão da demanda final em R 40 bilhões em preços de 2005 ou aproximadamente 12 das exportações em 2005 esse valor foi escolhido por ser a média do crescimento anual das exportações bra sileiras entre 2000 e 2005 Cada cenário distribuiu a expansão desse mesmo valor R 40 bilhões em combinações diferentes de aumento da demanda final nos setores econômicos A primeira questão que surge é saber qual setor gera maior crescimento medido pelo crescimento de empregos e salários A economia foi dividida em três grandes setores produtos primários manufaturados e serviços e a expansão total da demanda final R40 bi foi distribuída de acordo com os seguintes critérios No Cenário 1 a expansão da demanda final deuse somente nas atividades primárias No Cenário 2 a expansão da demanda final ocorreu apenas nos produtos manufaturados No Cenário 3 a expansão da demanda final foi distribuída entre os setores de serviços utilidades industriais e construção civil A segunda questão é saber se há diferenças entre o crescimento liderado pelas indústrias mais limpas ou mais sujas em termos de emprego e ge ração de renda Para responder a isso o cenário 2 foi dividido em dois sub cenários nos quais o crescimento da atividade industrial foi diferenciado pela intensidade potencial de poluição de acordo com os coeficientes do IPPS as 10 indústrias mais poluidoras de acordo com o IPPS foram separadas do resto da indústria No cenário 21 assumiuse que a maior parte do crescimento da de manda final R 30 bi foi concentrada nas 10 atividades mais poluidoras Potencial de crescimento da economia verde no Brasil Carlos Eduardo Frickmann Young 93 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 enquanto o crescimento das exportações das atividades menos poluidoras foi de apenas R 10 bi No cenário 22 simulouse o contrário do cenário anterior assumindo que as 10 atividades mais poluidoras tiveram um crescimento de apenas R 10 bi enquanto as menos poluidoras cresceram R 30 bi As 10 atividades industriais mais poluidoras de acordo com o IPPS são Produtos madeireiros excluindo móveis Papel e celulose Refinarias de petróleo e coque Produtos químicos Resinas Produtos químicos e seus derivados diversos Cimento Outros produtos nãometálicos Manufaturas de metal Metalurgia nãometálica A produção total associada a cada um desses cenários foi obtida pela mul tiplicação da matriz de Leontief pela expansão dos respectivos aumentos de demanda final Então o aumento do emprego pessoal ocupado foi calculado multiplicando o trabalhocoeficiente de rendimento relação entre o emprego e o valor da produção por atividade pelo coeficiente de expansão da produção por setor A equação abaixo resume o procedimento ΔNi NVP i a1 Δxi Onde ΔNi Expansão do emprego no cenário i NVP Emprego Valor da produção I A1 Matriz de Leontief para o Brasil 2005 calculada pelo IBGE Δxi Expansão da exportação no cenário i O aumento dos salários incluindo as contribuições sociais foi estimado em termos similares multiplicando o salário coeficiente de rendimento relação entre os salários incluindo as contribuições sociais e valor da produção por atividade pelo coeficiente de expansão da produção por setor A equação abaixo resume o procedimento ΔWi WVP i a1 Δxi Onde ΔWi Expansão do salário no cenário i WVP SaláriosValor da produção Potencial de crescimento da economia verde no Brasil Carlos Eduardo Frickmann Young 94 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 b Resultados A Tabela 2 apresenta os resultados agregados para cada cenário É muito interessante que embora a expansão agregada das exportações seja a mesma em todos os cenários R 40 bilhões os resultados variam consideravelmente tanto em termos de geração de emprego como de geração de salário tabela 1 emprego e salários criados por cenário Cenário Criação de Criação de empregos salários R Bi cenário 1 Expansão em atividades primárias 2476906 11182 cenário 2 Expansão na indústria manufatureira aumento linear em todos os setores 1351194 13186 Cenário 21 Expansão na indústria manufatureira aumento concentrado nos setores mais poluidores 1050523 11747 Cenário 22 Expansão na indústria manufatureira aumento concentrado nos setores menos poluidores 1409478 13464 cenário 3 Expansão em serviços utilidades industriais e construção civil 2008166 15220 Fonte elaboração própria baseada em IBGE Matriz InsumoProduto Brasil 2005 À primeira vista parece que no cenário 1 a expansão de atividades pri márias teria favorecido mais o crescimento do emprego já que apresenta o número mais elevado de postos de trabalho criados No entanto dois elementos devem ser considerados A expansão nas atividades primárias gera a menor expansão dos salários indicando que a qualidade dos empregos criados por esses setores é o de pior qualidade entre todos os cenários Os resultados do cenário 3 carac terizado por atividades identificadas com o crescimento desmaterializado mostra que o salário total teria sido de 36 a mais que no cenário 1 embora o emprego teria aumento de 19 a menos Efeitos dinâmicos os modelos baseados em matrizes insumoproduto projetam os padrões atuais para o futuro mantendo todos os parâmetros técnicos constantes ao longo do tempo No entanto a rápida mecanização na produção agrícola e a crescente intensidade de capital no setor de mi neração têm tido o efeito de substituir mais trabalho reduzindo a demanda por mãodeobra Por isso esses setores são responsáveis por desemprego líquido ao invés de emprego Isto pode ser comprovado observandose as Potencial de crescimento da economia verde no Brasil Carlos Eduardo Frickmann Young 95 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Contas Nacionais brasileiras a rápida expansão das atividades primárias aumentando a sua participação no PIB de 72 para 84 no período 2000 2006 foi acompanhada por uma redução constante da força de trabalho total de 224 para 198 no mesmo período tabela 2 tabela 2 Participação relativa das atividades primárias no Pib e emprego brasil Atividades primárias no PIB total 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 72 74 82 91 88 82 84 Atividades primárias no emprego total 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 224 213 211 211 215 210 198 Fonte elaboração própria baseada em IBGE Contas Nacionais Por outro lado a expansão no cenário 3 mostra um bom desempenho do emprego o segundo maior volume de empregos criados e o maior aumento do salário total Observe que o cenário 3 é o mais identificado com o esver deamento da economia já que expande a construção civil investimentos em limpeza da economia exigem obras de construção civil como por exemplo saneamento e serviços a base da desmaterialização do crescimento com base no conhecimento cultura tecnologia e componentes tácitos Percebese uma tendência semelhante no interior da indústria manfutarei ra A expansão das exportações concentrase no grupo de indústrias menos poluentes cenário 22 que teriam gerado 34 mais empregos e 15 mais salários do que no cenário 21 onde os setores dinâmicos são os mais po luentes Isso está relacionado ao fato de que a maioria dos setores de elevado potencial poluente como bens intermediários são muito intensivos em capital e demandam relativamente poucos empregos A mensagem da análise desses resultados é clara é uma falácia conside rar que os países em desenvolvimento como o Brasil têm de decidir entre crescimento econômico e qualidade ambiental Os cenários que apresenta ram os resultados mais consistentes para melhorar a atividade econômica medida pelo emprego e a criação de salário são exatamente aqueles onde a dependência no consumo de recursos naturais e a degradação são reduzidas Portanto não há razão para acreditar que como previsto pela curva ambiental de Kuznets a piora na qualidade ambiental é necessária para conseguirse maior atividade econômica cenários com mais poluição e esgotamento dos recursos levariam à redução do crescimento se comparados com cenários de crescimento verde Potencial de crescimento da economia verde no Brasil Carlos Eduardo Frickmann Young 96 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 cOnclUSãO Este trabalho mostrou que as iniciativas da economia verde são uma oportunidade para iniciar um novo padrão de desenvolvimento com base na capacidade endógena de geração e incorporação de progresso técnico mas sendo socialmente inclusivo e ambientalmente responsável Nesse sentido existem muitas semelhanças com o conceito original de industrialização propos to no Sistema CentroPeriferia Prebisch 1949 o desenvolvimento de longa duração só pode ser alcançado quando a economia se torna mais intensa em inovação e menos dependente da exploração extensiva da base de recursos naturais Esse argumento foi posteriormente aprofundado por Fajnzylber 1988 através do conceito de competitividade autêntica ou sistêmica Entretanto os exercícios empíricos têm mostrado que há uma tendência clara desde o final da década de 1990 de aumentar a dependência das exportações de bens primários e de bens industriais que são intensivos em poluição durante seu processo de produção Esse resultado é motivo de grande preocupação pois mostra que o Brasil e demais economias latinoamericanas estão fazendo o oposto do que é exigido pelos princípios do desenvolvimento sustentável Além disso há um risco crescente de que os mecanismos de punição poderão ser estabelecidos nos produtos sujos no comércio inter nacional com prejuízos óbvios para os países que têm as suas exportações associadas à degradação ou esgotamento dos recursos naturais O principal argumento para aqueles que defendem o status quo é que os países em desenvolvimento têm de decidir entre o crescimento econômico e qualidade ambiental A hipótese implícita por trás dessa visão é que a atividade econômica e a conservação ambiental estão necessariamente em oposição e portanto os tomadores de decisões têm de decidir entre um ou outro como se preservar os recursos naturais requeresse automaticamente travar o cres cimento da renda e de emprego Esse argumento conhecido como curva ambiental de Kuznets é comumente referido na literatura apesar de não haver evidências incontestáveis de que um padrão de crescimento sujo traria melhores resultados do que um esverdeamento da economia Para testar as diferenças em termos de criação de emprego e salários em padrões sujo e limpo cenários foram criados utilizando técnicas de insumo produto para simular as consequências do emprego de diferentes padrões de uso de recursos naturais Em cada cenário a mesma quantidade de demanda final foi considerada mas com distribuição setorial diferente Emprego e salá rios foram considerados como medida de crescimento porque são melhores indicadores de inclusão social do que o PIB Os resultados são muito consistentes mostrando que o crescimento espúrio com base no consumo de recursos naturais ou a degradação pode trazer re sultados muito piores do que outras opções econômicas que se concentram na Potencial de crescimento da economia verde no Brasil Carlos Eduardo Frickmann Young 97 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 produção de maior valor agregado de produtos que são menos prejudiciais ao meio ambiente Os cenários com aumento do emprego e criação de salário são exatamente aqueles em que a dependência no consumo de recursos naturais e a degradação são reduzidas Mais poluição e o esgotamento dos recursos naturais levariam a desempenhos desfavoráveis ao invés de um crescimento mais inclusivo levando a um resultado oposto ao esperado a partir da curva ambiental de Kuznets Finalmente devese ressaltar que os resultados apresentados neste rela tório têm importantes limitações relacionadas à metodologia e às hipóteses utilizadas e que a qualidade dos dados está longe de ser ideal A melhoria dos dados de produção e geração de indicadores ambientais são uma necessidade importante para melhorar nossa compreensão sobre a relação entre o comércio questões de competitividade e o meio ambiente Assim outra recomendação de política é a implementação de um sistema eficaz de informações ambientais relacionadas com os indicadores econômicos já existentes REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Fajnzylber F 1988 Competitividad internacional evolución y lecciones Revista de la CEPAL n 36 dezembro 724 Hettige H Martin P Singh M e Wheeler D 1994 IPPS The industrial pollution projection system Washington DC World Bank Malavasi L O Schuschny A R e Gallopín G 2005 Evolución de las emisiones industriales potenciales en América Latina 19702000 Serie Medio Ambiente y Desarrollo 97 Santiago de Chile CEPAL Prebisch R 1949 El desarrollo económico de la América Latina y algunos de sus principales problemas Santiago de Chile CEPAL Young C E F 1998 Industrial pollution and exportoriented policies in Brazil Revista Brasileira de Economia v52 543561 Young C E F 2010 Transition towards a green and inclusive economic model a Latin American perspective Relatório de pesquisa para o projeto Transición de América Latina y el Caribe hacia un modelo de crecimiento verde y inclusivo PNUMACEPAL Rio de Janeiro IEUFRJ Young C E F e Lustosa M C J 2001 Meio ambiente e competitividade na indústria brasileira Revista de Economia Contemporânea v 5 231259 Young C E F e Lustosa M C J 2002 Competitividade e meio ambiente In Braga A S e Miranda L C ed Comércio e meio ambiente uma agenda para a América Latina e Caribe 4160 Brasília MMA UNEP 2011 Towards a green economy pathways to sustainable development and poverty eradication a synthesis for policy makers Disponível em wwwuneporg greeneconomy Potencial de crescimento da economia verde no Brasil Carlos Eduardo Frickmann Young 98 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 o brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição CLÁUDIO R FRISCHTAK1 IntROdUçãO A visão dominante acerca da conservação do meio ambiente continua sen do a de que no processo de desenvolvimento os países são confrontados em última análise com uma escolha mais crescimento ou mais conservação Para propor as bases de uma nova economia é necessário reexaminar seus supostos básicos e a forma como se contabilizam seus resultados Não é tarefa simples pois a fragilidade do paradigma dominante não reside na experiência concreta dos países Afinal de contas a revolução industrial foi predadora de recursos naturais mas acelerou o crescimento e gerou elevação do nível de bemestar Então por que repensar a economia abandonando a conexão aparentemente tão mais necessária quanto menor o nível de renda entre crescimento e uso intensivo e insustentável dos recursos Em primeiro lugar porque a exaustão da capacidade de os ecossistemas suportarem a pressão da atividade econômica poderá restringir o próprio crescimento econômico Nessa perspectiva somente com a conservação o crescimento se tornaria viável Em segundo lugar a necessidade de promover o desenvolvimento em novas bases produzirá novas oportunidades Produtos e serviços voltados para soluções para a economia verde terão crescente participação na atividade econômica A exaustão do antigo modelo e a transição para uma economia verde impõem uma inversão da lógica dominante maior crescimento passaria a depender e ser necessariamente acompanhado por maior conservação ou uso sustentá vel dos recursos de modo que o novo tradeoff seria entre crescimento e uso predatório do capital natural O objetivo deste trabalho é estabelecer as bases para uma economia verde no Brasil e uma estratégia de transição a tRanSIçãO paRa a ecOnOMIa veRde nO bRaSIl A economia verde não tem precedente nem modelo Ela supõe uma trans formação do modo de produzir e consumir a redefinição do planejamento 1 Presidente da InterB Consultoria Internacional de Negócios 99 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 governamental e de políticas públicas e maior ênfase no esforço inovador Para permitir uma aproximação da abordagem das políticas públicas no apoio setorial à transição para a economia verde desenvolvese a seguinte estrutura analítica para fins de facilitar a exposição A oferta é organizada em duas categorias A oferta de mercado é aquela que responde de forma autônoma seja a uma demanda preexistente ou que apresenta aspectos tais que a própria oferta gera a demanda em ambos os casos a produção resulta do curso normal dos negócios das empresas incumbentes e da entrada de novas firmas A oferta estruturada é aquela que pela dificuldade de atingir a demanda pelos retornos insuficientes ou pela complexidade tecnológica ou institucional que envolve requer algum nível de intervenção ou apoio seja em PD no planejamento ou no próprio investimento na organização da produção ou na precificação A estruturação da oferta pode envolver investimentos diretos de governo subsídios fiscais e financeiros mudanças no plano regulatório dentre outras ações A demanda por sua vez poderia ser classificada como espontânea quando emerge das necessidades básicas dos indivíduos sendo determinada fundamentalmente pelo nível de renda e educação pelo volume e natureza da informação a que estes têm acesso pela experiência de consumo e pelo seu entorno via efeito demonstração ou ainda como induzida a qual requer que seja manejada ou estimulada por meio de transferências normas e outras ferramentas inclusive por campanhas de conscientização e educação pública para assegurar a criação de mercados para bens e serviços que es pontaneamente não surgiriam Essas categorias produzem uma matriz 2x2 A figura 1 sintetiza a estrutura analítica aqui proposta No sentido horário começando pelo quadrante supe rior esquerdo temse o quadrante I que abarca atividades que combinam uma demanda espontânea e uma oferta de mercado e que em conjunto constituem parte dominante do PIB na economia ainda que parte menor do PIB Verde O quadrante II é composto por atividades que necessitam que a oferta seja estruturada para que o mercado se forme e que a demanda potencial seja suprida O quadrante III reúne atividades que dependem tanto da estruturação da oferta quanto da indução da demanda para se tornarem economicamente viáveis Essas seriam em tese as que levariam mais tempo e absorveriam mais recursos para responderem Por fim o quadrante IV engloba atividades que se viabilizam se a demanda é estimulada por meio de um fluxo maior de informação inclusive campanhas de esclarecimento transferências ao consumidor que induzam mudanças de hábito e outras medidas que mudem o padrão de consumo dominante O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak 100 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 figura 1 matriz de atividades do Pib Verde e da dinâmica das políticas públicas A matriz ilustra também a dinâmica de uma atividade tipicamente verde cuja dimensão inicial é limitada mas que impulsionada pela mão do Estado inicialmente na estruturação da oferta e posteriormente pela indução de sua demanda expandese ao longo do tempo simbolicamente círculos concêntri cos maiores caracterizando a transição para uma economia verde Retornos crescentes de escala ou o acúmulo de experiência refletido em curvas de aprendizado e consequentes ganhos de produtividade poderão fazer com que algumas dessas atividades retornem ao quadrante I ou na sua direção tendo já adquirido uma dimensão que dê economicidade à atividade Vejamos a aplicação dessa estrutura analítica a um conjunto de atividades que seriam parte constituinte do PIB Verde entendido como o conjunto de atividades econômicas que conservam ou ampliam o estoque de capital natural e apesar de não exaurirem a potencialidade do PIB Verde são possivelmente as mais emblemáticas2 conservação dos ecossistemas Essa categoria é composta pelas atividades econômicas que contribuem para a integridade dos ecossistemas e sua capacidade de prover suporte material e a multiplicidade de serviços essenciais a uma vida digna para a atual e as futuras gerações O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak 2 A área dos círculos reflete a importância econômica relativa das atividades medidas em caráter aproximado pela sua contribuição ao PIB do país ofeRta meRcaDo eStRutuRaDa DemaNDa iNDuZiDa eSPoNtÂNea 101 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 figura 2 conservação dos ecossistemas Elaboração InterB Fontes 1 Valorização do Real e competitividade das exportações 70410 httpwww administradorescombrinformeseinformativovalorizacaodorealecompetitividadedas exportacoes31985 2 Mudança de hábito 270509 Valor Econômico 3 Espécies invasoras causam prejuízo de US14 trilhão 280410 Valor Econômico 4 Jóias da Floresta 280410 Valor Econômico 5 Valor econômico e sociocultural do ecoturismo e das atividades recreacionais providas pela Área de Proteção Ambiental Serra de São José MG PIBICCNPq httpwwwsoberorgbr palestra5499pdf 6 Lavouras de árvores 121205 Unicamp httpwwwportaldoagronegociocombr conteudophpid23107 7 Discussão sobre REDD define futuro da floresta 240809 Valor Online Na figura 2 notase que essas atividades são ainda de magnitude relativa mente pequena e contam com apoio limitado concentrandose no quadrante I Ainda não há para todos os efeitos uma verdadeira economia da floresta com uma exploração inteligente e em escala não apenas dos produtos da bio diversidade fármacos cosméticos mas também do extrativismo sustentável e turismo ecológico dentre outros A maior exceção é o plantio do eucalipto em terras nuas ou exploradas pela pecuária de baixa produtividade principal mente quando combinado com a restauração da vegetação nativa Exemplo recente3 sugere que esta última alternativa de recomposição da cobertura vegetal é economicamente viável e na medida em que ganha escala e expe riência consolidase como uma atividade do quadrante I O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak 3 O Vale Reflorestar fundo com patrimônio de R 605 milhões para reflorestamento Jornal do Comercio 060510 ofeRta meRcaDo eStRutuRaDa DemaNDa iNDuZiDa eSPoNtÂNea REFLORESTAMENTO ESPÉCIES NATIVAS 6 FARMACOS NATURAIS 1 COSMÉTICOS NATURAIS 4 REFLORESTAMENTO ESPÉCIES ExÓTICAS 3 PRODUTOS ORGÂNICOS 2 AGROPECUÁRIA SUSTENTÁVEL TURISMO ECOLÓGICO 5 ExTRATIVISMO SUSTENTÁVEL ALIMENTOS REDD REDD 7 102 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 figura 3 conservação dos ecossistemas na transição para a economia verde De modo geral a ampliação dessas atividades depende não apenas das políticas de governo basicamente estruturando a oferta e ocasionalmente in duzindo a demanda como da legislação básica que promova a proteção e uso sustentável dos ecossistemas Na esfera da proteção aos ecossistemas o país conta com uma legislação bastante abrangente centrada fundamentalmente no Sistema Nacional de Unidades de Conservação SNUC no Código Florestal no Código de Águas e nas normativas que orientam a utilização de recursos naturais as atividades econômicas e a intervenção nas paisagens O sistema de proteção das UCs necessita ser reforçado com a criação de novas unidades em áreas críticas e fundamentalmente pela consolidação das UCs existentes São necessários sistemas de gestão monitoramento e fiscalização que garantam a integridade das unidades e que coíbam ati vidades predatórias no seu interior É preciso a criação de uma rede social de proteção em torno e no interior das unidades com o engajamento das comunidades tradicionais dotandoas de condições dignas de vida inclusive pelo pagamento dos serviços ambientais e pela exploração sustentável dos recursos naturais O Código Florestal é o outro texto básico que ordena as atividades no plano da conservação e cuja revisão tem sido objeto de debate conflituoso Para muitos produtores na fronteira o cadastramento e licenciamento ambiental no contexto de um plano de recomposição de APPs e Reserva Legal assim como a regularização fundiária legalizando o uso da terra para fins econômicos no marco da legislação é o mais vantajoso Um instrumento poderoso e pouco utilizado numa perspectiva de susten tabilidade no campo é o crédito rural O Plano de Safra 201011 dá um passo O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak ofeRta meRcaDo eStRutuRaDa DemaNDa iNDuZiDa eSPoNtÂNea AGROPECUÁRIA SUSTENTÁVEL TURISMO ECOLÓGICO 5 ExTRATIVISMO SUSTENTÁVEL ALIMENTOS REDD REDD 7 REFLOREST ESPÉCIES NATIVAS 6 COSMÉTICOS NATURAIS 4 PRODUTOS ORGÂNICOS 2 103 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 nesse sentido com o Programa de Agricultura de Baixo Carbono ainda que o programa absorva não mais do que 5 dos recursos disponíveis4 Ademais há outros instrumentos de promoção dessas atividades Certas medidas compõem as políticas de governo mas necessitam ser ampliadas a exemplo do ICMS ecológico De forma mais ampla devese estimular empre sas e indivíduos a elaborarem e executarem projetos de utilização sustentável e inteligente dos recursos naturais com a conservação e recomposição dos ecossistemas O fundamental é que a proteção dos ecossistemas não seja apenas uma tarefa de governo mas envolva ativamente a sociedade transportes e saneamento São analisadas aqui as atividades que servem para estruturar cidades sus tentáveis por meio de investimentos direcionados a melhorias na acessibilidade mobilidade e saneamento figura 4 Redes de cidades sustentáveis Elaboração InterB Fontes 1234 Governo culpa carro e moto por poluição 260310 Folha de São Paulo 23Chineses e espanhóis entram na disputa pela obra do TAV 060809 httpwwwco pa2014orgbrnoticiasNoticiaaspxnoticia870 4 Mesmo sem orçamento governo quer mais hidrovias 120110 Valor Econômico 5 Baltar Emerenciano e PereiraSubsídio na prestação de serviços de água e esgoto http wwwabrhorgbrnovoisimprechidriccentrooestebsb21pdf 6 Sem ajuda oficial carro elétrico é inviável 130410 Valor Econômico 7 Reinventar a Mobilidade 120809 Agenda Sustentável httpwwwagendasustentavel combrartigoaspxid2765 8 Paes diz que bilhete único não terá subsídio 280410 O Globo O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak 4 Ver Valor 07062010 p B12 ofeRta meRcaDo eStRutuRaDa DemaNDa iNDuZiDa eSPoNtÂNea BILHETE ÚNICO 3 SANEAMENTO 5 TRANSPORTE CICLOVIÁRIO 7 BUSRAPID TRANSIT CARRO ELÉTRICO 6 TRANSPORTE METROVIÁRIO 2 TRANSPORTE FERROVIÁRIO METROPOLITANO 3 104 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Observase na figura 4 que de modo geral para existirem ou ganharem escala essas atividades necessitam de uma oferta estruturada pois não há solução pura de mercado a exemplo de transporte de massa eficiente e de baixo impacto ferroviário metroviário bondes BRT Esses sistemas que facilitam a acessibilidade na rede de cidades são críticos para a mobilidade intraurbana Se bem que inovações tais como o carro elétrico devam ser encaradas como um avanço as cidades só serão efetivamente sustentáveis se irrigadas por sistemas eficientes de transporte de massa Já no caso de saneamento básico sua viabilidade econômica geralmente depende do nível de renda dos usuários além do custo de investimento As fragilidades dos sistemas de transportes e saneamento e o baixo grau de adaptação das cidades ao seu entorno natural exigem o desenho de uma estratégia específica de modo a tornálos sustentáveis Devese considerar o alto grau de urbanização do país seu impacto sobre a qualidade de vida e o fato de que a intervenção do setor público tanto no âmbito dos investimentos quanto da normatização das atividades urbanas parece essencial Figura 5 A figura 5 sugere a importância de políticas ativas para a sustentabilidade dos sistemas de transporte e saneamento com especial ênfase no transporte de massa As regiões metropolitanas necessitam de um planejamento integrado no plano da acessibilidade e mobilidade assim como na questão do saneamento Isso deve ser tratado por um órgão de planejamento metropolitano e com poderes de alocação de recursos respeitando os processos de consulta à sociedade Os investimentos voltados para a melhoria da qualidade de vida da população urbana são elevados e o interesse coletivo deve ser o critério dominante nas decisões de investimento no que diz respeito à alocação de recursos figura 5 Redes de cidades sustentáveis na transição para a economia verde O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak TREM ALTA VELOCIDADE BUSRAPID TRANSIT ofeRta meRcaDo eStRutuRaDa DemaNDa iNDuZiDa eSPoNtÂNea SANEAMENTO 5 TRANSPORTE CICLOVIÁRIO 7 CARRO ELÉTRICO 6 TRANSPORTE METROVIÁRIO 2 TRANSPORTE FERROVIÁRIO METROVIÁRIO 3 105 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 energia Essa categoria é composta por atividades direcionadas à produção e ao uso eficiente de energias renováveis O Brasil tem uma situação relativamente peculiar no sentido de que o país já possui uma estrutura relativamente adap tada a uma economia de baixo carbono por deter significativa participação de energias renováveis a figura 6 sugere contudo que a nova geração de soluções energéticas solar eólica nuclear e projetos de fronteira em hidreletricidade e utilização de biomassa ainda não ganharam escala como já o fizeram os biocombustíveis e para tanto vão necessitar de formas de apoio mais estruturadas A agenda de sustentabilidade em energia é densa como ilustrado pela figura 7 É necessário transitar para a fronteira da economia eficiência e inovação em energia estimulando a utilização em escala de novas fontes consolidando os avanços significativos que vêm ocorrendo no plano doméstico e se articulando com os esforços globais para novas soluções Dois conjun tos de ações se configuram como essenciais primeiro o apoio estruturado aos esforços de PD tanto no âmbito público das universidades e centros de pesquisa como na esfera privada e empresarial Segundo é necessária a ampliação dos programas de eficiência energética tanto nos processos produtivos nos produtos e no seu uso racional e eficiente figura 6 energia Elaboração InterB Fontes 1 Governo culpa carro e moto por poluição 260310 Folha de São Paulo 2 Vento a preço de água Jan10 Revista Brasil Energia Ed 350 3 Energia solar no Brasil 240310 Valor Econômico 4 IPI menor para linha branca vai respeitar critério ambiental 291009 Valor Econômico O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak ofeRta meRcaDo eStRutuRaDa DemaNDa iNDuZiDa eSPoNtÂNea BIOMASSA DE CANA ENERGIA HÍDRICA ENERGIA SOLAR 3 ENERGIA EÓLICA 2 ENERGIA NUCLEAR BIOCOMBUSTÍVEIS 1 LINHA BRANCA DE BAIxO CONSUMO 4 106 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 figura 7 energia na transição para a economia verde Resíduos A figura 8 ilustra as atividades relacionadas à geração e tratamento de resíduos o descarte de produtos o aproveitamento dos materiais recicláveis e a redução ou eliminação do que não é biodegradável em horizonte razoável O espaço para ampliação das soluções de mercado será determinado por uma combinação de políticas públicas e maior conscientização da sociedade figura 8 ciclo de vida Elaboração InterB Fontes 1 Moda do papel reciclado dá novo nicho à indústria 180107 Valor Econômico 2 Redução de custos move mercado de reciclagem 290110 Valor Econômico 35 Mudança de hábito 270509 Valor Econômico 4 Sustentabilidade para a demolição da Help 120410 O Globo 6 A caneta que se dissolve 270410 O Globo O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak BIOMASSA DE CANA ENERGIA HÍDRICA ENERGIA SOLAR 3 ENERGIA NUCLEAR BIOCOMBUSTÍVEIS 1 LINHA BRANCA DE BAIxO CONSUMO 4 ofeRta meRcaDo eStRutuRaDa DemaNDa iNDuZiDa eSPoNtÂNea ENERGIA EÓLICA 2 PAPEL RECICLADO 1 ofeRta meRcaDo eStRutuRaDa DemaNDa iNDuZiDa eSPoNtÂNea METAIS RECICLADOS 2 COLETA SELETIVA 3 DEMOLIÇÃO SUSTENTÁVEL4 PRODUTOS INIVADORES RECICLÁVEIS BIODEGRADÁVEIS 5 PLÁSTICO VERDE 107 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak figura 9 ciclo de vida dos produtos na transição para a economia verde Como se observa na figura 9 há necessidade de uma nova política que se volte para a gestão dos resíduos examinando de forma criteriosa a necessi dade ou não de controlar ou regular a produção e uso de bens cuja pegada é sensível seja pelas externalidades negativas ao longo do seu ciclo de vida seja pelo seu caráter de baixa degradabilidade no descarte porém que não apresentem economicidade na sua reciclagem O papel da política de gover no seria promover alternativas com base no redesenho dos produtos novos materiais e na promoção da reciclagem e redução do desperdício5 Vale enfatizar que várias das medidas para incentivar a reciclagem no plano individual são relativamente simples pois dependem de normas a serem obedecidas pelo produtordistribuidor sem dispêndio público Ao mesmo tempo muitas das intervenções de governo podem ser transitórias de modo que após um período de ganhos de escala e redução de custos as atividades de integração do ciclo de vida dos produtos tornemse viáveis no mercado Com a combinação de maior escassez e preços mais elevados de matériasprimas e os ganhos em escala propiciados num primeiro momento por políticas e normas emanadas do poder público a coleta e reciclagem de elementos descartáveis por meio de operações de logística reversa seriam fruto de iniciativas de empresas A própria coleta seletiva após um período 5 Um avanço muito significativo deuse com a instituição em 2010 da Política Nacional de Resíduos Sólidos que regula a reciclagem disciplina o manejo dos resíduos e inova com a logística reversa a qual determina que todos os envolvidos na cadeia de comercialização dos produtos organizemse e realizem o recolhimento de embalagens usadas e dos resíduos dos produtos ofeRta meRcaDo eStRutuRaDa DemaNDa iNDuZiDa eSPoNtÂNea LOGÍSTICA REVERSA METAIS RECICLADOS 2 COLETA SELETIVA 3 DEMOLIÇÃO SUSTEN TÁVEL 4 PRODUTOSINIVADORES RECICLÁVEIS BIODEGRADÁVEIS 5 PLÁSTICO VERDE 108 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak inicial pode se tornar autosustentável e eventualmente rentável o suficiente para dispensar subsídios governamentais Em síntese a proteção dos ecossistemas os sistemas de transporte e sa neamento a energia e os resíduos podem ser integrados em uma economia verde envolvendo de forma limitada as iniciativas de governo que podem ter caráter temporário A análise acima aponta que parte considerável do PIB Verde já se prefigura no quadrante I Isso indica que há soluções de mercado mas muitas são incipientes e outras nem mesmo existem A expansão de muitas dessas atividades irá depender de políticas ativas ainda que esse apoio possa ser apenas temporário eStRatégIa de tRanSIçãO A operacionalização da estratégia de transição para uma economia verde supõe estabelecer uma agenda de governo da economia verde Essa agenda se desdobraria em Primeiro a constituição de grupo de trabalho ou equivalente envolvendo não apenas governo mas universidades e instituições de pesquisa empresas e organizações da sociedade civil com os seguintes objetivos Identificar de forma objetiva critérios gerais de sustentabilidade que nor teariam o apoio direto ou indireto do governo a projetos e atividades Inversamente definir o que seriam atividades predatórias do capital natural que deveriam ser contidas tributadas ou desincentivadas Introduzir na Contabilidade Nacional a dimensão de sustentabilidade no sentido sugerido pelo relatório Stiglitz com foco na variação dos estoques de capital natural Construir gradativamente indicadores que sirvam para precificar os serviços dos principais ecossistemas reconhecendo que esse exercício é experi mental e sujeito a tentativas e erros e que certos serviços críticos não são possivelmente mensuráveis em termos econômicos Inventariar as ações de governo inclusive das empresas públicas que afetam direta ou indiretamente a conservação do capital natural do país hierarquizando seu impacto Segundo e com base nos resultados do esforço empreendido definir um marco de referência e um conjunto de normas que sirvam de base para uma reorientação das ações de governo Vale sublinhar que ainda há no país um amplo conjunto de políticas e iniciativas que geram incentivos que promovem atividades predatórias ou sem mérito na perspectiva da economia verde Devese conduzir uma revisão detalhada dos programas de governo pré inventariados assim como dos incentivos tributários financeiros e outros 109 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 tanto no plano setorial quanto regional além dos planos de investimento das empresas estatais e examinar a viabilidade econômica já na nova perspec tiva e jurídica de eliminar ao longo dos próximos anos todas as formas de suporte a projetos e atividades claramente não condizentes com a economia verde por Serem diretamente predatórias ao capital natural sem compensações suficientes pelos seus efeitos econômicos Contribuírem para sujar a matriz energética a exemplo de usinas de ge ração de energia com base em óleo diesel óleo combustível ou carvão Reduzirem a acessibilidade e mobilidade nos sistemas de cidades e Ignorarem novos conceitos e normas arquitetônicas métodos construtivos e uso de materiais visando economia de energia aproveitamento da água da chuva reciclagem dentre outros terceiro devese avançar uma agenda positiva voltada à proteção e re composição do capital natural nos principais ecossistemas É imprescindível que o país proteja sua biodiversidade Na questão específica da proteção às florestas tropicais o Brasil deve reforçar sua liderança na capacidade de monitoramento na contenção do desmatamento e na busca de alternativas dignas de geração de renda e emprego para os povos da floresta comunida des tradicionais assim como a população atraída por meio de programas de governo dentre outros No plano dos recursos hídricos o país deve intensificar seus esforços no sentido de gerir adequadamente suas bacias e garantir o uso múltiplo equilibrado e sustentável da água cuja produção e conservação da qualidade necessitam envolver as populações ribeirinhas e produtores rurais e cuja precificação é essencial para seu uso racional Essas são as diretrizes da estratégia de transição para a economia verde cOnclUSãO A economia mundial iniciou há anos um processo de transição apoiado no uso predatório do capital natural e no esgotamento da capacidade dos ecos sistemas com efeitos deletérios sobre a sustentabilidade Um novo paradig ma está emergindo em que crescimento e conservação são positivamente correlacionados e formam a base da economia verde O Brasil é uma potência ambiental pelos seus amplos recursos ecossistêmi cos e de energia renovável Com o apoio de políticas adequadas de governo pode se tornar um dos países que mais rapidamente venham a se consolidar enquanto economia verde Esse processo baseiase em quatro vetores cha ves do PIB Verde brasileiro i a conservação e ampliação do capital natural sob formas eficientes de exploração agropecuária de uma nova economia da floresta inclusive com o uso inteligente da biodiversidade ii a transformação O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak 110 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 do sistema de cidades por meio de um planejamento integrado no plano metro politano tendo por referência a necessidade de um projeto transformador na acessibilidade e mobilidade urbanas na ampliação do saneamento além da implantação de um novo padrão arquitetônico e construtivo iii o maior estímulo à geração e utilização de energias renováveis necessariamente articuladas à intensificação dos esforços de eficiência energética e iv a integração do ciclo de vida do produto no cálculo econômico de produtores e consumidores por meio de uma regulação adequada da nova legislação e esforço inovador em design e uso de novos materiais O Brasil e a economia verde fundamentos e estratégia de transição Cláudio R Frischtak 111 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais MARIA CECÍLIA JUNQUEIRA LUSTOSA1 IntROdUçãO A discussão sobre os limites do crescimento devido à finitude dos recursos ambientais colocou o desafio de aliar preservação ambiental e o crescimento econômico No âmbito deste debate duas vertentes de análise podem ser identificadas a primeira privilegia a tecnologia como sendo o principal vetor de mudanças gerando processos produtivos mais ecologicamente corretos e consequentemente ampliando os limites do crescimento econômico A outra vertente contrária à primeira coloca a impossibilidade de aliar a preservação ambiental e o crescimento econômico no sistema capitalista A necessidade de novos mercados impondo um padrão de consumo intensivo em matérias primas e energia faz com que cresçam cada vez mais a necessidade de re cursos ambientais ultrapassando os limites da disponibilidade destes recursos mesmo com tecnologias mais limpas Independentemente deste debate a evolução tecnológica na direção de processos produtivos mais eficientes do ponto de vista ambiental utilizando menos materiais e lançando menos rejeitos no meio ambiente é desejável do ponto de vista social pois se não resolve o problema ambiental pelo menos busca amenizálo Nesse sentido o desenvolvimento de tecnologias mais limpas é extremamente necessário Entretanto o estudo da mudança tecnológica envolve diversos aspectos e é um processo evolucionário que apresenta características de nãolinearidade cumulatividade e de interdependência temporal pathdependence Além do mais a mudança tecnológica na direção da sustentabilidade ambiental depen de de outros fatores não econômicos como desenvolvimento de capacidades específicas das empresas infraestrutura e mudanças institucionais Este artigo aborda as questões relativas à inovação na transição para uma economia verde do ponto de vista da teoria evolucionária da mudança tec nológica e está dividido em quatro partes além desta introdução A primeira 1 Professora associada da Faculdade de Economia Administração e Contabilidade da Universidade Federal de Alagoas FEACUFAL Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Agronegócio e Inovação GAINUFAL e da Rede de Pesquisa em Sistemas e Arranjos Produtivos e Inovativos Locais RedeSistUFRJ Diretora da Regional Nordeste da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica EcoEco 112 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 trata do surgimento das questões ambientais enquanto resultado do processo de produção econômica A segunda aborda questões pertinentes da relação entre inovação e meio ambiente focando nos fatores que influenciam na ca pacitação das empresas para se tornarem inovadoras A terceira apresenta os resultados de pesquisas sobre o comportamento ambiental das empresas brasileiras principalmente no que tange ao investimento ambiental 1 qUeStõeS aMbIentaIS e a pROdUçãO ecOnôMIca A partir da Revolução Industrial do final do século 18 o desenvolvimento econômico e tecnológico baseado no uso intensivo de matériasprimas e energia aumentou a velocidade de utilização de recursos naturais Dada a abundância desses recursos a questão da sustentabilidade do sistema econô mico ou seja a manutenção das condições para seu bom desenvolvimento não esgotando os recursos de que necessita e deixandoos disponíveis em boa qualidade para uso futuro não ficou no centro das preocupações dos economistas durante muitas décadas Mais de um século e meio depois do início do processo de industrialização e do surgimento dos sistemas de produção agropecuários é que a questão da finitude dos recursos naturais vista como ameaça ao crescimento das economias modernas entra definitivamente na agenda de pesquisa dos economistas Além da utilização intensiva dos recursos naturais os rejeitos dos processos produtivos lançados no meio ambiente resultaram no acúmulo de poluentes acima da sua capacidade de suporte gerando a poluição Esta passa de uma dimensão local degradação dos corpos hídricos dos solos e da qualidade do ar para uma dimensão regional chuvas ácidas e global mudanças climáticas e depleção da camada de ozônio A depleção dos recursos naturais e a poluição são problemas ambientais resultantes das ações antrópicas que também levam à perda da biodiversidade gerando desequilíbrios nos ecossistemas e fazendo com que percam parte de suas funções biológicas e sociais Esse conjunto de problemas é denominado de questão ambiental Seus efeitos negativos sobre o meio ambiente são resultados de decisões e ações passadas sugerindo uma interdependência temporal path dependence revelando um processo de mudanças contínuas e evidenciando incertezas em relação ao conhecimento dos impactos ambientais resultantes do crescimento econômico A hipótese de que a capacidade de suporte do planeta estava chegando ao seu limite seja pela quantidade de poluentes lançados no ambiente ou pela exaustão dos recursos naturais data do final dos anos 1960 Travaram se intensos debates nos meios político acadêmico e social incorporando o discurso do movimento ambientalista que apontava para a incompatibilidade Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 113 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 entre preservação ambiental e o crescimento econômico baseado na utilização intensiva de recursos naturais e energia de fontes nãorenováveis Após mais de cinco décadas desse debate percebese que não é o crescimento que chegou ao seu limite mas os padrões tecnológicos e de consumo até então adotados pelos países industrializados O crescimento econômico baseado em padrões tecnológicos intensivos no uso de matériasprimas e energia principalmente proveniente de hidrocar bonetos grandes demandantes de recursos naturais pode esbarrar nos limites da finitude dos recursos ambientais seja pela exaustão ou pela perda de qualidade A mudança dos padrões tecnológicos atuais na direção de ou tros que degradem menos o meio ambiente é condição necessária para que o crescimento econômico possa ser contínuo É nesse sentido que o crescimento econômico pode ser possível para todos os países mas com tecnologias mais limpas2 e eficientes no uso dos recursos naturais Percebese portanto que há uma diferença entre a mudança do atual pa drão tecnológico com a base energética calcada na queima de combustíveis fósseis e o desenvolvimento de novas tecnologias mais limpas dentro desse mesmo padrão a fim de minimizar os impactos ambientais das atividades econômicas A mudança do padrão tecnológico é extremamente complexa pois ocorre no longo prazo depende de muitas variáveis e mesmo induzida por qualquer tipo de política não se sabe a priori todas as consequências dela decorrentes pois nem todas as externalidades negativas de uma tecnologia desenhada e utilizada para fins específicos podem ser previstas Quando se trata de ques tões relativas ao meio ambiente as externalidades atingem uma dimensão adicional pois elas podem ter efeitos cumulativos e de depleção que envolvem incertezas À medida que a poluição acumulada aumenta efeito cumulativo podem ser constatados os efeitos perversos sobre os ecossistemas e a saúde humana mas não se sabe exatamente até onde eles podem ser afetados Mas a tecnologia por si só mesmo utilizando intensivamente recursos natu rais e devolvendo os rejeitos das atividades produtivas para o meio ambiente não geraria impactos ambientais significativos se não fosse o efeito escala chegase no limite ambiental gerado pelo padrão de consumo O aumento contínuo da produção demanda maior quantidade de recursos naturais e joga mais rejeitos no meio ambiente Esse aumento está associado ao padrão de consumo imposto pelo modo de produção capitalista intensivo Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 2 Kemp e Soete 1992 colocam com propriedade que o termo tecnologia limpa apesar de ser amplamente usado não é linguisticamente o mais correto Primeiro porque nenhuma tecnologia é totalmente limpa e segundo porque se devem distinguir tecnologia limpa clean e tecnologias que despoluem o ambiente cleaning O termo correto seria tecnologia mais limpa cleaner ou poupadora de recursos naturais environmentsaving Há ainda as tecnologias de controle para monitorar os níveis de emissões e a degradação dos recursos naturais 114 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 em matéria e energia que é o padrão dos países centrais que transferese por meio da subordinação cultural econômica tecnológica e financeira aos países da periferia3 seguindo a lógica de acumulação do sistema capitalista Para sua expansão são necessários novos mercados e portanto novas ne cessidades dos consumidores que para serem atendidas precisam desenvolver indefinidamente a produção4 Assim crescem a população e suas necessida des elevando a escala da produção industrial e dos sistemas agropecuários resultando no aumento tanto da demanda por recursos naturais quanto dos rejeitos dos processos produtivos Colocase portanto um tradeoff entre crescimento econômico e preserva ção do meio ambiente Por um lado o crescimento econômico trouxe melhorias nas condições de vida da população gerando maior quantidade de bens e serviços disponíveis para satisfação das necessidades porém distribuídos de forma não equitativa Por outro lado esse mesmo crescimento trouxe proble mas ambientais que não ficam restritos às atividades industriais e agropecu árias como a urbanização desordenada agravando as condições ambientais causando danos à saúde humana e à qualidade do meio ambiente Dada a complexidade da questão acima exposta este artigo aborda um aspecto específico para subsidiar esta discussão mais ampla a inovação ambiental como via de mudança do padrão tecnológico vigente na direção de uma economia verde Dessa forma colocase uma questão central como induzir mudanças tecnológicas na direção de tecnologias mais limpas a fim de se obter sustentabilidade ambiental Ou seja que os recursos naturais sirvam para as gerações atual e futuras e que os níveis de poluição sejam reduzidos mesmo com o aumento da produção 2 InOvaçãO e MeIO aMbIente O setor industrial é um dos que mais provoca danos ao meio ambiente seja por seus processos produtivos ou pela fabricação de produtos poluen tes eou que tenham problemas de disposição final após sua utilização Se por um lado as tecnologias adotadas levaram à degradação ambiental por outro elas possibilitaram maior eficiência no uso dos recursos naturais e a Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 3 O esquema centroperiferia é uma tese de Raúl Prebisch na qual a América Latina fazia parte de um sistema de relações econômicas internacionais que funcionava como uma constelação cujo centro era os países industrializados e a periferia era a passiva América Latina Nesse contexto o Brasil passou por um processo de modernização isto é a adoção de padrões de consumo sofisticados dos países centrais por uma pequena parte da população que concentrava a maior parte da renda oriunda das exportações de café Furtado 1974 Com o aprofundamento do processo de globalização nas últimas décadas o padrão de consumo dos países centrais espalhase por todas as economias capitalistas gerando um enorme mercado de produtos intensivos em matéria e energia que apresentam grande obsolescência tecnológica 4 A organização da sociedade industrial desde o século 19 está baseada no modelo mecanoprodutivista do positivismo progresso científico progresso técnico desenvolvimento econômico progresso sociocultural Labeyrie 2004 p 125 Nesse contexto não há lugar para discutir as desigualdades sociais e os desequilíbrios ecológicos causados pelo progresso científico e tecnológico bases do crescimento econômico 115 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 substituição de insumos no processo produtivo Um exemplo marcante foi o melhor aproveitamento energético dos derivados do petróleo e a sua substitui ção parcial por outras fontes energéticas após o primeiro choque do petróleo em 1973 Portanto o desenvolvimento tecnológico na direção de um padrão de produção menos agressivo ao meio ambiente é visto como uma solução parcial do problema A mudança tecnológica na direção de tecnologias mais limpas passa pelo processo de inovação Segundo Hall 1994 o processo de inovação corres ponde a todas as atividades que geram mudanças tecnológicas e a interação dinâmica entre elas que não precisam ser invenções primárias Ao inovar a empresa está buscando solução para um determinado problema que é resolvido dentro de um paradigma tecnológico isto é dentro de determina dos padrões de soluções amplamente aceitos baseados nos princípios das ciências naturais Assim uma vez estabelecido o paradigma tecnológico as inovações tornamse seletivas na capacidade de solucionar problemas ao mesmo tempo em que encobrem outras soluções que estariam fora do para digma tecnológico caracterizando uma cegueira do paradigma tecnológico predominante As tecnologias são eleitas no processo seletivo que de acordo com as características predominantes do ambiente seletivo escolhem deter minadas tecnologias e não outras Entretanto quando as dificuldades para achar soluções tornamse cres centes inclusive para os problemas ambientais há um forte incentivo para a mudança de paradigma tecnológico Mas essa não é uma condição suficiente visto que para estabelecer um novo paradigma é necessário que ocorram avanços no conhecimento básico além de outros fatores institucionais e de mercado Assim o paradigma tecnológico dominante e o ambiente seletivo estabelecem o ritmo e a direção do progresso técnico que pode até gerar uma mudança de paradigma num processo lento e gradual Dentro do paradigma tecnológico vigente é selecionada uma determinada tecnologia Segundo B Arthur citado por López 1996 a tecnologia não é eleita por ser a mais eficiente mas se torna mais eficiente porque foi eleita Isto é as tecnologias tornamse mais atrativas quanto mais são utilizadas Assim a tecnologia possui interdependência temporal pathdependence ou seja ela será resultado de trajetórias previamente definidas Isso gera um efeito de lockin fazendo com que as empresas fiquem presas à tecnologia mais difundida e ao paradigma tecnológico vigente Esses eventos têm grandes efeitos sobre a capacidade da empresa em achar soluções para problemas específicos ou seja sobre sua capacidade de inovar inclusive na direção de tecnologias ambientalmente saudáveis TAS As TAS podem ser definidas como o conjunto de conhecimentos técnicas métodos processo experiências e equipamentos que utilizam os recursos naturais de forma sustentável e que permitem a disposição adequada dos re Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 116 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 jeitos industriais de forma a não degradar o meio ambiente Elas são obtidas por meio das inovações ambientais As mudanças tecnológicas na direção de tecnologias ambientais podem ocorrer na trajetória tecnológica um motor à combustão mais potente e que gera menos emissões ou no paradigma tecnológico mudança das fontes de energia primária na direção de gerar menos impactos ambientais No que tange à geração primária de energia podese identificar o paradigma dos hidrocarbonetos ou seja baseado no petróleo e no gás natural Dessa forma para que ocorram melhorias ambientais as empresas devem adotar inovações Entretanto a inovação na empresa não é resultado de uma decisão baseada em fatores internos mas de interações complexas entre ela e seus clientes e fornecedores e de um contexto mais amplo que inclui o ambiente institucional cultural e social a infraestrutura aspectos macroe conômicos o sistema de inovação O foco da análise deve portanto sair da empresa e buscar uma abordagem sistêmica Essas considerações induzem a um aspecto importante para a economia verde como direcionar a mudança tecnológica na direção de inovações am bientais e levanta a seguinte questão o que capacita as empresas a gerar e adotar inovações ambientais Há uma série de fatores econômicos sociais institucionais e científicos que influenciam na capacitação das empresas para se tornarem inovadoras Em linhas gerais podemse agrupálos em fatores in ternos e externos às empresas Dentre os fatores internos podemse destacar as competências específicas para resolução de problemas a capacidade de absorção da empresa e o acesso às inovações desenvolvidas por terceiros As competências específicas da empresa para resolução de problemas são acumuladas ao longo do tempo Ou seja são habilidades e conhecimentos que a empresa possui adquiridos com o tempo que determinam sua capacidade de absorver ou criar conhecimento Essas habilidades e conhecimentos espe cíficos dependem dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento PD do conhecimento individual dos funcionários do tamanho e da natureza da empresa pública privada transnacional etc do setor de atividade e do grau de especialização O segundo fator interno está diretamente relacionado com o primeiro A capacidade de absorção segundo Cohen e Levinthal 1990 é definida pelas habilidades de reconhecer o valor da nova informação assimilála e aplicála para fins comerciais sendo crucial para capacitar a empresa a inovar Essa habilidade para avaliar e utilizar o conhecimento externo é função do nível de conhecimento anterior ou seja na medida em que o conhecimento externo e a empresa possuam padrões básicos e linguagem comuns fica mais fácil utilizar a informação de forma produtiva Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 117 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 O acesso às inovações desenvolvidas por terceiros não é livre e em geral possui altos custos Seja por falta de informação da empresa que quer adotar a inovação ambiental por estratégia concorrencial do inovador em não difundir sua inovação por proteção de patentes e segredo industrial ou pelos custos de manutenção da capacidade de absorção as inovações não estão disponíveis como produtos na prateleira de um supermercado Isso significa que há um custo de acesso e que ele pode ser alto Logo para muitas empresas tornase difícil inovar seja pelo alto custo de desenvolvimento interno ou de aquisição de tecnologias de terceiros Dentre os fatores externos estão o paradigma tecnológico vigente o Sistema Nacional de Inovação o contexto macroeconômico as medidas de caráter regulatório e o grau de competição do mercado no qual a empresa está inserida O paradigma tecnológico vigente como explicado anteriormente delimita a capacidade da empresa de inovar pois define o padrão científico no qual as inovações devem ficar circunscritas Nesse sentido a mudança no paradigma tecnológico pode fazer com que a empresa se torne mais ou menos inovadora a depender de suas competências específicas O Sistema Nacional de Inovações SNI o segundo fator externo vai in fluenciar na capacidade das empresas gerarem e adotarem inovações pois se constitui num sistema organizacional que visa desenvolver a ciência e tecnologia dentro dos limites da nação É um arranjo institucional complexo que envolve os laboratórios de PD das empresas os institutos de pesquisa e universidades as instituições de financiamento as instituições educacionais e as instituições legais patentes leis de regulação da concorrência O SNI deve ser considerado em suas três dimensões as instituições a interação entre elas formando uma rede e a capacidade de aprendizado Assim um SNI eficaz induz as empresas a serem inovadoras O contexto macroeconômico é um fator que interfere no processo de inovação da empresa pois explicita o contexto econômico no qual ela está inserida As empresas têm dificuldades para tomar decisões em condições de grande incerteza geradas por um cenário de instabilidade macroeconômica Nesse contexto há certa paralisia para inovar Reversamente a estabilidade macroeconômica cria confiança nos agentes econômicos que tenderão a consumir e investir mais As medidas de caráter regulatório são muito importantes para induzirem as inovações ambientais Alguns setores necessitam de maiores regulamentações em função do tipo de atividade que desenvolvem Por exemplo as empresas cujas atividades causam impactos negativos no meio ambiente estão sujeitas ao cumprimento de regulamentações que podem ser indutoras de inovações a depender dos objetivos e instrumentos de política ambiental Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 118 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Finalmente o grau de competição do mercado no qual a empresa está inserida é um dos fatores que mais influencia sua decisão de gerar e adotar inovações inclusive as ambientais Com pressão dos mercados sobretudo os mais competitivos a inovação passa a ser fator de diferenciação entre a empresa e seus concorrentes criando assimetrias entre elas e podendo ser a única forma de sobrevivência num mercado que valoriza a não agressão ao meio ambiente Diante do exposto as novas trajetórias e bifurcações de trajetórias tecnológi cas devem ser induzidas para incorporarem melhorias ambientais mesmo que não seja essa a finalidade primeira do desenvolvimento de determinada tec nologia Ou seja ao incorporar a questão ambiental nas inovações podemse obter melhorias ambientais e ganhos econômicos simultaneamente A adoção de tecnologias menos poluentes não tem sido guiada pela proteção ambiental mas pela busca de eficiência na utilização dos recursos Fukasaku 2000 Apesar dos avanços das tecnologias ambientais no setor industrial tecno logias mais limpas intensificação do uso de materiais menos agressivos ao meio ambiente melhorias de processos e sistemas de reutilização de mate riais os problemas ambientais ainda persistem A condição para se obterem ganhos na direção de um padrão de produção mais ecologicamente correto implica a mudança na direção de um paradigma tecnológico que não esteja calcado na utilização intensiva de energia e matériasprimas e a consequente adaptação de processos produtivos Um novo paradigma tecnológico requer um longo prazo de maturação com diversas transformações inclusive de ordem conceitual Por exemplo a definição de consumo necessita ser revista Consumo é um termo distinto de utilização O primeiro significa destruição da matéria original ou melhor transformação em outros elementos Ou seja quando queimamos carvão houve consumo pois ele foi transformado em gás carbônico e água A utilização significa que não há transformação da matéria mas a ela podem ser adicionados outros elementos É o caso da água e dos metais que per manecem água e metais mesmo depois de utilizados Assim eles podem ser reciclados e reutilizados em outras circunstâncias Entretanto essa distinção não é feita pela maioria das atividades econômicas que geram poluição por não reciclarem materiais já utilizados deixando consequentemente de trans formar rejeitos do processo produtivo em riquezas 3 InOvaçãO e MeIO aMbIente naS eMpReSaS bRaSIleIRaS A industrialização brasileira foi marcada por um relativo descaso com a questão ambiental consequência do atraso no estabelecimento de normas ambientais e agências especializadas no controle da poluição da estratégia Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 119 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 de crescimento associada à industrialização por substituição de importações privilegiando setores intensivos em emissão e da tendência de especializa ção do setor exportador em atividades potencialmente poluentes Young e Lustosa 2001 Durante muitos anos o setor industrial não atentou para os custos ambien tais de seus processos produtivos e nem com os seus desperdícios inclusive a poluição Acreditavase que produzir de maneira ecologicamente correta seria mais oneroso e prejudicaria o desempenho econômicofinanceiro das empresas Porém a busca por alternativas que minimizem os impactos nega tivos da atividade produtiva sobre o meio ambiente tem se refletido em ganhos econômicos e melhoria da competitividade das empresas A questão ambiental ganhou espaço nas preocupações sociais das em presas a partir da década de 1990 Ao perceberem crescente interesse e preocupação da sociedade com o meio ambiente as empresas buscaram inserirse no contexto dos agentes participantes das mudanças em resposta aos anseios da sociedade vistos a diminuição da capacidade financeira do Estado e o descrédito deste como ator de transformação capaz de solucionar problemas sociais relevantes Na medida em que a preservação do meio ambiente tornouse um fator de diferenciação para as empresas sendo uma oportunidade de negócios surgiu a possibilidade de incluir preocupações ambientais em suas estratégias por meio de práticas ecologicamente mais adequadas Tais práticas se traduziram em adoção de TAS implantação de sistema de gestão ambiental racionaliza ção do uso dos recursos naturais entre outros Aproveitando para melhorar sua imagem e ter o reconhecimento da so ciedade de ser um ator chave no processo de transformação as empresas passaram a investir em programas ambientais de cunho social Mesmo com pouco incentivo fiscal as empresas envolveramse nesses projetos na busca de uma imagem positiva servindo como poderoso instrumento de marketing diferenciandose de seus concorrentes e ganhando espaço na mídia de for ma espontânea inclusive Esse é um primeiro indício de que o meio ambiente pode ser uma forma de melhorar a competitividade A despeito das ações socioambientais implementadas pelas empresas com resultados positivos para o meio ambiente e para a sociedade os problemas ambientais dentro de casa resultado dos impactos ambientais negativos de suas atividades centrais ficaram bem aquém da visibilidade dos projetos ambientais volta dos para a sociedade As exceções são as empresas que sofreram alguma pressão para fazêlo exigência dos países que importam produtos brasileiros e das regulamentações ambientais que forçam as empresas a diminuírem os impactos sobre o meio ambiente de suas atividades A redução de custos também exerceu um papel importante na minimização dos impactos ambientais das empresas Entretanto o meio ambiente não foi Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 120 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 o foco principal os programas de conservação de energia de otimização de processos com objetivos de reduzir os custos com insumos os processos de controle automatizados que reduzem desperdícios a recirculação das águas entre outros tiveram um rebate positivo na utilização mais racional dos recursos naturais As evidências empíricas mostram que as inovações que geram impactos positivos tanto no meio ambiente quanto no desempenho econômico das empresas estão relacionadas com o seu porte Seja por pessoal ocupado ou por faixa de receita líquida são as maiores empresas as que consideraram o meio ambiente um fator de motivação para a empresa inovar Lustosa 2002 Podcameni 2007 O tamanho da empresa tem influência positiva na probabilidade de realização de investimento ambiental ou seja quanto maior a empresa maior é essa probabilidade Ferraz e Seroa da Motta 2001 As micro e pequenas empresas MPE atuaram menos na solução de questões ambientais indicadas pelas variáveis de adoção de gestão ambiental de melhoria da imagem do aumento de vendas do acesso a novos mercados e do investimento ambiental CNI et al 2001 Outros estudos confirmam que as exigências impostas pela legislação ainda são o principal fator determinante do investimento ambiental nas empresas Segundo Almeida et al 2004 a maioria das empresas ainda restringe sua res ponsabilidade ambiental ao cumprimento da legislação ambiental e em resposta às multas e sanções Porém as crescentes exigências do mercado e a compe titividade entre as empresas fazem com que a adoção de princípios de gestão ambiental tornese condição necessária à sobrevivência das empresas Ferraz e Seroa da Motta 2001 em estudo que analisa os determinantes do investimento ambiental na indústria paulista constataram alguns fatores internos e externos às empresas que são significantes para o investimento ambiental Os fatores internos apontam que as plantas com maior número de trabalhadores as empresas mais antigas e as que possuem participação do capital estrangeiro tendem a fazer mais investimentos ambientais bem como aquelas que possuem maior proporção de exportações sobre vendas e que pertencem a setores considerados poluentes Em relação aos fatores externos às empresas somente os fatores associados à regulação ambiental formal como o número de advertências do órgão ambiental por exemplo se mostraram significativos Tigre 1994 em pesquisa realizada junto aos produtores de equipamentos e serviços ambientais mostra que 69 das empresas perceberam as regula mentações governamentais como extremamente influentes no crescimento do seu mercado e que 21 consideraram tais regulamentações influentes5 Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 5 Às outras opções de resposta pouco influente e não influente foram atribuídos percentuais de 7 e 3 respectivamente 121 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 A inovação nas MPE está relacionada a fatores como a organização e a ne cessidade de inovação do setor em que estão inseridas Apesar de na maioria das vezes não possuírem capital suficiente elas possuem outras vantagens que favorecem o investimento em inovações como estruturas flexíveis ativida des diversificadas e adaptação rápida às mudanças no mercado No entanto as pequenas empresas têm menos acesso às informações tecnológicas do que as grandes Além disso a dificuldade em obter crédito torna as iniciativas de inovação bastante arriscadas Dentre outros fatores que inibem a inovação nas MPE estão a baixa capacita ção gerencial das pessoas que estão à frente do negócio e o horizonte de curto prazo no planejamento Por possuírem uma pequena dimensão os proprietários eou administradores se prendem na resolução de problemas diários e não dão a devida importância para estratégias de longo prazo e de inovação No que tange especificamente à questão da inovação ambiental sua impor tância está no fato de a produção ecoeficiente ser um importante instrumento de competitividade na medida em que reduz custos e melhora a qualidade dos produtos possibilitando a abertura de novos mercados cOnclUSõeS O processo de crescimento das economias capitalistas modernas iniciado com a Revolução Industrial do século 19 gerou uma enorme produção de bens materiais Paralelamente a esse aumento espetacular da escala de produção surgiram também as questões ambientais depleção dos recursos naturais e poluição Entretanto foi no final da década de 1960 que a degradação do planeta passa paulatinamente a entrar na agenda de discussão dos meios sociais políticos e acadêmicos O movimento ambientalista passa a assumir uma vertente social e política Nesse debate a inovação e a tecnologia passam a ser variáveis importantes a serem estudadas pois são elas que estabelecem o conjunto de conheci mentos técnicas métodos processo experiências e equipamentos que vão transformar as matériasprimas em bens de consumo Assim o padrão tecnológico apresenta uma dupla face ele foi e ainda é em grande medida um dos fatores que leva ao agravamento das questões ambientais na proporção em que aumenta a escala de produção Sua outra face surge como a solução de problemas ambientais por meio de mudanças tecnológicas na direção de tecnologias ambientalmente saudáveis que uti lizam os recursos naturais de forma sustentável e que permitem a disposição adequada dos rejeitos da produção de forma a não degradar o meio ambiente Tais mudanças ocorrem por meio das inovações ambientais Uma vez que são as empresas os agentes produtores da economia a ca pacidade de elas gerarem e adotarem inovações ambientais é determinante Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 122 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 para que se tenham processos produtivos e produtos menos agressivos ao meio ambiente e consequentemente melhorias ambientais gerenciando adequadamente os recursos naturais e controlando a poluição Não obstante os benefícios que as inovações ambientais podem trazer existem fatores de ordem tecnológica política e mercadológica que limitam sua geração e difusão Nos casos em que as empresas não mostram interesse em práticas menos agressivas ao meio ambiente o Estado deve por meio da gestão ambiental pública utilizar os meios legais a política ambiental e suas regulamentações e incentivar as empresas a mudarem seu comporta mento em relação aos impactos ambientais resultantes de suas atividades A regulamentação ambiental tem um lado normativo e outro informativo traduz as necessidades de proteção ambiental em requerimentos específicos sinali zando para os poluidores e os fornecedores de tecnologias ambientais o que está sendo demandado A geração e principalmente a difusão de inovações ambientais são fundamentais para harmonizar preservação ambiental com o crescimento da produção econômica REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Almeida J R Mell C S e Cavalcanti Y 2004 Gestão ambiental planejamento avaliação implantação operação e verificação 2ª ed Rio de janeiro THEx CNI SEBRAE BNDES 2001 Relatório da competitividade da indústria brasileira Brasília CNISEBRAE Rio de Janeiro BNDES Cohen W e Levinthal D 1990 Absorptive capacity a new perspective on learning and innovation Administrative Science Quarterly 35 128152 Ferraz C e Seroa da Motta R 2001 Regulação mercado ou pressão social Os determinantes do investimento ambiental na indústria Anais do xIx Encontro Na cional de Economia Salvador BA ANPEC Fukasaku Y 2000 Stimuler linnovation environnementale In OCDE Le developpe ment durable Número especial Paris OCDE Furtado C 1974 O mito do desenvolvimento econômico Rio de Janeiro Paz e Terra Hall P 1994 Innovation economics and evolution theoretical perspectives on chang ing technology in economic systems Nova York Harvester Wheatsheaf Kemp R e Soete L 1992 The greening of technological progress an evolutionary perspective Futures 245 437457 Labeyre V 2004 As consequências ecológicas das atividades tecnoindustriais In Morin E A religação dos saberes o desafio do século XXI 4a ed Rio de Janeiro Bertrand Brasil López A 1996 Competitividad innovacion y desarrollo sustentable una discusión conceptual DT 22 Buenos Aires CENIT Lustosa M C J 2002 Meio ambiente inovação e competitividade na indústria brasi leira a cadeia produtiva do petróleo Tese de Doutorado Rio de Janeiro IEUFRJ Podcameni M G 2007 Meio ambiente inovação e competitividade uma análise da indústria de transformação brasileira com ênfase no setor de combustível Dis sertação de mestrado Rio de Janeiro IEUFRJ Preston J T 1997 Technology innovation and environmental progress In Chertow M R e Esty D C Thinking ecologically the next generation of environmental policy Londres Yale Univ Press Tigre P B coord 1994 Tecnologia e meio ambiente oportunidades para a indústria Rio de Janeiro UFRJ Young C E F e Lustosa M C J 2001 Meio ambiente e competitividade na indústria brasileira Revista de Economia Contemporânea v 5 Edição Especial 231259 Rio de Janeiro IEUFRJ Inovação e tecnologia para uma economia verde questões fundamentais Maria Cecília Junqueira Lustosa 123 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 agricultura para uma economia verde ADEMAR RIBEIRO ROMEIRO1 1 cOnSIdeRaçõeS InIcIaIS O que é uma economia verde O entendimento sobre o significado de uma economia verde dependerá da concepção de sustentabilidade ecológica subja cente No relatório recente do PNUMA sobre economia verde esta concepção é aquela implícita no conceito de desenvolvimento sustentável é possível conciliar crescimento econômico com conservação ambiental através do au mento da eficiência ecológica2 da maior prudência nas decisões que envolvem impactos ambientais da maior consciência dos consumidores na escolha de bens e serviços menos impactantes etc O relatório deixa claro o quanto se pode fazer nesse sentido levando ao esverdeamento da economia3 Entretanto no muito longo prazo dentro de uma escala humana milhares de anos4 a concepção de sustentabilidade ecológica a ser considerada é aquela que estabelece claramente que o crescimento econômico expresso pelo aumento da produção materialenergética per capita não pode continuar indefinidamente pelo simples fato de que existem limites entrópicos para o aumento da eficiência ecológica de acordo com a 2ª Lei da Termodinâmica a Lei da Entropia não é possível reduzir a zero as emissões de resíduos ge rados pelas atividades humanas5 É preciso ter em conta a finitude do planeta Terra o qual é um sistema fechado do ponto de vista das trocas de matéria com outros sistemas no espaço com exceção da queda ocasional de mete oritos do ponto de vista energético o planeta está calibrado para apenas absorver energia solar e irradiar calor para o espaço sideral não possuindo fontes endógenas ativas significativas de energia as fontes geotérmicas são relativamente pouco importantes O aumento sem limite da produção material 1 Professor titular do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas IE UNICAMP coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Meio Ambiente NEPAM UNICAMP e diretor da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica 2 Mais com a mesma quantidade de recursos eou mantendo o nível de produção com uma menor utilização de recursos o que se traduz numa redução da emissão de resíduos por unidade de produto ou serviço 3 As recomendações deste relatório em grande medida ecoam o que vem sendo dito há décadas pelo principal teórico do conceito de desenvolvimento sustentável o professor Ignacy Sachs da Universidade de Paris Ver por exemplo Sachs 2006 4 O mínimo que se deve considerar como escala humana de longo prazo é 10 mil anos desde a invenção da agricultura no neolítico Na média devese ter em perspectiva o período transcorrido desde o controle do fogo pela humanidade algo entre 200 e 400 mil anos 5 Alguns especialistas acreditam ser teoricamente possível aumentar em até 10 vezes a atual eficiência ecológica média Por exemplo as atuais emissões de carbono produzidas pela queima de carvão para a produção de aço poderiam ser reduzidas em até 90 com a introdução de novos processos Para uma discussão detalhada ver os trabalhos do Factor Ten Institute httpwwwfactor10de 124 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 6 É fonte exógena de energia toda fonte de energia que não a solar diretamente recebida diariamente pelo planeta como os combustíveis fósseis e a energia nuclear os materiais inertes na crosta terrestre todo tipo de recurso mineral na medida em que são extraídos e processados na ecosfera camada da Terra onde se concentra a vida de alguns metros abaixo no subsolo até algumas centenas de metros acima do solo se tornam resíduos ativos na medida em que forçam os ecossistemas da ecosfera a absorvêlos 7 O fato de as previsões iniciais terem fracassado em função de erros na modelagem e nos parâmetros assumidos não mudam em nada os fundamentos lógicos que levaram à sua elaboração 8 Para uma análise do debate sobre indicadores que reflitam essas dimensões do desenvolvimento econômico ver Veiga 2010 energética com base em fontes exógenas de energia e de materiais que se encontram inertes na crosta terrestre levaria a desequilíbrios termodinâmi cos crescentes que acabariam produzindo processos adaptativos ecológicos catastróficos para a espécie humana6 Nesse sentido o crescimento zero da produção materialenergética será inevitável por bem ou por mal tal como o previra o Clube de Roma em 19727 Crescimento zero é preciso que se diga não implica necessariamente au sência de desenvolvimento humano Certamente o desenvolvimento humano depende do crescimento da produção materialenergética de modo a se obter um nível de conforto material que se considere adequado No entanto a partir de certo nível de conforto material o desenvolvimento humano depende muito mais de outros fatores principalmente daqueles relacionados ao equilíbrio emocional dos indivíduos Nesse sentido um índice que melhor mediria o desenvolvimento em suas várias dimensões não seria o PIB tal como tem sido correntemente calculado8 No caso da agricultura os limites à sua expansão são mais óbvios a área agrícola disponível é visivelmente finita e por mais espetaculares que te nham sido os ganhos de produtividade do solo não se pode contar mais com aumentos expressivos enfim parece claro para todos que a produtividade agrícola não pode crescer indefinidamente Enfim Thomas Malthus estava absolutamente certo em sua intuição fundamental sobre os limites ambientais ao crescimento Quem discorda da ideia de que a população mundial não possa crescer perpetuamente Os economistas mais obtusos o admitem embora continuem acreditando que o crescimento perpétuo do consumo material energético o possa No entanto não basta admitir que a expansão da produção agrícola tenha limites É preciso considerar as condições em que essa produção é realiza da estas têm que permitir a sua continuidade por milênios No começo do século 20 na Europa sobretudo na França um debate se produziu nos meios agronômicos sobre as grandes vantagens da agricultura americana de alta produtividade do trabalho mas grandes impactos ambientais comparada com a agricultura europeia que conservava o ecossistema agrícola mas era menos produtiva por unidade de trabalho Muitos especialistas chegaram a argumentar a favor da agricultura americana dizendo que não compensaria Agricultura para uma economia verde Ademar Ribeiro Romeiro 125 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 perder em ganhos de produtividade para conservar os solos uma vez que no futuro por volta do final do século a agricultura não seria mais necessária para a produção de alimentos Os efeitos catastróficos da erosão nos EUA acabaram por levar a um grande movimento para a conservação de solos e para a adoção de outras práticas conservacionistas que garantiram um mínimo de sustentabilidade às práticas agrícolas ditas modernas9 No entanto podese questionar esse mínimo de sustentabilidade das práticas atuais como tem sido feito pelos movimentos em prol de práticas alternativas de agricultura estas sim capazes de efetivamente garantir a capacidade produtiva agrícola no longuíssimo prazo 2 a eSpecIfIcIdade ecOlógIca dO SetOR pROdUtIvO agRícOla A atividade agrícola depende de espaço É a principal responsável pela transformação irreversível de ecossistemas naturais Apresenta também a peculiariedade de ter a quantidade e a qualidade de suas produções afetadas pelo grau em que as técnicas utilizadas impactam sua base natural As práticas ditas modernas garantiram a quantidade mas não a qualidade dos alimentos Estes têm apresentado graus variados de contaminação por agroquímicos bem como queda na qualidade nutricional estrutura de aminoácidos e teor de vitaminas afetados pela fertilização desbalanceada e pela degradação da estrutura física dos solos Entretanto mesmo a quantidade não está garantida se considerarmos o muito longo prazo Os defensores das práticas atuais argumentam de modo análogo aos defensores da agricultura americana no começo do século 20 que a adoção de práticas agroecológicas reduziria em muito a produtividade do trabalho agrícola representando um custo não aceitável pela população De fato os chamados produtos orgânicos ou mais genericamente agroeco lógicos10 são mais caros sendo que sua comercialização visa ainda a nichos de mercado compostos de um público mais consciente e disposto a pagar mais caro por produtos de melhor qualidade11 Podese argumentar entretanto que esses preços já poderiam ser menores se os Estados dedicassem às práticas agroecológicas esforços semelhantes ao que dedicam à agricultura convencional em termos de pesquisa e extensão agrícolas crédito subsídios etc Além disso é preciso considerar que uma Agricultura para uma economia verde Ademar Ribeiro Romeiro 9 A erosão eólica em particular nas grandes planícies semiáridas produzia tempestades de poeira dust bowl que chegavam até a Costa Leste 10 Por produtos agroecológicos devem ser entendidos todos aqueles que foram produzidos segundo certas regras de cultivo baseadas no manejo inteligente das forças da natureza minimizando introdução de insumos agroquímicos exógenos 11 Para uma análise dos problemas de adoção de práticas agroecológicas no Brasil ver Assis e Romeiro 2004 e 2007 126 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 correta contabilização ecológica mostraria que os preços mais elevados dos produtos agroecológicos embutem uma série de serviços ecossistêmicos12 que beneficiam toda a sociedade O primeiro deles já mencionado é a qualidade dos alimentos Alimentos mais saudáveis em termos nutritivos e isentos de contaminação química Outro serviço importante é a produção de água de qualidade Uma paisagem agrícola agroecológica resulta de um manejo de solo que potencializa a capacidade de infiltração de água eliminando a erosão e contribuindo para a regularização do fluxo de água dos rios Desse modo a qualidade das águas não é afetada pelo carreamento de terra e agroquímicos reduzindo o custo de tratamento de água nos centros urbanos que não resolvem todo o problema e contribuindo para a manutenção da fauna aquática Um terceiro serviço ecossistêmico é aquele da manutenção de uma bio diversidade florística e faunística na paisagem agrícola que é cada vez mais valorizada na maioria dos países Para o ecoturismo ou turismo rural essa pai sagem agroecológica é fundamental e cada vez mais os cidadãos de diversos países estão dispostos a pagar por esses serviços A absorção e estocagem de carbono seria um quarto Há outros porém nem todos podem ser moneti záveis devido à falta de informações Os que são monetizáveis deveriam ser contabilizados e levados em conta na formulação de políticas agrícolas de apoio às práticas agroecológicas Possivelmente a necessária contabilização da dimensão econômica mone tária do valor da agricultura agroecológica seja suficiente para justificar políticas mais incisivas em seu apoio De qualquer modo é preciso não perder de vista suas dimensões propriamente ecológica e sociocultural cujas métricas não são monetárias A dimensão sociocultural tem sua métrica no papel que o espaço agrícola pode ter para a preservação da identidade cultural de muitos povos No caso da dimensão ecológica que interessa a todos a métrica é a sustentabilidade de muito longo prazo definida por critérios a utilitário necessidade para a sobrevivência humana e b deontológico aceitação do direito à sobrevivência de espécies não úteis A ciência agrícola já acumulou experiência suficiente para definir os parâ metros de sustentabilidade de longuíssimo prazo para as práticas agrícolas um agroecossistema onde certa proporção de remanescentes de flora e fauna nativas contribue para a resiliência agroecossistêmica de longo prazo de prá ticas agropecuárias baseadas no manejo de processos naturais Agricultura para uma economia verde Ademar Ribeiro Romeiro 12 Para uma categorização dos serviços ecossistêmicos ver o Relatório de Avaliação Ecossistêmica do Milênio MEA da sigla em inglês de 2005 127 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 21 os princípios ecológicos das práticas agroecológicas Podese dizer que as práticas agrícolas modernas evoluíram em resposta a estímulos econômicos provenientes das vantagens da monocultura em termos da organização e da produtividade do trabalho agrícola e da perspectiva de ganho com a especialização na produção do produto mais rentável13 Tecni camente isso foi possível por meio da introdução de procedimentos químico mecânicos que se revelaram eles próprios degradantes da base produtiva É preciso ter claro que a monocultura contraria uma regra básica na na tureza segundo a qual diversidade é sinônimo de estabilidade Quanto mais simplificado for um determinado ecossistema maior a necessidade de fontes exógenas de energia e matéria para manter o equilíbrio A monocultura pro voca um profundo desequilíbrio tanto do ponto de vista da cobertura vegetal infestações de pragas como daquele das atividades física química e bioló gica do solo Os fatores desestabilizadores ganham força e obrigam o agricultor a recorrer a técnicas intensivas em energia para manter as condições favoráveis ao de senvolvimento dos vegetais Entretanto essas soluções técnicas não buscam eliminar as causas do desequilíbrio mas apenas contornar seus efeitos sobre os rendimentos A eficácia inicial dessas técnicas e procedimentos tornou a grande maioria dos especialistas extremamente otimista A experiência mostrou entretanto que não havia razão para esse otimismo Na França por exemplo devido à baixa geral da taxa de matéria orgânica a estrutura física dos solos tornouse cada vez mais suscetivel à ação de fatores climáticos bem como à passagem de máquinas e equipamentos pesados cujo uso por sua vez se fez necessário para descompactar solos mais suscetíveis à compactação devido ao baixo teor de matéria orgânica Em outras palavras a degradação da estrutura física do solo provoca uma contradição permanente no nível das intervenções que visam modificar favoravelmente as condições de abastecimento de água e nutrientes para as plantas quanto mais o solo se degrada menos se pode contar com fatores naturais serviços ecossistêmicos para se obter as condições necessárias para o cultivo as quais têm que ser obtidas por meio de intervenções químico mecânicas que também contribuem para a degradação No entanto é preciso ter claro que essas inovações não resolvem a contradição na medida em que se destinam a contornar os efeitos da degradação do meio sobre a produtivi dade sem tocar nas causas dos problemas É preciso enfrentálos com a adoção de práticas agrícolas que manejem a natureza e não lutem contra ela Um ecossistema agrícola implica forçosamente a simplificação do ecossistema original Por essa razão é necessário que o Agricultura para uma economia verde Ademar Ribeiro Romeiro 13 Ver Romeiro 1991 1998 para uma análise histórica desse processo 128 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 agricultor intervenha permanentemente para mantêlo estável Contudo essa intervenção deve ser feita de acordo com as próprias leis da natureza A simplificação extrema pode ser evitada através da rotação de culturas Essa prática é um notável meio de manutenção da estabilidade do ecossistema agrícola Além de reduzir drasticamente o risco de infestação de pragas na cobertura vegetal as rotações contribuem eficazmente para a manutenção de uma boa estrutura física do solo A agroecologia busca precisamente isto a partir da experiência milenar das agriculturas camponesas bem sucedidas desenvolver cientificamente práticas agropecuárias que manejem a natureza de modo a obter serviços ecossistêmicos úteis à produção 3 pOlítIcaS agROaMbIentaIS Em decorrência do exposto nas seções anteriores a pesquisa científica em agroecossistemas sustentáveis deve ser parte fundamental de uma po lítica agroambiental para a agricultura No Brasil já há mais de 20 anos se começou a pesquisa com práticas agrícolas menos impactantes14 Um dos mais notáveis resultados desse trabalho é a expansão do sistema de plantio direto15 que já ultrapassou a marca dos 10 milhões de hectares Tratase de um sistema de cultivo em que o agricultor cria as condições garantindo o teor de matéria orgânica necessário e protegendo o solo do sol e da chuva medidas necessárias para que as atividades da microvida do solo resultem uma estrutura física adequada ao plantio Representa um reconhecimento de como o manejo inteligente das forças da própria natureza permite obter serviços ecossistêmicos de conservação de solo e manter uma produtividade elevada Outro exemplo notável mais antigo e de imenso sucesso é aquele do uso em larga escala da fixação de nitrogênio atmosférico através de ino culantes que potencializam esse processo natural que ocorre com plantas leguminosas como a soja Ainda o controle biológico de pragas na soja com o uso de vírus que ataca seu principal inseto predador São técnicas que usam processos naturais serviços ecossistêmicos mas que ainda são aplicadas principalmente em monoculturas Atualmente os órgãos de pesquisa no Brasil vêm ampliando o esforço de pesquisa em agroecossistemas sustentáveis Por exemplo a EMBRAPA já há alguns anos criou um centro de pesquisa em agrobiologia além de manter outro centro de pesquisa em agricultura e meio ambiente16 São centros de Agricultura para uma economia verde Ademar Ribeiro Romeiro 14 Para uma análise mais ampla das perspectivas de políticas agroambientais ver Romeiro 2007 15 O plantio direto é um sistema de cultivo sem aração do solo A semente é enterrada diretamente no solo que foi coberto com uma camada de restos de cultura picados palhada os quais o protegem e ao mesmo tempo fornecem a matéria orgânica necessária para alimentar a cadeia de organismos que vivem no solo As condições adequadas para o desenvolvimento da planta a partir da semente resultam precisamente das atividades desses organismos portanto essas atividades se traduzem no serviço ecossistêmico de estruturação do solo para a implantação e desenvolvimento das culturas 16 EMBRAPA Agrobiologia CNPAB e EMBRAPA Meio Ambiente CNPMA 129 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 referência mas todos os demais centros de pesquisa da EMBRAPA também têm essa preocupação com a sustentabilidade das práticas agrícolas Recente mente foi lançado um pacote tecnológico de integração pecuáriaagricultura São duas atividades que possuem fortes complementaridades ecológicas de modo que sua integração aumenta a produção por hectare de modo susten tável Tratase de um passo importante para viabilizar a efetiva adoção de práticas agroecológicas Juntamente com a política científica e tecnológica é fundamental que as externalidades negativas das práticas convencionais sejam mensuradas e taxadas de algum modo Simultaneamente as externalidades positivas serviços ecossistêmicos geradas pelos agricultores devem ser consideradas Assim o custo de adoção de determinadas práticas sustentáveis custo de oportunidade representa o valor de um serviço de conservação ambiental ofe recido pelo agricultor Com esse serviço de conservação ambiental o agricultor garante que a natureza agroecossistema produza serviços ecossistêmicos como os mencionados alimentos saudáveis quantidade e qualidade da água biodiversidade As certificações mais conhecidas de produtos alimentares como da agricultura orgânica ou biodinâmica começaram enfatizando o ca ráter saudável dos alimentos produzidos mas hoje as certificações tendem a incluir também outros serviços ecossistêmicos decorrentes da preservação e manejo de uma determinada paisagem agrícola como a biodiversidade e a água em especial É preciso levar em conta também que muitos dos serviços ecossistêmicos produzidos com a adoção de práticas agroecológicas também beneficiam o próprio agricultor Neste caso podese falar de tecnologias ganhaganha win win technologies que produzem externalidades ambientais positivas e ao mesmo tempo são rentáveis para os produtores Esse é o caso dos alimentos saudáveis quando o mercado reconhece seu valor pagando o preço neces sário para rentabilizar a produção No caso da água um solo protegido e com o teor adequado de matéria orgânica aumenta a resistência das culturas ao estresse hídrico poupando portanto gastos com irrigação suplementar ou prejuízos com quebras de safras Os gastos com controle de pragas também são menores uma vez que há um maior equilíbrio ecossistêmico A maior biodiversidade também aumenta a produtividade ao garantir uma melhor polinização das culturas Há portanto que se fazer um balanço para se chegar ao custo de opor tunidade real da adoção de práticas agroecológicas e desse modo ter uma referência justa para o pagamento por serviços ambientais que a sociedade como um todo deveria fazer aos agricultores Agricultura para uma economia verde Ademar Ribeiro Romeiro 130 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Assis R L e Romeiro A R 2004 Análise do processo de conversão de sistemas de produção de café convencional para orgânico um estudo de caso Cadernos de Ciência e Tecnologia 211 143168 Brasília EMBRAPA Assis R L e Romeiro AR 2007 O processo de conversão de sistemas de produção convencionais para orgânicos Revista Brasileira de Administração Pública 41 863885 Romeiro AR 1991 O modelo euroamericano de modernização agrícola Nova Economia 221 175197 Belo Horizonte UFMG Romeiro AR 1998 Meio ambiente e dinâmica de inovações na agricultura São Paulo FAPESPANNABLUME 277 p Romeiro A R 2007 Perspectivas para políticas agroambientais In Ramos P org Dimensões do agronegócio brasileiro políticas instituições e perspectivas 1 ed v 1 283317 Brasília NEAD Estudos Sachs I 2006 Caminhos para o desenvolvimento sustentável Rio de Janeiro Editora Garamond Veiga J E 2010 Indicadores de sustentabilidade Estudos Avançados n 68 JanAbr Agricultura para uma economia verde Ademar Ribeiro Romeiro 131 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural1 ARILSON FAVARETO2 IntROdUçãO A economia verde pode favorecer os mais pobres especialmente na área rural A resposta a esta pergunta é afirmativa A Green Economy Initiative GEI3 lançada em 2008 pelo PNUMA e a posterior Green Economy Coa lition GEC4 frente de treze organizações internacionais de consumidores trabalhadores empresários ambientalistas e pesquisadores definem economia verde como aquela que além de se tornar justa e resiliente também conse guiria melhorar a qualidade de vida de todos dentro dos limites ecológicos deste planeta Portanto a questão fundamental não é saber se tal intento pode favorecer os mais pobres mas sobretudo evidenciar como isso pode acontecer e que iniciativas o materializariam No caso das regiões rurais são dois os pontos de partida para analisar tal questão Sabese por um lado que há uma tendência declinante da partici pação da agricultura na formação da renda das famílias Isto é cada vez mais os rendimentos das famílias rurais provêm de outras atividades nãoagrícolas como empregos urbanos em pequenas localidades próximas de outras ativida des realizadas no âmbito dos próprios estabelecimentos agropecuários como a prestação de serviços ou a manufatura de parte dos produtos ou ainda das transferências de renda via programas sociais Por outro lado é conhecido o peso do atual padrão de produção agropecuária na emissão de gases estufa como mostram todos os relatórios disponíveis sobre este tema Além disso embora gere muita riqueza e um alto volume de produção este padrão baseado na expansão da agricultura intensiva promove um descarte de trabalho por conta da introdução da mecanização e de insumos industrializados e por aí apresenta pequeno efeito sobre a formação da renda dos mais pobres E finalmente tratase de um padrão que pressiona severamente o meio ambiente pela intensidade do uso de recursos naturais 1 Este artigo foi elaborado a pedido da Conservação Internacional CIBrasil e baseiase em argumentos e trechos originalmente publicados em outros trabalhos do autor 2 Sociólogo professor da Universidade Federal do ABC e pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento Cebrap Email arilsonfavaretoufabcedubr 3 httpwwwuneporggreeneconomy 4 httpwwwgreeneconomycoalitionorg 132 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Mas este é apenas um dos lados da moeda e reflete a extensão até os dias atuais de um paradigma de desenvolvimento rural que teve origem no pósguerra do século passado Gradativamente vem emergindo aquilo que a literatura chama de uma nova ruralidade cujos contornos são significativa mente diferentes e nos quais residem as grandes oportunidades para inaugurar um novo ciclo de desenvolvimento num sentido compatível com os princípios preconizados pela economia verde O objetivo deste artigo é evidenciar os contornos dessa ruralidade emer gente cujo traço distintivo é a transição de um paradigma agrário e agrícola para um paradigma organizado em torno do enraizamento ambiental do de senvolvimento rural E junto disso sinalizar alguns temas importantes para que o Brasil acelere a transição em direção a esse novo padrão Para tanto são três as seções que se seguem a esta breve introdução Na primeira delas são apresentados os contornos da chamada nova ruralidade Na segunda é apresentado um breve quadro sobre a heterogeneidade atual das regiões rurais brasileiras e suas diferentes formas de inserção econômica e de uso dos recursos naturais Na terceira são indicados alguns temas sensíveis para a transição rumo a uma economia verde 1 O enRaIzaMentO aMbIental da nOva RURalIdade De acordo com a teoria social Abramovay 2003 três são as dimensões definidoras fundamentais da ruralidade a proximidade com a natureza a liga ção com as cidades e as relações interpessoais derivadas da baixa densidade populacional e do tamanho reduzido de suas populações O que muda na nova etapa do desenvolvimento rural que emerge com a chamada nova ruralidade são o conteúdo social e a qualidade da articulação entre essas instâncias No que diz respeito à proximidade com a natureza os recursos naturais antes voltados para a produção de bens primários são agora crescentemente objeto de novas formas de uso social com destaque para a conservação da biodiversidade o aproveitamento do potencial paisagístico disto derivado e a busca de fontes renováveis de energia A natureza é vista cada vez mais como fundamental por sua capacidade insubstituível de prover os serviços ambientais necessários à existência humana o fechamento do ciclo de determi nados elementos químicos que seriam nocivos à saúde a regulação climática a formação de bacias hidrográficas entre outros Quanto à relação com as cidades os espaços rurais têm deixado de ser meros exportadores de bens primários para dar lugar a uma maior diversificação e integração intersetorial de suas economias com isso arrefecendo e em alguns casos mesmo inver tendo o sentido dos fluxos demográficos que vigorava no momento anterior As relações interpessoais por fim deixam de apoiarse numa relativa ho mogeneidade e isolamento características tradicionalmente associadas ao Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 133 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 rural Elas passam a estruturarse a partir de uma crescente individualização e heterogeneização Tratase de um movimento compatível com a maior mo bilidade física com o desenvolvimento das tecnologias de informação e de comunicação com o novo perfil populacional e com a crescente integração entre mercados que antes eram mais claramente dicotomizados no rural e no urbano mercados de bens e serviços mas também o mercado de trabalho e o mercado de bens simbólicos Favareto 2007 Essa mudança qualitativa pode ser melhor compreendida mediante rápida exposição tendo por base exemplos da experiência internacional Um dos principais livros sobre o desenvolvimento rural no mundo contem porâneo é justamente consagrado à análise da realidade dos EUA Rural development in the United States de Galston e Baehler 1995 Nele os au tores destacam como ao longo da história norteamericana foram mudando as vantagens comparativas das áreas rurais Numa primeira longa etapa da formação do território norteamericano a grande vantagem comparativa estava situada na disponibilidade de produtos primários madeira carvão minerais e produtos agrícolas A busca por esses recursos orientou a ocupação do espaço e foi por bom tempo a principal fonte de trabalho e riqueza Obviamente com o passar do tempo a importância dessa produção foi de crescendo relativamente às demais atividades econômicas tanto em termos de pessoal ocupado como de riqueza gerada As inovações tecnológicas e a consolidação de cidades desencadearam uma diversificação da base produtiva com o desenvolvimento crescente de atividades de transformação e serviços Nessa etapa os espaços rurais passam a ter como fatores de atração de in dústrias e investimentos seus terrenos e mãodeobra mais baratos além de aspectos como menor fiscalização e sindicalização A principal vantagem passa a ser a localização já que o aproveitamento desses fatores menos onerosos nas áreas rurais só eram viáveis em razão de certa distância dos centros mais dinâmicos compensando custos de transporte Mas da mesma maneira que o avanço tecnológico permite uma diminuição de custos de produção e a introdução de técnicas poupadoras de mãodeobra na agricultura na ati vidade manufatureira acontece o mesmo Com isso o dinamismo passa a se concentrar no setor terciário Nas duas últimas décadas do século passado os condados que mais ofereceram serviços ligados ao aproveitamento de ameni dades rurais paisagens naturais ou cultivadas ar puro água limpa atrativos culturais foram aqueles que apresentaram maior crescimento Constituem exceção os lugares que contaram com tipos muito especiais de investimentos como cassinos prisões ou centrais de distribuição dos correios Mas tratase de um tipo de investimento que por motivos óbvios não pode ser a base de uma estratégia a ser preconizada para as áreas rurais No caso da Itália apresentado em Veiga 2006 é evidente o contraste entre áreas rurais que dependem essencialmente das rendas obtidas através da Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 134 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 exportação de bens primários eventualmente industrializados e outras onde a economia está assentada nos deslocamentos de rendas geradas e obtidas nas cidades Essa divisão encontra certa correspondência em características naturais como o relevo sendo planícies e planaltos característicos no primeiro caso e proximidade de colinas e montanhas no segundo Essa divisão parece ter sido influenciada diretamente pela evolução de todo um leque de fenô menos relacionados ao turismo por sua vez estreitamente determinado pelo aumento do tempo livre e da renda e por consequência também do aumento das atividades de lazer de crescentes estratos e camadas sociais Além da conservação do patrimônio natural que está na raiz deste tipo de fenômeno e da exploração econômica das decorrentes amenidades cuja maior expressão é a atividade turística o mesmo estudo mostra também que há um terceiro vetor de valorização da ruralidade a exploração de novas fontes de energia Claro que a agricultura de commodities continua tendo um peso enorme na conformação dos espaços rurais e igualmente que atividades terciárias sempre existiram nesse meio O que destacam Galston Baehler 1995 e Veiga 2006 é a ênfase crescente nesse segundo conjunto tanto em termos de pessoas ocupadas como de riqueza gerada mas principalmente naquilo que ele traz de novo para as instituições voltadas ao desenvolvimento rural a importância crescente da natureza e dos valores não diretamente mo netizáveis Neste quadro de mudança de vantagens comparativas uma constatação incontornável é a de que nem todas as localidades rurais têm as mesmas condições de experimentar um processo de desenvolvimento baseado na ex ploração de suas amenidades A baixa densidade populacional característica básica desses espaços é um complicador para a diversificação econômica O perfil demográfico e as características do tecido social marcadamente das áreas rurais estagnadas ou daquelas que perdem população são outros há uma fragilidade dos laços sociais externos carência de oportunidades locais baixa expectativa quanto às possibilidades de mobilidade social e de ampliação das interações Distância de centros urbanos também pode se converter em desvantagem pelo aumento nos custos de informação e transporte Por isso junto à ênfase nos atributos específicos desses territórios a literatura disponível chama igualmente atenção para a forma de inserção dessas loca lidades no espaço extralocal Jacobs 1984 Veltz 2003 ou como preferem alguns autores para a relação das regiões rurais com as cidades ou com outras partes do mundo Nessa visão é a economia da cidade que molda a economia das regiões rurais E isso acontece pela exportação de produtos primários pela atração de atividades de transformação ou pela captação da renda de setores urbanos como aposentados ou profissionais liberais estes em busca de segunda residência ou via atividades turísticas O fato é que quanto mais estreitas forem essas relações mais chance de prosperidade elas têm Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 135 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Sobre as áreas que estão fora dessa proximidade não há fatalismo É possível criar uma articulação entre regiões rurais e uma rede de cidades ou a constituição de uma rede de cidades numa região rural Isso pode ser feito através de investimentos em comunicação e transporte diminuindo distâncias através de uma espécie de divisão territorial do trabalho entre pequenas locali dades tentando suprir necessidades que teriam que ser satisfeitas em centros urbanos Ou ainda através da geração dos próprios pólos de crescimento com a formação de cidades que venham a suprir essas necessidades Em qualquer uma dessas possibilidades a palavra chave é diversificação É isso que garante o suprimento da população local que cria as condições para a introdução de inovações e a adaptação desses territórios às pressões e con tingências advindas das mudanças econômicas mais gerais implicações para o desenvolvimento Essas mudanças que já estavam em curso desde o último quarto do século 20 nos países do capitalismo avançado foram percebidas pelos organismos multilaterais e órgãos de governo e transformadas em reorientações para o desenho de políticas O desgaste da política agrícola de viés exclusivamente setorial começa a surgir em meados dos anos 80 e abre espaço para uma série de reformas e debates sobre O futuro do mundo rural não por acaso título do Comunicado da Comissão Europeia ao Parlamento em 1988 Um marco inegável nesta mudança de visão foi a criação do Programa Leader Ligações Entre Ações de Desenvolvimento das Economias Rurais em 1991 e ainda hoje a principal referência de programas territoriais de desenvolvimento rural Mas as melhores sínteses da percepção dos organismos de planeja mento sobre tais mudanças foram expressas em dois momentos no meio da década de 90 a conhecida Declaração de Cork que teve origem na confe rência A Europa rural perspectivas de futuro e o workshop Postindustrial rural development the role of natural resources and the environment Nesses eventos surgiu o consenso básico sobre a ruralidade avançada sintetizado no quadro 1 a seguir Com isso teve início uma transição progressiva no desenho e no lugar institucional das políticas de desenvolvimento rural Elas começam a passar de uma visão basicamente setorial para aquilo que se convencionou chamar por abordagem territorial do desenvolvimento rural Tratase de uma aborda gem que pretende superar a separação rígida entre rural e urbano e se apoiar justamente nas complementaridades entre esses dois espaços Veiga 2000 Abramovay 2003 Favareto 2007 Como decorrência a ênfase nas políticas agrícolas passa a dar lugar a uma crescente aproximação com as políticas de desenvolvimento regional Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 136 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Quadro 1 consenso básico de meados dos anos 1990 sobre a ruralidade avançada 1 As zonas rurais que englobam os locais de residência de um quarto da população europeia e de mais de um quinto da norteamericana e mais de 80 dos dois territórios caracterizamse por tecidos culturais econômicos e sociais singulares um extraordinário mosaico de atividades e uma grande variedade de paisagens florestas e terras agrícolas sítios naturais incólumes aldeias e pequenas cidades centros regionais pequenas indústrias etc 2 As zonas rurais bem como os seus habitantes formam uma autêntica riqueza para suas regiões e países e podem ser bem competitivas 3 A maior parte dos espaços rurais europeus e norteamericanos é cons tituída por terras agrícolas e florestas que influenciam fortemente o caráter das paisagens 4 Dado que a agricultura certamente permanecerá como importantíssima interface entre sociedade e ambiente os agricultores deverão cada vez mais desempenhar funções de gestores de muitos dos recursos naturais dos ter ritórios rurais 5 Mas a agricultura e as florestas deixaram de desempenhar papel predo minante nas economias nacionais Com o declínio de seus pesos econômicos relativos o desenvolvimento rural mais do que nunca deve envolver todos os setores sócioeconômicos das zonas rurais 6 Como os cidadãos europeus e norteamericanos dão cada vez mais importância à qualidade de vida em geral e em particular a questões relativas à saúde segurança desenvolvimento pessoal e lazer as regiões rurais ocupa rão posições privilegiadas para satisfazer tais interesses oferecendo amplas possibilidades de um autêntico desenvolvimento moderno e de qualidade 7 As políticas agrícolas deverão adaptarse às novas realidades e desafios colocados tanto pelos desejos e preferências dos consumidores quanto pela evolução do comércio internacional principalmente uma adaptação que im pulsione a transição de um regime de sustentação de preços para um regime de apoios diretos 8 Os subsídios estabelecidos pelas respectivas políticas agrícolas serão crescentemente contestados E já é ampla a aceitação de que apoios finan ceiros públicos devam ser cada vez mais condicionados a uma adequada gestão dos recursos naturais e à manutenção e reforço da biodiversidade e das paisagens culturais 9 As reformas das políticas agrícolas da primeira metade da década de 1990 conservaram inconsistências duplicações e alta complexidade jurídica apesar de inegáveis avanços em termos de transparência e eficácia 10 Tornase absolutamente necessário promover a capacidade local de desenvolvimento sustentável nas zonas rurais e nomeadamente iniciativas privadas e comunitárias bem integradas a mercados globais Reproduzido de Veiga 2004 Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 137 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 2 e nO bRaSIl A principal tendência de médio e longo prazo que se manifesta hoje nas regiões rurais brasileiras pode ser sintetizada em duas afirmações aqui como em todos os países do capitalismo avançado a agricultura tem uma tendência declinante tanto na formação das rendas das famílias de agricultores como na ocupação de postos de trabalho e as regiões rurais por uma série de razões não experimentam mais um movimento generalizado de êxodo mas uma heterogeneização do seu perfil demográfico com elevação da escolarização e maior diferenciação social A decorrência dessa tendência é também por aqui uma mudança nas vantagens comparativas das regiões rurais com o declínio do potencial dinamizador e inclusivo das atividades mais tradicionais ligadas ao fortalecimento do setor agropecuário e uma ascensão do potencial de novas atividades relacionadas à exploração da biodiversidade do poten cial paisagístico dela derivado e da nova estrutura de formação das rendas nessas regiões É um potencial que no entanto não vem se realizando como esperado ou sugerido na literatura sobre a nova ruralidade Diferentemente disso as tendências e os potenciais da nova etapa do desenvolvimento rural manifestamse de maneira multiforme Infelizmente por conta da limitação inerente à forma de organização dos dados estatísticos brasileiros não há boas leituras disponíveis sobre essas dinâmicas em escala microrregional De maneira esquemática podemse categorizar em quatro os tipos de regiões rurais hoje existentes no Brasil Em cada um desses tipos experimentase um estilo de desenvolvimento específico com o qual a geração de inovações voltadas a um padrão mais sustentável precisaria necessariamente dialogar O primeiro tipo abrange regiões rurais onde um determinado padrão de urbanização associado a características morfológicas do território como o meio ambiente e a estratificação social favoreceu a que ali se criasse uma forma de uso social dos recursos naturais na qual a busca pela conservação encontra correspondentes em formas de dinamização da vida social Ali a diversificada economia local conta com alto grau de integração econômica e de coesão territorial Paisagem cultura e economia se entrelaçam de maneira a fazerem com que se consiga associar a dinamização econômica com bons indicadores sociais e com desempenho positivo em indicadores ambientais Algo semelhante ocorre em regiões como o Vale do Itajaí em Santa Catarina São regiões que combinam uma ruralidade assentada em fatores ambientais com uma estrutura social mais diversificada e descentralizada Nessas áreas os investimentos em inovação deveriam favorecer a disseminação das atividades econômicas hoje embrionárias de aproveitamento dos recursos naturais locais por meio de atividades como o turismo ou o manejo desses recursos Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 138 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 No segundo tipo entretanto embora as características morfológicas do território no que diz respeito ao meio ambiente favoreçam a conservação as características da estratificação social não contribuem para que ali sejam criadas as instituições capazes de diminuir as fraturas entre grupos sociais por conta de sua posição social A conservação encontrase em conflito com as possibilidades de dinamização da vida local O padrão de urbanização é ainda incipiente ou se deu numa direção na qual não houve valorização do rural Esse é o caso típico de certas áreas da Amazônia onde a presença da floresta convive com o avanço da agricultura de negócios As estruturas sociais locais não apresentam vigor nem padrão de interação suficientes para fazerem frente ao movimento de expansão das atividades primárias resultando em perda de biodiversidade e depleção de recursos naturais como terra e água Há um alto grau de conflito entre instituições e as populações locais são fortemente afetadas por ele São regiões que combinam uma ruralidade assentada em fatores ambientais com estruturas sociais mais especializadas e concen tradas Nessas áreas os investimentos em inovação deveriam favorecer o maior ganho de escala das atividades econômicas que já se apoiam em novas formas de uso dos recursos naturais e a criação de arranjos produtivos locais capazes de aumentar a participação dos pequenos e médios empreendimentos mediante por exemplo a criação de arranjos voltados ao processamento de produtos florestais em modalidades sustentáveis de manejo No terceiro tipo as características morfológicas do território em termos ambientais e sociais engendram uma relação de exploração com o rural sob restritas possibilidades de conservação e maior risco de esgarçamento dos tecidos sociais apesar da possível dinamização econômica com o setor primário e de transformação As regiões que experimentam dinamismo acen tuado e dependente da atividade agrícola se encaixam nesse tipo Nestas a riqueza gerada estabelece uma relação entre o municípiopólo do território e os demais na qual todos os recursos são concentrados não resultando em expansão da riqueza para o conjunto dos grupos sociais As possibilidades de conservação ambiental são restritas ao mínimo exigido por lei como no caso de preservação de remanescentes matas ciliares e vegetação de topo de morro A biodiversidade local é fortemente comprometida ou ameaçada pelo vigor da exploração agrícola comercial Nos casos das regiões mais dinâmicas como algumas áreas do interior do estado de São Paulo o padrão de urbanização oferece infraestrutura e serviços até razoáveis mas concentrados Em outras menos dinâmicas a especialização setorial e o enrijecimento das estruturas sociais levam a um padrão no qual impera a precariedade caso das regiões cacaueiras na Bahia ou na Zona da Mata pernambucana São regiões que combinam uma ruralidade setorial e estruturas sociais mais especializadas e concentradas Nessas regiões os investimentos em inovação deveriam favorecer a diversificação econômica e a constituição de arranjos favoráveis aos pequenos e médios empreendimentos sempre com incentivos especiais Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 139 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 para a adoção de práticas menos intensivas em recursos naturais e menos poluentes O quarto tipo é formado por situações nas quais embora as características morfológicas do território já não sejam tão promissoras no que diz respeito aos recursos naturais as estruturas sociais poderiam favorecer um processo de mudança e de criação de novas instituições No entanto as formas de do minação econômica impedem ou bloqueiam essa inovação Há fissuras entre o setorial e o ambiental e entre os grupos sociais Um exemplo desse tipo de território é o oeste catarinense Uma concentração de grandes empresas agroindustriais convive com uma estrutura social baseada num expressivo segmento de agricultores familiares A região apresenta uma dinâmica eco nômica razoável mas indicadores sociais e de desigualdade não tão bons As possibilidades de reprodução dos grupos sociais locais ainda dependem muito dos vínculos extralocais favorecendo a perda de recursos humanos valiosos Com isso bloqueiase a possibilidade aberta pela configuração social local de maiores interações e de criação de novas instituições capazes de mudar o rumo do desenvolvimento territorial São regiões que combinam uma ruralidade setorial e estruturas sociais mais diversificadas e desconcentradas Aqui os investimentos em inovação deveriam favorecer sobretudo a diversificação das atividades econômicas e um novo padrão de uso dos recursos naturais Como se vê para cada tipo de dinâmica de desenvolvimento em curso um determinado aporte em atividades de promoção de inovações deveria ser constituído Contudo esse aporte não é o único elemento que pode ser mo bilizado para influenciar essas dinâmicas invertendoas quando negativas ou fortalecendoas quando positivas Há vários projetos e investimentos em curso que poderiam ser mais bem aproveitados pelas regiões interioranas do Brasil Apesar dos baixos investimentos brasileiros em pesquisa e desenvolvimento o país hoje apresenta patamares próximos aos de países como Espanha e Itália mas proporcionalmente mais distantes de países como Coreia do Sul Alemanha Japão ou Estados Unidos vários programas e projetos hoje em execução no âmbito do Governo fFederal poderiam favorecer a emergência das atividades econômicas sugeridas Apenas a título de exemplo o Governo Federal tem feito importantes investimentos em turismo por meio do Programa de Desenvolvimento do Turismo que poderiam ser acessados por essas regi ões interioranas dotadas de atrativos ambientais ou culturais Da mesma forma o Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior tem apoiado a descentralização industrial incentivos dos quais as regiões interioranas poderiam se beneficiar desde que introduzindo também critérios ambientais O mesmo vale para os investimentos em biotecnologia Ora a existência dessas oportunidades não garante seu aproveitamento Nem há nelas a destinação de recursos que poderiam favorecer a introdução de inovações ou o apoio a empreendimentos das regiões rurais voltadas a Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 140 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 aproveitálas O que se quer destacar mais uma vez é como essas oportu nidades compõem um ambiente que poderia ser extremamente favorável à geração de um novo ciclo de desenvolvimento nas regiões rurais brasileiras O fundamental é reconhecendo a heterogeneidade das regiões rurais brasileiras adotar como vetor o fortalecimento de uma economia da nova ruralidade seja incentivando a adoção de novas práticas de produção agropecuária como a produção orgânica ou novas tecnologias menos intensivas e mais conservacionistas seja por meio da atividade turística ou da atração de novas populações interessadas em manter a disponibilidade de amenidades ambien tais seja ainda aproveitando o enorme potencial produtivo da biodiversidade e da biomassa mediante a produção de biocombustíveis por exemplo ou por intermédio da exploração industrial de produtos químicos fármacos ou cosméticos 3 IdeIaS paRa UMa agenda É claro que várias dessas novas atividades podem ser potencializadas e ainda assim aumentar a pressão sobre o meio ambiente A produção brasileira de etanol é um exemplo há um aproveitamento da biomassa mas concomi tantemente as técnicas de produção e o peso da monocultura pressionam negativamente a biodiversidade e os recursos naturais necessários como a terra ou a água Não se trata portanto somente de promover novas atividades nas regiões rurais mas especialmente de como fazêlo Da mesma forma isso não necessariamente leva a uma inclusão dos mais pobres De novo podese recorrer a um exemplo dos biocombustíveis desta vez com o biodiesel apesar do desenho inovador introduzindo um Selo Social para as empresas que compram matériasprimas de agricultores familiares ao menos nos seus primeiros anos de existência o programa não logrou incluir produtores das regiões mais pobres e viu os incentivos serem capturados pelos segmentos mais consolidados da agricultura familiar o que se expressa no predomínio da soja fornecida por agricultores do CentroOeste e do Sul como matéria prima principal em vez da mamona ou do dendê fornecidos por agricultores e produtores familiares pobres do Norte e do Nordeste como se imaginava inicialmente Por isso não é trivial o tema da transição para um novo modelo ou um novo paradigma É fundamental reconhecer que as instituições formais e informais incen tivos padrões culturais programas e políticas apresentam um viés onde a inércia do velho paradigma sempre se faz presente Vários poderiam ser os itens a compor uma agenda compatível com os contornos de uma economia da nova ruralidade por sua vez coerente com a ideia de uma economia verde Aqui são citados apenas três deles O primeiro é a introdução de uma vigorosa política de inovação voltada ao aproveitamento da biomassa e da biodiversidade e à promoção de Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 141 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 novos sistemas de produção menos intensivos em recursos naturais e menos poluentes O Brasil tem enorme potencial neste terreno e conta com instituições de pesquisa com décadas de tradição e de excelência internacio nal Contudo apesar desse potencial pouco tem sido feito comparativamente à produção de ciência tecnologia e inovação voltadas aos parâmetros da velha ruralidade ou do padrão produtivista e altamente intensivo em recur sos naturais Sem isto essas novas atividades continuarão sendo nichos de mercado e não a base para um novo ciclo caso atual dos produtos da bio diversidade ou se constituirão de maneira ambígua substituindo recursos não renováveis por renováveis mas a um custo ambiental significativo caso dos biocombustíveis O segundo é a adoção de um sistema de incentivos voltado à expansão das atividades econômicas baseadas em novas formas de uso social dos recursos naturais Os ganhos de escala das velhas atividades e os custos de transação envolvidos na adoção de novas formas de uso dos recursos naturais precisam ser compensados por uma política de incentivos que estimule os agentes sociais a adotarem novas tecnologias e explorar novos mercados nos quais os ganhos de curto prazo decorrentes do uso intensivo e da depleção de recursos naturais dão lugar a atividades que privilegiam os ganhos de longo prazo expressos na conservação ambiental e na manutenção da biodiversidade e da prestação de serviços ambientais O terceiro item de uma agenda mas não menos importante do que os dois anteriores é a formação de coalizões de atores e de interesses coerentes com essas novas atividades e modalidades de uso dos recursos naturais Os atores da velha ruralidade são conhecidos as empresas do setor agroali mentar e as organizações de agricultores ricos e pobres A eles será preciso agregar outros segmentos portadores de outros interesses e sobretudo das habilidades sociais necessárias a fortalecer os caminhos pelos quais pode estar se dando esta transição de paradigmas Para isso é preciso criar novos espaços de articulação e de influência na moldagem das políticas Como se vê não são tarefas simples Mas são tarefas e desafios cujo en frentamento é necessário para a transição para uma economia verde onde a conservação ambiental se possa somar à melhoria do padrão de vida de boa parte da sociedade REFERêNCIAS BIBLIOGRAFICAS Abramovay R 2003 O futuro das regiões rurais Porto Alegre Ed da UFRGS Favareto A 2007 Paradigmas do desenvolvimento rural em questão São Paulo FapespEdusp Galston W A Baehler K J 1995 Rural development in the United States connect ing theory practice and possibilities Washington DC Island Press Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 142 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Jacobs J 1984 Cities and the wealth of nations London Penguin Books Veiga J E 2000 A face rural do desenvolvimento natureza território e agricultura Porto Alegre Ed UFRGS Veiga J E 2004 Destinos da ruralidade no processo de globalização Estudos Avançados 51 maioagosto 5167 Veiga J E 2006 Nascimento de outra ruralidade Estudos Avançados 2057 Veltz P 2003 Des lieux et des liens Paris Ed de Laube Economia verde e um novo ciclo de desenvolvimento rural Arilson Favareto 143 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 o desmatamento da floresta amazônica causas e soluções BASTIAAN PHILIP REYDON1 1 IntROdUçãO O debate sobre o problema do desmatamento da floresta amazônica que tem se expresso entre outros no debate sobre as mudanças no Código Flo restal tem se caracterizado por sua superficialidade e pelo seu caráter ideo lógico Inicialmente há a necessidade de se identificar o processo de forma clara após isto buscar as suas causas e finalmente pensar nas soluções no curto médio e longo prazos É inegável que as fortes políticas de comando e controle2 e incentivo eco nômico3 implementadas nos últimos anos tiveram um papel crucial na redução do desmatamento Como essas dependem da intervenção direta do Estado dificilmente podem ser mantidas no longo prazo principalmente porque os principais indutores produtivos do desmatamento desde a pecuária passan do pela produção de grãos chegando à produção de energia persistirão e soluções perenes devem ser encontradas Este trabalho tem como objetivo central mostrar que a solução definitiva desse problema passa necessariamente pela solução dos problemas fundiários do país que consiste principalmente no Estado brasileiro assumir em conjunto com a nação a efetiva governança sobre a propriedade da terra Inicialmente o presente artigo apresenta uma breve descrição das principais causas do desmatamento identificadas na literatura sobre o tema Em segui da mostrase que dois problemas que aparecem marginalmente na literatura 1 Professor livre docente do Núcleo de Economia Agrícola e Ambiental do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas NEAIEUnicamp assessor de Sustentabilidade da Agência de Inovação Unicamp e consultor do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento Banco Mundial e da FAO Endereço eletrônico basrey ecounicampbr 2 As principais Políticas de Comando e Controle intervenções diretas do Estado que modificam o comportamento dos desmatadores foram a as operações Curupira 2005 e Arco de Fogo 2008 que combateram a extração ilegal de madeira b decreto 632107 que restringe a concessão de crédito pelos bancos e obriga os proprietários dos municípios que mais desmatam a se recadastrarem c a criação de Unidades de Conservação somando mais 20 milhões de hectares aos mais de 80 milhões já existentes totalizando 273 UCs d homologação de 87 Terras Indígenas em aproximadamente 18 milhões de hectares e e restrição aos produtos agropecuários advindos de propriedades nos municípios com maior incidência de desmatamento 3 As políticas de incentivo econômico que usam mecanismos econômicos preços ou outros para incentivarem ou inibir os agentes econômicos a diminuir o desmatamento foram as seguintes a operação Arco Verde 2008 e b Linha especial de crédito no âmbito do FNO FNE e FCO para a recuperação de áreas degradadas reflorestamento manejo e regularização ambiental na Amazônia Legal 144 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 são de forma combinada os principais determinantes do desmatamento da floresta a especulação com terras através do próprio desmatamento da terra e a ausência de governança fundiária O quarto item analisa historicamente a formação do quadro institucional que leva à ausência de regulação no mercado de terras Finalmente na última seção além de se argumentar pela necessidade de uma efetiva governança na propriedade da terra mostramse os principais mecanismos de implantação e os benefícios que gerará 2 O deSMataMentO e SUaS pRIncIpaIS caUSaS Segundo a FAO 2010 o Brasil perdeu uma média de 26 milhões de hectares de florestas por ano nos últimos 10 anos comparado com uma perda anual de 29 milhões de hectares anuais na década de 90 na Indonésia as perdas foram de 500 mil hectares no período de 20002010 e de 19 milhão de hectares no período de 19902000 O gráfico 1 que consiste no levantamento do desmatamento da Amazônia com base em imagens de satélite evidencia que o desmatamento nos últimos anos girou em torno de 64 e 74 milhões de hectares o que representa uma melhora substantiva mas ainda é um desmatamento muito elevado para um bioma com as características do amazônico Bioma este que tem na floresta em pé sua maior riqueza dada sua elevada biodiversidade sua importância para a regulação do clima no planeta sua produção de água doce e solos pobres para atividades agropastoris gráfico 1 Desmatamento na amazônia legal Fonte PRODES 2011 A pergunta que permanece é como inviabilizar um aumento nas taxas de desmatamento e mais como reduzilas significativamente O desmatamento da floresta amazônica é um processo complexo com múltiplos determinantes O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 145 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 e objeto de diferentes estudos teóricos e empíricos4 Margulis 20009 afirma que Não acreditamos que exista uma força principal que impulsione ou que explique sozinha os desmatamentos na Amazônia As causas são várias e decorrem de uma combinação sofisticada de diversas variáveis e fatores Os principais grupos de variáveis que induzem ao desmatamento presentes em Margulis 2000 e na maior parte da literatura são a ganhos associados ao uso da terra na Amazônia determinados por pre ços agrícolas aumento dos preços da terra variação nos preços dos insumos aumento nos preços da madeira e a diminuição dos salários rurais b políticas públicas e crédito a disponibilidade de recursos creditícios baratos FINAM FNO e de políticas de incentivo fiscais SUDAM c acessibilidade a construção de rodovias eou outras obras que facilitem o acesso a áreas de fronteira d macroeconomia ciclos de crescimento do PIB crescimento da popu lação Na medida em que esses quatro agrupamentos de variáveis têm interferido diretamente no desmatamento da Amazônia podese dizer que após as inter venções dos últimos anos e a crise de 20089 todos estariam tendo impactos positivos no desmatamento mas nem por isso o desmatamento aumentou Por outro lado mesmo nos períodos nos quais essas variáveis não apresentavam crescimento o desmatamento crescia Isso indica que há outros fatores mais profundos cuja importância relativa não tem sido destacada 3 O deSMataMentO e a eSpecUlaçãO cOM teRRaS No nosso entender o desmatamento da Amazônia é fruto da continuidade da tradicional forma de expansão da fronteira agrícola brasileira que em geral costuma ocorrer através das seguintes etapas a ocupação de terras virgens privadas ou públicas a extração de sua madeira de lei a instalação da pecuária5 e por fim o desenvolvimento de uma agropecuária mais moder na Essas atividades econômicas exercem o papel de gerar renda e legitimar a ocupação dos novos proprietários no curto prazo quase sem necessidade de recursos6 No longo prazo as terras ou permanecem com pecuária mais intensiva ou se existir demanda serão convertidas para grãos ou outra ati vidade econômica O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 4Para uma revisão exaustiva ver Soares Filho et al 2005 5 Reydon e Romeiro 2000 mostram que o principal motor da pecuarização é por um lado a existência de muita terra devoluta passível de ser apropriada associada à possibilidade de a baixos custos instalar a pecuária tornando o desmatamento uma estratégia de valorização do capital imbatível 6 Com frequência são estes mesmos ocupantes que se utilizam de mão de obra escrava 146 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Mas o que importa é que existe a expectativa de que haverá demanda pela terra7 para ser utilizada em algum momento do futuro fazendo com que seus preços se elevem significativamente E quanto mais próxima fisicamente a terra se encontra de regiões que permitam a utilização produtiva maior será o seu preço A valorização dessas terras ocorrerá à medida que as expectativas vão se elevando Nos vários estudos de Margulis 2000 e 2003 e na literatura já citada a questão da especulação com a terra aparece mas normalmente está asso ciada ao crescimento do preço da terra Contudo o crescimento do preço da terra não significa necessariamente que está em andamento um processo de especulação Nesse sentido efetivamente o preço da terra na região Norte grosso modo acompanha os movimentos do preço da terra do restante do país não gerando grandes ganhos especulativos A especulação com a terra que conforme este artigo propõe é o principal motor do desmatamento da floresta amazônica dáse de uma forma muito mais microeconômica e associada à própria ocupação da terra e pode ser muito mais claramente percebida através de pesquisas de campo O que ocorre na realidade é que qualquer pessoa que adquire ou ocupa a terra com floresta tem a clara percepção que sua terra isto é seu investimento se valoriza com o processo de desmatar Na tabela 18 observase inicialmente que os preços da terra com mata nos diferentes estados variam entre R 108 no Acre a R 546 no Mato Grosso Observase aí também como os estados menos desmatados têm os preços mais baixos da terra enquanto os estados do Mato Grosso Pará e Rondônia têm os preços mais elevados Mas a conclusão mais importante que se tira da tabela é que em todos os estados o desmatamento sempre valoriza a propriedade significativamente sendo que na média desses estados o desmatamento mais que quadruplica o valor da terra Isso ocorre porque o preço da terra ainda é fundamentalmente fruto das expectativas dos ganhos produtivos decorrentes da agropecuária associados a ela sendo que nas terras desmatadas seu uso pode ocorrer imediatamente e sem custos de desmatar No caso mais extremo que é o do Acre o desmatamento multiplica esse valor por mais de 14 vezes enquanto no estado do Amazonas multiplica o valor da terra por quase 10 vezes Poucos investimentos têm retornos tão elevados quanto esses O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 7 Esta é decorrente do aumento de preços da arroba do boi gordo da soja ou mesmo do anúncio de que o país será o maior produtor de álcool do mundo No período recente esses fatores convergiram fazendo com que a demanda por terras crescesse mais ainda e seus preços também pressionando ainda mais o desmatamento 8 A metodologia da empresa de agronegócios Agra FNP coleta preços médios em regiões homogêneas dos estados citados usando uma terminologia não homogênea Para as matas agregamos as chamadas matas matas de fácil acesso e de difícil acesso Para as pastagens utilizamos as pastagens formadas fácil e difícil acessos pastagens formadas de alto suporte e pastagens formadas de baixo suporte 147 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Há que se levar em conta que esses proprietários além do ganho patri monial com o desmatamento têm os ganhos oriundos da venda da madeira em CotriguaçuMT estimase um retorno líquido de R 2400ha e do seu uso econômico posterior se ocorrer com pecuária gerará uma receita líquida adicional de mais de R 120 por hectareano9 Portanto o maior catalisador do desmatamento é a combinação dos ganhos da valorização da terra na sua conversão de floresta em terra produtiva associados aos ganhos da madeira e da pecuária estabelecida posteriormente tabela 1 Preços médios de terras de matas e de pastagens Estados da Amazônia em Rha correntes de 2008 Estados Mata Rha Pastagem Rha Variação Acre 10800 157180 14554 Amapá 14100 80000 5674 Amazonas 13243 124391 9393 Pará 45773 150940 3298 Rondônia 35850 176250 4916 Mato Grosso 54613 208369 3815 média NoRte 41653 183239 4399 Fonte AgraFND 2009 Esse processo de aquisição e desmatamento que já é muito rentável em áreas privadas tornase muito mais lucrativo nas terras devolutas que se gundo estimativas10 representam 42 do total da área da Amazônia onde ocorre a maior parte dos desmatamentos Isto é no apossamento das terras devolutas os ganhos oriundos da madeira da pecuária e da valorização da terra se multiplicam pois a terra em si não precisou ser adquirida apenas usurpada do patrimônio público11 4 O apOSSaMentO de teRRaS na aMazônIa e a InSegURança dOS dIReItOS de pROpRIedade Essa prática do apossamento pode ser atestada na ausência de cadastro e de efetiva regulação da propriedade da terra no Brasil e particularmente O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 9 Vide Margulis 2003 10 Estimativa de Shiki 2007 indica que 42 das terras da Amazônia são devolutas 11 Talvez algumas despesas com capangas armas advogados e os custos lícitos e ilícitos de regularizar a área 148 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 na Amazônia Os dados cadastrais existentes baseados nas declarações dos proprietários de terras que se cadastraram no INCRA mostram que em 2003 35 dos 509 milhões de hectares de terra na Amazônia Legal estavam ocupa dos sob o direito de posse privado seja como propriedade registrada ou como posse Por outro lado o recente processo de criação de reservas quer federais quer estaduais de diferentes tipos fez com que hoje 42 da Amazônia Legal esteja sob algum tipo de proteção aproximadamente metade dessa área era Terras Indígenas e a outra metade Unidades de Conservação de vários tipos Os 24 restantes não estavam em nenhuma dessas categorias e portanto são tecnicamente consideradas terras públicas sem alocação Figura 1 Mas a situação é mais complexa e incerta do que esses números indicam Muitas das áreas protegidas estão fisicamente ocupadas por usuários privados cujas reivindicações de ocupação podem ou não ter validade de acordo com a legislação complexa apresentada na próxima seção A grande área descrita como privada pelo sistema cadastral também está em dúvida Dos 178 milhões de hectares declarados como propriedades privadas 100 milhões de hectares podem estar baseados em documentação fraudulenta Outros 42 milhões de hectares dessa área são classificados a partir de declarações cadastrais como posse que podem ou não ser passíveis de regularização fundiária novamente dependendo das suas circunstâncias de tamanho história e localização12 Dessa forma 30 da área pode ser legalmente incerta eou contestada figura 1 Situação fundiária na amazônia legal considerando dados do Sistema Nacional de cadastro Rural 2003 e áreas protegidas 2006 Fonte Barreto 2008 O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 12 Há todos os tipos de tamanhos de posseiros no cadastro do INCRA Tanto os pequenos com menos de 200 ha quanto os com mais de 1000 ha somam 149 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 O Estado brasileiro é tão ciente de sua incapacidade de regular o uso da terra principalmente por não ter um cadastro que foi obrigado a tomar as seguintes ações concretas para diminuir o desmatamento da Amazônia e aumentar a governança fundiária mas sempre de forma emergencial sem enfrentar o problema na sua origem a Estabeleceu a Lei 1195209 regularizando as posses de até 400 ha a custo zero e vendendo as posses de entre 401 e 1500 ha os posseiros têm que comprovar que vivem no lote desde 2004 b O governo implementou o Programa Terra Legal que estabelece os critérios para a regularização fundiária das áreas rurais situadas em terras da União no âmbito da Amazônia Legal c Criação de inúmeras áreas protegidas APAs na forma de UCs baseada na lei 9985 de julho de 2000 para proteção na beira das principais estradas em construção na região amazônica para evitar o apossamento e desmata mento A evidência mais clara da incapacidade que o Estado brasileiro vem ten do de efetivamente ter governança no mercado de terras é a própria edição da Portaria 55899 aplicável para todo território brasileiro e não somente à Amazônia Legal Nela o INCRA impôs a todos os proprietários de imóveis com mais de 10000 ha a necessidade de apresentar a sua documentação comprobatória Dos 3065 proprietários convocados apenas 1438 469 compareceram fazendo com que o cadastro de 1627 imóveis fosse cance lado perfazendo 46 milhões de hectares13 Além disso 53 da área destes imóveis se localizam nos estados do Norte do Brasil em grande parte na floresta amazônica Apenas no estado do Amazonas segundo Lima 2002 foram cancelados em 14 comarcas o equivalente a 485 milhões de hectares de propriedades registradas junto aos respectivos cartórios de registro de imóveis no início dos anos 2000 Também há estudos acadêmicos como o de Araújo et al 2008 que evidenciam a partir de dados municipais que os direitos de propriedade pouco seguros como os da Amazônia têm impacto positivo no desmatamento 5 qUadRO InStItUcIOnal da RegUlaçãO fUndIÁRIa pOR qUe nãO exISte cadaStRO e a gOveRnança fUndIÁRIa Esta seção analisa historicamente a formação do quadro institucional brasilei ro a qual leva à ausência de regulação no mercado de terras Demonstrase que muitas das características que provocam essa ausência são heranças de uma inépcia histórica do Estado brasileiro com relação à governança fundiária O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 13 Vide Sabato 2001 para maiores detalhes 150 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Até a Lei de Terras brasileira 1850 as regras de ocupação do solo urbano e rural eram definidas a partir do poder do rei da Igreja e do poder político e físico dos ocupantes A Lei de Terras deve ser entendida num contexto mais geral de estabelecimento de leis que colocavam restrições ao acesso à terra em todo o mundo colonial14 Em função dos interesses dos proprietários do país a Lei de Terras manteve a possibilidade de regularização das posses fruto da ocupação de terras devolutas o que novamente inviabilizou a criação do cadastro Isto é sempre houve a possibilidade de serem regularizadas as posses oriundas de ocupações de terras devolutas Além do usucapião que estabelece que após alguns anos o posseiro pode regularizar sua propriedade os próprios estados principalmente após a República em alguns momentos históricos concederam propriedades com ou sem títulos Esse é o mecanismo básico que fez e faz com que nunca fosse estabelecido um cadastro efetivo que inclusive permitiria definir as áreas devolutas passíveis de utilização por outros tipos de políticas fundiárias Até a Lei de Terras o registro das propriedades era feito basicamente junto aos Registros Paroquiais de Terra sob responsabilidade do vigário local Esse registro foi utilizado por muito tempo após a promulgação da Lei de Terras Em 1864 uma nova obrigação institucional acaba por estabelecer uma tradição que perdura até os dias de hoje e que acaba gerando uma maior indefinição e incapacidade de se regular efetivamente o mercado de terras a necessida de de se registrar as propriedades nos cartórios independentemente de sua comprovação De alguma forma o registro no cartório dá ares de legal ao imóvel sem que haja qualquer mecanismo que garanta isso15 A Proclamação da República em 1889 ao passar aos estados os direitos sobre as terras devolutas geraram a possibilidade para que os seus manda tários as repassassem através de concessão de títulos não registrados Isso ocorreu com mais intensidade em alguns estados do que em outros mas independentemente disso criou mais uma ambiguidade na concessão de títulos que dificultou a regulação estatal do mercado de terras16 A institucionalização do Registro Público de Terras em 1900 é possivel mente o principal passo para o sistema hoje vigente de registro de imóveis O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 14 Como na América Latina Austrália e nos Estados Unidos 15 As irregularidades mais comuns são a concessão de títulos a propriedades inexistentes ou devolutas e a superposição de várias áreas ou seja vários proprietários têm títulos sobre a mesma terra Quando isso ocorre dizse que a terra possui andares para cada proprietário com título irregular para aquela área acrescentase mais um andar O Governo Federal está dando um passo decisivo na regulação do mercado de terras rurais e urbanas ao implementar com dificuldades a Lei 102672001 na qual os cartórios são obrigados quando houver qualquer mudança na propriedade a repassála ao INCRA numa planta com os seus limites em forma cartográfica latitude e longitude 16 Apesar disso há a tentativa fracassada de regulação da propriedade através do Registro Torrens 1891 na qual os posseiros e proprietários poderiam obter o título definitivo através de petição não contestada E por outro lado a possibilidade de legalização das posses em 1895 e em 1922 referentes às posses entre 1895 e 1921 acaba por criar as condições para que as posses perdurem e se enfraqueça a regulação do mercado de terras como expresso na Lei de Terras de 1850 151 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 em cartórios Nessa regra todos precisam demarcar e registrar seus imóveis quer rurais quer urbanos mas sem qualquer fiscalização e sem que haja um cadastro O Estado também precisaria demarcar e registrar as suas terras devolutas o que é impraticável pois estas são definidas por exclusão Ele próprio age portanto ilegalmente Essa obrigatoriedade acaba por potencializar as possibilidades de fraudes nos registros nos cartórios públicos A promulgação do Código Civil de 1916 gerou a incapacidade de se regular os mercados de terras no Brasil tanto por reafirmar o cartório como a institui ção de registro como por possibilitar que as terras públicas fossem objeto de usucapião Nas palavras de Osório Silva 1996324 com isso completavase o quadro para a transformação do Estado num proprietário como os outros E assim ficava sustentada a doutrina da prescritibilidade das terras devolutas Ou em outras palavras a possibilidade do usucapião das terras devolutas Portanto o Código Civil por motivos não necessariamente atrelados aos interesses dos proprietários de terras acabou por estabelecer os grandes marcos da institucionalidade do acesso à terra no Brasil ao definir que o registro em cartórios de imóveis era necessário às vezes também suficiente para comprovar sua titularidade A grande inovação institucional na esfera da política e administração fun diária brasileira é o Estatuto da Terra de 1964 cujas regras e conceitos conti nuam válidos até o presente Portanto para orientar a implantação da política agrária e agrícola o Estatuto de 1964 criou o Cadastro de Imóveis Rurais17 Todos os imóveis privados ou públicos deveriam ser registrados inclusive as posses Os proprietários deveriam providenciar informação sobre a situação da documentação e uso da terra usada para estimar a produtividade a fim de facilitar a reforma agrária O INCRA criado em 1970 tornouse responsável pela gerência do Sistema Nacional de Cadastro Rural SNCR o qual man tinha o Cadastro de Imóveis Rurais Uma vez que o imóvel era registrado o INCRA emitia o Certificado de Cadastro de Imóvel Rural CCIR exigido para qualquer tipo de transação de terra Posseiros registrados pelo INCRA também receberam o CCIR e deveriam pagar o Imposto sobre o Imóvel Rural embora os valores desse imposto tenham sempre sido mantidos a níveis baixos O Estatuto da Terra mais uma vez manteve a legitimação de posse permitindo assim a titulação de terras públicas ocupadas informalmente O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 17 Como o cadastro de 1967 e os recadastramentos posteriores foram para fins fiscais ITR baseados em declarações dos proprietários de terras e não fiscalizados este é pouco confiável como mostrou o estudo de Sabato 2001 com base nas informações decorrentes do Decreto 55898 Outras tentativas recentes de integrar os cadastros dos diferentes órgãos públicos para melhorar a qualidade das informações têm fracassado pelas ausências de vontade política e de um órgão que assuma o papel de executor da governança fundiária no país 152 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Fonte Legislação em vigor e Reydon 2006 O esquema 1 procura sintetizar através de uma visão esquemática as inter relações entre os órgãos do sistema de administração fundiária do Brasil Percebese que não há vínculos entre o INCRA e os municípios fazendo com que haja muitos problemas fundiários na ligação entre terras rurais e urbanas Além disso não existe uma instituição que centralize o cadastro e faça uma ligação com os órgãos do Judiciário que são responsáveis pela titulação dos imóveis Não aparece no quadro mas grande parte dos problemas fundiários no Brasil tanto rurais quanto urbanos quando não resolvidos na esfera ad ministrativa acabam na justiça e esta por ter muitos processos em todos os seus tribunais acaba por levar anos para julgálos fazendo com que quase sempre os casos relativos à terra quer rural quer urbana sejam julgados como fatos consumados Portanto o grande problema do desmatamento da Amazônia se associa à ausência de governança fundiária no país que decorre do processo histórico de construção de quadro institucional e legal inadequados para esse fim Ape nas com a construção de uma instituição que tenha como meta a governança fundiária e o ajustamento do quadro legal brasileiro para esse fim haverá a diminuição do desmatamento e o adequado uso do solo no país O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon esquema1 Situação da administração fundiária no brasil Presidência da República com aprovação do Legislativo estabelecem Áreas de Conservação de Terras Indígenas Governos estaduais com aprovação do Legislativo estabelecem Áreas de Conservação Estaduais Cartório de rrgistro de imóveis registra e titula com base em contatos de compra e venda consultando apenas seus registros Judiciário homologa ou cria títulos em decisões de qualquer tipo de conflito Lei 10267 imóveis com alterações no cartório apresentam planta georeferenciada para cadastro Institutos Estaduais de Terras responsáveis pelas terras públicas estaduais AGU repasse das terras devolutas Municípios decisões sobre terras rurais e urbanas uso cobrança de iptu etc Incra concede matrícula inicial única faz cadastro concede título de concessão de uso aos assentados discriminação das terras devolutas e colonização Receita Federal cobrança de ITR Assentamentos de sem terras Colonização destinação de terras públicas e loteamentos rurais 153 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 6 a neceSSIdade de gOveRnança18 da teRRa cOMO cOndIçãO neceSSÁRIa paRa a RedUçãO dO deSMataMentO A agricultura brasileira apresenta um desempenho exemplar com cresci mento de produção de alimentos oferta de energia e divisas e maior inserção internacional entre outros Mas a segurança associada à propriedade da terra continua sendo um grande problema particularmente na Amazônia A sua solução requer uma adequada e participativa governança fundiária conforme entre outros FAO 2007 e Deininger et al 2010 Os benefícios a serem obtidos de um adequado sistema de gestão territorial dependem da clara identificação dos imóveis que são registrados e um meca nismo simples e efetivo para a obtenção e atualização de suas informações Esse processo necessita se iniciar sem que se fique dependente das infor mações dos títulos ou outras formas de documentos formais que podem ser utilizados sempre que houver conflitos sobre a propriedade Há que se iniciar com um processo de titulação que concilie informações das propriedades a partir das imagens de satélites19 com um levantamento das propriedades junto aos proprietários e posseiros legítimos posse mansa A efetiva participação dos proprietários e posseiros consiste segundo estudo de Gessa 2008 num efetivo conhecimento e assim empoderamento dos proprietários de terras principalmente os pequenos20 Apenas com a efetiva governança sobre a terra particularmente com a criação de um cadastro moderno e auto alimentado será possível a Garantir os direitos das propriedades privadas para os diferentes fins negócios arrendamento garantias em obtenção de crédito para a concessão de pagamentos por serviços ambientais entre outros b Identificar as terras públicas e garantir o seu adequado uso para criação de reservas assentamentos ou colonização c Estabelecer com mais segurança as demais políticas fundiárias reforma agrária crédito fundiário tributação sobre a terra d Regular os processos de compras de terras para limitar o acesso a es trangeiros a proprietários com muitas terras ou a outros proprietários O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 18 FAO 20089 trabalha com uma definição adequada de governança fundiária Governance is the system of values policies and institutions by which a society manages its economic political and social affairs through its interactions within and among the state civil society and private sector Land governance concerns the rules processes and organizations through which decisions are made about access to land and its use the manner in which the decisions are implemented and the way that competing interest in land are managed 19 As inovações tecnológicas de captação de informações através de satélite segundo Deininger et al 2010 permitem avanços que podem revolucionar o sistema de registro de imóveis existente 20 Baseado em estudo de Gessa 2008 que propõe o mapeamento participativo como um importante instrumento para assegurar direitos de propriedade e criar empoderamento das populações menos privilegiadas em regiões com direitos de propriedade inseguros 154 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 e Zonear o uso da terra estabelecer e regular colocando limites através de zoneamento a produção agrícola e pecuária em regiões específicas Es tabelecer áreas protegidas e de proibição do desmatamento f Regular os processos de conversão de terras agrícolas em urbanas e assim ter um cadastro para cobrança dos tributos sobre a propriedade IPTU e ITR A governança fundiária não resolve o problema do desmatamento da Ama zônia mas é condição necessária para enfrentar o problema Pelo lado das terras devolutas o cadastro ao permitir a identificação e o apossamento por parte do Estado dessas terras dificultará em muito seu apossamento privado inapropriado e o desmatamento Também possibilitará a utilização dessas terras devolutas na execução da política fundiária brasileira através de colonizações organizadas reforma agrária e outros Nas terras privadas a efetiva governança participativa permitirá a partir do conhecimento da realidade da discussão de prioridades para seu uso e de uma fiscalização adequada o planejamento e a regulação do uso do solo através de zoneamentos e outros instrumentos coercitivos A governança efe tiva também impedirá o desmatamento e certamente limitará a especulação com as terras que é a principal causa do desmatamento REFERêNCIAS BIBLIOGRAFICAS AGRAFNP 2010 Relatório de análise do mercado de terras São Paulo Araujo C et al 2008 Property rights and deforestation in the Brazilian Amazon CERDI Etude et Documents E200820 Disponível em httpacademicresearch microsoftcomPublication14157363propertyrightsanddeforestationinthebrazil ianamazon Acesso em 180511 Barreto P 2008 Quem é dono da Amazônia Belém IMAZON Disponível em http wwwibcperuorgdocisis10458pdf Acesso em 180511 Deininger K 2003 Land policies for growth and poverty reduction Washington World Bank e Oxford University Press Deininger K et al 2010 The land governance framework methodology and early lessons from country pilots In Innovations in land rights recognition administration and governance Washington World Bank GLTN FIG e FAO FAO 2007 Buena gobernanza en la tenencia y la administración de tierras Estudios sobre Tenencia de La Tierra no 9 Roma FAO FAO 2008 Towards good land governance FAO Land Tenure Policy Series Draft version 01 RomeNairobi FAO 2010 Global forest resources assessment report Roma FAO Gessa S D 2008 Participatory mapping as a tool for empowerment Roma Inter national land coalition Lima 2002 Relatório das correições extraordinárias nos registros de terras rurais no estado do Amazonas Governo do Estado do Amazonas Secretaria da Cultura do Estado do Amazonas 440 p Margulis S 2000 Quem são os agentes dos desmatamentos na Amazônia e por que eles desmatam Paper conceitual Brasília Banco Mundial Disponível em http wwwamazoniaorgbrarquivos13213pdf O desmatamento da floresta amazônica causas e soluções Bastiaan Reydon 155 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Margulis S 2003 Causas do desmatamento da Amazônia brasileira Brasília Banco Mundial100 p PRODES 2011 Taxas de desmatamento da Amazônia Legal Projeto PRODES Ministério da Ciência e Tecnologia IBAMA Ministério do Meio Ambiente INPE Disponível em httpwwwobtinpebrprodesprodes19882010htm Acesso em 180511 Reydon B P 2007 A regulação institucional da propriedade da terra no Brasil uma necessidade urgente In Ramos P org Dimensões do agronegócio brasileiro políticas instituições e perspectivas Brasília MDA Reydon B P e Cornelio F N M 2006 Mercados de terras no Brasil estrutura e dinâmica Nead Debate n7 Brasília MDANEAD 444 p Reydon B P e Plata L O 2000 Intervenção estatal no mercado de terras a ex periência recente no Brasil Estudos NEAD n3 Campinas NEAD 172p Reydon B P e Romeiro A R 2000 Desenvolvimento da agricultura familiar e re abilitação das terras alteradas na Amazônia In Reforma Agrária e Desenvolvimento Sustentável BrasíliaDF v 1 p 311317 Sabbato A 2001 Perfil dos proprietáriosdetentores de grandes imóveis rurais que não atenderam à notificação da Portaria 55899 Disponível em 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transição para uma economia com baixo carbono constituise em imperativo que exigirá uma mudança de paradigma com ampla repercussão na cultura na economia e no direito re dimensionando o ideário da sustentabilidade e da justiça ambiental Nessa transição considerando as consequências da globalização e o caráter transfronteiriço da poluição existem tarefas que exigirão um enfrentamento pela comunidade internacional sem prejuízo das ações locais destacandose nesse aspecto as medidas para conter a emissão de gases do efeito estufa e a adaptação aos efeitos do aquecimento global Contudo mesmo nessas ações que envolvem a cooperação internacional resta aos países um amplo rol de tarefas visando propiciar internamente a transição para uma economia verde O Brasil ostenta internacionalmente uma posição privilegiada nesse contexto com uma matriz energética relativamente limpa além de uma megadiversidade e outros atributos naturais que asseguram ao país uma posição de relevo na conservação da biodiversidade Contudo a riqueza natural não é suficiente para assegurar um desenvol vimento em bases sustentáveis ou tampouco propiciar o esverdeamento da economia No caso brasileiro a expansão da fronteira agrícola e a falta de políticas públicas consistentes para orientar a exploração econômica dos re cursos naturais contribuíram para forjar um modelo de exploração predatória que tem causado ao país grandes prejuízos econômicos e ambientais Como resposta a esse quadro inúmeras leis foram editadas com significativos avanços em termos de proteção ambiental embora persistam grandes desafios para a transição rumo a uma economia que possa ser definida como verde 1 Professor de direito ambiental da Universidade Federal de Mato Grosso UFMT PhD procurador do Estado de Mato Grosso presidente do instituto O Direito por um Planeta Verde 157 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Certamente que o direito pode dar uma contribuição relevante nesse pro cesso conforme será analisado neste ensaio Um primeiro desafio consiste em delimitar os instrumentos e mecanismos que podem contribuir para a concretização de um desenvolvimento em bases sustentáveis o que implica a revisão dos subsídios implícitos às atividades poluentes conforme abordado no primeiro capítulo No segundo capítulo deste ensaio são também apontados os principais desafios desse processo concluindo com a contribuição do direito brasileiro à transição para uma economia verde O contexto é amplamente favorável às mudanças necessárias tanto em termos de conscientização da sociedade como dos imperativos ditados pela crise ecológica da atualidade Restanos enfrentar esses desafios e construir um novo paradigma no qual o direito ao meio ambiente ecologicamente equili brado não seja mera proclamação mas uma realidade pautada na solidariedade intra e intergeracional 1 ecOnOMIa veRde e a SUStentabIlIdade pOSSível Desde a conceituação de desenvolvimento sustentável2 dada pela Comis são Brundtland desenvolveuse vasta produção intelectual visando objetivar o conceito e estabelecer parâmetros para quantificálo O maior obstáculo nessa tarefa reside na falta de indicadores para medir o desenvolvimento sustentável já que em princípio nenhum dos três objetivos do desenvolvimento susten tável econômico ambiental e social se mede atualmente com parâmetros compatíveis Dourojeanni 2000 Não é sem propósito que Morin e Kern 1995 assinalam que a própria noção de desenvolvimento mostrase gravemente subdesenvolvida Assim ocorre com a sustentabilidade ou ela se traduz em decisões econômicas e ações políticas fixando limites reais à utilização dos recursos naturais e emissão de poluentes ou do contrário o desenvolvimento sustentável não terá sido senão um mito irrealizado que transmitiremos às gerações futuras juntamente com um gigantesco passivo ambiental legado de uma civilização predatória Por isso mesmo é de suma importância o aprofundamento dos debates acerca do modelo econômico que escolhemos e das ações locais e globais que podem contribuir para assegurar o crescimento dos setores limpos com sustentabilidade Nesse sentido pondera Dourojeanni 2000 que cabe aos atores e partici pantes do processo de gestão precisar para cada país ou região o significado A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 2 Segundo Brundtland et al 1988 o desenvolvimento sustentável é aquele que satisfaça as necessidades da geração presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações para satisfazer suas próprias necessidades 158 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 da sustentabilidade admitindo tratarse de termo ambíguo que se aplica à produção à ecologia à economia ao meio ambiente à sociedade e ao de senvolvimento Na medida em que perpassa áreas distintas e distanciadas o conceito de sustentabilidade exerce uma função integradora e revolucionária implicando a ruptura de padrões crenças e técnicas secularmente consolidadas e inserindose num contexto de mudança de padrões nas relações do homem com o mundo natural Nessa acepção a sustentabilidade pode exercer uma ação transformadora tanto na esfera econômica incentivando investimento em capital limpo como na esfera políticoadministrativa através da descentralização e democratização dos centros decisórios De todo modo em que pese a imprecisão do conceito de desenvolvimento sustentável este pode ser considerado viável e possível na medida em que fixa diretrizes capazes de informar as políticas públicas nesse momento de transição de uma sociedade industrial para uma sociedade de risco3 ofere cendo critérios orientadores da intervenção pública no domínio do ambiente e sobretudo na economia ao fomentar o aumento do capital natural Para tanto é imprescindível que se opere na área econômica e jurídica uma profunda revisão dos incentivos implicitamente concedidos às atividades poluentes4 já que frequentemente os efeitos externos dessas atividades eco nômicas não são considerados no sistema de preço gerando o que na ciência econômica são identificadas como externalidades Essas externalidades somente serão reduzidas se os custos ambientais forem assumidos pelos agentes produtores e consumidores através da intervenção estatal por meio de instrumentos econômicos ou de comandoe controle o que implica a superação de uma tradição dos estudos econômicos que enxergam o meio ambiente como inesgotável Além disso não se podem ignorar as pesquisas que alertam quanto ao volume dos recursos naturais consumido atualmente considerado acima da capacidade de reposição do planeta5 ou seja a humanidade está consumindo recursos de forma insustentável Esse aspecto não está sendo adequadamente A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 3 Na acepção de Ulrich Beck 1992 a configuração da sociedade contemporânea como uma sociedade de risco tem como pressuposto a constatação de um quadro de riscos catastróficos marcados pela invisibilidade ameaça nuclear aquecimento global etc e pela incapacidade do Estado em dar respostas eficazes para tais problemas e garantir a segurança dos cidadãos irresponsabilidade organizada estado de segurança e explosividade social 4 O World Watch Institute estima que o equivalente a 3 da economia mundial ou o equivalente ao PIB da Itália é gasto em subsídios a atividades que destroem o meio ambiente Januzzi G De M A política energética e o meio ambiente apud Romeiro et al 1999 p156 Esse índice referese aos subsídios explícitos o custo socioambiental das atividades poluentes que são suportados pela população e não pelos poluidores é incalculável 5 Uma investigação conduzida por uma equipe internacional de cientistas sob a coordenação de Mathis Wackernagel intitulada Levantando o consumo ambiental excessivo da economia humana alerta para a incapacidade do planeta em absorver o carbono lançado na atmosfera Segundo Wackernagel a expansão econômica estimula a demanda de recursos e supera a capacidade do planeta em restaurar bens e serviços Já não estamos vivendo dos juros da natureza mas do capital da natureza Economias sustentáveis não são possíveis se vivermos acima dos meios que a natureza proporciona Polakovic 2002 159 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 considerado na formulação das políticas públicas nenhuma consideração de ordem econômica tem sido dada ao exaurimento desses recursos tratados como se fossem inexauríveis Via de consequência as políticas econômicas são geralmente concebidas e implementadas tendo em vista um horizonte temporal extremamente limitado políticas de curto prazo e nesse contexto se não se verifica um crescimento dos setores limpos a sustentabilidade resta comprometida Por isso mesmo a transição para uma economia verde exige mudanças substanciais em termos de políticas públicas visando reorientar os mecanismos de mercado de forma a compatibilizar crescimento econômico com sustenta bilidade Nesse sentido sob a perspectiva jurídica as medidas necessárias envolvem estruturação de um sistema que possa efetivamente orientar as políticas públicas combinando o emprego de instrumentos econômicos e mecanismos de comandoecontrole que necessariamente devem estar informados por alguns princípios éticos entre os quais destacamos a justiça ambiental e a equidade intra e intergeracional No capítulo seguinte serão enfocados os desafios a essa transição conside rando o contexto nacional e os megaproblemas que repercutem negativamente no ambiente em nosso país 2 deSafIOS à tRanSIçãO paRa UMa ecOnOMIa veRde nO bRaSIl Conforme assinalado na transição para uma economia verde existem desafios que são de ordem global e de ordem nacional como decorrência da espacialidade singular característica do direito ambiental Martin Mateo 1977 onde os problemas ambientais desconhecem fronteiras bem como do proces so de globalização que mantém as economias interdependentes Além disso existem situações em que problemas globais repercutem na esfera nacional agravando as deficiências internas e atuando de forma sinergética para ampliar as condições de risco e acentuar o caráter multifatorial da poluição Nesta abordagem serão assinalados três fatores que se relacionam direta mente com o modelo de desenvolvimento implementado em nosso país e se constituem em desafios na transição para uma economia verde a pobreza o desmatamento e a expansão da agropecuária conduzida de forma insus tentável 21 enfrentando a pobreza Em pleno século 21 a pobreza segue sendo um dos mais relevantes pro blemas socioambientais que afeta a humanidade e continua sendo endêmica nos países em desenvolvimento com cerca de 12 bilhões de pessoas vivendo A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 160 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 com menos de US 1 por dia em 1999 de acordo com a Nota de Informação da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento6 O Brasil encontrase em posição privilegiada entre os países em desenvol vimento mas os índices de pobreza subsistem elevados e há uma significativa desigualdade de renda que precisa ser superada como forma de reduzir a pressão sobre os recursos naturais a falta de saneamento e assegurar uma melhoria na qualidade de vida De acordo com pesquisa conduzida pelo IPEA7 o quadro nacional apresenta expressiva melhora na redução das desigualdades sociais mas o problema ainda é grave O estudo aponta que de 1995 até 2008 13 milhões de pessoas saíram da miséria no país o que possibilitou reduzir à metade o número de pessoas nessas condições considerando nesse caso o número de famílias com rendimento por pessoa de até 14 do salário mínimo mensal Contudo o país ainda contabiliza cerca de 75 milhões de brasileiros com renda domiciliar per capita inferior a US 1 PPC por dia Esse percentual é muito maior quando se considera a proporção de brasilei ros em pobreza absoluta que segundo o IPEA é de 288 Nesse percentual se inserem os membros de famílias com rendimento médio por pessoa de até meio salário mínimo mensal cerca de US 5 por dia Cabe salientar que o relatório da ONU Nosso futuro comum já assinalara que a poluição não decorre apenas do desenvolvimento mas resulta também da pobreza que impõe a favelização a falta de saneamento a ocupação de áreas de risco e a falta de educação entre outras consequências Os desafios a serem enfrentados para a redução da pobreza no país de acordo com a pesquisa conduzida pelo IPEA8 resultam sobretudo da falta de acesso aos alimentos decorrente do baixo poder aquisitivo de milhões de brasileiros problema que é agravado por uma série de outros fatores como condições inadequadas de saneamento básico baixos níveis de educação e serviços de saúde deficientes Na área do saneamento os indicadores do Brasil urbano 805 de mora dores urbanos atendidos por saneamento adequado são inferiores aos das áreas urbanas de países como a Jamaica 82 segundo dados das Nações Unidas9 Apesar dos avanços na última década o relatório acrescenta que a falta de uma solução adequada para o esgoto doméstico ainda atinge cerca de 31 milhões de moradores nas cidades Já no Brasil rural não só a situação é pior como a melhoria tem sido mais lenta Em 2008 769 da população não tinha acesso adequado a esgoto A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 6 UNCTAD 2004 7 Presidência da República 2007 8 Idem 9 UNCTAD 2004 161 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 isso significa que a proporção de 231 dos moradores rurais atendidos por saneamento adequado é inferior à da zona rural do Afeganistão 25 também de acordo com dados da ONU Outro aspecto igualmente relevante no que se refere à pobreza e falta de saneamento é o fato de que menos de 50 do esgoto sanitário produzido no Brasil é coletado e apenas 13 desse total é efetivamente tratado Como con sequência segundo o Ministério da Saúde 65 das internações hospitalares decorrem da inadequação desses serviços contabilizandose anualmente cerca de 50 mil mortes de crianças no Brasil Irigaray e Rios 2005 Como consequência a falta de soluções adequadas para a coleta e o baixo índice de tratamento dos esgotos domésticos são os principais responsáveis pela poluição dos recursos hídricos no Brasil problema que se faz sentir de forma mais aguda em municípios densamente povoados de regiões metropo litanas e cidades de grande e médio porte afirma o relatório do IPEA Ora não é dificil estabelecer a relação entre a pobreza e o desenvolvimento insustentável É notório que a proporção da população sem acesso a água potável e esgotamento sanitário ou em moradias precárias tem relação direta com a qualidade de vida e a saúde da população e portanto com a susten tabilidade ambiental Nesse sentido o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos destaca no documento The state of the worlds cities 2006200710 que há uma correlação positiva entre as condições de moradia e indicadores de desenvolvimento humano O referido relatório observa que a existência de uma ou mais inadequações habitacionais ameaça a saúde a educação e as oportunidades de emprego dos moradores de assentamentos precários eles passam mais fome têm poucas chances de conseguir um emprego bem remu nerado no setor formal têm menor nível educacional são mais vulneráveis a doenças e morrem mais cedo do que o resto da população urbana Conforme enfatiza o documento o lugar de moradia importa Por isso mesmo superar esse quadro de injustiça socioambiental constitui se em prioridade para a transição rumo a uma economia verde em que o crescimento econômico se dê em bases sustentáveis 22 o avanço do desmatamento De acordo com o relatório do IPCC a diminuição da cobertura florestal em consequência dos desmatamentos e conversões para usos alternativos do solo bem como a degradação associada ao corte seletivo de espécies quei madas e outras práticas que ocasionam a perda de estoques remanescentes A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 10 UNCHS 2006 162 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 de carbono são responsáveis por cerca de 18 do total estimado dos gases do efeito estufa em todo o mundo11 Desse modo conter o desmatamento e as queimadas passa a ser uma necessidade global de mudança para uma economia de baixo carbono Especialmente em nosso país esse desafio também é prioritário sobretudo em função das elevadas taxas de desmatamento especialmente na região amazônica onde mais de 70 do desmatamento resulta de formação de pastagens Ao analisar o risco de expansão dos biocombustíveis na Amazônia assi nalamos Da área de floresta existente no território brasileiro 20 já foram des matados o que corresponde a 67 milhões de hectares Apesar das ações governamentais direcionadas para reverter o avanço da fronteira agrícola sobre a floresta as taxas de desmatamento mantêmse elevadas Segundo o INPE no período de 20072008 a área desmatada equivaleu a 11968 km² e embora se constate uma gradativa redução desse percentual ele pode estar associado à conjuntura do mercado e não há nenhuma segurança de que o desmatamento será contido com o aquecimento da economia mesmo porque a ausência do aparelho de Estado na Amazônia é um dos fatores que agrava o quadro atual caracterizado pela grilagem de terras desmatamento ilegal violência e trabalho escravo Irigaray 2010 Esse quadro de degradação da floresta amazônica segue impulsionado principalmente pela pecuária extensiva e pela atividade madeireira Estudos realizados pelo Imazon revelam que a variação dos índices de desmatamento na Amazônia Legal oscila de acordo com as cotações do boi e da soja ou seja quanto maior o valor dos produtos maiores são as taxas de desmatamento Ainda de acordo com esse estudo cerca de 34 do desmatamento ocorrido nos últimos anos cedeu lugar a pastos que ocupam cerca de 75 a 81 do total desmatado entre 1990 e 2005 Barreto et al 2008 A falta de uma política agrícola que dialogue com a gestão ambiental evi dencia a fragilidade das políticas públicas para a região e mantém latente o risco de que as taxas de desmatamento voltem a subir conforme também observa Paulo Moutinho 2009 Alguns estudos recentes demonstram que o desmatamento amazônico apesar da recente redução nas suas taxas poderá aumentar nas décadas que estão por vir Soares et al 2006 Estimase que mais da metade da Amazônia brasileira estará desmatada ou degradada em decorrência da exploração de madeira e do fogo caso o padrão de ocupação siga a traje tória das últimas duas décadas A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 11 IPCC 2007 163 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Cabe observar que o avanço do desmatamento na Amazônia implica au mento significativo nos índices de emissão de carbono pelo Brasil agravado pelo fato de que via de regra o desmatamento ocorre ilegalmente e frequen temente é seguido de queimada Por isso mesmo a contenção do desmatamento passa a ser uma priorida de o que coloca nosso país em uma posição de evidência conforme salienta André Lima 2009 A Constituição Federal Brasileira de 1988 fez em 2008 20 anos de vigência Nesse período de 1988 a 2008 despachamos para o espaço 348 mil km2 de floresta tropical apenas na Amazônia Em apenas duas décadas em menos de uma geração Isso corresponde utilizandose dados conservadores do Governo Federal a algo em torno de 123 bilhões de toneladas de gás carbô nico na atmosfera Tudo o que o Brasil emitiu de carbono florestal amazônico em 21 anos de vigência da nossa constituição cidadã corresponde a quase duas vezes todo o esforço de redução de emissões acordado pelos países do Anexo I do Protocolo de Quioto para o primeiro período de compromisso 20082012 Cabe salientar que apesar do esforço do Governo Federal para conter o desmatamento na Amazônia e da expressiva queda verificada nos últimos anos em 2010 foram desmatados 7 mil km2 de floresta No Cerrado a savana brasileira esse controle mostrase ainda mais débil e os índices de conversão têm aumentado significativamente nas últimas décadas fazendo com que seja hoje em dia o bioma brasileiro mais ameaçado de destruição Estimase que o Cerrado já perdeu aproximadamente 49 de sua vegetação nativa e cerca de 142 mil km2 são desmatados por ano em especial para a formação de pastagens segundo dados do IBAMA Acresçase que o desmatamento é apenas a ponta de um iceberg que precisa ser enfrentado na transição para uma economia verde já que asso ciado a esse problema persistem práticas culturais como as queimadas que degradam o solo ou o uso abusivo de pesticidas que contaminam o solo e os corpos hídricos além de outros impactos ambientais associados à expansão da agropecuária o que será analisado no item seguinte 23 a expansão da agropecuária O Brasil tem se destacado internacionalmente como o celeiro do mundo ocupando posição proeminente na produção de grãos carne frango e outros produtos agrícolas Tanto a agricultura quanto a pecuária são responsáveis pelo superávit primário obtido pelo país em sua balança comercial Embora se reconheça a vocação agropecuária do país e a possibilidade da expansão do agronegócio em bases sustentáveis ainda existe no Brasil A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 164 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 uma larga distância entre as práticas do setor e o objetivo de uma agricultura e pecuária que possam ser consideradas verdes Superar essa distância entre o real e o ideal implica reconhecer que nesse superávit festejado pelo governo não estão sendo contabilizados os subsídios que essas atividades recebem implícita e explicitamente e nem os déficits no cumprimento da legislação ambiental que causam impactos significativos sobre o meio ambiente A pecuária é conforme assinalado responsável por mais de 70 do desma tamento ocorrido na Amazônia De acordo com o governo brasileiro IBGE de 1990 até 2008 o rebanho da região passou de 211 milhões para 714 milhões de cabeças Esse crescimento é impulsionado por diversos fatores baixo preço ou uso gratuito da terra geralmente terra pública ocupada ilegalmente crédito subsidiado e mão de obra barata ou em condições análogas à escravidão As áreas desmatadas na Amazônia abrigam geralmente extensas fazendas de gado nas quais se pratica uma pecuária extensiva de baixa produtividade que avança sobre áreas protegidas Reserva Legal e APPs causando uma severa degradação sobretudo quando analisada sob a óptica biológica pois conforme pesquisa elaborada pelo Imazon em parceria com o Banco Mundial a Amazônia possui algumas peculiaridades tais como solos pobres chuvas em excesso em cerca de 80 da região atributos suficientes para tornar do ponto de vista puramente econômico qualquer empreendimento agropecuário tradicional inviável12 No que se refere à agricultura os problemas não são menores A expansão do agronegócio tem ocorrido via de regra com desrespeito à legislação florestal através da implantação de monoculturas intensivas altamente dependentes de agrotóxicos e fertilizantes Cabe observar que a opção pela monocultura temse constituído como uma estratégia do agronegócio para reduzir custos e aumentar a produção o que hoje responde por um terço do PIB e 42 das exportações no Brasil Todavia como assinalam as jornalistas Safatle e Pardini A pujança do agribusiness é só uma parte da história Falta contabilizar os prejuízos socioambientais13 Segundo Guilherme Delgado economista do IPEA citado na matéria o agro negócio brasileiro mistura a modernidade técnica com o atraso das relações sociais Alertam que ainda existem no país 36 milhões de famílias rurais em situação de extrema pobreza vivendo com menos de um dólar per capita ao dia Esse contingente está sendo alijado uma vez que a agricultura de grande escala gera pouco emprego e causa um êxodo rural que os centros urbanos não são capazes de absorver com dignidade Ou seja além do passivo ambiental A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 12 Relatório Manejo florestal sustentável mudanças econômicas no uso do solo e implicações para políticas públicas na Amazônia Folha de S Paulo 22 de outubro de 2000 13 Safatle e Pardini 2004 165 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 já que a monocultura via de regra não respeita a Reserva Legal existem outras repercussões de ordem social que devem ser consideradas Segundo FeltranBarbieri e Kassai 2008 o passivo ambiental tangível gerado pela inexistência das Reservas Legais pode ser superior a R 112 milhões nas regiões amostradas podendo atingir os R 16 bilhões se extra polados para todo o domínio do Cerrado quase 05 do PIB brasileiro de 2006 Esse passivo não contabiliza as perdas intangíveis de biodiversidade e demais serviços ambientais mas apenas as externalidades sofridas pela população geradas no agribusiness Acresçase que além do gigantesco passivo ambiental gerado pela ativi dade tratase de negócio muito exposto à competição internacional e com o flanco aberto para a criação de barreiras nãotarifárias em decorrência do descumprimento da legislação ambiental e do emprego de trabalho escravo 3 a cOntRIbUIçãO dO dIReItO bRaSIleIRO paRa UMa ecOnOMIa veRde peRSpectIvaS Dentre os países megadiversos o Brasil ocupa posição de destaque com mais de 132 do número total de espécies do planeta excepcional disponi bilidade hídrica e a maior reserva florestal do planeta dentre outros atributos naturais Não se podem ignorar as ameaças que pairam sobre essa diversidade de biomas e ecossistemas em decorrência sobretudo da expansão da fronteira agrícola feita em confronto com a legislação ambiental existente o que causa prejuízos econômicos pela perda de recursos naturais explorados de forma predatória e prejuízos ecológicos com a erosão da biodiversidade Contudo desde a Constituição Federal de 1988 desenvolveuse amplo marco regulatório capaz de compatibilizar o crescimento econômico com a sustentabilidade sendo certo que o Brasil detém as condições para exercer um forte protagonismo nessa transição rumo a uma economia verde carac terizada sobretudo pela baixa emissão de carbono Na Constituição Federal estão assegurados alguns princípios que devem orientar não apenas a atuação do poder público como também do setor empresarial e da sociedade civil destacandose o reconhecimento do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado associado ao dever do poder público e da coletividade de defender e preservar esse direito Esse dever se complementa com o reconhecimento da defesa do meio ambiente como princípio que deve informar a ordem econômica e com a definição de um rol de tarefas constitucionalmente atribuídas ao poder público para assegurar a efetividade do direito reconhecido no art 225 de nossa Carta Magna A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 166 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Dentre as principais normas que fornecem as bases para o desenvolvimento sustentável em nosso país figuram o Código Florestal Lei nº 477165 a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente Lei 693881 a Lei da Ação Civil Pública Lei nº 734785 a Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos Lei nº 943397 a Lei que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação Lei nº 998500 a Lei de Política Nacional de Resíduos Sólidos 1230510 e a Lei de Política Nacional de Mudanças Climáticas Lei 1218709 Especialmente nesta última estão definidos alguns princípios objetivos e diretrizes para a transição rumo a uma economia verde na qual o desenvolvi mento possa se concretizar em bases sustentáveis com justiça socioambiental Nesse sentido assinala a referida lei os objetivos da Política Nacional de Mudanças Climáticas deverão estar em consonância com o desenvolvimento sustentável a fim de buscar o crescimento econômico a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais parágrafo único do art 4o Nessa tarefa o grande desafio continua sendo o de aumentar o nível de implementação dessas normas sobretudo do Código Florestal que se mostra hábil a conter o avanço da fronteira agrícola sobre ecossistemas frágeis mas que enfrenta grande resistência no meio ruralista Nesse sentido é preocupante o esforço da bancada ruralista no Congresso Nacional para adaptar o Código Florestal aos anseios de expansão do agronegócio nos remanescentes de floresta e Cerrado ainda existentes eliminando a proteção jurídica dos ativos florestais existentes na contramão do esforço governamental para reduzir as emissões provocadas pelos desmatamentos Igualmente preocupante é a posição dúbia do governo brasileiro que de um lado apresenta ambicioso plano para reduzir as emissões de carbono e de outro lado não parece determinado a exercer uma política ambiental eficaz mantendo um orçamento pífio para os órgãos ambientais enquanto aposta em obras altamente impactantes como as da usina de Belo Monte ou o asfaltamento das BRs 163 CuiabáSantarém e 319 ManausPorto Velho dentre outras Essa contradição se exterioriza na desestruturação dos órgãos ambientais e na falta de vontade política para implementar uma gestão eficiente do meio ambiente fazendo com que a impunidade nos casos de infrações ambientais continue sendo a regra as multas aplicadas pelos órgãos ambientais não são pagas e poucos poluidores são responsabilizados civil e criminalmente pelos danos que causam caraterístico da irresponsabilidade organizada descrita por Ulrich Beck Além da superação desses fatores limitantes novos mecanismos devem se agregar ao esforço de contenção do desmatamento e valorização da produção sustentável Por isso mesmo o emprego de instrumentos como o REDD o pagamento por serviços ambientais e a cobrança pelo uso da água constituem A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 167 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 experiências que apontam para a necessidade de estruturação jurídica de um sistema de gestão ambiental que combine o emprego de instrumentos econô micos com a previsão de sanções e procedimentos eficazes para a reparação e compensação de danos causados ao meio ambiente Cabe registrar que embora as ações implementadas para conter as mudan ças climáticas terem se concentrado na redução das emissões associadas à queima de combustíveis fósseis o desmatamento e a degradação das florestas estão atualmente no centro do debate porque constituem causas significati vas do aquecimento global na medida em que respondem em conjunto por 174 das emissões globais de gases do efeito estufa mais de um terço de emissões dos países em desenvolvimento e também porque a redução dessas emissões pode ser obtida a um custo menor que as demais fontes de emissões Irigaray 2010 Desse modo nosso país detém um patrimônio natural inigualável e uma base jurídica capaz de propiciar a transição para uma economia verde Porém esses valores devem se concretizar em termos de consciência social amparados por uma atuação política que possa configurar um Estado de Direito Ambiental 5 cOnSIdeRaçõeS fInaIS A transição para uma economia verde pressupõe justiça ambiental e me lhoria das condições de vida da população Desse modo é prioritário que as políticas públicas enfrentem a pobreza e promovam um crescimento inclusivo e propiciem a todos e todas uma participação mais ativa no processo de cres cimento econômico e do compartilhamento dos seus benefícios mediante a redução da desigualdade e a inclusão social o que não é uma tarefa difícil no Brasil onde a fome e a desnutrição não se devem à escassez de produção de alimentos já que a agricultura nacional produz mais do que o suficiente para suprir as necessidades da população brasileira Da mesma forma estão postas as condições para a adequação das ativi dades econômicas aos novos padrões de sustentabilidade delineados pela legislação brasileira considerando a vocação agropecuária e o notável de senvolvimento agroindustrial do país nos últimos anos Contudo o avanço legislativo ainda repercute timidamente no campo Há um déficit significativo na implementação dessas leis que possuem caráter meramente simbólico já que seguem desrespeitadas sem maiores conse quências além de enfrentarem a resistência de setores que apostam no aumento da produtividade de forma insustentável ou seja sem considerar o custo ambiental Esse embate entre a manutenção de uma legislação rigorosa e sua flexi bilização tem como pano de fundo o grande debate global acerca das conse A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 168 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 quências das mudanças climáticas e das medidas de mitigação e adaptação necessárias Nesse contexto o Brasil que assumiu compromissos internacionais de redução em suas emissões sobretudo aquelas decorrentes dos desmatamen tos ilegais e queimadas corre risco de assistir a uma escalada no avanço do desmatamento se ceder às pressões para flexibilizar sua lei florestal Reverter esse quadro pressupõe portanto não apenas medidas de coman doecontrole e ajustes do gerenciamento ambiental no setor florestal mas também medidas econômicas que possibilitem o realinhamento de incentivos econômicos em favor da conservação dos ativos florestais e a estruturação de uma economia de base florestal com o fomento de meios de subsistência alternativos atraentes para a população que depende desses recursos Iriga ray 2010 Dentre os instrumentos econômicos o pagamento pelos serviços ecológicos prestados pela floresta desempenha um papel relevante na construção de al ternativas para conter o desmatamento e a degradação desses ecossistemas Nesse sentido a implementação de uma política de REDD no Brasil revelase uma alternativa consistente dada a magnitude das emissões do desmatamento e o baixo custo de redução dessas emissões desempenhando um papel muito importante na estratégia global de redução de emissões de gases do efeito estufa Myers 2009 Infelizmente a exigência da utilização sustentável dos recursos naturais em nosso país embora constitucionalmente assegurada ainda não logrou encontrar na política ambiental mecanismos consistentes que permitam sua real implementação Isso ocorre porque a exigência de um gerenciamento que considere a capacidade de suporte dos ecossistemas e não comprometa a disponibilidade dos mesmos para as gerações futuras tratase de meta que somente se concretiza se articulada com outras políticas públicas especial mente econômicas orientadas para a mesma finalidade Além disso nenhum país consegue produzir e melhorar sua qualidade am biental sem que o poder público consiga coibir práticas insustentáveis e incen tivar as boas condutas ambientais e o uso sustentável dos recursos naturais Para isso nosso país precisa superar esse quadro de vulnerabilidade institu cional e fortalecer a implementação do marco regulatório existente integrando principalmente as políticas agropecuárias com a proteção do meio ambiente como condição para assegurar a transição para uma economia verde A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 169 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Barreto P et al 2008 A pecuária e o desmatamento na Amazônia na era das mudanças climáticas Belém Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia Beck Ulrich 1998 La sociedade del riesgo Hacia una nueva modernidad Barcelona Ediciones Piados Ibérica Brundtland G H et al 1988 Nosso futuro comum Relatório de 1987 da Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento Rio de Janeiro Fundação Getúlio Vargas Dourojeanni A 2000 Procedimientos de gestión para el desarrollo sustentable Série Manual Vol 10 CEPALECLAC Santiago Nações Unidas FeltranBarbiberi R e Kassai J R 2008 Passivo ambiental das reservas legais inexistentes no cerrado Trabalho apresentado no Ix Simpósio Nacional Cerrado Desafios e estratégias para o equilíbrio entre sociedade agronegócio e recursos naturais Brasília EMBRAPA IPCC 2007 Quarto relatório de avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática Irigaray C T J H 2004 O emprego de instrumentos econômicos na gestão ambiental In Figueiredo G P Direito Ambiental em Debate Vol 2 Rio de Janeiro Esplanada Irigaray C T J H 2010a A expansão dos biocombustíveis na Amazônia riscos e desafios In Heline Sivini Ferreira e José Rubens Morato Leite org Biocombustíveis fonte de energia sustentável considerações jurídicas técnicas e éticas São Paulo Saraiva Irigaray C T J H 2010b Pagamento por serviços ecológicos e o emprego do REDD na Amazônia In Paula Lavratti V P et al org Direito e Mudanças Climáticas 3 Serviços Ecológicos São Paulo Instituto O Direito por um Planeta Verde Irigaray C T J H e Rios Aurélio V org 2005 O Direito e o desenvolvimento sustentável Brasília IEB Irigaray C T J H Vieira G F e Silva L R 2009 Regularização fundiária na Amazônia a lei e os limites Revista de Estudos SocioJurídicoAmbientais Amazônia Legal 5 Cuiabá EditUFMT Lima A 2009 Desafios jurídicos para a governança sobre as emissões de CO2 por desmatamento e a titularidade do carbono florestal Disponível em httpwwwplanetaverde orgmudancasclimaticas indexphplingporcontartigos Acesso em 05122009 Martin Mateo R 1977 Derecho ambiental Madrid Instituto de Estúdios de Administración Local Morin E e Kern A B 1995 TerraPátria Porto Alegre Sulina Moutinho P 2009 Desmatamento na Amazônia desafios para reduzir as emissões de gases de efeito estufa do Brasil p 23 Disponível em httpwwwipamorgbrbiblioteca Acesso em 05122009 Myers E 2009 Mudança climática e setor florestal cartilha de REDD In Florestas o setor florestal nos mercados voluntários de carbono segunda edição Revista Ecosystem Marketplace The Katoomb Groups Polakovic F 2002 Junho 06 O homem consome e a Terra não consegue repor O Estado de São Paulo GeralAmbiente p A15 Presidência da República 2007 Objetivos de desenvolvimento do milênio relatório nacional de acompanhamento coordenação Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos supervisão Grupo Técnico para o acompanhamento dos ODM Brasília IPEA MP SPI Romeiro A R et al org 1999 Economia do meio ambiente teoria políticas e a gestão de espaços regionais Campinas UNICAMPIE Safatle A e Pardini F 2004 Setembro 01 Grãos na balança Carta Capital n 306 UNCTAD 2004 Assegurando ganhos de desenvolvimento a partir do sistema comercial internacional e das negociações de comércio Nota de Informação TD397 Disponível em httpwwwunctadorgptdocstd397ptpdf UNCHS 2006 The state of the worlds cities 20062007 the millennium development goals and urban sustainability 30 years of shaping the Habitat agenda Sterling Earthscan Overview 1112 A transição para uma economia verde no direito brasileiro perspectivas e desafios Carlos Teodoro J Hugueney Irigaray 170 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 mecanismos de mercado para uma economia verde PETER H MAY1 aRgUMentOS eM pROl de UMa ecOnOMIa veRde Para alcançar uma economia verde é necessário assegurar a redução da utilização de materiais e energia no processo produtivo de modo a permitir que a sociedade prospere sem necessariamente crescer Daly 1996 Jackson 2009 e Victor 2008 Por outro lado atores sociais destituídos das benesses do capitalismo moderno devido à má distribuição de riquezas podem alcançar patamares de consumo mais elevados sem no entanto esgotar o capital natu ral Assim sendo as metas aparentemente contraditórias de decrescimento no Norte e esverdeamento do crescimento com equidade no Sul representam a base para um diálogo propositivo em torno de um futuro sustentável e além disso configuram a plataforma para debate na Rio20 O assunto analisado nesta breve contribuição discute a seguinte questão até que ponto podese recorrer aos chamados mecanismos de mercado para assegurar a necessária transformação na utilização dos recursos naturais Mais especificamente como promover uma modificação guiada pelas fontes renováveis e pelo despejo de resíduos de modo a convertêlos em insumos e não em desperdício Esta análise pode parecer contraditória pois propõe um caminho diametral mente inverso ao que historicamente move os agentes econômicos visando a maximizar seus retornos Somado a isso há um reconhecimento de que o mercado tem impulsionado paulatinamente os atores econômicos ao cres cimento fundamentado no rápido esgotamento dos recursos naturais e na geração de poluição e ao alargamento do abismo entre ricos e pobres intra e entre os países Este trabalho alinhase à perspectiva contemporânea que reconhece limites nos mecanismos de mercado abrindo com isso um lugar ao discurso estruturado na economia do meio ambiente Apresentaremos neste capítulo uma introdução a alguns dos principais ar gumentos da economia do meio ambiente tanto aqueles voltados à regulação 1 Professor Associado do Programa de PósGraduação em Ciências Sociais em Desenvolvimento Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro CPDAUFRRJ coordenador do Mestrado Profissionalizante em Práticas de Desenvolvimento Sustentável PPGPDSUFRRJ coordenador da linha de pesquisa em Biodiversidade Recursos Naturais e Culturais e pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Políticas Públicas para Estratégias de Desenvolvimento INCTPPED past president da International Society for Ecological Economics ISEE conselheiro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica ECOECO e colaborador da Amigos da Terra Amazônia Brasileira 171 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 de bens públicos quanto aqueles que propõem solucionar os efeitos nefastos da economia moderna Tais argumentos questionam a superioridade relativa dos mecanismos de mercado adotados em muitos países como o mecanis mo mais eficiente para assegurar a provisão dos serviços ambientais Nesse sentido discorreremos sobre o pagamento a serviços ambientais PSA e sua aplicação de maneira complementar aos mecanismos de comando e controle voltados ao esforço de se reduzir e reverter as emissões de carbono sobretudo as oriundas do desmatamento nos países tropicais REDD InStItUIçõeS paRa geStãO aMbIental De quais instituições a sociedade dispõe para sinalizar e apoiar a transi ção rumo a uma economia verde Devese reconhecer antes de qualquer coisa que o mercado é apenas uma entre várias instituições constituídas pelas sociedades humanas para administrar as relações de troca e produção North 1990 O mercado em muitos casos pode não ser a instituição mais adequada para sinalizar uma mudança na trajetória tecnológica mesmo que essa trajetória esteja alicerçada pelo alto desperdício e pelo uso de insumos exauríveis devido ao fato de o mercado não contemplar os bens públicos Vatn 2010 Desse modo em que condições seria aceitável apropriarse da eficiência alocativa do mercado para imprimir uma finalidade verde aos processos econômicos Um primeiro passo sugere a seleção de políticas mais adequadas o que consequentemente envolve a diferenciação entre os instrumentos disponíveis que vão desde a regulação com base em padrões físicos até critérios funda mentados apenas na ação de indivíduos que atuam em seu próprio interesse e respondem às leis de oferta e demanda Entre ambos há uma série de opções com maior ou menor grau de dependência em relação às forças do mercado cujas respectivas conveniência e eficácia atinentes à regulação das atividades econômicas no contexto de restrições ambientais têm sido objeto de inúmeros estudos ver a respeito Seroa da Motta Ruitenbeek et al 1996 Os critérios para a escolha do mecanismo apropriado diferem quando se trata da perspectiva da economia ecológica Nessa perspectiva podemos clas sificar os instrumentos para gestão de recursos naturais de acordo com duas variáveis principais 1 a importância insubstituibilidade relativa do recurso em questão e 2 a sua resiliência capacidade de recuperarse do estresse ou da degradação Essas duas variáveis revelam sem lançar mão de artifícios de valoração pelo mercado os condicionantes biofísicos da intervenção humana Situações em que a biota tem pouca capacidade para suportar perturbações e que concomitantemente constituise de espécies endêmicas ou culturas ameaçadas configuram perfeitos candidatos para aplicação das regras de santuário isto é nas quais devese proibir o acesso e uso de tais recursos Mecanismos de mercado para uma economia verde Peter H May 172 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Como a extinção é irrevogável não há meios para substituir espécies ou povos cuja sobrevivência depende da manutenção de ecossistemas intactos No outro lado dos extremos os recursos naturais resilientes cujas perdas associadas à sua exaustãomodificação são menos relevantes ditam algum sentido relativo ao aproveitamento da eficiência alocativa do mercado visto que ela fornece recursos através de prêmios ou mesmo reforçando com portamentos mais limpos Isso permite a criação de mercados que negociem cotas extras de permissão para emitir poluentes por exemplo E no meio disso tudo observamse as restrições intermediárias quais sejam quotas de pesca ou tamanho de malha de rede permitido King 1994 A localização específica das fronteiras entre as diferentes modalidades de intervenção não são mensuráveis sendo necessárias adaptações do manejo em resposta às diferentes características evolutivas dos ecossistemas em análise Infelizmente existem dificuldades para a elaboração de políticas eficazes devido à incerteza e à ignorância sobre a resiliência de ecossistemas e os tipping points ou limiares associados às mudanças nesses sistemas Numa primeira avaliação parece ser prudente errar por precaução uma vez que as consequências involuntárias ou imprevisíveis de atividades humanas podem causar perdas irreversíveis provocando danos ao próprio bemestar humano Ring e SchroterSchlak 2011 Nesse sentido uma resposta relativa à formu lação de políticas mais adequadas para combater a perda de biodiversidade deve abranger instrumentos que possam proteger um padrão mínimo acon selhável safe minimum standard CiriacyWantrup 1952 de conservação de biodiversidade independentemente da eficiência potencial dos instrumen tos econômicos disponíveis os quais em suma baseiamse em benefício custo A regulação direta Comando e Controle CC estabelecendo áreas protegidas zonas de exclusão de pesca ou de proibição de uso de certos produtos ou substâncias pe OGMs que possam impactar a biodiversidade são componentes chave nesses contextos Num estágio intermediário a incerteza e a ignorância sobre os limites podem indicar a criação de esquemas de permissão apoiados no princípio de cap and trade estabelecer o teto para a produção ou utilização de determinado recurso ou da emissão de poluentes que essa produção acarreta e depois co mercializar o excedente ou a falta em relação ao teto Esses impõem um limite agregado sobre a exploração de espécies ou hábitats deixando a alocação dentro daquele limite do mercado e assim combinam eficiência na alocação do esforço de conservação com a segurança do limite O surgimento do mercado de carbono segue esse caminho Se não houvesse uma limitação fixada por regulação não haveria incentivo para buscar formas para reduzir os custos através de um mercado estruturado em permissões de emissão O surgimento de mercados para serviços ambientais deve sua inspiração teórica ao trabalho seminal de Ronald Coase de 1960 que estabeleceu que Mecanismos de mercado para uma economia verde Peter H May 173 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 um ponto ótimo de degradação ambiental seja identificado sob a regência da lei através de interação dos agentes interessados em negociar permissões de uso dos recursos ambientais Nesse mundo construído hipoteticamente a responsabilidade jurídica de cada agente em uma negociação é definida e obedecida obrigatoriamente Um ponto de equilíbrio seria alcançado através da negociação livre entre os agentes Aqueles que se sentissem prejudicados numa negociação seriam compensados por um valor maior do que o mínimo que eles aceitariam para abrir mão do padrão desejado A solução seria simé trica se a parte prejudicada pela degradação ambiental fosse responsabilizada tendo de pagar algo ao causador do dano para este desistir No entanto para que se atinja o ótimo econômico o teorema de Coase propõe que o custo das transações2 para se chegar a uma solução negociada teria de ser nulo Assim sendo haverá negociação se os benefícios excederem os custos de se chegar a uma solução negociada caso contrário não existirá solução o que também implicaria segundo Coase uma solução de equilí brio uma vez que uma solução de menor custo é alcançada Nesse sentido argumentase que se não há negociação é porque a situação do status quo é melhor do que a de se incorrer nos custos de procurar uma solução Analo gamente a existência das externalidades seria considerada como um ponto ótimo e desse modo o poder público não precisaria intervir É evidente que o problema nesse tipo de solução consiste na premissa de que as informações são assimétricas entre os atores envolvidos na nego ciação em suma os poluidores normalmente são poucos sabem o quanto produzem de emissões e o quanto estão dispostos a investir na sua mitigação Os afetados são muitos desorganizados sem informações sobre a fonte ou as características dos danos que sofrem e sem recursos facilmente mobilizados para levar os poluidores à justiça ou mesmo à mesa de barganha Falta nisso não só o poder para exercer o saber Lewontin 1992 mas também falta entre os agentes o saber para exercer o poder pagaMentOS pOR SeRvIçOS aMbIentaIS Embora a maioria dos ensaios acerca dos mecanismos de mercado concentrese nos problemas relativos à poluição há um grande movimento em prol da utilização desse tipo de instrumento como meio para estimular a participação de proprietários rurais num esforço coletivo para a conservação da biodiversidade das águas e dos estoques de carbono nas florestas Assim sendo em vez de responsabilizados pelas emissões que causam ao desmatar e levados ao banco dos réus são tratados como provedores de serviços am 2 Notase que os custos de transação dependem segundo Williamson 1979 1985 da frequência das transações do grau de especificidade da transação e do nível de incerteza que a transação envolve Mecanismos de mercado para uma economia verde Peter H May 174 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 bientais em potencial Essa interação estimula a participação de proprietários rurais seja sugerindo que desistam de utilizar as florestas para fins produtivos seja estimulandoos a incorporar melhores práticas de uso do solo diminuindo consequentemente a emissão Essa grande barganha coaseana é chamada Pagamento por Serviços Ambientais PSA Um dos principais pensadores sobre o assunto Wunder 2005 classifica os PSAs como qualquer transação que envolve pelo menos um comprador um vendedor e um serviço ambiental contingente no pagamento entre as partes Desse modo haverá condições para uma negociação caso o custo de prover o serviço somado aos custos de transação em realizar o negócio forem menores do que o benefício socioambiental obtido conjuntamente pelos compradores sejam locais ou globais O problema nessa situação é que os benefícios dos serviços ambientais são obtidos por muitos alguns podendo pegar carona nos esforços dos outros instigando assim pouco incentivo em contribuir Por isso quando as informações são assimétricas os custos de transação tendem a ser novamente altos Ou seja existem abundantes falhas no mercado para negociações desse teor Além disso há problemas de insegurança nos contratos no mercado de carbono por exemplo o agente comprador é o único responsável pelo cum primento do que fora estabelecido com o vendedor dos créditos de carbono com reduções nas emissões Nesse caso é vantajoso para o vendedor de créditos desmatar e depois dizer que pena a queimada na roça vizinha fugiu do controle Passa a ser problema do comprador buscar uma fonte alternativa de carbono ou securitizar para cumprir com suas obrigações de redução É por isso que no único mercado regulado de carbono que atinge os países em desenvolvimento aquele motivado pelo Mecanismo do Desenvolvimento Limpo MDL encontramse principalmente projetos que implicam redução de emissões na fonte tipicamente em empreendimentos que envolvem mudança de fonte de energia ou alteração de processos industriais e não projetos envol vendo florestas ou mudanças no uso do solo É o problema do risco moral Há três saídas para o problema do risco moral nos contratos do PSA O primeiro é da internalização o próprio comprador do benefício ambiental pro move a provisão dos serviços ambientais como parte do seu próprio negócio Empresas multinacionais podem reduzir emissões numa região de baixa eficiência e creditar os ganhos internamente em outra filial Em muitos casos utilizase outra solução que é cada vez mais adotada de PSA Nela o Estado assume as responsabilidades seja garantindo ou pagando em última instância os benefícios ambientais Veiga e May 2010 Os principais programas nacionais de PSA na América Latina Costa Rica e México por exemplo adotam esse procedimento visto que os atores econô micos não contam com o quadro institucional necessário para intermediar as negociações entre demandantes e provedores de serviços No caso do Brasil a Mecanismos de mercado para uma economia verde Peter H May 175 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 remuneração de serviços ambientais por proprietários particulares é proibida dada inexistência desta figura na legislação o que acaba exigindo a inclusão de empresas cooperativas ou associações no processo com seus respectivos custos de transação e assim diluindo a receita do provedor O último caso referese à ação voluntária por parte de atores do setor privado Nesses casos basta uma validação por uma terceira parte certi ficando o cumprimento com o objeto do contrato nos termos da redução de emissões e outros aspectos como a inserção do projeto nos processos do desenvolvimento local e regional conservação de biodiversidade e da água A certificação independente é uma forma de regulação sem Estado em que há a intermediação da relação entre produtores e consumidores estabelecendo regras que comprovem através de um grau adequado de confiança que os processos produtivos obedecem a critérios de sustentabilidade Kaechele May et al 2011 A proliferação de padrões de certificação independentes so bretudo os oriundos das articulações promovidas por ONGs configuram a real importância dessa validação por terceiros visto que se faz urgente a criação de um mecanismo capaz de superar um dos principais obstáculos da atração de recursos voltados aos mercados de serviços ambientais A partir de 2009 96 do volume de CO2 comercializado em projetos florestais já eram objeto de certificação independente Hamilton Chokkalingam et al 2009 betteR Redd than dead O tema redução do desmatamento como alvo das negociações impôsse no âmbito da regulação global na construção de uma agenda pósQuioto devido à falta de opções capazes de atingir as metas previstas O Brasil que não é muito atrativo aos investimentos destinados às reduções de emissões de outros setores visto que estes já se encontram relativamente verdes é um dos maiores emissores de gases do efeito estufa devido ao persistente desmatamento Apesar de terse recusado por anos a fio a entrar em negociações com os países do Norte para definir questões relacionadas à ocupação das suas fronteiras o Brasil indiscutivelmente decidiu não entrar como pária nas negociações do novo acordo do clima e portanto se compro meteu em Copenhaguen em 2009 a fazer cortes radicais no desmatamento ao longo dos próximos anos reduzindo em 80 a taxa de desmatamento na Amazônia e 50 no Cerrado em comparação com uma linha de base dos 10 anos anteriores Esse acordo foi facilitado porque desde um pico em 2005 a taxa de desmatamento vem diminuindo havendo chegado em 2010 a um pata mar quase 70 abaixo do pico Mas ainda permanece uma área considerável de desmatamento anual a ser combatido Boa parte dos novos desmatamentos decorre da expansão do pasto para gado de corte em municípios que possuem baixa capacidade de governança ambiental Mecanismos de mercado para uma economia verde Peter H May 176 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Nas Conferências das Partes COP e particularmente desde a COP12 ocorrida em Nairobi 2006 o tema desmatamento que sempre fora adia do devido a questões de soberania nacional passou a receber cada vez mais atenção Na COP15 em Copenhaguen 2009 decidiuse disponibilizar consideráveis recursos ao desmatamento evitado através de transferências voluntárias entre países do Norte e do Sul O alvo dos recursos são as ações elaboradas por países que buscaram promover a Redução de Emissões oriun das do Desmatamento e da Degradação de Florestas REDD Outras ações complementares visando a enriquecer e restaurar as funções ecossistêmicas de florestas tropicais foram também contempladas REDD A redução do desmatamento ocorrido a partir de 2005 elevou o Brasil a uma posição de destaque nas negociações do clima Segundo o governo a redução foi resultado de um grande esforço de fiscalizar infratores e retirar o boi pirata3 de áreas protegidas Em compensação o governo da Noruega prometeu doar um total de US 1 bilhão ao longo de 10 anos ao Brasil depositados no Fundo Amazônia criado pelo BNDES especificamente para executar ações a fundo perdido que reforçam a fiscalização municipal e a regularização fundiária estimulando assim usos mais sustentáveis dos recursos naturais Entretanto de acordo com análises de entidades ambientalistas a redução do desmatamento observado pode também ter sido reflexo do declínio dos preços das commodities agropecuárias e da repercussão da crise no merca do financeiro a partir de 2008 Segundo alguns desses analistas seria mais interessante estabelecer instrumentos que compensassem aqueles que iriam desmatar usando o instrumental de PSA do que focar todos os recursos em regulação Permanece a questão para agir em prol das metas de redução do desmatamento devese privilegiar mecanismos de mercado ou de CC Se for do mercado quanto se precisa pagar Qual o custo para a sociedade para os atores econômicos afetados e para comunidades dependentes nos recursos florestais para seu sustento Quem se beneficia Nesse desafio o Brasil está amparado na legislação do uso do solo existente fortemente calçada em CC O Código Florestal em sucessivas reedições de Medidas Provisórias desde 1998 permite alteração de vegetação nativa com fins produtivos em apenas 20 das propriedades na Amazônia e 65 no Cer rado O restante tem que ficar como Reserva Legal O problema é que poucos obedecem ao Código que ainda assim vem sendo alvo de um esforço pela bancada ruralista do Congresso para diluílo PL 007402011 do substitutivo da Lei 4771 relatado pelo deputado Aldo Rebelo Por outro lado programas estaduais visando ao fortalecimento dos requisitos do Código Florestal foram implantados nos últimos anos com base no licenciamento ambiental mais recentemente no cadastramento ambiental do uso do solo rural com algum 3 Tratase da presença de gado em propriedades ilegais em geral públicas Mecanismos de mercado para uma economia verde Peter H May 177 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 êxito Licenciamento que indica os contornos de cada propriedade e a loca lização das reservas e Áreas de Preservação Permanente APP quando combinado com monitoramento de mudanças no uso do solo por satélite e verificação no campo permite aferir se o Código vem sendo observado na prática Esse aparato instrumental faz com que o Brasil seja de longe um dos poucos países que possuem capacidade de monitoramento e verificação do desmatamento podendo assim ter acesso aos recursos prometidos pelos países do Norte a título de REDD Uma vantagem do Código ainda não aproveitada em muitos estados é de servir como teto cap pois estabelece a máxima área que cada propriedade pode modificar permitindo o funcionamento de mecanismos de mercado que possam compensar aqueles que observam a lei Segundo a posição dos pro dutores rurais eles precisariam de algum incentivo para restaurar as áreas indevidamente desflorestadas e demandariam recursos para cobrir o custo de oportunidade da retirada das áreas de produção além de alguma compensação pelos benefícios propiciados aos outros membros da sociedade pela restaura ção das funções ecossistêmicas Outros argumentam que os produtores rurais já receberam incentivos vultosos para desmatar e que agora precisam observar a Lei como mínimo aceitável sendo que somente aqueles que já observam o Código Florestal devem ser compensados pelo PSA Apesar das discussões e múltiplos exercícios para estimar quanto seria o custo da redução do desmatamento persiste a questão de como melhor es truturar instituições para regular a provisão de bens públicos Uma revisão da experiência com instrumentos econômicos e de CC aplicados à conservação da biodiversidade Ring e SchroterSchlak 2011 sugere que o melhor caminho em termos da eficáciacusto é uma combinação mix de instrumentos com a base fundamentada na regulação Nesse sentido o fortalecimento do Código Florestal e não o seu enfraquecimento deve servir como base a partir da qual inovações institucionais possam florescer no Brasil Concluímos que instrumentos de mercado tais como aqueles associados ao PSA e ao REDD devem assumir um papel importante na transição para uma economia verde Tal papel deverá ser mediado por uma regulação definidora dos critérios de acesso e controle sobre os recursos naturais refletindose em limites biofísicos amparados nas ciências e em ampla e prévia consulta às populações que dependem de tais recursos para seu sustento A partir de parâmetros assim estabelecidos é possível em circunstâncias específicas aproveitar a eficiência alocativa do mercado para servir de alicerce às demais instituições da sociedade Mecanismos de mercado para uma economia verde Peter H May 178 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CiriacyWantrup S V 1952 Resource conservation economics and policies Berkeley California University of California Press Coase R H 1960 The problem of social cost Journal of Law and Economics 3 outubro 1960 144 Daly H E 1996 Beyond growth the economics of sustainable development Boston Beacon Press Hamilton K U Chokkalingam et al 2009 State of the forest carbon markets taking root and branching out Washington DC Forest Trends Jackson T 2009 Prosperity without growth economics for a finite planet Londres Sterling VA Earthscan Kaechele K May P H et al 2011 Forest certification a voluntary instrument for environmental governance In Shleuter I R Instrument mixes for biodiversity poli cies Leipzig Policymix Project King D M 1994 Can we justify sustainability New challenges facing ecological economics In Jansson M H Folke C e Costanza R Investing in natural capital the ecological economics approach to sustainability Washington Island Press Lewontin R C 1992 Biology as ideology the doctrine of DNA Nova York Harper Perennial North D C 1990 Institutions institutional change and economic performance Cambridge Nova York Cambridge University Press Ring I e C SchroterSchlak 2011 Instrument mixes for biodiversity policies draft Leipzig Helmholz Institute Serôa da Motta R e Ruitenbeek J et al 1996 Uso de instrumentos econômicos na gestão ambiental da América Latina e Caribe lições e recomendações Rio de Janeiro IPEA Vatn A 2010 An institutional analysis of payments for environmental services Eco logical Economics 696 12451252 Veiga F C N e May P H 2010 Mercados para serviços ambientais In May P H Economia do meio ambiente teoria e prática Rio de Janeiro Elsevier Victor P A 2008 Managing without growth slower by design not disaster Chelteham Northampton Edward Elgar Williamson O 1985 The economic institutions of capitalism Nova York The Free Press Williamson O 1979 Transactioncost economics the governance of contractual relations Journal of Law and Economics 222 23361 Wunder S 2005 Payments for environmental services some nuts and bolts In CIFOR Occasional Paper CIFOR 42 Mecanismos de mercado para uma economia verde Peter H May 179 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde1 RONALDO SEROA DA MOTTA 2 IntROdUçãO O conceito de economia verde significa que o crescimento econômico pode estar baseado em investimentos em capital natural e portanto a estrutura da economia muda na direção dos setorestecnologias verdes ou limpos que vão substituindo os setorestecnologias sujos ou marrons O relatório Rumo a uma economia verde caminhos para o desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza produzido pelo PNUMA UNEP 2011 procura então demonstrar que essa transformação pode ser alcançada sem perdas de renda e emprego e ainda com a redução da pobreza Essa tarefa de apreciação do capital natural impõe a necessidade de res pondermos a pelo menos duas perguntas a saber i Quanto vale um recurso ambiental e ii Que instrumento devemos usar para capturar esse valor Outro recente relatório The economics of ecosystems and biodiversity TEEB 2011 por exemplo oferece algumas estimativas dos custos dos ecos sistemas e da biodiversidade em escala global e exemplos de como capturar esses valores através de instrumentos econômicos Como diz o relatório estimar os valores associados aos bens e serviços ambientais e suas formas de captura no mercado é uma tarefa controversa e complexa mas mesmo assim os números resultantes acabam por indicar oportunidades de geração de renda e emprego através do reconhecimento dos valores econômicos dos recursos naturais Ou seja para financiar os investimentos em capital natural temos que co nhecer a sua contribuição econômica e social e saber precificálos de acordo com sua contribuição para o bemestar da sociedade Na seção seguinte são discutidos conceitos e técnicas e também limitações da valoração dos bens e serviços ambientais Na terceira seção analisamos as formas de precificação desses bens e serviços para a construção de uma economia verde A última seção conclui com algumas considerações finais 1 IPEA Rio de Janeiro abril de 2011 2 Técnico de Planejamento e Pesquisa do IPEA e membro dos 3º e 5º Relatórios do IPCC 180 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 valORandO benS e SeRvIçOS aMbIentaIS3 Se podemos identificar a necessidade da qualidade ambiental para garantir a maximização do bemestar por que as políticas de crescimento econômico não a incorporam desde a sua gênese Ou melhor por que o próprio sistema econômico naturalmente não otimiza os usos dos recursos naturais De acordo com o que a teoria econômica concenciona o uso de recur sos naturais quase sempre gera economias externas negativas no sistema econômico Essas externalidades não são totalmente captadas no sistema de preços porque a segurança dos direitos de propriedade ou uso desses recursos resultam em altos custos de transação devido à dificuldade técnica ou cultural de fixar direitos exclusivos e rivais Sendo assim não é possível estabelecer relações de troca entre esses direitos que garantam o uso ótimo dos recursos Em suma essas dificuldades técnica e institucional em definir direitos de propriedade entre contemporâneos e gerações presentes e passadas impe dem a existência de um mercado que sinalize o valor do recurso ou quando esse existe essas imperfeições resultam em preços ou custos de uso que não refletem o valor econômico ou social do recurso e portanto seu uso introduz ineficiência no sistema econômico Isto é o uso dos recursos ambientais gera custos externos negativos intra e intertemporais O valor econômico ou o custo de oportunidade dos recursos ambientais normalmente não é observado no mercado por intermédio do sistema de pre ços No entanto como os demais bens e serviços presentes no mercado seu valor econômico deriva de seus atributos com a peculiaridade de que esses atributos podem ou não estar associados a um uso O valor econômico dos recursos ambientais VERA pode ser decomposto em valor de uso VU e valor de não uso VNU e se expressa da seguinte forma VeRa VuD Vui Vo Ve onde Valor de Uso Direto VUD valor que os indivíduos atribuem a um recurso ambiental pelo fato de que dele se utilizam diretamente por exemplo na forma de extração de visitação ou outra atividade de produção ou consumo direto Por exemplo extrativismo turismo recreação e atividades de pesquisa científica4 Valor de Uso Indireto VUI valor que os indivíduos atribuem a um recurso ambiental quando o benefício do seu uso deriva de funções ecossistêmicas Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 3 Para uma apresentação mais detalhada desse tema ver por exemplo Hanley Shogren e White 2007 Seroa da Motta 1998a e 2006 UNEP 2000a Kolstad 2000 Freeman 1993 e Pearce e Turner 1990 4 Benefícios insitu 181 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 como por exemplo a contenção de erosão controle climático e proteção de mananciais5 Valor de Opção VO valor que o indivíduo atribui à conservação de recursos que podem estar ameaçados para usos direto e indireto no futuro próximo Por exemplo o benefício advindo de terapias genéticas com base em propriedades de genes ainda não descobertos de plantas em florestas tropicais Valor de NãoUso Passivo ou Valor de Existência VE valor que está dissociado do uso embora represente consumo ambiental e deriva de uma posição moral cultural ética ou altruística em relação aos direitos de existência de outras espécies que não a humana ou de outras riquezas naturais mesmo que essas não representem uso atual ou futuro para ninguém Um exemplo claro deste valor é a grande mobilização da opinião pública para salvamento dos ursos panda ou das baleias mesmo em regiões em que a maioria das pessoas nunca poderá estar ou fazer qualquer uso de sua existência Há também outra forma de classificar o valor econômico do recurso ambiental pela sua capacidade de gerar fluxos de serviços ecossistêmicos tal como se estabeleceu no Millenium ecosystem assessment report MEA 2005 que categoriza ou tipifica os serviços ambientais em serviços de provisão regula ção suporte e culturais da seguinte forma Serviços de provisão que geram consumo material direto como por exem plo alimentos água fármacos e energia Serviços de regulação que regulam as funções ecossistêmicas como por exemplo sequestro de carbono decomposição dos resíduos sólidos purifi cação da água e do ar e controle de pestes Serviços de suporte que dão suporte às funções ecossistêmicas como por exemplo formação de solo fotossíntese e dispersão de nutrientes e sementes Serviços culturais que geram consumo não material nas formas cultural intelectual recreacional espiritual e científica O quadro a seguir exemplifica e relaciona essas taxonomias Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 5 Benefícios exsitu 182 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 taxonomia geral do valor econômico do recurso ambiental Valor econômico do recurso ambiental Valor de Uso Valor de NãoUso Há ainda na literatura certa controvérsia com relação ao valor de existência representar o desejo do indivíduo de manter certos recursos ambientais para que seus herdeiros gerações futuras possam usufruir de seus usos diretos e indiretos bequest value ou valor de legado Essa é uma questão conceitual que de certa forma é irrelevante na medida em que para a valoração ambien tal o desafio consiste em admitir que os indivíduos atribuem valor a recursos mesmo que dele não façam qualquer uso Os usos e nãousos dos recursos ambientais encerram valores os quais precisam ser mensurados para se tomarem decisões informadas quanto aos usos e nãousos diversos e até mesmo quando são conflitantes ou seja quan do um tipo de uso ou de nãouso exclui necessariamente outro tipo de uso ou nãouso Por exemplo o uso de uma praia para diluição de esgoto exclui ou pelo menos limita seu uso para recreação Verificados esses usos e nãousos e os seus respectivos serviços am bientais podese então proceder à sua valoração cuja metodologia será apresentada a seguir Os métodos de valoração econômica do meio ambiente são parte do arca bouço teórico da microeconomia do bemestar e são necessários na avaliação dos custos e benefícios sociais quando as decisões de investimentos públicos afetam o consumo da população e portanto seu nível de bemestar Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta Valor de uso Direto Bens e serviços ambientais apropriados diretamente da exploração do recurso e consumidos hoje Serviço de provisão e regulação Valor de uso indireto Bens e serviços ambientais que são gerados de funções ecossistêmicas e apropriados e consumidos indiretamente hoje Serviços de regulação suporte e culturais Valor de opção Bens e serviços ambientais de usos diretos e indiretos a serem apropriados e consumidos no futuro Serviços de provisão regulação suporte e culturais ainda não descobertos Valor de existência Valor não associado ao uso atual ou futuro e que reflete questões morais culturais éticas ou altruísticas Serviços culturais Valor Serviços relacionados 183 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 O leitor poderá agora avaliar com mais clareza o grau de dificuldade para encontrar preços de mercado adequados ou não que reflitam os valores atribuídos aos recursos ambientais Essa dificuldade é maior à medida que passamos dos valores de uso para os valores de nãouso Nos valores de uso os usos indiretos e de opção apresentam por sua vez maior dificuldade que os usos diretos Conforme procuramos demonstrar até agora a tarefa de valorar economi camente um recurso ambiental consiste em determinar quanto melhor ou pior estará o bemestar das pessoas devido a mudanças na quantidade de bens e serviços ambientais seja na apropriação por uso ou não Dessa forma os métodos de valoração ambiental corresponderão a este objetivo à medida que forem capazes de captar essas distintas parcelas de valor econômico do recurso ambiental Todavia conforme será discutido a seguir cada método apresentará limitações nesta cobertura de valores a qual estará quase sempre associada ao grau de sofisticação metodológica e de base de dados exigido às hipóteses sobre comportamento do indivíduo consumidor e aos efeitos do consumo ambiental em outros setores da economia Tendo em vista que tal balanço será quase sempre pragmático e decidido de forma restrita cabe ao analista que valora explicitar com exatidão os li mites dos valores estimados e o grau de validade de suas mensurações para o fim desejado Conforme será discutido a seguir a adoção de cada método dependerá do objetivo da valoração das hipóteses assumidas da disponibili dade de dados e do conhecimento da dinâmica ecológica do objeto que está sendo valorado Os métodos de valoração aqui analisados são assim classificados métodos da função de produção e métodos da função de demanda Métodos da função de produção métodos da produtividade marginal e de mercados de bens substitutos reposição gastos defensivos ou custos evitados e custos de controle Se o recurso ambiental é um insumo ou um substituto de um bem ou ser viço privado esses métodos utilizamse de preços de mercado deste bem ou serviço privado para estimar o valor econômico do recurso ambiental Assim os benefícios ou custos ambientais das variações de disponibilidade desses recursos ambientais para a sociedade podem ser estimados Com base nos preços desses recursos privados geralmente admitindo que não se alteram frente a essas variações estimamse indiretamente os valores econômicos preçossombra dos recursos ambientais cuja variação de disponibilidade está sendo analisada O benefício ou custo da variação da disponibilidade do recurso ambiental é dado pelo produto da quantidade variada do recurso vezes o seu valor econômico estimado Por exemplo a perda de nutrientes do solo causada por desmatamento pode afetar a pro Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 184 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 dutividade agrícola Ou a redução do nível de sedimentação numa bacia por conta de um projeto de revegetação pode aumentar a vida útil de uma usina hidrelétrica e sua produtividade Métodos da função de demanda métodos de mercado de bens comple mentares preços hedônicos e do custo de viagem e método da valoração contingente Esses métodos assumem que a variação da disponibilidade do recurso ambiental altera a disposição a pagar ou aceitar dos agentes econômicos em relação àquele recurso ou seu bem privado complementar Assim esses métodos estimam diretamente os valores econômicos preçossombra com base em funções de demanda para esses recursos derivadas de i mercados de bens ou serviços privados complementares ao recurso ambiental ou ii mercados hipotéticos construídos especificamente para o recurso ambiental em análise Utilizandose de funções de demanda esses métodos permitem captar as medidas de disposição a pagar ou aceitar dos indivíduos relativas às varia ções de disponibilidade do recurso ambiental Com base nessas medidas estimamse as variações do nível de bemestar pelo excesso de satisfação que o consumidor obtém quando paga um preço ou nada paga pelo recurso abaixo do que estaria disposto a pagar O excedente do consumidor é então medido pela área abaixo da curva de demanda e acima da linha de preço Assim haverá variações do excedente do consumidor frente às variações de disponibilidade do recurso ambiental Assim o benefício ou custo da variação de disponibilidade do recurso ambiental será dado pela variação do excedente do consumidor medida pela função de demanda estimada para esse recurso Por exemplo os custos de viagem que as pessoas incorrem para visitar um parque nacional podem determinar uma aproximação da disposição a pagar destes em relação aos benefícios recreacionais do parque Essas medidas de disposição a pagar podem também ser identificadas em uma pesquisa que questiona junto a uma amostra da população valores de pagamento de um imposto para investimentos ambientais na proteção da biodiversidade Identificando essas medidas de disposição a pagar podemos construir as respectivas funções de demanda Note que esses dois métodos gerais podem de acordo com suas hipóteses estimar valores ambientais derivados de funções de produção ou de demanda com base na realidade econômica atual Na medida em que esses valores custos ou benefícios possam ocorrer ao longo de um período então será necessário identificar esses valores no tempo Ou seja identificar valores resultantes não somente das condições atuais mas também das condições futuras A prospecção das condições futuras poderá ser feita com cenários alternativos para minimizar o seu alto grau de incerteza De qualquer forma Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 185 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 os valores futuros terão que ser descontados no tempo isto é calculados seus valores presentes e para tanto há que se utilizar uma taxa de desconto social Essa taxa difere daquela observada no mercado devido às imperfeições no mercado de capitais e sua determinação não é trivial embora possa afetar significativamente os resultados de uma análise de custobenefício No contexto ambiental a complexidade é ainda maior Por exemplo devido a sua possibilidade de esgotamento o valor dos recursos ambientais tende a crescer no tempo se admitimos que seu uso aumenta com o crescimento econômico Como estimar essa escassez futura e traduzila em valor mone tário é uma questão complexa que exige um certo exercício de futurologia Assim sendo alguns especialistas sugerem o uso de taxas de desconto menores para os projetos onde se verificam benefícios ou custos ambientais significativos ou adicionar os investimentos necessários para eliminar o risco ambiental Considerase assim que os custos e benefícios ambientais serão adequadamente valorados e que cenários com valores distintos para a taxa de desconto devem ser utilizados para avaliar sua inderteminação Essa complexidade também irá se refletir quando se montar um Sistema Nacional de Contas Ambientais para medir a renda nacional PIB deduzida de quanto a economia consumiu depreciação ou investiu apreciação em capital natural6 Em níveis desagregados as Contas Ambientais se aproximam de uma análise de custobenefício onde o PIB reflete uma medida do bene fício e o consumo de capital natural representa o custo Logo os conceitos e técnicas de valoração serão os mesmos que aqui foram discutidos7 Em suma a escolha de um ou outro método de valoração econômica do meio ambiente depende do objetivo da valoração das hipóteses consideradas da disponibilidade de dados e do conhecimento científico a respeito da dinâmica ecológica do objeto em questão pRecIfIcandO OS benS e SeRvIçOS aMbIentaIS8 Embora a internalização das externalidades ambientais aumente a eficiên cia do sistema estes ganhos são percebidos diferentemente pelos agentes econômicos e são dispersos no tempo Ou seja afetam a distribuição intra e intertemporal da renda Então como podemos internalizar esse valor no sistema de preços para que os seus usuários percebam esse valor A teoria econômica propõe que para corrigir essa falha de mercado tra gédia dos comuns sejam esses direitos de uso definidos de tal forma que a 6 Seria uma medida do produto interno líquido PIL de uma economia que representa o PIB menos o consumo de capital 7 Ver por exemplo Seroa da Motta 1995 e 1998b para uma discussão detalhada de como aplicar técnicas de valoração em Contas Ambientais e algumas estimativas de consumo de capital no Brasil 8 Para uma discussão mais ampla ver por exemplo Hanley Shogren e White 2007 Seroa da Motta 2006 UNEP 2000b Kolstad 2000 e Pearce e Turner 1990 Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 186 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 troca deles via mercado estabeleça um preço de equilíbrio que represente o custo social desses recursos Essa possibilidade pode acontecer na forma de uma cobrança pelo uso do recurso natural ou com a criação de mercados Ou seja instrumentos eco nômicos que sinalizem preços que reflitam o custo de oportunidade social do recurso e que portanto internalizem o preço correto do recurso no sistema econômico Note que o ganho de eficiência de um instrumento econômico está associado a heterogeneidade de custos de controle ou uso entre os agentes econômicos Essa diferenciação de custo flexibiliza as decisões individuais quando essas são tomadas comparandose o valor de cobrança ou do direito de emissão ou uso com os custos de controle ou uso Isso leva a que os usuários com me nor custo façam mais controle a custos menores que a cobrança ou realizem receitas vendendo direitos Todavia esses ganhos de eficiência podem não ser anulados por altos custos de transação de informação ou implementação seja na cobrança ou na criação de mercados Quando isso ocorre a introdução de instrumentos econômicos deve ser evitada cObRança Teoricamente existe um imposto pigouviano equivalente ao dano ambiental marginal que permitiria alcançar o ótimo econômico da degradação Tal no menclatura devese ao economista Arthur Cecil Pigou que o formulou pela primeira vez na década de 20 no século passado Esse imposto adota o critério do nível ótimo econômico de uso do recurso quando externalidades negativas como por exemplo os danos ambientais são internalizadas no preço do recurso tanto nos processos produtivos como nos de consumo Uma vez que este novo preço da externalidade é determinado e imposto a cada usuário agregado ao seu preço de mercado cada nível de uso individual se altera e também o nível de uso agregado Os novos níveis desse modo refletiriam uma otimização social desse uso porque agora os benefícios do uso são contrabalançados por todos os custos associados a ele ou seja cada usuário paga exatamente o dano gerado pelo seu uso A determinação desse imposto não existe na prática tendo em vista as dificuldades de mensuração precisa dos danos ambientais conforme dis cutimos na seção anterior Logo o nível ótimo de uso é determinado no processo político dos agentes sociais afetados e daí se derivam os pagamentos pelo uso do recurso natu ral Nesses casos o preço econômico pode ser definido em dois tipos preço de indução e preço de financiamento cada um com um critério distinto que Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 187 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 gera valores também distintos mas ambos estão orientados para reduzir as externalidades negativas Preço de indução o novo preço do recurso é determinado para atingir um certo nível agregado de uso considerado tecnicamente adequado e não uma receita agregada É determinado de tal forma que o somatório da alteração individual induzida de uso resulte no novo nível agregado desejado Assim sua determi nação tem que ser baseada em simulações para identificar como os indivíduos iriam alterar seu comportamento de uso do recurso frente aos preços O preço de indução estaria associado ao princípio do poluidorusuário pagador9 Por exemplo seria o caso de uma cobrança pela água para induzir uma redução agregada do seu uso de x ou uma taxa que incentive um aumento de certificação em Y A determinação de um preço de indução se baseia nas funções de demanda ou de custo de cada usuário logo diferenciando os preços de forma a induzir os usuários no agregado a juntos atingirem um nível de uso desejado Dessa forma a regra geral para essa diferenciação de preços seria um preço maior para os usuários mais sensíveis a preços maior elasticidadepreço Isso porque esses usuários seriam aqueles a reduzir mais o uso por cada unidade monetária a mais no preço Preço de financiamento adota o critério de nível ótimo de financiamento no qual o preço é determinado para obter um nível de receita desejado Assim o preço de financiamento está associado a um nível de orçamento predeter minado e não a um nível desejado de uso do recurso Sua aplicação está associada ao princípio do protetor recebedor como por exemplo cobrança pelo uso do recurso para gerar uma receita necessária para um determinado investimento numa unidade de conservação ou despesa para pagamentos por serviços ambientais10 Ao contrário do preço de indução a regra geral para diferenciação de pre ços seria um preço menor para os usuários mais sensíveis a preços maior elasticidadepreço Isso porque esses usuários seriam aqueles a reduzir mais o uso por cada unidade monetária adicional no preço e por conseguinte reduzindo a receita Em suma com o preço de financiamento se procura atingir uma meta de receita agregada e o preço de indução ao invés de objetivar uma receita total procura alterar o nível de uso individual Qualquer que seja a sua forma o instrumento econômico representa sempre um preço econômico das exter nalidades negativas Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 9 Na sua concepção exante o usuário percebe o pagamento do dano antes do ato de uso A sua formulação expost está mais associada à reparação de danos via meios judiciais após seu uso ter gerado o dano 10 Na literatura econômica este preço adotaria a regra de Ramsey assim denominada em associação ao seu primeiro proponente 188 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 cRIaçãO de MeRcadOS A outra possibilidade de precificação é a criação de um mercado de direitos transacionáveis de uso ou poluição Nesses mercados são distribuídos ou vendidos direitos de uso ou poluição que no agregado não ultrapassem os níveis de uso ou de poluição desejados Uma vez realizada essa alocação inicial níveis de uso ou de poluição acima das cotas individuais teriam que ser obtidos por transações desses direitos entre os usuáriospoluidores Por exemplo o usuáriopoluidor que tenha um custo alto de controle terá um incentivo para comprar cotas daqueles com custos menores Note que é a ausência de ou dificuldade de assinalar direitos completos de propriedade dos recursos ambientais que torna seu uso menos eficiente Caso a especificação dos direitos completos fosse possível uma negociação entre os usuários poderia ocorrer de forma que os usos de maior retorno mais eficientes fossem priorizados ou seja as trocas de direitos no mercado indu ziriam a que os usuários de maior benefício de uso ou menor custo fossem aqueles que pagassem mais por esses direitos Os termos da negociação seriam com base nos custos e benefícios percebidos pelas partes Para que um mercado de direitos entretanto se realize será necessário que os direitos de propriedade sejam bem definidos e que haja um grande número de participantes comprando e vendendo com diferentes custos e benefícios Por outro lado um mercado assim institucionalizado diversificado e atomizado requer um apoio institucional e legal mais sofisticado Assim há que se atentar para estes três principais condicionantes a alocação inicial a alocação inicial desses direitos poderá ser realizada de forma i neutra na proporção do nível atual de uso ou poluição11 ii com critérios distributivos onde há maior alocação para certos segmentos da so ciedade e em ambos os casos essa alocação tanto pode ser gratuita ou através de leilões que permitam a geração de receitas No caso de leilão cada usuáriopoluidor pagaria pelas cotas de acordo com o valor dessas para sua atividade No caso da distribuição gratuita haverá uma questão distributiva a ser enfrentada dado que esses direitos seriam na verdade fonte de custos e benefícios dos seus titulares b informação imperfeita o poder público e os usuáriospoluidores não esta riam perfeitamente informados sobre o nível de uso ou poluição do recurso e os seus custos Assim os custos de transação desses direitos seriam altamente elevados e o nível de transações seria mais baixo e portanto menos eficiente Embora tal imperfeição possa ser amenizada valendose de mercados futuros a administração de tal sistema é complexa para ser implementada de forma Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 11 Grandfather system 189 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 abrangente em regiões de grande extensão e com uma alta diversidade de usuáriospoluidores e c poder de mercado os usuários ou poluidores com poder de mercado12 tenderiam a manipular a compra de direitos para a criação de barreiras à entrada para concorrentes ou competição regional ou ainda para realizar arbitragens de preço visando a lucros anormais Tais imperfeições podem ser amenizadas com limites de uso ou emissão por usuário ou restrição de transferências embora sua administração seria também complexa ao exigir uma gama extensa de informações dos principais usuários Em suma a precificação do recurso ambiental gera um dividendo imediato para a sociedade ao aumentar a eficiência ambiental Mas há também um ganho de eficiência adicional um segundo dividendo com a possibilidade de melhorar a eficiência econômica da tributação com a substituição de receitas de tributos distorcivos sobre o consumo e capital pelas receitas resultantes dos tributos ambientais ou aquela proveniente das receitas de direitos de uso Dessa forma uma reforma tributária na qual uma tributação ambiental é intro duzida e suas receitas são utilizadas para financiar reduções nos outros tributos gera o chamado dividendo duplo Nesse caso essa reciclagem fiscal permitiria um tributo ambiental de receita neutra que reduz a degradação ambiental e melhora a eficiência da economia ao reduzir a carga tributária distorciva cOnSIdeRaçõeS fInaIS Uma avaliação ecológica deve anteceder a qualquer iniciativa de aplicação de critérios econômicos pois ela é crucial para determinar como os serviços ambientais estão correlacionados com os níveis de estoque de capital natural Dessa forma o uso do critério econômico exige explicitação dos impactos ecológicos físicoquímicos e biológicos que norteiam sua aplicação Uma limitação adicional ao uso do critério econômico está associada à determinação do desconto no tempo dos custos e benefícios uma vez que a forma e o valor dessa taxa de desconto dependem de hipóteses sobre o crescimento futuro do consumo e alterações futuras nas preferências dos indivíduos Esse exercício de capturar valores associados a gerações futuras carrega um grau de incerteza e portanto não podem ser deterministicamente estimados Assim há que se considerar então uma análise de sensibilidade dos resultados a distintas taxas de desconto Há também que se identificar a sensibilidade de diversos modelos estatís ticos distintos quando das estimativas de impactos ecológicos bem como na sua mensuração econômica Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 12 Oligopolistas ou oligopsônicos 190 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Por fim cabe ressaltar que a magnitude do impacto ambiental num especí fico setor pode ser significativa de forma a afetar outros setores na sua cadeia produtiva Isto é se há evidências que efeitos intersetoriais são significativos há que se considerar essas relações setoriais na economia que são captadas com modelos de equilíbrio geral13 Nem sempre os impactos têm essa exten são14 mas é bom ressaltar que esses modelos de equilíbrio geral geralmente requerem uma alta sofisticação estatística e de base de dados A valoração e precificação dos recursos ambientais não identificam somente custos e benefícios totais mas também se não principalmente como esses são distribuídos no interior da sociedade ie quem está arcando com os custos e quem está recebendo os benefícios Esse processo de valoração e precificação assim é muito importante por que orienta os tomadores de decisão a encontrar também formas de conciliar outras alternativas que harmonizem essa distribuição de ganhos e perdas e a partir daí construir consensos e estimular participação apoio e compromisso entre os diversos reguladores econômicos na construção das bases de uma economia verde REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Freeman AM 1993 The measurement of environmental and resource values Washington Resources for the Future Hanley N Shogren J F e White B 2007 Environmental economics in theory and practice Basingstoke Palgrave Macmillan 2a ed Kolstad C D 2000 Environmental economics Oxford Oxford University Press MEA 2005 Millennium ecosystem assessment general synthesis report Washington Island Press Pearce D W e Turner K R 1990 Economics of natural resources and the environment Nova York Harvester Wheatsheaf Seroa da Motta R coord 1995 Contabilidade Ambiental Teoria Metodologia e Estudos de Casos no Brasil Rio de Janeiro IPEA Seroa da Motta R 1998a Manual para valoração econômica de recursos ambientais Brasília Ministério do Meio Ambiente Seroa da Motta R 1998b Sustainability principles and depreciation estimates of natural capital in Brazil In Faucheux S OConnor M e van Straaten J eds Sustainable Development Concepts Rationalities and Strategies Amsterdam Kluwer Academic Publishers Seroa da Motta R 2006 Economia ambiental Rio de Janeiro FGV Editora TEEB 2011 The economics of ecosystems and biodiversity mainstreaming the eco nomics of nature a synthesis of the approach conclusions and recommendations of TEEB UNEP 2011 Towards a green economy pathways to sustainable development and poverty eradication a synthesis for policy makers Disponível em wwwuneporg greeneconomy UNEP 2000a Environmental valuation a worldwide compendium of case studies UNEP UNEP 2000b Economic instruments for environmental management A worldwide compendium of case studies UNEP Valoração e precificação dos recursos ambientais para uma economia verde Ronaldo Seroa da Motta 13 Uma versão mais simplificada desse modelo é uma matriz insumoproduto onde as elasticidades de substituição são nulas Já num modelo de equilíbrio geral se abandona essa hipótese com estimativas específicas de elasticidades para cada atividade embora as funções de produção e consumo adotem os coeficientes técnicos de uma matriz 14 Como geralmente acontece por exemplo nos impactos de mudança do clima onde as análises quase sempre usam tais modelos 191 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 o papel das instituições financeiras na transição para uma economia verde MÁRIO SÉRGIO VASCONCELOS1 O debate começou a ganhar corpo na década de 1970 e se intensificou na virada do século deve haver um limite para o crescimento já que a economia faz parte de um sistema o planeta Terra cujo equilíbrio tem de ser respeitado na exploração de seus recursos O rompimento desse equilíbrio não interessa a ninguém no longo prazo Por isso a grande fronteira da sustentabilidade talvez seja responder como levar essa realidade em conta nos modelos de negócios das empresas E mais os bons resultados de uma empresa não garantem a perenidade do negócio por si só Mais do que a última linha do balanço cada vez mais os investidores e sociedade querem saber o que foi necessário fazer para se atingir tais resultados Em outras palavras a sustentabilidade é parte integrante da gestão e não um mero adendo Para as instituições financeiras a preocupação com o desenvolvimento sustentável vem desde a década de 1980 Contudo foi na década de 1990 que o tema ganhou maior repercussão culminando com o lançamento dos Princípios do Equador comentados adiante De lá para cá uma série de compromissos voluntários autoregulações e regulações estão incentivando os bancos a assumir um papel sustentável e inserirem conceitos de susten tabilidade em sua gestão Nesta última década as instituições financeiras brasileiras têm adotado uma série de práticas visando à incorporação de elementos sustentáveis em suas atividades tendo transformado o Brasil em um caso único entre os países emergentes mantendo programas e projetos de melhoria ambiental relacionados a suas operações promoção da educação ambiental nas comu nidades e crescente participação de funcionários especializados em riscos e oportunidades ambientais Muitas delas ponderam aspectos socioambientais na concessão de crédito promovem treinamentos sobre temas socioambientais relacionados à gestão do negócio para auditorias internas e para os gerentes de relacionamento de diferentes segmentos como atacado gestão de ativos e compliance A capacitação de gerentes e analistas para disseminar a política 1 Diretor de Relações Institucionais da Federação Brasileira de Bancos FEBRABAN 192 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 de risco socioambiental e promover a avaliação de riscos socioambientais em toda a área de crédito é outra prática comum Seu objetivo consiste em instruir as equipes para identificar riscos em grupos econômicos e setores considerados críticos como ligado ao petróleo químico petroquímico de celulose e siderúrgico Os bancos no Brasil estiveram atentos às questões da responsabilidade so cioambiental ao longo da década e aderiram maciçamente a pactos internacio nais e nacionais Essa adesão está ligada ao posicionamento institucional das empresas ao reconhecimento da importância desses pactos à postura ética à reputação e à imagem Alguns exemplos desses compromissos assumidos gradualmente e em escala variada pelos diversos bancos no Brasil são Princípios do equador foram lançados em 2002 pelos dez dos maio res bancos de financiamentos de projetos do mundo Estabelecem critérios mínimos para a concessão de crédito em projetos que exijam investimentos acima de R 10 milhões assegurando que os projetos financiados sejam de senvolvidos de forma socialmente e ambientalmente responsável Pacto global foi lançado oficialmente pelas Nações Unidas em 2000 Encoraja empresas a adotar políticas de responsabilidade social corporativa e sustentabilidade orientando as organizações a redefinir suas estratégias e ações por meio de dez princípios nas áreas de direitos humanos trabalho meio ambiente e combate à corrupção united Nations environment Programme finance initiative uNeP fi tratase de uma parceria entre o PNUMA e o setor financeiro global firmada desde 1997 cuja missão é identificar e promover as melhores práticas rela cionadas à sustentabilidade Todos os membros assinam uma declaração por meio da qual se comprometem a integrar cada vez mais o desenvolvimento sustentável às suas operações objetivos do milênio oDm os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio ODM estabelecem compromissos aprovados entre líderes de 191 países membros das Nações Unidas em 2000 São oito os Objetivos do Milênio erra dicar a extrema pobreza e a fome atingir o ensino básico universal promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres reduzir a mortalidade infantil melhorar a saúde materna combater o HIVAids a malária e outras doenças garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer uma Parceria Mundial para o Desenvolvimento O esforço coletivo deve garantir até 2015 o cumprimento desses objetivos Princípios para investimento Responsável PRi uma das realizações do Unep FI em conjunto com o Pacto Global foi a criação em 2006 da decla ração Princípios para Investimento Responsável PRI na sigla em inglês Com essa iniciativa o objetivo é que os investidores de todo o mundo incorporem voluntariamente aspectos ambientais sociais e de governança corporativa no O papel das instituições financeiras na transição para uma economia verde Mário Sérgio Vasconcelos 193 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 momento em que efetuarem suas aplicações Até abril de 2011 mais de 850 instituições de investimentos tornaramse signatárias Pacto empresarial pela integridade e contra a corrupção lançado em 2006 durante a Conferência Internacional Ethos o pacto contém um conjunto de sugestões diretrizes e procedimentos para serem adotados pelas empresas e entidades no seu relacionamento com o poder público Pacto Nacional pela erradicação do trabalho escravo no brasil criado em maio de 2005 é coordenado e monitorado pelo Instituto Ethos de Empre sas e Responsabilidade Social pelo Instituto Observatório Social pela ONG Repórter Brasil e pela Organização Internacional do Trabalho Sua missão é implementar ferramentas para que o setor empresarial e a sociedade brasileira não comercializem produtos de fornecedores que utilizem trabalho escravo carbon Disclosure Project cDP é um requerimento coletivo for mulado por um grupo de 534 investidores institucionais responsáveis pela administração de um patrimônio estimado em US 64 trilhões O projeto foi idealizado para que empresas e investidores em todo o mundo tenham aces so a informações sobre o impacto provocado pelas emissões de gases do efeito estufa e pelas mudanças climáticas nos resultados das companhias O CDP é coordenado por uma entidade sem fins lucrativos financiada pelo Carbon Trust do governo britânico e por um grupo de fundações liderado pela Rockefeller Foundation Protocolo Verde Um passo mais concreto no compromisso dos bancos com as finanças sustentáveis foi dado em abril de 2009 com a assinatura de um protocolo de intenções entre a FEBRABAN e o Ministério do Meio Ambiente conhecido como Protocolo Verde Ele é fruto do esforço comum para adotar políticas socioambientais que sejam precursoras multiplicadoras demonstrativas ou exemplares de práticas bancárias e que estejam em harmonia com o objetivo de promover o desenvolvimento sustentável Para construir e implementar uma agenda comum de sustentabilidade no setor alinhada aos princípios e às diretrizes do Protocolo Verde a FE BRABAN com o apoio da Fundação Getulio Vargas FGV deu início em 2009 à construção de uma matriz de indicadores de sustentabilidade para as instituições financeiras Além de criar índices próprios o projeto irá se inspirar em outras referências existentes e reconhecidas no mercado como o suplemento setorial para instituições financeiras da Global Reporting Initiative GRI os indicadores EthosFEBRABAN e o questionário de ava liação do Índice de Sustentabilidade Empresarial ISE da BMFBovespa O papel das instituições financeiras na transição para uma economia verde Mário Sérgio Vasconcelos 194 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Além da participação dos bancos associados esse processo de construção coletiva conta com a colaboração de representantes de organizações da sociedade civil O objetivo é oferecer uma ferramenta de gestão que trace um diagnóstico do desempenho individual e setorial avaliando a contribuição dos bancos para a geração de riquezas com o olhar da sustentabilidade Pretendese ainda que a matriz sirva de instrumento de comunicação e de prestação de contas à sociedade incluindo o desenvolvimento de novos produtos e serviços que contribuam para a transição rápida a uma economia verde e mais inclusiva Individualmente os bancos devem confirmar seu compro metimento com as diretrizes do Protocolo Verde Em 2009 tornaramse signatários do documento o Banco do Estado do Rio Grande do Sul o BIC Banco o Banco Sofisa o Banco Votorantim o Bancoob o BNP Paribas Brasil o Banrisul o Bradesco o Cacique o Citi o HSBC o Itaú Unibanco o Safra e o Santander Brasil Vários bancos também oferecem produtos com foco em programas de financiamento fundos de aplicação e cartões de afinidade com anuidades destinadas a ONGs que se dediquem à questão ambiental São emblemáti cos os fundos de ações de empresas que compõem o Índice de Sustentabi lidade Empresarial ISE da Bovespa e os programas de financiamento para conservação do meio ambiente e recuperação ambiental com o objetivo de regularizar e recuperar áreas de Reserva Legal e de Áreas de Preservação Permanente degradadas O desempenho desses fundos verdes sinaliza a eficácia e a competência das empresas que adotam práticas sustentáveis Em 2010 um ano fraco para a bolsa os fundos registrados como sustentáveis e de governança na Associa ção Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de CapitaisAnbima representante de 340 instituições que atuam nos mercados financeiro e de capitais apresentaram uma valorização de suas cotas da ordem de 796 para 104 de valorização do Índice da Bolsa de Valores Na área de crédito e financiamento foram criadas novas linhas ambientais para o financiamento de reflorestamento o desenvolvimento de sistemas agroflorestais e o investimento em energias renováveis Os bancos também oferecem linhas de crédito para a aquisição de máquinas e equipamentos com taxa de juros reduzida às empresas que queiram desenvolver processos produtivos mais limpos Para a redução do impacto ambiental há ainda pro gramas voltados para despoluição de bacias hidrográficas compensações ambientais implantação e manutenção de Unidades de Conservação e uso de biodiesel e produção orgânica O papel das instituições financeiras na transição para uma economia verde Mário Sérgio Vasconcelos 195 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Para avaliar e classificar os riscos socioambientais nas linhas de negócios a ferramenta mais utilizada pelos bancos é o questionário socioambiental que inclui checagem de informações relacionadas a compliance exigência de licenças ambientais e visitas in loco Há bancos que aprofundam essas ava liações por meio de análise dos potenciais riscos socioambientais do cliente setor ou projeto com a gestão da prática por equipe especializada que realiza a pesquisa de informações públicas com consultoria e auditoria independen tes e quando necessário com assessoria técnica para o financiamento de melhorias socioambientais Já para assegurar que o cliente esteja de fato cumprindo as exigências so cioambientais previstas em contrato os bancos realizam auditorias ambientais visitas técnicas avaliações das propriedades monitoramento das carteiras de crédito e reavaliação dos projetos Apesar de todas essas práticas o processo de auditoria para políticas e riscos socioambientais é ainda um desafio do setor A maioria dos bancos não possui verificação com foco em sustentabilidade mas tem a intenção de estruturála nos próximos anos O objetivo é prevenir riscos e incentivar a adoção de melhores práticas entre os clientes Alguns no entanto já desenvolvem esse processo para algumas linhas de projetos com base nos Princípios do Equador O destaque é a aplicação periódica da política de risco socioambiental para o crédito pessoa jurídica com supervisão técnica do comitê de auditoria interno e aplicação de testes de efetividade Os resultados dessas avaliações são reportados aos principais executivos como os membros do conselho de administração e do comitê de sustentabilidade A capacitação e o engajamento dos profissionais em políticas socioambien tais é outro desafio para a incorporação e a avaliação de critérios de susten tabilidade tornandose meta estratégica das áreas de negócio dos bancos Entre as principais iniciativas existentes estão treinamentos conceituais e de análise de risco socioambiental para as gerências de relacionamento para as auditorias internas e para os analistas No entanto a maioria dos bancos tem como meta ampliar a oferta de capacitações para uma parcela maior do público interno Vale destacar que todo esse movimento não é bom mocismo porque o risco a gestão do risco é o cerne do negócio financeiro E o risco ambiental tem impacto efetivo e crescente sobre os quatro grandes riscos enfrentados pelas instituições bancárias o risco de mercado o risco legal operacional e o mais importante que é o risco de reputação A reputação é talvez o maior ativo de empresas que atuam numa atividade a intermediação financeira em que a confiança e a credibilidade são a diferença entre a vida e a morte Basta lembrar que crédito vem do latim credere acreditar confiar Na última crise correram o mundo as imagens de clientes acampados nas portas do banco Northern Rock da GrãBretanha lembrando as fotos esmaecidas das antigas O papel das instituições financeiras na transição para uma economia verde Mário Sérgio Vasconcelos 196 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 corridas bancárias tão comuns no século 19 e início do século 20 Aliás não por acaso uma pesquisa da consultoria Accenture com altos executivos de todo o mundo revelou que 72 dos entrevistados destacaram a importância de compromissos visíveis e autênticos com a sustentabilidade como necessidade urgente a fim de reconquistar a confiança e reconstruir a reputação abaladas pela crise financeira internacional Um exemplo entretanto ilustra o tamanho do papel das instituições fi nanceiras como indutoras de boas práticas nos setores em que investem e aqueles que financiam a mídia cada vez mais coresponsabiliza bancos por projetos que financiam como o de Belo Monte O mundo inteiro está olhando para o Brasil e se questionando como estão sendo tratadas as comunidades locais e indígenas Como estão sendo considerados os impactos ambientais E fica a seguinte pergunta como as empresas que fazem parte do consórcio estão tomando as devidas providências E por fim como os bancos estão se posicionando frente a tudo isso Só por esse exemplo podemos aquilatar a responsabilidade imensa e como sua postura proativa é que será determinante Principalmente quando muitos mercados estão sendo colocados em xeque hoje em dia O modelo energético é um exemplo e já observamos como universidades institutos de pesquisas e empresas estão trabalhando para encontrar novas tecnologias A inclusão da base da pirâmide também é um desafio e grandes e pequenas organizações já estão se posicionando e oferecendo soluções inovadoras Entre os inúmeros novos negócios que estão surgindo com certeza temos embriões de grandes negócios que em 10 anos serão muito rentáveis Os bancos devem ser os propulsores dessas ondas entender quais são essas tendências fomentar investir e financiar esse tipo de negócio induzindo o processo de transição para uma nova economia As lideranças das instituições financeiras têm que estar prontas para fa zer essa guinada Hoje Bloomberg e Reuters por exemplo estão criando mecanismos que ajudarão os analistas a considerar as variáveis ambientais sociais e de governança Mas é preciso ir além É necessário que cada banco conheça o impacto de sua carteira de clientes e tenha um plano estratégico para fazer essa transição Estar próximo de universidades ou de incubadoras por exemplo ajudará a identificar as tendências Tudo isto para dizer que não cabe mais aos bancos um papel passivo e de monitoramento e sim um papel ativo identificando empreendedores tec nologias e novos modelos de negócios Somente assim vamos ter um saldo positivo para todas as partes O papel das instituições financeiras na transição para uma economia verde Mário Sérgio Vasconcelos 197 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde1 RONALDO SEROA DA MOTTA2 CAROLINA BURLE SCHMIDT DUBEUx3 IntROdUçãO O relatório Rumo a uma economia verde caminhos para o desenvolvi mento sustentável e a erradicação da pobreza produzido pelo UNEP 2011 procura demonstrar que o desenvolvimento sustentável pode ser alcançado sem perdas de renda e emprego e muito menos com aumento da pobreza O relatório modela assim os efeitos macroeconômicos renda emprego e consumo de uma economia verde Os resultados dos modelos de crescimento adotados no relatório estimam que em médio prazo a partir de seis anos investimentos em capital natural na magnitude de 2 do PIB mundial entre 20112050 gerariam um cresci mento de setores limpos que mais que compensariam as perdas de renda e emprego dos setores marrons que se contraem E que esses investimentos também reduziriam o nível de pobreza daqueles que dependem diretamente de serviços ambientais O conceito economia verde não é assim substitutivo ao de desenvolvimento sustentável e sim instrumental Financiar esses investimentos de forma sustentada exigirá regulação com corte de subsídios perversos e precificação dos bens e serviços ambientais além de um sistema de indicadores ambientais Na seção seguinte discutimos como a teoria da sustentabilidade incorpora os princípios da economia verde Por último delineamos brevemente as es tratégias básicas para a construção de uma economia verde no Brasil SUStentabIlIdade e ecOnOMIa veRde4 O conceito de desenvolvimento sustentável surge formalmente no relatório Brundtland Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento 19875 1 Rio de Janeiro abril de 2011 2 Técnico de Planejamento e Pesquisa do IPEA e membro dos 3º e 5º Relatórios do IPCC 3 Pesquisadora do Centro de Estudos Integrados sobre Meio Ambiente e Mudança Climática Centro ClimaCOPPEUFRJ e membro do 5º Relatório do IPCC 4 Esta seção foi baseada em Seroa da Motta 2011 5 A ideia de compatibilizar crescimento econômico e natureza já era um tema recorrente antes da publicação do relatório Brundtland mas foi este que teve mais sucesso na sua formalização 198 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Esse documento introduziu definitivamente a ideia de que o desenvolvimento econômico deve se realizar sem comprometer o desenvolvimento econômico das gerações futuras De forma bastante simplificada a novidade dessa abordagem do desenvol vimento sustentável reside na inserção da dimensão ambiental nos modelos de crescimento econômico A sustentabilidade do crescimento econômico sempre foi a questão central dos modelos de desenvolvimento Entretanto os modelos de desenvolvimento adotados pelos países nos últimos cinquenta anos da era do planejamento e da intervenção governamental excepcionalmente referiamse às questões ambientais como uma restrição A base natural das economias em planeja mento era considerada como infinita isto é como um fator de capital sem restrições de escassez Não obstante essa base natural estar intrinsecamente associada às vanta gens comparativas ensejadas pelas economias na sua inserção internacional e altamente associada às atividades de subsistência das camadas mais po bres da população geralmente majoritárias nos países em desenvolvimento na literatura sobre desenvolvimento econômico poucas são as referências às questões ambientais Apesar da finitude desses recursos colocar um impedimento na trajetória de desenvolvimento adotada e gerar problemas sociais significativos a percepção de escassez não existia na concepção desses modelos6 O conceito de desenvolvimento sustentável embora possa ter inúmeras descrições e sua utilização nos meios de comunicação geralmente ocorrer em contextos vagos é possível ser discutido objetivamente da mesma forma que se discute a sustentabilidade do crescimento econômico quando se considera a importância de manteremse nãodeclinantes os valores dos ativos de uma economia Isto é a sustentabilidade de uma economia ocorre na medida em que o seu estoque de capital que define o fluxo de bens e serviços futuros seja mantido pelo menos constante A questão atual da sustentabilidade apenas introduz a necessidade de tratar se o capital natural diferenciadamente do capital material Uma diferenciação com semelhante corte teórico e metodológico ao daquela que introduziu a teoria do capital humano e tecnológico nesses mesmos modelos Os modelos de crescimento econômico desenvolvidos na década de 70 que analisavam a otimização intertemporal do uso dos recursos naturais na produção7 dependiam de hipóteses sobre a essencialidade dos recursos e seus impactos no nível de crescimento da economia Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux 6 Ver por exemplo Dasgupta e Maller 1996 para uma análise sobre esta lacuna na literatura 7 Ver Hartwick 1977 Solow 1978 e Dasgupta e Heal 1979 199 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 De acordo com Perrings et al 1995 a essencialidade dos recursos ambien tais pode ser analisada pelo grau de complementaridade e de substituição entre o capital natural e o capital material dentro das possibilidades de produção e consumo de uma economia Isto é a elasticidade de substituição entre esses dois tipos de capital é que define o grau de essencialidade Quanto maior a elasticidade de substituição menos essencial será o recurso Nos modelos tradicionais assumese que essa elasticidade de substituição é maior ou igual a um Ou seja o nível do estoque de capital natural poderá ser reduzido desde que a economia consiga realizar os investimentos com pensatórios em capital material Essa seria a conhecida regra de SolowHartwick na qual a sustentabilidade de uma economia entendida como a capacidade da economia em manter certo nível de consumo seria determinada pela capacidade de evitar que a renda gerada na exploração do recurso natural nãorenovável seja totalmente transformada em consumo presente Para tal bastaria reinvestir parte dessa renda gerada com a exploração de recursos naturais na formação de capital seja material ou natural equivalente ao consumo de capital natural8 O importante para a maximização do bemestar de acordo com esses mo delos é manter o estoque total de capital constante ao longo do tempo9 Assim as questões ambientais não eram consideradas como relevantes ou restritivas ao crescimento O que importa é a capacidade política de imobilizar parte dos ingressos resultantes da exploração desses recursos naturais Entretanto a capacidade de geração de serviços dos ecossistemas depende da manutenção de certos componentes ecossistêmicos tais como população e cadeia alimentar dentro de limites específicos Uma vez vencidos esses limites o sistema poderá entrar em colapso e sua produtividade tornase nula A definição desses limites identifica os limites do crescimento e portanto determina a trajetória de sustentabilidade de uma economia Assim é prudente identificar quais os níveis mínimos de segurança ou a capacidade de suporte dos recursos naturais que estão sendo apropriados na geração de renda Dessa forma podemos definir o capital natural crítico como aquele em que o nível de consumo já excede sua capacidade de suporte e portanto sua produtividade tende a zero Nesses casos a elasticidade de substituição é menor que um e as possibilidades de substituição entre capital natural e material tendem a se reduzir quando o produto cresce Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux 8 Isto é os custos ambientais seriam inferiores aos benefícios ou a geração de renda resultante poderia compensar ou recuperar as perdas ambientais e ainda adicionar valor agregado à economia 9 Além de outras hipóteses restritivas tais como valoração de capital no tempo e constância da taxa de desconto no tempo 200 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Nesses casos críticos um nível de estoque de capital natural declinante representa uma trajetória de nãosustentabilidade e perdas de bemestar de vem ser consideradas Logo o consumo desse capital tem que ser negativo isto é deve ser apreciado e não depreciado O capital natural nãocrítico seria então aquele no qual o nível de estoque ainda não atingiu sua capacidade de suporte Entretanto isso não significa que esse capital não apresente um nível mínimo de segurança abaixo do qual ele se torna crítico Entretanto o consumo desse capital pode ser compensado por investimentos em capital material sem perdas de bemestar Seja em investimentos de recu peração de rios áreas contaminadas ou no controle desses impactos como no caso das mudanças climáticas com esforços em mitigação e adaptação A hipótese de sustentabilidade muito fraca crescimento econômico sem restrições ambientais assume que as possibilidades de substituição são inesgotáveis desde que o estoque total da economia não decline No outro extremo a hipótese de sustentabilidade forte de crescimento zero assume que não há mais possibilidades de substituição pois todas as formas de capital natural são críticas e não se admite qualquer consumo de capital natural Intermediariamente estaria a hipótese de sustentabilidade fraca que distin gue as formas críticas e nãocríticas de capital natural e determina tratamentos diferenciados de acordo com o nível crítico de estoque identificado Nessa abordagem se admite também o progresso técnico como agente de susten tabilidade quando esse reduz a intensidade ambiental do consumo Enfim a sustentabilidade seria possível com maior eficiência ambiental re sultante de i mudanças nos processos de produção e no desenho do produto ii mudanças na estrutura de produção e consumo e iii redução no nível de produção e consumo Nesse espectro a economia verde seria caracterizada por um aumento contínuo no estoque de capital natural isto é uma apreciação e não uma depreciação Com isso seria possível níveis de intensidade mais baixos de materiais e poluição por unidade de renda que por sua vez induziriam ao desligamentodescasamento ou à separação da atividade econômica dos impactos ambientais Essa proposição representa que políticas econômicas direcionadas ao capital natural podem acelerar esse desligamento sem redução nos níveis de consumo e produção De certa forma esta possibilidade se contrapõe àquela que admite que o desligamento aconteça espontaneamente dentro do processo de crescimento econômico quando a economia atinge um nível limiar de renda curva ambiental de Kuznets EKC na sigla em inglês10 Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux 10 Ver uma revisão crítica da EKC em Galeotti Manera e Lanza 2009 201 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Logo o desafio na construção da economia verde é o de criar capacidade institucional para a integração das políticas ambientais às políticas econômi cas e um sistema de indicadores ambientais que seja capaz de mensurar e monitorar os benefícios dos investimentos em capital natural eStRatégIaS de gOveRnança de UMa ecOnOMIa veRde Nas seções anteriores vimos que de acordo com os pressupostos teóricos econômicos a apreciação do capital natural não reduz necessariamente a eficiência da economia brasileira Ou melhor o custo ambiental gerado na exploração ineficiente dos recursos ambientais reduz as possibilidades de crescimento11 Desafiando o juízo convencional o custo ambiental não está associado à pobreza mas ao contrário a pobreza é parte do custo ambiental É comum ob servar na literatura referências constantes à pressão populacional sobre o meio ambiente12 e que a pobreza exacerbaria a pressão sobre a base natural dessas economias e ampliaria a crise ambiental Evidências dessa relação positiva entre pobreza e degradação têm sido contestadas na literatura que mede a relação entre renda e degradação à luz da hipótese da curva ambiental de Kuznets ver por exemplo Heerink Mulatu e Bulte 2001 e a de Justiça Ambiental ver Acselrad Herculano e Pádua 2004 e Shepard e CobinMark 2009 Por exemplo o baixo consumo em particular energético da população de baixa renda gera um nível muito baixo de gases do efeito estufa Relatórios do IPCC13 por outro lado confirmam que a falta de capacidade de renda dessa população resultará numa baixa capacidade de adaptação e eles serão aqueles que mais sofrerão com os impactos das mudanças climáticas Já Seroa da Motta 2004 mede a contribuição por nível de renda na po luição hídrica e atmosférica no Brasil e evidencia que a alta concentração da pressão de degradação a partir do padrão de consumo das pessoas mais ricas acrescenta outro aspecto regressivo para a distribuição desigual da renda no Brasil Isto é a pressão total da degradação se deve principalmente ao padrão de consumo das classes de renda mais alta e o relaxamento no controle am biental cria indiretamente um subsídio para o consumo dos ricos a expensas dos pobres Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux 11 Tanto como o congestionamento e a baixa qualidade dos serviços de infraestrutura os custos ambientais ineficientes da nossa economia também podem ser incluídos como parte do chamado Custo Brasil 12 Essa hipótese se inicia no trabalho seminal de Ehrlich 1968 que introduz o conceito de risco ambiental devido à pressão populacional no que ficou conhecido como a tese neo malthusiana 13 Ver por exemplo IPCC 2007 202 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Assim a distribuição dos custos e benefícios do controle ambiental deve ser equitativa E por último procuramos demonstrar como a valoração e a precificação dos bens e serviços ambientais podem contribuir para a construção de uma economia verde Enfim a questão ambiental pode deixar de ser um problema e tornarse uma solução Para tal será preciso conciliar essas faces de realidade aci ma descritas e desenhar as opções de gestão que harmonizem as políticas econômicas e ambientais A seguir elaboramos algumas destas opções a saber sistematizando os indicadores ambientais ampliando os instrumentos econômicos e removendo os incentivos perversos SISteMatIzandO OS IndIcadOReS aMbIentaIS As magnitudes econômica e ecológica das questões ambientais são distintas e as suas importâncias relativas têm que ser esboçadas É portanto necessário um exercício de priorização dos objetos das ações de política para a construção de uma economia verde Todavia tal esforço requer uma iniciativa que deve estar presente no interior do sistema de planejamento como a de estabelecer concretamente o objetivo de gerar indicadores físicoquímicos que avaliem o padrão de uso dos recursos ambientais associados a indicadores econômicos e sociais que avaliem sua inserção na economia real14 Conforme o relatório da Comissão StiglitzSenFitoussi que fez uma ampla análise da mensuração do desempenho econômico e do progresso social as decisões dos tomadores de decisão dependem daquilo que é medido de quão boas são as medidas e de quão bem as medidas são entendidas15 As condições essenciais para realizar essas iniciativas são a a criação de um sistema estatístico ambiental que inclua indicadores ambientais e b o estabelecimento de relações destes com os tradicionais indicadores eco nômicos e sociais Os indicadores ambientais podem refletir a pressão das atividades eco nômicas produção e consumo sobre o meio ambiente como por exemplo emissões de gases do efeito estufa consumo de energia renovável e taxa de desmatamento ou o estado do meio ambiente como por exemplo concen tração de poluentes na atmosfera e nos recursos hídricos e níveis de extinção de espécies16 Esses indicadores permitem assim uma avaliação específica de um recurso ambiental Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux 14 Ver Seroa da Motta 1996 para uma avaliação de um esforço de geração de indicadores ambientais no Brasil 15 Stiglitz Sen Fitoussi 2009 p 9 16 Ver OECD 1993 onde primeiro se apresentou uma proposta de indicadores nessas categorias 203 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Uma avaliação mais geral do desempenho ambiental de uma região ou bioma tem que se valer de índices ambientais compostos que agreguem e sintetizem indicadores ambientais de pressão e estado como por exemplo o Environmental Sustainability Index ESI e o Environmental Performance Index EPI além de índices compostos que meçam a pegada ambiental por exemplo Ecological Footprint Index17 Por fim há os indicadores que correlacionam indicadores ambientais com indicadores econômicos que medem produção e consumo e que partem de um sistema de contas nacionais Um sistema de contas ambientais SCA tem sido proposto para inserir a variável ambiental no atual sistema de contas na cionais SCN O desempenho das atividades econômicas é refletido no SCN com medidas de agregados macroeconômicos como por exemplo o produto interno bruto PIB os investimentos e a depreciação de capital Quanto maior o estoque de capital de uma economia maior será sua capacidade de gerar renda O PIB é a renda gerada na economia Os investimentos representam o quanto a economia criou de capital na geração deste PIB e portanto é parte do PIB A depreciação representa o quanto a economia consumiu de capital para gerar o PIB e portanto não está incluída no PIB O produto interno líquido PIL de uma economia é assim o PIB menos o consumo de capital Essas medidas do SCN são estimadas com base nas informações coletadas junto às unidades produtivas por meio de pesquisa de questionários pex censos Conforme já discutido o uso de capital natural gera custos que os agentes econômicos não internalizam nas suas atividades Portanto o SCN não foi concebido inicialmente para captar os custos ambientais associados à depreciação do capital natural Esforços têm sido feitos pelo Escritório Estatís tico das Nações Unidas ver SEEA 2003 para uniformizar uma metodologia que permita que a estimação desse consumo de capital natural seja integrada ao SCN na forma de um sistema de contas ambientais Observe que a estimação do consumo de capital natural gera um indicador de quanto a sociedade está abrindo mão de seus ativos naturais para gerar renda ie trocando sustentabilidade por consumo presente Esse indicador pode oferecer uma boa orientação para os esforços de investimentos am bientais necessários para manter um nível sustentável de capital natural Por exemplo o Banco Mundial World Bank 2006 tem estimado o indicador de poupança genuína ou poupança líquida ajustada net adjusted savings para medir quanto da renda nacional é devida ao consumo de capital natural A determinação do nível adequado de sustentabilidade tem sido entretanto um dos principais problemas da valoração do consumo de capital natural Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux 17 Ver Stiglitz Sen e Fitoussi 2009 para uma discussão detalhada desses índices em particular para os de pegadas que para os autores não consideram as trocas comerciais entre países nem contabilizam a substituição de capital natural por capital material ou seja ganhos de produtividade ambiental ao longo do tempo 204 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Por exemplo Seroa da Motta 1998 estimou que 240 do PIB brasileiro em 2005 poderia ser considerado consumo de capital natural no critério de fraca sustentabilidade mas esse percentual poderia alcançar 29 no caso de um cenário de sustentabilidade forte Um Sistema de Contas Ambientais não se resume por exemplo à medida de PIB verde A integração com todos os indicadores econômicos das Contas Nacionais oferece inúmeras opções de medidas de desempenho ambiental As mais simples seriam intensidade de consumo ambiental emissões de po luente energia etc por unidade de renda e consumo renda nacional rendas das famílias consumo do governo importações e exportações até as que estão relacionadas com a formação de capital que mediriam as apreciações e depreciações do estoque de capital natural18 Os estudos até então realizados19 indicam também que a utilidade do SCA para a gestão ambiental está fortemente associada ao grau de desagregação dos indicadores em termos setoriais locais e temporais Dessa forma cabe ao planejamento de uma economia verde definir um Plano de Indicadores Ambientais que se inicie imediatamente com um conjunto mínimo e viável de indicadores ambientais que podem ser por exemplo consolidados desde já dos registros administrativos dos órgãos ambientais organizados para moni toramento e fiscalização como por exemplo inventários de emissões ou de fauna e flora e das já existentes pesquisas contínuas que investigam aspectos ambientais saneamento resíduos sólidos desmatamento etc Em suma sem o conhecimento da base natural e como essa se transforma em relação às atividades econômicas todo e qualquer esforço na direção de uma economia verde não poderá ser orientado e verificado aMplIandO OS InStRUMentOS ecOnôMIcOS A mudança estrutural da economia na direção de setores verdes vai requerer a precificação correta dos bens e serviços ambientais de forma a refletir seu verdadeiro custo de oportunidade Essa correção de preço pode ser feita atra vés de instrumentos econômicos de cobrança pagamentos ou tributos pelo uso do recurso ambiental ou pela criação de mercados de direitos de uso Além do aspecto de geração de eficiência esses instrumentos podem gerar receitas fiscais ou administrativas adicionais para a financiar a capacitação institucional dos órgãos ambientais b realizar pagamento ou compensações ambientais e c quando desenhados de forma progressiva viabilizar políticas compensatórias para aliviar os impactos ambientais sobre os pobres20 Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux 18 Nesse caso que se mensura o consumo de capital natural há questões conceituais e metodológicas mais complexas ou controversas para a monetização do valor do recurso natural e seus serviços Ver SEEA 2003 e o capítulo sobre valoração dessa publicação 19 Ver uma resenha recente em Stigliz Sen e Fitoussi 2009 20 Ver por exemplo Seroa da Motta 2006 205 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Para tal a primeira condicionante é a consolidação e codificação da legis lação ambiental e a criação do espaço legal para a adoção de instrumentos A segunda é o reconhecimento do espaço fiscal desses instrumentos no sistema tributário brasileiro Todavia a ampliação do uso dos mesmos deve ser cautelosa devido às suas dificuldades técnicas e administrativas Flexibilidade compatibilização institucional gradualismo e participação dos agentes afetados devem ser critérios a serem respeitados na introdução destes Antes de qualquer tentativa de desenvolver um instrumento econômico os reguladores devem primeiro analisar os objetivos das políticas e o estado atual dos usos do recurso natural Esse é um passo óbvio apesar de ser frequen temente desprezado especialmente quando os reguladores estão ansiosos por transferir uma boa experiência de um determinado instrumento aplicado em outro país Os reguladores devem primeiro explicitar a política ambiental e seus objetivos em cuja direção se considere o uso de instrumento econômi co Notese que um instrumento é um meio e assim não pode substituir os objetivos das políticas Em suma um instrumento destinase a servir a uma política e não o inverso ReMOvendO OS IncentIvOS peRveRSOS O maior desafio no planejamento de uma economia verde será nos ajustes a serem realizados nos instrumentos econômicos que são atualmente utiliza dos ou em desenvolvimento pelas políticas econômicas sociais e setoriais Logo a inserção da questão ambiental nessas políticas é crucial para eliminar incentivos perversos ao uso dos recursos ambientais que se contrapõem eou anulam os esforços de precificação e preservação dos recursos ambientais Entre essas políticas destacamos a as orientadas para recursos naturais e infraestrutura como as de energia abastecimento de água malha viária e outras b as tipicamente setoriais como por exemplo expansão agropecuária e industrial c as de cunho macroeconômico voltadas para estímulos às exportações geração de emprego e investimentos d as de conteúdo estrutural como a reforma agrária e as privatizações e e as de objetivo distributivo que estimulam as pequenas empresas o as sentamento urbano e outras A remoção de incentivos perversos à construção de uma economia verde somente será viável com um trabalho conjunto do sistema de regulação am biental e com o de regulação setorial que viabilize compromissos de diagnós Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux 206 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 tico avaliação e encaminhamento das ações de redefinição dessas políticas setoriais Certamente a incerteza sobre vários impactos ambientais visàvis os benefícios desejados poderá em certos casos indeterminar as decisões Todavia um esforço comum e participativo contribui para indicar essas áreas de incertezas avaliar seus custos e eliminar percepções distorcidas Somente com isso será possível um ajustamento menos custoso e mais eficiente dessas políticas Em suma nesses casos de indeterminação e incerteza a postura recomendada seria a identificação dos perdedores e beneficiados e das suas perdas e ganhos resultantes dos impactos ambientais e das possíveis ações mitigadoras e compensatórias Em conclusão as opções que aqui foram brevemente delineadas confirmam a hipótese de que a regulação ambiental não deve ser compreendida como um problema e que além de uma solução pode representar uma fonte de benefícios econômicos e sociais para o Brasil do século 21 com uma economia verde que gere crescimento com preservação e alívio à pobreza REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Acselrad H Herculano S e Pádua J A eds 2004 Justiça ambiental e cidadania Rio de Janeiro Relume Dumará Arrow K et al 1996 Economic growth carrying capacity and the environment En vironment and Development Economics 1 104110 Dasgupta P e Heal G 1979 Economic theory and exhaustible resources Cambridge Cambridge University Press Dasgupta P Maller K G 1996 Environmental economics in poor countries the current state and a programme for improvement Environment and Development Economics 1 37 Ehrlich P R 1968 The Population Boom Nova York Ballantine Galeotti M Manera M e Lanza A 2009 On the robustness of robustness checks of the Environmental Kuznets Curve Environmental and Resource Economics 424 551574 Hartwick J 1977 Intergenerational equity and the investing of rents of exhaustible resources American Economic Review 66 972974 Heerink N Mulatu A e Bulte E 2001 Income inequality and the environment aggre gation bias in environmental Kuznets curves Ecological Economics 38 359367 IPCC 2007 Fourth assessment report climate change 2007 AR4 Cambridge Cambridge University Press United Kingdom and New York OECD 1993 OECD core set of indicators for environmental performance reviews A synthesis report by the Group on the State of the Environment OECD Paris 35 p Perrings C A et al 1995 Biodiversity conservation and economic development the policy problem In Perrings et al eds Biodiversity conservation Dordrecht Kluwer Academic Publishers SEEA 2003 Handbook of national accounting integrated environmental and economic accounting Nova York ONU Seroa da Motta R coord 1995 Contabilidade ambiental teoria metodologia e estudos de casos no Brasil Rio de Janeiro IPEA Seroa da Motta R 1996 Indicadores ambientais no Brasil aspectos ecológicos de eficiência e distributivos Texto para Discussão 403 Rio de Janeiro IPEA Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux 207 ECONOMIA VERDE Desafios e oportunidades Nº 8 Junho 2011 Seroa da Motta R 1998 Sustainability principles and depreciation estimates of natural capital in Brazil In Faucheux S OConnor M e van Straaten J eds Sustainable development concepts rationalities and strategies Amsterdam Kluwer Academic Publishers Seroa da Motta R 2004 Padrão de consumo e degradação ambiental no Brasil Ciência Hoje 35211 3538 Seroa da Motta R 2006 Economia ambiental Rio de Janeiro FGV Editora Seroa da Motta R 2011 A sustentabilidade do desenvolvimento In Netto D et al eds O Brasil e a ciência econômica no século XXI Volume II São Paulo Saraiva no prelo Shepard P M CorbinMark C 2009 Climate justice Environmental Justice 24 163166 Stiglitz J Sen A e Fitoussi J 2009 Report by the Commission on the Measurement of Economic Performance and Social Progress Paris Solow R M 1978 Intergenerational equity and exhaustible resources Review of Economic Studies 41 2945 Turner R K 1992 Speculations on weak and strong sustainability Cserge Working Paper GEC 9226 UNEP 2011 Towards a green economy pathways to sustainable development and poverty eradication a synthesis for policy makers Disponível em wwwuneporg greeneconomy World Bank 2006 Where is the wealth of nations measuring capital in the 21st Century Washington World Bank WCED 1987 Our common future United Nations The World Commission on Environ ment and Development The Brundtland Report Mensuração nas políticas de transição rumo à economia verde Ronaldo Seroa da Mota Carolina Burle Schmidt Dubeux International Baccalaureate The British School of Rio de Janeiro Brazilian Social Studies Internal Assessment Geografia Até que ponto o desmatamento da Amazônia diminuiu entre os anos 2000 e 2023 Word Count Sumário 1 Seção 1 Plano de InvestigaçãoNumero página Seção 2 Avaliação das Fontes Seção 3 Análise das Fontes Seção 4 Conclusão Bibliografia Anexos SEÇÃO 1 PLANO DE INVESTIGAÇÃO 2 O propósito desta investigação é analisar a seguinte pergunta sendo proposta Até que ponto o desmatamento da Amazônia diminuiu entre os anos 2000 e 2023 O desmatamento da Amazônia ocorre por diversos fatores como por exemplo políticas econômicas e sociais A Amazônia é desmatada e explorada há séculos dado que muitos políticos nem sempre sao eficazes em ajudar na conservação ambiental Além do mais a falta de leis e de fiscalização na região somente agravam a situação e permitem o aumento de atividades ilegais do desmatamento ajudando as taxas sobre o desmatamento a crescerem Dados estatísticos e acadêmicos nesta área apontam inúmeros motivos para tamanho desmatamento incluindo a criação de gado exploração de recursos naturais e expansão agrícola na região amazônica Adicionalmente a migração de pessoas à procura de trabalho também auxilia para que mais áreas sejam desmatadas para o desenvolvimento econômico Com a piora da crise climática global esta questão do desmatamento especialmente na Amazônia a maior floresta tropical no planeta vem ganhando cada vez mais importância e espaço dentro do cenário nacional e internacional direcionando uma atenção maior ao tópico desta investigação tanto por parte de governos quanto de acadêmicos da área e até da sociedade como um todo Para abordar esta investigação fontes primárias e dados estatísticos sobre o desmatamento na Amazônia entre os anos 2000 e 2023 serão analisados e explorados em profundidade suplementando a investigação com fontes secundárias sobre o assunto As principais fontes a serem utilizadas no decorrer desta investigação são um gráfico ilustrando a taxa de desmatamento na Amazônia durante diferentes anos e um artigo acadêmico O desmatamento da floresta Amazônica Causas e Soluções de Bastiaan Philip Reydon que discute potenciais as causas e soluções para o desmatamento na floresta Amazônica Número de palavras 288 3 SEÇÃO 2 AVALIAÇÃO DE FONTES E EVIDÊNCIAS FONTE A A primeira fonte examinada consiste em um gráfico representativo da taxa de desmatamento na região amazônica ao longo dos anos Este gráfico foi obtido do site amazôniaorg e é atribuído à autoria de Cintia Cavalcanti e Aldrey Riechel Sua publicação ocorreu em 10 de novembro de 2023 No site em questão há uma abordagem mais detalhada sobre os números relacionados ao desmatamento na Amazônia acompanhada de explicações No entanto é importante notar que essa análise não constitui o foco primordial do trabalho O foco principal desse gráfico é a ênfase nos números do desmatamento e mostra perfeitamente os números declinando durante os anos Este gráfico é de grande importância para a minha pesquisa pois abrange o período necessário de 2000 a 2020 fornecendo uma visão detalhada dos números precisos relacionados ao desmatamento É importante ressaltar que o gráfico em questão é atualizado visto que foi feito em 2023 período recente em relação à minha pesquisa que se estende de 2000 a 2020 Essa atualidade confere ao gráfico uma relevância significativa Embora este gráfico seja extremamente útil é importante reconhecer que ele também apresenta algumas limitações como por exemplo ele tem data de 1988 que não são importantes para o meu trabalho o que pode atrapalhar na hora de analisar o gráfico Portanto ao interpretar e utilizar este gráfico é necessário considerar a relevância temporal dos dados apresentados Outra limitação do gráfico é que não mostra os números exatos dos meses o que limita na hora de pesquisa já que não pode ser específica números das palavras 254 FONTE B Floresta Amazônica Causas e Soluções publicado na Revista Política Ambiental e escrito por Bastiaan Philip Reydon Bastiaan Philip Reydon é professor da Universidade Estadual de Campinas Unicamp com mestrado em Agronomia e 4 doutorado em Economia do Desenvolvimento Espaço e Meio Ambiente do Instituto de Economia Por o autor ser entendido desta área de agronomia o conteúdo dele pode ser considerado confiável Dentro da minha pesquisa pretendo utilizar as páginas 143 e 147 da fonte referenciada O artigo mostra as questões relacionadas ao desmatamento na Floresta Amazônica mostrando tanto suas causas quanto possíveis soluções No texto também mostra estáticas sobre o desmatamento A publicação oferece uma análise sobre um tema de grande relevância ambiental O objetivo deste artigo é abordar de maneira abrangente todas as causas e possíveis soluções associadas ao desmatamento com o intuito de mostrar os fatores que contribuem tanto para o aumento quanto para a redução dos números desse problema ambiental O autor Bastiaan Philip Reydon tem o propósito de mostrar de que forma podemos diminuir esses números e também retrata a importância de diminuirmos esse número Essa fonte também é de grande importância para essa pesquisa já que ele ajuda a mostrar a jornada e o porquê dos números do desmatamento na Amazônia estarem descendo ou subindo Esta fonte apresenta algumas limitações ele tem informações desnecessárias para a minha pesquisa já que só vou utilizar algumas páginas deste artigo Outra limitação a ser considerada é a falta de atualização do artigo datado de julho de 2011 A limitação é especialmente relevante em contextos de pesquisa que são de 2000 a 2020 A ausência de dados mais recentes pode prejudicar a precisão da análise pois eventos descobertas ou mudanças significativas que ocorreram após 2011 podem não estar refletidos na obra Número de palavras 292 SEÇÃO 3 ANÁLISE DE FONTES E EVIDÊNCIAS Número de palavras aprox 700 5 SEÇÃO 4 CONCLUSÃO Número de palavrasaprox 200 BIBLIOGRAFIA ANEXOS se necessário NÃO CONTA NO WORD COUNT Bibliografia Exemplo de referência online G1 O Globo 2014 G1 Online Available at httpg1globocomriodejaneironoticia201404aposrenunciadecabralpezao assumegovernodorjnestasextahtml Acesso em 20 junho 2018 Exemplo de referência bibliográfica GRANJA P 2015 UPP o novo dono da favela Cadê o Amarildo 1 edição ed Rio de Janeiro Revan 6 Taxas de desmatamento Amazônia Legal Estados Taxas km² 211k 178k 137k 11k 138k 149k 291k 182k 132k 174k 173k 182k 216k 254k 278k 19k 143k 117k 75k 7k 64k 46k 5k 62k 69k 75k 101k 109k 116k 9k 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 2022 2023 As entradas e bandeiras envolvia a captura de índios nativos das regiões que os paulistas adentravam A imagem do bandeirante na historiografia brasileira é retratado como genocida porém Afonso Taunay na sua obra Histórias das Bandeiras Paulistas julga os números publicados de índios existentes muito exagerado Relata que no século XVII jesuítas alegavam que havia mais de trezentos mil índios em uma região chamada Guaíra que estavam sob a ameaça dos vicentinos Porém deixa explícito que esse número era exagerado a fim de vitimizar as famílias que poderiam ser capturadas Ademais Taunay julga exagero por parte de documentos jesuítas que relatam que em uma bandeira de 1628 haviam oito ou nove mil prisioneiros e que durante a caminhada morreram milhares e declaram que apenas mil e quinhentos indivíduos adentraram São Paulo Portanto é possível concluir que os jesuítas visavam a proibição das entradas paulistas Isso devido ao fato de que os bandeirantes capturavam os índios que os jesuítas tinham a intenção de catequisar Estrangeiros espanhóis e jesuítas caracterizavam os bandeirantes como figuras desalmadas que ignoram as leis e Deus fugindo para as florestas de forma ilegal e tal descrição repercutiu mundialmente para capitãesgerais vicereis e outras autoridades O autor Afonso Taunay expressa a sua opinião com mensagens explícitas e descritivas onde ele relata que os fatos descritos são verídicos uns exagerados falsos e até grotescamente fantasiosos A seção 3 serve também para que você mostre os pontos de vista dos autores que produziram as suas fontes e como eles abordam o assunto que você está trazendo na sua pergunta Por outro lado existe uma outra visão do bandeirante como uma figura que era um morador simples de região remotas da colônia que tinha uma situação financeira desfavorável levando uma vida quase que de indigente pobre analfabeto sem perspectivas e usava as rotas de interiorização como a única chance de melhorar as suas vidas O autor do livro Bandeirantes e 22 DAVIDOFF 1982 pg 2630 9 Personal code hyj385 Pioneiros paralelo entre duas culturas Vianna Moog defende tal visão apresentando o lado explorador ganancioso e predatório do bandeirante porque segundo ele o mesmo tinha uma falta de interesse coletivo visava um ganho de fortuna com rapidez e tinha uma instabilidade social e emocional A mensagem passada pelo autor Clodomir Vianna Moog é explícita e descritiva já que o mesmo indica claramente o que ele acredita ser a realidade O autor Porém é importante considerar também que os bandeirantes tinham qualidades e defeitos e que de certa forma não é necessário caracterizálo como nem herói e nem vilão O autor Alcântara Machado relativiza a figura do mesmo já que não leva a sua imagem aos extremos sendo ele nem nobre e nem pobre De certa forma o autor justifica os erros cometidos dos bandeirantes pelo fato de que eram lavradores modestos rústicos e simples que dedicavam a sua vida para a subsistência e a captura de nativos Portanto deixa implícito que essa era o estilo de vida do bandeirante e não tinha como objetivo descaracterizar a cultura indígena como alguns autores relatam Alcântara Machado analisa a figura do bandeirante idealizado numa cidade moderna e civilizada contrastandoa com a imagem do bandeirante em uma cidade em condições precárias com falta de iniciativa devido ao progresso de outras regiões do Brasil enquanto a região de São Paulo estava estagnada economicamente e entrando em decadência Esse empobrecimento de São Paulo chamado Capitania de São Vicente na época era devido à pobre qualidade do solo para a atividade açucareira com o plantio da cana de açúcar e a distância dos portos europeus no Norte Portanto o autor relativiza a figura do bandeirante já que leva em consideração as benfeitorias do mesmo e acredita que o bandeirante praticava os seus atos considerados agressivos por uma questão sobrevivência SEÇÃO 3 ANÁLISE DE FONTES E EVIDÊNCIAS Esta seção analisará as fontes A e B escolhidas para a pesquisa a primeira consiste no gráfico representativo da taxa de desmatamento na região amazônica ao longo dos anos e a segunda é uma parte de artigo escrito por Bastiaan Philip Reydon professor da Unicamp com mestrado em Agronomia e doutorado em Economia do Desenvolvimento Espaço e Meio Ambiente O exame das fontes busca responder à pergunta inicial Até que ponto o desmatamento da Amazônia diminuiu entre os anos 2000 e 2023 Começando pelo gráfico vemos que abrange períodos desde 1988 até 2023 sendo bem atualizado para a pesquisa com as taxas de desmatamento em km² e abaixo representado Partindo do período de interesse para a pesquisa 20002023 iniciando pelo ano 2000 podemos perceber que a taxa de desmatamento foi de 182k e cresceu até 2004 quando alcançou 278k ou seja subiu quase 10k A partir de 2005 já teve uma queda passando para 19k e continuou diminuindo até 2007 com 117k A partir de 2008 teve um aumento para 129k e a partir de 2009 redução bastante alta passando para 75k até atingir o menor valor em 2012 46k No ano seguinte 2013 houve leve aumento para 59k e nos anos seguintes ocorreram diversas variações porém de modo geral houve crescimento já que até 2022 chegou a 116k No entanto no ano passado em 2023 teve redução para 9k valor parecido com o do ano de 2019 101k Se fizermos uma análise dividindo o intervalo pela metade aproximada percebemos o seguinte de 2000 a 2011 ocorreu uma redução bastante acentuada de cerca de 118k E no período seguinte de 2012 a 2023 aconteceu um leve aumento de aproximadamente 44k De modo geral podemos observar o seguinte a partir do ano 2000 182k até 2023 9k teve uma diminuição absoluta de 92k havendo variações Além disso se considerarmos que em 2004 teve aumento para 278k a redução foi maior ainda de cerca de 188k Assim voltando à pergunta inicial podemos notar que de fato houve uma diminuição do desmatamento da Amazônia entre os anos 2000 e 2023 considerando apenas os números absolutos e as taxas em km² Passando agora à análise da segunda fonte temos o artigo de Bastiaan Philip Reydon que trata sobre o desmatamento da floresta amazônica O maior problema é que a pesquisa é datada de 2011 e traz dados desse ano e de períodos anteriores O autor inicia falando que várias políticas e leis tiveram bastante efeito na redução do desmatamento da Amazônia mas também afirma que como essas medidas dependem de atuação estatal não são muito eficientes no longo prazo Outro ponto abordado é que os piores problemas do desmatamento são a pecuária produção de grãos e de energia os quais vão ser mantidos mesmo com essas leis de proteção Dessa forma o autor entende que a solução para o desmatamento está ligada à resolução dessas questões Logo no começo na página 144 Bastiaan traz alguns dados da FAO 2010 sobre o desmatamento no Brasil afirmando que houve perda de 26 milhões de hectares de florestas em 10 anos comparando os dados com o da Indonésia em que a perda foi bem menor 500 mil hectares apenas Em seguida o autor mostra um gráfico comparativo demonstrando que nos últimos anos o desmatamento tinha diminuído bastante com números por volta de 64 milhões de hectares Porém ele menciona também que ainda é um número alto de desmatamento tendo em vista que a Amazônia é um bioma com tanta diversidade e sua importância para o clima do planeta Outros problemas que o autor fala que também geram desmatamento foram os seguintes a ganhos sobre uso da terra amazônico b políticas públicas c crédito d construção de rodovias e crescimento da população Assim de acordo com a segunda fonte retomando a pergunta houve redução do desmatamento no entanto temos que considerar que essa fonte examinou um período de tempo bem menor 2010 e 2011 Número de palavras 661