Morangos Mofados

Preciso que façam um diálogo de uma RádioNovela e me mandem tudo escrito no tema Pera uva ou maçã Um capítulo do livro Morangos Mofados de Fernando Sabino Com imagens enviadas também A red apple sitting on a dark table with books and a lamp blurred in the background A man lighting a cigarette with a lighter while a woman sits in the background slightly out of focus A woman smiling and covering her mouth with her hand sitting at a table with a man who looks serious an apple and ashtray are on the table RADIONOVELA PÊRA UVA OU MAÇÃ PERSONAGENS NARRADOR Voz grave pausada ELE psicanalistaterapeuta Voz calma firme e curiosa ELA paciente Voz inicialmente contida depois acelerada e emotiva INÍCIO EFEITO Música suave e melancólica de fundo como de um piano Fade in NARRADOR Voz grave com eco Existem rituais Pontos fixos na vida Para ela o ritual era sempre o mesmo segundas e quintas às cinco da tarde A bolsa apertada contra o peito as unhas roídas Ele a esperava Um encontro silencioso entre duas pessoas que mesmo a sós mantinham suas distâncias Um jogo de paciência Uma peça em que os papéis eram fixos até hoje EFEITO Porta pesada de madeira abrindo devagar rangendo levemente Passos contidos A música de fundo aumenta um pouco antes de sumir ELE Voz calma firme Pode se sentar EFEITO Porta fechando Som de cadeira sendo arrastada Silêncio tenso O único som é a respiração dos dois NARRADOR Ela se senta A cabeça baixa Olha fixamente para as meias dele como se nelas residisse a única verdade que importasse EFEITO Um maço de cigarros sendo tirado do bolso O som de um filtro batendo no braço de uma poltrona repetidamente Barulho de isqueiro plástico sendo rodado entre os dedos Ação demorada EFEITO Isqueiro riscando Trago profundo de cigarro Cinza caindo no cinzeiro ELA De repente sem olhar nos olhos Desculpe mas acho que você está com as meias trocadas EFEITO Som do relógio da parede marcando os segundos alto e claro O único som na sala ELE PENSAMENTO Monólogo interno voz baixa e reflexiva Não não estou Eu mesmo as escolhi esta manhã Uma bordô com friso branco a outra xadrez preta e vermelha Uma pequena rebeldia Inofensiva Mas ela notou Sempre percebe Por que ela sempre percebe ELE Com frieza contida E isso te incomoda ELA Ombros subindo e descendo Voz rápida Não é que incomode só que na verdade eu não me importo nem um pouco com as suas meias EFEITO Silêncio Tragada longa no cigarro O som da cinza caindo em um cinzeiro de vidro ELE Curioso Quer dizer então que você não se importa EFEITO Silêncio o tiquetaque do relógio mais alto ELE Intrigado Não foi o que você disse ELA Voz acelerada inquieta Não O que eu quero mesmo dizer é que hoje não estou disposta a perder tempo discutindo Hoje eu aposto nas ameixas EFEITO Som de uma caixa de fósforos sendo remexida O fósforo riscando Um estalo de chama O som de um filtro sendo acendido e a pessoa se dando conta Um suspiro de frustração O fósforo é apagado com um sopro ELA Voz acelerada e muito inquieta Escuta não estou disposta a passar os quarenta e cinco minutos discutindo as razões de eu dizer que você está com as meias trocadas certo EFEITO Som de cigarro sendo batido no cinzeiro ELA Voz mais calma indecisa É que aconteceu uma coisa uma coisa muito importante ELE Sua voz agora demonstra mais curiosidade do que calma O que aconteceu de tão importante ELA Voz febril quase trêmula Quando vinha pra cá tropecei num caixão de defunto EFEITO A música melancólica de piano retorna bem suave O som de passos de um cortejo fúnebre pesados e lentos O som seco de frutas caindo no chão paf paf paf Repete o som algumas vezes ELE PENSAMENTO Monólogo interno Aposta em ameixas Um caixão O que é isso De todos os inícios de sessão este é o mais estranho Eu deveria anotar Relato de evento onírico Mas ela não está dormindo O suor em suas têmporas O terror e a excitação Não é um sonho ELA Rápida quase ofegante Quando vinha caminhando naquele sobrado amarelo vinha saindo um enterro EFEITO ela fazendo som de contradição thu thu thu ELA Confusa Não não foi assim Eu vinha caminhando com um quilo de ameixas que comprei antes EFEITO Som de outro cigarro sendo aceso ELA Rápida ofegante e confusa Também não foi assim Antes ontem na verdade eu dormi até quase as três horas da tarde de hoje aí minha mãe me acordou para vir para cá EFEITO Som do cigarro sendo apagado no cinzeiro ELA Voz envergonhada Acendi o filtro que merda ELE PENSAMENTO Monólogo interno Ela nunca fala palavrão ELA Rápida querendo encerrar o assunto Eu vinha vindo estava meio tonta sempre fico meio tonta quando durmo até tanto Não que eu durma parece que durmo Foi nessas barraquinhas de frutas que eu vi estava de cabeça baixa umas ameixas tão vermelhas eu estava pensando em umas coisas EFEITO Pausa O som da música e dos passos param Resta apenas o eco do relógio A respiração dela ofegante ELE Voz firme baixo Que coisas EFEITO SILÊNCIO ELA Confusa e brava Que coisa o quê ELE Voz mais alta e interrogativa No que você está pensando ELA Voz encabulada brava Sei lá muito triste uma merda Mas não importa não me interrompa Deixa eu falar deixa eu falar depois que acordo alguma coisa em mim continua dormindo EFEITO Traga fundo e solta a fumaça ELA Tom mais baixo choroso Eu vi as ameixas pedi um quilo estavam bonitas vermelhas estava quase sem grana meus pais não me dão EFEITO Silêncio respiração contrariada Pensei se eu comprar as ameixas vou ter que voltar a pé mas não me importa quem sabe assim a coisa dentro de mim acorda EFEITO Respiração ofegante cansada chorosa Vim comendo as ameixas uma atrás da outra caminhando devagar não conseguia não comer foi aí que eu vi EFEITO Respiração de quem está pensando Na casa amarela sabe o sobrado acho que era um caixão com defunto saindo bem na hora que eu ia passar não deu tempo tropecei no caixão e as ameixas caíram todas na calçada EFEITO Ameixas caindo pessoas ah ah ah E todo mundo parou Me olhando as pessoas com lenços uma porrada de coroas de flores devia ser alguém rico sabe Aí que eu entendi que era um velório velório não um enterro Enterro que é antes né ELE Rápido e curioso É velório é antes ELA Voz envergonhada Todo mundo ficou me olhando Eu de joelhos juntando uma por uma e eles imóveis parecendo uma fotografia me olhando Eu nem estava me importando que estavam em um enterro e tudo parou só por minha causa certo E eu Catando uma por uma só quando terminei que as coisas voltaram a se mexer EFEITO Silêncio som do relógio andando ELA Voz de deboche Me olhando as pessoas e eu juntando as ameixas EFEITO Som apagando o cigarro ele acendendo outro cigarro ELE Voz firme No que está pensando ELA Ri pela primeira vez uma risada suave Numa brincadeira boba de quando eu era guria Pêra uva ou maçã EFEITO Risadinha curta quase infantil ELA Pêra era um aperto de mão Uva um abraço Maçã um beijo na boca Foi a primeira vez que eu beijei de língua EFEITO Som de dedabado este é um som não padrão mas mantive a sua intenção ELA Faz tanto tempo que eu não bebo tanto tempo que eu não danço será que ainda existe esses bailes dançantes ELE PENSAMENTO Monólogo interno Acho que ela vai chorar melhor pegar o lenço EFEITO Pausa A música de fundo retorna um pouco mais intensa A voz dela se torna mais intensa também ELA INCISIVA Quanto tempo falta ELE INDECISO Cinco minutos EFEITO Ela cantarolando desafinada ELA Olha antes de ir embora eu quero eu preciso continuar apostando nas ameixas Foi isso que pensei quando saí do enterro Não importa se é proibido Não importa se a gente deve ou pode Quando a gente precisa a gente não se importa Querer A gente inventa EFEITO Ele apaga o cigarro no cinzeiro O som é limpo e final O silêncio denso retorna Os passos da cadeira dela se movendo ELA Levantandose decidida O som do tecido da blusa roçando em algo Isto é para você EFEITO Som de uma fruta sendo colocada sobre uma superfície de madeira Um som seco quase abafado A música retorna bem suave ELE Surpreso baixo Uma ameixa obrigado ELA Voz firme com brilho contido Feliz ano novo EFEITO Porta batendo com força Silêncio súbito A música e os efeitos sonoros se apagam exceto o som do relógio e um leve murmúrio do ar condicionado ELE PENSAMENTO Monólogo interno voz firme reflexiva com um tom de espanto Mas é setembro Apenas setembro E ela me deseja feliz ano novo O que significa Um novo começo Um ciclo quebrado E essa ameixa vermelha como sangue Uma oferta Um aviso Eu que estou acostumado a palavras a fórmulas hoje recebo uma fruta Uma fruta no meio de setembro Uma aposta E eu o que eu aposto Devo ligar para os pais uma nova internação para ela EFEITO Som de uma leve batida na porta distante NARRADOR Voz em off A secretária com a discrição de sempre anuncia o próximo cliente A sessão de quarenta e cinco minutos chegou ao fim Mas algo na rotina se quebrou para sempre Sobre a mesa uma ameixa Madura lustrosa com a casca estufada quase arrebentando pela pressão interna da polpa Um pequeno solitário e incerto feliz ano novo EFEITO Fundo musical suave melancólico de piano Fade out FIM